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Tema I
Atos do juiz: despacho; decisão interlocutória (simples e com força de definitiva). Sentença penal. Conceito e
espécies. Sentença como fato e ato jurídico. Sentença absolutória e seus efeitos. Sentença condenatória.
Notas de Aula1
No processo penal, ao contrário do processo civil, não se tem como norte principal
para definição do recurso cabível a natureza da decisão. O critério principal é a estrita
previsão legal, e, dali decorrente, residual: significa que do que esteja no artigo 581 do CPP,
que será abordado adiante, é cabível recurso em sentido estrito; o restante, desafia apelação.
Mesmo assim, o estudo da natureza das decisões ainda guarda alguma importância.
Vejamos, então.
A primeira divisão que se aponta separa os atos do juiz em despachos e decisões.
Despachos são atos de impulso oficial do processo, em que o juiz dá andamento ao
processo, somente. Em regra, não comportam recurso algum.
Decisões, por sua vez, é um tronco do qual se desprendem diversas espécies.
As decisões interlocutórias simples são aquelas que solucionam questões relativas à
regularidade do processo, e nunca analisam o mérito. Em regra, não comportam recurso
algum, com algumas exceções em que se admite o recurso em sentido estrito. Como
exemplo de interlocutória simples que desafia recurso, aquela que recebe a denúncia.
Pelo ensejo, vale a indagação: a decisão de recebimento da denúncia precisa ser
fundamentada? Há duas orientações: para o STF, não se trata, tecnicamente, de uma
decisão, e sim de um despacho, não precisando atender a exigência constitucional de
fundamentação. Ademais, qualquer análise mais profunda do juiz, neste momento,
externaria seu convencimento sobre o fato, comprometendo sua imparcialidade, revelando
antecipação de juízo. Em segunda vertente, Geraldo Prado e André Nicolitt defendem que,
sendo uma decisão, é imprescindível a fundamentação judicial, como em qualquer outra
decisão.
Segundo tipo de decisão são as interlocutórias mistas, aquelas que encerram o
processo, ou uma etapa dele, sem qualquer análise do mérito. Estas decisões podem ser
terminativas ou não terminativas: não terminativas são as que encerram uma etapa do
procedimento – como a pronúncia –, enquanto as terminativas são aquelas que encerram a
relação processual – tendo como bom exemplo a impronúncia.
Outro tipo é a decisão com força de definitiva. Alguns autores definem este tipo
como sinônimo de decisão interlocutória mista, mas para aqueles que a diferenciam elas são
aquelas decisões que analisam o mérito de questões e processos incidentes. Bom exemplo
seria a decisão que determina o levantamento do sequestro.
Há ainda as decisões terminativas de mérito, que são aquelas que encerram o
processo, analisam o mérito, mas não condenam nem absolvem. Como exemplo, as
decisões que declaram extinta a punibilidade.
Por fim, há as decisões definitivas, que analisam o mérito e encerram o processo,
condenando ou absolvendo. É a sentença criminal.
2. Sentença penal condenatória
1
Aula ministrada pela professora Elisa Ramos Pittaro Neves, em 21/9/2009.
“Art. 387. O juiz, ao proferir sentença condenatória: (Vide Lei nº 11.719, de 2008)
(...)
IV - fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração,
considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido; (Redação dada pela Lei nº
11.719, de 2008).
(...)”
Este dispositivo já nasce controvertido. Estaria correta esta atuação do juiz, na nossa
dinâmica processual penal?
Alexandre Câmara, em recente artigo, defende que o processo penal não se presta a
discutir verbas indenizatórias. Esta sentença violaria o contraditório e a ampla defesa, pois
o réu não terá qualquer oportunidade de se defender do valor do prejuízo ali arbitrado.
Geraldo Prado, por seu lado, entende que esta sentença é extra petita, porque não houve
pedido de condenação em reparação de danos, em verbas indenizatórias. Polastri, por fim,
defende que a reforma do CPP adotou, neste aspecto, o princípio da adesão, ou seja, a
vítima obtém a reparação dos danos já na esfera penal.
Segundo efeito da sentença penal condenatória é o previsto no artigo 393, I, do
CPP: a prisão incontinenti. Veja:
Com a reforma do CPP, não existe mais a prisão decorrente de sentença penal
condenatória recorrível, pois não existe mais prisão automática, hoje. Desta forma, o artigo
supra precisa ser interpretado de forma conjunta com o artigo 387, parágrafo único, mais
acima, do CPP, de forma que este efeito prisional apareça apenas quando a prisão for
necessária, ou seja, quando houver presentes os quesitos da cautelaridade.
Suponha-se que o réu tenha sido condenado, e seu recurso desprovido, pendendo
apenas os recursos excepcionais (que não contam, em regra, com efeito suspensivo). Este
réu pode ser preso, de forma automática? Veja a súmula 267 do STJ:
Há quem aplique a prisão imediata com este argumento, baseado na súmula acima,
porque se o recurso não tem efeito suspensivo, nada impede o mandado de prisão, eis que o
artigo 393, I, do CPP, autoriza tal prisão. Desta forma, neste pé, o agente deve ser preso.
O STF, porém, entende que, a despeito de o recurso não ter efeito suspensivo, toda e
qualquer prisão pré trânsito em julgado deve ser calcada em cautelaridade, ou seja, não há
prisão automática – deve ser decretada a prisão preventiva. Acompanham a Corte Maior,
neste entendimento, Ada Pellegrini e Marcellus Polastri.
“Art. 596. A apelação da sentença absolutória não impedirá que o réu seja posto
imediatamente em liberdade. (Redação dada pela Lei nº 263, de 23.2.1948)
Parágrafo único. A apelação não suspenderá a execução da medida de segurança
aplicada provisoriamente. (Redação dada pela Lei nº 5.941, de 22.11.1973)”
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
O juízo de segunda instância não poderá jamais reparar este erro material, quando
esta correção for prejudicar o réu, e o recurso houver sido exclusivo da defesa: tratar-se-ia
de ofensa à vedação à reformatio in pejus, proibida no artigo 617 do CPP. A reforma de erro
material, neste caso, só seria possível para favorecer o réu.
O juiz da execução não pode adentrar o mérito da maior parte das questões
analisadas pelo juízo da sentença condenatória: quando individualiza a pena, operará
alterações de diversos aspectos da sentença, como o regime, por exemplo. Todavia, jamais
poderá se imiscuir na questão do cálculo da pena, sob qualquer ângulo. Veja que o juiz da
execução pode, até mesmo, reconhecer que houve crime continuado, quando da
individualização de penas, por exemplo, mas não poderá alterar o cálculo da pena, nem
mesmo para corrigir o erro material, sob pena de ofender a coisa julgada.
Questão 2
Resposta à Questão 2
Para o STF, este despacho está correto, eis que este ato não se trata de uma decisão,
e sim de mero despacho. Ademais, se o juiz se aprofundar na análise dos argumentos e do
mérito, neste momento, estará antecipando juízo de mérito da causa, o que violaria a
imparcialidade necessária para o processamento. É válido o ato nesta forma, portanto.
Tema II
Sentença penal (continuação). Emendatio libelli e mutatio libelli. Forma das sentenças. Publicações das
sentenças. Coisa julgada e preclusão.
Notas de Aula2
No processo penal, os limites da sentença não são determinados pelo pedido, e sim
pela causa de pedir. Permanecendo esta a mesma, o juiz poderá dar ao fato definição
jurídica diversa daquela constante da inicial acusatória.
Na emendatio libelli, imagine-se a causa de pedir como um compartimento, um
invólucro: o juiz poderá, sem extrapolar os limites deste invólucro, realizar quaisquer
variações na definição jurídica dos fatos. Se no curso do processo, nenhum fato alheio a
este invólucro surgir, o juiz poderá, naqueles limites traçados pela inicial acusatória, alterar
a imputação, ajustando-a, retificando a capitulação lançada pelo autor da ação penal.
Veja que a gravidade da imputação consequencial é irrelevante. Pouco importa se,
do ajuste feito pelo juiz, surja uma imputação mais grave: haverá este ajuste, e a sentença
será perfeitamente escorreita. Basta que as alegações constantes da causa de pedir (na
analogia do invólucro) permitam a conclusão a que o juiz chegou.
Este ajuste promovido pela emendatio não compromete a ampla defesa e o
contraditório pela simples razão de que o réu, ao longo de todo o processo, se defendeu da
causa de pedir, e não do pedido capitular. Por isso, o réu teve exercida a ampla defesa desde
sempre, sem óbices, acerca daqueles fatos, e se por acaso a capitulação for diversa, a
substância não o é, não prejudicando a defesa de forma alguma.
O § 1° do artigo supra, porém, traz uma alteração importante: se a nova definição
criminal encontrada pelo juiz ao promover a emendatio fizer recair a condenação em crime
passível de sursis processual, o juiz abrirá vista ao MP, para que este se manifeste sobre
esta proposta de suspensão. É uma inovação legal, que já era adotada pela jurisprudência,
sendo verdadeira positivação da súmula 337 do STJ:
2
Aula ministrada pelo professor Marcos Paulo Dutra Santos, em 22/9/2009.
“Art. 617. O tribunal, câmara ou turma atenderá nas suas decisões ao disposto nos
arts. 383, 386 e 387, no que for aplicável, não podendo, porém, ser agravada a
pena, quando somente o réu houver apelado da sentença.”
Imagine-se que haja uma imputação por concurso material entre um furto e um
roubo. Para fins de suspensão condicional do processo, a súmula 243 do STJ e 723 do STF
entendem que as penas mínimas devem ser somadas para verificação do cabimento desta
benesse.
“Súmula 723, STF: Não se admite a suspensão condicional do processo por crime
continuado, se a soma da pena mínima da infração mais grave com o aumento
mínimo de um sexto for superior a um ano.”
No exemplo, a soma das penas mínimas chega a cinco anos – um do furto e quatro
do roubo –, sendo impossível a suspensão. Imagine-se que, em julgamento, o réu seja
absolvido do roubo: vai remanescer apenas o furto como infração a ser julgada. É esta a
hipótese travada na parte final da súmula 337 do STJ: o furto será passível de suspensão
condicional do processo.
Mas repare que, neste caso, a decisão não é meramente interlocutória mista: é
verdadeira sentença, eis que julgou o mérito, parcialmente. Nesta sentença, absolutória, o
juiz consignará no final de seu decisum que, em relação ao furto, abre vistas ao MP para
pronunciar-se sobre o sursis processual.
No caso do § 1° do artigo 383, da decisão que abre vistas ao MP, esta decisão
desclassificatória não encontra previsão expressa de recurso em sentido estrito, e, além
disso, é uma decisão com força de definitiva, eis que enfrentou uma questão de mérito
definitivamente (a elementar que, ausente, definiu a emendatio). Por isso, desafia apelação
supletiva, com base no artigo 593, II, do CPP:
“Art. 593. Caberá apelação no prazo de 5 (cinco) dias: (Redação dada pela Lei nº
263, de 23.2.1948)
I - das sentenças definitivas de condenação ou absolvição proferidas por juiz
singular; (Redação dada pela Lei nº 263, de 23.2.1948)
II - das decisões definitivas, ou com força de definitivas, proferidas por juiz
singular nos casos não previstos no Capítulo anterior; (Redação dada pela Lei nº
263, de 23.2.1948)
(...)”
Quando, de outro lado, a decisão que se estiver analisando for a sentença que
absolve o réu de um dos crimes capitulados, restando outro passível de sursis processual –
como no exemplo dado há pouco, do concurso entre roubo absolvido e furto –, por se tratar
de clara sentença absolutória, o recurso cabível é a apelação, mas com base no artigo 593, I,
do CPP, supra.
Se a apelação for manipulada pela acusação, em qualquer dos dois casos, não é
significa que não haverá a proposta de suspensão condicional do processo. Por isso, não se
fala, aqui, em aplicação do artigo 28 do CPP, porque a apelação, nestes casos, discutirá o
provimento jurisdicional desclassificatório, ou o provimento jurisdicional absolutório – e
não a possibilidade ou não de sursis processual. Se o tribunal confirmar, no julgamento da
apelação, a desclassificação ou a absolvição, o MP não poderá se furtar à proposta de
suspensão condicional do processo, pois seria uma recusa arbitrária, negando efetividade à
preclusão já operada na decisão mantida em segundo grau.
A apelação do artigo 597 do CPP tem efeito suspensivo da demanda, quando de
sentença condenatória ou absolutória, debalde o texto restritivo do artigo (valendo ainda
mencionar que este artigo só foi recepcionado até o termo “suspensivo”):
“Art. 492. Em seguida, o presidente proferirá sentença que: (Redação dada pela
Lei nº 11.689, de 2008)
(...)
“Art. 81. Verificada a reunião dos processos por conexão ou continência, ainda
que no processo da sua competência própria venha o juiz ou tribunal a proferir
sentença absolutória ou que desclassifique a infração para outra que não se inclua
na sua competência, continuará competente em relação aos demais processos.
Parágrafo único. Reconhecida inicialmente ao júri a competência por conexão ou
continência, o juiz, se vier a desclassificar a infração ou impronunciar ou absolver
o acusado, de maneira que exclua a competência do júri, remeterá o processo ao
juízo competente.”
