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SÃO CARLOS
2015
DAVID DE PÁDUA BOZOLA
SÃO CARLOS
2015
DAVID DE PADUA BOZOLA
BANCA EXAMINADORA
SÃO CARLOS
2015
A minha amada filha
Camila, o sonho concreto da minha vida.
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Universidade Federal de São Carlos pela oportunidade que me foi oferecida ao
realizar este curso de especialização.
Agradeço ao tutor Ítalo Silva pelas correções, orientações e acima de tudo pelo
profissionalismo e companheirismo.
Agradeço a Coordenadora Profª Adriana Maamari por liderar o curso com tamanha
excelência.
Agradeço a tutora Gisele Gomédi que se mostrou atenciosa nos momentos difíceis.
“As aulas dirigem-se ao conjunto, mas a cada um dos alunos na medida em que busca
despertar em cada um, de acórdão com a bagagem que traz, o prazer pela discussão dos
temas que lhe são importantes, e, mais ainda, despertar em cada um o prazer de exercer sua
própria inteligência, como os riscos decorrentes desse exercício”.
Sônia Campaner
RESUMO
O seguinte trabalho visa todas as etapas do ensino de filosofia nos dias de hoje no Brasil. A
começar pelo seu surgimento como disciplina trazida da Europa. A crise da sua exclusão até
sua regulamentação e o retorno dramático ao Currículo Nacional. Além do ensino, busca-se
analisar os problemas relacionados a alunos desmotivados; uma alternativa intelectual que
possa ser gratificante em meio à sociedade pós-moderna. Entende-se necessário um
esclarecimento de quem é quem em sala de aula, partindo do próprio professor que deverá
deixar claro a si seu papel vivendo uma dualidade professor e filósofo. Assim, projeta-se uma
metodologia filosófica mais complexa e completa, que mesmo no caminho árduo, estreito,
encontrará um futuro promissor no que tange o pensamento do aluno de hoje, procurando
desenvolver competências e habilidades às regras do pensamento sistematizado e coerente.
Tratando da sua história a temas importantes para a emancipação intelectual e
consequentemente postura crítica frente às situações alienadoras nas quais o aluno se vê
envolvido. Através de uma didática inovadora, o professor inseriu o aluno nos temas caros à
filosofia e que podem torna-se caros a ele como parte da sua vida, através de um olhar mais
refinado sobre os problemas encontrados em atitudes interpretadas como banais ao olhar do
senso comum. O professor será capaz de introduzir no aluno a história da filosofia de uma
forma dinâmica ao conseguir mostrar a importância das teorias antigas correlacionando-as
com teorias de épocas sequentes até a sociedade onde está integrado. A interdisciplinaridade
como uma forma de integrar a filosofia praticamente nas demais disciplinas, configurando-se
como um desafio ainda maior. O professor valorizará a filosofia caso consiga um
envolvimento filosófico nas demais competências e habilidades na prática com uma ou mais
disciplinas. Para esse olhar mais refinado, será abordada uma sequência de exercícios de
leitura e escrita. Para leitura, mostrar ao aluno que além dos textos filosóficos encontrados nos
materiais didáticos, são possíveis outras fontes de leitura filosófica, como jornais, revistas,
charges, etc. A produção textual representará a formulação das ideias do aluno, desde os
momentos de sondagem até a produção conceitual concretizada. A avaliação é medida a partir
da compreensão do aluno sobre o significado do philos em seu dia a dia como aluno de
filosofia. A filosofia é o amor daqueles que sabem que o conhecimento filosófico é uma busca
constante, não é conhecimento acabado, permitindo ao aluno uma oportunidade de se
aventurar nos conceitos filosóficos.
Palavras-Chave: Filosofia; Metodologia; Temas; Conceito; Problematização; Caderno do
Aluno; História; Ensino; Aprendizagem; Didática; Sensibilização.
ABSTRACT
The following work aims at all stages of the philosophy of education today in Brazil.
Beginning with its emergence as brought discipline in Europe. The crisis of its exclusion by
its regulation and the dramatic return to the National Curriculum. In addition to teaching, we
seek to analyze the problems relating to unmotivated students; an intellectual alternative that
can be rewarding in the midst of post-modern society. Means necessary clarification of who is
who in the classroom, beginning in the very teacher who should make clear to you your role
living a teacher and philosopher duality. Thus, it is projected a more complex and complete
philosophical methodology, which even in the hard, narrow way, find a promising future with
respect students' thinking today, seeking to develop skills and abilities to the rules of
systematic and coherent thought. Treating its history the important issues for intellectual
emancipation and therefore critical stance in the face of alienating situations in which the
student is involved. Through innovative teaching, the teacher placed the student in themes
dear to philosophy and can becomes dear to him as part of his life through a more refined look
at the problems encountered in attitudes interpreted as banal sense to look with a. The teacher
will be able to introduce the student to the history of philosophy in a dynamic way to get
show the importance of ancient theories correlating them with theories of sequential times to
the society in which is integrated. The interdisciplinarity as a way to integrate the philosophy
practically in other disciplines, configured as an even greater challenge. The teacher will
value the philosophy if you can a philosophical involvement in other skills and abilities in
practice with one or more subjects. For this more refined look, a reading sequence of
exercises will be addressed and writing. For reading, show the student that besides the
philosophical texts found in textbooks, are possible other sources of philosophical reading,
such as newspapers, magazines, cartoons, etc. The text production represent the formulation
of student ideas, from the probing moments to realized conceptual production. The
assessment is measured from the student's understanding of the meaning of philos in their
daily lives as a philosophy student. The philosophy is the love of those who know that
philosophical knowledge is a constant search, is not just knowledge, allowing the student an
opportunity to venture into philosophical concepts.
Figura 5 – Avaliação
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................ 12
2 O QUE É FILOSOFIA?.................................................................................................. 15
5.1 A formação.................................................................................................................. 30
6 INTERDISCIPLINARIDADE........................................................................................ 37
10 AVALIAÇÃO................................................................................................................... 71
11 CONCLUSÃO.................................................................................................................. 79
REFERÊNCIAS: ............................................................................................................. 81
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1. INTRODUÇÃO.
Temos amores, uns pelos carros, alguns por sapatos, outros por algo sem relação
com cifras, valores como a vida, e outros pelo conhecimento. Entre os últimos podemos
entender que estamos falando dos filósofos. Originalmente a filosofia se compromete a amar,
um amor incompreensível, trata-se de um saber inacabado. Logo, sendo inacabado, sendo
uma construção constante do conhecimento todos podem ser filósofos. Isso nos leva à sala de
aula, propiciar aos alunos o desejo pela busca crítica de respostas que rodeiam sua vida, sua
realidade fazendo dele um filósofo amador, como aquele que ama algo por se sentir livre ao
viver aquilo.
Entende-se que a filosofia não explica, mas implica nas questões da vida. É busca
e ouvir; é o diálogo entre “sexos opostos” dos conceitos parindo novas ideias. Desde seu
nascimento a filosofia é polêmica. Foi e até hoje é considerada uma prática perigosa. Tivemos
até um pensador das antigas condenado à morte sobre a acusação de corromper os jovens e
acusado de ser filósofo. Ser filósofo é crime! Não sabia? Ao menos é o que os militares
pensavam quando resolveram excluir a filosofia da grade escolar. Você, filosofia ressuscite do
seu túmulo ao que jaz há mais de vinte anos por conta daqueles que a torturaram, a calaram
com armas, censura e morte.
Ela voltou! Ainda que tímida, mas mesmo assim já pode fazer a diferença na vida
dos alunos. O professor poderá mostrar aos alunos algo diferente, algo que não espera nada
além do interesse pela atenção pelas questões simples da vida, tais como: o que é a vida? Isso
é o que a filosofia mostrará que não é um oráculo detentor do conhecimento, mas um oráculo
que lança um enigma angustiante.
Todos filosofam desde o começo da vida, fazendo perguntas primárias que todo
pequeno indivíduo curioso faz. Por mais que simples que sejam as perguntas, o que marca a
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vida dos jovens são as respostas dadas pela sociedade. Cabe ao professor ensinar, mostrar aos
alunos que não se ensina a filosofar e nem filosofia, até aquele que entra em sala de aula ainda
não tem uma identidade definitiva. O que se deve ensinar ao aluno é recuperar um olhar
sensível que se perdeu no mundo capitalista e alienador. Cabe ao professor ensinar ao aluno a
perceber que apesar da filosofia não ser um conhecimento acabado, ela potencializa a
capacidade de crítica frente à realidade que o envolve.
