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Rosana Baeninger♣♣
Resumo
O trabalho busca atualizar as tendências da migração no Interior do Estado de São
Paulo, destacando modalidades de deslocamentos populacionais que redesenham os
espaços urbanos e rurais do interior, conformando novas territorialidades e
emprestando características distintas à regiões e pólos de São Paulo. As
transformações no espaço paulista, por sua vez, refletem mudanças maiores ocorridas
no sistema urbano brasileiro, com a desaceleração do crescimento das metrópoles
nacionais e a formação de novas aglomerações urbanas de caráter metropolitano e não-
metropolitano. O caso de São Paulo aponta para a necessidade de novas interpretações
teóricas, uma vez que as evidências empíricas suscitam abordagens que superem as
explicações ancoradas apenas em processos econômicos e, especialmente, no processo
de industrialização. Essas são algumas das preocupações que estão presentes no
trabalho, onde se procura, além de indicar tendências, indicar questões teóricas
relevantes.
∗
Trabalho apresentado no XIV Encontro Nacional de Estudos Populacionais, ABEP, realizado em Caxambú-
MG – Brasil, de 20-24 de Setembro de 2004. Este estudo constitui parte do Projeto “Crescimento das Cidades,
Regionalização e Reestruturação Urbana no Eixo da Hidrovia Tietê-Paraná”, com apoio financeiro do CNPq-
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, em desenvolvimento no NEPO/UNICAMP.
♣
Professora do Departamento de Sociologia, do IFCH – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas e
Pesquisadora do NEPO – Núcleo de Estudos da População, da UNICAMP – Universidade Estadual de
Campinas, Av. Albert Einstein, 1300, Cidade Universitária “Zeferino Vaz”, CEP 13.081-970 –
Campinas/SP/Brasil, http://www.unicamp.br/nepo
1
Interiorização da migração em São Paulo: novas
territorialidades e novos desafios teóricos ∗
Rosana Baeninger♣♣
Introdução
Este trabalho busca atualizar as tendências da migração no Interior do Estado de São
Paulo, destacando deslocamentos populacionais que vem redesenhando os espaços urbanos e
rurais do interior. O entendimento dos processos internos de redistribuição da população no
Estado de São Paulo passa necessariamente pelas tendências nacionais de redistribuição da
população e de migração, em especial pelo menor crescimento das regiões metropolitanas;
cujos reflexos, no caso da de São Paulo, são revelados pelas novas territorialidades no Interior
paulista.
Considerando, portanto, este panorama das migrações nacionais, das novas formas de
reorganização da população, dos espaços urbanos e da rede de cidades como pano-de-fundo
para a compreensão dos processos de desconcentração da população paulista, o trabalho
inicia-se apresentando o menor crescimento populacional das metrópoles nacionais, nos
últimos trinta anos, bem como aponta para a tendência de formação dos novos espaços
regionais, que se traduzem nas aglomerações urbanas de caráter metropolitano e não-
metropolitano. Na segunda parte do estudo, focaliza-se para o caso de São Paulo, destacando-
se as tendências recentes da migração e as novas territorialidades no interior paulista. Busca-
se também introduzir interpretações teóricas, vis -a-vis as evidencias empíricas, que possam
contribuir para o entendimento das transformações e da realidade social impostas na virada do
século XXI.
Parte I
∗
Trabalho apresentado no XIV Encontro Nacional de Estudos Populacionais, ABEP, realizado em Caxambú-
MG – Brasil, de 20-24 de Setembro de 2004. Este estudo constitui parte do Projeto “Crescimento das Cidades,
Regionalização e Reestruturação Urbana no Eixo da Hidrovia Tietê-Paraná”, com apoio financeiro do CNPq-
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, em desenvolvimento no NEPO/UNICAMP.
♣
Professora do Departamento de Sociologia, do IFCH – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas e
Pesquisadora do NEPO – Núcleo de Estudos da População, da UNICAMP – Universidade Estadual de
Campinas, Av. Albert Einstein, 1300, Cidade Universitária “Zeferino Vaz”, CEP 13.081-970 –
Campinas/SP/Brasil, http://www.unicamp.br/nepo
2
pessoas2 se destinaram às regiões metropolitanas no período 1970-1980, correspondendo a
22,5% da migração intermunicipal nacional.
