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Afinal, que inovações

eram essas? Eram


muitas e abrangiam
todos os aspectos da
vida acadêmica.
Stemmer introduziu,
para os alunos, uma
programação definida
e obrigatória de
estágios, concebida
em sintonia com o
cumprimento do
currículo e
desenvolvida ao longo
de toda a duração do
curso; criou estímulos
ao aperfeiçoamento
cultural — não técnico
— dos alunos; engajou
os docentes em
programas de
treinamento
pedagógico e
profissional...
Caspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia
. República Federativa do Brasil
Fernando Henrique Cardoso

. Ministério da Educação
Paulo Renato Souza

. Secretaria Executiva do MEC


Luciano Oliva Patrício

. Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior


Abílio Afonso Baeta Neves
Arno Blass

Caspar Erich Stemmer

Administração, ciência e tecnologia

2002
Direitos exclusivos para esta edição:
Paralelo 15 Editores
Copyright © Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior - Capes -Ministério da Educação

Edição: Paralelo 15 Editores


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Telefone: (61) 410 8860

Projeto editorial: Franck Soudant


Preparação de originais e revisão: Mércio Brito
Projeto gráfico e capa: Roland

ISBN 85-88468-10-7

F i c h a catalogtáfica

Blass, Arno
Caspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia / Arno
Blass - Brasília: Paralelo 15, Coordenação de Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior, 2002.
192 p. (Biblioteca Anísio Teixeira)
1. Educação. 2. Educação Superior. 3. Ensino universitário. 4. Ensino
Técnico. I, Blass, Arno. II. Título.
CDU 370
òW 378
SUMARIO

Agradecimentos 9

Introdução 11

Capítulo 1
O ensino da engenharia em Santa Catarina 15

Capítulo 2
Quem é Stemmer 23

Capítulo 3
0 primeiro mandato na EEI 37

Capítulo 4
O novo mandato na EEI:
O começo da pós-graduação na
Universidade Federal de Santa Catarina 57

Capítulo 5
A direção do Centro Tecnológico 73

Capítulo 6
O docente Stemmer 87
Capítulo 7
O Cepes/Premesu 93

Capítulo 8
Reitor da UFSC 101

Capítulo 9
O retorno ao departamento e outros vôos 149

Capítulo 10

O repouso do guerreiro 169

Honradas e distinções 175

Iconografia 177

Glossário 185
À memória de
João David Ferreira Lima
AGRADECIMENTOS

todos os que, através de depoimentos gravados ou escri-


tos, sempre aproveitados no livro, forneceram subsídios,
na forma de informações e de comentários, acerca da pessoa
do biografado: Amílcar Figueira Ferrari, Antônio Diomário de Queiroz,
Clara Amélia de Oliveira, Edson Machado de Sousa, Hamilton Savi,
Herta Kieser, João Ignácio Ibanez, João José Cândido da Silva, José
Israel Vargas, Lindolpho de Carvalho Dias, Luiz Bevilacqua, Oswaldo
Antônio Furlan, Paulino Vandresen, Rodi Hickel, Rodolfo Joaquim
Pinto da Luz, Sérgio Roberto Arruda, Sílvio Coelho dos Santos, Walter
Celso de Lima e Walter Fernando Piazza.
Aos que forneceram informações em conversas informais: Edemar
Soares Antonini, Hans Helmut Zürn, José João de Espíndola, Luiz
Gonzaga de Souza Fonseca, Moacir Pereira e Raul Valentim da Silva.
Ao jornalista Moacir Loth, pela cessão de entrevistas que fez com
o biografado, durante um período de mais de 20 anos.
À senhora Ledair Teresinha Petry, diretora da Divisão de Arquivos
da Agência de Comunicações - Agecom da UFSC, pela prestimosa
atenção e apoio na busca e reprodução do material iconográfico.
Ao Prof. Oswaldo Antônio Furlan, pelo esmerado trabalho de revi-
são, feito graciosamente, e pelos valiosos comentários e sugestões.
Ao biografado, Caspar Erich Stemmer, e a sua esposa Helena Amélia
Stemmer, diletos amigos de longa data, pela paciência e boa vontade
com que se deixaram importunar ao longo de todo um trimestre.
INTRODUÇÃO

a noite de 3 de novembro de 1999, o Conselho Universitá-


rio da Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC,
em sessão solene realizada no seu salão de atos, outorgou
o título de professor emérito a Caspar Erich Stemmer, ex-diretor da
Escola de Engenharia Industrial - EEI e do Centro Tecnológico - que,
em virtude da Reforma Universitária de 1967, sucedeu a ela -, bem
como ex-reitor dessa universidade.
Na tarde de 14 de março de 2002, a comunidade universitária, ao
inaugurar o novo prédio construído para abrigar a Fundação do Ensi-
no da Engenharia em Santa Catarina - Feesc e a direção do Centro
Tecnológico - CTC da UFSC, prestou tocante homenagem ao fundador
e primeiro diretor-presidente dessa fundação, conferindo ao prédio o
nome de Edifício Professor Caspar Erich Stemmer.
Na semana seguinte, a Editora da UFSC lançou uma coletânea de
33 crônicas alusivas aos 40 anos da UFSC, selecionadas entre 120
concorrentes. Numa delas, o professor Stemmer é alvo de singelo
depoimento de uma professora da universidade, no qual é tratado de
modo afetuoso e pelo traço gauchesco do uso da segunda pessoa do
singular:
Em uma ensolarada tarde de verão de 1974, estávamos nós, estu-
dantes de mestrado, durante o período denominado nivelamento,
desanimados com as dificuldades e medrosos, quando passaste
por nós. Isto ocorreu ali perto do prédio da Mecânica. Sem te
conhecer, e tu sem conheceres a nós muito menos, paraste e nos
ofereceste palavras de estímulo. Esta capacidade de dar ânimo
Arno Blass

àqueles que chegavam em busca de formação e aprimoramento


profissional, dentro da férrea seleção imposta, ficou guardada na
memória, por todos estes anos, para te dizer. Quantas vidas foram
alteradas, de pessoas anônimas para ti, mas indiferenciadas diante
da tua capacidade de animá-las, frente às dificuldades naturais de
quem inicia a busca por uma oportunidade profissional? Tua men-
sagem foi algo assim:
"Não se assustem com nada, eles [professores] só pressionam
vocês com um único objetivo, o de testar quem é forte. Mante-
nham-se corajosos, não há o que temer. Os que ficarem, e resisti-
rem até o fim, vencerão."1
Nessas e em outras homenagens, assim como nos discursos profe-
ridos no decorrer delas, foi evidenciado o reconhecimento da comu-
nidade universitária a alguém que dedicou mais de três décadas de
sua vida à UFSC, que a ela trouxe novos conceitos e idéias, que a
transformou e nela deixou marca indelével, que é hoje aplaudido
mesmo por aqueles que, no passado, a ele se opuseram. As inovações
que introduziu, a partir de 1965, inicialmente no curso de Engenha-
ria Mecânica, e que procurou estender aos cursos subseqüentemente
criados nessa área, no início causaram estranheza e até rejeição em
certos setores mais conservadores do corpo docente. Mas o grande
mestre Tempo acabou por mostrar que as inovações de Stemmer eram
oportunas e acertadas.
Afinal, que inovações eram essas? Eram muitas e abrangiam todos
os aspectos da vida acadêmica. Stemmer introduziu, para os alunos,
uma programação definida e obrigatória de estágios, concebida em
sintonia com o cumprimento do currículo e desenvolvida ao longo de
toda a duração do curso; criou estímulos ao aperfeiçoamento cultu-
ral - não técnico - dos alunos; engajou os docentes em programas de
treinamento pedagógico e profissional, que logo desembocaram na

1 Clara Amélia de Oliveira, "UFSC - 40 anos: Fragmentos, memória, história", in


A UFSC na minha história, Florianópolis, Editora da UFSC, 2002, pp. 54-55.
Caspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

pós-graduação formal stricto sensu; deu início ao estabelecimento


de parcerias de cooperação mútua com o segmento industrial; intro-
duziu a sistemática da contratação de docentes em regime probató-
rio, por um período de dois anos, condicionada a renovação dos
contratos à prestação de provas de recondução; estimulou a implan-
tação do regime de dedicação exclusiva dos docentes, que ainda não
era regulamentado por lei; e, tão logo dispôs da massa crítica reque-
rida, partiu para a criação dos primeiros cursos de pós-graduação da
universidade, que oportunamente vieram a nuclear os primeiros gru-
pos de pesquisa.
É claro que muitas dessas inovações só foram implantadas após
árduo trabalho de convencimento, objetivando derrubar as resistên-
cias - ativas e passivas - que sempre se opõem a idéias novas.
Hoje pode parecer que nada de revolucionário ou de inovador
existe nessas iniciativas. Deve-se lembrar, porém, que Stemmer, ten-
do começado por introduzi-las nos cursos de engenharia já a partir
de 1965, antecipou-se à Reforma Universitária de 1967, que as uni-
versidades só estariam compelidas a implantar a partir de 1971. A
UFSC revelou um traço de pioneirismo, ao implantá-la já em 1970. E
não é incorreto afirmar que, por vezes, as soluções dadas por Stemmer
foram mais abrangentes e eficazes do que as alternativas que viriam a
ser impostas pela legislação, como se explanará mais abaixo.
O pioneirismo de Caspar Erich Stemmer e o seu decisivo envolvi-
mento no processo de criação, implantação e consolidação dos pri-
meiros cursos de pós-graduação em Engenharia da UFSC, quando di-
retor da Escola de Engenharia Industrial e do Centro Tecnológico,
bem como o seu inegável empenho na criação de diversos outros
cursos de igual status em outras áreas, quando reitor da UFSC, tor-
nam oportuna a inclusão de seu nome, feita por iniciativa da própria
Capes, nesta série de biografias que homenageiam personalidades
marcantes na montagem da pós-graduação no Brasil. De minha par-
te, sinto-me honrado pelo convite para escrever tal biografia. Faço-o
Arno Blass

como ex-aluno e, posteriormente, colega de Stemmer. Durante seu


reitorado, integrei o que um jornalista jocosamente - embora com
notória segunda intenção - chamou de Sistemmer. Orgulho-me dis-
so. Então enfrentamos memoráveis batalhas na mesma frente. Resga-
tar, agora, os momentos mais importantes da luta de Stemmer pela
UFSC e pelo Brasil é, ao mesmo tempo, obrigação e grande prazer.
O ENSINO DA ENGENHARIA
EM SANTA CATARINA

presidente Juscelino Kubitschek, já no final de seu gover-


no, sancionou a Lei nº 3-849, de 18 de dezembro de 1960,
ue criou a Universidade de Santa Catarina. Este ato pôs
termo à prolongada luta pela criação de uma universidade em Santa
Catarina, mobilizando a intelectualidade e a política catarinense de
então. Os principais expoentes dessa luta militavam nas seis faculda-
des que já operavam em Florianópolis e que constituíram o núcleo
inicial para a almejada universidade.1
Por algum tempo, esse movimento esteve cindido em duas verten-
tes, que mimetizavam a polarização política vigente no estado: uma
delas, liderada pelo diretor da Faculdade de Filosofia, Prof. Henrique
da Silva Fontes, ligado à UDN, evoluiu da idéia de uma instituição
particular para a de uma universidade estadual; a segunda, cujo maior
defensor foi o diretor da Faculdade de Direito, Prof. João David Ferreira
Lima, que tinha vínculos com o PSD, preconizava uma universidade
federal. Quando o governador do estado, Heriberto Hülse, udenista,
preferiu dar seu respaldo à posição de Ferreira Lima, o movimento
foi unificado e a luta foi transferida para os próprios corredores do
poder, no Rio de Janeiro e, em seguida, em Brasilia.2

1 J. D. Ferreira Lima, UFSC: Sonho e realidade, 2. ed., Florianópolis, Editora da


UFSC, 2000.
2 Idem, pp. 57-63. A propósito, interessa observar que o governador seguinte,
Arno Blass

Ferreira Lima, atendendo a clamores locais, batalhava pela inclu-


são, no anteprojeto de lei de criação da universidade, de uma escola
de Engenharia e de uma faculdade de Agronomia, por entender que o
estado tinha necessidade de profissionais dessas áreas. Jurandyr Lodi,
então diretor de ensino superior do MEC, mostrou-se inicialmente ar-
redio à idéia. Contudo, cedeu em parte e, ao lado da nominata das seis
faculdades existentes, anotou: curso de Engenharia Industrial - Mecâ-
nica, Química, Metalúrgica. Argumentou que essa restrição estava em
consonância com o projeto desenvolvimentista do presidente da Re-
pública. Então pronunciou as célebres palavras que, até hoje, como
que enfeixam a missão oficiosa dos cursos de engenharia da UFSC:
Ferreira, quero que vocês façam uma grande escola, e que sua
fama corra de tal forma que, quando um pai no Amazonas disser
que seu filho vai estudar engenharia, os circunstantes aconselhem:
mande-o para Florianópolis, que lá está a melhor.3
Ferreira Lima, escolhido e nomeado em outubro de 1961 para ser
o primeiro reitor da nova Universidade, viu-se, de imediato, com a
pesada tarefa de tirar a Escola de Engenharia Industrial do papel e de
convertê-la em realidade. Para tanto, firmou convênio bilateral de
cooperação com a Universidade do Rio Grande do Sul - a qualifica-
ção federal só veio a ser incluída na designação oficial das universida-
des federais em 1964 -, pelo qual buscou o apoio necessário para a
implantação, ainda no ano de 1962, do curso de Engenharia Mecâni-
ca, a primeira das três modalidades arroladas por Jurandyr Lodi, que
fora escolhida como prioritária pelas indústrias do estado.
A UFRGS - que ainda era URGS - montou o currículo do novo
curso, o mesmo que Stemmer vinha tentando infrutiferamente intro-

Celso Ramos, filiado ao PSD, criou a Universidade para o Desenvolvimento do


Estado de Santa Catarina - Udesc, materializando o sonho de Henrique Fon-
tes.
3 J. D. Ferreira Lima, op. cit., pp. 71-73-
Gaspar Erícb Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

duzir no Rio Grande do Sul, com pequena alteração. Seus técnicos


fizeram também o projeto inicial da escola que se iria construir no
campus da UFSC - então USC -, em Florianópolis. O professor Ernesto
Bruno Cossi foi escolhido como primeiro diretor da EEI, razão pela
qual se transferiu para a capital catarinense.
Professores da UFRGS foram selecionados para exercerem a re-
gência - tal era a designação vigente à época - temporária das diver-
sas disciplinas do curso e passaram a deslocar-se quinzenalmente a
Florianópolis, viajando de avião, e lá permanecendo por dois ou três
dias. Ministravam aulas e orientavam os instrutores "locais", selecio-
nados para substituí-los futuramente. Como a Florianópolis do início
da década de 1960 nada tinha de pólo industrial, os aspirantes à
docência nas disciplinas do ciclo profissionalizante tiveram de ser
trazidos de fora. Ao final de dois anos e meio, diante da manifestação
expressa do regente gaúcho, o instrutor local passava a responder
pela disciplina, sendo ainda acompanhado, durante um semestre,
por seu tutor gaúcho; ao mesmo tempo, um novo instrutor era esco-
lhido. Findo o período, o professor gaúcho deixava de vir a Florianó-
polis.4 Como se verá abaixo, essa sistemática veio a ser flexibilizada
em diversos casos.
A maior parte do corpo de instrutores das disciplinas básicas -
Matemática, Física, Química, Desenho Técnico -, correspondentes
às primeiras duas séries, pôde ser constituído de elementos disponí-
veis na comunidade, em sua maioria engenheiros civis e arquitetos já
estabelecidos em Florianópolis, que trabalhavam como autônomos
ou em autarquias e que encontravam na EEI uma segunda fonte de
renda. Mas, quando começaram a ser implantadas as disciplinas
profissionalizantes, não havia em Florianópolis profissionais com o
perfil docente compatível com as mesmas; foram necessários profis-
sionais de fora. Por outro lado, não havia na cidade um parque indus-

4 J. D. Ferreira Lima, op. cit., pp. 119-123.


Arno Blass

trial que oferecesse oportunidades de complementação salarial, que


era impositiva, visto que o salário de um instrutor - exigindo um
comprometimento de 20 horas por semana - era insuficiente como
fonte única de subsistência.
Celso Ramos, governador do estado à época, compreendeu esta
realidade e abriu oportunidades para os docentes vindos de fora, en-
tre os quais se incluíam, na verdade, diversos catarinenses que ha-
viam cursado Engenharia Mecânica na UFRGS. À época desenvolvia-
se, a todo o vapor, o Plano de Metas do Governo - Plameg, que
incluía um ambicioso programa de eletrificação rural, executado sob
a égide de uma autarquia, a Comissão de Energia Elétrica - CEE. A
CEE contratou esses docentes, resolvendo a questão salarial, mas dei-
xando uma interrogação: sendo o Plameg um programa de governo,
como ficaria a situação desses docentes a longo prazo? Um futuro
governador viria a ter a mesma perspectiva altruísta de Celso Ramos?
Por outro lado, as oportunidades de trabalho no Plameg - ou na CEE
- eram definidas e não guardavam relação com as disciplinas profis-
sionalizantes do curso de Engenharia Mecânica.5
Cossi permaneceu em Florianópolis até o final de 1964. Durante
sua gestão, foram construídos dois prédios de madeira - que os alu-
nos carinhosamente chamavam "casinhas de Tarzan" - nos jardins da
Reitoria, no centro de Florianópolis, prédios que abrigavam salas de
aulas e os embriões de uma biblioteca e dos primeiros laboratórios -
de Física e de Química - da nova escola. Uma pequena edificação de
alvenaria já existente abrigou a direção e a secretaria da EEI, além de
duas salas de aula. Ao mesmo tempo, foram iniciadas as obras do
pavilhão de Mecânica no campus. Paralelamente, estava sendo nego-

5 Exemplifico com meu caso pessoal: selecionado na EEI para uma disciplina
que tratava de processos de conformação sem remoção de material - forja-
mento, estampagem -, trabalhava, na CEE, no projeto de uma hidroelétrica de
pequeno porte.
Gaspar Erich Stemmer - Adminstração, ciência e tecnologia

ciada a aquisição de uma ampla lista de equipamentos da antiga Re-


pública Democrática Alemã, negociação que ficou conhecida como
Convênio do Café. A lista compreendia desde itens para a ampliação
dos laboratórios de Física e de Química, já existentes, até máquinas
de ensaio, equipamentos para a área térmica e máquinas Operatrizes,
para as disciplinas profissionalizantes e respectivos laboratórios, que
ainda viriam a ser instalados.
Cossi, ainda durante sua gestão, providenciou um exame de sele-
ção dos docentes - regentes e instrutores - para as novas disciplinas
que iriam ser implantadas a cada ano, até a quarta série. Nessa etapa,
Stemmer, que ministrava a disciplina Construção de Máquinas na úl-
tima série do curso de Engenharia Mecânica da UFRGS, atuava em
Porto Alegre como observador e conselheiro de Cossi, indicando -
entre seus alunos - aqueles que demonstrassem potencialidades para
a atividade de docência.
Em 1964, quando a terceira série do curso da EEI entrou em ope-
ração, Stemmer passou a vir a Florianópolis na qualidade de profes-
sor regente, responsável pela implantação da disciplina Vibrações Me-
cânicas. Como instrutor, tinha José João de Espíndola, que fora seu
aluno em Porto Alegre em 1962.
Como Cossi já havia manifestado seu interesse em retornar a Porto
Alegre, pensou-se em nomes para substituí-lo. A Congregação da EEI
- provisoriamente constituída por docentes da UFRGS - deveria ela-
borar uma lista tríplice, que o reitor encaminharia a Brasilia. Em
princípio, diante das restrições legais vigentes à época, apenas os
regentes de disciplinas, isto é, os docentes da UFRGS que atuavam na
EEI, eram elegíveis. Mas um dos docentes locais, beneficiado por um
enquadramento legal, chegou à condição de elegível. Este fato causou
uma cisão no jovem corpo de instrutores da EEI. Um grupo, consti-
tuído quase em sua totalidade por docentes locais responsáveis pelas
disciplinas básicas - então em número superior ao das profissionali-
zantes - argumentava que já era hora de a EEI ter um diretor de seu
Arno Blass

próprio quadro, caracterizando, assim, a candidatura do único pro-


fessor local em condições de elegibilidade. Do outro lado, ficaram os
docentes das disciplinas profissionalizantes, engenheiros mecânicos,
em sua maioria recém-formados. Embora vários deles fossem catari-
nenses, não possuíam vínculos profissionais consolidados externamen-
te à universidade e demonstravam, ademais, uma preocupação corpo-
rativa legítima: o único curso ministrado na EEI, até o momento, era
o de Engenharia Mecânica, pelo que importava assegurar que um
futuro diretor compreendesse os problemas setoriais. Este grupo
trocava idéias na hora do cafezinho. Quem poderia substituir Cossi?
Um nome parecia ser consenso. Mas... aceitaria o desafio?
Os integrantes do grupo cotizaram-se para financiar a ida de um
representante a Porto Alegre, com a dupla missão de convencer Stem-
mer a aceitar a indicação de seu nome e de propô-lo à Congregação
como candidato dos professores que, nos próximos anos, estariam
assumindo as responsabilidades inerentes ao curso de Engenharia Me-
cânica da EEI, à medida que os professores de Porto Alegre comple-
tassem seu ciclo no processo de implantação da Escola.6 A missão era
estrategicamente mais ampla: assegurar nomes para completar a lista
tríplice, mesmo que não interessados em assumir a direção, bem
como mobilizar forças políticas para assegurar que Stemmer viesse a
ser o escolhido em Brasília. A missão de Porto Alegre coube a José
João de Espíndola, cujo sucesso foi completo. Depois disso, diversos
colegas mobilizaram-se com êxito no plano político. Stemmer foi
eleito como primeiro nome da lista tríplice, sendo oportunamente
designado vice-diretor da EEI, responsável pela direção, da mesma
forma que o fora Cossi anteriormente.
Em verdade, um fator que nem todos os jovens instrutores então
chegaram a conhecer conspirou em favor deles: Stemmer havia sido

6 Cf. Arno Blass, "Um bom investimento", Boletim Informativo da Associação


dos Aposentados e Pensionistas da UFSC-Apopen, Florianópolis, 32 (4),
out 1996, p. 4.
Gaspar Erích Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

selecionado para implantar, em 1965, duas disciplinas da quarta sé-


rie do curso, Máquinas Operatrizes e Tecnologia Mecânica, para as
quais deveriam ser também montados dois laboratórios.7 Ele já havia
ponderado a Cossi que, para conciliar a interação entre as obras civis
para os laboratórios, a aquisição dos equipamentos para os mesmos,
bem como o preparo de material didático para as duas novas discipli-
nas - diapositivos e pranchas -, sua presença Florianópolis deveria
ser constante. Era preciso considerar, ainda, que ele assumiria - com
o dever de preparar substitutos - duas disciplinas inéditas em seu
currículo docente, radicalmente diferentes daquelas com as quais
estivera comprometido até então. Eram disciplinas que tratavam de
processos, enquanto que aquelas que ministrava em Porto Alegre e na
terceira série da EEI, eram vinculadas a projeto mecânico.8

7 Sirvo-me, aqui, assim como nos capítulos subseqüentes, de anotações do


próprio Stemmer, feitas para um futuro livro de memórias.
8 Atuando provisoriamente na disciplina de Cálculo Infinitesimal 1, da primeira
série, meu nome já havia sido selecionado para a instrutoria das duas discipli-
nas que Stemmer iria introduzir na quarta série. Começava a se configurar o
modelo de dedicação exclusiva, numa época em que a lei era evasiva a respei-
to. Começava, também, outra iniciativa que teria seguimento no futuro: Stem-
mer organizou um programa de estágios que me caberia realizar durante os
meses de janeiro e fevereiro em Porto Alegre, em três empresas - de estampa-
ria, de forjaria e de usinagem. Durante uma semana, reunimo-nos em um
laboratório da UFRGS com o objetivo de familiarizar-nos com um aparelho
hidráulico Solex usado para a medição de forças de usinagem. Era uma incur-
são modesta no terreno da pesquisa... Stemmer, ao início da quarta série, não
poderia, evidentemente, continuar acumulando suas novas funções com as
aulas de Vibrações Mecânicas, pela sobrecarga que representava. Face ao seu
inegável preparo para a disciplina, respaldado por sólida formação matemá-
tica, José João de Espíndola viria a assumir a regência desta disciplina, após
apenas um ano na função de instrutor.
QUEM É STEMMER

Origens1
aspar Heinrich Stemmer era filho de uma numerosa famí-
lia de Bochum, região do Ruhr, na Alemanha. Era gradua-
do em Economia. Em virtude da situação crítica do país,
logo após o término da Primeira Guerra, resolveu emigrar para a
Argentina e, posteriormente, para o Brasil. Chegando a Novo Ham-
hurgo, Rio Grande do Sul, empregou-se como contador na fábrica de
calçados Kremer & Cia., de propriedade de Waldemar Kremer e de
sua esposa, Amália, ambos descendentes de imigrantes alemães che-
gados ao Brasil ainda na primeira metade do século XLS.
Caspar Heinrich e Wally Cordelia, filha de seus patrões, enamora-
ram-se e casaram em 1923. A primeira filha do casal, Hildegard
Juliane, nasceu em 1929, mas morreria pouco tempo depois. Caspar
Erich nasceu em 1930. Mais tarde nasceria Fritz, o caçula.
A família Stemmer morava em uma casa de grandes dimensões,
situada à frente de um curtume do pai de Wally Cordelia, na rua
General Osório, meio caminho entre as então vilas de Novo Hambur-
go e Hamburgo Velho. Tinha quatro quartos, biblioteca, hall de en-
trada - mais tarde convertido em escritório -, ampla cozinha, varan-
da e porão. Ao lado, havia um grande galpão, com forno para pão e

1 Uma vez mais, lanço mão, condensando bastante, dos esboços autobiográfi-
cos de Stemmer.
Arno Blass

garagem para o Ford modelo A. Nos fundos, belíssimo pomar, com


numerosas árvores frutíferas - laranjeiras, caquizeiros, pereiras, ba-
naneiras, figueiras, ameixeiras, nespereiras e parreiras. O gosto de
Caspar Erich por colher frutas levou-o a desenvolver lá, em sua infân-
cia, o gosto pelo cultivo de árvores frutíferas, que o acompanhou
pelo resto da vida.
Caspar Erich freqüentou o jardim de infância evangélico em Ham-
burgo Velho. Freqüentou, em seguida, a escola primária no Grupo
Escolar Antônio Vieira, da mesma vila; transferiu-se, ao chegar à quarta
série, para o Colégio São Jacó, dos Irmãos Maristas, onde ficou até o
fim do ginásio. Esteve sempre entre os melhores da classe, recebendo
todos os anos medalhas e menções honrosas. Mas as possibilidades
de formação em Hamburgo Velho e Novo Hamburgo da década de 40
eram limitadas e Caspar Erich já as havia explorado ao máximo. Se
tivesse pretensões a um curso superior, teria de ir para a capital, onde
começaria por preparar-se melhor para o vestibular. Mesmo que estu-
dasse numa escola pública, entretanto, esta mudança de domicílio
representaria pesado encargo financeiro. Na melhor tradição germânica,
estava na hora de o garoto começar a batalhar pelo seu sustento.
Assim, a vida de Caspar Erich passou a sofrer profundas modifica-
ções a partir de 1945. Ele prosseguiu seus estudos no Colégio Esta-
dual Júlio de Castilhos, em Porto Alegre. Esse colégio ocupava, na
época, bonito e austero prédio no início da avenida João Pessoa,
idêntico ao da Faculdade de Direito, que ficava ao lado, ambos situa-
dos no mesmo quarteirão em que estavam, também, as instalações da
Escola de Engenharia. Sua localização próxima ao centro da cidade
era conveniente para quem teria de trabalhar para prover seu susten-
to. OJulinho, como era referido afetivamente por seus alunos, era
público, gratuito e misto, sendo mantido pelo governo do estado do
Rio Grande do Sul. Tradicionalmente, possuía bons professores e com-
petia, em pé de igualdade, com seus congêneres. Matriculado no
científico vespertino, Caspar Erich veio a fazer parte de uma turma
Caspar Rrich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

experimental, constituída de alunos selecionados, atendidos pelos


melhores docentes, com o objetivo claro de reforçar o conceito do
colégio frente a seus concorrentes.
Caspar Heinrich, por ter antes prestado serviços à Bromberg &
Cia., grande firma comercial e importadora da cidade, e por ter co-
nhecido um de seus diretores, Max Ertel, teve relativa facilidade
em conseguir emprego de meio expediente para o filho. Também
obteve, para ele, alojamento, um pequeno quarto de sótão, na pensão
de uma senhora alemã muito ranzinza.
Caspar Erich começou a trabalhar na seção de eletricidade da fir-
ma Bromberg, onde montava lustres de lâmpadas fluorescentes. De-
pois, passou à função de correspondente. Como o trabalho era muito
e trabalhasse apenas meio expediente, tinha ele de datilografar dire-
tamente as cartas, sem fazer rascunhos preliminares. Eram propostas
de fornecimento de material elétrico, nas quais informava preços,
condições de venda, de pagamento e prazo de entrega. Em seguida,
passou para o departamento de elevadores, que comercializava pro-
dutos Otis, elevadores e escadas rolantes. De lá passou para o depar-
tamento de engenharia, que atendia à venda de moinhos de trigo, de
bombas hidráulicas e de todos os produtos técnicos, como hidrelétri-
cas, subestações de energia, motores diesel, entre tantos outros. Essa
rotatividade viria a propiciar interessantes oportunidades de aprendi-
zado. Mas o escasso salário não era suficiente para cobrir as despesas
com a pensão e as visitas semanais á sua família, em Novo Hamburgo.
Para cobrir o déficit, Caspar Erich trabalhava tempo integral durante
as férias escolares, aplicava dinheiro na Caixa Econômica, do qual
lançava mão ao longo do ano, na medida das necessidades.
Enquanto estudava em Porto Alegre, tanto no Julinho como, mais
tarde, na Escola de Engenharia, Stemmer não se desvinculou dos inte-
resses de sua terra natal. Fundou a União de Estudantes de Novo Ham-
burgo, reunindo estudantes secundaristas e universitários provenien-
tes dos diversos colégios novo-hamburgueses. Dela veio a ser presi-
Arno Blass

dente, promovendo intensa atividade: bailes, exposições de pintura,


apresentações teatrais, artigos em jornais e até mesmo um programa
na Rádio Progresso, de Novo Hamburgo.
Em janeiro de 1949, tirou férias na firma Bromberg, quando
retornou a Novo Hamburgo, a fim de preparar-se para o vestibular
para a Escola de Engenharia da URGS, vestibular que, naquela época,
costumava realizar-se em fevereiro e que constava de provas escritas e
orais. Voltando a Porto Alegre e retornando, também, à atividade na
Bromberg, trabalhava de manhã e realizava as provas do vestibular à
tarde. Apesar da sobrecarga de atividades, finalizou o vestibular com
média 9,25 - a melhor entre os candidatos ao curso de Engenharia
Mecânica - e só superada pela média 9.29 de Ernesto Bruno Cossi.
Os alunos da turma especial do Julinho, de modo geral, saíram-se
todos muito bem, entre eles Helena Amélia Oehler, que viria a ser a
senhora Stemmer. E os três - Stemmer, Cossi e Helena - tornaram-se,
anos depois, professores e diretores da Escola de Engenharia Indus-
trial e do Centro Tecnológico da UFSC.

Formação superior

0 curso de engenheiros mecânicos-eletricistas que Stemmer en-


controu na UFRGS era ainda de criação recente e estava configurado
para a realidade industrial do Rio Grande do Sul anterior ao desen-
volvimentismo juscelinista. Basicamente constava de um currículo de
engenharia civil levemente modificado pela inclusão de tópicos em
mecânica e eletricidade. Simplesmente cursando uma disciplina a
mais - Astronomia e Geodésia - era possível obter, também, o grau
de engenheiro civil, possibilidade da qual Stemmer se valeu. A expe-
riência adquirida na Bromberg foi muito útil e lhe deu vantagem
sobre seus colegas nas aulas práticas de algumas disciplinas. Mas, de
modo geral, decepcionou-se com o curso.
Stemmer continuava trabalhando na Bromberg, já agora no De-
partamento de Engenharia. A variedade dos problemas que enfrentava
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

era enriquecedora, propiciando-lhe permanentes desafios. Em 15 de


maio de 1954, casou-se com Helena Amélia Oehler, que se graduara
em Engenharia Civil e que passou a trabalhar no setor de cálculo
estrutural da firma Azevedo Bastian & Castilhos, então uma das mais
ativas empresas de construção civil de Porto Alegre. Em pouco tem-
po, ela tornou-se a responsável pelo cálculo estrutural de alguns dos
maiores edifícios da cidade.
Em meados de 1955, uma indicação para uma bolsa da Fundação
Rotária, para a realização de um ano de estudos avançados no exte-
rior e para atuar como embaixador da boa vontade, contribuindo
para o entendimento entre os povos, despertou o interesse de Stemmer
e Helena, mas sua implementação apresentou alguns percalços, ten-
do levado cerca de dois anos para efetivar-se. O Rotary Clube dava
preferência a candidatos solteiros. Mas, durante a entrevista, Stemmer
argumentou satisfatoriamente, razão pela qual veio a ser escolhido.
Escolheu realizar estudos na Rheinisch-Westfalische Technische
Hochschule Aachen - RWTH Aachen.
Assim, ambos chegaram a Aachen, com uma bolsa de 1 000 mar-
cos por mês, o que lhes iria exigir vida bastante espartana. Um ano
era pouco tempo para a realização de estudos formais, o que moveu
Stemmer a fazer o melhor possível: freqüentou aulas de vibrações e
de dinâmica de máquinas, bem como realizou estágios nos laboratóri-
os de Elementos de Máquinas - do Prof. Karl Lürenbaum - e de Máqui-
nas Operatrizes - do Prof. Herwart Opitz. Procurou ainda observar como
se fazia o ensino da engenharia mecânica, o que era considerado
relevante no currículo, bem como a grande preocupação vigente quanto
à formação humanística dos futuros engenheiros. Analisou, a fundo,
a estrutura de funcionamento da RWTH Aachen. E procurou conhecer
pessoas, fazer os contatos que lhe seriam importantes no futuro.
Levando a sério seu papel de embaixador da boa vontade e promo-
tor do entendimento entre os povos, reuniu os cerca de 50 estudantes
ibero-americanos da RWTH e fundou uma associação. Promoveu reu-
Arno fitos

niões mensais em que, a exemplo do que vira fazer no Rotary Clube,


um dos membros falava sobre seu país. Os sucessivos palestrantes
foram aperfeiçoando o sistema, trazendo diapositivos e fotografias.
Quando chegou a vez de falar sobre o Brasil, Stemmer resolveu esnobar:
conseguiu de Paul Drews, então presidente de uma associação de apoio
a estudantes estrangeiros, um auxílio de 200 marcos; trouxe um con-
junto de dança brasileiro que se apresentava na Exposição Mundial
de Bruxelas - que se realizava então -, conseguiu da Embaixada do
Brasil filmes, cartazes, café, mate e engajou os demais estudantes
brasileiros e alguns portugueses, organizando um coral. Os mais flu-
entes em alemão falavam sobre o Brasil - população, situação econô-
mica, posição da mulher, clima, exportações, estágio de desenvolvi-
mento. Foi um happening de que se falou por muito tempo.
Tendo regressado ao Brasil em setembro de 1958, Helena, que
havia aprendido alemão ao cursar algumas disciplinas de engenharia
civil em Aachen e ao realizar um estágio no famoso escritório do
Prof. Fritz Leonhardt, especialista em concreto pretendido, em
Stuttgart, voltou a trabalhar para a firma Azevedo Bastian & Castilhos.
Stemmer retornou á Bromberg, mas não gostou do clima que lá im-
perava, resultante de atritos entre os dois principais acionistas. Sentia
que talvez não devesse continuar por muito tempo naquela firma. Por
outro lado, o período passado no ambiente acadêmico de Aachen
despertara nele interesses cuja concretização não conseguia visualizar
no ambiente da firma, que então lhe parecia restrito.
Caspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

Começa a carreira docente1

Convidado pelo Prof. Rubens Penha Rodrigues, Caspar Erich pas-


sou a lecionar no curso de Engenharia Mecânica da UFRGS, como
assistente de um professor visitante francês, que viria para instalar
a disciplina de Construção de Máquinas. Os alunos matriculados
esperavam com ansiedade por esta disciplina, que daria, finalmen-
te, um sabor de engenharia mecânica ao currículo. Um mês antes
de começar o ano letivo, contudo, o francês desistiu de vir ao Bra-
sil. Bastante preocupado, Penha - como era conhecido - insistiu
que Stemmer assumisse a disciplina sozinho. Caspar Erich aceitou,
mas impôs condições: teria de preparar material didático, fazer
traduções, elaborar apostilas, estudar ele mesmo... Precisaria de
uma posição em tempo integral na universidade. Penha estava com
uma batata quente na mão, pelo que não podia regatear. Assim, em
março de 1959, Stemmer deixou a Bromberg e tornou-se professor.
As apostilas que preparou circularam inicialmente em edições do
Centro dos Estudantes Universitários de Engenharia, mas vieram mais
tarde a ser publicadas, em forma de livro, pela Editora Globo, gra-
ças ao entusiasmo de Álvaro Magalhães, professor de Física da Es-
cola de Engenharia e responsável pelo setor de publicações técnicas
daquela editora.
A primeira turma de Construção de Máquinas tinha menos de
vinte alunos, nove dos quais eram os primeiros ditos "puros",
isto é, estritamente engenheiros mecânicos. Mas a necessidade de
selecionar e de preparar material didático a partir do zero fez com
que esse primeiro ano fosse extremamente trabalhoso. O depoi-
mento de João Ignácio Ibanez - aluno desta primeira turma e de-
pois assistente da disciplina - dá bem a idéia de como Stemmer foi
recebido:

2 Lanço mão, uma vez mais, dos esboços autobiográficos de Stemmer.


Arno Blass

[...] nossa expectativa quanto à cadeira de Construção de Máqui-


nas era grande, uma vez que, com exceção de algumas poucas
cadeiras, o que imaginávamos sobre Engenharia Mecânica ainda
estava muito longe de ser alcançado. Eis que se nos aparece o
engenheiro Stemmer, um jovem de, imagino, 28, 29 anos, recém-
desembarcado da Alemanha, onde havia estudado na Escola Téc-
nica Superior de Aachen. Não foi difícil concluir, desde as primei-
ras aulas, que a aparência, a forma de expressar-se deste novo
professor, e a região de Aachen, em tudo combinavam. A grande
surpresa foi a cumplicidade imediatamente estabelecida entre pro-
fessor e alunos; foi como se, desde o início, já tivesse sido estabele-
cido que ele seria, no mínimo, o nosso professor homenageado na
formatura (éramos muito poucos para torná-lo paraninfo). [...]
Ao longo desse ano letivo, além de sermos brindados com um
curso de Construção de Máquinas no mínimo inovador, o Prof.
Stemmer foi pródigo no ensino extracurricular de temas como a
importância do conhecimento de línguas estrangeiras - alguma
coisa de alemão técnico tivemos de aprender -, política estudantil,
a importância dos estágios profissionalizantes e tantos outros atri-
butos, não ensinados nos cursos de então, e sempre necessários à
formação de bons profissionais.3

Mais adiante, prossegue o Prof. Ibanez:


Stemmer nunca foi um professor do tipo retórico; o que desaper-
cebidamente encantava e prendia a atenção era sua simplicidade e
a praticidade na apresentação dos conteúdos, na maioria das ve-
zes muito áridos. Suas aulas eram organizadas. [...] Para mim,
agora que os anos vividos e a experiência deles colhida já me
proporcionam uma visão ao mesmo tempo crítica e quase históri-
ca daquela figura, não tenho dúvidas em afirmar que a sua carac-
terística mais marcante é, e sempre foi, o engenho. E não só o
engenho, mas, também, a capacidade e a arte de transformar sua
engenhosidade em fatos e obras de inigualável qualidade.

