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09/04/2018 O descaminho das humanidades — CartaCapital

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Economia
Educação

O descaminho das humanidades


por Carlos Drummond — publicado 08/04/2018 00h30, última modificação 07/04/2018 22h13

A proposta de eliminação das Ciências Humanas das universidades federais é


boa para o setor privado e péssima para o ensino, inclusive o de Economia
Fabio Motta/Estadão Conteúdo

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Celso Furtado: alicerce em humanidades

Registrada no fim de março no Senado, a proposta de extinção dos cursos de Filosofia, História,
Geografia, Sociologia, Artes e Artes Cênicas das universidades públicas contava, na segunda-
feira 26, com o apoio de 3.670 indivíduos. Caso essa “ideia legislativa” obtenha ao menos 20 mil
adesões no prazo de até quatro meses, será enviada à Comissão de Direitos Humanos e
Legislação Participativa para debate e parecer dos senadores e eventual encaminhamento de
projeto de lei.

O objetivo declarado da proposta é favorecer o ensino privado. A eliminação dos cursos se


justificaria, nos termos da sugestão, por serem “baratos e facilmente realizáveis em universidades
privadas, presencialmente e à distância”.

A última especificação conecta-se à intenção de o governo liberar a realização de 40% do Ensino


Médio à distância, senha para a privatização e o rebaixamento generalizados da educação,
impulsionados também pelo Programa “Escola Sem Partido”, aprovado em alguns municípios.

Leia também:
O que o neoliberalismo combate?

As faculdades particulares passariam a ser as ofertantes exclusivas dos cursos extintos nas
universidades federais gratuitas, as mais bem avaliadas nos rankings mundiais de qualidade.
Estas deixariam de formar professores e pesquisadores naquelas áreas de conhecimento e de
fornecer disciplinas a outras estruturas curriculares.

Entre os prejudicados figuram, por exemplo, os bons cursos de Economia das universidades
federais, que incluem o ensino de história. Cabe lembrar que a história, segundo o economista
norueguês Erik S. Reinert, é o único laboratório disponível para os profissionais do seu ramo. Sem
o aporte desta e de outras matérias de humanidades, será ainda mais difícil evitar o atrelamento
completo do ensino aos interesses do setor financeiro.

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Marshall, professor de Keynes

Há uma relação inseparável, entretanto, entre o conhecimento de ciências humanas e uma boa
formação em economia, chama atenção Andrew John Mearman, professor da Escola de Negócios
Bristol da Universidade West of England.

Apesar de os currículos da maior parte dos cursos denotarem a concepção de que as habilidades
necessárias aos profissionais da área são essencialmente a capacidade de elaborar matemática
de alto nível e reproduzir os pontos centrais de determinada linha de pensamento, diz Mearman,
vários estudiosos reconhecem o caráter essencial do conhecimento de humanidades na solução
de problemas complexos que exigem saber econômico combinado à flexibilidade de pensamento,
insights de outras disciplinas e consciência da realidade social e política do país e do mundo.

Muitos dos seus colegas de ofício não conseguiram entender a crise de 2008, diz o professor, por
nunca terem estudado história nem o fenômeno da desigualdade. Os efeitos são ainda mais
perniciosos quando o profissional trabalha no setor industrial ou no governo, alerta o professor,
que esteve no Brasil em 2014 para falar sobre a necessidade de reformulação do ensino no seu
segmento.

Segundo a filósofa Martha C. Nussbaum, da Universidade de Chicago, referência no debate sobre


educação, “o ensino de economia deve recorrer às humanidades e às artes a fim de promover um
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clima de responsabilidade vigilante e uma cultura de inovação criativa. Assim, não somos forçados
a escolher entre uma forma de educação que busque o lucro e outra que promova a boa
cidadania. Uma economia florescente requer as mesmas habilidades que apoiam a cidadania. Os
proponentes da ‘educação para o lucro’ adotaram uma concepção empobrecida do que é
necessário para atingir seu próprio objetivo.”

A importância do ensino de humanidades é transcendente, defende o professor Michael S. Roth,


da Universidade de Wesleyan, em Connecticut: “O acesso a uma educação ampla, autocrítica e
pragmática continua a ser essencial para uma cultura que valoriza a inovação e uma economia
que depende dela. Também permanece essencial à uma sociedade que aspira a ser democrática”.

Cabe ainda ressaltar que a formação humanística é indispensável ao discernimento exigido no


enfrentamento das questões éticas presentes nas decisões dos economistas, conforme alerta
Gary Saul Morson no livro “Centavos e Sensibilidade ‒ O que a economia pode aprender com as
ciências humanas”.

A economia, adverte o autor, “envolve inevitavelmente questões éticas, não redutíveis à economia
em si. Os economistas muitas vezes contrabandeiam preocupações dessa natureza nos seus
modelos com conceitos como ‘preço justo de mercado’, no qual questões éticas não reconhecidas
são tratadas como dados inevitáveis”.

