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Uma questão premente.

Como sair do capitalismo (concl)

Sumário

1 - Um quadro global de abordagem

2 – Caraterização da actual paisagem neoliberal

3 – O papel nefasto das classes políticas

4 - A captura ideológica

«««««««««« ||||| »»»»»»»»»»

1 - Um quadro global de abordagem

Poulantzas enquadrava a realidade humana em três grandes esferas – a


económica, a política e a ideológica ou cultural.

 Na primeira organiza-se a produção de bens e serviços, a base


material, infraestrutural, da sociedade, na sua mais vasta acepção e,
nela se constituem os rendimentos, os capitais que alimentam a
máquina capitalista que domina o planeta.

 Na segunda, as classes políticas gerem a hierarquia das decisões que


administram a população, gerindo ainda a parte do excedente
económico afeta aos aparelhos de Estado, para a manutenção da boa
ordem capitalista e da reprodução do capital.

 E finalmente, na terceira incluem-se todos os instrumentos de caráter


ideológico, mediático ou religioso, bem como a amálgama designada
por senso comum cujo entrançado deverá conduzir à formulação de
visões da realidade que suscitem a aceitação por parte dos “de baixo”,
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das hierarquias e da redistribuição do excedente que mantenha o
domínio dos “de cima”.

Os escravos, eram, antigamente, para os seus donos, simples meios de


produção, animados e tão versáteis que até se podiam reproduzir, tal como
os cereais ou o gado, no âmbito da propriedade do senhor a quem competia
arcar com os escravos, enquanto custos de produção e garantir a sua
produtividade. Nesse contexto de desumanização do escravo, toda a
produção era da posse do senhor e o excedente económico era utilizado de
acordo com as suas necessidades e caprichos. Os servos da gleba não eram
simples meios de produção mas súbditos com um conjunto bem definido de
obrigações face ao senhor, no capítulo da carga tributária (entrega de
cereais, por exemplo) e da prestação de serviços (por exemplo, como
militares).

O capitalismo libertou os servos e os escravos dos vínculos a senhores, não


por espírito humanitário mas, porque desvinculando-se de responsabilidades
quanto à sua existência e manutenção, a sobrevivência do trabalhador forçá-
lo-ia a um maior esforço, a uma maior produtividade, daí resultando
aumento da rendabilidade do capitalista. Os trabalhadores, autónomos na
decisão de venda da sua força de trabalho eram parte de contratos formais
ou implícitos de trabalho, com mais ou menos direitos, de acordo com a
conjuntura política, económica e a força das movimentações laborais ou
revolucionárias. Eram formalmente “livres” de vender ou não a sua força de
trabalho; tal como o são, hoje.

A última crise estrutural, o fim da quarta onda de Kondratiev (anos 70)


assinalou a passagem do capitalismo de perfil keynesiano - com forte
intervenção do Estado na produção e como garante de direitos avançados
para os trabalhadores – para o modelo neoliberal que acelerou a
globalização, segmentou a produção e domesticou ou destruiu os poderes
sindicais e das organizações ditas de esquerda. A derrocada soviética
acelerou esse processo, fortaleceu os capitalistas e os seus partidos,
anulando também as referências que mantinham vivas as organizações de
perfil trotsko-estalinista, reconduzidas à defesa pouco convicta de uma
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frouxa ou pretensa social-democracia, quando não a um perfil vincadamente
de direita radical, com apostas isolacionistas, nacionalistas e de “elevação”
patriótica.

2 – Caraterização da actual paisagem neoliberal

A entrada no neoliberalismo maduro conduziu a vários fenómenos novos;

 O reforço da extensão e do poder das multinacionais reduziu a sua


ligação ao país de origem, transformou a concorrência Inter-imperialista
em concorrência global, desnacionalizada, no seio do Império do capital,
competindo entre si e encomendando às classes políticas a geração de
medidas facilitadoras da movimentação de capitais e mercadorias,
criando instituições globais de regulação;

 Nesses movimentos homogeneizantes do espaço de atuação está


incluída a segmentação da produção e a deslocalização territorial dos
seus elementos, no sentido da promoção, entre outros efeitos, do
embaratecimento dos custos e da compressão dos rendimentos do
trabalho, mormente nos países desenvolvidos;

 Nessa sequência, na maioria dos estados-nação, a função estatal de


capitalista coletivo ao nível nacional, de concertação entre empórios
nacionais, passou a centrar-se na garantia da boa ordem capitalista
interna para a atração do investimento estrangeiro, mormente enquanto
nós das redes de negócio das multinacionais;

