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Democracia versus iniquidade: o purismo

religioso à disposição do retrocesso


democrático
Manoel Ribeiro de Moraes Jr.

… vida de gado, povo marcado, ê, povo feliz …


(Zé Ramalho)

Nestas últimas semanas, muitos


evangélicos, sobretudo batistas, foram
naufragados com e-mails que sugeriam
ufanisticamente assistir a uma proposta
do Pr. Paschoal Piragine de não votar, nesse
pleito democrático de 2010, no Partido dos
Trabalhadores (PT). Não atentando obrigatoriamente às leis eleitorais que regem
democraticamente o seu país (1), o Pr. Piragine, no início de sua homilia política,
construiu o axioma de sua fala associando, forçosamente, à pregação cristã, um
conceito de pureza étnica ao lado de outro, o de unidade nacional
antigotestamentária, ambos sob a flâmula escatológica da “iniquidade” – um
conceito de exclusão social que os próprios fariseus usaram contra Jesus Cristo
(que, para eles, era um iníquo e que, por isso, merecia a morte, a morte de
cruz[2]). Em passo seguinte, sem lembrar dos conflitos religiosos dos séculos XVI
ao XVIII que, inclusive, retalharam mortalmente reformadores e protestantes (3),
o pastor associou culposamente ao Partido dos Trabalhares e ao terceiro Plano
Nacional de Direitos Humanos, o problema do homossexualismo, da homofobia,
do infanticídio indígena, da pedofilia, do fim da liberdade religiosa, da pornografia,
do divórcio, da violência familiar, do homicídio familiar, do esquartejamento de
feto, da pobreza etc. Sem querer defender a coligação PSDB e DEM (antigo PFL
da ditadura torturenta e militar), ou do Partido Verde, PSTU, PCO, PT, PSDC, PRTB
ou PCB, quero questionar a posição política do pastor Piragine, um pastor que se
quer fazer teólogo da Missão Integral da Igreja – mesmo que usada como
estratégia de crescimento de Igreja.

Democracia e Intolerância sob o ponto de vista da Teologia Cristã


Política

À luz das Teorias do Direito contemporâneo de Jürgen Habermas (4) e


de John Rawls (5), as perspectivas sócio-democráticas dos nossos tempos
respondem à pluralidade de valores e, sobretudo, às necessárias garantias dos
direitos individuais. Estas teorias democráticas se acenderam devido aos conflitos
sangrentos da noite de São Bartolomeu, do conflito religioso na cidade de Münzer,
dos massacres aos trabalhadores acontecidos no período da Revolução
dos massacres aos trabalhadores acontecidos no período da Revolução
Industrial, do massacre étnico promovido pelo Nazismo a partir de um princípio de
iniquidade religiosa, moral e étnica: conflitos de ontem, conflitos de hoje. Assim, as
Teorias Democráticas do Direito indicam ser necessário que os princípios
reguladores das sociedades que pretendem ser democráticas se balizem pela
Declaração dos Direitos Humanos. Ora, a luta ideológica destes pensadores, ao
defenderem a Democracia e os Direitos Fundamentais, visa contornar as
compreensões particulares e intolerantes de mundo que, entre várias
possibilidades, objetiva associar liberdade individual à prática da iniquidade
religiosa.

A luta pela dissolução da democracia e a ressurreição das


compreensões particulares de iniquidade são responsáveis pela morte de
evangélicos e católicos no mundo islâmico fundamentalista, é responsável pela
morte de torcedores de futebol (palmerenses, flamenguistas,
vascaínos, hooligans e muitos outros), foi responsável pelas mortes históricas de
negros e índios cometidas inclusive por evangélicos batistas e presbiterianos nos
EUA, pela vergonhosa perseguição e preconceito aos bolivianos no subúrbio de
São Paulo, pelo preconceito aos nordestinos e pela perseguição fatal ao
cristianismo e ao seu fundador nos anos que vão do 34 ao 40 de nossa era cristã
.

