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Supremo Tribunal Federal

Ementa e Acórdão

Inteiro Teor do Acórdão - Página 1 de 78

05/12/2017 SEGUNDA TURMA

MANDADO DE SEGURANÇA 32.788 G OIÁS

RELATOR : MIN. GILMAR MENDES


IMPTE.(S) : DEMÓSTENES LÁZARO XAVIER TORRES
ADV.(A/S) : PEDRO PAULO GUERRA DE MEDEIROS E
OUTRO(A/S)
IMPDO.(A/S) : PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DO
MINISTÉRIO PÚBLICO
PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO -GERAL DA UNIÃO
LIT.PAS.(A/S) : UNIÃO
PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO -GERAL DA UNIÃO
AM. CURIAE. : MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE GOIAS
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE
GOIÁS

Mandado de Segurança. 2. Direito Administrativo. 3. Processo


Administrativo Disciplinar. 4. Conselho Nacional do Ministério Público.
5. Decadência do direito à impetração não configurada. 6. Alegação da
necessidade de abertura de sindicância não conhecida. 7. Independência
da atividade fiscalizatória do Senado e das competências disciplinares do
CNMP. Tutela de bens jurídicos distintos. Princípio do non bis in idem não
violado. 8. Renovações sucessivas da suspensão cautelar por quase dois
anos. Incompatibilidade com a LCE 25/98. Impossibilidade de medida
cautelar antecipar pena. 9. Princípios do devido processo legal, do juiz
natural, do contraditório e da ampla defesa violados. 10. Decurso do
prazo prescricional não demonstrado. 11. Anulação de todas as provas
que ensejaram a abertura do PAD pelo STF (RHC 135.683, Rel. Min. Dias
Toffoli, Segunda Turma, DJe 3.4.2017). 12. Segurança concedida para
determinar o retorno do impetrante às suas funções e para decretar a
nulidade do Processo Administrativo Disciplinar 0.00.000326/2013-60.

AC ÓRDÃ O
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do
Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, sob a presidência do

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MS 32788 / GO

Senhor Ministro Edson Fachin, na conformidade da ata de julgamento e


das notas taquigráficas, preliminarmente, por maioria de votos, concluir
pelo afastamento da alegação de incidência do prazo decadencial, e, no
mérito, por unanimidade de votos, conceder a segurança, tudo nos
termos do voto do Relator.
Brasília, 5 de dezembro de 2017.
Ministro GILMAR MENDES
Relator
Documento assinado digitalmente

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28/11/2017 SEGUNDA TURMA

MANDADO DE SEGURANÇA 32.788 G OIÁS

RELATOR : MIN. GILMAR MENDES


IMPTE.(S) : DEMÓSTENES LÁZARO XAVIER TORRES
ADV.(A/S) : PEDRO PAULO GUERRA DE MEDEIROS E
OUTRO(A/S)
IMPDO.(A/S) : PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DO
MINISTÉRIO PÚBLICO
PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO -GERAL DA UNIÃO
LIT.PAS.(A/S) : UNIÃO
PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO -GERAL DA UNIÃO
AM. CURIAE. : MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE GOIAS
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE
GOIÁS

RELATÓRIO

O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (RELATOR): Trata-se


de mandado de segurança impetrado por Demóstenes Lázaro Xavier
Torres contra ato do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP),
que “submete o Impetrante a Procedimento Disciplinar 0.00.000.000326/2013-
60, cumulado com aplicação de suspensão preventiva”.
Consta das informações (eDOC 46) prestadas pela autoridade
apontada como coatora que o processo disciplinar em questão foi
instaurado por decisão plenária proferida nos autos da Reclamação
Disciplinar CNMP 0.00.000.000875/2012-53. Concluiu-se, no referido
julgamento, que havia elementos suficientes para a instauração do
processo disciplinar, porquanto, em suma, “o requerido seria o braço político
de um grupo criminoso, figurando como intermediário entre 'Carlinhos
Cachoeira' e os Governos Federal e do Estado de Goiás”.
O impetrante foi afastado cautelarmente por decisão proferida pelo
CNMP em 24.10.2012, em razão, nos termos das informações prestadas,
“da gravidade dos fatos investigados”; da “perplexidade, prejuízo e descrédito à

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imagem do Parquet perante a sociedade”; e do “grande constrangimento e


desconforto na instituição, comprometendo o exercício normal das atribuições
ministeriais”, que o retorno do impetrante às suas funções teria
ocasionado. A suspensão cautelar foi, sucessivamente, prorrogada, a cada
termo do prazo de 60 dias previsto na Lei Complementar 25/98 (Lei
Orgânica do Ministério Público do Estado de Goiás).
Insurge-se, assim, o impetrante, neste mandado de segurança, contra
alegadas ilegalidades verificadas no trâmite do processo administrativo
disciplinar, assim como em face das sucessivas prorrogações da decisão
cautelar de suspensão.
Preliminarmente, sustenta que o mandado de segurança foi
protocolado em observância do prazo decadencial de 120 dias para a
propositura da medida. A propósito, argumenta que os atos coativos
impugnados se protraem no tempo, uma vez que o processamento do
procedimento disciplinar, eivado das ilegalidades apontadas, estaria a
renovar o referido prazo decadencial.
Acrescenta, ainda, que foi determinada sua suspensão preventiva em
24.10.2012, quando da prolação da decisão colegiada que referendou a
portaria de instauração do procedimento ético-disciplinar e julgou
procedente o pedido de avocação do procedimento ao CNMP. A
mencionada suspensão preventiva foi prorrogada sucessivas vezes, por
decisões referendadas pelo Colegiado do CNMP, a cada 60 dias – prazo
máximo previsto na Lei Complementar 25/98 – totalizando, quando da
impetração do mandado de segurança, mais de 450 dias.
Segundo o impetrante, esgotados os recursos administrativos, os
atos tidos por ilegais continuaram a produzir seus efeitos, razão pela qual
se faz cabível o presente mandado de segurança.
No mérito, argumenta que o processo administrativo disciplinar
fundamenta-se nos mesmos fatos que originaram o processo que teve
curso no Conselho de Ética e Decoro Parlamentar do Senado Federal, que
acabou resultando na imposição da sanção de perda do mandato de
Senador da República. Tais circunstâncias caracterizariam a existência de
bis in idem, o que é vedado em nosso ordenamento jurídico.

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Adicionalmente, no entendimento do impetrante, não se poderia


instaurar processo administrativo disciplinar, no âmbito do Conselho
Nacional do Ministério Público, a respeito dos fatos submetidos ao
Conselho de Ética e Decoro Parlamentar do Senado Federal, uma vez que
a conduta em questão foi praticada em período no qual o impetrante
estava licenciado de suas funções no Parquet, exatamente para exercer o
seu mandato.
Sustenta, ainda, que o processo impugnado, ao pretender aplicar-lhe
a pena de demissão, seria contrário à garantia constitucional da
vitaliciedade, já devidamente assegurada ao impetrante.
Aduz que o processo em apreço seria ilegal por: (i) não ter narrado
qualquer fato material com suas circunstâncias contextuais; (ii) ter como
relator do processo de avocação o Corregedor-Geral do Conselho
Nacional do Ministério Público, o que violaria o Regimento Interno do
Conselho Nacional do Ministério Público; (iii) ter sido instaurado
processo administrativo disciplinar, em vez de sindicância, em
contrariedade às leis orgânicas federal e estadual do Ministério Público;
(iv) estarem prescritas eventuais pretensões sancionatórias por parte do
CNMP; (v) ser inepta a portaria de instauração do processo; e, ainda, por
(iv) cercear seu direito de defesa.
Ao final, pugna pelo reconhecimento da prescrição punitiva em
relação aos fatos investigados.
O Conselho Nacional do Ministério Público prestou informações no
eDOC 46.
A União requereu o ingresso no feito (eDOC 45), assim como o fez o
Ministério Público do Estado de Goiás (eDOC 48), este último na
qualidade de amicus curiae. Ambos os pedidos foram por mim deferidos
(eDOC 51).
Deferi parcialmente o pedido liminar (eDOC 57) em 1º.7.2014, para
o fim de suspender a ordem de afastamento cautelar do impetrante,
proferida pelo CNMP.
Com a iminência do julgamento do processo administrativo (eDOC
62), que poderia resultar na perda de objeto do mandado de segurança,

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MS 32788 / GO

deferi novo pedido para suspender o andamento do processo, decisão de


3.10.2014 (eDOC 66).
A União interpôs agravo regimental (eDOC 74) em 28.10.2014.
Diante da informação (eDOC 75) de que tramitava no âmbito do
CNMP o Procedimento de Avocação 1.00021/2015-28, conexo ao que
constitui objeto do presente mandado de segurança, proferi nova decisão
(eDOC 90) determinando a suspensão de seu andamento.
Contra a referida decisão a União interpôs novo agravo regimental
(eDOC 98) em 11.11.2016.
A Procuradoria-Geral da República manifestou-se pela denegação da
segurança (eDOC 58).
Mediante a petição de 6.4.2017, o impetrante requer seja
determinado o arquivamento do processo administrativo disciplinar ora
examinado, em razão do reconhecimento pela Segunda Turma do STF –
ocorrido quando do julgamento RHC 135.683 – da ilegalidade das provas
que o fundamentaram (eDOC 108).
É o relatório.

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Voto - MIN. GILMAR MENDES

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MANDADO DE SEGURANÇA 32.788 G OIÁS

VOTO

O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (RELATOR): Insurge-


se o impetrante contra a instauração e o curso do Processo Administrativo
Disciplinar 0.00.000.000326.2013-60, no âmbito do CNMP, instaurado após
o julgamento da Reclamação Disciplinar 0.00.000.000875/2012-53 pelo
plenário do órgão.
Inicialmente, examino a questão relativa ao cabimento e ao
conhecimento do mandado de segurança, notadamente em relação a
determinados argumentos trazidos pelo impetrante.

1) Do cabimento e conhecimento

(i) Da inocorrência da decadência processual para impetração do


Mandado de Segurança

Conforme relatado, o impetrante insurge-se, neste mandado de


segurança, contra supostas ilegalidades no trâmite do processo
administrativo disciplinar, bem como contra as sucessivas prorrogações
da decisão cautelar de suspensão.
No caso, o processo administrativo disciplinar foi instaurado em
12.4.2013 (eDOC 5, p. 208), por consequência do julgamento da
Reclamação Disciplinar 0.00.000.000875/2012-53, ocorrido no plenário do
CNMP, em 13.3.2013, oportunidade em que determinada a abertura do
PAD em apreço, “por ter, em tese, [o impetrante] envolvimento com as
atividades ilícitas praticadas por Carlos Augusto Ramos, vulgo 'Carlinhos
Cachoeira' e outras pessoas, utilizando-se de seu cargo e influência política para
benefício pessoal e de terceiros”. É de destacar-se que, quando do julgamento
da reclamação disciplinar pelo CNMP, foi determinado o afastamento
preventivo do impetrante de suas atividades pelo prazo de 60 dias.
Em 6.5.2013, o CNMP promoveu o aditamento à Portaria CNMP-

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Voto - MIN. GILMAR MENDES

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CONS/GAB/CC 1, de 12.4.2013, e determinou a reabertura da defesa


prévia do impetrante, com nova citação, nos termos do art. 97 do
RICNMP (eDOC 5, P. 294).
Esclarece o impetrante que, desde 24.10.2012 e até a impetração do
mandado de segurança, encontrava-se suspenso em razão de sucessivas
prorrogações da determinação do afastamento, tendo alcançado, à época,
mais de 450 dias de suspensão, em que pesem às reiteradas impugnações,
no âmbito administrativo, das decisões tomadas nesse sentido pelo
CNMP (eDOC 2, p. 5).
A análise objetiva dos fatos narrados nestes autos levou-me ao
reconhecimento, em sede de decisão liminar, de que haveria
plausibilidade nas alegações do impetrante quanto à verificação de
abusividade nas sucessivas prorrogações da decisão de afastamento – por
quase um ano e meio (eDOC 57).
Nesse contexto, não há como negar, portanto, à parte impetrante o
direito subjetivo ao conhecimento da alegada violação a direito líquido e
certo, notadamente quando se trata de encadeamento de atos que se
protraem no tempo, no âmbito de processo administrativo disciplinar,
ainda que tenha sido instaurado há mais de 120 dias da data da
impetração.
Ademais é preciso levar em consideração a eficiência processual e a
primazia da decisão de mérito, normas fundamentais já inclusive
incorporadas à estrutura do Novo Código de Processo Civil. Nesse
sentido, citem-se os arts. 4º e 8º do novo CPC:

“Art. 4º As partes têm o direito de obter em prazo


razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade
satisfativa”.

“Art. 8º Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz


atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum,
resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e
observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade,
a publicidade e a eficiência”.

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Voto - MIN. GILMAR MENDES

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Isso porque, no presente caso, há razões peculiares que justificam


avançar à análise do pedido autoral, notadamente em razão de a abertura
do Processo Administrativo em questão ter-se baseado, exclusivamente,
nas interceptações telefônicas declaradas ilegais por esta Segunda Turma,
nos autos do RHC 135.683.
De mais a mais, esta Corte possui farta jurisprudência quanto à
superação de óbices processuais, quando necessário, para avançar ao
exame do mérito dos processos.
Ao julgar a ADPF 132, Rel. Min. Ayres Britto, relativa à união
homoafetiva, o Plenário deste Tribunal decidiu convertê-la em ação direta
e inconstitucionalidade e julgá-la em conjunto com a ADI 4.277, com a
finalidade de conferir interpretação conforme à Constituição ao art. 1.723
do Código Civil.
Registre-se, também, o julgamento do Agravo de Instrumento
375.011, Rel. Min. Ellen Gracie, no qual a 1ª Turma desta Corte superou a
ausência de prequestionamento da matéria veiculada em recurso
extraordinário para aplicar a orientação sedimentada neste Tribunal
quanto à questão de fundo. Eis a ementa do julgado:

“AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE


INSTRUMENTO. SERVIDORES DO MUNICÍPIO DE PORTO
ALEGRE. REAJUSTE DE VENCIMENTOS CONCEDIDO PELA
LEI MUNICIPAL 7.428/94, ART. 7º, CUJA
INCONSTITUCIONALIDADE FOI DECLARADA PELO
PLENO DO STF NO RE 251.238. APLICAÇÃO DESTE
PRECEDENTE AOS CASOS ANÁLAGOS SUBMETIDOS À
TURMA OU AO PLENÁRIO (ART. 101 DO RISTF). 1. Decisão
agravada que apontou a ausência de prequestionamento da
matéria constitucional suscitada no recurso extraordinário,
porquanto a Corte a quo tão-somente aplicou a orientação
firmada pelo seu Órgão Especial na ação direta de
inconstitucionalidade em que se impugnava o art. 7º da Lei
7.428/94 do Município de Porto Alegre - cujo acórdão não
consta do traslado do presente agravo de instrumento -, sem

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fazer referência aos fundamentos utilizados para chegar à


declaração de constitucionalidade da referida norma municipal.
2. Tal circunstância não constitui óbice ao conhecimento e
provimento do recurso extraordinário, pois, para tanto, basta a
simples declaração de constitucionalidade pelo Tribunal a quo
da norma municipal em discussão, mesmo que
desacompanhada do aresto que julgou o leading case. 3. O RE
251.238 foi provido para se julgar procedente ação direta de
inconstitucionalidade da competência originária do Tribunal de
Justiça estadual, processo que, como se sabe, tem caráter
objetivo, abstrato e efeitos erga omnes. Esta decisão, por força
do art. 101 do RISTF, deve ser imediatamente aplicada aos casos
análogos submetidos à Turma ou ao Plenário. Nesse sentido, o
RE 323.526, 1ª Turma, rel. Min. Sepúlveda Pertence. 4. Agravo
regimental provido”. (AI 375011 AgR, Relatora Min. ELLEN
GRACIE, Segunda Turma, julgado em 5.10.2004, DJ 28.10.2004
PP-00043 EMENT VOL-02170-02 PP-00362).

Além disso, no Recurso Extraordinário 298.694, Rel. Min. Sepúlveda


Pertence, o Plenário desta Casa assentou a possibilidade excepcional de
conhecimento de apelo extremo por fundamento constitucional diverso
daquele em que se alicerçou o acórdão recorrido. Esse precedente possui
a seguinte ementa:

“Recurso extraordinário: letra a: possibilidade de


confirmação da decisão recorrida por fundamento
constitucional diverso daquele em que se alicerçou o acórdão
recorrido e em cuja inaplicabilidade ao caso se baseia o recurso
extraordinário: manutenção, lastreada na garantia da
irredutibilidade de vencimentos, da conclusão do acórdão
recorrido, não obstante fundamentado este na violação do
direito adquirido. II. Recurso extraordinário: letra a: alteração
da tradicional orientação jurisprudencial do STF, segundo a
qual só se conhece do RE, a, se for para dar-lhe provimento:
distinção necessária entre o juízo de admissibilidade do RE, a -
para o qual é suficiente que o recorrente alegue adequadamente

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a contrariedade pelo acórdão recorrido de dispositivos da


Constituição nele prequestionados - e o juízo de mérito, que
envolve a verificação da compatibilidade ou não entre a decisão
recorrida e a Constituição, ainda que sob prisma diverso
daquele em que se hajam baseado o Tribunal a quo e o recurso
extraordinário. III. Irredutibilidade de vencimentos: garantia
constitucional que é modalidade qualificada da proteção ao
direito adquirido, na medida em que a sua incidência
pressupõe a licitude da aquisição do direito a determinada
remuneração. IV. Irredutibilidade de vencimentos: violação por
lei cuja aplicação implicaria reduzir vencimentos já reajustados
conforme a legislação anterior incidente na data a partir da qual
se prescreveu a aplicabilidade retroativa da lei nova”. (RE
298694, Relator Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Tribunal Pleno,
julgado em 6.8.2003, DJ 23.4.2004 PP-00009 EMENT VOL-02148-
06 PP-01270 RTJ VOL 00192-01 PP-00292).