 A globalização, acelerada pelas multinacionais e pelo sistema financeiro,


ao unificar o planeta numa rede muito densa de fluxos de mercadorias,
capitais e informação, transforma-o, não num conjunto unificado de
fábricas deslocalizadas mas como uma só fábrica, como dizem Hardt e
Negri. Assim, por exemplo, para os EUA, entre os anos 40 e 2016 a
parcela dos lucros obtidos no exterior, passou de 7% para 40%;

 É enorme o papel do sistema financeiro que, utilizando as comunicações


instantâneas, hoje disponíveis, permite a fácil liberalização dos
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movimentos de capitais, a multiplicação de territórios com amplas
vantagens fiscais para o seu parqueamento, garantindo ainda uma
acerba concorrência entre os estados-nação para a sua atração;

 A dívida e o consumismo dominam a vida de multidões, diretamente ou


através do pagamento de dívidas públicas na sequência de que, do ponto
de vista do capital global, as operações financeiras apresentam uma
rendabilidade superior à da venda de bens e serviços. Se nestes últimos
casos tende a findar rapidamente a relação consumidor-vendedor, no
caso das dívidas para compra de habitação ou da utilização do cartão de
crédito, trata-se de dívidas de uma vida ou que se renovam
sistematicamente, com elevadas taxas de juro;

 A dívida, constituída junto do sistema financeiro por pessoas, empresas e


Estados é um instrumento de captura, de condicionamento da vida dos
povos, sob a devida mediação das classes políticas; e, sendo
tendencialmente perpétua, gera, de facto, não o pagamento de juros
mas a constituição de rendas. A dívida pública é particularmente
apetecível pelo sistema financeiro pois os Estados, mesmo com
dificuldades, jamais vão à falência, uma vez que têm por detrás, uma
população susceptível de ser espoliada;

 Firmou-se uma clivagem, resultante da aplicação extensiva do taylorismo


aos serviços, entre o trabalho não qualificado, caraterizado por baixos
salários, precariedade, com o recurso intensivo a empresas de trabalho
temporário e o trabalho altamente qualificado, com contrapartidas em
altos salários, bónus e emprego estável. Essa clivagem, existente no seio

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de cada estado-nação, hierarquiza também, genericamente todos os
recantos do planeta, mormente entre países do Norte e países do Sul;

 A continuidade, nos chamados países do Sul, de enormes faixas de


população não inseridas na economia global (há no planeta 1500 M de
pessoas sem trabalho ou rendimento regular), coexiste com a sua
entrada progressiva na economia global, através de imigração, da fuga à
guerra, para os países do Norte ou, pela sua integração nas minas, nas
plantações ou nas filiais das multinacionais nos países do Sul. Essa
integração tende a exercer pressão para a baixa do preço do trabalho
pouco qualificado e a contribuir para o desemprego massivo no Norte,
alimentando, politicamente, derivas nacionalistas e racistas;

 A produção agrícola inserida nos circuitos globais do capital é minoritária


a nível global mas altamente agressiva face aos solos e ao ambiente em
geral, devido ao uso intensivo de pesticidas, fertilizantes, OGM, água e
da prática da monocultura, gerando elevados custos energéticos diretos,
como no capítulo do transporte, da armazenagem e da
congelação/refrigeração;

 Há uma tendência para o aumento do tempo de trabalho a despeito dos


ganhos de produtividade resultantes, sobretudo da automatização e da
massiva utilização da informação na produção de bens e serviços. Para o
efeito foi determinante o apagamento da pressão sindical a partir do
princípio da década de 80 do século XX, com o aumento da precariedade
e da contratação através de empresas de trabalho temporário; para
agravar a situação, com a vulgarização do uso da internet, de
computadores e smartphones, a vida de cada pessoa deixa de apresentar
uma fronteira entre tempos de trabalho e de lazer, daí resultando uma
total captura do trabalhador pelo capitalista;

 Com a tendência para estagnação da massa salarial global, o foco do


capitalismo dirige-se para o proveito obtido através da dívida, do
consumismo, do culto da moda, com a captura antecipada de
rendimentos futuros. Porém, isso não favorece suficientemente a

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produção material daí resultando a estagnação em que o neoliberalismo
se vem atolando, sobretudo, nos últimos dez anos. Para o efeito,
observa-se a aposta deliberada nos rendimentos obtidos nos jogos
financeiros, com pirâmides de Ponzi, a qualquer momento susceptíveis
de novas crises financeiras, com base nos mercados formais de títulos ou
de criptomoedas, em todos os casos, com parca ou nula regulação;

