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Tema I
Notas de Aula1
natureza em atenção a ela própria, mas sim para que os seres humanos não fossem mais
ameaçados por catástrofes decorrentes dos danos ambientais.
O direito ambiental veio ganhando força também com os movimentos pelos direitos
das minorias, e, curiosamente, por movimentos sociológicos aparentemente desconexos
com qualquer cerne jurídico, como o movimento hippie: a comunhão do homem com a
natureza era uma das principais bandeiras deste movimento, o que teve, sim, influência no
desenvolvimento jurídico da proteção ambiental.
Além destes dois elementos – a ocorrência de desastres ambientais que ceifaram
vidas humanas e os movimentos sociológicos fundados na natureza –, a ameaça de uma
guerra nuclear por conta da “guerra fria” foi um terceiro fator de elevação da proteção
ambiental à categoria de direito. O medo da guerra nuclear, ou de um acidente nuclear que
levasse ao fim dos tempos, realmente levou à criação de um direito ambiental, pois se
passou a levar em conta a manutenção do meio ambiente como questão de perpetuação da
raça humana: se um acidente nuclear poderia dizimar a vida, igual potencial teria um
acidente ambiental de grande escala – o que deveria ser evitado, portanto.
Um dos primeiros desastres ambientais que marcaram o surgimento do direito
ambiental foi o mal de Minamata, intoxicação que surgiu na década de cinquenta na ilha
japonesa que tem este nome, decorrente da dispensação de mercúrio na água por uma
indústria química, à época. A população local se contaminou pelo mercúrio, tendo o sistema
nervoso central afetado por tal contaminação, o que chamou a atenção aos danos causados
pela poluição ambiental.
A legislação ambiental americana surgiu em decorrência de um caso famoso de
contaminação, a tragédia de Love Canal. Uma empresa americana - Hooker Chemical
Company – instalou um aterro de lixo químico nesta localidade, próxima a Niagara Falls, e,
posteriormente, vendeu ao Estado Norte-Americano, que construiu ali uma comunidade
habitacional para pessoas de baixa renda. Com menos de cinco anos da ocupação civil, os
tonéis químicos subterrâneos começaram a se romper, e a comunidade passou a padecer dos
efeitos altamente nocivos desta contaminação – natimortos, abortos espontâneos, fetos
malformados, adultos com distúrbios cerebrais, etc.
À época, com a vigência dos dogmas de que a poluição é inerente ao progresso e
que a regeneração é questão de tempo, nada obrigava a empresa química a cuidar melhor
dos dejetos, pelo que sequer teria, a população de Love Canal, direito a indenizações
quaisquer, a não ser a devolução do dinheiro pago pela moradia. O tamanho do absurdo este
case propugnou a formação da legislação ambiental norte-americana.
Assim, vê-se que foram as catástrofes os grandes catalisadores da legislação
ambiental em cada país. Em seguida, os países que adquiriram (forçosamente) esta
consciência ambiental, se reuniram para produzir uma orientação planetária sobre o direito
ambiental, pela só razão de que a poluição não reconhece fronteiras. Em 1972, a
Conferência de Estocolmo, primeira reunião internacional com escopo ambientalista,
trouxe alguns parâmetros que hoje são consolidados: a idéia de que o direito ao meio
ambiente equilibrado é um direito humano; a idéia de que o dano ambiental deve ser
prevenido, e não remediado – porque por vezes é irreversível; a idéia de que os danos
ambientais geram responsabilidade a seus causadores, dentre outros.
O Brasil, em plena ditadura militar, posicionou-se radicalmente contra a
Conferência de Estocolmo e tudo o que ela apregoava, especialmente porque aqui se
encontrava absolutamente arraigado o entendimento de que sem poluição não há progresso.
“Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem
de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder
Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e
futuras gerações.
§ 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:
I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo
ecológico das espécies e ecossistemas; (Regulamento)
II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e
fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético;
(Regulamento) (Regulamento)
III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus
componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão
permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a
integridade dos atributos que justifiquem sua proteção; (Regulamento)
IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente
causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto
ambiental, a que se dará publicidade; (Regulamento)
V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e
substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio
ambiente; (Regulamento)
VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a
conscientização pública para a preservação do meio ambiente;
VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem
em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os
animais a crueldade. (Regulamento)
§ 2º - Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio
ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público
competente, na forma da lei.
§ 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os
infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas,
independentemente da obrigação de reparar os danos causados.
§ 4º - A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o
Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua
utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a
preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais.
§ 5º - São indisponíveis as terras devolutas ou arrecadadas pelos Estados, por ações
discriminatórias, necessárias à proteção dos ecossistemas naturais.
§ 6º - As usinas que operem com reator nuclear deverão ter sua localização
definida em lei federal, sem o que não poderão ser instaladas.”
“Na madrugada entre dois e três de dezembro de 1984, 40 toneladas de gases letais
vazaram da fábrica de agrotóxicos da Union Carbide Corporation, em Bhopal,
Índia. Foi o maior desastre químico da história. Gases tóxicos como o isocianato
de metila e o hidrocianeto escaparam de um tanque durante operações de rotina. Os
precários dispositivos de segurança que deveriam evitar desastres como esse
apresentavam problemas ou estavam desligados.
Estima-se que três dias após o desastre oito mil pessoas já tinham morrido devido à
exposição direta aos gases. A Union Carbide se negou a fornecer informações
detalhadas sobre a natureza dos contaminantes, e, como conseqüência, os médicos
não tiveram condições de tratar adequadamente os indivíduos expostos. Mesmo
hoje os sobreviventes do desastre e as agências de saúde da Índia ainda não
conseguiram obter da Union Carbide e de seu novo dono, a Dow Química,
informações sobre a composição dos gases que vazaram e seus efeitos na saúde.
Infelizmente, a noite do desastre foi apenas o início de uma longa tragédia, cujos
efeitos se estendem até hoje. A Union Carbide, dona da fábrica de agrotóxicos na
época do vazamento dos gases, abandonou a área, deixando para trás uma grande
quantidade de venenos perigosos. A empresa tentou se livrar da responsabilidade
pelas mortes provocadas pelo desastre, pagando ao governo da Índia uma
indenização irrisória face a gravidade da contaminação.
Hoje, bem mais de cento e cinquenta mil sobreviventes com doenças crônicas
ainda necessitam de cuidados médicos, e uma segunda geração de crianças
continua a sofrer os efeitos da herança tóxica deixada pela indústria.”
responsáveis a incumbência de arcar com a maior parte dos ônus da poluição até então
registrada. O Protocolo de Kyoto, outro elemento fundamental da história ambiental,
estabeleceu metas somente para estes países do Anexo 1, com vistas à cessação do
aquecimento global. Este protocolo é refutado pelos países desta categoria porque, segundo
eles, não há justiça na completa desoneração de países considerados em desenvolvimento,
como China, Brasil e Índia, eis que poluem tanto quanto os países do Anexo 1 – o que gera
uma desigualdade comercial entre países em desenvolvimento e os países industrializados.
Este é o tom das conversas internacionais, hoje, o que pode ser percebido nos resultados da
Conferência de Copenhague, em que países desenvolvidos exigiram equivalência das metas
de emissão de poluentes, gerando impasse internacional sobre este aspecto.
Hoje, a legislação ambiental brasileira é considerada uma das mais modernas do
mundo. O problema, agora, é a efetivação desta legislação, especialmente ante o
desconhecimento do que dita e da falta de vontade política na promoção de sua eficácia.
O artigo 225, caput, da CRFB, há pouco transcrito, sedia este princípio em nossa
ordem jurídica. Contudo, não é ali que se apresenta, expressamente, a natureza de um novo
direito fundamental a este valor, o meio ambiente equilibrado. A primeira vez que se falou
nesta natureza jurídica foi na ADI-MC :
A lógica é bem simples: se a vida e a saúde são direitos fundamentais, e sem meio
ambiente ecologicamente equilibrado não há vida ou saúde, o meio ambiente é um direito
fundamental pressuposto à própria vida e saúde. O direito ambiental, portanto, é um novo
direito humano.
Com isso já se responde à questão inicial deste tópico: os direitos ambientais são
imprescritíveis, e por isso seus ditames podem ser impostos a qualquer um, a qualquer
tempo, mesmo se a norma sobrevier ao que estiver instalado – prevalecem sobre direitos
adquiridos.
Este é um princípio implícito na CRFB de 1988. Este conceito veio a ser burilado
no curso da ECO-92, e por isso não poderia estar explicitamente mencionado na CRFB,
podendo, contudo, ser depreendido da intelecção do seu artigo 225, já transcrito.
Desenvolvimento sustentável é o estabelecimento de métodos de produção,
industrialização e exploração que não sejam exaurientes dos recursos naturais, nem
insuportavelmente danosos ao ambiente. Mas este conceito de produção sem poluição é
apenas a primeira faceta do princípio do desenvolvimento sustentável, havendo mais duas:
a equidade intergeracional e a eliminação da pobreza.
A equidade intergeracional significa que a atual geração dominante dos meios de
produção e exploração deve se preocupar com as gerações futuras, preservando o planeta
para as gerações que estão por vir. O real desenvolvimento sustentável só se alcança
quando às gerações de quarenta, cinquenta, cem anos adiante seja garantida a existência de
recursos naturais.
Um bom exemplo de não sustentabilidade é o modo de vida de um norte-americano
de classe média: segundo a ONU, se todos do planeta consumissem recursos nos padrões de
um estadunidense médio, o planeta se exauriria em seis meses.
2.4. Prevenção
Este é um princípio basilar do direito ambiental, que impõe que o dano ambiental
não seja recomposto, mas sim evitado. As catástrofes ambientais devem ser evitadas, a todo
custo. Assim, se existe certeza científica que uma determinada atividade vai causar dano
ambiental, ela simplesmente não deve ser realizada. Mas e se a atividade for certamente
poluente, danosa ao ambiente, mas for igualmente imprescindível, necessária à vida e à
economia? Como exemplos, a exploração de petróleo e a mineração: são atividades
prejudiciais ao meio ambiente, mas imprescindíveis à vida humana. Significa, portanto, que
o princípio da prevenção simplesmente não se aplica?
A questão é intrincada. O ideal de aplicação do princípio é a abstenção de práticas
danosas ao meio ambiente, mas quando esta abstenção for impossível, como nos exemplos
dados, o princípio assume caráter de guia para a minoração ao máximo do dano que
certamente será causado. Destarte, o que o princípio da prevenção impõe é que, sendo
possível, o dano seja absolutamente evitado; se impossível a abstenção da prática danosa,
que seja realizada da forma menos gravosa possível – mesmo que a maior custo.
Este princípio tem uma falha em sua concepção: ele demanda certeza científica de
que o dano ocorrerá para que seja invocável como meio de obstar a prática da atividade.
Sem a certeza científica, não se pode impor que a atividade não seja praticada. E, como há
novas técnicas que não são comprovadamente danosas, passam ao largo da aplicação da
prevenção. A doutrina, atenta a esta quebra de efetividade do princípio, sugeriu novo
preceito, o da precaução, próximo tópico.
2.5. Precaução
existir a ameaça de que determinada técnica seja danosa – veja, basta a ameaça verossímil,
não se exigindo a certeza científica do dano –, a atividade será obstada.
Este é o princípio da precaução: a falta de comprovação científica de que resultará
dano não pode servir de justificativa permissiva da realização da atividade potencialmente
danosa. In dubio pro ambiente é um brocardo que bem traduz este princípio da precaução.
Tal princípio constitui a garantia contra riscos potenciais, que não podem ser ainda
identificados, devido à ausência da certeza científica formal, e baseia-se na idéia de que os
riscos de dano sério e irreversível requerem a implementação de medidas que possam
prever este dano.
O case brasileiro que é mais citado, a ilustrar a importância da precaução, é o da
talidomida. Este medicamento foi liberado para consumo sem que houvesse certeza de que
era seguro, e com isso se verificou, tarde demais, que era causador de má formação fetal.
Houvesse precaução, os danos teriam sido evitados, pois não se exigiria comprovação
científica de que o dano seria causado – a mera possibilidade de dano obstaria o consumo
do medicamento, evitando os danos que se seguiram.
A visão da abstenção total quando há potencial dano, que é a versão da precaução
que se percebe no Brasil, é a visão européia do princípio. Nos EUA, a visão da precaução é
mais calcada em uma análise custo-benefício: se, no caso, tem-se que a possibilidade de o
dano realmente acontecer existe, mas é pequena, e o benefício econômico é imediato e
vultoso, não se pode obstar a atividade. Nesta perspectiva, tem-se que promover a atividade
e os estudos sobre a causação do dano concomitantemente, e se o dano se demonstrar
severo, aí então se impede a continuidade da atividade.
Algo que se debate bastante é se o princípio da precaução não seria, na verdade, um
exacerbado medo do novo. O que este princípio apregoa é que, se o estado atual da técnica
coloca aquela atividade como segura, ela pode ser praticada; se o estado atual ainda não
permite a certeza da segurança, não se pode permitir a prática – o que não significa, veja,
que a atividade seja realmente segura, mas somente que ainda não se a pode dizer segura.
O estudo prévio de impacto ambiental, que será estudado quando da análise do
licenciamento ambiental, é derivado deste princípio: qualquer atividade potencialmente
poluidora demanda as verificações científicas sobre seus efeitos, antes de ser liberada.
2.6. Poluidor-pagador
Este princípio vem sofrendo mutações ao longo do tempo. Sua primeira versão era
centrada em um caráter punitivo, ou seja, aquele que poluiu deve pagar por isso, não se
admitindo mais a poluição gratuita. Não se pode, porém, entender que se trate de um
pagamento para poluir: não significa que o poluidor possa comprar seu direito a poluir. Não
se pode, de forma alguma, mercantilizar o ecossistema. O pagamento era sanção, e não
preço para habilitar determinada monta de poluição.
Adiante, este princípio ganhou uma nota mais educativa do que sancionatória. A
doutrina percebeu que se a punição valer a pena para o poluidor, ou seja, se a multa for
menor do que o benefício econômico adquirido com o desrespeito ambiental, o poluidor
não se absterá de poluir. Por exemplo, se o preço de um filtro for mil reais, e a multa pela
sua não instalação for cem reais, o poluidor preferirá pagar a multa, eis que para ele sairá
mais barato. Por isso, a punição deve ser de tal forma grave que leve o poluidor a
desestimular-se em poluir, ou seja, atue pedagogicamente, criando uma consciência
ambiental pela força.
Mais recentemente, fala-se em uma faceta econômica do princípio do poluidor-
pagador, o que se concentra na correção das externalidades negativas, conceito do ramo
econômico que significa que, se da atividade econômica surte prejuízo, este deve por ela ser
suportado: a externalidade – a atividade empreendida – causa impacto negativo no meio
ambiente, prejuízo que deve ser saneado.
Aqui se insere a responsabilidade pós-consumo, que é a que imputa à exploradora
da atividade econômica arcar com os prejuízos que tal atividade acarrete. Exemplo desta
responsabilidade é a imposição por lei, aos produtores de agrotóxicos, que recolham as
embalagens após o consumo, pois o descarte irregular de tais embalagens é altamente
danoso ao ambiente. Outro exemplo, surgido na esteira da decisão sobre os pneus, é a
imposição, por portaria do Conama, do seu recolhimento pelas indústrias que os fabriquem
ou que empreendam a remoldagem. O mesmo acontece, por fim, com as baterias de
celulares e carros.
