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DRAFT – ORIGINAL EM Análise Social, vol.

XLV (197), 2010, 639-662

A DIMENSÃO INSTITUCIONAL DA GOVERNANÇA URBANA E A GESTÃO


TERRITORIAL NA ÁREA METROPOLITANA DE LISBOA
José Luís Crespo, jcrespo@fa.utl.pt
João Cabral, jcabral@fa.utl.pt

Faculdade de Arquitectura, Universidade Técnica de Lisboa


Rua Sá Nogueira, Pólo Universitário, Alto da Ajuda, 1349-055 Lisboa

Resumo

Nos últimos anos as abordagens da governança têm vindo a influenciar o


desenho e implementação das politicas urbanas. O Estado e a administração
pública deixam de ter o papel exclusivo, passando o foco para a coordenação
dos interesses públicos e privados, procurando conseguir metas e projectos
colectivos. A capacidade de organização e de articulação do poder
central/regional e local é crítica para a eficácia da gestão urbana,
nomeadamente ao nível das decisões para o planeamento e gestão territorial
no desenvolvimento das áreas metropolitanas e das regiões urbanas e através
da criação de novas estruturas empresariais municipais e intermunicipais.

Palavras-chave: Governança, Administração central/regional/local, Gestão


territorial, Área Metropolitana de Lisboa

Abstract

In recent years governance approaches have been influential in the design and
implementation of urban policies. The State and the public administration don’t
have anymore an exclusive role on these matters, focusing now on the
coordination of the public and private interests for achieving collective projects
and goals. The capacity of organization and articulation of the central/regional e
local powers is critical for the efficiency or urban management, namely at the

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level of planning decisions for the development of metropolitan areas and urban
regions and through the creation of new municipal and inter-municipal
entrepreneurial structures.

Key-words: Governance, Central/regional/local administration, Territorial


planning, Metropolitan Area of Lisbon

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1. Introdução

Governança é um termo/conceito muito antigo e uma realidade ainda mais


antiga (Pierre & Peters, 2000; Peters, 2002). As sociedades sempre
necessitaram de alguma forma de orientação, de direcção e de gestão
colectiva. As variações na ordem política e económica têm produzido diferentes
respostas às questões fundamentais sobre a forma de orientar e direccionar a
sociedade e de como lidar com o conjunto de desafios que daí decorrem, assim
como das respectivas respostas. Desta forma, a governança não é uma
constante pois tende a mudar à medida que as necessidades e os valores
também mudam.

A habitual resposta às várias questões foi dada pelo Estado, mas as soluções
que têm sido eficazes num determinado contexto, em pouco tempo podem
tornar-se ineficazes. O processo de governação/governança representa uma
continuação da política conjunta de adaptações e de actividades
administrativas às mudanças na sociedade, no que constitui uma “adequação”
aos modos de desenvolvimento e implementação de metas colectivas (Peters,
2002).

A capacidade de adaptação da contemporânea governança está associada ao


colocar em questão os pressupostos em que assentam e regulam as
abordagens consideradas “tradicionais”, designadamente, os pressupostos
sobre a centralidade dos intervenientes Estado e autoridade pública na
governação estão postos em causa. A noção de um único locus de soberania e
de uma ordenação hierárquica dentro do sistema de governança já não
corresponde à realidade.

Como um conceito, a governança surgiu a partir da convicção partilhada de


que, em vários níveis e graus “as estruturas tradicionais de autoridade ...
falharam” (Kooiman, 1993:251) e que o Estado moderno é agora obrigado a um
ciclo de re-legitimação. As conceptualizações tradicionais do governo, que
reconhece o Estado como o mais proeminente actor em jogo na política
pública, são designadas como abordagens desactualizadas na organização

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das interacções sociais. As perspectivas da governança, em vez disso, visam


agregar “a totalidade das concepções teóricas de governar” (Kooiman, 2003:4)
e são consideradas como um efectivo “processo de orientação para a
sociedade” (Peters & Pierre, 2003:2).

No entanto, não existem substituições ou alterações globalmente aceites para


orientar esses novos pressupostos e, como consequência, tanto no mundo
académico como na prática, são mais problemáticos do que o foram no
passado.

Com este pano de fundo, pretendemos neste artigo discutir o conceito de


governança nas suas várias vertentes, ao nível do seus significados e das
várias perspectivas a ele associados. Uma outra componente interpretativa
relaciona um conjunto de fenómenos e mutações na sociedade com o próprio
conceito de governança. Em seguida, colocamos a acentuação nas
perspectivas da governança que têm vindo a moldar muito do pensamento
sobre a politica urbana. Por último, para a Área Metropolitana de Lisboa,
analisamos a governança e a gestão do território, ilustrando dois aspectos
críticos: i) a questão do papel e das implicações das decisões da administração
pública ao nível central/regional e local para o planeamento e desenvolvimento
territorial, e ii) a emergência de instituições e de empresas municipais e
intermunicipais com responsabilidades na gestão de áreas e de serviços da
competência da administração local, com o objectivo de promover condições
de flexibilidade, nomeadamente contratual, e de articulação institucional para
maior rentabilidade na prestação desses serviços.

2. Governança: a adaptabilidade de um conceito com vários significados


e perspectivas

A governança é um termo desorganizado, um conceito "chapéu", por vezes mal


interpretado, devido aos múltiplos significados que lhe estão conferidos (Pierre,
2005). O motivo de sua popularidade é a sua capacidade de – ao contrário do

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que o termo mais restrito governo/governação – cobrir todo o leque de


instituições e relações envolvidas no processo de governar (Peters & Pierre,
2000).

Inicialmente o conceito esteve estritamente ligado ao do governo/governação.


Com este sentido restrito, a utilização do termo permaneceu muito tempo
limitada à área jurídica e constitucional para descrever a condução dos
assuntos de Estado ou a direcção das instituições que se caracterizam por uma
multiplicidade de actores, para os quais a utilização de governo parecia
restritiva. Mais recentemente, a maioria dos autores consideraram haver
distintas condições analíticas (Stoker, 1998). Entrou nos trabalhos e no
vocabulário das ciências sociais e tornou-se um termo/conceito em voga em
diversas áreas: política, economia, relações internacionais, entre outras. As
ideias associadas são bastante variadas se nos referimos a boa governação; a
governança internacional, europeia, regional, metropolitana ou urbana; a
governança multi-nível, vertical a horizontal governança – para citar apenas
alguns exemplos. Dependendo de quem é o interlocutor, a sua área de
actividade ou de investigação ou, simplesmente a sua sensibilidade, evoca-se
um, ou vários, desses possíveis significados (Borlini, 2004).

A mudança do sentido do governo, associado à governança, enquadra um


novo processo de governar. A governança refere-se à auto-organização,
caracterizada pela interdependência inter-organizacional de redes, recursos de
trocas, onde as regras do jogo significam alguma autonomia em relação ao
Estado (Rhodes, 1997).