 A automatização da produção é histórica e tem reduzido em muito o


esforço humano. A sua utilização tem-se estendido a novas áreas mas
não representa forçosamente redução do emprego; e, menos ainda
“excesso” de seres humanos. O que tem sucedido é o enorme
desenvolvimento de funções pouco automatizáveis, nas áreas da saúde,
dos cuidados pessoais, da educação, do desporto, das artes, das viagens,
da gestão dos afetos e dos serviços em geral. A automatização tenderá a
substituir os humanos em tarefas simples, repetitivas, penosas, hoje
destinadas a gente menos qualificada, imigrantes ou mulheres. O grande
problema é que a automatização, no último século, pouco tem reduzido
o tempo de trabalho de cada ser humano, por razões inerentes ao
próprio funcionamento do capitalismo; que tem sabido apropriar-se dos
ganhos de produtividade.

 O desenvolvimento tecnológico tende a aumentar a produtividade e a


disponibilidade de bens e serviços necessários ao bem-estar humano,
dos outros seres vivos e da saúde do planeta, conduzindo a situações de
custo reduzido, tendencialmente nulo. A intromissão do capitalista nesse
processo, em busca da acumulação de capital, gera instabilidade e
enormes custos, miséria, doença, infelicidade. O lucro, como
instrumento central na acumulação capitalista, impede o cabal emprego
das tecnologias na libertação do Homem face ao trabalho, à sua
penosidade, à sua constituição como obrigação, em vez de elemento
para a fruição da vida, dos afetos e do lazer.

 A presença do capitalista conduz ainda ao encarecimento dos bens e


serviços, à segmentação entre quem tem e não tem dinheiro para a
compra, bem como ao afastamento de milhões de pessoas, tornadas
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inúteis para o “mercado de trabalho”. A continuidade desta realidade
abre todos os caminhos para a substancial redução da população
humana (a uns 600 M de acordo com estudos mais pessimistas) e a total
mercantilização e militarização do planeta, marcado já hoje pela
concorrência pelo domínio dos recursos e dos consumidores, entre
multinacionais concorrentes, numa competição que exacerba conflitos
entre nacionalismos.

 O padrão quantitativo e qualitativo das necessidades de cada ser


humano é estável e previsível. Não é conveniente nem racional que o
nível da produção global dependa dos jogos dos capitalistas para
aumentar a sua rendabilidade – com subidas e descidas abruptas que
geram instabilidade, crises, desemprego…; é insana a busca incessante
do crescimento do PIB que até engloba, como investimento, algo tão
produtivo como a aquisição de… armamento. O capitalismo é uma
calamidade.

3 – O papel nefasto das classes políticas

Como acima referimos, a acumulação de capital exige uma vultuosa e, tão


cuidada quanto possível, gestão dos povos e dos recursos vivos ou
inanimados, com relevo para a essencial utilização do instrumento Estado.

 A nível do político, os interesses do capital global são representados


pelas classes políticas nacionais e locais, para aquilo que se pode
designar como uma gestão política de proximidade, no quadro da
globalização excludente que se vive. Nessas coortes de burocratas,
entertainers e corruptos, alguns dos seus membros são cooptados para a
gestão direta de multinacionais, do sistema financeiro ou para as
instituições plurinacionais de enquadramento político e económico,
como o FMI, a OMC, o BCE, a Comissão Europeia, etc.

 Para evitar uma consciencialização alargada do nefasto papel das classes


políticas junto da plebe, as mesmas desenvolvem duas estratégias de
manipulação. Uma, consiste na utilização de uma narrativa que privilegia
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enxurradas de abordagens sectoriais, parcelares, superficiais, sem que se
encare a sua integração numa visão da dominação global por parte do
capitalismo; isto é, revelam uma postura conservadora, de continuidade
do sistema económico e do modelo político, quer usem etiquetas de
direita ou de “esquerda”. A segunda estratégia, decorre da primeira, das
vantagens próprias com a continuidade desse papel apaziguador; trata-
se dos privilégios atribuídos pelas classes políticas a si próprias e que
revelam uma profunda vontade de perpetuação de funções, de gestão
do pote. Na realidade, as classes políticas são firmes e intratáveis na
consolidação da ideia do “there is no alternative”;

