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Por que precisamos da Psicanálise?

Um rápido ataque hegeliano à cegueira neurocientífica de nossos dias1

Estamos aqui tratando da diferença entre a abordagem psicanalítica e a


neurocientífica no entendimento do que é o sujeito, do que somos em
nosso íntimo. À primeira vista e sem maiores questionamentos, a maior
parte das pessoas tende a concordar com o ponto de vista científico de
quem faz experiências com aparelhos complicados, ao mesmo tempo em
que despreza os estudiosos que teorizam sobre a estrutura da psique
tomando como base uma análise especulativa. A análise dos
neurocientistas como a contagem de células neuronais ou ressonância
magnética para estabelecer quais áreas do cérebro respondem a
estímulos são, na determinação de como somos e pensamos, muito mais
acreditadas do que a análise que não se dá como um experimento
exterior, mas pela interpretação da fala e dos sonhos, como fazem os
psicanalistas. Eles comumente são retratados como místicos ou meros
loucos com resposta simplista como “tudo se resume a sexo” ou outras
tolices do tipo.

Não desprezamos aqui a importância da neurociência, importância que se


revelará muito maior com o progresso das tecnologias de interação entre
o cérebro e as máquinas, e que transformará completamente as
possibilidades humanas. Apenas desejamos, neste curto escrito, mostrar o
limite à possibilidade de conhecimento da neurociência, o que abre
espaço para entender o campo em que opera a psicanálise. Temos uma
questão central para tratar deste assunto que envolve a discussão do que
é conhecimento e do que é ciência quando o objeto do conhecimento
científico é à própria consciência (tomada aqui como a relação de
consciente e inconsciente e não no sentido de instância racional que faz o
cálculo do gozo). Não quero me aprofundar muito nisso, mas apenas
tentar evitar um erro muito frequente nos debates sobre o assunto, o que

1
Tradução da comunicação apresentada em alemão na turma do Winterkurs DAAD, na Duisburg-Essen
Universität em Essen, no mês de fevereiro de 2015, como resposta à exposição de dois colegas
neurocientistas.
tem relação direta com nossa questão. Um exemplo ajuda a tornar clara a
questão.

Há uma cena2 no começo do primeiro filme do Guia dos Mochileiros da


Galáxia em que dois alienígenas superinteligentes constroem uma
máquina na forma de uma gigantesca cabeça pensante para responder à
pergunta sobre “a vida, o universo e tudo o mais". Eles então fazem a
pergunta e a máquina responde que irá pensar e 7,5 milhões de anos
depois, quando a máquina está pronta para responder, eles retornam em
frente a uma multidão ansiosa e vão diante da cabeça gigante para
finalmente fazer a pergunta sobre “a vida, universo e tudo mais”. A cabeça
então responde a mais importante das questões: 42!

A redução de todo o significado a um número obviamente não explica


nada e esse é o anticlímax da cena.

Este também é o mesmo ponto que a neurociência comumente é incapaz


de compreender. Ela busca conhecer a consciência pelos seus mecanismos
puramente orgânicos (biológicos) e inorgânicos (físicos e químicos) em sua
comparação com o comportamento observável exteriormente. Não
percebem que a consciência, no entanto, apesar de ser materialmente
formada por estes elementos externos, é outra coisa, diferente deles.

Por isso a máquina do filme tem razão também ao dizer que uma nova
máquina, para poder responder adequadamente à questão, precisará ter
como sua matéria a própria vida. O problema da consciência, como
demonstrou Hegel cem anos antes de Freud fundar a psicanálise, está já
ao menos parcialmente apresentado na complexidade da própria vida. Um
exemplo basta para me fazer claro.