2.7. Usuário-pagador
consideradas bem de domínio público, além de ser recurso natural limitado, dotado de valor
econômico.
2.8. Cooperação
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
Questão 2
Resposta à Questão 2
Resposta à Questão 3
Veja que a sociedade não é isenta da sua parcela de responsabilidade por não
descartar corretamente o lixo, mas a empresa é imputada por parte da responsabilidade.
Tema II
Notas de Aula3
1. Bens ambientais
3
Aula ministrada pela professora Flávia da Costa Limmer, em 10/12/2009.
Neste diapasão, quando uma floresta de interesse ambiental estiver situada em uma
propriedade privada, o proprietário deverá respeitar sua função ecológica, a fim de ter seu
direito respeitado. Da mesma forma, um rio público deve ser preservado, a fim de se
resguardar a função ambiental daquele elemento. E veja que a função ecológica deve ser
respeitada por todos, ou seja, tanto o rio quanto a floresta devem ser preservados por toda a
coletividade, de forma difusa. O bem ambiental é direito da sociedade, direito difuso e
fundamental, e por isso fica sujeito a limitações gerais de uso, gozo e disposição.
(...)”
“Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios:
(...)
III - proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e
cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos;
IV - impedir a evasão, a destruição e a descaracterização de obras de arte e de
outros bens de valor histórico, artístico ou cultural;
(...)
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
Questão 2
Resposta à Questão 2
Questão 3
Resposta à Questão 3
Tema III
Notas de Aula4
Nosso Código Florestal é de 1965, mas antes desse diploma havia já o Código de
1934, com previsões referentes à sistemática das áreas protegidas. Contudo, é no Código de
1965, com as alterações posteriores, que se aperfeiçoou esta normatização, a qual vem
sendo efetivada mormente por meio de ações civis públicas, eis que a efetividade
administrativa destas normas não tem sido promovida a contento.
A CRFB de 1988 recepcionou à plenitude a Lei 4.771/65, o Código Florestal –
doravante CF –, através do seu artigo 225, já abordado, que coloca sob incumbência do
Poder Público e da coletividade a proteção ambiental. Dentre as incumbências do Poder
Público, está expressa no inciso III do § 1º deste artigo a criação de áreas de proteção
específica. Reveja:
“Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem
de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder
Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e
futuras gerações.
§ 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:
(...)
III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus
componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão
permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a
integridade dos atributos que justifiquem sua proteção; (Regulamento: Lei
9.985/2000)
(...)”
4
Aula ministrada pela professora Isabella Franco Guerra, em 11/12/2009.
Um dos principais requisitos para esta exceção é que deva ser comprovado, no
procedimento do licenciamento ambiental que para tanto deve ser realizado, que a
supressão da vegetação é a ultima ratio, não havendo outro modo de se chegar ao fim que
se pretende, a finalidade pública que se quer alcançar (a construção de uma estrada, por
exemplo) – além da compensação ambiental pelos danos que serão causados.
Sobre a reparação de áreas de preservação permanente, veja o REsp. 704.967:
O artigo 1º, § 2º, III do CF define reserva legal como a área localizada no interior de
uma propriedade ou posse rural, excetuada a de preservação permanente, necessária ao uso
sustentável dos recursos naturais, à conservação e reabilitação dos processos ecológicos, à
conservação da biodiversidade e ao abrigo e proteção de fauna e flora nativas.
A reserva legal, que também é uma limitação administrativa, difere da área de
preservação permanente por ser exclusivamente incidente em propriedades rurais. Além
disso, é subsidiária às áreas de preservação permanente: quando se for criar uma reserva,
esta não computará a área de preservação permanente que porventura se encontre no plano
previsto para a reserva. Isto significa, por exemplo, que se em uma determinada
propriedade é determinada reserva de vinte por cento do terreno, e nesta mesma
propriedade passa um rio de cinco metros de largura, já há uma área protegida de trinta
metros a partir da margem, área de preservação permanente que não será computada para o
preenchimento da reserva: o total da área protegida será de trinta metros a contar da
margem, mais vinte por cento do total da propriedade.
O artigo 16 do CF fala da definição de percentuais das propriedades:
I - reduzir, para fins de recomposição, a reserva legal, na Amazônia Legal, para até
cinqüenta por cento da propriedade, excluídas, em qualquer caso, as Áreas de
Preservação Permanente, os ecótonos, os sítios e ecossistemas especialmente
protegidos, os locais de expressiva biodiversidade e os corredores ecológicos; e
(Incluído pela Medida Provisória nº 2.166-67, de 2001)
II - ampliar as áreas de reserva legal, em até cinqüenta por cento dos índices
previstos neste Código, em todo o território nacional. (Incluído pela Medida
Provisória nº 2.166-67, de 2001)
§ 6º Será admitido, pelo órgão ambiental competente, o cômputo das áreas
relativas à vegetação nativa existente em área de preservação permanente no
cálculo do percentual de reserva legal, desde que não implique em conversão de
novas áreas para o uso alternativo do solo, e quando a soma da vegetação nativa
em área de preservação permanente e reserva legal exceder a: (Incluído pela
Medida Provisória nº 2.166-67, de 2001)
I - oitenta por cento da propriedade rural localizada na Amazônia Legal; (Incluído
pela Medida Provisória nº 2.166-67, de 2001)
II - cinqüenta por cento da propriedade rural localizada nas demais regiões do País;
e (Incluído pela Medida Provisória nº 2.166-67, de 2001)
III - vinte e cinco por cento da pequena propriedade definida pelas alíneas "b" e "c"
do inciso I do § 2o do art. 1o. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.166-67, de
2001)
§ 7º O regime de uso da área de preservação permanente não se altera na hipótese
prevista no § 6o. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.166-67, de 2001)
§ 8º A área de reserva legal deve ser averbada à margem da inscrição de matrícula
do imóvel, no registro de imóveis competente, sendo vedada a alteração de sua
destinação, nos casos de transmissão, a qualquer título, de desmembramento ou de
retificação da área, com as exceções previstas neste Código. (Incluído pela Medida
Provisória nº 2.166-67, de 2001)
§ 9º A averbação da reserva legal da pequena propriedade ou posse rural familiar é
gratuita, devendo o Poder Público prestar apoio técnico e jurídico, quando
necessário. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.166-67, de 2001)
§ 10. Na posse, a reserva legal é assegurada por Termo de Ajustamento de
Conduta, firmado pelo possuidor com o órgão ambiental estadual ou federal
competente, com força de título executivo e contendo, no mínimo, a localização da
reserva legal, as suas características ecológicas básicas e a proibição de supressão
de sua vegetação, aplicando-se, no que couber, as mesmas disposições previstas
neste Código para a propriedade rural. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.166-
67, de 2001)
§ 11. Poderá ser instituída reserva legal em regime de condomínio entre mais de
uma propriedade, respeitado o percentual legal em relação a cada imóvel, mediante
a aprovação do órgão ambiental estadual competente e as devidas averbações
referentes a todos os imóveis envolvidos. (Incluído pela Medida Provisória nº
2.166-67, de 2001)
Questão que tem sido reiterada no STJ é se pode o novo proprietário ser compelido
a reflorestar área de reserva legal desmatada pelo antigo proprietário. O STJ tem
reiteradamente decidido que sim, porque esta obrigação tem natureza propter rem: o
proprietário adquirente pode figurar no pólo passivo de uma ação que vise a compelir tal
cumprimento, pois se trata de uma obrigação legal imposta em apreço à função sócio-
ambiental, e seu descumprimento é inadimplemento desta função. É claro que haverá
regresso contra o antigo proprietário, mas há imputação do novo proprietário pela
obrigação de reflorestar.
O CF admite um manejo sustentável destas áreas de reservam uma exploração
planejada e equilibrada, com aprovação prévia do plano de exploração pelos órgãos
A Lei 9.985/2000, apelidada de Lei do Snuc justamente por ser o dimploma que
regula o Sistema Nacional de Unidades de Conservação, é a lei que trata desta forma de
proteção. No seu artigo 2º, também conceitual, apresenta o próprio conceito de unidade de
conservação, dentre outros. Veja:
O artigo 7º da Lei do Snuc é fundamental, porque trata dos dois grandes grupos de
unidades de conservação: as unidades de proteção integral e as unidades de uso
sustentável. Veja:
“Art. 10. A Reserva Biológica tem como objetivo a preservação integral da biota e
demais atributos naturais existentes em seus limites, sem interferência humana
direta ou modificações ambientais, excetuando-se as medidas de recuperação de
seus ecossistemas alterados e as ações de manejo necessárias para recuperar e
preservar o equilíbrio natural, a diversidade biológica e os processos ecológicos
naturais.
§ 1º A Reserva Biológica é de posse e domínio públicos, sendo que as áreas
particulares incluídas em seus limites serão desapropriadas, de acordo com o que
dispõe a lei.
§ 2º É proibida a visitação pública, exceto aquela com objetivo educacional, de
acordo com regulamento específico.
§ 3º A pesquisa científica depende de autorização prévia do órgão responsável pela
administração da unidade e está sujeita às condições e restrições por este
estabelecidas, bem como àquelas previstas em regulamento.”
“Art. 12. O Monumento Natural tem como objetivo básico preservar sítios naturais
raros, singulares ou de grande beleza cênica.
§ 1º O Monumento Natural pode ser constituído por áreas particulares, desde que
seja possível compatibilizar os objetivos da unidade com a utilização da terra e dos
recursos naturais do local pelos proprietários.
§ 2º Havendo incompatibilidade entre os objetivos da área e as atividades privadas
ou não havendo aquiescência do proprietário às condições propostas pelo órgão
responsável pela administração da unidade para a coexistência do Monumento
Natural com o uso da propriedade, a área deve ser desapropriada, de acordo com o
que dispõe a lei.
§ 3º A visitação pública está sujeita às condições e restrições estabelecidas no
Plano de Manejo da unidade, às normas estabelecidas pelo órgão responsável por
sua administração e àquelas previstas em regulamento.”
“Art. 13. O Refúgio de Vida Silvestre tem como objetivo proteger ambientes
naturais onde se asseguram condições para a existência ou reprodução de espécies
ou comunidades da flora local e da fauna residente ou migratória.
§ 1º O Refúgio de Vida Silvestre pode ser constituído por áreas particulares, desde
que seja possível compatibilizar os objetivos da unidade com a utilização da terra e
dos recursos naturais do local pelos proprietários.
§ 2º Havendo incompatibilidade entre os objetivos da área e as atividades privadas
ou não havendo aquiescência do proprietário às condições propostas pelo órgão
responsável pela administração da unidade para a coexistência do Refúgio de Vida
Silvestre com o uso da propriedade, a área deve ser desapropriada, de acordo com
o que dispõe a lei.
§ 3º A visitação pública está sujeita às normas e restrições estabelecidas no Plano
de Manejo da unidade, às normas estabelecidas pelo órgão responsável por sua
administração, e àquelas previstas em regulamento.
§ 4º A pesquisa científica depende de autorização prévia do órgão responsável pela
administração da unidade e está sujeita às condições e restrições por este
estabelecidas, bem como àquelas previstas em regulamento.”
Este artigo foi alvo de uma ADI, criticando a natureza jurídica desta compensação
imposta ao empreendedor. O STF julgou parcialmente procedente a ADI, por entender que
a natureza desta compensação é especial, consistindo em mera aplicação do princípio do
usuário-pagador, não se opondo à CRFB senão quanto à expressão “não pode ser inferior a
meio por cento dos custos totais previstos para a implantação do empreendimento”,
reduzindo este texto do dispositivo, por entender que o limite deve ser extraído caso a caso.
Veja a ementa:
“Art. 22. As unidades de conservação são criadas por ato do Poder Público.
§ 1º (VETADO)
§ 2º A criação de uma unidade de conservação deve ser precedida de estudos
técnicos e de consulta pública que permitam identificar a localização, a dimensão e
os limites mais adequados para a unidade, conforme se dispuser em regulamento.
§ 3º No processo de consulta de que trata o § 2o, o Poder Público é obrigado a
fornecer informações adequadas e inteligíveis à população local e a outras partes
interessadas.
§ 4º Na criação de Estação Ecológica ou Reserva Biológica não é obrigatória a
consulta de que trata o § 2o deste artigo.
§ 5º As unidades de conservação do grupo de Uso Sustentável podem ser
transformadas total ou parcialmente em unidades do grupo de Proteção Integral,
por instrumento normativo do mesmo nível hierárquico do que criou a unidade,
desde que obedecidos os procedimentos de consulta estabelecidos no § 2o deste
artigo.
§ 6º A ampliação dos limites de uma unidade de conservação, sem modificação dos
seus limites originais, exceto pelo acréscimo proposto, pode ser feita por
instrumento normativo do mesmo nível hierárquico do que criou a unidade, desde
que obedecidos os procedimentos de consulta estabelecidos no § 2o deste artigo.
§ 7º A desafetação ou redução dos limites de uma unidade de conservação só pode
ser feita mediante lei específica.”
Veja que só não é exigida a consulta pública nas estações ecológicas e nas reservas
biológicas – exceções que não se justificam, na verdade.
A criação das unidades de conservação é sempre por ato do Poder Público, lei ou
decreto. Assim como criados, por simetria das formas deveriam ser desafetados, mas a
CRFB estabelece regra específica que dispõe que a unidade de conservação só pode deixar
de existir por lei, mesmo se fora criada por decreto.
V - Reserva de Fauna;
VI – Reserva de Desenvolvimento Sustentável; e
VII - Reserva Particular do Patrimônio Natural.”
“Art. 15. A Área de Proteção Ambiental é uma área em geral extensa, com um
certo grau de ocupação humana, dotada de atributos abióticos, bióticos, estéticos
ou culturais especialmente importantes para a qualidade de vida e o bem-estar das
populações humanas, e tem como objetivos básicos proteger a diversidade
biológica, disciplinar o processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso
dos recursos naturais.(Regulamento)
§ 1º A Área de Proteção Ambiental é constituída por terras públicas ou privadas.
§ 2º Respeitados os limites constitucionais, podem ser estabelecidas normas e
restrições para a utilização de uma propriedade privada localizada em uma Área de
Proteção Ambiental.
§ 3º As condições para a realização de pesquisa científica e visitação pública nas
áreas sob domínio público serão estabelecidas pelo órgão gestor da unidade.
§ 4º Nas áreas sob propriedade privada, cabe ao proprietário estabelecer as
condições para pesquisa e visitação pelo público, observadas as exigências e
restrições legais.
§ 5º A Área de Proteção Ambiental disporá de um Conselho presidido pelo órgão
responsável por sua administração e constituído por representantes dos órgãos
públicos, de organizações da sociedade civil e da população residente, conforme se
dispuser no regulamento desta Lei.”
“Art. 16. A Área de Relevante Interesse Ecológico é uma área em geral de pequena
extensão, com pouca ou nenhuma ocupação humana, com características naturais
extraordinárias ou que abriga exemplares raros da biota regional, e tem como
objetivo manter os ecossistemas naturais de importância regional ou local e regular
o uso admissível dessas áreas, de modo a compatibilizá-lo com os objetivos de
conservação da natureza.
