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A aaa elec Gc ee Ce como um importante (ices wets ace Clee ocr eae “9 Walter Benjamin da peo ue ue Wes Coe es ge Te oe es Ceo cen brasileira, marca- Ge ie a cee Gite eae. Oe eee oan ae eee Ceo ee ee mila) on) ae eee ace eee co Fe ee Mi ee cao alema, de 1989, 6 Gio en ie cease cee eee cute OE Ticleae e Pieces rare, Beco ee cele e cece Piece eae One cease Cee icc A escrita Ha futuro para a escrita? COLECAO COMUNICAGOES Diregio: Norval Briello [A Coles Comunicagées protende mostrar 0 amplo ¢ sds leque de hor zontes e posspecivasextcas que se abre pata uma jovem -Warmetod, no orignal A ideta de morte eéraica advém da segunda lei da termodinimica. Ese lei estabelece que a entropiaceade a zumentar em um sistema isolado [n. do TI) ‘em curto espaso de tempo. Fssa é a escolha desconfortével diante da qual se encontra o inscrever (e todos os modos de informar elaborados antes da invengio da informagio transportada por meios eletromagnéticos). Ha uma saida para esse dilema: pode-se escrever em tijolos de barro ¢ em seguida queimélos. Escolhe um objeto macio, dow-Ihe uma forma, endureso-0, para forgé-lo a nio se esquecer rapidamente. Com isso, posso simultaneamente informat sem significativa resistencia objetiva ¢ ludibriar a perfidia do objeto por muito tempo. A invenso da queima de tijolos com o objetivo de endurecer a meméria é uma obra prima do “espirito” e toda a histéria do Ocidente pode ser visea como tuma série de variagées desse tema: desde as cépias de manuscritos e a impressao de livros até a meméria automética e a inteligéncia artificial Trata-se de variagdes de um tema: produsio de informasio, difusdo ¢ armazenagem duradoura (tanto quanto possvel “acre perennius’), paca o «spirito livre do sujeito contrapor seu desejo pela imortaidade & pérfida inércia do obi sua vendéncia para a morte térmica. O inscrever, 0 escrever que resulta numa inscrigio, & visto assim como expressio do livre arbittio. c ae ae © mito da eriagio do homem, lido como modelo do inscrever, contém uma ourra pigina. Ela permite compreender o essencial nesse modo de escrever (¢ no escrever em geral). Deus moldou sua imagen com argila, para insuflar nessa imagem sew sopro. Deus nio inscreveu ‘emargila amorfa, ele inscrevew em uma imagem de angila. le ni escreven contra 0 dado (das Datum “argila’), mas contra algo feito (a imagem “Deus’), Portanto, contra um Faktum. O gesto de escrever néo se orienta diretamente contra o objeto, mas indiretamente, por meio de uma imagem, ou seja, por meio da transmissio de uma imagem, Ele grava em argila, para dilacerar uma imagem. © inserever (0 escrever em geral) é iconoclastico. ‘Tomemos novamente a etimologia como testemunha. © inglés “to write” (que embora, como a forma latina “scribere’, eambém signifique “tiscar") lembra-nos que “riscar” e“arranhat” (reissen) originam-se da mesma raiz, O estilo riscante é um estilete, e quem escreve inscrigdes é tum tigre dilacerador: ele esfarrapa imagens. Inscrigbes sio cadaveres de imagens esfarrapadas ¢ rasgadas, sfo imagens que o mortifero estilete » uusado para eserever sacrificou; por isso, 0 sentimento de horror pelo qual foi tomado o primeira receptor de inscrigdes. Os antigos judeus ajoclharam-se horrorizados diante de ambas as placas, e nas Metamorfoses", chamavse de época de ouro aquela em que ainda nio havia inscrigbes:“nec verba minantia fixo aere legebantur” —“antigamente ainda nfo havia palavras amedrontadoras, fxadas em bronze duradouro, para serem lidas’ © eestilete usado para escrever volta-se contra as imagens que nés fizemos do e a partie do mundo objetivo. Fle volta-se contra qualquer zona do imaginario, do magico e do ritual, que colocamos diante do mundo objetivo. Ele dilacera nossas representagées"* do mundo para organizi-las de forma esfarrapada em linhas ordenadas, em conceitos que podem ser contados, narrados € criticados. O mito da criagio do hhomem mostra © engajamento antimégico de todo escrever. Por isso, qualquer escrica é rerrivel por natureza: ela nos desticui das representagées por imagens anteriores & escrita, ela nos arranea do tuniverso das imagens que, em nossa consciéncia anterior & escrita, dew sentido a0 mundo ea nés. Um argumento usado anceriormence assevera que 0 escrever objetiva conduzir o eirculo de vertigem do pensamento 2 pensamento orientado por linhas. Agora, € possivel dizer: de um cfeculo magico do pensamento pré-histérico a um pensamento histérico conformado em linhas, Na verdade, 0 eserever consiste em uma transcodificagao do pensamento, de uma tradugio do cédigo de superficie bidimensional das imagens para o cédigo unidimensional das linhas, do compacto ¢ cconfuso cédigo das imagens para o claro e distinto cédigo da escrita, das, representac6es por imagens para os conceitos, das cenas para 0s processos, de contextos para os textos, O escrever € um método para dilacerar essas representagées e torné-las transparentes. Quanto mais o escrever se desenvolve, mais profundamente o estilete usado para escrever penetra 10s Fundamentos das representagSes armazenadas em nossa meméria para dilaceré-los, para “descrevé-los’, para “explie‘clos’, para codifica-los em 5, O autor efere-se 3 obra de Ovi . Vorstliangen, no original, conceitos. Esse avango do escrever ao longo das linhas em diregio aos fandamentos da meméria (do incon: a ¢ em direcio a0 meas objetivo desprovido de representagses por imagens é o que chamamos dde“historia’s Ble € uma compreensio progressiva, Deus, de acondo com o mito, dlacerou sua prépia imagem (€ indiferente se essa imagem representa im boneco antropomérfico ou tum tijolo), © ele assim nos escreveu, Entdo, como sua insctigao, Ele nos enviou a0 mundo, nos expulsou do paratso, nos quelmou e nec ces = pur qu uo deere cxplca comproceder ominar o mundo e¢ a nés mesmos. Assim fomos criados, com essa fnalidade fomos estos, desea forma fons envines, ne €o wens destino. A palavea drabe “magtub" significa tanto “destino” quanto ‘nscrigi De que abriremos méo quando subetituirmos o esdigo escrito por outro mais eficiente? Com certeza, de toda a antropologia que diteta (ou indiretamence Fandamenta-se no mito mencionado. & provavelmence a antropologia de que nés, ocidentais, dispomos. As inscrigdes levadas em considerasio até agora, esse modo de favarinformagées nos objets, deixaram de ser morlernas hd tempos Atualmente, ndo estamos mais cercados por tjolos de aryla queimados nem por quadros cinzelados; 20 contrério, nadamos numa correnteza de imprestos, de flhas de papel manchadas de tinta, Nao sio inscrigoes, so sobrescrigées aquilo que nos inunda, As perguntas a se fazer sto ag feguintes: de que forma distinguem-se sobrescrigées de inscrigbes?;o ‘que se faz quando se sobrescreve? : 3. Sobrescricées Sz os siwais GRAFICOS SAO GRAVADOS NOS OBJETOS OU, aplicados em suas superfices, isso & simplesmente uma questio de técnica. Uma questio de técnica, contudo, nunca é apenas uma questio técnica. Existe um complexo feedback entre a técnica e 0 homem que a utiliza, Uma consciéneia em processo de transformagio clama por técnicas inovadoras, e uma técnica inovadora transforma a consciéncia. Quando se comecou a fabricar ferramentas de bronze, ¢ néo mais de pedra, isso era a expressio de uma consciéncia em proceso de tcansformagio e, simuleaneamente, indicagio de uma nova forma de consciéncia. Pode-se falar, com razo, de um homem da idade da pedra ede um homem da idade do bronze ~ ou de um homem que inscreve € de outro que sobrescreve, ‘A diferenga técnica que sobressai entre ambos os métodos de escrita € a seguinte: a0 inscrever, usa-se um estilo; 20 sobrescrever, um pincel (on algo mais novo que um pincel). estilo é uma cunha, cujos prinefpios mecinicos, no mais tardat, os antigos gregos reconheceraim com exatido. Os complexos procedimentos nos quais gotas de tinta sio retidas em pincéis somente comesaram a ser usados gradualmense com a quimica e a Fisica. O estilo € uma ferramenta mais primitiva do que o pincel. Por outro lado, usar 0 pincel é mais confortivel do que usar 6 cinzel. © estilo é estruturalmente mais ficil e funcionalmente mais complicado do que o pincel, Trata-se de uma caracteristica do progresso: tudo torna-se estruturalmente mais complexo, pata funcionalmente tornar-se mais ficil (am outro indicio de que, primeiro, gravou-se, € depois, sobrescreveu-se). car ao invés de cinzelar, para poder escrever com menos esforg0, ce mais cépido. A rapidez no escrever € a diferenga fundamental entre a inscrigio © a sobresericio, Pega-se um pincel ou uma pena (esse pincel natural), para se escrever no fmpeco do entusiasmo, com toda a leveza, ‘como em tum voo, Entio vira-se a pena e escreve-se. com sua ponta, para se eserever ainda mais répido (ali, essa inversio da pena, esse esto antioriental do Ocidente mereceria ser mais bem analisado). Depois clas penas de ganso, passa-sea utilizar instrumentos ca vez mais ripidos ara escrever: a esferogrifica, a méquina de escrever, o processador Word ~ isto é penas cada vez mais répidas. Os escritores ocidentais perrencem Alatte das aves plumadas. eee As inserigdes sio escritas que demandam muito esforso ¢ sio Produzidas lenta e cautelosamente, Sao “monumentos” (“monere” = concemplar). As sobrescrigses sio escritas fugazes aplicadas em superficies, cuja finalidade & ensinar uma mensagem a um leitor, Sio “documentos” (“docere” = ensinar). As inscrigdes sio monumentais, as sobrescrigdes sio documentais. Essa diferenga nem sempre é dbvia, ‘Quando os romanos riscaram as placas de cera com seus buts, eratava, se para cles de fxar seus conceitos. Eles queriam documentar. E quando os monges copiavam érdua ¢ cautelosamence uma letra sagrada depois 4a ourra no pergaminho com suas penas de ganso, tratava-se para eles de devosio, de contemplar a divindade: erguer seu monument. Mas fica o sentimento de que teria sido melhor se os romanos tivessem pincelado © 0s monges, cinzelado, Nossa literatura nao é monumental (como a da Mesopotamia), ela ‘Mo exige citcunspeceio nem contemplagio, Ela & documental. ela quet ensinar ¢ insteuit, Nossa literarura nao pretende formar sibios, mas doucores, Ela é escrita rapidamente, pata ser lida rapidamente. E essa Yelocidade € uma das explicagées para a dindmica da crescente torrente de textos em que estamos imersos. AAs penas € os instrumentos que as sucederam sio canais. Sejamn tubes ou nio, eles aplicam normalmente tinta preta sobre superficies normalmente brancas. A mio que escreve e dirige a pena instrui os canais para distribuirem a tinea em forma de sinaisgrificos, Por isso, quem escreve ‘nto € um pintor, ele & um desenhista. Ele nao cobre a superficie com tinta, para encobri-la de maneira que a tinta pudesse representar algo imageticamente, mas ele produz um contraste entre a cor da tinta ea da superficie, para que o sinal fique claro e nitido (0 preto no branco). © Viste: Fovteee 2 objetivo nto & uma representagio por imagem, mas clareza e nitidex (legibilidade inequivoca). O escrever nio é expressio de um pensamento magico e compacto, mas sim de um pensamento discursivo e histrico. Quem escreve € um organizador de sinais, um desenbisca, um na verdade, um desenhista veloz. Seu designer, um semidlogo. desenhar chama-se “croqui’, uma palavea que se origina da raiz grega “sche’, que significa ‘pegar com a mio rapidamente. As sobrescrigSes