 No âmbito da UE o modelo político contempla uma constelação


dominante de partidos conservadores, atualmente acossados por novas
formações de extrema-direita, mormente na Áustria, na Hungria ou na
Polónia mas também com fortes implantações na Alemanha, em França
ou na Itália que culpam refugiados e imigrantes das causas da
estagnação neoliberal. Esses partidos conservadores repartem com os
nominalmente designados socialistas e sociais-democratas as funções
políticas no seio da UE, não sendo conspícuas as diferenças entre ambas
as constelações. Entre os últimos, alguns têm alguma representação
entre os trabalhadores, como o Labour e o SPD alemão, mostrando-se os
restantes, meros grupos de mandarins ao serviço do mundo dos
negócios. Os ambientalistas, com a sua visão centrada nos efeitos da
gestão capitalista, pretendem colmatar aqueles sem equacionarem a
necessidade de destruição do próprio capitalismo; e em alguns casos,
assumem mesmo posições imperiais como Joschka Fischer, campeão da
intervenção da NATO no desmantelamento da Jugoslávia e no
decorrente alargamento da área de influência do capital alemão.

 Falar das esquerdas institucionais europeias remete-nos para formações


conservadoras, crentes num evolucionismo de cariz social-democrata,
beneficiando do apagamento dessas referências nos partidos
formalmente designados como tal. Essas formações têm uma relação de
amor-ódio com os últimos; por um lado, anseiam ocupar o seu lugar na

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gestão do Estado, algo que o Syriza conseguiu na Grécia e por outro,
quando isso não se mostra fácil, estabelecem lógicas de aproximação
ideológica e programática, para a captação de apoiantes daqueles. o que
nunca se mostrou profíquo (casos do Podemos, do France Insubmisse ou
do BE português). Como dizia Willy Brandt nos anos 70 do século
passado, “um bom social-democrata foi comunista na sua juventude”
Finalmente, restam grupos de órfãos da URSS, nacionalistas, verdadeiros
guetos sociais e políticos, na periferia europeia (Grécia e Portugal).

 Como se sabe o Estado é uma peça central na gestão capitalista e, por


várias razões. Primeiro, porque se apresenta como lídimo defensor dos
interesses nacionais, como se se vivesse no tempo dos capitalismos
indígenas em competição. Depois, porque desde sempre, qualquer classe
política, ao controlar o aparelho estatal gere os seus interesses próprios,
de estrato social, mais em consonância com os interesses do capital –
nacional ou global – do que visando o bem-estar da plebe. O Estado é o
regulador local de serviço e as classes políticas os instrumentos dessa
regulação dos interesses do capital, compaginados com a manutenção da
boa ordem interna, de eleições regulares que nada alterem mas que
mantenham a multidão na mansidão e na alienação face aos seus
próprios interesses;

 A complexidade das relações económicas e sociais no capitalismo


globalizado de perfil neoliberal exige uma ativa intervenção do Estado
como regulador da acumulação, do trabalho, da distribuição dos fundos
públicos, como da sua arrecadação, mantendo um aparelho coercivo tão
zelosamente apurado quanto necessário. Os dados que se seguem, para
alguns países da UE – mais próximos de Portugal ou igualmente vítimas
da troika - clarificam algumas dessas funções.

O quadro I revela dinâmicas distintas para o total do gasto público, com


realce para o caso grego, para a violenta agressão a que o país foi
submetido, mostrando-se a Alemanha, a Itália e Portugal com níveis de
crescimento aproximados, a despeito das suas diferenças, enquanto a
Irlanda se destaca, na sequência de uma forte dinâmica nos primeiros
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anos do século. Os consumos intermédios, isto é as aquisições de bens e
serviços apresentam um crescimento muito superior à média global, por
um misto da moda da externalização e da procura de dinamização
económica (Espanha e Portugal) mostrando-se claramente no indicador
grego, o efeito da brutal contração exigida pela troika.

A FBCF, o investimento, mostra-se com um dinamismo baixo, sobretudo


na Grécia e em Portugal onde os cortes se fizeram sentir marcadamente
provocando drásticas reduções, quando comparadas com o ano 2000; o
que no caso português revela a continuidade entre a atuação do governo
Passos como do atual. A ideia keynesiana do investimento público, como
dinamizador da atividade em geral, não foi considerada no ideário
neoliberal do partido-estado, PS/PSD, alternadamente no poder no
período em análise.

Finalmente, somente em Espanha, na Grécia e na Irlanda (a despeito da


crise) há uma proximidade entre o crescimento das remunerações e o do
gasto público global. Portugal destaca-se como o país, entre os
selecionados, onde foi maior o desfasamento entre o crescimento da
massa das remunerações e do total do gasto público. Uma situação que o
governo actual e os seus consortes (a chamada “geringonça”) mantêm –
estagnação relativa da massa salarial1 e baixo nível de investimento –
como a chave empobrecedora para uma redução do deficit público.

