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7º Seminário Direitos, Pesquisa e Movimentos Sociais

Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 27 a 30 de abril de 2018.

O Paradoxo de Santos Dumont: problemas éticos e metodológicos atinentes


às pesquisas sobre movimentos sociais na contemporaneidade
Desde, pelo menos, o início dos anos 2000 — e de maneira mais marcada a partir de
2008 — as ciências sociais têm sido chamadas mais entusiasmadamente ao estudo de
movimentos sociais, contentious politics, ações coletivas, etc. Deve-se a isso a crescente
expansão e visibilidade de tais fenômenos em consórcio com as crises econômico-sociais
vividas em âmbito global, com as dificuldades de manutenção do wellfare state na Europa
(Della-Porta, 2015); e, em Brasil, principalmente a partir de 2012, por razões que ainda não
aparecem com estrita clareza, mas que compõem-se – é possível antecipar – de fatores
estritamente intestinos, de uma conjuntura econômica mundial e também de um grau de
porosidade ao contexto de sublevação mais amplo vivido globalmente.
Com a eclosão do ciclo de protestos de maio/junho de 2013 1 em Brasil, intelectuais de
diversas áreas foram chamados a direcionar seus esforços para tentar entender, e explicar, “os
problemas no paraíso”2. Na “corrida do ouro” das explicações científicas possíveis para o
fenômeno (com cada “mineiro” desesperado por mostrar a pepita que reluzisse com maior
brilho, com a qual se jactaria frente aos demais), as matrizes teóricas utilizadas foram as mais
sortidas, igualmente sortidas foram as conclusões derivadas das análises3.

1. Objetivos
Nesse contexto, algumas considerações se fazem necessárias, uma vez que já há
relativo consenso nas discussões de epistemologia da ciência acerca da inegabilidade da
existência de desdobramentos sociais na produção científica e a partir dela, bem como de sua
instrumentalização social4. Destarte, apresento o problema deste trabalho, de maneira bastante
geral, equacionado assim: quais são os interesses sociais potencialmente beneficiados e
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Para entender por que “maio/junho” e não “junho” cf. Tavares et. al., 2016. Doravante, remeter-me-ei a estes
eventos apenas como ciclo de protestos de junho.
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“Problemas no Inferno parecem compreensíveis, mas por que é que há problemas no Paraíso, em países
prósperos ou que, ao menos, passam por um período de rápido desenvolvimento, como a Turquia, a Suécia ou o
Brasil? [...] os protestos explodiram em um país que, ao menos de acordo com a mídia, encontrava-se em seu
ápice econômico, desfrutando da alta confiança depositada no próprio futuro” (ŽiŽek, 2013, p. 102)
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Sobre os diversos “sabores” explicativos para o ocorrido, Bringel (2013) – criticamente – apresenta alguns dos
equívocos, miopias, cometidos em certa parte das análises, seja quando i) tendem a sobredimensionar as lutas
atuais vis-à-vis as anteriores e vice-versa; ii) a miopia política, tendente à incapacidade de entendimento das
lutas sociais para além de sua relação com o estado; iii) algumas análises que, na avaliação dos fenômenos de
superfície (protestos etc) alijam a compreensão dos fenômenos de fundo; iv) só consegue avaliar mobilizações a
partir de seus outputs políticos mais evidentes (politicas públicas e impacto eleitoral) e quantitativamente
mensuráveis. (p. 44)

