ricana. Agências Reguladoras: aspectos rele- vantes. Papel das Agências no contexto atual. Responsabilidade civil da Administração Pú- blica: evolução doutrinária e jurisprudencial. Teorias civilistas. Teorias publicistas. Excluden- tes da responsabilidade civil da Administra- ção Pública. O caso fortuito ou força maior. Culpa da vítima: exclusiva e concorrente. Atos de terceiros e fenômenos da natureza. Da repa- ração do dano. A responsabilidade civil no novo Código Civil (Lei 10.406/2002, art. 43) e na Constituição Federal (§ 6º do art. 37). A res- ponsabilidade do Estado pelos atos das agências reguladoras. Responsabilidade da Agência por atos comissivos e omissivos da Administração. Conclusão.
Introdução
A Responsabilidade Civil do Estado refere-
se à imposição sobre o Poder Público de re- parar danos causados a terceiros em decor- rência de suas ações ou omissões. Deflui, atualmente, de dispositivo inscrito da Lei Magna, que no art. 37, § 6º, diz expressa- mente: “As pessoas jurídicas de direito pú- blico e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causa- rem a terceiros, assegurado o direito de re- Daisy de Asper y Valdés é subprocuradora- geral da República, aposentada, professora de gresso contra o responsável nos casos de Direito Administrativo da UPIS e AEUDF e co- dolo ou culpa” (BRASIL, 2002). ordenadora do Curso de Pós-Gradução em Di- Cogita-se, ao se tratar da responsabili- reito Público do ICAT/AEUDF. dade estatal, de três tipos de funções pelas Brasília a. 40 n. 159 jul./set. 2003 181 quais se reparte o poder estatal: a adminis- concebeu a criação de agências regulado- trativa, a legislativa e a judicial. Atualmen- ras para aqueles setores em que as condi- te, a crescente turbulência do processo de ções de monopólio natural vigoravam. A redefinição das funções do Estado na eco- busca por maior competição e, portanto, o nomia, em curso desde meados dos anos 90, ingresso de novos capitais nesses setores centra-se na responsabilidade resultante da permitiria a simultânea expansão da oferta atuação da Administração Pública, já que e queda de preço. Assim, foram criadas a com relação aos demais poderes essa res- Agência Nacional de Telecomunicações ponsabilidade incide em casos especiais. (ANATEL), a Agência Nacional do Petróleo Para os atos administrativos, a regra consti- (ANP) e a Agência Nacional de Energia Elé- tucional é, pois, a responsabilidade objeti- trica (ANEEL). va da Administração. Quanto aos atos le- gislativos e judiciais, o erário só responde A centenária experiência americana quando comprovada a culpa na sua expe- dição, de modo ilegítimo ou lesivo. Obser- Aperfeiçoadas e reformadas ao longo do ve-se que o texto constitucional refere-se aos tempo, as agências americanas têm um sé- “agentes administrativos” e não aos “agen- culo de existência. A primeira agência re- tes políticos”, membros dos Poderes do Es- guladora surgiu em 1887 – Comissão de tado. Comércio Interestadual (ICC) – para regu- Limita-se o presente estudo à responsa- lar preços e impedir concentração excessi- bilidade civil do Estado resultante da atua- va no setor ferroviário. Com o New Deal, no ção das Agências Reguladoras. Moldadas governo Roosevelt, na década de 30, deze- na experiência norte-americana, represen- nas de agências foram criadas para regular tam um marco na transição do paradigma a economia e vencer a depressão. Dotadas de Estado intervencionista para o Estado de amplos poderes, passaram a ser conhe- regulador. Setores inteiros da produção, cidas, nessa época, como “o quarto poder”. antes monopólios estatais, foram privatiza- Na década de 60, a evolução da legisla- dos. Criaram-se, e ainda se criam, agências ção concentrou-se na proteção ao meio am- e regimes regulatórios para administrar biente, à saúde pública e ao consumo, preo- mercados novos em telecomunicações, ener- cupando-se com o bem-estar social, e na cor- gia, petróleo, distribuição de água, trans- reção das falhas do mercado. portes, entre outros. Assumem as agências Nos anos 70, organizações não-governa- reguladoras funções executivas, legislativas mentais e grupos de interesse exerceram for- e judiciárias que caracterizam a criação de te influência na agenda regulatória: novas um Estado dentro do próprio Estado. diretrizes, metas e prazos rígidos lhes fo- É interessante tentar resumir o extenso ram impostos. O excesso de regulamenta- escopo de atuação a partir das diferentes ção passou a ser criticado como fonte de competências que cabem às agências autô- ineficiência empresarial, manutenção de nomas neste novo arranjo institucional. É preços altos e atraso tecnológico. um órgão executor, na medida em que im- Na década de 80, com a onda de desre- plementa o sistema nacional de gerencia- gulamentação e privatização encetada pelo mento. É também um órgão regulador clás- governo Reagan, setores inteiros foram libe- sico, uma vez que lhe compete, por um lado, rados: telecomunicações, seguros, rodovias, regular no sentido clássico a oferta e a de- ônibus, TV a cabo, petróleo, gás e energia. manda e, por outro lado, fiscalizar os usos Entretanto, o Governo Clinton, de maioria dos recursos, inclusive mediando os confli- democrata, reafirmou o mandato das agên- tos e dispondo de poder de polícia. Muitas cias, mantendo o sistema de regulação soci- surgiram no quadriênio 1995-98, quando se al nos moldes clássicos. Segundo o Índice