Feitas essas considerações, concluo pelo afastamento da alegação de


incidência do prazo decadencial previsto no art. 23 da Lei 12.016/2009.

ii) Da alegada ilegalidade das penas de demissão ou de


aposentadoria compulsória

Aduz o impetrante que, inúmeras vezes, instou o CNMP a explicitar


o fundamento legal para aplicar a pena de demissão ou de aposentadoria
compulsória. Tal pretensão, todavia, não teria sido acolhida (eDOC 2, p.
25 e seguintes).
Nesse sentido, sustenta que não seria admissível, à luz do caso
concreto, a conclusão pela aplicação de sanções de demissão ou de
aposentadoria compulsória. Diferentemente, a pena máxima a que estaria
sujeito, na hipótese de condenação disciplinar, seria a de suspensão.
É de reconhecer-se que, no âmbito do processo administrativo em
questão, antes mesmo da submissão do mérito do tema ao plenário do
órgão, foi aventada a aplicação das penas de aposentadoria compulsória
ou demissão.

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Não houve, todavia, uma análise definitiva por parte do CNMP em


relação à subsunção dos fatos a eventual pena a ser aplicável.
Sobre o tema, é relevante destacar que o artigo 1º da Lei 12.016/99
dispõe que o mandado de segurança é cabível quando há violação a
direito líquido e certo ou justo receio de sofrê-la, por parte de ato de
autoridade. Adicionalmente, o artigo 5º especifica que não se concederá
mandado de segurança quando se tratar de ato do qual caiba recurso
administrativo com efeito suspensivo.
A vedação à propositura de mandado de segurança em relação a ato
sujeito a recurso com efeito suspensivo tem como racional a necessidade
de demonstrar-se a concretude da violação ou da ameaça ao direito
líquido e certo. A notícia, ou a mera expectativa, dissociada de atos
concretos que violam ou possam, efetivamente, violar o direito não enseja
a propositura do mandado de segurança.
A propósito do cabimento do mandado de segurança, em obra
conjunta, desenvolvida com Arnoldo Wald e Hely Lopes Meirelles,
tivemos a oportunidade de nos manifestar nos seguintes termos:

“Quando a lei veda que se impetre mandado de segurança


contra 'ato de que caiba recurso administrativo com efeito
suspensivo, independente de caução' (art. 5º, I), não está
obrigando o particular a exaurir via administrativa para, após,
utilizar-se da via judicial. Está apenas condicionando a
impetração à operatividade ou exequibilidade do ato a ser
impugnado perante o Judiciário. Se o recurso suspensivo for
utilizado, ter-se-á que aguardar seu julgamento para atacar-se o
ato final; se transcorre o prazo para recurso, ou se a parte
renuncia à sua interposição, o ato se torna operante e exequível
pela Administração, ensejando desde logo a impetração. O que
não se admite é a concomitância do recurso administrativo
(com efeito suspensivo) com o mandado de segurança, porque,
se os efeitos do ato já estão sobrestados pelo recurso
hierárquico, nenhuma lesão produzirá enquanto não se tornar
exequível e operante. Só então poderá o prejudicado pedir o
amparo judicial contra a lesão ou a ameaça a seu direito. O que

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se exige sempre – em qualquer caso – é a exequibilidade ou a


operatividade do ato a ser atacado pela segurança; a exequibilidade
surge no momento em que cessam as oportunidades para os
recursos suspensivos; a operatividade começa no momento em
que o ato pode ser executado pela Administração ou pelo seu
beneficiário”. (MEIRELLES, Hely Lopes; MENDES, Ferreira
Gilmar; WALD, Arnoldo. Mandado de Segurança e Ações
Constitucionais. Malheiros Editores. 36ª ed. São Paulo. p. 42)

É cediço que não se está aqui a tratar de ato pendente de recurso


com efeito suspensivo. Quer me parecer, todavia, que o raciocínio aplica-
se ao exame da legalidade quanto à especificação de eventual sanção, se
cabível na hipótese de eventual condenação, ainda a ser submetida à
deliberação do órgão competente.
Na hipótese dos autos, verifica-se que nem sequer houve uma
deliberação definitiva de mérito por parte do plenário do CNMP. Assim,
quanto ao particular, as meras alusões, no curso do processo, inclusive na
portaria de instauração, de sanções alegadamente incabíveis, não são
suficientes para caracterizar a exequibilidade e operatividade exigidas como
pressupostos para o cabimento do mandado de segurança.
Assim, deixo de conhecer do mandado de segurança, nesse ponto.

iii) Da necessidade de abertura de sindicância

Defende o impetrante que, nos termos do art. 204 da LC 25/98, seria


incabível, no presente caso, a abertura de processo administrativo.
Diferentemente, deveria ter sido aberta uma sindicância, uma vez que, a
teor do que dispõe o inciso I do art. 204, seria o único procedimento
cabível na hipótese de aplicação de penas de advertência, censura e
suspensão por 90 dias.
Assim, segundo a inicial, considerando que a sanção máxima
aplicável à hipótese dos autos seria a pena de suspensão, deveria o
CNMP ter determinado a abertura de sindicância e não de processo
administrativo, cuja instauração tem lugar somente nos casos de

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disponibilidade ou de aposentadoria e demissão.


Inicialmente, importa destacar, quanto ao particular, que a
sindicância é procedimento apuratório, investigativo, e, portanto, anterior
à abertura do processo administrativo. Por sua natureza, aliás, a
sindicância não tem por finalidade, de per se, o julgamento definitivo da
conduta e a aplicação da respectiva sanção. Tais fins deverão ser
alcançados no processo administrativo a ser instaurado, se for o caso,
após a conclusão da sindicância.
A doutrina e a jurisprudência têm se atentado a impropriedades na
denominação – incluindo a legislativa – dos institutos em questão, à luz
da natureza e dos propósitos dos procedimentos.
Ou seja, em que pese eventual nomenclatura inapropriada, quando o
procedimento tiver caráter preparatório e objetivar a apuração de fatos e
respectivos autores, para o fim de instauração de processo administrativo,
estar-se-á diante de sindicância. Quando o procedimento tiver por
finalidade o julgamento definitivo da conduta, com eventual aplicação de
sanção, caracterizar-se-á processo administrativo.
Nesse sentido, e diante do caráter preparatório – e não sancionador –
da sindicância, colhem-se, do Supremo Tribunal Federal, inclusive,
julgados em que se reconhece a inexistência da exigência de observação
do contraditório e da ampla defesa no âmbito das sindicâncias. Confira-
se, nessa linha, a seguinte ementa:

“DIREITO ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL


EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. SERVIDOR PÚBLICO.
SINDICÂNCIA. PROCEDIMENTO QUE ANTECEDE A
INSTAURAÇÃO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO
DISCIPLINAR. PRESCINDIBILIDADE DE CONTRADITÓRIO
E AMPLA DEFESA. PRECEDENTES. APLICAÇÃO DA
SÚMULA VINCULANTE 5. 1. O Supremo Tribunal Federal já
assentou ser dispensada a observância dos princípios do
contraditório e da ampla defesa no decorrer da sindicância,
procedimento que antecede a instauração do processo
administrativo disciplinar. Precedentes. 2. “A falta de defesa

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técnica por advogado no processo administrativo disciplinar


não ofende a Constituição” (Súmula Vinculante 5). 3. Ausência
de argumentos capazes de infirmar a decisão agravada. 4.
Agravo regimental a que se nega provimento”.
(RE 715790 AgR, Rel. Min. ROBERTO BARROSO, Primeira
Turma, Dje 6.8.2015)

Conclui-se, portanto, que, a rigor, insurge-se o impetrante não com o


caráter do procedimento em si, mas sim com a possibilidade de aplicação
de sanção mais gravosa, que, no seu entendimento, não seria aplicável à
conduta investigada.
Sobre o tema, reporto-me aos argumentos que me levaram a concluir
pela impossibilidade de, neste momento, reconhecer, quanto a este
particular, a existência de violação – ou ameaça de violação – a direito
líquido e certo em razão de aplicação, em abstrato, de sanção
alegadamente incabível.
Pela mesma razão, não conheço do presente mandado de segurança
quanto a esse fundamento.
Superadas as questões relativas ao conhecimento deste writ, passo à
análise das questões de mérito passíveis de conhecimento neste mandado
de segurança.

2) Do mérito das questões trazidas aos autos

(i) Da alegação de violação ao princípio non bis in idem

Informa o impetrante que, em razão dos mesmos fatos examinados


no processo administrativo disciplinar ora impugnado, foi submetido a
procedimento administrativo disciplinar que teve seu regular curso no
âmbito do Senado Federal, em razão do exercício de seu mandato de
Senador da República.
Esclarece que a Portaria CNMP-CONS/GAB/CC 1, de 12.4.2013,
cinge-se a transcrever trechos oriundos de operações policiais que
integraram os autos do Inquérito 3430/DF, que tramitou no Supremo

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Inteiro Teor do Acórdão - Página 16 de 78

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Tribunal Federal, sob a relatoria do Min. Ricardo Lewandowski.


Nesse sentido, argumenta o impetrante que a portaria em referência,
em síntese, trataria dos seguintes fatos:

“a) Orientação para que Fernando Cavendish não fosse


convocado para ir ao Senado (fls. 207-209);
b) Operação conjunta MPE/MPF (fls. 209 e 210);
c) Influência de 'Carlos Cachoeira' sobre a vida política do
Impetrante (fls. 210 e 211);
d) Recebimento por parte do Impetrante de diversos
presentes e regalias de 'Carlos Cachoeira': rádio nextel; viagens
em aeronaves; garrafas de vinho e pagamento de fogos de
artifício (fl. 212);
e) Depósito de um milhão na conta corrente do Impetrante
(fls. 212-215);
f) Interferência no MP para atender interesses de 'Carlos
Cachoeira'; pedido de parecer para libertar pessoas ligadas à
Operação Sexto Mandamento; pedido para não trocar membros
do MP que investigavam crime organizado; promotor Rodney e
a cidade de Catalão; e, Empresa Gabardo (fls. 216-222);
g) DNIT (fls. 223-225);
h) Sócio oculto da Delta (fls. 225-226)”. (eDOC 2, p. 15)

No que concerne ao processo administrativo que tramitou no Senado


Federal, nos termos informados pelo impetrante, foram analisados os
seguintes fatos:
“a) Orientação para que Fernando Cavendish não fosse
convocado par ir ao Senado (fls. 7950, 7951 e 7965);
b) Operação conjunta MPE/MPF (fls. 7906, 7948 e 7949);
c) Influência de 'Carlos Cachoeira' sobre a vida política do
Impetrante (fls. 9685 e seguinte sem numeração, e com duas
numerações distintas 314; 306 e 307);
d) Recebimento por parte do Impetrante de diversos
presentes e regalias de 'Carlos Cachoeira”: rádio nextel (fls. 349,
350, 402, 408 e 7904, 7933, 7936 e 7963); viagens em aeronaves
(fls. 371, 403 e 7907); garrafas de vinho (fl. 7976) e pagamento de

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fogos de artifício (fls. 7934 e 7935)


e) Depósito de um milhão na conta corrente do Impetrante
(fl. 7904);
f) Interferência no MP para atender interesses de 'Carlos
Cachoeira': pedido de parecer para libertar pessoas ligadas à
Operação Sexto Mandamento; pedido para não trocar membros
do MP que investigavam crime organizado; promotor Rodney e
a cidade de Catalão; e, Empresa Gabardo (fls. 7913, 7928, 7929,
7944, 6777, 7676, e 7677); ofício nº 013/CPMI VEGAS de
16/05/2012 do Senador Vital do Rêgo, Presidente da CPMI ao
Senador Antonio Carlos Valadares comunicando que o Ministro
Ricardo Lewandowski deferiu pedido de compartilhamento de
interceptações telefônicas com o Conselho de Ética e Decoro
Parlamentar do Senado Federal);
g) DNIT (fl. Após a 9679 e antes da 9680, sem numeração);
h) Sócio oculto da Delta (fls. 7914, 7915, 7949, 7950 e
7968).” (eDOC 2, p. 15/16)

Consigna, ainda, o impetrante que a Portaria CNMP-CONS/GAB/CC


3, de 6.5.2013 limita-se a transcrever trechos das operações policias em
questão e trata, especificamente, dos seguintes temas:

“a) Recebimento pelo Impetrante de um aparelho de som;


b) Atuação em favor da empresa VITAPAN;
c)Admissão de uma funcionária 'fantasma'; e
d) Informação a 'Carlos Cachoeira' da tramitação do PL
7228/2002 (fls. 371/372).” (eDOC. 2, p. 16)”

Já o processo administrativo disciplinar que teve curso no Senado,


no que concerne ao tema em apreço, discutiu a respeito de:

“a) Recebimento pelo Impetrante de um aparelho de som


(fl. 7934);
b) Atuação em favor da empresa VITAPAN (fls. 7912 e
7945)
c) Admissão de um funcionária 'fantasma' (fls. 7908,7938 e

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Inteiro Teor do Acórdão - Página 18 de 78

MS 32788 / GO

7939); e
d) Informação a 'Carlos Cachoeira' da tramitação do PL
7228/2002 (fls. 404,408,590,7904,7905,7947,7948,7953 e 7954)
(eDOC 2, p. 16)

O processo administrativo disciplinar do Senado Federal foi


efetivamente julgado e o impetrante foi condenado por seus pares à pena
de cassação do mandato, por quebra de decoro parlamentar.
Diante da sanção já imposta pelo Senado, com fundamento nos
mesmos fatos analisados no âmbito do processo administrativo que
tramita no CNMP, argumenta o impetrante que não seria legítima uma
nova condenação, em razão do princípio que veda o bis in idem.
A violação, portanto, ao princípio da impossibilidade de aplicação
de sanção em bis in idem decorreu, segundo o impetrante, da constatação
de que os mesmos fatos deram ensejo à abertura de dois processos
administrativos em esferas administrativas distintas: a primeira delas no
Senado Federal, que culminou com a cassação do mandato de Senador da
República, e outra no Conselho Nacional do Ministério Público.
A esse respeito, reputa-se demonstrado, nos termos acima extraídos
da inicial, que os fatos que ensejaram a abertura de ambos os processos
administrativos decorrem das práticas examinadas no âmbito do
Inquérito 3430/DF, que tramitou sob a relatoria do Min. Ricardo
Lewandowski.
Resta, assim, examinar se a eventual incidência de dupla penalidade,
em razão dos mesmos fatos, seria inviável, por ofensa ao princípio que
veda o bis in idem, ainda que provenientes de autoridades administrativas
diversas, e com fundamento em substrato normativo distinto.
No contexto constitucional e normativo brasileiro, o princípio do non
bis in idem, muito embora não expressamente consignado no texto
constitucional, está intimamente relacionado aos princípios da legalidade,
da proporcionalidade e do devido processo legal. (BRINDEIRO, Geraldo.
O devido processo legal e o Estado Democrático de Direito. Revista
Consulex. Ano I. Nº 9. Set. 1997)
A rigor, o princípio do non bis in idem constitui-se como garantia do

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cidadão diante do poder sancionador do Estado, com objetivo de tutelar o


seu direito subjetivo a uma persecução pautada pelo devido processo
legal, que, ao final, resulte, nas hipóteses cabíveis, na imposição de
sanção, legal e previamente prevista, que seja proporcional e condizente
com a ofensa ao bem jurídico afetado pela conduta ilícita.
Em formulação rasa, o princípio do non bis in idem vedaria a
persecução sancionadora (penal ou administrativa), com a imposição ao
acusado de duas ou mais sanções, tendo como fundamento os mesmos
fatos apurados em processo prévio.
De forma análoga, o princípio em questão vem especificado no Pacto
de São José da Costa Rica, no artigo 8º, n. 4 , ao impor-se a vedação da
instauração de novo processo, pelos mesmos fatos, contra acusado
absolvido por sentença passada em julgado.
Muito embora a interpretação literal do dispositivo faça referência à
impossibilidade de dupla persecução, após uma sentença absolutória, em
razão dos mesmos fatos, deflui da evolução do princípio a sua aplicação
às hipóteses em que há prévia imposição de sanção pelos mesmos fatos
praticados pelo acusado.
Em que pese a redação do artigo 8º, n. 4 do Pacto de São José da
Costa Rica, bem como a formulação genérica acima referida, no sentido
de que seria vedada a dupla sanção em razão dos mesmos fatos, a
concretização do princípio em apreço em nosso ordenamento jurídico não
se releva isento de desafios.
Em análise comparativa – e a propósito da especificação de
parâmetros para a verificação da incidência do princípio que veda o bis in
idem –, pode-se mencionar a experiência do sistema espanhol, no qual,
tradicionalmente e nos termos do que restou consignado na sentencia 2/81,
do Tribunal Constitucional d'España, de 30 de janeiro de 1981, compreende-
se a verificação do princípio quando há identidade de fatos, sujeitos e
fundamentos para a imposição das sanções.
Muito embora revogada, a Lei 30 de 1992, que dispõe sobre o regime
jurídico das administrações públicas e do procedimento administrativo
comum, previa, no mesmo sentido, em seu artigo 133, que:

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“No podrán sancionarse los hechos que hayan sido


sancionados penal o administrativamente, en los casos en que
se aprecie identidad del sujeto, hecho y fundamento“.
(“Não se poderão sancionar os fatos que tenham sido
sancionados penal ou administrativamente, nos casos em que se
constate identidade de sujeito, fato e fundamento”. Tradução
livre).