Imagine-se que haja concurso material entre roubo simples, cuja pena máxima é de
dez anos, e ameaça, cuja máxima é de seis meses. Pela conexão, a competência é da vara
criminal. Pela letra do artigo 81 supra, se em relação ao roubo sobreviesse absolvição,
subsistindo a ameaça, perpetuar-se-ia a competência desta vara processante (mantendo-se a
aplicabilidade das medidas despenalizadoras para a ameaça, que é de menor potencial
ofensivo). Esta solução não agride o artigo 383, § 2°, do CPP, porque este último fala em
desclassificação, e o que se passou foi uma absolvição do crime que serviu de vis atractiva.
Imagine-se, porém, que houvesse uma lesão corporal gravíssima em cúmulo
material com o crime de ameaça. Novamente, a conexão faria competente a vara criminal,
em detrimento do JECrim. No julgamento, o juiz desclassifica a lesão gravíssima para
simples. Ora, perceba o imbróglio: se a única infração fosse, desde o início, a lesão corporal
gravíssima, se houvesse a desclassificação para simples, o artigo 383, § 2°, do CPP,
determinaria o envio do feito ao JECrim. Contudo, pelo fato de existir um outro crime
conexo – que nunca foi da competência, isoladamente considerado, do juízo em que agora
se vê –, a perpetuação da competência se imporia, em atenção ao artigo 81, caput, do CPP.
É bastante estranha, esta dinâmica.
Sintetizando: em havendo duas imputações conexas ou continentes, que em
princípio chamariam juízos diversos, se o juízo de competência prevalente absolve o réu da
sua imputação originária, é natural que em relação à outra prossiga oportunizando os
institutos despenalizadores, caso seja a restante de menor potencial ofensivo, segundo o
artigo 81, caput, do CPP. O mesmo dispositivo dá solução idêntica na hipótese de a
imputação originária do juízo de competência prevalente ser desclassificado, de sorte que
tanto ela quanto a outra, conexa ou continente, seriam por ele apreciadas, o que, todavia,
arranha o artigo 383, § 2°, do CPP, que estabeleceu como regra o declínio da competência.
A solução seria ou aplicar o princípio da especialidade, em prol do artigo 81 do CPP –
olvidando o fato de que a norma é originária do CPP –; ou priorizar o atual artigo 383, § 2°,
de forma que no caso de desclassificação, a solução seria o declínio da competência,
oportunizando os institutos despenalizadores do JECrim (posição que tende a prevalecer).
Tendo sido caso de declínio da competência do juízo processante para o JECrim,
veja que a imputação originária ainda é a que justificara a competência original da vara
criminal. O primeiro passo é abrir para que o MP promova o aditamento, eis que se o
julgamento se pautar na mesma denúncia, inalterada, a sentença será extra petita – haverá
uma lesão corporal gravíssima na causa de pedir, por exemplo, e o julgamento de outro
crime completamente diverso. O procedimento adotado, ali, será o dos §§ do artigo 384 do
CPP, por analogia (eis que este artigo é a sede da mutatio libelli, que será vista com zelo
adiante).
Assim se desenvolve o procedimento, portanto: o juiz do JECrim, então, abre vistas
ao MP por cinco dias (o ideal, em apreço ao sistema acusatório, é que o MP assim proceda
espontaneamente). Em seguida, dar-se-á a oitiva da defesa técnica, também em cinco dias,
na forma do § 2° do artigo supra. Depois, o juiz passa ao recebimento do aditamento,
também como dita o § 2° do mesmo artigo. Quarto passo é a notificação das partes para se
pronunciar sobre a necessidade e interesse na prova oral (no máximo de três testemunhas)
em prazo de cinco dias cada parte, excluída a prova oral já produzida. Adiante, o juiz
designa a audiência de instrução, interrogatório e julgamento 3, para oitiva destas novas
testemunhas, se arroladas, bem como para o interrogatório (ou reinterrogatório, se for o
caso) do acusado.
O órgão acusante pode se recusar a aditar, entendendo impertinente a
desclassificação? A doutrina refuta esta possibilidade, à exceção de Afrânio Silva Jardim.
STF e STJ igualmente rechaçam esta tese. Isto porque se trata de decisão, tendo corrido
processo até então, e a rediscussão violaria diretamente a preclusão. Em que pese a
sustentação positiva de Afrânio, que diz que o MP, em razão da sua independência
funcional, não pode veicular uma opinião delitiva com a qual não concorda, podendo assim
se recusar a aditar, STF e STJ, sublinhando que a unidade e indivisibilidade é do órgão
ministerial e se projeta apenas administrativamente, sustentam que tal recusa é impensável,
porque permitiria revolver questões de mérito preclusas tornando o processo uma marcha
3
É claro que serão, primeiro, notificadas as partes para arrolarem as testemunhas, para somente após o que
designar a audiência – havendo uma certa inversão cronológica entre os §§ 4° e 2° do artigo em comento.
Ademais, tendo havido a desclassificação para o JECrim, a eventual instrução somente ocorrerá se frustrados
os institutos despenalizadores, que hão de ser oportunizados antes de ser retomada a instrução.
involutiva, e não evolutiva, como deve ser – até porque, em apreço à teoria do órgão, a
preclusão operada no processo anterior alcançou o MP como um todo, tanto o que lá
oficiou como o daqui, ante a unidade e indivisibilidade.
Se ainda assim o MP se recusar, porém, e o PGJ, alçado pela aplicação do artigo 28
do CPP, insistir na recusa, o juiz deverá instaurar conflito negativo de competência, o que é
absolutamente estranho e indesejado.
Se se admitir recurso em sentido estrito desta decisão de desclassificação e remessa,
com base no artigo 581, II, do CPP (decisão que conclui pela incompetência do juízo), este
não terá efeito suspensivo; e não será processado nos autos originais (não tendo também o
efeito suspensivo reflexo). O juiz processante, então, precisará formar o instrumento e
remeter o traslado para o tribunal, remetendo os autos para o JECrim (pois se não há
suspensão, deve o feito correr por lá). Ora, se o procedimento prosseguirá no juizado, e lá
forem oportunizados os institutos despenalizadores, o recurso perderá o objeto, por
preclusão lógica. E, ao contrário, se o recurso for conhecido e provido, tudo o que foi
realizado no novo juízo será nulo. Por isso, o promotor (do juízo original, e não o do
juizado, que careceria de atribuição) poderá obstar o curso do procedimento, por meio de
impetração de mandado de segurança para concessão de efeito suspensivo ao recurso, a fim
de aguardar seu julgamento para que o processo volte a curso. Este mandamus não era
admitido pelo STJ, mas a reforma trazida pela Lei 12.016/09 permite expressamente, a teor
do seu novel artigo 5º, II:
Geraldo Prado, acompanhado por André Nicolitt, pondera que como o caput do
artigo 384 do CPP usa termos imperativos para as condutas do MP, não subsistiria o
aditamento provocado, hoje, somente podendo haver aditamento espontâneo, o único que se
harmoniza com o sistema acusatório. Contudo, é posição amplamente majoritária a de que é
cabível o aditamento provocado, por mais de um argumento: a fixação de prazo não faria
qualquer sentido; e a previsão de aplicação do artigo 28 do CPP, no § 1°, para controle da
atuação do parquet pelo juiz é clara ingerência do juízo sobre a atuação no aditamento. Por
isso, STF e STJ também se filiam a esta vertente, sobremaneira por entenderem que o
sistema acusatório está resguardado, uma vez que a palavra final ainda será do MP, na
figura do PGJ.
Havendo provocação da mutatio pelo juiz, este ato é irrecorrível, aparecendo como
mero despacho, mas desperta, com base na tese garantista acima exposta, a possibilidade de
impetração de um HC.
A mutatio, o artigo 384 do CPP, não se aplica em grau recursal, por falta de previsão
no artigo 617 do CPP, já transcrito: há um silêncio eloqüente do legislador, que contemplou
o artigo 383, a emendatio, mas deixou de fora o artigo da mutatio. Seria clara supressão de
instância, se fosse permitida esta dinâmica da mutatio em segunda instância. A respeito,
veja a súmula 453 do STF:
“Súmula 453, STF: Não se aplicam à segunda instância o art. 384 e parágrafo
único do Código de Processo Penal, que possibilitam dar nova definição jurídica
ao fato delituoso, em virtude de circunstância elementar não contida, explícita ou
implicitamente, na denúncia ou queixa.”
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
“Art. 395. A denúncia ou queixa será rejeitada quando: (Redação dada pela Lei nº
11.719, de 2008).
(...)
II - faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal; ou
(Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).
(...)”
Questão 2
Resposta à Questão 2
É importante sublinhar que, neste caso, como o corréu é prefeito, a extensão será
determinada pelo tribunal de justiça que é competente para o processo e julgamento.
Tema III
Notas de Aula4
4
Aula ministrada pelo professor Marcos Paulo Dutra Santos, em 22/9/2009.
“Art. 579. Salvo a hipótese de má-fé, a parte não será prejudicada pela
interposição de um recurso por outro.
Parágrafo único. Se o juiz, desde logo, reconhecer a impropriedade do recurso
interposto pela parte, mandará processá-lo de acordo com o rito do recurso
cabível.”
1.2. Tempestividade
Para recurso, o prazo flui sempre da intimação, começando no dia útil seguinte. Em
se tratando de carta precatória, nada se altera, pois o legislador não diferenciou as situações.
Veja a súmula 710 do STF:
“Art. 370. Nas intimações dos acusados, das testemunhas e demais pessoas que
devam tomar conhecimento de qualquer ato, será observado, no que for aplicável,
o disposto no Capítulo anterior. (Redação dada pela Lei nº 9.271, de 17.4.1996)
§ 1° A intimação do defensor constituído, do advogado do querelante e do
assistente far-se-á por publicação no órgão incumbido da publicidade dos atos
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
Questão 2
Resposta à Questão 2
O apelo será recebido, na forma da súmula 705 do STF, pois nada há que possa
prejudicar o réu na reanálise do decisum.
Tema IV
Teoria geral dos recursos (continuação). Efeitos dos recursos: dilatação procedimental, efeito devolutivo,
efeito suspensivo, efeito extensivo. Extinção anormal dos recursos: renúncia, desistência, deserção. Due
Process of Law. Prisão Provisória do recorrente (quando cabível).
Notas de Aula5
5
Aula ministrada pelo professor Denis Andrade Sampaio Júnior, em 23/9/2009.
“Art. 577. O recurso poderá ser interposto pelo Ministério Público, ou pelo
querelante, ou pelo réu, seu procurador ou seu defensor.
Parágrafo único. Não se admitirá, entretanto, recurso da parte que não tiver
interesse na reforma ou modificação da decisão.”
6
A autodefesa se compõe do direito à voz, como o interrogatório; direito de presença, como na audiência; e
direito de petição, que é o que fundamenta a capacidade postulatória pessoal do réu para recorrer.
O prazo para o acusado e para a defesa técnica tem início na respectiva intimação,
correndo de forma independente para cada um.
Havendo divergência na manifestação recursal do defensor e do réu, prevalece a
vontade de qualquer deles que manifestar intento em recorrer, porque o recurso defensivo,
em regra, não prejudicará o acusado, ante a vedação à reformatio in pejus em recurso
exclusivo da defesa.
Se quem recorre é o acusado, e a defesa técnica não manifestou intento em recorrer,
o juiz deverá destituir o defensor, e intimar o réu para constituir novo patrono, ou dizer se
tem interesse em ser patrocinado pela Defensoria Pública. Se o réu nada disser, nem
constituir novo advogado, a Defensoria atuará, pois a defesa técnica é indispensável. A não
intimação para tanto gera nulidade do feito, desde então.
“HC e Prequestionamento - 1
Assim o é por mera lógica: o MP não pode desistir de recurso interposto, na forma
do artigo 576 do CPP, considerando-se esta interposição como o marco da devolução:
“Art. 576. O Ministério Público não poderá desistir de recurso que haja
interposto.”
O próprio acusado, propria manu, diga-se, pode assim recorrer, de forma genérica,
pela mera manifestação neste sentido.
A interposição de recurso no procedimento especial do júri, outrossim, não pode ser
genérica. Nesta seara, a interposição é vinculada, como se vê no artigo 593, III, do CPP, e o
efeito devolutivo é atinente às razões do recurso, e não amplo na extensão, como regra:
“Art. 593. Caberá apelação no prazo de 5 (cinco) dias: (Redação dada pela Lei nº
263, de 23.2.1948)
(...)
III - das decisões do Tribunal do Júri, quando: (Redação dada pela Lei nº 263, de
23.2.1948)
a) ocorrer nulidade posterior à pronúncia; (Redação dada pela Lei nº 263, de
23.2.1948)
b) for a sentença do juiz-presidente contrária à lei expressa ou à decisão dos
jurados; (Redação dada pela Lei nº 263, de 23.2.1948)
c) houver erro ou injustiça no tocante à aplicação da pena ou da medida de
segurança; (Redação dada pela Lei nº 263, de 23.2.1948)
d) for a decisão dos jurados manifestamente contrária à prova dos autos. (Redação
dada pela Lei nº 263, de 23.2.1948)
(...)”
