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O Código de Ética e a prática jornalística: uma análise de reportagens da Veja

e da Época 1

NASCIMENTO, Jefferson Luís Moreira 2


SOUSA, Marco Túlio de 3

GT DE JORNALISMO

Resumo: Em um contexto no qual as leis que envolvem o exercício do jornalismo estão passando
por alterações, propomos uma reflexão sobre uma das referências jurídicas nesse campo: o
Código de Ética dos Jornalistas. Dessa forma, toma-se como objeto empírico duas reportagens,
uma da Veja e outra da Época, sobre o mesmo assunto, e pretende-se verificar em que medida os
princípios estabelecidos no Código de Ética são desrespeitados. Além disso, procuramos
identificar se as infrações cometidas podem ser enquadradas nos crimes de injúria, calúnia e
difamação, os quais são as transgressões do Código Penal mais comumente atribuídas aos
jornalistas.

Palavras-chave: Código de Ética; jornalismo; Coreia do Norte.

1- Introdução

Neste trabalho partimos de uma constatação do pesquisador Ciro Marcondes Filho sobre a
ética na atividade jornalística. O autor, em seu livro “A saga dos cães perdidos”, afirma que no
jornalismo,

“há deslizes éticos relativos à forma de conseguir e divulgar as informações. Eles estão
associadas à várias formas de desrespeito ao outro com a finalidade de conseguir um
furo. Como os meios de comunicação vivem do e estimulam o impacto, o valor da
verdade da informação fica em segundo plano, importando o efeito-
choque”(MARCONDES FILHO, 2002, p. 132).

A conclusão do autor é que “os jornalistas continuam na profissão mais sujeita à prestação
de contas sobre ética profissional e a que menos seriamente considera essa demanda”

1
Trabalho orientado pelo professor Leonardo da Cunha Barreto Pereira - Professor de Ética na Comunicação
e Direito à Informação na Faculdade de Comunicação da Universidade Federal de Juiz de Fora.. Pós-graduando em
Direito Corporativo pelo IBMEC-RJ.
2
Graduando da Faculdade de Comunicação Social da UFJF. Bolsista do Programa de Educação Tutorial
(PET), financiado pela Secretaria de Ensino Superior (SESu, MEC).
3
Graduando da Faculdade de Comunicação Social da UFJF. Bolsista do Programa de Educação Tutorial
(PET), financiado pela Secretaria de Ensino Superior (SESu, MEC).
(MARCONDES FILHO, 2002, P 135). A partir desse questionamento, propomos uma discussão
acerca do cumprimento dos preceitos presentes no Código de Ética dos jornalistas.
O primeiro Código brasileiro foi criado em 1987 e vigorou até 2007, ano em que foi
atualizado em Congresso Extraordinário realizado em Vitória (ES). O documento fixa normas a
que deverá subordinar-se o profissional, nas suas relações com a comunidade, com as fontes de
informação, e entre jornalistas. Segundo Taís Ferreira, “A atualização do Código de Ética do
Jornalista Brasileiro reafirma valores que são essenciais para o exercício do jornalismo,
recordando à mídia sua função informativa, cidadã e educativa, possibilitando à sociedade um
debate mais amplo e verdadeiro sobre a comunicação”. (FERREIRA, 2007)