Não se desconsidera, todavia, que a perspectiva tradicional do


sistema espanhol também tem passado por relevantes evoluções e
temperamentos, em decisões mais recentes do Tribunal Constitucional.
De fato, no âmbito da STC, de 11 de outubro de 1999, reforçou-se a
íntima ligação entre o non bis in idem e os princípios da legalidade,
tipicidade e da proporcionalidade. Nesse sentido, asseverou-se:

“si la exigencia de lex praevia y lex certa que impone el


art. 25.1 de la Constitución obedece, entre otros motivos, a la
necesidad de garantizar a los ciudadanos un conocimiento
anticipado del contenido de la reacción punitiva o sancionadora
del Estado ante la eventual comisión de un hecho ilícito, ese
cometido garantista devendría inútil si ese mismo hecho, y por
igual fundamento, pudiese ser objeto de una nueva sanción, lo
que comportaría una punición desproporcionada de la
conducta ilícita”.
(se a exigência de lei prévia e específica, de que o art. 25.1
da Constituição se refere, se deve, entre outros motivos, à
necessidade de garantir aos cidadãos um conhecimento
antecipado do conteúdo da reação punitiva ou sancionadora do
Estado ante o eventual cometimento de um ato ilícito, essa
previsão garantista seria inútil se esse mesmo ato, e por igual
fundamento, pudesse ser objeto de uma nova sanção, o que
caracterizaria uma punição desproporcional da conduta ilícita.
Tradução livre.)

A nossa experiência, no âmbito do Supremo Tribunal Federal, revela

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tratamento restritivo quanto ao reconhecimento da incidência do


princípio do non bis in idem. A esse respeito, foi editada a Súmula 19, cujo
teor é o seguinte:

“É inadmissível segunda punição de servidor público,


baseada no mesmo processo em que se fundou a primeira”.

A decisão que fundamentou a edição da Súmula 19 foi proferida no


âmbito do julgamento do RMS 8048, da relatoria do Min. Victor Nunes. A
conclusão a que se chegou foi consubstanciada na seguinte ementa:

“Depois de aplicada a pena de disponibilidade, prevista


no Estatuto dos Funcionários Municipais, e de julgada válida
pela Justiça, não pode a autoridade pública, com base no
mesmo inquérito, aplicar ao funcionário a pena de demissão,
pois, tendo sido encarregado aquêle processo, a nova
penalidade foi aplicada sem processo algum”.
(RMS 8048, Rel. Min. Victor Nunes, DJ 26.4.1962)

No caso em questão, o impetrante havia sido sancionado com a pena


de disponibilidade por ato ilícito praticado no exercício de função
pública. Posteriormente, o prefeito local, no âmbito do mesmo processo
administrativo, houve por bem impor nova pena, sendo esta última de
demissão do referido funcionário público. Diante de tais circunstâncias,
assentou, à época, o Min. Victor Nunes:

“Ora, se o processo já estava encerrado com aplicação da


pena cabível, que era a disponibilidade, como poderia o
Prefeito aplicar ao impetrante nova pena, e desta vez máxima,
que foi a demissão a bem do serviço público, sem instaurar
novo inquérito, onde lhe fôsse garantida ampla defesa, como
quer o art. 189, II, da Constituição Federal?
Aqui está o ponto crucial da controvérsia. A
disponibilidade fôra imposta mediante processo; mas a
demissão foi decretada sem processo algum, porque o anterior,

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já encerrado, não poderia servir para aplicação de segunda


penalidade, autêntico bis in idem. É, pois, insustentável o ato
demissório, já que apoiado em processo administrativo extinto
ou exausto, o que vale dizer que foi praticado sem processo”.

No caso paradigma, que fundamentou a edição da súmula, tratou-


se, portanto, de uma dupla penalidade ocorrida em um mesmo processo
administrativo. Ou seja, uma determinada conduta do agente foi
duplamente penalizada por autoridades administrativas de mesma
natureza, em único processo administrativo, com fundamento em
regulamento específico.
A tradição do sistema brasileiro tem admitido, portanto, em
circunstâncias excepcionais, a possibilidade de aplicação de sanções a
acusado submetido a processos administrativos distintos que tratam dos
mesmos fatos. Não se verifica, a rigor, uma estrita aderência à tese de que
seria inviável a aplicação de mais de uma sanção pelos mesmos fatos
praticados.
Como visto, o próprio paradigma que resultou na edição da Súmula
19 do Supremo Tribunal Federal, nos termos acima transcritos, revela-se
restritivo em relação ao reconhecimento da incidência do princípio. No
caso, concluiu-se pela vedação da dupla sanção quando forem elas
aplicadas em um mesmo processo administrativo.
Tal entendimento, aliás, foi reverberado em julgados posteriores. A
propósito, registro o julgamento que se deu no âmbito do Recurso
Extraordinário 120.570, da relatoria do Ministro Sepúlveda Pertence, cujas
conclusões restaram assim ementadas:

“I - Funcionário público: punição: "ne bis in idem"


(Súmula 19), inaplicabilidade: diversidade dos pressupostos
das punições sucessivas, de resto, não impostas no mesmo
processo disciplinar. 1. Em tese a prisão disciplinar imposta ao
recorrente por um fato determinado não impede que o mesmo
fato se some a faltas antecedentes para lastrear a afirmação de
sua incapacidade para a função militar e determinar a sanção

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final de exclusão. 2. Para a incidência da orientação assentada


na Súmula 19 e necessário - como resulta do precedente que a
lastreia (RMS 8.084, 31.1.62, Victor Nunes) - que as duas
punições sucessivas sejam impostas no mesmo processo
administrativo. II - Garantia constitucional da ampla defesa:
ofensa pela omissão da imputação. A formulação e entrega do
libelo acusatório e a forma, segundo a legislação aplicável ao
caso, de especificar a imputação, delimitando o objeto do
processo disciplinar e, via de consequência, da defesa do
acusado: dado que a ciência pelo acusado da substancia de fato
das acusações e pressuposto elementar da ampla defesa, a sua
omissão ofende o preceito constitucional que a assegura e
implica a nulidade da punição”.
(RE 120570, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Primeira Turma, DJ
8.11.1991) (sem grifos no original)

Em evolução ao referido entendimento, tem-se admitido a aplicação


de sanções cumulativas em processos administrativos distintos, em
relação a mesmos fatos, fundamentos e sujeitos, em hipóteses em que há
(i) independência de instâncias ou (ii) complementaridade nas sanções
aplicadas.
De fato, no sentido de que é viável a aplicação de sanções em relação
aos mesmos fatos, em situações em que se verifica a independência de
instância administrativa e penal, é de notar-se o que restou decidido no
MS 20.947, da relatoria do Ministro Paulo Brossard, cuja ementa
transcrevo:

“PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR.


DEMISSÃO DO SERVIÇO PÚBLICO APÓS REGULAR
PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO EM QUE SUAS
REGRAS ESPECÍFICAS FORAM OBSERVADAS.
INSUBORDINAÇÃO DO PROCEDIMENTO
ADMINISTRATIVO AO PROCESSO PENAL. AUTONOMIA
DAS RESPONSABILIDADES CIVIL, DISCIPLINAR E
CRIMINAL E DE SUAS RESPECTIVAS SANÇÕES. LEI

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1.711/52, ART. 200 E DECRETO N. 59.310/66, ART. 369”. (MS


20947, Rel. Min. Paulo Brossard, Tribunal Pleno, DJ 10.11.1989)

Da mesma forma, também se entendeu, no Mandado de Segurança


22.728, da relatoria do Ministro Moreira Alves, a legitimidade de
aplicação da dupla sanção quando há independência de instâncias
administrativas e complementaridade das sanções aplicadas. A propósito:

“Mandado de segurança. Servidor público. Penalidade de


cassação da aposentadoria por improbidade administrativa e
por aplicação irregular de dinheiros públicos. - Inexistência de
nulidade do processo dirigido pela nova comissão processante,
porquanto, além de não haver ofensa ao artigo 169 da Lei
8.112/90, não houve prejuízo para a impetrante. -
Improcedência da alegação de ocorrência de prescrição.
Interpretação da fluência do prazo de prescrição na hipótese de
ser interrompido o seu curso (artigo 142, I e §§ 3º e 4º, da Lei
8.112/90). - Falta de demonstração da alegação vaga de
cerceamento de defesa. - A alegação de que as imputações à
impetrante são inconsistentes e não foram provadas, demanda
reexame de elementos probatórios, o que não pode ser feito no
âmbito estreito do mandado de segurança. - Inexistência do
"bis in idem" pela circunstância de, pelos mesmos fatos, terem
sido aplicadas a pena de multa pelo Tribunal de Contas da
União e a pena de cassação da aposentadoria pela
Administração. Independência das instâncias. Não aplicação
ao caso da súmula 19 desta Corte. - Improcedência da alegação
de que a pena de cassação da aposentadoria é inconstitucional
por violar o ato jurídico perfeito. - Improcedência da alegação
de incompetência do Ministro de Estado da Educação e do
Desporto. Mandado de segurança denegado”.
(MS 22728, Rel. Min. Moreira Alves, Tribunal Pleno, DJ
13.11.1998) (sem grifos no original)

Não é estranho, portanto, ao nosso sistema a aplicação de sanções


distintas, ainda que em razão dos mesmos fatos, por autoridades

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diversas. Os critérios que conduzem à conclusão pela viabilidade da


aplicação de sanções cumulativas, nessas hipóteses, é a diversidade de
instâncias, de fundamentação e de função sancionatória.
Sobre o tema, deve-se destacar que o Supremo Tribunal Federal tem
reconhecido a competência sancionatória do Tribunal de Contas de
União, no exercício do controle externo da Administração Pública (art.
71, CF/88), independentemente da atividade fiscalizadora interna de
órgãos do Executivo (art. 74, CF/88). A esse respeito, transcrevo a ementa
da PET-AgR 3.606, da relatoria do Ministro Sepúlveda Pertence:

“Conflito de atribuição inexistente: Ministro de Estado dos


Transportes e Tribunal de Contas da União: áreas de atuação
diversas e inconfundíveis. 1. A atuação do Tribunal de Contas
da União no exercício da fiscalização contábil, financeira,
orçamentária, operacional e patrimonial das entidades
administrativas não se confunde com aquela atividade
fiscalizatória realizada pelo próprio órgão administrativo,
uma vez que esta atribuição decorre da de controle interno
ínsito a cada Poder e aquela, do controle externo a cargo do
Congresso Nacional (CF, art. 70). 2. O poder outorgado pelo
legislador ao TCU, de declarar, verificada a ocorrência de
fraude comprovada à licitação, a inidoneidade do licitante
fraudador para participar, por até cinco anos, de licitação na
Administração Pública Federal (art. 46 da L. 8.443/92), não se
confunde com o dispositivo da Lei das Licitações (art. 87), que -
dirigido apenas aos altos cargos do Poder Executivo dos entes
federativos (§ 3º) - é restrito ao controle interno da
Administração Pública e de aplicação mais abrangente. 3. Não
se exime, sob essa perspectiva, a autoridade administrativa
sujeita ao controle externo de cumprir as determinações do
Tribunal de Contas, sob pena de submeter-se às sanções
cabíveis. 4. Indiferente para a solução do caso a discussão sobre
a possibilidade de aplicação de sanção - genericamente
considerada - pelo Tribunal de Contas, no exercício do seu
poder de fiscalização, é passível de questionamento por outros
meios processuais”. (Pet 3606 AgR, Rel. Min. Sepúlveda

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Voto - MIN. GILMAR MENDES

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MS 32788 / GO

Pertence, Tribunal Pleno, DJ 27.10.2006 )

Diante dos posicionamentos acima examinados e considerando a


evolução do tema no sistema pátrio, é viável a sistematização da matéria
no sentido de reconhecer a exigência de três requisitos para a aplicação
do princípio non bis in idem: (i) uma mesma conduta a constituir o objeto
de mais de uma persecução de natureza sancionatória; (ii) identidade
subjetiva; (iii) identidade teleológica da norma sancionadora.
Evidentemente, os requisitos mencionados devem submeter-se ao
crivo dos princípios constitucionais aplicáveis e que fundamentam o non
bis in idem, notadamente, devido processo legal, tipicidade, legalidade e,
ainda, princípio da proporcionalidade.
Na hipótese ora examinada, e nos termos já relatados, discute-se a
respeito da possibilidade de acumulação de sanção eventualmente a ser
efetivada pelo CNMP com a sanção devidamente implementada por
parte do Senado Federal.
Não há como negar, na hipótese, a existência de fatos que constituem
o mesmo objeto de processos administrativos distintos. O sujeito
submetido aos processos persecutórios é o próprio impetrante.
A verificação da função sancionatória de cada um dos processos
disciplinares ora analisados, todavia, demanda análise mais aprofundada.
É inegável, igualmente, a independência da atuação da atividade
fiscalizatória do Senado, em relação à conduta de seus integrantes, e das
competências disciplinares do CNMP. A priori, não há como considerar
como prejudicadas as competências do CNMP em razão de eventual
decisão, seja sancionatória ou condenatória, por parte do Senado Federal
em processos administrativos disciplinares diversos.
O arcabouço normativo que fundamentou o processo administrativo
que teve curso no Senado Federal é, no essencial, constituído pelos artigos
55, II e § 1º, da Constituição Federal e pelos artigos 5º, II e III; e 11, II, da
Resolução-SF 20/1993 (Código de Ética e Decoro Parlamentar do Senado
Federal).
Fundamentalmente, naquela oportunidade, concluiu-se que “o
Senador Demóstenes Torres teve um comportamento incompatível com o decoro

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Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 27 de 78

MS 32788 / GO

parlamentar” (eDOC 31, p. 10), razão pela qual se entendeu pela aplicação
da sanção de perda do mandato.
No âmbito do CNMP, invocou-se a violação aos deveres previstos no
artigo 91, incisos I, II e II, da LC 25/98, para a instauração do processo
administrativo ora impugnado (eDOC. 2, p. 13), que assim dispõe:

“Art. 91 - São deveres do membro do Ministério Público,


além de outros previstos em lei:
I - desempenhar, com independência, zelo, presteza,
serenidade e exatidão suas funções, exercendo com probidade
as atribuições previstas na Constituição da República
Federativa do Brasil e na legislação infraconstitucional;
II - manter conduta ilibada e irrepreensível na vida
pública e particular, guardando decoro pessoal;
III - zelar pelo prestígio dos Poderes da União, do Estado e
dos Municípios, bem como das Funções Essenciais à Justiça,
respeitando suas prerrogativas e a dignidade de seus
integrantes”.

Da interpretação dos dispositivos da norma suscitada, cotejando-a


com o que dispõe o Código de Ética e Decoro do Senado Federal, extrai-se
a conclusão de que os referidos arcabouços normativos, cada um em sua
esfera de incidência, objetivam, em princípio, tutelar bens jurídicos
distintos entre si. Os fins, portanto, das normas em questão, muito
embora análogos, direcionam à tutela de atividades, funções e
responsabilidades que não se confundem.
Nesse contexto, portanto, torna-se oportuno examinar a questão –
também levantada na inicial – relativa à possibilidade de aplicar a sanção
prevista na norma que regulamenta a atividade do Ministério Público do
Estado de Goiás em razão de atos praticados pelo impetrante no exercício
de suas funções de Senador da República, enquanto licenciado do Parquet.
A propósito do tema, ressalto que o Supremo Tribunal Federal já se
manifestou a respeito de circunstâncias fáticas análogas, no âmbito do
Mandado de Segurança 25.579, da relatoria do Ministro Joaquim Barbosa.

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Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 28 de 78

MS 32788 / GO

Naquele caso, nos termos em que me manifestei à época, discutiu-se


se “é regular o processo ético-disciplinar junto à Câmara dos Deputados para
apurar e, eventualmente, punir fatos imputados a Deputado referentes a período
em que ele estava investido no cargo de Ministro de Estado Chefe da Casa Civil”.
O Supremo Tribunal Federal, no âmbito do julgamento do
mencionado mandado de segurança, reconheceu a possibilidade de
aplicação da sanção a parlamentar, ainda que os atos tivessem sido
praticados durante o período em que esteve licenciado para exercício de
funções no Executivo. O acórdão do julgado em questão ficou assim
ementado:

“MANDADO DE SEGURANÇA. MEDIDA LIMINAR.