É preciso reconhecer o mundo, buscar saber e ouvir temas, problemas que estão
inseridos no dia a dia, que muitas vezes são ignorados e até bem aceitos por serem
considerados algo comum, algo bom. É nítida a falta da crítica por grande parte da população,
mas desde já devemos recuperar o tempo perdido e propor aos jovens algo que ao mesmo
tempo propõe autonomia, originalidade, também dá liberdade.
abordar a filosofia em todos os aspectos que envolvem seu ensino em sala de aula, desde o
significado da filosofia até o diagnóstico feito pelo professor sobre a experiência adquirida
pelos alunos em aula. Definir a filosofia, sua teoria e prática como norte para o objetivo de
aprender a filosofar.
Quem é quem? Uma hipotética dicotomia entre professor e filósofo permeia o que
diz respeito à identidade do professor de filosofia, se este não se conscientizar sobre sua
identidade, será apenas um professor de história da filosofia. Existe a necessidade de uma
mescla de professor de filosofia com o filósofo para atuar de forma competente sobre os
temas teóricos e prática filosófica. Sendo assim, o professor conseguirá motivar o aluno
alienado na cultura de massa hipnotizante.
O produto final será um aluno leitor da filosofia clássica e daquela que está nas
entrelinhas no mundo pós-moderno. Um aluno escritor, autor de uma nova vida emancipada
pelo senso crítico e mediado pelo bom senso.
15
2. O QUE É FILOSOFIA?
Em sala de aula nos deparamos com várias perguntas feitas por alunos: O que é
filosofia? Para que serve? O que fazem os filósofos? “Depois de algum tempo, vai-se
engenhosamente criando algumas estratégias de respostas possíveis, tratando de armar uma
defesa que, de certa forma, nos imunize frente ao desconforto daqueles interrogatórios” [...]
(CERLETTI, 2008, p.22).
Estamos tão confusos sobre o que é a filosofia que não temos uma segurança
quanto ao que diz respeito a uma resposta que mostre o que é a filosofia no seu sentido formal
e ao mesmo tempo mostre o que é a filosofia no entendimento juvenil. Mas, é importante para
professores e alunos esse desconforto para ambos tentarem se compreender filosoficamente:
É isso que move o filosofar; esse atrito não só entre aluno e professor, mas
entre o professor e “a incerteza, o incômodo, a insatisfação ou a
impossibilidade de dar conta cabalmente dos mais básicos de nossa
atividade, longe de ser um obstáculo – ou, talvez, precisamente por sê-lo –
constitui o motor da filosofia” (CERLETTI, 2008, p.23).
de seu interesse, colocando-se desse modo numa atitude de abertura frente ao aluno”
(CAMPANER, 2012, p.37).
Pode-se partir da mesma prática dos gregos antigos, a de que a filosofia possibilita
a contemplação da natureza, observar os fenômenos dos elementos da vida. Os gregos
buscavam também na retórica, expor suas filosofias. Apesar da filosofia atuar nessas práticas,
ela em si não é formada totalmente:
Parafraseando, Ceppas entende que a filosofia é uma espécie de rock’n roll, ela
configura-se numa busca prazerosa e frenética. Também diz que a filosofia não é algo
passivo, o professor deve mostrar que a filosofia ataca, não é oráculo que sabe de tudo, o
aluno deve sair da zona de conforto:
Alguns podem dizer que “a filosofia não é arte e não é ciência, assim como não é
religião, mitologia ou opinião” (ASPIS; GALLO, 2009, p.32). A filosofia atua em todas essas
áreas da vida, mas não se resume apenas a umas delas, não tem uma preferência.
A análise dos argumentos filosóficos talvez seja o que revela mais de perto o
modo de pensar dos filósofos, o aluno tendo a oportunidade de se deparar com conceitos
filosóficos perceberá que a filosofia não é um consenso, uma unanimidade teórica de cada
1
Nesse caso, o álbum Jazz é um livro musical de autoria de Henri Matisse.
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tema e área. O que tem parte em comum entre maioria das correntes, como em qualquer
governo, a filosofia impõe uma série de regras, - premissas – para formular as conclusões “ela
constitui-se numa forma de organizar, de um impor uma ordem. Podemos falar assim, de uma
disciplina no pensamento, isto é, na imposição de uma ordem ao pensamento” (ASPIS;
GALLO, 2009 p. 30).
Isso não implica que ela não possa atuar nessas áreas, mas também não se
resume exclusivamente a uma delas. “A filosofia constituiu-se na
antiguidade como um saber autônomo, com regras próprias, propondo uma
outra forma de abordar a realidade, distinta daquela apresentada pelas
religiões e pela mitologia” (ASPIS; GALLO, 2009, p.29).
Muitas vezes o professor entra em sala para ensinar filosofia, e mal sabe que ao
final da aula ele terá tido uma aula. Como pode ser bela a cena de alunos debatendo por
assuntos como problemas sociais de cada grupo de jovens; cada um apresentando suas
justificativas sobre problemas causados pelas drogas, violência, preconceito, política, etc.
18
Existe um ditado que é dando que se recebe, no caso da filosofia, não se dá nada!
A filosofia quer receber, e muito tudo aquilo que se apresentar como um desafio para o
intelecto de qualquer pessoa, independente do gênero, sexo, cor, etnia, crença, cultura,
política, status. Enfim, a filosofia é uma busca incessante e só aqueles que a amar
incondicionalmente a entenderão.
19
Em 1946 havia uma previsão que o ensino filosófico torna-se parte da grade
curricular como disciplina não obrigatória. Mas “[...] só foi colocada em prática no final de
1961, durante o governo de João Goulart. A Lei 4024/61 tinha como uma de suas orientações
a não obrigatoriedade do ensino de filosofia e sociologia” (CARAVALHO; SANTOS, 2010,
p.14).
Após o Golpe militar, a educação nacional sofre mudanças, em especial a filosofia
que deixa de fazer parte dos vestibulares do país. A repressão maior ao ensino de filosofia
estaria a acontecer: “em 1971, a Lei 5692/71 elimina de vez filosofia e sociologia da grade
curricular do Ensino Médio, substituindo-as por organização social e política brasileira”
(OSPB), (CARAVALHO; SANTOS, 2010, p.14).
Era nítida a repressão militar a toda forma de conhecimento que emancipasse os
cidadãos. Era preferível uma sociedade alienada ao invés de crítica e questionadora, que fosse
um potencial risco ao governo. Os estudantes filosofia, sociologia, psicologia e afins, eram
considerados comunistas, e naquele governo esse movimento político era considerado crime.
A desculpa usada pelo governo militar era: “a filosofia não é disciplina e nem
pode ser, pois é uma atitude crítica ao pensamento, e não há modelo pedagógico que dê conta
de sua natureza, ou que possa estabelecer limites didáticos para o seu ensino”
(CARAVALHO; SANTOS, 2010, p.14).
Apesar do fim da ditadura militar, a filosofia ainda não encontrava lugar na grade
curricular. Sofreu vários vetos como o de 2001 quando o então presidente Fernando Henrique
Cardoso vetou a proposta de Lei aprovada no congresso e criada pelo deputado Padre Roque
(PT-PR), que alterava o artigo 36 da LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional).
Segundo FHC, o retorno da filosofia seria considerando contrário ao interesse público:
2
As publicações do Diário Oficial podem ser encontradas no site: http://portal.in.gov.br/
3
O retorno da filosofia foi oficializado pelo Diário Oficial em:
http://www.imprensaoficial.com.br/PortalIO/Certificacao/GatewayCertificaPDF.aspx?notarizacaoID=a0724760-
ba4b-4e1b-a7fe-c38f0c0d3ceb
4
O site oficial do deputado estadual Carlos Giannazi disponível em: http://www.carlosgiannazi.com.br/
5
A O Projeto de Lei N° 194/2015 do Deputado Giannazi encontra-se:
http://www.al.sp.gov.br/propositura/?id=1248740
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A história da luta pelo retorno da filosofia mostra ser incansável. Talvez porque
aqueles que lutam pelo seu retorno entendam mais que qualquer um o seu valor como
disciplina. E filosoficamente, como podemos entender a necessidade da filosofia na
educação? Afinal, por que ensinar algo que não assume unicamente uma corrente ou linha de
pensamento? Por que ensinar algo que não é ciência? Por que ensinar algo que não está
acabado? Como assim!? Através dessas perguntas pode-se ter uma base inicial das razões do
ensino filosófico ou de filosofia serem uma possibilidade em sala de aula.
Para Campaner (2012, p. 41), “o aluno vem com um saber pronto, aquilo que ele
tem certeza de saber pelo fato de estar envolvido no mesmo senso diariamente. Então, a
filosofia permite desvendar aquilo que se encontra por trás do que é considerado óbvio”. A
filosofia é uma ferramenta que permite ao aluno saber distinguir o que é senso comum do que
é senso crítico. A noção de senso crítico torna-se fundamental para a consolidação do jovem
frente às angústias da juventude.
O que deve ser proposto para aquele que não tem ideia do que seja a filosofia?