§ 1º A Área de Relevante Interesse Ecológico é constituída por terras públicas ou
privadas.
§ 2º Respeitados os limites constitucionais, podem ser estabelecidas normas e
restrições para a utilização de uma propriedade privada localizada em uma Área de
Relevante Interesse Ecológico.”
“Art. 17. A Floresta Nacional é uma área com cobertura florestal de espécies
predominantemente nativas e tem como objetivo básico o uso múltiplo sustentável
dos recursos florestais e a pesquisa científica, com ênfase em métodos para
exploração sustentável de florestas nativas.(Regulamento)
§ 1º A Floresta Nacional é de posse e domínio públicos, sendo que as áreas
particulares incluídas em seus limites devem ser desapropriadas de acordo com o
que dispõe a lei.
§ 2º Nas Florestas Nacionais é admitida a permanência de populações tradicionais
que a habitam quando de sua criação, em conformidade com o disposto em
regulamento e no Plano de Manejo da unidade.
§ 3º A visitação pública é permitida, condicionada às normas estabelecidas para o
manejo da unidade pelo órgão responsável por sua administração.
§ 4º A pesquisa é permitida e incentivada, sujeitando-se à prévia autorização do
órgão responsável pela administração da unidade, às condições e restrições por este
estabelecidas e àquelas previstas em regulamento.
§ 5º A Floresta Nacional disporá de um Conselho Consultivo, presidido pelo órgão
responsável por sua administração e constituído por representantes de órgãos
públicos, de organizações da sociedade civil e, quando for o caso, das populações
tradicionais residentes.
“Art. 18. A Reserva Extrativista é uma área utilizada por populações extrativistas
tradicionais, cuja subsistência baseia-se no extrativismo e, complementarmente, na
agricultura de subsistência e na criação de animais de pequeno porte, e tem como
objetivos básicos proteger os meios de vida e a cultura dessas populações, e
assegurar o uso sustentável dos recursos naturais da unidade.(Regulamento)
§ 1º A Reserva Extrativista é de domínio público, com uso concedido às
populações extrativistas tradicionais conforme o disposto no art. 23 desta Lei e em
regulamentação específica, sendo que as áreas particulares incluídas em seus
limites devem ser desapropriadas, de acordo com o que dispõe a lei.
§ 2º A Reserva Extrativista será gerida por um Conselho Deliberativo, presidido
pelo órgão responsável por sua administração e constituído por representantes de
órgãos públicos, de organizações da sociedade civil e das populações tradicionais
residentes na área, conforme se dispuser em regulamento e no ato de criação da
unidade.
§ 3º A visitação pública é permitida, desde que compatível com os interesses locais
e de acordo com o disposto no Plano de Manejo da área.
§ 4º A pesquisa científica é permitida e incentivada, sujeitando-se à prévia
autorização do órgão responsável pela administração da unidade, às condições e
restrições por este estabelecidas e às normas previstas em regulamento.
§ 5º O Plano de Manejo da unidade será aprovado pelo seu Conselho Deliberativo.
§ 6º São proibidas a exploração de recursos minerais e a caça amadorística ou
profissional.
§ 7º A exploração comercial de recursos madeireiros só será admitida em bases
sustentáveis e em situações especiais e complementares às demais atividades
desenvolvidas na Reserva Extrativista, conforme o disposto em regulamento e no
Plano de Manejo da unidade.”
“Art. 19. A Reserva de Fauna é uma área natural com populações animais de
espécies nativas, terrestres ou aquáticas, residentes ou migratórias, adequadas para
estudos técnico-científicos sobre o manejo econômico sustentável de recursos
faunísticos.
§ 1º A Reserva de Fauna é de posse e domínio públicos, sendo que as áreas
particulares incluídas em seus limites devem ser desapropriadas de acordo com o
que dispõe a lei.
§ 2º A visitação pública pode ser permitida, desde que compatível com o manejo da
unidade e de acordo com as normas estabelecidas pelo órgão responsável por sua
administração.
§ 3º É proibido o exercício da caça amadorística ou profissional.
§ 4º A comercialização dos produtos e subprodutos resultantes das pesquisas
obedecerá ao disposto nas leis sobre fauna e regulamentos.”
“Art. 20. A Reserva de Desenvolvimento Sustentável é uma área natural que abriga
populações tradicionais, cuja existência baseia-se em sistemas sustentáveis de
exploração dos recursos naturais, desenvolvidos ao longo de gerações e adaptados
às condições ecológicas locais e que desempenham um papel fundamental na
proteção da natureza e na manutenção da diversidade biológica.(Regulamento)
§ 1º A Reserva de Desenvolvimento Sustentável tem como objetivo básico
preservar a natureza e, ao mesmo tempo, assegurar as condições e os meios
necessários para a reprodução e a melhoria dos modos e da qualidade de vida e
exploração dos recursos naturais das populações tradicionais, bem como valorizar,
conservar e aperfeiçoar o conhecimento e as técnicas de manejo do ambiente,
desenvolvido por estas populações.
“Art. 21. A Reserva Particular do Patrimônio Natural é uma área privada, gravada
com perpetuidade, com o objetivo de conservar a diversidade biológica.
(Regulamento)
§ 1º O gravame de que trata este artigo constará de termo de compromisso
assinado perante o órgão ambiental, que verificará a existência de interesse
público, e será averbado à margem da inscrição no Registro Público de Imóveis.
§ 2º Só poderá ser permitida, na Reserva Particular do Patrimônio Natural,
conforme se dispuser em regulamento:
I - a pesquisa científica;
II - a visitação com objetivos turísticos, recreativos e educacionais;
III - (VETADO)
§ 3º Os órgãos integrantes do SNUC, sempre que possível e oportuno, prestarão
orientação técnica e científica ao proprietário de Reserva Particular do Patrimônio
Natural para a elaboração de um Plano de Manejo ou de Proteção e de Gestão da
unidade.”
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
Tema IV
Responsabilidade Civil Ambiental: Dano ambiental e dano moral ambiental. Reparação do dano.
responsabilidade objetiva. Bases principiológicas. Caso fortuito e força maior. Seguro. Passivo ambiental.
Notas de Aula5
5
Aula ministrada pela professora Isabella Franco Guerra, em 11/12/2009.
O estudo indutivo do tema, passando por um exemplo empírico até chegar à teoria
sobre as responsabilidades, é um bom caminho. O caso escolhido para tanto é o da Cidade
dos Meninos, um dos leading cases no Brasil no que se refere à responsabilidade por dano
ambiental. Veja abaixo trecho de um trabalho publicado, que tratou deste evento, a fim de
resumi-lo6:
“A Cidade dos Meninos é uma área de 1900 hectares (19 km²), de propriedade
federal, hoje sob a responsabilidade patrimonial do Ministério de Previdência
Social. Fica situada na localidade de Pilar, Distrito de Campos Elíseos, Município
de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, Estado do Rio de Janeiro (no km 12
da antiga estrada Rio-Petrópolis).
A Baixada Fluminense é uma área plana, cortada por 35 rios, em alguns pontos
aterrada, que margeia o fundo da Baía de Guanabara. Era uma zona endêmica de
malária: os registros de epidemias na região começam em 1888, afetando sua
população, inicialmente formada por negros ex-escravos, que, libertos pela Lei
Áurea e abandonados à própria sorte, foram para os manguezais locais obter sua
sobrevivência com a extração de lenha. Teria começado então, com a devastação
das matas e erosão de solos, a proliferação do mosquito vetor da malária. Em
função da extensão do problema, o Governo federal da época buscou um
atendimento emergencial com obras de saneamento básico, iniciado em 1916 e que
prosseguiram com obras rodoviárias, aterro e retificação de rios.
Em 1946, o país sob outra presidência, a Cidade das Meninas foi transferida para a
Fundação Abrigo Cristo Redentor. A instituição passou a ser só para meninos e
novos pavilhões foram construídos (padarias, escolas de pesca, oficinas de
marcenaria, cestaria, mecânica, vassouraria, etc) para a educação profissionalizante
de meninos e rapazes que lá residiam em regime de internato. Havia ainda horta,
pomar, avicultura, suinocultura, bovinos, não apenas para treinamento dos alunos,
6
Trecho do artigo “Exposição a riscos químicos e desigualdade social: o caso do HCH
(hexaclorociclohexano) na Cidade dos Meninos, RJ”, publicado na Revista Desenvolvimento e Meio
Ambiente: riscos coletivos - ambiente e saúde, número 5, 2002, pp. 61 - 71, ISSN 1518-952X, UFPR. Autora:
Selene Herculano.
7
como para a sua própria alimentação. Além dos quatro institutos que abrigavam as
crianças, havia ainda na Cidade dos Meninos mais duas escolas, uma da rede
estadual e outra da rede municipal, que atendiam não apenas às crianças
internadas, mas também aos filhos dos funcionários que lá moravam.
O HCH é um pesticida organoclorado, isolado por Faraday em 1825, que teve suas
propriedades inseticidas descobertas em 1942, na França e na Inglaterra. Seu
isômero, gama-HCH recebeu o nome de Lindano. O gama-HCH, ou Lindano, é um
inseticida de amplo espectro usado para tratamento de sementes, do solo,
aplicações sobre folhas, em florestas, material orgânico guardado, em animais e na
saúde pública. Seu uso tornou-se restrito em alguns países e totalmente proibido
em outros, como no Japão, desde 1971. No Brasil, teve sua utilização na
agricultura proibida por Portaria Ministerial de 1985, mas continua sendo utilizado
em campanhas de saúde pública, na tentativa de erradicação e/ou controle de
vários vetores de doenças transmissíveis e endêmicas (MELLO, 1999).
Em 1950 a fábrica de HCH foi então inaugurada dentro da Cidade dos Meninos,
utilizando como matérias primas o benzeno, fornecido pela Companhia Siderúrgica
Nacional, de Volta Redonda, e o cloro, fornecido pela Companhia Eletroquímica
Fluminense, de São Gonçalo, ambas no Estado do Rio de Janeiro. Além do HCH, a
fábrica também desenvolvia pesquisas com outros pesticidas, como o arsenito de
cobre, também conhecido como Verde Paris e o tricloro bis (clorofeniletano) ou
DDT. (MELLO, 1999). A partir de 1956 a fábrica, que passara a se chamar
“Fábrica de Produtos Profiláticos”, produziu, até seu fechamento em 1960: pasta
de DDT; pasta de BHC (isômero alfa, enriquecido com gama-HCH);
emulsionáveis – DDT; mosquicidas – DDT + Lindano (gama-HCH); rodenticidas,
composto “1080 (monofluoroacetato de sódio) e cianeto de cálcio. (MELLO,
1999).
(Relatório final de gestão do seu Diretor, Brigadeiro Dr. Bijos, apud MELLO,
1999).
Segundo relato dos moradores, a fábrica abandonada foi sendo depredada com o
tempo e os tonéis de papelão nos quais o chamado BHC estava acondicionado se
romperam e o pó foi se infiltrando pelo solo onde os animais pastavam. A
população local deu diferentes usos ao material abandonado: era usado
domesticamente para matar piolhos e como inseticida de casas e quintais; foi
também utilizado como pavimentação da estrada interna; o pó-de-broca era
também recolhido do chão pelos moradores e vendido nas feiras livres locais.
(...)”
“Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem
de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder
Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e
futuras gerações.
(...)
§ 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os
infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas,
independentemente da obrigação de reparar os danos causados.
(...)”
“Art. 14 - Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal, estadual
e municipal, o não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou
correção dos inconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade
ambiental sujeitará os transgressores:
I - à multa simples ou diária, nos valores correspondentes, no mínimo, a 10 (dez) e,
no máximo, a 1.000 (mil) Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional - ORTNs,
agravada em casos de reincidência específica, conforme dispuser o regulamento,
vedada a sua cobrança pela União se já tiver sido aplicada pelo Estado, Distrito
Federal, Territórios ou pelos Municípios;
II - à perda ou restrição de incentivos e benefícios fiscais concedidos pelo Poder
Público;
III - à perda ou suspensão de participação em linhas de financiamento em
estabelecimentos oficiais de crédito;
IV - à suspensão de sua atividade.
§ 1º Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor
obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os
danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O
Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de
responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente.
§ 2º No caso de omissão da autoridade estadual ou municipal, caberá ao Secretário
do Meio Ambiente a aplicação Ambiente a aplicação das penalidades pecuniárias
prevista neste artigo.
§ 3º Nos casos previstos nos incisos II e III deste artigo, o ato declaratório da
perda, restrição ou suspensão será atribuição da autoridade administrativa ou
financeira que concedeu os benefícios, incentivos ou financiamento, cumprimento
resolução do CONAMA.
§ 4º (Revogado pela Lei nº 9.966, de 2000)
ambientais puros, fazendo com que o anunciante fosse condenado a não mais exibir tal
comercial.
Outro ponto polêmico é a responsabilização do financiador do empreendimento. No
direito americano tem sido entendido como responsável subsidiário o banco que financia
projeto causador de dano ambiental (em ações denominadas de deep pocket actions), sob a
lógica do enquadramento da instituição financiadora como poluidora indireta, pois se não
houvesse o empréstimo não haveria o dano, em última análise, eis que o projeto não se
implementaria – o que só seria afastado se banco tomasse as devidas providências
preventivas, assegurando-se de que a licença ambiental estivesse em dia. A questão da
configuração do poluidor indireto, como dito, é bastante controvertida.
Com base neste raciocínio, tem-se sugerido que os bancos têm uma função social de
verificar a questão ambiental em projetos que financiem. Tal como verificam com enorme
presteza se o seu investimento terá o retorno esperado, em qualquer empréstimo que fazem,
deveriam avaliar o retorno ambiental de seus financiamentos, a fim de evitar empréstimos
para projetos que causem danos ambientais.
Por fim, há que se falar do seguro ambiental. Há um projeto de lei em tramitação
que pretende impor seguro ambiental obrigatório a todos os projetos potencialmente
poluidores. Neste caso, nenhuma licença ambiental seria expedida sem a comprovação de
tal contratação de seguro de responsabilidade civil por danos ambientais – o que fomentaria
a investigação, pela seguradora, do risco ambiental da atividade, a fim de calcular seu
retorno econômico.
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
Questão 2
Em março de 2004, o Estado de Santa Catarina foi assolado pelo ciclone Catarina,
o qual atravessou uma fazenda, em Itajaí, devastando área destinada a reserva legal, e
contaminando um rio próximo com agrotóxicos. Há responsabilidade civil no caso em
tela?
Resposta à Questão 2
Questão 3
condenados à execução integral do projeto de recuperação, sob pena de multa diária, bem
como ao pagamento de compensação pelos danos materiais e morais.
Os réus sustentam a ocorrência de caso fortuito, consubstanciada em fortes chuvas,
causadoras da destruição das obras de recuperação da área e dos alagamentos, não
podendo ser responsabilizados pelos prejuízos experimentados.
Em réplica, o MP acrescentou que não obstante as chuvas torrenciais terem
contribuído para o dano, tal agravamento se deu por falta da implantação de sistema de
captação que era de inteira responsabilidade dos réus, que exploravam a área de forma
irregular.
