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Gabriel Medina e Cláudio Wilson Soares Barbosa (Orgs.

Experiências produtivas
de agricultores familiares
da Amazônia
Experiências produtivas
de agricultores familiares
da Amazônia
Copyright © 2015 by Gabriel Medina and Cláudio Wilson Soares Barbosa Autores e suas filiações institucionais

Editora Kelps Alfredo Kingo Oyama Homma Idelbergue Ferreira Araújo


Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e
Rua 19, nº 100 — St. Marechal Rondon - CEP 74.560-460 — Goiânia — GO
(Embrapa Amazônia Oriental) Pequenas Empresas (Sebrae)
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Ana Paula Souza Jair Carvalho dos Santos
Fundação Viver, Produzir e Preservar (FVPP) Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
Diagramação: Horst Thomas, thomaachen@yahoo.de
(Embrapa Amazônia Oriental)

Anderson Serra
Universidade Federal do Pará (UFPA)
CIP - Brasil - Catalogação na Fonte José Ferreira de Sousa Filho
Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Biblioteca Pública Estadual Pio Vargas
Rurais de Medicilândia (STTR)
Experiências produtivas de agricultores familiares da Amazônia. Antônio Reis do Nascimento Filho
Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Gabriel Medina e Cláudio Wilson Soares Barbosa (Editores). – Goiânia: Kelps, 2015.
Rurais de Medicilândia (STTR)
198 p. il. Segunda edição Juraci Dias
Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
ISBN: 978-85-400-1211-0
Rurais de Medicilândia (STTR)
Benno Pokorny
Universidade de Freiburg, Alemanha (Uni Freiburg)
1. Desenvolvimento Rural. 2. Agricultura Familiar. I Título
 CDU: 631.1 Katiele Amorim
Universidade Federal de Goiás (UFG)
Carlos Harold
Universidade Federal de Goiás (UFG)
Índice para catálogo sistemático:
CDU: 631.1 Marlon Costa de Menezes
Universidade Federal do Pará (UFPA)
César Augusto Tenório de Lima
Autores das figuras em cada página do livro: Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA)

Gabriel Medina: 8, 10, 11, 12, 13, 16, 20, 22, 25, 26, 27, 28, 29, 31, 35, 36, 37, 38, 40, 42, 45, 47, 50, 54, Nayra Glaís Pereira Trindade
57, 63, 64, 73, 75, 77, 79, 81, 92, 112, 130, 131, 132, 133, 158, 176, 179, 190, 192, 195; Cláudio Wilson Cláudio Wilson Soares Barbosa Universidade Federal do Pará (UFPA)

Soares Barbosa: 21, 32, 61, 77, 82, 87, 91, 93, 126, 150,170; Arquivo do STTR de Medicilândia: 14, 94, Serviço Cerne de Apoio à Produção
Familiar na Amazônia (Cerne)
97, 99, 101, 102, 105, 107, 108, 110, 113, 114, 115, 116, 117, 119, 120, 124, 136, 138, 141, 197; Arquivo Thaynara Viana Cavalcante
do CDS: 193, 194; Jair Carvalho dos Santos: 181, 183, 184, 178, 188; Marlon Costa de Menezes: 49; Universidade Federal do Pará (UFPA)

Nayra Glaís Pereira Trindade: 18, 43, 72; Idelbergue Ferreira Araújo: 145, 146, 147, 148; Benno Pokorny: Gabriel Medina
153; Anderson Serra: 150, 158, 163, 164, 165, 168, 169, 170, 175; Benno Pokorny e Anderson Serra: 164 Universidade Federal de Goiás (UFG) Thomaz Monteiro
(Diagrama). Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Medicilândia (STTR)
Guilherme Brito
Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
Direitos Reservados
(Embrapa Amazônia Oriental)
É proibida a reprodução total ou parcial da obra para fins comerciais, de qualquer forma ou por
qualquer meio, sem a autorização prévia e por escrito dos autores. A reprodução parcial para fins não
comerciais está autorizada pelos autores. A violação dos Direitos Autorais (Lei nº 9.610/98) é crime
estabelecido pelo artigo 184 do Código Penal.

Impresso no Brasil, Printed in Brazil


Sumário

Resumo executivo 9 Criação de Galinha Caipira e Caipirão 113


Gabriel Medina Antônio Reis do Nascimento Filho, Thomas Monteiro e Cláudio Wilson Soares Barbosa

Apresentação  10 Criação de Gado de Leite 125


Ana Paula Souza Juraci Dias, Antônio Reis do Nascimento Filho, Guilherme Brito, Cláudio
Wilson Soares Barbosa, Katiele Amorim, Carlos Harold e Gabriel Medina
Introdução 13
Gabriel Medina e Cláudio Wilson Soares Barbosa Manejo de Açaizal Nativo e Cultivado 141
Idelbergue Ferreira Araújo
Manejo de Búfalos na Váreza  15
Cláudio Wilson Soares Barbosa, Katiele Amorim e Gabriel Medina Melhorias nas Experiências
Produtivas: Lições Aprendidas 153
Extração Tradicional de Madeira 43 Benno Pokorny e Anderson Serra, com apoio de
Marlon Costa de Menezes, Cláudio Wilson Soares Barbosa, Gabriel Medina, César Antônio Reis do Nascimento Filho e Luiz Carlos Piacentini
Augusto Tenório de Lima, Nayra Glaís Pereira Trindade e Thaynara Viana Cavalcante
O Desafio Atual das Reservas Extrativistas:
Acordos de Pesca 73 Agricultura ou Extrativismo?  179
Cláudio Wilson Soares Barbosa e Gabriel Medina
Alfredo Kingo Oyama Homma e Jair Carvalho dos Santos

Cultivo de Cacau em Terra Mista  97 Conclusão 192


Juraci Dias, Antônio Reis do Nascimento Filho,
Gabriel Medina e Cláudio Wilson Soares Barbosa
José Ferreira de Sousa Filho e Carlos Harold

6  Apresentação Apresentação  7
Lista de siglas
ADEPARÁ – Agência de Defesa Agropecuária do Estado do Pará
APAT – Autorização Prévia à Análise Técnica de Plano de Manejo Florestal Sustentável
Resumo executivo
AUTEX – Autorização de Exploração Florestal Gabriel Medina
CDS - Comitê de Desenvolvimento Sustentável de Porto de Moz
CEBRAN – Central de Biotecnologia em Reprodução Animal A partir de experiências produtivas de
CEPLAC – Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira
CERNE – Serviço Apoio à Produção Familiar na Amazônia
agricultores familiares e comunidades tradicionais,
Colônia Z64 – Colônia de Pescadores Z64 argumenta-se que o desenvolvimento da
CPF – Cadastro de Pessoa Física
EMBRAPA – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
Amazônia passa necessariamente pelo(a):
FLONA – Floresta Nacional
FNO – Fundo Constitucional do Norte (Crédito)
 Reconhecimento de que em muitos podem contribuir para aumentar sua re-
FVPP – Fundação Viver, Produzir e Preservar
GAR – Grupo de Ação e Reflexão
municípios os produtores familiares são siliência diante de pressões externas que
GTPF – Guia de Transporte de Produto Florestal
parte da vocação produtiva regional e seu provêm de diversos atores, de madeireiros
IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis desenvolvimento deve ser priorizado; a ONGs ambientalistas;
ICMBio – Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade
IE – Inscrição Estadual  Inclusão produtiva dos produtores fa-  Tratamento da questão produtiva nas
IN – Instrução Normativa miliares como condição fundamental para unidades de conservação (com destaque
INCRA – Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária a superação da pobreza e da degradação para as reservas extrativistas) como alter-
MDA – Ministério do Desenvolvimento Agrário ambiental na Amazônia rural; nativa concreta de desenvolvimento rural
MMA – Ministério do Meio Ambiente sustentável, em contraposição à ideia de
MS – Matéria seca  Apoio a experiências locais de produ- subdesenvolvimento sustentado;
MSTTR – Movimento Sindical dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais ção agrícola, pecuária e extrativista, que
ONG – Organização não Governamental têm maior potencial de sucesso do que  Reconhecimento de que o Estado tem
PAEX - Projeto Estadual de Assentamento Agro-extrativista modelos produtivos externos; papel fundamental de reconhecimento e
pH – potencial Hidrogeniônico, indicador de acidez apoio às iniciativas produtivas existentes
PMFS – Plano de Manejo Florestal Sustentável  Superação da abordagem tradicional e precisa estar mais receptivo a parcerias
PRONAF – Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar
de “proteção” das populações locais em com as populações locais, superando a
RDS – Reserva de Desenvolvimento Sustentável
favor de sua inclusão social e de seu forta- abordagem atual concentrada no coman-
RESEX – Reserva Extrativista
lecimento político e econômico, reconhe- do e controle.
RG – Registro Geral ou Carteira de Identidade
cendo que mudanças culturais também
SEMA – Secretaria de Estado de Meio Ambiente
SEMMPA – Secretaria Municipal de Meio Ambiente
SEPAQ – Secretaria de Estado de Pesca e Aquicultura do Pará
SNUC – Sistema Nacional de Unidades de Conservação
STTR – Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais
O conjunto de capítulos deste livro, contendo experiências produtivas
SUDAM – Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia
conduzidas pelos produtores familiares na Amazônia, revela um gran-
UC – Unidade de Conservação de potencial de desenvolvimento regional que precisa ser reconhecido e
UCs de Uso Sustentável – Unidades de conservação voltadas para compatibilizar o uso sustentável dos recursos naturais apoiado. O futuro da Amazônia depende de um projeto estratégico para
com a conservação da natureza, por isso admitem a presença de moradores conforme definido no SNUC. a produção e geração de renda no campo hoje.

9
Apresentação E ste livro resgata a valorização dessa participação ao apresen-
tar os desafios e potencialidades das estratégias produtivas
implementadas por famílias agricultoras da colonização, mo-
radores da várzea e da terra firme na floresta amazônica (Figura 1).

O Projeto Governança de Recursos Naturais por Pequenos Pro-


dutores da Amazônia é uma parceria entre o Comitê de
Desenvolvimento Sustentável de Porto de Moz (CDS), o Sin-
dicato de Trabalhadores Rurais de Medicilândia, a Fundação Viver,
Produzir e Preservar (FVPP), o Serviço Cerne de Apoio à Produção
As propostas técnicas apresentadas ao longo do livro tratam de ma-
nejo de búfalo na várzea, do uso de florestas, de acordos de pesca,
do cultivo de cacau em terra mista, da criação de gado de leite, da
criação de galinha caipira e do manejo de açaizais. Além da constru-
ção coletiva com apoio técnico e acompanhamento sistemático das
Familiar na Amazônia (Cerne), a Universidade de Freiburg e deze- famílias participantes, traz outros elementos imprescindíveis para o
nas de produtores familiares oriundos das vicinais da Transamazô- sucesso da produção familiar, dentre eles a necessidade de uma con-
nica no município de Medicilândia e comunidades ribeirinhas da certação entre o que desejam, podem e querem fazer os agricultores
Reserva Extrativista Verde para Sempre, no município de Porto de familiares da Amazônia e o que a política pública oferece nesse sen-
Moz, com o apoio da União Européia. O projeto ultrapassou suas tido. No caminho desse ajuste, há que se considerar ainda o papel
metas e objetivos trazendo para o debate do desenvolvimento regio- da assistência técnica, do crédito e a participação das organizações
nal a voz dos agricultores familiares, pescadores, ribeirinhos, extra- sociais na gestão das iniciativas.
tivistas e outros tantos que, dada a ausência das políticas públicas
que melhorem de fato sua qualidade de vida, são frequentemente Enfrentar os desafios que essas iniciativas aparentemente sim-
esquecidos quando o assunto é a elaboração de estratégias e pro- ples apresentam é o primeiro passo para a garantia de resultados
postas adequadas à melhoria da agricultura familiar. positivos nessa empreitada. Criar galinhas, porcos, gado, cultivar
cacau, mandioca, fazer acordos de pesca e manejo florestal não
tem nenhum mistério nos inúmeros manuais técnicos existentes no
mercado e tampouco na prática cotidiana dos produtores. Por que,
então, ainda existem tantas queixas no campo? As propostas técni-
cas apresentadas neste livro cumprem a missão de ajudar na ela-
boração dessa resposta que pode incluir muitos outros elementos.
Nessa direção, por mais que os bancos digam que estão abarrotados
de recursos para a produção, que dezenas de técnicos sejam con-
tratados para prestar assistência técnica, os produtores familiares
continuam manifestando em seus inúmeros documentos de reivin-
dicação a necessidade de investimentos na produção.

Figura 1. É preciso Lançando-se um olhar mais aprofundado para as atividades


garantir voz aos agricul- aqui relatadas, percebemos que existem muitos vazios a serem pre-
tores familiares e comu- enchidos no caminho entre o que desejam os produtores e o que
nidades tradicionais da realmente está disponibilizado pelo governo: a criação de porcos,
Amazônia nos momen- galinhas, gado não necessita apenas de crédito, mas de informa-
tos de elaboração das ções técnicas adequadas à realidade amazônica, bem como ao in-
estratégias de desenvol- teresse, condições reais e desejo dos produtores. Assim, é preciso
vimento regional. começar a enfrentar os desafios partindo da base, dando voz à

10  Apresentação Apresentação  11
população do campo. Logo, buscar melhorias para a atividade de
criação de búfalos na várzea de Porto de Moz começando pelas
restrições ambientais da atividade, por exemplo, é o mesmo que
Introdução
colocar sobre os criadores, secularmente Gabriel Medina e Cláudio Wilson Soares Barbosa
abandonados pelo Estado, a responsabilida-
de de encontrar, sozinhos, a saída para um A inclusão produtiva dos agricultores familiares é
passivo ambiental cometido coletivamente fundamental para o desenvolvimento rural sustentável
por governo e sociedade. Exigir que agri-
cultores submetam-se aos rígidos padrões da Amazônia.
da “produção limpa” sem uso do fogo, des-
matamento ou agrotóxicos, e que tenham
ainda de dominar a linguagem dos juros
bancários, insumos e índices técnicos, im-
praticáveis em sua maioria, sem olhar o
perfil e o desejo dessas famílias, é represar
milhões de recursos dedicados à produção
familiar nos bancos e condenar os agricul-
tores à miséria cada vez mais crescente no
campo.

Figura 2. Acordos de De outro lado, os exemplos dos acordos de


pesca desenvolvidos pesca estabelecidos nas comunidades de Porto de Moz refletem a
pelas comunidades capacidade que as bases possuem de construir estratégias de for-
mostram o potencial das talecimento da produção que de fato funcionam mesmo quando o
iniciativas locais para a Estado é completamente ausente (Figura 2). Para garantir sua so-
boa gestão dos recursos, brevivência e das próximas gerações, os comunitários que têm na
mas precisam ser apoia- pesca uma importante fonte de renda costuram acordos e regras que
dos pelo Estado. garantem o peixe na mesa de suas famílias, no mercado e no rio,
que satisfazem a maioria e funcionam sem necessidade de recorrer
às bases legais. É como eles mesmos dizem: quem acorda, cumpre!

Nestas propostas técnicas, de maneira simplificada e resumida,


estão contidos os saberes, as ponderações e as recomendações dos Figura 1. A vocação de
produtores sobre um conjunto de atividades por eles desenvolvidas
e as contribuições técnicas dos profissionais convidados. Ousamos
apresentar um produto que traz um exemplo das complexidades e
da simplicidade da produção familiar na Amazônia.  
A vocação de muitos municípios da
Amazônia está na agricultura fa-
miliar. Apesar da disputa de inte-
resses, principalmente em áreas de fron-
teira, muitos municípios ainda mantêm a
pios pequenos, com tradição de produção
agrícola ou extrativista, os agricultores
familiares representam a essência da so-
ciedade local, abastecem o mercado e têm
influência na política local quando orga-
muitos municípios da
Amazônia está na agri-
cultura familiar e o seu
desenvolvimento passa
pela inclusão produtiva
Ana Paula Souza ocupação de seus espaços por produtores nizados em sindicatos, colônias de pesca- dos agricultores.
Fundação Viver, Produzir e Preservar (FVPP) familiares (Figura 1). Em muitos municí- dores, cooperativas ou associações. Esses

12  Apresentação Introdução  13
agricultores, por representarem a maior mílias. É necessário um projeto estratégi- concentração fundiária ainda está no co-
parte das propriedades rurais, dinamizam co de desenvolvimento, claro e de longo meço e os níveis de degradação ambiental
a economia local e geram grande diversi- prazo, construído a partir das cadeias são baixos. Esses fatores concorrem posi-
dade de produtos, mesmo que em peque- produtivas existentes. A inclusão produ- tivamente para o desenvolvimento da pe-
na escala e com processo tecnológico sim- tiva passa pela garantia das condições quena produção e para a redução dos efei-
ples. Particularmente quando a vocação para que os agricultores possam produzir, tos negativos das transformações sociais,
produtiva dos municípios está definida e beneficiar sua produção, comercializar o econômicas e ambientais. Se a inclusão
passa pela produção familiar, é possível produto de seu trabalho e gerar renda. Es- produtiva não é resolvida nessa geração,
planejar o desenvolvimento local a partir sencialmente precisa ser um projeto pen- há o risco claro de desestruturação das ati-
das atividades existentes. Nesses casos, a sado a partir das condições e capacida- vidades dos agricultores e de suas cadeias
pergunta central é como fortalecer o seg- des locais, sem dependência de recursos, produtivas. A consequência imediata é o Figura 3. Criação tradicional de búfalos em Porto de Moz, exemplo da
mento familiar como eixo de desenvolvi- conhecimentos e tecnologias alheios aos surgimento de grande massa de pobres importância de se trabalhar propostas produtivas a partir das atividades
mento local. produtores (Figura 2). que deixam o campo, sem perspectiva de já desenvolvidas e considerando os conhecimentos, interesses e capaci-
futuro. Uma vez que as atividades produ- dades dos agricultores.
O desafio da década para a Amazônia é A demanda é urgente, pois ainda é pos- tivas existentes são desestruturadas, a de-
garantir a inclusão produtiva dos agricul- sível valer-se do potencial existente, como pendência de programas governamentais
tores familiares. A questão essencial é a o fato de os agricultores ainda estarem no assistencialistas aumenta, com poucas No entanto, ainda faltam, na Amazô-
consolidação de atividades produtivas no campo, terem produção, fazerem parte de chances de se tornarem emancipatórias. nia, experiências práticas consolidadas de
campo e a organização comercial na cida- cadeias de comercialização estabelecidas desenvolvimento local que possam servir
de como forma de geração de renda para e ainda não estarem marginalizados so- Já existe o entendimento conceitual de de exemplo. Mesmo frente à existência
que os agricultores tenham condições de cialmente como em outras regiões do Bra- que a inclusão produtiva passa pela valo- de um conceito claro acerca dos passos
viver bem e garantir o futuro de suas fa- sil. Em muitos municípios, o processo de rização e reconhecimento do protagonis- fundamentais para o fortalecimento da
mo dos agricultores e das comunidades, produção familiar, há poucas experiên-
pela construção de propostas produtivas cias concretas sistematizadas. Um esforço
a partir dos conhecimentos, interesses e nessa direção foi feito no marco do proje-
capacidades locais, pela atuação partici- to Governança de Recursos Naturais por
pativa dos atores externos e pela colabo- Agricultores familiares Rurais da Ama-
ração do governo. Dentro dessa compre- zônia nos municípios de Porto de Moz
ensão, a governança local (ou sistemas e Medicilândia, no Pará. Os municípios
locais de produção e gestão) é uma das são caracterizados pela forte presença de Mais do que
alternativas mais promissoras por partir produtores familiares, mas são essencial- ideias novas, é
Figura 2. Os agricultores da: a) capacidade dos grupos locais em mente diferentes em sua história e modo preciso valorizar
familiares e as comuni- gerenciar estrategicamente seus recursos, de vida. A área rural de Porto de Moz, por
dades tradicionais têm b) noção de que propostas e acordos que exemplo, é ocupada há mais de cem anos
as atividades
melhores condições de saiam das comunidades podem ter mais por populações ribeirinhas que vivem da produtivas já de-
gerenciar seus recursos efetividade que a gestão do Estado e c) pesca, da criação de animais e do uso da senvolvidas pelos
do que o governo. Cabe importância do Estado avalizando os sis- floresta (Figura 3). Medicilândia, por outro
agricultores e sua
ao Estado reconhecer temas de governança local para garantir lado, foi colonizada na década de 1970 por
e apoiar as iniciativas sua robustez, principalmente diante de imigrantes de outras regiões que hoje tra- capacidade de
locais. ameaças externas. balham com cacau, gado, têm criação de gestão.

Introdução  15
pequenos animais e começam a plantar seguir e sistematizadas na conclusão do pacidade e interesses locais. É uma pro- rotacionado de pastagem, segundo resul-
açaí (Figura 4). livro. Cada capítulo tem como ponto de posta simples, mas que responde técnica e tados de uma experiência que está sendo
partida as atividades já desenvolvidas legalmente (dependendo da interpretação testada em Medicilândia. O sétimo capí-
Este livro reúne as lições de quatro anos pelos agricultores e suas práticas de pro- que se dê à legislação) às exigências conti- tulo traz lições sobre o manejo de açai-
de acompanhamento de diferentes ativi- dução. Em alguns casos, foram testadas das nos planos de manejo tecnicistas. zais plantados e nativos, revelando que
dades produtivas organizadas em propos- modificações na forma de produzir, con- as variedades nativas, por apresentarem
tas técnicas que têm por objetivo apoiar siderando os interesses dos agricultores e Para a gestão pesqueira, a proposta maior resistência e menor demanda por
os agricultores em seus projetos de de- suas propostas. Nos casos em que as mo- apresentada no terceiro capítulo sistema- insumos e tratos, são mais adaptadas a
senvolvimento. A iniciativa busca lições dificações surtiram efeito, foram incorpo- tiza as experiências dos acordos de pes- agricultores com baixo nível de manejo e
sobre: a) as possibilidades de inclusão radas ao sistema produtivo e os custos de ca desenvolvidos pelas comunidades de capacidade de investimento. Esse conjun-
produtiva dos produtores familiares como implementação foram apresentados nos Porto de Moz e indica os procedimentos to de capítulos revela que o apoio à inclu-
forma de garantir o futuro da Amazônia; respectivos capítulos. metodológicos para sua elaboração e re- são produtiva de agricultores familiares
b) a viabilidade de se trabalhar propostas gulamentação. Como forma de assegurar na Amazônia precisa ser estruturado, com
produtivas construídas junto com os pro- O primeiro capítulo, sobre búfalos, o cumprimento dos acordos e avaliar sua o Estado oferecendo as condições neces-
dutores a partir das atividades que eles já aborda um tema polêmico: a criação de eficácia num horizonte de tempo preesta- sárias para que os agricultores produzam
desenvolvem, considerando seus conhe- animais de grande porte no interior das belecido, propõe-se um sistema de moni- e gerem renda.
cimentos, interesses e capacidades; e c) o Reservas Extrativistas (Resex). Embora na toramento a partir de indicadores simples.
papel do Estado e outros atores-chave no maioria das Resex exista criação de ani- A expectativa em relação ao Estado é de O oitavo capítulo traz uma avaliação
apoio ao desenvolvimento rural na Ama- mais de grande porte (bovinos ou bubali- reconhecimento dos acordos, como forma sobre as melhorias implementadas no
zônia, em particular no apoio à inclusão nos), até agora o Ministério do Meio Am- de fortalecê-los para a resolução de confli- conjunto de experiências apresentadas ao
produtiva dos agricultores familiares. biente (MMA) tem se mantido omisso em tos, principalmente com atores externos. longo do livro. O capítulo revela a impor-
tratar dessa questão à luz da legislação, tância que pequenos aportes financeiros
As experiências sobre esses temas es- por entender que há incompatibilidade Os capítulos seguintes tratam de temá- podem ter no apoio a produtores interes-
tão contidas em cada um dos capítulos a entre a atividade e o Sistema Nacional de ticas ligadas à produção agropecuária, sados em experimentar melhorias em suas
Unidades de Conservação (Snuc). No caso principalmente com base nas experiên- práticas ou investir em novas atividades
da Resex Verde para Sempre, em Porto de cias de Medicilândia, um município es- produtivas. O décimo capítulo revela que
Moz, os criadores buscam saídas, mobi- sencialmente agrícola. O quarto capítulo o baixo desenvolvimento da agricultura é
lizando-se a partir de suas organizações apresenta algumas possibilidades para uma das principais razões da pobreza ru-
e, à medida que expõem suas práticas, o cultivo de cacau em terra mista, consi- ral na Amazônia e advoga em favor do de-
levam órgãos ambientais e organizações derando o interesse dos agricultores em senvolvimento rural a partir da produção
ambientalistas a encarar a realidade das expandir os plantios para essas áreas. O agrícola e pecuária, em oposição ao sub- Este livro traz
Unidades de Conservação de Uso Susten- quinto capítulo trata da criação de gali- desenvolvimento sustentado. Finalmente, experiências
tável na Amazônia. nha caipira e caipirão em sistema de ma- na conclusão, a inclusão produtiva dos
Figura 4. Cultivo de nejo semiconfinado, de baixo custo, con- produtores familiares é apontada como o
concretas de in-
cacau em Medicilândia. O segundo capítulo do livro trata do uso siderando a disponibilidade de material e melhor caminho para o desenvolvimento clusão produtiva
Os agricultores familia- tradicional da floresta para a produção de de mão de obra no lote. sustentável da Amazônia.  implementadas
res da Amazônia preci- madeira e da construção de sistemas de por agricultores e
sam ter condições de governança envolvendo extrativistas e No sexto capítulo são apresentadas su-
produzir, comercializar e órgãos ambientais. O capítulo aborda um gestões para o manejo de gado para a pro- comunidades na
gerar renda no campo. sistema de gestão florestal pautado na ca- dução mais intensiva de leite, em sistema Amazônia.

Introdução  17
Manejo de
Búfalos
na Váreza
Cláudio Wilson Soares Barbosa,
Katiele Amorim e Gabriel Medina

Práticas de alimentação,
saúde, reprodução animal e
produção de queijo de bubalinos
desenvolvidas a partir das
experiências tradicionais dos
criadores são apresentadas
neste capítulo.

18  Manejo de Búfalos na Váreza Manejo de Búfalos na Váreza  19


Estado
do Pará

Brasil A quantidade de animais varia de 10 a unidade de conservação, visto que o Siste-


Os criadores
100 animais por família. Poucos criadores ma Nacional de Unidades de Conservação
têm acima de 100 cabeças e existem al- (Snuc) não prevê textualmente a permis- desenvolveram
gumas fazendas com planteis maiores. O são para a criação de animais de grande experiências
búfalo é criado visando a comercialização porte em Reservas Extrativistas. Este ca- inovadoras para
Porto de Moz da carne e a produção de leite para a fa- pítulo traz o resultado do esforço das fa-
bricação de queijo. O gado vendido para mílias para consolidar propostas técnicas a alimentação
corte funciona como uma poupança para de criação de búfalos e para desenvolver dos animais
as famílias e a produção de queijo serve um sistema de governança interna com tanto em áreas
como uma fonte de renda que se interca- apoio dos órgãos do governo, a partir dos
la com a pesca em áreas só com várzea e interesses e capacidades das comunida-
de várzea quan-
Estado do Pará com a agricultura e extração de madeira des.   to em áreas de
em áreas com várzea e terra firme. transição entre
Porto de Moz várzea e terra
Os principais desafios das famílias
Legenda são relacionados à: firme.
Limite do Municipio de Porto de Moz
RESEX Verde para Sempre
Comunidades e Localidades  Alimentação adequada para os
Criação de Búfalo animais, em particular na época das
Figura 1. A criação de cheias, quando os animais jovens não
búfalos tornou-se uma conseguem pastejar e os adultos têm
1. Alimentação
das atividades mais
importantes para a po-
pulação rural de Porto
de Moz nas últimas
E m Porto de Moz, em 61% das co-
munidades e localidades rurais, há
famílias que trabalham com a cria-
ção de búfalos (Figura 1). A maior parte
pastos plantados na terra firme na épo-
ca das cheias, quando os pastos naturais
são cobertos pela água. Nos dois casos, a
criação depende muito da disponibilidade
que nadar por muito tempo para en-
contrar capim nativo;

 Sanidade animal para aumentar o


1.1. Áreas de várzea
três décadas. Das 107
comunidades e localida-
des rurais em Porto de
Moz, em 65 há famílias
criando búfalos.
dos criadores está concentrada na área de
várzea entre os rios Xingu e Amazonas, ao
norte do município.

Os criadores usam dois sistemas prin-


das pastagens naturais e da rusticidade
do animal.

A criação do búfalo está organizada


em núcleos formados por famílias com
ganho de peso e reduzir a mortalidade;

 Reprodução para evitar a consangui-


nidade do rebanho existente na região;
N o sistema de criação característico das áreas de várzea, às
margens dos rios, as famílias constroem casas tipo palafitas
e maromba (curral suspenso) onde os animais descansam e
são tratados na época da cheia. Nesse sistema, o principal desafio é
garantir alimentação para o gado no período das cheias, em parti-
cipais de manejo de acordo com as condi- relações de parentesco e que moram pró-  Produção de queijo considerando as cular para os bezerros que não conseguem nadar grandes distâncias
ções naturais. Aqueles que estão apenas ximas umas das outras. Os animais são exigências sanitárias. à procura de pastos. As principais sugestões técnicas para melhores
em áreas de várzea (sem terra firme) tra- criados soltos e não há cerca dividindo as condições de manejo construídas pelos criadores, considerando as
balham com o gado em marombas (cur- terras. As áreas entre um criador e outro Adicionalmente, a criação da Resex Verde condições ambientais e de investimentos existentes são:
rais suspensos) com livre acesso às áreas são marcadas por limites naturais, como para Sempre em 2004, que inclui a área
de capim nativo. Já os que estão em área uma árvore, enseada ou igarapé. Nesse com criação tradicional de búfalos, susci- 1.1.1. Manejo de pastagens naturais
de transição entre várzea e terra firme sistema, as relações familiares próximas tou nas famílias e comunidades a neces-
trabalham com o gado na várzea no pe- facilitam o entendimento sobre o uso do sidade de dialogar com o órgão gestor de A sugestão das famílias consiste na rotação de áreas entre o período
ríodo de água mais baixa aproveitando espaço comum. Resex. O esforço de diálogo busca garantir de cheias e de baixa das águas. Para isso alguns criadores já estão
os campos naturais e levam o gado para a permanência da criação no interior da construindo duas marombas: uma, mais próxima do rio, para man-

20  Manejo de Búfalos na Váreza Manejo de Búfalos na Váreza  21


ter o gado no período de águas baixas, e zerros e búfalas que ficam na maromba
outra, no fundo da propriedade que geral- durante o período pré-parto que ocorre
mente é mais alta e menos afetada pela no período das cheias. Nessa época do
cheia, para manter o gado durante a su- ano, o capim fica com as folhas secas e
bida das águas. As famílias que vivem em duras, obrigando os criadores a forne-
áreas de transição e ainda não construí- cerem muito talo de capim rabo-de-rato
ram sua segunda maromba, costumam le- (o preferido pelos criadores) para os
var o gado para os tesos (áreas mais altas animais (Figura 2). Os criadores infor-
sem floresta) e ilhas (áreas mais altas com mam que os talos são preferidos pelos
floresta), onde os animais permanecem animais pois as folhas normalmente já
durante o inverno. estão palhadas (duras).

1.1.2. Complementação  Preparo de área de recreio na


alimentar ilharga da maromba – Algumas famí-
lias começaram a fazer quadras (pique-
Outro desafio é garantir complementação tes) próximas à maromba para reservar
alimentar em particular para os animais pastos para a época das cheias. Essas Figura 3. Área de recreio
pequenos e para as búfalas no período pré áreas servem como fonte de capim a no Rio Uiui mantida com
e pós-parto. As principais propostas téc- ser fornecido aos animais jovens na 1.2. Área de transição madas com capim braquiarão ou quicuio. cerca elétrica. Essas
nicas implementadas pelos criadores são: maromba ou para ser pastejada com
mais facilidade por estarem próximas
entre várzea e terra Quando o criador não tem pasto formado
na terra firme, é comum que ele arrende
áreas são cercadas
com flexais (tábuas de
 Fornecimento de capim na marom- dela (Figura 3). firme áreas de pastagem para todo o rebanho. madeira) ou mesmo com
ba – Todas as famílias que têm apenas A seguir são apresentadas as principais cerca elétrica, princi-
áreas de várzea, cortam capim nos cam-
pos ou às margens dos rios para os be-
 Produção de silagem – A maioria
dos criadores não considera viável a
produção de capineira em plantios se-
parados para a produção de silagem,
pois toda a área de várzea alaga uma
N as áreas de transição entre várzea
e terra firme, os animais perma-
necem tradicionalmente por cerca
de seis meses em cada ambiente. Os ani-
mais ficam na área de várzea durante o
sugestões técnicas para a garantia da ali-
mentação dos animais no sistema terra
firme que estão sendo construídas com os
criadores:
palmente durante o
verão. Algumas famílias
mantêm a cerca elétrica
nas cheias, subindo o
arame conforme sobe o
vez por ano, dificultando o plantio de período de estiagem (de agosto a janeiro) 1.2.1. Pastagem de terra firme nível da água.
qualquer cultura. Mas, considerando o pois os campos naturais propiciam ótimo
ciclo curto de algumas culturas, a ferti- rendimento de leite, crescimento e engor- A abertura de novas áreas normalmente é
lidade natural dos solos e o fato de que da, principalmente quando ocorrem as feita no sistema corte-e-queima. No caso
Figura 2. Geralmente parte das áreas próximas à maromba primeiras chuvas de dezembro e o capim de reforma de áreas, os agricultores prefe-
o capim é fornecido às não fica coberta de capim, o plantio de rebrota rapidamente. Nas áreas de várzea, rem esperar o tempo de pousio para a for-
búfalas pré e pós-parto milho para silagem parece uma opção há predominância das espécies de capim mação da capoeira, para então proceder à
e aos animais jovens a ser testada por criadores interessa- nativo rabo-de-rato, pomunga, arroz bra- roçagem, derruba, queima e plantio com
que nadam menos e dos. Para os criadores que já têm cerca vo e perimembeca às margens dos rios. sementes ou mudas. Quanto mais antiga
têm dificuldades para elétrica, a opção de separar uma área Na época das cheias (de fevereiro a julho), a capoeira, menor será a competição da
pastejar áreas distantes para a produção de silagem parece os animais são levados para áreas de terra pastagem reformada espécies invasoras.
nas cheias. mais fácil.  firme, que são normalmente abertas e for- A alternativa de arar a terra é inviabiliza-

22  Manejo de Búfalos na Váreza Manejo de Búfalos na Váreza  23


da pela presença de tocos nas áreas e pela de uma área de pastagem de três hecta- 9,3 toneladas de MS/ha por ano. Conside- e com a estacionalidade (10%), serão ne-
indisponibilidade de tratores na região, e res são apresentados no apêndice ao final rando-se que as 10 búfalas pesam 550 kg cessários 31.429 kg de matéria seca por
É importante
o uso de herbicidas para dessecar a vege- do capítulo, e foram levantados com base cada, elas vão consumir juntas 110 quilos ano. Essa quantidade poderá ser suprida trocar os
tação secundária é limitado pela falta de nos valores fornecidos por um criador da de matéria seca por dia. Considerando- por 3,4 ha de braquiarão. animais de
conhecimento e assessoramento técnico. comunidade Bom Jesus, do Rio Coati. se ainda as perdas com o pastejo (30%) pasto para
Os pastos feitos em terra firme são geral-
mente de braquiarão e, em alguns casos, ÁREA TOTAL = Necessidade de matéria seca por ano = 31.429/ 9.300 = 3,4 que o capim
1.2.2. Divisão das quadras
de quicuio (Figura 4). Junto com o capim, (piquetes) Produção esperada (kg) cresça.
é recomendado plantar a leguminosa ca-
lopogônio que é fonte importante de pro- A divisão da área em quadras serve para Quadro 1. Características e exigências das principais forrageiras.
teína para os animais e também aduba o fazer o rodízio do gado para que a forra- Forrageira Características Produ- Produ- Altu- Altura Exigên- Período Queda
solo com nitrogênio, principal nutriente gem tenha tempo de descanso e consiga ção de ção de ra de de saída cia de de des- de pro-
requerido pelas pastagens para seu desen- se restabelecer para o próximo ciclo de matéria matéria entrada dos aduba- canso dução
seca/ seca/ha/ dos animais ção na épo- na seca
volvimento. Os custos para a implantação pastejo. Para que isso ocorra, é fundamen-
ha/ano ano nos animais (cm) ca das
tal que o gado entre quando o capim te- (tonela- primei- (cm) águas
nha atingido a altura indicada e que seja das) ros anos
retirado também com o capim na altura (tonela-
das)
indicada, garantindo o período necessário
Braquiarinha Tolerância à baixa fertilidade, bom cres- 18 8,4 30 10 Baixa 28 a 32 Alta
para que o pasto se recupere (Quadro 1).
cimento sob a sombra, boa qualidade dias
forrageira e alta produtividade sob uso
É necessário observar o formato dos pi- intensivo
quetes. O comprimento normal do piquete Braquiarão Fácil estabelecimento, resistência à 20 9,3 40 20 Média 28 a 35 Média
não pode ultrapassar três vezes a largura. cigarrinha das pastagens (muito mais dias
que o braquiarinha), alta produção de
Os piquetes mais adequados são os qua-
sementes, boa qualidade forrageira, boa
drados, pois possibilitam melhor aprovei- cobertura do solo com domínio sobre
tamento do pasto. O quadro 2 apresenta plantas invasoras
a área de pastagem que será necessária Colonião Bom desenvolvimento em solos argilo- 40 18,6 70 40 Alta 28 a 35 Alta
para criar diferentes tamanhos de reba- arenosos férteis e drenados, moderada dias
resistência à seca e ao fogo e elevados
nho de acordo com o tipo de pasto.
teores de açúcar (engorda de bovinos
Mombaça Elevada produção sob adubação 40 18,6 90 50 Alta 28 a 30 Alta
A estimativa do tamanho da área de intensiva, elevada qualidade, alto valor dias
manejo foi feita dividindo-se a necessi- alimentício e moderada resistência à
Figura 4. Um dos principais desafios dos produtores é manter seus dade de massa seca de forragem por ano cigarrinha das pastagens
pastos produzindo a longo prazo, pois a reforma é normalmente muito pela produção de massa por hectare (OLI- Tanzânia Elevado valor nutritivo e alimentício, 30 14,0 70 30 Alta 28 a 32 Alta
dispendiosa, em particular se feita em capoeira nova que apresenta VEIRA, 2006). Como exemplo, supondo-se elevada resposta à adubação, boa dias
resistência à cigarrinhas das pastagens,
muita competição com plantas invasoras. A área da foto foi roçada, plan- que seja necessário alimentar 10 búfalas uniformidade de pastejo, boa resposta
tada com mudas de quicuio e roçada outras duas vezes até a formação em pasto de braquiarão, parte-se do prin- sob pastejo rotacionado
do pasto. O plantio com mudas, embora muito trabalhoso, é comum na cípio de que as búfalas consomem 2% de Quicuio Boa adaptabilidade a solos úmidos e de 12 5,6 35 15 Baixa 28 a 35 Média
região por causa de pragas que atacam os plantios feitos com sementes seu peso vivo em matéria seca (MS) e que baixa fertilidade, alta resistência à seca, dias
logo na germinação. o braquiarão tem produção esperada de tolerante ao ataque de cigarrinhas

24  Manejo de Búfalos na Váreza Manejo de Búfalos na Váreza  25


Quadro 2. Estimativa de área de da área. No caso de rebanhos leiteiros, dividindo o pasto até chegar à quantidade de sombra nas quadras. Geralmente as
pasto necessária para criar deve ser de um dia (no máximo dois) suficiente para garantir o tempo de des- pastagens têm árvores que podem for-
diferentes rebanhos de pois o prolongamento da ocupação canso necessário para a recuperação do necer sombra. Em curto prazo, as famí-
bovinos. causa variação na produção de leite. O capim (Quadro 1). lias preferem separar um piquete de livre
Pasto Rebanho Área (ha) gado deve começar a ocupação antes acesso que tenha árvore só para garantir
Braqiuarão 10 3,4 de a planta soltar a inflorescência ou 1.2.3. Água e sombra a sombra permitindo que, na hora do sol
30 10,0 apresentar folhas envelhecidas pois, a forte, as búfalas possam ir para esse local
50 16,9 partir daí, já tem pouco valor nutritivo. Para que a búfala apresente alta produção que também deve ter uma fonte de água.
Colonião 10 1,7 de leite, o acesso à água é uma questão Quando os piquetes não oferecem sombra
30 5,0 O cálculo do número de piquetes central. Para isso, é fundamental planejar e água suficientes, os animais passam a
50 8,4 obedece a seguinte equação: os piquetes, garantindo o acesso em dis- abrir buracos para se refrescar durante os
Tanzânia 10 22,0
tâncias curtas. A demanda de uma búfala períodos mais quentes e, com isso, dete-
NÚMERO DE PIQUETES = é de 80 litros de água por dia por animal rioram a pastagem.
30 6,7
Período de Descanso + 1 de até 500 quilos. Para cada litro de leite
50 11,2
Período de Ocupação produzido a búfala aumenta o consumo 1.2.4. Uso de cerca elétrica
Braquiarinha 10 3,7
de água em cinco litros. Então uma búfa-
30 11,2 No exemplo do braquiarão, que tem pe- la que produzir 10 litros de leite terá que Para a divisão interna dos piquetes é reco-
50 18,7 ríodo de descanso de 28 a 35 dias (média beber os 80 litros mais 50 litros de água mendado o uso de cercas elétricas alimen-
Mombaça 10 1,7 de 32 dias) (Quadro 1), se o período de por dia, totalizando 130 litros finais. As tadas com bateria. Os custos com arame
30 5,0 ocupação for de um dia, o resultado é o búfalas leiteiras são animais preguiçosos e estacas para implantação desses pique- Figura 5. A cerca
50 8,4 seguinte: (32/1) + 1 = 33 piquetes. que não se dispõem a caminhar muito tes são menores, se comparados com os elétrica facilita a divisão
Quicuio 10 5,6 para beber água. Assim, deve-se observar da cerca convencional, com arame liso ou dos piquetes e permi-
30 16,7 O tamanho do piquete é calculado di- a qualidade das vias de acesso e a distân- farpado. Essa geralmente é uma novidade te a recuperação da
50 11,2 vidindo-se a área total pelo número de cia dos bebedouros, rios e igarapés. Be- para os agricultores. A cerca elétrica pos- pastagem nas áreas de
piquetes. No exemplo dado, os 3,4 ha de- bedouros mal localizados e distantes das sibilita dividir a área com apenas um fio terra firme. O sistema
vem ser divididos pelos 33 piquetes. Isso áreas de manejo e de descanso certamen- e trabalhar com estacas a cada 15 metros é simples e mais barato
Com o pasto Para se calcular o número de piquetes é resulta em cada piquete com 0,103 ha, ou te prejudicarão a produção de leite. Outro em média (Figura 5). Até que o animal se do que a construção
necessário que o agricultor considere: 1,030 m², o que faz com que cada uma das ponto importante é a qualidade da água convencional de cercas.
dividido em
10 búfalas utilize 103 m² por dia. oferecida aos animais. Se as búfalas tive-
quadras é mais  Período de descanso – Relaciona- rem acesso a uma fonte de água quente,
fácil entrar com se ao tempo em que o gado não ocupa Alguns criadores preferem fazer uma barrenta ou suja, o consumo será afetado.
o gado no mo- o piquete e deixa o pasto se recuperar quantidade menor de piquetes. Não há in- Nesse caso, os animais bebem apenas o
para uma ocupação futura. O período conveniente nisso, desde que se consiga mínimo necessário mas não o suficiente
mento em que o de descanso é dependente de alguns fa- ter o número de piquetes necessário para para proporcionar produção elevada.
capim está alto e tores como a espécie forrageira, as con- respeitar o momento de entrada e saída
retirar o rebanho dições de fertilidade do solo e o clima do gado do pasto. A experiência com as Outro aspecto que no pastejo rotaciona-
da região. famílias de Porto de Moz indicou que elas do se tem levado em conta é o bem-estar
no momento em
preferem começar dividindo seus pastos animal, pois comprovadamente um ani-
que o capim pre-  Período de ocupação – É a época em duas ou três áreas. Ao longo do tem- mal produz mais quando está em situação
cisa se recuperar. em que o gado está pastejando dentro po, aquelas que viram resultados, seguem de conforto. Assim, é indicada a presença

26  Manejo de Búfalos na Váreza Manejo de Búfalos na Váreza  27


acostume com a cerca, é necessário algum cobre enterradas no chão de 3 em 3 me-
tempo, mas, depois de alguns choques, o tros em área úmida; Figura 7. Bezerros com
rebanho passa gradativamente a evitar o sinais subnutrição por falta
contato. Para a instalação os seguintes de-  Isolar o fio da cerca – Um bom iso- de pasto e amamentação.
talhes são importantes: lamento garante a eficiência do siste- A oferta do colostro nos
ma. O fio da cerca não deve estar em primeiros dias e leite pos-
 Seguir as recomendações do ma- contato nem com o capim nem com a teriormente é fundamental
nual de instruções do aparelho eletri- madeira das estacas. Para o isolamen- para o desenvolvimento
ficador (aparelho de choque) – Cada to, é possível trabalhar alternativas inicial dos bezerros, uma
eletrificador indica quantos quilôme- locais como borracha de pneus velhos vez que os criadores não
tros de cerca consegue cobrir. Existem para envolver os fios, produtos comer- têm recursos nem tradição
eletrificadores disponíveis para fun- ciais como isoladores para pregar nas de oferecer complementa-
cionar com energia da rede elétrica, estacas ou mesmo tubos de plástico de ção alimentar. Geralmente,
com baterias recarregáveis, com ener- cinco oitavos que podem ser inseridos a desmama é natural, feita
gia solar e com pilhas. Na compra do em furos feitos nas estacas com fura- pela própria búfala a partir
aparelho é importante ter uma ideia da deiras manuais ou elétricas; do oitavo mês.
extensão da cerca a ser estabelecida e
saber a fonte de energia a ser usada;  Para-raios – Devem ser instalados

 Aterramento – O eletrificador tem


para garantir a segurança do sistema e
evitar queima do eletrificador.
curral de ordenha (Figura 6). No caso de
criadores que levam o gado para a várzea 2. Sanidade
uma saída que deve ser aterrada. A e deixam a área de pasto em terra firme
sugestão é conectá-la a três varas de 1.2.5. Manejo do rebanho parada por seis meses, recomenda-se que, 2.1. Cuidados com os bezerros
a cada inicio de uso da área, seja feita a
O manejo busca garantir que o gado entre
no piquete no momento em que o capim
está em seu melhor estágio e saia no mo-
mento adequado para permitir a recupe-
ração rápida do capim. Caso chegue o dia
roçagem dos piquetes um mês antes de
colocar os animais. Isso facilita que a pa-
lhada formada pelo tempo de descanso
logo seja cortada e assim o capim rebrote
e esteja em boa qualidade para o primeiro
P ara garantir o bom desenvolvimento inicial do bezerro, é ne-
cessário deixá-lo mamar logo após o parto, ingerindo o colos-
tro do leite, fundamental para o fortalecimento do seu siste-
ma imunológico. Depois, quando começa a ordenha, é importante
deixar leite suficiente para o bezerro mamar. Os criadores começam
de trocar as búfalas de piquete e elas não pastejo. Caso não seja possível fazer a ro- a ordenhar a búfala a partir do oitavo dia do nascimento do be-
tenham consumido toda a área, faz-se o çagem, recomenda-se colocar os animais zerro, quando o leite “clareia”. Parte pequena dos criadores, para
repasse com os animais jovens para nive- jovens para fazer o corte, sem, contudo, promover o melhor desenvolvimento dos bezerros, começa a tirar
lar o capim, sempre respeitando a altura deixar que “rapem” o pasto. leite apenas a partir do vigésimo dia do nascimento. A partir do
forragem no momento da saída. início da ordenha, os produtores passam a apartar as búfalas no
Sal mineral – Não é tradição entre os final do dia, prendendo os bezerros nos currais ou marombas, para
Figura 6. Uma técnica Para aproveitar o bosteamento, que ser- criadores oferecer sal mineral para o re- a ordenha na manhã do dia seguinte. Durante a ordenha e ao longo
simples de adubação é ve como adubo para o solo, recomenda-se banho. Mas alguns já começam a usá-lo do dia, os bezerros ficam com as búfalas. É comum que os criadores
fazer os animais boste- entrar no piquete 15 minutos antes de re- como fonte complementar de minerais ordenhem e deixem pouco leite para os bezerros. Nesse caso, como
arem no pasto antes de tirar os animais para que eles se levantem para os animais que estão na terra firme. os bezerros não recebem alimentação complementar, têm baixo de-
trazê-los para o curral e façam o bosteamento no piquete e não O recomendado é ter um cocho coberto senvolvimento inicial e não se fortalecem o suficiente para suportar
de ordenha. no corredor durante o caminho para o para que seja distribuído à vontade.   a época da chuva (Figura 7).  