Todos devem aprender o que é filosofia? Como temos certezas se os alunos têm interesse pela
filosofia? Independente das perguntas e das respostas, é interessante levar em consideração o
desejo do professor. Se este tem o compromisso filosófico ou não. Se este não se abate aos
obstáculos. O peregrino filósofo!
No mundo atual, os alunos estão envolvidos cada vez mais em coisas superficiais,
que atendem desejos imediatos e desnecessários. Muitas coisas que lhes chama a atenção são
extraídas do pensamento de massa, ou do círculo social que o envolve. O individuo não é
mais esse, ele é o todo compactado num só, como uma pasta zip:
Outro ponto específico da filosofia está na produção de conceito, fazer com que os
alunos saiam um pouco do campo optativo para o conceitual. Objetiva-se que seja [...] “uma
atividade de criação conceitual, pois o conceito é a matéria e o produto da filosofia – isto é, ao
mesmo tempo em que é feita de conceitos, a filosofia consiste em fazer, em produzir
conceitos” (ASPIS; GALLO, 2009, p.33).
Aspis e Gallo (2009), diziam que a filosofia não é algo apenas dos filósofos, mas
que todos aqueles que se identificarem com um problema para filosofar podem fazê-lo. Daí
parte a ideia de que outro objetivo filosófico seja estar incluso em qualquer área de uma vida
filosófica. Em concordância:
E, por fim, pode ter um papel de aprofundamento para quem atua em outras
áreas para as quais o conhecimento de teorias filosóficas pode trazer uma
contribuição específica. Isso ocorre, sobretudo, em áreas como filosofia da
25
6
O caderno volume disponível em:_http://www.cadernojw.com/2015/03/caderno-do-aluno-de-filosofia-1-ano-
apostila-1-respostas.html
7
O livro de Aristóteles também disponível em: ARISTÓTELES. Da alma. Disponível em:
<http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/ps000011.pdf>. Acesso em: 12 jul. 2013. Tradução Eloisa
Pires.
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O aluno esteve acostumado a dar respostas prontas para situações formais da vida,
o que pode acarretar um desinteresse por temas e história da filosofia que abordam os
problemas da vida de forma diversa em suas correntes de pensamento crítico. Na filosofia é
aberta uma dimensão, um espaço a mais para aquele introvertido respondedor ser um
extrovertido implicante. “Nessa etapa, a filosofia poderá despertar interesse e mostrar-se
necessária, se for apresentada como uma possibilidade de descoberta de novas significações
sobre o real, para além do senso comum” (RODRIGO, 2014, p.58).
Percebe-se que o conceito é uma criação subjetiva dos alunos, não deve ser a
princípio algo extremamente elaborado com fundos sistemáticos. Então o professor parte para
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a criação, não a resolução. Pode-se entender que a produção conceitual no início está mais
para um ensaio do que para um raciocínio formal que deve ser feito a partir de premissas
corretas e verdadeiras. O professor deve pensar em temas caros à filosofia e que ao mesmo
tempo sejam apresentados de forma que os alunos consigam entender. Conceitos estranhos,
mas que estão ligados ao dia a dia do jovem. “Eis aí um dos grandes desafios do ensino de
filosofia: encontrar formas de explicitar para o aluno a relação entre o conceito abstrato e o
mundo concreto, uma vez que ele não consegue, por conta própria, estabelecer essas
mediações” (RODRIGO, 2014, p.60).
Assim, como a problematização, o conceito é uma habilidade que têm duas faces,
a do indivíduo e a do outro. Aquilo que é muitas vezes estranho ao indivíduo deve ser
analisado e compreendido para a possibilidade de outros conceitos:
Os conceitos por sua vez, são elementos que compõem unidades de sentido
articuladas de modo mais complexo nas frases e nos raciocínios. Daí a
importância do contato direto com os textos filosóficos, pois neles os
conceitos se apresentam como instrumentos ativos de organização do
pensamento sobre determinada forma de compreensão do real (RODRIGO,
2014, p.60).
8
O material citado é facilmente encontrado na internet, disponível em:
http://www.cadernojw.com/2015/03/caderno-do-aluno-de-filosofia-2-ano-apostila-1-respostas.html
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importante é que eles se sintam envolvidos, que fiquem instigados, que queiram continuar,
mesmo que ainda só consigam repetir opiniões comuns e preconceitos. Não é ainda nesta fase
que vamos corrigi-los e pedir rigor” (ASPIS; GALLO, 2009, p.132).
Atrair o aluno fazendo uso da dinâmica mental é uma tática bem promissora. Essa
dinâmica pode desenvolver novos conceitos partindo da experiência subjetiva do aluno fora e
dentro da sala. Logo:
Essa experiência citada por Rodrigo é fundamental para que haja um elo entre os
novos conteúdos filosóficos e a criação de conceitos. Não é possível a criação de conceitos
sem alguma experiência. “Nunca um aluno é uma tabula rasa. Sempre há algo (certos saberes,
certas práticas) que se reacomoda a partir da irrupção do novo. Esta reacomodação,
ressignificando o que possuía, é uma composição subjetiva” (CERLETTI, 2008, p.40).
Com a “simpatia” do aluno pela filosofia fica mais fácil a inserção deste às
atividades filosóficas, como no momento da leitura – que pode ser contextualizada – que além
de ser complexa, exige do aluno interpretação e reflexão filosófica. Tudo o que se pode
analisar será de fato objeto de leitura em sala de aula. Logo, “a intertextualidade – dialogo ou
interação entre textos de diversos gêneros e registros (orais, escritos, visuais, como música,
literatura, cinema etc.) – também se revela um recurso interessante em vários aspectos”
(RODRIGO, 2014, p.61).
Após a aproximação com o campo filosófico o aluno terá que entender e praticar o uso do
vocabulário técnico, sem isso, ele continuará apenas produzindo conceitos muito subjetivos e
isolados do restante. “A filosofia, assim como a ciência e a arte, tem um vocabulário técnico
ou uma terminologia que lhe é própria, o que permite conferir uma expressão adequada e
precisa aos seus conceitos” (RODRIGO, 2014, p.62).
5.1 – A formação.
Um dia desses um aluno perguntou por que todos os filósofos são ateus? A
resposta foi outra pergunta. O que é um filósofo? O aluno entende por filósofo todo aquele
que dá aula de filosofia, mesmo que ele não saiba que este não seja formado em filosofia.
O que está acontecendo? Por que não se percebe a diferença? É interessante como
é fácil se passar por filósofo, você pode enganar qualquer um, inclusive você mesmo. O “você
mesmo” é uma reflexão do que é um filósofo e um professor, ou, o que faz alguém ser os
dois? A partir daí pode-se perguntar: e se o aluno estiver certo? E se eu for um filósofo? O
que ele obervou de filósofo em mim? Pode-se começar pelas Diretrizes Curriculares do Curso
de Filosofia, elaboradas a partir da LDB publicada pelo MEC em 20/12/1996, que formalizam
o seguinte:
cursos existe uma base em comum. Tanto bacharel como professor deve conhecer e ensinar
história da filosofia, temas, problemas, análise, reflexão crítica, tudo isso ambos devem
dominar, a diferença estaria na finalidade com relação aos alunos.
É comum o professor entrar em sala de aula, olhar para seus alunos, olhar para o
Caderno do Aluno ou para o livro didático e se perguntar o que devo ensinar? O que sou
obrigado a ensinar? Como fui orientado ontem mesmo na diretoria? Nem sempre um
professor experiente está convicto do que ensinar, principalmente se esse buscar a cada dia
um ensino melhor. O professor não pode se esquecer de refletir sobre a possibilidade da
invenção em sala de aula. “É proverbial a divisão na educação brasileira entre quem produz o
saber científico e pedagógico e aquele que o coloca em prática, retirando assim do professor a
possibilidade de refletir sobre sua prática e produzir um saber relativo a ela” (CAMPANER,
2012, p.35).
Para Aspis e Gallo (2009, p.64) [...] “a dicotomia entre o “professor de filosofia” e
o “filósofo”, que vê este último como pensador – o produtor de conceitos em nossa
perspectiva – enquanto que ao primeiro caberia apenas ensinar, transmitir, reproduzir, em uma
palavra”. Talvez no dia a dia, na prática filosófica na qual o professor busque estimular o
aluno esteja a resposta do que seja um reprodutor filosófico e um conceituador profissional.
Então caberia na rotina de sala de aula que:
Poderíamos usar outra pergunta tal como: Ensinar o pronto ou ensinar a pensar?
Se optarmos pela segunda alternativa – que está relacionada ao produzir mais do que
transmitir – entenderemos que é competência do licenciado a capacidade de provocar nos
alunos a prática filosófica. “E, como afirmamos acima, quem melhor que o professor de
filosofia para cuidar da pedagogia do conceito? Encontramos assim, que o “filósofo” –
produtor – e o “professor de filosofia” – transmissor – tornam-se uma mesma pessoa”
(ASPIS; GALLO, 2009, p.65).
