Sie sind auf Seite 1von 22

IDENTIFICAÇÃO PARTIDÁRIA E COMPORTAMENTO ELEITORAL

Marcello Baquero*

Neste trabalho, examina-se, a natureza das mudanças no cenário internacional e a


influência no fenômeno de declínio partidário no cenário latino-americano e, num segundo
momento, avalia-se as conseqüências desse declínio na forma de se fazer política nessa
região, bem como suas implicações para o processo de consolidação democrática.

A restauração democrática que ocorre no mundo, nas últimas duas décadas, e que
Samuel Huntington denominou da Terceira Onda (1994), propiciou o surgimento de
inúmeros trabalhos com o objetivo de examinar os mecanismos político-institucionais que
possibilitassem a plena consolidação democrática. No caso da América Latina diversos
estudos (Rozenwurcel, 1991; Przeworski, 1994; Kurz, 1992; O`Donell et alli, 1988;
Almeida et alli., 1991) têm apontado para a existência de barreiras econômico-sociais que
geram dúvidas quanto a estabilidade política. É inegável que a relação entre Estado e
sociedade nesses países está em processo de transformação, não há, porém, clareza sobre o
destino dessas mudanças. Uma das esferas na qual o impacto dessas mudanças está claro
diz respeito ao papel dos partidos políticos no cenário dos ano 90. Embora o processo da
democracia como única alternativa de organização política seja consensual, isso não tem
implicado no surgimento de instituições efetivas de intermediação ou representação
política. Pelo contrário, está claro que os partidos políticos se encontram em crise.

Obviamente que a consolidação democrática não depende unicamente da existência


de partidos ou um sistema partidário institucionalizado e forte. O desempenho econômico,
a cultura política, os padrões de desenvolvimento histórico, a intensidade das
desigualdades econômicas e sociais, bem como a dependência externa num contexto de
globalização, são algumas das variáveis relevantes em qualquer análise de construção
democrática.

A ênfase nos partidos políticos, entretanto, torna-se relevante na medida em que


eles se constituem no eixo fundamental da representação política. Ao mesmo tempo,
constata-se que uma parcela significativa do eleitorado seja, cada vez mais, conquistada
por estratégias eleitorais anti-partidos.

* Professor do Programa de Doutorado em Ciência Política da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
e-mail: baquero@vortex.ufrgs.br
2

Historicamente os partidos políticos sempre foram considerados instrumentos


absolutamente essenciais para o funcionamento e manutenção da democracia
representativa. Ao mesmo tempo, eram vistos como o elemento estabilizador das
sociedades em processo de mudanças, e se atribuía a estas organizações o papel de
intermediar a relação entre Estado e sociedade. Entretanto as mudanças na era da chamada
“globalização” tem proporcionando evidências de que os partidos, à semelhança de outras
instituições, estão em processo de transformação. Essas transformações sugerem que a
estabilidade dos sistemas políticos contemporâneos podem exigir muito mais do que a
presença de partidos ou a sua institucionalização.

Richard Rose (1984) tem argumentado que, para compreender o papel dos partidos
no governo deve-se distinguir claramente entre retórica e realidade, na medida em que o
que os partidos dizem não é o que fazem. Essa afirmativa é relevante e atual para a
América Latina, pelo fato dos partidos historicamente terem divorciado a sua prática do
seu discurso, levando a um crescente questionamento sobre sua importância e ao gradual
afastamento, segundo pesquisas de opinião, dos cidadãos, dessas organizações uma vez
que as mesmas, segundo eles, não se constituem em canais efetivos de transmissão de
demandas.

A crise dos partidos políticos tem sido a tônica da última década do século XX
(Rubio, 1995). A história da evolução partidária na América Latina é marcada pelo fato de
que o declínio dos partidos esteve sempre associado a mudanças de regimes, ou seja, ao
seu papel quase inexistente em função de golpes de estado. Quando da existência normal
de partidos observou-se uma luta antropofágica entre eles, o que praticamente significava
sua anulação recíproca (Baquero, 1984). Não existiam preocupações pelas regras do jogo
democrático, na medida em que estilos clientelísticos e elitistas não proporcionavam uma
verdadeira representação da sociedade. Em outros casos, em que pese a aparente força
partidária, do ponto de vista histórico bem como da presença desses partidos na arena
eleitoral, eles não foram capazes de canalizar com eficiência as reivindicações sociais dos
diferentes grupos na sociedade. Finalmente, em alguns casos a polarização ideológica
levou a uma situação de inércia dos partidos, o que em algumas circunstâncias, resultou em
retrocessos institucionais. Embora isso não signifique que a não polarização ideológica
leve a menos conflitos. Na verdade a polarização ideológica na América Latina deve ser
vista como o resultado da prevalência de sistemas políticos extremamente desiguais e
excludentes.
3

Esses fatores foram gradualmente se consolidando, gerando um impacto negativo


na população, levando-os a uma passividade política permanente, bem como a
internalização do que parece ser um sentimento mágico de resignação que permite a
manipulação da opinião pública, via estratégias neo-populistas através dos meios de
comunicação, possibilitando a continuidade de valores tradicionais na política. Isso tem
tornado difícil conciliar apoio genérico quanto a forma da democracia com o fato das
pessoas não acreditarem nas instituições políticas e nos governantes. A crise nos partidos
cria um círculo vicioso onde as reivindicações da população não chegam ao Estado,
criando uma situação onde a própria legitimidade do sistema é colocada dívida (Boudon,
1998). Por outro lado, atualmente chegamos a etapas da anti-política. Tanto os partidos
políticos quanto a classe política estão desprestigiados (Rial, 1998). Num levantamento
feito por Félix Loñ (1998) com representantes significativos da sociedade civil encontrou
que as críticas aos partidos e aos seus dirigentes apontavam para uma preocupação
somente com a reeleição, o envelhecimento de espírito, o charlatanismo dos políticos e os
seu papel de defraudadores na política bem como a impermeabilidade à crítica e controle
dos cidadãos.

Acrescente-se que os partidos na América Latina, desde o início adquiriram o


caráter de instituições formais, porém seu conteúdo não correspondia ao papel que se
supunha eles deveriam desempenhar. Neste contexto, segundo Reyna e Mayer (1989), os
partidos foram muito mais uniões de notáveis. Era difícil portanto, para eles cumprir com
sua função básica, - “a representação face ao Estado dos interesses das classes e grupos
sociais significativos pelo seu número e posição estratégica” (Reyna; Mayer, 1989, p.17).
Com o processo de abertura política que se materializa na década de 70, os partidos
políticos voltam à cena política como organizações sobre as quais se depositam grandes
expectativas. Porém, apesar do ressurgimento dos partidos como atores ativos da
reconstrução democrática, enquanto eixos de articulação política, eles não têm conseguido
cristalizar as expectativas populares depositadas neles.

