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Kato, M.; S. Duarte, M.E.; Cyrino, S. & Berlinck, R. “Português brasileiro no fim do
século XIX e na virada do milênio” In Suzana Cardoso, Jacyra Mota e Rosa Virgínia
Matto e Silva (orgs.) Quinhentos anos de história lingüística no Brasil. Salvador,
Empresa Gráfica da Bahia/Funcultura/Governo da Bahia. Pp. 413-438. (2006). ISBN:
85-232-0260-9.
1. Introdução
1
Tradução em português do original em inglês apresentado no colóquio “La Citoyenneté au XIXe Siècle au
Brésil et en France”, Paris, 1991.
interrogativas-Q e d) perda da inversão não-acusativa .
Nas seções seguintes faremos um estudo das correlações encontradas na literatura, a saber:
a) a correlação entre o decréscimo do sujeito nulo e o aumento do objeto nulo (seção 3);
b) a correlação entre perda de inversão em interrogativas-Q e sujeito nulo (seção 4);
c) a correlação entre sujeito nulo e inversão românica (seção 5);
d) a correlação entre perda de clítico e a restrição de monoargumentalidade na inversão VS
(seção 6).
2. Mudanças atestadas
Durante todo o século XIX, os sujeitos referenciais de primeira, segunda e terceira pessoas
são preferencialmente nulos (cf. Duarte 1993), como ilustram os exemplos em [1], estando
seu preenchimento condicionado por ênfase ou contraste e pela existência de um referente
2
não acessível sintaticamente, um procedimento comum nas línguas de sujeito nulo por
razões funcionais (cf. Calabrese 1986), como se vê em [2]:
[1] a. Quando (cv)i te vi pela primeira vez, (cv)i não sabia que (cv)j eras viúva e rica.
(1845)
b. Tua filhai lamentar-se-á, (cv)i chorará desesperada, não importa (...) Depois que
(cv)i estiver no convento e acalmar-se esse primeiro fogo, (cv)i abençoará o teu
nome e, junto ao altar, no êxtase de sua tranqüilidade e verdadeira felicidade, (cv)i
rogará a Deus por ti. (1845)
[2] Falei ontem com seu tenente-coronéi e elei disse-me que (cv)i havia de vir com
sinhá Dona Perpétua e com sinhá moça Rosinha. (1882)
Mesmo que o referente não esteja sintaticamente acessível, o sujeito nulo será preferido se
não houver ambigüidade na sua interpretação, como ilustra [3]:
[4] No fundo a fortuna é para quem sabe adquiri-la. (cv) Pintam-na cega... Que
simplicidade! (1845)
3
indeterminados) foneticamente representados, como ilustram os exemplos da peça de 1992
a seguir:
Na história do PB, podemos observar que o objeto nulo sempre foi possível. (cf. Cyrino
1993, 1997). Porém, no decorrer dos séculos temos um aumento significativo em sua
ocorrência. Essa mudança atinge primeiramente a posição nula cujo antecedente é
proposicional, como no exemplo [8], seguindo-se a posição nula com antecedente
predicativo, como no exemplo [9] e, finalmente, o objeto nulo com um NP [-específico]
como antecedente, exemplo [10]:
4
[9] Eu inda agora não creio
Que he verdade este amor
Mas praza a Deos, se assim for (cv) (157?) (cf. se assim o for)
No século XIX, podemos observar o objeto nulo já com as características que apresenta no
século XX. Em outras palavras, entre os diferentes tipos de objeto nulo segundo as
diferentes possibilidades de antecedente, temos uma maior ocorrência daquele que se
apresenta como o objeto nulo característico do PB2. A mudança se apresenta, nos dados, na
passagem do século XVIII para o século XIX; isto é, a partir do século XIX o objeto nulo
com antecedente [+específico, -humano], como podemos ver nos exemplos em [11], é o
tipo que mais ocorre nos dados:
O século XX apresenta uma alta incidência de objetos nulos, sendo a maior ocorrência de
objetos nulos com antecedente [-humano], como nos exemplos abaixo:
[12] a. Já viu que o nosso cinema virou clube i... E o burro... que limpe (cv)i depois!
(1992)
b. ... quando eu fui no curral, peguei um bocado de bostai de vaca e taquei (cv)i em
cima do ferimento... (1960)
2
O primeiro trabalho que mostra o objeto nulo peculiar do PB é o de Galves (1984).