28  Manejo de Búfalos na Váreza Manejo de Búfalos na Váreza  29


2.2. Estrutura e higiene camentos e a ordenha das búfalas. Embo-
ra não seja comum, recomenda-se que o
O principal desafio no que se refere ao as- curral tenha piso de cimento, permitindo Figura 9. Maromba
peto sanitário é garantir a higiene no trato a instalação de uma esterqueira para faci- secundária, no fundo
com os animais. Como a criação é extensi- litar a limpeza e a retirada do esterco, que da área do criador. A
va, o maior cuidado deve ser tomado para pode ser aproveitado para a adubação. A rampa deve ser o menos
manter as instalações limpas. Os criado- esterqueira é uma prática sanitária que inclinada possível para
res em geral não investem em instalações evita a propagação de doenças. evitar muito esforço du-
Cuidados com e isso pode trazer prejuízos. A seguir, são rante subidas e descidas
a saúde animal apresentadas as recomendações mais im- A parte do curral para os animais adul- de animais. Nesse caso,
portantes para a estrutura e higiene das tos que ficam pouco tempo não precisa ser seria útil ter tábuas de
garantem maior
instalações usadas para o manejo dos coberta, mas a parte destinada aos bezer- proteção lateral rente à
produção e quali- animais (curral nas áreas de terra firme e ros que ficam presos, geralmente a partir rampa para evitar que o
dade do produto. maromba nas áreas de várzea). das 16h deve ser coberta. Dentro do pró- animal escorregue.
prio curral pode-se fazer uma sala cerca-
2.2.1. Curral da para a ordenha, diminuindo assim os
gastos com instalações. A área a ser desti- 2.2.2. Maromba acidentes que provocam a morte desses
A função do curral é facilitar o manejo do nada para a ordenha no curral depende de animais.
rebanho, permitindo a aplicação de medi- quantas pessoas fazem esse trabalho, mas A maromba é uma estrutura suspensa
basicamente é utilizada uma área de 2m x feita de madeira para abrigar o gado na A principal medida para evitar aciden-
3m para cada búfala e sua cria. Essa área época das cheias. Para o assoalho é reco- tes é amansar os animais adequadamen-
deve ser limpa antes e depois da ordenha, mendado deixar espaço de dois centíme- te. Na prática as búfalas são amansadas Os criadores
de forma a evitar o acúmulo de dejetos, tros entre tábuas e usar tábuas de três quando têm a primeira cria e o criador desenvolveram
como na Figura 8. centímetros de espessura, para facilitar a começa a fazer a ordenha. Com o bezerro
limpeza. A rampa deve ter as laterais bem mamando, o criador vai tentando tirar o diferentes prá-
cercadas, contendo proteção capaz de evi- leite. A prática exige principalmente cari- ticas de manejo
Figura 8. O piso de madeira no curral dificul- tar que, ao escorregar, o animal coloque nho e paciência nos primeiros dias, com de rebanho para
ta a retirada do esterco e, particularmente as patas para fora e seja pisoteado pelos várias tentativas. O criador não deve ser
evitar acidentes.
nas épocas mais úmidas, fica com odor forte, demais. É muito importante fazer degraus agressivo com os animais. O quadro 3 traz
provocado pela urina dos animais acumula- para evitar que a rampa fique escorrega- um resumo dos principais tipos de aciden-
da na parte de baixo do assoalho, problema dia (Figura 9). Sugere-se 2,5 m2 por animal tes, causas e medidas preventivas.
que pode ser contornado com a utilização de para calcular o tamanho da maromba.
piso de cimento com esterqueira. A falta de Caso haja a morte de animais, é reco-
cobertura aumenta o estresse térmico dos 2.2.3. Acidentes mendado fazer a queima das carcaças. Na
bezerros, presos no meio da tarde de cada época da cheia recomenda-se levar as car-
dia, com o sol ainda forte, para facilitar a Os bubalinos são animais que apresentam caças para as áreas de teso e queimar ou
ordenha no dia seguinte. A alternativa seria alta capacidade de adaptação a ambientes enterrar. Não é correto jogar as carcaças
cobrir a parte do curral em que os bezerros hostis em relação a outras espécies de ani- no rio para serem levadas pela maré, pois
ficam presos, dotando-a de uma fonte de mais domésticos. Mesmo em áreas de pas- isso provoca contaminação das águas e
água. tagens de terra firme, são muito comuns doenças nas populações rio abaixo.  

30  Manejo de Búfalos na Váreza Manejo de Búfalos na Váreza  31


Quadro 3. Tipos de acidentes mais comuns. 2.3. Calendário de vacinação e
Tipos de
acidentes
Causas Ocorrência Medidas de prevenção
controle de parasitas

É
Afogamento Transporte por água Bezerros podem ser atropelados e Evitar aglomeração dos animais ou pressionar necessário que o criador siga o calendário profilático, que é o
de animais em grandes afogados pelos animais adultos em para que nadem mais rápido. Sempre que
grupos incluindo animais situação de pressão possível mantê-los em filas deixando a líder do
cronograma de vacinação e combate a endoparasitas e ectopa-
jovens grupo guiar os demais (só as fêmeas exercem rasitas (LÁU, 2006) (Quadro 4).
liderança no rebanho). Evitar transportar
animais por áreas de boiados sempre que pos- Figura 10. O búfalo é
sível. Evitar transportar rebanhos com muitos
animais  Cura de umbigo – Na várzea os dicamentos para evitar resistência nos muito resistente, mas
Chifre engatado Enroscamento dos chi- Principalmente entre búfalas com Serragem do chifre a cerca de cinco centímetros criadores não costumam fazer cura de animais. No caso de infestação por pio- alguns cuidados são fun-
fres em troncos e raízes mais de cinco anos de idade da raça da ponta. A idade indicada é a partir do quarto umbigo, sendo raros os casos de infla- lho, todo o rebanho deve ser medicado. damentais para a saúde
de árvores Murrah ou do cruzamento desta ano. O cuidado é evitar corte que provoque mação (Figura 10). Na terra firme, é animal.
com Mediterrâneo. Esses animais sangramento e crie condições para infecções e mais comum haver complicações e os  Brucelose – A vacinação deve ser
apresentam chifres em forma de bicheira
círculo, com pequena abertura na cuidados com a cura do umbigo devem feita entre o terceiro e o oitavo mês de
parte interna. Ao esfregá-los em ser redobrados. Tanto na várzea quanto vida, sendo recomendado o sexto mês.
troncos e raízes de árvores há risco na terra firme, a cura deve ser feita no Mas só as fêmeas devem ser vacinadas.
de o animal ficar preso e não conse-
primeiro dia de vida do animal com so-
guir sair. Quando ocorre em regiões
alagadas pode haver afogamento lução de iodo a 10% repetindo-se esse  Manqueira – A vacina para man-
Chifrada (e chifres Briga entre animais Sobretudo entre búfalas que dispu- Serragem dos chifres ou descarte quando se procedimento duas vezes ao dia até o queira deve ser aplicada junto com a
engatados) tam a liderança do rebanho. É muito trata de animal de baixa produtividade quinto dia ou até que o umbigo fique vacina de brucelose. Depois, deve ser
comum a briga entre búfalas pro- seco. Caso o umbigo esteja grande, deve feitaanualmente junto com a campa-
vocar o encaixe dos chifres fazendo
ser cortado a dois dedos do abdômen. nha de vacinação.
com que os animais fiquem presos
uns nos outros. Quando isso ocorre
em áreas alagadas aumenta o risco  Verminoses e ectoparasitas (prin-  Aftose – As vacinações para aftose
de morte por afogamento. Outro cipalmente piolho) – O fundamental devem ser feitas duas vezes por ano
tipo de ocorrência muito comum é
o engate do chifre na parte anterior desses tratamentos é aplicar os medi- nas campanhas que acontecem em
da coxa. Em muitos casos um animal camentos na dose correta, concluir o maio e novembro em Porto de Moz. O
morre engatado no outro tratamento iniciado e alternar os me- controle é feito pela Adepará.
Acidente em Rompimento da estru- Em marombas construídas durante O cuidado essencial está na construção da
marombas tura da maromba ou o inverno, normalmente às pres- estrutura da maromba de acordo com a quan-
frestas que permitam a sas, com estruturas frágeis ou com tidade de animais desejada. Para o assoalho
entrada das patas dos abertura entre tábuas. A maromba é recomendado deixar espaço de 2 cm entre Quadro 4. Calendário profilático.
animais e descidas e mal construída possibilita a entrada tábuas e usar tábuas de 3 cm de espessura. A Idade Cura de Vacina contra Vacina contra
subidas em rampas com das patas dos animais e derrapa- rampa deve ser o menos inclinada possível para Vermifugação
(Dias) umbigo Brucelose Manqueira
assoalho escorregadio gem provocando a fratura da bacia evitar muito esforço durante subidas e descidas
(cavidade óssea que serve de base de animais e com as laterais bem cercadas, 1a5 ✔
ao tronco e de ponto de apoio aos contendo proteção capaz de evitar que, ao 15 ✔
membros inferiores) escorregar, o animal coloque as patas para fora
30 ✔
e seja pisoteado pelos demais. Fazer espécie de
degrau para evitar que fique escorregadia 120 ✔
180 ✔ ✔

32  Manejo de Búfalos na Váreza Manejo de Búfalos na Váreza  33


meses junho e julho. Nessas áreas, as crias dois anos de idade quando atingem cer-
ocorrem durante o período das cheias, o ca de 350 kg; próximo ao parto atingem
que representa riscos de perda do bezerro em média 450 kg. Parindo normalmente
e muito trabalho para o criador. Como não a partir de três anos de idade, uma búfala
existe terra, o criador deve ficar vigiando gera dez crias em média.
a búfala nos dias que antecedem a parição
para, aos primeiros sinais de parto, levá- As raças Murrah e Mediterrâneo ou o
la à maromba e evitar que o parto ocorra cruzamento entre as duas raças ocupam

3. Reprodução Figura 11. O rebanho


criado solto tem alta
dentro da água. Esse é um dos períodos
de maior cuidado com a alimentação das
búfalas para prevenir a engorda excessi-
maior espaço na preferência dos criado-
res, principalmente pela dupla aptidão
para carne e leite. Em menor escala são
A troca de touros

A
ou a inseminação
s comunidades têm rebanho misto com baixa produção de taxa de consanguinida- va, capaz de provocar disfunções durante encontrados os animais da raça Jafaraba-
leite (dois litros por búfala por dia, em média), mas conside- de. Alternativas incluem o parto ou subnutrição que também pode di. Mesmo apresentando menor produção
artificial são prá-
ram que o gado tem ganho de peso relativamente bom. Um a troca de touros entre ocasionar problemas após o parto. de leite, essa raça tem crescimento rápido, ticas importantes
dos principais desafios é a consanguinidade do rebanho da região, comunidades e a aquisi- podendo chegar a 1.000 kg na fase adulta. para evitar con-
que tem a mesma origem. Para superar o problema, há a possibili- ção de touros de outras Na faixa de transição entre várzea e Uma dificuldade da raça Jafarabadi para
sanguinidade no
dade de troca de touros e inseminação artificial. regiões. terra firme, a monta ocorre no início do as áreas de várzea de Porto de Moz é o
período chuvoso, principalmente nos me- tamanho e a disposição dos chifres que rebanho.
Como as famílias criam os animais soltos, ses de janeiro e fevereiro e a parição em comprometem a sobrevivência dos ani-
sem áreas individuais separadas (Figura novembro e dezembro. Para a criação na mais na época das cheias.
11), os touros cobrem as búfalas das pro- faixa de transição, os partos ocorrem no
priedades vizinhas, sem distinção. Então final do período seco com grandes exten- 3.1.1. Seleção do touro
a troca de touros entre vizinhos não é sões de terra disponíveis. Como não há
funcional para evitar que os pais cubram cercas para manejo dos animais, em mui- Considerando que o processo reprodutivo
as filhas. Uma alternativa encontrada é a 3.1. Monta natural tos casos a búfala vai parir nas ilhas, per- ocorre através de monta natural, os cria-
troca de touros entre comunidades. Outra manecendo com a cria escondida por até dores têm a preocupação em selecionar o
opção avaliada pelos criadores é a aquisi-
ção de touros de outras regiões, principal-
mente do Marajó, como forma de renovar
o sangue do rebanho da região.
D e maneira geral, a reprodução
ocorre de forma natural, obede-
cendo ao ciclo de reprodução dos
animais e sua adaptação ao ambiente.
Isso ocorre devido às condições oferecidas
cinco dias antes de se juntar ao rebanho.
Mais frequentemente entre as novilhas
de primeira cria (primíparas), há muitos
casos de abandono do bezerro recém-nas-
cido que dificilmente é encontrado com
melhor animal para reprodutor, normal-
mente da mesma propriedade. Os critérios
de seleção basicamente se restringem ao
desenvolvimento corpóreo do animal. Os
machos com crescimento acelerado e que
A inseminação é difícil de ser imple- pelos ecossistemas (várzea e terra firme) vida ou, quando encontrado, já está em apresentam boa formação de chifres (bem
mentada nas áreas onde não é possível e pelo modo extensivo como a criação é estado debilitado e morre nos primeiros armados, como definem os criadores), fi-
separar as búfalas dos touros por causa desenvolvida. dias. Alguns criadores adotam a constru- cam reservados para futuros reprodutores
da criação solta e extensiva. Nas áreas ção de cercado próximo do curral para as nas propriedades. Quando os criadores
em que os criadores têm pastos separados Para os criadores que dispõem só de búfalas que estão por parir, evitando as- têm oportunidade, adquirem touros dos
(em particular aqueles que têm pastos em área de várzea, a monta ocorre nos pri- sim a perda do bezerro. compradores de gado que adentram os
terra firme) há possibilidade de separar meiros meses do período seco, isto é, rios ou trocam com vizinhos animais com
dos touros, com facilidade, as búfalas a principalmente nos meses de agosto e se- Em ambos os ecossistemas, as novilhas aparência física bem desenvolvida.
serem inseminadas.   tembro, com a parição acontecendo nos de primeira cria entram no cio a partir dos

34  Manejo de Búfalos na Váreza Manejo de Búfalos na Váreza  35


O processo reprodutivo tem importância a frequência de parição, a produção de 3.2. Inseminação artificial
singular nos resultados econômicos da leite e se é boa criadeira (se possui ins-
criação de bubalinos relativos à produção
de leite e ganho de peso dos animais para
abate. Por isso, há que se ter atenção es-
pecial para este fator. A seguir, recomen-
dações simples que podem trazer bons
tinto maternal).

3.1.2. Quadra-maternidade
Uma alternativa para evitar que a búfa-
U ma alternativa, embora ainda não
testada, para introduzir sangue
novo nos pequenos rebanhos dos
criadores familiares de Porto de Moz, é a
inseminação artificial. Considerando os
resultados: la realize o parto longe dos cuidados do custos para obtenção de touros de linha-
dono é o estabelecimento do piquete-ma- gem sanguínea diferente e comprovada-
 Troca anual de touro – O ideal para ternidade. O piquete é uma área cercada mente bons reprodutores, fica bem mais
a criação com monta natural é a troca com oferta de água e alimento abundante barato produzir animais por inseminação
anual do touro entre as comunidades. e de qualidade para os animais ficarem do que comprar touros, considerando que
Com isso, evita-se a consanguinidade confinados no pré-parto. Isso faz com que os mais próximos estão na Ilha do Marajó.
provocada pelo acasalamento entre o criador acompanhe de perto o parto e o Para a inseminação, deve-se ter acompa-
animais com elevado grau de paren- pós-parto do animal evitando longas ca- Figura 12. A quadra-maternidade construída nhamento de pessoas com experiência,
tesco (irmã, mãe, filha...). A tendência minhadas para descobrir o local onde a próxima à maromba e à casa do criador (ao podendo ser o próprio produtor, e evitar a
é que a filiação entre animais não con- búfala escondeu a cria ou mesmo a per- fundo) facilita a cura do umbigo, permite ao aquisição de sêmen de animais não adap-
sanguíneos apresente produtividade da do bezerro por abandono, ataque de bezerro mamar o colostro nas cinco primei- tados às condições ambientais da região.
igual ou superior aos pais biológicos. morcego e afogamento em passagens. A ras horas, que é quando o leite está com
quadra ou piquete maternidade (Figura maior concentração de anticorpos, e favore- Além do sêmen do touro, é fundamen-
 Conhecer as origens do touro – A 12) cumpre função parecida com a área de ce o criador no parto. A búfala entra na área tal a seleção das búfalas a serem insemi-
troca do touro dever ser baseada em recreio na ilharga da maromba destinada reservada da maromba quando começa a dar nadas pois a cria herda características
critério de escolha objetivando melhor aos bezerros.   sinais de parto e fica até o bezerro ter cinco do pai e da mãe. Como critério sugere-se
produtividade. Não basta trocar por dias de vida. escolher as búfalas por produção de leite,
trocar. É necessário que o reprodutor ganho de peso, que sejam boas criadeiras
tenha boas características. Para isso é (evitando búfalas que rejeitam ou deixam
importante ter informações dos pais: se os filhos escondidos na mata), de bom
a mãe tem boa produtividade de leite, temperamento (evitando búfalas agressi-
se as filhas também apresentam boa vas) e bom úbere e bicos bem definidos, e
produtividade e, sobretudo, se o animal de fácil ordenha. Do ponto de vista sanitá-
é saudável. Um reprodutor contami- rio, é fundamental trabalhar apenas com
nado com a bactéria Brucella abortus, animais imunizados para brucelose e com
causadora da brucelose, pode contami- exame de tuberculose.
nar um rebanho não imunizado inteiro,
ocasionando perda da produção pro- As búfalas devem ser inseminadas 12
vocada por abortos além dos riscos de horas depois da identificação do cio, que é
contaminação humana. caracterizado pela inquietação do animal
e pelas búfalas se deixando montar. No
 Selecionar as melhores búfalas do caso de bubalinos as búfalas costumam
plantel para a inseminação – Avaliar entrar no cio durante a noite, e é mais di-

36  Manejo de Búfalos na Váreza Manejo de Búfalos na Váreza  37


4. Produção de queijo
Figura 13. Jiqui (brete) 4.1. Higiene na ordenha
usado para a vacinação
do rebanho. Se adapta-
do, pode ser usado para
facilitar a inseminação. A ordenha é feita manualmente nas manhãs durante o perí-
odo de lactação da búfala. Há duas formas mais comuns
para a ordenha. Na primeira, principalmente entre a terceira
semana e o segundo mês de vida do bezerro, o ordenhador faz o
procedimento durante a amamentação do bezerro. Nesse caso, nor-
As famílias criam
búfalas princi-
palmente para
produzir queijo
fícil para o criador identificar o momento Para a inseminação, é recomendado se ter malmente o bezerro mama em dois mamilos e o ordenhador retira o
exato do cio. Se o criador preferir, os ve- um jiqui (Figura 13) que deve ser cober- leite dos outros dois. Geralmente o bezerro é posto para mamar até para o mercado
terinários recomendam a inseminação em to, para conforto do produtor quando for descer o leite da búfala, quando então começa a ordenha. A segun- regional que está
tempo fixo para bubalinos. Nesse caso, o manejar o rebanho (aplicação de vacinas da forma é adotada quando o bezerro já está mais crescido e já se cada vez mais
cio é induzido pela aplicação de hormô- e inseminação), e para diminuir o estres- alimenta com capim (complementarmente), normalmente a partir
nios e o processo de inseminação geral- se do animal (estresse térmico) quando do terceiro mês de vida. Nesse caso o ordenhador prende o bezerro
exigente em ter-
mente precisa ser acompanhado por um ali estiver. Sugere-se usar cavaco ou pa- com uma corda, enquanto faz a ordenha. mos de qualidade
especialista. lha para cobrir o jiqui. Telhas de amianto do produto.
não são recomendadas por aumentarem o Para essa atividade não foi possível ob-
Para a inseminação é necessário ter: calor. servar cuidados higiênicos convencionais,
como a limpeza das mãos e dos mamilos
Botijão – O botijão serve para manter Como a inseminação é feita buscando das búfalas. O período mais crítico é no
o sêmen congelado com nitrogênio e pre- a melhoria da raça e a superação dos pro- início das chuvas, pois os tetos ficam su-
cisa ser reabastecido periodicamente. blemas de consanguinidade, é recomen- jos de barro. Nesse período os produtores
dado que o criador garanta que os bezer- lavam os tetos antes do início da orde-
 Sêmen – O criador pode escolher o ros tenham leite suficiente para mamar, nha. O período de cheia é considerado o
sêmen com base nas características do o que vai garantir seu desenvolvimento mais higiênico pelos produtores, pois os
animal que ele quer (tamanho, produ- inicial. Buscando a melhoria do plantel, tetos estão limpos. Para a higiene na or-
ção de leite, peso). No Pará, a Cebran alguns criadores recomendam não tirar o denha duas práticas são fundamentais:
(Central de Biotecnologia em Reprodu- leite das búfalas inseminadas, para per- 1. Levar o gado para a água para banhar-
ção Animal) localizada no município mitir que os bezerros atinjam 300 kg já no se antes da ordenha
de Castanhal, comercializa sêmen de primeiro ano de vida.   2. Construir um curral-maromba com fon-
bubalinos. te de água para facilitar a higienização
Figura 14. O queijo é parte da alimentação e dos tetos. O leite deve ser transportado
 Aplicadores e luvas – Para a intro- fonte de renda garantida para os criadores em recipientes fechados até as queijarias
dução do sêmen. de búfalos. (Figura 14).

38  Manejo de Búfalos na Váreza Manejo de Búfalos na Váreza  39


mogênea. Leva-se ao fogo até formar uma Apêndice
massa elástica. Novamente é posto em Custos para a implantação e piqueteamento com o uso de cerca
peneiras para desidratar o soro. A massa elétrica de três hectares de pasto em área de capoeira.
é temperada com sal e levada ao fogo em Custo Custo
Atividades Finalidades Unidade Quantidade
um tacho com manteiga de búfala satu- unitário (R$) total (R$)
rada até fritar. Uma vez frito, é posto em PREPARO DA ÁREA
recipiente com capacidade para a quan- Roço da capoeira Preparo da área Diárias 50 30,00 1.500,00
tidade produzida (forma de plástico com (outubro) para plantio
capacidade média de 1 a 10 kg). Plantio com mudas Acelerar a formação Diárias 50 30,00 1.000,00
de quicuio e evitar ataques de
pragas que ocorrem
A Agência de Defesa Agropecuária do em plantio por
Estado do Pará (Adepará) impõe restri- semente
ções à comercialização do queijo, parti- Transporte das Buscar as mudas Frete 1 180,00 180,00
cularmente fora do município de origem. mudas
Como os produtores de queijo da região Roço 1 (junho) Roço da juquira para Diárias 30 30,00 900,00
não têm nenhum registro, a Adepará abrir espaço para o
desenvolvimento do
proibiu a saída de queijo do município de capim
Porto de Moz e estabeleceu prazo de dois Roço 2 (janeiro) Roço da capoeira Diárias 20 30,00 600,00
anos, ainda em 2008, para os produtores para abrir espaço
se regularizarem junto aos Sistemas de para o desenvolvi-
Figura 15. Leite coalhado em processo de retirada do soro. Os produtores Inspeção Sanitária. mento do capim
tradicionais de queijo enfrentam o desafio de aprimorarem a higiene no CERCA
processo de fabricação para garantir mercado. As recomendações aqui apresentadas Arame liso flexível Cerca Metro 2.000 300 500,00
são feitas buscando melhores resultados Isoladores Isolamento dos fios Unidade 160 1,00 160,00
higiênicos na ordenha e no manejo do lei- Estacas Suporte para os Unidade 80 5,00 400,00
te, mas não atendem as exigências sanitá- arames
4.2. Produção de queijo rias da Adepará em sua totalidade. Para Eletrificador Eletrificar arame Unidade 1 100,00 100,00
obtenção do selo de inspeção sanitária de Aterramento Condutor de desvio Unidade 3 10,00 30,00

D epois da ordenha, o leite passa por


um crivo para retirar parte das im-
purezas e fica em repouso durante
aproximadamente 24 horas em recipiente
de plástico, até coalhar. Depois é posto em
produtos artesanais comestíveis, incluin-
do o leite e seus derivados, recomenda-
se pesquisar na Lei estadual/PA Nº 7.565
de 25 de outubro de 2011, regulamenta-
da pelo Decreto Nº 480 de 12 de julho de
Conectores do
aterramento
Porteira eletrificada
Mão de obra
Kit pára-raios
Conectar fios

Fechar piquetes
Instalação
Desvio de descarga
Unidade

Unidade
Diárias
Unidade
3

1
2
1
1,00

30,00
30,00
30,00
3,00

30,00
60,00
30,00
sacas de fibra para o processo de desidra- 2012. Os procedimentos burocráticos para elétrica
tação (retirada do soro) (Figura 15). Quan- pedido de registro são apresentados na Esticador de arame Esticar os arames Unidade 10 2,00 20,00
(bobi)
do desidratada, a coalhada é misturada portaria Nº 025, publicada pela Adepará,
ao leite cru até formar uma mistura ho- em 25 de fevereiro de 2013.  TOTAL 6.013,00

40  Manejo de Búfalos na Váreza Manejo de Búfalos na Váreza  41


Extração
Tradicional
de Madeira
Marlon Costa de Menezes, Cláudio Wilson Soares
Barbosa, Gabriel Medina, César Augusto Tenório de
Lima, Nayra Glaís Pereira Trindade e Thaynara Viana
Cavalcante

Famílias que trabalham com


extração de madeira de forma
tradicional apresentam suas
experiências em busca de
alternativa para os planos
tecnicistas de manejo florestal
que se mostraram inacessíveis
para os moradores da Amazônia.

42  Extração Tradicional de Madeira Extração Tradicional de Madeira  43


Estado
do Pará

Figura 1. A madeira é parte da Brasil


vida das populações ribeirinhas
da Amazônia, com diversos
usos locais e comerciais.

Porto de Moz

P rodutos florestais são fundamentais


para o meio de vida tradicional das
populações ribeirinhas da Amazô-
nia, servindo tanto para construções lo-
cais quanto como fonte de renda quando Estado do Pará
comercializados (Figura 1). Em Porto de
Moz, a madeira é o principal produto ex- Porto de Moz
traído da floresta e sua exploração comer-
cial passou por quatro ciclos principais: Legenda
Limite do Municipio de Porto de Moz
RESEX Verde para Sempre
 De 1970 a 1982 – Produção de ma- Comunidades e Localidades
deira lavrada a machado, serrada com Extração de madeira
o serrotão e extração de madeira em
tora, principalmente de espécies de Figura 2. A extração de madeira tradicio-
baixa densidade chamadas de madeira A criação da Reserva Extrativista (Resex) nalmente é uma das atividades mais impor-
branca; Verde para Sempre, em 2004, encerrou o tantes para a população rural da Amazônia.
processo de apropriação das terras e a ex- Das 107 comunidades e localidades rurais de
 De 1982 a 1990 – Entrada de pe- ploração florestal praticadas por grandes Porto de Moz (89 dentro da Resex e 18 fora
quenos madeireiros locais trabalhando empresas madeireiras. Mas parte impor- da Resex), em 64 há famílias trabalhando
com bufetes (caminhões velhos) para a tante das comunidades que estão em área com madeira.
retirada de madeira de alta e baixa den- de terra firme ainda hoje complementa
sidades mais distantes das vias fluviais; seu sustento com a produção de madei-
ra em tora, madeira serrada, móveis rús-
 De 1990 a 1996 – Introdução de má- ticos, barcos, canoas e remos. A maior
quinas pesadas por grandes empresas parte das comunidades produz madeira
e disputa por grandes áreas de floresta
para a retirada da madeira;

 De 1996 a 2004 – Elaboração de


planos de manejo empresariais, muitas
serrada com o uso de motosserra (esteio,
falca, barrote, flechal, viga, tábua e ripa) e
fabrica canoas e barcos de pequeno e mé-
dio portes para o mercado local e regional.
Em Porto de Moz, 64% das comunidades
N este capítulo, é feita uma breve caracterização das práticas
tradicionais de uso florestal madeireiro desenvolvidas em
pequena escala pelas famílias rurais de Porto de Moz, em es-
pecial das comunidades do interior da Resex Verde para Sempre. O
capítulo também trata das possibilidades de reconhecimento dessas
vezes em áreas griladas, e apropriação e localidades rurais têm famílias que tra- práticas por parte dos órgãos ambientais como alternativa às nor-
dos espaços de uso das comunidades balham com madeira em maior ou menor mas dos planos convencionais de manejo florestal que geralmente
ou famílias. escala (Figura 2). estão muito distantes das condições das comunidades.

44  Extração Tradicional de Madeira Extração Tradicional de Madeira  45


1. Práticas tradicionais Figura 3. A madeira
retirada pelas famílias
de uso florestal em Porto de Moz serve
tanto para a construção
local de barcos, casas
1.1. Definição das espécies de interesse e marombas (currais
suspensos) quanto para

A espécie é definida no ato da encomenda feita pelo compra-


dor, que determina ao extrativista a espécie, o tamanho e a
quantidade de peças, de acordo com o mercado de destino.
A principal espécie explorada pelas comunidades em Porto de Moz é
a itaúba (Mezilaurus itauba) por sua alta densidade e durabilidade.
a comercialização no
mercado local. Itaúba
e piquiá são espécies
com maior demanda
pela diversidade de
A itaúba é altamente resistente à água e utilizada em praticamente usos, em particular nas
todos os tipos de construções rurais e naval. embarcações.

Para a confecção de braços para as em- (Vochysia paraensis), marupá (Simarou- mília explora sua área individual de explorar madeira. Em geral, essas áre-
barcações, o piquiá (Caryocar villosum) ba amara) e cedrorana (Cedrelinga cata- acordo com suas necessidades, força as concentram os maiores estoques de
é a espécie mais utilizada (Figura 3). Para eniformis), são usadas para paredes de de trabalho e espécies disponíveis. A madeira e funcionam como reserva da
a produção de móveis são usados muira- casas e barcos. exploração nessas áreas tem diminuído comunidade que a demarcou para uso
catiara (Astronium lecointei), angelim- bastante em função da redução dos es- futuro ou para a elaboração de plano de
pedra (Hymenolobium petraeum), ange- 1.2. Definição da área toques das principais espécies. manejo.
lim-rajado (Marmaroxylon racemosum),
louro-faia (Euplassa pinnata), cedro-chei-
de exploração  Áreas comunitárias – Mais de 10  Áreas de livre acesso – Essas áreas
roso (Cedrela odorata) e marupá (Sima-
rouba amara). Espécies de alta densidade
como maçaranduba (Mani lkara huberi),
cumaru (Dipteyx odorata), ipê (Handro-
anthus serratifolius e Handroanthus im-
A madeira é retirada principalmente
em três tipos de áreas, concebidas
a partir de seu uso:

 Áreas particulares – Os lotes par-


comunidades demarcaram áreas co-
munitárias para resistir à invasão das
madeireiras antes da criação da Resex.
A exploração acontece em área comum,
normalmente demarcada nos fundos
geralmente estão nas cabeceiras de iga-
rapés ou em estradas abandonadas por
empresas madeireiras, afastadas dos
núcleos comunitários e dos lotes indi-
viduais. Elas normalmente são explora-
petiginosus), jatobá (Hymenaea courba- ticulares são geralmente áreas de 100 das áreas particulares. Seu uso acon- das por grupos de famílias específicos,
ril) e angelim-vermelho (Dinizia excelsa) ha localizados nas margens dos rios tece a partir de normas estabelecidas às vezes de diferentes comunidades,
são destinadas, sobretudo, para o merca- e, embora não tenham marcos físicos pelo conjunto de moradores de uma embora seja mais comum que famílias
do de Belém. Já madeiras brancas, como estabelecidos, são reconhecidos pelos determinada comunidade que, em tese, da mesma comunidade trabalhem jun-
jabutirana (Erisma uncinatum), quaruba moradores de maneira informal. A fa- não aceita a entrada de estranhos para tas. Esse, a princípio, parece um caso

46  Extração Tradicional de Madeira Extração Tradicional de Madeira  47


clássico de recursos de livre acesso e, tadas normalmente são exploradas por Força de trabalho – Para o extra- para áreas mais fechadas. Quando a área
portanto, de difícil governança (OS- grupos de famílias sem normas estabele- tivista que trabalha sozinho, árvores ao redor do tronco é relativamente limpa,
TROM, 1990). Mas, na maioria dos ca- cidas.   acima de 400 cm de circunferência são o motosserrista não costuma fazer rota de
sos, áreas específicas são exploradas difíceis de serem posicionadas para a fuga.  
por grupos específicos de famílias e 1.3. Seleção das árvores serragem, por isso não são preferen-
podem ser consideradas áreas de uso ciais para abate. 1.5. Processamento

No sistema
comum gerenciadas por um grupo mais
privativo que uma comunidade maior.

De modo geral, a escolha da área a ser


explorada é feita a partir da espécie dese-
D ependendo da quantidade deseja-
da, a exploração (inventário) das
árvores é realizada da seguinte
forma: a) durante as caçadas, as árvores
são encontradas e mapeadas mentalmen-
Os serradores fazem o teste de oco antes
da derruba a partir do atrito do facão ou
machado no tronco das árvores e análise
do som emitido. Árvores que têm oco pro- A
(serragem)
serragem da madeira é realizada
no próprio local de queda da árvo-
re, utilizando-se apenas a motos-
tradicional, a jada, da proximidade das vias de acesso te, tendo como referência um igarapé, um duzem eco mais forte (agudo), as que te- serra para desdobro. A árvore é serrada
madeira é retira- (estrada aberta por empresas e abando- caminho aberto (pique) ou uma área mais oricamente não têm produzem som mais em tora de acordo com o comprimento de-
da de diferentes nadas ou vias de acesso por igarapés) e elevada da floresta; b) por meio de infor- grave. Alguns serradores também fazem o sejado para as peças. Em seguida, a tora é
da ausência de conflito com moradores mações de áreas com incidência de deter- teste através da perfuração com a ponta marcada com uma linha (barbante) envol-
áreas cuja ges- das proximidades. Quando a exploração minadas espécies transmitidas entre os do sabre da motosserra (em posição ho- vida em óleo queimado (óleo lubrificante
tão fica a cargo é feita em pequena quantidade, ela ocor- extratores; e c) no modo convencional de rizontal) até o âmago da árvore. Árvores já usado e com coloração escura) (Figura
de cada família, re principalmente nos lotes particulares. procura na floresta pelas espécies de in- que apresentam sinais de terra ou perfu- 4). A primeira serragem divide a tora em
No entanto, comunidades que têm áreas teresse. Um mateiro é capaz de caminhar ração sem pó (buraco sem terra) são con-
de grupos de
comunitárias estão explorando ou plane- vários quilômetros em floresta fechada sideradas impróprias para o abate. Feito
famílias ou de jam explorar essas áreas. Famílias que já sem instrumento de orientação e retornar esse procedimento e constatando-se que Figura 4. Desdobro da
A
comunidades. exploraram os lotes particulares e moram ao final do dia para o ponto de partida. não há oco, a árvore é derrubada para a madeira por extrativis-
em comunidades que não têm área comu- direção em que ficam os galhos mais pe- tas da Resex Verde para
nitária, buscam áreas afastadas e de livre 1.4. Derruba sados. Algumas espécies, como a muira- Sempre: a) marcação
acesso e são suscetíveis a conflitos na dis- catiara, por exemplo, apresentam tronco da tora com barbante e
puta com outros moradores.

O tipo de área explorada tem influência


na forma como é feita a gestão do recur-
so. Nos lotes particulares, é comum que a
P ara o abate das árvores de interesse,
normalmente são adotados três cri-
térios básicos:

 Tamanho da árvore – Rodo (circun-


oco a até três ou quatro metros de altura e
o restante do caule sólido.

Para a derruba, primeiro realiza-se um


corte horizontal no tronco a cerca de 40
óleo queimado e
b) serragem das peças
com motosserra.

família dona da área faça a exploração ou ferência) acima de 200 cm e tronco a 50 cm de altura do chão (quando não
venda a árvore em pé para serradores da (fuste) acima de 5 m de comprimento há sapopema), seguido de outro corte dia-
comunidade, que pagam, em média com e reto; gonal, até o encontro dos dois, abrindo B
30% da produção. Nas áreas comunitá- uma boca em formato de triângulo. Os ri-
rias, as iniciativas em curso têm conside-  Logística de transporte – Distância beirinhos chamam esse procedimento de
rado os acordos firmados entre os mora- entre a localização da árvore e a mar- “fazer a cara”. Depois o corte é realizado
dores e, em alguns casos, inclui benefícios gem do igarapé, dependendo do meio do lado oposto (costa) até o tombamento
para a comunidade quando a floresta é de transporte disponível; inicial da árvore. A rota de fuga é feita do
explorada comercialmente. As áreas afas- lado oposto ao direcionamento da queda,

48  Extração Tradicional de Madeira


duas partes (bandas), que são posiciona- menos, duas pessoas para puxá-lo e caminhões velhos e, por isso, financei-  Calango – Sistema de transporte uti-
das com o lado da serragem para cima. apoiar a madeira. Somente é utilizado ramente mais acessíveis para as comu- lizado para conduzir a madeira em tora
Novamente a madeira é marcada com o para o transporte de madeira serrada. nidades, embora sejam raros os casos até as margens de um rio ou local de
barbante nas laterais, para a primeira ser- O uso do rodado é restrito a locais que de comunidades ou famílias que possu- serragem, normalmente utilizado em
ragem de retirada do brancal (alburno) de não são alagados e a áreas com pouco am um no município. Por seu tempo de distâncias curtas. Consiste na constru-
ambos os lados da banda. declive. uso, geralmente apresentam alto custo ção de uma estiva em forma de trilho,
de manutenção e, em muitos casos, feita com varas. A tora é colocada em
A partir desse procedimento, são retira-  Tração animal – Composto por uma não têm documentos. Os bufetes foram um suporte, também confeccionado
das as peças que sofrem um segundo cor- carroça com rodas e um animal para a muito usados na época da exploração com varas e deslizada sobre as estivas
te na parte que fica para o lado de baixo tração. Na Resex, apenas uma comu- de madeira por pequenos madeireiros empurradas com o auxílio de machados
da serragem. O corte para a retirada das nidade tem três animais da espécie locais. cravados na tora, até o destino final.
peças é sinalizado com a utilização do bubalina usados no transporte de ma-
“graminho”, instrumento feito de madeira deira serrada. O búfalo entra na mata e
em formato de “L” com um prego fixado arrasta a madeira serrada apoiada em
de acordo com a espessura da peça, com a uma estrutura chamada “jacaré”, até A B
ponta saliente cerca de 1 mm.  a estrada mais próxima. A partir daí a
madeira é embarcada na carroça, que
1.6. Transporte é puxada pelo animal até a margem do
rio ou igarapé.

O transporte é feito com o uso de


rodado, tração animal (normal-
mente com búfalos), jerico (micro-
trator), bufete (caminhão velho) ou manu-
almente carregando-se a madeira serrada
 Jerico – Possui grande versatilidade,
podendo ser utilizado não apenas no
transporte da madeira serrada, mas du-
rante todo o ano de maneira integrada
ou deslocando-se as toras com o calango a atividades agrícolas, além de trans-
(Figura 5). Para as famílias que têm acesso portar cargas. Apesar disso, são poucas
ao bufete ou jerico, as árvores são proces- as comunidades que possuem jerico, C D
sadas em até cerca de 8 km das margens por causa de seu alto custo. As famílias
dos rios ou igarapés, que servem como via com pouco capital para investir usam o
de escoamento. Para as famílias que usam rodado, e outras com um pouco mais de
rodado ou tração animal, as árvores são capital, preferem o bufete, que é de uso
processadas no máximo a 3 km das mar- mais tradicional na região, geralmente
gens dos rios e igarapés. As características comprado de extratores de madeira.
dos principais sistemas de transporte usa-
dos são:  Bufete – Para o transporte com ca-
minhão do tipo bufete, precisa-se do
 Rodado – Sistema que requer maior motorista (que também ajuda a colocar
esforço físico dos extrativistas, não as peças na carroceria) e mais duas pes-
sendo recomendada sua utilização em soas para colocar as peças em cima do Figura 5. Tipos de transporte utilizado pelas comunidades da Resex Verde para Sempre para o deslocamento da madeira
longas distâncias. São necessárias, pelo caminhão. Os bufetes geralmente são serrada da floresta até a margem dos rios: a) rodado, b) jerico com carroça adaptada, c) bufete e d) calango.

50  Extração Tradicional de Madeira Extração Tradicional de Madeira  51


Após a saída das empresas, as famílias ção rasteira com facão ou foice, seguida Quadro 1. Principais usos da madeira em Porto de Moz e sua relação
A madeira está passaram a utilizar as estradas principais da derruba de árvores mais grossas com com as outras atividades produtivas.
presente em já abertas por máquinas e a abrir peque- motosserra e posterior destoca. O traba- Atividades Uso da madeira Principais espécies utilizadas
todas as ativida- nos ramais laterais que permitem a entra- lho de abertura dos meios de acesso para Pesca Construção das embarcações e casas para Itaúba, piquiá, jabutirana, quaruba, marupá e cedrorana
da de bufetes ou o transporte com roda- o transporte das peças é posterior à sua beneficiamento do pescado
des: da moradia
do. Para o uso do caminhão, a largura do serragem. Isso evita que o produtor des- Criação de gado Principalmente para as famílias que criam na várzea: Itaúba, maçaranduba, jarana, piquiá, acapu e pau-ferro
à produção. ramal é de 3,5 a 4 m e, para o rodado, de perdice seu trabalho, pois, se o ramal fos- construção de marombas, currais, jiquis e cercas
cerca de 1,5 m. Esse trabalho é realizado se aberto primeiro e as árvores fossem Instalações e Praticamente todas as moradias são construídas de ma- Itaúba, jabutirana, quaruba, marupá, cedrorana, cupiú-
em área com muitas espécies para serem impróprias para serem transformadas moradias deira. Na área de várzea há forte demanda de madeira ba e frangueiro
dura para a construção de trapiches interligando as
exploradas e permite às famílias utilizá- em peças, haveria perda de tempo e re- moradias para o período das cheias. Na cidade, grande
las por vários anos. cursos. Os ramais normalmente são aber- parte da população mais pobre compra madeira dos ri-
tos em direção às peças que deverão ser beirinhos para a construção e reforma de suas moradias
A abertura dos ramais é feita de for- transportadas. Movelaria Uma atividade importante que oferece trabalho e renda Muiracatiara, angelim-pedra, angelim-rajado, louro-faia,
ma manual com a roçagem da vegeta- para a população urbana é a moveleira. Praticamente cedro-cheiroso e marupá
toda a matéria-prima vem do interior da Resex Verde
Ao chegar às margens dos igarapés para Sempre
(porto de transbordo), as peças são trans-
portas em rabetas ou canoas até o rio
principal. Depois são transportadas em ção de casas, currais, marombas, cer- de moradias das camadas mais pobres
embarcações maiores até a cidade ou ou- cas e embarcações. A maior demanda da população urbana que não conse-
A engrenagem
tro local de destino.   é das famílias que moram em área de guem comprar madeira nas serrarias do sistema tra-
várzea que, por não possuírem flores- em função do preço. A madeira é entre- dicional é movi-
1.7. Mercado ta, compram das comunidades da terra gue na sede dos municípios, a partir de mentada pelos
firme, a madeira necessária para as ins- encomendas.

A produção de madeira serrada é de talações rurais. A produção de madei- compradores


grande importância para a repro- ra para essa demanda é feita de duas  Marreteiro – O marreteiro vende que adiantam os
dução dos modos de vida no mu- formas: a) o interessado, com parentes a prazo, para o extrativista, produ- recursos neces-
nicípio de Porto de Moz (Quadro 1), prin- ou amigos que moram na terra firme, tos de primeira necessidade e recebe
cipalmente para a população mais pobre vai até a floresta na companhia de seu o pagamento em madeira serrada. Ele
sários às famílias
(Figura 6). E se relaciona com todas as conhecido e retira a madeira desejada; também adianta insumos necessários para produção da
atividades produtivas existentes. b) o interessado faz a encomenda das à serragem da madeira e/ou troca por madeira.
peças desejadas ao extrator de uma co- alimentos e vestuário para, depois,
A demanda local por madeira estabelece munidade para recebê-las no porto ou descontar do valor total da madeira a
um mercado relevante para as famílias buscá-las no local onde foi processada. ser adquirida. Esse tipo de mercado é
que é somado à demanda dos mercados o mais antigo da região, funcionando
de Porto de Moz e de outros municípios.  Consumidores na sede municipal como sistema de aviamento desde os
Os principais sistemas de comercialização – A madeira é vendida na cidade para tempos da produção de látex. Ao ofe-
da madeira são: os moveleiros, para os donos de plai- recer a mercadoria, o marreteiro anun-
nadeiras, usadas para o desengrosso cia também produtos de interesse para
Figura 6. A madeira é parte da vida das populações ribeirinhas, sendo  Consumidores locais – A principal da madeira, e para particulares. Nor- receber em pagamento, como madeira,
usada para a construção de embarcações, marombas, casas e móveis. demanda por madeira é para a constru- malmente é destinada à construção farinha, animais de criação e caça. Na

52  Extração Tradicional de Madeira Extração Tradicional de Madeira  53


subida do rio, os produtos são vendi- tes de entrar no mercado. Nesse tipo de
dos e, na baixada, o marreteiro vem mercado, o atravessador estabelece o
recolhendo os produtos em pagamento. preço pago por cada espécie em função
Nessa prática de escambo, quanto mais do acordo que ele tem com a indústria
distante da sede do município, maiores (Figura 7).
são os preços dos produtos vendidos
e menor o valor do produto recebido Algumas espécies são serradas por medi-
como pagamento. da padrão, como a falca de itaúba, com 3
ou 4 cm de espessura, 18 cm de largura e
Atravessador (mercado regional) até 10 m de comprimento (Quadro 2). As
– Diferente do marreteiro, o atraves- falcas são usadas principalmente para for-
sador adianta os insumos ou compra a ro de barco, assoalho de casas, trapiches e
madeira com pagamento em dinheiro. construção de marombas. A unidade de
A produção é revendida para as indús- medida mais usada na comercialização
trias madeireiras que reprocessam e das peças é o palmo (um palmo equivale
“esquentam” (legalizam) a madeira an- a 20 cm lineares da peça).  

Figura 7. A madeira produzida é comercializada com consumidores locais, regionais, marretei-


Quadro 2. Tipo, dimensão e valor das peças da espécie itaúba produzidas pelos extrativistas das
ros e atravessadores. É comum que o investimento necessário para a exploração seja finan-
comunidades da Resex Verde para Sempre, Porto de Moz – PA.
ciado pelos compradores e é esse recurso adiantado que movimenta o sistema tradicional de
Dimensão (m) Quantidade de Valor da peça Quantidade de Valor do
Produtos extração madeireira.
Largura x Espessura Comprimento palmos (R$) peças por m³ m³ (R$)
Falca 0,18 x 0,04 4,00 20 16,00 35 560,00
0,18 x 0,04 6,00 30 24,00 23 552,00
0,18 x 0,04 8,00 40 32,00 17 544,00 1.8. Organização de pessoas conhecidas que trabalham em
0,18 x 0,04 10,00 50 40,00 14 560,00
Caibro 0,07 x 0,04 2,00 10 5,00 179 895,00
produtiva conjunto.

