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Pode-se separar a ciência da pseudociência por razões teóricas e por razões práticas
(Mahner 2007, 516). De um ponto de vista teórico, a questão da demarcação é uma
perspectiva esclarecedora que contribui para a filosofia da ciência da mesma maneira
que o estudo das falácias contribui para o estudo da lógica informal e da argumentação
racional. De um ponto de vista prático, a distinção é importante para orientar decisões,
tanto na vida privada quanto na pública. Uma vez que a ciência é a nossa fonte de
conhecimento mais confiável em variadíssimas áreas, precisamos distinguir o
conhecimento científico das suas imitações. Dado o estatuto elevado da ciência na
sociedade contemporânea, tentativas de exagerar o estatuto científico de várias
afirmações, ensinamentos e produtos são suficientemente comuns para tornar o
problema da demarcação premente em muitas áreas. O problema da demarcação é,
assim, importante em muitas aplicações práticas como as seguintes:
2. A “ciência” da pseudociência
O uso mais antigo da palavra “pseudociência” data de 1796, quando o historiador James
Pettit Andrew se referiu à alquimia como uma “pseudociência fantástica” (Dicionário
Oxford de Inglês). Essa palavra tem sido usada com frequência desde a década de 1880
(Thurs e Numbers 2013). Durante toda a sua história, a palavra teve um significado
claramente difamatório (Laudan 1983, 119; Dolby 1987, 204). Seria tão estranho
alguém descrever orgulhosamente as suas próprias atividades como pseudociência como
se vangloriar de serem má ciência. Uma vez que a conotação pejorativa é uma
característica essencial da palavra “pseudociência”, qualquer tentativa de deslindar uma
definição da palavra de uma maneira valorativamente isenta não teria qualquer
significado. Um termo essencialmente valorativo tem de ser definido em termos
valorativos. Isso é não raro difícil, pois a especificação do componente valorativo tende
a ser controversa.
Outra maneira de expressar esta ideia é que o problema da demarcação tem uma
preocupação mais profunda do que demarcar a seleção de atividades humanas que, por
várias razões, escolhemos denominar “ciências”. O problema último é “como
determinar quais as crenças que estão epistemicamente justificadas” (Fuller 1985, 331).
3. O “pseudo” de pseudociência
Uma comparação dos prefixos de negação relacionados com a ciência pode contribuir
para esclarecer as distinções conceituais. “Anticientífico” é um conceito mais restrito do
que “não-científico“, pois o primeiro termo, mas não o segundo, implica alguma forma
de contradição da ciência ou de conflito com ela. “Pseudocientífico” é, por sua vez,
mais restrito do que “não-científico”. O primeiro difere do segundo porque abrange
medidas incorretas inadvertidas, cálculos incorretos e outras formas de má ciência
protagonizadas por cientistas que se reconhece que tentaram mas não conseguiram fazer
boa ciência.
1. Não é científico, e
2. Os seus principais proponentes tentam criar a impressão de que é científico.
Caso 1: Uma bioquímica realiza um experimento que considera que mostra que
determinada proteína tem um papel essencial na contração muscular. Há um consenso
entre os seus colegas de que o resultado é um mero engano que resultou de erro
experimental.
Isto explica por que razão a fraude em ciência não é normalmente considerada
pseudocientífica. Essas práticas não estão em geral associadas a uma doutrina desviante
ou não-ortodoxa. Pelo contrário, o cientista fraudulento está ansioso para que seus
resultados estejam em conformidade com as previsões das teorias científicas
estabelecidas. Desviar-se das teorias científicas estabelecidas levaria a um risco muito
maior de ser descoberto.
A pseudociência é uma antítese da ciência no sentido individual mas não no outro. Não
há um corpo de pseudociência que corresponda ao da ciência. Para ser pseudocientífico,
um fenômeno tem de pertencer a uma ou outra das pseudociências particulares. Para
acomodar esta característica, a definição acima pode ser modificada para substituir 2
pelo seguinte (Hansson 1996):
2'. Faz parte de uma doutrina não-científica cujos principais proponentes tentam criar a
impressão de que é científica.
A maioria dos filósofos da ciência e dos cientistas prefere considerar que a ciência é
constituída pelos métodos de investigação e não por doutrinas particulares. Há uma
tensão óbvia entre 2' e essa concepção convencional de ciência. Isto, no entanto, talvez
seja assim porque a pseudociência às vezes envolve uma representação da ciência como
uma doutrina fechada e acabada ao invés de uma metodologia para uma investigação
em aberto.