DECISÃO DO COLEGIADO. POSSIBILIDADE. MANDATO
PARLAMENTAR. TRAMITAÇÃO E PROCESSAMENTO DE
REPRESENTAÇÃO POR QUEBRA DE DECORO
PARLAMENTAR. DEPUTADO FEDERAL LICENCIADO E
INVESTIDO NO CARGO DE MINISTRO DE ESTADO.
LIMINAR INDEFERIDA. 1. Nos órgãos jurisdicionais de
composição múltipla, em regra a colegialidade deve primar
sobre a individualidade no processo de tomada de decisões.
Assim, é faculdade do Relator, sempre que considerar relevante
a matéria, submeter ao colegiado o julgamento de pedido de
concessão de medida liminar em mandado de segurança. 2. Na
qualidade de guarda da Constituição, o Supremo Tribunal
Federal tem a elevada responsabilidade de decidir acerca da
juridicidade da ação dos demais Poderes do Estado. No
exercício desse mister, deve esta Corte ter sempre em
perspectiva a regra de auto-contenção que lhe impede de
invadir a esfera reservada à decisão política dos dois outros
Poderes, bem como o dever de não se demitir do
importantíssimo encargo que a Constituição lhe atribui de
garantir o acesso à jurisdição de todos aqueles cujos direitos
individuais tenham sido lesados ou se achem ameaçados de
lesão. À luz deste último imperativo, cumpre a esta Corte
conhecer de impetração na qual se discute se os atos

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Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 29 de 78

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ministeriais do parlamentar licenciado se submetem à


jurisdição censória da respectiva câmara legislativa, pois a
matéria tem manifestamente estatura constitucional, e não
interna corporis. Mandado de segurança conhecido. 3. O
membro do Congresso Nacional que se licencia do mandato
para investir-se no cargo de Ministro de Estado não perde os
laços que o unem, organicamente, ao Parlamento (CF, art. 56, I).
Conseqüentemente, continua a subsistir em seu favor a garantia
constitucional da prerrogativa de foro em matéria penal (INQ-
QO 777-3/TO, rel. min. Moreira Alves, DJ 01.10.1993), bem
como a faculdade de optar pela remuneração do mandato (CF,
art. 56, § 3º). Da mesma forma, ainda que licenciado, cumpre-
lhe guardar estrita observância às vedações e
incompatibilidades inerentes ao estatuto constitucional do
congressista, assim como às exigências ético-jurídicas que a
Constituição (CF, art. 55, § 1º) e os regimentos internos das
casas legislativas estabelecem como elementos caracterizadores
do decoro parlamentar. 4. Não obstante, o princípio da
separação e independência dos poderes e os mecanismos de
interferência recíproca que lhe são inerentes impedem, em
princípio, que a Câmara a que pertença o parlamentar o
submeta, quando licenciado nas condições supramencionadas,
a processo de perda do mandato, em virtude de atos por ele
praticados que tenham estrita vinculação com a função exercida
no Poder Executivo (CF, art. 87, parágrafo único, incisos I, II, III
e IV), uma vez que a Constituição prevê modalidade específica
de responsabilização política para os membros do Poder
Executivo (CF, arts. 85, 86 e 102, I, c). 5. Na hipótese dos autos,
contudo, embora afastado do exercício do mandato
parlamentar, o Impetrante foi acusado de haver usado de sua
influência para levantar fundos junto a bancos "com a
finalidade de pagar parlamentares para que, na Câmara dos
Deputados, votassem projetos em favor do Governo"
(Representação nº 38/2005, formulada pelo PTB). Tal imputação
se adequa, em tese, ao que preceituado no art. 4º, inciso IV do
Código de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos

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Inteiro Teor do Acórdão - Página 30 de 78

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Deputados que qualifica como suscetíveis de acarretar a perda


do mandato os atos e procedimentos levados a efeito no intuito
de ‘fraudar, por qualquer meio ou forma, o regular andamento
dos trabalhos legislativos para alterar o resultado de
deliberação’. 6. Medida liminar indeferida”.
(MS 25579 MC, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Red. Para
acórdão Min. Joaquim Barbosa, Tribunal Pleno, DJ 24.8.2007)
(sem grifos no original)

Em voto proferido naquela ocasião, ressaltei que “se é certo que a


cassação de mandato político não constitui procedimento estritamente político,
estando, portanto, sob o pálio do controle de legitimidade pelo Poder Judiciário,
por outro lado, não se pode negar a sua natureza eminentemente política, tendo
em vista que tal procedimento está jungido a parâmetros éticos e político-
disciplinares da respectiva Casa Legislativa”. Ou seja, muito embora a
persecução a que se submete o parlamentar seja efetivo processo
administrativo disciplinar, com fundamento normativo nos respectivos
Códigos de Ética e Decoro, não se deve desconsiderar a sua natureza
eminentemente político-disciplinar.
Assim, o processo administrativo disciplinar que apura a conduta do
membro do Ministério Público não se confunde com o processo
administrativo próprio das casas legislativas. As funções, prerrogativas,
deveres, e, consequentemente, as responsabilidades inerentes ao
Ministério Público exigem conformação sancionatória própria, com o
específico propósito de resguardar a legitimidade de tal relevante mister.
Não se confundem, portanto, com os valores a serem preservados
pelo Código de Ética e Decoro Parlamentar, com fundamento no qual são
perquiridas infrações que eventualmente possam atentar aos valores da
atividade política do parlamentar, ainda que possam assemelhar-se, ao
menos em parte, na carga moral subjacente às normas.
Dessa forma, conquanto ambos os processos administrativos
disciplinares ora apreciados tenham sido instaurados contra o mesmo
sujeito e com base nos mesmos substratos fáticos, os fundamentos que
levaram à aplicação da sanção em cada um deles se fundamenta em

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Inteiro Teor do Acórdão - Página 31 de 78

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diplomas normativos diferentes e de natureza díspar, tendo em vista que


a função sancionatória de cada uma das instâncias se destina a atividades,
funções, responsabilidades, prerrogativas e deveres diversos.
Com fundamento nessas razões, afasto o argumento relativo à
incidência do princípio non bis in idem.

(ii) Das alegações acerca de vícios procedimentais

a) Suspensão cautelar

Insurge-se o impetrante contra a suspensão preventiva, determinada


em 24.10.2012 e prorrogada sucessivamente, no âmbito do processo
administrativo preliminar impugnado.
Desde já, reporto-me às razões consignadas na decisão por mim
proferida em 1º.7.2014 (eDOC 57) acerca da alegação suscitada.
Reitero que o afastamento do impetrante de suas funções por quase
dois anos não é compatível com a Lei Complementar estadual 25/98,
mormente ao levar-se em conta a inexistência de qualquer previsão que
permita a prorrogação sucessiva e indiscriminada da suspensão
anteriormente decretada.
A esse respeito, é de considerar-se que o afastamento cautelar deve
estar devidamente amparado nos estritos termos da Lei Complementar
estadual 25/98, e correlacionado, em concreto, a justificativa
correspondente, de forma proporcional, à gravidade da medida.
Não se verifica legítima a medida cautelar como forma de
antecipação de pena.
Concluo, nesses termos, portanto, pela necessidade de confirmação
da liminar concedida na decisão de 1º.7.2014 (eDOC 57), por seus
próprios fundamentos.

b) Da inviabilidade da relatoria do feito pelo Corregedor Nacional

Argumenta, ainda, o impetrante que o Corregedor-Geral do

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Conselho Nacional do Ministério Público foi o relator do processo de


avocação do Procedimento Administrativo Disciplinar instaurado no
âmbito do Ministério Público do Estado de Goiás, o que teria violado o
regimento interno do Conselho Nacional do Ministério Público vigente à
época.
Nos termos em que a própria inicial esclarece (eDOC p. 53 e 54), o
processo administrativo foi distribuído ao Corregedor-Geral, com o
objetivo de análise conjunta do feito com reclamação disciplinar, com
identidade de objeto, com o objetivo de se “evitar procedimentos
instrutórios e decisões contraditórias nos feito”.
Dessa forma, reunidos os feitos sob mesma relatoria em razão da
conveniência da instrução, bem como para evitar a prolação de decisões
contraditórias, não incorreu a autoridade coatora em violação ao devido
processo legal e ao princípio do juiz natural.
Sublinho que a possibilidade de reunião de feitos com esse intuito é
reconhecida pelo Novo Código de Processo Civil, aplicado
subsidiariamente ao processo administrativo, nos termos do art. 55, § 3º,
do NCPC, ao dispor que “serão reunidos para julgamento conjunto os
processos que possam gerar risco de prolação de decisões conflitantes ou
contraditórias caso decididos separadamente, mesmo sem conexão entre eles”.
Essa possibilidade, já reconhecida pela jurisprudência dos tribunais
pátrios antes mesmo do advento da codificação processual, tem por
fundamento conferir efetividade ao princípio da economia processual e
isonomia jurisdicional, diante de risco efetivo de decisões contraditórias
sobre o mesmo fato.
Ainda que superado esse óbice, destaco, por oportuno, que o
posterior pedido de avocação do feito, formulado pelo CNMP, foi julgado
procedente pelo colegiado do órgão, com posterior distribuição livre do
feito entre seus Conselheiros, convalidando eventual vício de
competência para conhecimento do pedido, que pudesse ser imputado ao
Corregedor-Nacional (eDOC 2, p. 55).
Assim, afasto a alegação suscitada quanto à violação dos princípios
do devido processo legal e do juiz natural.

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c) Inépcia da portaria que instaura o PAD e do respectivo aditamento; e


cerceamento de defesa

O impetrante argumenta que tanto a portaria de instauração do


processo administrativo disciplinar quanto o seu respectivo aditamento
são omissos quanto à descrição dos fatos, devidamente cotejados com os
tipos previstos na LC 25/98.
A portaria e respectivo aditamento estariam a impedir o exercício
pleno do direito de defesa, haja vista que, nos termos da inicial, “não
descrevem os fatos, circunstâncias e os elementos mínimos que uma peça
acusatória deve conter, como prescreve o artigo 41 do CPP”.
Após detido exame dos autos do processo administrativo verifico, a
esse respeito, que consta, ainda que de forma sintética e aliunde, a
descrição dos fatos imputados ao impetrante, conforme se extrai do
conteúdo da Portaria-CNMP-CONS/GAB/CC Nº 01, de 12 de abril de
2013:

“RESOLVE:
Instaurar, em obediência à decisão Plenária proferida nos
autos da Reclamação Disciplinar nº 0.00.000.000875/2012-53
(apenso ao Pedido de Avocação nº 0.00.000.000930/2012-12),
Processo Administrativo Disciplinar contra o Procurador de
Justiça do Estado de Goiás Demóstenes Lazaro Xavier Torres,
por ter, em tese, envolvimento com as atividades ilícitas
praticadas por Carlos Augusto de Almeida Ramos, vulgo
‘Carlinhos Cachoeira’ e outras pessoas, utilizando-se de seu
cargo e influência política para benefício pessoal e de terceiros,
o que configura afronta ao art. 91, I, II, e III, da Lei
Complementar Estadual 25/1998 (Lei Orgânica do Ministério
Público do Estado de Goiás), conforme os fatos constantes do
Anexo I desta Portaria” (eDOC 5, pp. 208/209).

O Anexo I, contante da Portaria de instauração do PAD em análise,


por sua vez, referindo-se ao voto do Corregedor Nacional de Justiça do

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Pedido de Avocação do PAD, descreve os atos imputados ao impetrante,


conforme se extrai do seguinte trecho do referido documento:

“(...). As condutas estão descritas no voto do Corregedor


Nacional do Ministério Público, que passa a fazer parte do
presente anexo:
‘(...)
V – MÉRITO. Indícios suficientes de autoria e
materialidade da prática de infração funcional a ensejar a
instauração de procedimento administrativo disciplinar em face
do Membro do Ministério Público do Estado de Goiás.
A reclamação disciplinar tem como objeto apurar, sob o
aspecto disciplinar, fatos descobertos durante a ‘Operação
Monte Carlo’, desencadeada pela Polícia Federal em fevereiro
de 2008, e que deram origem ao Inquérito nº 3430/GO, em
tramitação perante o Excelso Supremo Tribunal Federal, sob a
relatoria do Ministro Ricardo Lewandowski.
O inquérito tem como apenso o Processo Cautelar de
Interceptação Telefônica nº 13279-78.2011.4.01.3500, no qual
estão transcritas inúmeras conversas entre o reclamado e
‘Carlinhos Cachoeira’, a revelar uma estreita relação de
amizade entre os dois.
Segundo o relatório de inteligência da Polícia Federal
foram registradas, no período de 28/02/2011 a 24/08/2011, 298
(duzentos e noventa e oito) chamadas telefônicas ente o
Procurador de Justiça e ‘Carlinhos Cachoeira’, além de vários
encontros.
Da análise minuciosa das interceptações telefônicas,
verifica-se que a amizade entre Demóstenes Torres e ‘Carlinhos
Cachoeira’ estava especialmente voltada para a realização de
diversos negócios que envolviam interesses políticos e
empresariais de ambos.
Existem, ainda, indícios relevantes de que o reclamado
não só tinha conhecimento das atividades ilícitas realizadas por
‘Carlinhos Cachoeira’, mas também auxiliava a mantê-las e
protegê-las, fornecendo a ele informações das quais tinha

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conhecimento em razão do exercício do cargo de Senador da


República e Membro do Ministério Público.
Algumas das conversas interceptadas pela Polícia Federal
demonstram a atuação do reclamado com esse intuito: (...)”
(eDOC 5, p. 210/211)

Na Portaria-CNMP-CONS/GAB/CC Nº 3, de 6 de maio de 2013, de


aditamento da primeira portaria de instauração do PAD, para a
reabertura de prazo para defesa prévia ao requerido, com nova citação,
menciono as seguintes condutas atribuídas ao impetrante:

“As condutas atribuídas ao Procurador de Justiça do


Estado de Goiás Demóstenes Lazaro Xavier Torres,
consubstanciam inequívoca violação aos deveres previstos no
art. 91, I, II, e III, da LC nº 25/98, e configuram também, em tese,
a prática de crimes incompatíveis com o exercício do cargo
(arts. 317, 319, 321 e 332 do Código Penal) e atos de
Improbidade administrativa definidos nos arts. 9º, 10 e 11 da lei
federal nº 8.429/92.
Além das imputações já descritas na Portaria-CNMP-
CONS/GAB/CC Nº 01, de 12 de abril de 2013, publicada em 15
de abril de 2013, ora aditada, configuram também, em tese,
faltas funcionais, crimes incompatíveis com o exercício do cargo
e atos de Improbidade administrativa, as seguintes condutas
praticadas por Demóstenes Lazaro Xavier Torres:
1. Demóstenes Lazaro Xavier Torres recebeu um aparelho
de som no valor de R$ 27.000,00 (vinte e sete mil reais),
adquirido no Exterior (Estados Unidos da América), por Calos
Augusto de Almeida Ramos, vulgo Carlinhos Cachoeira, através
do seu subordinado Gleyb Ferelra da Cruz.
2. Demóstenes Lazaro Xavier Torres, no exercício da
atividade parlamentar, patrocinou interesses particulares da
empresa farmacêutica denominada Vitapan Indústria
Farmacêutica Ltda., relacionada a ‘Carlinhos Cachoeira’,
atuando em diversos momentos em favor desta empresa
farmacêutica visando a obtenção de registro de medicamentos

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genéricos e similares junto à Agência Nacional de Vigilância


Sanitária – ANVISA. Nesse sentido, em pelo menos duas
oportunidades, Demóstenes Torres solicitou à ANVISA o
agendamento de reunião para tratar de assuntos relativos à
Vitapan, tal como se deu nos dias 09 de fevereiro de 2011 e 21
de setembro de 2011.
3. Demóstenes Lázaro Xavier Torres admitiu Kenia
Vanessa Ribeiro, sobrinha de ‘Carlinhos Cachoeira’ para ocupar
cargo comissionado do vinculado a seu Gabinete. A admissão
foi motivada pela satisfação dos interesses particulares de
‘Carlinhos Cachoeira’, e sua vinculação funcional ao Senado
ocorreu apenas de direito, pois efetivamente jamais exerceu as
funções do seu cargo.
4. Demóstenes Lázaro Xavier Torres patrocinou
diretamente interesses de Carlinhos Cachoeira sobre o trâmite
do PL 7228/2002 (transforma contravenção de jogo de azar em
crime) informando-o sobre a tramitação no Parlamento e
alertando-o sobre a possibilidade de aprovação do projeto que
seria prejudicial aos interesses do contraventor.”

Demonstrada, portanto, a descrição das condutas imputadas ao


impetrante na Portaria de instauração do Processo Administrativo
Disciplinar, de forma suficiente a propiciar o exercício do direito à ampla
defesa e ao contraditório, não prospera a alegação de violação à referidas
garantias processuais.

d) Do decurso do prazo prescricional para apuração dos fatos imputados ao


impetrante pela Administração Pública

Alega o impetrante que não houve a explicitação dos fatos vis-à-vis


às sanções específicas a serem impostas. Por essa razão, aplicar-se-ia a
regra mais benéfica, qual seja, a de advertência, que prevê o prazo
prescricional de um ano.
Segundo seu entendimento, considerando o transcurso do prazo de
mais de um ano decorrido entre os fatos e a instauração do procedimento,

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haveria a incidência da prescrição.


A propósito, reporto-me às razões de decidir preliminarmente
desenvolvidas, em relação à ausência de definição, em concreto, por parte
do Plenário do CNMP, das sanções a serem aplicadas, a demonstrar a
inexistência, neste momento processual, de ato exequível pela
Administração Pública, a caracterizar violação a direito líquido e certo do
impetrante.
Não se deve olvidar que, tal como alertado na inicial, a própria
portaria de instauração faz menção a penas de maior gravidade – ainda
que alegadamente incabíveis – com prazo prescricional de cinco anos.
Ademais, o art. 203, § 1º, da LC 25/1998 do Estado de Goiás,
repetindo norma contida no art. 142, § 2º, da Lei 8.112/90, que incide
subsidiariamente ao processos administrativos instaurados contra
membros do Ministério Público, prevê que a infração disciplinar punida
em lei como crime terá o prazo de prescrição deste.
Dispõe, ainda, que a instauração do processo administrativo
disciplinar interrompe o prazo prescricional para apuração dos fatos que
se tornarem conhecidos pela Administração, conforme se extrai de sua
redação:

“Lei Complementar 25, de 6 de julho de 1998.

Art. 203. Prescreverá:


I – em 1 (um) ano, a infração punível com advertência;
II – em 2 (dois) anos, a infração punível com censura;
III – em 4 (quatro) anos, a infração punível com
disponibilidade ou remoção compulsória;
IV – em 5 (cinco) anos, nos casos dos incisos II e III do
artigo 185;
§ 1º A infração disciplinar punida em lei como crime terá o
prazo de prescrição deste
§ 2º A instauração do respectivo procedimento
administrativo disciplinar e a decisão neste proferida
interrompem a prescrição.
(...)”

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Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 38 de 78

MS 32788 / GO

“Lei 8.112, de 11 de dezembro de 1990.

Art. 142. A ação disciplinar prescreverá:


(…)
§ 1º O prazo de prescrição começa a correr da data em que
o fato se tornou conhecido.
§ 2º Os prazos de prescrição previstos na lei penal
aplicam-se às infrações disciplinares capituladas também como
crime.
§ A abertura de sindicância ou a instauração de processo
disciplinar interrompe a prescrição, até a decisão final proferida
por autoridade competente.”