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desfavorecidos pelos resultados de pesquisas científicas dedicadas ao estudo de movimentos
sociais no Brasil contemporâneo?
2. Metodologia
A resposta a esta questão será perquirida por modo da seguinte empreita:
i) apresentar algumas considerações acerca do contexto em que inserem os estudos
contemporâneos de movimentos sociais (pensando o caso brasileiro em suas particularidades:
a aparente fragilidade das instituições democráticas; o patente recrudescimento quanto a
direitos civis, de modo geral, e de ativistas, de maneira mais aguda; o surgimento de leis que
abrem brecha para uso contra movimentos sociais e seus militantes – como por exemplo a Lei
No. 13.260/2016 a.k.a. Lei Antiterrorismo, ou também a Lei No. 12.663/2012, a.k.a. Lei
Geral da Copa, etc. todavia recorrendo a fatos e acontecimentos do exterior vez por outra para
demonstrar alguns paralelos);
ii) Pintado um contexto geral no qual militam alguns e pesquisam outros, apresentar
algumas considerações acerca das noções de “inteligência” e “inimigo interno” utilizadas
pelos mecanismos de repressão do estado. Valer-me-ei de alguns estudos feitos na área por
pesquisadores interessados no assunto, utilizo alguns periódicos “científicos”, ainda que não
propriamente acadêmicos (notadamente a revista brasileira de inteligência e a Military
Review), utilizo também um manual de investigação de guerra vazado pelo wikileaks em 2007
e alguns outros documentos, processos e escritos;
iii) avaliar em contraste os modi operandi de certo tipo de pesquisa sobre movimentos
sociais com os modi operandi das investigações de inteligência baseando-me em alguns
artigos de acadêmicos publicados na área e nestes documentos mencionados no segundo
tópico.
Por fim, a título de exemplo (e sem a pretensão de com isso montar uma base de dados
e casos exaustiva. Aqui é importante ressaltar uma vez mais que me importa menos
demonstrar uma reincidência frequente do uso das pesquisas sobre movimentos sociais em

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Este modo de percepção da relação entre os saberes e as suas implicações sociais não é recente. De maneira
incipiente desde Marx (com a ideia de armas da crítica ou da incorporação científica no processo de
aprimoramento da geração e acumulação de valor) a autores como Horkheimer (com a distinção entre teoria
tradicional e teoria crítica) “Tanto quanto a influência do material sobre a teoria, a aplicação da teoria ao
material não é apenas um processo intracientífico, mas também um processo social” (Horkheimer, 1983, p.
122), chegando mesmo ao primeiro Habermas (com a ideia da aplicabilidade social do conhecimento científico
em última instância apenas em sua materialização tecnológica), a ideia tem sido pensada e debatida. Não se trata
de desbotar uma vez mais a surrada constatação de que a neutralidade científica não pode ser alcançada. Mas de
que própria pretensão à neutralidade funciona em desfavor do ganho científico.

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desfavor dos mesmos, interessa-me é demonstrar, a partir de um contraste metodológico como
elas potencialmente podem vir a ser utilizadas com essa finalidade, os problemas éticos
latentes, do ponto de vista da pesquisa acadêmica, desta mesma potencialidade, etc.) apresento
em profundidade dois casos de uso de pesquisas sobre movimentos sociais e ativismo que
findaram por ser utilizadas em desfavor dos movimentos que observavam e interpretavam.
Um destes casos é brasileiro, o outro inglês.

3. Conclusões
As conclusões do trabalho levaram às seguintes prévias: é possível dizer já com
relativa certeza (a partir dos estudos de Bevington & Dixon, 2005, p. 189), que na Califórnia
(onde procederam seus estudos mais exaustivos sobre o assunto) os ativistas e militantes de
movimentos sociais veem pouca ou nenhuma utilidade – a eles próprios – nas pesquisas feitas
sobre eles. Como ressaltam os autores, isso difere de dizer que eles não veem interesse em
pesquisas de modo geral. Estudos historiográficos, econômicos, biográficos, etc. parecem-lhes
servir, contam-nos os autores, sobremodo. De tal sorte que não estamos falando aqui de um
antiacademicismo rudimentar, ou de uma “rejeição intelectual” a priori. O mesmo foi
manifestado por um coletivo ativista britânico chamado Dialectical Delinquents, que em
2011, em uma carta pública (por ocasião do caso que mencionei na sessão anterior que será
apresentado na versão integral do artigo) por acaso explicitou o que se segue:

“Much of the content of the articles for The British Journal of Social
Psychology are simply petty recuperation for academics of the most obvious
aspects of social movements which anybody who participates in such
moviments is well aware of” (DIALECTICAL DELINQUENTS, 2011, itálico
meu)

Ainda não constam, ao menos ainda não os encontrei, estudos de grande fôlego
estatístico para que possamos afirmar que, em Brasil, pouco ou nada veem os movimentos
naquilo que se produz sobre eles. Sei, igualmente, que não é o melhor proceder epistêmico
contar com a boa fé em suposições e opiniões abstratas, todavia uma constatação é possível.
Os movimentos sociais têm suas bases e fóruns de debate. Nestes locais toda sorte de
informação e interpretação da realidade posta se dá, seja presencial, seja pela internet.
Conjuntura, textos clássicos de autores pioneiros de correntes políticas históricas, questões
como solidariedade financeira, elaborações prático-organizativas e estratégicas, visão de
mundo. Todas estas questões, tão debatidas em vários departamentos acadêmicos e sob os

