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Universidade Estadual de Maringá

07 a 09 de Maio de 2012

TIGUÁ E TIKUEIN: A EXISTÊNCIA SOCIAL DA CRIANÇA XETÁ

SILVA, Maria Angelita (UEM)


MÜLLER, Verônica Regina (UEM).

1 Introdução

O tema da invisibilidade cultural e social remonta a tempos longínquos.


Estudiosos de hermenêutica e exegese apontam que nos textos onde se expressa
quantidades de pessoas envolvidas na narrativa, apenas o número de homens adultos são
registrados, ficando excluídas mulheres, escravos/estrangeiros, idosos e CRIANÇAS.
O mundo hegemônico, o padrão da racionalidade moderna ocidental, parte
epistemologicamente do Norte, do homem adulto, branco, “bem sucedido” física,
econômica e intelectualmente como referência.
Nossa atenção enquanto pesquisadoras da Cultura da Infância Xetá, entre outras
coisas, é a constatação que o espaço e tempo para ser diferente do que está ditado pelas
regras e padrões globais de existência, se manifesta como não existente, como uma
alternativa não credível ao que existe (Santos, 2003d:743-746).
A sociedade Xetá, nesse sentido, constituiu-se duas ameaças ao contexto do que
existe oficialmente: a primeira se constituiu na sua forma de existir enquanto povo
desvinculado da vida líquida, que é uma vida de consumo (Bauman, 2009, p.16), a
segunda pelo fato de que depois de exterminados como sociedade, seus sobreviventes
serem crianças que protagonizaram a resistência cultural, (Tomás, 2011, p.54), e a
resignificação de sua existência como etnia Xetá.

Uma Descoberta
Abril de 2010, num colégio elitizado de uma cidade de médio porte no interior
do Paraná, uma professora de quarto ano, se esforçava em desenvolver um assunto, que
junto com a data comemorativa da Páscoa era tema da semana: 19 de Abril – Dia do
Índio. Inicia escrevendo com letras garrafais a palavra ÍNDIO, assim desejava que as

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crianças fossem dizendo palavras que lhes viessem à mente a partir desse enunciado. A
professora imaginava e preparara a aula nesse sentido, de que as palavras associadas
seriam: arco, flecha, oca, rio, cocar, peneira, mata, floresta, natureza, pesca, nudez,
tribo, aldeia... E numa atitude lúdica ela apresentaria novos conceitos sobre a cultura
indígena, inclusive narrando às crianças que a população indígena atualmente está na
universidade e que há pouco havia sido convidada a formatura de indígenas, uma
Guarani formada em Enfermagem e um Kaingang, formado em Direito. Entretanto para
embaraço da professora, depois de um longo e estéril silêncio a primeira palavra
associada foi: POBRE.
Durante a semana estava prevista a apresentação de um documentário, no
laboratório de informática, entre outras coisas, a carta do cacique Yeha Noha e uma
entrevista onde um líder Yawanawá desabafa sobre o resultado esmagador do contato
com os não indígenas, ele chamava atenção para fato da religiosidade de seu povo ter
sido profundamente afetada pela força brutal da intolerância e deslocamento de poder,
ou seja, a língua e os rituais de seu povo foram condenados e interpretados como ritos
de feitiçaria, um ranço da Idade Média e caça as bruxas. O fato do colégio que a
professora trabalhava ser confessional potencializou o desconforto que foi se
desenvolvendo em indignação, passando impreterivelmente por uma comoção estranha
que afetou inclusive as crianças até então alheias ao tema da semana, a data
comemorativa e o conceito cultural do que fosse: ÍNDIO.
Ao retornar à sala de aula as crianças ao menos estavam curiosas a respeito da
emoção causada à professora a partir da apresentação daqueles documentários. Portanto
talvez agora houvesse uma condição potencializada para redimensionar o conceito
cultural da palavra ÍNDIO.
Retomando a ideia inicial somado a algumas pistas deixado pelos
documentários, ela arriscou narrar a formatura daqueles (as) indígenas e problematizar
sobre os aspectos da vida cotidiana desses povos que estão inseridos no modo de vida
ocidental, todavia é uma gente de características culturais, lingüísticas, antropológicas
distintas da nossa, mas que apesar da diferenças são dotados de uma singularidade
riquíssima. E conforme a professora ia narrando a experiência sua com povos indígenas,
o conceito de pobreza e riqueza ia se redimensionando, e o ÍNDIO foi deixando de ser

