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FRANCISCO

J. MARQUES

Nasceu em Miranda do Douro, em 1966.


É jornalista desde 1990, tendo passado pelo Público, pelo Jornal de Notícias e pela agência
Lusa. É funcionário do FC Porto desde 2011 e diretor de informação e comunicação
do clube desde 2016.

DIOGO FARIA

Nasceu no Porto, em 1990.


É licenciado, mestre e doutorando
em História, pela Universidade do Porto.
Foi bolseiro de doutoramento da Fundação para a Ciência e a Tecnologia
entre 2014 e 2017. Integra, atualmente,
o departamento de comunicação do FC Porto.
O Polvo Encarnado
Os esquemas, manipulações e compadrios que viciam o futebol português
Francisco J. Marques
Diogo Faria

© 2017, Francisco J. Marques, Diogo Faria e Ideias de Ler

1.ª edição em papel: novembro de 2017


ISBN 978-989-740-046-9

Este livro respeita


as regras do Acordo Ortográfico
da Língua Portuguesa.
INTRODUÇÃO
Lisboa, 21 de agosto de 2017. Aos 60 minutos de um confronto entre Benfica
e Belenenses, Diogo Viana, extremo dos azuis do Restelo, vai ao chão para cortar
uma bola. Eliseu, lateral dos encarnados, salta e atinge o adversário, com a sola
da bota e com extrema violência, na perna esquerda. O árbitro, em posição
porventura desfavorável, não sanciona o lance disciplinarmente. O videoárbitro,
com todos os recursos para decidir o que era evidente, não intervém. Nos dias
seguintes, a crítica especializada é unânime: Eliseu tinha de ter sido expulso. Na
sequência desse acontecimento, a Comissão de Instrutores da Liga propõe que o
internacional português seja castigado. O Conselho de Disciplina da Federação
Portuguesa de Futebol ainda o julga, no quadro de um processo sumário, mas opta
por deixar passar em claro um caso flagrante de conduta violenta.

Lisboa, 19 de outubro de 2017. Pouco passava das 9:00 da manhã quando a


imprensa online e os canais informativos começam a noticiar que o Estádio da
Luz está a ser alvo de buscas pela Polícia Judiciária. Não muito depois, já se
sabe que a operação também inclui as residências de Luís Filipe Vieira, Paulo
Gonçalves, Pedro Guerra e Adão Mendes. Antes da hora do almoço, a
Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa confirma que estão em curso buscas
domiciliárias e não domiciliárias. No terreno, atuam quatro magistrados do
Ministério Público, dois juízes de instrução, 28 membros da Polícia Judiciária,
“incluindo peritos financeiros e contabilísticos e informáticos”. Em causa está
uma “investigação em curso pelos crimes de corrupção ativa e passiva”. A
Procuradoria confirma a existência de um suspeito. Entretanto, é constituído um
arguido. A origem de tudo são “os denominados emails do Benfica”.

Estes dois episódios são um espelho do futebol português. O primeiro reflete


os favorecimentos ao Benfica, que têm sido norma desde há vários anos. O
segundo é um sinal de esperança na justiça civil, que parece ter despertado para a
realidade do desporto nacional e que, aguarda-se, acabará por expurgar a sua
podridão.
O objetivo deste livro é apresentar, em todo o seu esplendor, o polvo
encarnado que, pelo menos nos últimos 15 anos, tem dominado quase por
completo o futebol português – não no campo, onde os jogos se disputam –,
adulterando a verdade desportiva das competições através do controlo dos
bastidores do desporto.
Um polvo, como se sabe, é um animal invertebrado que se destaca pela
exuberância dos seus oito tentáculos revestidos de ventosas. Gosta de se
movimentar pelos fundos dos mares e mexe-se bem entre as rochas, alcançando
alguns dos buracos mais recônditos com os tentáculos. Distingue-se pela sua
capacidade de camuflagem, ajustando a cor da pele em função das necessidades.
Quando se sente ameaçado, expele uma tinta escura que repele os predadores.
Não por acaso, já há vários anos que se associa as características deste
cefalópode à máfia. Metaforicamente, o Benfica é um polvo.
Nesta obra serão abordados oito temas que correspondem aos oito tentáculos
através dos quais o clube da Luz manipula e subverte a realidade do futebol
português: o controlo das instituições desportivas, a arbitragem, a justiça
desportiva, a imprensa, os cartilheiros, a BTV, as claques e o regime. Em relação
a cada assunto, procurar-se-á apresentar uma visão geral sempre sustentada em
exemplos concretos.
Tudo o que aqui se escreve é baseado em fontes que, na maior parte dos
casos, qualquer leitor poderá facilmente consultar e verificar: livros, documentos
oficiais, notícias da comunicação social. Sempre que possível, apresentamos
links para páginas online que, no momento em que este livro foi finalizado,
estavam disponíveis seguindo os endereços indicados. Em alguns casos, é
avançada informação inédita presente, por exemplo, em cartilhas do Benfica. Se
as análises e interpretações dos autores aqui plasmadas são pessoais e,
naturalmente, discutíveis, os dados que as sustentam são, na sua maior parte,
factuais. Procurou-se, de resto, que este livro fosse um exercício essencialmente
jornalístico.
Esta é uma história de manipulações, dissimulações, compadrios e influências
ilegítimas. É uma história de pessoas que olham o futebol a partir das sombras, de
outras que abdicam de pensar pela própria cabeça para reproduzirem as vozes do
dono e de algumas que, na sua miséria moral, só se querem colar com a maior
força que puderem a uma das inúmeras ventosas de um qualquer dos tentáculos do
polvo. É uma história negra e triste, mas é a história do futebol português nos
últimos anos. E é uma história que tem de ser contada e bem conhecida, até por
respeito por todas as vítimas dos esquemas do Benfica de que são um exemplo
acabado, em última análise, os seus próprios adeptos.
Entre 5 e 6 de janeiro de 2016, circulou entre altos dirigentes do Benfica um
conjunto de mensagens sobre Mário Costa, recém-empossado presidente da
Assembleia Geral da Liga Portuguesa de Futebol Profissional. Participaram no
diálogo Rui Gomes da Silva, vice-presidente do clube, Domingos Soares de
Oliveira, CEO, e Paulo Gonçalves, assessor jurídico da SAD. O que se diz sobre
Mário Costa está muito longe de ser simpático. “Gajo pouco recomendável” e
“artista” acabam por ser os termos menos deselegantes. A indignação reina entre
a cúpula da Luz, sustentada numa alegada ligação entre ele e o FC Porto, clube de
que será adepto. Reina, mas por pouco tempo. Luís Filipe Vieira entra em cena
para acabar com a discussão e descansar a sua corte: “Tenham calma sei qual a
missão dele ninguém vai fazer melhor o trabalho pretendido” (assim mesmo, tudo
seguido, sem vírgulas nem pontos). A cabeça do polvo está tranquila. A
Assembleia Geral da Liga está em boas mãos. E, para além disso, tem uma
missão. Não sabemos que missão é essa, mas sabemos que o Benfica já tem um
histórico longo e consistente de controlo das instituições que lideram o futebol
português. Esse é um objetivo estratégico que o clube persegue praticamente
desde o início do século. E que, como já se viu e se continua a ver, não para de
dar frutos.

MAIS IMPORTANTE DO QUE CONTRATAR BONS JOGADORES

A 1 de junho de 2002, o FC Porto não era campeão há três temporadas


consecutivas, enquanto o Benfica vinha de oito épocas sem festejar o principal
título nacional. Por essa altura, Jorge Nuno Pinto da Costa, a completar 20 anos à
frente dos Dragões, e Luís Filipe Vieira, gestor do futebol encarnado sob a
liderança de Manuel Vilarinho, procuravam reforçar os respetivos plantéis para
uma luta que se adivinhava dura ao longo dos meses seguintes. Nesse 1 de junho
de 2002, o FC Porto anunciou que tinha conseguido contratar um dos jogadores
desejados pelo treinador José Mourinho para a frente de ataque da equipa das
Antas: Edgaras Jankauskas. O lituano tinha passado os seis meses anteriores ao
serviço do Benfica, por empréstimo da Real Sociedad, participando em 12 jogos
e marcando oito golos. Vieira tentara, ao longo das semanas anteriores, assegurar
a sua continuidade na Luz, mas um encontro noturno entre o líder portista e o
atleta desviou-o em definitivo para o Norte.
Jankauskas é, talvez, uma personagem improvável na história do controlo do
futebol português pelo Benfica, mas a verdade é que ele foi o mote para uma das
declarações mais famosas de Luís Filipe Vieira: “O Benfica tem prioridades
definidas e uma das mais prementes, devido à sua dimensão, era voltar a ter
presença nos órgãos sociais e de decisão do futebol português, concretamente da
Liga”1. Por outras palavras: para o Benfica, era mais importante assegurar
lugares na Liga do que contratar bons jogadores. Uma ideia que sintetiza todo um
programa político que vem sendo executado há pelo menos 15 anos.

***

A primeira grande batalha do Benfica pelo controlo das instituições do futebol


português decorreu precisamente entre abril e junho de 2002. O mandato de
Valentim Loureiro, presidente da Liga desde 1996, terminava a 30 de junho, mas a
disputa eleitoral precipitou-se alguns meses, quando, de forma algo
surpreendente, José Guilherme Aguiar, diretor executivo deste organismo durante
os mandatos do major, anunciou a sua candidatura a 9 de abril. O também
presidente da Câmara Municipal de Gondomar reagiu no mesmo dia,
comunicando a sua recandidatura para mais quatro anos à frente da instituição que
geria o futebol profissional em Portugal. De repente, havia dois candidatos para
eleições que nem sequer se encontravam marcadas. Os dados estavam lançados e
começava naquele momento a disputa de apoios, a elaboração dos programas e a
formação das equipas.
Ao longo das semanas seguintes, os clubes foram-se associando às duas
candidaturas, com clara vantagem para Valentim Loureiro. Ao seu lado
colocaram-se o Benfica, o Alverca, o Beira-Mar, o Boavista, o Gil Vicente, o
Paços de Ferreira, o Santa Clara, o Sporting de Braga, o Salgueiros, a União de
Leiria e o Vitória de Setúbal (à data, todos na primeira liga), para além de outros
conjuntos do escalão secundário. Com José Guilherme Aguiar estavam o FC
Porto, o Sporting, o Belenenses, o Marítimo e o Vitória de Guimarães. A escassez
de apoios ao atual comentador da SIC Notícias tornou inviável a sua eleição e
praticamente inevitável a sua desistência, anunciada a 31 de maio.
No mesmo dia, Valentim Loureiro apresentou a equipa que o acompanharia à
frente da Liga nos quatro anos seguintes. Ou seja, enquanto Pinto da Costa fechava
o negócio de Jankauskas e reforçava o plantel do FC Porto, Luís Filipe Vieira
estava a negociar o espaço que caberia ao Benfica na nova estrutura dirigente do
futebol português (que é como quem diz, estava a tratar de outros reforços…). E
essa negociação não lhe correu nada mal: ao clube da Luz coube indicar o diretor
executivo, a peça-chave no funcionamento da máquina que organizava a principal
competição desportiva nacional. O escolhido foi Francisco Cunha Leal.
O balanço dos acontecimentos destes dias, no curto prazo, foi largamente
favorável ao FC Porto. Jankauskas revelou-se um jogador extremamente útil e
marcou 14 golos numa época em que os Dragões venceram o campeonato, a Taça
de Portugal e a Taça UEFA, em Sevilha. O Benfica não ganhou rigorosamente
nada. Cunha Leal, no entanto, viria a estar à altura da confiança e das expectativas
de que foi investido por Luís Filipe Vieira.

A LIGA DE CUNHA LEAL

Cunha Leal, vice-presidente do Benfica no início dos anos 90, foi diretor
executivo da Liga durante quatro anos, entre 2002 e 2006. Para além disso, foi, na
prática, presidente interino deste organismo, numa altura em que Valentim
Loureiro se encontrava suspenso por motivos judiciais (de abril de 2004 a abril
de 2005). O seu mandato esteve muito longe de ser isento de polémicas, e quase
todas tiveram um denominador comum: a proteção do clube da Luz. Recuperamos
três exemplos.
A primeira grande controvérsia rebentou a 24 de maio de 2004, antevéspera
de o FC Porto se sagrar campeão europeu em Gelsenkirchen. Nesse dia, foi
noticiado pela SIC que Ricardo Rocha, defesa-central do Benfica contratado ao
Sporting de Braga em 2002, se encontrava irregularmente inscrito desde essa
altura. O acordo entre a equipa de Lisboa e este jogador fora assinado a 15 de
janeiro daquele ano, para entrar em vigor a partir do início da época desportiva
de 2002/2003. No entanto, segundo os regulamentos em vigor naquela altura, os
contratos só poderiam ser firmados a partir de 1 abril. A aceitação deste registo
pelos serviços da Liga, onde entrou a 8 de maio, careceu, portanto, de legalidade.
Isso significa que, entre 2002 e 2004, Ricardo Rocha disputou 56 jogos pelo
Benfica em competições nacionais nas quais pura e simplesmente não podia
participar.
As eventuais consequências desta inscrição irregular, à data em que foi
descoberta e denunciada, eram muito claras: poderiam ser impugnados todos os
jogos em que o atleta tivesse participado e que ainda não tivessem sido objeto de
homologação. Uma vez que os resultados são homologados 30 dias após a disputa
das partidas, eram abrangidos apenas três confrontos: Sporting-Benfica, Benfica-
União de Leiria (ambos para o campeonato) e FC Porto-Benfica (para a Taça de
Portugal). Caso fossem atribuídas penas de derrota aos encarnados em cada um
destes jogos, como ditava o Regulamento de Competições da Liga, o Benfica
desceria do segundo para o terceiro lugar do campeonato e perderia a Taça de
Portugal.
Face à gravidade da situação, o clube da Luz apressou-se a reagir. O momento
mais marcante desta história ocorreu quando Luís Filipe Vieira invadiu o estúdio
do programa Dia Seguinte, da SIC Notícias, onde se estava a discutir esta
questão2. Foi um episódio insólito, que causou um incómodo evidente a todos os
participantes, principalmente pela profunda deselegância revelada pelo
presidente do Benfica. Vieira apareceu nervoso, irritado, exibindo tiques de fala
que, entretanto, foi perdendo (quanto não fazem as assessorias de imagem e de
comunicação…) e revelando um egocentrismo que agora gosta de apontar a
outros: “Vocês hoje têm uma audiência fantástica, então vindo cá eu… de certeza
que aumentou. Já estão os telefones a tocar por todo o lado para saberem que eu
estou cá”. Compensou a ausência de argumentos válidos para explicar a inscrição
irregular do jogador – foi incapaz de reconhecer (e de contrariar) que o contrato
foi assinado dois meses e meio antes da data que era imposta pelos regulamentos
– com a dureza que habitualmente se reconhece em quem entra em debates
perdidos com um estado de espírito alterado: pura e simplesmente tentou ao
máximo evitar que mais alguém falasse. Deixou, para além disso, ameaças
implícitas no ar, que não podem deixar de ser lidas como mensagens dirigidas à
comunicação social responsável pela descoberta deste telhado de vidro: “Quando
se começar a falar do Benfica, têm que ter respeitinho. É que o tempo da
bandalheira acabou no Benfica. Quem nos tratar mal, nós tratamos mal”3.
Cunha Leal entrou em ação logo no dia seguinte. Em conferência de imprensa
na sede da Liga, anunciou perentoriamente: “A inscrição de Ricardo Rocha é
válida” e por isso mesmo não existia “nenhuma razão para retirar a Taça de
Portugal ou o 2.º lugar ao Benfica”. De acordo com o diretor executivo da Liga, o
facto de o contrato ter sido homologado por aquele organismo e pela Federação
Portuguesa de Futebol tornava a sua validade indiscutível, sendo ignorada a
circunstância de ter sido assinado numa data muito anterior àquela que era
definida pelo Regulamento de Competições. Que se saiba, este foi o primeiro
grande favor prestado por Cunha Leal ao Benfica. Na prática, o caso morreu aí,
com a “vitória” dos encarnados nessa conferência de imprensa realizada na Rua
da Constituição, no Porto. A 2128 quilómetros de distância, na Arena AufSchalke,
em Gelsenkirchen (Alemanha), José Mourinho ministrava o último treino antes da
final da Liga dos Campeões. No dia seguinte, o FC Porto bateu o Mónaco por 3-0
e tornou-se campeão europeu. Estas coincidências de datas não deixam de ser
curiosas: em 31 de maio de 2002, o Benfica estava feliz por conseguir um lugar
importante na Liga, enquanto o FC Porto festejava, a 1 de junho, a contratação de
um jogador importante nos sucessos que se seguiriam; a 25 de maio de 2004, o
Benfica exultava com uma nova vitória na secretaria e ao arrepio dos
regulamentos, enquanto o FC Porto, no dia seguinte, conquistava o troféu mais
importante do mundo a nível de clubes. Objetivos diferentes originaram
resultados diferentes. Luís Filipe Vieira bem tinha avisado que a prioridade eram
os lugares na Liga…
Um caso em que a atuação de Cunha Leal não foi muito diferente aconteceu
pouco após o arranque da temporada seguinte. À sexta jornada do campeonato, o
FC Porto, que já tinha derrotado o Benfica na Supertaça Cândido de Oliveira
(vitória por 1-0 com golo de Quaresma), deslocava-se à Luz, em partida marcada
para 17 de outubro. As semanas que antecederam este jogo foram marcadas pela
polémica em torno dos bilhetes disponibilizados aos adeptos portistas. Seguindo
uma linha cronológica, a história é fácil de contar: a 29 de setembro, o FC Porto
fez saber ao Benfica que pretendia 2600 ingressos para os seus adeptos, tomando
como valor de referência os 5% da lotação do estádio que os regulamentos
internacionais determinam que sejam disponibilizados à equipa visitante; a 7 de
outubro, o clube da Luz, alegando razões de segurança, anunciou que cedia apenas
1008 bilhetes, o que motivou uma reação de Fernando Gomes, vice-presidente e
administrador da SAD do FC Porto (atual presidente da FPF), que criticou esta
decisão e apelou à intervenção da Liga no sentido de fazer cumprir as normas;
Luís Filipe Vieira reagiu uma semana antes do clássico, exigindo um pedido de
desculpas de Fernando Gomes, que a não acontecer teria como consequência a
não disponibilização de qualquer bilhete aos adeptos azuis e brancos; no dia
seguinte, confirmava-se a ameaça: uma vez que o FC Porto não se retratou, o
Benfica não enviaria um único ingresso para o Dragão; entretanto, surgiram
notícias que davam conta de que as claques portistas, os Super Dragões e o
Coletivo Ultras 95, tinham conseguido adquirir, em casas do Benfica espalhadas
por todo o país, milhares de bilhetes para os mais diversos setores do Estádio da
Luz – estava, então sim, criado um sério problema de segurança, reconhecido por
entidades como o Sindicato dos Profissionais de Polícia, a Federação Portuguesa
de Futebol, a Secretaria de Estado do Desporto e o Ministério da Administração
Interna; o FC Porto apenas confirmou a sua participação neste jogo na véspera da
sua realização, quando foi obtida a garantia de que os adeptos portistas seriam
concentrados num setor próprio do recinto, devidamente resguardados do
contacto direto com os rivais lisboetas. A história da partida também é simples: o
FC Porto marcou cedo, por Benni McCarthy, e o resultado não se alterou. A
polémica criada pelo Benfica, uma vez mais, acabou com uma derrota no campo.
Na secretaria já não foi bem assim.
A atuação de Cunha Leal neste caso foi discreta, mas ainda assim, uma vez
mais, perfeitamente alinhada com os interesses encarnados. A 15 de outubro,
antevéspera do confronto, o diretor executivo da Liga deu conta publicamente da
disponibilização pelo FC Porto aos organismos competentes de documentação
relacionada com esta polémica. Informou, no entanto, que entre esses documentos
não se encontrava o pedido dos bilhetes por escrito, o que significaria que das
Antas nunca teria saído uma requisição formal. Estaria assim legitimada a atuação
do Benfica que, muito objetivamente, só pode ser considerada condenável. Em
primeiro lugar, porque procurou condicionar a natureza festiva e espetacular do
futebol, cerceando o acesso dos adeptos de uma das equipas ao recinto que
acolheria o jogo. Para além disso, alegando infundadas razões de segurança,
acabou por criar um problema gravíssimo que poderia ter tido consequências
inimagináveis. Como é evidente, seria muito mais seguro concentrar num único
setor 2600 adeptos do FC Porto, como o Benfica recusou, do que lidar com o
mesmo número de aficionados distribuídos um pouco por todo o estádio. A
solução encontrada pelo clube da Luz para remediar a situação acabou também
por não ser a mais feliz: 3000 portistas foram encaminhados para uma secção do
estádio com cerca de 1800 cadeiras. A sobrelotação a que se assistiu poderia ter
redundado numa tragédia que felizmente não aconteceu, mas que teria Cunha Leal
como um dos principais culpados, dada a sua atuação enquanto responsável
máximo pelo organismo que tutelava a organização do campeonato nacional.
O episódio de favorecimento ao Benfica mais famoso deste período é, sem
dúvida, o Estorilgate, ainda hoje muitas vezes recordado. Aconteceu na mesma
época 2004/2005. À trigésima jornada de um campeonato disputado em 34
rondas, a equipa da Luz deslocava-se ao terreno do Estoril. Só que o terreno do
Estoril, desta vez, localizou-se… no Algarve. Nesta reta final da competição, a
luta pelo título envolvia quatro equipas: o Benfica (na frente, com 55 pontos), o
Sporting, o Sporting de Braga (ambos a apenas um ponto do primeiro lugar) e o
FC Porto (a quatro pontos da liderança). Tratou-se de uma luta invulgarmente
competitiva, nivelada por baixo (o Benfica que conquistou esta liga foi, de longe,
o pior campeão dos últimos largos anos), com constantes oscilações na tabela das
principais equipas, ao longo de várias semanas. Em cada jornada, qualquer
pormenor assumia um carácter quase decisivo: uma bola que vai à barra, um golo
mal anulado, um penálti poupado a um adversário (a equipa da Luz teve
imensos…), etc. A alteração do estádio onde se realizaria um jogo estava muito
longe de ser um pormenor. Era, na verdade, um verdadeiro “pormaior”. A
mudança do recinto onde se disputou o Estoril-Benfica significou que a equipa da
Luz passou de uma situação em que jogava fora, num terreno mais curto, num
estádio com adeptos da equipa adversária, nas mesmas condições que os seus
rivais na luta pelo título tiveram de enfrentar, para outra em que, apesar de não
jogar em casa, passou a dispor de circunstâncias muito mais favoráveis do que o
seu oponente, que jogou verdadeiramente fora, num estádio com 30 000 adeptos a
torcer pelos pupilos de Luís Filipe Vieira. Tudo se torna mais estranho se
tivermos em conta que o Estoril, à 29.ª jornada, tinha 26 pontos, 21 deles
conquistados em casa, e lutava para não descer de divisão (estava a quatro pontos
da linha de água). Na prática, ao aceitar jogar no Algarve, a equipa da linha de
Cascais punha em causa as hipóteses de pontuar, num jogo que à partida seria
sempre difícil, algo que se torna ainda mais incompreensível se tivermos em
conta o sufoco em que se encontrava na tabela classificativa. Como é que isto foi
possível? Ou, citando Luís Filipe Vieira, “o que passou se”?
A resposta a esta questão passa, em primeira medida, pela identificação de
duas das personagens envolvidas neste imbróglio. José Veiga era, desde o final da
época anterior, diretor-geral do futebol do Benfica. Deteve, até outubro de 2004,
80% do capital da SAD do Estoril, o que significa que chegou a dirigir um clube
(o Benfica) ao mesmo tempo que era proprietário de outro (o Estoril) que
disputava a mesma competição. Por sua vez, o presidente da SAD do Estoril era
António Figueiredo, benfiquista fanático e antigo vice-presidente do clube da Luz,
atualmente comentador da CMTV e assumido recetor das cartilhas de Carlos
Janela. Ou seja, na época 2004/2005, Veiga e Figueiredo eram, face ao Benfica e
ao Estoril, duas figuras híbridas, cujas posições de destaque na condução
desportiva dos respetivos clubes teciam uma inevitável teia de interesses entre a
Segunda Circular e o António Coimbra da Mota. E o administrador estorilista,
particularmente, não tinha qualquer problema em escondê-lo. Quando
questionado, dias antes do jogo, sobre a equipa pela qual torceria naquele jogo,
deu uma resposta inequívoca: “Espero que o resultado não impeça o Benfica de
ser campeão e o Estoril de se manter”4.
Os desejos de António Figueiredo não se concretizaram plenamente: o
Benfica foi campeão, mas o Estoril desceu. No Algarve, o vermelho foi a cor
dominante do jogo: o vermelho do Benfica, que acabou por vencer por 2-1, e o
vermelho dos cartões exibidos aos jogadores canarinhos. A sequência dos factos
foi a seguinte: o Estoril colocou-se em vantagem, aos 11 minutos; aos 25, surge a
primeira expulsão; mesmo a jogar contra dez, o Benfica só consegue empatar aos
75; três minutos depois, o Estoril fica a jogar com nove; aos 82, Mantorras lá
resolveu. Tudo foi caricato neste jogo, até o calçado do árbitro Hélio Santos, de
Lisboa, que foi cedido pelo Benfica. Carlos Xavier, à data treinador-adjunto do
Estoril, comentou assim estes acontecimentos: “No Estoril, quando fui adjunto de
Litos, passei por uma situação incrível. O presidente deixou que a equipa
descesse para a segunda divisão a troco de ir jogar contra o Benfica ao Algarve
apenas por causa da receita. Perdemos porque dentro do campo as coisas estavam
todas feitas, ao ponto de mais tarde eu e o Litos termos sido ouvidos pela Polícia
Judiciária sobre o que se tinha passado. O jogo foi comprado, ou vendido, neste
caso”5.
No meio disto tudo, qual a atitude de Cunha Leal? De forma uma vez mais
discreta e eficaz, limitou-se a ser o facilitador que validou institucionalmente uma
farsa que colocou em causa a verdade desportiva e influenciou decisivamente o
desfecho de um campeonato. No fundo, aconteceu o mesmo nos episódios
anteriores. Enquanto diretor executivo da Liga, Cunha Leal representou para o
Benfica uma garantia de que as suas artimanhas nunca seriam obstaculizadas pelo
organismo responsável pela organização dos campeonatos profissionais em
Portugal. O clube da Luz teria sempre o respaldo, numa expressão feliz de Rui
Santos (insuspeito de qualquer afeição pelo FC Porto), das “cunhas desleais”6…
Muito mais haveria a contar sobre a nefasta passagem desta figura pela
direção da Liga Portuguesa de Futebol Profissional. Terminamos com um facto
que é elucidativo do seu carácter e das intenções com que exerceu estas funções:
em 2007, um ano depois de deixar a Liga, integrou o elenco de um filme dirigido
pelo marido de Leonor Pinhão baseado numa obra de Carolina Salgado.

“SEMPRE TENHO ESTADO E ESTIVE AO TEU LADO”

Avançamos alguns anos no tempo7. Em 2011, Fernando Gomes é eleito


presidente da Federação Portuguesa de Futebol e deixa vazia a cadeira do poder
na Liga. Apresentam-se dois candidatos às eleições que se realizam no princípio
do ano seguinte: António Laranjo, antigo diretor de torneio do Euro 2004, que
conta com o apoio de FC Porto, Benfica e Sporting; e Mário Figueiredo, um quase
desconhecido advogado do Porto, com uma ligação ténue ao futebol enquanto
representante jurídico do Marítimo. Um conjunto de promessas particularmente
aliciantes para os clubes mais pequenos, como a garantia de alargamento do
campeonato nacional de 16 para 18 equipas, assegurou a Mário Figueiredo uma
vitória por seis votos. Iniciou-se então um dos períodos mais pródigos em
situações anómalas da história do futebol profissional em Portugal.
As avaliações ao mandato de Mário Figueiredo são quase unanimemente
negativas. Foi um período em que a Liga perdeu quase todos os patrocínios e
entrou numa situação financeira caótica. Foi um tempo em que a tão apregoada
centralização dos direitos televisivos (uma das promessas mais emblemáticas
deste advogado) foi inviabilizada pelo arranque da transmissão dos jogos do
Benfica no canal do clube. Foi uma época de atropelos ao regular funcionamento
das instituições, com iniciativas de clubes (os “sócios” da Liga) visando o
escrutínio e o confronto da direção a serem recorrentemente inviabilizadas, sem
qualquer justificação plausível, pela mesa da Assembleia-Geral. Foi até uma
altura em que se procurou, por via administrativa, perpetuar o presidente no
poder, através de rejeições de sustentação jurídica muito questionável das
candidaturas que o desafiavam. Foi, enfim, uma fase negra na história da Liga,
ainda que seguramente mais clara para alguns dos seus membros, como o Benfica,
como tivemos oportunidade de constatar recentemente.
Um conjunto de contactos entre Mário Figueiredo, Luís Filipe Vieira e Paulo
Gonçalves, no final da época 2013/2014, é bem esclarecedor acerca da natureza
da relação entre o clube da Luz e a direção da Liga nesta altura. Tomemos três
exemplos.
Estamos em 2 de abril de 2014. O presidente do Benfica acaba de ser
suspenso por dois meses pelo Conselho de Disciplina da Federação Portuguesa
de Futebol, na sequência de críticas duras ao árbitro Jorge Tavares pela sua
atuação num jogo em que os encarnados empataram com o Belenenses. A pena de
Vieira, note-se, é a mais leve possível, uma vez que os regulamentos preveem um
castigo de dois meses a dois anos para ilícitos deste género. Nesse dia 2 de abril,
Mário Figueiredo envia uma mensagem eletrónica ao primeiro-ministro da Luz,
partilhando um link com declarações de António Salvador, também elas sobre
arbitragem, após um Rio Ave-Sporting de Braga. Salienta que o presidente do
Braga “não fala em roubo, nem faz acusações genéricas” e deixa um
conselho/pedido/declaração de fidelidade ao amigo Luís: “Pf tem calma que
sempre tenho estado e estive do TEU LADO”. Uma frase destas não deixa grande
margem para dúvidas nem para interpretações: Mário Figueiredo, enquanto
presidente da Liga, era um aliado do Benfica e, em concreto, de Luís Filipe Vieira
– que, curiosamente, reencaminhou este email para Paulo Gonçalves,
acompanhado de um eloquente: “Ainda querem me fazer atrasado mental”. Na
prática, como é que esta aliança se concretizava? Os outros dois exemplos dão-
nos algumas luzes.
Quarta-feira, 29 de janeiro de 2014. Neste dia são divulgadas as nomeações
de delegados8 para os jogos da 17.ª jornada da primeira liga e da 28.ª da segunda.
Nuno Cabral9, delegado da Liga, queixa-se a Paulo Gonçalves: “Sou o único
delegado até ao momento que não fiz 1.ª liga”. O assessor jurídico da SAD
encarnada regista a reclamação e dá-lhe seguimento, em email enviado a Mário
Figueiredo: “A ser verdade, será que o homem é feio ou incompetente? É o único
delegado que ainda não fez nenhum jogo da I Liga e já foi nomeado 11 vezes para
Chaves (qualquer dia vai ser treinador do Chaves… eh eh eh)”. O presidente da
Liga responde com toda a diligência: “Só Tu para me fazeres sorrir um bocado.
Ele está pronto? Vem fazer um jogo aqui ao Porto? Só tens que dizer…”. É
extraordinária a gravidade destas mensagens, que revelam:
1. que um delegado da Liga, quando tinha razões de queixa das nomeações
para o exercício da sua função, apresentava-as a um funcionário do
Benfica;
2. que esse funcionário do Benfica se sentia perfeitamente à vontade para
reencaminhar essa reclamação ao presidente da Liga, confirmando que
não é inocente o facto de ter sido a si que Nuno Cabral se dirigiu;
3. que Mário Figueiredo acolhia, sem qualquer problema, este tipo de
contactos do Benfica e que, pior do que isso, se colocava à disposição
desse clube para promover as nomeações que bem entendesse (“Vem fazer
um jogo aqui ao Porto? Só tens que dizer…”). Na sequência destes
contactos, Nuno Cabral recebeu pelo menos duas “prendas”: a 16 de
março, teve a oportunidade de fazer o tal jogo no Porto sugerido por
Mário Figueiredo, neste caso em Vila Nova de Gaia (Porto B-Académico
de Viseu); a 20 de abril, estreou-se na primeira liga, logo no Estádio da
Luz e no jogo do título do clube do seu coração (Benfica-Olhanense).

Quarta-feira, 23 de abril de 2014. Duas mensagens muito simples. Uma frase


cada uma. Paulo Gonçalves para Mário Figueiredo: “Para a próxima jornada já
estão feitas as nomeações?”. Mário Figueiredo para Paulo Gonçalves: “Mais
sugestões do que as anteriores?”. Assim, só. Sem “caro amigo”, “grande abraço”,
“cumprimentos”… Nada. Não há como dizer que estes emails são
descontextualizados: o assessor da SAD do Benfica pergunta se as nomeações
(que só podem ser dos delegados) estão feitas, o presidente da Liga pergunta se
há mais sugestões para além das anteriores. Em 2013/2014, o Benfica tinha poder
(autoridade, pelo menos) para sugerir nomeações de delegados. E o presidente da
Liga era de tal forma submisso que até perguntava se havia mais pedidos. Maior
promiscuidade entre um clube e as instituições que gerem o futebol é difícil de
imaginar.