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Regulatório Federal, em 2000, os Estados desses serviços. Substitui-se o desgastado Unidos gastaram 721 bilhões de dólares em modelo burocrático, rígido, burocratizado, financiamento e salários para as agências por um modelo flexível, participativo, efici- reguladoras (EXAME, 2002, p. 44). ente. Não se busca o encolhimento do papel do Estado, mas sim um Estado melhor, ver- Agências Reguladoras: dadeiramente voltado para o cidadão como aspectos relevantes destinatário final daquela prestação. Nesse cenário, é fenômeno atual, de rá- No Brasil, a mudança do perfil do Esta- pida expansão, as agências executivas. Par- do-Previdência, titular e executor dos servi- te integrante das chamadas agências autô- ços públicos, para o atual modelo neolibe- nomas, têm elas como meta a busca de ex- ral processou-se por meio das Emendas celência na implementação de políticas Constitucionais, particularmente a Emen- públicas. São as autarquias e fundações que da nº 19/98, que tratou especificamente da realizam contrato de gestão com órgão da Reforma Administrativa. Esse modelo está Administração Direta, a que se acha vincu- expressamente evidenciado no Plano Dire- lada, para redução de custos e melhoria na tor da Reforma do Aparelho do Estado, que qualidade do serviço. Outra das chamadas estabeleceu as diretrizes de atuação políti- agências autônomas, a agência reguladora, co-institucional do governo Fernando Hen- com maior atuação no mercado do que a rique Cardoso. Entre as inovações trazidas agência executiva, surgiu da necessidade de ao mundo jurídico, destacam-se as agênci- intervenção em determinados setores da eco- as executivas e reguladoras. nomia, fruto do processo de privatização, Partindo do pressuposto do exaurimen- que extinguiu total ou parcialmente os mo- to do Estado interventor, diretamente envol- nopólios de alguns setores públicos, com- vido no setor produtivo, postula-se uma petindo-lhes a função de fiscalização e con- ampla reformulação das bases da Admi- trole. nistração Pública. Deixa o Estado de ser exe- A Constituição Federal de 1988 dispôs cutor para se tornar regulador, enfrentan- no art. 174 que, “como agente normativo e do, desse modo, os novos desafios do mun- regulador da atividade econômica, o Esta- do globalizado. Entre outras tarefas e fun- do exercerá, na forma da lei, as funções de ções, compete-lhe promover maior aproxi- fiscalização, incentivo e planejamento, sen- mação com a sociedade e impulsionar o do este determinante para o setor público e desenvolvimento econômico. Entretanto, as indicativo para o setor privado”. Logo, para mudanças requeridas pelo Estado não se fazer atuar esse dispositivo, atribui-se espe- reduzem à imposição de reformas adminis- cial relevo às agências reguladoras. trativas. De fato, vão mais além, na medida Segundo SILVA (2000, p. 217), planeja- em que atingem valores, paradigmas e a pró- mento “é um processo técnico instrumenta- pria cultura organizacional, buscando a do para transformar a realidade existente construção de espaços de relacionamento no sentido de objetivos previamente estabe- entre a ação do governo e o cidadão. Trans- lecidos.” forma-se, principalmente, a ideologia, a for- Consiste, assim, o planejamento econô- ma de conceber o Estado e a Administração mico em um processo de intervenção estatal Pública (DI PIETRO, 2000). com vistas a organizar atividades econômi- Não há, nessa nova visão, espaço para o cas para obter resultados previamente esta- Estado prestador de serviços, para o assis- belecidos. tencialismo. Estimula-se, agora, a participa- O planejamento envolve decisão políti- ção ativa do cidadão, deliberando, atuando ca. Às agências reguladoras cabe a imple- para a melhoria na qualidade da prestação mentação de tais políticas, elaborando pro-
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jetos, desenvolvendo incentivos, visualizan- tos de suas áreas de competência e respon- do o usuário como destinatário final de todo dem pelo cumprimento de metas fixadas e esse processo. Deve, pois, responder por pelo desempenho das atividades dos pres- decisões equivocadas, pela imprudência na tadores de serviço. elaboração do planos e pelos danos causa- Diverge-se, na doutrina, quanto ao po- dos aos atores econômicos atingidos, ainda der normatizador das agências regulado- que de modo reflexo, por sua atividade re- ras, afirmando parte da doutrina que po- gulatória. dem exercitá-lo, desde que respeitados os Do mesmo modo, a Administração Pú- limites legais estabelecidos na lei que as ins- blica tem o privilégio de modificar unilate- tituiu. Compete-lhes, entretanto, a regula- ralmente os contratos administrativos, e, mentação da prestação de serviços entre por isso, deve o particular que com ela con- prestadores e usuários. Segundo a Lei trata ter seus direitos resguardados. A 9.784/99 (Lei do Processo Administrativo Constituição Federal, no art. 37, inc. XXI, – LAP), têm essas agências o poder de apli- garante o equilíbrio econômico-financeiro car sanções às empresas privatizadas, des- do contrato administrativo, garantindo que de que respeitado o devido processo legal, serão mantidas as condições efetivas da pro- administrativo. posta. Logo, as agências reguladoras, como poder concedente, não poderão alterar uni- Responsabilidade civil da lateralmente os contratos de concessão se Administração Pública: evolução romperem essa garantia do equilíbrio eco- doutrinária e jurisprudencial nômico-financeiro. Isso ocorrendo, deverão ressarcir as concessionárias de serviço pú- Segundo MEIRELLES (2001, p. 609), a blico pelos prejuízos causados a estas doutrina da responsabilidade civil da Ad- (SAAD, 1994). ministração Pública evoluiu do conceito de irresponsabilidade para o de responsabilidade Papel