Esteio
0,07 x 0,04
0,07 x 0,04
0,11 x 0,11
0,11 x 0,11
4,00
6,00
2,00
4,00
20
30
10
20
10,00
15,00
8,00
16,00
89
60
41
21
890,00
890,00
328,00
336,00
T odo o sistema de organização está
baseado em laços de parentesco
existentes entre famílias. Portanto,
a forma mais comum de organização para
a atividade madeireira é entre membros
Na divisão do trabalho de extração da
madeira, existem diferentes funções. A
função de serrador fica para os que têm
maior resistência física, habilidade para
cortar as peças com precisão e afiar a cor-
0,11 x 0,11 6,00 30 24,00 14 336,00
Viga 0,11 x 0,04 2,00 10 4,00 114 456,00 de uma família ou em núcleos familiares, rente, e conhecimento do equipamento
e não de forma comunitária (envolvendo para realizar consertos quando há proble-
0,11 x 0,04 4,00 20 8,00 57 456,00
todas as famílias de uma comunidade). A ma mecânico. Cada serrador normalmen-
0,11 x 0,04 6,00 30 12,00 38 456,00
organização em núcleos familiares pode te tem um ajudante para bater a linha
0,11 x 0,04 8,00 40 16,00 29 464,00
ser explicada pelas relações de confiança (marcador), empilhar as peças serradas,
0,11 x 0,04 10,00 50 20,00 23 460,00
estabelecidas entre membros das famílias riscar com o graminho e ajudar a colocar
Barrote 0,07 x 0,04 5,00 25 12,50 71 887,50 e pela necessidade de um número mínimo a peça na posição ideal para o serrador

54  Extração Tradicional de Madeira Extração Tradicional de Madeira  55


(Figura 8). A atividade que requer o maior dono da motosserra entra com a máquina Quadro 3. Principais funções das equipes de extração da madeira em campo.
Diferente do que número de pessoas envolvidas é o trans- e os acessórios sobressalentes (correntes, Função Atividades realizadas
é promovido no porte das peças serradas da floresta até a sabres e limas), enquanto o “dono do tra- Mateiro (explorador) Pelo conhecimento que possui da floresta, localiza as árvores a serem extraídas e as identifica classifi-
manejo florestal margem do rio (baldeio), que necessita em balho” fornece apenas o combustível. cando sua destinação
torno de 3 a 5 pessoas (Quadro 3). Fatores Motosserrista Faz o teste do oco (se for o caso), derruba as árvores e serra as peças
comunitário, a
como a distância, meio de transporte uti- Em poucas comunidades existem mo- Ajudante do motosserrista Limpa as rotas de fuga (se for o caso), ajuda no posicionamento das toras para a serragem das peças,
exploração tra- lizado e tamanho das peças determinam radores que compram madeira dos produ- faz as marcações na madeira e retira as peças serradas do local
dicional de ma- a estratégia de transporte a ser adotada. tores para revenda. Quando ocorre é por Preparador de ramais Faz o roço e destoca e, quando usado o calango para o transporte das peças, faz a “estiva”
que alguém tem um barco com capacida- Motorista Dirige o bufete ou jerico e ajuda no carregamento das peças para o veículo
deira está orga-
É muito comum entre os produtores a de para transportar alguns metros de ma- Carregadores Carregam as peças para o veículo ou as transportam nos meios disponíveis
nizada em torno troca de dias de trabalho nas atividades de deira até a cidade. Cozinheiro Prepara a comida para os que estão trabalhando
de relações de transporte e serragem das peças e a con- Caçador (quando necessário) Vai em busca de caça para alimento
confiança entre tratação de diaristas. Na troca de dias, o Além desse sistema organizado em nú- Negociante da comunidade Embarca a madeira na beira do rio e transporta rumo à cidade para negociação ou armazena à espera
primeiro beneficiado paga com seu traba- cleos familiares, parte das comunidades do comprador (marreteiro ou atravessador)
membros de uma
lho o mesmo número de dias que recebeu do interior da Resex Verde para Sempre
família ou grupos na mesma atividade. Já na contratação tem empreendido esforços e recursos na
de famílias. de diarista, o pagamento é feito de acor-
do com a atividade. Para as atividades de
transporte de peças, o valor da diária tem
constituição de associações comunitárias
com a finalidade de aprimoramento do
gerenciamento das atividades, através de
2. Reconhecimento das Planos de ma-
como base o salário mínimo vigente. Para
operador de motosserra, há dois tipos de
planos de manejo florestal comunitário.
Esse novo modelo de organização social
práticas tradicionais nejo florestal
comunitário
diárias: um, quando o operador é dono do
equipamento (cerca de R$ 150,00), e outro
quando se contrata apenas o serviço (cer-
ca de R$ 80,00). Para o primeiro caso, o
torna-se mais abrangente por extrapolar
a organização dos núcleos familiares, mas
também torna-se mais complexo à medi-
da em que agrega praticamente todos os
membros de uma comunidade com ou
O maior desafio das famílias em Porto de Moz é o reconheci-
mento legal de suas práticas tradicionais de uso florestal. As
exigências formais do Plano de Manejo Florestal Sustentável
(PMFS) são muito distantes das práticas tradicionais, dos interesses
e das capacidades das comunidades. Como alternativa, as famílias
promovidos pelo
governo e ONGs
ficaram restritos
a poucos projetos
sem laços de parentesco e confiança. têm buscado o reconhecimento de seu sistema de uso da floresta piloto, altamen-
por parte dos órgãos ambientais, fazendo com que seja respeitado o
te subsidiados e
Nesse novo modelo de organização há modo de vida e os costumes locais, ou ao menos, adaptado nas re-
disputas em função do controle do núcleo gras do manejo os métodos tradicionais de extração dos produtos da sem viabilidade
Figura 8. Membros das diretivo da sociedade, com predominân- floresta, por meio de práticas mais simplificadas e de baixo impacto. financeira. Al-
famílias se organizam cia da direção nas mãos dos represen- ternativas mais
para a extração de ma- tantes das famílias mais numerosas das
próximas dos in-
deira assumindo tarefas comunidades. Igualmente, os custos com 2.1. Marco legal nº 6.040, de 07 de fevereiro de 2007, que
teresses, capaci-
que vão da exploração a legalização e manutenção burocrática institui a Política Nacional de Desenvolvi-
florestal até a comercia-
lização, função funda-
mental desempenhada
pelo serrador e seu
ajudante.
das associações ou cooperativas, têm tor-
nado muitas delas inativas, com dívidas
na Receita Federal e com baixo impacto
na melhoria da geração de renda para as
famílias/pessoas associadas.  
A s famílias que trabalham com ma-
deira em Porto de Moz se enqua-
dram na definição de população
tradicional adotada tanto por estudiosos
quanto pelo Estado. O decreto presidencial
mento Sustentável dos Povos e Comunida-
des Tradicionais, define as comunidades
tradicionais como grupos “culturalmente
diferenciados e que se reconhecem como
tais, que possuem formas próprias de or-
dades e práticas
tradicionais das
famílias precisam
ser apoiadas.
Extração Tradicional de Madeira  57
ganização social, que ocupam e usam ter- diferentes instrumentos administrativos
ritórios e recursos naturais como condição para regular o acesso e uso. Nas Resex, o
para sua reprodução cultural, social, reli- Instituto Chico Mendes de Conservação da
giosa, ancestral e econômica, utilizando Biodiversidade (ICMBio) aplica as normas
conhecimentos, inovações e práticas gera- técnicas contidas na Instrução Normativa
dos e transmitidos pela tradição” (BRASIL, nº 16, de 04 de agosto de 2011. Nos assen-
2007, Art. 3º, I). tamentos da reforma agrária, aplicam-se
as normas contidas na Instrução Normati-
No contexto da população da Resex va nº 65 de 27 de dezembro de 2010, emiti-
Os órgãos am- Verde para Sempre, o Art. 18 do Sistema da pelo INCRA. Em áreas de jurisdição dos
bientais podem Nacional de Unidades de Conservação estados aplicam-se diferentes instrumen-
adaptar facilmen- (SNUC) determina que um dos objetivos tos para garantir o controle por parte das
te as normas do básicos das reservas extrativistas é “pro- secretarias estaduais de meio ambiente.
teger os meios de vida e a cultura dessas
manejo florestal populações e assegurar o uso sustentável Se a lei assegura a proteção dos meios
às condições das dos recursos naturais da unidade”. A Re- de vida da população, cabe, portanto, ao
comunidades, serva Extrativista, segundo o SNUC (Lei Estado promover os meios necessários
nº 9.985/2000), é uma área utilizada por para essa garantia (Figura 9). No caso da
uma vez que elas populações extrativistas tradicionais, cuja produção de madeira, tem se mostrado Figura 9. A exploração
são feitas por subsistência baseia-se no extrativismo e, infrutífero assegurar esse direito a partir de madeira em pequena
meio de instru- complementarmente, na agricultura de da elaboração dos Planos de Manejo Flo- munidades é o investimento inicial neces- zônia. Adicionalmente, a viabilidade fi- quantidade precisa ser
ções normativas. subsistência e na criação de animais e tem restal Sustentável tal como atualmente é sário antes da produção. Para um plano nanceira de tais iniciativas é limitada por apoiada. Cabe ao Estado
como objetivos básicos proteger os meios exigido. O manejo florestal, mesmo sendo formal, é necessário investir na compra se tratar de modelos técnicos distantes da reconhecer as práticas
de vida e a cultura dessas populações e as- de exploração de impacto reduzido, não de equipamentos, na formação técnica, capacidade das comunidades (MEDINA & tradicionais de uso
segurar o uso sustentável dos recursos na- consegue responder às necessidades das na criação de entidade representativa, POKORNY, 2011). Essa situação cria um florestal.
turais da Unidade (BRASIL, 2000, Art.18). famílias extrativistas por adotar grande na contratação de responsável técnico impasse que não parece ter fim próximo,
A lei de gestão de florestas públicas para quantidade de procedimentos técnicos pelo projeto e no trâmite burocrático do senão pela ressignificação e flexibilização
produção sustentável (Lei nº 11.284/2006), que não dialogam com os conhecimentos processo. Infelizmente as comunidades das exigências normativas em favor dos
tem como um dos seus princípios o res- e práticas de exploração florestal tradicio- normalmente não têm condições de ar- extrativistas com a constituição de siste-
peito ao direito da população, em espe- nal e implicam custos elevados em sua car com esse investimento e tampouco o mas de governança locais que favoreçam
cial das comunidades locais, de acesso às implantação, muito além da capacidade Estado tem programas para subsidiar as o controle da atividade sem a imposição
florestas públicas e aos benefícios decor- de quem exerce de fato a atividade. comunidades. de normas externas, possibilitando a
rentes de seu uso e conservação (BRASIL, constituição de um manejo florestal adap-
2006, Art. 2º, III). Os custos com a elaboração e aprova- Os poucos casos em que as comunida- tativo de acordo com cada realidade local.
ção de um plano de manejo inviabilizam des da Amazônia conseguiram protocolar A ressignificação é possível uma vez que
Contudo, a legislação ambiental brasi- a produção legal de produtos florestais planos de manejo florestal conforme a instruções normativas e portarias não são
leira é categórica ao definir que produtos em baixa escala, salvo quando totalmente legislação em vigor, dependeram de sub- leis e podem ser expedidas de acordo com
florestais destinados à comercialização subsidiado (ver apêndice 1, no final des- sídios significativos do Estado que nunca a visão dos órgãos ambientais, embora
devem ter origem em um PMFS. De acor- te capítulo). Além do custo de produção estiveram disponíveis para mais que duas amparadas pela legislação vigente.  
do com a jurisdição da área, aplicam-se em si, uma grande dificuldade para as co- dezenas de comunidades em toda a Ama-

58  Extração Tradicional de Madeira Extração Tradicional de Madeira  59


2.2. Ressignificação do manejo florestal verno e monitoramento externo para ga- comunidades. Parte do desafio está na for- Quadro 4. Comparação entre sistema tecnicista
e sistema tradicional.
a partir das comunidades rantir o cumprimento do plano. mação dos profissionais da área técnica.
Em praticamente todas as formações das
Elementos Tecnicista (tal como Tradicional (tal

O
do sistema de proposto hoje pelo como descrito nesse
s grupos familiares, as comunidades e os órgãos ambientais Ao restringir o manejo florestal a mo- ciências agrárias, incluindo a engenharia gestão governo) artigo)
concordam sobre a importância do planejamento das ativi- delos técnicos, os órgãos ambientais des- florestal, muitas vezes o que se aprende é Exploração Delimitação da Delimitação da área Uso de limites naturais
dades que pode resultar em um plano de manejo florestal. O qualificam as práticas das comunidades e a fórmula de como se fazer, e não os ele- no campo área de manejo com picada, marcos e (limites de respeito) ou
plano ajuda as comunidades a atingirem seus objetivos de geração as condenam à informalidade. Mas mui- com pontos de GPS picadas
mentos fundamentais para se construir
Inventário Inventário amostral e Localização das áreas
de renda de forma planejada, a partir do melhor uso possível dos tas vezes as práticas tradicionais seguem diferentes fórmulas. Se, em vez de con- florestal inventário 100% na UPA durante as caçadas ou
recursos e ajuda também o governo a atingir os objetivos de orde- princípios similares, que buscam garantir centrar-se nas fórmulas prontas, o profis- visitas específicas para
namento e conservação das florestas, o que permite o controle da a manutenção da floresta e o controle da sional for capaz de aprender os conceitos, mapeamento mental
madeira que é comercializada. Portanto, existe consenso sobre a im- madeira (Quadro 4). Potencialmente, es- ele terá maiores condições de reconhecer Planejamento e Planejamento cartográ- A partir das árvores
construção dos fico e no local a partir derrubadas conectando
portância do planejamento para desenvolver a atividade florestal. sas práticas podem alcançar resultados as práticas tradicionais. Também é impor- ramais do inventário com ramais existentes
muito positivos e até mais eficientes do tante que o técnico perceba que, mais im- Derruba Teste do oco, direcio- Teste do oco e derruba
que os do modelo tecnicista, pois as fa- portante do que transferir seus modelos namento da queda e a partir da direção
O que precisa ser repensado e ressignifica- mílias não almejam apenas retorno eco- para a comunidade, sua função é de va- técnica de corte natural de queda
Arraste Trator de esteira, trator Tração animal, calango,
do é a forma como se faz o manejo. Para nômico. Em muitos casos, os vários ciclos lorizar o conhecimento local para a cons- (transporte) florestal (skidder), car- rodado, jerico ou
garantir a manutenção da floresta e o são garantidos pelas grandes áreas de trução do projeto de manejo participativo. regadeiras e caminhões bufete
controle da madeira, o modelo atual (res- floresta utilizadas, pela dinâmica de mer- Processamento Várias bitolas na De acordo com a enco-
paldado por estudos ainda preliminares) cado e pela baixa capacidade de explora- Para promover sistemas de manejo indústria menda, na própria flo-
resta com motosserra
aposta que a floresta manejada pode ser ção que as famílias possuem. O planeja- viáveis sugere-se:
Mercado Comercialização Mercados externos Mercados locais
explorada por vários anos se for adotado mento das ações é feito considerando os Organização Comunitária e com Família ou grupos de
um ciclo de corte definido, conforme sua conhecimentos tradicionais e buscando a  Descrever o sistema de gestão – auxílio de terceiros famílias
As famílias e co- capacidade de regeneração. A Instrução viabilidade da atividade dentro das condi- Listar todas as práticas desenvolvidas Controle Responsável Engenheiro florestal Comunidade ou atores
Normativa 05 do MMA, de 11 de dezem- ções existentes. A fiscalização e o monito- (da floresta ao mercado), identificar técnico locais
munidades fazem bro de 2006, admite tanto planos de ma- ramento podem ser feitos pelos próprios como a atividade está organizada (fa- Detentor do Pessoa jurídica: asso- Grupos familiares e
plano ciação, coope- rativa ou indivíduos
a gestão de seus nejo na modalidade pleno quanto planos grupos ou pelas comunidades que che- miliar, grupo de famílias, comunidade), empresa
recursos e os ór- de baixa intensidade. Os planos plenos gam ou podem chegar a acordos de mane- conhecer os mercados e suas implica- Protocolo do Modelo oficial (docu- Não faz
permitem o uso de máquinas para o ar- jo, similares aos acordos de pesca, muito ções e conhecer as normas de uso ou a pedido de au- mentações, mapas
gãos ambientais torização prévia e inventário florestal
raste de toras e a exploração de até 30m3/ difundidos e adotados por eles mesmos. possibilidade de sua construção;
precisam dar sig- APAT amostral
ha com ciclos de corte de 35 anos. Já os
Protocolo do pla- Toda a documentação
nificado aos sis- planos de baixa intensidade não permi- Dessa forma, é possível afirmar que as  Verificar enquadramento – Identifi- no de manejo formal e o PMFS/POA
Não faz

temas de manejo tem o uso de máquinas, mas garantem a famílias ou comunidades fazem ou podem car em cada parte do sistema de gestão, A partir da análise
exploração de até 10m3/ha com ciclos de fazer manejo florestal e que o mais impor- os elementos fundamentais e interpre- Emissão da
jurídica, geoprocessa- Não faz
locais passando corte de 10 anos (MMA, 2006). O manejo tante é garantir o reconhecimento de suas tá-los de acordo com os conceitos estru-
AUTEX
mento e técnica
a apoiá-los em florestal com exploração de impacto re- práticas e a adoção de métodos mais sim- turais do manejo florestal. Esse exercí- Guia de trans- Emitido pelo órgão li- Não faz
porte da madeira cenciador para todas as
vez de substituí- duzido também se baseia na engenharia ples dentro dos elementos estruturantes cio muitas vezes demonstra ao técnico
etapas de deslocamento
para planejar a forma de colheita florestal do sistema de manejo técnico já conheci- que as comunidades fazem o manejo
los por sistemas da madeira
e garantir a responsabilidade técnica do do. A maior dificuldade é prática, pois o florestal (ver como exemplo a primeira Monitora- Monitoramento Fiscalização (comando Não faz
tecnicistas e plano de manejo. Finalmente, concentra- corpo técnico que avalia os planos precisa parte deste artigo); mento e e controle) e relatório
padronizados. se nos mecanismos de fiscalização do go- ser sensibilizado a acatar as propostas das gestão técnico

60  Extração Tradicional de Madeira Extração Tradicional de Madeira  61


 Pensar melhorias – Se a comunida- florestais? Para a implementação de acor-
Assim como no
de quiser trabalhar melhorias, deixar dos dessa natureza, são elementos-chave:
caso dos acor- que ela planeje e consolide suas pro-
dos de pesca, as postas a seu modo, de acordo com suas  Interesse dos produtores – Os
famílias fazem condições.  acordos visam atender aos interesses
do grupo que os elaborou (famílias ou
ou podem fazer a 2.3. Elementos-chave comunidade). Quando criado sem con-
gestão dos re-
para acordos de siderar os interesses de todos os mem-
cursos florestais. bros do grupo, as chances de fracasso
O Estado pode
gestão florestal são grandes. Nesse sentido, os grupos

desempenhar o tradicional que desejarem elaborar acordos para


uso dos recursos florestais devem pau-
papel de facili-
tador de boas
práticas de ges-
tão florestal.
É inegável que as comunidades e fa-
mílias que usam tradicionalmente a
floresta e outros recursos naturais na
Amazônia têm contribuições importantes
para a manutenção e uso sustentável dos
tar as discussões com base nos inte-
resses dos produtores e avaliar quais
vantagens o acordo vai propor- cionar
(Figura 10). Medidas restritivas ou proi-
bitivas podem ser acordadas, quando
recursos naturais e podem dialogar com a oferecem vantagens para o grupo. Caso
legislação sem prejuízos recíprocos. Essas contrário, geram conflitos e têm pouca Figura 10. As famí-
experiências acumuladas têm resultado eficiência. lias têm domínio das
em acordos (conjunto de normas) cele-  Considerar o conjunto de ativida- interesse comercial e para uso, volu- informações necessárias
brados entre moradores de determinadas  Capacidade de gestão – A elabora- des antes de formular normas – As me médio explorado por família, área para o planejamento,
comunidades como forma de regular a ex- ção de um acordo é demorada e gera experiências dos acordos de pesca disponível, área sendo usada e equipa- que são compartilhadas
ploração desses recursos. discussões profundas e longas. Para se mostram que parte do sucesso de um mentos usados na produção (serragem durante as reuniões, de
chegar a um consenso, as famílias reali- acordo depende de sua integração com e transporte). modo que as decisões
Os resultados desses acordos permitem zam diversas reuniões, discutem, ama- o conjunto de atividades econômicas são tomadas a partir
às comunidades e às famílias resolverem durecem os temas para depois tomar a desenvolvidas. À medida em que o gru-  Reconhecimento do Estado – Para de informações reais e
seus conflitos e evitam que a exploração decisão final. A gestão, isto é, os cuida- po considera a dinâmica de produção alguns casos em particular, pode ser pertinentes.
predatória leve à escassez dos recursos vi- dos gerais com o cumprimento do acor- local, garantindo renda de diferentes muito importante contar com o apoio e
tais para o seu modo de vida. Um exemplo do, às vezes é tensa e de difícil consen- atividades ao longo do ano, as chances reconhecimento dos órgãos de governo,
são os acordos comunitários de pesca em so. Para isso, é importante que o grupo de sucesso são maiores. particularmente dos órgãos ambientais
que as comunidades definem, com base tenha estrutura de organização mínima que controlam a atividade madeireira.
em suas experiências e conhecimentos, as que permita a realização de reuniões, e  Informações – Criar um acordo, Na atividade florestal, a defesa das áre-
normas para a prática da atividade que, lideranças capazes de mobilizar as fa- por mais simples que seja, requer um as de exploração de invasores externos
em alguns casos são reconhecidas pelo Es- mílias para os encontros. Normalmen- conjunto de informações que permita ou a legitimação para a comercializa-
tado, com resultados eficientes. Se os acor- te, os grupos familiares têm líderes e as uma leitura objetiva da realidade. Para ção são exemplos dessa importância. O
dos de pesca têm efeitos práticos positivos comunidades têm associações comuni- um acordo sobre o uso da floresta, as apoio do governo fortalece os acordos
para o uso sustentável dos recursos pes- tárias ou coordenação de comunidades seguintes informações são essenciais: e garante às comunidades, que não
queiros, por que não experimentar e re- que cumprem o papel de mobilização. número de famílias na comunidade e têm poder de polícia, uma instituição a
gulamentar acordos para uso dos recursos envolvidas na atividade, espécies de quem recorrer em caso de conflito.  

62  Extração Tradicional de Madeira Extração Tradicional de Madeira  63


2.4. Normas do acordo ordinária) em que as atividades devem Figura 11. No plano de
acontecer. manejo técnico o Estado

N ormas não são estranhas à vida


concreta das comunidades tra-
dicionais. Todas, sem exceção,
possuem conjuntos de normas simbólico-
representativas que são repassadas entre
 Atividades não permitidas – São
definidas a partir da mesma orienta-
ção que determina o que é permitido. O
nível de reflexão envolve as melhorias
transfere para as comu-
nidades a responsabili-
dade de cumprir as nor-
mas legais, condenando
a maioria à informali-
as pessoas como forma de regular e dar desejadas e a proteção dos meios de dade. Um meio termo
significado à vida, à produção e à relação produção do grupo. Não se proíbe por precisa ser encontrado
com os meios que garantem a reprodução proibir. Proíbe-se ou não, permite-se ou entre a necessidade do
da vida (sobrevivência). não, em função das estratégias claras Estado de acompanhar
de proteção dos meios de produção. as iniciativas e as condi-
De modo geral, as normas elaboradas ções que as comunida-
pelas comunidades ou grupos de famílias  Destino da produção (consumo ou des realmente têm para
têm caráter prático: enfrentar um proble- venda) – O que faz as comunidades op- fazer a gestão de seus
ma, atender aos interesses reais do grupo, tarem por permitir a comercialização recursos.
garantir a sobrevivência. Portanto, muitas de determinado recurso ou destiná-lo
vezes têm mais efeitos que as leis e as nor- somente ao consumo próprio é, entre
mas do Estado. Com base nas diferentes outros aspectos, a quantidade existen-
experiências de comunidades que elabo- te (estoque) e a demanda do mercado tre as comunidades e dentro do grupo consentimento do grupo, após reunião
raram suas normas para uso dos recursos (preço). que estabeleceu as normas. Como for- para determinar se quem pleiteia aces-
naturais, os elementos essenciais são: ma de facilitar a delimitação da área, so ao recurso dentro do território de
 Quantidade explorada – É determi- usa-se normalmente a construção de uma comunidade pode ou não entrar,
 Atividades permitidas – Normal- nada pelos conhecimentos elaborados um mapa falado para a identificação quanto ele pode retirar, e em que condi-
mente as comunidades ou grupos de sobre os processos ecológicos das espé- dos limites naturais. ções. 
famílias, quando elaboram suas regras cies e estoques existentes. À medida em
para uso dos recursos naturais, pensam que a oferta de recurso diminui ou afeta  Formas de acesso – São definidos 2.5. Proposta de arranjo
em questões mais amplas e abrangen- a sobrevivência do grupo, a tendência basicamente os níveis tecnológicos em-
tes. Como, por exemplo, o uso do fogo é que a comunidade estabeleça normas pregados no processo produtivo, consi- institucional para
ou a captura de animais, mesmo que o mais restritivas e mantenha um equilí- derando a capacidade real do grupo e o acordo florestal
enfoque das normas seja outro. Esses brio entre os estoques disponíveis e a as possibilidades de interação com ou-
elementos são introduzidos com base
nos conhecimentos elaborados e re-
presentam uma visão mais profunda/
sistêmica capaz de valorizar diversos
aspectos da vida. É, portanto, nesse
quantidade explorada.

 Delimitação da área do acordo –


Praticamente todas as comunidades
fazem limite umas com as outras. Cada
tros atores, normalmente externos.

 Quem pode acessar – Basicamente


as normas fecham o acesso a determi-
nados recursos ao grupo familiar ou
A operacionalização prática de um
acordo florestal requer tanto que
as comunidades busquem, dentro
de suas condições, formas para atender
as necessidades do Estado quanto que o
contexto e expectativa que as comu- uma possui regras próprias para o uso aos moradores das comunidades que Estado consiga garantir o reconhecimento
nidades definem o que é permitido e a dos recursos. Nesse aspecto, a definição as estabeleceu. O acesso de estranhos e apoio aos acordos comunitários (Figura
maneira (condições ordinária e extra- de limites da área com determinadas se dá somente em condições excepcio- 11). Para o Estado é particularmente im-
regras ajuda a manter a boa relação en- nais: por parente de moradores ou por portante a manutenção da floresta, prin-

64  Extração Tradicional de Madeira Extração Tradicional de Madeira  65


cipalmente para atender a pressão am- No quadro 5 são apresentadas as pro- Quadro 5. Propostas para a formalização das práticas tradicionais.
Uma vez que as bientalista internacional e também para postas em que as famílias e comunidades Área de Definições técnicas Propostas
práticas locais efetivar o controle da madeira produzida têm possibilidade de se aproximar do sis- atuação
tradicionais são que entra no mercado, evitando que ela tema formal de uso dos recursos flores- Exploração Delimitação da área O governo reconhece o mapa falado apresentado pelo produtor,
sirva para esquentar (acobertar) madeira tais, assim como as responsabilidades que de manejo grupo ou comunidade ou o governo se propõe a mapear geogra-
compreendidas, é ficamente os limites da área
retirada de forma clandestina de outras caberiam ao Governo. 
possível promo- áreas. Inventário florestal A família ou comunidade disponibiliza para consulta o controle
do número de árvores e espécies que será explorado com base
ver sua formali- em sua capacidade produtiva
zação por meca- As comunidades podem adotar em seu
Planejamento e A partir das árvores derrubadas e/ou processadas ou da forma
acordo de gestão um plano de manejo construção dos como o grupo pratica
nismos simples simples, com controle do que é produzi- ramais
e acessíveis a do por cada extrator de determinada área Derruba Teste do oco com o facão ou com a utilização da motosserra
todos. com anotações específicas (ver apêndice Arraste (transporte) O governo reconhece o sistema de transporte tradicional e
2). Elas também podem preencher uma financia equipamentos simples e práticos pelas linhas de crédito
Guia de Transporte de Produto Florestal existentes
(GTPF) semelhante ao sistema estabeleci- Processamento O governo reconhece o sistema de processamento tradicional
(normalmente com motosserra)
do pela Agência de Defesa Agropecuária
Mercado Comercialização Guia de Transporte de Produto Florestal emitida pela
do Estado do Pará (Adepará) para trans-
comunidade
porte animal (ver apêndice 3). Essa guia
Organização O governo reconhece a organização das famílias (representação
pode ser preenchida pelas famílias no ato por pessoa física ou associação existente)
do transporte e apresentada aos órgãos Controle Responsável técnico A comunidade ou atores locais serão corresponsáveis pelo uso
de governo quando solicitado. Assim, a da floresta. Se necessário, o governo garante um responsável
comunidade assume o controle do plane- técnico para as famílias e comunidades, que seja sensível às
jamento de uso de seus recursos e, caso práticas tradicionais
o Estado tenha condições de acompanhar, Detentor do plano A comunidade ou a família é detentora do plano de manejo e a
liderança da organização ou da associação existente assume a
ela pode apresentar os dados. corresponsabilidade
Protocolo do pedido Desnecessário
Por outro lado, é também fundamental de autorização
que o Estado assuma seu papel de apoia- prévia APAT
dor do desenvolvimento local e atue forta- Protocolo do plano A família protocola na sede do município em órgão convenia-
lecendo os acordos de gestão. Se o Estado de manejo do, o plano de manejo tradicional com base em formulário
simplificado (apêndices 2 e 3) com anuência da liderança da
está disponível para ajudar as comunida-
comunidade
des, seu potencial de apoio ao desenvolvi-
Emissão da AUTEX O governo emite a AUTEX com base no plano de manejo tradicio-
mento sustentável é potencializado. nal entregue na sede do município
Guia de transporte A família apresenta a declaração de comercialização e transporte
Atuando mais no apoio que na fiscali- da madeira dos produtos florestais e o governo emite a Guia de Transporte
zação, o Estado pode ainda ampliar sua de Madeira
atuação com os mesmos recursos de que Figura 12. As famílias precisam de apoio do Monitoramen- Monitoramento A família ou comunidade é responsável pela boa gestão do negó-
já dispõe, pois terá os produtores locais Estado no reconhecimento e apoio às suas to e gestão cio florestal. O governo monitora a execução do plano de manejo
tradicional dentro de suas condições
como parceiros (Figura 12). práticas.

66  Extração Tradicional de Madeira Extração Tradicional de Madeira  67


Apêndice 1 Valor Unitário Tecnicista Tradicional
Discriminação Unidade Quantidade
3 (R$) (R$) (R$)
Custos para produção de 1 m de falca serrada por comunidades da Resex Verde para Sempre comparando o sistema tecnicis-
ta e o tradicional. O custo estimado da elaboração de um plano de manejo formal é de R$ 174.981,00 considerando o caso de Derruba
uma comunidade produzindo 331,82 m3 ao custo de R$ 527,34 por m3. Capacitação em corte direcional Pessoa 0,0030 1600 4,80 -
Valor Unitário Tecnicista Tradicional Motoserrista Diária 0,0301 80 2,41 2,41
Discriminação Unidade Quantidade
(R$) (R$) (R$) Ajudante Diária 0,0301 50 1,51 1,51
Criação e gestão da entidade jurídica Alimentação Pessoa 0,0603 10 0,60 0,60
Deslocamento Passagem 0,0030 550 1,65 - Consumo (gasolina e óleo) Unidade 0,0030 2533 7,60 7,60
Registro do estatuto social Folha 0,0030 600 1,80 - Capacete para motosserrista Unidade 0,0030 50 0,15 -
Registro da ata de fundação Folha 0,0030 210 0,63 - Botina para motosserrista Unidade 0,0030 200 0,60 -
Serviços de contabilidade Pessoa 0,0030 2500 7,50 - Processamento
Juros de capital necessário para investir Financiamento 0,0030 15000 45,00 - Capacitação em processamento Pessoa 0,0030 1600 4,80 -
Impostos Venda 0,0030 5000 15,00 - Motosserrista Diária 0,5425 80 43,40 43,40
Delimitação da área de manejo Ajudante Diária 0,5425 60 32,55 32,55
Capacitação Vessoa 0,0030 1600 4,80 - Alimentação Pessoa 1,0849 10 10,85 10,85
Extrativista Diária 0,1055 45 4,75 - Depreciação e manutenção da motosserra Anos 0,0030 2450 7,35 7,35
Alimentação Pessoa 0,1055 10 1,06 - Consumo (gasolina e óleo lubrificante) Litro 10,0054 5 50,03 50,03
Bússola e GPS Unidade 0,0030 1350 4,05 - Óleo queimado Litro 4,0022 2,7 10,81 10,81
Terçado e lona 7 x 8 m Unidade 0,0030 340 1,02 - Corrente Unidade 0,0995 75 7,46 7,46
Capacete Unidade 0,0151 9,88 0,15 - Limatão e lima chata Unidade 0,5003 4 2,00 2,00
Perneira de couro e botina Unidade 0,0151 95 1,43 - Transporte Jerico Rodado
Trena de 30 m e 50 m Unidade 0,0030 110 0,33 - Depreciação do rodado Anos 0,0030 28,000/900 84,00 2,70
Inventário Florestal Motorista Diária 0,5425 30/40 16,28 21,70
Capacitação em inventário florestal Pessoa 0,0030 1600 4,80 - Consumo Litro 0,5425 16 8,68 -
Extrativista Diária 0,4219 45 18,99 9,49 Burocracia do plano de manejo e plano operacional anual
Alimentação Pessoa 0,4219 20 8,44 4,22 Responsável técnico (elaboração e ha 0,0030 11500 34,50 -
Chapa de alumínio e pregos 15x21 Quilo 0,0090 32 0,29 - acompanhamento)
Martelo, lápis-estaca e punção numérico Unidade 0,0030 65 0,20 - Protocolo do pedido de APAT Anos 0,0030 240 0,72 -
Estradas e ramais Protocolo do plano de manejo Anos 0,0030 240 0,72 -
Capacitação em planejamento de estradas Pessoa 0,0030 1600 4,80 - Emissão da Autex Anos 0,0030 200 0,60 -
Revitalização de estrada principal Km 0,0121 1625 19,66 19,66 Guia de transporte da madeira Anos 0,0030 500 1,50 -
Abertura de estrada principal Km 0,0030 3000 9,00 - Acompanhamento da tramitação Viagens 0,0030 9500 28,50 -
Abertura de ramais Km 0,0060 1600 9,60 9,60 TOTAL GERAL 527,34 243,94

Nota: Valores calculados em 2013 para a produção de 331,82 m3 de madeira serrada com motoserra. No sistema tecnicista a
sugestão técnica tem sido o transporte com jerico, em comparação com as práticas tradicionais mais simples baseadas no trans-
porte com rodado.

68  Extração Tradicional de Madeira Extração Tradicional de Madeira  69


Apêndice 2 Apêndice 3
Roteiro para a elaboração escrita do plano de manejo tradicional (proposta para discussão) Roteiro para a declaração de comercialização e transporte dos produtos florestais (proposta para discussão)

Requerente: Vendedor:

RG: CPF: RG: CPF:

Representante ( ) individual, ( ) do grupo ou ( ) da comunidade: Representante ( ) individual, ( ) do grupo ou ( ) da comunidade:

RG: CPF: RG: CPF:

Comunidade/Localidade: Comunidade/Localidade:

Área (ha): Município: Estado:

Localização:

P1: P2: Comprador:


Coordenadas Geográficas (ou pontos de referência):
P3: P4: RG: CPF:

Município: Estado: Empresa:

CNPJ: IE:

Município: Estado:
Produção anual planejada:

Espécie a ser utilizada Número de árvores por ano Volume explorado por ano (estimado)
Quantidade comercializada:

Espécie Quantidade Tipo de produto Quantidade

Planejamento da Exploração: Transporte:

( ) Machado ( ) Motosserra Tipo: ( ) Barco ( ) Caminhão


Forma de exploração:
( ) Outros_____________________________________ ( ) Tração animal ( ) Rodado

Forma de comercialização: ( ) Tora ( ) Serrada ( ) Manual ( ) Outros__________________

( ) Barco ( ) Caminhão Destino: ( ) Município ( ) Estado

Forma de transporte do extrativista: ( ) Tração animal ( ) Rodado

( ) Manual ( ) Outros_____________________________________ Roteiro: ( ) Rios/Igarapés:

( ) Barco ( ) Caminhão ( ) Estradas/Rodovias:

Forma de transporte do comprador: ( ) Tração animal ( ) Rodado


Assinatura do Vendedor: Assinatura do Comprador:
( ) Manual ( ) Outros_____________________________________

70  Extração Tradicional de Madeira Extração Tradicional de Madeira  71


Acordos
de Pesca
Cláudio Wilson Soares Barbosa e Gabriel Medina

Os passos para a elaboração de


um acordo de pesca, o marco
legal para sua normatização
e os elementos para seu
monitoramento são apresentados
neste capítulo a partir da
experiência de comunidades
ribeirinhas da Amazônia.

72  Acordos de Pesca Acordos de Pesca  73


Estado
do Pará

Brasil tidade de pescado e o preço aumenta, a


Quando os
tendência é que pescadores também au-
mentem sua produção. Para isso eles ge- acordos são bem
ralmente adquirem equipamentos com “amarrados”,
maior capacidade de captura ou aumen- eles garantem o
Porto de Moz tam o tempo das atividades de pesca. Isso,
aos poucos, vai quebrando as formas tra-
uso dos recursos
dicionais de uso desses recursos podendo, pesqueiros por
em pouco tempo, gerar crise de escassez muito tempo.
das espécies com maior demanda.

Estado do Pará Nesse caso, é necessária a elaboração


escrita e a regulamentação das regras es-
Porto de Moz tabelecidas pelas famílias para garantir
maior controle das atividades pesquei-
Legenda ras e assegurar a participação de órgãos
Limite do Municipio de Porto de Moz
RESEX Verde para Sempre reguladores. Assim, as comunidades que,
Comunidades e Localidades sozinhas, não consigam fazer valer as re-
Acordo de pesca gras do acordo, podem contar com o apoio
do poder de polícia do Estado. Para isso, é
Figura 1. Acordos de fundamental que os órgãos do Estado es-
pesca desenvolvidos por
iniciativas das comuni-
dades ribeirinhas têm
garantido a manutenção
dos estoques pesqueiros
O s acordos comunitários de pesca
têm se constituído ao longo dos
anos como importante estratégia
de gestão coletiva dos recursos pesquei-
ros na Amazônia. Eles buscam agregar
aos recursos pesqueiros. Esse processo de-
mora anos, é contínuo e não precisa ser
necessariamente escrito ou regulamen-
tado por órgãos de governo. Em muitos
casos, os costumes e as tradições aceitos
tejam abertos a parcerias com as comuni-
dades e reconheçam esses acordos (Figura
2). Neste artigo são apresentados alguns
passos básicos com o objetivo de nortear
o processo de construção de um acordo
em muitos rios da Ama- interesses de pescadores artesanais que pelos grupos locais vão regulando as for- comunitário de pesca, a legislação vigen-
zônia. Em Porto de Moz, pescam comercialmente, ribeirinhos que mas de exploração da pesca, sem inter- te e uma proposta de metodologia para o
das 107 comunidades e pescam para o consumo e para a venda e venção de atores externos. Esse processo monitoramento dos acordos a partir das
localidades rurais exis- órgãos governamentais. Em Porto de Moz, tem apresentado bons resultados quando experiências das comunidades ribeirinhas
tentes, 22 participam de 21% das comunidades e localidades ru- não há risco de invasão de pescadores de do município de Porto de Moz que já avan-
algum acordo de pesca rais participam dos sete acordos de pesca outras localidades, quando a pesca se des- çaram em seus acordos (Quadro 1). 
ou de convivência. ou de convivência existentes no municí- tina apenas à subsistência dos moradores
pio (Figura 1). e quando a quantidade capturada de pes-
cado é pequena e não afeta, no longo pra-
A construção de bons acordos de pesca zo, os estoques existentes.
deve passar por um processo profundo de Figura 2. O reconhecimento
reflexão e análise sobre os problemas vi- Contudo, quando a pesca tem finalida- pelo Estado tende a forta-
venciados pelas comunidades ou grupos de comercial, a situação muda. À medida lecer os acordos de pesca
que desejam instituir regras para acesso que o mercado demanda maior quan- diante de ameaças externas.

74  Acordos de Pesca Acordos de Pesca  75


Quadro 1. Situação geral da gestão coletiva dos recursos
pesqueiros em Porto de Moz. 1. Passos para a Identificar
Rios
Acaí
Comunidades Tipo de acordo
Espírito
Santo, N. Sª
Acordo
comunitário de
Situação
Comunidades têm contro-
le do acesso aos recursos
Avanços
Acordo regulamentado
pela Secretaria de Estado
elaboração de um o problema
não significa
Aparecida e
Santa Ana do
Mutuncaia
pesca pesqueiros pelas normas
estabelecidas desde 1993
de Pesca e Aquicultura
por Instrução Normativa acordo de pesca culpar alguém;
é preciso chegar
até as causas
Jaurucu Juçara, Acordo comunitá- Pesca moderada nos Acordo entregue ao 1.1. Identificação do problema
Carmelino e rio de pesca períodos de maior pro- ICMBio e espera por para pesar como

O
Ariruá dução, sobretudo para posicionamento
subsistência s acordos são constituídos em função de um ou mais proble- enfrentá-las.
Coati e Maria de Acordo Acordo não cumprido por Comunidades voltaram a mas enfrentados por uma ou mais comunidades. Normal-
Cupari Matias, Vila comunitário de moradores, pesca com se reunir para discutir o mente são provocados pelo risco de escassez de alimento
Nova Bom pesca o uso de rede, pesca do acordo de pesca e unifi-
ou pelo fato já consumado, causado pelo uso predatório dos recur-
Jesus, Vila pirarucu em período do cação do acordo de cada
Bom Jesus e defeso, parecer do procu- comunidade em um único sos pesqueiros, pelo emprego de apetrechos com alta capacidade de
São João rador do ICMBio contrário captura, como redes com malhas pequenas, pesca no período da de-
à normatização do acordo sova, entrada de pescadores estranhos às comunidades e captura de
Uiui Cuieiras, Acordo Controle da pesca do Doze anos de acordos pescado com tamanho inferior ao permitido para exploração comer-
Monte Sinai e comunitário de acari estabelecido, as com resultados no
cial. O primeiro passo para a elaboração de um acordo é sintetizar o
Santa Luzia pesca comunidades respeitam repovoamento do rio,
os períodos estabelecidos principalmente com acari; problema ou os problemas. Esse trabalho normalmente é feito por
para a captura comercial, acordo escrito entregue um grupo pequeno, envolvendo os moradores mais interessados no
usam apetrechos em ao IBAMA, mas sem estabelecimento do acordo.
acordo com o estabeleci- posicionamento sobre a
do nas normas regulamentação
Majari Espírito Santo Plano de uso Acordo frágil com des- Conseguiram fazer
e São João do PAEX cumprimento por parte reuniões para decidir as Para o detalhamento do problema, o grupo
das famílias locais que normas do acordo mas a pode trabalhar com metodologias como a
pescam comercialmente implementação ainda é construção de uma linha do tempo rela-
um desafio
tando os acontecimentos relacionados à
Acaraí Por Ti Meu Acordo de Foi criado em 1996 e Conseguiram manter a
atividade pesqueira ao longo dos anos.
Deus, Pedrei- convivência envolve a relação com exploração dos recursos
ra e Arimum os diferentes recursos de maneira estável, sem Depois verifica quais acontecimentos fo-
dos rios e floresta. Estão conflitos e sem explora- ram importantes na origem do problema:
revitalizando o acordo, re- ção predatória a pesca de rede, a entrada de marreteiros,
fletindo sobre os resulta-
dos e formulando novas
geleiras, etc (Figura 3). Para essa primeira
regras de convivência fase é muito importante que o problema
Peituru Miritizal, Acordo de pesca Os pescadores locais As comunidades conse-
Laranjal e estão cumprindo o acordo guiram pactuar normas
Cajueiro com resultados já per- gerais para controle da Figura 3. Conflitos de pesca surgem a partir
cebidos no aumento da pesca e mantêm a gestão
do momento em que pessoas usam equipa-
quantidade de pescado. do acordo baseada no
Contudo, há invasão de diálogo entre pescadores mentos com maior capacidade de captura
pescadores estranhos às externos e internos e quando novos atores invadem espaços de
comunidades uso tradicional.

76  Acordos de Pesca Acordos de Pesca  77


seja compreendido em sua origem (busca- em soluções concretas. O quadro 2 traz o
se as causas), pois é a partir dele que o exemplo da identificação dos problemas
grupo planeja os passos seguintes. Quan- na gestão pesqueira feita pelas comunida-
do o problema não é identificado corre- des dos rios Coati e Cupari em Porto de
tamente, corre-se o risco de estabelecer Moz. 
normas ou regras que não irão resultar

Figura 4. Famílias de
várias comunidades
usam os ambientes de
Quadro 2. Quadro-resumo dos problemas.
pesca, daí a importância
Natureza Causa Atores envolvidos Consequências Evolução
de que elas participem
Invasão externa Esgotamento dos Pescadores da Conflitos com A cada ano vem
dos acordos.
estoques de pesca- cidade e de outras moradores locais, aumentando a
do em outros rios comunidades apreensão de presença de pes-
e lagos barcos e redes de cadores externos,
pesca, ameaças em alguns casos a
convite de morado-
1.2. Identificação das um trabalho de aproximação das partes
res locais pessoas envolvidas envolvidas.

Q
Uso de apetre- Facilidade em cap- Moradores das Conflitos entre Nos últimos dez
chos de pesca turar pescado com comunidades que famílias, envolvi- anos aumentou uando o problema provocar ten- 1.3. Mapeamento das
não permitidos rede de pesca não aderiram ao
acordo
mento de órgãos
ambientais e polí-
significativamente o
número de famílias
sões entre moradores, entre co-
munidades ou mesmo entre mora-
áreas de pesca

H
cia, mudanças nos com rede de pesca
dores e pescadores de fora, as principais á comunidades privilegiadas por
métodos tradicio- Conhecer as
nais de captura do pessoas envolvidas devem ser identifi- disporem de ecossistema bem di-
pescado cadas. Isso permite encontrar a raiz e versificado composto de lagos, pessoas envol-
Dissenso entre Cada comunidade Moradores das qua- Uso de diferen- Cada comunidade a abrangência do problema a partir da igarapés, rios e outros ambientes que vidas é passo
as comunida- tem suas próprias tro comunidades tes apetrechos e busca defender identificação dos atores-chave. As comu- concentram estoques de pescado de di-
des ou normas normas de pesca conflitos entre os apenas seus am- importante para
diferentes para para os mesmos próprios morado- bientes de pesca, nidades procuram saber quem agencia ferentes espécies. Antes de iniciar o pro-
o mesmo rio rios e sem clareza res, neutralização sem interação e ou apoia qualquer atividade considerada cesso de elaboração das normas, o grupo o diálogo.
de sua essência da capacidade de apoio das demais danosa, a abrangência dela e se tende a constrói um mapa falado dos diferentes
mobilização das aumentar ao longo do tempo. ambientes naturais usados para a pesca
comunidades
pelas famílias e identifica os principais
Ausência do Órgãos ambientais ICMBio, polícia Comunidades fra- Com a criação da
Estado não têm recursos militar, judiciá- gilizadas, risco de Resex aumentou a A essência do trabalho de construção usuários desses ambientes para depois
nem agentes de rio, moradores e conflito e violência presença de agen- de um processo de gestão coletiva dos re- chamá-los para as reuniões (Figura 4).
fiscalização pescadores física durante as tes do ICMBio, mas cursos pesqueiros por meio dos acordos Por exemplo, há lagos que são usados por
apreensões de pes- com pouca capaci- de pesca está nas pessoas e, para isso, é pescadores de mais de uma comunidade
ca por moradores dade de resolver os
conflitos fundamental estabelecer canais de diálo- (Box 1). Uma vez identificada essa situa-
Definição Comunidades não As quatro Enfraquecimento Comunidades estão go abertos e francos entre todos os envol- ção, não dá para pensar em normas para
de territó- têm claros seus comunidades do processo de mais abertas para o vidos. Normalmente, quando o clima é de esses lagos sem considerar os moradores
rio de cada limites e onde suas interação entre as diálogo entre elas tensão entre as pessoas, a tendência é que das comunidades vizinhas.  
comunidade regras podem valer comunidades esse canal seja bloqueado se não é feito

78  Acordos de Pesca Acordos de Pesca  79


Box 1: Descrição do mapeamento das áreas de pesca utilizadas pelos moradores 1.4. Reflexão sobre o
das comunidades dos rios Coati e Cupari e comunidades vizinhas.
problema sintetizado

A s famílias das comunidades dos rios Coati e Cupari estão situadas numa
grande faixa de transição entre a várzea e a terra firme. Elas usam vários
lagos e rios para a prática da pesca, como o lago Urubu, entre os rios Coati e
Uiui, considerado pelos moradores como ambiente natural de reprodução de diver-
sas espécies, dentre elas o pirarucu. De modo geral, essas comunidades vivem em
U ma vez que a comunidade iden-
tificou o problema e os atores e
mapeou as áreas de pesca, as in-
formações são socializadas com todos os
moradores e pessoas envolvidas, direta
ambientes com estações definidas: o inverno chuvoso, culminando com as cheias ou indiretamente (Figura 5). Isso é fei-
dos rios e alagamento dos campos inundáveis, e o período do verão, em que os cam- to durante as reuniões convocadas pelo
pos ficam secos. No verão, o lago Urubu permanece cheio e funciona como refúgio grupo que trabalhou na sistematização. O
dos peixes que migram das áreas de campos que secaram. problema deve ser apresentado sem juízo
de valor. Ou seja, como ele é em sua essên- Figura 5. As reuniões nas comunidades para discutir a questão da pesca
Nas cabeceiras do Rio Cupari também existe um complexo de lagos conhecido cia, sem a pretensão de culpar ou respon- normalmente são conduzidas de maneira espontânea. É importante ter
como lagos do Rancho. Trata-se de um conjunto de lagos pequenos (mais de 100) sabilizar as pessoas envolvidas. O proble- alguém que relate o problema identificado.
que permanecem cheios durante todo o ano. Esses lagos são interligados por igara- ma apresentado é analisado criticamente
pés e concentram boa parte do pescado capturado por moradores da comunidade por todos e as reflexões vão construindo
São João do Cupari. Entre os rios Cupari e Peituru existe outro conjunto de lagos ao longo dos encontros um juízo crítico ou 1.5. Solução do problema Propostas pouco
naturais, conhecido como poços da Fortaleza. Esses poços também são interligados consciência em torno do problema.

U
por igarapés mas, diferentemente do Rancho, não permitem acesso de canoas de ma vez que o problema foi identi- amadurecidas
pescadores durante o período seco. Um aspecto fundamental para a refle- ficado e analisado criticamente, a podem aumentar
xão é a importância econômica da pesca comunidade começa a pensar nas o problema. Uma
Além desses ambientes, na grande faixa de campos inundáveis entre os rios Uiui para determinado número de famílias. saídas ou soluções possíveis. Aí, todos
e Coati, existe uma infinidade de lagos pequenos que servem como abrigo para Nesse caso, é necessário encontrar res- os moradores afetados devem participar boa solução
espécies aquáticas durante a seca e são pontos de pesca para moradores do Rio postas para algumas perguntas: quantas com opiniões que apontem para alterna- pode demorar
Coati. Esses lagos são particularmente importantes para a reprodução do pirarucu, famílias na comunidade vivem da pesca e tivas, sempre pensando num horizonte de anos para ser
principal espécie comercial da região. Informações levantadas junto aos pescado- quantas têm outras atividades de geração tempo razoável, sem a pressa de encon-
construída e
res mostraram que esta espécie procura construir seus ninhos em locais com solo de renda? A criação do acordo ou normas trar soluções imediatistas que, muitas ve-
argiloso particularmente nas margens do Rio Coati que, pelas ribanceiras argilosas, para a pesca vai afetar a vida dessas famí- zes, podem aprofundar o problema. Esse é fruto de pro-
tornaram-se ambiente propício para a reprodução. Também os caminhos ou passa- lias? De que forma? Como resolver isso? processo, normalmente demora bastante cesso contínuo
gens (como são conhecidos pelos moradores os caminhos abertos pelos búfalos) são Essas e outras perguntas vão aos poucos tempo e exige muitos encontros pois, se e adaptativo.
locais importantes para a reprodução do pirarucu, pois à medida que os animais abrindo novos horizontes de reflexão en- a compreensão do problema sempre apre-
retiram da superfície a matéria orgânica (tabatinga), o solo argiloso fica exposto tre os participantes da reunião e nortean- senta divergências, as possíveis soluções
tornando-se propício à construção dos “ninhos”. do as discussões para o ponto central: a são ainda mais difíceis de serem formula-
identificação do problema.  das e postas em prática.  