UM PRESIDENTE DA AG DA LIGA SOB CONTROLO E UM LíDER


DA FPF MONITORIZADO

Durante o mandato de Mário Figueiredo, o presidente da Assembleia-Geral


da Liga era Carlos Deus Pereira, advogado do Algarve que representou o Benfica
como jogador na década de 80, tendo realizado 34 jogos ao serviço da equipa
principal dos encarnados entre as épocas de 1980/1981 e 1987/1988. Deus
Pereira suscitou mais notoriedade do que é habitual no exercício das suas
funções, tendo em conta as diversas decisões polémicas que foi assumindo, com
destaque para a rejeição das iniciativas de conjuntos de clubes que visavam a
destituição de Figueiredo e para a já referida não aceitação de candidaturas que
desafiavam o poder instituído nas eleições de junho de 2014.
Soubemos recentemente que também Carlos Deus Pereira estava ao serviço
do Benfica enquanto era presidente da Assembleia-Geral da Liga. Revela-o a
correspondência que trocou com Pedro Guerra, funcionário desse clube e, à data,
comentador da CMTV, nos primeiros meses de 2014. Tudo começou a 11 de
fevereiro, quando Deus Pereira fez chegar uma mensagem ao diretor de conteúdos
da BTV, explicando o funcionamento do negócio do futebol, a importância da
Olivedesportos no contexto do desporto nacional e dando conta das iniciativas da
Liga para destruir Joaquim Oliveira e, por arrasto, o FC Porto10. Nesse momento,
o presidente da AG da Liga aproveitou para participar a Pedro Guerra que
tomaria em breve uma decisão sobre o pedido de destituição de Mário
Figueiredo, prometendo informar o funcionário do Benfica antecipadamente,
apesar da confidencialidade que envolvia o assunto11. O teor deste email é
gravíssimo, na medida em que confirma que a Liga tinha o objetivo deliberado de
prejudicar um dos seus membros, para além de revelar que a promiscuidade entre
o líder da AG do organismo e o representante de um clube ia ao ponto de lhe ser
disponibilizada documentação confidencial antes mesmo de as partes interessadas
nesses diplomas serem notificadas. E o que é mais grave no meio disto tudo? É
que Carlos Deus Pereira cumpriu mesmo o que prometeu…
A 16 de fevereiro, o presidente da AG da Liga enviou a Pedro Guerra o
requerimento apresentado por FC Porto, Académica, Estoril, Belenenses,
Sporting de Braga, Vitória de Guimarães e Tondela visando a destituição de
Mário Figueiredo. Fê-lo para que Guerra pudesse “observar os clubes que
querem voltar ao antigamente e ver os argumentos que utilizam”. E reforçou a
promessa anterior: “Amanhã vou tomar decisões e aquilo que decidir envio-lhe
em primeira mão”. Na verdade, não foi no dia seguinte que Deus Pereira tomou
uma decisão. Foi a 20 de fevereiro que Guerra recebeu a apreciação ao
requerimento de convocação de uma Assembleia-Geral Extraordinária da Liga,
com a pretensão dos clubes que tinham subscrito esse pedido a ser naturalmente
rejeitada.
O que está aqui em causa não é a validade jurídica da decisão de Carlos Deus
Pereira (altamente questionável, tanto quanto sabemos), mas a indecência dos
seus procedimentos, bem revelada por uma cronologia muito simples: Pedro
Guerra é “notificado” a 20 de fevereiro; o documento, contudo, tem como data 21
de fevereiro – ou seja, Guerra recebeu-o até antes de ele, oficialmente, existir e
ser válido; os clubes – principais partes interessadas nesta questão – foram
notificados a 24. Inacreditavelmente, quatro dias antes de as entidades que se
dirigiram ao presidente da AG Liga terem conhecimento da sua decisão, já Pedro
Guerra – e o Benfica, claro – a tinha na sua caixa de correio. Carlos Deus
Pereira, para além de não assumir uma postura de isenção e equidistância em
relação a todos os clubes que integravam a Liga, como era sua obrigação,
assumia-se como uma fonte privilegiada da comunicação terrorista promovida
pelo Benfica, que tinha (e tem) Pedro Guerra como uma das suas figuras de
referência.
Por incrível que pareça, este antigo jogador da equipa da Luz foi capaz de
algo ainda pior. Muito pior. A 16 de fevereiro de 2014, Carlos Deus Pereira
enviou ao mesmo colaborador da BTV uma mensagem que reproduzimos
integralmente (sublinhamos, por isso, que o português é o do autor, não o nosso):
“Os ficheiros são de mensagens do F Gomes presidente da FPF à altura ainda
Presidente da Liga. chamo a atenção das mensagens enviadas ao Tiago Craveiro
no ficheiro Tiago.csv – 2.ª mensagem. Ai, o actual presidente da FPF declara
eterno amor ao azul e branco. São estas duas criaturas que querem mandar no
futebol português e já mandam na arbitragem e na disciplina”. Em anexo seguiam
sete ficheiros Excel contendo 132 SMS, enviadas e recebidas por Fernando
Gomes entre 26 de junho de 2010 e 12 de setembro de 2011. Este email revela
que:
1. elementos dos órgãos sociais da Liga no mandato 2011-2014 tiveram
acesso, pelo menos, às comunicações escritas estabelecidas por membros
dos mesmos órgãos no mandato anterior;
2. para além de aceder aos registos desses contactos, muitos deles de
natureza pessoal, o presidente da AG da Liga não os preservava,
enviando-os sem qualquer pudor a um funcionário de um clube (um caso
de flagrante e completamente injustificada violação de privacidade);
3. o objetivo desta divulgação, tendo em conta o conteúdo da mensagem que
é destacada no corpo do email, era não só colocar em causa a isenção do
presidente da FPF (quanta ironia, tendo em conta quem pratica este
ato…), mas também atingir o FC Porto;
4. em suma: o presidente da AG da Liga deu ao Benfica a possibilidade de
monitorizar o presidente da FPF, fornecendo-lhe elementos para,
eventualmente, o denegrir ou chantagear (que é como quem diz, para “o ter
na mão”).

O caso das SMS de Fernando Gomes que vão parar à caixa de correio
eletrónico de Pedro Guerra é uma espécie de cereja no topo do bolo dos
exemplos de controlo das instituições do futebol português pelo Benfica. O
próprio facto de ser alguém com a irrelevância institucional de Guerra a receber
estes documentos é altamente significativo: a ascendência da turma de Vieira
sobre as autoridades do futebol português é de tal forma grande que até alguém
como Pedro Guerra, que gosta de se apresentar como um mero colaborador do
clube, tem acesso a este tipo de contactos e de informação. Somos incapazes de
imaginar o que é que poderão receber e saber figuras como Luís Filipe Vieira,
Domingos Soares de Oliveira, Paulo Gonçalves, etc. Para finalizar, o que importa
salientar é que nesta situação são duas as instituições que estão em causa, e o que
se verifica é que o clube da Luz acaba por beneficiar da influência objetiva que
detém sobre uma delas (a Liga) para aceder a um instrumento que lhe permite
influenciar a outra (a FPF). Nem com muita criatividade seria fácil conceber um
mecanismo mais totalitário e ao mesmo tempo eficaz de controlo de quem manda
no futebol português.

EM RESUMO

O atual ciclo diretivo do Benfica iniciou-se no ano 2000, quando Manuel


Vilarinho substituiu Vale e Azevedo na presidência do clube e integrou Luís
Filipe Vieira na gestão do futebol. Vieira assumiu muito cedo que um dos
objetivos estratégicos do clube passava pelo controlo de posições-chave na
estrutura das instituições que dirigem o desporto nacional, com particular
destaque, à época, para a Liga. Percebeu-se então que o projeto encarnado
ultrapassava o imediatismo com que normalmente se prepara cada época
desportiva e que tinha um alcance de médio/longo prazo: num primeiro momento,
seria importante assaltar o poder; o sucesso desportivo viria por arrasto.
A tentativa de colonização das estruturas de futebol pelo Benfica foi
duplamente eficaz: por um lado, porque o clube da Luz conseguiu ocupar as
posições pretendidas; por outro, porque beneficiou diretamente das suas escolhas.
O caso de Cunha Leal é exemplar, tal a quantidade de polémicas em que
interveio, sempre a favor do Benfica, violando a postura neutra que dele seria de
esperar enquanto diretor executivo da Liga, podendo mesmo ser considerado um
dos principais rostos do escandaloso título encarnado de 2004/2005. No tempo
de Mário Figueiredo, assistiu-se ao aprofundamento de tudo isto, com a
promiscuidade entre Liga (nas pessoas dos seus presidentes da Comissão
Executiva e da Assembleia-Geral) e Benfica (nas pessoas do seu presidente, do
assessor jurídico da sua SAD e de um funcionário) a atingir uma dimensão
inimaginável, que resultou em situações como a cedência ilegítima de
documentação confidencial e a possibilidade de um clube participar no processo
de nomeação de delegados da Liga. A isso juntou-se a monitorização do
presidente da Federação Portuguesa de Futebol, proporcionada ao Benfica pela
cúpula da Liga através de uma violação quase pornográfica da sua privacidade,
tanto numa esfera pessoal como profissional.
O controlo das instituições do futebol português pelo Benfica resulta, no
fundo, de uma teia de relações e de uma colonização de lugares-chave de certos
organismos que foram levadas a cabo ao longo da última década e meia e que
proporcionam:
1. a circulação de informação privilegiada;
2. a obtenção de benefícios para o clube;
3. em última análise, vantagens no domínio desportivo.

Isto tem um nome: tráfico de influências. Nem precisamos de recorrer às


nossas palavras para o explicar. O Regulamento Disciplinar da FPF é
suficientemente claro e o confronto dos seus conteúdos com tudo o que aqui é
relatado não pode deixar margem para dúvidas:

O clube que, por si ou por interposta pessoa, com o seu


consentimento ou ratificação, solicitar ou aceitar, para si ou para
terceiro, vantagem patrimonial ou não patrimonial, ou a sua promessa,
para abusar da sua influência, real ou suposta, junto de qualquer agente
desportivo, representante, agente ou funcionário da Federação ou de
qualquer sócio ordinário desta, com o fim de obter uma qualquer
decisão destinada a alterar ou falsear o resultado ou o desenvolvimento
regular de uma competição desportiva, é sancionado com exclusão da
competição entre 1 e 3 épocas desportivas e cumulativamente com multa
entre 25 UC e 125 UC, se sanção mais grave não lhe couber por força
de outra disposição deste Regulamentoi12.

1
A Bola, 2 de junho de 2002, p. 3.
2
À data em que escrevemos este texto, o vídeo estava disponível no Youtube:
https://www.youtube.com/watch?v=KrQ47toeF7Y&t=616s
3
Dez anos mais tarde, era a vez de Adão Mendes dizer que “quem prejudica o Benfica sabe que é castigado”.
4
http://www.record.pt/futebol/futebol-nacional/liga-nos/estoril/detalhe/antonio-figueiredo-espero-que-nao-
impeca-benfica-de-ser-campeao.html
5
Sábado, 4 de dezembro de 2015.
6
Record, 16 de maio de 2008: “As cunhas desleais não honram o futebol nem os lugares, quando se percebe
que o objetivo é prejudicar o FC Porto.”
7
Não porque, entretanto, o Benfica não tenha exercido qualquer domínio sob as instituições do futebol, mas
porque esse controlo se fez sentir mais ao nível da justiça desportiva, como se verá mais à frente.
8
Os delegados da Liga são agentes desportivos (no máximo dois por cada jogo), a quem, entre outras
atribuições, compete “fiscalizar o bom cumprimento das normas regulamentares na organização e realização
do jogo”. Cf. Regulamento de competições organizadas pela Liga Portuguesa de Futebol Profissional,
artigo 65.
9
Personagem que será apresentada com mais detalhe noutro capítulo.
10
“Eu enquanto Presidente da AG e o Mário enquanto Presidente da Comissão Executiva, (sic) espetámos
uma faca, talvez facalhão, numa das cabeças da hidra, o Joaquim Oliveira. O Pinto da Costa agora mais frágil
vem por arrasto, porque o J Oliveira está falido.”
11
“Em principio (sic) vou produzir o meu despacho relativamente ao requerimento de AG que solicita a
destituição do Mário Figueiredo no dia 12. Vou enviar-lho antecipadamente. Vou-lhe enviar também o teor do
requerimento assinado pelo Porto, Braga, Académica, Belenenses, Estoril e Tondela. Isto é absolutamente
confidencial.”
12
Regulamento Disciplinar da Federação Portuguesa de Futebol, artigo 55, § 1.
O tetracampeonato do Benfica é uma mentira. Esta é a conclusão a que chega
qualquer analista da Liga portuguesa que se esforce por olhar com alguma
objetividade para os últimos quatro anos. Trata-se de uma mentira global, como
se dá conta neste livro, que abrange os mais diversos domínios do fenómeno
futebolístico (a organização das competições, a justiça, a comunicação, etc.). Uma
das suas facetas mais evidentes, mais indesmentíveis e mais facilmente
inteligíveis por qualquer adepto de futebol é a arbitragem. O Benfica beneficiou,
ao longo das últimas épocas, de uma quantidade absurda de situações anómalas,
que incrementaram os seus resultados e diminuíram os dos seus adversários. Sem
esse suporte, o clube da Luz teria sido incapaz de ganhar, pelo menos, dois desses
quatro títulos. Não é difícil demonstrá-lo. E não acreditamos que coisas destas,
tão estranhas e tão recorrentes, aconteçam por acaso. Ao longo da última década e
meia, o Benfica trabalhou muito, e bem, para criar este cenário.

UM HISTÓRICO DE ESCÂNDALOS: OS CAMPEONATOS DE


2014/2015 E 2016/2017

Talvez a questão mais difícil de responder sobre as últimas épocas seja: nos
últimos quatro anos, que campeonato é que o Benfica ganhou de forma mais
escandalosa? O de 2014/2015 ou o de 2016/2017? A “liga do colinho” ou a “liga
Salazar”? Admitimos que é extremamente complicado selecionar uma das
hipóteses. Por isso, optamos por avançar com alguma informação objetiva e
deixar esse julgamento nas mãos do leitor13.

Época 2014/2015: lances em que a interferência do


árbitro pôde condicionar mais os resultados
FC Porto Benfica
A Contra A favor Contra
favor
Penáltis não assinalados 12 3 7 9
Penáltis mal assinalados 1 0 3 0
Golos mal validados 2 0 4 1
Golos mal invalidados 1 0 2 4
Expulsões poupadas 3 2 4 3
Expulsões injustas 0 0 2 0

Analisando este quadro, facilmente se percebe que os números não enganam:


o Benfica beneficiou de 25 erros graves dos juízes da partida, entre os quais nove
penáltis contra que não foram assinalados e quatro golos a favor que foram
considerados válidos, mas que deveriam ter sido anulados. O cenário torna-se
mais negro se tivermos em consideração os jogos em que vários destes erros
ocorreram e os seus resultados finais: o Benfica ganhou por 0-1 no Bessa, à
segunda jornada, com um golo a ser indevidamente anulado ao Boavista perto do
fim; venceu por 2-3 no Estoril, num jogo em que ambas as equipas marcaram um
golo que deveria ter sido anulado e em que foram poupados um penálti e uma
expulsão contra a equipa de Vieira; à nona jornada, na Luz, os da casa venceram
por 1-0, com um golo marcado irregularmente e com um tento do adversário a ser
injustamente invalidado; na receção ao Gil Vicente o cenário é parecido, com o
Benfica a vencer por 1-0, beneficiando de um golo irregular; a 26 de abril, os
encarnados recebem o FC Porto numa partida potencialmente decisiva, empatam
0-0, e uma vez mais é-lhes perdoado um penálti. São cinco jogos em que o
Benfica é objetivamente ajudado pelos árbitros. Para contrapor, há apenas um em
que é prejudicado no resultado final: em Guimarães empatou a zero, apesar de ter
marcado um golo limpo. No total, se partirmos do princípio de que todos os
penáltis não assinalados seriam convertidos, o Benfica terminaria este
campeonato com menos oito pontos.
Se olharmos agora aos jogos do FC Porto, deparamos com o cenário inverso.
Ou seja, passamos de um quadro de uma equipa altamente beneficiada (o Benfica)
para o de outra brutalmente prejudicada (o FC Porto). Foram 19 os erros graves,
alguns dos quais influenciaram decisivamente o desfecho de cinco jogos: à sexta
jornada, o FC Porto empatou a uma bola em Alvalade, vendo ser-lhe negado um
penálti no último minuto; no Estoril, novo empate penalizador, com os Dragões a
sofrerem duas faltas dentro da área adversária; em Guimarães, mais um empate e
mais dois penáltis por marcar; nas partidas mais decisivas da reta final do
campeonato, que terminaram com empates a zero e a uma bola em Belém e na Luz,
mais um penálti subtraído em cada jogo. Se partirmos, uma vez mais, do princípio
de que essas grandes penalidades seriam convertidas, estes cinco empates
transformavam-se em vitórias e o FC Porto terminaria o campeonato com mais
dez pontos. Recordamos que esta não é a nossa opinião, mas o resultado da
análise de três antigos árbitros.
Face aos dados apresentados, é incontestável que o FC Porto foi muitíssimo
prejudicado pelas arbitragens, enquanto o Benfica foi levado ao colo. Com todos
os penáltis convertidos, a equipa de Julen Lopetegui poderia ter sido campeã com
15 pontos de vantagem. Mesmo que tenhamos em conta que nem todas as grandes
penalidades dão em golo e que até seria possível que houvesse outras ocorrências
nos jogos que determinassem resultados diferentes, uma distância potencial de 15
pontos é suficientemente significativa para que se considere que em condições
normais o FC Porto, em 2014/2015, teria sido campeão sem qualquer dificuldade.
A perceção que muitos hoje terão de que aquela equipa portista não teria valor
para alcançar o título não passa de uma construção da imprensa e, muito
particularmente, dos comentadores benfiquistas, sempre muito bem afinados pelas
cartilhas. A real diferença de valores entre FC Porto e Benfica naquela
temporada, de resto, ficou bem patente nas competições europeias: os Dragões
atingiram os quartos de final da Liga dos Campeões e foram capazes de bater o pé
ao superfavorito Bayern de Munique, ganhando por 3-1 na primeira mão e
acabando por perder por 7-4 no conjunto da eliminatória; o Benfica, por outro
lado, ficou em último lugar na fase de grupos da mesma prova, tendo vencido
apenas um jogo em seis. Por muito que custe reconhecê-lo aos arautos do regime,
nessa época o FC Porto foi, de muito longe, a melhor equipa portuguesa.

Época 2016/2017: lances em que a interferência do


árbitro pôde condicionar mais os resultados
FC Porto Benfica
A Contra A favor Contra
favor
Penáltis por assinalar 15 2 8 4
Penáltis mal assinalados 1 1 2 0
Golos mal validados 2 1 3 2
Golos mal invalidados 2 0 1 1
Expulsões poupadas 5 4 5 4
Expulsões injustas 5 1 0 0

A temporada 2016/2017 também foi marcada por uma sucessão de erros de


arbitragem que prejudicaram o FC Porto de forma recorrente e o impediram de
ser campeão. Ao contrário do que aconteceu na época analisada anteriormente,
desta vez a intervenção dos árbitros na definição da classificação foi mais
unilateral, ou seja, se que em 2014/2015 os Dragões foram muito penalizados e o
Benfica muito beneficiado, desta vez os erros incidiram especialmente sobre a
equipa portista, enquanto houve um certo equilíbrio entre benefícios e prejuízos à
turma da Luz.
Analisando o quadro, verifica-se que o Benfica foi beneficiado com 14 erros
graves. Olhando jogo a jogo e ponderando o impacto dessas situações irregulares
nos resultados, nota-se que os comandados de Luís Filipe Vieira deveriam ter
ganho três partidas que empataram (frente ao Vitória de Setúbal e ao Boavista, em
casa, e ao Sporting, fora) e empatado uma que perderam (frente ao Vitória de
Setúbal, fora), o que lhes asseguraria mais sete pontos na classificação final. Por
outro lado, com justiça, teriam perdido dois jogos que empataram (ambos frente
ao FC Porto) e empatado três outros que ganharam (frente ao Desportivo de
Chaves e ao Estoril, em casa, e contra o Moreirense, fora), o que implicaria um
desconto de oito pontos na tabela classificativa. Ou seja, no final do campeonato,
o impacto das arbitragens nos jogos do Benfica acaba por se revelar quase neutro,
uma vez que, tendo sido beneficiados em oito pontos mas prejudicados em sete,
de acordo com o tribunal de O Jogo os encarnados terminariam o campeonato
com 81 pontos, em vez dos 82 que alcançaram oficialmente.
A situação do FC Porto, prejudicado gravemente em 25 situações, é bastante
diferente. Os Dragões foram beneficiados num jogo que empataram e deviam ter
perdido (em Paços de Ferreira), mas prejudicados noutros sete: um que perderam
e deviam ter empatado (em Alvalade, onde um dos golos do Sporting resultou de
um livre que teve origem numa falta inexistente) e seis que empataram mas que
deviam ter vencido (contra o Vitória de Setúbal e o Braga, fora, face ao Vitória de
Setúbal e o Feirense, em casa, e frente ao Benfica, tanto em casa como fora). No
total, o FC Porto foi beneficiado em um ponto e penalizado em 13, o que significa
que, havendo justiça, teria terminado a Liga com mais doze pontos (ou seja, com
88), o que resultaria numa vantagem de sete pontos sobre o Benfica.
Existe outra forma de comparar muito diretamente a dualidade de critérios da
arbitragem em relação ao FC Porto e à turma da Luz: basta verificar até que ponto
um jogador que passou pelos dois clubes em épocas consecutivas foi penalizado
com cartões quando estava num lado e no outro. Maxi Pereira representou o
Benfica em oito épocas, entre 2007 e 2015. Nesse período, foi expulso apenas
uma vez, por acumulação de amarelos. No FC Porto, em duas temporadas, foi
expulso duas vezes. O jogador mudou assim tanto para de um lado ter uma média
de uma expulsão em oito anos e no outro passar para uma expulsão por ano? Não
colocamos em causa as expulsões de Maxi ao serviço dos Dragões, mas não
podemos deixar de perguntar: em oito anos na Luz só se terá justificado mesmo
um cartão vermelho? Ou, na verdade, é mais fácil expulsar um jogador quando
está no FC Porto do que no Benfica?
Face ao exposto, conclui-se que pelos menos dois dos títulos conquistados
pela turma da Luz, nos últimos quatro anos, resultaram de favorecimentos
proporcionados pelas equipas de arbitragem, quer em seu benefício direto quer
em prejuízo do FC Porto. Conclui-se ainda que, para além disso, o julgamento da
agressividade de um jogador dos Dragões dá origem a penalizações diferentes do
que as geradas pela análise dessa mesma agressividade quando ao serviço do
Benfica. Com verdade desportiva, o panorama recente do futebol português seria
bastante distinto e, provavelmente, já não se falaria com tanta frequência em “fins
de ciclo” ou “novas hegemonias” – ideias que muita comunicação social gosta de
propagar, ignorando os fundamentos em que assentam as conquistas que
supostamente lhes dão corpo. Perante esta realidade, há uma questão que se
coloca: o Benfica tem sido constantemente beneficiado por mero acaso ou há
outras circunstâncias que proporcionam este “colinho”?

O CONSELHO DE ARBITRAGEM DE VÍTOR PEREIRA

Vítor Pereira foi, durante dez anos (entre 2006 e 2016), o principal rosto da
arbitragem portuguesa, primeiro como presidente da Comissão de Arbitragem da
Liga, depois como líder do Conselho de Arbitragem da FPF. Foi uma década em
que este ex-árbitro foi quase permanentemente contestado por um número
significativo de clubes, entre os quais não se inclui o Benfica. As polémicas que o
envolveram davam um livro, pelo que só daremos conta de algumas das mais
significativas.
As nomeações dos árbitros foram um dos principais objetos de crítica da
atuação de Vítor Pereira, desde logo pela forma como eram efetuadas: Pinto da
Costa revelou, em fevereiro de 2016, que apesar de a comissão de nomeações
integrar três elementos, estas eram decididas por apenas um deles, o próprio
presidente do Conselho de Arbitragem, uma vez que os restantes, discordando da
sua atuação, se abstinham em todas as votações14. Se olharmos às escolhas
efetuadas ao longo destes dez anos, encontramos inúmeros casos, no mínimo,
“estranhos”.
Por exemplo, porque é que João Capela, entre março de 2013 e fevereiro de
2016, só serviu para arbitrar jogos do FC Porto realizados fora do Dragão? E
porque é que, entre os oitos jogos dos Dragões que apitou nesse período, três
foram deslocações (tradicionalmente complicadas) à Madeira? E tem algum
significado o facto de o FC Porto ter ganho apenas três dessas oito partidas? É
apenas uma coincidência que nessa altura o mesmo juiz tenha arbitrado também
oito jogos do Benfica, que por acaso ganhou todos?
Porque é que Bruno Paixão, após ter tido influência direta na única derrota do
FC Porto em três edições consecutivas do campeonato (derrota por 3-1 frente ao
Gil Vicente, em janeiro de 2012), só quase três anos depois é que serviu para
apitar um jogo dos Dragões? E porque é que, no mesmo período, este árbitro foi
escolhido para sete jogos do Benfica? É um acaso o facto de os encarnados
apenas terem perdido uma dessas partidas e logo graças a um penálti que o juiz
“não viu” e foi assinalado por um assistente?
Como notou Pinto da Costa numa entrevista a O Jogo em fevereiro de 2015,
como é que se compreende que para o FC Porto-Vitória de Guimarães, num
momento em que as duas equipas eram líderes do campeonato em igualdade
pontual, tenha sido nomeado um árbitro como Paulo Baptista que, para além de
não ser internacional, tinha descido de divisão e sido repescado poucos meses
antes? E o que justifica que na primeira volta do mesmo campeonato o árbitro
Manuel Mota tenha apitado três jogos do FC Porto, quando vários outros
internacionais não arbitraram qualquer jogo do clube?
Não temos respostas para todas estas perguntas. Apenas registamos que o
processo e os critérios das nomeações estavam longe de ser claros e inteligíveis
pelo público em geral, e que esta aparente ausência de uma lógica nas escolhas
coincidiu com um período em que o FC Porto foi tendencialmente muito
prejudicado e o Benfica muito beneficiado.
Também estranha neste mandato foi a promoção de árbitros à categoria de
internacionais. De acordo com as regras da FIFA, podem alcançar esse estatuto os
juízes que, entre outros requisitos, “tenham arbitrado regularmente jogos da
divisão principal do seu país durante pelo menos dois anos”15, critério que não
tem eco no Regulamento de Arbitragem da FPF16. Em novembro de 2015, o
Conselho de Arbitragem concedeu este estatuto a quatro árbitros, nas seguintes
condições:

Promoção Promoção a Jogos na primeira


à 1.ª internacional liga no momento da
categoria promoção a
internacional
Fábio 2013/2014 2015/2016 12
Veríssimo
João 2014/2015 2015/2016 2
Pinheiro
Sérgio 2014/2015 2015/2016 2
Piscarreta
Tiago 2013/2014 2015/2016 14
Martins

Salta à vista uma dupla precocidade destes árbitros: por um lado, tinham
todos uma muito reduzida experiência na primeira categoria (de uma época, nos
dois primeiros casos, e de duas, nos restantes); por outro, alcançaram o estatuto
de internacionais após terem arbitrado um número de jogos muito reduzido na
primeira liga, sendo difícil conceber que se enquadrem no critério definido pela
FIFA. Muito justamente, estes juízes ficaram conhecidos por “internacionais
proveta” e são um dos mais excêntricos legados de Vítor Pereira como presidente
do CA.
Mas não foram apenas as nomeações e as promoções esquisitas que marcaram
este período. Os contactos que o principal responsável pelo CA mantinha com os
árbitros e as instruções que lhes passava também deram que falar e são
indiciadores dos interesses que o podem ter movido ao longo destes dez anos. Em
outubro de 2015, o ex-árbitro Marco Ferreira, em entrevista ao jornal espanhol
As, não teve papas na língua: “Não vou dizer que o Benfica pede ao Vítor Pereira
que fale com os árbitros para favorecer o clube. Não digo isso. O que digo é que
ele faz isso porque sabe que o Benfica é o único clube que o apoia. Por isso, não
quer que nenhum árbitro que não goste do Benfica apite os seus jogos. O Benfica
nunca falou comigo e nunca pediu para os favorecer. Mas Vítor Pereira sim.” O
antigo juiz madeirense acrescentou : “Numa semana em que eu tinha um jogo do
Benfica, ele telefonava a dizer que tinha de ter cuidado, que o jogo tinha de correr
bem. E só o fazia antes de jogos do Benfica. Nunca me telefonou antes de um jogo
do FC Porto, por exemplo. Não só a mim, mas a muitos companheiros…”. Marco
Ferreira é mesmo mais detalhado em relação ao conteúdo de alguns desses
contactos: “Nomeou-me para um Rio Ave-Benfica. Nessa semana ligou-me duas
vezes, quarta e quinta-feira. Na quinta-feira disse-me que tinha de fazer um bom
jogo, senão não me nomeava para o Benfica-FC Porto, que era em abril. Disse
que eu tinha de ter cuidado, pois ‘eram os que se queixavam’ e ‘era o jogo do
título para o Benfica’. Eu disse que não, que não era o jogo do título para o
Benfica porque levava quatro pontos de vantagem com respeito ao FC Porto. E
ele contestou-me: ‘É muito diferente jogar contra o FC Porto em abril com uma
diferença de quatro pontos e com uma de dois ou um.’ Isto, do meu ponto de vista,
é grave, porque estava claramente a referir-se ao Benfica”. As instruções de Vítor
Pereira chegariam ao ponto de recomendar uma excessiva tolerância em relação
ao comportamento do treinador encarnado: “Antes do Sp. Braga-Benfica foi mais
ou menos a mesma conversa. Disse-me que o jogo tinha de correr bem e que eu
não devia ligar ‘caso viesse ruído do banco’. Ele disse-me isso porque, no
Boavista-Benfica, expulsei o treinador do Benfica no intervalo. Vítor Pereira
tinha medo que o expulsasse outra vez”. Marco Ferreira não tem dúvidas em
relação ao impacto que estas conversas podiam ter nos seus colegas: “Eles têm
medo que Vítor Pereira acabe com as suas carreiras como acabou com a minha.
Sou um exemplo para eles daquilo que se pode passar. Eu era árbitro
internacional e nunca na história de Portugal um árbitro internacional tinha
descido à segunda categoria”17. A serem verdade, as acusações deste ex-árbitro
são gravíssimas, pois indiciam que Vítor Pereira, enquanto presidente do
Conselho de Arbitragem da FPF, estava ativamente (e não apenas passiva ou
tacitamente) ao serviço do Benfica, o que pode constituir um fator-chave para a
compreensão de escândalos como os de 2014/2015.
Estranhamente, o Conselho de Justiça da FPF não atribuiu qualquer relevância
às revelações de Marco Ferreira, tendo arquivado o inquérito a que deram
origem: “As três situações concretas que Marco Ferreira denunciou nas
declarações que prestou não indiciam, com um mínimo de objetividade, que Vítor
Pereira tivesse tentado que ele arbitrasse de modo a favorecer qualquer equipa
(no caso o Benfica), pelo que não existem razões para se instaurar qualquer
processo disciplinar nem ordenar a abertura de qualquer inquérito”18. O antigo
presidente do Conselho de Arbitragem anunciou uma queixa-crime contra o ex-
árbitro, cujo desfecho é desconhecido. Em sua defesa apareceu (quem mais
poderia ser?) Luís Filipe Vieira que, porventura numa demonstração de gratidão,
não teve dúvidas em considerar que “houve cobardia nos ataques a Vítor
Pereira”19.

