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RIO DE JANEIRO • Sexta-feira • 16 de março de 2018 FUN DADO EM 9 DE ABRIL DE 1891
Últimas palavras
Em artigo enviado ao JB horas antes de sua morte, Marielle diz que intervenção não é solução
Reforma Trabalhista, PEC dos Gastos, Refor-
ma da Previdência. O impacto dessas profun-
das mudanças, inspiradas em um projeto po-
lítico retrógrado, alinhado com interesses que
servem ao capital internacional e a setores do
empresariado, arremessa um contingente de ci-
dadãos e cidadãs para uma espiral de pobreza.
É neste contexto que tentamos
ampliar o olhar sobre a Interven-
ção Federal na Segurança Públi-
ca do Rio de Janeiro e avaliar sua
real intenção, já que o estado está
em décimo lugar nos índices de
violência, atrás de Sergipe, Goi-
ás e Maranhão — para citarmos
como exemplos apontados no
Anuário de Segurança Pública.
Sendo assim, a Intervenção Federal busca se ali-
cerçar numa justificativa que não tem assento
na realidade. Nossa pergunta que não quer ca-
lar: por que o Rio de Janeiro?
As últimas experiências mostram que a ocupa-
ção das Forças Armadas não resolveu o proble-
ma de insegurança. Inclusive, é importante que
observemos os anos em que o Exército é levado
às ruas para “solucionar” uma situação emer-
gencial. O que há em comum não é um episó-
dio alarmante na segurança, mas o fato de que
são todos anos eleitorais. O que tivemos como
resultado desta política?
O interventor federal General Braga Netto de-
clarou que “o Rio de Janeiro é laboratório para o
Brasil”. E o que vemos é que neste “laboratório”
as cobaias são os negros e negras, periféricos, fa-
velados, trabalhadores. A vida das pessoas não
pode ser experimento de modelos de segurança.
O apontamento das favelas, como lugar do pe-
rigo, do medo que se espraia para a cidade, des-
perta o mito das classes perigosas, como bem
ressalta a psicóloga Cecília Coimbra, colocando
EDITORIAL
‘Os bons resultados da intervenção serão uma forma de honrar a memória da vereadora. Por ela,
o melhor que se pode fazer é mostrar que os beneficiários são os que ela supunha vítimas.’ Pág. 8
Ano 127 • nº 20 • www.jb.com.br R$ 5,00
a favela como objeto principal e inimiga pública.
No último fim de semana, pelo menos cin-
co pessoas morreram e quatro ficaram feridas
na Região Metropolitana do Rio. Delas, quatro
eram mulheres. Alba Valéria Machado morreu
ao tentar proteger o filho, em Nova Iguaçu. Na-
talina da Conceição foi atingida durante con-
fronto entre PMs e traficantes
na Praça Seca. Janaína da Silva
Reprodução Facebook
Oliveira morreu em tentativa de
assalto em Ricardo de Albuquer-
que. Tainá dos Santos foi atingida
por um tiro de fuzil na comuni-
dade Vila Aliança. São as mulhe-
res negras e periféricas que per-
dem seus filhos para a letalidade.
Essa estatística assustadora de-
monstra que mesmo às vésperas de completar
um mês do início da Intervenção, a tão falada
sensação de segurança não passa de um discur-
so político-midiático. E as mortes têm cor, classe
social e território. Definitivamente a segurança
pública não se faz com mais armas. Mas com po-
líticas públicas em todos os âmbitos. Na Saúde,
Educação, Cultura e geração de emprego e renda.
É premente a necessidade de monitorarmos
esse processo, tendo o cuidado de lutar para que
os direitos individuais e coletivos sejam assegu-
rados, para que as instituições democráticas se-
jam preservadas e sigam autônomas. O contrá-
rio disso se revelaria algo bem perigoso em uma
sociedade que tem uma tradição patrimonialis-
ta, pouco afeita ao trato democrático e que tem
uma relação histórica violenta com sua popula-
ção mais vulnerável.
Marielle Franco era vereadora da cidade do
Rio (PSOL) e relatora da Comissão da Câma-
ra Municipal de Acompanhamento da Inter-
venção Federal.
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COISAS DA POLÍTICA
Tereza Cruvinel
tereza.cruvinel@jb.com.br
Tiros na intervenção
Os cinco tiros que mataram a vereadora Marielle
Franco e seu motorista Anderson Gomes varejaram
a intervenção federal no Rio, alvo de protestos da
multidão que acorreu ao centro durante o velório,
colocando o presidente Michel Temer no centro do
drama: enquanto não vier um esclarecimento cabal
do crime, cobrado pela ONU e uma dezena de orga-
nizações internacionais, ele pesará sobre seu gover-
no, podendo devorar o que lhe resta de mandato, as-
sim como o caso Riocentro liquidou com o governo
do último ditador-presidente, João Figueiredo.
Com a intervenção, o governo federal assumiu o in-
teiro controle da área de segurança do estado, através
do interventor, general Braga Neto. “ Ele só responde a
mim”, já disse Temer, ecoando os termos de seu decre-
to. Foi a intervenção e sua autoridade que os facínoras
desafiaram ao fuzilar a parlamentar, ativista de muitas
frentes de defesa dos direitos humanos, voz e rosto do
povo que habita os territórios visados pela intervenção,
os morros e favelas. Não tendo sido planejada, e não
dispondo ainda de um plano de ação mais consistente,
a intervenção limitou-se neste primeiro mês às incur-
sões por comunidades em que os bandidos se abrigam,
intimidando os moradores com suas revistas. O povo
que Marielle representava. O general, por disciplina,
aceitou a tarefa arriscada, pediu comedimento às tro-
pas, evitou ocupações para não agravar conflitos mas
eles não tinham como não aflorar.
A investigação começa naturalmente com uma
pergunta: a quem interessava a morte de Marielle?
A força que ela vinha combatendo era a do 41º. Ba-
talhão da PM, como na postagem do último dia 10
numa rede social: “O que está acontecendo agora
em Acari é um absurdo! E acontece desde sempre!
O 41° batalhão da PM é conhecido como Batalhão
da morte. Chega de esculachar a população! Chega
de matarem nossos jovens”. A unidade lidera as es-
tatísticas de homicídios decorrentes de confrontos:
segundo levantamento da Folha de S. Paulo, foram
567 desde 2011, quando os números começaram a
ser compilados. Em janeiro, policiais do batalhão
responderam por 41% das mortes violentas nos
bairros a ele vinculados. Se, eventualmente, os as-
sassinos de Marielle foram policiais, a intervenção,
que ameaça “depurar as polícias”, foi desafiada por
um poder paramilitar que afronta a democracia e
estado de direito. Se foram bandidos, explicitaram
a força do narco-estado instalado no Rio, que não
será vencido por uma intervenção feita às pressas,
contaminada por propósitos eleitorais. O “Fora Te-
mer”, que andava perdendo força, ressurgiu forte
ontem na sessão especial da Câmara e nas manifes-
tações no centro do Rio.
Ao condenar o crime, Temer prometeu que
a intervenção vai restaurar a paz no Rio e que o
banditismo não destruirá nosso futuro. “Nós os
destruiremos antes”. Ele mesmo não terá tempo
para isso e está com um caso de repercussão inter-
nacional dentro do Palácio do Planalto.
ÓDIO E PRECONCEITO
Há dois aspectos subjacentes na execução de Ma-
rielle Franco. Primeiro, como apontado pelas deputa-
dos Érica Kokay e Maria do Rosario em seus discursos
na Câmara, a torrente de ódio,com laivos fascistas, que
vem tomando conta do Brasil. No limite, o outro, que
me incomoda, é inimigo. Deve ser combatido com
fúria, talvez com a morte. Seja na política ou nos con-
flitos pessoais. Se isso não for contido, as coisas ainda
vão piorar muito. E há também, na eliminação de
Marielle, a bronca com os que, vindo de baixo, torna-
ram-se atores importantes na cena pública, ganhando
voz e emprestando-a aos que representam, como fazia
ela em relação aos favelados, negros e mulheres. Seus
assassinos, bons de pontaria, foram primários na ava-
liação das consequências.
A DISPERSÃO
Já não são onze os candidtos a presidente. On-
tem a Democracia Cristã lançou José Maria Eyma-
el, veterano figurante de outras disputas.
Política
Ciro: ‘Os avanços da
economia são pífios’
Pré-candidato do PDT afirma que a situação brasileira é “grave”
Em debate com empresários na Asso-
ciação Comercial do Rio de Janeiro, o
ex-ministro Ciro Gomes, pré-candidato
à Presidência pelo PDT, afirmou que
discorda dos analistas para os quais a
atividade econômica brasileira está bem
melhor. Segundo ele, os avanços ainda
são pífios em relação ao que foi perdido
durante a recessão econômica. “A situa-
ção brasileira é tão grave e tão difícil de
ser resolvida que pode levar a uma rup-
tura. Se é que a gente não está assistindo
a essa ruptura no dia-a-dia”, disse.
Apesar da melhora recente dos indi-
cadores econômicos, o ex-governador
do Ceará argumentou que a situação do
país não mudou. “O Brasil precisa mu-
dar, o Brasil está errado. As coisas não
estão melhorando. As coisas estão estru-
turalmente erradas no Brasil”, disse. Em
seguida, opinou que o crescimento do
PIB cresceu pouco no ano passado após
perdas consideráveis. Ele também se
referiu ao processo de desindustrializa-
ção em curso no País, a elevada taxa de
desemprego e o alto nível de informali-
dade no mercado de trabalho. “Qual
sistema previdenciário que funciona no
mundo se metade da economia está na
informalidade?”, questionou.
Ciro Gomes atacou os lucros excessi-
vos do sistema financeiro. Disse que um
dos motivos por que o Brasil enfrenta
dificuldade de crescer é o alto nível de
endividamento de famílias e empresas.
Citou que a rentabilidade das tarifas
bancárias no ano passado foi de R$ 36
bilhões. “A economia está toda estagna-
da e o sistema financeiro tem lucro de
14% acima da inflação. O sistema finan-
ceiro tem que ser sólido e líquido, por
favor não me confundam, mas não está
direito (o lucro excessivo)”, declarou.
O endividamento público também foi
apontado por Ciro como uma mazela.
Destacou que o Brasil tem R$ 4 trilhões
em dívida pública, o equivalente a 80%
do PIB. “Desses, R$ 1,184 trilhão vêm
de operações compromissadas. Opera-
ções compromissadas é o nome da nova
roubalheira do Brasil. Sem nenhuma
transparência”, queixou-se. “Ninguém
sabe o que é essa divida pública”.
O ex-ministro afirmou ainda que há
Alckmin aguarda prévia IBGE acusará
para apoiar João Doria ‘fake news’
O governador de São Paulo, Geraldo
Alckmin (PSDB), evitou ontem mani-
festar apoio à pré-candidatura do pre-
feito de São Paulo, João Doria, ao Pa-
lácio dos Bandeirantes. Alckmin disse
que, antes de tomar qualquer decisão,
é preciso aguardar a realização das pré-
vias de seu partido, prevista para este
domingo, dia18, para só então definir
qual será o candidato tucano ao gover-
no do Estado.
“Vamos aguardar primeiro as pré-
vias. A homologação da candidatura
é só na convenção”, explicou o gover-
nador paulista, depois de participar de
painel durante a edição latino-ameri-
cana do Fórum Econômico Mundial,
que este ano é realizado em São Paulo.
Alckmin, que é pré-candidato do
PSDB à Presidência, negou que a rea-
lização de prévias cause um racha no
partido. “O Doria só foi candidato a
prefeito de São Paulo (em 2016) por-
que fizemos prévia. Todos diziam que
isso iria dividir o partido e ele ganhou
no primeiro turno. Foi o melhor resul-
Para Ciro Gomes, “as coisas não estão melhorando, estão estruturalmente erradas no país”
A economia está
toda estagnada e o
sistema financeiro
tem lucro de 14%
acima da inflação”
CIRO GOMES
um potencial “explosivo” de desequi-
líbrio nas contas externas, puxado por
um déficit na balança de produtos ma-
nufaturados, o que pode pressionar o
câmbio em momento de recuperação
da atividade econômica. Se eleito, disse
que será contra privatizações em áreas
estratégicas para a segurança do País,
Rovena Rosa/Agência Brasil
Alckmin só se definirá depois do domingo
tado eleitoral desde a fundação do
PSDB”, afirmou.
Além de João Doria, o vice-gover-
nador de São Paulo, Márcio França,
que preside o PSB local, também já
declarou que vai sair candidato a go-
vernador. Na última quarta-feira, no
dia de abertura do Fórum, Doria foi
enfático em seu apoio à pré-candida-
tura de Alckmin ao Planalto. O go-
vernador, no entanto, até agora não
manifestou apoio à pré-candidatura
de João Doria.
Sexta-feira, 16 de março de 2018
Divulgação / Agência Brasil
como defesa e energia. Revelou que faz
parte de sua plataforma de campanha
tomar de volta as hidrelétricas leiloadas
da Chesf e a Embraer, caso seja vendida
para capital estrangeiro. Ele declarou-se
contrário à privatização da Eletrobras e
criticou a venda da participação da Pe-
trobras no bloco de Carcará, no pré-sal
da Bacia de Santos.
O pré-candidato do PDT, legenda
criada por Leonel Brizola. lamentou
a divisão do país em apenas dois gru-
pos: “O Brasil não cabe nessa miudice
de querer repartir o país entre coxinhas
e mortadelas”. Ele defendeu a ex-pre-
sidente Dilma Rousseff, dizendo que é
uma “mulher honrada” e garantindo
que nenhum de seus detratores jamais
teve “audácia” de acusá-la de qualquer
tipo de crime. Mas criticou as políticas
econômicas do governo da petista e de
antecessores que agravaram o processo
de desindustrialização no país e aumen-
taram o déficit potencial de produtos
manufaturados na balança comercial
brasileira.(Estadão Conteúdo)
com pesquisas
O presidente do Instituto Brasilei-
ro de Geografia e Estatística (IBGE),
Roberto Olinto, afirmou ontem que o
órgão ficará atento ao uso pelos can-
didatos de informações de pesquisas
realizadas pelo órgão. “Tem a questão
do fake news nas eleições. O IBGE fica
um pouco longe disso. Mas, em bre-
ve, teremos de ficar atentos, porque os
candidatos podem dizer que o desem-
prego foi tal e o crescimento aquilo.”
A declaração de Olinto foi dada
após palestra em evento da Associa-
ção Nacional dos Editores de Revistas
(Aner). Segundo ele, o IBGE preci-
sa atacar o mau uso da informação.
“Falou algo errado, vamos publicar
uma nota. Temos feito notas técnicas
e comentários exatamente para nos
defender de informações falsas.” Olin-
to afirmou que as pesquisas do IBGE
são produzidas de forma mais trans-
parente possível, e ressaltou ainda que
o órgão não produz opinião, mas que
analisa dados do passado.
Sexta-feira, 16 de março de 2018 Política Conheça nosso site www.jb.com.br • 3

Wilson Dias/Agência Brasil José Cruz/Agência Brasil

Carlos Marun diz que o ministro Barroso “não está agindo em conformidade com seus deveres” Luís Roberto Barroso foi informado sobre os ataques de Marun, mas explicou que não vai replicar

Marun ataca Barroso

Titular da Secretaria de Governo diz que pedido de “impeachment” do ministro do STF está “assentado”

O ministro da Secretaria de
Governo, Carlos Marun, reve-
lou que as bases para o pedido
de impeachment do ministro
do Supremo Tribunal Federal,
Luís Roberto Barroso, já estão
“assentadas” e que o documen-
to “em produção por advogados
amigos” questionará a parciali-
dade e o viés político-partidá-
rio do magistrado. Marun não
se conforma com decisões de
Barroso, que autorizou a que-
bra de sigilo bancário do pre-
sidente Michel Temer e excluiu
os criminosos da Lava Jato do
indulto natalino.
Ao chegar para um café da
manhã com a bancada de de-
putados do Norte/Nordeste,
Marun disse que um juiz não
pode ter atividade político-
-partidário e que, ao modificar
o decreto do indulto natalino,
o magistrado deu tratamento
diferente ao presidente Temer.
“O pessoal até pode vestir a
camisa vermelha por baixo do
terno ou azul, mas isso não
pode interferir nas decisões
exaradas pelo seu juízo”, decla-
rou Carlos Marun, para quem
o ministro pode ter cometido
crime de responsabilidade e
falta de decoro, o que motiva o
pedido de afastamento.
Marun pretende, no início de
abril, voltar à Câmara para apre-
sentar o pedido de impeachment
de Barroso durante sessão do
Congresso. O ministro enfati-
zou, porém, que se trata apenas
de uma licença do cargo do mi-
nistro e não de uma saída defi-
nitiva. “Isso não é constrangi-
mento, é simplesmente chamar a
atenção e buscar a punição. É um
juiz, que entendo, que não está
agindo em conformidade com
seus deveres”, afirmou.
O fiel escudeiro de Temer
revelou que vem conversan-
do sobre o assunto com parla-
mentares e que não tem rece-
bido críticas sobre sua posição.
“Muito pelo contrário”. Segun-
do ele, estão lhe oferecendo su-
porte jurídico para o encami-
nhamento do pedido.
Marun desconversou ao ser
questionado sobre posiciona-
mentos políticos de outros mi-
nistros do STF, como Gilmar
Mendes. “Não me recordo do
ministro Gilmar Mendes ter,
por exemplo, feito um decreto,
que é prerrogativa do presiden-
te da República. Não me recor-
do de uma afronta tão grave às
prerrogativas do presidente da
República.”
O emedebista disse que vai
exercer o direito de levar ao Se-
nado o pedido de impeachment
de Barroso e que caberá àquela
casa decidir se as preferências
políticas do magistrado estão ou
não interferindo em suas deci-
sões. Marun disse também que
Temer não mudou de ideia em
oferecer seus extratos bancários,
tanto que não recorreu da deci-
são de Barroso. Procurado pelo
JB, o ministro Barroso avisou
que não vai debater com Marun.

Torquato considera divergências ‘naturais’

Apesar das investidas de Car-
los Marun, o ministro da Justi-
ça, Torquato Jardim, declarou
ontem que as divergências do
presidente Michel Temer com o
ministro do Supremo Tribunal
Federal, Luís Roberto Barroso,
são “naturais”, mas destacou que
a última palavra é do STF.
“Não é a primeira vez que há
diferentes perspectivas e opini-
ões, faz parte do debate cons-
titucional e da independência
dos Poderes”, disse o ministro da
Justiça, quando questionado se
o Planalto tentava constranger o
STF. “O Supremo leva vantagem
porque pela Constituição ele tem
a última palavra. Na construção
de diálogo, o Supremo terá sem-
pre a última palavra”, ponderou.
Torquato Jardim participou de
um debate sobre combate à cor-
rupção durante o Fórum Eco-
nômico Mundial sobre América
Latina, em São Paulo. Ele disse
que é “legítima” a pressão que
aliados do ex-presidente Lula fa-
zem no Supremo para a Corte re-
visar o entendimento que permi-
te a prisão após condenação em
segundo grau. “O diálogo políti-
co faz parte da democracia, você
faz a cobrança que quiser sobre o
tema que quiser”, afirmou.
O ministro apontou, porém,
que ministros do STF já conce-
deram mais de 70 habeas corpus
para réus contrariando o último
julgamento do STF sobre o tema.