Quadro I - Gasto com as administrações públicas (variação 2016/2000 em %)


Alema Chipr Espan Irland Portug
França Grécia Itália
nha e ha a al
Total 46,5 88,1 86,9 65,5 29,8 122,8 47,1 52,1
Cons. interméd. 98,2 82,9 115,1 56,9 10,5 76,5 54,9 76,8
FBCF 37,0 27,9 -9,2 31,1 -25,4 31,5 0,1 -52,4
Remunerações 35,5 66,6 86,8 48,5 43,3 118,1 31,7 18,2
Fonte primária: Eurostat
A comparação face ao rendimento nacional (Quadro II) revela que,
exceptuando o caso da Alemanha, o crescimento do gasto com as
administrações públicas é superior ao do rendimento. Revela-se assim, o

1
Muito recentemente a tendência é publicamente referida
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papel do Estado como regularizador das dificuldades das economias
domésticas e o que lhe cabe como dinamizador do setor privado, através
da transferência de carga fiscal para pagamento de acrescidos consumos
intermédios ao mesmo tempo que se procede à compressão das
remunerações no total. Essa política constitui uma desvalorização do
trabalho exercido em funções públicas, o qual, em regra, funciona como
um referente para os salários e condições de trabalho no setor privado.

Quadro II – Rendimento nacional (variação 2016/2000 em %)


Alemanh Chipr Espan Irland Portug
França Grécia Itália
a e ha a al
Rendim. nac. 52,1 80,6 73,7 49,6 22,0 115,8 36,4 43,8
Fonte primária: Eurostat
O quadro III desagrega o gasto público e a sua evolução para algumas das
suas principais funções. Em todos os países, excepto a Itália, o gasto
militar mostra uma evolução que se situa aquém do crescimento do
rendimento nacional; porém, naquele país e na Alemanha observa-se
uma dinâmica superior à da globalidade do gasto público. A Grécia que
possui forças armadas desproporcionadas à sua dimensão demográfica e
económica tem um baixo crescimento no período; e Portugal, cujas FA’s
não têm operacionalidade militar nem se sabe para que servem,
procedeu a uma redução do gasto concernente.

Os gastos com a segurança pública crescem, em regra mais do que o


gasto público total, mormente na Grécia, por razões conhecidas, o
mesmo sucedendo em Espanha e França mas não na Itália.

Os gastos com o alojamento reduzem-se em quatro países, dos quais três


sob o torniquete do capital financeiro. No capítulo da saúde, o
crescimento dos gastos mostra-se elevado mas é modesto, inferior ao
observado para o total do gasto público, em Portugal e Grécia.

Finalmente, no capítulo da proteção social o crescimento dos gastos é


muito elevado, excepto na Alemanha mas, com mais notoriedade entre
os países intervencionados; entre estes, Portugal e Grécia apresentam as
taxas de crescimento menos elevadas.

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Quadro III - Gasto com várias funções das administrações públicas (variação 2016/2000 em
%)
Alem Espanh Franç Portug
Chipre Grécia Irlanda Itália
anha a a al
Defesa 47.4 62.6 53.0 41.6 8.3 35.9 51.2 -12.6
Segurança pública 50.0 59.8 92.3 83.1 150.2 70.8 29.9 58.0
Aloj./equip.colect -39,8 31.4 -27,3 58,9 -25,3 12,4 19.9 -32.1
Saúde 65.4 78.9 102.9 75.0 6.5 151.5 60.5 37.8
Ensino 54.5 94.3 70.2 45.2 36.0 95.1 19.5 6.7
Proteção social 40.6 184.7 128.2 80.6 85.5 195.5 69.3 112.0
Fonte primária – Eurostat
 O Eurostat releva os gastos com o funcionamento de “órgãos executivos
e legislativos, assuntos financeiros e fiscais, negócios estrangeiros”
(Quadro IV). Na realidade, trata-se do topo da pirâmide da direção do
aparelho de Estado (a classe política) e dos serviços logísticos essenciais
para o controlo estatal – a área financeira, a punção fiscal e as relações
com o exterior. Em rigor, deveria considerar-se o aparelho coercivo –
militares e polícias – acima considerados, bem como os tribunais, que na
média da UE, como em Portugal, representam apenas 0.3% do PIB.

