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FACULDADE TEOLÓGICA NACIONAL

DISCIPLINA

BATALHA ESPIRITUAL
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Faculdade e Seminário Teológico Nacional
Ensino à Distância

CAPÍTULO 1

VERDADES E MENTIRAS SOBRE BATALHA ESPIRITUAL

Eles atravessaram o mar e foram para a região dos gerasenos. Quando Jesus
desembarcou, um homem com um espírito imundo veio dos sepulcros ao seu encontro.
Esse homem vivia nos sepulcros, e ninguém conseguia prendê-lo, nem mesmo com
correntes; pois muitas vezes lhe haviam sido acorrentados pés e mãos, mas ele
arrebentara as correntes e quebrara os ferros de seus pés. Ninguém era suficientemente
forte para dominá-lo. Noite e dia ele andava gritando e cortando-se com pedras entre os
sepulcros e nas colinas.

Quando ele viu Jesus de longe, correu e prostrou-se diante dele, e gritou em alta voz: “Que
queres comigo, Jesus, Filho do Deus Altíssimo? Rogo-te por Deus que não me
atormentes!” Pois Jesus lhe tinha dito: “Saia deste homem, espírito imundo!” Então Jesus
lhe perguntou: “Qual é o seu nome?”

“Meu nome é Legião”, respondeu ele, “porque somos muitos.” E implorava a Jesus, com
insistência, que não os mandasse sair daquela região. Uma grande manada de porcos
estava pastando numa colina próxima. Os demônios imploraram a Jesus: “Manda-nos para
os porcos, para que entremos neles”. Ele lhes deu permissão, e os espíritos imundos
saíram e entraram nos porcos. A manada de cerca de dois mil porcos atirou-se precipício
abaixo, em direção ao mar, e nele se afogou. Os que cuidavam dos porcos fugiram e
contaram esses fatos na cidade e nos campos, e o povo foi ver o que havia acontecido.

Marcos 5.1-14

Quando estamos diante do assunto “batalha espiritual”, devemos considerar que o maior
milagre de Jesus Cristo é a salvação do pecador – que, após encontrar-se com Ele, nasce
de novo, é transformado e recebe uma nova vida. Neste capítulo, abordaremos a ação do
Maligno por meio da atuação dos demônios, bem como a doutrina sobre a libertação
desses espíritos imundos, o que há de verdades bíblicas sobre o assunto e muitos dos
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absurdos que vêm sendo praticados, em nome dessa guerra, em alguns setores da Igreja
brasileira.

Esta reflexão não tem o objetivo de ofender, entristecer ou até mesmo alarmar quem quer
que seja. Porém, trataremos de um assunto que tem pouca referência bíblica, em virtude
da pequena importância que as próprias Escrituras dão ao tema. Acredite, você que dedica
muito tempo do seu ministério a isso: essa não é a ênfase central da Palavra de Deus.
Curiosamente, no entanto, muitas pessoas fazem teologias imensas sobre o assunto,
enquanto a própria Bíblia Sagrada apenas pontua algumas questões.

Portanto, abordaremos este tema com o firme propósito de esclarecer os irmãos e as irmãs
na fé, visto que há muitas doutrinas erradas sendo divulgadas por aí. Diversas pessoas
são influenciadas de maneira equivocada e aplicam determinados ensinamentos sem uma
observação bíblica do assunto. Este é um erro muito comum: repetir o que outra pessoa
fala ou faz sem analisar o tema na verdadeira fonte de autoridade que é a Palavra de
Deus. Como cristãos, precisamos ter o hábito de examinar tudo à luz das Sagradas
Escrituras.

Se depositarmos a nossa confiança em pessoas, por mais influentes ou inteligentes que


sejam, cometeremos o erro de conferir autoridade a alguém que é falho, pois o ser humano
é imperfeito. Toda autoridade espiritual que um indivíduo tenha deve vir, exclusivamente,
da Bíblia Sagrada, não das próprias experiências. Essas servem para endossar o
argumento bíblico, ou seja, devem ser usadas como ilustração, sempre centradas na
Palavra. A pregação do Evangelho deve ser fundamentalmente bíblica e não extraída de
passagens pinçadas aleatoriamente. E a justificativa está no fato de que alguns trechos da
Bíblia, por serem empregados de modo superficial e isolado, acabam servindo de base
para os mais variados tipos de heresia.

DISTORÇÕES BÍBLICAS

Allan Kardec (pseudônimo do francês Hippolyte Léon Denizard Rivail, o mentor do


espiritismo denominado “kardecista”, em sua homenagem) fez uso de vários trechos dos
evangelhos para fundamentar doutrinas sem nenhuma
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ligação com o que as Escrituras realmente dizem. Um exemplo é a passagem de João


14.2, em que Jesus declara: “Na casa de meu Pai há muitas moradas; se não fosse assim,
eu volo teria dito; vou preparar-vos lugar” (ARA). Os espíritas utilizam esse versículo para
justificar a possibilidade de inúmeras encarnações. Na verdade, o que Jesus disse é que
na casa do Pai há lugar para muitas pessoas, para todos os que venham a crer no
Cordeiro de Deus como Senhor e Salvador. Cristo fez a promessa de que iria preparar uma
casa para cada um de nós, sendo-lhe necessário partir para completar a obra do Senhor,
que nos aguarda na eternidade. Entretanto, tirada do seu contexto e aliada a falsos
argumentos, essa passagem torna-se uma heresia.

Outro exemplo são as Testemunhas de Jeová, que acrescentam ao versículo de João 1.1
uma pequena palavra que muda bastante o sentido do texto. Observe: “No princípio era o
Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era um Deus”. Com a inclusão do termo
“um”, a divindade de Jesus Cristo é negada. É uma pequena mudança que, vinculada a
afirmativas enganosas, faz parecer verdade o que, na realidade, é mentira.

Precisamos entender que o que realmente importa não é considerar quem está
transmitindo a mensagem, mas se o que está sendo dito de fato está escrito na Palavra de
Deus. O expositor da Palavra pode ser respeitado como uma das maiores autoridades do
mundo, porém, se o que estiver pregando não for bíblico, de nada vale. Não se deixe
impressionar por aqueles que se expressam muito bem, que têm belos discursos ou são
famosos. Se Jesus tivesse buscado sucesso pessoal, não teria nascido em Belém, mas em
Roma, que era a grande cidade da sua época. O poder de Deus não precisa de
publicidade, mas deve ser pregado por seus filhos conforme a soberania do Senhor. Dessa
forma, é necessário estudarmos a Palavra e o pano de fundo histórico de toda essa
situação.

SAÍRAM DE NÓS MAS NÃO ERAM DE NÓS

Grande parte das práticas de libertação utilizadas hoje em dia é condenável e sem
embasamento bíblico. No Brasil, elas surgiram no final da década de 1970 e início de
1980, por intermédio de homens que se converteram na Igreja Pentecostal de Nova Vida,
atual Igreja Cristã Nova Vida (ICNV). Dois deles se tornaram muito famosos e são
conhecidos em todo o território nacional em virtude dos seus programas de televisão.
(Timóteo 3.16,17)
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Em um determinado evento a que compareci ouvi a conversa de algumas pessoas, na qual


uma delas afirmava que esses dois homens foram discípulos do Bispo Roberto McAlister,
fundador da Igreja Cristã Nova Vida. Quase me pronunciei, pois esses dois indivíduos, na
verdade, foram afastados da ICNV por defenderem ideias e doutrinas não abraçadas por
nossa igreja. Na época, eles pediram ao Bispo Roberto autorização para iniciar um
trabalho de libertação – nos moldes que realizam hoje – a qual lhes foi negada. Por causa
disso, se rebelaram, saíram da Nova Vida e fundaram uma igreja. Algum tempo depois,
eles se desentenderam e um deles fundou a própria denominação.

Não cabe aqui nenhum tipo de comentário positivo ou negativo sobre o fato. Eles
procederam conforme aquilo em que acreditavam. Todavia, essa fé nunca foi corroborada
pelo fundador da Igreja Cristã Nova Vida. Pelo contrário, desde o início a realização de
práticas sem base bíblica foi combatida e rejeitada nas igrejas da nossa denominação.

O MOVIMENTO DE GUERRA ESPIRITUAL

Outra questão que rende muita discussão a respeito dessas “teologias sobre demônios”
(por mais paradoxal que seja essa expressão) é o movimento de guerra espiritual que
surgiu na América do Norte por volta da década de 1980. Esse movimento chegou ao
Brasil quase na mesma época e foi abraçado por alguns que promoveram uma série de
preceitos e ensinamentos que não procedem da Bíblia Sagrada.

A escritora Rebecca Brown (pseudônimo da ex-médica Ruth Irene Bailey, que teve sua
licença médica cassada por imperícia e medicação imprópria a seus pacientes) escreveu
um livro sobre a hierarquia demoníaca. Ela relatou ter tido uma experiência espiritual, em
que foi ao inferno e fez uma entrevista com Satanás. Durante o tal encontro, o Diabo lhe
teria revelado, sem o menor problema, toda a hierarquia infernal. O feito seria o mesmo
que perguntar a Osama Bin Laden quais seriam os próximos ataques da Al-Qaeda. Você
acredita que ele divulgaria tais informações? Agora, imagine Satanás, o pai da mentira,
tornando conhecida toda a sua estratégia! Amado leitor, o Diabo não tem nada a nos
ensinar.

As Escrituras nos previnem de que nos últimos tempos pessoas obedeceriam a ensinos de
demônios: “O Espírito diz claramente que nos últimos tempos alguns abandonarão a fé e
seguirão espíritos enganadores e doutrinas de demônios” (1 Timóteo 4.1). Apostasia
significa “abandonar a fé”. No caso das pessoas que pregam tal teologia, como citamos
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acima, a consequência é a mesma. A Bíblia reprova esse tipo de ensinamento, porque o


Diabo é o pai da mentira.( João 8.44)

SATANÁS É UM ATOR COADJUVANTE

A Palavra de Deus é o nosso único referencial. Não podemos nos pautar em experiências
humanas, muito menos em orientações demoníacas, porque, no que diz respeito às coisas
espirituais, a autoridade máxima é a Palavra do Senhor:

Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a
correção e para a instrução na justiça, para que o homem de Deus seja apto e plenamente
preparado para toda boa obra.

Para estarmos aptos a fazer “toda boa obra”, é necessário o ensino, a instrução e a
correção da Palavra. Deus recomendou a Josué que zelasse por viver totalmente de
acordo com o Livro da Lei, sem nenhum desvio para a direita ou para a esquerda, a fim de
que fosse bem-sucedido.

Somente seja forte e muito corajoso! Tenha o cuidado de obedecer a toda a lei que o meu
servo Moisés lhe ordenou; não se desvie dela, nem para a direita nem para a esquerda,
para que você seja bem-sucedido por onde quer que andar. Não deixe de falar as palavras
deste Livro da Lei e de meditar nelas de dia e de noite, para que você cumpra fielmente
tudo o que nele está escrito. Só então os seus caminhos prosperarão e você será bem-
sucedido.

Josué 1.7,8

A Bíblia não oferece muitas informações sobre o Diabo, apenas o suficiente para
compreendermos a sua atuação. É até explicável, já que o tema das Escrituras é a história
da redenção do ser humano que caiu, por meio de Adão. Satanás é um ator coadjuvante: o
enganador, o trapaceiro, o que instigou Eva a pecar. A causa da queda do homem foi a
desobediência, cujos atores principais foram o casal Adão e Eva.( Gênesis 3) Eles podiam
simplesmente ter repreendido a serpente e obedecido ao Senhor. Por isso, podemos tirar a
seguinte conclusão: o pior inimigo do homem é o próprio homem. Os únicos que podem
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destruir a nossa vida espiritual somos nós mesmos. Quem não tem amor o bastante para
obedecer a Deus cai nas ideias e ciladas do Diabo.

A ênfase da Palavra está no relacionamento do homem com o Criador, no relacionamento


de fé e obediência. Quando destacamos demasiadamente o Inimigo, estamos
endeusando-o, conferindo-lhe um valor que ele não tem nem merece. Isso o faz parecer
poderoso e determinante, algo que ele também não é, pois é mentiroso e enganador.
Determinante é alguém que define algo e faz com que as coisas aconteçam. Quem faz isso
é Deus. De certo modo, também temos essa atitude quando somos desobedientes e
praticamos ações erradas, pecando e prescrevendo assim a nossa própria queda.

O QUE REALMENTE IMPORTA

A Bíblia ensina na medida certa o que precisamos saber sobre o Adversário. Então,
deixemos de lado as especulações, que só geram mistificações inúteis, como
interrogatórios a demônios e outras ações do tipo. Isso desvia o nosso foco daquilo que de
fato importa, que é a nossa relação com o Pai mediante a Palavra da Verdade.

Deus é o Criador de todas as coisas e de todos os seres. É o Único que detém o poder de
criação. Uma das leis científicas existentes afirma: “Na natureza nada se cria, nada se
perde, tudo se transforma”.5 Realmente, depois que Deus criou não existe mais criação,
apenas transformação, elaboração ou combinação dos elementos já formados. A Bíblia
afirma no livro de Gênesis 1.31a: “E Deus viu tudo o que havia feito, e tudo havia ficado
muito bom”. É provável que você então se pergunte: “Se tudo o que o Pai fez era bom,
quem criou Satanás?”. A resposta é fácil: Deus o criou. Mas é necessário observar que o
Senhor o criou como um ser bom, para servir diante dele, o Criador. O esclarecimento a
ser feito aqui é que o Altíssimo criou o anjo que viria a ser quem conhecemos como
Satanás para boas obras, mas ele possuía livre-arbítrio e escolheu tornar-se maligno.

Deus é criador, o Diabo não. Logo, para fazer suas obras malignas, ele utiliza o que o
Criador já fez, pervertendo o seu sentido pelo engano do pecado. Quando o Senhor criou o
Jardim do Éden, confiou o governo desse local ao homem. Alguns dizem que o homem, na
sua desobediência, entregou esse governo a Satanás. Na verdade, o governo foi tomado.
O Diabo fez uso dos elementos da Criação para influenciar o homem, a quem Deus tinha
dado autoridade sobre a natureza. Dessa forma, o Inimigo das nossas almas opera sobre a
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Terra por intermédio das pessoas que, pelo pecado e o afastamento do Senhor, se deixam
usar por ele.

5 Frase atribuída ao químico francês Antoine Laurent Lavoisier (1743–1794), considerado


o pai da química moderna.

Se o homem tivesse permanecido em obediência, ainda estaríamos num local com as


características do Éden, fazendo uso da natureza de maneira sábia. No entanto, quem
destrói a Criação é o próprio ser humano, inspirado na sua corrupção pelo Maligno. O
Diabo não tem poderes de, por exemplo, causar uma tempestade. Tal poder pertence a
Deus. Porém, ele pode possuir uma pessoa e levá-la a cometer barbaridades ou pode
enganar nações com falsas doutrinas. O poder do Inimigo é o do engano, utilizando os
elementos da Criação.

Após criar o mundo, o Altíssimo deu autoridade ao homem para governá-lo. O Diabo
consegue agir neste mundo por meio do ser humano, pois como o Maligno não é deste
mundo e não pode agir aqui, o faz por intermédio de alguém. E, justamente por causa
disso, a Bíblia nos orienta a não dar espaço para o mal.

MENTIRAS E VERDADES

O texto-base deste capítulo, Marcos 5.1-14, que fala sobre o jovem endemoninhado, é
usado para justificar uma série de erros sobre o assunto. Em todas as outras ocasiões em
que Jesus e os discípulos expulsaram demônios, eles apenas disseram: “Em nome de
Jesus, sai!”, ou utilizaram uma frase simples. Ninguém fez entrevista com o Diabo ou
perguntou o nome dele. O registro bíblico mostra apenas essa situação no Evangelho de
Marcos. Com base nesse texto, alguns afirmam que perguntar o nome do demônio dá
autoridade sobre o espírito maligno. No entanto, essa era uma crença egípcia. Tanto que
cada faraó, ao assumir o reino, se não gostasse do seu antecessor, apagava o seu nome
para eliminar a sua autoridade e a sua influência.
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A questão de saber ou não o nome dos demônios ou a sua origem é totalmente


desnecessária. A Bíblia Sagrada nos orienta a nem sequer pronunciar o nome deles: “Não
invoquem os nomes dos seus deuses” (Josué 23.7b). O texto se refere aos falsos deuses.
E alguns dos espíritos imundos ocupam essa posição. Não dizer o nome é para não dar
popularidade a eles. Ou seja, no momento da libertação não é necessário dizer o nome de
demônio nenhum, basta repreendê-lo no nome santo e poderoso de Jesus Cristo.

O que deve ser feito é apenas identificar o motivo da possessão, como, por exemplo,
espírito de prostituição ou espírito de mentira. Não existe nenhuma informação do Diabo
que nos seja útil. O que ele diz não traz entendimento, pelo contrário, só confunde. O
objetivo de Satanás pode ser expresso com a frase: “Falem mal ou falem bem, mas falem
de mim!”. Então não dê notoriedade ao Inimigo ou faça qualquer divulgação dele.

Quando Jesus chegou à província dos gerasenos, veio ao seu encontro um homem
terrivelmente endemoninhado. Observe as características do rapaz: não morava em uma
casa, vivia ao relento ou dentro de covas; andava sem roupas, gritando maldições e
aberrações; feria-se com pedras e todo tipo de objeto; era totalmente antissocial,
transtornado pela ação maligna que sobre ele estava. O primeiro fato espiritual aconteceu
quando esse homem correu em direção a Jesus: “Que queres comigo, Jesus, Filho do
Deus Altíssimo? Rogo-te por Deus que não me atormentes!”.( Marcos 5.7) Em outras
palavras, os demônios estavam dizendo: “Não temos nada com você! Não nos atormente!”.
O Diabo tem noção do plano do Senhor já revelado. O plano divino inclui o fato de que
Satanás será lançado no lago de fogo e enxofre no Juízo Final.( Apocalipse 20.10-14)
Todos os seguidores, obreiros e demônios de Satanás serão lançados no Inferno. Por isso,
o clamor daqueles demônios era no sentido de que Jesus não os castigasse antes do
Juízo Final.

Outro ponto dessa passagem é que, após o clamor dos demônios, o Senhor Jesus os
repreendeu: “Saia deste homem, espírito imundo!”.( Marcos 5.8) Em seguida, Jesus
pergunta – e é nisso que muitos se baseiam: “Qual é o seu nome?”. “Meu nome é Legião”,
respondeu ele, “porque somos muitos.”.( Marcos 5.9) O nome do demônio não era legião,
mas se referia à quantidade deles.

Por volta de 50 a.C., no tempo do imperador Júlio César, uma legião romana era composta
de três mil homens. Porém, ao longo da história, a legião que fazia parte do exército de
Roma oscilou entre dois mil e oito mil homens. O que Jesus estava fazendo era mostrar às
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pessoas quanto alguém podia ficar endemoninhado. No entanto, é preciso ter em mente
que as informações do Diabo nunca são confiáveis.

“E implorava a Jesus, com insistência, que não os mandasse sair daquela região.” (Marcos
5.10). Esse foi o pedido que os demônios fizeram a Jesus. O Diabo não é onipresente, ou
seja, não pode estar em todos os lugares ao mesmo tempo. Quando alguém está
endemoninhado, o espírito imundo não pode estar em outro lugar ao mesmo tempo. Só
quem é onipresente é Deus. No tempo de Jesus, havia um conceito da existência de
espíritos territoriais que dominavam regiões. Mas só Deus é dono e Senhor de toda a
Terra. A Bíblia mostra que Israel, ao sair do Egito, tomou os territórios ao longo do
caminho, e os povos foram derrotados e seus deuses destronados. Os povos
testemunharam reconhecendo que Jeová era o dono de toda a Terra. O ato de lançar para
fora da terra significava tomar o território, deixando uma parte do mundo livre de demônios.

“Os demônios imploraram a Jesus: “Manda-nos para os porcos, para que entremos neles”
(Marcos 5.12). Alguns podem pensar: “Ah, Pastor, tadinhos dos porcos!”. Porém, se
observarmos o contexto histórico, veremos que esse fato aconteceu numa cidade em
Israel, onde a maioria dos moradores era de estrangeiros que criavam manadas de suínos.
E criação de porcos é uma abominação para os judeus, que consideram o animal imundo.

Jesus, então, permitiu que os espíritos malignos entrassem naqueles animais. Em nenhum
momento, o Mestre aceitou a resposta dos demônios, mas ordenou que eles entrassem
nos suínos. O Senhor validou o fato de que o rapaz estava horrivelmente endemoninhado
não pela palavra do Diabo, mas pela entrada dos espíritos naqueles animais. Os demônios
não são onipresentes, por isso não é possível um mesmo demônio entrar em dez porcos
ao mesmo tempo, mas muitos espíritos malignos podem entrar em um mesmo ser.

Esse é o único caso bíblico em que o Mestre pergunta algo do tipo. Ele fez isso para
mostrar quanto alguém pode ficar endemoninhado. Mas essa não é uma regra bíblica, até
porque o Diabo nem mesmo confessou um nome, apenas algo relativo ao número. No
entanto, muitos utilizam essa passagem para afirmar o conceito de que é preciso perguntar
o nome do espírito maligno, e que desse modo se
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ganha autoridade sobre ele. Mas onde está escrita tal afirmação? Talvez esteja escrito em
algum papiro egípcio com mais de quatro mil anos, mas não na Bíblia! Tenha sempre em
mente: nossa autoridade está no nome do Senhor Jesus.

LIBERTAÇÃO X EXPULSÃO

Outra prática equivocada, muito comum, é a invocação. Alguns começam os cultos já


mandando sair determinados espíritos, pronunciando os nomes de vários deles. Essa
prática é errada porque o nosso culto tem de ser para o Senhor. Devemos invocar é a
presença de Deus. Caso aconteça alguma manifestação maligna, esta deve ser
repreendida no nome de Jesus Cristo. Perguntar o que não precisa ser perguntado fragiliza
a consciência das pessoas, porque alguns ficam com medo e acabam dando vazão a
ações demoníacas.

Não há credibilidade naquilo que Satanás fala, mas há valor no que Jesus Cristo fez. O
Diabo é pai da mentira, por isso não lhe pergunte nada, caso contrário estará obedecendo
a ensinamentos de demônios. Veja o que a Bíblia nos orienta:

Vocês pertencem ao pai de vocês, o Diabo, e querem realizar o desejo dele. Ele foi
homicida desde o princípio e não se apegou à verdade, pois não há verdade nele. Quando
mente, fala a sua própria língua, pois é mentiroso e pai da mentira.

João 8.44

A Palavra de Deus também fala sobre a estratégia maligna no texto bíblico de Mateus
12.43,45a:

Quando um espírito imundo sai de um homem, passa por lugares áridos procurando
descanso. Como não o encontra, [...] Então vai e traz consigo outros sete espíritos piores
do que ele, e, entrando, passam a viver ali. E o estado final daquele homem torna-se pior
do que o primeiro.
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Particularmente, gosto de separar as expressões “expulsão de demônios” de “libertação”.


Libertação vem pela Palavra de Deus, como Jesus afirmou: “E conhecerão a verdade, e a
verdade os libertará” (João 8.32). Conhecer a verdade não é um processo intelectual, e sim
de vivência. Se alguém conhece a verdade, num sentido profundo de intimidade, de
possuí-la de fato, está liberto não só do poder do Diabo como também do pecado. A
Palavra é libertadora.

Quando falamos de expulsão de demônios, surge o pensamento equivocado de que


devemos expulsar demônios apenas dentro das igrejas. A expulsão de demônios acontece
da seguinte forma: se um espírito maligno se manifestar, deve ser repreendido em o nome
de Jesus Cristo. Não é preciso gritar, sacudir a cabeça da pessoa ou ficar nervoso. Basta
ter autoridade espiritual. Podemos fazer isso em tom de voz baixo, porque se demônio
tivesse medo de grito não passaria em frente a um estádio de futebol em dia de jogo.

Quando um demônio é expulso de alguém e a pessoa não é discipulada e instruída na


Palavra de Deus, o espírito maligno volta. “Então vai e traz outros sete espíritos piores do
que ele, e entrando passam a viver ali. E o estado final daquele homem torna-se pior do
que o primeiro” (Lucas 11.26). Por isso a importância do ensino e de ser cheio da Palavra.

Durante o culto, existem situações em que pessoas são libertas em meio à ministração da
mensagem bíblica, sem manifestação demoníaca aparente. Em igrejas em que não existe
a prática do ensino da Bíblia e da sua verdade, onde se dá prioridade apenas ao ato de
expulsar espíritos imundos, nada é modificado na vida das pessoas. Isso acontece porque
falta a ministração da Palavra da Verdade.

Por que muitos líderes agem assim? Porque gostam do espetáculo e isso os faz parecer
poderosos. Quando uma manifestação demoníaca acontece, a expulsão deve ser feita de
maneira discreta, de preferência em local reservado, para que a pessoa não fique exposta
e o fato não vire uma exibição.

AUTORIDADE ESPIRITUAL

Em uma ocasião, os discípulos não conseguiram expulsar o demônio de um menino. Veja


o relato em Marcos 9.17-29:
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E um, dentre a multidão, respondeu: Mestre, trouxe-te o meu filho, possesso de um espírito
mudo; e este, onde quer que o apanha, lança-o por terra, e ele espuma, rilha os dentes e
vai definhando. Roguei a teus discípulos que o expelissem, e eles não puderam. Então,
Jesus lhes disse: Ó geração incrédula, até quando estarei convosco? Até quando vos
sofrerei? Trazei-mo. E trouxeram-lho; quando ele viu a Jesus, o espírito imediatamente o
agitou com violência, e, caindo ele por terra, revolvia-se espumando. Perguntou Jesus ao
pai do menino:

Há quanto tempo isto lhe sucede? Desde a infância, respondeu; e muitas vezes o tem
lançado no fogo e na água, para o matar; mas, se tu podes alguma coisa, tem compaixão
de nós e ajuda-nos. Ao que lhe respondeu Jesus: Se podes! Tudo é possível ao que crê. E
imediatamente o pai do menino exclamou [com lágrimas]: Eu creio! Ajuda-me na minha
falta de fé! Vendo Jesus que a multidão concorria, repreendeu o espírito imundo, dizendo-
lhe: Espírito mudo e surdo, eu te ordeno: Sai deste jovem e nunca mais tornes a ele. E ele,
clamando e agitando-o muito, saiu, deixando-o como se estivesse morto, a ponto de
muitos dizerem: Morreu. Mas Jesus, tomando-o pela mão, o ergueu, e ele se levantou.
Quando entrou em casa, os seus discípulos lhe perguntaram em particular: Por que não
pudemos nós expulsá-lo? Respondeu-lhes: Esta casta não pode sair senão por meio de
oração [e jejum].

Jesus disse à multidão que os discípulos não haviam conseguido expulsar o espírito
demoníaco por causa da falta de fé. No entanto, ao ser questionado em particular, Jesus
respondeu que aquela casta só poderia sair por meio da oração. No texto transcrito acima,
as palavras “e jejum” estão entre colchetes. Isso significa que elas não fazem parte dos
originais, sendo um acréscimo inserido. Em Mateus 17.14-21, onde esse episódio também
está registrado, toda a frase está entre colchetes: “[Mas esta casta não se expele senão
por meio de oração e jejum]” (v. 21). Porém, a instrução original do Senhor é: essa casta
só pode sair por meio de jejum e da oração. Jesus estava falando de consagração e
dedicação na oração.

Se não formos pessoas dedicadas à oração, não teremos autoridade espiritual, porque
esta não vem pela roupa que usamos ou pela entonação de nossa voz. A autoridade
espiritual vem por meio da dedicação à oração, pela busca da intimidade com Deus.

Existem situações em que alguém tenta expulsar um demônio e ele não sai. Quando isso
acontece, pode ser que a pessoa supostamente “possessa” esteja querendo atrair a
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atenção e a piedade dos irmãos, a fim de obter algum benefício em particular. Infelizmente,
vi o fato acontecer muitas vezes. Em outros casos, o benefício que desejam é atrair a
atenção por carência. Nessas situações, nem precisamos falar no nome de Jesus. Basta
dizer: “Fulano, pare com isso e se levante!”.

Em uma situação parecida, um certo Pastor que conheço falou para a pessoa que
aparentava estar possessa: “Se continuar vou chamar a polícia!”. É impressionante como a
pessoa parou de se contorcer e rapidamente se levantou. Quando se trata de um espírito
demoníaco, este se submete à autoridade do nome de Jesus. Para o caso de um espírito
maligno que não sai quando um cristão vai expulsá-lo, pode haver duas possibilidades. A
primeira: o cristão não tem uma vida de oração e vive de maneira hipócrita; a segunda: o
caso realmente não é uma questão de possessão espiritual.

Deus nos deu autoridade: “Eu lhes dei autoridade para pisarem sobre cobras e escorpiões,
e sobre todo o poder do inimigo; nada lhes fará dano” (Lucas 10.19). No entanto,
precisamos ter sempre em mente que expulsão de demônios não é motivo de espetáculo,
muito menos é o centro de um culto a Deus, nem mesmo um ministério. Porque os
ministérios dados pelo Senhor são: “E ele designou alguns para apóstolos, outros para
profetas, outros para evangelistas, e outros para pastores e mestres” (Efésios 4.11). Logo,
isso é o que devemos buscar. Por mais novo na fé que seja, o cristão tem autoridade sobre
Satanás, pois este não tem poder e foi destituído na

cruz do Calvário. Maior é Deus, que está em nós, do que aquele que está no mundo,( 1
João 4.4) e isso é um fato.

CONCLUSÃO

Não temos de entrevistar demônios, muito menos buscar informações deles. Precisamos
estar atentos quanto aos enganadores e mentirosos. A Bíblia nos garante que não há nada
em oculto que não venha a ser revelado (Mateus 10.26) e que todo o poder da mentira cai,
porque a Palavra de Deus é verdade e ela sempre prevalecerá.

Jesus Cristo venceu e sua vitória foi arrasadora. O Inimigo está com seus dias contados,
por isso não devemos temê-lo nem desejar aprender nada com ele. Temos que pregar o
Evangelho, e se, por um acaso, ao longo de nossa caminhada cristã, cruzarmos com
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algum demônio, basta expulsá-lo em o nome de Jesus Cristo. A Igreja não precisa ter
medo, fazer espetáculo nem valorizar as atuações demoníacas, porque Cristo já triunfou.

Quanto a nós, vivamos segundo a Palavra de Deus; preguemos o Evangelho da verdade,


sem fantasias e mistificações. O papel da Igreja de Jesus Cristo não é promover
espetáculo ou show de horrores, mas pregar as boas-novas da salvação. É ensinar e
discipular as pessoas a andarem com Cristo, em obediência às Sagradas Escrituras.

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CAPÍTULO 2

O CAMPO DE BATALHA

PR. ADRIANO CONCEIÇÃO DA SILVA

Ao raiar o dia 1° de setembro de 1939, as tropas da Alemanha nazista iniciaram a invasão


da Polônia, tendo como objetivo principal a retomada de um território conhecido como
“corredor polonês”, que ligava a Polônia ao Mar Báltico. A partir dessa ação alemã eclodiu
um dos conflitos mais sangrentos da história: a Segunda Guerra Mundial. De 1939 a 1945,
os países do eixo (Alemanha, Itália e Japão) e os aliados (Inglaterra, a extinta União
Soviética, França e Estados Unidos e outros, como o próprio Brasil) se enfrentaram em
diversas batalhas que produziram um terrível saldo de mais de 50 milhões de mortos e
quase 30 milhões de mutilados.

Iniciei este capítulo com a descrição de uma guerra travada entre humanos por perceber
que muitos falam e ensinam sobre o tema “batalha espiritual” como se ele ocorresse
exatamente do mesmo modo que acontecem as guerras em nosso mundo físico.

Com pouco mais de duas décadas de caminhada cristã, já ouvi relatos de irmãos
emocionados que afirmam ter visto anjos sangrando no meio da igreja após um embate
ferrenho contra as hostes de Satanás, ou a visão do exército celestial frente a frente com o
exército das trevas, prestes a se enfrentar, disputando o controle de um determinado
território.

Meu objetivo aqui não é o de ridicularizar as experiências de irmãos sinceros, mas ampliar
a visão que temos sobre batalha espiritual, porque na maior parte das vezes este conflito é
travado de uma maneira totalmente silenciosa e bem menos spielberguiana do que se
possa imaginar. Todavia, isso não significa que esta guerra seja menos séria, que
possamos vencê-la com meia dúzia de jargões evangélicos ou que seus efeitos possam
ser menos maléficos. Pelo contrário, quanto mais sutis forem as investidas do Inimigo,
mais preparo e vigilância para vencer seus ardis o cristão deverá ter.
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A BATALHA NA MENTE

Embora pese pouco mais de um quilo, o cérebro humano é o mais complexo e organizado
arranjo de matéria que existe em todo o planeta. Tem em média 100 bilhões de neurônios
(com cerca de 100 trilhões de conexões), que, em conjunto, conseguem realizar tarefas
com mais eficiência do que os supercomputadores mais poderosos que existem na
atualidade. O número de ligações entre os neurônios de um único cérebro humano é
superior ao número de todos os computadores do planeta que estão ligados hoje à rede
mundial de computadores – a Internet. A maioria dos cientistas dos nossos dias concorda
que o cérebro é o órgão que coordena o funcionamento do restante do corpo, incluindo o
funcionamento até do coração.

Em toda a sua complexidade e importância, o cérebro humano – que podemos traduzir por
“mente”, em seus aspectos relacionados ao pensamento

– é o palco principal onde o cristão trava sua batalha contra Satanás e o seu império. É por
isso que o sábio Salomão, inspirado por Deus, escreveu o texto de Provérbios 4.23, que
diz: “Acima de tudo, guarde o seu coração, pois dele depende toda a sua vida”.

É importante compreendermos que, para os hebreus, a palavra “coração” era usada para
designar a sede dos pensamentos, dos sentimentos e da vontade humana. Por essa
razão, algumas traduções da Bíblia substituem a palavra “coração” pela palavra
“pensamento”. Então, esse mesmo texto de Provérbios poderia ser escrito assim: “Acima
de tudo, guarde os seus pensamentos, pois deles depende toda a sua vida”.

Pelo fato de nossa vida depender do tipo de pensamento que desenvolvemos (que
produzimos), Satanás, que é um ser muito inteligente e conhece o ser humano de maneira
profunda, busca “lançar suas sementes” na mente humana para que o homem pense, aja e
reaja de acordo com a sua vontade. Quero deixar bem claro que estou me referindo à
mente do cristão, que, por pertencer a Cristo, não pode ser invadida pelo maligno e por
nenhum de seus súditos. A mente do cristão se torna um verdadeiro campo de batalha
porque o trabalho paciente e incansável do Diabo é o de tentar manipulá-la por meio de
pensamentos errados, impressões equivocadas e desejos distorcidos. O objetivo do
Adversário é que o servo de Deus seja totalmente derrotado ou pelo menos viva abaixo
das expectativas que o Senhor tem para a sua vida.
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Sim, a mente humana é o maior campo da batalha espiritual entre os homens e os


demônios.

O apóstolo Paulo, em 2 Coríntios 5.19,20, fez a seguinte declaração: “...Deus em Cristo


estava reconciliando consigo o mundo, não levando em conta os pecados dos homens, e
nos confiou a mensagem da reconciliação. Portanto, somos embaixadores de Cristo, como
se Deus estivesse fazendo o seu apelo por nosso intermédio...”.

Que declaração extraordinária! Primeiro fomos reconciliados com Deus, pois estávamos
separados dele em virtude do pecado. Depois, recebemos a missão de proclamar ao
mundo que seu relacionamento com Deus também pode ser restabelecido. É pelo fato de
conhecer essa missão, que se aplica a todos os filhos de Deus, que o Adversário ataca
com tanta voracidade a mente de homens e mulheres que querem experimentar e
comprovar a boa, agradável e perfeita vontade de Deus.

O EXEMPLO DE ELIAS

A Bíblia registra em 1 Reis 19.1-9 o seguinte relato:

Ora, Acabe contou a Jezabel tudo o que Elias tinha feito e como havia matado todos
aqueles profetas à espada. Por isso Jezabel mandou um mensageiro a Elias para dizer-
lhe: “Que os deuses me castiguem com todo o rigor, se amanhã nesta hora eu não fizer
com a sua vida o que você fez com a deles”. Elias teve medo e fugiu para salvar a vida.
Em Berseba de Judá ele deixou o seu servo e entrou no deserto, caminhando um dia.
Chegou a um pé de giesta, sentou-se debaixo dele e orou, pedindo a morte. “Já tive o
bastante, Senhor. Tira a minha vida; não sou melhor do que os meus antepassados.”
Depois se deitou debaixo da árvore e dormiu.

De repente um anjo tocou nele e disse: “Levante-se e coma”. Elias olhou ao redor e ali,
junto à sua cabeça, havia um pão assado sobre brasas quentes e um jarro de água. Ele
comeu, bebeu e deitou-se de novo. O anjo do Senhor voltou, tocou nele e disse: “Levante-
se e coma, pois a sua viagem será muito longa”. Então ele se levantou, comeu e bebeu.
Fortalecido com aquela comida, viajou quarenta dias e quarenta noites, até chegar a
Horebe, o monte de Deus. Ali entrou numa caverna e passou a noite.
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Elias foi levantado como profeta da nação de Israel em um dos períodos mais críticos da
História. O rei Acabe e sua esposa, Jezabel, mergulharam o povo de Deus em uma era de
profunda idolatria. Baal, o deus da fertilidade dos fenícios, tornou-se o “deus da nação”.
Além disso, os verdadeiros profetas estavam sendo assassinados e a Palavra do Senhor
era totalmente desprezada.

Elias surge nesse contexto da história de Israel como alguém levantado por Deus para
confrontar os pecados da liderança da nação e trazer o povo de volta para o verdadeiro
Deus.

Antes dos episódios narrados no capítulo 19, Elias vivenciou experiências fantásticas com
Deus: profetizou que viria seca sobre a terra e que só voltaria a chover quando ele
determinasse (e assim se cumpriu a palavra), viu Deus multiplicar a farinha e o azeite de
uma viúva, ressuscitou o filho único da viúva e venceu de forma esmagadora os 450
profetas de Baal. Depois de todas essas grandiosas experiências, Elias fugiu como um rato
diante da ameaça de Jezabel e cometeu pelo menos outros três erros que não devemos
praticar no momento de perseguição:

a) Elias buscou o isolamento;

b) Elias desistiu da vida;

c) Elias foi tomado por um sentimento de autocomiseração.

O que aconteceu com o grande profeta Elias? Por que de uma hora para outra caiu em tão
profunda depressão? Ele vivenciou o maior desafio do seu ministério profético: vencer a
guerra espiritual que estava sendo travada em sua mente. Satanás tentou paralisá-lo pelo
simples fato de que ele era um dos poucos remanescentes que estavam sabotando os
planos do Inimigo naqueles dias.

Aquele ataque de Satanás contra o profeta só foi desfeito porque o próprio Deus foi ao
encontro de Elias para restaurá-lo daquela condição. Agora observe bem as palavras do
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Senhor para um homem que tinha aceitado o conselho mentiroso do Diabo de que sua
vida e missão tinham chegado ao fim: “O Senhor lhe disse: ‘Volte pelo caminho por onde
veio, e vá para o deserto de Damasco. Chegando lá, unja Hazael como rei da Síria. Unja
também Jeú, filho de Ninsi, como rei de Israel, e unja Eliseu, filho de Safate, de Abel-
Meolá, para suceder a você como profeta” (1 Reis 19.15,16). Para quem pensava que
estava tudo acabado, Deus mostra a Elias que ele ainda seria canal da unção de Deus
para muitas pessoas.

EXEMPLOS ATUAIS

Assim como os servos de Deus do Antigo e do Novo Testamentos, os cristãos ao longo de


mais de 2 mil anos de História da Igreja travaram ferozes batalhas contra o Inferno em
suas mentes. Ainda hoje, o Maligno tem se dedicado de maneira silenciosa à “arte” de
minar a mente de homens e mulheres, para que não se cumpra o propósito de Deus em
suas vidas.

Certa vez, um pregador da Palavra muito amigo telefonou-me pela manhã cedo. Ele estava
internado e, embora soubesse que aquela enfermidade não era para sua morte,
necessitava que eu orasse por ele, porque sentia uma opressão terrível em sua mente. Era
como se o Diabo estivesse dizendo: “Você vai morrer. Não adianta crer em Deus. Você
está no fim da linha”. Dias depois do incidente, o irmão recebeu alta médica e voltou a
exercer suas atividades ministeriais sem grandes restrições, para a glória de Deus.

Em outra ocasião, fui procurado por um irmão em Cristo, que era casado. Segundo suas
próprias palavras, a esposa era muito dedicada. O seu problema era uma repentina paixão
por uma colega de trabalho que passou a dominá-lo, a ponto de querer se divorciar e viver
aquela aventura, que, por sinal, ele reconhecia como errada. Depois daquele encontro,
nunca mais vi o irmão. Não sei qual foi a sua decisão, mas sei que o Diabo o atacou na
mente, pois foi gerado em seu coração um sentimento equivocado que só poderia causar
destruição para os envolvidos.

O propósito do Inimigo em relação ao ser humano está registrado no conhecido texto de


João 10.10: “O ladrão vem apenas para roubar, matar e destruir...”. Ser bem-sucedido em
seus planos de roubo, morte e destruição contra um cristão traz um sabor de satisfação
muito maior para Satanás.
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Diante disso, será que há como vencer a guerra espiritual na mente? A Bíblia nos instrui
em como lutar e vencer esse tipo de conflito? A resposta é sim. Quem sabe você esteja
vivendo essa batalha no exato momento em que lê as páginas deste livro. Vamos aprender
então princípios da Palavra que o ajudarão a prevalecer contra os ataques malignos à sua
mente. Nunca se esqueça das palavras registradas pelo apóstolo Paulo em Romanos 8.31:
“Que diremos, pois, diante dessas coisas? Se Deus é por nós, quem será contra nós?”.

COMO VENCER A BATALHA ESPIRITUAL NA MENTE?

Vivemos em um tempo em que a maioria das pessoas busca respostas rápidas e


superficiais para todos os seus questionamentos. Mas esse não é o objetivo deste livro.
Por essa razão, você não vai receber uma “receita” de como vencer a guerra espiritual na
mente. O que vamos fazer é analisar seis princípios com base na Palavra de Deus a fim de
que estejamos bem preparados para a peleja.

1. Precisamos de visão equilibrada a respeito do Inimigo

Esse não é um princípio específico sobre a guerra espiritual na mente, mas um princípio
geral que deve nortear a vida do cristão em todos os momentos. O equilíbrio é
fundamental, porque grande parte da liderança evangélica assume uma postura radical ao
lidar com o tema “batalha espiritual”.

De um lado estão aqueles que promovem Satanás à condição de clone de Deus. Eles
falam do Inimigo como se fosse páreo para o Altíssimo, como se o Criador do Céu e da
terra estivesse “suando a camisa” para não perder o trono para o Diabo. Isso é um terrível
e grande engano. Porque o Senhor é o grande El Shadai – o Deus que tem todo o poder –,
aquele que não tem rival. O rei Davi expressou essa verdade em 1 Crônicas 29.11: “Teus,
ó Senhor, são a grandeza, o poder, a glória, a majestade e o esplendor, pois tudo o que há
nos céus e na terra é teu. Teu, ó Senhor, é o reino; tu estás acima de tudo”. Os quatro
seres viventes declaram dia e noite diante do trono de Deus: “... Santo, santo, santo é o
Senhor, o Deus todo-poderoso, que era, que é e que há de vir” (Apocalipse 4.8).

Nunca superdimensione o poder das trevas. Há cristãos e igrejas que falam mais nos feitos
e no poder do Diabo do que no Deus eterno. Satanás diante de Deus não passa de um
“ratinho com um megafone”; ele é um ser criado que tem seus dias de maldade contados,
pois já está condenado.
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O outro extremo, não menos perigoso, é ocupado por aqueles que afirmam que o Diabo é
um derrotado e que não precisamos nos preocupar com ele. Para esses líderes, o nome
do Adversário é humilhado e frequentemente usado em piadinhas nos púlpitos. Porém, a
Bíblia não nos ensina a nos posicionarmos dessa maneira. Observe o que a Palavra afirma
sobre o assunto em dois textos bastante conhecidos:

Portanto, submetam-se a Deus. Resistam ao Diabo, e ele fugirá de vocês.

Tiago 4.7

Estejam alertas e vigiem. O Diabo, o inimigo de vocês, anda ao redor como leão, rugindo e
procurando a quem possa devorar.

1 Pedro 5.8

Da mesma forma, nunca subestime o poder das trevas. Cristãos estão perdendo
importantes batalhas na vida espiritual porque entendem que o Diabo é um “cão morto”,
inofensivo e até engraçado. A verdade é bem outra. Nosso adversário é inteligente e cruel.
Por isso é importante o devido preparo para vencê-lo.

2. Precisamos ocupar a mente com as coisas do alto

Para que as ideias, as sugestões e os sentimentos semeados pelo Maligno não se alojem
em nossa mente, precisamos ocupá-la ao máximo com as coisas de Deus. Paulo ensinou
duas importantes verdades sobre o tema:

Finalmente, irmão, tudo o que for verdadeiro, tudo o que for nobre, tudo o que for correto,
tudo o que for puro, tudo o que for amável, tudo o que for de boa fama, se houver algo de
excelente ou digno de louvor, pensem nessas coisas.

Filipenses 4.8
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Portanto, já que vocês ressuscitaram com Cristo, procurem as coisas que são do alto, onde
Cristo está assentado à direita de Deus. Mantenham o pensamento nas coisas do alto, e
não nas coisas terrenas.

Colossenses 3.1,2

A mente humana funciona como uma esponja que absorve tudo o que vemos, ouvimos e
percebemos. Uma cena forte de violência ou um acidente pode ficar registrado em nossa
memória por muito tempo, talvez por toda a nossa vida. Sendo assim, precisamos
selecionar muito bem aquilo a que assistimos, como também o que lemos e ouvimos.
Precisamos “alimentar”, municiar nossa mente com o que edifica. O apóstolo Paulo deixa
bem claro que aquele que serve a Deus deve preencher a mente com o que agrada ao
Senhor.

Nos últimos anos, tem crescido o número de cristãos que procuram sua liderança para
confessar pecados relacionados ao vício de pornografia, seja pela internet, por filmes ou
revistas. Casamentos estão sendo desfeitos e muitas pessoas têm se tornado reféns de
pensamentos pervertidos.

Também cresce o sucesso de programas de TV em que os participantes ficam presos em


uma casa, vigiados por câmeras 24 horas por dia. Coisas simples do cotidiano, como
escovar os dentes ou tomar banho, podem ser observadas pelos telespectadores. O triste
é que o sucesso de tais programas é garantido por meio de apelo sexual, além de brigas e
fofocas entre seus participantes. O mais triste é que muitos cristãos perdem seu tempo
sagrado inserindo esse lixo em suas mentes, quando poderiam usar o mesmo tempo em
oração ou meditação nas Escrituras Sagradas.

Precisamos entender nossa mente como um campo, que, para produzir bons frutos (bons
pensamentos), necessita que toda erva daninha seja arrancada e somente boas sementes
sejam plantadas.

De vez em quando alguém me faz a seguinte pergunta: “Pastor, é pecado ver novela?” Ou:
“Posso ouvir música não cristã?”. Como disse anteriormente, as pessoas querem
respostas prontas: pode ou não pode, sim ou não. Mas, para tristeza de alguns, respondo:
“Você tem que saber se isso acrescenta algo ao seu intelecto ou à sua espiritualidade”.
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Minha resposta é sincera, porque creio que nem toda música não evangélica seja nociva e
que ainda existem raros, mas bons programas de TV, assim como existem músicas,
pregações, livros e debates ditos evangélicos que trazem ensinamentos completamente
estranhos à Palavra de Deus e que devem ser rejeitados.

Quando era recém-convertido, ouvi uma ilustração de sermão que nunca esqueci. O Pastor
disse que um homem muito esperto tinha dois cães, um preto e um branco. Então ele
alimentava o cão branco e deixava o outro com fome por dias. Ele levava os dois animais
para a praça principal de uma cidade e os punha para brigar. Obviamente, o cachorro
branco espancava o preto. Dias depois, voltava para a mesma praça, porém agora o cão
preto era que estava alimentado. O dono dos cães estava aceitando apostas. O que
acontecia? As pessoas apostavam no cachorro branco, mas agora era o preto que dava
uma surra e o povo perdia grande soma de dinheiro para o dono dos cães.

Apesar de simples, o objetivo da ilustração é mostrar que o espírito tem de estar bem
alimentado para vencer as inclinações da carne. Sem dúvida alguma, a ilustração também
serve para pensarmos na mente, pois precisamos que ela seja alimentada – preenchida
pelas coisas celestiais – para que as sementes malignas não sobrevivam no “campo” da
nossa mente.

3. Precisamos ter a mente constantemente renovada

Em Romanos 12.2 está escrito: “Não se amoldem ao padrão deste mundo, mas
transformem-se pela renovação da sua mente, para que sejam capazes de experimentar e
comprovar a boa, agradável e perfeita vontade de Deus”. Outro princípio fundamental para
que a batalha

travada na mente seja vencida é a sua renovação constante pelos valores do Reino de
Deus, para que tudo o que for contrário à Palavra de Deus seja automaticamente
rechaçado.

O apóstolo Paulo afirma em 1 Coríntios 2.16 que temos a mente de Cristo. Ter a mente de
Cristo significa ter os pensamentos, os valores e os sentimentos semelhantes aos do
Senhor Jesus. Não há cirurgia humana que possa nos fazer adquirir a mente de Cristo ou
de qualquer outra pessoa. O milagre de possuir a mente de Cristo só acontece por dois
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processos: o novo nascimento (João 3.3-6), que ocorre quando entregamos nossa vida a
Cristo e recebemos a sua natureza, e o lavar purificador da Palavra de Deus (Efésios
5.26).

Vivemos em um mundo que jaz no Maligno. Os níveis de moralidade, caráter e


espiritualidade são cada vez mais baixos. Apenas com a mente impregnada da Palavra do
Senhor o ser humano consegue se manter fiel a Deus. É por isso que o salmista dá um
importante conselho aos jovens: “Como pode o jovem manter pura a sua conduta? Vivendo
de acordo com a tua palavra” (Salmos 119.9; grifo do autor).

O cristão terá condições de rejeitar todos os manjares deste mundo apenas se a sua
mente estiver encharcada com a Palavra de Deus. Só a mente sã poderá rejeitá-los sem
titubear.

Um grande amigo muito jovem estava com um grupo de colegas estudantes, quando foi
convidado a participar de uma orgia sexual. Ele imediatamente rejeitou “a oferta” por ser
cristão. Mas o colega contra-argumentou: “Não tem ninguém da sua igreja vendo”. E o
rapaz prontamente respondeu: “Mas o meu Deus está aqui comigo”.