si0 cexoquis, eas sio esquemiticas, Expressam-se nelas a pressa e a falta de tempo e tranquilidade, caracteristicas da escrita com penas e da leitura daqquilo que foi escrito com esses instrumentos. Qualquer critica literéria Halljabritat, 00 orignal significados para os alexandrinos, para ‘Tomas de Aquino, para Hegel, para Galle ou pata os historiadores do século XX.O destino ou ice aquilo que o rexto “€ (a mensagem que ele 6), completa-se no receptor ‘Textos sem receptores nem leitores sio linhas de letras sem significado, a que se atribui um significado somente por ocasiso da leicura Curioso é 0 fato de os textos serem midias (pontes fundamentadas tanto nos pilares dos receptores quanto nos dos emissores), nem sempre Presentes no escrever. Hé aqueles que esquecem, ao escreves, que os textos, de acorelo com sua estrurura, so ditecionados a outros e que sio sem sentido para si préprios. © esquecimento do outro ao escrever & uma consequéncia do autoesquecimento. Quem escreve luta, armado com suas Letter, contra uma lingua que se defende. Ele quer domind- las ~ e também, por meio delas, 0 que a lingua significa, ou seja, seus pensamentos, sentimentos, cepresentages ¢ desejos. Essa luta 0 absorve, leva-o a esquecer-se de si mesmo e dos outros. © escrever € um risco inebriante. Sio justamente os textos escritos em autoesquecimento os mais significativos que temos. Essa é uma das contradigées que nos espreitam na esséncia do escrever. Nés distinguimos dois tipos de texto. O primeiro &“comunicativo’ informative, transmissivel. O outro é “expressionista’,expressivo, escrito sob pressio. Um exemplo do primeiro tipo seria a comunicagaa cientifica; do segundo, a lirica. Esses exemplos extremos levam-nos a dividir o conjunto da literatura em dois grupos: aquele que é recebido de modo consciente, , aquele outro, em que essa intengéo nio é consciente, Contra um tipo assim de critica literdria, existem as seguintes considerasées: a maior parte dos textos comunicativos quer ima recepsio conforesvel, quer ser facilmente legivel. Por isso, devem set “denorativos’, isto é transmitir uma mensagem inequivoca. A. consequéncia & que esse tipo de texto é interpretado da mesma forma por todos os leitores. Textos cientificos, especialmente aqueles escritos com sinais numéricos, so facilmente recepcionados, até mesmo quando parecem difices 20 leitor nao proficient, A dificuldade néo reside no texto, mas na codificagfo, ainda por ser aprendida, Hi, sem deivida, textos que se fazem passar por cientificos, mas que sio, apesar disso, “obscuros' Isso ¢ valido especialmente para textos das ciéncias humanas, A critica lierdvia sugerida aqui poderia mostrar que esse tipo de texto com reflexes formais nao é, na realidade, cientifico. Ao coneratio, & disfarcadamente cientifico. ‘Textos expressionistas, por outro lado, nao dio atengio a seus receptores. Eles podem, inclusive, ter um baixo grau de legibilidade, Eles podem ser “conotativos” (obscuros), isto é, transmitir mensagens ambiguas e plurissémieas. A consequéncia é que esses textos podem set ineerpretados de variadas maneiras por cada um de seus leitores. Os textos expressionistas so, por conseguinte, mais significativos do que 0s comunicativos? A critica literdria sugerida aqui seria obrigada a chegar A conclusio paradoxal de que justamente esse grupo da literatura, que nao & conscience de sua finalidade comunicativa, ransmite as mensagens mais significativas. Nio € necessitio, contudo, continuar a classificar a literatura como se empreendeu anteriormente, Textos que conscientemente comunicarn podem see, ainda que extraordinariamente, conotativos, Um exemplo & a Biblia, esse texto Fundamental do Ocidente. A Biblia & um texto cujo ‘objetivo é poder ser lido por qualquer pessoa e interpretado por qualquer tum a sua propria maneira, Ela fala para todos e para cada um & maneira que cada um escothe. Ela &¢ quer ser destino. Ao mesmo tempo, a Biblia «std inequivocamente escrta sob pressio. Nesse sentido, ela € um modelo para codos os textos. Pois foi escrita em autoesquecimento e €m consciéncia do outro, Essa consciéncia do outro € tio grande que 0 texto hebraico “original” realmente foi elaborado para sempre ser sraduziclo novamente por outro, E dessa maneira que se pode falar do destino da Septuaginta, da Vulgata, do Rei James, da Biblia de Lutero como destinos desdobrados do texto original hé muito perdido. O desdobramento do destino do Ocidente, assim como a histéria do texto biblico evidencia, poderia servie como modelo para aestrutura da historia do espirito humano, embora a Biblia coloque em ciivida o conhecido enunciado da teoria da comunieagio: “quanto melhor se comunica, ‘menos se informa, ¢ quanto mais se informa, mais dificil €a comunicagao’ “Textos sio produtos semiacabaclos, Suas linhas no sé se apressam. «em dirogio a um ponto final, como também ulerapassam-no 20 encontro do leitor, de quem se espera que 0 complete. Textos sio uma procura do ‘outro, mesmo quando quem escreve esti ciente ou nio, ou até mesmo indiferente, mesmo quando ele desiste enfaticamente, como Kafka, do leitor co-produror do texto. Pode-se naturalmente querer dividie o Universo dos textos por meio de virios ctitérios, todavia, ¢ comum a todos 0s textos serem bragos estendidos que procuram com ou sem esperanca ser abragades por outro, E assim a armosfera do gesto de excrever Para quem estou aqui, quando eu escrevo? Assim ressoa a questio politica em tuma sociedade em que a escria domina: escrever textos (¢ Publicé-los) é na verdade, 0 gesto politico em sociedades como a nossa. ‘Todos os demais engajamentos politicos sucedem e respeitam os textos, Se fizermos a pergunta acima no contexto concreto do universo dos fextos (¢ nao “no vacuo"), entio verifica-se que eu, que escrevo, estou ali para me dirigit aos receptores que estio 20 meu alcance, 20 conttirio de me dirigir a todas as pessoas. A ideia de que escrevo para todos nao é apenas megalomaniaca, mas também um sintoma de uma falsa consciéncia politica, Ao alcance de quem escteve, estio apenas os ‘eceptores com quem ele compartilha canais de transmissio por meio de seus textos. Por isso, ele nao escreve diretamente ao seu receptor, ele ‘sereve muito mais a seu mediador. Fle esté ali in erster Linie para seu mediador, considerando que "in erster Linie” deva ser entendido lireralmente: da primeira linha do texto até a tltima, 0 texto é escrito Para o mediador. Todo o texto & perpassadlo pelo fato de ter sido escrito em primeiro lugar para um mediador. Nenhuma critica literdria deveria desconsiderar esse Fito, O mediador néo ocupa uma posigso externa 20 texto, ele est, a0 contritio, no interior de qualquer texto. Ele é desde 4 invengao da tipografia, o editor, na maioria das vezes, © editor, cuja earefa € encontrar © caminho para a impressio da maior parte dos textos, é como uma tela de impressio*™ que se encontra imersa na corrente de textos. A enorme torrente de textos impressos ein ue estamos imersos hoje em dia nada mais é do que a ponea de um iceberg constituido por textos cortados, de textos que nfo conseguiram mpor-se a essa tela de impressio. Um texto é uma expressio,cujo objetivo consciente ow inconsciente €causar impressio. Os textos nio impresses sio expressées que causaram > Raster, no original, * uma ma impressio ao editor, Nao foram bern sucedidos na triagem (ita eo dina rar deo potas exon na ela oo alam com He *Cansar urna mé impressio" significa nfo ter correspondido aos eritérios daquele que se deixa impressionar. Com isso, surge a questio dos critérios. de censura (de acordo com o desenho daquela tela). Embora nds possamos observar em todos os lugares abordagens de apatelhos de censura automaticos (por exemplo, nas eedages dos meios de comunicagio de massa), os editores ainda no sio, por enquiinto, maquinas autométicas. Atualmente, 0s edicores ainda sio sufcieement eis para jstarem se cron 3 alguns am ue cles querem seguras. Ainda ha didlogos entre editores e textos que Se ‘nadie os crtvioe de edigio (is, o rau de fleibilidade do editor pode ser somado como medida pats veifar a tberdade de wna sociedade), Esses dilogos entre restos eeditores i modificam, se possivel, 08 ctitérios de edicio, B modificam também os textos. Isso € a esséncia do itso: que o participate rome-ae 0 outro do cura ese ansformey enquanto ele modifica 0 outro, Um texto impresso nfo € apenas aquele que transformou (capturou, impressionow) o editor, ele € também sn texto que foi modificado (que foi apreendlido e que causou impressio) pelo editor. © texto impresso € consequencia de um aperto 7 mos entre aguel que xreve«oeditos cle apresent 0 vests de ambas ab mios. A mio de guem escreve foi levada pela do editor. Esse aperto de mios é um dos gestos mais afiveis que existe, pois é, simulraneamente, «dos mais ptiblicos e dos mais intimos: 0 editor esté li para quem escreves aquele que escreve esté para o editor; ¢ ambos para o leitor © texto impresso, em contraste com @ nao impresso, encontea-se, portant, sob dae presses. le ¢carepido pla expresso de quem esereve e pela contrapressio do editor. Fle é um punho cerrado. B ele deve impor-se a set futuro leivor, como texto compacto, de acordo com ambos os objetivos. Ele deve, como se diz de maneita irrefletida, “informar” o letor, sem estar ciente da dindmica inerente a esse conceito. “Informar” quer dizer: imprimir uma forma em alguma coisa que provoque uma ressténcia a essa impressio, Em textos escrtos,escritore editor tramam para informar o leitor = para deixar-lhe uma impressio. Primeir, a expressio do escttor; depois, a contrapressio do editor; em seguida, a impressio da geifica; por tiltimo, a impressio sobre o leitor. Essa é a dindmica textual de Gutenberg. Permanece a questio se essa dinimica no caité em ponto morto ‘em virtude da produgio inflacionada de textos que nos é imposta. Se «e88e ponto morto nio é um dos motivos para atavefa da escrita. A grande quantidade de impressos que diariamence é levada a nossa casa, essa floresta de folhas em que nos perdemes nas livrarias ~ isso nio so, com certeza, punhos cerrados, nos quais escritores ¢ editores conspiraram para nos informar, Sio, provavelmente, curatives com cloroféemio que (8 editores produziram para nos anestesiar (considerando que esses. editores providenciaram escritores apropriados para tal finalidade). Imprime-se hoje em dia majoritariamente para anestesiat, e editores ¢ escritores parecem ser apenas fanciondrios dessas empresas de anestesias, This funcionérios, além disso, poderio ser substituidos em futuro previsivel por aparelhos ausomiticos: os editores, por telas programadas; s escritores, por processadores, Word ~ até que, finalmente, se desistir& do alfebeto por ser 0 cédigo-com baixo desempenho, ¢ a sociedade s6 seri informada (anestesiada) por imagens sonoras programadas, Em ‘utras palavras, eserever,editar, imprimir ele textos alfunuméricos ainda faz sentido, tendo em vista a inflagio textual e a revolugdo da informatica? O que est em questio aqui & 0 cerrar dos punhos, que poderia romper com os curativos anestesiantes, Trata-se de uma questio estética, “Aisthestac” quer dizer “perceber” e permanece a questio se, hoje e no futuro, os textos informativos realmente ainda poderao set compreendidas, se ainda sera possivel para escritores e editores conspirarem contra a crescente indistria de