A sentença julgou parcialmente procedentes os pedidos, com relação à obrigação
de fazer, e impôs multa pelo descumprimento, rejeitando o pedido de danos morais
coletivo.
Irresignados, os autores interpõem apelação, pleiteando a procedência do pedido
de indenização pelos danos morais ambientais.
Pergunta-se: o apelo é procedente? É admissível dano moral ambiental?
Resposta à Questão 3
Questão 4
responsabilidade dos réus que vinham explorando a área de forma irregular, sem
cumprirem com os termos do ajustamento de conduta firmado com a FUMAM. Após,
sobreveio sentença que julgou parcialmente procedente o pedido com relação à obrigação
de fazer e impôs multa pelo descumprimento, rejeitando, porém, o pedido de danos morais
coletivos. Irresignados, os autores interpuseram recurso de apelação em que pleiteiam a
procedência do pedido de indenização. Pergunta-se:
a) O recurso dos autores deve ser acolhido?
b) É admissível a indenização por dano moral ambiental? Fundamente a resposta.
c) Cite o posicionamento da jurisprudência acerca da matéria.
Resposta à Questão 4
Tema V
Licenciamento ambiental: Estudo prévio de impacto ambiental; relatório de impacto ambiental; audiência
pública; licenças e autorizações ambientais; compensações ambientais. Auditoria ambiental. Poder de
polícia.
Notas de Aula8
1. Licenciamento ambiental
8
Aula ministrada pela professora Cristiane Vieira Jaccoud do Carmo Azevedo, em 14/12/2009.
para licenciar será estadual, e quando for local, a competência é municipal. Esta divisão de
competências é uma das questões que mais alcança o Judiciário, com impugnações acerca
de licenciamentos realizados por quem não se mostrava competente, ante a nebulosidade
dos limites do impacto ambiental.
A competência estadual sempre foi exercida proficuamente, guardando-se uma
espécie de subsidiariedade prática para a União, e sempre se viu com estranheza a
competência licenciatória do Município. Hoje, certamente não se estranha mais a atuação
municipal nesta gestão ambiental, quer em sua própria área de incumbência –
empreendimentos de impacto local –, quer por delegação de competência licenciatória que
originalmente pertencia ao Estado, por meio de convênio. Veja os artigos 4° a 7° e 20 da
Resolução 237 do Conama:
O artigo 8°, inciso I, da Resolução 237 do Conama estabelece que aqui são
analisados os termos do EIA/RIMA, incumbindo ao Poder Público a atenção ao artigo 225,
§ 1°, da CRFB: deve ser dada publicidade aos estudos, segundo a Resolução 9/87 do
CONAMA, por meio das audiências públicas. A licença prévia é a fase em que se atesta a
viabilidade locacional do projeto pretendido.
É na fase da licença prévia que ocorre a maior concentração de trabalhos, em que se
exigem os relatórios e a publicidade dos atos, a fim de sanear as informações com a
participação pública e, eventualmente, comandar novos estudos.
Os resultados da audiência pública não vinculam o Poder Público; a requisição da
audiência pública, outrossim, vincula o procedimento: se não for promovida a audiência
requisitada, o processo de licenciamento é nulo.
O prazo mínimo da licença prévia é estabelecido de acordo com o cronograma, e o
máximo é de cinco anos. Sobre os prazos desta e das demais licenças, veja o artigo 18 da
Resolução 237:
Uma vez aferida a viabilidade do projeto, pela aquisição da licença prévia, passa-se
à instalação propriamente dita, o que demanda a licença de instalação, do inciso II do artigo
supra. Nesta fase, se cumprem as condicionantes específicas, previstas na fase de licença
prévia.
As condicionantes, totalmente casuísticas, são medidas minimizantes ou
compensatórias: serão minimizantes dos danos aquelas que reduzam os impactos do
empreendimento, e compensatórias aquelas que, não sendo possível diminuir o impacto, se
prestam a de alguma forma incrementar o ambiente danificado (como o plantio de árvores
em outro local, ante o alagamento de uma área por uma hidrelétrica, por exemplo).
O prazo mínimo desta licença é estabelecido no caso, e o máximo é de seis anos.
Concedida por um ano, por exemplo, pode ser prorrogada, desde que não ultrapasse nunca
o teto de seis anos.
Cumpridas as condicionantes, instalado o empreendimento conforme licenciado,
passa-se à próxima etapa, a licença de operação.
Casos Concretos
Questão 1
Região pleiteando a nulidade do decisum prolatado com fundamento no artigo 3º, §1º da
Lei 1.885/38, de 29/06/1999, bem como o artigo 10 e §4º da Lei 6.938/81. Pergunta-se:
a) O recurso deve ser provido? Analise a legitimidade passiva do IBAMA para
figurar no pólo passivo da ação civil pública intentada.
b) O IBAMA tem competência para emitir licença ambiental? Em quais situações?
Esclareça acerca da necessidade de elaboração de prévios EIA (estudo de impacto
ambiental) e RIMA (relatório de impacto sobre o meio ambiente).
Resposta à Questão 1
Tema VI
Gestão de Recursos Hídricos: Política e Sistema Nacionais de Recursos Hídricos. Cobrança pelo uso da
água: natureza jurídica. Água subterrânea. Usos da água. Política Nacional de Saneamento Básico.
Notas de Aula9
Qual é a natureza jurídica da água? Esta é uma pergunta de difícil resposta. Como se
trata de um dos bens mais caros à vida terrestre, é alvo de inúmeras controvérsias sobre seu
método de aproveitamento. Por exemplo, a água pode ou não ser objeto de apropriação?
9
Aula ministrada pelo professor Sávio Renato Bitencourt Soares Silva, em 14/12/2009.
Pode receber valor econômico? Pertence ao Poder Público? Das respostas a estas perguntas
surgirá a definição da natureza jurídica da água.
A água, hoje, é definida como recurso renovável, porém finito. Foi criado, no
regime do CC de 1916 e posteriormente pelo Código de Águas, Decreto 24.643/34, um
regime de águas públicas e águas privadas, ou seja, cursos de água que poderiam pertencer
ao particular ou ao Poder Público, a cada um aplicando-se o respectivo regime, de direito
privado ou público. O regime de direito privado, porém, é cada vez menos importante,
vigendo ainda hoje mormente no que diz respeito a direitos de vizinhança, no CC de 2002,
pelo que se percebe que o regime de direito público é predominante, no que diz respeito a
estes recursos.
A disciplina de regime privado das águas, especialmente aquele traçado no Decreto
24.643/34, é absolutamente excepcional, merecendo interpretações o mais restritivas
possível. Veja o artigo 2° deste Código de Águas:
“Art. 1.293. É permitido a quem quer que seja, mediante prévia indenização aos
proprietários prejudicados, construir canais, através de prédios alheios, para
receber as águas a que tenha direito, indispensáveis às primeiras necessidades da
vida, e, desde que não cause prejuízo considerável à agricultura e à indústria, bem
como para o escoamento de águas supérfluas ou acumuladas, ou a drenagem de
terrenos.
§ 1° Ao proprietário prejudicado, em tal caso, também assiste direito a
ressarcimento pelos danos que de futuro lhe advenham da infiltração ou irrupção
das águas, bem como da deterioração das obras destinadas a canalizá-las.
§ 2° O proprietário prejudicado poderá exigir que seja subterrânea a canalização
que atravessa áreas edificadas, pátios, hortas, jardins ou quintais.
§ 3° O aqueduto será construído de maneira que cause o menor prejuízo aos
proprietários dos imóveis vizinhos, e a expensas do seu dono, a quem incumbem
também as despesas de conservação.”
“Art. 1.294. Aplica-se ao direito de aqueduto o disposto nos arts. 1.286 e 1.287.”
Esta normatividade do CC não importa ao direito ambiental, mas sim ao direito civil
em relações de direito de vizinhança. Não há preocupação ambiental na mens destas
normas. Quando a casuística versar sobre questões essencialmente ambientais (qualidade da
água, potabilidade, ou o que quer que seja que extravase o direito de vizinhança), estas
normas não têm aplicabilidade.
Uma expressão bem feliz para identificar a natureza jurídica da água de regime
público é bem difuso: trata-se de um bem que, tendo valor econômico, é titularizado por
todas as pessoas, em um grupo não identificável – tal como o ar. Os entes do Poder Público
têm dever de cuidado com este bem, mas não a sua titularidade stricto sensu, não são donos
da água, na acepção da palavra.
O bojo normativo atual sobre recursos hídricos compõe-se principalmente da
própria CRFB, de uma lei específica, a Lei 9.433/97, e do Código de Águas, interpretado
sob filtragem constitucional. Há também diplomas específicos, como a Lei 9.966/00, que
trata da poluição por óleo, e a Lei 9.984/00, que trata da Agência Nacional de Águas.
“Art. 11. O regime de outorga de direitos de uso de recursos hídricos tem como
objetivos assegurar o controle quantitativo e qualitativo dos usos da água e o
efetivo exercício dos direitos de acesso à água.”
“Art. 12. Estão sujeitos a outorga pelo Poder Público os direitos dos seguintes usos
de recursos hídricos:
I - derivação ou captação de parcela da água existente em um corpo de água para
consumo final, inclusive abastecimento público, ou insumo de processo produtivo;
II - extração de água de aqüífero subterrâneo para consumo final ou insumo de
processo produtivo;
III - lançamento em corpo de água de esgotos e demais resíduos líquidos ou
gasosos, tratados ou não, com o fim de sua diluição, transporte ou disposição final;
IV - aproveitamento dos potenciais hidrelétricos;
V - outros usos que alterem o regime, a quantidade ou a qualidade da água
existente em um corpo de água.
§ 1º Independem de outorga pelo Poder Público, conforme definido em
regulamento:
I - o uso de recursos hídricos para a satisfação das necessidades de pequenos
núcleos populacionais, distribuídos no meio rural;
II - as derivações, captações e lançamentos considerados insignificantes;
III - as acumulações de volumes de água consideradas insignificantes.
§ 2º A outorga e a utilização de recursos hídricos para fins de geração de energia
elétrica estará subordinada ao Plano Nacional de Recursos Hídricos, aprovado na
forma do disposto no inciso VIII do art. 35 desta Lei, obedecida a disciplina da
legislação setorial específica.”
É claro que não se trata de uma alienação da água pública, mas sim uma
regularização do seu uso por quem dela necessite, de forma correta e isenta de desvios de
finalidade. Trata-se de um bem de uso comum do povo, e o acesso a este bem deve ser
controlado, regulamentado, a fim de ser bem empregado.
Mas veja que a outorga pode ser onerosa, ou seja, pode implicar contrapartida
econômica por quem recebe a água. Neste caso, o aporte financeiro significará que o Estado
está apropriando-se da água e a comercializando, ou seja, desvirtuando a natureza do bem?
Há quem entenda que é exatamente isto que ocorre, mas a maior parte da doutrina entende
que não: o acesso à água pode implicar custo para o Poder Público, e é por este acesso que
será devida a contrapartida econômica, não se tratando de uma compra e venda da água.
A outorga de água em nada se confunde com o licenciamento ambiental. Não é
porque recebe a outorga que a atividade está dispensada do competente licenciamento, e
vice-versa: sendo necessário o recurso hídrico, em um projeto licenciado, esta outorga deve
ser obtida, independentemente – o que em regra é feito em concomitância com o próprio
licenciamento.
A discricionariedade técnica impera no procedimento de outorga, sendo os
parâmetros traçados pelos estudos técnicos sobre o requerimento. Os parâmetros da outorga
não são dados pelo direito, e sim pelas ciências técnicas sobre o assunto – o que define a
discricionariedade técnica, e não uma mera discricionariedade jurídica, livre. Promover a
filtragem de uma outorga à luz das condições técnicas é uma coisa; vetá-lo por
inconveniência ou inoportunidade é outra bem diferente.
A discricionariedade técnica, portanto, quando cumpridas as exigências que dela
promanarem, acaba por gerar uma vinculação ao Poder Público: se o particular pretendente
da outorga cumprir os requisitos, a outorga se torna um direito subjetivo deste, e por isso
estamos diante de um ato administrativo vinculado.
O prazo máximo de outorga é de trinta e cinco anos, renovável. Veja o artigo 5° da
Lei 9.984/00:
A outorga pode ser revogada quando houver superveniência de causa que a torne
irregular. Se não há culpa do usuário na perda dos requisitos, os autores de direito privado
defendem indenizabilidade, mas predomina na doutrina ambiental o entendimento de que
não se fala em indenização, aqui, por se tratar dos riscos do negócio, assim como uma
tempestade ou um raio não implicam em indenização para o titular do direito.
1.2.1. Competência
Casos Concretos
Questão 1
até que sejam satisfeitos os requisitos legais exigidos para a regularidade da licença
prévia. Requer a oitiva das populações indígenas afetadas e a consulta ao Congresso
Nacional e, ao final, a suspensão dos efeitos do Certificado de Sustentabilidade Hídrica da
obra, da outorga concedida pela ANA e dos efeitos da decisão do Conselho Nacional de
Recursos Hídricos, que aprovou o projeto em desacordo com os procedimentos previstos.
Os réus, em defesa, argumentaram que, segundo parecer técnico elaborado, foram
atendidas parcialmente 6 (seis) das 31 (trinta e uma) condicionantes mencionadas na
licença prévia, tendo as demais sido cumpridas na integralidade, razão suficiente para
passar para a fase seguinte do processo consistente na emissão de licença de instalação.
Afirmaram, ainda, que foram implementados programas e planos para viabilizar a
execução das obras com a devida proteção ao meio ambiente, o que justifica a concessão
da licença de instalação. Reputou-se, ainda, prescindível a autorização do Congresso
Nacional, bem como o consentimento prévio de populações indígenas para implantação do
empreendimento (art. 231, §3º da CF), tendo em conta que o projeto não aproveitaria
recursos hídricos localizados dentro das terras indígenas e que, ao invés de prejudicar,
poderia resolver problema de escassez de que padeceria certa comunidade indígena.
Pergunta-se:
a) A determinação constitucional deveria ser atendida antes da concessão da
Licença Prévia? Sua ausência macula o licenciamento?
b) Os pedidos formulados na ação civil pública devem ser acolhidos? Fundamente
sua resposta.
Resposta à Questão 1
Tema VII
Os Municípios e o Meio Ambiente: Aspecto urbanístico. Plano diretor e Estatuto da Cidade. Patrimônio
cultural e tombamento. Limitações Administrativas no Direito Ambiental.
Notas de Aula10
10
Aula ministrada pelo professor Francisco José de Jesus Carrera, em 9/8/2010.
Para parte da doutrina, se resolve este conflito pela simples leitura do parágrafo
único do artigo supra, que determina certa prioridade ao Código Florestal, mas a questão
ainda é controvertida.
Adiante, a Lei 10/257/01, o Estatuto da Cidade, veio regulamentar expressamente os
artigos constitucionais sobre o tema, 182 e 183:
“Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinqüenta
metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a
para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja
proprietário de outro imóvel urbano ou rural.
§ 1º - O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à
mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil.
§ 2º - Esse direito não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez.
§ 3º - Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.”
