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dutra - benevides
PROJETÁ-LAS E ENTENDÊ-LAS NO QUADRO DA
TRANSFORMAÇÃO URGENTE E RADICAL.
NÃO PARA UM DIA QUALQUER POSTERIOR
À REVOLUÇÃO, MAS DIUTURNAMENTE.
participativo
FRANCISCO DE OLIVEIRA e socialismo
O SEGUNDO CICLO DO SEMINÁRIO SOCIALISMO SOCIALISMO
dutra - benevides
PROJETÁ-LAS E ENTENDÊ-LAS NO QUADRO DA
TRANSFORMAÇÃO URGENTE E RADICAL.
NÃO PARA UM DIA QUALQUER POSTERIOR
À REVOLUÇÃO, MAS DIUTURNAMENTE.
participativo
FRANCISCO DE OLIVEIRA e socialismo
Socialismo em discussão
ORÇAMENTO PARTICIPATIVO
E SOCIALISMO
Olívio Dutra
Maria Victoria Benevides
Diretoria
Luiz Dulci – presidente
Zilah Abramo – vice-presidente
Hamilton Pereira – diretor
Ricardo de Azevedo – diretor
Coordenação Editorial
Flamarion Maués
Assistente Editorial
Candice Quinelato Baptista
Revisão
Márcio Guimarães de Araújo
Maurício Balthazar Leal
Ilustração da Capa
Rodolfo Pizzignacco
Editoração Eletrônica
Enrique Pablo Grande
Impressão
Cromosete Gráfica
1a edição: outubrode 2001 – Tiragem: 4 mil exemplares
Todos os direitos reservados à
Editora Fundação Perseu Abramo
Rua Francisco Cruz, 234 – CEP 04117-091 – São Paulo – SP – Brasil
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Na Internet: http://www.fpabramo.org.br – Correio eletrônico: editora@fpabramo.org.br
Copyright © 2001 by Editora Fundação Perseu Abramo — ISBN 85-86469-57-2
Apresentação
Francisco de Oliveira ..................................................................... 5
Comentários
Orçamento participativo e democracia direta
Maria Victoria Benevides .............................................................. 19
Democracia direta como parte da construção do socialismo ............................. 21
Radicalização da democracia e socialismo democrático ..................................... 24
Controle público do Estado ............................................................................... 26
Debate com o público
Armelindo Passoni ....................................................................................... 31
Paulo Rubens ............................................................................................... 31
Roberto Gouveia .......................................................................................... 32
Pedro Pontual ............................................................................................... 33
Olívio Dutra ................................................................................................ 35
Maria Victoria Benevides ........................................................................... 40
Paul Singer ................................................................................................... 43
Anísio Homem ............................................................................................. 44
Juliana Piccoli Agati ..................................................................................... 45
Paulo Vannuchi ............................................................................................ 46
José Reinaldo Braga ..................................................................................... 47
Olívio Dutra ................................................................................................ 47
Maria Victoria Benevides ........................................................................... 54
Zilah Abramo ............................................................................................... 59
Alencar Santana Braga ................................................................................ 59
Gustavo Venturi ........................................................................................... 59
Antônio Lanzetti .......................................................................................... 61
Sebastião Marcelo Sobrinho ........................................................................ 62
Olívio Dutra ................................................................................................ 63
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 5
temas foram trabalhados, sempre, perguntando-se quais são suas
interações com o socialismo. De modo que as gestões da esquerda não
devem ser apenas o breve ciclo de uma administração, mas precisam
também realizar, concretamente, na vida cotidiana das cidades, das cida-
dãs e cidadãos, uma mudança cujo nome histórico é socialismo. Não
para um dia qualquer posterior à revolução, mas diuturnamente. Desse
modo, a perspectiva histórica do socialismo ajuda, orienta e valoriza me-
didas simples, ao alcance da cidadania, sem a grandiloqüência dos gran-
des eventos, mas preparando-a para seu autogoverno.
Foram abordados o recado das urnas de 2000, a rica experiência, que
a vários títulos representa uma enorme inovação política, do orçamento
participativo, o planejamento urbano, a reforma agrária e o movimento
dos trabalhadores sem-terra, as formas contemporâneas da luta social, a
decisiva revolução molecular-digital e a virada da informação, e, por
último, as complexas relações econômicas internacionais na era da cha-
mada globalização. O exame travejou, sempre, a experiência das lutas
com a reflexão que procurava projetá-las e entendê-las no quadro da
transformação urgente e radical. Destacados militantes do Partido dos
Trabalhadores, desde seu presidente de honra, novos dirigentes munici-
pais, calejados quadros políticos, governadores e prefeitos, especialistas,
reputados professores universitários, apoiados, discutidos e contestados
por um público sempre numeroso e participante, dedicaram o tempo ne-
cessário para arejar o pensamento, desafiando o entendimento da nova
complexidade. Assim, o PT busca juntar ação e reflexão, não apenas
para preparar quadros, mas para assumir o mandato da transformação –
como disse uma já clássica canção petista – “sem medo de ser feliz”.
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 7
Não reinventamos a roda. Nosso projeto é fruto das lutas históricas da
classe trabalhadora, da resistência democrática e de experiências go-
vernamentais desenvolvidas pelo campo popular em várias partes do
planeta em diferentes situações e circunstâncias históricas, especialmente
na nossa América Latina. Por meio do orçamento participativo, a popu-
lação protagoniza a construção da proposta orçamentária. Nesse pro-
cesso, invertem-se as prioridades, o que provoca mudanças importantes
na concepção estrutural da proposta.
Com a implantação do orçamento participativo, revigoram-se outras
vias de participação popular nas áreas de saúde, assistência social, habi-
tação, ensino, interpondo barreiras às práticas tradicionais das elites do-
minantes em nosso país, como o clientelismo e a corrupção. Floresce
com ele uma nova cultura, na qual o cidadão passa a ser sujeito, e não
mais objeto da política.
O orçamento participativo possibilita uma modificação substancial nas
relações das pessoas com o Estado e o poder público. A proposta orça-
mentária deixa de ser um arranjo de interesses entre governo, grupos
empresariais, especialistas e técnicos para se tornar uma decisão assu-
mida pelo povo na sua dimensão verdadeiramente política e cultural.
Começa a se democratizar radicalmente a relação do Estado com a
sociedade civil; as pessoas não mais limitam sua participação política ao
ato de votar em dia de eleição.
E não se trata de um “ovo de Colombo”, de uma fórmula mágica,
mas de um processo longo e árduo, de um aprendizado comum envol-
vendo muita gente. O governo, junto com sua base de sustentação – os
partidos que compõem a Frente Popular –, tem um papel importante,
mas a população tem o protagonismo principal. Com ela, o significado
desta alternativa radical de cidadania vai adquirindo contornos mais
nítidos. O governo vai se descentralizando e aprendendo a dividir o
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 9
início, de modo aberto e pluralista. Dessa forma, as 22 regiões do orça-
mento participativo no Rio Grande do Sul vão se tornando espaços fe-
cundos nos quais se desenvolve uma verdadeira opinião pública inde-
pendente. Espaços que não podem ser instrumentalizados nem pelos
partidos, nem pelo governo.
Com a experiência e o aprofundamento dos debates, esses espaços
públicos acabam por superar os corporativismos egoístas e os particu-
larismos limitadores, que aliás brotam inevitavelmente num primeiro
momento, em razão de uma longa história de exclusão e de ausência de
decisões e de projetos coletivos. Assim, as pessoas lutam não apenas
pelas demandas de suas ruas e de seus bairros, mas adquirem uma visão
integral de sua cidade, de seu estado e de seu país. Portanto, tornam-se
cidadãs e cidadãos solidários, com consciência crítica e preocupação
social, entendendo os processos de dominação, combatendo-os e se re-
conhecendo como construtores de uma nova sociedade.
