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ANTONIO CANDIDO FORMACAO DA LITERATURA BRASILEIRA (Momentos decisivos) 1° volume (1750-1836) 9? edigao 2 EDITORA ITATIAIA LIMITADA Belo Horizonte — Rio de Janeiro Copyright © 1975, by ANTONIO CANDIDO Sao Paulo FICHA CATALOGRAFICA (Preparada pelo Centro de Catalogagao-na-fonte, Camara Brasileira do Livro, SP) Candido, Antonio, 1918- C223f Formagao da literatura brasileira: momentos decisivos. 6. ed. Belo 6.ed. Horizonte, Editora Itatiaia Ltda, 2000. ilust. (Colegio reconquista do Brasil. 2" série; vol. 177-178) Bibliografia. Contesido, — v. 1. 1750-1836. — v.2. 1836-1880. 1. Literatura brasileira — Hist6ria e crftica 1. Titulo. I. Série: Reconquista do Brasil. 2*, Série; vol. 177-178. 75-0832 CDD-869.909 fndice para catélogo sistemético: 1. Literatura brasileira : Hist6ria e critica 869.909 2000 Direitos de Propriedade Literdria adquiridos pela EDITORA ITATIAIA LTDA Belo Horizonte - Rio de Janeiro Inapresso no Brasil Printed in Brazil PREFACIO DA 1* EDICAO L Cada literatura requer tratamento peculiar, em virtude dos seus problemas especifi- cos ou da relacdo que mantém com outras. A brasileira é recente, gerou no seio da portuguesa e dependeu da influéncia de mais duas ou trés para se constituir. A sua formagio tem, assim, caracteres préprios e néo pode ser estudada como as demais, mormente numa perspectiva histérica, como é 0 caso deste livro, que procura definir ao mesmo tempo o valor e a fun¢io das obras. A dificuldade esté em equilibrar os dois aspectos, sem valorizar indevidamente autores desprovidos de eficacia estética, nem menosprezar os que desempenharam papel aprecidvel, mesmo quando esteticamente secundérios. Outra dificuldade é conseguir a medida exata para fazer sentir até que ponto a nossa literatura, nos momentos estudados, constitui um universo capaz de justificar 0 interesse do leitor, — no devendo o critico subestiméa nem superestimé-a. No primeiro caso, apagaria o efeito que deseja ter, e € justamente despertar leitores para os textos analisados; no segundo, daria a impressio errada que ela é, no todo ou em parte, capaz de suprir as necessidades de um leitor culto. Hi literaturas de que um homem ndo precisa sair para receber cultura e enriquecer a sensibilidade; outras, que sé podem ocupar uma parte da sua vida de leitor, sob pena de Ihe restringirem irremediavelmente 0 horizonte. Assim, podemos imaginar um francés, um italiano, um inglés, um alem&o, mesmo um russo e um espanhol, que sé conhecam os autores da sua terra e, nao obstante, encontrem neles o suficiente para elaborar a visto das coisas, experimentando as mais altas emogies literarias. Se isto ja é impensével no caso de um portugués, o que se diré de um brasileiro? A nossa literatura & galho secundério da portuguesa, por sua vez arbusto de segunda ordem no jardim das Musas... Os que se nutrem apenas delas so reconheciveis a primeira vista, mesmo quando eruditos ¢ inteligentes, pelo gosto provinciano e falta do senso de proporcies. Estamos fadados, pois, a depender da experiéncia de outras letras, 0 que pode levar ao desinteresse e até menoscabo das nossas. Este livro procura apresentélas, nas fases formativas, de modo a combater semelhante erro, que importa em limitagio essencial da experiéncia literdria. Por isso, embora fiel ao espfrito critico, é cheio de carinho e apreco por elas, procurando despertar o desejo de penetrar nas obras como em algo vivo, indispensdvel para formar a nossa sensibilidade e visio do mundo. Comparada 4s grandes, a nossa literatura é pobre e fraca. Mas é ela, nao outra, que nos exprime, Se nao for amada, ndo revelaré a sua mensagem; e se néo a amarmos, ninguém o fard por nés. Se nao lermos as obras que a compéem, ninguém as tomard do esquecimento, descaso ou incompreensio. Ninguém, além de nés, poderd dar vida a essas tentativas muitas vezes débeis, outras vezes fortes, sempre tocantes, em que os. homens do passado, no fundo de uma terra inculta, em meio a uma aclimacao penosa da cultura européia, procuravam estilizar para nds, seus descendentes, os sentimentos que experimentavam, as observacées que faziam, — dos quais se formaram os nossos. A certa altura de Guerra ¢ Paz, Tolstdi fala nos “‘ombros e bragos de Helena, sobre ‘95 quais se estendia por assim dizer o polimento que haviam deixado milhares de olhos fascinados por sua beleza”. A leitura produz efeito parecido em relacdo as obras que anima. Lidas com discernimento, revivem na nossa experiéncia, dando em compensacio a inteligéncia e o sentimento das aventuras do espirito. Neste caso, o espirito do Ocidente, procurando uma nova morada nesta parte do mundo. 