Foi com a mente impregnada da Palavra que Jesus venceu a mais terrível batalha na
mente: a tentação no deserto (Mateus 4.1-11). Ele estava com fome e o Diabo
pessoalmente o tentou. Mas em todas as investidas Jesus declarou: “Está escrito”.

Não é de estranhar o fato de vermos tantos líderes espirituais caindo em adultério e tantos
cristãos com comportamento duvidoso. A geração de cristãos da atualidade é a que
investe menos tempo em oração e meditação na Palavra de Deus, por isso tantas derrotas
no seio da Igreja.

4. Precisamos ter discernimento espiritual

O quarto princípio para se vencer a batalha na mente é o discernimento espiritual.


Discernimento significa “saber a diferença”, “perceber com clareza”. Nesse contexto de
guerra espiritual, significa a capacidade de identificarmos quando é o Inimigo que está
atacando nossa mente.
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Em muitas ocasiões, não é necessário uma grande percepção para identificarmos os


ataques de Satanás. Por exemplo: em uma das mensagens sobre o Apocalipse, pregadas
pelo saudoso Bispo Roberto McAlister, ele narra a experiência de um pastor sul-africano
que veio pregar no Brasil e se sentiu fortemente oprimido por um espírito de prostituição. O
homem se trancou no quarto do hotel e ligou para o seu país, pedindo oração aos irmãos
de sua igreja. Embora a experiência desse pastor tenha sido intensa, isso não exigiu dele
grande discernimento em perceber a origem maligna daquilo que vivenciou.

Outro exemplo: em 1996, fui convidado pelo Pastor Jorge Duarte, da Igreja Cristã Nova
Vida (ICNV) Mesquita, no Rio de Janeiro, para assumir a liderança da Geração Ação, como
chamamos na denominação o grupo de jovens, daquela igreja local. Aceitei de imediato a
convocação, apesar de entender que era um grande desafio em minha vida. Só que, a
partir daquele momento, minha mente passou a ser bombardeada por um pensamento
sutil. Não foi simplesmente uma reação normal de medo ou insegurança diante de um
desafio. Comecei a acreditar que Deus estava me direcionando a não aceitar a liderança
da juventude da igreja. Fiquei convicto de que deveria agradecer ao Pastor pela confiança
e informá-lo de que o meu chamado era para cooperar apenas nos bastidores. Além do
mais, faltavam-me conhecimento, maturidade e tempo.

Tudo parecia indicar que a decisão era sensata e acima de tudo dada por Deus. Nunca fui
tímido, muito menos sou de fugir dos desafios da obra do Senhor. O problema é que
“parecia” que Deus estava me orientando a tomar tal decisão.

Em nossos dias, quantos irmãos sinceros (não estou falando de líderes sem caráter)
recebem a “revelação de Deus” de sair de sua igreja e fundam um ministério,
enfraquecendo a igreja de origem e gerando ressentimentos terríveis. Enganados por
Satanás, afirmam: foi a vontade do Senhor.

Um detalhe muito importante acendeu uma luz de alerta dentro de mim. Eu sabia que
decisões alinhadas com a vontade de Deus trazem paz ao coração. E, ao invés de paz, eu
sentia uma angústia muito grande. Então decidi ficar quieto e continuar orando. A oração
nos põe face a face com Deus e cara a cara com o Maligno. Logo, a mentira do Inimigo se
dissolveu. Minha mente se abriu e consegui discernir que Deus me chamava para aquela
obra.
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Até hoje ouço testemunhos de pessoas que foram abençoadas naquela época. Ali também
descobri que Deus me escolhera para ser um Pastor. Quantas coisas o Senhor fez por
mim e por meu intermédio que poderiam ter sido descartadas caso me faltasse a
sensibilidade espiritual para perceber o que Deus queria realizar. A Bíblia afirma em 1
Coríntios 2.15: “Mas quem é espiritual discerne todas as coisas...”.

Vivemos dias de grande confusão, a maioria das pessoas (inclusive cristãs) vive sem
direção: guiados por seus sentimentos, pela mídia e pelo próprio Satanás. Mas o apóstolo
Paulo ensina aos irmãos da igreja de Corinto que aqueles que são espirituais não serão
ludibriados, pois conseguirão discernir todas as coisas. A promessa não é para todos os
religiosos, tampouco para todos os membros de uma igreja, mas para aqueles que são
espirituais, ou seja, aqueles que crucificam sua carne e são guiados pelo Espírito Santo.

5. Precisamos ter autoridade espiritual

As últimas palavras que Jesus proferiu antes de ser elevado aos céus estão registradas em
Marcos 16.15-18: “...Vão pelo mundo todo e preguem o evangelho a todas as pessoas.
Quem crer e for batizado será salvo, mas quem não crer será condenado. Estes sinais
acompanharão os que crerem: em meu nome expulsarão demônios; falarão novas línguas;
pegarão em serpentes; e, se beberem algum veneno mortal, não lhes fará mal nenhum;
imporão as mãos sobre os doentes, e estes ficarão curados”.

Jesus deu uma ordem aos seus discípulos e prometeu que lhes daria autoridade (ou
poder). Em Atos 1.8, Lucas também registra uma das últimas palavras de Jesus antes da
ascensão: “Mas receberão poder quando o Espírito Santo descer sobre vocês, e serão
minhas testemunhas em Jerusalém, em toda a Judeia e Samaria, e até os confins da
terra”.

Que tipo de poder é esse que prometeu nos dar? Seria algum tipo de poder político ou
financeiro? Ou será que estava querendo dizer que seríamos superiores aos reles mortais?
Na verdade, Jesus nos prometeu poder para:

a) Testemunharmos dele;
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b) sermos usados para realização de sinais e maravilhas;

c) repreendermos toda fúria do Inferno.

Dentro do contexto de batalha espiritual na mente, o cristão não só pode, como deve, se
levantar com autoridade contra as forças do Inferno. Não há o que temer, pois a Bíblia é
clara quanto ao papel do cristão em relação a Satanás. Vejamos três referências bíblicas
que falam sobre o assunto:

a) Mateus 16.18: “E eu lhe digo que você é Pedro, e sobre esta pedra edificarei a
minha igreja, e as portas do Hades não poderão vencê-la”;

b) Tiago 4.7: “Portanto, submetam-se a Deus. Resistam ao Diabo, e ele fugirá de


vocês”;

c) 1 João 4.4: “Filhinhos, vocês são de Deus e os venceram, porque aquele que está
em vocês é maior do que aquele que está no mundo”.

Muitos aceitam passivamente a tirania de Satanás, vivendo constantemente debaixo de


pressão e com a mente confusa, como consequência de toda uma engenharia infernal
para dirigi-la ou pelo menos perturbá-la. A vitória de um cristão começa na mente (Saiba
mais em ZÁGARI, Maurício, A Verdadeira Vitória do Cristão. Rio de Janeiro: Anno Domini,
2012) e Satanás sabe disso, porque nossos pensamentos determinam quem nós somos e
em que cremos. É na mente que determinamos servir a Cristo ou ao mundo, fazer a
vontade de Deus ou a nossa, sermos cheios do Espírito Santo ou vivermos uma
espiritualidade rasa.

Com Cristo tenho aprendido diante de ataques tenebrosos a não me intimidar, a não
aceitar os abusos do Maligno. Quando assumi a liderança da ICNV Chatuba, no município
de Mesquita (RJ), durante semanas fui assolado com pesadelos em que demônios me
sufocavam ou eu era espancado e ameaçado de morte. Acordei diversas vezes com o
coração acelerado, como se tivesse acabado de participar de uma maratona.
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Um dia, no meio dessa batalha, levantei-me e abri a boca, não para clamar a Deus, pois
minhas palavras foram endereçadas ao Inferno. Eu disse: “Satanás, minha vida pertence
ao Senhor Jesus, aquele que te derrotou na cruz do Calvário. Por isso, querendo você ou
não, aquilo que o Todo-Poderoso tem para realizar por meio da minha vida naquele lugar
vai se cumprir”. Apesar das lutas e outros ataques que tenho sofrido, sei em quem tenho
crido e sei que Ele me deu autoridade para prevalecer no mundo espiritual.

6. Precisamos de parceiros de oração (de intercessores)

O sexto e último princípio é a necessidade de buscarmos ter parceiros de oração.


Geralmente valorizamos isso por parte de nossos líderes, mas entre o povo é muito
importante que se crie o compromisso de oração mútua. É o que nos ensina a Palavra de
Deus em Tiago 5.16: “Portanto, confessem os seus pecados uns aos outros e orem uns
pelos outros para serem curados. A oração de um justo é poderosa e eficaz”.

Uma das marcas da sociedade pós-moderna é o individualismo, aquela lógica de “cada um


por si e Deus por todos”. A Igreja inclusive tem incorporado tal filosofia, pois muitos fazem
parte de alguma comunidade de fé e não se relacionam com outros: por opção ou porque
são completamente ignorados pelos irmãos.

A Igreja precisa restaurar o verdadeiro conceito de unidade, pois somos membros uns dos
outros. Embora a salvação seja pessoal, a bênção de Deus é ordenada quando vivemos
em união (Salmo 133).

O texto de Tiago 5.16 chega a ser surpreendente em nossos dias. Somos curados quando
há confissão e oração mútua. Tenho experimentado a veracidade desse texto, pois me
reúno regularmente com outros seis pastores (além das reuniões semanais do Presbitério
da ICNV) para momentos de oração e encorajamento.

A batalha espiritual na mente pode ser vencida quando dividimos nossa dificuldade com
outros cristãos que possam nos apoiar em oração.

CONCLUSÃO
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O objetivo deste capítulo é abrir os nossos olhos e apresentar alguns princípios que podem
nos ajudar a vencer a guerra espiritual. Você que deseja vencer essa luta, que tem como
principal campo de batalha a mente humana, ore a Deus, declarando em o nome de Jesus
que seus pensamentos serão totalmente controlados pelo Senhor. Peça perdão pelas
vezes que você permitiu que eles se tornassem contrários à Palavra de Deus. Consagre a
sua mente ao Senhor. Ele o ajudará a pensar como Jesus pensa e, consequentemente, a
agir como Ele age.

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CAPÍTULO 3

A ARMA PRINCIPAL DA BATALHA

PR. LUIZ FERNANDO MARTINS

Usem... a espada do Espírito, que é a palavra de Deus.

Efésios 6.17

Quando falamos sobre vencer a batalha espiritual na mente, aprendemos que as


estratégias para obter essa vitória advêm da Palavra de Deus. O sucesso de grandes
homens de Deus resume-se simplesmente ao fato de que eles ouviram e obedeceram às
Sagradas Escrituras. Jesus afirmou que é impossível que a sua Palavra falhe: “Os céus e a
terra passarão, mas as minhas palavras jamais passarão” (Mateus 24.35). Por essa razão,
torna-se impossível ser vitorioso nos embates contra o Inimigo se não dermos a devida
importância às Escrituras. A parábola do semeador exemplifica bem essa questão de não
priorizarmos a Palavra.

O semeador saiu a semear. Enquanto lançava a semente, parte dela caiu à beira do
caminho, e as aves vieram e a comeram. Parte dela caiu em terreno pedregoso, onde não
havia muita terra; e logo brotou, porque a terra não era profunda. Mas quando saiu o sol,
as plantas se queimaram e secaram, porque não tinham raiz. Outra parte caiu entre
espinhos, que cresceram e sufocaram as plantas. [...] Quando alguém ouve a mensagem
do Reino e não a entende, o Maligno vem e lhe arranca o que foi semeado em seu
coração. Este é o que foi semeado à beira do caminho. Quanto ao que foi semeado em
terreno pedregoso, este é aquele que ouve a palavra e logo a recebe com alegria. Todavia,
visto que não tem raiz em si mesmo, permanece por pouco tempo. Quando surge alguma
tribulação ou perseguição por causa da palavra, logo a abandona. Quanto ao que foi
semeado entre os espinhos, este é aquele que ouve a palavra, mas a preocupação desta
vida e o engano das riquezas a sufocam, tornando-a infrutífera.

Mateus 13.3-7,19-22
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Ouvir, entender e obedecer. Há uma prática cristã chamada lex orandi que fala exatamente
sobre isso. Lex se refere à questão de que a pessoa, além de ouvir ou ler, deve entender e
pôr em prática. Trata-se de observar a Lei de Deus, meditar na sua Palavra e obedecer ao
que está escrito nela. Muito importante na cristandade antiga, essa prática foi deixada de
um tempo para cá. Os cristãos hoje não meditam mais na Bíblia Sagrada. Alegram-se
muito com ela, mas meditam pouco em suas palavras. Muitas vezes, a mensagem é bem
aceita na igreja, porém em casa ela não existe, não serve para nada. É por falta dessa
prática que muitos servos de Deus abandonam a fé cristã ou até mesmo usam as
Escrituras para defender um ensinamento antibíblico.

Conforme a parábola mencionada, quando alguém ouve a mensagem do Reino e não a


compreende, o Maligno vem e arranca o que foi semeado em seu coração (v. 19). Essa
passagem faz referência àquele que ouviu a mensagem do Evangelho com descaso. São
as pessoas que até vão à igreja, mas não têm compromisso. Elas ouvem, mas não
praticam. Além disso, estão muito longe de compreender que o Diabo faz de tudo para
roubar do nosso entendimento a semente da Palavra. Já vimos que existe uma batalha
que se trava em nossa mente. Por isso mesmo, não podemos ignorar o fato de que
existem espíritos malignos que rondam os nossos pensamentos.

A parábola do semeador também nos adverte da prioridade que precisamos dar à Palavra
de Deus. Às vezes, priorizamos mais as práticas religiosas. Por exemplo, quando algo
muito ruim acontece, todo bom religioso vai logo dobrar os joelhos e orar. Ou então pede
para alguém fazer uma oração e até jejuar. Lembro-me de certa vez que perdi meus
óculos. Fazia pouco tempo que os tinha comprado e meu pai ainda estava pagando. Como
orei para recuperá-los! Fiquei apavorado com a ideia de ter que contar aos meus pais o
que havia acontecido. Eu nunca orava e não gostava de orar, muito menos de ler a Bíblia,
mas naquele dia não parei de orar quando cheguei à igreja. Suei a camisa de tanto que
orei e supliquei por misericórdia.

Esse é um exemplo simples de como muitos só se voltam para o Senhor quando estão
enfrentando dificuldades. Priorizamos o relacionamento com Deus quando nos vemos em
aperto. Buscamos Sua presença em oração e Sua orientação na Palavra quando estamos
em situações difíceis. Isso é um problema, pois, quando não priorizamos as Escrituras,
também ficamos em segundo plano. Deus passa a priorizar a nossa vida quando Sua
Palavra também é prioridade em nosso viver.
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A CENTRALIDADE DAS ESCRITURAS

O apóstolo Paulo, em Romanos 10.16, fez uso das palavras do profeta Isaías quando
disse: “No entanto, nem todos os israelitas aceitaram as boas-novas. Pois Isaías diz:
‘Senhor, quem creu em nossa mensagem?’”. Há pessoas que de fato não dão a menor
importância à mensagem do Evangelho, à Palavra do Senhor. Além disso, há uma prática
no meio cristão de somente dar atenção a uma palavra que é agradável de ouvir. Porém,
nem sempre a Palavra de Deus virá da forma como gostamos de escutar. Certa vez, um
Pastor disse que havia coisas na Bíblia que ele não gostava de ouvir ou ler, mas que eram
necessárias.

Todo conselho que não tem a Bíblia como centro não é confiável. Se desejarmos ser bem-
sucedidos em qualquer luta contra o nosso Adversário, precisamos buscar orientação nas
Escrituras. Muitas vezes queremos que Deus fale conosco usando o pregador, quando na
verdade poderíamos ouvir a Sua voz por intermédio de Sua Palavra. Deus pode falar
conosco no silêncio do nosso quarto. Não daremos prioridade simplesmente porque foi no
silêncio? Sabe por que muitas vezes não vemos Deus agir em nossas vidas? Por falta da
Palavra de Deus. Oraremos quanto for necessário, mas se a Bíblia não tiver prioridade, de
nada adiantará. Precisamos deixar de esperar Deus falar conosco somente na pregação. A
simples leitura da Bíblia pode trazer a resposta certa para as nossas indagações, o milagre
que tanto esperamos, a estratégia que realmente destruirá os propósitos de Satanás.

Sendo assim, cabe aqui uma pergunta: Que lugar a Palavra de Deus ocupa em nossa
vida? O profeta Oséias disse, como registrado em seu livro: “Meu povo foi destruído por
falta de conhecimento” (4.6). Ele ainda prossegue dizendo: “Conheçamos o Senhor;
esforcemo-nos por conhecê-lo” (6.3). A derrota diante das ferramentas do Inimigo é certa
quando não consultamos as Sagradas Escrituras. Israel foi destruído porque não tinha o
devido conhecimento de Deus e de sua Palavra. Portanto, o lugar adequado para a
Palavra de Deus deve ser sempre o que lhe concede prioridade. Apenas dessa forma será
possível produzir frutos que se converterão em derrotas do Inferno. A Palavra não
frutificará em outro lugar que não seja o de prioridade, que requer obediência.

Se esse for o nosso entendimento, conseguiremos compreender a Palavra no momento


em que ela nos trouxer algo que não nos faça sorrir. Às vezes, a mensagem que
ouviremos nos fará chorar. Mas, ainda assim, ela não deve perder o lugar de privilégio em
nossas vidas. Somente dessa maneira estaremos fortalecidos contra a influência do poder
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das trevas, das entidades malignas que operam por meio do engano – dependendo da
importância que damos ou não à Palavra de Deus.

LIBERTAÇÃO, QUEBRA DE MALDIÇÃO E RENÚNCIA DE PECADOS: INÓCUAS SEM


A PALAVRA

João declarou em seu Evangelho: “E conhecerão a verdade, e a verdade os libertará”


(8.32). Não há maior libertadora de almas do que a Palavra de Deus que temos em mãos.
Não adianta “ministrar libertação” sobre a vida de uma pessoa se ela não quiser que a
mensagem libertadora entre em sua vida e promova transformação. Uma pessoa pode
chegar à igreja cheia de demônios e o pastor expulsar todos em o nome de Jesus.
Todavia, se ela não construir muros em volta de sua casa (vida), eles voltarão, pois a casa
estará aberta, vazia, sem proteção. A Palavra de Deus é a proteção que qualquer pessoa
necessita ter; ela é “lâmpada que ilumina os [nossos] passos e luz que clareia o [nosso]
caminho” (Salmos 119.105).

Por acaso, alguém teria coragem de parar o carro na rua, com carteira em cima do banco,
talão de cheques no painel e a chave na ignição? Dependendo do lugar onde se mora,
ninguém tem coragem de dormir com a janela do quarto aberta, em consequência do medo
de que a casa seja invadida por um ladrão. Na vida espiritual, há pessoas que estão com a
casa destrancada, sem a devida proteção da Palavra. Nesses casos, o ladrão vem, rouba,
mata e destrói (João 10.10). A arma mais eficiente no combate às potestades das trevas
não é tanto a oração, mas o valor que damos às verdades de Deus.

Certa vez, uma mulher chegou à igreja pedindo oração porque estava rodeada de
problemas com o marido, o filho, a vizinha e outras pessoas. Então, o Pastor que a
atendeu perguntou: “Vamos orar, você quer Jesus?” Ela lhe devolveu a pergunta: “Essa
igreja tem revelação?”. O pastor respondeu: “Não”. “Ah, então eu não quero”, retrucou a
mulher – e foi embora.

É impressionante como as pessoas se apegam a movimentos, mas negligenciam a Palavra


de Deus, que é o alimento para a alma. Muitos quebram os princípios bíblicos e acreditam
que, porque frequentam a igreja
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ou são filhos de crentes, estão ilesos de cobranças da parte do Senhor. Quem vive na
prática do pecado não conhece a Palavra; se conhecesse, se esforçaria para andar na luz,
porque em Deus não há treva nenhuma (1 João 1.5).

Crentes em Jesus não ficam endemoninhados, mas a pouca importância dada à Palavra
de Deus é tão grande que está causando falta de discernimento. Certa vez, orei por uma
jovem numa igreja e, de repente, ela caiu endemoninhada. Naquele momento, alguém
disse: “Ela está repousando no espírito”. Repouso no espírito? Tinha uma casta do
tamanho de uma árvore na vida daquela menina, e as irmãs glorificavam a Deus sem
perceber que se tratava de algo maligno. Então eu disse: “Não é aleluia não, irmãs. É
demônio que está oprimindo a jovem”.

A razão para a falta de discernimento é que a Palavra de Deus não está tendo prioridade.
Aquela jovem ainda não havia feito uma aliança de fato e de verdade com Cristo, e as
irmãs não tinham intimidade e profundidade na Palavra. Não adianta fazer oração forte,
quebra de maldição, renúncia de pecados, participar de círculo de oração, se as Escrituras
não estiverem em primeiro lugar. Uma das regras básicas da libertação é priorizar o
conhecimento e a prática da Palavra.

FOME DA PALAVRA

Quando Jesus foi tentado pelo Diabo no deserto, Jesus o confrontou com a Palavra
escrita:

Depois de jejuar quarenta dias e quarenta noites, teve fome. O tentador aproximou-se dele
e disse: “Se você é o Filho de Deus, mande que estas pedras se transformem em pães”.
Jesus respondeu: “Está escrito: ‘Nem só de pão viverá o homem, mas de toda palavra que
procede da boca de Deus’”. Então o Diabo o levou à cidade santa, colocou-o na parte mais
alta do templo e lhe disse: “Se és o Filho de Deus, joga-te daqui para baixo. Pois está
escrito: ‘Ele dará ordens a seus anjos a seu respeito, e com as mãos eles o segurarão,
para que você não tropece em alguma pedra’”. Jesus lhe respondeu: “Também está
escrito: ‘Não ponha à prova o Senhor, o seu Deus’”. Depois, o Diabo o levou a um monte
muito alto e mostrou-lhe todos os reinos do mundo e o seu esplendor. E lhe disse: “Tudo
isto te darei, se te prostrares e me adorares”. Jesus lhe disse: “Retire-se, Satanás! Pois
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está escrito: ‘Adore o Senhor, o seu Deus e só a ele preste culto’”. Então o Diabo o deixou,
e anjos vieram e o serviram.

Mateus 4.2-11

Jesus fez uso da Palavra que norteava a sua própria vida: “Nem só de pão viverá o
homem, mas de toda a Palavra que sai da boca de Deus” (v. 4). Da mesma forma,
devemos ter uma palavra que direcione a nossa vida. A que rege a minha vida é 2 Timóteo
3.14,15: “Quanto a você, porém, permaneça nas coisas que aprendeu e das quais tem
convicção, pois você sabe de quem o aprendeu. Porque desde criança você conhece as
Sagradas Letras, que são capazes de torná-lo sábio para a salvação mediante a fé em
Cristo Jesus”. Constantemente, preciso voltar a ler essa passagem para não me esquecer
de quem é Deus na minha vida.

Não devemos fazer isso para impressionar Deus. Ele não se impressiona com qualquer
coisa. Se desejarmos chamar a atenção dos céus para nós, devemos ter uma vida
devocional com a Palavra de Deus. Será que alguém com fome consegue dormir em cima
de um prato de comida? Acredito que, por mais que a pessoa esteja cansada, quando
chegar em casa, ela primeiro irá comer. O dia inteiro andando na rua, sob o sol escaldante,
o estômago fazendo aquele barulho e ao entrar em casa sente aquele cheirinho gostoso...
será que ela resistirá? Muito difícil.

Então, por que não podemos fazer o mesmo com a Palavra de Deus? Porque de certa
forma não estamos com tanta fome assim. Nesse caso, precisamos insistir, nos esforçar e
meditar de novo. Faça isso até que consiga inculcar esse princípio em sua mente e jamais
o perca de vista. Não sei fazer oração mágica, mas tenho certeza de que a Palavra de
Deus é capaz de nos tornar pessoas sábias que farão escolhas sábias. A melhor delas é
obedecer os mandamentos do Senhor.

Você quer vencer o Diabo? Tenha um firme compromisso com a mensagem do Evangelho.
E se porventura você se sente perseguido por ele, Deus o abençoe por isso. Satanás só
persegue quem quer andar na Palavra. Se ele não o estiver incomodando, é porque há
algo de errado e, como dizia o Bispo Roberto McAlister, “se você é um cristão autêntico e
não tem um probleminha com o Diabo, então está dormindo com ele”.

O normal para quem quer permanecer na Palavra de Deus é ser tentado. Por que o Diabo
foi tentar Jesus no deserto? Ele não perde tempo com quem já lhe pertence e serve. Ele
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atenta contra a vida daquele que ora, que persevera em cumprir o que está na Bíblia
Sagrada. Por essa razão, não podemos rejeitar a Palavra de Deus, porque, quando
fazemos isso, estamos rejeitando o próprio Senhor e ficamos desprotegidos.

FRUTOS DA PALAVRA

Muitos podem dizer: “Pastor, estou sendo tentado por uma ‘mulher de Potifar’ no meu
trabalho”, ou “Pastor, não consigo parar de me relacionar sexualmente no namoro”. Se não
houver uma postura por parte dessas pessoas de resistir a esses desejos, de fato elas se
tornarão presas do Adversário. E tal posicionamento só será eficiente se estiver com base
na Palavra. Todavia, quem não quer vida de santidade com o Senhor irá beber, cobiçar a
mulher do outro, mentir, fornicar e fazer tudo o que desagrada a Deus. Que trabalho o
nosso Inimigo terá com o cristão que não tem proteção? Que guerra venceremos se a
Palavra de vida não estiver em nós?

Quantas vezes precisei sair da casa de minha namorada – hoje, minha esposa –
correndo? Algumas vezes, eu mal chegava e dizia: “Hoje não podemos namorar. Não me
pergunte o porquê”. Voltava pelo caminho cantando e, quando chegava em casa, tomava
um banho bem gelado. Fazia isso para não pecar contra o Senhor. É uma escolha. Você
escolhe pecar ou não pecar.

Não adianta pedir oração para evitar a falha. É necessário fazer uma escolha. Por isso, a
palavra que está sendo semeada deve cair em boa terra. Se cair pelo caminho, o Maligno
a roubará e ela não frutificará – não poderá promover transformação e libertação. Quando
o Diabo não trabalha para distorcer e confundir a Palavra de Deus, ele procura roubá-la de
nós. Por isso é tão importante não permitir que isso aconteça. Se ele consegue ter êxito
em seus planos, não veremos as promessas de Deus se cumprirem em nossas vidas; ele
nos inutilizará totalmente.

Talvez você não estivesse inclinado a fazer essa leitura por não gostar do teor do assunto
que nos chama a uma responsabilidade, mas beleza e formosura não herdarão o Reino
dos céus. Porém, obediência e prática, sim.

Então, o que fazer para viver de forma obediente aos preceitos divinos? Como permanecer
na Videira? Qual o segredo? Fazer uma atividade legal para a juventude ficar mais firme
no Senhor? Em algumas igrejas, se não houver atividades, novas programações e
pregadores ou cantores que estão em evidência, os bancos simplesmente se esvaziam.
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Alguém pode reclamar: “O pastor só prega sobre este assunto”. Napoleão Falcão, um
renomado pregador, quando se converteu passou dois anos pregando no mesmo
versículo: “Não sabeis vós que os vossos corpos são santuário de Deus e o Espírito
Santo...” Na cadeira do barbeiro, quando ele ouviu essa palavra, recebeu a plenitude do
Espírito Santo. Então, toda vez que ele abria a boca para pregar nesse versículo, o Senhor
lhe dava uma nova revelação. Não existe nada mais novo do que a Palavra de Deus.

UMA ARMA PARA OS FORTES

Você quer algo novo em sua vida? Medite nesse livro de dia e de noite como o Senhor
falou a Josué: “Seja forte e corajoso, porque você conduzirá esse povo para herdar a terra
que prometi sob juramento aos seus antepassados. Somente seja forte e muito corajoso!
Tenha o cuidado de obedecer a toda a lei que o meu servo Moisés lhe ordenou; não se
desvie dela, nem para a direita nem para a esquerda, para que você seja bem-sucedido
por onde quer que andar. Não deixe de falar as palavras deste Livro da Lei e de meditar
nelas de dia e de noite, para que você cumpra fielmente tudo o que nele está escrito. Só
então os seus caminhos prosperarão e você será bem-sucedido. Não fui eu que lhe
ordenei? Seja forte e corajoso! Não se apavore, nem desanime, pois o Senhor, o seu
Deus, estará com você por onde você andar” (Josué 1.6-9). Quando o Senhor falou para
Josué ser forte e corajoso, não era para derrotar os inimigos, mas para meditar nas
Escrituras. Quem não medita na Palavra de Deus não é forte nem corajoso.

Na passagem em que Miriã e Arão criticam Moisés, lemos: “Imediatamente o Senhor disse
a Moisés, a Arão e a Miriã: ‘Dirijam-se à Tenda do Encontro, vocês três’. E os três foram
para lá. Então o Senhor desceu numa coluna de nuvem e, pondo-se à entrada da Tenda,
chamou Arão e Miriã. Os dois vieram à frente, e ele disse: ‘Ouçam as minhas palavras:
Quando entre vocês há um profeta do Senhor, a ele me revelo em visões, em sonhos falo
com ele. Não é assim, porém, com meu servo Moisés, que é fiel em toda a minha casa.
Com ele falo face a face, claramente, e não por enigmas; e ele vê a forma do Senhor. Por
que não temeram criticar meu servo Moisés?’” (Números 12.4-8). Moisés tinha intimidade
com o Senhor. Você quer ver o Senhor? Quer que as palavras dele estejam em seus
lábios? Medite nelas.

Em Mateus 13.21, encontramos aqueles que não permitem o tratamento e as profundas


transformações que a Palavra de Deus proporciona: “Todavia, visto que não tem raiz em si
mesmo, permanece por pouco tempo. Quando surge alguma tribulação ou perseguição por
causa da palavra, logo a abandona”. Muitos querem ser missionários, porém não abrem
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mão do pecado. Não oram, não louvam, não adoram, não meditam na Bíblia. Qualquer
pessoa que deseja ser um missionário deve ter o mínimo de intimidade com a Palavra. A
árvore de raiz rasteira cai com qualquer vento que sopra. Assim acontece com aquele que
não tem raízes na Bíblia; diante de qualquer dificuldade que enfrenta, deixa de ir à igreja e
até murmura contra Deus.

Que preço estamos dispostos a pagar para que a Palavra de Deus nos guie e se cumpra
em nossa vida? Se alguém quiser ser santo e quiser vencer as astutas ciladas do Diabo,
como disse o apóstolo Paulo, precisa saber manejar bem a “espada do Espírito”. O Senhor
não nos fez fracos, mas sim homens e mulheres fortes a ponto de dizer “não” para o que
nos impede de nos aprofundarmos no conhecimento das Escrituras.

A terra do nosso coração precisa ser como a que está descrita em Mateus 13.23: uma “boa
terra”, ou seja, alguém com a alma inclinada a ouvir e compreender a Palavra. Quando isso
acontece, vencer a guerra é consequência. Além disso, o resultado será a produção de
frutos, pois Jesus disse que um produzirá cem, o outro, sessenta, e o outro, trinta.

Muitos afirmam ter a Palavra, mas na verdade não a aplicam. Por isso estão indo à falência
em diversas áreas da vida. Estão perdendo a guerra para o Adversário na família, nos
relacionamentos, no trabalho, na vida espiritual. Não há como crescer se a semente da
Palavra não for plantada em terra fértil, se os pilares necessários para sustentar a vida não
forem erguidos. Não existe prosperidade sem entendimento real e profundo da Palavra de
Deus.

COMO MANEJAR A ARMA

Entretanto, é importante saber que entender a Palavra de Deus não é a mesma coisa que
entender a aula de um professor na faculdade. Muitas pessoas conhecem a Bíblia de
ponta a ponta, mas não conhecem o seu Autor – Deus. Para compreender o que está
escrito nela, é necessária a presença do Espírito Santo, que nos ensina todas as coisas.
Ser ensinado por Ele nos ajudará a aplicar a Palavra a nossas vidas.

Daniel, por exemplo, conseguiu entender a revelação que recebera do Senhor porque leu o
profeta Jeremias: “No primeiro ano do seu reinado, eu, Daniel, compreendi pelas
Escrituras, conforme a palavra do Senhor dada ao profeta Jeremias, que a desolação de
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Jerusalém iria durar setenta anos” (Daniel 9.2). Ele leu as Escrituras e descobriu qual seria
o tempo da desolação de Jerusalém: 70 anos de cativeiro. O ponto de partida desse
entendimento foi a Palavra de Deus, que gera frutos para a eternidade. Muitos perdem o
que receberam do Senhor por falta de entendimento. Até a intercessão feita por Daniel foi
com base na Palavra.

O profeta simplesmente mudou o rumo da História quando percebeu pelos livros que já era
tempo de acabar com a assolação de Jerusalém. Ele passou a orar, jejuar e se humilhar
em prol daquele povo (Daniel 10). O problema é que não queremos investir tempo com
Deus. Temos tempo para ouvir músicas, falar da vida dos outros, ver televisão, se
relacionar pela internet, mas não temos tempo para a Palavra do Senhor. Daniel, durante
três semanas, pranteou, chorou e clamou. A geração de hoje está falindo porque
justamente não quer ter trabalho para alcançar entendimento do que diz respeito a Deus.

Somente eu, Daniel, tive a visão; os que me acompanhavam nada viram, mas foram
tomados de tanto pavor que fugiram e se esconderam. Assim fiquei sozinho, olhando para
aquela grande visão; fiquei sem forças, muito pálido, e quase desfaleci. Então eu o ouvi
falando e, ao ouvi-lo, caí prostrado, rosto em terra, e perdi os sentidos. Em seguida, a mão
de alguém tocou em mim e me pôs sobre as minhas mãos e os meus joelhos vacilantes. E
ele disse: “Daniel, você é muito amado. Preste bem atenção ao que vou lhe falar; levante-
se, pois eu fui enviado a você”. Quando ele me disse isso, pus-me em pé, tremendo. E ele
prosseguiu: “Não tenha medo. Daniel. Desde o primeiro dia em que você decidiu buscar
entendimento e humilhar-se diante do seu Deus, suas palavras foram ouvidas, e eu vim em
resposta a elas. Mas o príncipe do reino da Pérsia me resistiu durante vinte e um dias.
Então Miguel, um dos príncipes supremos, veio em minha ajuda, pois eu fui impedido de
continuar ali com os reis da Pérsia. Agora vim explicar-lhe o que acontecerá ao seu povo
no futuro, pois a visão se refere a uma época futura.

Daniel 10.7-14

Daniel teve tal êxito em sua vida porque valorizou a Palavra e se empenhou em buscar
ouvir a voz de Deus. A resposta até demorou, 21 dias, mas desde o primeiro dia ele já
tinha sido ouvido. Todavia, ele perseverou e o resultado não poderia ter sido diferente: a
compreensão espiritual do que recebera do próprio Deus. Ele foi vencedor porque era
dedicado à Palavra. Seremos bem-sucedidos na batalha espiritual tal como o profeta?
Tudo depende de como manejarmos a grande arma que Deus nos deu para vencê-la: a
Bíblia Sagrada.
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CAPÍTULO 4

AS ARMAS AUXILIARES DA BATALHA

PR. SILAS BATISTA DE MENEZES

Entretanto, busquem com dedicação os melhores dons. Passo agora a mostrar-lhes um


caminho ainda mais excelente. Ainda que eu fale as línguas dos homens e dos anjos, se
não tiver amor, serei como o sino que ressoa ou como o prato que retine. Ainda que eu
tenha o dom de profecia e saiba todos os mistérios e todo o conhecimento, e tenha uma fé
capaz de mover montanhas, se não tiver amor, nada serei. Ainda que eu dê aos pobres
tudo o que possuo e entregue o meu corpo para ser queimado se não tiver amor, nada
disso me valerá. Assim, permanecem agora estes três: a fé, a esperança e o amor. O
maior deles, porém, é o amor.

1 Coríntios 12.31; 13.1-3,13

Da mesma maneira que os demais, este é um capítulo de confronto, pois se queremos de


fato entender o conceito bíblico de batalha espiritual, precisamos compreender que a
verdadeira guerra espiritual é aquela que travamos contra nossa própria natureza. Não
adianta nos concentrarmos no Diabo e não analisarmos algumas questões que são de
extrema importância na vida cristã.

Como já foi dito, em nossa caminhada com Cristo deveríamos valorizar muito mais os
ensinamentos das Escrituras, pois a Bíblia nos dá orientação para os momentos de
combate contra o nosso Adversário. No entanto, nem sempre aplicamos a Palavra de
forma correta em nossas vidas. Escolhemos valorizar o que não é prioridade, o que não
tem maior importância. Valorizamos as bênçãos materiais em detrimento das espirituais.
Valorizamos mais os dons espirituais do que o fruto do Espírito. Reconhecemos o valor dos
dons e sabemos que devemos buscá-los. Porém a vida do crente deve ser norteada por
virtudes que farão diferença exatamente quando ele estiver enfrentando a oposição das
trevas.

Paulo, um homem de Deus que vivenciou diversas batalhas contra o Inimigo, revela em 1
Coríntios 13.13 um segredo infalível para quem quer vencer qualquer luta espiritual. O
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apóstolo simplesmente mostra o caminho que todo cristão deve percorrer para ser bem-
sucedido diante das forças satânicas: pautar a vida em três pilares importantes: a fé, a
esperança e o amor.

A igreja de Corinto, a quem o apóstolo Paulo escreveu essa carta, era uma igreja cheia de
dons espirituais, cujo vocabulário utilizado era o “evangeliquês” da atualidade, ou seja, a
linguagem do fogo, onde milagres aconteciam, havia profetas e os dons de cura estavam
sempre presentes.

Aparentemente, os coríntios entendiam tudo sobre batalha espiritual. Mas era uma igreja
enferma, que precisava aprender mais sobre virtudes das quais o cristão não pode se
afastar de forma alguma.

Assim como a igreja de Corinto, nós supervalorizamos aquilo que pode ser visto. Os dons
muitas vezes são desenvolvidos e passam a ser admirados na vida das pessoas que os
possuem. Porém, nem sempre os dons são sinais de que a igreja está ou é uma
comunidade saudável. Muito menos de que a igreja está bem guarnecida.

Do ponto de vista humano, se olhássemos para os crentes de Corinto, diríamos que se


tratava de fato de homens e mulheres espirituais. Todavia, quando lemos toda a carta do
apóstolo Paulo aos Coríntios, observamos que, apesar de a igreja possuir muitos dons, era
uma igreja doente, enferma, dividida. Afinal, uns diziam “eu sou de Paulo”; outros, “e eu de
Apolo”; alguns outros, “eu de Cefas”. Os “mais espirituais” diziam: “eu [sou] de Cristo”!
Estes eram os piores.

Os dons eram usados naquela ocasião para engrandecimento pessoal. Por essa razão, o
apóstolo precisou ensinar que os dons servem para proveito do outro. Sendo assim, se eu
utilizo os dons para o meu próprio proveito, e não para benefício do meu irmão, há algo de
errado.

Aquelas pessoas, apesar de desenvolverem os dons, eram carnais. Precisavam ser


instruídas pelo apóstolo. Por isso, do capítulo 12 ao 14, Paulo discorre sobre os dons. No
capítulo 12, ele fala acerca da diversidade de dons e da unidade do Corpo de Cristo. Ele
afirma que todos os membros, embora desempenhem funções diferentes, são muito
importantes no Corpo, mesmo que alguns considerem outros de menor valor.
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No capítulo 13, ele discorre acerca do amor. E, no capítulo 14, continua ensinando sobre
os dons, ressaltando o uso correto de cada um deles. É interessante observar que, entre
os capítulos 12 e 14, Paulo interrompe sua linha de raciocínio – os dons – para falar sobre
o amor. É como se de repente ele desse uma parada antes de retomar o assunto de que
vinha falando. Está tratando a respeito dos dons no capítulo 12, mas, quando chega ao 13,
faz uma pausa para falar sobre algo mais importante. Por isso, sua forma de encerrar esse
texto bíblico não poderia ser outra: “Assim, permanecem agora estes três: a fé, a
esperança e o amor. O maior deles, porém, é o amor” (v. 13).

Com base na sequência dada pelo apóstolo Paulo, quero partilhar reflexões sobre essas
três virtudes – fé, esperança e amor – na vida do cristão. Elas são armas indispensáveis na
guerra espiritual e devem fazer parte da essência do crente.

O que é a fé? A fé não é algo simples de descrever nem algo fácil de compreender. O
escritor da carta aos Hebreus referiu-se à fé como “a certeza daquilo que esperamos e a
prova das coisas que não vemos” (11.1). E prosseguiu declarando que “sem fé é
impossível agradar a Deus, pois quem dele se aproxima precisa crer que ele existe” (v. 6).
Portanto, podemos afirmar que a fé faz parte da vida do crente em Jesus, porque sem ela
não se pode dizer que se é cristão.

Somos crentes porque primeiro Deus gerou em nossos corações a fé inicial para que
pudéssemos crer em seu Filho. A fé para salvação não consiste apenas numa crença
intelectual em algum credo ou num conjunto de dogmas religioso. Por mais sincera que
seja essa crença, a verdadeira fé existe no espírito. É algo que parte de dentro para fora.
Não se restringe somente ao nível intelectual, ao nível da nossa mente. Assim, posso dizer
que creio em Deus, acredito nele, mas isso transcende o entendimento humano.

A fé para salvação é gerada pelo Senhor e significa uma entrega total da nossa alma a Ele.
Se afirmamos que temos fé em Deus, temos que de fato considerá-lo como Senhor da
nossa vida. Tudo o que o nosso “eu” considera de valor devemos entregar-lhe para que
Ele preencha com os seus valores. Precisamos nos esvaziar cada dia mais para que o
Senhor preencha o nosso ser. Não podemos dizer que temos fé em Deus se queremos ter
uma vida independente dele. Só podemos declarar nossa fé quando de fato nos
entregamos totalmente a Ele.
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E qual é o objeto da nossa fé? O objeto da nossa fé é Deus, Cristo, as promessas que Ele
nos fez. Tudo o que o Senhor preparou de antemão para os remidos, nós recebemos pela
fé: a salvação, a cura espiritual, a santificação, a regeneração, o crescimento espiritual. E
como essa fé se manifesta em nossas vidas? “Pois vocês são salvos pela graça, por meio
da fé, e isto não vem de vocês, é dom de Deus” (Efésios 2.8). De quem vem a salvação
pela graça? De nós? Não. De Deus, para que ninguém se glorie. É a graça do Senhor se
manifestando em nossa vida, de modo que, se dizemos que temos fé – se entregamos
nossas vidas a Ele – é porque essa fé já se instalou em nossos corações.

Portanto, a fé elimina a autojustificação. Uma vez instalada em nosso ser, produz alegria –
uma alegria que não é baseada em circunstâncias, pois pode ser percebida mesmo em
meio à dor ou ao sofrimento. A fé, nesses momentos, gera paz. Isso é um fato que não
conseguimos explicar.

Certa vez, evangelizei uma pessoa que me perguntou: “Como ter paz num mundo tão
turbulento?”. “Não sei explicar”, respondi. “Mas posso dizer que sinto paz e que, se você
quiser, também poderá sentir”. Tudo é pela fé. Por isso, o apóstolo disse: “... permanecem
a fé, a esperança e o amor”.

Qual é o fim da fé? Em 1 Pedro 1.7-9, está escrito: “Assim acontece para que fique
comprovado que a fé que vocês têm, muito mais valiosa do que o ouro que perece, mesmo
que refinado pelo fogo, é genuína e resultará em louvor, glória e honra, quando Jesus
Cristo for revelado. Mesmo não o tendo visto, vocês o amam; e apesar de não o verem
agora, creem nele e exultam com alegria indizível e gloriosa, pois vocês estão alcançando
o alvo da sua fé, a salvação das suas almas”.

Se lermos o versículo anterior, “Nisso vocês exultam, ainda que agora, por um pouco de
tempo, devam ser entristecidos por todo tipo de provação” (v. 6), perceberemos a
afirmação do apóstolo de que haverá provações da nossa fé e um breve momento de
tribulação. Ele chama de breve porque não existe fé madura se não for provada no fogo.

Seja cauteloso com a frase: “Ah, Senhor, aumenta a minha fé”. Se você é uma pessoa que
continuamente faz esse pedido, saiba que Deus irá acrescentar a sua fé, porém você
passará por momentos muito difíceis, porque é assim que a nossa fé cresce.
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Depois de termos alcançado essa compreensão, é importante focalizar a outra afirmação


de Pedro, a de que a nossa fé, depois de confirmado o seu valor, se tornará muito mais
preciosa do que o ouro perecível, e redundará em louvor, glória e honra na revelação de
Jesus Cristo.

Portanto, qual é o fim da nossa fé? A salvação da nossa alma. Por esse motivo, quando
não temos fé também não temos salvação. Se apostatamos da fé, demonstramos não ter o
que há de mais precioso: a própria fé – a fé para salvação, que nos faz suportar as aflições
da vida. Isso porque o Senhor nunca nos prometeu que não teríamos dificuldades. “Pare
de sofrer!” é uma mensagem enganosa e desonesta, pois nós conhecemos a realidade da
vida e sabemos que enfrentamos dias de turbulência.

Entretanto, quando o Senhor põe fé em nossos corações, sabemos e cremos naquilo que
Ele falou: “E eu estarei sempre com vocês, até o fim dos tempos” (Mateus 28.20). É essa
fé que gera a nossa salvação, que nos ajuda a suportar as aflições da vida e em nossa
vida prática nos leva a fazer o bem às pessoas. Pois a fé sem obras é morta, como disse
Tiago.

Certa vez, li uma frase que me chamou a atenção: “A fé é a graça pela qual um homem vê
a Cristo”. Como já foi dito, só podemos ir ao Senhor pela fé. O apóstolo Paulo sabia da
importância da fé na batalha espiritual travada pelas pessoas, mas ele disse: “...
permanecem, pois a fé [e também] a esperança”.

ESPERANÇA

Quem é a nossa esperança? Quando Paulo escreveu a Timóteo, disse: “Paulo, apóstolo
de Cristo Jesus, por ordem de Deus, nosso Salvador, e de Cristo Jesus, a ‘nossa
esperança’”. Nossa esperança é o Senhor. Quando perdemos a esperança, perdemos tudo
porque só nele podemos esperar. Nesse mundo turbulento, tão cheio de dores e
amarguras, onde coisas terríveis acontecem, o que seria de nós se não tivéssemos
esperança?

Quando alguém perde a esperança, perde o Senhor. Quando, por exemplo, alguém perde
a esperança de ver um parente convertido aos pés do Senhor, está dizendo que não confia
mais nele. Se você tem alguém em sua casa que não conhece o Senhor, e, apesar da sua
oração, percebe que a vida dessa pessoa vem se tornando cada vez pior, não desista. Se
você acreditar que seu parente é um caso perdido, que o Senhor não está ouvindo, você
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correrá o risco de perder a esperança. Pensar dessa forma é não crer que o Senhor pode
salvar, que Ele permanece o mesmo. Além disso, você pode cair no erro de se considerar
melhor do que o outro porque o Senhor foi capaz de salvá-lo. Todavia, para o Senhor, não
há melhor ou pior. Todos éramos perdidos e o Senhor nos resgatou pela Sua graça e pelo
Seu amor.

O que esperar do Senhor, então? A Bíblia diz que dele podemos esperar a paz. Quantos
têm a paz no coração? Também podemos esperar a alegria na alma, o descanso e a vida
eterna. Nele, contrariando o dito popular, podemos esperar dias melhores. No Senhor,
podemos esperar. Sendo assim, o que vamos fazer? Desprezar esse tesouro que temos
ou abraçá-lo cada vez mais, orando: “Senhor, jamais quero te perder, jamais quero perder
a esperança de viver”?

Quantos não tentaram pôr fim à própria vida porque perderam a esperança? Não acredito
que as pessoas que se suicidam queiram morrer. Elas querem viver, mas não sabem como
porque não têm mais expectativas na vida. Mas o Senhor continua o mesmo, com Seu
poder para ressuscitar mortos e vivificar. Pode ser que você, querido leitor, esteja morto
espiritualmente, mas o Senhor afirma que os mortos ouvirão a sua voz. Como? Só a graça
de Deus mesmo. Como pode um morto ouvir? Um morto não sente nada, não ouve nada.
Está morto. Os mortos ouvirão, ressuscitarão e reviverão. Esperança.

O escritor aos Hebreus declarou que a esperança é como um refúgio que nos mantém
seguros: “Para que, por meio de duas coisas imutáveis nas quais é impossível que Deus
minta, sejamos firmemente encorajados, nós, que nos refugiamos nele para tomar posse
da esperança a nós proposta. Temos esta esperança como âncora da alma, firme e
segura, a qual adentra o santuário interior, por trás do véu” (6.18,19).

A esperança é a âncora da alma. Ela nos mantém firmes neste mundo de turbulência; ela
que nos faz perseverar em meio aos ataques do Inimigo. E é a esperança de que um dia
tudo será diferente que nos levará a uma realidade gloriosa. Como João escreveu em
Apocalipse 21.4-7: “‘Ele enxugará dos seus olhos toda lágrima. Não haverá mais morte,
nem tristeza, nem choro, nem dor, pois a antiga ordem já passou’. Aquele que estava
assentado no trono disse: ‘Estou fazendo novas todas as coisas!’ E acrescentou: ‘Escreva
isto, pois estas palavras são verdadeiras e dignas de confiança’. Disse-me ainda: ‘Está
feito. Eu sou o Alfa e o Ômega, o Princípio e o Fim. A quem tiver sede, darei de beber
gratuitamente da fonte da água da vida. O vencedor herdará tudo isto, e eu serei seu Deus
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e ele será meu filho’”. Tudo está feito! Você crê nisso? Tem essa esperança? Glória a
Deus! Eu tenho essa esperança.

Vimos que a fé é algo espetacular e a esperança, que se fundamenta na fé, também é


maravilhosa. Com ela, podemos ter convicção de que venceremos todas as guerras que
enfrentamos contra as forças do Maligno. Porém, Paulo prossegue afirmando que há algo
ainda mais excelente e que se constitui numa poderosa arma: o amor. “... Porém, o maior
destes é o amor.”

AMOR

Ainda que eu fale as línguas dos homens e dos anjos, se não tiver amor, serei como o sino
que ressoa ou como o prato que retine. Ainda que eu tenha o dom de profecia e saiba
todos os mistérios e todo o conhecimento, e tenha uma fé capaz de mover montanhas, se
não tiver amor, nada serei. Ainda que eu dê aos pobres tudo o que possuo e entregue o
meu corpo para ser queimado, se não tiver amor, nada disso me valerá.

1 Coríntios 13.1-3

Muitos podem não acreditar, mas uma arma poderosíssima contra o Diabo é o amor. Toda
vitória espiritual deve ser centrada no amor. Batalha Espiritual se vence com Cristo e Cristo
é amor. As pessoas que foram libertas alcançaram a libertação porque Cristo as amou. E
assim como elas receberam o Seu amor também precisam receber amor da Igreja. O
mundo precisa perceber que o amor do Senhor Jesus está derramado em sua Noiva, que
é o conjunto de todos nós que fomos feitos seus filhos pela graça.

