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amadePós- graduaçãoem Hi
stória
Núcl
eodeEst
udosem Históri
aSocialdaPolí
tica
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PROGRAMAÇÃO GERAL
CONFERÊNCIAS
MESA REDONDA
COMUNICAÇÕES DE PESQUISA
24 DE OUTUBRO / TERÇA-FEIRA
25 DE OUTUBRO / QUARTA-FEIRA
26 DE OUTUBRO / QUINTA-FEIRA
09:00 h às 10:30 h
Credenciamento
Hall dos Anfiteatros do ICH
10:30 h às 12:00 h
Sessão de Abertura e Conferência
Profa. Dra. Tânia Maria Tavares Bessone da Cruz Ferreira (UERJ)
O CEO, a SEO e os estudos dos Oitocentos
14:00 h às 15:30 h
Sessão de Comunicações 1 – Anfiteatro 2
Entre o patriarca e o bacharel: a complexa trajetória de D. Pedro II - Alessandra Bettencourt
Figueiredo Fraguas (UERJ)
“Antes de receber a vossa honrada carta já tinha resolvido seguir a carreira jurídica”: José
Antônio Gomes Neto e a conquista de uma colocação profissional no Alto Sertão baiano (1850-
1860) - Lielva Azevedo Aguiar (UFBA)
O Manifesto Político de 1867: Antônio Borges da Fonseca e a escrita de si - Carolina Paes
Barreto da Silva (UFF)
“O que é política?”: a escrita de Machado de Assis e a atuação política da família Faria Fraga no
contexto da Lei o Sexagenário (1883-1885) - Laiane Fraga da Silva (UEFS)
19:00 h às 21:00 h
Conferência
Prof. Dr. Rodrigo Camargo de Godoi – UNICAMP
Política e edição no Império: o caso de Francisco de Paula Brito
09:00 h às 10:30 h
Sessão de Comunicações 5 – Anfiteatro 2
A costura do território: os agentes e as ferrovias no Centro-Sul brasileiro de uma perspectiva
da Global History - Welber Luiz dos Santos (UFOP)
Desenvolvimento populacional de um centro urbano do sudeste escravista: Juiz De Fora, 1831
a 1888 - Caio da Silva Batista (UFJF)
Conflitos de interesse no litoral do Rio De Janeiro: trabalhadores, comerciantes e políticos no
processo de criação da Capitania do Porto da Corte (1845-1869) - Edilson Nunes dos Santos Jr.
(UFF)
A fortaleza de São João: remodelações oitocentistas - Maria Lectícia Oliveira Constanrin
Raptopoulos (UNIRIO); Anita Correia de Lima Almeida (UNIRIO)
10:30 h às 12:00 h
Conferência
Profa. Dra. Beatriz Bragoni (Universidad de Cuyo – Argentina)
Unificación nacional, sistema federal y gobierno representativo: apuntes sobre la historia del
poder y la política del siglo XIX latinoamericano
14:00 h às 15:30 h
Sessão de Comunicações 7 – Anfiteatro 2
Imprensa e a identidade política: a elite rivadaviana e seu projeto de nação - Juliana Gomes
de Oliveira (UFJF)
Um peruano entre os “construtores da nação”: uma análise dos principais artigos de Santiago
Nunes Ribeiro na revista Minerva Brasiliense - Thaís Ferreira Pilotto (UERJ)
Construção de Estados nacionais na periferia: linguagens, agendas e arcabouços
institucionais em um estudo comparado de Argentina, Brasil e Chile (1830-1870) - Lidiane
Rezende Vieira (UERJ)
Da queda de Rosas à guerra do Paraguai: pax armada no Rio da Prata (1852-1865) - Pedro
Gustavo Aubert (USP)
16:00 h às 18:00 h
Sessão de Comunicações 9 – Anfiteatro 2
O lugar da vida na operação historiográfica em Jules Michelet e a escrita da história na França
no início do século XIX - Renato Fagundes Pereira (UFG)
Auguste de Saint-Hilaire, a história ilustrada e a civilização dos povos: a Humanidade entre
práticas e representações - Rafael Augusto Gomes (UFSJ)
Em nome da pátria e do cidadão: a ação da linguagem liberal patriótica no processo de
independência do Brasil (1822) - Jorge Vinicius Monteiro Vianna (UFES)
Linguagens políticas disponíveis no Brasil e seus usos nas décadas de 1850 e 1860 - Beatriz
Piva Momesso (UERJ)
Existe uma confusão entre público e privado no Brasil? Um olhar a partir da História
Conceitual - Renato de Ulhôa Canto Reis (UFJF)
Sessão de Comunicações 10 – Sala A-I-12
A metáfora do “Reino de Deus” no jornal Imprensa Evangélica (1864-1889) - Jorge William
Falcão Jr. (UFJF)
A liberdade é uma bênção: o presbiterianismo e o abolicionismo no segundo reinado brasileiro
- Pedro Henrique Cavalcante de Medeiros (UFRRJ)
Por um estudo das congregações religiosas no século XIX: a congregação da missão de São
Vicente de Paulo e o Colégio do Caraça - Thales Contin Fernandes (UFJF)
Laurentino Inocêncio dos Santos, um curandeiro do Oitocentos: referências e possibilidades
na cidade do Rio De Janeiro - Eduardo Possidonio (UFRRJ)
Os desafios público-religiosos enfrentados pelo Conselho de Estado (1842-1870) - Eliene da
Silva Nogueira (UFJF)
19:00 h às 21:00 h
Conferência
Prof. Dr. Carlos Garriga – Universidad del País Vasco (Espanha)
Tradición, Constitución, Estado. Sobre América Latina en el siglo XIX
09:00 h às 10:30 h
Sessão de Comunicações 12 – Anfiteatro 2
A chegada das Filhas da Caridade ao Brasil no oitocentos e suas repercussões na história da
vida religiosa feminina local - Melina Teixeira Souza (UFF)
Condição feminina e relações de poder nos Oitocentos: a documentação do Recolhimento de
Santa Clara de Sorocaba - Bruna de Oliveira Garcia (UNIFESP)
Mulheres Chefes de domícilio no Distrito da Vila de Santo Antônio de Sá (1797) - Dermeval
Marins de Freitas (UFF)
10:30 h às 12:00 h
Mesa Redonda
Profa. Dra. Silvana Mota Barbosa – UFJF
Coordenação
Profa. Dra. Iara Lis Schiavinatto – UNICAMP
Entre a liturgia política e a noção de si: a virtude em questão
Prof. Dr. Alexandre Mansur Barata – UFJF
Trajetórias e narrativas de uma perseguição: Hipólito José da Costa e a Inquisição
Prof. Dr. Luiz César de Sá Júnior – PNPD/UFJF
Os cavalos de Gulliver: humanidade, animalidade e razão no Século das Luzes
14:00 h às 15:30 h
Sessão de Comunicações 14 – Anfiteatro 2
Pela “decência dos santuários” e “conservação dos homens”: a necessidade da construção de
cemitérios extramuros na província de Minas Gerais (1828-1857) - Pâmela Campos Ferreira
(UFJF)
A proteção social no Brasil imperial: a trajetória do montepio geral dos servidores do Estado -
Marconni Marotta (UFF)
A cidade mendicante: uma cartografia da mendicidade na cidade do Recife oitocentista (1840-
1870) - Grasiela Florêncio de Morais (UFPE)
Convidando os vivos: as formas de sentir o morrer em Juiz de Fora - Leandro Gracioso de
Almeida e Silva (UFRJ)
16:00 h às 18:00 h
Sessão de Comunicações 16 – Anfiteatro 2
A trajetória de Dom Domingos Antônio de Souza Coutinho: vida, diplomacia e sociabilidade
(1762-1833) - Débora Cristina Alexandre Bastos e Monteiro de Carvalho (UFJF)
“De Sabará para o Rio de Janeiro”: um ensaio sobre a trajetória de Francisco de Sousa Guerra
Araújo Godinho (1800-1808) - Nara Maria de Paula Tinoco (UFRRJ)
Uma disputa na corte palaciana de D. Pedro I: uma breve análise sobre as correspondências
trocadas entre Francisco Gomes da Silva e o Marquês de Barbacena - Rafael Cupello Peixoto
(UERJ)
A nacionalização da luta antiescravista: O abolicionista Ferreira de Menezes em Juiz de Fora
- Minas Gerias (1880) - Fábio Augusto Machado Soares de Oliveira (UFJF)
O deputado “sem juramento”: a efêmera celebridade de Monteiro Manso e sua participação na
propaganda republicana – 1888- 1889 - Marta Lúcia Lopes Fittipaldi (UFJF)
Sessão de Comunicações 17 – Sala B-I-07
“O bem que desempenhou no cargo para que foi eleito”: a eleição de juízes de paz no contexto
da cabanagem - Danielle Figuerêdo Moura (UFPA)
De olhos atentos ao andamento da justiça na província: a atuação dos juízes na pauta de
discussões do Conselho de Governo (1827-1834) - Eduardo da Silva Jr. (UFJF)
As luzes da educação: o Atheneo Provincial e sua missão civilizadora - Meryhelen Alves da
Cruz Quiuqui (UFES)
Representação da navalha e da bayoneta: a crítica ao sistema eleitoral do império - Kátia
Sausen da Motta (UFES)
Ser estrangeiro na província de Santa Catarina no século XIX - Cássila Cavaler Pessoa de Mello
(UFSC)
Este trabalho visa refletir sobre a complexidade da trajetória de d. Pedro II (1825-1891), a partir
do questionamento das biografias canônicas, que reforçam as teses do imperador erudito,
diletante e mecenas, por um lado, e do conservadorismo e da teatralização do poder, por outro
lado. Pontuando aspectos inéditos ou apenas tangenciados da trajetória do ex-imperador, a
proposta é verificar os indícios deixados por Gilberto Freyre e Sérgio Buarque de Holanda que,
embora não tenham aprofundado seus argumentos, apontaram para um imperador que cada
vez mais se desconectava do projeto político pensado pela elite imperial no período pós-
independência. Assim, ao contrário das assertivas que reiteram o imobilismo na trajetória de
d. Pedro II, o trabalho busca apresentá-lo como um indivíduo paradoxal e complexo, do qual,
nem as biografias laudatórias e hagiográficas, nem as biografias que pretendem atribuir um
sentido linear à sua vida, conseguem dar conta. Com base em intensa e extensa pesquisa na
documentação de caráter privado de d. Pedro II, custodiada pelo Museu Imperial, composta
por 44 diários, correspondências, minutas de documentos oficiais, resumos das reuniões do
Conselho de Estado, cadernos de estudos e traduções, entre outros, objetiva-se defender a
hipótese de que, desde o final da década de 1850 e, sobretudo, a partir de 1871, ano da sua
primeira viagem ao exterior, d. Pedro II conformou uma nova rede de sociabilidade, mormente
com intelectuais e cientistas, que favoreceu o rompimento com o projeto político
patrimonialista e a sua aproximação com o ethos burguês. Assim, o trabalho visa desconstruir
a tese do imobilismo e apresentar as tensões entre o agente social, d. Pedro de Alcântara, e a
estrutura social brasileira - agrário-aristocrática e patrimonialista. O conflito do agente em
sua passagem do ethos aristocrático ao ethos burguês pôde ser percebido a partir da
valorização de novos capitais (o cultural sobre o social), das lutas que perpassavam os campos
e, particularmente, da relação de forças entre a ortodoxia – a dominação tradicional, baseada
na pessoalidade e nas distinções sociais – e a heterodoxia – a dominação burocrática,
fundamentada na laicização do pensamento, no cientificismo, na burocratização racional do
Estado e na separação entre as esferas pública e privada. Neste sentido, seguir as pistas
deixadas por Freyre e Holanda, que identificaram um imperador paradoxalmente “entre o
patriarca e o bacharel” e, a partir das novas abordagens historiográficas que permitem uma
leitura diferenciada do arquivo pessoal de Pedro II e de outras fontes a ele relacionadas, revelar
uma perspectiva inédita sobre a trajetória do segundo imperador do Brasil é o desafio a que
nos propomos.
Palavras-chave: D. Pedro II; Biografias; Trajetória.
O objetivo dessa comunicação é debater o boato de reescravização dos homens de cor livres e
libertos como uma das motivações que levaram milhares de homens pobres a pegarem em
armas contra o governo imperial em Minas Gerais no ano de 1842. As principais fontes
utilizadas, além da bibliografia existente e de alguns textos memorialísticos, foram os
periódicos mineiros: Pregoeiro Constitucional (Pouso Alegre), Estrella Mariannense (Mariana),
O Universal (Ouro Preto), o Guarda Nacional Mineiro (Ouro Preto), O Correio de Minas (Ouro
Preto), o Publicador Mineiro (Ouro Preto), o Compilador (Ouro Preto) e o Arauto de Minas (São
João Del Rei). Foram estudadas folhas posicionadas aos dois lados do conflito, e também no
Compilador existem discursos de deputados provinciais de ambos os lados. Dentre os motivos
que explicariam a revolta de 1842, repetidos em manifestos e representações estavam a
recriação do Conselho de Estado e, principalmente, a aprovação da lei que reformava o Código
do Processo. Para os revoltosos a recriação do Conselho de Estado resultaria no “poder de uma
oligarquia”, e a reforma do Código do Processo Criminal geraria um quadro de “despotismo”.