Pode-se dizer, presentemente que a experiência latino-americana mostra que


transições para a democracia não conduzem necessariamente à consolidação democrática,
entendida num sentido maximalista. Uma das explicações para este fenômeno tem sido
atribuída a ênfase exagerada na influência da tecnologia eleitoral e a mera existência de
instituições formais como sendo suficientes para viabilizar a durabilidade de regimes
democráticos. Visto dessa perspectiva, a democracia reprime uma dimensão mais ampla e
eficaz de participação política. Neste sentido é relevante citar Santos (1985), para quem a
4

crise de participação só poderá ser resolvida se aceitarmos a obsolescência dos sistemas


partidários enquanto oligopólios da oferta de participação. Assim o problema da
representação, segundo o autor, poderá ser resolvido mediante o alargamento do escopo
das formas legítimas de participação.

A manutenção de mecanismos restritivos da participação política,


independentemente da presença de partidos, mantém latentes as ameaças para a
consolidação democrática. Entre essas ameaças podem ser apontadas: a recessão
econômica, os problemas sociais, a violência contra os regimes e a aparente insatisfação
dos militares com as políticas orientadas para sua corporação. Neste último ponto, o
conflito recente no Paraguai entre o Presidente Wasmosi e o general rebelde Oviedo é um
exemplo.

Porém, não é só a imagem dos partidos que está em declínio mas também as
próprias estruturas partidárias. A esse respeito Oscar Fernandez (1994), na sua análise
sobre os partidos políticos na Costa Rica e que tem razoável aplicabilidade ao resto da
América latina, tem argumentado que em relação a erosão das estruturas partidárias dois
aspectos surgem com destaque:

“(1) las oportunidades de ascenso, de incidencia o de beneficio, que


creen percibir o de las que realmente diponen, los múltiples grupos que
constituyen esas constelaciones partidárias y (2) a las dificultades
-aparentemente crecientes- que experimentan las dirigencias partidarias
para definir y hacer realidad una agenda de propósitos y decisiones de
manera relativamente autónoma y sostenida, ya que, tanto las presiones
de los grupos corporativos nacionales como de las agencias externas,
parecen pesar hoy más que ayer en las decisiones políticas más
importantes”. (Fernandez, 1994)
Nesse cenário, as dúvidas ressurgem quanto as possibilidades das recentes
democracias se consolidarem definitivamente. Para alguns autores (Dix, 1992), a sua
viabilidade dependerá substancialmente dos partidos políticos. Segundo Dix, embora
pareça que partidos fortes não sejam necessários para inaugurar a democracia, eles
certamente são necessários para consolidar a longo prazo uma base ampla de um governo
representativo. Bolivar Lamounier (1995) examinando o caso brasileiro, sustenta que
apesar da influência dos meios de comunicação nos processos eleitorais, isso não significa
que estejamos próximos de uma democracia direta, dispensando os partidos políticos.
Enquanto a democracia representativa existir, de acordo com esse autor, os partidos
diferenciados são absolutamente essenciais.
5

Ponto de vista intermediário é postulado por Cavarozzi e Garreton (1989), quando


afirmam que: “não se pode generalizar de que um sistema de partidos fraco leve
necessariamente a crise da democracia e que um sistema de partidos fortes impeça essas
crises ou sua derrubada”. Isto porque na prática política democrática, os partidos são os
principais instrumentos no processo de recrutamento de lideranças políticas, a estruturação
de escolhas partidárias e a elaboração de políticas públicas. Assim, para esses autores, o
futuro democrático, dependerá do crescimento ou do declínio dos partidos políticos
enquanto instituições. Por outro lado, há um consenso de que o sucesso das democracias
nascentes ou renascentes na década de oitenta depende, em grande parte, da capacidade
que tenham estas sociedades de constituir uma nova matriz de relações sociais entre o
Estado, os partidos e a sociedade

Apesar desses argumentos favoráveis aos partidos políticos, parte


significativa da bibliografia que trata do processo de redemocratização desde a década de
70, têm apontado a impotência dos partidos políticos não só na busca, mas também no
processo de consolidação democrática, apesar da importância a eles atribuída, inclusive por
governos com tendência autoritária, que reconheceram a importância da manutenção de
partidos como canais de mediação entre Estado e Sociedade. Essa impotência, ao contrário
de épocas anteriores, estaria levando a um declínio acentuado e permanente dos partidos
como instituições indispensáveis para a democracia no próximo século.

O Declínio dos Partidos

Como foi dito, a pouca eficácia das organizações partidárias tem levado ao
desenvolvimento de estudos que apontam o declínio da importância dos partidos políticos
como únicos representantes dos interesses da sociedade civil. A constatação desse declínio
motivou uma reorientação nos estudos sobre partidos para tentar avaliar se esse declínio
era algo conjuntural ou um processo de estruturação de novas relações políticas entre
Estado e sociedade civil. Um dos estudos mais significativos sobre essa questão é o de Kay
Lawson e Peter H. Merkl (1988). Nessa mesma linha de pensamento para Pogutke e
Scarrow (1996), os acontecimentos na década de 90 em vários países tem levado os
estudiosos de partidos políticos a se ocupar com mais profundidade sobre a origem da
hostilidade em relação aos partidos e instituições políticas. Eles identificam duas
perspectivas teóricas que proporcionam subsídios para compreender a imagem negativa
dos partidos. Por um lado, o sentimento anti-partidário pode ser datado da época de
6

Rousseau e o seu contrato social o qual estipulava que as ações dos políticos deveriam ser
guiados pela noção do bem comum. Já na perspectiva da massa, as atitudes de hostilidade
em relação aos partidos estão baseadas nas chamadas disfunções dos partidos políticos. O
que é importante ressaltar é que as duas perspectivas teóricas não são mutualmente
excludentes e tendem a se alimentar num ciclo vicioso.

