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NOVA DIREITA

O
conservadorismo
moral como
reinvenção da
marca MBL
EDIÇÃO - 124 DESTAQUE | BRASIL

por Gabriel Barcelos

novembro 2, 2017

Imagem por Allan Sieber

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Percebendo o fracasso da defesa das
ideias neoliberais no país, o MBL
realizou um redirecionamento.
Agindo de acordo com a lógica de
mercado, zeram algo próximo do
que no marketing se denomina
rebranding. A aposta foi no velho
conservadorismo brasileiro. Daí a
tentativa de censurar exposições de
arte, como velhos beatos com tochas
na mão

Vinhedo, interior de São Paulo, município de 70


mil habitantes, bem industrializado, conhecido
pela grande quantidade de condomínios. Foi lá,
em 2014, que surgiu o Renova Vinhedo, grupo
jovem de militância liberal. Como a rma o
próprio blog do coletivo, “o Renova foi o
movimento que deu base para a criação do
MBL; seus principais líderes e fundadores
foram no passado os criadores do Renova”.

Embora com uma roupagem jovem e dinâmica,


o grupo tem em seu DNA a tão combatida velha
política. Como a rma reportagem da Carta
Capital, “em Vinhedo, a origem do MBL
confunde-se com o poder do ex-prefeito
Milton Sera m, do PTB”. Condenado a 32 anos
de prisão por recebimento de propinas para a
facilitação de loteamentos, mas recorrendo em
liberdade, Sera m foi sucedido pelo vice, Jaime
Cruz, após sua renúncia. Como seu antecessor,
Cruz (agora no PSDB) também está envolvido
em problemas com a Justiça, sendo investigado
por superfaturamento das merendas escolares,
na época em que era secretário de Educação.
Segundo a mesma reportagem de 2016, “o atual
prefeito tem o apoio el de dois fundadores do
movimento, os irmãos Renan, coordenador
nacional, e Alexandre Santos”. Renan, segundo
reportagem do UOL, responde a mais de
sessenta processos, incluindo fraude,
sonegação, calote, danos morais e dívidas
trabalhistas. Já outro fundador do MBL,
Rubinho Nunes, é lho do ex-vereador Rubens
Nunes (PMDB), do grupo político de Cruz,
tendo sido pré-candidato à Prefeitura de
Vinhedo em 2016 pelo PMDB (eleição vencida
por Jaime Cruz). Tanto Rubinho como Renan
Santos podem ser facilmente vistos em fotos
demonstrando apoio a Sera m e Cruz, inclusive
marcando presença na posse do último como
prefeito.
O falso apartidarismo do MBL, apresentado
como novidade “fora da política”, foi
evidenciado posteriormente, em reportagem
do UOL, quando áudios revelaram o
nanciamento por parte de partidos como o
PMDB. O recebimento também foi con rmado
por um ex-membro, Bráulio Fazolo, em
entrevista ao Diário do Centro do Mundo.

Mas voltemos ao Renova Vinhedo, antecessor


do MBL. Como relata o blog do movimento,
apenas seis meses depois da fundação do
coletivo, em 2014, seus membros já investiram
numa empreitada eleitoral. Tratava-se do apoio
à candidatura a deputado estadual de Paulo
Batista, pelo PRP, famoso pelo bordão “raio
privatizador” e por seus vídeos de campanha
que se valiam do humor. A campanha foi
realizada junto com o Renova Valinhos, cidade
vizinha a Vinhedo, onde mora Batista. No texto
sobre a experiência, que não logrou êxito para
o candidato, os membros do Renova Vinhedo
exaltam os frutos positivos recolhidos. O que
mais chama atenção, ao ler, é a re exão sobre o
uso do que o movimento chama de “estética da
zoeira”: “Diante das ‘barreiras de entrada’ e da
opção fundamental por uma campanha pautada
em ideias, restou para nós do Renova o desa o
de construir uma candidatura competitiva e
polêmica, contrariando o receituário
bundamolista”. Para eles, “o uso da internet
enquanto ferramenta era um pressuposto”.
Contudo, “era necessária a criação de uma
‘estética da zoeira’, advinda de fóruns e ‘chans’
[fóruns anônimos] de internet, mescla de uma
postura anárquica e iconoclasta com
montagens toscas e grosseiras e profundas
referências à cultura pop”. Como conclui o
Renova Vinhedo, “zombar do sistema é sorrir
para implodi-lo”.

