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Tiranos de nós mesmos: a servidão voluntária na era da sociedade do desempenho 16/04/17 17:44

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13 de abril de 2017
ser livre, renuncia à liberdade e aceita o jugo; quando consente com seu sofrimento, ou

melhor, o procura. Tribunal Regional Federal


suspende licença de...
— Étienne de La Boétie[1] 13 de abril de 2017

Durante o século XVI, em algum ponto entre seus 16 e 18 anos, Étienne de La


Boétie escreveu o “Discurso da Servidão Voluntária”[2]. La Boétie perguntava-
LIVROS JUSTIFICANDO
se como um único tirano poderia manter sob o seu jugo milhares de homens
e dezenas de cidades. Como resposta, ele propõe que os próprios homens, por
hábito, ignorância e fraqueza moral, voluntariamente se submetem à tirania.
Um pequeno número deles obtém a confiança do tirano e dele se aproxima,
compartilhando de seus desmandos e recebendo seus favores. Esse pequeno
número de homens dispõe de seus próprios súditos, que também
compartilham de seus desmandos e recebem seus favores. Esses súditos
mantêm uma série de subordinados, os quais, por sua vez, possuem também
seus próprios subordinados.

Formam-se, destarte, relações de favorecimento e obediência em múltiplos


níveis ou instâncias. Todas essas instâncias controlam a malta ignorante pela

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força e, principalmente, pela enganação das políticas de “pão e circo” e dos


discursos religiosos e supersticiosos que envolvem o tirano em um manto de
devoção. Tece-se assim uma rede de favores e concessões, em queHOME
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homem deve obediência a outro, em uma teia cuja ponta leva, em última
instância, ao tirano. Ao cabo, os súditos são subjugados uns por meio dos
outros. O tirano se mantém tirano porque os próprios súditos se mantêm
servis. A servidão, paradoxalmente, é voluntária.

É impossível ler La Boétie sem nos questionarmos sobre a nossa própria


situação pós-moderna e sobre os limites de nossa liberdade. Até que ponto
somos livres? É óbvio que, em nossa sociedade pretensamente democrática,
não cabe continuarmos falando do tirano absolutista de La Boétie — ainda
que a descrição da dinâmica das relações de favorecimento e obediência seja
assustadoramente atual em nosso sistema político fortemente
patrimonialista. Mas seria esta a única forma de tirania?

Byung-Chul Han, no opúsculo “Sociedade do Cansaço”[3], discute a ascensão


Brasil em fúria
de um novo paradigma social, em que a sociedade disciplinar de Foucault é
R$ 49,90
substituída pela sociedade do desempenho. Esse novo modelo social é
movido por um imperativo de maximizar a produção. Nós, sujeitos de
desempenho, somos constante e sistematicamente pressionados a
aperfeiçoar nossa performance e aumentar nossa produção.

A crença subjacente, segundo Han, é a de que nada é impossível. Nós


podemos fazer tudo. Estamos constantemente pressionados por um poder-
fazer ilimitado. É um excesso de positividade, que se constitui em verdadeira
violência neuronal — uma violência que não parte do outro, mas que é
imanente ao sistema.

E por isso produzimos. Produzimos até a exaustão. E, mesmo cansados,


continuamos produzindo. Uma meta é sempre substituída por outra. A tarefa
nunca acaba. É frustrante e esgotante. O resultado é uma sociedade que gera
A Busca da Verdade no
fracassados e depressivos, a quem só resta recorrer a medicamentos para
Processo Penal
continuar produzindo mais eficientemente. Eliane Brum[4] capta muito bem
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esse sentido da sociedade do cansaço:

“ Estamos exaustos e correndo. Exaustos e correndo. Exaustos e


correndo. E a má notícia é que continuaremos exaustos e correndo,
porque exaustos-e-correndo virou a condição humana dessa época.
E já percebemos que essa condição humana um corpo humano não
aguenta. O corpo então virou um atrapalho, um apêndice
incômodo, um não-dá-conta que adoece, fica ansioso, deprime,
entra em pânico. E assim dopamos esse corpo falho que se
contorce ao ser submetido a uma velocidade não humana. Viramos
exaustos-e-correndo-e-dopados. Porque só dopados para


continuar exaustos-e-correndo.
Tchau, Querida Democracia
R$ 42,00

Mas por que insistimos em continuar correndo, mesmo exaustos? Por que
nos submetemos a tamanha violência psíquica? Onde está o tirano que nos
obriga a continuar correndo quando nossos corpos estão gritando por um
momento de pausa?