Ao mesmo tempo defendia-se a queda do Ministério de 23 de março de 1841, criador das “duas
leis de sangue”. Todavia vários historiadores têm procurado relativizar o peso das referidas
motivações e buscado entender o que teria levado milhares de homens pobres a arriscarem
suas vidas ao se envolverem no conflito. A pesquisa nos referidos periódicos tem possibilitado
a ampliação dessas motivações, tornando o contexto que antecedeu à eclosão da revolta muito
mais complexo. Assim outros motivos aparecem nas fontes consultadas, tais como: a
perseguição aos opositores, incluindo o recrutamento militar; a repressão à imprensa de
oposição, que em Minas Gerais já estava toda calada em maio de 1842; a possibilidade de um
maior controle das eleições pelo governo; por fim, o assunto dessa comunicação, o medo de
escravização de libertos ou livres. Depois de constatar a difusão desse boato em Minas Gerais
em 1842, a comunicação analisará sua presença em eventos políticos anteriores como, por
exemplo, quando da insurreição de Santa Rita do Turvo (atual Viçosa, no final de 1831). Em
seguida tratará do perigo real de escravização de libertos ou livres na sociedade brasileira
oitocentista. Por fim analisará que o medo da reescravização dos homens de cor era mais
relacionado à reforma do Código do Processo do que a princípio se imagina.
Por muito tempo a historiografia reservou à esfera provincial de poder um papel diminuto na
conformação dos interesses do Império. No que se refere à atuação dos presidentes de
província a situação não foi diferente: usualmente atribui-se pouca ou nenhuma margem de
ação aos presidentes, de maneira que esses não teriam poder efetivo para colocar qualquer
política em prática, muito embora se reconheça a importância estratégica da existência do
cargo. Para além disso, costuma-se repetir as mesmas ponderações sobre a política de
nomeação e a função principal do cargo. Visando avançar na compreensão do funcionamento
da presidência da província buscamos investigar empiricamente os elementos
frequentemente usados para caracterizar os presidentes, a fim de compreender as suas
implicações tanto para a administração da província quanto para as interações entre o
governo central e a elite regional. Para esse fim, circunscrevemos a análise, inicialmente, à
província do Rio Grande do Sul, no período que vai de 1845, após o final da revolução
Farroupilha (revolta que afetou toda a província do Rio Grande do Sul e estabeleceu uma
estrutura de governo paralela à estrutura imperial), e se estende até o final do Império, em
1889. O primeiro passo foi construir um perfil daqueles que exerceram esse cargo. Com esse
objetivo realizamos um estudo prosopográfico baseado em elementos da trajetória dos
indivíduos que desempenharam tal função, tais como naturalidade, idade, formação
educacional, cargos ocupados e o tempo que permaneceram à frente da presidência. Assim,
observamos que, como a historiografia já apontava, a maioria dos presidentes era proveniente
de outras regiões do Império, reflexo do desejo do governo central de nomear sujeitos que
estivessem descomprometidos com os interesses das elites regionais. Todavia, as nomeações
ocorriam, majoritariamente, dentro de um universo restrito composto por políticos que
tinham formação em direito. A resultante disso era que muitos dos indivíduos que ocuparam
a presidência, já nutriam laços com membros das elites provinciais, o que possivelmente
influenciava a forma como administravam a província e enfraquecia as pretensões do
governo de imputar às províncias um funcionário que fosse exclusivamente fiel ao governo
imperial. Outro traço constatado foi que a principal área de atuação profissional dos
presidentes era a política. Apesar disso, a passagem pela presidência não constituiu,
necessariamente, uma etapa de treinamento para ascensão na carreira, uma vez que alguns
dos presidentes já faziam parte da elite política imperial à época em que foram nomeados para
o esse posto. Ademais, cientes da diversidade econômica, política e social existente entre as
diversas províncias que integravam o Império, coletamos dados referentes à formação
educacional e naturalidade dos presidentes de outras províncias (Bahia, Pernambuco, Minas
Gerais e Santa Catarina) no período em foco, a fim de construir um panorama que nos
permitisse atentar para as peculiaridades e traços comuns dos presidentes de província do
Rio Grande do Sul. Desse modo, constatamos que apesar de haver uma explícita política de
provimento do cargo de presidente de província, os limites dessa orientação podiam variar de
acordo com a província em questão.
O Brasil é notoriamente conhecido como a nação que recebeu o maior número de escravos
provenientes da África. Minas Gerais, embora estivesse situada no interior do país, a partir do
século XVIII, devido à descoberta do ouro e a consequente exploração desta riqueza mineral,
acabou por se tornar uma das “margens do Oceano Atlântico”, estando a partir de então
indissoluvelmente ligada ao continente africano. Considerada como uma das maiores
importadoras de escravos dentre todas as províncias brasileiras, a região mineira absorveu a
maior parcela dos cativos novos que chegaram ao Rio de Janeiro na primeira metade do
século XIX. Ao longo dos anos, as pesquisas que se dedicam a analisar o tráfico atlântico de
escravos cresceram em volume e importância, e muitos são os estudos que abordam as rotas,
os números, as redes comerciais e os homens que estavam envolvidos nesse comércio
marítimo. Não obstante, ainda que se trate de uma temática amplamente discutida e
pesquisada, pouco se conhece acerca do transporte e distribuição terrestre dos mancípios
africanos que chegaram ao Rio de Janeiro. O tráfico de escravos não terminava com a chegada
dos navios e da “carga humana” ao mercado do Valongo. Após a travessia atlântica, um longo
percurso era percorrido pelos cativos que, por terra, eram levados e redistribuídos pelo interior
da região Centro-Sul do país. Não era uma jornada fácil, o caminho era longo e demandava um
esforço contínuo. Que a maior parte dos escravos que entraram em Minas Gerais foi
encaminhada para a Comarca do Paraibuna, situada na parte sul da Zona da Mata mineira,
não é novidade. No entanto, ainda que os números e o volume desse comércio sejam
largamente conhecidos, pouco ainda se sabe sobre os homens que estiveram envolvidos com
essa atividade mercante. Dessa forma, por meio de um intenso cruzamento entre os Registros
de despachos de escravos e de passaportes lançados pela Intendência de Polícia da Corte
entre os anos 1809 e 1833, e das Listas Nominativas de Habitantes para o ano de 1831, referentes
aos distritos de Santo Antônio do Juiz de Fora e Chapéu D’uvas, o presente trabalho buscará
apresentar os resultados iniciais de uma pesquisa ainda em fase de desenvolvimento. Quem
eram os homens que estavam envolvidos com esse comércio? Qual o perfil dos indivíduos que
se dedicaram a transportar esses escravos pelos sinuosos caminhos que ligavam a
capitania/província do Rio de Janeiro às Gerais? Como eram realizadas essas viagens?
Quantos cativos eram levados? O comércio caracterizar-se-ia por um pequeno número de
viagens e grandes remessas de escravos, ou por pequenos despachos e um maior número de
deslocamentos? Essas são algumas das questões que a presente comunicação buscará
responder. A nosso ver, a análise dos proprietários comerciantes que estavam envolvidos com
o comércio e a redistribuição terrestre dos escravos, muito poderá contribuir com a
historiografia alusiva ao tema. Primeiro, por se tratar de um assunto ainda pouco explorado, e,
segundo, por utilizar e apresentar as artimanhas de uma fonte histórica extremamente rica,
porém ainda pouco conhecida e utilizada: os registros de despachos de escravos e de
passaportes lançados pela Intendência de Polícia da Corte.
Antônio Paulino Limpo de Abreu, agraciado com o título de Visconde de Abaeté em 1854, foi
um político renomado, nascido em Portugal, e que possuiu importantes cargos no interior do
governo imperial brasileiro. Limpo de Abreu se muda para o Brasil aos doze anos de idade, em
1810, juntamente com sua mãe, após o falecimento de seu pai. No continente Americano, é
criado por um tio, devido a precoce morte de sua mãe. O político retorna à Portugal para obter
sua formação superior em direito na Universidade de Coimbra. Ao se formar e voltar ao Brasil,
inicia sua trajetória política como juiz de fora e chega à presidente do Senado, cargo que
manteve durante 12 anos consecutivos, e membro do Conselho de Estado. Limpo de Abreu é
considerado liberal moderado, partidário do constitucionalismo e sua atuação foi importante
durante processos de certos episódios da história do país, como por exemplo, a Independência,
a promulgação da Constituição etc. Como juiz de fora na vila de São João Del Rei, cargo no qual
permaneceu por dois anos, recebe Dom Pedro quando este viaja à província de Minas Gerais
em busca de apoio político. Além do apoio ao regente na ocasião da viagem, Limpo de Abreu,
em nome da Câmara, envia representações a ele apoiando a decisão pela independência. No
ano de 1823, é nomeado ouvidor da comarca de Paracatu e, em 1826, ainda nesse cargo, é eleito
deputado pela província de Minas Gerais, sendo reeleito até 1841 e, posteriormente, de 1845 a
1847. Após a abdicação de Dom Pedro I, o país passa por um período conturbado, momento em
que acontecem revoltas em diferentes partes do território, em Minas Gerais, por exemplo, no
ano de 1833, os revoltosos conseguem ocupar as repartições públicas. Diante desse cenário
Limpo de Abreu, que já era conhecido no país devido à sua atuação na Câmara dos deputados,
é nomeado pela regência como presidente da província com o objetivo de acalmar os ânimos.
Devido ao fato de discordar de algumas atitudes tomadas pelo ministério em relação a punição
dos revoltosos, Abreu pede demissão do cargo em dezembro de 1835. O presente trabalho, é
ainda uma investigação inicial, que se insere, portanto, nas pesquisas de trajetórias
individuais e tem o objetivo de assinalar e discutir alguns pontos da trajetória política de
Antônio Paulino Limpo de Abreu na província de Minas Gerais, onde sua carreira teve início.
Com isso, pretendemos contribuir para os estudos acerca da trajetória de um reconhecido
político, Visconde de Abaeté, bem como, propiciar uma maior reflexão sobre o papel das
províncias, câmaras e outras instituições localizadas fora da Corte, no processo de
consolidação do Estado brasileiro.
A proposta deste artigo é fazer uma exposição do andamento atual da pesquisa que estou
desenvolvendo para dissertação de mestrado. A intenção do estudo é entender as estratégias
de sobrevivência, com foco no mundo do trabalho, das mulheres sozinhas em um contexto
provincial de rebuliço político, à época da última revolta liberal do Império, a insurreição
praieira. Para isso, serão analisados os anúncios das mulheres viúvas nos dois jornais diários
pernambucanos em circulação durante os anos de 1842 e 1853, o Diário Novo e o Diário de
Pernambuco. A imprensa é entendida enquanto prática social, como um espaço de debate
público, que ao mesmo tempo condensa e constrói múltiplas redes de poder. As viúvas são
como um filtro de representação para pensar as experiências das mulheres sozinhas na
sociedade recifense oitocentista - estavam inseridas no mundo público, seja nos negócios, na
política ou no mundo do trabalho. Elas conviviam com outras mulheres sozinhas que também
eram chefes de famílias, mas que não carregavam a respeitabilidade do “título” de viúva.
Pretendo analisar como se constitui o protagonismo feminino diante da viuvez e como se
procede a quebra da normatização dos papéis sociais nessas situações. As viúvas anunciavam
nos jornais os próprios ofícios, os próprios negócios (desde escolas de meninas, a livrarias e
lojas de “fasendas”), participavam de leilões, compravam e vendiam mercadorias e
escravizados/as. A condição social de viúva é adquirida de forma não natural. Nesse trabalho
as “viúvas” não serão entendidas como um grupo natural, nem homogêneo dentro da
sociedade pernambucana. Com a morte dos maridos, elas se tornariam tutoras dos bens e dos
filhos, muitas vezes, mantendo não só a unidade doméstica, mas o resguardo dos bens
herdados. Herança essa que podia ser apenas um acúmulo das dívidas adquiridas pelo “seu
casal”, nos termos da época. Em contraponto às mulheres casadas, as viúvas estavam
associadas a um estado de solidão e desamparo. As regras e comportamentos sociais
impostos à elas deviam, na verdade, variar de acordo com a condição social. Os próprios
valores de casamento e organização da família nos meios senhoriais não se estendiam aos
lugares mais pobres, repletos de homens e mulheres com pouca ou nenhuma propriedade.
Antes de se tornarem viúvas, algumas dessas mulheres já trabalhavam. Na tarefa de suprir a
vida material da família, após a morte do marido, elas não estavam sozinhas. Eram amparadas
por comadres, compadres e até parentes próximos, formando relações de solidariedade. Na
tentativa de reivindicar o lugar das mulheres nas narrativas históricas, para colocar as
mulheres como participantes ativas, a pesquisa está inserida no campo da história social,
usando o gênero como categoria de análise histórica. Assim, a intenção é mostrar que as
viúvas estavam presentes no dia a dia da província e, porque não dizer, aquecendo a economia.