O STF tem entendido, inclusive, que se o recurso for exclusivo da acusação, no júri,
e o MP interpôs recurso de forma genérica (por exemplo, consignando na interposição que
recorre com base nas alíneas “a”, “b”, “c” e “d” do inciso III artigo 593 supra), deverá
vincular a matéria devolvida às razões, e não à interposição. Em apreço à ampla defesa, o
tribunal só terá a si devolvido aquilo que o MP consignar em razões, e não toda a matéria –
mesmo que, a critério, o apontamento de todas as alíneas, na interposição, assim fizesse
pensar. Veja julgado neste sentido, constante do informativo 502 do STF:
“Art. 601. Findos os prazos para razões, os autos serão remetidos à instância
superior, com as razões ou sem elas, no prazo de 5 (cinco) dias, salvo no caso do
art. 603, segunda parte, em que o prazo será de trinta dias.
§ 1º Se houver mais de um réu, e não houverem todos sido julgados, ou não
tiverem todos apelado, caberá ao apelante promover extração do traslado dos
autos, o qual deverá ser remetido à instância superior no prazo de trinta dias,
contado da data da entrega das últimas razões de apelação, ou do vencimento do
prazo para a apresentação das do apelado.
§ 2º As despesas do traslado correrão por conta de quem o solicitar, salvo se o
pedido for de réu pobre ou do Ministério Público.”
Veja que o caput diz “com as razões ou sem elas”, mas é imperativo ao contraditório
e à ampla defesa que haja as razões, a fim de que a parte contrária possa saber do que se
está recorrendo, e acudir com os argumentos que lhe assistirem. A respeito, veja o que disse
o STJ no seu informativo 399:
“Art. 617. O tribunal, câmara ou turma atenderá nas suas decisões ao disposto nos
arts. 383, 386 e 387, no que for aplicável, não podendo, porém, ser agravada a
pena, quando somente o réu houver apelado da sentença.”
A reforma para pior, quando o recurso for exclusivo da defesa, é impossível porque
não pode o órgão julgador ad quem agir de ofício em prol da acusação, sob pena de violar o
sistema acusatório: a inércia jurisdicional, salvo algumas exceções, deve prevalecer. Se há
trânsito em julgado para a acusação, não pode o tribunal atuar oficiosamente e prejudicar o
réu, mesmo que a decisão recorrida pela defesa seja teratológica.
O tribunal não pode, de ofício, sequer reconhecer nulidades, mesmo absolutas, se
estas prejudicarem a defesa. Veja a súmula 160 do STF:
“Súmula 160, STF: É nula a decisão do tribunal que acolhe, contra o réu, nulidade
não argüida no recurso da acusação, ressalvados os casos de recurso de ofício.”
Observe uma hipótese casuística curiosa: juiz federal absolve o réu; irresignado, o
MPF recorre, postulando somente condenação. O TRF, antes de adentrar o mérito, percebe
que há incompetência absoluta, por qualquer causa, e anula todo o processo, remetendo-o
ao juízo estadual. Este juízo condena o réu. Esta condenação é possível?
Esta condenação, ou qualquer decisão pelo juiz estadual, não é possível, pelo
seguinte: o MPF recorreu apenas para condenar o réu, e tal conduta fez com que a matéria
incompetência transitasse em julgado para o parquet. Destarte, ainda que absoluta, esta
nulidade não pode ser declarada em segunda instância. Sendo assim, a decisão absolutória
do juiz federal ainda está vigente, e deve ser observada.
Ada Pellegrini, porém, defende que a incompetência absoluta gera inexistência do
ato. Se se seguir esta orientação – e a jurisprudência não o faz –, a situação seria diferente:
inexistindo a sentença, nada obsta que o juízo competente, o estadual, julgue
irrestritamente. Não parece ser posição mais acertada.
Pelo ensejo, vale tratar da vedação à reformatio in pejus indireta, que surge da
combinação do artigo 617, supra, com o artigo 626, parágrafo único, do CPP:
Note que é caso excepcional em que a decisão nula produzirá efeitos mesmo depois
de retirada do ordenamento: ela produz o efeito de estabelecer a carga sancionatória
máxima para o caso.
Por conta da supressão de instância, diga-se, o tribunal não pode também aplicar a
mutatio libelli, como dispõe a já abordada súmula 453 do STF. A emendatio libelli,
outrossim, é possível, desde que o tribunal não agrave com isso a situação do réu, se o
recurso que fez o processo chegar até ali foi exclusivo da defesa.
No tribunal do júri, a dinâmica é diferente. Quando somente a defesa recorre da
decisão do plenário, e obtém sucesso no seu pleito de cassação da sentença, a fim de que
seja proferida nova decisão em novo júri, este novel conselho poderá julgar com liberdade,
ou estará limitado pela decisão anteriormente proferida e cassada, ou seja, não pode agravar
a situação do réu?
Três são as correntes sobre o tema. A primeira defende que a decisão do júri é
soberana, e, sendo assim, esta segunda decisão não tem limites, pois o novo júri é
igualmente soberano. A norma constitucional da soberania prepondera sobre a
infraconstitucional da vedação à reformatio in pejus. A jurisprudência, Pacelli, e Rangel,
assim se posicionam.
A segunda corrente, majoritária na doutrina (capitaneada por Ada Pellegrini),
entende que a proibição à reformatio in pejus se aplica sem qualquer ressalva, aqui, porque
há dois valores amparando-a, contra um só valor contraposto: a ampla defesa, que seria
tolhida caso o réu soubesse que o recurso pudesse prejudicá-lo; e o próprio papel de
garantia individual que o júri exerce, que ficaria prejudicado se o réu temesse o acesso ao
segundo julgamento. Sendo assim, a segunda decisão seria limitada pela primeira, cassada.
O STF apresenta uma terceira orientação, como se pode ver no informativo 542
desta Corte, em que entende que há soberania dos veredictos dos jurados, mas não do juiz-
presidente: só está vedada a reformatio in pejus sobre atos do juiz-presidente, e não sobre a
decisão do conselho. Veja:
defesa, bem como a vedação da reformatio in pejus. HC 89544/RN, rel. Min. Cezar
Peluso, 14.4.2009. (HC-89544)”
“Art. 654. O habeas corpus poderá ser impetrado por qualquer pessoa, em seu
favor ou de outrem, bem como pelo Ministério Público.
(...)
§ 2° Os juízes e os tribunais têm competência para expedir de ofício ordem de
habeas corpus, quando no curso de processo verificarem que alguém sofre ou está
na iminência de sofrer coação ilegal.”
Segundo Barbosa Moreira, não é o recurso que opera o efeito suspensivo: o recurso
apenas prolonga o efeito suspensivo que já se impunha à decisão. Entenda: em regra, no
processo penal, a decisão nasce sem efeito, só produzindo-os quando transitada em julgado.
Quando o recurso prolongar esta ineficácia da decisão, conta com o chamado efeito
suspensivo; quando não tem, a decisão produz efeitos desde quando prolatada.
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Esta limitação da pena não impede que seja reconhecida, por exemplo, a hediondez do crime da segunda
condenação, ou qualquer outra peculiaridade atinente à nova imputação, e que não existia na anterior. É só a
pena que fica limitada.
Em regra, a apelação conta com este efeito suspensivo, salvo quando a sentença for
absolutória: esta sentença produz o efeito liberatório do réu desde o momento de sua
prolação, ou seja, não há suspensão de efeitos a ser prolongada.
Se o acusado estiver solto, e sobrevier uma sentença condenatória, desta sentença
cabe apelação, com efeito suspensivo. Mesmo assim, o acusado pode ser preso, mas não de
forma automática, por conta da sentença condenatória, e sim por eventualmente estarem
presentes os requisitos da cautelaridade na prisão, fazendo-a necessária – será uma prisão
preventiva como outra qualquer.
Sendo assim, desde a prolação da decisão alvejada por estes recursos já cabe a
execução provisória da pena, se o réu estiver preso cautelarmente, ou vier a ser preso por
estas circunstâncias cautelares estarem presentes. Reforce-se: o réu jamais será preso para
cumprimento provisório de pena; será preso cautelarmente, e esta prisão se comutará em
execução provisória da pena, e se já estava preso, a natureza da prisão assim se
transformará. Veja o que disse o STF em seu informativo 535:
“Art. 580. No caso de concurso de agentes (Código Penal, art. 25), a decisão do
recurso interposto por um dos réus, se fundado em motivos que não sejam de
caráter exclusivamente pessoal, aproveitará aos outros.”
O efeito extensivo nada mais é do que uma ampliação dos limites subjetivos da
decisão, sendo favorável ao corréu.
Este efeito extensivo se aplica também às ações autônomas de impugnação, como o
habeas corpus ou a revisão criminal.
Para haver efeito extensivo, é preciso, por óbvio, que haja concurso de agentes. É
também necessário que a questão ventilada seja estritamente objetiva, e não pessoal do
recorrente. Por isso, um recurso que absolva um réu por atipicidade da conduta é
claramente extensivo ao coautor, mas um recurso que propugne ausência de provas quanto
ao recorrente não se estende necessariamente ao corréu não-recorrente.
A respeito, veja o que disse o STF no informativo 552:
8
O raciocínio é o mesmo dos direitos da personalidade, que podem não ser exercidos, mas nunca podem ser
renunciados.
“Art. 806. Salvo o caso do art. 32, nas ações intentadas mediante queixa, nenhum
ato ou diligência se realizará, sem que seja depositada em cartório a importância
das custas.
(...)
§ 2° A falta do pagamento das custas, nos prazos fixados em lei, ou marcados pelo
juiz, importará renúncia à diligência requerida ou deserção do recurso interposto.
(...)”
“Art. 595. Se o réu condenado fugir depois de haver apelado, será declarada
deserta a apelação.”
Este dispositivo não foi recepcionado pela nossa CRFB de 1988, pois a prisão em
nada tangencia a recorribilidade ou a regularidade recursal. A respeito, veja a súmula 347
do STJ, e o informativo 542 do STF:
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
Questão 2
Resposta à Questão 2
Teoria geral dos recursos (continuação). Sistemática dos recursos. Classificação. Procedimento recursal. O
artigo 557 do CPC e os recursos no processo penal.
Notas de Aula9
1. Procedimento recursal
9
Aula ministrada pelo professor Denis Andrade Sampaio Júnior, em 23/9/2009.
“Art. 610. Nos recursos em sentido estrito, com exceção do de habeas corpus, e
nas apelações interpostas das sentenças em processo de contravenção ou de crime a
que a lei comine pena de detenção, os autos irão imediatamente com vista ao
procurador-geral pelo prazo de cinco dias, e, em seguida, passarão, por igual prazo,
ao relator, que pedirá designação de dia para o julgamento.
Parágrafo único. Anunciado o julgamento pelo presidente, e apregoadas as partes,
com a presença destas ou à sua revelia, o relator fará a exposição do feito e, em
seguida, o presidente concederá, pelo prazo de 10 (dez) minutos, a palavra aos
advogados ou às partes que a solicitarem e ao procurador-geral, quando o requerer,
por igual prazo.”
que é quem pedirá dia e hora para o julgamento do recurso. Repare que só há revisor
quando o crime for apenado com reclusão, pois, do contrário, segue-se apenas com a
manifestação do relator, como dita o artigo 610 do CPP, supra.
No julgamento, pode haver sustentação oral, como dispõe o parágrafo único do
artigo supra. A voz processual, em regra, é exercida primeiro pela acusação, e depois pela
defesa, em prol do contraditório efetivo (à exceção das recusas peremptórias de jurados, no
tribunal do júri, em que a ordem é inversa). A ordem da sustentação do recurso é outra
exceção: primeiro, sustenta a defesa; a seguir, a acusação. Se o recurso for exclusivo da
acusação, porém, a primeira voz será da acusação, é claro, sob pena de nulidade no
julgamento. Veja o informativo 495 do STF:
O MP, em segundo grau, funciona também como custos legis, mas não é possível a
dupla sustentação, pelo membro de primeira e o de segunda instância. Veja o informativo
406 do STJ:
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
O pleito não deve ser deferido, porque não é imperativo o contraditório em face do
atuar do MP em custódia da lei, como o é em segunda instância. Nada há que imponha esta
abertura de vista para manifestação sobre o parecer ministerial.
Questão 2
ERASMO foi condenado e interpôs apelação, prometendo, nos termos do art. 600,
§ 4º do CPP, oferecer, em segundo grau, suas razões, que, todavia, não foram
apresentadas. O Ministério Público requereu a intimação do advogado do réu para suprir
a omissão. Contudo, apesar da efetivação da providência, o advogado não formulou as
razões do recurso. Diante de tais fatos, o Ministério Público requereu a intimação pessoal
do réu para que, diante da desídia de seu defensor, apresentasse as razões pelo mesmo
advogado ou por outro que viesse a constituir, ficando ressaltado que, se a omissão
persistisse após o prazo legal, isto significaria sua opção por ser defendido dali em diante
pela Defensoria Pública. O relator indeferiu a intimação pessoal do réu e incluiu o feito
em pauta, tendo sido negado provimento ao apelo. Explique se o procedimento do relator e
do órgão julgador está em consonância com o ordenamento jurídico vigorante.