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pobre, sem antena parabólica, jogos eletrônicos, internet, celulares, casas bem equipadas
com eletro-eletrônicos, sem roupas, sapatos ou bicicleta, para um ÍNDIO que tem outras
coisas e também essas, por que não?
É necessário informar que a professora mencionada fui eu e a partir dessa
experiência desenrolou acontecimentos que serão narrados a seguir.

A Surpresa de um Encontro.
Partindo dessa experiência, procurei me informar um pouco mais sobre a
realidade indígena no Paraná, na Universidade Estadual de Maringá. Em conversa com
Prof.º Lúcio Tadeu Mota, foi-me permitido participar da III Oficina de Produção de
Material Xetá, dos dias 24 a 26/08/2010. Foram três dias intensos, de uma beleza ímpar,
não acreditava que estava ali com aquela gente, um povo, uma “sociedade”, a sociedade
Xetá, fragmentos da História ali, com pesquisadores, lingüistas, autoridades, todos
engajados na revitalização da língua Xetá.
Notei logo dois grupos distintos: o corpo técnico, acadêmico, especialistas e o
Povo Xetá. Tratei de sentar num cantinho da sala, havia três mesas onde o povo se
reuniria para tal oficina, ajudei as acadêmicas e pesquisadoras com a exposição da linha
do tempo do povo Xetá e me sentei novamente. Lá do outro lado havia uma das mesas
onde estava preenchida na sua maioria por crianças e adolescentes, só havia um senhor
mais velho que mais tarde identifiquei com Ap, , enteado de Tikuein com D. Conceição
.
Um garoto de 11 anos, o J., ficou a me olhar e a sorrir, me senti atraída por
aquele sorriso tímido, que abaixava os olhos por vezes em seguida a me olhar de novo.
Aproveitei a empatia e me aproximei do grupo, pedi permissão para me sentar com eles,
eles aceitaram e já me elegeram “secretária” do grupo, responsável pelos registros em
papel manilha dos relatos e histórias que seriam narrados.
Em algum momento R. se aproximou interessada em me contar mais sobre eles,
só então soube que era esposa de Ap. Numa simplicidade desconcertante e cativante
fomos conversando, quando descobriu que eu era professora e que trabalhei com
crianças menores que a faixa etária escolar (Educação Infantil) me convidou para ir para
São Jerônimo-PR, narrou às dificuldades em relação aos pequeninos, falou da escola, de

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uma turma de pré-escolares, mas que os menores não tinham assistência escolar, falou
sobre o cacique Hipólito, que é Kaingang, falou de sua casa, seus afazeres, sua filha
casada que faz bolos deliciosos e já fizera para dois casamentos na Terra Indígena de
São Jerônimo. Contou a não existência de escola bilíngüe Xetá... Contou de um filho
que cria e como foi sofrido fazê-lo sobreviver, já que veio para ela muito doente...
No período da tarde, do terceiro dia de oficina, julguei que as crianças tivessem
exauridas, pois aquelas tarde do final de agosto, quente, seco era sufocante manter-se na
sala de trabalhos, no entanto logo que o líder deles, C. notou a ausência do grupo das
crianças foi até o local solicitando que voltássemos que todos deviam estar na oficina,
fiquei até envergonhada de ter tido a iniciativa de tirá-los da sala. Mas o resultado desse
pequeno espaço de tempo foi significativo.
A experiência foi ímpar, brincando com eles, duas situações opostas fizeram
desta experiência um lampejo de criatividade e intuição. Num primeiro momento
estávamos brincando espontaneamente, nos balançando naqueles instrumentos de
ginástica, uma das meninas, Y., se não a M. disse: “- Parece que a gente está voando!”
Então comentei que havia sonhado que voava, mas que eu tinha dificuldade de fazer
movimentos circulares no ar, a M., ou a Y., não me recordo direito, explodiu num
comentário: “- Eu sempre sonho que estou voando, fugindo do meu pai que voa atrás de
mim então eu acordo.” A Y. disse: “- Eu tive um pesadelo, meu pai estar sendo
esfaqueado e eu e minha mãe vendo tudo, depois esfaqueiam minha mãe e eu acordei.”
Eu continuei dizendo que em Guarapuava tinha um museu e quando fui lá a primeira
vez, vi o casco de uma jibóia na parede em exposição, naquela noite sonhei que uma
daquelas havia engolido minha mãe, acordei chorando muito...
Continuamos brincando, então comentei sobre o tempo seco que faz a pele ficar
com um aspecto ressecado e com rachaduras e o quanto minha pele estava ressecada.
Queria alguma coisa para passar que melhorasse, esperava que ela me confidenciasse
uma fórmula da mata, talvez com folhas medicinais, argila, cera de abelha, sabe-se lá...
Mas M. de súbito exclamou, no afã de ajudar: “- Minha mãe usa monange! ’ Uma
graça!
Na sequência lá vem o P., meu filho, 11 anos (que nesse dia se ausentou na
escola, para viver uma experiência significativa na Universidade Estadual de Maringá).