Para isso, foram selecionadas uma reportagem da Veja e outra da Época que versam
sobre os testes nucleares da Coreia do Norte ocorridos no mês de maio de 2009. Escolhemos o
presente tema por remeter a questões ideológicas ainda muito constantes nos veículos de
comunicação, mesmo com o fim do socialismo real. É o debate em torno da dicotomia
capitalismo x socialismo. Embora consideremos que todo texto, mesmo aqueles propostos como
eminentemente informativos, carregam visões de mundo daqueles que os escrevem, ou seja,
“todo dizer é ideologicamente marcado” (ORLANDI, 2005, p. 38). Supomos que, em assuntos
polêmicos como este, há uma tendência maior de aparecer a posição ideológica das revistas ou
dos próprios jornalistas. E, conseqüentemente, aumento da chance de ocorrerem transgressões do
Código de Ética.
Acreditamos que, nesses casos, os jornalistas deveriam observar o Código com maior
cautela para evitar, por exemplo, um direcionamento da opinião do leitor, não lhe dando
diferentes perspectivas de entendimento do assunto. Além disso, eles deveriam ter mais atenção
para não cometerem infrações jurídicas como injúria, calúnia e difamação.
O parágrafo 3º do artigo 140 do Código Penal diz que injúria consiste na utilização de
elementos referentes à raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição da pessoa idosa ou
portadora de deficiências de forma a ofender a dignidade ou decoro de alguém. A pena pode
variar de um mês a três anos. O artigo 141, ainda prevê como agravante do crime, ser cometido
contra um chefe de governo estrangeiro (caso do personagem principal do assunto abordado pelas
reportagens escolhidas), razão pela qual a pena é aumentada em um terço. O agravante ocorre
porque um chefe de Estado representa toda uma nação. Dessa forma, quando se ofende uma
pessoa de tal importância política, a população daquele país pode se sentir hostilizada também.
O crime de difamação ocorre quando é imputado a alguém fato ofensivo à sua reputação,
sendo sua pena, detenção de três meses a um ano. Por fim, calúnia acontece quando alguém é
acusado, falsamente, de um fato cometer um crime e a pena é de detenção de seis meses a dois
anos e multa.
Dessa forma, analisaremos se os jornalistas e as revistas podem ser acusados de alguns
desses crimes.

2 – Veja

Na mesma semana em que a Época divulgou a reportagem sobre Kim Jon-il, a Veja deu
grande destaque ao assunto, reservando, inclusive, a capa de sua edição nº 2115 ao tema. Na
capa, aparece uma imagem em computação gráfica do chefe de estado norte-coreano ao lado de
uma bomba atômica explodindo, o que já sugere uma relação entre guerra e o governo de Kim
Jon-il. A reportagem é assinada por Thomaz Favaro e Duda Teixeira.
O título da reportagem é “A bomba na mão de insanos” e o subtítulo é “A posse das
armas nucleares por países isolados e instáveis, como a Coreia do Norte aumenta o risco de o
gatilho atômico ser acionado por terroristas”. O título e o subtítulo da matéria já demonstram a
visão da revista sobre o tema. A Veja considera os governantes de Coreia do Norte e Irã
“insanos” e “terroristas”.
Segundo o Dicionário Escolar de Língua Portuguesa, do autor Domingos Paschoal
Cegalla (2005), o significado da palavra insano, enquanto substantivo, é pessoa doida ou
insensata. Pelo uso do termo, os repórteres e a revista podem ser acusados de cometerem
difamação e injúria. Em relação ao código podemos observar que este foi transgredido nos
seguintes pontos: no Artigo 6°, inciso VIII, que afirma ser dever do jornalista “respeitar o direito
à intimidade, à privacidade, à honra e a imagem do cidadão” (grifos nossos) e no artigo 12,
inciso III que diz que o jornalista deve “tratar com respeito todas as pessoas mencionadas nas
informações que divulgar”.
Ao longo da reportagem, a forma como os repórteres se dirigiram ao presidente da Coreia
do Norte foi uma maneira de ridicularizá-lo. Em determinado momento, Kim Jon-il foi chamado
de “figurinha ridícula que usa sapatos com salto plataforma para compensar a baixa estatura e o
topete ouriçado no estilo de Elvis Presley”. Em outro momento, o filho dele é chamado de
homossexual e é dito que este “prefere assistir a um concerto de Eric Clapton na Alemanha ao
tédio de um desfile militar” (grifos nossos). Isso dá margem a entender que os jornalistas
assumiram uma posição moralista ao associar os dois fatos: o de ele ser homossexual e o de
preferir assistir ao show a estar presente em um desfile militar em seu país. Novamente, caberiam
aos repórteres os crimes de difamação e injúria. Além disso, eles desrespeitaram, de novo, os dois
pontos do Código de Ética já sinalizados na situação anterior.
De acordo com o Código de Ética, artigo 6º, inciso XIV, “dever do jornalista combater a
prática de perseguição e discriminação por motivos sociais, econômicos, políticos, religiosos, de
gênero, raciais, de orientação sexual, condição física ou mental, ou de qualquer outra natureza”.
Isso também foi desrespeitado no seguinte trecho: “O fim da Guerra fria também fomentou o
comércio ilegal e a proliferação de programas nucleares em países periféricos, politicamente
conturbados, como o Paquistão, quando não governados por fanáticos, como o Irã”. Subentende-
se que o termo “fanáticos” está relacionado ao âmbito religioso. Neste caso, o leitor pode ser
induzido a entender que o chefe de governo iraniano pode ser uma pessoa perigosa, não só pelo
fato de ter o controle de um programa de armas nucleares, mas também por ser um fanático
religioso. Esse é um discurso ideológico que relaciona uma crença obcecada em uma determinada
religião à eclosão de guerras. Caberiam, mais uma vez, os crimes de injúria, difamação e a
transgressão dos artigos 6º, em seus incisos VIII e XIV, e do 12 no inciso III. Ainda podemos
considerar que houve calúnia, porque se refere ao governo paquistanês como tendo feito
comércio ilegal de armas nucleares sem fornecer dados que comprovem tal fato.
Percebemos também um uso excessivo de adjetivos como formas de caracterizar algo ou
alguém. Por exemplo, há os seguintes termos: “insanos”,“fanáticos”, “irracional”, “suicida”,
“figurinha ridícula”, “sujeito rechonchudo”, “aparência agonizante”, entre outros. Nesse sentido,
o Código de Ética é infringido no inciso II do artigo 11, que estabelece: “o jornalista não pode
divulgar informações de caráter mórbido, sensacionalista, ou contrário aos valores humanos,
especialmente em cobertura de crimes e acidentes” (grifos nossos). Além disso, todos os
adjetivos podem ser enquadrados como infrações aos pontos do Código de Ética 4 que foram
citados até agora e também como difamação e injúria.