Nos anos 80 e 90, no entanto, a taxa de crescimento da população metropolitana
nacional apresentou um decréscimo considerável, registrando 1,99% a.a., entre 1980-1991,
(contra 3,8% a.a. da década anterior) e mantendo-se nesse patamar (2,00% a.a.). entre 1991-
2000 (Tabela 1).
Para todas as regiões metropolitanas antigas as taxas de crescimento vêm registrando
ritmos decrescentes. Nos anos 70, apenas as regiões metropolitanas de Recife (2,7% a.a.) e
Rio de Janeiro (2,5% a.a.) registraram taxas de crescimento metropolitano inferior à média do
período (que foi de 3,8% a.a.), sendo elevadíssimas as taxas para a Região Metropolitana de
Curitiba (5,8% a.a.), Região Metropolitana de Belo Horizonte (4,7% a.a.), Região
Metropolitana de São Paulo (4,5% a.a.), Região Metropolitana de Salvador (4,4% a.a.),
Região Metropolitana de Belém (4,3% a.a.) e Região Metropolitana de Fortaleza (4,3% a.a.).
Tabela 1
População Total e Taxas de Crescimento
Regiões Metropolitanas - Brasil
1970-2000
Regiões Metropolitanas População Total Taxas de Crescimento
(antigas) (% a.a.)
1970 1980 1991 2000 1970- 1980- 1991-
1980 1991 2000
TOTAL 23.730.895 34.411.659 42.798.162 51.088.169 3,79 1,99 2,00
São Paulo 8.139.730 12.588.725 15.444.941 17.970.634 4,46 1,88 1,70
Rio de Janeiro 6.891.521 8.772.265 9.814.574 11.257.944 2,45 1,26 1,54
Recife 1.791.322 2.347.146 2.858.147 3.512.208 2,74 1,22 2,32
Belo Horizonte 1.658.482 2.609.583 3.436.060 4.277.157 4,70 2,42 2,46
Porto Alegre 1.574.239 2.285.140 3.038.792 3.544.789 3,84 2,16 1,73
Salvador 1.147.821 1.766.614 2.496.521 3.090.196 4,43 3,04 2,40
Fortaleza 1.036.779 1.580.074 2.307.017 2.923.417 4,29 2,67 2,67
Curitiba 821.233 1.440.626 2.000.805 2.716.288 5,80 3,03 3,46
Belém 669.768 1.021.486 1.401.305 1.795.536 4,30 3,43 3,37
2
Refere-se às pessoas que mudaram de município, pelo menos uma vez, na década; não inclui a migração
intrametropolitana.
3
Assim, no período de 1991-2000, as regiões metropolitanas com maiores taxas de
crescimento foram Curitiba (3,5% a.a.), Belém (3,4% a.a.), Fortaleza (2,6% a.a.), Belo
Horizonte (2,5 % a.a.), Recife (2,3% a.a.).
Quanto às metrópoles do Sudeste, a Região Metropolitana de São Paulo passou de
uma taxa de crescimento populacional de 4,5% a.a., no período 1970-1980, para 1,9% a.a.,
nos anos 80, e 1,7%, no período 1991-2000. A Região Metropolitana do Rio de Janeiro que
havia registrado taxa de 2,4% a.a., nos 70, baixou para 1,3% a.a., no período 1980-1991,
elevando-se ligeiramente para 1,5% a.a., no de 1991-2000. No caso do Estado de Minas
Gerais, sua área metropolitana registrou taxa de crescimento mais elevada (em torno de 2,4%
a.a.) que as demais metrópoles da Região Sudeste.