Analisando os documentos juntados aos autos, verifica-se que a


Portaria-CNMP-CONS/GAB/CC Nº 3, de 6 de maio de 2013 (eDCO 5, p.
294), que aditou a Portaria originária de instauração do Processo
Administrativo Disciplinar ora analisado, atribuiu ao impetrante
condutas que configuram a prática de crimes incompatíveis com o
exercício do cargo, descritos nos arts. 317, 319, 321 e 332 do Código Penal
e nos arts. 9º; 10 e 11, da Lei de Improbidade Administrativa.
Esses delitos prescrevem penas máximas in abstracto que variam, nos
termos do art. 109 do Código Penal, entre 1 (um) e 12 (doze) anos, motivo
pelo qual a prescrição a ser aplicada aos atos analisados pela decisão
impugnada poderá se dar em 4 (quatro) anos, caso as condutas ao
impetrante imputadas amoldem-se, em tese, aos tipos penais que
prescrevem crimes menos graves, ou em 16 (dezesseis) anos, para os mais
graves.
Sobre o tema relativo ao prazo prescricional em processo
administrativo disciplinar, o Supremo Tribunal Federal firmou
entendimento no sentido de bastar a capitulação da infração
administrativa como crime para ser considerado o prazo prescricional
previsto na lei penal. Nesse sentido, o seguinte precedente:

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MS 32788 / GO

“RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE


SEGURANÇA. PROCESSO ADMINISTRATIVO
DISCIPLINAR. PENA DE DEMISSÃO. FATO CAPITULADO
COMO CRIME. PRESCRIÇÃO PUNITIVA ESTATAL. PRAZO
FIXADO A PARTIR DA LEI PENAL (ART. 142, § 2º, DA LEI N.
8.112/1990). PRECEDENTES. RECURSO ORDINÁRIO EM
MANDADO DE SEGURANÇA AO QUAL SE NEGA
PROVIMENTO”. (RMS 33.858, Rel. Min. Cármen Lúcia,
Segunda Turma, DJe 18.12.2015)

De acordo com os documentos juntados aos autos, os fatos apurados


ocorreram entre os anos de 2008 e 2011 (eDOC 5, p. 210). A Reclamação
Disciplinar perante a Corregedoria Nacional do Ministério Público, aberta
contra o impetrante, foi instaurada em 24.10.2012, interrompendo, até a
decisão final no processo administrativo dela resultante, o prazo
prescricional (eDOC 5, p. 5).
Dessa forma, considerando a possibilidade de aplicação do prazo
prescricional de 4 (quatro) até 16 (dezesseis) anos e, tendo em vista a
interrupção do prazo prescricional pela instauração de processo
administrativo destinado a apurar as condutas atribuídas ao impetrante,
mostra-se prematura a sua pretensão de ver reconhecida a prescrição
administrativa em relação aos fatos narrados, o que afasta o
reconhecimento de direito líquido e certo, no tocante à alegação da inicial.

e) vícios na instrução probatória, ilicitude das provas e cerceamento de


defesa

O impetrante alega que o conjunto probatório que dá subsídio ao


processo administrativo em questão é ilícito, o que “obriga a declaração de
imprestabilidade de todos os áudios decorrentes das referidas escutas”.
Subsidiariamente, afirma, ainda, que (i) não houve a
disponibilização do material de áudio/vídeo em condições técnicas
indispensáveis para realização de parecer técnico, e que (ii) a portaria de
instauração não contém transcrição integral dos áudios, o que também

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Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 40 de 78

MS 32788 / GO

acarretaria violação ao direito de ampla defesa por parte do impetrante.


Assiste razão ao impetrante, neste particular.
Sobre o tema, a Segunda Turma do STF já teve a oportunidade de
manifestar-se a respeito da ilicitude das provas colhidas no âmbito das
operações Vegas e Monte Carlo – que subsidiaram a instauração do
processo administrativo em apreço –, quando do julgamento do Recurso
Ordinário em Habeas Corpus 135.683, da relatoria do Ministro Dias Toffoli.
No julgamento em questão, a Turma concluiu que as interceptações
telefônicas realizadas em primeiro grau de jurisdição, envolvendo o
impetrante, seriam ilícitas, em razão de usurpação de competência do
Supremo Tribunal Federal para processar e julgar a causa de que é parte
Senador da República, nos termos do art. 102, I, “b”, da Constituição
Federal. A propósito, confira-se a ementa que consubstancia a conclusão a
que se chegou no julgamento do RHC 135.683:

“Recurso ordinário em habeas corpus. Constitucional.


Processual Penal. Crimes de corrupção passiva e advocacia
administrativa. Interceptações telefônicas realizadas em
primeiro grau de jurisdição. Operação Vegas. Surgimento de
indícios do envolvimento de Senador da República, detentor de
prerrogativa de foro, em fatos criminosos em apuração.
Competência do Supremo Tribunal Federal para processar e
julgar originariamente a causa (CF, art. 102, I, b e c).
Necessidade de imediata remessa dos autos à Corte. Não
ocorrência. Usurpação de sua competência constitucional
configurada. Prosseguimento das investigações em primeiro
grau. Tentativa de arrecadar maiores elementos de informação
por via oblíqua sem a autorização do Supremo Tribunal
Federal. Violação do princípio do juiz natural (CF, art. 5º, LIII).
Operação Monte Carlo. Surgimento de indícios do
envolvimento de detentor de prerrogativa de foro nos fatos em
apuração. Sobrestamento em autos apartados dos elementos
arrecadados em relação ao referido titular de prerrogativa.
Prosseguimento das diligências em relação aos demais
investigados. Desmembramento caraterizado. Violação de

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competência exclusiva da Corte, juiz natural da causa.


Invalidade das interceptações telefônicas relacionadas ao
recorrente nas operações Vegas e Monte Carlo e das provas
diretamente delas derivadas. Teoria dos frutos da árvore
envenenada (fruit of the poisonous tree). Precedentes. Recurso
parcialmente provido. 1. Nos termos do art. 102, inciso I, alíneas
b e c, da Constituição de 1988, compete ao Supremo Tribunal
Federal processar e julgar, originariamente, nas infrações penais
comuns, o presidente da República, o vice-presidente, os
membros do Congresso Nacional, seus próprios ministros e o
procurador-geral da República, e, nas infrações penais comuns
e nos crimes de responsabilidade, os ministros de Estado e os
comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, os
membros dos tribunais superiores, os do Tribunal de Contas da
União e os chefes de missão diplomática de caráter permanente.
2. A prerrogativa de foro não tem como objetivo favorecer
aqueles que exercem os cargos listados na Constituição, mas
garantir a independência do exercício de suas funções, além de
evitar manipulações políticas nos julgamentos e a subversão da
hierarquia. 3. O papel do Supremo Tribunal Federal como Corte
Criminal relaciona-se intrinsecamente com o princípio
constitucional do juiz natural, segundo o qual ninguém será
processado nem sentenciado senão pela autoridade competente
(CF, art. 5º, inciso LIII). Portanto, em estrita observância a esse
princípio, somente o juiz constitucionalmente competente pode
validamente ordenar medidas de interceptação de
comunicações telefônicas em desfavor de titular de prerrogativa
de foro. 4. É válido o encontro fortuito de provas em
interceptações telefônicas (v.g. RHC nº 120.111/SP, Primeira
Turma, de minha relatoria, DJe de 31/3/14). 5. A jurisprudência
da Corte é no sentido de que a simples menção ao nome de
autoridades detentoras de prerrogativa de foro, seja em
depoimentos prestados por testemunhas ou investigados, seja
na captação de diálogos travados por alvos de censura
telefônica judicialmente autorizada, assim como a existência de
informações, até então, fluidas e dispersas a seu respeito, são

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Inteiro Teor do Acórdão - Página 42 de 78

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insuficientes para o deslocamento da competência para o juízo


hierarquicamente superior. Para que haja a atração da causa
para o foro competente, é imprescindível a constatação da
existência de indícios da participação ativa e concreta do titular
da prerrogativa em ilícitos penais. 6. Todavia, a hipótese
retratada nos autos não se coaduna com o entendimento
jurisprudencial suso mencionado por não se tratar de simples
menção a detentor de prerrogativa de foro, nem, muito menos,
de encontro fortuito de provas. 7. Em relação à operação Vegas,
deflagrada em 2008, embora as autoridades nela envolvidas
negassem que se tratasse de uma investigação direta em
desfavor de detentor de prerrogativa de foro, os documentos
contidos nos autos demonstraram que, no auge da persecução
penal, nos idos de 2008 já havia indícios reflexos de seu
envolvimento com o objeto em apuração, não obstante a
denúncia mencione que os fatos em relação a ele teriam como
termo inicial somente a data de 22/6/09, que antecedeu o
deslocamento da competência para esta Corte. 8. Portanto, o
surgimento de indícios de envolvimento do recorrente já no ano
de 2008 tornou impositiva a remessa do caso para o Supremo
Tribunal Federal, o que, por não ter ocorrido opportune tempore,
maculou os elementos de prova arrecadados em seu desfavor. 9.
É do entendimento do Supremo Tribunal Federal que,
‘surgindo indícios de detentor de prerrogativa de foro estar
envolvido em fato criminoso, cumpre à autoridade judicial
remeter o inquérito ao Supremo (...), sob pena de haver seu
arquivamento, ante a ilicitude dos elementos colhidos.’ (Inq nº
3.305/RS, Primeira Turma, Relator o Ministro Marco Aurélio,
DJe de 2/10/14). 10. Quanto à operação Monte Carlo, deflagrada
2011, embora as autoridades envolvidas na operação também
negassem que se tratasse de uma investigação direta em
desfavor de detentor de prerrogativa de foro, os documentos
constantes dos autos demonstraram exatamente o contrário. 11.
Desde o início da operação, em 2011, já havia indícios
relevantes de envolvimento do recorrente com os fatos
apurados, sendo certo que não cabia ao juízo de primeiro grau,

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para prosseguir com as investigações, promover seu


desmembramento, tal qual ocorreu ao se determinar a formação
de autos em apartado contendo o ‘Relatório de Inteligência
acerca dos encontros fortuitos envolvendo pessoas que
possuem prerrogativa de foro’. 12. Como afirmou a autoridade
policial, o relatório de inteligência acerca dos encontros
fortuitos em referência continha nada menos do que 6 (seis)
volumes e 1.237 páginas, o que sugere a existência de farto
material que se acumulou por ocasião das interceptações. 13.
Restou configurado, portanto, que as interceptações telefônicas
levadas a cabo, tanto na operação Vegas, quanto na operação
Monte Carlo, revelaram que seu conteúdo passou por análise
que, indiscutivelmente, não competia a juízo de primeiro grau,
mas ao Supremo Tribunal Federal, o que contaminou de
nulidade os elementos de prova angariados em desfavor do
recorrente nas operações policiais em evidência, por violação
do princípio do juiz natural (CF, art. 5º, LIII). 14. Recurso
parcialmente provido para se conceder a ordem de habeas
corpus no sentido de invalidar as interceptações telefônicas
relacionadas ao recorrente nas operações Vegas e Monte Carlo,
realizadas em primeiro grau, bem como as provas diretamente
delas derivadas, determinando-se seu desentranhamento dos
autos da ação penal à qual responde perante o Tribunal de
Justiça do Estado de Goiás, a quem compete avaliar se
remanesce justa causa para o prosseguimento do feito, a partir
de eventual constatação de outras provas autônomas suficientes
ao embasamento da acusação, uma vez que a via estreita do
habeas corpus, na linha de precedentes, não permite revolver o
acervo fático-probatório para melhor se reanalisar essa
questão”.
(RHC 135.683, Rel. Min. Dias Toffoli, Segunda Turma, Dje
3.4.2017)

Nos termos já consignados, o processo administrativo disciplinar


impugnado foi amplamente subsidiado com o arcabouço probatório
produzido no âmbito da ação penal de que trata o RHC 135.683.

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Diante disso, a conclusão quanto ao conjunto probatório há de ser a


mesma.
Do Relatório da Reclamação Disciplinar da qual resultou a
instauração do PAD, extrai-se o seguinte trecho, a demonstrar que o
substrato fático que justificou sua instauração se ampara exclusicamente
nas interceptações telefônicas ora em comento:

“Trata-se de reclamação disciplinar instaurada em face do


Procurador de Justiça Demóstenes Lázaro Xavier Torres, com
escopo de apurar a existência de responsabilidade disciplinar
do referido membro do Ministério Público do Estado de Goiás,
por suposto envolvimento em esquema criminoso engendrado
por Carlos Augusto de Almeida Ramos.
Com fundamento em conversas telefônicas entre o
Procurador de Justiça Demóstenes Torres e ‘Carlinhos
Cachoeira’, interceptadas pela Polícia Federal, busca-se apurar a
prática de infração disciplinar consistente em violação aos
deveres funcionais previstos no art. 91, incisos I a III, da Lei
Orgânica do MP/GO.” (eDOC 5, p. 8)

Do mesmo modo, da Portaria originária de instauração do PAD,


extrai-se que as provas colhidas contra o impetrante foram todas
decorrentes do Processo Cautelar de Interceptação Telefônica 13279-
78.2011.4.01.3500. Consta do Anexo I da referida Portaria, em referência
ao voto proferido pelo Corregedor Nacional de Justiça no âmbito da
Reclamação Disciplinar, a transcrição de inúmeras conversas
interceptadas pela Polícia Federal, das quais se extraíram os indícios de
atuação ilícita imputados impetrante, e que são objeto do PAD (eDOC 5,
pp. 210-232), nos seguintes termos:

“Fatos descritos nos autos da Reclamação Disciplinar nº


0.00.000.000930/2012-12 (apenso ao pedido de Avocação nº
0.00.000.000930/2012-12), acolhidos pelo Plenário do Conselho
Nacional do Ministério Público.
As irregulares atribuídas ao Procurador de Justiça do

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Estado de Goiás Demóstenes Lazaro Xavier Torres,


consubstanciam-se em: fortes indícios de que o reclamado tinha
conhecimento dos atos ilícitos praticados por ‘Carlinhos
Cachoeira’ e que utilizou-se diversas vezes de seu cargo e
influência política para beneficiar esses interesses, restando
configurada inequívoca violação aos deveres previstos no artigo
91, I, II e III, da LC nº 25/98. As condutas são descritas no voto
do Corregedor Nacional do Ministério Público, que passa a
fazer parte do presente anexo:
‘(...)
V – MÉRITO. Indícios suficientes de autoria e
materialidade da prática de infração funcional a ensejar a
instauração de procedimento administrativo disciplinar
em face do Membro do Ministério Público do Estado de
Goiás
A reclamação disciplinar e, epígrafe tem como objeto
apurar, sob o aspecto disciplinar, fatos descobertos
durante a ‘Operação Monte Carlo’, desencadeada pela
Polícia Federal em fevereiro de 2008, e que deram origem
ao Inquérito nº 3430/GO, em tramitação perante o Excelso
Supremo Tribunal Federal, sob a relatoria do Ministro
Ricardo Lewandowski.
O inquérito tem como apenso o Processo Cautelar de
Interceptação Telefônica nº 13279-78.2011.4.01.3500, no
qual estão transcritas inúmeras conversas entre o
reclamado e ‘Carlinhos Cachoeira’, a revelar uma estreita
relação de amizade entre os dois.
Segundo o relatório de inteligência da Polícia Federal
foram registradas, no período de 28/02/2011 a 24/08/2011,
298 (duzentos e noventa e oito) chamadas telefônicas entre
o Procurador de Justiça e ‘Carlinhos Cachoeira’, além de
vários encontros.
Da análise minuciosa das interceptações telefônicas,
verifica-se que a amizade entre Demóstenes Torres e
‘Carlinhos Cachoeira’ estava especialmente voltada para a
realização de diversos negócios que envolviam interesses

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MS 32788 / GO

políticos e empresariais de ambos.


Existem, ainda, indícios relevantes de que o
reclamado não só tinha conhecimento das atividades
ilícitas realizadas por ‘Carlinhos Cachoeira’, mas também
auxiliava a mantê-las e protegê-las, fornecendo a ele
informações das quais tinha conhecimento em razão do
exercício do cargo de Senador da República e Membro do
Ministério Público.
Algumas das conversas interceptadas pela Polícia
Federal demonstram a atuação do reclamado com esse
intuito:
(…).
Extrai-se, ainda, da leitura das interceptações
telefônicas anteriormente transcritas que a amizade de
Demóstenes Torres com ‘Carlinhos Cachoeira’,
proporcionou a ele o recebimento de diversas regalias e
presentes.
A título de exemplo, citamos: a) utilização de rádio
Nextel, com conta paga por Carlos Cachoeira; b) utilização
de aeronaves; c) garrafas de vinho; e d) pagamento dos
fogos de artifício utilizados na colação de grau de sua
esposa, dentre outros.
Além disso, há indícios de que o reclamado teria
recebida um milhão de reais da empresa DELTA,
consoante se infere das seguintes conversas telefônicas
interceptadas:
(…)
Outra conclusão que se extrai das interceptações
telefônicas é que a influência de ‘Carlos Cachoeira’ nos
Governos Federal e do Estado de Goiás contava
diretamente com a participação de Demóstenes Torres.
Este, utilizando de sua influência, atuava junto ao Poder
Executivo, ao Poder Judiciário e, inclusive, junto ao
Ministério Público, em benefício dos interesses de
‘Carlinhos Cachoeira’.
Por oportuno, vale destacar alguns trechos de

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conversas telefônicas, que comprovam que o reclamado se


utilizava dos contatos que tinha no Ministério Público par
atender aos pedidos de ‘Carlinhos Cachoeira’:
(…)
Portanto, a partir do acervo probatório dos autos,
conclui-se que há fortes indícios de que o reclamado tinha
conhecimento dos negócios escusos de ‘Carlinhos
Cachoeira’ e que utilizou-se diversas vezes de seu cargo e
influência política para beneficiar esses interesses.’”

Assim, tendo a Segunda Turma reconhecido que as provas em


questão foram produzidas em manifesta usurpação de competência do
Supremo Tribunal Federal, nos termos do art. 102, I, “b”, necessária se
faz a invalidação das interceptações telefônicas relacionadas às operações
em apreço, bem como de todas as provas diretamente delas derivadas,
nos termos do que dispõe o art. 5º, LVI, da Constituição: “são inadmissíveis
no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”.
Sublinhe-se que esse entendimento também é amparado por
expressa disposição legal, porquanto o art. 30 da Lei 9.784/99, que
disciplina o processo administrativo no âmbito da Administração Pública
Federal, veda a admissão, em processo administrativo, de provas obtidas
por meios ilícitos.
Isso porque, no medir os poderes de investigação do Poder Público,
é indispensável a preservação do equilíbrio entre o poder-dever de
apuração de atos ilícitos e os direitos dos indivíduos, igualmente
essenciais à estrutura constitucional do Regime Democrático de Direito.
O âmbito de proteção da garantia quanto à inadmissibilidade da
prova ilícita está em estreita conexão com outros direitos e garantias
fundamentais, como o direito à intimidade e à privacidade (art. 5º, X), o
direito à inviolabilidade do domicílio (art. 5º, XI), o sigilo de
correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das
comunicações telefônicas (art. 5º, XII), o direito de ser processado pela
autoridade competente (art.; 5º, LIII) e o direito ao sigilo profissional (CF,
art. 5º, XIII e XIV, in fine), dentre outros.