Dessa forma, são várias as razões apontadas para o declínio dos partidos, entre as
quais podem ser citadas: (1) o surgimento de novos movimentos sociais; (2) a
institucionalização de grupos de interesses; (3) as predisposições atitudinais por parte dos
cidadãos em não considerar os partidos importantes (4) o desaparecimento do monopólio
da representação política por parte dos partidos e, (5) mais especificamente no caso da
América Latina o monopólio do processo legislativo nas mãos do executivo através de
decretos leis e/ou medidas provisórias. A respeito do último ponto Rial (1998) argumenta
que “a representation política, especialmente la que se ejerce en órganos legislativos há
perdido relevância. Son los poderes ejecutivos los que concentram las decisiones
importantes” e continua ele,

“las formulas de gobierno dominantes otorgam al ejecutivo capacidade


de iniciativa legislativa privada, especialmente en el ámbito financiero
fiscal, o em ciertos casos, poderes de legislación efectiva por decreto, de
modo de poder gobernar. Como contraparte la pérdida de relevancia do
legislador es notoria”. (Rial, 1998, p.36)
Obviamente que sentimentos de anti-partidos não significam necessariamente uma
visão de sua exclusão do cenário político. Para os autores acima mencionados, existem
diferentes níveis de sentimentos anti-partidos. Num ponto extremo, estariam aqueles que
questionam o princípio de que a política exigia partidos políticos como agencias de
intermediação. Numa dimensão mais moderada, estão aqueles que mesmo sendo críticos
dos partidos, os consideram necessários para a democracia contemporânea. E, em ultimo
lugar, estariam aqueles que são críticos intransigentes de partidos específicos, qualificando-
os de ilegais e pedindo sua exclusão do cenário partidário. Por outro lado, Mair (1991)
atribui a crise dos partidos políticos ao fato de eles terem se distanciado de sua base de
apoio. Segundo o autor pode-se dizer que “los partidos en crisis ya no representan sino
sus proprios intereses”.( Mair, 1991, p.10).

Isso tem levado ao fato de que quando os interesses da sociedade civil nào são
agregados pelos partidos, eles são agregados em outras instancias. Esse fenomeno que
poderia ser considerado normal em sociedades materialmente consolidadas cria problemas
7

em países como da América latina na medida em que pode resultar num jogo corporativo
resultando em autoritarismo como temos testemunhado nesses países.

Mais recentemente vários autores que têm introduzido o conceito de sociedade pós-
materialista (Inglehart, 1989; Flanagan e Dalton, 1984; Dalton, 1994), sugerem que, pelo
menos, no contexto das democracias ocidentais, o declínio dos partidos políticos está
associado ao processo de modernização contemporânea e as mudanças nas relações entre
partidos e sociedade. Para esses autores, nos sistemas que têm experimentado a
institucionalização de valores pós-materialistas, a mobilização cognitiva e a ampliação do
repertório de participação política, tanto os partidos quanto as elites partidárias tem sido
desmistificadas. Pesquisas de campo realizadas nesses países sugerem que os cidadãos
acreditam que presentemente os partidos e as elites partidárias pouco ou nada fazem
melhor do que os cidadãos comuns.

Embora essa tendência tenha sido identificada nos Estados Unidos e na Europa,
poucos estudos têm examinado essa questão na América Latina (Dos Santos, 1989). Estão
os partidos latino-americanos também perdendo importância para estruturas corporativas?,
Será que novos movimentos sociais estão tomando o lugar dos partidos tradicionais? Para
responder a estas questões é necessário ter alguma evidência empírica, que atualmente é
precária nesses países.

A precariedade decorre, em parte, das definições conceituais de partido que tem


dominado a área de ciências sociais. A maioria dos cientistas sociais tem definido a
conquista do poder político como sendo a função primária de um partido. Para Robert
Michels (1974), autor da Lei de ferro da oligarquia dos partidos políticos, a essência de
um partido político é o Mechtstreben ou a luta pelo poder. Já para Maurice Duverger
(1979), o essencial num partido é a conquista do poder. Max Weber (1978) também
identifica a aquisição do poder como sendo a função principal de um partido. Para o autor
norte-americano Joseph La Palombara (1974),

“um partido político é uma organização formal cujo propósito primário


e consciente é colocar e manter nos cargos públicos pessoas que
controlarão, sozinhos ou em coalizões, a máquina do governo”. (La
Palombara, 1974, p.85)
Assim a conquista do poder, a qualquer custo tem-se constituído no objetivo
principal dos partidos contemporâneos

Sob esta perspectiva de busca do poder é inegável que existe, atualmente


competição partidária nesses países, entretanto, fica a dúvida a respeito do declínio e
8

importância ou não dos partidos políticos. Lawson e Merkl (1988) avaliam que existe um
relativo consenso de que os partidos perdem sua importância em virtude de não poderem
desempenhar as atividades a eles atribuídas pela sociedade civil . Exemplos dessas funções
seriam a deficiência na estruturação de processos eleitorais, as deficiências na articulação e
agregação de interesses de grupos heterogêneos na sociedade; a incapacidade de organizar
efetivamente o governo e, equívocos na formulação e aplicação de políticas públicas que
tem sacrificado as maiorias. Já para Richard Rose (1984), um partido perde sua
importância quando desaparece e não surge outro para ocupar o seu lugar.

Para alguns cientistas sociais (Selle e Svasand, 1991), não existe declínio dos
partidos, mas simplesmente sua adaptação aos novos tempos. Alan Touraine (1989) no seu
estudo sobre os novos conflitos sociais, referindo-se ao surgimento da sociedade pós-
industrial e mais especificamente ao papel dos partidos políticos, afirma que, dentro do
processo do desaparecimento do sagrado e do tradicional, a forma dos cidadãos
canalizarem suas reivindicações às autoridades competentes tem se alterado
significativamente. No declínio

“do sagrado e da tradição aliada a generalização dos conflitos,


enfraquece progressivamente de maneira espetacular, o papel da
intelligentsia, definida como o conjunto das pessoas instruídas que
servem de mediadoras entre as categorias excluídas do sistema político e
este”. (Touraine, 1989, p.7)
Ponto de vista diferente é postulado por Steel e Tsurutani (1991), o que se observa
presentemente é um retorno às disputas pelo poder baseadas em diferenciações ideológicas,
ao contrário do que ocorria na década de 70 quando se falava na fim da ideologia, baseado
no princípio que o surgimento do pós-industrialismo que levou a um processo de
convergência dos partidos políticos para o centro, caracterizando uma situação que foi
denominada como a era da “despolitização”. A crise econômico-social, nessa perspectiva,
estaria propiciando um retorno de partidos refortalecendo-os.