das Agências no contexto atual com culpa, daí para o da responsabilidade ci- vilística e desta para a atual fase de respon- As agências reguladoras integram a sabilidade pública Administração Pública Indireta e guardam No Absolutismo a regra era a irrespon- a natureza jurídica de autarquias especiais. sabilidade do Estado, ínsita na regra que Vinculam-se, nesse controle finalístico, ao via o Soberano como encarnação da divin- Ministério competente para tratar da respec- dade na Terra – “The king can do no tiva atividade. Têm seus diretores nomea- wrong”–, a infalibilidade real era a regra. dos pelo Presidente da República, após Com a revolução liberal do século XVIII, o aprovação do Senado Federal. Estado assemelhou-se ao indíviduo, para Caio TÁCITO (1999, p. 6) destaca carac- que pudesse ser responsabilizado por atos terísticas comuns das agências reguladoras culposos de seus representantes. Chega-se brasileiras. São constituídas como autar- aos dias atuais em que é atribuída ao Poder quias especiais. Estão afastadas da hierar- Público uma responsabilidade especial, re- quia tradicional dos ministérios e da influ- grada pelo Direito Público, fora do conceito ência política do governo, pois são dotadas civilístico de culpa. de autonomia financeira e administrativa. A doutrina da irresponsabilidade foi Podem exercitar poderes normativos com- sustentada pela Inglaterra e Estados Uni- plementares à legislação, com amplos po- dos até meados da década de 40, e abando- deres de fiscalização. Atuam, dentro dessas nada por legislação especial, respectivamen- características, como instância administra- te, o Crown Proceeding Act de 1947 e pelo Cla- tiva final nos litígios que envolvam assun- ims Act de 1946.
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No Brasil, nem mesmo a Constituição Estado, que praticava atos de gestão, por Imperial de 1824 esposou a tese da irres- meio de seus prepostos. ponsabilidade do Estado quanto a atos de- A oposição a essa teoria fundou-se no correntes da Administração Pública. Em seu reconhecimento da impossibilidade de se artigo 178, n. 29, dispunha que: “Os empre- dividir a personalidade estatal, ou impossi- gados públicos são estritamente responsá- bilidade de se enquadrar como atos de ges- veis pelos abusos e omissões praticados no tão todos aqueles praticados pelo Estado na exercício de suas funções, e por não faze- administração do patrimônio público e na rem efetivamente responsáveis aos seus su- prestação de seus serviços. balternos”. A doutrina civilista aceitava, pois, a res- Embora o texto ressalvasse que o Impe- ponsabilidade estatal desde que demonstra- rador não estava sujeito a qualquer respon- da a culpa. Igualava a responsabilidade do sabilidade, nos termos do art. 99 da referida Estado à do patrão ou comitente, pelos atos Constituição, entendia-se, doutrinariamen- dos empregados ou prepostos. Serviu de te, que a norma do art. 178, n. 29, traduzia inspiração ao art. 15 do Código Civil de 1919, uma responsabilidade solidária entre o Es- que consagrou a Teoria da Responsabilida- tado e seus agentes. Ainda que essa concep- de Subjetiva do Estado. ção de responsabilidade fosse aquiliana, De tendência individualista, o Código exigindo a prova da culpa do funcionário Civil Brasileiro, do início do século passa- para a sua caracterização, jamais se inter- do, consagrou a teoria da culpa como base da pretou esse dispositivo como consagrando responsabilidade civil do Estado. Dispõe o re- apenas a responsabilidade pessoal do fun- ferido art. 15: “As Pessoas Jurídicas de di- cionário, enquanto declarava a irresponsa- reito publico são civilmente responsáveis bilidade estatal (MELLO, 2001). As Consti- por atos de seus representantes que nessa tuições de 1891 e 1934 seguiram o mesmo qualidade causem dano a terceiros, proce- modelo com respeito à responsabilidade do dendo de modo contrário ao direito ou fal- Estado por ato do administrador. tando ao dever prescrito por lei, salvo o di- reito regressivo contra os causadores do Teorias civilistas dano.” Não admitia, pois, o referido artigo a res- Ao se admitir, inicialmente, a responsa- ponsabilidade sem culpa, exigindo sempre bilidade do Estado, adotavam-se os princí- a demonstração desse elemento subjetivo pios do direito civil, fundados na idéia de para a responsabilização do Estado. Esse culpa. Distinguiam-se, nesse primeiro mo- posicionamento doutrinário perdurou até a mento, para fins de responsabilidade, os Constituição de 1946, que, com o disposto atos de império e os atos de gestão. Os pri- no art. 194, abandonou a culpa subjetiva e meiros, praticados com todas as prerrogati- acolheu a teoria objetiva do risco administrati- vas e privilégios de autoridade, eram impos- vo, revogando em parte o art. 15 do C. Civil. tos unilateral e coercitivamente ao cidadão, Na medida em que predominam as nor- regidos por um direito especial, exorbitante mas de Direito Público sobre as de Direito do direito comum, porque aos particulares Privado, a doutrina civilista ou da culpa civil não se admitiam atos semelhantes. Já os comum não é sustentável no âmbito da Ad- segundos seriam aqueles praticados pela ministração Pública. Compatível com a re- Administração em situação de igualdade lação de confiança que deve presidir as re- com os particulares, para a gestão de seus lações entre a Administração e o Adminis- serviços, ao qual se aplicava o direito comum. trado, resta, portanto, a teoria da responsabi- A pessoa do monarca, que praticava atos lidade sem culpa, segundo MEIRELLES 1 de império, diferenciava-se da pessoa do (2001, p. 610).