Candidatura Lula ainda é possível PROTESTO E PESAR

Werther Santana/Estadão Conteúdo

KÁTIA GUIMARÃES
katia@jb.com.br
Apesar de a prisão do ex-presi-
dente Lula ser uma possibilidade
cada vez mais real, o advogado Luiz
Fernando Casagrande Pereira,
especialista em Direito Eleitoral,
afirma que será candidato à Presi-
dência, preso ou não. ““Qualquer
que seja o movimento do Fachin,
qualquer que seja o movimento
do Supremo, isso é um dado neu-
tro. Se ele estiver solto ou preso, o
registro da candidatura é possível
de ser feito e o indeferimento não
pode ser antecipado”, diz.
Autor do parecer encomenda-
do pelo PT que garante a viabili-
dade do registro da candidatura,
Luiz Fernando explica que isso
ocorre em função dos prazos a
serem obedecidos pelo TSE para
julgar um possível pedido de im-
pugnação do registro. “O TSE
terá que cumprir procedimentos
e isso leva tempo e até que che-
gue ao fim, Lula se mantém can-
didato com todas as prerrogati-
vas e é o que diz a Lei Eleitoral de
forma inequívoca”, reforça.
Segundo o calendário eleito-
ral, o prazo limite para o regis-
tro de candidaturas é o dia 16 de
agosto, mesma data do início da
campanha. E, justamente, por-
que as datas coincidem e porque
a campanha eleitoral foi reduzi-
da de 90 para 45 dias, o ex-presi-
dente tem um cenário a seu favor.
Por mais que o TSE seja célere,
cumprindo os prazos mínimos, a
decisão só poderá sair na metade
ou mais da campanha.
Em 2016, por exemplo, 145
prefeitos se elegeram sem que
houvesse ainda decisão sobre suas
candidaturas. Em 2006, o então
candidato Rui Pimenta, do PCO,
foi impugnado e foram necessá-
rios 150 dias para o TSE apreciar
o caso. Tempo parecido durou a
análise do registro de Ana Maria
Rangel, pelo PRP, 120 dias. “Estou
considerando o prazo mínimo
possível, 20, 25 dias”, acrescenta.
Com a nova negativa da pre-
sidente do STF, Cármen Lúcia,
o destino do ex-presidente Lula
ficou nas mãos do ministros Ed-
son Fachin, que vai analisar três
pedidos feitos pela defesa do pe-
tista: que reconsidere sua decisão
liminar e suspenda uma eventual
ordem de prisão contra Lula até
o julgamento das ações sobre a
prisão após condenação em se-
gunda instância; que leve o caso
à 2ª Turma, e não ao plenário; e,
por fim, que leve o habeas cor-
pus “em mesa” para julgamento
do plenário do STF.
Entre os advogados crimina-
listas, há dúvidas sobre o que Fa-
chin fará, mas há inclusive quem
ache que ele pode inovar e levar
o HC de Lula para o pleno do
STF. Dentre os caminhos jurí-
dicos possíveis para a defesa do
ex-presidente, caso tudo seja in-
deferido, está o agravo regimen-
tal, que pode ser feito toda vez
que uma decisão tomada é con- Professores e outros servidores municipais se reuniram em frente à
siderada prejudicial ao réu. Esse Câmara Municipal de São Paulo ontem para protestar contra a refor-
recurso, muito utilizado, pode ma da Previdência proposta pelo prefeito João Doria. Ao final, houve
ser feito junto à 2ª Turma ou ao ato de pesar pela morte da vereadora Marielle Franco.
plenário da Corte.
4 • Conheça nosso site www.jb.com.br Cidade Sexta-feira, 16 de março de 2018

Mauro Pimentel/AFP Marcos Tristão Mauro Pimentel/AFP

Dor, desolação e solidariedade transformaram despedida em vigília por justiça e respeito aos direitos humanos: homenagens à vereadora se espalharam por outras cidades do país

Adeus à vereadora guerreira

Marielle e o motorista que a acompanhava são velados por multidão em vigília na Cinelândia
Roberto Herrera
ANDRÉ LUÍS CÂMARA
andre.camara@jb.com.br

O Rio amanheceu mais triste, ontem. Em

Santa Teresa, o colégio Ceat suspendeu as
aulas. No Centro, a livraria Folha Seca ficou
de portas fechadas. Muita gente se encami-
nhou para a Cinelândia ainda incrédula e
sem compreender o que acontecia. Marielle
Franco, a combativa vereadora, morrera as-
sassinada, em uma rua do Estácio, na noite
anterior, juntamente com Anderson Pedro
Gomes, o motorista que a acompanhava.
Por volta das 13h10, a mãe e a filha de
Marielle entraram pelo portão lateral da Câ-
mara Municipal do Rio de Janeiro, onde, no
Salão Nobre, acontecia o velório. A impren-
sa não teve acesso ao local, e a cerimônia
transcorreu de maneira reservada, somente
para parentes, amigos e colegas de trabalho.
A mãe de Marielle, inconsolável, dizia: “O
que fizeram à minha filha? Ela não merecia
isso”. Aos prantos, atrás da avó, Luyara San-
tos, de 19 anos (a idade de Marielle quando
teve a filha), expressava, de modo comoven-
te, o sentimento de querer sua mãe de vol-
ta. Estudante de Educação Física na Uerj, A vigília durante o velório em frente à Câmara dos Vereadores do Rio, na Cinelândia, se transformou à noite num protesto contra a violência
ela postou no Facebook mensagem em que Marcos Tristão
dizia: “Mataram minha mãe e mais 46 mil
eleitores. Nós seremos resistência porque
você foi luta. Te amo”. Em resposta, recebeu
centenas de comentários de solidariedade. Motorista
deixa filho
A desolação das duas se estendia pela praça
da Cinelândia tomada por políticos, professo-
res, estudantes, líderes do movimento negro,
artistas e representantes da sociedade em ge-
ral. Desde as 10h, eles se concentravam em
uma vigília para prestar a última homenagem
de 1 ano
Reprodução Facebook
à quinta vereadora mais votada do Rio, nas úl-
timas eleições, que definia a si mesma como
“mulher, negra, mãe e cria da favela da Maré”.
“Conheci a Marielle há mais de 20 anos.
Ela foi minha aluna no pré-vestibular comu-
nitário”, contou Edson Diniz, diretor da Re-
des da Maré. Segundo ele, a atuação dela na
Câmara Municipal fortalecia a luta por uma
sociedade mais justa e igualitária. “Sobretu-
do, na defesa dos direitos dos mais pobres e
moradores de favela. Fica, agora, um gran-
de vazio. Jamais imaginei que isso pudesse
acontecer a ela”, afirmou. Diniz disse ainda
que, apesar de sua atuação contundente,
Marielle era uma pessoa muito querida por
todos da Maré. “Suas posturas sempre foram
abertas e democráticas. É uma perda irrepa- Parentes e amigos de Marielle estavam desolados na despedida, durante enterro no Caju Anderson: bico para ajudar a família
rável”, comentou.
“Ela foi a um ato que organizei para de- esperar que algo assim acontecesse especifi- um ataque ao Legislativo: “Ela estava no Anderson Pedro Gomes era
nunciar a morte do meu filho e se ofereceu camente a Marielle: “Todos nós que lutamos exercício da sua atividade como vereado- casado e estaria fazendo um bico
para ajudar”, contou Deize Carvalho, mãe de por direitos humanos neste país, contra as ra do município do Rio de Janeiro e saía de como chofer, há dois meses, para
Andreu de Carvalho, morto em 2008. máfias, os grupos de extermínio, essa cone- uma reunião que tinha como ponto central a ajudar a família, já que Ágatha
A polícia já reconhece que a principal xão espúria do poder estatal com o poder do questão da mulher negra, dos negros esque- Arnaus Reis, viúva do motorista,
linha de investigação da morte de Marielle crime, corremos sempre alguns riscos”, disse cidos e desconsiderados pelo poder público”. é funcionária pública estadual e
é a de que houve uma execução. Amigos e o deputado federal Chico Alencar (PSOL-RJ). A diretora de teatro Bia Lessa era uma tem tido dificuldade para receber
colegas parlamentares não têm dúvida disso. Ele lembrou o trabalho de muitos anos da ve- das tantas pessoas que ali se mostravam o salário em dia. Segundo ela,
“Temos que exigir uma apuração rigoro- readora como assessora de Marcelo Freixo, chocadas. “Estamos todos pasmos. Tem Anderson nunca comentou nada
sa do que aconteceu. Todas as característi- constantemente ameaçado pelas milícias. que parar agora. A quantidade de negros sobre ameaças à vereadora. Dos
cas (do assassinato) são de uma execução”, Cartazes exibiam frases como “Seu sangue mortos no Rio de Janeiro é uma coisa nove tiros disparados, três teriam
declarou o deputado federal Glauber Braga no chão não ficará impune”; “Companheira inacreditável, isso tem que acabar no atingido Anderson. Ele deixouum
(PSOL-RJ). Ele destacou que embora Ma- Marielle presente na luta”; e “Foi execução. Rio e no Brasil”. filho de um ano e foi sepultado
rielle trabalhasse, há muito tempo, com uma Mexeu com uma, mexeu com todas”. Muitos Os corpos chegaram por volta das 14h30. no Cemitério de Inhaúma,
questão espinhosa como a dos direitos hu- gritavam o nome de Marielle e também de Os caixões entraram pelo portão principal, Zona Norte da cidade, após o
mano, não demonstrava preocupação de es- Anderson. levados por amigos e colegas parlamentares. velório na Cinelândia, onde
tar sendo perseguida. O deputado estadual Eliomar Coelho No fim da tarde, Marielle Franco foi enterrada os manifestantes também lhe
Outro companheiro de partido disse não (PSOL-RJ) definiu a morte de Marielle como no Cemitério do Caju. prestaram homenagens.
Sexta-feira, 16 de março de 2018
Comoção na Maré
Na internet, moradores lamentam tragédia. UFF e PUC cobram punição rápida para o caso
A comunidade da Maré parou, ontem,
para prestar a última homenagem à vere-
adora Marielle Franco (PSOL) e também
protestar pelo assassinato da parlamentar
e do motorista Anderson Pedro Gomes,
na noite de quarta-feira. No perfil da ONG
Redes da Maré no Facebook, uma posta-
gem avisava que a organização fecharia a
partir de 14h para garantir a presença de
seus integrantes no ato no Centro do Rio.
A ONG, que desenvolve projetos sociais
e culturais no conjunto de favelas da Maré
desde 2009, foi uma das primeiras a dar
informações sobre o assassinato, ainda na
madrugada de quinta-feira. A reação de
comoção foi praticamente imediata, com
centenas de comentários lamentando e
considerando o fato uma tragédia.
“Até quando vão continuar nos matando?”,
questionou Marlon Soares. Para a internauta
Carme Lucia, a morte de Marielle representa
“uma grande perda para nós, população da
Maré. Até quando vamos ter que viver com
a violência?”. Já Marli Massena lembrou do
assassinato da juíza Patrícia Acioli, ocorrido
em 2011: “Creio que sua morte não ficará
impune, assim como não ficou impune o as-
sassinato da juíza Patrícia Acioli”.
O desejo de que as investigações des-
vendem logo o caso foi compartilhado por
muitos outros internautas. “Se há tantos
esforços e investimentos, nesse momento
no Rio, contra a violência, é fundamental
o sucesso nas investigações para coibir que
esses facínoras continuem determinan-
do o dia a dia dessa cidade maravilhosa.
Homens cruéis, sociopatas e covardes,
Cidade
Redes da Maré: homenagem a Marielle com foto em cenário da ONG e texto (ao lado)
FORA!”, escreveu Regina Braga.
O grupo Maré Vive acusou: “Assassina-
to. Crime Político. Mari vive. E vai viver!
Continuaremos a sua luta e vai ser maior a
cada dia”, declarou a ONG.
“Execução bárbara”
A Universidade Federal Fluminense,
onde Marielle cursou o mestrado em Ad-
ministração Pública, declarou em nota es-
perar que “haja uma rápida apuração deste
crime e que os responsáveis sejam punidos”.
Na Pontifícia Universidade Católica do
Acesse o calendário de ações e saiba mais em aglo.gov.br
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Reprodução/Site Redes da Maré
P R E C ISAR ÃO MOR R E R
Rio, onde a vereadora foi bolsista do curso
de Ciências Sociais, vários departamentos
manifestaram-se, lamentando o que cha-
maram de “execução bárbara” e cobrando
“rápida e rigorosa apuração” do caso e que
os mandantes e executores sejam identifica-
dos e levados a julgamento. “Que as ideias,
coragem, força e luta de Marielle sirvam
de inspiração, e que sua voz continue eco-
ando, pois Marielle ainda está presente em
nós. Somos todos Marielle”, escreveu o vi-
ce-reitor da PUC para Assuntos Comuni-
tários, Augusto Sampaio.
• 5
“Q UAN T OS MAIS
P AR A Q UE E SSA
GUE R R A AC AB E ? “
Quem vai responder a essa pergunta que desde
ontem à noite povoa nossos sonhos e pesadelos?
Sim, vivemos um pesadelo na cidade do Rio
de Janeiro, antes maravilhosa e hoje capital da
intervenção federal. As investigações estão em
curso mas a incômoda certeza de que Marielle
foi executada não nos abandona e certamente
vai nos acompanhar pelo resto das nossas vidas;
seja qual for a conclusão do inquérito policial. É
um sinal poderoso. Um aviso. Negros, pobres,
de periferia, “a justiça é para todos”. A Maré
perdeu uma filha, o conjunto sangra, com suas
16 favelas e seus 147 mil moradores. Marielle
que, nem faz tanto tempo assim, brincava pelas
ruas e vielas, exibia o seu sorriso confiante, seus
traços de princesa nagô; e fazia a gente pensar
que tudo é possível e que essa cidade, esse es-
tado, esse país tem jeito. E que a Justiça, um dia,
ainda que distante, ia estender sobre nós o seu
manto, que a todos iguala. Ledo engano. Mas
vamos enxugar as lágrimas e estancar o sangue.
Manter Marielle e seus sonhos vivos é prosseguir
na luta. Não queremos heróis, queremos direitos,
cidadania, democracia. E esses bens inalienáveis
do ser humano, para chegar aos becos pelos
quais trafegamos hoje entristecidos, abalados;
terão que ser conquistados, arrancados com gar-
ra, suor e lágrimas. Não vamos nos deixar abater.
Marielle merece viver como um símbolo que, nos
seus poucos 38 anos, fez sua vida a vida valer
à pena representando 46 mil eleitores, 140 mil
moradores da Maré, milhares de jovens negros
mortos, mulheres violentadas, trabalhadores sem
direitos, homens e mulheres agredidos por suas
escolhas. E pra nós, que tivemos o privilégio de
conviver com essa mulher inesquecível.
Redes da Maré
6 • Conheça nosso site www.jb.com.br Cidade Sexta-feira, 16 de março de 2018

INFORME JB
Arma do crime foi
liberada a uso particular
Antes restrita a Exército, 9mm podem ser usadas por PM até na folga
Maíra Coelho/Agência Estado

Jan Theophilo
jan@jb.com.br

O efeito eleitoral
A inda é cedo para avaliar o impacto que a exe-
cução da vereadora Marielle Franco terá nas
próximas eleições. Lideranças ouvidas ontem pela
coluna lembraram de episódios recentes que tive-
ram forte impacto eleitoral, como o Massacre da
CSN em 1988, que acabou garantindo a vitória de
Luiza Erundina para a prefeitura de São Paulo; ou o
Arrastão de Ipanema, em 1992, que fez Cesar Maia
virar uma eleição para prefeito que estava quase
ganha por Benedita da Silva. Alguns entendem que
a distância até o pleito poderá esvaziar o impacto
do episódio. Se fosse mais perto de outubro, o PSOL
nadaria de braçadas nas urnas. Mas o entendimento
geral é de que se for comprovado que se trata de
um crime político, a investigação não se encerra
na prisão dos assassinos, mas na descoberta dos Criminosos dispararam nove vezes contra o veículo onde estavam as vítimas: disparos entraram pela lateral traseira
mandantes. Caso contrário, é a desmoralização
completa da intervenção militar no Rio de Janeiro. MARIA LUISA DE MELO pelos peritos indicam que as armas crime também foram recolhidas pelos
malu@jb.com.br usadas no crime foram pistolas 9mm agentes. O Disque Denúncia já recebeu
— considerada uma das armas mais le- dez informações sobre o caso e divul-
Marielle 1 Povo unido Os assassinos da vereadora do PSOL tais do mundo, capazes de neutralizar gou cartaz no qual pede informações
Ciro Gomes manifestou Bom exemplo vem de Marielle Franco e de seu motorista An- o oponente com apenas um disparo. sobre a identificação e localização dos
sua preocupação com a cima. E as lideranças co- derson Gomes seguiram por cerca de Tal armamento, segundo especialistas, criminosos à população.
execução, ontem, durante munitárias de Petrópo- 4 km o carro onde as vítimas estavam é de uso restrito e comumente usado Moradora do Complexo da Maré,
um intervalo da gravação lis resolveram organizar e fizeram pelo menos nove disparos de pelo Exército e também por agentes da Marielle era crítica ao processo de in-
do programa “Jogo do uma campanha de doação pistola 9 mm, a dois metros de distân- Polícia Federal. tervenção e morreu dois dias antes de a
Poder”, do jornalista Ri- para dar um banho de loja cia do Chevrolet Agile branco, onde Em setembro do ano passado, no intervenção federal completar um mês.
cardo Bruno, que vai ao ar nas Polícias Civil e Militar estavam as vítimas, na noite da última entanto, uma portaria editada pelo co-
domingo à noite na CNT: da cidade. Conseguiram quarta-feira (14), na esquina das ruas mando do Exército liberou o uso de
“É uma mudança preocu- consertar 32 viaturas da Joaquim Palhares e João Paulo I, no Es- pistolas 9mm, de uso restrito das For-
A HISTÓRIA DO ARTIGO
pante. Estamos vendo pela PM, fora a arrecadação tácio. É o que apontam as investigações ças Armadas, para policiais, inclusive
Quando conversávamos sobre a produção de
primeira vez o crime me- de materiais de escritório da Polícia Civil. nas folgas. Alguns estados pediram au-
uma reportagem a respeito dos primeiros 30
dindo forças com o poder que faltavam nas delega- Agentes da Divisão de Homicídios torização para uso e conseguiram. dias da intervenção federal, o editor Clóvis
político”. cias. Taí uma moda que da Capital acreditam que os assassinos “O fato de o calibre ser 9 mm já res- Saint-Clair sugeriu que publicássemos um
valia a pena pegar. já sabiam o lugar exato onde a parla- tringe mais o rol dos investigados. Isso artigo da vereadora Marielle Franco no ma-
Marielle 2 mentar estava no carro, já que os dis- porque são armas mais difíceis de se- terial. O colunista Jan Theophilo me passou
O vereador Renato Cinco Ensaboado paros foram feitos de trás para frente rem compradas e autorizadas para uso o telefone de uma assessora de Marielle,
que reagiu à minha ligação na terça-feira 13:
foi um dos primeiros diri- Ontem, durante evento na do veículo (que tem os vidros escuros) do cidadão comum. O problema é que
“Que bom, estávamos pensando em como
gentes do PSOL a receber Associação Comercial, o e entraram pela janela lateral traseira. também acabaram caindo na mão de conseguir um contato com o Cidade do JB!”.
a notícia. Em menos de vice-governador, Francis- Apesar de o alvo ser Marielle, o moto- criminosos”, explica o perito criminal O texto foi enviado para meu e-mail às 18h39
meia hora ele chegou ao co Dornelles, levou um rista também acabou alvejado por estar Cássio Rosa, do Fórum Brasileiro de da quarta-feira e encaminhado ao editor às
local do crime. Em estado longo papo cabeça em na linha de tiro. Os disparos foram fei- Segurança Pública. 22h03 pela mesma assessora, que estava no
de choque, Cinco só vol- uma sala reservada da di- tos antes mesmo de o carro usado pelos Duas testemunhas já foram ouvidas carro com Marielle no momento do atentado.
pela polícia — uma assessora que es- Apesar da tragédia, o jornal decidiu não ante-
tou para casa às 6h, quan- retoria com o presidente criminosos, um Chevrolet Cobalt pra-
cipar a publicação do artigo e guardá-lo para
do se deu conta que per- do PDT, Carlos Lupi. “Te- ta, emparelhar com o veículo onde es- tava no mesmo veículo das vítimas e a edição de hoje, como fora planejado.
dera a carteira e o celular. mos em comum o getulis- tavam as vítimas. A principal linha de uma segunda mulher. Imagens colhi-
investigação da polícia é a de execução. das de câmeras por onde o carro da Celina Côrtes
mo “, despistou.
Subeditora de Cidade
Marielle 3 Os estojos de munição recolhidos vítima passou e próximas ao local do
Tudo isso acontecendo e Down no high
o pré-candidato do PT ao Madame chique de-
governo, Celso Amorim, bruçou-se na varanda
refrescava-se ontem à tar-
de tomando uma cerveja
gelada com amigos na Ca-
de seu apartamento no
Golden Green, um dos
condomínios mais ca-
Cronologia da intervenção
bana da Cely, restaurante ros da Barra, e ao ver 16 de fevereiro 27 de fevereiro retomar a votação da reforma da Previdência.
do bairro do Rio Verme- a quantidade de carros ■Presidente Michel Temer decreta intervenção ■ O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso ■ A Organização das Nações Unidas (ONU)
lho, em Salvador. pretos parados na en- federal na Segurança do Rio de Janeiro, passando o afirma, em entrevista, que o decreto de interven- e a Organização dos Estados Americanos
controle da área para as Forças Armadas. O Palácio ção expõe uma fraqueza do governo Temer, que, (OEA) divulgam nota conjunta demonstrando
trada da portaria ligou do Planalto justificou a decisão em função dos segundo FH, estaria encurralado. “profunda preocupação” com a intervenção,
Marielle 4 para o porteiro, pergun- casos de arrastões e saques durante o carnaval. A temendo, segundo as duas organizações, que
A procuradora-geral da tando se por acaso ha- declaração do governador Luiz Fernando Pezão, de 28 de fevereiro os direitos humanos sejam desrespeitados,
República, Raquel Doge viam criado ali um es- que havia “perdido o controle da situação”, também ■ A Câmara dos Deputados lança o portal “Ob- sobretudo em áreas de favelas e entre negros
serviu como a gota d’água: “Não estávamos prepa- servatório Legislativo”, com objetivo de fiscalizar e adolescentes.
defendeu ontem, em nota tacionamento do Uber. rados”, afirmou Pezão na época. o planejamento e execução das ações durante a
à imprensa o trabalho dos Ficou chocada com a ■ O general Walter Souza Braga Netto, chefe do intervenção no Rio. A dos vereadores, a Comissão 14 de março
membros do Ministério resposta. Os carros per- Comando MIlitar do Leste, é nomeado para coor- da Câmara Municipal de Acompanhamento da ■ Perto de completar um mês de intervenção, o
denar a intervenção. As polícias Civil e Militar, além Intervenção Federal, tendo Marielle como relatora. general Braga Netto afirma que o maior desafio é
Público do Estado do Rio tencem a equipe de 15 dos Bombeiros, passam a responder a ele. a coordenação de trabalho entre as polícias Civil e
de Janeiro, nas investi- seguranças de um ban- 3 de março Militar. E lança a frase: “Não sei como eles não se
gações do assassinato da queiro de jogo de bicho 19 de fevereiro Cerca de 1.400 militares das Forças Armadas matam”.
vereadora Marielle Franco que passou a residir ali. O secretário de Segurança do Rio, Roberto Sá, é realizam operação na Vila Kennedy. Durante a ■ PSOL envia ao Supremo Tribunal Federal (STF)
exonerado do cargo. ação foram presas cinco pessoas e retiradas 16 ação direta de inconstitucionalidade (Adin) contra
e de seu motorista Ander- barricadas do tráfico de drogas das vias de acesso a intervenção no Rio. Entre os questionamentos
son Pedro Gomes, na noi- Ponto final 21 de fevereiro à comunidade. No dia seguinte, horas após a saída do partido está “o caráter militar” da operação. O
te de quarta-feira. A luta continua. ■ Senadores aprovam o decreto da intervenção, dos militares da região, os traficantes voltaram a ministro Ricardo Lewandowski assume a relatoria
que já havia passado pelo crivo do plenário da instalar barricadas nas ruas. da ação.
Câmara dos Deputados. ■ O porta-voz do Gabinete de Intervenção Federal,
■ Governo afirma que vai gastar R$ 650 milhões, 8 de março coronel Roberto Itamar, afirma que anunciará em
LANCE LIVRE em 2018, com a intervenção no Rio. ■ General Braga Netto se reúne com o juiz breve o estudo de reestruturação das Unidades da
■ Primeira operação supervisionada pelo coman- Marcelo Brêtas, da 7ª Vara Federal e responsável Polícia Pacificadora. As UPPs que não estiverem
do da intervenção acontece na Penitenciária Milton pela Operação Lava-Jato no Rio, para pedir que o apresentando rendimento serão retiradas.
• Malu Garcez e o grupo a edição da campanha “Ovos
Dias Moreira, em Japeri, onde quatro dias antes dinheiro recuperado do esquema de corupção no
Dose Dupla apresentam Solidários do Coração”, que estourou uma rebelião. estado seja destinado à área de Segurança. 15 de março
espetáculo amanhã, às 19hs, contribui com o Pro Criança ■ O ministro da Justiça, Torquato Jardim, diz que
no Copa Praia Hotel. O Cardíaca, em Botafogo, da dra 23 de fevereiro 13 de março o assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL)
Grupo Mantiqueira renovou Rosa Célia.
■ Juízes, promotores e procuradores assinam ■ O presidente Michel Temer afirma que a não põe em xeque a eficácia da intervenção fede-
manifesto de apoio às Forças Armadas no con- intervenção no Rio deve ser suspensa em se- ral: “Foi uma tragédia. Mais uma tragédia diária do
texto da intervenção no Rio. tembro deste ano, quando o governo pretende Rio de Janeiro”.
Com Bernardo de la Peña
Sexta-feira, 16 de março de 2018 Cidade Conheça nosso site www.jb.com.br • 7

