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As consequências do agravamento do desemprego no Brasil
por Mauro Bellesa - publicado 23/10/2015 14:30 - última modificação 26/10/2015
14:03
Márcio Porchmann, por sua vez, destacou que no capitalismo "sempre há desemprego e
que o pleno emprego, apesar de possível, é quase uma exceção à regra". Ele disse que o
pleno emprego é algo que se verificou principalmente nos “30 gloriosos” (1945-1975)
por ações especiais, sobretudo nos países ricos, e em função de iniciativas como a
ampliação do emprego no setor público.
"O Estado empregava de 3 a 4% da mão-de-obra até meados do século 20, mas depois
da Segunda Guerra Mundial passou a responder por 15, 20, 25 e até 30% da força de
trabalho; nos Estados Unidos, corresponde a 15% (sem contar os militares) e nos países
escandinavos chega a 1/3 da mão-de-obra."
Pochmann também citou que aconteceram várias ações para a retirada de pessoas do
mercado de trabalho, como idosos, crianças, adolescentes e doentes, que até então não
tinham outra alternativa de acesso a alguma renda. "A expansão do Estado de bem-estar
social foi fundamental para essa retirada dessas pessoas do mercado de trabalho."
RAZÕES
Apesar de tudo isso, as duas últimas décadas do século 20 foram marcadas pela
ascensão do desemprego, sobretudo nos países ricos, observou. Isso deveu-se a algumas
razões fundamentais, segundo ele:
o desempenho das economias ricas não foi tão forte como tinha sido no pós-guerra
e foi puxado não tanto pela indústria, mas pelo setor de serviços, que possui uma
qualidade diferente de trabalho, com menor salário e menor jornada, com os
trabalhadores muitas vezes tendo mais de um emprego;
as medidas que foram contraindo o gasto público e retirando a capacidade do
Estado de contratar mão-de-obra (como as privatizações dos anos 80 e 90);
a redução de transferência de renda que possibilitava a certos segmentos viver na
condição de desemprego por certo tempo;
o ingresso de 1,8 bilhão de pessoas que estavam foram do mercado de trabalho em
função do fim da União Soviética e mudanças em economias como da China e
Índia;
deslocamento da produção de vários países, sobretudo para a Ásia.
Márcio Pochmann
Ainda no plano internacional, Pochmann indica várias transformações, como
a desregulamentação e mudança no estatuto do trabalho, visando a flexibilizar o uso e
reduzir o custo da mão-de-obra; a redução do emprego público, mencionada
anteriormente por Lúcia; a onda de imigrantes da África e Oriente Médio procurando
emprego na União Europeia, de mexicanos indo para os Estados Unidos e até mesmo de
pessoas de vários países latino-americanos e africanos buscando oportunidades no
Brasil.
Além disso, ele ressalta a presença cada vez mais frequente de novas formas de
organização do uso do trabalho, graças às tecnologia de informação. "Um exemplo
disso é o Uber e as caronas pagas, que devem desorganizar o trabalho dos taxistas, ou o
aluguel de quartos, à margem da rede hoteleira, e o fornecimento de refeições pagas por
famílias comuns."
Segundo Pochmann, o Brasil está sofrendo desde 2014 os efeitos da terceira onda da
crise iniciada em 2008: "A segunda onde atingiu a União Europeia em 2011 e 2012; a
terceira onda é essa que chega aos Brics".
ESGOTAMENTO
"A atual situação demonstra o esgotamento das políticas adotadas em 2008 e 2009 para
tentar evitar que a crise de dimensão global se abatesse com mais força nos Brics; no
caso do Brasil, trata-se do esgotamento da série de políticas que foram muito importante
para evitar o desemprego, o aumento da pobreza e a desigualdade."
Mas o Brasil acabou adotando um mudança na orientação da política macroeconômica,
que "de certa maneira foi contendo os mecanismos anticíclicos implantados de 2008 a
2014 e resultou numa recessão, que nos foi apresentada para durar um ou dois
trimestres, mas já estamos no quarto trimestre de 2015 e a recessão não dá sinais de
desaceleração, pelo contrário, e, infelizmente, os indicadores estão apontando um
quadro ainda pior, o que pode fazer com que avancemos na recessão em 2106".