2. Este livro foi preparado e redigido entre 1945 e 1951. Uma vez pronto, ou quase, e submetido & leitura dos meus amigos Décio de Almeida Prado, Sérgio Buarque de Holanda e, parcialmente, outros, foi, apesar de bem recebido por eles, posto de lado alguns anos e retomado em 1955, para uma revisio terminada em 1956, quanto ao primeiro volume, e 1957, quanto ao segundo. ‘A base do trabalho foram essencialmente os textos, a que se juntou apenas o necessdrio de obras informativas e criticas, pois o intuito nao foi a erudigio, mas a interpretagdo, visando 0 jufzo critico, fundado sobretudo no gosto. Sempre que me achei habilitado a isto, desinteressei-me de qualquer leitura ou pesquisa ulterior. 0 leitor encontrard as referéncias nas notas ou na bibliografia, distribuida segundo os capitulos, ao fim de cada volume. Mencionaram-se as obras utilizadas que se recomendam, excluindo-se deliberadamente as que, embora compulsadas, de nada serviram ou estéo superadas por aquelas. Nas citagdes, a obra ¢ indicada pelo titulo eo ntimero da pagina, ficando para a bibliografia os dados completos. Sempre que possivel, isto é, no caso de citagdes sucessivas da mesma obra, as indicagdes da pagina sao dadas no préprio texto, entre parénteses, ou reunidas numa tnica nota, para facilitar a leitura. Como é freqiiente em trabalhos desta natureza, nao se da especificagdo bibliografica dos textos sobre os quais versa a interpretacdo; assim nao se encontrard em nota, depois de um verso de Castro Alves, “livro tal, pagina tal”. Ascitacdes de autor estrangeiro sao apresentadas diretamente em portugués, quando. se trata de prosa, No caso mais delicado dos versos, adotowse o critério seguinte: deixar no original, sem traduzir, os castelhanos, italianos e franceses, acessiveis ao leitor médio, nos latinos e ingleses dar o original e, em nota, a tradu¢ao; dos outros, apenas a traducao. 10 1 LITERATURA COMO SISTEMA" Este livro procura estudar a formacao da literatura brasileira como sintese de tendéncias universalistas e particularistas. Embora elas ndo ocorram isoladas, mas se combinem de modo vario a cada passo desde as primeiras manifestagdes, aquelas parecem dominar nas concepgdes neoclassicas, estas nas romanticas, — 0 que convida, além de motivos expostos abaixo, a dar realce aos respectivos periodos. Muitos leitores acharao que o pracesso formativo, assim considerado, acaba tarde demais, em desacordo com o que ensinam os livros de historia literéria. Sem querer contesté-los, — pois nessa matéria tudo depende do ponto de vista, — espero mostrar a viabilidade do meu. Para compreender em que sentido € tomada a palavra formagio, e porque se qualificam de decisivos os momentos estudados, convém principiar distinguindo mané- festagées literdrias, de literatura propriamente dita, considerada aqui um sistema de obras ligadas por denominadores comuns, que permitem reconhecer as notas dominan- tes duma fase. Estes denominadores so, além das caracteristicas internas, (lingua, temas, imagens), certos elementos de natureza social e psiquica, embora literariamente organizados, que se manifestam historicamente e fazem da literatura aspecto organico da civilizago. Entre eles se distinguem: a existéncia de um conjunto de produtores literdrios, mais ou menos conscientes do seu papel; um conjunto de receptores, formando os diferentes tipos de publico, sem os quais a obra nao vive; um mecanismo transmissor, (de modo geral, uma linguagem, traduzida em estilos), que liga uns a outros. © conjunto dos trés elementos da lugar a um tipo de comunicagdo interhumana, a literatura, que aparece sob este angulo como sistema simbélico, por meio do qual as veleidades mais profundas do individuo se transformam em elementos de contacto entre os homens, ¢ de interpretagao das diferentes esferas da realidade. * A leitura desta “Introdugio” € dispensavel a quem ndo se interesse por questdes de orientacio critica, Podendo o livro set abordado diretamente pelo Capitulo 1, 23 Quando a atividade dos escritores de um dado periodo se integra em tal sistema, ocorre outro elemento decisivo: a formacdo da continuidade literdria, — espécie de transmisso da tocha entre corredores, que assegura no tempo o movimento conjunto, definindo os lineamentos de um todo. £ uma tradi¢do, no sentido completo do termo, isto é, transmissao de