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Artigo publicado no Vol.03 Nº01 - Edição de JAN a JUN 2014 - ISSN 2318-3152 -
Versão on-line disponível em: http://www.portais.pe.gov.br/web/pmpe/revista-doutrinal
RESUMO
O clamor da sociedade por segurança faz da formação policial uma área desafiante
e necessária diante da superação do paradigma repressivo e reconhecimento do
caráter preventivo como fundamento formativo do profissional de segurança pública.
Nesta perspectiva, o presente estudo teve como foco de atenção a natureza do
policiamento ensinado na respectiva Academia de Formação desse profissional,
nomeadamente através da percepção dos Oficiais lá formados e da análise da
malha curricular do CFO/PM. Para tanto, foram realizadas entrevistas junto a
tenentes que atuaram na operacionalidade entre os anos de 2009 a 2011, cujos
dados obtidos apontam para percepções distintas em torno da teoria ensinada e da
prática institucional, suscitando reflexões em torno da construção de política
formativa voltadas à proteção dos Direitos Humanos.
Introdução
O clamor social por uma polícia mais eficiente e protetora dos direitos
humanos é patente. E dentro do contexto atual da Segurança Pública, a formação
policial deve receber destaque e atenção de todos os segmentos da sociedade, não
mais somente dos que fazem as instituições policiais. A segurança pública passou a
ser um tema complexo e analisado sob a ótica das mais diversas camadas da
1
Capitão da Polícia Militar de Pernambuco, Doutorando do Programa de Pós-graduação em
Educação (PPGE) da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), e-mail
benoni_pmpe@yahoo.com.br
2
Professora da UFPE, membro do Núcleo de Formação Continuada Didático-Pedagógica dos
Professores da UFPE (NUFOPE) e membro colaborador do Centro de Intervenção e Integração
Educativa (CIIE) da Universidade do Porto (U.Porto), e-mail katiamcramos@gmail.com
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sociedade principalmente tendo em conta a transição paradigmática que aponta
para uma redefinição da atividade de policiamento e reflexão sobre a reforma da
polícia e a formação de seus profissionais no sentido mais protetor dos direitos
humanos.
É nessa perspectiva que o presente estudo se insere. E para dar conta do seu
propósito, na primeira seção trataremos dos estudos a respeito das concepções
sobre as atividades de policiamento na perspectiva da proteção dos direitos
humanos. Na segunda, apresentaremos a perspectiva curricular da formação do
Oficial da Polícia Militar de Pernambuco (PMPE) na sua relação com os conteúdos
relacionados com a atividade de policiamento e direitos humanos. Por fim, na
terceira seção, traremos dados de uma pesquisa junto a Oficiais Subalternos
atuantes das unidades operacionais, evidenciando desafios para uma reformulação
curricular perspectivada em função do caráter educativo e protetor dos direitos
humanos, que devem ser inerentes à formação policial.
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perpetua ao longo dos tempos. O policiamento ostensivo é entendido como
exclusividade da Polícia Militar para o cumprimento de suas missões, legitimando
sua ação tanto nas atividades preventivas quanto nas repressivas, quando assim for
preciso.
O pesquisador francês Monjardet (2003, p.299), levanta a reflexão em torno
das atividades de policiamento a serviço dos valores da sociedade democrática,
chega à
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minimização dos riscos a ser desenvolvido por uma força policial contemporânea.
Para Goldstein (2003) o bom policiamento é aquele desempenhado pela
polícia de modo a combater incansavelmente aos crimes e, ao mesmo tempo, estar
dentro da lei, além de proteger os direitos dos cidadãos. O trabalho da polícia deve,
portanto, ser baseado no equilíbrio das relações entre polícia e uma sociedade livre
e democrática. Debate fortalecido por Balestreri (2003) que aponta para
caracterização do policial como agente de segurança pública, como atributos de
ouvidor social, tratando da perspectiva de afirmação de um novo paradigma de
segurança pública.
Nesse contexto, a formação policial tem lugar de destaque por constituir-se
lugar privilegiado de onde emanam os padrões de policiamento e políticas de ação
policial, no sentido de cumprir a missão constitucional, manter a ordem pública e
garantir a paz social.
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trará consigo a pesquisa e o estudo mais avançado em torno da própria natureza do
trabalho e a formação profissional do policial.
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Neste contexto, destacamos as disciplinas de Policiamento Ostensivo I, II e III,
as quais se desenvolvem ao longo dos três anos, perfazendo o total de 390 h/a,
iniciando com o estudo teórico inicial da atividade de policiamento, a começar pelo
fundamento básico até as estratégias de policiamento, antes de desenvolver os
conteúdos de procedimentos em ocorrência e as técnicas de abordagem policial.
Em termos de direitos humanos, os cadetes tiveram a oportunidade de
trabalhar a temática no primeiro ano de formação, representando 30 horas-aula de
estudos, tratando das questões ligadas ao direito internacional humanitário e
princípios dos direitos humanos, relações de respeito à diversidade, debate sobre a
olícia e os direitos humanos e visitas de estudos, mas sem relacionar diretamente
com a prática do policiamento.