Contrariamente a esse ponto de vista, a realidade mostra que na perspectiva do


surgimento da sociedade pós-industrial, que se caracteriza pelo desenvolvimento acelerado
das informações e das comunicações, uma das conseqüências tem sido o enfraquecimento
dos atores ou instituições intermediárias tradicionais como os partidos políticos,
introduzindo um redimensionamento dos mecanismos e veículos de representação política.
Para alguns autores (Rial, 1998), a revolução na tecnologia da informação tem deixado
sem sentido boa parte da atividade partidária. A mobilização de recursos via expressão das
9

ruas deixa de ter relevância na política cotidiana, apelando para essa atividade somente em
circunstâncias excepcionais. Outrossim, segundo Touraine,

“embora os movimentos de base e o apelo a espontaneidade tenham


outras causas e por este motivo possam ser fenômenos de curta duração
parecem ser um dos sinais de uma transformação mais duradoura: a re-
aproximação entre a base social de uma ação coletiva e suas formas de
ação ao nível societal. Esta observação não dispensa absolutamente as
formas do sistema político mas indica o declínio do partido mediador”.
(Touraine, 1989, p.8).
No análise do caso francês George Ross (1992) sustenta que o declínio dos partidos
e as mudanças do sistema partidário pode ser explicado pela escola da “clivagem social”,
cujas variáveis causais principais estão localizadas nas estruturas sociais e as definições de
interesse de grupo que deles fluem. Por outro lado, o declínio relativo da classe
trabalhadora francesa, o retraimento das preocupações de classe da cultura política, o
crescimento continuo com etnia e a crescente saliência dos valores pós-materialistas
afetam mudanças básicas nos padrões de clivagem. O autor prossegue enfatizando que a
abordagem funcionalista, também seria aplicável pois salienta mudanças nas tarefas que os
partidos são esperados que desempenhem. A televisão e outros meios de comunicação têm
assumido muitas das tarefas da comunicação política que os partidos tradicionalmente
desenvolviam. Diante disso conclui que o declínio do partido comunista francês deve ser
visto dentro de um sistema complexo de atores conflitantes constrangidos tanto por si
mesmos como das racionalidades estabelecidas dentro da organização.

Beyme (1983), na sua análise sobre a importância ou não dos partidos argumenta
que :

“mesmo se os especialistas com mente analítica descobrissem que os


partidos não tinham muita importância em relação ao resultado político,
somos forçados a aceitar a idéia de que os partidos realmente têm
importância como um mito básico de democracias pluralistas. Isso
funcionaria como um tipo de “lebenstuge” - felizmente, é mais do que
isso”. (Beyme, 1983)
O declínio dos partidos, por outro lado, é explicado pelo surgimento de
movimentos sociais que não acreditam nos canais mediadores tradicionais para transmitir
suas reivindicações. Autores como Leffort (1983) e Offe (1984,1988), argumentam que o
descredito dos partidos justifica a busca de novos espaços de legitimidade para a ação
coletiva, por parte das mobilizações populares levando ao surgimento do que foi
denominado da invenção democrática. Nessa dimensão, os procedimentos tradicionais de
representação política, particularmente os partidos, estão exauridos sendo substituídos por
10

outras modalidades de encaminhamento de suas reivindicações. Segundo Offe (1983), o


sistema partidário perde credibilidade na medida em não proporciona espaços nos quais as
demandas podem ser processadas. Subjacente a essa discussão está a questão que
contrapõe a esfera da representação política vis-á-vis a participação direta. Os movimentos
sociais, nessa perspectiva, são vistos como sendo hostis a tradição da representação
política. Deduz-se, portanto, que as mobilizações populares enfatizem a dimensão
participativa em detrimento da esfera representativa. Desta forma, os partidos deixam de
ser ponto de referencia importante como transmissores de demandas. A perspectiva
autonomista identifica os grupos étnicos e movimentos feministas, entre outros, como
sendo formas alternativas de participação e representação política.

Ainda no campo do declínio dos partidos Kitschelt (1990), na sua análise de


movimentos sociais nas democracias ocidentais e, particularmente, os partidos Libertários
de Esquerda (Left Libertarian) argumenta que,

“contrariamente ao ponto de vista prevalecente dos partidos


tradicionais, os Libertários de Esquerda acreditam que os partidos
políticos são um entre vários atores que deveriam participar do ato de
governar (governing) e na formação das instituições sociais e não ter
uma posição focal dominante” (Kitschelt, 1990, p.180).
Este ponto de vista tem possibilitado que esses partidos modifiquem substancialmente sua
estrutura interna que pouco se assemelha aos partidos tradicionais. O dilema que enfrentam
nesse processo é entre a lógica da competição eleitoral vis-à-vis a lógica da representação
constituinte (constituency representation). Avaliando a situação argentina Mario Grondona
(apud, Loñ, 1998), argumenta que esse pais vive um clima de suspeita que gera um dano
político o qual leva a que os cidadãos desconfiem igualmente de todos os políticos.

No caso brasileiro e aplicável a América Latina, Wanderley G. dos Santos (1985)


aponta para uma tendência crescente de distanciamento entre governo e sociedade política
estruturada. Ao mesmo tempo observa-se um segundo processo que “é constituído pela
multiplicação rápida de novas fontes de geração de identidades coletivas que escapam ao
controle do oligopólio partidário” (Santos, 1985, p.6). Esse distanciamento aumenta pela
crescente particularização e individualização que fragmenta as identidades e lealdades
coletivas aumentando a distancia entre governantes e governados e alimentando o
sentimento anti-partido. De fato, os partidos políticos na América Latina nunca
conseguiram estabelecer um linkage que pudesse resolver o problema da participação. De
acordo com Boudon (1998), a grande maioria dos partidos latino-americanos ou são
personalistas ou clientelistas. Ainda mais, em pesquisa realizada no México, Venezuela e
11

Colômbia, Boudon (1998) encontrou níveis cada vez mais elevados de abstencionismo nas
eleições bem como uma crescente desconfiança nos partidos políticos enquanto
instituições. Segundo o autor

“... y esta crisis de los partidos permite que fenómenos peligrosos como
los ‘outsiders’ aparezcam, y ameaza además com la ingovernabilidade,
ya que no hay la eficacia gubernamental necesaria para mantener la
legitimidad del régimen democrático. Hasta el momento, esto há
sobrevivido, pero en Venezuela ya hemos visto dos intentos ou golpes de
Estado y este año hay habido rumores de outro”.( Boudon, 1998, p.25)
Independente da orientação e posicionamento desses autores, o conceito de
declínio está intimamente ligado ou decorre de uma perspectiva que enfatiza a
desagregação interna dos partidos, bem como os conflitos internos que imobilizam essas
organizações. Conceituado dessa forma, o declínio está relacionado com a estrutura
partidária strictu sensu e não necessariamente com a avaliação que os cidadãos fazem
dessas organizações e a implicação disso para a sobrevivência da democracia. Isto porque
esses autores pressupõem que a definição de democracia se refere a negociações entre
elites, colocando o papel do cidadão em plano secundário. No caso de Colômbia, México e
Venezuela segundo Boudon (op. cit.),

“existe una falta de conexión entre los partidos políticos y los votantes, o
el abandono total de éstos. A confianza en los partidos, por ende, ha
caído a bajo niveles sin precedente, mientras que el abstencionismo ha
ascendido al cielo”. (Boudon, 1998, p.11)
É necessário reconhecer que o monopólio da representação política, por parte dos
partidos, está em processo de modificação, fruto da emergência de uma nova realidade na
qual novas formas de ingerência política e representação estão surgindo, principalmente
por parte das mulheres, dos jovens, enfim dos excluídos da sociedade que estão mais
expostos aos acontecimentos no mundo. Dessa forma é a ação coletiva e a própria política
que estão em questionamento, particularmente a ação coletiva catalisada pelos partidos
políticos, a qual é vista como sendo deficiente e é substituída por ideologias
individualistas, apatias e envolvimento em movimentos fundamentalistas e formas
alternativas de ingerência política .

