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Universidade Federal do Rio de Janeiro

22 de Fevereiro de 2016

Professores: André Chevitarese e Flávio Gomes

Aluna: Anelise Martins de Barros

A voz do Morro: Olhares sobre as desocupações na cidade do Rio de Janeiro.

I. Introdução

Desde os primórdios da fundação da cidade do Rio de Janeiro que se tem notado a constante
presença de morros que perpassam toda a cidade e são representados nos mapas produzidos por
holandeses, espanhóis e franceses, como na gravura atribuída ao comandante holandês Oliver Van
Noort que se dirigia às Índias pelo Estreito de Magalhães e ao retornar a Holanda publica em 1602
um livro acerca de suas viagens onde a gravura está presente sob o título "Uma descrição verdadeira
da ilha do Rio de Janeiro.

O morro tão marcante nos mapas e representações da cidade do Rio se torna um monumento
questionado, pois se antes era um marco de onde se poderia ver amplamente a região e prever
possíveis invasões, posteriormente se torna um local a ser desmontado devido ao acúmulo de
doenças na cidade que eram trazidas pelos miasmas produzidos pelos habitantes1 dessas localidades,
como é dito por Licia Valladares em "A gênese da favela carioca. A produção anterior às ciências
sociais", onde ela afirma que "Os médicos higienistas, com seus estudos sobre os agentes causadores
das epidemias, em suas suposições sobre a contamina- ção do meio urbano pelos miasmas, viam a
cidade do Rio de Janeiro como um “corpo urbano” que apresentava deficiências e necessitava de
certas intervenções. Seguiu-se, naturalmente, a leitura da favela como doença, moléstia contagiosa,
uma patologia social que precisava ser combatida.".

II. Panorâma das visões e respostas encontradas à favelização dos morros no século XX

Essa concepção do morro enquanto local a ser combatido pode ser notada na reforma implementada
por Pereira Passos no início do século XX com a justificativa da higienização e da necessidade de se
ter uma capital segundo os modelos europeus e na derrubada do Morro do Castelo em 1922 sob
ordens do prefeito Carlos Sampaio, onde se tem o local visto como "marco inicial" da cidade do Rio
de Janeiro sendo desmontado.

Na era Vargas o intuito das fiscalizações aos morros, assim como algumas remoções, se tratou de
manter o embelezamento da cidade, como no código de obras de 1937 onde no artigo 30º da sétima

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sessão é declarado que "Quando da construção em um lote ... puder resultar prejuízo para um ponto
panorâmico ou para um aspecto paisagístico da cidade, a Diretoria de engenharia poderá para
defendê-los, limitar o nível acima do qual a construção não deva subir... ", além desse caráter
estético há também a constante preocupação com a saúde dos moradores da cidade devido a "falta
de higienização" desses locais e isso leva ao combate aos morros e aos seus moradores, os quais são
intensificados com a criação dos parques proletários para onde esses moradores eram remanejados,
inicialmente financiados pelo governo e posteriormente passavam a pagar cerca de 15% do valor do
salário mínimo.

O regime militar que teve seu início em 1964 manteve a desocupação das favelas em um primeiro
momento, assim como nos regimes anteriores, onde os moradores de comunidades eram removidos
e realocados para os parques proletários, o qual teve sua criação intensificada através de instituições
como o BNH2 e a CHISAM3. Esses parques em maioria ficavam a uma distância notável do Centro do
Rio de Janeiro, que é onde a maior parte dos moradores dessas favelas trabalhavam.

O ano de 1968 marca um novo viés acerca da questão das remoções que pode ser notado nas
palestras ministrada pelo Professor John Turner de Massachusetts a convite da SERFHAU4, onde o
ideal não é a retirada desses moradores, mas a reubarnização que permite a permanência próximo
ao seu local de trabalho e evita custos que os habitantes não conseguirão cobrir com a mudança para
outro local de moradia. O Jornal do Brasil realizou uma entrevista ao professor Turner na qual ele
afirma que "A favela é um aglomerado em pleno desenvolvimento. Assim, tende a aumentar cada
vez mais o número de seus habitantes. Nem mesmo uma mudança na política do Governo Federal
para a estabilização do homem, afim de evitar as migrações, acabaria com os problemas. ", nessa
citação fica evidente a posição do professor Turner acerca das remoções, mas mesmo com a
permanência de movimentos contrários a remoção dos moradores, a CHISAM permaneceu a afirmar
que a reurbanização não traria as devidas mudanças, por não ser "psicologicamente favorável, pois
os favelados continuariam pensando, agindo e vivendo como favelados".

III. A voz do Morro

Os moradores das favelas que sofreram remoções se expressaram das mais diversas formas acerca
da sua posição, sendo a música um dos principais meios de exposição dessa população
marginalizada. Uma das expressões dessa voz que flui do morro é o samba "Opinião", escrito por Zé
Keti em dezembro de 1964. Nesse Samba se encontra um trecho marcante onde há a seguinte
afirmação: "Podem me prender/ Podem me bater/ Podem, até deixar-me sem comer/ Que eu não
mudo de opinião/ Daqui do morro/ Eu não saio, não", esse trecho poderia ser interpretado por

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muitos como uma romantização da favela, mas se levarmos em conta outras fontes pode-se notar
que em alguns casos ele expressa o desejo desses morados em não sofrerem com a remoção, como
no jornal Correio da Manhã de 23 de agosto de 1964 onde há a notificação de duas tentativas de
suícido na remoção de vinte famílias da Favela da Mãe Solteira, onde uma das mulheres tentou
cortar os pulsos com gillete e a outra jogou gasolina em suas vestes e no barraco, mas ambas foram
impedidas a tempo pelos políciais que estavam presentes para evitar reações como essas.