Quadro IV -Gastos com a classe política e suas estruturas mais próximas


(em % do PIB)
Alemanha Chipre Espanha França Grécia Irlanda Itália Portugal
Topo da pirâmide
2000 1.8 3.2 1.9 1.8 1.5 1.5 2.4 2.1
2016 1.9 3.6 1.6 1.7 1.9 0.9 2.5 3.2
Aparelho militar e policial
2000 2.6 3.4 2.8 3.3 3.5 2.1 3.2 3.2
2016 2.6 3.2 2.9 3.4 4.3 1.3 3.2 2.7
Fonte primária – Eurostat
Observando o que designámos por topo da pirâmide, observa-se que na
Alemanha, em França e Itália, há um quadro de estabilidade no custo
relativo da classe política e suas próximas estruturas; que no período há
reduções em Espanha e, sobretudo, na Irlanda; e crescimentos nítidos
em Chipre e Grécia e um aumento substancial do indicador no caso
português. Em 2016, no contexto da UE, o peso do topo da pirâmide em
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Portugal é apenas superado, para além de Chipre, pelo observado na
Croácia (4.7%) e Hungria (3.6%) embora, nos últimos casos, haja um
pendor decrescente face à situação no princípio do século, ao contrário
do que acontece em Portugal. Recorde-se que próximo do último natal,
representantes dos partidos portugueses se reuniram com enorme
discrição para decidirem formas de se apoderarem de mais uma fatia do
dinheiro dos impostos o que parcialmente foi conseguido. De facto, não
fora o erário público gerido pela própria classe política, as quotas dos
partidos não seriam suficientes para manter tão numerosas castas – e
respetivas mordomias - de pretensos ungidos.

Quanto è relevância do conjunto militares/polícias observa-se um quadro


de estabilidade, com um aumento evidente registado na Grécia,
resultante do grande aumento do peso das forças policiais no PIB,
enquanto em Portugal a evolução registada prende-se acima de tudo
com a forte redução do orçamento militar (1.6% do PIB em 2000 e
apenas 0.9% em 2016). Em Portugal, a brandura da contestação nos
piores tempos da intervenção da troika – em grande parte controlada
pelos partidos da chamada esquerda - não exigiu grande investimento
policial da parte do poder, ao contrário do que aconteceu em 2009/10 na
preparação para a cimeira da NATO em Lisboa, anos em que os encargos
com a ordem e a segurança aumentaram o seu peso no PIB de 1.8% para
2%, voltando a decair a partir de 2011.

 Perante este quadro político sumariamente desenhado2 não se tem


revelado a procura de articulação a nível nacional ou europeia de uma
visão integrada de contestação – como a tentada em 2010/13 - com o
aproveitamento das redes de comunicação, as facilidades de troca de
informação, de deslocação, de partilha de conhecimentos. Essa ausência
de contestação tem facilitado o enquadramento do descontentamento
em narrativas racistas, fascizantes, islamofóbicas e excludentes,
protagonizadas pela extrema-direita que se vem afirmando na Europa.
2
Não oneramos este texto com considerações sobre as encenações eleitorais ou o quadro constitucional porque os
mesmos têm sido abordados com algum detalhe em textos específicos contidos no blog http://grazia-
tanta.blogspot.com/
grazia.tanta@gmail.com 2/04/2018 13
Essa ausência também tem concorrido para a aceitação tácita das
intervenções militares no Médio Oriente e em África, como lutas contra o
terrorismo (?); para a indiferença quanto à crispação junto das fronteiras
orientais da UE ou do muro na fronteira dos EUA com o México; para a
banalização face à presença militarizada ostensiva junto de grandes
interfaces de transporte ou de concentração de turistas.

 Qualquer quadro de ruptura com o sistema político não pode ser


desinserido da luta contra o capitalismo sendo de considerar em agenda,
como oportunidade uma próxima crise financeira, no seguimento das
pugnas comerciais a nível global, protagonizadas por Trump; e que de
modo previsível poderão corresponder a conflitos militares, mormente
através de guerras localizadas, encomendadas e, no essencial deixando
de fora os verdadeiros interessados, ainda que… com o rabo de fora. Essa
ruptura jamais surgirá no seio das classes políticas porque uma ruptura
compreende forçosamente a sua dispensa e extinção enquanto tal,
sendo essencial a devida compreensão no seio da contestação
multitudinária dos efeitos da inclusão protagonizada por membros das
classes políticas, das suas posturas elitistas, ancoradas num estado forte
e extenso, com muitos burocratas exibindo poder. O reforço do Estado
não é antagónico com o neoliberalismo, como se vem observando; nem
este recusará aquele reforço se isso for salvaguarda dos seus interesses
estratégicos.

