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Jovens rurais e influências institucionais para a permanência no campo: um

estudo de caso em uma cooperativa agropecuária do Triângulo Mineiro*


Rural youth and institutional influences to stay in the field: a case study in an
agricultural cooperative belonged to Triângulo Mineiro
La jeunesse rurale et les influences institutionnelles de rester dans le domaine:
une étude de cas dans une cooperative agricole du Triângulo Mineiro
Jóvenes rurales e influencias institucionales para la permanencia en el campo: un
estudio de caso en una cooperativa agropecuária del Triângulo Mineiro
Amábile Tolio Boessio**
(amabiletolio@hotmail.com)
Sheila Maria Doula***
(sheiladoula@gmail.com)

Recebido em 10/11/2015; revisado e aprovado em 26/11/2015; aceito em 30/03/2016


DOI: http://dx.doi.org/10.20435/1984-042X-2016-v.17-n.3(02)

Resumo: Objetivou-se investigar a percepção dos jovens rurais filhos de famílias associadas
da Cooperativa Agropecuária de Patrocínio (COOPA/MG) sobre o incentivo das instituições
(cooperativa e família) para sua permanência no meio rural e na atividade agropecuária, em um
estudo de caso com cunho qualitativo do tipo exploratório. Os jovens têm interesse em permanecer
no rural e na atividade familiar. Comparando com o estímulo da família, o estímulo da cooperativa
é menor.
Palavras-chave: juventude rural; reprodução social; instituições sociais.
Abstract: This study aimed to investigate the perception of rural young children of families
associated to Patrocínio’s Agricultural Cooperative (COOPA/MG) on encouraging institutions
(cooperative and family) for their stay in the countryside and agricultural activity, in a case study
with qualitative and exploratory nature. Young people are interested in staying in rural and family
activity. Compared to the family stimulus, the stimulation of cooperative is less.
Key words: rural youth; social reproduction; social institutions.
Résumé: Cette étude a visé à étudier la perception des jeunes enfants dans les zones rurale de
familles associés de la Coopérative Agricole de Patrocínio (COOPA/MG) à encourager les institu-
tions (coopératives et de la famille) pour leur séjour dans la campagne et l’activité agricole, dans
une étude de cas avec la nature qualitative et exploratoire. Les jeunes sont intéressés à rester dans
l’activité rurale et familier. Par rapport à la relance de la famille, le stimulus de la coopérative est
moins intéressant.
Mots-clés: jeunes ruraux; reproduction sociale; institutions sociales.
Resumen: Este estudio tiene como objetivo investigar la percepción de los jóvenes rurales hijos de
familias asociadas a la Cooperativa Agropecuária de Patrocínio (COOPA/MG) sobre el incentivo
de las instituciones (cooperativa y familia) para su permanencia en el medio rural y en la actividad
agropecuaria, en un estudio de caso de naturaleza cualitativa y tipo exploratorio. Los jóvenes se
interesan en permanecer en el medio rural y en la actividad familiar. En comparación con el estí-
mulo de la familia, el estímulo de la cooperativa es menor.
Palabras clave: juventud rural; reproducción social; instituciones sociales.

* Este artigo é oriundo da dissertação de mestrado da primeira autora sob orientação da segunda autora.
A dissertação foi defendida em 2015, no Programa de Pós-graduação em Extensão Rural da Universidade
Federal de Viçosa (UFV/MG). A pesquisa teve apoio financeiro do Convênio do Observatório Mineiro
do Cooperativismo, junto com a Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais
(SEDE) e do CNPq.
** Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Santa Maria, Rio Grande do Sul, Brasil.
*** Universidade Federal de Viçosa (UFV), Viçosa, Minas Gerais, Brasil.

INTERAÇÕES, Campo Grande, MS, v. 17, n. 3, p. 370-383, jul./set. 2016.


Jovens rurais e influências institucionais para a permanência no campo: 371
um estudo de caso em uma cooperativa agropecuária do Triângulo Mineiro

1 INTRODUÇÃO trajetória de seus pais e os problemas da


exclusão de parte dos filhos no processo
O processo de colonização ao qual o sucessório dos estabelecimentos agrícolas
Brasil foi submetido, o legado de conflitos familiares.
relativos às disputas de terras e a forma Brumer (2014) indica que as pes-
como foi aplicada e difundida a tecnologia quisas que abordam o segmento juvenil
no campo acarretaram uma visão simplis- tinham como foco central de análise as
ta e discriminatória que grande parte da principais causas de desinteresse dos
população ainda carrega e absorve em re- jovens em permanecer nas atividades
lação ao espaço rural. Atualmente, porém, agrícolas ou o fascínio pelas cidades.
com a intensificação das transformações A autora salienta que é recorrente na
sociais provocadas pela modernização literatura sobre a juventude rural a preo-
e urbanização do campo, verifica-se um cupação quanto à definição dos aspectos
processo de “recomposição do rural”, estruturais que determinam qual o papel
fazendo emergir uma nova ruralidade em e o lugar da juventude e que, por sua vez,
seus modos contemporâneos de reestru- restringem a liberdade de escolhas. Dessa
turação (WANDERLEY, 2009). forma, observar pelo ângulo econômico
Favareto (2007) aponta o início os motivos que levam à permanência ou
desse novo momento, no qual os espaços não do jovem no campo é fundamental
rurais estão cada vez mais integrados a na medida em que limitações econômicas
novas e complexas dinâmicas. Surgem, ainda persistem.
nesse contexto, novos agentes e interesses, Segundo Brumer (2014), para o seg-
novas estruturas de oposições e identi- mento juvenil, são fatores motivadores
dades. Diante dos diversos recortes da para a saída do campo as más condições
realidade do meio rural e percebendo as de trabalho vinculadas às incertezas de
significativas transformações ocorridas rentabilidade. Em concordância, Silvestro
nesse meio, torna-se importante compre- et al. (2001) apontam que muitos filhos de
ender que os jovens, como novos atores produtores rurais abandonam os negócios
sociais, são fundamentais no processo familiares por melhores oportunidades de
de desenvolvimento dos espaços rurais renda fora do meio rural, pois comparati-
contemporâneos. vamente as atividades ligadas ao campo
A preocupação com a permanência são consideradas pouco atrativas quanto
juvenil no campo e também na agricultu- aos rendimentos.
ra familiar é instigada pelo significativo Partindo-se do pressuposto de que
êxodo rural, que vem resultando em uma as diversas instituições presentes no meio
tendência ao envelhecimento e masculini- rural são fundamentais no processo de
zação no campo. Esse processo se torna formação de opinião do segmento juve-
tema presente na agenda de pesquisas do nil e na transformação de sua realidade,
país a partir da década de 1980. nesta pesquisa foram investigadas as
Nesse sentido, Brumer (2006) con- influências diretas de duas instituições,
sidera que dois aspectos são recorrentes uma cooperativa agropecuária e as famí-
na sociologia rural brasileira e ainda tra- lias dos jovens rurais. Objetiva-se, neste
tados como problemas não resolvidos, artigo, analisar a percepção dos jovens
que se configuram como entraves para rurais filhos de famílias associadas da
a reprodução social no campo e para os Cooperativa Agropecuária de Patrocínio
programas de desenvolvimento rural: a (COOPA), em Minas Gerais, sobre o in-
continuidade da tendência emigratória centivo de ambas as instituições quanto
de jovens decepcionados com a ativida- à permanência juvenil no meio rural e na
de agrícola e que não querem repetir a atividade agropecuária.