O paraibano Antônio Borges da Fonseca (1808-1872) foi um redator que desempenhou uma
marcante atividade jornalística no Império brasileiro. Pode-se dizer que o seu itinerário se
entrelaçou com a história da imprensa do Brasil Oitocentista: fundou cerca de 23 jornais em
diferentes províncias – Paraíba, Rio de Janeiro e Pernambuco –, ao longo de 1828 a 1869.Além
de ter atuado intensamente na imprensa, teve participação destacada nas Noites das
Garrafadas, no Sete de Abril de 1831 e na Rebelião Praieira de 1848 e 1849.Durante este último
conflito, escreveu o famoso Manifesto ao Mundo, um documento que pregava a instalação de
uma Assembleia Constituinte, a qual deveria realizar, principalmente, o voto universal, a
República e a nacionalização do comércio a retalho. Borges da Fonseca foi condenado, junto
com oito integrantes da Praieira, à prisão perpétua, como cabeça da rebelião, de acordo com o
art. 110 do Código Criminal. Recebeu anistia em 1852. No final de sua carreira política, em 1867,
escreveu uma autobiografia, intitulada O Manifesto Político: apontamentos de minha vida
política e da vida política do dr. Urbano Sabino Pessoa de Mello. No decorrer deste escrito,
percebe-se que a sua intenção era difundir e cristalizar uma identidade de si. Num empenho
de ter reconhecimento público, buscou mostrar que se projetou como tribuno, revolucionário,
republicano e líder popular. Eram por esses atributos que ele merecia ser lembrado, ao
contrário do seu principal antagonista, o deputado praieiro Urbano Sabino Pessoa de Mello,
que, segundo o redator, de origem conservadora, não defendia a “causa popular”, a dos homens
livres pobres do Recife. De uma maneira geral, os biógrafos do jornalista apoiaram-se em seu
relato autobiográfico, reproduzindo a figura que ele procurou consolidar. Não atentaram-se
para o contexto histórico e o local em que compôs o registro, para quem escreveu e os seus
principais objetivos. Nesse sentido, o presente trabalho propõe analisar a trajetória de Borges
da Fonseca através do Manifesto Político de 1867, estabelecendo os pontos importantes de sua
vida, assim como as suas contradições, incertezas e hesitações. Entende-se que assuas ideias
políticas foram construídas cotidianamente no calor dos acontecimentos e não seguiram uma
coerência e estabilidade como pretendeu demonstrar em seu depoimento. Neste, fez uma
cuidadosa seleção dos eventos políticos: alguns adquiriram maior peso, outros foram
omitidos. Para compreender melhor suas ações e pensamento político, é necessário conhecer
a história da sua vida vinculando-a ao processo de construção do Estado nacional brasileiro.
Borges da Fonseca era um homem ligado ao seu tempo; os seus projetos de Brasil foram
elaborados com base nas suas experiências históricas e nas limitações e possibilidades
inscritas pelas transformações da sociedade no qual estava inserido.
A pesquisa busca compreender porque alguns estrangeiros optavam por tornar-se cidadãos
brasileiros, mediante a naturalização (inciso V do artigo 1˚ da Constituição de 1824) ou
mediante a comprovação de haverem aderido expressamente ou tacitamente à
independência brasileira (inciso IV do artigo 1˚ da Constituição de 1824), enquanto outros
permaneciam na condição de estrangeiros e desejavam continuar sendo tratados como tais.
Além disso, buscamos compreender o processo burocrático de naturalização vigente entre
1832 e 1854, as dificuldades enfrentadas pelos que optavam por este caminho e o problema da
comprovação da nacionalidade. O recorte temporal inicial da pesquisa compreendia todo o
período imperial. Ele foi traçado dentro de um esforço para compreensão da política de
naturalização do Império do Brasil em um momento no qual acreditávamos que a
naturalização era um caminho vantajoso para todos os estrangeiros e o único caminho
possível para a aquisição da cidadania. Entretanto, logo percebemos a importância do inciso
IV do artigo 1˚ da Constituição de 1824 para os portugueses e, aos poucos, as desvantagens
associadas à posse da cidadania brasileira. Deparamo-nos com o problema do recrutamento e
com o esforço dos estrangeiros para comprovarem que não estavam na posse da cidadania
brasileira. O problema da comprovação da nacionalidade, então, ganhou espaço na pesquisa
em detrimento da política de naturalização do Império. Diante dos novos problemas
identificados, decidimos enfatizar o período situado entre 1824 e 1854, tendo como marco
inicial a Constituição e como marco final as mudanças ocorridas na década de 1850 em termos
de legislação sobre a naturalização. Além da redução temporal e da modificação dos temas a
serem abordados, entendemos que houve uma mudança em termos de perspectiva de análise.
A política estatal ficou em segundo plano e o cotidiano dos indivíduos assumiu o maior
espaço, embora sempre tenhamos desejado compreender suas atitudes. Inclusive, foi essa
preocupação que promoveu todas as mudanças analíticas expostas. Entre as principais fontes
analisadas, estão: os ofícios trocados entre os agentes consulares e os presidentes da
província de Santa Catarina, entres estes e o Ministério dos Negócios Estrangeiros, Ministério
dos Negócios do Império e os Juízes de Paz; as declarações de naturalização e as cartas de
naturalização. Apesar de termos selecionado majoritariamente a documentação produzida na
Província de Santa Cataria e em especial na sua capital Desterro, entendemos que este
trabalho proporciona uma reflexão sobre o que era ser estrangeiro no Império entre os anos
de 1824 e 1854.
O INQUÉRITO DO ARSENAL
Claudius Gomes de Aragão Viana (PPG HISTÓRIA, POLÍTICA E BENS CULTURAIS –
CPDOC/FGV)
Esta comunicação é a versão preliminar de um estudo mais amplo que se debruça sobre o
inquérito instaurado no Arsenal de Guerra do Rio de Janeiro nos primeiros meses de 1863.
Esse processo foi anexado ao relatório do Ministro da Guerra, José Mariano de Matos, e
encaminhado à Assembleia Geral Legislativa no início de 1864. Compõe-se da reunião de
quatro documentos: 1) O Aviso de 25 de fevereiro de 1863, nomeando uma comissão de
inquérito para apurar as denúncias publicadas no periódico Diário do Rio de Janeiro, de 23 de
fevereiro de 1863; 2) o ofício do presidente da comissão de inquérito, de 9 de junho de 1863,
contendo o relatório final da comissão; 3) a carta anônima do denunciante L., listando outras
suspeitas; e 4) a resposta do diretor José de Vitória Soares Andréa, datada de 10 de setembro
de 1863, ao relatório da comissão de inquérito. O fato do processo ter sido julgado de interesse
da Assembleia Legislativa já é em si extraordinário no contexto da longa série de relatórios
produzidos pelo Ministério da Guerra entre os séculos XIX e XX, visto que um procedimento
administrativo interno usualmente não deveria ter atingido tal nível da burocracia estatal;
mas, além disso, as circunstâncias possuem outros elementos consideráveis. A começar pelas
peças, um conjunto que dá voz a diversos personagens, que atacando adversários ou
defendendo suas próprias posições, se manifestam não apenas como testemunhas de fatos,
mas sobre a vida, o caráter e a maneira de ser uns dos outros. A partir daí se constitui –
parafraseio Foucault – mais do que uma obra ou um texto, mas uma luta singular, um
confronto, uma relação de poder, uma batalha de discursos e através de discursos, e se
desenrolam diversos combates simultâneos, entrecruzando-se: dos encarregados do inquérito
com o acusado, que lhes sabotava cada passo; entre eles próprios, ao final do processo; das
testemunhas de acusação e de defesa; dos anônimos que acrescentam denúncias.
Confrontando discursos, emitidos cada qual em nome da preservação de interesses
individuais, os documentos do inquérito retratam um momento onde a necessidade de
preservação do status quo supera e afronta as regras e efeitos de outros acordos pragmáticos,
tácitos ou explícitos. E, analisado por esse prisma, revela com certa clareza como uma força
externa pode desestabilizar um mecanismo institucionalizado de pequenos segredos, tramas,
acordos e disputas.
Antônio Conselheiro, líder da revolta de Canudos ocorrida no último quartel do século XIX na
Bahia, deixou um conjunto de manuscritos, nos quais registrava para além de sua
interpretação dos escritos bíblicos a transcrição de suas pregações. O presente trabalho
procurou à luz dos Estudos Culturais, sobretudo as contribuições de Raymond Williams no que
concerne ao Materialismo Cultural, promover uma leitura crítica dos manuscritos
conselheiristas, identificando características de um discurso coerente e politizado, ao
contrário do que seus contemporâneos afirmaram, e que conferiu caráter transgressor e
revolucionário à comunidade religiosa sertaneja. Recuperar as vozes de atores historicamente
subjugados pelo peso de uma narrativa tradicional, geralmente vinculada a legitimação do
discurso hegemônico, como aconteceu em Canudos, é uma das tarefas assumidas pelo que
convencionamos chamar de Estudos Culturais. Mais do que uma teoria interpretativa, trata-
se de um lugar de reflexão, no qual a diferença, a heterogeneidade e a atenção aos variados
sujeitos históricos ganham acentuado destaque. Assim, analisar a fala de Antônio
Conselheiro, outrora silenciado pelas narrativas que se erigiram a seu respeito, insere-se na
perspectiva desta renovação proposta, bem como contribui para uma compreensão mais
abrangente daquele que, ainda hoje, é considerado o maior conflito interno da história
brasileira e que, por muito tempo, foi reduzido ao massacre do exército sobre um grupo de
fanáticos religiosos. Ao contrário do que se poderia supor, as prédicas de Antônio Vicente
Mendes Maciel, o Conselheiro, revelam um homem letrado, lúcido de seu papel social,
conhecedor profundo da rotina católica e crítico articulado das questões políticas que o
circundavam. Além disso, o próprio papel da comunidade de Canudos passa a ser objeto de
reflexão, uma vez que logrou desestabilizar o sistema religioso e político, sem deixar de
dialogar com ele, demonstrando uma notável capacidade de negociação cultural, muito
próxima do que foi proposto pelas correntes interpretativas características da segunda
metade do século XX. Acredita-se, deste modo, que a recuperação e leitura destes escritos sob
uma ótica diversa, mais focada em seu papel cultural, pode devolver ao beato Conselheiro a
força que, muito antes, seus milhares de seguidores em Canudos já havia consagrado.
Palavras-chave: Antônio Conselheiro; manuscritos; Estudos Culturais.
“O BEM QUE DESEMPENHOU NO CARGO PARA QUE FOI ELEITO”: A ELEIÇÃO DE JUÍZES DE
PAZ NO CONTEXTO DA CABANAGEM.
Danielle Figuerêdo Moura (PPG HISTÓRIA SOCIAL DA AMAZÔNIA – UFPA; Professora da
Escola de Aplicação da UFPA)
As décadas iniciais dos oitocentos foram repletas de debates e agitações políticas e sociais no
Império brasileiro. É neste contexto da formação do Estado que se insere a explosão da
Cabanagem (1835-1840) e o combate à mesma. O estudo da historiografia, mas sobretudo a
pesquisa nas correspondências trocadas entre as autoridades municipais e provinciais indica
que nesses conflitos no Grão-Pará a participação dos juízes de paz foi direta. Sacerdotes,
militares, bacharéis, deputados e proprietários em Belém ou espalhados por mais de cinquenta
freguesias, assumiram a magistratura de paz na década de 1830, atuando como mediadores
entre várias parcelas da sociedade paraense. Não seria demais considerar que a sua atuação
(bem como a própria existência do cargo) foi um dos elementos fundamentais para a explosão
da Cabanagem e que muitos estiveram ligados aos cabanos. Por outro lado, os juízes eleitos
participaram do combate aos “rebeldes”, elaborando sumários, remetendo presos para Belém
ou informando ao presidente de província sobre os revezes da guerra e o estado em que se
encontrava sua localidade. Em meio a tudo isso, conflitos de jurisdição e de sobreposição de
poderes envolviam juízes de paz, juízes de direito, militares e o próprio presidente. Um tema
que ganha destaque nas correspondências trocadas entre autoridades durante o movimento
cabano é a imagem construída pelos representantes da ordem imperial referente aos
magistrados eleitos e a vinculação dos mesmos aos problemas do Grão-Pará: eram sujeitos
ignorantes, movidos pelo interesse próprio em prejuízo do coletivo e que estariam associados
aos cabanos. Assim, o combate aos cabanos e a retomada da província, perpetrado pelo
Presidente Francisco José de Souza Soares de Andréa, significava, na sua perspectiva, não
apenas o controle da população, do mundo natural e a derrota dos “rebeldes”, mas também
garantir que as autoridades locais, como os magistrados eleitos, lhe coadjuvassem nesta
empreitada. Foi neste sentido que, dentre as medidas adotadas por Soares d’Andréa logo após
sua chegada em Belém no ano de 1836, estava a ordem de proceder nova eleição para juízes
de paz e, na sequência, a interferência direta do presidente no resultado, escolhendo a quem
caberia assumir a vara. Considerando que a eleição de juízes de paz era um elemento
fundamental de mobilização e politização, a realização deste pleito nos dias conturbados da
Cabanagem e as interferências que o mesmo sofreu, informam muito sobre a política local e
sobre os revezes do movimento cabano. Portanto, este trabalho, que se encontra em
desenvolvimento, propõe a análise das eleições de juízes de paz no ano de 1836 como
elemento importante para a compreensão da magistratura de paz no Pará no contexto da
Cabanagem.
O presente trabalho tem como intuito analisar as relações de poder que circundavam as
principais famílias da região de Guarapiranga (MG) entre o fim do século XVIII e início do XIX.
Com base em inventários post-mortem, processos matrimoniais e registros paroquiais, a
pesquisa se atém a identificar as diferentes possibilidades empregadas pelos indivíduos e
suas famílias no objetivo central de se destacarem e se inserirem no rol dos eminentes grupos
da região. Diferentes famílias que ao longo de anos constituíram um cabedal de estratégias
com propósito eminente de estruturar os indivíduos em teias de ligações que lhes pudessem
assegurar benefícios econômicos, sociais e políticos por intermédio de matrimônios
promissores, alianças familiares e redes de poder. Projetos estes que se iniciam em um
contexto marcadamente hierarquizado e excludente de uma sociedade pautada nos preceitos
de Antigo Regime e que se estendem para além do período, com indivíduos, ainda no século
XIX, empregando mecanismos sociais e de poder para manterem-se entre os principais.