Um crime Morre uma Os que velam O assassinato Estou indignada

inaceitável e mulher e morre pela higidez significa um com mais um
inadmissível. um pouco cada do processo trágico avanço crime hediondo
Foi um atentado uma de nós, democrático na escalada da contra uma
ao estado de mas fica viva sua estão chocados barbárie que deve mulher negra
Direito e à luta por Justiça que se tente calar ser contida custe e ativista dos
democracia" e igualdade" a voz da política" o que custar" direitos humanos
MICHEL TEMER CÁRMEN LÚCIA LUIZ FUX RODRIGO MAIA LUIZA ERUNDINA

Temer põe PF às ordens

Assassinato de Marielle causou forte repercussão no governo, no Judiciário e no Congresso

Após saber do assassinato da vereadora

Marielle Franco, o presidente Michel Temer Reprodução Twitter

informou, em nota oficial, que colocou a Polí-

cia Federal à disposição para auxiliar em toda
a investigação. Mais tarde, em vídeo nas redes
sociais, afirmou que o crime é “inaceitável” e
“inadmissível”. E o classificou como um “aten-
tado ao Estado de Direito e à democracia”. Se-
gundo Temer, “trata-se do assassinato de uma
representante popular, que fazia manifesta-
ções, trabalhos, com vistas a preservar a paz e
a tranquilidade na cidade do Rio de Janeiro”.
Pela manhã, Temer se reuniu com minis-
tros no Planalto para discutir o caso. O mi-
nistro da Segurança Pública, Raul Jungmann,
e o diretor da Polícia Federal, Rogério Gallo-
ro, foram enviados ao Rio para acompanhar
as investigações. Jungmann também se reu-
niu com o interventor federal do Rio, general
Braga Netto, e com o general Richard Nunes,
secretário de Segurança do estado. O minis-
tro também disse que conversou com a pro-
curadora-geral, Raquel Dodge, e afirmou que
a investigação “já está federalizada”.
O presidente do TSE, ministro Luiz Fux,
abriu a sessão ordinária da Corte expressando
“o profundo pesar” da Justiça. Em nome da Jus-
tiça Eleitoral, Fux disse que todos “que velam
pela higidez do processo democrático ficaram
chocados que se tente calar a voz da política”.
O presidente nacional da OAB, Cláudio
Lamachia, divulgou nota na qual disse que No Parlamento Europeu, deputados de coalizão de esquerda protestam segurando cartazes em homenagem a Marielle

ONU cobra apuração

o “assassinato da vereadora Marielle Franco
é um crime contra toda a sociedade e ofen-
de diretamente os valores do Estado Demo-
crático de Direito”. O Conselho Federal da
OAB acompanha o caso e espera agilidade

na apuração e punição exemplar.
A presidente do STF, ministra Cármen Lú-
cia, manifestou pesar pela morte da vereadora.
“Morre uma mulher. No caso de Marielle, mor-
re um pouco cada uma de nós. Fica viva sua luta
por Justiça e igualdade. E o nosso compromisso
de continuar com ela. Assim, ela continua co-
nosco. Para sempre Marielle!”, disse no Twitter.
O ministro Luís Roberto Barroso afirmou que
“está acontecendo no Rio de Janeiro neste exato
momento, uma combinação medonha de desi-
gualdade, corrupção e mediocridade”.
Na Câmara, o presidente Rodrigo Maia
afirmou que o assassinato da vereadora e de
seu motorista “significa um trágico avanço
na escalada da barbárie que deve ser contida
custe o que custar”. À tarde, com girassóis
em punho e uma faixa preta, parlamentares
de diversos partidos fizeram homenagem
em sessão solene da Câmara, A deputada
Luiza Erundina (PSOL-SP), disse estar in-
dignada “face a mais um crime hediondo
contra uma mulher negra, do povo, uma ati-
vista dos direitos humanos”.
O ex-presidente Lula, em Salvador, prestou
homenagem à família de Marielle. “Conde-
namos veemente a falta de segurança que vive
grande parcela do povo brasileiro, vamos ser
solidários à família e amigos dessa jovem de
38 anos. Isso é abominável, temos de exigir
do governo do Rio e das Forças Armadas que
cuidam agora da violência (com a interven-
ção) que prestem contas à sociedade, mos-
trando os culpados”. A ex-presidente Dilma
Rousseff usou as redes sociais para lamentar
o crime. “O Brasil deve se levantar mostrando
sua indignação contra o assassinato”.
A
Reprodução internet/The Guardian
morte de Marielle Franco
na noite de quarta-feira
se tornou o assunto mais
comentado do mundo no Twitter
ontem. Fora das redes sociais, o
crime gerou reação da ONU, que
cobrou uma investigação rápida
sobre o caso, e de outras institui-
ções, como Anistia Internacional
“The Guardian” cita onda de protestos pelo Brasil e Human Rights Watch, que tam-
bém pediram a apuração do assas-
Reprodução internet/Le Monde
sinato.
O Escritório de Direitos Hu-
manos das Nações Unidas divul-
gou nota em que cobra rapidez,
transparência e credibilidade nas
Para investigações do assassinato da
“Liberation”, vereadora, que classificou de “pro-
Marielle fundamente chocante”. A imprensa
renovou internacional noticiou o caso, des-
esquerda tacando a atuação da jovem polí-
brasileira tica na área de direitos humanos e
suas críticas aos abusos da polícia.
Reprodução internet/Clarín Em Lisboa, um grupo se reuniu
na Praça Luís de Camões para pro-
testar. Em Buenos Aires, as Mães
da Praça da Maio dedicaram a sua
tradicional ronda de quinta-feira à
memória de Marielle.
“Clarín” Houve reações de políticos ao
retrata redor do mundo, que prestaram
Marielle homenagem a Marielle e critica-
como ram as forças de segurança brasi-
vereadora leiras.
e ativista No Parlamento Europeu, o ór-
gão legislativo da União Euro-
peia (UE), deputados da coalizão
Esquerda Unitária Europeia e
Esquerda Nórdica Verde (GUE/
NGL), que reúne 52 membros de
vários partidos, protestaram com
cartazes com a frase “Marielle, pre-
sente, hoje e sempre”.
Parlamentares levaram os carta-
zes para o plenário, que fica em Es-
trasburgo, na França. Um deles foi
Miguel Urbán Crespo, do espanhol
Podemos: “Intervi no Parlamento
Europeu para mostrar nossa con-
denação e repulsa a esse crime”.
Em nota publicada no site da
coalização, o grupo disse que está
“preocupado com a repressão con-
tra o povo e trabalhadores do Bra-
sil” e denunciou “a militarização
da sociedade pelo governo de Mi-
chel Temer”.
A deputada Marie-Pierre Vieu,
do Partido Comunista da França,
que está em Salvador participando
do Fórum Social Mundial, par-
ticipou de atos em homenagem a
Marielle durante o evento. “Muita
emoção aqui e ainda mais raiva”,
afirmou.
Os parlamentares pediram a
suspensão “imediata” das nego-
ciações do acordo comercial entre
a União Europeia e Mercosul por
conta do assassinato da vereadora.
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Vice-Presidente
Gilberto Menezes Côrtes
Presidente: Omar Resende Peres | Conselheiros: Gilberto Menezes Côrtes - René Garcia Jr - Octávio Costa - Wilson Cid - Hildeberto Aleluia
Salvo melhor juízo
A vereadora Marielle Franco, cuja trágica ausência
acaba de empobrecer as atividades comunitárias do Rio
de Janeiro, tornou-se – diga-se antes de tudo – credora,
no calor de suas convicções, do respeito e da admira-
ção dos cariocas, independentemente de ideologias e
cores partidárias, pois nem sempre fossem suas ideias
detentora de apoios unânimes. Pouco antes de tombar
sob balas assassinas, ela deixou, em forma de testamento
político, uma crítica contundente à intervenção federal
nos organismos da Segurança Pública da cidade. Uma
carta em que, nas horas derradeiras, ela opinou que a
decisão intervencionista é, na sua essência, uma arma-
ção contra as minorias; e minorias, nos seus segmentos
mais sofridos: os negros, os muito pobres, as mulheres
negras e pobres. O texto foi encaminhado ao JB e a ele
damos publicidade nesta edição.
A crítica da vereadora à intervenção favorece uma
outra reflexão, que certamente contrasta com a dela,
sem que nisso se negue seu ideal combativo. Porque a
decisão do governo federal de socorrer o Rio, quando
lhe fugia um mínimo de segurança, foi, na verdade e
antes de tudo, uma reação à banalização da morte dos
cariocas, onde as faixas que preocupavam Marielle são
exatamente as vítimas preferenciais do descalabro a que
fomos todos condenados.
Não há o que negar: as estatísticas sinistras do sangue
inocente que corre nas nossas ruas revelam a preferên-
Regime colonial do espírito
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.*
Quero voltar a falar da famigerada turma da bufunfa. O
leitor já conhece os seus feitos e façanhas. O núcleo duro é
composto de banqueiros e financistas. A serviço deles estão
economistas, jornalistas e outros profissionais – alguns muito
prestigiados e bem-remunerados, outros nem tanto e ansio-
sos para subir na vida.
Tenho por esses economistas bufunfeiros um divertido hor-
ror. Há exceções, claro, mas de maneira geral eles se notabilizam
por uma mistura de ignorância, oportunismo e falta de imagi-
nação. Recentemente, escrevi um artigo na Carta Capital sobre
eles, tomando como exemplo um economista que ocupa posição
elevada no governo federal.
Nelson Barbosa, que foi ministro da Fazenda no governo Dil-
ma, resolveu tweetar o artigo. Desencadeou-se uma pequena
tempestade. Foram, sem exagero, centenas de reações, a maioria
(confesso) negativas. Impressionante o número de pessoas ansio-
sas para defender o alto funcionário governamental e dispostas a
lançar insultos contra este pobre e indefeso articulista.
Fiquei quieto. Esperei alguns dias e respondi apenas que os
insultos me fizeram lembrar a observação de Dom Quixote: “La-
dram, Sancho, sinal de que cavalgamos”.
Assim, acredito que preciso voltar ao assunto. Estou aparente-
mente no caminho certo. Não cabe dar muito descanso à turma.
Há uma dimensão do economista bufunfeiro que não pode
ser subestimada: ele é quase sempre “cosmopolita”, no pior senti-
Editores
• Política/Nacional: Octávio Costa | octavio.costa@jb.com.br
• Editor de Cidade: Clóvis Saint-Clair | clovis@jb.com.br
• Informe JB: Jan Theophilo | jan@jb.com.br
Opinião
Fundado em 9 de abril de 1891
Diretor Presidente
Omar Resende Peres
Diretor de Redação
Toninho Nascimento Antonio Carlos Mello Affonso
CONSE LHO E DIT ORIAL
cia das quadrilhas pelos pobres, pelos pardos, negros,
pelas moças e senhoras indefesas. São também esses os
que, com maior frequência, vão chorar sobre os meninos
tombados pelas balas perdidas. Os pobres padecem, mui-
to mais que os brancos e os ricos, porque estes, mesmo
vivendo os perigos da violência, ainda dispõem de algum
recurso de defesa, têm casas com segurança, não preci-
sam subir o morro dominado pelo crime.
A ilustre ausente certamente sabia que, no quadro das
dificuldades em que vivem as mulheres, principais víti-
mas dessa violência que no Rio grassou mais que a febre
amarela, são as negras, as pobres, as excluídas as primei-
ras a serem chamadas ao sacrifício. Os números a esse
respeito não sofismam. Basta conferir.
É indispensável mostrar, até em respeito à memória
da vereadora e às preocupações que regeram seu manda-
to, que sem distinção de classes e de gêneros, a interven-
ção se fez necessária, e até tardava, diante de uma cidade
sob clima de guerra civil; guerra não declarada, mas nem
por isso diferente em seus efeitos. Chegamos a esse pon-
to. Outro caminho a população não tinha, além de apelar
aos recursos federais; uma tentativa de levar aos cariocas
um mínimo de paz, sem perseguições pré-concedidas,
sem disparar armas a ermo, exatamente o oposto ao que
fazem os bandidos. Isso parece tão claro, que não aceitá-
-lo só por força de imaginações tendenciosas.
Na verdade, seria impossível conceber de outra forma.
do da palavra – no sentido em que ela foi usada por Euclides da
Cunha, por exemplo, para quem o cosmopolitismo era “o regime
colonial do espírito”.
A ligação do bufunfeiro com o Brasil é tênue, duvidosa. Co-
meça pela sua formação, que se dá nos Estados Unidos (ou em
escolas brasileiras de economia que ensinam à moda americana).
Dos Estados Unidos, o futuro bufunfeiro volta bem treinado –
adestrado seria talvez a palavra mais apropriada – e capaz de re-
petir sem críticas os ensinamentos recebidos.
Como dizia Nelson Rodrigues, brasileiro não pode viajar. O
estudo no exterior produz uma verdadeira desnacionalização
mental – os alunos absorvem não só conceitos e teorias, mas
também valores. Saem daqui provincianos, suburbanos, e voltam
orgulhosos “cidadãos do mundo”, aparentemente sofisticados, na
verdade espiritualmente castrados.
A fragilidade psicológica do brasileiro chega a ser comovente.
Há casos particularmente medonhos. São aqueles que estudam
nos EUA e depois fazem carreira em organismos internacionais,
como o FMI e o Banco Mundial. Esses aí costumam se destacar
pelo vira-latismo. De novo, há exceções (e eu espero ser uma de-
las), mas o padrão geral é bisonho. Nos meus mais de 8 anos em
Washington, como diretor executivo no FMI pelo Brasil e ou-
tros países, conheci vários desses economistas, não só brasileiros,
mas outros latino-americanos. A sua função é dar uma aparência
local à defesa dos interesses do establishment internacional. Re-
cebem em troca cargos, homenagens e benesses. Não raro, re-
tornam a seus países de origem para ajudar a enquadrá-los nos
“consensos” internacionais do momento.
Fale com JB
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Sexta-feira, 16 de março de 2018
Vice-Presidente
Imagine-se a absurdez de uma decisão do governo de
mobilizar recursos e localizar em uma cidade suas prio-
ridades militares, se a missão fosse o horror de eliminar
os pobres e escolher etnias para atacar. Estaríamos diante
de intolerável inversão de papéis e de responsabilidades:
a sociedade confiscando aos bandidos o mal indiscrimi-
nadamente.Não há como imaginar tamanha insensatez.
O reparo, oportuno e respeitoso que se impõe à pro-
clamação derradeira da vida da vereadora, nada mais
pretende além de contribuir para a correta interpretação
dos fatos e da realidade que vivemos no Rio de Janeiro. A
interventoria não age com ações inspiradas em precon-
ceitos, mas em conceitos. E vale insistir: não podia ser
diferente. Se fosse para desviar seus objetivos ela já teria
sido repudiada pelos cariocas.
Os resultados que esperamos alcançar até o fim do
ano, prazo a que o governo se deu para cumprimento da
missão, obtida a depuração dos aparelhos de segurança,
depois de contido o crime organizado, restabelecida a
confiança da população em seus representantes, certa-
mente haverão de contemplar, em primeiro lugar e prio-
ritariamente, os condenado à exclusão os que para ela ca-
minham. Os bons resultados serão uma forma de honrar
a memória da vereadora Marielle Franco. Porque por ela
o melhor que se poder fazer é mostrar que os beneficiá-
rios preferenciais são exatamente os que ela supunha víti-
mas de uma intervenção agressora.
Conto um pequeno episódio, ligeiramente cômico, que é ilus-
trativo do que quero dizer. No início de 2017, quando eu estava
em Xangai, como vice-presidente do banco estabelecido pelos
BRICS, representantes do governo da China nos procuraram
para pedir que ajudássemos a reforçar os resultados da cúpula
dos líderes dos BRICS, que ocorreria em setembro, em Xiamen.
Uma das sugestões deles era preparar um documento sobre os
BRICS e a economia mundial, que contribuísse para consolidar
a visão dos cinco países sobre grandes temas internacionais. A
ideia foi bem recebida pelo banco.
Em uma reunião dos BRICS, em abril, os chineses apresenta-
ram aos outros quatro países as suas propostas para a cúpula. Fui
convidado a explicar como o banco dos BRICS pretendia con-
tribuir, inclusive na preparação de um documento sobre temas
econômicos internacionais. Abriu-se em seguida a discussão, e o
primeiro a pedir a palavra foi o representante brasileiro, um as-
sessor internacional do ministro Henrique Meirelles, economista
formado nos EUA e com longa carreira no FMI. Sem o menor
constrangimento, declarou taxativamente que não via razão para
o banco dos BRICS se dedicar a essa tarefa, pois já dispúnhamos
dos relatórios do FMI!
Não é caricatura, leitor. Era o regime colonial do espí-
rito, outra vez.
Os chineses não entenderam nada.
O autor é economista, foi vice-presidente do Novo Banco de
Desenvolvimento, estabelecido pelos BRICS em Xangai, e diretor
executivo no FMI pelo Brasil e mais dez países.
Venda em banca
Dias úteis: RJ,SP,MG, ES e DF: R$ 5,00 - Demais estados: R$ 6,00
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Sexta-feira, 16 de março de 2018 Opinião Conheça nosso site www.jb.com.br • 9