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2 JUVENTUDE RURAL E que será possível entender as identidades


REPRODUÇÃO SOCIAL NO CAMPO desses atores sociais.
De acordo com Castro et al. (2009),
A categoria juventude, segundo o papel social atribuído aos jovens rurais
Stropasolas (2006, p. 180), “unifica sim- entre os anos 1990 e 2000 focalizava a im-
bolicamente um grupo que é composto portância desse segmento para o futuro
diversamente, que encobre realidades so- da agricultura familiar, em razão da preo-
cialmente diversificadas”. O autor destaca cupação com as condições de reprodução
que, embora existam dificuldades no que social no campo e com a continuidade
tange à conceituação de juventude, esta das atividades agropecuárias voltadas à
é uma porta para que se possa construí- produção de alimentos. Stropasolas (2006,
-la, especialmente no caso específico da p. 173) considera, no entanto, que
juventude rural, pois “inúmeros agentes
[...] os jovens reclamam por mu-
e instituições externos, que pensam ou danças na condição social dos
representam as políticas e as intervenções agricultores na sociedade e nos
no espaço rural, o fazem desconsideran- valores que fundamentam as
do ou não problematizando a heteroge- relações de gênero e geração na
neidade presente entre seus membros” agricultura familiar; todavia, por
(STROPASOLAS, 2006, p. 176). não encontrarem espaço para as
Carneiro e Castro (2007) compre- transformações, mudam-se para
endem a juventude rural em sua dupla a cidade.
dinâmica social. Por um lado, a dinâmica O autor conclui que os jovens, embo-
territorial que relaciona a casa (a família), ra busquem “mudar de vida” procurando
a vizinhança (a comunidade local) e a melhores condições nas cidades, “também
cidade (o mundo urbano-industrial) e, mantêm uma forte identidade cultural
por outro lado, a dinâmica temporal, re- com um ethos [...] expresso na procura
lacionada ao passado das tradições fami- regular, nos finais de semana, pela so-
liares, que inspira práticas e estratégias no ciabilidade das comunidades rurais”
presente e no encaminhamento do futuro. (STROPASOLAS, 2006, p. 173).
De acordo com Carneiro e Castro (2007, Ao realizar uma pesquisa em dois
p. 24), “mais do que espaços distintos e contextos rurais diferentes, Carneiro
sobrepostos, trata-se essencialmente dos (1999) percebeu que os jovens, por mais
espaços de vida que se entrelaçam e que que almejem um padrão de vida melhor
dão conteúdo à experiência dos jovens e interligado ao estilo moderno e urbano,
rurais e à sua inserção na sociedade”. também demonstram um sentimento de
Paulo (2011) também considera que compromisso com a família e com o local,
não se pode definir o jovem apenas de sendo essa uma das contradições presen-
forma objetiva, mas sim dentro de um tes no desejo de ter “o melhor dos dois
conjunto das subjetividades e que há a ne- mundos” (ABRAMOVAY et al., 2007).
cessidade de entender esse segmento por Estes autores, ao realizarem uma pesquisa
meio da concepção de uma construção so- no oeste de Santa Catarina, constataram
ciocultural ligada a um processo histórico. que há por parte de rapazes pretensão
Com isso, a autora enfatiza a necessidade em continuar nas atividades agrícolas já
de entender o meio rural como um espaço desenvolvidas por seus pais; os jovens,
de vida e as relações que os jovens viven- no entanto, enfatizaram a precariedade
ciam, uma vez que, somente por meio do dessas propriedades devida, em grande
conjunto dessas relações, com a família e parte, à falta de apoio e de organização
com o mundo, e junto com a percepção das instituições locais que representam
que o próprio jovem tem dele mesmo, é os agricultores. Esse quadro, na perspec-

