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A EXTINÇÃO E A VOLTA DOS MUXARABIS NA CULTURA BRASILEIRA

Bruna Batista Gonçalves*

RESUMO

Por muitos anos, durante a colonização portuguesa em nosso país, utilizou-se para
fechamento das aberturas nas residências os balcões de muxarabis, composto por treliças de
madeira dispostos entre si, podendo também permitir sua abertura. Sua principal função
consistia no controle da passagem da luz e do fluxo de ar, permitindo uma temperatura
agradável no interior das residências. Os muxarabis, oriundos da arquitetura islâmica,
promoviam o conforto térmico e luminoso, corrigindo o excesso de luz e garantindo a vista
para o exterior. Entretanto, este artefato arquitetônico viria a ser proibido nas colônias
portuguesas. Neste contexto, este artigo consiste em relatar as possíveis explicações para a
extinção de um componente arquitetônico favorável ás condições climáticas de nosso país,
bem como estabelecer o seu uso na arquitetura contemporânea.

Palavras-chave: Muxarabi, influência arquitetônica moura, arquitetura contemporânea.

O muxarabi, “balcão mourisco, protegido em toda a altura da janela por treliça de


madeira, através do qual se pode ver sem ser visto” (COSTA, 2002. Pág. 151), promovia o
conforto térmico e luminoso, corrigindo o excesso de luz e garantindo a vista para o exterior.
Foi largamente utilizado em toda a colônia portuguesa e é comumente confundido com as
gelosias. O antropólogo e historiador Estevão Pinto esclarece bem as diferenças entre estes
elementos arquitetônicos.

As gelosias, caracterizam-se por seus abalcoados pouco salientes, recobertos


completamente pela treliça e munidos de aberturas móveis do tipo das
rótulas (...). Os mucharabis, afinal, eram balcões bem salientes, apoiados,
quase sempre, em cachorros de pedra, abrangendo dois ou três lanços
contínuos de janelas. Em geral, a construção estava provida, a exemplo das
gelosias, de postigos movediços semelhantes a paraventos (as tradicionais
rótulas). (PINTO, 1953. Pág. 18 e 19)

* Bacharela e licenciada em História pela Faculdade Asa de Brumadinho e graduanda em Arquitetura


e Urbanismo no Instituto Federal de Minas Gerais – IFMG.
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Trazidos ao Brasil na época da colonização, os muxarabis, tem sua origem na


influência do contato dos portugueses com a cultura dos povos árabes berberes.
Consequentemente, este elemento arquitetônico islâmico herdado pelos portugueses,
influenciou diretamente em nossa arquitetura, via colonização (WEIMER, 2012). É inegável o
contato dos portugueses com os árabes na Península Ibérica, onde os laços culturais dos
muçulmanos se enraizaram na cultura dos cristãos. Gilberto Freyre (2006) confirma esta tese
e admite a presença de uma plebe moçárabe entre os primeiros colonos que vieram para o
Brasil, transmitindo aqui traços de sua cultura moral e também material.

Segundo Gunter Weimer, as contribuições mouras no Brasil se deram não somente por
via indireta, através dos colonos portugueses, mas também pelos próprios africanos islâmicos,
por via direta.

Apresentava-se sedutor o comércio irregular de brasileiros com o Oriente,


cujos artigos eram altamente estimados por uma população, como a colonial,
do Brasil, não só marcada pela influência do Oriente desde os dias já
remotos de sua formação portuguesa como reavivada, em alguns dos seus
traços ou hábitos orientais, pela constante transferência do Oriente para o
Brasil de funcionários, militares e religiosos portugueses e pela também
constante importação de escravos impregnados da mesma influência
(FREYRE, 2013. Pág.355).

Weimer distingue essas contribuições, classificando-a em correntes distintas: a dos


árabes, a dos berberes e a dos açorianos. Partirei diretamente para a influência luso-berbere,
de onde se provem o objeto principal deste estudo. Antes, entretanto, é importante pontuar
que os berberes, povos provenientes do da África Setentrional, são também chamados de
mouros. Da cultura berbere, pontuarei aqui somente a utilização das treliças de madeira
denominadas muxarabis.

Ao se instalar no Brasil, o colono português trouxe consigo a influência da cultura


berbere-arábica transplantando-a em vários elementos da vida colonial que estariam ligados
aos sistemas de defesa e às necessidades do colono. Essa influência esteve presente também
em nossa arquitetura colonial caracterizada pela cobertura de quatro águas, pelas varandas,
pátios e, sobretudo, pelos abalcoados muxarabis (PINTO, 1953).