Por vezes, o termo “pseudociência” é usado de maneira mais ampla do que a captada
pela definição constituída por 1 e 2'. Ao contrário de 2', as doutrinas que entram em
conflito com a ciência são denominadas “pseudocientíficas” ainda que não sejam
propostas como científicas. Destarte, Grove (1985, 219) incluiu entre as doutrinas
pseudocientíficas as que “afirmam oferecer explicações alternativas às da ciência ou
afirmam explicar o que a ciência não pode explicar”. Do modo semelhante, Lugg (1987,
227–228) sustentou que “as predições do clarividente são pseudocientíficas, estejam
elas corretas ou não”, apesar de a maioria dos clarividentes não se declarem praticantes
de ciência. Nesse sentido, supõe-se que a pseudociência inclui não somente doutrinas
contrárias à ciência que se proclamam científicas, mas também doutrinas contrárias à
ciência tout court, independentemente de serem apresentadas em nome da ciência. Para
abranger este sentido ainda mais amplo de pseudociência, 2' pode ser modificado como
se segue (Hansson 1996, 2013):
2''. Faz parte de uma doutrina cujos principais proponentes tentam criar a impressão de
que representa o conhecimento mais confiável no assunto.
O uso comum parece vacilar entre as definições 1+2' e 1+2''; e de uma maneira
interessante: em seus comentários sobre o significado do termo, os críticos da
pseudociência tendem a endossar uma definição próxima de 1+2', mas o seu uso efetivo
da palavra é frequentemente mais próximo de 1+2''.
C. Um livro criacionista nega que a espécie humana tenha ancestrais comuns com
outros primatas.
D. Um pregador nega que se pode confiar na ciência nega também que a espécie
humana tem ancestrais comuns com outros primatas.
A não satisfaz 1, e portanto não é pseudocientífico em nenhuma das explicações; B não
satisfaz 1 nem 2' ou 2'', e portanto não é pseudocientífico em nenhuma das explicações;
C satisfaz os três critérios, 1, 2' e 2'' e é, portanto, pseudocientífico em ambas as
explicações. Por fim, D satisfaz 1 e 2'', sendo, portanto, pseudocientífico segundo 1+2'',
mas não de segundo 1+2'. Como os dois últimos exemplos ilustram, a pseudociência e a
anticiência são por vezes difíceis de distinguir. Os promotores de algumas
pseudociências, notadamente a homeopatia, tendem a ser ambíguos entre a oposição à
ciência e a alegação de que eles mesmos representam a melhor ciência.
Derksen (1993) difere da maioria dos outros autores que escrevem sobre o assunto
porque põe a ênfase da demarcação no pseudocientista, isto é, a pessoa individual que
faz pseudociência. O principal argumento a seu favor é que a pseudociência tem
pretensões científicas, e que essas pretensões estão associadas a uma pessoa, e não a
uma teoria nem a uma prática nem a um campo inteiro. Contudo, como Settle fez notar
(1971), é a racionalidade e a atitude crítica integrada nas instituições, e não os traços
intelectuais dos indivíduos, que distingue a ciência de práticas não-científicas como a
magia. O praticante individual de magia numa sociedade pré-alfabetizada não é
necessariamente menos racional do que o cientista individual na sociedade ocidental
moderna. O que lhe falta é um ambiente intelectual de racionalidade coletiva e de crítica
mútua. “É quase uma falácia da divisão insistir que cada cientista individual tem
pensamento crítico” (Settle 1971, 174).
Mas a mutabilidade da ciência é um dos fatores que torna difícil a demarcação entre a
ciência e a pseudociência. Derkson (1993, 19) indicou corretamente três razões
principais por que a demarcação é por vezes difícil: a ciência muda com o tempo, a
ciência é heterogênea e a própria ciência estabelecida não está livre dos defeitos
característicos da pseudociência.
As tentativas de definir o que se denomina hoje ciência têm uma história longa, e se faz
por vezes remontar as raízes do problema da demarcação aos Segundos Analíticos de
Aristóteles (Laudan 1983). Porém foi só no século XX que algumas definições
influentes de ciência a contrastaram com a pseudociência.
