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O canto anterior terminou com o Velho do Restelo a amaldiçoar a expansão para o Oriente, o que
desde logo sugere ao leitor que a viagem não será fácil.
Ora, terminada a narração da História de Portugal, Vasco da Gama vai contar ao rei de Melinde
como decorreu a sua viagem de Lisboa até ali.
Mais uma vez, realidade e fantasia se misturam, pois a par da indicação do percurso geográfico
efetuado aparecem episódios fantásticos.
Nesta etapa da viagem, os navegadores enfrentam inúmeros perigos que reforçam a ousadia dos
Portugueses.
Os fenómenos atmosféricos como o Fogo de Santelmo e a Tromba Marítima geraram nos navegadores
um grande receio, mas que estes conseguiram superar.
Surge-nos, mais adiante, um episódio cómico. Fernão Veloso, um marinheiro fanfarrão resolve arriscar-
se em terra, mas logo se arrepende e volta para o barco perseguido pelos africanos.
Um ponto crítico desta etapa da viagem era, sem dúvida, a passagem do Cabo das Tormentas, famoso
pelos inúmeros naufrágios aí ocorridos. O episódio do Gigante Adamastor representa de um modo
simbólico a desproporção de forças: por um lado, a fragilidade das naus e dos homens a bordo, por
outro, a fúria do mar, magnificamente personificada por este gigante aterrador.
Mas, os problemas dos Portugueses não terminariam aqui, ultrapassadas as dificuldades de navegação,
surge uma doença mortal: o Escorbuto, provocado pela falta de ingestão de alimentos frescos.
Por fim, Vasco da Gama termina a sua longa narração iniciada no canto III.
Gigante Adamastor (C. V, 37-60)
As naus portuguesas navegavam há cinco dias, estando junto do Cabo das Tormentas (futuro Cabo da Boa
Esperança) quando subitamente aparece, perante o espanto dos marinheiros uma nuvem escura e
imensa, que escondia o céu; o mar bramia e agitava-se, pressagiando uma ameaça terrível.
Desenha-se a imensa figura do Adamastor, gigante de aspeto horrendo e irado. O Poeta compara-o ao colosso
de Rodes, não se poupando a adjetivos para a sua descrição. O monstro interpela os marinheiros
aterrorizados, reduzidos pela sua presença avassaladora à dimensão de seres frágeis e indefesos.
Censura-lhes a ambição, a constante procura do novo, a ousadia de invadirem domínios que jamais tinham
sido atravessados.
Vasco da Gama enfrentando o próprio medo, ergue-se e frente àquela grandíssima estatura (59.5), ousa
perguntar: Quem és tu? (49.3).O poeta mostra, com estes efeitos cenográficos e intensamente dramáticos, a
sua conceção de valentia: herói não é aquele que não teme, mas o que supera o temor.
O gigante, irritado, profetiza a sua terrível vingança para os portugueses que ousarem por ali passar
no futuro. Os segredos do mar nunca tinham sido a nenhum grande humano concedidos (42.3), e nem a
coragem reconhecida do povo luso poderá alterar essa lei. Vasco da Gama fica a saber quais serão os destinos
fatais de Pedro Álvares Cabral, Bartolomeu Dias, D. Fernando de Almeida e Manuel de Sousa Sepúlveda,
com sua mulher e filhos, que irão morrer naquele local, a que D. João II dá o nome de Cabo da Boa Esperança.
Mas, diante da pergunta de Vasco da Gama, o Gigante muda o seu discurso. Explica que ele é o próprio
Cabo Tormentoso, castigo que os deuses lhe deram pela sua paixão por Tétis, que o despreza. A cólera
das suas primeiras palavras termina em lágrimas de dor. A nuvem negra desfaz-se, depois desta
confidência.
O Adamastor condensa em si todos os medos que suscitava o Mar Tenebroso, com o imaginário domínio
de forças sobrenaturais e maléficas. Mais um obstáculo vencido, à custa da coragem e inteligência de alguns
Portugueses.