Ao lado desse intenso fenômeno da metropolização já vinha se delineando também um
marcante processo de periferização da população residentes nas metrópoles; a maioria das
regiões havia apresentado no período 1970-1980 taxas de crescimento mais elevadas em seus
municípios periféricos3. Nos anos 80, o processo de periferização intensificou-se, no qual as
periferias das áreas metropolitanas continuaram exibindo taxas elevadas e superiores às de seu
núcleo. Os anos 90 consolidaram esse processo, com os núcleos metropolitanos de Belém,
Recife, Belo Horizonte, São Paulo, Rio de Janeiro e Porto Alegre registrando taxas de
crescimento de suas populações inferiores a 1% a.a. e permanecendo a tendência de taxas
superiores nas periferias metropolitanas. Destacam-se os crescimentos elevados dos
municípios periféricos das regiões metropolitanas de Curitiba (5,0% a.a., entre 1991-2000),
Belo Horizonte (4,3% a.a.), Salvador, São Paulo e Belém (em torno de 3,0% a.a.),
demonstrando o vigor dos processos internos de redistribuição espacial das populações
metropolitanas, em especial os deslocamentos intrametropolitanos que partem dos núcleos
para as periferias das regiões metropolitanas.
Esses deslocamentos internos em nível metropolitano imprimem novas características
ao processo de redistribuição da população: consolidam-se espaços urbanos na periferia
nacional, antes incapazes de reter e atrair sua população. No entanto, as “especializações do
território” (Santos, 1994) traduzem-se em metrópoles diferenciadas e fragmentadas, cujo
processo de periferização é antes de tudo a expressão do empobrecimento da população4
Os resultados do Censo de 2000 sugerem a continuidade do processo de desaceleração
do ritmo de crescimento das antigas metrópoles brasileiras, especialmente a Região
Metropolitana de São Paulo (com uma taxa de 1,7% a.a), Rio de Janeiro (1,54% a.a.) e Porto
Alegre (1,7% a.a.); taxas menores que a verificada para o conjunto da população urbana do
país (2,44% a.a.) e para as áreas metropolitanas (2,00% a.a.).
O Brasil das nove regiões metropolitanas manteve nos anos 90 o mesmo ritmo de
crescimento dos anos 80, ritmo este inferior ao conjunto da população urbana do País. A
importância desse processo de desaceleração metropolitana é revelada pela expressiva perda
de participação relativa das populações dessas metropóles no total da população urbana do
País: em 1970, a população das nove regiões metropolitanas respondia por 45,56% da
população urbana brasileira, passando para 37,03%, em 2000.
Na verdade, o entendimento do atual processo de urbanização e desaceleração das
grandes concentrações metropolitanas está relacionado com a distribuição da população em
diferentes espacialidades do sistema urbano brasileiro. Ressalte-se, portanto, que
3
Considera-se como núcleo, a sede regional de determinada área metropolitana, e como periferia os demais
municípios que compõem tais áreas.
4
A pesquisa “Características e Tendências da Rede Urbana no Brasil” (NESUR-IE/UNCAMP/IPEA, 1998)
aponta menor renda para os chefes de domicílios nas áreas periféricas que nos núcleos metropolitanos.
4
característica marcante do processo de urbanização no Pais, na virada do século XX para o
XXI, tem sido o intenso processo de interiorização das aglomerações urbanas.
De fato, a contrapartida desse processo de menor crescimento da população
metropolitana refletiu-se no expressivo crescimento da população residente em cidades não-
metropolitanas em todas as regiões brasileiras, onde as cidades pequenas e de porte
intermediário, juntamente com as cidades médias, registraram crescimento significativo5,
especialmente quando se considera os aglomerados urbanos.
Essa “interiorização do crescimento” 6 deveu-se em grande medida aos efeitos da crise
econômica, a partir dos anos 80, sobretudo nas metrópoles mais industrializadas como São
Paulo. De acordo com Pacheco (1997:6) “o melhor desempenho da agricultura, dos grandes
complexos minerais ou de produtos como papel e celulose, estiveram por trás de uma
‘desmetropolização’ da economia nacional. Cresceram as áreas de fronteira, ainda que
incorporando menos terra que na década de 70; as regiões voltadas ao processamento de
recursos naturais para exportação; e aquelas, como o interior de São Paulo, que ampliaram
suas exportações de manufaturados. Olhado deste ângulo, o quadro regional do início da
década de 1990 mostra-se muito distinto daquele herdado dos anos setenta. Foram muitas as
cidades de pequeno ou médio porte que sobreviveram relativamente melhor neste período. O
crescimento da agroindústria, a urbanização na fronteira, a agricultura irrigada, os
empreendimentos voltados para a exploração de recursos naturais criaram alternativas novas,
frente à crise das metrópoles industrializadas (...) O próprio desempenho das atividades
agrícolas pode ter contribuído para uma retenção maior da população nas cidades pequenas.”