80  Acordos de Pesca Acordos de Pesca  81


1.6. Formulação dos 1.7. Formulação Por outro lado, existe o cuidado de evi-
objetivos do acordo das normas tar que as normas privilegiem determina-
dos grupos e penalizem outros. Para isso, é

Q uando a solução encontrada para


o problema apontar para a consti-
tuição de acordo ou normas para
a pesca, são formulados objetivos claros.
Sabe-se que o acordo não é um fim, mas
E sse é o passo mais demorado e com-
plexo pois, normalmente, há muitos
questionamentos e posicionamen-
tos contrários, com prevalência dos ar-
gumentos mais elaborados ou ideias das
fundamental que, numa comunidade que
desenvolve outras atividades de geração
de renda (agricultura, madeira, pecuária),
além da pesca, o processo de elaboração
das normas conte com a participação de
um meio para o alcance de um ou mais lideranças mais carismáticas. Contudo, representantes de cada grupo específico,
objetivos. Esse processo considera a com- para evitar muitos desgastes e conflitos como forma de garantir que todos tenham
preensão do problema, os meios para en- que podem neutralizar ou inviabilizar o seus interesses reconhecidos e validados.
frentá- lo e onde objetivamente se deseja seguimento do processo de elaboração das É importante que todos os interesses e
chegar dentro de um horizonte temporal normas, elas são discutidas com enfoque ideias estejam contidos no acordo como
e espacial preestabelecidos. Um passo nos problemas identificados consideran- forma de garantir o cumprimento no lon-
preliminar importante é conhecer bem os do que eles afetam a todos na comunida- go prazo (Figura 6).
recursos e as práticas de captura (Quadro de. Assim, a responsabilidade de pensar
3) para pensar na formulação de objeti- estratégias que respondam aos problemas Um aspecto fundamental é a formaliza-
vos que consigam dar conta das questões passa a ser de todos. ção das normas com a elaboração de um
centrais. acordo escrito e assinado. Como exemplo,
as comunidades dos rios Coati e Cupari Figura 6. O pescado é fundamental para
durante mais de três décadas vivencia- a segurança alimentar das famílias ribeiri-
ram uma experiência de gestão dos recur- nhas e os acordos de pesca garantem que
sos pesqueiros endógena, desenvolvida e os estoques pesqueiros não se esgotem
Quadro 3. Informações técnicas centrais para subsidiar a formulação dos
objetivos de um acordo a partir da experiência das comunidades aprimorada ao logo dos anos, sobretudo rapidamente.
dos rios Coati e Cupari. baseada na proibição da pesca com rede
Principais Método de Meses Meses de Finalidade Área de ocorrência e do uso de substância tóxica contida na
espécies captura de maior menor raiz do timbó. As normas do acordo não novos moradores que, ao poucos, intro-
ocorrência ocorrência eram escritas por conter basicamente es- duziram a rede de pesca foram responsá-
Tucunaré, Linha de Julho a julho a Comercia- Rio Coati e, sas duas proibições. As demais práticas veis por fragilizar as normas locais e o seu
aruanã, mão, arco e setembro outubro lização e principalmente, permitidas eram realizadas por quase to- modo de gestão. A coesão social foi que-
pacutinga flecha, cani- subsistência Rio Cupari. Todos os
ço, tarrafa e lagos (Rancho, das as famílias. Esse modelo funcionou brada em alguns momentos, até tornar as
rede de pesca Fortaleza e outros) com certa eficiência até inicio dos anos normas ineficientes, já no inicio dos anos
Pirarucu Arpão e rede Agosto a outu- Março a julho Comércio e Lagos do Rancho, de 2000. Para mantê-lo, as famílias das de 2000. A partir de 2000, as comunidades
de pesca bro e janeiro e e dezembro subsistência igarapé do Urubu, comunidades realizavam a vigilância dos iniciaram um processo de reformulação
fevereiro Munguba, margens rios, com apreensão de barcos e equipa- de suas normas e consideram regulamen-
do Rio Coati (alguns
perímetros) mento de pesca e faziam encontros (Qua- tar o acordo para garantir maior respaldo,
Tambaqui, Tiradeira ou Abril a julho Agosto a Comercia- Campos alagados dro 4). principalmente na fiscalização. O quadro
pirapitinga espinhel, arco março lização e durante as cheias, 5 apresenta uma síntese da nova proposta
e flecha e subsistência rios e lagos durante No entanto, o aumento da população e do acordo construída pelas quatro comu-
rede de pesca o período seco
da demanda por pescado, e a entrada de nidades dos rios Coati e Cupari. 

82  Acordos de Pesca Acordos de Pesca  83


Quadro 4. Normas informais do acordo inicial de pesca dos rios Coati e Cupari Quadro 5. Práticas atuais e propostas de reformulação do
com as principais características de modelo de gestão adotado pelas acordo dos rios Coati e Cupari.
famílias até início dos anos 2000. Partes do acordo Práticas atuais Propostas do acordo
Partes do acordo Ação Área do acordo Indefinida Indefinida
Normas Proibição da pesca com rede e com uso da raiz do timbó Apetrechos Arco e flecha, arpão, linha de pesca, Excluir definitivamente rede de
Gestão local Ao pressentirem uso de apetrechos como rede de pesca, as famílias se reuniam siririca, tarrafa, caniço e rede de pesca, zagaião, farol, pesca de mer-
para o “enfrentamento” com o pescador, fosse ele da comunidade ou não. Isto pesca (malhadeira), espinhel, gulho e manter a exclusão do timbó
é, cada comunidade ou cada morador zelava isoladamente pelas normas do zagaião e farol
acordo e participava da mobilização em sua defesa quando havia ameaça. Isso Tipos de peixes capturados Pesca realizada durante o ano todo Estabelecer suspensão da pesca
não raramente provocava fortes conflitos internos, perdurando por longo tempo (principais) e com a captura das espécies: do pirarucu por três anos e definir
quando se tratava de conflitos entre moradores da mesma comunidade pirarucu, tucunaré, tambaqui e pira- tamanho das outras espécies para
Avaliação e Reuniões provocadas pelas lideranças locais sempre que as normas estavam pitinga de qualquer tamanho captura e comercialização
Monitoramento sendo ameaçadas ou quebradas Períodos dedicados à Na maioria dos anos, dependendo Determinar o período de primeiro
Fiscalização As comunidades realizavam a fiscalização dos rios e lagos, com apreensão de pesca do tamanho das cheias, a pesca de junho a 30 de setembro para
apetrechos de pesca considerados impróprios para comercialização inicia mais a pesca comercial, exceto para o
intensamente nos meses de junho pirarucu. Nos demais meses do ano
a setembro. Contudo, é praticada a pesca fica restrita à subsistência
durante todos os meses do ano
Gestão local do Acordo Ao pressentirem uso de apetrechos Criar um conselho intercomunitário
1.8. Normas integradas tempo dedicado à produção de queijo, no
como rede de pesca, as famílias se
reúnem para o “enfrentamento”
composto inicialmente por quatro
representantes de cada comunidade
ao cotidiano da trabalho com a agricultura, na exploração
florestal e na pesca. Assim, as famílias se
com o pescador, seja ele da comuni-
dade ou não. Isto é, cada comunida-
e um representante de cada uma
das seguintes instituições: ICMBio,
comunidade mantêm ativas de acordo com os ciclos da de ou cada morador zela isolada-
mente pelas normas do acordo
SEMMA, CDS, MSTTR, Colônia Z64
totalizando 21 membros com função
natureza e as atividades importantes para

A
de zelar pelas normas do acordo
ntes de serem normas para a pes- geração de renda (Figura 7).  e apoiar as comunidades em sua
ca, os acordos são normas para gestão
proteger os meios de vida das pes- Monitoramento Não existe nenhum tipo de monito- Estabelecer dois tipos de monito-
soas e não para prejudicá-las. Assim sen- ramento inerente ao cumprimento ramento: um sobre o cumprimento
das normas estabelecidas, nem das normas estabelecidas e a
do, eles precisam ser pensados de manei- do comportamento das espécies participação de atores externos e
ra integral e de acordo com a dinâmica da manejadas outro sobre o comportamento das
vida da comunidade e o calendário produ- espécies manejadas, ambos a partir
de indicadores simples
tivo. Nas comunidades de várzea de Porto
de Moz, a pesca e a produção de queijo se Fiscalização As comunidades realizam a fiscaliza- Sugere operações de fiscalização de
ção dos rios e lagos, com apreensão órgãos ambientais e policiais como
alternam durante o ano. Entre os meses de redes pesca principalmente reforço à fiscalização local
de outubro a fevereiro, as famílias dedi- Formalização Não há Elaborar acordo escrito e protocolar
cam a maior parte do tempo à produção Figura 7. A inundação dos campos de várzea, nos órgãos ambientais
de queijo e, entre os meses de maio a se- entre os meses de fevereiro a julho, propicia
tembro, à atividade pesqueira. um excelente ambiente de pesca para os
moradores. O acordo de pesca define o tipo
Um bom exemplo vem da comunidade de equipamento a ser usado em cada período
Cajueiro no alto Rio Peituru, que elabo- com maior ou menor impacto nos estoques
rou suas normas de pesca pensando no pesqueiros.

84  Acordos de Pesca Acordos de Pesca  85


2. Marco legal dos os procedimentos para elaboração e regu-
lamentação dos acordos de pesca.
que é responsável pelos acordos dentro
da unidade. Uma comunidade em área
Quadro 6. Regulamentação dos acordos de pesca.
Área/Jurisdição Órgão regulamentador Instrumento de

acordos de pesca Também é muito comum que as comu-


de jurisdição do Estado do Pará tem a
Sepaq como responsável pela aprovação Unidade de conservação ICMBio
regulamentação
Portaria
nidades estabeleçam punições para as do acordo. Esses órgãos são criados por (Resex, RDS)
2.1. Instrumentos para infrações. Mas as penalidades para dife- leis e, portanto, têm poderes para expedir Áreas de jurisdição do Sepaq Instrução Normativa
Estadodo Para
formalização dos acordos rentes tipos de crimes ambientais já são
previstas na lei 9.605 de dezembro de
diferentes tipos de atos administrativos
para gerir o espaço sob sua jurisdição. É Indefinida IBAMA Portaria

E m vários ambientes é comum ouvirmos falar que acordo de


pesca vira lei. O acordo de pesca não vira lei, nem existe lei
específica que determine como ele deve ser construído. Ao
contrário, até certo ponto ele é livre para ser formulado pelos mora-
dores, desde que não fira as leis em vigor nem introduza elementos
1998, conhecida como lei de crimes am-
bientais. Os artigos 34, 35 e 36 tipificam os
crimes praticados contra os recursos pes-
queiros e atribuem as penalidades para
cada tipo de crime (BRASIL, 1998). Portan-
nesse sentido e contexto que os atos ad-
ministrativos (IN e portarias) são usados
para regulamentar os acordos comuni-
tários de pesca no interior da Amazônia.
As comunidades são consideradas pelos
mitem administrar a atividade pesqueira
com base no conhecimento atualizado
dos seus componentes biológico-pesquei-
de exclusiva aplicação ou regulamentação do Estado como penali- to, não cabe às comunidades estabelecer órgãos gestores como “usuárias” dos re- ros, ecossistêmico, econômicos e sociais”
dades, multas e cobranças de taxas. penalidades a quem quebra as normas do cursos naturais, cujo “dono” é um ente (BRASIL, 2009. Art. 2o, XII).
acordo por elas já estarem contidas em da federação, o Município, o Estado ou a
legislação específica e serem de exclusiva própria União e, por tanto, sua gestão está O ordenamento pesqueiro de que trata
O princípio geral que norteia os acordos aplicação do Estado. subordinada a um desses entes. Na práti- a Lei no 11.959 considera “as peculiari-
de pesca é o consenso entre os moradores: ca, quem regulamentado os poucos acor- dades e as necessidades dos pescadores
“entende- se por acordo de pesca, um con- Todos os acordos no Brasil têm sido re- dos reconhecidos é o órgão que está mais artesanais, de subsistência e da aquicul-
O Estado tem junto de medidas específicas decorrentes gulamentados por atos administrativos próximo fisicamente ou que é demandado tura familiar, visando garantir sua per- Acordo de pesca
papel relevante de tratados consensuais entre os diversos como instruções normativas (IN) e porta- pelas comunidades. O quadro 6 apresenta manência e sua continuidade” (BRASIL, não vira lei. Ele
usuários e o órgão gestor dos recursos pes- rias que não passam pelo poder legislati- os órgãos e instrumentos usados para a 2009. Art. 3o. § 1o). Inegavelmente, es-
no fortalecimen- queiros em uma determinada área, defini- vo e, portanto, não são leis. A instrução regulamentação de acordos na Amazônia. sas considerações abrem novas reflexões é um consen-
to dos acordos ao da geograficamente” (IBAMA, 2002. Art. normativa é a maneira pela qual autori- sócio-jurídicas para o enquadramento dos so entre partes
regulamentá-los. 1o § único). Além dessa definição genéri- dades expedem normas internas de orien- Outro dispositivo legal que trata não acordos de pesca em comunidades cuja interessadas.
ca, a mesma instrução normativa postula tação geral para as repartições públicas. especificamente dos acordos, mas do or- atividade pesqueira baseia-se na subsis-
que os acordos sejam representativos, de- As portarias são atos pelos quais as auto- denamento pesqueiro é a Lei no 11.959, tência por considerar suas peculiaridades
monstrem que a exploração dos recursos ridades de nível inferior ao chefe do poder de 29 de junho de 2009 que dispõe sobre e necessidades. A lei permite explicita-
é sustentável, não estabeleçam privilégios executivo como ministros, secretários de a Política Nacional de Ordenamento Pes- mente a inclusão dos ambientes pesquei-
entre moradores, tenham viabilidade de estado e de município dirigem-se aos seus queiro e Aquícola. Segundo essa lei, “com- ros das comunidades ribeirinhas como
fiscalização e sejam regulamentados por subordinados transmitindo-lhes decisões pete aos Estados e ao Distrito Federal o passíveis de regulamentação, ainda que a
portaria complementar. Esses aspectos do órgão, de caráter interno. ordenamento da pesca nas águas conti- pesca não esteja voltada para a comercia-
devem ser observados quando se pretende nentais de suas respectivas jurisdições, lização. Isso permite que, em regiões onde
regulamentar os acordos junto ao IBAMA A publicação do acordo é feita pelo ór- observada a legislação aplicável, podendo os estoques de pescado sejam pequenos,
Os demais órgãos envolvidos na questão gão responsável pela gestão da área onde o exercício da atividade ser restrito a uma as comunidades elaborem estratégias de
ambiental como MMA, ICMBio, Secretaria estão as comunidades. Como exemplo, determinada bacia hidrográfica” (BRASIL, controle que garantam a segurança ali-
de Estado de Pesca e Aquicultura do Pará uma Reserva Extrativista é unidade fede- 2009. Art. 3o, § 2o). Textualmente, essa mentar das famílias. 
(Sepaq) e Secretaria de Estado de Meio ral gerida pelo Instituto Chico Mendes de lei define o ordenamento pesqueiro como
Ambiente do Pará (Sema) não apresentam Conservação da Biodiversidade (ICMBio) um “conjunto de normas e ações que per-

86  Acordos de Pesca Acordos de Pesca  87


3. Monitoramento do Figura 8. Em Porto de
Moz, muitas comu-
nidades têm acordos
acordo de pesca para suas áreas e estão
buscando as comunida-

P ara o bom monitoramento é importante estabelecer um mar-


co inicial, isto é, um diagnóstico que demonstre claramente a
situação que motiva as comunidades a estabelecerem normas
para acesso aos recursos pesqueiros. Para isso, é importante ter da-
dos numéricos da situação como quantidade de pescado produzida
des vizinhas para evitar
pesca predatória no
entorno. É imprescindí-
vel pensar estratégias
dialogadas envolvendo
anualmente, apetrechos de pesca utilizados, tamanho ou peso das as comunidades mais
espécies manejadas comercialmente, quantidade comercializada próximas da área defini-
anualmente e número de famílias que desenvolvem a pesca como da no acordo.
atividade de geração de renda. Sem um diagnóstico preliminar da
situação, fica mais difícil fazer adequações às normas estabelecidas
ao longo dos anos ou mesmo saber até que ponto elas estão sendo
estratégicas para o alcance dos objetivos pré-estabelecidos.

Quando o objetivo do acordo for garantir


a sustentabilidade da atividade pesqueira
a longo prazo, é importante adotar dois
tipos de monitoramento: o primeiro tipo
tem por finalidade verificar o cumpri- pécies manejadas. Isto é, saber se elas os efeitos e resultados das normas estabe- acordo não estão sofrendo forte pressão da
mento do acordo por parte das famílias aumentaram, diminuíram ou permane- lecidas num determinado período e serão pesca predatória (Figura 8). Isso porque,
do lugar e como está sendo realizada sua cem estáveis. Isso pode ser feito a partir valiosas para possíveis ajustes à medida mesmo com a comunidade cumprindo as
gestão. Isso pode ser feito a partir da ve- de indicadores simples como, por exem- que os objetivos do acordo não estejam normas estabelecidas que garantam a re-
rificação das atas das reuniões, anotações plo, saber se houve alterações no tama- sendo alcançados. Também servem para, composição das populações manejadas,
sobre conflitos, relatórios de apreensão de nho de determinada espécie pescada e na uma vez que os objetivos são alcançados, quando há pesca predatória nas proximi-
apetrechos de pesca e outras informações quantidade de pescado capturada para indicar quais aspectos e regras podem ser dades dos limites definidos pelo acordo,
registradas durante um determinado pe- comercialização no período permitido no flexibilizados para, por exemplo, permitir as chances de a comunidade não alcançar
ríodo. Uma sugestão é que as anotações acordo. que as famílias pescadoras possam pescar os resultados desejados são grandes. Isso
sejam sistematizadas anualmente e discu- maior quantidade de peixe sem compro- vale principalmente para as espécies que
tidas com a comunidade. Essas informações não vão precisar meter os estoques. migram para diferentes ambientes (lagos,
quantos peixes existem numa determina- barrancos, partes mais profundas dos rios
O segundo tipo de monitoramento visa da área, tampouco são pensadas para es- Igualmente, deve-se observar se as áre- e igarapés) de acordo com os ciclos da na-
ter informações sobre a situação das es- tudos científicos. Elas servem para indicar as do entorno dos limites geográficos do tureza. 

88  Acordos de Pesca Acordos de Pesca  89


3.1. Elementos sem exigir delas textos muito longos. alguém na comunidade anote, classifi-  Operações ambientais – Em mui-
O monitoramen-
essenciais para o Basta que cada acontecimento seja re-
gistrado da forma mais simples e obje-
cando a quebra das normas por mora-
dores e não moradores, e quantas vezes
tos casos, as comunidades denunciam
infração às normas aos órgãos de co- to oferece os
monitoramento tiva possível; ocorreu durante o período estabelecido mando e controle do Estado. Isso po- elementos para
do acordo no monitoramento, com um breve rela- derá resultar nas operações ambientais avaliar o com-
 Cumprimento das normas – Ba- to dos acontecimentos; que envolvem polícia, fiscais do Ibama,

A seguir são apresentados os ele- sicamente, as normas são voltadas ICMBio e outras forças dos aparelhos
prometimento
mentos centrais do monitoramen- para o controle do acesso aos recursos  Registro das reuniões dos mem- coercitivos do Estado. Esses fatos são das pessoas com
to do acordo pelas comunidades: pesqueiros (quantidade, apetrechos, bros da comunidade para tratar do importantes no sistema de monitora- as normas do
tamanho e período), de acordo com acordo – Normalmente as comunida- mento por apresentar o grau de difi-
acordo.
 Representatividade das famílias os interesses do grupo. No sistema de des se reúnem para discutir um proble- culdade que as comunidades têm no
que participam da elaboração e re- monitoramento, todas as normas cria- ma real, uma situação que aconteceu e processo de cumprimento das normas
visão do acordo – Uma vez que a das são descritas de forma sucinta para precisa de decisão do grupo a respeito. e ainda podem indicar quais medidas
elaboração das normas é concluída, é facilitar a comparação entre o que foi Contudo, nessas reuniões dificilmente precisam ser tomadas ao longo do tem-
fundamental anotar quantas e quais pensado e o que de fato aconteceu. Com são elaboradas atas. Como forma de po para convencer as famílias acerca
pessoas participaram de sua aprova- um quadro com duas colunas é possível garantir o registro dos acontecimentos, da importância do acordo para todos.
ção – extraindo a representatividade da organizar as informações para compa- uma pessoa pode fazer as seguintes As anotações sobre esses aspectos pre-
participação em relação ao conjunto de ração. Na primeira coluna, anotam-se anotações básicas: data, local, número cisam indicar a data, o que motivou a
moradores. Uma forma simples de fazer as normas estabelecidas no acordo. de participantes, situação que motivou operação e os resultados;
esse monitoramento é passar uma lista Na segunda, anotam-se as normas que a reunião e decisões do grupo. Ao final
de presença na reunião. Fazendo essas foram violadas, assinalando-se na pri- de cada período, uma pessoa pode sis-  Apresentação e discussão dos re-
anotações nas reuniões de elaboração meira coluna as normas cumpridas; tematizar as informações e apresentá- sultados – De nada adiantaria orga-
e posterior revisão do acordo, é possí- las numa assembleia; nizar um conjunto de informações se
vel identificar facilmente se o número  Classificação dos casos de quebra elas não são devolvidas ao grupo para
de pessoas envolvidas aumentou ou das normas do acordo – É muito co-  Participação dos órgãos ambien- subsidiar as reflexões acerca da gestão
diminuiu ao longo do tempo indicando mum nas comunidades que têm acor- tais e outras instituições na gestão do acordo. Assim sendo, uma vez que
se, de fato, há participação ativa e efe- dos de pesca, que algumas famílias do acordo – Um dos principais clamo- os dados do monitoramento da gestão
tiva das famílias interessadas. Mesmo que não concordam com as normas, res das comunidades que têm acordos estão sistematizados, é recomendado
que a comunidade tenha delegado a ou mesmo as que concordam, quebrem de pesca é pela participação dos órgãos que a comunidade marque uma assem-
função de elaborar a versão preliminar os pactos estabelecidos. Normalmente, ambientais na aplicação e cumprimen- bleia convocando todos os moradores e
do acordo a uma equipe, ela deve ser isso provoca fortes conflitos internos to das normas. Sabem as comunidades as instituições direta ou indiretamente
composta pelos principais interessados que, quando não são mediados, põem que sozinhas as chances de êxito do envolvidas e apresente os resultados.
e ser representada pelos diferentes gru- em risco a coesão social local e a lon- acordo são menores. Em muitos casos, Ao mesmo tempo, é importante refletir
pos existentes no local; gevidade do acordo. Quando ocorre de elas não conseguem fazer valer as de- sobre os dados, destacando os pontos
pessoas estranhas ao grupo quebrarem cisões da maioria de moradores. Para o que precisam de ajustes, formulando
 Escolha de pessoas na comunidade as normas, a situação é menos comple- monitoramento, é importante especifi- propostas para corrigir o que não está
para fazer as anotações – A comunida- xa, pois normalmente o grupo se une car quais instituições têm participação dando certo, tendo claro que a gestão
de pode escolher duas ou três pessoas e reage em defesa das normas pactua- ativa na gestão do acordo; do acordo deve contribuir para o alcan-
para fazer o registro dos acontecimen- das sem riscos à coesão do grupo. Cada ce dos objetivos estabelecidos;
tos relacionados à atividade pesqueira, vez que isso ocorre, é importante que

90  Acordos de Pesca Acordos de Pesca  91


 Grau de satisfação das famílias nificativa de espécies de valor comer-
quanto ao que foi estabelecido (nor- cial ou não, existem espécies de maior
mas) – Na mesma assembleia de apre- aceitação e preço nos mercados que,
sentação dos resultados do monitora- consequentemente, sofrem maior pres-
mento da gestão, é possível consultar são (Figura 9). O monitoramento vai
as famílias sobre o grau de satisfação acompanhar o comportamento dessas
que elas têm com o acordo: se estão espécies durante o período estabeleci-
percebendo alguma mudança nas re- do. As demais espécies, de baixo valor
lações entre as famílias, se estão mais comercial ou pescadas apenas para a
otimistas ou se há desconfiança com o subsistência, não precisam entrar na
futuro da atividade pesqueira e se es- lista, para evitar que ela fique extensa e
tão se sentindo prejudicadas com as complexa demais. A construção da lista
normas por estarem produzindo me- de espécies a serem monitoradas deve
nos pescado. O grau de satisfação pode ser feita, sobretudo, por pescadores
apresentar novos elementos para refle- locais, que têm conhecimentos profun-
xão. Por exemplo, se a gestão do acordo dos sobre os ambientes de pesca de sua
está sendo eficiente, mas um número região e sobre as espécies manejadas
significativo de famílias não apresen- comercialmente; Figura 9. As espécies de maior valor comercial, como o pirarucu, são as que sofrem maior pres-
ta reação positiva, deve-se refletir que são da pesca. Para o monitoramento, sugere-se que a comunidade faça uma lista das espécies
algo precisa ser mudado ou trabalhado,  Idade, tamanho ou peso de inicia- de maior demanda no mercado e da preferência dos pescadores por ordem de importância, por
pois a ideia central do acordo é o be- ção da fase reprodutiva das espécies exemplo, pirarucu, tambaqui e pirapitinga.
nefício das famílias e isso pode ser de- – Muitas espécies iniciam sua reprodu-
monstrado pela sua satisfação.  ção antes mesmo de atingirem a fase
adulta. Pescadores experientes sabem podem ajudar na formulação de regras importantes do monitoramento, por
3.2. Elementos muito bem indicar o tamanho, peso ou para a pesca no período do defeso. permitir o cruzamento com informa- O monitoramen-
to das espécies
essenciais para o idade em que várias espécies iniciam
sua reprodução. Essas informações
Por exemplo, o pirarucu sempre tem
locais preferenciais para sua reprodu-
ções de tamanho, de reprodução e gerar
resultados que possibilitem ajustes nas permite saber
monitoramento podem ser organizadas numa tabela ção, como margens de rios com igapós, normas do acordo relacionadas ao ta-
os resultados do
das espécies bem simples, contendo na primeira co- solo argiloso e passagens. Nesse caso, manho permitido para comercialização.
acordo.
luna o nome das espécies, seguida de é possível observar se as espécies são Para obter essa informação, é necessá-

A seguir são apresentados os ele-


mentos centrais do monitoramen-
to das espécies manejadas:

 Lista de espécies manejadas co-


outras três colunas indicando a idade,
peso e tamanho. Essas informações in-
dicarão se a população manejada está
conseguindo se reproduzir antes de ser
capturada;
encontradas nesses ambientes durante
o período de reprodução. A presença ou
a ausência dará sinais valiosos acerca
da população em determinados am-
bientes e, consequentemente, ajudará a
rio que os responsáveis pelo monitora-
mento consultem os compradores;

 Quantidade de pescado produzida


anualmente por espécie – Durante a
mercialmente – Muitas áreas têm ocor- comunidade a pensar ou repensar suas coleta de informações sobre o tamanho
rência de diversas espécies de pescado,  Época de reprodução de cada es- estratégias; ou o peso das espécies, pode-se fazer
principalmente as que estão interli- pécie – Com base na lista de espécies, as anotações da quantidade de pesca-
gadas com o Rio Amazonas. Contudo, pode-se acrescentar a época em que  Tamanho ou peso das espécies cap- do que cada comprador tem em suas
mesmo havendo uma variedade sig- cada uma se reproduz. As informações turadas – Esse é um dos aspectos mais caixas. Ao final da coleta, será possível

92  Acordos de Pesca Acordos de Pesca  93


Figura 10. Saber o  Número de pescadores – É impor- quilo e por espécie, e multiplicar pela Figura 11. O monitora-
número de pescadores tante saber o número de pescadores no quantidade produzida. Embora esse mento também pode
e a quantidade pescada início do monitoramento e acompanhar tipo de avaliação não esteja diretamen- se beneficiar do acom-
ajuda no monitoramento a cada ano a evolução para estabelecer te relacionado com o comportamento panhamento da de-
do acordo. a proporcionalidade entre o número de das espécies manejadas, é importante manda por pescado no
pescadores e a quantidade de pescado para avaliar a importância econômica mercado.
produzida por ano e, com isso, evitar da atividade e avaliar de que maneira
erros na estimativa da capacidade anu- um possível endurecimento ou flexibili-
al de produção. Ou seja, se aumentou zação das normas pode afetar a geração
a quantidade (Figura 10) de pescado de renda das famílias. Também permite
produzida no ano, mas aumentou tam- avaliar se houve variação da quantida-
bém o número de pescadores, pode sig- de produzida em função da variação de
nificar que a população de pescado não preço nos mercados consumidores (Fi-
aumentou ou aumentou em menor per- gura 11). 
centual do que aparenta. Desse modo,
sabendo-se o número de pescadores
em cada ano é possível precisar o cres-
cimento ou o decréscimo das espécies Apêndice
manejadas comercialmente; Recursos necessários para chegar à regulamentação de um acordo de pesca, considerando as
inúmeras reuniões que são realizadas até a definição consensual das normas.
Etapas Tipo de atividade Principais recursos necessários
 Número de compradores/atraves-
Identificação do problema Mobilização e reunião dos atores Meios de transporte (barco e
sadores – Igualmente é importante interessados combustível) e alimentação
precisar o número de compradores de
Identificação dos atores Reunião dos atores interessados Pessoas com conhecimento da
peixe a cada ano para garantir que a co- envolvidos cadeia da pesca (pescadores,
leta de informações foi completa, pois compradores e consumidores)
normalmente há mudanças a cada ano: Mapeamento das áreas de pesca Levantamento dos Pessoas com habilidade para a
muitos compradores desistem, outros ambientes de pesca para a elaboração mapas falados Uso
estimar com bastante confiabilidade iniciam, e assim por diante. Sabendo-se elaboração de mapas (falados de GPS e profissional na área de
ou georreferenciados) geoprocessamento (caso a opção
a quantidade de pescado produzida quantas pessoas praticaram a compra seja por mapa georreferenciado)
anualmente. A exemplo do estudo re- de peixe a cada ano, torna-se possível Reflexão sobre o problema Reunião entre todos os Mediador com habilidade para
alizado nas comunidades do Rio Acaí, avaliar se a coleta de dados foi comple- sintetizado envolvidos moderar reuniões tensas
a população de pescado apresentou ta ou não e introduzir fatores de corre- Solução do problema Mobilização e reunião com todos Pessoas com habilidades para
visível aumento a partir do quinto ano ção quando se fizer necessário; Formulação dos objetivos do os interessados anotações, moderador de
do acordo de pesca (segundo relato dos acordo reuniões habilidoso, material de
expediente e alimentação
moradores). Mesmo assim, é impor-  Preço pago por quilo por espécie Formulação das normas
tante avaliar a produção por, pelo me- – Para avaliar quanto a atividade pes- Diálogo dos interessados com Reunião para adaptação das Passagens aéreas para técnicos
nos, três anos para um resultado mais queira movimenta anualmente, basta agentes do órgão que regula- normas à linguagem das IN e dos órgãos ambientais e diárias
consistente; saber o preço pago ao pescador, por menta os acordos portarias

94  Acordos de Pesca Acordos de Pesca  95


Cultivo de
Cacau em
Terra Mista
Juraci Dias, Antônio Reis do Nascimento Filho,
José Ferreira de Sousa Filho e Carlos Harold

Este artigo traz lições para


agricultores interessados em
plantar cacau em terra mista
com práticas de preparo da área,
produção de mudas, plantio, tratos
culturais, controle de pragas e
doenças e beneficiamento da
produção.

96  Cultivo de Cacau em Terra Mista Cultivo de Cacau em Terra Mista  97


O
Figura 1. Cada vez mais
cultivo de cacau é uma das atividades agrícolas mais desenvolvidas na Tran- os agricultores têm
samazônica, em particular no município de Medicilândia. Parte do municí- investido no plantio de
pio tradicionalmente se destaca na produção do cacau por apresentar solos cacau em terra mista.
de terra roxa (Nitossolos) com alta fertilidade natural. No entanto, recentemente, o
cacau também tem sido cultivado por famílias que residem em áreas de terra mista
(geralmente Latossolos).

O cultivo do cacau em terra mista (também conhecida como terra branca) tem au-
mentado na região. No entanto, a maior parte dos agricultores não vem utilizando
nenhuma técnica de cultivo específica para as características do solo que tem
menor fertilidade natural do que a terra roxa. Mesmo ainda não havendo ne-
nhuma comprovação de viabilidade econômica e nenhuma proposta técnica
para o plantio de cacau em terra mista, muitos agricultores têm conseguido
produção satisfatória. Este artigo traz lições importantes para os agriculto-
res interessados em investir no plantio de cacau em terra mista, baseadas
nas experiências dos agricultores familiares de Medicilândia (Figura 1).

1. Preparo da área Para plantar em


terra mista vale

E sta é uma das etapas de maior importância em todo o cultivo


e funciona como um alicerce que terá a função de sustentar
todas as outras etapas. Uma planta que tem bom desenvolvi-
mento inicial terá raízes e copa bem formadas, ficando mais resis-
colocado em baldes ou outros recipientes
limpos, com um balde para cada profun-
didade (0 a 20 e 20 a 40 cm). Como mui-
tos agricultores não têm trado disponível,
a cultura anterior, o tipo de preparo do
solo e o nome do sítio e do proprietário.
Para enviar as amostras para um labora-
tório de análise de solo, em Medicilândia,
recomendação do laboratório é revisada
com o técnico que conhece a área e os in-
teresses dos agricultores. 
a pena fazer
correção e adu-
bação do solo. O
tente para o período menos chuvoso do ano. A principal proposta eles usam o enxadão para coletar o solo. os agricultores procuram o Sindicato de 1.2.1. Calagem calcário ajuda a
técnica construída em Medicilândia está ligada à correção e aduba- Nesse caso, a coleta também é feita em Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais planta a absorver
ção do solo no momento do preparo da área. Para isso, são observa- diferentes pontos da área a ser plantada. (STTR), que presta esse serviço.  A calagem é a adição de calcário como
dos os seguintes passos: condicionador do solo para adequar sua os nutrientes da
Após a coleta, o conteúdo de cada bal- 1.2. Correção do solo acidez (pH). Com a calagem, os nutrien- adubação.
de é misturado e uma amostra de 100 gra- tes são mais bem disponibilizados, faci-
1.1. Coleta de solo
para análise
mas de cada balde é armazenada em dois
sacos plásticos limpos e sem furos. Antes
de encaminhar a amostra ao laboratório, C om a análise do solo e a recomen-
dação feita pelos técnicos, é possí-
vel realizar a calagem e a adubação
litando sua captura pela planta. Sem a
calagem, a adubação pode não funcionar
bem, pois os nutrientes podem não ficar

P ara a coleta de amostras de solo nas


profundidades de 0 a 20 cm e de 20
a 40 cm, é usado um trado. A cole-
ta é feita em, no mínimo, 15 pontos, de
forma a representar toda a área. O solo é
os sacos são fechados e etiquetados infor-
mando: a profundidade da amostra, a cul-
tura que se pretende plantar ou a cultura
que já está plantada e outras informações
relevantes como as adubações anteriores,
com maior acerto e economia. Na região
é comum que os próprios laboratórios já
enviem a análise com a recomendação
baseada apenas nas informações conti-
das nas etiquetas. Sempre que possível, a
disponíveis.

O calcário é incorporado ao solo na


quantidade recomendada. Quando não é
usado arado ou outra forma de incorpo-

98  Cultivo de Cacau em Terra Mista Cultivo de Cacau em Terra Mista  99


rar o calcário, utiliza-se apenas a metade O uso de gesso em lavouras cacaueiras fornecer) mas, com o decorrer do tempo, a crescimento da planta. Sua principal fonte
Adubos orgâni-
da quantidade indicada, porque as reco- em solos de terra roxa com baixa presença planta enfraquece e seu desenvolvimento é a Ureia (45% de N) e o Sulfato de Amônio
mendações são baseadas na correção de de alumínio na parte mais funda do solo reduz (quando os poucos nutrientes dis- (20% de N e 22% de S). A Ureia tem mais cos são fonte
pH para a profundidade de até 30 cm. Isso (subsuperfície) não tem sido necessário. poníveis já foram utilizados). quantidade de N por quilo, mas o Sulfato de nitrogênio
evita o excesso de calcário na camada su- No entanto, se o plantio for feito em so- de Amônio é menos volátil (fica mais tem- alternativa aos
perficial do solo e o efeito da supercala- los com alto teor de alumínio, que é tóxi- Nas recomendações de adubação, mui- po no solo). A escolha de qual adubo usar
gem, que é prejudicial à planta. co às plantas por impedir o crescimento tas vezes ocorre indicação de formulações normalmente depende do preço no mer- adubos nitroge-
das raízes, o uso de gesso agrícola deve prontas como 11-30-17 e 10-28-20. Essas cado e das condições de transporte. nados e podem
Outro cuidado tomado é quanto ao tipo ser testado. No entanto a resposta ao ges- formulações são misturas dos macronu- ser produzidos na
de calcário a ser utilizado, pois existem so deve ser avaliada a longo prazo pois a trientes nitrogênio (N), fósforo (P) e potás- Os adubos nitrogenados são bastante
propriedade com
dois: calcítico e dolomítico. O calcário cal- principal função deste insumo é facilitar o sio (K), conhecidas como NPK. Mas, mui- voláteis e, mesmo que o produtor adicio-
cítico apresenta maior proporção de cálcio desenvolvimento do sistema radicular, o tas vezes, o adubo em formulação sai mais ne grandes quantidades, no prazo de 15 baixo custo.
com relação ao magnésio, muitas vezes que nem sempre é necessário em regiões caro do que se comprado separadamente dias o nitrogênio não estará mais presente
não contendo magnésio algum. O dolomí- com chuvas abundantes. seguindo a recomendação da análise de no solo. A solução para isso tem sido par-
tico apresenta maior proporção de mag- solo. Em Medicilândia estão sendo consi- celar as doses de adubação, evitar deixar
nésio quando comparado com o calcítico. 1.2.3. Adubação derados o papel de cada nutriente e os no- o adubo exposto ao sol, utilizar adubação
Para determinar qual calcário utilizar, é mes comerciais para a compra separada: orgânica ou plantar adubação verde.
avaliada a proporção de cálcio e magnésio A adubação em solos de baixa fertilidade
na análise de solo. Estando a proporção é importante (Figura 2). O solo pode ga- Nitrogênio Os adubos orgânicos como esterco bo-
maior que 3:1 (3 de cálcio para 1 de mag- rantir o bom desenvolvimento inicial do O primeiro número nas formulações co- vino, cama de frango, composto de casca
nésio), usa-se calcário dolomítico. plantio (enquanto possui nutrientes para merciais é o nitrogênio que está ligado ao de cacau, húmus de minhoca e compos-
to de folhas contêm elevada quantidade
A calagem é feita pelo menos 40 dias de nitrogênio. Esses adubos fornecem o
antes do plantio. Isso porque o calcário é nitrogênio na medida em que são decom-
um produto de baixa solubilidade, demo- postos, liberando o nutriente aos poucos,
rando a reagir no solo. Para seu melhor permitindo seu melhor aproveitamento.
aproveitamento, é distribuído antes dos Os adubos orgânicos também auxiliam no
adubos e do plantio. acúmulo de matéria orgânica no solo, o
que facilita a manutenção e disponibiliza-
1.2.2. Gessagem ção dos nutrientes. Particularmente o es-
terco bovino tem sido muito usado pelos
Apesar de o calcário reduzir a toxidez do agricultores.
alumínio, ele não consegue atingir a par-
te mais profunda do solo pois não desce
(percola) facilmente. Sendo assim, a úni- Figura 2. A correção e adubação do solo são
ca forma para a correção é o uso do ges- fundamentais para a boa produção de cacau
so agrícola, que possui outras vantagens em áreas de terra mista, que têm menor fer-
como ser fonte de Ca (Cálcio) e S (Enxofre). tilidade natural que solos de terra roxa.

100  Cultivo de Cacau em Terra Mista Cultivo de Cacau em Terra Mista  101
O uso de adubação verde com espécies Fosfato Triplo é um adubo de alta solubi-
Agricultores têm
vegetais como feijão-guandu, mamona, lidade e libera seus nutrientes de forma
usado adubos crotalária e mucuna, que possuem bac- mais rápida, sendo indicado para cultivos
verdes como fon- térias fixadoras de nitrogênio, é uma al- anuais e de ciclo curto.
te de nitrogênio e ternativa viável para a adubação que tem
sido difundida há décadas na Transama- Potássio
comprado adu- zônica. A adubação verde reduz os custos O terceiro e último número das formu-
bos para fósforo e fornece satisfatoriamente nitrogênio às lações se refere ao potássio, que é vital na
e potássio sepa- plantas de cacau, sendo normalmente fotossíntese e atua também na resistên-
plantada nas entrelinhas durante os pri- cia das plantas às doenças. Sua principal Figura 3.
radamente, como
meiros dois anos de cultivo. fonte é o Cloreto de Potássio (60% de K). Para plantar em terra
forma de reduzir A aplicação é parcelada quando feita em mista os agricultores
os custos. Fósforo solos arenosos e com baixa quantidade estão investindo em
O segundo número nas formulações é de matéria orgânica, pois ele é facilmente adubação.
o fósforo que é, geralmente, muito defi- perdido (lixiviado) sob tais condições.
ciente em Latossolos. Atua na formação
e desenvolvimento das raízes e, por isso, A quantidade adequada de cada nu- tão ligados à capacidade das plantas de catalisa vários processos metabólicos.
é muito importante na adubação de plan- triente a ser aplicada depende da reco- resistir a doenças e ao ataque de pragas, Os solos arenosos podem se tornar de-
tio. O fósforo também é fundamental para mendação de adubação derivada da aná- influenciando diretamente na produção. ficientes por causa das perdas por lixi-
a formação das sementes que, no caso do lise de solos. Uma análise bem feita e a Entre os principais micronutrientes para viação. O boro tem se tornado muito
cacau, é o produto de maior interesse. recomendação correta podem significar cacau destacam-se: comum como fungicida, sendo usado
muita economia para o agricultor. Em na calda bordalesa, principal fungicida
As principais fontes desse nutriente são particular na Transamazônica, onde os  Zinco – É o micronutriente cuja de- da produção orgânica.
o Super Fosfato Simples (18% de P2O5) e adubos são caros, a preferência tem sido ficiência mais limita a produção das
o Super Fosfato Triplo (41% de P2O5). Sua pelo uso da adubação orgânica ou adubos culturas. É quase impossível alcançar 1.2.5. Adubação de cobertura
aplicação é feita em dose única antes do verdes como fonte de nitrogênio e pela altas produções sem zinco. Solos argilo-
plantio e, posteriormente, nas adubações compra dos adubos para fósforo e potás- sos em sua maioria contêm mais zinco Na cultura do cacau, os agricultores fazem
de cobertura. No plantio, os agricultores sio separadamente, misturando-se os nu- que solos arenosos; adubação de plantio e, todo ano, no inicio
têm colocado o adubo nas covas e abai- trientes apenas no momento de fazer a das chuvas, fazem a adubação de cober-
xo das mudas, fazendo com que as raízes adubação (Figura 3).  Boro – O boro está ligado ao poder tura. A adubação de cobertura serve para
procurem o fósforo e direcionem seu cres- germinativo das sementes. A deficiên- adequar os teores de nutrientes no solo,
cimento para baixo, crescendo em pro- 1.2.4. Avaliação sobre cia de boro retarda o crescimento das pois parte deles vai para os frutos.
fundidade e auxiliando na superação dos micronutrientes plantas, afetando inicialmente os pon-
períodos de seca. tos de crescimento e as folhas novas. O Para a adubação de cobertura, a análise
Em Medicilândia, os agricultores estão fa- seu uso requer cuidados, pois é muito utilizada no plantio é levada a um técnico,
No plantio de culturas perenes como o zendo testes com micronutrientes na adu- pequena a diferença entre as concen- que é avisado da adubação usada na cova
cacau, tem sido indicado o uso do Super bação. Os micronutrientes são tão impor- trações de deficiência e toxidez; e pode recomendar a adubação de cober-
Fosfato Simples que tem menor solubili- tantes quanto os macronutrientes, mas tura. A análise de solo é refeita a cada três
dade, liberando os nutrientes aos poucos são usados em quantidade muito menor.  Cobre – O cobre é necessário para a anos de modo a garantir sua confiabilida-
e por um período maior de tempo. O Super Em muitos casos, os micronutrientes es- formação da clorofila nas plantas, pois de. 

102  Cultivo de Cacau em Terra Mista Cultivo de Cacau em Terra Mista  103
2. Produção de mudas 3. Plantio de homogeneizar o espaçamento entre as
plantas, sendo de 3 m x 3 m o espaçamen-

A s sementes usadas para o plantio pelos agricultores de Me-


dicilândia são oriundas da Comissão Executiva do Plano da
Lavoura Cacaueira (Ceplac) ou de roças vizinhas. A prática
de plantar sementes das roças vizinhas é comum entre os agriculto-
res pois, em alguns anos, a Ceplac não consegue atender a demanda
O preparo da área para o plantio é
realizado de duas maneiras:

 Em área de mata (primária ou ca-


poeira) – A roçagem é iniciada no mês
to mais utilizado.

Feito o balizamento, a etapa seguinte é


o coveamento com uso de uma cavadei-
ra ou enxadão. As covas devem ser feitas
por sementes. A produção de mudas ocorre de três a cinco meses de agosto ou setembro e, no mês se- com 40 cm de largura por 40 cm de pro-
antes do plantio, dependendo da disponibilidade de sementes. As guinte, é feita a derrubada das árvores. fundidade (40 x 40). A parte de cima do
mudas são feitas em sacos de polietileno de 15 x 25 cm que são en- Quando a vegetação seca, realiza-se a solo, com maior teor de matéria orgânica,
chidos com um extrato composto de 70% de terra e 30% de esterco. queima e, depois, em alguns casos, re- é separada da parte de baixo, mais pobre.
As sementes são colocadas em local úmido para germinar, antes de aliza-se o encoivaramento. Como alter- O adubo é adicionado à parte de cima do
serem plantadas nos sacos. Quando plantadas, as mudas são agru- nativa à queima, no município de Medi- solo que é jogado no fundo da cova. As-
padas em viveiros, montados pelos próprios agricultores, utilizando cilândia muitos agricultores ligados ao sim se promove o crescimento das raízes
principalmente madeira e folhas de coqueiro para o sombreamento Projeto “Roça Sem Queimar” apoiado em profundidade, auxiliando a planta na
(Figura 4).   pelo STTR já fazem o preparo da área superação dos períodos de seca.
a partir da roçagem da capoeira e do
plantio direto, sem uso de fogo. Entre Após o preparo da área, faz-se o trans-
Figura 4. A utilização várias vantagens da roça sem queima, plantio no início do período chuvoso, nos
dos viveiros se deve à está a manutenção da matéria orgânica meses de janeiro e fevereiro. O transplan-
Cacau demanda
necessidade de som- no solo. tio é feito retirando-se o saco de polieti- muito conhe-
breamento das mudas. leno da muda, tomando-se todos os cui- cimento e tra-
Próximo ao tempo do  Em área de pastagem – Inicia-se dados para que não ocorra a quebra do balho, mas os
plantio, a cobertura é com a eliminação do capim com her- torrão de modo a não danificar as raízes
retirada para que ocorra bicidas específicos para o controle de já formadas. A muda é inserida na cova resultados têm
a aclimatação das gramíneas. Outra prática que tem sido e coberta. compensado e
mudas. adotada por alguns produtores e que animado os agri-
apresenta vantagens ambientais é a A atenção no plantio é fundamental
utilização de roçadeiras costais na lim- para garantir a sobrevivência das mudas,
cultores a expan-
peza da área, em vez do uso de herbici- particularmente em áreas de terra mista dir os plantios.
das. Esta prática apresenta a vantagem que tende a reter menos umidade. Dos
da criação de uma camada de compos- agricultores acompanhados, em um deles
tos orgânicos, servindo como condicio- o plantio se desenvolveu sem problemas,
nadora do solo, armazenando umidade mas em dois houve mortalidade das mu-
e auxiliando na ciclagem de nutrientes. das tanto no viveiro quanto após o plan-
tio, levando à necessidade de replantio.
As atividades seguintes são realizadas em
dois passos: o balizamento e o coveamen- Utilizando-se o espaçamento 3 m x 3 m
to. O balizamento é feito com o objetivo pode-se plantar 1.111 cacaueiros em um

104  Cultivo de Cacau em Terra Mista Cultivo de Cacau em Terra Mista  105
hectare. A produtividade média é de um Figura 5. Cacau de um ano, bem sombreado
quilo de amêndoa por pé por ano (varian- com bananeira. As plantas de sombreamento
do de 700 gramas a dois quilos) com pro- provisório são retiradas dois anos depois do
dução média de 1,1 tonelada por hectare transplantio ou na medida em que as som-
por ano. Geralmente a área ocupada com bras se tornam muito densas, prejudicando o
o cultivo de cacau na terra mista varia en- crescimento do cacau.
tre um e oito hectares, com média de três
hectares por família, dependendo da situ-
ação financeira. 

4. Tratos culturais
Dentre os principais tratos culturais para o plantio do cacau, pos de poda: de formação, de recuperação
encontram-se sombreamento, roço, desbrota e poda. e de limpeza:

4.1. Sombreamento  Sombreamento definitivo – É feito solo, limitando o crescimento das plantas  Poda de formação – É feita após o
com árvores plantadas dentro da la- invasoras e reduzindo a necessidade de terceiro ano da cultura e consiste na

S endo o cacau uma planta de sub-


bosque, há necessidade de som-
breamento desde o início da im-
plantação da lavoura até a fase adulta e
voura com o intuito de, quando adul-
tas, apresentarem características de
bosques ou florestas pouco densas. O
objetivo é sombrear as plantas de ca-
roços.