4
A exceção é que os adjetivos “irracional” e “suicida” não podem ser considerados infrações ao incisivo
XIV do artigo 6º.
Também observamos que a reportagem não abriu espaço para que opiniões divergentes
fossem apresentadas. Os quatro especialistas entrevistados tinham pontos de vista semelhantes,
contrários ao governo de Kim Jong- il. Isso fere o Código de Ética, tanto no inciso III do artigo
7º, quanto no inciso I do artigo 12. O primeiro diz que “jornalista não pode impedir a
manifestação de opiniões divergentes ou o livre debate de idéias; já o último afirma que

“o jornalista deve, ressaltadas as especificidades da assessoria de imprensa, ouvir


sempre, antes da divulgação dos fatos, o maior número de pessoas e instituições
envolvidas na cobertura jornalística, principalmente aquelas que são objeto de
acusações não suficientemente demonstradas ou verificadas”(grifos nossos).

Podemos verificar as infrações sistematizadamente:

Infrações N° de transgressões ao N° de transgressões ao


Código de Ética Código Penal
Insano 3 2
terroristas 3 2
figurinha ridícula 3 2
homossexual que prefere
shows de rock a desfiles 3 2
militares
fanático 3 3
irracional 2 2
suicida 2 2
sujeito rechonchudo 3 2
aparência agonizante 3 2
não abriu espaço para opiniões 2 0
divergentes
Total 27 19