Essas tendências “reforçam o caráter relativamente desconcentrado do sis tema urbano
brasileiro” (Pacheco, 1997:39), bem como indicam outras áreas de recepção, absorção e
retenção populacional que passaram, a partir dos últimos vinte anos, a dividir com as antigas
regiões metropolitanas os destinos migratórios.
5
Veja-se Martine (1992) para uma análise da evolução das localidades urbanas no Brasil segundo Grandes
Regiões de 1940 a 1991.
6
O estudo “Características e Tendência da Rede Urbana Brasileira” – (NESUR – IE/IPEA, 1998) analisa os
impactos da economia no sistema urbano regional, onde se observa o crescimento de localidades fora das
grandes metrópoles.
7
As regiões metropolitans consideradas neste item são as adotadas pelo IBGE e as informações foram extraídas
do site do DATASUS.
5
as nove regiões antigas e as regiões metropolitanas de Vitória, Florianópolis, Entorno de
Brasília e Natal8. Desse modo, a maior parte dessas novas aglomerações urbanas, já
institucionalizadas como metrópoles, pode ser denominadas ‘aglomerados metropolitanos
recentes’ ( ao invés de novas regiões metropolitanas) para que se distingam dos espaços de
caráter eminentemente metropolitano. Essa distinção faz-se necessária, uma vez que a
definição sociológica de área metropolitana inclui, dentre outros elementos, a complexidade
da interação entre os espaços que compõem essa região, com intensa circulação de capital e
de população9; situação nem sempre presente nesses aglomerados.
As taxas de crescimento da população dos aglomerados metropolitanos, no entanto,
assemelham-se à dinâmica de crescimento das antigas metrópoles em décadas passadas. No
período 1980-1991 a taxa média de crescimento dos aglomerados metropolitanos recentes
chegou a 3,3% a.a. e, mesmo diminuindo esse ritmo na década seguinte, situou-se em 2,79%
a.a. Essas taxas ficaram bem acima da taxa média de crescimento nacional nas duas décadas,
bem como de crescimento urbano, indicando o impulso do processo de concentração de
população nessas localidades no período. De fato, esses aglormerados concentravam
9.141.654 habitantes, em 1980, passando para 16.759.231, em 2000. Esse acréscimo
populacional contribuiu para que aumentasse a participação relativa da população dessas áreas
no total da população urbana brasileira: de 11,4%, em 1980, para 12,1%, em 2000; no caso
das antigas regiões metropolitanas essa participação vêm decrescendo, como já apontado.
Nos anos 90, várias foram os aglomerados metropolitanos recentes que registraram
elevadas taxas de crescimento, dentre eles aqueles que são sediados por capitais estaduais –
Entorno de Brasília (3,5% a.a.), Goiânia (3,0% a.a.), Florianópolis (3,3% a.a.) e São Luis
(3,0% a.a.) – bem como outras no interior, tais como Foz do Rio Itajaí (4,1% a.a.), Maringá
(2,4% a.a.), Campinas (2,5% a.a.), Norte/Nordeste Catarinense (2,5% a.a.) e Região
Carbonífera (3,2% a.a.)
Considerando o total da população residindo em regiões metropolitanas e em
aglomerados metropolitanos chega-se a 67.847.400 brasileiros, ou seja, cerca de 49,2% da
população urbana do país. Assiste-se, desse modo, a intensificação do processo de
desconcentração polarizada da urbanização, cuja rede urbana vai se redefinindo a partir de
novos recortes espaciais regionais, ao mesmo tempo em que ocorre o espraiamento da
população dentre essas configurações urbanas.