“Art. 2º A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das
funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante as seguintes diretrizes
gerais:
I – garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra
urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura urbana, ao transporte
e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações;
II – gestão democrática por meio da participação da população e de associações
representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação, execução e
acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano;
III – cooperação entre os governos, a iniciativa privada e os demais setores da
sociedade no processo de urbanização, em atendimento ao interesse social;
IV – planejamento do desenvolvimento das cidades, da distribuição espacial da
população e das atividades econômicas do Município e do território sob sua área
de influência, de modo a evitar e corrigir as distorções do crescimento urbano e
seus efeitos negativos sobre o meio ambiente;
V – oferta de equipamentos urbanos e comunitários, transporte e serviços públicos
adequados aos interesses e necessidades da população e às características locais;
VI – ordenação e controle do uso do solo, de forma a evitar:
a) a utilização inadequada dos imóveis urbanos;
b) a proximidade de usos incompatíveis ou inconvenientes;
c) o parcelamento do solo, a edificação ou o uso excessivos ou inadequados em
relação à infra-estrutura urbana;
d) a instalação de empreendimentos ou atividades que possam funcionar como
pólos geradores de tráfego, sem a previsão da infra-estrutura correspondente;
e) a retenção especulativa de imóvel urbano, que resulte na sua subutilização ou
não utilização;
f) a deterioração das áreas urbanizadas;
g) a poluição e a degradação ambiental;
VII – integração e complementaridade entre as atividades urbanas e rurais, tendo
em vista o desenvolvimento socioeconômico do Município e do território sob sua
área de influência;
VIII – adoção de padrões de produção e consumo de bens e serviços e de expansão
urbana compatíveis com os limites da sustentabilidade ambiental, social e
econômica do Município e do território sob sua área de influência;
IX – justa distribuição dos benefícios e ônus decorrentes do processo de
urbanização;
X – adequação dos instrumentos de política econômica, tributária e financeira e
dos gastos públicos aos objetivos do desenvolvimento urbano, de modo a
privilegiar os investimentos geradores de bem-estar geral e a fruição dos bens
pelos diferentes segmentos sociais;
XI – recuperação dos investimentos do Poder Público de que tenha resultado a
valorização de imóveis urbanos;
XII – proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural e construído,
do patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e arqueológico;
XIII – audiência do Poder Público municipal e da população interessada nos
processos de implantação de empreendimentos ou atividades com efeitos
potencialmente negativos sobre o meio ambiente natural ou construído, o conforto
ou a segurança da população;
XIV – regularização fundiária e urbanização de áreas ocupadas por população de
baixa renda mediante o estabelecimento de normas especiais de urbanização, uso e
ocupação do solo e edificação, consideradas a situação socioeconômica da
população e as normas ambientais;
Veja que o primeiro elemento é justamente a previsão legal de que a área é urbana, e
isso se faz com a definição do zoneamento urbano. O zoneamento ambiental é feito por
meio do plano diretor,
O Estatuto da Cidade traça uma enorme gama de diretrizes para o implemento da
boa política urbanística. Veja o artigo 2º da Lei 10.257/01:
“Art. 2º A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das
funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante as seguintes diretrizes
gerais:
I – garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra
urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura urbana, ao transporte
e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações;
II – gestão democrática por meio da participação da população e de associações
representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação, execução e
acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano;
III – cooperação entre os governos, a iniciativa privada e os demais setores da
sociedade no processo de urbanização, em atendimento ao interesse social;
Casos Concretos
Questão 1
O município de Magé ajuizou Ação Civil Pública em face de Firmino dos Santos.
Aduziu que o réu está efetuando parcelamento irregular do solo na Estrada dos Pássaros,
nº 650, nesta localidade, descumprindo notificação feita por agentes da municipalidade e
afrontando direito difuso da coletividade à preservação do meio ambiente, bem como da
qualidade de vida da população. Disse que tais interesses se sobrepõem ao interesse
privado. Diante disso, pretende a condenação do réu a se abster de promover qualquer
atividade relativa ao parcelamento do solo no local, ou ainda, de realizar edificações, sob
pena de multa diária, sem prejuízo da regularização do que já foi loteado. Em defesa o réu
suscitou preliminar de inépcia da inicial, argumentando que a ação civil pública é meio
inadequado para o fim proposto, por não se tratar de interesses difusos ou coletivos. No
mérito, requereu a improcedência dos pedidos argumentando que não realizou qualquer
atividade de parcelamento do solo, pois apenas cedeu parte de seus direitos possessórios a
parentes necessitados de moradia, sendo tal direito hoje erigido à categoria de direito
social. Após a realização de vistoria no local, o expert concluiu que o parcelamento foi
iniciado, havendo no local três barracos ocupados por cinco famílias, parentes do réu.
Pergunta-se:
a) A preliminar argüida deve ser acolhida? Fundamente a resposta.
b) O direito ao meio ambiente equilibrado se sobrepõe ao direito de propriedade?
Resolva o conflito de direitos constitucionalmente protegidos.
c) A inércia do Poder Público permitiu, por muitos anos, a proliferação de
ocupações irregulares, inclusive em terras públicas. Como ponderar tal direito com a
defesa do meio ambiente (CRFB, art. 225), com a função social da propriedade (CRFB,
artigo 5º, XXIII) e com a função sócio-ambiental da cidade (CRFB, artigo 182 e Estatuto
da Cidade, artigo 1º)?
Resposta à Questão 1
a) A preliminar deve ser rejeitada, eis que a ação civil pública é perfeitamente apta
a deduzir tal pretensão. O direito à cidade sustentável é difuso, e o uso irregular
do solo é protegido por meio desse instrumento.
Questão 2
Resposta à Questão 2
Questão 3
Resposta à Questão 3
Tema VIII
Instrumentos de tutela do Meio Ambiente: Inquérito Civil. Termo de Ajustamento de Conduta e sua execução.
Notas de Aula11
houve voto vencido do Ministro Luiz Fux extremamente técnico, favorável à existência e
tutela deste tipo de dano:
“Art. 5º Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar: (Redação
dada pela Lei nº 11.448, de 2007).
I - o Ministério Público; (Redação dada pela Lei nº 11.448, de 2007).
II - a Defensoria Pública; (Redação dada pela Lei nº 11.448, de 2007).
III - a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios; (Incluído pela Lei nº
11.448, de 2007).
IV - a autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de economia mista;
(Incluído pela Lei nº 11.448, de 2007).
V - a associação que, concomitantemente: (Incluído pela Lei nº 11.448, de 2007).
a) esteja constituída há pelo menos 1 (um) ano nos termos da lei civil; (Incluído
pela Lei nº 11.448, de 2007).
b) inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao meio ambiente, ao
consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência ou ao patrimônio artístico,
estético, histórico, turístico e paisagístico. (Incluído pela Lei nº 11.448, de 2007).
§ 1º O Ministério Público, se não intervier no processo como parte, atuará
obrigatoriamente como fiscal da lei.
§ 2º Fica facultado ao Poder Público e a outras associações legitimadas nos termos
deste artigo habilitar-se como litisconsortes de qualquer das partes.
§ 3º Em caso de desistência infundada ou abandono da ação por associação
legitimada, o Ministério Público ou outro legitimado assumirá a titularidade ativa.
(Redação dada pela Lei nº 8.078, de 1990)
§ 4.° O requisito da pré-constituição poderá ser dispensado pelo juiz, quando haja
manifesto interesse social evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou
pela relevância do bem jurídico a ser protegido. (Incluído pela Lei nª 8.078, de
11.9.1990)
§ 5.° Admitir-se-á o litisconsórcio facultativo entre os Ministérios Públicos da
União, do Distrito Federal e dos Estados na defesa dos interesses e direitos de que
cuida esta lei. (Incluído pela Lei nª 8.078, de 11.9.1990) (Vide Mensagem de veto)
(Vide REsp 222582 /MG - STJ)
§ 6° Os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados compromisso
de ajustamento de sua conduta às exigências legais, mediante cominações, que terá
eficácia de título executivo extrajudicial. (Incluído pela Lei nª 8.078, de 11.9.1990)
(Vide Mensagem de veto) (Vide REsp 222582 /MG - STJ).”
Como se vê no § 6º, supra, a associação não é orgão público, e por isso não se
encarta nessa legitimidade. Vale dizer que a menção ao REsp. 222.582, dali constante,
existe porque ali foi questionada a vigência desse § 6º, e o STJ reputou-o perfeitamente
vigente, conforme ementa que se segue:
“Na condição de bem de uso comum do povo, o meio ambiente é um bem imaterial
que pertence à coletividade, como agrupamento natural não dotado de
personalidade jurídica. Trata-se de um bem que pertence indivisivelmente a todos
os indivíduos da coletividade e não integra o patrimônio disponível do Estado.
Para o Poder Público - e também para os particulares - o meio ambiente é sempre
indisponível e insuscetível de apropriação.”
Nesse sentido, veja o REsp. abaixo, que também trata de outro elemento estrutural
fundamental do TAC: esse instrumento depende de aceitação pelo obrigado, ou seja, é
preciso que manifeste vontade plena, espontânea e não viciada em cumprir a obrigação para
que o TAC seja imponível. Veja:
“REsp 802060 / RS. RECURSO ESPECIAL. Relator Ministro LUIZ FUX. Órgão
Julgador - PRIMEIRA TURMA. Data do Julgamento 17/12/2009. Data da
Publicação/Fonte DJe 22/02/2010.
Ementa: ADMINISTRATIVO. DANO AMBIENTAL. INQUÉRITO CIVIL.
TERMO DE AJUSTE DE CONDUTA. ART. 5º, § 6º, DA LEI 7.347/85. TÍTULO
EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. IMPOSIÇÃO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO.
CERCEAMENTO DE DEFESA. COAÇÃO MORAL. VIOLAÇÃO DO
CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. EXCESSO DE COBRANÇA.
MULTA MORATÓRIA. HOMOLOGAÇÃO DE TERMO DE AJUSTAMENTO
PELO CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO. ART. 9º, §§ 2º E
3º DA LEI 7347/85
1. A revogação da manifestação de vontade do compromitente, por ocasião da
lavratura do Termo de Ajustamento de Conduta - TAC junto ao órgão do Ministério
Público, não é objeto de regulação pela Lei 7347/855.
2. O Termo de Ajustamento, por força de lei, encerra transação para cuja validade é
imprescindível a presença dos elementos mínimos de existência, validade e
eficácia à caracterização deste negócio jurídico.
3. Sob esse enfoque a abalizada doutrina sobre o tema assenta: "(...)Como todo
negócio jurídico, o ajustamento de conduta pode ser compreendido nos planos de
existência, validade e eficácia. Essa análise pode resultar em uma fragmentação
artificial do fenômeno jurídico, posto que a existência, a validade e a eficácia são
aspectos de uma mesmíssima realidade. Todavia, a utilidade da mesma supera esse
inconveniente. (...) Para existir o ajuste carece da presença dos agentes
representando dois "centros de interesses, ou seja, um ou mais compromitentes e
um ou mais compromissários; tem que possuir um objeto que se consubstancie em
cumprimento de obrigações e deveres; deve existir o acordo de vontades e ser
veiculado através de uma forma perceptível(...) (RODRIGUES, Geisa de Assis,
Ainda quanto à natureza jurídica, vale mencionar os partidários das correntes que
disputam a solução: defendendo que é figura jurídica própria, Marcelo Abelha, Fiorillo,
Rosa Maria Andrade Nery; defendendo que é transação especial, Mazzilli e Milaré.
Se o TAC for tomado no curso do inquérito civil, ocasionará seu arquivamento, que
deverá ser homologado pelo Conselho Superior do MP. Se for tomado no curso do
processo, põe termo a este, e passa a ser título executivo judicial.
Se for firmado um TAC que negocie direito indisponível, se o objeto ofender a
Constituição de 1988, pode ser proposta ACP anulatória (Marcelo Buzaglo Dantas).
A respeito dos requisitos formais do TAC, veja o seguinte julgado:
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
Tema IX
Ação Civil Pública e Ação Popular: Partes. Competência. Processo. Sentença. Recursos. Coisa Julgada.
Execução.
Notas de Aula12
“(...)
LXXIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a
anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à
moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural,
ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da
sucumbência;
(...)”
A ação civil pública, por seu turno, vem trazida no artigo 129, III e § 1º da CRFB,
regulamentado pela Lei 7.347/85:
Vale dizer que tramita hoje no Congresso um projeto de Código de Processo Civil
Coletivo.
“Súmula 365, STF: Pessoa jurídica não tem legitimidade para propor ação
popular.”
Quando o Poder Público, constante do pólo passivo, migrar para o pólo ativo, na
forma do § 3º deste artigo supra, atuará como assistente litisconsorcial.
Havendo inobservância do litisconsórcio, nos casos em que este é necessário, há
nulidade absoluta do processo.
A competência para a ação popular não vem tratada na Lei da Ação Popular,
limitando-se a dizer o juízo, no artigo 5º: a regra é que seja de competência da justiça
estadual de primeiro grau. Veja:
“Art. 94. A ação fundada em direito pessoal e a ação fundada em direito real sobre
bens móveis serão propostas, em regra, no foro do domicílio do réu.
§ 1º Tendo mais de um domicílio, o réu será demandado no foro de qualquer deles.
§ 2º Sendo incerto ou desconhecido o domicílio do réu, ele será demandado onde
for encontrado ou no foro do domicílio do autor.
§ 3º Quando o réu não tiver domicílio nem residência no Brasil, a ação será
proposta no foro do domicílio do autor. Se este também residir fora do Brasil, a
ação será proposta em qualquer foro.
§ 4º Havendo dois ou mais réus, com diferentes domicílios, serão demandados no
foro de qualquer deles, à escolha do autor.”
“Súmula 224, STJ: Excluído do feito o ente federal, cuja presença levara o Juiz
Estadual a declinar da competência, deve o Juiz Federal restituir os autos e não
suscitar conflito.”
Pode haver ação popular originária no STF, na forma do artigo 102, I, “n”, da
CRFB:
1.1.1. Procedimento
II - Quando o autor o preferir, a citação dos beneficiários far-se-á por edital com o
prazo de 30 (trinta) dias, afixado na sede do juízo e publicado três vezes no jornal
oficial do Distrito Federal, ou da Capital do Estado ou Território em que seja
ajuizada a ação. A publicação será gratuita e deverá iniciar-se no máximo 3 (três)
dias após a entrega, na repartição competente, sob protocolo, de uma via
autenticada do mandado.
III - Qualquer pessoa, beneficiada ou responsável pelo ato impugnado, cuja
existência ou identidade se torne conhecida no curso do processo e antes de
proferida a sentença final de primeira instância, deverá ser citada para a integração
do contraditório, sendo-lhe restituído o prazo para contestação e produção de
provas, Salvo, quanto a beneficiário, se a citação se houver feito na forma do
inciso anterior.
IV - O prazo de contestação é de 20 (vinte) dias, prorrogáveis por mais 20 (vinte),
a requerimento do interessado, se particularmente difícil a produção de prova
documental, e será comum a todos os interessados, correndo da entrega em cartório
do mandado cumprido, ou, quando for o caso, do decurso do prazo assinado em
edital.