algo entre os homens, e 0 conjunto de elementos transmitidos, formando padrdes que se impdem ao pensamento ou ao comportamento, e aos quais, somos obrigados a nos referir, para aceitar ou rejeitar. Sem esta tradicéo nao hd literatura, como fendmeno de civilizacao, Em um livro de critica, mas escrito do ponto de vista histérico, como este, as obras nao podem aparecer em si, na autonomia que manifestam, quando abstraimos as circunstincias enumeradas; aparecem, por forca da perspectiva escolhida, integrando em dado momento um sistema articulado e, ao influir sobre a elaboragio de outras, formando, no tempo, uma tradigao. Em fases iniciais, é freqdente ndo encontrarmos esta organizacao, dada a imaturidade do meio, que dificulta a formagdo dos grupos, a elaboracdo de uma linguagem prépria € 0 interesse pelas obras. Isto nao impede que surjam obras de valor, ~ seja por forca da inspiragao individual, seja pela influéncia de outras literaturas. Mas elas néo sio representativas de um sistema, significando quando muito 0 seu esbogo. Séo mani- festagbes literérias, como as que encontramos, no Brasil, em graus varidveis de isolamento e articulagdo, no periodo formativo inicial que vai das origens, no século XVI, com os autos e cantos de Anchieta, as Academias do século XVIII. Periodo importante e do maior interesse, onde se prendem as ratzes da nossa vida literdria e surgem, sem falar dos cronistas, homens do porte de Antonio Vieira e Gregério de Matos, = que poderd, alids, servir de exemplo do que pretendo dizer. Com efeito, embora tenha permanecido na tradigdo local da Bahia, ele nao existiu literariamente (em perspectiva histérica) até 0 Romantismo, q:1ando foi redescoberto, sobretudo gracas a Varnhagen; @ 56 depois de 1882 e da edigéo Vale Cabral péde ser devidamente avaliado. Antes disso, nao influiu, nao contribuiu para formar o nosso sistema literdrio, e téo obscuro Permaneceu sob 0s seus manuscritos, que Barbosa Machado, o minucioso erudito da Biblioteca Lusitana (1741-1758), ignora-o completamente, embora registre quanto Joao de Brito e Lima péde alcangar. Se desejarmos focalizar os momentos em que se discerne a formacao de um sistema, € preferivel nos limitarmos aos seus artifices imediatos, mais os que se vao enquadrando como herdeiros nas suas diretrizes, ou simplesmente no seu exemplo. Tratase entio, (para dar realce as linhas), de averiguar quando e como se definiu uma continuidade ininterrupta de obras e autores, cientes quase sempre de integrarem um processo de formacio literdria. Salvo melhor juizo, sempre provavel em tais casos, isto ocorre a partir dos meados do século XVII, adquirindo plena nitidez na primeira metade do século XIX. Sem desconhecer grupos ou linhas tematicas anteriores, nem influéncias como as de Rocha Pita e Itaparica, é com os chamados arcades mineiros, as tiltimas academias e certos intelectuais ilustrados, que surgem homens de letras formando conjuntos 24 organicos e manifestando em graus varidveis a vontade de fazer literatura brasileira. Tais homens foram considerados fundadores pelos que os sucederam, estabelecendo-se deste modo uma tradicéo continua de estilos, temas, formas ou preocupacées. J4 que é preciso um comeco, tomei como ponto de partida as Academias dos Seletos e dos Renascidos e os primeiros trabalhos de Claudio Manuel da Costa, arredondando, para facilitar, a data de 1750, na verdade puramente convencional. 0 leitor perceberd que me coloquei deliberadamente no angulo dos nossos primeiros romanticos e dos criticos estrangeiros que, antes deles, localizaram na fase arcddica o inicio da nossa verdadeira literatura, gracas a manifestag3o de temas, notadamente o Indianismo, que dominardo a produgio oitocentista. Esses criticos conceberam a literatura do Brasil como expressio da realidade local e, ao mesmo tempo, elemento positivo na construgo nacional. Achei interessante estudar o sentido e a validade histérica dessa velha concepcio cheia de equivocos, que forma o ponto de partida de toda a nossa critica, revendoa na perspectiva atual. Sob este aspecto, poderseia dizer que o presente livro constitu (adaptando o titulo do conhecido estudo de Benda) uma “histéria dos brasileiros no seu desejo de ter uma literatura”. E um critério valido para quem adota orientacao histérica, sensivel as articulacdes e & dindmica das obras no tempo, mas de modo algum importa no exclusivismo de afirmar que sé assim é possivel estudélas. 25

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