Resposta à Questão 2
Tema VI
Recurso em sentido estrito. Natureza do rol do art. 581 do CPP. Taxativo ou exemplificativo. Exame das
hipóteses de cabimento do recurso em sentido estrito no CPP e na legislação extravagante.
Notas de Aula10
1. Recursos
“Art. 573. Os atos, cuja nulidade não tiver sido sanada, na forma dos artigos
anteriores, serão renovados ou retificados.
§ 1° A nulidade de um ato, uma vez declarada, causará a dos atos que dele
diretamente dependam ou sejam conseqüência.
§ 2° O juiz que pronunciar a nulidade declarará os atos a que ela se estende.”
Ainda quanto ao prazo, a Defensoria Pública conta com prazo dobrado, na forma do
artigo 5°, § 5°, da Lei 1.060/50:
“Art. 5º. O juiz, se não tiver fundadas razões para indeferir o pedido, deverá julgá-
lo de plano, motivando ou não o deferimento dentro do prazo de setenta e duas
horas.
(...)
§ 5° Nos Estados onde a Assistência Judiciária seja organizada e por eles mantida,
o Defensor Público, ou quem exerça cargo equivalente, será intimado
pessoalmente de todos os atos do processo, em ambas as Instâncias, contando-se-
lhes em dobro todos os prazos. (Incluído pela Lei nº 7.871, de 1989)”
O defensor dativo não conta com prazo em dobro, porque esta duplicação é uma
exceção, e como tal deve ser interpretada restritivamente. Além disso, só se justifica pela
dificuldade estrutural que as Defensorias podem vir a enfrentar, precisando de maiores
prazos. Tampouco a intimação pessoal, ali prevista, é dirigida ao defensor dativo.
Minoritariamente, Tourinho defende que é dobrado o prazo para o defensor dativo, ao
argumento de que a Lei 1.060/50 não é diploma específico para a Defensoria, e sim para
toda assistência jurídica gratuita. A respeito, veja o HC 85.543, do STF:
O ofendido tem prazo de quinze dias para que o ofendido possa interpor recurso,
como se viu no transcrito artigo 598 do CPP, contados desde quanto acabado o prazo para
recurso pelo MP. O assistente de acusação tem prazo de cinco dias, e não quinze: este artigo
se refere ao ofendido não habilitado no processo como assistente de acusação; se habilitado,
o prazo será igual ao do MP, de cinco dias.
Terceiro pressuposto recursal é a formalidade: o recurso deve obedecer a forma
prevista na lei, que, segundo o artigo 578 do CPP, pode ser por petição ou por termo nos
autos (certidão lavrada pelo escrevente da interposição oral do recurso):
“Art. 578. O recurso será interposto por petição ou por termo nos autos, assinado
pelo recorrente ou por seu representante.
§ 1° Não sabendo ou não podendo o réu assinar o nome, o termo será assinado por
alguém, a seu rogo, na presença de duas testemunhas.
§ 2° A petição de interposição de recurso, com o despacho do juiz, será, até o dia
seguinte ao último do prazo, entregue ao escrivão, que certificará no termo da
juntada a data da entrega.
§ 3° Interposto por termo o recurso, o escrivão, sob pena de suspensão por dez a
trinta dias, fará conclusos os autos ao juiz, até o dia seguinte ao último do prazo.”
“Art. 149. Quando houver dúvida sobre a integridade mental do acusado, o juiz
ordenará, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, do defensor, do
curador, do ascendente, descendente, irmão ou cônjuge do acusado, seja este
submetido a exame médico-legal.
§ 1º O exame poderá ser ordenado ainda na fase do inquérito, mediante
representação da autoridade policial ao juiz competente.
§ 2° O juiz nomeará curador ao acusado, quando determinar o exame, ficando
suspenso o processo, se já iniciada a ação penal, salvo quanto às diligências que
possam ser prejudicadas pelo adiamento.”
“Art. 426. A lista geral dos jurados, com indicação das respectivas profissões, será
publicada pela imprensa até o dia 10 de outubro de cada ano e divulgada em editais
afixados à porta do Tribunal do Júri. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008)
Da decisão que as acolhe, cabe recurso em sentido estrito; da decisão que as refuta,
não cabe recurso, cabendo, quiçá, habeas corpus.
O inciso IV do artigo 581 do CPP fala da pronúncia. A impronúncia não desafia
recurso em sentido estrito, e sim apelação, na forma do artigo 416 do CPP:
“Art. 341. Julgar-se-á quebrada a fiança quando o réu, legalmente intimado para
ato do processo, deixar de comparecer, sem provar, incontinenti, motivo justo, ou
quando, na vigência da fiança, praticar outra infração penal.”
“Art. 593. Caberá apelação no prazo de 5 (cinco) dias: (Redação dada pela Lei nº
263, de 23.2.1948)
(...)
§ 4° Quando cabível a apelação, não poderá ser usado o recurso em sentido estrito,
ainda que somente de parte da decisão se recorra. (Parágrafo único renumerado
pela Lei nº 263, de 23.2.1948)”
O artigo 397, IV, do CPP, traz uma inovação referente à extinção da punibilidade:
“Art. 197. Das decisões proferidas pelo Juiz caberá recurso de agravo, sem efeito
suspensivo.”
“Súmula 700, STF: É de cinco dias o prazo para interposição de agravo contra
decisão do juiz da execução penal.”
No inciso XVI do artigo 581 do CPP é prevista a decisão que ordenar a suspensão
do processo, em virtude de questão prejudicial, que é a questão que antecede logicamente a
principal. Como exemplo, a constatação de casamento duvidoso, a fim de configurar a
bigamia, que é feita no cível. Se o processo for suspenso em virtude do aguardo da solução
de uma questão prejudicial, como autorizam os artigos 92 e 93 do CPP, e a parte entender
que esta suspensão foi indevida, pode recorrer em sentido estrito.
“Art. 89. Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um
ano, abrangidas ou não por esta Lei, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia,
poderá propor a suspensão do processo, por dois a quatro anos, desde que o
acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime,
presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena
(art. 77 do Código Penal).
(...)”
De fato, o sursis processual só não está previsto no artigo 581 do CPP porque a Lei
9.099/95 é posterior ao CPP, porque do contrário seria parte do texto deste inciso XVI.
O inciso XVII fala na decisão de unificação das penas. Ocorre que, novamente, a
Lei de Execução Penal entrega esta competência ao juiz da execução, e por isso este inciso
também foi revogado: cabe agravo de execução desta decisão.
“Art. 145. Argüida, por escrito, a falsidade de documento constante dos autos, o
juiz observará o seguinte processo:
I - mandará autuar em apartado a impugnação, e em seguida ouvirá a parte
contrária, que, no prazo de 48 horas, oferecerá resposta;
II - assinará o prazo de três dias, sucessivamente, a cada uma das partes, para prova
de suas alegações;
III - conclusos os autos, poderá ordenar as diligências que entender necessárias;
IV - se reconhecida a falsidade por decisão irrecorrível, mandará desentranhar o
documento e remetê-lo, com os autos do processo incidente, ao Ministério
Público.”
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
Tema VII
Recurso em sentido estrito (Continuação). Processamento do recurso: prazo, juízo de retratação. Efeitos.
Notas de Aula11
“Art. 586. O recurso voluntário poderá ser interposto no prazo de cinco dias.
Parágrafo único. No caso do art. 581, XIV, o prazo será de vinte dias, contado da
data da publicação definitiva da lista de jurados.”
11
Aula ministrada pelo professor Sauvei Lai, em 24/9/2009.
Nada obsta, porém, que sejam as razões apresentadas juntamente com a peça de
interposição, à opção do recorrente.
O mesmo promotor que interpõe o recurso deve juntar as razões, pois resolução do
MP assim determina. Mesmo que o membro do parquet que interpôs a peça venha a sair de
férias, estas serão interrompidas para oferta das razões.
O efeito devolutivo é determinado pela interposição de recurso, ou pelas razões
recursais? O STF entende que é pela interposição que se fixa o efeito devolutivo, e não
pelas razões – mesmo porque entende que estas razões são dispensáveis, contra a maior
doutrina. Há súmula para a matéria, a 713 do STF, que apesar de tratar do júri, tem seu
raciocínio para cá transponível:
“Art. 589. Com a resposta do recorrido ou sem ela, será o recurso concluso ao
juiz, que, dentro de dois dias, reformará ou sustentará o seu despacho, mandando
instruir o recurso com os traslados que lhe parecerem necessários.
Parágrafo único. Se o juiz reformar o despacho recorrido, a parte contrária, por
simples petição, poderá recorrer da nova decisão, se couber recurso, não sendo
mais lícito ao juiz modificá-la. Neste caso, independentemente de novos
arrazoados, subirá o recurso nos próprios autos ou em traslado.”
Este efeito regressivo do recurso em sentido estrito é obrigatório, ou seja, o juiz tem
que realizar a verificação de seu julgado, antes de confirmá-lo expressa e
fundamentadamente, e remetê-lo ao tribunal ad quem. Se o juiz remete o feito ao tribunal
sem realizar expressamente o juízo de retratação, o tribunal estará impedido de julgar o
Não há juízo de retratação implícito: a mera remessa ao tribunal não significa que o
juiz enfrentou a retratação e refutou-a. Ainda que o juiz mantenha a decisão pelas próprias
razões desta, esta fundamentação indireta é necessária.
Se o juiz se retratar, efetivamente, observa-se o parágrafo único do artigo 589 do
CPP: a parte agora sucumbente poderá, por simples petição, recorrer novamente, recurso
este que tem duas características peculiares: não depende de novo arrazoado, pois suas
contrarrazões desempenharão papel de razões; e não é admissível novo juízo de retratação.
O prazo para esta petição é o mesmo do recurso em sentido estrito, de cinco dias.
O artigo 589, parágrafo único, supra, deve ser lido com cuidado, pois só é possível
sua dinâmica se a decisão em questão comportar recurso. Se, por exemplo, culminar a
retratação em recebimento de denúncia, como deste recebimento não cabe recurso, a
petição é descabida – cabe habeas corpus, somente.
Enfim, após o juízo de retratação negativo, é encaminhado o recurso em sentido
estrito ao tribunal ad quem.
de 1.988. Artigo 17. São dispositivos de eficácia contida e, pois, ineficazes, por
falta de regulamentação, os artigos 37, XI e 40, parágrafo 11 da Constituição
Federal, na redação que receberam, respectivamente, das Emendas Constitucionais
n° 19 e 20, de 1.998. Quando os referidos dispositivos constitucionais adquirirem
eficácia plena, os limites remuneratórios decorrentes da Emenda Constitucional n°
19 somente poderão ser aplicados a partir do início de sua vigência, não podendo
retroagir, para colher atos e efeitos que ocorreram em momento anterior ao da sua
promulgação e, pois, com ofensa ao direito adquirido, assegurado em cláusula
pétrea constante do artigo 60, § 4°, IV, da Constituição Federl Preliminares (3)
rejeitadas. Segurança concedida.”
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
Sim, as contrarrazões devem ser oportunizadas, eis que se o recurso for provido o
indiciado será o principal prejudicado, eis que se tornará réu. A súmula 707 do STF,
inclusive, determina nulidade do processo, na carência desta abertura de vistas para
contrarrazões.
Questão 2
Resposta à Questão 2
A decisão do juiz não é ilegal. Pode ser injusta, mas não é ilegal. Sendo assim, não é
cabível o mandado de segurança impetrado, devendo o writ ser denegado.
Tema VIII
Notas de Aula12
1. Apelação
“Art. 593. Caberá apelação no prazo de 5 (cinco) dias: (Redação dada pela Lei nº
263, de 23.2.1948)
12
Aula ministrada pelo professor Marcelo Augusto Rodrigues Mendes, em 25/9/2009.
recursal, como se vê na nova redação dos artigos 386 e 387 do CPP, pois a mudança de
concepção das sentenças absolutórias e condenatórias tem clara repercussão na apelação,
pois estas sentenças são pressupostos para que possa vir a existir uma apelação. Veja os
artigos em questão, com as redações prévias e posteriores alterações:
“Art. 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde
que reconheça:
I - estar provada a inexistência do fato;
II - não haver prova da existência do fato;
III - não constituir o fato infração penal;
IV - não existir prova de ter o réu concorrido para a infração penal;
V - existir circunstância que exclua o crime ou isente o réu de pena (arts. 17, 18,
19, 22 e 24, § 1o, do Código Penal);
VI - não existir prova suficiente para a condenação.
IV – estar provado que o réu não concorreu para a infração penal; (Redação dada
pela Lei nº 11.690, de 2008)
V – não existir prova de ter o réu concorrido para a infração penal; (Redação dada
pela Lei nº 11.690, de 2008)
VI – existirem circunstâncias que excluam o crime ou isentem o réu de pena (arts.
