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- Engels ainda estava vivo e já advertia inutilmente para que a herança dialética de Hegel
não fosse esquecida; não obstante, o kantismo e o positivismo acabaram reprimindo a
dialética da consciência dos socialistas da época. E foi inútil, de imediato, também a
segunda tentativa de restauração empreendida por Lenin, já que a petrificação e a
deformação do marxismo no período stalinista necessariamente transformou a imagem
de Hegel numa caricatura. 163
- Hegel é, depois de Heráclito, o primeiro grande pensador no qual o devir ganha uma
preponderância ontológica objetiva sobre o ser; sua grandeza filosófica reside, não menos
importante, no fato de que nele esse abandono da prioridade do ser em face do devir não
se limita ao caráter simples e direto, mas dá origem a um método global-universal. 164
- ele concebe a realidade como uma totalidade de complexos que são em si mesmos,
relativamente, também totalidades; a dialética objetiva consiste na gênese real e na
autoexplicitação, interação e síntese reais desses complexos; por isso, também o absoluto,
enquanto quintessência [Inbegriff] desses movimentos totais, não poderá jamais
converter-se na imobilidade de uma indiferença transcendente com relação aos
movimentos concretos; ao contrário, enquanto síntese concreta de movimentos reais, ele
também é – sem prejuízo de seu caráter absoluto – movimento, processo; a forma
originária da contradição hegeliana, a identidade da identidade e da não identidade,
mantém-se ineliminavelmente ativa também no absoluto. Esse núcleo dialético-
ontológico da filosofia de Hegel está em evidente contradição com a construção lógico-
hierárquica do seu sistema. 169
- O próprio Hegel, em alguns momentos, percebeu essa contradição, mas optou sempre
por afastá-la, atendo-se à unicidade lógica da estruturação sistemática. Assim, no início
da lógica do conceito, ele repete que a essência surgiu do ser, o conceito surgiu da essência
e, portanto, em última instância, também do ser. (...). Nessa admissão – que, se pensada
até o fim, deveria pôr abaixo, ou pelo menos transformar radicalmente, todo o sistema
lógico – triunfa a realidade última da concepção ontológica hegeliana, ou seja, que a
realidade (o mundo do conceito) é ontologicamente o fato primário, que ontologicamente
se obtém da realidade, mediante abstração, a essência, e desta, o ser; que, portanto, a
lógica reproduz as verdadeiras relações ontológicas em sequência inversa, que, contudo,
é necessária do ponto de vista lógico-metodológico. (...). Para ele é óbvio que de facto
(ontologicamente) o conceito constitui o verdadeiro começo, que o ser e a essência são
de facto (ontologicamente) derivados do conceito. 169.
- O momento de maior evidência desse estado de coisas será quando tratarmos da mais
importante descoberta metodológica de Hegel, isto é, das determinações de reflexão
[Reflexionsbestimmungen]. Acreditamos – e temos a esperança de conseguir demonstrálo
nas páginas seguintes – que reside aqui o centro da sua dialética, tanto da dialética da
dinâmica e da estrutura da própria realidade independente da consciência quanto da
dialética de seus diversos espelhamentos na consciência subjetiva. 172