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Desenvolvimento Territorial
Rural no Brasil: debates e as
experiências dos NEDETs
Organizadores
Divina Aparecida Leonel Lunas
Hamilton Matos Cardoso Júnior
1
Agricultura Familiar e
Desenvolvimento Territorial
Rural no Brasil: debates e as
experiências dos NEDETs
Divina Aparecida Leonel Lunas
Hamilton Matos Cardoso Júnior
(Organizadores)
Agricultura Familiar e
Desenvolvimento Territorial
Rural no Brasil: debates e as
experiências dos NEDETs
Goiânia – GO
Kelps, 2018
Copyright © 2018 by Divina Aparecida Leonel Lunas, Hamilton Matos Cardoso Júnior (Org.).
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Impresso no Brasil
Printed in Brazil
2018
PREFÁCIO
13
uma análise crítica sobre os caminhos estratégicos adotados pelo
Estado frente às realidades locais.
A agricultura familiar tornou-se um mecanismo estratégico
para o desenvolvimento local, logo, compreender como a produção
agrícola de caráter familiar pode oferecer alternativas para ampliar
as fontes econômicas locais e promover ajustes de ações políticas nos
municípios brasileiros garantindo, assim, impactos sociais, culturais
e ambiental nas comunidades são os objetivos dessa produção textual.
A perspectiva teórica-metodológica delimita-se, num primeiro
momento, em abordar o conceito de agricultura familiar de maneira
a facilitar o entendimento do termo e, desse modo, contribuir para
melhor compreensão da temática. Em um segundo momento,
promove-se discussões sobre as potencialidades da agricultura familiar
para o desenvolvimento local, numa lógica assentada nas questões que
envolvem: a qualidade de vida, trabalho, renda, entre outras variáveis.
A agricultura familiar, apesar de sua complexidade conceitual
e prática, possibilita o aprimoramento da produção agrícola no
contexto das realidades locais. Apesar de se vislumbrar uma
agricultura que tende a cada vez mais se modernizar em consonância
com os ditames do capital, a produção agrícola familiar ainda
permanece como principal recurso de abastecimento, oportunidade
de emprego e renda, além de acesso à terra a muitos trabalhadores
rurais, camponeses, assentados, entre outras categorias vigentes no
setor rural brasileiro, o que configura uma abrangência nacional,
regional e local, de enormes vultos.
Desse modo, importa discutir as influências que a política
neoliberal inseriu no processo de construção de uma agricultura
baseada na produção agrícola moderna a partir do binômio capital-
estado e como se delineou a estrutura conceitual da agricultura
familiar a partir desse momento. O sentido da produção e do trabalho
agrícola familiar no bojo da política neoliberal procurou escamotear
os conflitos e as contradições sociais, políticas e econômicas do
campo, delimitando o espaço das subjetividades camponesas ao
projeto técnico-cientifico em que o mais importante são os números
e as estatísticas. Nesse sentido, é de grande valia estabelecermos
uma reflexão sobre os princípios norteadores do neoliberalismo no
conjunto das interpretações conceituais da agricultura familiar.
14
O Neoliberalismo e o “Fim da História”
15
a política neoliberal implicou no conjunto das transformações que se
operaram no campo, especialmente a partir da chamada Revolução
Verde5. Para além disto entende-se que a política neoliberal
propiciou um movimento de generalizações, cujo objetivo almejava
escamotear os movimentos de contradiscursos atinentes a uma
crítica ao neoliberalismo. Nesse ínterim, cabe acrescentar, em última
instância, as contribuições valorosas de David Harvey (2006, p. 303)
que perscruta ser
A flexibilidade pós-modernista, por seu turno, é dominada pela
ficção, pela fantasia, pelo imaterial (particularmente o dinheiro),
pelo capital fictício, pelas imagens, pela efemeridade, pelo acaso e
pela flexibilização em técnicas de produção, mercados de trabalho
e nichos de consumo, no entanto, ela também personifica fortes
compromissos com o Ser e com o lugar, uma inclinação para a
política carismática, preocupações com a ontologia e instituições
estáveis favorecidas pelo neoconservadorismo.
16
ao tema a que se propõe este texto, a saber, sobre as possibilidades e
potencialidades da agricultura familiar para o desenvolvimento local,
a reflexão sobre a política neoliberal, mesmo que em poucas linhas, é
necessária e comporta, de modo geral, uma inflexão pertinente para
a análise do conceito.
17
São palavras que desde tempos remotos tem duplo sentido.
Referem-se aos que vivem lá longe, no campo, fora das povoações
e das cidades, e que por isso, são também rústicos, atrasados ou,
então, ingênuos, inacessíveis. Tem também o sentido de tolo, de
tonto. As vezes querem dizer também “preguiçoso”, que não gosta
do trabalho. [...] é significativo que a progressiva inutilidade dessas
palavras tenha correspondido aproximadamente ao crescimento das
lutas camponesas e à entrada da situação do campesinato no debate
político nacional (MARTINS, 1983, p. 22).
18
passo em que a luta pela terra foi se intensificando, surgem novos
agentes políticos, instituições, entidades para “representar” os anseios
do campesinato6. É desse processo que concorrem as generalizações.
É preciso abandonar as diferenças, as divergências, as contradições
em prol da unidade, da centralidade, em prol de uma politização
da luta. Já não é mais o caipira, caboclo, caiçara, tabaréu; é agora
o camponês, arrendatário, meeiro, agregado, volante, boia-fria,
pequeno agricultor, agricultor familiar, assentado de reforma agrária
entre outros agentes.
Esse mosaico terminológico revela a complexidade e os enigmas
de qualquer conceito tratado no campo das análises históricas. É
muito difícil abordar a agricultura familiar se negar sua diversidade
semântica. É necessário, portanto, levar à arena o embate político-
ideológico que delineou esse quadro conceitual, que não é um
assunto apenas de uma intelligentsia7, mas, e, sobretudo, do completo
segmento social.
A agricultura familiar se configura, como forma de subsistência,
em uma das mais antigas atividades do homem. As relações sociais
fundadas na produção agrícola e na troca dos produtos resultantes,
culminou em um aumento significativo da capacidade de acumulação
de riquezas, via excedentes. Numa perspectiva ampla, a produção
familiar foi e continua sendo a base de sustentação social e de
reprodução das gerações humanas (FERNANDES FILHO; GEORGE
FRANCIS, 1997, p. 229).
6
É importante destacar alguns pontos dessa afirmação. O primeiro é que, no caso do
Brasil, houve uma intensa manifestação de instituições e entidades, principalmente a partir
da década de 1950, pela representação da luta do campesinato. É o caso por exemplo dos
Sindicatos, do Partido Comunista Brasileiro, das LigasCamponesas, da Comissão Pastoral
da Terra, Comunidades Eclesiais de Base, entre outros. Isto foi importante no processo de
resistência e reivindicações no espaço das discussões políticas em torno da reforma agrária.
Entretanto, por outro lado e em segundo lugar, resultou inegavelmente num arrefecimento
do protagonismo do camponês no campo das discussões políticas. Daí a afirmação de que
as generalizações semânticas são, em relativa contribuição, resultado da intervenção de tais
grupos e instituições no processo e contexto da politização da luta camponesa.
7
Cabe aqui evidenciar que as terminologias, a despeito de uma aglutinação conceitual,
adotadas para designar o trabalhador rural, ou o homem que vive no/do campo, é, em
muitos dos casos, resultado de trabalho intelectual desenvolvido no seio da universidade,
o que não retira seu caráter político-ideológico. O que importa esclarecer é que muita das
vezes a intelligentsia desconsidera as particularidades e as especificidades que permeiam o
campo e o sujeito que nele vive.
19
Com o processo de industrialização e inserção do capital no
campo e na agricultura, alterações se fizeram sentir de maneira
estrutural. A concepção de uma agricultura de subsistência é
transposta, mas não de todo superada, por uma lógica mercadológica.
Nesse ínterim, a própria noção de família se alterou.
Na seara das modificações estruturais e sintomáticas no campo
e na agricultura, decorrência do avanço desmedido do capital na
esfera rural, o conceito agricultura familiar não é novo, porém, sua
operacionalização é que é. De acordo com Altafin (2007) são duas
possibilidades de entendimento sobre o conceito: a) que a agricultura
familiar compõe-se de elementos advindos da modernização
capitalista no campo; b) que a agricultura familiar é um conceito em
evolução que envolve elementos ainda históricos e tradicionais. A
primeira noção implica nas inovações tecnológicas e de implantação
de técnicas de aprimoramento da produção, como mecanização,
potencialização da produtividade do solo via insumos e defensivos
agrícolas, genética de sementes, entre outras revoluções tecnológicas
no setor rural. A segunda proposição refere-se aos elementos
tradicionais, no aspecto dos costumes, valores e saberes que ainda
permanecem, mesmo com o processo de modernização.
Se colocada em discussão, a partir das assertivas alocadas no
parágrafo anterior, uma questão importante: estamos falando de
uma agricultura de tipo familiar ou camponesa? Entenda-se que as
interseções aqui postas não encerram a hipótese que defendemos
neste texto, a saber, de uma flexibilização conceitual. Desse modo,
defende Altafin (2007, p. 2) que “[...] as transformações vividas pelo
agricultor familiar moderno não representam ruptura definitiva
com formas anteriores, mas, pelo contrário, mantém uma tradição
camponesa que fortalece sua capacidade de adaptação às novas
exigências da sociedade”. A posição é de que a agricultura familiar, nos
pressupostos apresentados por Altafin (2007), comporta elementos
do capitalismo e preserva resquícios tradicionais camponeses.
Para Abramovay (1992) a agricultura familiar só pode ser
compreendida a partir de uma análise das transformações estruturais
do processo produtivo agrícola como um todo e que, não obstante,
tem como retórica uma modernização atinente às novas exigências
20
do capitalismo agrário. Defende ainda que a agricultura de tipo
familiar, comporta, não mais em sua essência, uma agricultura de
tipo camponesa, uma vez que ela está “[...] altamente integrada ao
mercado, capaz de incorporar os principais avanços técnicos e de
responder às políticas governamentais, não pode ser nem de longe
caracterizada como camponesa” (ABRAMOVAY, 1992, p. 22).
A agricultura familiar para Abramovay (1992), se insere no
conjunto das modificações encetadas pelo capital agrário. Para o
autor, a produção agrícola familiar é concebida não por sua condição
pura de grupo familiar que emprega força de trabalho numa unidade
produtiva, mas sim e sobretudo, a partir da “[...] própria racionalidade
da organização familiar que não depende da família em si mesma,
mas, ao contrário, da capacidade que esta tem de se adaptar e montar
um comportamento adequado ao meio social e econômico em que se
desenvolve” (ABRAMOVAY, 1992, p. 23).
De outro ponto de vista, Wanderley (1999) assinala que o
agricultor familiar, mesmo inserido na lógica de mercado, não
perde seus hábitos e costumes tradicionais, não perde seus traços
de camponês. Assim, é de dentro do próprio jogo de mercado que
em muitos casos o agricultor tem que empreender sua própria
força para se reproduzir e se manter face as mazelas encetadas pela
modernização.
Importa aquiescer o elemento histórico até aqui apresentado.
Não significa demonstrar que a agricultura familiar é um conceito
rígido e imutável. No desenrolar do processo histórico-social em que
se nota as transformações no modo de vida do homem, as relações
estabelecidas são diluídas no binômio ruptura-continuidades.
Wanderley (1999, p. 49) salienta a existência de uma hipótese coerente
de que mais do que “[...] propriamente uma passagem irreversível e
absoluta da condição de camponês tradicional para a de agricultor
familiar “moderno”, teríamos que considerar, simultaneamente,
pontos de ruptura e elementos de continuidade entre as duas
categorias sociais”.
Numa crítica aprofundada, Fernandes (2012) indica que a
oposição agricultura familiar e agricultura camponesa foi criada no
seio da modernização capitalista na agricultura para designar, aos
21
primeiros, um certo atraso em relação ao contínuo progresso de
desenvolvimento das técnicas agrícolas de produção, enquanto que
ao segundo, estaria contido o novo, o moderno. Para o autor, não se
trata de uma questão de oposição ilustrativa de antigo e moderno,
velho e novo; trata-se e, sobretudo, de compreender o processo de
adaptação do campesinato às novas estruturas. Não significa dizer
que mediante o avanço do capitalismo no campo e na agricultora,
tenha-se que falar somente em agricultura ou agricultor familiar,
mas também em agricultura e agricultor camponês.
No Brasil, nos últimos vinte anos, não foi o mercado que possibilitou
a recriação do campesinato, mas sim a luta política desenvolvida
por meio das ocupações de terra, que se tornou a principal forma
de acesso à terra. Mas, os teóricos da agricultura familiar não têm
referencial para compreender esse processo. Assim, ignoraram a
parte essencial da formação dos camponeses brasileiros hoje: a luta
pela terra (FERNANDES, 2012, p. 4).
22
Apesar dos investimentos e da valorização dos pequenos
empreendimentos familiares pelas instituições mencionadas, existe
uma dificuldade sintomática de compreender as particularidades que
subsistem nos meandros da vida camponesa, afirma a autora. Assim,
Nos termos desses emaranhados de sentidos, advogo eu,
agricultor familiar é categoria sócio-profissional e jamais pode ser
compreendida como estado, pois que não tem sentido em si mesma,
salvo se se acolhem as reificações que lhe dão o estatuto de termo
de mobilização política. Da mesma forma, deve ser compreendido
como resultado de trajetórias diferentes daqueles que, por diversos
interesses, querem assim ser socialmente reconhecidos (NEVES,
2007, p. 17).
23
no dia-a-dia interligadas com práticas e estratégias diferenciadas de
representações diversas de si mesmos e do espaço de transformações
históricas. “Essa reelaboração cotidiana é sentida e experimentada
nas práticas dos sujeitos como experiência de diferenciação e/ou
oposição, gerando contestações de diversos graus e natureza. Essas
questões afetam vários estratos camponeses, posseiros, trabalhadores
rurais sem-terra, ou mesmo pequenos proprietários” (OLIVEIRA,
2009, p. 196).
Se a luta camponesa é uma luta política e contra o capital,
como bem define Medeiros (1981), o movimento histórico que o
engendra perpassa por diferentes interpretações de alterações no
conjunto da sociedade, sendo, portanto, imprescindível corroborar
da flexibilização conceitual. Em suma, compreender a agricultura
familiar é impetrar um profundo entendimento da luta camponesa.
Parte-se do pressuposto de uma flexibilização do conceito de
agricultura familiar para melhor compreensão do mesmo. A resolução
Nº 2191 de 24 de agosto de 19959 e a Lei Nº 11. 32610de 24 de julho
de 2006, ambas atinentes ao Programa Nacional de Fortalecimento
da Agricultura Familiar (PRONAF) e que articulam, no âmbito das
políticas públicas, o acesso ao crédito e financiamento por parte de
agricultores familiares que se encaixam nos quadros do programa e que
implica numa reformulação das estratégias de (re)produção camponesa.
9
A resolução Nº 2191 de 24 de agosto de 1995 institui, no âmbito do Banco do Brasil,
financiamento às atividades agropecuárias exploradas em que se faz uso da força de
trabalho do produtor e de sua família, em que, no mínimo, sua renda bruta anual seja de
pelo menos 80 % proveniente desta exploração. Além disso, a resolução estipula ainda
que para se enquadrar nas normas de beneficiamento de crédito, o produtor não pode
possuir área superior a quatro módulos fiscais (o equivalente a uma variável de 5 a 110
hectares, levando em conta a área do município onde se encontra o estabelecimento agrícola
familiar, bem como o tipo de exploração, produção e renda, etc.); que não mantenha
emprego permanente, salvo se for temporário, de mão de obra de terceiros; que explore sob
condições de proprietário, posseiro arrendatário ou parceiro e que resida no próprio imóvel
ou aglomerado urbano próximo. Disponível em: <http://www.bcb.gov.br/pre/normativos/
res/1995/pdf/res_2191_v3_L.pdf>. Acesso em: 30/05/2017.
10
A definição legal de “agricultura familiar”, segundo a lei nº 11. 326, de 24 de julho de 2006,
afirma o seguinte: “considera-se agricultor familiar e empreendedor familiar rural aquele que
pratica atividades no meio rural...”. Claro que a conceitualização pressupõe alguns requisitos
necessário para o enquadramento definitivo e decisório no acesso ao crédito rural, dentre as
quais já pontuamos em nota de pé de página anterior. Disponível em: <http://www.planalto.
gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11326.htm>. Acesso em: 30/05/2017.
24
Desde 1994, o programa apresentou um crescimento significativo
no que tange aos incentivos creditícios para o desenvolvimento
da produção agrícola de caráter familiar. Nos respectivos anos de
2005/2006, a quantidade de contratos estabelecidos pelo programa,
em nível nacional, alcançou 2,5 milhões. Neste mesmo período, o
financiamento destinado à execução dos contratos ultrapassou 6
bilhões de reais. O maior valor aplicado pelo PRONAF, segundo
o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) e o Instituto
de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), refere-se aos anos
de 2014/2015, respectivamente. Neste período, foram mais de 23,
9 bilhões de reais destinados ao programa. No que se refere aos
contratos assinados do período de 2014/2015, estes atingiram pouco
mais 1,8 milhões11.
Diante os dados apresentados ficam evidentes a evolução dos
investimentos e dos créditos disponibilizados a agricultura familiar.
Não é de se negar a importância do PRONAF para o fortalecimento
continuado das políticas públicas de desenvolvimento da produção
agrícola, especialmente a do pequeno agricultor. Ressalta-se,
ainda, que este instrumento se tornou a principal referência para a
destinação e acesso ao recursos públicos para a agricultura familiar.
Além disso, o programa visa atender aos assentados da reforma
agrária que procuram estabelecer uma produção agrícola sustentável
e reconhecida pela sociedade. Demonstrando uma opção da política
pública brasileira de criar um instrumento que atendesse a todas as
categorias deste agente agora definido por agricultor familiar.
Evidentemente o PRONAF abrange outros aspectos de
valorização da produção agrícola familiar, e que estão inseridos no
conjunto das políticas públicas de acesso à terra e crédito, aos quais,
vale menção aos programas de valorização da mulher do campo;
de incentivos à produção orgânica e agroecologia; da produção de
biodiesel; ATER (Assistência Técnica e Extensão Rural); Programa
11
Os dados apresentados, que respondem à data limite de novembro de 2015, constam
em planilhas subdivididas por Nacional, Unidade da Federação, Munícipios, Amazônia
Legal, Território, Semiárido e Região. A compilação destes dados corresponde ao trabalho
do MDA e do INCRA. Disponível em: http://www.mda.gov.br/sitemda/pagina/acompanhe-
a%C3%A7%C3%B5es-do-mda-e-incra>. Acesso em: 30/05/2017.
25
Nacional de Alimentação Escolar (PNAE)12; Programa Aquisição de
Alimentos (PAA)13; Mais Alimentos; Rede Brasil Rural e assistência
técnica especializada às comunidades tradicionais (indígenas e
quilombolas), entre outros.
Cabe pontuar que estes programas são resultados de lutas
e resistências empreendidos ao longo do processo histórico, por
camponeses, indígenas, quilombolas, entre outros. Necessariamente, tais
conquistas se efetivaram por pressões, manifestações e indignação da classe
trabalhadora, particularmente a camponesa, por vias de organizações e
movimentos sociais, sindicatos, entidades políticas, religiosas, etc.
A política de Reforma Agrária que tem no PRONAF apenas
um elemento de um conteúdo maior contido especialmente no Plano
Nacional de Reforma Agrária (PNRA), certamente é um grande
passo na busca pela melhoria nas condições de vida e trabalho para
produtores, agricultores familiares, trabalhadores e camponeses
no Brasil. Porém, os avanços devem permanecer numa análise
concentrada nas realidades sociais e econômicas destes sujeitos,
devendo ser coerente com as dificuldades que ainda se encontram
no meio rural brasileiro.
26
a agricultura familiar é um conceito de caráter flexível e, portanto,
complexo e subjetivo. Desse modo, a agricultura familiar seria um
conceito portmanteu, no qual se aglutina vários outros termos e
significados, para designar, semanticamente, uma ideia, um conceito,
termo ou palavra.
Partindo do pressuposto do entendimento da complexidade
que envolve a agricultura familiar, não apenas na sua concepção
conceitual, mas também prática, deve-se buscar metodologias
efetivas para que haja, sistematicamente, um desenvolvimento local
a partir do que a agricultura familiar tem a oferecer. Em grande
medida, o que se nota é uma agricultura familiar muito distante do
próprio contexto em que ela está inserida. Tal problemática decorre
de uma operacionalização exacerbada por parte das políticas públicas
destinadas ao setor e, não obstante, de uma autonomia deliberativa
falha, uma vez que o agricultor familiar é submetido às prerrogativas
de uma política que se consolida de cima para baixo, desconsiderando
em grande parte, a realidade local em que se encontra.
Estes são, em tese, alguns problemas sintomáticos. Para a
pretensão deste texto, pontua-se duas questões balizares para um
desenvolvimento local aliado aos princípios da produção agrícola
familiar, são eles: a) valorização, em todos os níveis, no conjunto da
realidade local, da agricultura familiar e de seus protagonistas, ou
seja, os produtores familiares; b) vislumbrar a agricultura familiar
como estratégia de desenvolvimento e fortalecimento dos contextos
locais a partir da geração de emprego e renda e da potencialização de
uma produção agrícola familiar autônoma e sustentável.
O primeiro ponto é um problema histórico. Desde os tempos
coloniais a produção agrícola familiar se apresenta como assessória
e subsistente à monocultura. Em contraposição a um produto de
grande valor no mercado externo, esteve quase sempre, a agricultura
familiar, tida como de “subsistência”14 e/ou “complementar”, como
14
É importante ressaltar que não estamos definindo a agricultura familiar como de
“subsistência”. Chama-se a atenção para o fato de que, historicamente, a produção de
caráter familiar, quer dizer, aquela que emprega força de trabalho da família no campo,
fora e continua sendo marginalizada no conjunto da sociedade. O reconhecimento dessa
marginalização e sua consequente superação é elemento de importância fundamental se
quisermos promover um desenvolvimento local atinente aos propósitos da agricultura
familiar.
27
mantenedora daquele núcleo agroexportador. Ao chamar a atenção
para o fato de que a economia brasileira, de um ponto de vista
histórico e estrutural, esteve entre dois flancos, a saber, os dos grandes
produtos e gêneros tropicais para exportação (açúcar, tabaco, algodão,
café, etc.) e das atividades acessórias ou de subsistência, Prado Júnior
(1977, p. 43) elucida que:
O papel secundário a que o sistema econômico do país, desenvolvido
pela grande lavoura, vota à agricultura de subsistência, determinou
um problema dos mais sérios que a população colonial teve de
enfrentar. Refiro-me ao abastecimento dos núcleos de povoamento
mais denso, onde insuficiência alimentar se tornou quase sempre a
regra.
28
obstáculos e os transforma em trampolim para o êxito. O trabalhador,
oposto ao tipo ideal do aventureiro, é aquele que vislumbra as
dificuldades a serem enfrentadas, no ímpeto do êxito. Seu esforço
é racional e demanda planejamento. Tira proveito máximo do
irrelevante (HOLANDA, 1956).
No caso brasileiro em particular, segundo o historiador,
teríamos sido alvo de maior influência do tipo ideal aventureiro.
Quer dizer que nossa formação histórica inicial se consolidou a partir
de uma “aventura”, de um espirito empreendedor, enfim, de uma
lógica do enriquecimento fácil e rápido. A constatação é precípua
e reveladora do descaso e do abandono mais do que evidente das
atividades iniciadas na pequena lavoura familiar.
Ora, se analisarmos, levando em consideração o contexto
histórico, o discurso dos apologéticos do agronegócio, ter-se-á a
clarividência de uma “naturalização” de suas propostas e ações,
desvelando uma aceitação de amplos os setores da sociedade, inclusive
aqueles por ele marginalizados. O agronegócio representa, no plano
político, econômico e ideológico, os interesses das elites agrarias. Sua
lógica se sustenta a partir do capital, em que se revela a produção em
larga escala de commodities15para a exportação, relegando à produção
agrícola familiar ou camponesa, um papel secundário.
No conjunto das transformações histórico-sociais e econômicas,
há a permanência de uma valorização à produção monocultora.
No plano da luta político-ideológica a retórica de classe das elites
agrárias perpetrou o discurso do progresso político e econômico
concomitante ao agronegócio. Doutro lado, é preciso que se diga, a
respeito da contraposição agricultura familiar e agronegócio, que as
posições de ambos os segmentos se apresentam, e por este fato tem
papel crucial a grande mídia, dentro de uma normalidade e harmonia
falaciosa, em que se absurda de igualá-los16.
15
Matéria-prima ou mercadoria primária produzida em larga escala e de grande valor no
mercado externo.
16
A Rede Globo lançou recentemente uma propaganda em que tenta estabelecer parâmetros
de semelhança entre o agronegócio e a agricultura familiar, o que é falacioso. A propaganda
tem por slogan “agro é tech, agro é pop, agro é tudo”.
29
Ao contrário da agricultura familiar, de onde advém a maior
parte dos alimentos e a geração de empregos no campo, os
grandes estabelecimentos pertencem ao chamado agronegócio,
especialmente ligados à produção de monoculturas, como soja,
milho, cana-de-açúcar e pela criação de gado. Sob as mais diversas
adversidades, agricultores familiares, comunidades tradicionais,
povos indígenas e quilombolas relutam pela permanência em suas
terras, assim como os movimentos sociais rurais, destacadamente o
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), persistem
no enfrentamento à ofensiva perpetrada pelo patronato rural do
agronegócio (XAVIER, 2015, p. 35).
30
da sociedade. Tais elementos de (re)leituras devem buscar encontrar
possibilidades de superação do próprio espaço rural enquanto, tão
somente, espaço de produção de gêneros primários. Turnes e Búrgio
(1999) identificam que o desenvolvimento local está devidamente
relacionado a uma perspectiva em que:
O espaço rural deve ser transformado num local de atividades
econômicas múltiplas e dinâmicas, que permitam às pessoas
que ali vivem acesso a condições dignas de vida, semelhantes
àquelas das regiões urbanas. Esse processo pode ser chamado de
“desenvolvimento local” e definido como um grande “mutirão”
da comunidade (poder público, sociedade civil, movimentos e
organizações populares) na busca de um projeto para o futuro do
seu território, identificando e valorizando os potenciais e riquezas
locais (TURNES; BURGIO, 1999, p. 11).
31
[...] a participação da agricultura familiar em algumas culturas
selecionadas: produziam 87,0% da produção nacional de mandioca,
70,0% da produção de feijão (sendo 77,0% do feijão-preto, 84,0%
do feijão-fradinho, caupi, de corda ou macáçar e 54,0% do feijão de
cor), 46,0% do milho, 38,0% do café (parcela constituída por 55,0%
do tipo robusta ou conilon e 34,0% do arábica), 34,0% do arroz,
58,0% do leite (composta por 58,0% do leite de vaca e 67,0% do leite
de cabra), possuíam 59,0% do plantel de suínos, 50,0% do plantel de
aves, 30,0% dos bovinos, e produziam 21,0% do trigo. A cultura com
menor participação da agricultura familiar foi a da soja (16,0%), um
dos principais produtos da pauta de exportação brasileira (IBGE,
2006, s.p).
32
A agricultura familiar deve ser a base de um novo modelo de
desenvolvimento rural, ressaltando-se seu papel fundamental em
uma política estratégica de segurança alimentar e distribuição
de renda e da riqueza nacional. Além disso, suas características
especificas propiciam indícios elevados de ocupação de mão-
de-obra, o que constitui um importante fator no processo de
desenvolvimento local (TURNER; BURGIO, op. cit., p. 14).
33
Um projeto de desenvolvimento municipal ou mesmo regional,
baseado na agricultura familiar sustentável, não é apenas uma
proposta política para o setor rural, é uma necessidade e uma
condição de fortalecimento da economia de um grande número
de municípios brasileiros. É desenvolvimento com distribuição de
renda no setor rural que viabiliza e sustenta o desenvolvimento do
setor urbano. (DESER, 1999, p. 33).
Considerações Finais
34
por estratégias de (re)produção social. Desse modo, a luta política do
campesinato propiciou uma reflexão acerca da estrutura fundiária
brasileira altamente concentradora.
Acredita-se que a utilização do termo atual de agricultura
familiar é um conceito complexo e de necessária reflexão no campo
teórico e prático, uma vez que expõe determinadas estratégias
políticas, econômicas e ideológicas no quadro da sociedade
brasileira. Inicialmente, tem-se que o conceito abarca um equívoco
terminológico, uma vez que considera apenas agricultor(a) familiar
inserido nos meandros da agricultura moderna. Por outro lado,
advoga-se a favor de uma concepção “híbrida” e flexível do conceito,
em que se procura abordar o agricultor(a) familiar dentro dos
quadros da modernização da agricultura, mas também respeitando
seus valores e costumes tradicionais que lhes são peculiares, ou
seja, resguardando seu caráter de camponês. Nesse sentido, pode-se
afirmar que existe uma agricultura familiar e camponesa.
Sabe-se que a agricultura familiar é a que produz os principais
produtos e a que põe a comida na mesa do brasileiro, com cada
vez mais qualidade e diversidade. Dito isto, seria preciso uma (re)
leitura das prioridades que subsistem no campo político e econômico
para aprimorar e reforçar as políticas públicas que refletem na ação
e reprodução de agricultores familiares no Brasil. Uma proposta
interessante seria imaginar um reordenamento mais equânime dos
recursos financeiros públicos ao setor da produção agrícola familiar,
uma vez que em comparação com o agronegócio os valores destinados
à agricultura familiar são muito baixos.
Uma questão sintomática neste texto é uma valorização que
parte do pressuposto de um reconhecimento social da agricultura
familiar e do agricultor(a) familiar como importantes agentes para
a promoção da democracia e cidadania. Tal reconhecimento deve
vir de amplos setores da sociedade civil, sem exceção. Compreende-
se, portanto, ser da maior importância a agricultura familiar para
o desenvolvimento local, uma vez que os municípios brasileiros
constituem o contexto da realidade local dos agricultores familiares.
35
Referências Bibliográficas
36
Departamento Sindical de Estudos Rurais. Municipalização e Novas
Diretrizes de Desenvolvimento Local para o apoio à Agricultura
Familiar. In: SABOURIN, Eric (Org.). Planejamento Municipal.
Brasília: Embrapa, 1999.
37
JUNIOR, Caio Prado. História Econômica do Brasil. 20ª ed. São
Paulo: Brasiliense, 1977.
38
TURNES, Valério Alecio; BÙRIGO, Fábio Luiz. Desenvolvimento
Local: uma nova forma de ver o espaço rural. In: SABOURIN, Eric
(Org.). Planejamento Municipal. Brasília: Embrapa, 1999.
39
O DESENVOLVIMENTO RURAL
NO TERRITÓRIO RURAL SUDOESTE
DE GOIÁS: ANÁLISE, MEDIDA E
PROPOSIÇÕES
1
Graduada em Ciências Econômicas e Mestranda do Programa de Mestrado Interdisciplinar em
Territórios e Expressões Culturais no Cerrado da Universidade Estadual de Goiás (TECCER/UEG) –
Anápolis – GO
camilavito@yahoo.com.br
41
agricultores familiares e suas organizações, universidades e instância
local do poder público –, seria a tomadora de decisões em relação aos
possíveis investimentos a serem executados.
Posteriormente, houve aprofundamento da política territorial
em municípios que já pertenciam aos Territórios Rurais e que
apresentaram maior vulnerabilidade social. Desta forma, foram
concebidos os Territórios da Cidadania (TCs). Alguns dos critérios
utilizados para a definição destes Territórios foram: menor IDHM,
maior concentração de agricultores familiares e assentados da
reforma agrária, maior concentração de povos tradicionais, maior
número de beneficiários do Programa Bolsa Família, menor renda,
maior número de municípios com baixo dinamismo econômico,
dentre outros.
Grosso modo, a principal diferença entre os Territórios Rurais
e os Territórios da Cidadania está no direcionamento da atuação
governamental: enquanto se busca, nos Territórios Rurais, a inserção
comercial da pequena produção rural, nos Territórios da Cidadania
a intenção passa a ser, também, a inclusão e a melhoria social da
população.
Em Goiás, inicialmente, foram criados sete Territórios Rurais,
mas com a instituição dos Territórios da Cidadania, quatro deles
passaram a ser assim denominados. Os Territórios Rurais (TRs)
criados em 2003 e que assim permaneceram foram: Estrada de Ferro,
Médio Araguaia e Vale do São Patrício. Os que se transformaram
em Territórios da Cidadania (TCs) foram o Das Águas Emendadas,
que engloba além de Brasília, municípios pertencentes ao estado de
Minas Gerais; o Chapada dos Veadeiros; o Vale do Paranã; e, o Vale
do Rio Vermelho. Em 2013, cinco novos Territórios Rurais (TRs)
foram concebidos: Norte, Parque das Emas, Serra da Mesa, Sudoeste
de Goiás e Vale do Araguaia.
Alguns estudiosos fazem críticas à atuação do Estado na
indução dos Territórios. Ortega e Estrada (2015) apontam como
pontos positivos às atuais políticas de desenvolvimento territorial
rural a superação da dicotomia rural-urbano, a estratégia de executar
as políticas em regiões e não mais em municípios isolados e a
mobilização do capital social.
42
Para eles, como pontos a serem melhorados estão o tamanho
e o recorte dos territórios e a presença de conflitos de interesse entre
os atores que dificultam a mobilização do capital social. Geraldi
(2012) defende que a intervenção do Estado na dinâmica social dos
meios rurais apenas serve para reproduzir o modo capitalista de
produção, uma vez que o desenvolvimento é concebido apenas no
viés econômico, onde o sujeito só pode ser reconhecido enquanto
puder consumir.
A fim de impedir esse modo de perceber e executar o
desenvolvimento, Sen (2010) propõe que o desenvolvimento deva
ser um processo de expansão das liberdades individuais a partir de
um comprometimento coletivo de toda a sociedade. Essas liberdades
envolvem não somente a abordagem econômica, mas também
consideram aspectos sociais e políticos. Nesse sentido, entende-se
que as liberdades permitem o fortalecimento de capacidades que
dão autonomia ao indivíduo para gerenciar suas próprias escolhas.
As capacidades, portanto, são fruto das possibilidades às quais
os indivíduos têm acesso e da proporção a qual lhes é permitida
o usufruto delas, o que resulta em níveis distintos de bem-estar,
tanto individual, quanto coletivo. No entanto, parcela significativa
das possibilidades só podem ser fornecidas pelas infraestruturas e
pelos serviços ofertados e mantidos pelo poder público.
Sob tal perspectiva, este estudo se propõe a identificar, por meio
da elaboração do perfil socioeconômico territorial e da mensuração
do Índice de Desenvolvimento Rural (IDR), os gargalos existentes
no TR Sudoeste de Goiás que podem ser corrigidos pelas atuais
políticas de desenvolvimento territorial. Por essa razão, o trabalho
está dividido em duas seções: na primeira são descritos os dados
socioeconômicos para dos municípios integrantes do TR Sudoeste
de Goiás e na segunda é calculado o Índice de Desenvolvimento
Rural (IDR) tanto para os municípios, quanto para o Território em
questão.
A pesquisa documental necessária para a análise do TR
Sudoeste de Goiás foram retiradas do Banco de Dados Agregados
mantido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE),
43
do Atlas de Desenvolvimento Humano mensurado pelo Programa
das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e da Matriz de
Informações Sociais divulgada pelo Ministério do Desenvolvimento
Social (MDS). Na confecção dos mapas, as bases cartográficas
utilizadas pertencem ao Sistema Estadual de Geoinformação
(SIEG-Goiás) e as informações foram pesquisadas no Sistema
de Informações Territoriais (SIT), elaborado pelo Ministério do
Desenvolvimento Agrário (MDA).
A metodologia utilizada para obtenção dos valores territoriais
foi desenvolvida por Ortega e Estrada (2015) que consiste em
calcular a média ponderada entre somatório dos indicadores de
todos os municípios integrantes do TR ou TC, tendo como fator
ponderador a população de cada município, e a população total
do TR ou TC. (ORTEGA; ESTRADA, 2015, p. 286, nota de rodapé
11). Para o cômputo do IDR utilizou-se o método idealizado pela
pesquisadora Kageyama (2004, 2009), cujo detalhamento está
contido na segunda seção.
44
Figura 1 – Municípios pertencentes ao Território Rural Sudoeste de Goiás
Fontes: Elaborado pela autora com dados do SIEG, 2017 e SIT, 2017.
Densidade
População População % Pop. População % Pop. Área
Município demográfica
Total Urbana Urbana Rural Rural (Km2)
(hab/Km2)
Acreúna 20.279 17.696 87,26 2.583 12,74 1.566,0 12,95
Cachoeira de Goiás 1.417 1.171 82,64 246 17,36 422,8 3,35
Castelândia 3.638 3.344 91,92 294 8,08 297,4 12,23
Maurilândia 11.521 11.120 96,52 401 3,48 389,8 29,56
Montividiu 10.572 8.584 81,20 1.988 18,80 1.874,2 5,64
Paraúna 10.863 7.987 73,52 2.876 26,48 3.779,4 2,87
Quirinópolis 43.220 38.163 88,30 5.057 11,70 3.786,7 11,41
Rio Verde 176.424 163.540 92,70 12.884 7,30 8.379,7 21,05
45
Densidade
População População % Pop. População % Pop. Área
Município demográfica
Total Urbana Urbana Rural Rural (Km2)
(hab/Km2)
Santa Helena de
36.469 34.815 95,46 1.654 4,54 1.141,3 31,95
Goiás
Santo Antônio da
4.423 3.372 76,24 1.051 23,76 451,6 9,79
Barra
São João da
1.689 1.277 75,61 412 24,39 287,8 5,87
Paraúna
Turvelândia 4.399 3.138 71,33 1.261 28,67 934,0 4,71
TR Sudoeste de
324.914 294.207 90,55 30.707 9,45 23.310,7 13,94
Goiás
Estado de Goiás 6.003.788 5.420.714 90,29 583.074 9,71 340.103,5 17,65
46
Tabela 2 - Taxa média anual de crescimento populacional dos municípios
pertencentes ao TR Sudoeste de Goiás entre 1991 e 2010 (em %)2
1991-2000 2000-2010
Município
Total Urbana Rural Total Urbana Rural
2
Em 1991 era distrito de Rio Verde, porém teve a população contabilizada.
47
Figura 2 – Evolução do IDHM dos municípios integrantes do TR Sudoeste de
Goiás entre 1991 e 2010
48
A taxa de mortalidade, sobretudo a infantil, permite averiguar as
possibilidades de se alcançar uma vida longa e saudável em determinada
localidade, que também sofre influência da proporção de acesso a
serviços públicos essenciais que elevam as expectativas da longevidade,
uma das dimensões do IDHM. Sen (2010) aponta que, justamente
no período de guerras (1911-20 e 1940-51), a expectativa de vida da
população da Grã-Bretanha elevou-se consideravelmente e identifica
como causa principal os aumentos na oferta de serviços públicos. Nesse
sentido, a Tabela 3 apresenta a trajetória da taxa de mortalidade infantil
e de atendimento com energia elétrica, água encanada e banheiro nos
domicílios presentes no TR Sudoeste de Goiás.
A proporção de mortes entre as crianças com até um ano de
vida no TR Sudoeste sofreu redução de mais da metade de seu índice
no período entre 1991 e 2010, porém com maior intensidade entre na
última década analisada: queda de 47,5%.
Tabela 3 - Evolução da taxa de mortalidade infantil e do número de domicílios
com energia elétrica, banheiro e água encanada dos municípios pertencentes ao
TR Sudoeste de Goiás entre 1991 e 2010 (em %)
Domicílios com
Domicílios com
Mortalidade Infantil banheiro e água
Município energia elétrica
encanada
1991 2000 2010 1991 2000 2010 1991 2000 2010
Acreúna 30,21 22,70 14,20 94,12 98,61 99,80 55,71 84,95 89,99
Cachoeira de Goiás 32,90 30,40 12,80 71,63 98,07 99,35 57,07 99,02 97,05
Castelândia 24,83 23,70 14,00 95,94 99,08 99,78 52,13 85,81 98,56
Maurilândia 28,00 24,00 14,00 93,68 97,90 99,62 57,35 87,27 94,63
Montividiu 25,93 22,30 13,70 73,30 97,67 99,38 57,88 89,28 98,31
Paraúna 26,31 25,90 15,40 82,15 93,96 99,81 60,93 88,87 91,58
Quirinópolis 26,31 22,20 12,20 87,50 99,11 99,92 70,63 91,04 97,33
Rio Verde 25,49 23,95 11,68 94,47 98,30 99,84 78,20 91,52 95,31
Santa Helena de Goiás 26,91 24,80 14,00 96,39 99,05 99,93 69,22 84,91 96,42
Santo Antônio da Barra 30,18 28,50 13,00 88,68 99,87 99,18 46,63 74,87 85,33
São João da Paraúna 29,95 24,70 14,50 76,64 96,50 100,00 41,74 86,14 84,74
Turvelândia 32,40 27,00 14,90 87,96 97,78 97,12 55,83 82,20 87,70
TR Sudoeste de Goiás 26,54 23,91 12,55 91,96 98,34 99,79 70,34 89,22 95,07
Estado de Goiás 29,53 24,44 13,96 87,13 97,25 99,39 65,06 86,07 93,66
49
Entre os municípios, as taxas de mortalidade infantil evoluíram
de modo semelhante e em proporções parecidas. O maior declínio
ocorreu em Cachoeira de Goiás que, apesar de possuir os piores
indicadores em 1991 e 2000, apresentou melhor percentual em
relação ao estado no ano de 2010. Já em Paraúna, a diminuição da
mortalidade infantil foi menos acentuada: cerca de 41,5% no período
1991-2010.
Em relação à existência do mínimo de saneamento básico e
do fornecimento de energia elétrica, o percentual de domicílios
atendidos no TR Sudoeste de Goiás foi superior ao valor estadual em
todo o período analisado, o que indica provisão adequada de serviços
públicos em geral. No entanto, ao longo do tempo, o crescimento
na oferta destes serviços ocorreu de maneira heterogênea entre os
municípios pertencentes ao referido Território.
O fornecimento de energia elétrica ascendeu de forma mais
aguda em Cachoeira de Goiás, Montividiu e São João da Paraúna.
Neste último, em 2010, todos os domicílios possuíam energia
elétrica. Os municípios de Santa Helena de Goiás, Castelândia e Rio
Verde, por possuírem percentuais elevados em 1991, apresentaram
os menores crescimentos relativos neste quesito.