A OBRA DE FERREIRA NUNES

O Conselho de Arbitragem da FPF divide-se em três secções: a profissional,


a não profissional e a de classificações. Foi à última que pertenceu José Ferreira
Nunes durante o derradeiro mandato de Vítor Pereira. Figura pouco dada a
aparições públicas, a não ser no camarote presidencial da Luz, Ferreira Nunes é
uma personagem muito importante na história recente do futebol português,
encontrando-se diretamente ligado a algumas das maiores polémicas dos últimos
anos. Damos conta de três exemplos.
No início de junho de 2013, Paulo Baptista, na altura um árbitro já experiente
(com onze épocas consecutivas de primeira categoria), classifica-se em penúltimo
lugar e é despromovido. Menos de um mês depois, é anunciado um excecional
alargamento do quadro de árbitros, justificado pelo elevado número de jogos
previsto para a temporada seguinte (o mesmo da época anterior). Esta alteração
excecional teve como consequência a manutenção de Paulo Baptista na primeira
categoria no ano em que arrancou o tetra do Benfica. Seguramente por
coincidência, este é um dos juízes que, de acordo com Adão Mendes e Pedro
Guerra, mais agradava ao clube da Luz naquele momento…
Também muito bizarra foi a história de outra despromoção, ocorrida dois anos
depois: Marco Ferreira, árbitro internacional de 38 anos, é relegado para a
segunda categoria duas semanas após ter sido nomeado para apitar a final da Taça
de Portugal e um ano depois de ter ficado apenas atrás de Pedro Proença na
classificação. Será também seguramente uma coincidência o facto de o
madeirense ter sido despromovido numa época em que arbitrou três jogos do
Benfica no campeonato, que resultaram em duas derrotas dos encarnados.
Segundo o tribunal de O Jogo, o clube da Luz não teve razões de queixa dessas
arbitragens (antes pelo contrário), mas bem sabemos quais eram, segundo Marco
Ferreira, as diligências de Vítor Pereira junto dos árbitros em vésperas de jogos
da equipa sediada em Carnide. A ligação do Benfica à despromoção deste juiz
não se fica por aqui: indignado e perplexo com o seu destino na arbitragem,
Marco Ferreira decidiu pedir uma reunião a Luís Filipe Vieira para tentar
perceber o que se passou20. À primeira vista, parece estranho que seja junto do
presidente do Benfica que um árbitro procure conhecer os motivos da sua
despromoção, cuja responsabilidade é da secção de classificações da Conselho
de Arbitragem da FPF. Se tivermos em consideração as ligações entre este clube
e Ferreira Nunes, abordadas mais à frente, a situação torna-se inteligível.
Cerca de um ano antes, outra descida associada ao Benfica, dessa vez a da
nota de um árbitro. A 10 de maio de 2014, o FC Porto recebeu os encarnados no
Dragão e venceu por 2-1. Segundo o jornal Expresso, Nuno Cabral, um delegado
da Liga que trabalhava para o clube da Luz, enviou um email a Luís Filipe Vieira
e a Paulo Gonçalves em que apontava 11 erros do juiz Rui Costa que,
alegadamente, teriam beneficiado a equipa da casa. A resposta de Vieira foi
perentória: “Paulo, devíamos participar deste artista, pois brincou com o Benfica.
Temos de dar-lhe cabo da nota”. Das palavras do presidente encarnado à prática
foi um pequeno passo: o Conselho de Arbitragem reviu a nota de Rui Costa, que
passou de 3.5 para 2.0. Segundo o jornal O Jogo, foi a maior descida de sempre21
e não há dúvidas de que esta situação completamente anómala resultou da
capacidade de influência das “autoridades” de Carnide.
Ferreira Nunes está diretamente associado a estes três casos, apesar de o seu
nome poucas vezes ter sido referido na praça pública. Se tivermos em conta a
relação estreita que sempre manteve com o Benfica, percebemos melhor como é
que tudo isto foi possível. Há diversos factos que atestam essa proximidade.
A 3 de abril de 2015, relata o Expresso, o assessor jurídico da SAD
encarnada Paulo Gonçalves comunica a Luís Filipe Vieira que precisa de
diversos convites para o jogo Benfica-Nacional, que se realizaria no dia seguinte,
dois deles destinados a Ferreira Nunes, ainda em funções no Conselho de
Arbitragem (recorde-se que o seu mandato apenas terminaria em meados do ano
seguinte). Gonçalves sugere que esses convites se destinem ao piso 1, mas o
presidente não concorda: “Ferreira Nunes pede para o CP [camarote
presidencial]”.
Cerca de um ano depois, a 2 de junho de 2016, numa altura em que Éder, a
poucas semanas de dar a Portugal o único título europeu de seleções da sua
história, se transferiu em definitivo do Swansea para o Lille, Ferreira Nunes, que
ainda não tinha deixado a secção de classificações, solicitou a Paulo Gonçalves
que elaborasse “o processo de pedido do mecanismo de solidariedade” relativo
àquela transferência, tendo em vista a compensação que o ADC Adémia, clube de
Coimbra (de onde Ferreira Nunes é natural), no qual o jogador se formou, teria
direito a receber.
Alguns meses mais tarde, em setembro de 2016, Ferreira Nunes tenciona
envolver-se numa disputa eleitoral na Associação de Futebol de Coimbra e
necessita de um parecer jurídico que demonstre que os então titulares dos órgãos
sociais daquela associação não se poderiam recandidatar. E, adivinhe-se, a quem
é que o solicita? A Paulo Gonçalves, pois claro… Na verdade, requer ao
assessor da SAD do Benfica que trate de obter o parecer, pedido que é
diligentemente atendido: o documento é elaborado por Ricardo Costa, antigo
presidente da Comissão Disciplinar da Liga, e Alexandre Mestre, ex-secretário
de Estado do Desporto, vindo a fatura a ser remetida para Paulo Gonçalves.
A 28 de fevereiro de 2017, Luís Filipe Vieira foi recebido para uma reunião
no Conselho de Arbitragem. Dois dias antes, Ferreira Nunes, qual consultor de
arbitragem do Benfica, remete um documento de quatro páginas com sugestões de
questões a abordar pelo presidente encarnado nesse encontro.
O que estes quatro exemplos revelam é que José Ferreira Nunes é uma figura
extremamente próxima do Benfica, não enquanto mero adepto, como seria seu
direito, mas como agente do futebol, em mais um caso evidente de conflito de
interesses. O que está aqui em causa não é a gravidade dos atos em si.
Obviamente, em condições normais, não há qualquer problema em que um
indivíduo ligado a um clube que nem sequer tem futebol sénior profissional, como
é o caso do Adémia, peça ajuda a alguém mais experiente para salvaguardar os
seus direitos numa transferência internacional. A questão aqui é que estas não são
condições normais. Não é normal que um elemento preponderante de um
Conselho de Arbitragem tenha uma relação tão próxima com uma figura tão
importante da SAD do Benfica. Não é normal que um membro do Conselho de
Arbitragem peça convites para o Estádio da Luz, que Paulo Gonçalves sugira que
sejam destinados ao piso 1 e que Luís Filipe Vieira indique expressamente que
devem ser para o camarote presidencial. Não é normal que meia dúzia de meses
após deixar o Conselho de Arbitragem alguém esteja a dar sugestões detalhadas
ao Benfica sobre as questões que deve levar a uma reunião desse mesmo órgão.
Nada disto é normal. E tudo isto é ainda mais anormal se tivermos em conta que
com Ferreira Nunes na secção de classificações aconteceram coisas como: 1) um
mau árbitro mas do agrado do Benfica foi impedido de descer de categoria; 2) um
árbitro bom mas não apreciado pelo Benfica foi impedido de se manter; 3) na
sequência de uma ordem de Luís Filipe Vieira, um árbitro sofreu a maior descida
de sempre de uma classificação. Como é evidente, só pode ter sido uma enorme
coincidência o facto de estas coisas terem ocorrido quando uma figura
extremamente próxima do Benfica pontificava na secção de classificações do
Conselho de Arbitragem…

OS AGENTES PERIFéRICOS: ADÃO MENDES E NUNO CABRAL

O Benfica tem ao seu serviço um conjunto de figuras que podemos designar


por agentes periféricos da arbitragem: são pouco conhecidas, a sua ligação ao
clube é informal, mas assumem um papel fundamental através da disponibilização
de informação, do aconselhamento e da atuação concreta nas suas esferas de
atividade. Até ao momento, foi possível identificar duas dessas personagens: o
ex-árbitro e antigo elemento do Conselho de Arbitragem da Associação de
Futebol de Braga Adão Mendes e o antigo delegado da Liga Nuno Cabral.
Uma troca de correspondência entre Adão Mendes e Pedro Guerra durante a
época 2013/2014, a primeira do tetra, é bastante reveladora sobre o nível de
conforto que o Benfica atingiu em relação à arbitragem. Ficamos a saber, por
exemplo, que havia naquela altura um conjunto de árbitros que, apesar de não
serem internacionais, eram muito do agrado do clube da Luz: Bruno Esteves,
Hugo Pacheco, Jorge Ferreira, Manuel Mota (cuja promoção à primeira categoria,
segundo Adão Mendes, resultou da sua própria ação), Nuno Almeida, Paulo
Baptista, Rui Silva e Vasco Santos. Era possivelmente este núcleo de juízes que
levava o ex-árbitro a considerar que “quanto às missas, temos bons padres para
todas, incluindo as da liga e as da juventude operária”. Segundo Adão Mendes,
este processo de “apuramento da raça” da arbitragem (uma expressão feliz de
José Manuel Ribeiro), que tem como uma das facetas o facto de “hoje quem nos
prejudicar [ao Benfica] sabe que é punido”, “foi conquistado com muito trabalho
do primeiro-ministro [Luís Filipe Vieira]”. De acordo com Mendes, “hoje o SLB
manda mesmo e outros já não mexem nada”. Pedro Guerra reconhece que, “na
verdade, não temos tido muita razão de queixa”. Naturalmente, não podíamos
estar mais de acordo com o diretor de conteúdos da BTV: com os oito padres
enunciados pelo seu interlocutor, naquela época o Benfica não perdeu um único
ponto, enquanto o FC Porto perdeu dez…
Mas nem só destas conversas, que indiciam um controlo pornográfico da
arbitragem pelo clube da Luz, se fazem os contactos entre Adão Mendes e os
encarnados. O antigo sindicalista de Guimarães continuou, durante bastante
tempo, a atuar como um fornecedor de informação de Pedro Guerra, a quem fazia
chegar documentos internos do Conselho de Arbitragem, análises a lances de
diversos jogos, printscreens de comentários no Facebook, entre muitas outras
coisas. É difícil compreender, portanto, a amnésia revelada pelo comentador
quando só aludiu a um contacto com Adão Mendes na final da Taça de Portugal de
2013. Também Paulo Gonçalves mantinha contactos com este agente periférico do
Benfica, e foi mesmo a ele que Mendes recorreu quando o seu filho, o árbitro de
segunda categoria Renato Mendes, teve problemas por causa de uma nota. Os
emails então trocados revelam uma grande familiaridade entre estas duas figuras.
Para além disso, confirmam que Adão Mendes era um servidor do Benfica (“peço
que ponha toda a carne no assador como eu a ponho todos os dias por nós”),
atestam a influência de Gonçalves junto dos órgãos federativos (caso contrário,
por que motivo Adão Mendes recorreria a essa figura? O que o leva a dizer com
convicção “sei que consigo vamos ganhar”?) e deixam no ar a possibilidade de
essa ascendência encarnada se verificar inclusivamente sobre o presidente do
Conselho de Arbitragem, Vítor Pereira: “Meu caro, o Vítor P. já respondeu ao
recurso do Renato e alegou que vai levar o caso a plenário. Era altura de o….”
(Adão Mendes para Paulo Gonçalves, 30 de setembro de 2014), “Vamos então…”
(Paulo Gonçalves para Adão Mendes, 2 de outubro de 2014)22.
A relação de Nuno Cabral com o Benfica tem várias semelhanças com a de
Adão Mendes: também neste caso, Pedro Guerra era um dos recetores
privilegiados de informação, mas não o único; as interações com Paulo
Gonçalves e Luís Filipe Vieira confirmam que o seu trabalho era perfeitamente
articulado com a cúpula da Luz. Em relação ao comentador da TVI e diretor de
conteúdos da BTV, Cabral funciona como um fornecedor de informação: enviou-
lhe com enorme regularidade, pelo menos entre 2014 e o princípio de 2017,
análises às arbitragens dos jogos do Benfica e documentos confidenciais da Liga
e da Federação (nomeadamente sobre a formação de árbitros). Para além disso,
em maio de 2014, remeteu a Guerra quatro mensagens que tinham como assuntos
“bastidores” (em três casos) e “pombinhos”, em que avançava com dados de
natureza pessoal sobre árbitros e membros de órgãos da Federação e da
Associação de Futebol do Porto relacionados com a disciplina e a arbitragem. O
perfil das interações de Cabral com Paulo Gonçalves e Luís Filipe Vieira não é
muito diferente, ainda que comporte elementos de maior gravidade, na medida em
que se relacionam com o exercício das funções que desempenhavam na Liga.
Assim, tanto encontramos mensagens com os mesmos relatórios sobre jogos do
Benfica e com dados da vida de árbitros e dirigentes, como queixas apresentadas
por Cabral a Paulo Gonçalves relativas às nomeações de que era objeto enquanto
delegado – reclamações a que, como vimos no capítulo anterior, era dado o
devido seguimento pelo assessor da SAD encarnada através do presidente da
Liga, Mário Figueiredo. Os esforços de Cabral tinham um propósito revelado
pelo próprio em mensagem enviada a Paulo Gonçalves na sequência de um email
anterior, que também tinha feito chegar a Luís Filipe Vieira: “Apenas quero ser
um ‘menino’ querido para vocês e fazer bem o meu trabalho”.
As figuras de Adão Mendes e Nuno Cabral são apenas dois indícios de um
esquema nebuloso de tentativa de controlo da arbitragem pelo Benfica que, ao que
tudo indica, deverá ser muito mais vasto. A sua concretização implica a
operacionalização de uma série de agentes que, espalhados um pouco por todo o
país e enquadrados numa série de estruturas dirigentes do futebol, atuam em
função dos interesses encarnados e alimentam um fluxo de informação que tem a
Luz como destino final. Trata-se daquele famoso “trabalho de formiguinha” de
que quase ninguém dá conta, mas que no final acaba quase sempre por se revelar
fundamental. Seja na vida em geral, seja num campeonato em particular…
EM RESUMO

Chegados ao final deste capítulo, importa recordar como começou: com a


demonstração cabal, baseada nas análises de um painel independente, da forma
vergonhosa como o Benfica tem ganho os últimos campeonatos, em grande medida
graças a erros de arbitragem a seu favor e em prejuízo dos seus principais
adversários. Não fossem as atuações dos juízes no campo, e o FC Porto teria
sido, com algum conforto e uma certa facilidade, campeão nacional em
2014/2015 e em 2016/2017. Estabelecido esse facto que nos parece indisputável,
colocam-se duas questões: será por acaso que o clube da Luz é muito mais
beneficiado do que os restantes? Sendo-o ou não, o que justifica esta vantagem na
competição?
Em relação à primeira pergunta, julgamos que só com muita ingenuidade se
poderá responder que sim. Como é evidente, sendo os jogos apitados por seres
humanos, a existência de erros não só é aceitável como é natural. O que não é
aceitável nem natural é que os erros sejam muitíssimos, aconteçam quase
exclusivamente num sentido e que o mesmo padrão se repita época após época. O
Benfica teria de ter bastante sorte para todos os anos ser altamente beneficiado
pelos árbitros ao mesmo tempo que os seus rivais são imensamente prejudicados.
Tanta sorte não cai do céu. Conquista-se.
O Benfica soube construir a sorte que lhe tem permitido ganhar campeonatos
através do desenvolvimento de uma rede de influências tentacular que lhe granjeia
o controlo do setor da arbitragem e que abrange tanto o seu núcleo central (o
Conselho de Arbitragem da Federação) como as suas ramificações a nível local.
Os mandatos de Vítor Pereira, a quem é inevitável associar a figura de Ferreira
Nunes, são, a esse nível, exemplares: às nomeações incompreensíveis somam-se
as descidas de árbitros que não caíam no goto do clube da Luz, as manutenções de
outros que eram do seu agrado, o “apuramento da raça” a que corresponde uma
nova geração de juízes aparentemente alinhada com os interesses encarnados, a
capacidade de fazer subir e descer notas em função dos humores de Luís Filipe
Vieira, etc. Para a conquista desse espaço, revelou-se fundamental a atuação de
uma série de agentes periféricos – de que ainda só conhecemos dois nomes,
apesar de não termos dúvidas de que serão muitos mais – com perfis muito
diversos, que tanto têm responsabilidades na promoção de novos juízes à
primeira categoria (ou seja, têm capacidade para fazer chegar ao topo do setor
árbitros que lhes transmitem segurança), como se dedicam a fazer chegar à Luz
uma massa brutal de informação que confere uma inegável vantagem ao clube de
Carnide. Em relação a outros domínios, há métodos que se repetem e que
levantam questões idênticas: porque é que o Benfica tem acesso a dados sobre a
vida pessoal e íntima dos árbitros? Que interesse objetivo tem essa informação?
É usada como e com que finalidade? Quais os resultados da sua utilização?
É esta rede de influências, fruto de um trabalho paciente do “primeiro-
ministro”, seguramente ainda mais consolidada hoje do que há três anos atrás, que
permite a Adão Mendes dizer convictamente que “hoje quem nos prejudicar sabe
que é punido” e “temos os padres que escolhemos…”. E é por causa dela que
Pedro Guerra, ao contrário dos números que gosta de desempenhar na televisão,
reconhece que, “na verdade, não temos tido razões de queixa”. Pois não, Pedro,
pois não… Com quatro campeonatos conquistados desta forma, o que poderiam
pedir mais?

13
Os dados em que nos baseámos têm origem no famoso “tribunal” do jornal O Jogo, o único órgão da
imprensa escrita que, há vários anos, dispõe de um painel de três antigos árbitros que, a cada jornada, analisam
e julgam os lances de arbitragem mais polémicos dos jogos do FC Porto, Benfica e Sporting.
14
http://www.dn.pt/desporto/fc-porto/interior/pinto-da-costa-diz-que-vitor-pereira-controla-todas-as-
nomeacoes-5045471.html
15
http://resources.fifa.com/mm/document/affederation/administration/02/82/17/33/circularno.1551-
2017fifarefereeinginternationallists_neutral.pdf
16
Segundo este documento, podem ser promovidos a internacionais árbitros que cumpram os seguintes
requisitos: “a. Seja classificado nos 12 (doze) primeiros lugares durante, pelo menos, 2 (duas) épocas
consecutivas ou seja classificado nos 12 (doze) primeiros lugares na primeira época desportiva, no caso de ter
tido média superior a 16 valores no Curso de Formação de Elite Nível 3; b. Tenha idade mínima de 25 e
máxima de 36 anos em 30 de junho do ano da indicação; c. Comprove conhecimento da língua inglesa, nos
termos definidos pelo Conselho de Arbitragem. d. Para além dos critérios acima enunciados na atribuição da
categoria, o Conselho de Arbitragem tem ainda em consideração o mérito, a experiência, o potencial, a
personalidade e a participação em cursos nacionais e internacionais”. Cf. Artigo 55 do Regulamento de
Arbitragem, disponível em: http://www.fpf.pt/Portals/0/Documentos/RegimentosRegulamentos/CO_022.pdf
17
http://www.dn.pt/desporto/benfica/interior/marco-ferreira-diz-que-vitor-pereira-lhe-pediu-para-favorecer-o-
benfica-4852671.html
18
http://www.maisfutebol.iol.pt/benfica/sporting/arquivado-inquerito-a-vitor-pereira-por-acusacoes-de-marco-
ferreira
19
http://www.record.pt/futebol/futebol-nacional/liga-nos/detalhe/vieira-houve-cobardia-nos-ataques-a-vitor-
pereira.html
20
http://observador.pt/2017/06/11/corrupcao-no-futebol-afinal-o-protagonista-da-pedro-guerra-foi-marco-
ferreira/
21
http://www.ojogo.pt/futebol/noticias/interior/nota-de-rui-costa-no-fc-porto-benfica-teve-a-maior-descida-de-
sempre-8583155.html
22
Estas transcrições correspondem integralmente aos emails trocados, não podendo ser alegada qualquer
manipulação ou descontextualização da informação.
Quando, no dia 14 de julho de 2017, o Expresso, o Jornal de Notícias e O
Jogo divulgaram o acórdão do Conselho de Justiça da Federação Portuguesa de
Futebol que ilibou Jorge Nuno Pinto da Costa e o FC Porto de todas as acusações
que lhes tinham sido movidas no âmbito do processo “Apito Final”, caiu por terra
uma das maiores encenações de que o futebol português foi palco ao longo dos
últimos anos. E, para além disso, confirmou-se juridicamente uma ideia que não
podia deixar de assaltar qualquer adepto comum: a justiça desportiva que tem
sido praticada em Portugal, muito mais vezes do que seria suposto e aceitável,
não tem sido justa. Mas o “Apito Final”, infelizmente, é apenas a ponta de um
icebergue. A história dos últimos 15 anos de justiça desportiva em Portugal é,
também ela, uma história de favorecimento do Benfica em detrimento do FC Porto
e de outros rivais.

A ABERRAÇÃO DO “APITO FINAL”

O processo “Apito Final” é a extensão no domínio da justiça desportiva do


famoso “Apito Dourado”, iniciado em abril de 2004, a partir de uma investigação
ao Gondomar Sport Clube. Rapidamente se percebeu que esta era, na verdade,
uma operação que tinha um alvo bem definido e enquadrado numa geografia muito
delimitada: pretendia-se atingir o futebol do Norte, em geral, e os seus dois
principais clubes, o FC Porto e o Boavista, em particular, investigando uma série
de práticas em função do espaço onde se realizaram. São muitas as originalidades
jurídicas e judiciais do “Apito Dourado” que ajudam a confirmar esta tese: por
determinação expressa do procurador-geral da República, o poder de controlo
hierárquico deste processo não coube ao procurador no círculo do Ministério
Público, como seria natural, mas a um procurador-geral distrital adjunto; em
2007, na sequência do lançamento do livro de Carolina Salgado, foi criada, no
Ministério Público, uma Equipa de Coordenação do Processo Apito Dourado,
liderada por Maria José Morgado; pouco depois, após um primeiro arquivamento
de todas as acusações, assiste-se a uma reabertura programada do processo, que
tem a referida obra como fundamento; apenas uma pequena parte das escutas
telefónicas realizadas foi objeto de apreciação, nunca tendo sido alvo de
investigação aquelas que envolviam o presidente do Benfica; para além disso,
uma seleção muito criteriosa dessas escutas foi passada por algum elemento do
aparelho judicial para o Youtube e para o Correio da Manhã.23 Apesar destas
anomalias, importa salientar o resultado final deste processo: tanto o FC Porto
como os seus dirigentes foram ilibados de todas as acusações e suspeições que
sobre eles impenderam, apesar de terem sido sujeitos a um escrutínio ímpar na
história da justiça portuguesa. Escrutínio esse que, ao contrário do que muitas
vezes é dito, incluiu a consideração das escutas telefónicas a Pinto da Costa, que
foram precisamente um dos instrumentos fundamentais da sua absolvição –
ninguém foi tão escrutinado em 43 anos de regime democrático como Jorge Nuno
Pinto da Costa, e hoje não parece difícil concluir que o único crime que lhe
podem apontar é ser presidente do FC Porto há 35 anos, período em que tornou o
clube de uma pequena cidade da periferia num dos grandes da Europa.
A transposição deste processo da justiça civil para a desportiva é
impulsionada pela tomada de posse de uma nova Comissão Disciplinar da Liga,
presidida por um então anónimo Ricardo Costa, que viria a ficar popularmente
conhecido como “o benfiquista de Canelas”, a 2 de outubro de 2006. Na altura, a
Liga liderada por Hermínio Loureiro definiu um objetivo claro: resolver o caso
“Apito Dourado”, rebatizado de “Apito Final” para efeitos de justiça desportiva,
em menos de seis meses. E a CD da Liga começou logo a tratar disso, atuando em
vários domínios: por um lado, cultivando a imagem pública do seu presidente,
numa estratégia clara de tentativa de credibilização – era apresentado como um
aluno brilhante, um professor de vocação, o detentor da maior biblioteca
portuguesa de Direito desportivo, o homem imperturbável que ninguém teria
capacidade de influenciar, etc.; por outro, começando a apreciar material surgido
pouco tempo antes, na sequência do levantamento do segredo de justiça do
processo-crime; pelo meio, o “benfiquista de Canelas” ia viajando até Itália para
se inteirar dos contornos do escândalo calciocaos.
O novo material que viria a estar na base do “julgamento” de Ricardo Costa
era constituído essencialmente por três elementos: a obra Eu, Carolina, assinada
por Carolina Salgado mas redigida por uma professora de Português e por Leonor
Pinhão; a certidão dos depoimentos em tribunal de Carolina Salgado; e a
transcrição de escutas telefónicas realizadas no quadro do processo-crime.
Consideradas no âmbito da justiça civil, estas três peças processuais ajudaram a
fundamentar a absolvição de Pinto da Costa. Na justiça desportiva, aconteceu
precisamente o oposto. Como é que isso foi possível?
A resposta é simples: Ricardo Costa ignorou princípios fundamentais do
Direito e utilizou a seu bel-prazer pseudoprovas, que soube manobrar em função
dos objetivos que pretendia atingir. E se é da natureza humana que cada um vê
aquilo que quer ver, não é aceitável que alguém a quem cabe aplicar a justiça se
esforce por ver o que não existe e por não ver o que não lhe interessa. O resultado
desta atuação dirigida de acordo com um propósito claro foi um conjunto de
procedimentos que só podem ser classificados como aberrações jurídicas e
disciplinares, de que são exemplos:
1. O recurso a escutas telefónicas – no âmbito da investigação e do
processo-crime do “Apito Dourado”, foram legalmente escutados
diversos suspeitos, e essas escutas foram objeto de análise e apreciação.
De acordo com vários juristas, que os tribunais viriam a confirmar, não é
aceitável, contudo, que as mesmas escutas sejam utilizadas no quadro de
um processo disciplinar que não tem o mesmo valor de um processo-
crime da justiça civil.
2. A ausência de contraditório – os visados nas escutas telefónicas,
nomeadamente o presidente do FC Porto, não tiveram acesso às “provas”
que lhes diziam respeito e muito menos tiveram oportunidade de as
contestar, como deve acontecer em qualquer processo judicial ou
disciplinar.
3. A consideração acrítica do testemunho de Carolina Salgado – a antiga
companheira de Pinto da Costa, na sequência da obra que foi publicada
em seu nome, prestou depoimentos em tribunal que desde logo se
revelaram inconsistentes, incoerentes e contraditórios entre si. Por esses
motivos, não foram considerados credíveis pela justiça civil. Ricardo
Costa, pelo contrário, tomou-os como seguros, de novo, sem os sujeitar à
contestação dos visados.

Foi neste quadro de “justiça a brincar” que a Comissão Disciplinar da Liga,


nas sessões de 6 e 7 maio de 2008, considerou provada a prática de “corrupção
da equipa de arbitragem”, na forma tentada, pelo FC Porto, que acabou
condenado à perda de seis pontos na época desportiva de 2007/2008, enquanto ao
seu presidente era aplicada uma pena de suspensão por dois anos24.
Esta decisão era passível de recurso para o Conselho de Justiça da FPF e
Ricardo Costa não teve qualquer pejo em afirmar publicamente que estava seguro
de que o resultado das diligências por si promovidas seria confirmado por esta
instância superior. O FC Porto, no entanto, trocou-lhe as voltas com uma escolha
que na altura foi incompreendida por muitos: optou por não recorrer, evitando
assim a possibilidade de a perda de seis pontos ter impacto na temporada
seguinte (e não na que acabava de terminar, em que o clube tinha sido campeão
com 20 pontos de avanço); para além disso, alegou que o recurso apresentado
individualmente por Pinto da Costa, por dizer respeito exatamente aos mesmos
factos que eram apontados ao clube, em caso de absolvição, teria como
consequência a ilibação do FC Porto. Ou seja, não recorrendo formalmente, o FC
Porto acabava por recorrer, na prática, através da figura do seu presidente. Caía
assim por terra a possibilidade, que com certeza estaria na mente da Comissão
Disciplinar da Liga, de o clube iniciar o campeonato de 2008/2009 com seis
pontos negativos. Mais tarde veio a confirmar-se que, face às circunstâncias, este
foi o melhor caminho.
O recurso apresentado por Pinto da Costa ao CJ da FPF foi apreciado a 4 de
julho de 2008, na reunião mais surreal da história do desporto português. Segundo
a sua ata, na sequência de uma altercação relevante entre os membros deste órgão,
o seu presidente decidiu dar por encerrada a sessão ainda antes de ser tomada
qualquer decisão. No entanto, cinco membros do CJ, à revelia do presidente e do
vice-presidente, decidiram encenar um simulacro de reunião, que acabou por
indeferir o recurso do presidente do FC Porto (para além de, entre outras
decisões, ter confirmado a descida de divisão do Boavista). Já de madrugada, foi
Álvaro Baptista – à data, o vogal do CJ que desempenhou o papel de “usurpador”
da função de presidente e que hoje é membro do Conselho de Disciplina da FPF e
deputado do PSD – que deu conta das “sentenças” à comunicação social, com
pompa e circunstância. Estava consumada a farsa: o FC Porto perdia seis pontos
no campeonato e o seu presidente era suspenso por dois anos, “decidiu” um órgão
da FPF numa reunião que o seu principal responsável considerou que não tinha
existido.
O FC Porto reagiu em comunicado no dia seguinte, anunciando a apresentação
de uma reclamação no Tribunal Administrativo e destacando que “a urgência
revelada por estes membros do CJ leva a questionar a sua verdadeira motivação,
facilmente percetível, atenta a forma precipitada e atabalhoada com que esta
‘manobra de diversão’ foi artificialmente criada”. O ataque ao futebol do Norte
continuava e já incluía, até, reuniões-fantasma.
Mas a quem é que interessava que o Conselho de Justiça da FPF negasse tão
rapidamente o provimento do recurso de Pinto da Costa? Ao Benfica, claro. E
porquê? Porque o Benfica tinha terminado a época na quarta posição, fora da Liga
dos Campeões. A estratégia do clube de Lisboa era simples: através da
condenação do FC Porto pretendia-se afastar os Dragões das competições
europeias, conseguindo-se dessa forma que o Benfica fosse repescado para o
playoff, no lugar do Vitória de Guimarães, que por sua vez ocuparia o lugar do
FC Porto, que estava apurado como campeão para a fase de grupos, bem como o
Sporting, que tinha sido segundo classificado.
E a verdade é que, vaidosa, a Federação Portuguesa de Futebol, através de
João Leal, já tinha enviado para a UEFA a informação de que o FC Porto tinha
sido condenado, mas omitindo, por exemplo, que o clube beneficiava, como se
viria a comprovar, do recurso de Pinto da Costa. Em primeira instância, e para
deleite da comunicação social mais parcial, a UEFA afastou os Dragões da Liga
dos Campeões, obrigando o clube a recorrer ao Comité de Apelo dessa
organização, que reverteu a decisão e recolocou o clube entre os participantes na
prova. Com o caso fora da órbita das instâncias nacionais, em que as decisões
eram tomadas mediante interesses particulares, não restou alternativa ao Benfica,
e ao novel aliado Vitória de Guimarães, se não recorrer para o Tribunal Arbitral
do Desporto (TAS, de acordo com a designação em francês), sediado na Suíça.
Pela segunda vez e em poucos dias, uma instância de justiça internacional iria
debruçar-se sobre o caso, o que obrigou o departamento jurídico do FC Porto a
viajar para a Suíça. Lá, o administrador Adelino Caldeira manteve a estratégia de
defesa antes traçada e que hoje se percebe ter sido a que melhor segurou os
interesses do clube, porque o deixou a salvo das artimanhas de Ricardo Costa e
de outros personagens mais ou menos secundários. Em Lausanne, Adelino
Caldeira contratou o advogado suíço Antonio Rigozzi, que apresentou a defesa do
clube perante os juízes Ulrich Hass (Alemanha), Efraim Barak (Israel) e Olivier
Carrard (Suíça). A decisão foi conhecida ao final da manhã do dia 15 de julho,
com o TAS a rejeitar os recursos do Benfica e do Vitória de Guimarães e a
confirmar a participação do FC Porto na Liga dos Campeões. Este desfecho foi
uma grande vitória para o FC Porto e iniciava um longo caminho de sucessivos
triunfos em diferentes instâncias de justiça, com exceção da chamada justiça
desportiva nacional, que há muito tinha decidido condenar o FC Porto e o seu
presidente. E foi nesse puzzle que surgiu um parecer de Freitas do Amaral, a
defender a legalidade das decisões da já referida reunião clandestina do
Conselho de Justiça. Foi com base nesse documento que a FPF encontrou
justificação para manter os castigos de Pinto da Costa e do FC Porto; também por
essa via o Boavista desceu de divisão, decisão que anos mais tarde viria a ser
revertida.
Como a justiça tarda mas, normalmente, acaba por chegar, ao longo dos anos
foram sendo conhecidos vários acórdãos dos tribunais, que tiveram um
denominador comum: a absolvição do FC Porto e dos seus dirigentes. Foi assim
em relação ao “Apito Dourado”, com o clube a ser ilibado de tudo, e em relação
ao “Apito Final”, com as deliberações da justiça desportiva a serem
permanentemente colocadas em causa. A 6 de maio de 2011, o Tribunal
Administrativo de Lisboa considerou irregular a segunda parte da reunião do CJ
de julho de 2008, determinando “a eficácia das decisões do presidente do
Conselho de Justiça registadas na ata da reunião de 4 de julho de 2008 desse
conselho e a legalidade da decisão de encerramento dessa reunião pelas 17 horas
e 55 minutos”. Para além disso, julgou “inexistente a pretensa decisão de
continuação da mesma reunião, proferida pelos vogais do Conselho de Justiça,
conselheiros Francisco Mendes da Silva, Álvaro Baptista, Eduardo Santos
Pereira, João Carrajola de Abreu e José Salema dos Reis e, em consequência,
inexistentes as deliberações por estes tomadas depois do encerramento da
reunião”. Tendo sido objeto de recurso, esta decisão transitou em julgado em
dezembro de 2016, quando o Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa a
confirmou definitivamente.
Este último ato teve como consequência a reentrada em cena do Conselho de
Justiça da FPF, nove anos depois da reunião-fantasma. Uma vez que essa sessão
foi considerada nula, a verdade é que o recurso apresentado por Pinto da Costa
continuava por julgar, pelo que foi objeto de reapreciação. O acórdão emitido a 5
de julho de 2016, para além de ser coerente em relação a todas as decisões da
justiça civil sobre o “Apito Dourado”, desfere uma última machadada na já
reduzida credibilidade da Comissão Disciplinar da Liga presidida por Ricardo
Costa, entre 2006 e 2010. Destacam-se passagens como: “Entendemos que os
dispositivos legais citados não permitem outra conclusão que não seja a de que é
nula a utilização de escutas telefónicas em processos disciplinares, mesmo que a
sua obtenção seja ou tenha sido legal, por respeitar a crime de catálogo e tenha
sido autorizada por um Juiz de Instrução Criminal”; “(…) face à falta de
credibilidade da mencionada testemunha [Carolina Salgado], não podemos deixar
de considerar que se estabelece uma dúvida insanável sobre se houve ou não
entrega de qualquer quantia ou sequer ‘prenda’ pelo ora recorrente Pinto da Costa
ao recorrente Augusto Duarte”; “não se provaram quaisquer factos integradores
dos ilícitos de que vinham acusados os ora recorrentes Jorge Nuno de Lima Pinto
da Costa e Augusto José Bastos Duarte”; “(…) a coarguida sociedade desportiva
‘Futebol Clube do Porto – Futebol, SAD’ também beneficia da presente decisão
absolutória, razão pela qual é revogada a condenação que lhe foi imposta no
acórdão ora referido”25.
Qual o balanço do “Apito Final”? Assistiu-se à atuação da justiça a duas
velocidades: ao mesmo tempo que a justiça civil, de acordo com os princípios da
legalidade, ia ilibando o FC Porto e o seu presidente de todas as acusações, a
justiça desportiva portuguesa, à revelia, ia tomando decisões contraditórias, que
não denotavam mais do que uma sanha persecutória em relação ao clube azul e
branco. Face à dimensão das aberrações jurídicas em causa, é difícil não
acreditar que a Comissão Disciplinar da Liga presidida pelo “benfiquista de
Canelas” e o Conselho de Justiça-fantasma da FPF não tenham atuado em função
de uma agenda própria, que só poderia ter como fim último o prejuízo desportivo
do FC Porto. A verdade é que o caso “Apito Dourado”/”Apito Final” foi avaliado
por muitas instâncias judiciais, desde os chamados tribunais comuns até às mais
altas instâncias de recurso, sem esquecer o Comité de Apelo da UEFA e o TAS.
Todas absolveram o FC Porto, com duas únicas exceções: a Comissão
Disciplinar da Liga, presidida por Ricardo Costa, e a versão clandestina do
Conselho de Justiça da FPF. Estes factos, por si só, chegam e sobram para deixar
claro o colossal erro de Ricardo Costa, que sobrepôs o seu “benfiquismo” ao
exercício da justiça. Ou será que todos os juízes que analisaram e ditaram
sentença sobre este caso estão errados? O silêncio de anos de Ricardo Costa
sobre estas matérias soa a uma genuína confissão.