O bacharel deve também ter uma vocação pedagógica (não explicitada nas
diretrizes) para poder “despertar os jovens para a reflexão filosófica”. Por
outro lado, não só o bacharel estará credenciado para a pesquisa, mas o
licenciado também, pois ele pode não só se dedicar à pesquisa, em níveis de
pós-graduação, num tema de seu interesse e que pertence às áreas definidas
nas Diretrizes Curriculares, como também se dedicar à pesquisa no ensino de
Filosofia. Essa não é uma pesquisa em didática ou metodológica de ensino,
mas em filosofia.
Aquele professor que entrou em sala de aula logo acima começa a refletir sobre o
dever do que ensinar. Logo, se ele observar possibilidades de ensino de filosofia em outras
fontes não ditadas, ele começará a filosofar. Se este perceber que as aulas de filosofia não
formam ninguém, ele começará a filosofar. Se o professor não tiver essa característica de
resistência sobre o que ensinar, não será professor. “Resulta-me difícil pensar que alguém
possa repetir conteúdos sem tê-los selecionado, interpretado, apropriado, elaborado, adaptado
para esse grupo de alunos, integrado com outros conhecimentos ou experiências anteriores”
[...] (JOSÉ, 2008, p.106).
33
O professor de hoje nada mais é do que o sujeito que um dia foi aluno em
transformação, indivíduo que não nasceu repentinamente, mas emergiu ao longo do seu
estudo acadêmico na universidade. Aquele que entrou como aluno de filosofia não se formou
professor ou bacharel, ele se transformou ao longo de sua própria emergência que se deu
muitas vezes por bacharéis. “A formação do professor de filosofia se dá, então, em toda sua
trajetória acadêmica, em todas as disciplinas cursadas, seja pelo conteúdo transmitido ou pelo
modo como ele foi transmitido por seus professores” (CAMPANER, 2012, p.33).
Se a prática filosófica está na emergência isso significa que não existe uma cisão
professor e bacharel, ou filósofo e “gente normal”. O professor pode ser um filósofo sem ser
especialista, pois o mais importante é mostrar aos alunos que o objetivo da filosofia não está
nas respostas e sim nas perguntas. “Assim, também, o professor é um filosofo em certa
medida, pois sua atividade junto aos alunos será tal que exprime o filosofar, ou seja, ele se
colocará numa posição que não é a do mestre explicador [...]” (CAMPANER, 2012, p.38).
Na visão de José (2008, p. 105), “se é pedida aos estudantes integração própria de
conhecimentos, não concebo professor que seja mero “repetidor”. E para não repetir é
necessário originar ideias, quer dizer, investigar, por mais modesta que esta investigação
seja”. Tanto José e Campaner observam a necessidade que os professores transcenderem a
transmissão, é necessária a prática filosófica sem distinção e nem comparação entre sujeito
licenciado e filósofo.
Quando o aluno observa o mestre de filosofia entrar na sala muitas coisas podem
passar na sua cabeça, entre elas “lá vem o chato sabe tudo”, ou “esse cara tem jeito de quem é
intelectual”. Esses exemplos são em si uma pequena amostra dos absurdos que podem
circundar a mente frutífera e ignorante dos jovens preconceituosos. O mestre de filosofia sabe
que está longe de ser detentor de algum conhecimento, Sócrates já reconhecia que o filósofo
nada sabe. Não podemos esquecer que Sócrates era considerado mestre e ensinava a filosofia
para os jovens gregos. Paradoxalmente, Sócrates sabia que era ignorante, essa ignorância do
sábio podemos encontrar em Campaner (2012, p.42) quando diz:
35
Porém, “esse mestre não pode ser um sábio que faz perguntas guiando o aluno
para a resposta que ele já conhece, tal como Sócrates o fazia [...]” (CAMPANER, 2012, p.43).
O professor não pode fazer aula com um repertório de perguntas prontas, ignorando o
entendimento apresentado pelos alunos em sala de aula. Com certeza algumas perguntas são
comuns, mas não são pré-estabelecidas. Caso isso ocorra, teremos uma aula desinteressante
tanto para as turmas como para o professor.
O mestre deve então lançar temas, percorrer todo o conteúdo que planejou antes
da aula e seguir sua sequência didática. Como exemplo podemos citar o tema “O eu racional”,
conteúdo do Caderno do Aluno, 2° Ano, Vol.1, no qual se inicia com questões sobre
existência. O mestre pode partir de questões que estão no material didático, como pode criar
suas próprias questões e participar junto aos alunos do que seria o objetivo filosófico. Em
seguida o mestre iniciará a apresentação do trecho do livro Discurso do Método de René
Descartes, com foco para o entendimento do seu conteúdo textual. O mestre abre espaço para
interpretações sem fazer uso de questões prontas. Questões são bem vindas, mas devem ser
criadas espontaneamente naquele momento por qualquer um da classe, inclusive o professor.
O aluno percebe que as aulas são naturais, fogem do que ele mesmo esperava, o mestre ensina
filosofia e a filosofar.
Esta distinção entre ensinar filosofia ou ensinar a filosofar precisa, pois, ser
superada e abandonada pelos professores. O que ela fez entre nós foi
embasar duas posições complicadas: a de afirmar um ensino de filosofia
baseado em habilidades e competências de pensamento, esvaziado de
conteúdo (quando se põe ênfase no processo do filosofar); e a de afirmar um
ensino conteudista da filosofia, negando a possibilidade da experiência do
pensamento pelos estudantes, quando lança ênfase sobre o produto da
filosofia (ASPIS; GALLO, 2009, p.61).
Ensinar é produzir, tanto o licenciado quanto o bacharel devem ter ciência que
essas são suas obrigações. O licenciado precisa pesquisar e entender o que vai ensinar, e o
bacharel sabe que deve transmitir conteúdo que aprendeu. Por isso:
36
Temos que deixar claro que, para nós, o ensino de filosofia pode ser
produção de filosofia, pode ser filosofar. Se, como dissemos, a filosofia for
matéria e ato interdependentes entre si, que estão em movimento espiral de
impulso mútuo e contínuo, se filosofar for produção de filosofia e filosofia é
filosofar, então o ensino de filosofia será ele também produção de filosofia
(ASPIS; GALLO, 2009, p.85).
6. INTERDISCIPLINARIDADE.
É bom que o professor observe a prática filosófica em tudo, inclusive nas outras
disciplinas curriculares. Em questões de português do Sistema de Avaliação de Rendimento
Escolar do Estado de São Paulo (SARESP)9 observa-se uma relação estreita com a prática
filosófica, questões que exploram além da interpretação a interpretação filosófica do aluno. O
objetivo dessas questões interdisciplinares é a formação do cidadão integrada em diversas
áreas da vida de forma simultânea. Nos PCNs lê-se:
Esse sintoma é combatido quando existe interação entre duas ou mais disciplinas
articulando conceitos, desde os mais complexos até os simples. É uma espécie de intercâmbio
mútuo no qual os resultados são recíprocos.
9
O site oficial do SARESP está disponível em: http://www.educacao.sp.gov.br/saresp.
38
A transdisciplinaridade:
(1994, p.159) que diz “toda e qualquer tentativa de reduzir o ser humano a uma definição e de
dissolvê-lo no meio de estruturas formais, sejam quais forem, é incompatível com a visão
transdisciplinar”.
Artigo 7
A transdisciplinaridade não constitui uma nova religião, uma nova filosofia,
uma nova metafísica ou uma ciência das ciências.
Artigo 8
A dignidade do ser humano é também de ordem cósmica e planetária. O
surgimento do ser humano sobre a Terra é uma das etapas da história do
Universo. O reconhecimento da Terra como pátria é um dos imperativos da
transdisciplinaridade. Todo ser humano tem direito a uma nacionalidade,
mas, a título de habitante da Terra, é ao mesmo tempo um ser transnacional.
O reconhecimento pelo direito internacional de um pertencer duplo - a uma
nação e à Terra – constitui uma das metas da pesquisa transdisciplinar.
Artigo 11
Uma educação autêntica não pode privilegiar a abstração no conhecimento.
Deve ensinar a contextualizar, concretizar e globalizar. A educação
transdisciplinar reavalia o papel da intuição, da imaginação, da sensibilidade
e do corpo na transmissão dos conhecimentos.
Artigo 14
Rigor, abertura e tolerância são características fundamentais da atitude e da
visão transdisciplinar. O rigor na argumentação, que leva em conta todos os
dados, é a barreira às possíveis distorções. A abertura comporta a aceitação
do desconhecido, do inesperado e do imprevisível. A tolerância é o
reconhecimento do direito às ideias e verdades contrárias às nossas.