A existência de instalação sanitária e água encanada nos
municípios ocorre em menor proporção se comparados à energia
elétrica em todos os municípios do TR Sudoeste de Goiás e em todos
os anos pesquisados. Os números territoriais indicaram o crescimento
de cerca de 35% nestes itens em duas décadas. Entretanto, a evolução
possui variância significativa entre os municípios: em Rio Verde, a
quantidade de domicílios com água encanada e banheiro aumentou,
aproximadamente, 21,9% entre 1991 e 2010, e, em São João da
Paraúna, a proporção mais que dobrou, com crescimento relativo de
103% no mesmo período. Ainda assim, este município teve a menor
proporção em 2010 dentre os demais.
Assim como a provisão de serviços públicos, a educação é
importante fonte de bem-estar social, pois proporciona o exercício
senso crítico da sociedade, o que confere autonomia às pessoas
enquanto tomadoras de decisão. A “educação constrói confiança,
confere dignidade, e amplia os horizontes e as perspectivas de vida”
50
(PNUD, 2017). Para avaliar o grau de acesso ao conhecimento nos
municípios do TR Sudoeste de Goiás foi elaborada a Tabela 4, que
contém a taxa de analfabetismo entre os adultos e a expectativa de
anos de estudo quando do ingresso na vida escolar por parte das
crianças.
Em todos os anos analisados, a taxa de analfabetismo no TR
Sudoeste de Goiás esteve superior ao nível estadual e a expectativa
de anos de estudo foi melhor apenas no ano 2000, o que expõe a
necessidade de implantação e melhoria das políticas públicas
educacionais nestes municípios.
Tabela 4 - Dados sobre educação dos municípios pertencentes ao TR Sudoeste de
Goiás entre 1991 e 2010
51
períodos analisados. A maior evolução realizou-se em Montividiu,
que possuía a menor expectativa em 1991, mas teve sua média
elevada em 57,9% em 2010, ainda que sua expectativa neste ano seja
intermediária. A menor elevação esteve em Maurilândia, que entre
1991 e 2010 aumentou a perspectiva de tempo de estudo em apenas
3% e obteve redução neste número entre 2000 e 2010.
A educação reflete no padrão de vida do indivíduo através
do rendimento que obtém, das condições de superação da pobreza
e do nível de desigualdade econômica existente na sociedade que o
permeia. A Figura 3 apresenta a trajetória da renda média per capita
mensal para os municípios integrantes do TR Sudoeste de Goiás no
período 1991-2010.
Os rendimentos médios por pessoa do TR Sudoeste de Goiás,
analisado em seu conjunto, estiveram abaixo da renda per capita
estadual nos anos de 1990 e 2000 e, em 2010, foram cerca de 2,4%
maiores em relação à Goiás, fato que sofreu influência da redução
da disparidade entre os índices educacionais estadual e territorial no
último ano observado. Entretanto, em todo o período informado, Rio
Verde foi o único município a obter renda média per capita mensal
mais elevada do Território e acima do valor estadual, o que demonstra
desigualdade econômica entre os municípios do TR Sudoeste.
Figura 3 – Evolução da renda per capita dos municípios integrantes do TR
Sudoeste de Goiás entre 1991 e 2010
52
Em referência aos demais municípios, ao se comparar 1991
e 2010, Castelândia apresentou o maior aumento relativo na renda
per capita (211,2%) e, em outro extremo, Maurilândia revelou o
menor crescimento relativo: 62,9%. Para a maioria dos munícipios,
a renda se elevou com maior intensidade na análise da primeira
década do período, porém este fenômeno foi mais expressivo em São
João da Paraúna, que, entre 1991 e 2000, teve elevação de cerca de
104,9% na renda e, entre 2000-2010, o aumento foi de apenas 11,5%.
Ainda no período 2000-2010, o aumento real da renda somente
ocorreu em Cachoeira de Goiás e Santa Helena de Goiá (70,7% e
77, 3%, respectivamente), pois o crescimento da renda foi superior à
inflação acumulada do período que, conforme o Índice Nacional de
Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), calculado pelo IBGE, foi de
aproximadamente 66,5%
Para averiguar a equidade na distribuição da renda e o nível de
pobreza dos municípios do TR Sudoeste, foram analisados os dados
da Tabela 5. O Coeficiente de Gini é usado para avaliar distribuição da
renda, em que os valores mais próximos de 1 revelam maior grau de
concentração. Em âmbito territorial, o Coeficiente de Gini é elevado,
o que demonstra concentração de renda, embora estivesse abaixo do
índice estadual, entre 1991 e 2010. Entre os municípios, Rio Verde foi
considerado um dos municípios com maior desigualdade econômica,
pois apresentou todos os valores acima do índice territorial em todo
o período analisado.
Tabela 5 - Evolução do Coeficiente de Gini e da proporção de pobres e
extremamente pobres dos municípios pertencentes ao TR Sudoeste de Goiás
entre 1991 e 2010 (em %)
Extremamente pobres
Coeficiente de Gini Pobres (em %)
Município (em %)
1991 2000 2010 1991 2000 2010 1991 2000 2010
Acreúna 0,53 0,57 0,53 30,91 17,21 8,08 10,17 4,71 3,51
Cachoeira de Goiás 0,41 0,52 0,47 27,42 29,63 9,82 5,46 1,77 3,18
Castelândia 0,50 0,61 0,58 43,68 31,41 9,73 21,86 7,90 3,04
Maurilândia 0,51 0,44 0,42 26,45 20,10 5,55 8,85 2,97 0,99
Montividiu 0,52 0,78 0,49 37,27 57,06 4,24 16,45 23,07 1,34
Paraúna 0,56 0,64 0,46 38,96 25,07 7,18 12,67 6,32 3,12
Quirinópolis 0,57 0,55 0,46 35,61 17,34 3,45 7,85 3,16 1,03
53
Extremamente pobres
Coeficiente de Gini Pobres (em %)
Município (em %)
1991 2000 2010 1991 2000 2010 1991 2000 2010
Rio Verde 0,56 0,60 0,54 27,63 13,37 4,43 7,89 3,13 1,15
Santa Helena de
0,53 0,51 0,53 26,86 20,14 5,17 5,05 4,37 1,60
Goiás
Santo Antônio da
0,48 0,51 0,42 39,13 26,36 10,73 19,67 5,45 4,63
Barra
São João da Paraúna 0,40 0,63 0,49 32,99 22,34 12,78 4,80 4,83 2,95
Turvelândia 0,51 0,59 0,45 37,67 28,70 9,11 7,01 15,30 4,30
TR Sudoeste de
0,55 0,58 0,52 30,35 18,17 5,01 8,37 4,47 1,53
Goiás
Estado de Goiás 0,59 0,60 0,55 32,32 20,97 7,59 10,86 6,11 2,32
54
iniciadas a partir dos primeiros anos do Governo Lula, como o
Programa Bolsa Família (PBF), cujo valor médio recebido e o número
de famílias beneficiadas no TR Sudoeste de Goiás nos anos de 2004 e
2013 estão descritos na Tabela 5.
Número de famílias
Valor médio anual recebido (em R$)
Município beneficiadas
2004 2013 2004 2013
Acreúna 643 1.378 273,16 1.922,82
Cachoeira de Goiás - 135 - 1.653,97
Castelândia 219 405 288,65 1.812,61
Maurilândia 44 807 254,50 1.812,72
Montividiu 176 511 418,41 1.835,40
Paraúna 74 662 170,82 1.286,49
Quirinópolis 833 2.490 408,81 1.745,58
Rio Verde 3.949 6.874 422,19 1.382,12
Santa Helena de Goiás 196 1.825 446,99 1.483,07
Santo Antônio da Barra 111 363 473,47 1.742,80
São João da Paraúna - 135 - 1.565,97
Turvelândia - 371 - 1.927,13
TR Sudoeste de Goiás 6.245 15.956 397,80 1.696,61
Estado de Goiás 135.758 340.341 428,99 1.640,80
55
o maior número absoluto de famílias beneficiadas tanto em 2004,
quanto em 2013. Referente ao valor médio anual recebido por
família, o aumento mais expressivo esteve em Paraúna, embora este
tenha apresentado os menores valores em ambos os anos, e a menor
variação proporcional ocorreu em Santa Helena de Goiás.
O aumento da dependência das políticas públicas de
transferência de renda, segundo Ortega e Estrada (2015) denotam
a pouca dinamização das economias locais. Para verificar a validade
de tal assertiva, a Tabela 7 expõe os valores do Produto Interno Bruto
(PIB) para os municípios do TR Sudoeste em 2000 e 2010.
Em 2010, a economia do TR Sudoeste de Goiás foi sustentada,
em sua maior parte, pelo setor terciário, ou seja, pela comercialização
de bens e prestação de serviços, seguindo os parâmetros do estado.
No entanto, parcela significativa dos setores secundário e terciário da
economia de Goiás e, sobretudo, do Território é oriunda da atividade
agropecuária. Conforme Lunas et. al (2015, p. 222), a economia
goiana “é alicerçada no agronegócio com uma produção integrada
para seu beneficiamento através de várias agroindústrias”.
Assim, os municípios de Castelândia, Rio Verde, Acreúna, Santa
Helena de Goiás e Quirinópolis possuem como setor econômico de
maior importância o terciário. A indústria foi predominante apenas
no município de Turvelândia. Os municípios de Paraúna, Montividiu,
São João da Paraúna, Santo Antônio da Barra, Maurilândia e Cachoeira
de Goiás tiveram como base da economia o setor agropecuário.
3
Atualizado pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) anual.
56
Montividiu 123.388 335.728 234.239 4,33 0,18 0,34
Paraúna 98.225 279.828 186.470 5,01 0,18 0,29
Quirinópolis 191.608 772.334 363.748 11,23 0,72 0,79
Rio Verde 987.519 4.160.896 1.874.701 12,19 2,94 4,26
Santa Helena
244.622 537.908 464.389 1,58 0,61 0,55
de Goiás
Santo Antônio
13.059 72.834 24.791 19,38 0,07 0,07
da Barra
São João da
8.681 24.770 16.480 5,03 0,03 0,03
Paraúna
Turvelândia 59.137 193.638 112.265 7,25 0,07 0,20
TR Sudoeste
1.912.363 6.825.079 3.630.419 8,80 5,41 6,99
de Goiás
Estado de
26.249.031 97.575.930 49.831.013 9,58 - -
Goiás
57
de cinco indicadores que resultam da média aritmética de variáveis
selecionadas cujos temas se relacionam à população, à educação, ao
bem-estar, ao meio ambiente e ao desempenho econômico. Todas
estão mencionadas no Quadro 1. Essas variáveis foram obtidas pelo
IBGE, através dos Censos Demográficos de 2000 e 2010, do Censo
Agropecuário de 2006 e do Perfil dos Municípios Brasileiros do ano
de 2008 e, também, pelo PNUD.
Quadro 1 - Variáveis utilizadas para a elaboração dos indicadores que compõem
o Índice de Desenvolvimento Rural (IDR) dos municípios pertencentes ao TR
Sudoeste de Goiás
Indicador Variáveis
Índice de
% de população rural, variação da população rural entre 2000 e 2010 e
população rural
densidade demográfica
(IPOP)
Índice de educação
Taxa de alfabetização e de escolarização da população rural e expectativa de
da população rural
anos de estudo
(IEDUC)
Índice de bem- % de moradores em domicílios com água canalizada, banheiro, energia elétrica,
estar da população geladeira, máquina de lavar roupas, telefone celular, computador e acesso à
rural (IBES) internet e automóvel particular
58
O IDR é, em suma, um número-índice que varia entre 0
(zero) e 1 (um), cujo valor mais próximo de 1, indica maior grau de
desenvolvimento rural. De acordo com o resultado obtido, a base
territorial é classificada de acordo com os parâmetros a seguir para
cada amostra:
1. IDR muito baixo: valores do IDR que vão desde o valor
mínimo até o 1º quartil;
2. IDR baixo: valores do IDR que estão entre o 1º e o 2º quartil;
3. IDR médio: valores do IDR que se situam entre o 2º e o 3º
quartil; e,
4. IDR alto: valores do IDR que vão desde o 3º quartil e o valor
máximo.
Para o TR Sudoeste de Goiás, o valor do IDR territorial foi
de 0,530, classificado como “IDR médio”, em virtude de sua baixa
dinâmica populacional nas áreas rurais e do desempenho econômico
desfavorável. A análise estatística dos valores do IDR para o Território
indicou pouca variabilidade, baixa amplitude e índices próximos ao
valor médio da amostra. A Figura 4 apresenta a classificação do IDR
para o TR Sudoeste de Goiás.
Figura 2 – Índice de Desenvolvimento Rural (IDR) dos municípios que compõem
o Território Rural Sudoeste de Goiás
Fontes: Elaborado pela autora com dados do SIEG, 2017 e SIT, 2017.
59
Na esfera municipal, o maior IDR esteve em Rio Verde, em razão
dos indicadores de população, este impulsionado pelo crescimento da
população rural em 23% durante uma década; de bem-estar, no qual
apresentou elevadas proporções na maioria das variáveis; e, enfim,
de meio ambiente, acarretado pela existência de instituições públicas
voltadas ao meio ambiente e pela não ocorrência de poluição do ar,
de contaminação do solo, de desmatamento e de prejuízo à atividade
agrícola e pecuária.
Em outro extremo, o município de Maurilândia obteve o menor
IDR, devido ao seu fraco desempenho nos indicadores de educação,
com a baixa perspectiva de anos de estudo (8,6 anos); de bem-estar, no
qual obteve a menor proporção de existência de geladeira (87,8%) e
computador com internet (0,0%) e baixa proporção do item máquina
de lavar roupas (13,2%) nos domicílios rurais; e, de meio ambiente,
que, embora tenha tido melhor resultado que Rio Verde em relação
ao não uso de agrotóxicos (79,2%), pontuou negativamente em todas
as demais variáveis ambientais.
O IPOP avalia o dinamismo demográfico do meio rural, neste
caso na esfera municipal, fundamentando-se no crescimento da
população rural e em sua variabilidade e, também, a partir do grau
de povoamento do município como um todo. O índice territorial foi
classificado como “IPOP médio” e atingiu o valor de 0,334. Rio Verde
é o município com o maior valor (0,500) mesmo que seu desempenho
seja equivalente ao valor médio na escala de 0 a 1, considerando que
quanto mais próximo de 1, maior é o desenvolvimento. O menor
índice ocorreu em São João da Paraúna. A heterogeneidade do IPOP
é reflexo da reduzida população rural do Território e do decréscimo
dos residentes rurais em oito dos doze municípios.
O IEDUC relaciona as taxas de alfabetização e frequência
à escola da população rural e a expectativa de anos de estudo das
crianças ingressantes na unidade de ensino para o município em
geral, com vistas a conhecer o nível do acesso ao conhecimento, que
acarreta não só o crescimento econômico, mas também amplia a
conscientização política da sociedade. Dentre os valores municipais,
apenas quatro índices estiveram situados acima do valor médio, o que
demonstra o baixo desempenho educacional do Território. O IEDUC
60
territorial foi categorizado como médio e alcançou o valor 0,595. O
maior coeficiente esteve no município de Cachoeira de Goiás, devido
à maior expectativa em relação ao tempo de estudo (11,5 anos). O
menor IEDUC direcionou-se ao município de Maurilândia.
O IBES refere-se às condições da infraestrutura dos domicílios
rurais e os bens de consumo neles presentes, apresentando o
percentual de moradores que deles desfrutam. Estas variáveis afetam
a percepção da longevidade da população rural à medida em que
revelam importantes aspectos sobre o saneamento básico, a higiene e
a salubridade e acerca de comodidades modernas que, outrora, eram
restritas aos moradores das áreas urbanas. O valor territorial foi igual
a 0,706 e classificado como “IBES médio”. O município de Castelândia
apresentou o maior índice, em razão dos percentuais de acesso aos
serviços públicos, ao saneamento básico e a alguns bens de consumo.
Turvelândia apresentou o menor IBES por possuir os menores
percentuais de existência de saneamento básico e energia elétrica.
O IMA avalia a qualidade e a conservação dos recursos
naturais: ar, solo, água e vegetação, tanto dos aglomerados rurais,
quanto urbanos, haja vista que as externalidades negativas causadas
por danos ambientais afetam a todos os habitantes. A mensuração
dos tipos de problemas ambientais, bem como o aparato institucional
existente para combatê-los é essencial para o meio rural em virtude
de a conservação ambiental e seu uso serem uma das principais
ocupações rurais não-agrícolas atuais. Em nível territorial, o resultado
do IMA foi de 0,690, com classificação em “IMA médio”. O maior
índice esteve em Turvelândia, onde não houve ocorrência ambiental
e existiu órgão público responsável pela gestão do meio ambiente no
município. O menor índice direcionou-se a Maurilândia.
Por fim, o IECOimplica o entendimento de que o
desenvolvimento não deve ser pensado apenas em relação ao capital
gerado na atividade agropecuária, seja este financeiro ou produtivo,
mas que, em contrapartida, considere a melhoria da capacidade
que o agricultor possui de gerir a vida com um emprego estável e
remunerador, a fim de garantir sua permanência no campo. O
desempenho econômico territorial foi considerado baixo, com
resultado igual a 0,385.
61
O maior índice esteve em Castelândia, em virtude do alto
rendimento mensal per capita da população rural (R$ 1.741,68),
que foi 2,6 vezes maior que o rendimento mensal per capita urbano.
Além disso, o município não apresentou proporção de pobres
e extremamente pobres no meio rural e 95,4% dos empregados
em estabelecimentos rurais eram permanentes. O menor índice
foi retratado em Santo Antônio da Barra, em razão do menor
rendimento mensal per capita da população rural (R$ 469,83) e da
baixa produtividade da terra e da mão de obra.
Considerações finais
62
Cachoeira Rio Santa Helena Santo Antônio São João da
Variáveis Acreúna Castelândia Maurilândia Montividiu Paraúna Quirinópolis Turvelândia
de Goiás Verde de Goiás da Barra Paraúna
População 20.279 1.417 3.638 11.521 10.572 10.863 43.220 176.424 36.469 4.423 1.689 4.399
Tx de
crescimento da positiva negativa negativa positiva positiva positiva positiva positiva positiva positiva negativa positiva
população
Êxodo rural não sim sim sim sim sim sim não sim não sim não
superior inferior superior inferior inferior inferior inferior superior superior inferior inferior inferior
Índice de Gini*
0,53 0,47 0,58 0,42 0,49 0,46 0,46 0,54 0,53 0,42 0,49 0,45
IDHM médio alto alto médio alto médio alto alto alto médio alto médio
Mortalidade superior superior superior superior superior superior inferior inferior superior superior superior superior
infantil* 14,2 12,8 14,0 14,0 13,7 15,4 12,2 11,68 14,0 13,0 14,5 14,9
Domicílios com superior inferior inferior inferior inferior superior superior superior superior inferior superior inferior
energia elétrica* 99,80% 99,35% 99,78% 99,62% 99,38% 99,81% 99,92% 99,84% 99,93% 99,18% 100% 97,12%
Dom. banheiro
inferior superior superior inferior superior inferior superior superior superior inferior inferior inferior
e água
63
89,99% 97,05% 98,56% 94,63% 98,31% 91,58% 97,33% 95,31% 96,42% 85,33% 84,74% 87,70%
encanada*
Taxa de superior superior superior superior superior superior superior inferior superior superior superior superior
analfabetismo* 15,57% 15,18% 26,82% 16,03% 10,13% 12,51% 10,51% 6,84% 13,18% 19,93% 12,75% 18,42%
superior superior inferior inferior inferior inferior superior superior inferior superior superior superior
Anos de estudo*
9,78 11,5 8,19 8,62 9,44 8,56 9,78 9,62 9,51 9,69 11,24 10,25
Renda per
664,09 549,16 724,42 557,51 791,60 575,52 761,68 936,75 769,09 502,83 619,67 519,75
capita*
superior superior superior superior inferior superior inferior inferior superior superior superior superior
% pobres*
8,08 9,82 9,73 5,55 4,24 7,18 3,45 4,43 5,17 10,73 12,78 9,11
% extremamente superior superior superior inferior inferior superior inferior inferior superior superior superior
superior 4,63
pobres* 3,51 3,18 3,04 0,99 1,34 3,12 1,03 1,15 1,60 2,95 4,30
% da população superior superior superior superior superior superior superior inferior superior superior superior superior
beneficiária PBF 20,06 26,98 33,16 20,70 14,04 18,07 16,28 11,06 14,65 24,07 22,68 24,83
médio médio alto muito baixo baixo muito baixo muito baixo alto médio baixo médio
IDR baixo 0,529
0,548 0,530 0,554 0,389 0,521 0,465 0,498 0,582 0,532 0,525 0,549
e de contaminação do solo, prejuízo da atividade agropecuária por
ocorrências ambientais, e, especificamente em Maurilândia, ausência
de órgão gestor do meio ambiente e de Conselho Municipal de Meio
Ambiente.
Em Quirinópolis, ainda foram observadas deficiências no
desempenho econômico, como baixo rendimento rural per capita,
poucos estabelecimentos rurais pluriativos e reduzida produtividade
da terra e do trabalho.
Referências Bibliográficas
64
ORTEGA, A. C.; ESTRADA, E. M. Desenvolvimento em territórios
rurais: estudos comparados de Brasil e Espanha. Campinas: Editora
Alínea, 2015.
65
POTENCIAL PARA O
DESENVOLVIMENTO RURAL
SUSTENTÁVEL DA AMAZÔNIA POR
AGRICULTORES FAMILIARES
67
partir das cadeias produtivas existentes (HOMMA; SANTOS, 2015).
A inclusão produtiva passa pela garantia das condições para que os
agricultores possam produzir, beneficiar sua produção, comercializar
o produto de seu trabalho e gerar renda. Essencialmente precisa ser
um projeto pensado a partir das condições e capacidades locais, sem
dependência de recursos, conhecimentos e tecnologias alheios aos
produtores (MEDINA; POKORNY, 2011). Se a inclusão produtiva
não é resolvida nessa geração, há o risco claro de desestruturação
das cadeias produtivas existentes, aumentando a dependência de
programas governamentais assistencialistas, com poucas chances de
se tornarem emancipatórios.
Já existe o entendimento conceitual de que a inclusão
produtiva passa pela valorização e reconhecimento do protagonismo
dos agricultores e das comunidades locais, pela construção de
propostas produtivas a partir dos conhecimentos, interesses e
capacidades locais (OSTROM, 1999). No entanto, ainda falta, na
Amazônia, a sistematização de experiências práticas consolidadas
de desenvolvimento local que possam servir de exemplo (MEDINA,
2012; BARBOSA, 2015).
Além do desenvolvimento dos sistemas produtivos adaptados
às condições socioeconômicas e ambientais da região, os agricultores
enfrentam o desafio de garantir o reconhecimento e apoio do
Estado. Tradicionalmente, grandes madeireiros e fazendeiros têm
tido mais sucesso em legitimar seus sistemas de produção do que
os pequenos produtores da Amazônia (MEDINA et al., 2009). Para
isso, as comunidades precisam superar as fragilidades institucionais
locais e interagir efetivamente com instituições externas, em especial
com agências de governo (DOVE, 1993; MUÑOZ et al., 2007;
BROCKINGTON, 2007).
Para analisar os potenciais e desafios do desenvolvimento da
Amazônia por agricultores familiares, este artigo reúne as lições
de quatro anos de acompanhamento das atividades tradicionais
de criação de búfalos, uso florestal e manejo de pesca. O estudo
busca compreender: a) as possibilidades de inclusão produtiva
das populações locais como forma de garantir o desenvolvimento
sustentável da Amazônia; b) a viabilidade de se apoiar sistemas
68
produtivos construídos por produtores locais a partir das atividades
que eles já desenvolvem, considerando seus conhecimentos,
interesses e capacidades; e c) o papel do Estado e outros atores-chave
no apoio ao desenvolvimento rural na Amazônia, em particular no
apoio à inclusão produtiva das populações locais.
O estudo de campo foi realizado junto a comunidades
ribeirinhas do município de Porto de Moz, no Pará, cuja área rural
é ocupada há mais de cem anos por populações que vivem da pesca,
da criação de animais, do uso da floresta e da agricultura. Este artigo
traz um resumo de alguns dos sistemas produtivos avaliados.
69
Figura 1: A criação de búfalos tornou-se uma das atividades mais importantes para
a população rural de Porto de Moz nas últimas três décadas. Das 107 comunidades
e localidades rurais em Porto de Moz, em 65 há famílias criando búfalos.
70
Moz, em 61% das comunidades e localidades rurais, há famílias que
trabalham com a criação de búfalo; esse número chega a 100% se são
consideradas apenas as comunidades de áreas de várzea.
Um dos principais desafios produtivos das famílias está
relacionado à alimentação adequada para os animais, em particular
na época das cheias, quando os animais jovens não conseguem
pastejar e os adultos têm que nadar por muito tempo para encontrar
capim nativo.
No sistema de criação característico das áreas de várzea,
às margens dos rios, as famílias constroem casas tipo palafitas e
maromba onde os animais descansam e são tratados na época da
cheia. Nesse sistema, o principal desafio é garantir alimentação para
o gado no período das cheias, em particular para os bezerros que não
conseguem nadar grandes distâncias à procura de pastos.
As principais alternativas técnicas construídas pelos criadores,
considerando as condições ambientais e de investimentos existentes
são o manejo de pastagens naturais e a complementação alimentar.
O sistema de manejo de pastagens naturais desenvolvido pelas
famílias consiste na rotação de áreas entre o período de cheias e de
baixa das águas. Para isso alguns criadores já estão construindo duas
marombas: uma, mais próxima do rio, para manter o gado no período
de águas baixas, e outra, no fundo da propriedade que geralmente é
mais alta e menos afetada pela cheia, para manter o gado durante a
subida das águas. As famílias que vivem em áreas de transição e ainda
não construíram sua segunda maromba, costumam levar o gado para
os tesos (áreas mais altas sem floresta) e ilhas (áreas mais altas com
floresta), onde os animais permanecem durante o inverno.
A complementação alimentar tem sido feita em particular para
os animais pequenos e para as búfalas no período pré e pós-parto.
As principais propostas técnicas implementadas pelos criadores são
o fornecimento de capim na maromba e o preparo de área de recreio
na ilharga da maromba:
• Fornecimento de capim na maromba - Tem sido feito por
todas as famílias que têm apenas áreas de várzea. As famílias
cortam capim nos campos ou às margens dos rios para os
bezerros e búfalas que ficam na maromba durante o período
71
préparto que ocorre no período das cheias. Nessa época do
ano, o capim fica com as folhas secas e duras, obrigando os
criadores a fornecerem muito talo de capim rabo-de-rato
(o preferido pelos criadores) para os animais. Os criadores
informam que os talos são preferidos pelos animais pois as
folhas normalmente já estão palhadas (duras).
• Preparo de área de recreio na ilharga da maromba - Tem
sido adotado por diferentes criadores. Algumas famílias
começaram a fazer quadras (piquetes) próximas à maromba
para reservar pastos para a época das cheias. Essas áreas
servem como fonte de capim a ser fornecido aos animais
jovens na maromba ou para ser pastejada com mais facilidade
por estarem próximas dela.
72
O principal desafio atualmente enfrentado pelos agricultores é
a restrição das linhas de crédito pelos bancos resultado do impasse
sobre a manutenção da atividade. O crédito é fundamental para
os criadores conseguirem reformar suas marombas de forma a
resistirem aos períodos de cheias na região.
Cheias recentes implicaram em perdas de rebanho
principalmente porque os criadores não tinham a infraestrutura
necessária para abrigar a criação. A solução definitiva passa pelo
reconhecimento e apoio ao desenvolvimento sustentável do sistema
de criação existente que é anterior à criação da reserva.
73
• De 1990 a 1996 – Introdução de máquinas pesadas por
grandes empresas e disputa por grandes áreas de floresta para
a retirada da madeira;
• De 1996 a 2004 – Elaboração de planos de manejo em
presariais, muitas vezes em áreas griladas, e apropriação dos
espaços de uso das comunidades ou famílias.
74
A maior parte das comunidades produz madeira serrada
com o uso de motosserra (esteio, falca, barrote, flechal, viga, tábua
e ripa) e fabrica canoas e barcos de pequeno e médio porte para o
mercado local e regional. Em Porto de Moz, 64% das comunidades
e localidades rurais têm famílias que trabalham com madeira em
maior ou menor escala.
A espécie madeireira a ser explorada é definida no ato da
encomenda feita pelo comprador, que determina ao extrativista a
espécie, o tamanho e a quantidade de peças, de acordo com o mercado
de destino. A principal espécie explorada pelas comunidades em
Porto de Moz é a itaúba (Mezilaurus itauba) por sua alta densidade
e durabilidade. A itaúba é altamente resistente à água e utilizada em
praticamente todos os tipos de construções rurais e naval.
Para a confecção de braços para as embarcações, o piquiá
(Caryocar villosum) é a espécie mais utilizada. Para a produção de
móveis são usados muiracatiara (Astronium lecointei), angelim-
pedra (Hymenolobium petraeum), angelim-rajado (Marmaroxylon
racemosum), louro-faia (Euplassa pinnata), cedro-cheiroso (Cedrela
odorata) e marupá (Simarouba amara). Espécies de alta densidade
como maçaranduba (Manilkara huberi), cumaru (Dipteyx odorata),
ipê (Handroanthus serratifolius e Handroanthus impetiginosus),
jatobá (Hymenaea courbaril) e angelim-vermelho (Dinizia excelsa)
são destinadas, sobretudo, para o mercado de Belém. Já madeiras
brancas, como jabutirana (Erisma uncinatum), quaruba (Vochysia
paraensis), marupá (Simarouba amara) e cedrorana (Cedrelinga
cataeniformis), são usadas para paredes de casas e barcos (MENEZES
et al., 2015).
A madeira é retirada principalmente em três tipos de áreas,
concebidas a partir de seu uso:
• Áreas particulares – Os lotes particulares são geralmente
áreas de 100 ha localizados nas margens dos rios e, embora
não tenham marcos físicos estabelecidos, são reconhecidos
pelos moradores de maneira informal. A família explora sua
área individual de acordo com suas necessidades, força de
75
trabalho e espécies disponíveis. A exploração nessas áreas
tem diminuído bastante em função da redução dos estoques
das principais espécies.
• Áreas comunitárias - Mais de 10 comunidades demarcaram
áreas comunitárias para resistir à invasão das madeireiras
antes da criação da Resex. A exploração acontece em área
comum, normalmente demarcada nos fundos das áreas
particulares. Seu uso acontece a partir de normas es
tabelecidas pelo conjunto de moradores de uma determinada
comunidade que, em tese, não aceita a entrada de estranhos
para explorar madeira. Em geral, essas áreas concentram
os maiores estoques de madeira e funcionam como reserva
da comunidade que a demarcou para uso futuro ou para a
elaboração de plano de manejo.
• Áreas de livre acesso – Essas áreas geralmente estão nas
ca
beceiras de igarapés ou em estradas abandonadas por
empresas madeireiras, afastadas dos núcleos comunitários
e dos lotes individuais. Elas normalmente são exploradas
por grupos de famílias específicos, às vezes de diferentes
comunidades, embora seja mais comum que famílias da
mesma comunidade tra balhem juntas. Esse, a princípio,
parece um caso clássico de recursos de livre acesso e, portanto,
de difícil governança (OSTROM, 1990). Mas, na maioria dos
casos, áreas específicas são exploradas por grupos específicos
de famílias e podem ser consideradas áreas de uso comum ge
renciadas por um grupo mais privativo que uma comunidade
maior.
De modo geral, a escolha da área a ser explorada é feita a partir
da espécie desejada, da proximidade das vias de acesso (estrada
aberta por empresas e abandonadas ou vias de acesso por igarapés) e
da ausência de conflito com moradores das proximidades. Quando a
exploração é feita em pequena quantidade, ela ocorre principalmente
nos lotes particulares.
No entanto, comunidades que têm áreas comunitárias estão
explorando ou planejam explorar essas áreas. Famílias que já
76
exploraram os lotes particulares e moram em comunidades que não
têm área comunitária, buscam áreas afastadas e de livre acesso e são
suscetíveis a conflitos na disputa com outros moradores.
O tipo de área explorada tem influência na forma como é
feita a gestão do recurso. Nos lotes particulares, é comum que
a família dona da área faça a exploração ou venda a árvore em pé
para serradores da comunidade, que pagam, em média com 30% da
produção. Nas áreas comunitárias, as iniciativas em curso têm con
siderado os acordos firmados entre os moradores e, em alguns casos,
inclui benefícios para a comunidade quando a floresta é explorada
comercialmente. As áreas afastadas normalmente são exploradas por
grupos de famílias sem normas estabelecidas.
As famílias desenvolveram um sistema de produção tradicional
que inclui práticas como:
77
derruba a partir do atrito do facão ou machado no tronco das
árvores e análise do som emitido. Alguns serradores também
fazem o teste através da perfuração com a ponta do sabre da
motosserra (em posição horizontal) até o âmago da árvore.
• Processamento (serragem) - A serragem da madeira é
realizada no próprio local de queda da árvore, utilizando-se
apenas a motosserra para desdobro. A árvore é serrada em
tora de acordo com o comprimento desejado para as peças.
Em seguida, a tora é marcada com uma linha (barbante)
envolvida em óleo queimado (óleo lubrificante já usado e
com coloração escura). A primeira serragem divide a tora em
duas partes (bandas), que são posicionadas com o lado da
serragem para cima. Novamente a madeira é marcada com o
barbante nas laterais, para a primeira serragem de retirada do
brancal (alburno) de ambos os lados da banda.
• Transporte - O transporte é feito com o uso de rodado, tração
animal (normalmente com búfa los), jerico (microtrator),
bufete (caminhão velho) ou manualmente carregando-se a
madeira serrada ou deslocando-se as toras com o calango
(MENEZES et al., 2015). Para as famílias que têm acesso ao
bufete ou jerico, as árvores são processadas em até cerca de 8
km das margens dos rios ou igarapés, que servem como via
de escoamento. Para as famílias que usam rodado ou tração
animal, as árvores são processadas no máximo a 3 km das
margens dos rios e igarapés. A abertura dos ramais é feita de
forma manual com a roçagem da vegetação rasteira com facão
ou foice, seguida da derruba de árvores mais grossas com
motosserra e posterior destoca. O trabalho de abertura dos
meios de acesso para o transporte das peças é posterior à sua
serragem. Isso evita que o produtor desperdice seu trabalho,
pois, se o ramal fosse aberto primeiro e as árvores fossem
impróprias para serem transformadas em peças, haveria
perda de tempo e recursos. Os ramais normalmente são
abertos em direção às peças que deverão ser transportadas.
78
O maior desafio das famílias em Porto de Moz é o
reconhecimento legal de suas práticas tradicionais de uso florestal.
As exigências formais do Plano de Manejo Florestal Sustentável
(PMFS) são muito distantes das práticas tradicionais, dos interesses
e das capacidades das comunidades. Como alternativa, as famílias
têm buscado o reconhecimento de seu sistema de uso da floresta por
parte dos órgãos ambientais, fazendo com que seja respeitado o modo
de vida e os costumes locais, ou ao menos, adaptado nas regras do
manejo os métodos tradicionais de extração dos produtos da floresta,
por meio de práticas mais simplificadas e de baixo impacto.
Essa situação cria um impasse que não parece ter fim
próximo, senão pela ressignificação e flexibilização das exigências
normativas em favor dos extrativistas com a constituição de sistemas
de governança locais que favoreçam o controle da atividade sem a
imposição de normas externas, possibilitando a constituição de um
manejo florestal adaptativo de acordo com cada realidade local.
Os grupos familiares, as comunidades e os órgãos ambientais
concordam sobre a importância do planejamento das atividades
que pode resultar em um plano de manejo florestal. O plano ajuda
as comunidades a atingirem seus objetivos de geração de renda de
forma planejada, a partir do melhor uso possível dos recursos e
ajuda também o governo a atingir os objetivos de ordenamento e
conservação das florestas, o que permite o controle da madeira que
é comercializada. Portanto, existe consenso sobre a importância do
planejamento para desenvolver a atividade florestal.
Manejo de pesca
79
Figura 3: Famílias de várias comunidades usam os ambientes de
pesca; daí a importância de que elas participem dos acordos.
80
intervenção de atores externos. Esse processo tem apresentado bons
resultados quando não há risco de invasão de pescadores de outras
localidades, quando a pesca se destina apenas à subsistência dos
moradores e quando a quantidade capturada de pescado é pequena e
não afeta, no longo prazo, os estoques existentes.
Contudo, quando a pesca tem finalidade comercial, a situação
muda. À medida que o mercado demanda maior quantidade de
pescado e o preço aumenta, a tendência é que pescadores também
aumentem sua produção. Para isso eles geralmente adquirem
equipamentos com maior capacidade de captura ou aumentam o
tempo das atividades de pesca. Isso, aos poucos, vai quebrando as
formas tradicionais de uso desses recursos podendo, em pouco
tempo, gerar crise de escassez das espécies com maior demanda.
Nesse caso, é necessária a elaboração escrita e a regulamentação
das regras estabelecidas pelas famílias para garantir maior controle
das ativida des pesqueiras e assegurar a participação de órgãos
reguladores. Assim, as comunidades que, sozinhas, não consigam
fazer valer as regras do acordo, podem contar com o apoio do poder
de polícia do Estado.
Para isso, é fundamental que os órgãos do Estado estejam abertos
a parcerias com as comunidades e reconheçam esses acordos. Nesta
seção são apresentadas algumas das experiências das comunidades
ribeirinhas do município de Porto de Moz que já avançaram em seus
acordos:
• Rio Acaí – As comunidades têm controle do acesso aos
recursos pesqueiros pelas normas estabelecidas desde 1993.
O acordo foi regulamentado pela Secretaria de Estado de
Pesca e Aquicultura por Instrução Normativa;
• Rios Coati e Cupari – O acordo não está sendo cumprido
por moradores. O parecer do procurador do ICMBio foi
contrário à normatização do acordo;
• Rio Jaurucu – A pesca é moderada nos períodos de maior
produção, sobretudo para subsistência. O acordo foi entregue
ao ICMBio e as comunidades esperam por posicionamento;
• Rio Uiui – O controle da pesca do acari foi estabelecido,
as comunidades respeitam os períodos estabelecidos para
81
a captura comercial, usam apetrechos em acordo com o
estabelecido nas normas. O acordo tem doze anos com
resultados no repovoamento do rio, principalmente com
acari. O acordo escrito foi entregue ao IBAMA, mas sem
posicionamento sobre a regulamentação;
• Rio Majari - Acordo frágil com descumprimento por parte
das famílias locais que pescam comercialmente. As famílias
conseguiram fazer reuniões para decidir as normas do acordo
mas a implementação ainda é um desafio;
• Rio Acaraí – O acordo de convivência foi criado em 1996
e envolve a relação com os diferentes recursos dos rios e
floresta. As famílias estão revitalizando o acordo, refletindo
sobre os resultados e formulando novas regras de convivência.
Conseguiram manter a exploração dos recursos de maneira
estável, sem conflitos e sem exploração predatória;
• Rio Peituru - Os pescadores locais estão cumprindo o acordo
com resultados já percebidos no aumento da quantidade de
pescado. Contudo, há invasão de pescadores estranhos às
comunidades. As comunidades conseguiram pactuar normas
gerais para controle da pesca e mantêm a gestão do acordo
baseada no diálogo entre pescadores externos e internos.
82
não passam pelo poder legislativo e, portanto, não são leis.3
A publicação do acordo é feita pelo órgão responsável pela gestão
da área onde estão as comunidades. Como exemplo, uma Reserva
Extrativista é unidade federal gerida pelo Instituto Chico Mendes de
Conservação da Biodiversidade (ICMBio) que é responsável pelos
acordos dentro da unidade. Uma comunidade em área de jurisdição
do Estado do Pará tem a Sepaq como responsável pela aprovação do
acordo.
Esses órgãos são criados por leis e, portanto, têm poderes
para expedir diferentes tipos de atos administrativos para gerir o
espaço sob sua jurisdição. É nesse sentido e contexto que os atos
administrativos (IN e portarias) são usados para regulamentar os
acordos comunitários de pesca no interior da Amazônia.
As comunidades são consideradas pelos órgãos gestores como
“usuárias” dos recursos naturais, cujo “dono” é um ente da federação,
o Município, o Estado ou a própria União e, portanto, sua gestão
está subordinada a um desses entes. Na prática, quem regulamentado
os poucos acordos reconhecidos é o órgão que está mais próximo
fisicamente ou que é demandado pelas comunidades.
Considerações Finais
83
o apoio necessário para sua consolidação. A inclusão produtiva
dos produtores familiares deve ser priorizada como alternativa de
desenvolvimen to sustentável da Amazônia com inclusão social,
geração de renda e manutenção dos recursos naturais (MEDINA et
al., 2015).
A ação de inclusão produtiva das populações locais a partir
de seus sistemas produtivos deve ser imediata, para aproveitar a
oportunidade que pode deixar de existir em curto espaço de tempo.
Caso mais uma década seja perdida sem um projeto claro para a
região, o êxodo rural, a marginalização dos produtores familiares e a
desestruturação das cadeias produtivas podem inviabilizar qualquer
tentativa posterior (MEDINA; BARBOSA, 2015).
Como exemplo, no caso da criação tradicional de bubalinos
em Porto de Moz, a suspensão do crédito rural após a criação da
Resex deixou as famílias sem condições de fazer os investimentos
mínimos necessários para superar os desafios das cheias na região.
Também a insegurança sobre a manutenção das atividades produtivas
tradicionais após a criação da reserva fez com que muitas famílias
considerassem deixar a zona rural para se arriscar a um futuro incerto
na sede do município. De cidade de vida pacata tradicional, Porto de
Moz transformou-se num dos municípios mais pobres do Pará, onde
já se multiplicam as áreas de favela e a criminalidade (HOMMA;
SANTOS, 2015).
A inclusão produtiva dos agricultores familiares deve começar
pela valorização das atividades e formas de produção existentes. O
potencial para se apoiar essas atividades é enorme, pois as populações
locais já estão produzindo, têm experiência no que produzem e têm
propostas de melhorias, como demonstram os sistemas locais de
criação de búfalos, de uso florestal e de manejo de pesca apresentados
neste capítulo. Falta a elas o reconhecimento do valor de suas práticas
pelo governo e o apoio para implementar as melhorias que planejam.