4.3. Desbrota
 eliminação de galhos sombreados inde-
sejáveis, com o objetivo de dar melhor
arquitetura à planta. Normalmente per-
mite-se o desenvolvimento de apenas
produtiva. O sombreamento para o cacau
está dividido em duas etapas:

 Sombreamento provisório – É plan-


tado, de preferência, no ano anterior ao
cau ao longo de toda sua existência.
Para o sombreamento definitivo é uti-
lizado mogno, cedro e outras espécies
locais de potencial madeireiro, com es-
paçamento variando de acordo com a
D urante toda a vida das plantas de
cacau ocorrem brotações, que são
chupões improdutivos que são
eliminados periodicamente, uma a três
vezes ao ano. Nas áreas de terra mista, a
três ou quatro galhos na coroa da plan-
ta. Os ramos ladrões que, porventura,
apareçam no troco ou abaixo da coroa,
devem ser eliminados;

plantio. Nos primeiros anos protegerá a espécie.  necessidade de desbrota geralmente é me-  Poda de produção – É feita a limpeza
cultura do excesso de sol, além de di- nor do que na terra roxa, pois o número de do excesso de ramos, sobretudo quan-
Para a manuten- minuir o ataque de pragas como tripes 4.2. Roço brotações tende a ser inferior. A desbrota do estiverem entrelaçados na copa, a
e monalôniom. Ele atua até que o som- começa já no primeiro ano da cultura.  fim de permitir maior aeração e melhor

P
ção dos plantios breamento definitivo já esteja implan- ara o controle das plantas invasoras arquitetura do cacaueiro. É realizada
de cacau, é fun- tado e agindo sobre a lavoura. Para a nas lavouras de cacau, o roço é feito 4.4. Podas de dentro para fora sem abrir espaços
damental fazer formação do sombreamento provisório, de duas a três vezes ao ano duran- para a entrada de luz solar sobre o eixo
sombreamento,
roços, desbrotas
e podas.
é muito usada a bananeira (Figura 5),
mas também podem ser usados a ma-
mona e o feijão guandu com espaça-
mento 3 m x 3 m.
te os primeiros seis anos e, pelo menos,
uma vez ao ano depois que a lavoura já
está formada. A formação da copa do ca-
cau reduz a luminosidade que chega até o
A poda consiste na retirada de ra-
mos que concorrem com a produ-
tividade da planta. São três os ti-
central do cacaueiro. Geralmente é feita
a cada dois anos a partir do quarto ano
após a colheita da safra principal, entre
os meses de setembro a novembro. Em

106  Cultivo de Cacau em Terra Mista Cultivo de Cacau em Terra Mista  107
áreas de terra mista geralmente o cres- de doenças como a vassoura-de-bruxa Para o seu controle, são feitas podas fi- de desenvolvimento. Após a invasão do
cimento de ramos em excesso é menor, e a podridão-parda. Normalmente é re- tossanitárias e remoção de frutos infecta- fruto, o fungo atinge as sementes, tornan-
reduzindo a necessidade dessas podas; alizada todos os anos a partir do quarto dos acompanhados de enterro ou queima do-as impróprias para a industrialização.
ano após a colheita, juntamente com a dos restos vegetais, visando a diminuição As sementes doentes podem contaminar
 Poda de limpeza – A poda de lim- catação manual de frutos doentes que do inóculo. Em lavouras com presença de as sadias através do contato entre elas, no
peza consiste na eliminação de galhos ficam no chão. Os galhos e frutos do- vassoura-de-bruxa, são feitas quatro re- processo de fermentação (ABREU, 1986).
secos e doentes ou ainda de ramos cuja entes devem ser queimados em local moções anuais, nos meses de fevereiro, A maior incidência da podridão parda nos
folhagem não recebe a luz solar. Esta separado.  maio, agosto e novembro, imediatamen- frutos de cacau ocorre na fase conhecida
poda é muito utilizada para o controle te antes ou após os períodos de maior como temporão na época da chuva, e di-
atividade vegetativa do hospedeiro. Jun- minui acentuadamente a partir do final
tamente com as podas sanitárias, alguns das águas.
agricultores fazem pulverizações com óxi-

5. Controle de do cuproso.

Podridão parda
O controle é feito de maneira integrada,
associando práticas culturais como podas
e remoção de frutos doentes e uso de cul-
Depois da colhei-
pragas e doenças A podridão parda é uma das principais
doenças dos cacaueiros do Brasil, causan-
tivares resistentes com controle químico.
O controle químico mais usado em Medi-
ta, vêm as etapas
fundamentais
do perdas de até 30% na produção anual. cilândia tem sido feito com o fungicida Re-
de fermentação,
5.1. Controle de pragas dicado em 250 mL por ha dissolvidos em Os sintomas aparecem em todas as partes cop (à base de Oxicloreto de Cobre) em pó
secagem e arma-
água.  das plantas, mas os maiores prejuízos são com recomendação de 6 a 12 gramas por

A pesar de a cultura do cacau apre-


sentar grande quantidade de
pragas, em Medicilândia a que
5.2. Controle de doenças
ocasionados quando infecta frutos. Os fru-
tos são suscetíveis em todas as suas fases
pé, resultando em 160 litros de calda por
hectare.  
zenamento que
garantem a quali-

E
mais tem incomodado os agricultores é o ntre as doenças que mais afetam os dade do produto.
chupança ou o Monalonion (Monalonion
spp.). Esta praga age sugando a seiva dos
ramos, das folhas e dos frutos novos. Seu
cacaueiros da região, estão a vas-
soura-de-bruxa e a podridão parda. 6. Beneficiamento

Pragas e doen-
ataque é maior nas áreas pouco sombrea-
das (ABREU, 1986) o que indica que uma
forma de evitar seu aparecimento é ter
as plantas com copas bem formadas, no
espaçamento ideal. O ataque desta praga
Vassoura-de-bruxa
A vassoura-de-bruxa é um fungo que
ataca ramos novos, frutos e botões florais.
Nos ramos, o sintoma é a superbrotação
lateral, fazendo com que os ramos fiquem
O beneficiamento do cacau visa obter amêndoas com umida-
de de 7% a 8%, sem impurezas e com aroma, sabor, textura
e aparência agradáveis. A produção de amêndoas de quali-
dade tem sido promovida tanto para atender os mercados externos
quanto para a fabricação de chocolate feita pelos próprios agricul-
ças são comuns
se dá principalmente do terceiro ao quin- com aspecto de vassoura. Nos frutos, os tores de Medicilândia (Figura 6). O beneficiamento é constituído das
em plantios de to anos do plantio, entre a retirada do sintomas são variados em função da in- seguintes fases: colheita e extração das amêndoas, fermentação,
cacau, mas têm sombreamento provisório e a formação fecção. Quando ataca os botões florais, secagem e armazenamento.  
sido controladas definitiva do cacau, devido à maior in- gera frutos deformados com aspecto de
cidência de luz. O combate a este inseto morango, que logo se mumificam. Quan- Figura 6. Os agricultores de Medicilândia investiram na
com bom mane-
requer o uso de inseticida e aquele usado do ataca frutos formados causa lesões es- produção de seu próprio chocolate com a marca CacauWay
jo e combates com maior frequência em Medicilândia é curas, irregulares e firmes ao tato (MAR- e, para isso, estão melhorando a qualidade das amêndoas
específicos. o Decis 25 EC (à base de deltametrina) in- TINS NETO, 2005). que são processadas na fábrica instalada no município.

108  Cultivo de Cacau em Terra Mista Cultivo de Cacau em Terra Mista  109
6.1. Colheita dos aço inox, obedecendo aos padrões da vigi- 6.4. Armazenamento Apenas os agricultores reunidos na coo-
frutos e extração lância sanitária e facilitando a comerciali- perativa de orgânicos têm armazenado o

das amêndoas
zação da polpa.

6.3. Fermentação A maioria dos produtores não arma-


zena cacau em suas propriedades,
vendendo semanalmente para os
cacau em galpões de madeira construídos
nas propriedades. O armazenamento não
deve ultrapassar 90 dias e deve-se tomar

A boa fermen-
O período da safra é de junho a
agosto, sendo as colheitas de en-
tressafra feitas durante pratica-
mente todo o ano. A colheita é feita com
o uso de podão, colhendo-se apenas os A
e secagem
maioria dos agricultores faz a fer-
mentação usando sacos de nylon
onde são armazenadas as amên-
atravessadores ou transportando a pro-
dução no carro de linha para a cidade.

Apêndice
diversos cuidados no que se refere ao con-
trole de ratos e insetos. 

Custo estimado para a implantação de um hectare de cacau em terra mista


tação é funda-
frutos maduros, que são derrubados no doas do cacau ainda com polpa. Esse pro- Atividades Unidade Quantidade Custo unitário (em R$) Custo total (em R$)
mental para chão e reunidos em montes (bandeiras) cesso dura três dias em média. Depois da Sacos para produção de mudas Milheiro 1,5 25,00 37,50
a qualidade formados em locais estratégicos da roça, fermentação, as amêndoas são colocadas Análise de solo Unidade 1 30,00 30,00
das amêndoas com auxílio de paneiros. A quebra é fei- ao sol, sobre lonas, para secar. Em tempo Calcário Tonelada 2 250,00 500,00
ta até o quinto dia após a colheita sendo normal de sol, a secagem é realizada em
produzidas. Mão de obra para calagem e adubação Diária 10 40,00 400,00
realizada com pedaços de facão (cutelo) até sete dias. Esterco e leguminosas como fonte de Nitrogênio Diária 15 40,00 600,00
que não são amolados para não cortar as Super Fosfato Simples Kg 340 1,20 408,00
amêndoas. Os frutos são partidos e as se- Para melhorar a fermentação algumas
Cloreto de Potássio Kg 60 2,00 120,00
mentes retiradas da casca, separando-se famílias já estão usando o cocho (caixas
Produção de muda de cacau Mudas 1000 0,50 500,00
as sementes da sibirea (talo central). Em de madeira cobertas), e para melhorar a
Muda de banana (sombreamento) Mudas 500 0,40 200,00
seguida, as sementes são levadas para a secagem construíram barcaças com las-
Broca Diária 10 40,00 400,00
fermentação.   tro de madeira fixo e cobertura móvel ou
estufa alternativa com cobertura fixa de Derruba Diária 04 50,00 200,00

6.2. Despolpamento plástico transparente (Figura 7). Os co- Coivara


Balizamento
Diária
Diária
03
04
40,00
40,00
120,00
160,00
chos têm furos no fundo para escoar o mel

A tualmente o preço da polpa se as- que sai da massa e para a ventilação. Para Coveamento Diária 06 40,00 240,00
semelha ao preço do cacau seco, uma boa fermentação no cocho, a massa é Plantio de banana Diária 05 40,00 200,00
fazendo o despolpamento se tor- revirada nos seguintes períodos: Retirada da bananeira (2 anos depois) Diária 02 40,00 80,00
nar financeiramente atrativo. No processo Capina antes do plantio do cacau Diária 04 40,00 160,00
de despolpamento, os produtores deixam  Primeira virada com 24 horas (1 dia) Plantio de cacau Diária 05 40,00 200,00
mais de 30% da polpa, pois esta quanti-  Segunda virada com 72 horas (3 dias) Roço primeiro ano Diária 21 40,00 840,00
dade é necessária para a fermentação.  Terceira virada com 96 horas (4 dias) Roço segundo ano Diária 21 40,00 840,00
Alguns já estão usando despolpadeiras de  Saída do cocho com 120 horas (5 dias) Roço terceiro ano Diária 21 40,00 840,00
Poda de formação (a partir do terceiro ano) Pé de cacau 1000 0,50 500,00
Figura 7. Instalações
para fermentação
A B Desbrota (três por ano desde o primeiro ano) Diária 02 40,00 80,00
Inseticida e adubo foliar Unidade 1 225,00 225,00
e secagem das
Adubação de cobertura (todo ano) Unidade 528,00
amêndoas de cacau:
a) cocho e b) estufa. Mão de obra para a adubação Diária 10 40,00 400,00
TOTAL 8.808,50

Cultivo de Cacau em Terra Mista  111


Criação
de Galinha
Caipira e
Caipirão
Antônio Reis do Nascimento Filho, Thomas Monteiro
e Cláudio Wilson Soares Barbosa

Experiências de construção
de infraestrutura e manejos
alimentar, sanitário e reprodutivo
para criação de galinha caipira e
caipirão são apresentadas neste
capítulo.

112  CriaÇão de Galinha Caipira e Caipirão CriaÇão de Galinha Caipira e Caipirão  113
A s famílias de Medicilândia nor-
malmente têm de 10 a 100 bicos
de galinha caipira comum, sem
raça definida. Os ovos que não são con-
sumidos servem para reprodução e os
uma linhagem geneticamente melho-
rada. Nesse caso, o criador compra, na
cidade, pintos de um dia de nascido e
os leva para criar em sua propriedade.
O interesse em trabalhar com o caipi-
aterro e alicerce. A construção é feita
próxima da residência, mas mantendo
distância mínima de 30 a 40 m, para
que o barulho não incomode a família.
O local deve ter fácil acesso à água e
para evitar que as chuvas molhem o
seu interior;

 Piso – Recomenda-se a construção


de piso de forma nivelada para evitar
Famílias que
pintos são criados principalmente para rão deve-se ao seu crescimento rápido, estar contra o vento, para evitar mau acúmulo de cama de frango apenas em
tradicionalmen- consumo familiar, com venda do exce- já que o animal pode chegar ao ponto cheiro; parte do galinheiro. O piso pode ser fei-
te criam galinha dente. É uma atividade de baixo risco de abate entre 90 e 120 dias. Por outro to em alvenaria, com uso de cimento e
caipira, agora para os agricultores, pois exige pouco lado, o investimento para a criação do  Posição – Os galinheiros são cons- areia, ou de chão batido tendo-se o cui-
investimento, já que as instalações são caipirão é maior, exigindo alimentação truídos no sentido leste-oeste, a fim de dado de deixá-lo bem compactado;
estão também construídas com materiais do próprio específica, infraestrutura e equipamen- evitar calor e umidade (sol e chuva) nas
experimentan- lote. Na alimentação, são utilizados ali- tos adequados. horas mais quentes do dia e no período  Laterais do galinheiro – O galinhei-
do a criação de mentos produzidos na propriedade com chuvoso; ro é cercado de tela para evitar o ataque
custo relativamente baixo, como milho, Este artigo traz a experiência dos de predadores. As laterais no sentido
caipirão.
macaxeira e cuim de arroz, e sobra de agricultores familiares de Medicilândia  Tamanho – É considerada a lotação leste-oeste são fechadas com palha ou
comida das refeições da família. Como com a criação de galinha caipira e caipi- de 8 a 10 pintos por metro quadrado até madeira, impedindo a entrada de sol.
as galinhas caipiras são criadas soltas rão. Em muitos casos, os investimentos os primeiros trinta dias. Um galinheiro As laterais no sentido norte-sul podem
no quintal, elas também ciscam durante feitos para a criação de caipirão também medindo 5 x 6 m, por exemplo, tem ser construídas com alvenaria ou com
todo o dia e se alimentam têm beneficiado a criação de galinha área de 30 m², com capacidade para madeira com altura não superior a 30
do que encontram. caipira, principalmente com a melho- 240 pintos. Depois desse período, os cm do chão, para não comprometer a Figura 1. Ambiente bem
ria da infraestrutura e da alimentação. animais são soltos na área de pastejo aeração do ambiente (Figura 1); arejado contribui para a
Ultimamente, as fa- Também tem sido comum a adoção das e retornam à noite para dormir no ga- prevenção de doenças.
mílias estão experi- práticas mais simples e baratas de cria- linheiro, por ser um local seguro contra
mentando a criação ção de galinha caipira para o manejo do predadores;
de galinha caipirão, caipirão.  
 Altura das laterais (pé direito) –
São usados esteios com altura entre 2,2

1. Infraestrutura a 2,5 metros para proporcionar boa ae-


ração da instalação e facilitar o manejo;

Tanto no sistema caipira como no sistema caipirão, as duas  Cobertura – A cobertura é feita com
principais estruturas são galinheiro e área de pastejo: telhas de fibrotex (sem amianto), cerâ-
mica ou com materiais do próprio lote
1.1. Galinheiro os principais aspectos considerados pelos como, por exemplo, palha de palmeiras
agricultores para facilitar e orientar a sua e cavaco. Não são usados materiais que

O s criadores constroem galinhei-


ros que garantam bem-estar aos
animais e facilitem a execução do
manejo adequado para o bom desenvol-
vimento das aves. A seguir estão listados
construção:

 Local – Os criadores evitam áreas


acidentadas para minimizar o custo
com a construção, principalmente com
causam barulho, como lona de polieti-
leno e telha de zinco, para não estressar
os animais e comprometer seu desen-
volvimento. Normalmente os galinhei-
ros têm um beiral de 1 a 1,2 m de altura

114  CriaÇão de Galinha Caipira e Caipirão CriaÇão de Galinha Caipira e Caipirão  115
Figura 2. Cuidados com 1.2. Área de pastejo tiva tradicional, mas as aves ficam vulne-
a temperatura do am- ráveis ao ataque de predadores naturais.
biente reduzem a morta-
lidade na fase inicial.
O pasto é indispensável na criação
de frango caipira e caipirão, pois
a ave tem o hábito e a necessida-
de de pastar. A área de pastejo tem como
finalidade proporcionar o acesso das gali-
Para fazer uma área de pastejo é
necessário:

 Estacas – A madeira usada deve ser


nhas a leguminosas e gramíneas de valor resistente, para evitar reforma em curto
proteico, de boa digestibilidade e de fácil prazo, e o espaçamento recomendado é
rebrotação (Figura 3). O pastejo também de 2,0 a 2,5 m de distância entre uma
 Cortinas – As cortinas são essenciais  Campânula – A campânula é monta- faz com que os animais se exercitem, pro- estaca e outra;
para o controle da temperatura do gali- da dentro do círculo com uma lâmpada porcionando as características de galinha
nheiro, podendo ser de lona plástica em de 100 ou 150 watts, para manter a tem- caipira, como maior rigidez da carne e me-  Tela de arame – A tela deve ter al-
cores claras. São instaladas nas laterais peratura elevada. A altura ideal é de 60 lhor sabor. tura superior a 1,5 m para cercar e não
do sentido norte-sul do galinheiro na cm, mas também pode ser definida com permitir a fuga das aves e a entrada de
fase inicial, entre 8 e 10 dias, dependen- base nas seguintes observações: se os É importante ter área de pastagem cer- predadores;
do da estação do ano. Elas devem per- pintos estiverem aglomerados embaixo cada de tela para prevenir o ataque de
manecer fechadas em dias frios e aber- da campânula, significa que a tempe- predadores. Os criadores consideram dois  Plantio de gramíneas – O pasto
tas em dias quentes, principalmente no ratura está baixa e deve-se baixar um aspectos principais: a quantidade de ani- plantado deve ser de alto teor de pro-
começo do ano, quando os dias come- pouco a lâmpada até que se tenha uma mais que se pretende colocar e a divisão teínas, boa digestibilidade, crescimento
çam frios em Medicilândia. As cortinas distribuição homogênea de calor. Caso em dois ou três piquetes. A área de paste- rápido e boa capacidade de rebrota. As
serão retiradas gradativamente até que os pintos fiquem distribuídos nas bor- jo ideal deve ter de 3 a 5 m2 para cada ave. gramíneas mais utilizadas em piquetes
os animais estejam adaptados à tempe- das do círculo, significa que a tempera- A divisão de piquetes evita a degradação são quicuio (Brachiaria humidicola) e
ratura natural; tura está muito elevada e a campânula das gramíneas e melhora a oferta e a qua- grama estrela (Cynodon dactylon). O
É possível usar precisa ser suspensa para que os pintos lidade dos alimentos para os animais. plantio pode ser feito com mudas ou
materiais dispo-  Cama-de-frango – É feita sobre o usem todo o espaço do círculo. A cam- Como exemplo, uma área medindo 20 x 30 sementes;
piso e pode ser de serragem de madei- pânula é um equipamento industriali- metros terá 600 m² com capacidade para
níveis nos lotes ra, palha de arroz ou de capim seco e zado que pode ser encontrado nas casas 150 aves.
para reduzir os triturado, com altura de cinco a oito agropecuárias, mas também pode ser
custos com insta- centímetros; feito com bacia de alumínio, fazendo-se Alguns criadores optam por manter as
um furo no centro da bacia no sentido aves em locais abertos com o intuito de re-
lações, mas man-
 Círculo para recebimento dos pin- inverso e colocando-se a lâmpada. Al- duzir custos, pois o investimento em telas
ter a eficiência. tos – É recomendado montar um círcu- guns criadores usam papelão, mas isso de arame galvanizado é elevado, podendo
lo dentro do galinheiro onde os pintos não é recomendado pela menor eficiên- inviabilizar a criação. Essa é uma alterna-
ficarão por aproximadamente 10 dias. cia e pelo risco de incêndio provocado
Esse círculo deve ter altura entre 40 e pelo aquecimento da lâmpada. 
60 cm, podendo ser confeccionado de Figura 3. Evitar estresse e oferecer
compensado ou de papelão (Figura 2). alimentação à base de gramíneas e legumi-
O círculo deve estar com cama de fran- nosas melhora o sabor da carne e reduz a
go na altura entre 5 e 8 cm; incidência de doenças.

116  CriaÇão de Galinha Caipira e Caipirão CriaÇão de Galinha Caipira e Caipirão  117
Figura 4. Os comedouros
e bebedouros devem
com cano de pvc de 100 mm, cortado ao
meio, ou com madeira (Figura 4).
2. Manejo alimentar
estar bem distribuídos
dentro do galinheiro ou
em lugar protegido de
sol e chuva para evitar
desperdício de ração.
 Bebedouro – Os bebedouros encon-
trados nas lojas são em forma de ci-
lindro, com um prato embaixo. Libera
a água à medida que ela é consumida
N a criação de galinha caipira produz-se ração de milho tri-
turado, macaxeira desidratada e triturada e cuim de arroz.
Também são aproveitadas frutas, verduras e sobra de ali-
mentação humana. Quando a criação é solta no terreiro, as aves
buscam alimento ciscando o chão e caçando insetos.
pelas aves. O criador também pode dis-
ponibilizar recipientes caseiros para
 Plantio de leguminosas – As legu- o fornecimento de água. O essencial é Já na criação de caipirão, é utilizada ra-
minosas podem ser fornecidas como que as aves tenham acesso à água em ção industrial inicial até o trigésimo dia.
alimentação para as aves ou serem quantidade e qualidade. Durante esse período, o consumo médio
plantadas em parte da área de pastejo. de ração por ave é de 1 kg. A partir de
Pode ser usado o amendoim forrageiro  Ninhos – Na criação de galinha cai- um mês, inicia-se a introdução gradativa
(Arachis pintoi), uma leguminosa de pira com reprodução na propriedade, de ração alternativa produzida no lote,
hábito rasteiro e de boa aceitação na os ninhos são construídos em local aliada ao uso de concentrados comerciais
alimentação das aves. A forma de plan- protegido de predadores, da chuva e do para balanceamento de ração, com base
tio mais comum é com mudas plan- excesso de sol. O tamanho adequado é na exigência nutricional das aves. O mais
tadas solteiras, pois o consórcio com de 35 x 35 cm de largura e de 15 cm de comum é os agricultores comprarem um
gramíneas não é recomendado, já que altura. Eles podem ser feitos com ma- saco de concentrado e misturarem com
as espécies têm resistência e hábitos de deira e a cama-de-serragem ou capim dois sacos de milho triturado produzido
crescimento diferentes. Vale ressaltar triturado e desidratado. Devem ser ins- na propriedade. A ração deve ser forne-
que, para garantir uma pastagem de talados a 1,5 m do chão, a fim de evitar cida duas vezes por dia, aumentando-se
boa qualidade é necessário que se faça ataques de predadores, e devem conter gradativamente a quantidade, de acordo
a rotação da área; suportes para que a galinha possa subir com o consumo e desenvolvimento das
para pôr e chocar os ovos (Figura 5).  aves. Para produção de ração alternativa
 Sombra – A sombra é necessária nos pode ser utilizado um triturador para pro-
piquetes, pois serve de refúgio para as cessar milho, macaxeira e cana-de-açúcar
aves nas horas mais quentes. O som- (Figura 6). O tamanho das partículas de
breamento pode ser feito com o plantio ração deve estar de acordo com o tama-
de árvores ou com uma construção de nho das aves, de modo a facilitar a inges-
palha. tão. 

Outras instalações importantes são:

 Comedouro – Os comedouros mais Figura 6. Produzir ração alter-


usados são em formato de calha para os nativa no lote reduz custos e
pintos, e tipo bandeja para os animais Figura 5. Os ninhos podem ser construídos mantém a eficiência do manejo
adultos, podendo ser confeccionados com materiais locais, reduzindo os custos. alimentar.

118  CriaÇão de Galinha Caipira e Caipirão CriaÇão de Galinha Caipira e Caipirão  119
3. Manejo sanitário  Doenças parasitárias – Para o con-
trole das doenças parasitárias, além da
limpeza de equipamentos e instalações,
ativo à base de mebendazol. O pastejo
rotacionado também é uma forma de
controle, pois a troca de piquete faz
A manutenção das instalações e recipientes limpos para ração deve-se estabelecer um plano de con- com que o ciclo de reprodução dos pa-
e água é a melhor forma de prevenir doenças. trole de endoparasitas e ectoparasitas rasitas seja interrompido. Sem a pre-
que dependerá do monitoramento das sença do hospedeiro, as larvas não che-

M anejo sanitário é um conjunto


de práticas que visa o bem-estar
dos animais, de modo que con-
tribua para o crescimento e produtividade
e evite que vetores causadores de doenças
naturais, como a calda obtida pela de-
sagregação de 200 g de fumo e 200 g de
sabão em um litro de água, e posterior
diluição em cinco litros de água.
condições das aves. Os principais para-
sitas que afetam as aves na região são
os vermes e o ácaro vermelho, conheci-
do como pichilinga, que é um ectopara-
sita. No controle de vermes, é recomen-
gam à fase adulta. No controle do ácaro
vermelho pode ser utilizado inseticida
doméstico. Outra forma de controle
preventivo é a higienização das instala-
ções, principalmente dos ninhos, onde
se desenvolvam e se proliferem no inte-  Controle de doenças fisiológicas, dado o uso de vermífugo com princípio o ataque é mais frequente. 
rior das instalações. O manejo sanitário patogênicas e parasitárias:
leva em conta dois aspectos principais:

 Limpeza das instalações e


equipamentos:
 Doenças fisiológicas – O controle
é realizado mediante práticas de ma-
nejo que garantem o bem-estar das
4. Manejo reprodutivo
 Comedouros e bebedouros – De-
aves e evitam situações estressantes.
Em particular deve-se ter os seguintes
e raça
vem ser limpos diariamente com água cuidados: Os criadores já buscam fazer a seleção de animais com maior
A manutenção Os criadores já
limpa, esponja e sabão; tamanho, resistência a doenças e aceitação no mercado.
das instalações e  Evitar ultrapassar a taxa de lota- buscam fazer a
recipientes lim-
pos para ração e
água é a melhor
forma de preve-
 Cama de frango – Deve ser revol-
vida semanalmente e substituída a
cada 20 a 30 dias, retirando-se toda a
cama e excrementos. Após a retirada
da cama, deve ser feita a desinfecção
ção adequada e manter a ventilação
das instalações;

 Fazer o manejo por idade, evi-


tando que fiquem juntos animais de
D e modo geral, a definição das raças é uma escolha do cria-
dor. No sistema caipira não existe raça definida. Atualmen-
te, para melhorar o plantel, as famílias estão comprando as
raças índio gigante ou gigante negro, por tratar-se de animais com
crescimento rápido e mais resistentes ao ataque de doenças (Qua-
seleção de ani-
mais com maior
tamanho, resis-
tência a doenças
nir doenças. do galinheiro; idades diferentes, pois as aves jovens dro 1). A seguir são apresentadas algumas sugestões para um bom e aceitação no
têm o sistema imunológico mais bai- manejo reprodutivo:
 Cama dos ninhos – Renovada a xo que as aves adultas.
mercado.
cada ciclo de incubação para evitar  Seleção dos reprodutores – De-
contaminação, principalmente por  Doenças patogênicas – São trans- vem-se selecionar exemplares jovens,
ectoparasitas; mitidas por meio de vírus e bactérias. de grande porte, boa aceitação no mer-
As principais doenças que ocorrem na cado e que estejam no início de idade
 Desinfecção – As instalações de- região Norte do Brasil são a bronquite reprodutiva. É recomendável avaliar o
vem ser desinfetadas sempre que hou- infecciosa, newcastle, gumboro e varí- desenvolvimento reprodutivo dos seus
ver a substituição de lotes de animais, ola aviária (bouba). Além da limpeza pais e também seu tamanho na fase
com aplicação de cal ou uso de lança- dos equipamentos e instalações, tam- adulta. É importante também utilizar
chamas, quando necessário. Para pul- bém devem ser ministradas as vacinas um reprodutor para grupos de 10 a 15
verizar, podem ser usados produtos necessárias. matrizes e fazer a substituição regu-

120  CriaÇão de Galinha Caipira e Caipirão CriaÇão de Galinha Caipira e Caipirão  121
larmente para evitar consanguinidade
pelo cruzamento de pai e filha.
 Uso de chocadeira elétrica – Per-
mite produção em larga escala e ace-
5. Comercialização
 Processo reprodutivo:

 Choca natural – A choca natural


feita diretamente pelas galinhas tem
leração no processo de postura das ga-
linhas. Tem como desvantagens o alto
custo com aquisição e manutenção do
equipamento e perda total dos ovos se
houver interrupção no fornecimento
O vos e galinha caipira têm mercado cativo em Medicilândia devido ao diferen-
cial de sabor, com possibilidade crescente de expansão no município e região,
considerando o recente aumento da população. Entretanto, o mercado ainda é
altamente variável e sazonal. Existem meses em que se comercializa com facilidade e
em outras épocas há mais dificuldade para encontrar mercado.
baixo custo, porém o rendimento pode de energia por período superior a três
ser menor, pois a galinha atrasa novas horas. Embora não exista mercado definido para Apêndice
posturas; galinha caipira, os agricultores têm certa Custos estimados para instalações com capacidade para criação 100 aves
facilidade em comercializá-la nas feiras (caipirão). Dependendo do material que o criador utilizar, os custos podem
Quadro 1. Comparação das raças e linhagens. da sede municipal, vendendo para os subir ou baixar.
Raça Linhagem Cuidados e Resultado restaurantes, e para os vizinhos, além de Custo Custo
Descrição Unidade Quantidade
custo atravessadores, que compram para reven- unitário (R$) total (R$)
Peso (kg) Tempo (dias)
da. O preço de uma galinha caipira adulta Madeira Metro 1 300,00 300,00
Caipira Indefinida Baixo Até 2,5 150
varia de R$ 20,00 a R$ 25,00. Não existe Telha Unidade 45 11,00 495,00
Índio gigante* Baixo Até 3 140
experiência de comércio de aves em larga Tela fina Metro 30 4,00 120,00
Gigante negro* Baixo Até 3 140
escala no município. O caipirão é uma no- Tela grossa Metro 110 3,50 385,00
Caipirão Carijó Médio Até 2,8 90
vidade e ainda não se sabe como o merca- Grampo Quilo 1 7,00 7,00
Amarelo de pescoço pelado Médio Até 2,5 60 do vai reagir ao aumento da oferta. Prego 18x24 Quilo 2 7,00 14,00
Preto Médio Até 2,3 90
Prego 19x36 Quilo 2 7,00 14,00
Amarelo Médio Até 2,4 70 Para os agricultores que irão iniciar um Lâmpada Unidade 3 3,00 9,00
Cinza Médio Até 2,0 90 processo de produção contínuo, a comer- Fio Metro 50 3,00 150,00
Granja Branco Alto Até 3 60 cialização será um desafio. Os agricultores
Triturador Unidade 1 1.080,00 1.080,00
* Usada para melhoramento do plantel existente via cruzamento com caipira sem raça definida. reconhecem esse desafio e já sinalizaram
Cano PVC100 mm Unidade 1 35,00 35,00
para a necessidade de constituição de for-
Comedouro Unidade 3 8,00 24,00
mas organizativas com vistas à busca de
Bebedouro infantil Unidade 2 8,00 16,00
Figura 7. Cuidados na No sistema caipirão é utilizada raça me- mercado local e regional. 
compra de pintos são lhorada geneticamente. Há a aquisição de Dobradiça Pares 5 3,90 19,50
fundamentais para diferentes linhagens, sendo que as linha- Tijolo Unidade 500 0,48 240,00
evitar altas taxas de gens carijó, amarelo de pescoço pelado e Cimento Sacos 5 30,00 150,00
mortalidade e aves de preto têm se mostrado as melhores para Lona Metro 32 1,20 38,40
baixo crescimento. a região, por serem de crescimento rápido Mão de obra para a Diária 5 50,00 250,00
e apresentarem boa adaptação. Na aqui- construção do galinheiro
sição de pintos, deve-se observar se as Compensado Peça 1,5 40,00 60,00
aves estão sadias e se o lote é homogêneo. Limpeza da área para o Diária 5 25,00 125,00
De preferência, são comprados pintos de piquete
um dia de vida, pois ainda possuem re- Mão de obra construção Diária 5 25,00 125,00
do piquete
serva nutricional, facilitando o transporte
TOTAL 3.656,90
(Figura 7).  

122  CriaÇão de Galinha Caipira e Caipirão CriaÇão de Galinha Caipira e Caipirão  123
Criação de
Gado de Leite
Juraci Dias, Antônio Reis do Nascimento Filho,
Guilherme Brito, Cláudio Wilson Soares Barbosa,
Katiele Amorim, Carlos Harold e Gabriel Medina

Experiências de melhorias
na alimentação, formação de
pastagem, piqueteamento dos
pastos e manejo de rebanho
leiteiro sendo desenvolvidas
por produtores familiares são
compartilhadas neste capítulo.

124  CriaÇão de Gado de Leite CriaÇão de Gado de Leite  125


O volumoso é o investimento alimentar A cana é pobre em proteína bruta (2%

A maioria dos pequenos criadores de gado do município de Medicilândia tem


propriedades de 100 ha, parte delas convertida em áreas de pasto com re-
banho médio de 50 animais. Parte importante das famílias, em particular
aquelas que vivem mais próximas da cidade, está voltada para a pecuária leiteira.
O sistema de criação tradicional é extensivo, com o pastejo realizado de maneira
mais barato. Quando se produz volumo-
so com quantidade e qualidade, reduz-se
a mão de obra na produção do alimento
complementar e na abertura de novas
áreas de pasto. Por isso, é fundamental
a 3% na matéria seca). Por isso, é neces-
sária a incorporação de uma fonte protei-
ca à massa picada no momento de forne-
cer aos animais, em particular se o gado
não estiver consumindo silagem rica em
contínua, sem a utilização de piquetes para o rodízio do pasto. A reprodução é garantir o bom manejo das pastagens proteína como a do milho. O mais comum
de monta natural e o manejo sanitário busca atender a legislação vigente. Alguns para a criação de gado (Figura 1).  é a adição de ureia à cana. As proteínas
criadores estão realizando melhorias no sistema tradicional e as lições para os in- garantem a manutenção das funções vi-
teressados em investir na criação de gado leiteiro são apresentadas neste capítulo. 1.2. Capineira e silagem tais do gado e também são fundamentais
no ganho de peso e na produção de leite.

1. Alimentação A capineira e a silagem são alimen-


tos volumosos e energéticos que
garantem a boa produção de leite
e complementam a alimentação do gado,
Para o uso da ureia, é necessário tomar
alguns cuidados, como inseri-la aos pou-
cos na dieta, até os animais se adaptarem,
Antes de pen-
sar em melhoria

B oas condições de alimentação são fundamentais para o de-


senvolvimento da atividade e devem ser garantidas como
primeiro passo, antes mesmo de se investir em melhoria ge-
nética do rebanho. O manejo alimentar tradicional do rebanho em
Medicilândia é composto basicamente por pastagem (principalmen-
principalmente na época menos chuvosa,
em que os pastos são menos produtivos. O
alimento é energético quando tem grande
concentração de carboidratos, servindo
principalmente como fonte de energia. A
misturar de forma homogênea à cana, for-
necer diariamente sem interrupções, uma
vez iniciado o fornecimento, e usar cochos
cobertos com furos para o dreno da água.
O uso de ureia de forma inadequada pode
genética do reba-
nho, é fundamen-
tal garantir boa
alimentação para
te braquiária) e sal mineral. Alguns criadores estão investindo em energia inicialmente atua na manutenção causar intoxicação nos animais, deixando o gad0.
Figura 1. Pasto de pastagens de qualidade, na produção de capineira e silagem e no do animal e as sobras garantem a produ- o gado mais agitado, com salivação em
qualidade é o primeiro uso de concentrado. Esses são os principais elementos da alimenta- ção do leite e a engorda. excesso, sem coordenação, com tremores
passo para se investir na ção do gado de leite.  musculares e com respiração ofegante.
criação de gado leiteiro. A capineira mais usada em várias regi- Caso isso ocorra, pode-se resolver o pro-
ões do Brasil é a de cana-de-açúcar, reco- blema fazendo o bovino ingerir vinagre,
1.1. Pastagem mendada como fonte adicional de energia sendo indicadas duas garrafas por animal.
para os bovinos, principalmente de leite.

A pastagem é a principal fonte de


alimento volumoso para o gado. É
um alimento de baixa densidade
(peso por volume), com alto teor de fibras
e baixa quantidade de energia. Os volu-
Para facilitar a alimentação, alguns cria-
dores compram trituradores para cortar o
material verde colhido antes de fornecer
ao gado. A cana é uma cultura tradicional
em Medicilândia, o que facilita sua adoção
A silagem mais comum é a de milho,
devido à sua composição nutricional com
grande quantidade de proteína. Para pro-
duzir a silagem, o milho é plantado em
área específica, colhido, triturado e ar-
mosos apresentam como características pelos criadores de gado. No entanto ainda mazenado coberto com lona e sem ven-
boas o fato de estimularem a mastigação são poucos os criadores que têm capineira tilação. A silagem de milho tem teor de
e a salivação, promoverem contrações ru- e alguns preferem usar o capim napier ao matéria seca (MS) entre 30% e 35% e, no
minais (passagem) e ajudarem na manu- invés da cana, pois é fácil conseguir mu- mínimo, 3% de carboidratos solúveis, o
tenção do teor de gordura no leite. das na beira das estradas.

126  CriaÇão de Gado de Leite CriaÇão de Gado de Leite  127


que proporciona boa fermentação micro- 1.3. Concentrado 2.1. Preparo do solo matéria orgânica superficial, a quebra
biana no rúmen do animal. da dormência de algumas invasoras

Em Medicilândia, praticamente ne-


nhum produtor usa a silagem de milho,
pois eles não têm tradição e avaliam que o
investimento financeiro e de mão de obra
O agricultor normalmente conhece
o concentrado como a ração que
é comprada nas lojas agropecu-
árias. O alimento é concentrado quando
tem característica inversa do volumoso:
A escolha da forma de preparo do
solo para semeadura ou plantio
depende de vários fatores, tais
como o nível tecnológico adotado na pro-
priedade, a possibilidade de uso de ma-
controladas anteriormente, a dificul-
dade para incorporar calcário ao solo,
principalmente por causa de tocos que
ficam na área, e a alteração da fisiolo-
gia da pastagem em áreas de juquira,
para produzir ou para comprar milho não alto valor energético, alta concentração de quinário e as condições da área. Entre as fazendo-a perfilhar menos.
compensa. Outra avaliação dos produtores proteínas e baixo teor de fibras. O concen- formas de preparo de solo mais usadas em
é que a genética do rebanho existente não trado tem como vantagem o aumento na Medicilândia estão:  Aração e gradagem – O arado des-
responde à suplementação complementar produção de leite e carne, atendendo de compacta o solo e enterra a camada
com silagem de forma a compensar o in- forma mais rápida às exigências do ani-  Uso do fogo – O preparo mais co- superficial, controlando as invasoras.
vestimento. Os criadores que produzem mal. O concentrado está disponível nas mum na região é o uso do fogo, feito A grade destorroa e uniformiza o solo.
leite preferem manter planteis com dupla casas agropecuárias de Medicilândia, mas normalmente em áreas de floresta e O uso de arado e grade tem como van-
aptidão (para leite e carne) pois também sua utilização tem limitações, como preço de juquira (pasto degradado cheio de tagens a possibilidade de incorporar o
ganham dinheiro com a comercialização e aumento da mão de obra. Mesmo quan- invasoras) no período seco do ano. calcário ao solo, o controle de invasoras
do gado. Além do leite eles comercializam do o agricultor fornece concentrado aos Apresenta como vantagens o controle e a descompactação do solo. Como des-
os bezerros para a engorda e as vacas me- animais, é necessário que ele coloque sal das invasoras e a queima da macega, vantagens estão a exposição do banco
nos produtivas para abate. Apenas recen- mineral no cocho com a função de suprir com redução das moitas, proporcionan- de sementes, o comprometimento da
temente alguns criadores estão avaliando a carência de minerais. O sal mineral deve do melhor desenvolvimento do capim. estrutura do solo, a necessidade de ma-
a possibilidade de se especializar mais na ser fornecido à vontade em um cocho a Como desvantagens, estão a redução quinário e o fato de só ser possível em
atividade leiteira.  que todos os animais possam ter acesso. da fertilidade do solo com a queima da áreas já destocadas.

 Plantio direto – É a não preparação

2. Formação de pastagens do solo, fazendo-se apenas a distribui-


ção superficial do calcário e o plantio
das sementes com plantadeira tico-tico.
Pastagem bem
formada dura

M uitos criadores ainda têm dificuldades na formação de


pastagens de qualidade. Problemas com o preparo do solo
e a semeadura reduzem a vida útil da pastagem. Os pro-
blemas se acentuam no verão, quando os pastos ficam com baixa
Tem como vantagem manter a estrutu-
ra do solo e o incremento da matéria
orgânica e como desvantagem a me-
nor taxa de germinação das sementes.
mais e é a for-
ma mais barata
de alimentar o
capacidade de suporte. Na implantação de novas pastagens, os agri- Medicilândia tem a experiência pionei- rebanho.
cultores de Medicilândia buscam escolher áreas planas, sem pedras, ra da “Roça Sem Queimar” que consiste
retirando tocos de árvores ou arbustos que possam machucar os no preparo da área para plantio com a
animais (Figura 2).  roçagem da capoeira, sem uso de fogo.
 
Figura 2. Na escolha da área também é importante avaliar a existência de
plantas invasoras e sua frequência com o intuito de prever quais serão as
mais problemáticas na fase inicial de estabelecimento do pasto e planejar
as estratégias mais adequadas de controle.

128  CriaÇão de Gado de Leite CriaÇão de Gado de Leite  129


2.2. Coleta de solo para alcançar níveis adequados de satu- tico-tico. No caso de pastagens com mais geira se desenvolve, sobretudo na fase de
para análise ração por bases (V% acima de 50), de pH
(entre 5,5 e 6,5), todos indicados na aná-
de cinco anos, pode ocorrer a necessidade
de aplicação do calcário em cobertura.
utilização sob pastejo, a demanda de fós-
foro diminui e a de nitrogênio e potássio

P ara a coleta do solo indica-se a utili-


zação de trado ou enxadão para re-
tirar amostras na profundidade de
0 a 20 cm. A coleta é feita em 15 pontos
diferentes de forma a representar toda a
lise de solo.

O calcário deve ser incorporado ao solo


na quantidade recomendada. Se não for
usado arado ou outra forma de incorporá-
No lugar do calcário também é possível
se utilizar gesso. O uso de gesso em áre-
as de pastagem é cada dia mais comum.
Ele apresenta inúmeros benefícios, como
aumentam.

Os adubos nitrogenados são bastante


voláteis e, mesmo que o produtor adicione
grandes quantidades, em 15 dias o nitro-
área, armazenando o solo coletado em um lo, deve-se utilizar apenas a metade da o fato de ser fonte de cálcio e enxofre e de gênio não estará mais presente no solo. A
balde limpo. quantidade indicada. As recomendações fazer com que o cálcio desça no perfil do solução para isso pode ser o parcelamento
são baseadas em correção de pH para a solo. O gesso aumenta o volume de solo das doses de adubação que deve ser feita
Após a coleta, o conteúdo do balde é profundidade de até 30 cm, mas se o cal- explorado pelas raízes uma vez que con- após a saída dos animais do piquete, ou
homogeneizado, retirando-se uma amos- cário não é incorporado, apenas a metade trola o alumínio em profundidade, neu- ainda a utilização de adubação orgânica
tra com aproximadamente 100 gramas. da dose é suficiente. Isso evita o excesso tralizando-o em camadas mais profundas ou o plantio de adubação verde.
Essa amostra é colocada em um saco plás- de calcário na camada superficial do solo (subsuperficiais). 
tico limpo e sem furos, que é lacrado em e o efeito da supercalagem, que é tão ou Uma fonte alternativa de nitrogênio
seguida. Antes de encaminhar a amostra mais prejudicial do que a não realização 2.4. Adubação são os adubos orgânicos como esterco
ao laboratório, o saco é etiquetado com as desta etapa. ou cama-de-frango. Os adubos orgânicos
seguintes informações: a profundidade da
amostra, a cultura que se pretende plan-
tar e outras informações relevantes como
adubações anteriores, cultura anterior, o
tipo de preparo do solo e nome do produ-
É recomendado que a aplicação de cal-
cário na reforma de pastagens seja feita
no fim do período chuvoso do ano ante-
rior ou, no máximo, dois meses antes do
A adubação de pastagem tem por
objetivo atender a demanda nutri-
cional das plantas. O mais comum
em Medicilândia é utilizar as formulações
comerciais dos macronutrientes nitrogê-
contêm nitrogênio que é liberado à me-
dida que a matéria se decompõe, permi-
tindo melhor aproveitamento. Também
auxiliam no acúmulo de matéria orgânica
no solo e atuam como condicionadores,
tor. As amostras são encaminhadas para plantio. A razão para isso é que o calcá- nio (N), fósforo (P) e potássio (K), conhe- armazenando nutrientes.
um laboratório de análise de solo. No caso rio é um produto de baixa solubilidade, cidas como NPK (para mais detalhes ver
de Medicilândia, o Sindicato de Trabalha- demorando a reagir no solo e necessi- capítulo sobre cacau neste livro). O esterco bovino pode ser usado na
dores e Trabalhadoras Rurais faz o enca- tando ser distribuído antes dos adubos e adubação depois de curtido, ou pelo ma-
minhamento.  do plantio. É interessante na escolha do A adubação de estabelecimento deve nejo adequado do gado no piquete. Se o
calcário que se verifique o valor do PRNT propiciar a rápida formação da pastagem, criador fica junto aos animais no piquete

Áreas de 2.3. Calagem (poder relativo de neutralização). Quanto com elevada produção inicial. Durante o por 15 minutos antes de encaminhá-los
maior o valor do PRNT, mais reativo é o estabelecimento, sobretudo nos primeiros para a ordenha, fazendo-os levantar, os

A
pastagem podem calagem é vista por muitos de calcário e mais rápida é a reação. O valor 30 a 40 dias, a demanda de fósforo pela animais irão bostear no piquete aduban-
ser corrigidas e maneira incorreta como uma do PRNT pode chegar até 120. forrageira é alta, enquanto a de nitrogênio do-o naturalmente.
adubação. Na verdade, a calagem e a de potássio é menor. A adubação de
adubadas para
nada mais é do que a adição de calcário A aplicação do calcário em áreas de manutenção ou de cobertura é recomen- A cama-de-frango pode ser usada na
aumentar a como condicionador do solo, adequando pastagem pode ser realizada a lanço. Em dada para repor os nutrientes que foram quantidade de três toneladas por hectare
produção. o pH para que os nutrientes sejam melhor caso de reforma de pastagens mantendo a retirados da pastagem durante o ano. Nor- na pastagem de brachiária, em um total
disponibilizados, facilitando sua captu- pastagem existente, os agricultores distri- malmente, a adubação de cobertura é fei- de cento e cinquenta sacos, com média
ra pelas raízes das plantas. As forragens, buem as sementes juntamente com o cal- ta logo no inicio do período chuvoso, com de 20 quilos por saco. A adubação deve
de maneira geral, necessitam de calagem cário a lanço ou plantam com plantadeira aplicação a lanço. À medida que a forra- ser feita após a saída do gado do piquete,

130  CriaÇão de Gado de Leite CriaÇão de Gado de Leite  131


NPK. No caso em que o nitrogênio já está
sendo suprido, é mais econômico comprar
3. Piqueteamento Piquetes permitem trocar o
apenas os adubos para fósforo e potássio.
O fósforo é particularmente importante no
do pasto gado de pasto, dando tempo
para o capim se recuperar
plantio e o potássio no desenvolvimento
da pastagem.

2.5. Pasto e sementes



O s criadores de Medicilândia começaram a desenvolver ex-
periências com a rotação de suas pastagens. O pastejo rota-
cionado é uma forma de manejo na qual ocorre divisão do
pasto em piquetes, permitindo o rodízio do gado entre os piquetes.
Com o piqueteamento da área consegue-se melhor aproveitamento
depois do pastoreio.