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Teorias publicistas serviço; nesta o fato lesivo provocado pela Administração faz concluir a sua respon- Com o famoso caso Blanco, ocorrido em sabilidade e necessidade de indenizar o le- 1873, a jurisprudência francesa entendeu sado (RIVERO, p. 562). que a responsabilidade estatal não poderia Fundamenta-se, pois, no risco que a atu- reger-se pelos princípios subjetivos do Có- ação da Administração Pública gera para digo Civil. Sujeita-se a regras especiais que os administrados, podendo causar dano a variam conforme as necessidades do servi- determinadas pessoas. Para restabelecer o ço e a imposição de harmonizar os direitos equilíbrio, o Estado deve indenizar o prejudi- do Estado com os direitos do cidadão2. cado, utilizando recursos do erário público. Com esse propósito, desenvolveram-se O risco, representado pela simples exis- três linhas de raciocínio, fundadas na respon- tência da atividade administrativa, e a soli- sabilidade objetiva do Poder Público:Teoria dariedade social, no sentido de compensar da Culpa Administrativa; Teoria do Risco Ad- aquele lesado por essa atividade, são as ba- ministrativo e Teoria do Risco Integral. ses dessa teoria, que, pelo teor de justiça soci- A Teoria da Culpa Administrativa consi- al que prega, tem sido adotada em diversos dera como essencial para caracterizar o nexo Estados modernos, e foi primeiro inscrita na de causalidade, responsabilizando a Admi- Constituição Brasileira de 1946, no art. 194. nistração, que ocorra a falta do serviço, para dela inferir a culpa da Administração. Nes- Excludentes da responsabilidade civil se caso, não se questiona a culpa subjetiva da Administração Pública do agente público, mas o nexo causal entre falta do serviço em si mesmo – fato gerador O caso fortuito ou força maior da obrigação de indenizar o dano a terceiro A doutrina é unânime em afirmar que a – e a culpa administrativa. É ônus, entre- responsabilidade objetiva do Poder Público tanto, da vítima comprovar a ocorrência da subsiste uma vez demonstrado o nexo de falta de serviço para obter indenização. causalidade entre o dano e a atividade do Essa falta de serviço pode apresentar-se Estado. Exclui-se, ao se adotar a teoria obje- sobre três modalidades: inexistência do servi- tiva, das discussões, a necessidade de pro- ço, mau funcionamento do serviço ou retardamento var a culpa, bastando o risco da própria ati- do serviço. O lesado, podendo comprovar a vidade administrativa para justificar a res- ocorrência de qualquer dessas disfunções do ponsabilização, uma vez evidenciado o serviço público, caracteriza a falta de serviço, nexo causal. com a correlata obrigação de indenizar. Logo, são excludentes de responsabili- Para a Teoria do Risco Administrativo, sur- dade os eventos que, por sua imprevisibili- ge o dever de indenizar tão-só pela ocorrên- dade e inevitabilidade, causem lesão ou cia de dano à vitima causado pela Admi- dano sem culpa da Administração, como o nistração, sem o concurso do lesado. caso fortuito ou força maior. Distinguem-se A idéia da culpa é substituída pelo nexo ambos apenas quanto à origem do evento. de causalidade entre o funcionamento do Força maior é o evento humano gerador de serviço público e o prejuízo sofrido pelo dificuldade intransponível de regular atua- administrado. É indiferente que o serviço ção da Administração. Assim, como adver- público tenha funcionado bem ou mal, de te MEIRELLES (2001), uma greve que para- forma regular ou irregular. lise os transportes é força maior, podendo Na Culpa Administrativa exige-se a fal- deixar de sê-lo se não afetar totalmente a ta de serviço, na Teoria do Risco Administra- prestação do serviço. E caso fortuito seria o tivo exige-se, apenas, o fato do serviço. Na- evento da natureza, como uma inundação ou quela presume-se a falta havendo falha do um vendaval causando danos imprevisíveis.