Aqui, penso, reside a principal crítica ao socialismo que conhecemos e
a maior contribuição à construção do socialismo democrático que quere-
mos. Refiro-me ao protagonismo das pessoas no processo de transfor-
mação social enquanto atividade permanente e cotidiana, ponto em que
as experiências de socialismo até aqui fracassaram. O orçamento
participativo é um espaço propiciador do exercício pleno da cidadania
por parte de milhares de pessoas do povo.
Assumimos, portanto, o desafio de reconstruir o Rio Grande como um
estado participativo sob o controle público. Para isso, não poderíamos
fazer a mera transposição do orçamento participativo aplicado em âmbi-
to municipal para a esfera mais ampla e complexa do estado. Era preci-
so levar em consideração um leque maior de forças e estruturas políti-
cas, como as prefeituras, os conselhos regionais de desenvolvimento, as
representações políticas locais, as diferenças regionais e as relações
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 11
Ética e luta de classes – O orçamento participativo revigora o con-
teúdo ético da atividade política, contrastando com o mar de corrupção
que assusta e revolta os brasileiros neste início do século XXI. Nossa
experiência de democracia participativa prova que a gestão transparen-
te dos recursos é a melhor maneira de se evitar a corrupção e o mau uso
do dinheiro público.
Entretanto, não encaramos essas conquistas nem de forma meramen-
te administrativa, nem de maneira idílica, como se tudo estivesse funcio-
nando às mil maravilhas. Ao contrário, temos plena consciência de que
esse processo revolucionário situa-se em um contexto de exacerbada
luta entre dois projetos distintos. As elites tradicionais sabem perfeita-
mente que esta prática dá um conteúdo real à democracia, acabando
com os privilégios, com o clientelismo e, em última análise, com o poder
do capital sobre o conjunto da sociedade. Trata-se, pois, de uma luta
política com nítido conteúdo de classe (ou de bloco de classes) que vai se
desenvolver ainda por um longo período.
Por isso, se alguém afirmar – alguns o fazem – que o orçamento
participativo é apenas uma forma mais organizada de os pobres disputa-
rem entre si as migalhas do capitalismo ou, no máximo, uma ligeira pri-
mavera democrática, mas sem qualquer relação com o socialismo, esta-
rá inteiramente equivocado. Além de ser um aprofundamento e uma
radicalização da democracia, também se constitui num vigoroso impulso
socialista, se encaramos o socialismo como um processo, para o qual a
democracia direta e participativa é elemento essencial, pois possibilita o
fortalecimento da consciência crítica e dos laços solidários entre os ex-
plorados e os oprimidos, abrindo caminho para a apropriação pública do
Estado e a construção de uma nova sociedade.
Nossos adversários de projeto de sociedade sabem bem disso, tanto
que os partidos alinhados com a ideologia neoliberal buscam nos sub-
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 13
Na prática, o neoliberalismo globalizante só tem concentrado renda e dis-
tribuído a miséria, agravando as desigualdades sociais e regionais, aumen-
tando o desemprego e promovendo crescente empobrecimento dos povos.
A abertura comercial e financeira feita de forma indiscriminada e
irresponsável torpedeou os projetos nacionais; parque industrial brasi-
leiro foi abandonado à própria sorte, numa competição desigual com
empresas estrangeiras que para aqui foram atraídas praticamente sem
riscos e com muito dinheiro público. Muitas fábricas pequenas e médi-
as fecharam, indústrias tradicionais foram compradas por grupos es-
trangeiros, setores importantes de nossa economia desapareceram e
presenciamos a desorganização de importantes cadeias produtivas. No
caso brasileiro, desde 1994, o patrimônio controlado por multinacionais
cresceu 80%. O desemprego e a exclusão social constituem a face
mais perversa desse modelo.
Nas grandes cidades brasileiras, pelo menos 20% das pessoas econo-
micamente ativas estão sem emprego. As decisões econômicas que afe-
tam milhões de brasileiros são cada vez mais tomadas fora de nossas
fronteiras, a partir do Fundo Monetário Internacional (FMI), uma espécie
de cooperativa dos grandes banqueiros, muito mais preocupado em de-
fender os interesses de credores e investidores estrangeiros do que em
resolver a crise social que este modelo agrava a cada dia em nosso país
e em diversos países do globo.
Mas, ao contrário do que pretendiam os teóricos neoliberais, a história
não acabou e os povos do mundo inteiro começam a perceber o engodo
desse modelo perverso. As manifestações de Seattle contra a Organiza-
ção Mundial do Comércio (OMC), em Washington, em Praga e, recente-
mente, em Buenos Aires contra a Área de Livre Comércio das Améri-
cas (ALCA) demonstram o vigor do crescente movimento de contesta-
ção ao pensamento único que o neoliberalismo tentou nos impor.
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 15
Devemos, pois, trabalhar cotidianamente para a construção do espaço
público, em que devem surgir e se desenvolver novas instituições, e bro-
tar viçoso o conceito vivo de república. Paralelamente, começam a ser
alicerçados os fundamentos de um Estado verdadeiramente democráti-
co, com o objetivo principal e essencial de garantir a cidadania. Um
Estado que socialize o poder, que seja transparente e controlado pela
sociedade civil, que caminhe em sentido oposto ao do neoliberalismo e
promova a mais ampla inclusão social.
Não queremos um Estado que seja maior do que a sociedade, mas
também rejeitamos o Estado mínimo pretendido e arquitetado pelos
neoliberais sob as cinzas das conquistas sociais e das lutas de várias
décadas dos trabalhadores.
Nessa luta pela hegemonia, o conteúdo da crítica socialista ao capitalismo
permanece vivo e atual. Não se confunda o conteúdo do socialismo com o
que se convencionou chamar abusivamente de “socialismo real”, para ca-
racterizar os regimes burocráticos do Leste Europeu. A desintegração da
União Soviética, em dezembro de 1991, assinala o fim de um ciclo e abre
uma nova etapa, marcada pelo absoluto domínio militar norte-americano e
por uma hegemonia indiscutível do hemisfério Norte na economia, na políti-
ca e na cultura. Entretanto, na Rússia, o encantamento com a vitória do
capitalismo durou pouco e logo desabaram os sonhos de consumismo gene-
ralizado. Em menos de dez anos, o chamado mercado livre só fez gerar
miséria, desemprego e constituir grupos mafiosos como órgãos de poder
político e econômico não institucionalizados; uma assustadora desagregação
ética faz hoje em dia parte do cotidiano russo em tempos neoliberais.
Mas a alternativa – e não existe outra, não há capitalismo com justiça
social – ao sistema capitalista neoliberal no qual estamos inseridos é,
digamos claramente, o socialismo. O socialismo democrático e libertário,
renovado permanentemente, mas sem se descaracterizar; um movimen-
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 17
18 ORÇAMENTO PARTICIPATIVO E SOCIALISMO
Comentários
Maria Victoria Benevides
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 19
Em relação à sua brilhante exposição, gostaria de tecer algumas con-
siderações a partir de sua avaliação e de sua análise do processo den-
tro do partido, da experiência do Rio Grande do Sul, da temática do
socialismo e da democracia. Concordo com suas frases finais, no sen-
tido de que a experiência do orçamento participativo, e toda a discus-
são que é feita sobre suas dificuldades e suas possibilidades de
aprofundamento, de ampliação, de levá-lo para outros municípios do
país, pode realmente configurar um projeto nacional do partido, que
faça parte da discussão e da especificidade programática de um parti-
do que aspira chegar à presidência da República.