Artigo final
A presente Carta Transdisciplinar foi adotada pelos participantes do Primeiro
Congresso Mundial de Transdisciplinaridade, que visam apenas à autoridade
de seu trabalho e de sua atividade (Carta da Transdisciplinaridade, 1994,
p.160).
40
Como desenvolver no aluno o interesse por uma disciplina que ele só encontra na
1ª série do Ensino Médio? Como montar aulas interessantes que proporcionem ao aluno um
entendimento das teorias como sendo relacionadas à realidade que o circunda? O professor
partirá da própria realidade juvenil como começo de conversa10.
Entrar em sala com motivação já é algo difícil mesmo para professores que têm
interesse sobre sua área de conhecimento, imagine como e onde podemos encontrar alunos
motivados? Para tentar responder essa questão tão importante para qualquer disciplina,
Cerletti (2008, p.32) é bem radical ao afirmar que (...) “nenhuma institucionalização pode
normatizar tudo. Pretender dar conta de tudo – do todo – é uma ficção”.
Quem está criando essa ficção? Claro, é o professor! Mas, ficção não é utopia,
isso que é o pior! Podemos então dizer que ficção seria um desejo abstrato, algo que foge da
realidade, mas não beira a perfeição. Se compararmos a escola brasileira com a Sul-Coreana
percebe-se que o ensino lá é considerado uma ficção aqui. Os alunos de lá, por exemplo, são
disciplinados em comparação ao aluno brasileiro. O aluno Sul-Coreano é uma ficção ou uma
utopia? Talvez a resposta a seguir mostre que não se trata de uma ficção, mas de uma
diferença entre valores:
10
Começo de conversa é um tópico do caderno do aluno, que aborda atividades para sondagem sobre a realidade
do aluno.
42
Por que o aluno não se interessa pelas aulas? Para Rodrigo (2014, p37), “o
desinteresse pelas aulas de filosofia deriva, em boa parte, da falta de compreensão dos
conteúdos ou do fato de que, muitas vezes, o estudante não consegue encontrar significação
nesses conhecimentos”. Como toda pessoa, o aluno é produtor de significados, em especial
para coisas que são lançadas maciçamente.
11
Site Oficial da ANPAD disponível em: http://www.anpad.org.br/~anpad/sobre.php
43
Resumindo, esse jovem age por impulso por falta de reflexão, e muitas vezes
procura entendimento sobre a realidade em coisas que o deixam mais alienado ainda. Logo,
“o grande desafio para o ensino da filosofia consiste em motivar aquele que ainda não possui
qualquer conhecimento do pensamento filosófico, ou sequer saber para que serve a filosofia”
[...] (MARCONDES, 2008, p.64). E para piorar, muitas vezes o professor pode atuar
nocivamente nessa situação “se os procedimentos de ensino que adota contribuem para
alimentar o desinteresse e a indiferença” (RODRIGO, 2014, p.37).
A filosofia precisa ser entendida como uma oportunidade de novos caminhos para
aqueles que estão no sentido único sem olhar para o lado contrário. “Assim, no âmbito
específico da filosofia, trata-se de enfrentar, por um lado, a realidade instituída pela
massificação do ensino no nível médio e, por outro, o desafio de trabalhar na perspectiva de
sua efetiva democratização” (RODRIGO, 2014, p.29).
Segundo Rodrigo (2012, p.10), a educação massificada foi um dos fatores que
exigiu um ensino filosófico mais compreensível aos jovens por estar “diante da nova realidade
posta pela massificação, o ensino filosófico generalizado passou a ser visto por muitos como
uma exigência democrática”. Democratizar é dar oportunidade a aqueles que carecem de
novas fontes de conhecimento. Que podem sair do seu mundo “pobre” para um mundo rico
em significados novos. Essa democratização, além de ser uma obsessão filosófica é também
vista por outros educadores como uma banalização da filosofia, e que esta não pode ser
tratada de modo simples no ensino médio.
que, muitas vezes, eles sequer conseguem ler e compreender textos simples e corriqueiros,
que dirá textos filosóficos” (RODRIGO, 2014, p.22).
Como ensinar filosofia para um público mais vasto e menos qualificado? Talvez seja na busca
por uma valorização do senso comum, “[...] a relação entre filosofia e homem comum”, “[...]
referente à conexões entre filosofia e democracia” (RODRIGO, 2014, p.12). Apesar da
filosofia estar envolvida pelo senso comum, ela pode ser praticada de acordo à realidade do
jovem para que este encontre uma identificação da filosofia com sua realidade. O professor
não deixa de ensinar filosofia só pro conta do “grau intelectual”, ele deixaria de ensinar
filosofia em caso de preconceito. Afinal, Independente do nível social, todos nascem
desprovidos de autonomia “o que muda com a massificação da filosofia não é o saber
filosófico enquanto tal, mas apenas seu ensino ou forma de difusão” (RODRIGO, 2014, p.14).
Essa desigualdade não deve ser vista pelo professor como uma carência de
capacidades do aluno. A emoção de pena sempre empobrece a alma daqueles que aparentam
dificuldade e sofrem com a desigualdade em sala de aula. Isso na verdade é uma condição de
fora ou de dentro? Existem:
Famílias que não podem custear os materiais indispensáveis, alguns que não
portam livros e cadernos senão com fotocópias isoladas em cadernos
polifuncionais; lares sem bibliotecas mínimas nem jornais que introduzam
noções de cultura em geral e habilidades linguísticas mínimas, pais com
jornadas extenuantes que não conseguem controlar, apoiar e motivar as
tarefas de seus filhos etc. (NAIVA, 2008, p.73).
Até esse ponto o aluno sente a ausência de auxílio externo, tanto no que diz
respeito às condições de estudo como a possibilidade de apoio familiar que é a base para a
segurança interna do jovem dentro e fora da escola. Por outro lado, a filosofia não tem
compromisso com a igualdade, mas com a integração; participação através do reconhecimento
daquele que é diferente e que ao mesmo tempo tem possibilidade de participar e praticar a
filosofia. A filosofia explora os limites humanos em busca de uma excelência didática na
prática da reflexão, isso é possível independente do nível cultural e socioeconômico. “A
46
Duas aulas por semana é pouco para tratar sobre os temas filosóficos, história da
filosofia e produção conceitual por parte dos alunos. A superação desses obstáculos deve
partir do próprio professor, não existe movimento externo, ou das autoridades em pró da
filosofia que consiga valorizar seu ensino. A valorização deve partir do próprio professor na
sua relação com a instituição, colegas e alunos. “É que nenhuma campanha
“conscientizadora” conseguirá convencer a opinião pública nem as autoridades da
importância do ensino médio de filosofia, sem antes fazer sentir tal importância aos próprios
alunos e aos próprios colegas de outras matérias” (NAIVA, 2008, p.83).
Novamente as cartas estão na mesa. O professor precisará jogar com o que tem e
observar minuciosamente os olhares de seus adversários, que assim como ele, contam com
toda a sorte do mundo.
47
7. 2 - Aluno motivado.
E como o professor pode mudar esse quadro que parece imutável, que é muitas
vezes desanimador? Qual o caminho ou receita para despertar no aluno algum tipo de
interesse pela filosofia? A filosofia deve antes de tudo ser significativa ao professor, para que
esse possa transmitir ao aluno aquilo que a filosofia é para ele. Pois:
O professor deve ser ouvinte das demandas apresentadas pelos alunos para o
despertar à possibilidades criadas a partir do compromisso filosófico na vida de todas as
pessoas, independente da ideologia de cada um ao mesmo tempo em que exista a articulação
entre a vida do aluno e os temas filosóficos. “Ao ser um esquema mínimo, não supõe nem
conteúdos nem gostos filosóficos do professor e, por sua vez, dá lugar ao pensamento dos
estudantes, à medida que a problematização seja uma construção coletiva” (CERLETTI,
2008, p.38).