UM LONGO HISTÓRICO DE INJUSTIÇAS

Como já dissemos, o “Apito Final” não passa da ponta visível de um


icebergue constituído por um conjunto muito maior e mais profundo de situações
anómalas no plano da justiça desportiva, de que o FC Porto tem sido vítima, pelo
menos, nos últimos 15 anos – uma cronologia que, curiosamente, coincide com a
declaração de Luís Filipe Vieira sobre a necessidade de controlo de lugares da
Liga pelo Benfica… Recordemos alguns exemplos.
Decorria a época 2004/2005, em que os encarnados venceram o campeonato
da forma que já tivemos oportunidade de observar no capítulo anterior, quando,
em janeiro, surgiu uma novidade no panorama da justiça desportiva portuguesa:
os processos sumaríssimos. Tratava-se de um procedimento disciplinar especial,
que resultava da iniciativa da Comissão Disciplinar da Liga, e que tinha como
objetivo aplicar a justiça em casos de infrações graves que não tivessem sido
objeto de análise e/ou penalização pelas equipas de arbitragem. À primeira vista,
esta nova prática não tinha nada de condenável. Pelo contrário, com recurso a
imagens televisivas seria possível castigar jogadores que o mereciam, na
sequência de ações (por exemplo, agressões) que os árbitros não tinham visto ou
não tinham tido capacidade para julgar corretamente. Seria assim, claro, caso
estes processos fossem como o sol, que quando nasce é para todos…
Entre janeiro e maio de 2005, os processos sumaríssimos movidos a
jogadores do FC Porto resultaram na suspensão de quatro atletas: Benni
McCarthy (três jogos de suspensão), Luís Fabiano (um jogo), Pedro Emanuel
(dois jogos) e Seitaridis (dois jogos). Ao Benfica apenas foi aberto um processo
deste tipo, relativo a uma agressão de Simão Sabrosa, que – surpresa das
surpresas! – não sofreu qualquer castigo. O uso e abuso deste mecanismo em
relação a jogadores portistas foi de tal forma maquiavélico que chegou ao ponto
de, no caso do avançado sul-africano, uma reclamação da penalização inicial de
dois jogos ter dado origem a um agravamento da pena, que passou para três. Por
coincidência, a partida de castigo que foi adicionada tratava-se do jogo no
Dragão contra o Benfica, com quem o FC Porto disputava o título. Em novo
recurso, o Conselho de Justiça da FPF viria a dar razão aos Dragões, permitindo
que McCarthy defrontasse os encarnados – e seria este mesmo jogador que viria a
marcar o golo azul e branco no empate a uma bola.
Se dúvidas houvesse em relação ao conforto do Benfica com estes novos
métodos da Comissão Disciplinar da Liga, as declarações de José Veiga, à data
responsável pelo futebol desse clube, são suficientemente esclarecedoras: “Pela
primeira vez, a CD da Liga está a funcionar como deve ser. O sr. Jorge Nuno
[Pinto da Costa] ainda não percebeu que as coisas mudaram e que as pessoas não
têm medo de tomar as decisões mais justas para o futebol nacional”26. Quase dez
anos antes de Adão Mendes anunciar com convicção que “hoje o SLB manda
mesmo e outros já não mexem nada”, já Veiga comunicava ao mundo que as
coisas estavam diferentes, como quem diz que “hoje quem nos prejudicar [ao
Benfica] sabe que é punido”. À distância de 12 anos, as palavras deste antigo
presidente da casa do FC Porto no Luxemburgo tornam-se particularmente
deliciosas. Naquela altura, Veiga não teve qualquer pejo em considerar que Pinto
da Costa andava “muito nervoso desde que está envolvido em processos de
apitos”. Curiosamente, o presidente portista foi ilibado de absolutamente tudo em
que o seu nome foi envolvido, tanto na justiça civil como na desportiva (ainda
que, neste caso, com uma década de atraso). Já o então diretor do futebol do
Benfica tem no seu cadastro condenações por fraude fiscal e acusações de outros
crimes graves que não o livraram de passar uns bons tempos na prisão.
Se avançarmos até agosto de 2008, encontramos o célebre caso do “Diabo de
Gaia”. Num Benfica-FC Porto disputado à segunda jornada, durante a primeira
parte, um icónico adepto encarnado entrou em campo e agrediu o árbitro
assistente José Ramalho, apertando-lhe o pescoço. Desde logo se levantou a
possibilidade de o Estádio da Luz vir a ser interditado na jornada seguinte, frente
ao Sporting, à imagem do que é costume acontecer no estrangeiro perante
situações similares. A Comissão Disciplinar de Ricardo Costa, no entanto,
resolveu tudo com uma singela multa de 7000 euros.
Mais perto do final desta época, encontramos novo caso flagrante, revelador
de uma justiça que sofre do mal fatal de ter dois pesos e duas medidas. A 2 de
abril de 2009, foi anunciada a suspensão por um jogo do avançado portista
Lisandro López, acusado de ter simulado um penálti numa partida frente ao
Benfica. Foi um castigo inédito, alicerçado numa norma de 2007, que até à data
nunca tinha sido aplicada e que jamais viria a sê-lo. Esta circunstância permite
que se coloque uma pergunta absurda: na história recente do futebol português
apenas houve um lance de simulação que deu origem a um penálti? Como,
evidentemente, a resposta é negativa, só se pode compreender esta penalização à
luz de um fator que tem sido constante na justiça desportiva portuguesa: a
perseguição ao FC Porto e aos seus atletas. A este caso concreto não será alheio o
facto de a Comissão Disciplinar da Liga ser, à data, presidida pelo “benfiquista
de Canelas”. E, possivelmente, também terá sido tido em consideração o facto de
o FC Porto se encontrar na liderança da Liga, a sete jornadas do fim, com quatro
pontos de vantagem sobre o Sporting e cinco sobre o Benfica, numa altura em que
Lisandro era um dos melhores marcadores da equipa.
Na época seguinte, novo escândalo. À 14.ª jornada, o FC Porto desloca-se à
Luz e perde por 1-0, com o golo de Saviola a ser marcado em fora de jogo. No
entanto, o grande destaque da partida é a ocorrência de incidentes no túnel que
envolvem jogadores portistas e assistentes do recinto desportivo (stewards)
encarnados. Ricardo Costa entra em ação dois dias depois e decreta a suspensão
preventiva de Hulk e de Sapunaru: até que se apurasse devidamente o que
aconteceu, os dois atletas azuis e brancos estavam impedidos de representar a sua
equipa. A 19 de fevereiro, a Comissão Disciplinar anunciou o seu veredito:
quatro meses de ausência para Hulk e seis para Sapunaru. No total, o avançado
brasileiro, indiscutivelmente um dos melhores jogadores da equipa e do
campeonato, foi impedido de participar em 17 jogos. No entanto, uma vez mais,
veio a verificar-se que o órgão disciplinar liderado pelo “benfiquista de Canelas”
atuou à margem dos regulamentos, considerando indevidamente que os stewards
eram agentes desportivos (como são os jogadores, os treinadores, os árbitros,
etc.). A moldura penal aplicável aos jogadores portistas era, na verdade, bastante
mais estreita e, em dezembro de 2010, seis meses após o final da época anterior,
foram anunciados os castigos definitivos: três jogos de suspensão para Hulk e
quatro para Sapunaru. Ou seja, o brasileiro devia ter falhado três jogos, mas
graças a Ricardo Costa esteve ausente 17. Ainda recentemente, Jesualdo Ferreira
considerou, com razão, que “se não fosse o caso do túnel, teria sido tetracampeão
no FC Porto”27.
Chegamos finalmente à época 2016/2017, também pródiga em castigos aos
azuis e brancos. A 7 de março de 2016, foi aplicada uma multa de 765 euros ao
FC Porto pelo facto de os seus adeptos terem entoado num jogo os cânticos “E
quem não salta é lampião” e “Filhos da p***, SLB”. No mesmo dia, ao Sporting
foi aplicada uma sanção de exatamente metade desse valor por cânticos como
“Vitória é m****” e “Filhos da p***”. O que impressiona aqui é a
desproporcionalidade dos castigos, para além do absurdo de ser alvo de censura
uma frase como “e quem não salta é lampião”, que, sendo jocosa, não é
propriamente ofensiva, insultuosa ou incitadora de violência. Tudo se torna mais
ridículo, claro, se tivermos em conta que o Benfica não foi alvo de qualquer
sanção na sequência de cânticos dos seus adeptos, que frequentemente dirigem
aos adversários palavras do mesmo nível daquelas que motivaram as
penalizações aos dois principais rivais.
Em termos de castigos, contudo, a principal novidade da parte final da época
passada foram as sanções aplicadas a um dos autores destas linhas, Francisco J.
Marques, por declarações que proferiu enquanto diretor de informação e
comunicação do FC Porto. Até ao momento em que escrevemos, já foi objeto de
duas suspensões, uma de 44 e outra de 76 dias, ambas na sequência de
considerações tecidas na newsletter do clube, o Dragões Diário. Uma vez mais,
o que está em causa não é a justiça das penas em função do caso concreto, apesar
de ser sempre muito questionável qualquer castigo que coloque em causa o
princípio constitucional do direito à liberdade de expressão, mas a diferença de
tratamento em relação a figuras de outros clubes. Principalmente se tivermos em
consideração que o Benfica teve um diretor de comunicação durante oito anos que
se distinguiu não só por uma quantidade inusitada de declarações públicas, mas
também pelo teor impactante de várias delas, de que são exemplo frases como “o
título do FC Porto é um tributo dos árbitros”, “a classificação está aldrabada por
influência direta dos árbitros” ou “não temos de mudar de treinador, temos é de
mudar de árbitros”. Por estas palavras, João Gabriel foi castigado com zero dias
de suspensão…

RELAÇÕES BEM TRABALHADAS

Mais difícil do que dar conta das injustiças do futebol português é tentar
perceber o que as justifica. Se é evidente que ao longo dos últimos anos o FC
Porto tem sido sucessivamente prejudicado em matérias de justiça desportiva –
ao contrário do Benfica –, perceber o que está na origem desse fenómeno exige a
análise de outros fatores que, à primeira vista, poderão não ser tão evidentes.
A construção deste cenário implica, antes de mais, a colocação das pessoas
certas nos lugares certos. Regressamos, de novo, à afirmação de Luís Filipe
Vieira sobre os lugares na Liga, que mais não é do que o reflexo de um programa
político global de controlo do futebol nacional. No caso concreto da disciplina,
esse projeto concretizou-se plenamente com a eleição de Ricardo Costa para a
liderança da Comissão Disciplinar da Liga, como já percebemos pelas passagens
anteriores. Durante quatro anos, assistiu-se a uma sucessão de equívocos de tal
forma recorrentes, descarados e unidirecionais que só podem ser explicados por
três motivos: 1) uma ignorância jurídica que o currículo académico do
“benfiquista de Canelas” torna inverosímil; 2) um fanatismo clubístico inibidor de
qualquer racionalidade; 3) uma atuação em função de uma agenda político-
desportiva própria ou alheia, que não tinha em consideração os princípios da
equidade, legalidade e transparência. Porque temos perfeita noção de que ser
adepto de um clube implica um compromisso emocional muito forte, e porque
sabemos que mesmo enquanto desempenhou funções como presidente da CD da
Liga Ricardo Costa frequentava regularmente o Estádio da Luz, ainda que
incógnito, só nos podemos inclinar para a segunda opção…
Para além do controlo destes lugares-chave, o Benfica tem sido bastante
eficaz em exercícios de sedução de decisores disciplinares. Exemplos disso são
as ofertas de convites para jogos na Luz, reveladas pelo Expresso a 24 de junho
de 2017, que em vários casos tiveram como beneficiários membros do Conselho
de Disciplina da FPF. Naturalmente, a cedência de convites, em si, não é um
problema, mas este caso é especial. Por um lado, o facto de vários elementos
desse órgão disciplinar procurarem recorrentemente obter ingressos para assistir
a jogos em casa dos encarnados é indiciador da existência de um vínculo, pelo
menos emocional, entre eles e o Benfica. O que, como é evidente, também é
legítimo. O que não é legítimo é que alguém se aproveite do exercício de uma
função que exige equidistância em relação a todos os clubes para alimentar
preferências clubísticas que são individuais e que não podem ser, de forma
alguma, associadas ao desempenho de tarefas no domínio da justiça. Por outro
lado, estas ofertas não são aceitáveis se tivermos em conta o que as justifica. Num
dos emails divulgados pelo Expresso, Paulo Gonçalves fundamenta a cedência de
convites a membros do CD para o Benfica-Juventus de 2014: “Como livraram o
JJ [Jorge Jesus] da suspensão aplicando somente uma multa pela expulsão
aquando do SLB x FCP, ficaram cheios de moral”. Ou seja, é um benefício do
órgão disciplinar aos encarnados que justifica a oferta, numa lógica que só parece
poder ser entendida como de troca ou retribuição de favores.
A relação entre convites para jogos do Benfica e benefícios à equipa da Luz
perante a justiça fica mais clara se analisarmos as sugestões de ofertas de
convites para acompanhar o Benfica na final da Liga Europa de 2014 (derrota
frente ao Sevilha, em Turim), que foram apresentadas por Paulo Gonçalves a Luís
Filipe Vieira. Entre os beneficiários encontravam-se Nuno Cabral, à data
delegado da Liga, e Emídio Fidalgo, “responsável pela nomeação dos delegados
na Liga e decisivo nos pareceres que emitiu…”. Ou seja, tendo o Benfica
beneficiado, seguramente, da intervenção de Emídio Fidalgo no plano disciplinar,
no âmbito das funções que exercia na Liga, decidiu premiá-lo com uma oferta que,
neste caso, tem até um valor material relevante, pois incluía viagens e alojamento,
para além do ingresso para assistir ao vivo a uma final europeia.
Novo email de 2016 prova que esta prática era recorrente. João Pedro Simões
Dias, antigo delegado da Liga, solicita entradas para um jogo na Luz contra o
Nacional da Madeira, mostrando disponibilidade para as pagar. Paulo Gonçalves
transmite instruções para que sejam cedidas: “Desenrasca por favor. Ele era
também delegado da Liga e foi suspenso por dois anos após um processo
disciplinar instaurado então pela CD da Liga por não ter relatado uns fatos (sic)
no túnel de acesso aos balneários aqui no Estádio da Luz. Com essa omissão,
safou-me a mim e ao Nuno Gomes de uma sanção, mas lixou-se. É boa gente,
benfiquista indefetível e sempre foi defensor na blogosfera do nosso estimado
líder”. As palavras do assessor jurídico da SAD do Benfica são suficientemente
claras para quase dispensarem explicações. Neste caso, com a oferta de bilhetes,
pretendia-se retribuir: 1) uma ação deliberada de um delegado da Liga em
benefício do clube de Carnide; 2) o benfiquismo “indefetível” desse antigo agente
desportivo; 3) o culto do “estimado líder” Luís Filipe Vieira, promovido pela
mesma figura na blogosfera.
Se dúvidas ainda houvesse sobre a pertinência e legitimidade deste tipo de
ofertas, o presidente da FPF, Fernando Gomes, e o líder da sua Comissão de
Disciplina, José Manuel Meirim, trataram de as esclarecer recentemente. A 7 de
julho deste ano, soube-se que o principal responsável federativo “enviou uma
carta aos presidentes dos órgãos sociais da federação a recordar que os seus
integrantes não podem, por regra, solicitar qualquer tipo de oferta a qualquer
agente desportivo, mesmo que seja um bilhete para um jogo de futebol. Na
prática, Fernando Gomes quer assegurar que não há elementos dos órgãos sociais
da federação em estádios de futebol. Para o líder federativo, não existe qualquer
vantagem para o exercício de funções ao nível de arbitragem, disciplina ou justiça
na presença de elementos destes órgãos nas tribunas dos estádios”28. Na mesma
data, também foi divulgado que José Manuel Meirim, no princípio da temporada
2016/2017, proibiu os membros da Comissão de Disciplina de assistirem a jogos
de futebol a convite dos clubes, procurando concretizar assim um esforço de
credibilização do exercício daquelas funções. São os principais responsáveis
pelo setor, portanto, que com estas atitudes confirmam que a prática encarnada
neste domínio está longe de ser recomendável.
Tendo todos estes elementos em conta, torna-se mais inteligível o quadro de
benefícios permanentes ao Benfica e prejuízos impostos ao FC Porto, que tem
marcado o panorama da justiça desportiva portuguesa ao longo dos últimos anos:
o clube da Luz, para além de ser muito eficaz a fazer chegar as pessoas certas aos
lugares certos, é também bastante generoso a premiar ilegitimamente todos
aqueles que contribuem para a sua quase imunidade disciplinar.

EM RESUMO

O cenário recente da justiça desportiva portuguesa é desolador. Este setor


padece de um mal que dificilmente poderá ser sanado tão cedo: a perceção
pública – bem fundamentada – de que a justiça é injusta.
O caso “Apito Final” é, a todos os títulos, o exemplo maior do que não pode e
não deve ser feito. Durante vários anos, ao arrepio dos princípios básicos do
Direito, as instâncias desportivas seguiram caminhos muito diferentes –
antagónicos, até – dos da justiça civil. Como resultado, os mesmos factos e as
mesmas provas que justificavam absolvições sucessivas nos tribunais (com as
decisões de primeira instância a serem sempre confirmadas em sede de recurso)
davam origem a condenações não fundamentadas quando o julgador investia mais
na promoção da sua imagem pública do que na fundamentação das suas decisões.
Evidentemente, a “justiça a brincar” não podia acabar por prevalecer e as suas
ações vieram todas a revelar-se, no longo prazo, improcedentes e inconsequentes
em termos legais. A mancha na credibilidade da justiça perante a opinião pública,
contudo, dificilmente será apagada tão cedo.
Mais difícil se torna a recuperação da credibilidade deste setor se tivermos
em conta que, para além do “Apito Final”, na última década e meia também se
assistiu a um espetáculo disciplinar que teve como principal característica, em
geral, a ausência de equidade no julgamento dos diferentes clubes e, em
particular, uma sucessão de julgamentos em prejuízo do FC Porto e em benefício
do Benfica. É muito difícil que alguém venha alguma vez a acreditar numa justiça
que condena uma pessoa a 76 dias de suspensão por dizer que “a verdade
desportiva foi grosseiramente adulterada” por um árbitro quando, poucos anos
antes, um indivíduo que exercia exatamente as mesmas funções noutro clube disse
que a “classificação está aldrabada por influência direta dos árbitros” e não foi
objeto de qualquer castigo.
Como ficou cabalmente demonstrado, a justiça desportiva tem sido incapaz de
cumprir com aquele que devia ser o seu objetivo fundamental: o clássico “Suum
cuique tribuere”, ou seja, dar a cada um aquilo que lhe pertence. E, como
acontece em relação ao controlo das instituições do futebol e à arbitragem, o que
parece estar na base desta disfuncionalidade é uma rede de influências que se
ramifica a partir do Benfica e que atinge em força, pelo menos, uma parte dos
decisores disciplinares.
23
Este processo e as suas originalidades são analisados com argúcia em: Gil Moreira dos Santos, Apitos
desafinados. Escute, olhe e pasme. Nótulas jurídicas à volta de uma “cantata de apitos desafinados”,
Porto, Só, 2010. Esta obra tem a vantagem de disponibilizar, em anexo, fac-similados, diversos documentos do
processo.
24
Curiosamente, estas decisões foram antecipadas pelo Correio da Manhã, com mais de um mês de
antecedência: http://www.cmjornal.pt/exclusivos/detalhe/fc-porto-castigado-perde-6-pontos
25
Acórdão de 5 de julho de 2017 do Conselho de Justiça da FPF, disponível em:
http://www.fpf.pt/pt/Institucional/Justi%C3%A7a/Ac%C3%B3rd%C3%A3os-Conselho-de-Justi%C3%A7a.
26
http://www.record.pt/futebol/futebol-nacional/liga-nos/benfica/detalhe/veiga-pinto-da-costa-e-um-
brincalhao.html
27
A Bola, 6 de julho de 2017.
28
http://tribunaexpresso.pt/revista-de-imprensa/2017-07-07-Fernando-Gomes-proibe-orgaos-sociais-da-
federacao-de-pedirem-ou-aceitarem-bilhetes-para-jogos
Os órgãos de comunicação social têm desempenhado um papel fundamental no
enviesamento do futebol português a favor do Benfica. Seja dourando os feitos
encarnados, promovendo acriticamente as “pérolas do Seixal”, diminuindo os
adversários, ocultando ou desvalorizando erros de arbitragem, ignorando
injustiças disciplinares ou até transportando, por iniciativa própria, equipamentos
do Benfica para o outro lado do Atlântico, são muito diversas as formas como a
imprensa contribui para a formação de um clima de asfixia mediática que parece
ter como objetivo exibir como natural e, acima de tudo, inevitável qualquer
sucesso da equipa da Luz. Este cenário resulta de uma conjugação de fatores que
incluem características históricas da comunicação social portuguesa, a
disponibilidade de diversos órgãos para servir o Benfica e a própria ação do
clube no fomento desse tipo de relações.

A CENTRALIZAÇÃO DA IMPRENSA EM LISBOA

Um dos fatores intrínsecos à estrutura da imprensa portuguesa que acaba por


beneficiar o Benfica é a acentuada centralização do poder mediático em Lisboa.
Uma lista dos principais órgãos de comunicação nacionais associada à
localização da sua sede é esclarecedora:

Órgão de comunicação social Sede


Imprensa escrita Correio da Manhã Lisboa
Diário de Notícias Lisboa
Expresso Lisboa
i Lisboa
Jornal de Notícias Porto
Público Lisboa
Sol Lisboa
A Bola Lisboa
O Jogo Porto
Record Lisboa
Televisões CMTV Lisboa
RTP Lisboa
SIC Lisboa
TVI Lisboa
A Bola TV Lisboa
Sport TV Lisboa
Rádios Antena 1 Lisboa
Rádio Renascença Lisboa
TSF Lisboa
Online Bancada Lisboa
MaisFutebol Lisboa
Observador Lisboa

Em 22 órgãos de comunicação social, 20 (ou seja, 91%) têm a sua sede em


Lisboa. Confirma-se, desta forma, que o centralismo crónico do país, um
fenómeno com séculos e transversal aos mais diversos domínios da realidade
portuguesa, se manifesta com particular acuidade na imprensa. E se, em termos
desportivos, há alguém que beneficia particularmente desta realidade, esse
alguém é quem, por um lado, está geograficamente mais próximo do poder e, por
outro, pela dimensão da massa adepta, é obviamente mais atrativo para quem
manda. Reúnem-se assim condições quase naturais para o desenvolvimento de
uma relação entre o Benfica e a imprensa em que ambos se servem mutuamente.
Pelo contrário, é naturalmente mais prejudicado quem está mais distante e quem
mais coloca em causa, historicamente, o centralismo em geral e, em particular, o
clube da Luz. Esse alguém é, como é óbvio, o FC Porto.
Este cenário está longe de ser novo, mas qualquer mudança também parece
muito distante. Se hoje em dia ouvimos muitas vezes falar em ‘descentralização’,
em ‘delegação de competências’ ou em ‘serviços de proximidade’, a verdade é
que em relação à comunicação social a tendência é de um progressivo
afunilamento dos órgãos em Lisboa. Basta recordarmos que não há muitos anos
existiam no Porto três diários generalistas de grande popularidade, o Comércio
do Porto, o Jornal de Notícias e o Primeiro de Janeiro, dos quais apenas o
segundo subsiste. Entretanto, também deixou de existir o histórico Norte
Desportivo e não vingou o semanário Grande Porto. Em sentido inverso, a
generalidade dos novos meios tem surgido na capital, de que são exemplos mais
recentes o diário i e os projetos online Observador e Bancada. Tendo estes
dados em conta, facilmente se percebe por que motivo, de acordo com um estudo
realizado a propósito do último Congresso dos Jornalistas Portugueses (que
decorreu entre 12 e 15 de janeiro de 2017), cerca de dois terços dos jornalistas
portugueses trabalham em Lisboa, enquanto no Norte se encontram apenas cerca
de 16% das pessoas que exercem esta profissão29.
A concentração do poder mediático em Lisboa surge, portanto, como uma
espécie de condição de base que terá de ser sempre tida em conta quando se
observa o tratamento privilegiado de que o Benfica é objeto pela parte da
esmagadora maioria da comunicação social.

OS DIRETORES DE COMUNICAÇÃO DO BENFICA


Um fator que também não pode ser descurado para compreender a relação
entre o clube da Luz e a imprensa é o perfil dos diretores de comunicação do
Benfica na última década. Os dois últimos indivíduos a ocupar esse cargo têm
uma característica em comum: foram durante largos anos assessores de imprensa
de figuras do primeiro plano da política nacional. João Gabriel, entre 1996 e
2006, acompanhou o Presidente da República Jorge Sampaio no Palácio de
Belém. Não muito longe, em São Bento, estava Luís Bernardo, que integrou o
gabinete dos primeiros-ministros António Guterres e José Sócrates. Como é
evidente, não está em causa a legitimidade destas escolhas, que é total, mas o seu
significado não pode ser ignorado. Luís Filipe Vieira tem selecionado para dirigir
a comunicação do clube homens bastante habituados a lidar com a imprensa a
partir de cima, de uma posição de poder. Homens que, quando chegam ao
Benfica, já beneficiam de uma extensa teia de relações, de dependências, de
mecanismos de pressão e de veículos de transmissão (nos dois sentidos) de
informação privilegiada. Uma vez mais, lá está a prioridade dada às redes de
influência que também já identificámos noutros capítulos…

A (IM)PARCIALIDADE DA IMPRENSA: OS NÚMEROS

O senso comum tem ideias muito bem definidas em relação à parcialidade da


imprensa portuguesa, particularmente da imprensa escrita desportiva. Se a uma
amostra de adeptos do futebol português for colocada a questão sobre de que
clube é mais próximo cada um dos diários desportivos, a esmagadora maioria,
seguramente, dirá que A Bola é do Benfica, O Jogo do FC Porto e o Record do
Sporting. Uma perfeita distribuição que, à primeira vista, até transmite uma
sensação de equilíbrio: cada um dos principais clubes tem o “seu” jornal. A
realidade, evidentemente, está longe de ser assim tão simples.
Uma análise com pretensões de objetividade, baseada em parâmetros métricos
bem definidos, à ligação dos três diários aos três grandes foi já ensaiada numa
dissertação de mestrado em Ciências da Comunicação defendida na Universidade
do Porto. A ideia apriorística da generalidade dos adeptos portugueses parece
confirmar-se: A Bola dedica mais manchetes, mais títulos positivos e mais
páginas ao Benfica; O Jogo faz o mesmo em relação ao FC Porto; e o Record
procede assim face ao Sporting30. Estes dados, contudo, parecem espelhar mais a
vocação comercial destes órgãos – ou seja, ao nível dos destaques, cada um deles
aposta num clube diferente, dirigindo-se dessa forma a um segmento distinto do
mercado – do que os seus posicionamentos político-desportivos, que se
manifestam através de indicadores mais subtis.
Um dos aspetos que podem ser mais reveladores da política editorial de um
jornal é a seleção dos autores que nele publicam artigos de opinião – sejam
comentadores assumidamente associados a clubes, sejam jornalistas que
escrevem editoriais e outros textos de análise de natureza mais subjetiva do que a
elaboração de notícias. Foram esses dados que procurámos estudar a partir de
uma amostra constituída por sete edições dos três desportivos publicadas em dias
consecutivos na última semana em que houve competições oficiais de futebol em
Portugal, na época 2016/2017 (24 a 30 de maio).

Fig. 1: Clubes dos “opinadores” de cada jornal desportivo (em %).


O primeiro indicador que analisamos é a distribuição dos autores de artigos
de opinião em função dos clubes de que são adeptos (fig. 1). Em linhas gerais,
verifica-se uma repartição que corresponde à perceção tradicional: A Bola tem
mais autores do Benfica, O Jogo do FC Porto e o Record do Sporting. No entanto,
uma análise mais fina do peso de cada clube em cada um dos jornais permite
identificar algumas nuances importantes. Por exemplo, os analistas do FC Porto,
apesar de estarem em destaque num dos desportivos (O Jogo, com cerca de 40%
de autores portistas), têm uma presença residual nos dois concorrentes: 10%, o
que significa que nos dois diários desportivos lisboetas 90% dos responsáveis
pela produção de opinião estão ligados aos clubes da capital (em O Jogo, apenas
40% dos opinadores estão ligados ao clube da terra onde se situa a sede do
jornal). O centralismo de que demos conta na abertura deste capítulo manifesta-se
neste indício em todo o seu esplendor.
Se, em vez de olharmos ao número de comentadores adeptos de cada clube,
observarmos antes o número de textos que os aficionados de cada um escreve nos
três desportivos (fig. 2), tendo em conta que há autores que publicam mais do que
uma vez por semana, acentua-se o peso do Benfica e diminui o do FC Porto face
ao indicador anterior. Na realidade, mesmo no Record, onde há mais
sportinguistas do que benfiquistas a escrever, é o Benfica que é objeto de mais
análises e opiniões. E em O Jogo, onde predominam os autores portistas, o seu
peso diminui se olharmos ao número de textos. A ascendência dos clubes da
capital, e particularmente do Benfica, é incontestável neste indicador.
Fig. 2: Artigos de opinião dedicados a cada clube, nos jornais
desportivos (em %).

O panorama dos autores de textos de opinião supostamente independentes, em


que se incluem editoriais de jornais e outros artigos não conotados com a defesa
de clubes, não é muito diferente (fig. 3). O Benfica é dominante em A Bola e no
Record e os clubes da capital, no seu conjunto, predominam nos três desportivos.
O FC Porto apenas assume algum destaque em O Jogo e pura e simplesmente não
é representado por adeptos seus nos artigos de opinião independentes do mais
antigo desportivo lisboeta. Se é verdade que em textos em que, supostamente, a
isenção deve ser uma pedra de toque, e o clube dos seus autores deve ser
irrelevante, não deixa de ser significativo este predomínio encarnado e a sub-
representação do FC Porto. Não é verosímil, de modo algum, que A Bola não
tenha capacidade para encontrar um jornalista que seja adepto portista e que
possa escrever com o estatuto de independente – como o fazem muitíssimos
sportinguistas e, sobretudo, benfiquistas.
Fig. 3: Artigos de autores supostamente independentes (em %).

Se olharmos aos comentadores assumidamente conotados com clubes (fig. 4),


verificamos, uma vez mais, que é o Benfica que domina globalmente, estando os
seus adeptos representados em maior número em A Bola e no Record. O FC Porto,
como noutros indicadores, apenas se destaca em O Jogo, que é, apesar de tudo,
aquele que menos espaço confere a este tipo de artigos.

Fig. 4: Clubes dos autores conotados com clubes (em %).


Tendo em conta estes dados, é possível esboçar um perfil de cada um dos três
desportivos:
1. A Bola – O Benfica domina em todos os indicadores. Se descontarmos os
artigos de opinião de autores assumidamente conotados com clubes, o FC
Porto é praticamente marginalizado em todos os aspetos, sendo a
representatividade dos seus adeptos praticamente nula. O peso dos
adeptos de clubes da capital na produção de opinião é mais do que
esmagador.
2. O Jogo – Este é o único diário em que o FC Porto é o clube mais
representado por adeptos seus, seja em artigos clubisticamente conotados,
seja em análises de natureza independente. Para além disso, é o jornal que
confere mais espaço a aficionados de outros clubes que não os três
grandes.
3. Record – É claramente um jornal lisboeta e representativo dos clubes de
Lisboa. Aparentemente, são os adeptos do Sporting os mais representados
(há mais autores sportinguistas do que benfiquistas), no entanto, na
verdade, é ao Benfica que é conferido mais espaço (há mais textos de
benfiquistas do que de sportinguistas). O papel de adeptos do FC Porto é,
também neste diário, residual.

O cenário não é muito diferente nos programas televisivos. Se descontarmos,


como é natural, a equidade patente nos programas em que participam
representantes dos três grandes, são os clubes de Lisboa que dominam os painéis
de comentários supostamente isentos. Basta pensarmos, por exemplo, no Mais
Transferências ou no Mais Bastidores, da TVI24, em que seis dos sete
comentadores habituais são adeptos do Sporting ou, principalmente, do Benfica.
Um panorama que não é muito diferente na RTP 3 ou na SIC Notícias.
Em suma, existe um desequilíbrio estrutural na representatividade de adeptos
dos três principais clubes nos painéis de opinião desportiva, seja na imprensa
escrita, seja na televisão – e tudo indica que chegaríamos a conclusões
semelhantes se prosseguíssemos a análise pelas estações de rádio e pelos meios
de comunicação online. O FC Porto é, de longe, o clube mais sub-representado,
contrastando com a sobre-representação do Benfica. Estes dados são
particularmente relevantes quando se olha à produção de análise e opinião
supostamente independentes: na verdade, a maior parte do que em Portugal é
vendido como um trabalho isento trata-se do resultado das reflexões de
indivíduos que ou estão ao serviço do Benfica, ou, pelo menos, têm um vínculo
emocional com esse clube. São os números que o demonstram. Se olharmos para
alguns exemplos de natureza mais qualitativa só poderemos reforçar essa
convicção.

A (IM)PARCIALIDADE DA IMPRENSA: OS CASOS

Seria possível escrever um livro inteiramente dedicado aos “truques” da


imprensa portuguesa que têm o FC Porto como alvo a abater e o Benfica como
objeto de exaltação. Optámos por selecionar apenas dez que nos parecem bem
significativos, a maior parte deles muito recentes (e por isso ilustrativos do
panorama atual da comunicação social), apesar de ser impossível não
começarmos por recuar a 2004:
1. 12 de dezembro de 2004. O FC Porto é campeão europeu e defronta os
colombianos do Once Caldas em Yokohama, no Japão. Em disputa está a
última edição da Taça Intercontinental. O jogo termina 0-0, apesar de os
Dragões terem marcado dois golos perfeitamente regulares. O troféu é
decidido nos penáltis. Ao décimo oitavo, Pedro Emanuel resolve a
questão a favor dos comandados por Victor Fernández. O FC Porto passa
a ser campeão do Mundo, 17 anos depois de ter sido a primeira equipa
portuguesa a alcançar esse estatuto. No dia seguinte, A Bola dedica-lhe
menos de um quarto do espaço da sua primeira página. O grande destaque
é o Benfica, que no dia anterior tinha jogado com o Belenenses. Desta
forma, a um dos maiores feitos da história do futebol português associou-
se uma das mais vergonhosas capas da história da imprensa desportiva
portuguesa.

Fig. 5: Primeira página de A Bola de 12-12-2004. No dia anterior, o FC


Porto vencera um dos mais importantes troféus da história do futebol
português, mas o destaque é dado ao Benfica.

2. 6 de março de 2011. À entrada para a 22.ª jornada do campeonato, uma


das melhores equipas de sempre do futebol português, o FC Porto de
André Villas-Boas, lidera o campeonato com oito pontos de vantagem
sobre o Benfica. Neste dia, os encarnados perdem em Braga e a diferença
entre os dois primeiros passa para 11 pontos. Aos 41 minutos, Javi Garcia
é expulso num lance polémico, o que justifica a manchete de A Bola do dia
seguinte: “Xistra decide o que estava decidido”. Para A Bola, o
campeonato de 2010/2011, que o FC Porto conquistou invicto graças a 27
vitórias e três empates, em que os Dragões bateram o Benfica por 5-0 em
casa e selaram o título na Luz, às escuras, foi decidido por Carlos Xistra.
Tudo isto soa tão absurdo que até dispensa mais comentários.
3. 15 de fevereiro de 2017. Jorge Nuno Pinto da Costa desloca-se ao
tribunal de Guimarães e, à chegada, é abordado por Tânia Laranjo. A
jornalista da CMTV, numa atitude insistente e ostensivamente
provocatória, tenta a todo o custo obter uma reação do presidente do FC
Porto. A dado momento, o empenho que dedicou à perseguição impediu-a
de ver um poste de iluminação, contra o qual chocou. Na hora, em direto,
acusou Pinto da Costa de a ter empurrado, algo que qualquer espectador
tinha a oportunidade de verificar que era completamente falso. Face à
mentira abjeta, o líder azul e branco, finalmente, reagiu: “Não seja
mentirosa e provocadora”. Estava alcançado o objetivo do CM. As
provocações e a mentira de Tânia Laranjo conseguiram originar uma
notícia: “Pinto da Costa insulta jornalista da CMTV à chegada ao
tribunal”. Desta vez, contudo, ninguém acreditou no CM. As imagens que
passaram em direto foram suficientemente esclarecedoras tanto do que se
passou como do carácter de Tânia Laranjo e de quem dirige este jornal.

4. 10 de abril de 2017. O FC Porto tinha jogado a 1 de abril na Luz, num


jogo que ficou marcado, entre outros benefícios de arbitragem aos
encarnados, por uma agressão de Samaris a Alex Telles que passou
completamente impune pelo crivo da equipa de arbitragem. Através da sua
newsletter, o Dragões Diário, o clube azul e branco deu conta deste facto.
A 10 de abril, o Público recupera a análise de Pinto da Costa a um lance
num jogo entre FC Porto e Campomaiorense na época 1999/2000 e titula:
“Há 17 anos, Pinto da Costa não viu o soco de Jardel”. Sem que nada o
fizesse prever, o diário generalista comparou dois lances muito distintos e
confrontou declarações do presidente portista com outras que não foram
da sua autoria. Ou seja, produziu uma notícia completamente
despropositada face à atualidade, até porque não assentava em qualquer
facto novo. O que motivou então, para além de um favor de natureza
clubística ao Benfica, esta notícia do Público? Este foi apenas um
resultado de uma investigação sobre agressões no futebol português e
sobre as reações dos dirigentes dos clubes? Nada disso. O Público
limitou-se a dar seguimento a uma publicação do blogue “O profeta do
Benfica”, que no dia anterior tinha desenterrado este caso e efetuado uma
primeira e absurda comparação com o de Samaris. O Público tratou
apenas de efetuar o transfer de uma publicação fanática de um espaço
onde elas podem e devem estar (os blogues de adeptos) para uma
imprensa dita ‘de referência’, que se liberta de qualquer pudor quando se
trata de servir o Benfica.