Quando discutimos a democracia, num momento como o atual, em
que todos se dizem democratas, em que todos os partidos se afirmam
democratas, em que todas as lideranças no país se afirmam valentes,
vigorosos democratas, temos de afirmar esse traço fundante da de-
mocracia para o Partido dos Trabalhadores, que é a soberania popu-
lar verdadeira, autêntica. Autônoma das peias de um sindicalismo
tutelado pelo Estado; autônoma de um partido entendido como van-
guarda, de dirigentes entendidos como elites iluminadas, de um
sindicalismo populista e trabalhista como o da nossa experiência his-
tórica anterior a 1964. Ou seja, essa especificidade do PT, indepen-
dentemente de eventuais alianças partidárias que ele possa fazer, deve
estar muito clara.
Não devemos ter medo de falar em democracia direta, mesmo diante
de prováveis ambigüidades que cercam a expressão. O PT é, sim, o
partido da democracia participativa, da democracia direta, embora isso
não signifique o desprezo pelas formas institucionais da democracia
representativa, muito pelo contrário. Pela democracia representativa
temos companheiros ilustres, valorosos e combativos em governos, como
Olívio Dutra; em prefeituras, como Tarso Genro, Marta Suplicy, nos-
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 21
Então, se agregarmos a idéia de soberania popular ao respeito integral
pelos direitos humanos, nas suas dimensões de liberdades públicas, indi-
viduais, direitos civis, econômicos, sociais, culturais, direitos da humani-
dade, que são essencialmente históricos, veremos como não deixaremos
fora do nosso conceito de democracia nem os seus aspectos de partici-
pação política, de liberdade, de pluralismo, de igualdade, nem os aspec-
tos da obrigação do Estado em relação aos direitos fundamentais, bem
como o dever da sociedade em relação àquele princípio revolucionário
da fraternidade ou, como falamos hoje, da solidariedade.
Essa é a primeira premissa do que entendo por democracia e de como
entendo a oposição radical entre democracia e capitalismo, mesmo que não
se fale ainda, explicitamente, de uma proposta socialista, que é a minha.
A segunda premissa é que a defesa da democracia direta, nas suas
várias formas, das quais a experiência mais bem-sucedida é o orça-
mento participativo, não exclui a democracia representativa. É justa-
mente por isso que insisto que não devemos ficar na defensiva em
relação ao nosso compromisso com a democracia direta; ora, ninguém
defende a abolição de eleições para nossos representantes no Legis-
lativo e no Executivo. Pelo contrário, há até os que defendem uma
ampliação das eleições, para, por exemplo, determinados cargos no
Judiciário, como ocorre em outros países. Aliás, em países que estão
longe de ser socialistas, como é o caso dos Estados Unidos, existe a
experiência com eleições diretas para promotores, entre outros car-
gos. Existe, sem dúvida, uma complementaridade entre democracia
direta e democracia representativa.
Considero que a democracia direta, nas suas várias formas, exerce
um efeito extremamente positivo na democracia representativa, no
sentido de que age como um corretivo aos vícios e mazelas já por
demais conhecidos em nossa cultura política – aliás, existentes em vá-
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 23
educação política que não está fechada nos limites da militância partidá-
ria, mas aberta para a cidadania efetivamente democrática. O orçamen-
to participativo, nesse sentido, é uma excelente escola de democracia.
A quarta premissa é que, hoje, o orçamento participativo é uma reali-
dade que transcende o PT, embora seja marca registrada do partido. Ele
já está sendo reivindicado por outros partidos, por outras tendências,
porque viram que dá certo, em termos de mobilização e de empenho das
comunidades, no plano local, com o processo decisório em torno de inte-
resses públicos.
Portanto, é cada vez mais importante que o diferencial petista se afir-
me. Assim como todos se dizem democratas mas não são, há diferenças
cruciais entre partidos e tendências políticas e ideológicas sobre o signi-
ficado concreto da democracia – e isso ocorre em relação ao orçamento
participativo também. Vejam o que aconteceu, por exemplo, com o pro-
jeto de bolsa-escola, que hoje se tornou um projeto de todos, a começar
pelo governo federal, que na minha avaliação está longe de ser um go-
verno republicano e democrático.
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 25
idéia de democracia. O poder dos políticos seria uma justificada
perícia que eles sozinhos possuiriam e, por definição, o inábil
populacho é chamado periodicamente apenas para julgar esses
peritos. Não existem nem podem existir especialistas em assuntos
políticos. Perícia ou sabedoria política pertencem à comunidade
política. Pois perícia, a tekiné, do grego, no sentido estrito, está
sempre relacionada a uma ocupação específica, e técnica é obvi-
amente reconhecida em seu próprio campo”2.
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 27
E aqui também entendo a ênfase que Olívio dá à questão da hegemonia,
entendida como uma direção política, mas também como uma direção
cultural da sociedade. O ponto importante levantado por Olívio Dutra é o
de entender essa forma de participação direta com o seu conteúdo de
classe. Já houve quem dissesse, até mesmo nas nossas hostes, que a luta
de classes tinha acabado. Então acho ótimo que o Olívio tenha enfatizado
esse aspecto. É, sim, um problema de luta de classes, e isso aparece
claramente no horror que causa às elites a própria idéia de participação
popular soberana.
Se consultarmos os anais da Constituinte que se encerrou em 1988,
veremos o argumento sincero e ideológico dos constituintes radicalmen-
te contrário à possibilidade de que o povo participasse de processos
decisórios diretamente, sem a mediação de partidos e de representantes.
É algo profundamente arraigado, que revela o solene horror a que o
povo, essa multidão suína – como dizia Burke, referindo-se à Revolu-
ção Francesa – possa efetivamente participar de processos decisórios.
Finalmente, gostaria de enfatizar a necessidade de que o orçamento
participativo seja uma experiência que leve efetivamente a um novo modo
de se fazer política, como parte de uma proposta alternativa de um siste-
ma político e econômico que caminhe na direção de um socialismo de-
mocrático e libertário.
Creio que seria importante reforçar alguns pontos, até para evitarmos
a armadilha de dizerem: “Vocês com essa história de democracia direta
estão querendo reproduzir as experiências totalitárias dos sovietes, das
revoluções etc.” Nós queremos as experiências radicalmente democrá-
ticas, na democracia participativa e, eu diria, no socialismo democrático.