De fato, ao se somar aos espaços metropolitanos (antigos e recentes) as populações das
novas configurações dos aglomerados urbanos não-metropolitanos totaliza-se 86.165.594
pessoas; correspondendo a 62% da população urbana nacional no ano 2000.
8
Outras áreas metropolitanas foram incluídas em categorias como metrópoles regionais, como é o caso de
Campinas. Veja-se IPEA/NESUR-IE-UNICAMP/IBGE (2000).
9
Veja-se, dentre outros, Villaça (2001).
6
Tabela 2
População Total, Taxas de Crescimento e Incremento Absoluto –Regiões Metropolitanas Antigas e Aglomerados
Metropolitanos Recentes. 1980, 1991 e 2000
População Total Taxas de Incremento Absoluto
Crescimento
7
Tabela 3
População Total , Taxas de Crescimento e Incremento Absoluto, Aglomerados Urbanos Não-Metropolitanos
1980, 1991 e 2000
8
aglomerados do interior, os quais quase que mantiveram a mesma taxa de crescimento nos
últimos vinte anos. Essas tendências indicam o fortalecimento dessas espacialidades no
interior, passando de uma população de 7,5 milhões, em 1980, para 11,9 milhões, em 2000.
O sistema urbano brasileiro tende, portanto, a se redesenhar em configurações
metropolitanas e aglomerados urbanos. Essas espacialidades, por sua vez, ao mesmo tempo
que concentra a população no conjunto da urbanização, apresenta especificidades
intrametropolitanas e intra-aglomerações sobretudo no que se refere ao processo de
redistribuição interna de suas populações, gerando espaços formados por sedes e entornos
regionais, centros e periferias. São nessas novas configurações urbanas, portanto, que as
populações se movimentam, se deslocam e circulam diariamente, trazendo novas demandas às
políticas sociais, quer seja em termos de transporte e moradia, como de saúde e educação.
Parte II
10
Diferença entre os volume dos fluxos de sentidos contrários estabelecidos entre duas regiões específicas.
9
de sua fronteira metropolitana 11, principalmente para Campinas, Santos, Sorocaba e São José
dos Campos que canalizaram quase a metade desses emigrantes metropolitanos; destaca-se
que, já nesse período, esse processo de desconcentração populacional dava indícios de
alcançar regiões mais longínquas à Região Metropolitana de São Paulo, com a Região de
Governo de Ribeirão Preto manifestando ganhos populacionais metropolitanos.
Essa tendência do fluxo metrópole-interior foi consolidada na década de 80 e de 90
com a Região Metropolitana de São Paulo perdendo população para todas as regiões do
Estado. Os anos 80 e 90 presenciaram, assim, a expansão regional fora das fronteiras
metropolitanas ou de seu “campo aglomerativo”12, emprestando o conceito de Azzoni (1986)
usado para espacializar a desconcentração industrial. Assim, a expansão dos espaços da
migração não traduz uma versão mais ampla da Região Metropolitana de São Paulo; os
longínquos destinos migratórios revelam novos padrões socioespaciais que se refletem no
processo de redistribuição da população.
Desse modo, os anos 80 e 90 assistiram a intensificação e consolidação das tendências
observadas nos anos 70, porém contextualizadas em tempos, momentos e espaços inseridos
em uma outra sociedade: a sociedade de risco (Giddens, 1991; Beck, 1992 ); a compreensão
dos fenômenos urbanos, em especial as novas formas de mobilidade espacial da população,
passam por dimensões que, mesmo como reflexos de reestruturações na econômica, compõem
um novo mosaico das interações sociais.