anestesiacio automética, Essa conspiragio contra a anestesia e a favor da informagio, esta compressio dos textos, para que ela possa transcender da era de Gutenberg para a época eletromagnética, é uma estratégia que conhecemos desde a navalha de Ockham. Apenas aqueles textos que se submetem a essa navalha podem sobreviver. Quanto mais compactado é lum texto, mais perceptivel no interior do curativo do software A navalha de Ockham diz “entia non sunt multiplicanda practer necesstatem”: nao se devem aumentae a8 coisas desnecessariamente, Ela € um instrumento que corta o desnecessirio ~ redundante, como se diria hoje em dia. A contrapressio do edicor contra a expresso do escritor como um agitar da navalha de Ockham. A diferenga entre textos impressos e nio impressos é clara: os primeitos foram guilhotinados; 0s segundos, esgrimidos. vise Fovteen 0 ‘Apesar do massacre dos textos, somos imundadbos por eles. Entrementes, a guilhotina do editor mostrow-se inoperante. A navalha de Ockham, por outro lado, permite estabelecer melhores critérios do que os da guilhotina: os critérios do editor (pontos escavados em sua tela), que correspondem a passagem da era de Gutenberg a situagio cletromagnétics, Em suma: quanto mais conciso, quanto mais compacto, melhor. Esse é um critério “de informatividade’: De acordo com ele, 0 sgrau de informatividade de um texto é inversamente propercional a0 seu grau de redundincia. Quanto mais conciso, mais verdadeieo ele é, pois o desnecessétio éfilso. As equagdes de Einstein sio mais verdadeicas clo que as de Newton, porque elas economizam os gramas ¢ se dio por satisfeitas com centimetros e segundos. Quanto mais conciso, melhor, pois tudo que € desnecessirio & indesejavel. Prescrigdes curtas (leis, manuais de instragao) sio melhores do que as extensas, porque oferecem padrées de comportamento mais ficeis de serem seguidos, Quanto mais conciso, mais belo, pois eudo que é desnecessério é io, Um belo texto & tum modelo de experiéncia, e quanto mais compacto ele for, mais forte seri a experiéncia moldada por ele. Parece como se nada fosse mais ficil, e portanto passivel de ser auromatizado, do que a edigio de textos. Eles podem ser reduzidos a tum minimo inevicivel. Hoje em dia, parece que toda critica texcual tem de dizer: apenas 0s textos minimos tém perspectivas para sobreviver & revolugio da informatica, Infelizmente, a coisa nio é tio ficil assim. HA textos que exatamente devido ao seu grat: de redundincia forsam a informasées (veja-se, por ‘exemplo, as digressdes intrincadas de Thomas Mann), Mas no tanto Por isso, e sim porque hé um ponto critico a partir do qual cada uso a mais da navatha de Ockham castra 0 texto, 20 invés de apariclo. Se as redundincias sie apagadas, sobram, normalmence, ruldos e nio informagées compreensiveis. A batalha dialégica entre escritor e editor consiste na descoberta desse ponto eritico: em que © maior grau de informatividade € alcangado, antes de tudo comecar a se deteriorar em ruidos. A descoberta desse ponto critico &, no final das contas, o critério de edigio mais decisive. Textos sio discursos, Os sinais grificos neles fluem e ultrapassam tum ponto final ao encontro de um leitor que os completa. Se a navalha 58 Aeserit de Ockham corta esse discurso, o leitor, entio, nio pode mais compreendé-lo (decifré-lo): quanto mais conciso um texto, mais dificil é para decifré-lo. A partir do ponto critica, rorna-se indecifcivel. A batalha entre escritor ¢ editor tem de elevar a dificuldade da leitura a0 maximo - e manté-la nesse Apice. Hla tem de oferecer ao leitor 0 maior {rau possivel de exigéncia, sem sobrecarregi-lo. O critério do editor & a capacidade de leitura do leitor. ‘Textos tém de ser fluentes. As Tetras, palavras, frases e parigrafos compactados devem ser sequéncias compleras. As particulas do texto devem ser construidas em uma estrutura ondulas, Trata-se de ritmo, de niveis de ritmos sobrepostes em camadas, Cada um dos niveis de lettas, palaveas, frases e parigrafos deve oscilar em seu ritmo, e todos devem oscilar juntos, Uma atmosfera uniforme deve oscilar no nivel musical, lexical, semintico e légico do texto. Apenas quando esta correto, um texto pode deixar o Teitor chegar a um entendimento ou nio, deixi-lo oscar entre a simpatia ¢ a antipatia, Por isso, a navalha de Ockham tem de nio apenas cortar o discurso, mas, além disso, produzir uma unidade coerente, Os editores tém de fazer do texto uma colagem, nao obstante, © leitor nao deve ver nele uma colagem. ‘Textos precisam estar afinados. Hé dois tipos de alinagio®, de ritmo. No primeiro, uma onda do discurso segue, uma apés a outra, No segundo, ela se quebra ¢ espuma, Esse segundo tipo de ritmo pode ser chamado de sincopado. Um texto é sineopado quando ele proprio sempre se contradiz e, mesmo assim, flui sem lacuna, Fsse tipo de texto capeura © leitor, porque ele ataca a batida de seu corasio, provoca-lhe contradigges, entusiasma-o involuntariamente, Um texto assim & realmente aquele punho cerrado que tompe essa midia que anestesia, ¢ © faz para informar. A contradigéo interna do texto, sua violéncia sincopada, é uma das consequéncias da contradigio externa entre escritor e editor, Textos verdadeiros, bons ebelos isto é eextos compactos, Auentes, completos e, ainda assim, contraditérios sio obra do didlogo criativo entre escritor ¢ editor. Eles nos dio o direito de ter alguma ® Seimmung, 10 or woven Foorsen » esperanga, ou seja, a de que nem todos os textos setéo sacrificados a0 prospero universo das imagens técnicas. ‘O esctitor esti li, em primeiro lugar, para seu editor, a fim de fazer ‘com ele, em conjunto, a partir do"texto” semiacabado, um punho cerrado, ‘ea esperanga consiste em que golpe com o punho cerrado atravesse a situagio informatica e capture o leitor — até mesmo depois da superagao do cSdigo alfanumérica - que por sua vez completa o sentido do texto, (O escritor est em busca do outeo para, em sua solidio, em solidariedade com o editor, invadir a comunidade (mesmo gue cle nem sempre esteja ciente dessa sua busca pelo outro). Antes da invengio da tipografia, nio havia editores. Eta, principalmente,aigreja que tinha como tarefa criticar os textos e transmiti-los aos leitores. Por isso, 0 escritor redigia antigamente em busca do totalmente Outro (ad maiorem Dei gloriam). ‘Antigamente, 0 leitor era para ele um mediador de seu texto no caminho para. divindade (para a perfeigio de seu texto). A invengio da tipografia modificou o escrever: 0 engajamento religioso tornou-se politico. 6. Tipografia DEVE-SE COMPREENDER ‘TIPOGRAFIA AQUI MUTO MAIS COMO UMA nova maneira de escrever e pensar do que como eéenica para producio de impressos ou método para disseminagao de informagoes alfanuméricas, Embora os aspectos da impressio sejam muito importantes para a compreensio da atual revolugio da informasao (e pode-se considerar a informacéo eletromagnética como desenvolvimento da técnica e do método de distribuigio da tipografia), trata-se aqui de uma ‘questi muito radical, a saber: se nio € apenas com a invengio da tipografia que aquele que escreve se torna ciente do que realmente realiza ‘quando organiza Lettern em sequéncias; se esse pacrao pritico e rebrico de escrever nao leva & superagio da consciéncia histérica, que se expressa no escrever; se a revolucio da informasio néo pode ser apreendida de alguma forma como uma criagio da virtualidade presente no escrever. ‘A palavea grega’typos” quer dizer em primeiro lugar’ vestigio’: Nesse sentido, typoi” sio como vestigios que os pés de um pissaro deixam na areia da praia. Entio, a palavra significa que esses vestigios podem ser utilizados como modelos para classificagio do péssaro mencionado. Por Ultimo, a palavra significa que eu préprio posso desenhas, na areia, esses vestigios de pés de passaros para poder comparar e distinguir diversas espécies de passaros. Portanto, “typos” significa aquilo que é comum a todo o conjunto de pisadas de passaros (“aguilo que é tipico”). Significa ‘© universal por “trds” de tudo que é particular” e individual, 8. Typisc, no ovigina Em geval, © que coresponde a um tipo ou © que exprime ow realiza os caracteves do tipo [ 1. do T]. % Charalteristsdh no orginal: Nest capital, o aor pte" Typ typ relacionados ao que é tipo; a"Charakter” "cherie relacionados a que é singular particule, A palavra grega “graphein” quer dizer em primeito lugar “inscrever” Nesse sentido, ‘tipografias” sio como vestigios deixados pelo estlere na argila. Contudo, como sabemos, a palavra “grapbein” significa no uso ‘comum escrever” Significa a inscrigao de sinais grificos ~ ou sea, desses vestigios que devem ser classficados, comparados e diferenciados, Com isso, a palavra“tipografia”é na realidade, um pleonasmo que podetia ser traduzido por insculpir uma cavidade” ou escrever sinais gréficos” Basta, contudo, dizer “escrever’ ‘Tipografa-se desde que a escrita (principalmente a alfanumérica) foi invencada. Gutenberg, na verdade, nao inventou nada: jé em meados do segundo milénio a.C. podia-se, nesse sentido, vipografar. Os pré- requisitos técnicos existiam antigamente (prensas, tintas, folhas, ¢ também a arte de moldagem por fundigio de metais). Ainda nao se Jmprimia, porque nao se estava ciente de que se manejavam tipos® quando se desenhavam sinais gréficos. Consideravam-se os sinais grificos caracteres. O pensamento “sipificante™® nao se impés i consciéncia naquela época. O grande feito de Gutenberg foi a descoberta dos ‘aracteres tipogrificos criados com a escrita alfanumérica, Um exemplo deve clucidar a dificuldade da conquista da consciéncia tipificante. Na dispata medieval sobre os universais, estava «em Jogo o problema da analogia. O que eu fago quando comparo uma ‘mesa a uma cadeira? Eu tenho de descobrir algo em comum nessas das coisas, que sejam tipicas a elas? Talvez a “qualidade de mobilia"™ comum 4 ambas? Essa era a posigo dos “realisas”. Ou tenho de me contentar com 0 faro de que essas duas coisas nio possuem particularidades compariveis ¢ que sou, por isso, obrigado a eriar do nada uma palavra sualquer (por exemplo, a palavra“mével") para impor uma analogia, na ‘Gomo em porruguts tpicoecaractristic ao plavrassindnimas,opeamos portradasie ‘Charalterisieh” como aguilo que & particular (n. do T) Bip. original. No sentido de model, form, eget ov conju iatesigado de ‘saructeiatcas que pode ser epevido por um nimeroindefnido de exemplares [nda Ty. & Dia “ppiserende" Denko, no original, ® Mabebsity no orginal, o realidade, impossivel? Essa era a posigio dos “nominalistas’. Para os eae or ic, nivel o waar oeule-se no particular pode ser descoberto: “universalia sunt realia’. Dai, a denominacio “tealistas Para os partidérios da segunda posigao, nao hi, na verdade, nada por trGs do partcula, tipico nfo é nada além de um nome que inventamos com 0 objetivo de fazer analogias: “universalia sunt nomina’, Dal, a sminagio “nominalistas’ ett 'Nio se tata, ness disput, coneudo, apenas de uma questio da Jsgica ("comparae” uma redugio a um semelhante comum ou € am truque para tornar o desigual em igual’). Trata-se, principalmente, de Se os universais so reais, eles devem formar uma pirimide organizada hierarquicamente. Depois de ter descoberto, por analogia a qualidade de mobilia em mesas ¢ cadeias, tenho de, por analogia, poder descobrie uma universalidade “superior” entre uma pesa de mobilia e