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A obtenção de provas sem a observância das garantias previstas na


ordem constitucional ou em contrariedade ao disposto em normas de
procedimento configurará afronta ao princípio do devido processo legal.
Nesse sentido, cito trecho da ementa do julgamento proferido pela
Segunda Turma desta Corte, no julgamento do HC 93.050, Rel. Min. Celso
de Mello, DJe 1º.8.2008:

“ILICITUDE DA PROVA - INADMISSIBILIDADE DE SUA


PRODUÇÃO EM JUÍZO (OU PERANTE QUALQUER
INSTÂNCIA DE PODER) - INIDONEIDADE JURÍDICA DA
PROVA RESULTANTE DE TRANSGRESSÃO ESTATAL AO
REGIME CONSTITUCIONAL DOS DIREITOS E GARANTIAS
INDIVIDUAIS. - A ação persecutória do Estado, qualquer que
seja a instância de poder perante a qual se instaure, para
revestir-se de legitimidade, não pode apoiar-se em elementos
probatórios ilicitamente obtidos, sob pena de ofensa à garantia
constitucional do "due process of law", que tem, no dogma da
inadmissibilidade das provas ilícitas, uma de suas mais
expressivas projeções concretizadoras no plano do nosso
sistema de direito positivo. A "Exclusionary Rule" consagrada
pela jurisprudência da Suprema Corte dos Estados Unidos da
América como limitação ao poder do Estado de produzir prova
em sede processual penal. - A Constituição da República, em
norma revestida de conteúdo vedatório (CF, art. 5º, LVI),
desautoriza, por incompatível com os postulados que regem
uma sociedade fundada em bases democráticas (CF, art. 1º),
qualquer prova cuja obtenção, pelo Poder Público, derive de
transgressão a cláusulas de ordem constitucional, repelindo,
por isso mesmo, quaisquer elementos probatórios que resultem
de violação do direito material (ou, até mesmo, do direito
processual), não prevalecendo, em conseqüência, no
ordenamento normativo brasileiro, em matéria de atividade
probatória, a fórmula autoritária do "male captum, bene
retentum". Doutrina. Precedentes. - A circunstância de a
administração estatal achar-se investida de poderes
excepcionais que lhe permitem exercer a fiscalização em sede

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tributária não a exonera do dever de observar, para efeito do


legítimo desempenho de tais prerrogativas, os limites impostos
pela Constituição e pelas leis da República, sob pena de os
órgãos governamentais incidirem em frontal desrespeito às
garantias constitucionalmente asseguradas aos cidadãos em
geral e aos contribuintes em particular. - Os procedimentos dos
agentes da administração tributária que contrariem os
postulados consagrados pela Constituição da República
revelam-se inaceitáveis e não podem ser corroborados pelo
Supremo Tribunal Federal, sob pena de inadmissível subversão
dos postulados constitucionais que definem, de modo estrito, os
limites - inultrapassáveis - que restringem os poderes do Estado
em suas relações com os contribuintes e com terceiros. A
QUESTÃO DA DOUTRINA DOS FRUTOS DA ÁRVORE
ENVENENADA ("FRUITS OF THE POISONOUS TREE"): A
QUESTÃO DA ILICITUDE POR DERIVAÇÃO. - Ninguém
pode ser investigado, denunciado ou condenado com base,
unicamente, em provas ilícitas, quer se trate de ilicitude
originária, quer se cuide de ilicitude por derivação. Qualquer
novo dado probatório, ainda que produzido, de modo válido,
em momento subseqüente, não pode apoiar-se, não pode ter
fundamento causal nem derivar de prova comprometida pela
mácula da ilicitude originária. - A exclusão da prova
originariamente ilícita - ou daquela afetada pelo vício da
ilicitude por derivação - representa um dos meios mais
expressivos destinados a conferir efetividade à garantia do "due
process of law" e a tornar mais intensa, pelo banimento da
prova ilicitamente obtida, a tutela constitucional que preserva
os direitos e prerrogativas que assistem a qualquer acusado em
sede processual penal. Doutrina. Precedentes. - A doutrina da
ilicitude por derivação (teoria dos "frutos da árvore
envenenada") repudia, por constitucionalmente inadmissíveis,
os meios probatórios, que, não obstante produzidos,
validamente, em momento ulterior, acham-se afetados, no
entanto, pelo vício (gravíssimo) da ilicitude originária, que a
eles se transmite, contaminando-os, por efeito de repercussão

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Voto - MIN. GILMAR MENDES

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MS 32788 / GO

causal. Hipótese em que os novos dados probatórios somente


foram conhecidos, pelo Poder Público, em razão de anterior
transgressão praticada, originariamente, pelos agentes estatais,
que desrespeitaram a garantia constitucional da inviolabilidade
domiciliar. - Revelam-se inadmissíveis, desse modo, em
decorrência da ilicitude por derivação, os elementos probatórios
a que os órgãos estatais somente tiveram acesso em razão da
prova originariamente ilícita, obtida como resultado da
transgressão, por agentes públicos, de direitos e garantias
constitucionais e legais, cuja eficácia condicionante, no plano do
ordenamento positivo brasileiro, traduz significativa limitação
de ordem jurídica ao poder do Estado em face dos cidadãos. -
Se, no entanto, o órgão da persecução penal demonstrar que
obteve, legitimamente, novos elementos de informação a partir
de uma fonte autônoma de prova - que não guarde qualquer
relação de dependência nem decorra da prova originariamente
ilícita, com esta não mantendo vinculação causal -, tais dados
probatórios revelar-se-ão plenamente admissíveis, porque não
contaminados pela mácula da ilicitude originária. - A
QUESTÃO DA FONTE AUTÔNOMA DE PROVA (‘AN
INDEPENDENT SOURCE’) E A SUA DESVINCULAÇÃO
CAUSAL DA PROVA ILICITAMENTE OBTIDA - DOUTRINA -
PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (RHC
90.376/RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.) -
JURISPRUDÊNCIA COMPARADA (A EXPERIÊNCIA DA
SUPREMA CORTE AMERICANA): CASOS ‘SILVERTHORNE
LUMBER CO. V. UNITED STATES (1920); SEGURA V. UNITED
STATES (1984); NIX V. WILLIAMS (1984); MURRAY V.
UNITED STATES (1988)’, v.g..”

Nos termos do entendimento firmado naquele precedente, a


declaração de nulidade das interceptações telefônicas, no caso, só não
geraria nulidade do Processo Administrativo Disciplinar, se acaso as
provas colacionadas aos autos pudessem ser obtidas por fontes
independentes e autônomas.
Ocorre, no entanto, que, conforme exaustivamente demonstrado, o

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Voto - MIN. GILMAR MENDES

Inteiro Teor do Acórdão - Página 51 de 78

MS 32788 / GO

substrato probatório que ampara o processo disciplinar em análise é


exclusivamente subsidiado pelas interceptações telefônicas consideradas
ilegais por este Supremo Tribunal Federal.
Assim, tendo em vista que documento obtido ilicitamente não
produz qualquer efeito no processo administrativo disciplinar e,
inexistindo outros meios de prova destinados a subsidiar as condutas
imputadas ao impetrante, faz-se mister reconhecer a existência de vício
insanável a fundamentar a inevitável nulidade do Processo
Administrativo Disciplinar ora em análise.

3) Conclusão

Ante o exposto, voto pela concessão da segurança pleiteada para o


fim de (i) confirmar a decisão liminar de 1º.7.2014, tornando definitivo o
retorno do impetrante às suas funções; (ii) decretar a nulidade do
Processo Administrativo Disciplinar 0.00.000326/2013-60, tendo em vista
basear-se, exclusivamente, nas interceptações telefônicas declaradas
ilegais pela Segunda Turma desta Corte, nos autos do RHC 135.683.
Com o exame de mérito do presente mandado de segurança, no
âmbito da Segunda Turma, julgo prejudicados os agravos interpostos
pela União.
É como voto.

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Esclarecimento

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28/11/2017 SEGUNDA TURMA

MANDADO DE SEGURANÇA 32.788 G OIÁS

ESCLARECIMENTO

O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI:


Ministro Gilmar, inclusive, foi a origem de tudo, tanto lá no Senado
quanto no Conselho e no Ministério Público, a matéria que saiu em
determinada revista, que vazou essas gravações. E gravações que foram
determinadas por autoridade incompetente, cuja nulidade já foi
declarada por esta Segunda Turma por unanimidade. Tudo se origina lá.
O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN (PRESIDENTE) - Se o
eminente Ministro-Relator me permitir, a Portaria de instauração refere-se
a essas provas, cuja nulidade aqui...
O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (RELATOR) - Assim
como toda a instrução estava fazendo nesse sentido.
O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN (PRESIDENTE) -
Porque, de qualquer sorte, a independência das esferas quiçá não nos
permitiria afirmar que, como se tratava de membro Ministério Público, o
Conselho não poderia apurar uma eventual infração ética, eis que Vossa
Excelência está afastando o bis in idem, mas as provas...
O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (RELATOR) - Afastei o
bis in idem em relação ao exame que o próprio Senado fez, tendo em vista
os critérios políticos que temos ressaltado.
Aqui, todas as provas ligadas ao processo disciplinar estão
lastreadas no processo criminal, cuja subsistência negamos aqui em
habeas corpus unânime.

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Voto - MIN. DIAS TOFFOLI

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MANDADO DE SEGURANÇA 32.788 G OIÁS

VOTO

O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI:


Senhor Presidente, o eminente Relator, quanto às questões
preliminares, adotou, como sói, a jurisprudência da Corte em relação à
independência entre os foros de análise de investigações disciplinares,
que são independentes.
E, quanto ao mérito, Senhor Presidente, eu fico muito tranquilo,
porque eu fui o Relator do habeas corpus e tive posicionamento
acompanhado por unanimidade pela Turma. Verifiquei, naquele habeas
corpus, realmente a chapada nulidade das provas que foram colhidas,
porque determinadas por autoridade que não tinha competência para
investigar o aqui impetrante; foi uma investigação feita direcionada ao
impetrante, porque não tinha competência de foro para fazê-la; e por
longo tempo. Não é um daqueles casos de “achados”, Senhor Presidente,
que ocorrem; houve interceptação telefônica constante por vários e vários
meses. Essas interceptações vazaram para a imprensa. A partir de uma
publicação na imprensa, começaram-se os procedimentos no Senado
Federal e aqui junto ao próprio Conselho do Ministério Público. E a
origem de tudo são interceptações telefônicas já declaradas nulas por esta
Segunda Turma, embora ainda sem a presença de Vossa Excelência, em
outubro do ano passado - penso que foi outubro do ano passado -,
outubro de 2016.
Portanto, Senhor Presidente, quanto ao mérito, não há, não vejo
outra decisão a ser tomada senão também aqui assentar a nulidade dessas
provas. E, uma vez essas provas tendo sido aquelas que motivaram a
abertura do procedimento administrativo, não há como dar outra decisão.
Então, eu acompanho o eminente Relator.

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Esclarecimento

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28/11/2017 SEGUNDA TURMA

MANDADO DE SEGURANÇA 32.788 G OIÁS

ESCLARECIMENTO

O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN (PRESIDENTE) - No


que diz respeito à questão da decadência que foi suscitada, fiz a
indagação ao eminente Relator porque a Portaria de instauração, pela
anotação que tenho - e Vossa Excelência também sublinhou isso no voto -,
é de 12 de abril de 2013, e a impetração se deu em 13 de fevereiro de 2014.
É evidente que houve uma última decisão em 18 de dezembro. Portanto,
aqui há um debate sobre o marco a partir do qual esse lapso temporal da
impetração seria eventualmente aferido, ou seja, do termo inicial para a
contagem desse prazo decadencial dos 120 dias, do artigo 23 da lei
respectiva. Se se contar a Portaria de instauração a partir de abril de 2013,
parece-me que o lapso temporal teria se exaurido; nada obstante, se se
contar da decisão de 18 de dezembro, a conclusão poderia,
eventualmente, ser diversa.
Eu vou pedir, embora já tenha se formado a maioria, vênia a Vossa
Excelência para examinar esse aspecto especificamente.
O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (RELATOR) - O que
ressaltei, como Vossa Excelência viu – até passei sobre essa questão – é
que o impetrante esclarece que, desde 24.10.2012 até a impetração do
mandado de segurança, encontrava-se suspenso em razão de sucessivas
prorrogações da determinação de afastamento. Essa é a questão e é uma
das discussões, porque foram sucessivos afastamentos de 60 dias, tendo
alcançado, à época, mais de 450 dias de suspensão, em que pese às
reiteradas impugnações, no âmbito administrativo, das decisões tomadas
nesse sentido.
Estou dizendo que a análise objetiva dos fatos narrados nestes autos
levou ao meu reconhecimento, em sede de decisão liminar, de que
haveria plausibilidade nas alegações do impetrante quanto à verificação
da abusividade nas sucessivas prorrogações da decisão do afastamento,
quase um ano e meio.

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Esclarecimento

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MS 32788 / GO

Nesse contexto, não há como negar, portanto, à parte impetrante o


direito subjetivo ao reconhecimento da alegada violação. Aqui é uma
sucessiva renovação da situação, e, por isso, entendi que se deveria
afastar a alegação de incidência do prazo decadencial.

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Vista

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28/11/2017 SEGUNDA TURMA

MANDADO DE SEGURANÇA 32.788 G OIÁS

RELATOR : MIN. GILMAR MENDES


IMPTE.(S) : DEMÓSTENES LÁZARO XAVIER TORRES
ADV.(A/S) : PEDRO PAULO GUERRA DE MEDEIROS E
OUTRO(A/S)
IMPDO.(A/S) : PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DO
MINISTÉRIO PÚBLICO
PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO -GERAL DA UNIÃO
LIT.PAS.(A/S) : UNIÃO
PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO -GERAL DA UNIÃO
AM. CURIAE. : MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE GOIAS
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE
GOIÁS

VISTA

O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN (PRESIDENTE) -


Como disse, peço compreensão de Vossa Excelência, vou pedir vista para
melhor examinar, mas, desde de logo, com aquiescência de Vossa
Excelência, já comunico ao Advogado e peço à Senhora Secretária que já
paute para a próxima Sessão para que não tenhamos delonga no exame
da importante matéria. Vou examinar este ponto, que a dúvida ainda em
mim remanesceu em parte.

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Supremo Tribunal Federal
Observação

Inteiro Teor do Acórdão - Página 57 de 78

28/11/2017 SEGUNDA TURMA

MANDADO DE SEGURANÇA 32.788 G OIÁS

OBSERVAÇÃO

O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI:


Senhor Presidente, só uma reflexão quanto a essa questão da
decadência, porque aqui o que eu verifiquei no relatório e no voto do
eminente Relator foi que os atos inicias do Conselho eram atos com data
certa, 60 dias de afastamento, que nem sequer completavam os 120 para
se apresentar impetração. E eles eram renovados.
O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (RELATOR) - Por 450
dias.
O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI:
Eles eram renovados.
E, por outro lado, houve recurso interno. Então, nós ficamos, e o
cidadão fica na disjuntiva, o mandado de segurança não cabe se existe um
recurso administrativo interno. E, aí, a ideia de se ter que apresentar o
mandado de segurança contra um ato que está sob a competência
administrativa, para a sua análise de mérito, é impor judicialização.
É só uma reflexão, porque ele recorreu no âmbito do setor
administrativo e internamente, como foi dito da tribuna.
O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN (PRESIDENTE) -
Houve uma interposição de recurso ou um pedido de reconsideração?
O SENHOR PEDRO GUERRA DE MEDEIROS (ADVOGADO) -
Houve a interposição de recurso de agravo interno, que ele também
oportuniza ao prolator da decisão da qual se agrava o juízo de retratação.
Então, ele pode, querendo, retratar-se ou não; não reconsiderando,
submete à decisão do Colegiado. E foi contra essa decisão colegiada que
reputou todas as teses da defesa, que foram reiteradas no mandado de
segurança, que se contaram os 120 dias, aliás, que não foram sequer
atingidos. É isso.

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Supremo Tribunal Federal
Extrato de Ata - 28/11/2017

Inteiro Teor do Acórdão - Página 58 de 78

SEGUNDA TURMA
EXTRATO DE ATA

MANDADO DE SEGURANÇA 32.788


PROCED. : GOIÁS
RELATOR : MIN. GILMAR MENDES
IMPTE.(S) : DEMÓSTENES LÁZARO XAVIER TORRES
ADV.(A/S) : PEDRO PAULO GUERRA DE MEDEIROS (18111/GO) E OUTRO(A/S)
IMPDO.(A/S) : PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO
PÚBLICO
PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO
LIT.PAS.(A/S) : UNIÃO
PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO
AM. CURIAE. : MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE GOIAS
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS

Decisão: Após o voto do Relator, que concedia a ordem,


confirmando a liminar deferida, no que foi acompanhado pelo
Ministro Dias Toffoli, pediu vista o Ministro Edson Fachin.
Presente à Sessão em favor do impetrante, o Dr. Pedro Paulo Guerra
de Medeiros. Ausentes, justificadamente, os Ministros Celso de
Mello e Ricardo Lewandowski. Presidência do Ministro Edson Fachin.
2ª Turma, 28.11.2017.

Presidência do Senhor Ministro Edson Fachin. Presentes à


sessão os Senhores Ministros Gilmar Mendes e Dias Toffoli.
Ausentes, justificadamente, os Senhores Ministros Celso de Mello e
Ricardo Lewandowski.

Vice-Procurador-Geral da República, Dr. Luciano Mariz Maia.