Outra chave importante para compreender o


nascimento do MBL é a ação dos think tanks
norte-americanos, instituições formadoras do
pensamento liberal por meio de grupos de
interesse (com semelhança notável ao ocorrido
no Brasil pré-golpe de 1964). As diferentes
organizações realizadoras dessas ações estão
sob o guarda-chuva da rede Atlas Network,
sediada nos Estados Unidos. Um desses think
tanks estrangeiros, o Students for Liberty, deu
origem ao Estudantes pela Liberdade (EPL) no
Brasil, criado em 2012. O EPL teve grande
in uência no nascimento do MBL, ao lado da
Atlas. Ao menos é isso que a rmou o diretor
executivo do grupo, Juliano Torres, à
reportagem da Agência Pública, ressaltando a
necessidade de criação de uma marca: “Quando
teve os protestos em 2013 pelo Passe Livre,
vários membros do Estudantes pela Liberdade
queriam participar, só que, como a gente
recebe recursos de organizações como a Atlas
e a Students for Liberty, por uma questão de
imposto de renda lá, eles não podem
desenvolver atividades políticas”. A solução
para driblar esses empecilhos marcaria o
nascimento do MBL: “Os membros do EPL
podem participar como pessoas físicas, mas
não como organização, para evitar problemas.
Aí a gente resolveu criar uma marca, não era
uma organização, era só uma marca para a
gente se vender nas manifestações como
Movimento Brasil Livre”. Segundo o Blog Junho,
“buscou-se criar uma marca que dialogasse
com o patriotismo desmiolado de parcela da
população – através do slogan ‘Brasil Livre’”.
Como o próprio Torres do EPL a rma, o
Estudantes pela Liberdade foi a organização
responsável pela formação política de grandes
quadros do MBL, a exemplo de Kim Kataguiri.

Conclui-se, então, que o MBL surgiu inspirado


nas formas de mobilização da juventude, como
as vistas em 2013, especialmente na força das
redes sociais. Como a rma Pedro Ferreira,
integrante do grupo Bonde do Rolê, um dos
fundadores do MBL e autoclassi cado como
“direita transante”, eles partiram “da tese de
que faltava estética e apelo para difundir na
sociedade uma visão de mundo mais liberal”.
Para o músico-ativista, “a esquerda
contemporânea desenvolveu uma roupagem
romantizada para seus ideais e, assim, formou
uma militância consistente. Era preciso – com
o perdão da ironia – revolucionar o
liberalismo”.
Reinventando a marca

Depois de obter sucesso nas ruas e ancorados


na ampla divulgação por parte do maior meio
de comunicação brasileiro, a TV Globo, eles
obtiveram a vitória no impeachment de Dilma
Rousseff em 2016. Tanto pela diminuição de seu
poder de mobilização nas ruas após isso como
pela necessidade de preservar Michel Temer e
outros aliados após o golpe, resolveram voltar a
focar a ação nas redes sociais. Desmoralizado
após uma série de denúncias e criticado por
seguidores pelo apoio a Temer, o MBL
conseguiu uma sobrevida com a viralização de
seus posts, com pro ssionais especializados na
criação de “memes”. Junto a isso, o grupo
investiu em ações isoladas nas ruas, de ataque
à esquerda, com a função de criar
performances para a câmera, para a divulgação
posterior em vídeo.