Então, a primeira exigência é a garantia de informação, ou seja, man-
ter um fluxo constante de informação. Não existem no orçamento
participativo efetivamente democrático os arcanos, os segredos, a mani-
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 29
Debate com o público
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 31
ções nos movimentos sociais quan- permite que as elites se apropriem
do não somos governo – via de re- do imposto que é pago pela socie-
gra somos fragmentados, corpo- dade como forma de acumulação
rativos, categorias isoladas, movi- de capital. E temos atuado pouco
mentos que não se somam no con- no sentido de estruturar a socieda-
trole social do dinheiro público – e de para fazer frente a esse Estado,
quando somos governo – aí, passa- principalmente às Procuradorias e
mos a tratar de uma forma global a ao poder Judiciário, que são tam-
gestão do dinheiro público. bém parte desse Estado da elite que
A outra questão, que é tão grave domina o país.
quanto a gestão do orçamento, diz
respeito ao dinheiro que não entra Roberto Gouveia
no orçamento, pois acaba sendo Fico muito animado com essas
desviado pela sonegação fiscal, que duas belíssimas exposições. O que
é uma das formas mais estruturadas eu acredito que se coloca como de-
de crime contra o patrimônio públi- safio para nós é exatamente a edu-
co. Temos tido poucas experiênci- cação para o exercício do poder.
as, pelo menos em nossas banca- Não viemos apenas para dividir
das estaduais e municipais, e até uma série de coisas, fundamental-
mesmo na bancada federal, no to- mente viemos para dividir o poder,
cante a como a sociedade se es- e aí se coloca a questão da educa-
trutura para não permitir que esse ção para o seu exercício. Gostaria
Estado que aí está continue a ser de ouvir o comentário de Maria
ineficaz no combate à sonegação. Victoria e de Olívio Dutra a res-
Temos que lembrar que não é só peito da potencialização dessa ex-
a gestão oligárquica, elitista, que periência e se o próprio orçamento
privatiza o Estado e concentra ri- participativo deve fazer parte de um
queza dentro de um orçamento. É conjunto de medidas que leve ao
também a gestão do Estado que processo de descentralização, de
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 33
ses são aspectos em relação aos pensar da sua própria metodologia,
quais o orçamento participativo so- da discussão de como é que se arti-
zinho não dá conta, daí a necessida- cula, por exemplo, a questão da par-
de de revigorarmos espaços como ticipação direta nas plenárias, o exer-
os conselhos municipais de políticas cício de uma participação direta que
públicas, articulá-los ao orçamento não necessariamente supõe que o
participativo. Então, penso – e gos- cidadão vá à plenária e que deve ter
taria de debater essa reflexão tam- algum peso no processo.
bém no nosso partido – que corre- Então, penso que devemos, com
mos o risco de operar um certo muita razão, aprofundar essa dis-
reducionismo da discussão da parti- cussão sobre o orçamento partici-
cipação popular e da ampliação das pativo para não perder de vista que
formas de exercício da democracia a questão da participação popular,
direta se limitarmos estas questões da ampliação das formas de exer-
ao orçamento participativo. cício de democracia direta, supõe
Isso, por um lado, tem o seu sen- outros canais e outros instrumen-
tido, dado o vigor dessa experiên- to articulados ao processo de or-
cia e sua originalidade, mas, ao çamento participativo. Quando fa-
mesmo tempo, recoloca para nós o lamos, por exemplo, do controle
desafio de ampliarmos o horizonte público sobre o Estado, temos a
das discussões, sem o que estare- face da organização da sociedade
mos talvez depositando no orça- civil, dos processos de exercício
mento participativo um nível de res- da cidadania, mas temos um enor-
ponsabilidade do qual ele sozinho me desafio, que é a modernização
não pode dar conta na operação dos da própria máquina do Estado.
processos de participação popular Quer dizer, como os processos de
dos municípios. planejamento estratégico, no nível
Hoje, mesmo no âmbito do orça- dos governos, podem efetivamen-
mento participativo, há todo um re- te contribuir para essa transparên-
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 35
metros dali, em São Luiz Gonzaga. bém as propostas alternativas, já
É um lugar no mundo onde ciência que um número crescente de pes-
e tecnologia parecem ser coisas dis- soas se dispõe a pensar, a discutir
tantes. No entanto, ciência e e a produzir políticas.
tecnologia têm tudo a ver com o Entendo que as preocupações de
processo de desenvolvimento que Pontual alertam para que não fa-
precisa ser desencadeado ali para çamos do orçamento participativo
aquela comunidade se ligar com a uma panacéia ou a forma única de
região, o estado e o país. Como pro- radicalização da democracia. Esse
vocar essa discussão? Esperar que cuidado, no entanto, não pode di-
ela surja espontaneamente, nas as- minuir a importância da experiên-
sembléias, é equivocado. Primeiro cia. É preciso aprofundá-la,
o tema deve ser provocado, e há espraiá-la mais ainda, antes de di-
várias formas de fazer essa boa zermos “é preciso ter cuidado com
provocação. A partir das questões ela...”, “reforcemos outras...”.
locais articular as questões regio- É possível, companheiro
nais com o espaço federado e a Armelindo Passoni, que o povo de-
integração do país, da América cida não aplicar recursos segundo a
Latina, enfim. Acredito que não há proposta do governo. Se não há re-
um espaço tão rico hoje quanto o cursos, essa é uma outra questão.
das assembléias do orçamento A discussão do orçamento também
participativo para a apropriação encara este problema. Por que não
desses elementos e a compreensão há? De onde vem a receita? Quem
de seu entrelaçamento. O orça- paga impostos? Quem não paga?
mento participativo não fabrica di- Quem está sendo privilegiado com
nheiro, mas fabrica uma coisa muito esta ou aquela política de anistia fis-
especial, o protagonismo, a cidada- cal ou de subsídio? Como o poder
nia, a crítica. Isto aumenta a co- público gasta o dinheiro? Com que
brança sobre o governo, mas tam- prioridades? Quem define isso? En-
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 37
princípio geral que garanta a par- é a realidade. Vamos criar um con-
ticipação popular, cidadã, na cons- selho paralelo? Não, vamos ter que
trução do orçamento. O resto tem estimular os militantes sociais a
de ser aberto, não pode ser tensionar constantemente esse pro-
engessado, no nosso entendimen- cesso e, com transparência e polí-
to. Como vai ser quando assumir- ticas claras, transformá-lo.
mos a presidência da República? Essa é uma luta que temos de
É um grande desafio: abrir o orça- assumir. Firmeza e paciência não
mento público federal para uma devem faltar para levá-la adian-
discussão que vá além da Comis- te. Mas, evidentemente, um go-
são de Orçamento do Congresso, verno nosso não pode repassar
das duas casas do Congresso, dos verbas para um município sem a
especialistas, dos grupos econômi- comprovação de como o dinheiro
cos. Como fazer isso? Eis a gran- será aplicado. Às vezes no pró-
de e desafiadora questão. prio local há dificuldades de fu-
O controle social das verbas pú- rar o bloqueio, mas na região há
blicas, companheiro Paulo Rubens, possibilidade de discutir melhor e
é um ponto fundamental. Vejamos fazer dessa maneira um cerco,
o caso da saúde. Existem os con- que acaba também por provocar
selhos municipais de saúde. Cada uma mudança naquele lugar ini-
centavo do dinheiro público repas- cial. Esse controle é muito impor-
sado deve ter sua aplicação com- tante: o cidadão saber que tem re-
provada. Por isso a importância de cursos para o seu município. Es-
um conselho de saúde no municí- ses recursos têm prazos para che-
pio. Mas não raro vamos encon- gar lá. Chegaram? Quanto?
trar o conselho manobrado pelo fi- Como foram gastos? Essa é uma
gurão local, pelo cacique político, e questão em torno da qual se pode
constituído pelos seus parentes e trabalhar o fortalecimento dos
cabos eleitorais. Infelizmente, essa conselhos. Os delegados e con-
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 39
capacidade de nos construir, cons- um número cada vez maior de pes-
truindo com os outros a apropriação soas do povo. Isso acaba arejando
pública, e não privada, do Estado. os espaços já existentes e possibi-
Temos obrigações e compromissos, litando a criação de novos e ricos
até porque somos um partido, e o espaços de participação popular.