Ravena Siqueira
Secretária

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documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o número 14187186
Supremo Tribunal Federal
Voto Vista

Inteiro Teor do Acórdão - Página 59 de 78

05/12/2017 SEGUNDA TURMA

MANDADO DE SEGURANÇA 32.788 G OIÁS

O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN: Acolho o bem lançado


relatório proferido pelo e. Ministro Gilmar Mendes. Como consignou Sua
Excelência, trata-se de mandado de segurança, com pedido de liminar,
impetrado em 13.02.2014, por Demóstenes Lázaro Xavier Torres,
Procurador de Justiça do Ministério Público do Estado de Goiás (MPGO),
em face de ato do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP),
proferido nos autos n.º 0.00.000326/2013-60, que determinou, em seu
desfavor, a instauração de processo disciplinar, bem como afastamento
cautelar do cargo.
A Procuradoria-Geral da República (eDOC 58) manifestou-se pela
denegação da segurança, em parecer assim ementado:

“MANDADO DE SEGURANÇA. PRETENSÃO DE


DESCONSTITUIR DECISÃO PROLATADA PELO CONSELHO
NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLCO QUE DETERMINOU
A INSTAURAÇÃO DE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO
DISCIPLINAR E DE ANULAR O FEITO. DECADÊNCIA E
AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO.
1. Instauração de processo disciplinar perante o Conselho
Nacional do Ministério Público. Decadência configurada. O
prazo para o ajuizamento de mandado de segurança é contado
a partir da ciência do ato que se aponta como coator.
2. Ausência de direito líquido e certo e de ilegalidade na
instauração e na condução do feito disciplinar. Garantia da
ampla defesa e do contraditório.
3. Parecer pela denegação da segurança.”

Em 03.10.2014 (eDOC 66), o Relator deferiu o pedido de medida


liminar para suspender o processo administrativo n.º 0.00.000326/2013-60,
em trâmite no CNMP, até decisão final neste mandado de segurança.
Sobreveio agravo interposto pela União (eDOC 74). Argumentou-se
pela decadência da impetração e sustentou-se a ausência de fumus boni
iuris para concessão das cautelares, diante da ausência de ilegalidade das

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Voto Vista

Inteiro Teor do Acórdão - Página 60 de 78

MS 32788 / GO

decisões do CNMP.
Em 12.09.2016, o e. Relator deferiu novo pedido do Impetrante, de
modo a suspender o andamento do Procedimento de Avocação n.º
1.00021/2015-28, em trâmite no CNMP (eDOC 90), “considerando a
possibilidade de eventual decisão prejudicial a ser tomada no âmbito do processo
disciplinar de que trata o Procedimento de Avocação nº 1.00021/2015-28,
necessário se faz o trâmite em conjunto de ambos os procedimentos, evitando-se,
dessa forma, não apenas decisões contraditórias, em tese, no âmbito do CNMP,
como, também, eventual perda de objeto do mandamus em trâmite neste STF”.
A União interpôs novo agravo (eDOC 98), em 11.11.2016. Reiterou os
argumentos pela decadência e pela legalidade dos atos do CNMP.
O Impetrante apresentou suas contrarrazões (eDOC 103).
Era o que havia a rememorar.

Preliminarmente, é preciso fixar o termo inicial da contagem do


prazo decadencial de 120 (cento e vinte) dias, previsto no art. 23, da Lei
12.016/2009, para impetração do presente mandado de segurança.
O Impetrante aponta como ato coator (eDOC 103, p. 6) decisão do
Conselheiro Relator do processo administrativo n.º 0.00.000326/2013-60,
de 18.12.2013, que prorrogou seu afastamento do cargo (eDOC 8, p. 1004-
1007).
A impetração, contudo, volta-se contra a própria instauração do
processo administrativo disciplinar, o qual foi inaugurado pela Portaria
CNMP-CONS/GAB/CC Nº 1, de 12 de abril de 2013, publicada no Diário
Oficial da União em 18.04.2013 (Seção 2, página 57, ISSN 1677-7050). É,
portanto, da ciência de tal ato que se deve iniciar a contagem do prazo
decadencial para impetração do presente mandado de segurança, o que
impõe o não conhecimento da presente impetração.
A alegação de que o recurso interno interposto na esfera
administrativa, em 12.08.2013 (eDOC 6, p. 269), deveria interromper o
prazo não deve subsistir, pois, na hipótese, não houve efeito suspensivo.
O Impetrante estava afastado do cargo desde 24.10.2012 e assim
permaneceu até liminar proferida no presente mandado de segurança,

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Inteiro Teor do Acórdão - Página 61 de 78

MS 32788 / GO

pelo e. Relator, em 1º.7.2014 (eDOC 57). Nesse sentido, colhe-se da


doutrina de Hely Lopes Meirelles que:

“Quando a lei diz que o direito de requerer mandado de


segurança extinguir-se-á cento e vinte dias após a ciência do ato
impugnado (art. 23 da Lei n. 12.016/2009), está pressupondo o ato
completo, operante e exequível. Não é, pois, o conhecimento
oficioso do ato que deve marcar o início do prazo para a
impetração, mas sim o momento em que se tornou apto a
produzir seus efeitos lesivos ao impetrante. Se o ato é
irrecorrível ou apenas passível de recurso sem efeito
suspensivo, contar-se-á o prazo da publicação ou da intimação
pessoal do interessado; se admite recurso com efeito
suspensivo, contar-se-á do término do prazo para o recurso (se
não for interposto) ou da intimação do julgamento final do
recurso (se interposto regularmente). Observamos, porém,
que o pedido de reconsideração, na via administrativa, não
interrompe o prazo para a impetração da segurança, salvo se a
lei lhe der efeito suspensivo”. (MEIRELLES, Hely Lopes.
Mandado de Segurança. 33ª ed. atualizada por Arnoldo Wald e
Gilmar Ferreira Mendes. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 62).
Grifos nossos.

Com efeito, a fluência do prazo de decadência não é sempre obstada


pela interposição de recurso administrativo. Apenas aqueles recursos com
efeito suspensivo são aptos a retirar do ato impugnado seu potencial
lesivo ao interessado e, portanto, impedem a impetração, em
interpretação a contrario sensu do art. 5º, I, da Lei 12.016/2009. Na hipótese
inversa, ou seja, se o ato é exequível, cabe ao interessado respeitar o prazo
de 120 (cento e vinte dias) previsto no art. 23, da Lei 12.016/2009,
inadmitida a inércia. Neste sentido, confira-se:

“DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO.


AGRAVO REGIMENTAL EM MANDADO DE SEGURANÇA.
ATO DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. RECURSO

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MS 32788 / GO

ADMINISTRATIVO SEM EFEITO SUSPENSIVO.


DECADÊNCIA. DELEGAÇÃO DE COMPETÊNCIA
DECISÓRIA À CORREGEDORIA NACIONAL DE JUSTIÇA. 1.
A interposição de recurso administrativo sem efeito
suspensivo não prejudica a fluência do prazo decadencial
para a impetração de mandado de segurança. Publicado o ato
impugnado em 13 de julho de 2010, operou-se a decadência em
novembro do mesmo ano, sendo inadmissível o writ impetrado
em 6 de dezembro de 2010. 2. Questionada a correção
processual do ato que não conheceu do recurso administrativo
– publicado em data posterior –, é possível conhecer do
mandado de segurança nesta parte. 3. Salvo expressa previsão
constitucional, legal ou regulamentar, não há direito subjetivo à
apreciação colegiada de processos administrativos. Na ausência
de disposição em contrário, é válida decisão do CNJ que delega
competência decisória à Corregedoria Nacional de Justiça. 4.
Agravo regimental provido parcialmente para conhecer-se, em
parte, do mandado de segurança e, nesta, denegar a ordem”.
(MS 30137 AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, Primeira Turma,
julgado em 21.08.2017).

Aplica-se, ademais, na hipótese, o enunciado de número 430 da


súmula da jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal:

“Súmula 430: Pedido de reconsideração na via administrativa


não interrompe o prazo para o mandado de segurança.”
Se assim não se entendesse, seria possível, diante de cada nova
provocação da Administração Pública, reiniciar a contagem do prazo
decadencial para o ajuizamento do mandado de segurança. Nesse
sentido, os seguintes julgados:

“AGRAVO INTERNO EM MANDADO DE SEGURANÇA.


ATO DA CORREGEDORIA NACIONAL DE JUSTIÇA.
DECLARAÇÃO DE VACÂNCIA DE SERVENTIA. ANÁLISE
DA SEQUÊNCIA DE EVENTOS NO PROCESSO
ADMINISTRATIVO IMPÕE O RECONHECIMENTO DA

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MS 32788 / GO

DECADÊNCIA. DECURSO DE MAIS DE 120 DIAS PARA O


AJUIZAMENTO DO WRIT. AGRAVO INTERNO
DESPROVIDO. 1. Os demandantes não podem ressuscitar,
diante de uma nova provocação da Administração Pública, a
todo e qualquer instante, o início do prazo decadencial para o
ajuizamento do mandado de segurança. Precedentes: MS
23.528, Min. Rel. Ellen Gracie, Tribunal Pleno, DJe 22/08/2011;
RMS 21.491, Min. Rel. Carlos Velloso, Segunda Turma, DJ
19/02/1993. 2. A decisão do Conselho Nacional de Justiça
apontada como ato coator tem por fito reafirmar entendimento
anterior do órgão, em respeito à coisa julgada administrativa,
de sorte que descabe a alegação de renovação do prazo
decadencial para impetração de mandado de segurança. 3. In
casu, a decisão do Corregedor Nacional de Justiça, exarada em
08.05.2013, que consolidou o pronunciamento administrativo a
respeito da controvérsia, é que poderia constituiria o ato coator
impugnável, de modo que a impetração do presente mandamus
em 18/06/2015 é, inevitavelmente, alcançada pela decadência.
Precedentes: MS 27.098 AgR, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira
Turma, DJe 10/12/2015; MS 21.356, Min. Rel. Paulo Brossard,
Tribunal Pleno, DJ 18/10/1991. 4. A manifestação de
corregedoria local, em sentido divergente a entendimento
fixado pelo Conselho Nacional de Justiça não tem, por si só, o
efeito automático de desconstituir decisão do órgão de controle
da atividade administrativa, financeira e disciplinar da
Magistratura. 5. Agravo interno a que se nega provimento.”
(MS 33668 AgR, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, julgado
em 19/06/2017). Grifos nossos.

“AGRAVO REGIMENTAL EM MANDADO DE


SEGURANÇA. ATO DO CONSELHO NACIONAL DE
JUSTIÇA. CARTÓRIOS. CONCURSO DE REMOÇÃO.
PROVAS E TÍTULOS. DECADÊNCIA. DECURSO DE MAIS DE
120 DIAS PARA O AJUIZAMENTO DO WRIT. AGRAVO
REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Os
demandantes não podem ressuscitar, diante de uma nova

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Inteiro Teor do Acórdão - Página 64 de 78

MS 32788 / GO

provocação da Administração Pública a todo e qualquer


instante, o início do prazo decadencial para o ajuizamento do
mandado de segurança. Precedentes: RMS 21.491, Min. Rel.
Carlos Velloso, Segunda Turma, DJ 19/2/1993, MS 23.528, Min.
Rel. Ellen Gracie, Tribunal Pleno, DJe 22/8/2011, MS 21.356, Min.
Rel. Paulo Brossard, DJ 18/10/1991. 2. In casu, o acórdão do CNJ
a ser considerado como coator deve ser aquele que julgou
improcedente o PCA 456, e não o ato que não conheceu do
Pedido de Esclarecimento. 3. A notificação da decisão
verdadeiramente coatora ocorreu em 27/6/2007 (fls. 360), e o
presente mandado de segurança foi impetrado em 11/1/2008,
configurando-se, portanto, a intempestividade do presente writ.
4. Agravo regimental a que se nega provimento”. (MS 27.098
AgR,Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em
24/11/2015, DJe 10-12-2015). Grifos nossos.

“IMPETRAÇÃO. PRAZO. TERMO INICIAL.


DECADÊNCIA. PRECEDENTES. 1. O termo inicial do prazo
decadencial de 120 dias começa a fluir, para efeito de
impetração do mandado de segurança, a partir da data em que
o ato do Poder Público, formalmente divulgado no Diário
Oficial, revela-se apto a gerar efeitos lesivos à esfera jurídica do
interessado . 2. Precedentes. 3. Agravo regimental improvido.”
(MS 23.528 AgR, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Tribunal
Pleno, julgado em 04/08/2011, DJe 22-08-2011).

“CONSTITUCIONAL. MANDADO DE SEGURANÇA.


DECADÊNCIA DO DIREITO A IMPETRAÇÃO. Lei 1.533/51,
art. 18. I. - Decadência do direito a impetração: quando o
impetrante ingressou, administrativamente, contra o ato de
demissão praticado pelo Ministro de Estado, já se esgotara o
prazo de 120 dias. Ademais, proferida a decisão na via
administrativa, o impetrante pediu o reexame do pleito, vale
dizer, pediu reconsideração. Acontece que o pedido de
reconsideração, na via administrativa, não interrompe o prazo
para o mandado de segurança. Súmula 430-STF. II. - Recurso

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Inteiro Teor do Acórdão - Página 65 de 78

MS 32788 / GO

ordinário improvido.” (RMS 21.491, Relator(a): Min. CARLOS


VELLOSO, Segunda Turma, julgado em 02/02/1993, DJ 19-02-
1993). Grifos nossos.

Conforme se vê dos autos, o Impetrante foi notificado do ato que


deveria ter sido apontado como coator em 18.04.2013, por meio de
publicação da portaria inaugural do processo disciplinar no Diário Oficial
da União (Seção 2, página 57, ISSN 1677-7050). Todavia, o presente
mandado de segurança foi impetrado, apenas, em 13.02.2014, de tal sorte
que se revela decorrido o prazo de 120 (cento e vinte) dias para
impetração do writ, configurando-se, portanto, sua absoluta
intempestividade, nos termos do art. 23, da Lei 12.016/2009.
Vencido, contudo, em relação à prejudicial, acompanho, quanto ao
mérito, as conclusões do e. Relator, eis que o substrato probatório que
ensejou, no CNMP, o processo disciplinar em comento, é exclusivamente
amparado pelas interceptações telefônicas decretadas nulas por esta
colenda 2ª Turma no julgamento do RHC 135.683, Rel. Min. Dias Toffoli,
em 25.10.2016.
É como voto.

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Esclarecimento

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05/12/2017 SEGUNDA TURMA

MANDADO DE SEGURANÇA 32.788 G OIÁS

ESCLARECIMENTO

O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (RELATOR) -


Presidente, gostaria de fazer um esclarecimento.
Estamos diante de um caso singular. Paulo e eu temos a ideia de
escrever um livro sobre mandado de segurança. Esse tema já se coloca
inevitavelmente na agenda. Ainda hoje, conversava com meu amigo e
colega de escritura, Arnold Wald, sobre essa questão para ver se, de fato,
temos precedentes próximos – procurei o Ministro Celso para que
pudesse nos ajudar –, mas não me deparei com nada equivalente.
Em um caso que trouxe à Turma, não faz muito tempo, colocou-se
uma questão parecida, mas não idêntica, em relação a uma aposentada
que obteve a liminar. Depois, verificou-se que, por um ou dois dias, o
prazo teria decorrido, e, aí, aplicamos o princípio da proporcionalidade,
uma vez que era notório que o direito substantivo se lhe reconhecia,
segundo a própria jurisprudência do Supremo.
Temos, aqui, uma situação em que a impetração ataca tanto a
abertura do PAD como os atos sucessivos de afastamento. Então, essa foi
a perplexidade que surgiu e que diz com a situação, talvez, de um tipo de
ato continuado ou de permanência, para usarmos conceitos muito
correntes na esfera punitiva.
Vejam: é certo que a instalação do PAD deu-se em 12.4.2013, como
Vossa Excelência acaba de destacar. Entretanto, no curso do referido
processo administrativo, ocorreram sucessivas prorrogações da decisão
do CNMP, que afastou o impetrante de suas funções – sempre sessenta
dias. Registre-se que a última prorrogação do afastamento cautelar
ocorreu em 18.12.2013, contra a qual não caberia mais recurso
administrativo. Dessa forma, tendo em vista que a impetração data de
13.2.2014, há de concluir-se que está dentro do prazo decadencial de
cento e vinte dias previsto pelo art. 23 da Lei 12.016/2009.
Essa é uma questão, para mim, que está imbricada e é de difícil

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Esclarecimento

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MS 32788 / GO

separação, uma vez que – como o Ministro Toffoli já havia destacado no


debate passado – ainda cabiam recursos internos. Depois, nessa
sequência, houve essa situação de consolidação e, daí, a impetração.
Ademais, é preciso levar em consideração a eficiência processual e a
primazia da decisão de mérito, normas fundamentais já inclusive
incorporadas à estrutura do novo Código de Processo Civil. Nesse
sentido, citem-se os arts. 4º e 8º no novo CPC:

“Art. 4. As partes têm o direito de obter em prazo razoável


a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa.

(…)

Art. 8. Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá


aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e
promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a
proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade
e a eficiência”.

“Isso porque, no presente caso, há razões peculiares que


justificam avançar à análise do pedido autoral, notadamente
porque a abertura do Processo Administrativo em questão
baseou-se, exclusivamente, nas interceptações telefônicas
declaradas ilegais por esta Segunda Turma, nos autos do RHC
135.683”.

Vossa Excelência, Ministro Celso, participou desse julgamento, no


qual ficou caracterizada a interceptação telefônica ilegal feita por
autoridade que não poderia acompanhar autoridade com prerrogativa de
foro – o caso é de relatoria do Ministro Dias Toffoli.