5
também Duarte, 1986), que substitui o clítico em desuso:
O gráfico a seguir, mostra a mudança do objeto nulo quanto a antecedentes no século XIX
e XX:
70%
60%
57%
49%
50%
40%
30%
20%
2% 8%
10%
0% 0% 0%
XIX XX
Conforme veremos na seção 3, a mudança se inicia com a perda do clítico cuja referência
se encontra no nível mais baixo de uma hierarquia referencial, ou seja, o clítico cujo
antecedente é [-humano].
6
VS quase categórica no século XIX e inícios do século XX, quer o sujeito esteja
representado por um nome quer por um pronome, seguido ou não de algum constituinte,
como mostram os exemplos em [14]
[17] Nesses planos estávamos, quando apareceu este homem, não sei donde, (...)(1845)
7
O segundo padrão se aproxima da chamada inversão germânica: o sujeito aparece
imediatamente posposto ao verbo e é comum a presença de um outro elemento em posição
inicial, embora essa não seja uma condição essencial no PB, como se observa em [18a-b]:
[18] a. Emília, aos cinco anos estava eu órfão, e tua mãe, minha tia, foi nomeada por
meu pai sua testamenteira e minha tutora. (1845)
b. Tem ele nove anos e será prudente criarmo-lo desde já para frade. (1845)
Ao contrário dos dois padrões anteriores, encontram-se também casos em que o sujeito não
vem contíguo ao verbo3. Essa construção, ilustrada em [19], constitui o que a literatura
designa por inversão românica. Aqui, o sujeito ocupa a posição final da sentença, em
adjunção ao sintagma verbal, e apresenta um nítido valor focal.
[19] a. Tocou à minha cunhada, como principal bem de fortuna e fonte de renda, a
conhecida fábrica de meias da rua de Santa Engrácia. (1896)
b. Ora, daí em diante, começaram a chegar à minha mulher as negras notícias a
meu respeito. (1896)
Ao compararmos o quadro identificado para o século XIX com dados do fim do século
XX, observamos um decréscimo de ocorrência das construções de inversão verbo-sujeito e
predicado-sujeito, o que acentua seu caráter marginal. Os exemplos a seguir ilustram os
3
Além da inversão românica, também nos casos de ‘falsa inversão’ ou ‘antitópico’ o sujeito pós-verbal
aparece linearmente distante do verbo, conforme mostram [a-b], abaixo. No entanto, aqui ele ocupa uma
posição deslocada à direita, em adjunção ao sintagma flexional. A posição de sujeito de Flexão, por sua vez,
contém um pronome nulo referencial com o qual o SN deslocado está co-indexado. Não se trata de uma
verdadeira inversão, o que fica provado pela naturalidade da construção correspondente com o pronome
expresso, sempre possível (cf. [c-d]) (Kato & Tarallo 1989; Kato 1992 e 1993).
8
casos de VSX encontrados nos dados da segunda metade do século XX. Com exceção de
[20c], as sentenças soam pouco usuais para o falante do PB moderno, revelando no
contexto uma opção marcada com nítidos objetivos discursivos.
A construção com sujeito final (VXS) é igualmente pouco comum nesse fim de século.
Vamos encontrá-la restrita quase que apenas a sentenças com verbos monoargumentais, em
especial verbos copulativos, como nos exemplos abaixo:
Estudando o uso do pronome pessoal em várias línguas, Cyrino, Duarte e Kato (2000)
concluem que a referencialidade tem uma relevância altamente translingüística na
pronominalização. Para uma língua que tem uma opção interna para variantes nulas ou
4
Cf, por exemplo, Tarallo 1985.
9
não-nulas, um fator forte para a seleção de uma forma ou outra é o estatuto referencial do
antecedente.
Na hipótese das autoras, argumentos [+N, +humano] estão no extremo mais alto na
hierarquia referencial, enquanto não-argumentos estão na posição mais baixa. Com relação
aos pronomes, o falante (eu) e o interlocutor (você), sendo inerentemente humanos,
primeira e segunda pessoas pronominais, estão no ponto mais alto na hierarquia, e o
pronome de terceira pessoa que se refere a uma proposição está na posição mais baixa,
com a entidade [-humano] entre os dois. O traço [± específico] interage com todos esses
traços:
I. Hierarquia Referencial
não-argumento proposição [-humano] [+humano]
3 p. 3 p. 2 p. 1 p.