Todavia, qual é a nossa motivação no Evangelho do Senhor? Qual é a nossa motivação ao


evangelizar? Ao cantar no coral, ao trabalhar em qualquer departamento da igreja? Qual é
a nossa motivação de viver? O que está por trás dos nossos atos quando fazemos o bem a
alguém? Os três versículos acima falam sobre isso. Mas, antes de entrarmos no assunto,

observe a seguinte orientação de Paulo: “... busquem com dedicação os melhores dons”
(1 Coríntios 12.31).
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Muitos crentes pentecostais gostam de “fogo”. Para eles, quanto mais barulho, mais
significa que o Espírito do Senhor está ali. Porém, o apóstolo deixa claro que não é bem
assim. É necessário buscarmos os dons de Deus, mas isso não é tudo.

Houve uma época em que apenas quem manifestasse publicamente os dons espirituais
era considerado espiritual. Se falasse com variedade de línguas em público era a pessoa
mais espiritual do mundo. Se Deus realizasse uma cura por meio dela, então, era quase
um deus. Há muitos anos, conheci “profetas” que eram venerados por irmãos e irmãs que
não tomavam nenhuma decisão sem antes consultá-los. O mais interessante é que Deus
sempre tinha “algo” para falar por esses “profetas”. Era incrível! Houve até uma “profetisa”
cuja casa vivia cheia de gente pela manhã, à tarde e à noite. Obviamente ela tirava
proveito disso.

Mas será que isso é de fato espiritualidade? Por que estamos realizando a “obra” da
maneira como fazemos? Porque muitos estão fazendo o que é certo pela motivação
errada, como se Deus não sondasse os nossos corações. Muitos oram com a motivação
errada. Jesus conhecia a intenção dos fariseus. Ele sabia que aqueles homens usavam a
desculpa de orar nas casas das viúvas apenas para comer a comida que elas ofereciam.
Deus conhecia o coração. Ele sabia que a oração podia ser falsificada, podia ser
narcisismo espiritual, sensacionalismo, hipocrisia.

Certa vez, pouco antes do Natal, assisti a uma pregação pela televisão de um desses
sacerdotes televisivos. Ele fez a pergunta e ele mesmo respondeu:

“Quer dizer que o senhor não vai comemorar o Natal? Não, eu não vou comemorar o Natal.
Como posso comemorar o Natal quando muitos dos meus irmãos estão passando
necessidade? Como comemorar o Natal numa mesa farta quando muitos estão sofrendo?
Como posso comemorar o Natal...?” E assim prosseguiu, citando uma série de coisas. “Eu
vou fazer um jejum em prol da igreja. Vou ficar a pão e água durante doze dias.” Ele
passou meia hora (contei no relógio) dizendo que faria um jejum em prol da igreja, que ia
ficar “a pão e água”.

Quem de fato deseja jejuar para Deus abençoar a vida de alguém, para ser cheio
espiritualmente ou receber a Sua unção, não precisa fazer o que aquele homem fez. O
verdadeiro propósito do jejum é esvaziar-se para que Deus encha. Se de fato aquele
propósito fosse verdadeiro, ele não precisaria anunciar por meia hora na TV que ia fazer
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um jejum, subir os montes etc. Além do mais, até hoje ele deveria ficar em jejum, porque
tenho certeza absoluta de que na igreja dele ainda há pessoas sofrendo, desempregadas e
na miséria.

Então, por que usar a rede de televisão para dizer que vai jejuar? Porque as pessoas o
terão como um líder espiritual e desejarão segui-lo. Por isso há muitos crentes em Jesus
sendo manipulados por pessoas inescrupulosas. Porém, não é isso que é espiritualidade.
Posso fazer uma oração parecer espiritual sem que ela seja. Posso pregar para satisfazer
o meu ego ou apenas para aparecer. No entanto, o Senhor conhece o meu coração.

Por qual motivo eu prego? Por qual motivo você faz o que faz? Nos tempos de Paulo, ele
disse que alguns pregavam por inveja. Que coisa inacreditável! “É verdade que alguns
pregam Cristo por inveja e rivalidade, mas outros o fazem de boa vontade” (Filipenses
1.15). Mas, como o próprio apóstolo declarou: “Aqueles pregam Cristo por ambição
egoísta, sem sinceridade, pensando que me podem causar sofrimento enquanto estou
preso. Mas, que importa? O importante é que de qualquer forma, seja por motivos falsos
ou verdadeiros, Cristo está sendo pregado, e por isso me alegro. De fato, continuarei a
alegrar-me, pois sei que o que me aconteceu resultará em minha libertação, graças às
orações de vocês e ao auxílio do Espírito de Jesus Cristo” (v. 17-19).

Se eles pregavam e sua motivação não era saudável, o Senhor era sabedor de tudo. Não
que Cristo esteja de acordo com tal intenção, mas Ele julgará todos, inclusive suas obras.
O mais importante a saber é que não é o pregador, mas o Espírito Santo, quem convence.
Não é a oratória, porque qualquer um pode fazer teatro e ter uma boa retórica. Boas obras
e um pouco de carisma têm rendido um bom dividendo para muitas pessoas. Mas isso não
é o suficiente.

Os coríntios usavam os dons de línguas para exaltar a si mesmos, mas eram como um
sino batendo, que só faz barulho. O som que produziam era como o de duas bacias
batendo uma na outra. Não havia melodia, apenas alarde. Devemos, sim, pedir ao Senhor
os dons. No entanto, é mais importante pedir que o Senhor nos encha com o seu amor
para que possamos fazer o bem às pessoas, porque esse é o verdadeiro objetivo do
Cristianismo.

Não posso dizer que amo o Senhor se odeio o meu irmão. É o que aprendemos com o
apóstolo João: “Se alguém afirmar: ‘Eu amo a Deus’, mas odiar seu irmão, é mentiroso,
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pois quem não ama seu irmão, a quem vê, não pode amar a Deus, a quem não vê” (1 João
4.20). Portanto, mais importante do que desenvolver os dons, é preciso buscar o fruto do
Espírito, cuja primeira virtude é o amor.

O Senhor Jesus resume toda a Lei em dois mandamentos: amar a Deus acima de todas as
coisas e amar ao próximo como a si mesmo. Marcos ainda afirma em seu Evangelho que
“... amar ao próximo como a si mesmo é mais importante do que todos os sacrifícios e
ofertas” (12.33). Sendo assim, se sou cristão de verdade, devo amar o próximo. Se de fato
me considero seguidor de Cristo, tenho que expressar este amor não só por meio de
palavras, mas de atitudes também. Não foi assim que o Senhor Jesus fez? “Porque Deus
tanto amou o mundo que deu o seu Filho Unigênito para que todo o que nele crer não
pereça, mas tenha a vida eterna” (João 3.16).

Sim, Jesus nos amou. Amou alguém como Pedro, que o negara três vezes, e os demais
discípulos que, na hora do aperto, o abandonaram. Homens cheios de falhas e defeitos,
incrédulos. Apesar disso, Jesus os amou até o fim: “Um pouco antes da festa da Páscoa,
sabendo Jesus que havia chegado o tempo em que deixaria este mundo e iria para o Pai,
tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim” (João 13.1).

CONCLUSÃO

Jesus amou até a cruz. Ele morreu para pudéssemos ter fé, esperança e amor, virtudes
que são armas importantíssimas e indispensáveis na batalha espiritual. A começar pelas
que surgem dentro de nós.

***
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CAPÍTULO 5

O DEUS DA BATALHA

PR. OSVALDO CHAVES

Mas o povo estava sedento e reclamou a Moisés: “Por que você nos tirou do Egito? Foi
para matar de sede a nós, aos nossos filhos e aos nossos rebanhos?” Então Moisés
clamou ao Senhor: “Que farei com este povo? Estão a ponto de apedrejar-me!”
Respondeu-lhe o Senhor: “Passe à frente do povo. Leve com você algumas das
autoridades de Israel, tenha na mão a vara com a qual você feriu o Nilo e vá adiante. Eu
estarei à sua espera no alto da rocha do monte Horebe. Bata na rocha, e dela sairá água
para o povo beber”. Assim fez Moisés, à vista das autoridades de Israel. E chamou aquele
lugar Massá e Meribá porque ali os israelitas reclamaram e puseram o Senhor à prova,
dizendo: “O Senhor está entre nós, ou não?”

Êxodo 17.3-7

Quando falamos sobre batalha espiritual, é necessário compreender, como já foi dito, que
a pior de todas as batalhas é aquela travada dentro de nós mesmos. No Novo Testamento
vemos os cristãos de Corinto, cuja visão a respeito do Senhor estava obscurecida e
precisava ser clareada à luz da Palavra. Já no Antigo Testamento percebemos claramente
que, assim como os cristãos de Corinto precisavam de fato conhecer a Deus, o povo de
Israel também necessitava descobrir que mais importante do que receber as bênçãos de
Deus é ter a sua presença. A maneira como enxergamos o Senhor faz toda a diferença
quando enfrentamos lutas espirituais, principalmente quando temos que lutar contra os
falsos deuses do Egito que insistem em permanecer dentro de nós.

Por que isso é importante? Pois nem sempre a batalha espiritual que teremos de travar
será contra um espírito maligno, mas contra nossa vaidade, nossa falta de conhecimento
de Deus, nossa desobediência.
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DEUS ESTÁ ENTRE NÓS?

Israel foi tirado do Egito por meio de sinais fantásticos e intervenções extraordinárias da
parte do Senhor. As dez pragas desafiaram todos os deuses do Egito e os humilharam. A
travessia pelo meio do mar a pés enxutos e o afogamento de todo o poderoso exército de
faraó demonstrou que não há deus como o Deus de Israel. O maná, que caiu do céu para
suprir a necessidade imediata de alimento, e a preservação de suas roupas e calçados
revelaram a provisão fiel de Deus Pai. O próprio Moisés chama a atenção do povo para a
singularidade daquele Senhor e do seu cuidado para com eles: “Pois, que grande nação
tem um Deus tão próximo como o Senhor, o nosso Deus, sempre que o invocamos?”
(Deuteronômio 4.7).

No entanto, havia um grande risco por trás de toda essa sucessão de eventos poderosos.
Israel poderia vir a crer num deus menor. Seu foco poderia ser posto apenas no poder, e
não também na palavra fiel desse Deus. Sua fé poderia se prender apenas à crença de
que suas necessidades imediatas seriam todas supridas oportunamente e que sua
experiência com o Senhor se resumiria a isso. Foi exatamente o que aconteceu.

Tão logo o povo começou a experimentar as primeiras dificuldades no deserto – e


certamente não é fácil viver no deserto –, passou a expressar seu descontentamento, a
ponto de sentir falta do Egito, do tempo em que eles eram escravos. Se cressem na
promessa fiel de um Deus que, muito mais do que fazer chover maná e carne, desejava
transformá-los de dentro para fora, eles saberiam que no final seriam conduzidos à boa
terra – com uma nova compreensão da vida. Se fossem capazes de entender os sinais
maravilhosos como um meio para um fim bem mais importante, permaneceriam firmes em
meio às provações.

Porém, eles só podiam crer no poder demonstrado em feitos extraordinários. Quando


faltava aquele poder, simplesmente viravam as costas e olhavam saudosamente para o
passado. A falta da manifestação de poder fazia-os duvidar até mesmo da mais preciosa
promessa do Senhor – a de que Sua presença estaria sempre com eles: “O Senhor está
entre nós, ou não?” (Êxodo 17.7). Não devemos ser tão apressados em julgar tal
comportamento, pois o que aconteceu naquela época com o povo escolhido por Deus se
repete aqui e agora, muitas vezes, conosco. Com a
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experiência de Israel na jornada pelo deserto, aprendemos valiosas lições para nossa
própria caminhada.

ACUSAÇÕES E SUSPEITAS

Quando cremos somente no poder revelado nos milagres e sinais, não somos capazes de
sobreviver às contrariedades. Nosso culto não é dirigido a Deus, mas ao seu poder; aos
milagres e sinais. O maior problema com o culto ao poder é que ele precisa sempre de
uma nova demonstração para se manter ativo. Aqui surge um problema: Deus não tem
compromisso com esse culto. Ele não se disporá a oferecer um show todas as vezes em
que nós nos sentirmos desmotivados. Se o nosso entendimento sobre Ele não estiver
claro, passaremos todo o tempo de escassez e luta acusando Deus ou os outros.

Tão logo saiu do Egito, “toda a comunidade de Israel reclamou a Moisés e Arão. Disseram-
lhes os israelitas: ‘Quem dera a mão do Senhor nos tivesse matado no Egito! Lá nos
sentávamos ao redor das panelas de carne e comíamos pão à vontade, mas vocês nos
trouxeram a este deserto para fazer morrer de fome toda esta multidão!’” (Êxodo 16.2,3).
Os 430 anos no Egito levaram aquele povo a confiar apenas no poder. Faraó dominava por
meio da demonstração de força. A dupla investidura do rei/deus – pretensão dos
governantes daquela época – confundia a mente do povo. Israel queria um deus que se
empenhasse na exibição de um poder confiável, que lhe desse segurança e desafiasse o
faraó. A grande preocupação em seus corações se voltava para o atendimento das
necessidades imediatas. Nas palavras de Paulo: “...seu deus é o estômago e eles têm
orgulho do que é vergonhoso; só pensam nas coisas terrenas” (Filipenses 3.19b).

Em circunstâncias adversas, em vez de descansarmos na fidelidade de Deus, de


tentarmos entender o propósito maior que Ele tem naquela situação – Ele sempre tem um
propósito –, suspeitamos do Senhor e não conseguimos nos contentar com a provisão do
pão (maná) de cada dia: “‘Ninguém deve guardar nada para a manhã seguinte’, ordenou-
lhes Moisés. Todavia, alguns deles não deram atenção a Moisés e guardaram um pouco
até a manhã seguinte, mas aquilo criou bicho e começou a cheirar mal. Por isso Moisés
irou-se contra eles” (Êxodo 16.19,20). Até mesmo a bênção que vem de Deus para suprir
nossas necessidades pode tomar outra forma – degradante, perversa – quando passamos
a confiar nela e a atribuir-lhe mais importância do que ao Deus que fez a provisão.
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Ainda assim o Senhor permanece fiel: “Como um pai tem compaixão de seus filhos, assim
o Senhor tem compaixão dos que o temem; pois ele sabe do que somos formados; lembra-
se de que somos pó” (Salmos 103.13,14). A fidelidade é um dos atributos do caráter de
Deus, por isso Ele jamais será infiel. O Senhor sabe muito bem do que somos feitos. Por
essa razão, mesmo diante da nossa ingratidão, Ele nos sustenta, pois se nos deixar por
nossa própria conta, certamente pereceremos. Então, seu cuidado para conosco nada tem
a ver com a questão de mérito.

O salmista Asafe trata com riqueza de detalhes essa relação de rebeldia versus graça
entre o povo no deserto e o Senhor Deus: “Mas contra ele continuaram a pecar,
revoltando-se no deserto contra o Altíssimo. Deliberadamente puseram Deus à prova,
exigindo o que desejavam comer. Duvidaram de Deus, dizendo: ‘Poderá Deus preparar
uma mesa no deserto?’ (...) Com a boca o adulavam, com a língua o enganavam; o
coração deles não era sincero; não foram fiéis à sua aliança. Contudo, ele foi
misericordioso; perdoou-lhes as maldades e não os destruiu. Vez após vez conteve a sua
ira, sem despertá-la totalmente” (Salmos 78.17-19; 36-38). Asafe tinha clara percepção da
graça extrema desse Deus que faz tudo unicamente para a sua glória e por amor ao seu
nome (Salmos 79.9).

A TRANSGRESSÃO DO PRIMEIRO MANDAMENTO

O povo ainda voltaria a murmurar muitas vezes. Mas essa postura não surpreenderia o
Senhor, pois Ele sabia perfeitamente o que estava em seus corações. Como vimos acima,
Israel fazia confissão verbal, mas seu coração não era sincero. Havia muitos deuses
estranhos povoando suas mentes (32.1). A verdadeira conversão – deles e nossa – é um
processo longo e constante. Muitos símbolos precisam ser abandonados; muitos pactos,
quebrados; muitos valores, revistos. Essa mudança não pode ocorrer em uma noite, ou em
apenas um evento. Aqui se encontra o valor do verdadeiro discipulado, do trabalho lento e
constante, da gestação de Cristo em nosso interior (Gálatas 4.19).

Somos pródigos em produzir deuses que se amoldem às nossas vaidades e desejos. Em


vez de almejarmos ter o caráter de Deus, optamos por fazer deuses adequados à nossa vil
humanidade – não é sem razão que os deuses gregos são famosos por revelar
características essencialmente humanas; são deuses feitos segundo o coração do homem.
Mesmo quando não fabricamos deuses em madeira ou barro, nós os concebemos em
nossas mentes. Assim como na constatação de Paulo em Atenas (Atos 17), descobrimos
em nós mesmos uma religiosidade latente, porém sofremos da pretensão de adorar a um
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Deus que não conhecemos. Nesse caso, ecoa o apelo do profeta Oséias: “Conheçamos o
Senhor; esforcemo-nos por conhecê-lo” (Oséias 6.3). Mais que todos os nossos esforços
por realizar tarefas ou oferecer sacrifícios, o Senhor deseja que tenhamos empenho em
conhecê-lo (Oséias 6.6; Miquéias 6.7,8).

Por tudo isso se fez extremamente necessária e relevante a dramática exortação de Josué
na assembléia de Siquém, muitos anos mais tarde: “Agora temam ao Senhor e sirvam-no
com integridade e fidelidade. Joguem fora os deuses que os seus antepassados adoraram
além do Eufrates e no Egito, e sirvam ao Senhor” (Josué 24.14). Josué sabia muito bem o
que estava fazendo. Às portas da Terra da Promessa, não faria sentido arrastar para
dentro de uma nova vida aquele povo com os seus velhos pecados e vícios. Ele foi capaz
de compreender que é relativamente simples retirar os deuses do altar e lançá-los fora,
mas não é tão simples tirá-los do coração. Esse conceito se estende por toda a Escritura e
é traduzido nos escritos de Paulo nos seguintes termos: “Despir-se do velho homem” e
“revestir-se do novo, criado para ser semelhante a Deus” (Efésios 4.22-24).

O PROCESSO DE PURIFICAÇÃO DO DESERTO

Dessa forma, entendemos por que o deserto é parte de um processo terapêutico utilizado
por Deus; funciona como um depurador da fé. É ali que se aprende a crer não apenas no
Deus de poder que realiza sinais e maravilhas, mas no Deus cuja aliança com Seu povo
exige que Ele tome a frente e seja o Bom Pastor. É o que diz o testemunho do próprio
Deus: “Lembrem-se de como o Senhor, o seu Deus, os conduziu por todo o caminho do
deserto, durante estes quarenta anos, para humilhá-los e pô-los a prova, a fim de conhecer
suas intenções, se iriam obedecer aos seus mandamentos ou não. Assim, ele os humilhou
e os deixou passar fome. Mas depois os sustentou com maná, que nem vocês, nem os
seus antepassados conheciam, para mostrar-lhes que nem só de pão viverá o homem,
mas de toda palavra que procede da boca do Senhor” (Deuteronômio 8.2,3). A verdadeira
questão aqui é a aliança de Deus com o povo. A obediência aos mandamentos é a
condição fundamental para a participação nos benefícios daquela aliança. A provisão, os
recursos e os milagres são apenas parte das ações salvíficas do grande “Eu Sou”.

O deserto é lugar de purificação; ali toda vaidade é trazida à tona e o coração é tratado. É
nele que enfrentamos o nosso maior adversário na batalha espiritual: nós mesmos. Nossas
intenções e pretensões são redirecionadas ou até mesmo substituídas por outras que
sirvam ao propósito de Deus. Foi assim que o Senhor Jesus se tornou aprovado. À
semelhança de Israel, Ele também foi levado pelo Espírito ao deserto (Mateus 4.1). Ali,
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entrou em contato com o mesmo dilema daquele povo: servir a Deus ou a si mesmo?
Satisfazer a vontade do Pai ou saciar a fome de pão? Amar a Deus acima de todas as
coisas ou criar deuses mentais que venham a se adequar ao limite da sua humanidade?
Ele escolheu ser fiel à vontade do Pai e assim sobreviveu ao deserto (Mateus 4.2-11). Não
há outro meio de atravessar para além do Jordão e entrar na Promessa a não ser pelo
deserto: “E aquele que não carrega sua cruz e não me segue não pode ser meu discípulo”
(Lucas 14.27). Nele, ou escolhemos o caminho da fidelidade a Deus e sobrevivemos ou
tombamos ante a fragilidade do que somos.

OS QUE CAÍRAM NO DESERTO

Mesmo que, em princípio, o povo tenha estado tão perto da verdade sobre Deus, com o
tempo acabou se afastando cada vez mais. A poucos dias da Terra Prometida, sua falta de
fé revelou quão longe estavam de Javé. No episódio dos doze espias (Números 13), no
retorno da missão de reconhecimento, dez homens trouxeram um relato desolador.
Descreveram a si mesmos como “gafanhotos” diante dos gigantes da terra de Canaã. Essa
autoimagem tão depreciativa mostra uma total falta de maturidade espiritual. Por outro
lado, dois deles, Josué e Calebe, expressaram a verdadeira fé no verdadeiro Deus – eles
reconheceram o tamanho do desafio, mas demonstraram total confiança em si mesmos e
no seu Deus. Eles não tinham fé na fé, mas confiavam na palavra do Deus que fez a
promessa – eles foram fiéis à aliança. O problema é que o povo se deixou levar pela
maioria e em uníssono chorou, rendendo-se ao medo e à incredulidade. Aqui não se trata
de ter muita ou pouca fé, mas apenas de confiar ou não na promessa.

Uma sentença pesada veio da parte do Senhor: “No entanto, juro pela glória do Senhor
que enche toda a terra, que nenhum dos que viram a minha glória e os sinais miraculosos
que realizei no Egito e no deserto, e me puseram à prova e me desobedeceram dez vezes
– nenhum deles chegará a ver a terra que prometi com juramento aos seus antepassados.
Ninguém que me tratou com desprezo a verá. (...) Nenhum de vocês entrará na terra que,
com mão levantada, jurei dar-lhes para sua habitação, exceto Calebe, filho de Jefoné, e
Josué, filho de Num” (Números 14.21-23,30).

Ao falar sobre o perigo da incredulidade, o autor aos Hebreus evoca esse momento crítico
do povo no deserto (Hebreus 3.7ss). Sua análise daqueles fatos ajuda-nos a entender o
que se passou com aquele povo. Ele fala do “coração perverso e incrédulo” que nos afasta
do Deus vivo (3.12); o deus que eles conheciam não era o Deus vivo. Também fala da
importância de nos apegarmos “até o fim à confiança que tivemos no princípio” (3.14). A
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caminhada pelo deserto é longa, assim como a caminhada da vida – não basta ser fiel até
certo ponto, mas é preciso ir até o fim. Nesse ponto, o mesmo autor tem uma palavra ainda
mais forte: “Pois as boas novas foram pregadas também a nós, tanto quanto a eles; mas a
mensagem que eles ouviram de nada lhes valeu, pois não foi acompanhada de fé por
aqueles que a ouviram” (4.2). Aqui está a questão central da sentença divina: apesar de
terem visto tudo o que o poder de Deus realizou, a palavra que lhes foi anunciada não foi
seguida de fé para a salvação.

Todos esses, contra os quais Deus esteve irado por quarenta anos, caíram no deserto
(Hebreus 3.17). Nada lhes faltou. Foram eles que atravessaram o mar a pés enxutos; que
beberam água da rocha; que viram a glória do Senhor. É curioso perceber que os que
caem geralmente são aqueles a quem nada falta, desde Adão. Por isso, Hebreus adverte:
“Portanto, esforcemo-nos por entrar nesse descanso, para que ninguém venha a cair,
seguindo aquele exemplo de desobediência” (4.11). Essa insatisfação que leva à queda só
pode ser domada por meio da disciplina de uma vida que se volta para Deus, dia a dia. O
maná de hoje não serve para o amanhã. A cada dia precisamos sair ao campo para colher
uma nova porção de graça e sustento da parte do Senhor. Até que um dia o veremos como
Ele é, conheceremos como somos conhecidos, nunca mais sentiremos qualquer
necessidade e seremos completamente satisfeitos.

A verdadeira fé é aquela que se sustenta, sobretudo, na esperança e no conhecimento da


promessa e na obediência à Palavra.

Assim se faz a verdadeira fé; ela é muito mais do que uma crença. É um tipo de
conhecimento ou interpretação da verdadeira finalidade da vida, que é servir aos
propósitos de um Deus de amor que tudo fez para a sua glória. Pedro é incisivo na
definição do sentido pleno da fé: a salvação das nossas almas (1 Pedro 1.9). Foi para isso
que Jesus Cristo se revelou: sua missão consiste em apresentar diante de si mesmo uma
igreja pura, gloriosa, sem mancha nem ruga, mas santa e irrepreensível (Efésios 5.25-27).
Cabe a cada cristão esquadrinhar as Escrituras em busca do entendimento dos termos
dessa aliança e viver por eles.

Por essa razão, Abraão é tido como paradigma da fé. Mesmo diante da possibilidade real
de perder o que lhe era mais precioso, ele creu que a promessa feita a ele seria realizada
– cumpriu-se em Abraão a máxima de Anselmo: (Anselmo de Cantuária viveu entre 1033 e
1109 na Europa. Foi um teólogo e filósofo muito influente em seu tempo, formulando
conceitos que buscavam conciliar a fé e a razão) “Crer para compreender; a fé em busca
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de entendimento”. O propósito maior é agradar aquele que fez a promessa. Por esse
motivo aquele crente subiu o monte Moriá com a decisão firme de obedecer a Deus, ainda
que o seu coração sangrasse dentro do peito. “Assim, quer vocês comam, bebam ou
façam qualquer outra coisa, façam tudo para a glória de Deus” (1 Coríntios 10.31). Essa fé
sustentou o Filho de Deus em suas maiores provas (Mateus 4.1-4). Pode parecer estranho
pensar que Jesus precisou de fé, mas o fato é que Ele não só precisou como expressou
sua fé muitas vezes: “Durante seus dias de vida na terra, Jesus ofereceu orações e
súplicas, em alta voz e com lágrimas, àquele que o podia salvar da morte, sendo ouvido
por causa da sua reverente submissão. Embora sendo Filho, ele aprendeu a obedecer por
meio daquilo que sofreu” (Hebreus 5.7,8). Pode-se perceber isso em sua agonia no
Getsêmani: “Meu Pai, se for possível afasta de mim este cálice; contudo, não seja como eu
quero, mas sim como tu queres” (Mateus 26.39).

Paulo também se apegou à fé na vontade soberana de Deus para suportar as várias


situações-limite por que passou: “Mas temos esse tesouro em vasos de barro, para mostrar
que este poder que a tudo excede provém de Deus, e não de nós. De todos os lados
somos pressionados, mas não desanimados; ficamos perplexos, mas não desesperados;
somos perseguidos, mas não abandonados; abatidos, mas não destruídos” (2 Coríntios
4.7-9). O que sustentava esse homem em meio a tanta contrariedade? A esperança na
fidelidade daquele que fez a promessa. Para Paulo, só há verdadeira vida em Cristo, e a
própria morte torna-se lucro, cumprindo-se o propósito de Deus (Filipenses 1.20,21).

Pedro expressa claramente qual é a função do poder de Deus manifestado na vida dos
seus filhos: “Seu divino poder nos deu tudo de que necessitamos para a vida e para a
piedade, por meio do pleno conhecimento daquele que nos chamou para a sua própria
glória e virtude” (2 Pedro 1.3). Ao refletirmos cuidadosamente nesse único versículo,
perceberemos que:

a) Pelo seu poder, Deus nos dá tudo de que necessitamos – não tudo o que queremos
– e isso deve nos encher de paz e confiança;

b) Ele nos dá para que pratiquemos uma vida piedosa – há uma finalidade bem clara
na liberação do seu poder e provisão;

c) Essa prática deve ter como base/meta o pleno conhecimento da pessoa de Jesus.
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Então, o que Deus faz tem a finalidade de revelar o que Deus é. Tudo o que Ele criou e
cria tem como propósito final a exaltação da sua glória.

TUDO PARA A GLÓRIA DE DEUS

Semelhantemente ao povo de Deus no passado, em muitos momentos nós adulamos o


Senhor com a boca, “enganamos” com a língua, mas o nosso coração não é sincero. Não
somos fiéis à sua aliança. O que dizemos sobre Deus nem sempre reflete algo sobre Ele,
de fato. Quando lemos em um adesivo: “Deus é fiel”, na maioria dos casos essa
declaração nada tem a ver com Deus. Só estamos dizendo que conseguimos obter aquele
bem em que colamos o tal adesivo e estamos felizes por isso. Na verdade, dizer que Deus
é fiel não pode ser uma atitude associada ou condicionada à suposta prova dessa
fidelidade. Deus é fiel porque a fidelidade faz parte do seu caráter, faz parte do seu ser. Ele
permanecerá fiel, mesmo quando eu não conseguir obter aquilo que desejo – foi assim
com o seu Filho amado.

No entanto, se a nossa fé só pode se sustentar ante a manifestação do seu poder, ela


corre o risco de morrer nesse deserto sem que possamos conhecer o verdadeiro Deus.
Assim como a mulher de Jó, reduziremos Deus ao tamanho das circunstâncias de tempo e
espaço. Para o bem da nossa fé, da verdadeira fé no verdadeiro Deus, Jó conseguiu
discernir como poucos a verdade sobre Deus e o tipo de relacionamento que o Todo-
Poderoso tem com os homens: “Aceitaremos o bem dado por Deus, e não o mal?” (Jó
2.10); e ainda: “Embora ele me mate, ainda assim esperarei nele” (Jó 13.15a).

O compromisso do Deus revelado nas Sagradas Escrituras é em primeiro lugar com a sua
glória e com o louvor do seu nome. Nas palavras de John Piper: “Deus é a pessoa mais
teocêntrica do universo”. (PIPER, John. Irmãos Nós Não Somos Profissionais. Shedd
Publicações: São Paulo 2009; p. 20) Infelizmente, temos sido bombardeados por uma
pregação antropocêntrica, na qual Deus, ou melhor, o que supomos ser deus, tem
obrigações para conosco. Afinal, nós o aceitamos e, assim, o entendemos
equivocadamente, Ele teria assumido tais obrigações. Dessa maneira, o homem está no
centro, ele é merecedor.

O fato é que esse delírio provocado pela liberdade da qual desfrutamos fez-nos esquecer a
pregação primitiva: “Meus irmãos, quero que saibam que mediante Jesus lhes é
proclamado o perdão dos pecados. Por meio dele, todo aquele que crê é justificado de
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todas as coisas das quais não podiam ser justificados pela Lei de Moisés” (Atos 13.38,39).
Toda a arrogância e a prepotência da religiosidade judaica se baseavam na
incompreensão desse fato. Então, construíram um edifício religioso com base num sistema
meritório, pela observância externa dos termos da lei mosaica. Mas seus corações
continuavam conservando os mesmos velhos hábitos da vida na impiedade. Nas palavras
de Jesus, em Lucas 11.39: “Vocês, fariseus, limpam o exterior do copo e do prato, mas
interiormente estão cheios de ganância e de maldade”. Os judeus não aceitavam a graça,
porque viver a graça de Jesus impõe a inversão do processo que eles viviam.

É preciso limpar o interior do prato e viver o dia a dia confiando apenas na graça,
praticando a justiça e a verdade. Com base nisso, o discípulo de Jesus entende que:

a) Ele não merece nada do que recebe – e tudo o que ele é e possui vem de Deus:
“Tudo vem de ti e nós apenas te demos do que vem das tuas mãos” (1 Crônicas 29.14b);

b) por receber tanto de Deus sem nada merecer, a única atitude sensata do discípulo é
servir a Jesus bem enquanto viver, seguindo o exemplo do apóstolo Paulo: “... nem
considero a minha vida de valor algum para mim mesmo, se tão somente puder terminar a
corrida e completar o ministério que o Senhor Jesus me confiou” (Atos 20.24). Não se trata
de expressar gratidão – não no sentido de tentar cobrir a medida do bem recebido das
mãos de Deus mediante o serviço a Ele – mas “gratuidade”, pela doação da vida em
resposta ao amor extremo derramado em nossos corações.

Talvez seja o caso de recuperar a compreensão primitiva da provisoriedade dessa vida;


assumir o custo da decisão de não vivê-la como um fim em si mesmo, de não amar a
criatura acima do Criador.

O cerne da mensagem cristã é a glória de Deus. Por toda a Bíblia, desde o Antigo
Testamento, encontramos marcas profundas dessa mensagem. Nos livros da lei: “(...) eu
serei glorificado por meio do faraó e de todo o seu exército (...)” (Êxodo 14.4b); nas
palavras dos profetas: “Por amor do meu próprio nome eu adio a minha ira; por amor do
meu louvor eu a contive, para que você não fosse eliminado” (Isaías 48.9); “Embora os
nossos pecados nos acusem, age por amor do teu nome, ó Senhor!” (Jeremias 14.7ab);
nos salmos: “Ajuda-nos, ó Deus, nosso Salvador, para a glória do teu nome;” (Sl 79,9a);
“Não a nós, Senhor, nenhuma glória para nós, mas sim ao teu nome, por teu amor e por
tua fidelidade” (Salmos 115.1). Não temos dificuldade em aceitar a graça. O nosso
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problema é permanecer na graça. Essa era a recomendação de Paulo aos irmãos de


Antioquia (Atos 13.43) – continuem na graça. Ele tinha plena consciência de que o cristão
deve ter como alvo a glória de Deus em tudo o que faz (1 Coríntios 10.31), pois a
finalidade de tudo o que a Escritura revela é que Deus seja TUDO em todos (1 Coríntios
15.28).

A aliança de Jesus com os seus discípulos está fundamentada numa clara noção de
serviço. Nos seus últimos momentos com eles, naquela hora em que Ele só podia pensar
em algo que fosse absolutamente essencial, sua escolha foi convidá-los para uma última
refeição. Após aquele momento tão singularmente especial, os discípulos passaram a
disputar entre si qual deles seria o maior – isso é o que somos nós. Diante disso, Jesus
tomou uma bacia com água, uma toalha, e passou a lavar-lhes os pés – isso é o que
precisamos ser (cf. Lucas 22; João 13). Ao propor a série de parábolas das “coisas
perdidas” (Lucas 15), Jesus deixa uma clara lição da correta relação do pecador com a
graça recebida. É preciso perder tudo, vender tudo, desamar a tudo e correr para os
braços do Pai.

O VERDADEIRO DEUS REVELADO EM CRISTO

Jesus falou à mulher samaritana sobre os verdadeiros adoradores e o verdadeiro culto


(João 4), o que pressupõe uma falsa adoração e um falso culto. Falou também aos judeus
que o perseguiam, mostrando-lhes a incoerência da sua religiosidade: “Vocês estudam
cuidadosamente as Escrituras, porque pensam que nelas vocês têm a vida eterna. E são
as Escrituras que testemunham a meu respeito; contudo, vocês não querem vir a mim para
terem vida” (João 5.39,40). Essa declaração de Jesus é de grande importância, pois deixa
claro que é possível que alguém examine e “estude cuidadosamente” as Escrituras e nelas
encontre algo bem diverso daquilo que Ele veio revelar. E mais, mostra que o estudo da
Bíblia por si só pode não levar a Cristo. Em ambos os casos, Jesus procura alertar para o
perigo da devoção a um deus desconhecido. Isso fica ainda mais evidente na declaração
de João 8.19: “Vocês não conhecem nem a mim, nem a meu Pai”. Só Jesus pode revelar o
verdadeiro Deus, pois Ele é o verdadeiro Deus e a vida eterna (1 João 5.20); “Quem me
vê, vê o Pai” (João 14.9). Então, qualquer aproximação das Escrituras em busca do
verdadeiro Deus deve ser feita em humildade de espírito e livre de preconceitos, em inteira
rendição a Jesus Cristo, sem “mas”.

Paulo dedica boa parte de seus escritos a demonstrar qual é o Cristo que ele anuncia (1
Coríntios 1.23; 2.2; Romanos 5.8; Gálatas 3.1; 6.14; Colossenses 1.20; 2.4). Sua
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mensagem mostra que a Cruz é o centro da mensagem cristã. Mas o Cristo crucificado é
escândalo para os judeus e loucura para os gentios, pois estes buscavam o deus da
sabedoria e aqueles o deus dos sinais e milagres – herança da geração que caiu no
deserto.

O fundamento pode ser o correto, mas a edificação sobre ele precisa preservar a correção
(1 Coríntios 3.10-15). Os gálatas começaram a carreira de modo correto, mas aos poucos
se deixaram desviar da retidão (Gálatas 3.1ss). É plausível deduzir que a Igreja primitiva
ainda oscilava entre o verdadeiro Deus e o falso e que a causa disso era o entendimento
equivocado da verdade do Evangelho. Então, mesmo sendo grato pelo simples fato de os
irmãos demonstrarem fé e amor ao Senhor Jesus, Paulo orava por eles para que
entendessem qual era a esperança à qual foram chamados (Efésios 1.15-19). A teologia
paulina é pontilhada pela esperança. Não se trata de otimismo em relação às coisas
terrenas, mas de confiança e certeza na consumação da obra que Deus, um dia, começou
em cada um de nós (Romanos 8.18-27; Filipenses 1.6). (Saiba mais em ZÁGARI, Maurício,
A Verdadeira Vitória do Cristão. Rio de Janeiro: Anno Domini, 2012)

A primeira vez que li as palavras de 1 Coríntios 11, fui tomado de pânico. Nesse trecho das
Sagradas Escrituras, pude ver que é perfeitamente possível nos reunirmos como Igreja, em
nome de Deus, tendo o mobiliário disposto corretamente, a Palavra de Deus nas mãos, os
sacramentos diante de nós, o “povo de Deus” no mesmo lugar e, ainda assim, não termos
um culto verdadeiro. E mais: é possível que, nesse caso, o culto nos faça mais mal do que
bem (1 Coríntios 11.17). Paulo usa palavras pontiagudas e que fazem perceber que
precisamos nos dispor constantemente ao autoexame quanto à validade da nossa fé e
consequentemente do nosso culto: “Quando vocês se reúnem [para participar da ceia], não
é para comer a ceia do Senhor”; “Examine-se cada um a si mesmo, e então coma do pão e
beba do cálice. Pois quem come e bebe sem discernir o corpo do Senhor, come e bebe
para sua própria condenação” (1 Coríntios 11.20,28,29).

Então, cooperando com a palavra de Jesus à samaritana, é possível que venhamos a


oferecer um falso culto, provocado por uma falsa ideia de Deus e de sua obra. Isso me faz
tremer. Antes de Jesus vir ao mundo e antes dos ensinos de Paulo, Isaías já alertava o
povo de Deus sobre o falso e o verdadeiro culto. O profeta denunciou que não havia prazer
em Deus pelo culto que o povo oferecia, pelo contrário, Ele expressava repugnância
(Isaías 1.11-13). Se o alvo for a glorificação do verdadeiro Deus, o culto a Ele precisa ser
feito em conformidade com a prática da justiça (Isaías 58).
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LANÇANDO FORA OS FALSOS DEUSES

Como restaurar o verdadeiro culto? A primeira coisa a fazer é retomar o conceito bíblico do
verdadeiro Deus. Vivemos um tempo em que grande parte das pessoas que frequenta a
igreja só conhece o Senhor de ouvir falar – da mesma forma que Jó, antes da sua
experiência transformadora no deserto. Consequentemente, essas pessoas não
experimentam a necessária devoção que precede o culto. De fato, precisamos retomar a
compreensão sobre a nossa relação com Deus típica do primeiro amor. O chamado do
Senhor ao homem é para que, uma vez liberto, o seu caminho seja conduzido por Deus. O
Senhor não quer ser apenas aquele que “abençoa” – não no sentido triunfalista onde a
palavra “bens” virou sinônimo de bênção – mas quer, principalmente, ser o Guia do
caminho dos seus filhos. É para isso que Ele nos liberta; para que possamos tomar a
decisão livre de lhe rendermos inteiramente nossas vidas.

Antes de conhecermos o Senhor, vivíamos guiados por desejos e paixões egoístas que
nos levavam à obediência ao curso desse mundo. Nesse estado, a Bíblia diz que
estávamos mortos (Efésios 2.1-3). Aqui há um diálogo que precisa ser considerado
constantemente: se vivermos para o pecado, morremos para Deus; se vivermos para
Deus, morremos para o pecado.

É por isso que, muitas vezes, o Senhor permite que as lutas venham, pois por meio
delas o Pai nos leva de volta à obediência e à retidão, o que possivelmente redundará em
bênção (Salmos 119.67): “Antes de ser castigado, eu andava desviado, mas agora
obedeço à tua palavra”.

É necessário lançar fora os falsos deuses aos quais servíamos antes de conhecer o
Senhor Jesus. Ninguém pode ver o Reino sem nascer de novo, mas o novo nascimento é
apenas o início de uma longa jornada que só pode ser levada a efeito com muita seriedade
e disciplina. O homem natural não nasce nem um pouco disposto a seguir a vontade do
Senhor. A nossa herança original é a natureza de Adão – arrogante e desobediente. Os
salmistas sabiam que o caminho do Senhor precisa ser aprendido: “Ensina-me o teu
caminho, Senhor, para que eu ande na tua verdade; dá-me um coração inteiramente fiel,
para que eu tema o teu nome” (Salmos 86.11). Também sabiam que a iluminação desse
caminho vem da Palavra de Deus (Salmos 119.105). Quando aprendemos o caminho e
passamos a andar por ele, então Deus deixa de ser apenas uma ideia nebulosa em nossas
mentes para ser o verdadeiro Senhor.
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CONCLUSÃO

Precisamos buscar ajuda em Deus para abrir mão de toda ideia distorcida que temos a seu
respeito. Tal postura nos levará a abandonar os falsos deuses que formulamos em nossas
mentes por causa da nossa vaidade. Sendo assim, as necessidades cotidianas não
determinarão a nossa fé nele, pois sabemos que não estamos em condições de exigir
nada, pois tudo de melhor que o Senhor poderia nos dar, Ele já nos deu. Então, ficaremos
livres de todo jugo e viveremos contentes com o que Ele faz e confiantes na sua provisão,
agora e no futuro. E, assim, saberemos com certeza que o Deus dos Exércitos sempre
estará ao nosso lado na hora em que formos enfrentar toda e qualquer batalha espiritual.

***

Sim, nossa luta não é contra o sangue e a carne, mas contra os principados e potestades,
contra os dominadores deste mundo tenebroso, contra as forças espirituais do mal, nas
regiões celestes. Sim, Satanás e seus demônios militam contra nós. E sim, estamos em
guerra espiritual. Mas não podemos parar aí. Temos que saber também que sim, Deus é
muito mais poderoso que Satanás. Sim, o maior campo de batalha espiritual, onde o
Adversário lança seu mais intenso bombardeio, é a nossa mente. Sim, a Palavra de Deus é
nossa maior arma nessa luta, junto com a fé, a esperança e o amor. E sim, Cristo tem
sempre que ser o foco da nossa vida, das nossas preocupações e de nossos cultos, e não
as hostes espirituais da maldade.

Vivemos num mundo tenebroso e em dias sombrios. Mas não apenas porque há demônios
entre nós ou porque o Diabo anda ao nosso derredor buscando a quem possa tragar. As
trevas e sombras que recaem sobre a Igreja de Jesus Cristo têm origem em grande parte
dentro das nossas próprias congregações. Pois muitos de nós têm devotado muito mais
atenção aos demônios do que a Cristo.
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Ou seja: trocamos o prato principal pela sobremesa. Trocamos o primário pelo secundário.
Trouxemos para o epicentro da nossa vida de fé algo que deveria estar na periferia. Jesus
não dava conversa para demônios. Sua metodologia consistia simplesmente em “Cala-te e
sai”. Mas só isso não dá ibope, não sustenta um “ministério”, não gera congressos, não
atrai pessoas amedrontadas, não cria shows de TV. O que desperta a mórbida curiosidade
dos temerosos e desinformados adeptos dos ensinos atuais de “batalha espiritual” – com
técnicas, mapeamentos, hierarquias, nomes e mil outras informações fornecidas por
supostos ex-satanistas, por demônios mentirosos que se manifestam em exorcismos ou
por pessoas que tiveram “revelações” – são esses seres do mal, que passaram a ditar as
ações de suas vidas de fé.

Os adeptos dessa corrente de “batalha espiritual” repreendem mais os demônios do que


oram a Deus. Dedicam-se mais ao estudo das supostas verdades ocultas do que a uma
boa análise teológica. Fascinam-se por séries intermináveis de livros de autores que
garantem ter tido experiências sobrenaturais, arrebatamentos e outras vivências que
revelam o que a Bíblia não diz.

É possível que um ou outro desses relatos seja verídico? Que o que os demônios digam
em sessões de exorcismo seja verdade? Só Deus o sabe. Mas essas são as perguntas
erradas. As perguntas certas são: de que modo esses relatos e essas afirmações afetam
minha caminhada de fé? Aproximam-me mais de Cristo? Tornam-me um cristão melhor?
Ajudam-me a amar mais a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a mim mesmo?
Estimulam em mim a manifestação do fruto do Espírito? Levam-me ao arrependimento dos
meus pecados? Conduzem-me a buscar em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua
justiça? Fazem a minha adoração ser mais bíblica, cristocêntrica e realizada em espírito e
em verdade?

Essa é a questão. Se sairmos bem de uma batalha espiritual mas não dissermos “sim” a
essas perguntas... terá de fato sido um triunfo? Ou apenas placebo? Como em tudo no
bom combate da fé, devemos buscar na Bíblia a resposta. Em nenhuma outra fonte: na
Bíblia e na Bíblia somente. E as palavras de Jesus proferidas no Sermão do Monte nos
dão uma boa pista sobre isso. Ouçamos o que o Mestre diz, como registrado no capítulo 7
do evangelho segundo Mateus:

Cuidado com os falsos profetas. Eles vêm a vocês vestidos de peles de ovelhas, mas por
dentro são lobos devoradores. Vocês os reconhecerão por seus frutos. (...) Nem todo
aquele que me diz: ‘Senhor, Senhor’, entrará no Reino dos céus, mas apenas aquele que
faz a vontade de meu Pai que está nos céus. Muitos me dirão naquele dia: ‘Senhor,
Senhor, não profetizamos em teu nome? Em teu nome não expulsamos demônios e não
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realizamos muitos milagres?’ Então eu lhes direi claramente: Nunca os conheci. Afastem-
se de mim vocês, que praticam o mal!

Vemos então que expulsar demônios não é credencial para ninguém afirmar que conhece
Cristo. Chamar Jesus de “Senhor” também não. Mas sim dar bons frutos. Mateus 3.10
afirma: “O machado já está posto à raiz das árvores, e toda árvore que não der bom fruto
será cortada e lançada ao fogo”. Qualquer semelhança com o Salmo 1 não é mera
coincidência:

Como é feliz aquele que não segue o conselho dos ímpios, não imita a conduta dos
pecadores, nem se assenta na roda dos zombadores! Ao contrário, sua satisfação está na
lei do Senhor, e nessa lei medita dia e noite. É como árvore plantada à beira de águas
correntes: Dá fruto no tempo certo e suas folhas não murcham. Tudo o que ele faz
prospera! Não é o caso dos ímpios! São como palha que o vento leva. Por isso os ímpios
não resistirão no julgamento, nem os pecadores na comunidade dos justos. Pois o Senhor
aprova o caminho dos justos, mas o caminho dos ímpios leva à destruição!

Ser bem-sucedido na grande batalha espiritual é tornar-se como essas árvores: plantadas
à beira de águas correntes, que dão fruto no tempo certo e cujas folhas não murcham. Que
assim seja nossa vida, como ramos ligados à Videira Verdadeira e não a qualquer figueira
seca. Se não, não teremos vida. Pelo contrário, seremos amaldiçoados pelo Senhor,
secaremos e morreremos. Mas se nos mantivermos ligados à Videira de onde vem a seiva
da vida teremos vida em abundância nesta terra. E, mais importante: teremos vida ao lado
de Deus por toda a eternidade.
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CAPÍTULO 6

ASPECTOS POSITIVOS E NEGATIVOS DA BATALHA ESPIRITUAL

ASPECTOS POSITIVOS

Inicialmente, é preciso arrolar os aspectos positivos do atual movimento de discernimento


da batalha espiritual. No entanto, qualquer lista que se faça está longe de ser exaustiva e
completa, elegendo apenas alguns dos movimentos básicos que precisam ser pensados
por nós.

Pensando, portanto, inicialmente, nos aspectos positivos do movimento de batalha


espiritual, dizemos que o seu aspecto responsivo em relação à tendência atual é positivo.

Eu, particularmente, gosto de tudo aquilo que responde à realidade. De alguma forma, nós
estamos, durante anos, refletindo sobre a necessidade de a Igreja ser uma instituição que
responda à realidade.

O atual movimento de batalha espiritual - sem que aqui haja qualquer justificativa dos seus
conteúdos e do que está sendo pregado - mostra que a Igreja foi capaz de dar um "bate-
pronto”, ou seja, aquele chute de primeira, na linguagem futebolística. Há nesse
movimento, portanto, uma resposta imediata.

O segundo aspecto positivo é a releitura da Bíblia nessa perspectiva, ou seja: todos os


acontecimentos mundiais que nos cercam, forçando a Igreja a dar uma resposta, fazem
também a Igreja reler a Bíblia com outros olhos. Começa-se a descobrir que a Bíblia fala
de coisas que até então se pensava não existirem. Assim, qualquer situação externa
secular, ampla, que de algum modo cercou e cerceou a Igreja, forçou- a a refletir e a
responder a tais questões de uma maneira mais adequada. Há uma quantidade enorme de
textos bíblicos que, em outras ocasiões, estavam esquecidos “na prateleira”, postos de
lado, mas que agora estão sendo recuperados e repensados, tornando-se objetos de
reflexão. O problema surge quando as coisas se tornam exageradas, porque toda e
qualquer releitura da Bíblia que se torna exagerada, de algum modo, deforma-se e adoece.
Mas, ainda que exageradas, essas releituras acabam sendo úteis àqueles que ouvem
todas as coisas e estão dispostos a reter o que é bom, com uma mente madura e
equilibrada.