uma pera de vestudtio, até chops a0 ic pirimide, 20 le todos os universais. Portanto, até Deus. Ea posso assim, ois eee com Deus e salvar minha alma. E precisamente por meio de dois métodos complementares. Ou luma questo existen racionalmente, na medida em que ex chegoa uma conclusso do particular caminho de um baixo nivel 20 mais genérico e, por causa dessa indus’ i de vealidadea um nivel cada vez mas superior, até ques no camino do pensamento (Filosofia e teologia), Finalmente, confronto-me com Deus. ‘Ou de modo pritico, por meio de obras’, na medida em que eu extraio © comum (a “esséncia") do particular (no “acidental"), e entio, dessa csséncia eu possa extra uma esténcia superior, até que finalmence eu possa ter extraido do acidental a silrima esséncia das esséncias (a“quinta’ “quintesséncia’, isto & Deus. Do chumbo, eu posso precipitar 0 ouro, ts do ouo, da 7 fonte, a pedra da sabedoria e, por fim, Deus. Eu posso chegar a Deus por meio de uma ago disciplinada (por exemplo, a juimia) e, assim, salvar minha alma. iz Se us universais ndo sio nada além de palaveas vazias, entio toda a filosofia ¢ a teologia sio escaramugas vazias de palavras (flatus vocis ~ mera emissio de voz), ¢ todas as priicas em busca de Deus como a alquimia sio, entéo, iabdlicas, Pois,entio, tenho de aceitar queo mundo ‘em que fui jogado no dia de meu nascimento é constituido por meros fenémenos incompariveis e singulares, em que minha alma se envolve ‘como em armadilhas, quando eu dedico minha atengio a eles, Eu ceaho, or isso, de dar as costas a esse vale de lagrimas e me abrir para uma fé concreta ¢ puramente inarticulada ("sola fide") da divindade, caso eu rio queira sucumbir 20 diabo, caso queira me salvar, A invengio da tipografia ~ 0 que também os livros de histéria gostam de dizer — decidiu, durante a era moderna, a disputa pelos universais a favor dos realistas. Embora inimeros nominalistas tenham colaborado decisivamente no desenvolvimento da filosofia e da ciéncia moderna, a méxima realista “universalic sunt realia” tornou-se o axioma do pensamento da pesquisa modernos. Nés cremos na realidade dos tuniversais, dos tipos, na realidade da particula ardmica, dos genes, das classes sociais, das ragas, e tentamos exibi-los e manuseé-los. Quando e2sa crenga, hoje em dia, comeca a tornar-se inconsistente, quando nos inclinamos traigoeiramente a ser nominalistas (por exemplo, como ositivistas ou fenomendlogos), culpamos o esgotamento, a exaustio do pensamento tipificance. E absurdo. A invengio da tipografia decidiu a disputa pelos universais a favor dos realistas. A tipografia esclareceu que manipulamos tipos quando eserevemos (¢, por conseguinte, também quando expressamos Pensamentos ao esctever). A tipografia fez com que os tipos ficassem tangiveis e sob controle. Assim ela deslocou a crenga platénica na realidade das ideias (essa crenga, que exerceu influéncia no realismo medieval) de seu nivel especulativo ao pritico. A tipografia tornou-se uum suporte da cigneia moderna, Oescricor da era pré gurenberguiana considerava os sinais grificos ‘caracteres que tornavam visiveis um som particular de uma lingua falada «specifica, De acordo com essa falsa concepsio, para cada lingua especifica deveria haver um alfabeto particular, pois o A latino representaria um som diferente daquele do alfa grego. Por isso, quatro alfabetos eram correntes lado a lado antigamente,a saber, 0 latino, o grego, o hebraico e © arabe, para que cada um tornasse a lingua, de que era particular, inteligivel de uma maneia que the era particular. Nessa época nio havia a clara consciéncia de que sinais grificos na realidade eram tipos, e néo caracteres, © que em funcio disso era posstvel representar uma lingua eslava com letras gregas; uma lingua germénica, com letras latinas ¢ uma lingua iraniana, com letras drabes. No entanto, 0 que remanesceu dessa usw Flvsser 6 consciéncia pouco clara: as linguas “particulares" a esses quatro alfibecos foram consideradas sagradas. Quando ainda hoje os quatro alfabetos mantém-se lado a lado, nao obstante a clara consciéncia do tipico a0 escrever, & porque reminiscéncias até hoje da consciéncia pouco clara resistem a0 pensamento tipificante. A tipografia trouxe & luz a consciéncia pouco clara do tipico no pensamento fundamentado na escrita e com isso a problematica (a diivida) desse pensamento. Dois problemas devem ser aqui levancados, uma vez que eles esclarecem a crise atual do pensamento. (1) A tipografia mostra que os tipos nao sto formas invarkiveis “eternas’ ; (como queiam Plato cos reais medievais), mas, 20 contririo, «que elas podem ser modeladas, aprimoradas e rejeitadas. Uma vez ‘que, por exemplo, no ha no alfabeto latino nenhum sinal para 0 ‘som alemao “sch, 0 tipo “sch” foi criado (aliés, uma eriagio pouco engenhosa), Isso nao quer dizer, contudo, que seja uma prova para a tese nominalista de que “tipos sio puras invensdes” Ao contrétio, isso significa que, embora tipos sejam um futo, eles tém de se adequar a0 que lhe € particular. © tipo “sch” nao paira sobre nés em um céu placdnico, mas nem por isso pode-se buscé-lo do nada, Ao contrétio, somos obrigados a adequi-lo ao som “sch”. Se Fizermos assim, apreenderemos esse som efetivamente de maneira tipica. Com isso, modifica-se radicalmente © conceito de “teoria’: ele nio significa ‘mais um contemplar passivo, religioso de formas erernas, nem uma cescaramusa vazia de palavras. Ele significa um modelar avansado de tipos cada vez melhores (e nesse sentido, mais verdadeiros). Teorias oferecem conhecimentos, mas sio criagdes, Esse problema que esta na base da experiéncia cientfica é uma das origens da crise atuial do pensamento histérico, do pensamento fundamentado na escrita, (2) Um impresso é uma coisa tfpica ¢ nio uma coisa particular, incomparavel, singular. Um impresso é um ‘exemplar’, um entre miicos exemplos de uma coisa singular (de um manuscrito, por exemple). Nio € como uma coisa particular (como essa folha de papel singular), mas é como tipo que o impresso tem valor. Nao é a produgio da coisa impressa (da folha, da impressio escrita) que a forna interessante, mas sim a produgio dos tipos (do texto), A apreciagao de um impresso destitui antropologia cléssica do “homo Jaber’ Ela comprova a tese crista do trabalho como castigo. A Lipificagso, a manipulasio de sinais, a “atribuigio de sentide’ ow tmelhor,0 informar evidencia-se, por caisa do impresso, como anobre atividade do ser humano. © trabalho, a produgio de coisas Particulates ¢ desprezada como subumana, como um gesto para set transferido para as méquinas de impress. A primeira consequéncia desse desprezo pelo trabalho e dessa supervalorizagio do tipificar € 3 revolusio industrial, portanto, a instalaséo de miquinas. A ipografia pode ser compreendida como 0 modelo e o embrifo da ‘evolugio industria: informagdes no devem ser impressas apenas em livros, mas também em téxteis, metais e plisticos. individuais concretos, € um exemplo disso. Ele coloca 0 “progress a duvida, Pois esse progresso ~ da ciéncia, da técnica, da conomia 6 Politica ~ das coisas concretas para os tipos abstratoslegiini sg lentamente, mas com certeza, como insanidade perniciosa: por exemple, em Auschwitz, nos armamentos nucleares, na destruigio do melon ambiente, em suma, em todos os aparelhos universalizantes etipifcantes, Nés comecamos a perder a crenga na realidade dos universais e 0 sencimenco nominalista do vale de ligrimas comeca, desde no minimo Kafka, a se condensar em nés e a0 nosso redor. O pensamento tipogréfico™, nesse caso, pode ser superado. A revolugio da informatica, essa produto de sinaise sua insergio em campos eletromagnéticos, quebrou de maneira evidente 0 modo de pensar tipogréfico. Os novos sinais, que aparecem em monicores de computador e nas telas dos televisores, mio sio mais vestigios que se gravam em um objeto, eles nio sio mais “tipogrificos’ B 9 modo de Pensar, que as novas informagdes produzem, nao é mais um modo de pensar tipogrifico, tipificante. O gesto de impressio ¢ a mentalidade que se expressa nesse gesto tornam-se arcaicas, O pensamento tipificante, histérico, ocideneal torna-se arcaico. © “progresso” torna-se arcaico, de tal modo que se rorna reaciondrio quem é atualmente progressisea, Sem diivida, somos majoritariamente condenados a pensar reacionariamente, Porque o modo de pensar que grava vestigios estd impregnado em nés, Preferisiamos continuar a escrever e a imptimir: posicionamo-nos com temor e tremor diante da revolusio da informatica, Evidentemente 0 que perdemos na passagem da cultura gutenberguiana para a eletromagnética é, na vetdade, tudo aquilo que valorizamos como heranga do Ocidente. Por outro lado, nao percebemos © que ganhamos com ela. Se nébs percebéssemos, teriamos galgado 20 nivel do novo modo de pensar. Enquanto, rodavia, tentamos nos embeber na vida e na poética de Sio Francisco de Assis, de acordo com © modo de pensar nominalisea, podemos pressentir nosso futuro, Sala fide? AA tipografia, esse escreveralfabético que se tornou consciente, pode ser considerada a expressio do pensamento ocidencal, histérico, © impresso vem se propagando desde a revolugio industrial até a Sociedade pés-industral. Ele € 0 embrido do atual desprezo que singe por objetos parrculares edo grande respeito pela tipicainformacto"purs, A teapreciagéo de todos o3 valores concetnentes a0 trabalho sera abordada a seguis. A consciénca sobre esse problema é uma das origens da crise atual. Quando, com Gutenberg, aqueles que escreviam ficaram cientes de que manipulavam tipos, de que eram “técnicos em informstica’ modo de pensamento vipificante péde se desdobrar por todas a5 éreas culturais. Esse modo consiste em criar tipos, adequiclos aos caractetes ddo mundo, aprimoré-tos de maneira progressva e em sepuida imprin. los no mundo, Esse modo de pensamenco formou-se aproximadaeaente em meados do segundo milénio a.C. no Oriente Médio, Ele é apreendido dle maneita consciente com a tipografia e conquista o lobo terveste na «rt movderna. Como disse McLuhan «gala de Gutenberg se propaga ara frente e para tris, (Com cereeza, a indicios de que a vitbria do pensamentotipificante, esse realismo modificado, sobre 0 nominalismio até agora optimido, nig & definitiva, A objeso nominalista contra essa classifcagioe tipificagio tuniversal de todos os fendmenos por meio da ciéncia, da técnica, da Politica da arte e da flosofia, isco é, que tudo nada mais € do que uma “mera emissio de voz’ volta aserintligivel. O grito de guerra de Hussed “7 coisa em si’ pelo abandono do tipo abstrato e pela volta aos eases * Das Buchivucenken, co orga cientifico progressista que se tornou consciente, A revolugio da informatica torna a tipografia,o alfabeto ¢ esse pensamento supérfluos. Ela leva a um novo modo de pensar, ainda nao evidente, mas jé pressentido, Embora possa soar como uma assergio, é, na realidade, uma questo que nos inquiera e nos enche de esperanca em diese ao futuro. 