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Essa imprevisibilidade rompe o nexo de ta que “não é justo nem jurídico que a só transfe- causalidade entre o dano e a atividade da rência da execução de uma obra ou serviço origi- agência. Não se trata de exclusão de culpa nariamente público a particular descaracterize sua mas sim de rompimento do nexo de causali- intrínseca natureza estatal e libere o executor pri- dade pela excludente. vado das responsabilidades que teria o Poder Público se o executasse diretamente, criando mai- Culpa da vítima: ores ônus de prova ao lesado.”(MEIRELLES, exclusiva e concorrente 2000, p. 615). Serão, portanto, responsabilizadas na sua atuação como prestadoras de serviço públi- Atenua-se a responsabilidade da Admi- co, não em sua atividade privada ou empresarial. nistração, entretanto, no caso de ser possível No entanto, observe-se que o dano cau- demonstrar a culpa da vítima, para excluir ou sado por obra pública, que é um fato admi- minorar seus encargos. Como adverte MEI- nistrativo, mas que deriva de um ato admi- RELLES (2001), a Teoria do Risco Adminis- nistrativo de quem ordena a execução, gera trativo não se confunde com a do Risco Inte- para a Administração a mesma responsa- gral – que prega a indenização em todo e qual- bilidade objetiva estabelecida para o servi- quer caso de dano suportado pelo particular. ço público. Mesmo que seja confiada a em- Significa sim que a Administração pode pro- preiteiros particulares, a responsabilidade var a culpa total ou parcial do lesado na ocor- por danos oriundos do fato da obra é do Po- rência, caso em que se eximirá do pagamento der Público que ordenou a execução. O total ou parcial da indenização. construtor particular só responde por atos O constituinte estabeleceu para as enti- lesivos resultantes de sua imperícia, imprudên- dades estatais e seus desmembramentos cia e negligência na execução do projeto. A res- administrativos, incluídas as agências au- ponsabilidade originária é da Administração, tônomas, a obrigação de indenizar o dano como dona da obra, mas pode ela haver do execu- causado a terceiros por seus servidores, in- tor culpado tudo quanto pagou à vítima4. dependentemente de prova de culpa no co- metimento da lesão. Firmou, portanto, o Atos de terceiros e fenômenos princípio objetivo da responsabilidade sem da natureza culpa pela atuação lesiva dos agentes públi- cos e de seus delegados. “Agente” foi o vocá- Mas o Constituinte só protegeu o indiví- bulo utilizado pelo constituinte, de modo ge- duo da atuação administrativa “pelos da- nérico, abrangendo, para fins de responsabi- nos que seus agentes, nessa qualidade, cau- lidade civil, todas as pessoas incumbidas da sarem a terceiros”, mas não por atos de ter- realização de algum serviço público, perma- ceiros ou fenômenos da natureza. Para a inde- nente ou transitório. O essencial é o “fato do nização de tais atos ou fatos naturais, per- serviço”, que o agente tenha praticado o ato manece o princípio geral da culpa civil, nas ou a omissão administrativa no exercício de suas modalidades de imperícia, imprudência suas funções ou a pretexto de exercê-las3. ou negligência na realização do serviço pú- MEIRELLES (2000) esclarece que evo- blico que possa ter ocasionado o dano. Logo, luiu do entendimento anterior em que con- o dispositivo constitucional abraça somen- siderava excluídas da incidência nesse prin- te a atuação funcional do servidor público, não cípio as pessoas físicas e jurídicas que exerci- contemplando, pois, os atos de terceiros ou tavam funções públicas delegadas, sob a for- fatos da natureza, como as enchentes, que ma de empresas estatais ou de empresas venham causar dano ao administrado 5. concessionárias ou permissionárias de ser- Tratando-se de evento da natureza pre- viços públicos, para a sua inclusão no prin- visível e resistível, como por exemplo um cípio da responsabilidade objetiva. Ressal- planejamento correto contra as secas, não
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haveria como imputar às agências compe- Código anterior, que: “as pessoas jurídicas tentes (ANA e ANEEL) responsabilidade pela de direito publico interno são civilmente res- crise energética. Evidentemente, se ocorreu a ponsáveis por atos dos seus agentes que crise é porque não houve o devido planeja- nessa qualidade causem danos a terceiros, mento para a utilização e aproveitamento dos ressalvado direito regressivo contra os cau- recursos hídricos, bem como a previsão de sadores do dano, se houver, por parte des- outras fontes de energia. Nesse diapasão, se tes, culpa ou dolo.” os efeitos da seca poderiam ser amenizados Conclui-se, da análise de tal dispositi- pela correta utilização dos recursos hídricos vo, que há responsabilidade da Adminis- bem como no fomento de novas fontes de ener- tração mesmo quando não houver culpa ou gia, caracterizou-se a falta do serviço. dolo por parte do agente público. Quando os causadores do dano agirem com culpa Da reparação do dano ou dolo, aplica-se a ação regressiva. Logo, a responsabilidade das agências reguladoras A ação de indenização é o meio judicial é objetiva em todos os casos. Desse modo, adequado para a reparação do dano que todos os danos conseqüentes à atividade não for resolvido de maneira amigável, por comissiva ou omissiva das agências regu- acordo entre as partes. Após a indenização ladoras estarão sujeitas ao regime de res- da vítima, a Administração Pública pode ponsabilidade objetiva, cabendo à vitima exigir do agente causador do dano ação re- demonstrar apenas a lesão e o nexo causal gressiva para obter dele o ressarcimento da- com a atividade estatal, no caso a agência quilo que foi pago a título de indenização. É reguladora que