Todos nós morremos Marielle,

um pouco presente!
JORGE ANTÔNIO BARROS*

GILBERTO SCOFIELD JR*

Eu estava em frente à Câmara de Vereadores do Rio quando
o corpo da vereadora Marielle Franco e do motorista Ander-
son Pedro Gomes chegaram em seus caixões. Meu horário de
almoço era preenchido com um aperto na garganta vendo cen-
tenas de pessoas aos prantos. Havia um sentimento ali, naquela
corrente de humanidades, que era a expressão da representati-
vidade da quinta vereadora mais votada do Rio. E não adianta
dizer que morreu ali uma feminazi, como eu li em posts de
gente carregada de ódio e “cansada da chatice do politicamen-
te correto”. Morreu ali uma representante eleita do povo que,
coisa rara, dialogava com ele. E não só. Morreram ali todas as
mulheres. Morreram ali todas as mulheres e homens negros.
Morremos ali todos os LGBTs. Morreram ali os moradores
de periferia e comunidades, tão fre-
quentemente confundidos pelos
conservadores com os bandidos que
eles tanto temem, mas insistem em
não enxergar no andar de cima, em
Brasília, nos partidos, nos governos.
Morreram todos que, de uma forma
ou de outra, encontravam sua voz na
voz de Marielle.
A hora é de claramente tomar la-
Uma semana depois que a
dos e partir para resgatar um país re-
fém do medo, do autoritarismo, dos
vereadora Marielle Franco
fascismos e dos esquerdismos toscos
incapazes de autocrítica. Quem me-
denunciou o 41º batalhão
lhor mapeou a trama que envolve a
execução de Marielle foi o querido
(de Acari) e no dia seguinte
Marcos Cavalcanti em sua página no
Facebook. Diz ele:
que o general Braga Netto
“Uma semana depois que a vere-
adora Marielle Franco denunciou o
(o chefe da intervenção
41º batalhão (de Acari) e no dia se-
guinte que o general Braga Netto (o
no Rio) tinha ordenado
chefe da intervenção no Rio) tinha
ordenado “inspeções” aos batalhões
“inspeções” aos batalhões
da PM, Marielle foi covardemente
assassinada.
da PM, Marielle foi
A execução da Marielle Franco é
um claro desafio ao general Braga
covardemente assassinada"
Netto. As milícias que controlam
várias regiões do Estado do Rio de
Janeiro estão incomodadas. Com a prisão de Picciani, Paulo
Mello e Eduardo Cunha (suporte político) e um interventor
que elas não controlam na secretaria de segurança, elas estão
se sentindo ameaçadas. E deram um recado. Não mexam co-
nosco.
Vivemos um momento decisivo no estado. Ou o general vai
se intimidar e negociar um “arrego” com as milícias, deixan-
do-as “quietas” em troca de uma “calmaria” na segurança ou
ele vai cumprir o que prometeu e enfrentá-las. Não tem muitas
alternativas, mas lembro ao general que o momento que vive-
mos não é parecido com o passado. Agora existem as redes so-
ciais e a vigilância e cobrança da sociedade vai ser muito maior.
Vai ser difícil ele fazer este acordo “por debaixo dos panos”.
A sociedade não quer saber apenas quem matou Marielle,
mas quem MANDOU executá-la. Puxando este fio da meada
vamos chegar muito perto do grupo de milicianos (fardados
ou não) que tomou conta do estado. A situação é muito grave.
É um enigma que interessa a todos nós. Ou o deciframos ou
seremos devorados por ele. Nós e o general.”
Eu vou além. Eu me questiono se uma intervenção militar
é apropriada ou solução permanen-
te para a violência de um estado em
decrepitude moral, educacional e fi-
nanceira. O estado de violência está
não apenas no Rio, mas no Brasil
inteiro diante da falta de uma eficaz
política de segurança pública. E de
educação. E de saúde. O Batalhão
de Acari é conhecido por atirar pri-
meiro e perguntar depois. Isso não
é polícia. Não se trata de defender
bandido, como muitos gostam de
simplificar (ah, os simplificadores e
sua incompetência intelectual para
enxergar tons de cinza). Trata-se de
construir uma política de segurança
pública que não se baseie num exter-
mínio humano que afeta justamente
os mais pobres e os negros. Que in-
clua na equação os recursos públi-
cos em saúde, educação e renda que
insistem em ser desviados para Ilhas
em contas secretas no Caribe.
A hora é de gritar alto, ir para as
ruas e frear essa onda de militarismo
assassino (pelo lado policialesco) ou
redentor (pelo lado da intervenção),
tão popular no discurso de muitos
candidatos nas próximas eleições.
Porque não se vê aí um fim definiti-
vo do que nos aflige num estado gerenciado por bandidos que
não estão nos morros. É hora de tratar o voto com muita, mas
muita atenção. Porque a democracia morreu baleada numa
rua do Estácio essa semana.
* Jornalista, colunista do JORNAL DO BRASIL,
Sempre aos Domingos, no Caderno B
Mataram uma vereadora no Rio. Ela poderia ter
sido eleita com seu voto. Eu não votei nela, sequer
acompanhava sua luta em defesa de minorias, mas
respeito profundamente todos os seus eleitores. Ela
era uma representante do poder legislativo municipal,
uma das cinco mais votadas nas eleições passadas. A
vereadora Marielle Franco, do PSOL, de 38 anos, foi
executada a tiros com o homem que dirigia o carro
na noite desta quarta-feira, na Rua Joaquim Palhares,
perto da Praça da Bandeira, a cerca de três quilôme-
tros da sede do Comando Militar do Leste, onde fica
o general Braga Neto, interventor federal na segurança
do Rio desde o dia 16 de fevereiro deste ano. Esse cri-
me brutal e covarde é um desafio à intervenção federal
no Rio.
O assassinato de vereadora não pode ficar impune.
É uma questão de honra para a intervenção federal.
Nada é mais urgente agora do que a resposta que a Po-
lícia Civil precisa dar contra essa execução covarde da
vereadora.
Na véspera de sua morte, a vereadora havia pu-
blicado em sua página no Facebook denúncia contra
a violência de policiais do 41º BPM (Acari), que vi-
nham ameaçando e aterrorizando moradores daquela
favela na Zona Norte da cidade. Ela escreveu em seu
Facebook: “Precisamos gritar para que todos saibam o
está acontecendo em Acari nesse momento. O 41° Ba-
talhão da Polícia Militar do Rio de Janeiro está aterro-
rizando e violentando moradores de Acari. Nessa se-
mana dois jovens foram
mortos e jogados em
um valão. Hoje a polícia
andou pelas ruas ame-
açando os moradores.
Acontece desde sempre
e com a intervenção fi-
cou ainda pior”.
É claro que não se
pode generalizar. Em
Os líderes do
toda unidade policial, há
agentes honestos e pre-
PSOL não
servadores das leis. Mas
o protesto de Marielle
querem, com
contra a ação nefasta de
alguns policiais deve ser
razão, se
levado em conta pela
apuração policial. Quem
antecipar e
não lembra que o anti-
go batalhão de Rocha
aguardam as
Miranda foi o celeiro de
matadores de chacinas
investigações,
como a de Acari (em
que 11 jovens desapa-
que precisam
receram em 1990) e de
Vigário Geral (em que
ser rápidas
foram mortas 21 pessoas
em 1993)? De onde vie-
e eficientes

O mártir de cada dia para dar

ram os policiais do novo
batalhão de Acari?
É óbvio que os tiros
que mataram Marielle
uma resposta
EDUARDO SIMBALISTA*
espaço do convívio social, inadmissível. No campo da ética,
imoral. No campo da lógica, irracional. No da inteligência,
e seu motorista foram
disparados também
ao crime
Rio, 40 graus. Acabo de passar
burrice incompreensível. No campo da política, retrocesso.
Para os aproveitadores de sempre,
contra cada um de seus
eleitores e pra tentar ca-
organizado,
pelo velório de Marielle, a mártir
da causa igualitária assassinada
mais proveito. Para os radicalis-
mos, estopim. Para as instituições,
lar aqueles denunciam a
violência dos covardes.
seja a origem
ontem no Estácio.
Há 50 anos, no mesmo mês de
um risco.
A marcha de 1968 reunia, às
Os líderes do PSOL não
querem, com razão, se
que tiver"
março, uma bala no peito calava o duas da tarde, 50 mil pessoas; ao antecipar e aguardam as
estudante Edson Luís no vizinho final do dia, quando partiu em investigações, que preci-
restaurante universitário Cala-
bouço, ali onde ser ergue o Trevo
A morte de Marielle direção à Candelária, arrastava
100 mil.
sam ser rápidas e eficientes para dar uma resposta ao
crime organizado, seja a origem que tiver.
Edson. E, da mesma Cinelândia
da realidade brasileira, onde agora
é emblemática. No Dizem que o martírio é o teste-
munho do derramamento do pró-
A necessidade de uma resposta rápida das autori-
dades é questão de sobrevivência da própria interven-
Marielle é chorada, partiria a Pas-
seata dos 100 mil.
campo das emoções, é prio sangue.
“Solto o ódio, mato o amor”,
ção. Os militares não vão querer sair desmoralizados
do Rio. A importância de a polícia dar prioridade à
Para o martírio de Edson Luiz,
assassinado também no mês de
comovente. No altar das cantava Luís Melodia, em “Está-
cio, Holly Estácio”. Era um caso de
investigação desse crime não é de forma alguma pelo
fato de a vereadora ser melhor do que qualquer outra
março, bastou uma bala covarde;
para matar Marielle e Anderson,
crenças, inacreditável. No amor transformado em ódio: “se
alguém quer matar-me de amor,
vítima de homicídio. Pelo contrário. Ela parecia ser
uma mulher simples, nascida na favela da Maré. Ou-
seu condutor, foram nove os dispa-
ros. O ódio aumentou, mas a mira é
espaço do convívio social, que me mate no Estácio”.
No Rio, hoje, 40 graus. Há
tros assassinatos também clamam por Justiça.
O que a sociedade precisa entender é que os limites
a mesma. Edson Luiz, 1968, Chico
Mendes, tiro de escopeta no peito,
inadmissível. um bocado de gente reunida na
Cinelândia. Nas escadarias da
tornam-se ainda mais frágeis, diante do assassinato de
parlamentares, magistrados, jornalistas, e outros repre-
1988, Marielle, 2018. O Brasil não Câmara Municipal, onde se cos- sentantes da própria sociedade. Eles são porta-vozes de
fabrica mártires que possam ser tuma encenar o Auto da Paixão segmentos sociais, movimentos da cidadania. Calar es-
marcados por décadas decadentes, de Cristo, uns choram, outros sas vozes é também calar um pouco cada um de nós.
aqui se produzem mártires todos os dias, pretos, brancos, discursam, uns fumam, outros bebem cerveja. E, parece
ricos, pobres. que a chapa vai esquentar. *Diretor do Sindicato dos Jornalistas do Município do
A morte de Marielle é emblemática. No campo das emo- Rio de Janeiro, fundador da Abraji, jornalista com larga
ções, é comovente. No altar das crenças, inacreditável. No * Jornalista passagem no JORNAL DO BRASIL e O Globo.
10 • Conheça nosso site www.jb.com.br Cidade Sexta-feira, 16 de março de 2018

Arranha-céus à vista
Projeto de construção de torres no Flamengo mobiliza os moradores do bairro
Marcos Tristão Reprodução
CELINA CÔRTES
celina.cortes@jb.com.br

Os moradores do Flamengo, na Zona Sul,

poderão ter de engolir um projeto megalô-
mano capaz de causar sérios impactos am-
bientais ao bairro. Sem que houvesse nenhu-
ma consulta popular, a secretaria municipal
de Urbanismo e Infraestrutura aprovou, tão
logo foi comprado pela Sig Engenharia em
leilão, realizado em janeiro de 2017, um ter-
reno em “L” com 5.900 metros quadrados,
localizado entre as ruas Machado de Assis e
Dois de Dezembro, Com os R$ 77 milhões
arrecadados, o estado pretendia quitar suas
dívidas com os servidores públicos. A área
é vizinha ao já saturado Largo do Machado.
O projeto, conforme os moradores, prevê
a construção de seis blocos de 21 andares,
com 487 apartamentos residenciais e 70 lo-
jas comerciais.
A extensa área, capaz de abrigar cinco pis-
cinas olímpicas, reúne dois terrenos. O maior
trecho, em frente à Machado de Assis, era a
antiga garagem de bondes, onde funciona-
va a usina de carvão para alimentar a então
futura extensão para a Zona Sul. O uso do
espaço foi sucedido pelas garagens da Com-
panhia de Transportes Coletivos (CTC) e da
Companhia de Desenvolvimento Rodoviário
e Terminais (Coderte). Depois passou aos
domínios do Metrô, quando virou um terre-
no baldio. A área foi ocupada por casebres,
demolidos antes que saísse a licença para
este fim, em 30 de janeiro de 2017, como in-
forma o engenheiro Rubens Cieslak, antigo
morador da Machado de Assis. “Não somos
contra os prédios, mas contra a altura deles e
ao adensamento. Criamos uma comissão téc-
nica de engenheiros para acompanhamento,
porque não houve nenhuma transparência
nessa história toda”, denuncia Cieslak.
A situação do terreno da Dois de Dezem-
bro, ocupado por um cortiço, também era
confusa, envolvendo um advogado que teria
adquirido a área por uso capião após paga-
mento das dívidas de IPTU e desaparecido.
O corretor Eduardo Tiago, que perderia a
vista de sua janela para o Pão de Açúcar se a
obra for adiante, tenta mobilizar os morado-
res contra a iniciativa. “Minha rua tem um
sério problema com esgoto, quando chove
os bueiros transbordam, apesar das duas
obras já feitas pela Cedae, Também sofre-
mos com o abastecimento de água precário
e, além disso, as torres vão cortar toda a cir-
culação de ar”, argumenta.
Apesar de fazer fronteira com a sede tom-
bada do Instituto dos Arquitetos do Brasil
(IAB), o diretor do Instituto Estadual do
Patrimônio Cultural (Inepac), Marcus Mon-
teiro, disse que a aprovação do projeto pelo
órgão foi anterior à sua gestão. “O impacto
foi reduzido com um afastamento entre o
projeto e a IAB”, resumiu, e atribuiu autori-
zação final à prefeitura. A secretaria munici-
pal de Urbanismo e Infraestrutura, por sua
vez, informou que o projeto atende a legisla-
ção municipal, “não havendo impedimentos
para o licenciamento”. O projeto aprovado,
entretanto, seria diferente do previsto pelos
moradores: envolveria dois blocos, um com
16 pavimentos e outro com 14, e 12 unida-
des por andar, além de um pavimento de lo-
jas e outros dois subterrâneos de garagem.
A área de 5.900 metros quadra-
dos reúne terrenos nas ruas
Machado de Assis e Dois de
Dezembro, próximos ao Largo
do Machado. Acima, reprodução
das torres que serão erguidas
pela construtora
Já o trecho de frente para a Dois de De-
zembro é colado à sede da Oi Futuro Fla-
mengo, que também estaria pleiteando tom-
bamento para se preservar, porém a empresa
não quis se manifestar, A Sig Engenharia
informou que será providenciada pelos em-
preendedores toda infraestrutura necessá-
ria, Alegou que se o prédio fosse mais baixo,
teria que ocupar mais área de terreno e mi-
nimizou a altura das torres: “afinal, cidades
com os melhores IDHs do mundo têm seus
arranha-céus.”
O arquiteto e urbanista Adir Ben Kaus
estranha a forma como o Estado e o
município lidam com um bem público:
“Um projeto com essas dimensões deve-
ria ser acompanhado por uma audiência
pública”, defende.

Mensagens dos leitores

As cartas, contendo telefone e endereço do autor devem ser dirigidas à redação do JORNAL DO BRASIL, rua Avenida Rio Branco, 53, 2108 - CEP: 20090-004 ou pelo e-mail: cartas@jb.com.br