As propostas externas pensadas para a produção familiar
na Amazônia até hoje ou ficaram restritas a áreas demonstrativas
subsidiadas ou não conseguiram gerar resultados que atendessem
a diversidade e a demanda desse público (MEDINA; POKORNY,
2011). Exemplos incluem os programas de pagamento por serviços
84
ambientais apoiados pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA) e
os produtos da sociobiodiversidade promovidos pelo Ministério do
Desenvolvimento Agrário (MDA).
A melhor ilustração da disfuncionalidade das propostas
externas para a Amazônia vem do modelo de manejo florestal
comunitário pois são poucas as experiências existentes e nenhuma
delas tem viabilidade financeira (MEDINA; POKORNY, 2011). Os
modelos tecnicistas são pensados sem considerar as práticas, os
interesses e a capacidade das famílias. A alternativa de governança
florestal apresentada pelas comunidades dentro de suas condições
tem grande potencial e cabe ao governo ressignificar sua concepção
de manejo florestal para apoiar as iniciativas locais.
Os agricultores familiares têm propostas práticas e viáveis e
são capazes de implementá-las (OSTROM, 1999). O conjunto de
sistemas descritos neste capítulo mostra que eles desenvolveram,
estão desenvolvendo ou podem desenvolver alternativas para
a consolidação e crescimento de suas atividades. Mas, além do
desenvolvimento dos sistemas produtivos adaptados às condições
socioeconômicas e ambientais da região, os produtores enfrentam o
desafio de garantir o reconhecimento e apoio do Estado para seus
sistemas produtivos.
Tradicionalmente grupos de grandes madeireiros e fazendeiros
têm tido mais sucesso em legitimar seus sistemas de produção do que
os pequenos produtores da Amazônia (MEDINA et al., 2009). Para
isso, as comunidades precisam superar as fragilidades institucionais
locais e interagir efetivamente com instituições externas, em especial
com agências de governo (DOVE, 1993; MUÑOZ et al., 2007;
BROCKINGTON, 2007).
O Estado tem, sim, papel fundamental na promoção do
desenvolvimento local. Sem o reconhecimento do Estado, os sistemas
de gestão locais são frágeis, principalmente diante de ameaças
externas, como invasão de madeireiros, geleiras e grandes produtores
(BARBOSA, 2015). Cabe ao Estado legitimar e apoiar essas propostas,
de forma a garantir-lhes a robustez e o respaldo necessários.
Considerando todas as limitações que o Estado
(particularmente os órgãos ambientais) tem para atuar na região
85
(falta de recursos, de pessoal, de infraestrutura e de conhecimento da
realidade), a estratégia de investir em parcerias com as comunidades,
em substituição à abordagem atual de comando e controle, pode ser
muito promissora.
No caso dos acordos de pesca em Porto de Moz, por exemplo, ao
regulamentar o acordo do Rio Acaí, a Secretaria de Estado de Pesca e
Aquicultura do Pará (Sepaq) fortaleceu as comunidades e promoveu
a boa gestão dos recursos. Por outro lado, quando o Instituto Chico
Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) não aceitou o
acordo dos rios Coati e Cupari, por defender um plano de manejo
geral e não local das atividades da Resex, os recursos pesqueiros
ficaram desprotegidos e as comunidades foram penalizadas.
Para apoiar o desenvolvimento local na Amazônia, cabe ao
Estado evitar criar novas restrições que desestruturem as experiências
produtivas em curso e passar a apoiá-las. Diferente de outras regiões
do Brasil, onde os produtores rurais têm a segurança necessária
para investir em suas propriedades, na Amazônia existe insegurança
causada pela questão fundiária, pelo avanço da fronteira, pela falta
de clareza e continuidade das ações e pela falta de relação do Estado
com os agricultores familiares.
Um produtor florestal de Porto de Moz, por exemplo, não pode
trabalhar porque não consegue atender às normas do governo para
o manejo florestal comunitário e o governo não abre diálogo para
a possibilidade de construir alternativas conjuntas. Uma questão
importante é: quais as regras do jogo para a produção familiar na
Amazônia, principalmente em Unidades de Conservação de Uso
Sustentável?
Referências Bibliográficas
86
BARBOSA, C; MEDINA G. Acordos de pesca. In: MEDINA, G.;
BARBOSA, C. (Org.). Experiências Produtivas de Agricultores
Familiares da Amazônia (Segunda edição). Goiânia: Kelps, 2015.
200p.
87
MENEZES, M.; BARBOSA, C.; MEDINA, C.; TRINDADE, N.;
CAVALCANTE, T. Extração tradicional de madeira. In: MEDINA,
G.; BARBOSA, C. (Org.). Experiências Produtivas de Agricultores
Familiares da Amazônia (Segunda edição). Goiânia: Kelps, 2015.
200p.
88
AGRICULTURA FAMILIAR EM
PIRENÓPOLIS/GO: BREVES
PERSPECTIVAS
89
a substituição da mão de obra pela mecanização. A perspectiva é
perceber como o trabalho na agricultura familiar vem se mantendo
nas áreas rurais, objeto desta investigação.
A família se apresenta como o elo capaz de proporcionar
ligações entre a terra e o trabalho, buscando mecanismos para a
geração de produção que satisfaça mais do que a subsistência dos
integrantes da composição familiar, mas que propicie possibilidades
de inserção em vários outros contextos não só de produção como de
comercialização, mas também, e principalmente, na sociedade cada
vez mais ampla e dinâmica em que vivemos.
Como estudo de caso, são abordadas duas propriedades a
partir de seus contextos históricos relacionados à propriedade da
terra, por meio da bibliografia disponível e com apoio em entrevistas
com os proprietários, que são os condutores das narrativas sobre o
processo de trabalho e de manutenção da família na propriedade e
da implantação da agricultura familiar e orgânica no município de
Pirenópolis.
Terra
90
fins militares e formar milícias sob seu comando”. Diante da posse,
“era-lhes, no entanto, permitido ficar com dez léguas, não contíguas,
e o restante deveria ser repartido, em regime de sesmaria, às pessoas
que as requeressem” (SILVA, 2004, p. 28).
Para evitar transtornos, o governo português buscou reproduzir
no Brasil as distribuições de sesmarias, um antigo instituto lusitano
“como única forma possível de viabilizar o povoamento: diante
da vasta extensão de terras e do reduzido número de pessoas”
(ALENCAR, 1993, p. 23). Mas, como relembra a autora:
91
sua escravaria para tais atividades. Porém, lavoura e pecuária já
faziam parte de um amplo esquema que possibilitava a subsistência
dos moradores.
92
fez-se, posteriormente, através de ‘brechas’ na legislação: os cartórios
locais aceitavam, por exemplo, os contratos de compra e venda dessas
terras, que se tornavam, desta forma, ‘legalizadas’” (1993, p. 25).
A ampliação quantitativa de estabelecimentos rurais voltados
à agropecuária em Goiás, após a mineração foi apresentada por
Estevam (2004, p. 40): “em 1756 havia, em Goiás, 500 sítios de
lavoura; em 1769, os sítios com roças estabelecidas somavam 1.647
e, em 1828, foram detectados 2.380 aproximadamente”. Talvez o
incremento da ocupação territorial tenha sido reflexo de incentivos
governamentais dispensados a tais empreitas.
Em 18 de setembro de 1850, foi promulgada a Lei nº 601,
mais conhecida como A Lei de Terras, que “buscou apreender a
questão fundiária em toda a sua complexidade e ordenar o quase
caos instalado após o largo período sem qualquer ordenação. Porém,
entre a lógica do documento e a realidade do país havia ainda uma
grande distância” (ALENCAR, 1993, p. 27). Segue a referida autora
apontando para a introdução do “princípio de usocapião na legislação
brasileira”. A posse da terra passa a ser, única e exclusivamente, por
compra, o que alterava o sistema anterior, baseado na influência
social e materializado em títulos de sesmarias.
Outra prática lusitana a que se recorreu foi a do padroado,
quando houve aexigência, pela Lei de Terras, do Registro Paroquial,
sendo “que o possuidor era obrigado a declarar a extensão de sua
terra ‘se fosse conhecida’ (art. 100). Além disso, as declarações dos
possuidores deveriam ser aceitas pelos Vigários” (ALENCAR, 1993,
p. 31).
Os Livros de Registros Paroquiais, nos quais os vigários
assinavam, reconhecendo, mesmo que com erros, as dimensões das
propriedades, representam fontes para se estudar as propriedades
rurais em Goiás “apesar de ser uma documentação que data de 1856
a 1861, é de suma importância, pois suas informações reportam à
primeira metade do século XIX e, em boa medida, ao período de
1822 a 1850” (SILVA, 2004, p. 65).
Continua ela descrevendo que em tais livros há registros de
“fazendas que supostamente foram recebidas por sesmarias e depois
vendidas, ou apossadas, em seguida repartidas, dadas em herança e
93
vendidas pelos herdeiros” (p. 67). Diante das várias possibilidades
de obtenção da posse de terras, a pesquisadora supracitada elaborou
uma tabela com os Registros Paroquiais goianos, da qual extraiu-se as
informações referentes a Meia Ponte, atual município de Pirenópolis,
contidas no Livro 9:
94
(1971) que indicou 35 grandes propriedades rurais que abarcavam
todo o município. Destas, duas remontavam ao século XVIII e duas
outras ao XX, cabendo à centúria intermediária 31 propriedades. A
computação das datas remete à primeira menção ao ano mencionado
e não à primeira transmissão, que, em muitos casos, foram adversas
à datação.
São dois os registros a serem aqui destacados:
[...] às margens do ribeirão “Mar e Guerra”, existe uma propriedade,
cujo primeiro dono, por nós alcançado, foi Manuel de Sepúlveda,
natural da freguesia de Sampaio, do arcebispado de Braga. De seus
herdeiros, adquiriu-a o comendador João Luiz Teixeira Brandão,
que a vendeu a João Floriano de Mendonça que, a 4 de maio de
1880, a transferiu, por 800$000, a João Mendes Ribeiro, natural
de Tamanduá, Minas Gerais. Em 25 de abril de 1886, João Mendes
Ribeiro e sua mulher, Bárbara Alves Peixoto, a venderam, por
400$000, ao capitão Jerônimo José de Siqueira, de cujos herdeiros a
houve, em 17 de setembro de 1908, Guilherme Pio Lopes que, em 25
de julho de 1913, a traspassou a seu irmão, Sansão Mamedes Lopes,
de que a houve José Antônio (JAYME, 1971, p. 418).
O segundo registro:
O “Engenho de São Joaquim”, famosa fazenda, mais conhecida, hoje,
por “Babilônia”, pertenceu ao comendador Joaquim Alves de Oliveira.
Compreendia dez sesmarias, excluindo-se a fazenda “Bernarda”, que
também faz parte do enorme patrimônio daquele opulento feudal
meiapontense. Com a morte do comendador Oliveira, ocorrida a
4 de outubro de 1851, todos os seus bens passaram para o domínio
de seu genro, comendador Joaquim da Costa Teixeira, que não
teve filhos legítimos, havendo tido, entretanto, com Eugênia de
Gouveia, contemplados em seu testamento: Luiz Francisco, Maria
Jesuína e Joaquim. Com a morte do comendador Costa Teixeira,
que sobreviveu à espôsa, parte de seus imensos haveres, havidos do
sogro, passaram para o domínio daqueles três bastardos, inclusive a
fazenda de que se trata. Em 29 de dezembro de 1868, Luiz Francisco
da Costa Teixeira vendeu uma gleba, por 350$000, a Luiz Manuel
Moreira Farinha, e, em 19 de maio de 1869, vendeu o resto do que
lhe coube, situado no lugar denominado “Custódio dos Santos”, por
300$000, a Antônio Tobias da Trindade (JAYME, 1971, p. 424).
95
passaram a desenvolver atividades de agricultura familiar em suas
propriedades. A justificativa de delimitação do estudo ocorreu devido
às propostas diferenciadas praticadas nas áreas rurais mencionadas,
assim como a atuação familiar junto à produção.
Trabalho
96
e de 1828 em Meia Ponte, quando eram 27 as propriedades (SALLES,
1992, pp. 255-260).
Ainda sobre a Lei de Terra há que se destacar que “objetivava
também a consolidação do monopólio dos fazendeiros sobre a mão-
de-obra, estendendo-o sobre a terra. Tudo isso para garantir a distinção
hierárquica entre proprietários e trabalhadores” (REINATO, 1990, p.
90). Ou seja, a submissão destes àqueles, em função da propriedade
e controle da produção, uma vez que a fazenda era “modelo de
organização social”, conforme aponta Arrais (2016), para quem:
[...] a base da economia goiana, no século XIX, constituiu-
se, fundamentalmente, pela agricultura de subsistência e pela
pecuária extensiva. Ainda assim, esse conjunto de atividades pouco
diversificadas e regionalmente articuladas com a rede de vilas e
povoados, não implicou isolamento absoluto (p. 25).
97
de ferro a Anápolis e a consequente mudança em relação à terra,
quando:
A estrutura fundiária, por seu lado, dava mostras de concentração:
15,0% dos 16.634 estabelecimentos agropecuários media até 40 ha,
porém cobria apenas 0,15% da área total; 28,0% dos estabelecimentos
media de 40 a 200 ha, cobrindo uma área de 2,03% da superfície e
57,0% dos estabelecimentos media acima de 200 ha cobrindo área
equivalente a 97,8% do território considerado” (ESTEVAM, 2004,
p. 89).
98
contingente” (ESTEVAM, 2004, p. 105) predominavam nas novas
propriedades locais. Mineiros que não se limitaram àquela colônia,
espalhando-se por várias regiões do território goiano, devido aos
baixos preços das terras e pela grande fertilidade das áreas, até então,
pouco cultivadas, conforme explica Borges (2000, p. 253):
[...] com a fronteira “aberta” até os anos 60, Goiás recebeu um
grande contingente populacional de outras unidades da federação,
principalmente de Minas Gerais. Formado tanto por trabalhadores
pobres como por grandes fazendeiros, este contingente chegou
ao Estado em busca de terras de cultura a preço acessível para a
exploração da agropecuária. O intenso movimento migratório foi,
portanto, o fator responsável pelo grande crescimento populacional
da época.
99
Quadro 2: Taxa de urbanização em Goiás (1960-2010)
Décadas 1960 1970 1980 1991 2000 2010 2014
Taxa de urbanização 30,0% 45,8% 67,6% 80,8% 87,9% 90,3% 91,4%
Fonte: www.ibge.gov.br (dados adaptados pelos autores para uma casa decimal).
Família
Em Goiás o vínculo familiar com a terra é bastante expressivo,
pois grande parte da população possui um antepassado que teve
100
ligação com a propriedade rural. Assim, a posse, a vivência e os
trabalhos agropecuários compuseram o cotidiano ou permanecem
compondo o ideário goiano.
Se no passado as famílias possuíam e mantinham as grandes
propriedades, com o tempo elas foram se desmembrando por herança
ou venda, em específico no abandono do rural rumo ao urbano. Há
de se considerar, ainda, que a manutenção da pequena propriedade
ficou muito dispendiosa e a concorrência com o grande produtor
agropecuário, que mantém produção mecanizada, inviabilizou os
trabalhos do pequeno camponês.
Não obstante, muitas famílias decidiram, com todas as
dificuldades, se manterem no pedaço de terra que pertenceu a seus
antepassados, no intuito de possibilitar condições de vida mais
saudáveis ligadas ao campo, mesmo considerando que “no debate
político nacional, ainda persiste a dificuldade de se reconhecer,
no contexto da diversidade do campo brasileiro, a importância de
atores sociais como os pequenos produtores na cadeia agropecuária”
(ARRAIS, 2016, p. 42). Situação que tem se alterado com as ações e
programas voltados para a agricultura familiar.
Dois documentos direcionam as propostas de agricultura
familiar no Brasil: o Dossiê Estatístico elaborado pelo fundo das
Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação em parceria com o
Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (FAO/INCRA)
e a Lei 11.326/2006, que estabelece as diretrizes para a formulação
da Política Nacional da Agricultura Familiar e Empreendimentos
Rurais. O primeiro apresenta três características principais, a saber:
I – a gestão da unidade produtiva e os investimentos nela realizados
são feitos por indivíduos que mantém entre si laços de sangue ou
de casamento; II – grande parte do trabalho é igualmente realizado
pelos membros da família; III – a propriedade dos meios de
produção é pertencente à família e é em seu interior que se realiza
sua transferência em caso de falecimento ou de aposentadoria dos
responsáveis pela unidade produtiva (FAO/INCRA, 2000, p. 8).
101
da Agricultura Familiar e Empreendimentos Rurais, considera
agricultor familiar aquele que:
I – não detenha, a qualquer título, área maior
do que 4 (quatro) módulos fiscais; II – utilize
predominantemente mão-de-obra da própria família
nas atividades econômicas do seu estabelecimento ou
empreendimento; III – tenha percentual mínimo da
renda familiar originada de atividades econômicas
do seu estabelecimento ou empreendimento, na
forma definida pelo Poder Executivo; IV – dirija seu
estabelecimento ou empreendimento com sua família.
102
apenas 12,6% da área regional e 12,7% dos financiamentos” (INCRA/
FAO, 2000, p. 18). Segue destacando que a região Centro-Oeste é
responsável por apenas 3,9% das propriedades brasileiras voltadas à
agricultura familiar.
Em relação à ocupação laboral “a agricultura familiar é a
principal geradora de postos de trabalho nomeio rural brasileiro”,
sendo “responsável por 76,9% do Pessoal Ocupado (PO). Dos
17,3 milhões de PO na Agricultura brasileira, 13.780.201 estão
empregados na agricultura familiar”; enquanto no Centro-Oeste o
índice é de apenas 54% (INCRA/FAO, 2000, p. 25-6).
Ao que se refere à renda anual obtida pelo agricultor familiar
brasileiro, o Relatório INCRA/FAO (2000, p. 37) menciona que 8,2%
apresentam renda negativa ou nula, enquanto 68,9% obtêm lucros
entre zero e R$ 3.000,00; o que demonstra que a lucratividade é
bastante pequena, o que pode ser considerada um desestimulador
para a permanência do pequeno produtor no campo.
Os dados relativos a Goiás (IBGE, 2009) apontam quase uma
década de distância das informações disponibilizadas no Relatório
do INCRA/FAO (2000), e indicam que são 88.436 estabelecimentos
familiares que ocupam 3.329.630 hectares, com média de 37,6 hectares
por estabelecimento; sendo que 24 mil deles estariam espalhadas por
mais de 400 assentamentos goianos.
Medina, Camargo e Silvestre (2014, p. 16) assinalam que “em
Goiás, a produção anual de alimentos pelos agricultores familiares
é significativa”, com destaque para a mandioca, o arroz, e o leite.
Apresentam comparações entre a contribuição da agricultura familiar
para a produção de alimentos no Brasil e em Goiás: Mandioca (Brasil
87% e Goiás 66%), milho (Brasil 46% e Goiás 9%) e arroz (Brasil 34%
e Goiás 45%).
Continuam os autores asseverando que “a agricultura
familiar gera trabalho e renda em Goiás” (2014, p. 18) a partir de
dados contidos no IBGE (2009): “há 213 mil pessoas exercendo
atividades em estabelecimentos rurais familiares, 130 mil homens e
74 mil mulheres”, havendo melhoras na situação econômica destes
trabalhadores. Outro ponto positivo é a segurança fundiária para
investir no desenvolvimento de suas propriedades.
103
A situação fundiária dos agricultores familiares em Goiás
retratada pelo IBGE (2009) os divide em: sem área (1,9 mil),
arrendatários (2,6 mil), ocupantes (2,9 mil), assentados (6,5 mil)
e proprietários (74 mil), o que adverte ainda para o não acesso à
propriedade por muitos trabalhadores rurais. Ou mesmo por pessoas
interessadas a lidar com a terra.
A classificação dos imóveis rurais pelo Instituto Nacional de
Colonização e Reforma Agrária (INCRA) define como minifúndio
o imóvel com área inferior a um Módulo Fiscal (MF); pequena
propriedade a que possui entre um e quatro MF; média propriedade as
que apresentam entre 4 e 15 MF, e grande propriedade aquela superior
a 15 MF. Lembra também que o Módulo Fiscal é uma medida variável
por município (www.incra.gov.br). Na prática, observou-se que até
mesmo os órgãos governamentais, ou a eles ligados, padronizam a
união das categorias minifúndio à de pequena propriedade por ocasião
de apresentação e divulgação de relatórios ou documentos.
Destarte, ao estudar a estrutura fundiária goiana recente
Teixeira Neto (2011, p. 135) observou a seguinte estruturação que
remonta aos dados relativos ao ano de 2003:
[...] a pequena propriedade, que muito cresceu em
todos os aspectos entre 1996 e 2003, passando de
67.589 para 103.035 estabelecimentos (aumento de
52,4%), de 2.494.594 ha para 4.495.084 ha (aumento
de 80,2%) de área total, de 36,9 ha para 48,5 ha de
tamanho médio (aumento de 31,4%).
104
Quadro 3: Dados Fundiários de Pirenópolis (2003)
105
Duas pequenas propriedades voltadas para a agricultura
familiar em Pirenópolis, que não participam da feira, são o foco da
abordagem proposta: a Chácara Mar e Guerra e a Fazenda Custódio
dos Santos.
Historicamente, recorrendo à cadeia dominial, a Chácara Mar
e Guerra teve como mais o antigo pertencimento a Fazenda Mar
e Guerra. Enquanto a Fazenda Custódio dos Santos surgiu como
desmembramento da antiga Fazenda Engenho de São Joaquim (atual
Fazenda Babilônia), conforme exposto anteriormente no final do
subtítulo: Terra. As propriedades em destaque pertencem, desde o
início da década de 1950, a pequenos agricultores oriundos de Minas
Gerais que em processo de migração para Goiás acabaram por
estabelecerem-se em Pirenópolis.
Os patriarcas foram, respectivamente, os agricultores mineiros
Franklin Luiz Rabelo e Geraldo Rezende Mesquita. O primeiro
comprou propriedade próxima a Pirenópolis, onde habitava com a
família de nove filhos. O segundo adquiriu e habitava, com os onze
filhos, terras próximas ao povoado de Caxambu.
Com o falecimento dos patriarcas as propriedades foram
colocadas em inventários, cabendo a partilhas aos descendentes.
Os protagonistas passam a ser então Geraldo Vilela Rabelo e
Gabriel Divino de Mesquita, que mantiveram a denominação das
propriedades herdadas e nelas permaneceram cuidando da terra e
constituindo família.
Geraldo contraiu matrimônio com Maria Aparecida Veiga —
filha de tradicional família pirenopolina também ligada aos trabalhos
agrícolas — com quem teve duas filhas. Sempre moraram na terra
que herdara e que possui extensão de 2,0 ha (0,5 alqueire goiano),
situada a 3 km da cidade, pela GO-338.
Gabriel casou-se com Maria Albertina de Freitas Mesquita,
filha de migrantes mineiros que se deslocaram para Goiás também
na década de 1950 e tiveram duas filhas e um filho, que habitam
e auxiliam nos trabalhos de agricultura familiar da propriedade
composta por 14,4 ha — o que corresponde a três alqueires goianos
— situada a 25 km de Pirenópolis, pela GO-431. A Figura 1 traz a
localização de ambas as propriedades.
106
Para melhor visualização no mapa, a Chácara Mar e Guerra (1)
e a Fazenda Custódio dos Santos (2) foram indicadas junto com os
povoados, o distrito e a cidade de Pirenópolis.As duas propriedades
possuem atualmente menos de um Módulo Fiscal (MF) referente
à cidade de Pirenópolis, que corresponde a 35 ha; classificando-
as, de acordo com os parâmetros estabelecidos pelo INCRA, como
pequenas propriedades de agricultura familiar.
107
a gente vendia assim: a casa ficava aberta ao comércio, o freguês
chegava, os vizinhos chegavam e compravam alface, couve e cheiro
verde, o que dava uma renda não muito grande, mas ajudava muito
[...]. Até hoje os vizinhos mais antigos que moravam ali se lembram
dos produtos que eram muito bons, a gente nunca usou veneno.
Então era um sacolão permanente (RABELO, 2017).
108
foi criado um e-mail em que a cada semana era postada a oferta
dos produtos disponíveis e os consumidores montavam suas cestas
encaminhando-as virtualmente, e em dia determinado a família
passava realizando a entrega na residência dos clientes.
Concomitante à agricultura familiar a Chácara Mar e Guerra
inseriu-se em no projeto de turismo rural “Vale Verde de Verdade”,
proposto pelo IPEC e financiado pelo Ministério do Turismo, e que
teve por objetivo “a busca da integração da comunidade rural do
Vale Mar e Guerra, na atividade turística da cidade” (RABELO, 2011,
p. 22). Na descrição da inserção no projeto aparecem as seguintes
informações:
[...] a Chácara do Seu Geraldo — onde se realiza a Agroecologia,
plantio orgânico e vida sustentável. No local em algumas horas,
o visitante vai descobrir como é possível viver uma vida saudável
aproveitando os recursos disponíveis em um pequeno pedaço de
terra e, ao mesmo tempo melhorando-a para um futuro mais fértil.
Podendo assim conhecer o verdadeiro conceito de desenvolvimento
sustentável. Através de um percurso pedagógico acompanhado pelo
proprietário local, o visitante conhecerá como é feito um plantio
orgânico, um sistema natural de tratamento e manejo da água e muitas
outras técnicas de como viver com baixo impacto ambiental. Ao final
da visita na propriedade é oferecido um delicioso lanche, que inclui
frutas da época e produtos caseiros (RABELO, 2011, p. 22).
109
Da aproximação com o Slow Food vieram aperfeiçoamento de
conhecimentos e ampla divulgação; inclusive participação no Slow
Filme: Festival Internacional de Cinema e Alimentação, o primeiro
festival brasileiro de cinema inspirado na cultura Slow Food e que em
sua segunda edição, em 2011, lançou o documentário “A horta de seu
Geraldo” (BOLA, 2011). Outra inovação a partir da segunda edição
foram as visitas de convívio, sendo que a Chácara Mar e Guerra é
um roteiro da programação desde então, recebendo os integrantes do
festival e apresentando inovações a cada ano.
Atualmente cultiva-se o milho, a mandioca em pequenas
quantidades e ainda frutas e hortaliças; sendo que estas passaram a
não mais serem comercializadas no sistema de cestas, uma vez que
passaram a fazer parte do kit de folhas para suco verde — detox,
que reúne várias hortaliças, folhas e vegetais disponibilizados em
seis pequenos recipientes que constituem um pacote, entregue
semanalmente aos clientes.
Diniz e Seleguini (2014, p. 69) rememoram que “no sistema
de produção familiar, a horticultura é um elemento fundamental,
seja para garantir a segurança alimentar da família, seja como fonte
alternativa de renda.” A horticultura é prática tanto na Chácara Mar
e Guerra quanto na Fazenda Custódio dos Santos.
Gabriel Divino de Mesquita, atual proprietário da Fazenda
Custódio dos Santos e muitos outros pequenos agricultores vizinhos,
que possuem como referência o povoado de Caxambu, resolveram,
ainda na década de 1970, por meio das Comunidades Eclesiais de
Base e da Comissão da Pastoral da Terra (CEB-CPT), organizarem-
se comunitariamente, visando a implementação da agroecologia
em suas propriedades. Inicialmente as ações ocorreram no terreno
da Escola Municipal Santa Maria de Nazaré, situada no povoado
de Caxambu, onde as crianças cursavam as séries iniciais e que a
professora e demais mães desenvolveram uma horta orgânica como
fonte de complemento à merenda escolar e como proposta piloto
para o cultivo das terras de região.
No final da década seguinte uma parceria se estabeleceu entre
uma médica sanitarista que atendia no posto de saúde municipal
110
localizado no povoado de Caxambu com a então professora,
Maria Albertina de Freitas Mesquita. Juntas desenvolveram
com a comunidade capacitações diversas voltadas para melhor
aproveitamento da produção, incluindo oficinas de artesanato com
materiais existentes na região.
Em 1996 foi a vez, de acordo com Mesquita (2014), da
implantação de vários cursos ministrados pelo Serviço Nacional de
Aprendizagem Rural (Senar), pela Empresa de Assistência Técnica
e Extensão Rural (Emater) e pelo Serviço Brasileiro de Apoio às
Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) com recursos da Fundação
Pró Natureza (Funatura), o que acabou incentivando o início dos
trabalhos da agroindústria voltada para a produção de geleias,
picles, chutneys; assim como a intensificação do extrativismo de
baru e cagaita. Deste modo surgiu a Associação de Desenvolvimento
Comunitário de Caxambu (ADCC).
O ano de 2001 foi marcado pelo início das atividades de
turismo pedagógico, destacando a visita, além da comunidade local,
de acadêmicos de Biologia que em encontro científico nacional
promoveram vivência de dez dias para melhor conhecer o projeto
desenvolvido em Caxambu. Pensando em melhor atender a demanda
que pratica o Turismo Rural na Agricultura Familiar, no projeto
Promessa de Futuro, foi elaborado por Mesquita (2014) um plano
de marketing para implantação de mais uma ação a se consolidar e a
colaborar com as demais atividades decorrentes da proposta iniciada
com a produção agroecológica mantida por pequenos produtores
rurais associados.
Independente da ADCC surgiu a Promessa de Futuro,
composta por 12 mulheres e suas respectivas famílias, que tinham
por produtos principais “a castanha de baru, conservas de pepino,
sabuguinho verde de milho, vargem e abobrinha verde, e geleias de
cagaita, hibisco, manga, tangerina e jabuticaba, picles e chutney de
manga” (RIBEIRO; GALIZONE; ASSIS, 2012, p. 88).
O calendário de atividades a serem seguidas na propriedade se
distribui ao longo do ano entre colheitas, beneficiamentos, processo
de embalagem, comercialização, divulgação, participação em eventos
111
e recepção de visitantes. A cada ano a Promessa de Futuro recebe, em
visita de convivência, os participantes do Slow Filme, para conhecer
as técnicas orgânicas da agricultura familiar desenvolvida pelos
associados.
A parceria como Slow Food foi inevitável, pelas convergências
das propostas, e a castanha de baru e a cagaita foram o elo inicial
de aproximação. A Promessa de Futuro participa, desde 2004 dos
principais eventos do movimento, inclusive o “Terra Madre” que
acontece a cada dois anos em Turim, na Itália. Assim, “junto com
o cultivo orgânico de alimentos, surgiram técnicas de cuidado com
os solos, como plantio direto e a rotação de culturas, e o resgate de
variedades tradicionais de arroz, fava, milho, feijão e de outras plantas
nativas. O trabalho de resgate de sementes crioulas” (MESQUITA,
2014, p. 22), quando muitos dos estudos e pesquisas contaram com a
parceria da Universidade de Brasília.
Em 2010, por ocasião da 6ª edição do Festival Gastronômico
e Cultural de Pirenópolis, o renomado chef Alex Atala realizou uma
visita, fora da programação, ao Promessa de Futuro, quando teve
a oportunidade de conhecer os trabalhos e ter acesso direto aos
produtos da cooperativa.
O escoamento da produção ocorre pelas inúmeras visitações
pedagógicas que acontecem atualmente apenas na propriedade do
senhor Gabriel; mas também por entregas diretas a consumidores e a
comerciantes em Pirenópolis. Para outras localidades as encomendas
são despachadas pelos Correios ou em ônibus, contando ainda com
suporte de amigos e parentes; além da rede do Slow Food, que
mantém colaboração na divulgação e na comercialização entre os
integrantes em eventos diversos ou em locais específicos de vendas
que são frequentados pelos que aderiram à proposta.
Promessa de Futuro é uma marca conhecida, que possui
uma identidade visual estampada nos rótulos de todos os produtos
disponibilizados para comercialização, que alcança o mercado
internacional e que muito contribui para a manutenção dos
envolvidos na produção: os pequenos agricultores familiares.
112
Considerações Finais
Para abordar breves perspectivas da agricultura familiar em
Pirenópolis fez-se um retrospecto histórico às questões ligadas a
ocupação inicial da terra, retomando a antiga Meia Ponte em que se
constituíram os dilatados latifúndios cuidados pelo trabalho escravo.
Grandes propriedades que passam ao longo do tempo por processos
de transmissão como: herança, aforamento, doação, posse, venda
e compra. Nem sempre permanecendo a cadeia dominial com a
mesma família.
O trabalho foi abordado a partir da transição do trabalho
escravo das minas auríferas para o cultivo agropecuário; situação de
exploração e submissão ao dono da terra, pouco alterada em Goiás,
mesmo com o advento da Lei Áurea, quando outras categorias de
trabalho tornaram-se mais evidentes como: meeiros, arrendatários,
assalariados, além de contar com novas forças de trabalho
representadas pelos imigrantes e migrantes.
No que tange à família faz-se necessário ressaltar a vinculação
do goiano com a terra e com o mundo rural, ao qual eram dedicados
quase todos os esforços até início do século passado. Período em
que se torna possível diferenciar produtores que comercializam suas
produções daqueles que cuidam apenas da subsistência, devido ao
tamanho reduzido de suas propriedades.
Ademais, a agricultura familiar é abordada inicialmente
pela legislação brasileira, por dados regionais e estaduais e por
levantamentos municipais, cujas informações são dispersas e/ou
não sintetizadas numericamente ou em documentos. Os indicativos
atestam a importância cada vez mais crescente da agricultura familiar
no Brasil.
Sobre as perspectivas da agricultura familiar em Pirenópolis/
GO, duas foram as propriedades e as ações por eles aplicadas: Chácara
Mar e Guerra com a Horta de seu Geraldo e a Fazenda Custódio
dos Santos com Promessa de Futuro. A delimitação pontuou como
requisito para o estudo a relação dos proprietários para com a terra,
ao demonstrarem respeito e cuidado, optando pela agroecologia,
pautada no manejo orgânico, resgate de espécies antigas, difusão de
113
conhecimentos, integração com produtores vizinhos, participação
em movimentos de responsabilidade produtiva como o Slow Food
e ainda com o Programa Nacional de Turismo Rural na Agricultura
Familiar.
A utilização consciente e responsável dos recursos hídricos que
abastecem, ao transcorrerem as propriedades, é outra ação planejada
para que as águas dos córregos: Mar e Guerra e do Caxambu
continuem seus cursos sem representar qualquer problema para os
moradores ou para os vizinhos.
Residir em área rural, praticando a agricultura familiar
orgânica não impediu que os filhos de Geraldo com Maria Aparecida
(duas filhas) e os de Gabriel com Maria Albertina (duas mulheres
e um homem), buscassem conhecimentos em outras áreas. Três
filhas cursaram graduação em Tecnologia em Gestão de Turismo
pela Universidade Estadual de Goiás e se mantiveram junto aos pais
contribuindo ainda mais para a ampliação positiva das ações, práticas
e projetos destinados à agricultura familiar em suas propriedades.
Diante das breves perspectivas apresentadas há concordância
de que a agricultura familiar é “um conceito em construção, com
definições divergentes, mas que possui significativas raízes históricas”
(CARDOSO JÚNIOR; LUNAS; GOMES, 2017, p. 18). Assim
como seus praticantes, que já foram designados por camponeses,
lavradores, pequenos produtores, agricultores de subsistência dentre
outras denominações como bem observou os supracitados autores.
O que nos leva a concordar que:
[...] o termo agricultura familiar, apesar de seu uso mais recente, não
é novo. Esse termo tem ganhado espaço nos debates acadêmicos,
nos movimentos sociais e nas políticas setoriais do governo. É
utilizado para nomear sujeitos que são integrantes de um ambiente
extremamente complexo: o campo (CARDOSO JÚNIOR; LUNAS;
GOMES, 2017, p. 16).
114
espaço rural, em contato com as atuais tecnologias de comunicação
e novidades de cultivo e manejo da terra, incluindo o resgate
de sementes e plantas importante que quase desapareceram em
decorrência da pouca valoração.
É possível afirmar que a resistência e a persistência dos
pequenos proprietários que praticam agricultura familiar têm muito
colaborado não só com a grande produção de alimentos colocados
à disposição de consumo; eles têm feito muito mais ao ampliar a
conscientização sobre a necessidade de uma alimentação saudável
baseada no tripé: terra, trabalho e família.
Referências Bibliográficas
115
BRASIL. Lei nº11.326/2006 — estabelece as diretrizes para
a formulação da Política Nacional da Agricultura Familiar e
empreendimentos Rurais. Disponível in: <http:/www.planalto.gov.
br/civil_03/_ato2006/2006/lei/11326.htm>. Acesso em novembro de
2017.
116
FAUSTO, Bóris. História do Brasil. 2 ed. São Paulo: EDUSP/FNDE,
1995. 650p.
117
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS. Fórum Goiano
de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos. Disponível em:
<http:www.mpgo.mp.br>. Acesso emnovembro de 2017.
118
RIBEIRO, Eduardo Magalhães; GALIZONI, Flávia Maria; ASSIS,
Thiago de Paula. (Orgs.). Comercialização solidária no Brasil: uma
estratégia de rede. Porto Alegre. EdiPUCRS, 2012. 216p.
119
A POSSE DA TERRA, PODER E
DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL
RURAL NO CONTEXTO DA
AGROINDÚSTRIA CANAVIEIRA NO
SUDOESTE GOIANO
121
Nesse contexto, a aglutinação de novas terras é imperiosa para
que se estabeleça a produção agroindustrial, como sinaliza a expansão
da cultura da cana. Os novos (e antigos) arranjos territoriais para
o desenvolvimento rural tem sido acordados mediante interesses
capitalistas e socioprodutivos. Há muito se tem distanciado a Terra
como espaço de vida e lugar par aqueles que nela vivem e dela
dependem como meio e modo de vida.
Concomitantemente, vale lembrar que no Estado de Goiás, a
partir de 2004, tem se acirrado movimentos de expansão de fronteiras
com elevada competição pelo uso do solo. A partir de dados do IBGE/
PAM (2010), é possível identificar a presença de quatro principais
complexos agroindustriais: de bovinos, de soja, milho e da cana-de-
açúcar, responsáveis pelo uso e ocupação de aproximadamente 97%
dos solos.
Tais complexos estabelecem uma situação de competição
por terras agricultáveis e por recursos naturais, sendo responsáveis
por diferentes externalidades em seus processos. Pontua-se aqui a
expropriação e distanciamento do pequeno e médio produtor rural
da Terra e do tipo de uso o solo.
Em especifico, nessa reflexão, tem-se a posse, aquisição e uso
da terra na lavoura canavieira agregarem padrões específicos de
apropriação dos territórios rurais. São situações e espaços de conflitos,
tensões e ajustamentos no campo, produtos de externalidades
perversas em temporalidades díspares, que definem com clareza os
atores sociais desse processo.
A cultura de grãos, voltada para a alimentação e exportação,
perde espaço (área de cultivo e colheita) frente ao avanço
desterritorializante do capital das usinas canavieiras no Sudoeste
Goiano.
Em consequência, percebe-se o potencial produtivo da agricultura
tradicional se especializar perdendo a característica inicial da agricultura
plural (policultura) e diversificada nas propriedades rurais.
A paisagem / território produtivo dessa região é percebida
como imensos mares de cana com ausência do sujeito do campo
(pequeno produtor rural). Nota-se a substituição do uso dos solos
agricultáveis com a alta produtividade da cana.
122
Posse, uso das Terras e estrutura fundiária
123
No caminho percorrido pela monocultura da cana, a cultura
de grãos e produtos alimentícios estão sendo atropeladas pela
perspectiva de altos rendimentos provenientes da boa fase que
atravessa o seguimento sucroalcooleiro (incentivos fiscais, facilidade
de acesso à terra, farta mão de obra e boas condições edafoclimáticas)
no país. Tem sido constante, em Goiás, a substituição das áreas
de pastagens e de cultivo de grãos como a soja, o milho e o sorgo,
principalmente, pela plantação de cana. Tal situação provocou um
deslocamento dessas atividades agrícolas para outras regiões (nova
fronteira agrícola?), bem como mudanças no contexto socioprodutivo
dos municípios.
Conforme dados da Seplan (2012-13), o crescimento
ascendente da cultura canavieira marcou discrepância em relação a
outros produtos agrícolas tradicionais na área estudada.
Quadro 1: Evolução da Produção Agrícola: Maurilândia/GO (2003 - 2012).
Produtos
2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012
Agrícolas
Cana-de-
açúcar - Área 10.803 10.580 8.414 7.992 9.000 9.000 10.200 9.550 10.440 13.130
colhida (ha)
Cana-de-
açúcar -
972.270 846.400 732.018 807.000 828.000 828.000 795.600 811.750 866.520 1.011.010
Quantidade
Produzida (t)
Mandioca -
Área Colhida 70 70 50 60 50 50 50 40 40 35
(ha)
Mandioca -
Quantidade 840 840 600 780 700 700 700 600 600 560
Produzida (t)
Milho (1º
safra) - Área 400 400 400 2.300 2.100 2.500 1.500 600 600 400
Colhida (ha)
Milho (1º
safra) -
2.000 2.000 2.200 12.650 10.500 12.500 9.000 3.660 3.660 2.440
Quantidade
Produzida (t)
Milho -
Total -Área 400 400 400 2.300 2.100 2.500 1.500 600 600 400
Colhida (ha)
124
Milho - Total
-Quantidade 2.000 2.000 2.200 12.650 10.500 12.500 9.000 3.660 3.660 2.440
Produzida (t)
Soja - Área
12.500 10.000 7.000 9.000 6.000 6.000 4.500 4.000 5.000 6.000
Colhida (ha)
Soja -
Quantidade 35.000 27.000 11.900 21.600 13.800 16.800 13.000 12.000 14.500 17.400
Produzida (t)
125
esta região em 1000 ha. Segundo o modelo adotado, a tendência é
diminuir a substituição de áreas agrícolas e aumentar a substituição
de pastagens (IBGE, 2010; CASTRO et al., 2010).
2
Entrevista feita pela autora com camponês do município de Turvelândia sobre seus modos e meios de
vida no campo (abril de 2012).
126
Quem é este homem do campo? São camponeses, pequenos
proprietários e trabalhadores rurais entendidos, nesse trabalho,
como termos correlatos, sinônimos na aproximação interpretativa
dos conceitos. Isso porque não importa, aqui, discutir as diferenças
e/ou semelhanças tipológicas dessas definições na dimensão teórica
e acadêmica. Principalmente no que tange ao conceito de camponês
em sua vasta discussão (FERNANDES, 1997, 2000; MARQUES,
2000; MARTINS, 1981; MEDEIROS, 1985; OLIVEIRA, 2007;
PAULINO, 2006; SHANIN, 1979; STEDILE, 1999, WANDERLEY,
1996; WOORTMANN, 1990; entre outros).