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tiva dos pesquisadores, não é verificado ticas públicas, em especial as de auxílio à


apenas ali, o que mostra que a construção juventude, entre outros.
de espaços para participação e represen- Por fim, Stropasolas (2011) con-
tação desses atores ainda é fundamental sidera importante, no esforço analíti-
no meio rural. co sobre a juventude rural, situar as
Carneiro e Castro (2007) apontam constantes modificações exigidas pelas
que atualmente os jovens estão perce- complexidades do mercado que tornam
bendo, de uma forma mais positiva, o delicadas não só as decisões de mudança
meio rural, valorizando-o como tranqui- na gestão econômica das propriedades,
lo, seguro e com boa qualidade de vida, mas também a transferência patrimonial
contrariando o que antes era percebido familiar com a substituição, nem sempre
pela sociedade como atrasado e parado. harmoniosa, das gerações mais antigas.
Em concordância, como colocam Doula et Em concordância, Redin (2014) entende
al. (2014) a partir da pesquisa com jovens a importância de se debater acerca de
rurais da Zona da Mata Mineira, os jovens intervenções institucionais que tenham
estão valorizando como fatores positivos como objetivo elaborar estratégias de re-
do rural a tranquilidade, a segurança, ser produção tanto social quanto econômica
dono da propriedade e também a liber- no campo, além da necessária valorização
dade, entendida como a ausência de cer- da profissão de agricultor. Se as gerações
tos controles que o trabalho nas cidades futuras refutarem os trabalhos ligados ao
impõe (horários rígidos, a vigilância do campo como simbolicamente depreciati-
patrão, dentre outros). vos, todos os processos mencionados não
Conforme aponta Redin (2012), serão eficazes. Por isso torna-se relevante
a valorização positiva ou negativa do entender as motivações juvenis e sua
rural pelos jovens envolve as condições relação com as instituições presentes no
materiais, os espaços de sociabilidade, meio rural.
bem como a oportunidade de continuar
os estudos sem necessitar migrar. Para 3 AS INSTITUIÇÕES
o autor, ampliar o campo de possibilida- “COOPERATIVA” E “FAMÍLIA”
des para a concretização desses anseios é
fundamental e deve ser um elo para gerar No clássico “As regras do método
melhor patamar de qualidade de vida e sociológico”, Durkheim (2001), ao definir
para assegurar a realização dos projetos a sociologia como a ciência das institui-
alternativos individuais e coletivos. ções, conceitua instituição como todos
Brumer e Spanevello (2008), ao se os modos, comportamentos e crenças
referirem à continuidade da agricultura instituídas pela coletividade. Para o au-
familiar e das unidades produtivas, con- tor, a existência das instituições orienta
sideram que os fatores que facilitam ou o desenvolvimento social e, para que a
dificultam a permanência dos jovens no sociedade tenha um bom funcionamento,
campo, além de não serem únicos, não é necessária a harmonia entre as institui-
são isolados. Esses fatores estão atrelados ções que a constituem, afinal estas são as
às condições socioeconômicas da família que regem as normas, condutas, valores
e da propriedade, à educação, ao acesso morais que passam a fazer parte de uma
ao lazer, ao envolvimento e participação consciência coletiva.
em movimentos sociais, à remuneração Para Berger e Berger (1994), a histo-
e autonomia juvenil, à perspectiva de ricidade é relevante para o entendimento
herdar a propriedade e suceder os pais, à da necessidade de se constituir uma ins-
percepção acerca do trabalho agrícola, à tituição, pois existem instituições para a
facilidade de acesso ao crédito e às polí- vida coletiva/social, como por exemplo, o

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Estado e instituições para a vida privada, young people and women”1 (FAO, 2012).
como por exemplo, a família. Os autores Inserindo a juventude como agenda prio-
destacam que cada instituição é respon- ritária, a FAO elaborou um mapeamento
sável por um ou mais valor social. das cooperativas que trabalham com e
Souza (2013) considera instituições para os jovens, identificando no Brasil a
sociais tudo o que for indispensável ao Cooperativa Agropecuária Regional de
funcionamento da sociedade, sendo por Palmeira dos Índios Ltda. (CARPIL), no
meio dessa organização que os indivídu- estado de Alagoas.
os se inserem no mundo da linguagem, A FAO define que seja papel das co-
da cultura e da produção. Para a autora, operativas agroalimentares a intermedia-
o fato de as instituições sociais ocidentais ção e promoção dos interesses gerais da
atualmente terem suas bases fundamen- sociedade, como a segurança alimentar,
talmente mantidas pelo predomínio da o combate à fome e à pobreza, a geração
lógica capitalista, faz com que seja ne- de empregos no campo e o desenvolvi-
cessária a existência de complexas insti- mento rural sustentável. Especificamente
tuições formadoras dos sujeitos sociais, em relação aos membros agricultores,
mas elas nem sempre estão em equilí- sua importância na esfera produtiva
brio, ao contrário do que havia proposto reside na oferta de serviços, incluindo
Durkheim. o acesso a mercados, recursos naturais,
Para os interesses deste artigo, im- informação, comunicação, tecnologias,
porta entender conceitualmente as orga- crédito, formação e capacitação, preços
nizações cooperativas como instituições mais baixos para insumos agrícolas (como
sociais. De acordo com Valadares (1999, sementes, fertilizantes e equipamentos) e
p. 17), “a organização cooperativa é um condições de armazenamento. Na esfera
sistema impulsionado por metas indi- política, as cooperativas devem facilitar a
viduais, metas organizacionais e metas participação dos pequenos produtores na
do marco institucional da sociedade em tomada de decisões em todos os níveis,
geral”. No entendimento de Schmidt e apoiá-los na obtenção de direitos de uso
Perius (2003, p. 63), “as cooperativas são da terra e negociar melhores condições
associações autônomas de pessoas que se em contratos agrícolas e preços nos mer-
unem voluntariamente e constituem uma cados locais, nacionais e internacionais ”
empresa, de propriedade comum, para (FAO, 2012).
satisfazer aspirações econômicas, sociais Como exposto por Presno Amodeo
e culturais”. (1999), nos valores sociais que funda-
Segundo a Food and Agriculture mentam as cooperativas, fica evidente
Organization (FAO), as cooperativas estão o compromisso que essas organizações
presentes em países desenvolvidos e em assumem com seus cooperados e também
desenvolvimento e, mundialmente, abar- com a coletividade onde estas se desen-
cam cerca de um bilhão de membros, em volvem. Para a autora, dois princípios
grande parte provenientes do setor agro- recebem destaque: Educação, forma-
alimentar. A importância das cooperati- ção e informação e Preocupação com a
vas agroalimentares foi particularmente Comunidade. Nessa mesma linha, como
reconhecida em 2012, quando a organi- exposto por Freitas e Freitas (2013), em
zação instituiu o Ano Internacional das pesquisa realizada em uma cooperativa
Cooperativas. No âmbito dessa comemo-
ração, a organização considera que “ag-
1
ricultural cooperatives play an important “Cooperativas agrícolas desempenham papel
role in supporting small agricultural pro- importante no apoio a pequenos produtores
agrícolas e a grupos marginalizados, como de
ducers and marginalized groups such as jovens e mulheres” (tradução da revisora).