A situação, porém, se complicou no ano seguinte: 80 alunos ma-


tricularam-se na disciplina, que foi alojada numa sala grande, no

3 João Ignácio Ibanez, comunicação pessoal ao autor, em julho de 2002.


Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

segundo andar do Instituto de Eletrotécnica. Mas as condições eram


precárias. A sala precisava ser fechada para permitir o uso do indis-
pensável episcópio, que realizava projeções diretamente a partir das
páginas de um livro; isso prejudicava as condições de ventilação do
ambiente, mas não propiciava isolação acústica suficiente para aba-
far o ruído dos bondes que faziam uma curva bem à frente. Com o
passar do tempo, Stemmer e seus assistentes aprenderam a conviver
com esses problemas, que ainda persistiam em 1962, quando cursei
a disciplina. Na verdade, eles só vieram a ser resolvidos muito depois,
com a retirada de circulação dos bondes e com o surgimento dos
retroprojetores, que não exigiam o escurecimento total do ambiente.
Mas, nessa época, Stemmer já se encontrava em Florianópolis.
Guardo, também, recordação pessoal de minha passagem pela
disciplina de Construção de Máquinas e de meus primeiros contatos
com Stemmer. Lembro de seu considerável esforço no sentido de,
naquele pequeno nicho que lhe fora concedido, procurar suprir as
deficiências do currículo vigente no Curso de Engenharia Mecânica
da UFRGS, até que soluções mais abrangentes viessem a ser imple-
mentadas. Como estudar construção de máquinas sem conhecer os
elementos de máquinas? A disciplina começava por aí. A formação
em processos de conformação deixava a desejar? Stemmer dava ênfa-
se às regras de projeto de peças forjadas, estampadas ou usinadas,
com o que procurava trazer ao aluno a consciência das limitações do
currículo, pelo menos.
Eu admirava particularmente a integração harmônica que existia
entre Stemmer e seus dois jovens assistentes, João Ignácio Ibanez e
Gert Funke, que faleceu prematuramente. Suas aulas eram um contí-
nuo revezamento. Todos os três tomavam parte nelas. Embora abor-
dando assuntos específicos, cada um fazia questão de enfatizar onde
ou em que um determinado tema se relacionava com o que os outros
dois haviam explicado. Após a aula, freqüentemente íamos sanar dú-
vidas na "sala dos professores". Uso as aspas intencionalmente, para
Arno Blass

destacar o inusitado do que lá encontrávamos: um grande salão, com


várias mesas sobre as quais se encontravam empilhadas centenas de
livros relacionados com a matéria, predominando os escritos em ale-
mão, evidentemente. E quando vinham as explicações, alguns desses
livros eram selecionados, abertos e, eventualmente, emprestados, para
que pudéssemos esclarecer aqueles pontos que a eles nos haviam
levado, e outros pontos, deles decorrentes, como os mestres já iam
antecipando.
Desde o momento em que começou a trabalhar na URGS, Stemmer
tratou de elaborar uma proposta que contemplava modificações radi-
cais no currículo do curso de Engenharia Mecânica. Vivia-se em ple-
na era do desenvolvimentismo juscelinista, em que as necessidades
do país se modificavam drasticamente, fazendo com que, no Rio Gran-
de do Sul, grandes indústrias se instalassem, para suprir o pólo auto-
mobilístico criado em São Paulo. Precisavam-se de engenheiros me-
cânicos com formação compatível, que o velho currículo, uma enge-
nharia civil modificada, não fornecia. Stemmer, compreendendo a
nova realidade e respaldado no modelo de Aachen, tinha consciência
do que deveria ser feito. Mas sua proposta foi objeto de acaloradas
discussões. Havia claro sentimento de insegurança entre os docentes
mais antigos quanto às mudanças que Stemmer propunha, envolven-
do matérias de que nunca haviam ouvido falar. Reclamava-se contra a
exclusão da disciplina Construção Civil do currículo, preconizada por
Stemmer. Este argumentava que era necessário liberar espaço no cur-
rículo para assuntos específicos da habilitação.
Quando sua proposta de reformulação curricular do curso de En-
genharia Mecânica da URGS parecia chegar a um impasse, Stemmer
foi consultado se não gostaria de vê-la implementada em Florianópo-
lis, na Escola de Engenharia Industrial, cuja implantação estava justa-
mente balizada pelas necessidades decorrentes do programa de de-
senvolvimento industrial do presidente Kubitschek. Stemmer concor-
dou de pronto. A proposta, contudo, passou ainda por mais uma
Caspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

pequena turbulência: Luiz Leseigneur de Farias, diretor da Escola de


Engenharia da UFRGS, insistia na manutenção da disciplina de geo-
metria descritiva, que ele lecionava e que Stemmer considerava útil,
mas dispensável, por sobrecarregar o currículo. Como a boa vontade
de Farias era indispensável, porquanto lhe competia liberar os docen-
tes aos quais caberia implantar as disciplinas na EEI, Stemmer cedeu
nessa questão.
Foi assim que a Escola de Engenharia Industrial da UFSC entrou
em operação em 1962: oferecendo o curso de Engenharia Mecânica
que tinha, quiçá, o currículo mais avançado do país, àquela época.

Empresário

No final de 1960, Stemmer foi procurado por um grupo de 20


alunos que se propunham a constituir uma empresa. Cada um segui-
ria sua vida, mas destinaria, durante dez anos, 5% de seu salário para
a constituição de um fundo destinado a financiar o empreendimento.
O que pretendiam fazer? Não sabiam ainda; gostariam de ter alguma
sugestão e queriam, também, convidá-lo a participar.
Após refletir um pouco sobre o assunto, Stemmer falou do proces-
so de industrialização que varria todo o país, em decorrência do pro-
jeto desenvolvimentista de Juscelino Kubitschek. Lembrou que, em Por-
to Alegre, não havia tornos automáticos, indispensáveis à produção de
peças em grandes séries. Stemmer possuía algum conhecimento de
causa: quando estivera na Alemanha, havia estagiado durante algum
tempo na fábrica de tornos automáticos Steinhãuser, em Stuttgart.
A partir dessa constatação, o grupo tentou fazer um levantamento
de mercado. Diversas empresas manifestaram interesse; alegavam ne-
cessitar de peças pequenas em lotes razoavelmente grandes e serem
compelidas a produzi-las de forma artesanal. Contudo, ao serem per-
guntadas sobre volumes e custos de produção, alegavam não ter esses
dados disponíveis.
Arno Blass

O grupo resolveu arriscar. Então defrontou-se com outro proble-


ma: como constituir um fundo numa época de inflação elevada (an-
tes do surgimento da correção monetária)? Deveriam aplicar o di-
nheiro num banco até conseguirem o montante suficiente para ad-
quirir o torno à vista ou seria preferível adquirir o torno a prestações,
diretamente do fornecedor? A firma Stil, representante da fábrica de
tornos automáticos Traub, da Alemanha, propôs o pagamento do tor-
no em vinte prestações.
Mas, e a base física da empresa? Onde instalá-la? Um dos sócios -
Roberto Bressiani - propôs que o torno fosse inicialmente instalado
na oficina mecânica de sua família, que ficava ao lado do Instituto de
Eletrotécnica, do outro lado da rua. Seu pai, egresso de escola técni-
ca e também sócio do empreendimento, tinha mais experiência prá-
tica do que os engenheiros, em sua maioria recém- formados. Adqui-
rido e instalado o torno, e obtida a primeira encomenda, havia che-
gado a hora de produzir o primeiro lote de peças. Um grupo de só-
cios ficou até as três da madrugada tentando produzir a primeira
peça. Mas, por mais cuidadosamente que afiassem as ferramentas,
elas simplesmente não cortavam o aço. Resolveram parar e tentar no
dia seguinte, com a cabeça fria. Ao retornarem, encontraram Bressiani,
o pai, sorridente, ao lado do torno, que funcionava maravilhosamen-
te. Qual foi o milagre? Simples: ao contrário dos tornos convencio-
nais, os tornos automáticos giram no sentido horário; as ferramentas
têm que ser montadas em posição invertida, relativamente aos tornos
convencionais.
A empresa foi registrada com o nome de Produtec Engenharia. Ela
viria a ser uma grande fonte de aprendizado prático para todos os que
dela participaram. Para lá Stemmer costumava levar seus alunos, dando
aulas ao pé da máquina. A empresa cresceu, teve de procurar acomo-
dações mais consentâneas, chegou a ter 30 tornos automáticos, além
de retíficas, laminadoras de roscas, tornos revólver, furadeiras e prensas.
No seu auge, chegou a ter 150 empregados. Stemmer afastou-se dela
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

ao transferir residência para Florianópolis, embora continuasse como


sócio. Recentemente, já beirando os 40 anos, a firma foi vendida a
um grupo empresarial.

Uma chance sedutora em Florianópolis

Em 1964, implantava-se a terceira série do curso de Engenharia


Mecânica em Florianópolis; Stemmer passou a viajar quinzenalmen-
te, para ministrar a disciplina Vibrações Mecânicas e preparar o futu-
ro titular da mesma. Aí as coisas começaram a acontecer muito rapi-
damente. Quem poderia implantar a disciplina Máquinas Operatrizes,
da quarta série? Ninguém conseguia pensar em outro nome, senão no
de Stemmer. E Tecnologia Mecânica, também da quarta série? Stemmer!
Em seguida, vem o convite para aceitar a candidatura à direção da
EEI. A EEI, aquela escola de engenharia em que se ministrava um
curso de Engenharia Mecânica segundo o currículo que ele, Stemmer,
havia concebido: aquele currículo que Porto Alegre havia rejeitado.
No dizer gauchesco, o cavalo passava encilhado...
A decisão não era trivial. Os Stemmer haviam acabado de cons-
truir ampla e confortável casa em Porto Alegre. Helena Stemmer,
uma vez mais, teria de abandonar sua exitosa carreira de calculista de
estruturas; teria ela oportunidades comparáveis em Florianópolis?
Stemmer a trouxe a Florianópolis em uma de suas viagens quinzenais,
mostrou-lhe a cidade e as praias, apresentou-lhe pessoas. Eventual-
mente obteve sua aprovação ao projeto de "passar algum tempo" em
Florianópolis. Para as crianças - Gaspar Henrique (com 9 anos),
Marcelo Ricardo (indo para os 5) e Miriam Helena (com 1 ano e
meio) - certamente seria bom sair de uma cidade grande e morar
num ambiente mais calmo e seguro.
O PRIMEIRO MANDATO NA EEI

um fim de tarde de fevereiro de 1965, um empoeirado fus-


ca azul cruza a ponte Hercílio Luz, no sentido continente-
ilha. Era Stemmer chegando a Florianópolis. A universida-
de havia encontrado para ele uma boa casa, recém-construída e sufi-
cientemente grande, situada na Baía Norte, à rua Almirante Lamego,
a poucas quadras da reitoria e da Escola de Engenharia Industrial.
Nos fundos do terreno, a pouco mais de 20 metros da casa, ficava a
praia do Müller, que já não existe. Por quê? No começo da década de
70, o mar foi aterrado, empurrado uns 200 metros; sobre o aterro
vieram a ser lançadas várias faixas de asfalto, quase uma dezena de
pistas de rolamento: trata-se da Av. Beira-Mar Norte, mais tarde deno-
minada Av. Jornalista Rubens de Arruda Ramos. Mas Stemmer não
esperou que lhe roubassem a praia; antes disso, já havia comprado
enorme terreno adjacente ao campus, onde, sobre uma elevação,
construiu sua casa. Com o tempo, iria deixá-la completamente cir-
cundada de árvores, em sua maioria frutíferas, lembrança atávica de
seus tempos de criança, em Novo Hamburgo.
Ao assumir a direção da Escola de Engenharia Industrial, Stemmer
inspirou-se e seguiu com rigor princípios enunciados por Zeferino
Vaz, o criador da Unicamp. Desde as primeiras decisões executivas
até as propostas - de curto e longo prazo - submetidas à congrega-
ção, tornou-se evidente que algo mais norteava o diretor, além da
mera rotina de uma escola em implantação. Outrossim, impressiona-
va a capacidade de trabalho do novo diretor, presente em todas as
atividades relacionadas com a EEI, que viajava com freqüência - numa
Arno Blass

época em que ainda era uma relativa maratona ir ao Rio de Janeiro


ou a Brasília - e que relatava os resultados das viagens. Permanecia
na EEI muito além do horário e procurava conhecer na cidade todas
as pessoas que, de alguma forma, poderiam vir a ter influência em
interesses da EEI.1

Laboratórios e biblioteca

Stemmer procurou incutir em seus docentes a visão de que os


laboratórios de uma escola de engenharia devem ser bem equipados,
de tal forma que permitam a realização de bons trabalhos de pesqui-
sa e o atendimento de problemas das empresas e da comunidade.
Entretanto, em virtude de os bons laboratórios serem caros e de ma-
nutenção dispendiosa, deve fazer-se um esforço de utilização otimizada,
para o ensino, a pesquisa e o atendimento de interessados externos;
deve haver, ainda, um esforço de marketing para a venda de serviços.
Apenas chegado a Florianópolis, começou a preocupar-se com os
equipamentos que precisariam ser adquiridos para os vários laboratóri-
os que, mesmo que numa escala incipiente, tinham de ser instalados na
medida em que cada série do curso de Engenharia Mecânica entrasse
em funcionamento - posteriormente, o problema tornou-se ainda maior
com o início de funcionamento dos cursos de Engenharia Elétrica e

1 Por isso mesmo, Stemmer sentiu que a implantação de duas disciplinas novas,
que vinha realizando, na quarta série, lhe tomava tempo considerável. Fiquei
sumamente emocionado quando, numa inesperada manifestação de confian-
ça, propôs-me que ao invés de trazer outro professor de Porto Alegre para
substituí-lo na tarefa de preparar-me para uma das disciplinas - Tecnologia
Mecânica -, eu assumisse sem mais delongas a responsabilidade plena pela
mesma. E assim, tornei-me, excepcionalmente, e em decorrência de circuns-
tanciada e elogiosa exposição de motivos de Stemmer, o único dos jovens
docentes a assumir uma disciplina do novo curso de Engenharia Mecânica,
após apenas alguns dias de funcionamento da mesma.
Caspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

Civil. Por um lado, havia a grande lista de equipamentos, totalizando


cerca de US$ 1 milhão, que deveriam chegar - e isto começou a
ocorrer já em 1966 - da República Democrática Alemã como parte
dos "convênios do café". Mas, ainda que ampla, essa lista apresentava
lacunas. Então Stemmer designou comissões para identificarem-nas e
especificarem equipamentos adicionais. Da mesma forma, solicitou
listas de livros e de periódicos que, no entendimento dos docentes,
deveriam estar disponíveis na ainda incipiente biblioteca da EEI.
Entretanto, converter listas em bens requer recursos. Stemmer
desencadeou busca desenfreada por recursos e doações, percorrendo
cada agência governamental, embaixadas e consulados, os programas
de cooperação internacional. Para a biblioteca, conseguiu numerosas
doações de organismos internacionais e do MEC. A Embaixada dos
Estados Unidos, paradoxalmente, fez a doação de um lote de livros
russos de engenharia, traduzidos para o inglês, e que eram relativa-
mente populares, à época. Uma significativa coleção de periódicos
foi enriquecendo a biblioteca. Para facilitar o acesso dos alunos ao
material de estudo, Stemmer instalou, nela, uma copiadora xerox,
quero crer que a primeira em Florianópolis.

O pavilhão de Mecânica

Originalmente, a UFRGS havia projetado um conjunto de cinco


prédios para alojar a EEI no Campus Universitário da Trindade. Des-
ses, dois estavam em construção quando Stemmer assumiu a direção:
o Pavilhão de Mecânica, de 80m x 50m, destinado a alojar os labo-
ratórios pesados, e um prédio destinado à administração da escola,
englobando biblioteca, espaço para exposição permanente de produ-
tos industriais de Santa Catarina e auditório com 250 lugares.
Entretanto, a vinda, em 1966, de Rudolph Atcon ao Brasil como
consultor do MEC, a quem tive a honra de ciceronear quando de sua
visita a Florianópolis, determinou uma ruptura radical da política de
Arno Blass

edificações do MEC para as universidades brasileiras. Obras monu-


mentais, que eram a tônica, foram postas de lado, em favor de
edificações mais baratas, funcionais e versáteis. Em decorrência des-
sa idéia, o projeto da UFRGS para a EEI foi abandonado, mantidas
somente as obras já em andamento. Mesmo assim, o prédio destina-
do à administração da EEI foi aproveitado para abrigar a reitoria da
UFSC. Edificações subseqüentes passaram a ser projetadas no escritó-
rio técnico da própria UFSC.
O pavilhão de Mecânica foi edificado em local muito baixo, ao
lado de um riacho. Já em 1964, Cossi, ainda na direção, fora adverti-
do sobre a cota reduzida em que ficaria o piso térreo do pavilhão.
Matemático e amante das coisas precisas, Cossi argumentava que o
piso estava sendo colocado na cota definida pelo escritório de enge-
nharia da UFRGS, sobre uma planta topográfica do local, e que qual-
quer alteração que se fizesse implicaria em isentar os projetistas de
qualquer responsabilidade sobre a obra. De pouco adiantou argu-
mentar, como Stemmer fez, que, depois do projeto de engenharia,
existe o engenheiro da obra, a quem compete corrigir no local quais-
quer imprevistos constatados. Quando Stemmer assumiu o mandato,
a concretagem do pavilhão de Mecânica já estava concluída. Em prin-
cípios da década de 70, aconteceu a primeira das periódicas e catas-
tróficas inundações do Pavilhão. Stemmer costuma dizer que não
imaginava, ao argumentar com Cossi, que o problema viria a estourar
em suas mãos.

Estágios e o
Centro de Formação Prática e Aperfeiçoamento

Uma das primeiras propostas encaminhadas por Stemmer à Con-


gregação da EEI, já no início de 1965, dizia respeito à questão dos
estágios obrigatórios. A posição vigente na ampla maioria das escolas
era a da recomendação da realização de estágios, por vezes até refor-
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

çada por estímulos, mas sem exigência de obrigatoriedade. Em São


Paulo, criou-se o Centro de Integração Empresa-Escola - CIEE,
objetivando ajudar os estudantes na busca de estágios. Até aquele
momento, no país, entretanto, apenas a Escola de Engenharia da Fun-
dação Universidade do Rio Grande - FURG exigia determinado tempo
de estágio em indústria como componente obrigatória do currículo.
A proposta de Stemmer, entretanto, diferia radicalmente. Come-
çava por redefinir o conceito de férias. Similarmente ao que constitui
o direito de todo trabalhador brasileiro, o aluno da EEI teria direito
a 30 dias de férias por ano. Assim, o ano físico passava a ter três
partes: a letiva, a não letiva - ou livre de preleções - e as férias.
Durante a parte livre de preleções, não cessavam as obrigações dos
alunos - nem dos professores - com a EEI. O currículo passava a ser
composto de dois tipos de componentes: as disciplinas e os estágios
- ou formação prática -, entendidos como complemento indispensá-
vel à formação acadêmica, por propiciarem a vivência da atividade de
engenharia em aspectos que a escola não pode transmitir de modo
eficiente. Os pré-requisitos de matrícula passavam a englobar tanto
disciplinas como estágios. A formação prática, totalizando 28 sema-
nas, era dividida em formação prática prévia - num mínimo de 12
semanas - e formação prática profissional - num mínimo de 16
semanas.2
A formação prática prévia compreendia um conjunto de estágios
obrigatórios, obedecendo a uma programação estabelecida, comum
a todos os alunos de um mesmo curso, que deveria ser cumprida nos
períodos livres de preleção, a partir da aprovação do aluno no vesti-
bular. Estes estágios poderiam ser realizados em indústrias ou em
escolas técnicas, ou ainda na própria EEI - tendo em vista que as

2 Cf. Escola de Engenharia Industrial, UFSC, Catálogo de cursos - Plano de


preleções-corpo docente, Florianópolis, Imprensa Universitária, 1969, pp.
142-168.
Arno Blass

empresas relutavam em aceitar estagiários das primeiras séries. De-


terminados estágios constituíam pré-requisitos de matrícula de disci-
plinas específicas. Durante alguns anos, Stemmer serviu-se de um
convênio de cooperação existente entre a UFSC e a Escola Industrial
de Florianópolis, que, posteriormente, veio a ser a Escola Técnica
Federal de Santa Catarina - Etefesc,3 para promover cursos práticos
de fundição, soldagem e usinagem, aceitos como estágios fundamen-
tais. Em suas próprias instalações, tornaram-se afamados os cursos
de enrolamento de motores elétricos.
Uma vez completada a formação prática prévia - o que deveria
ocorrer por volta do final da segunda série do curso -, o aluno passa-
va à formação prática profissional, concentrada em área da Engenha-
ria de interesse do aluno. Exceto pelo número exigido de semanas, a
programação tornava-se mais flexível: cada aluno poderia fazer uma
programação pessoal de estágios. Os pré-requisitos de matrículas para
as disciplinas das séries mais avançadas, por isso mesmo, passavam a
exigir apenas certo número de semanas de estágio em áreas definidas
de modo genérico. Estágios de natureza bastante diversa poderiam
satisfazer os requisitos de matrícula de uma mesma disciplina.
Para controlar a execução do programa de estágios de cada aluno,
para promover os cursos técnicos exigidos na etapa de formação prá-
tica prévia e para auxiliar o aluno na obtenção de vagas para estágio
em indústria, foi criado o Centro de Formação Prática e Aperfeiçoa-
mento - CFPA, dirigido por um professor-conselheiro, o que
correspondia ao que hoje se conhece como coordenador de estágios.
Fui designado, por Stemmer, para ser o primeiro professor-conselhei-
ro, função que exerci em 1965 e 1966.
A proposta, como se pode depreender, era revolucionária e exigia
grande esforço para convencer os alunos de seu mérito. Maior traba-

3 E que agora passa a ser o Centro Federal cie Educação Tecnológica de Santa
Catarina - Cefet/SC.
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

lho, entretanto, foi requerido para convencer os membros integran-


tes da congregação, mais apegados à tradição e avessos a mudanças.
Mas muita argumentação, o cansaço das reuniões que se prolonga-
vam pelas madrugadas e a falta de substância nas objeções levanta-
das, acabaram por resultar na aprovação da proposta. Coube a mim a
elaboração das disposições transitórias para colocar o sistema em
marcha. A primeira turma do curso, que cursava a quarta série - era
ainda a época dos cursos seriados -, foi integralmente dispensada de
estágios. Para as seguintes, foram estabelecidas programações e car-
gas específicas, compatíveis com o tempo disponível até o fim do
curso. A partir da turma que iria ser admitida pelo vestibular de
1966, ficaria valendo a programação plena aprovada pela congrega-
ção, que foi publicada em uma pequena brochura, disponibilizada a
todos os alunos.
A inovação funcionou bem no início. Quando foi criado o curso
de Engenharia Elétrica, a correspondente programação de estágios
foi elaborada sem maiores dificuldades. Os problemas começaram a
surgir quando da criação do curso de Engenharia Civil. A programa-
ção de estágios, por incompreensão ou desinteresse dos docentes da
área, era pouco atrativa e não motivava os alunos. As dificuldades
podiam ser previstas.
Mas o estágio obrigatório, no modelo proposto por Stemmer, se-
ria ferido de morte pela implantação, na UFSC, em 1970, da Reforma
Universitária imposta pelo Decreto-Lei nº 53/66, modificado pelo
Decreto-Lei nº 252/67. Ao ser criado o Centro de Estudos Básicos -
CEB, no espírito da nova legislação, as disciplinas correspondentes
ao ciclo básico dos cursos de engenharia e os respectivos docentes
foram transferidos para departamentos desse centro. O Centro
Tecnológico, sucessor da EEI, que acolheu as disciplinas do ciclo
profissionalizante dos cursos de engenharia e os respectivos docen-
tes, deixou de ter acesso aos alunos de Engenharia recém-admitidos
na universidade. Assim, passou a ter contato com os estudantes a
Arno Blass

partir do quinto semestre letivo. Os professores da EEI que foram


lotados no CEB eram justamente os que se opunham a Stemmer, o
que, certamente, não facilitava o diálogo. Resultado: deixou de ser
possível exigir que os alunos realizassem estágios a partir de seu in-
gresso na universidade, ou de colocar estágios como pré-requisitos de
matrícula de disciplinas oferecidas pelo CEB. A regulamentação de es-
tágios introduzida na EEI deixava de ser viável no CTC, pelo que teria
de ser drasticamente revista. Sob um aspecto positivo, é lícito lem-
brar que o conceito de estágio obrigatório estava no espírito da Refor-
ma Universitária e da Resolução 48/76, do Conselho Federal de Edu-
cação, no tópico "Currículos mínimos dos cursos de engenharia".

O Centro de Aperfeiçoamento Cultural

Stemmer, à mesma época em que inovava com os estágios obriga-


tórios, propôs que a EEI - mediante a colaboração das diversas facul-
dades da UFSC, de outras entidades e de profissionais de reconheci-
do valor - promovesse para seus alunos uma gama variada de cur-
sos de divulgação cultural. Argumentava que engenheiros são desti-
nados a assumir posições de chefia e liderança, sendo indispensável
que possuíssem, além dos conhecimentos técnicos, uma ampla visão
de aspectos éticos, políticos, econômicos, sociais e culturais da vida
atual.4
Para superintender as atividades de divulgação cultural, foi criado
o Centro de Aperfeiçoamento Cultural, com seu professor-conselhei-
ro e um conselho consultivo. A regulamentação criada para este cen-
tro listava especificamente alguns temas a serem cobertos: Economia
Nacional e Regional, Noções Gerais de Direito, Línguas Estrangeiras,
História, Música, Medicina Preventiva, Literatura, Lógica Filosófica e
Ética Profissional. A abordagem dos temas se dava por aulas ou pales-

4 Cf. Escola de Engenharia Industrial, op. cit., pp. 169-177.


Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

tras, eventualmente seguidas de debates. Durante algum tempo, as


atividades decorrentes tiveram a participação efetiva e dedicada do
padre Afonso José Birk, S. J., à época capelão universitário, até o
momento em que se afastou de Florianópolis.
A Reforma Universitária tornou vários dos temas que eram objeto
da ação do Centro de Aperfeiçoamento Cultural curricularmente com-
pulsórios. Em decorrência, ele se tornou redundante.

Treinamento e qualificação dos docentes

A formação em engenharia confere conhecimentos técnicos, mas


não prepara para a docência. Além disso, o engenheiro-docente pre-
cisa aprofundar e manter atualizados os seus conhecimentos. Stemmer
preocupava-se com estas questões e instava seus jovens docentes a
buscarem estágios de treinamento em indústrias e laboratórios espe-
cializados, a realizarem cursos de aperfeiçoamento e a se instruírem
em assuntos de natureza didático-pedagógica. Promoveu seminários
para a discussão de questões de natureza didático-pedagógica, nos
quais os jovens professores eram inscritos ex officio. Selecionou um
texto renomado à época e mandou fazer cópias mimeografadas de
capítulos selecionados. Em reuniões semanais dos novos docentes,
este material era lido, discutido, comentado e ilustrado à luz de si-
tuações de classe vivenciadas pelos participantes.
Mas Stemmer estava alerta para as tendências que se prenunciavam
para a educação superior no Brasil. Com a criação dos programas de
mestrado da Coppe e da PUC-RJ, já em 1966 eram enviados dois jovens
docentes para realizarem o mestrado em engenharia mecânica no Rio
de Janeiro: Paulo Antônio Corsetti - Coppe - e José João de Espíndola
- PUC-RJ. Ambos completaram o mestrado em cerca de um ano e
foram substituídos por um novo contingente: Arno Blass, Carlos Alfredo
Clezar e Nelson Back - que foram para a Coppe -, Raul Valentim da
Silva - PUC-RJ, mestrado em Engenharia de Produção - e Rodi Hickel
Arno Blass

- Escola Nacional de Química. Em 1968, deram início ao mestrado os


primeiros professores de engenharia elétrica.
Com o início do mestrado em Florianópolis, em 1969, grande
parte do corpo docente da EEI foi nele matriculada, sem prejuízo
para o fluxo dos que se afastavam para realizar a pós-graduação em
outras universidades. No mesmo ano de 1969, começaram a sair os
primeiros três candidatos ao doutoramento; mais cinco saíram em
1970. Isso representou uma considerável redução da força de traba-
lho disponível em Florianópolis, para manter o atendimento dos en-
cargos da EEI e - após a Reforma - dos diversos departamentos do
Centro Tecnológico. O problema foi minorado apenas em parte por
professores visitantes. Apesar disso, o esforço de qualificação docen-
te se manteve incessante - em torno de 15% do pessoal docente - até
a segunda metade da década de 70, quando, com o retorno de diver-
sos professores com doutorado, os departamentos envolvidos com
pós-graduação passaram a dispor da massa crítica requerida para fa-
zerem frente a seus encargos.

Cooperação com a indústria

Stemmer também procurou, desde o começo, estabelecer comu-


nicação e cooperação com o segmento industrial. Mobilizou docen-
tes para um programa de visitas a empresas, logo no início de seu
primeiro mandato como diretor. Foram visitadas quase todas as in-
dústrias do parque industrial do vale do Itajaí, bem como grande
contingente de empresas do sul do estado. Era preciso, dizia Stemmer,
que a escola fosse realimentada pela indústria, que esta indicasse em
que pontos a formação dos engenheiros estava deixando a desejar,
para que estas deficiências pudessem ser corrigidas. Era necessário,
também, que as indústrias aceitassem a presença de estagiários como
rotina, isto é, que propiciassem a formação prática naqueles pontos
em que alegavam encontrarem-se as deficiências dos recém-forma-
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

dos. Igualmente era mister que as indústrias tomassem conhecimen-


to de que a EEI estava se equipando e, neste processo, estava adqui-
rindo equipamentos sofisticados de teste que poderiam, eventualmente,
interessar a uma ou a outra empresa. Finalmente, que a UFSC estava
envidando esforços muito grandes para qualificar seus quadros;
destarte, problemas não triviais de engenharia, que ocorrem amiúde
no ambiente industrial, poderiam encontrar, em Florianópolis, o es-
pecialista adequado para resolvê-los.
Num primeiro momento, esta abordagem causou estranheza nas
indústrias visitadas. "Então vocês não vieram aqui pedir dinheiro?" -
foi a pergunta ouvida em uma das visitas, dando bem idéia de quão
necessária se fazia a aproximação buscada por Stemmer.
Algumas destas visitas deram resultados notáveis quase imediata-
mente. A empresa Hidráulica Industrial, de Joaçaba, fez doação de
um conjunto de turbinas Pelton, Kaplan e Francis, com os respectivos
reguladores, que veio a ser instalado no laboratório de máquinas
hidráulicas da EEI. A firma Caetano Branco, da mesma cidade, desta-
cada fabricante de máquinas agrícolas, orgulhava-se de que, embora
tivesse iniciado como empresa familiar, afastada dos grandes centros
urbanos, desenvolvera - por necessidade - uma notável auto-suficiên-
cia: teve uma fundição própria e gerou sua própria eletricidade, apro-
veitando uma queda d'água no rio que passava ao lado de seu parque
industrial. Fabricava, em 1965, um motor a gasolina para trilhadeiras,
que o dono exibia orgulhosamente, por tê-lo projetado sem ser enge-
nheiro. Perguntava: "E vocês, já projetaram um motor?" Pensava que
a potência do motor deveria estar pelos nove cavalos, pois este subs-
tituía, com alguma vantagem, o motor original de uma trilhadeira de
nove cavalos. Em troca de um teste no dinamômetro da escola, con-
cordou em receber três estagiários - ou tê-lo-ia feito por ser rotariano,
como Stemmer? Estes foram selecionados a dedo, sendo alertados de
que, ante algum problema, telefonassem a Florianópolis, ao profes-
sor mais relacionado, pois tinham a missão de fazer bonito. Os rapa-
Arno Blass

zes fizeram o projeto de uma nova fundição, que a empresa usou para
obter, com sucesso, um financiamento do Banco Nacional de Desen-
volvimento Econômico - BNDE. Três meses depois, o dono da em-
presa retornou a Florianópolis: queria nova leva de estagiários para as
férias seguintes. O mesmo ocorreu com o velho fundador da Eletro
Aço Altona, de Blumenau. Como típico blumenauense, tinha preven-
ção contra Florianópolis: uma cidade de burocratas, da qual nada de
bom poderia vir. Convidado e convencido a visitar a EEI, ficou im-
pressionado e disse que recomendaria a seu neto estudar na UFSC.
Cabe registrar, ainda, como parte do esforço de aproximação da
escola com a indústria, a promoção "Semana da Escola Aberta", duran-
te a qual industriais eram convidados a participar de visitas guiadas aos
laboratórios, quando lhes eram descritas as potencialidades de cada
um deles, as pesquisas e as atividades de extensão em andamento.

Provas para a recondução de docentes

Zeferino Vaz costumava dizer que "o pior inimigo da universidade


é a transigência com a mediocridade". Stemmer, por concordar com
essa tese, preconizava o maior rigor na seleção do corpo docente.
Entendia que era necessário fugir da contingência de ter de escolher
o menos ruim num concurso, por efeito da ausência de candidatos
qualificados. Antes de abrir concursos, impunha-se motivar pessoas
qualificadas a se inscreverem; se, porventura, aparecessem candida-
tos ainda melhores, o lucro seria da instituição.
Essa postura faz compreender o zelo com que, até 1964, Stemmer
observava os alunos que passavam por sua disciplina em Porto Alegre,
formandos em Engenharia Mecânica, sobre os quais relatava a Cossi,
com vistas ao eventual aproveitamento dos melhores para os quadros
da EEI. Mesmo assim, equívocos eram inevitáveis. Nesse caso, consta-
tava-se a dura realidade: é muito difícil a universidade pública desfa-
zer-se de um professor deficiente, por mais que os alunos reclamem
Caspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

e se confirme a procedência de suas reclamações. Esse mal é crônico,


arrasta-se há décadas, sem que se lhe dê solução.
Stemmer entendia, por isso - uma vez mais, antecipando-se ao
que viria a dispor a lei - que novos docentes deveriam ser admitidos
em regime probatório de dois anos, após o qual os mesmos seriam
submetidos a uma avaliação de desempenho, prestando provas de
recondução, envolvendo aspectos de conhecimento técnico e didáti-
co-pedagógico. A contratação definitiva de um docente dar-se-ia em
função de seu desempenho nestas provas; um mau resultado poderia
representar o término de seu vínculo com a universidade. A inovação,
embora tenha sido objeto de acirrado debate na congregação, acabou
sendo aprovado. Pelo que sei, ao menos um docente, contra o qual
pesava muita reclamação da parte dos alunos, deixou de ser aprovado
quando prestou as provas de recondução.
De minha parte, sinto orgulho por ter tido a oportunidade de
prestar provas de recondução em novembro de 1966 e de nelas ter
sido aprovado.
Mais uma vez, a Reforma Universitária, ao eliminar a relativa in-
dependência das unidades da universidade, acabou com este salutar
instituto em 1970. Vários anos depois, a legislação federal introduziu
a figura do regime probatório de dois anos para as nomeações de
novos concursados, mas interesses corporativos têm tornado este dis-
positivo letra morta.

Dedicação exclusiva

Stemmer, em 1964, antes mesmo de assumir a direção da EEI,


alertava que o modelo que vinha sendo empregado para fixar enge-
nheiros mecânicos, docentes da EEI, em Florianópolis, não atendia
aos melhores interesses da escola, mesmo que não se pudesse negar a
boa vontade e a decisiva ajuda do governo estadual no sentido de
viabilizar esta fixação. Os docentes que trabalhavam no Plameg eram
Arno Blass

liberados apenas para o comparecimento às aulas, de acordo com


horários previamente registrados. Assim, a atividade na UFSC ficava
relegada à condição de mero bico, uma situação contra a qual muitos
dos jovens docentes haviam assumido posição clara e inequívoca du-
rante seu tempo de estudantes, quando militavam no politizado e
maduro movimento discente anterior a 1964. Por outro lado, não
havia sintonia entre as atividades que eles desenvolviam no Plameg e
na UFSC. E a situação no Plameg era instável, suscetível de câmbios
radicais ao ensejo de mudança de governo. A conjuntura existente
não permitia que os jovens docentes exercessem as atribuições do
magistério de acordo com os padrões de seriedade que eles mesmos
haviam preconizado e cobrado quando estudantes.
Segundo a norma então vigente, os docentes eram contratados para
serem professores de uma disciplina específica, com a obrigação de
cumprirem 20 horas semanais nas atividades decorrentes. A dedicação
exclusiva, como a conhecemos hoje, não existia. Contudo, era admissível
a acumulação de dois contratos em disciplinas compatíveis. Alguém
teve esta idéia: com dois contratos em disciplinas relacionadas, seria
possível dedicar 40 horas semanais à universidade, desenvolvendo ativi-
dades que iam além das meras tarefas de preparar e ministrar aulas e
de preparar, aplicar e corrigir provas. Seria possível acompanhar o pro-
cesso de especificação, aquisição, recebimento e instalação de equipa-
mentos, num momento em que estas eram atividades inadiáveis; seria
possível estudar, expandir horizontes, buscar conhecimentos de didáti-
ca e pedagogia; seria possível dispor de tempo para viajar a serviço, às
expensas da universidade, quando isso se fizesse necessário. Em suma,
seria possível praticar o magistério exatamente daquela maneira que
tantos haviam preconizado no tempo de estudante.
Stemmer aplaudiu a idéia e a endossou. Cossi aceitou-a e levou-a
ao reitor. Ferreira Lima verificou que ela não continha ilegalidade,
aprovou-a e a pôs em prática. Assim, em 1965, quando Stemmer
assumiu a direção da EEI, já encontrou sete docentes nessa situação,
cobrindo a maioria das disciplinas da terceira e quarta séries do cur-
Caspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

so e as disciplinas de Cálculo Infinitesimal. Esse número aumentou


consideravelmente no ano seguinte, com a entrada da quinta série do
Curso de Engenharia Mecânica e a criação do Curso de Engenharia
Elétrica. A medida foi estendida pela universidade também aos cur-
sos de Física e Matemática, em implantação.
Quando o legislador debruçou-se sobre a questão dos regimes de
tempo, depois da introdução da Reforma Universitária, já encontrou
uma situação de fato em vigor na EEI. Em decorrência disso, o duplo
contrato dos docentes foi substituído pela atribuição do regime de
dedicação exclusiva. Foi uma rara situação em que as novidades da
lei não tolheram as posições inovadoras implantadas na EEI.