Eis alguns exemplos: há algumas décadas, houve um movimento na Igreja Evangélica no


mundo que era o da teologia da secularização, a qual era extremamente exagerada.
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Aqueles que embarcaram nela apaixonadamente acabaram perdendo a fé, perdendo a


espiritualidade e a possibilidade de se relacionarem com o invisível, tornando-se áridos e
secos. Houve outros, todavia, que não embarcaram naquela teologia, mas que
conseguiram resgatar dela o aspecto positivo, qual seja, a convocação de levar o sagrado
e a espiritualidade para o mundo. Ora, essa é uma convocação positiva, porém só foram
capazes de fazê- la e de executá-la aqueles que foram capazes de fazerem uma reflexão
crítica, discernindo o que servia ou não, o que era ou não de acordo com a Palavra de
Deus.

Outro exemplo é o da teologia da esperança, que cerca de 30 anos passados exacerbou a


consciência de alguns, fazendo-os mergulharem num mundo de utopias irrealizáveis,
frustrando e amargurando todos aqueles que nela acreditaram ardorosamente. Mas,
mesmo assim, ela deixou um "saldo positivo” àqueles que a discerniram não de forma
ardorosa, fazendo-os concluir que a fé cristã precisa ter referenciais utópicos que sejam
seus engravidadores, sendo aqueles que remetem para adiante, estabelecendo
referências maiores do que a mediocridade circundante.

A Teologia da Libertação é um outro bom exemplo. Com ela ocorreu a mesma coisa. Os
que creram nela obcecadamente reduziram o mundo ao estômago e aos elementos sociais
e econômicos, perdendo, deste modo, uma série de outras percepções. Entretanto, os que
foram capazes de encará-la como um movimento que continha aspectos positivos,
integrando-os às suas vidas tais como os elementos relacionados às práticas sociais, os
quais são úteis e inteiramente bíblicos - não exacerbaram o que de bom havia nessa
teologia.

Em qualquer situação é sempre assim: os exageros são sempre perniciosos (eu,


pessoalmente, acredito que o diabo é o pai dos exageros).

A terceira tendência positiva no movimento de batalha espiritual é a sua busca de


discernimento espiritual. No atual movimento de batalha espiritual há todo um desejo de
compreender o mundo espiritual, de discernir principados, potestades, sendo levada a
sério essa tarefa, procurando desnudá-los, objetivando discernir o que acontece nas
regiões celestiais.

O quarto aspecto positivo no movimento de batalha espiritual é que o seu espírito de


combatividade é apreciável, como a criação de um louvor de guerra bonito, gostoso
extremamente desafiante, fazendo-nos deixar de lado os cânticos mais tradicionais, para
entoarmos canções mais aguerridas como, por exemplo, “Ele é o Leão da tribo de Judá” e
"O nosso General é Cristo”. Tais louvores têm a propriedade de elevarem a alma a um
estado de exaltação tão tremendo, que faz uma pessoa sentir-se capaz de, em nome de
Jesus – O qual é o “Leão da tribo de Judá”, e O qual também é o “nosso General” -, vencer
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qualquer inimigo, mesmo que seja o diabo. Sem dúvida alguma, tais cânticos são muito
mais motivantes para esta geração do que aqueles hinos tradicionais (com algumas
exceções, é claro!), porque estes não nos desafiam a um confronto com o inimigo -
conquanto eu acredite que estes hinos tenham a sua hora e o seu espaço, convidando-nos
para uma reflexão mais intimista.

O quinto aspecto positivo no movimento de batalha espiritual é a sua visão estratégica da


cidade, especialmente nos contextos urbanos. Há um apelo enorme para que se
compreendam as relações que se estabelecem dentro dela e para que se compreendam
as forças que operam nela; quais são os principados e potestades que se assenhorearam
das estruturas urbanas? Isso tudo tem um valor enorme, no que se refere à evangelização
urbana, a qual não é feita sem que aqueles que a praticam tenham a visão da cidade como
um grande ente social, que precisa ser discernido e enfrentado no conjunto das forças
visíveis e invisíveis componentes desse ajuntamento humano.

Esses são alguns aspectos positivos do movimento de batalha espiritual que merecem
destaque, portanto. Em contrapartida, também acredito ser importante listar alguns
aspectos negativos desse movimento, os quais não devem ser entendidos como
resultantes de uma reflexão pessoal crítica e azeda, mas apenas como a revisão deles,
objetivando uma proposta equilibrada.

ASPECTOS NEGATIVOS

O primeiro aspecto negativo é a ênfase no macro, no grande, que tem roubado a


percepção do micro, instância na qual as pessoas reais existem na espiritualidade. Ou
seja, hoje em dia, vêem-se freqüentemente as pessoas “amarrando” demônios nos ares.
Pessoas vão às praças públicas, fazendo o exercício de “amarrar” os principados e as
potestades, dizendo:

“- Tá amarrado!”

No entanto, os possessos continuam nas esquinas. O que é interessante no movimento de


batalha espiritual é que cada vez mais ele está mais macro, porém cada vez mais menos
encarnado; cada vez mais gigante, intentando "amarrar” os demônios que atuam na
cidade, entretanto pessoas possessas continuam transitando pelas ruas.
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Outra nuance do macro, que vai vencendo o micro, é que se ora cada vez mais em grupo,
todavia menos individualmente. Vê-se uma ênfase enorme nas atitudes públicas e
coletivas como ir à praça “amarrar” demônio, orar em público, cantar em público... Mas, a
pergunta que faço é a seguinte: como são tais pessoas em casa, sozinhas? Será que toda
a exaltação e fervor demonstrados em público continuam? Parece que não.

O segundo aspecto negativo do movimento de batalha espiritual é que a ênfase no


invisível tem roubado em muito a visão do visível. Todos estão “especialistas” em ver o
invisível; porém, estão cegos para ver o visível. Por exemplo: batalhamos contra os
exércitos nas regiões invisíveis, entretanto esquecemo-nos da prostituta, que é um ser
visível e que carece da nossa ajuda. Mas, “amarram-se” principados e potestades nas
regiões celestiais (eu não tenho nada contra isso! Acredito que se deve enfrentá-los com
oração, em nome de Jesus), em detrimento da prostituta, do drogado, do menor de rua,
dos seres visíveis e cotidianos - os quais não devem ser jamais esquecidos - com os quais
nos deparamos na nossa cidade e no nosso país.

Outro exemplo é que se enfrenta o espírito de corrupção do país, mas se vota num
candidato evangélico corrupto. É um paradoxo: “amarram-se” principados e potestades nas
regiões celestiais, mas se vota num candidato evangélico visivelmente corrupto. Se se quer
“amarrar” o demônio da corrupção, deve- se começar por não votar em candidato
evangélico corrupto, começando, com isso, a fazer um “exorcismo” no Congresso.

Um outro exemplo ainda pode ser dado. “Amarra-se” o espírito de violência sobre o Rio de
Janeiro, mas não se faz nada contra os agentes visíveis da violência que atuam entre nós,
destruindo e deturpando a vida de crianças nas ruas, e corrompendo a vida de homens e
de mulheres. Faz-se nada, ou quase nada contra isso.

O terceiro aspecto negativo do movimento de batalha espiritual é que a ênfase no


discernimento dos espíritos tem causado muita neurose. Há tanta gente discernindo
espíritos a toda hora e em todo lugar, que até mesmo já discerniu o seu próprio espírito
como maligno. Pessoas têm adoecido em razão disso. De vez em quando, encontro com
uma dessas irmãzinhas fervorosas, que fazem diariamente orações de batalha espiritual,
que me dizem - recorrendo ao dito popular - o seguinte:

“- Pastor, por que quanto mais eu rezo, mais assombração me aparece?"

Eu lhe respondo:
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"- Deixa o diabo em paz! A senhora não dá sossego a ele o dia inteiro!...”

Certa vez me encontrei com uma irmã, num outro país, a qual me falou o seguinte:

“- Eu vim para Europa, mas estou aqui com uma lista de pedidos pelos quais devo orar. Eu
entro no banheiro, oro. Ando na rua orando. Mas, conquanto ore, minha cabeça está um
inferno!”

Eu lhe respondi:

“- Sabe por quê? Mesmo que o diabo não existisse, alguém que pensa na vida apenas
considerando as lutas, as opressões e as dificuldades, como a senhora pensa, está
vivendo num inferno. Não precisa de diabo nem de demônio. A senhora já se basta,
vivendo desse modo.”

Cuidado com esse tipo de gente que vê diabo em todas as coisas! Tenho, particularmente,
muito medo de qualquer espiritualidade que vê o diabo mais ativo no mundo do que o
Espírito de Deus. Qualquer espiritualidade que vê o diabo agindo mais intensamente no
mundo do que o Espírito Santo de Deus está doente. Não se pode viver uma
espiritualidade que faça do diabo o ser mais poderoso do mundo do que Deus; não se
pode viver uma espiritualidade que faça de espíritos malignos os agentes mais atuantes do
mundo do que o Espírito Santo de Deus. Afinal de contas, devemos acreditar no que nos
diz o apóstolo João:

"(...) porque maior é aquele que está em vós do que aquele que está no mundo.”

(I João 4:4b)

O quarto aspecto negativo do movimento de batalha espiritual é a ênfase maniqueísta da


luta do bem contra o mal. Ou seja: parte do movimento de batalha espiritual vê o mundo
assim: as forças da luz de um lado contra as forças das trevas de outro. É o bem contra o
mal. Essa visão maniqueísta da luta do bem contra o mal cega a visão de que bem e mal
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se interpenetram na história humana desde a queda, no Éden. A primeira ocorrência de


maniqueísmo se deu antes da queda do homem. Em Gênesis 1:4b isto pode ser verificado:

“(...) e fez separação entre a luz e as trevas.”

Hoje em dia, bem e mal se interpenetram. Basta ler o que Paulo escreveu aos romanos
sobre o conflito que se operava em sua alma:

“Porque nem mesmo compreendo o meu próprio modo de agir, pois não faço o que prefiro,
e, sim, o que detesto. Ora, se faço o que não quero, consinto com a lei, que é boa. Neste
caso, quem faz isto não sou eu, mas o pecado que habita em mim. Porque eu sei que em
mim, isto é, na minha carne, não habita bem nenhum: pois o querer o bem está em mim;
não, porém, o efetuá -lo. Porque não faço o bem que prefiro, mas o mal que não quero,
esse faço. Mas, se eu faço o que não quero, já não sou eu quem o faz, e, sim, o peca-do
que habita em mim. Então, ao querer fazer o bem, encontro a lei de que o mal reside em
mim. (...) Desventurado homem que sou! Quem me livrará do corpo desta morte?”

(Romanos 7: 15-21,24)

Jesus também Se posicionou contra o maniqueísmo na parábola do joio e do trigo

(Mateus 13:24-30), que diz:

“Outra parábola lhes propôs, dizendo: O reino dos céus é semelhante a um homem que
semeou boa semente no seu campo; mas, enquanto os homens dormiam, vem o inimigo
dele, semeou o joio no meio do trigo, e retirou-se. E, quando a erva cresceu e produziu
fruto, apareceu também o joio. Então, vindo os servos do dono da cosa, lhe disseram:
Senhor, não semeaste boa semente no teu campo? Donde vem, pois, o joio? Ele, porém,
lhes respondeu: Um inimigo fez isso. Mas os servos lhe perguntaram: Queres que vamos e
arranquemos o joio? Não! replicou ele, para que, ao separar o joio, não arranqueis também
com ele o trigo. Deixai-os crescer juntos até a colheita, e, no tempo da colheita, direi aos
ceifeiros: Ajuntai primeiro o joio, atai-o em feixes para ser queimado: mas o trigo, recolhei-o
no meu celeiro.”
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O que Jesus estava querendo dizer com tal parábola? Possivelmente isso:

“- É tarefa muito difícil separar a luz das trevas. Cuidado! Só Deus, no fim de tudo, discerne
o que é o quê, e quem é quem.”

Cuidado, portanto! Porque o maniqueísmo pode cegar-nos a percepção de que em todo o


bem há mal e de que em todo o mal há bem, desde a queda do homem. No homem mais
malévolo encontra-se humanidade; no homem mais santo encontra-se perversão.

O quinto aspecto negativo no movimento de batalha espiritual é a ênfase nos inimigos


explícitos de Deus, que muitas vezes encobre a percepção e o discernimento espiritual
daquelas que são as forças que agem contra Deus, ainda que usando o Seu nome. As
pessoas estão tão preocupadas com os inimigos explícitos, que deixam de praticar
discernimento com relação às forças (estas sim) antagônicas a Deus, mesmo se
manifestando em nome dEle. O que há de gente, tanto em nome de Deus quanto no nome
de Jesus, fazendo coisas que deixam Deus escandalizado é algo espantoso. Devemos ter
cuidado, para que na luta contra potestades malignas que atuam na cidade em que
moramos, não percamos o discernimento das potestades malignas que atuam na nossa
denominação, na nossa igreja, que falam nos púlpitos das nossas conferências
evangelísticas. Tal como Jesus diz em Mateus

7:21-24:

“Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a
vontade de meu Pai que está nos céus. Muitos, naquele dia, hão de dizer-me.- Senhor,
Senhor! porventura não temos nós profetizado em teu nome, e em teu nome não
expelimos demônios, e em teu nome não fizemos muitos milagres? Então lhes direi
explicitamente: - Nunca vos conheci. Apartai-vos de mim, os que praticais a iniqüidade.
Todo aquele, pois, que ouve estas minhas palavras e as pratica será comparado a um
homem prudente, que edificou a sua casa sobre a rocha”.
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Com isto, a Palavra de Deus nos está dizendo que há muita gente expulsando demônios,
profetizando e realizando milagres, em nome de Jesus, porém vivendo, na prática, contra
Ele.

O sexto aspecto negativo no movimento de batalha espiritual é a ênfase no papel


poderosamente malévolo do diabo, que subtrai dos agentes humanos sua
responsabilidade pelo mal moral e social que praticam. Há pessoas que fizeram do diabo
um ser poderosamente malévolo, responsabilizando-o por todo mal que há no mundo,
numa tentativa de isentarem-se da sua própria responsabilidade de evitarem o mal,
praticando o bem. Tais pessoas, com essa postura, negam o que Tiago diz em sua carta:

"(...) mas resisti ao diabo, e ele fugirá de vós.”

(Tiago 4:7b)

Em alguns lugares, vejo pessoas quase que pregando que o diabo é irresistível; quando
ele faz o “strip-tease” da maldade, ninguém resiste. É o que andam pregando por aí.
Cuidado! Tal maneira de pensar tira a capacidade de se viver com responsabilidade.

O diabo, de repente, tornou-se um ser vicário no seio da igreja evangélica, levando todas
as nossas culpas, apenas não nos perdoando, não nos redimindo e não nos salvando
delas, mas explicando todas elas. O diabo transformou-se num “pobre diabo”. Hoje em dia,
o indivíduo adultera, e alega, pondo a culpa no diabo:

“-Foi o diabo que me induziu a isso.”

Tirou-se do homem a responsabilidade moral e individual do pecado, colocando-a toda


sobre o diabo, atribuindo-lhe toda culpa pelos deslizes humanos.

O sétimo aspecto negativo do movimento de batalha espiritual é a ênfase no choque de


poderes nas regiões celestiais, que muitas vezes tira a racionalidade na percepção dos
fenômenos históricos. Ou seja: às vezes estamos com a mente tão concentrada no mundo
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abstrato, que nós nos esquecemos do que diz Apocalipse 12:10, que afirma que a grande
luta espiritual não é no céu, mas na terra:

"(...) Ai da terra e do mar, pois o diabo desceu até vós, cheio de grande cólera, sabendo
que pouco tempo lhe resta.”

Portanto, o grande discernimento não é o baseado na busca da compreensão do que


acontece nas regiões abstratas; mas, o grande discernimento é aquele que procura
compreender o que acontece aqui, no mundo concreto, onde o diabo se manifesta
diariamente, nas situações as mais variadas.

O oitavo aspecto negativo do movimento de batalha espiritual é a ênfase na luta espiritual


de olhos fechados e dentro dos lugares de oração, que faz de muitas reuniões de batalha
espiritual verdadeiras sessões de “videogames” para crentes.

Um pastor, certa vez, contou-me:

“- Eu às vezes chego a algumas igrejas, e vejo alguns fliperamas, alguns jogos de salão
acontecerem.”

E, pensando no que ele me disse, certa vez chegando em casa, vindo de uma viagem,
encontrei meu filho Lukas, que é "viciado” em Nintendo, entretido num desses jogos, numa
"luta" do bem contra o mal. Há uma guerreira que dá umas espadadas no rosto de um
gigante monstruoso e demoniacamente feio. Eu me aproximo do meu filho e lhe digo:

“- Oi, Lukas!”

E ele não dá a mínima:

“-Ih!... Vai!... Aí”... Caraaaaamba!...”– continua ele envolvido no jogo.


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Ele está "salvando” o mundo! Eu fico imaginando que a situação do Presidente dos
Estados Unidos é mais confortável do que a desse meu filho, em relação à "salvação” do
planeta.

Tento outra vez:

“- Lukas, sou eu ... papai! Cheguei de viagem!...”.

E continua ele lá:

"- Vai, vai, vai!... Ih!...Eh!... Eeeeeehhhhh! Uaaaaaaaaaaau! É demaaaaaaaais!”

Às vezes, encontro-me em certos lugares nos quais a atitude de batalha espiritual está
presente com todos os seus elementos bonitos, valorosos e válidos, entretanto fico com a
mesma sensação de que as pessoas envolvidas estão fazendo apenas uma
“performance”: “amarram” demônio aqui, "amarram” demônio ali; outros, mais ousados,
jogam-no no abismo. Aí se ouvem expressões como:

“- Temos que salvar a cidade! ‘Amarramos’ o país!... Tá ‘amarrado’ o demônio da


corrupção do Brasil!”

Ainda que tudo isso seja falado, embora se diga que o demônio da corrupção está
“amarrado” os corruptos continuam soltos. A sensação que se tem, quando se sai de uma
dessas reuniões de batalha espiritual, é que do lado de fora não há mais nenhuma criança
abandonada na rua, que não há mais mendigo algum debaixo das marquises; que não há
mais prostitutas nas esquinas, que os corruptos estão presos; que o Congresso Nacional é
composto apenas de homens honestos e comprometidos com a causa pública; enfim, que
não há mais problemas em nosso país.

Entretanto, na vida real, do lado de fora, nada mudou.


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A pergunta que se faz é a seguinte: há valor no movimento de batalha espiritual? Há. No


entanto, não há valor na atitude triunfalista e simplista que imagina que numa espécie de
“jogo de salão espiritual” se resolvem os problemas do país.

Só há valor na atitude de oração, de intercessão e de enfrentamento, quando ela é adulta


e amadurecida, e que sabe que em si mesma não resolve todas as coisas, mas que tem
consciência que é parte de um processo muito maior, o qual nos transporta da oração e da
intercessão para o mundo real, em nome de Jesus, para enfrentarmos as potestades
visíveis (corrupção, prostituição, imoralidade, crises, guerras, fome, desamor, etc.) cujas
correspondências invisíveis enfrentamos com nossa declaração de fé acerca do triunfo de
Jesus na cruz.

O nono aspecto negativo do movimento de batalha espiritual é a ênfase exagerada na


quebra de maldições, que reduz demais o discernimento dos males da alma, da mente, da
família e da cultura, os quais geram hábitos adoecedores.

Quando tudo é quebra de maldições, corre-se o risco de se cair num terreno perigosíssimo.
Isto porque não se pode acreditar que maldições são quebradas apenas com oração e
jejum. Como já se disse, elas fazem parte de um processo maior, o qual nos transporta de
uma atitude intimista para uma atitude prática e real, a qual tem sua visibilidade concreta
em ações para com o próximo, baseadas no caráter e na conduta de Jesus. Não adianta
dizer-se cristão. É necessário, porém, viver a vida que Cristo viveu.

A Bíblia não nos diz que Abraão fez um pacto com um espírito de mentira. Mas, a Palavra
de Deus nos dá conta de que, toda vez em que se encontrava em apuros, ele mentia:

"Quando se aproximava do Egito, quase ao entrar, disse a Sarai, sua mulher: - Ora, bem
sei que és mulher de formosa aparência; os egípcios, quando te virem, vão dizer: - É a
mulher dele, e me matarão, deixando-te com vida. Dize, pois, que és minha irmã, para que
me considerem por amor de ti e, por tua causa, me conservem a vida”.

(Gênesis 12:11-13)
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“Partindo Abraão dali para a terra do Neguebe, habitou entre Gades e Sur, e morou em
Gerar. Disse Abraão de Sara, sua mulher: Ela é minha irmã; assim, pois, Abimeleque, rei
de Gerar, mandou buscá-la.”

(Gênesis 20:1-2)

A Bíblia nos diz que Isaque - filho de Abraão - assistiu a isso tudo. Deste modo, quando
também se encontrava em apuros, Isaque também mentia, tal como o pai:

“Isaque, pois, ficou em Gerar. Perguntando-lhe os homens daquele lugar a respeito de sua
mulher, disse: É minha irmã; pois temia dizer: É minha mulher; para que, dizia ele consigo,
os homens do lugar não me matem por amor de Rebeca, porque era formosa de
aparência.”

(Gênesis 26:6-7)

Jacó - filho de Isaque e, portanto, neto de Abraão - seguiu a mesma cultura de mentira,
fazendo pior que seu pai e avô, mentindo e enganando:

“Jacó foi a seu pai, e disse: Meu pai! Ele respondeu: Fala. Quem és tu, meu filho?
Respondeu Jacó a seu pai: Sou Esaú, teu primogênito; fiz o que me ordenaste. Levante-te,
pois, assenta-te, e come da minha caça, para que me abençoes.”

(Gênesis 27:18-19)

Em razão dessa mentira, Jacó fez nascer ira no coração do irmão:

“Passou Esaú a odiar a Jacó por causa da bênção, com que seu pai o tinha abençoado; e
disse consigo: Vêm próximos os dias de luto por meu pai; então matarei a Jacó, meu
irmão.”
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(Gênesis 27:41)

Jacó, também, preferiu um filho dentre os outros que teve, gerando inveja no coração
destes:

“Ora Israel [Jacó] amava mais a José que a todos seus filhos, porque era filho da sua
velhice; e fez-lhe uma túnica talar de mangas compridas. Vendo, pois, seus irmãos, que o
pai o amava mais que a todos os outros filhos, odiaram-no e já não lhe podiam falar
pacificamente.”

(Gênesis 3:3-4)

Quem quebrou toda essa cultura de mentira, de engano, de ódios e de inveja foi alguém
que não quebrou tudo isso com uma oração de renúncia, mas com uma formação sólida
de caráter, independentemente das circunstâncias externas. Seu nome: José.

“E disse José a seus irmãos: Eu sou José; vive ainda meu pai? E seus irmãos não lhe
puderam responder, porque ficaram atemorizados perante ele. Disse José a seus irmãos:
Agora, chegai- vos a mim. E chegaram-se. Então disse: Eu sou José, vosso irmão, a quem
vendestes para o Egito. Agora, pois, não vos entristeçais, nem vos irriteis contra vós
mesmos por me haverdes vendido para aqui; porque para conservação da vida, Deus me
enviou adiante de vós. (... ) Assim não fostes vós que me enviastes para cá e, sim, Deus,
que me pôs por pai de Faraó, e senhor de todo a sua casa, e como governador em toda a
terra do Egito.”

(Gênesis 45:3-5, 8)

O que se está querendo dizer com isso? Está-se querendo dizer que há forças malignas
que passam de pai para filho, de geração a outra geração, destruindo vidas e
relacionamentos. Mas isso está longe, muito longe de abranger e explicar todo o problema.
Há problemas que têm a ver conosco mesmos, não com o diabo. O diabo é a cultura da
nossa casa; o diabo é ter paparicado um filho, esquecendo-se dos outros; o diabo é ter
sido filho de um pai tirano; o diabo é ter assistido às crises de família que muitas vezes
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redundaram em desavenças; o diabo é ter sido estigmatizado psicologicamente durante


toda a infância.

O que se está querendo dizer com isso? Está-se querendo dizer que o movimento de
quebra de maldições, conquanto tenha a sua validade em áreas e em aspectos legítimos,
defensáveis e bíblicos, está longe de explicar as ambigüidades da alma humana, da
família, do casamento e do ser como um todo.

De vez em quando encontro alguma senhora que me diz:

“- Pastor!... Eu não sei o que está havendo! Eu já 'quebrei’ já renunciei, já ‘amarrei’ mas,
mesmo assim, continua tudo igual como era antes.”

“- Minha irmã - eu digo - a senhora só precisa rejeitar a única coisa que precisa ser
rejeitada. O diabo não é o causador de todos os seus problemas. Seus problemas têm a
ver com a senhora também.”

Interessante que um dos textos mais fortes de maldição na Bíblia é Malaquias 4:6:

“Ele converterá o coração dos pais aos filhos, e o coração dos filhos a seus pais; para que
eu não venha e fira a terra com maldição.”

Esse texto diz, primeiramente, que quem fere a terra com maldição não é o diabo, porém o
Senhor:

“... para que eu não venha e fira a terra com maldição.”

Esse "eu” que está falando neste texto não é o diabo, mas é o Senhor.
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A segunda coisa que esse texto diz é que essa maldição que desgraça a terra é quebrada
com conversão, com perdão, com misericórdia, com quebra de padrões familiares, com
mudança de mente, de comportamentos, de relações e de vínculos:

“Ele converterá o coração dos pais aos filhos, e o coração dos filhos a seus pais...”

O décimo aspecto negativo do movimento de batalha espiritual é que a ênfase na vitória


espiritual ignora o fato de que Jesus disse que as pessoas e as sociedades são livres para
não encherem a casa, e, assim, serem tomadas pelas forças da maldade.

Às vezes, ouvindo determinadas pessoas, tem-se a impressão de que basta falar, declarar,
crer e dizer, para que as coisas sejam aquilo que se afirma que serão. Jesus não entendia
assim. Ele diz em Lucas 11:21-26 que quando o mais valente chega em casa, amarra o
valente bem armado, tirando-o dali. A casa, que era ocupada por este, tem que ser cheia,
caso contrário, ficando fazia e arrumada, forças piores podem vir sobre ela, destruindo tudo
de novo:

“Quando o valente, bem armado, guarda a sua própria casa, ficam em segurança todos os
seus bens. Sobrevindo, porém, um mais valente do que ele, vence-o, tira-lhe a armadura
em que confiava e lhe divide os despojos. Quem não é por mim é contra mim; e quem
comigo não ajunta espalha. Quando o espírito imundo sai do homem, anda por lugares
áridos, procurando repouso; e, não o achando, diz: voltarei para minha casa donde saí. E,
tendo voltado, a encontra varrida e ornamentado. Então vai, e leva consigo outros sete
espíritos, piores do que ele, e, entrando, habitam ali; e o último estado daquele homem se
torna pior do que o primeiro.”

(Lucas 11:21-26)

Os indivíduos e as sociedades continuam livres para querer ou não querer. Essa é a


história da cidade de Gadara.

“Tendo ele chegado à outra margem, à terra dos gadarenos, vieram-lhe ao encontro dois
endemoninhados, saindo dentre os sepulcros, e a tal ponto furiosos, que ninguém podia
passar por aquele caminho. E eis que gritaram: Que temos nós contigo, ó Filho de Deus!
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Vieste aqui atormentar-nos antes do tempo? Ora, andava pastando, não longe deles, uma
grande manada de porcos. Então os demônios lhe rogavam: Se nos expeles, manda-nos
para a manada dos porcos. Pois ide, ordenou-lhes Jesus. E eles, saindo, passaram para
os porcos; e eis que toda a manada se precipitou, despenhadeiro abaixo, para dentro do
mar, e nas águas pereceram. Fugiram os porqueiros, e, chegando à cidade, contaram
todas estas coisas, e o que acontecera aos endemoninhados. Então a cidade todo saiu
para encontrar-se com Jesus: e, vendo-o, lhe rogaram que se retirasse do terra deles.”

(Mateus 8:28-34)

Jesus passa por tal cidade (“Tendo ele chegado à outra margem, à terra dos gadarenos”),
expulsa demônios que atormentavam dois homens (“vieram-lhe ao encontro dois
endemoninhados (...) Então os demônios lhe rogavam: Se nos expeles, mando-nos para a
manada dos porcos. Pois ido, ordenou-lhes Jesus”), e depois vai embora. Aqueles homens
ficam livres, mas a cidade e os seus moradores continuam possessos (“Então a cidade
toda saiu para encontrar-se com Jesus: e, vendo-o, lhe rogaram que se retirasse da terra
deles”).

Deste modo, os indivíduos e as sociedades continuam livres para querer ou não querer.
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CAPÍTULO 7

DISCERNINDO PRÁTICAS E PERCEPÇÕES PERIGOSAS

Há algumas percepções e práticas que precisam ser discernidas por nós, das quais
estaremos tratando, neste capítulo.

Inicialmente, a primeira prática perigosa é a da autonomia total do diabo.

Em muitos aspectos o movimento da batalha espiritual está dando uma autonomia ao


diabo que ele não tem. O diabo continua servo, continua diabo.

Às vezes, vêem-se pessoas tratando o diabo como se ele estivesse em pé de igualdade


com o Senhor, dando a ele uma autonomia - agora sim - diabólica. Cuidado! Dar
autonomia ao diabo é diabólico.

Quem inventou essa heresia foi um dos pais da Igreja, em 165 da era Cristã, chamado
Justino Mártir. Ele começou a afirmar que o diabo era absolutamente autónomo, o que fez
surgir uma série de outras heresias que lhe foram decorrentes e paralelas.

No Velho Testamento, vê-se o diabo abaixo de Deus. Ele é um rebelado, mas continua um
servo, ainda que rebelado. As aparições de Satanás, no Velho Testamento, são
extremamente subservientes. Observa-se isso com relação à vida de Jó. Tudo que
Satanás lhe faz à vida é com a permissão de Deus:

“Disse o Senhor a Satanás: Eis que tudo quanto ele tem está em teu poder; somente
contra ele não estendas a tua mão. E Satanás saiu da presença do Senhor.”

(Jó 1:12)

Observe-se, também, no espírito maligno que põe mentira na boca dos falsos profetas nos
dias do profeta Micaías:
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“Então saiu um espírito, e se apresentou diante do Senhor, e disse: Eu o enganarei.


Perguntou-lhe o Senho:. Com quê? Respondeu ele: Sairei, e serei espírito mentiroso na
boca de todos os seus profetas. Disse o Senhor: Tu o enganarás, e ainda prevalecerás;
sai, e faze-o assim.”

(I Reis 22:21-22)

No Novo Testamento, vê-se o diabo julgado na cruz e com os seus dias contados, dizendo
por meio de seus demônios:

“(...) Que temos nós contigo, ó Filho de Deus! Vieste aqui atormentar-nos antes do tempo?”

(Mateus 8:29)

Segunda prática perigosa que precisa ser discernida é aquela que diz que Deus está
impotente sem a participação humana. Ou seja: se não orarmos, Deus não age; se não
pedirmos, Deus não atende; se não declararmos, Deus não Se manifesta; se não
autorizarmos, Deus não atua; e sem nós falarmos, Deus não faz nada. Segundo essa
teoria, Deus precisa nos comunicar primeiramente o “pretende” fazer, para depois agir.
Isso é completamente diferente do que vemos, de fato, Deus fazer.

Por exemplo, tive alguns amigos de drogas e de maluquice. Cinco anos depois de ter-me
convertido, um deles procurou-me apavorado em casa, chorando e trêmulo. Eu lhe
perguntei:

" - O que houve?”

Ele me respondeu:

“- Você não vai acreditar!... Eu e meu irmão estamos numa crise financeira enorme...
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E resolvemos colocar fogo no maior edifício da cidade, onde fica a nossa loja. Isso porque
fizemos um seguro e, em caso de perda do imóvel, ganharíamos uma fortuna Pois não é
que, quando na semana passada estava tudo preparado para darmos esse golpe, antes de
sair de casa, sentado no sofá, entrou um ser estranhíssimo na minha sala, cheio de luz. Eu
fiquei tremendo todo, não podendo me mexer de tanto medo. Ele me disse: ‘- Eu vou lhe
mostrar o que você vai fazer.’ Ele passou a mão no meu rosto e vi o prédio em chamas,
famílias morrendo, choro, morte, destruição... Meu irmão chegou em casa, e viu aquele ser
e as mesmas coisas que eu tinha visto. Ficamos os dois paralisados. Ele foi embora, e
mandou-nos que o chamássemos. Eu o estou chamando porque Ele mandou.”

Havia alguém orando por aquela situação? Havia alguém intercedendo para que aquela
tragédia fosse evitada? Não. Mas Deus é livre! Deus continua a interferir nos fatos, nas
situações e na História como Ele bem entende.

Talvez algumas das ironias da Bíblia sejam essas: quem estava orando pela conversão de
Saulo de Tarso? Quem? Não se sabe que alguém tenha orado por isso e reivindicado,
dizendo:

“- Aleluia! Eu estava orando há 15 anos pela conversão do nosso irmão Saulo.”

Que nada! Quando ele se converteu, muitos já pensavam em desertar.

Ou, ainda, a conversão de Cornélio, um pagão. Ele era pagão, mas gente boa, do tipo
espírita kardecista, que dava esmolas, fazia caridade. Até que um dia, um anjo do Senhor
lhe aparece e diz:

“(...) As tuas orações e as tuas esmolas subiram para memória diante de Deus. Agora
envia mensageiros aJope, e manda chamar Simão, que tem por sobrenome Pedro.”

(Atos 10:5)
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E Cornélio manda emissários a Pedro para que marquem um encontro, no qual a tônica da
conversa será sobre a soberania de Deus, O qual não faz acepção de pessoas. Deus
utiliza quem bem Ele entende para o cumprimento da Sua vontade, ainda que aos olhos
humanos os instrumentos sejam inadequados:

“Aconteceu que, vindo Pedro a entrar, lhe saiu Cornélio ao encontro e, prostrando-se-lhe
aos pés, o adorou. Mas Pedro o levantou, dizendo: Ergue-te, que eu também sou homem.
Falando com ele, entrou, encontrando muitos reunidos ali, a quem se dirigiu, dízendo: vós
bem sabeis que é proibido a um judeu ajuntar-se ou mesmo aproxímar-se a alguém de
outra raça; mas Deus me demonstrou que a nenhum homem considerasse comum ou
imundo;iísso, uma vez chamado, vim sem vacilar. Pergunto, pois, por que razão me
mandastes chamar? Respondeu lhe Cornélio: Faz hoje quatro dias que, por volta desta
hora, estava eu observando em minha casa a hora nona de oração, e eis que se
apresentou diante de mim um varão de vestes resplandecentes, e disse: Cornélio, a tua
oração foi ouvida, e as tuas esmolas lembrados no presença de Deus. Manda, pois,
alguém a Jope a chamar Simão, por sobrenome Pedro; (...) Portanto, sem demora, mandei
chamar-te, e fizeste bem em vir. Agora, pois, estamos todos aqui, na presença de Deus,
prontos para ouvir tudo o que te foi ordenado da parte do Senhor. Então falou Pedro,
dizendo: Reconhe-ço por verdade que Deus não faz acepção de pessoas; pelo contrário,
em qualquer nação, aquele que o teme e faz o que é justo lhe é aceitável. Esta é a palavra
que Deus enviou aos filhos de Israel, anunciando-lhes o evangelho da paz, por meio de
Jesus Cristo. Este é o Senhor de todos.”

(Atos 10:25-36)

Outro exemplo dessa liberdade de Deus ocorre na vida de Pedro, quando este é tirado da
prisão. A igreja estava orando, porém não acreditava em que aquilo por que orava fosse se
concretizar:

“Então Pedro, caindo em si, disse: Agora sei verdadeiramente que o Senhor enviou o seu
anjo e me livrou da mão de Herodes e de toda a expectativa do povo judaico.
Considerando ele a sua situação resolveu ir à casa de Maria, mãe de João, cognominado
Marcos, onde muitas pessoas estavam congregadas e oravam. Quando ele bateu ao
postígo do portão, veio uma criada, chamada Rode, ver quem era; reconhecendo a voz de
Pedro, tão alegre ficou, que nem o fez entrar, mas voltou correndo para anunciar que
Pedro estava junto do portão. Eles lhe disseram: Estás louca. Ela, porém, persistia em
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afirmar que assim era. Então disseram: É o seu anjo. Entretanto Pedro continuava
batendo; então eles abriram viram-no e ficaram atônitos.”

(Atos 12:11-16)

Deus continua sendo Deus, apesar da vontade e da incredulidade humanas.

A terceira percepção perigosa - possivelmente a mais perigosa dentre as demais - que


anda por aí é a que ensina a buscar conhecimento das coisas profundas de Satanás, em
Satanás. Podemos chamar essa percepção de Síndrome de Tiatira. Isto porque na igreja
de Tiatira havia um grupo de crentes que se julgava sabedor das “coisas profundas de

Satanás”.

“Digo, todavia, a vós outros, os demais de Tiatira, a tantos quantos não têm essa doutrina
e que não conheceram como eles dizem, as coisas profundas de Satanás: Outra carga não
jogarei sobre vós”.

(Apocalipse 2:24)

Há pessoas querendo aprender como lidar com o diabo, fazendo “entrevista” com o
demônio. Algumas pessoas me falam certas coisas, e eu lhes pergunto:

“- Onde foi que vocês ouviram isso? Isso não encontra respaldo algum na Bíblia!”

“ - Foi um demônio que nos falou. – respondem-me. - Nós queríamos saber como e por
que ele agia de tal maneira; nós o ‘amarramos’ e lhe ordenamos, e ele nos disse.”

É impressionante, e, ao mesmo tempo, paradoxal: aprender a verdade com o mentiroso.


Engana-se quem pensa que pode encontrar alguma verdade no diabo. Jesus disse:
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“(...)Ele [o diabo] foi homicida desde o princípio e jamais se firmou na verdade, porque nele
não há verdade. Quando ele profere a mentira, fala do que lhe é proprio, porque é
mentiroso e pai da mentira”.

(João 8:44)

Mesmo assim, vem um irmãozinho e diz:

“ - Diabo! Fala aqui! Explica a sua natureza! Eu o quero analisar.”

É uma sessão de “psicanáIise demonológica”, durante a qual o diabo fala um monte de


mentiras, as quais são creditadas como verdades e passadas adiante para outras pessoas.

Cuidado! Muitas das coisas misteriosas que se ouvem acerca do diabo, que, se procuradas
na Bíblia, não serão achadas, procedem de confissões do próprio diabo a pessoas que
estão dentro da igreja e que acreditam em tais declarações dele, muitas vezes não
percebendo que essas confissões vão de encontro com o que a Bíblia diz.

A quarta percepção perigosa é a que traz consigo o enfraquecimento da obra da cruz e a


hipertrofia da fé humana. A cruz, em alguns lugares, está cada vez mais fraca, não
parecendo que nela as maldições foram quebradas, tal como Paulo nos afirma:

“Cristo nos resgatou da maldição da lei, fazendo-se ele próprio maldição em nosso lugar,
porque está escrito: Maldito todo aquele que for pendurado em madeiro”.

(Gálatas 3:13)

Com isso, tranformam-se exceções em regras e regras em exceções.

A quinta percepção perigosa é a que traz consigo a minimização do papel da conjuntura


social e da ambiência histórica. Há quem pense que o diabo pode fazer a História. O diabo
não pode fazê-la, porém. Há apenas Um, que é o Senhor da História; o diabo é apenas
participante dela, mas com um poder enorme para influenciá-la. Ainda que tenha tal poder
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de influenciá-la, o diabo está sujeito a ela, não sendo o mentor da História, mas somente
parte dela. Eu, particularmente, acredito que o diabo piora com a sociedade. O diabo está
mais diabo a cada dia. O diabo apenas muda para pior.

Certa vez, ouvi um irmão pregando que o diabo ia se converter. E quando ele terminou de
pregar, um grupo de pastores correu em sua direção, sacudiram-no, perguntando-lhe:

“ - Que negócio é esse, irmão?! De onde é que você tirou isso... de que o diabo vai se
converter?!”

Ele olhou para um daqueles pastores que estavam à sua volta, e disse:

“ - Você não se converteu?! Se você pôde, por que o diabo não pode?!”

É importante que saibamos que o diabo age dentro da conjuntura. O diabo do Velho
Testamento é quase inocente perto do diabo descrito nas cartas de Paulo. Uma coisa era
ser diabo para Adão e Eva; outra coisa é ser diabo em Roma, o que exige muito mais
sofisticação. Ser diabo em Nova York e em Paris, por exemplo, muito mais ainda. No Rio
de Janeiro...

nem é bom pensar.

Num certo sentido, a Bíblia diz que o diabo está dentro da História, conquanto não a dirija.
Ele - o diabo - e seus demônios estão limitados e condicionados pela História, agindo
dentro dela, porém não lhe sendo senhores. Há um só Senhor sobre todas as coisas, e é
Aquele que ressuscitou dentre os mortos, qual seja, Jesus Cristo, o nosso Senhor.

A sexta percepção perigosa se refere à falta de modelos bíblicos, que tem absolutizado os
modelos experienciais, os quais, quase sempre, são muito relativos. Isto quer dizer que
falta o modelo bíblico do discernimento das coisas espirituais. Quais são os modelos que
temos? Toda vez que se ouve falar de batalha espiritual, pode-se estabelecer
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alguma relação, ou com a Argentina, ou com a Coréia (o modelo oriental), ou, ainda, com
os Estados Unidos, especificamente com a Califórnia (o modelo americano).

Mas o que se quer é o modelo bíblico! Não importa o que alguém na Argentina, na Coréia
ou nos Estados Unidos diz; mas o que importa é o que a Bíblia diz.

Quando os nossos modelos e referenciais não são os da Palavra de Deus, mas


experienciais, ocorre o surgimento da teologia demonológica, por meio da qual se ensina e
se acredita naquilo que demônios e bruxos dizem, tornando-se eles os principais objetos
de nosso estudo e atenção.

Todos nós temos de ser crentes, mas crentes na Palavra de Deus, baseando nossas vidas
nela, e, em nome de Jesus, não devemos nos impressionar com coisa alguma que não
proceda da Bíblia. Paulo alerta-nos sobre tal perigo, dizendo-nos:

“Mas, ainda que nós, ou mesmo um anjo vindo do céu vos pregue evangelho que vá além
do que vos temos pregado, seja anátema.”

(Gálatas 1:8)

O que é necessário saber ou sobre Deus, ou sobre o diabo está na Bíblia. O que for além
dela é mentira.
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CAPÍTULO 8

DISCERNINDO PRINCIPADOS E POTESTADES

“Quanto ao mais, sede fortalecidos no Senhor e na força do seu poder. Revestí-vos de


toda a armadura de Deus, para poderdes ficar firmes contra as ciladas do diabo; porque a
nossa luta não é contra o sangue e a carne, e, sim, contra os principados e potestades,
contra os dominadores deste mundo tenebroso, contra as forças espirituais do mal, nas
regiões celestes...”

(Efésios 6:10-12)

Em relação ao texto acima, gostaria de abordar uma temática presente nele que é a do
discernimento de quem são os principados e as potesdades invisíveis acerca dos quais
Paulo faz alusão.

No contexto em que esse texto se insere, Paulo está claramente falando de realidades
transcendentais, quando diz que “a nossa luta não é contra o sangue e a carne”; que
nossa luta não é contra o palpável, que é tocável. Paulo projeta a nossa percepção para
um outro nível, para uma outra dimensão, ao dizer que a nossa luta é “contra os
principados e potestades, contra os dominadores deste mundo tenebroso, contra as forças
espirituais do mal, nos regiões celestes.”

Eu, pessoalmente, concordo plenamente com a afirmação de que não há uma trama em
torno daqueles que são os instrumentos da maldade no mundo visível. Em geral, não há.
Aqui e ali, encontram-se alguns mais conscientes, mas, no geral, aqueles que são
instrumentalizados, "marionetados”, que são conduzidos por essas forças invisíveis não se
dão bem conta de como estão fazendo parte de um projeto diabólico, portanto, destrutivo.
Entretanto, como já se disse, encontro alguns com uma certa consciência. Eu tenho me
encontrado, nas reuniões de que participo, com pessoas de religiões as mais diversas
(budistas, krishinas, espíritas, umbandistas), todas preocupadas com o problema grave da
fome, da miséria e da violência. Nessas reuniões e em outros encontros, ao lidar com tais
pessoas - de grupos religiosos diferentes, com perspectivas distintas - percebe-se que, em
princípio, elas ficam inteiramente “armadas” devido à presença de um pastor, achando que
se vai agredi-las com um “bastão espiritual”, expulsando-as dali, dizendo:
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“ - Saaaaai!... Em nome de Jesus!”

Nota-se que a presença de um pastor entre eles gera algum tipo de constrangimento e
desconforto, até porque, certa vez, um dos presentes a uma daquelas reuniões, disse-me
que já havia lido alguns dos meus livros. Mas, isso foi dito com ar de preocupação, antes
do início da reunião. Ele assim me falou, com um ar grave:

“ -Li alguns livros seus...”

Ao final daquele encontro, já sorridente, ele me falou outra vez:

“ –É querido, eu já li alguns livros seus, sabia?!”

Acredito que ele estava pensando que eu fosse tratá-lo, na reunião, com a mesma
intensidade com a qual abordo os temas espirituais em alguns dos meus livros.

Mas, o que foi importante naqueles encontros de cidadania e de conversa sobre os


problemas não só da cidade do Rio de Janeiro, mas também de outros de algum modo
relevantes para todo o país, é que foi possível encontrar a maior humanidade possível
naquelas pessoas. De modo que se fica com um ódio terrível do diabo, que as está
usando; porém cheio de misericórdia, de compaixão e de ternura por elas. Dentre elas se
verifica, aqui e ali, uma pessoa ou outra um pouco mais arguta, mais perspicaz, ou outra
com mais discerni-mento. Mas, no geral, são pessoas que não sabem que estão
envolvidas com o mal.

Todavia, é bom que se diga o seguinte: conquanto a maior parte dos instrumentos usados
pelos principados e pelas potestades não saibam o quão usados são e nem saibam o
tamanho e a dimensão da grande trama espiritual na qual estão envolvidos, aqueles que
os usam sabem. Ou seja, se não há uma intenção por parte dos indivíduos e dos
instrumentos utilizados, há uma intenção por parte daqueles que os usam.
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Nesse sentido, o que Paulo está dizendo é que há uma grande trama cósmica. Em outras
palavras, ele diz:

“ - A nossa luta não é contra a carne, nem contra o sangue. Isso porque, no nível pessoal,
no nível individual, no nível do instrumento, no nível daqueles que são usados, a coisa é
simples de resolver. O discernimento das coisas espirituais tem que ir para além do nível
imediato, sendo imprescindível perceber a grande trama diabólica no nível cósmico, no
qual atuam os principados e potestades, que não são seres ‘burros’ mas inteligentes.”

Em 1978, eu saía do escritório da VINDE, em Manaus - naquela época recém-criada,


funcionando num porão de uma casa - para ir a minha casa almoçar. Quando voltei do
almoço, encontrei um funcionário, que estava encostado na parede, e, junto dele, alguém o
ameaçava com uma faca enorme em seu pescoço.

Porém, antes de eu entrar no escritório, um irmão paraibano me disse o seguinte:

“ - Não entra, não!... que ele fura o bucho.”

Eu não entendi nada.

“ - O que meu irmão?!”

“ - Não entra, não, que ele fura o bucho” - falou ele depressa. “ - Fale devagar para que eu
possa entende.” - pedi.

“ - Não en-tra que e-le fu-ra o bu-cho” - ele falou pausadamente, enfiando o dedo na minha
barriga.

Eu lhe perguntei:
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“ - Mas quem é que vai furar o bucho?”

Ele me levou até a porta e disse:

“ – O possesso! Olha lá ele!”

Da porta, eu pude ver o Eraldo, nosso funcionário, encostado à parede, com um


endemoninhado apontando uma faca em seu pescoço, e pedindo-lhe:

“ - Fala aquele nome fala! Fala aquele nome fala!”

Eraldo, timidamente, tentou dizer:

“ - Em nome de... de... de... de...”

Ele - Eraldo - era novo na fé naquela ocasião. A secretária havia fugido para o banheiro.
Outros dois funcionários haviam se trancado numa sala anexa. O endemoninhado, porém,
insistia com Eraldo:

“ - Fala aquele nome, fala! Fala aquele nome, fala”

Eu perguntei àquele irmão paraibano:

“ - Há quanto tempo ele está aqui fazendo isso?” “ - Há mais de uma hora.”

Logo em seguida, aquele irmão me perguntou:


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“ - O que o senhor vai fazer, pastor?”

“ - É uma boa pergunta.” – eu lhe disse “ - Isso exige muita reflexão. Eu não sei o que eu
vou fazer. Mas, uma coisa eu sei que vou fazer: vou conversar com o meu pai.”

Entrei no carro e me dirigi à igreja do meu pai. Chegando lá, logo desabafei:

“ - Papai, eu estou numa situação assim, assim, assim... O que eu faço?”

“- Não sei, meu filho! Vamos orar e ver o que é possível fazer.”

Nós entramos no carro, e ainda na frente da igreja, levantamos um clamor ao Senhor, de


mais ou menos uns cinco minutos, e depois eu disse:

“ - Agora vamos!”

Chegando no escritório da VINDE - havia uma sorveteria ao lado que se chamava Beijo
Frio, que era um “point” da cidade, na época, sendo um local disputadíssimo pela moçada -
eu já saí do carro num impulso, recitando aos gritos o Salmo 91 pelo meio da rua:

“Aquele que habita no esconderijo do Altíssimo, e descansa à sombra do Onípotente, diz o


Senhor: Meu refúgio e meu baluarte, Deus meu, em quem confio. Pois ele te livrará do laço
do passarinheiro, e da peste perniciosa. Cobrir-te -á com as suas penas, sob suas asas
estarás seguro: a sua verdade é pavês e escudo. Não te assustarás do terror noturno, nem
da seta que voa de dia, nem da peste que se propaga nas trevas, nem da mortandade que
assolaao meio-dia. Caiam mil ao teu lado, e dez mil à tua direita; tu não serás atingido.
Somente com os teus olhos contemplarás, e verás o castigo dos ímpios. Pois disseste: O

Senhor é o meu refúgio. Fizeste do altíssimo a tua morada.”


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Quando eu já estava mais ou menos no meio do salmo, eu ouço o endemoninhado lá de


dentro gritar:

“ – Desgraçaaaaaaaaaaado!!! Eu não me refugio na sombra do Altíssimo!”

Eu continuei gritando e entrando:

“Nenhum mal te sucederá, praga nenhuma chegará à tua tenda. Porque aos seus anjos
dará ordens a teu respeito, para que te guardem em todos os teus caminhos. Eles te
sustentão nas suas mãos para não tropeçares nalguma pedra. Pisarás o leão e a áspiíde,
calcarás aos pés o leãozinho e a serpente. Porque a mim se apegou com amor, eu o
livrarei; pô-lo-ei a salvo, porque conhece o meu nome. Ele me invocará, e eu lhe
responderei; na sua angústia eu estarei com ele, livrá-lo-ei, o glorificarei. Saciá-lo-ei com
longeividade, lhe mostrarei a minha salvação.”