 A política consiste na discussão e decisão sobre os assuntos coletivos no


seio de uma dada comunidade. Nas democracias de mercado ou
representativas, há um grupo social – a classe política – que assume essa
discussão e toma as decisões a partir de um mandato genérico obtido em
eleições, nas quais os candidatos emanam, geralmente, daquele grupo
social, com a exclusão da restante população. Há como que uma
privatização da política, por parte desse corpo social muito minoritário,
embora os custos dessa gestão privada sejam assumidos pelos excluídos
da discussão e da decisão; leia-se a esmagadora maioria da população.

grazia.tanta@gmail.com 2/04/2018 14
 Temos como basilares para a instituição de discussão e decisão
democrática, os seguintes elementos;

a. Recusa do encerramento nos espaços nacionais porque o mesmo, ao


dividir a Humanidade em compartimentos estanques, limita a conexão
entre culturas e povos, favorecendo as oligarquias políticas e
económicas, apostadas na divisão que facilite a continuidade do seu
poder;

b. A discussão e a decisão sobre uma determinada medida cabe,


exclusivamente, aos seus beneficiários diretos, mesmo que apenas
potenciais, sem intermediações, nem representantes que não de si
próprios;

c. As decisões sobre as medidas propostas são tomadas por maioria dos


votos, em votação expressa em assembleia para o efeito convocada
ou, por referendo, se necessário;

d. Essa discussão é pública e aberta, dela podendo resultar decisões a


cumprir por órgãos executivos de satisfação de necessidades públicas
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ou, por representantes eleitos para assegurar a sua expressa e unívoca
concretização;

e. Qualquer representante pode ser demitido das suas funções por


decisão expressa dos membros da comunidade que procedeu à sua
escolha;

f. A representação é um dever de cidadania e não objeto de mordomias,


imunidades ou vantagens específicas que constituam forma de
discriminação face ao conjunto dos representados. A representação
não constitui profissão, é temporária e não cumulativa;

g. Toda a documentação e arquivos relativos a processos de decisão


passados ou futuros são do domínio público, por parte da população
envolvida;

h. A articulação a nível regional ou das comunidades deverá ser feita


tendo como base redes rizomáticas, não hierárquicas ou centralizadas,
com articulação feita na base de interesses comuns, da troca de
experiências e com a ausência de preferências ou exclusivismos de
caráter nacionalista.

4 – A captura ideológica

Nenhum regime político e económico sobrevive sem o consentimento


expresso ou tácito do povo, com maior ou menor grau de repressão; e por
isso nenhum regime prescinde da gestão protagonizada por uma classe
política, nem da coerção exercida pela simples presença ou pela atuação
coerciva ou musculada de tribunais, polícias ou militares. Quando estes se
tornam inoperantes, submergidos pelo descontentamento de massa ou pela
atuação de grupos armados como bons intérpretes dos anseios populares, os
regimes caem, encetando-se uma nova formulação, mais ou menos virtuosa
mas, muitas vezes, pouco alterando os alicerces da dominação, mudando
sobretudo os atores.

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Neste contexto, as estruturas do poder, fragilizadas ou em decadência não
conduzem, por qualquer automatismo, a mudanças radicais nos regimes
políticos; nem a radicalização de uma vanguarda conduz a essas mudanças,
sem a desobediência empenhada e duradoura das grandes maiorias,
susceptível de anular ou manter temporariamente neutro o aparelho do
Estado, mormente as suas forças coercivas. O momento da revolução é algo
de muito transitório; o que verdadeiramente conta é o seu prolongamento
através de novas estruturas económicas e políticas, construídas e
consolidadas como elementos de soberania democrática e multitudinária.

Na História, o primeiro e ainda bastante presente instrumento de controlo


ideológico tem sido a religião. A consolidação do poder das oligarquias passa
pelo convencimento dos despojados e reprimidos de que no Além terão a
compensação devida dos seus males terrenos, da repressão e das
humilhações sofridas pela ação dos ricos e poderosos; e que estes serão
castigados pela sua opulência e soberba, numa vingança póstuma
perpetrada por qualquer figura mitológica revestida de poder. Como todos
sabemos que qualquer ser vivo morre, inventaram várias formas de “alma”
para permitir a perpetuidade feliz para uns (os bons) e horrendos castigos
para outros (os maus). Apesar de infantil, esta narrativa tem adeptos em
todas as latitudes.

Ligado ou não à religião, o conformismo tem sido gerado nas sociedades


junto de despojados e oprimidos através de mitos políticos sobre a –
implícita ou expressa - omnisciência de oligarquias políticas, de reis e
senhores, que legitima os últimos a usar a força bruta para que se cumpra a
ordem hierárquica e cleptocrática de “sempre”.