-espec. +espec.
[-ref] < ---------------------------------------------------------------------- > [+ref.]
5
Excetuando-se referentes proposicionais, podemos dizer que esta hierarquia é mantida na fala. A análise
sincrônica de Duarte (1995) revela as seguintes taxas de sujeitos pronominais plenos, de acordo com o traço
10
Gráfico 2. Sujeitos plenos e a hierarquia referencial
70%
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
XIX/1 XIX/2 XX/1 XX/2
O pronome expletivo que está numa posição baixa na hierarquia referencial (tanto o tipo
"there" como o tipo "it") ainda são categoricamente nulos no texto escrito examinado6.
Com a perda do clítico de terceira pessoa, o PB adquiriu o objeto nulo referencial e, com o
empobrecimento da morfologia de concordância, está perdendo o sujeito nulo referencial .
Ainda que cada processo tenha ocorrido independentemente, eles parecem ter sido guiados
pela hierarquia referencial em I e o mapeamento implicacional em II. A variação interna e a
mudança seriam assim apenas reflexos daquilo que governa a variação entre as línguas (cf
Tarallo & Kato 1989).
Como o clítico de 3ª pessoa não está mais no paradigma, objetos anafóricos com
antecedentes [+humano] são freqüentemente expressos por pronomes fortes "ele" e "ela", o
que mostra que a hierarquia de lexicalização proposta atua de novo, evitando que
pronomes altamente referenciais tenham uma expressão nula, como mostrado no Gráfico 3
abaixo, para os últimos três séculos:
referencial do antecedente: 68% [+humano], 65% [+arbitrário], 56% [-humano] e 44% [+hum/-espec].
6
Note-se, entretanto, que na fala já se observam estratégias de preenchimento do expletivo (cf. Duarte 1999),
entre as quais se destaca o uso do demonstrativo, como ilustra (i) a seguir:
(i) a. Isso era em torno de vinte pessoas.
b. Isso já faz muito tempo.
11
Gráfico 3. Objetos nulos e a hierarquia referencial
120%
100%
80%
60%
40%
20%
0%
XIX/1 XIX/2 XX/1 XX/2
Objetos cujo antecedente é [-humano] ou uma proposição são hoje quase que
categoricamente nulos. Por outro lado, vimos que os sujeitos que têm o traço [-humano]
são resistentes à mudança para pronome pleno (cf. Gráfico 2).
Até agora, vimos como a distribuição complementar de pronomes nulos e plenos ocorreu
ao longo da hierarquia referencial. A hierarquia de lexicalização não exclui a possibilidade
de sujeitos referenciais nulos. O que é excluído é a existência de uma língua com pronomes
nulos referenciais e pronomes plenos não-referenciais.
12
as propostas sobre o parâmetro do sujeito nulo correlacionam essa propriedade à inversão
livre VOS e não a XVSY das línguas V2, tipicamente germânicas. Kato e Duarte (1998)
procuram verificar se há efetivamente uma correlação entre a perda do sujeito nulo e o
desaparecimento do movimento do verbo para a segunda posição nas interrogativas-Q. Os
resultados daquele estudo encontram-se resumidos na presente seção.