A escolha da forrageira também é


de grande importância, lembran-
do que não existe forrageira me-
lhor que a outra e sim situações em que
uma forrageira tem características mais
nutricional da forrageira ao entrar-se com o gado no piquete no mo-
mento de maior capacidade dos pastos, retirando-o depois do paste-
jo, favorecendo a recuperação do capim (Figura 4). A forma para se
calcular a área de manejo e do número de piquetes necessários de
acordo com o tamanho do rebanho existente pode ser encontrada
desejáveis que outra. A braquiarinha, por no capítulo sobre búfalos, no início deste livro.
exemplo, tem problemas com cigarrinha Figura 4. É fundamental
das pastagens, mas suporta solos ácidos o controle dos mo-
e pouco adubados. Já o braquiarão é mais Os corredores são construídos em nível, algumas mangas exclusivas para as novi- mentos de entrada e
Figura 3. Estilosante e resistente à cigarrinha mas tem seu desen- para evitar erosão e variam de 3,5 m de lhas. No estágio atual, os criadores estão saída dos piquetes como
calopogônio plantados deve-se esperar pelo menos 30 dias para volvimento alterado por super-pastejo ou largura para rebanhos menores até 8 m buscando organizar a área e o número de forma de garantir a
junto com o pasto aju- retornar com o gado. pisoteio pesado e passa a não responder de largura para rebanhos maiores. Os piquetes de forma a garantir que o gado recuperação adequada
dam na nutrição animal bem à adubação. O colonião e o mombaça corredores que estão próximos da sala de da pastagem.
e adubam o solo com Outra fonte alternativa de nitrogênio apresentam grande produção, mas exi- ordenha, onde o fluxo de animais é mais
nitrogênio. para a pastagem é o plantio consorciado gem maior adubação e atenção redobrada intenso, são mais largos, e os corredores
com leguminosas, como estilosante e ca- quanto ao manejo a partir do controle efi- que levam aos piquetes, por estarem mais
lopogônio, que auxiliam na adubação do ciente da entrada e saída dos animais (as afastados, podem ser mais estreitos. Os
solo com nitrogênio e servem de alimen- características e exigências das principais corredores devem ser livres de pedras e
to proteico para os bovinos no período forrageiras foram apresentadas no primei- outros materiais ou objetos que possam
da seca (Figura 3). Essas forrageiras são ro quadro do capítulo sobre búfalos, no ferir os cascos dos animais. É necessário
ricas em proteína e executam a função início deste livro) realizar sempre a manutenção para que
importante de transformar o nitrogênio não haja acúmulo de lama.
encontrado na atmosfera e fixá-lo biologi- A compra de sementes fiscalizadas é
camente no solo. Para o plantio consorcia- fundamental para a qualidade dos pas- Em Medicilândia os criadores já há al-
do com pastagem, bastam três quilos de tos. Devem ser considerados maturidade, gum tempo vinham experimentando tra-
leguminosa por hectare. pureza, germinação, valor cultural e vigor balhar com diferentes pastos para mane-
das sementes. No manejo, os criadores jar o gado ao longo do ano. Normalmente,
Se o produtor opta por usar fontes al- evitam a formação de moitas com alta os produtores começam abrindo novas
ternativas de nitrogênio (esterco, cama- proporção de haste em relação às folhas, áreas de pasto separadas das anteriores
de-frango ou leguminosas), não vale a que causam problemas de digestibilidade e mantendo de duas a quatro áreas. Há
pena comprar as formulações prontas de e têm valor nutricional baixo.  também casos de criadores que mantêm

132  CriaÇão de Gado de Leite CriaÇão de Gado de Leite  133


entre e saia do piquete no momento certo região. Caso o criador tenha interesse em
e que o capim tenha o tempo necessário madeira, também pode pensar em mogno
para se recuperar entre um pastoreio e ou- ou cedro para sombreamento.
tro. 
A água é de fundamental importância
3.1. Sombra e água para o rebanho leiteiro, pois o leite apre-
senta 87% de água. Para que a vaca apre-

O bem-estar animal é fundamental e


tem implicação direta na produti-
vidade. Por isso, é indicada a pre-
sença de sombra em alguns pontos dentro
do pastejo rotacionado. Geralmente as
sente alta produção, é necessário que ela
tenha acesso à água de maneira fácil. A
demanda de uma vaca é de 80 litros por
dia por animal de até 500 quilos. Para
cada litro de leite produzido, a vaca au- Figura 6. A construção dos piquetes com cer-
pastagens têm árvores que podem forne- menta o consumo de água em cinco litros. ca elétrica na área de pastejo é uma novida-
cer sombra. A curto prazo pode-se separar Então uma vaca que produzir 10 litros de 3.2. Instalação da cerca de que está sendo testada em Medicilândia.
um piquete de livre acesso com sombra de leite terá que beber os 80 litros mais 50
árvores e fonte de água, a fim de permitir
que na hora do sol forte as vacas possam
ir para lá (Figura 5).
litros de água totalizando 130 litros finais
de água por dia (MORAIS et al., 2012). Os
bebedouros devem ser de fácil acesso e ter
água limpa.
O uso de cerca elétrica para a divi-
são interna dos piquetes é uma
novidade para os agricultores de
Medicilândia, mas deve crescer como con-
4. Manejo de
A longo prazo, é importante estabele-
cer sombra em todos os piquetes. Para a A experiência de Medicilândia mostra
sequência do maior acesso dos produtores
rurais à eletricidade. A cerca elétrica re-
rebanho leiteiro
formação de sombra nas pastagens, são que o volume de água disponível no re- duz o custo de implantação dos piquetes
indicadas plantas que tenham rápido servatório não é tão importante, mas sim (se comparado à cerca convencional com 4.1. Cria
crescimento, se possível leguminosas que o fluxo de reposição, que deve propiciar arame liso ou farpado), pois a quantidade
auxiliem na fixação do nitrogênio e que
não tenham folhas tóxicas aos ruminan-
tes. Com essas características podemos
citar a faveira como planta adaptada à
rápido enchimento do bebedouro. Os be-
bedouros devem ter sombra, para evitar
o aquecimento da água. Em muitos casos,
os altos custos relacionados ao estabe-
lecimento de bebedouros nos piquetes,
de arame e estacas usada é menor. Em Me-
dicilândia, os agricultores estão dividindo
os piquetes internamente com apenas um
fio e trabalhando com estacas a cada 15
metros em média (Figura 6). Até que o
É importante verificar se o bezerro conseguiu mamar logo após
seu nascimento pois é nas primeiras mamadas que ele rece-
be os anticorpos da mãe. Para que seja possível o manejo, é
necessário fazer um piquete pré-parto próximo à casa da pessoa
responsável pelo rebanho. Quando o bezerro completar quinze dias,
fizeram os criadores optar por manter o gado se acostume com a cerca, é neces- pode receber a primeira dose de vermífugo, que é dada a cada 30
acesso do rebanho aos igarapés como sário algum tempo mas, depois de alguns dias até a idade de um ano. Os primeiros sintomas apresentados
fonte de água.  choques, o rebanho passa gradativamen- por bezerros infestados com vermes são pelos arrepiados, mucosas
te a evitar o contato com a cerca. Outro pálidas, anorexia, perda de peso e abdômen aumentado.
Figura 5. A sombra é fundamental para o desafio tem sido as constantes quedas de
bem-estar animal. No caso de não existirem energia no município que tem limitado o Para acelerar a cicatrização e evitar que A saúde do reba-
áreas naturais de sombra para proteger as uso da cerca elétrica por alguns criadores. moscas sentem no umbigo do bezerro, nho é fundamen-
vacas do calor, deve-se providenciar cobertu- Detalhes importantes para a instalação da os criadores de Medicilândia costumam
tal para produção
ras provisórias, que podem ser de sombrite, cerca elétrica podem ser encontrados no aplicar mata-bicheira ou lepecid na forma
de bambu, de palha ou de qualquer outro capítulo sobre búfalos, no início deste li- de spray. Uma alternativa mais barata é com quantidade
material de baixo custo na região. vro.  o uso da tintura de iodo (álcool iodado) e qualidade.

134  CriaÇão de Gado de Leite CriaÇão de Gado de Leite  135


a 5% ou 10% logo após o nascimento. A rodízio entre medicamentos e evitar resis- dia em que a monta ocorreu, pois assim cio deve ser feita antes de se buscar as va-
prática da cura deve ser feita mergulhan- tência das bactérias e vermes. o criador terá a previsão do dia do parto e cas para a ordenha de manhã ou após a
do o umbigo na solução por 30 segundos pode tomar os cuidados necessários. ordenha, caso aconteça antes das seis ho-
duas vezes ao dia até o terceiro ou quin- Após a desmama, as novilhas são co- ras da manhã. Deve-se fazer a observação
to dia, e uma vez ao dia entre o quinto e locadas em piquetes com acesso à água a Para se trabalhar com inseminação, a de cio por no mínimo 30 minutos. As va-
o oitavo dia. Nos casos em que o cordão vontade e sempre limpa. Não é necessá- propriedade deve ter pessoas responsá- cas que apresentarem cio de manhã antes
umbilical ultrapassa 10 cm, recomenda-se rio que seja próximo da casa, mas é im- veis pela observação de cio das vacas e da ordenha, devem ser inseminadas logo
o corte e a ligadura (amarrar com cordão portante que também ocorra o rodízio de novilhas. As vacas costumam apresentar após a ordenha. E as que manifestarem
limpo) reduzindo-o para dois centímetros. piquetes, aumentado a capacidade de su- manifestação do cio durante os períodos após a ordenha, devem ser inseminadas
porte da pastagem. Na recria, o gado fica mais frescos do dia, ou seja, ao amanhe- à tarde. O intervalo entre cios é de 21 dias
Como em Medicilândia os bezerros têm mais tempo nos piquetes, pois o pastejo é cer e ao entardecer. Essa observação de em média. 
desmame tardio, o mais indicado é colo- menos agressivo do que o das vacas em
cá-los em piquetes de qualidade quando lactação.
forem apartados da mãe. Após os seis
Quadro 1. Calendário profilático para manejo sanitário (preventivo).
meses de idade, esses bezerros podem ser É indicado que as novilhas ganhem
Vacinas Quando vacinar
desmamados, pois já têm 90% do rúmen meio quilo por dia. Se todo o lote de cria
desenvolvido. Se a criação é para leite, re- estiver com baixo desenvolvimento, de- Paratifo ou diarréia dos bezerros (recomendada onde a Vacinar as vacas no 8º mês de gestação e os bezerros entre 15 e 30 dias após
morte de bezerros está associada ao quadro de diarréia) o nascimento, ou conforme recomendação do fabricante da vacina
comenda-se manter as bezerras e vender ve-se corrigir o mais rápido possível para
Pneumoenterite (salmonelose e pasteurelose) Vacinar as vacas no 8º mês de gestação e bezerros (as) entre 15 e 30 dias
os bezerros logo após a desmama. Mas que se tenha a idade de primeiro parto o (recomendada) após o nascimento ou conforme recomendação do fabricante da vacina
muitos criadores mantêm plantel com mais próximo possível de 24 meses. As Carbúnculo sintomático (manqueira)/gangrena gasosa, Vacinar bezerros e bezerras aos 60 dias de idade. Aplicar doses de reforço
dupla aptidão (carne e leite) e preferem novilhas chegam a seu desenvolvimento botulismo e enterotoxemia (recomendada) após 30 dias e revacinação anual
vender os bezerros mais velhos e pesando sexual quando alcançam 65% do peso Febre aftosa (obrigatória) Vacinar todos os bovinos de seis em seis meses (maio e novembro) a partir
mais. de um animal adulto. Para identificar o do primeiro dia de vida
momento certo para cobrir as novilhas é Brucelose (obrigatória) Vacinar somente as bezerras com idade entre 3 a 8 meses. Dose única.
Caso o produtor queira desmamar os necessário fazer o acompanhamento sa- Vacinação obrigatória devendo ser feita por médico veterinário cadastrado na
Adepará ou vacinador capacitado e cadastrado
seus bezerros precocemente (aos três me- nitário e de ganho de peso. Esse controle
ses de idade), deve adquirir concentrado pode ser feito com balança animal ou com Raiva (obrigatória em áreas de risco) Vacinar uma vez ao ano após o quarto mês de vida e revacinar anualmente
em regiões endêmicas. Consultar a Adepará de seu município
próprio para cria e colocar os animais em fita própria para pesagem. Com o uso da
Leptospirose (conforme diagnóstico) Vacinar os animais no quarto mês de vida com reforço após 30 dias e revaci-
pastagem com boa disponibilidade de fita, faz-se a medida torácica e a própria nação semestral. Deve ser feita conforme diagnóstico de exame laboratorial,
forragem. Os animais devem ter acesso à fita indica o peso aproximado do animal. indicando qual variante sorológica está presente na região
água limpa e abundante.  A vantagem desse tipo de “pesagem” é o Tétano Vacinar aos 45 dias de idade, com reforço após 30 dias e revacinação anual
baixo custo. IBR e BVD (conforme diagnóstico) Vacinação conforme diagnóstico laboratorial e epidemiologia da doença em
4.2. Recria propriedades com manifestações clínicas da doença. Vacinar aos 30 dias de
vida os bezerros filhos de mães não vacinadas e aos seis meses os filhos de
(pós-desmama) A monta normalmente é feita com o
próprio touro da propriedade, desde que mães vacinadas, com reforço após 30 dias e revacinação anual

A pós a desmama, devem ser to- ele não esteja cobrindo suas filhas, para Controle de endoparasitas (verminose) Aos 30 dias de vida e repetição a cada 90 dias até os 12 meses de idade.
Recomenda-se os vermífugos de amplo espectro por via oral, que são mais
mados os cuidados apresentados evitar a consanguinidade. Para a primeira eficientes e apresentam melhor relação benefício/custo
no quadro 1. É importante anotar monta, o touro não deve ser muito grande Controle de ectoparasitas (carrapatos) Banhos planejados aplicados de 21 em 21 dias, até que o número de parasi-
o tratamento feito em cada animal para para que a novilha não tenha problema tas seja pequeno. Banhos estratégicos aplicados nas épocas mais quentes e
evitar aplicar duas vezes o mesmo me- de parto já que ela ainda não completou úmidas do ano
dicamento e também para poder fazer o seu desenvolvimento. Deve-se anotar o Fonte: Adaptado de COSTA (2006)

136  CriaÇão de Gado de Leite CriaÇão de Gado de Leite  137


4.3. Vacas em lactação Figura 7. Após a ordenha, o leite deve ser
coado (com coador ou pano limpo), para
5. Mercado

P
4.3.1. Manejo sanitário
ara o manejo sanitário de vacas em
lactação, deve-se observar o calen-
dário profilático (Quadro 1). Para o
evitar que caia sujeira, e depois colocado em
recipiente tampado. As vacas que estiverem
recebendo antibiótico não podem ter seu
leite retirado até o dia de carência do medi-
camento (essa informação está na bula do
O leite é comercializado in natura e a granel para consumi-
dores na sede do município. Alguns produtores trabalham
na fabricação de derivados, principalmente o queijo. O leite
atualmente esta sendo comercializado em média a R$ 1,00 o litro e
o queijo a R$ 8,00 o quilo. Com o preço do leite em alta, nos casos
diagnóstico de mastite, caso o produtor medicamento), por causa do resíduo. em que os agricultores adotaram a rotação dos piquetes, o ganho
faça o desmame precoce, é necessário com produtividade tem compensado os custos de implantação (ver
adotar o teste da caneca telada para ve- 4.3.3. Manejo de ordenha apêndice).
rificar se há presença de grumos no leite tes novos, e só depois de certo tempo as
que passa pela tela. Havendo grumos, o outras são liberadas para entrar. Além dos A ordenha deve ser feita em ambiente Para os agricultores que trabalham também com gado para corte,
animal é tido como positivo para mastite melhores pastos é recomendado garantir limpo e os baldes devem ser lavados com existem dois tipos de mercado. No mercado local, a carne é vendida
clinica. O teste é feito diariamente em to- a elas suplementação alimentar com capi- sanitizante antes e após ordenha (Figu- principalmente para vizinhos, açougues e restaurantes. No mercado
dos os tetos de todos os animais. neira e concentrado, em particular para as ra 7). As mãos do ordenhador devem ser regional, o gado é vendido para os atravessadores que compram
vacas de primeira parição. Recuperando o lavadas em solução hipoclorada antes animais, normalmente em maiores quantidades, para abastecimen-
Caso a vaca seja positiva para mastite peso rapidamente, as vacas terão o máxi- da ordenha. Os tetos das vacas também to de um frigorífico instalado em Altamira, a 90 km de Medicilândia.
e estiver em início de lactação ela deve mo de produção no pico de lactação e vol- devem ser lavados caso estejam sujos. O quilo do gado vivo custa em média R$ 5,00.  
ser tratada com medicamento específico tam a entrar no cio 30 dias após o parto. Após tirar o bezerro, os tetos devem ser
e seu leite deve ser descartado durante o mergulhados em solução de higienização
tratamento, respeitando-se os dias de ca- Se as vacas em lactação forem dividi- conhecida como pré-dipping e secos com
rência do remédio pois ele deixa resíduos das em lotes, para facilitar o manejo do papel toalha, uma folha para cada teto.
Apêndice
no leite. Caso a vaca apresente mastite e concentrado, as vacas de primeiro parto Pré-dipping significa imersão dos tetos em
Custos para a implantação de um hectare de pasto piqueteados
esteja próxima do fim do período de lac- devem ter um lote especial, independente solução desinfetante antes da ordenha, e em Medicilândia, Pará.
tação, é mais conveniente secá-la pois o do dia de lactação em que ela esteja. Ela ajuda na redução da Contagem Bacteria- Atividades Custo (em R$)
produto usado para esse fim trata a mas- permanece nesse lote até o final da lacta- na Total (CBT) do leite e de coliformes. Reforma do pasto (arado e grade) 800,00
tite. Assim, sua glândula mamária se re- ção. Os lotes podem ser divididos assim:
Aquisição de sementes 240,00
cupera para próxima lactação. Se a vaca Após a ordenha, caso a vaca não te-
Plantio 100,00
apresentar reincidência de mastite, é in-  Lote de vacas de primeiro parto nha bezerro para mamar, deve-se passar
Kit cerca elétrica (isolador, esticador, chave disjuntor, mola 300,00
dicado deixá-la como vaca ama ou então – Para que não ocorram agressões das pós-dipping em seus tetos. O pós-dipping para porteira)
descartá-la.  vacas multíparas (de mais de um parto) é uma estratégia para controlar a mastite
Equipamento de choque (eletrificador) 120,00
sobre as primíparas (de primeiro parto) contagiosa, ajudando na cicatrização dos
Material para aterramento 105,00
4.3.2. Manejo alimentar e estas possam comer a quantidade de tetos. O iodo é o germicida mais comum
Aquisição de arame liso de três fios nas bordas e corredor e 1.200,00
ração oferecida; contido nos produtos para tetos. Compa- dois fios nas divisões
As vacas recém-paridas devem ser colo- rando-se preços, eficácia germicida e ca-
Estacas de madeira 300,00
Dividir as vacas cadas nos melhores pastos, pois elas pre-  Lotes por produção – Para que não pacidade de ação diante de elevados volu-
Frete para puxar estacas 100,00
cisam ser bem alimentadas para poder haja desperdício com concentrado para mes de matéria orgânica, verifica-se que o
em lotes facilita Mão de obra para construção da cerca 300,00
recuperar o peso. Normalmente o manejo animais que não estão com a produção iodo é uma boa opção para a maioria dos
a distribuição da feito pelo agricultor permite que as vacas esperada para a quantidade de concen- produtores de leite, oferecendo a melhor
Construção de bebedouro 500,00

alimentação. recém-paridas entrem primeiro nos pique- trado que lhe é oferecida. relação entre custo e benefício.  TOTAL 4.065,00

138  CriaÇão de Gado de Leite CriaÇão de Gado de Leite  139


Manejo de
Açaizal Nativo
e Cultivado
Idelbergue Ferreira Araújo

Experiências de plantio e manejo


de açaizais com variedades
nativas e com a cultivar BRS-Pará
são apresentadas neste capítulo.

140  Manejo de Açaizal Nativo e Cultivado Manejo de Açaizal Nativo e Cultivado  141
comercial ou responsáveis por muito agroflorestais a recomendação é de 400 a

I ndispensável na alimentação das populações ribeirinhas e apreciado por pesso-


as de diferentes lugares, o açaí tornou-se também um componente importante
da economia dos agricultores familiares e empresariais. O açaí ganhou reconhe-
cimento econômico a partir dos açaizais nativos das áreas de várzea. Os solos de
várzea têm boa fertilidade natural o que facilita o desenvolvimento da planta.
sombreamento. As famílias descartam
plantas muito altas, finas, defeituosas,
pouco produtivas e com pouca polpa
nos frutos. As de menor diâmetro são
eliminadas por meio de corte e as de
500 touceiras de açaí, 100 a 150 plantas
fruteiras além de 50 árvores de valor co-
mercial (AZEVEDO & KATO, 2013).

As árvores mantidas devem ficar bem


maior por meio de anelamento, a uma distribuídas para não comprometer a pe-
Atualmente os açaizais cultivados em terra firme ampliaram as possibilidades altura média de 1 m em relação ao solo; netração dos raios solares, necessários ao
de produção. Além das espécies nativas, o mercado já dispõe da cultivar BRS-Pará desenvolvimento produtivo do açaizeiro.
desenvolvida pela Embrapa para cultivo em terra firme.  Replantio – É o plantio de açaí em O manejo deve ser realizado ao menos
substituição a plantas velhas ou mor- uma vez ao ano, visando manter as con-
Este artigo traz a experiência de agricultores de Medicilândia no manejo de açai- tas ou em clareiras naturais ou abertas. dições favoráveis para maior produtivi-
zais nativos e também no plantio de açaizais em terra firme. Os diferentes sistemas Normalmente é feito com mudas retira- dade (Figura 1). Devido ao alto nível de
desenvolvidos e as práticas de manejo e plantio são apresentados como lições para das do próprio açaizal. fertilidade dos solos de várzea, não é ne-
agricultores interessados em investir na atividade. cessário fazer adubações. Também não se
Para alcançar índices superiores à produ- recomenda o uso de produtos químicos
ção nas condições naturais, especialistas para controle ou eliminação de plantas
recomendam 400 touceiras de açaí por indesejáveis, principalmente pelo risco de
hectare (CARVALHO, 2008). Em sistemas contaminação da água. 

1. Manejo de 1.1. Replantio de açaí


açaizais nativos em áreas de várzea

O manejo de açaizais tornou-se muito conhecido nas duas últimas


décadas, desenvolvido especialmente para aumentar a produção
dos açaizais nativos. O manejo requer as seguintes práticas:

 Desbaste – Visa eliminar o excesso tamento do palmito das plantas adultas


P or se tratar de ambientes inundá-
veis, o preparo da área deve ser rea-
lizado ao final do período chuvoso,
quando as águas estão em níveis mais
baixos. Dependendo da cobertura vege-
Ao manejar de perfilhamento de maneira a man- eliminadas; tal do local, o preparo de área consiste
açaizais nativos, ter de três a quatro estipes em cada na roçagem ou raleamento do excesso de
os ribeirinhos touceira. Também devem ser deixadas  Limpeza – Consiste na remoção das sombra.
aumentam a rebrotações para substituir os açaizei- folhas secas do açaizeiro, das plantas
ros adultos que alcançarem a altura de de menor porte, das bainhas soltas dos Muitas famílias coletam mudas para
produção, apro- corte de 12 m. O ideal é ter três níveis estipes, dos cipós e dos galhos. A limpe- plantio nos próprios açaizais nativos. Po-
veitando a fertili- de dossel com as plantas mães, filhas e za é feita para facilitar outras ativida- rém, para um açaizal comercial, recomen-
dade natural dos netas para garantir a sucessão do açai- des, inclusive a colheita; da-se a produção das mudas por permitir
zal. O desbaste é realizado no período selecionar características desejáveis como
solos. de entressafra para evitar prejuízos à  Raleamento – É empregado para Figura 1. O manejo de açaizais inclui desbas- tipo de touceira, produção de frutos e ren-
produção, além de conciliar o aprovei- a eliminação das árvores sem valor te, limpeza, raleamento e replantio. dimento de polpa.

142  Manejo de Açaizal Nativo e Cultivado Manejo de Açaizal Nativo e Cultivado  143
As mudas podem ser feitas pelo próprio
produtor sem custos elevados (Quadro 1).
meses, quando são transplantadas para o
campo. O uso da areia evita danificar as
2. Plantio em terra firme O crescimento

N
do mercado tem
Após selecionar sementes de boa qualida- raízes no processo de remoção e transfe- os plantios de terra firme são utilizadas tanto variedades
de, os agricultores preparam um cercado, rência para as sacolas. nativas quanto a cultivar BRS-Pará. Por causa das caracte- incentivado agri-
colocam areia com profundidade de 5 cm rísticas físicas dos solos, a formação de açaizais em áreas cultores a plan-
e semeiam manualmente os caroços de No replantio de açaizais, as famílias de de terra firme requer algumas recomendações distintas daquelas da tar açaí em terra
açaí a uma distância e profundidade mé- áreas de várzea também usam a semea- várzea, tanto para a implantação quanto para a condução.
firme.
dia de 2 cm. O plantio é sempre regado dura a lanço. Contudo, a germinação pode
para manter a umidade. ser baixa. Para maior eficiência, aconse- Considerando que o produtor fará um A cultivar BRS-Pará é mais exigente, se
lha-se a semeadura imediatamente após grande investimento de trabalho e capital, comparada às variedades nativas de açaí.
Depois de germinadas, e com média de a despolpa, pois a semente de açaí perde é fundamental que ele escolha uma boa Assim, se o agricultor não tem condições
2 cm de altura, as mudas são transferidas rapidamente sua capacidade germinativa área. A experiência de Medicilândia reve- de fazer o plantio de acordo com as reco-
para sacolas plásticas até a idade de oito após o processamento.  la a importância de se evitar solos degra- mendações da Embrapa, ele deve avaliar
dados e áreas distantes de fontes de água se não seria mais interessante plantar va-
para a irrigação. O preparo da área deve riedades nativas, que são mais rústicas.
Quadro 1. Sugestões para a produção de mudas de açaí para plantio em várzea ou terra firme. ser no final do período de estiagem.
Sementes Recomenda-se priorizar sementes de bons açaizeiros que tenham:
2.2. Tratos culturais
2.1. Seleção das

E
 Touceiras com número menor de perfilhos (4 a 5);
 Produção de frutos superior a cinco latas ao ano;
 Rendimento mínimo de oito litros de polpa por lata de açaí em fruto. Após a despolpa, as sementes
sementes m sistema de monocultivo, espaça-
mentos variando entre três e quatro

A
devem ser lavadas em água potável e semeadas imediatamente. cultivar BRS-Pará foi desenvolvi- metros e touceiras com três ou qua-
Sementeira  Recomenda-se plantar em sementeiras preparadas com areia com profundidade de cinco da pela Embrapa buscando agre- tro estipes deram resultados muito bons
centímetros e irrigadas diariamente;
gar características desejáveis e (EMBRAPA, 2004). É importante fazer uma
 A germinação não ocorre de maneira uniforme. Inicia a partir do 22º dia, tendendo a estabilizar
aos 48 dias contados a partir da semeadura.
gerar açaizais homogêneos em relação à análise do solo para avaliar a necessidade
origem genética, à produtividade e à qua- de correção e adubação. A correção é feita
Viveiro  Depois da sementeira, quando as mudas têm cerca de dois centímetros, devem ser passadas para sacolas
plásticas de tamanho de 15 x 25 cm, perfuradas e preenchidas com substrato (mistura de terra preta e esterco); lidade dos frutos. O porte baixo e a pre- dois meses antes do plantio e a adubação
 As sacolas com as mudas devem ficar em um viveiro em local de fácil acesso, próximo à fonte de água, com boa cocidade do BRS-Pará são características pode ser feita na cova no dia do plantio
drenagem, pouca declividade e próximo ao local de plantio definitivo; positivas da cultivar. Já no terceiro ano (para detalhes sobre correção e adubação
 A cobertura do viveiro pode ser de folhas de palmeira ou sombrite a 50%, com altura mínima de 2m; obtém-se os primeiros cachos e a produ- consulte o capítulo sobre cacau).
 A estrutura pode ser de colmos de bambu, estipe de açaizeiro ou madeira ção é uniformizada a partir no quinto ano
Tratos  Limpezas manuais periódicas; (EMBRAPA, 2004). No período de maior estiagem, a irriga-
culturais no  Manutenção da cobertura; ção também amplia a capacidade produti-
viveiro
 No sétimo mês, eliminar gradualmente a cobertura para aclimatação das mudas aos efeitos dos Por se tratar de uma planta desenvolvi- va do açaizeiro. Mas antes de investir em
raios solares antes de transplantá-las para o local definitivo; da com características pré-definidas, suas irrigação, vale a pena o produtor avaliar
 A planta deve ser transplantada do viveiro para o campo a partir do oitavo mês propriedades produtivas podem ser dimi- se a previsão de aumento de produção
 Em plantios em terra firme, é importante fazer o transplantio no início das chuvas.
nuídas se as condições de cultivo não se- compensa os custos. A outra opção é ado-
Irrigação  As plantas no viveiro exigem cerca de dois litros de água ao dia por planta. Quando as chuvas guirem as recomendações. É fundamental tar um sistema de manejo do açaizal me-
não atingirem a média dois milímetros por dia, o viveiro deve ser irrigado no início ou no final do dia.
corrigir e adubar o solo, irrigar, controlar nos estruturado, com práticas de manejo
Adubação  A adubação é recomendada quando a permanência das mudas no viveiro ultrapassar oito meses.
o perfilhamento, limpar os estipes e con- mais simples, com menos investimentos,
Fonte: Adaptado de SEBRAE/PA, 2011 trolar pragas eventuais. mas menos produtivo.

144  Manejo de Açaizal Nativo e Cultivado Manejo de Açaizal Nativo e Cultivado  145
Assim como no manejo dos açaizais nati- Figura 2. Consórcio de cacau e açaí: o dossel
vos, os tratos culturais nos açaizais plan- do açaizeiro produtivo permanece superior
tados em terra firme são importantes para ao do cacau, não havendo concorrência por
melhorar a produtividade. Os principais espaço no mesmo nível.
tratos culturais são roço, controle de perfi-
lhamento e limpeza dos estipes. 

nica, se fosse hoje, plantaria tanto o açaí


quanto o cacau com espaçamento de 6 x 6
m entre linhas e entre plantas.

3. Açaizais de Medicilândia: O manejo do açaí limitou-se à elimi-


nação do excesso de perfilhamento. As
experiências de cultivo demais práticas, como limpeza da área,
adubação e retirada de folhas despren-

O s quatro açaizais acompanhados foram plantados em áreas


de terra firme. Dois deles foram consorciados e os outros
dois não. Os três primeiros são de variedades nativas e o
último da cultivar BRS-Pará.
didas dos estipes são indiretas, pois são
realizadas em função do cacau. Daí a ob-
servação do produtor de que o “açaí não
tem trabalho e não tem despesa”.

A produção média obtida é de 30 litros


3.1. Consórcio de fruto por touceira ao ano. Do ponto de
cacau e açaí vista econômico, a avaliação do produtor
demonstra que os resultados financeiros

Há experiências
de plantio em
terra firme usan-
E sse sistema é composto de cacauei-
ros, açaizeiros de variedades nativas
e espécies florestais distintas com e
sem valor comercial. O projeto original foi
implantado considerando o cacau como
do açaí superam os obtidos com o cacau.
Isso também porque o custo de produção
do açaí é insignificante se comparado ao
do cacau.
do tanto varie-
atividade econômica principal, enquanto A experiência revela que o consórcio
dades nativas que o açaí e as espécies madeireiras foram com outra cultura produtiva ou espécies
quanto a cultivar incluídas ao subsistema como componen- florestais de interesse econômico pode ser
BRS-Pará. tes de sombreamento visando gerar o mi- um bom modelo de cultivo de açaí. O con-
croclima recomendado à lavoura cacauei- sórcio permite otimizar o uso do solo, os
ra (Figura 2). investimentos em serviços e em insumos,
diminuir o custo e aumentar a margem de
Para o açaí foi adotado o espaçamento tais estão em distribuição aleatória. Para ência do produtor em favor do plantio de ganho do produtor. Particularmente em
aproximado de 4 m, distribuído entre as explicar o plantio do açaí, o agricultor cacau. O açaizal teve boa formação e uni- Medicilândia, que tem tradição de plan-
linhas de cacau que tiveram espaçamento usou a expressão “plantei por plantar”. formidade dos cachos. No entanto, segun- tio de cacau, o consórcio com açaí parece
médio de 3 m. As demais espécies flores- Assim, o consórcio ocorreu por conveni- do avaliação do produtor e da equipe téc- muito promissor. 

146  Manejo de Açaizal Nativo e Cultivado Manejo de Açaizal Nativo e Cultivado  147
3.2. Consórcio cacau, presença de espécies indesejadas. No se- Mesmo com configuração pouco co- estipes, não são feitas. Como implicação,
açaí, café e espécies gundo nível do dossel também há concor-
rência entre o açaí e as espécies florestais,
mercial, a produção é destinada priori-
tariamente ao mercado e é componente
predominam dois níveis de dossel: um
formado no pavimento superior e outro
florestais em muitos casos prejudicando a entrada importante da renda familiar. O comércio no inferior, sem um intermediário.
dos raios solares para a área ocupada pelo do açaí é feito em frutos no próprio centro

E sse sistema é constituído por três


componentes produtivos de des-
taque: cacau, açaí de variedades
nativas e café, além de espécies flores-
tais diversas, de importância econômica
café e pelo cacau.

Trata-se de um subsistema que, sem


uma intervenção rigorosa de manejo, ten-
de a uma escala produtiva decrescente a
comercial de Medicilândia.

Um fator evidente nesta unidade de


produção é a escassez de mão de obra
em todas as fases produtivas, agravada
Contudo, fica evidenciado que o açaí
pode se constituir em um forte componen-
te econômico pois, mesmo sem planeja-
mento objetivo, tratamento técnico e ges-
tão, a capacidade produtiva do açaizal é
variável. O plantio é muito adensado, de níveis irrelevantes economicamente. A por ocasião da colheita. Isso tem reflexo muito boa. Adicionalmente, existe o com-
circulação dificultada em seu interior, li- combinação de componentes produtivos nas características do manejo adotado, ponente ambiental, nesse caso com a pre-
mitando o desempenho produtivo das es- deste subsistema pode ser reproduzida. pouco direcionado para o aumento da servação das fontes de água. Mesmo sem
pécies e a colheita (Figura 3). Contudo, é importante trabalhar com produtividade. números exatos, conclui-se que o custo
maior espaçamento e possivelmente com de produção é relativamente baixo, o que
Há concorrência nítida entre o cacau um número menor de culturas. A combi- Práticas de manejo essenciais, como o torna a atividade ainda mais importante e
e o café, já que ambos possuem portes nação de cacau e café não parece ter dado controle de perfilhamento, eliminação de viável economicamente para agricultores
próximos, sobretudo quando não condu- certo, pois ambos tendem a dividir o mes- plantas de porte muito alto e limpeza dos menos capitalizados.  
zidos adequadamente, fato agravado pela mo nível de dossel e concorrer entre si. 

3.3. Quintal de açaí


Figura 3. Sistema cacau, Figura 4. Quintal de açaí
açaí e café. Entre os
sistemas avaliados, este
é o mais diverso em
espécies e também o
menos produtivo.
E ste sistema é composto predomi-
nantemente de açaí de variedades
nativas, com espaçamento e distri-
buição aleatórios e espécies florestais sem
importância comercial em distribuição
e espécies florestais. Um
sistema de baixo custo,
baixa demanda por mão
de obra que se adequa
às condições da família
dispersa (Figura 4). O açaizal foi implan- e garante fonte extra de
tado no entorno da residência, asseme- renda, além dos benefí-
lhando-se ao sistema quintal, comumente cios ambientais.
praticado na região Nordeste do Pará.

A área produtiva é de aproximadamen-


te um hectare. As características do ma-
nejo, talvez pela localização do açaizal,
parecem ter função maior de proporcionar
alimento para a família e bem-estar ao en-
torno da moradia, combinado ao ambien-
te para a criação de animais domésticos.

148  Manejo de Açaizal Nativo e Cultivado Manejo de Açaizal Nativo e Cultivado  149
O plantio com
3.4. Plantio de açaí suprir a carência de água nos meses de 4. Recomendações com Os açaizais plan-
em monocultivo estiagem, além do controle de eventuais
a cultivar BRS pragas e doenças”. base na experiência tados com varie-
Pará é bastan-
te exigente em
tratos culturais
O monocultivo foi formado com a
cultivar BRS Pará com doze mil
plantas em uma área destocada
e com roçagem mecanizada. Trata-se de
O plantio realizado não atende ao es-
paçamento recomendado, o que aumenta
os custos com a limpeza das entrelinhas.
de Medicilândia
dades nativas se
mostraram mais
apropriados para

A
para atingir alta uma plantação recente de aproximada- No manejo, o controle do perfilhamento s experiências e pesquisas realizadas no decorrer das últi- agricultores com
produção. mente quatro anos estando, portanto, no não segue as recomendações e deve im- mas décadas levaram a descobertas importantes para trans- pouca capacida-
início do ciclo produtivo (Figura 5). plicar perda de produtividade. Também o formar a atividade do modo extrativista de subsistência
potencial genético pode não se expressar, para uma atividade com maior eficiência produtiva e importância
de de investimen-
Mesmo se tratando de um plantio co- considerando a ausência de adubação de econômica. Isso tem sido alcançado tanto com o manejo de açaizais to e manejo.
mercial projetado e envolvendo investi- cobertura e a falta de irrigação da área. nativos como com o plantio de açaizais com variedades nativas ou
mentos altos (ver apêndice), observa-se Sem os tratos culturais recomendados, com a cultivar BRS Pará.
que o nível técnico adotado não atende às é possivel que o desempenho produtivo
recomendações para a cultivar BRS Pará. seja comprometido, retardando a unifor-
De acordo com a Embrapa (2004, p. 02), mização dos cachos para além do quinto Estudos realizados em municípios e ilhas
Apêndice
“para o bom desempenho produtivo da ano.   próximas de Belém demonstram que os
Custo para a implantação de um hectare de açaizal em monocultivo com
cultura, é primordial realizar tratos cultu- ribeirinhos adotaram práticas distintas espaçamento de 3 x 3 m.
rais como adubação, roçagem, coroamen- para o manejo de seus açaizais adaptadas Custo Custo
to, manejo dos perfilhos, irrigação para à dinâmica produtiva e econômica local Quanti-
Atividade Finalidade Unidade unitário total
dade
(AZEVEDO & KATO, 2013). Nos açaizais (R$) (R$)
situados no município de Medicilândia, Preparo do Limpeza do Diária 3 45,00 135,00
Figura 5. Plantio de também existem manejos distintos que viveiro local; extração de
madeira e folhas
açaí em monocultivo. estão de acordo com as estratégias dos di- de palmeira;
Os açaizais da cultivar ferentes agricultores. construção
BRS-Pará exigem inves- Preparo da se- Diária 0,5 45,00 22,50
timentos superiores Nos quatro casos descritos, observa- menteira e semeio
aos recomendados às se que os açaizais de variedades nativas Sementes Kg 1 60,00 60,00
variedades nativas. Com parecem ser mais recomendados conside- Preparo terra Diária 2 45,00 90,00
isso, antes da implan- rando-se o baixo nível de manejo adotado enchimento de
tação é imprescindível e a baixa capacidade de investimento dos saquinhos
avaliar o objetivo e a agricultores. Isto se atribui às suas carac- Preparo Análise de solo Amostra 1 40,00 40,00
da área e Roço Diária 5 45,00 225,00
disponibilidade finan- terísticas naturais de maior resistência e adubação
ceira do projeto. Caso menor demanda por insumos e tratos. Os Adubo Kg 80 2,80 224,00
as exigências da cultivar resultados permitem dizer que a implan- Plantio Demarcação, Diária 14 45,00 630,00
não possam ser atendi- tação de açaizais com variedades nativas coveamento e
plantio
das, sugere-se plantar é uma atividade oportuna e promissora
Saquinho Milheiro 1 40,00 40,00
variedades nativas, que economicamente para agricultores fami-
TOTAL 1.466,50
são mais rústicas. liares.  

Manejo de Açaizal Nativo e Cultivado  151


Melhorias nas
Experiências
Produtivas:
Lições
Aprendidas
Benno Pokorny e Anderson Serra,
com apoio de Antônio Reis do Nascimento Filho,
Luiz Carlos Piacentini e Cláudio Wilson Soares
Barbosa

Este capítulo apresenta as


lições aprendidas de 43
projetos de desenvolvimento
e melhoramento de sistemas
produtivos realizados por
agricultores familiares e
comunidades rurais em
Medicilândia e Porto de Moz.
152  Melhorias nas Experiências Produtivas: Lições Aprendidas Melhorias nas Experiências Produtivas: Lições Aprendidas  153
1. Abordagem de
projetos locais
O uso eficiente dos recursos naturais e humanos é crucial
para melhorar as condições de vida das famílias rurais na
Amazônia. Entretanto, os sistemas de produção empregados
muitas vezes apresentam deficiências e limitações para atender as
demandas crescentes de mercado, os padrões e normas de produ-
ção e comercialização e para compatibilizar geração de renda com
prudência ambiental. Esses aspectos configuram novos desafios de
um contexto agrário em transformação, que impõe aos agriculto- Figura 1. A produção
res familiares a necessidade de melhorar seus sistemas produtivos de mandioca é a base
(Figura 1). Sem essa possibilidade, é pouco provável encontrar-se alimentar das famílias
estratégias de desenvolvimento rural que alcancem objetivos indi- em Medicilândia e Porto
viduais e coletivos de melhoria da qualidade de vida. de Moz.

Tradicionalmente, autoridades, organiza- idéia alternativa de considerar a capaci- ências. O projeto Governança estabeleceu ram as anotações dos principais avanços
ções de desenvolvimento, representações dade existente dos agricultores para me- um Fundo Financeiro Comunitário que e desafios das iniciativas. No total, 43 ini-
de agricultores, como também a maioria lhorar os seus sistemas de produção. disponibilizou recursos para custear parte ciativas foram apoiadas e analisadas.
dos agricultores familiares priorizam tec- do investimento inicial de cada iniciativa.
nologias “modernas” desenvolvidas por O projeto Governança ofereceu a possi- Inspirada em experiências promissoras Neste capítulo são apresentadas infor-
especialistas para uma agricultura de ex- bilidade de desenvolver experiências prá- da economia solidária, a equipe técnica mações quantitativas e qualitativas das
pansão (caso do gado) ou de intensifica- ticas com essa abordagem. O ponto de par- do projeto, juntamente com os agriculto- iniciativas, como também uma avaliação
ção (caso do cacau). Porém, as experiên- tida foi mobilizar agricultores familiares res e extrativistas dos GAR, elaborou um do potencial técnico para melhoria das
Tradicionalmen- cias com esses sistemas de produção são em Grupos de Ação e Reflexão (GAR) por plano de trabalho, incluindo a definição atividades desenvolvidas. Além disso,
te, iniciativas de ambivalentes. Somente um número limi- atividade produtiva. Esses agricultores de custos pagos com recursos externos e avalia-se a viabilidade e as limitações do
desenvolvimen- tado de agricultores possui capacidade fi- deveriam estar interessados e dispostos a disponibilizados pelos interessados. De- apoio a projetos desenvolvidos localmen-
nanceira, técnica e gerencial para adotar investir tempo e recursos para melhorar pois, essas atividades foram realizadas te, como alternativa à difusão de pacotes
to rural priori- os pacotes tecnológicos promovidos como atividades produtivas que já desenvol- pelas famílias interessadas, com o suporte tecnológicos desenvolvidos por especia-
zam a difusão suporte às tecnologias modernas, ainda vem e experimentar novas atividades de técnico de equipes de organizações locais listas. O capítulo termina com recomen-
de tecnologias mais considerando que os apoiadores ex- produção, de acordo com seus interesses e (Sindicato dos Trabalhadores Rurais de dações para serem trabalhadas com agri-
ternos, difusores de técnicas modernas, capacidade. Os GAR têm por objetivo ser- Medicilândia, Comitê de Desenvolvimen- cultores familiares na melhoria dos seus
“modernas” de-
possivelmente não irão garantir apoio vir como referência para a realização des- to Sustentável, Fundação Viver Produzir sistemas de produção.  
senvolvidas por permanente à atividade. Com base nes- sas atividades, prestando assessoramento e Preservar e Serviço Cerne) que, além de
especialistas. sa compreensão crítica, desenvolveu-se a técnico e favorecendo a troca de experi- orientar a execução das atividades, fize-

154  Melhorias nas Experiências Produtivas: Lições Aprendidas Melhorias nas Experiências Produtivas: Lições Aprendidas  155
2. Iniciativas apoiadas A maioria das famílias dos dois municí-
pios participantes das iniciativas decidiu
produção, seja pelo nível de intensidade,
seja pelas tecnologias de produção (exem-

D as 43 iniciativas apoiadas pelo projeto Governança, 31 foram


em Medicilândia e 12 em Porto de Moz. Em Medicilândia,
a maioria das iniciativas foi implementada individualmen-
te junto às famílias dos agricultores. Nesse município, uma inicia-
tiva foi executada pela Casa Familiar Rural, instituição de ensino
usar os recursos do Fundo para a produ-
ção de um produto específico principal-
mente para gerar renda, muitas vezes em
combinação com a possibilidade de con-
sumo doméstico. Isso mostra o interesse
plo: galinha caipira e caipirão, ou uso e
manejo florestal) ou pelo produto mesmo
(exemplo: peixe, suíno). Em Medicilândia,
a atividade mais escolhida foi a criação de
galinha caipira e caipirão. Também o cul-
Agricultores têm
interesse em
investir em proje-
tos que contribu-
direcionada aos filhos de agricultores familiares. Das 31 iniciativas das famílias em melhorar a situação de tivo de cacau em terra mista e a criação
realizadas, 59 famílias participaram ativamente. Nas comunidades renda e garantir, ao mesmo tempo, a se- de peixe foram bastante atrativos por se- am para a renda
tradicionais de Porto de Moz, as iniciativas foram executadas a par- gurança alimentar. Apesar de as famílias rem novidades que os agricultores tinham e para a seguran-
tir de abordagem coletiva. Assim, as 12 iniciativas realizadas nesse terem conhecimento básico sobre as ati- interesse em experimentar. Em Porto de ça alimentar.
município envolveram 293 famílias de 14 comunidades. O quadro 1 vidades escolhidas, a maioria dessas ati- Moz, a ênfase das iniciativas foi no uso
resume aspectos importantes das iniciativas realizadas. vidades apresenta componentes novos de de produtos florestais, em particular no

Quadro 1. Objetivos e investimentos das iniciativas promovidas.