Percebendo o fracasso da defesa das ideias


neoliberais entre o povo brasileiro (eles não
conseguiram convencer os trabalhadores de
que era bom perder direitos), partiram para um
novo redirecionamento. Agindo de acordo com
a lógica de mercado, zeram algo próximo do
que no marketing se denomina rebranding
(embora sem mudar a identidade visual, mas as
estratégias de sua organização, sua loso a

operacional). A aposta foi no velho


conservadorismo brasileiro em relação aos
costumes, à moral e à cultura, algo com muito
mais chance de sucesso. Daí a tentativa de
censurar escolas e exposições de arte, como
velhos beatos com tochas na mão.
O imaginário ao qual atualmente o MBL recorre
é o das “guerras culturais” e da luta contra o
“marxismo cultural”. A semente dessa segunda
ideia vem sendo plantada há muitos anos pela
direita brasileira, tendo Olavo de Carvalho
como seu principal formulador. Segundo essas
teorias, a esquerda teria colocado em segundo
plano a tomada revolucionária do poder para
investir na destruição dos tradicionais valores
ocidentais de família, religião e moral, cabendo
aos homens e mulheres de bem defender e
preservar esses pilares. O discurso em questão
fala muito melhor aos corações brasileiros,
relativamente progressistas em termos de
direitos sociais, mas conservadores em
questões comportamentais e culturais. Ou seja,
a esquerda caiu na armadilha do MBL, jogando
o jogo escolhido por eles, num terreno agora
bem mais favorável, em sintonia com a
subjetividade carola do Brasil, em uma cortina
de fumaça criada para desviar o foco de Temer
e grupos políticos próximos da organização. Os
“salvamentos” de Aécio Neves e Temer pelo
Congresso logo após as polêmicas são bem
ilustrativos desses objetivos.

O MBL vem se reinventando a todo momento e


resolveu apelar para táticas mais “fáceis”.
Riscaram um fósforo e acenderam um pavio em
sua cruzada moralista contra a arte. Existe
aqui, através do ciberespaço, um “efeito
manada”, algo tão conhecido de ações dos
meios de comunicação de massa durante o
século XX, a exemplo da propaganda
antissemita dos nazistas. O mesmo podemos
dizer da propagação de sentenças simples, na
forma de memes, com associação de ideias que
atingem mais rapidamente a passionalidade. Se
Goebbels fez um lme relacionando judeus a
ratos, agora “bandido bom é bandido morto”.
Uma linguagem simples, juntando imagens e
palavras, fácil de entender e com uma
composição ideal para a propagação em redes
sociais (a “estética da zoeira”).

Se a marca MBL estava severamente


comprometida, seus desvios estratégicos
conseguiram manter sua posição de grande
in uenciadora no campo da direita. Contudo,
eles continuam diante de contradições
di il t l í i ibi
di cilmente resolvíveis: como exibir sua
verdadeira face? Como difundir as impopulares
ideias neoliberais? Como seguir defendendo o
governo, mascarando sua hipocrisia e
seletividade? Essas barreiras se explicitaram
momentos depois da viralização de sua
campanha pseudomoralista. Um post do dia 19
de outubro defendendo a portaria de Temer
que exibiliza o combate ao trabalho escravo,
por exemplo, recebeu muitas críticas nos
comentários, inclusive de apoiadores do MBL.

“Rebeldia conservadora” e vácuo da esquerda

Infelizmente, a esquerda brasileira perdeu uma


oportunidade histórica quando abandonou um
movimento de amplo apoio popular como as
greves gerais de 2017 e outras mobilizações
contra as reformas de Temer. Essas lutas se
comunicavam diretamente com os direitos da
classe trabalhadora e gozam de considerável
aprovação na opinião pública. Contudo, elas
foram negligenciadas pela maior parte das
direções de movimentos nacionais, cegos para
a importância da difusão e disputa de ideias e
consciências.