Alianças familiares, mediante casamentos, se desvelava como estratégia fundamental entre
os grupos, como ser revela o enlace entre Joaquim Coelho Oliveira Duarte – capitão-mor e
licenciado - e Maria Hermelinda Duarte Purificação. Filhos de duas famílias relevantes e
estáveis da região – os Freitas Guimarães com os Pinta de Oliveira –, o casamento significou
aos nubentes e aos familiares possibilidades distintas de obter recursos desde financeiros a
sociais para todos. Embora Joaquim não se destaque entre a parentela como um dos mais
afortunados – seu montante de bens em 1833 soma o valor reduzido de 5:468$732 réis e 09 de
escravos –, Joaquim continua a privilegiar relações de poder que contribuíssem para a
manutenção de seu cargo de capitão-mor e licenciado. Entre estas possíveis redes de poder,
Joaquim apresenta-se como inventariante e testamenteiro de indivíduos eminentes da
região, como Antônio Gomes Sande e Antônio Carvalho da Mota. O capitão, já no século XIX,
continua a se esforçar, como a parentela anterior, a manter a distinção, poder e prestígio que
sua família tivera nas Minas e no reino no século precedente. Seus vínculos foram
estruturados de forma a preservar a hegemonia social e política que seus familiares sempre
desfrutaram, ainda que seus bens não fossem proeminentes. Neste sentido, é possível
identificar ao longo das gerações familiares conjunturas sociais similares à de Joaquim e sua
parentela na região, de indivíduos e famílias que procuraram manter o poder, prestígio,
influência e riqueza ao longo do século XVIII e XIX. Sendo assim, o trabalho procura identificar
por intermédio das relações estabelecidas por essas famílias e indivíduos as estratégias que
os mesmos empregaram no intuito de manter e ampliar o poder social, político e econômico
adquirido anteriormente e que se perpetua ao longo do XIX.
A presente proposta de trabalho tem como finalidade estabelecer, uma reflexão sobre os
conflitos e estratégias envolvendo a demarcação dos limites entre as capitanias de São Paulo
e Minas Gerais (Brasil), no período entre os anos de 1790 a 1820. O estabelecimento de limites
tanto internos quanto externos e a expansão territorial em fins do século XVIII e início do
século XIX na América portuguesa seguiu ritmos diferentes, e Minas Gerais como região
estratégica do império se inseria nesses movimentos territoriais. A ocupação do sul de Minas,
assim como em outras regiões da capitania onde o ouro não foi encontrado, ou rapidamente
se escasseou, se deu de forma mais lenta do que a percebida nas áreas de mineração. A
fronteira sul da capitania era aberta ao trânsito dos paulistas e era habitualmente chamada de
“sertões” da comarca do Rio das Mortes. A região de Campanha do Rio Verde foi descoberta
pelos paulistas por volta de 1720, tendo pouca divulgação até 1737, quando em 02 de outubro,
uma expedição militar sob o comando do ouvidor da comarca do Rio das Mortes, Cipriano José
da Rocha, toma posse do território em nome do rei. No entanto, a ocupação das áreas de
fronteira na capitania de Minas Gerais nunca foi consensual entre as autoridades tanto
metropolitanas quanto coloniais. O arraial de Campanha do Rio Verde era área de fronteira e
de disputa entre as autoridades de São Paulo e Minas Gerais. As ações e conflitos entre as
autoridades coloniais e os moradores do arraial demonstram as estratégias para consolidação
da posse desse território. Dessa forma o estabelecimento da vila de Campanha configurou-se
como recurso de organização administrativa, mas também serviu como elemento poderoso
de reafirmação da soberania portuguesa, endossado pelo Senado da Câmara da vila que passa
a destinar um terço de seus rendimentos a um donativo a herdeira do trono português. A essa
doação segue um curioso ato, o da posse do senhorio da vila à princesa do Brasil. A posse do
senhorio da vila de Campanha em 1806, fez com os oficiais da Câmara de São João del Rei se
manifestassem preocupados com o significado do senhorio e do alcance de novas atribuições
abertas para a vila de Campanha. Essa comunicação se propõe a investigar essas ações da
Câmara de Campanha, o auto de posse do senhorio da vila e doação da terça parte do
rendimento de seus bens para a Princesa do Brasil. Política, administração e justiça aparecem
amalgamadas nas diversas disputas entre a vila da Campanha e a cabeça de comarca, São
João del Rei, mas ao mesmo tempo frente a capitania de São Paulo, representando dessa
forma, os interesses próprios da vila mas que se configuram como interesses também
mineiros numa perspectiva mais ampla. Em face as transformações geopolíticas e rearranjos
econômicos que atingem o Brasil no início do século XIX, buscamos o sentido dessa
reminiscência senhorial e seu contexto para a vila da Campanha da Princesa.
Antes de iniciar o período conhecido como a Belle Époque no Brasil, o Rio de Janeiro já possuía
elementos da cultura francesa em seu cotidiano. Seja nas vestimentas e nos tecidos, nos
comportamentos e nos gestos, nos objetos e nos adereços, seja pelos imigrantes e pelos
viventes da cidade, nas conversas e no ensino primário, nos gostos e nas escolhas, até metade
do século XIX a cidade do Rio de Janeiro e seus habitantes já “respiravam o ar europeu”, em
especial o francês. É sabido que a cultura francesa torna-se uma referência internacional do
“bom tom” e “bom gosto” desde antes do século XVIII, em especial nas vestimentas e nos
adereços exportados para muitos dos países, inclusive para o Brasil, sendo que “as ideias
‘afrancesadas’ chegam com os alunos que estudavam fora da colônia” (HILSDORF, 2005, p. 325-
326), com os livros clandestinos, com as sociedades letradas, com os professores, e também
pelas ações da corte joanina. Assim, temos ao longo do século XIX o fortalecimento desta
cultura por parte de homens e mulheres, que tomavam a cultura francesa como um modelo, a
fim de se caracterizar como uma pessoa culta e com o gosto refinado. Utilizando a imprensa
feminina como fonte desta pesquisa, buscaremos, em um primeiro momento, identificar os
elementos da França no cotidiano carioca, bem como o uso que se fez desta cultura na cidade
do Rio de Janeiro na segunda metade do século XIX. Partindo desta identificação, será possível
realizarmos uma reflexão acerca das maneiras como esta cultura se descolou da França para
o Brasil, bem como as formas como tais elementos foram assimilados e utilizados e pelos
habitantes da cidade do Rio de Janeiro. Tendo como hipótese que esta cultura fez parte de
uma apropriação seletiva e, portanto, consciente, esperamos que esta reflexão contribua com
uma pesquisa de doutorado, em fase de desenvolvimento, cujo objetivo é compreender as
transferências e mediação da cultura francesa no Rio de Janeiro, por meio da imprensa
feminina. Desenvolvida por Michel Espanhel e Michel Werner (1988; 1999), a ideia de
transferência cultural é compreendida como os “[…]mouvementsd’idées, la circulation des
savoirs et des pratiques entre deux espaces culturels distincts” (COOPER-RICHET, 2013, p. 130),
mediada pelos “representantes da disseminação dos aspectos culturais” (OLIVEIRA, 2015, p.
152). Ao utilizarmos tais conceitos, acreditamos ser possível compreender “les intention de ses
acteurs, les motivations qui les animent” (JOYEUX, 2013, p. 160) neste processo. Assim, não se
propõe perceber tal noção como um mecanismo imitativo, reprodutivo ou teórico, mas sim por
meio de um uso seletivo e consciente, a fim de alcançar objetivos coletivos e particulares no
contexto político e social em que se está inserido, bem como servir como modelo para a
construção da cultura nacional brasileira.
A presente comunicação de pesquisa busca realizar uma reflexão sobre a construção das
redes de ativistas que permearam a nacionalização da luta antiescravista no Brasil
Oitocentista. Com essa intenção, realizaremos uma investigação sobre a viagem de Ferreira
de Menezes à cidade de Juiz de Fora, Minas Gerais, no ano de 1880, visando entender os
possíveis motivos, intenções e as relações estabelecidas pelo redator do principal jornal
abolicionista do Rio de Janeiro, Gazeta da Tarde, com as redações dos jornais existentes e com
as personalidades da localidade mineira. Em um segundo momento, buscaremos entender as
relações estabelecidas ao longo da última década de vigência do trabalho escravo no Brasil
entre os redatores e correspondentes dos periódicos Pharol, Echo do Povo e Gazeta de Juiz de
Fora com a redação do jornal fluminense. Por último, faremos uma caracterização do cenário
escravagista juiz-forano através das páginas do jornal Gazeta da Tarde. A principal fonte dessa
pesquisa será o jornal Gazeta da Tarde, tendo como proprietário e principal redator o jornalista
e ativista antiescravista Ferreira de Menezes referido acima. Após sua morte, em 1881, a
tipografia do periódico foi comprada pelo também jornalista e ativista antiescravista José do
Patrocínio. A viagem de Ferreira de Menezes foi noticiada nas páginas do jornal Gazeta da
Tarde em novembro de 1880, julgamos ser esse momento singular para a compreensão das
conexões construídas entre os ativistas de diferentes localidades e para a elucidação da
variabilidade dos repertórios adotados na luta contra a escravidão no Império Brasileiro. Essa
passagem do jornalista pela localidade é uma lacuna na historiografia sobre a cidade de Juiz
de Fora e também nos trabalhos que se debruçam sob a luta antiescravista no Brasil
Oitocentista. As outras fontes utilizadas nessa pesquisa serão os periódicos locais referidos
anteriormente. Nas redações desses periódicos juiz-foranos atuaram como redatores e/ou
correspondentes Sizenando Nabuco, Joaquim Campos Porto e João Severiano da Fonseca
Hermes. Todos estes declaradamente pela imprensa periódica do período como pessoas de
opiniões contrárias à existência da mão de obra escrava nas lavouras e cidades do Brasil
Oitocentista. Desta forma, através dos rastros deixados por esses indivíduos atuantes no
cenário sócio-política de Juiz de Fora no Gazeta da Tarde, buscaremos refletir sobre a
nacionalização da luta antiescravista no Brasil oitocentista.
A proposta desta pesquisa é analisar as estratégias adotadas pelos escravos e libertos em sua
inserção social no mundo livre, nas últimas décadas da escravidão e no período pós-abolição.
Os marcos temporais adotados foram a Lei Eusébio de Queirós, em 1850, que determina o fim
do tráfico de africanos para o Brasil, e a criação do Gerca, em 1961, responsável pela política de
erradicação dos cafezais que causará profundas mudanças socioeconômicas no cenário
capixaba. A base documental utilizada é bastante ampla: cobre desde fontes de natureza
demográfica, quantificável, como inventários post-mortem, registros de nascimento,
casamento e óbito, censo; até entrevistas com membros da Comunidade Quilombola de Monte
Alegre, construída por libertos e descendentes em Cachoeiro de Itapemirim, região sul do
Espírito Santo que se destacou no século XIX pela grande produção cafeeira e pela farta mão
de obra escrava. Relatórios de presidente de província, legislação e periódicos também serão
analisados com o objetivo de ressaltar a complexidade do período e das ações dos libertos na
(re) construção dos laços forjados ainda no cativeiro. Adota-se como hipótese, portanto, que
as relações tecidas durante a escravidão, especialmente as famílias, influenciaram as
escolhas realizadas após a liberdade, antes ou depois de 1888. Os vínculos familiares e as redes
de solidariedades, contudo, não devem ter sido os únicos elementos importantes a serem
considerados. Outros como a terra, também devem ter participado da decisão entre
permanecer no mesmo lugar onde foram escravizados ou migrar em busca de oportunidades
e/ou de estabelecer distância de lugares e lembranças indesejáveis. Investigar esses
elementos – laços familiares e terra – potencializadores da criação de raízes na região pode
ajudar a entender os caminhos percorridos pelos ex-escravos após a abolição. A literatura
sobre os ex-senhores e sobre os imigrantes de origem europeia que chegaram ao Brasil no
final do Oitocentos e primeiras décadas do século seguinte, particularmente, no Espírito Santo,
é farta. Entretanto, os rumos tomados pelos egressos do cativeiro permanecem pouco
conhecidos. Apenas recentemente se iniciaram os estudos sobre o assunto. Nomes como Ana
Lugão, Hebe Mattos e Carlos Eduardo C. Costa, Flávio Gomes estão entre os historiadores
interessados na questão. Entretanto, ainda falta muito a ser pesquisado em termos de Brasil,
como indicado pelos autores citados. É nesse sentido que propomos o estudo do sul do Espírito
Santo, área já investigada na dissertação de mestrado e que revelou um grande número de
arranjos familiares entre os escravos, envolvendo, inclusive, a população liberta/livre. Como a
pesquisa está em estágio inicial, a proposta desta comunicação é apresentar alguns casos
encontrados em inventários post-mortem e testamentos do sul Capixaba, na segunda metade
do século XIX, que apontam elementos como família e/ou terras que devem ter contribuído
para a decisão dos libertos de (re)construir suas vidas na região.
