"O setor atacadista com seus clientes, cerca de cinco mil agentes de distribuição em aproximadamente um milhão e meio de pontos de venda, por si só já é uma grande rede colaborativa."
O setor atacadista vem passando por mudanças. Uma delas, é a criação de
redes colaborativas no desenvolvimento de negócios de distribuição de bens de consumo como forma de integração e desenvolvimento em um mercado em forte processo de concentração e de alta competitividade. Para falar sobre o assunto, o consultor da Associação Brasileira de Atacadistas e Distribuidores (ABAD), Guilherme Tiezzi, esteve em Porto Alegre durante workshop promovido pelo Sindiatacadistas dia quatro de julho. Abaixo, entrevista com o também sócio fundador da Value Buiders – Colllaborative Business Experts, de São Paulo.
Quais as principais variáveis que afetam o setor atacadista?
Em primeiro lugar, é o consumidor. Os hábitos de consumo estão mudando.
Houve um grande aumento de inserção das classes C, D e E no mercado. E elas possuem hábitos de compra diferentes das classes A e B, principalmente no que diz respeito à localidade de compra e fidelização do canal. É uma população que adquire bens de consumo em bairros, em lojas de vizinhança, na média de duas a três vezes por semana. Compram em pequenas quantidades. E isso fez com que toda a estrutura do varejo tivesse que se adaptar a esse novo mercado, que representa 71% do que se consome no país. Em função disso, as lojas alteraram sua forma de planejamento, operação e formato. Toda a cadeia de logística se remodelou para ter mais organização de fluxo. As grandes redes, por exemplo, começaram a investir em lojas de vizinhança. O que foi muito positivo. Desde 2001, o pequeno e médio varejistas, que são os clientes do atacado, vêm crescendo, ganhando espaço. Já representam 53% da distribuição nacional. Outra variável é a tendência à concentração no setor. Grandes empresas vêm dominando o mercado do comércio – atacado e varejo. O que traz a necessidade de haver mais competitividade, que é a terceira variável. É preciso ter respostas rápidas, estruturas flexíveis para responder a essa mudança de mercado. E é aí que entra a linha de colaboração.
Como funcionam as redes colaborativas?
O setor atacadista com seus clientes, cerca de cinco mil agentes de
distribuição em aproximadamente um milhão e meio de pontos de venda, por si só, já é uma grande rede colaborativa. Do outro lado, existe o mercado organizado. De um lado, o varejo organizado, do outro lado, redes colaborativas, que são empresários independentes, mas que praticam o negócio em conjunto. O Brasil tem 500 mil pequenas e médias indústrias – que não são multinacionais. Essas indústrias utilizam mais de cinco mil agentes de distribuição (os atacadistas e distribuidores), que atendem a cerca de um milhão e meio de pontos de venda.
O Brasil possui uma cultura cada vez maior de colaboração. Um exemplo:
atacadistas que têm vendedores e caminhões, cada um continua com seus vendedores, concorrendo num processo comercial, mas o caminhão é compartilhado. A estrutura de logística é em comum. Isso faz com que o setor ganhe competitividade e desenvolvimento.
Existem quatro grandes blocos de colaboração: de produção, que são as
indústrias; de agentes de distribuição (atacados e distribuidores organizados); de varejistas; e de prestação de serviços (que prestam serviços para essas outras redes). São redes entre pequenas e médias empresas, onde não há espaço para as grandes. Porque, se existe uma grande empresa no meio, ela desarticula essa relação de interindependência. Todos os empresários possuem autonomia. Um exemplo de redes colaborativas são os consórcios de exportação, onde as indústrias conseguem vender juntas.
Tudo depende de uma mudança de cultura, de privilegiar a colaboração. A
gente brinca que é colocar um pouco o ego na mesa. Você tem que abrir mão de parte do seu ego. Deixar de ter uma visão de curto prazo, imediatista, como tem sido no Brasil e na América Latina nos últimos anos. E onde há no Brasil essas redes?
Nas regiões Sul e Sudeste é onde se encontra mais práticas de redes
colaborativas, mais cases. A evolução se deu mais rápido da Região Sul para o resto do país. Um exemplo é a Vinícola Aurora no Rio Grande do Sul. Trata- se de uma grande rede cooperativa de famílias que produzem vinho, enquanto que no Nordeste ainda predominam as grandes fazendas de latifúndio.
Outro exemplo é a Agência de Promoção de Exportações e Investimentos
(APEX Brasil), do governo federal, que estimula a criação de consórcios de exportação entre 20, 30 empresários.
Também a Brokernet Brasil, em São Paulo, junta uma rede de indústrias e
uma rede de distribuidores para atender um mercado específico. É uma macro-rede colaborativa formada por cinco pequenas e médias indústrias.
No setor, hoje, existe a necessidade de uma forte otimização na parte de
logística, certo? Como isso é possível?
Através de investimentos em pessoas e em tecnologia. Os atacados e
distribuidores do Brasil fizeram fortes investimentos e automatização de processos, como automação da força de vendas. O setor investiu muito em tecnologia, é referência nesses modelos de distribuição. Houve o incentivo na formação de pessoas – universidades criadas especificamente para atender esse setor, com apoio de instituições como Sindiatacadistas e ABAD. E houve também, no Brasil, a colaboração entre os empresários (que são as redes colaborativas). O investimento em tecnologia foi muito forte, para atender a nova demanda. E essa nova tecnologia fez com que o atacado, em conjunto com seu cliente, o pequeno varejo, tivesse preços competitivos.
A integração entre a indústria e o atacadista é necessária. Como se dá essa
integração? O primeiro passo é criar um dicionário do setor, para cada um saber exatamente o que o outro faz. A segunda etapa é planejar em conjunto. Se o foco é determinada região, determinado consumidor e, definidas as categorias de produtos, como então desenvolver o trabalho juntos. A partir daí, o atacado, o distribuidor e a indústria começam a definir estratégias para atender melhor o pequeno varejista. É o que se chama de trade-marketing.