3 – Época

Na semana do dia 1º de junho, a revista Época dedicou cinco páginas e mais um terço de
página para tratar do assunto referido. A reportagem é assinada pela jornalista Kátia Mello, com
colaboração de João Caminoto e Danilo Soares. Há ainda uma matéria complementar que ocupa a
parte inferior de uma das páginas que é de autoria de Marco Antônio de Rezende.
O título da reportagem da Época é “O que quer este homem?” e o subtítulo é “Com os
dias contados no poder, Kim Jong-il resolveu testar a política externa conciliatória de Barack
Obama. Porque a mais recente provocação nuclear do ditador da Coreia do Norte é também a
mais séria de todas”. É possível perceber qual enfoque que a matéria vai dar sobre o tema (a
relação do fato com a política externa do presidente americano Barack Obama). Podemos
observar também o tratamento que será dado ao político norte-coreano. Ele é tratado como
“ditador”. Também notamos que a Época classifica a atitude de Kim Jong-il, ao lançar o míssil,
como uma “provocação”, denotando uma opinião sobre o ocorrido, uma vez que o presidente não
confessou que fez isso com a intenção de “provocar” o Ocidente.
No entanto, apesar de ter caráter opinativo, não consideramos que esse título chega a
transgredir o Código de Ética, visto que, ao longo da matéria, são expostos fatos que sustentam a
hipótese da revista. Por exemplo: há uma fala de Barack Obama em que ele diz que “a Coreia do
Norte está diretamente e irresponsavelmente desafiando a comunidade internacional” (grifo
nosso), o que mostra que essa não era simplesmente uma interpretação criada pelo jornal. Além
disso, verificamos, na reportagem, outros fatos que sustentam esse argumento de que houve uma
provocação. Já havia, anteriormente, um aumento da tensão no relacionamento da Coreia com o
Ocidente devido à expulsão de jornalistas e inspetores da ONU da usina nuclear e houve até uma
desavença com a China, sua aliada histórica, que se opôs à operação militar. Isso tudo leva a crer
que há evidência de que o ato de Kim Jong-il foi para provocar. Dessa forma, entendemos que o
Código de Ética foi respeitado no que se refere ao artigo 12, inciso II, que diz que o jornalista
deve “buscar provas que fundamentem as informações de interesse público”.
A reportagem, em determinado ponto, refere-se à atitude de Kim Jong-il como não sendo
apenas “um latido do ditador coreano em troca de benesses para seu país” (grifos nossos). Como
a palavra latido, quase sempre, é utilizada para indicar o ruído promovido pelas cordas vocais de
um cachorro, supõe-se que o uso desse termo teve teor pejorativo. Conclui-se, então, que o
Código de Ética foi transgredido no Artigo 6°, inciso VIII, o qual diz que é dever do jornalista
“respeitar o direito à intimidade, à privacidade, à honra e a imagem do cidadão” (grifos nossos).
Outra transgressão ocorre no artigo 12, inciso III que afirma que o jornalista deve “tratar com
respeito todas as pessoas mencionadas nas informações que divulgar”.
Além disso, constatamos que o fato de ter-se referido ao ato do político norte-coreano
como latido, pode ser considerado crime de injúria e difamação conforme o Código Penal
estabelece.
Durante a reportagem principal, percebemos que não houve transgressões significativas
ao Código de Ética além das já analisadas. Procurou-se trazer dados numéricos para embasar o
que estava sendo dito, poucos foram os termos utilizados para qualificar as pessoas citadas de
maneira depreciativa. Somente encontramos a palavra "latido", como já dissemos.
Na matéria complementar, aparece o uso de determinados adjetivos que podem ser vistos
como prejudiciais à imagem do presidente norte-coreano. O jornalista se refere a ele como "o
pequeno ditador", "mulherengo", "frágil" e "titubeante". Naquela primeira expressão, por
exemplo, é provável que as palavras "pequeno" e "ditador" foram associadas de maneira a
diminuir a força política devido a sua baixa estatura. Ao invés de o texto dizer "ditador pequeno",
o que aparece é "pequeno ditador". Uma análise linguistica mostra que foi dada maior
importância ao fato de ele ser "pequeno" do que de ser "ditador" pelo fato de aquele ter vindo
antes deste.
O segundo termo, "mulherengo", denota uma posição moralista assumida pelo jornalista.
Há aí uma transgressão novamente ao Código de Ética no que se refere ao ponto em que este diz
que é dever do jornalista respeitar as pessoas mencionadas.
"Frágil" e "titubeante" revelam a opinião do repórter em um texto que deveria ser, de
acordo com os cânones do jornalismo, fundamentalmente informativo. Em vez de dizer "frágil" e
"titubeante", o jornalista poderia utilizar termos mais precisos como, por exemplo, dizer que Kim
Jon-il estava com saúde debilitada. Neste caso, não podemos afirmar peremptoriamente, porém,
que houve transgressão do código, visto que, como já foi exposto anteriormente, é inatingível
uma neutralidade absoluta. Além disso, esta matéria tem um teor mais pessoal do que a outra,
pois o repórter narra experiências das quais ele participou e deixa isso claro, no início do texto,
quando diz que "assistiu em Pyongyang ao desfile militar de 25 de abril". A matéria se torna um
misto jornalismo informativo e opinativo, sendo difícil detectá-la como um artigo ou uma
reportagem. Mas supomos que ela não é um artigo uma vez que não está graficamente separada
da reportagem principal.
Concluímos, por fim, que a cobertura da Época transgride o Código de Ética nos artigos
seis vezes nos artigos 6° e 12, além de seis transgressões ao Código Penal: injúria e difamação
(lembrando que estamos levando em conta apenas os crimes de injúria, difamação e calúnia).
Podemos verificar isso abaixo de maneira sistematizada:
Infrações N° de transgressões ao N° de transgressões ao
Código de Ética Código Penal
latido 2 2
pequeno ditador 2 2
mulherengo 3 2
Total 9 6

