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MEMÓRIA E HISTÓRIA ORAL: NOMEAÇÃO DE BAIRROS EM NATIVIDADE/RJ

LEONARDO DE SOUZA MEDEIROS

UNIVERSIDADE ESTADUAL DO NORTE FLUMINENSE


DARCY RIBEIRO - UENF
CAMPOS DOS GOYTACAZES – RJ
2012
MEMÓRIA E HISTÓRIA ORAL: NOMEAÇÃO DE BAIRROS EM NATIVIDADE/RJ

LEONARDO DE SOUZA MEDEIROS

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-


Graduação em Cognição e Linguagem do Centro
de Ciências do Homem, da Universidade
Estadual do Norte Fluminense, como parte das
exigências para a obtenção do título de Mestre
em Cognição e Linguagem.

Orientador: Professor Doutor Sérgio Arruda


de Moura

CAMPOS DOS GOYTACAZES


2012
MEMÓRIA E HISTÓRIA ORAL: NOMEAÇÃO DE BAIRROS EM NATIVIDADE/RJ

LEONARDO DE SOUZA MEDEIROS

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-


Graduação em Cognição e Linguagem do Centro
de Ciências do Homem, da Universidade Estadual
do Norte Fluminense, como parte das exigências
para a obtenção do título de Mestre em Cognição
e Linguagem.

Aprovada em ________ de ______________ de 2012.

Comissão examinadora:

_______________________________________________________
Eliana Crispim França Luquetti (Doutora, Linguística) – UENF
(Coorientadora)

_______________________________________________________
Leandro Garcia Pinho (Doutor, Ciência da Religião) – UENF

_______________________________________________________
Sílvia Lúcia dos Santos Barreto (Doutora, Comunicação) – IFF/Campos

_______________________________________________________
Sérgio Arruda de Moura (Doutor, Literatura Comparada) – UENF
(Orientador)
AGRADECIMENTOS

Ao meu Deus, que nunca me abandona, nem nos momentos mais difíceis e sempre
coloca as pessoas certas no meu caminho.
Aos meus pais, Cida e Zezé, meus maiores motivadores. Apoio constante, confiança e
amor incondicional! Ao meu irmão querido, Guilherme que sempre confia tanto em mim,
e a todos os meus familiares pelo tamanho reconhecimento da minha formação.
Ao meu orientador, Dr. Sérgio Arruda de Moura, por ter acreditado no meu potencial,
me escolhido, e, sobretudo, por ter me ensinado muitos valores.
A minha querida amiga e irmã, coorientadora Drª. Eliana Crispim França Luquetti, por
ter me acolhido, me encorajado, me apoiado, e principalmente por ter me apontado o
caminho certo para o sucesso. Não existem palavras suficientes que descrevam minha
profunda admiração! Só posso agradecer e pedir a Deus que sempre abençoe sua vida.
Aos membros da banca, que em sua maioria participaram de outros processos de
avaliação desse trabalho e aceitaram mais uma vez nosso convite, e que sempre
contribuíram com suas sábias sugestões.
Aos muitos amigos que fiz nessa árdua jornada: Maria das Graças (Dadai) - amiga
inseparável e constante. Muito obrigado pelo carinho e força de sempre! Hugo Coelho –
obrigado pelas brilhantes ideias e risadas; Joyce, Monique, Giselda, Karina, Karine e
Rachel – nunca conheci pessoas tão maravilhosas e carinhosas! Guardarei para
sempre em meu coração. Obrigado pela companhia em todos os momentos! Quero
estar com vocês em suas respectivas jornadas no mestrado.
Muitos contribuíram na construção dessa pesquisa, e por isso não poderia deixar de
agradecer a Jaqueline Pontes por dedicar seu precioso tempo na leitura e correção do
texto. Muito obrigado Jack! Conte sempre comigo!
A outros amigos, também, que direta ou indiretamente contribuíram apoiando meus
estudos e entendendo minha ausência em muitos momentos. Muito obrigado!
Acho que jamais poderia contemplar nesses agradecimentos todas as pessoas que
estiveram comigo nessa caminhada, mas que de alguma forma manifestaram seu apoio
torcendo por mim. Muito obrigado também!
Aos professores do Programa em Cognição e Linguagem, pela disponibilidade de
partilhar seus conhecimentos. As meninas da secretaria do programa, Silvana e Ana
Paula pela paciência de explicar e resolver nossas questões.
Aos meus grandes amigos do Ministério 3.16 – pessoas que fazem parte da minha vida
agora! Atuam em outra área, mas sei que me amam incondicionalmente. Muitos dos
meus sonhos eu realizo com vocês!
A todos que não tive como mencionar os nomes aqui, mas que se alegram comigo por
mais esta conquista. Muito obrigado mesmo!

Deus nos abençoe hoje e sempre!


“Posso todas as coisas naquele que me fortalece”.
Filipenses 4:13
RESUMO

Esta dissertação é resultado de uma pesquisa que se voltou para o estudo da História
Oral, enquanto uma metodologia investigativa que representa uma contribuição
imensurável no resgate da herança cultural de uma localidade. O que podemos verificar
em Natividade/RJ, a fim de desvelarmos a memória na questão da nomeação dos
bairros foi que o ato legal, mesmo sendo pertinente à autoridade legítima, não foi
suficiente para conseguir arrancar da população o caráter permanente que assume esta
memória específica. Essa questão é tão nítida que, na cidade estudada, boa parte da
população desconhece o nome oficial dos bairros. O resgate da memória consiste
numa tentativa de reconstrução do passado ou ressarcimento de uma perda, e a
oralidade é a forma privilegiada de transmissão de saberes, principal daqueles
vinculados às tradições, ao tentarmos entender a manutenção dos nomes tradicionais
dos bairros de Natividade, como uma forma velada de resistência. A cultura oral nesse
sentido esteve fortemente em evidência nos saberes populares dos seus habitantes.

Palavras-chave: Narrativa; Memória; Discurso; Natividade.


ABSTRACT

This dissertation is the result of a search that turned to the study of Oral History as a
research methodology that represents an immeasurable contribution in the rescue of
cultural heritage of a locality. What we can verify in Natividade / RJ, in order to find the
memory on the issue of the neighborhoods nomination was that the legal act, even
though pertinent to the legitimate authority, was not enough to take out of the population
the permanent character that affects this particular memory. This issue is so clear that in
the city studied part of the population does not know the official name of the
neighborhoods. The rescue of memory is an attempt of rebuilding the past or
compensating of a loss and the orality is a transmission of knowledge privileged way,
mainly for those who are linked to traditions, when trying to understand the maintenance
of the traditional names of the neighborhoods of Natividade, as a veiled way of
resistance. Oral culture in this sense was strongly in evidence in the inhabitants’ popular
knowledge.

Keywords: Narrative; Memory; Discourse; Natividade.


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ................................................................................................................. 8
PROBLEMA ..................................................................................................................... 9
HIPÓTESES ..................................................................................................................... 9
JUSTIFICATIVA ............................................................................................................. 10
OBJETIVOS ................................................................................................................... 12
METODOLOGIA............................................................................................................. 12
1 HISTÓRIA ORAL E MEMÓRIA ................................................................................... 14
1.1 História e memória ................................................................................................ 14
1.2 O caráter científico da memória e suas contribuições para a história oral ............ 17
2 ALGUNS PRESSUPOSTOS TEÓRICOS DA ANÁLISE DO DISCURSO ................... 23
2.1 Teoria da análise do discurso ............................................................................... 23
2.2 A questão da narrativa. ......................................................................................... 31
2.3 A estrutura narrativa do discurso e a questão ideológica no contexto de
Natividade ................................................................................................................... 32
2.4 Um olhar sobre os discursos popular e oficial em Natividade............................... 37
3 ANÁLISE DA AMOSTRA: EXPERIÊNCIAS QUE REVELAM ..................................... 47
3.1 Análises das narrativas dos natividadenses. ........................................................ 49
CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................... 56
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................... 58
APÊNDICES................................................................................................................... 61
ANEXOS ........................................................................................................................ 77
8

INTRODUÇÃO

Desde a Antiguidade, homens e mulheres contam histórias que presenciaram e


recontam outras histórias que ouviram. Até o advento da escrita, a oralidade foi o meio
prático de transmissão das tradições culturais. Mesmo séculos depois, realçamos o
poder que ainda tem a cultura oral quando o assunto é a memória histórica constituída.
O testemunho oral não pode se submeter ao crivo da veracidade, uma vez que sua
transmissibilidade não se faz por critério outro senão o da seleção da memória,
diferentemente do registro escrito.
A história oral contribui para a construção da identidade cultural das localidades
de um modo geral, como também enfatiza sua importância na cientificidade histórica.
Para evidenciarmos ainda mais essa profunda relação que a oralidade tem com
a memória, partiremos de um estudo de caso na cidade de Natividade, no interior do
Rio de Janeiro, na qual se observa nitidamente uma situação que a tradição oral
sobrepôs a oficialidade de um documento legislativo.
O que podemos verificar em Natividade, a fim de identificarmos a memória na
questão da nomeação dos bairros foi que o ato legal, mesmo sendo pertinente à
autoridade legítima, não foi suficiente para conseguir arrancar da população o caráter
permanente que assume esta memória específica. Essa questão é tão nítida que em
Natividade boa parte da população desconhece o nome oficial dos bairros
mencionados. A cada nova geração ratifica-se o nome popular, gravado na memória
dos natividadenses.
Esse ato legal é pertinente a Prefeitura Municipal de Natividade, que no ano de
1982 estabelece que os bairros existentes no município, bem como os que surgissem
com o passar dos anos receberiam seus nomes em homenagens a figuras religiosas
católicas.
Esta dissertação tem por objetivo analisar como a História Oral pode reestruturar
a formação ideológica das cidades, a partir de seus discursos, alterando a cena urbana.
Também se busca investigar se a História Oral se sobrepõe, em alguns casos, à
estrutura institucionalizada, resgatando a identidade social. Desse modo, busca-se
9

verificar especificamente de que maneira se perpetua o processo de nomeação das


ruas e bairros da cidade de Natividade, município do Rio de Janeiro.

PROBLEMA

Diante das prerrogativas levantadas, surge o interesse em pesquisar: De que


forma a História Oral pode recuperar a memória de uma cidade, de um bairro e com
que frequência nega-se o dado institucionalizado ou meramente factual e documental?

HIPÓTESES

 Há algum valor emocional e/ou cultural nos nomes atualmente extraoficiais dos
bairros que impossibilitaram a população da época aceitar a mudança;
 A mudança dos nomes não se deu através de proposta da massa populacional,
por isso não obtendo aceitação;
 A questão religiosa no contexto de Natividade influencia o processo de
renomeação dos bairros por parte do legislativo em vigência; e
 A população atual vê o ato institucional como uma forma de não valorização da
cultura local.
10

JUSTIFICATIVA

Este estudo se justifica por uma série de questões que constitui o objeto de
estudo desta pesquisa. Ele se propõe a caracterizar a discursividade presente nos
nomes dos bairros – bem como o processo legal de sua nomeação pelo poder público,
portanto, político, por meio de leis e portarias – a partir de estudo de caso na cidade de
Natividade, localizada no interior do Estado do Rio de Janeiro, com o objetivo de
analisarmos as formas pelas quais linguagem, discurso e memória se relacionam.
Com Charaudeau (2006, p.40), sabemos que “não é o discurso que é político,
mas a situação de comunicação que assim o torna”, e que todo ato de linguagem
emana de um sujeito que apenas pode definir-se em relação ao outro segundo os
princípios de alteridade, influência e regulação, que serão discutidos aqui. Com respeito
à memória, tentaremos conciliar a justificativa do princípio do imaginário da tradição,
segundo o qual, às vezes, a história de uma comunidade é inventada, mas necessária
para estabelecer uma filiação com os ancestrais, com um território, ou com uma língua
(CHARAUDEAU, op. cit, p.211). Nesse caso, a memória é que estabeleceu o vínculo
com o presente, porque manteve a tradição valorizada positivamente.
Entendemos que o poder de legislar em Natividade recaiu sobre um obstáculo,
que caracterizamos como a própria situação de comunicação para a nossa análise: a
não concomitância entre o que se disse (legislou-se) e o que se entendeu (resposta
como ação resultante). Ou seja, a inadequação de um ato legal (lei) que não resultou
no seu cumprimento. Esta situação nos lembra Rousseau (2004), quando este
percebeu o que havia de contraditório na relação do homem (natureza) com o conjunto
das convenções (sociedade). O filósofo concorda apenas em parte com o que o Emílio
afirma ter aprendido acerca das leis afirmando:

Leis! Onde elas existem e onde são respeitadas? Em toda parte só viste
reinar sob esse nome o interesse particular e as paixões dos homens.
Mas as leis eternas da natureza e da ordem existem. Para o sábio, são
como uma lei positiva; são escritas no fundo do seu coração pela
consciência e pela razão (ROUSSEAU, 2004, p.700).
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A lei escrita no fundo do coração dos homens, para usar a expressão de


Rousseau, está em contradição com a lei que se impõe “pelo interesse particular e as
paixões dos homens”.
Em Natividade, um paradoxo se instala nesses exatos termos. Depois de
sancionadas duas leis em 1982, pelo então prefeito Dermeval Lannes Vieira, os bairros
então loteamentos Morada do Engenho e Cachoeira Alegre, passaram a se chamar
bairro Santa Terezinha e bairro Nossa Senhora de Lourdes. Hoje, passados vinte e oito
anos, continuam conhecidos pelos nomes anteriores. Tentaremos entender o fato,
amplamente observado por todos os habitantes, de essas e outras localidades serem
conhecidas pelos antigos nomes, alheios aos efetivamente impostos por força de lei.
Ou seja, a pergunta é clara: o que ocorre ou ocorreu para que uma lei se preservasse e
ou inócua?
Portanto, a relevância desta pesquisa é resgatar a história da memória que
muitas das vezes se encontra em segundo plano pela subjetividade que a caracteriza,
mas é de extrema importância para o legado cultural das regiões e consequentemente
de seu povo.
Acreditamos que a História Oral é uma metodologia científica que visa defender
a história popular. Além disso, através de relatos orais, podemos resgatar a memória de
um povo, de um legado cultural de uma época, valendo-se da perspectiva da linguística
cognitiva, à luz de Marcushi (1999) que associa cognição e cultura.
Dessa forma, o presente estudo se concretiza pela possibilidade de se verificar a
História Oral intervindo na estrutura ideológica, sob o mesmo ponto em toda uma
cidade, no caso da cidade de Natividade, e não em pontos diferentes em grupos e/ou
indivíduos isolados. Ressaltamos, ainda, que esta pesquisa servirá de fonte de
enriquecimento para todos que desejam desvelar a transmissibilidade da memória.
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OBJETIVOS

 Analisar como a História Oral pode reestruturar a formação ideológica das


cidades e seu discurso alterando a cena urbana, sobrepondo em alguns casos à
estrutura institucionalizada resgatando a identidade social;
 Identificar a influência da oralidade na rejeição dos nomes oficiais dos bairros do
município de Natividade e as forças que corroboraram na rejeição desses
nomes;
 Revelar se a rejeição está relacionada à população da época e à forma como ela
foi conduzida por parte dos munícipes;
 Com base nos relatos coletados, concluir se o caráter religioso foi fundamental
enquanto influência na proposta inicial de renomeação dos bairros de Natividade.

METODOLOGIA

Como metodologia de trabalho, realizou-se inicialmente um levantamento


bibliográfico de teóricos e estudiosos que já se debruçaram sobre a temática em
relação à memória vinculada à História Oral, bem como seu uso como fonte de análise
em pesquisas. Fez-se também uma pesquisa de campo a fim de construir uma amostra
para a nossa análise, seguindo os seguintes critérios:
 Selecionar apenas os moradores mais antigos dos bairros pesquisados que
sofreram com as mudanças promovidas pelo processo de renomeação;
 Todos os moradores também foram escolhidos valendo-se dos critérios como:
idade; tempo de moradia na cidade e no bairro, bem como o caráter da
natalidade; e
 Coletar falas de informantes com o perfil idoso em sua maioria e que de alguma
forma estivessem relacionados com o processo de renomeação, seja como
cidadão natividadense que viu tudo acontecer e não comentou nada no período,
ou que tenha presenciado o fato, ou até mesmo que participado ativamente do
processo.
13

Há onze bairros em Natividade, mas nossa pesquisa deteve-se apenas em sete,


os quais são considerados os mais antigos da referida cidade, a saber: Bairro Morro do
Areião, Bairro da Liberdade, Bairro Popular Nova, Bairro Popular Velha, Bairro do
Balneário, Bairro do Pito e Bairro da Bagaceira.
Depois de coletadas as entrevistas, realizou-se uma análise dos relatos,
evidenciando as marcas discursivas que caracterizaram esse gênero, aonde os
princípios de alteridade, influência e regulação presentes nos domínios do discurso e
são essenciais para a compreensão da linguagem e ação são componentes de suma
importância nas trocas sociais. Além disso, utilizamos o estudo de caso como
ferramenta para estabelecer uma comparação entre os relatos coletados a fim de
identificar marcas que caracterizaram esse tipo de discurso, que é o de moradores
antigos dos bairros, pessoas que presenciaram diretamente ou não este processo de
renomeação; mas que nos dias atuais são de alguma maneira movidas por um
sentimento de valorização e resgate da cultura e memória dos bairros, com o objetivo
implícito de tornar memorável o nome antigo dos bairros em Natividade.
14

1 HISTÓRIA ORAL E MEMÓRIA

Neste capítulo, discutiremos a relação controversa entre memória e história, que


ora dependem entre si, ora se distanciam, ou até mesmo ficam incomunicáveis.
Também veremos como se constituíram estas relações, ou por que existe esta disputa
entre história e memória. Esse é um longo processo histórico que vem desde o início da
modernidade capitalista, quando, então, a História passou a ser considerada uma
ciência objetiva e expulsou de seu interior a possibilidade do uso de valores,
experiências, sentimentos, enfim tudo que o não fosse racional, sem posicionamentos,
sem cientificidade. Decorre daí de a memória ser pautada nas subjetividades, e por isso
ter sido afastada da construção dos conhecimentos históricos.