A aula de filosofia é antes de tudo, uma forma de respeito à opinião do aluno por
sua singularidade juvenil. Parte do princípio de ouvir o outro como forma de permitir espaço
ao singular; subjetivo; interpretativo de cada mente que está frente ao professor. Valorizando
essa abertura, Campaner (2012, p.28) afirma que:
Ao planejar aulas mais atrativas, deve-se ter em mente que a filosofia deve
atender os problemas de cada indivíduo de forma reflexiva, não devendo o professor usar sua
experiência própria como forma de impor uma solução às demandas. Cada um por si,
conseguirá encontra formas de visualizar pontos problemáticos dentro da sua própria
realidade. Logo, em concordância com Gallo e Aspis, Favaretto diz que:
Não seria o desafio a filosofar inerente ao ser humano, que o enfrenta de maneiras
diversas no dia a dia? Seria possível colocar esse desafio aos estudantes e fazer com que o
tomem nas mãos e o assumam como seus? Uma aula de filosofia precisa então despertar o
49
filósofo adormecido pela alienação da sociedade preconceituosa em que está inserido. Não
basta falar de filosofia, quais as correntes filosóficas, temas, enfim, é necessário:
Para Aspis e Gallo (2009), o professor deve ser sensível à construção subjetiva
das opiniões dos alunos. Não existe o que se costumeiramente entende por certo e errado;
deve-se mostrar ao aluno a necessidade de sair do óbvio. Começar ensinando de forma
descontraída e até lúdica o material, sair do rigor, mesmo que custe ainda ouvir opiniões do
senso comum, preconceitos. O importante é o envolvimento com o conteúdo e as questões
levantadas. Os alunos não se importam, por exemplo, com o que os pensadores ingleses,
franceses do século XVIII fizeram para a filosofia com suas contribuições técnicas. É
necessário fazer uma aproximação, isso “pode ser feito por meio de atividades que instiguem
os alunos” (ASPIS; GALLO, 2009, p.78).
Um dos caminhos possíveis para dar suporte ao estudo para tratar estas
questões poderia ser apresentado aos alunos o racionalismo de Descartes
12
O filme propõe uma reflexão sobre o que é real, onde os personagens não estão cientes que estão em camadas
diferentes de sonho. Disponível em: < http://artsbeat.blogs.nytimes.com/2010/06/30/a-man-and-his-dream-
christopher-nolan-and-inception/?_r=0> Acessado em: 22/05/2015.
50
Essa atividade torna a aula um campo propício para o diálogo, a investigação, não
interferindo nas opiniões – achismos – dos alunos.
Isso quer dizer que tanto essas orientações, como aquilo que for produzido
com base nelas, não deve ser visto como norma, mas indicação de caminhos
que a equipe docente pode seguir no sentido de pensar o ensino de sua
disciplina na escola. E, além disso, que esse trabalho não deve ser produto
do isolamento e da solidão do professor, que suas decisões não têm de ser, e
não devem ser, pessoais, mas marcadas por um objetivo comum.
Mas significa que ele vai definir os limites do seu trabalho e das exigências a
ele dirigidas. E mais, que ele vai definir alguns caminhos a serem
percorridos, vai preparar material para colocar à disposição do aluno, para
contribuir com a sua formação, consciente de que nem todas as estratégias
terão o resultado esperado, pois isso dependerá do conjunto de alunos que
ele terá diante de si (CAMPANER, 2012, p.35).
Hoje, percebe-se a filosofia como uma disciplina igual às outras, no que diz
respeito à postura do professor. Nas orientações técnicas do Estado de São Paulo, o professor
é orientado a usar o polêmico Caderno do Aluno, implicando a filosofia como disciplina
padronizada a todas as realidades escolares, com temas selecionados por serem mais
importantes que outros:
Parece que a banalização representa um risco real, quando, por falta de uma
compreensão da complexidade de determinado pensamento, este acaba
sendo traduzido em termos simplistas, mas não quando o complexo, uma vez
compreendido, é exposto em termos simples por razões de ordem didática
(RODRIGO, 2014, p.15).
Esses nexos são assuntos pertinentes a problemas éticos que o jovem presencia no
seu próprio dia a dia, na rotina familiar, escolar e particular. Por isso, a necessidade do
professor transportar os conceitos filosóficos e adequá-los ao mundo juvenil. O filósofo se
envolve com o tema como se fosse o próprio aluno, aliás, o professor também é aluno quando
quer saber as demandas em sala de aula para poder corrigir a rota metodológica. A
metodologia não é algo que prende o professor apenas ao conceito puro:
13
O termo Ad hoc significa “para esta finalidade”, “este efeito”. No caso, um efeito causado pela metodologia de
ensino.
56
[...] somos forçados a admitir que não há métodos para aprender, assim como
não há métodos para encontrar tesouros, [...] O aprender é sempre um
acontecimento, algo inusitado, que foge ao nosso controle e à racionalização
absoluta. Então, cumpre-nos perguntar: se não há métodos para aprender (e
não há, portanto, métodos para aprender filosofia), haverá métodos para
ensinar? (ASPIS; GALLO, p.69).
É frustrante quando se quer ensinar algo e os alunos não aprendem. Mas, como foi
dito, a aprendizagem é uma reação, isso não significa que eles vão reagir como o planejado na
metodologia. Aliás, o que se planeja é o conteúdo da aula, não reações dos alunos. Nesses
casos deve-se mudar a rota sem mudar o objetivo. O ensino não se faz por acaso, também nem
sempre sai como o planejado:
[...] é evidente que o professor precisa ter seu método de pensamento e seus
métodos de ensino. Mas não há o método. Não há o método de filosofar e
não há o método de ensinar. Há métodos, que podem ser experimentados,
57
Deve-se então ter em mente a história da filosofia como base da elaboração para
aquisição de novas formas de conhecimento e não como única fonte de deste. Logo, o
objetivo da transmissão filosófica é apenas como coleta e comparação de dados, tornando
inviável o filosofar. “Quando desejamos um “ensino filosófico” da filosofia, isto é, um ensino
de filosofia que convide os estudantes para a atividade filosófica, para que devolvam eles
mesmos, cada um deles a experiência do pensar filosoficamente, o ensino da história da
filosofia pode ser um grande risco” (ASPIS; GALLO, p.49).
textos para a construção de curiosidade dos alunos, e não como um modelo a ser plagiado. A
este respeito Descartes foi magistral na introdução do seu Discurso do método: “ o meu
desígnio não é ensinar aqui o método que cada qual deve seguir para bem conduzir sua razão,
mas apenas mostrar de que maneira me esforcei por conduzir a minha” (DESCARTES apud
GUIDO, 2008, p. 128).
A análise dos argumentos filosóficos talvez seja o que revela mais de perto o
modo de pensar dos filósofos, sendo possível fazer comparações entre pensadores e conceitos.
A análise deve ser detalhada, buscando mostrar a importância dos textos históricos que os
alunos têm em mãos.
Deve ser vista também como a história dos argumentos filosóficos, ou seja,
do modo como os filósofos procuraram justificar uma determinada
concepção, ou defender racionalmente uma determinada posição. A defesa
por Aristóteles do Primeiro da Não-Contradição no livro à da Metafísica, o
célebre argumento ontológico de Santo Anselmo, as provas da existência de
Deus em São Tomás de Aquino, o argumento do cogito de Descartes e a
concepção kantiana de argumento transcendental são alguns dos grandes
exemplos de argumentação retomados sucessivamente pela tradição
filosófica. O argumento ontológico formulado por Anselmo foi retomado por
São Tomás, reaparece em Descartes, é combatido por Kant e depois por
Nietzsche e por Bertrand Russel e defendido em algumas reinterpretações
contemporâneas (PLATINGA apud MARCONDES 2008, p.61).
O que será de uma aula de política atual se não recorrermos a textos de filósofos
de séculos atrás? Como o professor poderia estimular a crítica ao anarquismo atual se não
apresentar o anarquismo de Bakunin? No 1° ano do Ensino Médio, o aluno estuda as diversas
formas políticas de pensadores que partem de Platão à Marx, e justamente em época de
eleições. Observa-se a necessidade de “uma boa formação histórica é imprescindível para
61
posicionar-se, para valorizar e para compreender os fenômenos atuais” (NAIVA, 2008, p.82).
A partir dessa metodologia, pode-se privilegiar o conhecimento histórico da filosofia.
O professor conta com livros, textos, imagens, vídeos e ferramentas como data-
show, DVDs, auditórios, cinemas e o “acessa” para que o aluno seja capaz de compreender
melhor a construção histórica da filosofia em diferentes temas e correntes. “A história da
filosofia se apresenta, assim, como um arsenal, um depósito de armas, ou como um conjunto
de ferramentas, das quais podemos dispor para enfrentarmos nossos próprios problemas”
(ASPIS; GALLO, p.56).
Pedir que os alunos colem em alguma página de seus cadernos uma folha
solta e outra nesta e outra ainda, de maneira a formar uma página bem
comprida e que deve ser dobrada em forma de sanfona e guardada dentro do
caderno. Nesta folha, os alunos vão organizando uma linha do tempo
conforme forem estudando os filósofos, orientados pelos professores. Assim,
conforme o curso for se desenrolando, a cada novo filósofo estudado, os
alunos são orientados a ir organizando linear e cronologicamente os
pensadores estudados, completando sua linha do tempo. Esta pode comportar
não só o nome e as datas de nascimento e morte de cada pensador, mas
também, características principais de seu pensamento como palavras-chave
para localização do problema, além de algumas características de seu tempo
histórico.
