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Semiótica e libertação nas palavras Jogo, forma e estilo na literatura

Cristina Vaz Duarte da Cruz é doutora em Letras (Teoria Literária e Literatura Comparada) pela
Universidade de São Paulo (2005) no âmbito da Semiótica das Instâncias, com pós-doutorado
em Ensino de Línguas pelo Instituto de Educação da Universidade de Estolcomo. Atualmente é
professora titular de Língua Portuguesa e Semiótica na Universidade Federal do Oeste do Pará
(UFOPA).

Entrevistada por Júlio César Guimarães*

A pesquisadora Cristina Vaz toma todo o cuidado na escolha das palavras. É detalhista, como se
estivesse escolhendo um vestido de noiva na vitrine de uma loja. Seleciona as ideias.
Influenciada pela teoria a Semiótica da Instância, de Jean-Claude Coquet, ela é autora de “A
forma literária em Nathalie Sarraute”, 2007, resultado da pesquisa de doutorado em Teoria
Literária pela Universidade de São Paulo (USP).
Vaz analisa e expõe de forma clara dois livros de Sarraute, escritora nascida em Ivanovo, na
Rússia, a 18 de julho de 1900, mas que foi levada para França ainda criança onde cresceu e
produziu mais de 20 obras, sendo referência para o revolucionário movimento literário “Nouvelle
roman”.
Nesta entrevista, ela expõe os eixos principais de suas pesquisas, explorando obras da escritora
francesa Nathalie Sarraute (1900-1999).
Como tudo iniciou?
Minha graduação, onde conheci a semiótica pela primeira vez, foi na França. Fiz a graduação na
Paris VIII, uma faculdade que tem uma história interessante, pois foi formada graças a revolução
de maio de 1968, dos estudantes. Ela surgiu como uma opção interdisciplinar [movimento
científico que tem fundamentação na história da ciência moderna, a partir do século XX] e livre
em relação ao modelo tradicional que havia na França, muito autoritário, em que o professor não
tinha contato com o aluno. Paris VIII surgiu para democratizar o ensino. Além disso, propor
linhas interdisciplinares.
No departamento no qual eu estava, que era de Letras Modernas, fazia francês, só que era uma
universidade livre; o aluno podia escolher as disciplinas para seu currículo. Havia, por exemplo,
professores que ofereciam ao todo, 30 cursos e você poderia caminhar como bem intencionasse,
seja através da empatia com a área do professor, seja com a disciplina você podia fazer a sua
grade. E aí o que eu fiz? Encantei-me pelos estudos de Jean-Claude Coquet, que é um
semioticista, seguidor de Benveniste de Mello Point. Encantei--me pela linha de pesquisa dele e
fiz a opção de fazer 80% do meu curso baseado nas propostas de Coquet. Foi aí que comecei a
me especializar na semiótica. Todas as disciplinas que me influenciam são na área de semiótica.
Toda a minha formação foi pautada nessa pesquisa de semiótica. Primeiro Semiótica Literária,
depois jornalística, análise de artigos de jornais.
E o seu percurso na pós-graduação?
Fiz um mestrado sobre três artigos de jornais que saíram sobre a Teologia da Libertação [termo
elaborado pelo padre peruano Gustavo Gutiérrez, autor do livro “A Teologia da Libertação”, de
1971].
O interesse pela teoria da libertação é por causa do aniversário de 500 anos do descobrimento
da América Latina e com o interesse pela Teologia da Libertação, encontrei um caminho que era
tentar ver os discursos sobre política, nesses três artigos, ligados à religião.
Fiz o mestrado nessa linha em semiótica. Quando cheguei ao Brasil, tive dificuldades para achar
um orientador que entendesse que a semiótica era muito interdisciplinar, porque a semiótica feita
na USP [Universidade de São Paulo] era voltada muito para a linguística e não tinha uma
tomada em filosofia, uma filosofia mais aberta para a fenomenologia, não havia essa linha de
pesquisa; então, o lugar que encontrei para continuar minhas pesquisas não foi na Linguística,
não foi na Língua Francesa, como era o que fazia na França, foi em Teoria Literária porque o
Departamento de Teoria Literária na USP aceita linhas interdisciplinares. Acabei fazendo um
doutorado em Teoria Literária. A minha orientadora me deixou com ampla margem para
trabalhar de maneira interdisciplinar, pegando textos de uma autora e o compromisso com o
Departamento foi estudar um assunto da Teoria Literária. Apliquei a semiótica para a questão da
Forma Literária que era um assunto muito caro para os teóricos da literatura. A Forma Literária
seria o jeito dos autores escreveram. E mais do que um jeito, um formato mental que faz que um
livro seja de um autor e só dele, que não possa ser copiado.
O chamado estilo?