1.1 História e memória

Para Queiroz (2009), a História Oral seria um termo amplo, que recobre tipos
variados de relatos obtidos através de fontes orais, a respeito de fatos não registrados
por outro tipo de documentos, de fatos cuja documentação se quer completar, ou que
se quer abordar por ângulo diverso. A História Oral registra a experiência vivida ou o
depoimento de um indivíduo ou de vários indivíduos de uma mesma coletividade.
Ainda afirma que as fontes orais podem assumir a forma de histórias orais de
vida, os relatos orais de vida ou depoimentos orais, tendo, as duas primeiras, sua
referência na própria vida e na experiência do narrador e, a última, em fatos que
presenciou ou sobre ao quais detém informação. Cabe tornar claras as diferenças entre
estas formas.
O autor também explica que a história oral de vida é o relato de um narrador
sobre sua existência através do tempo. Os acontecimentos vivenciados são relatos,
experiências e valores transmitidos, a par dos fatos da vida pessoal. Através da
narrativa de uma história de vida, se delineiam as relações com os membros de seu
grupo, de sua profissão, de sua camada social, da sociedade global, que cabe ao
pesquisador desvendar. Há histórias de vidas mais ou menos ricas, mais completas ou
fragmentadas. Não acreditamos que seja efetivamente possível a obtenção de uma
15

história de vida completa, tantas são as facetas e os fatos que envolvem uma vida. É
evidente que uma vida não poderia ser totalmente revisitada, e um processo seletivo se
impõe envolvendo o próprio rememorar, em geral determinado pelo próprio narrador.
A proposta de estudos, através da História Oral, é o resgate da memória numa
tentativa de reconstruir um passado ou ressarcir uma perda. Várias disciplinas, como a
Etnologia, a História, a Psiquiatria e a Pedagogia emergem de uma dívida com os
desclassificados, com o passado, com os loucos e com os iletrados. Na dinâmica que
propiciou o alicerce às disciplinas supracitadas, por um longo período, utilizou-se de um
discurso que necessitava de elaborar antagonismos entre o passado e o presente
promissor, entre a nódoa marginal, patológica e a inteligência classificada coerente e
culta. No entanto, a oralidade não foi abandonada como forma de transmissão de
saberes, principalmente daqueles vinculados às tradições populares.
Muitos outros trabalhos se debruçam sobre a questão na tentativa de tentar
resgatar a história da memória que muitas das vezes se encontra em segundo plano,
pela subjetividade que a caracteriza. Contudo, esta é de extrema importância para o
legado cultural das regiões e consequentemente do seu povo, daí esta dissertação se
propor a abordar discurso, poder e memória, dando ênfase à História Oral na sua
função de reestruturar a formação ideológica das cidades. Sabemos da importância das
bibliotecas, como já afirmamos, mas pretendemos ponderar o uso da História Oral na
produção do conhecimento histórico e sua articulação com a memória.

Desde seu aparecimento, a função da História esteve em fornecer à


sociedade uma explicação de suas origens. Do grego, historie, significa
procurar, investigar. Nessa busca, a essência da História como
transformação (e seu processo formativo), bem como sua dimensão de
análise, como o tempo e o espaço, integraram a palavra História em sua
polissemia. Nesta polissemia, a história é uma série de acontecimentos,
e a narração desta série de acontecimentos (VEYNE, 1998, p.285).

A ampliação do conceito de fontes nos estudos históricos passou a enfatizar e a


utilizar em larga escala as representações na construção do conhecimento. Uma vez
que a forma como o indivíduo vê a si mesmo e o mundo em que está inserido se
distancia cada vez mais da antiga busca por uma realidade histórica independente do
sujeito, a verdade ou o real nada mais é do que uma construção cultural. Logo, numa
16

visão qualitativa atual, o papel do historiador não tem sido contar a verdade sobre um
fato, mas conhecer diferentes verdades e entender como estas foram construídas pelo
sujeito histórico. Todas as conclusões passam a ser provisórias. O imaginário (conjunto
de representações; coletivo) formula o real e pelo real é trabalhado, num constante
movimento de circularidade (SWAIN, 1994, p.52).
Analisando a memória articulada à história oral, a partir de Ricouer (2008),
quando este vê a memória como arte, denominando-a como escrita interior, pois os que
apreendem essa arte podem dispor daquilo que viveram, ouviram ou sentiram,
inferimos que, dessa forma, a História Oral vem intervindo sim na estrutura ideológica,
em toda uma cidade, por exemplo, como especificamente no caso de Natividade – RJ,
a partir do papel que exerce a memória na manutenção do costume, da tradição, bem
como o papel que exerce a oralidade. O autor defende ainda que as narrativas sejam
partes constitutivas do conhecimento histórico e se diferenciam por sua pretensão de
garantias de verdade, sendo constituídas a partir de uma dimensão de causalidade e de
perspectivas explicativas, num projeto hermenêutico e reflexivo.
De acordo com Peter Burke (2000), a visão tradicional das relações entre a
história e a memória se apresentava sob uma forma relativamente simples: a função do
historiador era ser o guardião da memória dos acontecimentos públicos, quando
escritos para proveitos dos autores, para lhes proporcionar fama, e também em proveito
da posteridade, para aprender com o exemplo deles.
Entretanto a explicação tradicional de que a história espelha a memória tornou-
se muito simplista na atualidade, pois percebemos que se tornaram cada vez mais
complexas. Lembrar o passado e escrever sobre ele não se apresentam como as
atividades inocentes como julgávamos até bem pouco tempo atrás. Tanto as histórias
quanto as memórias não mais parecem ser objetivas. Num caso como no outro, os
historiadores aprenderam a considerar fenômenos com a seleção consciente ou
inconsciente, a interpretação e a distorção. Nos dois casos, passam a ver o processo
de seleção, interpretação e distorção como condicionado, ou pelo menos influenciado,
por grupos sociais. Não é obra de indivíduos isolados (BURKE, 2000).
Em sua narração a história tem por desígnio a possibilidade de nos levar a
pensar sobre o passado de outros, de nós mesmos, de nossas vidas, de nosso
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cotidiano e da realidade que cerca todos aqueles que conhecemos diretamente ou


indiretamente.
Para Ricouer (1994, p.85), “O tempo torna-se tempo humano na medida em que
é articulado de um modo narrativo e que a narrativa atinge o seu pleno significado
quando se torna uma condição de existência temporal”.
Com Lowenthal (1998), verifica-se que:

O passado nos cerca e nos preenche; cada cenário, cada declaração,


cada ação conserva um conteúdo residual de tempos pretéritos. Toda
consciência atual se funda em percepções e atitudes do passado;
reconhecemos uma pessoa, uma árvore, um café da manhã, uma tarefa,
porque já os vimos ou já os experimentamos. [...] Somos a qualquer
momento a soma de todos os nossos momentos, o produto de todas as
nossas experiências (LOWENTHAL, 1998, p.64).

Um documento de arquivo, como toda escrita, está aberto a quem quer que
saiba ler; ele não tem, portanto, um destinatário designado diferentemente do
testemunho oral, dirigido a um interlocutor. O trabalho nos arquivos deve embasar a
objetividade do conhecimento historiográfico, abrigado na subjetividade do historiador.
Ocorreu uma mudança significativa: é então o testemunho ou o documento que serve
ou atende ao historiador que o evoca, além do testemunho ter sido elevado à condição
de prova documental. O arquivo recebeu uma definição bastante ampla englobando,
assim, todo conjunto de documentos, independente de data, forma ou suporte material
produzido ou recebido por toda pessoa física ou jurídica e por todo serviço ou órgão
público ou privado no exercício de sua atividade (RICOUER, 2008).

1.2 O caráter científico da memória e suas contribuições para a história oral

Nos últimos anos, muito se tem pensado, debatido, produzido e escrito sobre
memória, procurando decifrar seus enigmas, suas características, diferenças,
semelhanças, aspectos coletivos e individuais, as diferentes formas de concebê-la,
entendê-la, defini-la. Alguns afirmam que vivemos uma explosão da memória,
especialmente das memórias orais, que no final do século XX, passaram a receber
tratamento especial na construção histórica.
18

A memória sempre seleciona os eventos de forma individual, pois depende de


como cada um viveu. Dessa forma cada um guardará na lembrança o mesmo fato de
maneiras diferentes. A história dos nomes de cada bairro de Natividade/RJ se inscreve
nas suas particularidades e motivações. A lembrança dos mais velhos com relação à
origem dos nomes antigos dos bairros faz com que não se esqueçam da história do
surgimento de cada um desses lugares, que também, de forma natural, transmitam para
seus familiares, amigos ou conhecidos. O social aqui é entendido pelas relações com a
família, com o grupo, com a escola, com a igreja, que no caso da renomeação dos
Natividade/RJ teve grande contribuição, também a profissão, enfim, com as referências
próprias da pessoa que lembra.
Como a memória é pessoal e reconstruída cada vez que lembramos ela não está
pronta como se ao apertar um botão pudéssemos lembrar o que e como queremos. O
ato de lembrar depende de cada sujeito. A memória está totalmente vinculada à
pessoalidade de cada um, como e porque cada um reconstrói o que viveu. A memória
procura um sentido, ela se encadeia em outras construções do ponto de vista da
identidade pessoal, criando explicações, para apaziguar os conflitos, fechar as feridas,
restaurar as ruínas, silenciar as dores.
A memória está sempre ligada à lembrança e, evidentemente, a esquecimento.
Lembrança e esquecimento formam um par que se complementa e se opõe ao mesmo
tempo. Onde existir memória, lá estará o esquecimento e vice-versa.
Pozo (2005, p. 7) nos diz que:

É esse esquecimento que eu queria mais longe, mais distante no


horizonte, de modo que, quando as palavras se dissiparem, o tempo
ingrato não tivesse apagado de todas essas vozes da minha memória;
que durassem também elas, mais do que o próprio texto.

As lembranças são sociais e permanecem coletivas, pois podem também ser


trazidas à tona por outros que tiveram experiências vividas individualmente, que
contribuirão efetivamente ao confirmarem ou completarem o que se está narrando ou
contando. Ao rememorar voltamos ao passado e olhamos para ele com o olhar do
presente, onde se reconstroem as lembranças, buscando os elementos que
possibilitaram um agir sobre o presente ou um projetar do futuro.
19

Segundo Wehling (1997, p.27), “a memória exerce um papel estratégico na


constituição de uma hegemonia social, produzindo e repercutindo sobre ações, políticas
e discursos”. Lembrar do passado e escrever sobre ele não se apresentam como
atividades inocentes como julgávamos até bem pouco tempo atrás. Hoje sofremos
influências de todos os lados e nossa capacidade de influenciar e ser influenciado está
cada vez mais nítida.
Não se constitui novidade que desde a antiguidade a memória vem contribuindo
para transmitir informações acerca das experiências sociais. A recomposição do
passado provavelmente não teria atingido o nível que atingiu na Antiguidade Clássica,
se não tivessem sido empregados relatos orais como fonte fundamental de apreensão
histórica.
A História Oral ganhou mais adeptos principalmente nos anos de 1950 com o
advento do gravador, nos Estados Unidos, Europa e México, o que desde então
impulsionou sua difusão. No Brasil, a metodologia foi introduzida na década de 1970,
quando foi instituído o Programa de História Oral do CPDOC, o que fez crescer
bastante as pesquisas, principalmente a partir dos anos 1990, tendo sido criada
a Associação Brasileira de História Oral em 1994 que congrega membros de todas as
regiões do país.
A história passada de geração para geração é entendida muitas vezes por quem
a recebe não como uma cópia autêntica do ocorrido, sem subjetividade. Cada indivíduo,
enquanto sujeito histórico compreende e interpreta construindo uma representação
particular do ocorrido, modificando, muitas vezes, a tradição. O testemunho oral não
pode de submeter ao crivo da veracidade, uma vez que sua transmissibilidade não se
faz por critério outro senão o da seleção da memória, diferentemente do registro escrito.
Bosi (2004, p. 53) revela-nos que:

A lembrança é a sobrevivência do passado. Trata-se aqui da lembrança


do vivido, que particularmente o velho exercita. O passado,
conservando-se no espírito de cada ser humano, aflora à consciência na
forma de imagens- lembranças.

Pollak (1992) defende a ideia de que existem três elementos constitutivos da


memória, sendo eles: a memória individual, a coletiva, além da memória que categoriza
20

os lugares. Os dados da memória podem ser agrupados pelos eventos vividos pela
pessoa dos quais ela mesma se recorda e de acontecimentos vividos como este define
“por tabela” que são os fatos vividos por um grupo ao qual a pessoa sente pertencer,
mesmo sem ter vivido aquilo presencialmente, mas no seu imaginário devido à
importância do ocorrido. Já como exemplos de memória relacionados a lugares,
podemos citar as bibliotecas, museus e arquivos.
A História Oral contribui para a construção de identidade cultural das localidades
de um modo geral, como também enfatiza sua importância na cientificidade histórica.
De modo geral a história oral ganha foros de popularidade mundialmente e passa a ser
um recurso apreciado não apenas nas universidades e círculos acadêmicos.

A História Oral produz narrativas orais, que são narrativas de memória.


Estas, por sua vez, são narrativas de identidade na medida em que o
entrevistado não apenas mostra como ele vê a si mesmo e o mundo,
mas, também, como ele é visto por outro sujeito ou por uma
coletividade. Neste sentido, a dependência da memória, em vez de
outros textos, é o que define e diferencia a história oral em relação a
outros ramos da História (FENTRESS; WICKHAM, 1992 apud
ERRANTE, 2000, p.142).

Enquanto metodologia de pesquisa a História Oral se preocupa em avaliar e


aprofundar conhecimentos sobre determinada realidade, os modelos culturais,
estruturas sociais e processos históricos, obtidos através de entrevistas, conversas com
pessoas, relatos orais, que ao focarem suas lembranças pessoais, constroem também
uma visão mais concreta da dinâmica de funcionamento e das várias etapas da
trajetória do grupo social ao qual pertencem, ponderando esses fatos pela importância
em suas vidas.
O trabalho com essa metodologia compreende ainda o conjunto de atividades
anteriores e posteriores à gravação dos depoimentos. Exige, antes, a pesquisa e o
levantamento de dados para a preparação dos roteiros das entrevistas, articulada a
documentos escritos e outros tipos de registro. A História Oral caracteriza-se por ser
germinada a partir de uma excitação, pois o pesquisador procura o entrevistado e lhe
faz perguntas, comumente depois de consumado o fato ou a conjuntura que se quer
investigar. Além disso, faz parte de todo um conjunto de documentos de tipo biográfico,
21

ao lado de memórias e autobiografias, que permitem compreender como indivíduos


experimentaram e interpretam acontecimentos, situações e modos de vida de um grupo
ou da sociedade em geral.
Thompson (1992) afirma que os historiadores orais podem escolher exatamente
a quem entrevistar e a respeito do que perguntar. A entrevista propiciará também um
meio de descobrir documentos escritos e fotografias que, de algum modo, não seriam
localizadas. Definindo a história oral como pratica social possivelmente geradora de
mudanças que transformam tanto o conteúdo como a finalidade da história, pois revela
novos campos de investigação, cujo processo histórico não está acabado.
A memória diz respeito à questão do indivíduo, ou seja, ao próprio lócus da
memória. Esse enfoque é evidente em Portelli, pois, ao definir história oral como a
ciência e a arte do indivíduo, leva-nos a pressupor que a memória está intrinsecamente
ligada à experiência pessoal – pelo menos no caráter fenomenológico ao sujeito que
realiza o ato de rememorar.
A História Oral é uma ciência e arte do indivíduo. Embora diga respeito – assim
como a sociologia e a antropologia – a padrões culturais, estruturas sociais e processos
históricos, visa aprofundá-los, em essência, por meio de conversas com pessoas sobre
a experiência e a memória individual e ainda por meio do impacto que estas tiveram na
vida de cada uma (PORTELLI, 1997, p.15).
Contudo, o autor reconhece que apesar de a memória constituir-se enquanto um
processo essencialmente individual remete ao mesmo tempo a aspectos sociais e
padrões culturais. Em outros termos, a memória compreende dois níveis
concomitantemente: um individual e outro social. O caráter social e cultural da memória
é consequência da interação entre indivíduo e meio social, contudo, a apreensão das
experiências concretas através do ato de rememorar, é exclusivamente pessoal. Por
isso a existência de semelhanças, distinções, ou mesmo contradições em relatos e
depoimentos acerca de um acontecimento específico não se caracteriza como fato
peculiar para o estudo da memória, pelo contrário, seu caráter individual impede a
possibilidade da existência de memórias exatamente iguais.
Assim, por se tratar de um fenômeno concomitantemente individual e coletivo, a
memória apresenta-se enquanto processo dinâmico em permanente mudança, ligando
22

o sujeito histórico ao grupo social, e a um momento específico no tempo. Este aspecto


dual leva Diehl a afirmar que a memória é capaz de representar possibilidades de
aprendizagem e de socialização influenciando na construção de uma identificação
cultural.

A Memória possui contextualidade e é possível ser atualizada


historicamente. Ela possui maior consistência do que lembrança, uma
vez que é uma representação produzida pela e através da experiência.
Constitui-se de um saber, formando tradições, caminhos – como canais
de comunicação entre dimensões temporais –, ao invés de rastros e
restos como no caso da lembrança. A memória pode constituir-se de
elementos individuais e coletivos, fazendo parte de perspectivas de
futuro, de utopias, de consciências do passado e de sofrimentos. Ela
possui a capacidade de instrumentalizar canais de comunicação para a
consciência histórica e cultural, uma vez que pode abranger a totalidade
do passado num determinado corte temporal. (...) Nesse nível, ela
representa possibilidades de aprendizagem e de socialização,
expressando assim continuidade e identidade daquelas tradições
(DIEHL, 2002, pp.116-117).

No ato institucional de mudança dos nomes nos bairros de Natividade, verifica-se


que a linguagem usada nesse processo de rememoração por parte dos moradores
funciona como uma ferramenta socializadora, como possibilitadora das relações da
memória individual com a memória do grupo de convivência.
A condição necessária para que haja memória é o sentimento de continuidade,
presente naquele que lembra. Não há ruptura entre passado e presente, pois a
memória apenas conserva do passado aquilo que ainda está vivo ou que vive na
consciência do grupo, aqui representado pela população de Natividade. Ao não realizar
a ruptura do passado com o presente, a memória torna-se campo inesgotável de
lembranças. Cada época precisa ter a memória de todas as outras para superá-las e
realizar a tarefa do presente. Na relação entre passado e presente, a memória tem o
papel de nos liberar do passado como uma simples repetição.
23

2 ALGUNS PRESSUPOSTOS TEÓRICOS DA ANÁLISE DO DISCURSO

Neste item, apresentaremos alguns pressupostos da Análise do Discurso (AD)


que nortearão todo processo de análise e discussão dos relatos dos moradores da
cidade de Natividade. Verificaremos que a memória exerce um papel estratégico na
constituição de uma hegemonia social, onde a veremos exercer uma efetiva
participação em forma de confronto com as ações políticas que envolvem o poder e a
força contidos em suas mãos.