Partido dos Trabalhadores tem pro- Entendo que estas cinco coloca-
posta. Queremos que nossa propos- ções apresentadas pelos compa-
ta, que é de uma parte da socieda- nheiros trouxeram elementos no-
de, possa ser aceita pelo conjunto vos e importantes para a reflexão
dela num processo de construção da sobre democracia, sua radicali-
hegemonia, por meio do convenci- zação, representação, descentra-
mento e do reconhecimento, e não lização do poder, controle público,
da imposição e do arbítrio. aletando para o risco de, pela sim-
No processo do orçamento parti- plificação, não aquilatarmos bem os
cipativo, são eleitos os conselhei- desafios e potencialidades do orça-
ros, que, por sua vez, elegem os mento participativo.
delegados que compõem o COP,
Conselho do Orçamento Partici- Maria Victoria Benevides
pativo. A realização de cada assem- Olívio Dutra respondeu de uma
bléia local e regional é antecedida maneira tão completa e eficiente às
de reuniões e encontros de iniciati- questões, e de uma maneira com a
va das próprias organizações da so- qual eu concordo bastante, que vou
ciedade civil que mobilizam milha- me deter apenas em alguns pon-
res de pessoas. Reúnem-se para tos. Por exemplo, a questão sobre
discutir prioridades locais e regio- o orçamento participativo no plano
nais, para buscar a melhor repre- nacional e a questão jurídica. São
sentação possível nas eleições de pontos extremamente complicados.
conselheiros e de delegados. É um Acho muito difícil pensar numa con-
exercício de política praticado por figuração jurídica para o orçamen-
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 41
secretarias estaduais e vai para plo, no plano urbanístico de mu-
as delegacias de ensino; mas aí dança do bairro do Bixiga, em que
cada delegacia “senta em cima”. a população interessada participou
Vai para as escolas, e as diretoras de assembléias para discutir a ex-
– que muitas vezes são extrema- posição dos diferentes projetos e
mente conservadoras diante de depois votar.
qualquer inovação – “sentam em Assim, outras experiências de
cima” da proposta e do projeto. Ou democracia direta certamente com-
seja, há descentralização, mas o pletariam, junto com o orçamento
poder continua concentrado. participativo, um projeto efetivo de
E, finalmente, em relação à ques- mudança no exercício do poder, de
tão do Pedro Pontual, eu lembraria democratização do poder.
outras formas de democracia dire-
ta. Por exemplo, a iniciativa popu- Pergunta
lar: é necessário ampliar o âmbito Levando em conta que a maioria
da iniciativa popular legislativa dos eleitores não se interessa por
para emendas à Constituição. Há política, uma crítica que se faz ao
países em que as emendas consti- orçamento participativo é que só
tucionais podem ser feitas por de- vão às assembléias aqueles que já
cisão popular, e acho que nós po- são atuantes. O eleitor comum aca-
deríamos perfeitamente fazer isso, ba ficando fora de qualquer parti-
assim como ampliar formas de par- cipação. Como poderíamos respon-
ticipação popular em relação, por der a essa crítica?
exemplo, à realização de obras de Pergunta
impacto ambiental ou de grande O governador Olívio Dutra menci-
vulto financeiro. onou que houve uma liminar contra
Lembro que a ex-prefeita de o orçamento participativo. Poderia
São Paulo Luíza Erundina promo- explicar melhor isso e como ficou
veu consultas populares, por exem- essa questão?
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 43
que a sociedade é composta por ri- co se o povo fosse homogêneo e
cos e pobres, e que os pobres que- todo mundo quisesse a mesma coi-
rem exatamente a mesma coisa, sa e fosse preciso só implementar
portanto basta dar aos pobres, que aquilo que todo mundo quer. O que
são maioria, a voz e o poder de de- eu gostaria de ouvir do companhei-
cisão e tudo muda. Não é assim. A ro Olívio é um comentário sobre
população é heterogênea, sobretu- isso, porque é aí que está o proces-
do no plano estadual, por isso gos- so de construção da soberania po-
taria tanto que o companheiro pular. No plano orçamentário, após
Olívio nos contasse um pouco como 12 anos de orçamento participativo,
são os conflitos no processo do or- provavelmente já há um lastro de
çamento participativo entre as fac- conhecimentos de como encami-
ções do povo. Porque existem gran- nhar essas negociações e garantir
des quantidades de pessoas preci- que elas desemboquem depois, no
sando de escolas e de creches. Mas, Legislativo, de forma positiva.
e as famílias que não têm crianças
em idade escolar, como é que fi- Anísio Homem
cam? Existe necessidade de gran- Gostaria de fazer uma interven-
des recursos para a saúde. Mas os ção partindo um pouco da preocu-
que não precisam desse recurso, pação de Paul Singer, mas tirando
que não têm doenças crônicas, conclusão inversa. Ele tem razão
como é que ficam? Ou seja, a base quando diz que há um verdadeiro
do orçamento participativo, a meu conflito estabelecido entre a popu-
ver, é um processo de conflito e de lação que vai ao orçamento parti-
negociação entre as correntes, ou cipativo. Por quê? Porque existe
entre os setores que formam o algo que não apareceu na primeira
povo. A soberania popular se cons- rodada de falas, ou seja, que o or-
trói nesse processo. Ela não vem çamento dos orçamentos está am-
pronta de uma vez. Seria magnífi- putado, ele é completamente deter-
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 45
Como atrelar junto ao orçamento a experiência de Belém1 . Por que
participativo uma proposta de de- Valdir Ganzer foi convidado? Des-
senvolvimento econômico, porque de a primeira fase deste seminário,
acho que ele, por si só, não leva ao o critério tem sido mesclar visões
socialismo, porque não existe capi- diferentes no debate, com pessoas
talismo democrático. E acho tam- de regiões diferentes e com posi-
bém que o orçamento participativo ções diferentes. E a regra geral no
não é uma alternativa dentro do ca- seminário é dinamizar o debate, fa-
pitalismo, mas um processo que zer uma discussão quente no PT.
leva à construção do socialismo. Quando convidamos o Valdir, ele
Gostaria de saber qual a posição do disse, tudo bem, mas nós temos aqui
partido sobre essa questão. em Belém hoje uma divisão, no PT,
a respeito do orçamento partici-
Paulo Vannuchi pativo. E nós dissemos, ótimo, tra-
Gostaria de apresentar duas ga isso para o debate. Então, gos-
questões. A primeira é pedir um taria que os companheiros refletis-
relato aos companheiros da mesa, sem um pouco sobre isso.
e também uma avaliação, um ba- Como segunda questão, eu pedi-
lanço da questão levantada por ria que os dois debatedores reto-
Anísio Homem sobre o possível massem o tema da relação do or-
conflito entre setores da população, çamento participativo com o socia-
que ele vê como algo prejudicial. lismo. O orçamento participativo já
1. O debate deveria ter Eu gostaria de ver isso refletido na começou a nos permitir algumas
contado com a presença de discussão do PT. suposições, algumas hipóteses de
Valdir Ganzer, vice-prefeito de É uma pena a ausência de Valdir um socialismo que não é mais visto
Belém, e de Guilherme Ganzer, vice-prefeito de Belém, como algo que nasce da noite para
Menezes de Andrade, prefeito de
Vitória da Conquista (BA), como
que iria participar deste debate mas o dia, um Armagedon que separa a
comentadores, mas ambos não na última hora não pôde compare- história em antes e em depois. O
puderam comparecer. cer, pois ele traria para a discussão orçamento participativo traz algu-
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 47
que os gastos na convocação para vez mais. Tanto que os adversários
as assembléias não tinham sido pre- do projeto começam a vir para den-
vistos e que não era de competên- tro dele disputar suas propostas.