 Resposta da Previ
Em resposta à leitora Érica
Maria Santos (JB, 15/3/2018),
a Previ ressalta que sempre foi
reconhecida pelo seu modelo de
governança maduro e transpa-
rente e por seu corpo técnico
qualificado.
Nossas decisões de investimento
são pautadas por políticas bem
definidas e nossa visão é de lon-
go prazo, o que nos garantiu em
114 anos de história sucessivos
superávits.
Em 2016 a CPI dos Fundos de
Pensão e a Polícia Federal confir-
maram a boa governança da Previ,
uma vez que não houve qualquer
constatação de irregularidade ou
indiciamento dos nossos dirigen-
tes e executivos em suas investiga-
ções. Pelo contrário – a Previ foi
mencionada pela CPI como um
exemplo de gestão para o setor.
A Previ administra os recursos
sob a sua gestão com excelência
e responsabilidade, focada na
missão de garantir o pagamen-
to de benefícios aos associados
de forma eficiente, segura e
sustentável.  de nossa área possam merecer
Simone Monteiro
Gerente Executiva da Assessoria de Impren-
sa da Previ
Fundos de Pensão
A carta da leitora Érica  Maria
Santos, publicada pelo JB nesta
quinta-feira (15/3/2018), mostra
que a leitora é politicamente de
direita ou analfabeta política, pois
atribui a existência da corrupção
aos governos dos últimos 13
anos. A corrupção de hoje sem-
pre existiu e continua a existir em
diversos segmentos da sociedade
e podemos afirmar que ela vem
desde a ocupação portuguesa e se
manteve em todos os períodos da
nossa história.
A corrupção não tem apenas
13 anos, ela esteve presente nos
períodos imperial e republicano,
inclusive no período ditatorial,
quando a corrupção não chegava
à tona por conta da forte censu-
ra  imposta aos meios de comu-
nicação pelos militares.
Carlos Roberto Penna Dias dos Santos
Professor de História-Rio de Janeiro
Músico erudito
Sou um ávido leitor do JORNAL
DO BRASIL, nesta nova fase de
sua publicação em papel. E não
estou nada decepcionado. Ontem
vi que a colunista Hildegard
Angel dedicou um bom espaço à
figura de Claudio Santoro, uma
personalidade quase esquecida
de nossa intelectualidade.  Não
é sempre que a chamada grande
mídia dá uma atenção especial a
um nome da música erudita bra-
sileira. Espero que outras notícias
espaço em sua primorosa página
do Caderno B.
Ricardo Tacuchian
Maestro e compositor
Enfim, o JB!
Parabéns pelo relançamento. Aos
72 anos, posso afirmar que o JB
faz parte da minha história de
vida. Lembro de muitas pessoas
lendo o jornal, na lancha, durante
a travessia Niterói-Rio. Por força
do hábito, passamos a chamar de
caderno B, os eventuais cadernos
culturais de outros jornais. Enfim
temos de volta um Jornal que se
pode ler!
Wagner Gutterres
Niterói–Rio de Janeiro
Violência
Muito triste a execução da verea-
dora Marielle Franco. Vivemos
em tempos de barbárie. Como
disse a viúva do motorista, que
também foi assassinado: “É como
dizem, só mais um.” Difícil, a
nossa realidade.  haja também uma forte atuação
Quero chamar atenção para
uma faixa do PSOL estendida na
escadaria da Câmara, contra a
intervenção militar no Rio. Será
que a luta política se sobrepõe à
realidade? Vejam o que aconteceu
com uma integrante do partido e
legítima representante do povo.
Não podemos nos conformar
com a segurança pública coman-
dada por um partido corrupto,
cujo chefe da quadrilha está preso.
A intervenção federal não perde o
valor porque foi decretada por um
presidente que todos detestam.
Emmanuel Miranda Pereira
Rio de Janeiro
Contra a democracia
O mundo nunca precisou tanto
de pensamento livre quanto
agora. O mundo nunca preci-
sou tanto de consideração pelo
outro como agora. A liberdade de
expressão é parte integrante da
sociedade democrática. A mor-
te está presente na vida de todos
nós, para alguns mais cedo, de
modo mais trágico. Os assassina-
tos da vereadora carioca Mariel-
le Franco, e do seu motorista,
Anderson, são um golpe contra a
democracia.
Celso Fraga da Silva
Rio de Janeiro
Temor da população
O aumento da violência no Rio,
como demonstra o assassinato de
uma vereadora do PSOL, mesmo
com a intervenção federal na
segurança pública do estado, é
emblemático. Urge que parale-
lamente à ação intervencionista,
socioeconômica, para pôr fim ao
medo da população do Rio de
Janeiro.
José de Anchieta de Almeida
Advogado-Rio de Janeiro
Direitos humanos
Tão triste quanto a execução
da vereadora carioca Marielle
Franco e
do seu motorista, Anderson, é ter
que ler comentários de pessoas
desinformadas, nas redes sociais,
sem um mínimo de entendimen-
to, justificando as execuções à
atuação da vereadora em defensa
dos direitos humanos.
Estas pessoas são incapazes de
pesquisar as origens da Declara-
ção Universal dos Direitos Hu-
manos, criada ao fim da Segunda
Guerra Mundial. Sem este docu-
mento universal não poderíamos
expressar nossas opiniões.
Infelizmente a educação no
Brasil serve apenas para difundir
conhecimentos, mas não ensina
a pensar. Vem daí a repetição dos
preconceitos.
Daniel Marques
Virginópolis-Minas Gerais
A volta do JB
Mal espero amanhecer, corro à
banca mais próxima de casa para
retomar uma prática que havia
perdido: comprar um exemplar
do JORNAL DO BRASIL.
Lamentavelmente, não espero
encontrar textos do saudoso Ol-
demário Touguinhó, com quem
tive o prazer de conviver no meu
tempo de rádio e ele à frente da
Associação de Cronistas Esporti-
vos no Rio de Janeiro - ACERJ.
Estava realmente mal acostu-
mado com o JB. Foi ainda na
adolescência que vi despertar
minha paixão pelo jornalismo,
porque estava diante de um veí-
culo absolutamente isento, com
reportagens bem fundamenta-
das e principalmente muito bem
apuradas.
Apesar de levar o nome do país
ele não tinha nenhuma subordi-
nação aos ditames políticos. Não
estava envolvido em nenhum
esquema midiático para produzir
matérias “compradas”. Um texto
que não era tendencioso e servia
para suscitar uma análise mais
profunda sobre os temas mais
relevantes.
Mesmo com o formato digital
adequando-se a uma realida-
de incontestável, permanecia
uma lacuna causada pela falta
do jornal impresso. Não falo
sobre extinção porque o nome
JORNAL DO BRASIL não
morreria jamais. Prefiro acre-
ditar que ele estivesse apenas
adormecido, no berço de toda
sua grandeza.
Kleber de Castro
Rio de Janeiro
Sexta-feira, 16 de março de 2018
Petrobras perde R$ 446 milhões
No 4º ano sem lucro, Conselho de Administração estudará distribuição de reservas do capital
A Petrobras reportou prejuízo líquido
de R$ 5,477 bilhões no quarto trimestre
de 2017, revertendo o lucro líquido de R$
2,510 bilhões registrado em igual período
de 2016, e o ganho de R$ 266 milhões do
terceiro trimestre, conforme os números
atribuíveis aos acionistas.
No ano passado, a estatal somou preju-
ízo de R$ 446 milhões, uma melhora de
97% ante a perda de R$ 14,824 bilhões re-
gistrada no exercício de 2016.
De acordo com a Petrobras, o resulta-
do foi afetado pela assinatura do acordo
para encerrar a ação coletiva nos Estados
Unidos (class action) e pela adesão ao pro-
grama de regularização de débitos federais
para finalizar discussões administrativas e
judiciais relativas a impostos. Segundo a
Petrobras, excluindo o acordo da class ac-
tion, a companhia apresentaria lucro líqui-
do de R$ 7,089 bilhões.
O Ebitda (lucro antes de juros, impos-
tos, depreciação e amortização) ajustado
da petroleira foi de R$ 12,986 bilhões no
quarto trimestre, com baixa de 47,6%
em relação ao mesmo período de 2016
e diminuição de 32% ante o terceiro tri-
mestre de 2017.
No ano de 2017, o Ebitda ajustado to-
talizou R$ 76,557 bilhões, com queda de
14% ante o resultado de 2016. A margem
Ebitda ajustado ficou em 17% no último
trimestre de 2017, contra 27% nos três me-
ses anteriores. A receita líquida somou R$
76,512 bilhões no quarto trimestre, o que
significa uma alta de 8,5% na comparação
anual e de 7% na trimestral.
O resultado financeiro líquido da esta-
tal ficou negativo em R$ 7,598 bilhões no
quarto trimestre de 2017, ante uma cifra
negativa em R$ 5,309 bilhões de igual tri-
mestre de 2016 e despesas financeiras lí-
quidas de R$ 7,411 bilhões no terceiro tri-
mestre de 2017.
Em comunicado divulgado, o Conselho
de Administração da petrolífera determi-
nou a realização de estudos para alterações
no estatuto social na cláusula de destina-
ção dos resultados, “com o objetivo de es-
tabelecer pagamentos trimestrais de divi-
dendos ou de juros sobre capital próprio,
bem como possibilitar o pagamento de
dividendos intermediários à conta da re-
serva de lucros, observadas as disposições
legais aplicáveis.”
No demonstrativo de resultados apre-
sentado não há menção à distribuição de
proventos aos acionistas. O resultado do
estudo, se aprovado pelo colegiado, será
então encaminhado para deliberação em
assembleia geral de acionistas.
“Essa iniciativa reafirma o compro-
misso da Petrobras com a contínua me-
lhoria de sua governança corporativa
e com a criação de valor para os seus
acionistas, sem perder o foco no obje-
tivo de redução de endividamento e na
sustentabilidade financeira da compa-
nhia”, diz o comunicado.
Alavancagem
A alavancagem da Petrobras medida
pela relação entre endividamento líqui-
do e patrimônio líquido encerrou 2017
em 51%, abaixo da marca de 55% verifi-
cada ao término de 2016. A relação en-
tre dívida líquida e Ebitda ajustado subiu
para 3,67 vezes, após ter atingido 3,16
em final de setembro e ante 3,54 vezes
ao término de 2016.
O endividamento total, somando o de
curto prazo e o de longo prazo, atingiu
R$ 361,483 bilhões, com recuo de 6% ante
o montante observado em dezembro de
2016. O endividamento de curto prazo re-
cuou 27% de 2016 para 2017, de R$ 31,855
bilhões para R$ 23,244 bilhões. A dívida
de longo prazo recuou 4% no mesmo in-
tervalo, de R$ 353,929 bilhões para R$
338,239 bilhões. O endividamento líquido
da petroleira atingiu R$ 280,752 bilhões,
com queda de 11%.
Por tipo de moeda, o endividamento ce-
Economia&Negócios
ÍNDICE DÍVIDA LÍQUIDA / LTM EBITDA AJUSTADO
4,77
3,32
A RECESSÃO E O CONSUMO DE COMBUSTÍVEIS
EM MIL BARRIS/DIA
Ano 2013 2014
Diesel 984 1001
Gasolina 590 620
4T13 4T14
Fonte: Petrobras
Opinião do analista
Álvaro Bandeira: passado resolvido; muitas dúvidas ainda para o futuro
Para o economista-chefe e sócio da
Modal Mais, Álvaro Bandeira, o mais
importante na apresentação dos resul-
tados da Petrobras, em 2017, pelo pre-
sidente Pedro Parente e a diretoria, foi
o anúncio de que na Assembleia Geral
Extraordinária, em abril, o Conselho de
Administração vai colocar em votação
a questão dos dividendos aos acionis-
tas. Com os sucessivos prejuízos desde
2014, no governo Dilma, a Petrobras
acumulou quatro exercícios sem distri-
buir dividendos (o rateio dos lucros aos
acionistas).
Pela Lei das S.A., uma empresa não
pode deixar de distribuir dividendos
após três anos. Mesmo com resultados
negativos, ela é obrigada a propor em
assembleia a distribuição de reservas de
resultado na conta de patrimônio. Do
contrário, as ações preferenciais (PNs
no caso da estatal) passariam a ter di-
reito a voto. Por isso, lembra Bandeira,
nos últimos dias houve alta especulativa
dos papéis PNs e ligeira queda dos ONs.
Alguns analistas ainda acreditavam que
a estatal apresentaria algum lucro para
não ferir a Lei das S.A..
Mesmo com a limpeza do balanço
em 18 meses da gestão Parente (novo
impairment, pagamento de R$ 11,98
bilhões de indenização da class action
e os mais de R$ 10 bilhões do Refis), da
visível melhora dos resultados opera-
cionais e do índice de endividamento,
veio novo resultado negativo, de R$ 443
milhões. Mas o anúncio da AGE pegou
os especuladores no contrapé, sobre-
deu 10% no ano, de R$ 78,788 bilhões para
R$ 71,129 bilhões. Em dólar, convertido
em reais, a baixa foi de 5%, de R$ 276,876
bilhões para R$ 263,614 bilhões. No caso
do euro, o recuo da dívida foi de 18%, de
R$ 21,637 bilhões para R$ 17,773 bilhões.
IPO da BR
A Petrobras informou que os recursos
proporcionados pelo IPO da BR Distribui-
dora, que somaram R$ 4,906 bilhões, foram
destinados ao cumprimento do serviço da
dívida e financiamento dos investimentos
nas áreas de negócio da controladora. Até
a semana passada, havia expectativa entre
gestores de fundos de que esse capital im-
pulsionaria o lucro da Petrobras no ano,
eventualmente possibilitando o pagamen-
to de dividendos.
O mesmo destino foi dado a recursos
obtidos com a geração operacional de cai-
xa de R$ 86,467 bilhões, por captações e
Conheça nosso site www.jb.com.br
5,11
4,81
4,30
3,93
2015 2016 2017
923 780 717
553 545 521
4T15 1T16 2T16 3T16
Divulgação
Bandeira: resultado da Petrobras gera anticlímax
tudo os que fizeram arbitragens entre
as duas classes de papéis. As ações PN,
que quarta-feira subiram 0,27%, des-
pencaram ontem 4,78%, bem mais que
a queda de 2,08% das ONs.
Para Bandeira, a divulgação do ba-
lanço ontem funcionou como um “an-
ticlímax”. Ele lembra que o mercado já
vinha esperando um resultado ruim,
em função de novas baixas contábeis de
projetos descontinuados (impairment)
e da pesada indenização do acordo com
os acionistas americanos na corte de
Nova Iorque (class actions), bem como
no acerto de dívidas pendentes com a
Receita e a Procuradoria Geral da Fa-
zenda Nacional, através do Refis.
A questão dos dividendos vai ajudar
a clarear o horizonte futuro da estatal,
que veio resolvendo as pendências do
passado. O sócio do Modal Mais chama
a atenção para o uso de receitas da des-
mobilização total ou parcial de ativos
para abatimento e/ou alongamento de
recebimentos pela venda de ativos de R$
9,907 bilhões.
Em 31 de dezembro de 2017, o saldo de
caixa e equivalentes de caixa atingiu R$
74,494 bilhões e as disponibilidades ajus-
tadas totalizaram R$ 80,731 bilhões, com
impacto positivo da aplicação em títulos
do tesouro britânico em dezembro e com
efeito da variação do câmbio sobre as apli-
cações no exterior.
No quarto trimestre de 2017, o fluxo de
caixa livre foi positivo pelo 11º trimestre
consecutivo, atingindo R$ 6,608 bilhões. De
acordo com a petroleira, apesar das maio-
res margens nas vendas dos derivados e das
exportações, a geração operacional de cai-
xa foi afetada pelo acréscimo dos depósitos
judiciais, resultando em uma redução de
19%. Além disso, houve aumento dos inves-
timentos em 40% em função do pagamento
de bônus de assinatura relativo às três últi-
mas Rodadas de Licitação da ANP
• 11
3,54
3,24
3,23
3,67
3,20
3,16
SEM CLASS ACTION
4T16 1T17 2T17 3T17 4T17
dívidas a custos mais baixos. Os níveis
de endividamento em relação à geração
de caixa já declinaram da faixa de 5,11
vezes no fim de 2015, para 3,16 no 3º
trimestre de 2017. Com os gastos da
class action, o índice, que ficaria prati-
camente estável em 3,23, segundo a es-
tatal, repicou para 3,67 vezes. Bandeira
acredita que os planos em curso podem
garantir um índice de endividamento
de 2,50 vezes até o fim do ano. Um dos
ganhos da estatal em 2018 deve ser o
acerto de alguns bilhões no valor das
reservas da cessão onerosa.
Outra determinação importante,
acredita, foi a refirmação ontem de
que a política de reajustes quase di-
ários de derivados de petróleo irá
prosseguir. Ou seja, aparentemente,
Parente venceu a disputa com o mi-
nistro da Fazenda, Henrique Meirel-
les, que queria segurar os reajustes
nos preços dos derivados, devido às
pressões, desde julho do ano passa-
do, dos pesados reajustes do GLP (gás
de bujão) nos orçamentos de mais de
90% dos lares brasileiros.
Os efeitos da recessão têm sido pe-
sados sobre a Petrobras. As vendas de
diesel - o produto mais vendido no país
em volume - caíram 8% ano passado
e 28,37% desde 2014, antes do longo
período de recessão interrompido em
2017 pela supersafra agrícola. Mas a
movimentação de cargas ainda está
longe de voltar aos níveis de pré-reces-
são. Na gasolina, a queda foi de 4,44%
em 2017 e de 15,96%, desde 2014.
Segundo a estatal, o resultado do tri-
mestre apresentou melhora nas margens
das exportações e das vendas no mercado
interno, fruto da valorização da cotação do
Brent e da política de preços, contribuindo
para o crescimento de 19% no lucro bruto,
que atingiu R$ 25,203 bilhões, apesar do
menor volume de vendas.
Reação na Bovespa
O Índice Bovespa operou ontem
fortemente influenciada pelas perdas
nos papéis da Petrobras. Embora te-
nha tocado os 84.719 pontos na míni-
ma intraday (-1,55%), no fim o índice
reduziu a queda para 1,30% e fechou
em 84.928,20 pontos. Os papéis fe-
charam com recuo de 250 pontos, das
ações PN - que fecharam em queda de
4,78%. As ações ON fecharam a sessão
em queda de 2,07%.
(com Conteúdo Estadão)
12 • Conheça nosso site www.jb.com.br
Renê Garcia Jr.
(Ainda) Precisamos falar sobre previdência
A perspectiva de uma derrota fez o go-
verno retirar a Reforma da Previdência da
pauta – do Congresso Nacional e da mídia.
O esforço realizado ao longo do último ano,
porém, deixa lições importantes, principal-
mente porque o tema necessariamente pre-
cisará voltar a ser discutido, uma vez que o
comprometimento da Receita Corrente Lí-
quida é insustentável.
O governo acertou ao tentar mobilizar,
pela primeira vez, a opinião pública sobre o
assunto. Errou, porém, ao não atacar pontos
importantes, como o Regime de Previdên-
cia dos Servidores Públicos (RPSP), a con-
fusão entre benefícios previdenciários e de
cunho assistencial e a falta de um modelo
que gere poupança de longo prazo.
Pelas contas dos economistas Fernando
de Holanda Barbosa Filho e Bruno Ottoni,
o Brasil teria que crescer 3,7% ao ano e os
benefícios precisariam ser congelados para
que as despesas com previdência se esta-
bilizassem no nível que estão hoje, que já é
deficitário.
Em outra conta, Rogério Nagamine, es-
pecialista do Ipea para o tema, informa que
a alíquota de contribuição previdenciária de
equilíbrio, ou seja, o que tem que ser des-
contado de empregados e empregadores
Um outro olhar (necessário)
A experiência de outros países mostra que
é preciso uma análise profunda do perfil so-
cial e demográfico da população, mas tam-
bém um novo pacto social. A Grécia resistiu
– e resiste - à reforma e quebrou. O Chile fez
na década de 90, praticamente extinguiu a
rede de proteção social, voltou atrás e hoje
adota um modelo de renda mínima combi-
nado com repartição e capitalização que está
entre os mais bem avaliados do mundo nos
quesitos adequação, sustentabilidade e inte-
Entre 177 países, apenas 13 não adotam
nenhum critério de idade mínima para a
aposentadoria. O Brasil, além de ser um
deles, está entre os que exigem menor
tempo de contribuição. Também não im-
põe nenhuma outra condicionante, como
poderia ser a inatividade, por exemplo.
Brexit leva Unilever Toys ‘R’ Us fecha
para Roterdã as portas nos EUA
Gigante do setor de consumo anuncia mudança
após manter sede em Londres por quase 100 anos
A Uniever, gigante do setor produtos e
alimentos, anunciou ontem a transferência
de sua sede de Londres para Roterdã, deci-
são altamente simbólica antes do Brexit, e
um revés para o governo britânico. A em-
presa, que é uma das líderes na fabricação
de alimentos a cosméticos, tem quase um
século de presença jurídica no Reino Uni-
do e na Holanda.
A Unilever não menciona explicita-
mente a saída da Grã-Bretanha da União
Europeia (UE), originalmente previs-
ta para março de 2019, e garante que o
objetivo é fortalecer e simplificar sua
estrutura. A multinacional emprega 169
mil pessoas no mundo, e comercializa
marcas conhecidas, como Dove, Omo,
Knorr e Rexona.
“O Brexit não faz da Inglaterra um país
ruim para investir. Essa decisão é para os
próximos 30 a 50 anos e não depende da
política de hoje”, despistou o diretor-exe-
cutivo da Unilever, Paul Polman.
Economia&Negócios
O outro lado da moeda
para custear o atual modelo, será de mais de
30% da folha total em 2025, se nada for feito.
Isso acontece porque o envelhecimento da
população e a falta de uma regra de idade
mínima estão fazendo com que o Brasil ca-
minhe para ter um contribuinte para cada
beneficiário. Hoje são dois para um.
Em estudo recente, o Banco Mundial
apontou sete fragilidades na previdência.
A reforma que estava em tramitação en-
dereçaria duas. Acabaria com a aposenta-
doria por tempo de contribuição nos se-
tores público e privado e reduziria a taxa
de reposição (proporção da aposentado-
ria em relação ao último salário). O sis-
tema permaneceria generoso, com uma
taxa de reposição de cerca de 90%, muito
acima da média praticada nos países da
OCDE (70%).
Na prática, do ponto de vista social,
a reforma abandonada contribuiria
pouco para aumentar a equidade social
no Brasil. No modelo em vigor hoje,
os subsídios previdenciários, ou seja,
a parcela de recursos que sai do orça-
mento público porque não é coberta
pelas contribuições, acabam sendo di-
recionados às classes mais altas, prin-
cipalmente de servidores. A estimativa
gridade, de acordo com estudo divulgado
pela consultoria Mercer no ano passado.
Já nos Estados Unidos, aspectos de raça
e gênero começam a entrar no debate.
Estudos sobre a reforma aprovada lá, em
2015, indicam que o aumento da idade
mínima faz com que as parcelas mais ricas
da sociedade americana se apropriem pro-
porcionalmente de quase o dobro da pou-
pança previdenciária em relação à parcela
mais pobre da população. Isso ocorre por-
Idade mínima, o principal gargalo
Mas nem sempre foi assim. Entre 1960
e 1962, a Lei Orgânica da Previdência
Social, estabeleceu a idade mínima de 55
anos. Na época, era maior que a expecta-
tiva de vida (50 anos), o que explica sua
revogação. O problema é que a idade mé-
dia de aposentadoria por tempo de con-
A saída da Unilever é mais um golpe
para o governo conservador de Theresa
May, que tenta convencer as empresas a
permanecer no país, apesar das incertezas
do Brexit.
Segundo Lee Wild, analista da Interac-
tive Investor, “tornar Roterdã a sede do
grupo vem em uma hora ruim para There-
sa May, que vive um momento-chave das
negociações do Brexit”.
A partida da Unilever representa “um
enorme golpe para o governo britânico e
demonstra que o mundo dos negócios re-
almente pensa sobre a decisão do Reino
Unido de deixar a UE”, disse a organização
britânica pró-europeia, Best for Britain.
Para alguns observadores, a decisão é
uma consequência direta do Brexit. “Acho
que escolheram uma entidade [jurídica]
holandesa porque é preferível continu-
ar dentro da UE”, opinou Jos Versteeg,
analista de Amsterdã, do banco privado
InsingerGilissen.
IMPACTO DA APOSENTADORIA PRECOCE DA DISTRIBUIÇÃO DE RENDA
2.759
2.188
Renda trabalho
aposentados precoces ocupados
é que cerca de 35% dos subsídios ficam
com os 20% mais ricos.
Trata-se de uma discussão que precisa
ser encarada porque há diversas distorções
que levam a isso. No RGPS, Nagamine cita
o programa de Microempreendedor Indivi-
que a expectativa de vida não é a mesma
para todos os segmentos da sociedade. Os
mais ricos vivem mais e tendem a receber
o benefício por mais tempo.
Em um estudo apresentado no Dieese, a
pesquisadora Denise Gentil, apontou im-
pacto semelhante na adoção de uma ida-
de mínima padrão em todo o Brasil. Ela
lembrou que mesmo nos grandes centros,
a expectativa varia consideravelmente en-
tre as regiões mais ricas e mais pobres. Em
uma comparação dentro do município de
SP, a expectativa de vida pode variar 20
tribuição em 2016 ficou abaixo disso, em
torno de 53 anos, quando a expectativa de
vida é de cerca de 70 anos.
Muita gente se aposenta por tempo de
contribuição, mas permanece no merca-
do de trabalho, o que também contribui
para tornar o sistema menos equitativo.
Cadeia de lojas que dominava o mercado de
brinquedos anuncia fim das operações
Chega ao fim uma das referências da
indústria de brinquedos dos Estados Uni-
dos. A cadeia de lojas Toys ‘R’ Us vai fe-
char suas 735 unidades, mergulhada em
problemas financeiros.
O grupo, que ficou conhecido nos anos
1980 e 1990 pelas enormes lojas de brin-
quedos, não conseguiu pagar sua dívida
nem encontrar um comprador.
A Toys’R’Us declarou falência em
setembro de 2017, recorrendo ao ca-
pítulo da legislação americana sobre
falências, que permite que empresas
continuem funcionando normalmente
enquanto negociam as dívidas com os
credores.
“Estou muito decepcionado com o re-
sultado, mas não temos mais apoio finan-
ceiro para continuar com as operações da
companhia nos Estados Unidos”. afirmou
o presidente da Toys’R’Us, David Brandon,
citado no comunicado
“É um dia profundamente triste para
Sexta-feira, 16 de março de 2018
rene.garciajr@jb.com.br
4.299
2.212
renda todas as fontes
Ocupados mas não aposentados
dual (MEI), que estipula uma contribuição
previdenciária fixa em 5% do salário míni-
mo e permite que pessoas com renda média
que pode ser de mais de R$ 6 mil/mês, acima
do teto, estejam em um modelo que é quase
não contributivo.
anos de um distrito para outro. Em 2010,
era de 79 anos no Alto de Pinheiros, um
dos bairros mais nobres da cidade. Já em
algumas áreas da Zona Leste, não passa
dos 55 anos.
A pesquisadora fez um exercício sim-
ples. Comparou dois jovens de 20 anos,
um de Alagoas (homem) outro de Santa
Catarina (mulher). Cumpridas as estatís-
ticas, ele viveria 14 anos menos que ela.
Chegaria até os 69 anos. Só iria usufruir de
4 anos de aposentadoria. Ela teria 18 anos
de benefício.
Na faixa etária considerada como apo-
sentadoria precoce (antes dos 65), quan-
do se compara a renda média do traba-
lho (sem contar com outras fontes) com
a renda média total (de todas as fontes),
o pagamento da aposentadoria mais que
triplica a desigualdade de renda.
nós e para milhões de crianças e famí-
lias que atendemos nos últimos 70 anos”,
acrescentou. “O grupo e seus conselheiros
vão se esforçar para minimizar o impacto
da liquidação nos mercados canadenses e
no exterior”.
A despeito da falência nos EUA, o
grupo prevê a “reorganização” e “o
processo de venda” das suas operações
no Canadá, na Ásia, na Alemanha,
Áustria e Suíça.
A Toys ‘R’ Us divulgou que seguem em
aberto as opções para as atividades da em-
presa na Espanha, em Portugal, na França,
na Polônia e na Austrália.
A Toys ‘R’ Us tem sua base em Wayne,
no estado de Nova Jersey, e seu quadro de
funcionários nos Estados Unidos repre-
senta mais da metade das 65.000 pessoas
que emprega no total. A empresa disse
que vai detalhar em breve o projeto de li-
quidação de suas lojas americanas e o fim
de suas atividades.
Sexta-feira, 16 de março de 2018
China é alvo de Trump
Presidente dos EUA ameaça agora adotar medidas por violações dos direitos de propriedade intelectual
O presidente dos Estados Unidos, Do-
nald Trump, deve anunciar “nas próximas
semanas” medidas comerciais contra a
China pelo “roubo” de propriedade inte-
lectual, informou ontem um alto funcio-
nário do governo norte-americano, em
novo capítulo de seus esforços para refor-
mar as relações comerciais do país.
A iniciativa abriria nova frente na con-
troversa política comercial do governo
Trump, que já anunciou tarifas pesadas
sobre as importações de aço e alumínio e
apresentou ação contra a Índia na Organi-
zação Mundial do Comércio (OMC). Esta
nova posição da Casa Branca despertou o
medo de uma guerra comercial generali-
zada, que teria consequências imprevisí-
veis para o avanço da economia mundial.
Nas próximas semanas o presidente terá
em sua mesa de trabalho algumas reco-
mendações”, disse seu assessor de Comér-
cio Peter Navarro em entrevista à emissora
CNBC. Essas recomendações se baseiam
em um relatório elaborado por Robert Li-
ghthizer, representante de Comércio.
Para Navarro, a adoção dessas medidas “é
apenas um dos muitos passos que o presi-
dente está dando, com coragem, para atender
às práticas desleais do comércio”. O governo
americano tinha aberto, em agosto passado,
uma investigação, sob o capítulo 301 de sua
legislação comercial, relativa a violações dos
direitos de propriedade intelectual.
Propriedade intelectual
Particularmente, os EUA estão preocu-
pados com a obrigatoriedade de criar joint
ventures para que empresas americanas
operem na China. Em troca do acesso ao
mercado chinês, essas empresas são força-
das a ceder a seus associados locais uma
parte de seus conhecimentos tecnológicos.
A imprensa americana informou nesta
semana que os EUA analisam a possibili-
dade de aplicar sanções à China de US$ 30
bilhões a US$ 60 bilhões, mas Navarro não
adiantou detalhes. Ele, contudo, garantiu
que a China “violou todas as regras” desde
sua entrada na OMC em 2001 e acusou-a
de ter “desestabilizado o comércio mun-
dial”. Mas o governo chinês já adiantou
que qualquer medida americana sobre o
comércio terá uma resposta equivalente.
Em coletiva de imprensa, o porta-voz da
chancelaria chinesa, Lu Kang, disse que “se
for apresentada uma situação indesejada”,
o gigante asiático tem “a intenção de pro-
teger seus direitos legítimos”. Para Kang,
“a história provou que uma guerra comer-
cial não interessa a ninguém”.
O déficit comercial dos Estados Unidos com
a China chegou a US$ 375 bilhões no ano pas-
sado, mas as exportações americanas para o
país asiático também bateram recorde.
Governo aguarda publicação de regras para recorrer
O ministro interino da Indústria, Co-
mércio Exterior e Serviços (MDIC), Mar-
cos Jorge, afirmou ontem que o governo
brasileiro aguarda a publicação das regras
da sobretaxa sobre as importações de aço
e alumínio pelos Estados Unidos para em
seguida encaminhar a Washingtom recur-
so contra a medida.
“Estamos aguardando a publicação pelo
governo americano. Estamos falando ain-
da de anúncios, não tivemos acesso a pa-
pel publicado”, disse o ministro interino
a jornalistas durante o Fórum Econômi-
co Mundial, em São Paulo. “É preciso ter
acesso ao inteiro teor.” O prazo para o re-
curso começa a valer somente após a pu-
blicação das normas.
Marcos Jorge e o ministro das relações
exteriores, Aloysio Nunes, devem ir no-
vamente aos EUA para tentar entender
de que forma vai funcionar o recurso. O
ministro disse que o governo brasileiro
Economia&Negócios
Navarro, assessor econômico de Trump, não acredita que a adoção de sanções diretas à China tenham os efeitos devastadores previstos
Navarro é um funcionário próximo de
Trump que acabou se impondo - e impon-
do também os seus pontos de vista - na
disputa interna que provocou uma erup-
ção no governo, decorrente das tarifas so-
bre aço e alumínio.
A imposição dessas taxas causou uma
divisão no governo diante de possíveis
consequências para o país e acabou mo-
tivando a renúncia do principal assessor
econômico de Trump, Gary Cohn. Para o
lugar de Cohn, o presidente escolheu Larry
Kudlow, comentarista de TV e economis-
ta. A data da posse ainda não foi marcada.
Na manhã de ontem, Trump usou sua
conta no Twitter para reafirmar a esco-
lha de Kudlow. Além disso, mostrou
otimismo com o cenário para o futuro.
“Nosso país terá muitos anos de grande
sucesso econômico e financeiro, com
impostos baixos, inovação sem parale-
los, comércio justo e uma força de tra-
balho ainda maior pela frente”, afirmou
Trump na sua mensagem.
O assessor Navarro não acredita que
sanções diretas à China tenham os efeitos
devastadores previstos. “Não acho que
ninguém em Wall Street se oponha a ata-
carmos a China pelo roubo da nossa pro-
priedade intelectual”, comentou.
Legisladores e representantes da indús-
tria já alertaram que a adoção de medidas
contra a China poderiam provocar repre-
sálias que afetariam os exportadores ame-
ricanos. (AFP e Estadao Conteúdo)
já vem mantendo conversas com a Casa
Branca sobre o caso e ele próprio se reuniu
recentemente com o secretário de Comér-
cio dos EUA, Wilbur Ross. Além disso, a
embaixada brasileira em Washington está
em contato direto com técnicos do gover-
no americano, disse ele. “Estamos atuando
no âmbito bilateral junto aos EUA para
tentarmos, no âmbito do recurso, conven-
cê-los da não aplicação da tarifa para o
Brasil “, afirmou.
A decisão do presidente Donald Trump
de elevar a taxa cobrada na importação de
aço para 25% e de alumínio para 10% terá
impacto muito forte, tanto para o Brasil
quanto para os americanos, avalia Marcos
Jorge. “Há uma complementariedade no
setor siderúrgico”, disse o ministro interi-
no, destacando que 80% do aço exportado
daqui para os EUA são de produto semia-
cabado.
Esse produto semiacabado, explicou
Conheça nosso site www.jb.com.br
Para FMI, protecionismo
atrapalha o crescimento
A diretora do Fundo Monetário In-
ternacional (FMI), Christine Lagar-
de, alertou que o protecionismo pode
comprometer a expansão econômica
mundial. “Apesar de o sol brilhar na
economia mundial, há nuvens pesadas
no horizonte”, disse a dirigente em um
post de blog publicado antes da cúpula
financeira do G20, na próxima semana
em Buenos Aires.
“A recuperação esperada para 2018
e 2019 vai ficar mais lenta”, garantiu.
“Isso complica as perspectivas a médio
prazo para muitos países, especialmen-
te para as economias avançadas”, acres-
centou, lembrando que o FMI revisou
para cima em janeiro o crescimento
dos dois próximos anos a 3,9%.
Os ministros de Finanças e presiden-
tes de bancos centrais se reuniram em
Buenos Aires para, entre outras cosas,
proteger o atual crescimento econômi-
co e lutar contra as tensões comercias,
o aumento recente da volatilidade nos
mercados financeiros e as incertezas
geopolíticas.
Lagarde enumerou uma lista de cin-
co prioridades para manter o ritmo de
Marcos Jorge, é usado pela própria indús-
tria siderúrgica dos EUA para a transfor-
mação. Assim, a sobretaxa terá impacto
nos preços dentro do mercado america-
no. Ao mesmo tempo, boa parte do car-
vão usado na siderurgia brasileira vem do
mercado americano. “Somos o principal
importador desse produto”, disse ele.
No caso brasileiro, a decisão de Trump
pode trazer prejuízos como o desligamen-
to de fornos das siderúrgicas e também
perda de postos de trabalho. Por ter essa
relação de complementariedade, o minis-
tro interino disse que o Brasil não repre-
senta riscos para a indústria dos EUA e,
além disso, os americanos têm superávit
na balança comercial com o Brasil “Nos
últimos 10 anos, a balança comercial foi
favorável aos americanos.”
O ministro disse que a estratégia inicial
do Brasil será a negociação bilateral, mas o
Planalto não descarta nenhuma hipótese.
• 13
Mandel Ngan / AFP
Lagarde diz que recuperação será mais lenta
crescimento, e a primeira é “evitar o
protecionismo”. “Os legisladores têm
que trabalhar de forma construtiva
para reduzir as barreiras alfandegárias
sem recorrer a medidas excepcionais”,
acrescentou, pedindo para não aumen-
tarem as medidas protecionistas.
“A história da economia mostra cla-
ramente que as guerras comerciais não
são apenas prejudiciais ao crescimento
mundial, mas causam prejuízos”, lem-
brou Lagarde.
Na quarta-feira, o presidente Michel Te-
mer disse que o Brasil pode recorrer à Or-
ganização Mundial do Comércio (OMC)
caso as negociações com a Casa Branca
não avancem.
“Temos a convicção de que, pela boa rela-
ção que temos com os EUA e com o anúncio
da Casa Branca de que haverá possibilidade de
exclusão de países que se enquadram como na
relação que o Brasil tem, vamos poder retirar o
país dessa situação”, afirmou Marcos Jorge.
Reunião
Ontem, fontes da Comissão Europeia,
informaram que a comissária europeia
de Comércio, Cecilia Malmström, e seu
equivalente americano Wilbur Ross, se
reunirão na próxima semana para tratar
das pesadas tarifas impostas pelos EUA.
“Malmström e Ross acordaram se reunir
na próxima semana” durante uma ligação
telefônica. (Estadão Conteúdo)
14 • Conheça nosso site www.jb.com.br
A sedutora Londongrado
ALFONS LUNA
Da AFP
E
ntre os milhares de russos que fo-
ram viver no Reino Unido depois
da queda da União Soviética, há
espiões e milionários de passado obs-
curo, cujas dívidas podem acabar sendo
cobradas de maneira trágica nas ruas
britânicas.
A presença dos russos fascina e serviu de
inspiração para séries de televisão, como
a recente “McMafia”, da BBC, filmes
como “Eastern Promises”, de David Cro-
nenberg, e livros como “Londongrad”,
que explica a chegada dos magnatas.
Mas para além da ficção, existe uma saga
real e sinistra. Os últimos episódios fo-
ram a morte de Nikolai Glushkov, exila-
do russo parceiro de negócios do oligarca
e opositor do Kremlin Boris Berezovski,
cujo corpo foi encontrado na segunda-
-feira perto de Londres em circunstân-
cias inexplicadas, e a tentativa de assassi-
nato com gás nervoso do ex-espião russo
Serguei Skripal e de sua filha Yulia nas
ruas da aprazível cidade inglesa de Salis-
bury. O antigo agente foi condenado em
seu país por alta traição.
Mas a série teve outros capítulos notáveis,
como o de Alexander Litvinenko, espião
russo que se tornou inimigo do Kremlin,
morto em 2006 com polônio-210, ou o
do milionário russo Alexander Perepili-
tchny, morto repentinamente, em 2012,
ao que tudo indica pela ação de gelsi-
mium, planta que dependendo da dose
pode ser fatal.
Segundo as últimas cifras, hoje vivem
em Londres cerca de 100 mil russos. As
razões para os espiões e milionários se
instalarem no Reino Unido são distintas.
No caso dos agentes russos, se você “de-
cidia trabalhar para um país estrangeiro,
não olhava para Itália, Espanha ou Ale-
manha, mas para os Estados Unidos ou
o Reino Unido”, explica Yuri Felshtinsky,
historiador e amigo de Litvinenko.
Êxodo em Ghuta
Mais de 12 mil pessoas já fugiram de Ha-
mouria, cidade no reduto rebelde de Ghuta
Orienta, região nos arredores de Damasco que
se encontra cercada pelas forças do governo
sírio. O regime cada vez avança mais dentro
do território.
Homens, mulheres e crianças, muitos car-
regando malas, cobertores e pertences, cami-
nhavam a pé, em uma estrada suja, em direção
a postos do exército sírio. Trata-se do primei-
ro êxodo em massa na região desde o início da
ofensiva militar, lançada há um mês. Um ho-
mem levava uma criança dentro de uma mala,
apenas com os braços e a cabeça para fora.
Ghuta Oriental é atualmente a única área
perto da capital Damasco ainda nas mãos dos
rebeldes. A retomada do território pelas forças
leais ao presidente Bashar al Assad significará
uma importante vitória para o regime. Além
dos combates entre oposição e governo, mui-
tos grupos rebeldes lutam entre si.
Nos últimos dias, as Nações Unidas tenta-
ram implementar um cessar-fogo na região
para poder entregar ajuda humanitária e re-
tirar os feridos. Alguns comboios da ONU
chegaram a entrar na região, mas os constan-
tes bombardeios interromperam as atividades
por diversas vezes. Ontem, 25 caminhões com
suprimentos conseguiram atingir a cidade de
Douma
O Comitê Internacional da Cruz Vermelha
alertou que o carregamento representa apenas
uma fração do que é necessário. Vivem em
Ghuta Oriental cerca de 390 mil pessoas, que
enfrentam a falta de medicamentos, alimentos
e outros itens. Cerca de 1.100 pessoas morre-
ram na região desde 18 de fevereiro. O regime
Internacional Sexta-feira, 16 de março de 2018
Tolga Akmen/AFP
“Se, ao final, você tinha a sorte de não ser
detido ou assassinado na Rússia, e surgia
a oportunidade de imigrar, a escolha era o
país onde trabalhou”, acrescenta.
Em relação aos milionários, muitos enri-
queceram na União Soviética à sombra do
poder e depois caíram em desgraça, como
Boris Berezovski - encontrado enforcado no
chuveiro de sua casa londrina, em 2013.
O empresário russo e ativista anticorrupção
Roman Borisovich distingue duas ondas de
imigração russa desde a queda da ex-URSS:
uma anterior à crise econômica de 1998, e a
outra posterior.
A primeira era “vibrante, jovem, profissio-
nal”, com desejo de se integrar, e transfor-
mou Londres “em um centro financeiro rus-
so”, afirma à AFP.
A crise varreu tudo isso e chegou a segunda
onda, mais fechada e ensimesmada, com-
posta por “russos ricos, suas famílias e en-
torno”, batizados de oligarcas e caracteriza-
dos como ostentosos.
“Londres tem regras muito frouxas na hora
de aceitar dinheiro de estruturas obscuras,
de empresas anônimas offshore”, opina Bo- Mladen Antonov/AFP
risovich. Acima: Muitos
Para ele, isso atrai clientes russos dispostos a milionários
comprar anonimamente e criar um novo es- russos escolher
tilo de vida. Obviamente, Londres também bairros caros de
é um centro cultural, mas principalmente se Londres para
trata da aceitação do dinheiro sujo”, diz. viver. Ao lado:
Borisovich é organizador do “tour da clepto- Praça Vermelha,
cracia”, que leva os visitantes pelas residên- em Moscou
cias mais espetaculares compradas com o
dinheiro procedente da Rússia.
Os bilionários russos compram apartamen-
tos fantásticos em Chelsea, Knightsbridge,
ou Kensington - qualquer lugar ao redor de
Regents Park ou Hyde Park -, frequentam as
lojas mais caras, as alfaiatarias de Savile Row
e os melhores restaurantes.
“O Reino Unido é um velho país aristocrá-
tico que permite desfrutrar uma vida muito
rica. Na França, por exemplo, você se sen-
tiria um pouco incomodado dirigindo um
carro esportivo extremamente caro”, diz o
historiador Yuri Felshtinsky.
EUA sancionam
russos por eleições
Os Estados Unidos anun-
ciaram ontem uma série de
Louai Beshara/AFP
sanções contra pessoas e enti-
dades da Rússia, em resposta
à suposta ingerência de Mos-
cou nas eleições presidenciais
de 2016 e vários ciberataques.
A decisão foi tomada após vá-
rios meses de atrasos, que en-
fureceram muitos legislado-
res e geraram dúvidas sobre
a real vontade do presidente
Donald Trump de enfrentar
Moscou. As sanções atingem
19 pessoas e cinco entidades,
incluindo o serviço federal de
inteligência e o serviço secre-
to militar russo.
Chacal condenado
mais uma vez
O venezuelano Ilich Ra-
mírez Sánchez, conhecido
como Carlos, O Chacal, foi
condenado à prisão perpé-
tua por um atentado come-
tido em 1974, em Paris, em
julgamento de apelação. Essa
é a terceira condenação à pri-
são perpétua contra Carlos,
Pai dá água para um dos filhos na dramática fuga de milhares de sírios da cidade de Ghuta que não estava no tribunal
no momento do veredicto.
cortou a região em três para sufocar os rebeldes. havia água, eletricidade e educação para as O terrorista, que já admitiu
“Estávamos presos em porões e não nos crianças”, disse outro morador. a culpa em outros crimes, ale-
atrevíamos a sair. Não podíamos fazer nada. A guerra na Síria entra agora em seu oitavo gava inocência neste caso. O
Não havia comida”, disse um homem para a ano. O conflito já deixou mais de 350 mil mor- venezuelano já foi o homem
Agência Reuters na periferia de Hammou- tos, 1,5 milhão de feridos e provocou a fuga de mais procurado do mundo.
riyeh, onde estão os postos militares. “Não 11 milhões de pessoas dentro e fora do país.
Sexta-feira, 16 de março de 2018 Esporte Conheça nosso site www.jb.com.br • 15

