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As velas ardem até ao fim- Sándor Márai

As velas ardem até ao fim, romance publicado em 1942 pelo escritor húngaro Sándor Márai,
parece uma reflexão sobre a questão colocada por Aristóteles sobre a amizade entre desiguais.

O romance de Márai é uma longa reflexão sobre a amizade e a sua impossibilidade na


desigualdade. O livro é um exercício de rememoração da relação entre Henrik, rico aristocrata
e general, e Konrád, proveniente de uma família polaca decadente.

A acção decorre no coração do Império austro-húngaro, em plena viragem do século XIX para o
século XX, numa altura em que a situação geopolítica da Europa Central atinge o ponto de
ebulição que irá desembocar na Primeira Guerra Mundial (1914-1918), marcada pelo
assassinato do herdeiro do Império. O confronto entre dois velhos não passa de cinzas de um
mundo que ardeu até ao fim durante essa guerra.

Fala sobre a solidão da espera por um momento que tarda, mas que sabemos que virá e é esse
momento que nos faz viver para além de quase todas as pessoas que conhecemos.

Passados quarenta e um anos, Konrád regressa ao castelo do amigo para um longo jantar. O
monólogo é, em primeiro lugar, a descrição da traição de Konrád à amizade entre ambos. No
dia anterior ao desaparecimento de Konrád, este terá sentido um desejo intenso de assassinar
o amigo. Além disso, manteve um caso amoroso com Krisztina, a mulher do General. Todo o
valor da sua intensa amizade e todo o significado do intenso amor por Krisztina seriam agora
considerados nesta derradeira batalha que os dois enfrentarão. Konrád nunca desmente as
acusações, mas também nunca as confirma, como se tudo aquilo, passado tantos anos, já não
fizesse sentido.

A música era o lugar secreto que permitia às almas inconformistas serem aquilo que lhes era
interdito pela sociedade. Onde o seu Eu recalcado encontrava lugar de expressão. Para
Krizstina, era o lugar virtual onde poderia dar largas à sua fome de liberdade; para Konrád, o
veículo que lhe permitia realizar o seu desejo de apreço social; para a mãe do general, a
possibilidade de fuga à sensação de clausura, omnipresente, num palácio perdido no meio da
floresta. A música proporciona-lhes momentos de fuga, grandes pequenos desvios, ao
caminho que lhes foi predestinado, é a manifestação do individualismo. É por esse mesmo
motivo que ela é olhada com desconfiança por uma sociedade militarizada onde o principal
imperativo é obedecer. E é, também, por esse mesmo motivo que é considerada perigosa
pelas personagens como o general e o seu pai, que estão perfeitamente integrados nesse
mesmo sistema.

Mas é a música a ponte que une e, simultaneamente, traça a fronteira entre ambos os tipos de
personagens presentes no romance.

A desigualdade entre os amigos – aquilo que supostamente conduziu a traição (mais o seu
desaparecimento do que o desejo do homicídio ou o caso amoroso) de Konrád – reside não no
destino das duas famílias de origem (uma nobre e pujante e a outra decaída), mas no facto de
responderem a ethos diferentes. Henrik é um militar, na linha da velha aristocracia do império
austro-húngaro. Konrád, por seu lado, não tem espírito de militar, é meditabundo, com
propensão para a música e, ainda por cima, vagamente aparentado com Chopin. A
desigualdade dos amigos nasce no ethos que os anima e dá forma ao carácter, como se entre o
dever e a ordem militares e a criação artística, com um princípio de anarquia subjacente,
existisse uma incompatibilidade estrutural.

Uma quarta personagem é Nini, a ama do general. É a alma gémea do general quanto à forma
de exprimir os afectos. Nini é guardiã do lar, aquela que mantém aceso o fogo de Vesta, sem o
qual as salas do palácio ficam como que transformadas em túmulos.

Ao desejo obsessivo de descobrir os sentimentos ocultos atrás das ações que lhes estão
vinculadas, está ligada uma intensa sede de vingança, erodida, sublimada pelo tempo, mas
intacta, na sua essência.

A fome de verdade é saciada após um longo jantar à luz de velas. O general e o convidado
permanecem à mesa tentando, o primeiro, reconstruir o passado, enquanto o segundo se
limita a ouvir sem, praticamente, intervir. O interpelado está na posição do psicanalista, que
ouve o paciente no divã, enquanto as velas ardem até ao fim, iluminando todos os cantos
obscuros da mente.

No final, resta apenas a cera derretida nos castiçais. A cera é a dúvida que se desvaneceu pelo
calor libertado das velas azuis (azul, símbolo de liberdade) e pelo poder das memórias, cujo
impacto evocativo se reflete na expressão do convidado, como a chama da vela que acaba por
iluminar todas as sombras da consciência que possam, ainda, subsistir.

As velas ardem até ao fim enquanto têm pavio, um caminho a percorrer, um objetivo a
alcançar e as velas ardem durante os 41 anos até tudo ser descoberto. E assim são as vidas
também. Só vivemos enquanto ainda tivermos o que fazer, objetivos para lutar, coisas para
alcançar. Estas duas personagens esperaram 41 anos para se encontrarem porque era esse o
destino de ambas. Não podiam morrer sem antes falarem.

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