cia do Executivo fazer essa discus- Quero sublinhar novamente que
são, pois a Assembléia Legislativa o orçamento participativo é um
já discutia o orçamento. Era, por- processo e não apenas a discus-
tanto, um gasto desnecessário. são da receita e da despesa. É cla-
O poder Judiciário concedeu ro que ele engloba também a pres-
liminar, o que simplesmente impe- tação de contas do orçamento do
diu o Executivo de fazer qualquer ano anterior e, mais do que isso, a
referência às assembléias do orça- previsão do que é o gasto funda-
mento participativo, informando o mental, estratégico. Portanto, no
local e a hora das reuniões, convo- orçamento participativo disputa-
cando a população. Fomos proibi- mos uma visão de desenvolvimen-
dos de fazer isso, seis meses após to para o Estado. Fomos eleitos
a deflagração do processo. Essa com um projeto de desenvolvimen-
liminar demorou mais de um ano to desconcentrado, descentraliza-
para ser derrubada. do, reforçador dos sistemas locais
O que aconteceu? O movimento de produção. Isso envolve ques-
social assumiu essa tarefa como sua tões de conteúdo, de como orien-
e fez a convocação, organizou as tar nossa ação, nossos recursos e
reuniões e convidou o governo para investimentos nessa direção. Nos-
participar. E tivemos 190 mil pesso- so governo disputa esse projeto por
as participando no primeiro ano. No dentro do orçamento participativo.
segundo ano foram 280 mil pesso- Essa disputa inclui setores da nos-
as. Então, esse é um processo que sa própria base social, que têm uma
vem sendo apropriado pelos sujei- visão particularista da luta, local,
tos sociais, individuais e coletivos e, econômica, regional. O governo não
por isso, tem se consolidado cada pode ir para as assembléias e dizer:
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 49
Eu digo que essa é uma boa e ne- E é por dentro do orçamento
cessária peleia. participativo, por exemplo, que dis-
Sendo governo, temos responsa- cutimos qual é a estrutura tributá-
bilidade de executar obras, qualifi- ria justa para o país e o Rio Grande
car serviços, atender bem a popu- do Sul. Quem paga imposto, quem
lação, além do compromisso não paga, quem ganha, quem per-
programático. E como é que se faz de com isso? E qual é o papel dos
isso? “Ah, mas o orçamento her- entes federados municipal, estadu-
dado foi ditado pelo FMI, no gover- al e federal? Temos de nos sujeitar
no anterior...” Isso pode ser uma a uma matriz tributária imposta ver-
explicação no início, mas não uma ticalmente? Não, é preciso pressio-
solução depois. Claro que se deve nar para mudá-la. Há medidas que
denunciar esta ingerência para se podem ser tomadas no estado, sem
desvencilhar dela. Conscientizar! O esperarmos reforma tributária
povo tem noção desses problemas. federal. Levamos essa discussão
Quando discute o orçamento do para a Assembléia Legislativa,
estado, ele se pergunta: “E o orça- onde, de 55 cadeiras, temos 12. A
mento aqui do município?” Já é uma discussão foi grande e é claro que
boa inquietação, ele já está se aper- não passou. Já no segundo ano, se-
cebendo de mais coisas. A vida do tores empresariais se mostraram
cidadão, da pessoa, na verdade, é favoráveis a mudanças importan-
tratada por três orçamentos públi- tes na estrutura, mas ainda não ti-
cos: o da União, o do estado e o do vemos maioria para aprová-las na
município. Por que orçamento Assembléia Legislativa. No espa-
participativo só no estado? Ele se ço do orçamento participativo elas,
pergunta. E a partir daí passa a no entanto, foram apreciadas, aper-
querer orçamento participativo tam- feiçoadas e recomendadas.
bém na sua prefeitura. Penso que Portanto, o orçamento participa-
isso é positivo. tivo não é um espaço de subordi-
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 51
humanidade de felicidade e de de- devem ser também estimuladores
mocracia não se realiza nos mar- dessa consciência republicana do
cos do capitalismo. respeito à coisa pública e do con-
O orçamento participativo, por- trole público sobre o Estado, o go-
tanto, é um instrumento poderoso, verno e os governantes.
que, quanto mais for apropriado por Temos um ditado popular, acho
milhares de pessoas, mais potente que não só no Rio Grande do Sul,
será como ferramenta de constru- mas no Brasil inteiro, que diz: “O
ção de uma participação que a olho do dono é que engorda o boi”.
radicalidade democrática vai fazen- E o povo é o dono da coisa pública.
do mais transformadora. O povo tem de ter instrumentos
Tudo isso liga-se à questão do para cuidar bem do que é seu e
Estado de direito democrático, que fazê-lo produzir qualidade de vida
está no discurso dos liberais mas em todos os sentidos.
não está na sua prática. Não resta O companheiro Braga, de Cam-
dúvida de que a democracia repre- pinas, pergunta qual tem sido o pa-
sentativa é uma conquista da hu- pel do PT ou do movimento social,
manidade, mas ela precisa ser re- dos sindicatos, no processo do or-
vigorada, e a forma de fazer isso çamento participativo.
é estimular a participação, apos- Na exposição inicial, fiz questão
tar na intervenção direta das pes- de sublinhar que o espaço do or-
soas na construção da política, no çamento participativo não pode ser
controle do Estado, do governo, um espaço sob controle nem do
dos governantes. Entre nós não governo e nem dos partidos. Mas
está sequer alastrada – e muito é um espaço em que todos devem
menos sedimentada – a idéia de atuar com intensidade, franqueza,
república. As elites tradicionais disposição, solidariedade e políti-
têm feito do Estado uma proprie- cas. O PT tem de ser um grande
dade particular. Nossos partidos estimulador da participação popu-
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 53
quadro de acirrada e permanente rejeita o individualismo e tem no res-
disputa com o projeto adversário peito à individualidade do ser hu-
neoliberal, é coesão da base social mano um dos valores fundamentais
do governo. Isso significa construir da vida comunitária e da solidarie-
a política e a ação do governo com dade entre as pessoas. Esse sonho
a participação de todos os partidos nos embala para a construção do
e movimentos sociais da sua base. socialismo democrático e libertário.
Esse fazer político permanente exi-
ge bons debates e não é uma coisa Maria Victoria Benevides
fácil nem idílica. Requer descon- Como da outra vez, acho que
centração do poder, descentraliza- Olívio Dutra respondeu de forma
ção da ação, provocação permanen- bastante completa às perguntas,
te à participação direta, qualificação que, aliás, tinham muito mais a ver
da informação etc. etc. O compro- com sua experiência.
misso é executar o Plano de Inves- Eu teria duas considerações ape-
timentos, resultado da discussão nas. A primeira, em relação à ques-
realizada no orçamento participativo, tão de que só as pessoas que já são
nas suas assembléias, consolidado na participativas vão às plenárias do
Lei de Meios aprovada na Assem- orçamento participativo. Como en-
bléia Legislativa. É uma responsa- frentar essa questão, que ocorre
bilidade séria e importante. Se não em muitos outros momentos da vida
houver essa relação de responsa- partidária, quando falamos somen-
bilidade no seu cumprimento esta- te para os convertidos?
remos despotencializando um pro- Acho que isso ocorre em relação
cesso que tem uma enorme rique- a todo tipo de envolvimento políti-
za, e que tem muito a ver com nos- co de indivíduos e de grupos. É evi-
so sonho de transformação da so- dente que os mais politizados, que
ciedade que se realiza a partir do já estão de alguma maneira inseri-
protagonismo político. Nosso sonho dos numa organização pela base,
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 55
Paulo Vannuchi nos lembra do tórica da experiência dos sovietes,
objetivo desse seminário, que é jus- mas afirmar que ela não é suficiente
tamente associar o tema em ques- nem é o modelo para nós hoje. O
tão com uma proposta socialista, modelo do duplo poder não é mais
uma reflexão sobre o socialismo. o modelo, na minha opinião, para
Eu gostaria de insistir nisso, pois um socialismo contemporâneo, de-
vejo as formas de democracia di- mocrático e libertário, mas é uma
reta não apenas como uma radica- experiência que tem de ser levada
lização da democracia mas real- em conta.