‘Craques’ da internet Flu perde

Willian José e Talisca foram os recordistas em buscas na rede após convocação
Willian José? Anderson Talisca? Alguns no-
mes da convocação de Tite — a última antes da
lista definitiva dos 23 atletas que defenderão o
Brasil na Copa do Mundo — despertaram sur-
presa e curiosidade na torcida brasileira. O ata-
cante da Real Sociedad, com 37% das buscas,
e o meia do Besiktas, com 35%, foram os mais
procurados no Google, nas 24 horas posteriores
ao anúncio. Os dados são do Google Trends.
Sem destaque no futebol brasileiro após pas-
sagens apagadas por São Paulo, Grêmio e San-
tos, Willian José rumou para a Espanha. Por lá,
evoluiu como jogador e alcançou sucesso — já
tem 17 gols em 30 jogos nesta temporada.
Atuar em uma equipe sem muita visibilidade
na mídia brasileira (Real Sociedad), no entan-
to, leva o centroavante a ser pouco reconhecido
por aqui. Esse é um dos motivos que ajuda a en-
tender por que o nome dele foi o mais buscado
em 21 estados do Brasil.
do Avaí e
se despede
FLORIANÓPOLIS - Depois
Revelado pelo Bahia, Anderson Talisca foi o surpresa na convocação de Tite. Um dos mais de perder por 2 a 1 no Rio,
primeiro em seu estado natal, no Acre e em Ro- criticados, o atacante Taison, com 7%, comple- o Fluminense voltou a ser
raima. Ele ficou em segundo em todas as unida- tou o top 5 dos convocados para os amistosos derrotado pelo Avaí, ontem,
des federativas onde Willian José foi o que mais contra Rússia e Alemanha que mais tiveram o desta vez por 1 a 0, em Santa
atraiu a curiosidade dos torcedores. O jogador nome buscado no Google. Catarina. Com a derrota, deu
da Real Sociedad, por sua vez, foi o vice-líder As pesquisas com o tema “convocação da adeus à Copa do Brasil.
em Bahia, Acre e Roraima. seleção brasileira” cresceram 1500% nas 24 ho- Precisando de uma vitória
Ao contrário do atacante, Talisca conseguiu ras que sucederam o evento na sede da CBF, por dois gols de diferença, o
projeção no Brasil, mas foi vendido ao Benfica na Barra da Tijuca. O questionamento “quem Fluminense foi melhor do
por 4,75 milhões de euros assim que começou foi convocado para a seleção brasileira?” foi o que o Avaí nos primeiros 45
a brilhar no Brasileirão, antes da pausa para a que mais se repetiu, seguido por “quando será o minutos. Teve o controle do
Copa do Mundo de 2014, quando tinha apenas amistoso da seleção brasilieira?”. jogo, mas pouco ameaçou.
20 anos. Atualmente, está ao Besiktas, da Tur- A torcida do Cruzeiro pede frequentemente Na melhor chance, aos 34,
quia, que pagou 4 milhões de euros para tê-lo a convocação do goleiro Fábio, no clube desde Ayrton Lucas cruzou para Pe-
por empréstimo até junho deste ano. Marcou 2005. Esse “protesto” se refletiu na lista das per- dro, chutar no travessão.
16 gols e deu três assistências nesta temporada. guntas mais feitas, com “Por que o Fábio não é O Fluminense continuou
Zagueiro do Grêmio, Pedro Geromel liderou convocado?” ficando em terceiro lugar. “Quan- melhor na etapa final. Pressio-
as pesquisas no Rio Grande do Sul e foi o tercei- do é a convocação?” e “Qual a diferença entre nou o Avaí e ficou com um ho-
ro no total, com 13% das buscas. Logo abaixo técnica e tática?” fecharam a lista dos principais mem a mais depois que Getú-
ficou o goleiro Neto (8%), do Valencia, outra questionamentos no site de busca. lio foi expulso, aos 17 minutos.
Divulgação Divulgação Abel pôs Dudu, mais um
atacante, mas o jogador foi
expulso seis minutos depois,
por falta violenta. Não de-
morou o Avaí abriu o placar,
com Lourenço, aos 32 minu-
tos. Depois, ficou difícil para
o Fluminense reagir.