Descentralização do vestibular

Preocupado em atrair o maior número possível de candidatos ao


vestibular, democratizando oportunidades e permitindo melhorar a
seleção, Stemmer, logo que assumiu, começou a pensar na descentra-
lização do vestibular da EEI.
Convém relembrar que, até a implantação da Reforma Universi-
tária, cada faculdade fazia seu próprio vestibular, segundo critérios
próprios. O vestibular único e unificado, tal como o conhecemos
hoje - e que é praticado por todas as universidades brasileiras -,
representa uma criação da UFSC, embora só tenha sido introduzido
em 1970
Stemmer, durante o ano de 1965, encetou um programa de visitas
aos principais cursos de segundo grau em Santa Catarina, para mos-
trar as possibilidades que os cursos da UFSC ofereciam. O curso de
Engenharia Mecânica, por ser novo, era ainda desconhecido dos estu-
dantes; os que já dele haviam ouvido falar, encaravam-no com ceticis-

5 J. D. Ferreira Lima, UFSC: Sonho e realidade, 2. ed., Florianópolis, Editora da


UFSC, 2000, pp. 201-202.
Arno Blass

mo. Afinal, "santo de casa não faz milagres". Os estudantes do sul e


do oeste do estado tinham preferência por estudar em Porto Alegre,
enquanto que os do norte usualmente iam para Curitiba. Muitos alu-
nos excelentes sonhavam estudar no ITA ou na Efei, de Itajubá. Muito
deveria ser feito no sentido de carrear o interesse dos alunos para
Florianópolis, para cuja consecução Stemmer não poupou esforços.
E uma das maneiras que visualizou era, justamente, a de ir buscar o
candidato lá onde estivesse.
Assim, já em 1966, o vestibular da EEI foi descentralizado e reali-
zado em quatro cidades: Florianópolis, Blumenau, Criciúma e Chapecó.
Para viabilizá-lo, a EEI conveniou com escolas locais, que cederam
instalações e pessoal para a fiscalização. Para reduzir custos, apenas
um docente era enviado de Florianópolis às cidades do interior, com
toda a responsabilidade requerida para o sigilo e a lisura. Essa siste-
mática persistiu até 1969. Em 1970 o vestibular, com a unificação,
passou a ser realizado pela UFSC, na cidade de Florianópolis exclusi-
vamente. Mas quando Stemmer assumiu a reitoria, em 1976, uma de
suas primeiras iniciativas foi a de tornar a descentralizar o vestibular,
agora no âmbito de todos os cursos universitários, numa prática que
persiste até hoje. Num primeiro momento - em 1977 -, Stemmer
conseguiu até mesmo promover um vestibular único englobando a
UFSC, a Udesc e a Associação Catarinense das Fundações Educacionais
- Acafe, barateando assim os custos. Mas essas instituições preferi-
ram desvincular-se do vestibular em conjunto com a UFSC, por enten-
derem que tal procedimento beneficiaria a esta, na medida em que
ficava com os melhores candidatos.

Criação de novos cursos

Em princípios dos anos 1960, as Centrais Elétricas de Santa Cata-


rina - Celesc estavam comprometidas com um ambicioso programa
de eletrificação do estado. Demandavam por engenheiros eletricistas,
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

que, por não serem formados em Santa Catarina, essa recém-inaugu-


rada empresa iria contratá-los em outros estados. Os maiores contin-
gentes eram provenientes de Minas Gerais - de sua Efei -, do Rio
Grande do Sul e do Paraná. Contudo, apesar das boas condições ofe-
recidas, esses engenheiros, após terem permanecido pouco tempo
em Santa Catarina, retornavam aos seus estados de origem. Os inves-
timentos no treinamento de engenheiros recém-formados tinham, por-
tanto, pouco retorno. Em 1966, o engenheiro Milan Milasch, então
diretor-técnico da Celesc, levou sua preocupação a Stemmer: estava
na hora de formar engenheiros eletricistas em Santa Catarina. O que
era necessário para implantar o curso?
Stemmer ponderou que, sendo a UFSC instituição federal, seriam
necessários ao menos dois anos entre a decisão de criar o novo curso
e a efetivação da disponibilidade de recursos no orçamento da EEI,
para a sua implantação. Outrossim, alertou para o montante de re-
cursos que seriam necessários para a instalação de laboratórios e a
contratação dos docentes requeridos. Mas a Celesc tinha pressa e se
propunha a financiar, durante dois anos, os salários dos professores
cuja contratação se fizesse necessária, a fim de que a UFSC pudesse
implantar de imediato o novo curso, admitindo imediatamente alu-
nos das primeiras séries do curso de Engenharia Mecânica que por-
ventura preferissem passar para o de Engenharia Elétrica, já que a
maioria das disciplinas iniciais era comum aos dois cursos. Assim
veio a acontecer, permitindo que o novo curso de engenheiros eletri-
cistas começasse a funcionar ainda no ano de 1966.
Para equipar de modo adequado o curso de Engenharia Elétrica,
Stemmer buscou auxílios adicionais na Cotesc - antecessora da Telesc,
na Eletrobrás e na Sociedade Termelétrica de Capivari - Sotelca, pos-
teriormente absorvida pela Eletrosul, hoje Gerasul. Obteve, mais tar-
de, a vinda de um contingente de cooperantes franceses, pelo progra-
ma de cooperação militar daquele país e oportunidades para que
diversos professores do novo curso viessem a realizar seu doutora-
Arno Blass

mente na França.
A criação desse curso despertou, mais uma vez, o grupo de profes-
sores locais interessado na criação do curso de Engenharia Civil, que
passou a motivar alunos a se manifestarem nesse sentido. Outro gru-
po de professores preocupava-se com a possibilidade de uma divisão
de esforços redundar em prejuízos na qualidade dos cursos. Os alu-
nos interessados no curso de Engenharia Civil conseguiram sensibili-
zar o governador do estado, Ivo Silveira, que prometeu um auxílio de
Cr$ 50 mil para viabilizar a instalação do curso, já em 1968.6
Stemmer fez as contas: para implantar a terceira série desse curso
poderiam ser aproveitadas disciplinas já existentes do curso de Enge-
nharia Mecânica, sendo necessárias apenas duas contratações. Mas,
para as duas últimas séries, seria necessária a contratação de cerca
de dez docentes, que se somaria ao número das contratações já
compromissadas com a criação do curso de Engenharia Elétrica. Os
recursos prometidos pelo governador do estado representariam ape-
nas uma pequena fração do que a universidade teria de desembolsar
a curto prazo.
Stemmer empenhou-se por obter um incremento do auxílio pro-
metido pelo governo do estado, mas suas intenções foram entendidas
como obstaculizantes. Resignou-se, então, e preferiu procurar fontes
alternativas para o custeio desse empreendimento.
Tanto em 1966, quando da criação do curso de Engenharia Elétri-
ca, quanto em 1968, com a do curso de Engenharia Civil, o velho
convênio com a UFRGS foi reativado, o que levou docentes daquela
universidade a instalarem as disciplinas dos novos cursos, a selecio-
narem e a prepararem os docentes locais que deveriam assumi-las
futuramente. Duas exceções ocorreram na implantação do curso de
Engenharia Civil: a disciplina de Topografia, Astronomia e Geodésia

6 Cf., por exemplo, H. A. Stemmer e R. da S. Ferreira, Engenharia civil 25


anos, Florianópolis, Edição dos Autores, 1995, p. 33-
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

veio a ser instalada pelo Prof. Camil Gemael, da UFPR, enquanto que
a de Hidráulica e Hidrologia foi logo assumida por um docente local,
Alberto Odon May, que possuía pós-graduação na Holanda.

A Fundação do Ensino da
Engenharia em Santa Catarina

Stemmer, para viabilizar o repasse dos recursos das diversas fontes


destinados à implantação do curso de Engenharia Elétrica, criou, em
1966, a Fundação do Ensino da Engenharia em Santa Catarina - Feesc,
uma fundação de direito privado, com regimento simples, que veio a
se mostrar extremamente útil na execução ágil, eficiente e desburo-
cratizada de projetos com instituições públicas e empresas. Stemmer
presidiu-a durante sete anos. Em favor dela é que foi creditado o
auxílio do governo do estado para a criação do curso de Engenharia
Civil.
A Feesc atuava com agilidade na aquisição de materiais, no paga-
mento de bolsas de estudo e na contratação de pessoal técnico tem-
porário. Em caráter experimental, foi criado, na fundação, um fun-
do rotativo de bolsas - precursor do atual crédito educativo - que
teve vida curta, porquanto os favorecidos, depois de formados, ocul-
tavam seu endereço e deixavam de devolver as quantias recebidas. A
Feesc começou a operar, também, uma cooperativa de livros, que
veio a ser o núcleo inicial da Livraria Convivência,7 que tem prospera-
do até hoje.

Eleição para o segundo mandato

Aproximando-se o fim do mandato de Stemmer à frente da EEI,


alvoroçou-se o ambiente desta: seus opositores, em geral professores
das disciplinas básicas com interesses externos à universidade, tenta-
ram articular uma candidatura contrária à da reeleição. A esta altura,
Arno Blass

Stemmer já havia solicitado e obtido sua transferência para o quadro


da UFSC, de sorte que poderia candidatar-se diretamente para a dire-
ção da escola, não mais passando pela situação de vice-diretor em
exercício - da direção. Contava, para isso, com o apoio maciço dos
professores com dedicação exclusiva, mas pelo fato de apenas alguns
deles serem já regentes de disciplina, só estes tinham assento na con-
gregação. A eleição para a escolha da lista tríplice deu-se num sábado
à tarde, em novembro de 1967, com a presença integral de seus mem-
bros, incluindo-se os docentes da UFRGS, que então já constituíam
um grupo minoritário. Sua participação, contudo, foi importante
porque exerceu papel moderador, procurando manter a ordem e o
bom nível das discussões. Levantamentos efetuados pelos dois lados
indicavam um empate entre as duas chapas, devendo a eleição ser
decidida pelos votos da representação discente. Os estudantes, reuni-
dos em assembléia, foram submetidos a intensa pressão por parte do
grupo local, mas decidiram usar apenas dois votos, dando um para
cada lado. Dessa forma, a lista resultante seria necessariamente mis-
ta, isto é, seria integrada por membros das duas chapas. O secretário
da EEI, ligado ao grupo da oposição, elaborou uma ata contendo
agressões e expressões ofensivas. A congregação, após acalorados de-
bates realizados em assembléia, escoimou da ata os adjetivos menos
adequados. A oposição ainda tentou recorrer, alegando "substituição
irregular de ata". Encaminhada a lista a Brasília, o presidente Castelo
Branco, em 30 de janeiro de 1968, escolheu Stemmer para diretor da
EEI, com um mandato de três anos. Ainda uma vez, a oposição tentou
um recurso, que foi julgado improcedente pela Justiça Federal.
Mas a verdadeira tempestade ainda estava por precipitar-se...

7 Foi criada em 1979, com o nome original de Livraria da Feesc, quando inte-
grei, juntamente com os Profs. Sérgio Roberto Arruda e Adalberto Luiz Verani
Depizzolatti, a diretoria da Fundação.
O NOVO MANDATO NA EEI:
O COMEÇO DA PÓS-GRADUAÇÃO NA
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA

O mestrado em Engenharia Mecânica

temmer, ao tomar conhecimento de que no BNDE - hoje


I BNDES -, por iniciativa de José Pelúcio Ferreira, fora cria-
do um fundo, o Fundo de Desenvolvimento Técnico-Científi-
co - Funtec para incentivar cursos de pós-graduação, com o objetivo
de formar engenheiros de alto nível e de qualificar escritórios de enge-
nharia consultiva, de imediato passou a cogitar em dar este passo.
Em meados de 1968, a EEI já contava com cinco docentes que
haviam concluído o mestrado: José de Espíndola, Paulo Corsetti, Arno
Blass, Nelson Back e Carlos Clezar. Algum tempo depois, mais um,
Raul Valentim da Silva. Stemmer instituiu então a comissão, integra-
da por este grupo, com o encargo de elaborar o projeto de um curso
de pós-graduação em Engenharia Mecânica, que viria a ser o primei-
ro da UFSC.
O trabalho foi relativamente rápido, em parte porque foi indisfar-
çavelmente calcado no modelo da Coppe - com quatro ex-coppeanos
na comissão! Num rompante de otimismo, considerou-se como segu-
ro o retorno de todos os docentes que no momento se encontravam
afastados em programações de pós-graduação, bem como a contrata-
ção dos professores-visitantes que se fariam necessários. Com base
nessas premissas, foram delineadas cinco áreas de concentração -
Arno Blass

Fabricação, Projeto, Termotécnica, Industrial e Produção -, eviden-


ciando, desde o início, uma cobertura ampla do espectro da Enge-
nharia Mecânica, que sempre iria distinguir este curso de todos os
seus congêneres no país. As designações minimalistas dadas às áreas
de concentração - esta designação é posterior, pois então se falava
em "opções" - refletem a pouca experiência do grupo em questões
de marketing. Só bem mais tarde elas viriam a ser alteradas.
Nesse projeto, Stemmer estava relacionado como um dos docen-
tes do curso, onde era classificado como especialista. Quem, no Bra-
sil, naquele momento, estaria mais qualificado do que ele para mi-
nistrar a disciplina de Controle Numérico de Máquinas-Ferramenta,
prevista no projeto?
A formação matemática dos mestrandos ficaria a cargo de Walter
de Bona Castelan, engenheiro mecânico que enveredara pela Mate-
mática e obtivera o mestrado em Matemática no ITA, em 1968. Castelan,
que posteriormente se doutorou no ITA, realizou atividades de pós-
doutoramento na Universidade de Brown, nos Estados Unidos, e par-
ticipou ativamente de diversos Colóquios brasileiros de Matemática.
Teve uma carreira curta, mas brilhante, vindo a falecer tragicamente
num acidente aéreo, em 12 de abril de 1980.1
Stemmer, valendo-se do referido projeto de implantação do curso
de Engenharia Mecânica, preparou um pedido de apoio ao Funtec,
solicitando Cr$ 100 mil. Ao encontrar-se no Rio de Janeiro com Rodi
Hickel, este argumentou que o montante do pedido era muito mo-
desto, que a unidade monetária do BNDE era o CR$ 1 milhão. Rodi
sabia do que falava, pois conhecia o projeto Funtec que apoiava o
Instituto de Química, onde estudava. CR$ 1 milhão era, na época, da
ordem do orçamento anual da EEI. Trabalhando durante a noite na
casa de Rodi, na Ilha do Governador, os dois refizeram o pedido, nele

1 Caber-me-ia, então, substituí-lo, ministrando a disciplina Métodos Matemáti-


cos em Engenharia, durante 12 anos.
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

incluindo um computador IBM 1130, com 16 KB de memória, que


custava em torno de Cr$ 500 mil e era tido, na época, como o melhor
para o ensino, em virtude de sua configuração simples. Alguns meses
depois, a EEI recebeu a visita do próprio Pelúcio, que chefiava a
administração do Funtec, acompanhado de Alberto Luiz Coimbra, o
diretor da Coppe, como consultor. Diante das observações e ao pare-
cer de ambos, o pedido foi aprovado. Seria o Funtec nº 62, num
montante equivalente, em valores de hoje, a R$ 2,4 milhões. Era o
primeiro projeto aprovado a sair do triângulo Rio de Janeiro-Minas
Gerais-São Paulo. Só no ano seguinte viriam a ser aprovados projetos
da UFPB, Engenharia Elétrica de Campina Grande, e da UFRGS, Enge-
nharia Civil.2
Amílcar Figueira Ferrari, que mais tarde foi o sucessor de Pelúcio
à frente do Funtec e que à época era coordenador de pós-graduação e
pesquisa do CTC, da PUC-RJ, declarou que a notícia de que o Funtec
iria apoiar a Engenharia Mecânica da UFSC causou surpresa:
[,..] A UFSC, localizada em um estado pequeno, era muito jovem,
tinha apenas pouco mais de dez anos. As hoje bem divulgadas, por
padrões brasileiros, vantagens comparativas de Santa Catarina,
como a educação básica bem difundida e a distribuição de renda
aceitável, que a levaram à excelência em diferentes ramos indus-
triais e a outros destaques no contexto nacional, eram, pela preca-
riedade das comunicações e dos transportes da época, geralmente
desconhecidas.'
Entretanto, continua Ferrari,
Stemmer demonstrou correta ousadia e, sem dúvida, total confian-
ça no seu próprio projeto, quando procurou o BNDE, cujo Funtec
tinha à sua frente o grande brasileiro, criador e primeiro gestor do
fundo, cujas visão de longo prazo e clarividência foram basilares

2 Amílcar Figueira Ferreira, depoimento pessoal ao autor, em agosto de 2002.


3 Idem.
Arno Blass

para a construção da pós-graduação no Brasil, que foi José Pelú-


cio Ferreira. Convenceu-o a, acompanhado e assessorado por Al-
berto Luiz Coimbra, [...] fazer uma visita de observação in loco.'
Paralelamente ao apoio do Funtec, Stemmer não descurou de ou-
tros apoios: da Capes, do CNPq, da OEA e da própria UFSC, para
bolsas de estudo, equipamentos, obras civis e pessoal. Começou a
manter contatos regulares com a Cooperação Técnica Francesa, o
Conselho Britânico e o Serviço de Intercâmbio Acadêmico Alemão -
DAAD, cujo apoio iria manifestar-se, no futuro, em níveis diferencia-
dos, quando a pós-graduação fosse estendida a outras áreas da enge-
nharia. O reconhecimento, pelo CNPq, de que o curso constituía um
centro de excelência para a pós-graduação em Engenharia Mecânica
na Região Sul - indispensável para assegurar a continuidade dos apoios
conseguidos - veio em meados de 1969.5 Por isso mesmo, já em
1970, foi aprovado o Funtec nº84, em valor equivalente a R$ 5,8
milhões atuais.
Stemmer, para implantar e operacionalizar o Núcleo de Processa-
mento de Dados, criado com a aquisição do IBM 1130, conseguiu
trazer Clávio Coutinho Filho, um estatístico carioca que concluiu seu
mestrado em Informática, na PUC/RJ, em 1969-

Os primeiros professores-visitantes

No Funtec, eram previstos recursos para a contratação de profes-


sores-visitantes. Era necessário ter alguns docentes com o título de
doutor. Num seminário sobre vibrações em máquinas-ferramenta no
IPT, em São Paulo, Stemmer foi apresentado ao Prof. Dr. Jiri Tlusty,
da Universidade de Praga, cujos livros já conhecia. Convidou-o a ser
professor-visitante naEEI. Tlusty, alegando compromissos no Canadá,

4 Amílcar Figueira Ferreira, op. cit.


5 Processo CNPq nB 2.633/69-
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

declinou do convite, mas indicou o nome de Jaroslav Kozel, a quem


se referiu como "um colega muito qualificado e disposto a vir ao
Brasil." Stemmer, escrevendo então a Kozel, formalizou o convite e
apresentou proposta e condições. A resposta foi imediata: Kozel acei-
tou. Duas semanas depois, estava ele em Florianópolis. Alguns dias
depois, os tanques soviéticos invadiam a Tchecoslováquia: acabava a
Primavera de Praga. Kozel, um gigante de quase dois metros de altu-
ra, que aprendera a falar português com um estudante carioca, em
Praga, apaixonou-se por Florianópolis e estabeleceu excelente rela-
cionamento com colegas e alunos. Passados dois anos, naturalizou-se
brasileiro e permaneceu no Brasil até sua morte. Ministrou várias
disciplinas, orientou várias dissertações e implantou o laboratório de
metrologia.
Os outros professores-visitantes da primeira hora foram: Woon
Kwan Luk, chinês, com doutoramento em Waterloo, Canadá, na área
de usinagem; Jukka Artturi Lehtinen, finlandês, com doutoramento
pelo MIT, na área térmica; e os cooperantes franceses, Yves Jean Xa-
vier Gasnier, doutor do terceiro ciclo em economia, e Jean-Pierre
Massola, engenheiro aeronáutico com especialização. Ficaram por
períodos variáveis, superiores a dois anos. Stemmer conseguiu, ain-
da, que um professor-visitante alemão que estivera na Universidade
de Trinidad-Tobago, Johann Ludwig Atrops, antes de retornar à Ale-
manha, passasse algumas semanas em Florianópolis, quando minis-
trou um curso intensivo sobre Tópicos Avançados em Elementos de
Máquinas. Mais tarde, veio ainda William Burns Nicoll, de Waterloo,
no Canadá, aproveitando uma licença sabática.

Os primeiros alunos

O primeiro catálogo do curso não passou de um fascículo


mimeografado. Também o recrutamento de alunos para a primeira
turma foi econômico, tendo-se restringido a contatos epistolares com
Arno Blass

as escolas da Região Sul. Mas ura grande contingente de jovens do-


centes do curso de Engenharia Mecânica, já contratados com esta
condição, foram inscritos ex officio. Ao todo, o curso começou com
cerca de 30 alunos, em sua maioria catarinenses e gaúchos. Havia,
também, um boliviano.
O curso - cingindo-se a copiar a Coppe -, intitulado Programa de
pós-graduação em Engenharia Mecânica, iniciou formalmente suas
atividades em março de 1969- As dificuldades eram imensas; até a
distância entre Florianópolis e os grandes centros tornava questões
simples, como a aquisição de livros didáticos, sobretudo os importa-
dos, em grandes problemas. As copiadoras xerox ainda não haviam
chegado a Florianópolis. Havia uma copiadora sucedânea, da 3M,
extremamente lenta, cujas cópias escureciam rapidamente com o
passar do tempo, tornando-se imprestáveis.
Os alunos dessa primeira turma - descontadas as inevitáveis per-
das - começaram a trabalhar em suas dissertações no final do ano. A
disponibilidade de bibliografia constituía sério entrave: a biblioteca
era muito nova para estar adequadamente suprida, e um serviço como
o Comut sequer nos sonhos figurava. Vários dos orientadores locais já
tinham definidas datas de afastamento para o doutoramento: num
mesmo dia sairiam Nelson Back, José de Espíndola e Arno Blass. Seus
orientados tinham, portanto, de concluir suas dissertações em 1970.
E, assim, sete defesas vieram a ocorrer nesse ano.6

Dissabores

O segundo mandato de Stemmer como diretor da EEI já tinha


começado com um contratempo, que viria a determinar a ruptura
definitiva com o secretário da escola. As relações entre ambos fo-
ram tensas desde 1965, embora inicialmente se caracterizassem ape-

6 A primeira delas foi a de Getúlio Góes Ferretti, meu orientado.


Caspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

nas por marcantes diferenças na forma de atuar. Então passaram a


ocorrer posturas de franco antagonismo, como no episódio da ata
da eleição de 1967. No vestibular de 1968, que foi particularmente
difícil, constatou-se que o primeiro colocado foi o irmão do secretá-
rio, conhecido como aluno notoriamente fraco durante seu curso
secundário. Isso se somava a um episódio recente, de irregularidades
na contratação de quartos que a universidade alugava para estudantes
do interior do estado. Foram as últimas gotas. O secretário foi dis-
pensado.

A Sub-Comissão Geral de
Investigações de Santa Catarina

Carlos Chagas, secretário de imprensa da Presidência da Repúbli-


ca no governo Costa e Silva, relatou a Ronaldo Costa Couto um episó-
dio que este incluiu em seu livro História indiscreta da ditadura e
da abertura Na manhã do fatídico dia 13 de dezembro de 1968,
quando o Conselho de Segurança Nacional, em sua 43- reunião, deli-
berou sobre o que viria a ser o Ato Institucional nº5, o vice-presiden-
te, Pedro Aleixo, fez encaminhamento contrário ao mesmo: ("A Cons-
tituição tem o remédio para essa crise..."), quando foi interrompido
pelo ministro da Justiça, Gama e Silva: "Mas, Dr. Pedro, o senhor
desconfia das mãos honradas do presidente, aqui presente? É ele que
vai aplicar o ato." A resposta de Pedro Aleixo foi pronta: "Não, minis-
tro, das mãos honradas do presidente eu não desconfio; eu desconfio
é do guarda da esquina."
Três dias depois, já com base no AI-5, a ditadura criou a Comissão
Geral de Investigações - CGI, com o objetivo de investigar casos de
corrupção e de subversão. Em cada estado da Federação era criada,

7 Extraído de <http//www.estado.estadão.com.br> , edição especial/AI5/


ai5l6.html.
Arno Blass

com o mesmo fim, uma Subcomissão Geral de Investigações. Havia


uma semelhança conceituai muito grande entre a CGI e suas subco-
missões com a Seção Especial de Justiça,8 criada pelo Regime de
Vichy, na França ocupada durante a Segunda Guerra Mundial: numa,
como noutra, eram aceitas denúncias anônimas, e as garantias cons-
titucionais eram negadas aos acusados, num duvidoso compromisso
entre a ética e a conveniência do regime.
A Subcomissão - SCGI - de Santa Catarina era integrada pelo Co-
mandante do 5º Distrito Naval (à época sediado em Florianópolis) e
por dois advogados, sob a presidência do oficial militar. Um dos
juristas não aceitou a designação, pelo que nunca veio a assumir,
ficando a Comissão resumida a dois membros. Em determinado mo-
mento, no início de 1969, no interregno entre a saída do contra-
almirante Áttila Franco Aché, que fora reformado, e a chegada de seu
substituto, o contra-almirante Herick Marques Caminha, a SCGI ficou
restrita a um único membro, o advogado João Monim.
Um belo dia, no início de 1969, Stemmer foi chamado ao 5º Dis-
trito Naval pelo contra-almirante Áttila Franco Ache, que comandava
aquela unidade e estava em vias de ser reformado. Recebera uma
denúncia contra Stemmer, em virtude do que lhe pediu responder um
questionário. Não era obrigado, mas lhe ajudaria se o fizesse. O ques-
tionário continha cerca de 20 perguntas. Com que freqüência ia a
Porto Alegre? Por conta de quem? Que bens possuía? Quantas contas
bancárias? Movimentava recursos da EEI? Prestava contas à congrega-
ção? Aplicava dinheiro em letras de câmbio? Fez declaração de bens
ao assumir o cargo? O teor das perguntas permitia intuir a origem da
denúncia.
Em razão do convênio com a UFRGS, Stemmer era obrigado a ir a
Porto Alegre uma que outra vez. Outrossim, tinha ainda interesses

8 Cujo modus operandi é retratado causticamente no filme "Seção Especial de


Justiça" (Section Spéciale), de Costa Gavras, de 1974.
Caspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

pessoais naquela cidade. Em 1968, havia ido duas vezes a Porto Ale-
gre, no início e no fim do ano, por conta da UFSC, com o objetivo de
tratar de assuntos de sua função acadêmica. Outras duas vezes tinha
ido por conta própria, muito embora tenha dedicado bom tempo de
sua estada naquela cidade ao tratamento de assuntos profissionais. A
essas e às demais perguntas, Stemmer respondeu da forma mais do-
cumentada que lhe foi possível, e entregou o questionário respondi-
do diretamente ao comandante. Este disse que iria examinar as res-
postas, mas que Stemmer não se preocupasse: já havia mandado in-
vestigar sua vida privada, verificando que morava em casa alugada,
que tinha um fusca velho que trouxera de Porto Alegre, que não leva-
va vida dissipada.

O guarda da esquina

É possível que Pedro Aleixo - como signatário do Manifesto dos


Mineiros três décadas antes - estivesse, ao opor-se ao AI-5, apenas
falando em tese e expressando suas convicções - que, alguns meses
depois, iriam custar-lhe a Presidência, quando Costa e Silva ficou
incapacitado. Mas fatos posteriores viriam a justificar de sobejo suas
ressalvas.
A história do mundo está repleta de exemplos de que Estados de
exceção têm o efeito de aglutinar desajustados de todos os tipos. Não
foi diferente no Brasil. Assim que o "guarda da esquina" da ocasião
se viu só e com o poder na mão, revelou sua natureza doentia. E, é
claro, não lhe faltaram aqueles outros desajustados, que, escondidos
por trás da proteção do anonimato, se valeram do ensejo para ajusta-
rem contas pessoais.
Muitos profissionais liberais e industriais foram, então, indiciados
e humilhados, com base em evidências circunstanciais. Momm, con-
siderando lesivo ao interesse público o acordo de repasse de um sis-
tema privado de geração de energia elétrica à Celesc, quando da cria-
Arno Blass

ção dessa estatal, indiciou todos os envolvidos. Em decorrência, um


deles, candidato da Arena à Prefeitura de Blumenau, foi declarado
inelegível, o que levou à vitória o candidato do MDB.
Sobre Stemmer, a arbitrariedade pesou também. Alguém o denun-
ciou, aparentemente fornecendo a informação de que aplicava recur-
sos da EEI em letras de câmbio, a fim de protegê-los da inflação.
Estritamente, esse procedimento não era ilegal, mas a ilação contida
na denúncia é que ele estaria embolsando os rendimentos auferidos.
Quem foi esta execranda figura? Oficialmente não se sabe, mas há
indícios de que tenha sido um professor de tempo parcial de gênio
irascível, já falecido, que era, na época, companheiro de trabalho de
Momm numa empresa construtora e que mais tarde se demitiria da
EEI em virtude de uma questiúncula envolvendo horário de aulas.
Certo dia, Stemmer foi chamado à reitoria. Em virtude de viagem
de Ferreira Lima à Europa, o cargo de reitor estava sendo ocupado
pelo Prof. Roberto Mündell de Lacerda. Este mostrou a Stemmer um
documento assinado por Momm, solicitando minuciosa e detalhada
declaração de bens, especificando cerca de 20 itens, como móveis,
jóias, equipamentos domésticos, moventes e semoventes etc. A pri-
meira reação de Stemmer foi a de não responder, mas Lacerda ponde-
rou-lhe que, se assim procedesse, daria a Momm o pretexto para
prendê-lo. Em decorrência disso, Stemmer fez a declaração, incluin-
do até seu cão.
Stemmer, convencido de que estava sofrendo processo de perse-
guição e não uma investigação imparcial, decidiu viajar a Porto Ale-
gre, juntamente com o Prof. José de Espíndola, a fim de conversar
com o Prof. Roberto Medici, professor da Escola de Engenharia da
UFRGS e filho do Gen. Emílio Garrastazu Medici, então comandante
do 3º Exército. Medici levou prontamente o assunto ao conhecimento
de seu pai, que manifestou surpresa por estar o Sr. Momm naquela
função, para a qual havia sido expressamente vetado por ter atuado
ativamente na liberação de um navio com contrabando apreendido
díspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

no porto de Itajaí. O general escreveu um bilhete de próprio punho,


endereçado ao Gen. Álvaro Veiga Lima, chefe do SNI em Florianópo-
lis, solicitando-lhe que acompanhasse o caso. Stemmer, ainda temen-
do ser preso ao retornar, fez diversas cópias xerográficas deste docu-
mento, escondendo-as na bagagem e no carro.
Com o retorno de Stemmer a Florianópolis, o referido documento
foi entregue ao destinatário. No mesmo dia, porém, ao sair da EEI,
Stemmer foi abordado por dois policiais em trajes civis, que o inti-
maram a acompanhá-los. Stemmer ainda conseguiu avisar Nelson Back,
seu vice-diretor, que por ali passava, de que estava sendo preso. Foi
levado ao 52 Distrito Naval, onde um grupo de pessoas, presididas por
João Monim, começou a inquiri-lo. Monim, tendo lembrado, em
altos brados, os podêres da SCGI e salientado que já havia mandado
prender o filho do ex-governador, exigiu que lhe fosse entregue o
bilhete trazido de Porto Alegre. Stemmer argumentou que o destina-
tário do bilhete era outra pessoa e que já o havia entregue. Monim
ordenou que Stemmer fosse revistado. Neste ínterim, o telefone to-
cou; pelo teor da conversa, Stemmer deduziu que fosse o comandante
do 3º Batalhão de Caçadores.9 Após o telefonema, foi liberado.
Momm, em correspondência reservada procedente do Centro de
Informações da Marinha - Cenimar, determinou à Universidade aber-
tura de inquérito contra Stemmer, por motivo de "apropriação indébita,
fraude em concurso etc." (sic!). Roberto M. de Lacerda, como Reitor
em exercício, pediu a Stemmer que se afastasse da direção da EEI, para
que pudesse nomear uma comissão de inquérito, mas este não se sub-
meteu: considerava-se inocente e preferia ver caracterizada a arbitrari-
edade que se cometia contra sua pessoa. As denúncias contra ele levan-
tadas eram de caráter genérico e transferiam ao acusado o ônus da
prova. Outrossim, segundo verificara, inquéritos administrativos só
podiam ser abertos para averiguar denúncias específicas. Varrer três

9 Valho-me aqui, mais uma vez, dos apontamentos de Stemmer.


Arno Blass

anos de movimentações financeiras da EEI e de sua economia pes-


soal, sem saber propriamente o que procurar, era um trabalho insano.
Ante a recusa de Stemmer, Lacerda suspendeu-o por 90 dias, por
portaria reservada. Este detalhe iria gerar toda uma gama de situa-
ções kafkianas dali em diante, como se pode imaginar. Mas a situa-
ção era séria, porquanto Stemmer não tinha idéia do que deveria se
defender. Quando o contra-almirante Herick Marques Caminha assu-
miu o comando do 5º Distrito Naval, Stemmer conseguiu uma au-
diência com o mesmo, da qual participei. Caminha mostrou-se ini-
cialmente ríspido, mas acabou determinando que fossem entregues a
Stemmer os elementos concretos da acusação que sobre ele pesava.
Tratava-se apenas de quatro cheques, mas justamente os de maior
valor que Stemmer havia assinado; precisamente por isso foi fácil
lembrar daquilo a que se referiam, o que tornava a defesa simples e
rápida. O Banco havia informado à SCGI que esses cheques haviam
sido "pagos ao portador, no caixa do banco". Um deles, por exemplo,
referia-se ao pagamento de um conjunto de motores elétricos adqui-
ridos diretamente do fabricante, Eletro-Máquinas ANEL, de São Pau-
lo, com um desconto de 5% pelo pagamento à vista. Como se fazia
naquela época, Stemmer tinha sacado um cheque da conta que movi-
mentava e com ele tinha adquirido um cheque administrativo, de
igual valor, para ser enviado pelo Correio ao fabricante do equipa-
mento. O Banco esquecera de informar à SCGI a segunda parte da
operação. Stemmer elaborou sua defesa, instraindo-a com declara-
ção retificadora do banco, atestado de recebimento dos equipamen-
tos - firmado pelo docente responsável pelo laboratório ao qual os
mesmos tinham sido alocados -, cópia de prestação de contas à agência
que fornecera os recursos - Capes - e cópia de carta da própria Capes
comunicando a aprovação da prestação de contas. Similarmente pro-
cedeu nos outros três casos.
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

Efetivação da justiça

A Comissão de Inquérito da UFSC, integrada por três diretores de


faculdades, inocentou Stemmer de todas as acusações, em virtude do
que Ferreira Lima emitiu, então, longo e detalhado despacho, no
qual afirmava:
Considerando que toda importância assim aplicada, os juros e a
correção monetária foram escriturados e depositados nos bancos
para a aplicação devida;
Considerando que isto prova a lisura e a honestidade do referido
professor, pois como bem acentuou o relatório da Comissão a fls.
419, pelos documentos de fls. 407 a 413, constata-se que todas as
operações foram efetuadas através de diversos bancos e que as im-
portâncias oriundas das aplicações das letras resgatadas, bem como
os juros resultantes, eram todos depositados nos bancos, em contas
específicas da Escola, com coincidências de datas e utilizadas na
execução dos convênios ou para atender despesas conseqüentes e
aquisição de material para uso normal, nas atividades da Escola;
Considerando que não existe dispositivo legal que proíba aplica-
ção de recursos de convênio em letras de câmbio, tanto que outras
entidades públicas assim o fizeram, conforme foi mencionado no
processo;
Considerando que, no caso, a operação foi levada a efeito com
absoluta honestidade e em benefício da Escola, o que está provado
no processo e acentuado no relatório da Comissão;
Considerando tudo que assim foi exposto, o Relatório da Comis-
são e o mais que dos autos consta, e tendo em vista que contra ao
professor Caspar Erich Stemmer, Diretor da Escola de Engenharia
Industrial, nomeado por ato do Excelentíssimo Senhor Presidente
da República para exercer aquele cargo, nada ficou provado de
desabonador, mas, muito pelo contrário, o que este processo o
comprova, exuberantemente, a sua honestidade e o cuidado com
que geriu as importâncias sob sua guarda.
Decido eximi-lo de culpa e determinar o arquivamento do pro-
cesso.
Face a esta decisão, dê-se ciência ao Senhor Contra-Almirante
Herick Marques Caminha, ilustre e digno presidente da Subcomis-
Arno Blass

são Geral de Investigações, e ao denunciado, que face a ela deverá


reassumir o cargo de Diretor, do qual foi afastado na forma da lei,
ao se iniciar este.
Florianópolis, 27 de agosto de 1969.
Esse episódio é referido por Roberto Mediei, no livro em que fala
de seu pai,1" colocando-o como decorrência da queda de braço que
se travava entre Emílio Medici e Jaime Portela:
[...] Nessa ocasião, havia em Florianópolis um senhor chamado,
se a memória não me falha, doutor Mohn (sic), pessoa da confian-
ça do Portela, que perseguia todos aqueles que a sua inteligência
classificava como nocivos à causa de 64.
Quando Stemmer foi por ele ameaçado, relatou-me o que estava
ocorrendo. Levei o assunto ao conhecimento de meu pai, com
meu testemunho do valor desse colega, tanto sob o ponto de vista
do intelectual como do cidadão de conduta irreparável.
Essa queda de braço, [...] impediu que se praticasse uma injus-
tiça contra o brilhante professor [...].
A insólita perseguição empreendida contra Stemmer motivou a
mais completa repulsa por parte daqueles que o conheciam. Muitos
tentaram intervir, na forma que as circunstâncias da época permiti-
am. Alguns correram riscos ao defendê-lo e ao lhe protegerem a inte-
gridade. Nelson Back, seu vice-diretor, foi dele um aliado de grande
valia na encenação da ridícula comédia da suspensão "reservada". Os
alunos apuseram mais de 300 assinaturas - a expressiva maioria dos
alunos da EEI - em documento que lhe prestava solidariedade e apoian-
do-lhe os métodos administrativos. Stemmer respondeu, agradecen-
do a solidariedade e manifestando confiança na justiça, bem como a
esperança de que seus maldosos denunciantes recebessem o castigo
merecido. Cópias dos dois documentos foram afixados no bar da EEI,
de onde foram arrancados por dois indivíduos, que intimaram Stemmer

10 Roberto Nogueira Medici, Mediei, o depoimento, Rio de Janeiro, Mauad,


1995, p. 19.
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

a comparecer à Polícia Federal. O delegado - cujos dois filhos ha-


viam assinado o manifesto dos alunos - quis saber a quem Stemmer
chamava de maldosos. Stemmer respondeu que se soubesse o nome
de seus denunciantes, os levaria à justiça, por crime de calúnia. O
delegado deu-se por satisfeito e decidiu não abrir o inquérito que lhe
fora solicitado por Momm.
Durante todo o episódio, a oposição ficou silenciosa, regozijan-
do-se às ocultas. Nenhum apoio, nenhuma solidariedade prestou. Tudo
no espírito do que, em melhores dias, me foi dito por um de seus
integrantes: "Amigo meu não tem defeitos; inimigo, se não os tiver,
eu ponho".
A DIREÇÃO
DO CENTRO TECNOLÓGICO