mente como um caminho para esse Eu faria uma analogia, seguindo
socialismo a construir, esse socia- Cornelius Castoriadis, em relação
lismo que é processo. à democracia direta grega, que ele
Conhecemos a tradição históri- considera o embrião de nossa de-
ca, revolucionária, de democracia mocracia, apesar de ter sido alta-
direta, os sovietes, a Comuna de mente excludente, porque excluía
Paris e outras formas, e Paulo Van- as mulheres, os não-proprietários,
nuchi lembrou os entraves para que os estrangeiros. Era uma democra-
essa participação fosse efetiva- cia que convivia com os escravos,
mente democrática. assim como muitos séculos depois
Aqui, devemos voltar aos militan- os liberais jeffersonianos, os pais
tes pensadores, como Rosa Luxem- fundadores da democracia ameri-
burgo, que já questionavam, nos cana e que defendiam a República,
embates de doutrinas e estratégias conviviam, apesar de seu liberalis-
que marcaram seu tempo, os des- mo, com a escravidão. São experi-
vios antidemocráticos do socia- ências históricas que têm de ser
lismo. Por isso, digo que não deve- analisadas em seu contexto históri-
mos ter medo de falar em demo- co. Mas é preciso contextualizar: a
cracia direta. Não podemos. Temos democracia ateniense se deu no sé-
que reconhecer a contribuição his- culo IV a.C. No meu livro sobre a
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 57
botam de ponta-cabeça uma idéia de mocracia representativa brasileira
poder, uma idéia de governo, uma que se torna necessário voltar a ou-
idéia de processo decisório, e elas tra experiência do socialismo his-
são tão revolucionárias que causam tórico, que é o mandato imperati-
não apenas perplexidade, mas o ódio vo. Defendo o mandato imperativo
das elites, que não querem abrir mão não no sentido absoluto de uma pri-
de uma fatia mínima do seu poder. são do eleito por seu eleitorado, mas
Quando discuti essas questões defendo um mandato imperativo
numa Comissão Mista, do Senado e partidário, ou seja, um compromis-
da Câmara, na época da Constituin- so inamovível com o núcleo doutri-
te, defendendo essas idéias de de- nário e inegociável do programa
mocracia direta, lembro-me de um partidário, que tem de ser contro-
deputado, bem tradicional, de Minas lado não necessariamente pelo elei-
Gerais, que dizia: “Professora, tudo torado – que não sabemos quem é,
isso que a senhora fala é muito boni- no sistema eleitoral que temos –,
to. Mas, na realidade, não é isso. Eu, mas controlado e discutido pelo pró-
por exemplo, sou votado por quê? Sou prio partido. Ou seja, ninguém no
votado porque todo mundo sabe quem PT pode ser contra certos princípi-
é o meu pai, quem foi o meu avô, os e certas propostas que compõem
quem foi o meu bisavô. Não tem sen- o programa essencial do partido. E
tido que toda essa dinastia de poder aí é que vamos discutir se realmente
seja atacada, contaminada e prejudi- o orçamento participativo e formas
cada por um povo que não sabe de de democracia direta compõem
nada, que não tem condição nenhu- esse núcleo central do compromis-
ma de participar. Eu recebi um man- so partidário.
dato, eu tenho de ter carta branca Não tenho medo de enfrentar a
para o exercício desse mandato”. questão histórica do que foi a de-
Essa idéia de que o mandato é mocracia direta, desde a democra-
uma carta branca é tão forte na de- cia direta ateniense, excludente,
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 59
Abramo, duas pesquisas de opinião de maneira bastante acentuada
de âmbito nacional, uma em 1997, nesses dois levantamentos, não
com a população em geral, e outra aparecesse em amplas camadas
em 1999, com jovens de todas as da população.
regiões metropolitanas. Incluímos Isso nos coloca uma questão, que
nelas algumas perguntas para ten- seria: cabe ou não aos governos fo-
tar captar a consciência de direitos mentar a consciência desses direi-
no país. E tanto em uma como na tos políticos de participação? O que
outra o que se observou foi que pode ser uma questão banal, por-
cerca de dois terços da população que provavelmente o que une a
ou dos jovens das regiões metro- maioria das pessoas que estão aqui,
politanas expressaram espontanea- atraídas por este tema, é uma res-
mente ter noções sobre direitos que posta positiva a essa questão. Mas,
podem ser classificados na catego- como já foi dito, nem mesmo todos
ria de direitos sociais ou econômi- os governos petistas dão a mesma
cos: direito à educação, à saúde, ao importância e essa quetão. O or-
trabalho, à renda etc. Pouco mais çamento participativo é uma mar-
de 20%, somente, em ambas as ca forte do PT, mas não é desen-
pesquisas, mencionaram os chama- volvido em todas as administrações
dos direitos individuais ou civis: li- petistas. Acredito que aparece nes-
berdade de ir e vir, liberdade de ex- sa questão, talvez, um problema na
pressão. E os direitos propriamen- percepção do caráter pedagógico
te políticos foram mencionados por que não só o orçamento participa-
cerca de 10%, apenas. tivo, mas também outras formas de
Então, uma leitura otimista des- participação popular têm em rela-
ses dados nos levaria ao seguin- ção a transformar as pessoas que
te: é bem provável que poucas participam desse processo, seja os
décadas atrás essa consciência de indivíduos, seja os agentes coleti-
direitos sociais, que apareceu vos. Para fazer governos com in-
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 61
ências ou práticas capitalísticas, çamento participativo não acabou
um modo de ser capitalístico. com a teoria inventada por Maquiavel
A segunda questão é a tensão de marketing político. Nosso maior
entre as formas de participação e êxito são as várias gestões que se
as formas de protagonismo. sucedem no Rio Grande do Sul.
Em terceiro lugar, uma pergunta Por último, gostaria de saber se,
que suponho ser uma crítica frater- baseado nessa idéia de Guattari das
nal: o orçamento participativo não formas ou práticas capitalísticas,
é também, às vezes, uma maneira poderíamos nos aventurar a cha-
de postergar a ação do poder lo- mar a experiência do orçamento
cal? Não é uma maneira de não participativo de forma socialística.