O estilo tem uma componente [composição] que é a forma. O estilo seria o jeito de escrever, a
forma é essa bagagem que estrutura o pensamento do escritor permitindo-lhe fazer opções para
determinadas construções sintáticas [de sintaxe, parte da gramática que estuda a disposição das
palavras na frase e das frases no discurso], que ele tenha um número de linhas para o seu
parágrafo. A forma é mais ampla. O estilo está para o leigo. O teórico da literatura vai falar de
forma. A Forma Literária é esse arcabouço mental que faz com que um texto seja diferente de
outro. A palavra estilo leva mais para uma sofisticação do jeito de escrever e não é bem isso que
a forma estipula, mas todo esse arcabouço mental que faz a diferença entre os textos e ser
único. Aí está a questão. Um grande escritor é aquele que tem forma literária única, que não
pode ser copiado e que vai ficar na história como sendo um único estilo. Ninguém escreve como
Shakespeare, ninguém escreve como Machado de Assis. Cada grande escritor deixou uma
forma para ser absolvida.
Posso dizer que a forma contempla o estilo?
Isso...
São, digamos, detalhes?
O estilo do autor é como você falasse assim: “— O buraco da porta e o caixilho da porta”.
Caixilho vai ser a palavra do técnico, especialista, e o buraco da porta é para um leigo que olha e
fala: “— A porta passa por aqui”. A palavra estilo é ligada ao vocabulário leigo, como a gente fala
dos autores em geral. A palavra “forma” é um componente mais técnico da área da teoria
literária. A forma implica não só o jeito de pensar e de seguir um estilo, mas implica as escolhas
lexicais [escolha das palavras], as escolhas de formato do texto, não só a estruturação dos
parágrafos como a pontuação.
Tudo o que vai compor um jeito de escrever. Quando fiz a tese de doutorado, minha proposta
era conseguir encontrar uma verbalização para o que fosse a forma, como estrutura que deixa o
autor ser singular, que seja um exemplo na literatura, que fique marcado na história da literatura,
o que faz da forma literária de cada autor tenha um componente plural e singular.
A forma literária do autor é singular na medida em que ele tenha uma ligação íntima com o seu
texto. É plural na medida como ele se liga ao coletivo. Para uma forma ser única, precisa ter
duas componentes: uma componente singular, daquela relação do autor com o próprio texto e
trazer também um componente coletiva, que faça o link desse texto com o coletivo. Isso foi a
conclusão da minha tese em que o autor só fica na literatura e só permanece, nunca é
esquecido, quando consegue ter ao mesmo tempo, na forma literária, as componentes singular e
plural. Se você fica ligado ao seu texto e não consegue alcançar o coletivo, você não é um
grande autor. Minha tese diz isso: se você tem uma coisa e não tem outra, você não se insere na
história literária. É preciso ter as duas componentes.
Dê um exemplo...
Provei isso, analisando semioticamente dois textos da Nathalie Sarraute. O primeiro
[“Tropismos”, de 1939] e o último [“Abram”, de 1997]. Vi numa dimensão micro, em análise do
texto, o que é essa forma singular e essa forma plural. Fiz um caminho que poderia na
microestrutura representar o que ela tinha feito no coletivo. O que ficou grandemente marcante
foi observar como essa autora conseguiu fazer o link coletivo dela. A componente plural da forma
literária dela. Outra coisa que ficou muito marcante foi que a forma literária dessa autora
impedia, o que a gente referisse ao que ela põe em cena a palavra personagem, a palavra
narrativa, todos esses termos foram ultrapassados.
A forma literária que ela criou impede que a gente use os termos da narratologia [o seguimento
de fatos reais ou imaginários comuns em contos e histórias] para falar dos textos dela.
Por quê?
Bem, a forma literária dela ultrapassa... Você está vendo que fiz a capa em duas cores. Veja que
as letras estão como que mergulhadas umas nas outras, pois não existe linha entre a ficção e o
real. Ela coloca em cena uma forma literária que quebra a linha entre ficção e real. Quebrando
essa linha, não se pode mais falar em personagem, ficção, pois esses termos se referem quando
você tem uma separação entre real e ficcional. O que ela põe em cena nos textos dela impede
que a gente faça essa cisão. O real e a ficção são uma coisa só.
Então o que eram os textos dela? Romance ou um relato baseado em fatos reais?
Nenhuma coisa, nem outra. Deixa eu pegar um exemplo... [folheia o livro] Ela fala das palavras...
[folheia o livro] As palavras que estão em cena... [folheia o livro] Não tem uma estória... [folheia o
livro]... Ela fala das palavras, as palavras que estão em cena... [folheia o livro]
Os textos dela são baseados na palavra? Como?