V - Caso não requerida, até o despacho saneador, a produção de prova testemunhal
ou pericial, o juiz ordenará vista às partes por 10 (dez) dias, para alegações, sendo-
lhe os autos conclusos, para sentença, 48 (quarenta e oito) horas após a expiração
desse prazo; havendo requerimento de prova, o processo tomará o rito ordinário.
VI - A sentença, quando não prolatada em audiência de instrução e julgamento,
deverá ser proferida dentro de 15 (quinze) dias do recebimento dos autos pelo juiz.
Parágrafo único. O proferimento da sentença além do prazo estabelecido privará o
juiz da inclusão em lista de merecimento para promoção, durante 2 (dois) anos, e
acarretará a perda, para efeito de promoção por antigüidade, de tantos dias quantos
forem os do retardamento, salvo motivo justo, declinado nos autos e comprovado
perante o órgão disciplinar competente.”
“Art. 22. Aplicam-se à ação popular as regras do Código de Processo Civil, naquilo
em que não contrariem os dispositivos desta lei, nem a natureza específica da
ação.”
O MP sempre atua como custos legis, eis que não pode ser parte original (podendo
assumir como sucessor, como dito).
É perfeitamente admissível a liminar em ação popular, o que hoje é muito claro,
ante o cabimento de liminares em quaisquer demandas, na atual sistemática. Mesmo que
hoje seja dispensável, à época era importante esta previsão do artigo 5º, § 4º, há pouco
transcrito.
O artigo 7º, I, “b”, supra, estabelece que o juiz requisite a exibição de documentos
necessários à instrução do feito que estejam na posse do réu.
O inciso II do artigo 7º, supra, oferece uma discussão doutrinária, acerca da
possibilidade de optar ou não pela citação por edital, opção que ali aparenta ser conferida
ao autor. Predomina, por óbvio, a corrente que entende que a citação por edital não é uma
opção do autor, porque o devido processo legal impõe que o réu seja citado concretamente,
e não fictamente, quando possível.
O prazo para contestar a ação popular é de vinte dias, prorrogáveis por mais vinte,
na forma do inciso IV do artigo 7º, supra.
“Art. 315. O réu pode reconvir ao autor no mesmo processo, toda vez que a
reconvenção seja conexa com a ação principal ou com o fundamento da defesa.
Parágrafo único. Não pode o réu, em seu próprio nome, reconvir ao autor, quando
este demandar em nome de outrem. (§ 1º renumerado pela Lei nº 9.245, de
26.12.1995).”
Nada impede, porém, que haja a condenação do autor de má-fé nos ônus
decorrentes desta litigância, na forma que o CPC regula a litigância de má-fé.
No CPC, o juiz pode sanear o feito a qualquer tempo. Na ação popular, este
saneador tem momento correto a ser feito, como dita o inciso V do artigo 7º supra – o qual
também sinaliza a possibilidade de julgamento antecipado da lide nesta ação.
O inciso VI do artigo 7º, supra, trata da sentença na ação popular. A inobservância
do prazo na prolação da sentença em ação popular é peculiar caso em que há a sanção
expressamente cominada no parágrafo único deste dispositivo. Esta sanção foi derrogada
pela LC 35/79, Lei Orgânica da Magistratura Nacional, que determina que os prazos
judiciais são impróprios, não podendo o juiz padecer daquela sanção ali imposta.
A sentença da ação popular tem carga preponderantemente constitutiva negativa, na
medida que a pretensão se volta a desfazer o ato que é ilegal e lesivo. Pode ter também
cunho condenatório, quando houver que ser reparado o patrimônio público, na forma do
artigo 11 da Lei da Ação Popular:
“Art. 11. A sentença que, julgando procedente a ação popular, decretar a invalidade
do ato impugnado, condenará ao pagamento de perdas e danos os responsáveis
pela sua prática e os beneficiários dele, ressalvada a ação regressiva contra os
funcionários causadores de dano, quando incorrerem em culpa.”
“Art. 14. Se o valor da lesão ficar provado no curso da causa, será indicado na
sentença; se depender de avaliação ou perícia, será apurado na execução.
§ 1º Quando a lesão resultar da falta ou isenção de qualquer pagamento, a
condenação imporá o pagamento devido, com acréscimo de juros de mora e multa
legal ou contratual, se houver.
§ 2º Quando a lesão resultar da execução fraudulenta, simulada ou irreal de
contratos, a condenação versará sobre a reposição do débito, com juros de mora.
§ 3º Quando o réu condenado perceber dos cofres públicos, a execução far-se-á por
desconto em folha até o integral ressarcimento do dano causado, se assim mais
convier ao interesse público.
§ 4º A parte condenada a restituir bens ou valores ficará sujeita a seqüestro e
penhora, desde a prolação da sentença condenatória.”
A ação popular conta com verbas de sucumbência, para a parte autora que tem
rejeitada a pretensão, apenas quando estiver clara a má-fé no ajuizamento do feito, como
dispõe o próprio inciso LXXIII da CRFB. Assim o é porque o legislador constituinte
intentou não desestimular a busca da tutela do patrimônio público, pois o temor da
sucumbência poderia levar a que não fossem ajuizadas algumas ações. Para a parte ré,
porém, a sucumbência incide normalmente, carreando as verbas que se fizerem necessárias.
Veja os artigos 12 e 13 da Lei 4.717/65:
A sentença está sempre sujeita ao duplo grau de jurisdição, e este duplo grau é
altamente excepcional, eis que se opera em favor do autor da ação. Da sentença cabe
recurso de apelação, com efeito suspensivo, e a legitimidade recursal é ampla, cabendo até
mesmo para o MP, como se vê no artigo 19 da lei em comento:
“Art. 19. A sentença que concluir pela carência ou pela improcedência da ação está
sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de
confirmada pelo tribunal; da que julgar a ação procedente caberá apelação, com
efeito suspensivo. (Redação dada pela Lei nº 6.014, de 1973)
§ 1º Das decisões interlocutórias cabe agravo de instrumento. (Redação dada pela
Lei nº 6.014, de 1973)
§ 2º Das sentenças e decisões proferidas contra o autor da ação e suscetíveis de
recurso, poderá recorrer qualquer cidadão e também o Ministério Público.
(Redação dada pela Lei nº 6.014, de 1973)”
“Art. 18. A sentença terá eficácia de coisa julgada oponível "erga omnes", exceto
no caso de haver sido a ação julgada improcedente por deficiência de prova; neste
caso, qualquer cidadão poderá intentar outra ação com idêntico fundamento,
valendo-se de nova prova.”
Esta é a coisa julgada secundum eventum litis, que só se forma quando o autor
triunfar. Quando sucumbir, não há coisa julgada material, mas meramente formal. Esta
regra era uma novidade tremenda à época, mas hoje é usual nas class actions, tanto que na
ação civil pública a regra é repetida no artigo 16 da Lei 7.347/85, visto adiante, e no artigo
103, I, do CDC:
“Art. 103. Nas ações coletivas de que trata este código, a sentença fará coisa
julgada:
I - erga omnes, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de
provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação, com
idêntico fundamento valendo-se de nova prova, na hipótese do inciso I do
parágrafo único do art. 81;
(...)”
“Art. 17. É sempre permitida às pessoas ou entidades referidas no art. 1º, ainda que
hajam contestado a ação, promover, em qualquer tempo, e no que as beneficiar a
execução da sentença contra os demais réus.”
A titularidade para a ação civil pública pertence, originalmente, ao MP, como visto
no artigo 129, III, da CRFB. Trata-se da mencionada legitimidade autônoma ou
institucional. Veja o artigo 5º da Lei 7.347/85:
“Art. 5º Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar: (Redação
dada pela Lei nº 11.448, de 2007).
I - o Ministério Público; (Redação dada pela Lei nº 11.448, de 2007).
II - a Defensoria Pública; (Redação dada pela Lei nº 11.448, de 2007).
III - a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios; (Incluído pela Lei nº
11.448, de 2007).
IV - a autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de economia mista;
(Incluído pela Lei nº 11.448, de 2007).
V - a associação que, concomitantemente: (Incluído pela Lei nº 11.448, de 2007).
a) esteja constituída há pelo menos 1 (um) ano nos termos da lei civil; (Incluído
pela Lei nº 11.448, de 2007).
b) inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao meio ambiente, ao
consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência ou ao patrimônio artístico,
estético, histórico, turístico e paisagístico. (Incluído pela Lei nº 11.448, de 2007).
§ 1º O Ministério Público, se não intervier no processo como parte, atuará
obrigatoriamente como fiscal da lei.
§ 2º Fica facultado ao Poder Público e a outras associações legitimadas nos termos
deste artigo habilitar-se como litisconsortes de qualquer das partes.
§ 3º Em caso de desistência infundada ou abandono da ação por associação
legitimada, o Ministério Público ou outro legitimado assumirá a titularidade ativa.
(Redação dada pela Lei nº 8.078, de 1990)
§ 4.° O requisito da pré-constituição poderá ser dispensado pelo juiz, quando haja
manifesto interesse social evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou
pela relevância do bem jurídico a ser protegido. (Incluído pela Lei nª 8.078, de
11.9.1990)
§ 5.° Admitir-se-á o litisconsórcio facultativo entre os Ministérios Públicos da
União, do Distrito Federal e dos Estados na defesa dos interesses e direitos de que
cuida esta lei. (Incluído pela Lei nª 8.078, de 11.9.1990) (Vide Mensagem de veto)
(Vide REsp 222582 /MG - STJ)
§ 6° Os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados compromisso
de ajustamento de sua conduta às exigências legais, mediante cominações, que terá
eficácia de título executivo extrajudicial. (Incluído pela Lei nª 8.078, de
11.9.1990) (Vide Mensagem de veto) (Vide REsp 222582 /MG - STJ)”
Veja que podem ajuizar a ação civil pública dois órgãos diferentes como
litisconsortes ativos: um membro do MP Estadual e um membro do MPU, por exemplo, na
forma do § 5º do artigo supra. A doutrina, contudo, reputa esta previsão inconstitucional,
porque cada MP tem seu ramo de atribuições, e com isto haveria uma invasão de
atribuições pelo MP de outro ramo que viesse a campo fora de sua justiça. Este § 5º, na
verdade, foi vetado pela Presidência da República, mas por um erro de impressão do
documento original ele não foi retirado do texto, e com isso tem havido a errônea inclusão
deste dispositivo no quadro de leis vigentes no ordenamento. Veja o REsp. a que remete a
nota oficial ao final do dispositivo:
“REsp 222582 / MG. Relator Ministro MILTON LUIZ PEREIRA. Órgão Julgador:
PRIMEIRA TURMA. Data do Julgamento: 12/03/2002. Data da Publicação/Fonte:
DJ 29/04/2002 p. 166.
Não atuando como parte, o MP deve atuar como custos legis. Contudo, esta atuação
será passiva, ou seja, só emitirá manifestação quando entender necessário, e não em
qualquer ato, pois, afinal, o MP já tem-se presentado no processo.
Tal como na ação popular, havendo desistência ou abandono infundado, o MP
poderá assumir o feito como sucessor processual, quem quer que tenha ajuizado a ação
originalmente.
O MP não pode ajuizar ação civil pública para tutelar todos os tipos de interesses. O
artigo 81 do CDC provê a informação de que tipo de direitos podem ser tutelados pelo MP:
“Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá
ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo.
Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:
I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os
transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas
indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;
II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os
transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou
classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica
base;
III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os
decorrentes de origem comum.”
“Súmula 643, STF: O Ministério Público tem legitimidade para promover ação
civil pública cujo fundamento seja a ilegalidade de reajuste de mensalidades
escolares.”
O transcrito artigo 5º da Lei da Ação Civil Pública traz os demais legitimados para a
propositura desta class action. Vê-se que são legitimados entes federativos, entidades da
administração indireta e associações, e para todos estes é requisito especial que haja a
chamada pertinência temática.
Quando a associação intentar ajuizar ação individual, em nome de seus associados,
é necessária a autorização dos associados para tanto. Isto porque ela atua, nesse caso, como
representante processual destes associados, e não como substituta processual: não tem
legitimidade ad causam, mas somente ad processum. Por isso, a inicial deve vir instruída
com a ata da assembléia de autorização do ajuizamento, bem como relação nominal de
todos os associados até aquele momento, a fim de que não haja burla futura, com a
ocorrência de associação de pessoas posterior à sentença favorável, a fim de dela obter os
benefícios – sendo que o limite subjetivo da coisa julgada se estende somente aos
associados à época do ajuizamento da demanda.
Na ação civil pública, no entanto, essa autorização não é necessária, porque não se
trata de ação individual ajuizada em nome dos associados, e sim de uma ação coletiva, na
qual a associação é legitimada extraordinária, e não representante processual. Nesse
sentido, veja o que tem entendido o STJ:
A sentença desta ação tem alcance apenas dentro do território em que o juiz que a
prolatou tem competência. Veja os artigos 2º e 2º-A da Lei 9.494/97:
“Art. 2º-A. A sentença civil prolatada em ação de caráter coletivo proposta por
entidade associativa, na defesa dos interesses e direitos dos seus associados,
abrangerá apenas os substituídos que tenham, na data da propositura da ação,
domicílio no âmbito da competência territorial do órgão prolator. (Incluído pela
Medida provisória nº 2.180-35, de 2001)
Parágrafo único. Nas ações coletivas propostas contra a União, os Estados, o
Distrito Federal, os Municípios e suas autarquias e fundações, a petição inicial
deverá obrigatoriamente estar instruída com a ata da assembléia da entidade
associativa que a autorizou, acompanhada da relação nominal dos seus associados
e indicação dos respectivos endereços. (NR) (Incluído pela Medida provisória nº
2.180-35, de 2001).”
O artigo 1º, caput, da Lei 7.347/85 apresenta a legitimidade passiva desta ação:
incumbe aos causadores do dano e beneficiários do ato:
“Art. 1º Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as
ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados: (Redação
dada pela Lei nº 8.884, de 11.6.1994)
l - ao meio-ambiente;
lI - ao consumidor;
III – à ordem urbanística; (Incluído pela Lei nº 10.257, de 10.7.2001)
IV – a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico;
(Renumerado do Inciso III, pela Lei nº 10.257, de 10.7.2001)
V - por infração da ordem econômica e da economia popular; (Redação dada pela
Medida provisória nº 2.180-35, de 2001)
VI - à ordem urbanística. (Redação dada pela Medida provisória nº 2.180-35, de
2001)
Parágrafo único. Não será cabível ação civil pública para veicular pretensões que
envolvam tributos, contribuições previdenciárias, o Fundo de Garantia do Tempo
de Serviço - FGTS ou outros fundos de natureza institucional cujos beneficiários
podem ser individualmente determinados. (Redação dada pela Medida provisória
nº 2.180-35, de 2001).”
A Lei da Ação Civil Pública estabelece o foro competente para esta ação, como se
vê no seu artigo 2º:
“Art. 2º As ações previstas nesta Lei serão propostas no foro do local onde ocorrer
o dano, cujo juízo terá competência funcional para processar e julgar a causa.
Parágrafo único A propositura da ação prevenirá a jurisdição do juízo para todas
as ações posteriormente intentadas que possuam a mesma causa de pedir ou o
mesmo objeto. (Incluído pela Medida provisória nº 2.180-35, de 2001).”