Pode-se dizer que processo de desconcentração populacional da área metropolitana de
São Paulo está, em parte, associado à crise econômica dos anos 80 e à recessão econômica
dos anos 90. Até os anos 80, o processo de desconcentração da indústria de São Paulo em
direção a outros estados e para o interior 13 foi acompanhado, embora com defasagem
temporal pois a desconcentração econômica foi mais contundente nos anos 70, de importantes
fluxos migratórios na mesma direção. A partir dos anos 90, o processo de reestruturação
produtiva tem mudado o perfil da indústria brasileira, com a retomada do maior peso relativo
do Estado de São Paulo na distribuição da indústria de transformação nacional. Assim, em
que pese a enorme alteração na "dimensão espacial do desenvolvimento brasileiro", o Estado
de São Paulo diversificou e modernizou sua indústria de transformação, permanecendo na
posição de centro dinâmico do País.14. Nessa etapa econômica, entretanto, os fluxos
migratórios para o Estado têm se reduzido, tornando cada vez mais complexa a relação entre
áreas dinâmicas economicamente e capacidade de absorção de contingentes migrantes.
Na verdade, a “condição pós-moderna” (Harvey, 1992) que busca a metrópole paulista
tenderá a gerar, cada vez mais, um enorme excedente populacional sem que ocorra uma perda
de dinamismo econômico da região; a redefinição de seu papel no cenário nacional e a
competitividade entre metrópoles do mundo globalizado fará com que esta área reafirme seu
caráter de centro decisório do País, especialmente em termos financeiros15, tornando-se apenas
área de circulação para a população migrante.
11
São dessa década as discussões a respeito da formação da “Macrometrópole Paulista” ancorada no argumento
do transbordamento da população e de atividades econômicas para essa franja metropolitana que compreendia as
regiões de São José dos Campos, Sorocaba, Campinas e Santos (CAR/SEPLAN, 1984).
12
O conceito de “campo aglomerativo” do autor inclui as cidades num raio, a partir da Região Metropolitana de
São Paulo, de aproximadamente 150 quilômetros, constituindo um espaço mais abrangente da Região
Metropolitana de São Paulo. Para uma crítica desse conceito, veja-se Negri (1996).
13
Ver a respeito Cano (1991), Pacheco (1992), Diniz (1991), Negri e Pacheco (1993).
14
Veja-se Os relatórios do Projeto: Desenvolvimento Tecnológico e Competitividade da Indústria Brasileira.
SCTDE/FECAMP/IE-UNICAMP, Campinas, 1993.
15
A bibliografia recente sobre o processo de reestruturação econômica ressalta a importância de algumas
localidades (as cidades globais) no cenário financeiro internacional. Veja-se, Sassen (1998), Harvey
10
As mudanças no paradigma da indústria16, que se manifestam na crescente diminuição
da absorção de mão-de-obra, já revelam o deslocamento do eixo explicativo da migração via
industrialização. Nos anos 70, particularmente, os destinos migratórios apresentavam estreita
relação com o dinamismo industrial (incluindo-se o agroindustrial) das regiões do Interior 17;
as evidências empíricas apontam, agora, a necessidade de mudanças nas abordagens sobre as
migrações, em particular no caso paulista.
Essa reestruturação produtiva implica também na competitividade entre os espaços
urbanos para sua inserção nessa dinâmica global; nesse esforço, Harvey (1992:267) enfatiza
que “a produção ativa de lugares dotados de qualidades especiais se torna um trunfo na
competição espacial entre as localidades, cidades, regiões e nações (...) criando uma atmosfera
de lugar e tradição que aja como atrativo para o capital e para pessoas ‘do tipo certo’ (isto é
abastadas e influentes)”.
Nessa nova etapa de desenvolvimento econômico, as regiões mais dinâmicas estão
“abertas” e absorvem os migrantes qualificados; que é minoria. As variadas e distintas
modalidades de movimentos migratórios, envolvendo principalmente áreas urbanas, rompem
com o paradigma explicativo da emigração como um dos efeitos sociais negativos resultantes
do menor crescimento econômico e, sobretudo, da ausência de atividades industriais fortes.
Na relação migração/dinâmica econômica, as cidades mais prósperas (em termos de inserção
no mercado regional, nacional e internacional) tendem a registrar os maiores volumes de
emigrantes, tanto na Região Metropolitana de São Paulo quanto no Interior do Estado. Assim,
os fatores de expulsão, para os migrantes de baixa renda, estariam nas áreas mais dinâmicas e
os de atração nas de menor dinamismo. Essa interpretação só faz sentido, contudo,
considerando a dimensão espacial como elemento constitutivo do próprio processo
migratório; as migrações intrametropolitanas, intra-regionais e da metrópole para o Interior
exemplificam essa formulação.