A condição de estar e pertencer ao campo dá a característica
primeira de sua condição de camponês, assim esse ator local será
tratado nesse estudo. Sabe-se que a terra, seu espaço de produção,
trabalho e de vida, não obstante as ‘forças’ que regem o mundo rural,
tem no ser camponês – na campesinidade3 – no seu modus vivendi não
apenas a ética e a identidade camponesa, mas também a cumplicidade
e afetividade entre as famílias de uma comunidade rural tradicional
com a terra e a coletividade. Com as transformações advindas pela
monocultura da cana essas relações estão sendo modificadas. A honra,
a hierarquia e a reciprocidade que norteiam as relações sociais das
comunidades rurais são, aos poucos, quebradas ou diluídas.
Estruturas sociais e de comportamento são alteradas, tornam-
se difusas e pouco frequentes num espaço antes formando por pessoas
que viviam da terra (citam-se os mutirões, a horta comunitária,
empréstimo de pasto, festas religiosas nas capelas rurais...). Isso
nos remete ao que lembra Carlos Rodrigues Brandão sobre a ética
da campesinidade, que pode ser traduzida e lembrada pela cultura
popular e pela literatura como o ethos camponês. O autor explica
sobre este modo de vida e de sociabilização como um esquema de
reprodução simples no campo:
Essa ideia de que a gente pode viver uma vida inteira num lugar
onde todo mundo é pobre, mas onde ninguém passa fome. E
3
A categoria campesinidade é lembrada a partir da perspectiva adotada por Bourdieu (1962), mais
tarde trabalhada por Woortmann (1988) que, em síntese, entendem que a condição camponesa, os
valores camponeses, os esquemas de percepção e as metáforas práticas da vida são elementos que
caracterizam o ‘jeito de ser’ camponês. Trata-se de um valor, de uma cultura internalizada e que
acompanha os indivíduos em sua trajetória, além do espaço rural. Expressam-se nas noções de habituse
na hexiscorporal, ou seja, na dimensão da história internalizada, na história feita pelos indivíduos.
127
não que todo mundo produza, mas porque, tal como os índios,
descobrimos maneiras de fazer com que o essencial circule entre
nós sem precisar ser comprado, vendido ou acumulado. A própria
acumulação é um valor identificado historicamente com a chegada
do outro. (BRANDÃO, 2004, p. 126)
4
Nessa entrevista, feita pela autora, trabalhadores rurais do município de Maurilândia/GO diziam de
suas dificuldades como a falta de trabalho no campo e o aumento da lavoura canavieira (abril de 2012).
5
Entrevista concedida à autora por proprietário rural do município de Maurilândia/GO, falando sobre
os novos arranjos produtivos no campo em função da agregação de terras pela usina sucroalcooleira
(abril de 2012).
128
e metamorfoses socioespaciais que vem ocorrendo no campo. Nessa
perspectiva, os depoentes analisam sua existência e dificuldades de
se manterem no lugar rural, sendo, muitas vezes, a sua vontade. Esse
lugar, o campo, exprime sentimentos vividos numa contingência que
não cabe simulação. A vida dura vista, sentida e ouvida à luz do dia e
nos intempéries noturnos dão o tom da realidade experimentada por
muitos que fazem da lida no campo seu modo e meio de vida.
Mesmo nessa realidade, nota-se o sentimento de pertencimento
como elemento importante que identifica o camponês, sertanejo (ou
caipira), pequeno produtor rural. Nesse caso, nem mesmo a pobreza,
dificuldades e conflitos fazem com que o sujeito perca sua afeição e
pertença com seu lugar. Essa situação contraditória denota também
os traços da tradicionalidade e modernidade contida nos modos de
vida dos camponeses de ontem e também de hoje.
Ademais, trata-se da “lógica dialética de quem eventualmente
acumulou riqueza, modificou hábitos de consumo, tecnificou suas
atividades, mas ideologicamente continua fiel, como escreveria
Bourdieu, aos habitus e à pertença camponesa” (OLIVEIRA, 2006,
p. 13). Destarte, importa-nos ‘amarrar’ a ideia de pertencimento às
características identitárias que são manifestas no ser/estar do homem
do campo, no sujeito rural e rurícola, camponeses ou caipiras. Esses
possuem uma relação estreita com a terra e com a natureza.
O campo e o camponês se concretizam pela ligação íntima do
homem com a terra, formando o ‘modo de vida’ camponês dentro do
espaço geográfico, numa socialização espacial real para o homem do
campo (BRANDÃO, 1995).
129
Proálcool, que consolida o Centro-Sul; e, por último, a fase atual, que
expande as lavouras de cana rumo ao centro do país. Esse último,
iniciado nos primeiros anos deste século XXI, foi favorecido, como
antes (novos problemas constituem-se da repetição dos mesmos?),
por crises internacionais ligadas aos combustíveis.
Desta vez, a crise foi desencadeada pela demanda ambiental
voltada a uma nova matriz energética, visando o controle do
aquecimento global. Repetem-se situações anteriores já vistas e
sentidas no campo. No entanto, não se fala muito de impactos
ambientais, porém agora a preocupação recai sobre a competição
entre culturas alimentares de ciclo anual, alvos de polêmicas
internacionais (CASTRO et al., 2010) e internas.
Altos investimentos têm sido aplicados no setor sucroalcooleiro,
tanto nas usinas quanto na ampliação de áreas para o cultivo da cana-
de-açúcar por hectare, em várias regiões do Brasil. Veem-se aumentar,
em larga escala, áreas com cultivo de cana como matéria prima para
atender a agroindústria sucroalcooleira (paulistas e nordestinas)
e avançarem para outras regiões como triângulo mineiro e, mais
recentemente, sul e sudoeste goiano.
Figuras 1 e 2: Área de cultivo da cana e implementos agrícolas da Usina Vale
Verdão S/A. Monocultura da cana entre os municípios de Maurilândia e
Turvelândia, em Goiás.
130
de implementos e insumos agrícolas e à logística de distribuição
empreendida pelo Estado. Esse, como importante elemento na
organização territorial, rege as metamorfoses espaciais recriando
paisagens, tendo o capital da agroindústria como coadjuvante e
principal força motriz para criação de novas territorialidades em
espaço rural.
Estudos e pesquisas estão sendo empreendidos por grupos
ligados à Universidades Públicas Estaduais e Federais, além de
órgãos governamentais, institutos de pesquisa entre outras entidades
(CONAMA, FAEG, IBGE, EMBRAPA), afirmando o atual processo
de ocupação da agroindústria canavieira nos espaços rurais do
cerrado, inviabilizando o desenvolvimento socioeconômico dos
pequenos produtores de forma autônoma. Isso porque muitas
famílias rurais não têm conseguindo se reafirmar no território onde
já estavam inseridas, devido à difícil disputa com o capital das usinas.
Essas famílias foram afetadas profundamente pelas grandes
lavouras canavieiras. A ressonância do epicentro agroindustrial da
cana vai para além das áreas produtivas. Muitos agricultores tiveram
suas tradições e seus costumes comprometidos devido novos
arranjos socioprodutivos que estabelecem modificações no vínculo
do trabalhador rural com a terra e com o território.
Em termos quantitativos estima-se que a rápida expansão da ca-
na-de-açúcar, puxada pela crescente demanda global de etanol, já tem
rota definida: além de São Paulo, que lidera a produção, passará prin-
cipalmente por Goiás e por Minas Gerais, nas proximidades do alco-
olduto que a Petrobrás planeja consolidar para a exportação do etanol.
O crescimento da lavoura de cana nessas áreas tem sido
elevado, em linha com as exigências do consumo. A área de plantio
do produto vai duplicar no país em dez anos, passando para 12,2
milhões de hectares na safra 2015/2016 para uma produção de 26
bilhões de litros de álcool e 900 milhões de toneladas de cana, de
acordo com o Instituto de Economia Agrícola (IEA, 2012).
No Cerrado Goiano é forte a preocupação acerca da entrada
vigorosa das usinas sucroalcooleiras sem que estes espaços estejam,
de fato, preparados e oficialmente abertos à expansão do cultivo da
cana em escala industrial.
131
Figuras 3 e 4: Criação de gado em pequena propriedade rural cercada pela
lavoura canavieira da Usina Vale Verdão S/A ao fundo. Propriedade rural com
estreita faixa de terra utilizada como pasto para o rebanho de poucas cabeças de
gado, entre a rodovia e área ao fundo, sendo preparada para novo ciclo da cana
no município de Turvelândia/GO.
132
si tende ao esvaziamento das unidades de produção familiar, à
degradação ambiental e social. Esta é uma situação social nova, em
que os produtores rurais tradicionais não conseguem administrar as
imposições advindas de uma cultura técnica trazida pelas grandes
lavouras e cuja manifestação mais concreta é a possibilidade de
o produtor tradicional também se constituir em um rentista.
(SANTOS, 2003, p. 152)
133
Diante da vitalidade do capital para o despojo, as populações
que sofrem essa recolonização dos seus lugares de vida são mais
profundamente exploradas, empurradas a um êxodo incerto,
descaracterizadas do arraigo territorial que dá sentido a sua
identidade. Nesse processo, algumas definham, outras se organizam,
resistem, lutam, dizem “Basta!” [...].
134
monocultura canavieira de sujeitos que ainda lutam, não apenas pela
terra em que trabalham pra garantir sua reprodução, mas também
pelo território que marca profundamente sua forma de vida. Tal
situação parece acontecer distante, e ao mesmo tempo próximo, das
discussões políticas, acadêmicas e capitalistas sobre a apropriação de
terras para o desenvolvimento da agroindústria da cana, entre outros
embates. Para esse grupo de pequenos produtores e trabalhadores
rurais, não importa o tamanho da sua propriedade, implica sim a
importância que a terra-territorium tem para a reprodução da vida
num movimento contrário ao capitalismo no campo.
De forma equidistante, não são poucos os trabalhadores
e pequenos proprietários rurais que, pela falta da terra ou pela
dificuldade em manter sua pequena gleba, se empregam nas usinas
ou em outro tipo de trabalho (temporário ou não) na cidade. Haja
vista a oferta de empregos ser precária (no campo e na cidade), a
necessidade de aceitar as poucas oportunidades de serviço que
surgem não é ignorada. Caso de muitos jovens e chefes de família na
área pesquisada. Esses atores foram elencados no Grupo II8 - Sujeitos
Temporários do Lugar. Para eles:
[...] não teve jeito mais de ficar na roça. Tá muito difícil arranjá
trabalho pro meu marido e pros meninos que ajudava o pai na lida.
Nóis tinha uma terrinha mais não dava pra plantá muita coisa e só
criava umas cabeça de gado pras dispesa. Aí nóis resolveu arrendar
tudo e mudar pra cidade. Meu marido arranjou empregado na
usina...e os meninos tão procurando alguma coisa nas fazenda mais
grande aqui da região, é isso aí!
Pra mim compensou arrendar minha terra porque entra mais um
dinheirinho. Aqui na cidade tem escola pros meninos que ainda
é pequeno. Como não é muito longe, arranjei um serviço na usina
mesmo que arrendou minha terra. A muié fica aqui com os meninos e
eu vou e volto todo dia9.
8
Diz respeito ao grupo de sujeitos que ainda trabalham no campo, mas que residem na área urbana
de Maurilândia (ou vice-versa) num processo de migração diária cidade – campo / campo – cidade.
9
Entrevistas, concedidas à autora, por trabalhadores rurais que migraram do campo para a cidade. O
primeiro depoimento foi de uma trabalhadora rural que teve que deixar o campo por falta de trabalho
para a família. O segundo depoimento é de um jovem proprietário rural que optou por arrendar suas
terras e mudar com a família para a cidade. Ambos residem no município de Maurilândia/GO (abril
de 2012).
135
Semelhantemente, outros produtores rurais, por opção ou
por falta dela, entregam suas terras nas mãos dos usineiros, ficando
dependentes do valor pago pelos arrendamentos. Nesses casos, por
mais que resista, o êxodo se faz cada vez mais necessário para as
famílias rurais, hajam vista as possibilidades no campo diminuírem
por falta de terra. Na região pesquisada, os municípios que mais
recebem os migrantes do campo são aqueles em que a usina exerce
maior pressão pelas terras para a expansão da lavoura de cana.
Como consequência, municípios sede de usinas (Turvelândia)
ou muito próximas a elas (Maurilândia, Castelândia) têm aumentado
o número de “ex-camponeses” em sua população urbana. Já na
cidade, eles têm que entrar para o mercado de trabalho em atividades
não agrícolas. São sujeitos classificados na situação do Grupo III10 –
Sujeitos Fora do Lugar (outros elementos desses grupos de sujeitos
serão explicados nos capítulos seguintes). Na fala desses camponeses
expropriados de suas terras e da sua condição de viver no e do campo,
resume-se alguns trechos das entrevistas:
Não tive como pagar os empréstimos que fiz no banco, vendi um pouco
de terra e o resto arrendei pra usina [...]
A coisa foi apertando, aí eu já não tinha trabalho em lugar nenhum.
Todas as fazendas que eu conhecia já tava com pouco empregado ou
com a família fazendo de tudo. O jeito foi sair da roça e procurar outra
coisa na cidade!
[...] Apertei muito quando comprei o maquinário pra tocá a roça. A
colheita foi ruim... teve muita praga, aí eu mudei pra uma casinha que
eu tenho aqui na cidade e arrendei a terra pra usina plantar cana.11
136
custos elevados da produção. Dessa forma, não conseguem competir
no mercado, não obtêm lucros, por conseguinte perdem suas terras.
Esse ciclo favorece o sistema migratório do campo para a cidade nos
moldes atuais.
Em conformidade à estrutura fundiária brasileira corresponder
às situações de desterritorialização vivenciadas por camponeses/
trabalhadores rurais nos depoimentos apresentados, tem-se o modo
como propriedades rurais estão dispersas pelo território e seus
respectivos tamanhos, o que facilita a compreensão das desigualdades
no campo.
Em outros termos, adverte-se: a desigualdade estrutural
fundiária configura como um dos principais problemas do meio
rural, isso por que interfere diretamente na manutenção de pequenas
propriedades, na quantidade de postos de serviço, no valor de salários
e, automaticamente, nas condições de trabalho e no modo de vida.
No Brasil, grande parte das terras encontra-se nas mãos de pequena
parcela da população, os latifundiários.
Do lado oposto desta estrutura fundiária estão os minifundiários,
proprietários de milhares de pequenas propriedades espalhadas pelo
território brasileiro. Algumas são tão pequenas que muitas vezes
não conseguem produzir renda nem a própria subsistência familiar.
É elevada a discrepância em relação à distribuição de terras. Uns
com grande soma, outros possuem pouca ou nenhuma terra para
que delas possam sobreviver. Tais aspectos caracterizam a forma de
espacialização fundiária no Brasil.
O Sistema Nacional de Cadastro Rural (SNCR) do INCRA
(Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) registrou
em abril/2012 que havia 605,4 milhões de hectares em poder de 5,4
milhões de imóveis, distribuídos conforme a Tabela 1. Após análise
atenta dos dados, destacam-se dois extremos: os imóveis com área
menor que 10 ha, 34,1% do total ocupam somente 1,5% da área
total perfilhando com área média de 4,7 ha, enquanto áreas com
mais 100.000 ha (menos de 1%) ocupam 13% da área total, com área
média de 379.204,39 ha.
137
Tabela 1: Estrutura Fundiária no Brasil – 2012.
138
fortalecido. Por um lado, no mercado externo com a expansão das
commodities, e por outro, no mercado interno com uso privado dos
recursos naturais. Consequentemente, há apropriação da renda da
terra decorrente da alta dos preços agrícolas e da terra e, não menos
importante, a retomada virtuosa do crédito rural.
É fato que a concentração da terra é uma das características
do capitalismo no campo, agravando a questão agrária. Deve-se,
pelo menos, tentar atenuar a concentração fundiária, mesmo com
a permanência da propriedade privada, contando que o uso da
terra seja mais democrático e menos explorador. Além de sobrepor
os interesses econômicos individuais aos interesses coletivos, a
centralização fundiária, seja para especulação ou para a apropriação
da renda capitalista da terra, impede que um grande contingente
populacional tenha acesso a ela para viver e produzir.
Assim, a distribuição mais igualitária das terras é mais
coerente com os interesses coletivos, tanto pela melhoria das
condições de vida da população, quanto pela produção de alimentos
de forma socialmente adequada. Na estrutura fundiária brasileira
predomina a grande propriedade rural e a pequena propriedade, com
diferenciações produtivas. As transformações ocorridas e aquelas
ainda em curso no mundo rural mostram como a indústria subjuga e
modifica as condições de produção no campo (FERNANDES, 2001;
OLIVEIRA, 1991).
A burguesia agrária é articulada com as burguesias industrial
e financeira de base urbana. Assim, pouco a pouco forma
dois contingentes de operários agrícolas: os permanentes e os
temporários. Essas modificações ocorridas na economia e sociedade
agrária provocaram o desenvolvimento das classes sociais no campo,
principalmente o proletariado e a burguesia e novos relacionamentos
entre o campo e a cidade, a indústria e a agricultura (IANNI, 1984).
Esclarece-se que a discussão vai além do que percebido espacialmente,
dissecando o modelo para além das relações binárias, reconhecendo
outros movimentos no campo.
A sociedade brasileira, tendo em vista as diversidades e
desigualdades regionais, constitui a base do desenvolvimento
desigual e combinado que caracteriza a formação social do Brasil
139
sendo diversas as formas de industrialização da agricultura, de
subordinação do trabalho rural ao capital. É possível afirmar que
a história da agricultura brasileira tem seguido esse tom desde a
independência, numa tentativa de reforma agrária, a história de um
povoamento que não termina.
Todavia, com o fechamento da fronteira amazônica acha-se em
seus momentos finais o longo processo histórico de monopolização
das terras? Crê-se que não. Provavelmente, num repetir da história,
a questão agrária continuará a ser resolvida ou adiada de modo
conveniente aos blocos de poder. Uma reforma agrária que nunca
põe em questão o princípio da propriedade privada (EDUARDO,
2010) não está disposta a dirimir a questão.
Desse modo, a problemática agrária, entendida como resultado
da estrutura fundiária arcaica e conservadora, numa abordagem
territorial necessita ser concebida de forma holística, na busca
por princípios de desenvolvimento. Esse, como processo contínuo
de ação sobre as forças estimuladoras das ordenações territoriais
internas e externas.
Considerações Finais
140
recursos naturais. Consequentemente, há apropriação da renda da
terra decorrente da alta dos preços agrícolas e da terra e, não menos
importante, a retomada virtuosa do crédito rural.
É fato que a concentração da terra é uma das características
do capitalismo no campo, agravando a questão agrária. Deve-se,
pelo menos, tentar atenuar a concentração fundiária, mesmo com a
permanência da propriedade privada, contando que o uso da terra
seja mais democrático e menos explorador.
Além de sobrepor os interesses econômicos individuais aos
interesses coletivos, a centralização fundiária, seja para especulação
ou para a apropriação da renda capitalista da terra, impede que um
grande contingente populacional tenha acesso a ela para viver e
produzir.
Assim, a distribuição mais igualitária das terras é mais coerente
com os interesses coletivos, tanto pela melhoria das condições de
vida da população, quanto pela produção de alimentos de forma
socialmente adequada.
No modelo de estrutura fundiária brasileira predomina a grande
propriedade rural e a pequena propriedade, com diferenciações
produtivas. As transformações ocorridas e aquelas ainda em curso no
espaço e território rural mostram como a agroindústria e a monocultura
subjuga e modifica as condições de produção mais humana e igualitária
no campo (FERNANDES, 2001; OLIVEIRA, 1991).
A ‘burguesia’ agrária de hoje é articulada com as ‘burguesias’
industrial e financeira de base exportadora. Assim, pouco a pouco
forma dois contingentes de operários agrícolas: os permanentes e os
temporários.
São metamorfoses territoriais da economia e sociedade
agrária que provocaram o aparecimento de classes sociais no campo,
principalmente o proletariado e a burguesia e novos relacionamentos
entre o campo e a cidade, a indústria e a agricultura (IANNI, 1984).
Esclarece-se que a discussão vai além do percebido
espacialmente, dissecando o modelo para além das relações binárias,
reconhece-se outros movimentos no campo.
A sociedade agrária brasileira, tendo em vista as diversidades
e desigualdades regionais, constitui a base do desenvolvimento
141
desigual e combinado que caracteriza a formação social do país
sendo diversas as formas de industrialização da agricultura, de
subordinação do trabalho rural ao capital.
É possível afirmar que a história da agricultura no Brasil tem
seguido esse tom desde a independência, numa tentativa de reforma
agrária, a história de um povoamento que não termina.
Todavia, com o fechamento da fronteira amazônica acha-se em
seus momentos finais o longo processo histórico de monopolização
das terras? Crê-se que não. Provavelmente, num repetir da história,
a questão agrária continuará a ser resolvida (?) ou adiada de modo
conveniente aos blocos de poder. Uma reforma agrária que nunca
põe em questão o princípio da propriedade privada (EDUARDO,
2010) não está disposta a dirimir a questão.
Desse modo, a problemática agrária e o desenvolvimento
territorial rural, entendida como resultado da estrutura fundiária
arcaica e conservadora necessita ser concebida de forma holística, na
busca por princípios de desenvolvimento de base, local e endógeno.
Esse, como processo contínuo de ação sobre as forças estimuladoras
das ordenações territoriais internas e externas no campo.
Referências Bibliográficas
142
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo
Agropecuário 1995-1996. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/
home/estatistica/economia/ agropecuaria/censoagro/1995_1996/
default.shtm>. Acesso em: 30 jul. 2012.
143
STEDILE, J. P.; FERNANDES, B. M. Brava gente. São Paulo:
Fundação Perseu Abramo, 1999.
144
PARQUE NACIONAL DAS EMAS:
ATRIBUTOS ECOLÓGICOS E
IMPLICAÇÕES ECONÔMICAS
145
A primeira faceta diz respeito à importância socioeconômica
das UC para a população residente em suas proximidades. Críticos
ferrenhos das UC enfatizam o exagero do espaço geográfico que
ocupam, eliminando a possibilidade de usos do solo mais rentáveis
para produtores rurais e benéficos para o conjunto da sociedade.
Acrescentam, ainda, que o estabelecimento de uma unidade de
conservação condena o espaço geográfico e a população que nele
reside a um permanente estado de pobreza material. Como bem
destacam Geluda et al. (2011), as UC brasileiras são vistas como
obstáculos ao desenvolvimento econômico dos locais onde se
localizam. Já Medeiros e Young (2011) argumentam que as UCs
poderiam contribuir para a economia local, se todo o potencial
econômico de seus bens e serviços fosse utilizado3.
Já a segunda faceta envolve a sustentabilidade financeira
dessas unidades. Picolli (2011) assinala a significativa distância que
existe entre Gastos Efetivos Atuais (GEA) públicos em consolidação
e manutenção das áreas do Sistema Nacional de Unidades de
Conservação (SNUC) e os gastos mínimos necessários (que a
autora denominou Gastos Ideais em Conservação, GIC). Esses
deveriam ser maiores do que os GEA para que as UC brasileiras
pudessem ser geridas eficazmente. Além disso, Picolli (2011)
conclui também, seguindo a tendência de diversos autores, que os
Benefícios Transferidos da Conservação (BTC) à sociedade podem
ser significativamente superior aos GEA e GIC.
É pouco provável que uma UC, com receitas financeiras
(privadas ou públicas) insuficientes para cobrir os custos financeiros
necessários para sua gestão eficaz, seja capaz de gerar efeitos
(financeiros e/ou econômicos) significativos sobre a população da
região onde ela está localizada. Possibilidades e potencialidades
são distintos de efetividade. Não obstante, estudos brasileiros em
economia ambiental sobre UC preferem um enfoque normativo
3
Pelas estimativas dos autores, a produção madeireira nas florestas, por exemplo, segundo o modelo
de concessão florestal, teria o potencial de gerar, anualmente, entre R$ 1,2 bilhão a R$ 2,2 bilhões; R$
16,5 milhões anuais poderiam ser gerados com a produção de borracha em 11 Reservas Extrativistas
analisadas; a visitação em 67 Parques Nacionais (existentes no Brasil até 2011) teria o potencial de
gerar entre R$ 1,6 bilhão e R$ 1,8 bilhão por ano, considerando as estimativas de fluxo de turistas
projetadas para o país até 2016; R$ 96 bilhões foi o valor estimado pela não emissão de pelo menos 2,8
bilhões de toneladas de carbono pela criação e manutenção das áreas protegidas (mais exemplos em
MEDEIROS e YOUNG, 2011).
146
(o que pode ser possível) do que um enfoque positivo (a realidade
atual como efetivamente ela é)4. Por outro lado, é possível (em
certos contextos históricos, é provável) que UC “rentáveis” (receitas
financeiras maiores que seus custos financeiros) só consigam, por
uma série de razões, gerar (apenas) efeitos econômicos indiretos
sobre a população local.
Nossa preocupação neste artigo é com os impactos
socioeconômicos positivos e efetivos de uma UC sobre as comunidades
residentes próximas ao local de sua implantação. Decidimos por
uma análise baseada em uma perspectiva histórica de mudanças
socioeconômicas em municipalidades diretamente relacionadas com
uma unidade de conservação relativamente a municipalidades que, no
máximo, experimentariam efeitos indiretos marginais da existência
da mesma UC. O Parque Nacional das Emas (PNE) mostrou-se um
objeto de estudo relevante. Localizado em Goiás, o entorno do PNE
contempla municípios em Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul.
O PNE, criado no início da década de 1960, testemunhou as etapas
de ocupação do Cerrado brasileiro e é considerado uma “ilha” de
biodiversidade em um “mar” de atividades agropecuárias.
O texto está estruturado em três seções, além desta inicial e
da conclusiva. Iniciamos com uma breve apresentação do Parque
Nacional das Emas (PNE), com destaque para suas características
físicas, da fauna e da flora. Essas características desempenham funções
ecossistêmicas que representam potenciais benefícios (financeiros
e econômicos) para as comunidades que lhe circunvizinham. Ao
identifica-las podemos definir as mudanças que deveriam ter
ocorrido nessas comunidades ao longo de mais de cinco décadas
desde o estabelecimento do PNE.
Na segunda seção apresentamos as cinco municipalidades que
iremos considerar como as receptoras dos custos e dos benefícios
econômicos da existência de uma unidade de conservação em sua
vizinhança. Os benefícios líquidos são buscados em diferentes
indicadores socioeconômicos para essas municipalidades, que são
comparados com os disponíveis para outras seis municipalidades que
não auferiram esses benefícios líquidos. Essas municipalidades sem
4
Um exemplo recente é o estudo de T. V. Beraldo Souza (2016) sobre determinantes da demanda
turística por visitação de parques nacionais.
147
a influência direta do PNE estão geograficamente próximas às cinco,
mencionadas anteriormente, com a influência do Parque.
Fica evidente que nossos resultados devem ser avaliados com
ressalvas. Usamos dados de fontes secundárias e com considerável
grau de agregação. Além disso, são mais de cinquenta anos de
inúmeras mudanças sociais, econômicas e políticas. Não obstante,
se nossos resultados não evidenciarem diferenças socioeconômicas
entre municipalidades com e sem o PNE, diversas questões relevantes
passam a exigir novos desenhos de pesquisa científica e de políticas
públicas de conservação da diversidade biológica.
Dois conjuntos de questões são analisados na terceira seção do
artigo. Essa última seção central do artigo analisa as conquistas, os
conflitos e as incertezas relacionadas à criação, manutenção e gestão
do Parque Nacional das Emas. De uma perspectiva da pesquisa
científica, sugerimos que devemos reduzir desenhos metodológicos
baseados em “potencial/possível” benefício líquido de UC e
desenvolver aqueles que possam mostrar os seus efetivos benefícios
socioeconômicos. Quanto ao desenho de políticas de conservação,
mostramos a necessidade de mecanismos que incrementem os ganhos
próximos ao momento presente, sem sacrificar os que ocorrerão no
futuro mais distante.
148
capões de mata para formação de pastagens (FELTRAN-BARBIERI,
2004). As terras que iriam formar o futuro PNE pertenciam ao
pecuarista Filogônio Garcia e eram usadas como rota de peões e de
seus rebanhos que utilizavam o local para repouso (FLEURY, 2008).
Como essas terras não apresentavam potencial agrícola e Garcia
desejava livrar-se do pagamento de impostos, o proprietário decidiu
doá-las para a União.
Como terras devolutas dos estados de Goiás e Mato Grosso do
Sul e com o objetivo de salvaguardar sua fauna, flora e beleza cênica
do avanço das frentes de expansão da fronteira agrícola, foi criado
o Parque Nacional das Emas (PNE) em 11 de janeiro de 19615. Seu
nome está relacionado à existência do grande número de emas (Rea
americana americana) da família Rheidae, encontradas na região
(IBDF, 1981). Por estar cercado por estabelecimentos rurais6 o PNE
está isolado de outras áreas nativas, resultando em uma elevada
fragmentação de habitats (SHUVARTZ, 2006).
O PNE está localizado em um extenso chapadão onde
predomina a vegetação campestre nativa do Cerrado no extremo
da região sudoeste do Estado de Goiás e faz fronteira com o estado
de Mato Grosso do Sul. Distancia-se de Brasília aproximadamente
700Km, tendo como via de acesso a BR-060 seguindo em direção à
Goiânia. Sua área total é de 131.864 ha7, com a maior parte (113.535
ha ou 86,1%) localizada no município de Mineiros (GO), como
pode ser visualizado no Mapa 1. O PNE ainda ocupa partes dos
territórios dos municípios de Chapadão do Céu (15.059 ha, 11,42%),
Serranópolis (264 ha, 0,02%), ambos em Goiás, e Costa Rica (MS)
(3.244 ha, 2,46%) (MMA, 2004).
Santos (2000) menciona a importância da localização do PNE
em um dos mais relevantes divisores de águas da América do Sul,
entre as nascentes dos rios Araguaia, Taquari e Sucurí. Esses formam
respectivamente três sistemas hidrográficos: a bacia do Amazonas,
do Pantanal e do Paraná. Na região de influência do PNE existe um
5
Criado pelo Decreto No 49.874, emitido em 11 de janeiro de 1961 pelo então Presidente da República,
Juscelino Kubitschek. Seus limites foram revistos posteriormente pelo Decreto 70.375, de 6 de abril de
1972.
6
Como será detalhado a seguir.
7
Por sua extensão pode ser considerado uma UC de grande porte, uma vez que a maioria das áreas
protegidas no Brasil possui áreas menores que 100.000 hectares.
149
conjunto de 13 bacias hidrográficas, abrangendo 1.024.3788,45 ha,
sendo que o Parque ocupa a porção central equivalente a 12,78%
deste total. Essas bacias apresentam um histórico de ocupação
intensiva cuja vegetação original foi substituída pelas atividades
agropecuárias. Finalmente, de acordo com a Embrapa (2006), ali
também se encontram afloramentos do aquífero Guarani.
No PNE é possível identificar todos os tipos de fitofisionomias
característicos do Cerrado. Os campos sujos predominam, cobrindo
95% da área do Parque. O restante divide-se em: campo úmido,
campo cerrado, campo de murundus, campo limpo, mata ciliar,
mata mesofítica de interflúvio, vereda, mata, cerrado strictu sensu e
cerradão (IBDF/FBCN, 1981).
A parte composta de árvores e arbustos ocupam
aproximadamente 10% da área do Parque e situa-se principalmente
ao longo dos cursos d’água. As florestas mesófilas estacionais
semidecíduais estão presentes na forma de pequenas manchas sobre
terrenos mais férteis (IBAMA, 2006). O relevo no interior do PNE é
plano, porém há variação de altitudes entre 800 e 920 metros.
150
O clima na região do PNE é, predominantemente, tropical, com
duas estações bem definidas: seca no inverno e úmida no verão. As
temperaturas mais elevadas ocorrem durante a primavera e o verão
com médias de 24ºC, máxima de 31ºC e mínima de 17ºC, sendo o
mês de outubro o mais quente. No outono e inverno as temperaturas
são mais amenas. Junho é o mês mais frio com ocorrência de mínimas
absolutas de 10ºC (MMA, 2004).
Quanto às tipologias de solo existem três grandes domínios
pedológicos, a saber: o das terras Altas ou Chapadões, onde
prevalecem os Latossolos Vermelhos distróficos típicos, muito
argilosos; em menor quantidade ocorrem os Latossolos Vermelhos
amarelos distróficos típicos, de textura muito argilosa; e entre as
bordas dos chapadões nos relevos mais acidentados, encontram-se
os Plintossolos Pétricos, os mesmos em áreas de grande estabilidade.
Nas planícies de rios e córregos ocorrem os Gleissolos, seguidos de
Organossolos, com pequenas ocorrências de Plintossolos, (AGÊNCIA
RURAL, 2003). Em geral, os solos são pobres em nutrientes, bem
drenados e ácidos. (SILVA e BATALHA, 2008).
Uma das particularidades do PNE é sua expressiva diversidade
tanto em termos de fauna quanto de flora. De acordo com IBAMA
(2004) existem 606 espécies de plantas vasculares e assumindo que
o número de espécies vegetais do Cerrado varia entre 3.000 a 7.000.
Assim, o PNE compreende de 8,5% a 20% da flora do Cerrado como
um todo. No PNE predominam as fisionomias abertas de cerrado
(68,1% de sua área) e 25,1% de formações fechadas. Outros tipos
de vegetação também estão presentes como: campos úmidos (4,9%)
e as florestas ripárias e semidecíduas (1,2%) (RAMOS NETO e
PIVELLO, 2000).
No que concerne à fauna, o PNE se destaca com 401 espécies
de aves, dentre as quais 19 são espécies endêmicas e 14 estão espécies
ameaçadas de extinção. Existem também 22 espécies de peixes, 117 de
herpetofauna e vários insetos. De 13 espécies de lagartos endêmicos
do Cerrado, 8 ocorrem no Parque. Possui ainda uma rica fauna de
mamíferos, contando com ao menos de 85 espécies em seu interior e
94 ao todo se consideradas as áreas de entorno. Não obstante, é a fauna
de grandes mamíferos que coloca em destaque o PNE. As espécies
151
mais avistadas são: o veado-campeiro, o tamanduá-bandeira, o lobo-
guará, e a anta. Existem ainda outras espécies importantes, pela sua
raridade como: o cervo-do-pantanal, o tatu-canastra, a onça-pintada
e o cachorro-do mato-vinagre (MMA, 2003).
Por ser tratar de uma unidade de conservação que se enquadra
no grupo de Proteção Integral na classificação do SNUC8, o uso dos
recursos naturais do PNE deve ser restringir a “uso indireto”, ainda
de acordo com a definição do SNUC. Sobressai, nessa situação, a
visitação para turismo, lazer e contemplação. Diversas organizações
não governamentais9 atuam na área na busca de ampliação do
conhecimento sobre o Cerrado e repensar práticas agrícolas de baixo
impacto. Em 2001, o PNE foi reconhecido pela Organização das
Nações Unidas para Educação Ciência e Cultura (UNESCO), como
Patrimônio Mundial da Natureza e como área-núcleo da Reserva da
Biosfera do Pantanal.
152
Chapadão do Sul (também em Mato Grosso do Sul) e Alto Araguaia
(Mato Grosso). Efetuamos um amplo levantamento de indicadores
sociais, econômicos e físicos para todos os onze municípios (5com
PNE e 6 sem PNE). Ao compará-los, nossa hipótese de trabalho
era de que não haveria diferença significativa para os indicadores
entre os dois grupos de municípios.
Se confirmada essa hipótese, nosso resultado iria de encontro
a argumentos usuais em relação a unidades de conservação (UC)
no Brasil. Não capturando diferenças entre os dois grupos, não
se sustentaria o argumento de que a presença de uma UC em um
determinado ponto do espaço geográfico condenaria a população
local a níveis de renda e de bem-estar inferiores aos de populações
de outros espaços geográficos nos quais as atividades agropecuárias
teriam se desenvolvido sem aquela restrição institucional.
No entanto, a não observação de diferenças naqueles indicadores
entre os dois grupos de município também não confirma a hipótese,
transformada em fatos por alguns estudos recentes, de que a simples
presença de uma unidade de conservação em uma região tem o
poder de incentivar o crescimento da renda e do bem-estar local.
Projeções algébricas dos resultados de algumas UCs para todas as
demais UC semelhantes é um exercício sem qualquer base científica
e pouco útil para a formulação e a gestão de políticas públicas de
conservação da diversidade biológica por meio de estabelecimento
de áreas protegidas.
153
(2013) destaca que as propriedades localizadas a oeste do PNE
descumprem a legislação ambiental. Uma vez que estão desprovidas
de suas Reservas Legais (RL), bem como de Áreas de Preservação
Permanente (APP).
• Dinâmica Econômica
154
um deles, as mudanças observadas na renda, na distribuição dessa
renda e no nível de emprego não nos permite assinalar diferenças
entre os municípios dos dois grupos.
Em termos de renda domiciliar por habitante, os municípios
com a influência do PNE em Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do
Sul apresentavam-na em nível superior à média estadual em 2000,
com a exceção de Serranópolis em Goiás. A situação é similar para
os municípios SEM a influência do PNE, exceto por um número
maior (três) de municípios com renda domiciliar por habitante
menor do que a média de seus respectivos estados. Apenas três entre
todos os municípios analisados apresentam decréscimo de renda por
habitante ao longo da década passada, todos eles do grupo com a
influência do PNE (Chapadão do Céu em Goiás, Costa Rica em Mato
Grosso do Sul e Alto Taquari em Mato Grosso). A explicação para
essa queda nos três municípios está relacionada aos seus usos do solo
e dinâmicas populacionais. Voltaremos a esses pontos na sequência
do texto.
No que concerne a distribuição da renda entre “ricos” e “pobres”,
o indicador razão de renda revela uma realidade interessante. Razão
de renda evidencia o número de vezes que a renda agregada do quinto
superior da distribuição da renda (20% mais ricos) é maior do que a
renda do quinto inferior (20% mais pobres) na população residente
em determinado espaço geográfico (estado ou municípios), no ano
considerado (2000 e 2010). Todos os municípios, independentemente
do grupo, apresentaram redução na razão da renda, indicando que a
distância entre “ricos” e “pobres” ficou menor em 2010 relativamente
ao que era em 2000. Além disso, em todos eles a desigualdade
municipal era menor do que a de seus respectivos estados.
Os municípios analisados também apresentam certa
uniformidade em relação às suas taxas de desemprego em 2000 e em
2010 e nas suas variações no período. A taxa de desemprego para os
maiores de 16 anos diminuiu marcadamente entre 2000 e 2010 em
todos os municípios e ficaram abaixo da média dos três estados.
O único município que apresentou crescimento relativo do
desemprego na década foi Chapadão do Céu (Goiás). No entanto, no
final do período em 2010, sua taxa de desemprego ainda era muito
155
Tabela 1
Dinâmica Econômica
Razão de Razão de Taxa de
Renda Média Renda Média
Renda Renda desemprego
Domiciliar Domiciliar
16a e+
Per Capita Per Capita
Unidades Geográficas/Política
R$ de 2010 R$ de 2010
156
Goiás 566,67 785,17 26,18 19,67 12,10 (5,95)
Santa Rita do Araguaia 600,32 628,39 27,83 12,85 17,96 (5,29)
Perolândia 417,70 580,49 24,08 15,22 10,05 (7,78)
Jataí 600,32 956,24 19,96 18,49 8,00 (3,47)
Mato Grosso do Sul 570,68 784,97 28,50 20,86 12,82 (5,95)
Alcinópolis 308,02 759,71 19,42 14,54 8,77 (3,03)
Chapadão do Sul 861,74 887,12 20,59 11,76 6,35 (3,93)
Mato Grosso 575,02 735,32 30,67 24,15 11,49 (6,00)
Alto Araguaia 437,72 661,46 20,86 14,05 12,91 (5,87)
Fontes e Observações:
Renda Média Domiciliar per Capita: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?ibge/censo/cnv/rendamt.def
Razão de renda: Número de vezes que a renda agregada do quinto superior da distribuição da renda (20% mais ricos) é maior do quea renda do quinto
inferior (20% mais pobres) na população residente em determinado espaço geográfico, no ano considerado - http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/ibge/
censo/cnv/razaoGO.def
Taxa de desemprego 16a e+: proporção (%) da população residente economicamente ativa de 16 anos e mais que se encontra sem trabalho na semana de
referência, em determinado espaço geográfico, no ano considerado - http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?ibge/censo/cnv/desemprMS.def
baixa, quase a metade da média estadual, apesar do significativo
aumento de sua população ao longo dos anos iniciais do corrente
século.
É essencial destacar a diferença de escala entre os municípios
selecionados em nossos dois grupos. Entre eles há municípios
capazes de gerar uma produção anual significante, enquanto outros
municípios apresentam uma economia pequena, apesar de crescente.
Os dados sobre Produto Interno Bruto Municipal (PIB Municipal) e
sobre o PIB Municipal por habitante (PIB Municipal/hab) para 2010
estão resumidos na Tabela 2.
Tabela 2
PIB Municipal e PIB por Habitante – 2010 – R$
Produto Interno Produto Interno
Bruto Municipal Bruto Municipal
Unidades Geográficas/Política
por Habitante
PIB Municipal PIB Mun/Hab
Área Com Influência Direta do PNE
Goiás 97 575 930, 16 251,70
Mineiros 1 059 047, 19 995,60
Serranópolis 195 874, 26 196,86
Chapadão do Céu 682 160, 97 395,72
Mato Grosso do Sul 43 514 207, 17 765,68
Costa Rica 510 386, 25 922,39
Mato Grosso 59 599 990, 19 644,09
Alto Taquari 536 608, 66 247,90
Área Sem Influência Direta do PNE
Goiás 97 575 930, 16 251,70
Santa Rita do Araguaia 61 890, 8 933,28
Perolândia 206 860, 70 121,93
Jataí 2 142 103, 24 328,81
Mato Grosso do Sul 43 514 207, 17 765,68
Alcinópolis 106 732, 23 354,97
Chapadão do Sul 682 300 34 715,60
Mato Grosso 59 599 990, 19 644,09
Alto Araguaia 1 163 457 74 247,43
157
• Dinâmica Populacional
158
total do estado/município. Este declínio é observado em todos
os municípios de ambos os grupos analisados ao longo da década
passada. Ele tende a se intensificar à medida que as atividades
agropecuárias adotem técnicas produtivas mecânicas e/ou químicas
na busca de incremento de produtividade. Ao longo dos anos, esse
fenômeno tende a incrementar os efeitos positivos diretos e indiretos
do PNE.