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Ele tem o costume de capturar animais de pequeno porte, sempre com o intuito de
protegê-los e cuidá-los, argumenta que estão machucados e que se ele não ajudar vão
morrer. Eu insistia que soltasse o bichinho! Vinha com uma pombinha nas mãos
(filhote) por certo tentando impressionar a criançada, todos gritavam atrás dele, uns
cinco ou seis meninos Xetá: “- Solte ela, solte ela...”
Agora lendo a dissertação da Carmem Silva (1998), imagino o quanto é
simbólico esse gesto de captura (era comum o rapto e roubo de crianças Xetá nas
décadas de quarenta e cinqüenta), o que perfeitamente pode fazer parte da memória
coletiva do grupo Xetá. Conforme o etno-historiador Lucio Tadeu Mota (2003), a etnia
Xetá foi contactada no Paraná no ano de 1940. Estudos da antropóloga e pesquisadora
Carmem Lúcia da Silva (1998) afirmam que, no final dos anos de 1940, agrimensores
da Companhia de Colonização, avistaram estranhos índios. Em seguida, o auxiliar do
Serviço de Proteção ao Índio (SPI) visitou a região da Serra dos Dourados para verificar
a procedência das notícias de que existiam índios selvagens nesta região. Com o passar
dos anos, o povo Xetá desapareceu do cenário paranaense, sobreviveram alguns
indivíduos (crianças e jovens), expropriados do seu território, retirados de seus
familiares e de seu referencial cultural, para serem criados por famílias brancas que
habitavam diferentes pontos do Paraná.
Nesses episódios do relato dos sonhos e pesadelos, do hidratante monange e do
filhotinho de pomba, a gente pode suspeitar que as duas culturas se misturem,
entrelaçam: Uma proposta pedagógica carece reconhecer e contemplar esses pontos
antagônicos, complementares e que de certa forma constitui a construção ininterrupta de
uma sociedade considerada extinta, mas que assim como no filme Caminhando nas
nuvens, estrelado com o protagonismo de Anthony Quinn, quando a partir de uma única
raiz, depois de um parreiral todo ser exterminado por um incêndio, houve a esperança
do recomeço a partir de uma única raiz de muda sobrevivente da tragédia. Portanto oito
crianças sobreviveram, a raiz de um povo que teimou em continuar a sua existência.