A ordem capitalista, desenvolveu a abordagem filosófica inserta nas ciências


políticas e sociais e diversificou as formas de controlo social, para além da
religião e da repressão física; os mais primários dos meios de coerção foram
ultrapassados e priorizados por formas mais subtis e interiorizáveis nas
mentes das vítimas, como instrumentos de auto-coação.

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 O mito do trabalho honesto como forma de progressão na hierarquia
social tem subjacente a aceitação dessa hierarquia como natural. Essa
progressão é relativa ou frustrada de todo, tendo em conta a
precariedade, o desemprego, o aumento da jornada de trabalho, a
redução de direitos, o peso da punção fiscal ou da propensão repressiva
dos poderes. Para mais, os valores defendidos relativamente ao trabalho
honesto passam ao lado das classes políticas e do empresariato, aliados
próximos na manutenção do capitalismo e das suas formas oligárquicas de
representação;

 Essa aceitação de hierarquias e do posicionamento nas camadas inferiores


faz parte da captura ideológica a que se procede nos locais de trabalho ou
nas escolas, onde se reproduz uma hierarquia que pode resvalar para a
disciplina militarizada ou carcerária, de subjugação; e onde está
subjacente o papel subordinado das mulheres. De modo menos opressivo
mas absolutamente enganador é a votação nos actos eleitorais de
legitimação do regime e da classe política, mais transparente quando se
verifica o rotativismo entre atores gêmeos numa mesma peça. Perante os
crescentes níveis de abstenção há quem proponha o voto obrigatório,
numa extensão aos momentos eleitorais da lógica da obrigação, típica da
disciplina carcerária;

 Estabelece-se uma cultura de estratificação sexual e social em desfavor de


mulheres, velhos e jovens a que se junta a discriminação racial, a
xenofobia, a homofobia, a tolerância sobre a violência que se exerce sobre
aqueles grupos sociais e, mais geralmente, sobre trabalhadores e
desempregados ou, na aceitação tácita da violência que ocorre na cena
doméstica, no trabalho, na escola e no desporto;

 A atomização das pessoas é acentuada pelo urbanismo que afasta a


construção do espírito comunitário e pela desagregação das
solidariedades no seio da empresa. A solidariedade reduz-se à caridade,
centrada na ação do Estado e que é da em instituições privadas de caráter
empresarial ou religioso; o que acentua a narrativa do Estado como pai
distante e autoritário, fonte e gestor de todas as ações coletivas;
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 No fulcro dessa visão hierárquica e atomizante está a lógica concorrencial,
da luta de todos contra todos, numa arena de combate em que todos os
truques valem, onde tudo é apontado como possível, como se se vivesse
num mundo horizontal, com igualdade de oportunidades, como se não
existissem em constante reprodução, hierarquias políticas, sociais,
económicas, raciais e de género, geradoras de desigualdades. Nesse
contexto, compete a cada um proceder à construção do seu próprio
projeto de inserção no “mercado de trabalho”, mormente através da sua
empresarialização, uma forma fantasiosa que falha amiúde e desemboca
em trabalho precário e conjuntural, com parcos direitos e forte tutela
tributária e estatal, zeladora do funcionamento agilizado do referido
“mercado”;

Efeitos da lógica competitiva

 A escola não é tomada como local de estruturação social e de recolha


abrangente de conhecimentos mas como local de aquisição de
empregabilidade, tendo em conta a inserção no mercado de trabalho. A
enorme desagregação dos conhecimentos através da especialização
extrema gera técnicos despojados de consciência social ou capacidade de
análise das inserções nos planos, económico, social e político. Na
sequência da sua extrema especialização, demasiadas vezes baseada na
cópia de textos e na articulação não criativa daqueles, ocorre a
proliferação de ordens profissionais – corporações reconhecidas pelo
Estado que atingem uma variedade nunca alcançada no regime salazarista
que se afirmava corporativista – com a procura da elevação de uma
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profissão junto das instâncias do poder, ao mesmo tempo que
internamente se forjam hierarquias que colocam dificuldades no acesso à
profissão aos mais novos, para benefício dos mais velhos.

 Há uma captura das mentes pela imagem, pelo vídeo, pela visualização da
tv por mais repetitivos e empobrecedores que sejam os conteúdos, em
grande parte oriundos da central Hollywood, um dos produtos que mais
caraterizam a exportação dos EUA; o abandono da leitura ou do recurso
da leitura em diagonal sucede também em favor de jogos viciantes que
captam o tempo de cada um, reduzindo-lhe o tempo dedicado à
sociabilidade e à reflexão, em benefício da superficialidade e do
reacionarismo.

Este e outros textos em:


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http://www.slideshare.net/durgarrai/documents

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