Caso Scarpa
Ontem o Fluminense der-
rubou a liminar que liberava
o meia Gustavo Scarpa para
atuar no Palmeiras. Com
isso, o atleta perde condições
de defender o clube paulista
e o contrato com o tricolor
passa a valer novamente. A
decisão não é definitiva.
Avaí: Aranha, Guga,
Betão, Alemão e João Pau-
lo; Luan, Judson, Rômulo,
André Moritz (Lourenço)
e Luanzinho (Maurinho);
Getúlio. Fluminense: Jú-
lio César, Reginaldo, Gum
e Ibañez (Matheus Ales-
sandro); Gilberto, Richard
(Dudu), Jadson, Sornoza e
Ayrton Lucas; Marcos Jú-
nior (Robinho) e Pedro.
Juiz: Vinicius Gonçalves
(SP). Cartões amarelos Jud-
son, Getúlio, Ibañez. Cartão
Anderson Talisca, do Besiktas, foi o segundo que mais atraiu curiosidade na lista de Tite O centroavante Willian José foi o convocado que mais gerou pesquisas vermelho: Getúlio, Dudu.

Liga Europa define

times das quartas
A Liga Europa conheceu
ontem os oito times que dis-
putarão as quartas de final. O
Lazio se classificou ao vencer
o Dínamo de Kiev: 2 a 0. Já
o Arsenal passou pelo Mi-
lan, fazendo 2 a 1. O Olym-
pique de Marselha derrotou
o Athletic Bilbao por 2 a 1 e
o Atletico de Madrid goleou
o Lokomotiv Moscou (5 a 1).
Sporting, CSKA, RB Leipzig
e RB Salzburg também pas-
saram de fase. O sorteio dos
confrontos será hoje.
Santos derrota o
Nacional por 3 a 1
O Santos conseguiu ontem
seus primeiros três pontos
no Grupo 6 da Libertadores.
Depois de perder para o Real
Garcilaso na estreia, por 2 a
0, o time venceu o Nacional
de Montevidéu por 3 a 1, no
Pacaembu, com gols de Sasha
(2) e Rodrygo. O Santos é o
segundo com 3 pontos. O Es-
tudiantes lidera com 4.
Botafogo aproveita semana livre
Enquanto o Botafogo vai se refor-
çando para o Campeonato Brasi-
leiro, o técnico Alberto Valentim
só pensa no Campeonato Carioca.
Como o clube está fora da Copa do
Brasil (foi eliminado na primeira
fase pela Aparecidense), ele apro-
veita a semana livre para preparar
o time, que domingo faz jogo de-
cisivo contra o Vasco, pela última
rodada da Taça Rio.
Com 10 pontos e em terceiro lu-
gar do Grupo C, o Botafogo pre-
cisa fazer mais pontos do que a
Portuguesa, segunda colocada, que
enfrenta no mesmo dia o Flamen-
go, em Cariacica.
“A Taça Rio é uma competição
curta, com poucos jogos. Então
todos são decisivos. Contra o Vas-
co não será diferente. Temos que
encarar mais do que nunca como
decisão”, afirmou o treinador.
Maior contratação do Botafogo
para a temporada, o atacante uru-
guaio Rodrigo Aguirre deve ser
anunciado oficialmente até o fim
da semana. Depois de uma arras-
tada negociação e de uma bateria
interminável de exames, o jogador
assinou ontem sua renovação com
o Udinese, dono do passe. O con-
trato seguiu para a Itália e agora o
Alberto Valentim se vira com as bolas durante o treinamento do Botafogo
Botafogo espera que o clube italia-
no envie o contrato de empréstimo
para ser assinado. Isso deve acorrer
ainda hoje.
Como não pode mais ser inscrito
no Campeonato Carioca, Aguirre
só poderia estrear na Copa Sul-A-
mericana. Mas isso não será possí-
Vitor Silva/Botafogo
vel, já que o atacante está suspenso
por três jogos, por ter sido expul-
so justamente contra o Botafogo,
na Libertadores do ano passado,
quando ainda defendia o Nacional
de Montevidéu. A estreia de Aguir-
re só deve acontecer no Campeo-
nato Brasileiro.
Vasco
recolhe
os cacos
A derrota para a Univer-
sidad de Chile ainda dói,
mas com uma série de jo-
gos decisivos pela frente, o
Vasco não tem tempo para
lamentar. Com pelo menos
12 jogadores debilitados
pela virose que atacou par-
te do elenco às vésperas da
partida pela Libertadores, o
técnico Zé Ricardo está que-
brando a cabeça para escalar
o time que enfrentará o Bo-
tafogo no domingo.
Martín Silva, Paulão, Pau-
linho, Pikachu, Wellington,
Wagner, Ricardo, Thiago
Galhardo, Rafael Galhardo,
Bruno Cosendey, Paulo Vi-
tor e Caio Monteiro foram
os jogadores afetados — uns
mais do que outros — pela
virose. Zé Ricardo só vai es-
calar o time depois que to-
dos forem reavaliados, hoje.
“É um clássico, não importa
como está um ou outro”, re-
sumiu Desábato.
16 • Conheça nosso site www.jb.com.br Sexta-feira, 16 de março de 2018

Esportes
JORNAL DO BRASIL

Renato Mauricio Prado Futebol & Cia renato.mprado@jb.com.br

A hora é dos garotos do Fla

U
ma análise objetiva da atuação do Flamengo,
em Guaiaquil, merece mais elogios do que
críticas. É verdade que, não fosse a fulgurante
entrada de Vinícius Jr., o rubro-negro poderia ter sido
derrotado. Mas, não fosse também a catastrófica atua-
ção de Henrique Dourado, o Fla poderia ter vencido
o Emelec até com certa facilidade.
O atrapalhado centroavante teve, no mínimo, quatro
excelentes oportunidades para marcar e desperdiçou
uma após a outra! E ainda houve o pênalti escandaloso
à favor dos cariocas, não marcado pelo juiz. Aí, quem
sabe, Dourado marcaria...
De uma maneira geral, o Mais Querido dominou
a partida na “Caldera” do adversário. Sofreu uma rá-
pida pressão no início, mas logo se acalmou e passou
a ter, inclusive, maior posse de bola, quase sempre no
campo do rival. Faltava poder de definição – carên-
cia eterna de um elenco no qual até mesmo o camisa
nove supenso, Paolo Guerrero, não é exatamente um
exemplo de goleador.
Desde Zé Ricardo, passando por Rueda e chegando a
Carpegiani, o Flamengo tem como característica tocar,
tocar e tocar a bola, mas na hora de balançar a rede
dos rivais é um sacrifício colossal. São raros os chutes
certeiros e alguns não passam de meros petelecos.
Vinícius Jr. é a antítese desse estilo “arame liso”, que
cerca mas não machuca ninguém. Até mesmo quando
não brilha, o moleque abusado arrisca e, lembrando
aquele velho chavão, quem não arrisca, não petisca.
Ele ainda não é um craque (longe disso) e, certamen-
te, alternará momentos de brilho, como no Equador,
com atuações apagadas, como nas derrotas para o
Fluminense e para o Macaé. Mas tem que jogar. E ser
titular absoluto. No lugar de um dos dois Évertons.
Acho que Carpegiani deveria também começar
a usar bem mais a outra joia das divisões de base,
o centroavante Lincoln. Duvido que ele perdesse os
quatro gols feitos que o “Ceifador de Oportunidades”
perdeu anteontem. Vizeu já está com a cabeça longe
e, convenhamos, nunca foi brilhante.
A hora é dos garotos. Com Vinícius e Lincoln, quem
sabe, esse Flamengo embala. Por enquanto, ainda vai
aos trancos e barrancos, dependendo de momentos
especiais e isolados de um ou outro jogador.
Coragem, Carpegiani!
Os melhores e os piores
Além de Vinícius Jr., destaque absoluto e craque do
jogo, pode-se dizer que um dos melhores do Fla foi
Jonas. Eu ainda não o efetivaria no lugar de Cuellar –
que é mais técnico e mais equilibrado. Mas Carpegiani
parece pensar diferente. Gostei de Diego e de Éverton
Ribeiro, apesar da dificuldade que ambos continuam a
ter para chutar com eficiência. E, apesar do gol, tiveram
atuações positivas Diego Alves, Rodolpho e Juan. Mal
mesmo, só jogaram Henrique Dourado e Renê. Como é
ruim esse lateral! Versão bizarra do Pará, na esquerda.
Cadê o Trauco? Mil vezes melhor!
Amarelo na postura
Lucas Paquetá, como de hábito, esteve bem. Mas
se mostrou pilhado e fominha demais. Levou cartão
amarelo por uma falta sem sentido, na lateral do
campo e continuou discutindo com o juiz, correndo
risco de ser expulso. Além disso, deixou de passar
uma bola limpa para Diego, que estava livre, dentro
da área, optando por um chute inútil. Pior, ainda
acabou batendo boca com o camisa 10. Não é por
aí, garoto...
Merecem sofrer
Trinta e sete dos quarenta clubes do colégio eleitoral
da CBF bancaram as vaquinhas de presépio e assina-
ram apoio à candidatura única de Rogério Caboclo,
o apaniguado de Marco Polo del Nero nas próximas
eleições da CBF. As exceções foram Flamengo, Co-
rinthians e Atlético Paranaense.
Melhor pagar
Amigo advogado já me alertara que o caso de Gustavo
Scarpa contra o Fluminense era frágil e que a tendência
era que a liminar fosse cassada e o Palmeiras tivesse que
negociar com o tricolor um valor pela sua liberação.
Acertou na mosca.
E se?
Caminhando na praia de Ipanema, encontro o Bagá
ensandecido de alegria com os dois golaços de Vinícius
Jr. Assim que me vê, o sacrossanto crioulo abre aquele
sorrisão de poucos dentes e muita gengiva e dispara a
pergunta cheia de veneno:
- Chefia, vai que Vinícius Jr. vira titular e arrebenta
nos próximos meses. Como é que fica, Tite? Vai preferir
o Talisca?

Gols de Vinícius
Rodrigo Buendia/AFP

agitam Espanha
Não foram apenas os torcedores do Fla-
mengo que enlouqueceram com a exibição
de gala de Vinícius Júnior, quarta-feira,
diante do Emelec, do Equador, pela segunda
rodada do Grupo 4 da Copa Libertadores.
Ontem os jornais espanhóis também se ren-
deram à atuação espetacular da promessa
rubro-negra, que fez os dois gols da vitória
de 2 a 1. O garoto, de 17 anos, contratado
pelo Real Madrid por R$ 150 milhões, rece-
beu uma enxurrada de elogios, todos enalte-
cendo sua personalidade e categoria.
Principal jornal esportivo de Madri e
quase um porta voz do Real, o diário “Mar-
ca” lembrou que, desde que foi contratado
pelo gigante espanhol, Vinícius Júnior vive
em uma gangorra. Quando joga bem, uma
chuva de elogios. Quando vai mal, críticas,
contestações e muitas dúvidas. “Será que
vale o que o Real Madrid pagou?”, Será Vi-
nícius a estrela que todos esperam?”. Segun-
do o “Marca”, “quando o garoto joga bem é
comparado a Neymar. Se for mal, a compa-
ração é com Robinho”.
Encantado com a atuação decisiva de Vi-
nícius Júnior, o diário destacou a personali-
dade demonstrada pelo menino, que só fará
18 anos em 12 de julho. “Vinícius entrou
para fazer em meia hora o que o Flamen-
go inteiro não tinha conseguido até então. E
mostrou que merece jogar mais”.
O “AS”, também de Madri, disse que jogo
a jogo a jovem promessa vai demonstrando
que o Real Madrid não fez nenhuma loucu-
ra ao desembolsar uma fortuna para contra-
tar um menino, na época com 16 anos. “As
dúvidas eram naturais. Afinal, pagar tanto
dinheiro por um menino assusta a qualquer
um. Mas agora, com 17 anos, vai se firman-
do pouco a pouco. Os dois gols que fez em
menos de 25 minutos em um jogo de Liber-
tadores são provas inequívocas de seu po-
tencial”, escreveu o diário.
Como não poderia deixar de ser, Viní-
cius Júnior foi o centro das atenções, ontem
pela manhã, no desembarque do Flamengo.
Mostrou diante de um mar de microfones a
mesma personalidade que exibiu em Guaia-
quil. “As pessoas falam muito, dizem um
monte de coisas, mas eu continuo com a ca-
beça erguida”, afirmou o garoto.
Dormi bem pouco
no avião, mas
fiquei bem feliz
com todo mundo
me mandando
mensagem"
VINÍCIUS JÚNIOR
Vinícius Júnior comemora o gol com os óculos escuros atirado pela torcida do Emelec
Rio de Janeiro — Sexta-feira, 16 de março de 2018 Conheça nosso site www.jb.com.br • Não pode ser vendido separadamente
JORNAL DO BRASIL

MÔNICA LOUREIRO
monica.loureiro@jb.com.br

Marina Lima está impregnada de Brasil em

seu novo álbum, “Novas famílias”, o 21º de
carreira, que lança hoje em CD e nas plata-
formas digitais. O disco, que tem oito faixas
inéditas e a regravação do sucesso “Pra come-
çar”, traz guarânia, funk, eletrônico, samba,
balada, pop e até tecnobrega. Uma vitamina
mista que resulta, principalmente, de sua ex-
periência em São Paulo, para onde se mudou
há sete anos.
O trabalho está repleto de referências paulis-
tanas e novas parcerias. “Fui para São Paulo,
porque senti que o Rio não se interessava mais
por mim”, comenta, sem, no entanto, demons-
trar qualquer mágoa. “A diferença é que,
quando estamos no Rio, olhamos para o pró-
prio umbigo. Em São Paulo, tenho conhecido
mais do Brasil, entro em contato com culturas
diferentes. É um verdadeiro aprendizado, em
que adicionei coisas que já me atraíam. São
outros códigos, outras tribos”, diz a cantora
em entrevista, nesta quarta-feira, hospeda-
da em um hotel de Copacabana, sobre essas
novas influências.
“Novas famílias” aborda questões sociais con-
temporâneas, mudanças de costumes e bate
forte na política. Curiosamente, as referências
ao Rio de Janeiro aparecem na primeira e na
segunda faixas. “Um carioca acrobata/Não
deixa a peteca cair (...) Céus, e essas novas
famílias/Com terras molhadas de amor/
Minando qualquer ditador”, canta na faixa-
-título). “Mas ‘Novas famílias’ também é uma
referência a minha própria família, que hoje
se resume a mim e Cícero - meus pais e meu
irmão Beto morreram”, acrescenta a cantora e
compositora. Continua na página 2

Impregnada
de Brasil
Foto de José Peres
2 • Conheça nosso site www.jb.com.br
Cantora fala
das novas tribos
A cantora e compositora diz se sentir como uma forasteira em seu próprio país
A carga política que Marina imprime em “Novas fa-
mílias”, que terá show de lançamento em maio no Circo
Voador, se destaca em quatro faixas e no texto do encarte:
“Nunca me senti tão envolvida com o Brasil. A força e o
engajamento que tenho visto por aí não são brincadeira, e
têm me dado um orgulho danado. A verdade é que existe
muita gente boa, bem intencionada e talentosa no mercado
para ajudar a tirar o país desta crise. Estamos nos olhando
mais, conscientes das diferenças e querendo passar o Bra-
sil a limpo. Rio, São Paulo, Belém, Parnaíba, Mercosul...
Foram me chamar? Aqui está a minha trilha para o Brasil
de agora. Realista, crítica, porém cheia de amor pra dar.
Tudo, tudo, tudo vai dar pé”.
Entre as faixas mais politizadas, estão a primeira, que tem
até um tom otimista; “Mãe gentil”, um apelo pela mobilização
social; o sucesso “Pra começar” (lançada ao vivo em 2000) e
“Só os coxinhas”, com sua fina ironia. Questionada se o funk
seria uma resposta à letra machista de “Só as cachorras”, do
Bonde do Tigrão, Marina considerou um ponto de vista in-
teressante, porém disse que a inspira-
ção da parceria com o irmão Antonio
Cicero foi outra: “Fiz ‘Só os coxinhas’
quando vi aquela cena da farra dos
guardanapos do Sérgio Cabral Filho
em Paris, foi um choque para mim.
Aquilo é um retrato da corrupção e
do desprezo pelas pessoas, são aqueles
que só pensam em dinheiro”.
A música “Mãe gentil”, que a Mari-
na Lima considera “um grito de guer-
ra do Terceiro Mundo”, é assinada
por ela, a carioca Letícia Novaes e o
paraense Arthur Kunz. “Esta é pra
sair do chão, não no sentido de folia,
mas para reivindicar os nossos direitos. Perdemos nossa
pátria, sinto como se fôssemos forasteiros no nosso próprio
país”, revolta-se.
Ela, que fez questão de manter seu título de eleitor no
Rio de Janeiro, diz que tem um histórico ligado à esquerda.
“Sempre me preocupei com a desigualdade social. O Brasil
não tem sequer saúde pública decente e estão substituindo
as escolas pelas igrejas. Não tenho nada contra os evangéli-
cos, mas não quero as regras deles na minha vida”, dispara.
E destaca que, infelizmente, a música “Pra começar”, dela
com letra de Antonio Cicero, permanece atual: “Pátrias,
famílias/ Religiões e preconceitos/Quebrou, não tem mais
jeito”, mas não desanima: “Não podemos perder o entu-
siasmo. Eu acredito que se trate de um ciclo, que, de tantos
Caderno B Sexta-feira, 16 de março de 2018
IMORTALIDADE
Divulgação
Foto de José Peres
Antonio Cícero toma
posse hoje na ABL
Hoje, em cerimônia que será iniciada às 21
horas, toma posse na Academia Brasileira de Letras
(ABL) o poeta, filósofo e compositor Antônio
Cícero Correia Lima, passando a ocupar a cadeira
27. O novo acadêmico, que será recebido pelo
colega Arnaldo Niskier, foi eleito em 10 de agosto
do ano passado sucedendo o professor e ensaísta
Eduardo Portella, falecido em 3 de maio de 2017.
Os ocupantes anteriores da cadeira 27, que tem
como patrono Maciel Monteiro, foram Joaquim
Nabuco (fundador), Dantas Barreto, Gregório
Fonseca, Levi Carneiro e Otávio de Faria.
Antônio Cicero nasceu no Rio de Janeiro em
1945 e formou-se em filosofia na Universidade
de Londres. Poeta, letrista e professor de filosofia,
é autor dos livros de ensaios: “O mundo desde o
fim” (1995), “Finalidades sem fim” (2005), “Poesia
e Filosofia (2012) e “A poesia e a crítica” (2017).
Os livros de poemas são: “Guardar” (1996, Prêmio
Nestlé de Literatura Brasileira); “A cidade e os
livros (2002) e “Porventura” (Prêmio de Poesia da
Academia Brasileira de Letras).
Em “Poesia e filosofia”, ele afirma que “a
despeito de tanto o filósofo como o poeta terem as
cabeças nas nuvens, não são idênticas suas nuvens.
Os assuntos dos poetas não são tão genéricos e
abstratos quanto os dos filósofos. Ao contrário,
parecem ser bastante concretos. O poeta fala, por
exemplo, da manhã, da morte, do nascimento, do
azul, dos sapatos, das ruas, dos gestos...”.
Se a filosofia historicamente tem sempre que
em tantos anos, volta o retrocesso, a maldade,”compara.
criar um sistema novo, o mesmo não acontece com
A cantora e compositora se aventurou na literatura em
a poesia, pois um poeta da atualidade pode se referir
2012 com “Maneira de ser” e anda envolvida com dois
a temas que já foram objeto de poemas no passado
projetos cinematográficos. “A primeira vez em que fui
e, mesmo assim, criar uma imagem inusitada. O
ensaiar o texto com a Andrea Beltrão, fiquei com febre
que importa é como usa palavra. Quem não ama
no dia seguinte”, conta Marina sobre seu nervosismo em
as palavras, comenta Antonio Cicero, dificilmente
contracenar com a atriz no elenco de “Baleia”, filme de
será poeta. O importante, afirma, não é fazer
Esmir Filho ainda sem data de estreia.
o novo, mas sim o que não envelhece. Ou seja,
No projeto original, a cantora faria apenas trilha sonora do
“o fato é que os poemas pretendem ficar vivos,
longa, mas o diretor achou que seria ótimo tê-la interpretan-
mesmo quando já morreram o seu autor e o país
do uma cantora. “Ele e o Ismael (Caneppele, ator) levaram
em que ele viveu, e mesmo quando deixou de ser
três anos para me convencer e acho que o roteiro até mudou
falada (embora continue a ser lida) a língua em
por minha causa. É uma personagem com quem me iden-
que foram feitos”.
tifiquei, por não ser tão distante de mim. Mas já avisei que,
Por isso é que para Antônio Cícero filosofia é
quando estrear, estarei fora do país!”, brinca, com sua timidez.
documento e poesia, monumento. Como disse
Por outro lado, Marina parece à vontade com outro
José Guilherme Merquior, discutindo conceitos
projeto cinematográfico, o documentário de Candé Salles,
empregados por Michel Foucault, “os documentos
que tem provisoriamente o título “Chegando ao clímax
são transmissores de referência externa; os
com Marina Lima”. A produção registra a sua mudança
monumentos são contemplados por si próprios”.
para São Paulo, a produção do livro, o
Ao que Cícero acrescenta: “Pode-se dizer que,
estúdio de gravação do álbum “Clímax”,
em suma, enquanto de maneira geral, o poema
ensaios, shows e outros momentos da
seja contemplado por si próprio, funciona como
sua vida. “
um monumento; um texto filosófico, sendo lido
Do talento de Marina Lima como
em vista da tese que afirma, funciona como um
compositora, nem é preciso falar. O in-
documento”.
teressante é saber que ela cria no violão,
Um monumento que precisa ser criado com
no baixo, na guitarra e no Logic. A faixa
vagar e fruído também vagorosamente para ser
“Árvores alheias”, por exemplo, foi com-
entendido em sua totalidade. Para a poesia não
postas no programa de computador que
existe “tempo é dinheiro”. E exatamente neste nosso
oferece possibilidades infinitas. “Meu
tempo de aceleração desembestada das atividades,
interesse pela música eletrônica vem de
que ela, na opinião de Antonio Cícero, se faz mais
longe, comecei a mexer nisso em 1998.
desejável. Por quê? “Por que o que me parece
“Uma vez entrevistei a Björk, que tem
inteiramente indesejável é a aceitação passiva da
essa característica eletrônica em seu tra-
inevitabilidade do encolhimento de nosso tempo
balho, e perguntei o que ela achava desse preconceito. Ela
livre”, diz o culto e sensível poeta.
respondeu que tinha pena de pessoas que não se interessam
Com a leitura dos versos, “conseguimos romper a
e não aceitam novos recursos, porque acham que vão perder
cadeia utilitária cotidiana, concedendo ao poema a
espaço. É exatamente o que eu penso”.
concentração por ele solicitada. Configura-se então
O lançamento do disco, que futuramente sairá em vinil,
um tempo que já não se encontra determinado
acontece no mesmo dia em que Antonio Cicero toma posse
pelo princípio do desempenho. Afinal, a rigor, o
na Academia Brasileira de Letras. “O disco ficou pronto
poema não serve para nada. Ou bem a leitura de
em dezembro, porém decidimos deixar o lançamento
um poema recompensa a si própria, isto é, vale por
para o início do ano. Um mês e meio atrás, meu irmão me
sim, ou bem ela não vale absolutamente nada”.
ligou para dizer que sua posse era dia 16! Meu irmão, que
Com certeza, hoje os anjos lá no céu estarão
admiro tanto, construiu uma obra maravilhosa comigo,
felizes por mais um poeta entrar para a Casa de
chega agora ao ponto mais alto da erudição e intelec-
Machado. Poetas são imprescindíveis.
tualidade brasileira! Se meus pais estivessem vivos, nem
(Colaborou Cecilia Costa)
sei como reagiriam”, diz Marina, com olhos marejados e
Sexta-feira, 16 de março de 2018 Caderno B Conheça nosso site www.jb.com.br • 3