Entre 1991-2000, o saldo migratório permaneceu negativo para a cidade de São Paulo:
457 mil pessoas. Nesse sentido, a Região Metropolitana de São Paulo, e particularmente a
cidade de São Paulo, reforçando uma tendência incipiente anterior de "perda" de população,
teria se transformado agora em área de circulação para parcela significativa da população
migrante. O Interior de São Paulo reforçou nos anos 90 seu potencial de absorção migratória,
e muito provavelmente de atração dessa população oriunda da metrópole paulista, passando
de um saldo migratório positivo de 850 mil pessoas, nos anos 80, para 1,1 milhão nos 90
(Baeninger, 2002).
A intensificação do processo de urbanização no Estado de São Paulo, nos últimos
trinta anos, e a interiorização do desenvolvimento industrial propiciaram um novo desenho
regional ao Interior paulista, com a constituição de pólos regionais e áreas metropolitanas
emergentes18. Esse cenário consolidou e fortaleceu regiões cujas trajetórias históricas, ligadas
particularmente à cultura cafeeira, alavancaram o processo de urbanização trazendo à essas
áreas, no decorrer de um século, contornos urbanos distintos. Nesse contexto, os fenômenos
(1992),Castells (1999), dentre outros. Na bibliografia nacional destaca-se Santos (1996); Ianni (1999).Souza
(1999), dentre outros.
16
Veja-se, por exemplo, Benko e Lipietz (1994).
17
Alguns estudos, analisando principalmente a desconcentração industrial para o Interior, afirmaram se tratar do
primeiro caso de reversão da polarização no Brasil (Redwood III, 1984), processo que também embute a relação
migração/industrialização.
18
Veja-se Cano, W. (1988). A Interiorizaçào da Indústria no Estado de São Paulo, 1920-1980. Coleção
Economia Paulista, Fundação SEADE; Patarra, N. L. e Baeninger, R. (1989). Movimentos Migratórios: novas
características, novas indagaçòes. III Encontro da ANPUR, Águas de São Pedro; IPEA/NESUR/IBGE (2000)
Características e Tendências da Rede Urbana Brasileira, Campinas-IE/UNICAMP.
11
demográficos em curso, principalmente a dinâmica migratória, adquirem maior relevância,
sobretudo quando se consideram as migrações, a mobilidade intrametropolitana e intra-
regional.
Como analisado em estudo anterior (Baeninger, 2002), se por um lado, assistiu-se à
expansão dos espaços da migração em São Paulo, principalmente considerando regiões como
Marília, Assis, Jaú, Araçatuba, dentre outras, por outro lado, houve a redefinição de algumas
áreas, que se destacaram por perda populacional em décadas anteriores, como Bauru (com
saldos migratórios negativos no entorno), Presidente Prudente – áreas anteriormente
mencionadas como pólos regionais.
A consolidação dos espaços da migração ocorreu nas regiões metropolitanas o Interior
e Litoral: Campinas e Santos. Na região de São José do Rio Preto, a expansão dos espaços da
migração traduziu-se na reversão do saldo negativo do entorno de negativo para posittvo, de
uma para outra década. Os anos 90 parecem indicar, portanto, uma diversidade de situações
em termos de absorção migratória no Estado de São Paulo, inclusive com alguns retrocessos
de tendências passadas.
12
Referências Bibliográficas
BAENINGER, R. Expansão, Redefinição ou Consolidação dos Espaços da Migração em São Paulo? Análises a
partir dos primeiros resultados do Censo 2000. Anais do XIII Encontro Nacional de Estudos Populacionais –
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BENKO, G. Economia, Espaço e Globalização: na aurora do século XXI. Editora Hucitec, São Paulo, 1996.
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1980). São Paulo: Fundação SEADE, v.1. a v. 3 (Coleção Economia Paulista).
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