Na América Latina, a evidência histórica mostra as dificuldades de institucionalizar


partidos fortes e duradouros. Portanto, de maneira geral esses partidos, com poucas
exceções estiveram, na avaliação dos cidadãos sempre no lado negativo. Contrariamente ao
que se observa em outros países, salvo raras exceções, as sociedades latino-americanas têm
um passado de instabilidade política e partidária. Neste contexto, é razoável afirmar que se
12

depender da institucionalização de partidos para viabilizar a democracia estável, a América


Latina está longe de alcançar esse objetivo. Assim, surgem dúvidas quanto aos objetivos da
democratização em relação a ingerência dos cidadãos na coisa pública. Não há clareza se
esse processo tem facilitado o desenvolvimento da participação popular ou tem
obstaculizado essa participação. Assim ao ditado tradicional de que sem paz não há
democracia pode ser acrescentado que sem justiça social não há democracia. Isto é
agravado pelo fato de que tanto em democracias como em sistemas políticos não
democráticos os partidos têm se constituído nos principais pontos de contato entre o Estado
e a Sociedade, monopolizando a representação política. Presentemente, pode-se dizer que
os partidos, salvo raríssimas exceções na América latina (PT, no Brasil), têm abandonado
seu perfil ideológico para tonarem-se máquinas eleitorais. Nessa perspectiva, os partidos
têm se transformado em empresas eleitorais que substituem formas orgânicas de
participação e mobilização ativa dos cidadãos por vínculos mais estreitos com grupos de
interesse e com uma base social mais ampla, criando e fomentando lideranças políticas
pelo contato com a opinião pública através dos meios de comunicação. Como
conseqüência desse processo alteram-se também as formas discursivas dos partidos onde
predomina o estilo pragmático, tecnocrático e instrumental. A política é, nesse sentido,
reduzida e fetichizada a dimensão econômica e consumista.

Dessa forma, ao contrário de autores como Dix (1992) e Mainwaring (1994), que
vêem avanços significativos no processo de institucionalização de partidos utilizando os
critérios de Huntington, na nossa opinião os partidos, mesmo no período de transição
política, não se têm institucionalizado, se se expande o critério de avaliação por parte da
sociedade civil em relação à legitimidade dessas organizações. É evidente que a
insatisfação dos cidadãos face à incapacidade do sistema partidário em canalizar suas
aspirações adequada e eficazmente tem contribuído decisivamente para o crescente
distanciamento do eleitor dos partidos e para a emergência de formas alternativas de
representação política à margem deles.

Assim, por exemplo, utilizando o critério de idade cronológica de partidos, no caso


brasileiro não se pode afirmar que os partidos que surgem em virtude da reforma partidária
de 1979 sejam “novos”, no sentido estrito da palavra. Na verdade são partidos que voltam
a ocupar o espaço que haviam perdido com o golpe de estado de 1964. A antiga UDN se
transformou na ARENA, que por sua vez deu lugar ao PDS e presentemente ao PPB e ao
PFL. Por sua vez, o antigo PTB deu lugar ao MDB, posteriormente ao PMBD e que, em
1979, se desdobrou entre o PMDB e o PDT. De novo mesmo só pode ser considerado o PT.
13

Processo semelhante é observado em outros países da América latina, como é o caso do


Partido Liberal Radical Auténtico (PRLA) no Paraguay (Goíris, 1996). Diante dessa
situação, dificilmente poderia se afirmar que os novos partidos estejam a caminho de se
constituir no elemento fundamental da consolidação democrática.

Por outro lado, se bem é verdade que os velhos caudilhos personalistas têm
desaparecido, não se pode dizer que a política personalista tenha se extinguido. A maior
parte das pesquisas de opinião pública na América Latina mostra que, entre partidos e
pessoas, os eleitores escolhem predominantemente a pessoa do candidato. O Brasil é
ilustrativo dessa situação onde Collor de Mello foi eleito por um partido de pouca
relevância política. No caso argentino, a eleição de Menem é vista como o sucesso de uma
liderança carismática no sentido populista e que foi fortalecida numa época de crise social
e de crise de legitimidade do país (Arias, s/d). No caso da Venezuela, Rafael Caldeira
ganhou a presidência utilizando uma campanha anti-partidos.

O tradicional personalismo tem sido substituído pelo chamado “neo-populismo”.


Essa modalidade de liderança, pode ser argumentado, decorre de uma evolução histórica da
cultura política latino-americana, onde as populações são altamente receptivas a lideres
personalistas e populistas.

A implantação de um regime neoliberal não acabou com a influência do populismo


sobre o comportamento eleitoral dos cidadãos, mas simplesmente adaptou novas
estratégias de capitalizar o apoio das massas via mecanismos de uma época de revolução
tecnológica. Os meios de comunicação e um certo cesarismo eletrônico tem passado a
substituir a antiga reunião política de massas, e têm se constituído no maior instrumento de
influência da opinião pública. Institucionalizou-se a campanha eleitoral eletrônica, onde o
candidato é de fato apresentado como produto no mercado político. Não há evidência
empírica que mostre que houve um crescimento no contingente de cidadãos políticos
críticos e sofisticados. Assim, o populismo na sua versão neo não só se fortaleceu mas
reinstitucionalizou padrões tradicionais de comportamento político-eleitoral. Portanto, não
há contradições entre neo-populismo e neo-liberalismo, pelo contrário estas se
complementam na desestruturação de uma representação política efetiva.

As tendências resultantes dessa forma de se fazer política é claramente conduziva


ao declínio da importância dos partidos. A sociedade inicia um processo de canalização de
suas reivindicações através de atores não políticos ou corporativos, ou simplesmente se
afasta da política. Esse é o caso dos jovens na Argentina onde Rover (apud, Loñ, 1998),
14

constatou que existe na juventude um elevado índice de apatia, sendo que em 1995, 80,0%
dos entrevistados nessa faixa etária se declararam antipartidários, produto da desconfiança
crescente em relação aos partidos.