Entretanto, com a vinda da família Real para o Brasil no início do século XIX, os
muxarabis e seus derivantes (gelosias, adufas, urupemas) foram proibidos, sendo decretado a
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sua extinção das casas que a possuíam. O historiador Estevão Pinto, ao descrever um ensaio
sobre as possíveis razões do decreto para o fim dos muxarabis relata que, ainda em fins do
século XVIII, com o Capitão-General D. Tomás de Melo, os abalcoados desapareceram em
função do alinhamento dos calçamentos das ruas tortas. Já no século XIX, com a chegada da
Família Real no Brasil, D. João VI nomeia Paulo Fernandes Viana como Intendente
administrativo, que logo tratou de determinar a extinção dos balcões mouriscos. Segundo
Pinto, as razões para sua extinção estavam no temor de D. João VI pela insegurança que este
artefato trazia à população, visto que, um governador de Recife já havia sido morto vítima de
um disparo de bacamarte, proveniente, talvez, de uma casa de muxarabi, ao qual seria
possível passar um cano de uma arma. Talvez, esta explicação possa ser compreendida
quando Pinto, nos revela o uso deste componente nas edificações medievais para fechamento
de janelas e portas como sistema de defesa.

Contudo, ao fazer um estudo sobre as possíveis causas do desaparecimento dos


muxarabis mouriscos, percebe-se que os motivos vão além da falta de segurança que este
elemento arquitetônico oferecia. Segundo Lúcio Costa “esse costume que conferia à cidade
certo ar oriental chocou os fidalgos e elas foram obrigatoriamente arrancadas e substituídas
por venezianas e vidraças de guilhotina ou de abrir ‘à francesa’”(Costa, 2002. Pág.50). Essa
substituição pode ser explicada pelos tratados comerciais que viriam a ser acordados com a
presença da Corte no Brasil. O Tratado de 1810 abria os portos brasileiros aos estrangeiros,
“no entanto, o tratado entregou aos ingleses o exclusivo de tais relações mercantis” (LIMA,
1996. Pág. 258). Essa transformação na política mercantil do Brasil alteraria
consequentemente suas tradições morais e materiais.

A integração do país no mercado mundial, conseguida com a abertura dos


portos, iria possibilitar a importação de equipamentos que contribuíram para
a alteração da aparência das construções dos centros maiores do litoral,
respeitado, porém, o primitivismo das técnicas tradicionais (REIS FILHO,
2000. pág. 37).

Com os tratados comerciais estabelecidos após o estabelecimento da Corte portuguesa


no Brasil, importam-se não somente seus produtos, mas também sua cultura e modos de vida.
Gilberto Freyre (1948) em “Ingleses no Brasil” fala de forma abrangente sobre o
estabelecimento de comerciantes ingleses no nordeste brasileiro e “sua influência, durante
anos por assim dizer decisivos, sobre a paisagem, a vida e a cultura regionais” (pág. 79). Para
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o sociólogo, os ingleses viam no Recife, um ponto alvo para estabelecer suas relações
comerciais, uma vez que, sua localização tinha acesso facilitado pela proximidade com a
Europa e África e seus ventos favoráveis às embarcações.

Uma linha de navios que parasse no Recife em suas viagens entre o Rio e a
Grã-Bretanha poria em contato a zona de influência daquele grupo imperial
de negociantes residentes na metrópole senão do Norte, de quase todo o
Norte – o Norte do açúcar e do algodão, pelo menos – com a capital do
Império: o Rio de Janeiro. (FREYRE, 1948. Pág.80).

Como se percebe, o estabelecimento dos ingleses no nordeste brasileiro objetivava


estabelecer influência não somente naquela região, mas também alcançar sua capital, o Rio de
Janeiro.

Todavia, em “Sobrados e Mucambos”, Gilberto Freyre (2013) nos evidencia que


embora as relações com a Inglaterra trouxeram mudanças nos hábitos da vida dos brasileiros,
incutindo o preconceito sobre os costumes mouriscos, estas transformações não se deram de
forma ligeira.

Aliás, a vitória do Ocidente sobre o Oriente no Brasil foi menos fácil e mais
lenta, em certos meios, ou com relação a certos estilos de vida, do que parece
à primeira vista ter sido. A própria vitória do vidro de janela de casa e de
carruagem sobre o muxarabi, a gelosia, a rótula, a cortina de seda ou a
“esteira da India”, foi lenta, em grande parte do Brasil. Na verdade só em
relação com os sobrados ricos do Rio de Janeiro parece ter sido fulminante
(FREYRE, 2013. Pág.362).

Esta constatação nos indica que, embora houvesse um decreto proibindo a


utilização dos muxarabis, a sua substituição parece ter sido causa mais de uma consciência
social do que realmente de uma imposição, como nos sugere o professor arquiteto Gustavo
Rocha Peixoto. Segundo o professor, essas providências são realizadas em forma de leis
externas com a finalidade de transformar os hábitos culturais dos brasileiros, aos quais não
estavam inseridos nos padrões sociais da Europa, numa tentativa de aproximar o Rio de
Janeiro aos padrões de civilização europeia. Essas providências são assim apontadas por
Peixoto como ações civilizadoras contra a barbárie de nossa gente. Ações que muitas das
vezes são apontadas como violentas e repressivas, ao passo que são vistas como necessárias
para alcançar o autocontrole no esforço de conscientizar a população de se comportar dentro
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das novas regras estabelecidas através de um mecanismo psicológico automático de auto


controle.