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de crédito solidário na Zona da Mata de que atualmente há o enfraquecimento do


Minas Gerais, a importância dessas orga- poder quase absoluto da figura paterna
nizações coletivas está na educação e na dentro da organização familiar tradicional
conscientização econômica, em especial rural. Essa mudança estaria abrindo espa-
dos agricultores familiares, o que auxilia ço para a formação de um ambiente com
no desenvolvimento local pela via da maior participação de todos os membros
promoção da cooperação. da família, resultando em uma configu-
Ao considerar a existência de uma ração mais “democrática”. Contrariando
cooperativa em virtude de seus associados essa perspectiva, Stropasolas (2011), com
e a inclusão da família e da comunidade base em pesquisas também realizadas
como foco de sua ação institucional, cabe em Santa Catarina, considera que, além
também indicar as características da dos conflitos gerados pelos diferentes
instituição família para as análises aqui interesses dentro do grupo familiar, um
apresentadas. Família, por sua comple- grande gerador de conflitos é o modelo
xidade, é um termo de difícil definição, de gestão centralizado no pai e a grande
em especial nos tempos atuais; o seu en- dificuldade deste em aceitar inovações,
tendimento varia segundo fatores como geralmente propostas pelos filhos, nos
contexto, cultura, relações, crenças, entre processos gerenciais.
outras peculiaridades dos grupos. Ainda nesse sentido, Spanevello et
Prado (1988) apresenta o sentido al. (2011), em pesquisa realizada na região
popular e ainda dos dicionários, nos quais central do Rio Grande do Sul, constataram
família significa um conjunto de pessoas que são variados os fatores que fazem com
aparentadas, geralmente pai, mãe e filhos, que os jovens decidam por não seguir na
que vivem em uma mesma residência. Já atividade que até então vem sendo de-
para Donati (2008, p. 51), “a família é um senvolvida pela família, dentre os quais
grupo social humano primário, mas não as tarefas penosas próprias do trabalho
um grupo qualquer [...] a família é aquele rural, a falta de abertura dos pais para
“sistema social vivente” que preside a diálogo e a busca de autonomia financeira.
reprodução primária da sociedade”. Essas observações são importantes porque
No contexto rural, Loreto (1996) denotam contextos sociais em transforma-
considera que a família, em especial ção, o que coloca desafios adicionais para
aquela vinculada à pequena produção, é as várias outras instituições que atuam no
caracterizada por ser, ao mesmo tempo, meio rural.
produtora e consumidora. Para a autora,
é na família que as atividades a serem de- 4 METODOLOGIA E CARACTERIZA-
senvolvidas são organizadas e distribuí- ÇÃO DO UNIVERSO EMPÍRICO
das, bem como a família constitui-se como
local de tomadas de decisão, o centro onde O presente artigo apoia-se em uma
são desenhadas as regras e conduzidos os metodologia de cunho qualitativo do tipo
modos de se viver. exploratória, desenvolvida em um estudo
Na perspectiva da historicidade que de caso. Para a realização da pesquisa de
é própria das instituições, como apon- campo, foi utilizada como ferramenta de
taram Berger e Berger (1994), algumas coleta de dados a entrevista, conduzida
modificações recentes na configuração das por um roteiro diferenciado segundo
relações de poder podem ser observadas as características dos grupos de atores
na esfera familiar, embora seus resulta- sociais: 41 entrevistas com famílias coo-
dos ainda não permitam um consenso. peradas, 13 entrevistas com membros da
Silvestro et al. (2001) defendem, a partir direção, cargos de gestão e colaborado-
de pesquisa realizada em Santa Catarina, res da Cooperativa e 22 entrevistas com

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jovens, filhos de cooperados, de ambos confluência de diferentes demandas cien-