Essa linha do tempo não vai abranger toda a história da filosofia, apenas os
recortes selecionados pelo professor seguindo a metodologia planejada no início do ano
letivo. O importante é que sejam trabalhados os temas e pensadores relacionados, evitando a
aleatoriedade filosófica. Assim, Rodrigo (2014, p53) diz:
religião, onde o professor pode selecionar os conceitos estoicos e relacionar à vida dos alunos,
suas crenças e interpretações teológicas. Essa abordagem valoriza a aula:
mesmo da liberdade de escolha dos alunos, que resulta numa mera troca de opiniões ou num
excessivo ecletismo (CAMPANER, 2012, p.39).
O professor apresenta em linhas gerais qual o tema a ser estudada, que neste
caso é a questão do conhecimento que está ligada a questão da realidade: “o
que conhecemos da realidade é a realidade?”, “pode ser que todo mundo do
mundo esteja enganado, como quando acreditávamos que o planeta Terra era
plano?” Daí propõe a atividade que consiste em destruir um pequeno papel
com algo escrito para cada aluno, se a classe for pequena, ou para duplas de
alunos e pedir que classifiquem várias palavras, separando-as em real ou
não-real. Enquanto eles se decidem, o professor divide a lousa ao meio e
escreve real de um lado e não-real do outro. Dá um pedacinho de fita adesiva
para que eles preguem o papel no campo que acharem mais adequado. Pode-
se fazer dois papeis iguais, até mesmo para causar a eventual situação de
cada papel ser pregado em um dos diferentes campos. Nos papéis podem
estar escritos nomes de coisas imaginarias, de coisas vivas, porém que já
morreram, de coisas passadas, de coisas futuras, coisas concretas, abstratas,
por exemplo: Dom Pedro I, a maçã que comi hoje de manhã, meu tataravô,
[...] Depois que todos os papeis estiverem colados na lousa, o professor pede
que todos observem a classificação de algum dos papéis, que falem.
Com essa sensibilização é possível que alunos desenvolvam dentro da sala de aula
um vínculo maior com a abordagem filosófica. Ao problematizarem os temas, os alunos
podem dar início à criação de conceitos que darão oportunidades para debates em sala de aula.
O tema filosófico abrange toda aula filosófica, sempre que um professor citar um
filósofo, este com certeza terá uma bagagem de conceitos e ideias elaboradas para solucionar
problemas temáticos. Geralmente, os temas estão implicados na vida do aluno, cabe ao
professor não apenas ensinar o aluno a filosofar sobre temas, mas também, a implicar,
perceber que sua vida é repleta de temas.
Podemos levantar um problema muito comum no dia a dia daquele que tenta
trabalhar textos filosóficos em sala de aula, que é a dificuldade de interpretação do texto, o
interesse pelo tema e compreensão das palavras. O aluno vem de uma realidade composta de
palavras comuns, repetidas sem consciência e por predominantemente emocional. São várias
as causas da dificuldade de se trabalhar textos filosóficos, tanto por parte de quem ensina
como de quem trabalha, “mas, enfim, seja qual for a razão, se o aluno não possui esses
requisitos, é preciso, juntamente com os conteúdos filosóficos, investir na sua aquisição, ou
seja, na capacidade de ler, e interpretar, abstrair, argumentar, redigir etc.” (RODRIGO, 2014,
p.22).
importante é que o aluno entenda a importância da compreensão textual. Para Rodrigo (2014,
p.74) “o primeiro cuidado refere-se à seleção dos trechos a serem lidos, que devem ser relativamente
curtos, não apresentar dificuldades muito grandes do ponto de vista semântico e conceptual, abordar
temáticas que apresentem interesse para o aluno e que sejam do domínio do professor”.
O professor pede a alguns alunos que leiam os trechos para o restante da classe,
em seguida pergunta-se qual a mensagem de cada texto – lembrando que cada comentário
pode ter sido feito após a leitura de cada um – e se os alunos apresentarem dificuldades, o
professor poderá pedir a outro aluno que relei o trecho comentado. Essa releitura, mostra aos
alunos como é importante a paciência e o valor que se deve ter para compreender um texto de
forma filosófica. “O texto do filósofo e o poema do poeta são tentativas e esforços para dizer
tudo, sabendo que isso não é possível, e que seu texto é apenas um início, ou até mesmo uma
provocação, para aquele que o ouve ou o lê comece a falar” (CAMPANER, 2012, p.46).
14
ARISTÓTELES. Da alma. Disponível em: <http://www.dominiopublico.
gov.br/download/texto/ps000011.pdf>. Acesso em: 12 jul. 2013. Tradução Eloisa Pires.
66
Mesmo aquele que não pode ler é capaz de verificar o que está sendo feito
por aquele que escreve. Ele saberá identificar se há ou não pesquisa, pois a
trajetória realizada por aquela inteligência fará ou não sentido para ele. Em
termos de ensino, isso significa que a experiência dos alunos com a tarefa de
dizer o que pensam e ouvir suas próprias palavras, além de ouvir as palavras
dos outros, as quais são a tradução de seus pensamentos, é uma experiência
essencial na medida em que ela é a síntese de todo o processo de formação
de conteúdos (CAMPANER, 2012, p.44).
supus que não existia nada da maneira como os sentidos nos fazem imaginar;
e como há homens que se enganam ao raciocinar, ainda que sobre os
assuntos mais simples de geometria, e cometem paralogismos, considerando
que eu também estava sujeito ao erro como qualquer outro, eu rejeitei como
falsas todas as razões que anteriormente eu tinha tomado como
demonstrações; e, enfim, considerando que os mesmos pensamentos que
temos quando despertados também podem nos acometer quando dormimos,
sem que nenhum seja verdadeiro, decidi fingir que todas as coisas que até
então tinham penetrado meu espírito não eram mais verdadeiras que as
ilusões de meus sonhos. Mas logo em seguida ponderei que, querendo
pensar, dessa forma, que tudo é falso, era necessário que eu, que o pensava,
fosse alguma coisa; e observando que esta verdade, penso, logo existo, era
tão firme e certa que as mais extravagantes suposições dos céticos não
seriam capazes de abalá-la, julguei que eu podia adotá-la sem escrúpulos
como o primeiro princípio da filosofia que eu buscava.
Depois, examinei atentamente quem eu era, e vendo que eu podia fingir
que não tinha nenhum corpo e que não havia nenhum mundo, nem nenhum
lugar em que eu existisse, mas que não podia fingir que eu não existia, e que,
ao contrário, pelo fato mesmo de eu duvidar da verdade das outras coisas,
sucedia-se, evidente e certamente, que eu existia; enquanto se eu somente
deixasse de pensar, ainda que tudo que eu sempre tivesse imaginado fosse
verdadeiro, eu não teria nenhuma razão para imaginar que eu existia; disso
concluí que eu era uma substância cuja única essência ou natureza era só
pensar, e que para existir não necessitava de nenhum lugar nem dependia de
nenhuma coisa material; de modo que esse eu, isto é, a alma, pela qual sou o
que sou, é inteiramente distinta do corpo, e mesmo mais fácil de conhecer
que ele e, ainda que o corpo não existisse, a alma não deixaria ser tudo o que
é.
Após isso, eu considerei, de modo geral, o que é exigido para que uma
proposição seja verdadeira e certa; pois, já que acabava de encontrar uma
que eu sabia que o era, eu pensei que devia também saber no que consiste a
certeza. E tendo observado que na proposição penso, logo existo não há nada
que assegure que eu digo a verdade, a não ser que vejo muito claramente que
para pensar é preciso existir, eu julguei que podia admitir esta regra geral,
que as coisas que concebemos muito clara e distintamente são todas
verdadeiras, mas que há somente alguma dificuldade em determinar quais
são as que concebemos distintamente [...]”.15
“É preciso entender que a análise deve anteceder a síntese, mesmo porque a boa
síntese, aquela que resulta de uma compreensão e assimilação pessoal do texto lido – e não
um mero pinçar aleatório de frases – supõe a analise” (RODRIGO, 2014, p.75).
15
DESCARTES, René. Discurso do Método. Tradução Célia Gambini. Disponível em:
<http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/aa000016.pdf>. Acesso em: 10 out. 2012.
68
Até o momento, entende-se como texto filosófico todo escrito feito por filósofos.
Mas isso é verdade? Não! Todo texto que demonstre um problema, que exija uma discussão e
possibilidades de conceitos, pode-se entender como texto filosófico. Entende-se que é
necessária ao professor a sensibilização em relação ao que é um texto filosófico ou não. Uma
leitura não é filosófica apenas porque os textos são filosóficos; pode-se ler textos filosóficos
sem filosofar e ler filosoficamente textos jornalísticos, artísticos, políticos etc.