provocou o dano. o que autoriza o § 6º do art. 37 da CF, pois, primordialmente, o Estado indeniza a víti- A responsabilidade do Estado pelos ma, e só então o agente culpado indeniza o atos das agências reguladoras Estado, por ação regressiva. Enquanto para a Administração a res- As agências reguladoras identificam-se ponsabilidade independe de culpa, para o com as autarquias, conforme conceituadas servidor a responsabilidade depende de no art. 5º, inc. I, do Decreto-lei nº 200/67. culpa: aquela é objetiva, esta é subjetiva e se São elas também entes descentralizados da apura pelos critérios gerais do Código Civil. Administração Pública, com personalidade Como ação civil, destinada à reparação jurídica de direito público, com autonomia, patrimonial, a ação regressiva (Lei nº 8.112/ inclusive no tocante à gestão administrati- 90, art. 122, § 3º) transmite-se aos herdeiros va e financeira, com patrimônio e receita e sucessores do servidor culpado, podendo próprios, destinados a normatizar, regular ser instaurada mesmo após a cessação do e fiscalizar setores de atividades de interes- exercício no cargo ou na função, por dispo- se público, em nome do Estado brasileiro. nibilidade, aposentadoria, exoneração ou Como autarquias de regime especial, di- demissão. ferem das autarquias comuns, pois a lei ins- tituidora lhes confere privilégios específi- A responsabilidade civil no novo cos com vistas à ampliação de sua autono- Código Civil (Lei 10.406/2002, mia técnica, administrativa e financeira. Seus diretores possuem mandato fixo, o que art. 43) e na Constituição Federal lhes assegura independência e autonomia (§ 6º do art. 37) nas decisões. O novo Código trata da responsabilida- Logo, como pessoas jurídicas de direito de das pessoas jurídicas de direito público público, são sujeitos de direitos e obrigações. no art. 43, estabelecendo, diferentemente do Podem, portanto, adquirir direitos e contra-
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ir obrigações, inclusive as de indenizar pe- sentada pela companhia de sanea- los atos danosos, ainda que lícitos. mento, de acordo com a Lei que a cria.” Portanto, não se justifica a propositura entendeu, com base nesse precedente, não de ação indenizatória à pessoa jurídica de haver qualquer possibilidade de ser conhe- direito público interno a quem a agência cido o recurso do usuário, que objetivava o esteja vinculada, com o fim de receber inde- restabelecimento do fornecimento de água. nização pelos atos da agência reguladora. No seu voto, sustentou a legitimidade da Como pessoa jurídica autônoma, tem capa- conduta jurisprudencial que impõe o se- cidade para se fazer representar em juízo, guinte entendimento: para contrair obrigações e para responder “a) No que diz respeito à possibili- por lesões causadas a terceiros. Em conse- dade de corte de água pela falta de pa- qüência, a responsabilidade do ente de di- gamento, como se já não bastasse a au- reito público interno a quem a agência este- torização do Decreto nº 21.123/83 para ja vinculada somente será possível a título tanto, é até intuitivo que não estaria a subsidiário, uma vez exauridos os recursos SABESP obrigada a continuar forne- da agência reguladora causadora do dano. cendo a devedores da tarifa. Qualquer O art. 37, § 3º, da CF/88, com redação um sabe que a cobrança só será frutífe- determinada e incisos I a III acrescentados ra se o devedor tiver bens com os quais pela EC nº 19/98, prevê a elaboração de possa responder pelas dívidas. Em não Lei, visando disciplinar as formas de parti- tendo bens em tais condições, não há cipação do usuário na Administração Pú- quem faça um devedor pagar o que quer blica, no sentido de assegurar a manuten- que seja. A admitir-se a tese do impe- ção de serviços de atendimento ao usuário e trante, de que o fornecimento jamais avaliação periódica da qualidade dos servi- poderia ser cortado por falta de paga- ços. Nesse sentido, é interessante observar a mento, restando à concessionária a evolução jurisprudencial. Não tendo sido ain- cobrança judicial, estaríamos albergan- da elaborada a referida Lei, aplica-se o art. 22 do o locupletamento ilícito na sua for- do Código de Proteção ao Consumidor, que ma mais perversa, vale dizer, obrigan- determina: “os órgãos públicos, por si ou suas do a SABESP a fornecer água in aeter- empresas, concessionárias, permissionárias num a todos os maus pagadores para ou sob qualquer outra forma de empreendi- os quais teve, um dia, a infelicidade de mento, são obrigados a fornecer serviços ade- fornecer” (Apelação Cível nº 201.554- quados, eficientes, seguros e quanto aos es- 11/7, C, 2ª Câmara Civil, Rel SILVEI- senciais, contínuos.” No seu parágrafo úni- RA PAULILO, v. u., julg. em 21.12.93). co, dispõe que, “nos casos de descumprimen- No ROMS 8915/MA (DJ 17/08/98, to, total ou parcial, das obrigações referidas p.00023), o mesmo Relator, Ministro José neste artigo, serão as pessoas jurídicas com- Delgado, no “writ” impetrado por ausência pelidas a cumpri-las e a reparar os danos cau- de pagamento de tarifa de energia elétrica, sados, na forma prevista neste Código.” assim se manifestou: No RE nº 120.630/SP, o Rel. Min. José Del- “ADMINISTRATIVO. MANDA- gado, tendo como Recorrida a SABESP – Com- DO DE SEGURANÇA. ENERGIA panhia de Saneamento Básico do Estado de ELÉTRICA. AUSÊNCIA DE PAGA- São Paulo, em decisão de 20/11/97, e arri- MENTO DE TARIFA. CORTE. IM- mado em decisão da Suprema Corte (RE nº POSSIBILIDADE. 85.268, do Estado do Paraná) que assentou: 1. É condenável o ato praticado “SERVIÇO DE ÁGUA. É legítima pelo usuário que desvia energia elé- a suspensão do fornecimento de água trica, sujeitando-se até a responder por falta de pagamento de conta apre- penalmente.