4 – Considerações Finais

Baseados nas informações quantitativas apresentadas nos quadros, podemos inferir que a
reportagem da Veja pode ter transgredido mais o Código de Ética e o Código Penal, no que se
refere aos crimes de calúnia, difamação e injúria, do que a da Época. Somadas as principais
possíveis transgressões, enquanto a Veja teve 46 infrações, a Época cometeu 15. Além da grande
diferença numérica total, percebemos que a Veja pode ser acusada de calúnia e, em nenhum outro
momento, notamos na outra revista indícios de que os repórteres cometeram tal crime.
Ressalvamos, em contrapartida, que o Código de Ética tem alto teor subjetivo,
possibilitando algumas interpretações diferentes sobre determinados pontos. No artigo 2º, inciso I
por exemplo, é dito que “a divulgação da informação precisa e correta é dever dos meios de
comunicação”, não fica claro quais são os parâmetros para definir a precisão de um relato
jornalístico. Um outro exemplo é o artigo 6º, inciso XIV, quando se afirma que é “dever do
jornalista combater a prática de perseguição e discriminação por motivos sociais, econômicos,
políticos, religiosos, de gênero, raciais, de orientação sexual, condição física ou mental, ou de
qualquer outra natureza” (grifos nossos), esta expressão em negrito abrange muitos
significados possíveis e, diante disso, fica difícil delimitar o que seriam essas “possíveis outras
naturezas”. Nesse sentido, afirmamos que a nossa análise quantitativa não reflete de forma
peremptória as transgressões cometidas pelas revistas. O intuito dos quadros apresentados é
demonstrar a disparidade entre as duas reportagens no que tange ao respeito dos valores éticos
profissionais.
Apesar de os números encontrados não corresponderem, exatamente, à realidade dos
fatos, estes não são meramente aleatórios. Um fato que contribui para corroborar isso é o já
analisado uso excessivo de adjetivos e advérbios na Veja. Reconhecemos que toda produção
jornalística traz consigo posições ideológicas; como diz Eni Orlandi, “todo dizer é
ideologicamente marcado” (ORLANDI, 2005, p.38). E reconhecemos, também, que a
objetividade e a neutralidade jornalística são mitos. Porém, acreditamos que foi exagerado o
número de adjetivos utilizados com teor pejorativo para desqualificar Kim Jon-il em um texto
que deveria ser eminentemente informativo. Há um forte teor opinativo na matéria, que é vendida
como, meramente, informativa e objetiva.
A Época, por outro lado, procurou embasar sua argumentação com pesquisas empíricas e
ouviu os dois lados 5(entrevistou um porta-voz do exército norte-coreano), fato este que não se
encontra na reportagem da Veja. A Época também utiliza termos depreciativos à imagem do líder
norte-coreano, como: “latido”, “pequeno ditador” e “mulherengo”. Contudo, isso ocorre com uma
intensidade bem menor do que a Veja: esta apresenta 9 adjetivos pejorativos, enquanto a outra os
3 citados.
Temos de reconhecer também que os repórteres poderiam se defender utilizando preceitos
presentes no próprio Código de Ética. Eles poderiam se basear no artigo 6º, incisos I, X e XI. No
inciso I, diz-se que “é dever do jornalista opor-se ao arbítrio, ao autoritarismo e à opressão, bem
como defender os princípios expressos na Declaração Universal dos Direitos Humanos”. O
segundo afirma que “é dever do que “é dever do jornalista defender os direitos do cidadão,
contribuindo para a promoção das garantias jornalista defender os princípios constitucionais e
legais, base do estado democrático de direito”. Já o inciso XI estabelece individuais e coletivas,
em especial as das crianças, dos adolescentes, das mulheres, dos idosos, dos negros e das
minorias”. Os três incisos acima reforçam valores que não existem na Coreia do Norte, já que há
um regime político ditatorial naquele país. E fatos citados nas próprias reportagens confirmam a
repressão aos direitos individuais dos cidadãos norte-coreanos. Logo, os jornalistas poderiam
afirmar estarem defendendo princípios do Código de Ética. Contudo, é óbvio que essa defesa não
serve como justificativa para o uso excessivo de adjetivos e advérbios com teor sensacionalista e
para a matéria da Veja ter mostrado somente um lado do fato.
Outro argumento que poderia ser utilizado em defesa desses jornalistas é que o
cumprimento de todos os princípios do Código de Ética é uma tarefa árdua, complexa e polêmica,
como diz Luciene Tófoli (2008). A autora argumenta que a atividade jornalística está inserida no
modo de produção capitalista, voltado para a obtenção do lucro e, muitas vezes, submetida a
rotinas produtivas que escapam ao controle dos profissionais. Isso quer dizer que é muito difícil
para o jornalista, que teme ficar desempregado, não se adequar às demandas de notícias em