7. Prescrigées Un merono Que sé Pope PREVER A PARTIR DO MODO DE pensar que emerge da revolugio da informatica & observar aqueles que ‘manipulam os aparelhos que colocam novos sinais em campos eletromagnéticos. Sao pessoas que pressionam teclas. Eles atuamn a para programar os apatelhos. A palavra “programa” é a palavra grega equivalence & latina "praescriptio" & alema “prescrigéo’ Essas pessoas continuam a escrever out estio escrevendo de novo? Os reacionétios contemporincos estio certos quando afirmam que, na realidade, nada se transforma, que o “essencial” sempre permanece a mesma coisa? Para quem, entretanto, escrevem essas pessoas? Eles nio escrevem de forma alguma em ditegio a um ponto final, dirigindo-se a outra pessoa, eles escrevem muito mais para os aparelhos. As reflexdes anteriores no mostraram que o “essencial” no escrever & justamente a interlocugio com 0 outro? Portanto, o “essencial” no escrever dessas pessoas ‘modificou-se: trata-se de um outro escrever e teria, por conseguinte, de receber uma nova denominagio: “programar’. Isso nao é apenas desconfortével para os reacionéios, mas também terrivel. Esse tetror em relasio a0 que é novo pode ser compreendido, a principio, como algo aparentemente inofensivo, As pessoas ndo escrevem mais, na realidade,alfabericamente. Ao conteério, elas usilizam um outro cédigo, © chamado eddigo bindrio, A inteligéncia artificial nao & (talvex apenas provisoriamente) competence para decifrar letras. Embora os novos cédigos dos computadores sejam extraordinariamente faceis (tio simples quanto a inteligéncia artifical), saber fazer uso deles, contudo, nao é tio simples assim. Eles sio sistemas estruturalmente ficeis, mas fancionalmente, complexos. Muitos de nés néo aprendemos sua ‘operagio, enquanto todos nés aprendemos o alfabeto, ea tipografia teve como consequéncia uma afabetizacio geral edemocritica, Com os novos cédigos dos compuradores tornamo-nos iletrados de novo, Susgia wma nova casta de Letrados. As novas obras escritas (os progeamas de computadores) estdo mergulhadas, para a maior parte de nés, num mar de segredo, como 0 que envolved os escrtosalfabéticos antes da invengio ca tipogafia. Aquilo que é indecifravel € um segredo horroroso; diante dele ajoelhamo-nos ("supplex turba”) e tentamos evité-lo (0 bezerro de fouro em frente is duas placas). Naturalmente, nada € mais fil do que desvendar 0 segredo, Necess apenas de aprender o cédigo secreto (0 caso dos romans ¢ dos judeus, 0 alfabeto; em nosso caso 0 eSdigo do computador). Mas nosso horror diante do novo faz com que isso seja impossivel. S6 nossas criangas, sem receio algum, aprendem brincando, Nés temos de tentar de outra forma, nés temos de tentat, com nosso modo de pensar tipogréfico, descobrir 0 segredo do “escrever” pos- tipogrifico. Uma vez que este ensaio é lceral, tenta-se escapar do horror diante dos programas. Desde que se compreenda ‘programa’ por uma obra escrita que into se dirige a seres humanos, mas a apatelhos, pode-se dizer que sempre S© programou, desde a invengio da escrita ¢ antes dos aparelhos. Na verdade, sempre se escreveu aos homens como se eles fossem aparelhos, Padres dle comportamento foram prescritos aos homens. E esas Prescrigdes formam um principio arrebatador no fluido tecido dos discursos que designamos por literatura ocidental. Tome-se essa linha ‘como guia para uma visio completa da histéria do Ocidente, e pode-se, entdo, representar seu desenvolvimento da seguinte maneita: no inicio, desde as placas chammurdbieas, essas preserigées cram os “mancamentos"; posteriormente, desde o Duodecim tabularum, craram- be as leis" a partir deles, que se diversificaram mais tarde em “decretos" “ordens' e outras formas injuntivas; 96 entéo, desde a revolugio industrial, apareceram as prescrigées, que dizem respeito 20 comportamento do homem em relagio as miquinas, ou seja, aos “manuais de inserugic", até Que finalmente, desde a revolugio da informitica, os “progtamas” mencionados acima, isto é, as prescrigdes para as miquinas, esse desenvolvimento complerou-se. Os programas nio slo, portanto, apenas jum modo eoralmente novo de escrevet, eles sio muito mais a etapa final de uma tendéncia que havia comecado nos primeiros escritos, n A trajetéria até agora descrita das prescrigdes (e a historia do Oacidente que a ela se articula) pode sr interpretada de diversas fore Por exemplo, como uma tendéncia & dessacralizagio, Os andes (quate todos os dex) eram sageads, Elestinham um autor divino(f re cscitos por Deus), Bra uma auroridade sobre-humana que fazia dos homens marionetes (aparelhos). As"leis" (como as constituigbes) tinham tum autor, senio divino, no minimo, mitice (0 "povo' por exemplo), € era ‘essa antoridade mitica que manipulava 0 comportamento do homem. im todas as prescrigdes mais recentes, ficou cada vez mais claro que elas cram feitas por homens que manipulam ot outros homens, Com os “manuais de instrusio’, comprova-se que a finalidade de todas as prescrigbes & fazer com que 0 comportamento do homem seja mecdnico «auromético. Por isso & que, quanto mais auomaticas sto as mAquinas, mais as prescrigSes tornam-se concisas ~ até que se tornario su hho momento de total automnayio. No lugar delas, colocam-se 08 programas. Com eles, no se peescreve mais aos homens. Ao _ dino, prescreve-se aos aparelhos. Comprova-se, assim, que a tendéncia das prescrisdes (e da histéria ocidental) tem como objetivo um comportamento totalmente profano, e que, quando esse objetivo for aleangado, serd dispensivel nfo a6 presevever © que quer que se 208 homens, como também os manipular. Eles se comportario tio aucomiaticamente quanto eles deve sompora se ae Pode-se considerar a trajetéria das prescriges to somente com uma endéncia dewvalorizaio do comporeamento, afi de Ihe dar um cardter cientifico (no caso de compreender-se “ciéncia” como um pensamento e uma agio live de valores), Os mandamentos prescrevem tum comportamento que se guia por valores “eternos’; as leis, um comportamento guiado por valores a a 28 ouras prescricbes ue se seguem serio cada vez. mais ives de valores, até que os mantis de insert, digam respeieo 2 apenas um comportamenco funcional Trata-se, portanto, de uma despolitizagio ¢ de uma funcionalizagio progress do comportamento que pode ser apreendida na construgio sineivica das prescrigées. Has se transformam de proposigéesimperativas (voce deve) em proposigées funcionais do tipo “se... entio..’, O ‘mandamento "Hionra teu pai e tus mae" toma-se a instrugio de uso “se vocé quiser tomar canja de galinha, ento comporte-se assim e assado com uma lata de sopa em conserva, Essa progressiva desvalorizagio da sao conclui-se nos programas, Em programas de computadores criados de acordo com a anilise légica, no hé nenhum simbolo para “dever’ Comprova-se, assim, que a tendéncia das prescrigdes (e da historia ocidental, na realidade) objeriva uma total despolitizagéo de todas as formas de comportamento, ¢ que quando esse objetivo for alcangado, os seres hhumanos e a sociedade se guiario como um sistema automstico eibemético, Bssas duas interpretagées da tendéncia contida nas prescrig6es transmitem uma ideia do modo de pensar funcional que emerge: 6 um modo de pensar profane, destituido de valores. Ele nio pode mais ser apreendido por meio de categorias hiseéricas, politicas e éticas. Outras categoria, cibernéticas, computacionais, funcionais podem ser aplicadas a ele, Por essa razio, 0 ato de progeamar nao pode ser, na realidade, denominado escrever. F um gesto em que se manifesta um modo de pensar diference daquele por ocasiéo do escrever. A questio ainda nao resolvida é se a tentativa empreendida de desmitificar 0 ato de programar disseminou o horror. E ébvio que se pode tentar resolver a coisa de um ponto de vista otimista. Desde que os programas slo prescritos aos aparelhos, o encargo das prescrigées & transferido do ser hnmano para objetos inanimadi ‘ser humano fea livre para se comportar da maneica como quiser. Consequentemente, a tendéncia contida nas prescrigbes e que se completa nos programas teria ‘como finalidade a liberdade. Aparelhos comportam-se melhor ¢ mais rapido do que homens: eles montam automéveis melhor, eles costuram melhor, eles gravam melhor ¢, brevemente, eles também colherio cecejas melhor do que os homens. E eles também penisam melhor: calculam, desenham, decidem mais répido (estranhamente, eles calculam melhor do que colhem cerejas) F os seres humanos podem a partir de agora se concentrar em programar aparelhos. Isso nao setia a liberdade io almejada desde 0 inicio da histsria? Hii, nesse caso, duas objegdes toralmente diferentes que se devem considerar. A primeira e, muito compreenstvel, é relativamente ffeil de solucionar. Ela diz que nem todos os padrées de comportamento podem ser transferidos para os aparelhos, ¢ que justamente esses padres de comportamento que sido podem ser automatizados seriam aqueles que decerminam a dignidade do ser humano, como por exemplo, aquele vis Fostten 2 concernente a0 mandamento "Honra teu pai e tua mie’, Isso é um eqiuivoco, Todos os padres de comporcamento podem, como sempte, ser programados e automatizados. Precisa-se apenas decompé-los emt clementos comportamentais, em (ato)mos®, e em seguida computéclos novamente. E justamente essa decomposigdo e essa re-computagio gue se chama programar. O comportamento concernente ao mandamento ‘mencionado acima deixa-se decompor em Seomos do tipo “alimente ta ide enferma com arror de leite. Aparelhos se comportatio, depois desse mandamento, melhor, mais répido e de maneira mais precisa do que seres humanos. AA segunda objecio contra esse otimisto é mais importante, Ela assevera que uma libertag4o do ser humano das obrigagses do comportamento resultaré em uma total servidio. Quando nio existe nenhuma necessidade para comportar-se de alguma forma (para trabalhar, para ir, sentar, calcula, desenhar), todos os comportamentos tornam-se tum “act gratuit’ gestos sem sentido e absurdos. Apenas na luta contra a necessidade, de acordo com essa objerio,a liberdade pode se desdobrar, A servicio & 2 mesma tanto no caso de uma dependéncia quanto no de luma independéncia roral. Por outro lado, seria possivel objetar que qualquer comportamento humano, esteja de acordo com alguma prescticio ou nio, é absurdo em vietude da morte (a necessidade de morret), € que, na verdade, todas as prescrigdes sempre tiveram a finalidade de atribuir um sentido a esse absurdo, Quando as prescrigoes sii transferidas dos seres humanos para os aparelhos, aqueles cornam-se livres para atribuic um sentido ao comportamento absurdo dos aparelhos (€ com isso 20 seu préprio comportamento em funcio dos aparelhos). Programar quer dizer, entio, atribuigao de sentido, ¢ 0 objetivo dissimulado por tris do ato de programar é deixar o ser humano livre ara atribuir um sentido 20 mundo e a sta vida. Se, mesmo com esse orimismo semeado, perseverar o horror diante do programar, pode-se dizer, entio, que 0 objetivo da histéria foi % Aluone, no original. Trata-se de um nealogismo composto por Akt (ato) ¢ Atome (écomos). Ou sea, 0s padeses de comportamento podem ser decomposes em"atos em parculas, como os dtomos:¢ posterormente,calealdos e compurados (1. do T). aleangado com a superagio da escrita por meio desse programar, Qualquer comportamento torna-se profano, cientifico, funcional, despolitizado, e 0 ser humano est livre para atribuir um sentido a esse comportamento. A histéria, e 0 modo de pensar gerado por ela, complecou-se. Emerge um novo modo de pensar, pés-histérico, que atribui sentido ao absurdo. Se esse otimismo, de fato, satisfaz a todos a ue dizem respeito, é incerto, Se ele é aceito, permanece a questio se todo escrever serd superado pelo programar. Todas as prescrigses poderio ser