Os Índios Misturados ou O Novo Índio


Foi através de um documentário da TV Cultura sobre fotografia e o fotógrafo
latino americano (inca) Martin Chambi e as curiosidades pesquisadas na internet sobre o

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indianista, artista de seu povo e ativista político do movimento indigenista do Peru, que
iniciei as primeiras reflexões mais pontuais sobre A problemática dos “índios
misturados” e os limites dos estudos americanistas: um encontro entre antropologia e
história, texto de João Pacheco de Oliveira filho, na obra “Ensaios em Antropologia
Histórica” (1999) e a obra de José Uriel Garcia “O Novo Índio” (1930). O que essas
duas obras têm em comum é a resignificação do conceito sobre o ÍNDIO.
A obra de João Pacheco traz elementos interessantes à reflexão sobre o conceito
cultural do que é ser índio e/ou considerado como tal:
“É preciso entender que as manifestações simbólicas dos índios atuais
estarão marcadas comumente por diferentes tradições culturais. Para
serem legítimos componentes de uma cultura, costumes e crenças não
precisam ser exclusivos daquela sociedade, frequentemente sendo
compartilhados com outras populações (indígenas ou não). Tais
elementos culturais também não são necessariamente antigos ou
ancestrais, constituindo-se em fato corriqueiro a adaptação de pautas
culturais ao mundo moderno e globalizado.” (FILHO, 1999,p.117)

A obra de Garcia é um bom exemplo da resignificação do conceito cultural


indígena no artigo de ARAÚJO, Sabrina Moura: “O Indigenismo sob o olhar de Martin
Chambi”, fica explicitado a ideia:
... o pensamento de José Uriel Garcia também nos trás elementos para a
compreensão do amálgama das culturas branca e índia. Ele desmistifica
em sua obra “O Novo Índio” (1930) uma idéia corrente entre os autores
indigenistas de seu tempo: a idealização do passado incaico e da raça
indígena (...). Uriel Garcia propôs a valorização do encontro do passado
com o presente, do índio com o branco: o mestiço. Para ele o inca é um
momento do passado indígena, uma fração de sua história. O presente
se manifesta no índio e no mestiço, que ainda se desenvolvem e se
configuram como uma possibilidade. “O próprio Uriel Garcia conhecia
o trabalho de Martin Chambi e chega referir-se a ele como o exemplo
do espírito deste ‘ novo índio’”. (ARAÚJO, 2002, p.7)

Partindo das experiências expostas acima, foi que me inscrevi para seleção 2011 no
Programa de Pós Educação da UEM. A ideia era investigar a realidade da criança Xetá a partir
da necessidade exposta na oficina.
A motivação era colaborar na elaboração de proposta para educação infantil Xetá. É
claro que a ausência de território tradicional (há mais de dez anos corre na justiça a luta pelo
território tradicional) e da língua Xetá (a revitalização da cultura e língua materna, deste povo,
que está sendo realizada por meio da memória dos mais velhos, empreendida pelo Programa
Interdisciplinar de Estudos de Populações/Laboratório de Arqueologia, Etnologia e

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Etno-História – CCH/UEM), representava um desafio na laboriosa pretensão de


elaborar uma proposta pedagógica para educação infantil Xetá.
Aliás, o Programa Interdisciplinar estava na ocasião desenvolvendo pesquisa e
estudos para esse fim: Fortalecer a educação escolar; investigar, sistematizar,
compreender e propor práticas pedagógicas que valorizem os conhecimentos
tradicionais e universais dos quais os Xetá necessitam para construir sua autonomia.
Esses dois elementos - ausência de território tradicional demarcado e sistematização da
língua Xetá - apresentaram-se como obstáculo na obtenção do objetivo inicial, a promoção de
um Centro de Educação Infantil.
Ficou evidenciado que a promoção desse objetivo seria uma missão em médio prazo. O
fato de crianças Xetá protagonizarem a possibilidade não só da revitalização da língua, além
disso, o resgate e manutenção de sua Cultura seria a condição necessária a conquistas de outros
direitos, a escola bilíngüe, a ocupação de seu território tradicional e o reconhecimento de sua
história e cultura.
Os relatos a seguir darão pistas do cenário atual da cultura Xetá e o novo protagonismo
infantil no descortinar de sua existência.

Relatório de viagem a Umuarama – 05 a 06 de maio de 2011.