5
Isto está de acordo com o inciso I do artigo 12 do Código de Ética, que diz que o jornalista deve sempre
ouvir todas as pessoas e instituições envolvidas nas reportagens.
tempo real que tem de ser produzidas de forma atraente, espetacular e sensacionalista. Há uma
demanda de mercado para que isso seja feito na produção jornalística e, conseqüentemente, uma
pressão das próprias empresas para que isso aconteça, o que contribui para haver transgressões à
ética profissional.
Diante do que foi exposto, cabe a reflexão se o Código de Ética pode ser tido como
parâmetro para julgar se o trabalho de um profissional do campo jornalístico foi correto. Uma vez
que o documento é passível de múltiplas interpretações e ainda tem pontos que, dependendo da
situação, podem ser tidos como divergentes, a exemplo da situação analisada neste trabalho.
Pensamos que o Código tem sua validade no que se refere a traçar os preceitos
fundamentais para a prática jornalística voltada para atender os interesses dos cidadãos. E que,
como toda sistema de leis, tem falhas e requer um constante aprimoramento de acordo com as
mudanças sócio-históricas.

5 – Bibliografia

CEGALLA, Domingos Paschoal. Dicionário Escolar Domingos Paschoal Cegalla de Língua


Portuguesa. 1a edição, São Paulo: Companhia Editora Nacional, 2005.

FERREIRA, Taís. Prática Jornalística. A importância do Código de Ética. In Site do


Observatório da Imprensa, 28/8/2007. Disponível em:
http://www.observatoriodaimprensa.com.br/artigos.asp?cod=448CID002. Acesso: 28/11/2009.

GOMES, Luiz Flávio (org). Constituição Federal, código penal, código de processo penal.
Obra coletiva de autoria da Editora Revista dos Tribunais, com a coordenação de Giselle de Melo
Braga Tapai. 6º ed. rev. E ampl.. São Paulo: Editora dos Tribunais, 2004.

MARCONDES FILHO, Ciro. A Saga dos cães perdidos. 2º edição. São Paulo: Hacker Editores, 2002.

ORLANDI, Eni P. Análise de Discurso. Princípios e Procedimentos. Campinas: Pontes, 2005

TÓFOLI, Luciene. Ética no jornalismo. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008 (Coleção Ética nas Profissões).

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