Número de Número de Número de Número de
Sistema Objetivo Contribuição do Fundo Financeiro Comunitário (R$) Sistema Objetivo Contribuição do Fundo Financeiro Comunitário (R$)
iniciativas famílias iniciativas famílias
Média (mínimo Média (mínimo
Porto de Moz Detalhamento dos insumos – máximo) por Porto de Moz Detalhamento dos insumos – máximo) por
iniciativa iniciativa
Búfalo Produção mais efetiva 2 6 Melhoria do padrão racial com inseminação arti- 4.503 Suínos Aumento na produ- 1 7 Aquisição de matrizes com melhor padrão racial, 7.000
de carne e queijo para ficial e manejo reprodutivo, instalações apropria- ção de suínos para triturador de mandioca e material de construção
venda das para sistema de várzea e terra firma, com consumo e venda para instalações
cerca elétrica e capacitação para produção de Farinha Higienização da 1 16 Diagnóstico técnico da produção de piracuí; 1.500
queijo, de acordo com as normas de certificação de piracui produção para melhor capacitação, equipamentos e material (telha,
atender as exigências cimento, tijolos, tela e chapa para forno)
Manejo Implementar uma 4 100 Acompanhamento de todas as atividades, 15.000 do mercado
Florestal área coletiva de ma- particularmente na elaboração do plano de PFNM Fabricação de arte- 1 16 Capacitação e material (faca, alicate, martelo, 8.000
nejo florestal para ge- manejo, capacitação, equipamento e material sanato de cipó titica serra, serrote, lixa e um kit para produção de
rar renda e conscien- (botas, facão, foice, capacete, lona, GPS, lima e e outros PFNM para biojóia)
tizar a comunidade fita métrica) melhorar a renda
Acordo Alcançar um acordo 1 com 3 70 Mobilização das comunidades e articulação com 7.000
de pesca de pesca formal para comunida- o poder público para legitimar os acordos; des- Medicilândia
garantir renda e segu- des pesas de viagens; aquisição de equipamentos e
rança alimentar materiais (motores, baterias, rádio amador, farol Cacau Plantio de cacau em 5 7 Análise de solo e compra de adubação orgânica 990
e coletes de sinalização) terra mista e química. Capacitação em técnicas de preparo (500 – 1.300)
Artesanato Artesanato de buriti 1 8 Capacitação em artesanato e viagens de inter- 2.500 de mudas, combate às doenças e manejo dos
de buriti para diversificação da câmbio para conhecimento de experiências; cultivos; materiais (calcário, fósforo, sacolinhas,
renda aquisição de equipamentos (despolpadora, sementes)
freezer, caixa térmica, bacia e equipamentos de Galinha Criação de galinha 9 14 Construção das estruturas de criação (galinheiro, 2.845
higiene) caipira e caipira e caipirão para cercado), aquisição dos animais, de equipamen- (2.500 – 3.400)
Manejo Manejo de açaizais 1 70 Capacitação técnica para o manejo dos açaizais e 2.800 caipirão consumo e comercia- tos e materiais (ração inicial, madeira, telhas,
de açaí e processamento do compra de despolpadoras, botas e foices lização da carne bebedouro, comedouro, prego, tela, triturador,
fruto para renda e lâmpadas, fio, cano PVC, folha de compensado)
alimentação

156  Melhorias nas Experiências Produtivas: Lições Aprendidas Melhorias nas Experiências Produtivas: Lições Aprendidas  157
aproveitamento de madeira em projetos O Fundo investiu cerca de R$ 150.000,00 dicilândia, cada iniciativa realizada por de técnicos e especialistas para o asses-
formais de manejo florestal e na criação em 43 iniciativas, das quais 352 famílias família recebeu menos recursos do Fundo soramento técnico. Em alguns casos, a
de búfalos e manejo de pesca. As outras participaram ativamente. Isso correspon- em comparação com as iniciativas coleti- prestação de assessoramento técnico por
iniciativas refletem interesses mais espe- de a uma média de R$ 3.500,00 por ini- vas de Porto de Moz. Mesmo assim, houve instituições parceiras foi feita de forma
cíficos de um número menor de famílias. ciativa ou R$ 434,00 por família. Em Me- iniciativas, como cacau em terra mista, pontual, como dias de campo para plantio
nas quais foi alto o valor dos materiais e de cacau em terra mista ou oficina sobre
equipamentos disponibilizados pelo Fun- produção de farinha, ambos em Medici-
Quadro 1. Objetivos e investimentos das iniciativas promovidas. do. A maior contribuição do Fundo, com lândia, e também de forma mais perma-
Número de Número de R$ 15.000,00 por iniciativa, foi com o ma- nente, como no caso da criação de peixes
Sistema Objetivo Contribuição do Fundo Financeiro Comunitário (R$)
iniciativas famílias nejo florestal. Em outros sistemas, como em Medicilândia, e, em Porto de Moz, na
Média (mínimo criação de galinha caipira e produção de criação de búfalos e na elaboração de pla-
Medicilândia Detalhamento dos insumos – máximo) por hortaliças, as contribuições foram meno- nos de manejo florestal.
iniciativa
res, porque buscaram somente a inten-
Gado Queijo e leite para 2 3 Instalação de cercas elétricas e compra de equi- 3.450 sificação de atividades já realizadas. Em Enquanto o Fundo contribuiu princi- Em geral, a
de leite consumo e venda pamentos de beneficiamento, em particular fo- (2.000 – 4.875)
gão industrial, forma para queijo, tacho, tambor,
alguns casos, o Fundo custeou somente palmente para a compra dos equipamen- contribuição bem
balde plástico, adubo, ração, rolo de arame liso, pequenos melhoramentos técnicos, caso tos e materiais necessários para o estabe- moderada do
aparelho e material para cerca elétrica e gastos da construção de cerca elétrica para cria- lecimento do componente produtivo, as
de laboratório ção de búfalos. A menor contribuição foi famílias envolvidas nas iniciativas contri- Fundo Financei-
Açaí Manejo com nova 2 3 Capacitação no preparo de mudas e manejo dos 1.200 com as iniciativas de produção de pei- buíram, muitas vezes de forma significati- ro Comunitário
(plantio) variedade e melhoria açaizais, compra de despolpadora e freezer para (400 – 3.000) xe, com custo médio de R$ 250,00 por va, com as áreas, mão de obra e material
no processamento e armazenamento multiplicou-se
iniciativa. de construção disponível na propriedade.
armazenamento ao longo das
Em várias iniciativas, os agricultores con-
Peixe Produção para 5 8 Compra de material (tela do berçário, alevinos, 250
Adicionalmente, a equipe do projeto tribuíram também com materiais compra- iniciativas,
consumo doméstico ração entrosada e farelada) (0 – 460)
e venda Governança acompanhou cada iniciativa, dos. Particularmente as iniciativas com principalmente
Suíno Produção de carne de 3 5 Compra de quatro matrizes, ração para a fase 1.535 tanto diretamente nas propriedades das alta necessidade de mão de obra como, pelos esforços
suínos para consumo inicial, material de construção (arame farpado, (1400 – 1800) famílias e no âmbito dos GAR (logística e por exemplo, cacau e manejo florestal,
doméstico e venda telha, caixa d’água) material de consumo para realizar visitas contaram com uma forte contribuição das das famílias
Mandioca Produção de farinha 3 5 Compra de triturador, prensa e material para 1.500 técnicas, intercambio, reuniões), quanto famílias.   participantes.
de mandioca e tapio- construção de tanque de “pubagem” (bomba, (1.200 – 2.000) na documentação das experiências e as-
ca com novas varieda- mangueira preta, telhas, prego, fio, chapa de
des, infraestrutura de forno, motor para o caititu, carro de mão, folha
sessoramento técnico. Durante os seus
processamento de zinco, cimento). Capacitação para melhoria na três anos de execução, o projeto empregou
qualidade da farinha de tapioca. entre 2 e 4 técnicos com dedicação princi-
Maracujá Produção de polpa 1 2 Equipamentos de irrigação, adubo do solo e in- 2.300 pal a essas tarefas. O projeto Governan-
e fruto de maracujá fraestrutura do plantio (arame liso, caixa d’água, ça viabilizou apoio logístico para facilitar
para venda mangueiras, conexões, bobs, adubo)
a comunicação e o intercâmbio entre as
Horta Alimentação 1 12 Cooperação com a Casa Familiar Rural; aquisi- 2.500 famílias e os GAR e estabeleceu arranjos
e consumo do ção de sementes, adubo e materiais (tela, caixa
excedente d’água, cano PVC, pregos) institucionais com organizações técnicas
e de extensão presentes em Medicilândia
Média 3.554
e Porto de Moz. Nesses casos, os agricul-
Total 43 352 153.816
tores beneficiaram-se do conhecimento

158  Melhorias nas Experiências Produtivas: Lições Aprendidas Melhorias nas Experiências Produtivas: Lições Aprendidas  159
3. Experiências Quadro 2. Desempenho das iniciativas e problemas observados.
Objetivos alcançados Êxito parcial, mas sem continuação Pouco exitoso

O Fundo foi concebido a partir da ideia de que agricultores


e extrativistas que usam recursos naturais para geração de
renda e subsistência são capazes de desenvolver e/ou adap-
tar tecnologias para a produção agrícola de acordo com suas ca-
pacidades e necessidades, assim como são capazes de estabelecer
Sistema /
(Número de
iniciativas)
Cacau (5)
Desempenho

Em três iniciativas, o agricultor conseguiu produzir e


comercializar cacau de forma continua;
Problemas e aprendizagem

 Comparado com a produção em terra roxa, o cultivo


de cacau em terra mista é possível com custos adicio-
Em outra, houve 50% de mortalidade das mudas nais (número excedente em preparação para eventual
normas locais para o uso duradouro dos recursos naturais (Figuras 2 no primeiro ano, levando o agricultor a fazer o replantio, replantio), mão de obra (viveiro e replantio) e correção e
e 3). Partindo dessa afirmação, buscou-se apoiar as atividades agrí- atrasando o crescimento das plantas, mas com adubação do solo.
colas e os acordos comunitários já estabelecidos, como forma de for- continuidade na atividade;  Sem esses investimentos adicionais, a produtividade
Outra foi encerrada porque houve mortalidade de 90% tende a ser baixa demais para justificar o cultivo.
talecê-los, como também iniciativas novas desejadas pelas famílias.
das mudas já na fase de viveiro.
Galinha Uma está sendo mantida com o consumo e venda, por- A localização da propriedade mostrou-se um fator
O início e a duração do processo de esta- caipira ou que localizada em um contexto de grande produção de fundamental para o êxito.
belecimento das várias iniciativas varia- caipirão (9) cacau e gado, e pouca produção de pequenos animais. Insumos de produção (ração e aves) de fora do
ram bastante em decorrência dos detalhes Assim, além da localização privilegiada (próximo à estra- lote ou do município incidem em custo financeiro que o
tecnológicos, da complexidade dos ar- da), o produtor atendeu à demanda local por alimentos; agricultor procura evitar.
ranjos institucionais, da disponibilidade Sete produziram e consumiram, mas sem vender a
produção, encerrando a atividade porque os agricultores
dos recursos, da mão de obra e de outros sentiram-se desestimulados por estarem em área com
fatores, como a situação particular das muita concorrência, principalmente com produtores de
famílias participantes, acontecimentos frango caipira (mais apreciado pelo mercado);
pessoais, clima etc. Alcançar um plano de Uma foi interrompida no início, porque 90% das aves
morreram nos primeiros dias de criação.
manejo florestal envolvendo 60 famílias,
por exemplo, foi muito mais complexo Gado de leite As duas foram interrompidas. Em uma, os equipamentos Nem todas as tecnologias consideradas “simples”
(2) de produção de queijo eram inadequados. A cerca elétri- funcionam na prática.
do que melhorar a maneira de produção ca foi abandonada porque a energia falta com frequ- Em alguns casos, o agricultor encontra caminhos
de maracujá de uma família. De modo ência e os bebedouros foram implantados, mas o gado para adaptá-las às suas condições (o uso de piquetes,
Figura 2. Os geral, todas as iniciativas tiveram algum segue tomando água no igarapé. Na outra, o problema por exemplo, foi adaptado com número menor do
foi que o gado e o pasto não eram do agricultor, mas do que o proposto).
comunitários am- grau de dificuldade, maior ou menor, na
sogro dele, que não "autorizou" a adoção de piquetea-
pliaram o consumo implementação. O quadro 2 apresenta o Questões de gestão da familiar podem interferir na
mento e outras mudanças na forma de trabalhar.
implementação de novas atividades.
e a venda do açaí resumo e o desempenho das iniciativas e
em Porto de Moz. mostra a aprendizagem e as dificuldades Açaí (2) Uma teve êxito, aumentando o rendimento da Os açaizais plantados com variedades locais mostra-
área através do consórcio de açaí com cacau. A família ram-se mais apropriados para agricultores com pouca
observadas. continua a produzir para consumo e venda; capacidade de investimento e manejo do que o cultivo
Uma foi interrompida porque a família mudou-se para da variedade BRS Pará, que demanda mais mão de obra
Figura 3. Os planos de manejo ainda a cidade, apesar de ter implementado o sistema e estar no manejo da área.
não foram aprovados e os comunitários vendendo a produção. O planejamento da família em médio e em longo prazo
deve ser considerado no momento da elaboração de
continuam extraindo madeira de forma
projetos.
tradicional.

160  Melhorias nas Experiências Produtivas: Lições Aprendidas Melhorias nas Experiências Produtivas: Lições Aprendidas  161
Quadro 2. Desempenho das iniciativas e problemas observados.
Objetivos alcançados Êxito parcial, mas sem continuação Pouco exitoso Sistema /
(Número de Desempenho Problemas e aprendizagem
Sistema / iniciativas)
(Número de Desempenho Problemas e aprendizagem
iniciativas) Acordo O acordo de pesca foi implementado. Apesar do não  Acordos intercomunitários sobre gestão coletiva dos
de pesca (1) cumprimento das regras do acordo pela minoria das recursos pesqueiros têm potencial de gerar impactos
Peixe (5) Em três, as famílias estão produzindo para consumo É alto o risco na produção de peixes. Vale a pena famílias e eventual invasão de pescadores “externos”, positivos.
doméstico, mas sem comercialização; fazer adaptações no dimensionamento do tanque para houve impacto positivo na segurança alimentar das
reduzir custos, o que acaba por prejudicar o desenvolvi-  O reconhecimento e regulamentação de iniciativa local
Nas duas outras, as atividades foram interrompidas no famílias e na venda local do pescado. por parte do poder público fortalecem as comunidades
início porque em uma delas o tanque estourou, e em mento da atividade.
para a gestão mais eficiente de seus recursos.
outra os alevinos morreram por má oxigenação da água.
 Contudo, o respaldo do poder público é imprescindí-
Suíno (3) Em uma, a família mantém a produção para consumo e A criação de suínos de raça é possível se for feito o vel para evitar conflitos locais e invasão de pescadores
venda; manejo alimentar e sanitário adequado. externos.
Duas apenas produziram para o consumo, sem continui- Porém, a demanda de mão de obra adicional é Artesanato Os comunitários não deram continuidade à atividade  Aspectos de posse e propriedade particular de terra
dade da atividade ou comercialização dos animais. significativa. de buriti (1) porque a área com disponibilidade de matéria-prima podem ter grande influência, particularmente em con-
Mandioca (3) Em duas, as famílias produziram farinha de mandioca e Os custos para melhorar uma casa de farinha são bem está localizada em propriedade particular e o dono não textos tradicionais, onde as famílias não são necessaria-
tapioca com melhor qualidade para consumo e venda; pequenos e sua construção não exige conhecimento permitiu a entrada de pessoas. Não há produção de mente as proprietárias dos recursos.
Em uma, a mandioca não foi beneficiada porque a casa profundo. artesanato.
de farinha foi mal construída. Porém, é importante planejar cuidadosamente a cons- Manejo Houve aumento da produção nas áreas manejadas. Os  A melhoria de atividades produtivas com baixa deman-
trução e comprar os equipamentos adequados. de açaí (1) comunitários ampliaram o consumo e a venda , que da de mão de obra e já integradas ao mercado tem alto
Horta (1) A horta produziu por apenas um ciclo produtivo e duran- Estabelecer hortas para consumo doméstico é relativa- continua sendo plenamente desenvolvida. potencial de sucesso e continuidade.
te o verão. A produção foi consumida pelos alunos e a mente simples. Suínos (1) As famílias produziram os porcos, o que contribui para a  Simplesmente oferecer qualquer insumo produtivo
atividade foi interrompida durante o inverno. Porém, produzir em horta comercial demanda alimentação. Contudo, não venderam os animais para o gratuitamente oferece o risco da adoção de tecnologias
investimentos adicionais em infraestrutura, como, por mercado, apesar da continuidade da atividade. inadequadas.
exemplo, compra de estufa para assegurar regularidade Farinha Não havia produção de farinha de boa qualidade, nem  As normas de vigilância sanitária são pensadas para
na produção mesmo no inverno. de piracuí (1) para o consumo, nem para a venda, porque os equipa- a produção industrial de média e larga escala, o que
Maracujá (1) A família produziu para consumo doméstico, comercia- Agricultores experientes têm capacidade para resolver mentos necessários para atender às normas sanitárias impõe aos comunitários dificuldades no atendimento.
lização do fruto e da polpa, e continua desenvolvendo problemas de produção. são caros e inadequados para a produção em pequena
a atividade, apesar de problemas graves de pragas e escala.
doenças. PFNM (1) Atividade não iniciada por insuficiência de matéria-prima  Iniciativas induzidas por organizações externas têm pe-
Búfalo (2) Em uma, a cerca elétrica foi instalada para manejo da Os criadores implementam novas técnicas gradativa- e baixa demanda do mercado. rigo de não responder aos interesses reais das famílias;
pastagem, com redução dos custos de construção da mente, passando por processos de testes, validação e  Não faz sentido começar com atividades de produção,
cerca; adaptações, de acordo com as mudanças nos ciclos da caso não exista um mercado atrativo e acessível para os
Em outra, a legalização do queijo de búfala produzido natureza (cheias, secas), disponibilidade de recursos produtos.
artesanalmente não obteve êxito porque os procedi- financeiros, mão de obra e mercado.
mentos burocráticos foram complexos, de alto custo e Têm fortes limitações dos serviços de ATER local
demorados, ou mesmo porque não existiam normas de (EMATER), e dificuldade de diálogo com a da Agência de Do total de 43 iniciativas, 11 (26%) vidade é desenvolvida e produz, mas não
regularização. Inspeção Sanitária (ADEPARÁ). alcançaram as metas ou atenderam as é feita a comercialização. As demais 16
Mesmo contando com grandes conhecimentos, a expectativas dentro dos prazos, com con- iniciativas (37%) não alcançaram o obje-
implementação de propostas locais de melhoramento tinuidade após o apoio externo, gerando tivo de produção e venda de forma con-
precisa de apoio externo e reconhecimento por parte do
Estado. No caso de RESEX, do ICMBio. melhoria na renda e na segurança ali- tinuada. Resumindo, o balanço geral do
Manejo Os planos de manejo foram elaborados e protocolados Os procedimentos formais para autorização de Planos
mentar das famílias. Outras 16 iniciativas Fundo é modesto. Contudo, a análise das
Florestal (4) junto ao órgão ambiental responsável, mas ainda não de Manejo Florestal são impossíveis de ser cumpridos (37%) chegaram a ser executadas, mas o iniciativas exitosas e das que tiveram fa-
houve aprovação. Os comunitários continuam extraindo pelas comunidades de forma autônoma. êxito foi parcial, seja porque as famílias lhas conduz a entendimentos importantes
madeira de forma tradicional. Dependentes de ajuda externa, o custo financeiro ainda estão implementando a ação, seja sobre os fatores cruciais para o êxito e as
de elaboração dos projetos é alto e inviável para os porque a produção foi consumida e a ati- barreiras das atividades produtivas (ver
comunitários;
vidade encerrada, ou ainda porque a ati- Box 1).  

162  Melhorias nas Experiências Produtivas: Lições Aprendidas Melhorias nas Experiências Produtivas: Lições Aprendidas  163
Box 1: Lições aprendidas dos projetos apoiados pelo 3.1. Viabilidade Box 2: Exemplos de iniciativas que geram
Fundo Financeiro Comunitário. renda.
financeira e
Agricultores conhecem profundamente os seus sistemas produtivos, mas segurança alimentar Em Medicilândia, o cacau é um produto al-
mostram deficiências no planejamento e monitoramento e também na avalia- tamente rentável. Porém, até agora, sua pro-
ção de viabilidade de atividades novas.

Para investimentos substanciais, agricultores precisam de forte motivação,


como oportunidades de mercado ou alta pressão de órgãos reguladores;
O agricultor precisa de um motivo
forte e imediato para realizar in-
vestimentos adicionais no seu sis-
tema de produção. Assim, os agricultores
mostram-se dispostos a mudar as suas
dução concentra-se em áreas de boa fertili-
dade (terra roxa), e agricultores com lotes de
menor qualidade de solo são excluídos dessa
possibilidade comercial. Nesse contexto, o
projeto Governança apoiou agricultores na
Enquanto o agricultor tem facilidade de estimar os investimentos iniciais práticas para atender a normas de órgãos tentativa de produzir cacau em terra mista
para começar uma atividade nova, os desafios de manutenção e necessidades reguladores, ou, mais importante, para (solo de menor fertilidade) (Figura 4). Acom-
logísticas de produção e acesso ao mercado são subestimados; responder a oportunidades de mercado. panhando essas iniciativas, foi possível de-
É necessária a existência de um merca- finir as tecnologias de produção e avaliar
Atividades produtivas precisam ser baseadas em mão de obra, financiamen- do estabelecido e acessível que ofereça os custos e benefícios dessa opção. Com
to e recursos naturais realmente disponíveis, considerando que a família geral- preços atraentes que compensem custos base nos dados levantados, 0 Box 3 mostra
mente já ocupa a maior parte da sua mão de obra; eventuais relacionados com adoção e/ou o resultado financeiro do cultivo de cacau
adaptação do sistema de produção. Essa na terra mista, calculado para os primeiros
Os agricultores em contextos de assentamentos preferem atividades in- perspectiva de atratividade financeira 10 anos. A análise mostra que, mesmo em
dividuais, enquanto que em contextos tradicionais trabalham em grupos deve considerar não somente os investi- terra mista, a produção de cacau pode ser
familiares; mentos iniciais, mas também o custo de financeiramente viável. Depois de 10 anos,
manutenção do sistema, o custo de pro- pode-se esperar uma receita líquida total de
As iniciativas mais promissoras são as que buscam melhorar de forma gra- cessamento do produto e, muito impor- R$ 5.523,00 por hectare. Observa-se também
dual as atividades de produção já realizadas, com o objetivo de incremento da tante, o custo de transporte aos mercados que somente no terceiro ano o produtor pode
renda e da segurança alimentar; e de comercialização. De forma geral, mui- esperar a primeira receita proveniente das
tos sistemas de produção têm potencial bananas plantadas simultaneamente com
Aspectos externos à produção, como burocracia excessiva, pouca competên- para serem financeiramente viáveis para o cacau. Mesmo assim, nos primeiros qua-
cia do poder público e dificuldade logística para acesso ao mercado aumentam a maioria das famílias (ver Box 2). tro anos, os custos são significativamente
os riscos e reduzem as possibilidades de êxito das iniciativas; maiores em comparação com as receitas. Em
particular, os custos com mão de obra são
A colaboração em pequenos projetos elaborados pelos agricultores com relevantes nesse período. Adicionalmente,
base nas suas demandas e capacidades específicas apresenta-se como uma no terceiro ano, é necessária a construção
alternativa importante ao sistema de extensão rural clássico; de uma estufa para secar o cacau. Somente
no quinto ano a receita pela venda do cacau
Porém, considerando os desafios de um sistema de assistência técnica que compensa os custos operacionais. Depois, a
busca o acompanhamento individual, é importante avaliar criticamente se as cada ano, a proporção entre gastos e receita
propostas elaboradas pelos agricultores consideram de forma real a realidade fica cada vez mais favorável. De modo geral,
das famílias e do mercado. o investimento precisa de 10 anos para gerar
Figura 4. O cacau em terra mista pode dar lucro ao agricultor.
retorno financeiro.

164  Melhorias nas Experiências Produtivas: Lições Aprendidas Melhorias nas Experiências Produtivas: Lições Aprendidas  165
Box 3. Gastos e receitas de um sistema de cacau em terra mista.
25.000 R$

20.000

15.000

10.000

5.000

0
Ano
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
-5.000

-10.000

-15.000

-20.000 Figura 6. A produção de leite atende o mercado local e o consumo da família.


outros Cacau Subcontratos Máquinas Equipamentos Material Mão de obra
(banana, guandu, madeira...)

H á vários outros exemplos em que mudanças


pontuais e relativamente simples podem
melhorar o resultado financeiro. Entre os
sistemas experimentados no projeto, dois exem-
plos representam bem essa afirmação: a produção
Na criação de porcos, existia um preconceito ge-
neralizado de que porcos com padrão racial melho-
rado precisam de ração industrial para a alimenta-
ção. Muitos agricultores nunca iniciaram a criação
de porcos de raça por causa dessa informação pou-
A maioria dos agricultores que parti-
cipou das iniciativas mostra preferência
por sistemas de produção que combinam
a possibilidade de incremento na renda
com a segurança alimentar da família.
solo (por exemplo, cacau em terra mista e
produção de mandioca). Muitas vezes, as
propostas técnicas sugeridas por especia-
listas ou organizações de apoio não con-
sideram a possibilidade de produzir para
Produção para
mercado e consu-
mo doméstico é
vantajoso para o
de farinha de tapioca e a criação de porcos. A fa- co fundamentada. As três iniciativas de criação de Essa estratégia reduz a vulnerabilidade venda e consumo doméstico (Figuras 6 e
rinha de tapioca tem demanda no mercado local, porcos em Porto de Moz experimentaram a adoção do agricultor ao aumento no preço dos 7), e dessa maneira, são menos atrativas agricultor.
contudo precisa ser de boa qualidade (Figura 5). O de ração alternativa, com produtos do lote agrícola alimentos, e possibilita voltar a ocupar para os agricultores, mesmo com apoio
grão da farinha precisa ficar leve e crocante. Uma (frutas e mandioca), e foi comprovada a possibili- o mercado local com alimentos básicos, financeiro. Isso ficou evidente especial-
das agricultoras incentivou uma iniciativa apoiada dade de criar os suínos com base alimentar local. É caso, por exemplo, do açaí, que tem de- mente no caso das iniciativas direciona-
pelo Fundo porque percebia essa deficiência quan- bem provável que substituir a ração industrial por manda maior do que a oferta nos dois das para a comercialização de produtos
do não conseguia produzir a farinha com qualidade ração local baixe o custo de produção, tornando municípios. A outra vantagem dessa es- florestais não madeireiros.
e enfrentava dificuldades para vender a produção a criação de suínos tratégia é que, para manter a produção
no mercado local. Na iniciativa, a agricultora rece- de raça financeira- voltada para o mercado e para o consu-
beu treinamento específico para o beneficiamento mente viável para as mo doméstico, os agricultores geralmente
da farinha, com orientação técnica sobre o modo famílias. manejam um arranjo produtivo diversifi- Figura 7. Galinha caipira
correto de torrefação (basicamente uma questão cado. Isso resulta em menor necessidade tem grande demanda
de tempo no forno). Com esse novo conhecimento, Figura 5. A farinha de de insumos externos (plantio de milho e no mercado e também
foi possível produzir com a qualidade demandada tapioca precisa estar capineira como ração para galinha e gado contribui para a segu-
pelo mercado e ainda melhorar o preço do produto. crocante para ser bem de leite, por exemplo) e facilita o manejo rança alimentar dos
aceita no mercado. mais eficiente dos recursos como água e agricultores.

166  Melhorias nas Experiências Produtivas: Lições Aprendidas Melhorias nas Experiências Produtivas: Lições Aprendidas  167
Também os próprios agricultores ar os investimentos iniciais e, principal- certo capital disponível para pagar diaris- um processo complexo de elaboração de
mostraram dificuldade em avaliar ade- mente, por dificuldades de pagar as des- tas têm menos dificuldades de providen- plano de manejo e sua subsequente aná-
quadamente a viabilidade de opções de pesas correntes ao longo da realização da ciar o trabalho adicional necessário para lise pelas autoridades governamentais.
produção. Geralmente, eles possuem in- atividade, como também por problemas estabelecer e melhorar as atividades pro- Na prática, as comunidades dependem
formações sobre os preços, compradores de logística. As iniciativas mostram que, dutivas. Como consequência, a tendência de forte e constante apoio externo para
e rede de comerciantes somente para os enquanto o conhecimento sobre os inves- dos agricultores, no curso das iniciativas, superar as várias etapas desse processo.
produtos de intensa relação comercial e timentos iniciais são bastante reais, as ne- é de considerar a área, a mão de obra e Mesmo assim, não alcançaram o objetivo,
de práticas e rotinas já realizadas, mas cessidades de insumos para a manuten- o capital como insumos flexíveis e adap- haja vista a demora e a incompetência
não documentam os gastos de tempo, in- ção dos sistemas de produção, uma vez táveis à produção alcançada. Mesmo con- das agências governamentais em analisar
sumos e recursos empenhados nas ativi- estabelecidos, são subestimadas. Mesmo siderando experiências próprias sobre as os processos com agilidade. Um exemplo
dades. Assim, as considerações existentes com as informações disponibilizadas por limitações nesses fatores de produção, os de dificuldades para atender as demandas
sobre uma atividade limitam-se muitas agricultores com experiência nos GAR ou agricultores insistem nessa visão, muitas qualitativas do mercado observou-se no
vezes à esfera do caixa, ou seja, da entra- de técnicos que assessoram os projetos, vezes correspondendo insuficientemente caso da farinha de piracuí. Na prática, os
Atividades po- da e saída de dinheiro. Dessa maneira, o poucas famílias providenciam todos os às necessidades de uma produção estável. esforços e custos relacionados para pro-
dem não obter valor do próprio trabalho e também pos- insumos necessários durante as diversas cessar o produto conforme a legislação e/
síveis gastos patrimoniais não são consi- etapas de produção, processamento e co- Outra deficiência frequente é o risco de ou a demanda do consumidor, simples-
êxito se as famí- derados, como, por exemplo, a redução mercialização. Esse fato pode afetar nega- não considerar adequadamente aspectos mente foram maiores do que a capacidade
lias não conse- da fertilidade do solo ou a perda de valor tivamente o desempenho das atividades futuros nas decisões para o manejo dos dos agricultores, que preferiram continuar
guem dimensio- do equipamento em uso. Para atividades ao longo do tempo. sistemas produtivos. Um exemplo foi en- com produtos de baixa qualidade e práti-
não realizadas por eles mesmos, os agri- contrado no caso de uma agricultora que cas de processamento tradicionais, apesar
nar corretamente
cultores mostram maior deficiência de co- Outro problema observado nas iniciati- participou da atividade de beneficiamen- de preços significativamente menores. 
os custos de nhecimento. Nesses casos, eles tendem a vas foi a falta de mão de obra, porque a fa- to do açaí e que entrou no projeto apesar
manutenção do desconsiderar possíveis riscos, a ignorar mília já estava ocupada com outras ativi- de sua decisão de mudar para a cidade.
sistema. os custos relacionados à manutenção e dades econômicas. Ao longo do tempo, as Depois do esforço em melhorar o mane-
logística e, assim, têm expectativas exces- famílias tiveram certas limitações em de- jo do açaizal, aprender novas técnicas de
sivamente otimistas em relação ao poten- dicar muito tempo às atividades, em par- beneficiamento, acondicionamento e ar-
cial de renda.   ticular nos períodos de maior demanda de mazenamento e, mesmo ainda depois do
trabalho. Esse problema foi agravado pelo plantio de novas áreas com plantas mais
fato de que a viabilidade financeira das produtivas, ela abandonou temporaria-
3.2. Compatibilidade atividades realizadas dependia da pos- mente o lote, deixando os equipamentos
dos requerimentos sibilidade de usar mão de obra familiar,
por não requerer um pré-financiamento e
sem uso e a área de plantio do açaí sem
manutenção. Somente depois de um ano
com a realidade pelo modesto retorno por dia de trabalho, residindo na cidade, ela retomou as ativi-
do agricultor muitas vezes abaixo de possíveis receitas dades do lote.
com o trabalho de diarista fora do lote.

M esmo atividades produtivas te-


oricamente viáveis não são ne-
cessariamente fáceis de serem
realizadas pelas famílias. Isso pode se dar
por falta de recursos líquidos para custe-
Assim, a opção de trabalhar com mão de
obra contratada não funciona para mui-
tas famílias por requerer pagamento e
também por aumentar o risco. Na prática,
as famílias com filhos adultos e/ou com
Finalmente, constatou-se que burocra-
cia e demandas por qualidade do produto
reduziram a possibilidade de o produtor
atuar com êxito. O exemplo mais evidente
é o caso do manejo florestal, que demanda

168  Melhorias nas Experiências Produtivas: Lições Aprendidas Melhorias nas Experiências Produtivas: Lições Aprendidas  169
3.3. Capacidade rejistas de insumos pouco estruturadas), adaptando-as às necessidades e condições
de adaptação a probabilidade desses acontecimentos
é alta. Na realidade, em todas as inicia-
específicas. Nessas ocasiões, os agriculto-
res atuaram em dois níveis: primeiro, de
e interesse por tivas pôde-se observar acontecimentos forma espontânea, respondendo pragma-
mudanças não esperados que afetaram o seu desem- ticamente a acontecimentos ou demandas
penho. O quadro 3 mostra uma seleção imprevisíveis e, segundo, de forma estra-

Figura 8. Ataque de
animais silvestres é um
risco para a mandioca
U m grande desafio para qualquer
produtor resulta do fato de que
processos de produção inevita-
velmente sofrem de acontecimentos im-
previsíveis (Figuras 8 e 9). Considerando
desses acontecimentos observados em
Medicilândia.

As famílias participantes das iniciati-


vas mostraram boa capacidade de obser-
tégica, buscando aproveitar os recursos lo-
cais existentes, baixar os custos iniciais e
de manutenção, e também otimizar o uso
de mão de obra. Por exemplo, no caso do
gado de leite, os agricultores diminuíram
fio, que é isolado com mangueira comum,
dispensando o uso de equipamentos so-
fisticados e caros. Outras referências que
Figura 9. Dificuldade de
transporte é um proble-
ma geral de agricultores
e extrativistas
especificamente as condições ambientais vação e interesse em responder adequa- os custos com presilhas da cerca elétrica mostram a capacidade de adaptação dos
(chuvas fortes, estiagem intensa) e logísti- damente aos problemas da produção, e isolantes, simplesmente inserindo um agricultores são as iniciativas bem sucedi-
cas da região (longas distâncias, lojas va- como também em aperfeiçoar técnicas, furo no meio da estaca, por onde passa o das de plantar cacau em terra mista.

Quadro 3. Acontecimentos observados nas iniciativas estudadas em Medicilândia. Sistema Acontecimento Impacto
Sistema Acontecimento Impacto Mandioca Ataque de animais silvestres Perda total ou parcial das lavouras.
Cacau em Uso inadequado de agro-tóxicos Ameaça à saúde dos trabalhadores por problemas como dor de cabeça, náuseas e
terra mista cegueira.
Fogo acidental Perda total ou parcial da plantação. Deterioração dos equipamentos A farinheira (forno, triturador, motor) tem em média 10 anos de durabilidade quan-
do há manutenção adequada. Contudo, a falta de reparos e limpeza permanente
Mortalidade e baixo desenvolvimen- Se no período do plantio das mudas o verão for mais intenso, as plantas morrem pode diminuir o tempo de vida útil do equipamento.
to das mudas quase que completamente ou têm desenvolvimento desigual, exigindo mais gastos
financeiros e mais mão de obra para fazer novas mudas e replantio. Alto custo do transporte Se o agricultor não tiver transporte próprio, o escoamento da produção pode ser
dificultado em áreas não atendidas por carros de linha. Tudo é agravado no perío-
Encomenda de análise de solo em Demanda de tempo e recursos financeiros para os agricultores encomendarem o do das chuvas.
outro município serviço que é oferecido apenas em outras cidades.
Criação de Rompimento da barragem por Perda dos peixes, equipamentos e necessidade de reconstrução das barragens, que
Galinha Dependência de insumos externos Na possibilidade de o fornecedor de pintinhos e ração encerrar o fornecimento, o peixe enxurradas em geral envolve altos custos com aluguel de tratores.
caipira e na compra das aves e ração inicial que tem certo risco por ser uma atividade recente na região, os agricultores podem
caipirão ter que encerrar sua produção por falta de animais para recria e engorda e ração Mortalidade por falta de oxigenação Problemas com a renovação da água causados pelo mau dimensionamento dos
nas fases iniciais. tanques, períodos sem chuvas ou mesmo proliferação de microorganismos podem
levar à morte todo um lote de peixes.
Mortalidade Se o manejo alimentar e sanitário não for bem feito, grande parte do plantel pode
ser perdida em breve intervalo de tempo e comprometer a viabilidade econômica Ataque de predadores naturais Se o tanque não for bem preparado, pode haver entrada de peixes carnívoros,
da atividade. ocasionando prejuízos aos agricultores.
Insuficiência de caixa para compra Os agricultores precisam fazer um fundo de caixa para o reinvestimento da renda Dificuldade para construção dos A pouca disponibilidade de tratores nas localidades pode atrasar a construção dos
de pintinhos e ração gerada no ano anterior em compra de pintos e ração para as fases iniciais da cria- tanques açudes, assim como encarecer o investimento inicial.
ção. Se o produtor não fizer reserva financeira, a atividade será interrompida. Suínos Falta de produtos para produzir Suínos são animais com grande demanda por alimentos, e a alimentação com
Gado Queda do preço do leite Desinteresse em manter a atividade ou descuido no manejo alimentar e sanitário. ração no lote produtos do lote (frutas, mandioca, melancia) é de fundamental importância para
leiteiro manter o equilíbrio na relação custo versus benefício. A falta desses produtos no
Falta de chuvas Tem forte impacto na diminuição das pastagens e menor disponibilidade de água, lote pode inviabilizar a atividade.
o que implica redução da produção de leite.
Fuga de animais causada por curral Os suínos podem danificar as lavouras do agricultor e dos vizinhos, trazendo preju-
Açaí Frequente falta de energia elétrica Os agricultores usam gelo para conservar o açaí para o transporte até a cidade. A com problemas de manutenção ízo financeiro às famílias.
nas comunidades rurais falta de energia elétrica pode inviabilizar a produção de gelo e prejudicar a comer-
cialização do produto. Geral Dificuldades de transporte e Redução drástica da receita ou, mais frequentemente, desistência da comercializa-
comercialização ção e aproveitamento da produção para consumo doméstico.

170  Melhorias nas Experiências Produtivas: Lições Aprendidas Melhorias nas Experiências Produtivas: Lições Aprendidas  171
gas precisam de aplicação de veneno para vem como fonte de capim a ser fornecido
serem efetivamente combatidas, apesar aos animais jovens na maromba, ou para
de experiências de práticas alternativas serem pastejadas com mais facilidade por
que não ameaçam a saúde, como produ- estarem próximas dela. Isso ajuda a en-
ção orgânica e do projeto Roça-Sem-Quei- frentar um dos principais desafios relacio-
mar. Sem dúvida, preconceitos existentes nados à criação de búfalo, que é a alimen-
são também induzidos por manifestações tação adequada para os animais na época
de técnicos envolvidos na difusão de sis- das cheias.
temas de produção empresarial.
As iniciativas mostram que um am-
Apesar da capacidade de desenvolver biente de intercâmbio de conhecimentos
e adaptar práticas de produção às capa- entre agricultores, extrativistas e técnicos
Assistênica
cidades e condições específicas, as famí- promove inovações e adaptações impor- técnica deve
lias que participam das iniciativas nem tantes em favor da melhor gestão dos re- valorizar o
sempre valorizam o grande potencial de cursos naturais. As famílias participaram
conhecimento
tecnologias locais simples. Um exemplo ativamente das reuniões e atividades
em Medicilândia é o aceiro no cultivo do técnicas organizadas pela equipe técni- do agricultor.
cacau. O aceiro é a prática de limpar o ter- ca do projeto Governança. Nessas opor-
reno, criando uma faixa de proteção que tunidades, os agricultores mostraram-se
Figura 10. A ilharga da isola a área que se pretende queimar do dispostos a socializar conhecimentos e
maromba é uma prática restante do lote, evitando assim a propa- experiências com os demais agricultores
local dos criadores de Os agricultores mostraram conhecimento, tor buscasse incessantemente técnicas de gação do fogo. A propagação indevida do nos GAR. Nesses encontros, informações
búfalo que melhora o particularmente sobre os produtos clássi- combate à doença, o que resultou no êxito fogo causa prejuízo para os agricultores e relativamente simples, mas de grande
sistema produtivo. cos de intensa relação comercial, sobretu- na atividade. seus vizinhos. O aceiro é uma prática rela- importância, foram amplamente comuni-
do gado e cacau em Medicilândia e madei- tivamente simples, que pode ser feita de cadas, como o contato de fornecedores de
ra e búfalo em Porto de Moz. Mesmo assim, o conhecimento e a ca- forma mecanizada (trator), com roçadeira insumos, compradores que oferecem me-
pacidade do agricultor muitas vezes não ou mesmo de forma manual, com o uso lhores preços, técnicas bem sucedidas de
Um caso emblemático para mostrar a são suficientes para responder a todos os de enxada. Contudo, muitos agricultores manejo, entre outras.  
capacidade de responder a acontecimen- acontecimentos na implantação e exe- simplesmente não o fazem, embora o pre-
tos de sistemas de produção já executados cução das iniciativas, particularmente juízo causado por essa decisão seja alto, 3.4. Preferência pela
é a iniciativa do maracujá. Nessa iniciati- face aos desafios logísticos e de comer- caso o fogo se alastre para os plantios. Por
va, o agricultor enfrentou problemas com cialização e nas iniciativas nas quais os outro lado, também foram observados
atuação individual
uma doença no fruto, até então nova para
ele. Contudo, a sua experiência anterior,
aliada à boa estruturação de outros com-
ponentes da atividade, como irrigação e
espaçamento, além da necessidade ur-
agricultores trabalham com sistemas de
produção completamente novos para
eles. Frequentemente, a atuação dos agri-
cultores segue tradições baseadas em in-
formações pouco consolidadas e às vezes
exemplos positivos de difusão de tecnolo-
gia local, como no caso da preparação de
área de recreio na ilharga da maromba (Fi-
gura 10), feita por criadores de búfalo em
Porto de Moz. A técnica consiste em fazer
O bservamos que fora das iniciativas
e grupos de avaliação e reflexão,
as famílias pouco se comunicam
com vizinhos e outros possíveis parceiros
sobre opções de produção e comercializa-
gente de resolver o problema, já que essa em preconcepções comunicadas entre vi- piquetes próximos à maromba para reser- ção. Apesar da solidariedade que em geral
atividade é uma das principais fontes de zinhos. No sistema de cacau, por exemplo, var pastos para os animais se alimenta- os agricultores mostram, e do seu interes-
renda da família, fez com que o agricul- todos os agricultores acreditam que pra- rem na época das cheias. Essas áreas ser- se em contribuir ativamente na organiza-

172  Melhorias nas Experiências Produtivas: Lições Aprendidas Melhorias nas Experiências Produtivas: Lições Aprendidas  173
ção social e participar das organizações famílias das comunidades. Cada grupo de tas ou participação em eventos realizados de extensão. Quando os agricultores ino-
representativas, são raros os casos em pessoas, normalmente da mesma família, por alguma organização. Surpreendente- vam, buscando adaptar o seu sistema
que vizinhos trocam conhecimentos e ex- tem uma área própria para a exploração mente, mesmo aqueles sem experiência produtivo a essas tecnologias, em vez de
periências de forma sistemática ou se jun- ou trabalha em determinada área comum. prática têm uma ideia real das tecnologias melhorar o conhecimento e capacidades
tam para, por exemplo, reduzir os custos Portanto, a forma usual de organização e necessidades de insumos, em particular que já dispõem, os resultados mostram-se
de transporte ou facilitar as negociações para a atividade madeireira é de uma só de equipamentos, mão de obra e produ- críticos. Essa constatação fundamenta-se
com possíveis compradores. Quase todos família ou de núcleos familiares, e não de ção esperada, em qualidade e quantidade. em três motivos: a probabilidade de erros,
os participantes das iniciativas, também forma comunitária, envolvendo todas as a falta de conhecimento de aspectos de
no contexto mais tradicional de Porto de famílias de uma comunidade. Em conse- As deficiências risco e a distância das redes de comercia-
Moz, enfocam a família, especificamente quência, iniciativas direcionadas a apenas lização. Assim, mesmo que a perspectiva
o núcleo familiar, como elemento de atua-
ção econômica e produtiva. Por exemplo,
nas iniciativas de manejo florestal no con-
texto tradicional de Porto de Moz, a forma
de organização produtiva é baseada em
uma família ou a um núcleo familiar são
mais efetivamente desenvolvidas, ainda
mais porque a comunicação e negociações
necessárias em ações coletivas muitas ve-
zes são afetadas por conflitos pessoais ou
A pesar de os agricultores terem ex-
periência e conhecimento sobre
as técnicas de implementação e
manejo de diversos sistemas de produ-
ção adaptados às condições específicas
de gerar renda com iniciativas de alto in-
vestimento seja muito atrativa, em caso
de adoção exitosa, melhoramentos e ati-
vidades com crescimento gradual têm me-
lhores chances de obter bons resultados.
laços de parentesco existentes entre as entre as famílias.   dos seus lotes e às caraterísticas de suas
famílias, a maioria orienta sua produção Fatores de êxito A adaptação do
em poucos produtos voltados principal-

O
mente para o comércio e produzidos com êxito de qualquer opção produtiva sistema condu-
tecnologias padronizadas. Aparentemen- depende da possibilidade de aces- zida de forma
te, os agricultores tendem a continuar o sar mercados atrativos, incluindo autônoma pelos
4. Avaliação que já fazem, em vez de aproveitar even-
tuais opções de melhoramento, ou adotar
componentes produtivos novos. O espa-
os aspectos de transporte e de venda. Não
há logística e mercado para todos os pro-
dutos que garantam ao mesmo tempo uma
agricultores é
fundamental
Agricultores familiares e
extrativistas possuem
conhecimento do potencial de
A s experiências com as iniciativas revelam a possibilidade de
melhorar e enriquecer os sistemas de produção de agriculto-
res familiares e extrativistas na Amazônia. Foi possível esta-
belecer alguns componentes de produção e aumentar a viabilidade
dos sistemas já praticados com ajustes relativamente moderados.
ço existente para iniciativas próprias de
melhoramento raramente é usado, em
particular as que incluem possibilidades
de diversificação da produção voltada
à comercialização. Essa baixa iniciativa
renda suficientemente atrativa para justi-
ficar que o agricultor enfrente o risco de
perder investimentos feitos com recursos
limitados. Um fator comum que influen-
cia o acesso a uma tecnologia é o custo de
para a funciona-
lidade da ativida-
de desenvolvida.
sua propridade, o que é utiliza-
Foram os próprios agricultores que elaboraram a maior parte das é agravada pela falta notória de capital, estabelecimento. Tecnologias com custos
do efetivamente na elaboração iniciativas e das propostas técnicas apresentadas nos capítulos an- disponibilidade limitada de mão de obra, moderados de estabelecimento e manu-
de propostas técnicas que teriores deste livro. O agricultor é um profissional com conhecimen- acesso insuficiente à informação e baixo tenção, coerentes com a capacidade finan-
melhoram a sua base produtiva. to profundo do potencial da sua propriedade e da sua comunidade. interesse em enfrentar desafios da organi- ceira, com os recursos humanos (sobretu-
Ele tem domínio sobre as tecnologias e logística relacionadas ao sis- zação para as ações em grupo. do mão de obra) e com o conhecimento
tema de uso da terra, combinando atividades para consumo domés- do produtor, têm mais aceitabilidade do
tico e para o mercado. Resultado desse conhecimento sobre diversas De outro lado, existe um interesse geral que as que requerem altos investimentos.
práticas produtivas, somente poucas opções de produção são com- sobre os pacotes tecnológicos desenvol- Nesse sentido, é relevante também a pos-
pletamente novas para o agricultor. A maioria dos agricultores já vidos por especialistas, desenhados para sibilidade do agricultor de contribuir com
dispõe de experiências específicas, muitas delas de várias décadas, agricultura de larga escala e promovidos recursos próprios, em particular com mão
ou tem conhecimento prático das opções através de vizinhos, visi- por programas de crédito e organizações de obra familiar e conhecimento. A pos-

174  Melhorias nas Experiências Produtivas: Lições Aprendidas Melhorias nas Experiências Produtivas: Lições Aprendidas  175
Figura 11. O assesso-
sibilidade de adaptar o sistema produtivo te para garantir o êxito de todas as inicia- ramento técnico da
às suas condições específicas cria um sen- tivas. Aparentemente, os interesses e as agricultura familiar deve
timento de propriedade intelectual funda- expectativas dos agricultores nem sempre ser baseado em diálogo
mental para assegurar a funcionalidade correspondem às suas capacidades e rea- e intercâmbio que per-
local e reduzir possíveis dependências. As lidades. Sem dúvida, cada produtor é um mitam adaptar tecno-
observações mostram que particularmen- caso específico que precisa de soluções logias às capacidades e
te a fase de manutenção pode ser a mais bem orientadas a seus interesses e capaci- interesses específicos
crítica para o sucesso de um sistema de dades individuais. Assim, é preciso a con- dos agricultores.
produção porque muitas vezes é somente dução de mecanismos de assessoramento
depois de estabelecido que o agricultor en- técnico da agricultura familiar baseados
frenta gargalos na disponibilidade de mão em diálogo e intercâmbio (Figura 11), que
de obra e recursos. É quando surgem os permitam adaptar as tecnologias às capa-
maiores riscos e problemas que precisam cidades e interesses específicos dos agri-
de respostas. Portanto, é crucial conside- cultores, em vez de adaptar os agriculto-
rar conscientemente os numerosos riscos res às tecnologias baseadas na difusão de
que podem, e normalmente fazem redu- pacotes tecnológicos que, muitas vezes,
zir drasticamente a renda prevista com a seguem modelos de produção de grande
atividade. Esse é um argumento para evi- escala, pouco compatível com a situação
tar mudanças muito drásticas e optar por da maioria dos agricultores. Essa mudan-
tecnologias que assegurem ao agricultor o ça de paradigma implica que o assessora-
pleno domínio das técnicas e logísticas re- mento técnico deve considerar o sistema
lacionadas ao componente produtivo. de produção por inteiro como manejado
pelo agricultor, em vez de isoladamente
O financiamen-
Acompanhamento enfocar na promoção de somente um pro-
O assessoramen- duto ou uma tecnologia. o seu potencial para quebrar barreiras e dagem precisa de um acompanhamento to de projetos
to técnico deve
adequado superar preconceitos, como no exemplo individual de cada família, considerando produtivos com
ter a família e o
sistema de pro-
dução como foco
D iferentemente dos sistemas pro-
dutivos amplamente apoiados na
região via projetos FNO-Especial,
voltados prioritariamente para o mercado
externo (por exemplo, consórcio de côco
Nesse sentido, a estratégia de desenvol-
ver iniciativas em colaboração intensiva
com grupos de agricultores, e o seu finan-
ciamento parcial por um fundo comuni-
tário com recursos não reembolsáveis,
das iniciativas de cacau em terra mista e
da criação de suínos de raça, que nunca
foram consideradas pelo sistema de ex-
tensão rural clássico, por serem ativida-
des tecnicamente não referendadas. Tudo
um universo maior de agricultores, a sua
realização implica esforços significativos.
O fato de que várias iniciativas não alcan-
çaram os resultados pretendidos mostra,
ainda, que é imprescindível o aprimo-
recursos geridos
de forma coleti-
va, que priorizam
central de traba- as demandas de
e cupuaçu), ou mesmo os atuais projetos pode gerar resultados interessantes. Mais isso foi alcançado com um valor médio de ramento de alguns procedimentos para
lho, ativando o do PRONAF, concentrados principalmente importante ainda, essa abordagem tem investimento relativamente baixo por fa- assegurar o uso eficiente do fundo e dos
mercado e con-
potencial existen- em monocultivos (cacau e gado), o Fundo potencial para assegurar a relevância do mília, porque os agricultores foram moti- técnicos. Nesse sentido, é fundamental sumo doméstico
te e adaptando Financeiro Comunitário apoiou principal- investimento para o agricultor e de gerar vados a reduzir o custeio, pela necessida- realizar uma análise prévia das propos- específicas de
mente atividades em atendimento às de- benefícios diretos para as famílias, porque de de empenhar contrapartida. O tempo tas, para selecionar as que forem econo-
as tecnologias às cada família, tem
mandas de consumo doméstico e merca- se baseia nos conhecimentos, capacidades de elaboração das iniciativas foi relativa- micamente viáveis e compatíveis com os
necessidades dos do, e sistemas produtivos diversificados. e interesses específicos de cada família. mente pequeno e com pouca burocracia. interesses e capacidades dos agricultores alto potencial de
agricultores. Contudo, essa abordagem não foi suficien- Dessa maneira, as iniciativas confirmam Entretanto, tendo em vista que essa abor- familiares.   sucesso.
176  Melhorias nas Experiências Produtivas: Lições Aprendidas Melhorias nas Experiências Produtivas: Lições Aprendidas  177
O Desafio Atual
das Reservas
Extrativistas:
Agricultura ou
Extrativismo?
Alfredo Kingo Oyama Homma
e Jair Carvalho dos Santos

A partir do histórico e da situação


de pobreza das famílias rurais,
argumenta-se que a inclusão
produtiva pela agricultura, pela
pecuária e por determinadas
atividades extrativistas é o principal
desafio para o desenvolvimento de
unidades de conservação de uso
sustentável.
178  O Desafio Atual das Reservas Extrativistas: Agricultura ou Extrativismo? O Desafio Atual das Reservas Extrativistas: Agricultura ou Extrativismo?  179
Conforme dados do Censo Demográfico Figura 2. Um em cada
de 2010, a população total do município três moradores de Porto
de Porto de Moz era de 33.956 habitantes, de Moz vive em extrema
com 42,95% das pessoas residentes em pobreza. As áreas rurais
área urbana e 57,05% em área rural. Des- concentram a maior
se total, 11.857 encontrava-se em situação parte da população mais
de extrema pobreza, ou seja, com ren- carente que precisa de
da domiciliar per capita mensal abaixo condições para produzir
de R$ 70,00 (Figura 2). Isso significa que e gerar renda.
34,9% da população municipal viviam
nessa situação, sendo 67,7% desse subto- ficiou 1.068 famílias do município (DIAG-
tal (8.029 pessoas), no meio rural e 32,3% NÓSTICO, 2014; MUNICÍPIO, 2014).
(3.827 pessoas), no meio urbano (IBGE,
2014; MUNICÍPIO, 2014). Ainda segundo Outros indicadores socioeconômicos
os dados do Censo Demográfico 2010, em corroboram a pobreza do município de
agosto daquele ano, o município possuía Porto de Moz. A renda anual per capita
13.173 pessoas economicamente ativas, de 2011, por exemplo, foi de R$ 3.696,58
sendo que 12.333 estavam ocupadas e 841 enquanto que a do Estado do Pará que foi
não ocupadas. de R$ 11.493,73. O Índice Firjan de Desen-
volvimento Municipal (IFDM), equivalen-
A pobreza do município de Porto de te ao Índice de Desenvolvimento Humano
Moz pode ser dimensionada pelo aporte (IDH), para o município de Porto de Moz,
de recursos do Programa Bolsa Família, em 2011, foi de 0,3593, posicionando-se
que tem evoluído a ponto de superar Fun- em 138° lugar em relação ao conjunto de
do de Participação de Municípios (FPM). municípios do Estado (num total de 143)
Figura 1. Das 107 Em 2013, o volume de recursos para paga- e na posição 5.488° no universo de 5.565
comunidades e localida- mento de bolsas família foi de aproxima- municípios brasileiros (FIRJAN, 2014;
des rurais de Porto de
Moz, 89 estão na Resex
buscando a melhoria de
suas condições de vida.
O desafio atual das famílias que moram em Unidades de Con-
servação, em particular em reservas extrativistas (Resex) na
Amazônia, é a geração de renda para a melhoria de suas con-
dições de vida. A maior parte dos moradores de Resex tem tradição
de trabalhar com atividades extrativistas e com a produção agro-
damente R$ 11,7 milhões, enquanto que
o FPM foi de R$ 11,2 milhões. De 2004 a
2013, a soma de recursos transferidos pelo
Programa Bolsa Família teve aumento de
1.379,09%. De acordo com os registros da
IBGE, 2014).