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2. Essa violação, contudo, não re- de suas ações. Nesse sentido o acórdão do sulta em reconhecer como legítimo o Superior Tribunal de Justiça relatado pelo ato administrativo praticado pela Min. Vicente Leal6: empresa concessionária fornecedora “PROCESSUAL CIVIL. ADMINIS- de energia e consistente na interrup- TRATIVO. SERVIÇO FUNERÁRIO ção do fornecimento da mesma. DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO. 3. A energia é, na atualidade, um ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAU- bem essencial à população, constitu- SAM. AUTARQUIA MUNICIPAL. indo-se serviço público indispensável AUTONOMIA ADMINISTRATIVA E subordinado ao princípio da conti- FINANCEIRA. nuidade de sua prestação, pelo que se O serviço funerário do Município torna impossível a sua interrupção. de São Paulo, na qualidade de autar- 4. Os artigos 22 e 42, do Código de quia municipal dotada de autonomia Defesa do Consumidor, aplicam-se às administrativo-financeira, tem perso- empresas concessionárias de serviço nalidade jurídica e capacidade pro- público. cessual para ser acionado em juízo 5. O corte de energia, como forma nas ações que os seus servidores pos- de compelir o usuário ao pagamento tulam reajuste de vencimentos, o que de tarifa ou multa, extrapola os limi- evidencia a ilegitimidade passiva ad tes da legalidade. causam do Município de São Paulo.” 6. Não há de se prestigiar atuação Não há dúvidas de que responde a Pes- da Justiça privada no Brasil, especi- soa Jurídica de Direito Público objetivamen- almente, quando exercida por credor te pelos danos causados por suas ações, econômica e financeiramente mais devendo ressarcir à vítima a integralidade forte, em largas proporções, do que o dos prejuízos sofridos. devedor. Afronta, se assim fosse ad- Discordam, entretanto, a doutrina e a ju- mitido, aos princípios constitucionais risprudência quanto ao ato omissivo. Pre- da inocência presumida e da ampla domina a tese de que neste caso é necessá- defesa. ria a comprovação de negligência do Poder 7. O direito do cidadão de se utili- Público, para caracterizar a responsabili- zar dos serviços públicos essenciais dade subjetiva. MELO (1993, p. 430) afirma para a sua vida em sociedade deve ser que a imputação de um dano decorrente de interpretado com vistas a beneficiar a omissão estatal não pode ser realizada de quem deles se utiliza. forma imediata, uma vez que a inércia, por 8. Recurso improvido.” si, não é causadora de dano. A responsabi- Portanto, a interpretação das normas do lidade da Administração surge quando se Código do Consumidor aos usuários do ser- comprove que estava legalmente obriga- viço público evoluiu no sentido de respeito da a impedir a ocorrência do evento da- aos princípios constitucionais em prol do noso e não o fez – trata-se, pois, de res- destinatário final desses serviços. ponsabilidade por ato ilícito, e, por isso, subjetiva. Responsabilidade da Agência Ressalte-se que o dispositivo constitucional por atos comissivos e omissivos instituidor da responsabilidade objetiva do Poder Público (art. 37, § 6º, da CF vigente) refere-se aos da Administração danos causados pelos agentes públicos, e não aos Como sujeitos de direitos e obrigações, danos não causados por estes. A propósito, em as agências devem ser acionadas diretamen- decisão para firmar a responsabilidade do te pelos prejuízos causados em decorrência Estado por homicídio de presidiário pratica-
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do por outro detento, assim concluiu o Rela- vação de negligência dos funcionários do tor, Ministro Carlos Mário Velloso: “o Poder hospital, a indenização foi devida, pois de- Público, no caso, deve responder pela omis- monstrado o nexo de causalidade. são, porque não atuou quando deveria atuar: “RESPONSABILIDADE CIVIL DO cumpria-lhe colocar o preso em ‘cela segura’, ESTADO CARÁTER OBJETIVO, QUER diante da ameaça que existia contra a vítima SE TRATE DE CONDUTA COMISSI- e que lhe foi transmitida. O Poder Público foi, VA, QUER OMISSIVA: portanto, negligente, modalidade de culpa, a Responsabilidade civil do Estado faute du service dos franceses7.” - Interno de hospital municipal, com Percebe-se, em se tratando de ato omissi- distúrbios mentais decorrentes de in- vo do Poder Público, que a responsabilida- toxicação, que foge e vem a ser atro- de civil por tal ato é subjetiva, pelo que exige pelado e morto - Falha no dever de vi- dolo ou culpa, numa de suas três vertentes, gilância - Veículo atropelador também negligência, imperícia ou imprudência, não pertencente ao Município e que trafe- sendo, entretanto, necessário individualizá- gava irregularmente – Procedência.” la, mas ao serviço público, de forma genéri- ca (teoria da culpa administrativa). Conclusão No mesmo sentido a decisão do TRF da 4ª Região, Rel. Marcelo de Nardi8: Houve, doutrinária e jurisprudencial- “RESPONSABILIDADE CIVIL DO mente, louvável evolução no tema respon- ESTADO – FALTA DO SERVIÇO – sabilidade civil do Estado, partindo-se da CORRETORA DE VALORES MOBI- teoria da irresponsabilidade até a teoria do LIÁRIOS LIQUIDADA EXTRAJUDI- risco administrativo, fundada na responsa- CIALMENTE: bilidade objetiva da Administração. Os investidores clientes da corre- As agências reguladoras, conceituadas tora de valores mobiliários liquidada como autarquias especiais, pessoas jurídi- extrajudicialmente não têm direito a cas de direito público, têm autonomia técni- indenização por omissão da fiscali- ca, administrativa e financeira e capacida- zação a ser exercida pela CVM, pelo de de adquirir direitos, celebrar contratos e BACEN, ou pela