Em épocas de profundas crises sociais, o ufanismo irrefletido procura


culpar a diversidade cultural pelos problemas que lhe sejam atuais: o governo
republicano de Bush não revelou ao seu país que o próprio governo americano
(nas gestões executivas dos republicanos) tinha militarizado o Iraque de Saddam
Hussein e as milícias de Osama Bin Laden na luta contra o Irã e a antiga União
Soviética respectivamente, e, após alguns anos, deu andamento a vários
massacres militares, pois o julgaram como culpados pela crise sócio-econômica
que explodiu nos anos de 2008 e 2009, e porque eram fracos – considerando que
os EUA não têm coragem de invadir Cuba, China (a sua maior aliada comercial e
cambial) e Irã; a Alemanha nazista queria culpar os judeus, os ciganos, os eslavos
etc., por sua crise sócio-econômica surgida após a primeira guerra mundial. Há
vários exemplos de como a ideia de iniquidade surge como medida para excluir o
outro para que, assim, se implante um regime político ou religioso purificado da
democracia, e sob o terror da justiça apocalíptica de JHWH, Alá, Deus, do Estado
Comunista (que é completamente diferente das políticas que se autodiferenciam
destas quando se apresentam como socialistas) e, por mais absurdo que possa
parecer a todos, de Jesus Cristo (6).

Assim, as discussões sobre a Democracia Deliberativa e sobre os


Direitos Universais da Mulher e do Homem, não podem ser vistas sob a
ótica da iniquidade religiosa. Immanuel Kant (7) ensina que a convivência política
só caminha sob a perspectiva da liberdade e da garantia da individualidade
recíproca. Soberanamente, Jesus nos ensina que o outro, mesmo que este seja o
Samaritano iníquo (sob o ponto de vista da TORAH farisaica), não deve ser
portador de um julgamento moral ou de retaliação social, mas de amor, de amor
integral.

No mundo encontrado por Jesus havia absolutizações que escravizavam o


homem: absolutização da religião, da tradição e da lei. A religião não era mais a
forma como o homem exprimia sua abertura para Deus, mas se substantivara
num mundo em si de ritos e sacrifícios. Liga-se à tradição profética (Mc. 7,6-8) e
diz que mais importante que o culto é o amor, a justiça e a misericórdia (8).

Indo em colisão aos ensinos de Cristo presentes nos quatros


Evangelhos, o Pr. Paschoal Piragine ressuscitou o conceito de iniquidade
etnocêntrica usando inteligentemente um mecanismo de manobra ideológica entre
palavras e vídeos: vídeo não explica, seduz e co-move; púlpito é espaço de homilia
e não de política (ação que exige argumentação e debate público entre
opositores). Por este mecanismo de irreflexão e empunhando um ufanismo
autodestrutivo, o pastor da Primeira Igreja Batista de Curitiba desferiu a ação
curralesca de dirigir os votos de uma Igreja num pleito que se pretende
democrático: “não votem …!”, em nome de uma religião purificada da iniquidade.
Contudo, mutatis mutandis , se o Pastor Piragini levar às últimas consequências a
sua ética da luta veemente contra a iniquidade e, por isso, começar a ver per se
que os seus aliados, alguns bispos da CNBB (ou mais especificamente da Canção
Nova?) e outros, não cristãos, que ele diz estarem afins a esta luta, não se
adequam ao seu conceito de iniquidade? Ele os trairá pedindo para que a
Constituição do Brasil suspenda o direito do catolicismo, do espiritismo, do
luteranismo, do presbiterianismo, do pentecostalismo, das religiões indígenas, do
ateísmo, dos batistas arminianos, dos batistas calvinistas, dos batistras
tradicionais, dos outros batistas que não sejam da Primeira Igreja Batista de
Curitiba, dos batistas que não sejam ele mesmo? Deste modo, pode-se ver que a
iniquidade parece ser mais uma ideia subjetiva que o respeito e o amor ao
próximo; quando a ideia da iniquidade tem mais peso em vídeos programados
para iludirem que as palavras de Jesus, então o conceito de iniquidade deixa de
ser divino para ser malévolo.

A iniquidade não pode estar atrelada ao conceito de pureza étnica (9)


ou religiosa. Há profundas diferenças entre os conceitos de iniquidade
desenvolvidos em passagens do primeiro testamento cristão e aqueles
desenvolvidos no segundo testamento cristão. A luta da Igreja de Cristo é por
antecipar o Reino de Deus, gozando o eu paráclito e exercendo a transparência
de Cristo. A Missão Integral da Igreja de Cristo não deve promover uma batalha da
integridade moral burguesa e excludente, mas da integridade humana daqueles
que precisam ser filhos de Deus. Se for assim, um pleito democrático sobre a
integridade não pode nascer daqueles que sentam em dízimos e constituem
abastardas propriedades, mas de todos que queiram lutar por dignidade e que
precisam de Deus.