Diante dessas circunstâncias, Pochmann considera que dificilmente o desemprego será
contido sem uma mudança drástica na orientação da política econômica brasileira.
Helena Hirata
Tendo como referência os metalúrgicos da indústria automobilística e os empregados
domésticos, Helena comentou "a contradição entre a conscientização de classe nas
últimas décadas e as demissões". Perguntou também aos debatedores se haverá
movimentos sociais de resistência ao desemprego.
Respondendo à questão sobre os jovens, Anselmo Luís dos Santos reforçou o que
dissera durante sua apresentação, de que houve uma redução expressiva do desemprego
entre os jovens até 2013, apesar de ele ter se mantido elevado e agora apresentar um
crescimento grande: "Quando a economia desacelera, eles são os primeiros a ficar
desempregados; depois, quando a economia se recupera, eles são os últimos a ser
incorporados".
Santos disse que há um problema estrutural com os jovens brasileiros, já que 16% deles
(entre 15 a 29 anos) não estudam e não trabalham (não estão incluídos os
desempregados).
Citando um economista gaúcho, Lúcia dos Santos Garcia afirmou que existe um fosso
estrutural entre a realidade do jovem da família operária de base ("diferente da
'aristocracia' operaria, que negocia o PDE") e o jovem de classe média, "que frequenta
escola privada e tem outras perspectivas".
A partir de 2004, foi feito "um aceno de esperança" para esses jovens, mas "essa
geração levará um tombo, que é o tombo da frustração, da falta de perspectiva e do
descenso social generalizado".
A sociedade brasileira aceitará recuar? Essa é a grande incógnita, segundo Lúcia:
"Haverá resistência? Se ela existir, o movimento sindical operário vai liderá-la?".
José Darin Klein disse que o espectro das manifestações de 2013 refletiu o contraste
entre o que a sociedade quer e o que foi feito nos anos 2000. Ele considera que houve
um crescimento das manifestações em 2015, mas com parte delas resultante de "uma
onda conservadora que enxerga como única forma de resolver tudo derrubar a
presidente, mas sem propor nada para depois disso".
Ele também considera uma incógnita se surgirá um movimento de desempregados.
"Não há nenhuma instituição que esteja se organizando com essa perspectiva. As
centrais sindicais estão priorizando a questão do emprego e vinculando isso à mudança
da política econômica."
Márcio Pochmann concluiu o debate dizendo que as experiências dos anos 80 e 90
talvez sirvam pouco para explicar o que o país vivencia atualmente. "As manifestações
dos desempregados da indústria nos anos 80 foi num momento em que a atividade
industrial representava 35% do PIB; hoje ela corresponde a apenas 9%. Nos anos 90, as
manifestações foram impulsionadas mais fortemente por trabalhadores das empresas
estatais."
Apesar de julgar que o país tem condições de superar mais essa crise, Pochmann
considera que o quadro atual parece se encaminhar para o "crime perfeito", na medida
em que "evoluímos de uma crise política sem saída para uma crise econômica, dessa
para uma crise social de grandes proporções e nos encaminhamos para uma crise
institucional de grande monta em 2016, porque se soma à recessão a desagregação do
sistema administrativo brasileiro".
SISTEMA BANCÁRIO
Há ainda, segundo Pochmann, a perspectiva de uma crise bancária de grandes
proporções no início de 2016, decorrente dos empréstimos que as grandes construções
tomaram dos bancos públicos e dos fundos previdenciários para atividades vinculadas
principalmente ao setor de petróleo e gás.
"As empresas que estão sendo investigadas na operação Lava Jato saíram do cadastro de
fornecedores e não podem ser contratadas para novas atividades. Elas estão com
ativadas paralisadas, não podem participar de outras licitações e não podem vender os
seus ativos. Se não fecharem contratos até janeiro de 2016, não terão condições de pagar
o crédito tomado, estimado em US$ 400 bilhões, afiançado por bancos privados."
Segundo ele, se os bancos públicos não receberem pelos empréstimos, "irão atrás dos
afiançadores, que tem como ativos as obras que seriam construídas". A exigência de
dinheiro do Estado vai ser muito maior, segundo ele, "para evitar a quebradeira desses
grandes bancos". O resultado disso pode ser a perspectiva de "um Proer [Programa de
Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional] muito
mais avantajado do que aquele de 1995".