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Somente a luta, com uma ação sindical de Minas Gerais, preparando 40 novos instruto-
conduzida com precisos objetivos reivindicatórios, res de diversos ramos de atividades, aproximada-
com a conquista de um poder real dos trabalhado- mente 200 empresas já estão aplicando esta
res e do sindicato, é possível impor as modifica- técnica com resultados positivos” (Abrahão,
ções, sejam tecnológicos, técnicas ou normativas, 1993: 22)
que possam anular ou reduzir ao mínimo os riscos
a que o trabalhador está exposto no local de Em 1986 foi lançado no Brasil Ambiente de
trabalho”. (Oddone et al., 1986: 17) Trabalho: a luta dos trabalhadores pela saúde, por
Ivar Oddone e outros sindicalistas, para técni-
Essa metodologia teve um importante papel cos com atuação sindical e acadêmica.
no processo da Reforma Sanitária Italiana (Lei Além do Diesat, que adota este instrumento
833 de 23/09/78 que instituiu o Serviço Sanitá- desde 1983 e que nos últimos seis anos o tem
rio Nacional) que criou condições para cons- utilizado nos cursos de formação de CIPAs (Co-
trução de um sistema participativo e com missão Interna de Prevenção de Acidentes) ou
auto-regulação na eliminação dos riscos, pre- de monitores de Cipa, o Instituto Nacional de
vendo em seu artigo 20 os mapas de risco Saúde do Trabalhador (INST) da Central Úni-
(Oddone et al., 1986). ca dos Trabalhadores (CUT) é atualmente “um
dos principais signatários do método” (Freitas,
1992a: 11).
COMO O MAPA DE RISCO
CHEGOU AO BRASIL?
A CONSTRUÇÃO DE MAPAS DE
O Mapa de Risco se disseminou por todo RISCOS É OBRIGATÓRIA?
o mundo, chegando ao Brasil no início da
década de 80. Existem duas versões quan- A realização de mapeamento de riscos tor-
to à sua introdução no Brasil. A primeira, nou-se obrigatória para todas as empresas do
atribui tal feito às áreas sindical e acadê- país que tenham Cipa, através da portaria nº 5
mica, através de David Capistrano, Mário de 17/08/92 do Departamento Nacional de Se-
Gaawryzewski, Hélio Baís Martins Filho gurança e Saúde do Trabalhador do Ministério
e do Departamento Intersindical de Estu- do Trabalho.
dos em Saúde e Ambiente de Trabalho De acordo com o artigo 1º da referida por-
(Diesat). taria cabe às CIPAs a construção dos mapas
A outra versão atribui à Fundação Jorge de riscos dos locais de trabalho. Através de
Duplat Figueiredo de Segurança e Medicina seus membros, a Cipa deverá ouvir os tra-
do Trabalho (Fundacentro) a difusão do mapa balhadores de todos os setores da empresa
de risco no país. Segundo o Engenheiro Mário e poderá contar com a colaboração do Ser-
Abrahão: viço Especializado de Medicina e
S e g u r a n ç a d o Tr a b a l h o ( S E S M T ) d a
“Técnicos da Fundacentro de Minas Gerais empresa, caso exista.
foram designados para estudar o método de Os riscos deverão ser representados em plan-
trabalho e acompanhar os resultados. Após um ta baixa ou esboço do local de trabalho (cro-
longo acompanhamento e a constatação dos qui) e os tipos de riscos relacionados em tabelas
resultados positivos, eles começaram como próprias, anexas à referida portaria.
agentes multiplicadores a ensinar esta técnica Posteriormente os mapas deverão ser afixa-
por todo o País. Em São Paulo, graças aos dos em locais visíveis em todas as seções para
esforços conjuntos da Fundacentro São Paulo, o conhecimento dos trabalhadores, permane-
Delegacia Regional do Trabalho de Osasco e cendo no local até uma nova gestão da Cipa,
Sindicato dos Metalúrgicos de Osasco, que em quando então os mesmos deverão ser refeitos
1982 patrocinaram dois cursos com os técnicos (Brasil, 1992).