• Dinâmica Social
159
Tabela 3
Dinâmica Demográfica
População População Participação Participação Densidade
Total Total da população da população Demográfica
Unidades Geográficas/Política rural rural hab/km2
habitantes habitantes % %
2000 2010 2000 2010 2010
Área Com Influência Direta do PNE
Goiás 5.075.597 6.155.267 12,12 9,71 17,65
Mineiros 38.881 52.935 11,2 8,8 5,8
Serranópolis 6.449 7.489 36,5 26,0 1,4
Chapadão do Céu 3.773 7.001 25,4 16,0 3,2
Mato Grosso do Sul 2.125.817 2.486.261 15,92 14,36 6,86
Costa Rica 15.488 19.695 24,50 14,46 3,43
Mato Grosso 2.560.987 3.049.346 20,63 18,20 0,725
160
Alto Taquari 4.577 8.110 18,01 9028 5,79
Área Sem Influência Direta do PNE
Goiás 5.075.597 6.155.267 12,12 9,71 17,65
Santa Rita do Araguaia 5.080 6.924 8,9 11,0 5,1
Perolândia 2.784 2.950 39,0 37,0 2,9
Jataí 75.417 88.006 8,8 7,9 12,3
Mato Grosso do Sul 2.125.817 2.486.261 15,92 14,36 6,86
Alcinópolis 3.679 4.569 37,27 31,36 1,04
Chapadão do Sul 11.658 19.648 24,34 14,61 5,09
Mato Grosso 2.560.987 3.049.346 20,63 11,20 0,72
Alto Araguaia 11.668 15.717 20,49 11,65 2,82
161
Tabela 4
Dinâmica Social
% dos % dos % dos
extremamente extremamente vulneráveis IDHM IDHM
Unidades Geográficas/Política pobres pobres à pobreza
2000 2010
2000 2010 2010
Área Com Influência Direta do PNE
Goiás 6,11 2,32 46,38 24,22 0,737
Mineiros 6,63 2,38 56,59 0,590 0,681
Serranópolis 5,49 1,57 56,15 0,563 0,742
Chapadão do Céu 16,30 0,36 58,08 0,618 0,718
Mato Grosso do Sul 7,10 3,55 26,83 0,613 0,729
Costa Rica 19,33 1,58 19,41 0,596 0,706
Mato Grosso 7,83 4,41 27,00 0,601 0,754
Alto Taquari 3,33 1,15 16,83 0,634 0.705
Área Sem Influência Direta do PNE
162
Goiás 6,11 2,32 46,38 24,22 0,737
Santa Rita do Araguaia 6,16 2,63 59,42 0,596 0,714
Perolândia 8,73 3,11 57,92 0,551 0,676
Jataí 2,38 0,91 55,71 0,627 0,757
Mato Grosso do Sul 7,10 3,55 26,83 0,613 0,729
Alcinópolis 9,17 1,63 24,37 0,536 0,711
Chapadão do Sul 1,45 0,93 13,91 0,656 0,754
Mato Grosso 7,83 4,41 27,00 0,601 0,754
Alto Araguaia 5,97 3,66 22,84 0,583 0,704
Fontes e Observações: Extremamente Pobres: Em 2010, foi definida em R$ 70,00 mensais (de agosto de 2010) a extrema pobreza. Ou seja, quem residir em domicílios
com rendimento mensal per capita menor ou igual a este valor será considerado extremamente pobre. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE),
16,27 milhões de pessoas viviam em 2010 nesta situação, o que representava 8,5% da população.
Proporção de vulneráveis à pobreza: proporção dos indivíduos com renda domiciliar per capita igual ou inferior a R$ 255,00 mensais, em reais de agosto de 2010, equivalente
a 1/2 salário mínimo nessa data. O universo de indivíduos é limitado àqueles que vivem em domicílios particulares permanentes. IDHM – Índice de Desenvolvimento
Humano Municipal: média geométrica dos índices das dimensões Renda, Educação e Longevidade, com pesos iguais. Inclui os subíndices que compõem o índice da
dimensão Educação. Os índices das dimensões Renda e Longevidade são construídos a partir de um único indicador – renda per capita e esperança de vida ao nascer,
respectivamente.
A oferta desses serviços também tem sido efetuada pelo
Parque Nacional das Emas (PNE), objeto de estudo neste artigo,
como em qualquer outra unidade de conservação. Não obstante, das
análises realizadas na seção anterior fica evidente que os benefícios
econômicos derivados desses serviços ambientais não diferem dos
benefícios econômicos derivados de outras atividades produtivas,
com menor preocupação com a conservação da diversidade biológica
local. Precisamos entender com maior profundidade as interações
entre a oferta de serviços ecossistêmicos e a demanda por serviços
ambientais relacionadas com o PNE.
Para isso, precisamos compreender mais adequadamente as
conquistas, as limitações, os conflitos e as incertezas relacionadas
com o Parque Nacional das Emas. Esta é nossa empreitada nesta
seção do artigo.
• Conquistas
163
Quadro 1 – Classificação de serviços ecossistêmicos
Serviços Ecossistêmicos
Serviços de Provisão
Alimentos (lavoura, pecuária, alimentos extrativos,)
Fibras (algodão, seda, madeira, lenha)
Recursos Genéticos
Bioquímicos, medicinas naturais, fármacos
Água fresca
Serviços de Regulação
Regulação da qualidade do ar
Serviços de Suporte Regulação do clima (local, regional, mundial)
Ciclo de nutrientes Regulação da água
Formação do solo Controle da erosão
Produção primária Purificação da água e tratamento de dejeto
Regulação de doenças
Regulação de pragas
Polinização
Regulação de desastres naturais
Serviços Culturais
Valores estéticos
Valores religiosos e culturais
Turismo e recreação
• Limitações
164
é, então, reduzida castigando a fauna que nela busca alimento, abrigo
e local de reprodução.
A prevenção do fogo é feita de duas formas a construção
de aceiros preventivos, cerca de 10 Km², feito no final da estação
úmida (FRANÇA et al.,2007) e através de atividades desenvolvias
como trabalho integrado com a brigada, vigilância da unidade
treinamentos, simulação de incêndio, placas educativas, palestra aos
visitantes, campanhas nas escolas, e queimada controlada (PEREIRA;
FIEDLER E MEDEIROS, 2004).
No entanto, o Parque conta para combate ao fogo com 2
tratores com 2 pipas para água, 1 caminhão pipa, 1caminhão
rodo-fogo (IBAMA, 2004). Faltam, porém, equipamentos de EPIs
como máscaras, óculos, capacetes e coturnos, torre de observação
(PEREIRA; FIEDLER E MEDEIROS, 2004). Mesmo assim, segundo
Silva et al (2011, p. 35), “seria necessário trabalhos de monitoramento
por satélite para elaborar mapas com as frequências e tempo desde a
última queimada a fim de preservas espécies de plantas mais sensíveis
ao fogo”.
A essas limitações adicionam-se os tradicionais problemas
derivados da gestão do Parque realizada pelo ICMBio. Problemas esse
conhecidos porque outros parque também sofrem do mesmo mal
como: falta de verbas; ações desconectadas; falta de pessoal qualificado;
falta da implantação do Plano de Manejo; falta de disponibilidade dos
resultados das pesquisas realizadas no parque e entorno; o pequeno e
o descontínuo envolvimento da comunidade com o Parque e a falta de
decisões políticas na gestão (IBAMA, 2005). “Esses problemas, entre
outros, estão possivelmente aliados a fatores culturais e ao modelo de
gestão do serviço público e ao modelo de administração dos órgãos
gestores de parques” (SHUVARTZ, 2006, p. 59).
• Conflitos
165
agricultáveis10, a invasão de gramíneas exóticas (Brachiaria), o
manejo inadequado de agrotóxicos11, a caça predatória de animais
que circundam o parque e erosão dos solos (SILVEIRA 2004;
SHUVARTZ, 2006).
• Incertezas
Considerações Finais
10
Focos de incêndios dentro da área do parque desestabilizando a fauna e a flora.
11
Isso provoca a ruptura de ovos de aves antes do tempo, diminuindo o número de filhotes e até a
extinção das aves.
166
Referências Bibliográficas
167
FRANÇA, H., RAMOS-NETO, M.B. ; SETZER, A. O fogo no Parque
Nacional das Emas. Instituto do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renováveis (IBAMA). 140p, 2007.
168
MMA. MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE E DA AMAZÔNIA
LEGAL. Instrução Normativa n.3 de 27 de maio de 2003. Diário
Oficial da União, Seção 1. N.101, p.88-97, 2003.
169
SILVA, D.M.; BATALHA, M.A. Soil–vegetation relationships in
Cerrados under different fire frequencies.Plant and Soil, v.311, n.1, n.
2, p. 87-96, 2008.
170
AQUICULTURA: UMA PERSPECTIVA
DE REVOLUÇÃO SUSTENTÁVEL1
171
tornam a atividade insustentável, devido à pesca de espécies de vida
livre para a produção de alimento de peixes em confinamento(PARK
et al., 2016).
O uso das espécies de peixe é diversificado entre as diferentes
populações mundiais (BAGCHI; JHA, 2011). Os padrões de consumo
do pescado variam entre as espécies de peixes em um determinado
período de tempo e também para os ambientes continentais e
marítimos (JACQUET; PAULY, 2007). Em escala global, no ano
de 2011 a população mundial consumiu aproximadamente 130,8
milhões de toneladas de pescado (FAO, 2012). Suas práticas
correspondem 50% da produção de produtos de origem animal, com
um valor de 125 bilhões de Dólares. Representa 13% da proteína
e emprega aproximadamente 24 milhões de pessoas pelo mundo
(BUSH et al., 2013).
Com o aumento da preocupação das empresas com meio
ambiente e a sustentabilidade do planeta, tem ocorrido uma maior
cobrança do setor agroindustrial no sentido de controlar os efeitos
ambientais de todo o processo de produção, promovendo uma
política ambiental que diminua os impactos negativos na natureza
(ARRUDA, 2004; ANBEL, 2011). Dentro deste contexto, fica evidente
a necessidade contínua de estratégias para preservação ambiental.
Atitudes que diminuam a geração dos resíduos para o meio ambiente,
com o reaproveitamento da matéria-prima e a energia, através de
tecnologias que promovam reentradas na cadeia produtiva são
grandes alternativas sustentáveis (DAL PIVA et al, 2006).
O termo resíduo refere-se às sobras e aos subprodutos dos
processamentos dos alimentos que são de valor relativamente baixo
(ARRUDA, 2004). Na piscicultura, caracteriza-se por resíduo a
cabeça, as nadadeiras, pele, escamas e vísceras que, dependendo da
espécie, pode chegar a 66% em relação ao peso total. A produção de
farinha e óleo de peixe requer grandes quantidades de resíduos, sendo
uma atividade onerosa para pequenos produtores. Já a elaboração
de composto orgânico e silagem apresentam características de
produção que permitem, desde uma pequena até uma grande
unidade produtora utilizá-los como alternativas de aproveitamento
do resíduo (CONTERAS-GUZMÁN, 1994).
172
A importância da ictiofauna
173
assembléias de peixes assim como a extinção local de populações
ou espécies (ROSA & LIMA, 2008). Demonstram que devem
ser criadas estratégias de harmonia entre necessidades humanas e
conservação, qu e p o d e m c ont r ibu i r c om o sucesso de planos
de conservação das espécies (PRIMACK & RODRIGUES, 2001).
Piscicultura
174
apresentem agentes contaminantes. A reutilização desses resíduos
em áreas agrícolas necessita, entretanto, de sua prévia caracterização
e avaliação do potencial fertilizante. O método de compostagem
aeróbica pode ser uma ferramenta importante para eliminação de
possíveis patógenos, bem como para transformar os resíduos em
matéria orgânica estabilizada. Entretanto, a utilização de resíduos
provenientes da aquicultura tem sido pouco observada e estudada
no meio acadêmico.
175
tendências de produção científica na piscicultura, como técnicas de
desova, fertilização, variabilidade genética, endogamia e problemas
na adaptação e sobrevivência dos descendentes(DE ALMEIDA et al.,
2013; LOPERA-BARRERO et al., 2010, 2014; PORTA et al., 2006;
POVH et al., 2008).
Por outro lado, a produção em larga escala sofre com o aumento
nos custos do óleo de peixe e a diminuição dos serviços de provisão
em escala global, a utilização de recursos vegetais na produção de
rações permitirá a continuidade da piscicultura de maneira adequada
e sustentável (NG; ROMANO, 2013). Os efeitos de óleos substitutos ao
óleo de peixe são cada vez mais estudados em função da sua influência
sobre o crescimento, a eficiência alimentar, bem-estar, reprodução,
fisiologia e o apetite das espécies, com grande variação entre os
resultados obtidos (BONACIC et al., 2017; MONTERO et al., 2003;
NASOPOULOU; ZABETASKI, 2012; SARGENT et al., 1999; ZUO et
al., 2015; TURCHINI et al., 2010; TURCHINI et al., 2009).
Por exemplo, a associação do pescado como fonte de proteína e
lipídeos saudáveis e mudanças nos padrões alimentares da população
favorece o consumo de peixe por contribuir de maneira satisfatória
a saúde humana (JACQUET; PAULY, 2007). O que intensifica
a utilização dos estoques pesqueiros naturais, despertando a
necessidade em desenvolver métodos que suportem a demanda de
consumo (HENRIKSSON et al., 2012).
Toda e qualquer interação humana com o ambiente tem o
potencial de gerar impactos, a aquicultura também exerce um potencial
degradante aos recursos naturais (LACY; MEZA; MARQUET, 2017;
LASO et al., 2017). Dentre as principais interferências da piscicultura
no meio ambiente, destacam-se: enriquecimento de nutrientes na
água, introdução de espécies e lançamento de efluentes nos corpos
hídricos (GUTIERREZ-WING; MALONE, 2006).
Por exemplo, a qualidade da água é diretamente alterada pelas
condições ambientais do sistema utilizado na produção (CYRINO et
al., 2010). Em países como o Brasil, com grandes porções de água doce,
os problemas ambientais são maximizados se o manejo das práticas
humanas não forem bem planejadas (TUNDISI; MATSUMURA-
TUNDISI, 2003).
176
Aquaponia
177
Em todo o mundo as atividades utilizadoras de recursos hídri-
cos são geralmente inadequadas (JOFFRE et al., 2016). A falta de ma-
nejo e infraestrutura em ambientes urbanos e rurais exerce forte di-
minuição na qualidade do saneamento das águas residuais. Como es-
tratégia ambiental, muitos casos destacam o sucesso no uso de águas
residuais na aquicultura, por favorecerem a diminuição de matéria
orgânica e por ser um filtro ambiental no melhoramento da qualida-
de da água antes de ser dispensada em drenagens naturais(KUMAR
et al., 2015).
A aquaponia tem sido predominantemente difundida por todo
o mundo através de produtores em escala domiciliar, algo por mui-
tos referidos como “Backyard Aquaponics”, termo em inglês para
“Aquaponia de Quintal” ((HUNDLEY et al., 2013, HUNDLEY; NA-
VARRO, 2013). A prática de produção de alimentos, em especial
hortaliças, na própria residência é muito comum por todo o mundo,
doravante referida como agricultura urbana, e tem sido bastante in-
centivada por contribuir com a sustentabilidade ao diminuir a pres-
são de demanda sobre o setor produtivo de alguns produtos (AQUI-
NO, 2005). Segundo Rakocy (2006), a aquaponia oferece uma série
de vantagens:
• Cultivo integrado;
• No final do ciclo produtivo o produtor tem duas opções de
produtos;
• Menor gasto com água e
• Cultivo controlado.
Outro ponto positivo é reaproveitamento dos nutrientes,
assim como a nitrificação bacteriana com a consequente fixação
do nitrogênio pelos vegetais superiores mostraram-se técnica
e ecologicamente adequados (HUNDLEY, 2013). No estudo de
Barbosa (2011), verificou que no sistema tradicional de cultivo
de organismo aquático em tanque escavado pode causar sérios
problemas principalmente devido ao descarte de efluentes, e o risco
de introdução de espécies e patógenos no meio ambiente aquático
local.
178
Figura 3. Sistema de aquaponia - piscicultura e hidroponia
Espécies nativas
179
sucesso da produção comercial de alevinos. Isto leva a necessidade
de cada vez mais produzir alevinos e aprimorar a tecnologia de
reprodução natural e artificial de peixes (ANDRADE; YASUI, 2003).
Por outro lado, trata-se de técnica muito valiosa para a preservação
de material genético que pode ser utilizado tanto para programas
de melhoramento genético de espécies de interesse econômico
quanto para programas de preservação de populações nativas com
vistas à sua recuperação em ambientes que sofreram degradação
(CARNEIRO, 2007).
Estudos de biologia do sêmen de peixes foram iniciados no
século XIX. Várias características da biologia seminal de peixes
foram rapidamente identificadas: a imobilidade do espermatozoide
no sêmen in natura, a curta duração do seu desenvolvimento após
sua ativação e a necessidade de diluição em um meio hiposmótico
para a iniciação do movimento espermático (BILLARD; COSSON,
1992, MILIORINI, 2006, NAVARRO et al., 2014).
Essa técnica para armazenamento de sêmen de peixes está
ligada tanto a questões ambientais quanto econômicas. O impacto
ambiental sofrido pelo meio ambiente nos últimos anos, em especial
os ambientes aquáticos, vem afetando diretamente as populações
de espécies nativas de peixes. Mesmo antes de uma espécie de peixe
entrar para a lista daquelas ameaçadas de extinção, muitas de suas
características genéticas originais podem ter sido modificadas
visando a sua adaptação ao ambiente alterado.
Com o passar de algumas poucas gerações, algumas
características genéticas podem até serem perdidas. As estratégias de
recuperação da ictiofauna de corpos d’água que passam por período
de reversão de um processo de deterioração podem ser grandemente
auxiliadas por sêmen coletado num período anterior e armazenado
sob baixas temperaturas (RANA, 1995). O tema reveste-se de
grande importância, principalmente em função do notório declínio
dos estoques pesqueiros causadas pelas mais diversas razões como
a sobrepesca, a poluição, o uso conflitante da água, a construção
de barragens e reservatórios, o extrativismo, além da introdução
indiscriminada de espécies exóticas.
A criopreservação é uma das técnicas investigadas para
solucionar problemáticas deste seguimento por ser amplamente
utilizada no manejo da maioria das espécies, seja com finalidade
180
produtiva ou científica(FIGUEROA et al., 2013, 2015; MERINO et
al., 2011). A criopreservação oferece possibilidades de conservação
do material genético de espécies nativas e de produção, o que pode
aumentar as chances de preservação pincipalmente daquelas que
estão ameaçadas de extinção(MAZUR; LEIBO; SEIDEL, 2008;
CARNEIRO, 2007, NAVARRO et al., 2014, PATRA et al., 2016).).
Entretanto, os estudos sugerem que a criopreservação do
sêmen afeta as taxas de eclosão, danificando e prejudicando a
funcionalidade do esperma, além de reduções associadas das taxas de
fertilização(CABRITA et al., 2005; GOES et al., 2017). Para diminuir esses
efeitos da criopreservação, pesquisas têm sido direcionadas ao uso de
diferentes tipos de criopreservantes, e os resultados para a maioria deles
são satisfatórios do ponto de vista produtivo e ecológico(FELIZARDO
et al., 2010). Pois, evidenciam sucesso das soluções criopreservantes
para os gametas [por exemplo, espécies reofílicas (CAROLSFELD et
al., 2003; MURGAS et al., 2007; NINHAUS-SILVEIRA et al., 2006).
Resolvendo questões importantes para os commodities da aquicultura
e conservação de peixes (Figura 5).
Figura 5. Criopreservação de sêmen de Cachara (Pseudoplatystoma fasciatum).
1. Palhetas utilizadas na criopreservação de sêmen. 2 e 4. Espécie Cachara. 3.
Botijão criogênico. Empresa Cia do peixe, Cidade Ocidental, Goiás.
181
Espécies invasoras
182
de resíduos e gestão dos recursos naturais disponíveis para a região
(HUANG, 2011). Países em desenvolvimento têm a capacidade de
aumentar as redes temáticas de desenvolvimento agrícola no intuito
de gerar cooperação técnica, científica e econômica. O que por sua
vez gera fortalecimento de práticas de produção e consumo dos
produtos (DE AMORIM; DE ROSSO; BANDONI, 2016).
A piscicultura exerce diversificação econômica em diversos
países, principalmente os que estão em desenvolvimento. As
estratégias sociais criadas a partir das práticas dessa atividade no meio
rural melhoram sua economia com o uso da piscicultura, resultados
evidentes em países como a China, Índia e o Brasil (WORD BANK,
2010). A divulgação de informações relacionadas com a produção
de alimentos e a segurança alimentar tem demonstrado que o
conhecimento sobre a produção e a confiabilidade nos produtos
aumentam o consumo e a disposição a pagar pelos produtos nacionais,
incluindo os de agricultura familiar ou de práticas extensionistas
(ORTEGA; WANG; OLYNK WIDMAR, 2015).
A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
(EMBRAPA – pesca e aquicultura) exerce importante papel para o
desenvolvimento das práticas aquícolas no país. Atua principalmente
no desenvolvimento de técnicas e profissionalização da prática
em níveis satisfatórios. Desenvolve cursos, eventos e projetos que
atendem desde os pequenos produtores em sistemas reduzidos,
até a industrialização de produtos, processos e serviços inerentes a
piscicultura, assim como na pesca em águas interiores.
Em face da dinâmica da atividade e os diversos ramos e níveis
de atuação de profissionais e a população em geral, as contribuições
em nível federal impulsionam as atividades dentro dos estados.
Reforçando os núcleos menores, como associações de piscicultores,
produtores rurais, instituições públicas e entidades privadas.
Por exemplo, a piscicultura no estado de Goiás é atualmente
reconhecida pela associação de piscicultores do estado (AGP –
Associação Goiana de Piscicultura), com estimativas apontando
melhoria na logística, capacitação técnica e de mão-de-obra, assim
como a expansão no mercado produtor e consumidor. Comparada a
enorme possibilidade de outros estados brasileiros, especialmente da
183
região da Amazônia brasileira, sobretudo nos estados do Tocantins
e do Pará, o estado de Goiás demonstra que a situação futura poderá
ser um dos estados com maior importância na pratica da piscicultura.
Considerações Finais
184
até então desenvolvidas já demonstram grandes avanços para
implementação de produtos e técnicas. O estado de Goiás já destaca
como um dos estados brasileiros com fortalecimento da piscicultura
com inovação em sua organização através da Associação Goiana
de Piscicultores, aumento nas áreas de criação e diversificação das
práticas entre os produtores.
Destaca-se aqui que existe uma variedade de informações que
ainda não foram ou são pouco exploradas. Além do setor produtivo,
as publicações científicas e técnicas desenvolvidas no estado são
minimamente divulgadas em relação à potencialidade e atividades
aqui desenvolvidas. Deixamos aqui a sugestão de que as atualidades e
tendências da aquicultura sejam mais valorizadas no ramo acadêmico
goiano, o que irá contribuir satisfatoriamente com a produção de
peixes no Brasil e o avanço científico de maneira geral.
Referências Bibliográficas
185
ATTAYDE, J. L.; BRASIL, J.; MENESCAL, R. A. Impacts of
introducing Nile tilapia on the fisheries of a tropical reservoir in
North-eastern Brazil. Fisheries Management and Ecology, v. 18, n.
6, p. 437–443, 2011.
186
CARAMASCHI, E.P., HALBOTH, D.A. & MANNHEIMER, S.
Ictiofauna. In: BOZELLI, R.L., ESTEVES, F.A. & ROLAND, F. (eds.).
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Rio de Janeiro: IB- UFRJ/SBL, p. 155-177. 2001.
187
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Medical Society, v. 156, n. 1. 2004.
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of world fisheries and aquaculture 2012. FAO, Rome. 2012.
188
HALL, S. J.; DELAPORTE, A.; PHILLIPS, M. J. Blue Frontiers
Managing the environmental costs of aquaculture. Blue Frontiers:
Manging the environmental costs of aquaculture, 2011.
189
JOFFRE, O. M. et al. How is innovation in aquaculture conceptualized
and managed? A systematic literature review and reflection framework
to inform analysis and action. Aquaculture, v. 470, p. 129–148, 2016.
190
MAZUR, P.; LEIBO, S. P.; SEIDEL, G. E. Cryopreservation of the
germplasm of animals used in biological and medical research:
importance, impact, status, and future directions. Biology of
reproduction, v. 78, n. 1, p. 2–12, 2008.
191
NAVARRO, R. D. et al., Nutrição e alimentação de reprodutores de
peixes. Revista Augustus p. 108–118, 2010.
192
PORTA, J. et al. Genetic structure and genetic relatedness of a hatchery
stock of Senegal sole (Solea senegalensis) inferred by microsatellites.
Aquaculture, v. 251, n. 1, p. 46–55, 2006.
POUGH, F.H, JANIS, C.M. & HEISER, J.B. A vida dos vertebrados (4
edição). Atheneu, São Paulo. 750p. 2008.
193
WORLD BANK, FAO, Worldfish Center. The hidden har- vests: the
global contribution of capture fisheries. World Bank, Washington.
2010.
194
II PARTE – OS NEDETS NA
POLÍTICA DO DESENVOLVIMENTO
TERRITORIAL RURAL NO BRASIL:
RELATOS DE EXPERIÊNCIAS
195
EXPERIÊNCIAS DO NÚCLEO DE
EXTENSÃO EM DESENVOLVIMENTO
TERRITORIAL DO SUDOESTE DE
GOIANO (2015-2017)
197
Agrário (MDA), este trabalho irá sempre retomar esse órgão como
o propositor e executor da política aqui presente, tendo em vista a
importância e necessidade da manutenção de políticas setoriais para
a agricultura familiar.
Esta pesquisa apresenta-se como básica de caráter exploratório
e qualitativo. Foram utilizados os seguintes passos metodológicos:
pesquisa bibliográfica (teórica e técnica) e pesquisa de campo por
meio das ações do referido núcleo.
O trabalho divide-se em seis seções, a contar com essa
introdução. Nesse sentido, na segunda seção apresenta uma reflexão
bibliográfica sobre a política do desenvolvimento territorial no Brasil
e suas estratégias; na terceira seção destaca a criação dos Núcleos de
Extensão em Desenvolvimento Territorial (NEDET) e seu papel na
política ministerial; na quarta seção apresenta-se o Território Rural
do Sudoeste Goiano e o NEDET desse território; na quinta seção
são destacados os desafios, as ações e as perspectivas do NEDET
do Sudoeste Goiano no período de 2015 e 2016; por fim, a sexta e
última seção traz as considerações finais a respeito da discussão aqui
desenvolvida.
198
Entre as ações governamentais para o desenvolvimento da
agricultura familiar no Brasil, destaca-se como relevante a criação
do Ministério do Desenvolvimento Agrário pelo Decreto 3.338 de 14
de janeiro de 2000. É importante ressaltar como ação fundamental
para a criação do MDA a definição, de forma mais ampla, das ações
do Programa Nacional de Fortalecimento à Agricultura Familiar
(PRONAF) criado no ano de 19964, envolvendo fundos destinados à
assistência da agricultura familiar e reforma agrária.
Essas mudanças evidenciam o reconhecimento, em certa parte,
das reivindicações dos produtores do campo, criando, para isso, uma
estrutura institucional com competências setoriais, que outrora
se encontravam dissolvidas em assuntos de interesse maior. Do
mesmo modo, a destinação de linhas de financiamento reconhece a
importância da agricultura familiar para o abastecimento interno e
para a manutenção da segurança alimentar do país.
No ano 2000, como parte da estrutura do MDA, é criado o
Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável (CNDRS)
através do Decreto nº 3.508 de 14 de junho de 2000, visando orientar
a concepção de políticas públicas para o setor. Já no ano de 2004 é
criada a Secretaria de Desenvolvimento Territorial (SDT), passando
a integrar também a estrutura do referido ministério.
A criação desses dois órgãos no MDA fortalece o enfoque
territorial para o desenvolvimento rural no Brasil. Esses órgãos
passam a ser fundamentais no incentivo da participação social na
formulação das políticas para o desenvolvimento rural, colocando
o sujeito do campo não apenas como um espectador das ações
governamentais, mas como ator na formulação dessas ações e
políticas. Segundo Favareto (2010):
Em 2003 foi introduzido na concepção da política um movimento de
enorme transcendência ao considerar-se que o ambiente produtivo
dos agricultores familiares ultrapassa suas condições econômico-
produtivas, reconhecendo que o espaço geográfico, ambiente social,
político e cultural, assim como as condições da infraestrutura natural e
construída que circunda a empresa agrícola familiar, são determinantes
para a viabilidade de um modo sustentável de desenvolvimento rural
e de agricultura familiar. (FAVARETO, 2010, p. 87).
4
Decreto n° 1.946, de 28 de junho de 1996.
199
Essas mudanças significam um movimento importante sobre a
visão setorial, uma vez que entende a agricultura familiar e a reforma
agrária pelo viés do desenvolvimento territorial integral, englobando
não apenas os aspectos econômico-produtivos, mas também o
ambiente social, político e cultural nesse processo. Favareto (2010)
acrescenta que:
Essa decisão de passar de um foco centrado nos temas fundiários
e de agricultura familiar para uma concepção integral territorial,
parte do reconhecimento de que os objetivos do desenvolvimento
sustentável ultrapassam a dimensão econômico-produtiva da
agricultura familiar e envolvem outras esferas da vida social.
(FAVARETO, 2010, p. 87)
200
Os territórios rurais, também chamados de espaços urbanizados ou
microrregiões “rurais” são caracterizados a partir de discernimentos
demográficos. No caso em questão, são lugares que apresentam
uma densidade demográfica menor do que 80 habitantes por Km²
e uma população média por municípios de até 50.000 habitantes.
Os territórios rurais são classificados com o critério de uma maior
concentração do público favorecido do MDA.
201
relações influenciam na construção de uma identidade territorial que
ao mesmo tempo em que é coesa é diversa. Segundo o Ministério do
Desenvolvimento Agrário (2003):
202
A ação de parceria com as universidades é financiada pelo
MDA em conjunto com o Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico (CNPq). Segundo a SDT (2015) os Núcleos
têm como objetivo geral:
Contribuir para a consolidação da abordagem territorial como
estratégia de desenvolvimento sustentável para o Brasil Rural e da
articulação das políticas públicas integrantes da matriz do Programa
Territórios da Cidadania, por meio da articulação institucional e
operacional de Universidades Públicas Federais e Estaduais, dos
Institutos Federais de Educação Tecnológica, das instâncias de gestão
social dos Territórios Rurais e da Secretaria de Desenvolvimento
Territorial. (SDT, 2015)
203
da política territorial; produzir dados, informações e conhecimentos
por meio de pesquisas; assessorar e articular a participação das
mulheres, jovens, comunidades tradicionais e outros grupos sociais
nos Colegiados Territoriais e apoiar a consolidação dos Territórios
Rurais e da Cidadania (SDT, 2015).
204
ano de 2010 viviam nesse território5 324.914 habitantes, sendo o
município mais populoso o de Rio Verde, com uma população de
176.424 habitantes.
Segundo dados do Censo Agropecuário de 2006 (IBGE,
2016) existem no território um grande número de estabelecimentos
da agricultura familiar, com um total de 3.213 que empregam
7.741 pessoas. Os principais produtos destacados na região que
são produzidos pela agricultura familiar estão relacionados aos
hortifrutigranjeiros, como: alface, tomate, pimenta, pimentão,
cenoura, laranja, banana, melancia e mandioca, dentre outras.
Tendo em vista que a integração entre o desenvolvimento rural
e a abordagem territorial tem sido objeto das políticas públicas do
Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), foi criado no ano
de 2015 o Núcleo de Extensão em Desenvolvimento Territorial do
Sudoeste Goiano (NEDET), em atendimento ao edital de chamada
pública CNPq/MDA/SPM-PR Nº 11/2014. Sua duração inicial era de
24 meses (2015/2016), tendo sido prorrogada até o mês de julho de
2017. A entidade proponente e executora é a Universidade Estadual
de Goiás – UEG.
O projeto de extensão tem como objetivo geral: desenvolver,
implementar e manter ações extensionistas e de pesquisa no Território
Rural do Sudoeste Goiano por meio das ações integradas e definidas
no âmbito da política do Ministério de Desenvolvimento Agrário para
a capacitação e a gestão social; consolidação das políticas públicas
de desenvolvimento rural; e, também, pela inclusão produtiva nos
territórios definidos no projeto.
A atuação do núcleo nesse Território foi definida devido
à presença de unidades universitárias da Universidade Estadual
de Goiás e do Instituto Federal Goiano, essenciais no apoio ao
desenvolvimento de ações de extensão, o que permite uma atuação
direta em seus municípios.
Entre as atividades desenvolvidas pelo NEDET do Sudoeste
Goiano está a criação e o desenvolvimento de atividades que
contribuam para o mapeamento e avaliação das políticas
implementadas neste território e para a capacitação e qualificação
dos agentes para a promoção do desenvolvimento rural sustentável.
5
Dados trabalhados pelos autores.
205
Tendo como base o exposto até o momento, na próxima seção
apresentaremos os desafios apreendidos durante o processo de
implantação do NEDET do Sudoeste Goiano (conflitos, dificuldades
de mobilização, inclusão social e produtiva) e demonstrar os avanços
já alcançados de acordo com os agentes envolvidos no NEDET do
Sudoeste Goiano e os representantes do público-alvo específico.
206
sociais encontravam-se desmotivados com as políticas públicas e
com a discussão coletiva, estabelecendo a necessidade de resultados
concretos.
Por fim, apesar da grande produção agroindustrial da região,
em visitas aos municípios, podemos constatar um enorme potencial
para a produção familiar no Território. Entretanto, a falta de
articulação territorial entre os agricultores familiares e os mercados
consumidores, a organização produtiva dessas propriedades e a
ausência de assistência técnica apresentam-se como empecilhos
para a inclusão produtiva no Território. Assim, os pequenos
agricultores da região, constituídos principalmente de assentados,
acabam arrendando suas terras para o cultivo de monoculturas em
detrimento dos produtos de consumo alimentar.
Identificadas as dificuldades, o NEDET do Sudoeste Goiano
traçou eixos a serem priorizados durante sua atuação no Território,
os quais podem ser observados no quadro 1 a seguir.
Quadro 1 – Eixos definidos para atuação do NEDET do Território Rural do
Sudoeste Goiano – Goiás, 2015-2017
207
• Buscar tratamento prioritário às potencialidades do território;
• Incentivo ao reconhecimento da perspectiva do desenvolvimento
endógeno;
• Apoiar a criação e o desenvolvimento de associações e cooperativas;
• Elaborar projetos técnicos para submissão a editais de investimento
Inclusão Produtiva público;
• Ministrar oficinas voltadas à organização da produção no campo;
• Fortalecer o mercado institucional;
• Realização de eventos voltados aos processos produtivos;
• Definição e implantação de projetos pilotos de produção para serem
difundidos no Território.
208
Figura 2 – Capa da Apostilha da “Oficina de Cooperativismo do Território Rural
do Sudoeste Goiano”
209
Um ponto que nos chamou a atenção nas falas dos agricultores
familiares visitados no Território Rural do Sudoeste Goiano foi
a necessidade de assistência técnica, tendo em vista que a maior
parte das prefeituras do Território não disponibilizam profissionais
destinados a acompanhar esses pequenos agricultores.
Para sanar parte deste problema, foram realizados dois “Dias
de Campo”: o primeiro no município de Cachoeira de Goiás com
a temática “Bovinocultura e Piscicultura”; o segundo no município
de Paraúna, no Projeto de Assentamento Ponte de Pedra, com a
temática “Hortaliças e Piscicultura”. Durante os dois dias de campo
foram realizadas palestras por profissionais especializados, onde
ocorreram aulas práticas.
Tendo como objetivo principal a comercialização, o
armazenamento, a logística e o abastecimento de produtos da
agricultura familiar – o NEDET Sudoeste Goiano elaborou um projeto
técnico7 para a aquisição de veículos para apoio à comercialização
dos produtos da agricultura familiar do Território, submetido de
acordo com as diretrizes do edital PROINF 2015. Foram elaborados
outros projetos com base nas necessidades dos produtores que serão
submetidos a futuros editais do PROINF, PROINF Mulher e da
Fundação do Banco do Brasil.
Visando o fortalecimento local, dentre outras ações já
desenvolvidas pelo NEDET Sudoeste Goiano podemos destacar: a
participação nas reuniões dos núcleos diretivos do território, bem
como das plenárias conhecendo e tomando nota dos desafios do
território e possíveis ações que os possa suprir; visita a prefeituras,
sindicados e associações rurais dos municípios da região, em busca de
reestruturar o colegiado territorial e reorganizar os representantes do
poder público, da sociedade civil e grupos específicos8 nas discussões
das plenárias territoriais.
7
A proposta tem como impactos a inclusão socioprodutiva dos agricultores familiares, ampliando a
perspectiva de renda e segurança na produção agrícola familiar à medida que os produtos poderão ser
destinados diversos espaços de recebimento, comercialização e distribuição. Nesse sentido, a proposta
ainda impacta de forma positiva a segurança alimentar e nutricional do mercado consumidor da
região, incentivando o consumo de produtos da agricultura familiar. Por fim, a proposta ainda apoia
a infraestrutura produtiva dos agricultores familiares incentivando a produção familiar ou coletiva de
produtos alimentares com apoio logístico para a comercialização dos produtos da agricultura familiar.
8
Destacamos aqui que não foram realizadas ações junto a comunidades tradicionais devido à ausências
desses grupos no Território, focando-se, dessa forma, nos assentados rurais, mulheres e jovens.
210
As ações sempre foram realizadas por meio de trabalho de
campo e participação nos espaços coletivos9. Os principais pontos
debatidos giram em torno da sensibilização para o fortalecimento
da participação da implementação da política publica, pensando
sua gestão por meio da prática social, da participação e governança
como meios indispensáveis para o empoderamento do homem/
mulher do campo resultando na aproximação entre as instituições
governamentais e a sociedade. Buscou-se, de forma complementar,
a divulgação da política territorial por meio de banners e folders
explicativos, conforme a Figura 3.
Figura 3 – Folder de Divulgação da Política Territorial
9
É importante ressaltar que os custos de deslocamento com as reuniões das plenárias e do núcleo
diretivo são custeadas com recursos do NEDET do Sudoeste Goiano.
211
Em torno do último eixo destacado, a representatividade,
buscou-se a inclusão de dois importantes grupos até então distantes
das discussões que se davam no Território: as mulheres e os jovens.
Considerou-se que a participação do gênero feminino nas
discussões relacionadas ao campo deve ser efetiva e concreta, em
que as mulheres possam se integrar às discussões e movimentos
não apenas como companheiras de seus esposos, mas que seja
encorajado o espirito de liderança e a representatividade nos espaço
das discussões e tomada de decisões.
Nesse sentido, o NEDET do Território Rural do Sudoeste
Goiano realizou algumas ações destinadas à integração da mulher
rural no âmbito do desenvolvimento territorial. Como primeira ação,
foi criada a Câmara Temática das Mulheres no dia 22 de novembro
de 2015, em plenária realizada durante a II Conferência Nacional da
ATER no município de Quirinópolis/Goiás.
A câmara temática tem como objetivo a integração da
mulher rural, destinando espaços com reuniões e discussões que
possam promover a socialização de problemas comuns, despertar a
importância da representatividade feminina para o desenvolvimento
da agricultura familiar, promover a inclusão produtiva com a
valorização e apoio da NEDET do Sudoeste Goiano às iniciativas
produtivas e de comercialização já em operação no território rural,
bem como incentivar a participação do gênero nas plenárias com
intuito de que possam participar das decisões relacionadas à aplicação
de recursos públicos de programas governamentais no território.
Visando a inclusão produtiva da mulher no campo, o NEDET
do Território Rural do Sudoeste Goiano assessorou na elaboração de
um projeto destinado à estruturação da feira do Assentamento Ponte
de Pedra, município de Paraúna, submetido ao edital do PROINF
Mulher 2016.
Também foi realizada no dia 02 de abril de 2016 a “I Conferência
Territorial da Mulher do Sudoeste Goiano” (Figura 4). O evento teve
como objetivo realizar um encontro entre as mulheres do Território
Rural do Sudoeste Goiano para a troca de experiências, divulgação
dos produtos produzidos pelas mulheres do território (alimentos,
hortaliças, artesanatos, dentre outros), realização de rodas de
212
conversa com temas pré-determinados e a promoção de momentos
de bem estar para a mulher do campo.
A Conferência foi dividida em dois momentos principais: no
primeiro deu-se de início com a abertura do evento e contou com a
acolhida das participantes, momento de beleza e bem estar, abertura
da feira da agricultura familiar e exposição dos produtos artesanais
das mulheres rurais. Em seguida aconteceu a abertura do evento com
debate entre as mulheres rurais presentes, momento no qual foram
expostas as políticas públicas para as mulheres rurais formas de
acesso e limites.
213
agricultura familiar. A formação destas mesas possibilitou conversas
e informações acerca dos temas acima.
O evento ainda buscou proporcionar a visualização das
transformações do território pelas ações das políticas públicas e
investimentos voltados para a mulher rural brasileira. Considera-
se o evento de grande importância para a revitalização da
representatividade feminina no colegiado territorial, bem como
para o reforço das conquistas e direitos sociais das mulheres rurais.
O evento, além da socialização e integração da mulher rural, serviu
como base para algumas reflexões que passaram a integrar as ações do
NEDET do Território Rural do Sudoeste Goiano para a continuidade
do projeto e para a efetivação do desenvolvimento territorial da
agricultura familiar.
Com relação aos jovens, foi criada a Câmara Temática dos
Jovens. Esse espaço de discussões tem como objetivo integrar
a juventude do Território Rural do Sudoeste Goiano à política
do desenvolvimento territorial, apreendendo suas expectativas,
necessidades e ideias.
Por meio dessa câmara alguns jovens do Território puderam
participar da Ciranda da Juventude que ocorreu no mês setembro de
2016 na cidade de Silvânia. No evento puderam conhecer políticas e
ações destinadas apenas aos jovens do campo para posteriormente
disseminar essas informações por meio das reuniões no Território
e do “I Colóquio da Juventude do Território Rural do Sudoeste
Goiano”, realizado no dia 12 de setembro de 2016.
No âmbito da Câmara Temática dos Jovens estão sendo
implementadas algumas ações em busca de viabilizar na Universidade
de Goiás a implantação de um curso de nível superior por meio da
metodologia de alternância no Território. A ausência de cursos de
capacitação e de oportunidades de trabalho são um dos principais
problemas, segundo os jovens, para sua fixação no campo após
completar a maioridade.
Destacadas algumas ações e desafios do NEDET do Sudoeste
Goiano, ressalta-se a necessidade do assessoramento aos Territórios
Rurais e da Cidadania no intuito do assessoramento da gestão da
política pública. Destaca-se que essa continuidade não se relaciona
214
com prazo indeterminado, mas por um período de tempo necessário
à organização e motivação da participação e do empoderamento do
poder local.