Adamastor
O Adamastor de Os Lusíadas, poema épico de Camões, recupera a figura mitológica de um dos titãs que
se revoltaram contra Zeus e foram, por este, castigados e transformados em rochedos, ilhas e
promontórios. Inicialmente, o seu aspeto é o de uma figura descomunal, estranha e medonha. A aparência
horrenda do gigante é sugerida ainda antes de ele surgir, quando, nas estrofes 37 e 38 do canto V, se forma
uma «temerosa nuvem negra», acompanhada dos bramidos do mar irado. Este aspeto negro e carregado do
céu e do mar funciona como uma espécie de presságio, anunciando qualquer coisa de temível, que vem
a corporizar-se no Adamastor.
A sua imagem traduz as dificuldades sentidas pelos navegadores na passagem do oceano Atlântico para o
oceano Índico, ao dobrarem o cabo das Tormentas, mais tarde da Boa Esperança. É mais um processo de
enaltecimento, ao encarnar a vingança dos elementos naturais face à audácia dos navegadores
portugueses, que se atreviam a penetrar em espaços até então inacessíveis ao homem.
Na primeira parte do seu discurso, o Adamastor apresenta-se como senhor do mar desconhecido,
ameaçando os portugueses, que queriam devassar os seus domínios secretos, e profetizando para eles
duros castigos futuros. Na segunda parte do seu discurso, o Adamastor, identificando-se com o cabo
Tormentório e elogiando-se por ter conseguido o domínio dos mares, logo se abre em confidências,
revelando os acontecimentos que o levaram até àquele estado. A sua paixão por Tétis mereceu o castigo
dos deuses, que converteram o seu gigantesco corpo no cabo das Tormentas.
O Adamastor surge, no poema de Camões, como uma criação maravilhosa, a corporizar e simbolizar a quase
intransponível força do mar. O gigante é, pois, o símbolo das forças cósmicas que continuamente limitam
o homem. A vitória sobre o obstáculo que este gigante constitui significa o completo domínio dos mares
pelos portugueses.
est. 37 e 38
"Porém já cinco sois eram passados" localização das naus
est. 39 e 40
Caracterização da figura do Adamastor
est. 41 a 48
Discurso do Adamastor:
referência à ousadia dos portugueses;
profecias do gigante sobre o futuro dos Portugueses
est. 49
Interrupção do discurso por Vasco da Gama "Quem és tu?"
est. 50 a 59
O Gigante explica a sua génese;
Referência ao drama amoroso do Gigante;
Metamorfose do Adamastor.
est. 60
Desaparecimento do Gigante
Pedido do Gama a Deus para que as profecias do Gigante não se realizassem.
Quer Luís de Camões, quer Fernando Pessoa, dois dos maiores poetas portugueses, realçam nas suas
obras Os Lusíadas e Mensagem, respetivamente, a importância dos
Descobrimentos portugueses para Portugal e para o mundo, dando especial destaque para o dobrar do
Cabo das Tormentas, a partir daí conhecido como o Cabo da Boa Esperança, pelas perspetivas de novas
terras que a partir de então se poderiam conhecer.
A oposição da Natureza aos intentos dos Portugueses é metaforicamente representada tanto por Luís de
Camões, através do Adamastor, como por Fernando Pessoa, que recorre ao mostrengo para retratar esses
medos.
O Adamastor é um episódio de Os Lusíadas situado no Canto V, no momento em que Vasco da Gama
narra a sua viagem de Lisboa até ao Canal de Moçambique ao Rei de Melinde. "O Mostrengo" é um
poema que se situa na segunda parte de Mensagem, " Mar Português", momento em que Fernando
Pessoa retrata os Descobrimentos portugueses, realçando a ânsia pela conquista do desconhecido e o
esforço heroico da luta com o mar.