2.1 Teoria da análise do discurso

Enquanto disciplina, a AD adquiriu seu status logo no final dos anos de 1960, na
França, com os trabalhos de Michel Pêcheux. O método usado por Pêcheux procurava
associar o materialismo histórico à psicanálise e à linguística. A AD desenvolvida por
ele assimilava os documentos estudados às condições sócio-históricas de uma
determinada sociedade. Já em 1989, com Maingueneau, a AD passou a evidenciar a
posição de certas palavras, frases ou expressões que marcaram ou definiram certo tipo
de discurso, proveniente de uma determinada ideologia.
A temática do discurso inicia-se na segunda metade do século XX, precisamente
início dos anos de 1960, centrada em três eixos, trabalhando na confluência desses
campos de conhecimento e que irrompe em suas fronteiras surgindo e questionando os
domínios disciplinares que deixou de analisar, desencadeando uma ruptura com o
século XIX, pondo em observação a Linguística, o Marxismo e a Psicanálise. Podemos
entender o discurso como a conexão entre a língua e a ideologia.
Assim, a AD:

Interroga a Linguística pela historicidade que ela deixa de lado,


questiona o Materialismo perguntando pelo simbólico e se demarca da
Psicanálise pelo modo como, considerando a historicidade, trabalha a
ideologia como materialmente relacionada ao inconsciente sem ser
absorvida por ele (ORLANDI, 2009, p.20).
24

Na AD, conforme Orlandi (2009, p.15), “procura-se compreender a língua


fazendo sentido”, e “exclui o estudo da língua enquanto sistema abstrato” (idem, p.16);
pormenorizando, não se trata do estudo da língua e da gramática, mas sim das formas
como os seres sociais se expressam.

Levando em conta o homem na sua história, considera os processos e


as condições de produção da linguagem, pela análise da relação
estabelecida pela língua com os sujeitos que a falam e as situações em
que se produz o dizer. Desse modo, para encontrar as regularidades da
linguagem em sua produção, o analista de discurso relaciona a
linguagem a sua exterioridade (ORLANDI, 2009, p.16).

A AD não é apenas uma forma de leitura usada para decodificar um texto, ela
refere-se a um conjunto de procedimentos analíticos que envolvem diferentes saberes e
práticas do conhecimento. Usada na busca da dinâmica do pensamento e seus feitos
sociais e na produção de verdade, a AD é recorrida com a intenção de se compreender
aquilo que está além do linguístico.
Para compreendermos melhor o discurso dos entrevistados nesta pesquisa faz-
se necessário o entendimento de duas categorias: a situação e a memória. A situação é
o momento de compreender o que se produz no contexto, levando em consideração o
momento histórico (renomeação dos bairros), e os posicionamentos assumidos pelo
sujeito. A memória pode estar relacionada com a ideologia, ou melhor, é aquilo que se
diz sustentado em outros dizeres e centrado numa linha de pensamento para a
reprodução da vivência, é também o que está de certa forma internalizada
automaticamente no inconsciente dos cidadãos natividadenses.
A memória tem a capacidade de se fazer texto e discurso, ou os mesmos podem
conflitar, já que o discurso pode admitir o papel de narrativa ou um discurso escrito. Na
sociedade, a memória tem o poder de constituir uma hegemonia social, que poderá
exercer influências no campo político, tomando como exemplo um estudo de caso,
como o da renomeação dos bairros que aconteceu em Natividade/RJ.
A existência do discurso está intrinsecamente ligada no estabelecimento da
relação de um com outro e do contexto em que os atores e vozes sociais são
constituídos, podendo ser relações de exclusão, submissão e de subordinação.
25

A AD é o meio que permitiu a “compreensão dos diferentes atores históricos e de


seus projetos”. Para Bakhtin, (apud MORAES, 1995) gera o dialogismo, em que é
necessário conhecer o contexto da produção da fala ou do texto.

A Análise do Discurso considera como parte constitutiva do sentido o


contexto histórico social... Se este contexto for ignorado, todo o sentido
do texto é alterado... O contexto histórico social, então, o contexto de
enunciação, constitui parte do sentido do discurso e não apenas um
apêndice que pode ou não ser considerado. Em outras palavras, pode-
se dizer que, para a AD, os sentidos são historicamente construídos
(MUSSALIM; BENTES, 2001, p.123).

Os gêneros de discurso podem ser invariantes com relação ao lugar institucional,


como, por exemplo, um hospital, escola, empresa, família e/ou outros setores.
Se tomarmos como exemplo de análise um dos setores citados, veremos
múltiplos gêneros de discurso escrito ou oral que ali são praticados. Poderemos
verificar também esse discurso sendo praticado entre parceiros, sendo elas crianças,
adultos, homens e mulheres, de classes ou níveis superiores ou inferiores. Importante
aqui é sabermos que a efetivação desses discursos pode acontecer com pessoas em
múltiplas atividades de discurso, pois são interlocutores muito variados.
No contexto de Natividade/RJ, essa variedade de discursos é notória. No caso
dos bairros, a efetivação desses discursos é proveniente de pessoas de diferentes
classes, e até mesmo idades. Cada um tem sua maneira de explicar o porquê de ainda
manterem os antigos nomes gravados em suas memórias.
O discurso vinculado ao lugar irá depender de certo momento. Um dos
entrevistados nesta pesquisa afirma que o momento de renomeação dos bairros por
parte do prefeito conhecido como “Vavá” se deu em uma situação de efetiva
manifestação do poder religioso sobre o legislativo de Natividade/RJ. O entrevistado diz
haver certa ligação de “amizade” e talvez de interesses políticos naquele período.
Mesmo constatando tal situação, as noções de “momento” ou de “lugar” de enunciação
exigidas por um gênero de discurso não são evidentes.
A AD não busca o entendimento da realidade, mas busca em sua totalidade os
efeitos que são produzidos por elas.
26

A ordem discursiva nomeia a realidade, relações, interesses e


estratégias em luta, não constitui esforços ou atitudes individuais e
isoladas, mas contrapõe-se a outros discursos, interesses e projetos,
constituindo “teias” discursivas e demonstrando a pluralidade do real, a
heterogeneidade e capacidade ou possibilidade de transformações ao
longo do tempo. O discurso permite uma representação, mas não retrata
uma realidade, embora, muitas vezes, seja esta a sua intenção. Ele
interpreta, numa correlação de forças sociais, uma realidade. Como
objeto linguístico e sócio-histórico, constitui-se em um referencial, e
enquanto modo de construção discursiva permite diferentes formas de
apreensão e efeitos sociais. O discurso compreende palavras e frases
articuladas (famílias), elaborações que produzem sentidos, sentidos que
expressam momentos e uma lógica relacional socializada (MORAES,
1995, p.6).

Notadamente a AD realiza uma crítica às Ciências Sociais e à Linguagem, pois a


ideologia aparece como manifestação da língua, conforme, “não há discurso sem
sujeito e não há sujeito sem ideologia: o indivíduo é interpelado em sujeito pela
ideologia e é assim que a língua faz sentido” (ORLANDI, 2009, p.17).
É bom observar a diferença entre análise de discurso da análise de conteúdo, a
primeira busca conhecer a linguagem com materialidade simbólica própria buscando
identificar os significados e categorias presentes nele, o segundo compreender a busca
pelo sentido acadêmico.
O discurso distancia-se da terminologia comunicação definindo o que é
mensagem, que se constitui de emissor, receptor, código e para a AD,

Na realidade, a língua não é só um código entre os outros, não há essa


separação entre emissor e receptor, nem tampouco eles atuam numa
sequência em que primeiro um fala e depois o outro decodifica, etc. Eles
estão realizando ao mesmo tempo o processo de significação e não
estão separados de forma estanque (ORLANDI, 2009, p.21).

O discurso busca trabalhar o sentido, relegando em segundo plano a noção de


leitura, faz necessário entender que a linguagem é a linguagem e “só faz sentido
porque se inscreve na história” (idem, p.25), a leitura aparece como não transparente,
mas imbrica com pressupostos teóricos. O campo de conhecimento e o surgimento da
Análise do Discurso a coloca dentro do campo da interpretação o que a distingue da
hermenêutica.
27

A memória está intrinsecamente ligada à produção do discurso, e é partindo do


interdiscurso, em que a mesma é apoiada em dizeres e é analisada por cada palavra
que é dizível, o interdiscurso é o significado por uma situação dada, também analisada
pela relação entre o que já foi dito e o que se está sendo dito, coexistindo a relação
entre interdiscurso e o intradiscurso, o que induz ao sentido e sua formulação.
A memória que se constitui discurso no contexto de Natividade/RJ revela-nos
muito mais que uma simples lembrança. Há definitivamente uma afeição que ultrapassa
os domínios do poder legislativo, como já mencionado em outras partes do texto. O
afeto que cada morador, bem como os entrevistados nesta pesquisa, atribui aos nomes
antigos dos bairros é notório no que diz respeito à tradição e cultura dos
natividadenses. Mesmo que a história dos nomes antigos dos bairros seja esquecida ou
até mesmo desconhecida por parte da população, o que nota-se é uma efetivação e
perpetuação cada vez maior da divulgação dos nomes antigos em detrimento aos
oficiais.
A centralidade do esquecimento no discurso leva à formação das famílias
parafrásticas, em que o dizer sempre podia ser outro, e que está diretamente ligado às
escolhas que fazemos por meio de palavras e/ou expressões ditas. O esquecimento
ideológico é o que já foi dito, tudo isso nos faz entender que esse discurso já nasceu
em nós, e que podemos considerar como equívoco fazemos isso inconscientemente.

Quando nascemos os discursos já estão em processo e nós é que


entramos nesse processo. Eles não se originam em nós. Isso não
significa que não haja singularidade na maneira como a língua e a
história nos afetam. Mas não somos o início delas. Elas se realizam em
nós em sua materialidade (ORLANDI, 2009, p.35).

Podemos entender a categoria paráfrase como a manutenção dos dizeres e


polissemia a ruptura dos dizeres, essa duas são as famílias parafrásticas. A autora
afirma que nem os discursos já estão prontos e inacabados, mas que estão sempre em
mudanças e estão sendo construídos, ou melhor, estão sempre se fazendo, o que
impulsiona e condiciona a linguagem e os diferentes sentidos do discurso.
28

Se o real da língua não fosse sujeito a falha e o real da história não


fosse passível de ruptura não haveria transformação, não haveria
movimento possível, nem dos sujeitos nem dos sentidos. É porque a
língua é sujeita ao equívoco e a ideologia é um ritual com falhas que o
sujeito, ao significar, se significa (ORLANDI, 2009, p.37).

A linguagem é o resultado da interação entre o homem e o meio. Nessa relação


necessária, o locutor não possui total controle sobre a língua, mas a modifica a partir de
sua aplicação ante a sociedade que a constitui.
A língua enquanto sistema é social, uma vez que é utilizada por todos os
componentes de uma comunidade linguística. Neste ponto o que importa não é a
característica gramatical que um determinado elemento linguístico possui, e sim a
relação estabelecida entre eles. Relação esta que determina seu valor no interior do
discurso e consequentemente seu posicionamento na estrutura.
A aplicação da linguagem é o discurso, o uso de elementos linguísticos para
expressar seu mundo exterior e interior, seu pensamento de forma a intervir sobre eles,
que, a partir de sua natureza histórico-social, submete-se a regras de projeção.

[...] há nos mecanismos de toda formação social regras de projeção que


estabelecem a relação entre situações concretas e as representações
dessas situações no interior do discurso. É um lugar assim
comprometido, enquanto espaço de representações sociais, que é
constitutivo da significação discursiva (ORLANDI, 1996, p.26).

As relações sociais não interferem na estrutura da língua, uma vez que


indivíduos de diferentes classes de uma mesma sociedade utilizam uma mesma
estrutura linguística. A formação social interfere no conteúdo de um plano de expressão
na construção semântica, “[...], pois o conjunto de elementos semânticos habitualmente
usados nos discurso de uma dada época constitui a maneira de ver o mundo de uma
dada formação social” (FIORIN, 2007, p.19).
Admitimos aqui que, apesar de a linguagem em sua evolução natural ir
conquistando certa autonomia no que tange as relações ideológicas, esta continua
sendo por fatores sociais determinada nas construções semânticas.
Isso se dá pelo fato de a consciência ser construída socialmente. A consciência
constitui um fato socioideológico, uma vez que esta é expressa pela linguagem. Tanto
29

emissor quanto receptor limitam-se ao significar o discurso seja na enunciação seja na


interpretação às relações signo-significado preexistente em seus meios sociais.

Considerando-se ainda, no estudo da linguagem, o processo que reúne


o eu e o outro, na simultaneidade falante-ouvinte, podemos chegar à
articulação social entre interlocutores e deriva daí a possibilidade de se
apreender a ilusão subjetiva que muitas vezes está refletida, e não
criticada, nas teorias linguísticas: o sujeito que produz linguagem
também está reproduzido nela, acreditando ser a fonte exclusiva de seu
discurso, quando, na realidade retoma um sentido preexistente
(ORLANDI, 1996, p.26).

O sentido é construído a partir de uma formação discursiva dentro de uma


formação ideológica, que “constitui um conjunto complexo de atitudes e representações
que não são nem individuais nem universais, mas se reportam, mais ou menos
diretamente, às posições de classe e conflito umas com as outras” (ORLANDI, 1996,
p.27). O discurso é a manifestação da ideologia. Poderíamos dizer, então, que o
discurso também é social, mesmo que os indivíduos pensem que cada um produz o
discurso que bem entender. O que faz essa simulação é o fato de que o que exterioriza
o discurso é o texto e esse sim é individual. Cada um pode textualizar a sua maneira,
porém é constrangido a dizer o que sua classe diz. Há uma apropriação desse discurso
nos falantes de Natividade, que involuntariamente assumem o papel de “preservadores”
da cultura local, no que concernem os nomes tradicionais dos bairros.
A partir das condições sócio-históricas e do contexto ideológico o significado é
construído, esta última determinando o que pode ou não ser dito em uma dada
situação.
A aplicação das formas normativas de uma língua distingue-se da utilização da
língua. O emprego das normas produz um dado número de modelos de funcionamento,
todavia as estruturas linguísticas não se limitam a estes modelos. “A enunciação é este
colocar em funcionamento da língua por um ato individual de utilização” (BENVENISTE,
1989, p.83).
Para o locutor, a língua não é um sistema de formas normativas e intocáveis.
“(...) O locutor serve-se da língua para suas necessidades enunciativas concretas (para
30

o locutor, a construção da língua está orientada no sentido da enunciação da fala)”


(BAKHTIN, 2004, p.92).
Tanto Benveniste (1989) quanto Bakhtin (2004) consideram a existência de uma
estrutura formal, com normas fixas, objetivas e incontestáveis. E que para o locutor, sua
consciência subjetiva não toma a língua como este sistema de formas normativas.
Bakhtin (2004, p.75) afirma que, “Para o locutor, a forma linguística não tem importância
enquanto sinal estável e sempre igual a si mesmo, mas somente enquanto signo
sempre variável e flexível. Este é o ponto de vista do locutor”.
Uma forma linguística só possui, para o locutor, valor linguístico quando
acompanhada de compreensão de seu sentido particular. O signo fora de um contexto
não constitui a língua. A consciência linguística do locutor e do receptor não está
relacionada com o sistema abstrato de formas normativas, mas sim com suas reais
possibilidades de uso, carregado de contexto e significado. “A língua, no seu uso
prático, é inseparável do seu conteúdo ideológico ou relativo à vida” (BAKHTIN, 2004,
p.97).

Na realidade não são as palavras o que pronunciamos ou escutamos,


mas verdades ou mentiras, coisas boas ou más, importantes ou triviais,
agradáveis ou desagradáveis etc. A palavra está sempre carregada de
um conteúdo ou de um sentido ideológico ou vivencial. É assim que
compreendemos as palavras e somente reagimos àquelas que
despertam em nós ressonâncias ideológicas ou concernentes à vida
(idem).

Este conteúdo, este sentido é chamado por Benveniste de semantização da


língua. E que está no centro da enunciação permitindo que as formas linguísticas da
anunciação se diversifiquem e se engendrem.
O uso individual da língua introduz o locutor como condição da enunciação.
Apresentando aos locutores contextos precisos de enunciações e um contexto
ideológico. O locutor se apropria do sistema formal da língua e a aplica esta
aplicabilidade da língua, a enunciação, expressa uma determinada relação
(interpretação de) com o mundo.
Bakhtin e Benveniste atribuem grande importância ao enunciado, uma vez que
na análise de um discurso deve-se compreender suas especificidades para
31

compreender todos os agentes que interferem na construção do discurso, do significado


e da própria língua. Em sua relação entre língua e vida, a língua é viva e não pode ser
vista como algo acabado, estéril. “A língua, como sistema de formas que remetem a
uma norma, não passa de uma abstração, que só pode ser demonstrada no plano
teórico e prático do ponto de vista do deciframento de uma língua morta e do seu
ensino” (BAKHTIN, 2004, p.90).
Na relação existente entre língua e discurso, a ideia que se tem de enunciação
segue entre uma acepção discursiva e uma concepção linguística. Se houvesse uma
insistência na ideia da enunciação como acontecimento em um tipo de contexto e
apreendido na multiplicidade de suas dimensões sociais e psicológicas, operaríamos
primordialmente na dimensão do discurso.

2.2 A questão da narrativa.

A narração está vinculada à nossa vida, pois sempre temos algo a contar.
Narrar é relatar fatos e acontecimentos, reais ou fictícios, vividos por indivíduos,
envolvendo ação e movimento. Naturalmente, o termo “narrativa” é amplo e pressupõe
a possibilidade de diversas abordagens. Nesse trabalho refiro-me a uma narrativa
popular, que seja construída acumulativamente, com começo, meio e fim, que tenha
continuidade, que tenha como objetivo contar uma história de interesse geral,
abordando temas que permitam identificação imediata, um discurso compartilhável
construído através de uma linguagem familiar e acessível.
Vale lembrar que a narrativa é um recurso naturalmente humano e fundamental.
Sem ela, a sociabilidade, e mesmo a visão que temos de nós mesmos, não poderia ser
construída. Narramos nossas experiências cotidianas, nosso dia no trabalho, fatos
acontecidos, lembranças, sonhos, projetos e desejos. Narramos, mesmo de forma
solitária, em pensamento, para nós mesmos, episódios acontecidos que de alguma
forma não ficaram claros. Para além de um recurso literário, a narrativa pode ser
considerada um dos procedimentos através dos quais tornamos a vida e o mundo
interpretáveis.
32

Escrever sobre narratividade é um grande desafio. Quando falamos em narrativa,


supõe-se que se saiba o que é “narrar”. Não seria a relação entre o narrador e sua
relação artesanal? Segundo Benjamin (1994), o narrador sabe dar conselhos que
servem para muitos casos, pois dispõe da experiência. Seu dom é poder contar
algumas coisas e contá-la por inteiro. Por outro lado, a memória é a mais épica de
todas as dificuldades.
Entretanto, no caso dos relatos de Natividade, entra um pouco a questão do
imaginário. É preciso, então, estabelecer algumas considerações. Numa narrativa, é
necessária uma organização temporal, uma ordem na desordem do diverso, irregular e
acidental. Essa ordem seria concomitante ao ato de dizer.