Recentemente, Bevir et al., (2003:45) definiram governança como "uma


mudança na natureza ou significado do governo". Deste modo, nos últimos
anos tem “saltado” fora dos estreitos limites referidos para assumir, um
significado e uma área de aplicação muito mais amplas. Este carácter
paradigmático é o que permite o seu posicionamento sobre vários planos.
Kooiman (2003) foi capaz de identificar nada menos do que doze diferentes

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significados1 (correspondentes a várias áreas de utilização), com apenas um


conjunto de denominadores comuns – considerando as principais esferas
institucionais (Estado, mercado e comunidade) como componentes que não
são inequivocamente distintas, com a ideia de formas de cooperação como um
mecanismo de legitimação e uma garantia de eficácia; e com uma atenção
para sistemas concretos de acção e de decisão – mas com diferenças
substantivas noutros pontos de vista. Este vasto conjunto de significados
tornam aparente que os diferentes ramos das ciências sociais empreguem as
suas próprias e por vezes distintas interpretações (Kjær, 2004).

Jessop (1998) identificou dois significados estreitamente relacionados de


governança. Primeiro, a governança pode-se referir a qualquer modalidade de
coordenação de actividades independentes; o segundo, mais restritivo é a
hierarquia (ou a auto-organização). Nas formas de governo sócio-político os
agentes públicos ou privados, não agem isoladamente, mas em conjunto, em
combinação, ou seja, em 'co'-regime. Os modos de governança sócio-políticos
são sempre um resultado da interacção do público e do privado. A interactiva
governança sócio-política significa definir o “tom”, criando as condições político-
sociais para o desenvolvimento de novos modelos interactivos que regulam em
termos de co-gestão, co-direcção e co-orientação (Kooiman, 1993). A
governança aproxima-se do termo coordenação, no sentido da existência de
uma acção coordenada, depende de atitudes contingentes ou mecanismos
institucionais de coordenação ou concertação entre actores (Scharpf, 2001).

Para Milward (2004:239) a governança é um termo abrangente (não apenas


governamental) preocupado com as condições para a criação de regras para a
acção colectiva, muitas vezes incluindo agentes do sector privado. A essência
da governança é o seu enfoque sobre mecanismos de direcção e de gestão
(subvenções, contratos e acordos) que não exclusivamente associados à
entidade e a sanções do governo. Estes mecanismos, ou ferramentas, são

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Estado mínimo; governança corporativa; nova gestão pública; "boa governação"; socio-
cybernetic governança; redes auto-organizadas; direcção dos recursos – auto-regulação da
sociedade; governança global; governança da economia; governança e governabilidade;
governança europeia - governança multi-nível; governança participada.

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utilizadas para conectar redes de actores, que operam em diferentes domínios


das políticas públicas. Uma questão empírica crítica é o grau em que operam,
ou seja, se autonomamente ou se são conduzidos pelo Estado.

A governança significa pensar sobre a forma de orientar a economia e a


sociedade, bem como a forma de alcançar determinadas metas colectivas.
Podemos olhar a governança como processo em que o Estado desempenha
um papel fundamental, focando as prioridades e definindo os objectivos. Pode-
se ainda discutir a governança como uma estrutura – institucional com quatro
modalidades comuns, a hierárquica, de mercado, de rede e da comunidade – e
como processo – de direcção e de coordenação, onde o enfoque se centra
sobre o resultado (Peters & Pierre, 2000).

Recentemente, uma outra concepção procura mostrar que a governança em


rede prevê uma maior oportunidade para os indivíduos em participar no
processo de decisão política, de forma a construir um capital social e político,
assim como competências de auto-governação (Sorensen, 2002, 2005;
Sorensen & Torfing, 2003).

Na Europa, nos últimos anos, a noção de governança, como desafio de


direcção e de coordenação, foi objecto de numerosos debates tanto científicos
como políticos. A multiplicidade de utilizações e interpretações desta noção
pode derivar num enorme sucesso e pode ser também a sua principal
fraqueza. O sucesso, pois obriga a que muitas disciplinas reflictam em seu
redor e, a fraqueza, na sua utilização indiferenciada que coloca sérios
problemas de definição e orientação. O problema, é com efeito, que a
governança é utilizada como uma categoria de actores e como uma categoria
de análise, ou seja, tanto é mobilizada para descrever o que a realidade deve
ser, assim como o que ela é. Neste contexto, podem-se descrever várias
perspectivas e aproximações (pré-teoria, teoria, normativa, analítica) diferentes
da governança (Leresche, 2002; Borlini, 2004).

Governança como uma pré-teoria. O ponto central a focar aquando do


raciocínio sobre o conceito de governança é o da sua natureza pré-teórica.

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Uma governança que se consubstancia como uma espécie de paradigma,


como um quadro conceptual que ajuda a colocar uma série de questões
importantes sobre a sociedade, mas que, porque está situado num nível pré-
teórico, se revela difícil de circunscrever (Stoker, 1998; Le Galès, 2003).
Porque ainda não está solidificado ao nível das definições (Jordânia et al.,
2005), a governança é um conceito particular na actual literatura. Não é apenas
um item de investigação em si mesmo, tem também desenvolvido vários sub-
conjuntos teóricos, incluindo a governança Europeia, governança de empresas,
governança política, governança local e governança urbana.

Governança como teoria. Outros autores já definem e posicionam a


governança como uma teoria (Pierre & Peters 2000; Pierre 2000, 2005). No
entanto, salientam que não existe ainda uma completa teoria da governança.
Em vez disso, a governança oferece um quadro analítico ou, pelo menos, um
conjunto de critérios que definam o que são os "objectos dignos de estudo"
(Stoker, 1998). A perspectiva da governança na política urbana dirige o
observador a olhar para além das instituições da Administração Local para
pesquisar processos e mecanismos através dos recursos que são os actores e
a coordenar as suas acções e os seus recursos para a prossecução dos
objectivos definidos colectivamente. Obviamente, a governança urbana para a
maior parte, apresenta um grau significativo de centralidade para as instituições
políticas nestes processos. A perspectiva da governança, no entanto, permite
avançar para além do pressuposto de que estas instituições estão em pleno e
exclusivo controlo da gestão urbana e em pensar no papel dessas instituições
como uma variável (Pierre, 2005).

Governança como norma. Na acepção normativa, a governança liga-se


essencialmente a uma norma ou a um instrumento de utilização pública,
apresentada como a solução “milagre”. Encontramos esta aproximação no
universo das organizações internacionais, assim como na análise das políticas
públicas, através da corrente da gestão que procura melhorar a eficácia da
acção pública e da corrente dita democrática ou participativa, que enquadra a
governança como um utensílio de alargamento da participação nos processos

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de decisão. Nesta óptica há duas leituras contrastadas da governança: uma de


centrada na ideia de um enfraquecimento do Estado (neo-liberal) e outra que a
interpreta como uma extensão da mobilização cívica numa perspectiva de
desenvolvimento de uma democracia participativa (Leresche, 2002). Outro
significado da governança urbana, enquadrado nesta aproximação normativa,
que emergiu primeiramente no Reino Unido durante os anos 1980 e 1990, foi a
de um modelo de parcerias público-privadas de interacção e cooperação a
nível local (Stoker, 1998). O governo central promoveu um modelo inclusivo de
governança urbana, em particular, no que se refere ao papel da comunidade
empresarial local. A normativa, com o enfoque na política, foi enfatizada pelo
governo local como a única fonte de prestação de serviços, avançando-se para
uma estratégia de mobilização de recursos definida territorialmente para o
sector público, bem como o sector empresarial, interesses organizados e
outros actores importantes na cena local (Pierre, 2005).