A Reforma Universitária

provada a Reforma Universitária da UFSC, através da Lei


nu 64.824, de 15 de julho de 1969, Ferreira Lima tratou,
de imediato de implementá-la. O objetivo era tê-la plena-
^ mente implantada no início do ano letivo de 1970, um ano
antes da data limite que a lei prescrevia e antes das demais universi-
dades brasileiras, o que efetivamente veio a acontecer.
Assim, em dezembro de 1969, foram extintas as faculdades e cria-
dos os centros; foram ainda criadas as sub-reitorias - que depois
vieram a chamar-se pró-reitorias - e os conselhos previstos no corpo
da reforma. Os primeiros sub-reitores, diretores dos centros e inte-
grantes dos conselhos foram designados pro tempore por Ferreira
Lima, tendo seus nomes saído, suponho, de algum consenso entre os
membros do Grupo de Trabalho que planejou a Reforma, então am-
pliado e convertido em Comissão de Implantação da Reforma Univer-
sitária - Ciru.
Assim, a Escola de Engenharia Industrial deixou formalmente de
existir à meia noite de 31 de dezembro de 1969, a partir de quando
passou a existir o Centro Tecnológico - CTC. Stemmer foi designado
diretor desse centro, função que exerceu até abril de 1974. O autor
desta biografia foi designado membro do Conselho de Ensino e Pes-
quisa - CEP, onde ficou até setembro de 1970, quando se afastou
Arno Blass

para o doutoramento. Rodolfo Joaquim Pinto da Luz, hoje reitor da


UFSC já pela terceira vez, era então o representante discente.
O Grupo de Trabalho havia desempenhado bem a tarefa, embora o
resultado fosse suscetível de aperfeiçoamento, mas não procurou obter
aceitação para o mesmo. Pelo contrário, alguns de seus membros
procuraram apresentar-se como novos messias que outorgavam as novas
tábuas da lei, fazendo questão de deixar bem evidenciada sua imposi-
ção inquestionável, manu militari. A forma autoritária como se su-
focava qualquer questionamento não contribuiu, obviamente, para
um adequado entendimento, cujas conseqüências podem ser obser-
vadas até hoje. Ficou marcada como postura cujo entendimento me
escapa, embora a compreenda como característica da época.
Ao CEP cabia regulamentar toda uma série de aspectos da rotina
acadêmica, cujas diretrizes haviam sido estabelecidas na reforma.
Um dos pontos consistia na departamentalização da universidade. O
GT havia elaborado uma lista de departamentos a serem criados em
cada um dos centros. Evidenciando a total negação ao passado, os
departamentos, nessa lista, eram estruturados numa concepção
materiocêntrica. Segundo a mesma lista, o Centro Tecnológico deve-
ria vir a ter 12 departamentos, a maioria dos quais abrigando um
amontoado artificial e exótico de disciplinas - pelo menos para a
dimensão e o nível de desenvolvimento da UFSC naquela época. O
CTC rebelou-se contra tal proposta, sendo eu seu porta-voz no CEP.
Stemmer e um conjunto de professores - notadamente Espíndola e
Valentim - desdobraram-se na busca de argumentos para justificar
uma proposta alternativa, que levei ao CEP. Ela contemplava apenas
cinco departamentos - naquela ocasião -, estruturados numa con-
cepção carreirocêntrica. Consegui que fosse aprovada. Foi, se a me-
mória não me trai, o único revés que se conseguiu impor ao GT.
Hoje, passados mais de 30 anos, os fatos falam por si mesmos. Foi
essa concepção, pelo menos na área de engenharia, que manteve equi-
pes unidas, congregadas na busca de um objetivo comum. Com raras
Caspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

exceções, instituições que optaram por ela, tiveram sucesso; as que


optaram pelo materiocentrismo tiveram dificuldades crônicas, que,
aliás, antevi em meu parecer ao CEP.
Como a Reforma Universitária da UFSC tornou os diretores de cen-
tros figuras virtualmente decorativas, Stemmer ressentiu-se disso. De
uma hora para outra perdeu quase que totalmente sua autonomia.
Mas ele compensou esta situação, transferindo sua energia e iniciati-
va para a Feesc, da qual continuava diretor-presidente, e para o refor-
ço de seus contatos internacionais.
Stemmer retornou a Aachen, entre setembro e dezembro de 1970,
com uma bolsa do Daad para atualização tecnológica. Lá executou
programa centrado nos novos desenvolvimentos em comando numé-
rico de máquinas ferramenta. Coletou material didático, estabeleceu
contatos que eventualmente levariam ao convênio que seria implemen-
tado em 1976, realizou estágios e visitou indústrias e institutos de pes-
quisa. Antes de regressar, já em 1971 e com o suporte do British Council,
passou pela Inglaterra, onde três professores da UFSC faziam doutora-
mento - em Londres, Manchester e Southampton -, visitou-os, intei-
rou-se do andamento dos trabalhos, visitou empresas e outras univer-
sidades. De lá seguiu para o Canadá, os Estados Unidos, o México, o
Peru e a Bolívia, retornando ao Brasil em meados de fevereiro.
Quando se observa de quantas maneiras Stemmer se antecipou à
reforma, cabe perguntar - como já me fiz tantas vezes - por que
motivo ele foi alijado do processo de transformação da UFSC, naque-
le período crítico. Acho que a resposta veio quando da elaboração da
lista sêxtupla para a escolha do próximo reitor da universidade, em
fins de 1971: pessoas interessadas em entrar na lista se coligaram
numa campanha que tinha por objetivo impedir que Stemmer entras-
se no páreo, sob o temor de que, neste caso, ele seria o escolhido,
dadas suas ligações pretéritas com Roberto Medici.
Na verdade, no início Stemmer não estava interessado. Mas melin-
drou-se com as mentiras e as intrigas com que pretendiam afastá-lo.
Arno fites

Decidiu candidatar-se, numa coalizão com os docentes da área médi-


ca. Em clima tenso, todas as seis votações tiveram o mesmo resulta-
do, 11 versus 13, não incluindo o nome de Stemmer na lista.
Entretanto, justiça lhe seria feita anos mais tarde. Rodi Hickel,
seu futuro pró-reitor de Ensino de Graduação, ao falar sobre o tempo
em que Stemmer foi reitor da UFSC, atribui-lhe um papel relevante
no processo de implantação da Reforma Universitária:
Stemmer trouxe para a universidade dinamismo e competência.
Era o reitor de que a universidade necessitava para a consolidação
da Reforma Universitária. [...] Na área do ensino, as primeiras
preocupações do novo reitor traduziram-se em providências para
a melhoria do ensino, certo de que a credibilidade e a consolida-
ção da Reforma Universitária aumentariam na medida em que se
pudesse elevar a qualidade do ensino.1

O mestrado em Engenharia Elétrica1

Ao finalizar o primeiro ano de funcionamento do programa de


Engenharia Mecânica, Stemmer conseguiu convencer Walter Celso de
Lima - que trabalhava na Unicamp e que tinha mestrado pela PUC-RJ
- a transferir-se para Florianópolis. Ele e Hans Helmut Zürn, que
acabava de concluir o mestrado em Houston, começaram a montar o
projeto para o mestrado em engenharia elétrica, ao qual Stemmer, de
imediato, deu encaminhamento. As áreas de concentração (opções)
seriam duas: Eletrotécnica e Controles. Mas, já em 1972, veio a ser
lançada a área de Circuitos.

1 Rodi Hickel, depoimento escrito ao autor, Florianópolis, agosto de 2002.


2 Sirvo-me, aqui, de informações colhidas em entrevistas com Sérgio Roberto
Arruda, Walter Celso de Lima, Hans Helmut Zürn e Luiz Gonzaga de Souza
Fonseca.
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

Criar esse novo curso constituía aventura ainda mais temerária do


que a anterior. O terceiro mestre do curso, Sérgio Roberto Arruda, só
voltaria da Inglaterra em fins de 1970. Polidoro E. de São Thiago
Filho e Dinarte Américo Borba, que estudavam na Coppe, só viriam a
titular-se em 1971, assim como Carlos Inácio Zanchin, que viria a ser
contratado em 1972. A contratação, em início de 1971, de Luiz Gon-
zaga de Souza Fonseca, que tinha acabado de concluir o mestrado na
Coppe, apenas minorava o problema.
Para o referido curso poder começar em 1971, como pretendiam
Stemmer e Lima, teriam de ser contratados professores-visitantes; ou-
trossim, teria de ser tolerado um certo nível de dependência de do-
centes de Engenharia Mecânica. Quando o curso se iniciou, contava
com dois professores-visitantes: Rajamani Doraiswami, indiano, que
aqui permaneceria por quase uma década, e Bahaa Saleh, egípcio,
ambos com doutorado em Johns Hopkins. Ao final do primeiro ano,
pela cooperação francesa, chegou o casal Roger e Nicole Pouliquen,
ele com o mestrado na Universidade de Lavai, no Canadá, ela com o
doutorado em Grenoble. Em 1972, a eles se agregou o indiano Bantval
Vittaldas Baliga, que acabara de se doutorar no Virgínia Polytechnic
Institute. Em compensação, Hans Zürn afastou-se para doutoramento
ainda no decorrer de 1971.
O curso começou, no dizer dos professores fundadores, aprovei-
tando algumas migalhas que caíam do Funtec da Engenharia Mecâni-
ca. Mas, logo em seguida foi aprovado o Funtec nº 114, que concedia
recursos no valor atualizado de R$ 1,6 milhões para o Programa de
Engenharia Elétrica.3 O reconhecimento como centro de excelência
em Engenharia Elétrica veio cedo: Processo 10.622/70, do CNPq.

3 Amílcar Figueira Ferrari, depoimento escrito ao autor, agosto de 2002.


Arno Blass

O mestrado em Engenharia Industrial

Quando da criação do mestrado em Engenharia Mecânica, em


1969, duas das cinco áreas de concentração - opções - eram a Indus-
trial e a de Produção. Mas, desde o início, ficou evidenciada a dico-
tomia entre estas e as demais áreas. Assim é que, já em 1972, o
primeiro catálogo de pós-graduação da UFSC mencionava, entre os
cursos arrolados, o de Engenharia Mecânica-Industrial. Mas em 1973
foi formalizada a separação definitiva dos dois cursos. Foi criado o
Programa de Pós-Graduação em Engenharia Industrial, com três áreas
de concentração: Industrial, Produção e Pesquisa Operacional - as
duas primeiras desmembradas do Programa de Engenharia Mecâni-
ca; a terceira, nova.
No corpo docente estavam Raul Valentim da Silva, Adalberto José
Ramos Campelli, Crenilde Rodrigues Campelli e Clávio Coutinho Fi-
lho, todos com o mestrado e já veteranos, porquanto haviam milita-
do no Programa de Engenharia Mecânica desde sua criação, em 1969.
A eles se agregaram então Antônio Diomário de Queiroz, doutor do 3a
ciclo, que bem mais tarde viria a ser reitor da UFSC, e os primeiros
mestres da casa, nas duas áreas de concentração específicas: Leonar-
do Ensslin, Otávio Ferrari Filho, Márcio Nei Ferrari, Amauri Beck e
Paulo Renécio Nascimento. Já nesse primeiro ano, o programa foi
agraciado com um contrato Funtec.4

A expansão da pós-graduação
para além do Centro Tecnológico

Com projetos elaborados em 1971, começaram a funcionar, no


segundo semestre desse mesmo ano, os primeiros cursos de pós-gra-
duação da UFSC fora dos limites do Centro Tecnológico. Foram três

4 Funtec nº 214, num montante atualizado equivalente a R$ 2 milhões.


Caspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

os cursos criados: Odontologia - Odontopediatria, Físico-Química e


Letras - Lingüística. Na sub-reitoria de Ensino e Pesquisa, a coorde-
nação-geral de pós-graduação foi assumida, em 1972, por Walter Celso
de Lima, que para lá levou a experiência já adquirida no Centro Tec-
nológico. Alguns dos cursos criados listavam, em seu rol de docentes,
nomes vinculados aos programas de engenharia. No curso de Físico-
Química, por exemplo, oito dos onze docentes listados no catálogo
de 1972 pertenciam aos quadros dos cursos do CTC; no catálogo de
1973, este número caiu para quatro entre onze.

Realização e resultados do
Simpósio Nacional de Engenharia Mecânica

Em fins de 1970, a pós-graduação em Engenharia Mecânica da


UFSC já havia produzido seus primeiros mestres. Então Stemmer que-
ria que a comunidade da área soubesse desse fato e os conhecesse.
Começou a organizar, para julho do ano seguinte, um evento a que
chamou de 1º Simpósio Brasileiro de Engenharia Mecânica. Convidou
personalidades e conseguiu reunir pouco mais de uma dúzia de tra-
balhos. Não foram publicados anais, nem houve avaliação prévia dos
trabalhos. Mas o evento serviu para congregar a nata dos acadêmicos
da área e suscitou discussões sobre problemas comuns.
Nasceu dele a idéia de oficializar aquele evento, oferecendo-lhe
uma periodicidade e dando-lhe características comparáveis às dos
melhores congressos internacionais da área, isto é: um corpo de referees
para assegurar o nível qualitativo dos trabalhos, requisito essencial
para atrair autores estrangeiros e para conferir respeitabilidade ao
evento; publicação de anais; presença de conferencistas convidados.
O evento seria realizado a cada dois anos, com a designação de Con-
gresso Brasileiro de Engenharia Mecânica - Cobem; em homenagem
à iniciativa de Stemmer, o Simpósio passaria a ser conhecido como o
1º Cobem. O evento seria realizado nos anos ímpares, ficando a Coppe,
Arno Blass

desde logo, encarregada de realizar o 2º Cobem, em novembro de


1973.
O Cobem logo veio a se tornar o mais importante evento da área
da Engenharia Mecânica no país, tanto que as estatísticas revelam um
crescimento exponencial no número de trabalhos submetidos e de
participantes, a cada nova edição. Em 2001, o 16a Cobem, realizado
em Uberlândia, concentrou-se na temática "Engenharia para o novo
milênio".
O compromisso da classe com este novo evento mostrou logo a
necessidade da existência de uma associação que congregasse, de for-
ma sistemática, todos os interessados no desenvolvimento da área.
Em abril de 1975, em Campinas, um grupo de cerca de 30 represen-
tantes dos cursos de pós-graduação e dos melhores cursos de gradua-
ção em Engenharia Mecânica, além de um reduzido número de re-
presentantes de empresas, fundou a Associação Brasileira de Ciências
Mecânicas - ABCM, primeira Sociedade Científica Brasileira na área.
A ABCM supervisionaria doravante a realização dos Cobem e deveria,
oportunamente, vir a editar uma revista científica: Revista Brasileira
de Ciências Mecânicas, que começou a circular em 1979.
Hoje a ABCM tem mais de 900 associados, e a revista, agora
indexada, passou a chamar-se Journal of the Brazilian Society of
Mechanical Sciences. Em virtude do porte alcançado pelo Cobem, a
ABCM foi progressivamente criando eventos setoriais, alternativos ou
especializados. O primeiro deles foi o Simpósio Brasileiro de Tubula-
ções e Vasos de Pressão - Sibrat, iniciado em 1980, durante minha
gestão na presidência da ABCM. Subseqüentemente, surgiram o En-
contro Nacional de Ciências Térmicas - Encit, o Simpósio sobre Pro-
blemas Dinâmicos em Mecânica - Diname, o Congresso Nacional de
Engenharia Mecânica - Conem, realizado nos anos pares, o Int. Conf.
On Nonlinear Dynamics, Chaos and Control - Iconne, assumido
pela ABCM, em 1993, e o Congresso Nacional de Estudantes de Enge-
nharia Mecânica - Crêem.
Caspar Brich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

Diz Luiz Bevilacqua, um dos conferencistas do Simpósio de 1971,


que mais tarde veio a ser Presidente da ABCM:
Foi devido ao entusiasmo do professor Stemmer e de sua insistên-
cia e otimismo que tivemos a ousadia de convocar dois anos de-
pois um novo evento, que foi chamado de Congresso Brasileiro de
Engenharia Mecânica, e que desde então se realiza sem interrup-
ção a cada dois anos. [...] O Cobem foi em seguida a semente para
a criação da ABCM, que permanece firme até hoje. [...] O profes-
sor Stemmer foi um dos entusiasmados líderes de todas essas ações
no campo da engenharia mecânica no Brasil, e muitas vezes atuou
sem se preocupar em aparecer ou ganhar prestígio com as várias
iniciativas de que foi participante ativo e, muitas vezes, decisivo.5

Stemmer é hoje Sócio Honorário da ABCM.

O Convênio UFSC - Aachen


A idéia de um convênio de cooperação entre a RWTH Aachen e a
UFSC, beneficiando o Departamento de Engenharia Mecânica do Cen-
tro Tecnológico, começou a ser aventada durante a visita que Stemmer
fez a sua antiga escola, em 1970. Como áreas de interesse imediato
para essa cooperação foram definidas as de Processos de Fabricação,
Organização Industrial - abrindo, assim, a possibilidade para que
também o Departamento de Engenharia de Produção pudesse vir a
ser beneficiado - e Automatização, que, mais tarde, viria a contem-
plar também a área de Metrologia.
Aachen tinha certamente muito a oferecer à UFSC. Mas não di-
nheiro. Entretanto, havia um acordo de cooperação técnica firmado
entre os governos do Brasil e da República Federal Alemã, com um
dispositivo que permitia repassar dinheiro, através da Gesellschaft
für Technische Zusammenarbeit (Sociedade Alemã de Cooperação

5 Luiz Bevilacqua, depoimento escrito ao autor, setembro de 2002.


Arno Blass

Técnica) - GTZ, subordinada ao Bundesministerium für die


Zusammenarbeit (Ministério da Cooperação Econômica) - BMZ.
Stemmer já estivera no BMZ procurando informar-se, mas o acordo
exigia uma contraparte do Brasil. À época, quem prestava esta contra-
partida era a Secretaria de Cooperação Técnica Econômica Interna-
cional - Subin, hoje Agência Brasileira de Cooperação - ABC do Mi-
nistério das Relações Exteriores.
Stemmer percorreu todas as instâncias. Conseguiu que um convê-
nio de parceria entre a UFSC e a RWTH Aachen fosse ancorado ao
acordo de cooperação Brasil-Alemanha Ocidental, na forma de ajuste
complementar. Conseguiu definir um programa a ser executado ao
longo de um qüinqüênio. A GTZ disponibilizava recursos que, no
final, passariam dos 7 milhões de marcos alemães e que cobririam a
aquisição de uma lista definida de equipamentos, a vinda de diversos
professores-visitantes, alguns para uma longa permanência - um mí-
nimo dois anos - em Florianópolis, outros para períodos curtos -
poucos meses. Quatro docentes do Departamento de Engenharia Me-
cânica da UFSC fariam seu doutorado em Aachen, com bolsas forneci-
das pelo Daad. A Subin entraria com recursos no montante histórico
de pouco mais de Cr$ 3 milhões, para a cobertura de despesas de
frete, alfândega e custeios diversos, bem como para a contratação de
pessoal técnico.''
Mas Stemmer não conseguiu que Lacerda, então reitor da UFSC,
firmasse o convênio com a RWTH Aachen. Isso só veio a ocorrer em
1976, quando ele mesmo assumiu a reitoria. Só então é que os recur-
sos começariam a fluir.

6 Jornal Universitário, "Cooperação científica com a Alemanha", Florianópo-


lis, Vol. 1, n. 7, abr 1977, p. 11.
Caspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

A nova sistemática de estágios:


O Curso Integrado7

De vez que a primeira programação de estágios - introduzida por


Stemmer, em 1966 - tinha sido inviabilizada pela Reforma Universi-
tária, propôs ele, em 1973, exclusivamente para o curso de Engenha-
ria Mecânica, uma solução alternativa, calcada nos cursos "sanduí-
che" que observara na Alemanha: o estudante passaria alternadamente
um semestre na escola, outro em alguma empresa. A proposta, pelo
menos como originalmente formulada, não vingou. Os técnicos da
sub-reitoria de Ensino e Pesquisa objetaram. Mais uma vez, configu-
rou-se um conflito com a Reforma Universitária. Outrossim, havia
ressalvas quanto ao elevado tempo de estágio; ainda, ao aprovar um
currículo alternando semestres no ambiente escolar e na empresa, a
universidade estaria comprometendo-se a conseguir esses estágios para
seus alunos, o que seria por demais arriscado.
A discussão levou todo um ano. Stemmer argumentava que sua
proposta objetivava criar maior aproximação entre a escola e o meio
industrial, estabelecendo um comprometimento da parte das empre-
sas. Afinal, chegou-se a uma solução de compromisso. Quando o
Instituto Euvaldo Lodi - IEL estabeleceu sua sucursal em Santa Catari-
na, junto à Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina,
Hamilton Savi foi chamado para dirigi-la. Através do IEL-SC, Savi con-
seguiu sensibilizar o meio empresarial, que deu seu apoio a uma
nova proposta formulada por Stemmer e Edemar Antonini, na qual o
estágio profissional obrigatório ficava concentrado em um único se-
mestre letivo. Para que o aluno não chegasse às indústrias excessiva-
mente carente de conhecimentos de engenharia, tal semestre deveria

7 Sirvo-me, aqui, de material colhido em entrevista com o Prof. Edemar Soares


Antonini, a quem coube implantar essa nova sistemática e gerenciá-la durante
quase uma década.
Arno Blass

ficar mais próximo do fim do curso. Contudo, pretendia-se evitar a


situação então existente nas escolas técnicas federais, cujos alunos
realizavam prolongado estágio depois de se formarem, ficando vir-
tualmente sem acompanhamento por parte da escola.
Pretendia-se que a Coordenadoria de estágios mobilizasse docen-
tes do Departamento de Engenharia Mecânica para fazerem a supervi-
são dos estágios dos alunos do curso de Engenharia Mecânica. Esse
procedimento tinha dupla finalidade: assegurar que todas as empre-
sas que oferecessem vagas para estágios dessem razoavelmente a mes-
ma atenção e o mesmo acompanhamento ao estagiário; e permitir
que os docentes se familiarizassem com as rotinas industriais e com
novos equipamentos e, dessa atividade de supervisão, colhessem sub-
sídios e exemplos para suas aulas. Assim, definiu-se o nono - penúl-
timo - semestre do curso como aquele em que os alunos realizariam
seu estágio supervisionado, considerado parte integrante do currícu-
lo do curso. E para assegurar que assim fosse feito, o estágio consti-
tuía pré-requisito para uma disciplina do décimo semestre.8
Paralelamente, foram desenvolvidos esforços para manter, tanto
quanto possível, a antiga programação de estágios fundamentais, mas
ela acabou sendo progressivamente abandonada, mormente em razão
da indisponibilidade de recursos para custeá-la. Estágios prévios de
curta duração, realizados em indústrias, têm sido sempre estimula-
dos e intermediados pela Coordenação de Estágios.
O Curso Integrado, com o estágio supervisionado, funcionou mui-
to bem desde o início, particularmente em razão da estreita colabo-
ração entre Savi, no IEL, e Antonini, no CTC. O MEC interessou-se
pela iniciativa, tanto assim que forneceu, durante três semestres, re-
cursos para custeá-la - na UFSC e em três outras instituições selecio-

8 Lamentavelmente, esta prática veio a ser rompida duas décadas depois, sendo
hoje freqüentes os casos de alunos que realizam o estágio supervisionado após
terem cursado todas as disciplinas do curso.
Caspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

nadas - e para divulgá-la. Depois disso, o Departamento de Engenha-


ria Mecânica a custeou durante algum tempo. Posteriormente, as in-
dústrias passaram a fazê-lo, repassando recursos à Feesc.9

O Núcleo de Processamento de Dados da UFSC

No bojo dos novos Estatuto e Regimento da UFSC, decorrentes da


implantação da Reforma Universitária, o Núcleo de Processamento
de Dados, que abrigava o modesto computador IBM 1130, com 16Kb
de memória e seus periféricos, tornou-se um dos órgãos suplementa-
res da universidade. Stemmer conseguiu, junto ao Funtec, em 1970,
um auxílio complementar de Cr$ 1,2 milhões, para ampliar a memó-
ria desse computador para 64 kB e para adquirir mais alguns perifé-
ricos, entre os quais uma leitora/perfuradora de cartões, para facili-
tar a correção de provas internas e do vestibular. Mas os especialistas
opinaram que não valia a pena investir nesse sentido: a máxima ex-
pansão permitida seria já insuficiente; além disso, o computador es-
tava em vias de sair de linha.
A IBM propôs que a UFSC adquirisse o novo modelo 370/40, que
custava Cr$ 3 milhões, argumentando que a diferença em relação ao
dinheiro de que Stemmer dispunha poderia ser levantada pela venda
de serviços de computação, ao longo dos próximos anos. Como, na-
quele momento, a lista sêxtupla para a escolha do novo reitor estava
em Brasília, Stemmer promoveu uma reunião com todos os que a

9 É interessante mencionar que o curso de Engenharia de Materiais da UFSC,


criado bem mais recentemente, já no final do milênio, resgatou, com modifi-
cações, a idéia original de Stemmer. Funciona com um calendário especial,
em que os alunos alternam períodos na escola com períodos em indústrias,
segundo um modelo já experimentado na Universidade de Waterloo, no Cana-
dá. A supervisão - sistemática e eficiente - é realizada pelo Prof. Berend
Snoeijer. As despesas decorrentes são cobertas pelas empresas que recebem os
estagiários.
Arno Blass

integravam e expôs a situação. Todos se manifestaram favoráveis à


idéia da aquisição do 370/40, o mais potente, moderno e adequado
às crescentes necessidades de computação da universidade. Mas, quan-
do Roberto Lacerda foi nomeado e assumiu a reitoria, decidiu que o
assunto sairia do âmbito do Centro Tecnológico. Na verdade, nenhu-
ma decisão sobre o assunto seria tomada, até que o MEC propusesse
um programa de remanejamento de computadores entre as universi-
dades federais: a UFMA, que ainda não tinha computador, receberia o
velho 1130 da UFSC; esta receberia o 360/40 - mais limitado do que
o 370/40 - da UFMG, que receberia um maior. Mas, como havia
necessidade de adquirir periféricos para o 360/40, Lacerda hesitou; a
UFMG, por seu turno, relutava em entregar o computador. A substi-
tuição do velho 1130 só viria a ocorrer bem mais tarde, quando
Stemmer chegou à reitoria.
O DOCENTE STEMMER

temmer lecionou cinco disciplinas durante sua vida acadê-


mica. Na UFRGS implantou a disciplina Construção de Má-
quinas, que ministrou durante seis anos, entre 1959 e 1964,
procurando compensar notórias lacunas do currículo de Engenharia
Mecânica, que se praticava em Porto Alegre à época. Fazia incursões
em conteúdos a rigor alheios, mas essenciais, à disciplina ou à boa
formação do profissional de Engenharia Mecânica e ausentes do cur-
rículo. Como se amparava fortemente na literatura alemã, desconhe-
cida da grande maioria dos alunos, logo preparou um conjunto de
apostilas que, eventualmente, vieram a constituir capítulos de seu
primeiro livro.'
Em 1964, como parte do convênio de cooperação entre a UFRGS e
a UFSC, Stemmer implantou a disciplina Vibrações Mecânicas, da
terceira série do Curso de Engenharia Mecânica. Como a disciplina
que ministrava em Porto Alegre, trata-se de disciplina relacionada
com o projeto mecânico, fortemente embasada nas chamadas Ciên-
cias de Engenharia e na Matemática. Stemmer buscava motivar o alu-
no buscando situações práticas em que o conteúdo desta disciplina se
tornava relevante. Entretanto, uma vez criada a motivação, ele se
mostrava perfeitamente à vontade na instituição de um modelo de
análise, na formulação matemática e na solução do problema.

1 Cuspar Krich Stemmer, Projeto e construção de máquinas, Porto Alegre,


Globo, 1980.
Arno fito»

A partir de 1965, a atividade docente de Stemmer apresenta uma


ruptura radical com sua atuação anterior. Passou a ministrar discipli-
nas de cunho estritamente tecnológico, relacionadas com os Proces-
sos de Fabricação. Entre 1965 e 1974, foi o responsável pela discipli-
na Máquinas Operatrizes. Durante os primeiros dois anos, fui seu
auxiliar nesta disciplina; em 1967 foi admitido Áureo Campos Ferrei-
ra, que nela atuou até afastar-se para doutoramento no Canadá. Acre-
dito, sinceramente, que foi precisamente nesta disciplina, no final do
ano letivo de 1965, que se falou pela primeira vez em Controle Numé-
rico de Máquinas-Ferramenta numa universidade brasileira. Os ru-
mos tomados pela evolução da nova tecnologia fizeram com que os
atuantes da área preferissem, a partir de certo momento, usar a de-
signação Comando Numérico. Mas o detalhe importante é que, no
longínquo 1965, Stemmer tinha estabelecido uma associação mar-
cante entre a Engenharia Mecânica da UFSC e o estudo do Desenvolvi-
mento do Controle e do Comando Numérico, no Brasil. Quando se
criou a Sociedade Brasileira de Comando Numérico - Sobracon, em
1979, lá estava o pessoal da UFSC, e Stemmer como presidente do
Conselho Consultivo - até 1994 -, marcando a liderança estabelecida
em 1965.
Não é por outra razão que, ao ser criado o Programa de Pós-
Graduação em Engenharia Mecânica, o nome de Stemmer figurasse
no corpo docente, ministrando, desde a primeira turma, e até 1974,
a disciplina Controle Numérico de Máquinas Ferramenta.
Stemmer, ao término de seu mandato como reitor da UFSC, em
maio de 1980, retornou à atividade docente em seu departamento.
Em virtude de uma reforma efetuada no currículo do curso de Enge-
nharia Mecânica, Stemmer veio a ministrar a disciplina Processos de
Fabricação I, versão compactada da antiga disciplina de Máquinas
Operatrizes, o que fez até 1988 - exceto no primeiro semestre de
1987 -, quando passou a assumir uma série de cargos externos à
UFSC. Voltou a ministrar essa disciplina entre 1992 e 1994.
Caspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

De seu trabalho nessas duas disciplinas, resultaram mais dois ex-


celentes livros-texto, que foram publicados pela Editora da UFSC, em
sua "Série Didática". 0 primeiro deles,2 tratando da ferramenta sim-
ples de corte, a ferramenta de tornear, obteve repercussão nacional, e
é adotado em muitas escolas de Engenharia do país. Já se encontra na
quinta edição. Nele, Stemmer assume postura clara de obediência às
premissas estabelecidas para o estudo unificado das ferramentas de
corte, que caracterizam as normas DIN e ISO. Em decorrência, faz a
crítica das normas brasileiras para ferramentas de corte, que nem
sempre observam as mencionadas premissas, dando margem a con-
flitos de universalidade e lógica nos conceitos geométricos. Por essa
razão, diz-se forçado a usar terminologia própria, que justifica, por
vezes detalhadamente, em cada caso. O segundo,3 tratando das ferra-
mentas especiais, constitui uma publicação ímpar no mercado edito-
rial brasileiro. Mas encontra clientela sensivelmente menor, tendo
tido duas edições até o momento.
Stemmer, em suas aulas, assim como em seus livros, mostra preo-
cupação constante pela questão do estabelecimento de uma termino-
logia nacional. Não lhe agrada o mero aportuguesamento de termos
estrangeiros, que parece ter-se tornado a regra em nossos dias. Antes
de aceitar um "escanear" ou "deletar", prefere pensar se já não existe
algum termo em língua portuguesa que possa exprimir o conceito
envolvido. Por exemplo, quando se começou a falar num processo de
usinagem de acabamento designado, nos Estados Unidos, como
shaving, Stemmer logo compreendeu que essa designação inglesa
refletia a analogia que se podia estabelecer entre o referido processo
e o ato de barbear: em ambos, uma ferramenta desliza, sob abundan-

2 Caspar Erich Stemmer, Ferramentas de corte I, Florianópolis, Editora da


UFSC, "Série Didática", 1987.
3 Caspar Erich Stemmer, Ferramentas de corte II, Florianópolis, Editora da
UFSC, "Série Didática", 1992.
Arno Blass

te lubrificação, sobre a superfície da peça - rosto - para remover


diminutas porções de material. Propôs, então, mantendo a mesma
analogia, que o processo fosse designado, em português, como
"escanhoado". Terminologia adequada facilita o próprio estudo do
processo: uma idéia, mesmo que idealizada, do que o processo faz, já
se encontra embutida no nome, por efeito de analogia lingüística.
Entretanto, em empresas do parque industrial paulista, ouve-se com
freqüência designar esse processo pela palavra "cheivamento"...
Stemmer, embora se preocupe menos com pesquisa do que com o
desenvolvimento tecnológico, sabe compreender e valorizar o traba-
lho dos pesquisadores. Ele sabe, também, avaliar e julgar o mérito de
trabalhos. Mesmo tendo deixado de ministrar aulas na pós-gradua-
ção, seu nome continuou sendo esporadicamente lembrado para in-
tegrar bancas examinadoras. Sua participação, nestas oportunidades,
primava pela pertinência de suas intervenções, tanto pelas perguntas
que fazia ao candidato, quanto pelos comentários e sugestões sobre o
trabalho em si e sobre sua forma de apresentação.
Esse mesmo zelo formal, ele o demonstrou de sobejo ao coorde-
nar - de 1966 até meados da década de 1970 - a coleção "Polígono
da Técnica Mecânica," um conjunto de traduções de livros técnicos
de Engenharia Mecânica de diversas editoras alemãs, que alcançou
pouco mais de uma dezena de títulos, que foram publicados pela
Editora Polígono, de São Paulo, uma subsidiária da conhecida Livra-
ria Triângulo, que, entretanto, viria posteriormente a fechar. O pró-
prio Stemmer traduziu três títulos4 para a referida coleção, eu traduzi
dois, e vários professores de Engenharia Mecânica da UFSC participa-

4 Hans Schmidt, Medições de comprimentos, São Paulo, Polígono, coleção


"Polígono da Técnica Mecânica", s/d; II. Rognitz, Variadores escalonados
de velocidade em máquinas ferramenta, São Paulo, Polígono; coleção
"Polígono da Técnica Mecânica", 1973; H. Mauri, Construção de disposi-
tivos I, II e III, São Paulo, Polígono; coleção "Polígono da Técnica Mecâ-
nica", 1972.
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

ram do programa, além de outros. Stemmer selecionava os títulos e


procurava tradutores para os mesmos. Na primeira tradução, que fiz
em 1966, lembro-me de que ele acompanhava meu trabalho e, ao
invés de criticar minhas imperfeições, socraticamente me fazia per-
guntas que me faziam cair em mim e refazer determinados trechos.
Ao longo dos anos, Stemmer tem publicado artigos de atualização
do estado da arte de aspectos específicos ou gerais de Usinagem e
Organização Industrial. Eles têm sido acolhidos em revistas variadas,
como Werkstatt und Betrieb, Máquinas eFerramentas, Movimento
e Armazenagem, Mundo Mecânico e o Boletim da Sobracon.
O CEPES/PREMESU

uando, em março de 1974, Ernesto Geisel assumiu a Pre-


sidência da República, cogitava-se que Stemmer poderia
vir a ocupar algum cargo federal. Lynaldo Cavalcanti de
Albuquerque, que fora diretor-adjunto do Departamento de Assuntos
Universitários - DAU do MEC no governo anterior, já o havia apresen-
tado a Heitor Gurgulino de Souza, diretor geral, que lhe fizera um
convite para trabalhar em Brasília. Stemmer declinara do convite;
Lynaldo acabou levando Lauro Zimmer e Rodolfo Joaquim Pinto da
Luz, ambos de Florianópolis.
Quando Gurgulino passou o cargo para Edson Machado de Sousa,
Lynaldo voltou a mencionar o nome de Stemmer, que foi convocado a
Brasília, juntamente com Darcy Closs, do Rio Grande do Sul: Edson
Machado precisava definir, com urgência, os novos diretores da Capes
e do Cepes. Closs precisava de algum tempo para se desvencilhar de
seus encargos no Rio Grande do Sul; a direção da Comissão Especial
para Execução do Plano de Melhoramento e Expansão do Ensino Su-
perior - Cepes precisava ser preenchida com a máxima urgência. O
órgão - que lidava com máquinas e equipamentos - ainda estava no
Rio de Janeiro e deveria transferir-se para Brasília.
Stemmer retornou, passando pelo Rio de Janeiro e visitando o
Cepes, que estava instalado no 13º andar do Palácio da Cultura - a
antiga sede do MEC no Rio de Janeiro - projetada no estilo Le Corbusier.
Tinha cerca de 50 funcionários. Administrava convênios internacio-
nais com a República Democrática Alemã - RDA, a antiga Alemanha
Oriental - US$ 40 milhões -, com a Hungria - US$ 20 milhões - e
Arno Blass

com o Banco Interamericano de Desenvolvimento - BID - também


US$ 20 milhões. Edson Machado faz este relato:
Um dos grandes desafios que tínhamos pela frente era a revisão e a
melhoria das ações do ministério nas áreas de aquisição de equi-
pamentos e de investimentos na construção e melhoria das instala-
ções físicas dos campi das universidades federais. Vários progra-
mas de cooperação internacional nessas áreas já estavam em an-
damento, especialmente acordos para a aquisição de equipamen-
tos, valendo-se das trocas comerciais entre o Brasil e os países da
Europa Oriental - RDA, Hungria, Polônia - e um financiamento do
BID para a construção de novas instalações físicas. Desde logo,
constatamos que esses programas não tinham qualquer orienta-
ção geral, os projetos individuais das Ifes não eram analisados com
base em critérios e parâmetros que assegurassem o atendimento
das reais e mais urgentes necessidades dos programas de ensino e
pesquisa.
Devido a sua experiência na UFSC, especialmente como diretor
do seu Centro Tecnológico, Stemmer foi convidado a assumir a
Coordenação do Programa de Expansão e Melhoramento das Ins-
talações do Ensino Superior - Premesu, que viria a se tornar um
dos mais importantes programas do MEC para o ensino superior.1
Stemmer aceitou o convite e instalou-se no Rio de Janeiro. Sua
primeira tarefa foi a de reestruturar - segundo proposta do DAU - o
órgão, que passaria a ser o Premesu, ao ensejo do processo de mu-
dança para Brasília. Ele foi buscar Teodoro Rogério Vahl e Sérgio
Gargioni, em Florianópolis, para serem seus auxiliares. Rogério Vahl,
por seu turno, selecionou quatro alunos do curso de Administração
para integrarem a equipe em Brasília, uma vez que muitos funcioná-
rios do Rio de Janeiro não queriam transferir-se para lá. A tarefa
inicial do grupo era a de motivar os funcionários mais dedicados e
experimentados, resolver os problemas da transferência, encontrar
espaço físico em Brasília e fazer as necessárias adaptações.