No entanto, perder oportunidades históricas e


criar vácuos para o preenchimento da direita já
se tornou marca da esquerda brasileira, como
visto nas Jornadas de Junho de 2013. O MBL foi
forjado, entre outras coisas, na inspiração de
movimentos da juventude progressista, com

auge em 2013. É representativa também a


referência à “rebeldia” na formação do Renova
Vinhedo.

Vemos na juventude – nascida e/ou crescida


durante os governos PT e muito distante do m
da ditadura militar – o crescimento de uma
“rebeldia conservadora”, algo que parece uma
contradição em termos. Para esses jovens, a
“ordem estabelecida” se localizava no petismo
da Presidência, a qual precisavam derrubar, e
numa suposta “ditadura do politicamente
correto”, que deveriam combater. Diante da

recusa da esquerda em dialogar com uma


rebeldia a princípio difusa, mas disputável,
muitos jovens encontraram sua identi cação
em grupos de direita e extrema direita, de
linguagem e comunicação bem mais
conectadas às lógicas contemporâneas. A força
do MBL e o predomínio de jo ens entre aq eles
do MBL e o predomínio de jovens entre aqueles
que declaram intenção de voto em Jair
Bolsonaro (60%, segundo o Datafolha)
evidenciam uma situação crítica que muitos se
recusam a enxergar: a esquerda não dialoga
com a juventude de hoje (com poucas
exceções).
Portanto, torna-se urgente para todos os
defensores de um projeto popular, democrático
e de acesso aos direitos no país conhecer e
estudar as chamadas novas mídias e a
subjetividade midiatizada das novas gerações.
Não para repeti-las com sinal trocado, mas
para criar novas estratégias. Os 60% de
intenção de votos jovens em Bolsonaro são um
alerta. Ter um projeto político de comunicação
para furar o bloqueio do velho fantasiado de
jovem é uma missão para ontem, pois a
situação pode piorar se não for compreendida
a necessidade de enfrentar os debates e estar
presente no processo de construção de
consciências, pensamentos e identidades neste
mundo das mediações digitais, com relevante
protagonismo juvenil.

*Gabriel Barcelos é jornalista sindical, doutor


em Multimeios pela Unicamp e autor do blog
CineMovimento
(cinemovimento.wordpress.com).

Fontes consultadas

Blog do Renova Vinhedo


(https://renovavinhedo.wordpress.com).

“MBL, heróis com pés de


barro”, Carta Capital, 20 jun.
2016.

“A nova roupa da direita”,


Agência Pública, 23 jun. 2015.

“O MBL e sua rede”, Blog


Junho, 17 out. 2017.

“Líder do MBL responde a


mais de 60 processos e sofre
cobrança de R$ 4,9 mi”, UOL,
8 maio 2016.
“Renovação Liberal: a
associação familiar para onde
vai o dinheiro do MBL”, El
País, 30 set. 2017.

“Áudios mostram que


partidos nanciaram MBL em
atos pró-impeachment”, UOL,
27 maio 2016.

“Um dos fundadores e líderes


do MBL também é cantor do
Bonde do Rolê”, Folha de
S.Paulo, 7 out. 2016.

“Em protesto com baixa


adesão, manifestantes
defendem Lava Jato e
criticam Congresso”, UOL, 26
mar. 2017.

“Aliados de Temer, MBL é


criticado pelos próprios
seguidores ao defender PEC
241”, Democratize, 10 out.
2016.

“Para alavancar redes sociais,


MBL aposta em dupla de
‘memeiros’”, Folha de S.Paulo,
30 ago. 2017.

Post MBL no Facebook, 19


out. 2017. Disponível em:
<https://www.facebook.com/mblivre/posts/713905998733546>.
O post foi apagado, mas uma
cópia pode ser acessada em:
<goo.gl/GpJfQZ>.

“‘60% dos que indicam voto


em Bolsonaro são jovens’.
Entrevista com o diretor do
Datafolha”, IHU Online, 9 out.
2017.
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