20, 21, 22, 23, 26 e § 1o do art. 28, todos do Código Penal), ou mesmo se houver
fundada dúvida sobre sua existência; (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008)
VII – não existir prova suficiente para a condenação. (Incluído pela Lei nº 11.690,
de 2008)
Parágrafo único. Na sentença absolutória, o juiz:
I - mandará, se for o caso, pôr o réu em liberdade;
II - ordenará a cessação das penas acessórias provisoriamente aplicadas;
II – ordenará a cessação das medidas cautelares e provisoriamente aplicadas;
(Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008)
III - aplicará medida de segurança, se cabível.”
“Art. 387. O juiz, ao proferir sentença condenatória: (Vide Lei nº 11.719, de 2008)
I - mencionará as circunstâncias agravantes ou atenuantes definidas no Código
Penal, e cuja existência reconhecer;
II - mencionará as outras circunstâncias apuradas e tudo o mais que deva ser
levado em conta na aplicação da pena, de acordo com o disposto nos arts. 42 e 43
do Código Penal;
III – imporá, de acordo com essas conclusões, as penas, fixando a quantidade das
principais e a duração, se for caso, das acessórias;
IV – aplicará as medidas de segurança que no caso couberem;
III - aplicará as penas, de acordo com essas conclusões, fixando a quantidade das
principais e, se for o caso, a duração das acessórias; (Redação dada pela Lei nº
6.416, de 24.5.1977)
IV - declarará, se presente, a periculosidade real e imporá as medidas de segurança
que no caso couberem; (Redação dada pela Lei nº 6.416, de 24.5.1977)
II - mencionará as outras circunstâncias apuradas e tudo o mais que deva ser
levado em conta na aplicação da pena, de acordo com o disposto nos arts. 59 e 60
do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal; (Redação
dada pela Lei nº 11.719, de 2008).
III - aplicará as penas de acordo com essas conclusões; (Redação dada pela Lei nº
11.719, de 2008).
IV - fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração,
considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido; (Redação dada pela Lei nº
11.719, de 2008).
V - atenderá, quanto à aplicação provisória de interdições de direitos e medidas de
segurança, ao disposto no Título XI deste Livro;
O inciso IV do artigo 386 do CPP teve introduzida mais uma possibilidade de o juiz
absolver o réu com base em certeza da não autoria. É, portanto, mais uma hipótese de
recurso do réu de sentença absolutória, visando a mudança de fundamento da decisão. O
interesse está em que se reconheça, por exemplo, não a absolvição por falta de provas, que
não é uma absolvição por certeza de inocência, e sim pela certeza da não autoria.
Veja que a absolvição por certeza de não autoria é mais interessante ao réu por dois
motivos: ela tem reflexo no cível, eis que se há certeza de não autoria a ação indenizatória
civil fica obstada contra este réu; e tem outra repercussão, que se pode chamar de um
reflexo social: a mera ausência de provas sempre deixa pairando sobre o réu absolvido a
dúvida sobre seu envolvimento no crime, enquanto a absolvição por certeza de não autoria
é elidente de qualquer dúvida social.
No artigo 387, IV, supra, há ainda outro reflexo da reforma nesta seara: a
necessidade de fixação de valor mínimo a título de indenização à vítima do delito. A
apelação manejada contra esta sentença poderá alvejar, agora, a omissão do juiz que deixa
de arbitrar tal mínimo – efeito que atinge também as decisões provenientes do tribunal do
júri, em que o juiz-presidente deve fixar tal mínimo indenizatório.
O inciso II do artigo 593 do CPP, por seu turno, oferece maiores discussões. Trata
das decisões definitivas e das decisões com força de definitiva. Ali, inclusive, a apelação
assume caráter subsidiário, residual. Há um aparente imbróglio, aqui, porque o § 4° deste
artigo 593 dá à apelação um caráter preferencial sobre o recurso em sentido estrito,
enquanto se prevê o caráter residual no inciso II. A confusão é meramente aparente: se a
decisão definitiva, ou com força de definitiva, estiver contemplada no artigo 581 do CPP,
ou seja, arrolada como hipótese de cabimento de recurso em sentido estrito, não cabe
apelação; se é decisão de natureza definitiva ou com força de definitiva que não se subsume
a nenhuma das hipóteses do artigo 581 (cujo rol, como se sabe, é taxativo, mas é sujeito a
uma interpretação ontológico-evolutiva), cabe a apelação deste inciso II do artigo 593 – que
por isso é residual.
O § 4° do artigo 593 não cria nenhuma antinomia: a apelação é preferencial, ali,
quando uma mesma decisão concentrar duas naturezas, em capítulos diversos, um apelável
e um recorrível em sentido estrito. Neste caso, a apelação açambarca a discussão da matéria
que seria dada ao recurso em sentido estrito, em homenagem à unirrecorribilidade.
São decisões definitivas aquelas também chamadas decisões interlocutórias mistas
terminativas; e são decisões com força de definitiva aquelas chamadas de decisões
interlocutórias mistas não terminativas. As terminativas, como se sabe, são proferidas no
curso do processo, e têm o condão de por fim ao processo ou ao procedimento, mas não
resolvem o mérito, absolvendo ou condenando o réu – e é o não enfrentamento da pretensão
punitiva que as diferencia das sentenças definitivas. Exemplo claro de decisão
interlocutória mista terminativa é o de uma decisão que finda uma cautelar incidental, ou
um incidente processual qualquer (como a decisão que resolve um pedido de restituição de
coisas apreendidas, por exemplo), que não envolvem juízo de condenação ou absolvição do
réu. Também o acolhimento ou rejeição de uma exceção oposta pela parte é decisão
definitiva, nestes termos.
Veja que a ampla maioria destas decisões definitivas está no rol das que desafiam
recurso em sentido estrito, do artigo 581 do CPP, e por isso não serão desafiadoras desta
apelação residual. Uma questão: se o juiz reconhece a coisa julgada, por exemplo, e
extingue o processo de ofício, qual o recurso cabível? Neste caso, cabe apelação do inciso
II do artigo 593 do CPP, porque o que se encontra previsto no rol de cabimento do recurso
em sentido estrito, especificamente no inciso III do artigo 581, é a decisão que julga
procedente a exceção de coisa julgada, e não o seu reconhecimento de ofício. Fosse esta
decisão prolatada por provocação em exceção, subsumir-se-ia ao artigo 581, comportando
recurso em sentido estrito; como foi de ofício, comporta apelação, por escapar à previsão
do dispositivo em questão.
As decisões com força de definitiva, interlocutórias mistas não terminativas, por sua
vez, não põem fim ao processo ou procedimento, mas sim a uma fase processual, uma etapa
do procedimento. Há um exemplo claro deste tipo de decisão, que é a pronúncia, na
primeira fase do rito do júri, mas há outros: nos procedimentos especiais em que há defesa
preliminar, fase anterior ao próprio recebimento da denúncia, a decisão que desacolhe a
defesa preliminar é desta espécie, interlocutória mista não terminativa, porque o processo
terá seguimento. Exemplo desta defesa preliminar está no artigo 55 da Lei 11.343/07:
“Art. 514. Nos crimes afiançáveis, estando a denúncia ou queixa em devida forma,
o juiz mandará autuá-la e ordenará a notificação do acusado, para responder por
escrito, dentro do prazo de quinze dias.
Parágrafo único. Se não for conhecida a residência do acusado, ou este se achar
fora da jurisdição do juiz, ser-lhe-á nomeado defensor, a quem caberá apresentar a
resposta preliminar.”
O rechaço desta defesa é decisão apelável, eis que mista não terminativa ausente do
rol do artigo 581 do CPP.
Último exemplo evidente de decisão desta natureza vem no artigo 81 da Lei
9.099/95:
“Art. 81. Aberta a audiência, será dada a palavra ao defensor para responder à
acusação, após o que o Juiz receberá, ou não, a denúncia ou queixa; havendo
recebimento, serão ouvidas a vítima e as testemunhas de acusação e defesa,
interrogando-se a seguir o acusado, se presente, passando-se imediatamente aos
debates orais e à prolação da sentença.
§ 1º Todas as provas serão produzidas na audiência de instrução e julgamento,
podendo o Juiz limitar ou excluir as que considerar excessivas, impertinentes ou
protelatórias.
§ 2º De todo o ocorrido na audiência será lavrado termo, assinado pelo Juiz e pelas
partes, contendo breve resumo dos fatos relevantes ocorridos em audiência e a
sentença.
§ 3º A sentença, dispensado o relatório, mencionará os elementos de convicção do
Juiz.”
O inciso III do artigo 593 do CPP trata das decisões do rito do tribunal do júri. O
dispositivo traz quatro permissivos, quatro hipóteses em que será cabível a apelação.
Vejamos cada uma.
A alínea “a” do inciso em questão fala da apelação contra decisão do júri quando
ocorrer nulidade posterior à pronúncia. Veja que não só a nulidade posterior à pronúncia
dará ensejo à apelação, mas também nulidades anteriores à pronúncia que, eventualmente
possam ser suscitadas após a pronúncia: quando se tratar de nulidade absoluta, insanável.
Quando o legislador consignou ali que a nulidade posterior à pronúncia enseja a apelação,
referia-se à relativa, pois que esta está sujeita à convalidação, precisando de abertura legal à
sua suscitação. As absolutas, como é cediço, podem ser suscitadas e conhecidas a qualquer
tempo, dispensando a menção legal – ocorridas antes ou depois da pronúncia, desafiam
apelação.
Além disso, a nulidade relativa ficará sanada se o primeiro momento em que deva
ser suscitada deixar de sê-lo pela parte prejudicada: se esta parte não impugnar a nulidade
relativa em tempo, estará preclusa sua impugnação, e a nulidade convalidada. Veja o artigo
571, V, do CPP:
Passado este momento, o vício estará sanado, e nada mais poderá ser feito, não mais
comportando apelação.
A apelação com fulcro no artigo 593, III, “a”, pugna pela anulação da decisão, por
sua cassação, eis que alveja error in procedendo. Dado provimento à apelação, o tribunal
remete os autos a novo julgamento pelo conselho de sentença, por novos jurados, diversos
dos que atuaram no primeiro julgamento. A respeito, veja a súmula 206 do STF:
“Súmula 206, STF: É nulo o julgamento ulterior pelo júri com a participação de
jurado que funcionou em julgamento anterior do mesmo processo.”
Uma alteração promovida pela reforma que tem dado causa a nulidades posteriores
à pronúncia é a menção da decisão de pronúncia como argumento de autoridade. É vedado,
hoje, mencionar o ato de pronúncia como um pesar ao réu, induzindo os jurados a crer que
o ato de ser pronunciado é uma nota de que o réu já foi “pré-condenado”, achado culpado,
pelo juiz-presidente. Mas a hipótese mais corriqueira de apelação com base neste
dispositivo é mesmo o vício na quesitação, que torna o julgamento passível de anulação,
por provimento à apelação.
A segunda hipótese diz respeito à decisão do juiz-presidente que contraria a lei
expressa ou a vontade dos jurados, como se vê neste artigo 593, III, “b” do CPP. O
permissivo em questão, então, traz duas hipóteses de cabimento, em verdade: a violação à
lei ou a violação à decisão do conselho de sentença. Nos casos deste dispositivo, aplica-se o
§ 1º do mesmo artigo 593 do CPP, que comanda que o próprio tribunal ad quem vai corrigir
o erro do juiz a quo, reformando a decisão recorrida, e não anulando-a.
A carência da fixação do valor indenizatório mínimo, pelo juiz-presidente, se
enquadra no permissivo de apelo em questão, artigo 593, III, “b”, porque é caso claro de
violação à lei, ao artigo 387, IV, do CPP, há pouco transcrito. Caberia, também, a oposição
de embargos de declaração para suprir esta omissão, havendo mesmo quem entenda que
estes embargos são imperativos, não cabendo desde logo esta apelação, porque seria caso
de supressão de instância, eis que o tribunal estaria enfrentando de forma inaugural o
quantum indenizatório.
O permissivo da alínea “c” do inciso III do artigo 593 do CPP trata do erro ou
injustiça no tocante à aplicação da pena ou da medida de segurança, permitindo a discussão
por meio da apelação. Consiste na discussão de adequação, de justeza, da pena ou da
medida de segurança. Nesta hipótese, o tribunal também reforma desde logo a decisão,
como dispõe o já transcrito § 2° deste artigo 593 do CPP, e não a anula.
Entretanto, o ponto mais importante deste artigo 593, III, do CPP, é mesmo a alínea
“d”, que permite o apelo quando a decisão dos jurados for manifestamente contrária à prova
dos autos. A decisão aqui impugnada é proferida pelo corpo de jurados, pelo conselho de
sentença, o que impõe que qualquer alteração sobre esta seja altamente cautelosa, pela
sabida soberania dos veredictos. Veja: é claro que a soberania deve ser respeitada, mas
como qualquer princípio, é ponderável, e será mitigada quando a decisão que nela se
ampare beirar ao arbítrio, ao absurdo, à frustração de qualquer senso comum, até mesmo de
direito natural. E é isto que este permissivo legal admite.
A decisão manifestamente contrária à prova dos autos é sinônimo de decisão
arbitrária. É a decisão que simplesmente deu as costas a tudo que se desenvolveu no
processo, tanto para condenar como para absolver o réu, e que por isso não pode ser
mantida.