Governança como uma perspectiva analítica. A governança pode enquadrar-se


como suporte a um discurso ideológico e como uma grelha de leitura das
transformações da acção pública, em particular da acção pública territorial. A
noção de governança deve contribuir na análise de novos tipos de direcção que
foram postos em prática nas últimas décadas nos diversos domínios ou
territórios. A operacionalização da noção de governança nas diferentes
políticas visa verificar a sua utilidade e as suas consequências. Um dos
primeiros desafios analíticos consiste em determinar em que tipos de
processos e com que consequências para o poder e a democraticidade dos
mecanismos de governança (cooperação, parcerias, coordenação, etc.) são
postos em prática. O segundo é determinar os factores que estruturam a
emergência de mecanismos de governança. Uma perspectiva analítica permite
igualmente abordar a governança como uma modalidade de acção que tanto
substitui, como completa, o modelo de governação tradicional (hierárquico) por
lógicas cooperativas a partir de uma constatação de pluralidade de modos de
governação e de actores nas decisões. É uma forma de colocar o debate
teórico da governação/governança na produção e implementação de políticas
(Leresche, 2002). Neste sentido, a análise da governança permite alterar a

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perspectiva clássica das políticas públicas que, numa perspectiva


centralizadora, atribui somente aos actores institucionais a competência de
produzir políticas, para a substituir por uma perspectiva à priori mais aberta. A
noção de governança permite assim (des)institucionalizar a análise das
políticas públicas abrindo a focagem num conjunto de actores que participam
na construção e no tratamento dos problemas colectivos.

3. Governança: relações entre o conceito e alguns fenómenos

Podemos formular algumas hipóteses em relação ao desenvolvimento e ao


sucesso da governança do ponto de vista teórico e da relação entre o conceito
e o conjunto de fenómenos que ela indica (Borlini, 2004). Para os trabalhos
comparativos empíricos, a maioria das interpretações não são suficientemente
precisas para diferenciar as novas formas de governança das formas
tradicionais de governo. Apesar destas divergências, há um relativo consenso
sobre um certo número de pontos básicos.

Velhas ideias com nova roupagem. Existem inúmeros estudos sobre a


governança, que revestem velhas ideias com uma nova roupagem, pois muitas
das práticas actualmente agrupadas sob o conceito de governança foram
previamente analisados noutras rubricas, como nas teorias da regulação, nas
parcerias público-privado, nos distritos industriais, no estudo das redes, nos
estudos da gestão e da organização e na nova gestão pública (Jessop, 1998;
Le Galès, 1998; Borlini, 2004).

Governança e governo como pólos num continuum. A governança e o governo


são por vezes encaradas não como entidades distintas, mas como dois pólos
num continuum de diferentes tipos de governar (Finer, 1970). Se a extrema
forma de governo foi o "Estado forte" na época do "grande governo" (Pierre &
Peters, 2000:25), então a igualdade extrema da forma de governança é
essencialmente uma auto-organização e coordenação da rede de actores
sociais, sendo uma "auto-organização", no sentido de que resistem à direcção

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do governo (Rhodes, 1997; Schout & Jordan, 2005). A colocação do governo e


da governança nas extremidades de um continuum teórico é, no entanto,
improvável que seja suficientemente sensível para captar as mudanças na
forma e função da governança.

Estruturas governamentais multi-nível. Grande parte da literatura recente sobre


governança sublinha a importância crescente de estruturas governamentais
multi-nível, como a União Europeia (UE), para a disseminação das "novas"
formas de governança. A publicação do Livro Branco da Comissão Europeia
sobre a Governança Europeia2 (COM [2001] 428, final) veio dar um impulso a
esta corrente. O seu foco analítico é bastante difuso, mas também incide
principalmente sobre o nível da UE, sem dar suficiente atenção para a maneira
como as "novas" formas de governança são (ou poderiam ser) implementadas
nos Estados-Membros e em níveis abaixo. Pierre & Peters (2000) sustentam
que o Estado está a perder a sua capacidade como “director” e o controle é
deslocado num nível elevado para as organizações internacionais e regionais,
como a UE; num nível mais baixo para as regiões autónomas e municípios; e
para as corporações internacionais, organizações não-governamentais e outros
agentes privados ou semi-privados.

Diminuição da capacidade do governo e o fracasso das formas tradicionais da


política pública. Existe uma estreita ligação entre o desenvolvimento e a
aplicabilidade do conceito de governança e as mudanças sociais que têm
ocorrido nas últimas décadas, com profundas transformações que têm
investido nas sociedades ocidentais, levando à constatação da existência de
uma crise de governabilidade a vários níveis, com os governos instituídos, seja
do Estado ou municipais, a perderam a sua capacidade de acção para fazer
face às transformações em curso na sociedade. Os processos de globalização
económica, da unificação europeia, da passagem para o pós-fordismo das

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Tal como foi apresentada no Livro Branco, a governança, corresponde a regras,
procedimentos e comportamentos que afectam a forma como o poder é exercido a nível
europeu, nomeadamente no que diz respeito à abertura, participação, responsabilidade,
eficácia e coerência. A conotação positiva dada ao termo governança diz respeito a uma
oportunidade para resolver problemas através de uma cooperação do Estado com o mercado e
com a sociedade civil.

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relações económico-sociais, das transformações demográficas, a


complexidade acrescida das sociedades ligada à sua fragmentação, a
imprevisibilidade do futuro, a desconexão entre autoridades políticas e
cidadãos enfraqueceram e detiveram – em termos de sustentabilidade
financeira e de legitimidade – o sistema de bem-estar capitalista e explicam,
em parte, o falhanço dos modelos tradicionais das políticas públicas. Neste
sentido, podemos associar a governança a uma diminuição da capacidade do
governo central para orientar a sociedade. A monopolização da autoridade por
uma única entidade, o Estado, é o aspecto mais importante da teoria tradicional
do governo e que a distancia da governança. A perda de capacidade de
orientação, levou à convicção de que o Estado deve alterar a sua cultura da
função pública (Pollitt, 2000) ou mesmo delegar as políticas a agentes
exteriores ao sector público (Osborne, 2006). Do mesmo modo, um emergente
poder supranacional e regional, bem como o aumento da fluidez de activos
financeiros têm deslocado a autoridade para longe dos governos centrais.
Alguns autores concluem que tanto a opacidade fora do Estado (Rhodes,
1997), bem como a potenciação de formação de redes de vários níveis
enquadram-se no aumento da complexidade que caracteriza as sociedades
modernas e a subsequente diminuição da convencional interpretação
weberiana racional/legal do Estado. Todos estes elementos tornaram cada vez
mais difícil para o Estado nacional exercer o papel de único regulador da
economia e dos serviços sociais e cada vez mais se tornam necessárias
formas de coordenação entre as instituições, níveis territoriais e vários agentes
(Mingione, 2003; Le Galès, 2003).