1 Edson Machado de Sousa, depoimento escrito ao autor, setembro de 2002.


Caspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

Em setembro de 1974, Stemmer visitou a Alemanha Oriental e a


Hungria, juntamente com seu gerente de equipamentos, Sérgio
Gargioni. Visitaram as fábricas dos equipamentos que estavam sendo
distribuídos às universidades brasileiras. Na volta, passaram pela Po-
lônia, Estados Unidos e Guatemala.
Edson Machado resume assim o que foi a passagem de Stemmer
pelo Premesu:
Stemmer realizou ali uma das mais significativas tarefas a que se
impôs: botar ordem em ações que vinham se realizando de manei-
ra desorganizada e acrítica, com evidentes prejuízos para o país e
para as instituições federais de ensino superior.2

Os convênios do café

O Brasil possuía créditos comerciais com países do leste europeu,


mas os antigos países comunistas sentiam dificuldade em negociar
com empresas privadas, preferindo fazê-lo com o governo brasileiro.
O Brasil iria importar material ferroviário, mas Tarso Dutra, quando
ministro da Educação, conseguiu que parte dos recursos fosse desti-
nada ao reequipamento das universidades brasileiras.
A fim de acelerar o processo, as universidades foram visitadas por
um representante do Ministério do Comércio da RDA e por um repre-
sentante de uma firma brasileira. Procuravam os docentes responsá-
veis por laboratórios, comunicavam-lhes que sua universidade havia
sido aquinhoada pelo MEC com tantos US$ milhões de equipamen-
tos, bastando que elaborassem uma lista do que desejavam. Tal libe-
ralidade não era costumeira, fazendo com que alguns a encarassem
com ceticismo; outros, por sua vez, não estavam acostumados a espe-
cificar equipamentos. Mas os visitantes exibiam catálogos e insistiam
em que algo fosse escolhido. E aí começaram os problemas. Houve

2 Edson Machado de Sousa, op. cit.


Arno fites

casos de docentes que simplesmente pediam uma unidade de cada


item do catálogo, sem saber propriamente o que iriam fazer com ela.
Num caso, tendo a soma dos pedidos ficado muito aquém da cota
mencionada, alguém simplesmente alterou o pedido de uma guilho-
tina, do modelo 50 para o modelo 2.500. Em termos práticos, a
encomenda passou de uma pequena máquina com fins didáticos para
uma guilhotina de 42 toneladas, capaz de cortar chapas de uma pole-
gada de espessura por três metros de comprimento, num corte dire-
to... Quando os equipamentos começaram a chegar, muitos não sa-
biam o que fazer com aquilo.
O desafio proposto a Stemmer era, portanto, o de pôr ordem na
casa: verificar o que poderia ser feito com os equipamentos que não
serviam para o ensino ou para a pesquisa e redirecionar equipamen-
tos que, mesmo que servindo para estas finalidades, houvessem sido
originalmente solicitados por instituições que, na verdade, não ti-
nham aplicação para os mesmos.
Em relatório ao DAU, Stemmer sugeriu que equipamentos sem
utilidade para o ensino ou a pesquisa fossem vendidos. A Procurado-
ria Jurídica alertou que bens públicos só podiam ser vendidos me-
diante autorização do Congresso e do Executivo. Stemmer oficiou ao
Gabinete Civil da Presidência da República; no fim de um mês, rece-
beu a resposta de que um pedido de autorização ao Congresso era
inviável, de vez que a oposição certamente transformaria em cavalo
de batalha as compras mal feitas. Mas a UFSC - lembrava-se Stemmer
- havia alienado carros velhos. Procurou saber como. A Assessoria
Jurídica da UFSC informou: com a justificativa da inutilidade dos
bens para o órgão, o processo de venda era possível, mediante autori-
zação superior, sendo empregadas as mesmas modalidades de opera-
ção usadas na compra; outrossim, também o leilão era possível. O
Decreto-Lei 200, que estava vigente à época, explicava tudo.
Sem saber como proceder para realizar um leilão, Stemmer optou
pela concorrência. Fixou como valor mínimo aquele pelo qual cada
Caspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

bem fora adquirido, mais um adicional de 10% para as despesas de


transporte. Os interessados deveriam apresentar propostas em enve-
lopes lacrados. Tudo correu bem. A guilhotina industrial teve seu
preço mínimo fixado em Cr$ 250 mil e foi vendida por Cr$ 320 mil.
Seus adquirentes foram assediados com propostas de até Cr$ 500 mil
pela máquina. Stemmer lamentou não ter feito o leilão.
A segunda situação gerou uma série de episódios folclóricos. Num
caso, Stemmer enviou Jaroslav Kozel - o professor-visitante que trou-
xera da Tchecoslováquia e que se radicara em Florianópolis -, por ser
ele especialista em Metrologia, a Goiás. A UFG havia recebido grande
quantidade de máquinas-ferramenta de grande capacidade, além de
um completo laboratório de Metrologia de alta precisão. Estava tudo
encaixotado e armazenado em duas salas, atulhadas até o teto. De um
lado, milhares de dólares em equipamentos encaixotados e sem uso;
de outro, laboratórios ocupados, numa instituição que estava carente
de espaço físico. Em Goiás, deixaram Kozel esperando, enquanto o
reitor telefonava para o ministério, onde falou com o chefe de gabi-
nete, Dr. Direito: só sobre o cadáver dele é que remanejariam equipa-
mentos "para Santa Catarina". Kozel teve de retornar a Florianópolis
sem realizar o trabalho para o qual fora enviado, que consistia em
determinar quais equipamentos poderiam ou não servir à UFG.
Passados alguns dias, o reitor da UFG visitou Stemmer: precisava
dos equipamentos, pois iria criar um curso de Metalurgia. Stemmer
teve de explicar-lhe que Metalurgia e Metrologia eram coisas bastante
diferentes. Lembrou-lhe, ainda, que uma das máquinas universais de
medir, que havia sido desencaixotada e deixada ao relento, estava
com o barramento enferrujado, necessitando, portanto, dispendioso
trabalho de reparo, na fábrica, para que pudesse ser usada. Advertiu-
o de que poderia ser responsabilizado por incúria na guarda e manu-
tenção desse equipamento.
Kozel, tendo voltado a Goiás, constatou que a maior parte das
máquinas havia sido desencaixotada, para criar um fato consumado.
Arno Blass

Ao lado do campus surgira uma favela, conhecida como MEC/SUP.


Fora construída com a madeira das caixas dos equipamentos, que
continham essa inscrição. Resultado: algumas máquinas foram desti-
nadas à venda, enquanto os recursos apurados foram usados na insta-
lação de um laboratório de Eletricidade.
Num outro caso, Stemmer remanejou um torno automático que
se encontrava na Escola de Engenharia de Barretos, São Paulo, para as
oficinas da Escola de Engenharia Mauá, por ser o mesmo mais ade-
quado à produção que ao ensino. No dia seguinte, uma estação de
rádio local transmitiu:
Bom dia, barretenses. Será que é um bom dia? Hoje, na calada da
noite, retiraram de nossa Escola de Engenharia uma máquina de
precisão como só existem duas no Brasil: a nossa, embrulhada em
papel celofane, e outra na Volkswagen, produzindo peças para
automóveis.
Ainda outro caso: na Fundação Universidade do Amazonas havia
tantos microscópios que a universidade alugou uma casa para abrigá-
los, enchendo-a do chão até o teto, inclusive nos banheiros. Uma
sugestão de remanejamento foi repelida com veemência. "Nunca re-
cebemos nada, e se daqui a dez anos um professor necessitar um
microscópio e descobrir que foi remanejado, serei crucificado", -
disse o responsável pela guarda. O máximo que Stemmer conseguiu
foi promover o leilão de uma geradora de engrenagens de módulo
grande, própria para produzir engrenagens de dois metros de diâme-
tro.

Construções

O Premesu administrou um programa de construções nas univer-


sidades brasileiras, com um empréstimo de US$ 150 milhões do Fun-
do de Apoio ao Desenvolvimento Social - FAS, da Caixa Econômica
Federal. Esse programa assegurou a duplicação da área construída
Caspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

das universidades federais. Administrou, ainda, a conclusão de pré-


dios de três hospitais universitários, construções no campus da UFMG
- com recursos provenientes da troca de áreas dispersas na malha
urbana - e da UFRJ. Tratou-se do maior programa de construções na
história do ensino superior no Brasil. Stemmer participou de parte
desse programa. Ao assumir a reitoria da UFSC, em 1976, passou para
o outro lado, tornando-se cliente do programa que anteriormente
administrara.
REITOR DA UFSC

Da candidatura à nomeação

temmer, enquanto coordenava o Premesu, teve oportunida-


de de visitar quase todas as universidades brasileiras, ob-
servando e anotando idéias que encontrava em implementa-
ção e que julgava boas. Estabeleceu relacionamentos no DAU, no MEC
e no governo federal. Havia decidido que tornaria a candidatar-se à
reitoria da UFSC. Estava preparando-se para a função que aspirava
exercer.
Entretanto, tendo o governo do estado de Santa Catarina, em 1975,
criado a Fundação de Amparo à Tecnologia e ao Meio Ambiente -
Fatma, o secretário da Ciência e Tecnologia do estado, Dr. Baptista
Pereira, procurava alguém para implantar esse importante órgão da
administração estadual. Solicitou a Amílcar Ferrari, catarinense de
há muito afastado do estado, mas sempre ligado às coisas da terra,
que sugerisse um nome para dirigi-la. Ferrari propôs o de Stemmer.
Alguns dias depois, Edson Machado comunicou a Stemmer que o
governador de Santa Catarina, Antônio Carlos Konder Reis, solicitara
sua liberação do Premesu, a fim de que assumisse o gerenciamento
da Fatma. Mas isso não estava nos planos de Stemmer. Respondeu
que só se interessaria em voltar a Florianópolis se fosse para assumir
a reitoria da UFSC. Em decorrência disso, Ney Braga, então ministro
da Educação, telefonou para Konder Reis, dizendo que não podia
dispensar Stemmer do Premesu e que dele só abriria mão se fosse
para a reitoria da UFSC.
Arno Blass

Assim, quando se iniciaram as discussões para a elaboração da


lista sêxtupla para a reitoria, Stemmer levou ao Conselho Universitá-
rio sua candidatura. De imediato obteve o apoio dos professores Ayrton
Oliveira e Roldão Consoni, do curso de Medicina, de Nelson Back -
agora diretor do CTC - e de Sérgio Roberto Arruda - que havia sido
recentemente eleito representante dos docentes do CTC no Conselho
Universitário. Os diretórios acadêmicos apoiaram-no, mas o Diretório
Central dos Estudantes- DCE, que tinha três votos no Conselho Uni-
versitário, manteve-se esquivo. Afinal, o reitor Lacerda, que queria
manter seu vice-reitor fora da lista, porque com ele se aborrecera
durante sua gestão, aceitou uma composição. A lista sêxtupla aprova-
da para reitor foi encabeçada por João Makoviecki (15 votos), segui-
do de Caspar Stemmer (20 votos). Para vice-reitor, o primeiro nome
era o de Roldão Consoni (15 votos).
Embora a lista tenha sido enviada com bastante antecedência a
Brasília, a definição presidencial custou a sair. Ney Braga já apresen-
tava Stemmer como futuro reitor da UFSC, mas havia notícias de forte
pressão política em favor de João Makoviecki. Stemmer, enquanto
aguardava, viajou aos Estados Unidos, por conta própria, e visitou,
em Nova York, a Associação das Fundações dos Estados Unidos, bem
como várias de suas associadas que tinham sede na mesma cidade. Ao
retornar, soube, finalmente, em 7 de março de 1976, que o presiden-
te Geisel havia assinado sua nomeação. Viajou imediatamente para
Florianópolis, onde se reuniu com Roldão Consoni, seu vice, e convi-
dou seus sub-reitores: Rodi Hickel - Ensino e Pesquisa -, Teodoro
Rogério Vahl - Administração - e Volnei Millis - Assuntos Estudan-
tis. Para seu chefe de gabinete, convidou Genovêncio Mattos.
Todos aceitaram prontamente e começaram, de imediato, a pla-
nejar o trabalho. A idéia era criar um impacto que sinalizasse a todos
- professores, servidores e alunos - que a reitoria havia mudado e
que se imprimiria nova dinâmica na gestão da universidade e no rela-
cionamento com a comunidade.
Caspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

Aposse e as primeiras providências

A transmissão do cargo realizou-se em 10 de maio de 1976, na


Biblioteca Central da UFSC, presentes o governador do estado, Antô-
nio Carlos Konder Reis, o prefeito municipal, Espiridião Amin Helou
Filho e, representando o ministro da Educação, o diretor da Capes,
Darcy Closs. Grande número de professores, servidores e estudantes
lotava o salão.' Stemmer fez longo discurso, listando o que pretendia
fazer: melhoria do espaço físico, dos laboratórios, das salas de aula,
da biblioteca; qualificação dos professores e generalização do regime
de tempo integral; e assim por diante.2
No dia seguinte, Stemmer empossou seus sub-reitores, começan-
do, de imediato, todos a trabalhar. Um dos primeiros problemas que
foram atacados foi o da limpeza, da troca de lâmpadas queimadas,
dos vidros sujos ou quebrados, dos banheiros imundos. João Nilo
Linhares havia sido encarregado de estudar o assunto, tendo apresen-

1 Duas semanas antes da posse de Stemmer, retornei de Londres, com meu título
de doutor. Ao desembarcar do avião, em Florianópolis, foi-me comunicado
que iria ser designado chefe do Departamento de Engenharia Mecânica e
coordenador do curso de Pós-gruduação em Engenharia Mecânica, uma acu-
mulação que Stemmer pretendia adotar como regra, mas que teve curta dura-
ção, pois os designados foram gradativamente solicitando demissão de algum
dos cargos. Ao que me consta, fui o único a não fazê-lo.
2 Este discurso foi oportunamente resenhado, ao ensejo das comemorações dos
40 anos da UFSC, pelo Prof. Oswaldo Furlan, em artigo que o Jornal Univer-
sitário da UFSC publicou. Furlan, depois de ter referido as maiores realiza-
ções da administração de Stemmer, a quem tinha entrevistado, estendeu-se na
resenha. Em conclusão, afirma que Stemmer implementou quase todos os
numerosos e arrojados projetos então anunciados. A gestão Stemmer ficaria
"na história como pujante, progressista e crucial para o status atual da UFSC"
como centro de excelência.
Cf. Oswaldo Antônio Furlan, "Projeto administrativo avançado e exitoso",
Jornal Universitário, Florianópolis, Vol. 12, n. 354, abril 2002, p. 16.
Arno fites

tado três propostas alternativas. Terceirizar os serviços de limpeza era


uma solução muito cara. Realizá-los com os servidores estáveis não
oferecia perspectivas de êxito. A solução estava em criar na universi-
dade uma equipe bem identificada, contratada pela CLT, cada compo-
nente tendo tarefas definidas, havendo um chefe com podêres de ad-
vertir oralmente, numa primeira instância, depois por escrito, sus-
pender e propor ao reitor a demissão. Feita uma previsão dos recur-
sos necessários, Stemmer foi ao ministro: era importante criar, logo
no início da gestão, uma nova imagem. Ney Braga concordou e auto-
rizou o saque de CR$ 5 milhões do Fundo Nacional de Desenvolvi-
mento da Educação - FNDE. Euro Brandão, que era o secretário geral
do ministério, ainda argumentou que a praxe era liberar apenas re-
cursos provenientes dos rendimentos semestrais do fundo - que já
estavam esgotados -, não sacar sobre o principal. Mas Ney Braga
reconheceu o caráter emergencial do pleito de Stemmer e manteve o
saque.
Assim sendo, a sub-reitoria de Administração organizou um muti-
rão para a troca geral de lâmpadas em salas de aula, reparo de insta-
lações hidráulicas, limpeza de banheiros, colocação de papel, toa-
lhas e sabão líquido. Muitos se perguntavam, admirados, quanto tempo
duraria o milagre. Na verdade, a organização do serviço de limpeza -
Serlim - funcionou exemplarmente até o fim de sua gestão.3
Uma prática que iria caracterizar a gestão de Stemmer também
teve início em seus primeiros dias de mandato: a visita surpresa a
setores aleatórios da universidade, geralmente no período matutino.
De início ocorreram algumas situações embaraçosas: o reitor fla-

3 É surpreendente que, passados 26 anos, ao questionar ex-alunos, docentes e


servidores remanescentes daquele tempo para que listassem aspectos que
consideravam marcantes da administração Stemmer, metade dos consultados
tenham mencionado justamente este aspecto: a limpeza dos banheiros. E
muitos foram mais gerais: falaram na humanização do campus, numa referên-
cia ao ajardinamento e embelezamento das áreas não construídas.
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

grando aqueles que chegavam atrasados ao serviço. Mas Stemmer usou


tais situações construtivamente; a incerteza de quando se daria a pró-
xima visita e de qual o setor que seria visitado, fez com que os atrasos
deixassem de existir, de forma generalizada.
À sua equipe administrativa - no sentido mais amplo, indo desde os
sub-reitores até chefes de departamento e coordenadores de curso -,
Stemmer transmitiu as diretrizes que deveriam nortear o trabalho: a
administração deveria ser entendida como atividade meio; processos
deveriam ter tramitação rápida e soluções corretas; todos os envolvi-
dos nos problemas deveriam ser ouvidos; recursos deveriam ser in-
tensivamente procurados em todas as fontes, nacionais e estrangei-
ras, públicas e privadas; sempre que possível, projetos de pesquisa e
extensão deveriam ser transformados em projetos financiáveis; recur-
sos deveriam ser aplicados rápida e eficientemente, de modo a mini-
mizar os efeitos da inflação; as construções deveriam ser econômicas
e funcionais, porém sólidas e de baixa manutenção; deveria ser exer-
cido combate permanente ao desperdício.

O credo de Stemmer''

Desde quando assumira, pela primeira vez, a direção da Escola de


Engenharia Industrial, Stemmer, com freqüência, expressara de pú-
blico sua visão de universidade. Ele continuaria reiterando suas con-

4 A partir deste ponto, e até o final do Capítulo, faço uso intensivo de um


depoimento escrito, com 74 páginas datilografadas A4, que Stemmer elabo-
rou acerca de sua gestão, em fins da década de 80, para um projeto de resgate
da memória da UFSC, que foi, eventualmente, abandonado. No que diz respei-
to ao pessoal docente e ao ensino de graduação, valho-me, também, do
Relatório 1980, da pró-reitoria de Ensino de Graduação e depoimento escri-
to do Prof. Rodi Hickel. Ainda na parte referente ao pessoal docente, e no que
diz respeito à pós-graduação, sirvo-me de depoimento escrito do Prof. Pauli-
no Vandresen. Finalmente, no que diz respeito ao pensamento de Stemmer,
Arno fites

vicções ao longo do tempo em que esteve à frente da reitoria. Seu


próprio discurso de posse, ao relacionar um elenco de ações concre-
tas que ele se comprometia a implementar ao longo de seu mandato,
refletia a maneira como via a instituição e seu papel na sociedade.
Seu credo pode ser resumido como segue.
A universidade é responsável pela guarda, organização, sistemati-
zação, ampliação e difusão dos conhecimentos adquiridos pela hu-
manidade no decorrer da história. É um centro de ciência e de cultu-
ra. Deve reunir e guardar os conhecimentos adquiridos no passado
para que nossos sucessores possam prosseguir ampliando o conheci-
mento do mundo e das leis que o regem. Entretanto, não deve ser
passiva, como uma coleção de livros. Deve organizar e sistematizar o
conhecimento, para que possa ser assimilado mais rapidamente; deve
ampliar o conhecimento, por meio da pesquisa; deve difundir o co-
nhecimento, mediante cursos de extensão, destinados à comunidade
em geral, e por intermédio de cursos de formação, destinados espe-
cialmente à juventude.
É isto importante? O conhecimento é um dos bens mais valiosos
da humanidade, e mais importante do que os bens materiais. Condi-
ções de vida adequadas e dignas, saúde, alimentação, educação, par-
ticipação na vida comunitária, habitação, distribuição da riqueza,
preservação do meio ambiente, tudo depende do domínio da tecno-
logia, ou seja, do conhecimento.
Como se melhora, então, a qualidade da universidade?
O elemento essencial numa universidade é o professor. Com bons
professores é possível um ensino de boa qualidade, mesmo que os
recursos sejam escassos. Com eles se pode fazer bons programas de
pesquisa e obter recursos de órgãos de financiamento, estabelecer

sirvo-me de entrevista que concedeu ao jornalista Moacir Loth, publicada no


Jornal de Santa Catarina, de Florianópolis, pp. 24 e 25, em 25 de março
de 1979.
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

programas de estágios, de pesquisas e de desenvolvimento com o


apoio da indústria. Uma boa universidade começa, portanto, dando-
se a máxima atenção à qualidade dos professores. Ou seja, impõe-se:
a. Ter métodos adequados de seleção: Um professor mal escolhi-
do prejudicará gerações de estudantes e dificilmente será dis-
pensado.
b. Investir no aperfeiçoamento dos professores: Oferecer oportu-
nidades de cursos de pós-graduação, de especialização, estágios
e participação de congressos e de exposições.
c. Oferecer condições de trabalho: Regime de tempo integral -
com remuneração adequada -, local apropriado de trabalho,
apoio administrativo, boa biblioteca, laboratórios adequados,
autonomia de trabalho.
O pessoal de apoio, que deve multiplicar a eficiência dos profes-
sores, também não pode ser esquecido. Cabe oferecer-lhe remunera-
ção adequada, treinamento eficiente e oportunidades de carreira.
O aluno - como matéria prima sobre a qual atua o processo
educacional - deve ser bem selecionado, não só pelo preparo prévio
necessário, mas também pelo espírito de iniciativa, tenacidade e dis-
posição para estudos avançados, criatividade e honestidade intelec-
tual. Deve ser motivado com estágios práticos, oportunidade de parti-
cipar em tarefas de pesquisa e de colaborar em trabalhos profissio-
nais. O ideal é o aluno em tempo integral, que participa da vida
universitária, convive com os colegas, se impregna de cultura no
ambiente da universidade.
Matéria-prima de boa qualidade, mão-de-obra adequadamente trei-
nada e motivada, capital suficiente devem, finalmente, ser combina-
dos de forma otimizada por uma administração dinâmica e capaz, a
fim de que resulte um bom produto.
Por último, sem que isso seja menos importante, Stemmer acredi-
ta que só o trabalho útil e bem coordenado produz riquezas.
Arno Blass

Pessoal docente

Durante a gestão de Stemmer ocorreu uma considerável amplia-


ção do quadro docente da universidade, que cresceu a uma taxa de
10% ao ano. Claro que isso se deveu, principalmente, aos cursos que
estavam em implantação e aos que vieram a ser criados no período.
Em virtude das oportunidades que surgiam na universidade, que eram
amplamente divulgadas, foram adotadas medidas que objetivavam
motivar jovens talentosos, na forma de bolsas de iniciação científica.
Uma média de 20 bolsas de mestrado por ano foram destinadas a
estudantes que a universidade pretendia aproveitar no magistério. Fo-
ram contratados 45 professores-visitantes, todos doutores, permitin-
do a rápida qualificação dos programas de pós-graduação e a mini-
mização de problemas de endogenia.
Stemmer continuou empregando agressivamente a política de for-
mação de recursos humanos implantada por Ferreira Lima. No ano
de 1979, por exemplo, num quadro de 1.278 docentes, 391 (28,7%)
encontravam-se em treinamento; desses, 211 eram mestrandos e 26
realizavam cursos de especialização no âmbito da própria universida-
de; 154 encontravam-se afastados, 65 dos quais em cursos de douto-
rado (46 no exterior), 80 em cursos de mestrado e 9 em cursos de
especialização. Para estimular os docentes a buscarem a pós-gradua-
ção, a grande maioria dos novos foi admitida em regime de dedica-
ção exclusiva, sendo o tempo de estudo considerado parte integrante
do plano de trabalho.
Paralelamente, eram também desenvolvidos cursos de formação
didático-pedagógica - englobando didática do ensino superior, siste-
mática de avaliação de estudantes, metodologia do ensino e da pes-
quisa, estrutura e funcionamento da universidade etc. - para os no-
vos docentes, sob a orientação de especialistas do Centro de Educa-
ção. Foram 260 os novos docentes que freqüentaram esses cursos
entre 1976 e 1980.
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

Quando Stemmer assumiu, os auxiliares de ensino representavam


75,8% do corpo docente da universidade. Através de concursos públi-
cos realizados durante sua gestão, foi viabilizado o acesso de docen-
tes titulados às categorias superiores, na forma da legislação da épo-
ca, permitindo sua melhor distribuição entre as várias categorias fun-
cionais. No fim de seu mandato, os auxiliares de ensino representa-
vam 22,1% do quadro. Já os professores-colaboradores, refletindo as
restrições à contratação ou a indisponibilidade de profissionais no
mercado de trabalho, com a qualificação desejada pela universidade,
representavam, então, 30,7% do quadro, contra 1,2% em 1976. No
mesmo período, a participação dos docentes em regime de tempo
integral, refletindo a ênfase dada pela administração ao problema,
havia crescido de 37,8 para 67,0% do quadro.
Essa alteração no perfil do docente da UFSC foi acompanhada de
medidas efetivas no sentido de melhorar as condições de trabalho
dos professores: mais e melhores salas de professores, melhorias na
biblioteca e nos laboratórios, infra-estrutura de apoio administrati-
vo, simplificação e agilização dos processos burocráticos. Em convê-
nio com a Feesc, foi instalada a livraria do Centro de Convivência. A
capacidade da central telefônica do campus foi ampliada. Em moldes
similares aos da Feesc, mas com atuação em todo o âmbito da universi-
dade, foi instalada a Fundação de Amparo à Pesquisa e à Extensão
Universitárias - Fapeu, para dar apoio logístico aos docentes e pes-
quisadores na elaboração de projetos para obtenção de recursos extra-
orçamentários, para aquisição rápida de materiais, para administra-
ção de recursos de projetos e para as rotinas de prestação de contas.
Foram concedidas vantagens colaterais aos corpos docente e téc-
nico-administrativo: reserva de vagas no Colégio de Aplicação para
filhos de professores e funcionários da UFSC, depois estendidas a
toda a sociedade; ampliação do Colégio de Aplicação; instalação de
creche; atendimento médico no Hospital Universitário; atendimento
dentário para servidores no curso de Odontologia.
Arno Blass

Pessoal técnico e administrativo

Também o pessoal técnico e administrativo cresceu extraordina-


riamente no período (60,5%). Para a qualificação dos servidores fo-
ram promovidos diversos cursos de treinamento. A tramitação do
processo de reclassificação do pessoal da UFSC, que se encontrava
trancado no Dasp devido a problemas de diligências e dificuldades de
enquadramento, foi agilizada. A UFSC, mesmo tendo sido uma das
últimas a ter seu plano de reclassificação aprovado pelo Dasp, foi
uma das primeiras a tê-lo implantado, o que assegurou benefícios
financeiros para seus servidores.
Além das vantagens colaterais já mencionadas, os servidores técni-
co-administrativos tiveram benefícios específicos: refeições no Res-
taurante Universitário a preços reduzidos, especialmente para aque-
les situados na faixa de até três salários mínimos - apesar de fortes
pressões em contrário, este benefício foi mantido, mesmo quando o
aumento da concentração discente no campus sobrecarregou o Res-
taurante Universitário, antes de o mesmo vir a ser ampliado -; refei-
ções subsidiadas no restaurante do Centro de Convivência - durante
os períodos de fechamento do Restaurante Universitário, nas férias -
; promoções especiais para filhos de servidores - esportes, diverti-
mentos, artes, festas, entre outros -; fornecimento de uniformes -
para o pessoal da prefeitura do campus e do serviço de limpeza.

Corpo discente

A gestão Stemmer ampliou consideravelmente o programa de bol-


sas do trabalho, tendo sido criadas duas novas modalidades: as bolsas
do trabalho/esporte, com o objetivo de oportunizar a participação
estudantil nas associações atléticas e de dinamizar as atividades es-
portivas, atendendo os estudantes mais necessitados; e as bolsas do
trabalho/artes, que tinham por objetivo estimular a produção criativa
Caspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

dos alunos beneficiados e que, outrossim, serviam de pólo para ou-


tros interessados em artes. Foram, também, ampliadas as monitorias
e exploradas ao máximo as bolsas de iniciação científica do CNPq.
A UFSC manteve um serviço de encaminhamento de estudantes
comprovadamente carentes a hospitais e clínicas. Com a entrada em
funcionamento do Hospital Universitário, foi criado um serviço de
saúde, com prioridade para o atendimento do aluno e já não se exi-
gindo dele a comprovação de carência.
Devido aos crônicos problemas de moradia na cidade de Florianó-
polis, a UFSC criou um programa destinado a promover o Cadastra-
mento de imóveis que, após visitados e aprovados por assistentes so-
ciais, eram indicados aos alunos ou aos seus pais. Esse programa
revelou-se particularmente útil para os calouros provenientes do inte-
rior do estado. Um projeto de construção de moradias para estudan-
tes, com apoio das prefeituras municipais das principais cidades do
estado e de grandes empresas - que Stemmer denominava "Aldeia
dos Estudantes" -, entretanto, não teve receptividade e não vingou.
Foram promovidas mostras de pintura, desenho e fotografia, bem
como recitais de poesia, em promoções levadas por estudantes ao
interior do estado. Face ao alto interesse suscitado, foi criado o setor
de manifestações artísticas. De 1977 a 1979, foi promovido o Salão
Estadual Universitário de Artes Plásticas, com o patrocínio da Funda-
ção Nacional de Artes, montado sucessivamente nas cidades de Flo-
rianópolis, Criciúma, Lages, Chapecó e Blumenau, registrando, a cada
ano, mais de 20 mil visitantes.
Numerosas medidas foram tomadas para facilitar os estudos e
melhorar as condições de vida dos estudantes: racionalização de ho-
rários de aulas; melhoria das condições das salas de aula - limpeza,
manutenção e reparo de móveis, iluminação, disponibilidade de re-
cursos audiovisuais etc. -; melhoria das condições de operação da
Biblioteca Central; instalação de equipamentos xerox e de telefones
públicos nos vários centros; instalação do Centro de Convivência, com
Arno Blass

livraria, correio, bancos, restaurante, sala de meios e auditório; me-


lhoria de operação do Restaurante Universitário, com melhores car-
dápios, aquisição de insumos diretamente dos produtores, racionali-
zação do fluxo de atendimento e construção de nova ala; instalação
do Núcleo de Apoio Instrucional - NAI, um setor da biblioteca cen-
tral, com filmes, fitas de vídeo, e outros materiais audiovisuais, com
fácil acesso de alunos e professores; humanização do campus -ajar-
dinamento, revestimento de pátios e caminhos, iluminação, drena-
gem e limpeza de canais, estacionamentos -; melhoria do sistema de
informação dos estudantes acerca de cursos, bolsas, seminários, pela
eficiência Ao Jornal Universitário e do Manual do Estudante.

Novos cursos -graduação

O desenvolvimento do estado de Santa Catarina e o prestígio que a


UFSC vinha adquirindo atraíam, a cada ano, maior número de candi-
datos ao vestibular. No decorrer da gestão de Stemmer, esse número
cresceu de 7.227, em 1976, para 16.261, em 1980. A universidade
oferecia 1.960 vagas em 1976; por efeito da criação de novos cursos,
essa oferta foi ampliada para 2.745 vagas em 1980. A ampliação do
leque de ofertas da universidade foi norteada por estudos objetivos
acerca dos profissionais procurados pelo mercado de trabalho e dos
anseios da juventude. Os novos cursos criados foram estes:
Arquitetura - Dados estatísticos do Crea-SC mostravam que o núme-
ro de arquitetos que atuavam no estado decuplicara em cerca de
oito anos. Isto significava que várias dezenas de arquitetos imi-
gravam a cada ano, vindos de outras regiões do Brasil. Era indis-
pensável que fosse ensejado aos jovens catarinenses ocupar este
mercado de trabalho. O curso iniciou em 1977.
Ciências da Computação - Este curso constituía uma exigência pre-
mente, sob pena de Santa Catarina vir a ficar defasada em rela-
Caspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

ção ao desenvolvimento nacional e internacional na área da In-


formática. Teve início em 1977.
Psicologia - Estudos feitos mostravam grande demanda por este tipo
de profissional, da parte de escolas, empresas, hospitais etc. O
curso foi criado, tendo começado a funcionar em 1978.
Engenharia Sanitária - Instalado com o apoio e o estímulo do MEC,
que financiou a instalação de um laboratório, o curso, iniciado
em 1978, veio ao encontro da necessidade de profissionais espe-
cializados em Saúde Pública, definida como uma das priorida-
des nacionais.
Jornalismo - Apesar de restrições na área federal, a situação em
Santa Catarina justificava a criação do curso, em virtude da mi-
gração de profissionais - da imprensa escrita, do rádio e da
televisão - de outros estados para Santa Catarina. A universidade
investiu em laboratórios, criou o Jornal Universitário e colocou
a imprensa universitária à disposição do curso. Antes mesmo de
sua instalação, em 1979, a UFSC financiou cursos de mestrado
para quatro jornalistas que viriam a ser professores do curso.
Engenharia Química - Os efeitos sinérgicos deste curso, de seus
professores e laboratórios, eram muito importantes para inte-
grar e desenvolver os demais cursos de engenharia, bem como os
de farmácia e de tecnologia de alimentos. Outrossim, a deman-
da de profissionais na área de controle ambiental e nas indústri-
as química, têxtil, alimentar, do carvão e do petróleo era signifi-
cativa. 0 curso foi iniciado em 1979.
Engenharia de Alimentos - Também este foi instalado em 1979,
simultaneamente com o curso de Engenharia Química, porquan-
to os recursos adicionais que se faziam necessários, já estavam
disponíveis no Departamento de Tecnologia de Aumentos, onde
vinham sendo subutilizados na área didática, em que pesem seus
Arno Blass

relevantes serviços de pesquisa, extensão e atendimento à comu-


nidade. Outrossim, a indústria de alimentos era - e continua
sendo - das mais importantes do estado, sendo grande geradora
de empregos e apresentando excelentes perspectivas de cresci-
mento.
Engenharia de Produção - A criação deste curso, iniciado em 1980,
constituiu exigência do DAU para que o mestrado nesta área de
conhecimento fosse credenciado, em obediência ao que prescre-
via o Parecer 77/69 do CFE. Um terço do currículo era dedicado
a aspectos econômicos, gerenciais, logísticos e organizacionais
para a realização de grandes obras de engenharia, ficando a car-
go do Departamento de Engenharia Industrial - posteriormente
rebatizado de Departamento de Engenharia de Produção e Siste-
mas -; o restante era composto de matérias do programa dos
cursos tradicionais, nas opções civil, elétrica e mecânica.
Nutrição - Com este curso foi completado o leque de ofertas na UFSC
na área da Saúde, de certa forma integrando-se, também, com o
curso de Engenharia de Alimentos. Iniciou em 1980.
Secretariado - A carência de secretárias de nível superior era bastan-
te sentida em atividades do governo, da indústria, do comércio,
do ensino e da saúde. A necessidade de tais profissionais, agora
bilíngües, era aguda, também em decorrência do forte incre-
mento das exportações e da participação do Brasil no mercado
internacional. Os altos salários oferecidos pelo mercado de tra-
balho convenceram a universidade a criar um curso superior de
Secretariado, envolvendo conhecimento de línguas, correspon-
dência, taquigrafia, relações públicas, comunicação etc. Tam-
bém este começou a funcionar em 1980.
Bacharelados - Atendendo a reivindicações de alunos e de professo-
res, e considerando a reduzida demanda dos cursos de licencia-
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

tura, foram criados os bacharelados em Filosofia, Geografia,


História e Ciências Sociais, em 1979, em Biologia, em 1980,
com a redução equivalente das vagas nas correspondentes licen-
ciaturas. Com esta medida, melhorou sensivelmente a demanda
dos cursos nestas áreas, e foram reduzidas as evasões.

Cursos noturnos - Em atenção a reclamos da comunidade e objeti-


vando dar melhor utilização ao espaço físico disponível, foram
criados on transferidos para o período noturno os seguintes cur-
sos: Bacharelado em Ciências Sociais, Bacharelado em Filosofia
e em Secretariado. Foram, ainda, reformulados os currículos e
os horários dos cursos noturnos de Administração, Ciências Con-
tábeis, Economia e Direito.

Essa proliferação de cursos, mesmo que devidamente justificada,


não agradou a todos. Sílvio Coelho dos Santos, que seria pró-reitor na
gestão seguinte, do reitor Ernani Bayer, comenta:
No período 1976-1980, quando Stemmer estava exercendo a rei-
toria, a UFSC criou 18 cursos de graduação. O impacto desses
novos cursos sobre a instituição foi enorme. Tanto que no reitorado
seguinte, de Ernani Bayer, não foi fácil garantir a consolidação
desses cursos, em especial pelas dificuldades para contratar novos
docentes. As críticas sobre o açodamento com que a maioria des-
ses cursos estava sendo criada não foram poucas. As discussões
para a aprovação dos projetos no Conselho de Ensino, Pesquisa e
Extensão e no Conselho Universitário chegavam, às vezes, à exas-
peração entre o reitor e alguns poucos membros que tinham cora-
gem e, também, competência, para criticar as propostas, que en-
tendiam apressadas e, mesmo, impertinentes.'

Mas reconhece: "O processo de expansão da UFSC estava se tor-


nando irreversível".

5 Silvio Coelho dos Santos, depoimento escrito ao autor, Florianópolis, agosto


de 2002.
Arno fites

Antônio Diomário de Queiroz, que também viria a ser pró-reitor


e, mais tarde, reitor da UFSC, dedicava-se, então, a funções externas,
públicas e privadas. Mas acompanhava o que acontecia na UFSC e
entendeu melhor a motivação de Stemmer:
De fora, apreciei sua energia construtiva, expandindo o campus à
condição de cidade universitária. Criou dezenas de cursos novos.
Sempre confiou na capacidade de gerar os recursos necessários a
viabilizar as idéias consubstanciadas em bons projetos. Lembro-
me de tê-lo um dia encontrado num momento dessas crises orça-
mentárias do governo e de ter-lhe perguntado como faria para
tocar suas obras. Respondeu-me: "As crises passam e vão-se em-
bora; ao longo do tempo é sempre bom decidir e agir pela norma-
lidade." Guardo ainda essa frase como lição de vida.''

Pós-graduação

As atividades de pós-graduação e de pesquisa desenvolvidas na UFSC


estavam, juntamente com as de ensino de graduação, subordinadas à
sub-reitoria de Ensino e Pesquisa. Esse fato resultava de fatores
pregressos: ao ensejo da Reforma Universitária, apenas o mestrado
em Engenharia Mecânica estava em operação. Com o surgimento de
outros cursos de pós-graduação, começou a caracterizar-se nitida-
mente uma diferença entre os problemas suscitados pelos cursos de
terceiro e quarto graus. A graduação apresentava problemas de mas-
sa: muitas disciplinas envolviam um número muito grande de alunos;
já a pós-graduação estava ainda restrita a pequenos números de alu-
nos, mas fazia exigências em termos de equipamentos, bibliografia,
comutação bibliográfica, qualificação do pessoal docente, recursos
computacionais e outras. A Capes e o DAU preconizavam a adoção de
unidades administrativas diferenciadas para tratar dos dois níveis.

