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RESUMO
Por muitos anos, durante a colonização portuguesa em nosso país, utilizou-se para
fechamento das aberturas nas residências os balcões de muxarabis, composto por treliças de
madeira dispostos entre si, podendo também permitir sua abertura. Sua principal função
consistia no controle da passagem da luz e do fluxo de ar, permitindo uma temperatura
agradável no interior das residências. Os muxarabis, oriundos da arquitetura islâmica,
promoviam o conforto térmico e luminoso, corrigindo o excesso de luz e garantindo a vista
para o exterior. Entretanto, este artefato arquitetônico viria a ser proibido nas colônias
portuguesas. Neste contexto, este artigo consiste em relatar as possíveis explicações para a
extinção de um componente arquitetônico favorável ás condições climáticas de nosso país,
bem como estabelecer o seu uso na arquitetura contemporânea.
Segundo Gunter Weimer, as contribuições mouras no Brasil se deram não somente por
via indireta, através dos colonos portugueses, mas também pelos próprios africanos islâmicos,
por via direta.
Entretanto, com a vinda da família Real para o Brasil no início do século XIX, os
muxarabis e seus derivantes (gelosias, adufas, urupemas) foram proibidos, sendo decretado a
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sua extinção das casas que a possuíam. O historiador Estevão Pinto, ao descrever um ensaio
sobre as possíveis razões do decreto para o fim dos muxarabis relata que, ainda em fins do
século XVIII, com o Capitão-General D. Tomás de Melo, os abalcoados desapareceram em
função do alinhamento dos calçamentos das ruas tortas. Já no século XIX, com a chegada da
Família Real no Brasil, D. João VI nomeia Paulo Fernandes Viana como Intendente
administrativo, que logo tratou de determinar a extinção dos balcões mouriscos. Segundo
Pinto, as razões para sua extinção estavam no temor de D. João VI pela insegurança que este
artefato trazia à população, visto que, um governador de Recife já havia sido morto vítima de
um disparo de bacamarte, proveniente, talvez, de uma casa de muxarabi, ao qual seria
possível passar um cano de uma arma. Talvez, esta explicação possa ser compreendida
quando Pinto, nos revela o uso deste componente nas edificações medievais para fechamento
de janelas e portas como sistema de defesa.
o sociólogo, os ingleses viam no Recife, um ponto alvo para estabelecer suas relações
comerciais, uma vez que, sua localização tinha acesso facilitado pela proximidade com a
Europa e África e seus ventos favoráveis às embarcações.
Uma linha de navios que parasse no Recife em suas viagens entre o Rio e a
Grã-Bretanha poria em contato a zona de influência daquele grupo imperial
de negociantes residentes na metrópole senão do Norte, de quase todo o
Norte – o Norte do açúcar e do algodão, pelo menos – com a capital do
Império: o Rio de Janeiro. (FREYRE, 1948. Pág.80).
Aliás, a vitória do Ocidente sobre o Oriente no Brasil foi menos fácil e mais
lenta, em certos meios, ou com relação a certos estilos de vida, do que parece
à primeira vista ter sido. A própria vitória do vidro de janela de casa e de
carruagem sobre o muxarabi, a gelosia, a rótula, a cortina de seda ou a
“esteira da India”, foi lenta, em grande parte do Brasil. Na verdade só em
relação com os sobrados ricos do Rio de Janeiro parece ter sido fulminante
(FREYRE, 2013. Pág.362).
Não devemos esquecer também da chegada dos franceses no Brasil através da Missão
Francesa, a qual, segundo Reis Filho, foi responsável pela difusão da arquitetura neoclássica
no Brasil, alterando nossas formas de construção. Peixoto também nos adverte sobre o papel
da arquitetura neoclássica brasileira como processo civilizador resultando na “sublimação das
emoções sensoriais em nome de uma arquitetura racionalmente mais consistente e controlada,
por inteiro, assim no exterior como no interior” (PEIXOTO, 2000. Pág. 280). Peixoto aponta
que dentro das modificações urbanas ocorridas durante os reinados de D. João VI e D. Pedro
I, a proibição das gelosias é o melhor exemplo como nota civilizatória dentro da mentalidade
neoclássica.
O que nos interessa aqui de fato é pontuar que as mercadorias inglesas consistiam num
importante instrumento de controle social, sendo idolatrada pelos brasileiros, como bem
afirma Silva e Lemos.
Mas, se agora é possível admitir que nos deixamos entorpecer pela cultura europeia
em detrimento da cultura oriental, a volta deste elemento favorece nossa arquitetura. Se o
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antigo muxarabi estava ligado a condicionantes culturais, visuais e térmico, hoje, a sua função
bioclimática continua sendo inegável. Entretanto, questões plásticas e estéticas também
configuram o que há de melhor nesta estrutura, permitindo formas dinâmicas e ousadas.
Se os muxarabis utilizados nos dias de hoje tem um significado direto com nossa
identidade local, é também usado como um elemento de brise para resfriamento,
proporcionando ambientes com temperatura muito agradáveis. Para termos uma ideia basta
conferir os projetos do arquiteto paulista Márcio Kogan. Kogan trabalha a integração do
ambiente interno ao externo, sem, no entanto, tirar a privacidade que uma residência deve ter,
otimizando sempre o conforto térmico. O Vitacon Edifício Itaim, situado na capital paulista é
um belo exemplo de seu trabalho. Neste edifício, os moradores podem otimizar o conforto
térmico dos ambientes dependendo do uso e da incidência solar.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
SILVA, Geraldo Gomes da; LEMOS, Carlos A. C. Arquitetura do ferro no Brasil. São
Paulo, SP: [s.n.], 1984. 374f. Dissertação (Mestrado) - Universidade de São Paulo, Faculdade
de Arquitetura e Urbanismo.
FREYRE, Gilberto. Casa-grande & senzala. 51. ed. bras. São Paulo: Global, 2006.
REIS FILHO, Nestor Goulart. Quadro da arquitetura no Brasil. 9. ed. São Paulo:
Perspectiva, 2000. 211p.
LIMA, Oliveira. Dom João VI no Brasil. 3. ed. Rio de Janeiro: Topbooks, 1996. 790 p.
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PEIXOTO, Gustavo Rocha. Reflexos das luzes na terra do sol: sobre a teoria da Arquitetura
no Brasil da independência 1808-1831. São Paulo: ProEditores, 2000. 334 p.
PINTO, Estevão. Casa-grande & senzala: em quadrinhos. 3.ed. São Paulo: Global, 2005.
64 p.
WEIMER, Günter. Arquitetura popular brasileira. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2012.
333 p.