2.3 A estrutura narrativa do discurso e a questão ideológica no contexto de


Natividade

Nos domínios do discurso, faz-se a fusão de dois termos essenciais para sua
compreensão: linguagem e ação, componentes das trocas sociais “que têm uma
autonomia própria e que, ao mesmo tempo, se encontram em uma relação de
interdependência recíproca e não simétrica. Assim, porque todo ato de linguagem
emana de um sujeito que se define em relação ao outro, para Charaudeau (2006), são
os seguintes os princípios que orientam as práticas entre sujeitos:

• Princípio de alteridade. A existência do Outro cria no Sujeito a


consciência de si, fundamental para o estabelecimento das chamadas
trocas sociais.
• Princípio de influência. Aqui a questão se reveste de importância
política mais acentuada, uma vez que o Sujeito não cessa de trazer o
Outro para si, para que esse outro pense, diga ou aja segundo a
intenção daquele;
• Princípio de regulação. Se esse Outro puder ter seu próprio projeto de
influência, os dois serão levados a gerenciar sua relação
(CHARAUDEAU, 2006, p.9).

Ora, não há na situação de comunicação que se busca analisar um Sujeito físico


e um Outro, nos termos exatos de como ocorre em uma conversação. O que há é, de
um lado, o poder público representado pela Prefeitura e, do outro, a população de uma
33

cidade, envolvidos em uma situação extremamente formal de comunicação concebida e


instrumentalizada por projetos de leis e portarias do legislativo e executivo municipal.
Recorta-se a classificação de Charaudeau, como apresentada por Moura e
Medeiros (2010), para melhor esclarecer os termos em que se dão a alteridade, a
influência e a regulação.
Poder público (Prefeitura e prefeito) e povo (população de Natividade) compõem
o quadro do princípio de alteridade, segundo o qual o Sujeito Prefeitura (que fala
através de documentos de lei) reconhece a si como autoridade a partir desse Outro
(que nos termos de uma democracia o elegeu para o cargo). A legitimidade nasce
dessa relação, uma vez que um existe em função da existência do outro.
No princípio de influência está o claro propósito de o Poder influenciar os
habitantes, em torno de sua aceitação e aclamação, isto é, manter sua legitimidade. É
também por meio da autoridade da lei, que o Sujeito-prefeitura decreta os novos nomes
das localidades.
Já no princípio de regulação é que reside o problema. Esse problema aparece
como uma espécie de “protesto silencioso”: não tendo havido uma manifestação
explícita da população, porque talvez nunca tivesse havido esse propósito, o que
ocorreu de fato foi uma reação. Se for lei, é para ser cumprida, embora ninguém o faça.
A coação não tem validade porque entraria no espaço da intimidade, da livre expressão
linguística, que decidiu usar a nomenclatura anterior. Entende-se que o princípio de
regulação, nesse caso, não se deu, ou seja, não houve acordo anterior, nem consulta;
apenas a suposição da religiosidade do povo e a influência possível da igreja, em uma
cidade onde houve aparições da Virgem. Também não se imagina uma rejeição tácita
aos nomes religiosos impostos. Apenas uma incompatibilidade entre o hábito e a
ameaça a sua impossibilidade. Se alguém tomou conhecimento da lei e resolveu
obedecer a ela, esbarrou no obstáculo da aceitação coletiva, que caracteriza a
legitimidade e a própria existência do nome.
É interessante observar que no imaginário da população de Natividade o
sentimento de ainda existência dos nomes antigos dos bairros ainda é muito forte. Isso
se verifica até mesmo em uma simples correspondência que chega às casas dos
moradores, onde ainda permanece o nome antigo. Talvez pelo simples fato de a
34

maioria desconhecer o ato legal de renomeação seja um fator importante para que a
memória fique ilesa, não sofrendo qualquer alteração durante todos esses anos.
Mas o que dizer dos moradores que participaram ou até mesmo que assistiram
ao momento em que tais bairros sofreram as mudanças. Como se observa nos relatos
obtidos nas entrevistas, tais moradores não moveram qualquer descontentamento
externo, mas o íntimo estava de certa forma mexido com tudo que estava acontecendo.
A reação em forma de descontentamento se deu a partir do momento em que a não
aceitação dos novos nomes, mesmo que calada, perpassa gerações que guardam em
suas memórias as histórias que cada bairro possui, desde o seu surgimento e
recebimento dos seus respectivos nomes anteriores.
O presente de um indivíduo está conectado ao seu passado. Tudo o que temos
hoje é resultado de experiências passadas e vividas por pessoas em outros tempos. O
conceito ou informação que cada morador de Natividade possui sobre os bairros desta
cidade estão entrelaçados aos “saberes” de seus parentes ou até mesmo conhecidos.
Somos resultado de uma cultura e de uma história que se constrói a cada instante e
que teve início bem antes da chegada do desbravador de Natividade, José de Lannes
Dantas Brandão.
Cada acontecimento ou fato tem um valor e um significado diferente para cada
natividadense. A História Oral enquanto um documento ou fonte de pesquisa serviu e
serve como meio transmissor de cultura e informação no que diz respeito à perpetuação
dos nomes antigos que permanecem na memória dos habitantes de Natividade.
A situação de aparente “conformidade” que cada morador possa ter apresentado
no momento da renomeação dos bairros não pode ter validade na atual situação em
que se encontra ou que se conhecem os nomes dos bairros hoje. O que levou tais
indivíduos a não absorverem ou aceitarem tal imposição do legislativo é o que se tem
observado nas entrevistas realizadas.
É bem verdade que não se deve avaliar um indivíduo ou o período em que está
vivendo, antes disso é necessário avaliar as condições reais e materiais de vida, para
que se possa apreender as contradições intrínsecas à sociedade. Não se julga o que
um indivíduo é a partir de sua própria consciência; ao contrário, é preciso explicar essa
35

consciência a partir das contradições da vida material, a partir do conflito existente entre
as forças produtivas sociais e as relações de produção (MARX; ENGELS, 1996).

Na consideração de tais transformações é necessário distinguir sempre


entre a transformação material das condições econômicas de produção,
que pode ser objeto de rigorosa verificação da ciência natural, e as
formas jurídicas, políticas, religiosas, artísticas ou filosóficas, em
resumo, as formas ideológicas pelas quais os homens tomam
consciência desse conflito e o conduzem até o fim (MARX; ENGELS,
1996, p.78).

O contexto ideológico em que se deu a renomeação de tais bairros pode estar


vinculado a inúmeros fatores como os mencionados na referência anterior, como, por
exemplo, políticas, religiosas, artísticas ou filosóficas. Enfim, o que se têm depreendido
a partir dos relatos colhidos é que o contexto político da época favoreceu o impulso do
prefeito em vigência para sancionar tal lei.
Ideologia, nesse contexto, está relacionada ao discurso já que esse interage com
o texto e, assim, como o autor com o leitor. Nesse sentido a ideologia é um dos
componentes que instituem mais definitivamente o sentido textual desse discurso.
Verón (1977) a conceitua como um sistema de organização de regras e conceitos.
Desse modo, apreende-se a noção de ideologia enquanto uma perspectiva pela qual os
indivíduos compreendem as informações recebidas no ato de comunicação. A ideologia
é o prisma que refrata o conteúdo do texto desviando-o do sentido originalmente
proposto pelo Autor, e o sentido, nesse âmbito, é formatado pelo molde ideológico que
é comum ao Sujeito Leitor. A ideologia instaura dessa forma uma superfície de
persuasões e justificativas que constituem os sentidos pelos quais foram renomeados
os bairros de Natividade e também a não aceitação desses novos nomes. Assim, cada
morador tem possível autonomia para agregar algum valor ideológico ao bairro em
questão, como também pode estar imbuído de algum conteúdo ideológico, que pode vir
a justificar sua não manifestação no momento em que o ato se consolidou, sendo que
cada indivíduo é livre para optar e aceitar ou não aquela ideologia apresentada, a
proposta de renomeação.
Sobre o contexto de ideologia vale ainda desvelar que, para Konder (1998), a
ideologia constitui o conjunto de formas de representação da realidade e de normas
36

que os indivíduos proclamam ou realizam em seus comportamentos. Ainda segundo o


autor à medida que a classe trabalhadora antecipa, em seu movimento, aspectos da
comunidade humana reunificada do futuro, a sua concepção do mundo – o
materialismo prático – já apresenta elementos em que se nota a superação da
unilateralidade deformadora que tem limitado o alcance das ideologias do passado.
Necessário deixar claro que cada indivíduo vê determinada situação sobre um
ponto de vista, o campo da ideologia é aberto a inúmeras possibilidades, mesmo às
pessoas que passam pela mesma situação a veem de maneira diferenciada. Primo Levi
(1990), referindo-se à obra do psicanalista judeu Bruno Bettenheim, que, como ele,
viveu a experiência do campo de concentração, conta que Bruno ficou surpreso com
duas pacientes que lhe relatavam a experiência do campo de concentração. Eram duas
mães que viveram no campo de concentração e que conseguiram sair de lá vivas e com
seus filhos. Uma, ao relatar a experiência do campo, respirou aliviada e lhe disse: “que
bom que eu saí, agora posso cuidar de meus filhos”. A outra, ao relatar a mesma
experiência, desabafou: “Eu e meus filhos precisávamos ter passado por isso?”
Nesta dinâmica, Murillo (2008) relata que a valorização do estudo teórico acerca
da compreensão do conceito ideologia, abrangeria diversos processos, que são
próximos às ciências políticas sendo eles (de forma resumida):
1) Vislumbrar de que modo o ser que nasce de um ventre humano se hominiza, não
somente por razões biológicas mas também por razões culturais;
2) Compreender por que no processo de hominização, os mecanismos positivos ou
produtivos de poder, desenvolvidos em formas de dispositivos, se constituem em ideais
subjetivos;
3) Ajudar a evitar o cinismo (MURILLO, 2008) que, mesmo sabendo da dominação de
umas forças sociais sobre outras, por omissão naturaliza este processo de domínio;
4) Analisar como os mecanismos de poder são espaços de luta que transformam e são
transformados pelas subjetividades individuais e coletivas (também constituídas dentro
destes espaços) em diversos momentos da história;
5) Aportar luz sobre a compreensão de processos onde, por vezes, grupos humanos
em situações de extrema vulnerabilidade, aderem a propostas de caráter autoritário; e
37

6) Permitir revisar uma noção de “subjetividade” onde esta aparece como produto
“passivo”, isto para repensá-la, as subjetividades, como um produto ativo e construtivo,
algo que se faz também a partir das práticas sociais.
Portanto a categoria ligada à definição de ideologia e o uso ou não desta
categoria é fruto de largas polêmicas, tanto nos círculos acadêmicos como em partidos
e organizações políticas. Assim como a memória deve ser pensada no plural, pois não
existe uma definição única e imutável a representação da ideologia, está diretamente
ligada ao sujeito e ao contexto em que este está inserido, tendo também de ser
analisada no plural como uma representação social das condições objetivas de vida e
especificas de cada sujeito.
A AD dá o nome de formação ideológica o confronto existente entre forças que
estão presentes em um determinado momento histórico:

Falar-se-á em formação ideológica para caracterizar um elemento


(determinado aspecto da luta nos aparelhos) susceptível de intervir
como uma força confrontada com outras na conjuntura ideológica
característica de uma formação social em um momento dado; cada
formação ideológica constitui assim um conjunto complexo de atitudes e
de representações que não são nem “individuais”, nem “universais”, mas
se relacionam mais ou menos com as outras (BRANDÃO, 1998, p.38).

Verifica-se que a formação ideológica consegue de certa forma confrontar-se,


mas as forças presentes nela não precisam estar totalmente em confronto entre si;
podem em algum momento estabelecer relações de aliança ou até mesmo de
dominação. Nesse sentido, o conceito de formação discursiva é utilizado pela Análise
do Discurso para estabelecer o lugar onde o discurso e a ideologia irão se articular, ou
então, que uma formação discursiva é governada por uma formação ideológica.

2.4 Um olhar sobre os discursos popular e oficial em Natividade.

Natividade, pequena cidade situada na chamada região Noroeste fluminense,


estende-se em uma área de 387 km2, abrigando cerca de 15 mil habitantes. Subdivide-
se nos distritos de Ourânia e Bom Jesus do Querendo. Vale-se de intensa religiosidade
38

católica a ponto de ter um dia específico, 8 de setembro, para se comemorar a sua


Padroeira, Nossa Senhora da Natividade.
Além desse dia, de intensa efervescência de clima religioso, há também outra
data, 12 de Julho, quando se acredita ter aparecido no Sítio dos Milagres a imagem em
carne e osso de Nossa Senhora. As cinco aparições deram-se entre 1967 e 1977, a
uma única pessoa, um médico, dono da localidade. As aparições aconteceram em um
único ponto do regato existente no Sítio. Essa singular e estranha denominação do sítio
– Milagres – embora constando dos registros da Prefeitura desde 1942 era
desconhecida até princípios de 1968.
A partir dessa data, o número de peregrinos aumentou favorecido pela frequente
visita de fieis oriundos de todo o Brasil e também da própria cidade, que visitam o Sitio
dos Milagres no dia 12 de julho, mas também durante todo o ano, perdurando até os
dias atuais. Mesmo não considerado o fato como verídico por todos os fiéis da cidade,
pois há uma separação nítida entre católicos “tradicionais” e “carismáticos”, percebe-se
uma grande aceitação por boa parte dos demais que depositam nessa localidade onde
apareceu a Virgem, sua fé e esperança em milagres.
Ao constatarmos que a motivação religiosa prevalece no que diz respeito à
nomeação das localidades citadas, assim como acontece em outras ruas e bairros
espalhados por todo o Brasil, inferimos que um apelo à tradição justifica-se.
O discurso no contexto de Natividade é atravessado e constituído por uma
multiplicidade de falas; vozes que falam ou discursam aparentemente sobre um mesmo
objeto, com um suposto único objetivo. O discurso não subsiste, ou seja, não se
mantém à revelia de uma atividade histórica e de cultivo de interesses ideológicos. No
ambiente urbano, o discurso se espalha e permanece se assim a história ainda o
justificar.
Paulillo (1993, p.9) afirma que “o discurso – referido – recobre a discursividade
humana, e que a fala é essencialmente não um ato de um sujeito isolado que nomeia o
real, mas réplica, fala a partir de outras falas, fala que se põe como complemento ou
contraste em relação a outras falas”.
Bresciani (2001) revela que as cidades surgiram para acolher o homem e criar
condições para que se desenvolvam suas formas de organização. Nelas se fundaram
39

as instituições e a partir daí se investiram a cidadania e o princípio da identidade.


Desde sempre, elas não apenas refletem, mas também impõem princípios dessa
organização como se agissem, de fato, por vontade própria, e os homens a ela se
submetessem por imperativos os mais diversos (MOURA; MEDEIROS, 2010).
A cidade é o lugar onde de fato vive o cidadão investido de uma nacionalidade,
uma cultura nacional, de uma língua nacional, cabendo a ela a constituição de parte
dos dispositivos para assim agir. Podemos dizer que, vivendo na cidade como de fato o
cidadão vive, é a partir dela que ele enxerga os princípios políticos e ideológicos
manifestados (ou doutrinados) a partir das instituições ali instaladas. A cidade é o berço
da cidadania, como o era bem mais claramente na Antiguidade. A raiz grega polis para
cidade é a mesma que origina o vocábulo política.
Modernamente, os imperativos e feições da cidade se transformaram. De cidade-
estado, a exemplo de Esparta, na Antiguidade, e Veneza, na alta Idade Média, até São
Paulo, na atualidade, o status político da cidade sofreu mudanças, começando pelo fato
de que, na Modernidade, o Estado é maior que ela e acolhe uma complexidade política
que supera as suas fronteiras. As metrópoles, em contrapartida, “engolem” outras
cidades e “apagam” as suas fronteiras numa formidável mescla caótica de culturas e
etnias. É nesses termos que a cidade volta a se identificar com um estado dentro do
estado, tal sua força industrial, comercial, cultural e, portanto, política. Dentro dela, se
estabelecem diferentes regiões, zonas, distritos, bairros e ruas, todos com a intrínseca
necessidade de serem nomeados.
Percebemos assim, as cidades e os seus domínios na sua existência discursiva.
Os nomes não existem à revelia de sua atividade histórica e de cultivo de seus
interesses ideológicos. À parte sua materialidade consubstanciada nos seus prédios,
viadutos, canais, enfim, do seu traçado urbano geral, a cidade traz também uma face
simbólica, por sua vez, consubstanciada nos seus discursos. Assim, um prédio não
ostenta apenas uma utilidade, mas outras marcas, tais como sua fachada artística,
emblematicamente estética, que remonta a um período de sua história e da própria
História, a ideológica. Um prédio, portanto, atua como um discurso sobre a cidade, uma
vez que a revela em algum dos seus significados. Já o monumento traz a firme
40

convicção de um valor ideológico a ser ratificado. Ou seja, o monumento não tem


função outra que a da salvaguarda da memória.
O resgate da memória consiste em uma tentativa de reconstrução do passado ou
ressarcimento de uma perda, e a oralidade é a forma privilegiada de transmissão de
saberes, principalmente daqueles vinculados às tradições, como verificamos, ao
tentarmos entender a manutenção dos nomes tradicionais dos bairros de Natividade,
como uma forma velada de resistência. A cultura oral nesse sentido esteve fortemente
em evidência nos saberes populares dos seus habitantes.
Os bairros cumprem a mesma função de discurso sobre a cidade. Quando os
mesmos são nomeados em prol da memória de um vulto da história nacional, é a nação
que é homenageada na sua grandeza, e é a cidade (pela rua ou o bairro que é uma
síntese sua) que tem a autoridade da designação. Assim, o nome guarda sua
funcionalidade simbólica.
Contudo, o modo de governar assumiu vários contornos, o que demandou
drasticamente a confecção de instrumentos de lei e várias instâncias de poder. Da
nação, passando pelos estados até os municípios onde tudo é regulado por leis,
normas, portarias, entre outras, formuladas a partir de um dos princípios do discurso:
poder-fazer. É nesses termos que percebemos as cidades e os seus domínios na sua
existência discursiva. Cremos, ainda, que os discursos de poder se diversificaram, e
imaginamos governantes discursando para o maior número possível de cidadãos,
conciliando a maior diversidade possível de interesses, para continuar governando. O
discurso é uma ferramenta do poder. E se imaginarmos que todo discurso se tece a
partir de um outro, e que, por sua vez, engendra um outro, teremos o que Foucault
chama de ordem de discurso, que mantém durante um certo tempo um modo de pensar
e, consequentemente, de agir.
Dessa forma, podemos dizer que, modernamente, os imperativos e feições da
cidade se transformaram por conta dessa “autonomia” municipal. De cidade - estado, a
exemplo de Esparta, na Antiguidade, e Veneza, na alta Idade Média, até São Paulo, na
atualidade, o status político da cidade sofreu mudanças que refletem a pujança ou a
fraqueza do Estado, começando pelo fato de que, na Modernidade, o Estado é maior
que ela e acolhe uma complexidade política que supera as suas fronteiras. As
41