6 Antônio Diomário de Queiroz, depoimento escrito ao autor, Florianópolis,


setembro de 2002.
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

No bojo de uma série de alterações no estatuto e regimento da


universidade, a gestão Stemmer promoveu esta separação: a sub-rei-
toria de Ensino e Pesquisa foi subdividida, dela tendo nascido a pró-
reitoria de Ensino de Graduação e a pró-reitoria de Pesquisa e Pós-
Graduação. Contudo, entre as discussões acerca do novo regimento,
sua aprovação local, encaminhamento a Brasília e aprovação pelo
CFE passou tempo. A implementação das alterações regimentais só
veio a dar-se, oficialmente, em 10 de maio de 1979, portanto exata-
mente ao iniciar-se o último ano da gestão de Stemmer.
Paulino Vandresen foi o coordenador-geral de Pós-Graduação que,
no âmbito da sub-reitoria de Ensino e Pesquisa, preparou a imple-
mentação da futura pró-reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação, da qual
se tornou o primeiro titular. Podem considerar-se poucos os cursos
de pós-graduação que vieram a ser criados nessa gestão: apenas os
mestrados em Administração e em Ciências Sociais, ambos em 1978,
e o doutorado em Engenharia Mecânica, criado em 1980, embora só
tenha vindo a funcionar em 1981, todos devidamente autorizados
pelo MEC. Com isso, chegava a 14 o número de cursos de pós-gradua-
ção da universidade.
Na verdade, com o advento do sistema de avaliação da pós-gradua-
ção que Darcy Closs introduzira na Capes, com os percalços por que
passavam os processos de credenciamento de cursos e com a plena
cobrança dos dispositivos do Parecer 77/69 do CFE, as instituições
passaram a ser mais cautelosas. Eis o que relata Paulino Vandresen:
As atividades na área da pesquisa e pós-graduação eram ainda
incipientes na maioria dos centros da UFSC. Havia poucos douto-
res e mestres. O regime de tempo de 40 horas e dedicação exclusi-
va era limitado [...] conseqüentemente havia poucos projetos de
pesquisa. Uma análise desses projetos mostrou que a maioria não
fora concluída, principalmente pela falta de recursos financeiros e,
quando havia financiamento, o dinheiro ficava no caixa geral da
universidade, com sérias dificuldades administrativas para o paga-
mento das despesas.
Arno Blass

[...] Percebeu-se também que em muitos centros havia pouca


informação sobre órgãos financiadores e quase nenhuma tenta-
tiva de buscar financiamentos para projetos de pesquisa e exten-
são.
E as dificuldades não paravam por aí:
A pós-graduação se ressentia dos problemas já apontados para a
pesquisa. Quase todos apontavam a escassez de professores orien-
tadores e a falta de bolsas de estudo para aos alunos. Outra dificul-
dade enfrentada era a integração do ensino pós-graduado nos
departamentos e centros da UFSC.7
Essa análise, logicamente, era aplicável à UFSC como um todo.
Obviamente, o panorama era mais alentador para os lados do Cen-
tro Tecnológico, embora também por ali os problemas existissem.
O que iria caracterizar o período, portanto, seriam tentativas de
arrumar a casa; em termos de cursos novos, predominariam abor-
dagens exploratórias, em que eram realizadas incursões no campo
da pós-graduação lato sensu, na forma de cursos de especialização,
como preparação para um salto posterior à pós-graduação stricto
sensu.
A este respeito, é oportuno o depoimento que faz Sílvio Coelho
dos Santos, que mais tarde viria a ser o segundo pró-reitor de Pesqui-
sa e Pós-Graduação. Ele coordenava, em 1976, o curso de especializa-
ção em Ciências Sociais. Encontrando Stemmer durante uma viagem
de avião, este perguntou-lhe como ia o curso. Eis o que relata o
coordenador:
Disse-lhe que tudo ia bem e que pensava ter a oportunidade, mais
adiante, de conversar sobre as possibilidades futuras de transfor-
mar a experiência num programa de mestrado. Ele logo pergun-
tou-me: "O que é necessário para fazer isto?" Disse-lhe: precisa-
mos de espaço físico e de, pelo menos, dois professores doutores,

7 Paulino Vandresen, depoimento escrito ao autor, agosto de 2002.


Caspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

contratados como visitantes, para ampliar a massa crítica disponí-


vel. Imediatamente respondeu: "Se é isto o que falta, pode começar
a montar projeto".
Comenta, então, Sílvio Coelho dos Santos:
Para quem tinha trabalhado durante mais de dois anos para lograr
aprovar a proposta de um curso de especialização, a atitude assu-
mida pelo reitor durante uma conversa informal parecia irreal.
Tanto que logo questionei como resolveríamos a questão do espa-
ço físico.8
A resposta de Stemmer envolveu duas etapas: uma primeira solu-
ção, imediata, provisória, emergencial, estava disponível no piso in-
ferior da Biblioteca Central, que estava quase que inteiramente deso-
cupado. A solução definitiva encontrava-se no prédio que seria cons-
truído para o Centro de Ciências Humanas, que teria condições de
abrigar adequadamente o mestrado. Sílvio Coelho remata o relato
nestes termos:
E assim aconteceu. Em 1978, implantamos o Programa de Pós-
Graduação em Ciências Sociais, em nível de mestrado, com opções
nas áreas de Antropologia Social e Sociologia Política. A massa
crítica docente foi satisfatoriamente ampliada com professores-vi-
sitantes. E em 1979, o prédio do Centro de Ciências Humanas
estava sendo inaugurado.9
Sobre isso, eis meu depoimento pessoal: os processos de creden-
ciamento dos cursos de pós-graduação da universidade tramitavam
em Brasília sem terem perspectivas de aprovação. Em meados de
1976, Stemmer, entrando em contato com o Prof. Ruy Carlos de Ca-
margo Vieira, então no DAU, comunicou-lhe que me enviaria a Brasí-
lia, com plenos podêres para falar em nome da UFSC, na questão do

Sílvio Coelho dos Santos, depoimento escrito ao autor, Florianópolis, agosto


de 2002.
Idem.
Arno Blass

credenciamento dos três cursos de pós-graduação em engenharia.10


Com o Prof. Ruy passei toda uma manhã, quando ele me transmitiu,
com as devidas justificativas, uma série de pequenas diligências em
cada um dos três processos. A mais significativa dizia respeito ao
compromisso da UFSC de criar os cursos de graduação em Engenha-
ria de Produção. Retornando a Florianópolis, relatei a Stemmer e aos
demais coordenadores de curso as diligências acertadas. Cada um
tratou de implementá-las no que lhe dizia respeito, tanto que alguns
meses depois os três cursos estavam credenciados."

Viagem

Em março de 1977, como reitor da UFSC, Stemmer viajou ao Mé-


xico, Estados Unidos e Europa.
No México, visitou a Universidade Autônoma de Guadalajara, com
a qual firmou um acordo de cooperação e recebeu o título de Profes-
sor Honorário. Nos Estados Unidos, participou de uma reunião do
programa Partners of the America, através do qual os estados de
Santa Catarina e Virgínia são considerados irmãos, em decorrência
do que tem havido parcerias entre a UFSC e a Universidade de Virgínia,
em Charlottesville, a Virgínia Commomvealth University, em
Richmond, e o Virgínia Polytechnic Institute, de Blacksburg. Final-
mente seguiu para a Alemanha, para definir questões suscitadas pela
ativação do convênio UFSC-GTZ, com a participação da RWTH Aachen,

10 Anos mais tarde, voltaria a trabalhar com o Prof. Ruy Vieira, (mando integra-
mos a Comissão de Especialistas de Ensino de Engenharia da SESu/MEC.
11 De minha parte, não pude deixar de sentir certo orgulho ao constatar que a
pós-graduação em Engenharia Mecânica da UFSC viria a ser credenciada antes
de sua congênere da Coppe-ÜFRJ. Duplo orgulho: eu tinha feito parte da
Comissão Verificadora do CFE, cujo parecer finalmente levou ao credencia-
mento o curso onde eu fizera o Mestrado.
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

que também visitou e com cujos representantes manteve contatos


relativos ao convênio.

Consolidação da Universidade no campus:


Preliminares necessárias

Quando Stemmer assumiu, embora o campus da Trindade já abri-


gasse porção substancial da universidade, era um local pouco atraen-
te e apresentava muitos problemas de infra-estrutura. De outro lado,
muitos torciam para que as unidades que se encontravam espalhadas
pela cidade por lá continuassem por muito tempo. Mas Stemmer
pretendia mudar esta situação.
Pouco após sua posse, Stemmer contratou um jovem advogado,
Romeu Pitz, com boa experiência em trato com pessoas, para prefei-
to do campus. A equipe da prefeitura foi ampliada, os salários me-
lhorados, graças à reclassificação e à oportunidade da prestação de
horas extras. Foram organizados programas de treinamento. Foi in-
tensificada a manutenção elétrica, hidráulica, das pinturas e da alve-
naria. O setor de carpintaria, encarregado da manutenção de móveis,
foi reaparelhado. Foi planejado e desenvolvido um amplo plano de
jardinagem e plantio de árvores, com utilização do viveiro de mudas
da prefeitura e do horto botânico da universidade.
A antiga reitoria, situada na chácara Molenda, no centro de Flo-
rianópolis, havia sido ocupada, sem ônus, pelo comando do Grupa-
mento Leste, numa época em que não seria muito sábio objetar
contra este fato. A Imprensa Universitária ficara lá, encravada em
meio a instalações militares, o que causava sérios transtornos de
operação. Agindo com cautela, mas com determinação, Stemmer
fez ver às autoridades militares que, de acordo com a legislação, a
universidade estava impedida de ceder graciosamente, a qualquer
título, seus prédios e instalações para fins estranhos ao ensino. Ca-
beria ao Exército, portanto, pagar aluguel, adquirir ou desocupar o
Arno Blass

imóvel. Após algumas negociações, nomeada uma comissão para


proceder à avaliação, o Exército veio a adquirir o imóvel, pagando
com um cheque à vista. Parte desses recursos foi imediatamente
aplicada na construção de novas instalações para a Imprensa Uni-
versitária no campus.
Os contornos do campus não estavam definidos. Cerca de 32.380
m2 de área desapropriada pela União ainda estavam em mãos de par-
ticulares, pois os mesmos ainda não haviam sido indenizados. Terre-
nos particulares encravados no campus dificultavam a guarda contra
invasões e impediam a realização de um efetivo plano de utilização.
Outrossim, um programa intensivo de obras no campus valorizaria
os terrenos encravados, dificultando sua absorção futura. Outra parte
dos recursos remanescentes da venda da antiga reitoria foi, por isso,
utilizada num programa de aquisições e permutas que racionalizou a
poligonal do campus.
Graças, em parte, ao apoio de José Carlos Mello, professor do
Centro Tecnológico, que, na época, era um dos diretores da Empre-
sa Brasileira de Transportes Urbanos - EBTU, Stemmer conseguiu a
liberação de recursos para o asfaltamento das estradas que contor-
navam o campus. Com a prefeitura de Florianópolis, conseguiu o
planejamento e o acompanhamento das obras, inclusive a secagem
de um pantanal, fonte de mosquitos e doenças. As ruas internas ao
campus, que eram utilizadas como atalho por veículos que passa-
vam pelo bairro, foram interrompidas por rótulas, passando a ser-
vir exclusivamente para o acesso aos estacionamentos do campus,
que foram removidos para locais apropriados. A perturbação das
atividades acadêmicas pelo ruído do tráfego foi, assim, sensivel-
mente reduzida.
Uma área de 230ha no mangue do Itacorubi, entregue pela União
à Universidade, constituída em sua maior parte por área de preserva-
ção, foi delimitada. Com a prefeitura foram acertados os Omites má-
ximos do aterro de lixo que vinha poluindo o mangue e causando
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

problemas ambientais. Não foi possível obter a imediata remoção do


lixão para outro local, o que aconteceu alguns anos mais tarde. Algu-
mas áreas de mangue foram permutadas com o governo do estado,
para viabilizar a construção da perimetral norte - hoje, avenida Pro-
fessor Henrique Fontes, a principal via de acesso ao campus.
Para oferecer condições de transferência da área de mangue, foi
preparada, para o Patrimônio da União, planta de levantamento e
ocupação do mangue, que incluía a instalação de tanques para a pes-
quisa em aquicultura e pequena área lindeira ao bairro Santa Môni-
ca, destinada a abrigar a Aldeia dos Estudantes. A grande área restante
passou a constituir a reserva ecológica de preservação permanente.

Consolidação da Universidade no campus:


As obras

Stemmer, quando ainda era coordenador do Premesu - no qual


administrava a aplicação dos recursos do FAS no programa de cons-
truções nas universidades brasileiras -, foi muito insistente no senti-
do de que a UFSC não deixasse escapar a oportunidade de promover a
transferência de suas unidades, disseminadas pela cidade de Floria-
nópolis, para o campus. Oportunamente, conseguiu sensibilizar o
escritório técnico da universidade, que começou a elaborar os proje-
tos detalhados das edificações requeridas para essa transferência.
Stemmer, juntando-lhes amplas justificativas das necessidades acadê-
micas, das vantagens da integração das atividades no campus da Trin-
dade, das necessidades em termos de espaço adequado de trabalho
para professores, e outros argumentos, conseguiu destinar Cr$ 100
milhões daquele programa à UFSC. Mas o programa de construções
só foi desencadeado quando ele assumiu a reitoria.
Combinando projetos padronizados - de tijolos e concreto apa-
rente, simples e funcionais, de fácil manutenção - e administração
eficiente - a fim de minimizar o efeito corrosivo da inflação sobre os
Arno Blass

recursos12-, foi possível construir, ao longo do período de gestão de


Stemmer, com os recursos do FAS, as seguintes obras:
• Três blocos de laboratório para o Centro de Ciências Biológicas,
com 1.086 m2, com elevação da cota acima do nível das inunda-
ções.
• Onze blocos de construção modulada, atendendo cinco centros
- Sócio-Econômico, Tecnológico, de Ciência da Saúde, de Edu-
cação e de Ciências Humanas -, compreendendo 72 salas de
aula, 300 salas de professores - com condições de trabalho para
500 docentes - e quatro blocos de ligação, englobando escadas,
sanitários, portaria e área de circulação para conexão com os
blocos modulados.
• Terceiro módulo do restaurante universitário, para atendimento
simultâneo de 720 estudantes, com 960 m2, equipado com duas
esteiras rolantes para bandejas, e todo o mobiliário para possi-
bilitar o atendimento de 1.440 refeições por hora.
Com recursos obtidos com a venda da antiga reitoria, acrescidos
de recursos do orçamento normal da UFSC, foram construídos: o
prédio da Imprensa Universitária, com previsão para as aulas do cur-
so de Jornalismo, com 1.260 m2; a sala de aulas do horto botânico e
do orquidário; o segundo bloco do almoxarifado central, com 600
m2; dois blocos para ampliação do Museu Universitário e instalação

12 Em seu depoimento, o Prof. Rodi Hickel relata que o governo do estado de


Santa Catarina também obtivera, na mesma época, Cr$ 100 milhões do FAS
"para construir um estádio de futebol que nunca saiu do projeto, tendo sido
enterrada exclusivamente na terraplenagem do local em que deveria ser cons-
truído o estádio, quase metade desse valor. Os recursos restantes, corroídos
pela inflação, foram doados aos clubes de futebol de Santa Catarina, quando
se verificou que não era mais possível construir o estádio. O mesmo teria
ocorrido com os recursos obtidos pela UFSC se Stemmer não tivesse acelerado
a elaboração dos projetos, licitações e construções das áreas a construir."
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

do Museu Mineralógico, com 204 m2. Através de projeto específico


submetido pelo Prof. José João de Espíndola à Finep, foi construído o
laboratório de Acústica e Vibrações, incluindo câmara anecóica, com
490 m\ Com recursos levantados entre servidores e professores, foi
construída e equipada uma creche de 460 m2, para o atendimento de
64 crianças.
Com verbas de várias fontes, mas predominantemente da antiga
Caixa Econômica Estadual, foi construído o Centro de Convivência e
Educação Continuada, em dois pisos, com 2.800 m2, inaugurado em
22 de março de 1979, com a presença do ministro da Educação,
Prof. Euro Brandão. O piso superior abrigava os serviços de extensão
da universidade, englobando setor administrativo, auditório de 170
lugares, sala de exposições e restaurante. No térreo, foram instala-
dos: agência de correios, sala de meios, duas agências bancárias,
salão de cabeleireiro e de manicure, banca de jornais e a livraria da
Feesc. As áreas de serviço foram cedidas contra pagamento de alu-
guel.
Através de projetos junto ao Departamento de Desportos do MEC e
com recursos provenientes da loteria esportiva, foram construídos
dois blocos de salas de aula para o Centro de Desportos, com 390m2;
três quadras de basquetebol; canalização e recobrimento do arroio
que cortava o campo de desportos; ginásio coberto, com 1.296 m2.
Com recursos do Programa de Desenvolvimento das Ciências Agrá-
rias - Prodeca foi edificado o prédio do Centro de Ciências Agrárias,
englobando salas de aula, laboratórios, biblioteca, móveis e equipa-
mentos, com 2.239 m2. E com recursos de várias fontes - predomi-
nantemente da Finep - foi instalada a estação experimental de aqui-
cultura, com 32 tanques de criação de peixes, dois dos quais com
lha.
Foram ainda obtidos recursos para a construção do Hospital Uni-
versitário, com 22.900 m2, englobando ambulatório, enfermarias,
consultórios, cozinha, lavanderia, almoxarifado, farmácia, salas de
Arno Blass

aula, laboratórios de análises clínicas, setor de fabricação de remédi-


os, raios X etc.
Procedeu-se, ainda, à aquisição e total recuperação da antiga igre-
ja da Trindade e respectiva casa paroquial, de 861 m2, que foi desti-
nada ao setor artístico; à construção e instalação do biotério; à refor-
ma de prédio e à instalação do laboratório de restauração de obras de
arte; à ampliação do Colégio de Aplicação.
Stemmer conseguira negociar, em 1979, com o FAS e o Premesu,
uma complementação de Cr$ 155 milhões para o Hospital Universitá-
rio e outra de Cr$ 82 milhões para obras complementares de sanea-
mento e conclusão de prédio para o curso de Odontologia. As libera-
ções, contudo, foram por diversas vezes postergadas, só ocorrendo
após o término de sua gestão.
Com recursos assegurados pela alienação - para a Secretaria de
Educação do Estado - do prédio da antiga Faculdade de Direito, no
centro de Florianópolis, ainda na gestão Stemmer, foi realizado o
projeto completo e aberta a concorrência para a construção do se-
gundo bloco de salas de professores e de administração do Centro
Sócio-Econômico. Seguiu-se igual procedimento para a construção
do segundo prédio destinado ao curso de Odontologia, que seria cons-
truído com recursos de diversas fontes, inclusive os resultantes da
alienação do prédio da antiga Faculdade de Farmácia, no centro de
Florianópolis - que estava em negociação com a Justiça do Trabalho.
Seguiu-se igual procedimento também para a construção do prédio
próprio para o Colégio de Aplicação, que já tinha recursos iniciais
liberados pela Secretaria do 1- e 2- Graus do MEC.
Ao assumir, Stemmer encontrou 56.000 m2 de área construída no
campus. Ao término de seu mandato, mais 65.239 m2 haviam sido
construídos, num total de vinte e oito prédios. A universidade encon-
trava-se, com exceção de poucos setores, concentrada no campus. É
de se imaginar que o impacto desse monumental incremento da área
construída seria, por si só, gerador de sérios problemas de infra-
Caspar ErichStemmer - Administração, ciência e tecnologia

estrutura. Por isto Stemmer teve de enfrentar, paralelamente, a ques-


tão, realizando obras como:
• Nova rede de abastecimento de água, com tubos de ferro fundido
e reservatório de 2 milhões de litros, em convênio com a Com-
panhia de Águas e Saneamento de Santa Catarina - Casan.
• Implantação de rede telefônica subterrânea e instalação de nova
central inteiramente transistorizada, com 25 troncos e 250 ra-
mais, uma instalação modesta ante as necessidades, mas subs-
tancialmente melhor do que a rede anterior; serviço de telex.
• Instalação de dez telefones públicos nos locais mais movimenta-
dos do campus.
• Retificação e revestimento dos canais do Horto Botânico e do
canal do Meio e obras contra inundações; aterro para saneamen-
to e proteção contra enchentes, totalizando 37.000 m3 de terra e
5.000 m3 de pedras, urbanizando uma área de 210.000 m2.
• Estacionamentos calçados, disseminados pelo campus e gara-
gens para os veículos lotados na reitoria; ruas de acesso, portões
e cercas para o hospital universitário; passarelas, calçadas e pon-
tes, sobre os canais, para pedestres;
• Ajardinamento e paisagismo, com o plantio de mais de 10.000
árvores - ipês, flamboyants, pau-brasil, madeiras de lei, nativas
e ornamentais -, mini-bosques, gramados, passarelas.
Stemmer, poucos dias antes de passar o cargo a seu sucessor, falou
ao jornalista Moacir Loth:13
Mas uma universidade não pode nem deve ser apenas uma conver-
gente de obrigações e deveres do professor e aluno. E é preciso

13 Moacir Loth, "O comodismo esteve sepultado na gestão Caspar Stemmer, na


UFSC" Jornal de Santa Catarina, Florianópolis, 11-12 mai 1980, p. 19-
Arno Blass

humanizar esse convívio de todos os dias, porque está nos encontros


extra-classe a origem dos diálogos, da aproximação dos sentimen-
tos, da troca entusiástica das idéias, que identificam os sentimentos e
proporcionam o salutar exercício das condutas democráticas.

Os colégios

Stemmer dedicou grande atenção aos dois colégios agrícolas, situa-


dos em Araquari e Camboriú, no norte do estado, repassados pelo Mi-
nistério da Agricultura à UFSC, na época dos acordos MEC-Usaid. Em
ambos, as vagas foram aumentadas em 40%; foram adquiridos novos
tratores e implementos agrícolas, construídos novos dormitórios para
os alunos internos, montados geradores de biogás para fins de ensino e
de economia de combustível, atualizadas as bibliotecas - com a doação
de Cr$ 1 milhão pelo convênio Premen/BID. Em Camboriú, foram cons-
truídos: nova biblioteca e salas de aula, moderno aviário para 20 mil
frangos e uma estação de piscicultura, com o apoio da Sudepe. Foram,
ainda, acrescentados 64 ha à área útil, mediante permuta de terras da
antiga Escola de Tratoristas de Ilhota com o governo do estado. Em
Araquari, foi instalada moderna chocadeira para produção de pintos,
realizadas reformas, construído um poço artesiano e um prédio para
processamento e venda dos produtos da fazenda-escola.
Quando Stemmer assumiu, o Colégio de Aplicação encontrava-se
precariamente instalado no centro da cidade e ameaçado de extinção.
Stemmer transferiu-o para o campus, reforçando sua função de labora-
tório experimental, junto ao Centro de Educação. Uma reforma em
uma área coberta e a remoção de um teatro sem condições de operação
permitiu a construção de salas que viabilizaram o funcionamento ime-
diato e emergencial do colégio, ao lado do Centro de Educação. Ao
mesmo tempo, eram implantados o gabinete de Orientação Educacio-
nal, o serviço de Supervisão Escolar e o gabinete de Serviço Social.
Mas mesmo o caráter emergencial e transiente da solução dada ao
Colégio de Aplicação não desviava a atenção de Stemmer para a res-
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

ponsabilidade que a UFSC tinha para com seus alunos. A Profa. Herta
Kieser, diretora do colégio à época, lembra que, ao solicitar a com-
pra de uma máquina de costura para atender a necessidades do ensi-
no profissionalizante, Stemmer chamou-a e perguntou onde ficaria a
máquina. Não se satisfazendo com a resposta, dirigiu-se ao colégio,
observou o local e vetou-o: a iluminação ali era insuficiente. Alguns
dias após, destinou uma das casas obtidas em permuta na periferia
do campus às aulas de Iniciação ao Trabalho.
Ao atender a ponderações de ordem pedagógica, a escolha dos
alunos passou do sistema de provas - que privilegiava os mais bem
dotados - à seleção por sorteio; finalmente, atendendo a pedidos das
associações de professores e de servidores da UFSC, foram reservadas
vagas prioritariamente para filhos de funcionários da UFSC.14 Foram
estipuladas normas para assegurar vagas em proporções adequadas
para filhos de servidores modestos, de servidores qualificados e de
docentes, atendendo simultaneamente à justiça social e à heteroge-
neidade requerida para reproduzir, no "laboratório", as condições de
ensino nas escolas.15
Foram, ainda, implantadas as quatro primeiras séries do lº grau e
introduzida a profissionalização no 2- grau, adaptando o colégio às
normais legais então vigentes. Instalada a creche, a UFSC passou a
atender a todos os níveis de ensino: do maternal ao doutorado.
O colégio de aplicação, porém, necessitava de prédio próprio e con-
dizente com sua finalidade. Stemmer ainda chegou a obter os recursos
iniciais para a sua construção da Secretaria de 1ºe 2º Graus do MEC.

14 Este critério funcionou durante mais de uma década, vindo a ser derrubado na
Justiça por uma ação judicial movida por elementos externos à universidade.
É minha opinião que a administração da época não se esforçou suficiente-
mente para preservar este benefício colateral dos funcionários.
15 A Profa. Herta Kieser lembra que a medida desencadeou uma pequena reação
em cadeia: face à nova composição do alunado, o colégio teria de implantar
a merenda escolar; esta exigia instalações adequadas...
Arno fitos

Mas o interesse de Stemmer pelo Colégio de Aplicação não se


exauria com o equacionamento de problemas materiais. Ele estava lá
nas olimpíadas, gincanas, desfiles, debates científicos, formaturas,
prestigiando e incentivando o trabalho que lá era feito. Da mesma
forma, visitava com freqüência os colégios agrícolas, procurando in-
teirar-se de seus problemas e auscultar o pensamento dos professo-
res, num interesse realmente sincero.

A Biblioteca Universitária

A UFSC - seguindo orientação do Ibict e do MEC - havia decidido,


na gestão anterior, pela centralização da biblioteca, obtendo os recur-
sos e construindo amplo prédio de dois pisos, com 5.450 m2. Stem-
mer. ao assumir, encontrou-o sem móveis, nem divisões. Faltava, tam-
bém, infra-estrutura de apoio. Propôs, de imediato, passar todos os
professores do curso de Biblioteconomia, até então em regime de 20
horas semanais, para o de dedicação exclusiva, com a condição de
dedicarem meio período á organização da nova biblioteca central.
Contratou nova diretora e 18 bibliotecárias, recém-egressas do curso,
além de pessoal de apoio - portaria, secretaria, limpeza, ... Feito o
regimento da biblioteca, foi adotado o sistema de acervo aberto, com
acesso direto às estantes, com funcionamento contínuo, das 7 as 22
horas, inclusive aos sábados. Empréstimos poderiam ser feitos a alu-
nos, servidores e professores e, sob certas condições, à comunidade.
Para coibir abusos, a liberalidade do sistema era contrabalançada
pela cobrança de multas por atraso e não devolução de livros; de
outro lado, a efetivação de novas matrículas e a entrega do diploma o
final do curso passaram a ser condicionadas à comprovação de ne-
nhuma pendência com a biblioteca.
Foi feito o arranjo físico da biblioteca, bem como foram instaladas
as divisórias; estantes para os livros, móveis, fichários, impressos, im-
pressora automática de fichas e equipamento de microfilmagem foram
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciencias e tecnologia

adquiridos progressivamente. Foi realizada a catalogação de todos os


livros da UFSC, implantado o fichário sistemático e organizados os seto-
res de normas, de obras de referência, de periódicos, de recuperação
de livros danificados e de microfilmagem. O sistema de aquisição foi
simplificado, agilizado, subordinado somente à biblioteca, com estru-
tura, inclusive, para a importação direta. A ampliação do acervo foi
perseguida mediante projetos e pedidos a agências de fomento nacio-
nais e estrangeiras, públicas e privadas, com excelentes resultados.
Com orientação da Universidade da Virgínia, foi instalado o Nú-
cleo de Apoio Instrucional - NAI para o qual foram obtidos recursos
e adquiridos equipamentos de vídeo-fita, projetores de diapositivos,
fitas de vídeo virgens, equipamento de filmagem e revelação, leitora
de microfichas, gravador e 94 módulos instrucionais. Foi organizada
ampla videoteca, com filmes de valor educativo, obtidos das mais
variadas fontes, geralmente sob a forma de doação.
A centralização dos serviços de biblioteca foi sendo processada na
medida em que as unidades eram instaladas no campus. Foi confec-
cionado o catálogo coletivo dos livros e publicações, implantada uma
política de doação e permuta, sistematizado o processo de descarte,
desenvolvido o serviço de informações em coordenação com o siste-
ma nacional do CNPq/Ibict. Foi iniciado o uso de sistemas computa-
cionais, instalados os setores de obras raras, de assuntos catarinenses
e de teses de mestrado e doutorado. Foram criados ambientes para o
estudo e a pesquisa.
Em 1979 a biblioteca apresentava uma média diária de mais de 2
mil usuários e um acervo de 106 mil volumes.

Núcleo de Processamento de Dados

A UFSC havia ingressado na era da Informática em 1969, quando


foram obtidos recursos do Funtec, do BNDE, para a aquisição de um
computador IBM 1130, com 16 kB de memória, sendo então contra-
Arno Blass

tado um especialista com mestrado em Ciências da Computação. 0


objetivo inicial do serviço de processamento de dados assim instala-
do era dar suporte ao nascente curso de Pós-Graduação em Engenha-
ria Mecânica. Quando Stemmer assumiu a reitoria, sete anos depois,
a UFSC continuava com a mesma configuração do IBM 1130, mas
com o compromisso de atender mais de 1 mil alunos de iniciação à
computação, de efetuar a correção do vestibular, a matrícula e outras
tarefas administrativas. O apoio ao ensino e à pesquisa era precaríssi-
mo, e as tarefas administrativas geravam atrasos e erros.
Entrementes, BNDE, Capre, MEC e CNPq haviam decidido um pla-
no nacional de atendimento às universidades brasileiras com equipa-
mentos eletrônicos. A UFMG receberia um moderno computador
Burronghs, transferindo seu IBM 360/40 para a UFSC, que, por sua
vez, transferiria seu 1130 para a Universidade Federal do Maranhão. A
UFMG, embora atendida, a protelou a liberação do 360/40, que só foi
recebido pela UFSC em setembro de 1977. Em março, havia iniciado
o curso de Ciências da Computação, que logo veio a se tornar de
elevada demanda da universidade.
A chegada do novo computador ensejou maior acesso dos alunos
de graduação e pós-graduação aos recursos computacionais. Seu uso
para as tarefas administrativas foi estimulado, mas ficou aquém da
expectativa, em virtude de sobrecarga do computador e da equipe de
programadores e analistas. Em 1979, a UFSC conseguiu contratar uma
nova CPU, IBM 4341, com velocidade de operação dez vezes superior.
Tratava-se do segundo computador de sua classe instalado no Brasil,
produzido na fábrica de Sumaré, em São Paulo. Ao deixar a reitoria,
Stemmer deixava a UFSC entre as instituições brasileiras mais atuali-
zadas em informática, embora com recursos bem mais limitados do
que UFRGS, USP, UFMG, Coppe ou PUC/RJ, que haviam tido progresso
constante e apreciável, tendo alcançado níveis bem mais altos de rea-
lização e prestígio na área.
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

A Fapeu
Em 1979, funcionavam na UFSC 14 cursos de pós-graduação, abri-
gando mais de 800 novos alunos. No mesmo ano, foram defendidas
cerca de 100 dissertações. A pesquisa, aos poucos, institucionalizava-
se. Com honrosas exceções, os pesquisadores, por mais competentes
que fossem em suas respectivas áreas, não estavam acostumados a sair
à cata de recursos nas agências de fomento e, em muitos casos, não
sabiam propriamente como fazê-lo. Stemmer, refletindo a experiência
que já trazia do Centro Tecnológico e o conhecimento da realidade que
lhe era relatada por Paulino Vandresen, entendeu que era necessário
dar-lhes apoio logístico na elaboração de projetos, zelar pelo bom
nível destes e encaminhá-los a instituições pertinentes, das quais se
poderia esperar financiamento. Assim sendo, criou, em 28 de setem-
bro de 1977, a Fundação de Amparo à Pesquisa e à Extensão Universi-
tárias - Fapeu. Essa fundação, devidamente organizada e instituciona-
lizada, assumiu as tarefas de apoiar a elaboração dos projetos de pes-
quisa, em seus aspectos formais; contatar instituições interessadas no
objetivo do projeto e obter financiamento para o mesmo; e realizar as
tarefas burocráticas de datilografia dos relatórios, classificação das
despesas, coleta de preços, aquisição de materiais, preparação de
prestações de contas e realização de outras tarefas correlatas.
No período 1977-1979, a Fapeu preparou mais de 150 projetos,
captando Cr$ 247 milhões. Tornou-se responsável pelo gerenciamen-
to de importantes programas de pesquisa desenvolvidos na UFSC: plan-
tas medicinais, nativas florestais, criação de peixes e camarões, recu-
peração e utilização da ilha de Anhatomirim.

O Hospital Universitário

No que tange a hospitais universitários, a experiência do MEC re-


vela que a operação dos mesmos custa tanto quanto a da universidade
a que estão agregados. Mas, como ter um hospital traz prestígio à
Arno Blass

faculdade de medicina, era comum algumas universidades começa-


rem a construí-los, criando um fato consumado, torcendo para que o
MEC, eventualmente, assuma a obra. É por isso que o governo fede-
ral, em 1968, resolveu proibir terminantemente a construção de no-
vos hospitais universitários, zerando todas as verbas destinadas a esta
finalidade. Em decorrência dessa medida, quatro grandes esqueletos
de concreto, deteriorando-se sob as intempéries, tomados pelo mata-
gal, converteram-se em símbolos gritantes de sonhos grandiosos atro-
pelados pela carência econômica. Estavam situados nas universidades
federais de Pernambuco, Paraíba, Alagoas e Santa Catarina.
Quando, em 1975, o país encontrava-se em excelente situação
econômica, o crescimento das cidades passou a exigir uma amplia-
ção da rede hospitalar. Com a criação do Fundo de Apoio Social -
FAS, o ministro da Educação, Ney Braga, com o apoio do DAU -
Lynaldo Cavalcanti e Edson Machado de Sousa - e o Premesu -
Stemmer -, apresentou à área econômica do governo Geisel pedido
de recursos para a conclusão das obras civis desses quatro hospitais
universitários. Aprovado o pleito no início de 1976, coube à UFSC um
montante de Cr$ 63 milhões.
Stemmer, ao assumir a reitoria, em maio desse ano, tencionava ini-
ciar, de imediato, as obras. Era, no dizer de José João Cândido da Silva,
[...] o homem certo, no momento certo, no cargo certo. [...] Dele
recebemos uma incumbência: era seu desejo inaugurar o hospital
até o dia 10 de maio de 1980. [...] A grande qualidade que o Prof.
Stemmer imprimiu a nossa comissão, presidida pelo Dr. Polydoro
Ernani de S. Thiago, foi dar prazos e cobrar metas."'

16 O Prof. João José Cândido da Silva é hoje o secretário de estado da Saúde de


Santa Catarina. Durante a gestão Stemmer foi vice-presidente da Comissão de
Implantação do Hospital Universitário e, depois, vice-diretor do mesmo, até
ser convidado para ser assessor do ministro Jair Soares no Ministério da
Previdência e Assistência Social.
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

Mas o projeto arquitetônico elaborado há vários anos já não con-


dizia com os progressos mais recentes na área da saúde, com a cres-
cente preocupação com infecções hospitalares, nem com novos equi-
pamentos utilizados em diagnóstico e tratamento. Uma comissão da
área concluiu pela necessidade de reformulação total do projeto
arquitetônico. Com isso, haveria necessidade de rever, também, ou-
tros 26 projetos complementares - elétrico, hidráulico, de vapor,
mecânico, cozinha, telefonia, comunicação etc. -, confiados a firma
especializada.
Por outro lado, ao ser inspecionada a estrutura de concreto exis-
tente, foram constatadas fissuras profundas nas junções de apoio.
Convidada para realizar uma inspeção, a Profa. Leda Carmen Wulff
Gobetti, da UFRGS, juntamente com um grupo de técnicos, tendo
emitido parecer pouco lisonjeiro ao projeto original, recomendou
reforçar os apoios fissurados e refazer o cálculo estrutural da parte
ainda a ser construída, usando, por economia, os novos ferros de
construção disponíveis no mercado. Disso resultou que o Hospital
voltou à fase de projeto, com um gasto suplementar, enquanto se
desvaloriza o dinheiro parado.
Mas em novembro de 1976, finalmente, foi firmado o contrato
para a primeira etapa de obras com a firma vencedora da concorrên-
cia. A segunda etapa foi contratada em maio de 1977, quando os
projetos complementares começaram a ficar prontos, e a terceira,
em fevereiro de 1978. Stemmer, tendo começado a batalhar por com-
plementação nas verbas, conseguiu o suficiente para contratar a quar-
ta etapa de obras em início de 1979-
Contudo, com a mudança do governo, em março de 1979, a situa-
ção tornou-se crítica. De início, nenhuma decisão foi tomada até que
a nova equipe governamental se inteirasse dos problemas. O hospital
precisava de recursos para a conclusão das obras civis e para a aqui-
sição de equipamentos. E novas preocupações se configuravam: 1.200
funcionários, das mais diversas especialidades, seriam requeridos para
Arno Blass

operar o hospital, com seus 320 leitos. Algumas boas notícias trouxe-
ram alento: o Premesu repassou um equipamento de raios X e alguns
microscópios do leste europeu; o Inamps prometeu uma ambulân-
cia. A universidade e a Comissão de Implantação do Hospital Univer-
sitário foram à imprensa, que logo abraçou a causa. Os estudantes
puseram-se em campo. O governador do estado, o presidente da As-
sembléia Legislativa, deputados (estaduais e federais) e vereadores
tomaram partido em favor do hospital.
Quando Jair Soares, ministro da Previdência e da Assistência So-
cial, veio a Florianópolis, os estudantes o receberam com faixas e
cartazes, entregaram-lhe uma carta reivindicatória e o convidaram a
visitar as obras. Ele se declarou aliado. João José Cândido da Silva, da
Comissão de Implantação, conversou com Harry Graeff, presidente
do Inamps, sobre as necessidades de recursos para o início de funcio-
namento do hospital. Graeff admitiu a possibilidade de adiantar Cr$
44 milhões, pelo Inamps, que seriam ressarcidos em parcelas suaves,
através da prestação de serviços, quando o hospital estivesse funcio-
nando. Transmitiu esta sugestão ao ministro. E naquela tarde, em
concentração na Praça da Bandeira, este deu seu apoio à campanha e
garantiu recursos de Cr$ 44 milhões para o prosseguimento das obras
do hospital.
Esses recursos permitiram contratar os primeiros servidores e a
execução de uma série de obras de infra-estrutura. Mas muito mais se
fazia necessário. Aviso do novo ministro da Educação à Seplan, em
maio de 1979, pedia recursos para a conclusão dos quatro hospitais,
inclusive 75 milhões para a UFSC. Então já se vivia em clima de aber-
tura do regime militar, o que sugeria uma solução política. A banca-
da catarinense na Câmara Federal foi acionada: visitou, sucessiva-
mente, os ministros da Fazenda, da Saúde e da Educação, enfatizando
o interesse na conclusão do Hospital Universitário. Afinal, juntamen-
te com o governador do estado, Jorge Bornhausen, dirigiu-se ao mi-
nistro do Planejamento, Antônio Delfim Neto, que cedeu em parte:
Caspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

liberaria Cr$ 11 milhões dos Cr$ 75 milhões, ficando o restante para


1980.
Em janeiro de 1980, o Dasp aprovou o quadro de pessoal do Hos-
pital Universitário, pondo termo à longa batalha burocrática. A pri-
meira diretoria do hospital foi empossada em 11 de março de 1980,
exercendo a função de diretor-geral o saudoso Prof. Polydoro Ernani
de S. Thiago, que hoje dá nome ao hospital. Até o fim de março, 23
ambulatórios estavam ativados, assim como 42 leitos de pediatria e
58 de clínica médica. Trinta e cinco docentes, lotados no Departa-
mento de Clínica Médica do Hospital de Caridade, foram transferidos
para o Hospital Universitário.
Mas a batalha em favor de verbas para concluir e equipar o hospi-
tal ainda continuou. Em janeiro de 1980, o Premesu encaminhou
projeto ao FAS, incluindo os quatro hospitais universitários já referi-
dos e pleiteando recursos, dos quais Cr$ 155 milhões para a UFSC.
Aprovado pelo FAS, o projeto, dado seu montante, teria de ser anali-
sado, também, pelo Conselho de Desenvolvimento Social, integrado
pelos ministros das áreas social e financeira. Foi preciso, mais uma
vez, mobilizar argumentos sobre a relevância e a prioridade da obra.
Afinal, em 29 de abril, a Dra. Gilca Wainstein, coordenadora do
Premesu, comunicou que o convênio dos hospitais estava aprovado e
que iria trazê-lo em mãos a Florianópolis, quando viesse para a trans-
missão do cargo de reitor, para que Stemmer pudesse assiná-lo, como
último ato de sua gestão. Não deu. Mas o dinheiro, afinal, acabou
chegando, algum tempo depois.