Por sua alta excepcionalidade, por ser forte mitigação à soberania dos veredictos,
este permissivo é limitado a uma única utilização no mesmo processo, como dispõe o § 3°
deste artigo 593 do CPP: só pode haver uma apelação com este fundamento, no mesmo
processo. Por isso, se no novo julgamento, pelo novo júri designado, a decisão se
demonstrar igualmente afrontosa à realidade dos fatos processuais, mesmo sendo
igualmente teratológica, não será possível novo apelo com este fundamento.
Veja que hoje, em homenagem ao princípio da plenitude de defesa que vige no júri
(princípio um pouco mais denso e amplo do que a simples ampla defesa), é admissível até
mesmo a absolvição com base em argumentos metajurídicos e extraprocessuais, pelo que
há, inclusive, a previsão do quesito aberto, no júri – o famigerado terceiro quesito –, em que
se questiona aos jurados se estes simplesmente absolvem o réu. Esta possibilidade não joga
por terra a apelação que desta decisão possa sobrevir, com fulcro neste artigo 593, III, “d”,
do CPP (como chega a sugerir parcela minoritária da doutrina). É permitido, sim, absolver
de forma atécnica, contra as provas dos autos, mas é igualmente permitido que esta decisão
seja revista em apelação, interposta uma vez, com base neste permissivo. Se confirmada a
absolvição metajurídica, nova apelação não será possível, e ela será mantida.
O manejo desta apelação por uma única vez se dirige a ambas as partes, acusação e
defesa, em conjunto: se uma decisão é questionada por uma das partes, com base neste
dispositivo, a outra parte não poderá recorrer da próxima decisão do conselho, com base no
mesmo inciso. A decisão supostamente teratológica, com base na alínea “d” em questão, só
pode ser uma única vez revista no processo, quem quer que a provoque.
Ante esta vedação, é possível que esta segunda decisão venha a ser questionada em
revisão criminal, por conta de alguma teratologia que escapou às possibilidades de revisão
endoprocessual.
Qualquer apelação no tribunal do júri, conforme a interpretação do STF que se
colhe de sua súmula 713, é vinculada aos fundamentos de sua interposição, ou seja, o
tribunal ad quem deve observar rigidamente qual é a fundamentação da apelação do
recorrente, em que permissivo expressamente se amparou o recurso. Reveja o enunciado:
da pena. Como se vê no rol do artigo 581 do CPP, o recurso em sentido estrito é cabível
contra decisão que nega o sursis, na forma do inciso XI. Todavia, não é cabível este
recurso, porque a negativa de sursis vem inserta em uma decisão maior, que deve ser
considerada como um todo, e esta decisão é uma sentença, desafiante de apelação. Nas
palavras de Capez, “a apelação é o peixe grande, que engole o recurso em sentido estrito,
peixe menor”.
Veja que a Lei 7.210/84, Lei de Execução Penal, permite a suspensão condicional da
pena com o processo já em fase executória, no seu artigo 66, III, “d”:
Ocorre que, como visto, no curso da execução penal a lei só admite um único
recurso, o agravo em execução. Sendo assim, aqui não se aplica a previsão da preferência
pela apelação, pois esta preferência só se impõe quando a matéria que é dada a outro tipo de
recurso vier inserida em uma decisão que, como um todo, desafia a apelação.
Uma última hipótese, pouco discutida mas relevante, é quando uma sentença,
condenatória ou absolutória, simplesmente não é apelável: trata-se da sentença sobre
crimes políticos, tipificados na Lei 7.170/83. No artigo 30 desta lei, o legislador previu que:
Este artigo não foi recepcionado, porque a competência para julgar crimes políticos,
hoje, é da Justiça Federal. O juiz federal de primeira instância julga o crime político,
quando não há prerrogativa de função para o réu. Se este réu for condenado ou absolvido,
esta sentença não comportará apelação: comportará o recurso ordinário constitucional,
diretamente dirigido ao STF, na forma do artigo 102, II, “b”
Casos Concretos
Questão 1
Acusado de homicídio qualificado, Caio foi absolvido pelo júri. O promotor apelou,
com fundamento no art. 593, III, alínea "d", do CPP. Provido o apelo, Caio foi a novo júri,
tendo sido desta vez condenado na forma da pronúncia. A defesa apela, pleiteando o
afastamento da qualificadora pelo Tribunal de Justiça, com a conseqüente redução da
pena, com base no art. 593, III, letra "c". Indaga-se se o apelo deve ser conhecido.
Resposta à Questão 1
Se a soberania do conselho de sentença deve ser resguardada, não deve ser dado ao
tribunal ad quem interferir na qualificação dada aos fatos. Se os jurados resolveram que o
crime é de homicídio qualificado, não pode o novo apelo pretender que o tribunal ad quem
faça a reforma – e não anulação – do julgado, impondo ou retirando a qualificadora, parte
do mérito do julgado do conselho de sentença. Destarte, não é porque a decisão não pode
ser impugnada por novo apelo que se obsta o conhecimento deste – afinal, a vedação do §
3° do artigo 593 do CPP não se aplica ao caso –, mas sim porque a pretensão é descabida.
Questão 2
Resposta à Questão 2
O recurso por cota pode ser recebido. Esta forma de interposição, é alheia à previsão
legal de formas admissíveis, constantes do artigo 578 do CPP, mas a admissibilidade por
mero termo nos autos revela a informalidade como guia para o recebimento do recurso.
Nada obsta, portanto, que o recurso do parquet seja recebido.
Tema IX
Apelação (continuação). Apelação plena e limitada. Tantum devolutum quantum appellatum no Processo
penal. Reformatio in pejus e in mellius. Proibição da reformatio in pejus sem pedido. Anulação de sentença
condenatória por apelação do réu. Proibição de reformatio in pejus indireta (STF). Reformatio in mellius:
discussão. Extinção anormal da apelação: deserção. Fuga do réu apelante (Artigo 594). Artigo 806, § 2º
(ação privada). Desistência (não para o MP). Peculiaridades da apelação contra decisões do Tribunal do
Júri (artigo 593, III). Apelação restrita. Fundamento nas alíneas b ou c: órgão ad quem funciona como
iudicium rescissorium. Fundamento na alínea "a": órgão ad quem funciona como iudicium rescidens. Alínea
"d": soberania do veredicto - artigo 5º, XXXVIII, CF. "Mesmo motivo" (artigo 593, § 3º): o que significa?
Apelação nos juizados especiais criminais.
Notas de Aula14
1. Procedimento da apelação
“Art. 578. O recurso será interposto por petição ou por termo nos autos, assinado
pelo recorrente ou por seu representante.
14
Aula ministrada pelo professor Marcelo Augusto Rodrigues Mendes, em 25/9/2009.
§ 1° Não sabendo ou não podendo o réu assinar o nome, o termo será assinado por
alguém, a seu rogo, na presença de duas testemunhas.
§ 2° A petição de interposição de recurso, com o despacho do juiz, será, até o dia
seguinte ao último do prazo, entregue ao escrivão, que certificará no termo da
juntada a data da entrega.
§ 3° Interposto por termo o recurso, o escrivão, sob pena de suspensão por dez a
trinta dias, fará conclusos os autos ao juiz, até o dia seguinte ao último do prazo.”
Assim, a apelação pode ser interposta por simples petição, ou por termo nos autos.
Para a defesa, a jurisprudência é ainda mais benevolente, permitindo virtualmente qualquer
forma de interposição, bastando qualquer manifestação de intento em recorrer, sob qualquer
forma, por parte do réu.
Interposto o recurso, ele passará por duplo juízo prelibatório, no órgão de
interposição e no órgão de direcionamento, a quo e ad quem. Recebido, somente então será
analisado seu mérito.
A apelação é um recurso bifásico, como se pôde antever. Isto significa que há a peça
de interposição separada da peça de razões. Em verdade, a forma bifásica é a regra do
processo penal, vigendo na maioria dos recursos, inclusive no agravo em execução, que
segue o rito do recurso em sentido estrito, como se vê na súmula 700 do STF:
“Súmula 700, STF: É de cinco dias o prazo para interposição de agravo contra
decisão do juiz da execução penal.”
A apelação no JECrim não é bifásica: o recorrente conta com prazo único de dez
dias, para interpor e arrazoar a apelação. Veja o artigo 82 da Lei 9.099/95:
Veja que o STF, contudo, tem admitido que mesmo no JECrim haja a partição da
apelação em dois momentos, ou seja, o recorrente a torne bifásica – primeiro apresentando
a peça de interposição, e depois as razões em separado. Todavia, para assim ser possível, é
preciso que o recorrente apresenta ambas as peças ainda no prazo de dez dias desde a
intimação da decisão, pois do contrário haverá intempestividade. A respeito, veja o HC
85.344, do STF:
Surge questão: se a infração de menor potencial ofensivo tem prazo global de apelo
de dez dias, as contravenções penais, que são todas elas infrações de menor potencial
ofensivo, continuam sob a vigência do procedimento bifásico, com arrazoado em três dias,
como visto?
De fato, se o procedimento em que se estiver perseguindo a contravenção for o
sumaríssimo do JECrim, a apelação seguirá o prazo de dez dias. Contudo, há ainda uma
hipótese em que se aplica o prazo do CPP, de três dias: quando a contravenção estiver
sendo perseguida na vara criminal, por estar conexa a algum crime que ali deve ser
perseguido, e a apelação for apenas de matéria referente à contravenção, o prazo de três
dias para razões é o que deve ser observado.
Em qualquer caso de apelação bifásica, ressalte-se, a apresentação tardia das razões
é tida por mera irregularidade. O prazo de interposição deve ser respeitado, sob pena de
intempestividade, mas o prazo para razões não é peremptório. A apresentação
extemporânea das razões não impede o recebimento do recurso.
O dies a quo para interposição da apelação é questão peculiar. Para a defesa,
construiu-se um entendimento de que é necessária uma dupla intimação, em prol da ampla
defesa: para a autodefesa, intima-se o réu; para a defesa técnica, o patrono. O prazo para
apelar, neste caso, só terá início quando efetuada a última intimação, seja a do defensor,
seja a do réu.
Para o MP, o prazo corre desde quando o processo adentra na secretaria do órgão,
sendo este o momento em que se considera feita a intimação pessoal que é prerrogativa do
MP. Veja, por exemplo, o HC 83.255, do STF, e os REsp. 664.400 e 605.245:
“Art. 576. O Ministério Público não poderá desistir de recurso que haja
interposto.”
A não apresentação de razões pelo MP, após ter este interposto a apelação, consiste
em desistência tácita, o que não se admite. As razões são imprescindíveis, para qualquer das
partes, e para o MP ainda pesa esta obrigação com maior vigor, ante a indisponibilidade do
recurso.
Vigente a independência funcional, como vige, aquele promotor que interpõe o
recurso é quem fica obrigado a apresentar as razões. Se o membro interpõe o apelo e sai de
licença, o membro que supre sua ausência poderá apresentar razões da forma que bem
entender, inclusive louvando a sentença, diante das suas convicções pessoais, amparadas
pela independência funcional.
A renúncia ao recurso, prévia a sua interposição, é dada à defesa, se conjugadas as
vontades do réu e do defensor, mas não é dada ao MP: ele pode até deixar de recorrer,
correndo o prazo in albis, mas não pode renunciar expressamente ao direito de recorrer.
1.2. Apresentação de razões diretamente no juízo ad quem
O artigo 599 do CPP traz a possibilidade de que a apelação seja limitada a alguns
aspectos da decisão, ou plena, amplamente contestatória do decisum. Isto está diretamente
relacionado ao efeito devolutivo da apelação.
“Art. 599. As apelações poderão ser interpostas quer em relação a todo o julgado,
quer em relação a parte dele.”
Casos Concretos
Questão 1
Condenado pelo Tribunal do Júri, o réu interpôs seu apelo com fundamento no art.
593, III, d, do Código de Processo Penal e, desde logo, apresentou suas razões. A segunda
instância decidiu que a decisão dos jurados estava de acordo com a prova, mas,
verificando que a pena era excessiva, a abrandou de ofício. Indaga-se se, diante do
princípio da inércia da jurisdição e do pensamento cristalizado na súmula 713 do Supremo
Tribunal Federal, o segundo grau poderia decidir de tal modo.
Resposta à Questão 1
Questão 2
Resposta à Questão 2
Tema X
Notas de Aula15
1. Embargos de declaração
“Art. 382. Qualquer das partes poderá, no prazo de 2 (dois) dias, pedir ao juiz que
declare a sentença, sempre que nela houver obscuridade, ambigüidade, contradição
ou omissão.”
15
Aula ministrada pela professora Elisa Ramos Pittaro Neves, em 28/9/2009.
Estes recursos apresentam somente efeito regressivo, ou seja, eles têm por escopo
final a revisão pelo próprio julgador prolator da decisão criticada.
Por seu escopo restrito, é impossível que, em sede de embargos de declaração, haja
alteração substancial do julgado, ou seja, haja o efeito infringente. Este efeito extrapolaria
os limites do recurso.
voto vencido pode ser devolvido por meio deste recurso. O efeito devolutivo é limitado ao
voto vencido.