Dentre os muitos casos de resistência que corroboram a ausência de vontade dos habitantes de sair
dessas favelas está o caso da Favela de Brás de Pina onde os moradores, assim como o padre local
levantaram movimentos e abaixo assinados de resistência, os quais foram noticiados em jornais
como Jornal do Brasil, Última Hora e O Correio da Manhã, tendo sido noticiado neste ultimo em 1968
o seguinte trecho "Padre Artola já liderou uma luta de favelados contra a remoção da Favela de Brás
de Pina, há dois anos, tendo afirmado ao sr. Siegmund Kelsons que com os favelados vou ao inferno,
mas com os senhores não quero ir ao céu, nem com a polícia.", nesse trecho podemos ver a
resistência vinda tanto da parte dos moradores quanto da igreja local, o que gerou apoio de parte do
clero e revolta da outra que desejou uma punição ao padre por interferir nessas questões.

No jornal Última Hora de 16 de setembro de 1964 há uma reportagem onde moradores da favela de
Brás de Pina questionam se o plano do governo é reurbanizar o local ou removê-los, pois se for
reurbanizar eles podem contribuir financiando e disponibilizando mão de obra porque o importante
para eles era não haver a retirada do local, como no seguinte trecho fica explícito "- Se o objetivo de
Dona Sandra Cavallcanti é urbanizar e não somente remover os favelados não precisa gastar dinheiro
porque nós já temos pronto o projeto de urbanização da Favela de Brás de Pina...", na citação pode-
se notar o quanto há a empatia dos moradores com esses locais e isso também pode ser visto no
samba escrito por Zé Keti no ano de 1967, O Favelado, onde ele afirma que "O morro tem sede/O
morro tem fome/ O morro sou eu um favelado". Isso mostra que os moradores das favelas não
queriam a remoção do "Favelado".

IV. Conclusão

Em cada momento da história há uma justificativa para retirar os habitantes de seus barracos, mas
quando se tem contato com a história dessas remoções é sob o viés do Estado e raramente o viés do
morador. Através do samba e de recortes de jornais pode-se ouvir o que esses indivíduos tem a dizer,
nesses recortes se encontram seus desejos e suas opiniões acerca da retirada, uma parte aceitando a
remoção, outra drasticamente contra, mas todos sendo removidos e locomovidos para locais que os
distanciaram de seus trabalhos e encareceram suas vidas.

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Notas:
1
Os habitantes desses morros eram ex-escravos que foram libertos em decorrência das leis do fim do
século XIX e militares que retornaram da Guerra de Canudos.
2
BNH, Banco Nacional de Habitação, era uma instituição que financiava e produzia investimentos
imobiliários.
3
CHISAM, Coordenação de Habitação de Interêsse Social da Area Metropolitana do Grande Rio,
órgão público criado em 1968.
4
SERFHAU , Serviço Federal de Habitação e Urbanismo, criado em agosto de 1964.

Referências Bibliográficas:

Barros, P.C. Onde nasceu a cidade do Rio de Janeiro ? ( um pouco da história do Morro do Castelo ),
Revista geo-paisagem ( on line ),Vol. 1, número 2, 2002. Disponível em:
<http://www.feth.ggf.br/origem%20do%20rio%20de%20janeiro.htm>. Acesso em: 31 jan. 2016.

Mello, Macyr De. Revista o Cruzeiro, Rio de Janeiro, 8 de ago. 1942. Disponível em:
<http://bndigital.bn.br/hemeroteca-digital/ >. Acesso em: 31 jan. 2016.

Paixão, C.M. Q. As políticas públicas de transformação urbana na cidade do Rio de Janeiro no início
do século XX, Revista Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro, no 7, p. 119 - 140. 2013. Disponível
em: <http://www.rio.rj.gov.br/dlstatic/10112/4204432/4114327/revista_AGCRJ_7_2013.pdf >.
Acesso em: 31 jan. 2016.

Pivetta, F; Firpo, M. Justiça ambiental e a formação das favelas: uma visão de Manguinhos, Rio de
Janeiro. Disponível em:
<http://www.conhecendomanguinhos.fiocruz.br/files/Artigo%20JA%20e%20Favelas-
Manguinhos.pdf>. Acesso em: 31 jan. 2016.

Rio de Janeiro. Decreto no 6000, de 01 de julho de 1937. Código de Obras do Distrito Federal, Rio de
Janeiro, 1937. Disponível em: <http://www.rio.rj.gov.br/web/arquivogeral/raridades.> Acesso em: 31
jan. 2016.

Valladares, L. A gênese da favela carioca. A produção anterior às ciências sociais, Revista Brasileira de
Ciências Sociais, Vol. 15 no 44 outubro/2000. Disponível em: <
http://www.scielo.br/pdf/rbcsoc/v15n44/4145.pdf>. Acesso em: 31 jan. 2016.

Vasquez, P. O largo do Paço: Imagem e História. Rio de Janeiro: MAR, 2014. 64 p.

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