O processo de Independência política do Brasil foi bastante complexo, pois uma série de outros
processos o atravessaram: de uma perspectiva de longa duração, não se pode desconsiderar a
Crise do Antigo Sistema Colonial, entendendo o sentido da colonização e como suas
contradições levaram a colônia a romper os grilhões que a mantinham presa a metrópole
portuguesa; em uma perspectiva menos economicista e mais política, as demandas dos
grupos de influência que participaram do processo ganham valor, assim como, as
reverberações dos eventos que perpassam o processo, na sociedade. Daí a vinda da Família
Real e a intensificação das mudanças, ou, o enraizamento dos interesses da metrópole
interiorizada, fazem, sob o pano de fundo dos liberalismos, o processo se tornar menos
revolucionário e mais inevitável. Em meio as opções de Reino Unido ou de recolonização,
optou-se pela desagregação. O Historiador que se debruça sobre essa temática enfrenta o
desafio de equacionar sob sua perspectiva um conjunto de interações quase sempre ambíguas
e contraditórias: o Processo de Independência reúne velhos expedientes a novos desafios,
corpos velhos, trajando vestes modernas. O monarca ressignificado, se torna constitucional,
mas precisa do beija-mão das Câmaras Municipais – um símbolo precioso do antigo Império
Colonial Português – para se tornar Imperador. No pós-independência, a Constituinte é
fechada, o embate entre as frações de classes que alicerçaram o I Reinado, faz com que o Pedro
I tome as rédeas da monarquia constitucional, mas com uma Constituição outorgada, e
melhor, jurada pelas Câmaras Municipais. O processo de consolidação do Brasil Imperial
reúne rupturas e continuidades. No presente trabalho, discutiremos a modernização do
aparato legislativo do Império, a partir da abertura da Assembleia Nacional em 1826. Nossa
hipótese é a de que em meio a um processo de modernização e burocratização do arranjo
institucional do Estado, leis foram produzidas para minar a força do imperador,
principalmente a força fundamentada na tradição, por exemplo, a lei de 1 de outubro de 1828,
que define o funcionamento das Câmaras Municipais. Ademais, na medida em que se avança
e outras leis são promulgadas e, ou, também reformadas, muitas vezes se percebe o uso da
legislação de forma a permitir continuidades, tais quais, o tráfico de escravos. Portando, é
nosso objetivo compreender os usos dos liberalismos, então tendência no período, na
(re)estruração do Estado brasileiro. Dito de outra forma, buscaremos responder a questão:
como as leis que contribuíram para a estruturação de Estado sob uma rubrica liberal e
moderna e, portanto, nova, também funcionou para manter antigos expedientes, protegidos,
inclusive, desde antes da independência?
Palavras-chave: Brasil Império; Consolidação do Estado; Câmaras Municipais; Antigo Regime;
Monarquia Constitucional.
Este trabalho tem como cenário a cidade do Recife nos idos do século XIX (1840-1870) que,
configurava como a terceira capital mais notável do Brasil, portanto perdendo em prestígio e
importância apenas para as cidades do Rio de Janeiro e de Salvador. Em poucas décadas, o
Recife passou por inúmeras transformações do ponto de vista material e até mesmo imaterial,
em seus limites a população volumosa se espremia e os problemas oriundos de uma sociedade
escravagista não deixaria de afetar a capital da província pernambucana. Entre os muitos
problemas num cenário que se queria representar enquanto próspero, era a pobreza que se
fazia ostensiva pelas ruas, praças e pelas igrejas matrizes da cidade. No universo da pobreza
permeado pelas relações sociais que se travavam no século XIX, o mendigo, ou seja, aquele
que vivia miseravelmente e sem condições de suprir as suas necessidades básicas de
sobrevivência se tornou alvo de políticas de controle social empreendido pelas autoridades
citadinas que, por sua vez, passou a ver na mendicância um problema a ser combatido. A
cidade mendicante era a imagem que o Estado não queria imprimir e nem permitir que se
perpetuasse, pois macularia o seu projeto de modernização aos moldes civilizatórios à moda
europeia. Assim percebemos que em seus “afazeres políticos” as autoridades paulatinamente
modificaram o tratamento dado aos sujeitos que eram enquadrados como mendigos. Na
medida em que se alteravam as concepções sobre a cidade e sobre o universo do trabalho, as
percepções sobre a mendicidade foram se modificando e reforçadas pelo discurso médico e
jurídico. A tentativa de classificação desse contingente populacional nos permite refletir
sobre as condições determinantes que serviram para definir o dito mendigo, ora como aquele
que necessitava da caridade pública, ou seja, o coitado. Ora como aquele que, por representar
a figura de um corpo ocioso na cidade, era tido como um vilão. O ócio representava medo para
as elites dirigentes, nesse âmbito, a figura do vadio entrava em cena e se confundia com a do
mendigo. Portanto, o combate ao dito “resíduo social” trazia em seu bojo os ideais que se
pretendiam incutir em defesa de uma dada ordem ao mundo do trabalho.
Esta comunicação pretende analisar a condição jurídica dos africanos que desembarcaram
em portos brasileiros após a proibição do tráfico de escravos, tornando-os africanos livres. As
legislações que abrangem sua existência, previam que tais pessoas deveriam cumprir um
período de 14 anos de trabalho compulsório, afim de que aprendessem a dinâmica social e
fossem capazes de “viver sobre si”. Compreendemos que a historiografia sobre os africanos
livres tem avançado no sentido de problematizar sua existência, as contradições desta
liberdade, o número de pessoas que compuseram este grupo e a tutela na qual foram
submetidos. As páginas de jornais se mostraram campos férteis e dispostos a dar subsídio ao
historiador para elucidar como era o modo de vida dos africanos livres, como seus
concessionários os viam, e o que os próprios africanos demonstram saber do seu status
diferenciado, nos mostrando as estratégias, e formas de resistência criada por eles durante a
tutela. Através dos anúncios dos periódicos Diário do Rio de Janeiro e Jornal do Comércio é
possível perscrutar biografias de africanos livres. Utilizamos informações acerca das fugas,
repartição de polícia e obituário, com foco em suas idades, gênero, nações, características
físicas, ofícios, nomes de seus tutores, local de moradia. Nessa abordagem, a ênfase recai sobre
a experiência do indivíduo na diáspora, e não apenas em bases culturais que pudessem ter
sido trazidas da África e mantidas intocadas nas Américas. As identidades são, dessa forma,
produzidas na diáspora. Assim, preconizaremos analisar as especificidades do grupo,
evitando uma única concepção que diga respeito a uma cultura global dos africanos livres,
respeitando sua pluralidade, seus conflitos e embates. No qual, este grupo complexo e misto
estava ligado pela liberdade limitada que lhes foi atribuída pela Lei. Compreender a distinção
jurídica entre escravos, africanos livres e libertos, não significa separá-los do convívio social,
muito pelo contrário, nos interessa compreender para além dos atributos de sua condição
jurídica. Trazendo para o centro da nossa discussão suas vivências e as zonas de confluência
que possibilitaram as trocas de experiências e construção de redes de sociabilidade. Entre as
fronteiras da escravidão e da liberdade, tais personagens eram agentes de sua própria história,
sendo nossa intenção, recompor os retratos deste protagonismo. Corroborando para o
preenchimento de uma lacuna ainda existente no que diz respeito às especificidades deste
grupo. Suas experiências coletivas, assim como a criação de redes de sociabilidade, o
mapeamento de identidades, culturas e estratégias para livrar-se da tutela.
A criação das Assembleias provinciais em 1834 consolidou a província como unidade político-
administrativa do Estado imperial brasileiro. Diferentemente dos Conselhos Gerais que elas
vieram a substituir e cujas propostas deveriam ser aprovadas pela Assembleia Geral, as novas
instituições, com poderes legislativos, assumiram a direção dos “negócios mais interessantes”
de suas províncias. O Ato Adicional que as criou, determinou que a elas caberia legislar sobre
a divisão civil, judiciária e eclesiástica; sobre a instrução pública e os meios para promovê-la;
sobre a polícia e a economia municipal; sobre despesas; sobre a fiscalização das rendas
públicas; sobre impostos; sobre a supressão, a criação e a nomeação de cargos públicos, em
nível municipal e provincial, entre outros. Apesar de manter nas mãos do Presidente de
província, autoridade nomeada pelo poder central, a sanção aos projetos, sem dúvida, as
Assembleias concentraram amplas e importantes atribuições. O exercício do poder em
algumas matérias gerou, entretanto, disputas ferrenhas, apontando a dificuldade em
estabelecer o que eram negócios de interesse da província e de interesse geral. Foi o que
aconteceu com o projeto de subsídio dos promotores públicos, proposto pelo deputado Teófilo
Benedito Otoni, em 1838. Quando a Assembleia mineira se instalou nesse ano, dando início
aos trabalhos da segunda sessão legislativa, já se discutia na Câmara temporária, na corte do
Império, um projeto que visava interpretar o Ato Adicional. A esse projeto, Bernardo Pereira de
Vasconcelos propôs uma emenda que determinava que todos os empregados que cumpriam
leis gerais não poderiam ser considerados empregados provinciais. Essa proposta foi citada
na sessão da Assembleia mineira, pelo deputado e promotor público, Joaquim Antão
Fernandes Leão como “o cavalo de batalha do regresso”, uma vez que retirava das Assembleias
o direito de legislar sobre a matéria. Partindo da discussão suscitada pelo projeto dos
promotores, que utilizou a linguagem do regresso e do progresso como arma política e baseado
na pesquisa de uma ampla documentação reunida no fundo “Assembleia provincial”,
depositada no Arquivo Público Mineiro, o objetivo desta comunicação é apresentar o papel da
Assembleia mineira na defesa da reforma da Constituição e a quais “projetos” esse empenho
atendia. A maioria dos deputados da segunda legislatura havia sido reeleita, eram liberais
defensores do Ato Adicional. No entanto, se na primeira legislatura eles assistiram a uma
“relativa harmonia” entre as instâncias de poder oficial do Estado, uma vez que também na
Câmara dos deputados havia uma maioria liberal afinada às reformas, na segunda legislatura
a situação foi bastante distinta: a maioria dos deputados mineiros fez forte oposição ao
Governo. Alguns deles assumiram a alcunha de regressista como retórica para defender que
“estar no regresso” era “o verdadeiro progresso”, porque pressupunha prudência, não era, para
eles, um retorno ao passado, àquele período em que as províncias tinham poderes limitados,
era, sobretudo corrigir os excessos de um liberalismo entendido como radical. Atentar para os
insultos, para as identidades atribuídas e assumidas, pode, enfim, revelar as disputadas pelo
poder e as distintas concepções de Estado, o que nos interessa particularmente nesta
comunicação, mas também pode nos dizer sobre as diferentes percepções do tempo e da
história.
Juiz de Fora, em 2 de novembro de 1864, inaugurou seu primeiro cemitério público. Esta
novidade na cidade havia adotado, para tanto, boa parte dos preceitos sanitários da época. O
cemitério higiênico fazia parte do cumprimento de uma séria de legislações que haviam sido
promulgadas desde o início do século XIX para este fim, mas que não foram implementadas
facilmente pelo país, pois encontravam ora dificuldades financeiras nas câmaras, ora
entraves nos paradigmas culturais. Após a inauguração do campo santo juiz-forano, uma série
de profissionais se dedicariam à chamada “pompa fúnebre”, que englobava os cortejos que, por
sua vez, precisavam eventualmente dos convites de enterros e santinhos para acontecerem.
Os dois últimos se tornaram, durante a pesquisa de doutorado em andamento sobre os
costumes mortuários na cidade, uma importante e diferenciada fonte escrita para se analisar
como a morte era percebida no período, devido em grande medida à sua raridade. A chegada
da tipografia à cidade possibilitaria a impressão de todo tipo de anúncio comercial e também
de convites e santinhos. Algumas vezes, esses materiais também vinham diretamente da
corte e possuíam campos em branco a serem preenchidos, o que demonstra alguma
popularização da prática. Diferentemente da atualidade, em que a morte é renegada e o uso
dos santinhos se torna cada vez mais raro, no século XIX havia maior conexão com o sagrado
e uma série de preocupações para com o salvamento da alma foi adotada, o que propiciaria o
uso destes. Partindo da interpretação dessa documentação, conseguiu-se perceber que existia
um discurso padrão, sendo em primeiro lugar, a invocação do sagrado, pedindo que os vivos
se lembrassem dos mortos em suas orações; e em segundo, mais atenuado no século XIX, mas
já mais evidente no início do século XX, a preocupação com o sentimento distinção, que
poderia ser mais complexa, dependendo da situação social em que a família se encontrava.
Apesar do limite interpretativo desta mudança, e este é apontado devido ao conhecimento, ao
menos até o momento, da existência de um só exemplar de santinho do século XX, percebeu-
se especialmente ao cruzá-los com os anúncios da imprensa local, uma consolidação do que
BORGES (2002) entendeu por “morte burguesa”. A possibilidade de se analisar os raros
santinhos e convites, incomuns na maioria dos arquivos das cidades brasileiras, também
permite uma expansão interpretativa de como se estabeleciam as práticas funerárias em
diferentes partes do país. Para uma análise mais abrangente do fenômeno do morrer, foi
fundamental o aporte teórico concebido pelas obras de Ariès e Vovelle, além da historiografia
nacional representada por Almeida, Borges, Bastianello, Carvalho, Reis e Rodrigues.