Os embargos se dirigem, no TJ/RJ, ao próprio relator do acórdão embargado, como
dispõe o artigo 126 do Regimento Interno desta Corte:
O prazo para a interposição deste recurso é de dez dias, sendo recurso monofásico,
como dispõe o artigo 609 do CPP:
3. Carta testemunhável
A origem do nome16 carta testemunhável vem de seu escopo inicial: este recurso
surgiu para controlar o abuso de juizes que, temerosos de reformas em suas decisões, não
recebiam recursos. O recorrente, então, comparecia ao cartório judicial com duas
testemunhas, que depunham sobre este abuso, em ordem a que o recurso fosse recebido.
O artigo 639 do CPP é a sede:
16
Como curiosidade, o recurso em sentido estrito tem este nome porque originalmente, no processo penal
brasileiro, todos os recursos tinham um nome, à exceção do previsto no artigo 581 do CPP. Por isso, era
recurso em sentido lato o gênero, e cada espécie teria seu nome, exceto o inominado recurso do artigo em
questão, que passou a ser chamado recurso, em sentido estrito.
Casos Concretos
Questão 1
Condenado por crime de roubo praticado com emprego de arma, o réu apelou
querendo ser absolvido, mas a Câmara Criminal, por maioria, negou provimento ao seu
recurso. Interpostos embargos infringentes e de nulidade, o órgão julgador manteve a
condenação e reduziu as penas aplicadas ao recorrente. Indaga-se se esta decisão se
harmoniza com as regras regentes dos embargos infringentes e de nulidade.
Resposta à Questão 1
Questão 2
Resposta à Questão 2
O prazo de quarenta e oito horas é, na verdade, prazo de dois dias. Dito isto, o
REsp. deverá ser, sim, provido, pois se contam dois dias da data de intimação do parquet
(intimação que se considera feita quando o processo dá entradas na secretaria do MP).
Tema XI
Revisão criminal: natureza jurídica; possibilidades jurídicas. A revisão e a sentença absolutória imprópria.
Competência. Legitimidade. O Ministério Público e a revisão. A revisão e o júri. A regra contida no art. 580
do CPP e a revisão criminal. Os fundamentos do pedido. Procedimento. Reiteração.
Notas de Aula17
1. Revisão criminal
Trata-se de uma ação autônoma revisora da coisa julgada material, que tem por
objetivo corrigir erro judiciário. O objetivo desta ação é restaurar o status dignitate do
indivíduo, maculado por uma condenação indevida.
A natureza jurídica é controvertida. A primeira corrente, obviamente prevalente,
entende que se trata de uma ação autônoma de impugnação que tem caráter constitutivo
negativo – está para o processo penal como a ação rescisória está para o processo civil.
17
Aula ministrada pela professora Elisa Ramos Pittaro Neves, em 28/9/2009.
Magalhães Noronha entende, por seu lado, que a revisão criminal ora funciona
como ação autônoma, ora como recurso, pois se presta ao reexame de uma decisão.
Pergunta-se: existe jurisdição voluntária no processo penal? Para Pacelli, a revisão
criminal seria justamente uma das raras hipóteses de jurisdição voluntária no processo
penal. Há outros exemplos citados pela doutrina, como a nomeação de curador, mas não
seria, a rigor, jurisdição voluntária, e sim mera atuação oficiosa do juízo, pois jurisdição
voluntária é exercício de ação sem lide, sem pretensão oposta.
A possibilidade jurídica do pedido, desta ação, está encerrada no rol taxativo do
artigo 621 do CPP: só aquelas ali previstas possibilitam pedido de revisão criminal. Veja:
“Art. 623. A revisão poderá ser pedida pelo próprio réu ou por procurador
legalmente habilitado ou, no caso de morte do réu, pelo cônjuge, ascendente,
descendente ou irmão.”
criminal – posição que é deveras estranha, eis que o MP não deve figurar neste pólo
passivo, por toda a lógica da revisão criminal.
Quanto ao interesse processual desta ação, é bem claro: calca-se na necessidade de
correção do erro judiciário, que deve sempre ser combatido.
Há que se falar nas duas espécies de revisão criminal existentes, no direito
comparado: a pro societate e a pro reo. No Brasil, vige apenas a pro reo, em que só se
admite a desconstituição de sentenças condenatórias, a fim de proteger interesse do réu,
mas na Alemanha, em Portugal e na Espanha, por exemplo, pode haver revisão criminal
quando a coisa julgada favorável ao réu se demonstrar errônea, desconstituindo-se a
sentença absolutória eivada de erro judiciário. Mayrink e Noronha defendem que a revisão
pro societate deveria ser admitida também no Brasil – não dizem que seja, mas defendem
que deveria ser.
“Art. 181 - É isento de pena quem comete qualquer dos crimes previstos neste
título, em prejuízo:
I - do cônjuge, na constância da sociedade conjugal;
II - de ascendente ou descendente, seja o parentesco legítimo ou ilegítimo, seja
civil ou natural.”
“Art. 861. Quem pretender justificar a existência de algum fato ou relação jurídica,
seja para simples documento e sem caráter contencioso, seja para servir de prova
em processo regular, exporá, em petição circunstanciada, a sua intenção.”
As novas provas, a que alude o inciso III, podem demonstrar tanto a inocência
quanto a impropriedade da gravidade da pena, ou seja, podem provar que o réu não deveria
ter sido condenado, ou que a pena ficou acima do que era devido.
Imagine-se que uma reincidência foi considerada para efeito de aumento de pena, e
transitou em julgado a sentença. Proposta revisão, constata-se que a reincidência não
poderia ter sido considerada na pena. A revisão será procedente, mas surge uma questão: a
reincidência que foi afastada poderá ser considerada, na revisão, como maus antecedentes,
a aumentar a pena-base?
Em hipótese alguma a revisão pode agravar a situação do réu, como dispõe o artigo
626 do CPP. Mesmo que, globalmente, a pena seja reduzida, ela não pode sofrer nenhuma
majoração que tenha sido percebida somente porque proposta a revisão. A reincidência
deve ser absolutamente desconsiderada, no caso concreto sugerido.
1.2. Indenização
Note que não é todo erro judiciário que justifica indenização pelo agente: apenas
aquele erro oriundo de conduta dolosa ou culposa de agentes do Estado pode gerar
indenizabilidade.
Há ainda as excludentes de indenizabilidade no § 2° do artigo supra, que são, em
síntese, o fato exclusivo do réu, na alínea “a”; e a persecução penal ter sido em ação
privada, na alínea “b”. Esta segunda hipótese não foi recepcionada pela CRFB, por ofender
seu artigo 5°, LXXV, que não faz distinção:
“(...)
LXXV - o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que
ficar preso além do tempo fixado na sentença;
(...)”
“Art. 580. No caso de concurso de agentes (Código Penal, art. 25), a decisão do
recurso interposto por um dos réus, se fundado em motivos que não sejam de
caráter exclusivamente pessoal, aproveitará aos outros.”
Não cabe revisão criminal contra transação penal, porque nesta simplesmente não
há ação, não há processo, muito menos condenação. Ademais, a decisão judicial que
reconhece a transação sequer é sentença, e sim decisão homologatória. A solução para
impugnar esta decisão, então, como sinaliza Paulo Rangel, é a propositura de ação
anulatória do processo civil.
Havendo condenação criminal por crime que vem a sofrer abolitio criminis, não há
necessidade de propositura de revisão criminal, como se pode pensar. Na verdade, basta
uma mera petição ao juiz da execução, segundo Tourinho, para que seja conferida a elisão
dos efeitos penais.
Contudo, se o juízo que recebe esta petição não lhe dá o devido deferimento, o réu
deve interpor agravo de execução. Se, neste agravo, o réu ainda vier a ter indeferido o
reconhecimento que lhe é devido, aí então será caso de revisão criminal, após o trânsito em
julgado.
É possível que o réu ajuíze nova ação de revisão criminal, se a primeira lhe foi
improvida, desde que sob outro fundamento. Não pode, é claro, simplesmente repetir a
ação, sem fundamento diverso do originalmente encontrado improcedente.
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
O MP pode impetrar habeas corpus, neste caso, para libertar o condenado. Contudo,
o interesse do MP é a anulação do processo não para libertar o indivíduo, mas sim para
propor nova ação penal contra ele – o que desvirtua completamente o sentido e função do
habeas corpus, que é protetivo do réu. Ademais, estaria este instrumento operando como
verdadeira revisão criminal pro societate, o que é inadmissível.
O pedido de anulação, em verdade, é possível, mas não o seu escopo implícito, no
caso.
De qualquer forma, a competência para este habeas corpus é da justiça estadual.
Questão 2
Resposta à Questão 2
“Súmula 393, STF: Para requerer revisão criminal, o condenado não é obrigado a
recolher-se à prisão.”
Tema XII
Notas de Aula18
O artigo 626, parágrafo único, do CPP, já bem visto, traz expressa vedação à
reformatio in pejus na revisão criminal. Reveja:
18
Aula ministrada pelo professor Orlando Monteiro Espíndola da Cunha, em 6/10/2009.
Parágrafo único. De qualquer maneira, não poderá ser agravada a pena imposta
pela decisão revista.”
Nos termos deste HC 11.937 do STJ, não pode o tribunal, em recurso exclusivo da
defesa, levar em consideração circunstância não apreciada no primeiro julgamento, de
forma a fixar a pena base acima do fixado naquele julgamento original.
Quanto à reformatio in mellius na revisão criminal, é praticamente unânime o
entendimento de que o tribunal, ao julgar a revisão criminal, pode conceder mais do que o
réu pretende: pode, por exemplo, julgar pela absolvição, mesmo tendo sido pedida, na
revisão, apenas a diminuição de pena. Vicente Greco é a única voz que se insurge contra
esta dinâmica, dizendo-a incabível.
Da decisão proferida na revisão criminal, mesmo que não unânime, não cabem
embargos infringentes ou de nulidade. Cabem, em tese, embargos de declaração e recursos
excepcionais, somente.
Ocorrendo causa de extinção de punibilidade, cabe revisão criminal? Se porventura
a sentença condenatória transitar em julgado, sem reconhecer esta causa, a revisão poderá
ser proposta. O que não é possível é, durante o processo, não havendo reconhecimento de
extinção de punibilidade, ajuizar a ação de revisão criminal a fim de reconhecer a extinção
da punibilidade – basta provocar o juiz para este reconhecimento, e, se porventura sobrevier
sentença condenatória transitada em julgado ignorando a causa de extinção, desta sim
caberá revisão.
Em síntese, para Ada Pellegrini, não é possível o ajuizamento de revisão criminal
para reconhecimento de causa extintiva da punibilidade antes da sentença. Nesta hipótese,
segundo ela, o juiz deveria reconhecer de ofício a causa extintiva, nos termos do artigo 61
do CPP. Ainda, segundo ela, a impossibilidade de ajuizamento da revisão criminal
decorreria da ausência de um pressuposto essencial da ação de revisão: a sentença
condenatória com trânsito em julgado. Para Tourinho Filho, desde que haja esta decisão
condenatória transitada em julgado, tendo sido inobservada a causa da extinção da
punibilidade, será possível a revisão criminal, a fim de que o tribunal reconheça esta causa,
olvidada pelo juiz, que deveria ter reconhecido no momento oportuno.
“Art. 486. Os atos judiciais, que não dependem de sentença, ou em que esta for
meramente homologatória, podem ser rescindidos, como os atos jurídicos em
geral, nos termos da lei civil.”
Ada, por sua vez, não entende que a revisão da sentença de transação seja incabível,
mas defende que o instrumento mais adequado será o habeas corpus. Sérgio de Oliveira
Médici, por seu turno, defende perfeitamente admissível a revisão criminal da transação,
sendo corrente isolada.
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
Não: a revisão criminal não pode acarretar qualquer prejuizo ao réu, sob pena de
caracterizar reformatio in pejus, mesmo que o cômputo final da pena venha a ser menor do
que o anterior. Deveria, in casu, a condenação final ser menor ainda do que o foi.
Veja o HC 11.937, do STJ:
Questão 2
Diga se em sede de revisão criminal pode ser aplicada a regra constante do art.
580 do Código de Processo Penal.
Resposta à Questão 2
Tema XIII
Notas de Aula19
1. Recurso especial
o recurso excepcional pertinente (até mesmo ambos, se for o caso) da parte unânime. As
decisões objetivamente complexas despertam interesse-necessidade para a interposição de
mais de um recurso, cada um dedicado a seu respectivo objeto, sob pena de preclusão da
matéria não impugnada. A respeito, veja as súmulas 281 e 355 do STF, e 207 do STJ:
“Súmula 279, STF: Para simples reexame de prova não cabe recurso
extraordinário.”
É bastante óbvia a conclusão destas súmulas, porque a via extraordinária não é útil
para analisar a prova de fatos, e sim para averiguar a adequação jurídica da decisão.
As hipóteses de cabimento do REsp. são constitucionais, na forma do artigo 105,
III, da CRFB:
“Súmula 400, STF: Decisão que deu razoável interpretação à lei, ainda que não
seja a melhor, não autoriza recurso extraordinário pela letra ‘a’ do art. 101, III, da
Constituição Federal”
Esta súmula tem plena aplicabilidade no processo civil, mas a sua aplicação do
processo penal é controvertida. Pacelli entende que é inadmissível este óbice ao recurso
excepcional, no processo penal, tal a magnitude do direito envolvido, a liberdade.