os sexos e com idade entre 18 e 29 anos. tíficas e culturais”.
Posto que o objetivo deste artigo é analisar O município da sede administrativa
a percepção dos jovens sobre o incentivo da COOPA possui uma população total de
de duas instituições (cooperativa e famí- 82.471 habitantes, sendo que grande parte
lia) para sua permanência no meio rural, é composta pela faixa etária entre 5 a 49
o foco analítico incide nas entrevistas com anos, havendo equilíbrio entre homens e
o segmento juvenil. mulheres.
As entrevistas foram realizadas nas Para melhor caracterização do
propriedades familiares por meio das visi- contexto no qual os jovens entrevistados
tas técnicas junto com extensionistas e em se inserem, destaca-se que, na área da
reuniões de comunidade realizadas pela educação de nível fundamental e médio,
Cooperativa Agropecuária de Patrocínio Patrocínio conta com 12 escolas na rede
(COOPA). A escolha da COOPA para a municipal, 21 escolas da rede estadu-
investigação é justificada pelo destaque al e ainda quatro escolas particulares
que ela vem obtendo no Movimento (PATROCÍNIO, s.d.). Na educação de
Cooperativista Mineiro, principalmente nível técnico e superior, de acordo com
pela organização do quadro de associados o Ministério da Educação (BRASIL, s.d.),
e sua preocupação com os jovens inter- no município há cinco Instituições de
ligados a ela. Além das Comunidades Ensino Superior (IES), sendo elas: Centro
Cooperativistas, a COOPA conta com um Universitário de Maringá (Unicesumar),
Núcleo de Mulheres e o Núcleo de Jovens Faculdade de Patrocínio (IESP), Instituto
Cooperativistas. Federal de Educação, Ciência e Tecnologia
A pesquisa foi desenvolvida na do Triângulo Mineiro, Universidade
mesorregião do Triângulo Mineiro/Rio Paulista (UNIP) e o Centro Universitário
Paranaíba. O Estado de Minas Gerais, de do Cerrado (UNICERP); o município con-
acordo com dados do IBGE (2010), é com- ta ainda com a Escola Agrotécnica Sérgio
posto por 12 mesorregiões e 66 microrregi- de Freitas Pacheco (EASFP) e a Fazenda
ões. A mesorregião do Triângulo Mineiro/ Experimental (FUNCEP).
Alto Paranaíba abarca sete microrregiões, O UNICERP oferece cursos de gradu-
dentre elas a de Patrocínio, onde se locali- ação como Administração, Agronegócio,
za o município com o mesmo nome. Agronomia, Cafeicultura, Ciências
Caracteristicamente uma região Contábeis, entre outros e ainda cursos
agrícola, o Triângulo Mineiro/Alto de Pós-graduação. A EASFP oferece o
Paranaíba, desde os anos 1970, vem curso Técnico em Agropecuária em mo-
se modernizando por meio de inten- dalidades Concomitante e Subsequente.
sos investimentos governamentais. A Fazenda Experimental FUNCEP tem
Economicamente, a região vem tendo des- o intuito de dar suporte aos cursos do
taque tanto no que tange a seu complexo UNICERP, em especial aos cursos de
agroindustrial de processador de grãos e Agronomia e Agronegócio; conta com
carne como pela constante modernização estruturas para as criações de gado, porco
na pecuária extensiva. Esta é uma das e granja de aves, para os cultivos e novas
regiões do país que melhor se adaptou tecnologias para a produção de banana,
ao novo padrão agrícola (BRANDÃO, café, milho, soja, maracujá, entre outros
1989). De acordo com Schuls, Gatti Junior e, ainda, parcerias com empresas ligadas
e Silva (2000, s.p.), “a região do Triângulo à pecuária leiteira.
Mineiro/Alto Paranaíba é um centro de A oferta de ensino superior no muni-
referência econômica e cultural para o cípio, bem como na região, possibilita que
Centro-Oeste e se constitui em polo de os jovens tenham maior acesso à formação

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e capacitação, o que por sua vez oportu- conciliam tal função com as atividades
niza a inserção dos jovens no mercado na unidade produtiva. Ao considerar o
de trabalho com melhor qualificação. No tempo de moradia, os respondentes que
Instituto Federal presente no município residem no meio rural desde que nasce-
são oferecidos os cursos técnicos em ram totalizam 15, sendo apenas um resi-
informática, eletrônica e contabilidade dente há 3 anos – desde que assumiu os
e ainda o Curso Superior em Análise e negócios familiares. Já aqueles que estão
Desenvolvimento de Sistemas. Para o pre- morando na cidade, apenas um nunca
sente estudo observa-se também a oferta morou no campo – esse caso específico
dos cursos superiores de Administração e corresponde a um jovem que residiu 10
Agronegócios na Faculdade de Patrocínio anos fora do país e retornou para assumir
(IESP). a propriedade da família, porém apenas
O município de Patrocínio, de acor- vincula a propriedade à atividade e não
do com dados do último CENSO agro- como local de moradia.
pecuário, apresenta o 3º maior PIB agro- Dos jovens rurais participantes da
pecuário da mesorregião do Triângulo pesquisa, apenas três já são associados da
Mineiro/Alto Paranaíba. Do total de mu- COOPA, os demais justificaram a não as-
nicípios da microrregião de Patrocínio (11 sociação por conseguirem realizar tudo no
municípios), sete são pertencentes à área nome do pai e demonstraram interesse em
de atuação da COOPA. A cooperativa foi se associar futuramente. Quanto ao tra-
fundada em 1961 e atualmente conta com balho, todos se declararam trabalhadores
2.898 cooperados. A produção de leite é o rurais. Aqueles que trabalham somente na
foco da cooperativa, embora ela também propriedade familiar totalizam 15 jovens,
inclua em seus negócios a produção de e um jovem, além de trabalhar na proprie-
café, utilizado para troca em seus estabe- dade familiar, ainda é contratado como
lecimentos comerciais. tratorista em uma propriedade vizinha;
seis filhos de cooperados trabalham na
5 AS PERCEPÇÕES JUVENIS SOBRE COOPA como técnicos de campo ou nas
O INCENTIVO DAS INSTITUIÇÕES lojas agrícolas.
Os jovens pesquisados, em sua
Dos 22 jovens entrevistados, a maioria (77,27%), não estão mais estu-
maioria (63,63%) tem idades que variam dando, porém isso se justifica por já terem
entre 18 e 24 anos. Quanto ao estado civil, concluído o curso superior e estarem tra-
86,36% são solteiros, sendo apenas dois ca- balhando na área de formação. Dez jovens
sados e um em união estável. Em relação possuem formação na área das atividades
ao gênero, a minoria (27,27%) dos jovens desenvolvidas nas propriedades e, destes,
é do sexo feminino. Não se pode afirmar nove possuem ensino superior; cinco são
que o fato de a maioria dos entrevistados formados em áreas administrativas e uma
serem homens signifique uma tendência jovem possui pós-graduação. Dos jovens
à masculinização rural, porque, além de que estão estudando atualmente (cinco),
a amostra ser reduzida considerando a quatro estão cursando agronomia (um
totalidade de jovens da região, o estado deles já é técnico agrícola), e uma jovem
de Minas Gerais e a cidade de Patrocínio iniciou o curso de engenharia civil.
não demonstram tal característica. Ao tratar das percepções desses jo-
Quanto ao local onde residem, vens sobre os estímulos que recebem tanto
72,73% dos jovens moram nas proprie- da cooperativa quanto de suas famílias
dades familiares, sendo que os demais para a permanência na propriedade fami-
residem na cidade, pois, em grande par- liar e, ainda, na atividade já desenvolvida
te, trabalham como técnicos de campo e por seus pais, quase a totalidade dos en-

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trevistados, como observado no Quadro 1, do mesmo incentivo por parte da COOPA,


respondeu de forma positiva em relação à o número de respostas positivas foi me-
família. Já quando questionados a respeito nor, mas também expressivo.