“Súmula 183, STJ: Compete ao juiz estadual, nas comarcas que não sejam sede de
vara da Justiça Federal, processar e julgar ação civil pública, ainda que a União
figure no processo.(*)
(*) Julgando os Embargos de Declaração no CC n. 27.676-BA, na sessão de
08/11/2000, a Primeira Seção deliberou pelo CANCELAMENTO da Súmula n.
183.”
“Súmula 736, STF: Compete à justiça do trabalho julgar as ações que tenham
como causa de pedir o descumprimento de normas trabalhistas relativas à
segurança, higiene e saúde dos trabalhadores.”
1.2.1. Procedimento
O artigo 19 da Lei da Ação Civil Pública indica o rito ordinário como procedimento
a ser seguido nesta ação:
“Art. 19. Aplica-se à ação civil pública, prevista nesta Lei, o Código de Processo
Civil, aprovado pela Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973, naquilo em que não
contrarie suas disposições.”
O artigo 8º da mesma lei dita especificidades a serem seguidas nesta ação, porém:
“Art. 12. Poderá o juiz conceder mandado liminar, com ou sem justificação prévia,
em decisão sujeita a agravo.
§ 1º A requerimento de pessoa jurídica de direito público interessada, e para evitar
grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia pública, poderá o
Presidente do Tribunal a que competir o conhecimento do respectivo recurso
suspender a execução da liminar, em decisão fundamentada, da qual caberá agravo
para uma das turmas julgadoras, no prazo de 5 (cinco) dias a partir da publicação
do ato.
§ 2º A multa cominada liminarmente só será exigível do réu após o trânsito em
julgado da decisão favorável ao autor, mas será devida desde o dia em que se
houver configurado o descumprimento.”
“Art. 11. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou
não fazer, o juiz determinará o cumprimento da prestação da atividade devida ou a
cessação da atividade nociva, sob pena de execução específica, ou de cominação
de multa diária, se esta for suficiente ou compatível, independentemente de
requerimento do autor.”
O artigo 13 da lei em comento trata do destino da verba eventualmente resultante da
condenação:
O artigo 20 da mesma lei trata do regulamento deste fundo, o que veio tratado no
Decreto 92.302/86.
“Art. 20. O fundo de que trata o art. 13 desta Lei será regulamentado pelo Poder
Executivo no prazo de 90 (noventa) dias.”
A ação civil pública não conta com custas, mas por fundamento diverso da ação
popular (a qual tem as custas expressamente elididas pelo artigo 5º, LXXXIII, como visto).
Na ação civil pública, o que leva ao não pagamento de custas é a imunidade tributária. Veja
os artigos 17 e 18 da Lei 7.347/85:
“Art. 17. Em caso de litigância de má-fé, a associação autora e os diretores
responsáveis pela propositura da ação serão solidariamente condenados em
honorários advocatícios e ao décuplo das custas, sem prejuízo da responsabilidade
por perdas e danos. (Renumerado do Parágrafo Único com nova redação pela Lei
nº 8.078, de 1990).”
“Art. 18. Nas ações de que trata esta lei, não haverá adiantamento de custas,
emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras despesas, nem condenação
da associação autora, salvo comprovada má-fé, em honorários de advogado, custas
e despesas processuais. (Redação dada pela Lei nº 8.078, de 1990).”
“Art. 14. O juiz poderá conferir efeito suspensivo aos recursos, para evitar dano
irreparável à parte.”
É claro que, no caso dos agravos de instrumento, esta regra não se aplica, mormente
porque sequer é o juiz, e sim o relator, quem atribui tal efeito ao agravo.
A coisa julgada secundum eventum litis, nesta ação, está no artigo 16 da Lei
7.347/85:
“Art. 16. A sentença civil fará coisa julgada erga omnes, nos limites da
competência territorial do órgão prolator, exceto se o pedido for julgado
improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado
poderá intentar outra ação com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova.
(Redação dada pela Lei nº 9.494, de 10.9.1997).”
O artigo 11da Lei 7.347/85, há pouco abordado, traça a nota geral desta execução,
que geralmente se concentra em obrigações de fazer ou não fazer, combinando-se com o
artigo 461 do CPC:
“Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou
não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o
pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao
do adimplemento. (Redação dada pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994)
§ 1º A obrigação somente se converterá em perdas e danos se o autor o requerer ou
se impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado prático
correspondente. (Incluído pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994)
§ 2º A indenização por perdas e danos dar-se-á sem prejuízo da multa (art. 287).
(Incluído pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994)
§ 3º Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de
ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou
mediante justificação prévia, citado o réu. A medida liminar poderá ser revogada
ou modificada, a qualquer tempo, em decisão fundamentada. (Incluído pela Lei nº
8.952, de 13.12.1994)
§ 4º O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior ou na sentença, impor multa
diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou
compatível com a obrigação, fixando-lhe prazo razoável para o cumprimento do
preceito. (Incluído pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994)
§ 5º Para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado prático
equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas
necessárias, tais como a imposição de multa por tempo de atraso, busca e
apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de
atividade nociva, se necessário com requisição de força policial. (Redação dada
pela Lei nº 10.444, de 7.5.2002)
§ 6º O juiz poderá, de ofício, modificar o valor ou a periodicidade da multa, caso
verifique que se tornou insuficiente ou excessiva. (Incluído pela Lei nº 10.444, de
7.5.2002).”
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
Questão 2
O Ministério Público ingressa com uma Ação Civil Pública em face do Município
de Angra dos Reis e de Caio. Pretende a condenação dos réus ao pagamento de uma
quantia reparatória por dano ambiental sofrido em razão de uma construção de edificação
em área dominial costeira, de proteção ambiental e sem a prévia e necessária licença
municipal, bem como a condenação à promoção integral da recuperação do bem lesado.
Em sede de contestação, alega o primeiro réu que não havia necessidade da licença
ambiental diante do caso concreto e, por isso, o pedido deve ser julgado improcedente. Já
o segundo réu alega que seguiu todas as orientações municipais para que pudesse
construir, não possuindo qualquer responsabilidade e que, caso o pedido seja julgado
procedente, quem deverá arcar com o prejuízo é o ente público, pois nesse caso, ele
também terá sido lesado pelo Município. Merece procedência o pedido do Ministério
Público? Decida fundamentadamente.
Resposta à Questão 2
Tema X
Direito Ambiental Tributário: Políticas Fiscais. Imunidades e Isenções Tributárias. ITR das Unidades de
Conservação. ICMS ecológico ou verde. IPTU de imóveis protegidos. Executivos Fiscais.
Notas de Aula13
preciso haver uma harmonização entre meio ambiente e atividade econômica – o afamado
desenvolvimento sustentável.
A promoção do desenvolvimento sustentável pelas políticas fiscais é feita
sobremaneira pela utilização da extrafiscalidade como instrumento. A extrafiscalidade age
por via de três verbos: agir, estimular e desestimular condutas. O direito tributário tem por
dogma que o tributo não é sanção, mas hoje se tem em conta que há exceções em que,
justamente por ser predominantemente extrafiscal, o tributo assume esta função
sancionatória. A releitura do artigo 3° do CTN, nesta partes, se impõe, diante de institutos
como o IPTU progressivo por descumprimento da função social, por exemplo, do artigo
156, § 1°, da CRFB. Veja:
A isenção tem que ter caráter global, não podendo ser concedida de forma setorial.
Como exemplo, as empresas que se utilizam de material reciclado em determinada
porcentagem recebem incentivo na forma tributação menor do ICMS; ou a utilização de
materiais antipoluentes, que também repercute em menor tributação; ou ainda a alteração
da matriz energética, passando a indústria a consumir álcool ao invés de gasolina, também
favorecendo-se de menor tributação.
O Regulamento do IR, Decreto 3.000/99, nos artigos 609 a 611, trata de incentivos
fiscais nesta seara:
“Artigo 12:
1. Fica definido um mecanismo de desenvolvimento limpo.
2. O objetivo do mecanismo de desenvolvimento limpo deve ser assistir às Partes
não incluídas no Anexo I para que atinjam o desenvolvimento sustentável e
contribuam para o objetivo final da Convenção, e assistir às Partes incluídas no
Anexo I para que cumpram seus compromissos quantificados de limitação e
redução de emissões, assumidos no Artigo 3.
3. Sob o mecanismo de desenvolvimento limpo:
(a) As Partes não incluídas no Anexo I beneficiar-se-ão de atividades de projetos
que resultem em reduções certificadas de emissões; e
(b) As Partes incluídas no Anexo I podem utilizar as reduções certificadas de
emissões, resultantes de tais atividades de projetos, para contribuir com o
cumprimento de parte de seus compromissos quantificados de limitação e redução
de emissões, assumidos no Artigo 3, como determinado pela Conferência das
Partes na qualidade de reunião das Partes deste Protocolo.
4. O mecanismo de desenvolvimento limpo deve sujeitar-se à autoridade e
orientação da Conferência das Partes na qualidade de reunião das Partes deste
Protocolo e à supervisão de um conselho executivo do mecanismo de
desenvolvimento limpo.
5. As reduções de emissões resultantes de cada atividade de projeto devem ser
certificadas por entidades operacionais a serem designadas pela Conferência das
Partes na qualidade de reunião das Partes deste Protocolo, com base em:
(a) Participação voluntária aprovada por cada Parte envolvida;
Casos Concretos
Questão 1
A empresa Ônibus Bom Ltda., sediada no Estado de São Paulo, exerce atividade de
transporte coletivo de passageiros e mantém depósito de combustíveis para execução de
suas atividades. Desta feita, sujeita-se ao recolhimento da Taxa de Controle e Fiscalização
Ambiental instituída naquele estado, cujo fato gerador é o exercício regular do poder de
polícia conferido ao órgão ambiental estadual para controle e fiscalização de atividades
potencialmente poluidoras e utilizadoras de recursos naturais. Inconformada com o
pagamento da referida taxa, a empresa ajuizou ação na qual aduziu os seguintes vícios de
inconstitucionalidade e ilegalidade: a) inexiste consistente atividade de controle e
fiscalização das atividades potencialmente poluidoras e utilizadoras de recursos naturais
por parte do Estado. Sendo assim, a inexistência de fiscalização não configura o efetivo
exercício do poder de polícia; b) a taxa em questão, cobrada em razão da prestação de
serviço público, é inviável em razão da indivisibilidade do serviço de fiscalização
ambiental; e, c) ilegalidade do valor da taxa, cuja base de cálculo tem fundamento no
potencial poluidor, no grau de utilização de recursos naturais e no porte da empresa Com
base nos argumentos aduzidos pela empresa, comente sobre a constitucionalidade da Taxa
de Controle e Fiscalização Ambiental (TCFA) no Estado de São Paulo.
Resposta à Questão 1
O poder de polícia pode ser potencial, justificando a taxa, não precisando ser
efetivo. Ademais, a individualização do contribuinte é perfeitamente possível, in casu,
havendo até mesmo uma tabela estabelecendo o valor de taxas por porte do contribuinte.
A respeito, veja o seguinte julgado do STF:
Tema XI
Notas de Aula14
“Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem
de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder
Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e
futuras gerações.
(...)
14
Aula ministrada pelo professor Sávio Renato Bitencourt Soares Silva, em 17/12/2009.
impedir a aplicação de uma sanção mais grave, e mais correta, pelo ente superior, aplicando
sanção baseada na legislação inferior que se demonstra insuficiente. Já houve caso concreto
em que um enorme derramamento de óleo, no Estado do Rio de Janeiro, despertaria multa
de vinte mil reais se aplicada a legislação estadual; omitindo-se o Estado, deu lugar à
União, na figura do Ibama, aplicar multa mais condizente, de cinquenta milhões de reais.
A responsabilidade administrativa também pressupõe o devido processo legal, sendo
necessária a atenção à ampla defesa administrativa, nos moldes destes princípios oriundos
do poder jurisdicional. Além disso, o acesso à justiça é também garantido, caso a imposição
da sanção seja considerada irregular por aquele que tem-se prejudicado. Assim, a
legalidade, a competência e a atenção ao devido processo legal – este último manifestado
na ampla defesa, no contraditório, e na possibilidade de recursos – conformam a
responsabilização administrativa.
Como já se disse, a responsabilidade administrativa é objetiva, tal qual a cível. Três
são os pressupostos da responsabilidade objetiva: o ato, a conduta ou fato; o dano; e o nexo
causal. É claro que, objetiva que é, esta imputação dispensa a comprovação de culpa de
qualquer sorte. O fato de a atividade ser lícita e licenciada é irrelevante, se for causado um
dano ambiental. Como se verá, na responsabilidade criminal pelo dano ambiental, é
imperativo se perquirir da culpa ou dolo do agente, eis que se trata de responsabilidade
essencialmente subjetiva.
O artigo 14, § 1°, da Lei 6.938/81, já abordado, é a sede da responsabilidade
objetiva ambiental na esfera cível, pois a Lei 9.605/98 teve seus dispositivos que tratavam
do tema vetados, mantendo-se aplicável esta norma anterior. Há ainda algumas normas de
cunho cível na Lei 9.605/98, que escaparam ao veto, como a desconsideração da
personalidade jurídica para ressarcimento de danos, prevista no artigo 4° desta lei. Veja os
dispositivos:
“Art. 14 - Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal, estadual
e municipal, o não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou
correção dos inconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade
ambiental sujeitará os transgressores:
(...)
§ 1º Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor
obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os
danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O
Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de
responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente.
(...)”
“Art. 4º Poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade
for obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados à qualidade do meio
ambiente.”
“Art. 70. Considera-se infração administrativa ambiental toda ação ou omissão que
viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio
ambiente.
§ 1º São autoridades competentes para lavrar auto de infração ambiental e instaurar
processo administrativo os funcionários de órgãos ambientais integrantes do
Sistema Nacional de Meio Ambiente - SISNAMA, designados para as atividades
de fiscalização, bem como os agentes das Capitanias dos Portos, do Ministério da
Marinha.
§ 2º Qualquer pessoa, constatando infração ambiental, poderá dirigir representação
às autoridades relacionadas no parágrafo anterior, para efeito do exercício do seu
poder de polícia.
§ 3º A autoridade ambiental que tiver conhecimento de infração ambiental é
obrigada a promover a sua apuração imediata, mediante processo administrativo
próprio, sob pena de co-responsabilidade.
§ 4º As infrações ambientais são apuradas em processo administrativo próprio,
assegurado o direito de ampla defesa e o contraditório, observadas as disposições
desta Lei.”
I - advertência;
II - multa simples;
III - multa diária;
IV - apreensão dos animais, produtos e subprodutos da fauna e flora, instrumentos,
petrechos, equipamentos ou veículos de qualquer natureza utilizados na infração;
V - destruição ou inutilização do produto;
VI - suspensão de venda e fabricação do produto;
VII - embargo de obra ou atividade;
VIII - demolição de obra;
IX - suspensão parcial ou total de atividades;
X – (VETADO)
XI - restritiva de direitos.
§ 1º Se o infrator cometer, simultaneamente, duas ou mais infrações, ser-lhe-ão
aplicadas, cumulativamente, as sanções a elas cominadas.