4.2 Falsificacionismo
Popper apresentou esta proposta como uma maneira de traçar a linha divisória entre
enunciados que pertencem às ciências empíricas e “todos os outros enunciados — sejam
eles religiosos, metafísicos, sejam simplesmente pseudocientíficos” (Popper 1962, 39;
cf. Popper 1974, 981). Tratava-se tanto de uma alternativa ao critério de verificação dos
positivistas lógicos quanto de um critério para distinguir entre a ciência e a
pseudociência. Embora Popper não tenha enfatizado a distinção, estas são, é claro,
questões diferentes (Bartley 1968). Popper concedeu que os enunciados metafísicos
podem estar “bem longe de serem destituídos de significado” (1974, 978–979) mas não
evidenciou o mesmo acolhimento pelos enunciados pseudocientíficos.
O critério de demarcação de Popper foi criticado por excluir tanto a ciência legítima
(Hansson 2006) quanto por dar a algumas pseudociências o estatuto de científicas
(Agassi 1991; Mahner 2007, 518–519). Em bom rigor, o seu critério exclui a
possibilidade de que possa haver uma afirmação pseudocientífica refutável. Segundo
Larry Laudan (1983, 121), aquele critério “tem a consequência inadequada de aceitar
como “científica” toda a afirmação estapafúrdia que contenha asserções
comprovadamente falsas”. A astrologia, corretamente considerada por Popper um
exemplo estranhamente claro de pseudociência, foi efetivamente testada e
minuciosamente refutada (Culver and Ianna 1988; Carlson 1985). Do mesmo modo, as
maiores ameaças ao estatuto científico da psicanálise, outro dos seus alvos principais,
não vêm da alegação de que não é testável, mas antes de que foi testada e não passou
nos testes.
Os defensores de Popper afirmaram que essa crítica se apoia numa interpretação pouco
caridosa das suas ideias. Afirmam que não se deve interpretar Popper como alguém que
afirma que a falsificabilidade é uma condição suficiente para demarcar a ciência.
Alguns excertos parecem sugerir que ele a toma somente como condição necessária
(Feleppa 1990, 142). Outros sugerem que para uma teoria ser científica Popper exige
(além da falsificabilidade) que se façam tentativas vigorosas de pôr a teoria à prova e
que os resultados negativos dos testes sejam aceitos (Cioffi 1985, 14–16). Um critério
de demarcação baseado na falsificação que inclua esses elementos evitará os contra-
argumentos mais óbvios a um critério baseado apenas em falsificabilidade.
Contudo, no que parece constituir a última formulação de sua posição, Popper declarou
que a falsificabilidade é um critério simultaneamente necessário e suficiente. “Uma
frase (ou teoria) é empírico-científica se, e somente se, for falsificável". Ademais,
enfatizou que a falsificabilidade referida aqui “somente tem que ver com a estrutura
lógica das frases e classes de frases” (Popper [1989] 1994, 82). Uma frase (teórica), diz,
é falsificável se, e somente se, contradisser logicamente alguma frase (empírica) que
descreve um evento logicamente possível que seria logicamente possível observar
(Popper [1989] 1994, 83). Um enunciado pode ser falsificável nesse sentido, embora
não seja possível falsificá-lo na prática. Pareceria seguir-se dessa interpretação que o
estatuto de um enunciado como científico ou não-científico não muda com o tempo. Em
ocasiões anteriores, ele parece ter interpretado a falsificabilidade de maneira diferente,
sustentando que “o que era uma ideia metafísica ontem, pode se tornar uma teoria
científica testável hoje; e isso ocorre com frequência” (Popper 1974, 981, cf. 984).
Thomas Kuhn é um dos muitos filósofos para quem a visão popperiana do problema da
demarcação foi um ponto de partida para as suas próprias ideias. Kuhn criticava Popper
por caracterizar “todo a atividade científica em termos que somente se aplicam às suas
ocasionais partes revolucionárias” (Kuhn 1974, 802). O enfoque de Popper na
falsificação de teorias levou a uma concentração nas raras ocasiões em que uma teoria
inteira está em jogo. Segundo Kuhn, a maneira como a ciência funciona nessas ocasiões
não pode ser usada para caracterizar toda a atividade científica. Em vez disso é na
“ciência normal", na ciência que ocorre entre os momentos raros das revoluções
científicas, que se encontram as características com as quais se pode distinguir entre a
ciência e outras atividades (Kuhn 1974, 801).