Aparecimento de novos instrumentos e ferramentas para tomada de decisões.


Existe a tendência na literatura da ciência política para associar governo com
regulação e a governança a ser frequentemente vista como uma manifestação
do aparecimento de novos instrumentos políticos (Zito et al., 2003). Para
Heywood, (2000) as principais funções do governo são a capacidade de tornar
lei (legislação), o implementar do direito (execução) e a interpretação da lei
(adjudicação), enquanto que para Richards & Smith (2002), o governo é
burocracia, legislação, o controlo financeiro e a regulamentação. Pelo contrário,

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governança é caracterizada por uma crescente utilização de instrumentos


políticos não regulamentares. Estas são propostas, concebidas e executadas
por intervenientes não estatais, trabalhando junto com os agentes estatais ou
de forma independente. Podemos reconhecer que o conceito de governança
apresenta-se como uma ferramenta útil para a tomada de decisões, nomeando,
identificando e, em seguida, estudando uma nova situação, normalmente
caracterizada por uma multiplicidade de formas de regulação e pela
fragmentação do poder entre as várias camadas que compõem a actualidade
político-administrativa, económica e social.

4. Governança e políticas urbanas

Ao longo dos últimos anos, as teorias da governança têm vindo a moldar muito
do pensamento sobre a política urbana (Dowding, 1996; Goldsmith, 1997; Le
Galès, 2006; Stoker, 1998). Estas abordagens estão principalmente
preocupadas com a coordenação e a fusão dos recursos públicos e privados,
que se tornaram numa estratégia adoptada, em graus diferenciados, pelas
autoridades locais um pouco por toda a Europa Ocidental. Embora haja um
crescente corpo de investigação amplamente definido sobre a natureza das
parcerias público-privado (Pierre, 1995, 1998), a questão dos objectivos
políticos que guiam a governança urbana foram deixados, em grande parte,
sem resposta.

Concomitantemente, desenvolveu-se uma outra componente que tenta ajudar a


explicar os problemas de governabilidade ou as "lacunas da governação"
(Pierce, 1993) dentro de cada administração. Este desafio de governabilidade,
que é um tema antigo em ciência política, encontra hoje uma segunda
juventude, não pelo ângulo da crise de representação ou da participação
democrática tradicional, mas sobre o ângulo de elaboração e implementação
de políticas nas sociedades/sistemas cada vez mais complexos, fragmentados
e interdependentes. Neste sentido, a governança surge como uma resposta
coordenada numa crise geral de governabilidade, como um desafio de

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coordenação não só das instituições públicas, mas para todas as actividades


interdependentes (Leresche, 2002).

As teorias da governança visam agregar a totalidade das concepções teóricas


de governar e são consideradas como um efectivo processo de orientação para
a sociedade (Kooiman, 2003; Peters, 2003); referem-se a processos de
regulamentação, coordenação e controle (Rhodes, 1997); analisam o processo
de coordenação e de regulação, onde a principal preocupação é o papel do
governo no processo de governança entendido como uma questão empírica
(Kooiman, 1993; Rhodes, 1996, 1997); abrangendo todos os tipos de
mecanismos de orientação, que estão relacionados com os processos de
políticas públicas, envolvendo vários tipos de agentes, com uma variedade de
acções associadas aos diferentes intervenientes, com consequências para a
governança (Kickert et al., 1997).

É amplamente reconhecido que a contemporânea tomada de decisão política


não se limita à estrutura formal do governo. A política pública é formulada e
implementada através de um grande número de instituições formais e
informais, mecanismos e processos comummente chamado de governança
(Pierre, 2000; Pierre & Peters, 2000).

Uma outra componente significativa da governança urbana engloba-a como um


fenómeno empírico. A teoria, ou quadro, de governança urbana discutido
anteriormente identifica o processo de criação e sustentação da governança
como o principal foco de inquérito. Para os cientistas políticos, a importância de
estruturas políticas, o papel do governo na governança é talvez o mais
intrigante aspecto da gestão urbana (Pierre, 2005). Para Rhodes (1997) a
noção de "a nova governança", como "governar sem governo" é um pouco
enganadora, pois governança sem qualquer papel e presença do governo não
é muito provável de ocorrer. Para além disso, o papel do governo na
governança não é dicotómico, mas uma variável contínua. As instituições
políticas podem desempenhar um grande número de diferentes papéis na
governança. É necessário clarificar aquilo que modela o seu papel em
diferentes contextos institucionais, nomeadamente, o seu posicionamento

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exterior em diferentes definições nacionais, qual o relacionamento na


configuração da comunidade empresarial local e, várias outras situações que
compreendem um conjunto de questões chave na investigação da comparação
na governança urbana.

Entendendo governança urbana num sentido mais lato, isto é, para investigar
em que medida diferentes forças sociais, políticas e económicas tendem a
produzir diferentes modelos de governança urbana, requer uma abordagem
comparativa (Pierre, 2005).

Nas cidades, nomeadamente nas áreas metropolitanas e nas chamadas


regiões urbanas, surgiram novas configurações de relações entre o Estado e o
poder local. As alterações na paisagem política e administrativa atingiram
determinadas características e dimensões, onde os problemas a resolver são
tão importantes para o poder público, que derivaram em espaços onde se
testam novas formas de acção pública que passam cada vez mais pela
negociação contratual entre instituições de estatutos diversos (Gaudin, 1999).
Neste imbróglio institucional e político em que derivaram as grandes
aglomerações, um dos principais objectivos de toda a política pública é o de
estabelecer cenários de trocas/negociação entre instituições que têm a
pretensão de deter legitimamente uma parte do interesse geral e que dispõem
de uma parte dos recursos políticos (técnicos, financeiros, jurídico, capacidade
orçamental, …) indispensável a toda a acção pública. Os profissionais do
planeamento, os urbanistas e as autoridades locais transformaram-se em nós
de uma rede institucional. Para certos analistas, esta capacidade de
estabelecer relações inter-institucionais é um recurso essencial na competição
entre metrópoles. A institucionalização da acção colectiva parece um problema
tanto ou mais importante que o quadro espacial das metrópoles, ou seja, os
objectos sociais, políticos e económicos muito fragmentados.

A governança formalizou a reconfiguração de relações entre instituições e


actores participantes na elaboração e na prática de políticas aplicadas nas
metrópoles. Está em grande parte fundada sobre processos de recomposição
dos Estados modernos e sobre o lugar cada vez mais importante que convêm

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reservar aos actores e às instituições não estatais na regulação destas


sociedades.

Na fragmentação territorial e social em ligação com os processos de


internacionalização e de terciarização das cidades, enquadradas pela
governança urbana, podemos, nesses contextos, encontrar a possibilidade e a
capacidade dos actores urbanos colocarem em prática políticas, em particular
de desenvolvimento económico, mas também de planeamento urbano, através
da capacidade de integrar os diversos grupos sociais e políticos e de produzir
visões partilhadas do desenvolvimento urbano.