Nos últimos cinco anos, percebe-se um


processo de amadurecimento dos resi-
dentes rurais e urbanos de Porto de Moz
pecuária, sendo esta última, normalmente, a componente principal folha de pagamentos de maio de 2014, o sobre o papel da Resex e seu impacto na
O baixo desen-
da renda. Não obstante proporcionar o reconhecimento e o apoio às município possui 4.834 famílias benefici- qualidade de vida da população local. A volvimento da
atividades tradicionais, a criação de Resex gera novos desafios para árias do Programa Bolsa Família (55,63% reserva completou 10 anos em 8 de no- agricultura é uma
essas populações. Este capítulo aborda o tema com base na experi- da população do município). De outubro vembro de 2014 e o sentimento que reina
das principais
ência dos agricultores residentes na Reserva Extrativista Verde para de 2011 a março de 2014, o Bolsa Verde, é que pouca mudança ocorreu no sentido
Sempre, criada em 2004 e situada no município de Porto de Moz, programa de transferência coordenado das melhorias esperadas. A dinâmica da razões da
Estado do Pará (Figura 1). pelo Ministério do Meio Ambiente, bene- Resex tem forte efeito no município por pobreza rural.
180  O Desafio Atual das Reservas Extrativistas: Agricultura ou Extrativismo? O Desafio Atual das Reservas Extrativistas: Agricultura ou Extrativismo?  181
representar 74% de sua área total e apro- área da unidade (WATRIN e OLIVEIRA, Desde 1951
ximadamente 30% da população. Somen- 2009). Vivendo em um ecossistema singu-
te na Verde para Sempre vivem mais de lar, com enchentes anuais, o búfalo adap-
a criação de
10 mil pessoas, totalizando mais de 2.100 tou-se à paisagem anfíbia, permitindo a búfalos integra
famílias, distribuídas em 58 comunidades geração de renda pelas famílias criadoras a paisagem da
(QUINZEIRO NETO, 2012). com a venda de queijo, leite e de animais
Resex Verde para
para o abate. Em comparação com os bo-
Considerando que mais de 57% da vinos, os búfalos são mais resistentes a Sempre que foi
população reside no meio rural, que ape- doenças, parasitos e intempéries, sobre- criada em 2004.
nas 14% do PIB é gerado pelo segmento vivem com pastagens de baixa qualidade Figura 3. Os búfalos introduzidos na Fazenda Aquiqui, em 1951, integraram a paisagem das
da agricultura e que os residentes rurais e convivem em ambientes inundáveis. várzeas da Resex Verde para Sempre.
têm nesse segmento a principal fonte de No ambiente de terra firme, os desafios
renda, pode-se deduzir a razão pela qual são melhorar o desempenho da princi- (1910-1984), nascido em Porto de Moz, ad- tudar nos Estados Unidos, fato incomum
a população rural tem maior proporção de pal atividade agrícola, que é a produção quiriu uma vasta área de terras que mar- na época. A sua fluência na língua inglesa
É necessário moradores em situação de extrema pobre- de mandioca e de farinha, praticada com geia o Rio Aquiqui, pertencente ao coronel permitiu manter amizade com os ameri-
promover a za. Adicionalmente, a criação da reserva processos bastante primitivos, e fomentar cearense José Júlio de Andrade (?-1952), canos do Projeto Jari 2 que se estabelece-
agricultura, a pe- extrativista criou maiores restrições à prá- novas alternativas produtivas adequadas conhecido latifundiário, e à sua esposa ram nessa região, em 1967, fornecendo
cuária e as ativi- tica da agricultura e especialmente para a às condições socioeconômicas e culturais Laura Leme de Andrade (HOMMA et al., búfalos para suprimento de carne e, pro-
criação de animais. A criação de búfalos das famílias produtoras, cujos produtos 2010; SILVA, 2008). Posteriormente, foram vavelmente, obtendo facilidades em duas
dades extrativas constitui a principal atividade econômi- tenham aceitação nos mercados local e incorporadas áreas que margeiam os rios reportagens para a revista T ime sobre a
com potencial de ca de moradores das áreas de várzea da regional. Quati e Jaurucu, então pertencentes a Al- fazenda Aquiqui.
gerar renda nas Resex, juntamente com a pesca artesanal. tair Burlamaqui e a outros vizinhos, trans-
Verifica-se que a indefinição legal com Surgem então as questões relacionadas formando a propriedade em latifúndio. O A ideia da criação de búfalos, por parte
Unidades de relação ao destino dos búfalos criou um ao estágio atual e ao futuro da Resex Ver- pai de Michel, Alfredo Melo e Silva, era de Michel, decorreu do conselho recebido
Conservação de ambiente de incerteza e as muitas casas de para Sempre e dos seus moradores, que descendente de libaneses e, como muitos de Felisberto de Cardoso Camargo (1896
Uso Sustentável. abandonadas indicam que os moradores este capítulo pretende enfocar. A reserva de seus patrícios, optou pelo comércio, - 1977), primeiro diretor do Instituto Agro-
venderam o rebanho e mudaram para a passou a ser um enclave1 no município de atuando em Porto de Moz na época áurea nômico do Norte (IAN), atual Embrapa 2
As terras da Companhia Jari
cidade de Porto de Moz. Situação seme- Porto de Moz ou vice-versa? Quais os ca- de extração da borracha. Alfredo teve 18 Amazônia Oriental, como melhor alter- adquiridas por Daniel Keith
lhante ocorre em relação à extração de minhos para a agricultura e para o extra- filhos, sendo nove do primeiro matrimô- nativa agropecuária para as áreas de vár- Ludwig (1897-1992) pertenciam
madeira, recurso extrativo de maior valor tivismo com geração de renda na unidade nio, entre os quais Michel Melo e Silva. zea. Michel iniciou a criação bubalina em antes ao coronel José Júlio de
na reserva. A lentidão e as dificuldades de conservação?  1951, com reses vindas da Fazenda de São Andrade (LINS, 1991).
criadas para a regularização das áreas de Michel casou-se com Cléia Bentes, irmã João de Gurupatuba 3, em Cachoeira do
3
1
manejo comunitário têm sido empecilhos Fase pré-Resex Verde do governador do Estado do Pará no pe- Arari, na ilha de Marajó. Foram adquiri- A fazenda pertencia ao coronel
Sentido figurado para indicar para a apropriação de renda por parte dos ríodo 1925-1929, Dionísio Ausier Bentes, dos alguns animais de raça do plantel que Arthur Lima, pai da pajé Zeneida
relações produtivas, administra- moradores da Verde para Sempre e outros para Sempre responsável pela vinda dos imigrantes pertencia ao IAN, localizado no Campo Lima de Araújo (1934), autora do
agentes da cadeia produtiva. japoneses e pela implantação da Compa- Experimental de Maicuru, em Monte Ale-

É
tivas e políticas independentes livro O mundo místico dos caru-
entre a Resex e o município de importante fazer um retrospecto nhia Ford Industrial do Brasil (HOMMA, gre, bem como foram feitas aquisições de anas e a revolta de sua ave, que
Porto de Moz, do qual faz parte, O maior desafio da Resex está relacio- histórico para entender a situação 2003; LOBO, 2008). Foi prefeito de Porto de búfalos Murrah e Jafarabad que vieram, serviu de enredo para a Escola
sem integração, mas com nado com os moradores das várzeas, que atual. No dia 04 de outubro de 1941, Moz no período de 1948 a 1951. O casal provavelmente, do Estado de São Paulo de Samba Beija-Flor de Nilópolis
prejuízos para a sociedade. representam 22% (285,7 mil hectares) da o jovem advogado Michel Melo e Silva teve cinco filhos, aos quais estimulou a es- (Figura 3). no Carnaval de 1998.

182  O Desafio Atual das Reservas Extrativistas: Agricultura ou Extrativismo? O Desafio Atual das Reservas Extrativistas: Agricultura ou Extrativismo?  183
Em 1953, ocorreu a maior enchente do onde moravam e trabalhavam como va-
Desde 1951 Rio Amazonas, somente suplantada pelas queiros. Tinham uma relação de trabalho
a criação de enchentes de 2009 e 2012. No entanto, os informal e eram remunerados no sistema
búfalos integra búfalos conseguiram sobreviver, o que es- de “aviamento”. Nesse sistema, o proprie-
timulou Michel Silva a expandir a ativi- tário adianta bens de consumo e alguns
a paisagem da
dade, como alternativa principal às áreas instrumentos de trabalho e o retireiro
Resex Verde para de várzea. Dessa forma, a criação de bú- restitui a dívida contraída com produtos
Sempre que foi falos nas várzeas da Reserva Verde para extrativos, agrícolas e trabalho realizado.
criada em 2004. Sempre tem 63 anos de convivência com É um sistema de escambo em que a moe-
o meio, mostrando-se integrados à paisa- da serve apenas como referência de valor
gem, tal qual ocorre na ilha de Marajó. (SOARES, 2009; NAZARÉ, 2009).

No auge da atividade, na década de Para cada casal de retireiros, era forne-


1960, havia 197 “retiros” 4 espalhados na cido um rebanho inicial de 30 reses, sendo
fazenda, com um rebanho estimado em 28 búfalas “cheias” (prenhes), um repro-
18 mil bubalinos (Figura 4). Os retiros re- dutor e uma búfala com cria para garan-
cebiam nomes de santos provavelmente tir leite para a família. Aos retireiros, era
pelo fato de a esposa de Michel, Sra. Cléia, concedido prêmio, além do salário, quan-
ser extremamente católica. Para facilitar do ocorria o nascimento de 28 bezerros Figura 4. Povoados que
o deslocamento de Belém para a Fazen- sadios. nasceram dos antigos
da Aquiqui, o fazendeiro Michel chegou para evitar a consanguinidade e os ani- puma e o cheiro do sabão, bem como os “retiros” se espalham no
a possuir dois aviões: um Beechcraft Bo- Os retiros mais antigos ficavam no Rio mais machos jovens eram separados e resíduos do sal, espantavam as piranhas. interior da Resex Verde
nanza e um Cessna, que pousavam nas Quati, Rio UiUi (Retiro Marco), Boca (en- engordados para o abate. Efetuava-se a Essa técnica foi desenvolvida a partir da para Sempre.
comunidades Paxiubal e Caridade. trada do Rio Aquiqui, Retiro Laranjeira) castração desses animais com um ano a observação de que, nos locais onde se la-
e Furo do Aquiqui (Retiro Fé). O rebanho um ano e meio de idade. vava roupa, podia-se tomar banho tran-
A maior parte dos moradores da Fazen- bubalino na Fazenda Aquiqui era bastan- quilamente que não havia piranhas.
da Aquiqui, antes da sua falência, era ar- te dócil, o que permitia o uso de currais Eram construídas marombas na “cabe-
regimentada no município de Breves para feitos de varas, sem grande possibilidade ça” do teso (áreas mais altas, nas várzeas, A sede da fazenda ficava no Furo do
trabalhar em sua implantação, fazendo de ocorrência de quebra da estrutura ou próximas ao rio). Os animais costumavam Aquiqui, onde se localizava também a
derrubadas, formando pastagens e cons- fuga de animais. O estrume era queima- atravessar o rio em frente à maromba para vila dos empregados. Já o armazém da
truindo marombas (currais suspensos). do para afugentar os mosquitos e o chei- pastar na área de várzea na outra margem fazenda, onde funcionava o comércio de
Como Michel Melo e Silva era também ro da fumaça tornou-se comum para os e nas áreas submersas. No verão, o reba- compra e venda, ficava na beira do Rio
juiz de direito, fazia casamentos de “papel animais. nho pastava ao lado da maromba, pois os Amazonas. No armazém da fazenda, que
passado” (registro oficial), promovendo a pastos iam sendo descobertos à medida abastecia os moradores tanto da proprie-
união dos filhos de seus empregados. Esse Havia um processo de seleção das bú- que as águas iam descendo sem, muitas dade como das redondezas, vendiam-se Muitas comuni-
4
Retiros são áreas de várzea procedimento era estratégico na formação falas, no qual eram escolhidas aquelas vezes, prejudicar as instalações. Para evi- de armarinhos a máquinas de costura. dades surgiram
que, antigamente, eram cedidas de novos “retireiros”, pelo fato de todos que produziam pelo menos quatro litros tar o ataque de piranhas durante a traves- Os retireiros tinham acesso ao armazém
dos retiros feitos
pelo proprietário para seus eles, desde a infância, já saberem cuidar de leite por dia. Quando o retiro atingia 90 sia do rebanho, utilizavam-se as sacas de da fazenda para a realização de compras,
empregados (retireiros) para de rebanhos. Os retireiros eram famílias reses, o rebanho era desmembrado para algodão antes usadas no armazenamento cujos valores eram descontados dos salá- para a criação
moradia e criação de búfalos. que recebiam a concessão dos retiros outros retiros. Era feita a troca de touro, do sal, enchendo-se-lhes de sabão. A es- rios.  de búfalo.
184  O Desafio Atual das Reservas Extrativistas: Agricultura ou Extrativismo? O Desafio Atual das Reservas Extrativistas: Agricultura ou Extrativismo?  185
A decadência da Quais os caminhos para de a criação estar integrada à paisagem,
O futuro das
tal qual na Ilha de Marajó, onde os búfa-
Fazenda Aquiqui a agricultura na Resex? los tornaram-se emblemáticos. Como os Resex passa pela
moradores das várzeas iriam sobreviver melhoria de vida

A decadência da Fazenda Aquiqui


decorreu, provavelmente, da ideia
de implantação de um laticínio
moderno, em 1970, que partiu do irmão
de Michel, Valdomiro Melo e Silva, veteri-
N ão se justifica um subdesenvolvi-
mento sustentado para as popu-
lações mediante transferências
governamentais somente para manter a
apologia ao modelo das Resex. A elevação
com a retirada dos búfalos? O que fazer?
Uma relação de amor e ódio passou a ser
dedicada aos búfalos. O Ministério Públi-
co Federal pretende adotar uma estratégia
a ser aplicada para controle e redução do
dos moradores e
não pelo subde-
senvolvimento
sustentado.
nário que fez curso de laticínios nos Esta- Figura 5. Ruína do laticínio construído por da qualidade de vida dos moradores e a rebanho bubalino, como forma de garan-
dos Unidos e no conceituado Instituto de Michel Melo e Silva, na década de 1970, geração de renda passa pela valorização tir a permanência dos búfalos nas áreas
Laticínio Cândido Tostes, em Juiz de Fora, razão da decadência da Fazenda Aquiqui. das atividades extrativistas e da produção de pequenos produtores.
Estado de Minas Gerais. A fábrica de la- agrícola e pecuária, pois essas são as alter-
ticínios foi construída com recursos pró- nativas existentes para a maior parte das Um desafio adicional é a manutenção
prios, resultado da venda dos rebanhos Por volta de 1974, a Fazenda Aquiqui famílias. É fundamental partir de ativida- da produção de queijos. No médio e longo
existentes nos retiros Fé, Esperança e começou a entrar em decadência, decor- des que são tradicionais e que precisam prazos, o mercado deverá exigir qualidade
Caridade, que ficavam localizadas no Rio rente do fracasso do laticínio e do alto ser reconhecidas e apoiadas, para que as dos queijos e, caso os criadores de búfalos
UiUi, o que provocou o processo de desca- investimento realizado. A despeito de os inovações sejam adotadas. É também im- não consigam adaptar-se, poderá ocorrer
pitalização, desagregação dos retiros (de- retireiros conseguirem fabricar queijo de portante considerar novas atividades com o desaparecimento silencioso e gradativo
vido à concentração do rebanho próximo forma artesanal desde a década de 1950, potencial local. É provável que no futuro da produção tradicional. Como produzir
à fábrica) e o início do descontentamento com a tecnologia moderna o leite apre- tenhamos uma reserva extrativista sem queijo com qualidade para as condições
por parte dos retireiros. Montou-se uma sentava alta acidez, a manteiga ficava extrativismo decorrente da evolução do de várzea, com carência de energia elé-
olaria para fabricação de tijolos destina- aguada, o queijo tinha mau cheiro, sendo mercado, da domesticação de produtos trica, freezers, água potável, dificuldade
dos à construção da fábrica. Para o pro- impróprio para o consumo, o que levava a extrativos e do aumento do custo da mão de transporte do leite em barcos para um
cesso de limpeza dos vasilhames de leite, perdas na produção. de obra. laticínio? Essa é uma questão desafiadora,
o vapor era produzido a partir da queima mas possível de ser solucionada.
5
da lenha e foi adquirido maquinário para Com a decadência da Fazenda Aquiqui, Com a criação da Verde para Sempre, Em seu artigo 18, o SNUC indi-
a fábrica, procedente da Holanda (SILVA, foi promovida uma reforma agrária si- sonhos e esperanças das famílias que Outras possibilidades para as áreas de ca que Reserva Extrativista é uma
Reforma agrária
2009; LOBO, 2008). lenciosa. Os retireiros continuaram mo- criavam búfalos tradicionalmente trans- várzea estão relacionadas com a pesca e área utilizada por populações
silenciosa: com rando nos mesmos locais, criando búfalos formaram-se em pesadelo pelo fato de a a piscicultura. Acordos de pesca têm sido extrativistas tradicionais, cuja
a falência da O laticínio concentrou as 600 melhores e fabricando queijo de forma artesanal. A Lei n° 9.985, de 18/07/2000, que instituiu estabelecidos pelas comunidades com su- subsistência baseia-se no extra-

Fazenda Aquiqui, búfalas, que produziam três mil litros de ruína da fábrica de laticínios representa o o Sistema Nacional de Unidades de Con- cesso e carecem de maior reconhecimento tivismo e, complementarmente,
leite por dia no pico de produção. A or- monumento de um ciclo que se encerrou servação (SNUC), permitir apenas a cria- e apoio por parte do governo. A piscicul- na agricultura de subsistência
os retireiros con- denha iniciava à 01:00 hora da madruga- e de uma experiência agrícola incompleta ção de animais de pequeno porte 5. Para tura é uma ideia recente, que esbarra na e na criação de animais de
tinuaram moran- da e terminava as 08:00 horas da manhã. (Figura 5). Acredita-se que o histórico da que a legislação seja cumprida, os búfalos falta de maior conhecimento tecnológico pequeno porte, e tem como

do nos mesmos Adotava-se o procedimento de tirar leite área de várzea que hoje é ocupada pela precisariam ser erradicados da reserva ou sobre tipos de peixes, rações, sistemas objetivos básicos proteger os
de duas tetas durante três meses e depois Resex Verde para Sempre não deva ser do a área com criação tradicional de búfalos de criação, manejo da água, entre outros. meios de vida e a cultura dessas
locais e vivendo
três tetas do quarto mês em diante, o que conhecimento da maioria dos moradores teria que ser desmembrada da unidade, Outra atividade tradicional é o beneficia- populações, e assegurar o uso
da criação de permitia aos bezerros mamarem de forma mais novos de Porto de Moz (jovens e deixando de levar em conta o aspecto cul- mento da espécie acari para a produção sustentável dos recursos naturais
búfalos. suficiente. adultos mais novos).  tural, de 63 anos de convivência, e o fato de piracuí (farinha de peixe), que tem da unidade.

186  O Desafio Atual das Reservas Extrativistas: Agricultura ou Extrativismo? O Desafio Atual das Reservas Extrativistas: Agricultura ou Extrativismo?  187
grande potencial em algumas áreas da nes na melhoria da renda dos pequenos rando madeira, muitas vezes serrada com Belo Monte – a terceira
Resex. Nesse caso, o maior desafio encon- produtores. motosserra e em pequena escala, para
trado pelas famílias é a garantia da fonte os mercados locais. O desafio enfrentado maior hidrelétrica
O desenvolvi-
de matéria-prima, que tem sido trabalha- O investimento no incremento das ati- pelas famílias é em relação ao reconhe- do planeta
da por meio de acordos de pesca, além da vidades tradicionais e em novos cultivos cimento e apoio à melhoria de suas prá-

O
mento rural melhoria no processamento e de cuidados exige uma mudança de postura dos mora- ticas de extração de madeira. O manejo linhão que leva a energia elétrica
passa pela cria- com relação à higiene e comercialização. dores da reserva e do restante do municí- florestal comunitário na Comunidade de de Tucuruí para Manaus e Maca-
pio, mas também requer reconhecimento Arimum para a retirada de madeira, não pá, com 1.191 km e com duas tor-
ção de novas
Para os agricultores sediados nas áreas e apoio por parte do órgão gestor da re- terá efeito multiplicador na economia res de 295 metros de altura, atravessa a
alternativas de terra firme há outras alternativas para serva e do município. A criação de bovi- caso não consiga integrar um processo de Resex Verde para Sempre em toda a sua
tecnológicas para a produção agrícola e pecuária. A agricul- nos de leite com utilização de capineiras verticalização na cidade de Porto de Moz extensão. A construção do linhão e o cru-
a produção. tura pode ser incrementada tanto com a (plantio de forrageira de corte, próximas e de garantia da sua manutenção no longo zamento de cabos sobre o Rio Amazonas
melhoria de atividades tradicionais como de currais) e do sistema de parcagem (prá- prazo. foram concluídos pela multinacional Iso-
com a promoção de novas atividades. tica comum durante o período colonial, lux Corsán em 2013 (Figura 6). Trata-se de
Pode ser viável investir no incremento que consiste em prender o gado bovino O reflorestamento com espécies arbóre- uma obra de engenharia sem preceden-
do cultivo e processamento da mandioca, durante a noite em determinada área para as nativas, tais como mogno, paricá e ipê, tes no Brasil para a construção de linhas
tradicionalmente voltados para o consu- fertilizar o solo) deve ser incentivada na nas áreas desmatadas impróprias para a de transmissão e que as coloca entre as
mo das famílias, que dependem do uso de terra firme. Também existe potencial para agricultura, seria importante para recom- maiores do mundo.
variedades melhoradas, adubação e me- a criação de aves e suínos em pequena por áreas de Reserva Legal e de Preserva-
canização do preparo do solo e fabricação escala, visando o abastecimento familiar ção Permanente, mas dificilmente consti- A Hidrelétrica de Belo Monte, localizada
da farinha. O plantio de fruteiras perenes, e venda de excedente. Por causa da inde- tuiriam atrativo e não teriam viabilidade ao sul da reserva, quando concluída, será
como a bananeira, resistente a enfermi- finição com relação à criação de búfalos econômica para os pequenos produtores. a terceira maior hidrelétrica do planeta,
dades (sigatoka-negra, sikatoga-amarela nas várzeas, a partir de 2006, o rebanho No sentido prático, a maior riqueza para sendo superada pela de Três Gargantas
e mal-do-panamá), açaizeiro, cacaueiro, bovino ultrapassou o de bubalinos no mu- os moradores de terra firme está na retira- (na China) e a de Itaipu. Com a Hidrelé-
castanheira, piquiazeiro, cupuaçuzeiro, nícipio de Porto de Moz. da de madeira. trica de Tucuruí, quinta maior do mundo,
uxizeiro, tucumanzeiro, bacabeira, bacu- e com a Hidrelétrica de Belo Monte, o Es-
rizeiro, entre outras, deveria ser promo- A atividade florestal também é tradicio- O abandono da visão paternalista e a tado do Pará transforma-se no grande ge-
vido e depende da disponibilização de nal entre os moradores e tem representa- disponibilização de assistência técnica rador e exportador de energia elétrica do
mudas, recursos para investimento, de- do fonte de renda importante para muitas para o conjunto do município, e não pri- país e do mundo.
dicação no plantio e tempo de espera. O famílias da terra firme. O extrativismo vilegiando apenas a reserva, como tem
plantio de castanheiras é uma opção de de madeira, antes dominada por grandes ocorrido até o momento, são ações neces- Com a construção da Hidrelétrica de
médio e longo prazos, por gerar um pro- madeireiros, vem apresentando declínio sárias e urgentes para esse novo cenário. Belo Monte, as cidades de Altamira e Vitó-
duto com grande aceitação e valor de mer- desde 1990. O protesto dos madeireiros A segurança alimentar é outra condição ria do Xingu estão experimentando gran-
cado, fato que não pode ser negligenciado, em Altamira no dia 25 de novembro de importante tanto para os moradores da de crescimento populacional e aumento
mas que requer muita dedicação e cuida- 2003, em reação à presença do navio MV Verde para Sempre, como para todo o mu- na renda per capita, com reflexos na de-
dos para que obtenha êxito. O sucesso dos Artic Sunrise, do Greenpeace, em Porto de nicípio.  manda de alimentos (agrícola, pecuária,
cacaueiros em Medicilândia e em outros Moz, marca de forma emblemática final pescado etc.), de madeira e de produtos
municípios da Transamazônica constitui do ciclo de extração de madeira por gran- agroindustriais, o que irá exigir mudan-
um exemplo do papel dos cultivos pere- des empresas. Restaram famílias explo- ças nos processos produtivos. Os mora-

188  O Desafio Atual das Reservas Extrativistas: Agricultura ou Extrativismo? O Desafio Atual das Reservas Extrativistas: Agricultura ou Extrativismo?  189
extrativa. Para muitas Resex na Amazônia com maior densidade na margem direita
ter-se-á no futuro o desenvolvimento de do Rio Xingu (lado oposto à reserva).
atividades agrícolas decorrentes do baixo
nível de renda proporcionado pela eco- A venda de serviços ambientais, outra
nomia extrativista (exceto a extração de
O assistencialis-
corrente defendida por pesquisadores,
madeira de lei que, no entanto, exige altos pode ser vítima do seu próprio sucesso. mo ambiental
investimentos). As alternativas de desen- Mecanismos de assistencialismo ambien- deve ser evita-
volvimento passam pelo reconhecimento tal devem ser evitados na busca de atalhos do na busca de
das práticas tradicionais, pelo apoio dis- fáceis. O caminho deve ser outro, baseado
pensado à melhoria dessas práticas e pela na pedagogia do mercado, na geração de atalhos fáceis. A
promoção de novas alternativas de produ- emprego e renda, como alternativa mais saída é a inclusão
ção, com potencial para contribuir para o segura. O sucesso da Verde para Sempre produtiva das
desenvolvimento e autonomia financeira e do município de Porto de Moz será afe-
da população. A criação de búfalos e bovi-
comunidades.
rido pela redução dos atuais programas
dores da Resex e do município de Porto disputa relacionada à obra revela um ca- nos, a extração de madeira, a mandioca, a de transferências governamentais para a
de Moz não podem perder a oportunidade minho que deve ser trilhado pela via de- piscicultura, o cacaueiro, o açaizeiro, en- redução da pobreza. Há oportunidades e
de produzir e fornecer para esse mercado mocrática e pacífica. Há a necessidade de tre os mais importantes, são os que apre- mercados e vai depender de tecnologia,
Figura 6. Torre de crescente. a Hidrelétrica de Belo Monte atribuir res- sentam maior potencial a curto e médio assistência técnica e de se perseguir com
transmissão de 295 ponsabilidades de desenvolvimento para prazo. tenacidade os objetivos produtivos e de
metros para atravessar As pressões dos movimentos sociais com todos os municípios da bacia do Rio melhoria de bem-estar da sociedade local.
o Rio Amazonas, cuja com relação à Hidrelétrica de Belo Mon- Xingu, a montante e a jusante, e não ape- A população do município de Porto de O retrocesso tecnológico, defendido por
linha corta as terras te restringiram-se a atender demandas nas para os municípios de Altamira e Vitó- Moz precisa ter mais voz e participação muitos movimentos sociais e ambientais,
da Resex Verde com aparência coletiva nas reivindica- ria do Xingu.  efetiva – como, por exemplo, a realização pregando a volta ao passado com o cul-
para Sempre. ções, mas de cunho individual, de cará- de plebiscitos ou consultas populares para to ao atraso, são também prejudiciais no
ter assistencialista, sem uma perspectiva Conclusões a tomada de decisões cruciais -, em vez de longo prazo.  
estruturante para o longo prazo. Pelo fato decisões unilaterais que têm prevalecido
de o linhão passar na área da Verde para
Sempre e, potencialmente, outras linhas
de transmissão no futuro, a reivindicação
dos moradores do município de Porto de
Moz deve estar associada a aspectos de
A s soluções tecnológicas para a
agricultura na Resex Verde para
Sempre são caras e demoradas.
Já se passaram dez anos em discussões,
havendo necessidade de ações mais con-
até o momento, como a criação da pró-
pria Verde para Sempre e a retirada dos
búfalos. A melhoria da Resex depende da
melhoria do município de Porto de Moz e
vice-versa. Para isso, deve ser entendida O
Agradecimentos
s autores expressam seus agrade-
cimentos ao Sr. Rui Rayol Lobo,
Dr. Alfredo Melo e Silva, Sra. Ma-
infraestrutura com reflexos de longo pra- cretas. É necessário o emprego de tecnolo- como um ente único e não como um terri- ria do Socorro Barbosa Soares e Dr. Nor-
zo. Essas iniciativas envolvem a criação gia para a maioria das propostas ou ideias tório privilegiado. ton Amador da Costa pelas entrevistas
de estações de pesquisa agrícola, campus que se pretende implementar. Há a neces- e informações prestadas. A Dra. Rosa de
universitário, melhoria de postos de saú- sidade de maior apoio para as pesquisas A Verde para Sempre vive o parado- Nazaré Paes da Silva, Chefe da Resex Ver-
de, de escolas, de estradas, com forma de agrícolas, modernização da agricultura e xo de ser uma reserva extrativista com de para Sempre, ao Dr. Cláudio Barbosa,
pagamento de royalties pelo cruzamento utilização de insumos modernos (tratores, poucos recursos ditos não madeireiros. A ao Dr. Alexandre Rossetto Garcia e a Dra.
das linhas de transmissão. O linhão repre- roçadeiras costais, fertilizantes, etc.). O natureza (ou o plantio pelos índios pré- Ana Paula Santos Souza pelo apoio logís-
senta o calcanhar de Aquiles similar aos desafio é muito mais o desenvolvimento colombianos, como defendem alguns estu- tico emprestado para as visitas na Resex
trilhos da Companhia Vale, mas qualquer da atividade agrícola do que da atividade diosos) dotou os estoques de castanheiras Verde para Sempre. 

190  O Desafio Atual das Reservas Extrativistas: Agricultura ou Extrativismo? O Desafio Atual das Reservas Extrativistas: Agricultura ou Extrativismo?  191
Conclusão As alternativas locais
A inclusão produtiva dos produtores
familiares deve ser priorizada como alter-

Gabriel Medina e Cláudio Wilson Soares Barbosa

A inclusão produtiva dos produtores familiares é


nativa de desenvolvimento sustentável
da Amazônia com inclusão social, gera-
ção de renda e manutenção dos recursos
naturais. A construção de um projeto es-
A inclusão produtiva dos agriculto-
res familiares deve começar pela
valorização das atividades e for-
mas de produção existentes. O potencial
A inclusão
produtiva dos
produtores
condição fundamental para a superaração a pobreza tratégico claro para a produção e geração para se apoiar essas atividades é enorme,
familiares passa
de renda no campo pode valer-se, como pois os agricultores já estão produzindo,
e da degradação ambiental na Amazônia rural. ponto de partida, da presença das famílias têm experiência no que produzem e têm necessariamente
na área rural, de seu conhecimento e de propostas de melhorias. Falta a eles o re- pela valorização
cadeias produtivas existentes. conhecimento do valor de suas práticas de suas ativida-
pelo governo e o apoio para implementar
A ação de inclusão produtiva deve ser as melhorias que planejam. O conjunto de
des e formas de
imediata, para aproveitar a oportunida- capítulos sobre Medicilândia revela a ca- produção.
de que pode deixar de existir em curto pacidade que os agricultores têm para de-
espaço de tempo. Caso mais uma década senvolver alternativas produtivas a partir
seja perdida sem um projeto claro para a do potencial de suas áreas, do mercado e
região, o êxodo rural, a marginalização das condições institucionais. Os criado-
dos produtores familiares e a desestru- res de frango, de gado e os cultivadores
turação das cadeias produtivas podem de cacau e açaí daquele município, por
inviabilizar qualquer tentativa posterior. exemplo, perceberam o crescimento po-
Como exemplo, no caso da criação tradi- tencial do mercado regional e investiram
cional de bubalinos em Porto de Moz, a na melhoria de seus sistemas de produção
suspensão do crédito rural após a criação a partir de práticas já existentes.
da Resex deixou as famílias sem condi-
ções de fazer os investimentos mínimos Todas as propostas externas pensadas
necessários para superar os desafios das para a produção familiar na Amazônia
cheias na região. Também a promoção tá- até hoje ou ficaram restritas a áreas de-
Figura 1. A favela na cita e irresponsável da insegurança sobre monstrativas subsidiadas ou não conse-
cidade de Porto de Moz a manutenção das atividades produtivas guiram gerar resultados que atendessem
cresce principalmente
O desenvolvimento local tos municípios, os produtores familiares tradicionais após a criação da reserva fez a diversidade e a demanda desse público.
com famílias que deixam locais são parte da vocação de desenvol- com que muitas famílias considerassem Exemplos incluem os programas de paga-
o campo por falta de pela inclusão produtiva vimento regional e executam diferentes deixar a zona rural para se arriscar a um mento por serviços ambientais apoiados
condições para melhorar atividades produtivas, tanto agropecuá- futuro incerto na sede do município. De ci- pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA)
de vida.

A vocação produtiva da Amazônia


ainda precisa ser definida com
clareza e, a partir daí, será funda-
mental assegurar as condições necessá-
rias para seu desenvolvimento. Em mui-
rias quanto extrativistas. Esse modo de
produção, por se estruturar a partir das
condições locais e dos saberes da popu-
lação, precisa ser valorizado e receber o
apoio necessário para sua consolidação.
dade de vida pacata tradicional, Porto de
Moz transformou-se num dos municípios
mais pobres do Pará, onde já se multipli-
cam as áreas de favela e a criminalidade
(Figura 1). 
e os produtos da sociobiodiversidade pro-
movidos pelo Ministério do Desenvolvi-
mento Agrário (MDA). A melhor ilustra-
ção da disfuncionalidade das propostas
externas para a Amazônia vem do modelo

192  Conclusão Conclusão  193


O papel do Estado gurança necessária para investir em suas senvolvimento regional pelo MDA pode
propriedades, na Amazônia existe inse- comprometer o futuro da produção fami-

Figura 2. O uso tradi-


cional dos recursos
naturais pelas famílias e
comunidades da Amazô-
O Estado tem, sim, papel fundamen-
tal na promoção do desenvolvi-
mento local. Sem o reconhecimen-
to do Estado, os sistemas de gestão locais
são frágeis, principalmente diante de ame-
gurança causada pela questão fundiária,
pelo avanço da fronteira, pela falta de cla-
reza e continuidade das ações e pela falta
de relação do Estado com os agricultores
familiares. Um produtor florestal de Porto
liar na Amazônia. Esse ministério, que
tradicionalmente concentra suas ações na
região Sul do Brasil, precisa apoiar concre-
tamente também os produtores familiares
da Amazônia, com vistas à sua inclusão
nia deve ser reconhecido aças externas, como invasão de madeirei- de Moz, por exemplo, não pode trabalhar produtiva. 
e apoiado pelo Estado. ros, geleiras e grandes produtores. Cabe ao com tranquilidade porque não consegue
Estado legitimar e apoiar essas propostas, atender às normas do governo para o ma- Novos desafios requerem
de forma a garantir-lhes a robustez e o res- nejo florestal comunitário e o governo não
de manejo florestal comunitário. Como paldo necessários. Considerando todas as abre diálogo para a possibilidade de cons- novas abordagens
foi apresentado no capítulo sobre o tema, limitações que o Estado (particularmente truir alternativas conjuntas. Uma questão

E
são poucas as experiências existentes e os órgãos ambientais) tem para atuar na importante é: quais as regras do jogo para ntre os produtores familiares da Os atores locais
nenhuma delas tem viabilidade financei- região (falta de recursos, de pessoal, de a produção familiar na Amazônia, princi- Amazônia estão indígenas, popula- precisam ser for-
ra. Os modelos tecnicistas são pensados infraestrutura e de conhecimento da rea- palmente em Unidades de Conservação de ções tradicionais ribeirinhas rema- talecidos política
sem considerar as práticas, os interesses lidade), a estratégia de investir em parce- Uso Sustentável? nescentes do ciclo da borracha, comuni-
e a capacidade das famílias. A alternativa rias com as comunidades, em substituição dades quilombolas, colonos trazidos no
e economicamen-
de governança florestal apresentada pelas à abordagem atual de comando e contro- O maior investimento do Estado até período militar, assentados da reforma te como forma
comunidades dentro de suas condições le, pode ser muito promissora (Figura 3). o momento restringe-se à fiscalização e agrária e novos migrantes dos ciclos es- de enfrentar os
tem grande potencial e cabe ao governo No caso dos acordos de pesca em Porto à punição dos crimes ambientais, parti- pontâneos de ocupação da região. Esses
novos desafios
ressignificar sua concepção de manejo de Moz, por exemplo, ao regulamentar o cularmente pelos órgãos vinculados ao agricultores desenvolveram diferentes
florestal para apoiar as iniciativas locais acordo do Rio Acaí, a Secretaria de Esta- MMA. Também a atuação tímida e dis- modos de vida, que vão de economias ex- para o desenvol-
(Figura 2). do de Pesca e Aquicultura do Pará (Sepaq) tante das questões centrais para o de- trativistas a sistemas produtivos diversifi- vimento regional.
fortaleceu as comunidades e promoveu a
Os produtores familiares têm propostas boa gestão dos recursos. Por outro lado,
práticas e viáveis e são capazes de imple- quando o Instituto Chico Mendes de Con-
mentá-las. O conjunto de capítulos deste servação da Biodiversidade (ICMBio) não
O Estado tem
livro mostra que eles desenvolveram, es- aceitou o acordo dos rios Coati e Cupari,
muitas limitações tão desenvolvendo ou podem desenvolver por defender um plano de manejo geral e
para implemen- alternativas para a consolidação e cresci- não local das atividades da Resex, os re-
tar políticas de mento de suas atividades. O livro trouxe cursos pesqueiros ficaram desprotegidos e
algumas das principais experiências de- as comunidades foram penalizadas.
desenvolvimento senvolvidas por produtores de Porto de Figura 3. Representantes
e precisa estar Moz e Medicilândia, mas há muito mais Para apoiar o desenvolvimento local das comunidades pro-
mais receptivo nesses e em outros municípios. Essas ati- na Amazônia, cabe ao Estado evitar criar põem ao Estado (Minis-
vidades e os interesses e capacidades dos novas restrições que desestruturem as ex- tério do Meio Ambiente)
às propostas
produtores locais devem ser o ponto de periências produtivas em curso e passar a ações concretas para
dos produtores partida para qualquer proposta de desen- apoiá-las. Diferente de outras regiões do viabilizar o desenvolvi-
familiares. volvimento regional.  Brasil, onde os produtores rurais têm a se- mento local.

194  Conclusão Conclusão  195


genista à política de criação de Reservas governo, que criou a Reserva Extrativista
Extrativistas ilustrada em diferentes capí- (Resex) Verde para Sempre e mantém in-
Práticas extrati-
Figura 4. As comunida- tulos do livro. definidas as normas para uso dos recursos vistas tradicio-
des planejam o uso de naturais e desenvolvimento das ativida- nais e produção
seus recursos naturais. Os novos desafios requerem uma nova des produtivas.
agrícola e pecu-
Acordos de pesca e abordagem para a consolidação da pro-
acordos para o uso da dução familiar na Amazônia que passa, A questão produtiva em Porto de Moz ária são funda-
floresta são exemplos necessariamente, pelo fortalecimento dos passa pelo apoio às práticas desenvolvi- mentais para o
de propostas locais com atores locais, tanto econômica quanto das pelas famílias, como alternativa con- desenvolvimento
grande potencial de su- politicamente. A inclusão produtiva e a creta de desenvolvimento rural. A criação
cesso se apoiados pelo emancipação financeira dos agricultores é de búfalos precisa ser reconhecida como
nas Resex.
Estado. passo fundamental nesse processo. Mes- uma das principais fontes de renda da
mo que implique mudanças na cultura lo- população local e receber o apoio neces-
cal, a única forma de resistir às crescentes sário para seu desenvolvimento (Figura
cados. Eles também se organizaram para de outras regiões produtores com capital pressões externas é pelo fortalecimento 5). A produção de madeira é igualmente
a representação política de seus interesses para investir e cultura comercial compe- dos grupos locais via inclusão produtiva. importante e as formas tradicionais de ex-
(Figura 4). titiva. Os grandes produtores que chegam Essa condição pode ser traduzida pela se- tração precisam ser regulamentadas. Para
tendem a apropriar-se das terras e dos guinte imagem: se novos ventos chegam e a gestão pesqueira, é preciso reconhecer
No entanto, além das dinâmicas locais, recursos existentes e, frequentemente, ge- a estrutura da casa atual é frágil, é funda- os acordos de pesca, como forma de for-
a Amazônia é muito influenciada por di- ram perdas para as populações locais. mental refazer a casa, aproveitando, sim, talecê-los, principalmente para o caso de
nâmicas externas. O destino da região tem a madeira da casa anterior, mas também disputas com atores externos. Conside-
sido disputado por atores externos para a As famílias, as comunidades e as orga- considerando modificações estruturais rando que a maior parte do município foi
conservação ambiental, para o agronegó- nizações locais, em muitos casos, têm se que garantam maior segurança.  constituída em Resex, a inclusão produti-
cio e para a produção de energia. É par- mostrado fragilizadas diante das novas va dos moradores é fundamental para o
ticularmente relevante a influência dos dinâmicas regionais promovidas por ato- Porto de Moz e a questão desenvolvimento rural.
países ricos, promovendo a conservação res externos poderosos. Atraídas ou sub-
da região, principalmente por seus servi- jugadas pelas novas dinâmicas, as estru- produtiva nas Resex As atividades extrativistas são parte dos
ços ambientais. O governo brasileiro, in- turas que conhecemos hoje parecem não sistemas produtivos das populações ribei-
fluenciado pelo lobby conservacionista,
assumiu compromissos de redução do
desmatamento e de conservação da biodi-
versidade, que passa pela criação de Uni-
dades de Conservação.
ser capazes de resistir senão em exemplos
heroicos, mas pontuais. Também a polí-
tica convencional do Estado, tradicional-
mente voltada para a “proteção” das po-
pulações locais em áreas de fronteira, tem
O município de Porto de Moz, às
margens do Rio Xingu, ilustra as
condições da produção familiar
enfrentada por grande parte das popula-
ções ribeirinhas da Amazônia. Em Porto
rinhas da Amazônia e devem ser apoia-
das. Mas também é importante valorizar

Figura 5. A questão
ficado restrita a casos específicos diante de Moz, praticamente toda a zona rural é produtiva nas Resex
Adicionalmente, as dinâmicas de mer- da imensidão da região. Mais grave que ocupada por comunidades ribeirinhas tra- passa pelo apoio às
cado, que já foram muito apoiadas pelo isso, mesmo nos casos em que é efetiva- dicionais que vivem da pesca, da criação práticas desenvolvidas
Estado, têm incluído a região no agrone- mente implementada, a abordagem não de animais e da extração de produtos flo- pelas famílias como
gócio nacional, principalmente como pro- tem garantido a posterior inclusão social restais. Essas comunidades enfrentaram a alternativa concreta de
dutora de gado de corte e, mais recente- e produtiva dos agricultores protegidos. invasão de geleiras, de madeireiras e ago- desenvolvimento rural
mente, de soja. Essa dinâmica tem trazido Exemplos concretos vão da política indi- ra enfrentam o desafio de dialogar com o sustentável.

196  Conclusão Conclusão  197


a produção agrícola e sistemas de manejo seus objetivos de garantir bem-estar para enfrentados pelas comunidades pode ser Os agricultores familiares da Transa-
mais intensivos como alternativas de lon- as populações e não se transformem em resolvida com o desembaraço da burocra- mazônica convivem com a visão ortodo- O apoio à inclu-
go prazo. Como o extrativismo é limitado área de miséria e êxodo rural. cia que o governo criou. Para temas mais xa de que somente gado e cacau em terra são produtiva
pela baixa densidade de recursos de inte- complexos, o ICMBio precisa colocar-se ao roxa são passíveis de apoio financeiro das de agricultores
resse comercial, sistemas de manejo mais A gestão da Verde para Sempre tem lado das comunidades, e não acima de- agências de financiamento que operam na
familiares na
intensivos e cultivos agrícolas tornam-se sido desastrosa. Além de não conseguir las, para buscar soluções, contando com região, mesmo havendo uma política de
cruciais para a inclusão produtiva. implementar seus próprios instrumentos equipe capaz, interessada e comprometi- crédito diversificada do Pronaf. As propos- Amazônia precisa
de gestão (zoneamento, planos de manejo da.  tas sistematizadas neste livro comprovam ser estruturado,
As Resex têm se expandido no Bra- e acordos de gestão), o governo tem sido a diversidade de atividades produtivas e com o Estado
sil como alternativa de desenvolvimen- incapaz de reconhecer e apoiar as ativida- apontam para o potencial de se apoiar as
oferecendo as
to sustentável a partir do modo de vida des desenvolvidas pelas comunidades e, Medicilândia e a iniciativas existentes, considerando que
das populações locais. Entre 1988, ano de consequentemente, tem contribuído para os agricultores já estão produzindo, têm condições neces-
criação da primeira Resex, e 2010 foram a marginalização daqueles de deveriam
demanda de políticas experiência no que produzem e têm pro- sárias para que
criadas 59 Resex no Brasil, sendo 44 na ser os principais beneficiários de suas de apoio à produção postas de melhorias. Falta a esses agricul-
os agricultores
Amazônia, ocupando mais 11 milhões de ações: os moradores da Resex. Os autoin- tores o reconhecimento, pelo Estado, do

E
hectares no país. O número crescente de titulados “chefes da reserva”, designados m Medicilândia, às margens da Ro- valor de suas práticas, e apoio para imple- produzam e
Resex e de outras Unidades de Conserva- pelo ICMBio, chegam à unidade sem o dovia Transamazônica, a situação mentar as melhorias que eles projetam. gerem renda.
ção de Uso Sustentável reforça a impor- preparo necessário para trabalhar com as dos agricultores familiares ilustra
tância de se pensar com mais cuidado a populações locais, e sua elevada rotativi- as condições da produção familiar enfren- A assistência técnica precisa ser pensa-
questão das atividades produtivas nessas dade (desde a criação em 2004 a Resex já tadas por parte dos colonos e assentados da em novos moldes, valorizando as insti-
unidades para garantir vida digna aos houve seis chefes diferentes) tem levado que estão em regiões da Amazônia com tuições existentes no município, e precisa
moradores, o que inclui desenvolvimento à falta de continuidade das ações. O le- potencial de desenvolvimento. Apesar de ser vinculada aos agricultores através do
econômico e respeito aos modos de vida. vantamento inicial, que daria subsídio ao terem conseguido se consolidar às mar- Sindicato dos Trabalhadores Rurais e da
plano de manejo da unidade, com custo gens da Rodovia em áreas com bons solos, Casa Familiar Rural. As linhas de crédito
Na Resex Verde para Sempre, as ativi- superior a um milhão de reais, não teve esses agricultores já começam a enfrentar precisam ser abertas para contemplar as
dades produtivas tradicionalmente desen- uso prático até hoje e um novo levanta- o desafio de se manter nessas áreas dada atividades existentes e as demandas mais
volvidas pelas famílias não têm recebido mento parece agora ser necessário. à dinâmica atual da região que, com o as- específicas dos agricultores, que vão além
nenhum apoio dos órgãos públicos e têm faltamento da Rodovia e a construção da do gado e do cacau (Figura 6). 
sido alvo de restrições crescentes por não Há necessidade de mudanças radicais Hidrelétrica de Belo Monte, passou a rece-
estarem de acordo com os padrões tecni- na postura do ICMBio e do MMA como um ber maior pressão de grandes produtores.
cistas vigentes. Isso, apesar do fato de que todo. Em vez de portar-se como o dono
foram essas atividades e esses modos de dos recursos naturais e tutor das popula- Os produtores de cacau precisam de
vida que garantiram até hoje a conserva- ções, o órgão gestor deve priorizar a cons- assistência técnica para produzir em ter-
ção da área. Uma das consequências é a trução de políticas produtivas com base ra mista. Os criadores de gado precisam
crescente desesperança dos moradores, nas condições locais. Deve reconhecer as acessar as linhas de crédito para investi-
provocando a necessidade de medidas iniciativas existentes, como os acordos de mentos pontuais no manejo de seus pas-
emergenciais para se pensar a inclusão pesca e acordos de convivência que, po- tos e rebanhos. Os criadores de galinha
produtiva a partir das potencialidades tencialmente, têm impacto positivo maior caipira e produtores de açaí precisam de
existentes. Essas medidas são fundamen- do que muitas das ações atuais de coman- assessoramento para prospectar merca- Figura 6. A inclusão produtiva dos agricultores familiares da Amazônia
tais para que as Resex atinjam de fato do e controle. Grande parte dos problemas dos para sua produção, que é crescente. precisa ser apoiada pelo Estado por meio de políticas agrícolas específicas.

198  Conclusão Conclusão  199


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http://sistemasdeproducao.cnptia.embrapa.br/ (D.O.U. 13/12/2006). Procedimentos técnicos para de Pesquisa, 69).
Qual deve ser o futuro da Amazônia rural? Neste livro é apresentada uma proposta
clara e fundamentada em quatro frentes estratégicas:
1. Valorização da produção familiar como parte da vocação produtiva regional, 2. Promoção
de maior inclusão produtiva das famílias para a geração de renda no campo, 3. Valorização
das experiências locais de produção, e 4. Atuação do Estado no reconhecimento e apoio às
iniciativas locais. O livro traz experiências produtivas concre-
tas de cultivo de cacau e açaí, criação de bubalinos, bovinos
e galinha e manejo de pesca e floresta desenvolvidas pelos
produtores. O trabalho revela que o futuro da Amazônia de-
pende de um projeto urgente para a produção e geração de
renda no campo hoje.

Projeto Governança de Recursos Naturais por Pequenos Produtores Rurais na Amazônia


Realização: Apoio:

SERVIÇO DE APOIO
À PRODUÇÃO
FAMILIAR NA AMAZONIA

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