fazer, de adiar um serviço ou de não
fazer transformações que impli- Sebastião Marcelo Sobrinho
quem rupturas muito grandes para Gostaria de fazer aqui alguns co-
o imaginário coletivo? mentários e, ao mesmo tempo,
Quarta questão: a professora apresentar algumas questões. Eu
Maria Victoria Benevides citou diria que a primeira coisa que leva-
Castoriadis, que afirmava que po- mos satisfeitos daqui é essa noção
demos lutar contra o mercado ca- de processo. Acho que é importan-
pitalista, mas o mercado é como a te fixar essa noção. Por quê? Pa-
linguagem, não se pode viver em rece-me que é um processo de edu-
sociedade sem ele. Assim, o orça- cação política – e para nós o orça-
mento participativo não seria uma mento participativo na cidade de
maneira, como outras experiênci- Mauá (SP), do qual sou coordena-
as que Porto Alegre tem, de dor, tem sido isso, é coisa de gente
reinvenção do mercado como ta- teimosa. E ser teimoso tem um
refa histórica da esquerda? grande valor na política. Por que
E, penúltimo, como funciona a digo isso? Temos, em Mauá, uma
questão do imaginário, porque o or- das maiores dívidas públicas deste
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 63
da por todos de avaliação séria da bléia Legislativa, pois no Estado
experiência desafiadora que democrático de direito as leis são
estamos vivendo. Doze anos é pou- feitas pelas casas legislativas: as
co, ela não está ainda suficiente- câmaras municipais, as assembléi-
mente espraiada e enraizada no as legislativas e o Congresso Na-
nosso próprio estado. Mas não po- cional. Se existe uma participação
demos jogar fora a criança com a crescente no processo de discus-
água do banho. Devemos cuidar são e feitura do orçamento mas,
bem dela para que cresça viçosa e quando votado na casa legislativa
cheia de esperança. É evidente que todo aquele processo é descarac-
ela se relaciona a experiências ri- terizado, desrespeitado, surge uma
cas, vividas em situações históricas tensão entre o representado e o seu
e geográficas diferenciadas. Rela- representante, que vai desembocar
ciona-se ao protagonismo dos mo- em uma nova postura do eleitor
vimentos sociais e a uma proposta quando da renovação dos manda-
de nova sociedade que pensa glo- tos legislativos. Mas isso em um pro-
balmente mas trata de forma cesso com ritmos diferentes.
entrelaçada os desenvolvimentos Mas é importante que aqueles que
local, regional e nacional. participaram da construção coleti-
A questão da democracia direta, va da proposta na fase inicial parti-
participativa, e sua correta combi- cipem também do seu debate na
nação com a democracia represen- fase seguinte, nos legislativos. Isso
tativa há de ser sempre atual nes- implica construir uma permanente
se processo. As pessoas têm que interação do governo com seus par-
saber clara e objetivamente que es- lamentares, inclusive para que parti-
tão construindo uma proposta, mas cipem, desde o início do processo, dos
não estão finalizando ali o orçamen- debates da proposta nas suas bases
to, porque o orçamento só se torna e regiões. Isso certamente qualifica
lei depois de aprovado pela Assem- o debate no Legislativo, possibilitan-
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 65
ência do orçamento participativo, sição, de acompanhamento que tem
ninguém mais quer saber daquele de ser respeitada. Aliás, não é de-
tipo de consulta. mais sublinhar que o orçamento
Também a Assembléia Legis- participativo é o processo e não a
lativa, à medida que o orçamento peça orçamentária, a lei.
participativo foi sendo apropriado O orçamento participativo não
pela cidadania e se consolidou, ten- pode servir de escapatória para se
tou a ele se contrapor criando o justificar que tal obra não saiu por
Foro Democrático. No fundo, é o conta disso ou daquilo. É evidente
reconhecimento de que o debate do que, participando da construção da
orçamento não poderia ficar ilhado proposta, o povo passa a conhecer
na casa legislativa. Os próprios o grau de endividamento, os recur-
parlamentares querem agora ir às sos para investimentos e os custos
regiões, às comunidades, fazer reu- para a manutenção e conservação
niões abertas sobre a proposta or- da máquina pública. Estamos ago-
çamentária que o governo entrega ra na terceira edição do orçamen-
ao Legislativo a cada mês de se- to participativo no âmbito estadual.
tembro. Estimulamos o povo a par- Começamos o ano com uma pres-
ticipar também das reuniões do tação de contas sobre a execução
Foro Democrático como momento do orçamento anterior, para nela
importante no processo do orça- engatar a construção das priorida-
mento participativo. des do novo orçamento. Nosso go-
O orçamento participativo não verno tem conseguido que a defini-
pode ser uma protelação, servir de ção das prioridades tenha conso-
justificativa para se dizer “não fiz nância com a execução de políti-
porque o povo não decidiu ainda na cas constantes do nosso programa.
assembléia do orçamento”. Eviden- É claro que a estrutura administra-
te que não, mas é uma instância de tiva, burocrática, às vezes não res-
formulação, de decisão, de propo- ponde com a agilidade e a qualida-
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 67
68 ORÇAMENTO PARTICIPATIVO E SOCIALISMO
Sobre os autores
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 69
MARIA VICTORIA BENEVIDES nasceu em 1942, na cidade de
Niterói, Rio de Janeiro. Socióloga, com trabalho nas áreas de ciência
política, história política do Brasil e sociologia da educação, é professora
titular da Faculdade de Educação (Departamento de Filosofia da Educa-
ção e Ciências da Educação) da Universidade de São Paulo (USP).
É também membro titular do Conselho da Cátedra Unesco/USP de Edu-
cação para a Paz, os Direitos Humanos, a Democracia e a Tolerância,
sediada no Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP; diretora e pro-
fessora da Escola de Governo; membro do Centro de Estudos de Cultu-
ra Contemporânea (Cedec); membro da Comissão Justiça e Paz, de São
Paulo; membro da Diretoria da Rede Brasileira de Educação em Direi-
tos Humanos.
É autora dos seguintes livros: A cidadania ativa (Ática, 1992); O PTB
e o trabalhismo (Brasiliense, 1987); Violência, povo e política
(Brasiliense, 1984); O governo Jânio Quadros (Brasiliense, 1981); A
UDN e o udenismo (Paz e Terra, 1981) e O governo Kubitschek (Paz
e Terra, 1976).
26 de março – Perspectivas que a vitória das es- Expositor: Fernando Haddad – professor da USP
querdas nas eleições municipais de 2000 abre à cons- Comentadores: Gilmar Mauro (dirigente nacional do
trução do socialismo MST ), João Felício (presidente nacional da CUT ) e
Expositor: Luiz Inácio Lula da Silva (Presidente de Ricardo Antunes (professor da Unicamp)
Honrra do PT)
Comentadores: Marta Suplicy (prefeita de São Pau- 21 de maio – A luta pela terra e a organização dos
lo), Raul Pont (ex-prefeito de Porto Alegre) e Luiz assentamentos como contribuição para a construção
Dulci (presidente da Fundação Perseu Abramo) do socialismo.
Expositor: Plínio de Arruda Sampaio – ex-deputado
9 de abril – Perspectivas que o desenvolvimento federal e consultor da ONU.
local e a distribuição de renda abrem à construção do Comentadores: José Graziano da Silva (professor
socialismo. da Unicamp)
Expositor: Celso Daniel – prefeito de Santo André
Comentadores: Ladislas Dowbor (professor da PUC- 4 de junho – Perspectivas que a revolução
SP ), Marina da Silva (senadora pelo Acre) e Miguel microeletrônica e a internet abrem à luta pelo socialismo.
Rossetto (vice-governador do Rio Grande do Sul) Expositor: Laymert Garcia – professor da Unicamp
Comentadores: Bernardo Kucinski (professor da
23 de abril – O orçamento participativo como um dos USP), Maria Rita Kehl (psicanalista) e Walter Pinheiro
pressupostos políticos da construção do socialismo. (líder do PT na Câmara dos Deputados)
Expositor: Olívio Dutra – governador do Rio Gran-
de do Sul 18 de junho – Alternativa socialista ante a
Comentadora: Maria Victoria Benevides (profa. da globalização financeira
USP e da Escola de Governo) Expositor: Reinaldo Gonçalves – professor da UFRJ
Comentadores: João Sayad (secretário de Finan-
7 de maio – Papel dos sindicatos e cooperativas ças de São Paulo), Ronald Rocha (dirigente nacional
ante as mudanças nas classes sociais e suas lutas, na do PT) e Tânia Bacelar (secretária de Planejamento
perspectiva do socialismo. de Recife)
SOCIALISMO EM DISCUSSÃO 71
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