A governança joga-se no tipo de “arranjos” que os actores colocam em prática


para desenvolver essa capacidade tripla de acção, de integração e de adesão,
que deriva numa capacidade de representação. Neste sentido, uma concepção
mais sociológica da governança urbana define-se por um lado, em termos da
capacidade de integrar, em dar forma aos interesses locais, às organizações e
aos grupos sociais, e, por outro lado, em termos da capacidade de
representação no exterior, em desenvolver relações mais ou menos unificadas
na relação com o mercado, com o Estado, outras cidades e os outros níveis
governativos.

Ao nível do Estado, as instituições de governança urbana são elas próprias


constrangidas por factores como a organização das disposições constitucionais
e legais e de outros tipos de definições das responsabilidades das
organizações públicas. Apesar das teorias da governança urbana oferecerem
uma nova abordagem em análises comparativas das políticas urbanas,
também é importante reconhecer a importância do contexto nacional no qual
governança urbana está inserida. A política nacional continua a ser um
poderoso factor para explicar vários aspectos da política urbana, incluindo a
economia urbana, o conflito político urbano e as estratégias de mobilização dos
recursos locais. O Estado continua a limitar de forma eficaz a escolha política
local, continuando a ser a personagem chave nos sub-assuntos nacionais
(Harding, 1997; Pierre, 2000; Davies, 2002). O Estado é hoje, mais do que
nunca, influente na determinação da forma como os municípios e as regiões

16
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respondem ao desafio da globalização (Harding, 1997); assim como com a


internacionalização da economia, o Estado, é a determinante crítica do
processo político local (Strom, 1996). A análise da capacidade da organização
do poder local é essencial para a compreensão da gestão urbana. Isso ocorre
porque as organizações estão entre os principais intervenientes na
governação, embora de maneira diferente, em comparação com as mais
tradicionais análises da política urbana. Na perspectiva da governança, a
abordagem das questões chave está centrada sobre o papel do poder local na
gestão urbana (Pierre, 1999).

Os diferentes arranjos institucionais de governança urbana descrevem


diferentes sistemas de valores, normas, crenças e práticas. Estes sistemas
produzem diferentes valores, opções políticas urbanas e também resultados. A
governança urbana, nesta perspectiva, é encaixada numa miríade onde
encontramos a coesão económica, social, política e factores históricos relativos
ao intercâmbio entre a Administração e a sociedade civil local. As teorias da
governança urbana enfatizam resultados mais formais, processos políticos e
parcerias público-privado, como formas de interacção formal (legal) de
implementação politica. A interacção público-privada é vista como necessária
para gerir a tarefa de governar. No entanto, devido a diferentes configurações
do processo de governança oferecem diferentes actores, de participação e
influência, sendo também preciso olhar para as consequências do quadro
económico, político e ideológico em que esses processos estão embutidos.
Estes sistemas de valores são constituintes das instituições da governação
urbana (Pierre, 1999).

5. Governança e gestão territorial na Área Metropolitana de Lisboa

Estas questões ganham particular relevância quando aplicadas ao governo e


planeamento do território em áreas metropolitanas nos países da União
Europeia, que estão associadas a imperativos de competitividade e coesão
explícitos em diversas declarações e directivas comunitárias (Faludi, 2006,
2007). Como espaços de concentração de riqueza e de conhecimento, mas

17
DRAFT – ORIGINAL EM Análise Social, vol. XLV (197), 2010, 639-662

também de inovação, as áreas metropolitanas são actores críticos do


crescimento da economia e da sociedade Europeia. São também, de uma
forma geral, e nas cidades do sul da Europa em particular, lugares de conflito
entre diferentes interesses e poderes locais (municipais) que tendem a
polarizar opções de desenvolvimento que poderiam ser assumidas por
estruturas intermunicipais e metropolitanas e que acabam por ser
protagonizadas pelo nível nacional, perdendo assim grande parte da sua
capacidade mobilizadora. É neste duplo debate sobre a redefinição das
competências ao nível local na sua articulação com competências transversais
de nível superior e em contextos de competitividade metropolitana, com
sobreposição de interesses e de tutelas, que o papel da governança ganha
sentido e pertinência.

A questão é explicitamente assumida no Livro Verde sobre a Coesão Territorial


Europeia quando refere a necessidade de cooperação para garantir objectivos
de coesão territorial na UE e que deverão informar as decisões futuras sobre
política comunitária – “A melhoria da coesão territorial passa pela melhoria da
coordenação entre as políticas sectoriais e territoriais e por uma maior
coerência das intervenções territoriais” (CE, 2008).

O conceito de coesão territorial, e consequentemente a forma de o garantir


como objectivo de política, não é, porém, claro, como pode ser comprovado
pelos resultados do debate público promovida pela Comissão Europeia3.

São notórias, em particular, as diferentes preocupações entre entidades e


instituições representativas de países do norte e do sul da Europa. Faludi
(2006, 2007) desenvolveu esta temática quando se refere ao “modelo europeu
de sociedade” e em particular ao caso de França (mas que é extensível aos
outros países da “família” de planeamento Napoleónica) e à preocupação,
como uma dimensão cultural (em contraste com o “modelo anglo-saxónico”),
pelo território e pelo seu ordenamento apoiado num sistema de planeamento
que implica, para eficiente funcionamento, uma adequada articulação entre
escalas territoriais e níveis de responsabilidade.

3
http://ec.europa.eu/regional_policy/consultation/terco/contrib_en.htm

18
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“’Agglomérations’ and ‘pays’ are areas characterized by geographic, economic,


cultural or social cohesion, where public and private actors can be mobilized
around a territorial project (projet de territoire). There is a link with regulatory
planning in that the pays are invited to formulate new-style structure plans,
called ‘Schéma du cohérence territoriale’. Clearly, in French eyes the sense of
purpose generated by participation in territorial projects is important.” (Faludi,
2006:673)

A questão estará na criação das condições para que estas articulações tenham
lugar. No debate sobre Coesão Territorial Europeia o contributo enviado pela
Associação Portuguesa de Geógrafos, resultado de uma discussão alargada
promovida a nível nacional por esta associação, referia de forma oportuna:

“Perante a constatação de que o quadro legal português é suficiente, o


desenvolvimento de novas formas de governança deverá começar por abordar
a descoordenação entre tutelas sectoriais e entre escalas de intervenção que
ainda subsiste e que tem dificultado a emergência de novos comportamentos e
o reforço da participação dos agentes”4.

Esta descoordenação entre tutelas reflecte a tradição da intervenção, sobre um


mesmo território, de decisores públicos situados em diferentes níveis
institucionais. Os relacionamentos entre as diferentes autoridades são
essencialmente fundados sobre uma partilha de responsabilidades e pela
repartição de competências. Entretanto, a maior autonomia do poder local em
relação ao Estado e a abertura europeia modificaram-na. Assiste-se agora a
uma multiplicação de relações contratuais entre o Estado e o poder local e ao
desenvolvimento de relações directas entre o poder local e as instituições da
União Europeia. Neste sentido, o desafio encontra-se no conciliar das
prioridades nacionais e europeias e das iniciativas locais e encontrar uma nova
articulação entre políticas a diferentes escalas.