metrópoles, em contrapartida, “engolem” outras cidades e “apagam” as suas fronteiras


numa formidável mescla caótica de culturas e etnias, com repercussões culturais de
difícil análise. É nesses termos que a cidade volta a se identificar com um estado dentro
do estado, tal sua força industrial, comercial, cultural e, portanto, política. Dentro dela,
se estabelecem diferentes regiões, zonas, distritos, bairros e ruas, todos com a
intrínseca necessidade de serem nomeadas. Embora não seja esse o caso da pequena
Natividade, o status de cidade confere a todas elas uma relativa autonomia que permite
marcar o caráter específico de cada uma. Cabe ao poder legislativo e executivo, por
exemplo, definir e ocupar os seus territórios, e uma de suas atribuições é organizá-los,
impondo-lhes limites, enfim, nomeando-os, quando não reconhecem ainda por alguma
razão o nome que porventura já tenha.
Um bairro, ou o que for da cidade, atua como uma parte do discurso da e sobre a
cidade, uma vez que a revela em algum dos seus significados. Também o monumento
traz a firme convicção de um valor ideológico artificial a ser ratificado, mais intencional
do que o bairro ou a rua, já que o monumento será único, a querer marcar com
exclusividade um território simbólico. Ou seja, o monumento não tem função outra que
resgatar a memória. Marcamos com essas considerações o que de realmente há de
nostálgico na cidade e o que há de artificial, ou seja, do que não nasceu
verdadeiramente do ato espontâneo de lembrar.
O bairro, nesses termos, cumpre uma função de discurso simbólico sobre a
cidade, discurso esse que inclui a validade e a permanência do seu nome. Quando um
bairro (ou mesmo uma rua) é nomeado em prol de um sentimento religioso, substituindo
sua antiga e laica denominação, esta ação se reveste de outro sentido, o político, já que
ela se deu a partir de uma autoridade. Como veremos, tratou-se de uma autoridade de
fato, já que não se respeitou a tradição, e o novo nome foi imposto de forma artificial e
contraditória com o costume.
Percebe-se em Natividade descompasso entre o nome oficial dos bairros pela
permanência dos nomes antigos, conforme Quadro 1:
42

Quadro 1 – Nomes oficiais e populares dos bairros de Natividade/RJ

NOME OFICIAL NOME POPULAR


(RELIGIOSO) (AFETIVO)
Nossa Senhora de Morro do Areião
Fátima
Nossa Senhora do Liberdade
Rosário
Santa Terezinha Popular Nova
São Luiz Gonzaga Popular Velha
Nossa Senhora de Balneário
Lourdes
Nossa Senhora das Pito
Graças e
Ladeira São Cristóvão
Nossa Senhora Bagaceira
Aparecida
Fonte: dados da pesquisa.

Natividade se apresenta talvez como muitas outras cidades do país, como um


caso típico de espaço que sofre a interferência do poder público em desacordo com a
memória afetiva do povo. Para exemplificarmos melhor esse processo de nomeação de
ruas ou bairros, em 11 de junho de 1996, o então vereador Sebastião Pereira Filho,
considerando que, quando não se leva em conta a questão da religiosidade ou a
devoção a qualquer santo para fazer menção às localidades da cidade, pode-se então
fazer tal homenagem a pessoas que se destacaram por sua atuação exemplar na vida
pública ou particular. Ao considerar tal situação de destaque, lembrou-se do ex-prefeito
Altair Alves Ribeiro, cujo nome já fora lembrado outrora em Natividade, mas que pelo
muito que representou e fez pela cidade mereceria a honra de ter seu nome
perpetuado. Por isso, considerando ser obrigação do Poder Público perpetuar o nome
dos ilustres antepassados do Município e também de pessoas com extrema relevância,
43

mesmo sendo em pequeno número, o vereador apresentou o anteprojeto de lei nº


09/921, para não só nomear, como também criar o bairro Altair Alves Ribeiro. No Art. 1º
do referido anteprojeto, lê-se:
Passa a denominar-se “Prefeito Altair Alves Ribeiro”, o bairro sem denominação
que partindo do antigo “Corte de Pedra” da Rede Ferroviária Federal, no fim do bairro
Liberdade, termina na RJ 220, abrangendo as partes alta e baixa da rua D. Antônio de
Castro Mayer, inclusive o aglomerado conhecido por “Praia do Fubá”.
É interessante observar que o bairro Liberdade, mencionado acima, por força de
uma resolução anterior, a 58/68, de 29 de outubro de 1968, já tinha sua denominação
modificada para bairro Nossa Senhora do Rosário, resolução desconhecida pelo autor
do projeto, já que o denomina de Liberdade, como, aliás, é conhecido de fato.
Natividade tem, assim, um diferencial relativamente à índole honorífica dos seus
representantes políticos. A cidade, por força de sua história singular de aparição de
Nossa Senhora, desenvolveu-se culturalmente no sentido da religiosidade. Assim, em
1982, o então Prefeito Dermeval Lannes Vieira, sancionou lei, em cujo Art. 1º, se lê:
Passa a denominar-se Bairro São Luiz de Gonzaga, o bairro sem denominação
nesta cidade, a iniciar-se a Rua Acadêmico Ézio Freitas e Alvares, com término nas
proximidades da propriedade de Pedro Guedes Gomes, abrangendo toda área da
divisa do perímetro urbano do citado local.
Interessante neste caso é o que resultou das providências da lei: antes e depois
dela, o bairro conhecido como Popular Velha, continua a ser conhecido como tal. Vale
ressaltar que até mesmo nos documentos de correspondência o nome que prevalece é
o popular, perpetuando-se dessa forma gerações após gerações.
Outros casos semelhantes e que ocorreram à mesma época, desta vez com os
bairros Morada do Engenho e Cachoeira Alegre, atestam a fragilidade de uma lei (por
sua natureza, imperativa) e os costumes (da ordem do hábito). Estes bairros passaram
a se chamar oficialmente, por força da Lei nº 03 e 04/82, ambas de 25 de março de
1982, do bairro Santa Terezinha e bairro Nossa Senhora de Lourdes, e continuam na
memória afetiva do povo com a denominação antiga.

1
Todos os documentos de lei consultados fazem parte do arquivo da prefeitura de Natividade.
44

Tais leis apresentam a mesma lógica. Os antigos loteamentos foram


considerados, na justificativa, como “sem denominação” e por serem meros
loteamentos, talvez, os mesmos receberam por força desta Lei os respectivos nomes,
bairros Santa Terezinha e Nossa Senhora de Lourdes.
“Ora, o que não tem nome não existe” (MOURA; MEDEIROS, 2010, p.63). A
denominação de loteamento não é oficial; é apenas um nome de produto lançado no
mercado, sem nenhuma interferência oficial. Cabe então à oficialidade “batizá-lo” e
assim apropriar-se dele politicamente, tanto para efeitos de prestação de serviços, o
que lhe compete fazer, como também para cobrar por esses serviços impostos legais.
Recorre-se a testemunhos para reforçar ou enfraquecer-nos e também para
completar o que se sabe de um evento sobre o qual já temos alguma informação,
embora muitas circunstâncias a ele relativas permaneçam obscuras para nós. “O
primeiro testemunho a que podemos recorrer será sempre o nosso. Quando diz: “não
acredito no que vejo”, a pessoa sente que nela coexistem dois seres – um, o ser
sensível, é uma espécie de testemunha que vem depor sobre o que viu, e o eu que
realmente não viu, mas que talvez tenha visto outrora e talvez tenha formado uma
opinião com base no testemunho de outros. É fácil verificar essa aplicação no caso de
Natividade, onde o que realmente nota-se é uma massa que de certa forma está
representada como o eu que assistiu de “camarote” e sem manifestar qualquer tipo de
descontentamento inicialmente à renomeação dos bairros dessa cidade. Esse eu, de
certa forma viu e não viu essa mudança, já que os nomes antigos permanecem nos
dias de hoje, tão forte foi a memória oral dessa localidade, sem estabelecer qualquer
conflito direto com o poder legislativo.
As lembranças permanecem coletivas e são lembradas por outros, ainda que se
trate de eventos em que somente nós estivemos envolvidos e objetos que somente nós
vimos. Isto acontece porque jamais estamos sós. Não é preciso que outros estejam
presentes, materialmente distintos de nós, porque sempre levamos conosco e em nós
certa quantidade de pessoas que não se confundem. Para confirmar ou recordar uma
lembrança, não são necessários testemunhos no sentido literal da palavra, ou seja,
indivíduos presentes sob uma forma material e sensível.
45

O uso da linguagem está relacionado à concretização de ações tanto individuais


quanto coletivas ou sociais. Conversar é especificamente uma atividade social que é
posta desde que começamos a falar. Segundo Marcuschi (1998), em seu livro Análise
da Conversação, “a conversação é a primeira das formas de interação a que estamos
expostos e provavelmente a única da qual nunca abdicamos pela vida afora” (p.7). O
termo conversação usado nessa citação relaciona-se as variadas formas de interação
verbal que estão presentes em nossa sociedade.
Ainda com Marcuschi (1998) verifica-se que:

É sugestivo, portanto, conceber a conversação como algo mais do que


um simples fenômeno de uso da linguagem em que ativa o código. Ela é
o exercício prático das potencialidades cognitivas do ser humano em
suas relações interpessoais, tornando-se assim um dos melhores testes
para a organização e funcionamento da cognição na complexa atividade
da comunicação humana. Neste contexto a língua é um dos tantos
investimentos, mas não o único, o que permite uma análise de múltiplos
fenômenos em seu entrecruzamento (MARCUSCHI, 1998, p.7).

Ao conversarmos, naturalmente abordamos mais de um assunto, que podem ter


temáticas diferenciadas. O que é importante nessa conversa é que há e sempre haverá
um motivo que impulsiona tal atividade discursiva. Há certa correspondência de
objetivos entre os interlocutores ao constituírem esse texto oral. Essa conversa
espontânea vai se construindo nessa relação a partir dos momentos de intervenção que
são proporcionados pelos interlocutores presentes nessa atividade. Como afirma Koch
(1997, p.116), “nunca se pode prever com exatidão em que sentido o parceiro vai
orientar a sua intervenção”.
Não se pode determinar com exatidão a situação discursiva em que se deu a
proposta inicial de renomeação dos bairros em Natividade/RJ por parte do prefeito
Dermeval Lannes, mas sabemos que a tal situação se deu de forma desorganizada ou
até mesmo aleatória. Tal desorganização pode ser verificada nos relatos que fazem
parte desse trabalho, onde alguns entrevistados até hoje não conseguem entender o
que realmente impulsionou o prefeito Vavá a decretar a renomeação dos bairros. É
claro que os mesmo possuem ideias que nos levam a alguns questionamentos sobre o
ato, mas nenhum com total veracidade, apenas especulações. Naquele momento
existiram contribuições de alguns falantes, até mesmo os que não aceitaram a
46

imposição, mas se mantiveram calados por algum motivo. Sabe-se que o curso dessa
conversa é uma atividade semântica que implica a realização de um processo de
produção de sentidos estruturados e motivados por seus falantes.
A proposta desta pesquisa é também resgatar a memória de moradores de
bairros através da análise das entrevistas realizadas e que também irão compor parte
deste trabalho. Vale ressaltar que as entrevistas estão sendo constituídas por
conversações produzidas em situações naturais, onde não há uma ordenação de
questionamentos por parte do entrevistador, que procurou deixar o entrevistado o mais
livre possível durante as gravações, para que no momento das análises possam-se
fazer as devidas observações.
O processo de levantamento dos dados nesta pesquisa esteve focado na
questão de valor emocional e cultural presentes nos nomes extraoficiais dos sete
bairros analisados. A não aceitação, mesmo que calada da população é algo que
instiga essa pesquisa, ao tentarmos desvelar os motivos que levam a população
natividadense a até os dias de hoje não conseguirem absorver e muito menos aceitar a
proposta de renomeação.
Quando se verificou a possibilidade de analisar junto à população, no caso os
entrevistados selecionados previamente para a coleta dos relatos orais, pode-se
perceber que a construção e constituição dessa pesquisa se daria de forma árdua, já
que as falas coletadas viriam carregadas de subjetividades.
Tal subjetividade causaria transtornos inicialmente, mas já que se trata de uma
pesquisa que se baseia em fundamentos de falantes, ou seja, relatos puramente orais,
sem qualquer transcrição em outro documento, a imparcialidade desses falantes que
daria a “essência” necessária para a construção dessa análise. Sem deixar de lado a
hipótese da religiosidade do povo natividadense, que se vê constrangido em querer
hoje criticar e até mudar os nomes dos bairros novamente, mesmo não aceitando a
negação da cultura popular dos nomes antigos (extraoficiais) por parte da prefeitura
naquele momento de renomeação.
47

3 ANÁLISE DA AMOSTRA: EXPERIÊNCIAS QUE REVELAM

Este capítulo terá a finalidade de verificar junto aos relatos os momentos que
caracterizam a transmissibilidade dessa cultura de não aceitação dos nomes oficiais em
detrimento aos extra-oficiais. Valendo-se algumas vezes da transcrição aqui de tais
relatos, a fim de confirmar algumas hipóteses apresentadas na pesquisa, como por
exemplo, a relação que o prefeito tinha com a igreja Católica naquele período ou a
valorização, mesmo que involuntária, da cultura presente nos nomes antigos dos
bairros, valendo-se sempre da memória individual e/ou coletiva como suporte principal
para construção dessa pesquisa.
Tanto a memória coletiva quanto a individual possui um caráter
mutável/flutuante, pois existem nelas marcos ou pontos que são invariantes e/ou
imutáveis. Esse caráter mutável/flutuante pode ser percebido ao realizar-se uma
entrevista muito longa, como que em nosso caso, vemos que os entrevistados não
conseguem seguir uma ordem cronológica dos fatos. Várias vezes voltam aos mesmos
pontos sem perceberem tal feito, e é essa volta ou repetição que caracteriza essa
invariante nas entrevistas.
Os elementos que constituem essa memória coletiva ou individual podem ter sido
vividos pessoalmente ou pela coletividade à qual a pessoa pertence. Em sua maioria,
esses acontecimentos nem sempre tiveram participação de todos que o lembram, mas
que em seus imaginários, de certa forma, alcançaram alguma relevância na vida dessas
pessoas, que acabaram por internalizar ou apropriarem-se de tais acontecimentos.
Esses acontecimentos vividos pela coletividade podem até mesmo se juntarem
com eventos que não se cruzam num mesmo espaço-tempo da vida de uma pessoa ou
grupo. Eles podem ter acontecido em diferentes épocas e com pessoas distintas umas
das outras, mas que foram assimilados com o passar do tempo pela coletividade.
Para manter o anonimato das pessoas entrevistadas, denominamos aos mesmos
algumas letras para identificá-los, a saber: entrevistado I. A. F., entrevistado A. G. F., e
entrevistado J. M. Assim apresentamos a análise de quatorze entrevistas realizadas
com os moradores de sete bairros mais antigos do município de Natividade/RJ, a fim de
evidenciar de que forma esses moradores se posicionam em relação ao processo de
48

renomeação dos bairros da cidade em estudo, em 1968, bem como sua postura diante
da perpetuação dos antigos nomes na memória de seus moradores.
Nessas entrevistas foram propostas perguntas com uma abordagem qualitativa
capturando a história de vida individual dos moradores de Natividade/RJ, seguindo
também procedimentos nessas entrevistas de caráter aberto cujo procedimento
utilizado nesta pesquisa social visa coletar dados para tentar diagnosticar os possíveis
motivos que levaram os natividadenses entrevistados a rejeitarem os nomes atuais
oficializados pelo poder público.
É natural e aceitável que um fenômeno de projeção ou identificação política,
como no caso de renomeação dos bairros de Natividade/RJ, seja tão forte em certo
momento que poderíamos verificar então uma memória naturalmente herdada.
O ato oficializado de “troca” dos nomes antigos dos bairros de Natividade pelos
de homenagem aos santos, não trouxe descontentamento imediato, e isso pode ser
confirmado nas entrevistas, onde afirmam em vários pontos que nada foi feito pela
população a fim de contrariar o ato oficializado. Ninguém se manifestou publicamente e
menos ainda questionou-se a decisão do legislativo. Mas a rejeição viria com os anos!
Com o tempo a população da época foi demonstrando seu descontentamento ao não
usarem em hipótese alguma os nomes oficiais. Nem mesmo nos documentos
vinculados aos Correios isso era “respeitado”, muitos até mesmo desconheciam a
existência de um outro nome que não fosse o tradicional, e até o dia de hoje
desconhecem.
O que foi observado nas entrevistas realizadas no que diz respeito à memória,
verifica-se a questão da identidade vinculada de alguma maneira. Maurice Halbwachs,
no período de 1920-1930, já atribuía à memória esse caráter de coletividade e social,
ou seja, a memória como um fenômeno construído em conjunto e submetido a
flutuações, transformações e mudanças constantes. O caso de Natividade é prova viva
disso! A população não se manifestou no momento da troca de nomes, mas
silenciosamente e com o passar dos anos foi mostrando sua insatisfação com a atitude
do governo passado, na pessoa do prefeito Vavá. Da maneira mais simples que
poderíamos conceber, a memória foi a grande “vitoriosa” nesse contexto histórico,
quando os moradores que presenciaram e viveram o processo de alguma forma não
49

deram atenção ao ato legal, fazendo valer assim sua cultura popular em preservarem
os nomes antigos dos bairros.
Ao destacarmos essas características da memória, não podemos nos esquecer
também, a fim de relacionarmos aos moradores entrevistados nesta pesquisa, que na
maioria das memórias existem marcos ou pontos relativamente invariantes e imutáveis.
Percebe-se nesses relatos que a ordem cronológica não é necessariamente obedecida,
pois os entrevistados várias vezes voltam aos mesmos acontecimentos, e verifica-se
evidências dessas flutuações nos discursos apresentados, além de um “apego” a certos
períodos ou fatos da vida desses moradores.
O apego que mencionamos aqui está relacionado ao afetivo que o entrevistado
apresenta ao fazer relação aos bairros usados nesta pesquisa. Vale lembrar que os
bairros são os mais antigos de Natividade/RJ, e a relação de afetividade aos mesmos é
notório no que tange a representatividade da cultura popular presente nas narrativas
dos entrevistados.