Na quinta feira depois da aula no mestrado me dirigi com uma colega, T.Z., que
reside em Umuarama, cidade que tem muito a dizer sobre a pesquisa que realizo sobre
Cultura da Infância Xetá. T.Z apresentou-se no início do ano e com cordialidade
ofereceu carona e hospedagem, convidando-me a ir a Umuarama investigar se havia a
possibilidade de encontrar alguém que pudesse ministrar uma palestra no segundo
semestre sobre Cultura da Infância Xetá. Um dos desafios de nosso estudo é a escassez
de publicações sobre a etnia Xetá. A Professora Verônica, numa atitude generosa,
comentou que a escolha do palestrante não precisaria obedecer ao protocolo acadêmico,
mas que fosse alguém que tivesse o que dizer sobre a Infância Xetá.
Chegamos aproximadamente as 20 e 30 h., passamos na padaria enquanto T.Z
me apresentava à cidade com simpatia e hospitalidade. Fui apresentada a um moço que
sabendo que estava ali para estudar Xetá me advertiu que tomasse cuidado com quem
iria abordar, pois segundo ele havia gente tentando provar que nunca havia existido
nenhum Xetá por ali. T.Z. contextualizou sua fala comentando que havia mesmo um

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movimento de não existência da etnia Xetá, mais ainda, um esforço sistematizado de


provar tal afirmação. Iria compreender melhor essa fala apenas no dia seguinte.
Como a linha de pesquisa principal é Cultura da Infância, entendo ser necessário
e prazeroso narrar o encontro com Baby, a filha de T.Z, uma menina de sete anos que já
me recebeu, deixando-me desconcertada com tamanha espontaneidade e carinho, ao
exclamar o quanto era bonita ela disparou:” – Você também!” Tratou-me daquele jeito
que só uma criança consegue, me conduziu rapidamente pelo interior da bela e
aconchegante casa, levando-me para seu quarto e me comunicando que ali eu dormiria,
mostrou-me suas bonecas e brinquedos, suas caixinhas coloridas e depois do jantar,
esticou seus braços com uma pequena tigela contendo bombons, me apressei como ela e
também de braços esticados ofereci a ela uns bolinhos de chocolate que trouxera da
padaria para nossa sobremesa.
Julguei conveniente essa narrativa, pois Clarice Cohn em sua dissertação de
mestrado “A Criança Indígena: a concepção Xikrin de infância e aprendizagem. No
capítulo 2: Infância, socialização e aprendizado na antropologia, particularmente no
item 2.1 A descoberta do universo infantil aponta para a negligência no estudo da
infância por parte da antropologia, focando, segundo a autora, no que lhe falta,
atribuindo uma passividade que falha ao notar que ela é, na realidade, ativa na produção
social (...) um ator social ativo e produtor de cultural (apud CAPUDO,1995).
Assim fica evidenciado o quanto a criança é ativa, produtora de relações sociais,
com um grau de comprometimento na dinâmica social que extrapola a nossa desatenção
a autonomia do universo infantil – em experiências e vivências, mas também em
formulações, que lhe são próprias, sobre o mundo em que vive, é o que afirma a autora.
(COHN, p.27, 2000).
No dia seguinte conheci Tiguá, uma das crianças sobreviventes - através de um
professor de História da cidade que nos passou seu endereço por telefone - Fomos até
sua casa num bairro popular de Umuarama, apresentamos a proposta de ela protagonizar
a palestra sobre a memória da Infância Xetá, havíamos nos visto na III Oficina de
revitalização da língua, aceitou com alegria.
Ficamos de voltar para organizar sua fala e dar detalhes da viagem a Maringá no
mês de setembro, ocasião do IX Semana da Criança Cidadã, promovido pelo PCA –

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Programa Multidisciplinar de Estudos, Pesquisa e Defesa da Criança e do Adolescente.