5. 14 de maio de 2017. Um adepto do Sporting é assassinado nas imediações


do Estádio da Luz, sendo divulgados fortes indícios de envolvimento de
elementos da claque ilegal do Benfica “No Name Boys” nos
acontecimentos que estiveram na origem daquela morte. No dia seguinte, o
Record dedica uma referência discreta a esta tragédia na sua capa:
“Adepto leonino assassinado. Polícia já identificou o suspeito”. Quatro
anos antes, o mesmo jornal deu um destaque inusitado a confrontos entre
adeptos do FC Porto e do Sporting, antes de uma partida entre os dois
clubes no Dragão: “Vergonha. O pior incidente desde 1996”. Quando o
que esteve em causa, em 2017, foi mesmo o pior incidente desde 1996
(uma nova morte), talvez por o protagonista ter sido um adepto do
Benfica, o Record achou que não se justificava o mesmo tipo de realce.

Fig. 6: À esquerda, o destaque dado pelo Record a um dos mais tristes
atos de violência do desporto nacional. À direita, a importância que o
jornal dera, quatro anos antes, a um caso de muito menor gravidade que
não envolvera adeptos benfiquistas, mas sim portistas.

6. 6 de junho de 2017. No programa Universo Porto da Bancada, do Porto


Canal, começam a ser revelados documentos que testemunham diversas
práticas ilícitas do Benfica, sobretudo nos domínios da arbitragem, da
justiça desportiva e do controlo das instituições do futebol português. A
forma como, nos dias seguintes às revelações, a imprensa foi dando conta
do que se ia conhecendo foi bastante reveladora tanto dos alinhamentos
como da seriedade jornalística de cada órgão: O Jogo fez o que se exigia
face a matéria tão escandalosa, noticiando-a com destaque logo no dia
seguinte; o Record cumpriu os mínimos exigíveis, dando conta do
essencial no dia posterior às revelações e aprofundando-as dois dias
depois; o Diário de Notícias e o Jornal de Notícias, com maior ou menor
profundidade, também foram dando conta do que se ia conhecendo;
através do silêncio, assumiram-se como pontas de lança da defesa do
Benfica neste caso, logo desde o seu arranque, A Bola, a TVI e o
MaisFutebol – muitas vezes, mesmo nas semanas seguintes, quando a
agenda mediática já era dominada pelo que se dizia no programa de terça-
feira do Porto Canal, estes órgãos só despertavam para a realidade após
as reações tímidas do Benfica.


Fig. 7: À esquerda, O Jogo faz o destaque jornalístico que se impõe,
perante um alegado escândalo de corrupção associado à equipa da Luz. À
direita, na primeira página de A Bola do mesmo dia, o caso é ignorado
por completo.

7. 25 de junho de 2017. O FC Porto vence a Taça de Portugal de hóquei em


patins. O MaisFutebol, um dos órgãos que, ao longo da época, mais de
perto acompanharam esta modalidade, demora mais de 20 minutos a dar
conta desta conquista. Uma semana antes, quando o FC Porto se sagrou
campeão nacional de hóquei, numa jornada em que o Benfica reclamou
por um golo anulado perto do final do seu jogo, o mesmo MaisFutebol
conferiu prioridade a esse caso de arbitragem e às posições nacionais-
benfiquistas face ao principal facto da tarde: a definição do campeão
nacional. Perante a natural indignação que os adeptos portistas
manifestaram nas redes sociais a propósito desta linha editorial de um
órgão que gosta de propagar aos quatro ventos que privilegia o espetáculo
face às polémicas, o seu diretor, Luís Mateus, e um dos seus rostos mais
conhecidos, a jornalista Cláudia Lopes, optaram por insultar os
contestatários, que apelidaram de trolls e “malucos”. Poucas vezes terá
ficado tão evidente, no curto espaço de tempo de um fim de tarde, o que se
esconde por detrás da máscara de um pretensamente isento e alheio a
polémicas meio de comunicação desportiva.

8. 13 de julho de 2017 (ou qualquer outra quinta-feira). Quem abrir o jornal i


encontra artigos de opinião de António Galamba, redator dos discursos de
Luís Filipe Vieira, Ricardo Costa, ex-presidente da Comissão de
Disciplina da Liga, e António Rola, analista de arbitragem da BTV. A
estes textos juntam-se as notícias assinadas por Afonso de Melo,
jornalista com passado enquanto escrutinador de escutas telefónicas no
canal do clube de Carnide e autor de uma obra sobre o “Apito Dourado”,
difamatória do FC Porto. Seria difícil imaginar uma concentração de
tantos servidores cegos do “nacional-benfiquismo” num espaço de tão
poucas páginas.

9. 17 de julho de 2017. Dois dias antes, é conhecida a absolvição total do


FC Porto do processo “Apito Final”. O Benfica reage, mas, como tem
sido hábito recentemente, não dá a cara. Fala sempre através de uns
senhores anónimos que vão plantando notícias nos jornais que demonstram
mais abertura para recebê-las. Neste caso, A Bola e o Record. Ao
primeiro, falou uma “fonte oficial do clube da Luz”. Ao segundo, “fonte
dos encarnados”. Disseram ambas exatamente o mesmo, palavra por
palavra, sendo evidente que os dois diários se limitaram a reproduzir um
texto que ambos receberam – ou seja, o comunicado que o Benfica não
teve coragem para emitir formalmente. Que o clube lisboeta opte por
comunicar assim, revelando uma enorme incapacidade de assumir cabal e
claramente as suas posições, é um problema seu, de quem o dirige e dos
seus associados. Que haja jornais dispostos a servirem de caixa de
ressonância do terrorismo comunicacional transmitido sistematicamente
por fontes sem rosto é apenas mais um sintoma do estado moralmente
decrépito em que se encontra uma grande parte da imprensa portuguesa.

10. 15 de agosto de 2017. O Conselho de Disciplina da FPF aplica uma multa


de 2169 euros ao FC Porto devido ao comportamento incorreto do seu
público num jogo contra o Moreirense e, pelo mesmo motivo, multa o
Benfica em 4020 euros. No dia seguinte, A Bola dedica uma notícia à
sanção dirigida ao FC Porto. Sobre a do Benfica, muito mais grave, nem
uma palavra. Este é um dos testemunhos mais evidentes de uma imprensa
completamente subordinada aos interesses de um clube que não tem
qualquer pudor em sacrificar a transmissão de uma parte da realidade
para beneficiar a instituição que tanto se empenha em servir.

Estes dez exemplos são apenas uma amostra reduzida do posicionamento


político-desportivo da generalidade da imprensa portuguesa sedeada em Lisboa,
que passa por um claro favorecimento do Benfica, que contrasta com a
animosidade quase sempre revelada em relação ao FC Porto. Sublinhe-se,
contudo, que mais do que uma tendência clubística dos órgãos de comunicação
social, estes casos são reveladores da disponibilidade de diversos jornalistas e
responsáveis editoriais para o sacrifício das mais elementares regras do
jornalismo e do seu código deontológico tendo em vista o benefício do clube de
Luís Filipe Vieira.

UMA QUESTÃO DE INTIMIDADE

Face a este panorama, alguns leitores mais ingénuos poderiam perguntar-se


sobre a responsabilidade do Benfica neste cenário. Ou seja: é o clube um agente
ativo na forma como a comunicação social é moldada a seu favor? Ou parte da
imprensa a iniciativa de favorecer o Benfica, por julgar que essa atitude vai ao
encontro das expectativas e dos interesses da maior parte dos seus potenciais
leitores/clientes? Há vários indícios que apontam para uma intervenção direta das
autoridades do “regime nacional-benfiquista” neste setor.
Em primeiro lugar, há um testemunho na primeira pessoa de um antigo
colaborador do Benfica que aponta precisamente nessa direção. A 12 de março de
2016, Jorge Jesus, que treinou em Carnide entre 2009 e 2015, comentou numa
conferência de imprensa notícias que vinham sendo veiculadas com insistência e
que davam conta da sua suposta incompatibilização com o presidente do Sporting:
“Sei muito bem de onde vim, sei como se fazem essas estratégias e essas
montagens. É sempre assim”. Jesus dificilmente poderia ter sido mais claro: tendo
passado seis anos no Benfica, está bastante familiarizado com as estratégias de
comunicação do clube, que passam pela plantação de notícias sobre os rivais em
jornais que se encontram sob o seu controlo. Note-se que depois de uma acusação
desta gravidade não houve qualquer esforço de desmentido por parte dos visados
pelo antigo treinador encarnado.
Efetivamente, a intimidade entre responsáveis pelo Benfica e jornalistas é
uma realidade amplamente documentada. Todos se recordarão, por exemplo, das
fotografias dos jantares que reuniam frequentemente João Gabriel e o diretor do
Correio da Manhã e da CMTV, Octávio Ribeiro. Mas há mais. A 14 de novembro
de 2016, o diretor de comunicação do Benfica, Luís Bernardo, começou a
preparar um ciclo de almoços de Natal de Luís Filipe Vieira com jornalistas, na
linha de uma prática que já vinha sendo hábito desde os tempos de João Gabriel.
A lista de alvos incluía diversos órgãos de comunicação social e algumas
personalidades em concreto, por esta ordem: A Bola, Record, O Jogo, Sport TV,
SIC, RTP, TVI, Diário de Notícias e Jornal de Notícias (apresentados como um
conjunto), Expresso, Rui Santos, João Bonzinho e Rui Pedro Braz. Estamos
perante um caso flagrante de fomento de intimidade entre Vieira e a comunicação
social que parte do próprio e que pode ajudar a explicar os favores de vários
órgãos e de alguns comentadores descritos no ponto anterior.
Existe um caso flagrante desta promiscuidade levada ao extremo, que se
encontra bastante bem documentado por emails. Uma tradição de Ano Novo já
quase tão entranhada como comer doze passas à meia-noite é a entrevista que por
essa altura Luís Filipe Vieira concede ao diário desportivo A Bola (como seria de
esperar). E de que forma o presidente do Benfica dá entrevistas ao seu diário
desportivo favorito? Pode parecer uma pergunta estranha, cuja resposta deve ser
óbvia: Vieira encontra-se com um ou vários jornalistas, eles colocam-lhe
questões e o “primeiro-ministro da Luz” responde. Simples. Mas não é nada
assim. Na verdade, apesar de Vieira ser o suposto entrevistado, a sua intervenção
neste processo é quase nula. Podemos resumir tudo em alguns passos:
1. em meados de dezembro, um jornalista envia um conjunto de perguntas ao
diretor de comunicação do Benfica, Luís Bernardo;
2. António Galamba, o escritor-fantasma dos discursos de Luís Filipe Vieira,
elabora uma primeira versão das respostas, que é devolvida a Luís
Bernardo a 19 de dezembro;
3. a 22 de dezembro, Luís Bernardo faz alguns ajustes, acrescenta novos
temas e envia uma versão provisória a Vieira;
4. a 23 de dezembro, Luís Bernardo solicita a colaboração de Domingos
Soares Oliveira e Paulo Gonçalves na elaboração de algumas respostas;
5. no dia 26, chegam os resultados dessas colaborações e a entrevista é
encerrada.

Ou seja, a intervenção de Luís Filipe Vieira neste trabalho é quase tão grande
como a do próprio jornalista: quase nula, como antes se disse. O que é vendido
ao leitor como um trabalho jornalístico – uma entrevista, por definição, resulta da
interação entre um entrevistador e um entrevistado – não passa, afinal, de um
instrumento de pura propaganda em que o objeto de questionamento e de
confronto tem controlo absoluto sobre o que é publicado. Uma entrevista do
presidente do Benfica a A Bola trata-se, na verdade, de um artigo de opinião
travestido – com uma designação, uma apresentação formal e um arranjo gráfico
diferentes. Um artigo de opinião que, tal como os discursos de Vieira, nem sequer
é de sua autoria. Que Vieira e o Benfica procurem impor a sua propaganda à
opinião pública de uma forma tão descarada é revelador de uma imaturidade
democrática e de um espírito totalitário desconcertantes. Que A Bola se sujeite a
ser palco destas encenações, é um testemunho da baixeza que um jornalismo
servilista pode atingir.

EM RESUMO

O Benfica beneficia de condições estruturais muito favoráveis para o controlo


da imprensa: a nível dos fatores externos ao clube, destacam-se os factos de a
esmagadora maioria dos órgãos de comunicação social se encontrar sedeada em
Lisboa e de o clube encarnado ser aquele que aparentemente tem mais adeptos em
Portugal; internamente, assumem relevo o perfil dos diretores de comunicação do
Benfica e uma cultura intrinsecamente pouco democrática que facilmente resvala
para situações de condicionamento do trabalho jornalístico.
Tendo isto em conta, não surpreende que o panorama da imprensa portuguesa
– sobretudo da desportiva, mas não só – seja marcado por um predomínio
avassalador do Benfica: há mais benfiquistas a escrever nos jornais, a falar nas
televisões, a intervir nas rádios; os benfiquistas prevalecem não só na produção
de opinião clubisticamente assumida, mas também naquela que é supostamente
isenta e independente; os rivais do Benfica, com particular destaque para o FC
Porto, são inúmeras vezes objeto de “truques da imprensa”; o Benfica revela,
para além disto tudo, uma enorme capacidade para, por sua iniciativa quase
exclusiva, plantar na imprensa, seja através das habituais fontes anónimas, seja
através de entrevistas que na verdade não o são, as suas verdades oficiais que são
amplamente propagadas.
Esta ascendência do Benfica sobre a comunicação social tem como
consequência a possibilidade de o clube da Luz condicionar a seu bel-prazer a
formação da opinião pública, gerando um círculo vicioso de transmissão de
informação e propaganda entre clube, imprensa e adeptos, que alimenta uma
imagem da equipa e dos seus adversários alinhada com os interesses da turma de
Carnide. A exaltação do Benfica e a diminuição dos seus rivais têm efeitos não só
nos apoiantes deste clube como nos dos seus adversários, que não têm como
escapar ao sufoco imposto pela máquina encarnada. A BTV e as cartilhas, como
se verá, desempenham um papel fundamental neste processo.

29
https://www.publico.pt/2016/11/23/sociedade/noticia/retrato-dos-jornalistas-portugueses-40-anos-licenciado-
e-trabalha-em-lisboa-1752329
30
Ivo Miguel Costa Neves, A (im)parcialidade da imprensa diária desportiva em Portugal: os casos de
FC Porto, SL Benfica e Sporting CP. Dissertação de mestrado apresentada à Universidade do Porto, 2016.
Uma das revelações mais impactantes do Porto Canal nos últimos tempos tem
a ver com um aspeto verdadeiramente estruturante da comunicação oficial do
Benfica, que ultrapassa o domínio estrito da imprensa e merece, por isso,
tratamento à parte: a existência de cartilhas. Estes documentos, que a maioria das
pessoas, até há alguns meses, não fazia ideia que existiam, estão na origem de um
volume muito significativo da informação e da argumentação que invadem o
espaço público de discussão desportiva e que condicionam a formação das
opiniões de adeptos, quer do Benfica quer dos restantes clubes.

AS CARTILHAS: O QUE SÃO, COMO SURGIRAM, PARA QUE


SERVEM

As cartilhas são, na verdade, designadas pelo seu autor como “Notas e


informações”. Trata-se de documentos de extensão variável, quase sempre longos
(ultrapassam frequentemente as 30 páginas), que vão sendo atualizados à medida
que a jornada se desenvolve e que os acontecimentos desportivos o justificam
(uma primeira versão costuma ser enviada ao sábado, sendo remetidos sucessivos
aditamentos, pelo menos, no domingo e na segunda-feira). O seu autor, Carlos
Janela, disserta extensamente sobre a atualidade futebolística nacional, dividindo
normalmente o seu documento em três secções, cada uma dedicada a um dos
grandes clubes. As “notas e informações” são de perfil muito variado: há
informações factuais sobre os jogos, análises ao desempenho das equipas e dos
árbitros, sugestões de argumentos a utilizar nos programas, sugestões, até, de
frases a reproduzir nos debates. Os seus objetivos gerais são facilmente
discerníveis: formatar a opinião dos comentadores benfiquistas, afinar o seu
pensamento em função dos objetivos político-comunicacionais do clube e
contribuir para o alinhamento do seu discurso com uma matriz oficial que, porque
reproduzida diversas vezes, em vários dias e em múltiplos meios (em artigos de
opinião na imprensa escrita, em debates na televisão e na rádio), acaba por quase
assumir foros de verdade absoluta e indiscutível, tal a forma como é absorvida
por adeptos, comunicação social e até agentes desportivos.
É certo que nem sempre as cartilhas foram assim. Nas suas origens, que
remontam provavelmente aos primeiros anos de João Gabriel como diretor de
comunicação do Benfica, eram documentos muito mais curtos, que continham
apontamentos breves sobre os jogos dos três grandes, as suas arbitragens e
algumas curiosidades estatísticas ou de outros tipos. Eram, essas sim, verdadeiras
“notas e informações”, constituindo quase uma espécie de chave de leitura para a
interpretação do que se passou em cada jornada (de um ponto de vista benfiquista,
naturalmente). Tudo mudou com a entrada em cena de Carlos Janela, em 2014.
Uma figura cujo percurso importa recordar.
Carlos Alberto Ferreira Janela é um nortenho natural de Vila Nova de
Famalicão, onde nasceu em 1961, e foi no clube da terra que se iniciou nas
andanças do dirigismo desportivo. Era Janela responsável pelo futebol do FC
Famalicão quando, em 1988, rebentou um escândalo de corrupção que culminou
com a descida da equipa, que militava na II Divisão e se preparava para subir à
primeira, à então III Divisão: numa partida decisiva, os dirigentes famalicenses
tinham corrompido o presidente do Macedo de Cavaleiros, que se dispôs a
promover uma invasão de campo fictícia e assim proporcionou ao Famalicão uma
fundamental vitória na secretaria. A carreira do jovem Janela não foi prejudicada
por este “incidente” e na década seguinte já se encontrava ao leme do futebol do
Sporting, exercendo funções que mais tarde viria a desempenhar também no
Belenenses, de onde saiu após ter sido literalmente corrido pelos sócios31. Nos
últimos anos, apresenta-se como “gestor de ativos desportivos”, seja lá isso o que
for, e desfila por rádios e televisões ao abrigo de um estatuto de isenção que não
deixa de ser anedótico tendo em conta que trabalha há vários anos para o Benfica.
Pelo menos desde 2014, é Carlos Janela o autor das famosas cartilhas e foi ele
que as elevou ao estatuto de texto sagrado de intérpretes que abdicam da sua
liberdade intelectual para as reproduzir, a maior parte das vezes, acriticamente.
As cartilhas são remetidas por email aos “cartilheiros” no próprio dia do
programa em que cada um participa. Há uma exceção: Pedro Guerra, que parece
funcionar como uma espécie de pivô na gestão desta informação, vai recebendo
todos os ficheiros, por vezes mais do que um por dia, sempre vários por semana.
As mensagens de Janela incluem ainda indicações personalizadas, por exemplo,
sobre as escolhas dos cartilheiros para as rubricas dos programas em que
participam (“topo e fundo”, “altos e baixos”, “figura da semana”, etc.). Para além
disso, o “cartilheiro-mor” Carlos Janela sublinha diversas vezes um conselho
essencial: os cartilheiros devem manter os telemóveis ligados durante os
programas, para que possam ser devidamente instruídos por si em direto.

OS CARTILHEIROS

Os cartilheiros, de acordo com um documento produzido pelo Benfica em


abril de 2017, dividem-se em quatro grupos:

Grupos Constituídos por


Dirigentes do Benfica Luís Filipe Vieira, Luís Bernardo,
e responsáveis pela José Nuno Martins, Hélder
BTV Conduto, Orlando Dias
Comentadores de André Ventura, António
meios generalistas Figueiredo, António Simões,
que representam o Domingos Amaral, Jaime Antunes,
Benfica em debates João Alves, João Gobern, José
com adeptos de Calado, Leonor Pinhão, Pedro
outros clubes Adão e Silva, Pedro Guerra, Rui
Gomes da Silva, Sílvio Cervan,
Telmo Correia
Comentadores da António Bernardo, António Rola,
BTV Fernando Seara (pontualmente),
João Martins, João Tomaz, Luís
Filipe, Luís Lemos, Pedro Ferreira,
Pedro Valido, Ricardo Lemos
(pontualmente), Ricardo Maia,
Rogério Matias
Jornalistas e José Manuel Freitas, José Nunes,
comentadores Rui Pedro Braz
pseudo-isentos que,
não recebendo a
cartilha propriamente
dita, recebem notas
soltas emitidas pelo
clube regularmente

A lista impressiona pela extensão e confirma o alcance dos tentáculos do


polvo do Benfica na comunicação social. Se pensarmos nos principais programas
de debate entre adeptos dos três grandes, verificamos que o clube da Luz é
representado por cartilheiros em todos: João Gobern no “Trio d’Ataque”, da RTP
3; Rui Gomes da Silva no “O Dia Seguinte”, da SIC Notícias; Pedro Guerra no
“Prolongamento”, da TVI24; André Ventura no “Pé em Riste”, da CMTV; Pedro
Adão e Silva no “Aposta Tripla”, da SportTV. Se consultarmos os três jornais
diários desportivos, constatamos que apenas em O Jogo não escreveram
cartilheiros nos últimos anos; em A Bola estão ou estiveram Rui Gomes da Silva e
Fernando Seara; no Record publicam Leonor Pinhão e Pedro Adão e Silva. Pelas
rádios também passam recetores das cartilhas ou de informações soltas, como
Telmo Correia e José Nunes. Ou seja, o alcance do trabalho de Carlos Janela, se
tivermos em conta o panorama global da imprensa portuguesa, é quase universal.
É muito difícil encontrar um órgão de comunicação social em que não tenha voz
um dos ventríloquos do antigo diretor desportivo do Famalicão, emergindo o
Porto Canal como uma ilha quase isolada no que ao discurso oficial (e, muitas
vezes, como se verá, terrorista) do Benfica diz respeito.

LINHAS DE FORÇA DO DISCURSO CARTILHEIRO

Como em qualquer texto sagrado, é possível identificar nas cartilhas algumas


linhas de força discursivas que, à medida que os anos e as jornadas vão passando,
se vão mantendo com maior ou menor maleabilidade em função das
circunstâncias. Vejamos algumas das principais.

Revisionismo da história do futebol português


A reescrita da história, muito típica das ditaduras, é uma das características
mais presentes nas cartilhas benfiquistas, tendo até sido objeto de um documento
próprio, intitulado “As verdades deturpadas da história do Benfica”, que, apesar
de já ter cerca de dez anos, continua a ser reproduzido, pelo menos ao nível da
argumentação, pelos cartilheiros32. Esta revisão do passado aposta: a) na
exaltação de um prestígio internacional encarnado que é incompatível com mais
de cinco décadas sem títulos europeus; b) na tentativa de colagem dos sucessos
do FC Porto a benefícios de arbitragem; c) na caracterização do Benfica como
força opositora do Estado Novo; d) na negação do célebre “caso Calabote”. Eis
alguns excertos que o comprovam33:

• 14/03/2016: “Poucos dias após ter ganho em Alvalade e ter chegado


à liderança da Liga, o Benfica foi à Russia ganhar e eliminar o poderoso
Zénit/Gazprom. Esta proeza acontece poucos dias depois de ter sido
chamada de “equipa pequena”. Uma noite Brilhante para o Benfica e para
o futebol português.”

• 20/02/2017: “Uma equipa à Porto é aquela que só ganha com os


favores dos árbitros amigos. É uma equipa violenta, que põe em causa a
integridade física dos adversários. Uma equipa de jogadores que passam o
tempo a simular faltas para tentar enganar os árbitros. E é uma equipa que
cerca e protesta com os árbitros.”

• Época 2005/2006: “O Benfica era o clube do Regime”. Este é um


dos ataques de que o Benfica continua a ser vítima, relacionando o clube
com o Estado Novo, regime que vigorou em Portugal entre 1926 e 1974.
Nada mais falso. O Benfica foi mesmo o clube que menos ligações teve
com a ditadura e que mais dores de cabeça provocou a Salazar.”

• Época 2005/2006: “Não houve qualquer escândalo com a arbitragem


de Inocêncio Calabote nesse Benfica-Cuf. O chamado caso-Calabote é
uma grande mentira! E o árbitro não foi castigado (nem podia sê-lo!) por
causa de ter dado os tais quatro minutos a mais mas pelo facto de ter
omitido no relatório que o jogo havia começado atrasado.”

O culto do líder Luís Filipe Vieira


Cartilheiro que é cartilheiro tem de venerar o “primeiro-ministro” Luís Filipe
Vieira. Como em qualquer ditadura que se preze, a propaganda do Benfica
promove um culto do líder que Salazar, Estaline ou Hitler não desdenhariam. É “o
melhor presidente da história” do clube, o visionário que prevê com anos de
antecedência, o dirigente insuperável na dedicação, o homem que dá “entrevistas
de Estado”, o impoluto regenerador do pântano que é o futebol nacional. Uma
sequência de excertos das cartilhas de várias semanas consecutivas que
coincidiram com a pré-campanha para as eleições no clube dispensa qualquer
outro comentário:

16/05/2016: “Por Justiça, Reconhecimento e Gratidão, temos que exaltar o


principal responsável deste sucesso desportivo do Benfica, o “Pai” deste TRI – o
Presidente Luis Filipe Vieira. O V…não é apenas de Vitória, mas é sobretudo o
V…de VIEIRA! Depois de ter Refundado e Redimensionado o Benfica, depois de
tanta e tanta obra…Luis Filipe Vieira, muda o Paradigma do Benfica e…
Tricampeonato! Não podemos falar deste sucesso, deste TRI, sem sublinhar os
méritos de Luis Filipe Vieira. O Benfica é um “caso de estudo” a nivel mundial e
deve-o a LFV. E depois, não é só o Futebol…é o Hoquei, o Andebol, o Basket, o
Voleibol, o Atletismo, etc. Por tudo que tem feito nestes 15 anos, Luis Filipe
Vieira vai ser eleito o melhor presidente da história do Benfica, num tempo muito
exigente em todos aspectos.”

23/05/2016: “O Movimento “Benfica para a frente, Vieira a presidente”, está


em marcha, tem uma adesão sem precedentes e quer uma votação massiva em Luis
Filipe Vieira nas próximas eleições. Todos dizem, “Vieira é o homem certo no
lugar certo” ou “Vieira é o melhor presidente da história do Benfica”, ou ainda
“ele é o Cosme Damião dos tempos modernos”. Muitos Adeptos, Ex. Jogadores,
Ex. Dirigentes, Ex. Treinadores, deputados da nação, Ministros, Ex. ministros,
gente das artes, etc, todos pedem “Vieira a presidente”. É merecido este
Movimento de Reconhecimento e Gratidão pelo excelente trabalho e dedicação
de Luis Filipe Vieira. Nada melhor para ilustrar a grandeza e nobreza de Luis
Filipe Vieira que o discurso feito na Camara de Lisboa na passada 2ª feira. Ler
aquele discurso é perceber porque o Benfica é melhor e ganha mais vezes. Dar
formalmente os “Parabéns ao Sporting”, 24 horas depois deste frenético e tenso
campeonato é ter um grau de elevação pessoal acima do comum.”

26/05/2016: “Ainda está por apurar e provavelmente, apenas a história e o


tempo, determinarão a verdadeira dimensão e impacto da extraordinária Obra
realizada por Luis Filipe Vieira no Benfica. E não estamos apenas a falar da Obra
física, dos títulos desportivos ou da qualidade da Organização do Benfica, pois
tudo isso é demasiado visível. Desde a importância do novo Estádio, o Centro de
Treinos do Seixal, a BTV, o Museu Cosme Damião, etc…até aos títulos
desportivos e o reconhecimento internacional da moderna organização do
Benfica, tudo está refletido no 6º lugar do Rankinf oficial da UEFA. Até os nossos
rivais se rendem a tais evidências. Quero falar agora dos valores da Confiança,
Reconhecimento, Reputação, Credibilidade e Competencia que são conferidos
pelos sócios e adeptos do Benfica ao seu Presidente. São estes os pilares da
relação entre Luis Filipe Vieira e os benfiquistas.”

05/06/2016: “O Movimento “Benfica para a frente, Vieira a presidente”, teve


esta semana um momento sem precedentes na história do futebol português e do
SL Benfica. Um grupo de sócias e sócios do Benfica escreveram uma Carta à
Familia de Luis Filipe Vieira em sinal de gratidão, reconhecimento e elogio do
papel de todos os membros da família Vieira no sucesso do Benfica. Mais, A
carta releva a discrição, o recato e a categoria da postura dos membros da família
Vieira, mais concretamente a Esposa, a Filha, o Filho e os netos. São estes
valores e princípios que estão na base do sucesso deste Benfica refundado e
dimensionado por Luis Filipe Vieira. É caso para dizer que “por detrás de um
grande homem, não está apenas uma grande mulher…pode estar também uma
grande família”….Eis a Familia Vieira! O Movimento “Benfica para a frente,
Vieira a presidente”, continua com uma forte dinâmica, influenciado pela enorme
adesão diária de benfiquistas entusiasmados.”
12/06/2016: “É de leitura obrigatória a entrevista de Luis Filipe Vieira ao
Record, reproduzida em 2 edições de 8 + 10 páginas cada parte…18 páginas em
que se falou de tudo de forma positiva e categórica. É a chamada “entrevista de
Estado” em que fica bem patente a razão/causa principal porque o Benfica é
atualmente um dos maiores clubes do mundo a todos os níveis, mesmo existindo
num país com grandes limitações no plano económico-financeiro. Essa causa
principal do sucesso deste Benfica é o seu lider… o Presidente! Quem lê a longa
entrevista e vê as imagens da mesma, percebe imediamente que o Presidente do
Benfica tem o domínio total de todas as áreas e de todos os assuntos. E mesmo
sendo muito claro que ele é a “origem de todas as coisas”, nunca fala na 1ª pessoa
do singular e usa sempre a 1ªa pessoa do plural – Nós..o Benfica.”

Proteção dos árbitros e do Conselho de Arbitragem de Vítor Pereira


Por todos os motivos expostos no capítulo 2, é muito natural que o Benfica se
tenha sentido bastante confortável com a liderança do Conselho de Arbitragem da
Liga e da FPF por Vítor Pereira. Esse conforto teve uma transposição direta para
as cartilhas, uma vez que Carlos Janela sempre fomentou a proteção do antigo
árbitro internacional, que foi alvo de fortes elogios ao mesmo tempo que as suas
decisões mais polémicas – e mais prejudiciais para a generalidade dos clubes
para além do Benfica – eram objeto de apreciação positiva.

01/08/2015: “Quem quer trazer uma nova esperança ao Futebol Português não
andar constantemente a guerrear o Presidente do Conselho de Arbitragem da FPF,
Vitor Pereira, e a fomentar a divisão entre os árbitros.”

26/10/2015: “A doentia obsessão de Marco Ferreira contra o Vitor Pereira,


presidente do CA que não tem responsabilidades directas na sua despromoção,
pois não preside à Secção do Classificações e até o nomeou para a final da Taça
como prova de confiança. Afinal quem nomeou Marco Ferreira para o Final da
Taça de Portugal? Vitor Pereira! Logo acreditava nele…”
22/12/2015: “Agora, está o Conselho de Arbitragem a FORMAR árbitros que
tenham qualidade para suceder a Benquerença e Proença, casos de Artur Soares
Dias, bem encaminhado e com todas as condições até pela idade, e os mais
jovens, João Pinheiro, Tiago Martins, Sérgio Piscarreta, Fábio Verissimo, etc.”

22/12/2015: “Não se formam árbitros internacionais de elite de hoje para


amanha. E muito bom tem sido o trabalho de Vitor Pereira e seu Conselho de
Arbitragem.”

22/12/2015: “Foi durante o reinado de Vitor Pereira que Pedro Proença e


Olegário Benquerença atingiram o Grupo de Elite da UEFA, foram nomeados
para jogos importantes e finais. Nunca como nos últimos 10 anos, os árbitros
internacionais portugueses apitaram tantos jogos internacionais e estão muito bem
vistos na FIFA e UEFA. Isto deve-se a Vitor Pereira.”

18/01/2016: “É opinião geral que Vitor Pereira é considerado muito


competente e o “melhor presidente do CA” pelos seus pares.”

01/02/2016: “Nas criticas infundadas ao Benfica, nos insultos aos árbitros,


nos ataques ao CA e aos órgãos disciplinares, o Inácio tem vindo a revelar o que
é…um canalha da pior espécie!”

01/02/2016: “O árbitro que for arbitrar o Sporting em Alvalade tem que se


preparar muito bem psicologicamente senão acontece o que aconteceu ao Cosme
Machado, desorienta-se e comete erros.”

24/04/2016: “Os mensageiros de Porto e Sporting já começaram a lançar na


opinião publica a ideia que a Lista de Fernando Gomes para a FPF,
nomeadamente para a Arbitragem e Disciplina, está dominada por elementos
afetos ao Benfica. Não sendo uma verdade completa, deixem-nos passar essa
ideia…não o devemos negar ou contrariar. Em Portugal, a grande maioria das
pessoas encosta-se ao Poder. É bom que haja a percepção de que quem manda ou
quem tem Poder é o …Benfica. Nestes momentos de transicção…no preciso
momento em que o CA vai mudar de presidente, é bom que haja a percepção
generalizada que o futuro Conselho de Arbitragem não vai ser muito diferente do
atual.”

Perseguição a Pedro Proença


Enquanto árbitro, Pedro Proença foi um alvo habitual dos dirigentes do
Benfica e dos seus adeptos, que chegaram ao ponto de o agredir barbaramente
num centro comercial em frente ao Estádio da Luz. Quando se tornou presidente
da Liga, com o apoio de FC Porto e Sporting, continuou a suscitar forte
animosidade em Carnide, apesar de os encarnados até integrarem a direção deste
organismo a que preside. Ao contrário do que acontece em relação à Federação,
ao seu Conselho de Arbitragem e ao seu Conselho de Disciplina, os cartilheiros
são constantemente instruídos no sentido de atacarem Pedro Proença, de
colocarem em causa todas as suas decisões e de lhe apontarem responsabilidades
diretas em todos os males do futebol português.

23/11/2015: “Desde que Pedro Proença assumiu a presidência da Liga de


Clubes, Aumentou o ambiente de conflito e confronto no seio das competições
profissionais. Aumentou o numero de problemas entre clubes. Aumentou o numero
de erros dos árbitros em cada jornada. Aumentou o ambiente de suspeição no
futebol português.”

07/12/2015: “Tendo como bandeira eleitoral a Centralização dos direitos


televisivos, o Pedro Proença, não se consegue libertar dos interesses pessoais e
dos interesses particulares dos clubes que o apoiaram e elegeram, logo o seu
exercício como presidente da Liga não poderia passar do nível ZERO.”