3.1 Análises das narrativas dos natividadenses.

Desejamos analisar a importância que se dava à questão religiosa em


Natividade, pelo poder público. Há aqui uma inversão: os atos municipais que
analisaremos resultam de motivação religiosa que emana do espaço público, o que é
uma contradição, dada a laicidade do Estado. A hipótese de que a nomeação de bairros
foi fruto de uma motivação religiosa pudesse ter sua fundamentação na religiosidade
popular não pode ser aplicada aqui. O então prefeito Dermeval Lannes Vieira (Vavá),
que decretou essas leis de nomeação, segundo depoimentos de pessoas da época,
apresentava-se como uma pessoa religiosa, ativa na comunidade católica e que
também abria espaço para a participação da igreja na própria prefeitura. Sendo assim,
pode-se também supor que a própria igreja na época tenha sido responsável pela
concretização desses decretos por parte do prefeito, por meio do instrumento de sua
influência. Cabe aqui a análise da situação de comunicação que propiciou o discurso
legal de nomeação de bairros em Natividade.
50

Uma vez que os bairros foram renomeados sem qualquer consulta aos
munícipes, o sentimento de rejeição não apresentado no momento em que o ato se
deu, é visto nas entrevistas através de falas descontentes e entristecidas. Os
entrevistados apresentam grande descontentamento e frustração ao pensarem que o
ato foi uma iniciativa “egoísta”, no qual o prefeito Vavá não manifestou qualquer
preocupação em dar qualquer destaque à tradição que cada bairro de Natividade
apresenta. Essa insatisfação descrita nos relatos pode ser entendida no seguinte trecho
de uma das entrevistas: “... pra se quebrar uma tradição... tem que ter muito apoio da
opinião pública... e no caso desse [referindo-se ao Bairro da Liberdade]... e como de
todos os outros bairros... eu acredito que se ele [prefeito Dermeval Lannes] fizesse uma
consulta... ele não tria mudado... eu acho... porque não é só o nosso Bairro da
Liberdade... tem o Bairro do Sindicato... Bagaceira... mudou por quê?... pra que mudar
se o pessoal continua usando os mesmos nomes antigos?...” (Apêndice B, Entrevistado
A. G. F.).
Interessante aqui é o não entendimento da mudança dos nomes já que os
moradores nunca fizeram uso dos novos nomes, ou os nomes oficializados, como são
descritos. Seria possível afirmar que de certa forma os moradores entrevistados nesta
pesquisa não assumiram no passado qualquer tipo de posicionamento com relação ao
ato de renomeação, e por isso, hoje demonstram certa insatisfação por não terem feito
algo. Foi possível, também, observar que se baseado em uma das hipóteses desta
pesquisa, o ato de renomeação acontecendo nos dias atuais traria um desconforto para
o poder público, pois os moradores defenderiam a ideia de permanência dos nomes
antigos dos bairros.
Segue uma parte de uma das entrevistas para constatarmos que: “... eu acho
que seriam escolhidos os nomes antigos... porque é uma coisa que vem desde o
início... antes mesmo de sermos município... quando Natividade era distrito de
Itaperuna... esses nomes já existiam... então eu acredito que se fizesse agora um
plebiscito eu acredito que o pessoal gostaria que se mantivesse o nome antigo ou o
nome tradicional...” (Apêndice B, Entrevistado A. G. F.).
Por conta da memória afetiva que esses moradores possuem em relação ao
nome antigo dos bairros, acredita-se que o ato de renomeação trouxe desconforto e
51

insatisfação para a população da época, que mesmo se mantendo calada, manifestou


seu descontentamento, de forma natural, é claro, transmitindo a quem fosse a
identificação “original” dos bairros, ou seja, o nome que possui relevância para história
do município.
Outro aspecto evidenciado nas entrevistas foi a questão da religiosidade por
parte do prefeito que propôs a renomeação dos bairros usados nesta pesquisa. Em
questionamentos realizados durante a gravação dos relatos, foi possível verificar a
ligação que o prefeito tinha com relação à religiosidade, dado esse, levantado em uma
das hipóteses desta pesquisa. Em dado momento perguntou-se a um dos entrevistados
se o mesmo teria alguma ideia do que levou o prefeito ‘Vavá’ a realizar tais mudanças
dos nomes. Então, baseado em alguns trechos das entrevistas, verificamos as
seguintes respostas: “... eu acho que ele sempre foi uma pessoa muito religiosa... eu
acredito que seja isso... ele sempre foi muito religioso... sempre participou de tudo na
igreja... então eu acredito que tenha sido isso... essa vontade de homenagear os
santos... talvez... né?... acho também que nem mesmo a igreja ele consultou... acho
que foi uma coisa dele mesmo... não sei... eu não tenho fundamento pra poder afirmar
isso... é minha opinião... acho que ele não consultou a ninguém e nem a igreja... acho
que ele quis mudar... ele era uma pessoa que gostava de fazer as coisas... uma pessoa
dinâmica... então ele pensou em revolucionar isso mudando esses nomes todos... mas
eu acho que foi uma coisa dele mesmo...” (Apêndice B, Entrevistado I. A. F.).
Vale ressaltar que em todo instante o entrevistado I. A. F. procura manter-se
neutro quanto a manifestar sua opinião com relação aos possíveis motivos da
renomeação. Ele e outras pessoas das entrevistas sempre apresentam esse caráter de
neutralidade ao ser questionado quanto à religiosidade do prefeito ‘Vavá’ como força
propulsora para o momento da renomeação.
Interessante numa coleta de dados por meio de entrevistas é quando nos
deparamos com situações conflitivas. Esse conflito pode ser observado ao
compararmos posicionamentos dos entrevistados. Vimos anteriormente que o
entrevistado I. A. F. sabia que o prefeito “Vavá” era religioso, mas que não poderia
afirmar ser a igreja foi a principal responsável pela ideia da mudança de nomes dos
bairros. Mas, em outro relato, o entrevistado J. M. afirma com veemência tal influencia.
52

Segue o trecho: “... quem nomeou esses bairros foi o prefeito Dermeval Lannes com a
anuência da câmara... eles falam que foi ele... ele teve a ideia inicial... mas essa lei que
alterou os nomes dos bairros partiu no executivo e eu posso explicar porque... olha... a
igreja católica na época... ela tinha muita força para eleger ou não um candidato... a
igreja era mais forte em peso aqui em Natividade... por causa de Varre-Sai que é um
povo de origem católica e que antes fazia parte do território de Natividade... O
candidato que saísse com o apoio da igreja... era quase que imbatível... não quer dizer
que já estaria eleito... mas já possuía uma grande possibilidade de se eleger... nesse
caso... o ‘Vavá’ quando deu esses nomes estava pensando numa reeleição... então se
aproximou do padre Moacir ou o padre se aproximou dele e sugeriu a ele que desse
nome a cada bairro de Natividade a Nossa Senhora de Fátima... Lourdes... Aparecida e
das Graças... a ideia inicial partiu do padre Moacir... podem até falar que veio por parte
de algum devoto da igreja... todo líder religioso possui certo prestígio e se aquele
governante for ligado àquele governante e o padre Moacir pediu a ele que desse nome
a esses bairros...” (Apêndice B, Entrevistado J. M.).
É claro que os posicionamentos mesmo sendo diferentes, possuem uma ideia
central, a da participação ou influência da Igreja Católica em idealizar a mudança de
nomes nos bairros. Mesmo não podendo confirmar tal ato, hoje em dia, é nítido que
houve alguma manifestação religiosa naquele instante, pois se sabe que a população
tinha profunda ligação coma igreja. Essa relação é comum em cidades pequenas como
Natividade/RJ, que naquele período tinha o catolicismo como religião quase que
unânime no município. Então, a influência religiosa, se houve mesmo, é claro, seria
quase que natural. O entrevistado J. M. mesmo afirma que o candidato que tinha o
apoio da Igreja, conseguiria com facilidade se eleger. Uma pessoa que viveu o período
de renomeação dos bairros com certeza teria algum fundamento para se expressar
dessa forma, como fez esse entrevistado.
Afirmar com exatidão que a Igreja Católica interferiu de alguma forma na
renomeação dos bairros, seria impossível aqui nesta pesquisa, mas caracterizar a
religiosidade presente nos relatos coletados, isso sim seria viável. Vejamos, por
exemplo, que ao serem questionados sobre uma possível troca de nomes nos bairros,
onde voltaria a vigorar o nome tradicional (antigo), os entrevistados, em sua maioria,
53

discordam ou até mesmo ficam duvidosos se isso seria possível, já que de alguma
forma estariam negando o “princípio” religioso que cada um possui. Lembrando que
todos entrevistados julgam-se católicos, e talvez por isso não desejem que o nome
santo dado aos bairros seja deixado de lado.
A proposta que os mesmos fazem é a de voltar-se com o nome antigo, como por
exemplo, Bairro da Liberdade, e usar o nome santo Nossa Senhora do Rosário como
figura protetora do bairro em questão. O mesmo aconteceria com os demais bairros da
cidade, preservando de alguma forma a tradição cultural e religiosa de Natividade.
Claro que seria algo que causaria certo espanto na população, mesmo porque
muitos dos moradores da cidade desconhecem a tal troca de nomes. Sequer sabem
que seus bairros possuem nomes em homenagem a figuras santas da Igreja Católica, e
talvez por isso fiquem espantadas com o ato de uma nova renomeação.
Culturalmente não acredito que os atuais moradores de Natividade queiram uma
nova alteração de nomes dos bairros, mas creio que desejem que o nome
popularmente conhecido seja o que realmente evidencie essas localidades. Talvez pela
facilidade e comodismo já impregnado nas mentes dos munícipes, ou também pelo
simples desconhecimento da história que moveu todo esse processo.
A fim de verificarmos mais detalhadamente como a tradição dos nomes antigos
dos bairros ainda está impregnada na mentalidade dos moradores de Natividade,
analisaremos alguns trechos da poesia de um habitante deste município, que muito
colaborou com informações preciosas com relação ao processo de renomeação dos
bairros analisados. Segue:
“A Bagaceira antiga de minha infância querida. Humilde gente amiga faz parte
da minha vida. A Liberdade famosa antro de prazer carnal, das messalinas dengosas,
do Todo Azul e o Pombal. Populares Velha e Nova, dos Prefeitos o empenho: disso foi
mais uma prova a Morada do Engenho. O Sindicato obreiro, café beneficiava. Produto
bem brasileiro em larga escala exportava. O lendário Pito Aceso, comunidade
modesta. Se agiganta, é coeso quando se trata de festa. Das construções elegantes. O
Balneário é lazer, variados restaurantes, um convite ao bem-comer”.
As palavras em negrito dizem respeito aos nomes conhecidos pela maioria da
população em Natividade hoje. É interessante observar que o poema, segundo palavras
54

do autor em entrevista cedida, foi escrito a pedido da própria prefeitura do município,


que em celebração ao aniversário do mesmo desejou que o poeta fizesse algo alusivo.
E tal poesia foi distribuída em forma de um livrinho comemorativo para toda população.
É estranho pensar que a própria prefeitura não fez questão alguma de observar que os
nomes dos bairros mencionados na poesia estavam relacionados aos antigos.
É claro que se tratava de um momento de comemoração no município, mas o
processo de renomeação também faz parte dessa história; os nomes em homenagem
aos santos também fazem parte da cultura religiosa da cidade, tanto que os
entrevistados até se interessam por retornar-se ao nome antigo dos bairros, mas que o
nome santo, já instituído, ficasse também em destaque como padroeiro do bairro, ou
coisa parecida. Há ai um apego a questão religiosa também, mas que não nos cabe
julgar aqui.
O entrevistado G. L. R. V. afirma o seguinte para entendermos alguns dos reais
motivos do prefeito em modificar os nomes. Segue trecho: “O Sr. Dermeval era uma
pessoa muito fácil de lidar... muito religioso... acredito que o fato de ele ser muito
religioso influenciou na sua decisão de renomeação dos bairros em Natividade sim...”
Ainda ressalta: “... ele já era visto mesmo como uma pessoa muito religiosa...”
Entrevistado A. B. F. sobre a questão da religiosidade do prefeito, afirma o
seguinte: “... eu acredito que o Vavá, ele não foi pressionado por ninguém, era religioso,
tinha os seus santinhos que entregava os santinhos viam sempre com umas
mensagens bonitas, uns versículos da bíblia e os próprios ofícios que a gente batia na
máquina tinham versículos e mensagens bíblicas... eu acredito que foi uma coisa dele
mesmo... não foi influenciado por nada... ele era muito religioso freqüentava a igreja do
padre Moacir sim... que era a única que predominava no centro da cidade...”.
É fato que o prefeito baseou-se em algo para fazer a renomeação. Seria algo
voltado mais para o lado inspirativo, e não tanto a questão de alguém ter influenciado
diretamente. Outros informantes nessa pesquisa chegam a afirmar que a figura religiosa
do padre foi a propulsora do ato, mas que não poderia ser verificada como verdade
total.
Por fim, apenas para esclarecer como o processo se desencadeou dentro da
prefeitura, segue um trecho, ainda do entrevistado A. B. F. que conclui o seguinte: “... a
55

nomeação com santos ocorreu por ele ser religioso... funcionava assim... o prefeito com
os vereadores se reuniam e votavam, mas já estava determinado... então quando subia
pra câmara já ia só pra votar... ou eles denominavam por ser santo ou eles
denominavam uma pessoa que tinha morrido... mas era determinado pelo prefeito e
com a votação da câmara... existia uma reunião entre o prefeito e os vereadores, mas
para a nomeação dos bairros não precisou necessariamente ter uma votação entre os
vereadores foi uma decisão do prefeito mesmo... era só uma votação pra poder fazer as
placas das ruas... só pra isso... já tinha decidido os nomes e o prefeito precisava de
uma autorização da câmara pra poder fazer as placas... pra tudo que acontece ali o
prefeito precisa do respaldo legal da câmara municipal... não houve votação da
câmara... houve a votação da câmara sim só pra fazer as placas da denominação das
ruas... os bairros foram criados pelas próprias associações... ficava mais fácil lembrar
da Rua Santa Terezinha ou Nossa Senhora de Fátima, então eles preferiram denominar
um conjunto habitacional...”
A população ainda permanece descontente, mas também silenciosa com seus
pensamentos sobre o processo de renomeação. Algumas por desconhecerem o fato, e
outras por mero comodismo e aceitação natural dos fatos.
Sabemos que a memória possui essa capacidade de fazer valer aquilo que é
significativo em nossa mente. Ela guarda e/ou seleciona o que é relevante para a
pessoa. Sua seleção é natural, e não seguem um padrão organizacional.
56

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com esta pesquisa, pôde-se perceber a relevância das narrativas orais no


processo de reconstituição da memória de moradores dos bairros no município de
Natividade/RJ. Os sujeitos entrevistados e os documentos analisados demonstraram
que a história pode ser revista a partir de relatos, que seriam o elemento de
considerável importância na recuperação de informações que subjazem na memória
coletiva e também individual.
História e oralidade, enfim, estão destinadas a uma parceria que envolve
intermináveis e múltiplas possibilidades. A oralidade enquanto forma de expressão será
sempre uma riquíssima fonte para compreender a realidade que a produz, e neste
sentido um campo promissor para a História enquanto disciplina. Ainda como um meio
de representação, a oralidade abre possibilidades únicas àqueles que só com ela
podem contar, como que em nossa pesquisa que se vale somente dos relatos desses
moradores para constituição dos fatos relativos aos bairros em análise nessa pesquisa.
O que de fato pode ser constatado nessa pesquisa no que concerne à motivação
do prefeito Vavá de alterar os nomes dos bairros no município de Natividade foi a
questão religiosa. Verificamos isso claramente nos atuais nomes oficiais dos bairros,
que são em homenagem a alguma figura religiosa da Igreja Católica. A tradição dos
nomes antigos dos bairros não levada em consideração, menos ainda uma consulta foi
feita aos munícipes para saber quais seriam seus posicionamentos. Mas foi essa
tradição que sustentou e sustenta até hoje a memória dos natividadenses, em
permanecerem utilizando os nomes que possuem verdadeira história e significado para
eles.
Não que os nomes oficiais (em homenagem a figuras de santos ou santas) sejam
repudiados pela população, pelo contrário, na verdade eles não são aceitos por não
representarem um significado maior como os antigos e tradicionais, que possuem uma
história de literal para cada nome que receberam anteriormente. Os nomes oficiais são
respeitados apenas por uma questão de religiosidade, mas no que diz respeito a
tradição, seriam os nomes antigos que teriam o verdadeiro valor cultural.
57

Esta pesquisa buscou, de alguma forma, resgatar a memória e tentar reconstruir


um passado, ou mesmo ressarcir uma perda da memória histórica dos nomes
populares dos bairros em Natividade. Seria então a oralidade a forma que escolhemos
para verificar a transmissão desses saberes, principalmente daqueles vinculados a
tradições, como verificamos.
Ecléa Bosi (2004, p.53) revela-nos que “a lembrança é a sobrevivência do
passado”. A lembrança tratada aqui é a do vivido por idosos, em sua maioria.
Lembrança de um passado que está conservado no espírito de cada ser humano, em
nosso caso os entrevistados nessa pesquisa, que têm sua consciência aflorada na
forma de imagens e lembranças dos bairros.
Por fim, o que podemos verificar em Natividade na questão da nomeação dos
bairros foi que o ato imposto pelo poder público naquele momento não foi suficiente o
bastante para conseguir desfazer o que já existia culturalmente na memória dos
moradores. A cada nova geração, essa memória cultural é fortalecida através da
transmissão oral da cultura histórica presente em cada nome popular.
58