"De mais a mais, esta Corte possui farta jurisprudência


quanto à superação de óbices processuais, quando necessário,
para avançar ao exame do mérito dos processos.
Ao julgar a ADPF 132, Rel. Min. Ayres Britto, relativa à

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união homoafetiva, o Plenário deste Tribunal decidiu convertê-


la em ação direta e inconstitucionalidade e julgá-la em conjunto
com a ADI 4.277, com a finalidade de conferir interpretação
conforme à Constituição ao art. 1.723 do Código Civil.
Registre-se, também, o julgamento do Agravo de
Instrumento 375.011, Rel. Min. Ellen Gracie, no qual a 1ª Turma
desta Corte superou a ausência de prequestionamento da
matéria veiculada em recurso extraordinário para aplicar a
orientação sedimentada neste Tribunal quanto à questão de
fundo. Eis a ementa do julgado:

‘AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE


INSTRUMENTO. SERVIDORES DO MUNICÍPIO DE
PORTO ALEGRE. REAJUSTE DE VENCIMENTOS
CONCEDIDO PELA LEI MUNICIPAL 7.428/94, ART. 7º,
CUJA INCONSTITUCIONALIDADE FOI DECLARADA
PELO PLENO DO STF NO RE 251.238. APLICAÇÃO
DESTE PRECEDENTE AOS CASOS ANÁLAGOS
SUBMETIDOS À TURMA OU AO PLENÁRIO (ART. 101
DO RISTF). 1. Decisão agravada que apontou a ausência
de prequestionamento da matéria constitucional suscitada
no recurso extraordinário, porquanto a Corte a quo tão-
somente aplicou a orientação firmada pelo seu Órgão
Especial na ação direta de inconstitucionalidade em que se
impugnava o art. 7º da Lei 7.428/94 do Município de Porto
Alegre - cujo acórdão não consta do traslado do presente
agravo de instrumento -, sem fazer referência aos
fundamentos utilizados para chegar à declaração de
constitucionalidade da referida norma municipal. 2. Tal
circunstância não constitui óbice ao conhecimento e
provimento do recurso extraordinário, pois, para tanto,
basta a simples declaração de constitucionalidade pelo
Tribunal a quo da norma municipal em discussão, mesmo
que desacompanhada do aresto que julgou o leading case.
3. O RE 251.238 foi provido para se julgar procedente ação
direta de inconstitucionalidade da competência originária

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do Tribunal de Justiça estadual, processo que, como se


sabe, tem caráter objetivo, abstrato e efeitos erga omnes.
Esta decisão, por força do art. 101 do RISTF, deve ser
imediatamente aplicada aos casos análogos submetidos à
Turma ou ao Plenário. Nesse sentido, o RE 323.526, 1ª
Turma, rel. Min. Sepúlveda Pertence. 4. Agravo regimental
provido’. (AI 375011 AgR, Relator(a): min. ELLEN
GRACIE, Segunda Turma, julgado em 05/10/2004, DJ 28-
10-2004 PP-00043 EMENT VOL-02170-02 PP-00362).

Além disso, no Recurso Extraordinário 298.694, Rel. Min.


Sepúlveda Pertence, o Plenário desta Casa assentou a
possibilidade excepcional de conhecimento de apelo extremo
por fundamento constitucional diverso daquele em que se
alicerçou o acórdão recorrido." - fundando aquela base que hoje
nós temos já incorporada à doutrina do Tribunal, a propósito da
causa petendi aberta.

Também essa ideia da dispensa de requisitos outros foi incorporada


à legislação hoje. Havia um projeto da autoria do Ministro Peluso,
apresentado ao Deputado Flávio Dino, que trouxe esse tema a debate.
Hoje, acho que salva a exceção das questões relativas à tempestividade do
recurso, as questões ligadas as outras formalidades podem ser
dispensadas.
Aqui, o que me interessa é chamar atenção para um debate que, de
quando em vez, temos travado sobre a própria ideia – aqui há um dos
seus arautos – talvez o maior – o professor e querido amigo Peter
Häberle, na ideia do que ele chama de Möglichkeitsdenken, na ideia de um
pensamento de possibilidades. Temos vários exemplos de casos em que a
situação fática específica leva a um pensamento do possível.
Um dos casos em que aplicamos isso é – não sei se o Ministro Celso
se recorda – um caso que procuradores do trabalho, com menos de dez
anos, à falta de procuradores com mais de 10 anos, foram indicados para
TRT's. Depois, veio uma ADI da AMB, impugnando essa situação e
colocou-se a situação da nulidade da indicação, com reflexo ex tunc sobre

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investiduras de pessoas que já estavam até, aquela altura, na presidência


do Tribunal ou já tinham até passado pela presidência do Tribunal. O
Tribunal declarou a inconstitucionalidade. Mas, à época, cabiam, então,
embargos infringentes, porquanto houve mais de quatro votos naquele
sentido – assim como embargos infringentes na questão criminal. Então –
esse foi um caso de minha relatoria nos embargos infringentes –, foi
revertida a decisão, considerando o Tribunal que, naquelas
circunstâncias, não havia outra alternativa, porque, certamente, ou se
indicaria uma lista única, de um nome, ou não se indicaria ninguém, e o
Tribunal acabaria composto sem membros do Ministério Público, o que
acarretaria descaracterização do sistema constitucional.
Então, dentro das medidas que o Tribunal considerou, melhor que a
representação do Ministério Público se faça nesse caráter plural de ter
advogados e membros do Ministério Público, ainda que esse membro do
Ministério Público não tenha os dez anos prescritos. Foi essa a solução
dentro dessa ideia de pensamento de possibilidades. Isso era adotado
também por Zagrebelsky, chamando atenção para esse aspecto.
O professor Peter Häberle tem um texto fantástico sobre isso que diz:

“O pensamento do possível é o pensamento em


alternativas. Deve estar aberto para terceiras ou quartas
possibilidades, assim como para compromissos. Pensamento do
possível é pensamento indagativo (fragendes Denken). Na res
publica existe um ethos jurídico específico do pensamento em
alternativa, que contempla a realidade e a necessidade," -
porque também ele fala num pensamento de necessidade -
"sem se deixar dominar por elas. O pensamento do possível ou
o pensamento pluralista de alternativas abre suas perspectivas
para ‘novas’ realidades, para o fato de que a realidade de hoje
pode corrigir a de ontem, especialmente a adaptação às
necessidades do tempo de uma visão normativa, sem que se
considere o novo como o melhor”.

Nessa linha, observa Häberle:

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“Para o estado de liberdade da res publica afigura-se


decisivo que a liberdade de alternativa seja reconhecida por
aqueles que defendem determinadas alternativas”. Daí ensinar
que “não existem apenas alternativas em relação à realidade,
existem também alternativas em relação a essas alternativas.
O pensamento do possível tem uma dupla relação com a
realidade”. Uma é de caráter negativo: “o pensamento do
possível indaga sobre o também possível, sobre alternativas em
relação à realidade, sobre aquilo que ainda não é real. O
pensamento do possível depende também da realidade em
outro sentido: possível é apenas aquilo que pode ser real no
futuro (Möglich ist nur was in Zukunft wirklich sein kann). É a
perspectiva da realidade (futura) que permite separar o
impossível do possível."

Então, eu desenvolvia esse pensamento para depois chegar a um


texto que é bastante elucidativo do célebre jurista belga Chaïm Perelman,
na "Lógica Jurídica", em que ele examina outro aspecto da questão, que é
a lacuna do sistema jurídico ou da própria Constituição, em que ele diz:

“Durante a guerra de 1914-1918, como a Bélgica estava


quase toda ocupada pelas tropas alemãs, com o Rei e o governo
belga no Havre, o Rei exercia sozinho o poder legislativo, sob
forma de decretos-leis.
A impossibilidade de reunir as Câmaras, em consequência
da guerra, impedia incontestavelmente que se respeitasse o
artigo 26 da Constituição (‘O poder legislativo é exercido
coletivamente pelo Rei, pela câmara dos Representantes e pelo
Senado’). Mas nenhum dispositivo constitucional permitia sua
derrogação, nem mesmo em circunstâncias tão excepcionais. O
artigo 25 enuncia o princípio de que os poderes ‘são exercidos
da maneira estabelecida pela Constituição’, e o artigo 130 diz
expressamente que ‘a Constituição não pode ser suspensa nem
no todo nem em parte’ . (A. Vanwelkenhuyzen, De quelques lacunes
du droit constitutionnel belge, em Le problème des lacunes en droit, p.
347).

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Foi com fundamento nestes dois artigos da Constituição


que se atacou a legalidade dos decretos-leis promulgados
durante a guerra, porque era contrária ao artigo 26 que precisa
como se exerce o poder legislativo" (…) (Perelman, Chaïm.
Lógica Jurídica, trad. Vergínia K. Pupi. Ed. Martins Fontes, São
Paulo, 2000, p.105).

Perelman responde à indagação sobre a legitimidade da decisão da


Corte, com base nos argumentos do Procurador-Geral Terlinden. É o que
se lê na seguinte passagem do seu trabalho:

“Como pôde a Corte chegar a uma decisão


manifestamente contrária ao texto constitucional? Para
compreendê-lo, retomemos as conclusões expostas antes do
aresto pelo procurador-geral Terlinden, em razão de seu caráter
geral e fundamental.
Uma lei sempre é feita apenas para um período ou um
regime determinado. Adapta-se às circunstâncias que a
motivaram e não pode ir além. Ela só se concebe em função de
sua necessidade ou de sua utilidade; assim, uma boa lei não
deve ser intangível, pois vale apenas para o tempo que quis
reger.
A teoria pode ocupar-se com abstrações. A lei, obra
essencialmente prática, aplica-se apenas a situações
essencialmente concretas. Explica-se assim que, embora a
jurisprudência possa estender a aplicação de um texto, há
limites a esta extensão, que são atingidos toda vez que a
situação prevista pelo autor da lei venha a ser substituída por
outras fora de suas previsões.
Uma lei – constituição ou lei ordinária – nunca estatui
senão para períodos normais, para aqueles que ela pode prever.
Obra do homem, ela está sujeita, como todas as coisas
humanas, à força dos acontecimentos, à força maior, à
necessidade.
Ora, há fatos que a sabedoria humana não pode prever,
situações que não pôde levar em consideração e nas quais,

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tornando-se inaplicável a norma, é necessário, de um modo ou


de outro, afastando-se o menos possível das prescrições legais,
fazer frente às brutais necessidades do momento e opor meios
provisórios à força invencível dos acontecimentos".

E daí, Presidente, concluía Perelman:

“Se devêssemos interpretar ao pé da letra o artigo 130 da


Constituição, o acórdão da Corte de Cassação teria sido, sem
dúvida alguma, contra legem. Mas, limitando o alcance deste
artigo às situações normais e previsíveis, a Corte de Cassação
introduz uma lacuna na Constituição, que não teria estatuído
para situações extraordinárias, causadas ‘pela força dos
acontecimentos’, ‘por força maior’, ‘pela necessidade’ ".

Digo, então, que são muitos os exemplos na própria jurisprudência


do Supremo a propósito disso. Por isso, disse que, inclusive, o Tribunal
acabou naquele caso do Ministério Público, pelo pensamento do possível,
a reconhecer uma norma não escrita que era aquela que permitia que, não
havendo membros do Ministério Público com mais de dez anos, fossem
indicados membros do Ministério Público com menos de dez anos, como
fazia a regulação do Conselho do Ministério Público.
Eu arrostei também uma questão dessa, Presidente, no TSE. Lá, a
discussão era até mais característica, era a questão de pessoas deficientes
físicas, às vezes com grave estado de saúde, cujos parentes, normalmente,
reivindicavam que elas não mais participassem do processo eleitoral, não
tivessem que votar. Nós temos a exceção no texto constitucional, o voto
facultativo das pessoas com 16 anos ou acima de 70, mas não há norma
sobre isso, como havia no passado com a lei complementar, e se
considerava, portanto, que a lei complementar que legislava essa matéria
não tinha sido recepcionada. Esse debate veio, e eu fui o Relator e
coloquei essas mesmas premissas, dizendo que não era razoável que o
texto constitucional torturasse essas pessoas, ou que a interpretação do
texto constitucional torturasse essas pessoas, que nós poderíamos aplicar
a regra da facultatividade do voto das pessoas com mais de 70 anos

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também a essas pessoas que tinham dificuldade, às vezes estavam


impossibilitadas, de participar minimamente da vida eleitoral como
votantes, dificuldade de locomoção, ou mesmo a necessidade de
proceder-se à justificativa. Isso se tornou uma resolução do Tribunal
Superior Eleitoral na mesma linha.
Aqui, a questão, a rigor, invoca esse pensamento, mas ele traz,
exatamente, mais este embaraço ou a necessidade de se fazer essa
conjugação, porque, claramente, o ato impugna a abertura do PAD e
também as sucessivas suspensões.
De modo que admitir o mandado de segurança apenas às
suspensões nos levaria a fazer uma proteção efetiva pela metade e para
mandar o impetrante para as vias ordinárias, negando a proteção judicial
efetiva, quando nós já divisamos o próprio desfecho da demanda com
todo.

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Confirmação de Voto

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05/12/2017 SEGUNDA TURMA

MANDADO DE SEGURANÇA 32.788 G OIÁS

CONFIRMAÇÃO DE VOTO

O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI:


O caso concreto tem dois elementos de ordem prática, Ministro-
Presidente, Edson Fachin, e Ministro Celso de Mello. Quais são?
Primeiro, desde sempre, impugnaram-se as provas. Esta Turma, em 25 de
outubro de 2016, por unanimidade, declarou aquelas provas nulas. O ora
impetrante poderia até se valer de uma reclamação hoje, agora, dizendo
da utilização de provas que já foram declaradas em caso de natureza
subjetiva de que ele é parte, e, dentro da linha da nossa jurisprudência,
essa reclamação não teria outra solução a não ser o julgamento
.procedente
Então, vejam, eu entendo que o julgamento, em 25 de outubro de 2016, é um fato
novo que abriria a possibilidade de um novo mandado de segurança, abriria a
possibilidade até hoje, porque não há limite de prazo para se entrar com reclamação -
pode-se entrar com reclamação no dia de hoje. Qual vai ser a solução? Julgarmos
procedente a reclamação, porque nós já declaramos, em caso subjetivo deste próprio
impetrante, em habeas corpus, que aquelas provas são nulas; então, em reclamação,
seria automático, é chegar e julgar procedente, vai ter o mesmo efeito do que aqui
estamos a julgar, na prática.
Por isso, respeitando a jurisprudência - em grande parte também me
afino com a posição de Vossa Excelência, já decidi como Vossa Excelência
traz -, mas, aqui, há uma questão de ordem prática. Primeiro, eu entendo
que o julgamento reabriu o prazo e aí a impetração já estava posta, ele
não teria que fazer uma nova; e, segundo, nós estamos tratando aqui,
agora, de autoridade da nossa decisão. Como que nós vamos aqui dizer:
"olha, ele não tem nenhum direito líquido e certo subjetivo de ver essas
provas retiradas dos autos administrativos se nós já declaramos isso nulo;
até já teve efeito penal, o Tribunal de Justiça de Goiás trancou, salvo
engano, ações civis públicas e ações penais, todas as ações penais na
Justiça já foram trancadas com base na autoridade de nossa decisão.
Agora, nós vamos manter esse processo administrativo para ele ter que
vir com uma reclamação?

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Supremo Tribunal Federal
Confirmação de Voto

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MS 32788 / GO

Então, por questões de ordem prática, supero qualquer dilema no


conhecimento e mantenho o voto pelo conhecimento, Senhor Presidente.

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Voto - MIN. CELSO DE MELLO

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05/12/2017 SEGUNDA TURMA

MANDADO DE SEGURANÇA 32.788 G OIÁS

VOTO

O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: Preliminarmente,


por afastar a alegação de decadência, conheço da presente ação de mandado
de segurança.

Examinando o fundo da controvérsia mandamental, acompanho,


integralmente, o substancioso voto proferido pelo eminente Relator.

É o meu voto.

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Supremo Tribunal Federal
Extrato de Ata - 05/12/2017

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SEGUNDA TURMA
EXTRATO DE ATA

MANDADO DE SEGURANÇA 32.788


PROCED. : GOIÁS
RELATOR : MIN. GILMAR MENDES
IMPTE.(S) : DEMÓSTENES LÁZARO XAVIER TORRES
ADV.(A/S) : PEDRO PAULO GUERRA DE MEDEIROS (18111/GO) E OUTRO(A/S)
IMPDO.(A/S) : PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO
PÚBLICO
PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO
LIT.PAS.(A/S) : UNIÃO
PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO
AM. CURIAE. : MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE GOIAS
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS

Decisão: Após o voto do Relator, que concedia a ordem,


confirmando a liminar deferida, no que foi acompanhado pelo
Ministro Dias Toffoli, pediu vista o Ministro Edson Fachin.
Presente à Sessão em favor do impetrante, o Dr. Pedro Paulo Guerra
de Medeiros. Ausentes, justificadamente, os Ministros Celso de
Mello e Ricardo Lewandowski. Presidência do Ministro Edson Fachin.
2ª Turma, 28.11.2017.

Decisão: Preliminarmente, a Turma, por maioria, concluiu pelo


afastamento da alegação de incidência do prazo decadencial
previsto no art. 23 da Lei 12.016/2009, vencido o Ministro Edson
Fachin. No mérito, a Turma, por votação unânime, concedeu a
segurança pleiteada para o fim de (i) confirmar a decisão liminar
de 1º.7.2014, tornando definitivo o retorno do impetrante às suas
funções; (ii) decretar a nulidade do Processo Administrativo
Disciplinar 0.00.000326/2013-60, tendo em vista basear-se,
exclusivamente, nas interceptações telefônicas declaradas ilegais
pela Segunda Turma desta Corte, nos autos do RHC 135.683, e julgou
prejudicados os agravos interpostos pela União, tudo nos termos do
voto do Relator. Ausente, justificadamente, o Ministro Ricardo
Lewandowski. Presidência do Ministro Edson Fachin. 2ª Turma,
5.12.2017.

Presidência do Senhor Ministro Edson Fachin. Presentes à


sessão os Senhores Ministros Celso de Mello, Gilmar Mendes e Dias
Toffoli. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Ricardo
Lewandowski.

Subprocurador-Geral da República, Dr. Paulo Gustavo Gonet


Branco.

Ravena Siqueira
Secretária

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