As chamadas humanidades são alicerces da formação de John Maynard Keynes, Alfred Marshall
e Celso Furtado, entre muitos outros. Reconhecido como um dos maiores expoentes de todos os
tempos nas ciências econômicas, Keynes foi influenciado desde seu ingresso em Cambridge pelo
professor Alfred Marshall, que o estimulou a acrescentar ao seu interesse na matemática e nos
clássicos conhecimentos sólidos de política e de economia. Na universidade Keynes aproximou-
se do grupo cultural de Bloomsbury, integrado pela escritora Virginia Woolf.

“Para Marshall, a economia com suas análises e leis não era um corpo de dogmas imutáveis e
universais e de verdade concreta, mas ‘uma máquina para a descoberta da verdade concreta’,
anotou Ottolmy Strauch em ensaio biográfico sobre o professor.

Integrante da linhagem iniciada por Adam Smith e David Ricardo, Marshall era uma sumidade em
matemática, mas estava longe de supervalorizar a disciplina como fazem os economistas
neoliberais, mostra este excerto de uma carta da sua lavra pinçado por Strauch: “Um bom
teorema matemático relativo a hipóteses econômicas era altamente improvável de ser boa
economia; e eu prossegui, cada vez mais, segundo estas regras: 1. Use matemática como uma
linguagem estenográfica, antes do que como um instrumento de investigação; 2. Empregue-a até
que se obtenham resultados; 3. Traduza para o inglês; 4. Então ilustre com exemplos que tenham
importância na vida real; 5. Queime a matemática; 6. Se não teve êxito em 4, queime 3. Isso tenho
feito com frequência”.
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Este trecho do obituário de Marshall escrito por Keynes em 1924 relaciona os requisitos de uma
formação de alto nível: “O economista excelente deve alcançar um elevado padrão em várias
áreas diferentes e combinar talentos que raramente são encontrados juntos. Deve ser
matemático, historiador, estadista, filósofo ‒ em algum grau. Deve entender os símbolos e falar
em palavras, contemplar o particular em termos do geral e tocar o abstrato e o concreto no
mesmo voo de pensamento. Ele deve estudar o presente à luz do passado para os propósitos do
futuro. Nenhuma parte da natureza do homem ou de suas instituições deve estar inteiramente fora
das suas considerações”.

Celso Furtado, economista brasileiro de projeção internacional, defendia que a reflexão sobre a
cultura brasileira deveria ser o ponto de partida para o debate sobre as opções de
desenvolvimento em oposição à busca de diagnósticos a partir de “montagens conceituais sem
raízes em nossa história”.

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Keynes: fazer conta era o de menos (Foto: Reprodução)

Primeiro professor estrangeiro efetivo da Universidade de Sorbonne, lecionou e desenvolveu


pesquisas também nas universidades de Yale, Harvard e Colúmbia, nos Estados Unidos, e em
Cambridge, na Inglaterra. Foi diretor de pesquisas da Escola de Altos Estudos em Ciências
Sociais em Paris, integrou a Comissão de Desenvolvimento e Cultura da ONU e teve várias obras
traduzidas para dezenas de idiomas.

Os obscurantistas brasileiros perfilam com seus pares estadunidenses na campanha permanente


pela abolição do ensino de humanidades. “Talvez pudéssemos passar sem certos luxos

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intelectuais. Os contribuintes não deveriam estar subsidiando a curiosidade intelectual”, disparou o


governador da Califórnia em 1967, Ronald Reagan, ao se pronunciar sobre o assunto.

O senador da Flórida, Marco Rubio, durante sua campanha em 2016, disse no Twitter: “Nós não
podemos continuar nos formando em graduações que não levam a empregos. Você pode decidir
se vale a pena tomar emprestado 50 mil dólares para se especializar em filosofia grega, mas
lembre que o mercado para os filósofos gregos tem sido muito difícil nos últimos 2 mil anos”.

O deboche resvala na tradição intelectual dos chamados “pais fundadores” dos Estados Unidos,
versados nos autores clássicos fundamentais ao conhecimento humano e de grande importância
atual, ensina a filósofa Monique Canto-Sperber. Muitos de nossos problemas morais, diz, são os
mesmos que os gregos se colocavam e as respostas deles são ainda em parte as nossas.

Thomas Jefferson, por exemplo, dominava o latim, o grego e o francês e prosseguiu no estudo
dos clássicos da Antiguidade durante sua formação em Direito. Para ingressar no King’s College,
futura Universidade Colúmbia, Alexander Hamilton precisou mostrar proficiência nas gramáticas
grega e latina, ler três textos de Cícero e a Eneida, de Virgílio, no original em latim, requisitos
necessários também ao ingresso de James Madison no College of New Jersey, atual Universidade
de Princeton.

O percurso intelectual dos founding fathers está bem descrito em inglês e ao menos em parte é
encontrável também em português, mas talvez seja sempre grego para os inimigos das
humanidades, ao Norte e ao Sul.

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