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61

APÊNDICES
62

APÊNDICE A - Pequeno histórico de Natividade

Natividade é um município do estado do Rio de Janeiro, situada a uma altitude


de 182 metros e localizada no noroeste fluminense a 365 km da capital, subdivide-se
nos distritos de Ourânia e Bom Jesus do Querendo, com um total de 15.082 habitantes
de acordo com o Censo 2010. Sua colonização teve início na primeira metade
do século XIX por obra de José Lannes Dantas Brandão.
Habitada, inicialmente pelos índios Puris, teve a sua colonização iniciada no
período compreendido entre 1821 e 1831. Os historiadores são unânimes em atribuir o
desbravamento da região a José Lannes Dantas Brandão que, segundo uns autores,
teria pertencido à milícia de D. João VI e, segundo outros, teria sido um desertor da
força policial de Ponte Nova, em Minas gerais.
Segundo os autores que admitem a primeira versão, José Lannes assentou
praça na referida milícia, por volta de 1820 e conquistou, por atos de bravura, dois
meses depois de seu ingresso, o posto de sargento. Apesar de tão prodigioso início,
ficou pouco tempo, devido a um grave incidente ocorrido com um alferes lusitano.
Contam os autores que, em Niterói, onde se encontrava aquartelada parte dessa força,
voltando de estafante serviço, o, então, sargento foi chamado pelo alferes lusitano
Manoel de Souza, recém chegado de Portugal. O alferes conferiu-lhe a vexatória
missão de levar uma carta à namorada. Revoltado, o brioso sargento refutou a
incumbência. Arrebatado pela cólera, o alferes ergueu o rebenque, que trazia, para
fustigar a face do sargento, não conseguindo devido à ligeireza com que se esquivou.
Ao insistir, o alferes teve o chicote arrebatado de suas mãos e o rosto atingido, o que,
acovardado, o fez se refugiar no quartel. Ao perceber a dimensão de seu ato e as
consequências negativas que viriam, o sargento desertou das fileiras e iniciou fuga, em
busca do Rio Paraíba. Tendo chegado ao rio, José Lannes subiu-o até a confluência
com o Rio Muriaé, pelo qual prosseguiu até a primeira morada dos índios Puris, onde,
hoje, localiza-se a Fazenda Conceição. Depois de breve descanso, subiu guiado por
uma escolta dos Puris, pelo Rio Carangola até a “Cachoeira de Tombos”, de onde
voltou, assinalando, em sua passagem, os locais de Natividade e Porciúncula. Algum
tempo depois, estabeleceu-se, na atual, Fazenda São José.
63

Ao consultar o texto do Decreto nº. 1244, de 14 de dezembro de 1861, verifica-se


que a “freguesia” criada pelo Decreto 636 era a de “Nossa Senhora da Natividade”.
Decreto 1244 (texto da época): “Art. 1º. – A freguesia criada pelo Decreto nº. 636, de 23
de agosto de 1853, no território que constituiu o antigo 2º distrito da freguesia de Santo
Antonio de Guarulhos, do município de Campos, terá a invocação de – Nossa Senhora
da Natividade.”
Graças à fertilidade do solo da região, aconteceu considerável desenvolvimento.
Enquanto aconteciam modificações político-administrativas, as lavouras existentes
floresciam, permitindo lucros fabulosos, devido, em parte, ao suor do trabalho negro
escravizado. Com a lei abolicionista, em 1888, a situação de prosperidade sofreu sério
abalo e a economia local sentiu o golpe.
Em 27 de junho de 1890, passada a Proclamação da República, o governo,
desejando amparar e favorecer a vida econômica e social da região expediu o Decreto
nº. 101, com texto (da época) seguinte: “Art. 1º. – Fica criado o Município de Natividade
do Carangola, tendo por sede a povoação do mesmo nome, elevada à categoria de
Villa.” A instalação do município verificou-se no dia 14 de julho de 1890.
Curta foi a sua vida autônoma, pois em 8 de maio de 1891, o governo, por força
de um decreto, extinguiu o município de Natividade do Carangola, anexando o seu
território ao de Itaperuna.
Contudo, a Assembleia Estadual, por força do Artigo 6º. do Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias, promulgado em 20 de junho de 1947 e regulado por efeito
da Lei Estadual nº. 6, de 11 de agosto do mesmo ano, resolveu conceder, novamente,
autonomia político-administrativa, elevando à categoria de município, com território dos
distritos de Natividade do Carangola, Varre-Sai e Ourânia, desmembrados do município
de Itaperuna.
Com o tempo, Natividade do Carangola, passou a se chamar, apenas,
Natividade. Varre-Sai, mais tarde, se emancipou.
Natividade dedicou-se, cada vez mais à pecuária, deixando o café de ser a
cultura mais importante da cidade. A agricultura passou a ser dirigida para o arroz, o
milho e o feijão. Na área cultural, destacou-se a poesia e, principalmente, a arte teatral,
64

surgida em 1879 e tendo um grupo teatral muito ativo e engajado aos movimentos
sociais, inclusive, tendo importante papel no processo de emancipação do município.
Atualmente, a cidade acalenta a vontade de se equipar para atrair fábricas e
estabelecer uma infraestrutura que permita alavancar, de vez, o setor turístico, que se
baseia no turismo religioso (onde se destacam o Santuário das Aparições de Nossa
Senhora e a encenação da Paixão, Morte e Ressurreição de Cristo), no turismo cultural
(onde se destacam o Teatro, a Capoeira, Corais e Músicos) e no turismo rural (onde se
destacam as fazendas centenárias e as cavalgadas).

Marcos Históricos

 1821 - Desbravamento da região - José Lannes Dantas Brandão;


 1849 - Início do povoado - Antônio Lannes Dantas Brandão; e
 1947 - Emancipação político-administrativa - Dr. Sebastião Fausto de Faria.

Brasão de Armas

O Brasão de Armas do município de Natividade foi criado em 24 de agosto de


1964, pelo heraldista Alberto Lima, com base nos subsídios fornecidos por Dr. Renato
Vieira e Iracy do Nascimento e Silva. A criação foi aprovada por Deliberação Municipal
nº. 141, de 4/09/1964. Uma alteração na descrição heráldica do Brasão foi promulgada
pela Lei nº. 02/87, de 15/06/1987.
65

Interpretação do Brasão

 O escudo, português, lembra a origem lusitana de nossa Pátria;


 A estrela, José Lannes Dantas Brandão, o desbravador da região;
 O livro e a pena, a expansão cultural do município;
 As duas máscaras reafirmam a cultura no setor da arte teatral;
 A faixa ondulada, o Rio Carangola;
 O café, riqueza agrícola do passado;
 A flor-de-lis recorda o orago da cidade: Nossa Senhora da Natividade; e
 As datas, o desbravamento da região (1821) e a emancipação político-
administrativa (1947).
66

APÊNDICE B – Transcrição das entrevistas

Entrevistado: I. A. F.
Idade: 67 anos
Nascido em Natividade, onde reside desde então.
Ocupação: Poeta.

Era funcionário do estado... mas cedido à prefeitura de Natividade... em setenta e um


ou setenta e dois se não me engano... o negócio é o seguinte... quem nomeou esses
bairros foi o prefeito Dermeval Lanes com a “anuência” da câmara... eles falam que foi
ele... ele teve a ideia inicial... mas essa lei que alterou os nomes dos bairros... partiu no
executivo e eu posso explicar porque... olha... a igreja católica na época... ela tinha
muita força para eleger ou não um candidato... a igreja era mais forte em peso aqui em
Natividade... por causa de Varre-Sai que é um povo de origem católica e que antes
fazia parte do território de Natividade... o candidato que saísse com o apoio da igreja...
era quase que imbatível... não quer dizer que já estaria eleito... mas já possuía uma
grande possibilidade de se eleger... nesse caso o “Vavá” quando deu esses nomes
estava pensando numa reeleição... então se aproximou do padre Moacir ou o padre se
aproximou dele e sugeriu a ele que desse nome a cada bairro de Natividade a Nossa
Senhora de Fátima... Lourdes... Aparecida e das Graças... a ideia inicial partiu do padre
Moacir... podem até falar que veio por parte de algum devoto da igreja... todo líder
religioso possui um certo prestígio e se aquele governante for ligado aquele governante
e o padre Moacir pediu a ele que desse nome a esses bairros que era Pito aceso...
Bagaceira... Liberdade... centro... balneário estava em construção... estava construindo
o clube... logo depois veio o Balneário... na verdade o Pito aceso ia até o Ford Pneus...
era pequeno... atravessava a ponte do Ary... já se chamava de Pito... onde tem o
estádio Vila Almeida... se chamava rua do campo... tem uma poesia minha que fala de
bairro em versos... mas com essa proposta aprovada pela câmara em setenta e um ou
setenta e dois se não me engano... esses bairros passaram a ter esses nomes oficiais...
mas ninguém nunca fala que mora no bairro Nossa Senhora de tal... só o correio que
sabe disso... pois é ninguém fala... tinha um vereador que já foi contra... não sei se
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votou contra... pois não trabalhava na câmara entrei um ano depois... como
concursado... na função de secretário geral... quando eles me indicam é porque
participei de vários processos de Natividade... e como me interesso pelas coisas da
cidade... eu procuro saber sobre o porquê Bagaceira?... por que Pito aceso?... por que
Areião?... por que Liberdade?... por que Sindicato?... Pito aceso só era o morro...
ladeira são Cristóvão que chamamos hoje... o bairro era Sindicato... tem hoje o “Ganha
Tempo” da prefeitura que foi uma empresa... aquele ali era um departamento dos
beneficiários do café... existia um departamento de vários funcionários... então... pra
facilitar o trabalho dos bairros pra você... pode dividir os bairros como estão divididos...
começa pelo centro... entendeu... do centro que é onde começa... onde começou seis
planejamentos todo povoado brasileiro... toda comunidade brasileira começou quase
que no mesmo jeito... entendeu?... com a proximidade com Minas Gerais temos muitas
características de minas porque logo na frente tem Minas... sofremos influência de
Minas Gerais... então o desbravador é mineiro... José de Lanes e os dois irmãos dele
são mineiros... eram de Ponte Nova... então aqui no centro construiu a casa dele ali
onde é o clube ele construiu uma capelazinha onde tá o CLEN ficava por aqui e foi
esticando... Natividade é um vale não tem onde expandir para os lados vai esticando...
aí começou a surgir... Surgiu a Liberdade... Bagaceira... talvez a Bagaceira primeiro que
a Liberdade porque ele tinha a fazenda do Engenho lá... surgiu o Pito aceso e o
Sindicato e não tinha mais o bairro nenhum... era só isso... resumia nisso e esses
nomes foram dados de acordo com a situação... hoje por exemplo tem mais bairros... o
que era apenas uma rua virou bairros... isso acontece normalmente tinha a rua Vinhosa
ficou o bairro Vinhosa... isso acontece normalmente entendeu?... um fato que acontece
em todas as localidades... cria uma rua aí ela cresce e cria os bairros... o Pito aceso
que era um morrinho... uma ladeira... tinha esse local de beneficiar café e esse local
tinha um departamento... um local mesmo de beneficiários... tinha o sindicato... bairro
Sindicato... mas o Pito está separado... Pito ou Sindicato... eles se entrelaçam... aí você
vai perguntar... por quê?... tem uma versão né?... pode alguém ter outro... vamos
começar pelo Pito... o Pito aceso segundo consta um morador antigo que por
coincidência esse morador era meu avô... na primeira metade... bem no início do século
vinte... talvez em mil novecentos e quinze... dezesseis e vinte... a primeira metade do
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século vinte... ele morava ali nesse morro que era cheio de zonas de café... do lado do
barranco... ele morava num rancho daqueles... toda cidade não existia luz elétrica e
nem nada e como não tinha outra diversão o pessoal fazia o batuque... tinha o
barulho... outras pessoas iam tocar cavaquinho ou qualquer tipo de instrumento e eles
dançavam... concentrava muito negro ali no Pito... isso é uma característica de ser
muito povoado ainda mais morro de gente pobre... mas você pode observar que dá
muita gente da raça negra e o Pito não fugia a regra... esse pessoal tinha uma
matriarca que se chamava Generosa... era mãe... tia ou conhecida desse rapaz que
toda tarde depois do serviço ia fazer um batuque e meu avô já não era tão novinho
mais ficou aporrinhado com aquilo e certo dia fez um comentário com alguém “esse
morro aqui é muito bom... mas isso aqui é um pito... e um pito aceso e a desgraça
desse pito é o bororó da Generosa”... ele deu o nome do batuque de Bororó... o Bororó
da Generosa... o filho... sobrinho ou neto dessa senhora que era uma matriarca negra
se reunia no fina de tarde para fazer um batuque que esse senhor Venâncio Alves de
Farias deu o nome de Bororó e que era um Pito aceso... pito cachimbo e a desgraça do
pito era o Bororó... essa é minha visão... o Sindicato que é entrelaçado com o Pito...
esse departamento de café que tinha ali para beneficiar o café criou o Sindicato e ficou
o nome de Sindicato... deu pra sacar?... isso é a minha versão do Sindicato... Bagaceira
é a mais simples... o Engenho era a fazenda e o bagaço da cana jogava naquele lugar
ali... no local que criou as casinhas ali... Bagaceira... um depósito de bagaço... nome
desse lugar veio do bagaço de cana moída na fazenda do Engenho... a razão de serem
jogadas ali ninguém sabe... não era muito comum ter gado naquela época... a cultura
era o café... a mola compulsória do lugar era a lavoura... essa é a razão do nome
Bagaceira... e a Liberdade eu procurei saber por que ninguém me informou... difícil
você chegar a uma conclusão do nome do bairro Liberdade... aquela rua margem do rio
era um local de baixo meretrício e muitos e muitos anos funcionou lá uma zona de
prostituição que chamava de Liberdade... não sei se alguém ainda chama esse local de
casas de liberdade... essa é a razão... lá tinha esse local que ficava as prostitutas... não
era motel... elas moravam lá mesmo... eram mulheres excluídas da sociedade que com
desvio de conduta a família não aceitava... porque a sociedade não aceitava... na cada
de patroa muito raramente porque as patroas tinham medo por seus maridos e filhos...
69

na época era rígido... que não era bairro... mas que passou a ser bairro... Areião... era
por causa da quantidade de areia que existia naquele morro... descia e vinha pro
centro... descia muita areia daquele lugar ali... era chamada Rua do Areião... hoje eles
falam da rua que virou bairro... apesar de ser um bairro bem localizado no centro... ele
virou bairro... então... os bairros novos vai virar história porque hoje tem a Morada do
Engenho por causa da Fazenda do Engenho... tem a Popular Nova ao lado do
Engenho... porque Popular Nova?... porque tinha as casas da outra ponta... Popular
Velha porque era Popular... isso aqui quando foi criado era chamado de Conjunto
Habitacional ( ) Centenário... por quê?... porque ele foi concluído em mil novecentos
e setenta e dois... foi o ano do ( ) ... da independência do Brasil... mas ninguém
nunca falou isso... só falava popular... o Vavá também influenciado já no outro mandato
dele... o segundo mandato... nomeou de bairro São Luíz Gonzaga... oficialmente esse é
o nome... mas você vai ver na placa Conjunto Habitacional ( )... popular velha... era
só popular porque não tinha a nova... então quando construíram as novas casas
populares aqui ficou como popular velha... uns chegam correspondência como popular
velha e outras como São Luíz Gonzaga... mas nunca como conjunto habitacional ( )
... é totalmente desconhecido e a popular nova chama-se Santa Terezinha e tem o
Morro da Formiga que também era conjunto habitacional feito direcionado ao povo da
prefeitura... lá tinha um campo de futebol que era Campo da Formiga... Morro dos
Cabritos... que chama Morro São Pedro... não tem nada de Oscar Brito... ele não
existia... é uma versão totalmente sem fundamento... lá no morro ficavam cabritos
mesmo... tinha uns cabritinhos... alguma coisa... o prefeito Altair Alves... pai do Murilo
quis construir casas naquele morro lá... lá no morro que foi feito para cabrito... as
pessoas começaram a desdenhar porque o morro era bem íngreme... em mil
novecentos e sessenta e três... portanto há quarenta e oito anos atrás... ele foi eleito no
dia três de outubro de mil novecentos e sessenta e dois... quando foi em sessenta e
três ele cortou o morro para doar as casas pra alguém construir e surgiu o Morro dos
Cabritos... não tem nada de Oscar Brito... e foi o Vavá que deu o nome de Morro São
Pedro... não é novidade não... aqui em Natividade que ficou muito concentrado isso... a
formação do povo brasileiro é católica... todas as cidades do Brasil tem nome de
santo... São Salvador dos Campos dos Goytacazes... São José do Hawaí em
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Itaperuna... São Sebastião do Rio de Janeiro... São Pedro da Aldeia... Santa Maria
Madalena... a influência que veio dos desbravadores... tenho um projeto em mente que
iria ajudar nas escolas... ruas e bairros e tentar convencer ao legislativo a oficializar os
bairros antigos... não desrespeitando a fé de ninguém... mas deixar assim... como
patrono do bairro do Pito acesso Nossa Senhora de Fátima... como patrona do bairro
Bagaceira... Nossa Senhora Aparecida... deixava o morro São Pedro... mas Bagaceira...
Liberdade... Areião... deixava como patrono... isso é algo que tenho em mente pra
fazer... pra evitar e não tirar... é preciso que alguém sugere... por exemplo Cantinho do
Fiorello... não tem nome de santo e se colocar nome de santo não vai pegar... se
pudesse alterar faria sim sem comunicar... porque tem que sentir o clima que aí você
sabe o que o povo quer... existe uma complicação para alterar nome de rua... você
ouviu falar que o Senhor Mauro Alves Ribeiro era um homem de valor... importante...
com uma visão ampla... empresário muito bem sucedido... quando Mauro morreu... em
agosto de mil novecentos e oitenta e quatro... estava ainda o pessoal vivendo o trauma
da vida dele... foi sugerido que mudasse a avenida Amaral Peixoto por Avenida Mauro
Alves Ribeiro Júnior... o pessoal criou o maior problema... a pessoa pode não ter
conhecido... mas se mudar a pessoa vai criar problema... mas nessa questão do bairro
não... não precisa consulta vai oficializar o que já é sem magoar a outra parte... não se
deve brincar de fazer lei... tem que fazer e pronto... se alguém quiser que mude
depois... no momento da mudança não causou nada em ninguém porque foi entre
quatro paredes... não houve nenhum tipo de movimento... a população não teve acesso
a nada...

Entrevistado: A. G. F.
Idade: 76 anos
Nascida em Natividade, onde reside desde então.
Ofício: Poetisa e professora em Natividade.