22/12/2015: “O Pedro Proença desamparou os árbitros internacionais


portugueses e é hoje um mau presidente da Liga. Prejudicou duplamente o futebol
português.”

01/02/2016: “O Pedro Proença continua a dar sinais de grande incompetência.


O presidente da Liga vai à China, faz acordos com a empresa Ledman para
patrocinio da II Liga, os clubes da II Liga não têm conhecimento das bases desse
acordo, gera-se a confusão em Portugal porque as noticias vindas da China são
preocupantes para a credibilidade e integridade do futebol português.”

Rejeição do videoárbitro
Apesar das suas limitações, o videoárbitro é, há vários anos, encarado por
muitos em Portugal como um dos instrumentos que podem ser utilizados ao
serviço de uma arbitragem mais credível. Durante muito tempo, o Benfica, que à
partida será sempre o clube mais prejudicado por qualquer coisa que contribua
para o aumento da verdade desportiva das competições, instruiu os seus
cartilheiros no sentido de se mostrarem contra esta inovação. Curiosamente, o
próprio Carlos Janela, há dois anos, já usava um argumento que agora os adeptos
de rivais do clube de Carnide invocam e que suscita uma forte oposição para os
lados da Luz: as transmissões televisivas são falíveis e manipuláveis.

06/09/2015: “Atualmente está mais que provado que a forma mais eficaz de
fazermos passar um embuste, uma mentira, uma solução milagrosa ou vender
“gato por lebre”, é usar uma linguagem aparentemente cientifica ou métodos
científicos ou de instrumentos científicos como as Novas Tecnologias. É isto que
fazem os Ruis Santos desta vida, os charlatães!”

20/09/2015: “Os brasileiros pediram à FIFA para introduzir o Video Árbitro


no Brasileirão 2016? Que bom! Ainda bem que é um país de 3º mundo a querer
testar esse sistema.”
21/12/2015: “Esse sistema do Video Arbitro não pode ser implementado no
futebol, nem em desportos de jogos corridos ou sem pausas sistemáticas entre
cada jogada.”

21/12/2015: “Não há a possibilidade de introduzir o Video-Árbitro no futebol


com um sucesso acima dos 5%. A Introdução do Video – Árbitro, iria trazer
muitos outros problemas muito mais graves e sem qualquer solução. Até porque,
O Video– Árbitro seria utilizado igualmente por um árbitro, logo factor humano
sempre presente.”

21/12/2015: “O Video-Árbitro é um sistema falível porque uma imagem vídeo


de certo angulo pode não corresponder à imagem real do lance.”

21/12/2015: “Apenas por ignorância ou irresponsabilidade se poderá insistir


na proposta do Video-Árbitro. Não há ninguém em nenhum país de primeira
grandeza do futebol mundial a falar em vídeo árbitro no futebol.”

24/04/2016: “Que tipo de vídeo-árbitro quer esta gente? Querem um Video-


Árbitro que apenas vê as fantasias do BdC, do Octávio ou do Jesus? Ou, aquele
vídeo que o Jesus mostrou agora na Conferência de Imprensa em que as imagens
desmentem os argumentos do Jesus? Eles querem um Video Arbitro que apenas
tenha IMAGENS que sejam a favor do Sporting…um Video com software
especial…verde e branco.”

Associação do FC Porto aos Super Dragões e a um histórico de violência


Como será demonstrado mais à frente, não há clube em Portugal com um
histórico de violência dos seus adeptos tão grande como o Benfica: dois
assassinatos no cadastro da sua principal claque dão bem conta disso. Certamente
consciente desse facto, Carlos Janela instrui os seus fantoches no sentido de colar
o mais possível o FC Porto a atos de violência e vandalismo alegadamente
praticados por elementos das suas claques, seja em que circunstância for: chega
ao absurdo de imputar aos Dragões responsabilidades por acontecimentos
ocorridos em jogos do Canelas. Cheio de telhados de vidro nesta matéria, o
Benfica costuma atirar pedras enquanto esconde as mãos.

27/03/2017: “O lider dos Superdragões está autorizado pela FPF a ser o lider
da Claque Oficial de apoio à Selecção A? O Fernando Madureira, lider dos
Superdragões, grupo de adeptos do Porto que atacam ameaça, vandaliza e invade
centros de treinos dos árbitros, está autorizado pela Federação Portuguesa de
Futebol, a liderar a Claque Oficial de apoio à Selecção Nacional? O lider dos
Superdragões, jogador e capitão de equipa do Canelas, clube que joga nas
Distritais da AF Porto em que os restantes clubes, 12 equipas no total,
denunciaram à AF Porto, à FPF e à UEFA, como sendo uma equipa violenta e
com práticas mafiosas e contra a qual se recusaram a jogar, é o lider da Claque
Oficial da FPF?”

03/04/2017: “O caso Canelas/Superdragões/Porto/SPDE/ Fan Addict/


Madureira:
Falar de Canelas, Superdragões, Porto, SPDE, Fan Addict, Macaco, Pinto da
Costa, Luis Gonçalves…é estar exatamente da mesma coisa, é estar a falar da
Estrutura Operacional do Porto. O país, o mundo, está chocado com a violência
das imagens da agressão do jogador do Canelas ao árbitro José Rodrigues aos
DOIS MINUTOS DE UM JOGO. Mas há muitos meses que a Imprensa Nacional e
Internacional denuncia a gravidade do caso Canelas e as suas ligações ao Porto.
É muito claro que estes marginais/criminosos, só não estão presos porque são
PROTEGIDOS por Pinto da Costa e demais responsáveis do Porto.”

Associação de uma grande parte da imprensa ao FC Porto


É possível estabelecer paralelismos entre o discurso cartilheiro em relação às
claques e sobre a imprensa. Também face a este assunto, o Benfica recorre aos
ataques aos adversários como forma de esconder o seu próprio controlo sobre a
maior parte da comunicação social, que ficou bem patente no capítulo anterior.
Encontra-se, até, uma verdadeira obsessão em associar o FC Porto à Sport TV,
que se torna absurda quer tendo em conta o que se passa nas transmissões deste
canal quer considerando a relação económica privilegiada do clube de Carnide
com a empresa que o detém.

23/08/2015: “Vejam as transmissões e comentários da Sportv. Puro


facciosismo, parcialidade absoluta e repetidas tentativas de manipular os
espectadores. Uma vergonha. Cada transmissão dos jogos do Porto e dos jogos do
Sporting deveriam merecer um inquérito da Alta Autoridade para a Comunicação
Social. Cada adversário do Porto e do Sporting, deveria solicitar no final de cada
jogo com um desses clubes, a abertura de uma investigação à Sportv, ao seu
critério de seleção das imagens e ao conteúdo dos comentários dos jornalistas e
comentadores de serviço. Será que esses clubes não se sentem ofendidos? É
tempo de denunciar a Sportv, determinadores jornalistas e comentadores.”

13/09/2015: “Denunciemos o facciosismo e a indecência do jornal O Jogo


que no dia seguinte ao jogo Arouca x Porto, colocou na 1ª página “Tribunal do
Jogo – Um cartão amarelo injusto para Layun, um cartão amarelo por mostrar
a Maurides”. Conseguiram arrancar estes 2 “erros graves” do árbitro João
Capela para justificar as criticas estupidas e absurdas que os portistas fazem
sempre ao João Capela e para PREPARAR o AMBIENTE para o clássico.
Denunciemos a falta de vergonha da direcção do Jogo, que perante uma
arbitragem considerada por todos especialistas como muito boa, arrancaram a
ferros 2 “erros graves” do árbitro de um jogo em que o Porto ganhou facilmente
por 0-3. Pior, No Benfica x Belenenses, houve uma entrada violentíssima de
Ricardo Dias sobre Samaris, o árbitro não mostrou qualquer cartão e o jornal O
Jogo nem colocou este lance para análise e julgamento dos seus especialistas em
arbitragem. Isto é Parcialidade pura e mais uma tentativa de manipulação da
opinião publica de forma vergonhosa. Devemos denunciar esta vergonha e
prevenir que. Estamos preparados para mais uma transmissão da Sportv que vai
tentar distorcer e manipular os lances contra o Benfica. Os benfiquistas já
conhecem o tipo de transmissões da Sportv.”

22/02/2016: “A Direcção do Benfica tem que tomar um posição relativamente


à Sportv. É URGENTE. É uma vergonha a campanha ANTI-BENFICA que os
Comentadores da Sportv fazem contra o Benfica. Quem lhes dá essas ordens?
Quem encomenda esses fretes? É conhecida a mediocridade da grande maioria
dos Comentadores da Sportv, mas uma coisa é a falta de competência outra coisa
bem pior é a MANIPULAÇÃO DAS IMAGENS e a TENTATIVA de
MANIPULÇÃO da OPINIÃO PUBLICA através de comentários mentirosos e
atentatórios da verdade e dos factos. Tudo é feito para prejudicar o Benfica. A
selecção dos lances duvidosos contra ou a favor do Benfica é cururgicamente
feita para deixar sempre a ideia de duvida contra o Benfica. A Direcção do
Benfica tem que tomar uma posição. A Direcção do Benfica tem que repensar se
deve ou não deixar que os jogos do Benfica passem para esta Sportv. A Sportv
precisa de uma “limpeza geral”. Chega de fretes…basta de tanta mediocridade…
basta de tanto Anti-Benfiquismo!”

20/03/2017: “A cobertura, narração e comentários da Sportv foram um


verdadeiro escândalo. Não há isenção, independência e neutralidade nos jogos do
Porto. Desde a filmagem aos comentários, tudo joga a favor do Porto. As imagens
são manipuladas e os comentários são de uma parcialidade inadmissível. Tudo a
favor do Porto! Tal como o jornal O Jogo e o Jornal Noticias, a Sportv faz parte
dos instrumentos que o Porto tem ao seu dispor para MANIPULAR a Verdade
Desportiva.”

EM RESUMO
Ao Benfica não basta um controlo bastante abrangente da informação
veiculada pela comunicação social. A generalidade das opiniões emitidas
publicamente por adeptos do clube é também ela objeto de controlo apertado,
através de um mecanismo original e, tanto quanto se sabe, exclusivo do clube,
desenvolvido por Carlos Janela. Com as cartilhas, o clube procura uniformizar o
pensamento e o discurso dos comentadores benfiquistas, que abdicam da sua
liberdade intelectual para veicularem a voz oficial, tantas vezes fundamentada em
mentiras e em factos distorcidos. Os objetivos são essencialmente três:
1. Assegurar que no Benfica não exista diversidade de opiniões em relação a
matérias consideradas fundamentais pela direção do clube, forjando-se
assim artificialmente uma unidade aparente entre os adeptos do clube que
não é confirmada pela realidade.
2. Influenciar os adeptos benfiquistas, depositando esperanças na sua
capacidade de absorção e posterior reprodução do discurso oficial.
3. Condicionar também a formação da opinião pública supostamente externa
ao universo do Benfica, influenciando quer a imprensa, quer os adeptos de
clubes adversários, através da veiculação de informação falsa ou
deturpada e da repetição ad nauseam de argumentos e de mistificações
que eventualmente acabam por ser absorvidos.

31
http://www.maisfutebol.iol.pt/belenenses-carlos-janela-agredido-por-dois-socios
32
Veja-se, por exemplo, o artigo de Pedro Adão e Silva no Record de 3 de maio de 2017, intitulado “Campeão
da democracia”.
33
Para que o leitor possa ter uma experiência tão aproximada quanto possível do que é a leitura de uma
cartilha de Carlos Janela, optámos por manter a ortografia e a sintaxe originais. Os erros linguísticos não são,
portanto, da nossa autoria, apesar de assumirmos a responsabilidade pela sua publicação.
Uma grande parte dos adeptos do futebol português, quando pensa na BTV, é
assaltada pela recordação de dois senhores desesperados, em frente a uma
câmara, enquanto descrevem o golo de Kelvin que praticamente assegurou ao FC
Porto o título nacional de 2012/2013. Diz o senhor da esquerda: “Kelvin vai
adiantando, atenção que isto é perigoso, estamos já na compensação, olha o Porto,
Kelvin, o remate… e o golo.” No que é completado pelo da direita: “Como é que
é possível? Como é que é possível um golo nesta altura? Um golo desta forma,
cruzado, bastante denunciado…”. Se nos alhearmos das inúmeras situações
ridículas que, há quase dez anos, vêm fazendo as delícias dos apoiantes dos rivais
do Benfica, constatamos que na verdade a BTV tem sido, sobretudo, um
instrumento de poder ao serviço da turma liderada por Luís Filipe Vieira,
fundamental, a diversos níveis, para o domínio do submundo do futebol português
que os encarnados alcançaram ao longo dos últimos anos.

UMA AGÊNCIA DE COMUNICAÇÃO

Prometida desde 2005, a Benfica TV (entretanto rebatizada como BTV) está


no ar desde o final de 2008. Na conferência de imprensa em que o canal foi
apresentado, a 26 de setembro daquele ano, o seu diretor desde a fundação,
Ricardo Palacin, anunciou desde logo o principal objetivo do canal: “Queremos
ser uma agência de comunicação ao serviço do Benfica”. E é isso, precisamente,
que a BTV tem sido: uma agência de comunicação, no pior sentido que se possa
imaginar. O que é que isso significa? Que este canal funciona como gerador e
propagador de um discurso oficial que é absorvido pela imprensa e repetido
noutros canais, como difusor de notícias com impacto nos outros media
(frequentemente falsas ou, no mínimo, deturpadas), como espaço de formação de
comentadores, em suma, como plataforma altamente condicionadora da opinião
pública. A BTV é, portanto, um instrumento fundamental da estratégia de
colonização dos media pelo Benfica.
O canal do clube de Luís Filipe Vieira assume-se, no fundo, como uma
espécie de cartilha pública, que, apesar de teoricamente dirigida a um público-
alvo benfiquista, chega com grande facilidade à generalidade das pessoas que se
interessam por desporto em Portugal. Ao nível da definição de um discurso
oficial e do transfer entre o canal e o resto da imprensa, é exemplar o caso da
divulgação das escutas do “Apito Dourado”. Durante vários anos, foi este um dos
principais filões da BTV: a transmissão de escutas que foram criteriosamente
selecionadas, truncadas e libertadas por elementos do aparelho judicial, no mais
flagrante exemplo de violação do segredo de justiça de que há memória em
Portugal, e que eram difundidas, analisadas e debatidas por comentadores
benfiquistas. O discurso que nesses programas se produziu – e que ignorou, por
exemplo, que apenas uma ínfima parte das escutas foi conhecida e que nunca
aquelas em que Luís Filipe Vieira participa na escolha de árbitros para jogos do
Benfica foi difundida – foi amplamente reproduzido quer por comentadores
benfiquistas noutros canais, quer por largos setores da imprensa, que o
interiorizaram, e contribuiu para o enviesamento da perceção pública de um
processo que mais não passou do que de um embuste orquestrado por uma
coligação composta pelo clube da Luz, um setor da justiça e uma parte da
comunicação social. A BTV atuou, portanto, como uma verdadeira agência de
comunicação e de propaganda que, através da informação que divulga, condiciona
a perceção pública das massas sobre um determinado assunto – ao ponto de,
passados vários anos, muitos continuarem com aquele discurso oficial
interiorizado, mesmo já não tendo sequer noção aonde é que o foram “beber”.
Outra dimensão deste papel doutrinador da BTV passa pela formação de
comentadores que são devidamente formatados e alinhados em relação ao
discurso oficial do canal e depois lançados para outras estações, onde, nuns
casos, representam os adeptos do Benfica, enquanto noutros são mesmo
apresentados, imagine-se (!), como analistas isentos e independentes. Há dois
casos paradigmáticos de cada um destes tipos de comentadores:
• Pedro Guerra, que começou a aparecer publicamente na BTV, de que
foi diretor de conteúdos, saltando depois para a CMTV e para a TVI, onde
se notabilizou, simultaneamente, como um dos mais estritos seguidores das
cartilhas de Carlos Janela e como um dos mais fanáticos e violentos
adeptos com expressão pública;
• Rui Pedro Braz, antigo secretário técnico do futsal do Benfica e autor
do livro O Ninho da Águia, surgiu como comentador supostamente isento
após participar em programas da BTV em que comentava escutas do
“Apito Dourado”.

Percebe-se, então, que a fundação e o funcionamento da BTV se inscrevem no


programa de controlo do futebol português que o Benfica liderado por Luís Filipe
Vieira vem colocando em prática há 15 anos e que, neste caso, parece ter como
objetivos fundamentais: 1) a produção de um discurso fundamentalista de defesa
do clube e, sobretudo, da sua direção; 2) a promoção da assimilação desse
discurso por adeptos benfiquistas, adeptos de outras equipas e pela comunicação
social; 3) a formação de elementos da propaganda do clube que “dão o salto”
para outros canais, onde atuam como verdadeiros agentes, ainda que muitas vezes
informais, da turma de Vieira.

OS DIREITOS TELEVISIVOS

A transmissão dos jogos no campeonato de determinada equipa pelo seu


próprio canal é algo que não existe em parte nenhuma do mundo. Com uma
exceção: em Portugal, a BTV transmite, desde 2013/14, os jogos do Benfica na
Liga. E isso acontece perante a complacência de todas as autoridades, que optam
por ignorar o efeito nefasto que esta realidade induz na organização e na verdade
desportiva das competições. Só esta possibilidade de interferência, pelo menos
indireta, no desenrolar do campeonato pode justificar esta opção de Luís Filipe
Vieira, que resultou, comprovadamente, num desastre financeiro.
Foi a 25 de outubro de 2012 que o Benfica comunicou à CMVM que, a partir
da temporada seguinte, passaria a assegurar, através de meios próprios, a
transmissão televisiva dos seus jogos caseiros no campeonato, na sequência da
rejeição das propostas para renovação de contrato com a Olivedesportos. O
próprio clube tinha antes informado a mesma instituição que a última oferta
rejeitada daquela empresa tinha um valor global de 111 milhões de euros e dizia
respeito ao período entre 1 de junho de 2013 e 31 de julho de 2018, ou seja,
abrangia cinco temporadas desportivas. Caso a aceitasse, o clube receberia, em
média, 22,2 milhões de euros pela transmissão dos seus jogos em cada um desses
anos34.
Um ano e meio depois, eram conhecidos os primeiros resultados da nova
política encarnada em relação aos direitos televisivos. A BTV, que, entretanto, se
tinha tornado um canal pago, com uma mensalidade de 9,9 euros, gerou uma
receita bruta de 28,1 milhões de euros, o que levou o clube, numa despudorada
manobra de propaganda, a anunciar que estes eram “resultados que esperávamos,
mas de que muitos desconfiavam. Resultados que superaram a oferta feita pela
anterior empresa titular dos nossos direitos televisivos”. Se é verdade que 28,1 é
um número superior a 22,2, também não é mentira que a transmissão dos jogos
pelo próprio clube não é apenas uma fonte de receitas, mas também um
sorvedouro de despesas – que não podem, evidentemente, deixar de ser
consideradas na avaliação financeira deste negócio. E o que se depreende do
mesmo relatório de contas é que o investimento técnico e humano na BTV se
traduziu num impacto de 11 milhões de euros nas contas do Benfica. Ou seja, em
2013/14, a exibição dos jogos do clube da Luz no seu canal resultou em 17,1
milhões de euros de receita líquida. Tendo em conta que a Olivedesportos
oferecia 22,2 milhões de euros por temporada, verifica-se que o Benfica ficou a
perder mais de cinco milhões de euros.
Tendo este cenário em conta, o que pode justificar a aposta benfiquista na
transmissão dos próprios jogos, se a verdade é que isso significa que o clube fica
a perder dinheiro? A resposta pode resumir-se numa só palavra: poder. Com esta
aposta, por um lado, o Benfica tornou-se aparentemente independente de uma
empresa que, há décadas, domina uma parte importante do futebol português; com
isso, por outro, conseguiu incrementar um dos ingredientes fundamentais do poder
que tem vindo a exercer no panorama desportivo nacional, que é precisamente a
perceção pública de que o Benfica tem esse poder (já dizia Carlos Janela, a 24 de
abril de 2016: “Em Portugal, a grande maioria das pessoas encosta-se ao Poder.
É bom que haja a perceção de que quem manda ou quem tem Poder é o…
Benfica.”).
O desenrolar dos acontecimentos veio confirmar que, como foi dito, a
independência do clube da Luz face ao universo da Olivedesportos era apenas
aparente. Em dezembro de 2015, o Benfica assinou um contrato com a Nos, que
partilha com Joaquim Oliveira a propriedade da Sport TV, visando a cedência
dos direitos de transmissão televisiva por dez épocas, com um valor global de
400 milhões de euros. Com isso, deitou por terra o objetivo assumido pela
direção da Liga (a que até pertence…) de negociar conjuntamente os direitos
televisivos dos 18 clubes da primeira divisão – o que, de acordo com vários
estudos, permitiria aumentar os seus proveitos. E assumiu, pelo menos
tacitamente, que o modelo de negócio, que passava pela transmissão dos jogos
caseiros ser promovida pelo próprio clube, se não é economicamente inviável, é
no mínimo prejudicial para os interesses da instituição. Sendo certo que perdeu
dinheiro, o que ganhou, então, o Benfica com a opção de 2012? Eventualmente, a
possibilidade de, no futuro, ter mais força para negociar um contrato melhor,
como aconteceu em 2015. Conseguiu, para além disso, um controlo sobre as
transmissões propriamente ditas que, como se verá, tem uma importância que está
longe de ser insignificante na perceção pública que se tem sobre os jogos e que
pode, até, condicionar fortemente tanto as arbitragens (principalmente a partir da
temporada 2017/2018, marcada pela introdução do video-árbitro) como a
aplicação da justiça desportiva.

AS TRANSMISSÕES DA BTV
Quatro épocas completas e outra em curso de transmissões de jogos caseiros
do Benfica na BTV são tempo suficiente para uma avaliação sustentada desta
singularidade no panorama audiovisual e desportivo internacional. E o balanço,
na ótica da verdade desportiva, não podia ser mais negativo. Como seria de
esperar, qualquer telespectador se apercebe de que as emissões da BTV são
tendenciosas, não asseguram qualquer tipo de equidade em relação aos
participantes na competição em causa, contribuem para o enviesamento da
opinião pública a favor do Benfica e, no mínimo, têm potencial para influenciar o
videoárbitro a favor do clube da Luz. A melhor forma de o demonstrar é
apresentando exemplos concretos:
• 24 de fevereiro de 2017. O Benfica recebe o Desportivo de Chaves
e, logo aos 17 minutos, adianta-se no marcador com um golo de Mitroglou.
O ponta de lança grego beneficia de uma falta sobre um central flaviense
para se colocar em posição privilegiada para desviar a bola de cabeça
para a baliza. A falta é evidente e não dá para esconder. Ainda assim, a
BTV esforça-se. As repetições que são transmitidas exibem perspetivas
longínquas do lance. Os planos mais aproximados, que exibiriam na sua
plenitude a irregularidade do golo encarnado e que eram tecnicamente
possíveis face aos meios técnicos disponíveis, são ignorados.
• 1 de abril de 2017. O FC Porto disputa no Estádio da Luz o primeiro
lugar isolado no campeonato. Ainda antes dos dois minutos, numa jogada
disputada perto da bandeirola de canto, o benfiquista Samaris agride Alex
Telles com um soco na cara. Em direto, o lance é transmitido sob o ponto
de vista de quem está nas costas dos jogadores. O movimento do grego é
inequívoco, mas a natureza do seu gesto poderia ser confirmada com ainda
maior veemência se fosse exibida uma imagem obtida através da câmara
que se encontra para lá da linha de baliza. Ela existe e, na mesma
transmissão, foi aproveitada para esclarecer outros lances. Em relação a
este, que deveria ter resultado numa expulsão que deixava o Benfica em
inferioridade numérica com mais de 88 minutos de jogo pela frente,
alguém achou que seria dispensável.
• 29 de abril de 2017. O Estoril enfrenta o Benfica na Luz e, aos 6
minutos, dois jogadores canarinhos isolam-se, beneficiando de posição de
fora de jogo. O árbitro assistente assinala (bem) a irregularidade, que a
BTV se apressa a confirmar (bem) através de uma linha. Um minuto e
cinco segundos depois, dois atletas do Estoril voltam a isolar-se
completamente. O árbitro assistente, uma vez mais, anula esta jogada de
dois para zero, mas desta vez incorre num erro. Nas repetições, a BTV já
não recorre à linha de fora de jogo, que demonstraria cabalmente um erro
grave a favor do Benfica numa jogada que tinha tudo para ser decisiva
para o resultado (mesmo que depois não o viesse a ser para a distribuição
dos pontos). No espaço de um minuto, a dualidade de critérios
impressiona ao ponto de ser quase chocante.
• 9 de agosto de 2017. Aos 71 minutos, o Benfica vai batendo o Braga
na Luz por 3-1, quando os minhotos reduzem através de Ricardo Horta. O
árbitro assistente anula o golo e o videoárbitro não intervém. O lance é
milimétrico, mas uma análise geométrica, a posteriori, revela que o golo
deveria ter sido validado. Na BTV, terá sido a consciência de que o golo
foi limpo e de que o árbitro cometeu um erro que beneficiou o Benfica a
justificar, uma vez mais, a não utilização da linha de fora de jogo.
• 8 de setembro de 2017. O Benfica vai vencendo o Portimonense por
2-1 quando, aos 89 minutos, os algarvios restabelecem a igualdade. O
golo começa por ser validado, mas o videoárbitro acaba por intervir e dar
conta da existência de um fora de jogo no arranque da jogada. Entretanto, a
BTV tinha exibido uma imagem do lance com uma linha que demonstrava
que o avançado estava em posição irregular. Uma linha que, por não se
encontrar junto ao pé do último defensor encarnado e por ter sido traçada
num frame em que a bola já tinha partido do pé do jogador do
Portimonense que faz o último passe (e não no momento do passe), dá a
entender que o fora de jogo, que existe, é mais evidente do que na
realidade. Este erro ou esta manipulação têm uma influência muito direta
na perceção que qualquer pessoa (adeptos do Benfica, do Portimonense,
de outros clubes, árbitros, videoárbitros, etc.) cria do lance através da sua
análise televisiva.

Estes cinco exemplos muito recentes são bem significativos da forma como a
BTV trabalha a transmissão dos jogos caseiros do clube da Luz. Não nos parece
exagerado falar em manipulação e em fraude: há recursos que são utilizados
quando se pretende demonstrar que o Benfica foi prejudicado ou não foi
beneficiado, mas que são deixados na gaveta quando o seu uso é inconveniente; há
câmaras que deixam de existir quando poderiam servir para exibir infrações
encarnadas; os planos mais aproximados ou mais afastados também são
escolhidos em função das conveniências. Durante os primeiros quatro anos destas
transmissões, a principal consequência destes truques era o condicionamento da
opinião pública sobre as arbitragens dos jogos do Benfica: graças a certas
escolhas muitas vezes subtis, mas raramente (ou nunca) inocentes, quase se
poderia pensar que, pelo menos nos jogos em casa, a turma de Vieira não é tão
beneficiada quanto costuma ser. Influencia-se assim os adeptos, mas também os
jornalistas, os árbitros que estão de fora, os responsáveis pela aplicação da
justiça, os dirigentes das instituições que organizam a competição ou têm outras
responsabilidades no futebol português. Desde o arranque de 2017/18, o
panorama torna-se ainda mais grave. Com a introdução do videoárbitro, as
transmissões manipuladas da BTV passam a ter potencial para, em direto,
condicionar as decisões das equipas de arbitragem. Apesar de tanto o
videoárbitro como o seu assistente, que acompanham os jogos a partir de uma
cabine localizada na Cidade do Futebol, em Oeiras, terem acesso a todas as
imagens de todas as câmaras utilizadas na transmissão em clean feed (ou seja,
sem qualquer elemento adicional, como o cronómetro, o painel do marcador ou as
linhas de fora de jogo), a verdade é que nesse mesmo espaço têm acesso a um
ecrã que vai exibindo a transmissão proporcionada ao público em geral pela BTV
ou pela Sport TV. E se é certo que o protocolo do videoárbitro, mesmo
recomendando a disponibilização dessas imagens, determina que elas não podem
ser consideradas para tomada de decisões, não deixa de ser também evidente que
em lances de grande dúvida, tendo o videoárbitro à frente uma imagem que
contém elementos gráficos que podem ajudar a discerni-la, acaba por tornar-se
quase humanamente impossível que as mesmas sejam ignoradas. Dessa forma,
colocar ou não uma linha consoante interessa ou não ao Benfica deixa de ser uma
mera opção editorial que valoriza ou desvaloriza uma transmissão e passa a ser
uma decisão dependente do livre-arbítrio de quem dirige o canal e é
superiormente responsável pelo que é transmitido, que pode ter impacto direto na
arbitragem e na verdade desportiva dos jogos e das competições. A BTV
funciona, assim, como um instrumento do Benfica que permite a criação de uma
nova verdade desportiva (que, muitas vezes, de verdade tem muito pouco),
compreendendo-se, por isso, por que motivo Pedro Guerra, há alguns meses, a
propósito da forma como os jogos são filmados e transmitidos, disse uma frase
que na sua extrema simplicidade acaba por ser profundamente reveladora: “Eu sei
como é que essas coisas se fazem”.

UM ESPAÇO DE CENSURA

Se a BTV, pela forma como funciona como uma agência de comunicação, um


instrumento de poder e um meio de manipulação da verdade desportiva, não fosse
já um canal globalmente muito questionável, pelo menos a nível institucional e
desportivo, a política de verdadeira censura que nele reina transforma-o num
meio de comunicação civicamente desprezível, tal o nível dos atentados às
conquistas do 25 de abril que lá se cometem. Uma vez mais, os exemplos
concretos são por demais significativos.
No dia 11 de agosto de 2017, foi convidado do programa Jogo Limpo (que
ironia haver algo com este nome num canal que pertence ao Benfica), que tem
Pedro Guerra como comentador residente, o político, professor de Direito e
famoso benfiquista Fernando Seara. Em discussão estava o facto de os diretores
de comunicação do FC Porto e do Sporting se expressarem publicamente mesmo
estando castigados pelo Conselho de Disciplina da FPF. O antigo presidente da
Câmara Municipal de Sintra cometeu a ousadia de contrariar o discurso instituído
pelas cartilhas (sublimemente representado neste programa por Pedro Guerra),
que aponta para uma verdadeira lei da rolha. De acordo com Fernando Seara, um
elemento fundamental a ser tido em consideração perante este tipo de problemas é
o respeito pelo princípio constitucional do direito à liberdade de expressão. Em
poucas palavras: um regulamento disciplinar de uma federação não pode colocar
em causa um direito que é universalmente garantido pela Constituição da
República Portuguesa. Enquanto decorria esta exposição, Pedro Guerra
interrompeu-a por diversas vezes para tentar alinhá-la com o discurso do clube,
sempre sem sucesso. Foi preciso recorrer a uma medida mais drástica. A dado
momento, o apresentador Luís Lemos força o comentador a parar através de uma
conveniente saída para intervalo. A reação de Fernando Seara diz tudo: “Já
percebi”.
Poucos dias antes, foi o conhecido locutor de rádio e apresentador Fernando
Alvim, no podcast “Com o Humor não se Brinca”, a dar conta de outro episódio
de censura ocorrido no mesmo canal dois ou três anos antes. Alvim, que para
além de tudo é conhecido por ser um grande benfiquista, tinha concedido à BTV
uma entrevista de uma hora que, segundo o próprio, lhe teria corrido
particularmente bem. Seria transmitida poucos dias depois, mas nunca chegou a ir
para o ar. Na altura, foi-lhe apresentada uma justificação que o deixou
desconfiado: um problema de som tinha tornado aquele conteúdo irreproduzível.
Mais tarde, veio a saber por alguém de dentro o que realmente se tinha passado:
por nessa entrevista ter feito comentários depreciativos sobre o Banco Espírito
Santo, um dos principais parceiros do Benfica ao qual o clube e os seus
dirigentes ficaram a dever mais de 1000 milhões de euros (tendo, por isso, a sua
quota-parte de responsabilidade num desastre financeiro que obrigou à
intervenção do Estado e lesa todos os contribuintes), o diretor de conteúdos do
canal, Pedro Guerra, terá impedido a sua transmissão.
Estes dois casos são reveladores do espírito antidemocrático que condiciona
a programação da BTV. Ironicamente, num deles é objeto de censura alguém que
usava da palavra para defender o princípio constitucional do direito à liberdade
de expressão, uma conquista da democracia portuguesa que, apesar de já contar
com mais de 40 anos, continua longe de ter uma aplicação universal.