É a partir do segundo ano de curso que percebemos a inserção de um nível
mais ampliado de disciplinas presentes no primeiro ano e outras disciplinas que se
relacionam com a forma de pensar e agir em termos de policiamento, entre as quais:
Sociologia do Crime e da Violência e Fundamentos de Polícia Comunitária. Já no
terceiro, as disciplinas terminam seu ciclo de complexidade, como no caso de
Policiamento Ostensivo III, contudo, deveriam se relacionar com as disciplinas de
Planejamento Operacional de Policiamento Ostensivo, Sistema de Segurança
Pública no Brasil, Abordagem Sócio-Psicológica da Violência e Gerenciamento de
Crises, que oportuniza o discente a entender a natureza do policiamento, do crime
como fenômeno psicossocial e conhecer os estudos sobre segurança pública na
contemporaneidade.
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tenentes detêm uma visão legalista acerca dessas questões, afirmando
categoricamente que é de características ostensivas, atuando na prevenção, mas,
nessa parte, sem fazer menção à proteção dos direitos humanos. Tanto que, na
grande maioria das entrevistas, ficou evidente que o atual foco da atuação do
trabalho policial é o policiamento repressivo, atuando nas ocorrências e na redução
de índices de violência, como se vê na e
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Quando os entrevistados se viram à frente das questões que envolviam os
conteúdos estudados durante sua formação, refletindo sobre aqueles que julgavam
mais importantes diante das atividades atuais de policiamento, a tendência
majoritária foi apontar as disciplinas voltadas para o campo do conhecimento
operativo, tais como policiamento ostensivo (abordagem policial) e tiro policial, mas
sem se esquecer afirmar a imprescindível necessidade de relacionar estas
disciplinas com as do conhecimento cognitivo das áreas de direito e gestão
operacional e administrativa, como pode se constatar nas passagens a seguir:
údos práticos, abordagem, tiro e modalidades de policiamento, por
pol
Excetuando-se um dos entrevistados, quando o assunto foi relacionado à
insuficiência ou não contemplação de conteúdos julgados indispensáveis, na visão
profissional de cada um, mas com foco na atividade de policiamento, o alvo maior da
totalidade das entrevistas foi exatamente a falta de aproveitamento das
oportunidades de estágios durante a vida acadêmica e de exploração dos momentos
destinados a essa prática. Nas entrevistas, era possível notar a ênfase e as
expressões corporais ao falar deste tema, das quais destaco as seguintes: (OF.1)
a prática
cotidiana do Oficial, o EHP3
conteúdos importantes, deveríamos ir mais às Unidades Operacionais para aliar a
3 Estágio de Habilitação Profissional refere-se ao período em que o cadete em formação é alocado numa
OME para desenvolver a prática supervisionada das futuras atribuições do Oficial de Carreira (QOPM).
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dos discentes.
Verificamos ainda a preocupação de alguns tenentes com a prática de
sistêmica
relação entre a parte de direitos humanos e a parte de policiamento ostensivo geral,
Outra parte dos entrevistados, por sua vez, mostrou-se mais perspicaz ao
-ativo, não apenas repressivo, com uma
, entendendo o lado
spera um bom atendimento, respeitador e
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proximidade da polícia, nos dias atuais.
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com a polícia trabalhando ativamente e próxima da população, já está permeando o
pensamente deles, contudo, ainda um pouco desordenado.
É imprescindível notar, portanto, que a base de formação do policial
consubstancia-se num elemento fundamental neste processo de mudança de
filosofia de policiamento, como pudemos aprender no trabalho coordenado por
Ratton e Barros (2007, p.267):
Embora a polícia tenha sido instituída para atuar muito mais como força
repressiva do que preventiva, ou seja, atuando na ótica da punição do que
da prevenção, os novos paradigmas constitucionais têm exigidos processos
de redefinição tanto no modelo de gestão, quanto dos processos de
formação, de regulamentação da ação policial e de controle social.
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nos ensina Roldão (2003).
Como vimos anteriormente, a distribuição da carga horária do estudo do
policiamento é gradativa. Contudo, em termos de conteúdos abordados, não
observamos a presença desta gradação, pois o discente praticamente não estuda as
correntes teóricas e experiências em policiamento e tem apenas uma oportunidade
de refletir e debate as questões ligadas aos direitos humanos, além da ausência de
articulação entre eles, apontando para necessidade de revisar criteriosamente o
currículo e seus propósitos.
É óbvio que estamos tomando como referência as competências e
habilidades pretendidas para o futuro policial, dado os desafios da sociedade
contemporânea, e a formação enquanto processo educativo, que deve agregar
conteúdos, valores, atitudes e experiências de forma crítica para execução de suas
atividades. É um propósito que se aproxima do esforço de outras áreas, como a
Pedagogia, na busca de afirmar o Plano Nacional de Educação em Direitos
Humanos, que, como nos diz Dias e Porto (2010, p.29), seu objetivo principal "é a
difusão de uma cultura de direitos como forma de prover sustentação às ações de
promoção, proteção e defesa dos direitos humanos".