Eu já me encontrava anestesiado. Ele podia até estar com a metralhadora do Rambo, que
nada mais estava importando. Quando entrei na sala, o endemoninhado estava a uns 10
metros de distância de mim. Ele jogou o Eraldo no chão, e correu com a faca, como um
louco, na minha direção. Quando ele se aproximou de mim, eu disse:

“ - Sai dele, em nome de Jesus!”

Ele caiu, apanhou a faca de novo, veio até mim, e eu lhe disse outra vez:

“ - Sai dele, em nome de Jesus!”

Ele caiu, apanhou mais uma vez a faca, e a pôs a dois centímetros do meu rosto. Eu olhei
nos olhos dele, e disse mais uma vez:

“ - Sai dele, em nome de Jesus!”


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E, caindo aos meu pés, eu lhe retirei a faca, e entreguei-a para alguém. Ele, olhando para
mim, perguntou:

“ - Quem é você?”

“ - Eu sou o pastor Caio. E você, quem é?” “ - Eu me chamo Pedro.”

“ - O que você está fazendo aqui?” - perguntei-lhe.

“ - Eu não sei. Eu sou um sapateiro. Eu estava costurando sapatos lá na beira do rio, há 5


km daqui. De repente, uma força entrou em mim. E eu acho que vim direto para cá, afim de
matar alguém. E era você que eu estava procurando.”

Aquele homem não tinha consciência de nada, mas quem o mandou lá sabia o que estava
querendo. Quem o mandou lá tinha um projeto, uma intenção, um propósito, um plano e
sabia o que estava fazendo.

Quem são, portanto, esses principados e potestades invisíveis? Vamos procurar defini-los,
caracterizá-los, dando os perfis desses personagens do mundo espiritual, conforme
descritos pela palavra de Deus.

PRINCIPADOS E POTESTADES: QUEM

SÃO E COMO SE MANIFESTAM

Inicialmente, vejamos no Velho Testamento quem são eles, como são chamados e como
se manifestam. Vale também perguntar, primeiramente, como é que o Velho Testamento
descreve a Satanás. Ele aparece inicialmente em Gênesis, como a serpente:
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“Mas a serpente, mais sagaz que todos os animais selváticos que o Senhor Deus tinha
feito, disse à mulher: É assim que Deus disse: Não comereis de toda árvore do Jardim?
(...) Então a serpente disse à mulher: É certo que não morrereis. Porque Deus sabe que no
dia em que dele comerdes se vos abrirão os olhos e, como Deus, sereis conhecedores do
bem e do mal.”

(Génesis 3:1, 4 e 5)

Satanás aparece, portanto, como um ser provocador de inteligências à autonomia. Ele


existe para, de alguma forma, fazer a inteligência humana não se submeter ao projeto de
Deus. O propósito de Satanás é estimular a razão humana à autonomia, desviculando-a da
obediência a Deus.

Ele aparece no Livro de Jó, no capítulo 1, como um obcecado promotor de justiça: ele é o
acusador, o advogado de acusação, que questiona a Deus quanto à integridade de Jó,
pondo em questão os motivos que o levam a ser justo para com Deus e com os homens:

“Num dia em que os filhos de Deus vieram apresentar-se perante o Senhor, veio também
Satanás entre eles. Então perguntou o Senhor a Satanás: Donde vens? Satanás
respondeu ao Senhor, e disse: De rodear a terra, e passear por ela. Perguntou ainda o
Senhor a Satanás: Observaste a meu servo Jó? Porque ninguém há no terra semelhante a
ele, homem íntegro e reto, temente a Deus, e que se desvia do mal. Então respondeu
Satanás ao Senhor: Porventura Jó debalde teme a Deus? Acaso não o cercaste com sebe,
a ele, a sua casa e a tudo quanto tem? A obra de suas mãos abençoaste, e os seus bens
se multiplicaram na terra. Estende, porém, a tua mão, e toca-lhe em tudo quanto tem, e
verás se não blasfema contra ti na tua face.”

(Jó 1:6-11)

Com essa atitude de Satanás, aprendemos algo terrível: toda obra de acusação provém do
diabo. E não somente isto: toda a busca meticulosa, exagerada, obcecada e detalhista da
“justiça” é também diabólica.
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Satanás aparece também em 1 Crônicas 21:1 e 7, como o provocador de reis, incitando o


coração de Davi a fazer um censo com perspectivas erradas, em razão do qual sobrevêm
ao povo de Israel calamidades tremendas, porque a ira do Senhor se manifesta.

“Então Satanás se levantou contra Israel, e incitou a Davi a levantar o censo de Israel.
(...)Tudo isto desagradou a Deus, pelo que feriu a Israel.”

Ele é também descrito como o acusador impiedoso; aquele que chama a culpa à luz;
aquele que põe o dedo em riste; aquele que torna os pecados conhecidos; aquele que
agita a consciência; aquele que faz que sentimentos de culpa se exacerbem. Ele é assim
caracterizado em Zacarias 3:1-5, quando ele é posto como advogado de acusação num
grande tribunal espiritual, tentando fazer o sumo sacerdote Josué sentir-se um ser
desprezível, vil e culpado:

“Deus me mostrou o sumo sacerdote Josué, o qual estava diante do anjo do Senhor, e
Satanás estava à mão direita dele, para se lhe opor. Mas o Senhor disse a Satanás: O
Senhor te repreende, ó Satanás, sim, o Senhor que escolheu Jerusalém te repreende; não
é este um tição tirado do fogo? Ora, Josué, trajado de vestes sujas, estava diante do anjo.
Tomou este a palavra, e disse aos que estavam diante dele: Tirai-lhe as vestes sujas. A
Josué disse: Eis que tenho feito que passe de tií a tua iniquidade, e te vestirei de finos
trajes. E dísse eu: Ponham -lhe um turbante limpo sobre a cabeça. Puseram-lhe, pois,
sobre a cabeça um turbante limpo e o vestiram com trajes próprios; e o anjo do Senhor
estava ali.”

O Velho Testamento não fala tanto do diabo, o qual é descrito e referido em alusões muito
rápidas. Entretanto, o Velho Testamento não para por aí; são descritos outros personagens
do mundo espiritual, que são os demônios.

Em I Reis 22:21, os demônios são apresentados como espíritos mentirosos que se


manifestam por meio dos falsos profetas:

“Então saiu um espírito, e se apresentou diante do Senhor, e disse: Eu o enganarei.


Perguntou-lhe o Senhor: Com quê? Respondeu ele: Sairei, e serei espírito mentiroso na
boca de todos os seus profetas. Disse o Senhoz: Tu o enganarás, e ainda prevalecerás;
sai, e faze-o assim.”
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Isto se dá quando Josafá (rei de Judá) e Acabe (rei de Israel) vão à guerra juntos, e os
profetas destes os estimulam a ir para a luta. Josafá, não contente, faz a seguinte pergunta
aos cerca de 400 profetas de Acabe:

“Não há aqui ainda algum profeta do Senhor para o consultarmos?”

(I Reis 22:7)

Eles trazem o profeta Micaías, que profetiza:

“(...) Vi todo o Israel disperso pelos montes, como ovelhas que não têm pastor; e disse o
Senhor: Estes não têm dono; torne cada um em paz para a sua casa.”

( I Reis 22:17)

Acabe, porém, não confiou na sua palavra, por acreditar que Micaías sempre profetizava o
mal a seu respeito:

“Então o rei de Israel disse a Josafá: Não te disse eu que ele não profetiza meu respeito o
que é bom, mas somente o que é mau?”

(I Reis 22:18)

Micaías, então, lhe diz o que viu na sua visão, acerca do “espírito mentiroso” que o Senhor
permitiu que controlasse os profetas de Acabe, dando a este um mau conselho:

“(...) Vi o Senhor assentado no seu trono, e todo o exército do céu estava junto a ele, à sua
direita e à sua esquerda. Perguntou o Senhor: Quem enganará a Acabe, para que suba, e
caia em Ramote-Gileade? (...) Então saiu um espírito, e se apresentou diante do
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Senhor, e disse: Eu o enganarei. Perguntou-lhe o Senhor: Com quê? Respondeu ele:


Sairei, e serei espírito mentiroso na boca de todos os seus profetas. Disse o Senhor: Tu o
enganarás, e ainda prevalecerás; sai, e faze-o assim.”

(I Reis 22:19-20b;21-22)

Assim, descobre-se que é obra demoníaca proferir mentiras por intermédio da boca de
falsos profetas.

O Velho Testamento ainda fala desses espíritos como podendo ser espíritos de
prostituição. É o que é referido em Oséias 4:12:

“O meu povo consulta o seu pedaço de pau, e a sua vara lhe dá resposta, porque o
espírito de prostituição os engana, e eles prostituindo-se abandonam o seu Deus.”

Neste verso se diz que a sociedade de Israel, naqueles dias, estava cheia, possuída por
espírito de prostituição de todo tipo, que corrompia a nação como um todo.

O Livro de Jó, no capítulo 4, fala-nos de espírito de medo, de terror:

“Então um espírito passou por diante de mim; fez-me arrepiar os cabelos do meu corpo”.

(Jó 4:15)

O Salmo 91 parece ecoar tal afirmação, quando fala do terror noturno:

“Não te assustarás do terror noturno...”

(Salmo 91:5a)
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No texto de Jó, o que se tem é a afirmação de um de seus amigos - Elifaz - que, pelo jeito,
tinha uma compreensão bastante espírita do mundo, concebendo o cosmos absolutamente
regido por leis de causa e efeito, do ponto de vista moral. Se se está sofrendo, é porque se
fez algo errado:

“Segundo eu tenho visto, os que lavram a iniqüidade e semeiam o mal isso mesmo eles
segam.”

(Jó 4:8)

Com isso, Elifaz vai desenvolvendo um raciocínio espírita com uma determinada lógica, até
que num dado momento ele diz:

“Então um espírito passou por diante de mim; fez-me arrepiar os cabelos do meu corpo.”

(Jó 4:15)

Em seguida, ele continua descrevendo alguma coisa muito parecida com as que aparecem
em manifestações espiritualistas:

“Parou ele, mas não lhe discerni a aparência; um vulto estava diante dos meus olhos;
houve silêncio e ouvi uma voz.”

(Jó 4:16)

A Bíblia, no Velho Testamento, também faz menção à manifestação de um espírito de


adivinhação numa sessão com a pitonisa de En-Dor, quando Saul vai consultá-la com a
intenção de falar com Samuel:
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“Então disse Saul aos seus servos: Apontai-me uma mulher que seja médium, para que me
encontre com ela e a consulte. Disseram-lhe os seus servos: Há uma mulher em En-Dor
que é médium. (...) Então lhe disse a mulher: Quem te farei subir? Respondeu ele: Faze-
me subir Samuel.”

(I Samuel 28:7 e 11)

O Velho Testamento também fala acerca de espíritos das ruínas e das geografias do ódio.
Especialmente em Isaías e Jeremias encontramos afirmações reiteradas quanto a isso,
sobretudo quando se fala de Babilônia, de Nínive, de Jerusalém e de algumas outras
cidades abomináveis, as quais foram destruídas por causa do seu pecado, de sua
injustiça, da bruxaria e da idolatria que praticavam:

“Farei de Jerusalém montões de ruína, morada de chacais; e das cidades de Judá farei
uma assolação, de sorte que fiquem desabitadas.”

(Jerernias 9:11)

“Babilônia se tornará em montões de ruínas, morada de chacais, objeto de espanto e


assobio, e não haverá quem nela habite.”

(Jeremias 51:37)

Além disso, o Novo Testamento fala do assunto de modo ainda mais explícito:

“Então exclamou com potente voz, dizendo: Caiu, caiu a grande Babilônia, e se tornou
morada de demônios, covíl de todo espécie de espírito imundo e esconderijo de todo
gênero de ave imunda e detestável.”

(Apocalipse 18:2)
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Ao ler tais textos, parece que esses lugares - encharcados de ódio, destruição e caos - e
que configuraram uma geografia de injustiça e de impiedade, tornam-se referenciais de
algo espiritual que não é apenas simbólico, mas, de alguma forma, real e concreto.

Eu poderia contar várias histórias que nos deixam entender que as afirmações de Jeremias
e de Isaías não são só poéticas e simbólicas, porém factuais.

Em I Samuel 16:14-16, fala-se de um espírito maligno de tormenta, que é o que angustia a


Saul, deixando-o hipocondríaco:

“Tendo-se retirado de Saul o Espírito do Senhor, da parte deste um espírito maligno o


atormentava. Então os servos de Saul lhe disseram: Eis que agora um espírito maligno,
enviado de Deus, te atormenta. Manda, pois senhor nosso, que teus servos, que estão em
tua presença, busquem um homem que saiba tocar harpa: e será que, quando o espírito
maligno da parte do Senhor vier sobre ti, então ele a dedilhará, e te acharás melhor.”

Isto porque na versão da Septuaginta, ou seja, a versão grega do texto do Velho


Testamento hebraico, Saul é descrito como hipocondríaco. Os espíritos malignos que
agiam nele levaram-no a desenvolver uma hipocondria psicológica.

O Velho Testamento também fala de anjos - caídos ou não.

A primeira categoria de anjos que aparece no Velho Testamento são os chamados anjos
das nações, os quais são associados nos salmos com deuses de nações. No original
grego, diz-se que quando Deus estava repartindo as terras, Ele o fez de acordo com o
número de Seus filhos. Na versão em português, tem-se o seguinte texto:

“Quando o Altíssímo dístribuía as heranças às nações, quando separava os filhos dos


homens uns dos outros, fixou os termos dos povos, segundo o número dos filhos de
Israel.”

(Deuteronômio 32:8)
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Eu andei lendo e estudando alguns comentaristas e exegetas especialistas no Velho


Testamento, os quais são unânimes em dizer que o texto original não fala em filhos de
Israel, mas, sim, em filhos de Deus, que é a mesma designação usada no Velho
Testamento para referir-se a anjos:

“Num dia em que os filhos de Deus vieram apresentar-se perante o Senhor, veio também
Satanás entre eles.”

(Jó 1:6)

Parece que essa mesma realidade é a mesma que aparece no livro do profeta Daniel,
onde se fala que as nações da terra encontram correspondência espiritual nas regiões
celestiais. Fala-se, naquele texto ainda, de alguns príncipes, a saber: da Pérsia, como um
ser espiritual que tem ingerências profundas sobre o reino persa (Daniel 10:13); do
príncipe da Grécia (Daniel 10:20); e, de Miguel, como o príncipe de Israel:

“E ele disse: Sabes por que eu vim a ti? Eu tornarei a pelejar contra o príncipe dos persas;
e, saindo eu, eis que virá o príncipe da Grécia. Mas eu te declararei o que está expresso
na escritura da verdade: e ninguém há que esteja ao meu lado contra aqueles, a nãio ser
Miguel, vosso príncipe.”

(Daniel 10:20-21)

No livro do profeta Isaías, do capítulo 41 ao 48, essa mesma idéia parece forte, porque
naquele texto Deus nos é apresentado julgando os deuses dos povos num conselho
celestial. Não se está falando de um juízo de Deus sobre ídolos, mas se está falando do
juízo de Deus sobre principados e potestades espirituais que estão recebendo uma
sentença divina pela corrupção das nações que estiveram sob seu jugo.

A idéia bíblica de que a Babilônia representava forças espirituais malignas deveria nos
fazer tomar aceitável a idéia de que nações, hoje, estão, igualmente, sob a mesma
opressão de forças espirituais malignas.
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Outro ser descrito - também como anjo - é o Anjo do Senhor, que aparece inúmeras vezes
no Velho Testamento, em forma humana. Não se trata de anjos, mas de o Anjo do Senhor.
Uma de suas primeiras aparições está em Gênesis 18:1-4:

“Apareceu o Senhor a Abraão nos carvalhais de Manre, quando ele estava assentado à
entrada da tenda, no maior calor do dia. Levantou ele os olhos, olhou, e eis três homens de
pé em frente dele. Vendo-os, correu da porta do tenda ao seu encontro, prostrou -se em
terra, e disse: Senhor meu, se acho mercê em tua presença, rogo-te que não passes do
teu servo: traga-se um pouco de água, lavai os vossos pés e repousai debaixo desta
árvore.”

Observe, atentamente, que são três os homens que aparecem a Abraão. No entanto, este
se dirige a apenas um deles, chamando-o de “Senhor meu”. Os outros dois são apenas
descritos como anjos. Isso é confirmado, quando Abraão conversa com o Senhor a
respeito da destruição de Sodoma e Gomorra, que lhe fora anunciada por Ele, uma vez
que seu sobrinho Ló era morador de uma daquelas cidades:

“Disse ainda Abaão: Não se ire o Senhor, se lhe falo somente mais esta vez: Se,
porventura, houver ali dez? Respondeu o Senhor: Não a destruirei por amor dos dez.
Tendo cessado de falar a Abraão, retirou-se o Senhor; e Abraão voltou para o seu lugar.
Ao anoitecer vieram os dois anjos a Sodoma, a cuja entrada estava Ló assentado”.

(Gênsis 18:32-19:1a.)

É importante, ainda, que se chame a atenção para o fato de que tal aparição não foi uma
visão ou um sonho. Isto porque Abraão os trata com toda hospitalidade que era costume
oferecer aos visitantes naquela região:

“traga-se um pouco de água, lavai os vossos pés e repousai debaixo desta árvore; trarei
um bocado de pão: refazei as vossas forças, visto que chegastes até vosso servo; depois
seguireis avante. Responderam: Faze como disseste. Apressou-se, pois, Abraão para a
tenda de Sara, e lhe disse: Amassa depressa três medidos de flor de farinha, e faze pão
assado ao borralho. Abraão, por sua vez, correu ao gado, tomou um novilho, tenro e bom,
e deu-o ao criado, que se apressou em prepará-lo. Tomou também coalhada e leite e o
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novilho que mandara preparar, e pôs tudo diante deles; e permaneceu de pé junto a eles
debaixo da árvore; e eles comeram.”

(Gênesis 18:4-8)

Esse mesmo Anjo aparece em Juízes 2:1-5 de maneira gritante, porque nesse texto se diz
que ele não só aparece, mas também prega:

“Subiu o Anjo do Senhor de Gilgal a Boquim, e disse: Do Egito vos fiz subir, e vos trouxe à
terra, que, sob juramento, havia prometido a vossos pais. Eu disse: Nunca invalidarei a
minha aliança convosco. Vós, porém., não fareis aliança com os moradores desta terra,
antes derrubareis os seus altares; contudo, não obedecestes à minha voz. Que é isso que
fizestes? Pelo que também eu disse: Não os expulsarei de diante de vós; antes vos serão
por adversários, e os seus deuses vos serão laços. Sucedeu que, falando o Anjo do
Senhor estas palavras a todos os filhos de Israel, levantou o povo a sua voz e chorou. Daí
chamarem a esse lugar Boquim [pranteadores]; e sacrificaram ali ao Senhor.”

O Anjo do Senhor Se apresentou a Israel, pregando e exortando-o ao arrependimento, de


maneira que todo o povo chorou na presença dEle.

Ainda em Juízes 6:11-12, é feita outra referência a esse Anjo, agora, porém, manifestando-
Se a Gideão:

“Então veio Anjo do Senhor, e assentou-se debaixo do caralho, que está em Ofra, que
pertencia a Joás, abiezrita e Gideão, seu filho, estava malhando o trigo no lagar, para o pôr
a salvo dos midianitas. Então o Anjo do Senhor lhe apareceu, e lhe diss: O Senhor é
contigo, homem valente.”

Também em Juízes 13:3 é esse mesmo Anjo que anuncia o nascimento de Sansão à sua
mãe:
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“Apareceu o Anjo do Senhor a esta mulher, e lhe disse: Eis que és estéril, e nunca tiveste
filho; porém conceberás, e darás à luz um filho.”

Em Zacarias 3:1-2a, esse mesmo Anjo cala a boca de Satanás:

“Deus me mostrou o sumo sacerdote Josué, o qual estava dionte do Anjo do Senhor, e
Satanás estava à mão direita dele, para se lhe opor. Mas o Senhor disse a Satanás: O
Senhor te repreende, ó Satanás.”

Esse mesmo Anjo é chamado de príncipe do exército do Senhor:

“Estando Josué ao pé de Jericó, levantou os olhos, e olhou: eis que se achava em pé


diante dele um homem que trazía na mão uma espada nua; chegou-se Josué a ele, e
disse-lhe: És tu dos nossos, ou dos nossos adversários? Respondeu ele: Não; sou
príncipce do exército do Senhor, e acabo de chegar. Então Josué se prostrou sobre o seu
rosto na terra, e o adorou, e disse-lhe: Que diz meu Senhor ao seu servo? Respondeu o
príncipe do exército do Senhor a Josué: Descalça as sandálias de teus pés, porque o lugar
em que estás é santo. E fez Josué assim.”

(Josué 5:13-15)

Ele também Se manifesta como o inimigo noturno de Jacó, que “sai no tapa” com ele a
noite inteira:

“(...) e lutava com ele um homem, até ao romper do dia. Vendo este que não podia com
ele, tocou-lhe no articulação da coxa; deslocou-se a junta da coxa de Jacó, na luta com o
homem. Disse este: Deixa-me ir, pois ia rompeu o dia. Respondeu Jacó: Não te deixarei ír,
se me não abençoares. Perguntou-lhe, pois: Como te chamas? Ele respondeu: - Jacó.
Então disse: já não te chamarás Jacó, e, sim, Israel: pois como príncipe lutaste com Deus
e com os homens, e prevaleceste.”

(Gênesis 32:24b-28)
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Portanto, esse Anjo do Senhor é descrito por meio de categorias divinas, confundindo-Se
com Deus – quando se fala nEle, fala-se em Deus – numa mesma perspectiva, a tal ponto
que, desde a antigüidade, os comentaristas bíblicos falam de uma Teofania ou de uma
Cristofania, ou seja, de uma manifestação do próprio Cristo.

É-nos também apresentado esse mesmo Anjo como o destruidor noturno dos exércitos de
Senaqueribe.

“Então naquela mesma noite saiu o Anjo do Senhor, e feriu no arrail dos assírios a cento e
oitenta e cinco mil; e quando se levantaram os restantes pela manhã, eis que todos estes
eram cadáveres.”

(II Reis 19:35)

Este rei assírio, sitiando Jerusalém, e insultando ao rei de Judá, ao profeta e a todos os
moradores daquele reino, dispunha de um exército enorme de milhares de homens
fortemente armados e muito bem preparados. Diz -nos a Bíblia que Deus falou com o
profeta naquela mesma noite e este disse ao rei de Judá:

“Pelo que assim diz o Senhor acerca do rei da Assíria: Não entrará nesta cidade, nem
lançará nela flecha alguma, não virá perante ela com escudo, nem há de levantar
trincheiras contra ela. Pelo caminho por onde vier, por esse voltará; mas nesta cidade não
entrará, diz o Senhor.”

(II Reis 19:32-33)

Outra expressão muito bonita encontrada no livro de Reis é a proferida por Eliseu:

“(...)Meu pai, meu pai, carros de Israel, e seus cavaleiros!”

(II Reis 2:12)


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Este é o clamor de Eliseu, proferido quando Efias está sendo trasladado ao céu. Quando,
ainda, o rei da Síria declara guerra a Israel (II Reis 6:8), sitiando a cidade de

Dotã, onde se encontrava o profeta Eliseu (II Reis 6:1314), é pensando naqueles “carros
de Israel, e seus cavaleíros”, e vendo-os, que Eliseu assim diz ao seu moço:

“(...) Nio temas; porque mais são os que estão conosco do que os que estão com eles.”

(II Reis 6:16)

Isso é ratificado na oração que Eliseu faz ao Senhor:

“Orou Eliseu, e disse: Senhor, peço- te que lhe abras os olhos para que veja. O Senhor
abriu os olhos do moço, e ele viu que o monte estava cheio de cavalos e carros de fogo,
em redor de Eliseu.”

(II Reis 6:17)

Anjos também aparecem no Velho Testamento como ministradores de calamidades. Isto


porque quando Davi faz a escolha política errada de fazer o censo (I Crônicas 21:2), vindo
sobre ele o juízo de Deus (I Crônicas 21:7), é um anjo destruidor que executa o mandado
divino:

“Enviou Deus um anjo a Jerusalém, para a destruir; ao destruí-la, olhou o Senhor, e se


arrependeu do mal, e disse ao anjo destruidor: Basta, retira agora a tua mão. O anjo do
Senhor estava junto à eira de Ornã, o jebuseu. Levantando Davi os olhos, viu o anjo do
Senhor, que estava entre a terra e o céu, com a espada desembainhada na mão,
estendida contra Jerusalém; então Davi e os anciãos, cobertos de panos de saco, se
prostraram com o rosto em terra.”

(I Crônicas 21:15-16)
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O profeta Ezequiel fala de seres viventes e angelicais muito estranhos, de uma outra
ordem, de uma outra natureza:

“Do meio dessa nuvem saía a semelhança de quatro seres viventes, cuja aparência era
esta: tinham a semelhança de homem. Cada um tinha quatro rostos, como também quatro
asas. As suas pernas eram direitas, a planta de cujos pés era como a de um bezerro, e
luzia como o brilho de bronze polido. Debaixo das asas tinham mãos de homens, aos
quatro lados; assim todos quatro tinham seus rostos e suas asas. Estas se uniam uma à
outra; não se viravam quando iam; cada qual andava para a sua frente. A forma de seus
rostos era como o de homem; à direita os quatro tinham rosto de leão; à esquerda, rosto
de boi; e também rosto de águia todos os quatro. Assim eram os seus rostos. Suas asas se
abriam em cima; cada ser tinha duas asas, unidas cada uma à do outro; outras duas
cobriam os corpos deles.”

(Ezequiel 1:5-11)

E Isaías 6:2, fala-nos de serafins que aparecem enchendo o templo com a glória de Deus,
trazendo reverência eterna ao Senhor:

“Serafins estavam por cima dele; cada um tinha seis asas: com duas cobria o rosto, com
duas cobria os seus pés e com duas voava.”

De uma maneira geral e rápida, é isso que o Velho Testamento diz desses seres. O Novo
Testamento acrescenta algumas coisas mais.

Primeiramente, o Novo Testamento, quando fala de Satanás, diz que ele é o tentador,
focalizando-o como perturbador da dimensão existencial e psicológica, estimulando áreas
da psiquê, tentando fazer que esta se volte contra o projeto de Deus:

“Então o tentador, aproximando-se, lhe disse: Se és Filho de Deus, manda que estas
pedras se transformem em pães. Jesus, porém, respondeu: Está escrito: Não só de pão
viverá o homem, mas de toda palavra que procede do boca de Deus. Então o diabo o
levou à cidade santa, colocou-o sobre o pináculo do templo. E lhe disse: Se és Filho de
Deus, atira-te abaixo, porque está escrito: Aos seus anjos ordenará a teu respeito; e: Eles
te susterão nas suas mãos, para não tropeçares nalguma pedra. Respondeu-lhe Jesus:
Também está escrito: Não tentarás o Senhor teu Deus. Levou-o ainda o diabo a um monte
muito alto, mostrou-lhe todos os reinos do mundo e a glóría deles, e lhe disse. Tudo isto te
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darei se prostrado, me adorares. Então Jesus lhe ordenou: Retira-te, Satanás, porque está
escrito: Ao Senhor teu Deus adorarás, e só a ele darás culto.”

(Mateus 4:3-10)

Satanás também é apresentado como distorcedor da verdade, o desviador da visão da


Cruz; aquele que é capaz de transformar a revelação de Deus numa teologia humana. É o
que se verifica quando Pedro, após dizer “Tu és o Cristo, o Fílho do Deus vivo” (Mateus
16:16b), e de ter ouvido Jesus lhe dizer “Bem-aventurado és, Simão Barjonas, porque não
foi carne e sangue quem to revelou, mas meu Pai que está nos céus”. (Mateus 16:17), logo
após Pedro ter declarado e ouvido tais palavras, ele ouviu Jesus dizer ainda:

“É necessário que o Filho do homem sofra muitas coisas, seja rejeitado pelos anciãos,
pelos principais sacerdotes e pelos escribas; seja morto e no terceiro ressucite.”

(Lucas 9:22)

Pedro, ao ouvir essas palavras, achou que, porque Deus o havia usado uma vez, o usaria
sempre, falou-lhe:

“(...) Tem compaixão de ti, Senhor; isso de modo algum te acontecerá.”

(Mateus 16:22b)

Jesus, entretanto, lhe responde:

“(...) Arreda! Satanás; tu és para mim pedra de tropeço, porque não cogitas das coisas de
Deus, e, sim, das dos homens.”

(Mateus 16:23)
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Satanás também é apresentado como o príncipe deste mundo:

“(...) porque o príncipe deste mundo já está julgado.”

(João 16:11)

Satanás ainda é descrito como o deus deste século:

“(...) o deus deste século cegou os entendimentos dos íncrédulos, para que lhes não
resplandeça a luz do evangelho da glória de Cristo, o qual é a imagem de Deus.”

(II Coríntios 4:4)

Ele também é considerado o patrocinador do ódio, segundo o texto de II Coríntios

2:10-11:

“A quem perdoais alguma coisa, também eu perdôo; porque de fato o que tenho perdoado,
se alguma coisa tenho perdoado, por causa de vós o fiz na presença de Cristo, para que
Satanás não alcance vantagem sobre nós, pois não lhe ignoramos os desígnios.”

Em João 8:44b, Satanás é chamado por Jesus de homicida, pai de todo tipo de violência:

“(...) Ele foi homicida desde o princípio.”

Nesse mesmo texto de João, ele também é descrito como o pai da mentira:

“(...) e jamais se firmou na verdade, porque nele não há verdade. Quando ele profere a
mentira, fala do que lhe é próprio porque é mentiroso e pai da mentira.”
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(João 8:44c)

Ele também é o mentor da hipocrisia religiosa. Foi Satanás que incitou a Ananias e a Safira
a mentirem ao Espírito Santo, acerca do dinheiro resultante da venda de uma propriedade:

“Entretanto, certo homem, chamado Ananias, com sua mulher Safira, vendeu uma
propriedade, mas, de acordo com sua mulher, reteve parte do preço, e, levando o restante,
depositou-o aos pés dos apóstolos. Então disse Pedro: Ananias, por que encheu Satanás
teu coração, para que mentisses ao Espírito Santo, reservando parte do valor do campo?”

(Atos 5:1-3)

É o pai dos religiosos empedrados, de acordo com João 8:44a, quando Jesus diz aos
religiosos dos Seus dias:

“Vós sois do diabo, que é vosso pai, e quereis satisfazer-lhe os desejos.”

É o articulador das divisões da Igreja:

“Rogo-vos, irmãos, que noteis bem aqueles que provocam divisões e escândalos, em
desacordo com a doutrina que aprendestes; afastai-vos deles, porque esses tais não
servem a Cristo, nosso Senhor, e, sim, a seu próprio ventre; e, com suaves palavras e
lisonjas, enganam os corações incautos. Pois a vossa obediência é conhecida por todos;
por isso me alegro a vosso respeito; e quero que sejais sábios para o bem e símplices para
o mal. E o Deus da paz em breve esmagará debaixo dos vossos pés a Satanás.”

(Romanos 16:17-20)

Em outras palavras, sempre ou quase sempre, no meio das divisões quem está tendo
vitórias não é Deus, mas o diabo. Pode ser até que a divisão esteja sendo feita em nome
do Espírito Santo, mas, cuidado! O diabo vai estar dando uma gargalhada num canto da
igreja. A divisão só é admissível quando é feita em razão de um grande e importante
princípio da Palavra de Deus, seja tal princípio de natureza ética, ou doutrinária.
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Satanás também é apresentado como o requerente da vida humana. Em Lucas 22:31, é -


nos dito que ele reclamou a vida de Pedro:

“Símão, Simão, eis que Satanás vos reclamou para vos peneirar como trigo.”

Satanás é enfocado como o carrasco dos homens, quanto à disciplina, de acordo com 1
Coríntios 5:5. Alguns deles são entregues a Satanás para a destruição do corpo, a fim de
que a culpa lhes traga conseqüências psicossomáticas “para a destruição da carne, a fim
de que o

espírito seja salvo no dia do Senhor [Jesus].”

Ele – Satanás – é descrito como transformista, como um “camaleão espiritual”, em II

Coríntios 11:14:

“E não é de admirar, porque o próprio Satanás se transforma em anjo de luz.”

Satanás é tido por atiçador de hostilidades contra a Igreja, de acordo com Apocalipse

2:10:

“Não temas as coisas que tens de sofrer. Eis que o diabo está para lançar em prisão
alguns dentre vós, para serdes postos à prova, e tereis tribulação de dez dias. Sê fiel até à
morte, e dar-te-ei a coroa da vida.”

Ele é apresentado, também, como o grande dragão, em Apocalipse 12:9:

“E foi expulso o grande dragão, a antiga serpente, que se chama diabo e Satanás, o
sedutor de todo o mundo, sim, foi atirado para a terra e, com ele, os seus anjos.”
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Satanás é descrito como acusador, em Apocalipse 12:10b:

“(...) pois foi expulso o acusador de nossos irmãos, o mesmo que os acusa de dia e de
noite, diante do nosso Deus.”

Também Satanás é descrito como o pervertedor das nações do mundo, como em

Apocalipse 20:7b8a:

“Satanás será solto da sua prisão, e sairá a seduzir as nações que há nos quatro cantos da
terra.”

Ele é, também, o enganador milagroso, que é capaz de fazer sinais e prodígios com a
força da mentira e das trevas, conforme em I Timóteo 4:1:

“Ora, o espírito afirma expressamente que, nos últimos tempos, alguns apostatarão dao fé,
por obedecerem a espíritos enganadores e a ensinos de demônios.”

O Novo Testamento não só fala do diabo, mas também fala de demônios, de espíritos
malignos que possuem pessoas; de espíritos de enfermidade, como o de surdez e de
mudez (Marcos 7:25), de gagueira (Marcos 7:32-34) e de encurvamento. O Novo
Testamento também fala de espíritos de comunidade, como em Gadara (Mateus 8:28-34),
onde os espíritos pedem a Jesus para não serem mandados para fora daquela região,
porque haviam se especializado em “gadaranismo”. Fala-se em espíritos de angústia
coletiva (Apocalipse 9), quando se descreve a abertura do poço do abismo, do qual sai
toda sorte de seres espirituais melévolos, que geram angústia e perversão na sociedade
humana, as quais redundam em todo tipo de violência, como a guerra, a pornografia, o
caos social e a inteligência do homem rebelada contra Deus, quando o homem começa a
sentir um desejo ardente de morrer.

O Novo Testamento também fala de anjos como portadores de boas novas (Lucas 1:26-
28), quando do anúncio do nascimento de Jesus; ou como libertadores de cristãos, quando
da libertação de Pedro:
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“Eis, porém, que sobreveio um anjo do Senhor, e uma luz iluminou a prisão; e, tocando ele
o lado de Pedro, o despertou, dizendo: Levanta-te depressa. Então as cadeias caíram-lhe
das mãos.”

(Atos 12:7)

Os anjos também são descritos como recepcionistas daqueles que morrem no Senhor,
conforme Lucas 16:22a, quando Lázaro - o mendigo - é levado pelos anjos ao seio de
Abraão:

“Aconteceu morrer o mendigo e se relevado peIos anjos para o seio de Abraão.”

Os anjos são descritos, no Novo Testamento, como confodadores de aflitos, como em


Lucas 22:43, quando Jesus, na Sua agonia no Getsêmani, é confortado por um anjo:

“Então lhe apareceu um anjo do céu que o confortava.”

Também os anjos são pré-evangelizadores, “preparadores de terreno” espirituais, tal como


é narrado em Atos 10:3-4, quando Cornélio tem o coração preparado para receber a
palavra que Pedro lhe traria, através de uma ação pré-evangelizadora de um anjo:

“Esse homem observou claramente durante uma visão, cerca da hora nona do dia, um anjo
de Deus, que se aproximou dele e lhe disse: Cornélio! Este, fixando nele os olhos, e
possuído de temor, perguntou: Que é Senhor? E o anjo lhe disse: As tuas orações e as
tuas esmolas subiram para memória diante de Deus.”

Também anjos são algozes dos prepotentes, como aquele que fere a Herodes por não
haver dado glória a Deus:

“Em dia designado, Herodes, vestido de traje real, assentado no trono, dirigiu-lhes a
palavra; e o povo clamava: É a voz de um deus, e não de um homem! No mesmo instante
um anjo do Senhor o feriu, por ele não haver dado glóría a Deus; e, comido de vermes,
expirou.”
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(Atos 12:21-23)

Também são os anjos enfrentadores de poderes malignos, conforme a epístola de Judas,


verso 9:

“Contudo, o arcanjo Miguel, quando contendia com o diabo, e disputava a respeito do


corpo de Moisés, não se atreveu a proferir juízo infamatório contra ele; pelo contrário,
disse: O Senhor te repreenda.”

São descritos também como intercessores de campos missionários:

“Um anjo do Senhor falou a Filipe, dizendo: Dispõe-te e vai para a banda do sul, no
caminho que desce de Jerusalém a Gaza; este se acha deserto. Ele se levantou e foi.”

(Atos 8:26)

Filipe é retirado de uma cruzada evangelística em Samaria (Atos 8:4-8) e enviado para um
lugar deserto, para pregar o evangelho ao ministro da fazenda da Etiópia (Atos 8:27).

Em Atos 16:9b, Paulo está incerto para onde ir, e, à noite, tem uma visão, na qual um
varão macedônio se apresenta a ele e lhe diz:

“Passa à Macedônia, e ajuda-nos.”

Certa vez, lendo alguns livros dos “pais” da Igreja, constatei que é opinião quase unânime
entre eles que essa visão de Paulo foi a de um anjo. Isto porque, chegando a Filipos -
cidade da Macedônia - uma mulher chamada Lídia se converte (Atos 16:14), uma jovem
possessa de espírito de adivinhação é liberta (Atos 16:16-18), o carcereiro da prisão onde
ficaram presos Paulo e Silas se converte (Atos 16:29-30), uma igreja é estabelecida (Atos
17:4), e, em virtude de todas essas coisas, o ministério de Paulo toma um novo rumo,
devido ao atendimento do pedido feito para ir à Macedônia.
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No Apocalispe os anjos são descritos como mensageiros de Deus, questionadores da


verdade, libertadores de forças espirituais, guerreiros, portadores de oráculos, guardadores
de cidade, soldados nas batalhas espirituais, anunciadores de juízos e adoradores
incessantes na presença de Deus.

Embora a exposição desses elementos descritos tenha sido um pouco longa, ela se faz
necessária, uma vez que, possivelmente, haja algum leitor não muito afeito com eles,
objetivando resgatar esses personagens bíblicos: o que fazem, onde agem e como agem.
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CAPÍTULO 9

DISCERNINDO NOSSAS RELAÇÕES COM OS PRINCIPADOS E AS POTESTADES

Depois de se ter uma idéia rápida acerca dos seres espirituais que são descritos pela
Bíblia, cabe a seguinte pergunta: o que nós precisamos saber, hoje, sobre a nossa relação
com tais seres espirituais?

Há algumas coisas que a Palavra de Deus nos diz que são absolutamente importantes
discernir no lidar, no enfrentar e no perceber o mundo espiritual que nos cerca.

A primeira coisa que a Palavra de Deus diz que precisamos saber é que a cruz

relativizou o poder dos principados e potestades.

O que a Palavra de Deus diz a esse respeito pode ser encontrado em Colossenses

2:14-15:

“Tendo cancelado o escrito de dívida, que era contra nós e que constava de ordenanças, o
qual nos era prejudicial, removeu-o inteiramente, encravando-o no cruz; e, despojando os
principados e as potestades, publicamente os expôs ao desprezo, triunfando deles na
cruz.”

Também em João 12:31, encontra-se algo acerca disso:

“Chegou o momento de ser julgado este mundo, e agora o seu príncipe será expulso.”

Falando a obra do Espírito Santo, Jesus diz:

“Quando ele vier convencerá o mundo do pecado, da justiça e do juízo: (...) do juízo,
porque o príncipe deste mundo já está julgado.”
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(João 12:8 e11)

O diabo e todos os demônios já estão julgados; os principados e as potestades estão


julgados. Para os principados e potestades, a cruz é o ponto mais escatológico e mais
apocalíptico da História. O fim para eles, portanto, já veio. Nas regiões celestiais, o fim já
chegou. E o diabo sabe disso. É por isso que Apocalipse 12:10 diz:

“(...) Agora veio a salvação, o poder, o reino do nosso Deus e a autoridade do seu Cristo,
pois foi expulso o acusador de nossos irmãos, o mesmo que os acusa de dia e de noíte,
diante do nosso Deus”

Eu aprendi isso na prática. Eu era recém-convertido, e fui levado “a reboque” para expulsar
um demônio. Eu era novo na fé, naquela ocasião. Alguém foi chamar um pastor experiente
para isso:

“ - Pastor, pastor!...- Tem uma pessoa possessa lá perto de casa! Vamos lá!”

Eu, que estava perto daquele pastor, olhando para mim, falou:

“ - Vamos comigo, meu filho!”

Logo eu que, meses antes, havia sido um meio possesso! E lá fui eu.

Como eu andava rápido, e o pastor andava um pouco mais devagar, conversando com o
irmão que fora chamá-lo, quando dei por mim, eu já havia entrado na casa onde estava a
mulher possessa. Quando entrei na casa, e a possessa partiu na minha direção, e eu a
encarei, em nome de Jesus, falei-lhe da Cruz. Eu lhe falei:

“- Em nome de Jesus, que morreu na Cruz, eu o repreendo!”

De imediato, ela - a possessa - citou-me Colossenses 2:14-15, na íntegra. Depois disso, eu


perguntei àquele irmão que fora buscar-nos:
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“– Ela já foi a alguma igreja?”

Ele me respondeu:

“- Nunca. Ela não sabe ler! Ela é ‘burra depai e de mãe’!...”

Mas, apesar disso que ele me falou, ela recitou na íntegra tal texto bíblico. O espírito
maligno, por meio dela, falou:

“- Eu estava lá! Quando Ele cancelou o escrito de dívida, e expôs os principados e as


potestades ao desprezo, triunfando sobre eles na Cruz, eu estava lá!”

Confesso: o diabo nunca me edificou tanto!

Saiba disso: na batalha espiritual, não temos que vencer os principados e as potestades,
porque eles já estão vencidos; porém, temos apenas que reclamar a vitória de Jesus. Essa
é a primeira coisa que precisamos saber. Vejo muita gente querendo lutar e vencer uma
batalha que já está vencida. A rigor, a batalha espiritual já se deu. Hoje, nós estamos
apenas afirmando a vitória de Jesus.

A segunda coisa que precisamos saber e aprender é que os principados e as potestades


aprendem com a Igreja. Ou seja, há toda uma relação didática, pedagógica e instrutiva da
nossa parte com os principados e as potestades. Como isso se dá?

“Para que, pela igreja, a multiforme sabedoria de Deus se torne conhecida agora dos
principados e potestades nos lugares celestiais.”

(Efésios 3:10)

Enquanto estamos por meio destas páginas pensando e refletindo sobre batalha espiritual,
de acordo com Paulo, os principados e as potestades estão fazendo o mesmo. Enquanto
vivemos, praticamos nossa missão no mundo. A Palavra de Deus nos assevera que os
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principados e potestades estão recebendo ministração acerca da sabedoria divina,


mediante a reflexão, a ação e a postura da Igreja no seu fazer missionário na terra.

É por isso que a Igreja tem que desmascarar poderes espirituais. O apóstolo Paulo diz que
não ignorava os desígnios do diabo (II Coríntios 2:11). Era em virtude disso que ele podia
exercer discernimento, como o afirmado em Atos 16: 16-18,, em que Paulo, olhando para
aquela moça com espirito de adivinhação - a qual "confirmava” que Paulo era servo do
Deus Altíssimo (Atos 16:17) -, não encontrou nela nenhuma atitude de propaganda positiva
do reino, mas de uma atuação maligna e escarnecedora do diabo (Atos 16:18). Por isso
Paulo diz:

“Para que Satanás não alcance vantagem sobre nós, pois não lhe ignoramos os
desígnios.”

(II Coríntios 2:11)

A Palavra de Deus também nos diz em I Coríntios 4:9, que os apóstolos deixavam os
poderes espirituais (os principados e as potestades) perplexos, no teatro espiritual.

“Porque a mim me parece que Deus nos pôs a nós, os apóstolos, em último lugar, como se
fôssemos condenados à morte; porque nos tornamos espetáculo ao mundo, tanto a anjos,
como a homens.”

O interessante que a palavra utilizada no original grego é “ theátron”, que se refere a palco,
a espetáculo. Paulo diz que as potestades e os principados estão de olho na ação da
Igreja, na ação de apóstolos, na ação de homens e de mulheres de Deus. Há toda uma
expectativa espiritual acerca de tais manifestações. Ninguém evangeliza ou deve
evangelizar brincando. Paulo diz em 1 Coríntios 10 e 11 que os momentos de culto são
impregnados de realidades espirituais. Nós nos “ocidentalizamos”, tornando-nos muito
racionalistas, muito fechados, com uma mente muito árida, muito lógica, perdendo a
possibilidade de ler a Bíblia com os olhos que discernem o grande teatro espiritual, no qual
eu e você somos personagens cotidianos.

Paulo está dizendo que os principados e potestades o conheciam:


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“Mas o espírito maligno lhes respondeu: conheço a Jesus e sei quem é Paulo; mas, vós,
quem soís?”

(Atos 19:15)

É acerca disso que Paulo está falando:

“ - As potestades e os principados me conhecem. Nós, apóstolos, tornamo-nos espetáculos


tanto a anjos, quanto a homens.”

Lembro-me de uma ocasião em que entrei na casa de uma pessoa possessa, no bairro de
São Francisco, em Manaus. Quando cheguei àquela casa, encontrei uma menina que tinha
vindo do interior do Amazonas, a qual não sabia ler nem escrever, e que nunca havia saído
do interior do estado para a capital, e que nunca havia me visto antes; com uma força
sobre-humana – havia, mais ou menos, uns 8 homens segurando-a, os quais ela jogava de
um lado para o outro.

Quando cheguei àquela casa, portanto, ela, olhando para mim, falou com uma voz
masculina:

“ - Desgraçado! Eu o conheço! Eu o vi no Rio de Janeiro. Você era meu, mas o perdi!”

Naquela casa, apenas eu e aquele espírito sabíamos a que este se referia. Foi numa noite
de “reveillon”, no Rio de Janeiro, em 1972, eu ia ficando possesso, na praia de
Copacabana, sentindo uma coisa escuríssima entrando em mim... Fui perdendo o controle
sobre mim mesmo... Apenas me lembrei de um versículo que a minha avó me ensinara
embalando a minha rede em Manaus, que diz:

“Ainda que eu ande pelo vale da sombra da morte, não temerei mal nenhum, porque tu
estás comigo; a tua vara e o teu cajado me consolam.”
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(Salmo 23:4)

Eu me encontrava, naquela noite, com a cabeça cheia de maconha, cheia de cocaína,


cheia de bebida e de tudo que não prestava... Mas, no momento em que senti aquela coisa
entrando em mim, lembrei-me desse versículo ensinado pela minha avó. Eu não cheguei a
pronunciá-lo. O versiculo só passou pela minha cabeça, quando senti aquela coisa ser
jogada para fora de mim.

E lá estava eu no Amazonas, vendo, na prática, não nos bancos de um seminário, mas na


prática, o que a Bíblia diz quanto aos principados e potestades conhecerem as ações da
Igreja. Apóstolos, homens e mulheres de Deus são espetáculo tanto a anjos quanto a
homens.

Muitas vezes, em algumas cruzadas evangelísticas, literalmente me sinto no centro desse


palco, no qual há forças espirituais tremendas em ação. Se se quer evangelizar com
seriedade; se se quer pregar com compromisso; se se quer orar com fé; se se quer
ministrar com honestidade, é imprescindível que se adquira o discernimento de que não se
está apenas verbalizando uma verdade ou um sentimento, mas que se está no meio de um
conflito espiritual tremendo, no qual anjos e demônios reconhecem a sabedoria de Deus
pela ministração daqueles que são povo de Deus na Igreja.

A terceira coisa que precisamos saber e aprender é que os principados e as potestades


alimentam e são alimentados pelas forças da História. Algo acerca disso já foi falado bem
sucintamente no capítulo anterior, mas agora, iremos nos deter um pouco mais sobre esse
assunto.

Em Apocalipse 17:12-13, diz o seguinte:

“Os dez chifres que viste são dez reis, os quais ainda não receberam reino, mas recebem
autoridade como reis, com a besta, durante uma hora. Têm estes um só pensamento, e
oferecem à besta o poder e a autoridade que possuem.”

O interessante no texto citado é que a besta lhes dá autoridade e eles, reciprocamente,


oferecem autoridade a ela. Eles não têm autoridade ("ainda não receberam reino”), mas já
receberam da besta uma unção para tê-la (“mas recebem autoridade como reis, com a
besta”), e, quando a têm, devolvem-na a ela ("e oferecem à besta o poder e a autoridade
que possuem.”).
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Este texto de Apocalipse está dizendo absolutamente isto: os principados e as potestades


alimentam e são alimentados pelas forças da História - as forças políticas, econômicas,
culturais e pela sua conjuntura mais ampla e complexa.

A quarta coisa que precisamos saber e aprender é que os principados e potestades não
existem autonomamente. Primeiramente, porque não são independentes de Deus. Isto
porque continuam sob a soberania divina.

É importante que fique claro que não temos um universo dividido, no qual uma parte
pertence a Deus e a outra ao diabo. Não! O universo não está dividido assim. O universo
se manifesta desta forma: há Alguém sobre tudo e sobre todos. O Seu nome é o Senhor, e
abaixo dEle estão todas as coisas.

Também os principados e as potestades não são independentes uns dos outros, não
agindo sem conexão entre si. O apóstolo Paulo nos fala de uma coordenação e de uma
conjugação de forças e poderes:

“Quanto ao mais, sede fortalecidos no Senhor e no força do seu poder. Revestí-vos de


toda a armadura de Deus, para poderdes ficar firmes contra as ciladas do diabo; porque a
nossa luta não é contra o sangue e a carne, e, sim, contra os principados e potestades,
contra os dominadores deste mundo tenebroso, contra as forças espirituais do mal, nos
regiões celestes.”

(Efésios 6:10-12)

Observem as seguintes palavras extraídas do texto acima: “principados”, “potestades”,


"dominadores” e "forças”. Todas elas dão-nos uma idéia de ação coordenada.

Os principados e as potestades também não são independentes da História, agindo e


atuando dentro dela.

A quinta coisa que precisamos saber e aprender é que os principados e potestades são
sensíveis a duas ações especiais da Igreja. Há duas ações especiais da Igreja que
sensibilizam imensamente o mundo das realidades espirituais.

A primeira ação é a oração, conforme Atos 12:1 onde se diz que a Igreja está orando
"marotamente” (v. 12), mas, apesar disso, um anjo é enviado para abrir a porta do cárcere
para Pedro sair (v.7).
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Já em Mateus 17:14-21, é narrado o fato da tentativa feita pelos discípulos de Jesus de


expulsarem o demônio, mas não o conseguem. Jesus, porém, descendo do monte da
transfiguração, diz-lhes:

“(...) esta casta não se expele senão por meio de oração e jejum.”