O caso mais ilustrativo desta situação é o Peru onde para Reves (1996):

“no hay dudas sobre el debilitamiento y la deslocacion del sistema


de partidos vigente a lo largo de los años ochenta: los autollamados
“independentes” o “políticos no tradicionales” se ubican muy lejos
delante de las grandes organizaciones que estructuraban y
representaban las grandes opciones ideológicas de la política peruana”
(Reves , 1996, pp.77-78).
Referindo-se ao impacto da política neoliberal do Presidente Fujimori nas
organizações partidárias o autor argumenta que:

“el ocaso -momentaneo o durable- del sistema de partidos peruanos


tiene mas bien resgos sui generis vinculados a sua impotencia
estratégica frente a la dinámica antiparlamentária impulsada por un
ejecutivo triunfalista e legitimado por las expectativas que depiertan en
la población tanto lasreformas económicas de corte liberal como sus
éxitos en la lucha antiterrorista”. (Reves, 1996, p.78).
Estes argumentos, mantidas as devidas proporções do cenário que se examine têm
uma pertinência significativa, na medida em que mostra a atualidade da necessidade de
recompor o sistema partidário para uma dimensão que resgate uma maior comunicação
com a sociedade civil. A ineficiência dos partidos em conquistar ou reconquistar o campo
das articulações político-representativas, está fortalecendo o distanciamento dos cidadãos
dessas organizações. Outrossim, a incapacidade dos governos em transformar a economia
reduzindo o crescimento econômico, tem gerado um campo propício para o surgimento de
candidatos “salvadores da pátria”, com forte apelo popular e que capitalizam a insatisfação
das massas em detrimento dos partidos políticos.

É evidente que o componente sócio-econômico tem um peso significativo nessa


situação. Apesar de aparentes avanços na dimensão social, baixos índices de
desenvolvimento econômico e sócio-cultural são fatores fundamentais que dificultam a
consolidação democrática a curto prazo. A preocupação permanente dos países latino-
americanos passa a ser não a consolidação democrática mas a sobrevivência desses
sistemas.

Nesse sentido, ressurge com relevância a questão que aborda quais são os requisitos
necessários para viabilizar a democracia na América Latina. As exigências identificadas
décadas atrás continuam sendo relevantes. Ou seja, é necessário para a sobrevivência da
15

democracia uma base material capaz de atenuar as dificuldades econômicas dos cidadãos.
Atualmente está mais do que evidente que as economias de mercado não conseguem
resolver os crônicos problemas sociais destes países, contribuindo para a não
institucionalização da verdadeira competição e representação políticas. Segundo Lipset
(1994), um dos pré-requisitos da democracia é o desenvolvimento econômico de uma
nação “quanto maior o desempenho de uma nação, maiores as possibilidades desta nação
sustentar uma democracia” .

A ausência da pré-condição econômica, entretanto, além de criar um clima


generalizado de insatisfação e indiferença nos aspectos políticos-institucionais, por parte
da população, é deletério para a construção de uma cultura política democrática fundada na
valorização dessa forma de governo, por parte dos cidadãos. Não se pode afirmar que esse
consenso pré-democrático seja permanente e duradouro. Pelo contrário, as pesquisas de
opinião pública revelam uma crescente decepção com a democracia formal ou
procedimental. De fato, para Pzeworsky (1996), a situação atual dos países que enfatizam
as mudanças numa perspectiva neoliberal tem optado por salvar o capitalismo em
detrimento da democracia, particularmente no que diz respeito a destruição da dimensão
representativa.

A perspectiva teórica que estabelece determinados critérios como requisitos para o


fortalecimento da democracia é falha no caso latino-americano. O desafio está em
compatibilizar uma distribuição de renda mais eqüitativa, avanços no processo de
alfabetização, maior informação disponível, com um processo de mobilização dos regimes
atuais que fortaleça a confiança mútua entre Estado e sociedade, formando uma base
normativa de apoio a democracia. Está claro que concepções minimalistas de democracia
não contribuem para alcançar esse objetivo.

A questão sobre quem se beneficia com a democracia é altamente problemática na


América Latina, onde as economias de mercado com orientação neoliberal têm aumentado
a concentração de renda reproduzindo padrões históricos de exploração. As desigualdades
sociais têm aumentado, dando lugar a variáveis novas como é o caso do desemprego
estrutural e o da economia informal, composto por um segmento crescente de cidadãos
vulneráveis a apelos neo-populistas.

As incertezas, decorrentes desse tipo de regime na população, levam ao


desenvolvimento de relações sociais onde o ponto de identificação ou referente político é a
pessoa e não o partido. Os meios de comunicação passam então a ser o veículo que
16

praticamente determina os padrões a serem seguidos pelos cidadãos no campo do


comportamento político eleitoral. Nesse cenário, os partidos políticos têm experimentado
aquilo que se denominou como a sua decomposição, sugerindo que a estabilidade política
pode depender ou não da existência de partidos fortes e duradouros.

Pode-se dizer que, no contexto atual, os partidos políticos passam a ser mais um
entre os inúmeros concorrentes a tentar influenciar o sistema, ao invés de uma ligação
efetiva entre o eleitorado e o governo.

De maneira geral, argumenta-se que faz parte da nova política pós-industrial que os
partidos percam sua importância e passem a se orientar pelos assuntos do dia num contexto
de pega tudo catch all. Segundo Peter Druker (1994), os partidos no próximo século
perderão completamente a sua importância no sistema político.

Por outro lado, a incapacidade dos partidos, quando no poder, em resolver os


principais problemas sociais das sociedades latino-americanas, se agrava pelo fato de que
durante a vigência das medidas de ajuste neoliberais que se orientam no sentido de freiar a
expansão do gasto publico e do credito, afetando diretamente o aumento do desemprego e
a queda do poder aquisitivo da classe média o que, por sua vez, aumenta o numero de
pessoas entrando no mercado informal. Essa situação cria um clima de incerteza e
frustração com as instituições políticas, incidindo diretamente no seu descredito. Pode-se
dizer que o estilo político adotado pelos neoliberais no poder que, praticamente ignoram a
situação das classes menos favorecidas e da classe media particularmente, podem ser
criticas para o desenvolvimento democrático via partidos políticos.