O Jornal Universitário

Em agosto de 1976, começou a circular o Jornal Universitário,


com 12 páginas e tiragem de 4 mil exemplares. Desde o início, os
editores responsáveis - jornalistas José Hamilton Martinelli e Moacir
Pereira - produziram um jornal independente e descomprometido,
Arno Blass

voltado à divulgação da vida da universidade, não aos interesses do


gabinete do reitor. Sua missão era informar, criticar, levantar proble-
mas, exprimir os anseios da comunidade universitária. O jornal era
veículo de comunicação que dava acesso, facilidade de participação e
liberdade de expressão tanto aos alunos como ao reitor.
Cobrindo os acontecimentos ocorridos na UFSC, foi através do
jornal, muitas vezes, que a comunidade tomou conhecimento do que
se passava no âmbito da universidade. Foi o Jornal Universitário que
conseguiu motivar a comunidade a engajar-se em defesa da continua-
ção das obras do Hospital Universitário, quando as mesmas estavam
ameaçadas de paralisação por falta de recursos. Em 40 números,
durante a gestão Stemmer, o Jornal Universitário, retratando a vida
da universidade, em especial os vestibulares e as formaturas, retratou
a história da UFSC.
A criação do Jornal Universitário verteu da idéia de torná-lo um
jornal-laboratório dos alunos do curso de Jornalismo. Mas esse pro-
jeto veio futuramente a ser abandonado. O Jornal Universitário,
entretanto, sobrevive até hoje, com mais de 350 números publicados,
já com 16 páginas.

A ilha de Anhatomirim

A ilha de Anhatomirim, no litoral catarinense, está intimamente


vinculada à história de Florianópolis. No passado remoto, seu nome é
associado a piratas, ao meridiano de Tordesilhas, a invasores ingle-
ses, franceses e espanhóis. Em 1863, nela residiu, por algum tempo,
um jovem engenheiro militar, encarregado de trabalhos de restaura-
ção e recuperação das fortificações; seu nome era André Rebouças, o
futuro abolicionista.17 Mais recentemente, durante a Revolução

17 Sydney M. G. dos Santos, André Rebouças e seu tempo. Rio de Janeiro,


edição do Autor, 1985, p. 36.
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

Federalista, foi para lá que Moreira César, o preposto de Floriano,


levou e aprisionou cerca de 300 homens, de que posteriormente man-
dou fuzilar pelo menos 185. Este acontecimento traumatizou a então
pequena cidade de Nossa Senhora do Desterro. Ainda hoje, muitas
famílias guardam a lembrança dos antepassados mortos naquela oca-
sião.
A ilha de Anhatomirim, local de beleza deslumbrante, apresenta
mais de 2.000 m2 de prédios em ruínas. São, em sua maior parte,
construções erguidas sob o comando do brigadeiro Silva Paes, a par-
tir de 1739, entre as quais sobressai a Fortaleza de Santo Antônio. A
Casa da Guarda, com arcos majestosos, 70 metros de comprimento,
constitui uma das maiores e mais ousadas obras dos portugueses em
terras americanas. Algumas construções foram realizadas pela Mari-
nha, durante a segunda década do século passado. Essas edificações,
bem conservadas até o início do século XX, foram depois abandona-
das, deteriorando-se por efeito da ação do tempo e dos vândalos.18
Em algum momento da década de 70, a UFSC pleiteou a guarda e
a tutela dessa ilha. Quando Stemmer assumiu, o empresário Arman-
do Gonzaga, o Prof. Ignácio Ricken, presidente da Fapeu, e a Profa.
Bianca Sierra de Ledo, conceberam e puseram em execução a opera-
ção "Chapéu na Mão".19 Pela mesma, objetivavam levantar recursos
para uma rápida recuperação desses prédios históricos e a instalação
de um Instituto de Ciências do Mar - Icimar. Empresas e a comunida-
de em geral se motivaram; o governo do estado, o 5" Distrito Naval e
a Sudesul colaboraram.

18 Rosângela M. de M. Machado, Fortalezas da ilha de Santa Catarina, Floria-


nópolis, UFSC, 1994.
19 A Profa. Bianca Sierra de Ledo, da Universidade de Montevidéu, era especialis-
ta em Biologia Marinha. Naquela época, coordenava, na UFSC, a implantação
do Núcleo de Estudos do Mar.
Arno Blass

Em 1979, a UFSC firmou, com o ministério da Marinha e o Iphan,


um convênio que assegurou a essa universidade a tutela e a guarda da
ilha de Anhatomirim, dentro de um projeto que previa a instalação
de uma base de pesquisas oceanográficas de ecologia marinha e ou-
tros empreendimentos.2"

A Imprensa Universitária
e as atividades editoriais

A Imprensa Universitária, ao ser transferida para o campus, foi


instalada em um prédio adrede construído, com área de 1.259 m2.
Também recebeu novos equipamentos.
Durante a gestão Stemmer, ela publicou um total de 110 títulos,
em que se incluem os Anais do Museu de Antropologia, -a Revista da
Faculdade de Direito e a Revista do Instituto Histórico e Geográfico
de Santa Catarina, Aparecem, ainda, publicações discentes, livros
didáticos, anais de congressos realizados em Santa Catarina e obras
de divulgação da arte catarinense. Nessa época, foi publicada a pri-
meira edição de UFSC: Sonho e realidade, do primeiro reitor, Ferrei-
ra Lima. Surgiram textos em artes plásticas, livros de poesia, estudos
sobre o vestibular.
Foi lançada a coleção "Ensaios Catarinenses", destinada a abri-
gar dissertações de mestrado que, a critério das bancas examinado-
ras e colegiados, viessem a ser consideradas representativas dos di-
versos cursos de pós-graduação. Oito títulos foram lançados em
dois anos. A experiência obtida demonstrou que a complexidade do

20 Este projeto tem sido desenvolvido, com as inevitáveis adaptações e correções


de rota, pelas sucessivas administrações da UFSC. Na década de 90, a Funda-
ção Banco do Brasil financiou ambicioso projeto de restauração das fortalezas
do complexo defensivo da ilha de Santa Catarina, de que Anhatomirim fazia
parte.
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

mercado editorial exigia uma atuação mais rápida e dinâmica, com


vistas a atingir o público leitor fora dos muros da universidade.
Surgiu daí, em fins de 1979, o esquema de co-edição, estabelecido
com a Editora Lunardelli, que era então a mais ativa de Florianópo-
lis. Até maio de 1980, seis títulos chegaram a ser publicados.21

O Restaurante Universitário

O Restaurante Universitário já tinha sede no campus quando


Stemmer assumiu. Em que pesem a administração eficiente, a higi-
ene das instalações, a qualidade das refeições servidas e a contínua
busca de melhores insumos e de novas e melhores técnicas de pre-
paro, era inevitável que um problema teria de ocorrer, na medida
em que as várias unidades espalhadas pela cidade viessem para o
campus: o Restaurante Universitário se tornaria acanhado para a
demanda. Outrossim, os restaurantes espalhados pelas unidades eram
pequenos, e praticamente não havia restaurantes na periferia do
campus.
Com o atendimento de alunos e servidores, passaram a ser servi-
das mais de 4 mil refeições diárias no período das 11:30 às 13:30
horas, ou seja, o equivalente a um almoço a cada dois segundos.
Como os restaurantes universitários não estavam nas prioridades do
MEC, as reiteradas solicitações de verbas para a construção de nova
ala para o Restaurante Universitário não encontravam receptividade.
Stemmer partiu, então, para a racionalização dos serviços: esteiras
rolantes, simplificação do sistema de controle de identidade e dos
vales, atendimento super-rápido. Mas as filas aumentavam continu-
amente. Apesar de o tempo de espera não ultrapassar os 20 minutos
na hora do pique, os usuários ficavam impacientes, especialmente

21 Foi a semente. Na gestão seguinte, Silvio Coelho dos Santos criou a Editora da
UFSC, hoje uma das mais dinâmicas editoras universitárias do país.
Arno Blass

em dias de muito sol ou de chuva, e as reclamações passaram a ser


muitas e fortes.
Abriu-se uma segunda porta e colocaram-se mais mesas no salão.
Foi criado um horário especial para o atendimento de servidores,
deslocado da hora do pique. Foi feito apelo para que aqueles que
tivessem terminado o almoço saíssem logo, dando lugar a outros
usuários. Tudo era mero paliativo. Alguns, mais fortes e menos bem
educados, começaram a furar a fila, fazendo com que os demais,
especialmente as moças, tivessem de esperar mais. A solução foi co-
locar uma grade alta e com pontas, deixando um corredor estreito
entre a parede e a grade, permitindo a passagem de apenas uma pes-
soa. Ficou horrível, mas resolveu o problema dos furões. Mas tam-
bém serviu de combustível para os mais radicais, que começaram a
propor operação tartaruga: comer devagar e ficar batendo papo, para
que a fila não pudesse andar. Uma vice-diretora do colégio de aplica-
ção aderiu ao proselitismo barato e trouxe seus alunos para, em unís-
sono, baterem talheres. Os funcionários começaram a ficar amedron-
tados.
Brasília não se sensibilizava. A situação se tornava insustentável.
Stemmer reuniu-se com seus auxiliares, estabeleceu um austero pla-
no de contenção de gastos, reuniu todos os recursos da renda própria
da universidade e, em janeiro de 1980, iniciou a construção do ter-
ceiro bloco do Restaurante Universitário. Inaugurou-o no dia 9 de
maio, último de sua gestão, selando a paz entre usuários e a reito-
ria.22

22 Era uma sexta-feira. No sábado deu-se a transmissão do cargo. Na segunda-


feira, primeiro dia útil da nova administração, o reitor convocou jornais e
televisão para um ato público de remoção das grades do restaurante universi-
tário: "Isto não é campo de concentração!", foram palavras que recordo tê-lo
ouvido proferir. Pergunto a meus botões: teria ele tido este rompante se não
contasse com a terceira ala?
Caspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

Contraponto

Desde 1971, quando, em função da implantação da Reforma Uni-


versitária, foram criados os departamentos e as coordenações de cur-
so, os chefes dos departamentos e os coordenadores dos cursos23 vi-
nham sendo designados pro tempore pelo reitor. Stemmer serviu-se
deste dispositivo para compor uma equipe homogênea, que efetiva-
mente participasse do esforço que se fazia necessário naquela con-
juntura. Isto se traduziu em resultados práticos. Segundo Sérgio Arru-
da, que foi diretor do CTC durante a gestão Stemmer,
[...] a primeira metade do mandato foi tranqüila, praticamente
toda a comunidade acadêmica aprovando a gestão que primava
por resolver uma série de problemas que a administração anterior
vinha procrastinando.2'
As coisas começaram a mudar a partir da segunda metade de seu
mandato. Era reflexo natural do que acontecia no país. Falava-se em
abertura - do governo militar -, em distensão, Geisel indicou Figuei-
redo para substituí-lo; este assumiu o compromisso de restaurar a
democracia; logo mais o povo iria às ruas clamando por eleições -
Diretas-ja. O anseio da sociedade por abertura do regime e por liber-
dade encontrava no pequeno mundo do ambiente universitário per-
feita caixa de ressonância. Começaram as contestações políticas. A
situação converteu-se num confronto direto quando um grupo raivo-
samente radical e corporativo assumiu o controle da associação de
professores. Associava-se o nome de Stemmer ao regime militar. Eis
comentário de Arruda:
A fase mais crítica da "Revolução" havia passado, e o swing do
pêndulo passava agora por contestar tudo o que se pudesse con-

23 Num esforço por aparentar originalidade, os coordenadores de curso, naque-


la época, eram chamados de "integradores".
24 Sérgio Roberto Arruda, depoimento pessoal ao autor, agosto de 1970.
Arno Blass

figurar como autoridade. Confundia-se autoridade com autorita-


rismo.25
Os antigos opositores não só despertaram, mas também fizeram a
sua parte:
Havia, da parte da imprensa local, uma clara intenção de
desestabilizar a gestão de alguém que consideravam "estrangeiro"
e autoritário.26
Fazendo eco ao movimento pelas Diretas-Já, alguns setores come-
çaram a clamar pela eleição dos chefes dos departamentos. Stemmer
parecia preferir postergar esta abertura até o final de sua gestão. Ar-
ruda tece este comentário:
A meu ver, o maior erro político de Stemmer foi não ter, logo no
início da segunda metade do seu mandato, realizado eleições para
as chefias dos departamentos.27
Pessoalmente, não creio que tivesse feito muita diferença. Os ra-
dicais assumiam postura claramente maniqueísta e sempre encontra-
riam argumentos para justificá-la; afinal, exercitavam a contestação
pela contestação. Além disso, o que acontecia na UFSC, em maior ou
menor grau, também ocorria em quase que todas as universidades
federais. Foi nessa época que começaram as greves. Foi nessa época
que nasceu a idéia tresloucada de inviabilizar um vestibular. Mas este
propósito deu a Stemmer sua última grande vitória: conseguiu mobi-
lizar um grupo substancial de professores, colocou, pela primeira
vez, servidores técnico-administrativos e estudantes no trabalho de
fiscalização,28 e realizou o vestibular de 1980 com sucesso e sem
incidentes.

25 Sérgio Roberto Arruda, op. cit.


26 Idem.
27 Ibidem.
28 Uma solução de contingência que deu certo e continua em prática até hoje.
Caspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

A tal propósito pondera Sílvio Coelho dos Santos:


A redemocratização do país transformava-se numa aspiração cole-
tiva. Era inevitável que esse clima contagiasse o campus. Nos seus
estertores, o regime ainda prosseguia com a repressão. A "opera-
ção barriga verde" fez suas vítimas no campus. Apesar das interfe-
rências positivas da reitoria neste processo, defendendo professo-
res e alunos, boa parte da comunidade universitária entendia o
reitor como um preposto do regime. As primeiras greves acontece-
ram com ásperas críticas e muita exaltação. Stemmer não conse-
guiu eleger seu sucessor.29
Ao chegar o fim do mandato de Stemmer, a comunidade universi-
tária apresentava, assim, um comportamento ambivalente em relação
a ele. Havia a parcela expressiva de docentes, servidores e estudantes
que comparavam as duas universidades, aquela de 1976 e a de 1980,
observavam a diferença, pesavam prós e contras e só podiam aplau-
dir. Mas havia também os insatisfeitos.

No Departamento de Engenharia Mecânica

Enquanto Stemmer enfrentava os magnos problemas da Universi-


dade, seu departamento, o Departamento de Engenharia Mecânica,
colhia os frutos de seu trabalho pretérito.
Por um lado, o ajuste complementar ao Acordo de Cooperação
Técnica Brasil-Alemanha - Convênio UFSC-Aachen - entrava em ope-
ração em 1976, e estender-se-ia até 1981. Fui designado coordena-
dor deste convênio, pelo lado brasileiro. Durante este período, um
rodízio permanente de professores alemães, com períodos de per-
manência que variavam de poucas semanas até alguns anos, injetava
novas idéias, nucleava novos grupos ou expandia as potencialidades
de grupos existentes. Ao mesmo tempo, estabelecia-se um fluxo

29 Sílvio Coelho dos Santos, op. cit.


Arno fitos

continuado de chegada de novos equipamentos que renovava os


laboratórios existentes e permitia o estabelecimento de novos. Com
isso, em termos práticos, institucionalizava-se, finalmente, a pes-
quisa no departamento.
Aos docentes da UFSC que foram obter seu doutoramento na Ale-
manha nos termos originalmente ajustados, estabeleceu-se, ao final
do convênio, já na década de 80, um programa de doutoramento
cooperativo - "curso sanduíche" -, em que alunos de doutorado em
Engenharia Mecânica da UFSC obtinham os créditos em disciplinas
em Florianópolis, seguiam para Aachen e iniciavam lá seu trabalho
de tese, adquirindo os equipamentos requeridos com recursos desta-
cados do convênio. Retornando ao Brasil, traziam estes equipamen-
tos - "seu enxoval", como se dizia -, concluíam aqui sua tese e
defendiam-na, obtendo seu diploma pela UFSC.
Contudo, nos termos ajustados, apenas uma parte dos laborató-
rios e grupos do departamento era beneficiada pela parceria com
Aachen: aqueles relacionados com a chamada Mecânica Dura - Pro-
cessos de Fabricação, Metrologia, Materiais. Isto iria causar um
desbalanceamento considerável no departamento, não fora a eclo-
são de outro grande projeto em que Stemmer trabalhara no passa-
do, quando diretor do Centro Tecnológico: ele havia encaminhado
à Finep solicitação de apoio financeiro, com recursos do emprésti-
mo que o governo brasileiro então negociava com o BID. Através do
convênio BID 137 OC-BR, defasado de aproximadamente um ano
em relação ao de Aachen, e do qual fui designado executor, um
total de US$ 700 mil foram alocados ao departamento. Destinavam-
se à aquisição de equipamentos e para a vinda de dois professores-
visitantes estrangeiros. A aplicação destes recursos foi concentrada,
prioritariamente, naqueles setores que não foram beneficiados pelo
convênio de Aachen.
Desta maneira, o Departamento de Engenharia Mecânica, assim
como o curso de Pós-Graduação em Engenharia Mecânica, saíram
Caspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

destes convênios completamente modificados, com os laboratórios


reequipados e o pessoal qualificado, sendo atingida a massa crítica
requerida para que se iniciasse o doutoramento na área, mais uma
vez, o primeiro da UFSC.
RETORNO AO DEPARTAMENTO
E OUTROS VÔOS

A manhã seguinte

transmissão do cargo ao novo reitor pareceu mais uma


festa de despedida. Foram muitos os que vieram carinho-
samente abraçar e cumprimentar Stemmer e sua equipe
pelo trabalho que haviam desenvolvido no quadriênio.
Na segunda-feira, 12 de maio de 1980, pouco antes das oito da
manhã, o ex-reitor Caspar Erich Stemmer apresentou-se ao chefe do
Departamento de Engenharia Mecânica, Prof. Hyppolito do Valle Pe-
reira Filho. Está de volta ao departamento. Onde ficará? Quais disci-
plinas ministrará? Que outras atividades lhe competirá desenvolver?
Hyppolito não o esperava, não soube o que fazer. Não se preparara
para esta eventualidade. Sugeriu que Stemmer tirasse alguns dias de
férias - merecidas, acrescentou. Não tinha sala, não tinha mesa, não
sabia onde alojá-lo. Só então Stemmer deu-se conta de que deveria
ter providenciado antes o espaço para seu retorno às atividades aca-
dêmicas. Andava pelo corredor sem conseguir esconder sua frustra-
ção. Encontrou Bernd Emil Hirsch, um dos professores-visitantes ale-
mães que estavam no Departamento de Engenharia Mecânica em de-
corrência do convênio com a RWTH Aachen, que era, na verdade, o
coordenador do convênio pelo lado alemão. Hirsch levou-o até sua
sala e mostrou-lhe que, redistribuindo os móveis, seria possível con-
seguir-lhe mesa e espaço de trabalho.
Arno Blass

Stemmer, examinando seus diapositivos, transparências, apostilas


e material de aula, constatou que ele se haviam tornado consideravel-
mente desatualizados. A introdução de componentes eletrônicos e a
tendência à automatização haviam revolucionado a disciplina que
ministrava. Ao mesmo tempo, uma reforma curricular, ocorrida du-
rante o tempo em que estivera na Reitoria, havia substituído a antiga
disciplina, Máquinas Operatrizes, de dois semestres, por outra, Pro-
cessos de Fabricação I, de um semestre, com considerável perda de
conteúdo didático. Doravante, suas aulas teriam de ser mais sintéti-
cas, enquanto que a tecnologia didática teria de ser aprimorada.
Stemmer tomou contato, também, com novos livros e com novas
edições, bastante ampliadas, de livros que já conhecia.
Mas a adaptação à rotina departamental não seria fácil. O quadro
do seu departamento, em razão do aumento dos encargos com a pós-
graduação, com vários dos cursos novos, com compromissos assumi-
dos em convênios - Aachen, BID -, durante a passagem de Stemmer
pela reitoria, tinha passado de 45 para 62 docentes - incluídos os
visitantes. Os professores contratados nesse período encontraram su-
ficientes aliados entre os mais antigos, passando a constituir a maioria
do departamento, com condições de decidir o que se fazia e o que
não se fazia. E como, em sua maioria, não conheciam Stemmer, dei-
xaram-se enlear pela postura corporativista e passaram a hostilizá-lo
abertamente. Passado algum tempo, a maioria deles amadureceu e
mudou de atitude - alguns até me confessaram que, hoje, se envergo-
nham de posturas que assumiram naquele tempo. Mas ao início da
década de 80, o Departamento de Engenharia Mecânica não era local
agradável para Stemmer e para os que o apoiavam e respeitavam.
Stemmer, contudo, encontrou atividades que lhe tomariam o
tempo. Começou a produzir os originais do que viriam a ser seus
dois livros-texto sobre ferramentas de corte. Encetou um programa
de atividades, juntamente com Áureo Campos Ferreira, com o obje-
tivo de divulgar a Sociedade Brasileira de Comando Numérico -
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

Sobracon junto ao meio industrial do país. Renovou contatos com


empresas, visando ao estabelecimento de parcerias com o Grupo de
Comando Numérico - Grucon do departamento, ao qual pertencia.
E participou ativamente da árdua batalha pela criação do Centro Re-
gional de Tecnologia em Informática - Certi, empreendimento lide-
rado por Carlos Alberto Schneider, criado em 1984 por um grupo de
empresas catarinenses e paulistas, pela UFSC, pelo CNPq e pelo go-
verno estadual, com a missão de atuar em automação industrial
informatizada. Entrementes, o tempo passava, e o clima no depar-
tamento melhorava.
Em outubro de 1980, Stemmer voltou à Alemanha, convidado pelo
Reitor da RWTH Aachen. Desenvolveu um programa intensivo de atua-
lização tecnológica e tentou negociar uma extensão do convênio que
havia com aquela universidade, com a participação da GTZ. Realizou
várias visitas, Em dezembro, em férias, visitou a Itália e a Grécia.
Retornou em meados de janeiro de 1981.

Comissão de Avaliação do
Programa Nuclear Brasileiro

Stemmer considera que sua participação na Comissão de Avalia-


ção do Programa Nuclear Brasileiro, .constituída pelo Decreto nº
91.606, de 2 de setembro de 1985, foi uma de suas mais ricas expe-
riências. Durante sete meses, esta comissão reuniu-se, sob a presi-
dência de José Israel Vargas, para discussões internas, visitas a todas
as empresas e à maioria dos laboratórios envolvidos de alguma ma-
neira com atividades de interesse para a energia nuclear, palestras de
dirigentes e especialistas da Eletrobrás, Nuclebrás e suas associadas,
e depoimentos de dirigentes de associações pertinentes. Foram visita-
das as instalações das subsidiárias da Nuclebrás em Rezende, Poços
de Caldas e Itaguaí. Ainda foram visitadas as usinas Angra I, Angra II e
centros de pesquisa relacionados com a área.
Arno Blass

De todas essas atividades, foram reunidas informações para a ela-


boração do relatório final, que deveria contemplar: a situação em
que se encontrava o programa nuclear brasileiro; o papel da energia
nuclear no país; a questão tecnológica; efeitos ambientais, proteção e
segurança; aspectos econômicos, financeiros, institucionais e inter-
nacionais; e proposta de recomendações. Um relatório sintético, pre-
parado para o presidente da República, foi publicado pela Academia
Brasileira de Ciências, em dezembro de 1990, juntamente com dois
enormes volumes de anexos.

Breve retorno à iniciativa privada

A firma WEG Motores, com sede em Jaraguá do Sul, fundada em


1961, ascendeu rapidamente a uma posição de destaque entre os
fabricantes de motores elétricos. Em 1980, após uma viagem à Ale-
manha, um dos fundadores da empresa, Eggon João da Silva, conven-
ceu seus sócios de que a WEG não deveria limitar-se a fabricar moto-
res, mas, como suas concorrentes GE e Siemens, deveria atuar em
todo o campo de produtos elétricos. A firma já havia adquirido uma
fábrica de transformadores em Blumenau.
Durante sua viagem, Eggon conhecera a pequena empresa Hausen,
situada em Offenburg, que fabricava posicionadores lineares e robôs,
constituídos de três posicionadores lineares, formando um sistema
cartesiano. Ele se interessou em adquirir a tecnologia e retornou com
a idéia de instalar em Florianópolis uma empresa dedicada à eletrô-
nica, utilizando o potencial da UFSC. Propunha-se investir até US$ 5
milhões. Stemmer gostou da idéia e manifestou interesse em partici-
par do projeto "quando se aposentasse". Ao invés, a WEG lhe fez uma
proposta: ser o diretor industrial da subsidiária, WEG Automação,
que seria construída em Florianópolis. Moacyr Sens, engenheiro me-
cânico formado numa das primeiras turmas da UFSC, que seria o
diretor geral, trouxe-lhe, com o convite, as chaves de um carro Monza,
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

a que teria direito, como todos os diretores da firma. Em março de


1987, Stemmer solicitou licença sem vencimentos na UFSC e aceitou
o convite.
Instalou-se numa sala da incubadora industrial tecnológica do Certi,
contratou uma secretária e dois engenheiros que havia tido como
alunos. Enquanto Moacyr Sens tratava da aquisição de um terreno de
60.000m2 e da construção de um prédio, Stemmer trabalhava na tra-
dução de um texto alemão sobre servomotores e procurava fornece-
dores de guias lineares de alumínio extrudado. Os dois foram à Ale-
manha e à Itália buscar tecnologia de fabricação de servomotores.
Encontraram certa resistência: a tecnologia ainda se encontrava em
fase experimental, não podendo ser cedida. Concluíram que seria
melhor comprar alguns servomotores e desenvolver tecnologia pró-
pria por engenharia reversa.
Stemmer fez um levantamento e estimou que o mercado brasilei-
ro de servomotores para máquinas-ferramenta de comando numérico
seria de cerca de 2 mil por ano. Este número não agradou à WEG, que
fabricava 200 mil motores elétricos por ano. Stemmer argumentou
que valeria a pena investir nesta tecnologia, porquanto, numa analo-
gia, os servomotores estavam para os motores convencionais, assim
como os carros de Fórmula 1 estavam para os automóveis. Juntamen-
te com os inversores eletrônicos, esta tecnologia poderia vir a alterar
o campo de utilização de motores elétricos.
Um problema ainda em aberto era o da obtenção de ímãs de ter-
ras raras - cobalto-samário ou ferro-neodímio. Stemmer acionou Alo-
ísio Nelmo Klein, do laboratório de materiais da UFSC, que, junta-
mente com o Ipen, de São Paulo, desenvolveu um projeto de fabrica-
ção dos ímãs de cobalto-samário. A tarefa mostrou-se difícil, por-
quanto a sinterização deveria ser feita sob intenso campo magnético,
a fim de orientar todos os grãos de samário, e em atmosfera neutra,
para evitar a oxidação do samário. O Ipen, que produzia o samário,
também encontrou dificuldades, como a de garantir a pureza e a
Arno Blass

granulometria apropriadas. Tendo em vista ser pequeno o volume de


material requerido, a opção mais vantajosa acabou sendo a importa-
ção do Japão.
Com o agravamento da crise da década de 80, a WEG considerou
mais conveniente unificar seu setor eletrônico em Jaraguá, fechando
a fábrica em Florianópolis. Stemmer preferiu retornar à UFSC, o que
fez em julho de 1987.'

Na Secretaria de Transportes
e Obras de Santa Catarina

Em maio de 1988, o governador Pedro Ivo Campos, a fim de debe-


lar uma crise política, nomeou seu irmão, Emanoel Campos, para a
Secretaria dos Transportes e Obras. Emanoel, que tinha sido, por
longo tempo, chefe de gabinete de Ferreira Lima, o primeiro reitor
da UFSC, preocupado com o desafio de assumir uma secretaria em
que predominavam os engenheiros, convidou Stemmer para seu as-
sessor especial. Stemmer aceitou, mais por uma questão de amizade
do que por interesse.
Seu trabalho consistia em resolver alguns problemas especiais e
no relacionamento da Secretaria com o Departamento de Estradas de
Rodagem - DER. Um dos temas a que Stemmer se dedicou foi o
problema da ponte Hercílio Luz, que tinha sido interditada pelo go-
verno anterior, em decorrência de um parecer do IPT-SP. Ele não
concordava com o parecer do IPT, mas uma inspeção realizada poste-
riormente por técnicos da firma Steinman, que tinha projetado a
ponte, mostrou que efetivamente um olhai situado no cavalete es-
querdo sobre a torre insular estava rompido, o que era grave. Stemmer,
em sua função, inteirou-se do problema e formulou quatro alternati-

1 De sua passagem pela WEG e pela UFSC, Stemmer falou à Gazeta Mercantil,
que lhe dedicou a página "Personalidade", na edição de 26 fev 2002, p. 4.
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

vas de solução. Mas os custos envolvidos, justificados pela complexi-


dade dos trabalhos exigidos, têm postergado a adoção de medidas
corretivas. A ponte continua interditada até hoje.
Stemmer também se deteve em outros assuntos que passaram pela
secretaria na época. Mas antecipou sua saída ao ser convidado para a
Secretaria Executiva do PADCT, em maio de 1989-
Em 1995, entretanto, quando estava em viagem a Washington, a
serviço do MCT, ele obteve, do Ministério dos Transportes dos Esta-
dos Unidos, três importantes documentos. Um deles foi o Paper 1.662,
publicado nas Transactions da Asme, Vol. 82 (1928), com 130 pági-
nas, de autoria de D. B. Steinman e W. G. Grove, relativo ao projeto,
fabricação, transporte e montagem da ponte Hercílio Luz. Os outros
dois tratavam da queda no rio Ohio, em 1967, da ponte pênsil Silver
Bridge, construída à mesma época da ponte Hercílio Luz e com ca-
racterísticas técnicas vagamente comparáveis às desta. Eram dois re-
latórios do National Transportation Safety Board. Um deles, de 1968,
descreve minuciosamente o acidente; o outro, de 1970, elaborado
após a coleta dos destroços e a remontagem da ponte, deitada em
terra, atribui a causa do acidente à conjugação de quatro fatores.
Stemmer, mesmo afastado havia seis anos do problema, aprovei-
tou uma oportunidade que lhe veio ao encontro para encaminhar
subsídios ao governo do estado de Santa Catarina.

No PADCT-GEA e Secretaria Executiva

Em meados de 1985, Stemmer foi convocado a Brasília, para o


lançamento do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Científico e
Tecnológico - PADCT. Este compreendia dez Subprogramas em áreas
consideradas prioritárias para o desenvolvimento científico e tecno-
lógico do Brasil e dispunha de recursos do Banco Mundial. O projeto
previa a atuação coordenada de quatro agências brasileiras: a Capes,
a Finep, o CNPq e a Secretaria de Tecnologia Industrial - STI, do
Arno Blass

Ministério da Indústria e Comércio. Mais de mil projetos seriam fi-


nanciados. Para a função de acompanhamento e auditoria para o
governo brasileiro e o Banco Mundial, foi constituído um Grupo Es-
pecial de Acompanhamento, formado por 15 especialistas de desta-
que, sete dos quais eram estrangeiros e oito brasileiros, sob a presi-
dência de um brasileiro. Stemmer foi convidado para ser um dos
membros brasileiros do grupo.
Quando Antônio Maria Amazonas MacDowell solicitou demissão
da secretaria executiva do PADCT, em maio de 1989, Stemmer foi
convidado para ser seu substituto. Seu nome surgiu de indicação de
Lindolpho Carvalho Dias, seu colega no GEA, que o ministro Décio
Leal de Zagottis acatou. Stemmer, embora com alguma hesitação,
aceitou. Posteriormente, deixou um relato sobre as dificuldades e os
resultados deste seu retorno à atividade executiva.2 Coube-lhe encer-
rar o PADCT I, que previa um montante de aplicações de US$ 72
milhões do empréstimo do Banco Mundial e uma contrapartida com
recursos nacionais equivalentes a US$ 107 milhões. Um total de 2.700
projetos foram apoiados pelo PADCT I, nos dez Subprogramas.
Em dezembro de 1989, como secretário executivo do PADCT,
Stemmer esteve em Washington, juntamente com Ernesto Costa de
Paula, secretário adjunto, a fim de discutir com o Banco Mundial
detalhes de execução do programa. E juntamente com Edson Macha-
do de Souza, Ernesto Costa de Paula e representantes do Tesouro,
participou das negociações finais com o Banco Mundial, em setem-
bro de 1990, em Washington, relativas ao empréstimo que viria a
constituir o PADCT-2.
Sobre a passagem de Stemmer pela secretaria executiva do PADCT,
diz Lindolpho Carvalho Dias:

2 Simon Schwartzman (coord), Ciência e tecnologia no Brasil: Política in-


dustrial, mercado de trabalho e instituições de apoio, Rio de Janeiro, Ed.
da FGV, 1995, pp. 288-332.
Caspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

Devo destacar, nessa época, a ação do professor Stemmer durante


nossa luta para aprovar a Lei 8.010, que simplificou os procedi-
mentos para importação de equipamentos científicos, importação
essa que até então era terrivelmente trabalhosa. Não tenho dúvidas
de que nossa luta teve dele uma substancial contribuição. [...] mais
uma vez [ele] mostrou o quanto era capaz de atuar com grande
competência e extrema dedicação.'
Em seu relato, Stemmer exemplifica mais detidamente as dificul-
dades que ocorriam. O PADCT vinha realizando importações no volu-
me de US$ 10 milhões/ano. Todas as importações eram centralizadas
no CNPq, que tinha um setor com 38 funcionários para proceder a
todos os trâmites, desde a emissão das guias de importação até a
liberação dos bens na alfândega. Entre a formulação do pedido pelo
pesquisador e o recebimento do equipamento importado transcor-
riam, em média, três anos. Como os projetos eram integrados, isto é,
incluíam recursos em dólares, para as importações, e em cruzeiros
para as despesas de instalação, custeio e pessoal de apoio, resultava
considerável falta de sincronia entre o recebimento dos equipamen-
tos e a disponibilidade dos recursos em cruzeiros. Com a inflação
chegando os 80% ao mês, uma liberação prematura poderia ser mor-
tal.
Stemmer refere o caso da UFMT, que recebeu recursos em cruzei-
ros para a aquisição de uma kombi para realizar pesquisas geológicas
de campo. Como os preços, na época, estavam congelados, o fornece-
dor exigia um ágio de 30%, impossível de pagar, pois as compras
eram feitas mediante licitação pública. Quando os preços foram libe-
rados, três meses depois, a licitação poderia ser feita, mas os recur-
sos já eram insuficientes. Como não foi possível corrigir a parte em
cruzeiros, seis meses depois só era possível adquirir os pneus do
veículo. Um ano depois, o processo foi encerrado com a prestação de

3 Lindolpho Carvalho Dias, depoimento escrito ao autor, setembro de 2002.


Arno Blass

contas e a devolução do saldo, que a esta altura era equivalente a dez


centavos.
Stemmer procurou saber por que as importações demoravam três
anos. O problema começava na datilografia das guias de importação:
oito vias, com inúmeros dados, sem erros nem rasuras. Isso nunca
acontecia. Stemmer sugeriu adquirir microcomputadores. A licitação
dos mesmos, a par da escolha do software e de uma impressora
capaz de imprimir oito vias com papel carbono levaram um tempo
considerável.
Outro fator de atraso consistia na comprovação da inexistência de
similar nacional. A Cacex consultava a Abinee ou outra associação de
fabricantes de São Paulo. Caso houvesse similar nacional, a resposta
era rápida, e a licença não era concedida. Caso não houvesse, as
associações não tinham interesse em responder e, enquanto não o
fizessem, a licença não podia ser emitida. Foi necessário convencer a
Cacex a fixar um prazo de resposta para as associações, findo o qual
a inexistência de similar nacional seria presumida, por falta de mani-
festação.4
Ainda existiam vários outros entraves, que Stemmer pretendia des-
montar um a um. Lindolpho de Carvalho Dias, secretário geral do
MCT, porém, entendeu que o caminho viável seria o de obter a isen-
ção da licença de importação. Nesse sentido, Stemmer preparou ex-
posição detalhada e justificada ao Ministro da Fazenda, requerendo a
dispensa da licença prévia para a importação de equipamentos e bens

4 Conheci bem esse problema. Administrando, em torno de 1980, o convênio


BID (157 OC-BR), eu pretendia importar um túnel de vento. Uma firma
nacional mandou carta, dizendo-se em condições de fornecer o equipamento
pretendido. Pedi-lhe, então, uma oferta. A firma respondeu, reiterando que
tinha condições de fornecer o equipamento. Tal situação se repetiu por diver-
sas vezes, ao longo de quase um ano. Vi-me compelido a solicitar à Cacex que
considerasse inidônea a firma, juntando toda a correspondência trocada. Se
ela o fez, não sei; mas consegui a licença de importação.
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

destinados à pesquisa científica e tecnológica. Os especialistas da


Cacex ficaram ofendidos: processos de importação eram extrema-
mente simples; as dificuldades encontradas resultavam de pura in-
competência...
Por intermédio do ministro Zagottis, Lindolpho solicitou que o
ministro da Fazenda nomeasse uma comissão para examinar melhor
o problema. Convocada a comissão, com a presença de representante
da Cacex/Rio, da fiscalização da Fazenda e de mais dois representan-
tes do Ministério da Fazenda, Lindolpho e Stemmer compareceram,
trazendo minuta de resolução que introduziria algumas simplifica-
ções. Stemmer historiou a situação por que passavam as importações
do PADCT. Lindolpho lembrou que elas representavam menos de 2%
das importações do país, em virtude do que tinham efeito pouco
significativo sobre a balança de pagamentos. Os representantes da
área da Fazenda, renitentes de início, aos poucos foram amolecendo.
De fato, dizia um deles, guias em oito vias e sem rasuras são um
problema. Foi então que o representante da fiscalização pediu para
expressar sua opinião, que era radical: a minuta de Stemmer era
muito tímida; a tendência atual era a desregulamentação; poder-se-ia
fazer um teste, livrando a pesquisa científica e tecnológica de contro-
les e licenças; não havia porque a Fazenda deveria confiar mais na
Cacex do que no CNPq.
Todos acabaram concordando. O representante da Cacex lembrou,
apenas, que tinha de submeter a proposta a seu chefe. Em pouco
tempo foi redigida minuta bastante simples, que viria a ser objeto de
um aviso conjunto dos ministros da Ciência e Tecnologia e da Fazen-
da. Dele resultou a Lei 8.010, de 29 de março de 1990, que, segundo
Stemmer, é a Lei Áurea da ciência brasileira. O resultado imediato foi
que, ao fim de cerca de 60 dias, alguns pesquisadores estavam rece-
bendo seus equipamentos.
Arno Blass

Diretoria de Coordenação
de Programas da SCT - Decop

Quando José Goldemberg assumiu a Secretaria de Ciência e Tecno-


logia da Presidência da República, no início do governo Collor, con-
vidou Edson Machado de Sousa para secretário adjunto. A Stemmer,
convidou-o para assumir a Diretoria de Coordenação de Programas -
Decop - antiga Secop dos tempos do MCT; Stemmer foi nomeado em
abril de 1990.
Entretanto, o relacionamento entre Goldemberg e Stemmer nunca
foi bom, o que era agravado por divergências na condução do PADCT.
Este programa estava estruturado para ser gerenciado e executado
através da comunidade científica e baseado na avaliação dos pares,
impedindo interferências políticas ou da burocracia governamental.
Isto não agradava a Goldemberg. A ruptura ocorreu em princípios de
1991 • Inicialmente, Stemmer dispôs-se a permanecer até ser designa-
do um sucessor; mas, como isto estava demorando demais, pediu sua
exoneração, em julho. Duas semanas depois, Goldemberg deixou a
SCT para assumir o MEC...