§ 2º A advertência será aplicada pela inobservância das disposições desta Lei e da
legislação em vigor, ou de preceitos regulamentares, sem prejuízo das demais
sanções previstas neste artigo.
§ 3º A multa simples será aplicada sempre que o agente, por negligência ou dolo:
I - advertido por irregularidades que tenham sido praticadas, deixar de saná-las, no
prazo assinalado por órgão competente do SISNAMA ou pela Capitania dos
Portos, do Ministério da Marinha;
II - opuser embaraço à fiscalização dos órgãos do SISNAMA ou da Capitania dos
Portos, do Ministério da Marinha.
§ 4° A multa simples pode ser convertida em serviços de preservação, melhoria e
recuperação da qualidade do meio ambiente.
§ 5º A multa diária será aplicada sempre que o cometimento da infração se
prolongar no tempo.
§ 6º A apreensão e destruição referidas nos incisos IV e V do caput obedecerão ao
disposto no art. 25 desta Lei.
§ 7º As sanções indicadas nos incisos VI a IX do caput serão aplicadas quando o
produto, a obra, a atividade ou o estabelecimento não estiverem obedecendo às
prescrições legais ou regulamentares.
§ 8º As sanções restritivas de direito são:
I - suspensão de registro, licença ou autorização;
II - cancelamento de registro, licença ou autorização;
III - perda ou restrição de incentivos e benefícios fiscais;
IV - perda ou suspensão da participação em linhas de financiamento em
estabelecimentos oficiais de crédito;
V - proibição de contratar com a Administração Pública, pelo período de até três
anos.”
“Art. 18. A multa será calculada segundo os critérios do Código Penal; se revelar-
se ineficaz, ainda que aplicada no valor máximo, poderá ser aumentada até três
vezes, tendo em vista o valor da vantagem econômica auferida.”
“Art. 75. O valor da multa de que trata este Capítulo será fixado no regulamento
desta Lei e corrigido periodicamente, com base nos índices estabelecidos na
legislação pertinente, sendo o mínimo de R$ 50,00 (cinqüenta reais) e o máximo
de R$ 50.000.000,00 (cinqüenta milhões de reais).”
Casos Concretos
Questão 1
João Manhoso opôs embargos à execução fiscal ajuizada pelo Estado do Rio
Grande do Sul pretendendo a anulação de multa aplicada em razão da ocorrência de
infração administrativa ambiental consistente no desmatamento ocorrido em área de
Proteção Ambiental localizada dentro de sua fazenda. Aduz que o respectivo auto de
infração, formalizado em 2004, que deu origem à certidão de dívida ativa nº 99/05
decorreu do corte de duas árvores nativas, por terceiros, sem a pertinente autorização do
órgão fiscalizador. Acrescenta, ainda, que a respectiva área, por ocasião do corte ilegal,
não era ocupada pelo embargante, encontrando-se em estado de abandono, razão pela
qual não pode ser responsabilizado. O Estado, por sua vez, rebate os argumentos
defensivos, aduzindo que a responsabilidade do embargante é fruto da culpa in vigilando
decorrente da obrigação de preservação ambiental da respectiva área. Decida
fundamentadamente a questão, esclarecendo acerca da natureza da responsabilidade civil
decorrente de danos causados ao meio ambiente.
Resposta à Questão 1
Questão 2
Uma empresa de petróleo foi multada pelo IBAMA e pelo INEA (Instituto Estadual
do Ambiente) pelo mesmo fato, qual seja um vazamento de óleo de um tanque de
armazenamento de combustível numa ilha da Baía de Guanabara, poluindo o mar, as
praias e os rios da Área de Proteção Ambiental de Guapimirim. De acordo com a
Constituição Federal e com base na legislação sobre a matéria, quais desses órgãos
ambientais teriam competência para fiscalizar e para multar pelos danos ambientais
causados? O poluidor deverá pagar as duas ou apenas uma das multas aplicadas?
Fundamente e justifique as respostas.
Resposta à Questão 2
A empresa será multada pelos dois entes, mas não é obrigada a pagar duas multas.
Isto porque ambos têm competência para fiscalizar e multar, mas a multa emitida pelo ente
menor é prioritária ao superior – pagando a multa estadual, a federal perde exigibilidade, na
forma do artigo 76 da Lei 9.605/98.
Sendo a competência administrativa comum da União e dos Estados para proteger o
meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas, nos termos do artigo 23,
inciso VI, da Constituição Federal, tanto o IBAMA, como o INEA, órgão ambiental federal
e estadual, respectivamente, têm competência para fiscalizar e multar pelos danos causados,
independentemente da titularidade dos bens atingidos, mas o poluidor deverá pagar apenas
uma das multas, porque o pagamento da multa estadual substitui a federal pelo mesmo fato,
a fim de evitar-se o bis in idem na mesma esfera de responsabilidade, nos termos dos arts.
76 da Lei Federal 9.605/98 e 12 do Decreto Federal 6.514/08.
Tema XII
Tutela Penal Ambiental: Tipos penais. Aplicação de penas alternativas. Responsabilidade penal da pessoa
jurídica. Crimes em espécie. O Ministério Público e o Poder Judiciário na tutela penal ambiental
Notas de Aula15
O artigo 225, § 3°, da CRFB, é a sede constitucional deste tema, pelo que vale a
pena revisitá-lo:
“Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem
de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder
Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e
futuras gerações.
(...)
§ 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os
infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas,
independentemente da obrigação de reparar os danos causados.
(...)”
Está bem claro, ali, que o constituinte impôs a responsabilidade integral ambiental,
administrativa, cível e penal, à pessoa natural e à pessoa jurídica. O bem jurídico ambiental
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Aula ministrada pelo professor Diogo Rudge Malan, em 17/12/2009.
é tão relevante que o constituinte optou por levar a cabo a mais ampla imputação possível,
em tripla esfera, a fim de demonstrar a severidade com que encara os danos ambientais, e,
como a maior parte dos danos ao meio ambiente são perpetrados por empresas, não poderia
deixar de incluí-las no alvo da punição penal.
É fato que as pessoas jurídicas, em si, não são as agentes do dano: são as pessoas
naturais que por ela atuam. Contudo, estas pessoas causam o dano se valendo de toda a
estrutura e da persona da pessoa jurídica, e como há uma separação absoluta entre
personalidades natural e jurídica, entre sócios ou representantes legais e a própria
sociedade, não seria sistêmico permitir que pessoas naturais, agindo isoladamente em nome
próprio, fossem penalmente responsáveis, e as mesmas pessoas naturais, atuando em nome
ou no interesse de uma pessoa jurídica, permitissem que esta entidade abstrata escapasse às
penas criminais.
Do ponto de vista da filosofia do direito, o que fundamenta a responsabilidade penal
da pessoa jurídica é a teoria da realidade, orgânica ou organicista. Esta teoria, do direito
alemão, interpreta a pessoa jurídica como uma realidade social, capaz de exercer direitos e
contrair obrigações, manifestando vontade própria e autônoma e independente, em relação
às respectivas vontades de seus representantes. Como tal, deve responder por seus atos
voluntários, sendo perfeitamente possível considerar-se que seja imputável em todas as
esferas. O artigo 3° da Lei 9.605/98 reforça esta autonomia, a teoria organicista, que a
CRFB positivou:
Tais são os requisitos para a imputação penal da pessoa jurídica, conforme este
dispositivo supra: que haja um ato decisório praticado por pessoa natural representante
legal ou contratual, ou de órgão colegiado da pessoa jurídica; que este ato se configure
como infração ambiental típica; e que deste ato haja benefício à pessoa jurídica.
Note, portanto, que o ato de um gerente, que não seja o representante legal ou
contratualmente eleito, não pode ser imputado à pessoa jurídica: este gerente será
responsabilizado solo pelo crime ambiental. Da mesma forma, se o fato típico ambiental for
praticado, agora sim, por um representante da sociedade, mas não reverteu em benefício da
pessoa jurídica, esta também não será imputada criminalmente.
A jurisprudência tem debatido a responsabilização criminal da pessoa jurídica desde
quando introduzida em nosso ordenamento. O STJ já se manifestou contrário a esta
imputabilidade, baseando-se exatamente na teoria oposta à da realidade ou orgânica: a
teoria da ficção jurídica, de Savigny. Segundo esta teoria, a pessoa jurídica não existe no
mundo fático, mas apenas no mundo das idéias, abstratamente; como tal abstração, não
pode ser concebível que uma ficção possa agir por conta própria, agindo sempre por
intermédio da vontade de seus representantes. Não há conduta da pessoa jurídica: a conduta
é da pessoa natural que a representa, e como não há conduta da própria entidade, esta não
pode ser imputada – nullum crimen sine conduta. Esta é, de fato, a tese amplamente
majoritária na doutrina criminalista, que refuta fortemente a imputação direta da pessoa
jurídica.
Mas o artigo 225, § 3°, da CRFB, está aí, conferindo esta incriminação da pessoa
jurídica. Quem refuta esta imputabilidade diz que este dispositivo deve sofrer interpretação
sistemática, sobremaneira diante dos princípios penais inscritos no artigo 5° da CRFB,
como a culpabilidade, a responsabilidade penal subjetiva, e outros, que definem a dinâmica
da responsabilidade criminal no Brasil. Dentre todos, o princípio da intranscendência da
pena merece destaque: a pena não pode ultrapassar a pessoa do criminoso, e, sendo assim, a
condenação da pessoa jurídica afetará o patrimônio não só dela, mas de todos que nela têm
investido, mesmo nada tendo a ver com o fato criminoso (funcionários ou acionistas de
uma S/A, por exemplo).
Debalde esta decisão do STJ, do Ministro Gilson Dipp, refutando a imputabilidade
criminal da pessoa jurídica, a jurisprudência é hoje francamente majoritária em admitir esta
responsabilidade. Em verdade, o próprio Ministro relator deste acórdão mudou seu
entendimento desde então, ele próprio passando a admitir como legítima e possível a
responsabilidade criminal societária, quando preenchidos os mencionados requisitos do
artigo 3° da Lei dos Crimes Ambientais.
A pessoa jurídica, porém, não pode jamais figurar isoladamente no pólo passivo de
uma ação penal condenatória. Isto porque o representante que praticou o ato em nome da
pessoa jurídica também terá, necessariamente, que ser responsabilizado pessoalmente pelo
fato típico que praticou: a imputação da pessoa jurídica não exclui a do representante. O
que vige hoje, portanto, de forma pacífica, nos crimes ambientais, é o sistema da dupla
imputação, ou coautoria necessária, quando a pessoa jurídica for responsabilizável pelo
ato. Trata-se da chamada responsabilidade penal por ricochete, em que a prática do ato
pelo representante legal ricocheteia na pessoa jurídica.
É claro que, quando os requisitos de responsabilização da sociedade não estiverem
preenchidos, ou seja, a pessoa jurídica não for imputável, não será esta posta no pólo
passivo: apenas a pessoa natural responderá pelo crime, não havendo o ricochete na pessoa
jurídica. A sociedade não pode ser imputada isoladamente pelo crime ambiental, porque
esta imputação necessariamente decorre de ato da pessoa natural, que responderá em
coautoria; mas a pessoa natural pode responde sozinha pelo crime ambiental, se não houver
esta repercussão sobre a pessoa jurídica, decorrente da presença dos três requisitos da
imputação, constantes do artigo 3°, supra.
O habeas corpus não pode ser usado em defesa da pessoa jurídica, como paciente,
pela simples razão de que não existe o bem jurídico protegido por este remédio
constitucional quando se está tratando de uma pessoa jurídica: não existe liberdade
ambulatorial a ser resguardada, porque sociedades não são corpos que produzam
movimento. A respeito, veja o HC 92.921, do STF:
“Art. 23. A prestação de serviços à comunidade pela pessoa jurídica consistirá em:
I - custeio de programas e de projetos ambientais;
II - execução de obras de recuperação de áreas degradadas;
III - manutenção de espaços públicos;
IV - contribuições a entidades ambientais ou culturais públicas.”
Uma crítica que se faz é que estas sanções não precisariam do direito penal para
serem aplicadas: o próprio direito administrativo permite estas penalidades, sem o rigor
típico do direito penal – o que seria uma afronta à característica ultima ratio deste ramo do
direito.
A Lei 9.605/98 contém uma variada tipologia de normas penais em branco. Veja um
exemplo claro, o artigo 54, § 2°, V:
“Art. 54. Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou
possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de
animais ou a destruição significativa da flora:
Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.
(...)
§ 2º Se o crime:
(...)
V - ocorrer por lançamento de resíduos sólidos, líquidos ou gasosos, ou detritos,
óleos ou substâncias oleosas, em desacordo com as exigências estabelecidas em
leis ou regulamentos:
Pena - reclusão, de um a cinco anos.”
A denúncia deve narrar e identificar todos os requisitos do citado artigo 3°, sob pena
de inépcia.
Esta posição está longe de ser pacífica, porém, sendo absolutamente majoritário no
STJ o entendimento de que a independência das instâncias prevalece – o TAC não impede o
curso da ação criminal.
1.3. Competência
“Art. 26. Nas infrações penais previstas nesta Lei, a ação penal é pública
incondicionada.
Parágrafo único. (VETADO).”
Questão 1
Resposta à Questão 1
Questão 2
Guerra Peixe foi denunciado por infração aos artigos 38 e 39 da Lei 9.605/98, que
tipificam as condutas de destruir floresta de preservação permanente, mesmo que em
formação, e cortar árvores em floresta considerada de preservação permanente, sem a
devida permissão da autoridade competente. Em sua defesa aduziu que não agiu com dolo
e nem com culpa, pois sua finalidade era apenas a de limpar a área de uma antiga estrada
abandonada por mais de 20 anos. Acrescentou, ainda, que obteve licença junto à
Prefeitura de São João do Rio Branco para realizar a pretendida limpeza. O laudo pericial
elaborado comprovou os danos ambientais conseqüentes à atividade de desmatamento e de
remoção de terras. Os documentos apresentados retratam a existência de autorização
municipal para a realização de limpeza na área, com a advertência de que não seria
permitido o corte das árvores existentes no local. Como magistrado, decida a questão.
Resposta à Questão 2
Questão 3
José Carlos, sócio-gerente da empresa “Polui Bem Ltda.”, foi denunciado pela
conduta descrita no artigo 54, §2º, inc. II, in fine c/c art. 15, inc. II, “a” e art. 54, § 2º, inc.
V c/c art. 15, inc. II, “a”, todos da lei 9.605/98 na forma do artigo 70 do CP. Em razão
disso, impetrou habeas corpus para trancar a ação penal, com fundamento na alegação de
que os fatos narrados na denúncia ocorreram antes da vigência da Lei 9.605/98. Responda
fundamentadamente se a ordem deve ser deferida.
Resposta à Questão 3
Questão 4
João Tigre foi indiciado pela prática do delito previsto no artigo 31 da Lei 9.605/98
(introdução sem licença de espécie animal no país) uma vez que mantinha em cativeiro
animais da fauna exótica, em desacordo com a Instrução Normativa nº 2/2001 do IBAMA,
autarquia responsável pela expedição de autorização de ingresso e posse desse tipo de
animal. Com fundamento na jurisprudência dos Tribunais Superiores, esclareça acerca da
competência para deflagração da ação penal.
Resposta à Questão 4