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mais diversos olhares e clivagens, são também debatidos pelos movimentos sociais
(BARKER & COX, 2002). Mas é difícil vermos estes mesmos movimentos, ao menos em
suas manifestações públicas (em blogs, fóruns, cartas públicas, etc.) abordando pesquisas
mais recentes feitas pela academia. A despeito inclusive de muitos destes acadêmicos
dizerem-se alinhados junto aos setores politicamente progressistas.
Segundo: podemos constatar que não só nos documentos observados utilizados pela
repressão (U.S. UNCLASSIFIED, 2008; Os números mencionados no periódico Millitary
Review, etc.), bem como para os estudiosos da área de inteligência (Lahneman, 2002;
Lowenthal, 2003, etc.), nem só a metodologia de extração de informação de movimentos
sociais com vistas à produção de aparatos de inteligência tem bastante afinidade com certo
tipo de pesquisa em movimentos sociais produzidas contemporaneamente, como estes
mecanismos têm muitas vezes como protocolar proceder à revisão de produção realizada por
pesquisadores de movimentos sociais com vistas a aprimorar, lapidar, refinar os teus próprios
conhecimentos e técnicas de vigilância e repressão.
Por fim há a constatação de que, a despeito de toda a conjuntura recente, dadas
algumas evidências no cânone das pesquisas em movimentos sociais na contemporaneidade
aqui e alhures, esta discussão – sobre papel da pesquisa sobre movimentos sociais, sua
relevância (FLACKS, 2005) aos mesmo e sua possível afinidade metodológica e passibilidade
de apropriação por mecanismos de repressão – parece ainda quedar silente, ou não aparece
sequer como questão, para boa parte dos pesquisadores e intelectuais que se dedicam a estes
tema e objeto.

Referências
BARKER, Colin; COX, Laurence. "What have the Romans ever done for us?" Academic and
activist forms of movement theorizing. In: "Alternative Futures and Popular Protest" 8th
annual conference, April, Manchester, 2002

BEVINGTON, Douglas; DIXON, Chris. Movement-relevant Theory: Rethinking Social


Movement Scholarship and Activism. Social Movement Studies. Vol. 4. No 3, 2005

BRINGEL, Breno. Miopias, Sentidos e Tendências do Levante Brasileiro de 2013. Insight


Inteligência, 2013

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DELLA-PORTA, Donatella & DIANI, Mario. The Oxford Handbook of Social Movements.
Oxford: Oxford University Press, 2015
DIALECTICAL DELINQUENTS. Aufheben’s Crowd Controlling Cop Consultant: The Strange Case of
Dr. Johnny and Mr. Drury, 2011. Disponível em: <http://dialectical-delinquents.com/wp-
content/uploads/2013/01/Aufhebens-cop-consultant-Oct-23rd-2011.pdf> Acesso em: 19/09/17
FLACKS, Dick. A questão da relevância nos estudos dos movimentos sociais. Revista Crítica
de Ciências Sociais. Nº 72. Coimbra, 2005
HORKHEIMER, Max. Teoria Tradicional e Teoria Crítica. In: BENJAMIN, Walter. et. al.
Textos Escolhidos. São Paulo: Abril Cultural, 1983
LAHNEMAN, Willian J. The Need for a New Intelligence Paradigm. International Journal
of Intelligence and Counterintelligence, v.3, n.2, 2002.
LOWENTHAL, Mark. Intelligence: From Secrets to Policy. Washington: CQ Press, 2003.
TAVARES, Fracisco Mata Machado, et. al. As jornadas de maio em Goiânia: para além de
uma visão sudestecêntrica do junho brasileiro em 2013. Opinião Pública. Vol. 22. No. 1,
2016
U.S. UNCLASSIFIED. Human Terrain Team Handbook, 2008. Disponível em: <
https://wikileaks.org/wiki/US_military:_Human_Terrain_Team_Handbook,_Sep_2008 >.
Acesso em: 11/08/2016
ŽIŽEK, Slavoj. Problemas no Paraíso. In: MARICATO, Ermínia, et. al. Cidades Rebeldes.
São Paulo: Boitempo, 2013

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