O Bairro da Liberdade que tem esse nome ou tinha... ou tem... nem sei agora... toda
vida foi conhecido como Bairro da Liberdade... depois o prefeito resolveu trocar os
nomes... mas ninguém usa o nome novo... por quê? Porque Liberdade é um bairro
71

tradicional... né?... esse nome vem desde o começo da cidade... então troca sem fazer
uma pesquisa... sem nada... que o povo não aceita... não usa o nome... não é que a
gente tenha alguma coisa contra o novo nome... a gente tem contra a mudar uma coisa
tradicional... o Bairro da Liberdade... dizem os antigos que tem esse nome porque aqui
sem pré houve muita “liberdade” aqui nesse bairro... sabe?... dizem que o nome vem
daí... cada qual tem a sua história... acho que essa tal “liberdade” era a vida fácil de
antigamente... mas atualmente eu não penso assim... acho que importante é o sentido
nato da palavra... a palavra liberdade mesmo que diz o direito que cada um tem de ir e
vir... eu acredito que seja a liberdade que caracteriza o bairro... e o nome atual é Nossa
Senhora do Rosário... nome que o prefeito colocou. eu não tenho nada contra o nome...
só acho que poderia colocar o nome de Nossa Senhora do Rosário como padroeira do
bairro... uma vez que temos até a Praça do Rosário ali já... né?... ai seria o nome de
Nossa Senhora do Rosário como padroeira do bairro e junto o nome mesmo do bairro
como Liberdade... eu acredito que o novo nome não pegou mesmo e a prova disso é
que ninguém usa o novo nome... se ele tivesse feito um plebiscito ou coisa assim... com
certeza o povo pediria para continuar o nome Bairro da Liberdade... assim como em
outros bairros também... mas ele não fez isso... ele colocou o nome e alterou o nome de
todos os bairros... sem fazer consulta pública... que eu acho que seria o necessário
para mudar uma coisa. eu penso que para se quebrar uma tradição tem que ter muito
apoio da opinião pública... e no nosso caso... eu acredito que ele fizesse uma consulta..
ele não teria mudado... eu acho... porque não é só o nosso bairro que aconteceu isso...
tem o Bairro do Sindicato... o Bairro da Bagaceira... e eu penso... mudou porque?...
porque mudar se o pessoal continua usando os mesmos nomes antigos?... acho que o
prefeito sempre foi uma pessoa muito religiosa... ele sempre foi muito religioso...
sempre participou de tudo na igreja católica... então eu acredito que tenha sido essa a
razão dele mudar os nomes dos bairros... e talvez também... ele quisesse homenagear
os santos... eu acho... acredito também que nem mesmo a igreja ele consultou para
mudar os nomes... foi uma coisa dele mesmo. não sei ao certo... não tenho fundamento
para poder afirmar isso... é só minha opinião... acho que ele não consultou a ninguém e
nem mesmo a igreja... ele decidiu mudar e pronto... ele era uma pessoa que gostava de
fazer as coisas... uma pessoa dinâmica... então ele pensou em revolucionar isso
72

mudando esses nomes todos... mas eu acho que foi uma coisa dele mesmo... acho que
seriam escolhidos os nomes antigos porque é uma que vêm desde o início... antes
mesmo de sermos município... quando Natividade era distrito de Itaperuna... ai esses
nomes já existiam... então eu acredito que se fizesse agora um plebiscito e eu acredito
que o pessoal gostaria que mantivesse o nome antigo... o nome tradicional... eu
acredito que toda população deve cultivar esse mesmo pensamento meu de manter a
tradição... então no caso se fosse feita uma consulta popular... eu acredito que todo
mundo votaria no nome antigo... acho que é involuntariamente que as pessoas ainda
usam os nomes antigos... não é por causa de quererem valorizar a cultura não... eu
acho que as pessoas nem pensam no novo nome... quando se fala o nome do Bairro da
Liberdade... por exemplo... ninguém pensa que ele se chama Nossa Senhora do
Rosário... é Bairro da Liberdade pra todo mundo... velhos... rapazes e crianças... acho
que uma tradição não pode ser quebrada... é como eu digo sempre... “o povo que não
cultiva uma tradição é um povo que perdeu a noção do seu próprio destino”... eu já li
isso em algum lugar quando fiz um encontro em cultural em Niterói... talvez... ai lá
alguém falou isso e eu achei interessante... e é mesmo... eu sou muito presa a essas
coisas antigas... eu gosto muito de coisa do passado... eu gosto muito do folclore...
nosso folclore é pobre e nós temos que procurar cultivar aquele que a gente tem... e
acho que esses nomes dos bairros se encaixam nesse folclore e nessa tradição...

Entrevistado: J. M.
Idade: 72 anos
Nascido em Natividade, onde reside desde então.

Acho que não lembro muita coisa não da história... minha cabeça não anda muito boa
mais... o que eu sei é que a Bagaceira era um local de cana-de-açúcar da Fazenda do
Engenho... onde hoje fica a Vila Cunha... O dono da fazenda era o doutor Tancredo
Lopes e o senhor Lannes Dantas Brandão... eu lembro que na Liberdade havia
rivalidade entre os meninos de um bairro com os do outro, e tinha um senhor na
Bagaceira que ensinava luta para defesa... Átila Ribeiro... irmão de Olímpio também da
Bagaceira... no centro havia divisão de ruas para pobres e negros e do outro lado a
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classe abastada... eu me lembro disso... acho que já sou velho sabe, mas tinha também
o baile das moreninhas que era na parte de cima do cinema para os pobres e negros
assistirem e a outra parte no Clube Lítero Esportivo... ao lado da casa do doutor Walter
Leite Novaes... médico que atendia as pessoas indo às residências a cavalo... eu
lembro também que no Morro do Areião a família antiga que morava lá era do Pedro
Americano... avô do Brasilino Americano do INSS... quando o Vavá trocou os nomes
dos bairros eu não vi o pessoal achando ruim não... ninguém comentou nada na hora...
ele foi lá e mudou... mas também não perguntou quem iria gostar ou não... eu não
comentei nada porque para mim tava tudo na mesma... eu já conhecia os nomes
antigos mesmo e o nome de santo lá não iria pegar mesmo... eu acho que ninguém usa
mesmo esse nome de santo não né... eu acho... eu nunca vi não... o Vavá era uma
pessoa boa, tratava a gente bem na rua e ele era muito católico... ia na igreja...
ajudava... que lembre né?... e o povo católico gostava dele porque ele ajudava a igreja
nas festas... na construção... essas coisas né?... mas eu acho que ele não deveria ter
mudado os nomes dos bairros não... sabe... foi bobeira dele... ninguém usa mesmo
isso... então deixa o nome mesmo que a gente sabe... cada um tem sua história
mesmo... é o que eu acho...

Entrevistado: G. L. R. V.
Idade: 53 anos
Era Agente Administrativo quando os bairros foram renomeados.

O Sr. Demerval era uma pessoa muito fácil de lidar... muito religioso ... acredito que o
fato de ele ser muito religioso influenciou na sua decisão de renomeação dos bairros
em Natividade sim... não acredito que o motivo de hoje poucas pessoas conhecerem os
verdadeiros nomes do bairros da cidade se dá pelo fato que na época da nomeação
dos mesmos não tenha sido passado a população essa mudança... acho que o povo
não entendeu né... ele já era visto mesmo como uma pessoa muito religiosa... mas aqui
em Natividade as pessoas já estavam acostumadas com os outros nomes... pra você vê
ali perto do Padrão, qual é a referência ali?... era conhecido como ponte do “Seu Ari”
porque ele tinha um posto de gasolina ali... você vê aqui nesse bairro aqui da
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Liberdade... ninguém falava bairro da Liberdade... todo mundo conhecia como ponte do
“Seu Joel” porque ele tinha um posto de gasolina ali... Morro da Formiga, ele colocou
um nome no bairro ali, tem nome de santo também... acho q é Santa Rita de Cássia...
pessoal só conhecia como Morro da Formiga... a Rua do Campo ali, o bairro chama Vila
Almeida, mas todo mundo conhece como Rua do Campo porque? Por causa do campo
do Nac... então o pessoal vai mais assim pelo costume... pelo nome fantasia... lá no
Pito por exemplo, o bairro é conhecido como bairro do Pito... Ali é Ladeira São
Cristóvão, conhecido como bairro do Pito, se fala Ladeira São Cristóvão ninguém
sabe... Morro São Pedro, conhecido como Morro dos Cabritos... ele divulgou, mas fica
na memória do povo né... o povo acostumou... igualzinho o apelido... você tem seu
nome, mas a pessoa trata você com o apelido... aí várias pessoas não vão conhecer
pelo nome, somente pelo apelido... então eu creio que é por aí... você vai faz um bairro
bonito, coloca um nome bonito, e o pessoal só vai conhecer pelo nome que está
acostumado ouvir dos mais antigos de lá... não me recordo se aqui na prefeitura
alguém foi contra... mas eu creio que sim... talvez alguém fez crítica, porque houve a
troca dos nomes e as pessoas estavam acostumadas com os nomes antigos, mas eu
não tenho lembranças se alguém foi contra a troca dos nomes não.

Entrevistado: A. B. F.
Idade: 53 anos
Aposentada
Era Chefe de gabinete e Secretária quando os bairros foram renomeados.

Demerval Lanes Vieira (Vavá) era uma pessoa íntegra... uma pessoa que era mais dos
pobres mesmo... ele gostava disso aqui... inclusive tem na história que quem desbravou
era um dos parentes do Demerval... então ele amava isso aqui... era um político nato...
ele já acordava fazendo como se fosse prefeito dentro de casa mesmo como já dizia a
dona Zenir (esposa)... ele... eu acredito que o Vavá, ele não foi pressionado por
ninguém, era religioso, tinha os seus santinhos que entregava os santinhos viam
sempre com umas mensagens bonitas, uns versículos da bíblia e os próprios ofícios
que a gente batia na máquina tinha versículos e mensagens bíblicas... eu acredito que
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foi uma coisa dele mesmo... não foi influenciado por nada... ele era muito religioso
freqüentava a igreja do padre Moacir sim... que era a única que predominava no centro
da cidade... no centro da cidade existia a igreja do padre Moacir, num era a igreja
católica... então não é que ele influenciou... é que ele nos próprios folhetinhos dele já
distribuía seus santinhos... fazia aquelas coisinhas de campanha dele... é tanto que
todos falam...vou entregar santinho... agora não é aqueles santinhos de verdade é a
foto do candidato... ele dava o santinho e dava o retrato, atrás do retrato às vezes tinha
mensagem ou era calendário pro ano inteiro... a nomeação com santos ocorreu por ele
ser religioso... funcionava assim... o prefeito com os vereadores se reuniam e votavam,
mas já estava determinado... então quando subia pra câmara já ia só pra votar... ou
eles denominavam por ser santo ou eles denominavam uma pessoa que tinha
morrido... mas era determinado pelo prefeito e com a votação da câmara... existia uma
reunião entre o prefeito e os vereadores, mas para a nomeação dos bairros não
precisou necessariamente ter uma votação entre os vereadores foi uma decisão do
prefeito mesmo... era só uma votação pra poder fazer as placas das ruas... só pra
isso... já tinha decidido os nomes e o prefeito precisava de uma autorização da câmara
pra poder fazer as placas... pra tudo que acontece ali o prefeito precisa do respaldo
legal da câmara municipal... não houve votação da câmara... houve a votação da
câmara sim só pra fazer as placas da denominação das ruas... os bairros foram criados
pelas próprias associações... ficava mais fácil lembrar da Rua Santa Terezinha ou
Nossa Senhora de Fátima, então eles preferiram denominar um conjunto habitacional...
não tinha bairro aí falava a essa rua aqui vamos chamar ela de Sindicato... essa aqui
fizeram umas populares novas aqui, onde? Num tem a placa no lugar aí ficava vamos
chamar de Popular Nova? Aí colocava Popular Velha, Popular Nova, Liberdade,
Areião... mas foi tudo porque não lembravam ou não tinham acesso a placa... é muito
difícil você sair daqui até lá... você ta vendo alguma placa daqui até lá até hoje? Nós
estamos em 2012... então eu acho que eles pecam nessa porque se tivesse mais
propagação... se tivesse tipo assim em cada curva... em cada encontro da curva tivesse
vocês estão indo pra rua tal transversal a fulano de tal... porque tem gente que passa
aqui e não sabe que rua que eu estou morando... sabe que é Popular Nova, mas não
sabe que é rua Abel Jacinto da Fonseca... as vezes fala Morada do Engenho... ah você
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mora na Morada do Engenho... Entendeu? Fica até hoje isso, mas a culpa é do
executivo, de passar pra população... eles precisam do apoio só pra denominar as ruas,
mas eles não dependem do povo para denominar os bairros... não é necessário que o
prefeito tivesse comunicado a população antes de ter tomado a decisão da nomeação
dos bairros... nenhum prefeito precisa, já imaginou se fosse no Rio de Janeiro? Eles
não saem do gabinete deles pra perguntar outras pessoas, simplesmente colocam na
cabeça, eles que criam e a câmara autoriza, quando chega lá em cima já está votado é
só assinar... que eu lembre teve sim uma votação na época do Murilo Alves Ribeiro teve
um plebiscito porque houve muita confusão quando ele queria acabar com a divisória
das ruas, que era a rua dos pobres e a rua dos ricos, então ele fez uma votação existe
um livro, existem muitas assinaturas inclusive eu assinei, esse livre ficou no BANERJ e
todo mundo que passava via uma maquete, porque todo mundo falou demais que não
ia ficar bonito, que ele não deveria mexer na estrutura, como foi agora do jardim com o
Taninho que fez a maquete, só que o Taninho colocou um outdoor, teve votação na
câmara, teve votação do projeto, teve dois projetos, eles votavam qual ficaria melhor e
ficava centralizado... esse plebiscito do Murilo que foi uma ótima coisa que ele fez... o
Murilo nunca quis mudar o nome da praça... o popular prevaleceu, porque o que te falei,
por incoerência, por falta de interesse não do prefeito, mas tem vários secretários ali o
secretário de obras de administração, eles poderiam fazer uma divulgação e placas
para a população... isso...conjunto habitacional...Tubiacanga foi por causa da novela...e
caiu na boca do povo vira lei...então não sobressaiu, sobressaiu mais o que o bairro
determinava o que eles achavam mais fácil de decorar, os próprios carteiros eles tem
anotados assim o nome dos bairros, eu acredito que você pode digitar o nome correto
nos documentos, mas na hora de falar você vai falar... ah vou no bairro da Liberdade...
não tem jeito o que vai prevalecer sempre é o que o povo determina... então os
prefeitos não sei...deveriam interagir mais com as pessoas.
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ANEXOS
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ANEXO A – Formulário de autorização de uso de imagens e/ou entrevistas

AUTORIZAÇÃO DE USO DE IMAGENS E/OU ENTREVISTAS

Autorizo a Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro a utilizar,


sem ônus e a qualquer tempo, as imagens e/ou entrevistas realizadas na pesquisa
“MEMÓRIA E HISTÓRIA ORAL: NOMEAÇÃO DE BAIRROS EM NATIVIDADE/RJ”,
objetivando divulgação no meio científico e educacional no âmbito internacional.

Natividade, ___ de _____________ de 2012.

_____________________________________
Assinatura

Nome completo: __________________________________________________


Endereço: _______________________________________________________
Identidade: ______________________________________________________
CPF: ________________________________________ Tel: _______________
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ANEXO B – Mapa para localização de Natividade no Norte-Noroeste Fluminense

Fonte: <http://www.ferias.tur.br/fotos/6985/natividade-rj.html>. Acesso em: 19 jan. 2012.


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ANEXO C – Poema

Natividade

Amado torrão de natal! Orgulho e alegria de todos os natividadenses!


Cidade aconchegante, acolhedora, de gente hospitaleira. De braços
sempre abertos para o irmão que chega a todos agasalha no mesmo e
fraternal amplexo-conterrâneos e visitantes.
Para os natividadenses não há nenhum lugar no mundo, por mais belo,
por mais rico, por mais famoso, por mais cantado pelos poetas que seja
que substitua este vale de topografia complicada que, às vezes, dificulta a
expansão da cidade.
Esta topografia é retratada bairro por bairro, nos versos que seguem:

Num longo estreito vale,


deitada a cidadezinha.
Não há outra que a iguale,
é uma só, é sozinha.

Amar esse chão natal


do coração bem lá dentro...
sentimental natural
a começar pelo Centro.

Sua gente ilustrada


constantemente feliz,
pela praça ajardinada
e suntuosa matriz.

O ladeiroso Areião
Com a Encosta do Sol.
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Não importa a estação


é belo seu arrebol.

A Bagaceira antiga
de minha infância querida.
Humilde gente amiga,
faz parte da minha vida.

De apertadas ruelas
estreitando amizades.
Janelas frente janelas,
sincera afetividade.

A Liberdade famosa
antro de prazer carnal,
das messalinas dengosas,
do Todo Azul e o Pombal.

Nada contra tais figuras.


Seriam dignas de pena?
Verdade não eram puras...
e a Maria Madalena?

Foi num passado distante


nenhuma marca deixou
nos atuais habitantes,
pois o que passou, passou.

O destacado Castelo
outrora um bairro pobre.
Transformou-se, ficou belo,
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hoje é um ponto nobre.

Na pequena Avenida
quem mora lá se enfeitiça.
Não sei por nada da vida,
é a sede da justiça.

Também de templo Batista,


com mais de noventa anos...
dos fieis grande conquista,
do fato estão ufanos.

Em Vila Almeida a fama


pelo glorioso NAC
com seu tapete de grama,
a passarela de craques.
Surgiu em seu horizonte
escola da Educação.
De ensinar rica fonte
é o Colégio Padrão

São Pedro não é favela


é até morro maneiro.
Povo de conduta bela,
trabalhador e ordeiro.

Fica o bairro Santa Rita


no topo da escadaria
Pra subir o corpo agita,
no alto só alegria.
83

De gente bem educada


sem ganância desmedida.
Contente pela morada,
vive a vida bem vivida.

Populares Velha e Nova,


dos Prefeitos o empenho:
disso foi mais uma prova
a Morada do Engenho.

O bairro desenvolvido
todo ano se engalana,
por seu parque distinguido,
com a festa da EXFANA.

Entre o monte e o Carangola


Tubiacanga surgiu.
Seu morador nada amola,
nem enchente o atingiu.

Com sua Creche Padrão


o novo Parque Lajinha,
aguardando extensão
seguindo o curso da linha.

Estrada do velho trem


que nessas bandas passava,
num saudoso vai-vem,
pesado, resfolegava.
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O Sindicato obreiro,
café beneficiava.
Produto bem brasileiro
em larga escala exportava.

Dessa fonte de riqueza


só ficou recordação.
Porém, nenhuma tristeza,
teve em troca educação.

Com a ida do Portella,


o colégio pioneiro.
Alunos em marcha bela
da cultura escudeiro.

O lendário Pito Aceso,


comunidade modesta.
Se agiganta, é coeso
quando se trata de festa.

Desde tempo bem distante


com o seu boi pintadinho,
Na frente o preto elegante
“toureiro” Nenê Pretinho.

Das construções elegantes


O Balneário é lazer,
variados restaurantes,
um convite ao bem-comer.
85

Cantinho e Vila da Paz;


Pedro Gomes, bairro novo,
crescendo cada vez mais
na união de seu povo.

Acima os bairros citados


integram nossa cidade,
em resumo aqui cantados
com toda simplicidade.

Alguns deles têm história


pela sua antiguidade.
Para nós é uma glória
Pois tudo é Natividade!

Didi Faria.

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