Como agenda de pesquisa, os estudos sobre “formação do Estado” passaram por um período
de baixa visibilidade, contudo, nas últimas décadas, o interesse pelo campo ampliou-se,
fomentado novas pesquisas que tratam da formação do estado, tipos de regime e os episódios
de mudança. Este projeto une-se a este movimento com o objetivo de, partindo de uma
metodologia histórico conceitual, analisar a formação dos Estados nacionais na América
latina, especialmente os casos de Argentina, Brasil e Chile, a fim de estudar as estratégias
políticas de construção estatal na periferia, suas dinâmicas, os resultados políticos e, por
conseguinte, traçar os percursos do processo de estabilização do Estado. Deste recorte
resultam questões importantes, como a tentativa de compreender o grau de influência que a
condição periférica acarreta nas trajetórias da consolidação do aparato estatal, assim como
das decisões a respeito dos sistemas políticos – monarquia e republica – e os reflexos deste
cenário nas linguagens e ações políticas. O projeto parte da pergunta de pesquisa acerca das
implicações da formação de Estados nacionais em uma região considerada periférica, a
América Ibérica, a fim de verificar as aproximações e distinções destes percursos em
comparação com a experiência de países centrais, Grã-Bretanha, França e Estados Unidos. O
ponto central é, à medida que analisamos a recepção e aclimatação por parte das elites
ibéricas das teorias políticas estrangeiras, delinear a trajetória institucional e política até a
estabilização do Estado. Tal proposta de análise nos possibilitará perceber não apenas as
distinções de processo de formação entre o centro e a periferia, como também os dilemas que
fazem os países periféricos divergirem em suas trajetórias, como, por exemplo, compreender
o motivo que faz Brasil e Chile possuírem uma trajetória à estabilização mais acelerada do que
a Argentina. Tendo em vista compreender estes processos de desenvolvimento estatal na
periferia e analisar as recepções e aclimatações das correntes políticas, utilizaremos autores
centrais para o debate em cada país como norte para reconstrução do contexto político
estudado. Os personagens clássicos escolhidos representam, de maneira generalista, grupos
políticos díspares em suas concepções a respeito da formação do Estado Nacional. Nossos seis
autores poderiam ser divididos em dois grandes grupos, os Liberais federalistas: Domingo
Faustino Sarmiento (1811-1888), na Argentina, Aureliano Cândido de Tavares Bastos (1839-
1875), no Brasil e José Victorino Lastarria (1817-1888) no Chile. Do outro lado do espectro
político estão os Conservadores unitaristas: Juan Bautista Alberdi (1810-1884), na Argentina,
José Paulino Soares de Sousa, o Visconde do Uruguai (1807-1866), no Brasil e Mariano Egaña
Fabres (1793-1846) no Chile. Além do seu valor no âmbito da reconstituição da construção
nacional, trazer a lume discursos, conceitos e representações por meio dos quais estes países
foram projetados e concebidos é de grande importância para o resgate dos significados
históricos e de formação da Teoria Política e do Pensamento Político Brasileiro.
Os planos de uma carreira profissional para os filhos das elites oitocentistas começavam bem
cedo e, no caso de José Antônio Gomes Neto, não foi diferente. Sendo proveniente do alto
sertão da Bahia, região de entreposto entre o norte de Minas Gerais, o rio São Francisco e a
Chapada Diamantina, o estudo da sua trajetória demonstra o quanto a educação superior foi
uma prioridade para aquelas famílias que viam na instrução um caminho de ascensão social
e obtenção de prestígio. No caso específico de José, a escolha profissional também fez parte
de um projeto familiar que requereu grande empenho financeiro e investimentos de outra
natureza, tudo em prol do status conferido pelo título de bacharel. O intento de seu pai de
enviá-lo à Corte assim que concluísse o bacharelado em ciências jurídicas, na cidade de
Olinda, era a continuidade desse projeto que, conforme se esperava, culminaria com uma
colocação imediata para o cargo de juiz municipal da vila de Caetité, ou, pelo menos, de outra
comarca do alto sertão baiano, onde sua família residia. Mas, com a morte do seu pai, em 1846,
esses planos tiveram que ser refeitos. Recém-formado, o bacharel retornou ao sertão da Bahia
para cumprir as obrigações recaídas sobre ele, único filho do sexo masculino, principal
herdeiro material e simbólico dos bens familiares. Porém, mesmo estando longe da corte,
conseguiu se cercar de uma rede de contatos e influências que lhe proporcionou a conquista
do seu objetivo inicial: uma colocação ao cargo de juiz municipal. Através de pesquisas
realizadas junto ao arquivo familiar de José Antônio Gomes Neto foi possível observar o
quanto os anos de estudo propiciaram o estabelecimento dessas redes e a construção de
alianças entre jovens estudantes de diferentes lugares do Império. Apresentar de que maneira
o sujeito em destaque se beneficiou das alianças constituídas no âmbito da formação jurídica,
demonstrando como esses contatos eram estabelecidos, as trocas envolvidas e o quanto eles
influenciaram na política imperial a partir de meados do século XIX é o objetivo dessa
comunicação.
Palavras-chave: José Antônio Gomes Neto; redes sociais; alto sertão da Bahia; influência
política.
LEITURA NOS ANOS INCIAIS DO SÉCULO XIX E A CENSURA DENTRO DO IMPÉRIO LUSO-
BRASILEIRO
Maíra Moraes dos Santos Villares Vianna (PPG HISTÓRIA – UERJ)
Este trabalho tem como objetivo fazer uma reflexão através do viés da história cultural e da
história política sobre o funcionamento do aparelho censório no período de permanência da
Corte joanina no Rio de Janeiro. Partindo dos estudos realizados sobre a história do livro e da
censura se têm como proposta analisar a cultura política da época, relacionando com a
concepção de uma sociedade hierarquizada e pautada em privilégios e que objetivava a
manutenção de tal ordem. Assim, os livros podem ser vistos como instrumentos de poder e de
representação simbólica dentro de tal sociedade. Dessa forma, a censura atribuída aos livros
combatia as ideias que pudessem romper com a ordem dentro dessa sociedade, ou seja, que
atacasse a religião, os valores morais e a coroa. Utilizada como um mecanismo de poder
dentro do Império luso-brasileiro, o aparelho censório sofreu alterações conforme as
necessidades de cada época. A abordagem pretendida em tal estudo busca apresentar as
principais transformações, mas destacando as alterações ocasionadas pela transferência da
corte de Portugal para o Brasil. A chegada da corte na cidade do Rio de Janeiro gerou variadas
mudanças em relação ao aparelho administrativo e político. A cidade passou por alterações
de cunho políticos e culturais para que pudesse comportar a corte joanina. Uma
transformação também é ocasionada no âmbito da leitura, a partir da Instalação da Impressão
Régia, tipografia oficial e a primeira do Brasil. Apesar de ter sido criada com a finalidade de
propagar os atos do Governo, também foi responsável pela publicação de obras diversas como:
jornais, obras literárias e científicas. Apesar de tais mudanças, a circulação de ideias estava
subordinada a um sistema político que privilegiava uns em detrimento de outros, porém
sempre ligado ao privilégio concedido pelo Rei. Dentro de tal concepção será destacado o papel
dos censores enquanto homens letrados e leitores, portanto representantes de um grupo que
buscava a partir das suas funções obter reconhecimento dentro da ordem estabelecida. Os
pareceres dos censores régios aos pedidos de licenças para entrada e circulação de livros
dentro do Império luso-brasileiro, durante o período de 1808-1821, estão presentes no fundo da
Mesa do Desembargo do Paço, no Arquivo Nacional do Rio de Janeiro e serão utilizados para
compreender a dinâmica da censura, assim como o papel desempenhado pelos censores
dentro de tal processo, destacando a importância na avaliação da obra. Além disso, a partir de
tal documentação se busca problematizar as questões que envolviam as regras e critérios que
configuravam e determinavam a circulação e o acesso a elas.
Aos 10 dias de janeiro de 1835 o governo imperial autorizou a publicação do decreto de autoria
do então Ministro dos Negócios Estrangeiros, Aureliano de Souza e Oliveira Coutinho, que
criou e organizou o Montepio Geral de Economia dos Servidores do Estado. Oliveira Coutinho
resumiu bem sua finalidade que era de “beneficiar, quanto se possa, e sem gravame do Tesouro
Público Nacional, as famílias dos Empregados Públicos, que falecem sem lhes deixar meios de
honesta subsistência” (decreto de 10 de janeiro de 1835). Ressalta-se que desde meados de 1826,
na Primeira Legislatura (1826-1839), o governo passou a receber uma série de demandas, civis
e militares, por aposentadorias, pensões, entre outros benefícios, em que os requerentes
argumentavam um direito estabelecido pela Constituição Imperial de 1824, sobretudo em seu
artigo 102 inciso XI, e 179 inciso XXXI que, respectivamente, outorgou ao imperador e ao poder
legislativo a concessão de recompensa de serviços feito ao Estado ainda que não estiverem
designadas e taxadas por Lei e garantiu os socorros públicos. Nas duas primeiras décadas da
conjuntura do Brasil independente a demanda (e pressão)social e política sobre as autoridades
imperiais resultou em uma série de concessões de benefícios, ditos sociais, seja através de
garantias legais, como por exemplo, na expressa publicação da Lei de 6 de novembro de 1827,
que autorizava o pagamento de benefícios para familiares de militares, seja através concessão
individual de benefícios àqueles funcionários públicos que prestaram relevantes serviços ao
país. Em uma análise, ainda que superficial, dos orçamentos e despesas estatais nas décadas
de 1820 e 1830, observa-se que o valor despendido para o pagamento das aposentadorias,
pensões, e outros tipos de benefícios, civis e militares, passou, respectivamente, de 9:500$000
réis para 129:982$333 réis, aumento de cerca de 1.267%. De modo geral compreendemos que,
ainda que com capacidade limitada, o governo imperial se articulou para atender estas
demandas. No entanto, parte dos pesquisadores (em diversas áreas como da História,
Economia e Direito) inclinam-se a afirmar 1923, com a execução do decreto 4.682 de 24 de
janeiro (alcunhado de Lei Eloy Chaves), o marco inaugural da intervenção do poder público
nas políticas previdenciárias brasileiras, quando estabeleceu a obrigatoriedade das empresas
de estradas de ferro de erigir caixas de aposentadorias e pensões (CAPs) para os seus
empregados. Por conseguinte, a hipótese por nós aventada, tenta validas parte das teses
destes pesquisadores do século XX para o século XIX, por entender que a criação do montepio,
por iniciativa dos estadistas imperiais, foi uma tentativa de retirar do Estado parte a
responsabilidade pelo pagamento dos serviços prestados pelos funcionários públicos
imperiais. Em parte, bem-sucedida, uma vez que a existência da instituição serviu de
justificativa para que não houvesse necessidade de regulamentação legal dos benefícios para
outras categorias profissionais do funcionalismo público (além daquelas já existentes). Em
parte, malogrado, uma vez que a cláusula da compulsória participação do funcionário na
instituição foi retirada do seu estatuto, deixando intacto o para que o fluxo de demandas direto
do Estado continuasse aberta.
A Fortaleza de São João, localizada no bairro da Urca, na cidade do Rio de Janeiro, é formada
por um complexo de diversos fortes, construídos ao longo de séculos. Com origem no período
de fundação da cidade, foi marco de resistência e de defesa do espaço urbano. O conjunto
edificado é considerado patrimônio cultural e o portão da antiga fortaleza, de 1572, foi tombado
pelo IPHAN em 1938. Com caráter de defesa militar e de reconquista territorial, a construção
da Fortaleza de São João explica-se por conta de sua localização estratégica, uma vez que seu
acesso se dá por três pontos: a Praia de Fora, a Praia do Porto e a entrada da Baía de Guanabara.
Quando Estácio de Sá desembarcou na Baía de Guanabara, entre os morros Cara de Cão e Pão
de Açúcar, em 1565, ali estabeleceu imediatamente um arraial e posteriormente cercou-o,
dando início à construção do que hoje é um complexo de fortes independentes, composto da
seguinte forma: São Martinho (1565), São Teodósio (1572), São José (1578) e São Tiago (1618),
sendo posteriormente reforçados pelas baterias Mallet e Marques Porto (1902). Mesmo após a
transferência da cidade para o morro do Castelo em 1567, por Mem de Sá, a construção
continuou com sua função de guarda da entrada da Baía, ainda que de forma secundária. No
ano de 1831, durante o período da Regência, após a abdicação de D. Pedro I, o Decreto de 24 de
dezembro de 1831 determinou a redução do armamento da Fortaleza por contenção de
despesas, permanecendo apenas 7 peças na bateria mais baixa, e sem o pessoal operacional
das mesmas. Em 1855, as instalações da Fortaleza passaram a ser utilizadas pela Escola de
Aplicação do Exército que, mesmo depois de sua transferência para a Praia Vermelha,
manteve dependências naquele local. Entre 1861 e 1862 ocorreram sucessivos incidentes
diplomáticos entre Brasil e Inglaterra. O ápice desses incidentes ficou conhecido como
“Questão Christie”, um episódio de grandes proporções político-militares, no qual o vice-
almirante Warren, sob as ordens do embaixador britânico William Christie, aprisionou cinco
navios brasileiros que se dirigiam ao porto do Rio de Janeiro. Esses episódios serviram como
um alerta para a situação crítica das chamadas “fortalezas da entrada da barra”; as Fortalezas
de Santa Cruz e de São João, que estavam completamente desguarnecidas. Dessa forma, o
então Imperador D. Pedro II, preocupado com possíveis invasões estrangeiras pelo fácil acesso
pelo mar, decidiu rearmá-las, tendo a Fortaleza de São João suas defesas reforçadas no Forte
de São José, que passou a ter um conjunto de 17 casamatas, construídas e equipadas com os
melhores e mais resistentes materiais e aparatos bélicos da época. O objetivo geral desse
trabalho é estudar a Fortaleza de São João e a retomada de sua importância estratégica de
proteção da entrada da cidade do Rio de Janeiro na segunda metade do século XIX, dando
ênfase ao processo de sua remodelação por questões de defesa militar contra possíveis
invasões; e ao fato de, apesar das remodelações, a instalação manter ruínas da antiga muralha
da Fortaleza e seu portão, construído em 1572. A questão que se deseja investigar é a maneira
como o passado da fundação da cidade manteve-se presente e, afinal, integrou a nova
paisagem urbana do complexo reformulado no século XIX.