(Mateus 17:21)

Os teólogos tentam dar as explicações as mais diversas a este texto; mas, eu prefiro
continuar a acreditar que oração é oração, e jejum é jejum, literalmente.

A segunda ação que sensibiliza os principados e potestades é o testemunho dos crentes, o


qual deflagra processos tremendos nas regiões celestiais. O testemunho que gera tais
processos é o de Jesus, quando se abre a boca para anunciar-Lhe a vitória, pregando a
Sua cruz e não se dobrando às forças históricas que tentam fazer que se negue o Seu
nome, e andando em integridade, proclamando a Sua vitória.

Em Apocalipse 12:11, lemos:

“Eles, pois, o venceram por causa do sangue do Cordeiro e por causa da palavra do
testemunho que deram, e, mesmo em face da morte, não amaram a própria vida.”

Sei que, atualmente, a intenção de muitos, quando pensam em enfrentar principados e


potestades, é convidar crentes para algum lugar para fazerem declarações bonitas e
triunfantes da vitória de Jesus, Todavia, o texto acima de Apocalipse diz que tais
declarações não são feitas de mim para você, e nem de mim para os seres espirituais
apenas; mas, ela é feita de nós para o mundo. Quando se vai para a sociedade, deve-se
proclamar a vitória da cruz

(“venceram por causa do sanque do Cordeiro”), suportando o peso de ser servo de Jesus,
mesmo às custas de ações e atitudes que trarão conseqüências profundas à vida,
podendo redundar em morte.
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CAPÍTULO 10

DISCERNINDO AS FORÇAS HISTÓRICAS NA BATALHA ESPIRITUAL

Agora que já se sabe quem são esses seres espirituais; agora que já se sabe o que a Cruz
lhes fez; agora que já se sabe qual a relação dos principados e potestades com a Igreja;
agora que já se sabe como os principados e potestades atuam na História; agora que já se
sabe quais as ações da Igreja que fragilizam tais seres espirituais; agora, enfim, que já se
sabe tudo isso, uma pergunta deve ser feita: será que se pode escolher um caso, ou fazer
um estudo de casos, no qual se possa ver esses seres em ação, bem como o povo de
Deus em ação em relação a esses seres?

No capítulo 10 do profeta Daniel, diz-nos que tudo o que vai ser descrito e narrado nele
ocorreu num momento histórico-político importantíssimo. O que é interessante na Bíblia é
que as coisas espirituais não estão divorciadas da História. Não se fala das dimensões
celestiais num lugar indefinido; ao contrário, elas têm a ver com a terra, com o mundo em
que vivemos.

Primeiramente, diz-se que tudo aconteceu no terceiro ano do rei Ciro (v.1) - acerca do qual
Isaías havia profetizado quase 100 anos antes (Isaias 45), dizendo que Deus o levantaria
para abrir a porta aos exilados judeus em Babilônia, permitindo-lhes a volta à sua terra, a
fim de reconstruírem suas vidas.

Prosseguindo, Daniel diz que no terceiro ano do rei Ciro ele estava à beira do rio Tigre
(Daniel 10:4). Lá, Daniel teve a visão de anjo, o qual é descrito de forma inteiramente
diferente daquelas que geralmente ouço, quando alguém diz que teve uma visão de um.
Geralmente, dizem-me:

“- Pastor, eu vi um anjão com uma espada deste tamanho!...”

Passado algum tempo, eu pergunto a uma das pessoas que me disseram ter visto um anjo:

“- Como era mesmo aquele anjo que você disse que viu?”

“- Ah! Me esqueci, pastor!” - responde-me.


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Eu nunca vi um anjo. Mas, no dia em que vir um, certamente, mesmo que viva mais 400
anos, vou descrevê-lo exatamente da mesma forma que o vi pela primeira vez. Não
consigo crer em alguém que diz que vê anjo, mas se esquece dele no dia seguinte.

Daniel, entretanto, diz:

“- Eu vi um anjo!... E, olha, eu tive uma tremedeira danada... Mudei de cor... fiquei branco
de medo... quase desmaiei... Eu fiquei estarrecido com aquela visão esmagadora!...”

O anjo o toca e lhe diz:

“- Levanta, Daniel.”

Daniel diz que foi tocado pelo anjo (v.10), ficando de pé, mas que, mesmo assim,
continuou a sentir medo (v.11). O anjo, então, começa a relatar-lhe o propósito de sua
visita:

“(...) Daniel, homem muito amado, está atento às palavras que te vou dizer, e levanta-te
sobre os pés; porque eis que te sou enviado. Ao falar ele comigo esta palavra, eu me pus
em pé tremendo. Então me disse: Não temas, Daniel, porque desde o primeiro dia, em que
aplicaste o coração a compreender e a humilhar-te perante o teu Deus, foram ouvidas as
tuas palavras; e por causa das tuas palavras é que eu vim. Mas o príncipe do reino da
Pérsia me resistiu por vinte e um dias; porém Miguel, um dos primeiros príncipes, veio para
ajudar-me, e eu obtive vitória sobre os reis da Pérsia. Agora vim para fazer-te entender o
que há de suceder ao teu povo nos últimos dias; porque a visão se refere a dias ainda
distantes.”

(Daniel 10:11-14)

O anjo começa a dizer-lhe que os persas vão cair (v.20) e que outro reino iria levantar-se -
o da Grécia (v.20), surgindo um homem poderoso nesse reino, cujo nome não é citado,
mas é Alexandre, o Grande. Esse reino grego será intenso e mundial (Daniel 11:3), porém
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curto. Quando esse rei grego morrer, o reino será dividido em quatro (Daniel 11:4). E foi
isso que ocorreu, historicamente falando. Cassandro, Lasímoco, Ptolomeu e Seleuco
ficaram com os reinos. Dois desses reinos tornam-se especialmente fortes, quais sejam o
de Ptolomeu e o de Seleuco.

Depois disso, o anjo diz que haverá guerra entre o reino do norte e o reino do sul (Daniel
11:10-11). E o campo dessa batalha será Israel.

Daniel faz menção a uma mulher muito bonita, que é Cleópatra, aparecendo em Daniel
11:6, a qual é filha do rei do Sul, mas que é dada a um príncipe do reino do Norte, na
tentativa de uma aliança entre os reinos. Mas, a aliança é quebrada depois (Daniel 11:7).

Vão sendo descritas as inúmeras lutas históricas entre Ptolomeus e Seleucos. Também é
mencionada a revolta dos macabeus (Daniel 11:14).

O que é que se aprende com toda essa narrativa?

Em primeiro lugar, aprende-se que os principados e as potestades têm relação com a


História. Em Daniel 10:13, encontramos algo a esse respeito, falando que as
manifestações espirituais se relacionavam com o mundo visível e suas expressões
políticas. O verso 13 nos fala do príncipe da Pérsia – a qual existe na geografia mundial
real, concreta. O anjo está dizendo que havia uma correspondência espiritual, e que havia
principados malignos agindo na Pérsia:

“Mas o príncipe do reino da Pérsia me resistiu por vinte e um dias. Porém Miguel, um dos
primeiros príncipes, veio para ajudar-me, e eu obtive vitória sobre os reis da Pérsia.”

Em Daniel 10:20b, fala-se sobre o príncipe da Grécia:

“(...) eis que virá o príncipe da Grécia.”

Também havia um principado poderoso agindo na Grécia.

E, em Daniel 10:21b, fala-se em Miguel, que é chamado de “vosso príncipe” ou seja,


príncipe do povo de Israel:
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“(...) e ninguém há que esteja ao meu lado contra aqueles, a não ser Miguel, vosso
príncipe.”

Se a Pérsia tinha principados; se a Grécia tinha principados; se Israel tinha Miguel; a


pergunta que deve ser feita agora é a seguinte: quem são os principados que estão sobre
o

Brasil?

Algo interessante é notar que os principados também mudam com a História. Eles estão
tão imiscuídos nela, que não mantêm um mesmo padrão de atuação o tempo todo: a
História muda, eles mudam com ela.

Se os principados e potestades não mudassem, nós teríamos o mesmo padrão de ação


espiritual na Pérsia (atualmente Irã) até hoje. Houve convulsões religiosas e políticas tão
profundas que determinaram outra manifestação espiritual lá.

Mas o princípio que fica é este. Por mais estranho que isso possa parecer a algumas
mentes teológicas mais sofisticadas, a Bíblia é clara quanto à atuação dos principados e
potestades no seio da História, agindo sobre nações, de maneira tão íntima, tão intrínseca
que a Bíblia os especifica, referindo-se à área de atuação deles, como o príncipe das
Nações.

Há todo um exercício a ser feito por nós, com cuidado e inteligência, para discernirmos
quem são os principados que atuam no nosso país.

Em segundo lugar, aprende-se que a batalha espiritual não nos isenta de vivermos dentro
o conjunto das forças históricas.

A vitória do anjo sobre os principados da Pérsia não mudou a História, do ponto de vista
mediato. O anjo diz a Daniel:

“- Eu vim para te dizer que tu és amado. Não pude chegar mais cedo, porque fui impedido
pelo príncipe da Pérsia. Miguel veio ao meu socorro. Depois disso é que eu pude vir.”

Poder-se-ia pensar que ele - o anjo - diria o seguinte:


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“- O povo de Israel está livre, nunca mais ninguém vai oprimi-lo. Não há mais sofrimento,
desgraça, opressão, não há mais nada que aflija o homem.”

Não é isso que se espera como resultado de vitória nas regiões celestiais? No entanto, o
anjo diz que houve vitória, mas que, apesar dela, sofrimentos e angústias sobreviriam
sobre o povo de Deus.

Isso nos deve levar a rever completamente o nosso entendimento do que vem a ser vitória
nas regiões celestiais. Vitória nas regiões celestiais, tendo por base o texto de Daniel 10 e
11, não significa mudanças sócio-políticas radicais; não significa reviravoltas econômicas
dramáticas; não significa, necessariamente, a prosperidade material do povo de Deus. A
vitória do anjo não mudou dramaticamente a História, mas mostrou o que haveria de
acontecer no futuro:

“Agora vim para fazer-te entender o que há de suceder ao teu povo dos últimos dias;
porque a visão se refere a dias ainda distantes.”

(Daniel 10:14)

Em terceiro lugar, aprende-se que a batalha espiritual não é tanto a de neutralizar forças
espirituais, mas de discerni-las, a fim de não nos aliarmos a elas.

Há pessoas que pensam que não é preciso ter tal discernimento, uma vez que acreditam
que não vão ter garantias de que o seu confronto espiritual não vai mudar a História,
imediatamente. Daniel não mudou o curso histórico. A peleja foi vencida nas regiões
celestiais não necessariamente para neutralizar as forças espirituais que estavam agindo
na

História, nem para neutralizar as forças históricas alimentando as espirituais; mas,


sobretudo, para discerni-las, para não nos aliarmos a elas.

Daniel recebe discernimento da visão:


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“(...) e teve inteligência da visão.”

(Daniel 10:1b)

O perigo é que alguns do povo de Daniel não tiveram discernimento, aliando-se ao lado
errado. É o que se diz em Daniel 11:14:

“Naqueles tempos se levantarão muitos contra o rei do Sul; também os dados à violência
dentre o teu povo se levantarão para cumprirem a profecia, mas cairão.”

Em quarto lugar, aprende-se que a batalha espiritual não é ganha quando o povo de

Deus triunfa sobre as forças da História, e, sim, quando não se deixa seduzir por elas.

Encontra-se uma afirmação acerca disso em Daniel 11:33-35, que diz:

“Os entendidos entre o povo ensinarão a muitos; todavia cairão pela espada e pelo fogo,
pelo cativeiro e pelo roubo, por algum tempo. Ao caírem eles, serão ajudados com
pequeno socorro; mas muitos se ajuntarão a eles com lisonjas. Alguns dos entendidos
cairão para serem provados, purificados, e embranquecidos, até ao tempo do fim, porque
se dará ainda no tempo determinado.”

Há, nesse texto, alguma palavra de vitória sobre as forças históricas? Ao contrário: estão
debaixo de pancada.

Por fim, em quinto lugar, o que se aprende é que a batalha espiritual não é caracterizada
por vitória histórica do povo de Deus, mas pela sua salvação.

A grande vitória não é ter a garantia de que, um dia, o Brasil vai ter um Presidente da
República evangélico. A grande vitória não é ter a certeza de que todas as verbas públicas
irão para os caixas da Igreja. A grande vitória não é saber que nada vai ser feito sem a
autorização de algum pastor poderoso.
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Note-se que o povo de Israel tem um defensor, que é Miguel (Daniel 12:1), mas passam
por angústias terríveis:

“Nesse tempo se levantará Miguel, o grande príncipe, o defensor dos filhos do teu povo, e
haverá tempo de angústia, qual nunca houve, desde que houve nação até aquele tempo;
mas naquele tempo será salvo o teu povo, todo aquele que for achado inscrito no livro.”

Mas, a Palavra de Deus ainda diz:

“(...) mas naquele tempo será salvo o teu povo.”

O povo de Daniel não se tornou o povo mais forte da História. Pelo contrário, é descrito
como um povo fraco e abatido, mas com a promessa de que seria uma nação de pessoas
salvas.

Do Brasil, o que podemos esperar quanto à vitória contra os principados e potestades? A


Palavra de Deus nos promete apenas que podemos ser um povo salvo; o que nós
queremos ver é um povo de gente embranquecida e purificada; gente que não se dobra,
gente que não se curva, gente que não se vende; gente que não se deixa seduzir por
lisonjas; gente que não pega em armas para praticar violência; gente que sabe que a luta
não é contra carne e sangue, mas contra principados e potestades; gente que sabe que
não é por força nem por violência, mas que é pelo Espírito Santo de Deus que se
consegue vencer (Zacarias 4:6b), em nome de Jesus.
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CAPÍTULO 11

DISCERNINDO OS TRÊS NÍVEIS DE BATALHA ESPIRITUAL

“Acautelai-vos por vós mesmos, para que nunca vos suceda que os vossos corações
fiquem sobrecarregados com as conseqüências da orgia, da embriaguez e das
preocupações deste mundo, e para que aquele dia não venha sobre vós repentinamente,
como um laço. Pois há de sobrevir a todos os que vivem sobre a face de toda a terra.
Vigiai, pois, a todo o tempo, orando, para que possais escapar de todas estas coisas que
têm de suceder, e estar em pé na presença do Filho do homem.”

(Lucas 21:34-36)

Neste capítulo, nós vamos tratar da batalha espiritual em três níveis diferentes, quais
sejam: o individual (aquilo que acontece na mente e no coração de cada um de nós
individualmente), o social (aquilo que acontece na memória da sociedade - nos “porões”
psíquicos da sociedade) e o cultural (a formação de valores e de percepções dentro da
sociedade).

O texto acima de Lucas aborda, de uma maneira sucinta, os três níveis de batalha
espiritual, os quais nos propomos a tratar neste capítulo.

Primeiramente, está o nível individual, porque Jesus está falando a pessoas, a indivíduos,
alertando-os, advertindo-os acerca de coisas que poderiam atingi-los, implicando luta
individual para cada uma delas (“Acautelai -vos por vós mesmos”). Mas também é dito que
tal luta individual também se daria num âmbito mais amplo do que o individual, referindo-se
ao nível social. Isto é atestado quando Ele fala para se ter cuidado com orgias, embriaguez
e preocupações deste mundo ("nunca vos suceda que os vossos corações fiquem
sobrecarregados com as conseqüências da orgia, da embriaguez e das preocupações
deste mundo”). Jesus está falando de uma sociedade, na qual tais coisas se tornaram
referenciais muito nítidos. Jesus faz referência ao nível social - Ele não só fala de orgia,
embriaguez e das preocupações deste mundo, mas fala também das conseqüências para
uma sociedade em que tais valores estão impregnando a consciência de todos. Ele não diz
para se ter cuidado apenas com a orgia, embriaguez e com as preocupações materialistas
do dia-a-dia; Ele diz, também, para se ter cuidado com as conseqüências desses
comportamentos ("nunca vos suceda que os vossos corações fiquem sobrecarregados
com as conseqüências da orgia, da embriaguez e das preocupações deste mundo”). Ou
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seja, ter cuidado com aquilo que vai se transformar em hábito, em cultura. Não se está
necessariamente dizendo a alguém que se envolveu com orgia, com embriaguez ou com
as preocupações deste mundo. Jesus diz para se ter cuidado não só com estas coisas,
mas também com suas conseqüências destrutivas. Pode ser que você, que lê este livro,
não pratique tais coisas, mas está inserido numa sociedade que gerou uma cultura que
está impregnada pela licenciosidade, pela corrupção ou pelo imediatismo materialista, que
podem atingi-lo, penetrá-lo e vitimá-lo não porque você as pratique, mas pela assimilação e
absorção dessa cultura que é tremendamente destrutiva. Isso é tão sério, que Jesus diz
que as conseqüências de tais coisas iriam abranger toda a terra, atingindo a todos os seus
habitantes:

“Pois há de sobrevir a todos os que vivem sobre a face de toda a terra.”

(Lucas 21:35)

Será que Jesus está dizendo que todas as pessoas estariam praticando aquelas coisas, ou
está dizendo que a formação dessa cultura tornar-se-ia algo globalizante, tendo um poder
de penetração enorme na alma humana, sem que esta percebesse, ou quisesse?

Eu e você, diariamente, estamos envolvidos com esses três níveis de luta espiritual.
Algumas das manifestações mais corriqueiras que se dão em cada um desses níveis às
vezes vêm mascaradas de fisionomias despretensiosas, inocentes... Mas, por trás delas,
há forças espirituais operantes e poderosas.

A Batalha Espiritual no Nível Individual

Para se perceber, de uma maneira mais objetiva, a luta que se trava na mente, no coração,
na consciência, nas emoções, nos desejos, nas volições e no íntimo de cada um, faz-se
necessário refletir sobre o texto que se encontra em Mateus 4:3-10, que fala sobre a
tentação de Jesus no deserto:

“Então o tentador, aproximando-se, lhe disse: Se és Filho de Deus, manda que estas
pedras se transformem em pães. Jesus, porém, respondeu: Está escrito: Não só de pão
viverá o homem, mas de toda palavra que procede da boca de Deus. Então o diabo o
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levou à cidade santa, colocou-o sobre o pináculo do templo. E lhe disse: Se és Filho de
Deus, atira-te abaixo, porque está escrito: Aos seus anjos ordenará a teu respeito; e: Eles
te susterão nas suas mãos, para não tropeçares nalguma pedra. Respondeu-lhe Jesus:
Também está escrito: Não tentarás o Senhor teu Deus. Levou-o ainda o diabo a um monte
muito alto, mostrou-lhe todos os reinos do mundo e a glória deles, e lhe disse: Tudo isto te
darei se prostrado, me adorares. Então Jesus lhe ordenou: Retira-te, Satanás, porque está
escrito: Ao Senhor teu Deus adorarás, e só a ele darás culto.”

Neste texto, encontra-se o maior estratagema de indução da mente humana jamais


concebido na História. As três tentações a que Jesus foi submetido como indivíduo, como
pessoa, têm complexidades tremendas. De alguma forma, elas explicitam áreas de
susceptibilidade e fragilidade individual que são comuns a todos os seres humanos.
Nessas tentações, são encontradas lutas, pressões, induções, questionamentos,
perturbações que atingem a cada um de nós, nas circunstancias e situações as mais
diversas.

A primeira tentação é a de tentar absolutizar o desejo humano. Essa tentação busca fazer
do desejo humano a medida maior, a referência mais importante, em função da qual a vida
pode ser orientada; essa tentação é a de dizer a si próprio que leis, princípios, regras e
valores são menores que o próprio desejo, o qual não pode ser reprimido sob hipótese
alguma.

É isso que o diabo tenta fazer brotar no coração e na mente de Jesus, inicialmente:

"Então o tentador, aproximando-se, lhe disse: Se és Filho de Deus, manda que estas
pedras se transformem em pães.”

(Mateus 4:3)

Em outras palavras, o diabo estava Lhe dizendo:

“- Libera os desejos de Teu corpo. Teu corpo quer; Teu corpo sente; Teu corpo precisa;
Teu corpo tem fome.”
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Há uma afirmação profunda do desejo mais intrínseco que habita o corpo de cada um de
nós, que é o sexual, não apenas restrito e relacionado ao ato sexual em si, mas num
sentido amplo de satisfação de um prazer físico. Por exemplo, essa satisfação pode ser até
mesmo oral (há pessoas que comem muito, porque estão impotentes sexualmente; e uma
das maneiras de compensar a impotência sexual é comendo). Cada um vive os dramas de
sua própria sexualidade, seja ela reprimida, seja ela adoecida, de maneira diferente, e
tenta satisfaze-la pelos meios mais distintos.

Deste modo, o diabo se aproxima de Jesus e argumenta:

“ - Teu corpo quer e precisa; Tu tens fome. Portanto, alimenta-Te! Leva o Teu desejo às
últimas conseqüências.”

O diabo não só absolutiza o desejo do corpo, mas o desejo da alma:

“Se és Filho de Deus, atira-te abaixo, porque está escrito: Aos seus anjos ordenará a teu
respeito; e: Eles te susterão nas suas mãos, para não tropeçares nalguma pedra.”

Em outras palavras, o diabo estava Lhe dizendo:

“– Tu queres ser conhecido e notado? Pula do pináculo do templo na hora em que houver
o maior número de pessoas no átrio. Assim, todos O verão, especialmente se uma legião
de anjos se formar numa espécie de ‘pára-quedas’ celestial, de modo que Tu desças de
maneira triunfal.”

Há nessa afirmação um estímulo muito sutil a área de satisfação da auto-estima, de auto-


aceitação da própria personalidade.

Por último, o diabo absolutiza o desejo do espírito. O desejo de glória, de realização


humana, de promoção, de deixar uma marca na História, de conquista:
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“Levou-o ainda o diabo a um monte muito alto, mostrou-lhe todos os reinos do mundo e a
glória deles, e lhe disse: Tudo isto te darei se prostrado, me adorares.”

(Lucas 4:8-9)

Fico pensando em algumas sessões de psicoterapia que são freqüentadas por muitas
pessoas, nas quais se recebe todo o tipo de orientação de psicoterapeutas que não são
cristãos - portanto, não tendo nenhum referencial da Palavra de Deus -, os quais estimulam
seus pacientes a satisfazerem seus desejos, negados e reprimidos, que, segundo esses
profissionais, os estão infelicitando. Às vezes, surge aquele desejo enorme de ir para cama
com outro, ao qual se é estimulado, sob a alegação de que tal vontade não pode ser
reprimida, não impor-tando os meios.

A segunda tentação é a de tentar manipular o sagrado na vida humana. Isto é muito sério,
porque se faz alusão ao poder de se operarem milagres: transformar pedras em pães.

“(...) manda que estas pedras se transformem em pães.”

Há também a tentativa de manipulação do poder da promessa de Deus. A promessa que o


diabo tenta manipular é a encontrada no Salmo 91:11-12:

“Porque aos seus anjos dará ordens a teu respeito, para que te guardem em todos os teus
caminhos. Eles te sustentarão nas suas mãos, para não tropeçares nalguma pedra.”

É essa a promessa divina a que o diabo recorre, tentando seduzir a Jesus:

“Se és Filho de Deus, atira-te abaixo, porque está escrito: Aos seus anjos ordenará a teu
respeito; e: Eles te susterão nas suas mãos, para não tropeçares nalguma pedra.”
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(Mateus 4:6)

O diabo também tenta distorcer o ideal de serviço a Deus e à humanidade. Jesus quer
servir a humanidade, quer alcançar o ser humano, sendo-lhe o seu Salvador, mesmo que
seja nos confins da terra.

O diabo, entretanto, lhe propõe o mundo:

“Levou-o ainda o diabo a um monte muito alto, mostrou-lhe todos os reinos do mundo e a
glória deles, e lhe disse. Tudo isto te darei se prostrado, me adorares. Então Jesus lhe
ordenou: Retira-te, Satanás, porque está escrito: Ao Senhor teu Deus adorarás, e só a ele
darás culto.”

(Mateus 4:8-9)

O diabo é especialista em perverter o sagrado. É por isso que, freqüentemente, ele é


capaz de transformar o milagre em charlatanismo, é capaz de transformar a promessa
genuína de Deus em heresia; é capaz de transformar o serviço caridoso ao próximo em
negócio.

Soube, algum tempo atrás, depois da chacina dos meninos da Candelária, no Rio de
Janeiro, que há cerca de 600 meninos de rua dormindo no centro da cidade, ou seja, um
número muito menor do que se imaginava que houvesse. Também soube que há 600
organizações de caridade recebendo dinheiro do Governo Federal, dos EUA e de países
da Europa, para atenderem às crianças de tua do Rio. O absurdo é que há uma entidade
para cada criança. No entanto, nada é feito! As crianças continuam abandonadas,
dormindo ao relento. Dentre essas 600 organizações, há apenas, no máximo, 40 fazendo
alguma coisa. As demais têm um diretor-executivo ganhando US$ 2.000,00, uma psicóloga
ganhando US$1.000,00, uma assistente social ganhando US$ 1.000,00, uma secretária
ganhando US$ 800,00, um monte de gente ganhando em dólares para fazer nada! O que
deveria ser uma motivação maravilhosa - ajudar a crianças de rua - transforma-se,
subitamente, em algo maligno. O serviço caridoso, muitas vezes, tornou -se um negócio
altamente rentável. Isso também acontece, infelizmente, dentro da Igreja, dentro dos
projetos missionários e dentro de tantos outros segmentos religiosos, nos quais, tantas
vezes, se usa o nome de Jesus.
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A terceira tentação é a de tentar absolutizar o papel da dimensão econômico-social, do


marketing e da política. O diabo tenta encher o coração de Jesus com obsessões quanto a
isso. A questão econômico-social está presente quando o diabo propõe a Jesus:

“(...) Se és Filho de Deus, manda que estas pedras se transformem em pães.”

O diabo tenta incutir-Lhe que qualquer milagre tem que ser feito, mesmo que seja “na
marra”.

A questão do marketing aparece quando o diabo Lhe propõe atirar-Se do pináculo do


templo:

“Se és Filho de Deus, atira-te abaixo, porque está escrito: Aos seus anjos ordenará a teu
respeito; e: Eles te susterão nas suas mãos, para não tropeçares nalguma pedra.”

Com tal proposta, o diabo estava querendo dizer-Lhe que não haveria necessidade alguma
de Ele - Jesus - cumprir o Seu ministério. Bastava que Ele subisse no pináculo do templo e
de lá Se precipitasse, para que todos O vissem, quando os anjos fossem ao Seu encontro
nos ares, sustentando-O até o chão. Assim, segundo o diabo, Jesus seria visto, “de cara”,
como o Filho de Deus. Isso tudo, na mente do diabo, valia muito mais do que três anos de
ministério combativo, sincero e perseverante.

A questão política também se faz presente quando o diabo tenta seduzi-Lo, dizendo que
tudo o que tem valor, tudo o que importa, tudo o que tem sentido é a política, como
primeira e última referência da vida.

A quarta tentação é a de tentar criar a filosofia de que os fins justificam os meios.

Cada uma das três tentações acima descritas traz em si tal filosofia. O diabo,
implicitamente, diz isso para Jesus:

“- Não importa como Tu vais chegar lá! O importante é chegar! Não importa se Tu vais
comer pão em algum lugar. O que importa é que transformes pedras em pães aqui, para
Te alimentares. Tu não queres ser visto como o Salvador? Nada de cruz! Salta do pináculo
do templo, para que os anjos venham ao Teu socorro, afim de que, em vindo eles, todos
possam ver quem Tu és. Tu, também, não queres os reinos do mundo? Porque conquistá-
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los pelo sacrifício e pelo amor? Nada disso! Por que Tu não Te curvas diante de mim? Eu
dou um jeitinho nisso!...”

Essa filosofia nos atinge cotidianamente nas mais variadas áreas da nossa vida, seja a
profissional, seja nas nossas opções políticas, seja no modo através do qual vemos o
mundo e as pessoas ao nosso redor.

Em síntese, o que o diabo está dizendo é:

“- Para comer, para se promover e para conquistar, vale tudo!”

Eu, particularmente, acredito que, algum dia, todos nós já ouvimos algo parecido com isso.

Algum tempo atrás, ouvi de um líder religioso, neste país, uma afirmação que ele próprio
fizera, de que, por Jesus, ele faria qualquer coisa. Ele disse:

“- Por amor a Jesus, eu passo cheque sem fundos; por amor a Jesus, eu passo duplicata
fria; por amor a Jesus, eu minto; por amor a Jesus, enfim, eu faço qualquer coisa.”

Isso não é brincadeira, infelizmente! Hoje, no nosso país, há muita gente acreditando
nessa filosofia e, em decorrência disso, praticando-a. Essa é uma filosofia diabólica! É o
mesmo que transformar pedras em pães, pular do pináculo e curvar-se diante do diabo,
crendo que os fins justificam os meios.

A quinta tentação é a de tentar desviar o foco histórico de Deus para o homem.

Quando o diabo se aproxima de Jesus, ele tenta de toda forma tirar o foco de Deus e
desviá-lo para Jesus. Isso se verifica por meio da proposição condicional de que se utiliza
o diabo, a fim de tentar seduzir a Jesus:

“(...) Se és Filho de Deus, manda que estas pedras se transformem em pães.”


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(Mateus 4:3)

“(...) Se és Filho de Deus, atira-te abaixo...”

(Mateus 4:6a)

A preocupação que o diabo manifesta por meio de tais expressões não é com a glória de
Deus, mas com a situação imediata, presente, circunstancial; não é com a vontade de
Deus, mas com o conforto, com a satisfação pura e simples; não é com as opções de
Deus, mas com tudo aquilo que pode facilitar a vida.

Preocupam-me todas as manifestações de espiritualidade que colocam um homem ou uma


mulher contra a parede, forçando-os a darem uma demonstração de quem eles são.

Certa ocasião, um pastor contou-me que estava em crise com a sua igreja. Eu lhe
perguntei, então, qual a razão daquela crise. Ele me respondeu que lá na igreja dele o
critério que os membros estabeleceram para saber quem é pastor ungido é saber se ele
tem ou não o poder de soprar e as pessoas caírem.

Quase ninguém está interessado em saber como o pastor se relaciona com Deus, se ele lê
ou não a Bíblia, em como ele trata a mulher, em como ele trata os filhos, em como ele
administra a igreja. Ninguém se interessa pelo caráter do líder. A coisa toda está resumida
ao poder de sopro, ao “soprômetro” se soprou, e caiu, é homem de Deus. Tome cuidado
com isso!

Quando a espiritualidade começa a requerer demonstrações (“Se és Filho de Deus, manda


que estas pedras se transformem em pães.” “(...) Se és Filho de Deus, atira-te
abaixo...”),tal espiritualidade não provém de Deus, O qual não requer de nós
demonstrações de poder para que verdadeiramente sejamos reconhecidos como Seus
filhos; mas, Deus quer que vivamos, apenas, como Seus filhos. O que passar disso tem
procedência maligna.

A sexta tentação é a de tentar criar a mentalidade utilitária do mundo espiritual.

Segundo tal tentação, o mundo espiritual tem que ser utilizado, ao qual se possa ter
acesso, a fim de manipulá-lo. Nas três tentações a que foi submetido Jesus, há palavras
que refletem a função utilitária que o mundo espiritual deve ter. Na primeira tentação se
tem:

“(...) Se és Filho de Deus, manda que estas pedras se transformem em pães.”


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Com isso, o diabo estava querendo dizer a Jesus:

“- Se há poder em Ti, esse poder tem que estar a Seu serviço.”

Na segunda tentação, o diabo lhe diz:

“(...) Se és Filho de Deus, atira-te abaixo; porque está escrito: Aos seus anjos ordenará a
teu respeito, e: Eles te susterão nas suas mãos, para não tropeçares nalguma pedra.”

O diabo está querendo dizer a Jesus o seguinte:

“– Se a Palavra de Deus serve para alguma coisa, ela tem que ser útil, no momento em
que Tu precisares.”

Na terceira tentação, o diabo Lhe propõe:

“(...) Tudo isso te darei se, prostrado, me adorares.”

O diabo quis dizer a Jesus:

“- Basta que Tu me adores, para que tenhas tudo quanto queres.”

Preocupa-me muito, também, todo tipo de manifestações de espiritualidade utilitária.


Infelizmente, nos dias de hoje, cada vez mais um número maior de pessoas olha para o
mundo espiritual numa perspectiva utilitária, a qual se baseia em '”palavras de ordem” do
tipo manda, decreta. Eu, pessoalmente, não tenho nada contra a fé genuína; mas é que,
em muitos casos, manifestações outras podem estar embutidas em tais práticas.
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Ou ainda: é perigosa e diabólica a espiritualidade utilitária, uma vez que ela concebe a
Deus, como Deus, apenas como fonte de bênçãos. Se Deus não abençoar - sobretudo
material e financeiramente - Deus não é Deus, segundo essa espiritualidade.

Portanto, exerçamos o nosso discernimento espiritual não apenas para distinguir as forças
obviamente diabólicas que estão operando neste mundo; mas exerçamo-lo também para
discriminar as forças malignamente sutis que estão operando dentro da Igreja e dentro das
nossas próprias teologias.

A sétima tentação é a de tentar gerar desapontamento em relação à Palavra de Deus. Um


dos ardis a que o diabo constantemente recorre é o de produzir dentro do coração humano
o descrédito, a tristeza, a frustração, o abatimento e o cansaço em relação à Palavra do
Senhor. No episódio da tentação de Cristo, ele - o diabo - lança mão do Salmo 91 (Mateus
4:6), no seu trecho mais eloqüente, e propõe a Jesus:

“- Olha, há um montão de gente lá embaixo. Se Tu pulares daqui, e os anjos vierem ao Teu


socorro, será um verdadeiro show. Pula daqui, porque Tu tens base bíblica para fazer isso,
sem que mal algum Te suceda. Está lá nas Escrituras: Aos Seus anjos ordenará a Teu
respeito; eles Te sustentarão nas suas mãos para que não tropeces em pedra alguma.
Isso é a Palavra de Deus para Ti. Pula, então. Pula!”

Jesus, olhando-o, diz:

“– O Salmo 91 foi escrito para homens, não foi escrito para passarinhos. Homens andam
no chão; passarinho é que anda pelo céu, voando. Se o homem estiver andando com Deus
realmente, com dignidade e querendo servi-Lo, os anjos do Senhor o ampararão em todos
os seus caminhos. Eu não pulo, não, diabo!”

Possivelmente, hoje em dia, alguém teceria o seguinte comentário quanto à atitude de


Jesus em não pular do pináculo do templo:

“– Ele não tem fé...”

A oitava tentação é a de tentar fazer a relação com o poder e com a autoridade ser mais
importante que a relação com a vontade de Deus para a vida humana. É tentação
extremamente sutil e diabólica a de tentar fazer que a nossa relação com o poder e com a
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autoridade seja mais importante do que a nossa relação com a vontade de Deus. O diabo
aproxima-se de Jesus e lhe diz:

“- Olha, Jesus, os reinos são meus. Eu os darei a Ti. Tu queres poder e autoridade? Eu os
tenho para Te dar!”

Jesus, entretanto, lhe diz:

“- Meu negócio não é poder e nem autoridade. Meu negócio é cumprir a vontade de Meu
Pai, O qual está nos céus. Arreda de Mim, Satanás! Só ao Senhor Deus de toda a terra se
deve prestar culto e adoração. Só a Ele se deve dar glória.”

O primeiro nível de batalha espiritual acerca do qual se falou foi o individual, que foi
analisado levando-se em consideração oito tipos de tentações que abrangem um campo
enorme de ação do diabo na mente humana, sobretudo na de pessoas que querem servir
a Deus, mas que estão enfrentando uma batalha no nível da mente.

A Batalha Espiritual no Nível Social

O segundo nível de batalha espiritual é o que se dá na memória social. Os principados e


potestades estão condicionados pelo arcabouço social influenciando a sociedade, ao
mesmo tempo em que são limitados por ela, muitas vezes submetendo-se ou ajustando-se
às circunstâncias sociais.

Para ilustrar tal afirmação, nada melhor do que a história de Gideão, que pode ser
resumida da seguinte maneira: Israel plantava trigo, o qual era roubado pelos midianitas
(Juízes 6:3), os quais também invadiam a terra, com seu gado e com toda a sua gente,
destruindo-a (Juízes 6:5). Deste modo, ninguém mais agüentava plantar trigo, uma vez que
os midianitas sempre o roubavam. O povo começou a clamar angustiado diante de Deus,
porque plantava e não comia (Juízes 6:7). Deus suscita livramento por meio de Gideão, o
qual é visitado pelo Anjo do Senhor (Juízes 6:11), que lhe diz:
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“(...) O Senhor é contigo, homem valente. Vai nessa tua força, e livro a Israel das mãos dos
midianitas; porventura não te enviei eu?”

(Juízes 6:12b e 14b)

Gideão, atemorizado, responde-lhe:

“(...) Ai, Senhor meu, com que livrarei a Israel? Eis que a minha família é a mais pobre em
Manassés, e eu o menor na casa de meu pai.”

(Juízes 6:15)

Gideão enfrenta conflitos interiores, querendo saber se realmente fora ele ou não escolhido
para tal missão, pedindo ao Anjo um sinal (Juízes 6:17):

“Se hás de livrar a Israel por meu intermédio, como disseste, eis que eu porei uma porção
de lã na eira: se o orvalho estiver somente nela, e seca a terra ao redor, então conhecerei
que hás de livrar a Israel por meu intermédio, como disseste.”

(Juízes 6:36-37)

Gideão recebeu da parte de Deus o sinal pedido:

“E assim sucedeu; porque ao outro dia se levantou de madrugada e, apertando a li, do


orvalho dela espremeu uma taça cheia de água.”

(Juízes 6:38)

Não satisfeito ainda, Gideão pede um outro sinal:


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“Não se acenda contra mim a tua ira, se ainda falar só esta vez; rogo-te que mais esta vez
faça eu a prova com a lã: que só a lã esteja seca, e na terra ao redor haja orvalho.”

(Juízes 6:39)

Mais uma vez Gideão tem o seu pedido atendido:

“E Deus assim o fez naquela noite: pois só a lã estava seca, e sobre a terra ao redor havia
orvalho.”

(Juízes 6:40)

Gideão, então, crê que realmente fora ele designado a cumprir a missão de destruir os
midianitas. Gideão convocou a quase todo o Israel para anunciar-lhe o livramento do
Senhor (Juízes 6:35). Ajuntaram-se a Gideão 32 mil homens (Juízes 7:3). Mas, o Senhor
diz a Gideão:

“(...) É demais o povo que está contigo, para eu dar os midianitas em sua mão; a fim de
que Israel se não glorie contra mim, dizendo: A minha própria mão me livrou.”

(Juízes 7:2)

O Senhor ainda diz a Gideão:

“Apregoa, pois, aos ouvidos do povo, dizendo: Quem for tímido e medroso volte, e retire-se
da região montanhosa de Gileade.”

(Juízes 7:3a)
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Tendo feito Gideão conforme o Senhor lhe ordenara, 22 mil homens voltaram para suas
casas (Juízes 7:3b), ficando apenas 10 mil (Juízes 7:3b). Disse mais o Senhor a Gideão:

“( ...) Ainda há povo demais: faze-os descer às águas, e ali os provarei; aquele de quem eu
te disser: Este irá contigo, esse contigo irá; porém todo aquele de quem eu te disser: Este
não irá contigo, esse não irá. (...) Todo que lamber as águas com a língua, como faz o cão,
esse porás a parte; como também a todo aquele que se abaixar de joelhos a beber.”

(Juízes 7:4 e 5b)

Dos 10 mil homens que foram submetidos a tal teste, apenas 300 beberam água em pé,
como gente (Juízes 7:6a), acerca dos quais o Senhor falou a Gideão:

“Com estes trezentos homens que lamberam as águas eu vos livrarei, e entregarei os
midianitas nas tuas mãos.”

(Juízes 7:7a)

Entretanto, o coração de Gideão ainda tinha temores, dúvidas e vacilações quanto ao


sucesso de sua missão. O Senhor, porém, fala a Gideão:

“Se ainda temes atacar, desce tu e teu moço Pura ao arraial; e ouvirás o que dizem;
depois, fortalecidas as tuas mãos, descerás contra o arraial.”

(Juízes: 7:10-11a)

Atendendo à ordem do Senhor, Gideão, acompanhado do seu moço - Pura -, desce ao


arraial, às escondidas. Chegando lá, “na moita”, Gideão ouve dois homens conversarem.
Naquele momento, um estava contando ao seu companheiro:
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“(...) Tive um sonho. Eis que um pão de cevada rodava contra o arraial dos midianitas, e
deu de encontro à tenda do comandante, de maneira que esta caiu, e se virou de cima
para baixo, e ficou assim estendida.”

(Juízes 7:13b)

Depois de ter relatado o sonho, o que o ouvia lhe disse:

“(...) Não é isto outra coisa, senão a espada de Gideão, filho de Joás, homem israelita. Nas
mãos dele entregou Deus os midianitas e todo este arraial.”

(Juízes 7:14)

Ouvindo tal sonho, e sabendo do seu significado, Gideão volta ao arraial de Israel, e diz
aos seus comandados:

“(...) Levantai-vos, porque o Senhor entregou o arraial dos midianitas nos vossas mãos.”

(Juízes 7:15b)

Após ouvir as palavras do Senhor, Gideão cercou o arraial dos midianitas, "(...) repartiu os
trezentos homens em três companhias, e deu-lhes a cada um nas suas mãos trombetas, e
cântaros vazios, com tochas neles." (Juízes 7:16).

Depois disso, disse-lhes Gideão:

“(...) Olhai para mim, e fazei como eu fizer. Chegando eu às imediações do arraial, como
fizer eu, assim fareis. Quando eu tocar a trombeta, e todos os que comigo estiverem, então
vós também tocareis a vossa ao redor de todo o arraial, e direis: Pelo Senhor e por
Gideão!”
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(Juízes 7:17-18)

Dispondo, desta forma, os homens para a batalha, Gideão comanda os seus trezentos
homens na luta contra os midianitas (Juízes 7:19 -20), os quais ficam apavorados, e que,
segundo o relato bíblico, dão “a correr, e a gritar, e a fugir.” (Juízes 7:21b).

Gideão alcança a vitória com uma minoria que lutou em nome do Senhor.

Essa narrativa sobre Gideão apresenta-nos uma luta de potestades. Primeiramente,


fazem-se presentes as potestades espirituais, as quais se manifestam mesmo naqueles
governos que se dizem ateus, não crendo em Deus nem na existência do diabo. Não é por
tal descrença que nem Deus nem o diabo vão estar ausentes. Não há nada, nem instância
a mais remota possível que não esteja impregnada de realidades espirituais. Não há
nenhum fenômeno humano - seja social, seja político – que não esteja penetrado por
aquelas realidades. Os fenômenos sociais são mais do que eles realmente aparentam ser.
Mesmo uma guerra entre povos está impregnada de forças espirituais.

O segundo tipo de potestade – entendam-se potestades como poderes – que aparecem no


episódio de Gideão são as potestades políticas. Elas aparecem logo em Juízes 6:1,
representadas pelos midianitas, os quais têm o poder de invadir, de saquear, de matar e
de fazer guerra. A outra potestade política é Israel (Juízes 6:2), que não pode tanto, em
função do eu é invadido e espoliado. Os midianitas e Israel são potestades porque são
poderes.

Nesse mesmo sentido, o Palácio do Planalto, no Brasil, é uma potestade; a Casa Branca,
nos EUA é uma potestade; a Casa Rosada, na Argentina, é uma potestade; nesse mesmo
sentido a Câmara dos Deputados e o Senado são uma potestade; o Supremo Tribunal de
Justiça também o é. São potestades, só que políticas.

A terceira potestade que aparece no episódio de Gideão são as potestades econômicas


que se manifestam na luta pelo trigo:

“Porque cada vez que Israel semeava, os midianitas e os amalequitas, como também os
povos do Oriente, subiam contra ele. E contra ele se acampavam, destruindo os produtos
da terra até à vizinhança de Gaza, e não deixavam em Israel sustento algum, nem ovelhas,
nem bois, nem jumentos.”
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(Juízes 6:34)

Em Juízes 6:11, descobre-se que era o trigo o principal motivo pelo qual os midianitas
eram levados a saquear Israel:

“(...) estava malhando o trigo no lagar para o pôr a salvo dos midianitas.”

(Juízes 6:11b)

Nesse sentido, cada plano econômico é uma potestade; cada pacote econômico é um
poder também de natureza espiritual, pois ajuda a determinar a resposta que as pessoas
dão a Deus e ao mundo.

A quarta potestade que aparece no cenário da luta de Gideão contra os midianitas são as
potestades culturais, que têm a ver com memórias, - símbolos, representações, meios de
comunicação.

Em Juízes 6:25, fala-se em Baal, em poste-ídolo, e numa série de outras coisas que já
haviam sido incorporadas ao patrimônio religioso-cultural do povo israelita.

É nesse contexto que se dá o chamamento de Gideão para libertar a Israel. A vitória dele
precisa ser entendida a partir do sonho do soldado midianita, narrado em Juízes 7:13-14.

Gideão é a expressão do pão roubado, que volta como um bumerangue:

“(...) Tive um sonho. Eis que um pão de cevada rodava contra o arraial dos midianitas.”

(Juízes 7:13)

A história da região é a história do trigo. O soldado sonha com o pão que é feito com o
trigo que é roubado por ele mesmo. O que ele começa a sentir é culpa, a qual começa a
ocupar a sua mente, até mesmo quando dorme, em sonhos, em pesadelos, fragilizando-o,
não só a ele, mas a todos que estão no arraial dos midianitas.
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Embora sempre invadindo, saqueando, roubando, matando e usurpando, tais atitudes


começam a fazer mal aos midianitas, que sabiam no íntimo de seus corações que seria o
próprio pão, feito com o trigo roubado por eles, que os destruiria. Tal qual um bumerangue
que é arremessado por uma pessoa, mas que volta ao mesmo ponto de onde foi lançado.
É algo que vai, mas que volta. O pecado é assim também.

A Bíblia diz que a planície entre a fonte de Harode até o outeiro de Moré (Juízes 7:1)
estava cheia de midianitas, amalequitas e de povos do Oriente para saquearem a Israel,
mais uma vez:

“Os midianitas, os amalequitas e todos os povos do Oriente cobriam o vale como


gafanhotos em multidão; e eram os seus camelos em multidão inumerável como a areia
que há na praia do mar.”

(Juízes 7:12)

Mas, segundo a Palavra de Deus, quando os trezentos homens de Gideão gritam

“Espada pelo Senhor e por Gideão!” (Juízes 7:20b), eles saem “a correr, e a gritar, e a
fugir.” (Juízes 7:21b).

Foi o Espírito Santo que infundiu medo no coração de toda aquela gente apavorada que
corria gritando, desesperadamente. Mas o Espírito do Senhor utilizou um fenômeno
psicossocial: uma culpa acumulada durante anos a qual os fragilizou.

O que aprendemos no episódio da luta de Gideão contra os midianitas, que pode nos
ajudar a discernir a atuação de principados e potestades na memória social de um povo?

Em primeiro lugar, aprendemos que a culpa social sempre se volta sobre a sociedade
responsável por ela. Quem viver ainda verá os sérvios se autodestruindo: ninguém que
violenta mães na frente de seus filhos; ninguém que rouba, mata e estupra crianças
passará impune sem que tais ações se voltem sobre suas próprias cabeças. Ninguém
também assola, ninguém mata, ninguém rouba, ninguém adultera, ninguém explora sem
que todos esses pecados e suas conseqüências voltem sobre quem os praticou. Podem
até demorar, mas sempre voltam.

Em segundo lugar, aprendemos que a culpa social pode transformar-se em inconsciente


coletivo. A sociedade que está praticando injustiça, perversão, idolatria, iniqüidade vai
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sendo penetrada em seu inconsciente por tais coisas, redundando em sonho, pesadelo,
suor frio à noite, em noite mal dormida, em estresse noturno, que vai minando, fragilizando
a mente humana.

Uma das coisas mais curiosas para mim seria poder fazer uma pesquisa sobre com o que
os brasileiros sonham.

Em terceiro lugar, aprendemos que a culpa social pode transformar-se em consciência


coletiva. Há uma culpa que se acumulou, indo para o inconsciente, mas que volta numa
consciência esmagadoramente poderosa e fragilizante. O sonho do soldado midianita é
inconsciente (Juízes 7:13b), mas, de repente, transforma-se em consciente, porque ele
sonhou, e lembrou-se do que sonhou. Às vezes, o indivíduo acorda mal-humorado, e não
sabe o porquê; trata mal a mulher, e também não sabe o porquê; bate nos filhos, e não
sabe o porquê; tem vontade de matar o vizinho, e não sabe o porquê; olha para a
empregada com culpa, e não sabe o porquê; se é empresário, vê o seu empregado triste,
desmotivado, e não sabe o porquê. Mas chega uma hora em que todos esses motivos
obscuros saem do nível do inconsciente, voltando ao nível da consciência.

A prova de que o sonho do soldado midianita já tinha se tornado numa obsessão, num
pesadelo na cabeça de todos eles, é que ao contar o sonho, o que o ouvia interpreta-o de
imediato:

“(...) Não é isto outra coisa, senão a espada de Gideão, filho de Joás, homem israelita. Nas
mãos dele entregou Deus os midianitas e todo este arraial.”

(Juízes 7:14)

O sonho do soldado era o mesmo que povoava a mente de todos os soldados midianitas,
de modo que, quando um sonhou, o outro teve logo a interpretação:

“- Sonhei com um ‘pão-bumerangue’, que dava sobre a tenda do comandante e a


derrubava ao chão.”

“- É Gideão, que vem sobre nós para destruir-nos.”

As potestades espirituais, sejam elas boas, sejam elas más, agem no espaço de fragilidade
da sociedade, tornando-a extremamente vulnerável. Quando a sociedade chega a esse
ponto, tudo pode acontecer. Se gritarem “(...) Pelo Senhor e por Gideão!” a sociedade cai;
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mas, se gritarem “Por Chico Xavier!”, ela também cairá. Quando a sociedade chega a esse
ponto, é a hora de a Igreja discernir as forças espirituais que estão agindo no ambiente
social onde ela está inserida, anunciando o Reino e a Salvação de Deus, em nome de
Jesus.

No caso de Gideão, é um Anjo do Senhor que está à frente. Mas, no caso dos alemães, na
época da 2.ª Guerra, foram potestades diabólicas, que arregimentaram o pais inteiro para
matar e nem sentir que matava. No Rio de Janeiro, atualmente, estamos presenciando as
duas frentes: de um lado, estão as potestades diabólicas agindo com um poder
avassalador de morte; de outro, porém, muitas e muitas almas se convertendo; sambistas
e macumbeiros indo a Jesus. É hora de ver quem é que vai gritar mais forte.