É nesse momento que Byung-Chul Han encontra Étienne de La Boétie: nós,


exaustos e dopados, continuamos correndo voluntariamente. Alçados a
empresário de nós mesmos, responsáveis e culpados por tudo o que nos
acontece, nós nos coagimos a sermos cada vez mais eficientes. No século

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XVI, La Boétie denunciava a servidão voluntária aos governos tiranos; o


homem submetia-se voluntariamente à coação do tirano; e o tirano era o
outro. Na sociedade do cansaço de Han, nós somos tiranos de nós mesmos.
Longe do que se poderia esperar, “[a] queda da instância dominadora não leva à
liberdade. Ao contrário, faz com que liberdade e coação coincidam”[5]. Somos
levados — ou melhor, entregamo-nos — à “liberdade coercitiva” ou à “livre
coerção” de maximizar o desempenho. Enquanto empresários de nós
mesmos, somos ao mesmo tempo exploradores e explorados, agressores e
vítimas, senhores e escravos do trabalho. “Essa autorreferencialidade gera uma
liberdade paradoxal que, em virtude das estruturas coercitivas que lhe são inerentes,
se transforma em violência.”[6]
Discurso de ódio e sistema
O instigante paradoxo de La Boétie, portanto, mantém-se e sofistica-se. A penal
liberdade encontra novas formas de coerção, oriundas não mais de fora, mas R$ 42,00
sistematicamente imposta a nós e por nós. Na superatividade incessante de
nossa condição de exaustos-e-correndo-e-dopados, nos quedamos passivos.
Sem tempo para parar, contemplar, pensar ou criar, não chegamos nem a
perceber nossa servidão voluntária pós-moderna — ainda que sintamos
todos os seus efeitos. Como então podemos deixar de ser servos na sociedade
do desempenho?

Na França de La Boétie, a monarquia absolutista foi deposta quando, no


contexto da revolução francesa, o terceiro estado (burguesia) tomou
consciência de sua condição de servidão voluntária e decidiu dela libertar-se.
Foi esse ímpeto que inspirou as famosas palavras do abade Sieyès:

Nós temos três questões para nos fazer.

1º O que é o terceiro estado? — TUDO.

2º O que ele tem sido até o presente na ordem política? — NADA.

3º O que ele exige? — SER ALGUMA COISA.[7]

É bem verdade que, no século XVIII, a revolução sangrenta levou os tiranos à


forca. Na França, a guilhotina, literalidade da morte do tirano, foi símbolo da
morte da tirania. Mas, se o tirano do Estado absolutista vestia coroa, cetro e
todos os símbolos do poder, podendo ser imediatamente identificado, o
tirano da sociedade do desempenho não tem rosto. Ou melhor, o tirano da
sociedade do desempenho só ganha um rosto quando nos olhamos no
espelho. Como então matar a tirania da sociedade do desempenho quando o
tirano somos nós mesmos?

Talvez a lição da revolução francesa para os homens exaustos-e-correndo-


e-dopados seja a tomada de consciência. O primeiro passo para
conseguirmos superar a livre coerção é nos percebermos inseridos em uma
estrutura social que nos leva a uma guerra conosco mesmos, na qual nos
auto violentamos a ponto de nos encontrarmos à beira de um “infarto
psíquico” ou de um “infarto da alma”, para utilizarmos as expressões de
Han[8]. Não é à toa que já adentrou o senso comum a ideia de a depressão
ser o mal do nosso século. O que falta é compreendermos o quanto nossa
depressão é fruto de uma violência voluntária.

Essa percepção abre novos horizontes de compreensão. Ela permite, por


exemplo, que nos demos conta do quanto nossa hiperatividade é, na verdade,
passiva (paradoxo da hiperatividade). Sobrecarregados de informações e
afazeres, realizamos as múltiplas tarefas que nos cabem, liquidando nossos
impulsos criativos. A sociedade do desempenho, que tanto cobra
empreendedorismo, mata a criatividade do sujeito que corre. Han[9] aponta
que, em nossa correria hiperativa, dispersamos nossa atenção em um esforço

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de multitarefas e perdemos nossa capacidade de atenção profunda, que é


pressuposto das criações culturais. Nossos movimentos variam entre o
andar, o correr e o cavalgar. Mas nenhum é um movimento novo. Trata-se
de movimentos lineares, retos, que se diferenciam apenas por serem mais ou
menos acelerados. São “[p]ura inquietação [que] não gera nada de novo.
Reproduz e acelera o já existente”. A atividade incessante aniquila a
criatividade.