A quem servia a educação secundarista no Brasil oitocentista? Qual era sua função? É de
consenso que a educação secundária era voltada para a instrução da elite financeira e
intelectual brasileira, já que o ingresso nos cursos superiores estava vinculado a esse nível de
ensino. Ao criar o Atheneo Provincial em 23 de maio de 1873 – única instituição pública, em
solo capixaba, voltada para o ensino secundário no final do período imperial – o Presidente da
Província deixa claro a influência da escola americana, onde a falta de instrução se igualava
aos conceitos de “trevas”, “ignorância” e, sobretudo, “estagnação”. Em contrapartida, a escola
seria o “futuro” e o “progresso” da sociedade. Tendo essas concepções e questionamentos em
foco, analisaremos os relatórios e discursos dos chefes do executivo com o intuito de
identificar os ideais defendidos para a instrução secundária pública capixaba entre 1873 a
1890, além disso, será analisado o papel que o professorado assumiu nesse projeto
educacional.
Magistrado é o oficial que interpreta o direito e suas leis a serviço dos monarcas, ou seja,
segundo a historiografia atual e os tratados de época são considerados magistrados/ ministros
do Rei aqueles que se formaram na Universidade de Coimbra e cumpriram alguns requisitos
mínimos. Estes requisitos se apresentam da seguinte forma: progressão na carreira,
experiência nos ofícios, local e tipo de função exercida. Locais e funções que também seguiam
a lógica de Antigo Regime, portanto, as atividades empregadas nas colônias e conquistas do
Império, em especial, o Brasil eram levadas em consideração. O termo elite togada está
intimamente ligado aos desembargadores, último grau na progressão da carreira e de caráter
honorário devido a experiência nas práticas de julgar ou ocupantes dos principais ofícios de
justiça e administração no Império português. Portanto, devido as modificações ocorridas no
ensino e nos moldes do direito durante a segunda metade do século XVIII, ou seja, por exemplo,
a Reformulação dos Estatutos de Coimbra, Lei da Boa Razão, as modificações dos poderes
entre política e direito assim como a preponderância das Secretárias de Estados como centro
de decisão. Eventos que diminuíram a ação dos Tribunais e Conselhos e de seus membros, os
magistrados, de participarem do poder de mando e decisão prestando-se a seus serviços aos
monarcas do aspecto técnico do direito. O presente trabalho tem por objetivo analisar a
atuação de Francisco de Sousa Guerra Araújo, durante os anos de 1800 a 1808, após sua
passagem como ouvidor na Comarca do Sabará na Capitania de Minas Gerais é nomeado
como desembargador do Tribunal da Relação do Rio de Janeiro. Natural de Mariana, Vila
pertencente a Comarca de Vila Rica, filho de um dos advogados reinóis radicados no território
e sobrinho de um dos ouvidores da Comarca do Serro Frio, portanto, participaram das elites
mineiras conforme o desenrolar da segunda metade do século XVIII, mas, nosso intuito é
demonstrar a trajetória de Francisco Godinho no ápice da carreira jurídica, ou seja, como
desembargador. Pretendemos analisar conforme a historiografia do período o momento de
transição e movimentação social que ocorre, desde os anos de 1790 até 1808, quando ocorre os
juizados de inconfidência a transmigração da Família Real, abrangendo a trajetória de
Francisco Godinho como desembargador do Tribunal da Relação do Rio de Janeiro e
Conselheiro do primeiro Conselho da Fazenda radicado em terras luso-americanas.
A presente comunicação tem por objetivo discutir uma parte já desenvolvida de nossa
pesquisa de mestrado, trazendo também toda a problemática metodológica que acompanha a
mesma. Zacarias de Góes e Vasconcellos foi um político que desempenhou papel central na
segunda metade do século XIX em diversos momentos da política Imperial, como por exemplo,
a queda de seu Gabinete em 1868, que é considerada por diversos autores tais como Sérgio
Buarque de Holanda e José Murilo de Carvalho, como um marco que transformou o rumo dos
acontecimentos nos anos seguintes. Entretanto, existem poucos trabalhos consistentes que
realizam uma biografia de Zacarias de Góes, sobretudo no período em que o mesmo esteve
atuando no senado (1869-1877). A historiografia se concentra na verdade ora na publicação de
sua obra Da Natureza e Limites do Poder Moderador, no ano de 1860 ora na já referida queda
de seu Gabinete. Um personagem que desempenhou papel central em 1868 e redigiu uma das
principais obras críticas que se referem à questões relacionadas ao Poder Moderador, não
continuaria participando ativamente e influenciando discussões importantes para os rumos
da política Imperial? Nossa busca segue justamente este caminho; mapear onde Zacarias de
Góes estaria nos anos seguintes a 1868 através do material disponível, isto é, da análise dos
Anais do Senado e da imprensa periódica. Nestas fontes encontramos um material riquíssimo,
que demonstram que o Conselheiro, como também era conhecido, continuou de fato
exercendo sua influência de maneira ativa em momentos decisivos para o Império, tais como
os rumos do fim da Guerra do Paraguai e a Lei do Ventre Livre em 1871, enquanto senador até
o seu falecimento, em dezembro de 1877. Além disso, Zacarias de Góes se tornou um dos
principais opositores do Partido Conservador, rejeitando na década de 1870 o convite para
compor o Conselho de Estado, alegando que “nenhum conservador o colocaria no poder, como
ele mesmo já fizera anteriormente”. Nesta comunicação, iremos expor nossa reconstrução
dessa memória política esquecida pela historiografia de Zacarias de Góes entre os anos de
1869 – 1871 e de que forma esta memória se aproxima ou se afasta daquela já construída. Além
disso, destacaremos os motivos que nos levaram até uma definição de “memória” e todo o
percurso percorrido em relação aos problemas enfrentados quanto a uma delimitação e
enquadramento dentro de referenciais teóricos e metodológicos para o estudo de uma
trajetória, biografia e memória individual.
Entre os inúmeros encargos das municipalidades que a lei de 1828 previa (especificamente no
título terceiro), estava à que dizia respeito ao cuidado e manutenção da salubridade na
província. Questões de cunho higienista passaram a figurar como medidas necessárias à uma
salutar vivência entre os indivíduos, e tal pauta estaria na incumbência das câmaras
municipais. Dentro de uma preocupação inédita com a saúde pública nos mais distantes
rincões do Império, às municipalidades caberia a responsabilidade de solicitar ao poder
provincial lâminas de pus vacínico, fiscalizar a limpeza dos matadouros públicos, estabelecer
datas mais apropriadas para se abater rezes que chegavam de viagem, e entre outros pontos
relativos à salubridade, estabelecer cemitérios fora do perímetro urbano.
Procuraremos neste trabalho compreender qual a relação existente entre a História Filosófica
setecentista e os paradigmas ilustrados de Civilização e Humanidade. Buscaremos
demonstrar como as representações do “selvagem” americano estavam conectadas a certo
arquétipo de Homem construído pelos núcleos letrados e científicos europeus – formados por
filósofos, historiadores e naturalistas, entre outros – durante a transição dos séculos XVIII e
XIX. Pretendemos também demonstrar também como essas representações influenciaram
projetos civilizatórios e modelos de cidadania diversos. Para ilustrar tal movimento, daremos
ênfase às representações indígenas e estratégias civilizatórias formuladas pelo naturalista
Auguste de Saint-Hilaire (1779-1853) em seus relatos de viagem, documentos produzidos num
incipiente Brasil entre os anos de 1816 e 1822 e publicados na França da década de 1830.
Nosso objeto de pesquisa é o estudo biográfico de Felisberto Caldeira Brant Pontes de Oliveira
e Horta, marquês de Barbacena, diplomata e senador do Império do Brasil. O marquês de
Barbacena foi figura política importante do Primeiro Reinado estando presente em eventos-
chave do governo de D. Pedro I, como: a negociação pelo reconhecimento da independência
brasileira; a guerra da Cisplatina; a crise de sucessão do trono português (1826); as negociações
pelo segundo casamento do primeiro monarca, além de ter sido pivô de importante crise ao
final do reinado de D. Pedro I, quando foi demitido do ministério da Fazenda, em fins de 1829.
A partir do estudo da correspondência pessoal do marquês de Barbacena, conseguimos
identificar as estratégias sociais desenvolvidas pelo referido personagem para a sua ascensão
política na corte palaciana de D. Pedro I. Neste sentido, percebemos uma relação proximal
entre Barbacena e Francisco Gomes da Silva, o “Chalaça”, sujeito componente do famoso
“Gabinete Secreto” do primeiro monarca. Segundo Octávio Tarquínio de Sousa, o Gabinete era
composto por indivíduos que conheciam o imperador, alguns desde a infância, e que se
transformaram em amigos dedicados, merecendo do monarca um acesso diário e tratamento
cordial. Assim, o referido gabinete, guardava alguns estigmas do absolutismo, apresentando
“por vezes o que haveria de mais peculiar ao servilismo de meros lacaios” (SOUSA, 1972, t.III, p.
40), ao mesmo tempo em que cumpria incumbências da política imperial das mais relevantes.
Deste modo, defendemos que a presença do marquês de Barbacena junto a “Chalaça” foi
importante instrumento político para que ele conquistasse a confiança do Imperador e
adentrasse ao topo da hierarquia política do Primeiro Reinado. Assim, o referido trabalho visa
esmiuçar as referidas correspondências trocadas entre Francisco Gomes da Silva e
Barbacena, a fim de apontar as estratégias adotadas por ambos no jogo político palaciano de
D. Pedro I, bem como as consequências políticas desta relação. Acreditamos que o acirramento
da disputa entre Barbacena e “Chalaça”, e a busca pelo primeiro em se tornar o “principal
conselheiro” de D. Pedro I dentro de sua corte palaciana, provocou rupturas no campo político
imperial que desembocou naqueda do marquês de Barbacena do ministério da Fazenda, em
setembro de 1829, e no agravamento da crise política do Primeiro Reinado com o aumento das
rivalidades entre “portugueses” e “brasileiros” que marcaram todo o governo do primeiro
monarca.
Este trabalho versa sobre os padrões de alforrias na região central da Província do Espírito
Santo entre 1871 e 1888. Pretendeu-se dar destaque a ação dos escravos – que tinham
assegurada a liberdade caso obtivessem pecúlio suficiente para pagar por ela a partir de 28 de
setembro de 1871 –, às redes de solidariedade que se formaram em torno das manumissões e
as estratégias dos senhores nas “concessões” de cartas num momento de desagregação do
sistema escravista. Para tanto, foram analisadas as práticas de alforrias registradas em vinte
e um livros do cartório do segundo ofício de notas do Juízo de Vitória. As informações
baseiam-se em amostra de 155 cartas de liberdade contendo 171 escravos alforriados. Os
estudos de alforrias na Província do Espírito Santo engrossam as fileiras de trabalhos que
refutam a ideia de um padrão único de alforrias para todo o Brasil e chamam atenção para a
diversidade de características das manumissões, que variam de acordo com o lugar e período
em foco.
A maior parte da produção crítica ou historiográfica sobre Machado de Assis ainda assenta
sobre seu trabalho como romancista e contista, gêneros clássicos de ficção, enquanto sua
atividade como jornalista/cronista, em diversos dos mais importantes jornais e revistas das
últimas décadas do Oitocentos no Rio de Janeiro, somente há pouco começa a ganhar
importância e destaque. Considerando que Machado atuou regularmente como jornalista
desde finais dos anos 1850 até pelo menos a virada do século e que a maior parte de sua
produção de contos e romances também apareceu pela primeira vez nos periódicos da cidade,
acredita-se que as crônicas publicadas em diversas colunas e folhetins merecem ao menos
igual importância na sua formação como escritor, no seu papel como homem de letras e no
reconhecimento como o mais importante autor brasileiro em sua época. Entre as diversas
séries de crônicas produzidas, merecem destaque as Histórias de quinze dias (depois de trinta
dias), publicadas na Ilustração Brasileira entre julho de 1876 e abril de 1878, e as Notas
Semanais, publicadas n’O Cruzeiro, entre junho e setembro de 1878. Esses dois conjuntos, que
parecem ser complementares, apesar de estarem em periódicos diferentes e serem assinados
por “autores” diferentes, respectivamente Manassés e Eleazar, são especialmente
significativos porque publicados entre o lançamento de Iaiá Garcia e Memórias Póstumas de
Brás Cubas, fazem uma espécie de ponte entre o escritor ainda retraído dos primeiros
romances e o grande analista que se consolida a partir dos anos 1880. As crônicas produzidas
no intervalo entre 1876 e 1878 evidenciam como a atividade jornalística serviu, a cada semana,
a cada quinzena, para que Machado exercitasse os elementos literários que contribuíram para
a solidificação de sua imagem ao longo do século XX, como escritor irônico, sofisticado, de
humor afiado, que entretêm mas ao mesmo tempo questiona a perspicácia do leitor, de crítico
mordaz dos costumes e regras da sociedade, que desafia a identidade que se queria construir
para o país, expondo as contradições e ridículos de um Estado monárquico, escravista,
pretensamente progressista e civilizado(r), mas profundamente conservador e desigual.