O que é preciso ter é convicção de que o Brasil está maduro. As pessoas estão sonhando,
porque a iniqüidade se acumulou. O tempo chegou. É hora de gritarmos forte “Por Jesus e
pelo Senhor!”, e todas as demais forças cairão, em nome de Jesus.

É por isso que a Bíblia diz que o pecado não encheu ainda a medida de certos povos
(Gênesis 15:16b). Eu, particularmente, não entendia isso.

Algum tempo atrás, Israel assinava o acordo de paz com os palestinos. Naquele episódio,
via a ironia da História: primeiro, Israel vence ao forte, quando era fraco; sente-se
fortalecido com isso, até mais do que deveria realmente ser. Em contrapartida, os
palestinos começaram a fazer guerrilhas e mais guerrilhas, até que desistem. Os jovens
palestinos vão para as ruas e começam a atirar pedras (é a história de Davi e Golias, ao
contrário: Israel é Golias e os jovens palestinos, Davi). Jogaram tantas pedras, que Israel
assinou o acordo com os palestinos. Fora mais fácil para Israel enfrentar guerrilhas e
guerrilheiros do que pedradas de jovens desarmados.

No Brasil, já chegou o tempo. É hora de aproveitarmos, porque esse tempo vai, esse
tempo vem, mas, às vezes, não volta. Assim como as consciências se sensibilizam, as
consciências sociais também se petrificam. Chegou, portanto, o momento de gritarmos
pelo Senhor Jesus, aqui no Brasil, enquanto as consciências estão sensíveis.

A Batalha Espiritual no Nível Cultural

Em Marcos 5:1-20 é narrada a história do endemoninhado gadareno. Ao atravessar o mar


da Galiléia, chegando à cidade de Gadara (Marcos 5:1), vem ao encontro de Jesus um
homem possesso de espíritos imundos (Marcos 5:2). Segundo o próprio texto bíblico, tal
homem “vivia nos sepulcros, e nem mesmo com cadeias alguém podia prendê-lo; porque,
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tendo sido muitas vezes preso com grilhões e cadeias, as cadeias foram quebrados por ele
e os grilhões despedaçados e ninguém podia subjugá-lo” (Marcos 5:3-4).

Ao defrontar-se com Jesus, Este lhe falou:

“(...) Espírito imundo, sai desse homem!”

(Marcos 5:8b)

O endemoninhado retrucou:

“(...) Que tenho eu contigo, Jesus, Filho do Deus Altíssimo? Conjuro-te por Deus que não
me atormentes.”

(Marcos 5:7)

Jesus, em contrapartida, pergunta ao espírito que fala:

“(...) Qual é o teu nome?”

(Marcos 5:9a)

E o espírito Lhe responde:

“(...) Legião é o meu nome, porque somos muitos.”

(Marcos 5:9b)
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Então, ao serem ordenados que saíssem daquele homem, os espíritos Lhe rogaram

“encarecidamente que não os mandasse para fora do país.” (Marcos 5:10).

Mas, por que os demônios suplicaram a Jesus que não os mandasse para fora daquele
país? Porque haviam se especializado em infernizar gadarenos, conhecendo sua
antropologia, sua história, sua cultura.

Os demônios, então, pediram-Lhe que os deixasse entrar nos porcos que pastavam por ali.
Jesus o permitiu.

E, saindo do corpo daquele homem, os demônios dirigiram-se a uma manada de porcos,


que, conforme a Bíblia, era constituída de aproximadamente dois mil porcos (Marcos 5:13),
os quais, infestados de espíritos malignos, precipitaram-se “despenhadeiro abaixo, para

dentro do mar, onde se afogaram.” (Marcos 5:13).

Os porqueiros, ao verem o que acontecia, entram em pânico. Uma “lei econômica” que
Jesus estabelece é que a propriedade privada precisa ser respeitada até o ponto em que a
sua manutenção não esteja destruindo a vida humana. Quando se chega a tal ponto, a
propriedade privada tem de ser usada para salvar vidas.

Os porcos se precipitam no mar, morrendo afogados. Os porqueiros ficam apavorados,


porque do ponto de vista econômico, eles sofreram uma grande perda.

Indo ao encontro de Jesus, os porqueiros “viram o endemoninhado, o que tivera a legião,


assentado, vestido, em perfeito juízo; e temeram.” (Marcos 5:15).

E, vendo isso, pedem a Jesus que Se retire daquela cidade (Marcos 5:17), porque eles não
conseguiam viver com a lucidez.

O que é que se pode aprender com essa história, que, embora sendo a história de um
homem, ela é mais do que isso: ela é a história de uma cultura, de uma sociedade.

A primeira é que as dez cidades - Decápolis dentre as quais Gadara (ou Gerasa) - haviam
sido fundadas por Alexandre, o Grande, daí sua origem grega (Decápolis), as quais foram
ampliadas pelos seus sucessores, ficando no meio dos reinos que sucederam o reino de
Alexandre (acerca dos quais já se falou no capítulo anterior), ou seja, ao norte a Síria,
onde ficava o reino dos Selêucidas, e o outro ao Sul, no Egito, onde era o reino dos
Ptolomeus. Decápolis ficava entre esses dois reinos, portanto, Gadara também. Daí,
quando houve desentendimento entre os selêucidas e os ptolomeus, Gadara também se
tornou campo de batalha. Ora esta cidade ficava sob o domínio dos selêucidas, ora sob o
domínio dos ptolomeus. E, depois de estar alternadamente sob o jugo selêucida e sob o
jugo ptolomaico, ocorre a Revolta dos Macabeus, ficando agora Gadara sob o jugo judaico.
Depois desse período de domínio judaico, apoderam-se de Decápolis os romanos, que
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impõem sua língua, seu regime de governo, suas manifestações religiosas, suas leis,
enfim, uma nova cultura. Nesse período de domínio romano, dá-se uma nova revolta dos
judeus, a qual é sufocada, e o governo daquelas dez cidades é dado a Herodes, que
começa a fazer obras “faraônicas” em todas elas. Depois desse período de governo de
Herodes, o próprio César, o Augusto, toma o poder.

O Novo Testamento alterna o nome da cidade do “gadareno”, ora chamando-a de Gadara,


ora chamando-a de Gerasa. Mas é esta última que nos ajuda a entender a mensagem do
texto em questão. Trata-se de uma curiosidade interessante sobre o nome Gerasa. Ele
vem do hebraico “Gers”, que significa expulsar, tirar de dentro, expelir. Isso reflete toda
conturbada história sócio-política não só daquela cidade, como também das outras nove.
Porque com todo “entra-e-sai” das forças que disputavam o poder naquela região, criou-se
uma cultura de possessão. Portanto, a cidade de Gerasa (ou Gadara) tem um nome que
desenvolve e denuncia tal estado de coisas, qual seja, o de possessão. Era uma
sociedade que “se acostumara” à invasão, à possessão. Na cidade de Gerasa - que tem
uma cultura que assimilou e que absorveu a idéia da possessão política, econômica, social
- o diabo usa esse estado de coisas. Com isso se aprende que os fenômenos sócio-
político-econômicos não são estanques, mas que podem ser manipulados por forças
espirituais para esmagarem seres humanos, espiritualmente.

A história do gadarenos ajuda-nos a compreender que havia naquela cidade uma cultura
de possessão. Porque as sociedades, quando adoecidas, “abrem a porta” para o diabo
entrar nelas, e agir nas mentes humanas.

Observe-se que há uma cultura entre a cidade e a possessão, uma vez que há uma
relação estranha e doentia entre a cidade de Gerasa e seu possesso “de estimação”.
Como se sabe disso? A Bíblia nos diz que ele vivia nos sepulcros (Marcos 5:3), mas não
morria de fome. Por quê? Porque aparecia sempre um pratinho de comida, um pedaço de
pão, uma garrafa d’água ou de vinho ao lado da sepultura toda manhã. A sociedade dos
gerasenos mantinha o possesso, a “besta”. A cidade fazia cadeias para serem quebradas,
porque a Bíblia diz que grilhões e cadeias eram postos nele, os quais eram quebrados
(Marcos 5:4). Eu, pessoalmente, não acredito na resistência daquelas cadeias e grilhões
que lhe eram postos. Isto porque, se se quiser fazer corrente resistente para possesso
algum quebrar, isso é possível. Quebra-se o braço; a corrente não. Porque até a
possessão demoníaca tem limites, que é o limite físico da resistência do osso de um
possesso. O possesso fica com uma força sobre-humana, enquanto o osso agüenta. Por
exemplo, uma menina possessa, às vezes, consegue jogar ao chão dez ou quinze
homens; mas não joga cinqüenta. Mesmo o poder diabólico agindo no corpo humano, tem
um limite, que é o limite do corpo.

No entanto, para o endemoninhado gadareno eram feitas correntes para serem quebradas
por ele. De alguma forma há uma mórbida situação de contentamento em se ver o
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possesso quebrar as correntes. Os moradores daquela cidade não conseguiam quebrar as


correntes sócio-político-econômicas dos povos que os invadiram, mas há um dentre eles
que consegue quebrar todo tipo de corrente, num “espetáculo de liberdade”.

A cidade tem uma relação doentia com o possesso, porque ela o quer possesso. No
momento em que Jesus “despossessa” o possesso, seus moradores ficam aborrecidos,
porque Jesus acabou com o seu “espetáculo”.

Aprende- se com isso que, de algum modo, as sociedades precisam de seus possessos,
de seus loucos, de seus doentes. As sociedades não podem sofrer a sua própria violência,
a sua própria impotência, a sua própria frustração sem uma válvula de escape. Torna-se
imprescindível que haja o gadareno, e muitos “loucos” para que outros possam se achar
normais.

Não se pode viver sempre com ódios revolucionários. Por isso tem que se vazar toda a
frustração social, política, econômica, cultural, emocional e sexual de todo tipo num ser que
carrega em si toda a nossa miséria e amargura.

A Igreja também precisa de seus doidos, para se sentir mais normal. Quando estão todos
normais, ninguém gosta, sendo preciso haver um maluco, para que todos possam
conversar teologicamente, doutrinariamente, metodologicamente, etc. Aparecem, então, os
loucos, os possessos, os monstruosos, os suicidas, os hereges e os charlatães.

Se se quer entender quais são as potestades que estão operando na cultura brasileira, não
é preciso fazer pergunta a endemoninhado:

“- Qual é a potestade que está atuando no Brasil? Fala, demônio!”

Não é preciso nada disso! Basta ouvir Raul Seixas. Por quê? Porque quando se fala nele,
fala-se de tantos outros que estão vazando loucura. Nas suas músicas, ele diz um monte
de esquisitices, mas que muita gente gosta. E um dado interessante sobre ele, que é um
“gadareno cultural” do Brasil: quando ele estava vivo, as pessoas lhe estavam dando
“pratinho”, “corrente” para ele quebrar, etc. Até que ele morreu e transformou-se em ídolo.
Talvez seja ele a primeira pessoa na nossa cultura, a tornar-se ídolo depois de morto no
Brasil. É um fenômeno quase que religioso. Por quê? Muitas pessoas da nossa sociedade,
quando ele estava vivo, davam-lhe o “pratinho”, sustentando-o. Ainda que não houvesse
muita identificação entre ele e a sociedade que o mantinha, era importante a sua
existência. Quando ele morre, não havendo mais a possibilidade de projetar nele tudo o
que ela queria, a sociedade começa a cultuar a sua memória, para mantê-lo vivo, porque
ele precisa estar vivo, com toda a sua loucura, a fim de que a sociedade possa se sentir
um pouco mais sã.
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Dentro da Igreja evangélica brasileira esse mesmo fenômeno está acontecendo.

A história do gadareno também nos ajuda a discernir a relação entre a dimensão sócio-
política e suas conseqüências espirituais sobre a vida dos indivíduos. As situações sócio-
políticas têm suas conseqüências e implicações na vida espiritual das pessoas. Observe-
se que todo drama sócio-político-cultural de toda a cidade de Gadara afeta a vida do
indivíduo. Talvez aquele endemoninhado tivesse nascido uma pessoa sensibilíssima; podia
ser o maior poeta, ou o maior músico daquela cidade. Geralmente, o diabo esmaga as
pessoas mais sensíveis. Raramente se vê um indivíduo bruto, possesso. Quase sempre é
uma alma sensível que cai nas mãos do diabo. Ele vê aquilo que ninguém vê; sente o que
ninguém sente. Desde pequeno, algo estranho começa a nascer dentro dele. Sentimentos
de frustração e de amargura vão brotando no seu interior, fragilizando-o. Até que o diabo
usa essa fragilidade individual da personalidade, das emoções, da auto-imagem, entrando
dentro dele, destruindo sua vida, até o dia em que Jesus chega e diz:

“- Sai dele, espírito imundo!”

Libertando-o do diabo e dos demônios que estavam dentro dele, Jesus o desoprime de
toda carga maligna que estava sobre ele.

Não adianta dizer que se vive com Deus e com Jesus - aqui no Brasil - e dizer que não se
dá a mínima importância aos acontecimentos sociais, culturais, políticos e econômicos,
porque se é de outra esfera. Não adianta dizer isso. Agindo assim, algumas pessoas
tentam negar que vivem no Brasil.

Certa vez um pastor me falou que não conseguiu ficar numa certa igreja, porque ele tinha
que fazer um “suicídio intelectual”, uma vez que, ao chegar lá, um irmão, líder da igreja,
dizia assim, no início do culto:

“- Irmãos, vamos repetir: No meu país não tem inflação! No meu país não tem inflação! No
meu país não tem inflação! No meu país não tem inflação! Meu dinheiro não corrói! Meu
dinheiro não corrói! Meu dinheiro não corrói! Meu dinheiro não corrói!”

Tal pastor ficou naquela igreja durante um ano, ouvindo essas coisas. No entanto, naquele
período, 30% de inflação ao mês. E a coisa piorou mais ainda quando aquele mesmo
irmão, líder da igreja, começou a dizer assim:
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“- Olhe para a sua mulher e diga: Minha mulher é bonita. Minha mulher é bonita. Minha
mulher é bonita. Minha mulher é bonita.”

Aquele pastor me disse que, se a relação era a mesma, em que ele dizia que não havia
inflação, mas havia, e se aquele irmão está mandando dizer que a nossa mulher é bonita,
é porque, de fato, não é.

De outra vez, conversando com um empresário, ele me disse:

“- Eu nem quero saber mais! Não quero saber de coisa alguma. Eu não estou nem aí para
o Brasil. Eu estou vivendo bem, sem conseqüência da alguma da crise.”

Essa conversa foi algum tempo atrás. Outro dia, conversando com o mesmo empresário,
ele já não se sentia o mesmo. Por quê? Porque nenhum de nós que vive no planeta Terra
consegue se desvincular das realidades políticas, sociais e econômicas, vivendo como se
elas não trouxessem nenhuma ingerência espiritual à vida. Porque, conquanto sejam de
natureza sócio-político-econômica, o diabo usa a conjuntura, as circunstâncias do
momento histórico e a espiritualidade que tais forças em conjunto geram para influir na
mente e na alma das pessoas, deprimindo-as, desgraçando-as, oprimindo-as,
desvalorizando-as em sua autoimagem, “gadarenizando-as” enfim.

O gadareno foi também vitimado pela dimensão sócio -política nas seguintes áreas: ele se
feria com pedras por uma sociedade que se odiava po não poder ser livre. Ele quebrava as
cadeias de um povo que ansiava por libertação, mas não sabia como tê-la. Ele era a
expressão mais livre e organizada e uma sociedade oprimida e desorganizada. Por isso
quando Jesus lhe pergunta o nome, os demônios que o possuem verbalizam um outro
anseio: legião, a qual era a forma mais organizada de coletividade naqueles dias, que era
a legião romana. Ele é o único que denuncia o opressor: os romanos, que estavam no
país, mais que eram indesejados ali, mas para os quais ninguém tinha coragem de dizer
isso. Só aquele homem, lançando mão do “pré-requisito” de ser possesso, pode falar o que
quiser, porque o doido pode falar o que quiser. Até Davi, quando ameaçado de morte, e
querendo escapar, fez-se de doido (I Samuel 21:12 -14). O gadareno endemoninhado
denuncia como o opressor? Quando interrogado por Jesus acerca de seu nome, ele
responde:
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“- Legião, porque somos muitos.”

Ele, com isso, está explicitando dois desejos: o do diabo, ao querer continuar destruindo
aquela vida, e o dos romanos, de continuarem ali, exercendo o poder naquela região. O
diabo e Roma tinham os mesmos objetivos: oprimir e destruir a vida humana.

Assim, descobrimos que doenças “psicodemoníacas” também podem ser produzidas - pelo
menos agravadas - por conflitos de classe, por exploração econômica e política, por
conflitos entre tradições que são quebradas, por revoluções, por violência urbana, por
impotência humana, por abusos, por culpa, por revolta, por ódio, pela frustração sócio-
econômica, e pela corrupção e pela injustiça institucionalizadas. Se vemos tudo isso
acontecer no Brasil, tais coisas não acontecem apenas nos níveis em que os sociólogos,
psicólogos, psiquiatras, cientistas sociais e políticos, e tantos outros especialistas dizem
estar acontecendo; mas elas criam cunhas, que lascam, abrindo passagens para dentro da
espiritualidade geral do país, oportunizando ao diabo, por tais vias, embrenhar-se por elas,
a fim de arruinar a alma das pessoas.

A melhor maneira de discernir os espíritos que operam numa sociedade é mediante a


compreensão da cultura nacional. Os demônios nunca se tomam totalmente autônomos
em relação à realidade histórica, precisando eles de veículos para se manifestarem.
Quando atuam em pessoas, eles querem corpos; quando querem atuar mais amplamente,
precisam de culturas, de sociedades, de sistemas políticos e econômicos.

A cidade mais mal sucedida em termos de evangelização no país é Uberaba. A maior parte
das cidades brasileiras hoje tem, no mínimo, de 10 a 15% de crentes na população,
algumas já chegando a 40%. Anápolis tem um índice elevado, bem como Londrina e
Goiânia; alguns municípios do Rio de Janeiro apresentam um índice elevadíssimo de
população evangélica. Mas, Uberaba tem em torno de 2% de população evangélica, como
sinal da influência espírita naquela localidade.

Uma coisa estranha é que Uberlândia cidade vizinha a Uberaba - é uma cidade próspera,
cuja Igreja cresce, sendo a “Disneylândia” do Triângulo Mineiro, provocando um complexo
de inferioridade nos moradores de Uberaba, que pode ser verificado quando se conversa
com os seus habitantes:

“- Ah!... Lá em Uberlândia as coisas acontecem... Aqui, não!”


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Uberlândia - cuja origem do nome é algo americanizado, portanto de Primeiro Mundo -


procede de “Uber”, que significa farinha e de “Land” que significa terra; portanto Terra da
Farinha. No entanto, Uberaba significa Terra da Farinha Podre. Indagando acerca do
significado do nome dessa cidade, encontrei outra significação: “terra da curva do rio não-
sei-de-que amaldiçoado” . As significações do nome de tal cidade só traduzem desgraça.

A importância das relações culturais é algo inegável. Não só as de nível nacional, como
também as de um bairro, as de um município, as de uma cidade. Por que São Paulo é São
Paulo, e o Rio é o Rio? Não há, apenas, quatrocentos quilômetros separando essas duas
cidades. Há, também, algo mais que as distingue. Em São Paulo, sente-se uma “coceira”
por se ganhar dinheiro; no Rio, sente-se uma vontade de "soltar a franga” e “liberar geral”.
Desculpem-me os cariocas!

Eu queria desafiar os cristãos de Uberaba a transformarem a sua cidade de Terra da


Farinha Podre em Terra do Pão da Vida, em nome de Jesus.

O que se pode fazer para enfrentar as potestades sócio-político-cultural-econômicas no


nível individual?

A primeira é submissão à Palavra. Volte-se para a Palavra, como Jesus o fez: “Está
escrito”. Livros evangélicos são ótimos, mas nossa fonte de orientação e submissão é a
Bíblia, a Palavra de Deus. Se tiver que escolher entre algum livro, fique, sempre, com a
Palavra do Senhor.

A segunda coisa para enfrentar essas potestades no nível individual é praticar o bom
senso, não se “estupidificando”, não pulando do pináculo do templo. Jesus disse: “Não
tentarás o Senhor teu Deus”.

A terceira é resistir ao diabo. Jesus disse: “Retira-te, Sátanás”. É necessário falar,


repreendendo o demônio, uma vez que isto é feito no nome de Jesus.

Se fizermos essas três coisas - submissão à Palavra, prática do bom senso e resistência
ao diabo - ele, o diabo, fugirá de nós, conforme nos diz a Palavra de Deus:

“(...) mas resistí ao diabo, e ele fugirá de vós.”

(Tiago 4:7b)
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CAPÍTULO 12

DISCERNINDO OS ELEMENTOS DA FÉ CRISTÃ

“(...) se declaram judeus, e não são, sendo antes sinagoga de Satanás.”

(Apocalipse 2:9b)

“Vi ainda outra besta emergir da terra; possuía dois chifres, parecendo cordeiro, mas falava
como dragão.”

(Apocalipse 13:11)

Estamos entrando, neste capítulo, num terreno onde todo cuidado é necessário, porque a
terra é santa, sendo preciso todo cuidado quando se abordam aspectos relacionados às
entidades que representam a fé cristã.

Tais entidades podem começar com propósitos maravilhosos e com ideais de serviço ao
Reino de Deus, mas, no curso do tempo, mudarem sua natureza, pervertendo-se e “se
demonizando”. Essa é a terrível sutileza que pode acontecer-lhes.

Os dois textos acima dizem que, para nós cristãos, não é importante saber o que as
entidades dizem sobre si mesmas. Jesus diz, acerca delas, que “(...) se declaram judeus, e
não são, sendo antes sinagoga de Satanás”. O que as entidades dizem sobre si mesmas
não é importante, mas, o que elas são.

Por outro lado, se o que elas dizem sobre si mesmas não é importante, também com o que
elas se parecem não o é. João, no livro do Apocalipse, fala da besta que emerge da terra,
que é o poder religioso que abençoa o estado corrupto e “demonizado”. João nos diz que
tal besta se parecia com o Cordeiro, tendo Suas feições, mas o seu discurso, o que dizia,
característico do dragão. Isso é muito sério, principalmente porque nossa tendência é
ficarmos muito impressionados com esses dois aspectos - com o que falam e com o que se
parecem. A Bíblia nos diz que o que elas dizem não importa, mas o que elas são de fato; e
com o que elas se parecem também pouco importa.
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Há um conceito absolutamente fundamental quando uma instituição, quando uma


entidade, seja ela uma igreja, seja ela uma entidade de qualquer outra natureza, “se
demonizam” e se pervertem em seu caminho, rendendo-se às influências malignas dos
principados e das potestades. O conceito é simples e é basicamente este: sempre que
qual-quer coisa ou qualquer instituição torna-se um fim em si mesma, fugindo assim a seu
propósito original, ela “se demoniza”. A VINDE pode “demonizar-se” daqui há algumas
gerações adiante. A igreja que freqüentamos pode “demonizar-se” a nossa denominação
pode “demonizar-se”, dezenas de missões evangélicas no passado “se demonizaram”. Nós
não estamos falando novidade alguma com relação à possibilidade de que daqui para
frente tais coisas aconteçam. Imaginemos o que ocorreu com a Igreja Católica Apostólica
Romana original. Fora ela uma Igreja maravilhosa, com raízes apostólicas, com gente
santa... Porém, dois séculos depois essa instituição se obscurece, enchendo-se de trevas
e pervertendo-se, na Idade Média.

Para mim, um dos exemplos mais dramáticos disso é o Santo Sepulcro, local onde se
celebra a crucificação de Jesus e Sua ressurreição, com possibilidades históricas as mais
prováveis de que aquele seja o lugar, geográfica e geologicamente falando, em que Jesus
ressuscitou. Sempre que entro naquele lugar não me sinto bem. É um cenário cheio de
idolatria, obscuridade, com um clima espiritual de morte, mas não da morte que passa de si
mesma para a vida, porém morte em si mesma, morte como aniquilamento final. É muito
comum cristãos irem àquele lugar. Eles vão até lá alegres, mas, quando ali entram, levam
um susto tremendo. Eu digo sempre que isso é um exemplo do que ocorreu com a
serpente de bronze no deserto, a qual Moisés fez para que, ao olharem para ela, as
pessoas que tivessem sido mordidas de cobras fossem curadas (Números 21:9). Essa
mesma serpente de bronze, que no passado fora bênção, transforma-se em maldição,
tendo que ser destruída (II Reis

18:4).

O interessante é que um lugar histórica e geograficamente tão significativo quanto aquele


tenha conseguido se transformar em algo tão obscuro e, às vezes, até cheio de presença
espiritual maligna.

Se isso pôde ocorrer com a montanha do Calvário, o mesmo pode acontecer com a nossa
denominação, com o lugar mais santo da nossa igreja, e com qualquer coisa que fazemos.
A Bíblia está cheia de exemplos que ilustram isso.

A Arca da Aliança simboliza o lugar da presença intensa de Deus. Nela havia exemplares
originais das Tábuas da Lei, uma porção do maná e a vara de Arão que florescera
(Hebreus 9:4). Tudo isso ocorre por ordem e por instrução divina. Mas, no momento em
que essa mesma Arca começa a ser observada e concebida como um fim em si mesma;
no momento em que ela começa a tomar conta sozinha do cenário religioso, crescendo na
mente das pessoas, tornando-se objeto de culto; quando ela deixa de apontar para a
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direção para a qual foi destinada, passando a captar para si mesma toda a atenção, ela
perde a sua significação. O que Deus faz com ela? Deus “perde” essa Arca. No exílio ela
desaparece, nunca mais volta a ser encontrada, o que, possivelmente, salvou os judeus no
exílio de se terem transformado num povo idólatra da Arca, uma vez que o templo estava
destruído, e Jerusalém fora arrasada. Se eles ficassem com a Arca lá no exílio, talvez a
história fosse outra. Deus os salva da Arca, a fim de salvá-los para Ele.

O Templo também foi construído por ordem divina, segundo a arquitetura divina, com
instruções minuciosas de Deus. Repentinamente, ele deixa de ser o lugar da presença de
Deus, tornando-se um fim em si mesmo, transformando-se no lugar dos negócios, no lugar
das jogatinas. Deus o destrói. Ele é reconstruído, na intenção de ser outra vez o lugar da
presença de Deus. Perverte- se mais uma vez. Jesus entra nele, exorcizando-o (João 2:13-
16). O ato de Jesus de entrar no Templo com azorragues, expulsando dali as pessoas que
faziam mau uso dele, é um ato de exorcismo institucional e religioso. Devemos interpretar,
portanto, este ato de Jesus, da mesma forma que interpretamos uma expulsão de
demônios. Como o exorcismo feito por Jesus não resolveu tudo, o Templo foi destruído
depois.

A Sinagoga também foi criada por um movimento de judeus no exílio, em Babilônia, para
substituir o Templo, para fazerem dela um local onde a Palavra pudesse ser ensinada,
podendo seus filhos crescerem na fé, mantendo-se unidos, além de servir como um centro
de promoção cultural do judaísmo, sendo um local de reflexão e de oração. Isso acontece.
Depois, transforma-se num fim em si mesma, mais importante do que Deus. Pela
sinagoga, pessoas são perseguidas e mortas. Paulo, por exemplo, sofre barbaramente as
intervenções impiedosas e intolerantes daqueles que eram os líderes da Sinagoga. Em
Apocalipse 2:9b se diz, como que resumindo isso, que tais pessoas “se declaram judeus, e
não são, sendo antes

sinagoga de Satanás”.

A Igreja, em Apocalipse, já recebe advertências de Jesus quanto ao risco de ela “se


demonizar”, perdendo seu alvo, seu rumo, seu propósito, ensimesmando-se, voltando-se
para si própria. Quando se lê em Apocalipse 2 e 3 as palavras proféticas de Jesus,
confrontando a Igreja, elas revelam a Sua denúncia quanto ao ensimesmamento, quanto à
possibilidade de “demonização”, na medida em que se vai perdendo o rumo. Jesus diz em
Apocalipse 2:5 à igreja de Éfeso:

“Lembra-te, pois, de onde caíste, arrepende-te, e volta à prática das primeiras obras; e se
não, venho a ti e moverei do seu lugar o teu candeeiro, caso não te arrependas.”
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Com isso, Jesus está dizendo que aquela igreja iria acabar, se continuasse a praticar o
que a desviava dos caminhos de Deus.

Ele também diz à igreja de Pérgamo, em Apocalipse 2:16:

“Portanto, arrepende-te; e se não, venho a ti sem demora, e contra eles pelejarei com a
espada da minha boca.”

A essa igreja, Jesus diz que ela deve se arrepender, a fim de que Ele não venha sobre ela
e a destrua.

Jesus diz à igreja de Sardes, em Apocalipse 3:3b:

“(...) Porquanto, se não vigiares, virei como ladrão, e não conhecerás de modo algum em
que hora virei contra ti.”

À igreja de Laodicéia, Ele diz:

“(...) estou aponto de vomitar-te da minha boca.”

(Apocalipse 3:16b)

Essas expressões todas são fortíssimas e deveriam ser ouvidas com toda a intensidade
com a qual foram proferidas, significando exatamente o que elas queriam significar.

A grande questão sobre como começar a entrar na área do exercício do discernimento de


quando essas entidades religiosas “se demonizam” começa primeiramente com uma
percepção da relação de Jesus com a religião em Israel. Se queremos achar as pistas para
discernir a “demonização” institucional, atentemos para a relação de Jesus com a religião
em Israel, porque tal percepção nos ajuda a discernir quando a religião "se demoniza”.
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QUANDO A IGREJA “SE DEMONIZA”

Há quatro pistas que o Evangelho nos dá sobre quando a religião “se demoniza”.

A primeira pista é quando a religião aceita o mundo como o mundo é. A religião

“se demoniza” quando ela aceita o mundo como o mundo é. Jesus foi chamado de
satânico pela religião, porque Ele não aceitava o mundo como ele era. Ele olha para o
mundo e diz:

“- Não, não está certo!”

Mas, a religião olha para o mundo e diz:

“- Está tudo bem!”

Há, com isso, um choque tremendo, o qual é verificado em quatro áreas:

1.º . Jesus não aceitou a possessão demoníaca como “status” para ninguém. Jesus olhava
para o possesso, para gente oprimida espiritualmente, e expulsava os demônios que os
atormentavam. O que aconteceu? Foi acusado de expelir demônios em nome de Belzebu.

“(...) Este não expele os demônios senão pelo poder de Belzebu, maioral dos demônios.”

(Mateus 12:24)

Infelizmente, essa mesma atitude dos fariseus em acusarem Jesus de expelir demônios
pelo poder de Belzebu ainda se verifica em muitas igrejas tradicionais. É necessário muito
cuidado, principalmente aquele que tem a pretensão de achar-se o grande discernidor de
quem é ou não é de Deus, a fim de que não venha a estar afirmando o fato de que prefere
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ver pessoas quietamente possessas a aflitamente em processo de libertação, em nome de


Jesus.

2.º. Jesus não aceitou a normalidade da vida pretensamente “certinha” dos religiosos.

Jesus olhou para os fariseus em suas práticas rígidas e formais, com tudo muito certinho e
tudo no lugar, e com isso, achando-se com a capacidade de julgar as demais pessoas, de
enfrentar o próximo com ar de superioridade, porém vivendo a desgraça de serem
mediocremente felizes: felizes por participarem de todas as reuniões da igreja; felizes por
sentarem nos primeiros bancos da igreja; felizes por se acharem o exemplo de virtude
cristã; felizes por acreditarem que são melhores que os outros. Isso é o farisaísmo. Jesus
diz não a isso tudo. Ele procurava justamente os de vida torta, os desviados, os infelizes.
Por exemplo, a mulher samaritana:

“Disse-lhe Jesus: Vai, chama teu marido e vem cá; ao que lhe respondeu a mulher: Não
tenho marido. Replicou-lhe Jesus: Bem disseste, não tenho marido; porque cinco maridos
já tiveste, e esse que agora tens não é teu marido; isto disseste com verdade.”

(João 4:16-18)

O gadareno é um outro exemplo. Zaqueu também o é. Jesus - com relação a este último
“escandaliza” a todos, quando diz que vai à sua casa:

“Quando Jesus chegou àquele lugar, olhando para cima, disse-lhe: Zaqueu, desce
depressa, pois me convém ficar hoje em tua cosa. (...) Todos os que viram isto
murmuravam dizendo que ele se hospedara com homem pecador.”

(Lucas 19:5 e 7)

Jesus escandaliza a todos aqueles que acham que tudo está certo como está, julgando-se
eleitos de Deus por vocação e méritos próprios, de modo que, os que não o são, devem
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ser tratados como pecadores e, como tais, sujeitos à condenação. Esquecem-se das
palavras de Paulo:

“Porque pela graça sois salvos, mediante a fé; e isto não vem de vós é dom de Deus; e
não de obras, para que ninguém se glorie.”

(Efésios 2:8-9)

Jesus subverte a normalidade farisaica, não se encaixando em padrão algum. Diante


disso, dizem que Ele é louco e endemoninhado:

“Ele tem demônio e enlouqueceu.”

(João 10:20a)

Em uma outra situação semelhante, também O chamam de possesso:

“(...) Tens demônio.”

(João 7:20)

3.º . Jesus não aceita a “filosofia do Gabrie1à” praticada pelos fariseus. A “filosofia da
Gabriela” é aquela que preconiza: “eu nasci assim, vou viver assim, vou morrer assim:
Gabriela, sempre Gabriela.” Jesus não crê nisso. Isto porque quando a mulher pecadora
unge os Seus pés com ungüento e os beija, e os enxuga com os seus cabelos (Lucas
7:37-38) e Jesus lhe diz que os seus pecados estavam perdoados (Lucas 7:48), o fariseu,
em cuja casa Ele estava, Lhe diz, julgando definitivamente a mulher:

“(...) Se este [Jesus] fora profeta, bem saberia quem e qual é a mulher que lhe tocou,
porque é pecadora.”
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(Lucas 7:39b)

Em outras palavras, o fariseu estava pregando a “filosofia da Gabriela” a Jesus:

“- Tu não sabes que ela é pecadora, e que nasceu assim, e que vive como tal e que vai
morrer no pecado? Ela é uma prostituta! Tu não sabias? Não tem jeito, não!”

Quando observamos mais atentamente os Evangelhos, verificamos que a “filosofia da


Gabriela”, embora afirmada e reafirmada diariamente pelos fariseus, é contrariada na
mesma proporção por Jesus. E porque Ele age assim, é chamado de blasfemo:

“Por que fala ele deste modo? Isto é blasfêmia! Quem pode perdoar pecados, senão um,
que é Deus?”

(Marcos 2:7)

Porque Jesus diz que as pessoas podem mudar, que não há ninguém que esteja debaixo
de opressão que não possa ser liberto, Ele é acusado de blasfemo.

Freqüentemente, ouço pessoas, em muitas igrejas evangélicas, dizerem:

“- Não sei por que se gasta tanto dinheiro com esse tipo de gente irrecuperável! Uma vez
drogado, sempre drogado. Uma vez prostituta, sempre prostituta.”

Há muitas igrejas que pensam assim, infelizmente. Acreditam que “pau que nasce torto
morre todo”.

4.º . Jesus não aceita que ninguém passe fome ou necessidade em dia santo. Por causa
disso, Jesus foi acusado de transgredir a Lei, juntamente com os Seus discípulos:
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“Por aquele tempo, em dia de sábado, passou Jesus pelas searas. Ora, estando os seus
discípulos com fome entraram a colher espigas e a comer. Os fariseus, porém, vendo isso,
disseram-lhe: Eis que os teus discípulos fazem o que não é lícito fazer em dia de sábado.”

(Mateus 12:1-2)

Quando a Igreja se torna realista demais, é um perigo. Nós somos chamados à


inconformação radical. Paulo diz:

“Rogo-vos, pois, irmãos, pelas misericórdias de Deus, que apresenteis os vossos corpos
por sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional. E não vos
conformeis com este século, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para
que experimenteis qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus.”

(Romanos 12:1-2)

Segundo o apóstolo Paulo, tudo é mutável, se a graça de Deus está operando. É


imprescindível haver utopia, sonho, projeto, esperança e paixão. É imprescindível,
sobretudo, ter a certeza de que Deus no mundo é sempre um Deus agindo e mudando os
estados de coisas e as pessoas.

Quando a Igreja aceita o mundo como ele e, alguma coisa a está pervertendo
demoniacamente.

A segunda pista é quando a religião tem mais prazer em punir do que em perdoar. Quando
isto estiver ocorrendo na nossa igreja, ou na nossa denominação, é porque ela já “se
demonizou”.

Quando os crentes começam a sentir prazer nas sessões extraordinárias, para as quais
toda a igreja é convocada para punir e disciplinar irmãos em pecado, cuidado! Tal igreja
pode estar em processo de “demonização”. Eu, particularmente, conheço crentes que não
perdem a uma sessão de disciplina de sua igreja. Eles faltam à celebração da Ceia, às
reuniões de oração, ao culto evangelístico ao ar livre, mas, em dia de sessão disciplinar, lá
estão eles, nos primeiros bancos, eufóricos. Cuidado! Há algo demoníaco operando nesse
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tipo de comportamento. Tais pessoas assemelham- se aos “atiradores de pedra” descritos


em João 8. São os especialistas em atirarem pedra, em disciplinar:

“Os escribas e fariseus trouxeram à sua presença uma mulher surpreendida em adultério
e, fazendo-a ficar de pé no meio de todos, disseram a Jesus: Mestre, esta mulher foi
apanha da em flagrante de adultério. E na lei nos mandou Moisés que tais mulheres sejam
apedrejadas; tu, pois, que dizes?”

(João 8:3-5)

Pessoas que agem como escribas e fariseus estão fazendo parte de um projeto de religião
“demonizada”.

O projeto de religião de Jesus não tem prazer em punir, mas em perdoar. O projeto de
religião de Jesus tem prazer em dizer:

“(...) Mulher, onde estio aqueles teus acusadores? Ninguém te condenou? (...) Nem eu
tampouco te condeno; vai, e não peques mais.”

(João 8:10b e 11b)

Algum tempo atrás, um amigo contou-me uma história que me deixou profundamente
entristecido. Ele contou-me um episódio que se deu numa sessão de disciplina ocorrida
numa igreja da qual ele era pastor auxiliar. Disse-me ele que uma determinada moça da
igreja aproximou-se do pai, muito envergonhada, e confessou:

“- Papai, eu quero que o senhor me ajude. Porque hoje à noite, voltando da escola, cinco
homens me agarraram, levaram-me para um terreno baldio... e me estupraram...”

Essa moça era uma menina de quinze anos de idade. Choraram juntos, pai e filha. A
notícia chegou ao pastor da igreja, um homem insensível. Ele mandou chamar o pai da
menina e lhe disse:
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“- Ouvi dizer que a sua filha foi agarrada atrás de um muro, num terreno baldio... É
verdade?”

O pai falou:

“- Não, pastor. Ela foi violentada ...”

O pastor retrucou:

“- Olha, essa história de mulher dizer que foi agarrada e violentada... Eu? Eu não acredito,
não! Uma mulher quando quer fechar a perna, não há homem que abra.” – e depois
arrematou: “- Traga a menina para a sessão da igreja.”

Esse meu amigo que me contou essa história me disse que presenciou a tudo isso, como
pastor auxiliar, sem voz e sem poder de decisão, vendo 20 homens de cabeça branca,
líderes daquela igreja, quase que numa atitude de “masturbação psicológica” perguntarem
à menina:

“- Diga-nos aqui, menina. Como foi? Tiraram-lhe a roupa como? Conte-nos como tudo
aconteceu.”

E as perguntas mais aviltantes possíveis foram feitas à menina. Ele se desfazia em pranto:

“- Não, não foi isso, não! Eu não os vi!... Me agarraram... me bateram... quase arrancaram
meu cabelo...”

Sadicamente, aqueles líderes insistiam:

“- Que é isso, menina! Conte-nos como foi de verdade! Pode abrir o coração!”
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Meu amigo me disse que num determinado momento, não agüentando mais, ele começou
a vomitar, saindo correndo para o banheiro, onde vomitou quase que interminavelmente.
Saindo do banheiro, às pressas, foi embora para casa, disse para a mulher e para os filhos
que iriam sair daquela cidade. Vendeu tudo o que tinha, comprou passagens para ele e
para sua família, mudou-se para um outro país, no qual reside até hoje.

Ele me disse que não suportou mais aquela situação, porque era, pelo menos, a quarta
vez que ele presenciava coisas como aquela acontecerem.

Uma igreja assim está tão “demonizada” quanto um terreiro de macumba. Há algo de
maligno agindo naquela igreja. Não é o Espírito de Jesus, nem o Espírito da graça.

A terceira pista é quando aqueles que mostram virtudes divinas são vistos como maus, e
aqueles que mostram características satânicas são tidos como bons, pela Igreja.

O indivíduo que está cheio de amor, de misericórdia, de compaixão, de bondade, de


piedade e de mansidão é escorraçado. Mas, aquele que faz politicagem, que é impiedoso,
malicioso, vai obtendo sucesso: diácono, presbítero, presidente de organizações dentro da
igreja, etc. Foi o que aconteceu com Jesus. Ele era bondoso, piedoso, misericordioso,
amoroso, compassivo, generoso, mas, mesmo assim, O mataram.

“Que mal fez ele? Perguntou Pilatos.”

(Mateus 27:23a)

Jesus não roubou, não matou, não mentiu, mas viveu a justiça, a verdade, o amor, e o
perdão. Mas, por que O mataram? Por inveja, segundo a Bíblia:

“(...) por inveja o tinham entregado.”

(Mateus 27:18b)
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É preciso que olhemos para nossa igreja, para nossa denominação, procurando ver se
aqueles que mostram virtudes divinas, portanto sendo piedosos, simples, amorosos e
misericordiosos, estão sendo reconhecidos como servos de Deus, ou se estão sendo
julgados, enquanto que os que são “mafiosos”, espertalhões e oportunistas estão
ascendendo aos mais altos escalões do poder eclesiástico. Quando isso ocorre na Igreja,
algo diabólico está operando nela.

A quarta pista é quando a continuidade do poder da Igreja se torna mais importante do que
a sua abertura para a novidade de Deus. Em João 11:47b-48, é possível verificar os
líderes religiosos de Israel verem Jesus ressuscitar a Lázaro e dizerem:

“(...) Que estamos fazendo, uma vez que este homem opera muitos sinais? Se o deixarmos
assim todos crerão nele; depois virão os romanos e tomarão não só o nosso lugar, mas a
própria nação.”

Torna-se evidente que os principais dos sacerdotes e os fariseus - os líderes da religião,


portanto - não queriam nem saber que um milagre extraordinário havia sido operado da
parte de Deus. O que importa a eles é a continuidade do poder da igreja que, segundo
pensavam, estava ameaçada, uma vez que Jesus estava operando milagres dentre as
pessoas, as quais criam nEle. Os líderes religiosos da época temiam perder o poder, tendo
em vista o crescimento da popularidade de Jesus. Acreditavam que, se O deixassem
continuar a fazer milagres, perderiam o seu posto, o seu “status” de líderes.

Vejo isso ocorrer em muitos grupos evangélicos, infelizmente. Ouço pastores que me
dizem o seguinte:

“ - Olha, pastor Caio, estou preocupadíssimo com essa onda teológica que está vindo por
aí! Sabe por quê? Porque ela vai tirar o meu lugar.”

Eu respondo da seguinte maneira, quando ouço tais palavras:

“- Meu irmão, quem tem mensagem não precisa ter medo de nova onda alguma. Se você
tem mensagem, a sua igreja nunca vai acabar. E se acabar, é porque ela não tem
mensagem. E se não tem mensagem, é bom que ela acabe mesmo.”
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Nós aprendemos nas relações de Jesus com as instituições religiosas nos Evangelhos
quando elas se “demonizam”, mas também aprendemos com as relações de Paulo com a
religião, em que momento a Igreja “se demoniza”.

Paulo diz que há dois critérios básicos por intermédio dos quais se deve julgar uma igreja
que começa a “se demonizar”.

Em primeiro lugar, Paulo nos diz que a Igreja está sendo penetrada, de alguma forma, por
algo maligno, quando a consciência pagã determina a compreensão da fé cristã. Quando
numa igreja as pessoas são batizadas, participam da Ceia, podendo ter dons espirituais,
mas se a visão com a qual estão interpretando o mundo ainda é pagã, correm o risco de se
associarem a demônios. Vejamos o que o apóstolo Paulo diz à igreja de Corinto, acerca
disso:

“(...) e eu não quero que vos torneis associados aos demônios.”

(I Coríntios 10:20b)

Paulo está falando a uma igreja. Ele está dizendo em outras palavras:

“- Cuidado, porque pode ser que alguma coisa faça vocês se associarem aos demônios.”

O interessante é que no contexto imediatamente anterior Paulo está falando de alimentos


sacrificados a ídolos (I Coríntios 10:17-19). Ele fala do perigo de que a igreja não tivesse
se libertado da mentalidade pagã do panteão greco-romano, olhando ainda para o ídolo
como se em si mesmo ele tivesse algum poder:

“No tocante à comida sacrificada a ídolos, sabemos que o ídolo de si mesmo nada é no
mundo, e que não há senão um só Deus.”

(I Coríntios 8:4)
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Com isso, Paulo está dizendo que o perigo não está no ídolo em si mesmo - porque ele
não é nada -, mas o que está por trás dele. Paulo está dizendo, em outras palavras:

“- Quando vocês, que ainda não se viram livres da mentalidade pagã, comem alimentos
sacrificados aos ídolos, com a idéia de que o alimento em si está impregnado de algo
demoníaco, o qual, de fato, está, estão-se associando a demônios. Não porque há
demônio na comida, mas porque vocês pensam que há, e a comem assim mesmo. Eu
como, e não acontece nada, porque como dando graças a Deus, e também porque comida
não é nada. Eu como porque creio que não há demônio na comida, porque se cresse que
houvesse demônio no, feijão e no arroz e os comesse assim mesmo, eu estaria
estabelecendo uma relação demoníaca com tal alimento.”

Paulo alerta para o cuidado que se deve ter quanto a olhar para vida com uma mentalidade
pagã. Há pessoas que se convertem, mas que mantêm alguns resquícios pagãos em sua
maneira de conceber a espiritualidade. A essas pessoas Paulo diz que tenham cuidado:

“(...) e eu não quero que vos torneis associados aos demônios.”

Às vezes vou a algumas igrejas, nas quais algumas pessoas me dizem o seguinte:

“- Pastor Caio, por que o senhor não dá uma 'soprada’ hoje, aqui, para que todos caiam?”

Então eu pergunto:

“- Mas... porque, irmão?”

Respondem-me:

“- É porque ontem pregou aqui o pastor ‘Fulano de Tal’ que não pregou com toda a unção
com que o senhor pregou esta noite, mas que soprou e caiu muita ,gente. Se o senhor
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soprar então, aí é que vai cair um monte de gente mesmo. Ainda mais que o povo está
com uma vontade enorme de cair.”

Eu respondi:

“ - Se Deus quiser derrubar qualquer um enquanto eu estiver pregando, Ele pode fazê-lo,
pois Ele é livre. Mas, eu?!... dar tampinha na testa das pessoas para que elas caiam?!...
Nunca!”

Creio que Deus pode derrubar pessoas diante do Seu poder, mas me preocupo muito
quando vejo tais coisas acontecerem na igreja com muita freqüência ultimamente. Porque,
num país como o nosso, no qual as pessoas estão acostumadas a levar passe, preocupa-
me que muitas delas - que estão entrando numa fila para receberem tapinha na cabeça, e
caírem - estejam substituindo o passe espírita pelo passe evangélico. Amedronta-me que a
visão pagã do espiritismo não tenha sido eliminada, e que alguém, oriundo da macumba e
do espiritismo, ainda sem multa consciência do que ocorre na igreja, ao ver tal coisa
acontecer, interprete-a como o passe evangélico. Paulo nos diz para termos cuidado:

“Vede, porém, que esta vossa liberdade não venha de algum modo a ser tropeço para os
fracos.”

(1 Coríntios 8:9)

Depreende-se, então, que tal coisa está sendo vista com uma mentalidade pagã. E se é
pagã, caiu-se no mesmo espírito sobre o qual Paulo fala em 1 Coríntios 10:19-20:

“Que digo, pois? Que o sacrificado ao ídolo é alguma coisa? Ou que o próprio ídolo tem
algum valor? Antes digo que as coisas que eles sacrificam, é a demônios que as
sacrificam, e não a Deus; e eu não quero que vos torneis associados aos demônios.”

É pela mesma razão que me preocupo muito com uma tal visão mágica que algumas
pessoas têm de objetos, tais como do lenço, do sal, da água fluidificada, porque, será que
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no nosso contexto, eles não funcionam apenas como uma cristianização de uma
mentalidade pagã, a qual continua estabelecendo os mesmos vínculos idolátricos do
passado?

Em segundo lugar, Paulo nos diz que a Igreja está sendo penetrada, de alguma forma, por
algo maligno, quando o exagero dita as regras da vida. A luta indômita e freqüente de
Paulo durante todo o seu ministério é a do equilíbrio, não deixando nunca que a
espiritualidade descambasse para o lado do exagero. Há três batalhas que ele enfrenta
para manter o equilíbrio.

A primeira é a batalha do legalismo x liberarismo. Escrevendo a epístola de Gálatas, nós o


vermos lidar com irmãos que defendem o legalismo. Já escrevendo à igreja de Corinto -
cidade portuária, com prostituição, turismo, beleza - ele alerta quanto à tendência dos seus
membros de afrouxarem a vida religiosa, quanto ao cuidado com o “vale tudo” da
espiritualidade, quanto a fugir da imoralidade, do adultério, da idolatria.

A segunda é a batalha do racionalismo x misticismo. Paulo diz, escrevendo aos coríntios,


que decidira nada mais saber a não ser de Jesus Cristo crucificado, com medo de que a fé
cristã se tornasse em algo inteiramente racionalista:

“Porque decidi nada saber entre vós, senão a Jesus Cristo, e este crucificado. E foi em
fraqueza, temor e grande tremor que eu estive entre vós. A minha palavra e a minha
pregação não consistiram em linguagem persuasiva de sabedoria, mas em demonstração
de Espírito e de poder, para que a vossa fé não se apoiasse em sabedoria humana; e, sim,
no poder de Deus.”