Sendo a leitura algo aberto a várias práticas, podemos encorajar o aluno a escrever
podemos citar exemplos de poesias, aforismos, ditados populares, letras de música rap, MPB
e outras. A leitura é isso, algo que se encontra em todo o ambiente, aberta a todo público, sem
discriminação. É passível de interpretação e de colocação. É uma prática constante, coragem e
foco. Simplesmente porque “aquele que deseja pedalar precisa de coragem para pedalar”
(ASPIS; GALLO, 2009, p.107).
69
A aula de filosofia não é dogmática, nem campo ditador. Como já foi dito no
capítulo 2, para Kant, a filosofia não é transmitida, não é conhecimento pronto, ela é uma
prática. O conceito é caro à filosofia por sua propriedade singular e subjetiva de quem as
formulou. A filosofia é essa busca constante de conhecimento e de implicações pertinentes, e
que desde sempre devem ser compartilhadas pelos alunos com seus colegas, professores e no
restante da sociedade.
71
10. AVALIAÇÃO.
A filosofia está cada vez mais preocupada em como se deve aplicar a avaliação,
onde uma provável pergunta é: que tipo de avaliação traz ao professor dados de que o aluno
realmente aprendeu ou não? Para Rodrigo (2014, p.94):
Ou seja, todos os tópicos que foram citados neste trabalho anteriormente que
envolve o processo cognitivo do aluno serão avaliados. Sendo assim, o professor não deve
aplicar a avaliação apenas em uma data específica, deve-se aplicar no maior número possível
de aulas.
o professor irá somar o conceito do aluno aos demais, ele deixa de ser o dono absoluto do
diagnóstico do aluno no campo pedagógico e didático.
Figura 3 – Cinco jovens de classe alta agridem doméstica - Filosofia - 2ª Série - Volume 1 (2014-2017)
com situações do cotidiano: 1. O que você faria se presenciasse um idoso sendo maltratado?
2. Qual atitude tomaria se testemunhasse policiais agredindo um homem? 3. O que você faria
se seu irmão dissesse que é homossexual? 4. O que você faria se reparasse que o filho da
vizinha sempre aparecesse com hematomas pelo corpo. Por fim, 5. Qual decisão tomaria se
um amigo confessasse que atropelou e matou alguém? Os alunos foram orientados a
respondê-las apenas dentro das circunstâncias descritas, que não deveriam levantar hipóteses.
Essa forma de avaliar consta como uma forma de sondagem sobre a realidade ética e moral
dos alunos.
Além dessa introdução o professor pode articular atividades nas quais o aluno
problematize questões sobre o que é certo e errado, justo e injusto, educação, etc. O professor
divide a classe em grupos que deverão associar o tema ética a outras esferas da vida.
Seguidamente, avaliar a apresentação em grupo onde cada um justificará sua resposta frente
às perguntas feitas pelos colegas. A intenção é que haja uma autorreflexão coletiva, na qual o
professor avaliará as opiniões apresentadas, e aqueles que elaboram perguntas. “Os estudantes
podem e devem participar inclusive do processo de correção, por meio de autocorreção,
correção entre pares ou entre grupos. Costuma-se dizer que o ser humano aprende com os
erros; seria mais exato dizer que ele aprende corrigindo os próprios erros” (RODRIGO, 2014,
p.96).
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O seguinte link é um exemplo prático do conteúdo a ser avaliado; disponível em:
<http://g1.globo.com/politica/noticia/2015/03/ministro-do-stf-autoriza-investigacao-de-politicos-na-lava-
jato.html>. acessado 07/03/2015.
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trabalho” (RODRIGO, 2014, p.96). A correção ou orientação está apenas no ponto temático,
já no caso da autoanálise, cabe ao aluno ter ciência do seu desempenho, procurar refletir e se
avaliar. “A segunda dimensão da avaliação à qual nos referimos, a saber, como instrumento
de tomada de consciência e redirecionamento do aluno em seu processo de aprendizagem”
(ASPIS; GALLO, 2009, p. 116).
Esse ensino ativo exige do professor reflexões acerca do que e como estimula no
aluno a produção conceitual. Quando o professor lança um tema, deverá analisar a
possibilidade do aluno em identificar o problema contido, de forma explicita ou implícita.
Identificar através da leitura de textos ou citações de livros, os problemas que levaram o
filósofo a tratar sobre tal tema e como ele desenvolveu sua teoria. Nesse aspecto avaliativo,
contempla-se a capacidade do aluno em recriar o conceito do filósofo refazendo o movimento
de pensamento e se consegue relacionar a outros problemas, dentro ou fora da sua realidade.
A proposta filosófica é uma avaliação além dos números e “cifras” como muitos
alunos interpretam as notas. Deve-se ficar claro que a avaliação é um diagnóstico e ao mesmo
tempo um processo que acompanha todas as atividades em todas as aulas. “Os exercícios
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propostos pelos professores devem ser escolhidos de acordo com os objetivos a serem
alcançados, assim é importante que os critérios de avaliação estejam claros e explícitos para o
professor e para o aluno, antes de se trabalhar sobre a proposta” (ASPIS; GALLO, 2009,
p.118).
Não adianta aplicar uma avaliação, sem antes saber o que deseja contemplar
filosoficamente em sala de aula. Um exemplo são os trabalhos que o aluno deve fazer
pesquisando na internet. O “deus Google” é fonte de informação para as pesquisas que os
alunos irão fazer e dissertar longas páginas, e muitas vezes corre-se o risco de apenas alguns
membros executarem a pesquisa e transcrevê-la enquanto outros apenas se encarregam de não
esquecerem de anexar seus nomes. Logo:
É mais proveitosa uma produção em sala de aula na qual cada aluno será avaliado
individualmente ao longo do percurso, que a pesquisa de longos trabalhos pela internet. O
professor poderá avaliar o aluno com maior afinidade presenciando o aluno exercendo sua
prática filosófica em atividades que se enquadram dentro da sala e mostrem que o aluno está
filosofando. Para Aspis e Gallo (2009, p.122):
A interferência do professor pode fazer com que o aluno reflita sobre o refletido
percebendo que o processo filosófico está em constante aperfeiçoamento ou mudança. Logo,
o professor não precisa dar um conceito na primeira avaliação, pode propor ao aluno que
refaça seu texto – ou elabore outro – e aí sim dar um valor final. Essa postura avaliativa está
mais próxima da subjetividade conceitual do aluno sobre determinado tema. Por isso:
Pensamos que aqueles que sejam feitos individualmente devam valer mais,
pois revelam com maior exatidão a produção de cada aluno, assim como os
feitos em classe, pois por meio destes se pode medir a capacidade dos alunos
de trabalhar em um tempo determinado, sabendo administrá-lo, além de nos
assegurarmos de sua autonomia (ASPIS; GALLO, 2009, p.123).
Como você avalia seu percurso de estudos na filosofia? Faça uma lista dos
mecanismos de avaliação que você vivenciou durante seu trajeto como
estudante de filosofia. Faça uma análise crítica destes mecanismos,
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11. CONCLUSÃO.
alunos com seu “espírito” filosófico, despertará no aluno desinteressado um significado que
esteja relacionado com sua realidade.
Essa filosofia viu! Propõe reflexões críticas sobre tudo, não para de perturbar
nossas mentes que muitas vezes preferem a ociosidade que entender a si mesmas.
Convenhamos, é mais cômoda uma vida irrefletida e feliz ao invés do autoconhecimento;
postura ética; vida política e responsabilidades afins.
REFERÊNCIAS:
ANPAD. XXXI Encontro da ANPAD: Políticas Públicas em Educação: Lições do Caso Sul-
Coreano. Rio de Janeiro: 2007. Disponível em: http://www.anpad.org.br/admin/pdf/APS-
B2884.pdf Acessado em: 22/05/2015.
ASPIS, R; GALLO, S. Ensinar Filosofia: um livro para professores. São Paulo: Atta, 2009.
BORNHEIN, Gerd (1972). Introdução ao filosofar: o pensamento filosófico em bases
existenciais. Porto Alegre, Globo.
CADERNO do Aluno. Filosofia – 1ª Série – Volume 1. São Paulo: S, E, 2014-2017.
CARUSO, M.; DUSSEL, I. De Sarmiento a los Simpsons: cinco conceptos para pensar la
educación contemporânea. Buenos Aires: Kapelusz, 1996.
CARVALHO, M; SANTOS, M. O Ensino De Filosofia No Brasil: Três Gerações. In:
COLEÇÃO Explorando o Ensino: Filosofia; Vol. 14, Ministério da Educação, 2010.
FLEURY, Maria Tereza Leme; MATTOS, Maria Isabel Leme de. Sistemas educacionais
comparados. Estudos Avançados, vol.5 n.12. São Paulo, Mai/Aug. 1991.
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KOHAN, W. (org.). Filosofia: caminhos para seu ensino. Rio de Janeiro, Lamparina editora,
2008.