Bolsa de Valores em contrair obrigações, inclusive as de indeni- que opera, quando essa empresa pra- zar. ticou fraudes, e apresentou balanço ir- A responsabilidade objetiva do Estado regular. A responsabilidade do Esta- está consagrada pela teoria do risco admi- do, em casos de omissão de serviço de nistrativo, conforme previsto no art. 37, § 6º, fiscalização, deve ser demonstrada da Constituição Federal de 1988. O disposi- com os requisitos do nexo de causali- tivo prevê a responsabilização por atos co- dade e da culpa.” missivos dos agentes públicos, atuando nes- Logo, em se tratando de situações impos- sa qualidade. Basta para sua caracteriza- síveis de prevenir, não há que se falar em ção a existência de nexo de causalidade, não responsabilidade objetiva do Estado. A res- se perquirindo quanto a culpa do Estado ou ponsabilidade por atos omissivos, nessa do agente administrativo. perspectiva, deve-se pela não-prestação de Diverge-se, doutrinariamente, quanto à um serviço público, do qual tinha o dever omissão da Administração. Rege-se pelo sis- legal de prestar. tema da responsabilidade subjetiva, ado- Mas há também decisões que entendem tando a teoria da culpa administrativa, fun- ser objetiva a responsabilidade civil da Ad- dada na “falta do serviço” (inexistência, ministração, mesmo em face de ato omissi- retardo ou mau funcionamento do serviço vo. Nesse caso, não obstante a não-compro- público) e não da culpa individualizada do
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agente público. Mas também se entende ser peut incomber à l’Etat pour les dommages causés objetiva a responsabilidade civil da Admi- aux particuliers par le fait des personnes qu’il em- ploie dans le service publique...n’est ni générale, ni nistração, mesmo diante do ato omissivo, absolue; elle a ses régles spéciales...’. Si restrictive ou seja independentemente da comprova- que puisse paraître la formule, elle n’en consacre ção de culpa, uma vez demonstrado o nexo pas moins l’existence d’une responsabilité da la de causalidade. puissance publique, indépendamment de tout tex- Mas, com o advento do novo Código Ci- te.” (RIVERO, 1990, p. 340). 3 DJU 22.04.91 – detento assassinado por colega de vil, verifica-se, pelo seu art. 43, a unificação cela; RJTJSP 124/139 – (morte causada por falta de do sistema de responsabilidade do Estado, tampa em bueiro; BAASP 1.671, de 2.1.90 – vítima e, em conseqüência, das agências regulado- atingida por projétil durante tiroteio). 4 ras. Desse modo, os atos e fatos causadores RTJ 140/136; RT 142/612; 229/130; 233/153; de danos, sejam eles comissivos ou omissi- 236/95. 5 Por isso, a jurisprudência tem exigido a prova vos, provocados pela ação ou omissão dos de culpa da Administração nos casos de depreda- agentes públicos, são responsabilizados ob- ções por multidões (RDA 49/198; 63/168, 211/ jetivamente. 189, 297/301). 6 São excludentes da responsabilidade, Superior Tribunal de Justiça no Resp 249527 – por não se caracterizar o nexo causal, o caso SP – 6ª T. Rel. Min. Vicente Leal (DJU 14.02.2000, p. 87): fortuito e a força maior quando imprevisí- 7 RE 179.147. STF, Rel. Min. Carlos Mario Vello- veis e inevitáveis, o fato da vítima, exclusi- so, 2ª Turma, DJ de 27.2.98, p.18. vo ou concorrente, e o atos de terceiros, pois 8 Brasil, TRF 4ª Região. AC95.04.520.94-4-RS- o Constituinte só protegeu o indivíduo da 3ª T. Rel. Juiz Marcelo de Nardi – DJU 05.05.1999. atuação administrativa “pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros”. Para a indenização de tais atos Bibliografia ou fatos naturais, permanece o princípio geral da culpa civil – nas suas modalidades BRASIL. Constituição (1988). Constituição da Repú- de imperícia, imprudência ou negligência na blica Federativa do Brasil: São Paulo: Saraiva, 2002. realização do serviço público – que possa DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito admnis- ter ocasionado o dano. trativo. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2000. Logo, o dispositivo constitucional abra- FEBRE reguladora. Exame, São Paulo, p. 44, 23 ça somente a atuação funcional do servidor jan. 2002. público, não contemplando, pois, o fato da vítima, os atos de terceiros ou fatos da natu- MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo bra- sileiro. 26. ed. São Paulo: Malheiros, 2001. reza, como as enchentes, que venham a cau- sar dano ao administrado. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direi- to Administrativo. 4.. ed. São Paulo: Malheiros, 1993. ______. Curso de direito administrativo. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 2001. Notas RIVERO, Jean. Droit administratif. Treiziène éd. Pa- 1 Como menciona esse autor, “a doutrina do ris: Dalloz, 1990. Direito Público propôs-se a resolver a questão da responsabilidade civil da Administração por prin- SAAD, Renan Miguel. O ato ilícito e a responsabilida- cípios objetivos, expressos na teoria da responsabili- de civil do Estado: doutrina e jurisprudência. Rio de dade sem culpa ou fundados numa culpa especial do Janeiro: Lúmen Júris, 1994. serviço público quando lesivos a terceiros”. 2 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucio- “D’abord reconnue, em dehors même des cas nal positivo. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2000. où un texte précis la consacrait, pour les actes dits de gestion, qui ne mettait pas en jeu la souveraineté TÁCITO, Caio. A reforma do Estado e a moderni- de l’État, elle fut admise en principe par le célèbre dade administrativa. Revista de Direito Administra- arrêt Blanco (...) qui affirme: ‘La responsabilité qui tivo, Rio de Janeiro, n. 215, p. 1-7, jan./mar. 1999.