INCENTIVO PARA A PERMANÊNCIA DO JOVEM NO CAMPO/


%
ATIVIDADE AGROPECUÁRIA
DA FAMÍLIA 90,90
DA COOPA 68,18
Quadro 1 - Incentivo da família e da cooperativa para a permanência no campo e na
atividade agropecuária, jovens filhos de cooperados, COOPA.
Fonte: Pesquisa de campo, 2015.

De forma geral, os jovens percebem Em relação ao incentivo por parte


incentivo da cooperativa, em especial da COOPA, foram selecionados trechos
pela presença dos técnicos de campo nas de entrevistas que demonstram o papel
propriedades, mas o estímulo familiar de formação e informação atribuído a
é vinculado à tradição e torna-se mais essa instituição e que contribuem nas
significativo, conforme mostram os de- atividades desenvolvidas nas unidades
poimentos: de produção:
Meu pai nasceu aqui na fazenda Ajuda muito né. Se não fosse
né, o meu vô tinha as terras aí pe- pela Cooperativa acho que não
gou e passou pra eles, aí tinham 5 fazia esses cursos não né. Aqui é
hectares de café, ele pegou e plan- fácil, vem prá comunidade aqui,
tou, mas o sonho dele era planta é tudo pertinho de casa né, agora
15 hectares, 5 pra cada filho. Aí se nóis tivé que sair daqui pra ir
ele plantou esses 5 e vinha cuidar pra cidade aí já acho que é mais
e foi mexendo com leite. E a cada difícil né. (JOVEM 1).
ano começou a plantar mais um
pouquinho, mais um pouquinho Ah, incentiva sim, por exemplo,
e tá com 120 hoje. Aí a gente foi quando eu fiz técnico, a cooperati-
vendo que o negócio tava cres- va que me deu a bolsa de estudos
cendo demais e deixar na mão pra fazer, eu acho que isso já é
de funcionário não dava certo e um tipo de incentivo que ela dá.
foi a experiência que nós tivemos (JOVEM 13).
aqui, aí largou de mexer com leite
porque deixando nas mãos dos A cooperativa ajuda sim, estimu-
funcionário tavam acabando com la. Igual, tendo assistência técnica,
tudo que tinha. Aí eu resolvi lar- trabalhando direitinho e vendo
gar o escritório de contabilidade que dá lucro que tem rentabilida-
de incentiva muito. (JOVEM 14).
que a gente tinha lá e trabalhava
lá pra vim toma conta e trabalha
Assim, esse negócio de perma-
aqui na roça. (JOVEM 102).
nência depende muito de incen-
tivo familiar, mas a COOPA tem
Eles incentivam de mais de nós
vários instrumentos dentro dela
fica. Se fosse pelo meu pai eu tava
que ajudam a ter um norte, tem
mais lá plantando uma lavoura a
muito treinamento, bastante pa-
mais de café. (JOVEM 14).
lestra, que eu acho que estimula
o jovem, o adolescente a querer
2
Para manter o anonimato dos jovens, optou-se ficar na área rural. Porque daí a
pela atribuição numérica dos entrevistados. criança começa a participar das

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Jovens rurais e influências institucionais para a permanência no campo: 379
um estudo de caso em uma cooperativa agropecuária do Triângulo Mineiro

reuniões, adolescentes, aí vai gos- quatro jovens indicaram que já atuam nas
tando daquela atividade né, eu propriedades como sucessores; os demais
acho que isso tendência a querer afirmaram que nunca conversaram com
permanecer. (JOVEM 17). seus pais sobre esse assunto. No entanto,
Os jovens entrevistados foram ques- entre os filhos de cooperados pesquisados,
tionados também sobre o que a COOPA a maioria (86,36%) dos jovens gostaria de
ainda poderia fazer para incentivar os manter a propriedade e os negócios da
jovens a permanecerem nas atividades já família, considerando sua permanência no
desenvolvidas pelos núcleos familiares. meio rural. Alguns trechos das entrevistas
As respostas indicam uma demanda por exemplificam tal posicionamento:
novas tecnologias que resultem em maior Eu quero continuar aqui, traba-
eficiência e, consequentemente, em maior lhar prá gente é melhor. Minha
rentabilidade: família incentiva, por vontade
deles eu fico aqui sim. Eu até ia
Acho que o que mais tá faltando
prá cidade, trabalhar na Syngen-
agora é curso mesmo, que nem,
ta, mas aí não deu e eu fiquei. Pelo
vai numa reunião é um assunto,
meu pai e pela minha mãe eu fico
trata dele mas aí depois vai na ou-
aqui, eu que cuido do café, das
tra reunião e fala de outra coisa.
coisas aqui. (JOVEM 1).
Se eu quero agora fazer um curso
de inseminação, não tem. Apri- Ah, eu gosto desse meio, eu me
morar as técnicas sempre ajuda o sinto nesse meio. Igual, eu faço
jovem a querer ficar. (JOVEM 9). curso de agronomia porque eu
quero continuar, mesmo que não
Tem que incentivar a pessoa a
for assim na mesma fazenda, mas
enxergar a fazenda com um lugar eu quero continuar. (JOVEM 3).
diferente pra viver, porque quem
vive lá não é mais bobo, nada O que eu tenho de plano é traba-
disso. Tem que enxergar ela como lhar aqui [COOPA] até uma certa
uma empresa rural, até expandir idade e dali então ficar só lá na
mais os negócios, não só leite e propriedade mesmo. (JOVEM 8).
café. (JOVEM 12).
Eu tô fazendo o que eu gosto,
A cooperativa já faz, mas tem que cada dia mais eu aprendo, o que
intensificar de mostrar pro jovem eu aprendi na faculdade eu tô
que é uma atividade rentável, que podendo emprega aqui no meio
se fizer direitinho pode ganhar até rural, aqui em casa na fazenda.
mais que qualquer outro emprego Eu tô colhendo o que eu tô plan-
na cidade. Tem que levar é mui- tando. (JOVEM 9).
to exemplo, mostrar dos jovens
que começaram a tocar a mesma Eu tenho vontade de ficar, mas
atividade do pai, que já tá sendo é mais por amor mesmo, porque
o sucessor do pai e que tá dando é uma pequena propriedade. Eu
muito certo. Porque nesses caso o enxergo que tem como ganhar
filho tá empregando mais tecno- dinheiro mas às vezes acaba
logia que o pai e aí tá tendo mais que é mais fácil enxergar mais
sucesso ainda, isso aí é certo que oportunidade na cidade. Mas eu
incentiva o jovem. (JOVEM 16). queria mesmo era por uma ques-
tão de sucessão. Eu acho que é
Os jovens rurais participantes da um pecado não continuar aquilo
pesquisa também foram indagados se na que o meu pai tem e trabalhou a
propriedade de sua família já foi decidi- vida inteira e meu avô também.
do quem irá suceder aos pais. Somente (JOVEM 12).