e (b) a casos em que o sujeito, nominal ou pronominal, é seguido por algum constituinte
(VSX), como em [23]:
A maior parte dos dados porém, apresenta o sujeito em posição final (VS ou VXS). Se o
sujeito é um pronome, ainda temos o padrão V2, mas, se é um SN, o que significa mais de
metade dos dados, pode-se dizer que se trata de uma estrutura ambígua entre V2 e inversão
estilística. Um exame da distribuição dos dados pelos dois últimos séculos revela que as
sentenças que exibem um inequívoco padrão V2, já raras a partir dos anos 30, deixam de
aparecer na segunda metade deste século. O que chama a atenção é o fato de que no século
XIX e inícios do século XX as interrogativas com o sujeito não expresso ilustradas em [24]
são muito mais freqüentes do que as com o sujeito expresso, o que é compatível com uma
língua positivamente marcada em relação ao parâmetro do sujeito nulo, que era o caso do
português brasileiro nesse período:
13
[24] a. Com quem tenho o prazer de falar? (1845)
b. Mas como soube que eu estava aqui? (1845)
c. Para que estudaste tanto, rapaz? (1882)
d. Onde se esconderia ? (1845)
Observe-se que, se o sujeito é nulo, sua posição é invisível e o pronome nulo pode ser
imaginado pela criança que adquire a língua como estando antes ou depois do verbo, como
mostra [24]d’:
Quanto aos contextos em que o sujeito é um SN, o que se observa é que a ordem VS, antes
irrestrita, se não desaparece no final do século XX, limita-se a verbos monoargumentais
como em [15]a aqui repetido como [26] :
Como já foi dito, tais estruturas são ambíguas, podendo ser interpretadas com autênticas V2
(V para COMP) ou como um tipo de deslocamento à direita (inversão estilística). Assim,
Kato e Duarte (1998) sugerem, seguindo Kato (1993), ser este um contexto que torna a
14
reanálise possível. Enquanto a geração mais velha pode estar atribuindo a [26] acima a
estrutura [27]’, a criança, já num contexto de mudança, pode estar interpretando-a como
[27]’’, um caso de deslocamento à direita:
Se a estrutura é [27]’, o sujeito pós-verbal pode ser um pronome e a mesma gramática que
o produz contém sentenças como [22-23]; se a estrutura é [27]’’, o pronome pós-verbal é
impossível, como revelam os dados do português brasileiro contemporâneo.
O período de tempo foi o primeiro grupo de fatores selecionado pelo programa de regra
15
variável VARBRUL para ambos os fenômenos analisados e o exame dos pesos relativos
obtidos para cada período mostra que a pressão sobre o preenchimento do sujeito precede a
pressão sobre a ordem SV. Observem-se os pesos relativos na tabela a seguir:
Na seção anterior, ficou clara a relação entre sujeito nulo e XVOS, mais do que com
XVSO. O que nunca ficou muito claro na teoria é por que a propriedade de sujeito nulo
vem associada com a de inversão livre, ou românica. Nesta seção iremos apresentar a
teoria sobre sujeito nulo e inversão proposta em Kato (1999 e 2000a), que mostra como
essas propriedades podem ser derivadas de uma mesma propriedade.
7
Kato mostra que o caso “default”é aquele que se manifesta no contexto de predicativo enquanto Caso
16
[28] a. Me [TP I like beer]
b. Moi[TP j’aime la bière].
c. Yo [TP am-o la cerveza ].
A análise de Kato elimina pro como categoria descritiva. O sujeito é a própria concordância,
que pode desempenhar a função de resumptivo quando o pronome forte está presente. Note-
se que a posição do pronome forte é a dos DPs deslocados como em:
Lembrando que movimentos só são possíveis com núcleos e projeções máximas, fica claro
que somente com o espanhol podemos obter a ordem VOS, movimentando-se o TP por cima
do DP "Juan"8 . Com o inglês e o francês obtemos uma construção de deslocamento à direita:
O movimento do V+O no inglês e no francês é agramatical porque teríamos que mover T’,
uma projeção não-máxima.
Kato propõe ainda que o paradigma de concordância do PB foi substituído pelo paradigma de
pronomes fracos livres quase homófonos com os pronomes fortes, e os afixos deixam de ter
autonomia, aparecendo já afixados ao verbo desde o léxico. Requer-se, então, que pronomes
livres ou sintagmas apareçam na derivação para checar o nominativo e os traços de T. O
padrão VOS deixa de ser possível uma vez que o Spec de T aparece preenchido como no
inglês. Movendo TP, o que se obtém é uma estrutura de deslocamento à direita.
17
[31] a. O João [TP ele comeu a torta]
b. [TP ele comeu a torta] o João.
Já no PE não temos pronomes fracos, que podem ocorrer dentro de TP. Quando o pronome ou
um DP aparece, ele é externo. Daí ser possível a ordem VOS, que resulta do movimento de
TP.
Os estudos empíricos de Andrade Berlinck (1989, 1995 e 2000) e Kato et alii (1996) atestam
que o único tipo de verbo ainda produtivo na ordem VS no PB é o inacusativo, que parece
aceitar essa ordem de forma irrestrita:
18
[35] a. Chegou o trem.
b. ?Telefonou o cliente9.
c. *Assinou uma carta o chefe do departamento.
d. **Enviou uma carta a todos o presidente da associação.