MARIELLE FRANCO, a vereadora que se tornou

Hildegard Angel
mártir pela coragem, dará nome à Biblioteca de
Manguinhos, que será reaberta dia 29. Iniciativa
do Secretário de Estado de Cultura, Leandro
Sampaio Monteiro, que deseja homenagear sua
luta de mulher negra, criada em comunidade com
problemas semelhantes aos de Manguinhos.
hilde@jb.com.br

Os que pretenderam eliminar Marielle deram vida a uma mártir, símbolo das mulheres, pobres e negros
Fotos no Rio de Janeiro, Valéria Burgos, Luciene Lacerda e Geo Brito / Lisboa, Gabriela Roque

Marielle, que falta você nos faz

Uma aluna que combateu a política das UPPs Maré, entre os anos de 1999 e 2009”. O estudo faz governador Sérgio Cabral. Articulada e com uma
como única solução para a desigualdade, esta foi o levantamento dos dados sobre os efeitos da au- oratória impecável, a quinta mais votada vereadora
a Marielle Franco da Silva em sua passagem pela sência do Estado e as inúmeras incursões policiais de 2016 trazia a vocação política na alma. Marielle
UFRJ, no curso de Especialização e MBE em Res- na comunidade onde ela nasceu e viveu a maior levou para as audiências no plenário da Câmara
ponsabilidade Social. Seus professores, ouvidos parte da vida. Em 2014, a convite de professores da seu conhecimento de sala de aula e seu ímpeto de
pela coluna, destacaram a dedicação e o esforço, Universidade Federal Fluminense, Marielle parti- mulher idealista. Este seu perfil combativo a levou
nas aulas, de Marielle, que nunca aceitou a políti- cipou de uma aula na Oficina de Políticas Públicas, a ser nomeada relatora da comissão de vereadores
ca de violência conduzida pelo Estado nas favelas. um projeto de extensão da UFF, em Macaé. E foi que acompanha o trabalho de militares na inter-
Ao fim do curso, em 2011, defendeu sua tese so- aplaudida de pé por um auditório lotado, quando venção federal no Rio de Janeiro. Sua morte agora
bre “Participação, mobilização e controle social na atacou a política de segurança pública do então é História da cidade. Marielle, presente!
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Luiza Lemmertz e Caio Blat interpretam Diadorim e Riobaldo na peça encenada por Bia Lessa na rotunda do centro cultural
‘Grande Sertão: Veredas’
em reta final no CCBB
Escritor analisa pontos de contato entre o clássico de Guimarães Rosa e a montagem de Bia Lessa
MARCIO SALGADO*
A adaptação de “Grande Sertão: Veredas”
para o teatro, feita por Bia Lessa, é um tra-
balho de rara beleza. A peça segue à risca o
enredo de amor reprimido e batalhas san-
grentas, revelados numa linguagem que se
reinventa a cada frase, e os ambientes de
sombras que se iluminam na obra-prima de
Guimarães Rosa.
O romance conta a história do jagunço
Riobaldo (Caio Blat), que atravessa o sertão
no encalço do inimigo, Hermógenes (Leon
Góes), e o seu desejo interditado por um
companheiro de bando, que, ao final, se reve-
la mulher, e se chama Diadorim (Luíza Lem-
mertz). Uma dúvida metafísica atormenta
o narrador e transpassa toda a narrativa - a
existência ou não do diabo.
Pela dimensão desta obra do escritor mi-
neiro - o romance tem cerca de 600 páginas,
escrito numa linguagem inventiva, fora dos
padrões estabelecidos - percebe-se o grau
de dificuldade que teve a diretora para en-
cená-la. Contudo, a montagem de Bia Lessa
mantém-se fiel ao enredo, à sua linguagem
criativa, e alcança múltiplos objetivos.
Bia Lessa encontrou uma forma original
de encenar “Grande Sertão: Veredas”, com
figurinos e materiais cenográficos simples. O
espetáculo não se passa em um teatro conven-
cional, mas na rotunda do Centro Cultural
Banco do Brasil (CCBB), onde foram erguidas
duas arquibancadas para abrigar o público.
Grande quantidade de bonecos de feltro
podem ser vistos nos espaços, por onde as
pessoas circulam livremente, fora dos horários
do espetáculo. Na peça, ganham as mais dis-
tintas formas, o que se observa também entre
os personagens em cena. São seres humanos
que se tornam bichos, pássaros, rios, ventos.
A epígrafe do livro - “O diabo na rua,
no meio do redemoinho...” - sugere que tal
entidade ronda aquelas páginas e povoa o
imaginário do narrador. De fato, Riobaldo
não esquece esse tema, enquanto conta a um
interlocutor que não toma parte na história,
os acontecimentos da sua vida quando ainda
era um fora da lei. O livro não se divide em
capítulos, o tempo da narrativa é recorrente,
Caderno B
Atores ficam no palco durante toda a montagem
Serviço
Grande Sertão Veredas
Concepção, direção geral e
adaptação Bia Lessa
Texto: Guimarães Rosa
Com Caio Blat, Luiza Lemmertz, Luísa
Arraes, Leonardo Miggiorin, Leon
Góes, Balbino de Paula, Daniel Passi,
Elias de Castro, Lucas Oranmian e
Clara Lessa
Centro Cultural Banco do Brasil
(CCBB)
(Rua Primeiro de Março, 66- Centro;
Tel. 3808-2020)
De quarta a domingo, às 21h
Duração: 140 minutos
Capacidade: 172 espectadores
Classificação: 18 anos
Ingressos: R$ 20 e R$ 10
Sexta-feira, 16 de março de 2018
Fotos de Roberto Pontes/ Divulgação
segue e retorna. Enquanto Riobaldo conta,
ao acaso, os seus feitos, passado e presente
se misturam.
Sobre a encenação do romance de Guima-
rães Rosa, a diretora observa que, para enfren-
tar as complexas questões propostas pelo autor,
tanto do ponto de vista metafísico, como do
ponto de vista formal, ela teve que se organizar
e estruturar para se dedicar a essa tarefa.
Na peça, os atores permanecem em cena
todo o tempo. E se entregam de corpo e alma
aos seus personagens. Caio Blat encarna Rio-
baldo de forma memorável, sem brechas, em
uma inesgotável quantidade de falas. O ator
protagoniza uma forte cena de sexo, com
Luísa Arraes, que, na peça, se desdobra em
vários personagens.
Bia Lessa observa no texto de encarte que
eles se transformam “diante do espectador, sem
truques, sem artifícios, usufruindo das possi-
bilidades ilimitadas que o teatro nos oferece.”
Em vez da adaptação, Bia Lessa definiu
a sua montagem como uma “transposição”,
que reproduz as palavras de Guimarães Rosa.
É natural, em casos como este, que os espec-
tadores comparem a peça teatral com o ro-
mance. É mesmo lugar-comum comentários
tais como: “Gostei mais do romance do que
da peça”, ou vice-versa. Mas devemos atentar
para o fato de que são criações artísticas que
fazem uso de linguagens distintas.
Na leitura de um romance, os leitores for-
mam imagens mentais dos personagens e dos
ambientes descritos. No teatro, os personagens
são representados por atores. Eles estão ali,
diante do público, a cada noite. E este ato se
encaixa à perfeição aos dizeres de Guimarães
Rosa sobre a vida: “Viver é muito perigoso...”
Sobre Guimarães Rosa
Escritor e diplomata, Guimarães Rosa
(1908-1967) nasceu em Cordisburgo, Minas
Gerais. Eleito para a Academia Brasileira de
Letras em 1963, só tomou posse em 16 de
novembro 1967, três dias antes da sua morte.
No seu discurso de posse na ABL proferiu a
seguinte frase: “A gente morre é para provar
que viveu.” O mundo das letras ainda busca
o seu significado.
*Jornalista, escritor, autor do romance O filósofo do
deserto (Multifoco, 2017)
Sexta-feira, 16 de março de 2018
Brilho eterno de Boal
Os Grupos de Teatro do Oprimido, formados a partir do projeto fundado por Boal em 1986, irão se apresentar esta noite na sede da Lapa
MÔNICA RIANI
Personagem exponencial para a evolução do tea-
tro no mundo, Augusto Boal (1931-2009) legou à
posteridade a metodologia do Teatro do Oprimido,
eixo para a transformação da realidade dos menos fa-
vorecidos a partir do trabalho com técnicas teatrais.
A data de seu nascimento, 16 de março,
baliza a criação do Dia Internacional do
Teatro do Oprimido, data lembrada hoje
em diferentes partes do mundo. No Rio,
o Centro de Teatro do Oprimido (CTO),
na Lapa, recebe o público, a partir das
19h, para uma noite de memória e arte.
Na agenda, estão apresentações do
trabalho dos Grupos de Teatro do Opri-
mido, ou GTOs, com shows de música,
sarau de poesias e exibição do vídeo-
-documentário do projeto “Teatro do
Oprimido na Maré”. O ponto alto da
comemoração é o anúncio da conquista
de recursos para dois anos de fomento
às atividades de dez grupos que traba-
lham com a filosofia de Boal. São grupos Metodologia desenvolvida pelo diretor está presente em 70 países
pautados pela diversidade de aborda-
gens. “As Marias do Brasil”, de domésticas, “Pirei na
Cenna”, de usuários e familiares da Saúde Mental,
“Panteras”, com representantes LGBT, e “Maremo-
to”, de jovens moradores do Complexo da Maré.
Ainda na noite de hoje, haverá sessão do “Cor do
Brasil”, sobre a valorização do negro na socieda-
de,com participação especial de dois músicos da
Orquestra Maré do Amanhã.
Membro do Colegiado, Géo Britto está há 28 anos
no CTO. “Augusto Boal criou o Teatro do Oprimido
nos anos 1970, resultado de todo seu acúmulo de luta
política e cultural dos anos 1950 e 1960. No Teatro
Caderno B
Dia Internacional do
Teatro do Oprimido é
comemorado hoje, data de
nascimento do artista há
87 anos. Evento comemora
novo patrocínio para CTO
do Oprimido, propõe que se democratize os meios
de produção para que os próprios oprimidos usem
o teatro para debater e transformar a realidade”,
contextualiza.
Hoje, o Teatro do Oprimido se multiplica em
mais de 70 países, nos cinco continentes: na Pales-
tina, há a atuação pela luta do Estado Palestino; na
Guatemala, entra no embate pelos direitos indíge-
nas; na Europa, surge como instrumento pela luta
dos direitos dos imigrantes. A cada dois anos, na
Índia, há a mobilização do povo pela luta de direitos
através de uma marcha. “Lá, chegaram a se reunir 15
Conheça nosso site www.jb.com.br • 5
Fotos de divulgação
mil indianos. São muitos países e opressões, o Teatro
do Oprimido busca sempre, a partir do oprimido,
mudar essa realidade através da arte e da organização
politica”, completa Britto.
Hoje, o Centro de Teatro do Oprimido continua
o trabalho de Boal realizando oficinas, seminários,
articulando e estimulando ações em diversos países
CPDoc JB formando muitos multiplicadores. Em
fevereiro, houve o 5º Encontro Latino-
-Americano com participação superior
a 300 membros. Em agosto, estudantes
de Antropologia e outras faculdades da
New York University e da Universidade
da Califórnia em Los Angeles (Ucla)
virão fazer intercâmbi.
“O CTO realizou, recentemente,
imensa gama de trabalhos aqui mesmo
no Brasil, com agentes penitenciários,
agentes comunitários de saúde, profes-
sores de escolas públicas, agentes cultu-
rais dos pontos de cultura, integrantes
de diversos movimentos sociais. Com
subsídios da Petrobras liberados ago-
ra poderemos subsidiar muitas outras
ações, finaliza.
FELICIDADE É...
Ler o Caderno B
todos os dias!
Gabriel Souza
6 • Conheça nosso site www.jb.com.br Caderno B
Inéditos de
João Donato
Álbuns do consagrado pianista e autor de sucessos chegam ao
mercado em caixa com quatro CDs, pelas mãos de Marcelo Fróes
LUIZ ANTONIO MELLO
Especial para o JB
Comemorando dez anos de existência, a gra-
vadora Discobertas lança um box com quatro
CDs de raridades do mestre João Donato, álbuns
que jamais foram lançados. Fazem parte da caixa
caixa os álbuns “Raridades - Anos 70”, Gozando a
existência” (1978), “Naquela base; (1988) e “Janela
da Urca”. Todo o material é inédito, incluindo os
encontros com Nara Leão, Djavan e Alaíde Costa.
O produtor Marcelo Fróes iniciou a extensa
pesquisa há quatro anos no acervo particular do
pianista e compositor acreano. O produtor diz
que “o projeto exigiu uma longa gestação para
chegar a este formato histórico e documental,
que tanto agrada aos fãs, colecionadores e his-
toriadores.”
Depois de passar os anos 1960 nos Estados
Unidos, Donato voltou ao Brasil em 1972 e já, no
ano seguinte, começou a gravar discos para selos
brasileiros. Após os clássicos “Quem é quem”
(1973) e “Lugar comum” (1975), gravou a série
“Leilíadas”, em 1986, parou e só tornou aq sua
discografia mais regular dez anos depois, a partir
de “Coisas tão simples”.
Marcelo Fróes conta que “Donato já havia fala-
do sobre o disco de 1988, cujos tapes de 24 canais
consegui recuperar na Cia, dos Técnicos, em 2014.
Já conhecia “Gozando a existência”, então propus
mergulhar no acervo dele. Foram dois anos de
emoções, ouvindo cerca de 800 cassetes e outros
formatos.” O produtor ficou surpreso com o bom
estado do acervo, uma vez que Donato “anotava
o conteúdo das fitas e datava. Sobreviveram a
muitas mudanças de endereço nesses 30, 40 anos”
Na ùltima década, a Discobertas já lançou qua-
se 70 boxes, fora algumas dezenas que fez para
as grandes gravadoras em 20 anos. Nos encartes
dos CDs, João Donato explica o que o trouxe de
volta ao Brasil. “Estava com saudades do pessoal,
também por ter me separado. O meu casamen-
to acabou, minha filha e minha mulher foram
embora para perto de São Francisco e eu fiquei
sozinho em Los Angeles. Aí, pensei: ‘O que é que
eu tô fazendo aqui, sozinho nos Estados Unidos?
Todo mundo falando em inglês perto de mim...
o rádio, a televisão... Eu fiquei meio desnorteado,
então concluí: ´Pô, tô com saudade do pessoal do
Brasil, da minha família. Aí, eu vim.”
Dos amigos da música de que sente falta, está
Nara Leão, com quem Donato adorava trabalhar:
“Nara era minha irmã, a gente ia de mãos dadas
pegar o ônibus. Ela não tinha carro e nem eu,
então eu a encontrava. Ela avisava no telefone que
estava saindo, pegava o ônibus no Leme e aí eu
ficava na esquina da Rua Montenegro , aquela que
depois virou Vinicius de Moraes. Tempos depois,
Nara gravou a minha ‘Nasci Para bailar`, que foi
um de seus grandes sucessos.
“Gozando a existência” foi um projeto experi-
mental gravado por João Donato e seus muitos
amigos, entre setembro e outubro de 1977 e em
julho do ano seguinte. Marcelo Fróes explica que
“das sessões participaram Vinicius de Moraes,
Nara Leão, Miúcha, Cristina Buarque, Alaíde
Costa, Rosinha de Valença. Beth Carvalho, Gal
Costa, Quarteto em Cy, Luiz Alves, Domingui-
nhos, Jackson do Pandeiro, Fernando Leporace,
Novelli e dezenas de pessoas.”
O álbum seria triplo, porém diversas fitas se
perderam e, de acordo com Fróes, “muitos dos
artistas citados não estão efetivamente nas faixas
que compõem o produto que pudemos montar.
Dentre as muitas curiosidades dos bastidores,
fica a conclusão de que o não- lançamento deste
disco em 1978 liberou os compositores Novelli,
Paulo Jobim e Nelson Angelo a levarem suas três
canções para o repertório do clássico “Clube da
Esquina 2”, que Milton Nascimento gravou e
lançou em 1978 - contando inclusive com a par-
ticipação de Donato.”
Sexta-feira, 16 de março de 2018
Deisi Rezende /CPDoc JB
“Leilíadas” , gravado ao vivo num nightclub ca-
rioca e que subaproveitou o riquíssimo repertório
que João Donato vinha compondo e ensaiando ad
eternum em shows e demos, a oportunidade de
gravar um novo disco de estúdio surgiu em 1988,
quando um admirador japonês chamado Yoichi
Ogawa resolveu propor a gravação. João Donato
diz que “foi ideia do Ogawa”.
Ele disse “Vamos gravar um disco. Eu produzo,
patrocino. Aí liguei para os meninos, Luiz Alves,
Robertinho, pra começar a arrumar os músicos
para tocar. Gravamos esse disco instrumental,
“Naquela base”, que também ficou pra lá, nin-
guém deu continuidade. Ogawa foi embora pro
Japão. Um cara curioso, ia em todos os meus
shows. Em todo lugar que eu ia tocar, estava lá
aquele japonês. Aí, um dia, eu fui lá na mesa dele e
falei: “Pô, em todo lugar que eu tô você tá, rapaz?!
Ele disse ´é que eu gosto de ouvir a sua música´.
Ficamos amigos e um dia ele me perguntou se a
gente queria gravar um disco, que ele queria pagar
pelas gravações. Só que, após a gravação, ele viajou
para o Japão e deixou as fitas do disco comigo.”
Frustrado com o não-lançamento de seu ál-
bum instrumental, Donato aproveitou a oportu-
nidade de gravar no estúdio particular do amigo
Ritchie, um ano depois, experimentando sinteti-
zadores novos e equipamentos modernos. Nasceu
ali “Janela da Urca”, um registro cheio de canções
novas, algumas com letra e voz, e que - embora
tenha ficado arquivado por tantos anos, conta
uma história e ilustra o final de um ciclo. Donato
buscou novos rumos e, a partir de 1996, retomou
de vez sua discografia.
Ficha Técnica
Box “Mad Donato”
Produção executiva: Marcelo Fróes
Masterização: Ricardo Carvalheira
Projeto gráfico: Bady Cartie