O caso da Área Metropolitana de Lisboa (AML) é paradigmático dos problemas


de articulação do nível nacional/regional, dado que não há órgão eleito

4
http://ec.europa.eu/regional_policy/consultation/terco/pdf/4_organisation/134_1_apg_pt.pdf

19
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representativo do nível metropolitano, com o nível municipal. Acresce a este


problema a condição particular de formação de uma área metropolitana
herdeira de um sistema de governo não representativo e de um quadro de
planeamento ausente que não dava enquadramento legal aos processos e
projectos de urbanização que não fossem de iniciativa pública, os quais, por
outro lado, já eram reduzidos como o era a capacidade de intervenção das
autarquias locais.

Neste sentido, o crescimento de Lisboa e da sua região urbana não se


desenvolveram segundo os modelos de regulação e os padrões da maioria das
cidades europeias. O modo de regulação que estruturou a articulação entre
urbanização e desenvolvimento social e económico nestas cidades foi, no caso
de Portugal, periférico e incompleto (Rodrigues, 1988). A preocupação que
houve com o desenho da cidade de Lisboa a partir dos finais do século XIX
(exemplo das Avenidas Novas) e a intervenção do Estado social dos anos
quarenta, não se desenvolveram para a cidade alargada e periférica nem foram
integrados num modelo de infra-estruturação social e económica coerente.

Não obstante o território da AML foi sendo urbanizado, intensa e


extensivamente, respondendo à procura efectiva criada pelo modelo de
industrialização periférica, em processos mais ilegais do que legais, ao longo
dos eixos de comunicação principais, nas envolventes alargadas dos núcleos
tradicionais, através de processos de loteamento e parcelamento das grandes
propriedades (Cabral, 2004). Este processo não foi complementado com
investimentos equivalentes em termos das condições de reprodução social,
dado o reduzido papel do consumo interno e das infra-estruturas públicas para
o desenvolvimento da economia (ibid).

A situação mudou significativamente a partir do fim dos anos 70 com uma


dinâmica de urbanização demasiado intensa face à resposta de um sistema de
planeamento municipal, representativo, mas ainda incipiente e sem uma
articulação adequada com as decisões de política da administração central, em
particular as das empresas públicas responsáveis pelas grandes infra-

20
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estruturas. O que acontece não é muito diferente dos problemas que enfrentam
muitas regiões urbanas ou áreas metropolitanas com ritmos e cenários de
desenvolvimento condicionados a imperativos de articulação entre níveis de
decisão, agentes e instituições com diferentes agendas e prioridades, em que o
nível local é normalmente o parceiro mais fraco.

A relativa fragilidade do nível local é o resultado da sua proximidade ao utente


e ao cidadão e de uma mais directa dependência das dinâmicas de mercado
(fundiário, da habitação) ao contrário dos concessionários e operadores de
serviços públicos e das instâncias políticas de nível superior, menos imunes a
flutuações conjunturais, mantendo-se, porém, fortemente interessadas nos
benefícios derivados da valorização fundiária e da visibilidade e protagonismo
que os grande projectos e equipamentos urbanos viabilizam.

Na AML, com 19 municípios, a gestão deste território, pela sua própria


natureza pautada por interdependências funcionais e de fluxos, exigiria uma
administração regional com autoridade efectiva, competências, recursos e
legitimidade para enfrentar e resolver os complexos problemas que se colocam
à região. Ora a instituição metropolitana, criada em 1991, não tem as
competências e recursos, até porque não é um órgão eleito, nem tem revelado
as capacidades necessárias para enfrentar os desafios da governabilidade
metropolitana.

Deste modo, a governança, pelas suas características já referenciadas, será o


grande desafio da modernização estratégica, designadamente, como no caso
da AML, de regiões e sub-regiões de concentração urbana e suburbana
extensiva e com persistente tradição de falta de ordenamento territorial, uma
excessiva burocracia estatal, uma descoordenação dos meios disponíveis
(públicos e privados), falta de articulação horizontal e vertical, de autonomia
social, etc.

Sabe-se que entre a fixação de um determinado projecto/plano e a sua


efectivação medeia um caminho burocrático complexo, com decisões
intermédias, pareceres, autorizações, regulamentos, etc., que muitas vezes
induzem num retardamento ou inviabilização do mesmo. Tudo isto num

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universo em que os vários responsáveis, Estado (centralizado, desconcentrado


ou descentralizado), sociedade civil ou outros intervêm. Um dos maiores
obstáculos a uma governabilidade/governança eficazes pode ser identificável
pelo labirinto institucional e de tutelas presentes num processo de
planeamento. Num estudo recente5 contabilizaram-se nada menos do que 180
entidades públicas com actuação na Região de Lisboa, em áreas tão diferentes
como a administração do território, desenvolvimento regional, turismo, entre
muitas outras.

As conclusões e a informação recolhida em dois trabalhos de investigação


recentes sobre a AML ilustram dois aspectos associados a alguns dos pontos
críticos acima referidos: a) a questão do papel e das implicações das decisões
da administração pública ao nível central / regional e local para o planeamento
e desenvolvimento territorial, e b) a emergência de instituições e de empresas
municipais e intermunicipais com responsabilidades na gestão de áreas e de
serviços da competência da administração local, com o objectivo de promover
condições de flexibilidade, nomeadamente contratual, e de articulação
institucional para maior rentabilidade na prestação desses serviços.

Em relação ao primeiro aspecto, os resultados de um projecto recente


desenvolvido entre escolas da Universidade Técnica de Lisboa sobre
dinâmicas de localização e transformação do território da AML são
esclarecedores sobre a importância do nível municipal face aos investimentos
da administração central no ordenamento do território metropolitano6. Neste
estudos foram cruzados dois tipos de informação: as classes de espaço
propostas nos diferentes Planos Directores Municipais (PDM) associadas a
padrões de uso de solo dominantes e o edificado inscrito até 1992 (altura em
que entraram em vigor muitos dos PDM dos municípios da AML) e entre 1992-
2001.

5
http://www.gestaoestrategica.ccdr-lvt.pt/1056/estrategia-regional:-lisboa-2020.htm
6
Projecto Totta/UTL/01(2004-2006) – Dinâmicas de Localização, Transformação do Território e
Novas Centralidades na Área Metropolitana de Lisboa: que papel para as políticas públicas?
Projecto financiado pelo Colégio de Estudos Integrados - UTL com a participação de quatro
escolas da Universidade Técnica de Lisboa – Clara Mendes (FA) (coord.), Romana Xerez

22
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As conclusões referem que o sistema de planeamento, utilizando o zonamento


como um instrumento de controle e condicionador do desenvolvimento do
território municipal e consequentemente metropolitano, teve aí um impacte
diminuto, pois faltou uma articulação entre os diferentes instrumentos de
gestão territorial e dos próprios recursos. Um dos aspectos que potencialmente
contribuiu para esta falta de coordenação e de eficiência foi a não
operacionalização e implementação de um Plano Regional de Ordenamento do
Território (PROT)7.