Outrossim, a magnitude da crise tem convertido a economia no eixo em torno do


qual gravitam todos os problemas das sociedades latino-americanas. Esta perspectiva que,
de maneira geral, foi assimilada pelos partidos políticos, os colocou numa posição
vulnerável tornando-os presos aos executivos no poder. A falta de opções a serem
apresentadas ao modelo neoliberal pelos partidos políticos consolida a idéia de que essas
medidas de ajuste são inevitáveis. No processo, como conseqüência das políticas
neoliberais aumenta a debilidade das classes populares que não vêem mais os partidos
como organizações capazes de mediar suas reivindicações. Do ponto de vista da população
o problema não é se uma política de ajuste é ou não inevitável, mas se é inevitável ou não o
custo social gerado por essas medidas. Nesse contexto, a avaliação de quem está no poder,
por parte dos eleitores, passa a ser guiada pelo desempenho administrativo e visibilidade de
realizações. O concreto leva a um pragmatismo eleitoral em detrimento de partidos.
17

Do ponto da vista dos eleitores, o declínio dos partidos políticos, na Europa


Ocidental, tem levado segundo Dalton (1984) ao surgimento de novas modalidades de
comportamento eleitoral, os quais têm substituído os tradicionais pontos de referencia que
catalisavam a identificação partidária. Para Dalton, a ampliação da escolaridade nas
sociedades democráticas avançadas tem levado a uma mudança qualitativa na sofisticação
política das massas. Dessa maneira, as necessidades funcionais para orientar o
comportamento eleitoral, avaliar assuntos de natureza política e mobilizar o envolvimento
político está em declínio para um setor crescente da sociedade.

Na década passada verificou-se um aparente colapso nos alinhamentos partidários


estáveis na maioria dos sistemas políticos ocidentais. O comportamento político
atualmente se caracteriza por elevados índices de volatilidade partidária tanto em nível
individual quanto em nível agregado. Na América Latina este fenômeno continua a ser a
regra. As mudanças entretanto, ocorrem dentro de um contexto de alteração do
comportamento dos cidadãos além dos quadros partidários estabelecidos de campanhas e
de eleições. Níveis de mobilização cognitiva, a semelhança do que ocorre nas chamadas
democracias avançadas, pode estar levando uma parcela dos cidadãos latino-americanos a
ações ou métodos mais diretos de participação política via associações de moradores,
movimentos eclesiais de base, novos movimentos sociais a margem dos partidos.

Mobilização cognitiva é conceitualmente diferente de identificação partidária.


Enquanto a última é representada pela proximidade da identidade partidária dos eleitores, a
mobilização cognitiva implica que o cidadão possui as habilidades e recursos necessários
para se envolver na política sem depender de sinalizações externas ou partidárias.

Segundo Dalton, mobilização cognitiva é mais elevada entre os mais jovens,


embora eles tenham uma experiência limitada com a política e o processo eleitoral. Esse
grupo denominado de apartidários não está vinculado a partidos políticos. No entanto se
envolvem na política. Assim, se a tese da mobilização cognitiva está correta, este grupo
deve possuir as habilidades necessárias para se orientar na política sem depender de rótulos
partidários. São independentes, porém diferentes dos apolíticos. A sua influência,
entretanto, pode ser decisiva em pleitos eleitorais. Deduz-se assim que os membros da
nova classe média provavelmente pertençam a essa categoria analítica.

A participação política e a independência das organizações controladas pelas elites,


pode-se dizer é conseqüência das tendências sócio-econômicas do industrialismo
avançado, levando ao que se convencionou chamar de valores pós-materialistas. Os pós-
18

materialistas estão pouco integrados na quase totalidade dos sistemas democráticos, já que
a maioria os partidos estabelecidos não tem correspondido as suas novas preocupações.

Um número significativo de jovens, a classe média e cidadãos pós-materialistas


estão evitando se afiliar a partidos e estão envolvidos mais diretamente no processo
político como apartidários. Seu comportamento político eleitoral, desse modo, é
influenciado por avaliações pragmáticas e não ideológicas do desempenho administrativo
de quem está no poder.

À Guisa de Conclusão

A análise apresentada neste trabalho, que contrapõe, por um lado, a bibliografia


tradicional que valoriza e considera inquestionável a existência de partidos para a
consolidação democrática e, por outro lado, um número, cada vez crescente de estudos que
questionam a importância e significado dos partidos na política contemporânea, não pode
ser conclusivo. O objetivo é o de apresentar algumas reflexões sobre o impacto de novos
acontecimentos tanto em nível nacional quanto internacional que estão afetando a matriz
tradicional de relações políticas entre Estado e sociedade civil e que estão colocando os
partidos numa posição de pouca importância. Não há, neste trabalho, nenhuma intenção de
sugerir a extinção de partidos, pelo contrário, o pressuposto é o de apontar para a
necessidade de fortalecer os partidos para uma dimensão que estabeleça uma relação de
mediação efetiva entre Estado e cidadãos.

Esta expectativa, entretanto, não pode ser avaliada à margem do que está ocorrendo
concretamente no cenário político contemporâneo que coloca os partidos políticos numa
situação de descredito e falta de credibilidade permanente.

Neste sentido, a América Latina vive, atualmente, no que diz respeito ao processo
de consolidação democrática, uma situação paradoxal. Por um lado, os partidos políticos,
na medida em que constitucionalmente são os únicos veículos através dos quais a política
formal pode ser feita, constituem-se em organizações de singular importância. Ao mesmo
tempo, esse monopólio da representação política os têm levado a uma prática política que
os descaracteriza enquanto interlocutores entre o Estado e a sociedade. Os partidos estão
sendo, salvo raríssimas exceções, desatualizados, reféns de um Presidencialismo imperial,
distantes dos objetivos que legitimam sua existência e presos a práticas políticas
tradicionais como o clientelismo, o fisiologismo, o personalismo e a ignorância das
19

mudanças que estão ocorrendo no campo das atitudes e comportamento eleitoral dos
cidadãos.

Evidência acumulada ao longo do tempo mostra que os partidos não se constituem


atualmente em pontos de referência para orientar o comportamento político-eleitoral. A sua
ineficácia tem reduzido sua credibilidade, estimulando o surgimento de formas alternativas
de participação política. Verifica-se apenas uma aceitação formal dessas organizações, ao
mesmo tempo que os eleitores não lhes atribuem legitimidade, em função de sua atuação
política. Impõe-se, com urgência, um redirecionamento dos partidos a fim de que possam
recuperar o espaço de interlocução entre Estado e sociedade. A indiferença dos partidos
quanto ao seu declínio em importância para os eleitores poderá comprometer, a médio
prazo, as bases já precárias de institucionalidade democrática, agravando a crise de
legitimidade e governabilidade nesses países. O fechamento do Congresso Peruano pelo
Presidente Fujimori, com o apoio maciço da população, deveria ser um alerta para todos os
partidos que se preocupam com a consolidação democrática na América Latina. A situação
se agrava caso se concorda que os partidos não podem ser substituídos. Se eles ainda
cumprem função essencial, a postura de quem se proclama democrático deve ser uma luta
pela reestruturação para desempenhar eficientemente o papel de intermediador entre
Estado e sociedade.
20

BIBLIOGRAFIA

ALMEIDA, H. T. Maria et alli. Capitalismo, democracia y reformas. Flacso: Chile, 1991.