O Tecnópolis

Stemmer, tendo retornado a Florianópolis, foi de imediato convi-


dado a assumir a secretaria executiva do Conselho das Entidades Pro-
motoras do Pólo Tecnológico da Grande Florianópolis - Tecnópolis.
A primeira parte do Tecnópolis - o ParqTec Alfa - começava a ser
construído e implantado numa área de cerca de 60.000m2, próxima a
duas universidades, destinada a abrigar pequenas e médias empresas
das áreas de instrumentação, telecomunicações, mecânica fina e in-
formática.
O governo do estado assegurava a infra-estrutura necessária: tele-
comunicações, abastecimento, saneamento e sistema viário. Aos inte-
Gaspar Erich Stemmer - Administração, cièticia e tecnologia

ressados em se estabelecer no Tecnópolis eram oferecidos: terreno


com infra-estrutura, financiamento para terreno e construção, incen-
tivos fiscais e redução de impostos estaduais e municipais. O detalha-
mento da conceituação do pólo cabia ao Centro Empresarial para a
Elaboração de Tecnologias Avançadas - Celta, um spin-off do Certi.
Ao Celta coube também a criação e a execução das quatro primeiras
propostas de parques tecnológicos de Florianópolis, entre 1991 e
1992.
Stemmer permaneceu na secretaria executiva até princípios de
1992, quando o Celta assumiu a coordenação operacional de todas as
atividades relacionadas ao funcionamento do ParqTec Alfa. Atualmente,
o Celta é responsável pela administração desse parque.

Volta à UFSC - Chefe de Departamento

A razão da saída de Stemmer do Tecnópolis estava em sua eleição


para a chefia do Departamento de Engenharia Mecânica da UFSC. A
engrenagem tinha dado uma volta. Anatematizado por muitos ao re-
tornar da reitoria, agora foi aclamado pela ampla maioria: sua gestão
gerava esperanças. Assumiu em janeiro de 1992.
Ao longo dos anos, em virtude de pressões do movimento do-
cente, o departamento havia-se burocratizado ao extremo. Todas as
decisões tinham de sair da reunião do colegiado do departamento,
constituído de 65 docentes, dez alunos e um servidor. Era difícil
obter quorum; quando isso acontecia, as reuniões se prolongavam,
carentes de objetividade; os debates eram monopolizados por uma
minoria de determinada corrente política. O grupo contestador in-
sistia na tese de que o quorum deveria ser calculado sobre o efetivo
total do Departamento de Engenharia Mecânica, incluídos os do-
centes afastados, que estavam realizando pós-graduação no exteri-
or. A procuradoria jurídica da universidade lhes deu respaldo neste
pleito.
Arno Blass

Stemmer, procurando contornar as dificuldades, expôs como pro-


cederia desde então. Primeiro: não iria correr de sala em sala para
buscar os membros do colegiado e, na forma do regimento, passaria
a decidir ad referendum após duas convocações sem quorum. Se-
gundo: propunha a constituição de uma câmara, composta de seis
professores e um aluno, todos eleitos, à qual o departamento delega-
ria a análise e a aprovação de projetos de pesquisa, que constituíam a
grande maioria dos processos. Os do contra argumentaram que, sen-
do o departamento a menor fração da universidade, não poderia divi-
dir-se em câmaras. A discussão arrastou-se, foi à procuradoria, mas a
proposta de criação da câmara passou, aprovada pelo Conselho
Departamental do GTC. Stemmer propôs, então, uma segunda câmara
para outros assuntos, ficando as reuniões do colegiado reservadas à
aprovação da distribuição da carga didática e do calendário de aulas,
para a eleição do chefe e do subchefe e dos membros das câmaras.
As câmaras mostraram-se eficientes e ágeis, analisando com mais
objetividade e coerência os processos. Foram definidos parâmetros
de análise dos projetos de pesquisa, levando em conta os objetivos do
departamento, o envolvimento de alunos de graduação e de pós-gra-
duação e, quando as propostas eram contratadas, se envolviam con-
corrência a empresas de engenharia ou de consultoria, se respeita-
vam o limite de tempo que os docentes envolvidos podiam dispensar
às pesquisas contratadas e se as taxas de ocupação e de depreciação
dos equipamentos utilizados e aquela devida ao departamento esta-
vam previstas.
Um problema sério do Departamento de Engenharia Mecânica era,
uma vez mais, o espaço físico, especialmente em virtude do grande
número de estudantes de pós-graduação em fase de dissertação ou
tese. A construção de um novo prédio, para abrigar os setores admi-
nistrativos, salas de professores e alguns laboratórios leves, havia sido
iniciada havia alguns anos, mas encontrava-se parada. O senador An-
tônio Carlos Konder Reis havia conseguido um destaque do orçamen-
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

to da União para a conclusão desta obra, mas a liberação do dinheiro


vinha sendo postergada.
Stemmer, tendo ido a Brasília para tratar de assuntos do interesse
do departamento, conversou com Eunice Durham, secretária da SESu/
MEC. Lembrou-lhe o apoio que ele lhe dera, através do PADCT, quan-
do ela dirigira a Capes. Relatou-lhe os problemas do Departamento
de Engenharia Mecânica e pediu reciprocidade. Eunice confessou-lhe
que Goldemberg havia congelado a liberação de recursos para os cen-
tros de excelência, que já vinham etiquetados do Congresso, por en-
tender que limitavam o arbítrio do ministério na destinação dos re-
cursos orçamentários. Uma parte desses recursos congelados destina-
va-se aos departamentos de Engenharia Elétrica e Engenharia Mecâni-
ca da UFSC. Levando em conta o fato de que Goldemberg já nao era o
ministro, dispôs-se a conseguir sua liberação. Retornando a Florianó-
polis, Stemmer falou com o reitor Antônio Diomário de Queiroz, o
qual propôs que os referidos recursos fossem integralmente aplica-
dos para conseguir a conclusão do prédio da Engenharia Mecânica, e
que ele compensaria o Departamento de Engenharia Elétrica de algu-
ma outra forma. Stemmer preparou, então, o plano de aplicação e
solicitou à SESu, a liberação dos recursos, no que foi atendido, o que
possibilitou o prosseguimento da obra. O novo prédio seria inaugura-
do, com a presença do ministro da Educação, Murílio Hingel, algum
tempo depois de Stemmer deixar a chefia do departamento. A placa
comemorativa registra o nome do ministro, do reitor e do diretor do
CTC. Stemmer foi esquecido...
Stemmer empenhou-se, ainda, em sanar, na medida do possível,
deficiências do Departamento de Engenharia Mecânica em termos
de pessoal técnico. Presidi a uma comissão por ele designada para
levantar as reais necessidades dos vários laboratórios e grupos de
pesquisa do departamento e para confrontá-las com a situação exis-
tente. O documento produzido serviu para que Stemmer justificasse
seu pedido de pessoal técnico, no que viria a ser atendido apenas
Arno Blass

parcialmente, dadas as restrições a que estava sujeita a própria uni-


versidade.
Mas o que mais distinguiu Stemmer de seus antecessores na chefia
do Departamento de Engenharia Mecânica foi o resultado de suas
viagens. Levava agendas mais encorpadas, fazia mais contatos, conse-
guia acesso a personalidades mais influentes e obtinha melhores re-
sultados. Além disso, viajava sem ônus para a universidade e para o
departamento. Terminou seu mandato em janeiro de 1994.

Novamente no MCT

Stemmer, ao deixar a chefia do Departamento de Engenharia Me-


cânica, foi novamente chamado a Brasilia, onde seria, durante um
ano, o secretário executivo do MCT. Nessa condição, representou o
Brasil no lançamento do satélite Brasilsat B2, realizado no centro
espacial de Kourou, na Guiana Francesa, em agosto de 1994. E repre-
sentou o ministro José Israel Vargas na conferência de alto nível dos
ministros de Ciência e Tecnologia das Américas, que se realizou em
Acapulco, no México, em 1994.
Em fevereiro de 1995, ele reassumiu a Secretaria de Coordenação
de Programas - Secop, do MCT, a antiga diretoria que já dirigira em
1990-1991. No bojo de uma reforma administrativa, ela passaria a
chamar-se Secretaria de Desenvolvimento Científico - Sedec. Tinha
35 funcionários de nível superior, distribuídos entre duas coordena-
ções e nove divisões.
As ações da Sedec concentravam-se no planejamento, acompanha-
mento e coordenação de programas implementados no âmbito do
sistema de ciência e tecnologia e de outros ministérios, assim como
na representação do MCT em comissões nacionais e internacionais e
na supervisão de programas específicos: o Programa Piloto para a
Proteção das Florestas Tropicais do Brasil - PP-G7, o Programa do
Trópico Úmido - PTU, o Centro Brasileiro-Argentino de Biotecnolo-
Caspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

gia, o Programa de Ciências do Mar, o Programa Antártico Brasileiro


- Proantar, o Programa de Energias Renováveis e Meio Ambiente, o
Programa de Recursos Humanos para Áreas Estratégicas - Rhae e o
Projeto de Pesquisa em Larga Escala da Biosfera da Amazônia - LBA.
Em junho de 1995, por decreto presidencial, Stemmer foi nomea-
do chefe da delegação do Brasil na XXVIII Sessão do Conselho Execu-
tivo e da XVIII Assembléia da Comissão Oceanográfica Intergoverna-
mental - COI em Paris. Tornou a chefiar a delegação brasileira nas
assembléias do COI nos dois anos seguintes. Participou, ainda, em
Nova York, de uma reunião da ONU sobre meio ambiente, na qualida-
de de representante do MCT.
Como já ocorrera quando fora secretário executivo do MCT,
Stemmer, durante sua passagem pela Sedec, chegou a ocupar interi-
namente o Ministério da Ciência e Tecnologia, tendo sido para tanto
nomeado pelo presidente da República, em 16 de setembro de 1995.5
Um dos itens do acordo que criou o Mercosul previu o intercâm-
bio técnico-científico, sendo escolhidas como áreas-piloto a infor-
mática e a biotecnologia. Foram criados os Centros Brasileiro-Argen-
tino de Biotecnologia - CBAB no Brasil; Cabbio, na Argentina -, com
um conselho binacional, e o Centro Brasileiro-Argentino de Informá-
tica. Como representante do Brasil, Stemmer participou das reuniões
17a—julho de 1995 -e 18 a -maio de 1996-do conselho binacional,
ambas realizadas em Buenos Aires.
Participou do Encontro de Cooperação Cultural e Científica Bra-
sil-Alemanha, em Friedrichshaven, em junho de 1996, onde proferiu
palestra sobre "Testemunho de uma cooperação de sucesso: RWTH
Aachen/UFSC Florianópolis". Aproveitando a proximidade, visitou tam-
bém a fábrica Zeiss, em Iena. Em agosto, Stemmer, por indicação da
Comissão Interministerial de Recursos do Mar - Cirm, que é dirigida
pelo ministro da Marinha e da qual participava como representante

5 Diário Oficial da união, 27 set 1995, p. 7.335.


Arno Blass

do MCT, integrou um grupo de pesquisa em viagem à Antártida. Re-


tornou à Alemanha em setembro, a fim de participar de uma reunião
de avaliação do PP-G7, em Bonn. Dali seguiu para Harare, no
Zimbabwe, designado pelo Itamaraty para chefiar a delegação brasi-
leira à Conferência Mundial de Cúpula sobre Energia Solar. Aprovei-
tou para visitar Joanesburgo e Pretória, na África do Sul.
A convite da empresa Ebara, Stemmer integrou comitiva de seis
pessoas, representantes do MCT, Eletrosul, Inpe e Anel, que visitou o
Japão, em março de 1998. Esteve no japan Consult Institute, que
estava elaborando o projeto de eliminação do S02 e redução do NOx
dos gases da chaminé das caldeiras da Usina Termelétrica Jorge Lacer-
da, em Tubarão, da Eletrosul. Além de ter feito contatos com órgãos
governamentais, visitou, também, a Planta Piloto Fujisawa, tendo ido,
depois, a Nagóia - para visitar a Central de Hekinan -, a Kioto -
edificações históricas e indústria Ebara - e a Kansai, a ilha artificial,
construída para alojar um aeroporto. De lá voou para a China, onde a
comitiva também visitou instalações de produção de energia elétrica
e fez turismo. Ainda visitaram a Tailândia, a Indonésia, Hong Kong e
Macau.
Stemmer, como membro da comissão que, presidida pelo minis-
tro Henrique Brandão Cavalcanti, organizou a participação brasileira
na Expo-98, no Ano Internacional do Mar, dirigiu-se a Lisboa, em
junho de 1998, representando o Brasil na solenidade relativa ao dia
dedicado ao Brasil. No fim do mês, visitou a Alemanha, a convite da
Câmara de Comércio e Indústria Brasil-Alemanha.
O Ministro José Israel Vargas, em depoimento ao autor, assim se
refere à passagem de Stemmer pela Sedec:
[Stemmer] regressou, a meu convite, ao mesmo posto [que ocu-
para em 1990, tendo gerido com grande competência também o
Programa Piloto de Gestão da Floresta Amazônica, financiado pelo
Grupo G-7 dos países industrializados. Este programa possibilitou,
com recursos de contrapartida do governo brasileiro, a notável
recuperação do Instituto de Pesquisas da Amazônia - Inpa em
Caspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

Manaus, e do Instituto Emílio Goeldi, em Belém, que se tornaram


centros de excelência em pesquisas ambientais para esta vasta re-
gião equatorial. Além disso, o PP-G7 apoiou, na região, projetos
nos mais variados campos científicos, sempre sob a competente
liderança de Stemmer. [...]
Tendo o PADCT passado à responsabilidade de Luis Antônio
Barreto de Castro, dedicou-se Stemmer, além das atividades referi-
das, à promoção do uso das energias renováveis no Brasil, particu-
larmente da energia solar, que motivou, entre outras ações, a orga-
nização da primeira grande exposição sobre o assunto na Praça
dos Três Podêres, em Brasilia.''
E relata, a respeito, incidente pitoresco:
É irônico e ao mesmo tempo revelador de nosso atraso recordar
que aquela área fora palco dos mais diversos ajuntamentos de
manifestantes, que ali se reuniam, às vezes por vários dias, agredin-
do o meio ambiente. A realização do evento motivou processo
público contra o professor Stemmer por parte do Governo do
Distrito Federal de então. A ironia está em que a exposição tentava
disseminar a utilização de tecnologia essencialmente limpa. Como
dizia o poeta: "Vede da estória o desconcerto".7
Stemmer permaneceu na SEDEC até janeiro de 1999- Já se havia
aposentado, na UFSC, em abril do ano anterior.

6 José Israel Vargas, depoimento escrito ao autor, setembro de 2002.


7 Idem.
O REPOUSO DO GUERREIRO

os 72 anos de idade, Stemmer não consegue desabituar-


se de sua condição de professor da UFSC e de sentir que,
de certa forma, ainda tem responsabilidades para com a
'"universidade à qual dedicou a maior parte de sua vida. Ele
pode ser visto quase que diariamente a andar pelos caminhos do
campus. Seus passos são trôpegos, mas a determinação é firme. Não
segue ao acaso. Tem agenda e objetivos.
Encontra-se agora engajado num novo acordo de cooperação téc-
nica com a Alemanha, que beneficiará estudantes de engenharia. Vem
encontrando alguma resistência da parte de elementos do conselho
departamental do Centro Tecnológico. Mas não se abate. Argumenta,
justifica, vence resistências, supera as barreiras burocráticas. No di-
zer de Antônio Diomário de Queiroz, "olha para o futuro com espe-
rança e acredita no poder transformador da universidade".
Em julho de 2001, aproveitando saldo de milhagem e viajando
com recursos próprios, voltou à Alemanha para visitar a Feira Mun-
dial Expo 2001. Ao ensejo, estendeu a viagem até Ilmenau, na antiga
Alemanha Oriental, a fim de se encontrar com alunos brasileiros que
cursavam engenharia naquela cidade. Eram eles os precursores do
convênio que ele vem defendendo.
É justamente esta tenacidade que Rodolfo Joaquim Pinto da Luz,
atual reitor da UFSC, focaliza com tanta propriedade quando diz:
O estilo de Stemmer é o de uma pessoa que faz, e faz com muito
dinamismo. Mesmo aposentado, ele continua participando ativa-
mente, trazendo idéias e sugestões e colocando claramente aquilo
Arno Blass

de que discorda. Aquilo em que ele acredita, ele realiza. Isto foi, a
seu tempo, fundamental para a Engenharia e, depois, para toda a
universidade. A marca de Stemmer na universidade é muito gran-
de, e também fora dela. No Premesu, ele acreditava no programa
de equipamentos e de construções. E nas várias funções que de-
sempenhou no MEC e no MCT, sempre agiu da mesma forma.1
E menciona um exemplo de extrema relevância:
Lembro, quando eu estava na SESu, a questão da Lei das Funda-
ções.2 Sendo ele secretário executivo do MCT, fomos ambos ao
Congresso discutir com os partidos, com o relator, com as lideran-
ças políticas [o projeto de lei] para a institucionalização das funda-
ções. Toda aquela lei tem uma participação muito grande nossa.
Inclusive uma das soluções para evitar que as fundações perdes-
sem sua finalidade, como já aconteceu, foi que houvesse um cre-
denciamento pelo MEC e pelo MCT, pela SESu e pela Sedec, que até
hoje permanece. Então, a influência de Stemmer foi muito grande;
ele deu uma contribuição não só local, mas nacional, e de suporte;
quer dizer, não foi uma pessoa que teorizou sobre a pós-gradua-
ção, mas foi a pessoa que fez, que deu o apoio que a situação
exigia.1

Também Edson Machado de Souza, arrematando seu depoimento,


faz esta síntese, na mesma linha de pensamento:
O que posso dizer desses muitos anos de relacionamento é que
sempre nutri o maior respeito pela integridade, nobreza de propó-
sitos e, para usar uma palavra da moda, transparência do Stemmer.
Alguém sempre disposto a dialogar, franco e sincero, não esconde
o seu pensamento e suas opiniões, o que algumas vezes lhe anga-

1 Rodolfo Joaquim Pinto da Luz, depoimento gravado, Florianópolis, agosto de


2002.
2 Faz referência à Lei nº 8.958, de 20 de dezembro de 1994, à portaria
Interministerial MEC/MCT nº 631, de 5 de junho de 1995, e à portaria inter-
ministerial MEC/MCT nº 2089, de 5 de novembro de 1997, que revoga e
substitui aquela.
3 Rodolfo Joaquim Pinto da Luz, op. cit.
Caspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

riou antipatias. Pragmático e administrador competente, um


tocador das missões que lhe foram confiadas, nunca deixou que
eventuais discordâncias o desviassem dos objetivos que se tinha
traçado. Muitas vezes obstinado, batalhava intensamente para lo-
grar os meios necessários, e quantas vezes o conseguiu. A ciência
e a tecnologia, o ensino superior no Brasil, devem muito a esse
batalhador.
Lindolpho de Carvalho Dias enaltece sua "dedicação e comporta-
mento ético na atividade de administrador público".
Sílvio Coelho dos Santos chama a atenção para um episódio curio-
so, que demonstra o interesse sincero de Stemmer pelas coisas da
universidade. Em 1978, faleceu o professor Oswaldo Rodrigues Ca-
bral, um dos batalhadores pela criação da UFSC, na qual criou o
Museu de Antropologia. Seus colegas de trabalho resolveram a ele
dedicar um número dos Anais do Museu de Antropologia.5 Foram
publicados diversos artigos que relatavam a trajetória e a influência
de Cabral no desenvolvimento do ensino e da pesquisa, além de ou-
tros, que davam conta da vida do médico, do administrador e do
político. Pediram ao reitor Stemmer que fizesse a apresentação deste
número especial. Sobre isso relata Sílvio Coelho dos Santos:
Para surpresa de todos, Stemmer traçou um perfil de Cabral que
ressaltava suas incursões na área da literatura, face que poucos
conheciam. Para tanto, Stemmer tomou informações sobre Luis de
Olinda, João Só e Egas Godinho, pseudônimos de Cabral, comen-
tando seus contos, novelas e romance. Ao final, concluiu:
"Eis aí a obra fundamental de um homem coerente, que pautou
sua vida por uma linha reta e um grande amor à ciência histórica,
sem deixar de ironizar ou criticar aquilo que achava errado."
O reitor Stemmer mostrava, pois, que não só tinha admiração
por Oswaldo Rodrigues Cabral, como conhecia profundamente

4 Edson Machado de Souza, op. cit.


5 Anais do Museu de Antropologia, Florianópolis, UFSC, ano X, n. 11, jul
1978.
Arno Blass

sua obra científica e literária. Em outras palavras, Stemmer lia a


produção de seus professores e de seus amigos.
Raul Valentim da Silva, um dos fundadores do primeiro curso de
pós-graduação da UFSC, costuma perguntar às pessoas que encontra
no campus: "Quando começou a pós-graduação na UFSC?" Aos que
respondem que foi em 1969, ele corrige: "Não. Foi em 1965, quando
alguns professores se cotizaram para que um deles fosse a Porto Ale-
gre tentar convencer Stemmer a aceitar a direção da Escola de Enge-
nharia Industrial."
E como está hoje em moda perguntar como teria sido a história se
certos eventos não tivessem ocorrido, é pertinente indagar: "Se Stem-
mer não tivesse vindo a Florianópolis, como seriam hoje o Centro
Tecnológico e a UFSC? Por quanto tempo predominaria o conformis-
mo? Quando seria assumida uma posição positiva em relação aos
estágios dos estudantes, à dedicação e à qualificação dos docentes?
Quando iria surgir a primeira pós-graduação? Em que condições ela
surgiria?" Seguramente não teria surgido na área da engenharia.
É quiçá esta mesma percepção que leva Rodi Hickel a concluir seu
depoimento acerca da passagem de Stemmer pela reitoria da UFSC
com o seguinte parágrafo:
Porém, mais importante do que dados estatísticos e listagem de
realizações, fala o sentimento com que se realiza uma obra. É Fer-
nando Pessoa que diz: "Tudo vale a pena quando a alma não é
pequena", E a alma não é pequena quando se age com dedicação
e amor. Fui auxiliar direto do professor Stemmer durante o perío-
do em que exerceu a reitoria e sou testemunha do seu carinho pela
universidade, buscando sempre as melhores soluções para os pro-
blemas da UFSC. Não houve setor da universidade que não sofres-
se o influxo de sua administração. Sua capacidade de liderança,
competência e dinamismo deixaram marca indelével na história da
Universidade Federal de Santa Catarina.

José Israel Vargas ressalta o amor que Stemmer tem mostrado pela
natureza, que traduziu ao longo de sua vida na atenção que tem dis-
Caspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

pensado à sua ilha e ao grande arvoredo que plantou, nos fundos de


sua casa. Dele deu testemunho também com o trabalho que desenvol-
veu em seus últimos anos na Sedec.
E agora, quando não está caminhando pelo campus, nem envolvi-
do com problemas relacionados à universidade, Stemmer anda por
seu arvoredo. E se preocupa. Passou um quarto de século montando
um pequeno jardim botânico temático, concentrado em frutíferas.
Quando começou, seu pequeno paraíso situava-se nos confins da ci-
dade. Hoje, a cidade veio até ele e o vai circundando lenta, mas
inexoravelmente. Algumas empresas construtoras já estão de olho
naquela área estrategicamente situada em relação ao campus e à Via
Expressa... Por quanto tempo será possível preservar aquela área como
ela se encontra hoje? Stemmer procura imaginar soluções.
Apesar de ainda envolvido com suas causas, Stemmer, juntamente
com sua esposa Helena, curte hoje o ócio com dignidade. Na sala de
sua casa, os livros transbordam das prateleiras. Muitos deles estão
empilhados sobre a mesa, vários abertos em páginas relacionadas a
algum assunto que está despertando seu interesse no momento.
Helena, também ela aposentada, tem seu nome ligado ao curso de
Engenharia Civil, cuja história ajudou a escrever.6 Foi chefe do depar-
tamento e coordenadora do curso. Mais tarde, foi diretora do Centro
Tecnológico. Também integrou a Comissão Permanente dos Regimes
de Tempo - Copert da universidade, da qual foi presidente. Um dos
filhos, Marcelo Ricardo, doutorou-se em Aachen e é, também ele,
docente da UFSC, no Departamento de Automação e Sistemas.
Quando o sol se põe nas colinas que ficam além do campus,
Stemmer pode observar os galhos nus do jambeiro que fica à frente
da janela de sua sala se transformarem, aos poucos, em meros riscos
negros, contrastando contra o céu que vai escurecendo. Quiçá, por

6 H. A. Stemmer e R. da S. Ferreira, Engenharia civil 25 anos, Florianópolis,


Edição dos Autores, 1995, 236p.
Arno Blass

um instante, a paz seja perturbada pela disparada de um sagüi por


sobre os galhos. Talvez então, vindo do passado distante, Stemmer
consiga entreouvir uma antiga cantilena:
Onde é que mora a amizade?
Onde é que mora a alegria?
Moram lá na Trindade,
Na Escola de Engenharia.
Mas quando amanhece, Stemmer pode, da mesma janela, obser-
var o campus da UFSC, com o CTC em primeiro plano. Vê os prédios
que mandou construir, os estacionamentos lotados, a movimentação
nervosa das pessoas. Vê uma instituição que tem vida. Por certo deve
sentir um justificado orgulho, ao recordar o que havia ali, em 1965,
quando chegou a Florianópolis, ou em 1976, quando assumiu a rei-
toria, e ao dar-se conta de que foi ele o agente da maioria das trans-
formações ocorridas. Talvez não lhe ocorra fazê-lo, mas certamente
ele poderia dizer como Horácio:
Ediflquei monumento mais perene do que o bronze, mais alto do
que o edifício régio das pirâmides, o qual nem a chuva corrosiva
nem o vento impotente ou a inumerável série dos anos e a fuga dos
tempos pode destruir. Não morrerei todo, e muita parte de mim
evitará a Morte. Eu, renovado, crescerei sempre com o louvor das
futuras gerações...7

7 Horácio, Ode 30, Livro III.


HONRARIAS E
DISTINÇÕES

Medalha da Inconfidência, governo do estado de Mina Gerais,


1976.
Professor Honorário, Universidad Autônoma de Guadalajara, Mé-
xico, 1977.
Denominação de nova espécie de Mirtácea, "Myrcia Stemme-
riana", Flora Ilustrada Catarinense, 1977.
Cidadão de Santarém (Pará), 1979-
Medalha "Andrés Bello", Universidad de Chile, 1979-
Medalha do Mérito Universitário - grau de Grande Conselheiro,
UFRN,1979-
Cidadão Honorário - Ehrengast der Westfálische Technische
Hochschule Aachen, 1980.
Prêmio "AnísioTeixeira", Capes, 1986.
Medalha da Ordem de Rio Branco, grau de Comendador, Itama-
raty, 1987.
Professor Emérito, concedido por ocasião dos "200 anos de En-
sino Regular de Engenharia no Brasil", CREA/RJ - IME - Escola
de Engenharia da UFRJ, 1993.
Membro da Academia Nacional de Engenharia, 1993.
Arno Blass

Ordem Nacional do Mérito Científico, grau de Comendador, MCT,


1996.
Ordem do Mérito Naval, grau de Oficial, 1996.
Cidadão Honorário de Florianópolis, 1999-
Professor Emérito, UFSC, 1999.
Medalha do Sexagésimo Aniversário da PUC-RJ, 2001.
Ordem Nacional do Mérito Científico, promovido ao grau Grã-
Cruz, MCT, 2002.
T

ICONOGRAFIA

Foto 1 - Gaspar Erich Stemmer, foto oficial como reitor da UFSC.


Arno Blass

Foto 2 - 0 professor Roberto Mündell de Lacerda transfere a


Caspar Erich Stemmer o colar do reitor da UFSC.
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

Foto 3 - Posse de Gaspar Erich Stemmer como Reitor da UFSC em 5 de maio de 1976. A sua
esquerda aparecem: o reitor Roberto Mündell de Lacerda, o governador do estado de Santa
Catarina, Antônio Carlos Konder Reis, o professor Darcy Closs, representando o ministro da
Educação. À direita, o vice-govemador Marcos Büchele e o secretario estadual da Educação.
Antero Nercolini. Na extrema esquerda, o então prefeito de Florianópolis, Esperidião Amin
Helou Amin Filho.

Foto 4 - Stemmer discursa para a comunidade universitária relacionando


as ações que serão executadas em sua administração.
Arno Blass

Foto 5 - Lançamento da primeira edição do livro UFSC - Sonho e Realidade, de autoria do


Prof. João David Ferreira Lima primeiro reitor da UFSC, em 1980. Stemmer faz a apresentação
do livro, ladeado por Roldão Consoni, vice-reitor, Ferreira Lima e pelo Prof. Paulo Lago à
direita, e por Volnei Millys, pró-reitor de Assuntos Estudantis, à esquerda.

Foto 6 - Teodoro Rogerio Vahl, sub-reitor de Administração, discursa, em 1977, ao se afastar


para a realização de seu doutoramento na Alemanha. A sua direita, Antônio Nicoló Grillo, que
o substituiu. À esquerda. Roldão Consoni e Stemmer.
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

Foto 7 - Durante a execução do hino nacional, na sessão solene do Conselho Universi-


tário da UFSC, em 1979, para a outorga do título de Professor Honoris Causa a Alherto
Luiz Galvão Coimbra, 0 fundador da Coppe-UFRJ. A partir da esquerda, vêem-se: Paulo
Alcântara Gomes - representando a Coppe, Roldão Consoni - vice-reitor da UFSC, Antero
Nercolini - secretário estadual da Educação de Santa Catarina, Stemmer, Coimbra, Hans
Dieter Schmidt - secretário de Indústria e Comércio de Santa Catarina, Arno Blass, José
Israel Vargas, Aristides Pacheco Leão - da Academia Brasileira de Ciências, José Pelúcio
Ferreira - presidente da Finep e Amílcar Figueira Ferrari -BNDES.

Foto 8 - Sérgio Roberto Arruda, o Diretor, discursa durante a solenidade de inaugura-


ção das novas instalações do Centro Tecnológico, em 1980. À direita do vice-reitor Roldão
Consoni aparece o pró-reitor de Ensino de Graduação, Rodi Hickel; atrás do vice-reitor, o pró-
reitor de Pesquisa e Pós-Graduação, Paulino Vandresen.
Arno Blass

Foto 9 - Ao ensejo do convite formulado a Stemmer pelo ministro de Ciência e Tecnologia,


Dedo Leal de Zagottis, para a secretaria executiva do PADCT; entre outros, vêem-se Stemmer,
Ernesto Costa de Paula - que seria o secretário-adjunto, o ministro Zagottis, José' Duarte de
Araújo - vice-presidente do CNPq e Lindolpho de Carvalho Dias - secretário geral do MCT.

Foto 10 - Stemmer mostra ao presidente Fernando Henrique Cardoso a exposição sobre


energias renováveis, na Esplanada dos Ministérios, Brasília.
Caspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

Foto 11 - Stemmer e parte da delegação brasileira em Punta Arenas, no Chile,


por ocasião de visita às instalações brasileiras na Antártida.
GLOSSÁRIO
ABC - Agência Brasileira de Cooperação do Capes - Coordenação de Aperfeiçoamento
Ministério das Relações Exteriores. de Pessoal de Nível Superior.

ABCM - Associação Brasileira de Ciências Capre - Comissão de Coordenação das Ati-


Mecânicas. vidades de Processamento Eletrônico.

Abinee - Associação Brasileira da Indústria Casan - Companhia de Águas e Sanea-


Elétrica Eletrônica. mento de Santa Catarina.

Agecom - Agência de Comunicações da CDS - Conselho de Desenvolvimento So-


cial.
UFSC.
CEB - Centro de Estudos Básicos (UFSC).
Anel - Agência Nacional de Energia Elétrica.
CEE - Comissão de Energia Elétrica (SC).
Arena - Aliança Renovadora Nacional.
Asme -American Ociely ofMechanical Celesc - Centrais Elétricas de Santa Catari-
Engineers, na.

BID - Banco Interamericano de Desenvol- Celta - Centro Empresarial para a Elabo-


vimento. ração de Tecnologias Avançadas.

BMZ - Bundesministerium für Cenimar - Centro de Informações da Ma-


wirbschaftliche Zusammenarbeü und rinha.
Entwicklung.
CEP - Conselho de Ensino e Pesquisa
BNDE - Banco Nacional de Desenvolvimento (UFSC).
Econômico.
Cepes - Comissão Especial para Execução
BNDES - Banco Nacional de Desenvolvi- do Plano de Melhoramento e Expan-
mento Econômico e Social. são do Ensino Superior.

Cacex - Carteira do Comércio Exterior do Certi - Centro Regional de Tecnologia em


Ministério da Fazenda. Informática.
Arno Blass

CFE - Conselho Federal de Educação. Daad - Deutscher Akademischer Austausch


Dienst.
CFPA - Centro de Formação Prática e Aper-
feiçoamento (UFSC). Dasp - Departamento Administrativo do
Serviço Público.
CIEE - Centro de Integração Empresa-Es-
cola. DAU - Departamento de Assuntos Univer-
sitários do MEC.
Cirm - Comissão Interministerial de Re-
cursos do Mar. Decop - Diretoria de Coordenação de
Programas da Secretaria de Ciência
Gru - Comissão de Implantação da Refor-
e Tecnologia da Presidência da Re-
ma Universitária (UFSC).
pública.

CLT - Consolidação das Leis do Trabalho.


DER - Departamento de Estradas de Roda-
CNPq - Conselho Nacional de Desenvolvi- gem (SC).
mento Científico e Tecnológico.
DIN - Deutsches Institut fur Normung.
Cobem - Congresso Brasileiro de Engenha-
Diname - Simpósio sobre Problemas Di-
ria Mecânica.
nâmicos em Mecânica.
COl - Comissão Oceanográfica Intergover-
DCE - Diretório Central dos Estudantes
namental.
(UFSC).
Conem - Congresso Nacional de Engenha-
EBTU - Empresa Brasileira de Transportes
ria Mecânica.
Urbanos.
Copert - Comissão Permanente dos Regi-
EE! - Escola de Engenharia Industrial
mes de Tempo (UFSC).
(UFSC).
Coppe - Coordenação dos Programas de
Efei - Escola Federal de Engenharia de
Pós-graduação de Engenharia.
Itajubá.
Cotesc - Companhia Telefônica Catarinense.
Eletrobrás - Centrais Elétricas Brasileiras
Crea - Conselho Regional de Engenharia, S/A.
Arquitetura e Agronomia.
Eletrosul - Centrais Elétricas do Sul do
Crêem - Congresso Nacional de Estudan- Brasil S/A.
tes de Engenharia Mecânica.
Encit - Encontro Nacional de Ciências
CTC - Centro Tecnológico. Térmicas.
Gaspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

Fapeu - Fundação de Amparo à Pesquisa e IEL - Instituto Euvaldo Lodi.


à Extensão Universitárias.
Ifes - Instituições Federais de Ensino Su-
FAS - Fundo de Apoio ao Desenvolvimento perior.
Social.
Inamps - Instituto Nacional de Assistência
Fatma - Fundação de Amparo à Tecnologia Médica da Previdência Social.
e ao Meio Ambiente.
Inpa - Instituto de Pesquisas da Amazô-
Feesc - Fundação do Ensino de Engenha- nia.
ria em Santa Catarina.
Inpe - Instituto de Pesquisas Espaciais.
Finep - Financiadora de Estudos e Proje-
Iphan - Instituto do Patrimônio Histórico
tos.
e Artístico Nacional.
FNDE - Fundo Nacional de Desenvolvimento
IPT - Instituto de Pesquisas Tecnológicas.
da Educação.
ISO - International Organization of
Funtec - Fundação Nacional para o Desen-
Standardization,
volvimento da Educação Tecnológica.
ITA - Instituto Tecnológico da Aeronáutica
Furg - Fundação Universidade do Rio
Grande. LBA - Projeto de Pesquisa em Larga Escala
da Biosfera da Amazônia.
GEA - Gemenskapen fôr Eletroniska
Affàrer. MCT - Ministério de Ciência e Tecnologia.

Gerasul - Centrais Elétricas do Sul do Bra- MDB - Movimento Democrático Brasileiro.


sil.
MEC - Ministério de Educação e Cultura.
GTZ - Gesellscbaft fur Techniscbe
Zusammenarbeit. NAI - Núcleo de Apoio Instrucional (UFSC).

Grucon - Grupo de Comando Numérico. Nuclebrás - Empresa Nuclear Brasileira


S/A.
Ibid - Instituto Brasileiro de Informação
em Ciência e Tecnologia. ONU - Organização das Nações Unidas.

Icimar - Instituto de Ciências do Mar PADCT - Programa de Apoio ao Desenvol-


(UFSC). vimento Científico e Tecnológico.

Iconne - Int. Conf. on Nonlinear Plameg - Plano de Metas do Governo do


Dynamics, Chãos and Control. Estado de Santa Catarina.
Arno Blass

PP-G7 - Programa Piloto para a Proteção Serlim - Serviço de Limpeza (UFSC).


das Florestas Tropicais do Brasil.
SESu - Secretaria do Ensino Superior do
Premeu - Programa de Expansão e Melho- Ministério da Educação.
ria do Ensino Médio,
SCGI - Subcomissão Geral de Investiga-
Premesu - Programa de Expansão e Me- ção.
lhoramento das Instalações do Ensino
Superior. Sibrat - Simpósio Brasileiro de Tubulações
e Vasos de Pressão.
Proantar - Programa Antártico Brasileiro.
SNI - Serviço Nacional de Informações.
Prodeca - Programa de Desenvolvimento
das Ciências Agrárias. Sobracon - Sociedade Brasileira de Coman-
do Numérico.
PSD - Partido Social-Democrático.
Sotelca - Sociedade Termelétrica de Capivari.
PTU - Programa do Trópico Úmido.
STI - Secretaria de Tecnologia Industrial
PUC-RJ - Pontifícia Universidade Católica do Ministério da Indústria e Comér-
do Rio de Janeiro. cio.

RDA - República Democrática Alemã. Subiu - Secretaria de Cooperação Técnica


Econômica Internacional.
RFA - República Federal Alemã.
Sudepe - Superintendência de Desenvolvi-
Rhae - Programa de Recursos Humanos
mento da Pesca.
para Áreas Estratégicas.
Sudesul - Superintendência de Desenvolvi-
RWTH Aachen - Rbeiniscb-Westfalische
mento da Região Sul.
Technische Hochscbule Aachen.
Telesc - Telecomunicações de Santa Catari-
Secop - Secretaria da Coordenação de Pro-
na S/A.
gramas do Ministério de Ciência e Tec-
nologia. Udesc - Universidade para o Desenvolvi-
mento de Santa Catarina.
Sedec - Secretaria de Desenvolvimento Cien-
tífico do Ministério de Ciência e Tecno- UDN - União Democrática Nacional.
logia.
UFG - Universidade Federal de Goiás.
Seplan - Secretaria de Planejamento da
Presidência da República. UFMA - Universidade Federal do Maranhão.
Caspar Erich Stemmer - Administração, ciência e tecnologia

UFMG - Universidade Federal de Minas UFSC, Universidade Federal de Santa Cata-


Gerais. rina.

UFPB - Universidade Federal da Paraíba. URGS - Universidade do Rio Grande do Sul.

UFPR - Universidade Federal do Paraná. USC - Universidade de Santa Catarina.

UFRGS - Universidade Federal do Rio Gran- Usaid - Agência dos Estados Unidos para o
de do Sul. Desenvolvimento Internacional.

UFRJ - Universidade Federal do Rio de Ja- USP - Universidade de São Paulo


neiro.
Amílcar Figueira Ferrari

José Pelúcio Ferreira e a pós-


graduação no Brasil

Helena Bomeny

Newton Sucupira e os rumos de


educação superior

Walter Colli (ed.)

Paschoal Senise, uma carreira


dedicada à educação

Maria Stella de Amorim

Roberto Cardoso de Oliveira,


um artífice da Antropologia

Giulio Massarani, Luisa


Massarani e Terezinha Costa

Alberto Coimbra e a Coppe

Arno Blass

Caspar Enrich Stemmer,


administração, ciência e
tecnologia

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