A análise que foi feita mostra que, entre 1991 e 2001, o aumento do
preenchimento, em termos de área, pelas edificações no espaço urbano
consolidado, apresenta um nível médio de cerca de 17%, enquanto que no
espaço urbanizável o nível médio é de cerca de 5%. Por outro lado, em
espaços com restrições e limitações à construção, como sejam os espaços
agrícola, florestal ou natural, a urbanização dispersa continuou a aumentar. O
estudo conclui que o índice de concretização do que estava programado,
nomeadamente no espaço urbano, foi baixo e que o edificado foi-se
dispersando por áreas com outras apetências fora do tecido urbano
consolidado ou do espaço previsto ser urbanizado pelo PDM.

Uma outra conclusão do projecto foi de que, sendo um dos objectivos das
políticas municipais o controle do desenvolvimento urbano, estas não se
revelaram eficazes, pois foram as infra-estruturas, principalmente as
rodoviárias, tuteladas pelo poder central, que condicionaram esse mesmo
desenvolvimento urbano, funcionando dessa forma como um guia para o
assentamento e o desenvolvimento de novas urbanizações, equipamentos e
infra-estruturas. Nesta sequência, os municípios tiveram um papel reduzido no
controle do desenvolvimento urbano, ficando este alicerçado na eficácia das

(coord. ISCSP), Manuel Brandão Alves (coord. ISEG – CIRIUS), Fernando Nunes da Silva
(coord. IST – CESUR) e João Cabral (coord. FA).
7
Na AML, ténues passos têm sido implementados no âmbito da governança, que podem ser
detectáveis na relação estabelecida entre a CCDR-LVT e os municípios, designadamente, na
implementação de protocolos de colaboração que foram firmados baseados nas orientações do
PROT-AML e da sua transposição para os instrumentos de planeamento do território, em
especial os PDM’s.

23
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empresas públicas, nomeadamente da tutela pelas infra-estruturas de


circulação rodoviária que condicionaram e orientaram o próprio processo de
expansão da urbanização (Cabral et al., 2007).

Este é o resultado da confrontação de duas lógicas de intervenção que estão


associadas às agendas distintas de dois níveis e escalas de actuação,
central/regional e municipal. O Quadro I junto identifica as diferenças mais
significativas, que têm implicações para as trajectórias de desenvolvimento das
regiões urbanas.

Quadro I: As agendas dos níveis Nacional/Regional/Metropolitano e Municipal


na gestão e no planeamento territorial
Dimensão Agenda Nacional / Regional / Agenda Municipal
Metropolitana
Política Racionalização e eficiência dos Conformação com as dinâmicas de
investimentos públicos mercado, pressões da comunidade e
orçamento municipal
Processual Adequação do quadro legal e Classificação e controle do uso e
institucional ocupação do solo; viabilização do
sistema de participação
Formal Coerência e rentabilidade das Conformação do uso do solo aos
redes ambientais e de infra- direitos da propriedade e aos
estruturas interesses públicos e privados
Fonte: Cabral, J. (2006)

Deste modo, o desafio em termos da governança metropolitana coloca-se ao


nível do complementaridade institucional e operacional das duas agendas e da
capacidade de promover e potenciar a articulação das escalas macro-micro:
instituições fortes ao nível macro e de grande flexibilidade operacional ao nível
micro (Portas et al., 2003: 39). No entanto, a capacidade institucional e
operativa necessária ao desenho e implementação das políticas adequadas
levanta outras questões, nomeadamente no que respeita à compatibilização de
tutelas de que é exemplo a legitimação democrática do nível "transmunicipal" e
à "revisão da abordagem e do entendimento das diferentes funções do
planeamento, capacidade de inovação e competências acrescidas" (ibid: 208).

Em relação ao segundo aspecto, a emergência de estruturas complementares


da administração municipal só ganha sentido na sequência da revolução de
Abril de 1974 e da Constituição de 1976, com a formalização de um poder
político com estatuto de administração autónoma. Desde então, os municípios

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têm vindo a assumir um crescente protagonismo nos processos de


desenvolvimento dos seus territórios, materializado num aumento gradual das
suas competências nas mais diversas áreas. Os governos locais e regionais,
não só em Portugal como em quase toda a Europa Ocidental, tiveram que fazer
face às novas expectativas e exigências dos seus cidadãos por melhores
serviços, assim como fazer face à necessidade de racionalizar o uso dos
(escassos) recursos públicos, enquadrando-se numa tendência global de novas
práticas de gestão pública.

Neste contexto, o poder local procurou encontrar novas formas de gestão dos
bens e dos interesses públicos, regra geral, pela transição de uma gestão
directa para um regime empresarial, procurando parcerias com outros
municípios, ou outras entidades públicas e privadas. Assiste-se a uma clara
mudança do papel do poder local, de um governo mais interventor em que faz
tudo sozinho, para um outro, mais estratégico.

As relações entre municípios são marcadas pelo alargamento de sistemas de


cooperação e de trocas e por uma acentuação da concorrência. A diminuição
global dos recursos levou a que as cidades promovessem a atracção para o
seu território de investimentos públicos e privados e de uma população
qualificada. Isto traduziu-se no lançamento de grandes projectos urbanos
modernistas, no desenvolvimento de operações de marketing urbano, na
procura de melhorar o enquadramento para a instalação das empresas, do pôr
em prática festivais culturais de prestígio, de vastas operações de escritórios,
entre outras estratégias. Estas operações foram-se afirmando em detrimento
de investimentos de longo prazo, como os equipamentos de base,
designadamente de educação e de formação. Para contrariar esta tendência,
os diferentes países da Europa empreenderam novas medidas legislativas no
início dos anos 90 para relançar a cooperação entre municípios. Com efeito,
uma das questões de maior actualidade é a da construção de uma forma
institucional específica de governar as regiões (como atrás foi referido), assim
como, formas de cooperação entre municípios (associações de municípios),
mais ou menos alargadas, para determinados fins. A realização da cooperação

25
DRAFT – ORIGINAL EM Análise Social, vol. XLV (197), 2010, 639-662

intermunicipal coloca alguns problemas associados à questão das escalas


pertinentes de gestão.

Em Portugal, ocorreu um processo de descentralização administrativa no início


dos anos 80 e a possibilidade dos municípios portugueses enveredarem pela
empresarialização dos serviços públicos surge nos primeiros anos da década
de 908. O estudo desenvolvido por Crespo (2008) mostra como as empresas
municipais se transformaram rapidamente na forma mais usual para as
autarquias prosseguirem os mais variados fins. Com o surgimento da
legislação, aquilo que antes era uma excepção – ou seja, empresas com
capitais públicos substituírem os departamentos municipais na prestação de
serviços públicos – passou a ser uma regra.

Nem sempre são perceptíveis as razões que levam as autarquias a optar por
uma empresa municipal, uma fundação, uma sociedade anónima ou uma por
quotas. Parecem ser sobretudo razões casuísticas de ordem política e pessoal
que orientam a escolha por um ou outro modelo, sobretudo quando as
entidades foram criadas por iniciativa directa das autarquias. As empresas
municipais também podem constituir uma forma de privatização “encapotada”
dos serviços camarários. Com efeito, na maior parte dos casos, a sua criação
mais não foi que a transferência de competências – que nem sempre significa
extinção – de serviços ou departamentos autárquicos, com os correspondentes
funcionários.