Nessas crônicas Machado tratou de assuntos como as crises ministeriais, a lei de 28 de
setembro, as eleições, o censo, mas também sobre as touradas e outros hábitos pouco
“civilizados”, como os circos de horrores, o hábito de soltar foguetes nas festas (juninas) de
santos, contrariando os críticos que o atacavam por não tratar de política e outros assuntos
graves do Estado/nação e nem mesmo de aspectos da cultura popular. Uma razão provável
para esta negligência com as crônicas pode ser pela forma como Machado trata de temas tão
sérios sob um véu de sátiras, metáforas humorísticas, histórias cômicas e ridículas, mas que
permitiam aos mais atentos perceber o absurdo e o descompasso real da vida nacional,
cambaleando entre o atraso e o progresso. Juntamente com o uso dos narradores sob os quais
se escondia, esses recursos, típicos de narrativas de ficção, inventadas, imaginadas, remetiam
a textos que não deveriam ser levados a sério, mas que permitiam maior liberdade para
Machado comentar e criticar a política nacional, a cultura da boa sociedade escravocrata,
algumas propostas liberais – mas nem tanto –, o sistema eleitoral, entre tantos outros
assuntos.
O presente trabalho propõe analisar as relações entre a Irmandade do Rosário e a elite juiz-
forana diante do processo de afirmação da mesma e o processo de construção de sua Capela,
situada no bairro Granbery. A criação desta confraria, ocorreu 21 dias antes da abolição da
escravidão, o que denota uma certa singularidade dada o histórico da cidade que, com a
expansão cafeeira, chegou a concentrar 26% da população escrava da Província. Nesse sentido
a pesquisa visa compreender as relações que existiram entre os membros dessa irmandade
de homens pretos e algumas figuras que compunham elite juiz-forana do final do século XIX
e início do século XX, uma vez que o fundador dessa confraria ao se despedir do cargo,
alegando estar avançado em idade e precisa cuidar da saúde, faz a seguinte afirmação; “a
irmandade do rosário sempre foi dos pretos”. Nesse sentido, as fontes utilizadas até o
momento para empreender esta pesquisa são o compromisso da Irmandade do Rosário da
Freguesia do Santo Antônio de Juiz de Fora e vários artigos do Jornal “O Pharol”, onde se pode
notar uma intensa atividade, não só no que se refere ais festejos idealizado pela irmandade,
mas também os diversos atos de doações de várias pessoas ilustres da elite local para a
construção da Capela. Logo o projeto visa analisar os interesses da elite local na promoção da
Capela do Rosário, que no momento de sua inauguração pode se notar a presença dessa elite,
porém não há referências dos membros dessa Irmandade.
Esse artigo tem o objetivo de discutir a relação entre a vida e a produção historiográfica na
escrita da história de Jules Michelet. Partimos do pressuposto de que o historiador francês
Jules Michelet se enquadra numa perspectiva histórica extremamente singular. Ele
definitivamente rompe com a ideia de apreciar o passado por ele mesmo. A história deve
estimular os homens a agir, tornarem-se Prometeus. Concepção de história que emerge no
século XIX num contexto político pós-revolucionário. Nesse sentido, vamos discutir no
interior da história da historiografia, história das ideias e dos conceitos, elementos que
contribuíram para a emergência dessa concepção de história que deve ser compreendida
fundamentalmente como história poética em oposição às tentativas de adequação do
conhecimento histórico a metafísica cartesiana. Isso significa repensar o lugar da vida na
produção da narrativa histórica e a fundação de uma nova verdade.
Este trabalho se insere no campo da História da Imprensa, que tem avançado nos últimos anos
com o alargamento dos campos na história e da noção de documento histórico. Desenvolvo
este estudo a partir da ideia de Robert Darnton e Daniel Roche na obra Revolução impressa. A
Imprensa na França, 1775-1800 compreendendo os impressos como agentes históricos que
tiveram poder transformador na história, o que implica em ver os impressos como força ativa
na história, tendo em vista que por meio da relação entre escrita e leitura, pode-se mover o
pensar, o saber e o agir. O publicista sobre qual me debruço, Santiago Nunes Ribeiro, foi um
peruano que desde criança habitava o Brasil e que teve importância fundamental na
construção de um sentimento nacional brasileiro. Partirei de um caminho deixado por
Antônio Candido, em sua obra Formação da Literatura Brasileira, na qual o autor evidencia a
importância de Santiago na formação de uma interpretação acerca da história da literatura
brasileira, que teria sido a mais notável até Silvio Romero. Me proponho neste trabalho,
analisar os que considero como principais artigos escritos por Santiago Nunes Ribeiro,
publicados em Minerva Brasiliense (1843-1845), ao longo da duração da revista. Por meio da
análise de seu discurso viso demonstrar a riqueza de seu pensamento, não me centrando
apenas em seu ensaio “Da nacionalidade da Literatura Brasileira”, o que não exclui a extrema
relevância deste que é tido como um dos principais ensaios publicados pela Minerva. Destaca-
se a importância da atuação de Santiago Nunes Ribeiro na revista romântica Minerva
Brasiliense (1843-1845), da qual o publicista foi colaborador desde o início e redator na
considerada segunda fase da revista, que se iniciou em 15 de novembro de 1844. Nessa
segunda fase, em que atuou como redator, sublinham-se seus esforços em ampliar o público
leitor da revista, assim como na formação de uma Biblioteca Brasílica, que teve como principal
objetivo a publicação de obras raras a um valor menor que o encontrado nas livrarias. Algumas
obras seriam publicadas pela primeira vez nesta publicação, como foi o caso das Cartas
Chilenas. Em suma, meu objetivo é traçar uma análise dos principais artigos de Santiago
Nunes Ribeiro publicados em Minerva Brasiliense. Dentre estes artigos, analiso Da
nacionalidade da literatura brasileira, o artigo que é considerado o principal em sua carreira
devido à polêmica que suscitou, estabelecendo uma comparação ao artigo de Domingos
Gonçalves de Magalhães Ensaio sobre a história da literatura do Brasil com o objetivo de
mostrar a relevância do ensaio deste peruano, muitas das vezes esquecido pela história.
Também me proponho a analisar os ensaios nos quais Santiago expressa sua opinião sobre o
público leitor que se formava, assim como naqueles em que expõe suas aspirações relativas à
construção das bases da nação.
Fundada por São Vicente de Paulo em 1625 na França, a Congregação da Missão destacou-se
por seu papel decisivo na reforma do clero francês no âmbito dos movimentos reformistas
pós-concílio de Trento. Portadores de uma espiritualidade fortemente marcada pelo rigorismo
moral, esses padres destacaram-se por pregar missões junto às pobres comunidades rurais
francesas. Já em suas primeiras décadas, a Congregação enfrentou problemas relacionados a
conciliação entre o dever missionário e as atividades internas em prol da santificação pessoal.
Esse conflito foi imortalizado no livro de normas, entregues aos missionários somente em
1658. Em 1820, dois missionários lazaristas (outro nome dado aos padres da missão) chegaram
ao Brasil, oriundos de Portugal. Ao aqui chegarem, logo receberam a herança do ermitão
Lourenço de Nossa Senhora, um santuário encravado na Serra do Caraça, atual município de
Catas Altas, com a condição de formar ali um colégio para a educação da mocidade e um asilo
de missionários. Enquanto lá permaneceram, os congregados edificaram um dos mais
importantes colégios brasileiros do século XIX. Além de ensinar a mocidade, tais padres foram
responsáveis por realizar missões em toda a região. Os livros utilizados nas missões, bem
como documentos que regiam a vida diária da casa lazarista, incluindo uma cópia das Regras
e Constituições Comuns da Congregação ainda podem ser encontradas nos arquivos daquela
instituição. O objetivo da atual comunicação é, através dessa dos documentos encontrados,
compreender aquilo que temos chamado até então de espiritualidade lazarista. Quais valores,
ritos e práticas eram valorizados por aqueles padres dentro de um universo de outras tantas
crenças, ritos e práticas possíveis? Em que tais elementos influenciaram as ações daqueles
padres em prol da reforma dos valores religiosos nas Minas oitocentistas? Essas são questões
que pretendemos abordar na comunicação. Através de cartas e demais documentos
produzidos por D. Antônio Ferreira Viçoso, bispo de Mariana (1844 – 1875) e um dos mais
importantes membros da Congregação no Brasil, já foi possível identificar de forma
sistemática o papel exercido pela figura de São Vicente na elaboração de uma espiritualidade
lazarista brasileira, com conflitos e valores muito parecido com aqueles gestados no início da
Congregação. Tal relação é óbvia, contudo, entendê-la tem se mostrado esclarecedor na
compreensão de falas, atos e posicionamentos tomados pelos padres congregados no cenário
das Minas Gerais do século XIX.
Os estudos sobre a família escrava têm sido de suma importância para compreendermos a
Escravidão no Brasil. Assim, o presente trabalho busca não só dialogar com o debate sobre
esta dimensão do passado escravista, como contribuir para ele, concentrando-se no âmbito
de propriedades de ordens religiosas. Sendo assim, viso estudar a formação e os laços
comunitários entre os escravos da Ordem de São Bento, no Recôncavo da Guanabara, no
século XIX. Para isso, analiso arquivos paroquiais: assentos de batismo, casamento e óbito
entre os anos de 1817 e 1857 da Capela de Nossa Senhora do Rosário. Tais fontes me permitiram
realizar uma análise mais acurada das relações familiares desses indivíduos que vivenciaram
o cativeiro, os então chamados: Escravos da Religião.
Este artigo tem como objetivo a leitura contextual da construção de ferrovias no Centro-Sul
do Império do Brasil a partir de uma perspectiva que extrapole os limites do Estado Nacional.
A partir de tal perspectiva, o caráter internacional e as relações internacionais, as influências
atlânticas no que concerne à expansão dos avanços da chamada "revolução industrial" e
temas afins a serem observados num jogo de escalas que conecta o industrialismo e a
expansão do capitalismo industrial oitocentista e como se dão suas influências regionais e as
conexões entre agentes que se movimentam num espaço que vai além das fronteiras
nacionais. A expansão técnica ferroviária no século XIX de uma perspectiva global e as
variações nas relações internacionais num âmbito regional a partir da observação de como se
dão as mudanças nos contratos de mão-de-obra em setor altamente especializado e com
demandas de novo tipo, que demandam novas perspectivas de mercado financeiro, de
associação, de administração pública e de contratos internacionais.
Em junho de 1812, Innocencio Soares de Aguiar Montalvão, tenente coronel de milícias da Villa
de Nossa Senhora de Bonsucesso das Minas Novas da Comarca de Serro do Frio da Capitania
das Minas Gerais, fez requerimento à Sua Alteza Real o príncipe D. João, suplicando a graça
“da propriedade dos Officios de Tabelião e Escrivão de Órfãos da Villa Nova do Príncipe de Sta.
Anna de Caetaté, Comarca de Jacobina, Capitania da Bahia”. Este episódio revela os trâmites
da requisição de mercês no regime polissinodal da monarquia pluricontinental portuguesa no
período que reputamos como Antigo Regime tardio (1808-1820) e a trajetória de um pequeno
fidalgo na complexa teia de relações sociais na América portuguesa, na conjuntura em que
esta ocupava alguma centralidade em um império transatlântico decadente, mas ainda cioso
de suas instituições que, embora esmaecido pelo longínquo período de seu vigor entre os
séculos XVII e XVIII e solapado pelas diversas reformas ocorridas desde o período josefino (ou
pombalino, como aponta a historiografia corrente), guardava algum vigor no período em
estudos.Ao debruçar sobre o processo de petição de mercê que fez o Coronel Innocêncio
Montalvão e as disputas em torno da emancipação da Villa Nova do Príncipe de Sta. Anna de
Caetaté, almejamos aqui também trazer elementos para uma reflexão acerca do Antigo
Regime português em seu tardio movimento que - ao transferir sua sede de decisões para o
Rio Janeiro em função da devastadora expansão liberal napoleônica sobre a Europa - visava
a recomposição da outrora vigorosa monarquia pluricontinental que ao longo de três séculos
constituíra de territórios europeu e ultramarino distribuídos nos diversos continentes, cuja
relação centrífuga entre centro-periferia era pautada pela natureza polissinodal de suas
instituições, lastreadas por uma concepção jurídico-política pautada no tomismo da segunda
escolástica que concebia ao catolicismo os elementos que procuravam justificar sua
operacionalidade e manter coesos os diversificados territórios do império. Esse período que
compreende a transferência da Corte em 1808 até o pós-revolução liberal do Porto que
suprimira o Antigo Regime, exigindo o retorno do rei a Portugal e sua reativação como sede
do império em 1821, compreende um período conhecido como Joanino no qual tivemos um
recrudescimento das relações do Antigo Regime, particularmente com a aproximação com a
pequena nobreza e fidalguia fluminense e repactuação das relações políticas diretamente com
os centros de poder.