Sim, a palavra é o assunto do texto, a escolha das palavras para você falar qualquer coisa. Aqui,
oh, vou dar um exemplo, ler um pedacinho do texto dela. Esse é o texto IV do livro dela “Abram”,
“Ouvrez” [em francês] que é o ultimo texto, escrito aos 97 anos. Ela escreveu:
— Vocês parecem incomodados... O que aconteceu com vocês? — Vocês que estavam lá o
tempo todo, vocês devem ter percebido alguma coisa? — Claro que não, vocês nos viram... Nós
respondemos prontamente a todas as convocações... — Foi fácil, era a mais banal das
conversas. O que quer que fosse... Impossível de se dar um passo em falso... — Logo que a
secretária eletrônica foi acionada, nós viemos cumprimentar como se deve alguém simpático,
gentil... — Mas vocês que recebiam o que chegava do outro lado da ligação, vocês sabem bem o
que os colocou nesse estado... Então, digam-no... — A gente não está se sentindo bem... — Por
quê? Façam um esforço... — Ora, alguma coisa aconteceu com a palavra “é”, que em francês se
pronuncia “C’est”... — Com “C’est”? — Sim, “C’est” foi maltratado diante de nós, seu “t” foi
retirado...— E foi necessário aceitá-lo sem fazer nada. — Retirado o seu “t”? Como? — Logo que
o fone foi retirado do gancho, veio de lá, precedendo “Antonin”, um “C’es” amputado de seu “t”...
C’es... Antonin... e não “C’est’Antonin”...
Aí ela fala de uma frase que foi pronunciada na secretária eletrônica e fica um delírio em volta
dessa frase. Então isso não é contar uma história. Isso é uma discussão em forma dialogal. Você
vê que são diálogos [mostra o texto para o entrevistador]. Não tem uma estória, só existe uma
discursão de palavras.
Ela faz uma análise daquela situação?
Daquela palavra...
Qual foi a palavra nesse texto?
“C’est’Antonin”... [ao aportuguesar a pronuncia fica: Cét’Antantonan]
Mas o que quer dizer no texto essa palavra?
Essa palavra vem do Francês que significa: “É o Antônio”. Só que em francês você pode falar
“C’est’Antonin” ou “C’es... Antonin...”. Na verdade a regra diz que você tem que fazer a elisão,
que é a ligação entre os dois sons, criando o terceiro que é a letra “t”: “C’est’Antonin”. Só que a
pessoa que diz isso, omite a ligação entre as palavras e não forma essa letra “t”. Não formando
essa letra “t”, fica um erro em língua francesa, mas a pessoa que fala, fica mais tranquila com ela
mesma. Sabe por quê? Porque existe uma onomatopeia que “t’Antonin” significa “êxitante” e a
pessoa que fala ao telefone, não quer se passar por “exitante”, então ao em vez dela falar
“C’est’Antonin”, como se você estivesse dizendo “É o “exitante”, faz-se um erro na língua
francesa pra quebrar a língua francesa e não deixar que se faça uma explicação subliminar
nessa língua. Então nos jogos de discurso dela são todos voltados para quebrar os limites da
língua francesa.
Você poderia dar um exemplo?
Acho que no Brasil alguns autores fazem isso em pequenos momentos dos seus livros. Ou, por
exemplo, não sei se você pegou aquele artigo do Machado de Assis sobre Dom Casmurro [ela
se refere a um artigo em construção intitulado “Semiótica e Interdisciplinaridade”], quando você
pega o Dom Casmurro e escolhe o uso de sintaxe curta para descrever a casa de Matacavalos,
ele também quer chegar aos limites da língua portuguesa-brasileira. Ele fica tentando mostrar
sintaticamente o quanto aquela casa foi racional. Você pode perceber que as frases são curtas,
lapidares.
O segundo capítulo do Dom Casmurro é uma compilação de frases muito curtas e lapidares para
demostrar o quanto é racional aquele espaço que ele [Machado de Assis] estava descrevendo.
Muitos autores fazem isso para tentar chegar aos limites da língua. E a Nathalie Sarraute tentou
chegar aos limites da língua sem contar uma história. Só discutindo palavras e jogos de
palavras. Sem se aprofundar muito nas situações, no contexto, mas se aprofundado bastante na
discussão do uso da palavra. Ela tem até o livro do uso da palavra. Um dos livros que ela
estudou, escreveu, se chama “O uso da palavra”, ainda não foi traduzido em português do Brasil,
só de Portugal.
Então ela foi única em sua forma de escrever?
Olha... Da maneira como ela faz, foi única. Porque isso mostra que ela foi uma pessoa que criou
uma forma literária de escrever. Só que ela faz parte de uma corrente de literária maior que se
chamava “Nouvelle roman” [“Novo romance”]. Teve muita gente que escreveu de maneira
revolucionária com a forma literária. Tem o texto muito famoso que se chama “O pão”, nele se
descreve o pão como se fosse uma montanha, com crateras, as cascas de pão eram as crostas
que você podia observar da terra, um texto absolutamente descritivo que fala do pão e do relevo
do pão. Essa coisa de tentar focalizar o microscópico, o que é muito pequeno, para tentar chegar
numa dimensão maior, foi uma vertente da escola literário que é o “Nouvelle roman”, uma escola
que surgiu ali pelos anos 1940 e 1950 do século XIX e que chegou até os nossos dias porque
pessoas escreveram até o final do século, como Nathalie Sarraoute, que morreu em 1999.
*Entrevista originalmente publicada no livro digital “Jornalismo Científico e Pesquisa na
Amazônia”, organizado por Manuel Dutra e Samuel Lima.

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