A Missão Integral não é uma experiência teológica onde se discute


crescimento estratégico de Igreja, pois não é uma teologia da propaganda
concorrencial de marketing mercadológico (10). Antes, a Missão Integral da Igreja
é a reflexão de nossa Missão em Cristo que não condena e, por isso, não pede a
crucificação ou o banimento constitucional do diferente, do outro. Todas as vezes
que a Igreja retroagir à democracia em nome de uma iniquidade humana, ela
pedirá a crucificação de Cristo, tal como os fariseus o fizeram. Cristianismo não é
estratégia nem para crescimento de Igreja e nem para falsidade político-ideológica.
Com John Stott (11), vejo a Missão Integral da Igreja Cristã como uma experiência
de repensar a atitude de relação social da igreja com seu tempo, associando-se
radicalmente ao Deus encarnado (Cristo Jesus) que nos abre o véu da ignorância
e nos chama a dialogar e a cuidar de todos: bons e ruins, ricos e pobres, fortes e
fracos.

Existe uma segunda razão por que as pessoas desenvolveram uma aversão pela
idéia de conversão. Diz respeito à impressão de imperialismo arrogante que
alguns evangelistas às vezes dão (12).

O que nos é proibido é toda retórica tendenciosa, toda manipulação deliberada de


resultados, toda artificialidade, hipocrisia e representação, toda atitude de colocar-
se em frente a um espelho com o objetivo de, conscientemente, planejar nossos
gestos e caretas, toda autopropaganda e autoconfiança. De maneira mais
positiva, devemos ser nós mesmos, ser naturais, desenvolver e exercitar os dons
que Deus nos deu e, ao mesmo tempo, depositar nossa confiança não em nós
mesmos, mas no Espírito, que concorda em operar por meio de nós (13).

Com Jürgen Moltmann, visualizo um imperativo à Igreja de Cristo de


vivência pela integridade humana, onde esta comunidade humana de Cristo
surja no mundo como antecipação do Reino de Deus (14). A luta pelo novo que
vem de Deus é viver, sobretudo, uma fé pascoal (mas não Paschoal) em Cristo –
Ele mesmo, filho de Deus, que foi preterido por uma população extasiada (talvez
expressando sua opinião por meios de palmas efusivas) que gritou e apoiou
veementemente pela libertação de Barrabás.

Considerações Finais

É difícil pedir para que a Igreja de Cristo jogue pedra caluniosa em nome
de uma hipotética iniquidade. Nem a mulher adúltera, Estevão, os ladrões, os
assassinos, eu mesmo, os homossexuais, os pobres, as crianças que morrem
nos lixões de Curitiba (por causa do modelo monetário capitalista – a moeda que
tem o rosto de César – que é a mesma que constrói grandes Igrejas Evangélicas),
nem mesmo as crianças indígenas que morrem por problemas culturais, por
doenças trazidas pelos comerciantes, por ladrões, por missionários bons e maus
etc., devem ser objeto de julgamentos, mas de cuidado e amor. Quem deve ter
direito à justiça? Quem deve ter direito à igualdade?

É tempo da Igreja de Cristo no Brasil descobrir que ela não vive mais
em sociedades absolutistas. Se isso for verdade, o regime democrático que
rege constitucionalmente o nosso país pede para que todos exerçam sua
cidadania, conheçam a Constituição Federal e participem dos fóruns públicos
visando a uma melhor regulamentação do direito público e do privado, sempre à
luz da Declaração dos Direitos Humanos. Se alguém satanizar os Direitos
Humanos, esse estará satanizando a garantia da liberdade religiosa dos batistas,
presbiterianos, católicos, espíritas, negros, índios, brancos, pardos etc. Sem o
direito do outro, não há o meu direito; sem o meu direito, não há o direito do
outro. Se Deus não amar e cuidar do outro, por que ele haveria de amar e cuidar
de mim? Se Deus cuida e ama a mim, por que ele não haveria de amar e cuidar de
outros além de mim mesmo?