programadas, mas nao se escrevem apenas prescrigées. A literarura io consiste apenas em meros mandamentos, leis e manuais de instrugio. E esses outros fios do tecido da literatura no podem, com certeza, set programados. Portanto, continuaremos a escrever. E 20 continuarmos a escrever, conservaremos o modo de pensar histdrico, politico e avaliador. Essa objecio (reacionaria) cambém revela-se um equivoco. E verdade que nem toda literatura consiste em prescrigdes, em padres de comportamento. Ha também modelos de conhecimento (por exemplo, textos cientificos e filos6ficos) e de experigncia (por exemplo, poesia e tudo aquilo conhecido como as “Belas Letras’, belles lettres). A classificagdo da literatura em padrées de comportamento, de conhecimento ¢ de experiéncia segue 0 padrio clissico e, desde a revolugio industrial, é um padrio que nao se sustenta mais, a saber, a divisio dos “ieais’ em "bom; "verdadeiro” e "bele’, Nés dispomos, hoje em dia, de métodos com 0s quais podemos reduzir os modelos de conhecimento e de experiéncia a padrées de comportamento, na medida ‘em que reduzimos todas as proposigdes a0 tipo “se. entio. O eéleulo proposicional permite teaduzir as asserges de qualquer tipo em fungées. Toda a literatura sera programavel Literarura programada seria uma situagio na qual todos os textos seriam reduzidos, em primeiro lugat, a prescrigSes, para, posteriormente, serem computados pela inteligéncia artificial. Reconhece-se nas imagens de que jf dispomos que modelos efetivos de conhecimento e de experiéncia seriam produszidos extraordinariamente dessa maneira. Os modelos de conhecimento codificados de maneira bindria, digical, desde as ficeis curvas estatisticas até as representagées complexas de toda a teoria que aparecem nas telas ¢ nos monitores jogam uma sombra ‘Yaw Fustien s na impressionabilidade ¢ na expressividade” de todos os textos cientificos codificados alfanumericamente. A chamada arte computacional ja cria nese momento modelos de experiéncia (configuragoes “impossiveis, fantésticas), que, embora sejam imagens, so baseados em programas codificados digitalmente, que por sua vez podem ser considerados teanscodificagées de textos codificados alfanumericamente, Esses modelos de experiéncia extraordinariamente fortes podem ser considerados, em primeiro lugas, como poesia e fiesio programadas, ¢ 56 entio como “artes plisticas” Portanto, 0 ponto de vista otimista parece ter razio em relacio & programagio de todo escrever: se 0 escrever alfahético sera substituido pela programagio digital, entéo todas as mensagens transmitidas por textos, todos os padrdes de comportamento, de conhecimento ¢ de experiéncia sero transmitidos cde manera mais efetiva¢ criativa por meio das novas midias informaticas. iio devemos, contudo, deixar-nos entusiasmar por esse otimismo. Por meio da programagio de tudo o que foi até agora escrito alfanumericamente, muito se ganharia, todavia o horror dos reacionsrios nao pode de maneira alguma ser rejeitado simplesmente como algo inoportuno. Na realidade, se perderia, por ocasiao da transcodificagio do cédigo alfanumérico em digital, aquilo que poderia ser considerado, nfo apenas pelos reaciondrios, como o mais precioso no escrever: se perderia a lingua falada como mediacio entre 0 pensamento € a escrita, Os cddigos digitais sio ideogrificos no sentido de que eles tornam conceitos (“ideias") inteligiveis. Eles nao representam, ao contririo do alfabeto, sons da fala. O pensamento se desligaria da lingua, por ocasiéo da programagio daquilo que foi escrito anteriormente com o alfabeto. E isso € terrive ‘O escrever, como aprendemos na escola, é um gesto da consciéncia histérica. © programar, como as criangas comeam a aprender, € um gesto de uma consciéncia desenvolvida de outra maneira, comparavel muito mais a uma consciéneia matemitica do que a uma literéria. Os cébdigos, de que elas se servem, slo tio ideogréficos quanto 08 algarismos. % Bindeaclichhet © Ausdricklichhit, respectivamente, no original. Que o pensamento matematico é arhistérico, i nos dizia Witegenstein cm sua observagio de que ndo tem sentido dizer que “dois mais dois é gual a quatro as seis horas da tarde. O pensamento matemitico, todavia, ‘estava até agora embebido organicamente no cédigo alfanumérico, ele entusiasmou-se com a corrente do pensamento historico. Agora, 0 programar emerge a partir do cédigo numérico, desliga-se dele e separa- se da lingua falada, Tsso nos da direico a algum pessimismo. 8. A Lingua Falada Coto 0 paoceanian si DESLIGOU DA RSCRITA ALFANUMERICA, © pensamento nio tem mais de Iaborar por meio de uma lingua falada para se tornar evidente. O desvio por meio da lingua em direso ao sinal, que tio bem caracteriza a cultura ocidental (e as demais culturas alfabetizadas), vai se tornar supérfluo, A confusio entre 0 pensat € 0 falar, que surgiu sob © dominio do alfabeto, ser superada. Uma confusio ‘que é responsivel por chamarmos as regras do pensamento de “légiea" (cegras da linguagem), por utilizarmos a critica lingtistica como método de anilise do pensamento, por a biblia afiemar que no inicio era o Verbo ‘ou por Heidegger afirmar que a linguagem € a morada do Ser. Essa confisio entre o pensar €o falar éna verdade surpreendence. Pois sempre houve outros cSdigas, além do alfabeto, por meio dos quais © pensamento rornavacse evidente: © eédigo da pintura e o da matemética, Jf se era, pportanto, ciente de que o falar é apenas uma variedade do pensamento ¢, por isso, sempre se tentou nomear diversas variedades por um “esignador” comum. Um exemplo impressionante disso é a tentativa (frusteada) de reduzir as regeas da légica ¢ da matemiética a uma s6 (vide Russel / Whitehead: Principia Mathematica). Contudo, o alfabero era 0 cédigo hegeménico, ele eclipsou codes os outros por milhares de anos. Com a superagio do alfabeto, © pensamento vai se emancipar da fala, coutras formas de pensamento nio verbais (matematicas ¢ imagéticas, provavelmente totalmente novas) se desdobrardo de maneira imprevisive O falar, contudo, nio seri de forma alguma superado. Ao contririo: lingua falada, entdo desligada do alfabeto, vai inundar o cenirio. Discos, tas e imagens que falam vio vociferar na sociedade e cochichar-Ihe. ‘Azé mesmo a inteligéncia artificial vai aprender fila. O falar, maneira como a lingua falada & apreendida, serd desenvolvida tecnicamence. O perigo reside na possibilidade de o falar desligado do alfabeto volear 4 selvageria. Nossas linguas passaram por milhares de anos pelo crivo e pela corrosto das telas de impressio do alfabeto ¢ transformaram-se assim em instrumentos poderosos ¢ belos, refinados c precisos. Se lhes sao permitidas a expansio, elas vio barbarizar — ¢ com elas uma boa parte do pensamento, Sem divida, o efeito do aifabeto sobre o falar nio deveria ser subestimado, Se observarmos a cena falada atual, perceberemos que, de ‘muito, a maior parte das conversas e dos escritos é bobagem e nos irrita como algo absurdo. Em torno de 95% do que ¢ falado ¢ escrito so sgramaticalmente incorsetos (enunciados como ‘essa maquina de lavar melhor” ou “Berlin localiza-se no Norte") ¢ nao dizem, na realidade, nada, Um othar sobre um programa de computador tem um efeito de descanso estético, quando escutamos as pessoas falando nas ruas e lemos a corrente de jornais, revistas € romances, Se essa verbosidade e essa demagogia perdessem o dominio sobre pensamento depois da supressio do alfabeto, isso poderia ser visto como uma catarse estética, politica e ‘em termos de teoria do conhecimento. A linguagem ¢ indubitavelmente a maior realizago do espirico, € as linguas que estio a nossa disposigio pertencem aos nossos mais preciosos resouros. Alguns dos inumeriveis aspectos dessa heranga que nos foi concedicla para conservar e ampliar se detalham em seguida. Nossas linguas (as indo-germanicas e as camito-semiticas) “Bexionam-se,ou s¢ja, elas modificam as palavras de acordo com posigio que ocupam na estrutura sintitica da oragio. As oragdes construidas por essas palavras sio'‘pro-posigdes”(“Aus-sagen"): predicados proferidos Por sujeitos. Aquilo que nossas linguas declaram (o universo de nossas linguas) € consticuido, portanto, por situagées projetadas e direcionadas, Por exemplo: a frase “Hinsel ama Gretel” & um projeto de “amu”, que parte de Hiinsel e tem em vista a Gretel Isso nio é valido para todas as familias linguisticas. Em linguas aglutinantes (como, por exemplo, em tupi-guarani), hd colagem de palaveas ao invés de oragbes. Por isso, 0 uuniverso deles (0 que é falado por eles) nao tem carter de projeto, mas sim caréter concreto, Em linguas isolantes (como o chinés), nao hi oragoes. Ao contrétio, ha justaposicio de silabas,¢ ao invés de um carfier de projeto, 0 universo deles ter, por isso, cardeer de mosaico. Enquant nosso pensamento estiver preponderantemente vineulado 4 lingua, estaremos desorientados nesses dois universos, Eles fazem com que nosso pensamento comece a vacilar, porque provam que nosso universo nao & estruturado pela realidade, mas ao contrério, por nossas linguas. Embora tal vacilo seja suportivel, ele mostra também o que nés devemos a nossas Iinguas: elas nos oferecem a rede em cujos nés ¢ linhas pensamos, sentimos, queremos ¢ agimos. Nossas linguas tém a mesma estrutura flexional — se bem que 0 alemo, por exemplo, tende a agutinayées como Donaucampycifabrtshapitin’ (capitao do navio a vapor do Daniibio), e o inglés, ao isolamento, como. “pat” ouset Cada uma de nossas inguas apenas manipula essa estrutura de uma maneira particular, Flas possuem, cada uma respectivamente, ‘uma gramética prépria, Isso permite-nos traduzit de uma das nossas para outras, sem cair, contudo, da rede que nos suporta. E a tradugio & tum método poderoso para ampliar e aprofundar nosso universo. Pois nossas linguas sio sistemas abertos: elas permitem que elementos de outras linguas (Iéxico e gramética) as complementem sem perder seu cariver, Tradugdes nos capacitam a dizer de outra maneira em nossa lingua aquilo que foi dito anteriormente. A variedade, a semelhanga estrutural ¢ a diversidade de nossas linguas nos possibilicam abrie criativamente nosso universo para novos pensamentos, sentimentos, vontades e agées. Essa variedade de nossas linguas tem um outeo lado. Linguas faladas sio fendmenos aciisticos, Cada lingua tem sua prépria melodia, seu proprio ritmo e, precisamente, em aiveis sobrepostos: o dos fonemas sobre o das palavras e o das frases atéo nivel do discurso. Muitas dessas melodias ¢ riemos linguisticos sio convergentes (por exemplo, 2 musicalidade do italiano com a do russo), outras sio completamente diferentes umas das outras (por exemplo, o ritmo do rcheco eo do francés). Nés somos, por conseguinte, capazes de produzir composigbes linguisticas musicais e deixar nosso universo vibrar em afinaydes cada vez mais novas. Nossas linguas sio cédigos nos quais diversos tipos de palavras se cifeam em simbolos, para representar conceitos, e regras de construgao sintética, em regras de pensamento. Trata-se de cédligos duplamente cifrados. Agora, os cédigos tendem em diresio a dois horizontes que se opsem, A denotasio, no qual cada simbolo significa um tinico elemento em seu universo, € 3 conotagio, no qual cada simbolo significa uma regio definida sem precisio e cada elemento no universo & significado por mais de um simbolo. A vantagem de um cédigo