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to mais baixa for a escolaridade dos mesmos. Mas Risco. Este fato pressupõe dois motivos: o tem-
a limitação antes de tudo está na própria portaria po de exercício legal da Portaria ainda não com-
ministerial que aleatoriamente ou arbitrariamen- portou esta fase ou, o que seria muito pior, ela
te estabeleceu grupos de riscos (físicos, químicos, não vem ocorrendo e o mapeamento dos riscos
biológicos, ergonômicos e mecânicos) sem vem se limitando ao desenho em planta baixa
conceituá-los, apenas exemplificando aspectos e afixação do mesmo em algum lugar da fábri-
que estariam contemplados e deixando a porta ca.
aberta através de um genérico “outros”, ao final Mais uma vez as dificuldades dos trabalha-
de cada relação de grupo. dores neste campo são imensas: as informações
Neste particular, os autores da proposta não dos trabalhadores sobre os resultados e con-
seguiram sequer os pais da matéria (os italia- clusões do mapeamento; a validação dos acha-
nos), que categorizaram os riscos em quatro dos; a discussão da contraproposta patronal; a
grupos: mobilização dos trabalhadores de determina-
do setor mais prejudicado etc.
“O 1º compreende os fatores presentes também no Como enfrentar a absoluta autoridade do
ambiente em que o homem vive fora do trabalho empregador dentro da fábrica, possibilitada
(nos locais de habitação)... luz, temperatura, pela forma de contratação individual do
ventilação e umidade. O 2º engloba os fatores trabalho e o arcabouço jurídico-legal de uma
característicos do ambiente de trabalho: poeiras, Consolidação das Leis do Trabalho (CLT)
gases, vapores e fumaças. O 3º compreende os ultrapassa e de caráter antidemocrático?
fatores que exigem trabalho físico, provocam Como possibilitar que as partes com interes-
fadiga física e mental. Por fim, o 4º compreende ses distintos dialoguem e negociem condições
as condições de trabalho que geram estresse e a de trabalho se a organização do trabalho já é
organização de trabalho”. determinada unilateralmente pelo empregador,
(São et al., 1993: 2) definidor da tecnologia a ser utilizada no pro-
cesso produtivo, das matérias-primas emprega-
Não adotando uma conceituação de cada gru- das, do ritmo e da organização da produção, da
po, estabeleceu-se a discórdia e mesmo a dúvi- distribuição dos resultados da produção?
da: o que se entende por riscos ergonômicos, De fato, numa relação desigual de organiza-
quando se exemplifica com “conflitos” e “tra- ção e poder dentro da empresa, as dificuldades
balho de turno”? O trauma pós-assalto ocasio- dos trabalhadores brasileiros para imple-
nado pela violência do ato ou, a ocorrência mentarem a metodologia do Mapa de Risco,
rotineira de estupros no acesso a um local de com resultados efetivos, são imensas.
trabalho isolado, seriam classificados como? Conclui-se então pela assertiva de que uma
Mecânicos? Biológicos? Ergonômicos? metodologia para investigação e negociação
Os exemplos poderiam suceder-se extensa- das causas da nocividade do trabalho no Brasil
mente e o motivo já foi apontado. Daí a difi- só vai ter sucesso efetivo quando acompanha-
culdade e o direito das pessoas também da das condições objetivas para o exercício
inferirem conclusões apressadas. Ainda mais real da democracia e da cidadania nos ambien-
quando elas não são “técnicas”. tes de trabalho, com livre possibilidade de or-
ganização dos trabalhos, com contratação
coletiva de trabalho, com liberdade e autono-
SOBRE A NEGOCIAÇÃO DO mia sindical, conferindo a ambas as partes as
MAPA E SEUS condições propícias para o diálogo e o enten-
DESDOBRAMENTOS dimento na organização do trabalho e da pro-
dução, fazendo com que o “risco” deixe de ser
Pouca informação se tem sobre como tem um fenômeno pré-determinado socialmente.
ocorrido na prática, no cotidiano, o encami-
nhamento e as discussões entre empregados e
empregadores, sobre os achados do Mapa de
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