Referências Bibliográficas

BOFF, Leonardo. Paixão de Cristo, paixão de mundo: os fatos, as interpretações e


o significado ontem e hoje. Petrópolis: Vozes, 2007, pp. 28-29.
CRÜSEMANN, Frank. “A Torah no pentateuco: desafio e qustionamento” in: A
Torá. Teologia e história social da lei do Antigo Testamento. Petrópolis: Vozes, 2002,
pp. 11-34.
CHRISTIN, Olivier. La paix de religion. L´autonomisation de La raison politique au
XVI siècle. Paris: Seuil, 1997.
DOUGLAS, M. “A impureza ritual” in: Pureza e perigo. Lisboa: Edições 70, (s/d).
FERRY, Luc. Filosofia Política. El derecho: la nueva querella de los antiguos y los
modernos. México: Fondo de cultura económica, 1991.
GRAY, John. Missa negra. Religião apocalíptica e o fim das utopias . Rio de Janeiro,
São Paulo: Record, 2008.
HABERMAS, Jürgen. “O direito como categoria da mediação social entre
facticidade e validade” in: Direito e Democracia. Entre facticidade e validade. Rio de
Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997.
MOLTMANN, Jürgen. Vida, esperança e justiça. Um testamento teológico para a
América Latina. São Bernardo Campo: Editeo, 2008.
MOLTMANN, Jürgen. Teologia da Esperança. Estudos sobre os fundamentos e as
conseqüências de uma escatologia cristã. São Paulo: Loyola, Teológia, 2005.
MOXNES, Halvor. “Regras de pureza e ordem social” in: A economia do Reino:
conflito relações econômicas no Evangelho de Lucas . São Paulo: Paulus, 1995.
PIRAGINE, P. Crescimento integral da Igreja. Um crescimento em múltiplas
direções . São Paulo: Vida, 2006.
RAWLS, John. O direito dos povos . São Paulo: Martins Fontes, 2001.
RAWLS, John. A Theory of Justice. Oxford: Oxford University Press, 1971
RAWLS, John. Political Liberalism. New York: Columbia University Press. 1993.
RAWLS, John. História da filosofia moral. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
STOTT, John. A missão integral da Igreja no mundo moderno. Viçosa: Ultimato,
2010.

Notas

(1) Lei 9.504/97 regulamentada pelo artigo 13 da Resolução 22.718/2008 do TSE.


(2) Sobre a relação entre o código de ética farisaico que anexa a pureza “étnica” à
“ iniqüidade religiosa”, cf. MOXNES, Halvor. “Regras de pureza e ordem social”
in: A economia do Reino: conflito relações econômicas no Evangelho de Lucas .
São Paulo: Paulus, 1995, pp. 99-106. Sobre os problemas de interpretação
surgidos a partir de relações teológicas não refletidas entre os códigos da Torah e
o Novo Testamento cristão, cf. CRÜSEMANN, Frank. “A Torah no pentateuco:
desafio e qustionamento” in: A Torá. Teologia e história social da lei do Antigo
Testamento. Petrópolis: Vozes, 2002, pp. 11-34.
(3) CHRISTIN, Olivier. La paix de religion. L´autonomisation de La raison politique
au XVI siècle. Paris: Seuil, 1997.
(4) Cf. HABERMAS, Jürgen. “O direito como categoria da mediação social entre
facticidade e validade” in:Direito e Democracia. Entre facticidade e validade. Rio de
Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997, pp. 17-63.
(5) RAWLS, John. O direito dos povos . São Paulo: Martins Fontes, 2001.
(6) GRAY, John. Missa negra. Religião apocalíptica e o fim das utopias . Rio de
Janeiro, São Paulo: Record, 2008.
(7) RAWLS, J. História da filosofia moral. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
(8) BOFF, Leonardo. Paixão de Cristo, paixão de mundo: os fatos, as
interpretações e o significado ontem e hoje. Petrópolis: Vozes, 2007, pp. 28-29.
(9) A antropóloga inglesa Mary Douglas afirma que as religiões étnicas
aprofundam sua demonologia do outro a partir de uma cosmovisão que
substancializa o cumprimento das éticas nacionais e a rejeição das outras formas
de vida como a única forma de garantir a estabilidade sócio-econômica. Para mais,
cf. DOUGLAS, M. “A impureza ritual” in: Pureza e perigo. Lisboa: Edições 70, (s/d),
pp. 19-42.
(10) Com a obra Crescimento integral da Igreja. Um crescimento em múltiplas
direções (São Paulo: Vida, 2006), Piragine não percebe que o paradigma da Missão
Integral foge à lógica estratégica da correlação marketeira entre “crescimento” e
“evangelização”.
(11) STOTT, John. A missão integral da Igreja no mundo moderno. Viçosa:
Ultimato, 2010.
(12) Idem, ibdem, p. 132.
(13) Idem, p. 154.
(14) MOLTMANN, Jürgen. Vida, esperança e justiça. Um testamento teológico para
a América Latina. São Bernardo Campo: Editeo, 2008.

Manoel Ribeiro de Moraes Jr é doutor em Ciências da Religião (UMESP),


mestre em Ética e Filosofia Política (UERJ) e graduado em Filosofia (UERJ)
e em Teologia (STBSB). É Diretor Acadêmico do Seminário Teológico
Batista Equatorial/FATEBE e professor adjunto de Filosofia na Universidade do
Estado do Pará (UEPA).

Fonte: Novos Diálogos

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