denotativo (por exemplo, a ldgica simbélica) & distingao e clareza; a de um c6digo Peradigmeta, no original ir ‘outros estio i fora es6 podem ser alcangados li. A parede da biblioteca, contudo, néo permite apenas, ea exige o gesto revolucionério, porque © ‘outro esti em seu interior. Revoluges sio possiveis apenas no universe histérico da parede da biblioteca, e néo no das imagens técnicas. (b) Abrie: © livro escothido ¢ girado esté sobre a mesa para ser aberto, Enconeramo-nos aqui diante de uma escolha diferente daquela que ‘corre por ocasio da decisio na selegto entre os diversos livros. A cescolha de um entre varios livros pée 0 escolher em xeque, uma vez ‘que nessa ocasito fica ébvio que s6 se pode escolher a partir de uma ‘quantidade limitada, e que, gragas 4 parede da biblioteca que se rornou gigante e que nio pode ser olhada rapidamente, seleciona-se indiscriminadamente ~ guiado por boa sorte ou critérios nfo inerenees a0 liveo" (desse declinio da democracia representativa, falaremos, talvez, depois). Na escolha para abri-lo, a0 contrétio, hd quatro métodos. Abre-se no sumétio, no indice onoméstico ou de assuintos, procuram-se imagens, ox nao se abre e apenas folheia-se. Esse dltimo método, que se esquiva da escolha, deve ser discurido separadamente, Abre-se 0 sumdrio para verificar de que trata o livro, Pega-se 0 brago do outro ndo em fungao desse outro, mas por causa do assunto. Esse abrir em fungio do assunto vé no livro um tratado “sobre”. Quando agente I, esd sobre o assunto pata poder agir nele de cima para baixo. E realmente sedutor querer compreender estatisticamente os leitores que abrem os sumérios. Quantos de nés:nos esforgamos em escalar 0s assuntos para entio mergulhar neles de novo de cima para baixo? Abre-se 0 indice onoméstico ou remissivo para verificar em que ageupamento o autor se encontra, Nao apenas os nomes, também 0s assuntos indicam isso, pois so assuntos comuns a uma sociedade. E abrir esses indices é como pegar 0 brago do outro para participar de seu convivio social. Esse gesto intersubjetivo do folhear encontra no livro 1 Niciehuchbrteron, ao original tum segmenco de dilogo e um convite para entrar nesse didlogo. Muitos liveos, inclusive este, néo tém um registro desse tipo. Nio necessariamente que rejeitem um diglogo com o leitor, mas porque quetem se incorpotar a um grupo social. Por isso, a auséncia de tal registro é para aquele que folheia o livre am abortecimento ¢ uma provocasio: ele irrita-se porque néo sabe com quem esté lidando, ¢ & desafiado a reconhecer 0 outre — esse outro cujo brago ele pegou ~ (e rio pode reconhecé-lo a ndo ser assim). Caso esse desafio seja aceito, poxlesurgic um clidlogo novo e ndo o prosseguimento de um didlogo inicado. Abre-se o livro em busca de imagens para verificar o que se dleveria, nna realidade, compreender em primeiro lugar. Quando se é decente, fazx-se isso com dor na consciéncia, Pois sabe-se que as imagens foram colocadas no livro para que fossem vistas em fungio do que esté escrito, A dor na consciéncia é am sintoma de uma consciéncia histérica perturbada. Dé-se preferéncia as imagens de maneita pré-hist6rica, 20 ins de integré-las ao texto. Aqui, a estatistca também seria wm aunilic: quantos de nds abrimos nas imagens (como as criansas e outros analfabetos) ¢ 0 fazemos a partir de restos da consciéncia pré-histérica ou da nova consciéncia que esté surgindo? Livros sem imagens sio aqueles ue transmitem conceitos dos quais se faz uma ideia ou conceitos que ‘do se quer apresentat, nfo se pode ou nio se quer ilustrat. (O abrir € 0 gesto da escolha de um modo de leitura do livro aberto, Para isso, hi araalmente recursos (par exemple, ficheiros) e também apaelhos de registro" (servigos de resumos, Centros de Documentagio € de Informasio ete.), apoiando-se em técnicas desenvolvidas em smemérias artificiais, de manciea que a escolha na praxis das bibliotecas ‘do acontea mais necessariamente diante da parede, mas que a prépria parede a assuma, Poder escolher é um importante aspecto da liberdade, A tevolusio do girat 0 livro, devem-se seguir as escolhas do abrit, Memétias artficiais nao sio abertas, e mesmo os livros antigos comegam «ase privar das escolhas. Isso pode ser considerado um sintoma do declinio dda democracia representativa © Aafcllagappanes, no exgil Vis Poaseen a (€) Polhear: liberdade compreende poder escolhes; e o ter de escolher revela a falta de liberdade que se faz passar por liberdade. Negam-se, na realidade, duas situagées fronteirigas: aquela na qual a escolha & impossivel por falta de critérios (quantidades que estéo além do campo da visto), ¢ aquela na qual todas as alternativas sio equivalentes (0 asno de Buridan). Por isso, 0 néo poder escolher sportante aspecto da liberdade. Trata-se da liberdade de deixar jogar 0 acaso, Trata-se do gesto de folhear. também é Deixamos as folhas dos livros correrem por entre os dedos, na expectativa de encontrar alguma coisa por acaso que permita enrolat 08 fios tecidos no livro a partir de um fim solto, Hé algo de labirintico nessa busca por um fim do fio de Ariadne. Quando se analisa 0 acaso, encontra-se uma série de causas por tris dele, por exemplo, formas de letras que se sabressaem, cujo objetivo € deixar aqueles que folheiam por acaso” perplexos. Quando se analisam, contudo, as cauisas, encontra-se uma série de acasos por trés delas, por exemplo, as formas de letras que se sobressaem podem ser selecionadas aleatoriamente pelo autor ou pelo tipégeafo encre aquelas que estio disponiveis, As camadas de acaso e de causa armazenadas ummas sobre as cutras, essa estrutura de sanduiche das explicagées, fazem com que 0 folhear se transforme na causa, cuja consequéncia é um modo de leitura especifico pelo qual o livro folheado pode ser decifrado, Assim como os dlversos métodos de abrir. (E 0 que quer dizer exatamente o enunciado 0 cas é uma ordem inexplicada; ¢ a ordem, um inexplicado caos). ‘Nas memérias artifciais auténticas, nao ha folhear. Se ¢ livro tiver de se render as memérias auromatizadas, as informagdes ali armazenadas serio reveladas com métodos mais refinados do que aqueles do abrir e do folhear. Uma ciéncia e uma técnica inteiramente relacionadas 2 esse método estio em gestacio. Nio teri sentido querer virar essa meméria, como se vira a pégina do livro ~ ando ser para os especialistas que venham a conserti-la por ocasiéo de eventuais acidentes. Mas ndo ha cevolugSes que sejam assuntos de cespecialiscas. Estaria assim perdida a chance pouco funcional (néo auromatizada) de viear a pagina, de escolher ou de deixar a0 acaso; cestaria assim perdida a liberdade histérica, que nao é automnatizvel, Somos tracas de liveos, nao por bibliofilia, que se revela atualmente como necrofilia, mas sim por engajamento pela liberdade histérica — ¢ contra aparelhos automiéticos e seres engajados por florestas verdes, Esse ‘nosso “worn-lke feeling’ 0 sentimento de nos alimentarmos de cadéveres (livros), explica nosso horror pelo desaparecimento dos livros. 13. Cartas A eatavra "cARTA” SIGNIFICA, SM ALEMAO, “ESCRITA wilive” (om francés, brevet") e em inglés, “breve resumo escrito’, Em alemio, todavia, ndo é mais usada com esse significado: hé cartas extensas. O ue se quer dizer com isso agora é que ndo sio pensadas para publicasio, ndo sio textos enderesados a0 editor — se bem que imimeras cartas foram editadas e muitas outras parecem dirigir-se a um destinatirio explicito, na realidade pesrancjam em direcio 20 editor. No capitulo anterior, apresentou-se a histéria,0 perfodo do.escrever, como tim estigio intermedisrio entre o caminho da floresta ea terra dos aparelhos aurométicos, Logo, as cartas também sZo apenas um fendmeno intermediario entre aguilo que ressoa da floresta e aquilo que nos dizem 05 automéveis robotizados quando esquecemos de colocar o cinto de seguranga. Que elas sejam um fendmeno intermedia jé € algo que nio se pode desconhecer. Por exemplo: “Em sofrimento, v6s deverieis me chamar" era como talvez, no periodo da pré-escrita,clamava-se por Deus. Na era histérica, havia um mandamento escrita com esse propésito, € atualmente pensa-se no telefone, embora se saiba que nio se pode encontrar 0 namero de que se precisa no catslogo. De maneira estranha, 0 telefone, 0 primeito de todos 08 meios a abo, néo superou os correios. No"PTT” francés", o P permanece como 4 primeira letra e 0°T,a tltima Isso serd diferente assim que o telefone se interligar, por meio dos computadores, a elemérica, 0 que, como ‘© Servgo Postale de Telecomsinicaso (a. do 7] comesamos a reconhecer, nio deve levar a uma estatizacio centralizadora, mas, 20 contratio, pode levar a privatizagio descentralizadora (vejam-se EUA e Japto). Apesar disso, pode-se dizer que a troca de cartas atualmente esti tio sobrecartegada quanto a rede telefenica (e também o “minitel", que acabou de ser introduzido na Franga, esse primeiro precursor da telematica). Deve haver algumma coisa na escrita - na leicura - de cartas que hes permite sobreviver, Eu desconhego se ja se desenvolveu alguma filosofia por meio de ‘woca de cartas. Ela deveria partir de uma anilise do esperar. Cattas saa coisas por que se esperam ~ ou que chegam inesperadamente. Nauralmente, esperar & uma cagoriareligiosssigifie er esperanga. O correio fandamenta-se no Principio Esperanga. Os carteiros, esses gentis Funcionirios medievais,sio anjos (de“angelai” = mensageitos), e 0 que eles carregam sio evangelhos (mensagens felizes conforme a esperanga amparada pelo correio). Nio se diz que no havers mais esperanga quando o corteio desaparecer. As chamadas telefonicas também sao esperadas com receio e temor, ¢ quando o telefone inesperadamente toca, de maneira estidente, trata-se de um golpe ripido totalmente inesperado. Todavia, a espera por cartas tem uma outra duragio © um outro ritmo, Podemos esperar por cartas a0 longo de semanas ¢ essa espera se condensa em horas fixadas do dia. O que foi dito h4 pouco € uma descrigio da duragio e do ritmo de festividades. ‘Talvez, a carca ainda perdure por um breve perfodo porque ela é um dos ‘muito poucos elementos solenes que ainda possuimos. A observagio clas carras deve partir desse ponto: carta como uma publicagio comemorativa, Como tudo que é solene, as cartas também seguem determinados rituais. Por exemplo, eas erazem (normalmente impresso) o endereco do remetente, uma sequéncia descritiva com indicagées de lugar e data de sua produgio, o enderero daquele a quem ela se dirige, um teatamento formal a0 destinarério, Além disso, encerra-se com uma saudacio de despedida tio formal quanto o cumprimento inicial, e é assinada, Cada tuma dessas formulas pode serracionalizada, uma vez que tém uma angio racional intrinseca a0 propésito da carta. Isso é vilido para todos os rituais: os rituais culinarios judaicos, por exemplo, podem set tacionalizados como medidas de higine. Mas ease tipo de, explicagéo ‘angencia 0 mais essencal do ritual, isto 0 fato dese tratar de um gesto 4 absurdo, Esse absurdo fica evidente quando se imagina alguém dirigindo- se oralmente a0 outro por “prezado senhor” ou despedindo-se dele coralmente com um “atenciosamente’, Uma investigagio sobre rituais episcolares do ponto de vista histdrico, geogrdfico e socioculeural (sem considerar outros) nos forneceria importantes contribuigSes para o conhecimento da sociedade. Se compararmos as atuais frmulas