INTERAÇÕES, Campo Grande, MS, v. 17, n. 3, p. 370-383, jul./set. 2016.


380 Amábile Tolio Boessio; Sheila Maria Doula

Uai eu gosto da fazenda, gosto fazenda com 17 anos falando eu


do lugar, gosto da atividade. Eu não vou mexer com isso aqui
gosto muito de café, minha espe- mais não. Sai, fui prá cidade,
cialidade dentro da agronomia trabalhei e decidi voltar, mas eu
mais é o café mesmo, então eu te- sai, porque não tava dando nada.
nho vontade de abrir mais lavora (JOVEM 14).
assim que der. Eu gosto, é paixão
mesmo, mas eu não gosto muito No meu ponto de vista não tá
de leite. (JOVEM 14). faltando nada. Que nem o seguin-
te, oportunidade pra vim tem,
Eu tenho interesse em continuar porque na fazenda tem serviço
sim, eu acredito que seja uma demais, no meio rural serviço
atividade rentável, atividade não falta, de qualquer lado. Mas
tranquila de trabalhar né, apesar também aqueles que não tem
de depender muito de clima, acesso à tecnologia é mais fácil de
ter algum contratempo, mesmo ir embora. É que a mecanização
assim você tem resultados bons, ela te dá oportunidade de fazer
por isso que eu sempre invisto lá. um serviço melhor, você trabalha
(JOVEM 16). mais com a cabeça e menos com
Finalmente, os jovens rurais entre- o corpo. O tamanho da área não
interfere, porque em 10 hectare
vistados responderam ao questionamento
cabe 10 pessoas trabalhando tran-
sobre o que falta no meio rural para que quilamente, porque não é pouco
o jovem ali permaneça. A falta de tecno- serviço. Mas também vai muito
logia e ainda, em dois casos, a percepção da vontade da pessoa de querer fi-
negativa da profissão de agricultor, esta car né. Que nem aqui ó, eu conhe-
especificamente ligada à mídia e também ço vizinho de 30 e poucos anos
à desvalorização por parte do governo, que não quis ficar porque o pai
foram respostas que deram certa coesão não dava liberdade, se ele fosse
à opinião dos jovens: ficar ele não tinha oportunidade
de tomar decisão, era do jeito que
O problema em geral é que a agri- o pai dele queria, aí ele desanima
cultura é vista ainda como uma mais fácil né. (JOVEM 10).
atividade que denigre a imagem,
e isso é cultural, não vai ser só A partir das entrevistas e levando
a cooperativa que vai mudar. em conta o que se destacou na literatura
Enquanto a mídia não exaltar o acerca do tema, evidencia-se que a per-
produtor como um fornecedor de cepção juvenil sobre o rural é formulada
comida, de alimento, enquanto
por meio de suas relações dentro da fa-
ficar exaltando só montadora de
carro e coisa assim, não vai adian- mília, das relações na comunidade e com
tar. É visto ainda como atividade a sociedade mais ampla, e das relações
rústica, tosca. (JOVEM 12). com instituições sociais que fazem parte
de seu constructo simbólico. Os jovens
Tá faltando lucratividade, porque da pesquisa percebem o rural como um
ninguém guenta só por paixão. local tranquilo, demonstram sentimentos
Sem dinheiro, não dá pra fazer de pertença familiar e ligação sentimental
nada. Eu acho que principalmente
com a terra, mas também incluem em seu
o ganho financeiro, porque se
campo de visão as instituições que atuam
o cara tá ganhando bem ele vai
pensar duas vezes antes de ir pra como estímulo/desestímulo a seus proje-
cidade, agora, se tá muito ruim, tos futuros.
ele vai procurar outros ganhos. Os jovens almejam tecnologia,
Eu mesmo já procurei, saí da conforto, certa estabilidade, qualidade

INTERAÇÕES, Campo Grande, MS, v. 17, n. 3, p. 370-383, jul./set. 2016.


Jovens rurais e influências institucionais para a permanência no campo: 381
um estudo de caso em uma cooperativa agropecuária do Triângulo Mineiro