O conjunto de átomos que formam uma pessoa, seu número exato, não
são a pessoa mesma. A vida é mais que o conjunto de elementos
inorgânicos que a formam, ela se utiliza deste conjunto para se compor,
mas permanece diferente do mero amontoado de matéria. A vida é um
outro, uma unidade que se utiliza dos diferentes átomos como seus
momentos, sem com eles se confundir. O todo na vida, sua unidade, é

2
https://www.youtube.com/watch?v=aboZctrHfK8
muito mais do que a mera soma analítica das partes e o conjunto de
átomos que formam um ser humano, ao serem decompostos, não
guardam nada de humanidade.

O mesmo se dá com a consciência. Não podemos achar que o mero


cálculo de pulsos neuronais é em si a consciência, isto é no máximo a
representação externa de como ela funciona do ponto de vista físico ou
fisiológico, mas nunca nela mesma. Em outro exemplo curto se percebe
facilmente isso: no comportamento de uma pessoa notamos que ela está
deprimida, só dorme e não tem vontade de fazer nada, nem de comer.
Numa análise neurocientífica, percebe-se que a atividade de determinada
área do cérebro diminuiu e que falta determinado tipo de substância em
seu sangue, ou o que quer que se possa ver com os mais modernos
equipamentos. A resposta neurocientífica liga estes dois pontos, o
comportamento observável e o padrão fisiológico fora da normalidade e
prescreve um tratamento. A indústria farmacêutica agradece e patrocina
cada vez mais pesquisadores. Um braço muito rentável da moderna
máquina de alienação capitalista!

Conversando com a pessoa descobrimos que algo vai mal em seu universo
significante. Ela perdeu um filho, um amor, ou simplesmente não
consegue dar conta de tudo que esperam dela ou do que ela espera dela
mesma. Esta falta é, antes de ser uma pura falta neuroquímica, algo
experimentado pela sua própria consciência em seu próprio universo
simbólico e que não pode ser decifrado em laboratório. A causa anterior
não é uma disfunção neurológica, mas algum problema significante em
seu espírito, por assim se dizer.

O que ocorre é que a “ciência” de hoje faz com que o entendimento do


espírito (Geist, conforme os dois sentidos diversos que se encontram na
língua alemã) fique dividido em dois polos opostos e contraditórios: de um
lado o funcionamento objetivo, físico-químico da mente, o entendido
como objeto da ciência mesmo e que em português é representado pela
palavra mente. De outro, a unidade maior que os elementos, que, uma vez
que não é objeto desta “ciência”, aparece como algo místico, religioso, o
espírito. Aqui se perde a unidade que possibilitaria compreender mais a
fundo o humano, jogando-se em dois extremos: uma ciência pobre,
desprovida de qualquer insight sobre a complexidade humana ou o
misticismo religioso, o puro sentir, um “badalar de sinos” desprovido de
qualquer significação determinável.

Significado é justamente algo humano, algo que os humanos dão para as


coisas em sua relação com elas e não algo das coisas em si. Pode-se fatiar
um cérebro como quiser que lá não se encontrará a consciência, do
mesmo jeito que dissecando um cadáver não se apreende a essência da
vida. Pulsos neuronais nunca poderão explicar a natureza interna do amor
ou do medo, não porque não se possa percebê-los com instrumentos ou
mesmo induzi-los quimicamente, mas porque a forma destes
instrumentos de capturá-los será sempre como a resposta da máquina do
filme: 42! Algo que, ainda que possa informar coisas úteis do
funcionamento exterior do pensamento, está totalmente desgrudado do
significado interno da própria consciência.

Para encontrar o significado e lidar com os problemas do espírito,


precisamos assim de uma ciência que caminhe pelo lado interno, que lide
diretamente com o universo significante do sujeito. Aqui não há atalhos, e
a capacidade de abstrair somada ao conhecimento de diferentes modos
de ser deve substituir microscópios e computadores. Tendo em mente
esta advertência inicial, pode-se agora retornar sem o preconceito usual
às teorias psicanalíticas, que vão exigir antes de tudo o cuidado de não se
tomar por simples o que de fato é ao menos tão complexo como a vida.

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