UEM.
O evento foi uma oportunidade bem sucedida de reunir o povo Xetá, numa nova
oficina de revitalização da língua que ocorreu nos dias (de 26 a 28/09/2011) da IX
Semana da Criança Cidadã. Indianara, filha de Tiguá não pode comparecer, como
combinado para desenvolvermos a narrativa da memória da infância Xetá em três atos,
três gerações: Tiguá, a sobrevivente, sua filha Indiana e seu neto Willian.
O que ocorreu nessa noite de atividade acadêmica foi histórico, Xetá (s) da Terra
Indígena Kaingang de São Jerônimo, alguns de Curitiba e cidades do interior do Paraná,
compuseram a mesa junto a Tiguá e Willian, contaram sobre sua experiência, sua
história e resistência. Ao final brindaram o evento com um canto na língua Xetá em que
meninos, jovens e homens Xetá apresentaram sendo aplaudidos com entusiasmo por um
público comovido. Por certo ninguém ali duvidava da existência desse povo e sua
resistência, a começar pelo número de crianças e adolescentes Xetá presente naquele
local.

Palavras finais
Nesse sentido, autores como TOMÁS, MÜLLER, SARMENTO apontam, para o
protagonismo infantil e a expansão da compreensão sobre os mundos sociais e culturais
das crianças, considerando que suas são realidades heterogéneas e múltiplas (Tomás
2011, p.133). No entanto, a infância tem sofrido um processo de ocultação,
historicamente construídas sobre as crianças (...) ocultando a realidade dos mundos
sociais e culturais das crianças (Sarmento, 2007, p.26).
Portanto, a valorização das crianças como sujeitos de direitos em situação
peculiar de desenvolvimento, exatamente como garante o Estatuto da criança e do
Adolescente ( Lei Brasileira n. 8.069/1990) e, ainda, como produtoras e transmissoras
de culturas que devem ser identificadas, preservadas e potencializadas, formam o
mosaico de atitudes políticas e epistemologia que elabora um novo pensar e agir a
respeito da existência da criança no mundo (Müller, 2007,p.15). A criança Xetá, nesse
contexto, apresenta uma ilustração incontestável de tal protagonismo e jeito de ser a se
traduzir.

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REFERÊNCIAS

ARAUJO, S. M. O Indigenismo sob o olhar de Martin Chambi. s/d Disponível em


WWW.caminhodamemória.com/memo/martin_chambi. Acesso em 7 de set. 2010.

BAUMAN, Z. VIDA LÍQUIDA. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed. 2009.

CASTILHO FRANÇA, M. C. Resenha: LOPES DA SILVA, Aracy; NUNES, Ângela;


MACEDO, Ana Vera Lopes da Silva (Org.). Crianças indígenas: ensaios
antropológicos. São Paulo: Global, 2002. 280 p. (Coleção Antropologia e Educação).
Horizontes Antropológicos, Porto Alegre, vol.8 no.18 Dec. 2002.
Disponível:http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-
71832002000200014> Acesso em: 10 março 2012.

COHN, C. "A CRIANÇA INDÍGENA: a concepção Xikrin de infância e


aprendizado" São Paulo: USP, 2000. (Dissertação de mestrado apresentada ao
programa de Pós-Graduação do Departamento de Antropologia da Universidade de São
Paulo).

FILHO, J. P. Oliveira .Ensaios em Antropologia Histórica, Rio de Janeiro: Ed. UFRJ,


1999.

MOTA, Lúcio Tadeu. Língua da memória, língua na escola: estudos dirigidos em


língua e escolarização entre os Xetá, 2003.

MÜLLER, R. V. História de Crianças e Infâncias – Registros, narrativas e vida


privada. Petrópolis: Vozes, 2007.

SANTOS, Boaventura de Sousa. A GRAMÁTICA DO TEMPO: para uma nova


cultura política. – 3ª Ed. – São Paulo: Cortez, - (Coleção para um novo senso comum),
2010.

SILVA, Carmem Lúcia da.Sobreviventes do Extermínio: uma etnografia das


narrativas e lembranças da sociedade Xetá. Florianópolis: UFSC,1998. (Dissertação
de Mestrado em Antropologia Social).

VASCONCELLOS, Vera M. R. e SARMENTO, Manuel Jacinto. Infância (In)Visível.


Araraquara, SP. Ed. Junqueira e Marin, 2007.

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TOMÁS, Catarina. Há muitos mundos no mundo: Cosmopolitismo, participação e


direitos da criança. 1. ed. Porto: Afrontamento, 2011.

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