fixas com as barrocas, as inglesas com as francesas ou as de uma carta comercial com as de uma carta de amor, teremos perante os olhos critérios formais, para nao dizer, critérios sécio-estruturais, Em relario a carta, trata-se de uma solenidade cujo ritual adequa-se A posigio social daquele que comemora, embora seja ‘catia’ (da qual todos participam). Esses rituais também sio plésticos: algumas férmulas nuangadas esto & disposigéo de quem comemora, € cle préprio as pode modelar. A atual reforma do ritual da igreja est muito distante de ter alcangado essa catolicidade e plasticidade do ritual epistolan. ‘Assim, reconhece-se que a escrita de cartas tem afinidades com o fazer literdrio. A quem escreve sio impostas outras regras, além das da _gramiética e da ortografia (no fazer poético, as das rimas e as dos ritmos), « essas regras adicionais sio solenes: a6 mesmo tempo, racionalizaveis e absurdas,rigidas e lexiveis. Nese caso, duas estratégias ficam em aberto ppara quem escreve: a primeira, a“classica’, na qual o escritor esforga-se para produzir um todo estruturado com as regras e devido 3s regras: a segunda, a “romintica’, na qual ele esforga-se pelo afrouxamento e pela ampliagio criativa das rogras. O oscilar entre o classicismo e 0 romantismo, essa dinamica da poesia ( de toda.a arte), e isso tanto no sentido hist6rico quanto no individual, é caracteristico na escrita de cartas. Em virtude disso, pode ser considerada como uma das artes mais refinadas. Ela & compreendida como se estivesse em decadéncia. Houve épocas de alta florescéncia — como a romana antiga, a da “literatura response” hebraica, a do século XVIII -,e o atual periodo de decadéncia do € 0 primeiro. Ele tem, todavia, um novo cariter, Nao se trata, nesse caso, de um declinio da arte de esceever cartas, teata-se do declinio da arte no sentido tradicional, do declinio da eserita em geral ~ do declinio da atmosfera solene, As cartas sto coladas e jogadas em caixas pretas (gue sio pintadas de amarelo, vermetho ou azul), para serem retiradas, em ourro lugar, das us Astoria «aixas pretas (por exemplo, das caixas postais)e abertas. Todo o processo encontra-se imerso em mistério, em miseésio epistolar, eo mensageito dos deuses, Hermes, é de fato 0 anjo alado que vigia os correios. Esse hermetismo dos corrcios corresponde a todas as caixas pretas,e ele pode ser rompido de maneira cibernética. Assim, o globo tertestre carrega, além de outras esferas (a atmosfera e a biosfera), cambém a esfera dos cotreios, uma rede de canais de correspondéncia que se torna cada vez mais densa, Todavia, essa esfera dos correios nio pode ser considerada como tum sistema fechado (como a biosfera). Ela alimenta-se de plantas prensadas em papel, de homens que escrevern letras e~ quando ainda se escrevia com penas ~ de aves depenadas. Uma vez que nio & um sistema fechado, nio esté ameagada de entropia, mas sim da deterioragio de suas fontes. A desttuigéo da floresta amazénica ameasa a esfera dos correios, assim como 0 declinio do cédigo alfanumérico. Numa previsio. sagaz desse possivel colapso de suas fontes, a esfera dos correios se aliou a dos telégrafos e da telefonia para formar a PT'T. Mas essas duas séo csferas de outra natureza. Blas nao sio mais apoiadas no globo terrestre ~ como navios que transpertam por oceanos; trens e automéveis, sobre a tetra; aviges, pelo ar. Elas trafegam, a0 contrétio, sem apoio, por campos cletromagnéticos. A ligagio com os TT arranca o P da Terra ~ © com isso também de seu mistéxio. A rede de agéncias de correio, que abarca todo o mundo (igual a da francomaconaria), tenta em vao adequar-se a esse desprendimenco da Terra. Em vao, porque ela (como 2 francomagonaria) é essencialmente arcaica, Bla € vista ~ a despeito de todos os seus avatares ~ como os ‘mensageiros romanos, que se apressavam de um posto militar a outta, € como o postilhio que, enquanto tocava uma corneta, ditigia nas cidades medievais. Caso se observe de perto, reconhece-se 0 trovador, ese pocta {que corria de cidade em cidade, Mas é exatamente o arcaico do correi esse gesto arcaico do laerar e do retirar 0 laere, que explica 0 apelo que le ainda exerce, Estamos em vias de nos afastar da Terra corporalmente € principalmente mentalmente, estamos em vias de nos afastat de tudo telativo aos deuses primordiais™, isto é, de deixar para trés tudo 0 que se Chthonishe, no original Vide Foveeee uy apéia na Mie Terra. Temos saudades, por isso, de nossa grande Mae ‘Terra, da caverna do tivero materno, dos mistérios ocultados com os sete selos, de volta aos mistérios eleusinos, cuja forma mais antiga ¢ 0 correio, Kierkegaard descreveu como as cartas, esses paptis esperados com temor ou que surgem inesperadamente, que sio cuspidos do grande ventre dos corteios, sio recebidas. Elas sao, em primeito lugar, decifradas como 0s demais textos. E entio sio lidas suas entrelinhas. Kierkegaard considera que a Biblia também é lida assim, essa carta de rods as cartas; ese assim nao for lida, entio nio &a Biblia. Qualquer texto, entretanto, pode ser lido como uma carta, isto & nao necessariamente de maneira critica, mas em busca de se reconhecer o remetente, Naturalmente, © reconhecimento pode transformar-se em critica quando a carta se revela como mentira, A carta é um modelo para a melhor forma de todos os moddos de ler textos “Temos imagens que nos fazem imaginar a leitura de carras: aquelas da proclamasio da concepgio sem desonra. © mensageiro € 0 arcanjo Gabriel, 0 destinacirio é a virgem, ¢ nds, nascidos tardiamente, interpretamos a surpreendente atitude de Maria rettait-se como reagio 20 falo do anjo, oculto para nés, pelo qual o Logos espermatico supritia virgem, Nao se trata, todavia, de acordo com a teologia, de um proceso psicolégico, mas de umsimbélico” Nao é um falo, mas uma carta que Gabriel traz. Maria reeri-se porque € solicitada a ler essa carta e logo aps a dar & palavea escrita (logos) um corpo. De maneira semelhante, Maomé também deve terse assustado quando o mesmo arcanjo comesou a ditar-lhe 0 Corio (Deus deve ter tentado duas vezes, pois - como sabemos ~ nem sempre o correio funciona corretamente). Trata-se, no caso de Maria, de Maomeé, e em geral na recepgio de cartas, do abrir-se para 0 outro, que emerge ali do mistétio hermérico. Isso ndo é mais possivel nas atuais condigoes dos correies. Hoje, 0 ue chega desse mistévio é quase sempre publicidade (carcas falsas em forma e contetido) e contas a pagar, portanto, cartas que contém ameacas no manifestadas. No caso da publicidade, & descartada mesmo sem ter side aberta, ea contas s4o pagas o mais rapidamente posstvel para serem retiradas da frente. Nessa torrente de papel profana hé também, isoladamente, cartas de verdade, que, quase sempre, s¢ resolvem por si mesmas, quando lhes dedicamos tempo. Os correios atualmente nio 120 servem mais a0 abrir-se a0 outro, mas, ao contrrio, ao fechar-se para os outros; no mais & concepgio sem contaminagio, mas, ao contrério, & concepcio contaminada por medidas de protesio, & concepgio com preservatives, Nao s6 & impossivel ler todos os textos como se fossem ‘artas, como também tornou-se impossivel ler cartas de outras maneiras a nio ser como textos que dever ser criticados. A solenidade das cartas, sua atmosfera religiosa é uma consequéncia dos mistévios das cartas esse misterioso lacre com o qual nés entregamos a earta ao orificio das caixas pretas dos correios. Isso é teligioso, pois si0 2 erenga nos correios ¢ a confianga nele que nos levam a confiar-the nosso segredo, Nés sabemos que, neste momento, deveriamos de maneira sensata tratar os correios com desconfianga. Nenhum lacte, qualquer ‘que seja, pode manter o segredo hoje em dia. A luz profana do iluminismo piiblico penetra em udo 0 que est ciftado e lactado porque a caverna do mistétio ganhou fendas. Aquilo que € piblico, 0 pablico, o impessoal rasgou seus direitos a tudo o que for privado, escuro, nio esclarecido. Atzavés das fendas, 0 impessoal penetra em forma de censura no segredo das cartas. A carta nao se dirige mais apenas ao outro a quem queremos ‘escrever, mas, contra a nossa vontade, ao gaeuno que, todavia, surge sem rosto nas brumas comuns do impessoal, © garano sem rosto oculta na carta os rostos daqueles que querem ser reconhecidos reciprocamente: a festividade nao € absurda, ela tornou-se paradoxal. Cartas sio escritos que nio querem ser publicados, mas que podem penetrar involuntariamente na esfera piblica anénima por meio da censura. O correio € uma caixa preta secreta que sofreu fendas. Redes {que nio tém de se apoiar mais na Terra, mas que vibram sem apoio em campos, tornaram-se portadores de mensagens incersubjetivas. A solenidade e o mistério do escrever e ler cartas se dissolveram. A aticude existencial do esperar, do aguardar, do ter esperansa tornou-se supérflus em virtude da simultaneidade césmica das mensagens transmitidas cletromagneticamente. Ter esperanga nio € mais esperar, ter esperanca tornou-se ser surpreendido, Escrever cartas perdeu todo e qualquer sentido. Todavia, i medida que os teletipos e midias telemiticas mais recentes ¢ ainda mais automatizadas tomarem o lugar das cartas ¢ dos correios, reconheceremos 0 que teremos perdido com a folha de papel ‘chamada carta’: uma das itimas aberturas por meio das quais podiamos View Fuses ta ter esperanga de reconhecer © outro, Pois, de acordo com esse método, as mensagens telemiticas serio sempre decifradas e, de acordo com esse método, elas também serio sempre respondidas, suas entrelinhas, todavia, nio serio lidas. Teremos um now tipo de solenidade, um novo tipo de segredo, uma nova forma de reconhecimento reciproco diante de nés, e ele viré de uma forma to inesperada e sem esperanga que ficaremos surpreendidos demais para poder reconhecer nele novamente a carta, Desaprenderemos a arte de escrever cartas, ainda sem ter aprendido a nova arte da intersubjetividade, a arte computacional. Subteaem-se as cartas (embora esse"se” seja sem rosto, mas vista diversas mAscaras), € nés caimos na massa sem referéncia; nao obstante, pressentimos que os meios de comunicagio de massa comegam a se ramificar em midias intersubjetivas, por meio das quais hd troca de correspondéncias. Apenas essa vaga nosio, parao qual apalavra esperanga € forte demais, permite-nos aguardar 0 ocaso das cartas ¢ dos correios, Uma vaga nogio que comesa a ganhar forma ¢, na verdade, em forma de carta de valor declarado. O cheque é uma carta enderegada a tum banco que se encarrega de dar dinheiro aquele que a traz. Ao invés disso, hé agora cartes de plistico munidos de memérias artificiais. “Talvez, esse cartio bancério inteligente seja um precursor de todas as cartas do faruro. Nao hé em torno dele muita solenidade, mas a0 contrario muico segredo. Pode ser que ~ diferentemente do livro — a carta realizard o salto para o contexto da informécica e que as cartas sobreviverio & escrita, Uma visio do futuro: um globo terrestre embrulhado por cartées de pléstico inteligentes, que zunem como abelhas € que tensionam relagdes inter-humanas como fios de mel com ‘zunidos inaudiveis. Sem chivida, deixamos de ser cupins que perfuram papel e tornamo-nos habitantes celulares que sorvem mel. Uma avaliagio esse progresso deve ser deixada para aqueles que ainda dispsem de valores — ou fingem dispor.

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