de vida, ou seja, desejam um rural onde juventude que esta é uma profissão rentá-
possam construir suas vidas com acesso a vel e, quando aliada à tecnologia, torna-se
tudo o que podem ter em qualquer lugar. uma profissão menos penosa. Levando
Nesse sentido, por mais que a família os em consideração que esses jovens preten-
incentive para que permaneçam nas uni- dem suceder a seus pais, cabe mencionar
dades produtivas, se as instituições pre- que estes, em grande parte, pretendem
sentes no meio rural não oportunizarem fazê-lo mudando a atividade produtiva,
esses acessos, os jovens poderão optar por do leite para o café, por considerarem
sair do meio rural. Nota-se que as deman- que tal atividade exige menor esforço
das juvenis por cursos de capacitação/ físico, podendo ser tecnificada com mais
atualização, possibilidades de expansão facilidade. Daí decorre a necessidade, em
e diversificação dos negócios e tecnolo- futuro breve, de certa flexibilidade e adap-
gias que amenizem o trabalho pesado tação institucional por parte das famílias
e permitam maior lucratividade estão e também da cooperativa quanto a perfil
contempladas, ao menos teoricamente, da atividade econômica.
nas diretrizes que orientam a atuação e Considerando que as cooperativas
o papel das cooperativas no meio rural. têm, em seu princípio básico, atender as
necessidades de seus membros, cabe colo-
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS car que, mesmo o processo sucessório não
sendo de sua responsabilidade, pois é de
Neste artigo, objetivou-se investigar âmbito doméstico e privado, existem me-
a percepção dos jovens rurais filhos de canismos que ela pode utilizar para ameni-
famílias associadas da COOPA sobre o zar tais falhas comunicativas em relação às
incentivo das instituições – cooperativa unidades familiares, principalmente nos
e família – para sua permanência no momentos de reuniões nas comunidades,
meio rural e na atividade agropecuária. quando as famílias, e não apenas os coope-
Observou-se que, embora haja um per- rados, comparecem. As próprias famílias
centual maior de respostas em relação ao cooperadas participantes da pesquisa fo-
apoio familiar, na percepção dos jovens, a calizaram esses momentos coletivos como
cooperativa também é vista como institui- propícios para a abordagem dessa fase de
ção incentivadora. Os jovens da pesquisa transmissão patrimonial.
demonstraram a grande importância em Torna-se fundamental dispor do
sua escolha de permanência, tanto em fato de que a cooperativa está inserida em
função do incentivo familiar, como pelo uma região que oferece oportunidade de
fato de a cooperativa oferecer condições estudos e capacitação para esses jovens,
para melhorias na produção agropecuária. sem que precisem se deslocar, em alguns
Destaca-se que a maioria (86,36%) dos en- casos, nem mesmo de município, fato não
trevistados pretendem continuar nas pro- comum quando se analisa outros contex-
priedades familiares e ainda mantendo a tos de vivência da juventude rural. Os
atividade já desempenhada pela família. jovens participantes, quase em sua totali-
Foi perceptível nas entrevistas com dade, continuam residindo na zona rural
os jovens como a instituição cooperativa e deslocam-se diariamente para a cidade
pode adentrar no auxílio da permanência onde realizam seus estudos, o que possi-
juvenil e facilitar a reprodução social nas bilita vincular a formação com o trabalho
unidades produtivas familiares de seus na unidade de produção familiar. Nesse
associados. Para esses jovens, a coope- aspecto, a COOPA conta com filhos de co-
rativa deveria investir em cursos que os operados com nível de formação superior,
capacitem para continuar as atividades o que deveria ser valorizado como trunfo
dos pais, no sentido de mostrar para a em suas ações futuras. As demandas por

INTERAÇÕES, Campo Grande, MS, v. 17, n. 3, p. 370-383, jul./set. 2016.


382 Amábile Tolio Boessio; Sheila Maria Doula

capacitação, nesse caso, abarcam, na pers- BRUMER, Anita. A problemática dos


pectiva dos jovens, temas mais pontuais, jovens rurais na pós-modernidade. In:
o que facilitaria a oferta desse serviço por VII CONGRESO LATINOAMERICANO
parte da cooperativa. DE SOCIOLOGÍA RURAL, 2006, Quito
Finalmente, observou-se que o (Equador). Anales …, 2006.
segmento juvenil pertencente à amostra ______. As perspectivas dos jovens agricultores
desta pesquisa se reconhece como rural, familiares no início do século XXI. In: RENCK,
mas expõe um desejo de reconhecimen- Arlene; DORIGON, Clovis (Org.). Juventude
to das profissões ligadas ao campo, ao rural, cultura e mudança social. 1. ed. Chapecó,
considerar que a sociedade ainda vê SC: Unochapecó, 2014. p. 115-138.
esse espaço como atrasado. Em diversos BRUMER, Anita; SPANEVELLO, Rosani
momentos, os jovens demonstraram um Marisa. Jovens agricultores da Região Sul do
posicionamento positivo em relação à Brasil. Porto Alegre, RS: UFRGS; Chapecó,
profissão e à continuidade das ativida- SC: Fetraf-Sul/CUT, 2008. Relatório de
des, considerando que não mais se tem Pesquisa.
um trabalhador rural “matuto” e rústico, CARNEIRO, Maria José. O ideal rurbano:
mas sim um trabalhador mais vinculado campo e cidade no imaginário de jovens
às tecnologias. Talvez por isso tenha sido rurais. In: TEIXEIRA DA SILVA, Francisco
ressaltado o papel que a cooperativa deve Carlos et al. (Org.). Mundo rural e política. Rio
desempenhar como instituição mediadora de Janeiro: Campus, 1999.
no acesso e no avanço tecnológico dos CARNEIRO, Maria José; CASTRO, Elisa
jovens, de suas famílias e da população Guaraná de (Org.). Juventude rural em
local, pois, além do maior conforto do- perspectiva. Rio de Janeiro: Mauad X, 2007.
méstico e das facilidades nos processos CASTRO, Elisa Guaraná de Castro et al. Os
produtivos, a tecnologia contribuiria com jovens estão indo embora? Juventude rural e a
a valorização simbólica do espaço e das construção de um ator político. Rio de Janeiro:
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Sobre as autoras:
Amábile Tolio Boessio: Doutoranda em Extensão Rural na Universidade Federal
de Santa Maria (UFSM). Pesquisadora do Observatório da Juventude Rural e do
Observatório Mineiro do Cooperativismo. E-mail: amabiletolio@hotmail.com
Sheila Maria Doula: Docente no Departamento de Economia Rural, Pesquisadora do
Observatório da Juventude Rural e do Observatório Mineiro do Cooperativismo da
Universidade Federal de Viçosa (UFV). E-mail: sheiladoula@gmail.com

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