A situação atual resulta de um processo de mudança por que passou o PB ao longo de pelo
menos dois séculos. Andrade Berlinck mostra que construções como as exemplificadas em
[35c-d] eram possíveis e relativamente comuns na língua utilizada em terras brasileiras no
século XVIII, tornando-se residuais nos dados mais recentes. O gráfico 5 ilustra esse
percurso.
100%
90%
80%
70%
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
XVIII/1 XVIII/2 XIX/1 XIX/2 XX/1 XX/2
SV VSX VXS
Por outro lado, as construções inacusativas com SN posposto mantiveram um padrão de uso
bastante regular nesse mesmo intervalo de tempo, como mostra o gráfico 6.
9
Embora os dados mostrem apenas uma ocorrência residual de VS com verbos inergativos, o falante não a
rejeita como os padrões VOS.
19
Gráfico 6: Freqüência de VS no PB.
45%
40%
40%
35%
33% 30% 30%
30% 29%
25%
26%
20%
15%
10%
5%
0%
XVIII/1 XVIII/2 XIX/1 XIX/2 XX/1 XX/2
VS
Vimos na seção anterior que o movimento-P que produz a ordem VOS é sensível a peso.
Essa restrição no PB parece ser mais radical do que nas demais línguas românicas. Podemos
sugerir que isso se deve ao fato de o PB ter perdido seu clítico de terceira pessoa, que abrange
hoje a segunda e a terceira pessoas do discurso. Como o clítico de primeira pessoa ainda é
preservado, esperaríamos que com ele tivéssemos a possibilidade de inversão. E de fato é
possível termos [36]a, mas não [36]b e c: o primeiro porque o clítico de terceira pessoa
desapareceu e o segundo porque o TP com um DP pleno como objeto é excessivamente
pesado para a aplicação do movimento-P.
O clítico dativo diferencia te de lhe, este último caindo em desuso na região centro-leste do
Brasil. Temos então o seguinte contraste:
20
[37] a. Me telefonou o Pedro.
b. Te telefonou a Maria?
c. * Lhe telefonou o Pedro.
d. ??Telefonou pra mim o Pedro.
e. ??Telefonou pra Maria o Pedro.
Já o PE conta com o paradigma de clíticos plenos e conta ainda com a ênclise, o que vai
permitir uma possibilidade generalizada de inversão:
10
As construções do tipo V2, produtivas no PE, parecem ser um recurso para evitar excesso de peso no
movimento-P.
21
Gráfico 7: VOS em orações declarativas com verbos
transitivos diretos
14%
13%
12%
10%
8%
7%
6%
4%
4%
2% 2%
2%
1%
0%
XVIII/1 XVIII/2 XIX/1 XIX/2 XX/1 XX/2
VOS
Segundo a idéia de que o movimento que gera VOS é sensível a peso, deveríamos esperar
que essa ordem ocorresse com mais freqüência quando o complemento do verbo se
realizasse como um pronome clítico ou como um objeto nulo. De fato é o que se constata
quando os resultados apresentados acima são reanalisados segundo essas distinções, como
nos mostra o gráfico 8:
35%
30% 31%
24%
25%
20%
17%
15% 13%
11%
10%
5% 5% 4%
5% 4%
5% 2%
1% 0% 2%
0% 0% 0%
XVIII/1 XVIII/2 XIX/1 XIX/2 XX/1 XX/2
7. Conclusões
Os estudos de mudança aqui relatados e as correlações feitas sobre elas deixam claro que o
PB se caracteriza, após 500 anos de descoberta, com uma gramática própria, bem distante
das demais línguas românicas de sujeito nulo.
22
Roberts (1993) interpretou as mudanças ocorridas no PB como paralelas às que ocorreram
no francês antigo, língua de sujeito nulo. Analisando as ainda produtivas inversões
inacusativas e existenciais, Kato (2000b) mostra que tais inversões se distanciam do padrão
italiano e português europeu e se aproximam mais das inversões do francês. Outros estudos
mostram o PB como uma língua orientada para o discurso (Pontes 1987, Galves 1993,
Negrão 1999). Como essas duas tendências podem ser conciliadas em um único sistema?
Há muito ainda a se pesquisar no milênio que se inicia, mas podemos dizer que muito se
descobriu no final deste que passou.
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