Em finais de 1999 existiam em Portugal Continental 25 empresas municipais,


sendo que 60% dessas empresas municipais estavam concentradas nas duas
áreas metropolitanas de Lisboa (44%) e do Porto (16%). Em 2001, 269 dos 308
municípios portugueses tinham participações directas no capital de empresas
públicas e privadas. As autarquias portuguesas tinham interesses económicos
em 114 empresas municipais e intermunicipais, 187 sociedades anónimas, 58

8
Depois de várias tentativas, através de vários pacotes legislativos, para a criação de um
regime legal para a constituição de empresas municipais, foi aprovada a Lei 58/98 que veio
permitir a criação de empresas municipais (Silva, 2000). Este quadro legal foi actualizado com
a introdução da Lei 53-F/2006. A legislação produzida nesse período permitiu às autarquias
participarem em vários modelos de gestão, a saber: Associações de Municípios, Áreas
Metropolitanas e Comunidades Urbanas, Fundações Municipais, Sociedades Anónimas, por
quotas e cooperativas e as Empresas Municipais que será a opção mais vulgarizada.

26
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sociedades por quotas, 19 instituições bancárias, 35 cooperativas e 21


fundações – num total de 434 entidades. Segundo os dados disponíveis na
Direcção Geral das Autarquias Locais, em Setembro de 2005, havia 114
empresas municipais e intermunicipais. Em Agosto de 2008 existiam 167
empresas municipais em Portugal Continental, das quais 43% estavam
concentradas nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto e nas principais
cidades portuguesas que correspondem às capitais de Distrito. Quanto à
classificação dos serviços prestados pelas empresas municipais estão
principalmente ligados ao desporto, recreio e lazer (27%), cultura (20%),
turismo (15%) e habitação (4%). Essencialmente, as empresas municipais,
estão associadas à gestão e manutenção de uma infra-estrutura (piscina,
teatro, entre outras), principalmente nos casos dos municípios fora das áreas
urbanas. A maior concentração de empresas municipais está na capital, no
município de Lisboa, onde a densidade e a diversidade de problemas é mais
acentuada, sentindo-se a necessidade de novas formas de gestão para a
resolução dos mesmos. As áreas de actuação das empresas municipais, na
AML, são diferentes do país, as mais representadas são os transportes
rodoviários e o ordenamento do território (Crespo, 2008).

6. Conclusão

O predomínio das tipologias dos estudos da governança mostra que existe um


amplo espectro de configurações. A “governação sem governo” onde se
argumenta que a direcção da sociedade em diferentes níveis, depende cada
vez mais da interacção de redes de agentes do sector público e privado e que
estão em grande parte removidos da influência e do controle central dos
Estados Rhodes (1996, 1997); noutra surge a admissão do Estado-central,
onde o Estado mantém um primado geral na direcção dos processos (Gilpin,
2001); ou ainda a criação de um estilo de governo mais participativo, que não
significa que o governo seja na realidade menos poderoso, mesmo que a sua
função nominal – através do conceito de steering – se encontre confinada a
posições subalternas dentro dos processos políticos através dos vários agentes

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do Estado-Nação (Kooiman, 2003). Assim, a diferenciação entre governo e


governança continua a ter alguma ambiguidade, embora alguns afirmem que
agora a direcção numa determinada comunidade é “uma responsabilidade de
todos os membros, grupos e sectores” (Kooiman, 1999), para outros existe
alguma susceptibilidade para absorver ou sobrepor a governança a
convencionais acepções de governar. A governança pode ser inclusiva, na
medida em que dilui a fronteira entre ambos os conceitos
(governo/governança).

As mudanças nos estilos de governação envolvem correspondentes mudanças


nos instrumentos utilizados, bem como nos conteúdos dos governantes. As
mudanças no conteúdo e nas metas do governo são as transformações mais
óbvias. Esta mudança de soluções para as questões básicas da economia
política, foram evidentes durante os anos 1980 e 1990 na maioria dos países
da Europa Ocidental e América do Norte, aprovando as ideias neoliberais do
papel do Estado e com a redução significativa do papel do sector público.

A governação dos territórios, tradicionalmente conduzida pelos poderes


públicos de uma forma centralizada e normativa, tem vindo a conhecer
mutações aceleradas induzidas pela própria evolução da sociedade. Ora este
novo papel que se reclama à administração central coloca sérios desafios à
forma como esta está organizada entre si e como se relaciona com o seu meio
envolvente, ao nível da reestruturação e cooperação; da promoção de uma
cultura organizacional de consulta e diálogo; e da libertação dos antigos
instrumentos burocráticos de controlo e comunicações internos.

Responder aos desafios da governação regional (e metropolitana)


contemporânea é uma condição para o sucesso da Estratégia Regional Lisboa
20209. Mas para isso torna-se necessário partilhar de um entendimento claro
dos processos socio-políticos que afectam a governação dos territórios em
geral e definir um quadro de articulação institucional ajustado às realidades
administrativas e da sociedade civil regionais, como demonstra o estudo do
papel dos diferentes níveis de intervenção e controle nas transformações

9
http://www.gestaoestrategica.ccdr-lvt.pt/1056/estrategia-regional:-lisboa-2020.htm

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urbanas na AML.

Os desafios do poder público incitam ao desenvolvimento e ao colocar em


prática novos modos de intervenção no seio das instituições. Não se trata de
substituir os modos clássicos de acção pública e do controle político mas de
integrar novos procedimentos, de desenvolver novos saberes, de organizar
diferentemente os serviços afim de que a gestão dos assuntos públicos seja
eficaz e que as instituições representem melhor a sua missão. O papel
emergente das empresas municipais e intermunicipais na AML ilustra estas
tendências que representam novas perspectivas para a gestão territorial.

Interessa, sobretudo, enfatizar que acção pública deve ser baseada numa
concertação entre todos os parceiros de um projecto territorial. Trata-se de
estabelecer procedimentos que permitam desenvolver trocas entre todas as
partes, de enfrentar problemáticas comuns, de construir progressivamente um
consenso e de estabelecer proposições de decisão. A avaliação constitui
igualmente um utensílio de primeira importância. Bem conduzida, ela pode
permitir de melhor enfrentar a complexidade crescente das políticas urbanas,
de reforçar a transparência da acção pública, de formar o julgamento dos
cidadãos e de proporcionar o debate democrático. É uma medida de
clarificação progressiva do sentido e das práticas da acção colectiva.

Em definitivo, a noção de governança abriu um campo de investigação que


está longe de estar completamente explorado na sua totalidade. A adaptação
dos modos de regulação de acção pública continua em mutação neste início de
século. O vocabulário, não cessa de se enriquecer com novos termos,
traduzindo-se pela renovação dos quadros de pensamento para apreender os
fenómenos em emergência. A governança deixou de ser exclusiva ou até
principalmente um mero instrumento de estratégia, tornando-se num fim em si
mesma, num tema material ou substancial de mudança, num sector autónomo
da doutrina e da prática da modernização prioritária.

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