Considerações Finais
Referências Bibliográficas
215
BRASIL. Decreto n° 3.338 de 14 de janeiro de 2000. Disponível em:
< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D3338.htm>. Acesso
em agosto de 2016.
216
ORTEGA, Antônio César. Políticas Públicas Territórios Rurais
no Brasil. In: ORTEGA, Antônio César; ESTRADA, Eduardo
Moyano (Orgs). Desenvolvimento em Territórios Rurais: Estudos
comparados de Brasil e Espanha. Campinas: Ed. Alínea, 2015, p. 27-
52.
217
DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL:
A CONSTRUÇÃO DO COMITÊ DE
JOVENS DA PLANÍCIE LITORÂNEA - PI
1
Graduanda em Engenharia de Pesca da Universidade Federal do Piauí – Coordenadora do Comitê de
Jovens da Planície Litorânea e colaboradora do NEDET do Território Rural da Planície Litorânea do
Piauí – Parnaíba–PI
alessandramota.24@hotmail.com
2
Graduado em Engenharia de Pesca – Coordenador do Comitê de Jovens da Planície Litorânea e
colaborador do NEDET do Território Rural da Planície Litorânea do Piauí – Parnaíba – PI
antoniotrompetista@hotmail.com
3
Mestranda do Programa de Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente (UFPI) – Assessora
Territorial de Gestão Social do NEDET nos Territórios dos Cocais e Planície Litorânea – Parnaíba – PI
jussara26@gmail.com
4
Doutor em Administração – Docente da Universidade Federal do Piauí Coordenador do NEDET nos
Territórios dos Cocais e Planície Litorânea – Parnaíba – PI
josenildopeixe@gmail.com
219
No que diz respeito às juventudes, atores mais que importantes
para renovação de potencialidades, temos uma diversidade de
programas educacionais que vem permitindo a formação escolar
e acadêmica para cumprir com as demandas sociais, tais como
o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego –
PRONATEC; Programa Universidade para todos – PROUNI que são
os mais expressivos criados para atender as necessidades educacionais
das juventudes brasileiras.
Entretanto, há uma necessidade que ultrapassa as paredes
escolares e passa pelas formações não formais ou informais: as do
mundo social, das decisões comunitárias, da ação, do protagonismo
das juventudes.
O território, segundo Guimarães (2003) é um espaço físico
multidimensional, que agrega relações ambientais, econômicas,
sociocultural e política entre instituições e pessoas. Nesse espaço
os grupos sociais são distintos e dialogam entre si. Segundo Flores
e Medeiros (2013) essas relações se materializam no palco da
disputa, por isso território também é local de disputas e conflitos.
Segundo Saquet (2015, p. 135) “Onde há relações de poder, em
cada território substantivado, há condições para a resistência, para
insurreição e movimentação” e neste caso se observa e se materializa
a sustentabilidade em diferentes dimensões como forma de
resistência ou resiliência, ou a resistência/resiliência como forma de
sustentabilidade.
O que Flores e Medeiros (2013) sugerem é que a sustentabilidade
seja pensada de forma contextualizada, interdisciplinar e que alcance
todas as escalas do mundo social e ambiental.
Na abordagem de desenvolvimento territorial, Flores e Medeiros
(2013) e Saquet (2015) nos orientam quanto ao fortalecimento das
identidades locais, sobre os conhecimentos geracionais e endógenos
que se renovam através dos tempos. Saquet (2015) chama a atenção
para a formação política cotidiana “a ação real é inseparável de uma
formação das consciências” (SAQUET, 2015 p 127). A cooperação, a
solidariedade, a participação, a valorização do patrimônio cultural
e ambiental passa por essa formação política, pela construção da
sustentabilidade territorial.
220
O MDA (2009) entende que a abordagem territorial combina
a proximidade social, que favorece a solidariedade e a cooperação
com a diversificação de atores sociais, melhorando a articulação dos
serviços públicos, organizando melhor o acesso ao mercado interno,
chegando até ao compartilhamento de uma identidade própria que
fornece uma sólida base para a coesão social.
Nesse sentido, as políticas públicas de promoção ao
desenvolvimento territorial sustentável necessitam proporcionar
a auto-organização dos sujeitos, que segundo Saquet (2015 p.
133) “é um elemento que as políticas públicas devem considerar,
valorizar e potencializar.” Cabe ao poder público fomentar novas
territorialidades.
Silva (2013, p.107) concebe o território como:
Símbolo de um universo coletivo, sendo um espaço privilegiado
de apropriação, de poder, do cotidiano e da busca de soberania dos
atores sociais, lugar onde acontecem os conflitos, enfrentamentos,
abrigagem, segurança, oportunidades, poder e lutas sociais.
221
O Comitê de Jovens foi organizado por intervenção pública,
pelo Núcleo de Extensão em Desenvolvimento Territorial – NEDET
da Universidade Federal do Piauí através do Projeto Gestão dos
Territórios (11/2014/CNPq/MDA/SPM-PR/UFPI)
222
Esse Território, segundo o IBGE (2010), possui 265.202
habitantes. O Território Rural da Planície Litorânea-PI apresenta
a economia relacionada ao setor primário com destaque para o
comércio, pesca artesanal e aquicultura, pecuária de leite, agricultura
familiar, arroz irrigado, fruticultura Irrigada, e cerâmica – mas com
algum grau de transformação através principalmente da indústria de
laticínios e agroindústria de beneficiamento do arroz.
Com potencialidades no turismo, artesanato e estação de
energia eólica, além da educação como escolas, universidades e
escolas técnicas, ainda sofre com carências no acesso a políticas
públicas.
Durante atividades de pesquisa que a Universidade vem
fazendo no Território da Planície Litorânea, podemos perceber que
há uma limitação de acesso as políticas públicas, geralmente por falta
de informação ou má gestão. Tais questões evidenciam a necessidade
de avançar no processo de desenvolvimento territorial no estado
para contribuir com as transformações sociais.
Assim, a conjuntura no Piauí demanda novos caminhos
para as políticas públicas Territoriais quanto ao desenvolvimento da
captação de recursos, fortalecimento e autonomia dos colegiados,
programas/projetos estratégicos, as cadeias produtivas locais, a
inserção no mercado de alimentos, as tecnologias socioambientais,
estratégias de convivência com o seca e igualdade social de gênero.
223
com respaldo da política pública da Secretaria do Desenvolvimento
Territorial – SDT, do Ministério do Desenvolvimento Agrário –
MDA, através do edital 011/2014.
Apresentado a Rede de Colegiados do Piauí, do Território
da Cidadania dos Cocais-PI e do Território da Planície da Planície
Litorânea-PI, apresentou o Projeto Gestão dos Territórios dos Cocais
– PI e Planície Litorânea – PI.
A proposta atuou de forma associada com atividades de
pesquisa-ação participativa, assessoramento organizacional
participativo e ensino focado em processos de formação educativos
em gestão social compartilhada dos conselheiros dos colegiados
em regime de alternância, com ênfase em gênero e juventudes do/
no campo para apoiar a inclusão socioprodutiva, emancipação das
organizações sociais, acesso às políticas públicas de desenvolvimento
territorial e fortalecimento da economia solidária.
Com uso das metodologias participativas (KUMMER, 2007;
VERDEJO, 2006) em processos formativos durante dois anos,
acompanhamento e assessoramento das organizações produtivas
oriundas da agricultura, pesca e piscicultura, com o esforço de
contribuir com o fortalecimento de pertencimento dos sujeitos do
território.
O projeto vem contribuindo para transformação das condições
de vida dos/as camponeses/as gerando subsídios para a consolidação
de políticas públicas de promoção do Desenvolvimento Territorial e
Rural com base na sustentabilidade.
224
como trabalhador, camponês, agricultor familiar.” Esse diálogo se
materializa nas estratégias de territorialização e reterritorialização.
Para a autora (2009 p. 185) o jovem rural vem “acionando diversas
estratégias de disputa por terra e por seus direitos como trabalhadores
e cidadãos”. Dessa forma as juventudes rurais não estão deslocadas
de seus espaços do campo, mas lutam para dar novas configurações
rurais.
O Comitê de jovens está inscrito nestas estratégias de renovação
da categoria Juventude rural, desenhando um forte interesse pelo
campo e oportunizando as transformações a partir do desejo e do
protagonismo do/a jovem rural. Formado no dia 12 de novembro de
2015 através da rede de colegiados da planície litorânea e cocais – PI, é
uma ação social com o objetivo de integrar os/as jovens para o espaço
de debate promovendo a autonomia e provocando ações sociais.
É um movimento onde há o diálogo de ideias e objetivos para
dinamizar o Território pelas juventudes, entre 15 e 29 anos, (idades
delimitadas pela Política Nacional da Juventude, criada em 2005)
para reelaborar histórias e territorialidades.
São jovens agricultores/as, filhos/as de pescadores/as,
piscicultores/as, sindicalistas, mobilizadores dos movimentos sociais
e egressos/as do ensino superior e das escolas agrícolas. Estes/as
jovens atuam em projetos sociais de construção de Saberes como O
projeto “Sementes dos Saberes Agroecológicos da Juventude Rural do
Piauí5”, Atuam como educadores-educandos das juventudes de suas
comunidades, no apoio ao fortalecimento das cadeias produtivas
locais, desenvolvimento de tecnologias socioambientais, construção
de produtos científico-tecnológicos e acesso aos mercados de ciclo
curto, os quais subsidiam sua profissionalização no setor de Ater e
inserção ao mercado de trabalho.
O comitê então é formado por jovens protagonistas que estão
inseridos em atividades políticas e educativas na promoção do
desenvolvimento territorial assegurando-lhe condições de liberdade
e de igualdade de direitos.
5
Projeto realizado em parceria entre a Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento
Agrário (Sead), a Universidade Federal do Piauí (UFPI), Federação dos Trabalhadores (as) rurais,
agricultores (as) do estado do Piauí – Fetag-PI, criado para contribuir com o desenvolvimento das
juventudes rurais em 33 municípios dentro dos territórios de Cocais e Planície Litorânea, no Piauí.
225
Segundo Oliveira (2014 p. 34) ao falar dos jovens de periferia,
afirma que ele “vivenciam as suas experiências entre a exclusão
e o pertencimento”. O grupo social organizado contribui para
proporcionar pertencimento a medida que interferem nas histórias
de vida da comunidade.
De acordo com o Regimento do Comitê, foram elencados sete
objetivos para orientar as ações. Constituem objetivos do Comitê da
juventude do território dos cocais:
I- estimular, apoiar e desenvolver o estudo e o debate da condição
da juventude, bem como propor medidas e politicas publicas,
objetivando eliminar todas as formas de discriminação identificadas;
II- fiscalizar e exigir o cumprimento da legislação que assegura
os direitos dos jovens, (conforme estatuto da juventude), a vida, a
liberdade, democracia, igualdade de oportunidades no trabalho,
educação, saúde, esporte, lazer, cultura, justiça, formação política
partidária, cor, respeito ao pluralismo de ideias, culturas e etnias.
III- manter canais permanentes de relação com movimentos de
jovens, apoiando o desenvolvimento de atividades dos grupos
autônomos, sem interferir no conteúdo e orientação de suas
atividades;
IV- desenvolver programas e projetos em diferentes áreas de
atuação, especialmente programas de geração de emprego e renda
para a juventude.
V- Incentivar e promover a participação e integração social e política
do jovem.
VI- Estimular os jovens o interesse pela agricultura familiar
com ênfase de reduzir o êxodo rural, abrangendo alternativas de
crescimento das comunidades e posteriormente fortalecendo a
sucessão rural.
VII- conscientizar sobre os direitos e deveres dos jovens fortalecendo
a luta por políticas de desenvolvimento territorial. (REGIMENTO
DO COMITÊ DE JOVENS, 2017)
226
Atividades executadas, métodos, enfoques, abordagens, técnicas e
instrumentos vivenciados.
227
Os encontros mobilizam e realizam diagnósticos rurais
participativos com o objetivo de levantamento de dados sociais,
ambientais, da agricultura familiar, pesca artesanal, aquicultura,
turismo, desenvolvimento territorial, políticas públicasde 33
municípios de dois Territórios do estado do Piauí: Cocais e da Planície
Litorânea, aplicados em comunidades rurais e assentamentos agrários,
os jovens participaram como pesquisadores em suas comunidades e
assentamentos, como também em outros municípios.
Os jovens ainda integraram a construção de Quintais
Agroecológicos que continham Tanques de recirculação para cultivo
de peixes, camarões, pomar, hortas de material reciclado (pets), horta
econômica, roçado e Sistema de Irrigação na Estação de Aquicultura
– UFPI – Parnaíba. Realização do Espaço ecológico com o uso de
material reciclado como pneus, garrafas pets, madeira e outros
(Figura 2).
228
impacto ambiental e apoiá-los no desenvolvimento de estratégias
que garantam a saúde e a soberania alimentar de suas comunidades.
Na construção dos quintais os jovens se reúnem, pensam e
articulam ideias, precisam trabalhar juntos, discutirem, planejarem,
testar tecnologias e reconstruí-las. Esse movimento de ação-
reflexão-ação coletiva, proporcionando no dizer de Oliveira (2014)
uma identidade coletiva, uma ação política de pertencimento e
transformação local.
Na construção dos quintais na Estação de Aquicultura
no Campus da UFPI, na sede da Federação dos Trabalhadores
e Trabalhadoras da Agricultura Familiar – FETAG/PI e no
Assentamento Palmares, município de Luzilândia, os jovens foram
protagonistas, utilizaram seus saberes para dinamizar e incluir
atividades produtivas e econômicas para agricultores/as familiares,
pescadores artesanais e piscicultores de base ecológica.
De forma participativa os/as jovens problematizam “o
concreto sociocultural, quando se insere no campo, analisando as
relações homem, agricultura, sociedade e natureza” (SILVA, 2007,
p.03). Interferem ativamente nas relações sociais, econômicas e
ambientais, de forma que garantem tentativas de sustentabilidade e
novas territorialidades, além de se construírem como atores/atrizes
políticos e autônomos.
Segundo Rodrigues (2016 p. 98) “[...]a ideia de juventudes
rurais não foge a relação da proximidade com a natureza, vínculo
e manejo da terra, sedimentação familiar e comunitária.” Rodrigues
(2016) ainda chama atenção para o contexto da pobreza em que estão
inseridos os/as jovens rurais e, segundo a autora, essa é uma grande
questão para inserção dos jovens em trabalhos assalariados no campo
ou na cidade, distanciando-se do trabalho familiar, conquistando
bens de consumo e serviços básicos, tais como educação e saúde que
só encontram nos caminhos da migração.
Nesse sentido, o comitê proporciona a discussão e
construção de saídas para pobreza rural, utilizando as estratégias
de desenvolvimento endógeno, ou seja, utilizando a abordagem
da sustentabilidade territorial (FLORES, MEDEIROS, 2015).
Os jovens dentro do Comitê constroem programas e trabalhos de
campo; proposta de projeto e oficinas participativas para levar
229
conhecimento às comunidades rurais mais distantes com diferentes
temáticas.
Participaram de conferências nacionais, Congressos nacionais
e internacionais (ATER, Mulheres e Juventudes); Execução de
projetos de inserção sócio profissional, Atividades Político-Cultural,
Participações em oficinas de gênero e temáticas voltadas a “A violência
contra a mulher do campo” e “Relacionamentos Abusivos”.
É uma atividade educativa e política. Para compreender a
prática social e política do comitê, vamos aqui descrever e analisar
algumas ações realizadas na comunidade rural Brejinho de Fátima
no município de Luís Correia.
Na referida comunidade os jovens se reuniram as 9:30h. No
local apareceram algumas lideranças da comunidade e a presidência
do sindicato rural. Fizeram a apresentação do quintal agroecológico
e ouviram sugestões da comunidade e dos demais jovens. Houve
uma apresentação teórica sobre a importância da agricultura familiar
no Brasil por uma integrante do comitê que previamente realizou
pesquisa bibliográfica e apresentou questões importantes sobre o
tema que é tão próximo e tão real para aquela comunidade que vive
da pesca artesanal e de atividades agrícolas.
Na discussão sobre o tema, a jovem apresentou políticas
públicas de apoio a agricultura para conhecimento comunitário, tais
como o Programa de Aquisição de Alimentos – PAA; e o Programa
Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar - PRONAF,
e todas as suas variações (PRONAF A, PRONAF B, PRONAF
mulher, PRONAF jovem, PRONAF alimentos, PRONAF semiárido,
PRONAF indústria, PRONAF agroecologia, PRONAF eco, PRONAF
mais alimentos)
Trouxe para a discussão Programas para educação do campo,
tais como o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e
Emprego – PRONATEC e o Seguro Safra. Após sua fala sobre
agricultura familiar e políticas públicas, outro jovem fez apresentação
sobre o tema agroecologia.
Utilizando imagens dos quintais já construídos para a
comunidade, iniciou a discussão mostrando as bases científicas da
agroecologia, sobre os perigos dos agrotóxicos e mostrou opções de
compostagem e inseticidas naturais. Incluiu no seu discurso o tema
230
do êxodo rural e falou sobre sua experiência pessoal de sair de sua
cidade e procurar emprego fora.
O jovem continuou sua palestra falando a diferença entre
agroecologia e orgânico, falou um pouco sobre o agronegócio e o uso
da monocultura pelos grandes latifundiários. Destacou os sistemas
agroflorestais e finalizou com um vídeo que retrata as pessoas que
vivem na região que sofre com a seca.
Os integrantes da reunião participaram do momento houve
alguns depoimentos sobre a transição da agricultura tradicional
para alguns princípios agroecológicos. Nesse mesmo encontro,
considerando que a comunidade tem grande potencial turístico,
outra jovem fez uma apresentação teórica do tema: Turismo rural.
Mostrou vários exemplos sobre a temática, com muitas imagens e
opções diferentes sobre turismo rural, atividades praticadas.
Incluiu as atividades eco turísticas que acontecem no território,
mostrando imagens da pedra do sino que se localiza na comunidade,
abriu-se uma discussão sobre o potencial do turismo na comunidade
onde surgiu a ideia de utilizar o monumento natural “pedra do sino”
para fazer a prática dessa atividade.
A jovem que é estudante de turismo continuou sua apresentação
com outros exemplos de atividades de turismo rural, pesca, pesque e
pague, atividades esportivas, atividades recreativas, trilhas e feiras de
agropecuária, e a opção do artesanato, falou sobre o perfil do turista
rural, como busca pela tranquilidade e opções diferentes da rotina
em que estão acostumados. Ao final fez uma atividade em que tinha
como objetivo mostrar os possíveis potenciais da comunidade para
realizar o turismo rural.
Os participantes da oficina construíram cartazes onde estavam
representados possíveis pontos turísticos que a comunidade tem,
foram expostos pelos próprios participantes, eles relataram todas
as qualidades, em destaque ficou a “pedra do sino”, as nascentes,
cachoeiras, a feira agropecuária que acontece no mês de setembro, a
feira comunitária que acontece todo domingo, o festival junino e os
festejos religiosos que acontecem na comunidade. Ainda apareceu
o futebol feminino que se destaca na região, o artesanato feminino,
na região há muitas costureiras e confeccionistas, pessoas que fazem
redes e sandálias personalizadas, produção em gesso, tapetes, a
231
culinária típica da região- ovos caipiras, cocada, tapioca, carneiro,
etc.- e os festejos culturais, religiosos como a via sacra(teatral).
A oficina continuou e os jovens utilizaram alguns instrumentos
das metodologias participativas, construíram a ferramenta Fortalezas,
Oportunidades, Fraquezas e Ameaças – FOFA; Linha da vida;
Diagrama de Venn, Matriz de problema, causas e efeitos e a Matriz
Histórica da comunidade. (VERDEJO, 2006; KUMMER, 2007).
Essa construção realizada em uma comunidade foi apenas um
dos momentos do comitê, os jovens transitam dentro do território
observando potencialidades diversas de cada local, levando suas
experiências e trazendo outras histórias que somadas constroem
novas ruralidades positivas, promovendo pluriatividades a partir do
desejo e da necessidade local/territorial (Figura 3).
A disseminação de ideias e de novas relações sociais, econômicas
e ambientais, realizada pelos jovens dinamiza o pertencimento,
oportuniza a responsabilidade social desses atores diante de desafios
de seus espações, de seus territórios.
Os jovens ainda construíram o regimento interno do grupo,
para formalizar a organização e seus planejamentos anuais.
Figura 3:Construção das oficinas de metodologias participativas na comunidade
brejinho – PI.
232
Considerações finais
Referências Bibliográficas
233
CASTRO, E. G. de. Juventude rural no Brasil: processos de exclusão
e a construção de um ator político. Revista Latinoamericana de
Ciências Sociales, Niñez e juventud. 2009. 1 (7), pp. 179 - 208.
Disponível em: http://www.umanizales.edu.co/ revistacinde/indez.
html. Acesso em 16 de Junho de 2017.
234
SECRETARIA DE DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL – SDT
- Portal do Ministério do Desenvolvimento Agrário: Articulando
Políticas Públicas e Demandas Sociais. Disponível em: <http://
www.mda.gov.br/index.php?sccid=129>. Acesso em 10 Maio 2017.
235
POLÍTICA DE DESENVOLVIMENTO
TERRITORIAL: RELATOS DE
EXPERIÊNCIAS DO NEDET DO
TERRITÓRIO CENTRAL DA
CIDADANIA DE RONDÔNIA PARA
JOVENS E MULHERES DA FLORESTA
AMAZÔNICA
237
arranjos territoriais específicos, que se constituíram da relação
humana com a natureza amazônica, desde o ponto de vista do
pertencimento, geográfico e das estratégias de inserção social e renda.
Neste contexto, o Departamento de Engenharia de Pesca da
Universidade Federal de Rondônia - UNIR, Campus Presidente
Médici-RO, desenvolveu o projeto Núcleo de Desenvolvimento
Sustentável do Território Central da Cidadania para Jovens e
Mulheres da Floresta Amazônica – Rondônia, promovendo o tripé
indissociável do ensino, pesquisa e extensão, com base nas experiências
das atividades dos projetos: Pirarucu-Gente (CNPq/MDA),
desenvolvido no Território da Cidadania Central de Rondônia, na
conjuntura de ATER e demandas das chamadas públicas; do Programa
Peixe Vivo: sustentabilidade da pesca artesanal de Rondônia (MPA);
do Projeto Peixe Vivo: pesca artesanal e aquicultura amazônica de
base familiar e ecológica no estado de Rondônia (PROEXT 2011); e
do projeto SEMENTES AGROECOLÓGICA: Transformação cidadã
da juventude do campo na Amazônia numa ação conjunta entre o
MDA, Secretaria Nacional da Juventude – SNJ, UNIR, Federação dos
Trabalhadores na Agricultura de Rondônia – FETAGRO e Federação
de Pescadores e Aquicultores de Rondônia – FEPEARO.
As atividades conjuntas da pesquisa participativa, do
assessoramento organizacional participativo e do ensino focado no
desenvolvimento sustentável do Território Central da Cidadania
para Jovens e Mulheres da Floresta Amazônica – Rondônia,
buscou contribuir com o fortalecimento dos espaços sociais,
envolvimento de atores locais, igualdade social de gênero, inclusão
socioprodutiva, aumento de renda, efetivação das políticas públicas
de desenvolvimento territorial, especificamente quanto à redução
das desigualdades e crescimento da justiça social.
Entende-se que essa ação implicou em analisar, repensar
e estabelecer métodos e instrumentos de gestão coletiva das
concepções de vida e das visões de mundo. Desse modo, é consensual
que o projeto apoiou o encontro da pesquisa, ensino e extensão
mediado pela reflexão teórico-prática e de troca de saberes entre
os povos da floresta, professores, pesquisadores, extensionistas e
discentes para a construção de um novo conhecimento coletivizado
e sistematizado a partir da realidade do povo da floresta amazônica
238
que clama por construir de forma participativa a sustentabilidade da
região amazônica, pertencentes aos territórios envolvidos. Por isso,
o artigo busca sistematizar os principais resultados obtidos por meio
da assessoria do NEDET apontando as ações e o papel da assessoria
territorial na política de desenvolvimento sustentável.
Estes dados são oriundos de pesquisas realizadas pelo Projeto
Núcleo de Desenvolvimento Sustentável do Território Central da
Cidadania para Jovens e Mulheres da Floresta Amazônica – Rondônia
(UNIR/CNPq/MDA/SPM-PR), que se utilizou de metodologias
participativas com base na pesquisa-ação participativa, observação
direta, análise de dados secundários e entrevistas semiestruturadas
com delegados do Colegiado de Desenvolvimento Territorial
(Codeter) do Território Central da Cidadania de Rondônia.
O Colegiado de Desenvolvimento Territorial é uma
institucionalidade que reúne representantes do poder público e da
sociedade civil atuante no Território Central, com o objetivo de
ampliar a participação social, a representação das organizações que
compõem o Território e a articulação necessária para a gestão social
das políticas públicas. O Colegiado Territorial é o principal espaço de
negociação, articulação, decisão e priorização de propostas e projetos
pertinentes com a visão de desenvolvimento do território.
O Estado de Rondônia
239
a capital é Porto Velho, mas se destacam como cidades importantes
para a socioeconômica e política estadual, os municípios de:
Guajará-Mirim, Ariquemes, Jaru, Ji-Paraná, Rolim de Moura, Cacoal
e Vilhena. É o terceiro estado mais populoso dessa macrorregião,
com seus 1,7 milhão de habitantes,sendo superado apenas pelo Pará
e Amazonas. No entanto, apenas dois de seus municípios possuem
população acima de 100 mil habitantes: Porto Velho, a capital sendo
a maior cidade do estado com 511.219 mil habitantes, e Ji-Paraná,
com 131.560 mil habitantes (IBGE, 2016).
Em Rondônia temos dois domínios morfoclimáticos: Domínio
Amazônico, na porção norte; dos Cerrados, na porção sul e uma área
de transição na porção central do estado. Estes domínios, embora
transformados pelas atuais atividades agropecuárias, fazem parte
do complexo ecossistema que precisa ser mais bem reconhecido
e explorado sustentavelmente, uma vez que a biodiversidade
amazônica ainda não está devidamente pesquisada quanto as suas
potencialidades (AB’SÁBER, 1975).
Localizado na Amazônia Ocidental, Rondônia apresenta uma
variedade de aspectos físicos e humanos que embaralham a mente do
observador. À primeira vista, sua vegetação é exuberante e composta
por florestas de palmeiras e cocais, matas de igapó nas várzeas, floresta
fechada com árvores de copas altas, matas esparsas, além de cerrado em
boa parte do território. A vegetação de cerrado do planalto se mescla à
floresta amazônica e à bacia pantaneira, num espetáculo indescritível de
encontro de floras, cenário recortado pelos maiores formadores da Bacia
Amazônica, com uma variedade de águas claras e escuras (ASSIS, 2011).
Apesar de ser um estado jovem, criado em 1982, possui o 3º
maior Índice de Desenvolvimento Humano – IDH (seu IDH médio
é 0,72), o 2º maior PIB per capita, e a 3ª menor taxa de analfabetismo
entre todos os estados das regiões Norte e Nordeste do país. Possui
também a 8ª melhor distribuição de renda e a 4ª menor incidência
de pobreza de todo o Brasil. A economia se baseia na agricultura,
no extrativismo e na pecuária. De forma geral, possui as mesmas
potencialidades e belezas características de outros estados da região
amazônica (IBGE, 2010).
Diversas foram as fases de desenvolvimento nesta região; entre
elas a descoberta de ouro no Rio Corumbiara, no século XVIII; a
240
conquista e o povoamento dos vales do Guaporé, Mamoré e Madeira;
a construção do Real Forte Príncipe da Beira, no período colonial;
o primeiro e o segundo ciclo de látex (borracha); a construção da
estrada de ferro Madeira Mamoré [...]. Mas foi com a abertura da
BR-364, na década de 60, que se iniciou a real colonização do então
território Federal de Rondônia (OLIVEIRA, 2001).
Figura 1 – Territórios de Rondônia
241
sudeste), território Vale do Guaporé (ao sudoeste), e Território de
Identidade Zona da Mata (ao sul), ver figura 1; e abrange uma área
de 28.225 km2 (PTDRS (2013).
Os municípios do Território Central tiveram suas formações
atreladas aos ciclos da borracha; à implantação de estações telegráficas
mediante a Comissão Rondon; à abertura da rodovia BR – 364; aos projetos
de colonização e núcleos urbanos implantados pelo Instituto Nacional de
Colonização e Reforma Agrária – INCRA e, mais recentemente, pelos
desmembramentos dando origem a vários municípios (PTDRS (2013).
Atualmente, o Território Central é formado por 13 municípios,
sendo eles: Alvorada D’Oeste, Governador Jorge Teixeira, Jaru, Ji-Paraná,
Mirante da Serra, Nova União, Ouro Preto do Oeste, Presidente Médici,
Teixeirópolis, Theobroma, Urupá, Vale do Anari, Vale do Paraíso (Figura
2). A população rural do Território Central em 2010 era de 106.824
habitantes e a urbana de 214.955 habitantes segundo o Plano Territorial
de Desenvolvimento Rural Sustentável e Solidário – PTDRS (2013).
242
A distribuição populacional é predominantemente urbana nos
municípios de Jaru, Ji – Paraná, Ouro Preto do Oeste e Presidente
Médici, excluindo estes quatro municípios, fica bem evidente a
presença predominante de uma população rural no Território Central.
O território é caracterizado por agricultores familiares, distribuídos
em 23.242 propriedades rurais com menos de 100 hectares. Desta
forma, fica aparentemente evidenciado que não há concentração de
terras na região. A zona rural do Território Central está perdendo
população e as pessoas que permanecem estão alcançando uma faixa
etária “madura” (IBGE, 2016).
A relação de gênero se mantém na prática, estável. Habitam
o Território Central, além da população generalizada, agricultores,
pescadores, indígenas e extrativistas que compõem a agricultura
familiar. O plano territorial de desenvolvimento sustentável deste
território deixa clara a necessidade de investir em ações de geração
de renda e que envolvam os jovens (PTDRS, 2013).
Com relação à dimensão social do Território Central,
comparando os dados populacionais dos anos de 2000 e 2010, houve
uma perda de aproximadamente 3,0% em sua população, com maior
destaque para os municípios de Alvorada D’Oeste e Governador
Jorge Teixeira.
Dos 13 municípios que compõem o Território Central, somente
dois (Ji – Paraná e Vale do Anari) não apresentaram diminuição na
população, contudo, esta perda populacional já foi bem maior se
compararmos os dados dos anos de 2000 e 2007. Neste período a
perda populacional chegou a 6,0%. No território existe demanda
social, isto é, necessidade de realizar investimentos em políticas
públicas para benefícios coletivos dos grupos sociais e dá indicativos
de aplicação de ações, de desenvolvimento sustentado, centradas aos
agricultores familiares, produtores rurais e políticas para mulheres.
De acordo com os integrantes do Colegiado de Desenvolvimento
Territorial – Codeter – os motivos deste êxodo são a busca de
oportunidade de ocupação, emprego e renda; e busca de melhores
condições de educação (PTDRS, 2013).
Na educação do estado e no Território Central, com relação à
educação rural, verifica-se uma inadequada grade curricular que é
243
exclusivamente voltada ao contexto urbano. De acordo com o Censo
Escolar de 2010, o ensino fundamental demonstra uma debilidade
na área rural e, de um modo geral, apresenta inconstâncias diante
do número de alunos nas séries iniciais e nas séries finais, podendo
indicar evasão escolar (PTDRS, 2013).
Assim, é importante a construção de um modelo educacional
destinado a atender a realidade rural. Os pescadores artesanais,
de certa maneira, estão presentes em todo o Território Central,
Contudo, somente nos municípios de Ji – Paraná e Presidente Médici
existem colônias de pescadores e entidades de representação desta
classe de agricultores familiares. Também há terras indígenas e três
Reservas Extrativistas – RESEX que são unidades de conservação
de uso sustentado. No Território Central não foram identificadas
comunidades quilombolas.
De acordo com a Lei Complementar Estadual nº 233, de 06 de
junho de 2000, grande parte do Território Central,
[...] são áreas com grande potencial social. Estão dotadas de
infraestrutura suficiente para o desenvolvimento das atividades
agropecuárias, sobretudo estradas de acesso; concentram as
maiores densidades populacionais do Estado; nelas localizam-se os
assentamentos urbanos mais importantes. Os custos de oportunidade
da preservação já se tornaram excessivamente elevados para garantir
a conservação, aptidão agrícola predominantemente boa, apresenta
vulnerabilidade natural à erosão predominantemente baixa (PTDRS,
2013, p. 48).
244
Secretaria de Desenvolvimento Territorial – SDT, da Diretoria de
Políticas para Mulheres Rurais do Ministério do Desenvolvimento
Agrário – MDA e da Secretaria de Políticas para Mulheres da
Presidência da República.
Nesse sentido, as Assessorias Territoriais de Gestão Social –
ATGS, Inclusão Produtiva – ATIP e de Gênero – ATGE juntamente
com a coordenação do Projeto Núcleo de Desenvolvimento
Sustentável do Território Central da Cidadania para Jovens e
Mulheres da Floresta Amazônica – Rondônia, iniciaram as atividades
de mobilização e articulação com os membros do Colegiado
Territorial de Desenvolvimento Rural – Codeter – que até então
estava desarticulado devido o esvaziamento dos membros tanto do
poder público quanto da sociedade civil.
Para tanto, após a mobilização de representantes do poder
público e sociedade civil, realizou-se a eleição da estrutura
organizacional do TCCRO com a prerrogativa de caráter gerencial
dos planos, programas e projetos dentre outras finalidades, de modo
que o Núcleo Diretivo ficou composto por 6 (seis) membros, sendo
50% representantes governamentais de nível municipal, estadual
e federal e 50% representantes da Sociedade Civil, garantindo a
equidade de gênero, além disso, constituiu-se o Núcleo Técnico,
instância de caráter operacional, encarregado do apoio técnico-
científico às ações territoriais, constituído por 10 membros, dando
suporte permanente ao funcionamento do núcleo diretivo e do
colegiado. Formado preferencialmente por instituições/órgãos de
pesquisa, assessoria técnica e organizações de apoio (Figura 3).
245
Buscando elaborar, implementar, monitorar, avaliar e
aperfeiçoar as ações Territoriais do PTDRS e do Programa Território
da Cidadania – PTC, com vistas ao desenvolvimento com equidade
e equilíbrio, se fez necessário o planejamento estratégico de ações
para o TCCRO de acordo com a realidade dos atores sociais, a fim de
promover uma agenda de atividades a serem executadas ao longo do
ano pela estrutura organizacional do território, ficando deliberado
que as reuniões ordinárias do Núcleo Diretivo seria mensal e do
Codeter/TCCRO trimestral.
A política territorial possibilita aos membros do Codeter ter um
espaço de discussão, proposição, deliberação, gestão e controle social
das políticas públicas de Desenvolvimento Territorial Sustentável
e Solidário, com funcionamento permanente, e conduzido por
regimentos e normas aplicáveis, no entanto, o Codeter/TCCRO
possui dificuldades voltadas à implementação e integração das
políticas públicas acessadas pelos atores sociais.
Para levantar as dificuldades e necessidades e a priorização
de atividades para curto, médio e longo prazo do colegiado do
TCCRO, Núcleo Diretivo e Técnico, o planejamento estratégico, foi
realizado de forma participativa, equitativa e democrática, assim
foram elencadas ações prioritárias, nas quais foram relatadas pela
equipe NEDET, sendo: 1 - Dificuldade de acesso ao Programa Luz
para Todos, principalmente pelas aldeias indígenas e escolas do
campo; 2 - Ausência de suporte técnico aos Povos e Comunidades
Tradicionais para elaboração de projetos sustentáveis; 3 - Gargalos
na área ambiental; 4 - Licenciamento das agroindústrias familiares;
5 - Dificuldade de acesso ao crédito fundiário pelos agricultores
familiares.
Realizado o diagnóstico participativo com o Codeter, foram
traçados planos de ações distribuindo as responsabilidades e prazos
de execução entre os membros. Portanto, essas demandas passaram
a fazer parte do planejamento das atividades a serem realizadas pelo
Codeter e suas instâncias territoriais.
Na busca para fortalecer a participação de jovens, mulheres,
povos e comunidades tradicionais na discussão territorial, o NEDET
apoiou atividades de assessoria técnica para articulação, promoção
246
e efetivação da participação desses membros no Colegiado do
Território da Cidadania Central, com vistas à inclusão produtiva e
fortalecimento dos grupos sociais. Para isso, constituíram Comitês
em três categorias: Juventude, Mulheres, Povos e Comunidade
Tradicionais, que tem por objetivo fortalecer a organização dos
segmentos sociais historicamente fragilizados, consolidando um
espaço de identidade, representação e discussão de suas pautas
específicas, para além do plenário.
Quanto aos membros do Codeter, 62% participam de outas
instâncias colegiadas, garantindo a integração e envolvimento dos
atores sociais e a identidade do território, surgindo diversos espaços
institucionais de participação social de forma a envolver os atores sociais
na dinâmica de gestão das políticas e do desenvolvimento da região.
Portanto, os espaços são abastecidos com informações
técnicas que estimulem as discussões, oferecem novos elementos
para as reflexões, apresentando alternativas que permitem definir as
melhores estratégias de desenvolvimento. Como o planejamento é
um processo, que deve se adaptar permanentemente às mudanças
dos objetivos ou das condições, cria localmente uma capacidade de
planejamento e de diagnóstico técnico (GUANZIROLI, 2008).
Quanto à participação dos membros em Movimentos Sociais
ou Coletivos, 66% estão vinculados, quanto aos segmentos de atuação
44% são de Movimentos Sociais do Campo. Outros segmentos citados
em menores proporções foram: Assistência Técnica e Extensão Rural;
Movimentos ou Coletivos de Mulheres; Rede de Agroecologia.
Medeiros e Dias (2011) mencionam que se as
instituiçõesparticipam do colegiado, mas não percebem tal Política
Territorial como algo estratégico, capaz de promover mudanças
significativas no país, sua contribuição no debate já nasce
comprometida. A presença no colegiado de entidades que não estão
preparadas tecnicamente ou dispostas a contribuir com a discussão
territorial faz com que o debate seja monopolizado por um grupo
restrito de organizações que, no limite, pode utilizar da estrutura do
colegiado para reforçar seus próprios interesses.
O Codeter/TCCRO não é apenas o espaço físico, mas um
espaço dinâmico, de relações sociais, econômicas, ambientais e de
247
construção de identidades, de modo que 32% dos membros estão a
menos de um ano participando das discussões territoriais, no entanto,
29% contribuem para a política territorial a mais de sete anos.
Mesmo com esta diversidade de membros e experiências nas
discussões no espaço territorial, para a articulação da paridade de
gênero, desde o primeiro momento, houve dificuldade para encontrar
nomes para os núcleos diretivo e técnico e consequentemente para
a formação do colegiado de mulheres e jovens. Diante disso, a
assessoria do território central buscou, em cada reunião efetivada nos
municípios, enfatizar a importância do envolvimento das mulheres
nesse processo, inclusive explicando aos companheiros e filhos
presentes que por intermédio desse espaço, a troca de saberes poderia
contribuir para o desenvolvimento da família. Da mesma maneira,
houve uma conversa com a juventude, mostrando as vantagens e uma
maneira de ter voz na luta pela própria independência financeira.
Após a mobilização nas reuniões do colegiado, percebeu-
se a diferença na participação das mulheres de forma positiva,
empenhando na busca pelo espaço que têm direito. Além da articulação
do NEDET-Central, o incentivo do governo federal mediante edital
Proinf-Mulher, foi eficaz em iniciar uma maior participação das
mesmas. De encontro vieram os Proinf ’s direcionados a juventude
e aos povos e comunidades tradicionais, o que abre espaço para a
minoria ter espaço e voz para lutar pelos seus direitos.
Apesar da participação da mulher, da juventude e dos povos e
comunidades tradicionais ainda se mostrarem tímidos no território,
nas conferências direcionadas a cada público, foi visto a força e a
qualidade da discussão política dos mesmos, o que levanta uma outra
questão, o espaço oferecido a esses públicos são suficientes para a
demanda que buscam? A própria resposta vem da indagação destes,
nas três conferências realizadas com a colaboração do NEDET, a
mulher, o jovem, o indígena, o pescador, o extrativista e todos os
outros que compõem a classe, pediram mais espaço, fomento e
políticas públicas voltadas para cada realidade, para cada público,
assim a contribuição e o giro que a economia precisa fazer, passaria
por todas as classes.
248
Dentre os grupos de mulheres que passaram a constituir o
Codeter, estão as da Associação das Agricultoras e Agricultores da
Agricultura Familiar de Teixeirópolis (AAAAFAT), residentes no
município de Teixeirópolis, Rondônia. O grupo é formado por 23
mulheres e dois homens que trabalham na fabricação de chocolate
artesanal (Figura 4).
249
demandas levantadas no Codeter, está a industrialização dos produtos
da agricultura familiar.
Dentre os assuntos abordados no Codeter, o mais discutido
foi a legislação para a agroindústria familiar, seus entraves para
regularização e funcionamento, a construção de propostas para
negociar com os governos das três esferas, e Gestão de conflitos
perante os órgãos municipal, estadual e federal, propondo uma
formulação na legislação específica para as agroindústrias do estado
de Rondônia. Foi realizada uma Formação e Capacitação para
Agroindústrias e Mercados do município de Ji-Paraná, onde alguns
membros do Codeter participaram (Figura 5).
250
Para Caporal (2006), os novos desafios da Ater pública dizem
respeito ao processo de gestão, onde é necessário introduzir na
prática de gestão formas de participação que permitam compartilhar
e distribuir o poder. Portanto, as chamadas públicas devem atingir
um público diversificado sempre respeitando a realidade e a cultura
de cada um em prol do desenvolvimento sustentável da mulher, dos
jovens, da família e dos povos e comunidades tradicionais com suas
especificidades e meio de produção.
Investigou-se também a respeito do Programa de Aquisição
de Alimentos – PAA e Programa Nacional de Alimentação Escolar
– PNAE quanto ao acesso pela agricultura familiar, políticas que
os agricultores não precisam passar pelo procedimento de licitação
e ainda possuem o direito de recolher sua contribuição para a
Previdência Social e para o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural
– SENAR, possuindo o direto de receber aposentadoria, pensão por
invalidez e cursos de capacitação (RYNGELBLUM, 2015).