FAKE NEWS

As fake news são, provavelmente, a praga que mais contamina e condiciona a


formação da opinião pública na atualidade. Este conceito, que se começou a
disseminar sobretudo a partir das últimas presidenciais dos Estados Unidos da
América, no final de 2016, serve para designar supostas notícias que “são
completamente compostas e manipuladas para se assemelharem a jornalismo
credível e atraírem o máximo de atenção”35. Felizmente, quando comparada com
algumas realidades internacionais, a imprensa portuguesa tem-se mantido
praticamente imune a este fenómeno. Apesar de, com alguma regularidade, serem
publicadas notícias que contêm informação errada e, por vezes, até enviesada ou
manipulada, a verdade é que não existe em Portugal uma prática reiterada de pura
invenção de informação, mas há sempre desonrosas exceções – e talvez a BTV
seja a mais significativa.
No dia 30 de agosto de 2017, no programa da BTV Lanças Apontadas, foi
apresentado um suposto ranking das equipas mais corruptas da Europa, que
coloca o FC Porto em terceiro lugar e que teria sido publicado no jornal inglês
Daily Mail a 12 de janeiro do mesmo ano. Percebeu-se que teria sido o
comentador José Manuel Antunes, vice-presidente do Benfica no mandato de Vale
e Azevedo e seu indefetível apoiante até ao fim, a sugerir a divulgação daquele
conteúdo, que foi objeto de tratamento gráfico pelo canal. Ou seja, não foi
apresentado o tal ranking tal como ele teria sido mostrado no Daily Mail nem no
formato em que o comentador o teria recebido, mas sim através de um quadro
com a chancela do canal, numa emissão dirigida pelo próprio diretor da BTV,
Ricardo Palacin. Durante largos minutos, o painel comentou aquela lista, sendo
destacados os factos de ter sido um jornal estrangeiro a elaborá-la e de qualquer
pessoa a poder consultar facilmente na Internet, numa estratégia evidente de
tentativa de credibilização do seu conteúdo.
Qualquer espectador minimamente atento que assistisse a este programa terá
logo percebido que alguma coisa não batia certo. Por um lado, seria muito
estranho que uma notícia publicada num jornal britânico de grande circulação e
cuja matéria assume tal relevância demorasse quase nove meses a ser conhecida
em Portugal e que fosse logo um programa da BTV a descobri-la. Por outro, a
insistência em argumentos que procuravam reforçar a convicção de que a fonte
seria muito credível podia, por si só, ser encarada como um indício de
insegurança de quem a reproduz. Perante estas circunstâncias, o FC Porto fez o
que se impunha: em primeiro lugar, procurou o tal ranking na Internet quer
através do site do Daily Mail, quer a partir de diversos motores de busca – nada
se encontrou; em seguida, contactou o Daily Mail, na pessoa de alguns dos seus
jornalistas, que confirmaram que não existia nada no site nem na edição de 12 de
janeiro de 2017 e que não tinham qualquer memória de uma publicação com
aquele teor; finalmente, perante estes fortes indícios de que a BTV tinha utilizado
o nome do Daily Mail para tentar credibilizar um conteúdo falso, contactou
formalmente a direção daquele jornal e obteve dos seus serviços jurídicos por
escrito aquilo de que já desconfiava: o ranking divulgado pela BTV não foi
produzido nem divulgado pelo Daily Mail. Em suma, num programa da BTV
apresentado pelo seu diretor foi noticiado um conteúdo falso altamente
difamatório não só do FC Porto, mas também de todas as outras equipas citadas.
Na emissão de 12 de setembro de 2017 do programa Universo Porto da
Bancada, do Porto Canal, o FC Porto denunciou este embuste da BTV, dando
conta de todos os elementos e de todos os passos seguidos pelo clube para
confirmar com certeza absoluta que algo daquela gravidade tinha sido inventado e
divulgado sem qualquer fundamento. No dia seguinte, em nova emissão do Lanças
Apontadas, Ricardo Palacin procurou desresponsabilizar-se, sublinhando que
fora José Manuel Antunes a propor a difusão daquele conteúdo e dando conta de
que aquele programa não é um espaço de informação, pelo que não poderia ser
acusado de difundir notícias falsas (fazendo por ignorar, portanto, que não é só
em programas de informação que se transmitem notícias e que, obviamente, se
está a difundir fake news quando se diz que um jornal publicou algo que
efetivamente nunca o fez). Já o notável dirigente do Benfica da era Vale e
Azevedo, numa atitude que é difícil qualificar em palavras que não sejam muito
duras em relação à sua integridade ou à sua saúde mental, optou por reafirmar que
aquele ranking fora mesmo publicado pelo Daily Mail (apesar de o próprio
jornal confirmar que não o fez) e sugeriu aos telespectadores a consulta do
Google Cached, onde seria possível encontrá-lo. Uma vez mais, não tinha razão,
dado que uma pesquisa no tal site se revelou infrutífera. Ou seja, o programa
Lanças Apontadas, na sua emissão de 13 de setembro, tornou-se reincidente na
propagação de fake news, uma vez que, perante a complacência do diretor do
canal, e mesmo após o Daily Mail ter desmentido a BTV, no mesmo espaço se
continuou a falar de um conteúdo falso como se fosse verdadeiro.

EM RESUMO

A ideia da fundação da BTV remonta aos primeiros tempos de Luís Filipe


Vieira à frente do Benfica e assume-se como um vetor essencial da sua estratégia
de controlo global do futebol português, que tem sido desenvolvida ao longo dos
últimos 15 anos. Desde que foi para o ar, em 2008, este canal serviu de
incubadora quer de um discurso oficial completamente alinhado em relação ao
poder de Vieira, quer de uma série de figuras que funcionam como porta-vozes
dessa linha. Para além disso, tem revelado uma grande capacidade de influenciar
a opinião pública através da imprensa, nomeadamente graças à difusão de
notícias falsas, à propagação insistente de argumentos questionáveis que são
absorvidos com extrema facilidade e à manipulação das transmissões televisivas.
O canal é, para além disso, um instrumento de poder que o Benfica utiliza para
interferir no mercado dos direitos televisivos, furando qualquer veleidade de
centralização destes direitos (como acontece, por exemplo, na liga inglesa),
pressionando a Sport TV para um alinhamento pró-Luz mais acentuado e
condicionando, a partir de 2017/18, as decisões dos videoárbitros e o alcance da
verdade desportiva do campeonato. No fundo, a BTV é um ponto de confluência
de tudo o que há de pior, por um lado, no futebol português e, por outro, no
panorama dos media: desempenha um papel fundamental nos esquemas que os
homens de Luís Filipe Vieira têm levado a cabo para manobrar o futebol
português e obter benefícios desportivos para o Benfica e é um órgão de
comunicação social condicionado por uma censura muito dura (um verdadeiro
“lápis vermelho”) que, para além disso, se presta à difusão reiterada de notícias
falsas.

34
http://www.jornaldenegocios.pt/empresas/detalhe/slb_confirma_agrave_cmvm_que_benfica_tv_vai_transmitir_jogos_da_liga
35
É muito interessante o artigo de Elle Hunt sobre este fenómeno publicado no The Guardian: “What is fake
news? How to spot it and what you can do to stop it”. https://www.theguardian.com/media/2016/dec/18/what-
is-fake-news-pizzagate
O futebol é um espaço privilegiado de manifestações de irracionalidade dos
adeptos, seja sob a forma de paixões assolapadas, seja como ódios que com
alguma frequência resvalam para situações de violência. Nenhum clube é imune a
umas ou às outras. Dos maiores aos mais pequenos, todos são apoiados por
indivíduos que, de forma mais ou menos organizada, protagonizaram momentos
infelizes, tanto nos estádios durante os jogos como noutros contextos. No
panorama do futebol português, o Benfica é um caso à parte. Por um lado, porque
os seus adeptos estão associados a um (incomparavelmente) maior histórico de
violência; por outro, porque as suas claques constituem um caso excecional no
panorama legal e institucional do desporto português, pelo nível de impunidade
fomentado por uma relação (ilegítima) com o clube – uma realidade que a
imprensa portuguesa muitas vezes esquece, mas que até a France Football já
destacou como um dos “sinais de declínio” do futebol português da atualidade36.

UM HISTÓRICO DE VIOLÊNCIA

Nos últimos 21 anos, a gravidade dos atos cometidos por membros das
claques do Benfica, supostamente no quadro do apoio ao clube, é inimaginável e
muito significativa, mesmo se pensarmos à escala internacional. Recordamos
apenas meia dúzia dos que fizeram correr mais tinta.

18 de maio de 1996. No Estádio Nacional, em Oeiras, Benfica e Sporting


disputam a final da Taça de Portugal. Da bancada onde se encontram as claques
encarnadas, vão sendo disparados very lights que procuram atingir o espaço onde
se concentram mais adeptos do Sporting. De acordo com o relato de um presente
no local, é à terceira tentativa que, finalmente, é alcançado o objetivo: um adepto
do Sporting é atingido e morto. As testemunhas no local, quer de um lado quer do
outro, não têm dúvidas quanto à intencionalidade do ato37. Hugo Inácio, que
disparou o engenho pirotécnico, viria a ser condenado a quatro anos de prisão por
homicídio por negligência grosseira. Mais tarde, fugiria da prisão e viria a ser
objeto de outras condenações por crimes cometidos no âmbito de jogos do
Benfica.

4 de junho de 1997. A equipa de hóquei em patins do FC Porto desloca-se ao


pavilhão da Luz. No final do jogo, o autocarro dos Dragões sofre uma emboscada
e é bloqueado. Membros de claques do Benfica assaltam a bagageira do veículo e
apanham tudo o que podem. Segundos depois, os atletas portistas estão a ser
agredidos com os seus próprios sticks. O hoquista Filipe Santos, histórico capitão
azul e branco, sofre lesões graves na cabeça que o deixam em coma, tornam
inevitável o recurso a uma intervenção cirúrgica e impedem-no de competir
durante vários meses.

20 de junho de 2008. Uma vez mais, um episódio de violência em torno de


um autocarro (desta vez de adeptos) ligado ao FC Porto, que é atacado nas
imediações do Estádio da Luz durante um jogo de hóquei. A viatura é incendiada
e fica completamente destruída. Ao mesmo tempo, decorria um jogo de futsal
entre Benfica e Belenenses, do qual, segundo testemunhas, saíram cerca de meia
centena de apoiantes dos encarnados que poderão ter estado envolvidos neste ato
de vandalismo.

30 de agosto de 2008. O Benfica recebe o FC Porto no Estádio da Luz. Em


pleno jogo, um adepto dos encarnados conhecido como Diabo de Gaia entra em
campo e agride um árbitro assistente, apertando-lhe o pescoço. Na sequência
deste caso, viria a ser condenado a um ano de prisão (com a pena a ser
substituída por uma multa) e à interdição de acesso a recintos desportivos durante
o mesmo período. Mais recentemente, em 2016, foi-lhe aplicada uma pena de
quatro anos de prisão efetiva por liderar um gangue de contrabando de tabaco.
Entretanto, ao Benfica, responsável por uma gravíssima falha de segurança, nada
de relevante aconteceu, tendo o caso sido resolvido pela Comissão Disciplinar da
Liga, então dirigida pelo inefável Ricardo Costa, com uma simples multa.

22 de abril de 2017. A turma de Luís Filipe Vieira desloca-se ao Estádio de


Alvalade para disputar uma partida que tinha potencial para ser decisiva na
definição do título. Na madrugada anterior, numa rotunda junto ao Estádio da Luz,
adeptos dos dois rivais lisboetas envolvem-se em escaramuças. Marco Ficini, um
italiano de 41 anos que apoiava o Sporting, é atropelado mortalmente. Nos dias
seguintes, apura-se que as circunstâncias da sua morte, em que estiveram
envolvidos elementos da claque No Name Boys, foram particularmente violentas
e cruéis.

26 de agosto de 2017. Em Vila do Conde, o Rio Ave recebe o Benfica numa


partida que termina empatada a uma bola. No final do jogo, uma falha de
segurança permite que os adeptos localizados na bancada dedicada aos
encarnados, a maior parte deles pertencentes a claques, abandonem o estádio ao
mesmo tempo que os apoiantes do Rio Ave. Num ápice, desenvolve-se um
chorrilho de atos de violência perpetrados por benfiquistas contra os adeptos da
equipa da casa. As agressões resultaram em vários feridos, com alguns a
necessitarem de assistência hospitalar.

Estes seis casos são apenas uma amostra curta do terror que, com mais
frequência do que é admissível num país civilizado, um grupo de adeptos do
Benfica espalha pelos estádios portugueses. É evidente que é preciso ter cuidado
com as considerações que se tece a este propósito. Todos os clubes têm adeptos
que em certos momentos se excedem. E, em abstrato, nenhum clube pode ser
responsabilizado por atos que não tem como controlar ou evitar. O caso muda de
figura quando existe um enquadramento legal que enforma as atividades das
claques e quando, mesmo perante o incumprimento assumido, reiterado e até
orgulhoso dos preceitos legais, os clubes continuam a apoiá-las ilegitimamente.
O APOIO DO CLUBE

Em 2009, a Assembleia da República aprovou uma lei que “estabelece o


regime jurídico de combate à violência, ao racismo, à xenofobia e à intolerância
nos espetáculos desportivos, de forma a possibilitar a realização dos mesmos
com segurança”38. Esse diploma estabelece que as claques dos clubes,
previamente constituídas como associações, devem registar-se enquanto Grupos
Organizados de Adeptos junto do Instituto Português do Desporto e Juventude
(IPDJ). A 31 de julho de 2017, o IPDJ comunicou ao jornal Expresso que se
encontravam regularizadas 23 claques: duas do FC Porto, quatro do Sporting,
duas do Vitória de Setúbal, uma de Boavista, Marítimo, Vitória de Guimarães,
Nacional, Leixões, Naval, Beira-Mar, Feirense, Tondela, União da Madeira,
Académica, Arouca, Gil Vicente, Desportivo das Aves e Sanjoanense39. Isso
significa que as autoridades receberam, de cada um dos grupos, uma lista dos
seus membros, integrando os seus dados pessoais e os contactos, que é atualizada
trimestralmente. Por estarem regularizadas, estas claques, por um lado, têm o
direito a ser apoiadas pelos respetivos clubes e, por outro, podem frequentar os
estádios exibindo elementos (como tarjas) que as identifiquem claramente. O
IPDJ confirma que nunca foi registada qualquer claque do Benfica.
Perante este panorama, nem os No Name Boys nem os Diabos Vermelhos
podem legalmente receber qualquer tipo de apoio do clube da Luz. Não é isso que
acontece. Ambas as claques são ativamente apoiadas pela direção do Benfica,
que, assim, para além de cometer uma ilegalidade, se torna moralmente
responsável pelas suas ações, uma vez que é materialmente responsável pela sua
existência. São diversas as provas desse apoio.
A primeira e mais evidente passa pelo facto de os membros das claques
encarnadas ocuparem um setor específico do Estádio da Luz, claramente
identificado e destacado face aos restantes adeptos – até há bem pouco tempo,
abundavam as tarjas alusivas a esses grupos, entretanto (convenientemente)
reservadas para exibição nos jogos fora de casa. Naturalmente, só com apoio do
clube é possível assegurar que uma determinada parte de um recinto desportivo
fique exclusivamente adstrita a esse grupo, a quem são destinados os bilhetes ou
lugares anuais correspondentes àquele espaço. Ainda assim, o Benfica, através
das suas sempre anónimas “fontes oficiais”, prefere atirar areia para os olhos da
opinião pública, fugindo despudoradamente à verdade: “Não controlamos os
grupos de adeptos que, de forma livre, se organizam para comprarem bilhetes
para setores do estádio todos juntos. É isso que fazem: vêm para as bilheteiras,
compram ingressos para a mesma zona, mas isso não tem a ver com o clube”40.
Se dúvidas houvesse a propósito da falsidade destas declarações, a divulgação,
na Sporting TV, de uma fatura de um lugar anual na Luz dissipou-as por completo:
é o próprio clube que designa o setor 12 do piso 0 do estádio como “claque
NN”41.
A generosidade do Benfica em relação aos seus “grupos organizados de
adeptos” está longe de se esgotar nos apoios para as partidas na Luz. A 23 de
fevereiro de 2017, o diretor de prevenção, segurança e organização de jogos do
Benfica, Rui Pereira, enviou um email ao administrador Domingos Soares de
Oliveira dando conta de um contacto da PSP relativo a incidentes ocorridos na
estação de serviço de Aveiras, após um jogo entre o Sporting de Braga e a turma
de Carnide. Durante uma mudança de turno de funcionários e após terem
importunado a gerente do estabelecimento, elementos dos No Name Boys teriam
fugido sem pagar, em três carrinhas Mercedes Vito, numa manobra que, de acordo
com a própria gerente, era muito frequente em dias de jogos do Benfica fora de
casa. Para além disso, a responsável pela bomba teria revelado saber
perfeitamente não só que eram elementos das claques encarnadas que cometiam
aqueles atos, mas também que era o próprio clube que as financiava, uma vez que,
quando ocasionalmente decidiam pagar o combustível de que se abasteciam, as
faturas eram solicitadas em nome do Benfica. Face a estes comportamentos, Rui
Pereira transmitiu diversas preocupações: a) a PSP sabe há muito tempo que o
Benfica paga o aluguer de carrinhas destinadas aos No Name Boys; b) a PSP tinha
ficado a saber que o clube também lhes paga o combustível; c) a PSP poderia vir
a elaborar um auto de ocorrência associando o nome do Benfica à prática de
crimes, na medida em que era o clube que financiava os alugueres das viaturas
que estavam na origem dos ilícitos; d) a PSP considera que tanto os No Name
Boys como os Diabos Vermelhos “andam muito à vontade”. À parte deste
episódio, Rui Pereira informa que também pode vir a ser fonte de problemas para
o clube o facto de Hugo Caturna, um dos alegados líderes dos No Name Boys,
vender bilhetes para jogos do Benfica nas imediações do Estádio da Luz,
transportando sacos com 200 a 300 ingressos, cuja origem poderia vir a ser
questionada pelas autoridades. Num sinal evidente de respeito (ou temor?) em
relação às claques, Rui Pereira sugere que estes assuntos sejam tratados “com
pinças”, uma vez que seria importante evitar uma “quebra da acalmia que temos
vivido nos nossos jogos caseiros nos últimos recentes anos”42.
A 5 de agosto de 2017, disputou-se em Aveiro a Supertaça Cândido de
Oliveira, com o Benfica a enfrentar o Vitória de Guimarães. Mais de duas horas
antes do início da partida, ainda não estavam as portas do estádio abertas ao
público em geral, já havia membros das claques do clube da Luz no interior do
recinto, decorando com faixas de apoio à equipa o espaço que viriam a ocupar
durante o jogo – uma atividade que, de acordo com a legislação, é reservada aos
grupos de adeptos devidamente registados. Esta ação só foi possível porque a
entidade organizadora da prova, a FPF, a viabilizou. E a Federação só a pode ter
viabilizado por os grupos em causa serem reconhecidos, ainda que informal e
discretamente, pelo próprio Benfica. Dificilmente algum seguidor atento do
futebol português poderia ter dúvidas a esse respeito, mas também essas foram
claramente dissipadas através de um vídeo que rapidamente se espalhou pelas
redes sociais: foi o funcionário do Benfica Nuno Gago, antigo membro dos No
Name Boys e atual oficial de ligação aos adeptos dos encarnados, que
acompanhou e auxiliou os elementos das claques na colocação das tarjas43.
Os resultados concretos da sua ação são difíceis de discernir pela opinião
pública, mas há sinais evidentes de que o IPDJ tem consciência deste panorama
de irregularidades fomentado pelo Benfica. Segundo o Record, num relatório de
95 páginas, esse instituto público identifica diversos casos de apoio ilegítimo do
clube da Luz às suas claques durante 2014 (presumindo-se que o documento é de
2017, é bastante preocupante a morosidade da atuação perante problemas deste
calibre) e propõe até uma multa de 37 250 euros ao Benfica44. Um valor irrisório
que não pode suscitar outro comentário: aparentemente, para os lados da Luz, o
crime compensa.

AUTORIDADES DE OLHOS FECHADOS?

É difícil compreender como é que as claques do Benfica, fonte de tantos e tão


graves incidentes ao longo das últimas décadas, continuam livremente a espalhar
o seu rasto de criminalidade pelo país perante a complacência das mais diversas
autoridades – sejam institucionais do futebol, sejam judiciais, sejam políticas.
A FPF, aparentemente, ainda não está consciente da seriedade de um dos
maiores problemas da atualidade do futebol português – ao contrário, por
exemplo, do que acontece com a France Football, que revela ter bem noção da
sua gravidade. Não se conhece desta instituição uma ação concreta, um sinal ou
sequer uma palavra sobre este assunto. Se é verdade que Fernando Gomes já deu
conta da preocupação em relação ao “clima de ódio [que] tem tido reflexo
também entre os adeptos”, é igualmente certo que nunca se pronunciou sobre o
problema específico das claques que não se encontram regularizadas, dos crimes
que as mesmas cometem e das dificuldades de identificação e responsabilização
dos infratores que a ausência de registos no quadro da lei implicam.
O IPDJ, como antes se referiu, já deu sinais de que conhece este problema e
de que pode ter alguma noção das suas implicações. As ações concretas até ao
momento, pelo menos as que são conhecidas, é que deixam a desejar ou são um
reflexo de uma preocupante ausência de capacidade de atuação. Houve uma
exceção: durante o verão de 2017, o Estádio da Luz chegou a estar interditado
pelo IPDJ devido a irregularidades do seu regulamento de segurança relacionadas
com o apoio às claques ilegais45. O regulamento foi corrigido quase da noite para
o dia e não se chegou a verificar qualquer reflexo prático do impedimento de
realização de jogos no recinto.
As outras autoridades do Estado, tanto judiciais como políticas, parecem não
ter despertado verdadeiramente para o problema. É verdade que tanto a
Assembleia da República como o Governo já legislaram sobre as claques em
mais do que uma ocasião. Entretanto, vários anos passaram e as realidades que
mais diretamente terão influenciado a produção dessa legislação mantêm-se
inalteradas (ou até agravadas). Cabe ao poder político acompanhar a execução
das normas que produz e realizar as adaptações que considere adequadas em
função da realidade. E cabe ao poder judicial identificar as circunstâncias de
incumprimento da lei e julgar e punir os infratores. Tanto em relação a um caso
como ao outro, continuamos todos sentados à espera da respetiva atuação.
Entretanto, os crimes continuam a ser cometidos.

EM RESUMO

A irregularidade jurídica em que vivem as claques do Benfica é grave. O


apoio ilegal que o clube lhes presta é mais grave ainda. E quase tão criticável e
perigoso como isso é o facto de o primeiro-ministro da Luz, Luís Filipe Vieira,
ainda gozar com a situação: “Claques? Não sei que palavra é essa. Sei o que são
sócios organizados. Nunca soube que o Benfica tinha claques”46. Com este tipo
de comportamentos, a direção do clube valida uma atitude orgulhosamente
ostensiva de uma parte dos seus adeptos, que não tem qualquer problema em
celebrar a ilegalidade em que se encontra (um cântico muitas vezes ouvido na Luz
e nos seus pavilhões diz pura e simplesmente: “Ilegais, ilegais”), que até assume
fazer parte da sua identidade: “É uma filosofia: sem nome, sem cara. E é esse o
nosso orgulho”, declarou um membro dos No Name Boys ao jornal Soli47.
As claques estão para o Benfica como as milícias paramilitares estão para os
regimes ditatoriais: atuam à margem da lei com o apoio ativo (mesmo que
encapotado) do regime, espalhando o terror em favor dos seus interesses. E isso
só acontece porque em Portugal as autoridades não atuam quando e como devem.

36
Nicolas Vilas, “Portugal. Les signes du déclin”. France Football. N.º 3724 (19 de setembro de 2017), pp.
60-61.
37
http://www.record.pt/especial/detalhe/very-light-nao-foi-acidente-936085.html
38
Lei n.º 39/2009, de 30 de julho, alterada pelo Decreto-Lei n.º 114/2011, de 30 de novembro, e pela Lei n.º
52/2013, de 25 de julho. Os diplomas estão disponíveis online em: http://www.gmcs.pt/pt/lei-n-392009-de-30-
de-julho
39
http://tribunaexpresso.pt/benfica/2017-07-31-Como-e-que-se-regula-as-claques--O-IPDJ-explica-1
40
http://observador.pt/especiais/claques-como-nasceram-de-que-forma-evoluiram-no-que-se-tornaram-com-
polemicas-e-violencia-pelo-meio/
41
http://www.record.pt/futebol/futebol-nacional/liga-nos/sporting/detalhe/nuno-saraiva-mostra-fatura-de-red-
pass-com-referencia-a-claque-nn.html
42
Estes documentos, cuja veracidade nunca foi contestada pelas partes envolvidas, foram publicados no blogue
Benficaleaks: http://benficaleaks.blogspot.pt/2017/04/e-agora-o-benfica-vai-continuar-negar-o.html
43
https://www.ojogo.pt/futebol/1a-liga/porto/noticias/interior/francisco-j-marques-denuncia-funcionario-do-
benfica-a-ajudar-no-name-boys-na-supertaca-8687516.html
44
http://www.record.pt/futebol/futebol-nacional/liga-nos/benfica/detalhe/ipdj-confirma-que-benfica-da-apoio-
ilegal-as-claques.html
45
https://www.ojogo.pt/futebol/1a-liga/benfica/noticias/interior/benfica-impedido-de-jogar-na-luz-por-causa-das-
claques-jogo-com-braga-em-risco-8673735.html
46
https://www.dn.pt/desporto/benfica/interior/o-benfica-nao-quer-ser-campeao-da-pre-epoca-8675252.html
47
https://sol.sapo.pt/artigo/398584/claques-a-margem-da-lei
O Benfica é um clube de regime. E isso significa que é um clube que serve o
regime e se serve do regime, na mesma medida em que o regime se serve do
Benfica. Qual regime? Todos os regimes, como se verá. O facto de a turma da Luz
ser, pelo menos desde meados do século passado, o clube nacional que tem mais
adeptos, colocou-o numa situação privilegiada no que toca às relações com o
poder político. Favorecer o Benfica, aos olhos de muitos decisores, equivale a
beneficiar, pelo menos indiretamente, uma fatia importante da população. A
circunstância de se tratar de um clube sedeado na capital de um país
profundamente centralizado exponencia essa posição favorável muito singular.
Para justificar estas ideias, nem seria necessário avançar mais informações ou
argumentos. Tudo o que se escreveu nos sete capítulos anteriores só é possível,
precisamente, por se estar a falar de um clube ao qual o poder vai permitindo
(quase) tudo. Ainda assim, há alguns sinais muito concretos e evidentes que dão
conta da estreita relação entre o Benfica e o poder político que importa assinalar.

SEMPRE LADO A LADO

Um dos sinais públicos mais evidentes da proximidade entre o Benfica e o


poder político passa pelas constantes aparições públicas de membros do
Governo, presidentes de câmara, deputados e outros políticos junto de elementos
dos órgãos sociais do clube. Seja nos camarotes do Estádio da Luz, seja em
eventos públicos dos mais diversos tipos, são muito frequentes estas exibições de
intimidade entre o poder e o Benfica, sendo que a maior parte das vezes as
imagens transmitem uma sensação de que se trata de uma relação desigual em que
é o clube, e muito particularmente Vieira, que tem uma ascendência hierárquica.
Ao longo da temporada 2016/2017, causaram particular impacto as diversas
presenças do primeiro-ministro António Costa e do ministro das Finanças Mário
Centeno na tribuna presidencial da Luz, sempre ao lado de alguém que direta ou
indiretamente (através de empresas de que é proprietário ou dirigente) deve
centenas de milhões de euros ao Estado e a instituições intervencionadas pelo
Estado.
Esta tendência para a comparência de figuras do regime nos jogos caseiros do
Benfica remonta aos “tempos da outra senhora”. Antes do 25 de Abril, na própria
época em que se realiza a revolução (1973/74), Agostinho Barbieri Cardoso,
subdiretor da Direção-Geral de Segurança (a nova designação da PIDE durante a
governação de Marcelo Caetano), e, portanto, um dos carrascos da repressão
policial e política do Estado Novo, tinha um livre-trânsito que lhe permitia
assistir às partidas dos encarnados no Estádio da Luz na qualidade de “convidado
dos órgãos sociais”. Esta é apenas mais uma prova da relação estreita entre o
Benfica e o fascismo português (não é, evidentemente, um exclusivo deste clube)
que não pode ser apagada por nenhuma cartilha que procure apresentar a turma de
Eusébio como um baluarte da resistência ao Estado Novo – nunca o foi.

Fig. 8: O cartão de convidado dos órgãos sociais do clube da Luz para o


biénio 1973/74, em nome de Agostinho Barbieri.
OS FAVORES DO PODER POLÍTICO

A proximidade entre o Benfica e o poder não seria algo de problemático se


apenas se manifestasse desta forma, ou seja, através de aparições públicas dos
seus dirigentes junto dos protagonistas políticos do Estado. A verdade é que este
clube, ao longo de várias décadas, tem beneficiado recorrentemente de situações
excecionais proporcionadas por quem tem autoridade para as promover. Da
mesma forma que as arbitragens ou a justiça desportiva, por norma, não têm
conseguido assegurar a equidade e isenção que se exige face às outras equipas
quando é o Benfica que está em causa, também os políticos têm uma propensão,
que quase parece natural, para tratar o clube de forma diferente. Os exemplos são
vários e permitem recuar, uma vez mais, até ao Estado Novo.
Um dos principais favores proporcionados pelo poder ao Benfica foi
promovido pelo próprio António de Oliveira Salazar e é de conhecimento quase
universal: o travão colocado em diversos momentos à saída de Eusébio para o
estrangeiro. Ao contrário do que muitas vezes acontece com episódios deste
género, não se trata de um mito ou de uma efabulação popular. Aconteceu mesmo.
Foi o próprio antigo jogador que o confirmou, em entrevista ao Expresso a 12 de
novembro de 2011: “Houve a Juventus e depois o Inter de Milão. Mas o
‘padrinho’, a alcunha que eu pus ao Salazar, não deixou. Acho que ele gostava do
país e gostava tanto que não me deixava ir porque pensava que era importante
para o país. Eh, pá, fui oito vezes ter com ele à Assembleia. Eu, o Coluna e o
diretor do Benfica. O Coluna só me dizia baixinho: Não digas nada. […] Só
queria dizer-lhe que não o conhecia de lado nenhum, o que era verdade. Era muito
ingénuo, eu sei, mas não tinha roubado ninguém, não tinha cometido nenhum
crime. Só queria perguntar-lhe porque é que não me deixava sair”48. Ou seja, na
época de maior sucesso desportivo da história centenária do Benfica, houve um
ditador que influenciou direta e ativamente a política desportiva do clube (e, para
o caso, é indiferente se o fazia devido a motivações desportivas ou meramente
políticas ou propagandistas), impedindo por diversas vezes aquele que era, de
longe, o seu melhor e mais decisivo jogador de se mudar para o estrangeiro.
Já no início deste século, fez correr muita tinta um acordo do Benfica com o
Estado tendo em vista a regularização de dívidas fiscais. Durante vários anos, o
clube não entregou ao erário público o valor do IRS que era descontado aos
salários dos jogadores, ficando devedor de cerca de dez milhões de euros às
autoridades tributárias. Em 2001, para poder assinar um contrato relacionado com
a construção do estádio, a direção encarnada necessitou de uma declaração que
atestasse uma situação fiscal regularizada, o que não correspondia à realidade. A
certidão de que o clube precisava só poderia ser passada se houvesse uma
impugnação da liquidação da dívida no quadro da legislação fiscal vigente, o que
implicava a entrega de garantias. E foi nesse ponto que o caso se tornou
particularmente polémico: o Benfica entregou como garantia 20% das ações da
SAD do clube, que nem sequer se encontravam cotadas em Bolsa, avaliando-as
unitariamente em 3,30 euros, um valor que foi considerado manifestamente
exagerado. Ou seja, o clube, à época encabeçado por Manuel Vilarinho e Luís
Filipe Vieira, teve a oportunidade de apresentar como garantia do pagamento de
uma dívida elevada algo que, na verdade, tinha muito pouco valor – uma decisão
validada pela então ministra das Finanças, Manuela Ferreira Leite49. Esta
deliberação é especialmente questionável tendo em conta que surgiu numa altura
em que o Governo de Durão Barroso estava em funções há poucos meses e em
que as eleições que o tinham levado ao poder tinham contado com algo de
absolutamente inédito: pela primeira vez (e única até agora) na história da
democracia portuguesa, um clube participou ativa e assumidamente na campanha
eleitoral, recomendando aos seus adeptos que votassem num determinado partido.
As declarações do presidente Manuel Vilarinho num comício do PSD, em que
Luís Filipe Vieira também participou, são inequívocas: “Foi uma decisão, uma
deliberação dos órgãos sociais do Benfica: apoiar esta candidatura, apoiar o
PSD. Exatamente para ter influência nas eleições. Nós não somos feijão-frade.
Não temos duas caras. Queremos que tenha influência”50.
Em 2015, foi a vez de a Câmara Municipal de Lisboa procurar beneficiar o
Benfica, fazendo os possíveis para isentar o clube de cerca de 4,6 milhões de
euros em taxas municipais relativas a uma alteração ao loteamento inicial dos
terrenos do estádio: estavam em causa 2,6 milhões de euros de “taxa pela
realização, manutenção e reforço das infraestruturas urbanísticas” e cerca de 2
milhões de euros de “alterações urbanísticas”. A proposta de isenção teve origem
no próprio clube e foi bem acolhida pela maioria do executivo liderado por
António Costa, apesar da recusa de todos os vereadores da oposição e de um
vereador do PS. Os serviços jurídicos da Câmara também emitiram um parecer
negativo, por considerarem que a proposta não se encontrava devidamente
fundamentada, pelo que carecia de legalidade51. A insistência do executivo neste
perdão de impostos agitou até a oposição da presidente da Assembleia
Municipal, Helena Roseta, eleita nas listas do PS (o partido da maioria), que
afirmou que o órgão que dirigia só poderia vir a chumbar aquela deliberação, em
nome “dos princípios da transparência e da legalidade”52. A oposição a esta
iniciativa foi de tal forma veemente que a vereação de António Costa acabou por
recuar e solicitar à Assembleia a devolução da proposta ainda antes da sua
votação. Foi por muito pouco que, ao arrepio da legalidade, o erário público não
foi lesado em quase cinco milhões de euros, que ficariam a repousar nos cofres
do Benfica, quando, na verdade, deveriam servir os interesses dos cidadãos de
Lisboa.

UM CASO EXEMPLAR: A INTERFERÊNCIA NAS AUTÁRQUICAS DE


2017

Como se disse na abertura deste capítulo, o Benfica serve-se do regime, do


poder e dos políticos na mesma medida em que o regime, o poder e os políticos
se servem do Benfica. Nas últimas autárquicas, o caso da campanha eleitoral de
Oeiras é, a esse nível, verdadeiramente exemplar.
Em setembro de 2017, começou a circular a informação de que o Benfica
construiria em Oeiras um centro de alto rendimento que funcionaria como uma
verdadeira “casa das modalidades”. À primeira vista, tudo normal, não fosse dar-
se o caso de, por um lado, esta notícia ter surgido em plena campanha eleitoral e
de, por outro, o anúncio ser factualmente falso: a construção do empreendimento
foi apresentada como uma inevitabilidade quando, na verdade, tem sido
sucessivamente travada pelos serviços da câmara. Uma cronologia breve do
processo é bastante esclarecedora:
1. A 30 de maio de 2017, na sequência de um pedido de informação do
Benfica relativo à construção de uma “Cidade Desportiva das
Modalidades/Centro de Alto Rendimento” do clube em terrenos
municipais, a Divisão de Planeamento do Departamento de Planeamento e
Gestão Urbanística da Câmara Municipal de Oeiras emitiu um documento
em que concluiu que “a proposta em referência não recolhe
enquadramento urbanístico que permita a sua concretização”.
2. A 13 de setembro de 2017, o mesmo organismo da Câmara Municipal de
Oeiras emitiu um novo parecer em que identificou diversos procedimentos
legais cuja concretização seria indispensável para a viabilização da
construção: “A proposta para a Cidade Desportiva das
Modalidades/Centro de Alto Rendimento só poderá ter sequência após os
processos mencionados”.
3. A 18 de setembro, o Correio da Manhã anunciou o que estava para vir:
“Benfica entra na campanha em Oeiras”53.
4. A 19 de setembro, arrancou oficialmente a campanha eleitoral para as
autárquicas de 2017.
5. A 21 de setembro, o Benfica deu conta do projeto no seu site, recorrendo
a um título sugestivo: “Vem aí mais uma obra à Benfica”.
6. No dia seguinte, realizou-se uma visita de Paulo Vistas, presidente da
Câmara de Oeiras e recandidato nestas eleições, e de Luís Filipe Vieira,
acompanhados de jornalistas, aos terrenos onde supostamente viria a ser
construído o Centro de Alto Rendimento. Em todas as declarações
públicas, o projeto é apresentado como algo consumado.

