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A noite vai chegando, pois o sol que entra por aquela

A espera greta lá em cima já deu o sinal, está sumindo, é o relógio


Por Ari de Oliveria Zenha dele, está quase na hora de voltar pra “casa”.
Hoje o dia foi brabo, e já anoitecendo não tinha
Ela espera seu homem. notícia alguma da conversa do sindicato.
Homem trabalhador, chão de fábrica, pega quatro É sempre aquela mesma coisa, o mercado tá ruim, não
conduções, passagem alta, ônibus lotado, mal conservado, vende, ou as vendas estão muito baixas, a empresa está
sujo na maioria das vezes, gasta horas a fio para chegar ao endividada, tem que cortar custos.
trabalho onde o espera um dia estafante. Trabalho repetitivo, Ele pergunta para si mesmo: acabamos de ter eleições
monótono... É de pouca conversa pois, segundo ele, e a presidenta eleita, em quem eu votei, prometeu várias
“conversar demais no trabalho atrapalha, o chefe não gosta coisas para nós trabalhadores e ela está fazendo o contrário,
e o patrão muito menos”. e o pessoal aqui está “pê da vida”. “Êta merda”, completou
Carrega sua marmita feita de madrugada ou no dia indignado.
anterior pela patroa, como gosta de chamá-la com seu Eu realmente não entendo esses tais economistas, diz
palavreado simples, mas cheio de significado e de gratidão ele, e acrescentou: são uma cambada de safados! Eu só
para com a companheira. queria que eles saíssem dos seus escritórios, de seus
Quando saiu de “casa”, as crianças ainda dormiam, só empregos de milhões, nos bancos, e viessem trabalhar aqui
a mulher havia levantado e preparado um minguado café, pelo menos uma semana pra ver o que é bom “pra tosse”.
afinal, ”saco vazio não para em pé”, já lhe falaram tantas São “uns sacanas”, finalizou.
vezes, mas para ele, nesta cidade grande, não tem essa de dar Eles acham que a gente não entende o que eles fazem
moleza, senão “dança”, perde emprego e o escasso salário, e e estão fazendo, disse para si, mas a gente entende e os
aí a coisa pega mesmo. resultados das coisas que eles fazem caem sobre nós!
Hoje ele está mais preocupado, o filho mais novo de Bom, mais um dia de trabalho se foi, mas a incerteza
dois anos anda perrengue, a mulher já o levou diversas vezes de continuar trabalhando, esta sim fica na cabeça da gente!
ao Posto de Saúde e nada, continua na mesma. Os outros Como vou falar com a Jacinta? Ah, meu Deus, vai ser um
quatro são uma “escadinha”, como ele diz. O mais velho tem auê danado! E as crianças, o aluguel, a comida, a luz, a água?
oito anos e está na escola, e a filha também; os outros dois e Ah, falando em água, é coisa que não tem lá na vila, mas nos
o mais novo, a mulher cuida. Ele sabe da labuta dela para bairros dos ricaços e no Palácio dos Bandeirantes tem. “Êta
criá-los. vida”!
O dia hoje promete ser daqueles, supõe. Sol O trânsito hoje parece que tá melhorzinho, menos
escaldante, e sua chegada ao trabalho não foi lá dessas carro, então vou chegar mais cedo em “casa”, mas não vou
coisas. Os companheiros o avisaram que vai haver cortes, ou falar nada com a minha mulher da situação, ela vai ficar
seja, desemprego, um dos inúmeros pavores aos quais estão “maluca”, já trabalha como uma “louca”, vende coisas, cuida
submetidos os trabalhadores, a incerteza de todos os dias. das crianças e ainda toma conta de duas das vizinhas.
Põe o macacão e toma o lugar de “sempre” junto ao Chegando em “casa”, a sua mulher, Jacinta, já notou
seu posto de trabalho. Ufa! O dia promete, diz para si alguma coisa diferente nele. Ele tentou despistar ao máximo
mesmo, calado, mas atento a tudo e a todos. para poupá-la e não disse nada, apenas que falaram pra ele
Em “casa”, as coisas vão indo. Ainda não tem casa que um tal de Levy, ministro da Fazenda, tá aprontando e
própria, paga aluguel de um barraco na periferia, bem longe com a concordância da Presidenta, e que uma tal de Kátia,
de tudo e de todos, pois não é assim a vida da grande maioria uma grande latifundiária e representante do agronegócio de
da classe trabalhadora?, vai dizendo para si mesmo. primeira hora, está como ministra da Agricultura, e que tinha
Há dez anos está nessa vida corrida e desgraçada, muita coisa mais acontecendo e que ninguém tá entendendo
como diz às vezes para a mulher, outras para si e a alguns nada. E foi finalizando a conversa. Jacinta, que esperou seu
companheiros. homem chegar o dia todo, foi cuidar das suas coisas com
Já lhe contaram que lá na vila onde mora as coisas uma baita indignação...
andam de mal a pior, pois o tráfico está entrando devagar e
a polícia também. Ele pensa: “a coisa não tá pra peixe”.
Hora do almoço, esquenta a marmita, isso quando dá.
Não come, engole quase mecanicamente a “comida”
preparada pela companheira, sempre a mesma coisa, não ♦ Ari do Oliveira Zenha é economista
muda. Quando tem carne, ah, uma alegria só, mas hoje não,
é ovo e mais algumas coisas para enganar o estômago e Fonte: Caros Amigos, 03 de março de 2015.
matar a fome .
Conversa com os companheiros do trabalho e o
assunto é o da entrada – demissão. Há palpites para todos os
gostos e uma única conclusão: “cabeças vão rolar”. O
representante do sindicato, ele ficou sabendo, estava lá para
conversar com os “home” para ver como fica a situação.
Trabalha lá há uns sete anos. Antes vivia de biscate e
era uma vida de cigano, danada de ruim. Não que agora não
seja ruim, mas pelo menos tem carteira assinada, décimo
terceiro, férias, fundo de garantia e cesta básica.

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