Constatou-se que nos municípios entrevistados do TCCRO
foram cadastradas aproximadamente 912 famílias nos dois programas
(PAA e PNAE), destes cadastros 344 são feitos em nomes das
mulheres. Apesar dos programas serem voltados para toda a família
a participação da mulher tem sido destaque em todo processo, pois
muitas passaram a contribuir com o orçamento familiar a partir do
envolvimento em um dos programas ou em ambos, destacando o
empoderamento das mesmas. Um dos entrevistados citou que após a
entrada de algumas beneficiárias nos programas foi nítida a melhoria
na autoestima destas mulheres e no fortalecimento de associações/
sindicatos rurais.
A participação da juventude rural nos dois programas é menor
quanto ao número de cadastros, com apenas 44 registros, todavia,
na unidade familiar, os mesmos têm grande contribuição em todo
processo de manejo das culturas comercializadas nos programas,
de modo que a autonomia financeira adquirida contribui para não
evasão da juventude do campo para os grandes centros, “pois muitos
saem em busca de uma fonte de renda”, explica um dos entrevistados.
A Ação de Apoio a Projetos de Infraestrutura e Serviços
em Territórios Rurais - Proinf é uma política pública vinculada
251
aos territórios, sendo alvo prioritário da assessoria de Inclusão
Produtiva do projeto NEDET realizar o monitoramento dos projetos
implementados no TCCRO, diante disso foi realizada a pesquisa.
O Proinf era operacionalizado pela extinta SDT/MDA, que
outrora visava contribuir para a qualificação de processos produtivos
e econômicos da agricultura familiar nos Territórios Rurais. Assim,
por intermédio de parcerias com estados, municípios e participação
da sociedade têm apoiado a aquisição de equipamentos e a construção
de infraestrutura para a produção, beneficiamento, escoamento e
comercialização de produtos da agricultura familiar nos territórios
rurais.
Estes resultados posicionam o Proinf como importante
instrumento indutor dos processos de inclusão produtiva, de
geração de trabalho e renda e de autonomia econômica de famílias
e empreendimentos da agricultura familiar, mesmo que apresente
grandes problemas de gestão local dos empreendimentos pelos
beneficiários e de monitoramento da gestão pública municipal,
estadual e federal, no entanto, se suprimidas as dificuldades de
gestão, é de grande importância para a agricultura familiar, por
propicia a organização social, beneficiamento e agroindustrialização
da produção agrícola dos agricultores e agricultoras familiares.
Estudos apontam as fragilidades e limitações das experiências
de espaços públicos de participação social no meio rural. Os estudos
estão vinculados aos Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural
Sustentável – CMDRS e apontam o caráter estritamente normativo,
a incapacidade de agrupar a diversidade de atores sociais, a falta de
interesse dos agricultores e suas organizações, e principalmente, a
restrição de sua atuação à agricultura familiar, sua fragilidade em
gerenciar os recursos públicos (oriundos de programas e políticas
governamentais) e formular projetos de financiamento viáveis e
adequados à realidade local (FAVARETO e DEMARCO, 2004).
Os colegiados são dotados de plena autonomia para deliberar
sobre sua agenda, suas pautas prioritárias e suas estratégias de controle
social das políticas públicas. Organizam-se segundo os preceitos
da participação, transparência, representatividade, diversidade e
pluralidade conforme estabelecido na Resolução nº 52 do Condraf
252
(2005), portanto, a participação destes grupos é de fundamental
importância para o desenvolvimento territorial, pois são capazes de
desenvolver uma leitura aprofundada da realidade local e contribuir
para o processo de gestão e planejamento estratégico dos programas
e políticas públicas Federais, Estaduais e Municipais.
O Codeter/TCCRO, como aponta a figura 6, é capaz de
desempenhar em plenária o papel de identificação de demanda e
seleção de projetos, ambos de 19%; de elaborar 17% e aprovar 22%
dos projetos financiados pelo Proinf.
Figura 6 - Papel desempenhado pela Plenária do Colegiado em relação aos
projetos financiados pelo Proinf
253
Figura 7 - Projetos de infraestrutura Proinf - 2003-2014 apoiados no TCCRO
254
Considerações finais
255
envolver a sociedade e seus meios de convivência no planejamento
e gestão das políticas públicas, no entanto, estas devem continuar
sendo vivenciadas e investigadas para serem cada vez mais percebidas
e aprimoradas.
Referências Bibliográficas
256
IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo 2010.
257
IMPLANTAÇÃO DO NÚCLEO DE
EXTENSÃO EM DESENVOLVIMENTO
TERRITORIAL PARA O TERRITÓRIO
RURAL SERRA DA MESA, EM
GOIÁS: TERRITÓRIO VIVO, O
DESENVOLVIMENTO ACONTECE!
1
Doutor em Agronomia - Docente do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Goiano –
Câmpus Ceres – Coordenador do NEDET no Território Rural Serra da Mesa – Ceres – GO
luis.sergio@ifgoiano.edu.br
2
Graduada em Biologia - Integrante do NEDET no Território Rural Serra da Mesa e colaboradora da
Associação Raízes da Floresta – São Luiz do Norte – GO
moniquinacp@yahoo.com.br
3
Graduado em Agronomia - Integrante do NEDET no Território Rural Serra da Mesa e cooperado da
Cooperativa Agropecuária dos Produtores e Agricultores Familiares de Uruana e Região - Uruana – GO
tiagomdagro@hotmail.com
4
Graduando em Agronomia pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Goiano -
Integrante do NEDET no Território Rural Serra da Mesa - Ceres – GO
joaopedro_flima@hotmail.com
259
Ainda de acordo com Lamarche (1997) parte dos pequenos
produtores “é excluída do processo de modernização, conservando
muitas de suas características tradicionais: a dependência em relação
à grande propriedade, a precariedade do acesso aos meios de trabalho,
a pobreza dos agricultores e sua extrema mobilidade social”.
Por outro lado, segundo o autor, os produtores familiares que
se modernizam “devem continuar a assumir a propriedade fundiária
e a dependência penosa e ambígua do trabalho assalariado, que
se constitui geralmente de um ordenado pago à força de trabalho
local e somente em alguns raríssimos casos indica uma mudança
qualitativa do ponto de vista estrutural”. Ligado a isso, observa-se que
a agricultura familiar está frequentemente envolvida na contradição
entre a pressão dos mercados e a necessidade de sobrevivência da
família.
Mas, mantém estratégias de convivência que procuram
aproveitar oportunidades e reduzir riscos nas decisões. Por isso, em
diferentes situações com o mercado e em distintas condições regionais,
desenvolveram-se variadas formas de agricultura familiar, na qual a
participação da família também apresenta gradações nas decisões de
produção e no projeto familiar (CANUTO E CARMO, 2009).
O engajamento dos movimentos sociais e agentes do governo
tem como resultado um arcabouço de políticas públicas, orientadas
para o setor da agricultura familiar, como: PAA – Programa de
Aquisição de Alimentos; PNAE – Programa Nacional de Alimentação
Escolar; PGPM-Bio – Programa de Garantia de Preços Mínimos para
Produtos da Sociobiodiversidade; PRONAF – Programa Nacional de
Fortalecimento da Agricultura Familiar, dentre outros.
A partir de conceitos paralelos e tangentes, aflora a discussão da
lógica do território e do desenvolvimento territorial, que visualizam
uma melhor forma de aproveitamento dos recursos e potencialidades
de cada região. Esta nova abordagem para o desenvolvimento dos
espaços rurais permitiria o rompimento com o caráter setorial das
políticas públicas e das intervenções do Estado (FREITAS et al, 2010).
O território seria formado também por uma trama de
relações sociais capaz de valorizar o conjunto do ambiente em que
260
atuam determinados atores sociais, e transformar os atributos e
oportunidades naturais em vantagens competitivas para a promoção
do desenvolvimento (ABRAMOVAY, 2000).
O Território Rural Serra da Mesa foi homologado em 2009,
sendo considerado, portanto, um território novo, composto por 14
municípios. Destaca-se dos demais por apresentar a maior bacia
hidrográfica, nascida e desembocada no país, a bacia Araguaia -
Tocantins, que corta todo o território. Além da produção de água
o território também apresenta forte extração de minérios, duas
hidrelétricas e também uma forte atuação do agronegócio referente à
produção de cana de açúcar, soja e pecuária extensiva.
Sendo assim, o objetivo deste trabalho foi consolidar a
abordagem territorial com estratégia de desenvolvimento sustentável
e tratar das ações de articulação para o acesso às políticas públicas no
Território Rural de Serra da Mesa/GO.
261
Trabalhando com estes atores sociais, o NEDET Serra da
Mesa promoveu intensamente a divulgação do projeto aprovado
pelo CNPq/MDA em todos os municípios do Território Serra da
mesa, constituindo assim, uma ampla discussão da importância
da integração dos atores, com as Instituições de Ensino, Pesquisa
e Extensão e das políticas públicas promovidas pelos agentes
governamentais.
As ações do NEDET e seus atores sociais começaram com
as visitas de diagnóstico nos municípios utilizando um mapa
didático triangular de reconhecimento de cada município em que
os pontos do triângulo seriam um agricultor familiar. Este seria
convidado a compor o Colegiado Rural do Território Serra da Mesa
e que tentaríamos promover uma ação para que o mesmo pudesse
ser exemplo e multiplicador de como um Colegiado flui ao longo
de seu desenvolvimento, a princípio com a ajuda do NEDET e,
posteriormente, com os agricultores fortalecidos.
Os diagnósticos, o planejamento por município e as ações
executadas serão descritas na sequencia em que as visitas foram
feitas. As visitas foram feitas pela equipe do NEDET: Mônica de
Castro Pinto (Gestão Social), Tiago Moreira Damasceno (Gestão
Produtiva); Profº Luís Sérgio Rodrigues Vale (Coordenador) e o
estudante-bolsista do curso da Agronomia João Pedro Ferreira Lima.
A equipe do NEDET elaborou questionários para os seguintes
fins: Questionário para os Agricultores Familiares; para os Gestores
de Cooperativas e para a obtenção do Índice de Gestão Social.
Após contato prévio via telefone ou email era feito o agendamento.
Quando foram realizadas as visitas nas propriedades rurais de
agricultura familiar o secretário de agricultura, ou o seu representante
acompanhava a equipe do NEDET em cada município através do
mapa didático (Figura 1).
262
Figura 1. Mapa utilizado para visita de diagnóstico do Território Serra da Mesa
263
Municipais de Desenvolvimento Rural Sustentável e Solidário. Neste
ato ficou acordado entre os municípios presentes, que as reuniões
para a divulgação do projeto e das ações seriam bimestrais e rotativas,
ou seja, cada encontro se daria por sorteio entre os 14 municípios
que fazem parte do território. Outro ponto importante discutido
nesta reunião foi que a água seria o produto mais importante a se
trabalhar, visto que o território é conhecido como “Berço das Águas”.
Ficou claro o interesse dos agricultores familiares presentes na
recomposição de nascentes e na conservação da água.
Para o NEDET Serra da Mesa a reestruturação do Colegiado
Territorial que estava inativo por vários anos era fundamental para o
fortalecimento das classes sociais e uma promoção dos atores sociais,
uma vez que, é um espaço de planejamento, gestão e controle social
de políticas públicas, articulando e fomentando programas e projetos
voltados para a comunidade da agricultura familiar.
Segundo a Coordenação Estadual dos Territórios de
Identidade da Bahia (2017), o Colegiado Territorial tem a função de
Sensibilizar, comprometer, articular e coordenar os atores sociais do
território, com vistas à construção coletiva de um Plano Territorial
de Desenvolvimento Sustentável, elaborando uma agenda de
prioridades, bem como a seleção dos projetos a serem implementados
em cada fase do Plano; articular, apoiar e acompanhar os arranjos
institucionais que, no âmbito do território, se responsabilizarão
pela elaboração, implantação e operação dos projetos específicos;
estimular e apoiar a criação, estruturação e operacionalização de redes
territoriais de prestação de serviços (assistência técnica, formação,
tecnologias apropriadas, informação/divulgação); contribuir para
a integração territorial, articulação intermunicipal, buscando
estabelecer relações horizontais de cooperação e oportunidades;
apoiar a elaboração de estudos e pesquisas, bem como a produção
e edição de instrumentos de divulgação, informação e formação,
que contribuam para o desenvolvimento territorial; representar o
território perante entes públicos e privados, nacionais e estrangeiros,
visando a articulação de parcerias que objetivem o desenvolvimento
territorial; desenvolver e apoiar programas, projetos, ações e
iniciativas voltadas para o desenvolvimento territorial; incentivar a
264
qualificação e capacitação técnica dos seus membros e dos atores do
território; fomentar a criação e o fortalecimento de redes sociais de
cooperação no território; articular-se com outros colegiados, fóruns,
redes, universidades e outros organismos nacionais e internacionais
com o propósito de construir relações de cooperação.
O Colegiado Territorial dentro de suas ações de gestão tem as
instâncias na forma de Plenárias, Núcleo Diretivo e Núcleo Técnico.
O Colegiado Territorial Serra da Mesa realizou as seguintes Plenárias
nas cidades do Território e descreve as suas ações:
265
Associação Raízes da Floresta, Sra. Maria Cristina de Castro,
de São Luiz do Norte.
A partir desse momento as ações do Território são promovidas
pelo Colegiado e os trabalhos realizados em parceria com o
NEDET Serra da Mesa. O NEDET teve papel fundamental para que
acontecesse essa reestruturação do Colegiado Territorial para que
toda a comunidade pudesse usufruir dos benefícios das políticas
públicas. Assim, o Colegiado começou a fazer uma divulgação dos
editais em aberto para toda a comunidade, em que, os próprios atores
sociais serão sempre os beneficiários dos programas.
266
visem o desenvolvimento cultural, científico, educativo,
cooperativo, econômico, social e político para as pessoas que
vivem em grupos, tais como as entidades públicas, privadas
e associações civis, religiosas, sociais, profissionais, sindicais
e cooperativas. O Colegiado continua até o momento em
suas reuniões com os membros do Território utilizando as
técnicas do curso em ações práticas para o fortalecimento de
toda a comunidade;
f) Barro Alto: Em reunião com a Rede Estadual de Colegiados o
NEDET e o Colegiado conseguiram articular com o IBRACE
a realização de um curso de formação de conselhos focando
para o Conselho de Desenvolvimento Rural Sustentável e
Solidário. Na plenária do Colegiado foram apresentados
os cursos. A comunidade de cinco municípios fez o curso
que aconteceu em Barro Alto e São Luiz do Norte. Os
cinco municípios conseguiram aprovar a lei municipal em
concordância com as modificações e sugestões do CONDRAF.
Os prefeitos de cada um destes municípios deram posse ao
novo Conselho na reunião do Colegiado que aconteceu no
município de Nova Iguaçu de Goiás;
g) Niquelândia: Foi feita uma reunião do NEDET para a
apresentação do projeto do CNPq/MDA e ao mesmo tempo
fortalecer o Colegiado do Território para as futuras ações
junto à comunidade;
h) Nova Iguaçu de Goiás: Na cidade foi realizada uma reunião
do Colegiado para dar posse a cinco novos Conselhos
Municipais de Desenvolvimento Rural Sustentável e Solidário
(CMDRS) em cinco municípios: São Luiz do Norte, Hidrolina,
Guarinos, Santa Rita do Novo Destino e Barro Alto. Além
dessas atividades foi aplicado o questionário de IGS (Indice
de Gestão Social) pelo NEDET Serra da Mesa.
267
criado pelo Poder Legislativo Municipal para auxiliar nos processos
de intervenção e no planejamento das ações demandadas para o
meio rural, inclusive, a elaboração, fiscalização, acompanhamento
e avaliação do Plano Municipal de Desenvolvimento Rural com a
finalidade de promover o desenvolvimento local.
268
de janeiro de 2015 a maio de 2016 aconteceram oito cursos do
PRONATEC Campo no município de São Luiz do Norte.
A parceria foi feita com o ITEGO (Instituto Tecnológico de
Goiás) da Unidade de Ceres e a Associação Raízes da Floresta, de
São Luiz do Norte. Os cursos foram: Agricultor Familiar, Agricultor
Orgânico, Artesão em Cerâmica, Doma de Animais, Plantas
Aromáticas e Medicinais, Inseminação Artificial, Produtos de
Derivados de Leite e Açougueiro. Um fato que despertou muita a
atenção do NEDET foi o Curso de Agricultor Familiar realizado na
Comunidade Quilombola Porto do Leocárdio, no município de São
Luiz do Norte.
Este curso foi realizado em uma escola da comunidade que
havia sido fechada por ordem da Secretaria de Educação. Este fato
aumentou muito a autoestima destas pessoas tão sofridas. Os sonhos
deles afloraram e os trabalhos ali se tornaram para a equipe do
NEDET desafios ainda bem maiores. Outro fato também interessante
foi a realização do curso de Açougueiro para estimular a produção
de galinha caipira para os Quilombolas e para a comunidade do
assentamento rural Novo Horizonte II. No encerramento do curso
foi articulada uma visita dos agricultores em um abatedouro de
peixe da COOPERPESCA (Cooperativa de Pesca de Agricultores
Familiares) no município de Uruaçu, com o objetivo de incentivá-los
com a atividade de galinha caipira.
Todos os cursos foram um sucesso e os pedidos para novos
cursos cresceram. A equipe do NEDET sempre acompanhou
todos os cursos junto com a Associação Raízes da Floresta. Assim,
outros cursos foram surgindo por parte da comunidade através do
diagnóstico feito pelo NEDET, quando da visita aos municípios e a
aplicação do questionário. Os cursos foram os de Produção de leite;
Produção de caprinos; Produção de mel e de Agroecologia. Os cursos
aconteceram nos municípios de Barro Alto, Santa Rita do Novo
Destino e em São Luiz do Norte. Os profissionais da COOPERATER
(Goiânia) e da COOPERAF (Itapuranga) foram os palestrantes.
Visando também apresentar resultados de pesquisa e incentivar
alternativas de produção agrícola o NEDET, o Colegiado e a Associação
Raízes da Floresta implantaram uma Unidade Demonstrativa (UD)
269
com oito cultivares de maracujás híbridos no município de São Luiz
do Norte. As sementes foram obtidas através de uma parceria do IF
Goiano – Campus Ceres e a EMBRAPA Cerrados, de Brasília.
A UD foi implantada e os agricultores do Território podem
visitar a propriedade e verificar os resultados de produção de
maracujá. A elaboração do projeto e a implantação foram feitas com
a colaboração dos alunos do Curso de Agronomia e do Mestrado em
Irrigação no Cerrado do IF Goiano – Campus Ceres. A proprietária
da UD de maracujá está colhendo resultados promissores, com venda
direta de frutos e de polpas em feiras livres do município.
Essa nova alternativa para os agricultores é tão importante
que pode e muito aumentar a renda familiar e empregar e fixar
mão de obra na zona rural. No trabalho de Vale et al. (2013), em
um trabalho de pesquisa realizado em Ceres e trabalhando também
com cultivares de maracujás híbridos, foram obtidos produtividades
médias que variaram de 42 a 46 toneladas por hectare, sendo que
a média da região é de 23 toneladas por hectare de cultivares não
híbridos. Pensando mais fortemente os próprios agricultores podem
formar uma cooperativa e processar o produto e vender a polpa para
os municípios e também para os programas de alimentação escolar.
Assim, podem agregar mais ainda valor à produção local e garantir a
sustentabilidade social e econômica.
Outra iniciativa muito importante do NEDET foi a implantação
de uma UD no assentamento Novo Horizonte para produção de
sementes de arroz, feijão e milho em parceria entre a Associação
Raízes da Floresta com a EMBRAPA Arroz e Feijão (Goiânia). Esta
UD teve como objetivo distribuir após a colheita as sementes entre
os agricultores familiares. Em janeiro de 2016 foram efetuadas
as semeaduras das culturas de arroz, feijão e milho. A EMBRAPA
cedeu os insumos e os agricultores juntamente com o IF Goiano –
Campus Ceres, a S.A (INCRA) e o NEDET Serra da Mesa afirmaram
o compromisso da assistência técnica aos agricultores.
Por motivo de falta de chuvas no período de cultivo, não
teve êxito o experimento. Mas, independentemente do resultado
ficou acertado entre os agricultores e a EMBRAPA uma nova
oportunidade de implantação dessa unidade demonstrativa, uma vez
270
que, os agricultores viram a necessidade de parceria e o benefício da
produção de sua própria semente. Isso pode reduzir muito o custo da
obtenção de sementes para as safras dos agricultores.
Dentre das ações para a inclusão produtiva do NEDET a
associação Raízes da Floresta elaborou um projeto denominado
de “Forno de Soluções” e concorreu ao edital de chamada pública
BNDES-CONAB Nº 002/2013 para os agricultores familiares de São
Luiz do Norte. O projeto tem como objetivo viabilizar a ampliação
do fornecimento de panificados e processados caseiros em geral
e hortaliças, para comercialização via PAA, PNAE e feiras livres
de agricultores. O Projeto foi aprovado em 2016 no valor de R$
30.980,40.
O presente projeto visa o aparelhamento de duas cozinhas
residenciais das agricultoras, uma a ser escolhida pelos associados
entre agricultores familiares tradicionais, e outra cozinha junto
aos associados quilombolas, que vivem em uma comunidade rural
a 23 km da sede do municio de São Luiz do Norte/GO. Com a
instalação das duas cozinhas, será possível um aumento produtivo,
padronização dos produtos com o uso de equipamentos apropriados,
resultando uma produção em quantidade e qualidade aos mercados
atingidos. Foi aprovado também um projeto de irrigação do BNDES
(R$20.000,00) para a aquisição de uma Motoencanteiradora e
equipamentos de irrigação. A máquina será utilizada em comum
acordo entre os interessados, possibilitará um melhor preparo do solo
(revolvimento e levantamento de canteiros) e melhor aproveitamento
de tempo e recurso financeiros na condução da horta.
O kit de irrigação é para a área da comunidade Quilombola, que
possibilitará a produção coletiva de hortaliças durante todo o período
do ano, e evitando a sazonalidade da produção, devido ao regime
irregular de chuvas na região. Com o equipamento de irrigação não
deixará faltar o produto para as entregas institucionais e na feira. Com
este recurso será feita a contratação de serviço técnico especializado
na produção agroecológica, com técnicos experientes no trabalho
de campo com agricultura familiar, para melhor organização da
produção, aumento produtivo e planejamento de venda nas feiras e
nas políticas públicas de comercialização.
271
O NEDET através de sua equipe deu todo o apoio na instalação
e orientação tanto para equipar a cozinha como na implantação da
irrigação. Na parte da agricultura, o coordenador do projeto NEDET/
CNPq o prof. Luís Sérgio Rodrigues Vale trabalhou com um grupo
de alunos do curso de Agronomia do IF Goiano – Campus Ceres na
elaboração e orientação na confecção dos canteiros para produção de
alface na comunidade Quilombola Porto do Leocárdio.
Os alunos demarcaram a área, coletaram amostras de solo
e interpretaram para a aplicação dos insumos agrícolas. A etapa
de implantação da irrigação aconteceu também com os alunos do
curso de Mestrado em Irrigação no Cerrado do IF Goiano – Campus
Ceres. O kit de irrigação foi instalado às margens do Rio das Almas
e fará a irrigação da produção de alface, cenoura e cheiro verde para
encaminhar aos programas de aquisição de alimentos do governo.
O projeto será assistido pela Associação Raízes da Floresta e pelo
IF Goiano – Campus Ceres, como atividade de Extensão junto aos
alunos do curso de Agronomia.
De acordo com o INCRA (2017), as comunidades quilombolas
são grupos étnicos – predominantemente constituídos pela população
negra rural ou urbana –, que se autodefinem a partir das relações
com a terra, o parentesco, o território, a ancestralidade, as tradições
e práticas culturais próprias. Estima-se que em todo o País existam
mais de três mil comunidades quilombolas.
O Decreto nº 4.887, de 20 de novembro de 2003, regulamenta
o procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação,
demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes
das comunidades dos quilombos de que trata o artigo 68, do Ato
das Disposições Constitucionais Transitórias. A partir do Decreto
4883/03 ficou transferida do Ministério da Cultura para o INCRA
a competência para a delimitação das terras dos remanescentes
das comunidades dos quilombos, bem como a determinação de
suas demarcações e titulações. A situação atual da Comunidade
Quilombola Porto do Leocárdio é a titulação das terras por parte do
INCRA.
272
Realização e implantação de unidades de preservação ambiental
273
Foi feito um levantamento prévio das nascentes em visita
“in loco” com aquiescência dos proprietários que prontamente
se dispuseram a participar do projeto e em regime de mutirão foi
executado nesta primeira etapa o cercamento e povoamento de oito
das nascentes, que ocorreu em outubro de 2015 a março de 2016. O IF
Goiano – Campus Ceres/NEDET/CNPq/MDA ficou responsável pela
elaboração e execução do projeto; A SAMA e a Tractbel forneceram
a mão-de-obra, mudas de espécies nativas, arames e alimentação; a
Secretaria Municipal de Meio Ambiente forneceu a madeira para o
cercamento e os agricultores ajudaram na implantação.
O Ministério Público do estado de Goiás estendendo-se a
uma preocupação também social além do envolvimento de alunos
do SENAI do ensino fundamental na etapa do plantio das mudas
em algumas propriedades juntamente com seus professores, propôs
também como forma de reintegração social, a participação dos
reeducandos do Sistema Prisional de Minaçu na etapa final de
limpeza das nascentes contempladas no projeto.
Diante da proposta o NEDET aceitou e o IF Goiano – Campus
Ceres ofereceu aos reeducandos um curso sobre recuperação
e preservação de nascentes. O curso teórico foi oferecido a 12
reeducandos, que participaram diretamente da implantação do
projeto nas propriedades de agricultura familiar. O curso teve como
palestrante a Bióloga do NEDET Mônica de Castro Pinto e o IF
Goiano – Campus Ceres fez a certificação oficial dos participantes.
De acordo com o Ministério Público de Goiás os reeducandos
terão suas penas reduzidas pela participação nas atividades de
recuperação de nascentes do município de Minaçu. Este fato foi
de extrema importância para todos do NEDET e a comunidade
rural de agricultores familiares. Isso demonstra a importância da
ressocialização dos reeducandos juntos à comunidade.
Segundo Mirabete (1988), a ausência prolongada do condenado
em seu meio social acarreta um desajustamento que somente poderá
ser superado se forem oferecidas ao condenado condições adequadas
à sua reinserção social quando for liberado. É preciso, pois, que toda
comunidade seja conscientizada da missão que lhe cabe na tarefa de
assistir aquele que, tendo transgredido a lei penal, está resgatando
274
o débito criado com a prática do crime muitas vezes em condições
materiais muito abaixo das suas necessidades, comuns a todas as
pessoas.
Diz bem René Ariel Dotti: “A abertura do cárcere para a
sociedade através do Conselho da Comunidade, instituído como
órgão da execução para colaborar com o juiz e a administração,
visa neutralizar efeitos danosos da marginalização. Não somente os
estabelecimentos fechados, mas também as unidades semi-abertas
e abertas devem receber a contribuição direta e indispensável da
sociedade”.
Para a segunda etapa do projeto em Minaçu foi feito o
cercamento e a recuperação das nascentes do Rio Bonito. O projeto e
o questionário para os agricultores familiares foram elaborados pelo
NEDET/IF Goiano – Campus Ceres. O questionário foi aplicado com
o objetivo de obter informações acerca das atividades dos agricultores
e de sua realidade. Como resultado deste diagnóstico tem-se que
a maior parte dos agricultores não possui energia elétrica em suas
propriedades (mesmo situando na região de produção de energia
elétrica); tem uma renda média menor que um salário mínimo e as
nascentes estão degradadas.
Foi realizado o cercamento nas propriedades rurais, em seguida
o plantio e a manutenção das espécies nativas com os alunos das
escolas do ensino fundamental do SENAI. Como relatam os autores
Brito, Medina e Venturoli (2016), “a recuperação das matas ciliares
em áreas de agricultura familiar é fundamental para garantir fontes
de água no cerrado”.
A partir da execução do projeto SER NATUREZA em Minaçu
outras demandas começaram a surgir pelos agricultores familiares
em todo o Território. Assim, o NEDET e o IF Goiano – Campus Ceres
orientam os agricultores que procurem o Colegiado e os próprios
gestores municipais para participar de novos empreendimentos neste
processo de recuperação de nascentes. O IF Goiano – Campus Ceres
pode participar como parceiro junto com seus alunos dos cursos de
Meio Ambiente e da Agronomia nos novos projetos.
Após os resultados promissores obtidos com as parcerias, com
o projeto SER NATUREZA e o legado deixado nos processos de
275
recuperação de nascentes no Território Rural Serra da Mesa, o NEDET
concorreu com o projeto “RECUPERAÇÃO DE NASCENTES
QUE ABASTECEM O CÓRREGO ÁGUA BOA NO MUNICÍPIO
DE MINAÇU-GO”ao prêmio da SOCIEDADE AMBIENTALISTA
BRASILEIRA NO CERRADO – SABC que ocorreu em 2016.
Como resultado final o projeto do NEDET ficou em segundo lugar
e foi premiado com aporte financeiro e a cerimônia aconteceu na
Faculdade de Educação da UFG, em Goiânia.
Com a experiência adquirida pelos membros do NEDET Rural
Serra da Mesa, os trabalhos de recuperação de nascentes têm a sua
continuidade para em prol da comunidade do Território. E para
minimizar os impactos ambientais causados pelas mineradoras,
hidrelétricas e do agronegócio, o IF Goiano – Campus Ceres,
o NEDET Serra da Mesa e o Colegiado Territorial Serra da Mesa
elaboraram um projeto e concorreram ao edital 001/2015 do SECIMA
(Secretaria do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos de Goiás)
para buscar recursos para a recuperação de nascentes degradadas e
diagnosticadas no Território.
O projeto denominado de “Alma Lavada” tem como objetivo
recuperar as nascentes, matas ripárias e veredas das propriedades
periurbanas e rurais dos municípios de Hidrolina, São Luiz do Norte,
Barro Alto, Nova Iguaçu de Goiás e Niquelândia, localizadas no
“Território Rural Serra da Mesa”, principalmente alimentadas pelos
afluentes do Rio das Almas; situado na Bacia Hidrográfica Tocantins/
Araguaia.
O projeto foi aprovado com recursos de R$500.000,00
(Quinhentos mil reais) para abranger os cinco municípios do
Território e recuperar 16 nascentes, tendo perspectivas para
expansão nos outros nove municípios. Será implantado em dois anos
(2017-2019). A instituição proponente é o Instituto Federal Goiano
– Campus Ceres.
Este projeto também é extremamente importante porque
partiu da necessidade de alguns municípios da preservação de
suas nascentes. Assim, o NEDET conseguiu várias parcerias para
a execução do projeto: Saneamento de Goiás S.A (SANEAGO);
EMBRAPA (Goiânia); Prefeitura de São Luiz do Norte; Prefeitura de
276
Hidrolina; Prefeitura de Nova Iguaçu de Goiás; Prefeitura de Barro
Alto e prefeitura de Niquelândia; Colegiado Territorial Serra da
Mesa; Associação Raízes da Floresta e Diocese de Uruaçu.
O projeto contempla entre várias ações a implantação de um
viveiro no IF Goiano – Campus Ceres para produção de mudas
nativas da região para as 16 nascentes. Será adquirido um veículo
tipo caminhonete para o transporte da equipe nas localidades;
recursos para compra de material para o cercamento e plantio de
mudas e cursos e palestras para a comunidade envolvida no projeto
dos parceiros.
Considerações Finais
277
aprimoramento das pessoas. A comunidade e o Colegiado Territorial
estão com atuação muito forte frente aos municípios para promover
a criação dos Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural
Sustentável e Solidário e continuar com as atividades que iniciaram
para o bem dos atores sociais.
Referências Bibliográficas
278
FREITAS, A. F.; FREITAS, A. L.; DIAS, M. M. Desafios da gestão
social dos territórios rurais. In: 48º CONGRESSO BRASILEIRO
DE ECONOMIA E SOCIOLOGIA RURAL (SOBER), 2010, Campo
Grande – MS. Anais - SOBER, Campo Grande – MS, 2010.
279
SANTOS, L. M. dos. A política de compras governamentais e a
agricultura familiar: uma avaliação do PAA e do novo formato do
PNAE. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação) – Instituto de
Economia. Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2012.
280
PROGRAMA DE AQUISIÇÃO DE
ALIMENTOS (PAA): UMA ANÁLISE DA
EXECUÇÃO ORÇAMENTÁRIA EM TRÊS
MUNICÍPIOS DO CARIRI CEARENSE
NO ANO DE 2016
281
no âmbito da política agrária brasileira, pois prioriza a compra dos
produtos oriundos da agricultura familiar, garantindo que o Estado
componha esta cadeia produtiva, o que estimula a produção e auxilia
no seu escoamento (CAMPELLO, VARGAS 2013). Tal estratégia é
composta por cinco modalidades, cada uma possuindo orçamentos
próprios, operacionalizado através dos governos estaduais, dos
municípios e da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).
A política pública supracitada é uma das ações acompanhadas
pela Assessoria de Inclusão Produtiva dos Núcleos de Extensão
em Desenvolvimento Territorial (NEDET), ação de extensão que
objetiva o fortalecimento das políticas públicas territoriais através
de ações que promovam o desenvolvimento territorial sustentável
das unidades assessoradas pelo projeto. No NEDET vinculado a
Universidade Federal do Cariri, dois territórios foram assessorados:
o Território Rural Centro-Sul e Vale do Salgado e o Território da
Cidadania do Cariri, sendo o último onde se localizam as três cidades
onde a seguinte pesquisa fora desenvolvida.
Assim, diante de algumas situações observadas durante o
trabalho de extensão realizado no núcleo, acredita-se ser relevante
compreender a discrepância entre as fases inerentes à execução da
despesa durante a execução deste programa. Nessa perspectiva,
após coletados dados das cidades do Cariri, cujo acompanhamento
do PAA é realizado pela Secretaria de Desenvolvimento Agrário do
Ceará (SDA-CE), elegeram-se três cidades que fazem fronteira entre
si e têm na agricultura sua principal atividade econômica. Deste
modo, é neste recorte territorial que será realizado o presente estudo,
cujo objetivo é analisar a execução orçamentária do PAA durante
o ano de 2016 nos municípios de Brejo Santo, Milagres e Porteiras,
localizados no microterritório Cariri Leste.
282
de Desenvolvimento Territorial (SDT), a Secretaria de Políticas para
as Mulheres (SPM) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico (CNPq), tendo como finalidade central
fornecer apoio a ações de assessoria e monitoramento de duas políticas
públicas: Território Rural e Território da Cidadania (MARTINS,
MACIEL e ALENCAR, 2016).
O processo de implementação dos núcleos ocorreu a partir
das Chamadas Públicas publicadas pelo CNPq nos anos 2013 e
2014, onde professores de diversas universidades públicas federais,
estaduais e institutos tecnológicos enviaram propostas de intervenção
territoriais e multiterritoriais. É apontado por Martins, Maciel e
Alencar (2016) que foram implantados 101 núcleos em todo país,
oriundos de 101 instituições de ensino superior, suprindo a demanda
de 168 territórios brasileiros.
Aos NEDETs são atribuídas atividades referentes à prestação
de assessoria técnica dos Colegiados Territoriais, sejam eles advindos
de Territórios Rurais ou de Territórios da Cidadania, fomento a
práticas que estimulem o processo de gestão social dos territórios,
monitoramento das políticas públicas de inclusão produtiva de
agricultores familiares, estímulo da participação de mulheres,
jovens e povos tradicionais nas instâncias colegiadas, além do
desenvolvimento de pesquisas, métodos e tecnologias sociais que
visem à promoção do desenvolvimento territorial sustentável
(BRASIL, 2015).
Para isso, cada núcleo conta com uma equipe técnica composta
por coordenador geral, coordenadores de núcleo (caso o projeto seja
multiterritorial) e três assessorias territoriais: Assessoria Territorial
para Gestão Social (ATGS), Assessoria Territorial de Inclusão
Produtiva (ATIP) e Assessoria Territorial de Gênero (ATGE), contato
também com um bolsista de graduação. No quadro abaixo, estão
ilustradas as funções de cada assessoria:
283
Tabela 1:Composição Geral- Equipes NEDETs
Função Atuação
Apoio ao fortalecimento da Gestão Social nos processos
Assessor (a) Territorial de Gestão
de organização, funcionamento e governança das diversas
Social (ATGS)
instâncias colegiadas dos territórios assistidos.
Fomento e monitoramento das estratégias de inclusão
Assessor (a) Territorial de Inclusão
produtiva, com foco no desenvolvimento territorial
Produtiva (ATIP)
sustentável.
Assessorar atividades que incentivem à participação das
Assessor (a) Territorial de Gênero
mulheres, jovens e comunidades tradicionais nos colegiados
(ATGE)
territoriais e em seus respectivos comitês temáticos.
Coordenador de Núcleo Executar e acompanhar as atividades desenvolvidas
Territorial (Caso o projeto seja pelos assessores territoriais e pelos bolsistas no território
Multiterritorial) selecionado.
Realizar a supervisão das atividades e manter a eficiência e
Coordenador Geral
regularidade das ações estabelecidas.
Atuar nas atividades do NEDET em conjunto com os
Bolsistas de Extensão
demais integrantes.
284
Conhecendo o Programa de Aquisição de Alimentos-PAA e suas
implicações
285
à melhoria da qualidade das refeições das entidades da rede sócio
assistencial, a recomposição dos estoques públicos de alimentos,
bem como o apoio ao desenvolvimento da economia local. Um fator
importante na execução do programa é a priorização da aquisição
de produtos oriundos de sistemas agroecológicos e da produção
orgânica, incentivando o manejo agroecológico e a preservação da
biodiversidade (CAMPOS, BIANCHINNI, 2013).
A compra da produção agrícola é efetuada geralmente pela
Secretaria de Agricultura de cada município ou órgão designado,
que faz o cadastro e acompanhamento dos agricultores, sendo
supervisionados pela Secretaria de Desenvolvimento Agrário de cada
estado. No caso cearense, o processo de supervisão do programa é
realizado pela Coordenadoria de Desenvolvimento Territorial e
Combate à Pobreza Rural (CODET), que promove o planejamento
das ações, capacitação dos executores e produtores, bem como o
controle do orçamento e proventos de pagamento (CODET, 2017).
O trâmite legal para a execução do PAA passa por seis etapas.
Primeiramente ocorre a adesão, onde as unidades executoras locais
(entidades dos estados e municípios) estabelecem com o MDSA o
termo de compromisso com validade de cinco anos, prorrogáveis por
igual período, para realização do programa. A etapa seguinte consiste
na pactuação de valores e metas, onde a entidade supracitada fixa
a despesa, determinando sob quais valores, metas e parâmetros as
unidades executoras podem traçar seu plano operacional, que terá
validade anual (BRASIL, 2014).
A fase seguinte é a afirmação da Proposta de Participação, que
ocorre quando as unidades executoras selecionam os beneficiários
fornecedores, as entidades consumidoras e os tipos de alimentos
que serão comprados, bem como seus valores. Da aprovação das
propostas segue-se para a aquisição e distribuição de alimentos, que
deve obedecer às normas de padrões de segurança alimentar, na
produção, acondicionamento, manejo, transporte e destinação final
dos alimentos. Segue-se com a fase do pagamento aos fornecedores,
que ocorre por meio de cartão de crédito específico do PAA. A última
etapa consiste no apoio financeiro às unidades executoras, mediante
o cumprimento de metas pré-estabelecidas (BRASIL, 2014).
286
O Programa de Aquisição de Alimentos entra no rol do que
se chama de políticas de inclusão produtiva, uma série de ações e
programas do governo federal, e também incentivados pelo governo
do estado, que objetivam a inserção sócio produtiva de famílias de
baixa renda, ou em situação de vulnerabilidade econômica.
Ainda temos um grande contingente de agricultores familiares
que precisa de apoio para superar a pobreza e a extrema pobreza.
Produzir alimentos é uma boa saída para superar essa situação.
Participar dos circuitos curtos de abastecimento, atendendo a
demandas dos mercados locais, em particular os institucionais,
pode ser um bom caminho para se promover a inclusão produtiva
(CAMPOS, BIANCHINNI, 2013, p.23-24).
287
dispõe sobre a estrutura conceitual para a elaboração e apresentação
das demonstrações contábeis, as despesas são decréscimos nos
benefícios econômicos durante o período contábil sob a forma de
saída de recursos ou redução de ativos ou incremento em passivos,
que resultem em decréscimo do patrimônio líquido e que não sejam
provenientes de distribuição aos proprietários da entidade.
Orçamento é parte de um planejamento de empresas públicas
ou privadas cujo fim imediato é demonstrar o fluxo de ingressos e
aplicação de recursos em determinado período. Aqui nos interessa o
Orçamento Público cuja definição, segundo o manual acima referido,
é aquela executada por entidade pública e que depende de autorização
legislativa para sua realização, por meio da Lei Orçamentária Anual
ou de Créditos Adicionais, pertencendo ao exercício financeiro da
emissão do respectivo empenho (BRASIL, 2008).
A execução orçamentária dá-se a partir de quatro elementos
gerais: o planejamento, a execução e controle e avaliação. O
Planejamento faz-se a partir de instrumentos legais como a Lei
Orçamentária Anual ou o Plano Plurianual.
A execução orçamentária é regulamentada pela Lei nº
4.320/1964 cujas etapas são: empenho, liquidação e pagamento,
detalhadas a seguir (BRASIL, 2008):
288
Metodologia
289
RESULTADOS E DISCUSSÕES
290
Figura 1: Execução da despesa do PAA no Cariri em 2016
291
despesa. Por fim, a barra em amarelo, quase imperceptível no gráfico,
denota a relação percentual que incide entre o valor empenhado e o
que foi pago.
Algumas ponderações podem ser feitas na análise qualitativa
do gráfico, tem-se que há uma discrepância enorme entre o
empenho, a liquidação e o pagamento. Observa-se, por exemplo, que
os municípios de Salitre, Porteiras e Nova Olinda foram os únicos
a aproximar os três valores, ao passo que Várzea Alegre, Aurora e
Brejo Santo apresentam o exato contrário. A diante levantar-se-á
algumas hipóteses que expliquem tais, usando como exemplo os três
municípios do cariri leste.
292
Figura 2: Empenho da Despesa do PAA para 2016.
293
Na Figura 3 estão representadas quatro variáveis para os três
municípios, onde as séries 1, 2 e 3 equivalem, respectivamente a
Brejo Santo, Milagres e Porteiras. A tabela 1 caracteriza o número
de agricultores cadastrados, a 2 o volume de alimentos em quilos, a
tabela 3 o valor do pagamento em reais, e na 4 está a relação percentual
correspondente ao que foi pago, com base no que foi empenhado.