É essa a índole das primeiras providências do intendente Paulo Fernandes


Viana ao exigir que se advertisse os passantes com pregões, antes de lançar à
rua os rejeitos domésticos, ou ao proibir e mandar arrancar as gelosias e
muxarabis bárbaros demais e em desacordo com uma corte europeia. Com d.
Joao chega ao Brasil a Europa (PEIXOTO, 2000. Pág. 272).

Não devemos esquecer também da chegada dos franceses no Brasil através da Missão
Francesa, a qual, segundo Reis Filho, foi responsável pela difusão da arquitetura neoclássica
no Brasil, alterando nossas formas de construção. Peixoto também nos adverte sobre o papel
da arquitetura neoclássica brasileira como processo civilizador resultando na “sublimação das
emoções sensoriais em nome de uma arquitetura racionalmente mais consistente e controlada,
por inteiro, assim no exterior como no interior” (PEIXOTO, 2000. Pág. 280). Peixoto aponta
que dentro das modificações urbanas ocorridas durante os reinados de D. João VI e D. Pedro
I, a proibição das gelosias é o melhor exemplo como nota civilizatória dentro da mentalidade
neoclássica.

É importante ressaltar aqui também a presença do ferro nas sacadas em substituição


aos abalcoados em treliças de muxarabis. Carlos Alberto Lemos e Geraldo Gomes da Silva,
em dissertação de mestrado, discutem o uso do ferro no Brasil e nos adverte que a utilização
deste material na arquitetura europeia não tinha a mesma importância dada pelos brasileiros.

Provavelmente a atitude dos brasileiros, como de resto dos consumidores de


produtos industriais não seria a mesma dos europeus. As polêmicas sobre a
conveniência de uso do novo material não existiram aqui. O ferro, como
tantos outros produtos industriais, foi consumido e aceito, tacitamente,
dentro de amplo e complexo sistema de dominação cultural e econômica
(SIVA e LEMOS, 1984. Pág. 155).

O que nos interessa aqui de fato é pontuar que as mercadorias inglesas consistiam num
importante instrumento de controle social, sendo idolatrada pelos brasileiros, como bem
afirma Silva e Lemos.

Mas, se agora é possível admitir que nos deixamos entorpecer pela cultura europeia
em detrimento da cultura oriental, a volta deste elemento favorece nossa arquitetura. Se o
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antigo muxarabi estava ligado a condicionantes culturais, visuais e térmico, hoje, a sua função
bioclimática continua sendo inegável. Entretanto, questões plásticas e estéticas também
configuram o que há de melhor nesta estrutura, permitindo formas dinâmicas e ousadas.

Se os muxarabis utilizados nos dias de hoje tem um significado direto com nossa
identidade local, é também usado como um elemento de brise para resfriamento,
proporcionando ambientes com temperatura muito agradáveis. Para termos uma ideia basta
conferir os projetos do arquiteto paulista Márcio Kogan. Kogan trabalha a integração do
ambiente interno ao externo, sem, no entanto, tirar a privacidade que uma residência deve ter,
otimizando sempre o conforto térmico. O Vitacon Edifício Itaim, situado na capital paulista é
um belo exemplo de seu trabalho. Neste edifício, os moradores podem otimizar o conforto
térmico dos ambientes dependendo do uso e da incidência solar.

No entanto, a tecnologia atual possibilita a exploração deste material de forma muito


mais intensa e arrojada, mas devemos admitir que longe de toda essa tecnologia foram eles os
responsáveis pelo conforto térmico em uma arquitetura totalmente vernacular.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

SILVA, Geraldo Gomes da; LEMOS, Carlos A. C. Arquitetura do ferro no Brasil. São
Paulo, SP: [s.n.], 1984. 374f. Dissertação (Mestrado) - Universidade de São Paulo, Faculdade
de Arquitetura e Urbanismo.

COSTA, Lúcio. Arquitetura. Rio de Janeiro: José Olympio, 2002. 152p.

FREYRE, Gilberto. Casa-grande & senzala. 51. ed. bras. São Paulo: Global, 2006.

________________. Ingleses no Brasil: aspectos da influência britânica sobre a vida, a


paisagem e a cultura do Brasil. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio, 1948. 394p.

_________________. Sobrados e mucambos: decadência do patriarcado rural e


desenvolvimento do urbano. Recurso Digital. São Paulo: Global, 2013.

REIS FILHO, Nestor Goulart. Quadro da arquitetura no Brasil. 9. ed. São Paulo:
Perspectiva, 2000. 211p.

LIMA, Oliveira. Dom João VI no Brasil. 3. ed. Rio de Janeiro: Topbooks, 1996. 790 p.
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PEIXOTO, Gustavo Rocha. Reflexos das luzes na terra do sol: sobre a teoria da Arquitetura
no Brasil da independência 1808-1831. São Paulo: ProEditores, 2000. 334 p.

PINTO, Estevão. Casa-grande & senzala: em quadrinhos. 3.ed. São Paulo: Global, 2005.
64 p.

______________. Mucharabis e balcões. Recife: 1953. 34p.

WEIMER, Günter. Arquitetura popular brasileira. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2012.
333 p.

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