Contra essa hiperatividade passiva, propõe o autor que criemos espaço para o
repouso, o tédio e a contemplação. O repouso nos dá tempo — tempo para
pensar e para criar. É assim que nos apercebemos de novos movimentos que,
ao invés de reproduzirem o andar linear, adotam a dinâmica fresca da dança.
“Comparada com o andar linear, reto, a dança, com seus movimentos revoluteantes,
é um luxo que foge totalmente do princípio do desempenho”.[10] Nesses novos
movimentos, conseguimos fugir da lógica de reprodução hiperativa e
resgatamos a criatividade. Para tanto, precisamos apenas aprendermos a
parar de correr.

No século XVI, La Boétie já constatava que a força da tirania provinha da


servidão fornecida voluntariamente ao tirano. Por conseguinte, para
enfraquecer os tiranos, “basta não lhes dar nada e não lhes obedecer, sem
combatê-lo ou atacá-lo, e eles ficam nus e são derrotados”[11]. Na sociedade do
desempenho, permitirmo-nos o repouso é uma atitude revolucionária. É um
exercício de desobediência aos imperativos tirânicos de produção que nos
impomos. Se quisermos superar nossa condição de exaustos-e-correndo-e-
dopados, basta não lhe darmos mais o combustível da hiperatividade
incessante. Se a servidão é voluntária, a autonomia também o é.

Lucas de Melo Prado é Mestre em Ciência Jurídica pela Universidade do Vale do


Itajaí – UNIVALI. Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Piauí – UFPI.
Professor de Direito Humanos, Filosofia Geral e Filosofia Jurídica na Faculdade
Avantis.

Bibliografia

BRUM, Eliane. Exaustos-e-correndo-e-dopados. El País, 4 jul. 2016. Disponível em:

<http://brasil.elpais.com/brasil/2016/07/04/politica/1467642464_246482.html>. Acesso em: 9

fev. 2017.

HAN, Byung-Chul. Sociedade do cansaço. Tradução de Enio Paulo Giachini. Petrópolis: Vozes,

2015. Título original: Müdigkeitsgesellschaft.

LA BOÉTIE, Étienne de. Discurso da servidão voluntária. Tradução de Casemiro Linarth. São

Paulo: Martin Claret, 2009. Título original: Discours de la servitude volontaire.

SIEYÈS, Emmanuel Joseph. Qu’est-ce que le tiers état? 3. ed. Paris: Ed. du Boucher, 2002.

Disponível em: <http://www.leboucher.com/pdf/sieyes/tiers.pdf>. Acesso em: 9 fev. 2017.

Referências

[1] LA BOÉTIE, Étienne de. Discurso da servidão voluntária. São Paulo: Martin Claret, 2009. p.

36.

[2] Ibid.

[3] HAN, Byung-Chul. Sociedade do cansaço. Petrópolis: Vozes, 2015.

[4] BRUM, Eliane. Exaustos-e-correndo-e-dopados. El País, 4 jul. 2016. Disponível em:

<http://brasil.elpais.com/brasil/2016/07/04/politica/1467642464_246482.html>. Acesso em: 9

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fev. 2017.

[5] HAN, Byung-Chul. op. cit. p. 29.

[6] Ibid. p. 30.

[7] SIEYÈS, Emmanuel Joseph. Qu’est-ce que le tiers état? 3. ed. Paris: Ed. du Boucher, 2002.

Disponível em: <http://www.leboucher.com/pdf/sieyes/tiers.pdf>. Acesso em: 9 fev. 2017.

Tradução nossa. Texto original: Nous avons trois questions à nous faire. 1º Qu’est-ce que le

Tiers état ? — TOUT. 2º Qu’a-t-il été jusqu’à présent dans l’ordre politique ? — RIEN. 3º Que

demande-t-il ? — À ÊTRE QUELQUE CHOSE.

[8] HAN, Byung-Chul. op. cit. Respectivamente p. 20 e 71.

[9] Ibid. p. 31-35. Citação direta: p. 34.

[10] Ibid. p. 35.

[11] LA BOÉTIE, Étienne de. op. cit. p. 37.

* capitalismo Exaustão Servidão voluntária Sociedade do Desempenho Tirania

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