O critério de demarcação de Popper diz respeito à estrutura lógica das teorias. Imre
Lakatos descreveu esse critério como “bastante espantoso. Uma teoria pode ser
científica mesmo que não haja qualquer prova em seu favor, e pode ser pseudocientífica
ainda que todas as provas estejam em seu favor. Isto é, o caráter científico ou não-
científico de uma teoria pode ser determinado independentemente dos fatos” (Lakatos
1981, 117).
Como alternativa, Lakatos (1970; 1974a; 1974b; 1981) propôs uma modificação do
critério de Popper, a que chamou “falsificacionismo (metodológico) sofisticado". Nesta
concepção, o critério de demarcação não deve ser aplicado a uma hipótese ou a uma
teoria isoladas, mas, em vez disso, a um programa de pesquisa completo, caracterizado
por uma série de teorias que sucessivamente se substituem entre si. A seu ver, um
programa de pesquisa é progressivo se as novas teorias fizerem previsões
surpreendentes que são confirmadas. Ao contrário, um programa de pesquisa
degenerativo é caracterizado por teorias que são fabricadas apenas para acomodar fatos
conhecidos. O progresso na ciência somente é possível se um programa de pesquisa
satisfaz o requisito mínimo de cada nova teoria desenvolvida no programa ter um
conteúdo empírico maior do que tinha a sua predecessora. Se um programa de pesquisa
não satisfaz esse requisito, é pseudocientífico.
Numa tendência algo semelhante, Daniel Rothbart (1990) sublinha a distinção entre
padrões usados quando se testa uma teoria e os que são usados ao determinar quando
uma teoria deve de todo ser testada. O último, o critério de elegibilidade, inclui que a
teoria deve integrar o sucesso explicativo da sua rival e produzir implicações testáveis
inconsistentes com as da rival. Segundo Rothbart, uma teoria não é científica se não for
digna de teste nesse sentido.
George Reisch propôs que a demarcação poderia se basear na exigência de que uma
disciplina científica seja adequadamente integrada nas outras ciências. As várias
disciplinas científicas têm interconexões fortes que são baseadas na metodologia, na
teoria, na semelhança entre modelos etc. O criacionismo, por exemplo, não é científico
porque os seus princípios básicos são incompatíveis com os que conectam e unificam as
ciências. Falando mais em geral, diz Reisch, um campo epistêmico é pseudocientífico se
não pode ser incorporado na rede de ciências estabelecidas já existentes (Reisch 1998;
cf. Bunge 1982, 379).
Merton considerou que esses critérios pertencem à sociologia da ciência, e que são,
portanto, enunciados empíricos sobre normas na ciência efetiva em vez de enunciados
normativos sobre como a ciência deve ser conduzida (Merton [1942] 1973, 268). Os
seus critérios foram frequentemente rejeitados por serem simplistas por alguns
sociólogos, e foram pouco influentes em discussões filosóficas sobre o problema da
demarcação (Dolby 1987; Ruse 2000). O seu potencial no contexto filosófico não
parece ter sido suficientemente explorado.
1. Crença na autoridade: Sustenta-se que uma pessoa ou algumas pessoas têm uma
habilidade especial para determinar o que é verdadeiro e o que é falso. Os outros
devem aceitar os seus juízos.
2. Experimentos irrepetíveis: Dá-se crédito a experimentos que não podem ser
repetidos por outros com o mesmo resultado.
3. Exemplos escolhidos a dedo: usa-se exemplos escolhidos a dedo embora não
sejam representativos da categoria geral a que a investigação se refere.
4. Resistência ao teste: uma teoria não é testada embora seja possível testá-la.
5. Desconsideração de informação refutadora: Observações ou experimentos que
entram em conflito com uma teoria são ignorados.
6. Subterfúgios inerentes: o teste de uma teoria é organizado de modo a que a
teoria só possa ser confirmada, mas nunca desconfirmada, pelo resultado.
7. Abandona-se explicações sem que sejam substituídas: desiste-se de explicações
defensáveis, de modo que a teoria nova deixa muito mais por explicar do que a
anterior (Hansson 1983).
Alguns dos autores que propuseram demarcações de critério múltiplo defenderam que
essa perspectiva é superior a toda a demarcação de critério único. Destarte, Bunge
(1982, 372) asseriu que muitos filósofos não forneceram uma definição adequada de
ciência porque pressupuseram que um atributo único seria suficiente; a seu ver, a
combinação de diversos critérios é necessária. Dupré (1993, 242) propôs que se entende
melhor a ciência como um conceito wittgensteiniano de semelhança de família. Isso
significaria que há um conjunto de características da ciência, mas, embora cada parte da
ciência tenha algumas, não podemos esperar de nenhuma parte que as tenha todas.