(I Coríntios 2:2-5)

Em Colossenses 2:18, Paulo nos alerta quanto ao culto aos anjos, diz-nos para termos
cuidado com as mentes que se dizem invadidas de visões sobrenaturais:

“Ninguém se faça árbitro contra vós outros, pretextando humildade e culto dos anjos,
baseando-se em visões, enfatuado sem motivo algum na sua mente carnal.”
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A terceira é a batalha da pobreza x prosperidade. Em II Coríntios 9:10-11a, Paulo


primeiramente fala da igreja da Macedônia que, inicialmente, havia sido pobre, passado
por tribulações, dificuldades. Mas, Paulo diz a ela que Deus é Deus de graça, O qual supre
abundantemente todas as coisas, interessando-Se em que haja prosperidade, para que,
prosperando, ela possa continuar a ser uma igreja generosa, abençoando a vida de outras
pessoas:

“Ora, aquele que dá semente ao que semeia, e pão para alimento, também suprirá e
aumentará a vossa sementeira, e multiplicará os frutos da vossa justiça. Enriquecendo-vos
em tudo para toda a generosidade.”

Porém, escrevendo I Timóteo 6:9-10; 17-19, Paulo fala da tendência de os irmãos ricos da
igreja de Timóteo estarem pensando apenas em prosperidade:

“Ora, os que querem ficar ricos caem em tentação e cilada, e em muitas concupiscências
insensatas e perniciosas, as quais afogam os homens na ruína e perdição. Porque o amor
do dinheiro é raiz de todos os males; e alguns, nessa cobiça, se desviaram da fé, e a si
mesmos se atormentaram com muitas dores. (...) Exorta aos ricos do presente século que
não sejam orgulhosos, nem depositem a sua esperança na instabilidade da riqueza, mas
em Deus que tudo proporciona ricamente para nosso aprazimento, que pratiquem o bem,
sejam ricos de boas obras, generosos em dar e prontos a repartir, que acumulem para si
mesmos tesouros, sólido fundamento para o futuro a fim de se apoderarem da verdadeira
vida.”

Cuidado com o dinheiro e com a ansiedade pela prosperidade material, porque trazem em
si mesmos o germe da destruição. Observemos como tais coisas parecem contraditórias:
primeiramente ele fala para um grupo que se deve ter confiança em Deus, crendo que Ele
é abençoador e, por isso, supre as necessidades de cada um, mesmo na precariedade e
escassez de recursos; depois, para um outro grupo, Paulo diz que se deve ter cuidado com
a prosperidade, porque ela pode matar.

Heresias são sempre verdades exageradas. Heresias só são perigosas porque partem de
pressupostos verdadeiros, mas que foram exacerbados, deturpados, absolutizados e
agigantados, obcecando a alma e a mente humana, tirando-lhe o equilíbrio e, por fim,
“demonizando-a”.
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PRINCÍPIOS IMPORTANTES

Há, porém, alguns princípios que, se observados, ajudam-nos a exercer discernimento


espiritual.

O primeiro refere-se a uma pergunta que sempre devemos fazer, ao olharmos para uma
instituição religiosa, seja ela uma igreja, seja ela uma missão: quem é que está sendo
glorificado através dela? Quem é que recebe glória? É o líder da instituição? É a instituição
em si? Preocupa-me muito quando denominações evangélicas históricas fazem cultos
comemorativamente exclusivos, anunciando a sua “presbiterianicidade”, a sua
“batisticidade”, a sua “luteraneidade”, e assim por diante. Devemos ter cuidado. Deus não
divide Sua honra com igreja (seja ela qual for), nem com o líder dela (seja ele quem for). A
glória é única e exclusivamente de Deus.

Em segundo lugar devemos ver se a Palavra de Deus é o centro. Se a Palavra não for
mais centro, mas for o sopro, a queda, uma nova revelação, é uma nova apropriação da
Palavra que Pedro não soube, Paulo não soube, nem Jesus soube. Então, cuidado! Se o
que se ensina não está descrito nas Escrituras, não creia, mesmo que seja praticado pelo
homem mais santo da igreja, pelo homem mais santo da denominação.

Em terceiro lugar, devemos ver se há equilíbrio, porque o diabo é o pai do exagero, o qual
também é mentira. Mentira não é apenas negar uma verdade, mas também exagerá-la,
exacerbá-la. O diabo é o pai do exagero.

Faz vinte anos que estou caminhando com Jesus, fazendo um esforço enorme para manter
o equilíbrio. Quando me converti, a ênfase era carismática, sendo a espiritualidade de
certa forma mensurada pela capacidade de falar em línguas, expulsar demônios, profetizar.
A primeira pergunta que era feita a um convertido naqueles dias era:

“- Você é batizado no Espírito Santo?”

Ou, então:

“- Você já falou em línguas?”


183
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Nessa ocasião, eu já era pastor presbiteriano, em Manaus. Pregando nos lugares mais
diversos, eu era abordado por irmãos na fé que me perguntavam:

“- O senhor fala em línguas?”

Eu lhes respondia:

“- Sim, falo.”

Falo, sim. Às vezes, até mesmo nos púlpitos das igrejas mais tradicionais. Falo, mas falo
baixinho. Ninguém precisa me ouvir falar. Só Deus, porque o próprio apóstolo Paulo disse
que esse dom não se destina à edificação de outros, mas à individual:

“Pois quem fala em outra língua não fala a homens, senão a Deus, visto que ninguém o
entende, e em espírito fala mistérios.”

(1 Coríntios 14:2)

Perguntavam-me ainda:

“- O senhor expulsa demônios?”

Não havia como negar, uma vez que na porta do meu escritório, às vezes se formava uma
fila só de endemoninhados, parecendo um INPS de possessos. Então me diziam:

“- O senhor é carismático, então!”

Eu lhes respondia:
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“- Não, eu sou cristão!'”

“- Mas por que você não é carismático?”

“- Porque eu prefiro continuar a ser apenas cristão.” - respondia.

Eles ficavam me olhando, e arriscavam:

“- Você é diferente. Faz as coisas que os carismáticos fazem, mas se nega a dizer que é
um deles...”

Eu, incisivamente, respondia, então:

“- Eu não digo que sou carismático, porque ser carismático é ser pequeno demais. Ser
cristão é maior! Eu sou cristão!"

Depois, veio uma outra ênfase, a qual falava que as grandes questões eram aquelas
relacionadas à injustiça, à corrupção, à opressão e à tirania. Os livros mais lidos naquela
ocasião eram os do profeta Isaías, Jeremias, Oséias e Amós. Os defensores da Teologia
da Libertação, ouvindo-me pregar, diziam:

“- Esse é um dos nossos!”

Disseram-me certa vez:

“- Que coisa maravilhosa! Nunca tínhamos visto um carismático progressista.”

Eu lhes dizia:
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“- Mas eu não sou nem carismático, nem progressista.”

“- Então, o que o senhor é?” - perguntaram.

“- Eu faço um esforço enorme para ser crente.”- respondia.

Eles insistiam:

“- Então... Como é que o senhor vê a Teologia da libertação?”

“- Há coisas muito interessantes nela. Mas, o fundamento da minha fé, da minha vida e de
tudo que penso está na Bíblia. Quando falo contra a corrupção, contra a injustiça, contra a
miséria, tais coisas não têm nada a ver com o ponto de vista de teologias humanas, mas
têm a ver com o que diz Isaías, Jeremias, Oséias. Enfim, têm a ver com a Palavra de
Deus. Só isso.”

Muitos ficaram chateados comigo, em virtude desse meu posicionamento. Eu lhes disse:

“- Eu não posso me envolver com isso, uma vez que essa teologia passa. E eu não quero,
mais à frente, ter que voltar atrás e pedir desculpas às pessoas porque me equivoquei,
porque ‘embarquei numa furada’.”

Em quarto lugar, devemos ver qual é a consciência que as pessoas têm na igreja: se é
consciência cristã ou é consciência pagã.

Em quinto lugar, devemos ver se a entidade religiosa tem existência para fora de si, ou se
existe para fazer propaganda de si mesma, garantindo sua sobrevivência.

Em sexto lugar, devemos ver se há espaço para o que é novo nele, tendo Deus portas
abertas para agir; devemos ver se ela está aberta para mudanças promovidas pela
atuação do Espírito Santo.
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Em sétimo lugar, devemos ver se há sinais regulares de arrependimento, dando os seus


membros provas visíveis e sinceras de contrição e de confissão de pecados, porque se
houver apenas triunfalismo, Deus não está nela. Triunfalismo é atitude de fariseu, ao dizer:

“- Graças a Ti, ó Deus, porque eu não sou pagão, não sou pecador! Graças a Ti porque
sou honesto, Senhor!”

Quando a igreja descamba para o lado do triunfalismo, ela se torna estéril, árida, sem vida.
Mas tem que haver choro, confissão de pecado, quebrantamento, para que possa haver
perdão e justificação.

Em oitavo lugar, devemos ver como o dinheiro é administrado pela instituição religiosa,
vendo, ainda, se ele é valorizado acima da medida que deve ser. Devemos ver se se fala
mais em dinheiro do que em Jesus.

Em nono lugar, devemos ver como a questão do poder é tratada. Veja se há na instituição
religiosa um tirano, um dono absoluto, um ditador, porque, se houver, dela Jesus não é o
cabeça.

Em décimo lugar, devemos ver se o amor e a justiça “temperam-se” um ao outro.

Devemos ver se na instituição religiosa há amor e há justiça. Vejamos se o exercício da


justiça não é uma prática justiceira; e que o amor não é frouxo, mas justo e misericordioso.

Na batalha espiritual, nós não temos apenas que lidar com a “demonização” da sociedade,
mas também com a “demonização” do sagrado. Cabe a nós, hoje e sempre, ver se a Igreja
continua confessando que Jesus veio em carne para destruir as obras do diabo, ou se ela
agora já se contenta com o fato de que ela mesma se tornou um fim em si mesma.

Exercendo tais discernimentos, estaremos preparados não apenas para expulsar


demônios que se manifestam em pessoas, cidades, culturas e nações, mas também
capacitados para perceber a ação dessas forças dentro de instituições cristas, disfarçadas
em regras morais, tradições e ênfases antibíblicas.
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CAPÍTULO 13

COMO ESTAR PREPARADO PARA VENCER PRINCIPADOS E POTESTADES

“Ele vos deu vida, estando vós mortos nos vossos delitos e pecados, nos quais andastes
outrora, segundo o curso deste mundo, segundo o príncipe da potestade do ar, do espírito
que agora atua nos filhos da desobediência, entre os quais também todos nós andamos
outrora, segundo as inclinações da nossa carne, fazendo a vontade da carne e dos
pensamentos e éramos por natureza filhos da ira, como também os demais. Mas Deus,
sendo rico em misericórdia, por causa do grande amor com que nos amou, e estando nós
mortos em nossos delitos, nos deu vida juntamente com Cristo - pela graça sois salvos, -, e
juntamente com ele nos ressuscitou e nos fez assentar nos lugares celestiais em Cristo
Jesus.”

(Efésios 2:1-6)

“A mim, o menor de todos os santos, me foi dada esta graça de pregar aos gentios o
evangelho das insondáveis riquezas de Cristo, e manifestar qual seja a dispensação do
mistério desde os séculos oculto em Deus, que criou todas as coisas, para que, pela igreja,
a multiforme sabedoria de Deus se torne conhecida agora dos principados e potestades
nos lugares celestiais.”

(Efésios 3:8-10)

Até aqui vimos pontos positivos, pontos negativos e perigos do movimento de batalha
espiritual. Vimos também quais são os personagens espirituais contra os quais lutamos.
Vimos também como tal luta se trava no nível pessoal, social e cultural, e como ela se deu
no universo cósmico, sendo a Cruz a nossa vitória.

No capítulo anterior, vimos como as instituições - mesmo as cristãs - podem ser


“demonizadas”, quando perdem o referencial da sua missão e do seu propósito de
existência.

Neste capítulo, vamos tentar esboçar alguma coisa que nos pode ensinar como estar
preparados para enfrentar a batalha espiritual. Isto porque a Carta de Paulo aos crentes de
Éfeso pode ser lida sob várias perspectivas. Nela há alguns temas em torno dos quais
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certas verdades gravitam. Um dos temas mais fortes dessa carta é o que se refere às
regiões celestes, aos principados e potestades e às relações dessas dimensões espirituais
com a vivência e com a prática do povo de Deus no mundo. A prova disso é que nos dois
textos da Carta que lemos, Paulo está afirmando as regiões celestiais. Primeiramente, ele
fala:

“(...) por causa do grande amor com que nos amou, e estando nós mortos em nossos
delitos, nos deu vida juntamente com Cristo – pela graça sois salvos, -, e juntamente com
ele nos ressuscitou e nos fez assentar nos lugares celestiais em Cristo Jesus.”

Em seguida, ele ainda diz:

“(...) pela igreja, a multiforme sabedoria de Deus se torne conhecida agora dos principados
e potestades nos lugares celestiais.”

Por último, ele ensina a viver, a se preparar para a existência, e conclui:

“Quanto aos mais, sede fortalecidos no Senhor e na força do seu poder. Revesti-vos de
toda a armadura de Deus, para poderdes ficar firmes contra as ciladas do diabo; porque a
nossa luta não é contra o sangue e a carne, e, sim, contra os principados e potestades,
contra os dominadores deste mundo tenebroso, contra as forças espirituais do mal, nas
regiões celestes.”

Constata-se, a partir disso, que há uma preocupação de Paulo em ensinar a estarmos


preparados para enfrentar os principados e as potestades, que existem com tanta
realidade quanto reais são as coisas visíveis que apalpamos e vemos.

ENFRENTANDO PRINCIPADOS E POTESTADES

E como estar preparados para enfrentar os principados e potestades?


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Em primeiro lugar, é necessário que, primeiramente, tenhamos sido libertos do império das
trevas. Não podemos sair por aí querendo enfrentar principados e potestades com a vida
ainda não liberta do império das trevas. Isso é de suma importância. Demônios se
submetem ao nome de Jesus, em razão do Seu nome. Até falsos profetas que não O
conhecem podem expulsar demônios, conforme o próprio Jesus o diz, em Mateus 7:22-23:

“Muitos, naquele dia, hão de dizer-me: Senhor, Senhor! Porventura não temos nós
profetizado em teu nome, e em teu nome não expelimos demônios, e em teu nome não
fizemos muitos milagres? Então lhes direi explicitamente: Nunca vos conheci. Apartai-vos
de mim, os que praticais a iniqüidade.”

Entretanto, precisamos saber que, de vez em quando, o diabo resolve dar uma “surra”
violenta em alguns filhos de Ceva - exorcistas ambulantes que andam por aí expulsando
demônios, sem conhecerem a Jesus (Atos 1913-14). O diabo, porém, sabe dizer a tais:

“(...) Conheço a Jesus e sei quem é Paulo, mas, vós, quem sois?”

(Atos 19:15b)

Portanto, a primeira coisa que precisamos saber para estarmos preparados para enfrentar
os principados e as potestades é se realmente fomos libertos do império das trevas. Paulo
fala acerca disso, dizendo que se fomos libertos de uma vida que se caracterizava por uma
atitude de conformação aos tempos, de uma vida que se submetia às ingerências e às
injunções do império das trevas, não podemos andar “segundo o curso deste mundo,
segundo o príncipe da potestade do ar, do espírito que agora atua nos filhos da
desobediência, entre os quais também todos nós andamos outrora, segundo as inclinações
da nossa carne fazendo a vontade da carne e dos pensamentos.” (Efésios 2:2-3a) . Com
isto, Paulo quer dizer que o curso deste mundo nada mais é do que seguir e adotar para si
os padrões, valores, hábitos e referenciais deste mundo. Paulo quer dizer, em outras
palavras:

“- Um dia nós fomos libertos do império das trevas. Um dia, também estivemos sob delitos
e pecados. Entretanto, fomos retirados desse império. O que deve nos dar essa certeza é
uma vida totalmente diferente daquela que antes vivíamos, a qual se caracterizava por
adotar para si os padrões e valores deste mundo.”
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Paulo ainda nos diz mais:

“- A nossa vida, que antes estava sob o domínio do império das trevas, era caracterizada
por total submissão às forças espirituais que influenciam a humanidade, ou seja, segundo
o príncipe da potestade do ar, o qual atua nos filhos da desobediência. Portanto, se somos
libertos do império das trevas, já não temos mais canal algum aberto com essas forças
espirituais malignas. Porém, andamos segundo o Espírito Santo, conforme a mente de
Cristo, consoante a vontade de Deus.”

Em segundo lugar, a vida, debaixo do poder do império das trevas, era marcada pela
absolutização do desejo da carne, caracterizando-se por ser uma existência segundo as
inclinações da nossa própria carne e dos nossos pensamentos. Sob essa perspectiva, o
desejo do corpo e os pensamentos devem ser sempre absolutizados, estimulados,
liberados e realizados. Paulo fala acerca disso, quando diz que “também todos nós
andamos outrora, segundo as inclinações da nossa carne, fazendo a vontade da carne e
dos pensamentos.”

(Efésios 2:3).

Paulo nos diz que Ele - Jesus - nos deu vida, estando nós mortos em nossos delitos e
pecados (Efésios 2:1). Vivíamos sob o poder do pecado, tanto externamente, no que se
referia às questões sociais (do mundo em direção à alma), quanto internamente, no que
tangia aos nossos próprios desejos carnais e dos nossos pensamentos, que geravam
conflitos tremendos no espírito (da carne e da mente em direção à alma). No entanto, Deus
nos libertou desse estado de opressão, pelo Seu grande amor por nós:

“Mas Deus, sendo rico em misericórdia, por causa do grande amor com que nos amou, e
estando nós mortos em nossos delitos, nos deu vida juntamente com Cristo - pela graça
sois salvos, - , e juntamente com ele nos ressuscitou e nos fez assentar nos lugares
celestiais em Cristo Jesus.”

(Efésios 2:4-6)

Ainda que não estejamos plenamente assentados nos lugares celestiais, já desfrutamos,
de alguma forma, as bênçãos de um dia poder estarmos lá assentados. É uma bênção que
não se realiza só prospectivamente, ainda que se concretize plenamente só no futuro. É,
também, uma bênção para o agora, uma bênção “hic et nunc”.
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Precisamos saber, portanto, que principados e potestades só são vencidos por aqueles
que já estão sentados em lugares espirituais em Cristo Jesus.

O Presidente da República não pode fazer nada contra os demônios. Nem ministros de
estado, nem governadores, nem deputados e senadores. Tais pessoas podem realizar
projetos em âmbitos específicos, mas, no âmbito espiritual, no que se refere ao
enfrentamento de potestades e principados, só podem aqueles que morreram com Cristo,
que ressuscitaram com Ele e que estão assentados nos lugares espirituais com Ele, é que
podem desembainhar a espada, para enfrentar as forças espirituais malignas, em nome de
Jesus.

Em terceiro lugar, é preciso que vivamos numa busca constante de unidade. É um contra-
senso enfrentar principados e potestades com um exército todo dividido, no qual há ódio,
amargura, falta de reconciliação, portanto, sem objetivo comum. É um absurdo, então,
haver dissensões entre nós, porque, havendo conflitos internos, não teremos forças para
enfrentar os principados e potestades nas regiões celestes. E em razão disso que Paulo
põe o tema dos principados e potestades no centro (Efésios 2:11-3:16), desenvolvendo em
torno dele toda uma discussão a respeito da unidade da Igreja. Paulo fala algumas coisas
interessantes acerca disso.

Primeiramente, Paulo diz que a unidade é fruto da compreensão da obra da Cruz:

“Mas agora, em Cristo Jesus, vós, que antes estáveis longe, fostes aproximados pelo
sangue de Cristo. Porque ele é a nossa paz, o qual de ambos fez um; e, tendo derrubado a
parede da separação que estava no meio, a inimizade aboliu na sua carne a lei dos man-
damentos na forma de ordenanças, para que dos dois criasse em si mesmo um novo
homem, fazendo a paz, e reconciliasse ambos em um só corpo com Deus, por intermédio
da cruz, destruindo por ela a inimizade.”

(Efésios 2:13-16)

Não é a denominação que nos une. Nós - Igreja - só conseguimos viver em unidade se,
obcecadamente, colocarmos os nossos olhos na cruz, no sangue do Cordeiro. É olhar para
o outro, absolutamente diferente de nós - às vezes estranho, ou até mesmo bizarro -
reconhecendo que ele é lavado no sangue do Cordeiro como nós.
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Em segundo lugar, Paulo diz que é preciso entender a unidade como fruto de uma atitude
madura. De um lado, olhamos para a Cruz de Cristo, que nos uniu, que nos reconciliou,
que pos por terra diferenças étnicas, diferenças sociais, preconceitos e posturas antigas,
convergindo-nos uns para os outros, com base no sangue do Cordeiro. De outro lado,
Paulo diz que, para isso, é necessária uma atitude amadurecida, porque, se for de criança,
não une:

“Rogo-vos, pois, eu, o prisioneiro no Senhor, que andeis de modo digno da vocação a que
fostes chamados, com todo humildade e mansidão, com longanimidade, suportando-vos
uns aos outros em amor, esforçando-vos diligentemente por preservar a unidade do
Espírito no vínculo da paz."

(Efésios 4:1-3)

Em outras palavras, Paulo está dizendo:

“- Se não houver maturidade, é impossível haver unidade. Para que haja unidade, é
preciso que as pessoas estejam vivendo com humildade, às vezes tendo que ‘engolir’
coisas, sendo pacientes, não impondo ‘no peito e na raça’ suas vontades; é imprescindível
que sejam flexíveis, mansas; que falem a verdade em amor; que sejam longânimas, crendo
que o tempo pode ser responsável pela maturação do outro; que tenham a capacidade de
olhar para o passado e aprender com ele; que se suportem umas as outras em amor.”

Paulo diz, ainda, que é preciso haver um esforço diligente, consciente para se obter a
unidade, a fim de que se mantenha e se preserve o vínculo da paz no Espírito, sendo
necessário muito cuidado, porque o corpo é de Cristo. Portanto, não o dividamos.

Em terceiro lugar, Paulo diz que é preciso entender que a unidade resulta de um
discernimento adulto de nossas origens comuns. Paulo fala de sete referenciais de origem,
dos quais precisamos sempre nos lembrar, os quais, ainda, caracterizam a irmandade
essencial no corpo de Cristo, mais importantes do que os muitos fatores que podem causar
divisão à Igreja. Eis os sete referenciais:
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“Há somente um corpo e um espírito, como também fostes chamados numa só esperança
da vossa vocação; há um só Senhor, uma só fé, um só batismo; um só Deus e Pai de
todos, o qual é sobre todos, age por meio de todos e está em todos.”

(Efésios 4:4-6)

Há muitas denominações evangélicas, mas, Jesus, Ele tem só um corpo. Não há o espírito
dos presbiterianos, o espírito dos batistas, o espírito dos pentecostais, etc. Há, porém, um
só Espírito, O qual faz o pentecostal dançar e o reformado enlevar-se cantando hinos
tradicionais. Só há uma esperança: é a de sermos resgatados do corpo mortal em que
vivemos para uma vida total, plena e eterna em Jesus Cristo, o nosso Senhor, O qual nos
vocacionou para a salvação. Há um só Senhor, que é sobre todos, que é o Senhor Jesus.
Se Ele é nosso Senhor, somos irmãos. Há uma só fé, não se fazendo referencia alguma a
nenhum corpo doutrinário harmônico; porém, de uma única fé, da qual se diz:

“Porque pela graça sois salvos, mediante a fé; e isto não vem de vós, é dom de Deus; não
de obras, para que ninguém se glorie.”

(Efésios 2:8-9)

Há um só batismo, que não e por imersão, nem por aspersão, nem por efusão, mas pelo
Espírito Santo. É um batismo que não é na água, mas na morte e na ressurreição de
Jesus. É um batismo que não é feito com símbolos. Quando alguém nos estertores da
vida, sem água, sem pastor, sem ninguém, sem coisa alguma, diz, tal como o ladrão da
cruz:

“Jesus, lembra-te de mim quando vieres no teu reino.”

(Lucas 23:42)

Esse alguém é batizado com Cristo, sepultado com Ele, ressuscitado com Ele, e ainda O
ouve dizer:
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“(...) Em verdade te digo que hoje mesmo estarás comigo no paraíso.”

(Lucas 23:43)

Há um só Pai, O qual é sobre todos, age por meio de todos e está em todos. Se olhamos
para cima, e chamamos a Deus de Pai, somos irmãos. A teologia que afirma o Pai, afirma
que há o Filho e o Espírito Santo. Não somos irmãos na teologia que só afirma o Pai, nem
na teologia que só afirma Jesus, nem na teologia que só afirma o Espírito Santo. Mas, na
teologia em que Pai, Filho e Espírito Santo são afirmados, não importa o quanto diferentes
sejamos, nós somos irmãos.

Em quarto lugar, Paulo diz que a unidade se concretiza no esforço de harmonia


doutrinária, dizendo, ainda, que tal harmonia deve ser o alvo, o objetivo de todos nós.
Quais são as causas que nos impelem a buscar a harmonia doutrinária, objetivando a
diminuição das distâncias, dos extremismos, das discrepâncias? Paulo nos diz que elas
provêm do equilíbrio dos dons ministeriais:

“E ele mesmo concedeu uns para apóstolos, outros para profetas, outros para
evangelistas, e outros para pastores e mestres, com vistas ao aperfeiçoamento dos santos
para o desempenho do seu serviço, para a edificação do corpo de Cristo.”

(Efésios 4:11-12)

A maturidade de se buscar a harmonia doutrinária surge quando a Igreja recebe


ministração variada e diversa, quando não ouve uma teologia que é um “samba de uma
nota só”, mas quando está ouvindo vozes que se equilibram. E por isso que Paulo fala que
Deus concedeu uns para apóstolos, outros para pastores, outros para evangelistas, etc.,
com o objetivo do aperfeiçoamento do corpo de cristo, “até que todos cheguemos à
unidade da fé e do pleno conhecimento do filho de Deus, à perfeita varonilidade, à medida
da estatura da plenitude de Cristo.” (Efésios 4:13).

Quando uma igreja é só de evangelistas, ela perde o equilíbrio, só se falando em


conversão, em apelo. As famílias estão em crise, membros brigando uns com os outros,
crentes passando pelas dificuldades as mais diversas, mas não há uma palavra para trazer
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cura à família, à alma; nenhuma atitude que vá em auxílio do que está necessitado. A
igreja, porém, só fala em conversão.

Quando a igreja é só de profetas, ela adoece, ficando com uma tendência enorme de
amargurar-se, uma igreja um tanto ufanista acerca da sua relação com Deus e da Sua
Palavra, tornando-se uma comunidade que apenas celebra o seu poder de falar, não
ensinando, esquecendo-se dos elementos doutrinários apostólicos mais amplos.

Quando a igreja é só de pastores, ela fica enferma, não tendo voz para fora, curando
almas, não havendo ensino e exortação.

Mas, quando a igreja tem pluralidade de ministérios, e os realiza à luz da Palavra de Deus,
alcança-se a unidade, no vínculo da fé, em nome de Jesus.

Portanto, para que a unidade se concretize, ela tem de proceder do equilíbrio entre os
dons ministeriais.

Em quinto lugar, Paulo diz que a unidade vem do nosso compromisso com a fé. A unidade
funciona quando ela não é um fim em si mesma, não ocorrendo para si própria. É em razão
disso que Paulo discrimina quais são os objetivos da unidade:

“Com vistas ao aperfeiçoamento dos santos para o desempenho do seu serviço, para a
edificação do corpo de Cristo.”

Em sexto lugar, Paulo diz que a unidade provém do nosso desencantamento com relação
às invenções teológicas. Só conseguimos caminhar em direção ao amadurecimento
quanto à harmonia doutrinária, quando nós deixamos de ser meninos, não nos deixando
enganar por qualquer coisa:

“Até que todos cheguemos à unidade da fé e do pleno conhecimento do filho de Deus, à


perfeita varonilidade, à medida da estatura da plenitude de Cristo, para que não mais
sejamos como meninos, agitados de um lado para outro, e levados ao redor por todo vento
de doutrina, pela artimanha dos homens, pela astúcia com que induzem ao erro.”

(Efésios 4:13-14)
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Unidade só é possível, quando a Igreja está amadurecida, não se abalando por doutrinas
que entram e saem de moda de tempos em tempos.

Em sétimo lugar, Paulo diz que a unidade vem da capacidade de harmonizarmos verdade
e amor.

“Mas, seguindo a verdade em amor, cresçamos em tudo naquele que é o cabeça, Cristo,
de quem todo o corpo, bem ajustado e consolidado, pelo auxílio de toda junta, segundo a
justa cooperação de cada parte, efetua o seu próprio aumento para a edificação de si
mesmo em amor.”

(Efésios 4:15-16)

É o equilíbrio entre o amor e a verdade, mas não de um amor licencioso, nem da verdade
tirana. Mas da igreja que equilibra o amor com a verdade, e a verdade com amor.

O que isso tudo tem a ver com principados e potestades?

Paulo diz que, quando a Igreja vive no espírito de reconciliação e de unidade, ela ganha
ascendência sobre os principados e potestades. A Igreja pode “amarrar” todos os
demônios, mas se os crentes estiverem brigando uns com os outros, sem paz, sem
harmonia, tal ação não tem impacto nas regiões celestiais. O diabo gargalha da Igreja,
quando a vê fazendo batalha espiritual, mas com o corpo todo desajustado, cheio de
ressentimentos, mágoas, amarguras e crise. É o que a Palavra de Deus nos diz:

“Para que, pela igreja, a multiforme sabedoria de Deus se torne conhecida agora dos
principados e potestades nos lugares celestiais.”

(Efésios 3:10)

Agora é a hora de buscarmos a unidade da Igreja, não a deixando para o futuro. Esta é a
hora de embasbacarmos, em nome de Jesus, os principados e as potestades, deixando-os
perplexos, por vivermos a unidade no corpo de Cristo.
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Em quarto lugar, é preciso buscar saúde para a vida moral, espiritual, conjugal, familiar e
profissional. Não basta sabermos que fomos libertos do império das trevas, e nem é só
termos um bom convívio com o nosso irmão na busca da unidade, mas é preciso que
olhemos para dentro de nós mesmos para vermos se há, no nosso interior, saúde moral,
espiritual, conjugal, familiar (em termos mais amplos) e profissional (Efésios 6:5-9).

Falando de vida moral, Paulo diz:

“Mas a impudicícia, e toda sorte de impurezas, ou cobiça, nem sequer se nomeie entre
vós, como convém a santos, nem conversação torpe, nem palavras vis, ou chocarrices,
coisas essas inconvenientes (...) Sabei, pois, isto: nenhum incontinente, ou impuro, ou
avarento, que é idólatra, tem herança no reino de Cristo e de Deus. (...) E não sejais
cúmplices nas obras infrutíferas das trevas; antes, porém reprovai-as.”

(Efésios 53-5,11)

Paulo afirma tais realidades, mas nos admoesta a lembrarmos que somos luz no Senhor:

“Pois outrora éreis trevas, Porém agora sois luz no Senhor; andai como filhos da luz
(porque o fruto da luz consiste em toda bondade, e justiça, e verdade), provando sempre o
que é agradável ao Senhor.”

(Efésios 5:8-10)

Lembro-me de quando ainda era pastor em Manaus (por volta de 1977). Um dia eu estava
em casa, à noite. E na hora do jantar, chegou a nossa casa um pastor trazendo um outro
pastor, este absolutamente endemoninhado. Possesso, olhando para as pernas da minha
irmã, começou a falar toda sorte de palavras torpes e vulgares, dizendo, ainda, o que
queria fazer às mulheres que estavam na casa. Olhando também para mim, e dirigindo-me
um monte de acusações, disse:

“- Eu usei esse homem aqui para o acusar, dizendo que você é tudo o que não presta.”
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E eu ouvindo tudo aquilo. Às vezes, ele voltava um pouco à lucidez. Lá pelas tantas eu
olhei para ele, e lhe recitei Hebreus 4:12-13:

“Porque a palavra de Deus é viva e eficaz, e mais cortante do que qualquer espada de dois
gumes, e penetra até ao ponto de dividir alma e espírito, juntas e medulas, e apta para
discernir os pensamentos e propósitos do coração. E não há criatura que não seja
manifesta na sua presença; pelo contrário todas as coisas estão descobertas e patentes
aos olhos daquele a quem temos de prestar contas.”

Logo em seguida, perguntei-lhe:

“- Qual é o seu nome?”

Tão logo terminei de fazer -lhe a pergunta, aquele pastor foi arremessado a uns três
metros de distância, rolando pelo chão da minha casa, depois pelo quintal, uivando como
um animal raivoso, e dizendo:

“- Eu sou o demônio. Eu entrei nesse desgraçado, porque ele estava pastoreando no


interior do Amazonas, e estava adulterando com uma caboclinha que era empregada dele.
Todo dia ia para a cama com ela. Esse desgraçado teve a coragem de me desafiar em
praça pública, chegando para um bruxo que falava em meu nome, dizendo: ‘- Bruxo, eu o
repreendo!’ Eu falei para ele, através do bruxo: ‘-Quem é você para me repreender, seu
adúltero, hipócrita! Você está vindo da cama de adultério. Como você tem coragem de falar
comigo? Vou entrar em você, e vou fazê-lo pular como um possesso na frente de todos.’ E
foi por causa disso que entrei nele.”

Eu o levei para fora da minha casa, mais ou menos às três horas da manhã. O demônio,
porém, continuava a dizer:

“- Eu saio, eu saio! Mas deixa eu entrar no guarda-noturno, que está ali, perto daquele
poste.”
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“- Você não vai entrar em ninguém.” - eu lhe respondi. “- Deixa, então, eu entrar no
cachorro.”- ele insistia.

Quando acabou de falar, todos os cachorros da vizinhança começaram a latir juntos.

“- Você não vai entrar em ninguém”. - eu lhe disse novamente.

“- Para onde é que você vai me mandar?” - ele me perguntou.

Eu lhe respondi:

“- Eu não recebi poder de Deus para traçar o destino espiritual de nenhuma criatura dEle...
nem do seu! Quem disse para onde você vai foi o Senhor Jesus. Agora, uma coisa eu lhe
digo: eu recebi autoridade, em nome de Jesus, para lhe dizer que você não vai ficar nele. E
eu o entrego ao Senhor Jesus, que sabe para onde vai mandá-lo. Sai dele, agora, em
nome de Jesus!”

O demônio deixou aquele pastor, o qual caiu num pranto tremendo. Ele me perguntou o
que havia acontecido. Contei-lhe toda a história. Ao final, ele me perguntou:

“- Crente fica possesso?”

“- Não! Mas, pastor fica. Crente não fica. Quem é batizado, selado no Espírito Santo da
promessa, habitado pelo Senhor Jesus... não tem diabo que toque nele, em nome de
Jesus.” - eu lhe respondi.

O diabo pode oprimir, pode pressionar, pode tentar induzir, pode angustiar, pode tocar na
carne; mas, possuir a consciência de um ser que foi comprado e lavado pelo sangue de
Jesus, nunca! Se o contrário acontecer, repreenda, em nome de Jesus.
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“- Tudo isso aconteceu- eu lhe disse- porque você aprendeu a pregar, era pastor...

Você só nunca se converteu, nunca encontrou a Jesus de fato. Você é papagaio de pirata
no navio da igreja. Agora, vai para casa, e jejue até encontrar um lugar de
arrependimento.”

Dois dias depois, recebi um bilhete dele, que dizia:

“Pastor, duas horas atrás, encontrei um lugar de arrependimento. Há 48 horas que não
como, que minha mulher não come, que meus filhos não comem. Nem a minha filhinha de
um ano de idade comeu. Nós choramos j untos, porque o meu coração estava duro como
pedra, até hoje de manhã, quando a convicção esmagadora do meu pecado se abateu
sobre mim e a luz da Cruz de Cristo resplandeceu na minha alma.”

Alguns anos depois, encontrei-me com ele no Geração 79. Cinco anos mais tarde,
encontramo-nos de novo, sendo ele pastor no interior de Minas Gerais. Há dois anos
recebi um recado dele por alguém a quem ele pedira:

“- O Pastor ‘Fulano de Tal’ mandou dizer que nunca mais o maligno tocou nele, e que vive
para honrar o nome do Senhor Jesus.”

Se quisermos vencer principados e potestades, não brinquemos com a impudicícia, nem


com a impureza, nem com a cobiça, nem com a conversação torpe, nem com palavras vãs,
nem com avareza, nem com idolatria, nem sejamos cúmplices com as obras das trevas.
Pelo contrário, enchamos a alma com ações de graça, com bondade, com justiça e com
verdade, porque esses são os frutos da luz.

Paulo não se refere apenas à vida moral, dizendo que somente esta tem que estar sadia.
Mas também se refere à vida espiritual. Em Efésios 5:15-21, ele define alguns quadros de
saúde espiritual.

Primeiramente, ele diz que é preciso ser prudente, e não tolo:


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“Portanto, vede prudentemente como andais, não como néscios, e, sim, como sábios.”

(Efésios 5:15)

Prudência é algo que está faltando muito na igreja evangélica brasileira, mas que precisa,
urgentemente, ser incorporada à nossa espiritualidade.

Em segundo lugar, Paulo diz que é preciso ser objetivo:

"Remindo o tempo, porque os dias são maus.”

(Efésios 5:16)

Em terceiro lugar, ele diz que é preciso haver plenitude do Espírito Santo na alma:

“E não vos embriagueis com vinho, no qual há dissolução, mos enchei-vos do Espírito.”

(Efésios 5:18)

Em quarto lugar, ele diz que é preciso haver adoração, cantando-se salmos e hinos
espirituais ao Senhor:

“Falando entre vós com salmos, entoando e louvando de coração a o Senhor, com hinos e
cânticos espirituais”.

(Efésios 5:19)
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Em quinto lugar, Paulo diz que é preciso haver um coração grato:

“Dando sempre graças por tudo a nosso Deus e Pai, em nome de nosso Senhor Jesus
Cristo.”

(Efésios 5:20)

Em último lugar, Paulo diz que é preciso haver sujeição, humildade, e ouvir o outro:

“Sujeitando-vos uns aos outros no temor de Cristo.”

(Efésios 5:21)

Sem esses pré-requisitos, desenvolve-se uma espiritualidade luciferiana. Se não


desenvolvermos as características acima descritas na nossa espiritualidade, podemos cair
naquela síndrome.

Paulo diz que não só deve haver saúde moral e espiritual, mas também saúde conjugal.
Não adianta ir à praça pública “amarrar” demônios, deixando-se a mulher “amarrada” em
casa. Tenho ouvido ultimamente o seguinte tipo de comentário:

“- Olha, pastor, eu aprendi que toda vez que a minha mulher está brigando comigo é obra
do diabo. Eu logo digo: ‘- Eu o repreendo em nome de Jesus!’”

“- Aí você soltou o diabo em casa!” – eu argumento.

Repreende- se o diabo desse modo num possesso na rua. Em casa, nós o tratamos com
amor. Tudo o que o diabo quer em casa é que você viva o ódio. Problemas malignos em
casa só são resolvidos com amor.
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As mulheres devem desenvolver uma submissão lúcida aos maridos, porque estes são o
cabeça da mulher, assim como Cristo é o cabeça da Igreja:

“As mulheres sejam submissas a seus próprios maridos, como ao Senhor; porque o marido
é o cabeça da mulher, como também Cristo é o cabeça da igreja, sendo este mesmo
salvador do corpo.”

(Efésios 5:22-23)

Paulo não está sendo romântico, dizendo, por exemplo, às mulheres:

“- Sejam submissas a vossos maridos, porque eles são maravilhosos.”

Não, ele não diz isso. Eu conheço poucas mulheres que podem dizer assim:

“- Eu me submeto ao meu marido com inteiro prazer porque ele é maravilhoso.”

Mas Paulo não tem romantismos: submissão ao marido - apesar do marido -, porque ele é
o cabeça da mulher, tal como Cristo é o cabeça da Igreja.

Não só é necessário ter uma submissão lúcida ao marido, como também um respeito
singelo por ele:

“(...) e a esposa respeite a seu marido.”

(Efésios 5:33b)

Não se trai o marido, não se deve enganá-lo, não falando às amigas de como ele ficou
impotente na última relação sexual, não dizendo para ninguém que já faz dois anos que
você não tem um orgasmo... Eu fico chocado quando ouço mulheres falando sobre suas
intimidades com o marido, o que ele quis ou não fazer da última vez. Isso é o mesmo que
retirar a roupa do marido em praça pública. Respeite o seu marido.
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Aos maridos, Paulo diz que eles devem amar as suas próprias mulheres, tendo por elas
um amor sacrificial, assim como Cristo amou a Igreja e Se entregou por ela:

“Maridos, amai vossas mulheres, como também Cristo amou a igreja, e a si mesmo se
entregou por ela.”

(Efésios 5:25)

O mesmo marido, que é obedecido, é convidado à fraqueza. O marido não é estimulado a


ser forte e poderoso em casa. A mulher é convidada a se submeter ao marido, o qual, por
sua vez, é convidado a se entregar a ela. É convidado a mais do que isso: o marido é
convidado a ser sacerdote em casa. A função do marido, descrita em Efésios 5:26- 27, é
sacerdotal, tal como no passado o sacerdote apanhava uma pombinha e um cordeiro e os
lavava para serem oferecidos a Deus no altar, num sacrifício limpo e bonito:

“Para que a santificasse, tendo-a purificado por meio da lavagem de água pela palavra,
para apresentar a si mesmo igreja gloriosa, sem mácula, nem ruga, nem coisa semelhante
te, porém santa e sem defeito.”

(Efésios 5:26-27)

Paulo diz mais aos maridos:

“Assim também os maridos devem amar as suas mulheres como a seus próprios corpos.
Quem ama a sua esposa, a si mesmo se ama.”

(Efésios 5:28)

O amor que o marido deve devotar à mulher é um sentimento operoso, que vai à luta, não
manipulando, sendo responsável:
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“Porque ninguém jamais odiou a sua própria carne, antes a alimenta e dela cuida, como
também Cristo o faz com a igreja.”

(Efésios 5:29)

E mais: a relação conjugal é autônoma, independente de ingerências políticas e


econômicas por parte dos demais parentes:

“Eis que por isso deixara o homem a seu Pai e a sua mãe, e se unirá à sua mulher, e se
tornarão os dois uma só carne.”

(Efésios 5:31)

Os pais devem ser honrados, mas, a nossa casa é a nossa casa.

Marido e mulher também têm muito sexo, sexo abundante. Sexo é algo espiritualíssimo.
Tudo que os principados e potestades querem é que marido e mulher não gostem de fazer
sexo. Paulo diz, em I Coríntios 7:5, que para que se deixe de fazer sexo tem que haver
uma razão muito forte. Segundo Paulo, só se for para se dedicarem à oração por algo
muito específico, e, logo em seguida, juntarem-se de novo:

“Não vos priveis um ao outro, salvo talvez por mútuo consentimento, pois algum tempo,
para vos dedicardes à oração e novamente vos ajuntardes, para que Satanás não vos
tente por causa da incontinência.”

Para enfrentar o diabo na área sexual, quando se é casado, mais importante do que jejuar
e orar dez horas por dia é ter sexo em abundância.

Certa vez um rapaz me perguntou:


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“- Pastor Caio, o que é que faço? Eu olho para minha namorada, e fico pensando: ‘Que
mulher bonita!’ O que o senhor acha disso?”

“- Amém, irmão! O que tem de moço que olha para uma mulher como se olhasse para um
poste de ferro, não é brincadeira!”

Hoje em dia, quando ouço um rapaz dizer:

“- Que corpo bonito a minha namorada tem!”

Quando ouço um rapaz dizer isso, eu digo:

“- Aleluia! Mas... 'segura as pontas’. Espere a hora certa.”

Paulo não tinha soluções espirituais para tais coisas. Ele apenas disse:

“Caso, porém, não se dominem, que se casem, porque é melhor casar do que viver
abrasado.”

(I Coríntios 7:9)

Paulo diz:

“(...) e se tornarão os dois uma só carne.”

E isso só é possível numa relação madura e responsável como deve ser o casamento. Há
muita desgraça sexual na Igreja, porque muitos casais ficaram tão espirituais que

não conseguem mais ter prazer abundante na cama com a esposa ou com o marido, de
modo que o diabo consegue “passar-lhes a perna” com uma colega ou com um colega de
trabalho. Certa mulher uma vez falou para a minha esposa:
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“ - Alda, estou vivendo um conflito muito grande. Eu me converti, e agora não consigo mais
ter relação sexual com o meu mando. Quando ele diz para mim: ‘- Vem cá, meu amor! Tire
a roupa.’ , e eu começo a tirar a roupa, e o ato se inicia, eu morro de vergonha, e fico
imaginando o Anjo do Senhor acampado ao nosso redor. Aí, não dá mais. O que é que eu
faço?!”

A minha esposa assim lhe respondeu:

“- Esqueça o Anjo do Senhor, e vai fundo!”

É também preciso que haja saúde na relação familiar mais ampla, com os filhos. É com
uma relação na qual pais são convertidos aos filhos, e os filhos são convertidos a seus
pais é que se vence a batalha espiritual. Não adianta aos filhos irem para praça pública
“amarrar” demônios, se não honram aos pais em casa:

“Filhos, obedecei a vossos pais no Senhor, pois isto é justo. Honra a teu pai e a tua mãe
(que é o primeiro mandamento com promessa), para que te vá bem, e seja de longa vida
sobre a terra.”

(Efésios 6:1-3)

E nem adianta aos pais ficarem participando de reuniões de batalha espiritual, se não
sabem disciplinar os filhos com amor, não os admoestando com sabedoria, mas sendo
chatos, e que irritam tanto aos filhos, que se tornam instrumentos do diabo para amargurar-
lhes a vida:

“E vós, país, não provoqueis vossos filhos à ira, mas criai-os na disciplina e na
admoestação do Senhor.”

(Efésios 6:4)
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O que se vê de gente na luta espiritual, mas com a família destroçada, não é brincadeira!
Cuidemos da nossa casa, em nome de Jesus, para que o diabo não tenha vantagem sobre
nós.

Em último lugar, Paulo diz que deve haver saúde também na vida profissional:

“Quanto a vós outros, servos, obedecei a vossos senhores segundo a carne com temor e
tremor, na sinceridade do vosso coração, como a Cristo, não segundo a vista, como para
agradar a homens, mas como servos de Cristo, fazendo de coração a vontade de Deus,
servindo de boa vontade, como ao Senhor, e não como a homens, certos de que cada um,
se fizer alguma coisa boa receberá isso outra vez do Senhor, quer seja servo, quer livre. E
vós, senhores, de igual modo procedei para com eles, deixando as ameaças, sabendo que
o Senhor, tanto deles como vosso, está nos céus, e que para com ele não há acepção de
pessoas”.

(Efésios 6:5-9)

São discriminados no texto acima os elementos que fazem parte dessa relação profissional
- empregado e empregador -, e como devem se travar as relações entre eles. Aos
empregados, Paulo diz a estes que trabalhem sem crise com a autoridade patronal, não
tendo uma mentalidade sindicalmente hostil, não tendo medo de submeter-se aos patrões,
porém não lhes vendendo a consciência; sendo sinceros aos patrões, e participativos;
tendo uma visão espiritual do trabalho, fazendo deste um meio de servir a Deus (para se
fazer a vontade de Deus trabalhando não é necessário ser pastor), podendo-se ser
engenheiro, advogado, professor, médico e até funcionário público, e mesmo assim fazer a
vontade do Senhor.

Paulo diz que não só se deve fazer a vontade de Deus dentro dos canais profissionais,
mas também que, por meio deles se possam acumular recompensas inda que no
funcionalismo público não se dê para acumulá-las, mas, servindo-se a Jesus em qualquer
lugar, é possível fazer “poupança espiritual”.

Aos patrões, Paulo diz que tudo o que foi falado aos empregados serve para eles também,
acrescentando que deixem de lado a administração opressiva e parcial, não oprimindo os
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empregados, nem lhes fazendo discriminação, não lhes sendo tirano, mas servindo ao
Senhor no espírito da liberdade e do respeito.

CONCLUSÃO

“Quanto ao mais, sede fortalecidos no Senhor e na força do seu poder. Revesti-vos de


todo a armadura de Deus, para poderdes ficar firmes contra as ciladas do diabo; porque a
nossa luta não é contra o sangue e a carne, e, sim, contra os principados e potestades,
contra os dominadores deste mundo tenebroso, contra as forças espirituais do mal, nas
regiões celestes.”

(Efésios 6:10-12)

Paulo nos convida a tomarmos posse das armas do Espírito. Para quê? Qual a razão de
termos saúde em todas as áreas da nossa vida, e ainda tomarmos posse das armas do
Espírito? A resposta é a seguinte:

“(...) para poderdes ficar firmes contra as ciladas do diabo”.

Portanto, há ciladas, há armadilhas e estratagemas armados pelo diabo. Nesse sentido,


então, há uma trama diabólica, embora, às vezes, não haja dos seus instrumentos. É por
esta razão que Paulo nos alerta quanto às “ciladas do diabo”.

Paulo nos sugere sete ações para enfrentarmos tais ciladas.

A primeira é pôr um valor íntimo na nossa alma:

“(...) cingindo-vos com a verdade.”

(Efésios 6:14a)
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A verdade é a primeira de todas as coisas, tendo de ser o principal princípio, pois se


relaciona ao caráter.

A segunda é o comportamento público. Não só o íntimo tem que ter valores e princípios,
mas também o exterior.

“(...) vestindo-vos da couraça da justiça.”

(Efésios 6:14b)

A verdade do íntimo tem que aparecer externamente na forma de um comportamento


comprometido com a justiça.

A terceira é ter estilo de vida, não só tendo princípios por dentro e comportamento visível
por fora. Mas é necessário haver um estilo de vida que seja pautado na paz, não na
beligerância, mas no evangelho da reconciliação e da misericórdia:

“Calçai os pés com a preparação do evangelho da paz.”

(Efésios 6:15)

A quarta é uma postura espiritual adequada, típica de pessoas que têm fé, que não
duvidam, que falam e que confessam com ousadia, convictamente, que caminham com o
escudo da fé:

“Embraçando sempre o escudo da fé, com o qual podereis apagar todos os dardos
inflamados do maligno.”

(Efésios 6:16)
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A quinta ação é ter equilíbrio na mente, estando ela tomada pela graça de Deus; as crises
de consciência têm que estar resolvidas; a alma e a mente têm que estar em harmonia, e
protegidas com a certeza de que na Cruz se está seguro na salvação em Cristo:

“Tomai também o capacete da salvação”.

(Efésios 6:17a)

A sexta ação é uma atitude de combatividade, sendo corajoso, intrépido, pregando a


Palavra e denunciando em nome dela; não tendo medo de principados e potestades,
porque a Palavra de Deus é a espada do Espírito:

“(...) e a espada do Espírito, que é a palavra de Deus.”

(Efésios 6:17b)

A sétima ação é uma atitude de vigilância, de súplica, de intercessão, de oração pela Igreja
de Deus:

“Com toda oração e súplica, orando em todo tempo no Espírito, e para isto vigiando com
toda perseverança e súplica por todos os santos”.

(Efésios 6:18)

Fazendo todas essas coisas, prevaleceremos, em nome de Jesus, passando pelo dia mau,
porém permanecendo inabaláveis.

É isso que eu espero e desejo para todos nós, em nome de Jesus.

Amém.

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