Esta sequência cronológica permite perceber com grande facilidade que os


preceitos legais indispensáveis para a construção do Centro de Alto Rendimento
não estavam cumpridos no momento em que o mesmo foi anunciado. E nem se está
perante uma mera formalidade, uma vez que o facto de os terrenos se localizarem
em plena Reserva Ecológica Nacional e de albergarem uma parte de um
monumento nacional (o Aqueduto das Águas Livres) não torna líquida a
ultrapassagem destes entraves. Tendo isto conta, só um motivo pode explicar o
facto de se ter precipitado este anúncio, fazendo-o coincidir com a campanha
eleitoral: tentar influenciar as eleições, procurando canalizar para Paulo Vistas o
máximo de votos de adeptos benfiquistas. Felizmente, o povo não é estúpido e
não se deixa enlear em manobras de propaganda tão básica. O candidato oficioso
do Benfica à Câmara de Oeiras ficou muito longe de alcançar o seu objetivo: foi
rejeitado por cerca de 86% do eleitorado e ficou a mais de 27% de distância do
vencedor.

O PERFIL POLÍTICO DO BENFICA

O que já se escreveu neste livro sobre diversos assuntos associados à relação


entre o Benfica e os poderes públicos é suficiente para se traçar uma
“radiografia” ao perfil político do clube. Uma característica salta muito
facilmente à vista: é um clube profundamente antidemocrático. Há vários aspetos
que o demonstram claramente:
1. Ao contrário do que acontece na generalidade dos regimes e das
instituições democráticas (como o FC Porto), nas eleições do Benfica não
se aplica a regra de “um homem / um voto”, que decorre do princípio da
igualdade de todos perante a lei. Os estatutos encarnados preveem
diferentes escalões em que, consoante a antiguidade, cada sócio tem
direito a x número de votos.
2. Nas eleições benfiquistas, também há restrições sérias à apresentação de
candidaturas. Só pode ser candidato a presidente um sócio que tenha
completado 25 anos de filiação após os 18 anos de idade – uma medida
tomada em pleno mandato de Luís Filipe Vieira para afastar potenciais
candidaturas à presidência de figuras como José Veiga ou Rui Costa, que a
dada altura apareceram como possíveis alternativas ao poder instituído.
3. Uma das principais características do poder vieirista que o aproxima de
qualquer ditadura é a aniquilação das oposições. São inúmeras as vozes
que, ao longo dos últimos 15 anos, se insurgiram contra a gestão do
Benfica e que, passado pouco tempo, sucumbiram perante os encantos de
sedução de Vieira, passando a apoiá-lo incondicionalmente. São, por
exemplo, os casos de José Eduardo Moniz, Rui Rangel e Varandas
Fernandes, ou até de personagens menores, como José Marinho.
4. Como já se deu conta nesta obra, na BTV existe censura – um verdadeiro
lápis vermelho que normalmente é riscado pelo censor Pedro Guerra.
5. Tal como os regimes ditatoriais têm milícias paramilitares, o “Estado
Vieirista” tem as claques (ilegais e financiadas pelo clube) que funcionam
como elementos difusores de terror, em nome dos preceitos do regime.
6. A propaganda do vieirismo não é muito distinta da dos regimes ditatoriais,
uma vez que tem origem no próprio clube e é imposto aos seus
comentadores, exaltando todas as supostas virtudes do líder e procurando
encarnar dele a glória do clube e do regime.
7. O pensamento único que o clube procura promover a propósito de todos
os assuntos e o condicionamento da liberdade intelectual de quem
intervém na comunicação social, direta ou indiretamente, em nome do
Benfica (seja na condição de adepto, seja na suposta condição de
comentador “independente”) são características próprias de estados
totalitários, em que todas as liberdades são sacrificadas em prol de um
valor comum (o próprio Estado, o líder, uma ideia, etc.).

Este perfil político antidemocrático, com o qual provavelmente muitos dos


adeptos do Benfica não se identificam, mas que tem sido muitíssimo aprofundado
por quem dirige o clube na última década e meia, é a génese de todos os
comportamentos ilícitos (ou, pelo menos, imorais) que foram descritos nas
páginas anteriores e que têm tido como consequência o agrilhoamento do futebol
português, cada vez mais asfixiado pelas amarras do “nacional-benfiquismo”.

EM RESUMO

Os resultados do clube encarnado na última década e meia têm no(s)


regime(s) um forte aliado. É bem evidente o apoio de diversas instituições e
personalidades políticas, que foi claro durante o período do Estado Novo, mas
surpreendente nos anos mais recentes. Os perdões e benefícios fiscais,
consumados ou quase consumados, são particularmente escandalosos, menos para
quem conhece e reconhece as opções centralistas da política portuguesa.
Para além desses benefícios do sistema político, há, no clube de Carnide, uma
espécie de regime político próprio, semelhante aos dos países ditatoriais. O
“Regime Vieirista”, através do seu primeiro-ministro ou dos seus “secretários de
Estado”, controla com mão de ferro a comunicação externa e interna e os
movimentos daqueles que têm uma opinião diferente da do líder, podendo tornar-
se incómodos. Não será por isso de estranhar que destacadas figuras do clube,
como Rui Costa ou, mais recentemente, Nuno Gomes, tenham acabado por se
apagar ou se afastar do Benfica.

48
http://tribunaexpresso.pt/arquivos-expresso/2017-01-25-Fui-ter-com-o-Salazar-oito-vezes.-O-Coluna-so-me-
dizia-para-estar-caladinho-eu-so-queria-perguntar-ao-homem-porque-nao-me-deixava-sair
49
https://www.publico.pt/2002/06/04/economia/noticia/ferreira-leite-despachou-a-favor-do-benfica-148689
50
http://expresso.sapo.pt/politica/2015-09-16-O-golo-de-Vilarinho-que-lesionou-Durao-Barroso-2
51
http://observador.pt/2015/03/18/parecer-juridico-pede-camara-lisboa-fundamente-isencao-taxas-ao-benfica/
52
https://www.publico.pt/2015/02/25/local/noticia/helena-roseta-diz-que-isencao-de-taxas-ao-benfica-ascende-
a-46-milhoes-1687371
53
http://www.cmjornal.pt/cm-ao-minuto/detalhe/benfica-entra-na-campanha-em-oeiras
“Em Portugal, a grande maioria das pessoas encosta-se ao poder. É bom que
haja a perceção de que quem manda ou quem tem o poder é o Benfica” – Carlos
Janela

Ao longo deste livro viu-se que nos últimos 15 anos houve um clube que foi
trilhando um caminho que o conduziu ao controlo do futebol português. O projeto
começou, talvez ingenuamente, por ser assumido publicamente, mas com o passar
do tempo foi-se tornando cada vez menos transparente. Os resultados, contudo,
estão à vista. Existe, em Portugal, um regime “nacional-benfiquista” que se
manifesta plenamente nos domínios das instituições do futebol, da arbitragem, da
justiça desportiva, da comunicação social e das relações com o poder político.
Um controlo que ainda vai sendo assumido, normalmente através dos teclados de
alguns dos rostos deste polvo encarnado quando escrevem para alguns dos seus
congéneres: “Hoje o Benfica manda e os outros não mexem nada”, afirmou Adão
Mendes, um dos rostos do polvo.
O resultado de 15 anos de trabalho de Luís Filipe Vieira é este. O futebol
português é dominado por um polvo encarnado. Um molusco com tentáculos que
chegam a todo o lado, com força suficiente para adulterar a verdade desportiva.
Uma organização que já é mais do que um clube de regime. O Benfica é o regime.
Mas, como todos os regimes, acabará por cair pela força da justiça. Até porque
ainda fica muito por contar.
Ao longo desta obra são referidos os nomes de várias figuras – algumas mais
conhecidas do que outras – que, de forma mais ou menos direta, se encontram
ligadas às atividades de manipulação do futebol português pelo Benfica. Este
anexo tem como objetivo identificá-las e apresentá-las de forma breve. A
diversidade dos seus perfis é um espelho da vastidão e do alcance dos tentáculos
do polvo encarnado.

Adão Mendes
Sindicalista profissional entre 1985 e 2012, foi árbitro da primeira categoria
na transição das décadas de 80 para 90. Ficou conhecido como “o árbitro
vermelho” por ser comunista. Tornou-se, posteriormente, observador de árbitros
da Liga, função de que foi expulso em 1997, por ser considerado “tecnicamente
inepto”54. Ainda assim, viria a integrar durante vários anos o Conselho de
Arbitragem da Associação de Futebol de Braga, até ser afastado, em 2011, pelo
presidente dessa Associação, no quadro de um esforço de renovação que tinha
como objetivo conferir-lhe “maior rigor e transparência”55. Participou em trocas
de emails com Paulo Gonçalves e Pedro Guerra, revelando a existência de um
núcleo de oito árbitros que ofereciam garantias ao Benfica, dando conta do seu
papel na evolução da carreira de um deles, comunicando contactos previamente
estabelecidos com Luís Filipe Vieira e procurando obter benefícios para o seu
filho, também árbitro, junto do Conselho de Arbitragem da FPF, através da
intermediação do assessor jurídico da SAD encarnada.

André Ventura
Licenciado e Doutor em Direito, é professor da Universidade Nova de Lisboa
e da Universidade Autónoma de Lisboa. É primo de Pedro Guerra e afilhado de
casamento de Rui Gomes da Silva. Militante do PSD, integra o seu Conselho
Nacional e assume publicamente a ambição de vir a ser líder do partido. Apesar
de, em 2015, ter afirmado que a cidade de Sintra “é a única que verdadeiramente
me apaixona e cujos problemas verdadeiramente me preocupam”, foi, dois anos
depois, candidato a presidente da Câmara Municipal de Loures, tendo dado nas
vistas pelo carácter racista e xenófobo do seu discurso. Foi diretor de campanha
de Luís Filipe Vieira nas últimas eleições do Benfica. É, há vários anos,
comentador da CMTV e integra a lista dos cartilheiros de Carlos Janela desde
2014.

António Costa
Licenciado em Direito. É, desde 2015, primeiro-ministro de Portugal, após ter
sido, entre 2007 e 2014, presidente da Câmara Municipal de Lisboa. Enquanto
exerceu esta função, o seu executivo apresentou uma proposta de perdão de taxas
municipais ao Benfica de perto de cinco milhões de euros, que viria
posteriormente a ser retirada, perante a reprovação generalizada. Enquanto líder
do Governo, é presença assídua no camarote presidencial do Estádio da Luz.

António Figueiredo
Vice-presidente do Benfica durante o mandato de Manuel Damásio, apoiou
publicamente Luís Filipe Vieira na sua primeira candidatura à liderança do clube.
Entretanto, tornou-se presidente do Estoril e protagonizou o caso “Estorilgate”’.
Na altura, afirmou publicamente: “Espero que o resultado não impeça o Benfica
de ser campeão”. Carlos Xavier, à data treinador adjunto da equipa de Cascais,
resumiu o caso: “O presidente deixou que a equipa descesse para a segunda
divisão a troco de ir jogar contra o Benfica ao Algarve”. É comentador da CMTV
e, desde 2009, um dos cartilheiros do Benfica.

António Galamba
Frequentou dois cursos do Ensino Superior, que não concluiu. Político
profissional desde muito jovem, a sua carreira esteve, desde cedo, associada à
Juventude Socialista, a cujos órgãos superiores pertenceu durante vários anos.
Tornou-se deputado pela primeira vez em 1995, sendo sucessivamente reeleito
até 2009. Foi o último governador civil de Lisboa. Assume-se como “consultor de
empresas”, sendo atualmente funcionário da WL Partners, de Luís Bernardo. É
autor de uma crónica semanal no jornal i e dos discursos e entrevistas de Luís
Filipe Vieira.

António Rola
Antigo árbitro de futebol, integrando a primeira categoria entre as épocas de
1990/91 e 1996/97. Nunca alcançou o estatuto de internacional. Em 2002, na
altura do arranque do vieirismo, foi contratado pelo Benfica como assessor para
as questões de arbitragem. Atualmente, é comentador na BTV, sendo um dos
recetores da cartilha de Carlos Janela, e tem uma coluna de opinião no jornal i.

Barbieri Cardoso
Inspetor da PIDE a partir de 1948, tornou-se subdiretor da polícia política do
Estado Novo em 1962. Era considerado por muitos o “cérebro” da organização e
esteve envolvido na conceção de operações como a que culminou com o
assassinato de Humberto Delgado. Pelo menos na época desportiva de 1973/74,
usufruiu do estatuto de “Convidado dos órgãos sociais” do Benfica, que lhe
proporcionava livre acesso ao Estádio da Luz.

Carlos Deus Pereira


Jogador de futebol na década de 80, Carlos Deus Pereira representou a equipa
principal do Benfica entre 1981/1982 e 1985/1986 e na época 1987/1988.
Participou em 34 jogos e não marcou qualquer golo. Jogou, ainda, no Farense e no
Olhanense. Mais tarde, licenciou-se em Direito e tornou-se advogado (atualmente
com escritório no Algarve) e professor universitário (na Universidade Moderna).
Foi vogal do Conselho de Administração, presidente e presidente da Mesa da
Assembleia-Geral do Farense. Entre 2012 e 2014, foi presidente da Assembleia-
Geral da Liga. Nesse período, deu nas vistas por ter rejeitado as iniciativas dos
clubes que visavam a destituição de Mário Figueiredo e por não ter aceitado as
candidaturas que o desafiaram nas eleições de 2014 (que viriam a ser anuladas).
Ao mesmo tempo, assumia, em contactos com Pedro Guerra, as iniciativas da
Liga que visavam a destruição de Joaquim Oliveira e do FC Porto e cedia ao
mesmo comentador mais de uma centena de SMS enviadas e recebidas pelo
presidente da FPF, de natureza pessoal e profissional.

Carlos Janela
Natural de Famalicão, começou no clube da terra a carreira como dirigente
desportivo. Era diretor para o futebol quando, em 1988, rebentou um escândalo
de corrupção que culminou com a descida de divisão da equipa. Mais tarde, viria
a desempenhar funções semelhantes tanto no Sporting como no Belenenses, e,
segundo a imprensa, esteve perto de ingressar no Benfica durante a presidência de
Luís Filipe Vieira. Nos últimos anos, apresenta-se como “gestor de ativos
desportivos” – apesar de ninguém saber bem que ativos desportivos é que gere –
e é presença habitual nos painéis de comentários de diversas televisões e rádios.
É, pelo menos desde 2014, o autor das famosas cartilhas do Benfica. Apesar
disso, continua a ser apresentado como comentador supostamente independente na
CMTV.

Domingos Amaral
Escritor e jornalista, integrou as redações ou colaborou como cronista em
jornais e revistas como O Independente, Correio da Manhã, Diário de Notícias,
Grande Reportagem, Record, GQ e Maxmen. Integra frequentemente painéis de
comentário desportivo na qualidade de adepto do Benfica, recebendo as cartilhas
de Carlos Janela desde 2014.

Durão Barroso
Foi deputado, secretário de Estado, ministro e primeiro-ministro de Portugal.
Entre 2004 e 2014, foi presidente da Comissão Europeia. Chegou a líder do
Governo na sequência das legislativas de 2002, em que contou com o apoio ativo
e empenhado do Benfica e dos seus órgãos sociais, conforme demonstraram
publicamente Luís Filipe Vieira e Manuel Vilarinho. Foi o seu executivo que
aceitou ações do clube da Luz não cotadas em Bolsa como garantia do pagamento
de avultadas dívidas fiscais.

Ferreira Nunes
Natural de Coimbra, foi vice-presidente do Conselho de Arbitragem da
Federação Portuguesa de Futebol, responsável pelas classificações dos árbitros,
quando Vítor Pereira dirigia esse organismo. Durante o seu mandato ocorreram
várias coisas estranhas: pelo menos um árbitro de quem o Benfica não gostava
desceu de categoria de forma, no mínimo, caricata; outro que o clube da Luz
apreciava particularmente foi impedido de descer, apesar de as suas
classificações assim o determinarem; a maior descida de sempre na nota de um
árbitro aconteceu na sequência de uma ordem de Luís Filipe Vieira nesse sentido.
Após deixar o Conselho de Arbitragem, continua envolvido em polémicas: em
Coimbra, de onde é natural, foi objeto de debate público a sua nomeação para
administrador das Águas de Coimbra, apesar de não ter habilitações para ocupar
a função; tencionou candidatar-se a presidente da Associação de Futebol de
Coimbra, buscando junto de Paulo Gonçalves apoio jurídico e enviando para o
Benfica a fatura de um parecer jurídico; no verão de 2017, através do seu
pseudónimo Frankc Vargas, continuava a contactar os árbitros, criticando a
descida de categoria de um dos juízes que Adão Mendes identifica como “padre”.
É presença assídua na tribuna de honra do Estádio da Luz, como convidado
especial do seu presidente.

Francisco Cunha Leal


Vice-presidente do Benfica durante o mandato de Jorge de Brito (1992-1994),
foi indicado pelo seu clube para o cargo de diretor executivo da Liga (2002-
2006). Presidiu interinamente a este organismo entre 2004 e 2005. No exercício
dessas funções, destacou-se pelas situações recorrentes de favorecimento dos
encarnados, como nos casos da inscrição irregular de Ricardo Rocha, da não
cedência de bilhetes aos adeptos portistas para o Benfica-Porto de 2004/2005 e
do famoso “Estorilgate”. Após deixar a Liga, viria a participar num filme baseado
numa obra de Carolina Salgado.

Jaime Antunes
Economista e empresário, trabalhou no Jornal do Comércio e dirigiu o
Semanário Económico, o Diário Económico (foi proprietário de ambos) e a
revista Expansão. Foi dirigente e candidato à presidência do Benfica, em 2003,
contra Luís Filipe Vieira. É comentador na CMTV e recebe as cartilhas de Carlos
Janela desde 2009.

João Gabriel
Foi jornalista da TSF, da SIC e da TVI, destacando-se como repórter
internacional. Abandonou o jornalismo para assessorar Jorge Sampaio durante os
dez anos em que foi Presidente da República. Posteriormente, tornou-se diretor de
comunicação do Benfica, cargo que exerceu entre 2008 e 2016. Durante esse
período, assumiu-se como arquiteto de uma política de comunicação agressiva e
terrorista, estando ligado à génese das cartilhas, à transformação da imagem de
Luís Filipe Vieira (que se tornou um especialista na leitura de discursos redigidos
por outros) e ao estreitamento das relações com diversos órgãos de comunicação
social.

João Gobern
Antigo jornalista de A Capital, Sete, Correio da Manhã Rádio, O
Independente, Visão, Focus, Sábado. Foi diretor da revista de televisão e social
TV Guia. A convite de Carlos Daniel, tornou-se comentador de futebol da RTP, na
qualidade de independente. Viria a ser afastado dessas funções após ser apanhado
em direto a festejar um golo do Benfica, durante o programa em que supostamente
se expressaria com isenção – não causa surpresa, portanto, que agora se saiba que
já nessa altura recebia as cartilhas. Poucos meses depois, assumiu o papel de
representante dos encarnados no Trio d’Ataque, da RTP 3. É um dos
comentadores mais apreciados por Luís Filipe Vieira, ao ponto de considerar que
Gobern “merece” estar perto de si na tribuna presidencial da Luz.

José Calado
Ex-jogador de futebol, com a formação repartida entre o Belenenses e o Casa
Pia, representou o Benfica entre 1995/96 e 2000/01. Nos últimos anos, tem sido
comentador na BTV e na CMTV. Recebe as cartilhas desde 2012 e é um dos seus
mais fiéis e rigorosos intérpretes.

José Manuel Antunes


Empresário do setor do turismo, foi vice-presidente do Benfica durante o
mandato de Vale e Azevedo, que apoiou até ao fim e cuja lista de recandidatura
integrou. Após alguns anos no Brasil, tem dado nas vistas como comentador da
BTV, não propriamente pelos melhores motivos: para além de estar na origem da
divulgação de uma lista falsa dos alegados clubes mais corruptos da Europa, são
frequentes as fundamentações muito pouco rigorosas e distorcidas das suas
análises.

José Manuel Delgado


Foi guarda-redes do Benfica entre 1982/83 e 1987/88. É, há vários anos,
diretor adjunto do jornal A Bola e participa regularmente em programas de A
Bola TV. Por norma, é o jornalista que efetua os “simulacros de entrevistas” a
Luís Filipe Vieira, por alturas do Ano Novo, que na verdade são respondidas, por
escrito, por outras figuras da estrutura encarnada. É visto, há já muito tempo,
como um dos principais pontas de lança do Benfica na comunicação social.

José Manuel Meirim


Licenciado em Direito e doutorado em Motricidade Humana. Exerceu funções
docentes na Universidade Católica Portuguesa, na Faculdade de Direito da
Universidade Nova de Lisboa e na Faculdade de Motricidade Humana. Integra os
quadros da Procuradoria-Geral da República, de que foi técnico e assessor.
Ganhou notoriedade pública como comentador de assuntos de Direito do
Desporto. É, desde 2016, presidente do Conselho de Disciplina da Federação
Portuguesa de Futebol.

José Nuno Martins


Tem uma longa carreira ligada à rádio e à televisão, tendo sido realizador,
produtor e autor de programas da RTP. Foi provedor do ouvinte da RDP. É diretor
do Jornal do Benfica e participa em programas da BTV, destacando-se por
declarações polémicas e caricatas, como quando, após uma goleada do FC Porto
ao Mónaco, considerou que a equipa do principado é um conjunto de “cegos”.

Leonor Pinhão
Filha do jornalista Carlos Pinhão e mulher do realizador João Botelho. Autora
do livro Eu, Carolina, assinando com o pseudónimo “Carolina Salgado”.
Comentadora desportiva há vários anos, colabora com a SIC e o canal Q, sendo
autora de crónicas semanais nos jornais A Bola, Record e Correio da Manhã.

Luís Aguilar
Jornalista, colaborou com órgãos de comunicação social como A Bola,
Record, Sábado e Playboy. Autor de diversos livros sobre futebol. Apesar de ser
conhecido como adepto fervoroso do Benfica, é apresentado pela TVI 24, de que
é comentador há vários anos, como analista isento e independente. Autor de
diversas declarações de amor ao clube da Luz nas redes sociais.

Luís Bernardo
Foi assessor de imprensa dos primeiros-ministros António Guterres e José
Sócrates. É proprietário da empresa de comunicação WL Partners, que emprega
António Galamba, e que beneficiou de diversos contratos de ajuste direto
assinados com autarquias (câmaras e juntas de freguesia) governadas pelo PS.
Substituiu João Gabriel como diretor de comunicação do Benfica e deu
continuidade às principais linhas da sua política, com destaque para a
uniformização do pensamento e do discurso dos comentadores através das
cartilhas de Carlos Janela.

Luís Filipe Vieira


É natural de Lisboa, onde nasceu em 1949. As suas origens são humildes, mas
tornou-se um dos homens mais ricos do país graças, tanto quanto se sabe, ao
comércio de pneus e a negócios imobiliários. Em 1993, foi condenado a 20 meses
de prisão pelo roubo de um camião. Segundo Pedro Guerra, jornalista de O
Independente, durante o julgamento não se mostrou arrependido pelo crime. Ao
longo da vida foi sócio de, pelo menos, quatro clubes: Alverca, Benfica, FC
Porto e Sporting. Iniciou a carreira de dirigente desportivo no clube ribatejano, a
que presidiu até o deixar às portas da falência, em 2001. Na altura, foi um
empenhado aliado do FC Porto, que ajudou ativamente a desviar jogadores do
Benfica – na sua autobiografia, Pinto da Costa refere-se a ele como um dos
maiores amigos que teve no futebol. Em 2001, tornou-se responsável pelo futebol
do Benfica (função que poderia perfeitamente ter exercido noutro clube, caso
outros lhe tivessem “pegado”), sob a presidência de Manuel Vilarinho. Dois anos
depois, foi eleito presidente do clube. Durante os seus mandatos, foi responsável
pelo desenvolvimento e aprofundamento do carácter antidemocrático do Benfica.
É (suposto) autor de diversas frases marcantes: “O Benfica será mais forte do que
o Real Madrid” (2003); “Dentro de três anos o Benfica será o maior do mundo”
(2003); “Deixem o Benfica chegar a 2011 e verão que o Benfica será um colosso
europeu, para não dizer mundial” (2006); “Se eu fosse o treinador do Benfica, só
queria dormir, porque quando acordasse não ia saber qual a equipa que ia pôr a
jogar, tal a qualidade” (2007). Em nome individual ou através das suas empresas,
era, em 2016, devedor de mais de 500 milhões de euros ao Estado ou a
instituições por ele intervencionadas. Em 2002, assumiu que era mais importante
assegurar lugares na Liga do que contratar bons jogadores, e essa tem sido a
principal linha de força dos seus mandatos: controlar, a partir dos bastidores,
todos os domínios do futebol português.

Luís Mateus
Licenciado em Comunicação Social, iniciou a carreira no jornalismo no jornal
A Bola. Após passar pelo site terraportugal.com, tornou-se subdiretor do
Maisfutebol em 2001. Ocupou esse cargo até 2016, quando passou a dirigi-lo em
substituição de Luís Sobral. É, ainda, comentador do programa Maisfutebol, da
TVI 24. Tendo em conta as funções que ocupa, é responsável por uma linha
editorial que hostiliza frequentemente o FC Porto e protege o Benfica, de que é
um exemplo flagrante a ausência de notícias sobre o “caso dos emails”.

Manuela Ferreira Leite


Economista e professora universitária, foi deputada, ministra da Educação e
das Finanças e candidata a primeira-ministra, enquanto líder do PSD. Foi sob a
sua tutela que, em 2002, foram aceites ações do Benfica não cotadas em Bolsa
como garantia do pagamento de dívidas fiscais do clube.

Mário Figueiredo
Licenciado em Direito e advogado, foi presidente da Liga entre 2012 e 2014.
Antes, tinha sido advogado do Marítimo. Durante o seu mandato assistiu-se à
degradação da situação financeira da Liga, causando polémica as viagens que
realizou, por exemplo, aos Estados Unidos, para fins que não foi possível apurar.
Uma das suas principais promessas eleitorais, a negociação conjunta dos direitos
televisivos dos clubes, esbarrou com o arranque das transmissões dos jogos do
Benfica na BTV. Sabe-se agora que Mário Figueiredo assumia em privado que
esteve sempre ao lado deste clube e do seu presidente, aceitando (e até
solicitando) sugestões de nomeação de delegados da Liga que lhe eram
apresentadas por Paulo Gonçalves.

Nuno Cabral
Delegado da Liga entre 2013 e 2016, colaborava simultaneamente com o
Benfica, a quem fornecia análises das arbitragens de todos os jogos. Para além
disso, fazia chegar ao clube informações sobre a vida privada e íntima de árbitros
e de elementos das estruturas dirigentes do futebol, tanto nacionais como
distritais. Como recompensa pelos serviços prestados, foi um dos convidados
especiais do Benfica para a final da Liga Europa de 2014, que culminou com a
derrota encarnada frente ao Sevilha. Em email enviado a Paulo Gonçalves, deu
conta da sua vontade de ser um “menino querido” do Benfica.

Nuno Farinha
Jornalista, passou por publicações como Gazeta dos Desportos, Foot, Nova
Gente, TV 7 Dias e TV Guia, de que foi diretor. Atualmente, é diretor adjunto do
Record. Gosta de se afirmar adepto do Barcelona, ainda que em tempos já tenha
expressado publicamente o seu benfiquismo primário: “Eu sou um deles! Dos que
sofrem, dos que gritam, dos que vão à Luz sempre que a vida permite, dos que
discutem, dos que se exaltam, dos que amam o Benfica”. Apesar deste perfil, foi
comentador supostamente isento da RTP e hoje em dia não se coíbe de efetuar, no
Record, análises às arbitragens do Benfica, substituindo os especialistas Jorge
Faustino e Marco Ferreira e fazendo passar uma esponja sobre os lances em que o
seu clube é escandalosamente beneficiado.

Octávio Ribeiro
Foi jornalista, entre outros órgãos de comunicação social, da RTP, da TVI e
do Diário de Notícias e, desde 2002, do Correio da Manhã, de que é diretor, tal
como da CMTV. Pelo meio, foi assessor de um dos governos de Cavaco Silva, a
convite de Marques Mendes. Ficaram famosas as refeições que partilhava com
João Gabriel, quando este exercia as funções de diretor de comunicação do
Benfica, não sendo de estranhar, portanto, a proximidade entre o CM e a CMTV e
este clube.

Paulo Gonçalves
Advogado, natural do Porto e descrito pelo site bancada.pt como “portista
ferrenho e fanático”56, iniciou a carreira nos assuntos do Direito desportivo no
FC Porto. Foi, posteriormente, para o Boavista, clube de que foi diretor-geral.
Nessa altura, organizava conferências de imprensa para acusar o Benfica de
pressões sobre os árbitros57. Em 2007, mudou-se para o clube da Luz, passando a
desempenhar a função de assessor jurídico da SAD encarnada, que ainda exerce.
Segundo José Guilherme Aguiar, “faz tudo o que Vieira lhe diz”58. De acordo com
os emails que têm sido revelados pelo Porto Canal e pelo Expresso, é o principal
operacional dos encarnados nas estratégias de controlo do futebol português: era
ele que combinava com Mário Figueiredo a nomeação de delegados da Liga; era
ele que recebia as faturas dos pareceres jurídicos de Ferreira Nunes; era ele que
sugeria a Vieira que convidasse Nuno Cabral para a final da Liga Europa de
2014; era a ele que Vieira mandava baixar as notas de árbitros; era a ele que
Adão Mendes recorria para obter favores do Conselho de Arbitragem da FPF, etc.
É, provavelmente, o principal cérebro do polvo.

Pedro Adão e Silva


Licenciado em Sociologia e doutorado em Ciências Sociais e Políticas, é
professor universitário no ISCTE. Presença assídua na comunicação social como
comentador de assuntos políticos, tem-se feito notar, ultimamente, como um dos
fiéis intérpretes das cartilhas de Carlos Janela, que recebe desde 2014 e que
costuma debitar quer nos seus artigos no Record, quer em comentários na Sport
TV.

Pedro Guerra
Suposto antigo jogador de futebol, foi durante vários anos jornalista de O
Independente. Foi nessa altura que denunciou atividades criminosas de Luís
Filipe Vieira e que se destacou pelos contactos promíscuos com magistrados do
Ministério Público59. Entre 2002 e 2005, foi assessor de Paulo Portas, quando
este era ministro da Defesa, tornando-se posteriormente assessor do grupo
parlamentar do CDS. Nessas funções, ficou conhecido por não convocar para
conferências de imprensa os jornalistas que eram incómodos para o governante
que servia. Para além disso, foi polémico o despacho da sua nomeação, que o
identificava como licenciado, apesar de não possuir qualquer grau académico
superior. Foi, pelo menos entre 2011 e 2017, assalariado do Benfica e da BTV, de
que foi diretor de conteúdos. Recebe as cartilhas de Janela desde 2012 e já
propagou a sua doutrina na CMTV e na TVI24. A sua fama está associada não só
aos seus comentários, mas também a episódios como aquele em que ligou para a
BTV, usando um outro nome (“Fernando Santos”, que são os nomes intermédios
do seu nome completo: Pedro Fernando Santos Alves Guerra), para defender
ferozmente Luís Filipe Vieira60. Recentemente, ficou-se a saber que Pedro Guerra
desenvolveu, ao longo dos últimos anos, uma série de contactos que podem
indiciar o envolvimento em atividades ilícitas ou, pelo menos, ilegítimas, de que
são exemplo as referências de Adão Mendes a árbitros que dão garantias ao
Benfica, a cedência de documentação confidencial pelo presidente da
Assembleia-Geral da Liga e o acesso a SMS do presidente da Federação
Portuguesa de Futebol.

Ricardo Costa
Advogado, consultor e professor universitário de Direito, foi presidente da
Comissão Disciplinar da Liga entre 2006 e 2010. É popularmente conhecido
como “o benfiquista de Canelas”. Na Liga, destacou-se pela sanha persecutória
em relação ao FC Porto, tendo sido um dos responsáveis por uma condenação do
clube no âmbito da justiça desportiva cujos fundamentos viriam a ser arrasados
em várias instâncias da justiça civil. Foi autor de um parecer jurídico solicitado
por Ferreiras Nunes a Paulo Gonçalves, cuja fatura foi enviada para o Benfica.
Ricardo Palacin
Jornalista, colaborou com a RTP, a SIC e a Televisão de Macau. Foi diretor
executivo da SIC Radical e é diretor da BTV desde a fundação do canal.
Apresenta semanalmente, há vários anos, o programa Lanças Apontadas, que
alcançou notoriedade quando divulgou um ranking dos clubes mais corruptos da
Europa, supostamente publicado a 12 de janeiro de 2017 pelo jornal inglês Daily
Mail, que veio a provar-se ser falso.

Rui Gomes da Silva


Natural de Rio Tinto (Gondomar), é advogado, político e comentador de
futebol. Foi deputado pelo PSD quase continuamente entre 1987 e 2009. Entre
2004 e 2005, foi efemeramente ministro dos Assuntos Parlamentares e ministro
adjunto do Governo de Santana Lopes. Foi vice-presidente do Benfica e integrou
a administração da sua SAD. É comentador da SIC Notícias e recebe as cartilhas
de Carlos Janela desde 2009. Em nome do clube, assinou um “contrato” de
prestação de serviços de bruxaria com um general guineense. Para além disso,
soube-se recentemente que apoiava a promoção de agressões a comentadores
inconvenientes para os encarnados.

Rui Pedro Braz


Antigo jornalista da TV Guia, foi secretário técnico do futsal do Benfica e
colaborador da BTV. É autor de livros sobre o mundo benfiquista. Nos últimos
anos, exerce a função de comentador supostamente isento e independente na
TVI24. Os tons encarnados das suas análises tornaram-se menos surpreendentes
quando se conheceu que o seu nome integra uma espécie de apêndice da lista dos
cartilheiros do Benfica, relativa a jornalistas que recebem notas soltas com
alguma regularidade.

Telmo Correia
Advogado, é deputado do CDS desde 1999. Foi ministro do Turismo no
Governo de Santana Lopes. Comentador da BTV e da Antena 1, recebe as
cartilhas de Carlos Janela desde 2009 e é um dos mais empenhados seguidores da
linha nacional-benfiquista e vieirista de análise político-desportiva. É um
elemento importante da relação entre o Benfica e o Parlamento.

Vítor Pereira
Antigo árbitro internacional, entre 2006 e 2016 foi sucessivamente presidente
da Comissão de Arbitragem da Liga e do Conselho de Arbitragem da Federação
Portuguesa de Futebol. De acordo com o antigo árbitro Marco Ferreira, ligava
aos árbitros nas vésperas de participarem nos jogos do Benfica com
recomendações de cuidado, algo que não fazia quando se tratava de outros clubes.
Após deixar a FPF, colaborou com a Confederação Brasileira de Futebol e é,
atualmente, presidente do Conselho de Arbitragem da Federação Grega.
E-mails trocados entre Luís Filipe Vieira e Mário Figueiredo, divulgados
pela imprensa em junho de 2017.

E-mails trocados entre Adão Mendes e Pedro Guerra, divulgados pela


imprensa em junho de 2017.
54
http://www.record.pt/futebol/futebol-nacional/detalhe/guardar-os-guardas.html
55
https://bancada.pt/futebol/portugal/coutada-afastou-adao-mendes-por-querer-maior-transparencia
56
https://bancada.pt/futebol/artigo/paulo-goncalves-o-portista-fanatico-da-sad-do-benfica
57
https://arquivos.rtp.pt/conteudos/futebol-treinos-do-boavista-4/
58
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