Algumas observações são importantes, pois os números não
falam por si. Existem variações numéricas que são representativas,
no entanto, os dados não especificam os tipos dos produtos que
foram fornecidos, nem os preços pagos por cada tipo.
Pode-se observar na Figura 3 que a relação da quantidade
de quilos e pagamento nos munícios de Brejo Santo e Milagres
são discrepantes. Onde 65.038 kg de alimentos corresponde
ao valor de 154.047,55 reais em Brejo Santo, enquanto que os
20.097,03 kg de Milagres está para 152.469,86 reais. Essa diferença
da proporcionalidade de valores pode ser explicada pelo tipo de
alimento que foi fornecido. Por exemplo, entre os quilos fornecidos
por Milagres, talvez existam um valor expressivo de carne, enquanto
que o número de Brejo Santo esteja mais representado por hortaliças,
que são expressivamente mais baratas. Trocando em miúdos, grosso
modo, 20.000kg de carne, custam mais que 65.000kg de hortaliças.
Essa é uma suposição, com base no que se conhece dos tipos de
produtos que são comprados pelas unidades executoras.
Repare-se que na Figura 2 o número de agricultores é o total
de fornecedores que foi cadastrado, e o valor que poderia ser gasto
no ano de 2016, enquanto que no gráfico 3 o número de agricultores
representa a soma de fornecedores que cumpriu a proposta em
cada mês, contado a partir de abril, pois os primeiros três meses são
destinados ao processo de Pactuação e Valores e Metas, que precisa
ser renovado a cada ano, como explicado anteriormente.
Outra questão levantada pode ser a relação percentual da
execução da despesa. Nos municípios de Milagres e Porteiras a execução
é superior a 80% do valor empenhado, enquanto que em Brejo Santo
está em 51%. Uma explicação para esta diferença, ainda que por
categoria, os municípios estejam em um mesmo patamar de capacidade
produtiva, pode ser o cumprimento da entrega da produção acordada.
294
Na fala dos agricultores entrevistado na EXPROAF eles relatam
que há algumas dificuldades na produção, como a falta de água e
recursos para otimização do que é produzido. Ou mesmo entraves na
comercialização, apontados pelos fornecedores como a Burocracia
no processo, a entrega dos produtos com base nas demandas das
entidades receptoras, entre outros motivos de menor incidência. Por
outro lado, por parte das unidades executoras, é elucidado que ocorrem
erros no processo de transporte e acondicionamento dos produtos
que comprometem a segurança alimentar, e consequentemente estes
produtos são rejeitados e não pagos.
Considerações Finais
295
Entende-se que existem outros tipos de abordagem e mesmo
resultados possíveis para o PAA. Aliás, conseguiu-se identificar
na pesquisa de campo outras variáveis para serem analisadas
posteriormente. Porém, nesse texto o foco foi entender os estágios
da despesa e como isso ocorre na prática com um programa real,
que tem recurso do governo e precisa seguir normas de execução.
Considera-se que os objetivos propostos foram alcançados, e as
hipóteses levantadas são passiveis de investigação.
Referências Bibliográficas
296
COORDENADORIA DE DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL
E COMBATE A POBREZA RURAL-CODET. Orientações Básicas
sobre o Programa de Aquisição de Alimentos. Fortaleza: Secretaria
de Desenvolvimento Agrário, 2017.
297
DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL
DOS AGRESTES CENTRAL E
SETENTRIONAL DE PERNAMBUCO:
REFLEXÕES ACERCA DA
IMPLANTAÇÃO DE POLITICAS
PUBLICAS
299
a Secretaria de Desenvolvimento Territorial (SDT), no âmbito do
Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA)6.
A criação da SDT instituiu a abordagem territorial como eixo
central e foco de atuação da gestão do Estado. O enfoque territorial
se dá como estratégia, essencialmente, integradora de espaços, atores
sociais, agentes, mercados e políticas públicas de intervenção, tendo
na igualdade, no respeito à diversidade, na solidariedade, na justiça
social, no sentimento de pertencimento, na valorização da cultura
local e na inclusão social, as bases fundamentais para conquista da
cidadania.
Os territórios são mais do que uma simples base física. Eles
têm vida própria, possui um tecido social, uma teia complexa de
laços e de relações com raízes históricas, políticas e de identidades
diversas, que vão muito além de seus atributos naturais, dos custos
de transporte e de comunicações, e que desempenham função ainda
pouco conhecida no próprio desenvolvimento econômico (BRASIL,
2003, p. 03). De acordo com a SDT,
[...] o Território Rural é compreendido como um “espaço físico,
geograficamente definido, geralmente contínuo, compreendendo
cidades e campos, caracterizado por critérios multidimensionais,
tais como o ambiente, a economia, a sociedade, a cultura, a
política e as instituições, e uma população, com grupos sociais
relativamente distintos, que se relacionam interna e externamente
por meio de processos específicos, em que se pode distinguir um ou
mais elementos que indicam identidade e coesão social, cultural e
territorial” (BRASIL, 2003, p. 04).
300
construção de uma nova institucionalidade – o território -, fundado
na representação dos interesses sociais e econômicos da agricultura
familiar e que previa a coordenação e a articulação de um grupo
de municípios em torno de uma estratégia comum (LEITE; WESZ
JUNIOR, 2007).
No PRONAT7 (Programa Nacional de Desenvolvimento
Sustentável de Territórios Rurais)há a intenção de gerar o
empoderamento e abrir a possibilidade de inclusão sócio-produtiva
dos agricultores familiares de modo a tentar reduzir as desigualdades
das mais variadas ordens (social, econômica, produtiva, fundiária e
de gênero) e a pobreza extrema do espaço rural brasileiro.
O Governo Federal justificou a implementação desse programa
a partir de dados que demonstram a importância do setor rural
para o desenvolvimento do país. Segundo informações contidas no
PRONAT, cerca de 1/3 da população, 80% dos municípios e 90% da
superfície nacional, estão situados em municípios que dependem,
em grande escala, das atividades rurais para gerarem emprego,
fornecerem alimento e produtos, crescerem economicamente8 e se
desenvolverem (FREITAS, 2011).
Para alcançar as metas propostas e operacionalizar o PRONAT,
foi necessária a implantação de táticas para o fortalecimento da
agricultura familiar, através de programas da aquisição da produção:
o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), e o Programa
de Aquisição de Alimentos (PAA).
Outra estratégia utilizada foi a implantação de financiamento
direto aos pequenos produtores, através do Programa Nacional de
Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF); e o Programa
de Apoio à Infraestrutura nos Territórios Rurais(PROINF), este
último com objetivo de facilitar o processo produtivo, estimulando
o associativismo a nível de produtores, bem como consórcio entre
municípios, que visam o fortalecimento das ações estratégicas das
7
O PRONAT foi fundamentado pela Ação Orçamentária de Apoio a Projetos de Infraestrutura e
Serviços em Territórios (PROINF) e sua coordenação era feita pela Secretaria de Desenvolvimento
Territorial (SDT) do então Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA).
8
Importa aqui destacar que nos municípios de pequeno porte do Semiárido brasileiro, onde as
condições produção são precárias, a aposentaria rural e os programas de transferência de renda,
tornam-se elemento os essenciais para a sobrevivência das famílias.
301
unidades federadas, na busca de uma identidade produtiva, levando,
inclusive a criação de alguns Arranjos Produtivos Locais (APL).
Visando um maior diálogo entre governo e sociedade civil
organizada, foram criados os Colegiados Territoriais, que são
formados por atores sociais e gestores públicos. Os Colegiados têm
como atribuição sensibilizar, envolver, articular e coordenar os atores
sociais do território, com vistas à construção coletiva de um Plano
Territorial de Desenvolvimento Rural Sustentável, elaborando uma
agenda de prioridades, bem como a seleção dos projetos a serem
implementados em cada fase do Plano.
O objetivo do presente estudo é mostrar as ações do Estado
e a atuação dos Colegiados, via editais, que visaram beneficiar o
desenvolvimento socioeconômico dos Territórios do Agreste Central
e Agreste Setentrional de Pernambuco, no período 2014-2016 Esse
recorte temporal foi escolhido por ser o mesmo na qual foi prestado
serviços de consultoria para apoiar à implantação e manutenção de
Núcleos de Extensão em Desenvolvimento Territorial (NEDET) para
auxiliar os membros dos Territórios no desenvolvimento sustentável
para o Brasil Rural9.
Para tanto foram discutidos os fundamentos desse modelo
de gestão, analisando sua base teórico-metodológica, além da
realização de entrevistas com os membros do Colegiado. A
intenção das entrevistas foi entender o processo de divulgação da
chamada dos editais publicados pelo Governo Federal, voltados
para o desenvolvimento territorial, assim como os procedimentos
de elaboração dos projetos para submissão. Após essa etapa,
foram avaliadas as aberturas de editais que contribuem para o
desenvolvimento territorial. Dentre os principais editais analisados
estão os dos Projetos de Infraestrutura e Serviços em Territórios
Rurais (PROINF), os do Programa Nacional de Alimentação Escolar
(PNAE) e o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA).
9
A referida consultoria foi selecionada a equipe pelo edital do CNPq/MDA/SPM-PR Nº 11/2014.
302
Caracterização e diagnóstico territorial dos Agrestes Central e
Setentrional
303
de Desenvolvimento Rural Sustentável de Pernambuco e pela
Secretária de Desenvolvimento Territorial.
Essas duas Regiões de Desenvolvimento são ricas na produção
agropecuária, na cultura de subsistência, principalmente o cultivo de
feijão e milho; nas áreas de brejo, aparecem a videira, a fruticultura
e o plantio de hortaliças, principalmente em São Vicente Férrer
e Machados. A olericultura e a floricultura também representam
algumas das atividades destas regiões.
O comércio é significativo, sobretudo nas sedes urbanas
dos municípios de Caruaru, Pesqueira, Belo Jardim, Bezerros no
território do Agreste Central e Santa Cruz do Capibaribe, Surubim e
Limoeiro no território do Agreste Setentrional.
Figura 2: Distribuição dos Municípios no Território do Agreste Central
304
Figura 3: Distribuição nos municípios no Território do Agreste Setentrional
305
e o Gado Leiteiro (voltadas a produção de lucro para os pequenos e
médios produtores rurais) formavam a base da economia regional,
permanecendo essa estrutura como modelo econômico regional
principalmente até meados da década de 80 do século passado.
O Agreste pernambucano se caracteriza pelas pequenas e
médias propriedades rurais, “mais de 85% dos estabelecimentos
agropecuários do Agreste são formados por propriedades ou
explorações com extensão inferior a 20 hectares, embora disponham
de apenas 14% da área regional” (ANDRADE, 2001. p. 167), esse
parcelamento do solo imprimiu características distintas das demais
mesorregiões do estado de Pernambuco. Essa particularidade na
dimensão dos lotes rurais é um dos fatores que contribuem para o
perfil da diversificação na produção agropecuária entre pequenos
produtores e agricultores familiares.
No entanto, a economia de base rural dos Territórios encontra-
se em processo de encolhimento, fruto do crescimento acelerado
e sem planejamento da indústria de roupas, que traz consigo um
segmento de comércio voltado a suprir as necessidades de produção
do setor têxtil, marcado principalmente por unidades de venda e
representação de máquinas de costuras e uma grande variedade de
lojas de aviamentos que são utilidades primordiais para o aceleramento
do ramo de produção têxtil na região. A concentração de capital e das
terras, o controle das políticas locais, muitas vezes com uso da força
– o que é relatado historicamente no contexto rural pernambucano –
inibem a diversificação produtiva, incidem na má qualidade de vida da
população e provocam desemprego e êxodo rural.
Historicamente, o Agreste pernambucano se caracteriza pelas
pequenas e médias propriedades rurais, esse parcelamento do solo
imprimiu características distintas das demais mesorregiões do
estado de Pernambuco. Essa particularidade na dimensão dos lotes
rurais é um dos fatores que contribuem para o perfil da diversificação
na produção agrícola. De acordo com Andrade (1986) e Andrade
(2011) essa diversificação sempre esteve calcada em um modelo de
consorciamento na quais culturas e criações de subsistência (milho,
feijão, tubérculos, fava, entre outros) como Algodão e o Gado Leiteiro
foram a base da economia regional.
306
Tal perfil foi modificado com o processo de inversão da
população que passou a residir predominantemente nos centros
urbanos. A alteração do padrão residencial populacional (a partir de
meados da década de 1980) iniciou o desmonte da base produtiva
rural que passou para uma base tipicamente urbana.
Essa problemática assinala para a importância de se olhar mais
atento para a agricultura familiar da região na qual os territórios em
tela estão inseridos, buscando incentivar as iniciativas locais e as
oportunidades de fortalecimento da produção através implantação
de experiências de base agroecológica, procurando dinamizar
a produção local, abrir perspectivas de autonomia financeira e
contribuir substancialmente para transformar as condições históricas
de exclusão social da população rural.
Pode-se dizer que a sustentabilidade socioeconômica dos
Territórios passa a estar atrelada ao apoio a uma numerosa população
rural, em que se insere a população voltada para as atividades agrícolas
com seu papel dinamizador do desenvolvimento rural, conforme já
apontado por Weid (2001).
Atualmente, a população economicamente ativa do Agreste
Central é de 394.678 habitantes distribuída percentualmente pelos
seguintes setores produtivos: Agropecuária (35,2%), comércio e
serviços (17,1%), indústria da transformação (13,1%) e serviços
domésticos (14,9%). Os demais 29,7% estão distribuídos em outros
setores produtivos como construção civil, alojamento e alimentação,
transporte e armazenagem, entre outros (Fonte: PTDRS).
Dentro deste cenário o setor de confecção tem se destacado
no processo de expansão, marcado principalmente por unidades
de venda e representação de máquinas de costuras e uma grande
variedade de lojas de aviamentos que são utilidades primordiais para
o aceleramento do ramo de confecções na região.
A predominância de pequenas e médias unidades rurais no
território do Agreste assinala a peculiaridade da estrutura fundiária
do território diante das características observadas nas outras
mesorregiões do estado de Pernambuco, indica a importância da
agricultura familiar, buscando incentivar as iniciativas locais e as
oportunidades de fortalecimento da produção através implantação
307
de experiências de base agroecológica, procurando dinamizar
a produção local, abrir perspectivas de autonomia financeira e
contribuir para transformar as condições históricas de exclusão
social da população rural.
Diante deste quadro socioeconômico verifica-se a necessidade
do fortalecimento dos pequenos produtores agrícolas e principalmente
dos agricultores familiares como forma de garantir a permanecia, a
identidade e empoderamento rural/agrícola dentro dos territórios.
308
para discutir conjuntamente a melhor opção para estruturação
do território. A plenária contou com a participação de mais de
60 atores sociais (poder Público e sociedade civil). Após debate
na plenária foi escolhida como necessidade emergente para o
fortalecimento da Agricultura Familiar, o projeto de apoio à
estruturação de empreendimentos produtivos seria feito através da
solicitação de Kit para Feiras Agroecológicas. O valor demandado
ao MDA foi de R$ 322.515,00 e o valor da contrapartida foi de R$
80.628,75 (disponibilizado pela SEAF/SARA Secretaria Executiva da
Agricultura Familiar da Secretaria de Agricultura e Reforma Agrária
de Pernambuco), somando um total de R$ 403.143,75.
A escolha pela aquisição de Kit-Feira (composto basicamente
por barracas desmontáveis de ferro fundido com cobertura de lona,
balança e galeias) para a comercialização da produção de hortaliças,
raízes, tubérculos e frutas produzidos em módulos familiares nos
moldes da agricultura orgânica e/ou ecológica, pois esse tipo de
produção garante um lucro bastante representativo, em primeiro
lugar pelo valor agregado e em segundo lugar pelo fato do pequeno
produtor tem a possibilidade de se livrar da figura dos atravessadores.
Na ocasião alguns dos atores sociais foram questionados
sobre como ele se identificava quanto seu papel na construção do
território. Como perfil de resposta os entrevistados afirmaram que se
sentem protagonistas na organização do território a partir das suas
participações nas decisões nas plenárias (Figura 5 e 6).
Porém, também obtemos como colocação padrão o fato do
Estado não cumprir a sua parte. Essa colocação deu-se em função
de que alguns PROINFs, apesar de submetidos e aprovados, ainda
não tiveram o seu produto entregue pelo MDA. Como exemplo,
pode-se citar o PROINF de 2009 do Agreste Central, que teve
suas instalações concluídas e com capacidade de funcionamento
para o beneficiamento de mel apenas no ano de 2016, tendo sua
operacionalização no munícipio de Brejo da Madre de Deus, que foi
responsável pela garantia da contra partida exigida nos edital (Figura
4).
309
Figura 4: Casa do Mel, Brejo da Madre de Deus - Agreste Central
310
Figura 5: 3º Assembleia Ordinária do Colegiado Território Agreste Setentrional
de Pernambuco, 2016.
311
Outro projeto que se destaca nas ações do Estado para o
fortalecimento territorial é o Programa Nacional de Alimentação
Escolar (PNAE). O PNAE tem por objetivo contribuir para o
crescimento orgânico e o desenvolvimento intelectual, emocional e
social, o rendimento escolar e a formação de hábitos saudáveis dos
alunos, por meio de ações de educação alimentar e nutricionais e da
oferta de refeições que cubram as suas necessidades nutricionais na
escola. Apesar da relevância do programa, os territórios do Agreste
vêm enfrentando dificuldade para se tornarem fornecedores das
Prefeituras municipais e do Governo do Estado de Pernambuco,
devido às exigências de registro fiscal para os fornecedores das
merendas escolares, todavia os agricultores começam a buscar
estratégias para a comercialização dos seus produtos através do uso
do CNPJ das associações comunitárias.
Mais um grande problema enfrentado pelos agricultores da
agricultura familiar se dá pelo fato da ausência de assistência técnica
para que os alimentos e produtos derivados possam atender as
especificidades quanto ao processo de certificação sanitárias vigentes,
desta maneira fica evidente a dificuldade desses profissionais do
campo se inserirem dentro de um mercado formal, restando às
feiras livres, as centrais de abastecimento e os supermercados como
possibilidade de escoamento de sua produção, sendo esses dois
últimos reduzindo o lucro do produtor de forma bastante acentuada
por conta dos atravessadores de produção.
A geração de renda nesse caso fica dificultada, pois por conta
de infraestrutura de transporte e escoamento da produção, esses
produtores se submetem ao papel do atravessador, que como já é de
domínio público acaba que por explorar o trabalhador, pagando em
alguns casos valores que não cobrem nem os custos de produção,
ficando apenas a produção vendida nas feiras livres uma possibilidade
de obtenção de lucro, visto que a venda é realizada diretamente ao
consumidor final.
Diante do exposto, os programas PAA e PNAE também se
destacam como fundamentais para o desenvolvimento Territorial.
Eles, por si só, se articulam com os Conselhos Municipais de
Desenvolvimento Rural e respectivamente com as Associações.
312
Baseados nestas estratégias, os Territórios buscam mobilizar os
parceiros, os gestores e os demais órgãos para participarem dos
Editais.
Além das ações anteriormente elencadas, o NEDET em
conjunto com o CODETER, atuou de forma bastante contundente
na articulação e na realização da etapa territorial (Figura 7) da II
Conferência Nacional de Assistência Técnica de Extensão Rural -
CNATER. Os municípios do Agreste foram representados pelos
secretários municipais de agricultura e meio ambiente, presidentes
de sindicatos rurais, coordenadores de associações comunitárias,
agricultores e profissionais da área rural. Os participantes debateram
sobre a utilização dos meios tecnológicos a serviço das atividades
do campo e a da implantação de políticas públicas de incentivo à
produção rural.
Figura 7: Etapa territorial do Agreste Setentrional da II Conferência Nacional de
Assistência Técnica de Extensão Rural (CNATER).
313
na etapa estadual, pois parte representativa parte dos delegados
foram escolhidos para representarem o estado de Pernambuco na
culminância da conferencia nacional.
Mediante aos grandes desafios que os Conselhos de
Desenvolvimento Territorial tiveram foi articular e implementar os
núcleos diretivos, pois, para que de fato esses colegiados assumam
as suas atividades de organização, sensibilização e mobilização para
manter a essência da participação dos atores da sociedade civil
(principalmente) e as representações do setor público na condução
das atividades do colegiado, por sua vez os núcleos diretivos
mantiveram sempre usando o papel decisivo e mediador entre os
participantes das mais diversas esferas.
Outro grande desafio identificado foi o cumprimento dos
calendários pactuados de assembleias e reuniões dos núcleos diretivos.
O grupo NEDET esteve sempre à disposição para esclarecimento e
dialogar com os membros que compõe os territórios. A circulação
das informações foi alvo de grande importância na mobilização
para efetivar as ações dos núcleos diretivos, porém é válido lembrar
que muitas vezes as disputas políticas pelo controle das ações e das
informações, geraram a criação de núcleos de disputa interna. Esse
fato se deu não apenas no colegiado como todo, mas principalmente
entre os grupos de articulação criados dentro do próprio núcleo
diretivo.
Por sua vez os espaços específicos de cada setor, como: sendo
gênero, juventude, desenvolvimento econômico e ater, ganharam
força, em função do trabalho desempenhado pelas Assessorias
Territorial de Gestão Social (ATGS) que a partir de sua larga
experiência em conduzir diálogos acerca do desenvolvimento que só
é construído a partir da participação e do empoderamento dos atores
de todos os segmentos. .
Sendo assim, a importância desses espaços mobilizados sempre
será valioso para manter o debate do desenvolvimento dentro dos
colegiados territoriais, porém com o declínio/extinção da politica
nacional de desenvolvimento territorial, iniciada com o desmonte do
Ministério do Desenvolvimento Agrário, que se tornou apenas uma
secretária ligada ao ministério da Casa Civil.
314
Nessa perspectiva se lança a hipótese de que a fragilidade das
disputas internas dos núcleos diretivos e dos colegiados territoriais
acaba por desestruturar ainda mais o processo de crescimento
estratégico dos Territórios, visto que a ausência de ações para serem
discutidas e disputadas pela base e pelos municípios que compõem
os territórios, levará sem sobra de duvida ao desmantelamento das
discussões de empoderamento dos atores do campo e da cidade.
Considerações Finais
315
Quanto ao PNAE, os componentes do colegiado indicam a
inviabilidade de submissão ao edital em função das imposições
produtivas incompatíveis com a produtividade de um agricultor
familiar do Território do Agreste Central e Setentrional.
Entende-se, portanto, que o desafio do Estado é otimizar os
processos de entrega dos equipamentos solicitado nos projetos,
proporcionando assim a melhoria socioeconômica e produtiva nos
Territórios Rurais dos Agrestes Central e Setentrional , consolidando
o empoderamento dos agricultores familiares como atores ativos
nas tomadas de decisões voltadas ao crescimento e (re)produção
econômica dos territórios.
No tocante aos atores da sociedade civil, fica posto o desafio
de manter a articulação para a discussão de táticas e estratégias de
desenvolvimento territorial, devido a ausência deestímulos práticos
a continuidade das atividades dos CODETER´s, sendo necessário
elucidar alguns elemento: i) ausência de clareza nos rumos das
politicas de desenvolvimento territorial do atual governo federal;
ii) inexistência de editais para o financiamento da ampliação de
ações ligadas ao crescimento econômico através da implementação
de novos vetores desenvolvimento; e iii) finalização da consultoria
ofertadas pelos NEDET´s, pois não houve tempo hábil para fazer
a transição do modelo de articulação realizados por consultoria,
ficando os colegiados “órfãos” desse norteamento, que antes das
universidades eram ofertadas por ONG´s.
Assim, fica claro que hoje há apenas incertezas quanto ao futuro
da articulação dos atores dos colegiados, da prática de escuta da base
para a implementação de politicas voltadas ao desenvolvimento
territorial.
Referências Bibliográficas
316
ANDRADE, Manuel Correia de. A terra e o Homem no Nordeste.
São Paulo Atlas, 1986. 239 pgs.
317
WEID, J. M. V. D., Qual estratégia para o desenvolvimento rural?in:
núcleo de estudos agrários e de desenvolvimento (NEAD), José
Graziano, Jean Marc e Bianchini debatem o Brasil rural precisa de
uma estratégia de desenvolvimento, Brasília: MDA/CNDRS/NEAD,
2001.
318
DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL
DO NORDESTE RIOGRANDENSE EM
FOCO
319
atividade agropecuária, constituída por minifúndios com terrenos de
relevo irregular e com uma produção diversificada. Segundo IBGE
(2014), os 20 municípios que compõe o Território Rural do Nordeste
do Rio Grande do Sul possuem, no conjunto, aproximadamente
125.000 habitantes, incluindo diversos grupos indígenas caingangues
e charruas, tendo como motor de desenvolvimento atividades ligadas
à agricultura, pecuária leiteira, suinocultura, avicultura, fruticultura
e vitivinicultura, bem como agroindústrias processadoras destas
matérias primas: carnes, leite, grãos, uvas e óleos vegetais.
Segundo o estudo da Secretaria de Planejamento do Governo do
Estado do Rio Grande do Sul (RUMOS, 2015), a região do Território
foi classificada como de médio desenvolvimento econômico, com
baixos níveis de desenvolvimento social e média potencialidade
física e socioeconômica.
O Índice de Desenvolvimento Socioeconômico (IDESE) da
região do Território Rural do Nordeste era de 0,737, apresentando
índices abaixo da média estadual em todos os blocos analisados:
educação, renda, saúde, saneamento e domicílios (FEE, 2009).
Salienta-se ainda que a região tem apresentado população em
declínio, como resultado do êxodo rural principalmente de jovens
(FEE, 2009; PFÜLLER, 2016).
O êxodo da população jovem do campo acarreta dois grandes
problemas sociais: o aumento da população na faixa da miséria das
grandes cidades do país e a escassez de mão-de-obra na agricultura. Ao
mesmo tempo, o êxodo de jovens do meio rural afeta a continuidade
das atividades das propriedades rurais e influencia para que a mulher
rural também sofra consequências negativas, uma vez que acaba
sendo obrigada a assumir a força de trabalho deste jovem ausente no
sistema produtivo (PFÜLLER, 2016)
Trabalho realizado no planejamento estratégico regional
do Corede Nordeste apontou como fraquezas limitantes ao
desenvolvimento regional, dentre fatores: parques industriais com
infraestrutura e integração deficientes, baixa qualificação de mão
de obra, planejamentos fragmentados, cultura individualista e
esgotamento dos recursos naturais. Nestes mesmos levantamentos,
sugere-se a possibilidade de expansão da prestação de serviços e a
320
maior agregação de valores para a agricultura familiar (PFÜLLER
& SANTOS, 2011), o que deve impactar para um desenvolvimento
mais sustentável.
Neste sentido, a ONU (1987) define como desenvolvimento
sustentável “aquele que é capaz de satisfazer as necessidades atuais
sem comprometer a habilidade das futuras gerações de atender
suas próprias necessidades.” O Relatório também considera que:
“no mínimo, o desenvolvimento sustentável não deve pôr em risco
os sistemas naturais que sustentam a vida na terra: a atmosfera, as
águas, os solos e os seres vivos.”
Segundo o MMA (2016), o grande desafio do desenvolvimento
rural sustentável é “superar a dicotomia entre produção e proteção
ambiental”. Ainda, segundo o mesmo Ministério, o desafio é duplo:
por um lado, reverter o estágio atual de degradação dos ecossistemas
provocada pela agropecuária, e por outro, mas ao mesmo tempo,
promover, difundir e consolidar formas e estilos do sistema
produtivo agrosilvopastoril e desenvolvimento rural praticados em
bases sustentáveis.
Neste sentido, em 2003 o governo federal criou o Programa
Nacional de Desenvolvimento Sustentável de Territórios Rurais –
PRONAT, visando priorizar suas ações em regiões onde o investimento
público e privado não era suficiente para atender as necessidades da
população e buscando promover o aceleramento dos processos locais
e regionais para aumentar as chances de geração de renda, levando em
consideração a sustentabilidade no campo (DANTAS & COSTA, 2014).
Assim, o presente trabalho busca elucidar alguns aspectos
pesquisados durante o desenvolvimento do projeto, visando contribuir
para a consolidação da abordagem territorial como estratégia de
desenvolvimento sustentável, realizado por meio do levantamento e
monitoramento de dados junto ao Colegiado Territorial, através de
consulta em materiais bibliográficos e órgãos institucionais locais e
regionais e sites da internet como IBGE, portal dos NEDETS, portal
SGE, entre outros, e reuniões municipais e regionais com diversos
atores sociais, como subsidio à “pesquisação” das políticas públicas
existentes com foco na agricultura familiar, no meio ambiente e na
organização das mulheres rurais.
321
Fundamentação Teórica
322
e jovens no meio rural considerando essa nova organização do rural?
Se a agricultura não gera mais renda suficiente para o sustento da
população que vive no campo e dele depende o que fazer para reverter
tal situação? Essas são algumas das indagações mais prementes que
as práticas produtivas e educativas terão que se debruçar.
Por outro lado, a escolha das estratégias mais adequadas para
alcançar os objetivos contidos no processo desenvolvimento regional
passa, certamente, por um conhecimento mais aprofundado das
características de cada região, das suas limitações e potencialidades.
Todavia, o termo região tem sido utilizado com bastante
frequência pelo senso comum e que desconhece todos os elementos
que o compõe. Diversos autores têm afirmado que uma região pode
ser considerada um território diferenciado em virtude de qualidades,
povos, desenvolvimento, interesses locais ou uma identidade regional.
Conforme Haddad (1989), nenhum conceito de região satisfaz,
ao mesmo tempo, geógrafos, cientistas políticos, economistas,
antropólogos, entre outros, pois enquanto para alguns autores, as
regiões são entidades concretas e objetivas, que podem ser facilmente
identificadas, para outros, elas são abstratas, sendo apenas formas de
classificação que facilitam análises espaciais.
No artigo “Caracterização de Arranjos Produtivos Locais de
Turismo: Uma Análise Com Base na Teoria dos Espaços”, Boullon
(2002), destaca a possibilidade de regionalização a partir de atividades
produtivas, por decisões político-administrativas ou elementos
materiais de natureza diversas.
Outra forma de regionalização é a partir de critérios políticos,
que se materializam na associação de municípios com interesse
comum. Um terceiro critério de regionalização é o interesse de
intervir num determinado espaço, por questões estratégicas, cujos
limites são estabelecidos por decisões político-administrativas,
as quais são denominadas regiões-plano ou regiões-programa
(BOULLON, 2002).
Assim, a delimitação do estudo e implementação de projetos
de desenvolvimento em uma região geográfica, pode ocorrer pela sua
geografia (região sul do Brasil), pela sua cultura (primeira colônia de
imigração alemã), pelo seu produto ali desenvolvido (vinhos no vale
323
dos vinhedos), por interesse da população (território do rural), pelo
conjunto de semelhanças (COREDEs), assim por diante.
Tampouco, o desenvolvimento econômico não ocorre de
forma homogênea no espaço, pois durante o processo de crescimento
econômico as regiões crescem de maneiras diferentes, devido à sua
estrutura produtiva e sua disponibilidade de recursos, independente
da existência de políticas. Assim, estudar a diferenciação espacial e os
diferenciados padrões de desenvolvimento regional é fundamental
para entender a dinâmica local e regional, que ocupam posição de
destaque nas análises econômicas, sociais e geográficas, assim como,
auxiliam no planejamento regional (WIEBUSCH, 2007).
Segundo o MDA (2015), o colegiado territorial é o ambiente da
gestão social nos territórios rurais e territórios da cidadania. Trata-
se de instâncias de gestão social da política territorial, constituídas
como espaços de pactuação política entre os diferentes segmentos
organizados que o integram. É a partir dessas institucionalidades
que se busca ampliar o acesso, a integração e articulação das políticas
públicas contextualizadas às especificidades de cada território,
assegurando os canais de participação social necessários para o
fortalecimento da democracia participativa.
324
de conhecer independentemente dos sentidos; sensação; intuição;
ideia; imagem; representação intelectual. Segundo a mesma autora,
estudos na área e percepção ambiental podem ter como objetivo
educacional buscando “formação de conhecimento, sistema de
valores; ensino de classes populares; percepção de riscos ambientais”.
Já Fernandes s.d. define que “percepção ambiental pode ser
definida como sendo uma tomada de consciência do ambiente pelo
homem, ou seja, o ato de perceber o ambiente que se está inserido,
aprendendo a proteger e a cuidar do mesmo”.
A Carta da Terra (2016), construída na conferencia para o meio
ambiente em 1992, conhecida como Rio 92, se refere conservação
ambiental como uma necessidade para o desenvolvimento sustentável.
O texto aparece como um dos compromissos a serem assumidos
por todos: “adotar planos e regulamentações de desenvolvimento
sustentável em todos os níveis que façam com que a conservação
ambiental e a reabilitação sejam parte integral de todas as iniciativas
de desenvolvimento.”
No caso deste trabalho, buscou-se identificar a percepção am-
biental dos agricultores moradores do território, com o fim de diagnós-
tico da situação. Com base no diagnóstico pode-se buscar o desenvol-
vimento rural sustentável, conforme definido pela ONU e pelo MMA.
Para o levantamento, aplicou-se um questionário que continha
várias questões como escolaridade dos pais e dos filhos, acesso a
políticas públicas, e a percepção se este acesso os manteve na mesma
situação, se a situação destes piorou ou se avançou. As mesmas
opções foram dadas para a questão situação das questões ambientais,
questões sócioeconômicas e questões culturais educacionais.
325
• Percepção ambiental dos agricultores do município de Santa
Cecília do Sul
326
• Percepção ambiental dos agricultores do município de Sananduva
327
dos pesquisados relatou perceber alguma melhora nas questões
ambientais solicitadas.
328
Pode-se observar que o que mais se destaca é uma piora, para
81% em relação a quantidade de pragas e doenças, para 63% em
relação ao clima, para 72% em relação a quantidade de mata e para
81% em relação a qualidade das águas dos rios.
Os distúrbios climáticos (secas, tempestades e enchentes)
permanecem na mesma para 36% dos entrevistados e piorou para
54%. A degradação do solo foi o único item de destaque entre os que
avançaram, segundo 72% dos entrevistados.
329
• Percepção ambiental dos agricultores do município de
Tapejara
330
• Percepção ambiental dos agricultores do município de São José
do Ouro
Figura 7: Percepção ambiental dos agricultores do município de São José do
Ouro, em 2016.
331
Figura 8: Percepção ambiental dos agricultores do município de São João da
Urtiga, em 2016.
332
Figura 9: Percepção ambiental dos agricultores do município de Paim Filho, em
2016.
333
Figura 10: Percepção ambiental dos agricultores do município de Maximiliano de
Almeida, em 2016
334
Figura 11: Percepção ambiental dos agricultores do município de Água Santa, em
2016.
335
• Percepção ambiental dos agricultores do município de Cacique
Doble
336
• Percepção ambiental dos agricultores do município de Ibiaçá
Figura 13 Percepção ambiental dos agricultores do município de Ibiaçá, em 2016
337
melhoras, o item mais lembrado foi a degradação do solo para 17%
dos agricultores.
Figura 14: Percepção ambiental dos agricultores do município de Machadinho,
em 2016
338
Figura 15: Percepção ambiental dos agricultores do município de Machadinho,
em 2016
339
O que se defendeu como pré-condição para o desenvolvimento
sustentável com igualdade econômica e social na Conferência
Nacional de Políticas para as Mulheres, são mudanças de padrões
existentes no país, onde se estabeleçam princípios norteadores
na promoção da igualdade nas mais diferentes dimensões. Neste
caso, compreende a moradia digna, com infraestrutura básica no
meio rural e urbano, maior acesso a programas de financiamento
para as mulheres em situação de vulnerabilidade social, bem
como, valorização do trabalho reprodutivo com divisão sexual dos
trabalhos, historicamente delegado as mulheres (CNPM, 2013).
O rompimento desses paradigmas libera a mulher da
obrigatoriedade dos encargos domésticos, sendo um fator decisivo
para sua autonomia, principalmente econômica. Dessa forma o
desenvolvimento econômico de um país não pode abstrair da
contribuição das mulheres, pois estas desigualdades são excludentes,
desintegradoras. Deste modo, deverá sim, incluir instrumentos que
permitam conciliar a diversidade de gênero, o avanço econômico,
com novos padrões de inserção social (CNPM, 2013).
A luta das mulheres pela Igualdade de Direitos, durante
a história é conquistada pouco a pouco, principalmente na
Constituição Federal. Pode-se constatar que desde 1824 quando a
mulher ainda não era considerada cidadã, nem podia votar. Após, em
1932 garantiu-se o direito do voto assistido, se a mulher fosse casada.
Em 1934 consagrou-se o princípio de igualdade entre os sexos, e a
garantia de descanso antes e após o parto. Em 1946 nos artigos da
Constituição ressalva que “todos são iguais perante a lei”. No ano de
1967 uma grande conquista de garantia para a aposentadoria com 30
anos de serviço (NEDET, 2013).
As conquistas das mulheres para a igualdade de gênero no
Brasil concretizaram-se muito com a promulgação da Constituição
Federal de 1988. Seu marco foi à apresentação da Carta das Mulheres
Brasileiras aos Constituintes (1988), que indicava as demandas do
movimento feminista. A Carta Magna de 1988 incorporou no Artigo
5°, I: “Homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos
termos desta Constituição”. E no Artigo 226, Parágrafo 5°: “Os
direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos pelo
340
homem e pela mulher”. Esses dois artigos garantiram a condição de
equidade de gênero, bem como a proteção dos direitos humanos das
mulheres pela primeira vez na República Brasileira (NEDET, 2013).
Além dessas conquistas, podem-se citar ainda os direitos de
família, direito de propriedade, direitos trabalhistas; direitos das
trabalhadoras domésticas e das trabalhadoras rurais. Que todos
na sua grande maioria são conquistas dos movimentos sociais
organizados das mulheres urbanas e rurais.
Outro viés importante para reduzir as desigualdades de gênero e
a violência contra a mulher é a criação da Lei 11.340/2006, conhecida
como Lei Maria da Penha, representa uma grande conquista dos
movimentos feministas, em busca da erradicação, prevenção e
punição da violência contra a mulher. Ela é o resultado de muitos
anos de luta para que as mulheres brasileiras pudessem dispor de um
instrumento legal que assegurasse seus direitos e também para que o
Estado brasileiro passasse a enxergar a violência doméstica e familiar
contra a mulher (NEDET, 2013).
O Art. 1º da Lei 11.340/2006cria mecanismos para coibir e
prevenir a violência doméstica e família contra a mulher, nos termos
do § 8º do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre
a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher,
da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar
a Violência contra a Mulher e de outros tratados internacionais
ratificados pela República Federativa do Brasil; dispõe sobre a criação
dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e
estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação
de violência doméstica e familiar (NEDET, 2013).
Apesar das conquistas históricas de direitos, as mulheres
ainda sofrem no cotidiano com a violência física, sexual e moral,
discriminadas enquanto gênero e também no ambiente profissional.
Conforme a Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM),
a autonomia econômica das mulheres constitui fator de suma
importância na busca da igualdade entre mulheres e homens, sejam
elas das cidades, do campo, das florestas ou das águas. É a condição
que elas têm de prover o seu próprio sustento, decidindo por elas
mesmas a melhor forma de fazê-lo. Isso envolve também as pessoas
341
que delas dependem. Assim, ela é mais do que autonomia financeira,
uma vez que inclui uma perspectiva de vida de longo prazo, com
acesso a previdência social e a serviços públicos (NEDET, 2013).
• Resultados
342
Mulher, entre outras ações que melhoraram a inclusão das mulheres
rurais nas organizações econômicas do Território.
A percepção que se teve através da realização deste trabalho
é de que há um grande caminho a percorrer no que se refere à
discussão sobre Desenvolvimento Territorial Rural Sustentável e
ocorre uma necessidade de intensificação de atuações na superação
das desigualdades de renda e gênero.
A luta pela igualdade de gênero é um ato de construção
permanente, executado por muitas pessoas que incessantemente se
mobilizam e lutam para que a igualdade de gênero seja de fato algo
presente na vida cotidiana de todos.
As assessorias de gestão social realizaram o acompanhamento
sistemático da composição e funcionamento do colegiado, produzem
informações, assessoram o colegiado e suas instâncias e contribuem
para a mobilização dos atores sociais, especialmente o grupo de
mulheres.
Considerações Finais
343
suas realizações, percebeu-se uma dificuldade em aglutinar
representantes de entidades concretamente interessados no processo
de desenvolvimento. Isso pode ser atribuído à indiferença das
prefeituras municipais quanto às questões do território, além da forte
rotatividade da participação dos atores nas instâncias do colegiado.
Para potencializar a política de territórios rurais e superar as
dificuldades encontradas na implementação das ações pelo Núcleo
de Extensão em Desenvolvimento Territorial, é fundamental um
maior envolvimento de representantes dos municípios e atores
sociais comprometidos com o desenvolvimento e fortalecimento do
território
A manutenção dos Núcleos de Extensão – NEDETs, nos
territórios constituídos, poderá contribuir significativamente nas
políticas de desenvolvimento territorial. A percepção das questões
ambientais pelos agricultores moradores do Território Nordeste
Riograndense é de que, no geral, houve piora da situação. Podemos
destacar os que obtiveram maior porcentagem de respostas, o
aumento na quantidade de pragas e doenças, a piora na qualidade
das águas dos rios.
De forma geral, não perceberam alteração nas perturbações
climáticas e no clim. Como itens que melhoraram, a degradação do
solo foi a mais citada. Também foi lembrado o aumento no número
de animais nativos e na quantidade de mata.
Referências Bibliográficas
344
BRASIL. Presidência da República. Secretaria de Política para as
Mulheres. Presidência da República. Secretaria de Políticas para as
Mulheres. Plano nacional de políticas para as mulheres. Brasília:
Secretaria de Políticas para as Mulheres, 2013. http://www.spm.gov.
br/.
345
PFÜLLER, E. E. Desenvolvimento rural e sustentável e perspectivas
de um novo rural. In: THAIS JANAINA WENCZENOVICZ;
ROBSON OLIVINO PAIM. (Org.). Olhares ao campo: educação,
história e desenvolvimento. 1ª ed. Erechim: EPUB2, 2016, v. 01, p.
50-61.
346
Em apoio à sustentabilidade, à
preservação ambiental, Pronto Editora
Gráfica/ Kelps, declara que este livro foi
impresso com papel produzido de floresta
cultivada em áreas não degradadas e que
é inteiramente reciclável.
Fevereiro, 2018
9 788540 023406