No seu estudo sobre o modelo policial e sua formação, Poncioni (2005)
destaca a importância da formação nas academias de polícia para a construção da
identidade profissional, como etapa que faz considerável diferença para a vida
profissional. E o momento de busca na formação, o desenvolvimento de valores da
profissão bem como das competências e habilidades para o campo de trabalho
policial. Ele precisa, então, entender o que é ser policial num determinado modelo de
policiamento, cuja essência permeia a proteção social.
De forma bem categórica, os sujeitos do presente estudo, Oficiais formado na
APMP, atestaram o desejo de aproximação, enquanto antigo discente, com sua
futura atividade de policiamento. O planejamento de um curso de formação,
principalmente numa área como a segurança pública, deve se preocupar com esta
maior interação do formando com os integrantes de sua futura Instituição e, por que
não, da sociedade, seu objeto de proteção, atuando como sujeito ativo no processo
formativo.
Nos seus estudos sobre o ensino policial, Lima et. al. (2006) aponta que
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planejar a atuação de maneira flexível permite uma adaptação às necessidades dos
alunos. É preciso, assim, ir além da execução das atividades de estágio
supervisionado, o ideal é justamente o acompanhamento disciplinar dos docentes
nestas atividades contextualizadoras do conhecimento teórico ensinado na escola de
formação, devendo, para tanto, promover atividades que permitam relação direta
com o conteúdo trabalhado.
No que se refere à proteção aos direitos humanos - debate bem atual da
sociedade contemporânea - ficou evidenciada a carência da relação interdisciplinar
do tema com as disciplinas responsáveis por desenvolver a capacidade de realizar
policiamento. Se considerarmos a relevância de se desenvolver um trabalho de
integração dos conteúdos das disciplinas que tratam do policiamento com as outras
importantes áreas do conhecimento para atividade policial, sem dúvida, trazer os
avanços na área de direitos humanos para o debate de realizar o policiamento
ostensivo e preventivo é imprescindível para uma melhor formação policial. Candau
e Sacavino (2010, p.128) nos ensina a respeito do princípio da integração que:
Os temas e questões relativas aos direitos humanos devem ser integrados
no desenvolvimento das diferentes áreas curriculares [...] Não se trata de
incluir novas disciplinas ou unidades didáticas [...] O desafio está em
integrá-los tato no plano cognitivo, quanto afetivo e comportamental no dia a
dia das escolas em suas diferentes dimensões.
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condições objetivas que se lhe oferecem para trabalhar.
Considerações Finais
Destacamos, novamente, que não teve o propósito de generalizar as
informações e percepções detectadas nos Oficiais Subalternos da PMPE,
entrevistados sobre a natureza do policiamento ensinado na formação, mas sim,
proporcionar subsídios necessários ao debate acerca da construção de política
formativa de seus profissionais de segurança pública voltada para proteção aos
direitos humanos.
Reforçamos também que, assim como foi percebido por Caruso et. al. (2007),
é preciso discutir a realidade da polícia com seus próprios integrantes, no interior de
sua instituição, e assim, romper com os pré-conceitos, construindo um ambiente
propiciador de diálogo ativo. Para, assim, ser capaz de permitir aos seus integrantes
falar abertamente de seus dilemas, inquietações e desafios na formação do
profissional de segurança pública e no estabelecimento de uma política de
policiamento mais voltado para proteção dos direitos humanos.
Nesse sentido, ficou evidenciado que é imprescindível promover o debate
curricular sem perder de vista os temas atuais em torno do trabalho policial e a
formação de seus profissionais. Dessa forma, é igualmente importante refletir sobre
o requisito de ingresso na carreira. A graduação em Direito, por exemplo,
possibilitaria focar mais a matriz curricular da formação profissional na atuação
policial, considerando que o cadete já entraria qualificado no que se refere aos
conteúdos jurídicos.
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Entretanto, a revisão dos parâmetros curriculares deve romper com pré-
conceitos e paradigmas, estendendo este debate em fóruns interdisciplinares,
permitindo o diálogo entre policiais e profissionais de ensino na construção de
políticas educacionais para formação dos profissionais de segurança pública.
A pertinência do debate permanente acerca da formação dos Profissionais de
Segurança Pública, pelo seu caráter dinâmico, perspectivada na atuação preventiva
e educativa é notória. As atividades futuras de policiamento a ser desempenhadas
pelos futuros policiais devem se alinhar à realidade da nossa sociedade
contemporânea.
O avanço das ações formativas é fundamental. O enfrentamento de desafios
nesse debate - em construção - na perspectiva de efetivar políticas de policiamento
em proteção aos direitos humanos, no âmbito das Academias de Formação dos
Policiais, faz parte da caminhada pela formação profissional do agente de
Segurança Pública voltada para atender os anseios da sociedade contemporânea. E
trilhar o ensino policial no compromisso de qualidade, em busca do maior objetivo da
função policial: a paz social e proteção dos direitos humanos.
Referências
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Janeiro. Rede de Policiais e Sociedade Civil, p. 163 a 178, 2007.
LIMA, Maria Socorro Lucena et. al. O Ensino Policial: trajetórias e perspectivas.
Fortaleza: UECE, 2006
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