Contudo, uma definição de critério múltiplo de ciência não é necessária para justificar
uma explicação de critério múltiplo do modo como a pseudociência se afasta da ciência.
Ainda que a ciência possa ser caracterizada por uma única característica definidora,
diferentes práticas pseudocientíficas podem se afastar da ciência de maneiras
amplamente divergentes. Assim, a supracitada caracterização de pseudociência em sete
itens foi proposta como representação de sete maneiras comuns de se afastar de um
critério mínimo de ciência (necessário, mas não suficiente), a saber: a ciência é uma
busca sistemática pelo conhecimento cuja validade não depende do indivíduo
particular, antes estando aberta a que pessoa verifique ou redescubra.
5.2 Ceticismo
O termo “ceticismo” tem pelo menos três usos distintos que são relevantes para a
discussão sobre pseudociência. Primeiro, o ceticismo é um método filosófico cujo
procedimento é pôr em dúvida afirmações consideradas trivialmente verdadeiras, como
a existência do mundo exterior. Esse foi e ainda é um método muito útil para investigar
a justificação de crenças supostamente corretas. Segundo, as críticas da pseudociência
são amiúde denominadas “ceticismo”. Esse termo é mais comumente usado por
organizações dedicadas a desmascarar a pseudociência. Terceiro, a oposição ao
consenso científico em áreas específicas é por vezes denominada “ceticismo”. Por
exemplo, quem nega a ciência climática é amiúde denominado “cético climático".
Para evitar a confusão, a primeira dessas noções pode ser especificada como “ceticismo
filosófico“, a segunda, como “defesa da ciência” e a terceira, como “negação da
ciência”. Adeptos das duas primeiras formas de ceticismo podem ser denominados
“céticos filosóficos” e “defensores da ciência“, respectivamente. Adeptos da terceira
podem ser denominados “negadores da ciência”. Torcello (2016) propôs o termo
“pseudoceticismo” para o chamado ceticismo climático.
6. Unidade na diversidade
Kuhn observou que embora o seu próprio critério de demarcação e o de Popper sejam
profundamente diferentes, conduzem essencialmente às mesmas conclusões sobre o que
deve contar respectivamente como ciência e pseudociência (Kuhn 1974, 803). Essa
convergência entre critérios de demarcação distintos é um fenômeno muito geral. Os
filósofos e outros teóricos da ciência diferem amplamente em suas concepções acerca
do que é a ciência. No entanto, há uma unanimidade virtual na comunidade de
disciplinas do conhecimento quanto à maioria das questões particulares da demarcação.
Há concordância generalizada, por exemplo, de que o criacionismo, a astrologia, a
homeopatia, bioeletrografia, rabdomancia, ufologia, teoria dos astronautas antigos,
negação do Holocausto, catastrofismo velikovskiano e negação do aquecimento global
são pseudociências. Há alguns aspectos controversos, por exemplo, a respeito do
estatuto da psicanálise freudiana, mas o quadro geral é de consenso, e não de
controvérsia, nas questões particulares da demarcação.
Num certo sentido, é paradoxal que tanto consenso tenha sido alcançado nas questões
particulares apesar do dissenso quase completo acerca do critério geral em que esses
juízos se deveriam presumidamente basear. Esse enigma é um sinal inequívoco de que
ainda há muito trabalho filosófico a ser feito na demarcação entre ciência e
pseudociência.
Bibliografia
Obras citadas
Antroposofia
Hansson, Sven Ove, 1991. “Is Anthroposophy Science?”, Conceptus 25: 37–49.
Astrologia
Criacionismo
Parapsicologia
Psicanálise
Cioffi, Frank, 1998. Freud and the Question of Pseudoscience. Chigago: Open
Court.
——, 2013. “Pseudoscience. The case of Freud’s sexual etiology of the
neuroses”, pp. 321–340 in Pigliucci and Boudry (eds.) 2013.
Grünbaum, Adolf, 1979. “Is Freudian psychoanalytic theory pseudoscientific by
Karl Popper’s criterion of demarcation?”, American Philosophical Quarterly,
16: 131–141.
Charlatanismo e medicina não-científica
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