ARIAS, Maria Fernando. Charismatic leadership and the transition to democracy: the rise
of Carlos Saúl Menem in Argentine politics. Texas papers in Latin America. Paper Nº
95-02 s/d.

BAQUERO, Marcello. As eleições municipais de 1992: um novo padrão de


comportamento eleitoral. Textos. Porto Alegre: UFRGS/NUPERGS, 1994.

__________. Reflexões sobre a gênese dos partidos políticos na América Latina:


abordagem histórica. Cadernos de Estudo. Porto Alegre: UFRGS, Abril, 1985.

BOUDON, Lauwerence. Los partidos y la crisis de representación em América Latina: los


casos de Colombia, México e Venezuela. Revista Contribuiciones,. Buenos Aires:
Ciedla No. 157, ano XV, 1998

CAVAROZZI, Marcello e GARRETÓN, Manuel Antonio. Muerte e ressurreccion. Los


Partidos Políticos en el autoritarismo y la transicion del Cone Sur. Chile: FLACSO,
1989.

DALTON, Russell. Cognitive mobilization and partisan dealigment in advanced industrial


democracies. The Journal of Politcs. Vol.46, 1984.

DIX, H. Robert. Democratization and the institutionalization of Latin American political


parties. Comparative Political Studies, vol.24, nº 4, January, 1992:488-511.

DRUCKER, Peter. Sociedade Pós-capitalista. São Paulo: Pioneira, 1993.

DUVEGER, Maurice. Os partidos políticos. Brasília: Editora da UnB, , 1980.

FERNANDEZ, Oscar. Los partidos políticos en Costa Rica: Entre la erosion y el cambio
In: BATAILLON, Gilles (editor) Centroamérica entre democracia y desorganización.
Guatemala: Flacso, Centro de Estudios Mexicanos y Centroamericanos, 1994.

GOÍRIS, Flavio A. A transição político-democrática no Paraguai “1989-1993” . A


trajetória do partido Liberal Radical Auténtico-PLRA. Dissertação de Mestrado em
Ciência Política .Porto Alegre: UFRGS, 1996.

HUNTINGTON, Samuel. A ordem política nas sociedades em mudança. São Paulo:


Editora da Universidade de São Paulo, 1975.

__________. The Third wave:democratization in the late twentieth century. University of


Oklahoma Press, 1993.

KITSCHELT, Herbert. New social movements and the decline os party organization. In:
DALTON J. Russell and KUECHLER, Manfred. Challenging the political order: New
social movements in Western Democracies. New York: Oxford University Press, 1990.

KURZ, Robert. O colapso da modernização: da derrocada do socialismo de caserna à


crise da economia mundial. São Paulo: Paz e Terra. 1992.
21

LAMOUNIER, Bolivar. Crise ou mudança? O futuro da política na Era da Globalização.


Papers. Konrad Adenauer. n.24, 1996.

LA PALOMBARA, Joseph. Political parties and political development. New Jersey:


Princeton University Press, 1972.

LAWSON, Key e MERKEL, H. Peter. When parties fail: Emerging Alternative


Organizations. New Jersey: Princeton University Press., 1988.

LEFORT, Claude. A invenção democrática. Os limites do totalitarismo. São Paulo:


Brasiliense, 1983.

LIPSET, Seymour. The social requisites of democracy revisited: 1993 Presidential Address.
American Sociological Review. Vol. 59 (Feb.1-22), 1994.

MAIR, Peter, ed. The West European Party System. New York: Oxford University Press,
1991.

MAYER, Lorenzo e REYNA, José Luis (Coordenadores). Los sistemas politicos en


America Latina. México: Siglo XXI Editora, 1989.

MICHELS, Robert. Os partidos políticos. Brasília: Editora da UnB, 1984.

O`DONELL, Guillermo, SCHMITTER C. Philippe e WHITEHEAD, Laurence (eds.).


Transições do regime autoritário: América Latina. São Paulo: Vertice, 1988.

OFFE, Claus. Problemas estruturais do Estado Capitalista. Rio de Janeiro: Tempo


Brasileiro, 1984.

__________. Partidos politicos e nuevos movimentos socialses. Madrid: Editorial


Sistemas, 1988.

PRZEWORSKI, Adam. Democracia e mercado: no Leste Europeu e na América Latina.


Rio de janeiro: Relume-Dumará, l994.

__________. Una mejor democracia, una mejor economia. Revista Etcetera. México. No
222

POGUNTKE, Thomas e SCARROW, Susan, E. The politics of anti-party sentiment:


Introduction. European Journal of Political Research,. N.29 April, 1996, pp. 257-262.

REVESZ, Bruno. El ocaso del sistema de partidos en la escena electoral peruana. Revista
Mexicana de Sociologia. Vol.58, N.1 enero-marzo, 1996, pp.77-95.

RIAL, Juan. La representación política en cuestión. Revista Contribuiciones,. Buenos


Aires: Ciedla. No. 157, ano XV, 1998

ROSE, Richard. Do parties make a difference? New Jersey: Chatham House Publishers.
1984

ROSS, George. Party decline and changing party systems. France and the french
communist party. Comparative Politics. 1982.
22

ROZENWDURCEL, Guillermo (comp.) Elecciones y política economica en América


Latina. Buenos Aires: Cedes, 1991.

RUBIO, Ferreira Matilde Delia. A crise dos partidos políticos e a reforma do sistema
eleitoral. Papers. Konrad Adenauer, nº 24. 1966:15-24

SANTOS, Wanderley Guilherme dos. O Século de Michels: Competição Oligopólica,


Lógica Autoritária e Transição na América Latina. Dados, vol. 28, nº 3, 1985.

SELLE, Per E SVASAND, Lars. Membership in party organizations and the problem of
decline of parties. Comparative Political Studies. Vl. 23 N.4, January 1991:459-477

STEEL, Brent e TSURATANI, Do consenso ao disenso: notas sobre os partidos políticos


pós industriais. Texto traduzido. Porto Alegre: Departamento de Letras da UFRGS,
1990.

TOURAINE, Alain. Os novos conflitos sociais: para evitar mal entendidos. Lua Nova. N.
17, Junho de 1989.

WEBER, Max. Economia e sociedad. México: Fondo de Cultura Económica, 1979.

Das könnte Ihnen auch gefallen