A hipótese da alínea “c” deste artigo supra se dedica às divergências ocorridas entre
tribunais diversos, e não dentro do mesmo tribunal. Veja a súmula 13 do STJ:
“Súmula 13, STJ: A divergência entre julgados do mesmo tribunal não enseja
recurso especial.”
Ademais, se a posição do STJ for a mesma da decisão recorrida, mesmo que haja
divergência com outros tribunais, o recurso especial é inadmissível. Veja a súmula 83 do
STJ:
“Súmula 83, STJ: Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a
orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida.”
1.1. Prequestionamento
“Art. 535. Cabem embargos de declaração quando: (Redação dada pela Lei nº
8.950, de 13.12.1994)
(...)
II - for omitido ponto sobre o qual devia pronunciar-se o juiz ou tribunal. (Redação
dada pela Lei nº 8.950, de 13.12.1994)”
Chegando ao STJ, este enfrentará aqui a matéria quando à omissão não reconhecida,
e devolverá os autos ao juízo a quo – aquele que se negou a suprir a omissão –, para que
seja processado o feito. Depois desta manifestação do STJ, considera-se que haja, já, o
prequestionamento implícito, podendo caminhar ao STF ou STJ com seu recurso especial
ou extraordinário questionador da matéria de fundo. Haverá, portanto, dois recursos
excepcionais: um recurso especial somente para suprir a omissão, calcado na violação ao
artigo 535, II, do CPC, criando o prequestionamento; e, posteriormente, um outro recurso
especial ou um recurso extraordinário, estes sim levando à Corte superior a matéria de
direito que realmente se desejava ver enfrentada.
Por último, há ainda o prequestionamento ficto, que é o seguinte: quando há
necessidade de oposição de embargos de declaração prequestionadores, a questão se
considerará prequestionada desde o momento em que tal oposição foi feita. A diferença
entre esta modalidade e a implícita é simples: não mais se precisa aguardar o resultado dos
embargos de declaração para que se possa acessar o STJ: independentemente do que
entender o tribunal embargado – suprindo ou não a omissão – a parte já pode acessar o STJ
ou STF com o recurso especial já com a matéria de fundo, ainda que a omissão não seja
suprida (dispensando-se a interposição do recurso especial apenas com o fito de suscitar
violação ao artigo 535, II, do CPC, conforme explicado). Esta modalidade é admitida
apenas em poucas turmas do STF, pois parece, de fato, uma rendição, ainda que tímida, à
corrente de Alexandre Câmara.
Veja a súmula 282 do STF, que revela a sua posição majoritária:
“Súmula 356, STF: O ponto omisso da decisão, sobre o qual não foram opostos
embargos declaratórios, não pode ser objeto de recurso extraordinário, por faltar o
requisito do prequestionamento.”
Casos Concretos
Questão 1
O Ministério Público deflagrou ação penal por crime previsto no art. 68 da Lei
8.078/90, sustentando sua acusação em interceptação de conversas telefônicas realizada
em 23.07.96. A sentença condenatória foi mantida em grau de apelação. Diante da
interceptação das comunicações telefônicas, a Câmara Criminal decidiu estarem provados
o fato e sua autoria. Foi interposto recurso especial questionando negativa de vigência do
artigo 564, IV, do CPP e da Lei 9296/96, além de dissídio sobre a admissibilidade da prova
realizada. Em recurso extraordinário alegou-se contrariedade ao art. 5º, XII e LVI da
Constituição Federal. O Ministério Público apresentou contra-razões alegando incidência
das Súmulas 7 do STJ e 279 do STF, sustentando que incumbe às vias ordinárias a
apreciação da prova da materialidade e da autoria. Emitir juízo de admissibilidade dos
dois recursos.
Resposta à Questão 1
Tema XIV
Notas de Aula20
1. Recurso extraordinário
“Art. 271. Ao assistente será permitido propor meios de prova, requerer perguntas
às testemunhas, aditar o libelo e os articulados, participar do debate oral e arrazoar
20
Aula ministrada pelo professor Marcos Paulo Dutra Santos, em 2/10/2009.
os recursos interpostos pelo Ministério Público, ou por ele próprio, nos casos dos
arts. 584, § 1o, e 598.
§ 1° O juiz, ouvido o Ministério Público, decidirá acerca da realização das provas
propostas pelo assistente.
§ 2° O processo prosseguirá independentemente de nova intimação do assistente,
quando este, intimado, deixar de comparecer a qualquer dos atos da instrução ou
do julgamento, sem motivo de força maior devidamente comprovado.”
“Art. 584. Os recursos terão efeito suspensivo nos casos de perda da fiança, de
concessão de livramento condicional e dos ns. XV, XVII e XXIV do art. 581.
§ 1° Ao recurso interposto de sentença de impronúncia ou no caso do no VIII do
art. 581, aplicar-se-á o disposto nos arts. 596 e 598.
(...)”
Ademais, é claro que o assistente de acusação não teria mesmo esta legitimação,
porque sequer pode se habilitar em habeas corpus, vez que é ação impugnativa autônoma
pro reo.
A síntese, portanto, é que o assistente só terá legitimidade supletiva para interpor
recursos excepcionais se a decisão que os enseja for decorrente de apelação, ou recurso em
sentido estrito contra sentença extintiva de punibilidade, sendo irrelevante que o recorrente
do apelo ou do recurso em sentido estrito tenha sido o MP ou ele próprio.
Há uma exceção a esta regra, porém. Para entendê-la, é preciso um escorço bastante
intrincado, a começar pela súmula 714 do STF:
penal por crime contra a honra de servidor público em razão do exercício de suas
funções.”
“Art. 145 - Nos crimes previstos neste Capítulo somente se procede mediante
queixa, salvo quando, no caso do art. 140, § 2º, da violência resulta lesão corporal.
Parágrafo único - Procede-se mediante requisição do Ministro da Justiça, no caso
do n.º I do art. 141, e mediante representação do ofendido, no caso do n.º II do
mesmo artigo.
Parágrafo único. Procede-se mediante requisição do Ministro da Justiça, no caso
do inciso I do caput do art. 141 deste Código, e mediante representação do
ofendido, no caso do inciso II do mesmo artigo, bem como no caso do § 3o do art.
140 deste Código. (Redação dada pela Lei nº 12.033. de 2009)”
No parágrafo deste artigo, está dito que se o crime for praticado contra funcionário
público em razão de suas funções, a ação será pública condicionada a representação. A
isonomia, porém, nunca permitiu que o STF tolerasse bem este dispositivo, pelo seguinte:
se o agente público for injuriado em sua vida privada, a ação penal será privada (à exceção
da injúria racial). A mesma injúria, contra o mesmo agente, mas em razão de suas funções,
transforma a ação penal em pública, fazendo o ofendido perder a titularidade da ação penal
em favor do Estado – o mesmo fato delituoso sendo tratado de forma processualmente
diferente.
A súmula, então, criou uma legitimação concorrente entre MP e ofendido,
premiando a isonomia, mitigando, claramente, o princípio da titularidade da ação penal do
MP – pois esta concorrência é notável exceção.
O problema é que as ações concorrentes, uma privada e outra pública, são norteadas
por princípios completamente antagônicos: a privada segue-se pela oportunidade e
disponibilidade, enquanto a pública é obrigatória e indisponível. Para resolver a situação,
então, o ofendido simplesmente tem o direito de escolha: ou oferece a ação privada, ou
representa ao MP para que este ofereça a ação penal pública. Feita a escolha, esta é
definitiva.
Da escolha feita, surtirão variantes, em razão das particularidades de cada tipo de
ação. Por exemplo, se optou pela ação privada, e porventura ocorrer a perempção, a
punibilidade do réu estará extinta, insanavelmente. Se optar pela representação, pela ação
pública, pode ainda acontecer de o MP quedar-se inerte, azoando agora a propositura da
ação penal privada subsidiária da pública. Se o MP, ao contrário, promover o arquivamento
da representação, não poderá o ofendido reformar ajuizar a ação subsidiária, e tampouco
poderá reformar sua opção original, ajuizando a ação penal privada pura, a que tinha direito
antes de escolher pela representação (em que pese haver corrente que defenda a
possibilidade, neste caso peculiar, de ação penal privada subsidiária da pública, mesmo ante
a manifestação do MP pelo arquivamento). A escolha, repita-se, é definitiva.
Optando pela ação pública, e ajuizada esta pelo MP, a vítima pode se habilitar como
assistente de acusação. Repare que este assistente é um pouco diferente do usual: é alguém
que, outrora, teve legitimidade própria para a persecução criminal, tendo aberto mão desta
em favor do MP. Por isso, o STF entenderá que, ao menos em nível recursal, este ex-
legitimado privado terá ainda a legitimação recursal irrestrita, ou seja, não há, em relação
ao assistente neste caso peculiar, a mera legitimidade recursal supletiva – tem legitimidade
recursal supletiva irrestrita, porque é ex-legitimado ad causam para o feito. Por isso, a ele
não se aplica a súmula 208 do STF – eis a exceção.
O artigo 102, III, da CRFB, determina que é cabível o recurso extraordinário contra
decisões de última instância:
Já o artigo 105, III, da CRFB, fala que o recurso especial é cabível de decisões
tomadas em última instância, mas por tribunais:
Os acórdãos das turmas recursais dos juizados são decisões tomadas em última
instância, em último grau recursal do sistema de seu rito, de fato. Por isso, cabe recurso
extraordinário de tais decisões, na forma da súmula 640 do STF:
“Súmula 640, STF: É cabível recurso extraordinário contra decisão proferida por
juiz de primeiro grau nas causas de alçada, ou por turma recursal de juizado
especial cível e criminal.”
Pela redação do artigo 105, III, supra, porém, não é cabível o recurso especial de
decisões das turmas recursais, porque estas não são tribunais, como ali se diz
expressamente. Veja a súmula 203 do STJ:
“Súmula 203, STJ: Não cabe recurso especial contra decisão proferida por órgão
de segundo grau dos Juizados Especiais.”
Fica clara a incoerência da Corte, ao se cotejar esta leitura da súmula 348 com a
anterior súmula 203. Ambas envolvem o conceito de tribunal, em interpretações
contraditórias pelo STJ.
O STF, desautorizando completamente esta súmula 348 do STJ, decidiu
recentemente que a competência para solucionar o conflito de competência em questão,
entre JECrim e vara criminal do mesmo TJ, deve ser resolvido por este respectivo TJ. Veja
o julgado constante do informativo 557 desta Corte:
O CPC já regulou a matéria desde 2006, para o processo civil, no artigo 543-A:
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
isso desafia apenas recursos excepcionais, se cabíveis. Serão interponíveis, portanto, neste
exemplo, dois ou até três recursos, sem consubstanciar exceção à unirrecorribilidade: cada
capítulo, que é uma decisão integrada ao acórdão complexo, terá um só recurso a questioná-
lo.
Exceção a este princípio existirá, porém, quando no acórdão houver um único
dispositivo, uma única “decisão”, desafiadora de mais de um recurso. É o caso exato de um
acórdão em que uma matéria apenas é resolvida, e esta decisão ofende, simultaneamente,
lei federal e a CRFB, desafiando respectivamente recurso especial e recurso extraordinário.
Há dois recursos cabíveis de uma só decisão em essência, de um só dispositivo do acórdão.
Questão 2
"X", juiz federal com atuação na Seção Judiciária do Rio de Janeiro, foi ofendido
em razão de suas funções pelo delegado de Polícia Federal "Y", chefe da Delegacia de
Entorpecentes do RJ. "X" formulou, tempestivamente, representação ao Ministério Público
Federal, dirigindo-a ao Procurador-Chefe da Procuradoria da República no Estado do
Rio Janeiro, o qual, por sua vez, escolheu, determinado Procurador da República, de
feição marcadamente persecutória, para oficiar no feito. Oferecida denúncia em face de
"Y", "X" se habilitou como assistente. Contra a decisão de recebimento da denúncia, o
defensor do réu impetrou habeas corpus, alegando ter sido violado o princípio do
promotor natural, já que a representação formulada por "X" deveria ser submetida à livre
distribuição no âmbito do Ministério Público Federal, de maneira que a escolha dirigida
pela Chefia do Ministério Público Federal violou o aludido princípio. O Tribunal Regional
Federal denegou a ordem, que acabou sendo concedida pelo Superior Tribunal de Justiça,
que determinou o trancamento da ação penal por violação àquele princípio. Desta decisão
não foi interposto recurso pelo Ministério Público Federal. Pergunta-se: Pode o assistente
recorrer extraordinariamente dessa decisão?
Resposta à Questão 2
Tema XV
Habeas corpus. Conceito; origem; finalidade. O habeas corpus no direito brasileiro. Habeas corpus e
revisão criminal, no CPP. O habeas corpus como ação: condições objetivas de procedibilidade. Habeas
corpus preventivo e liberatório. Competência territorial e hierárquica para o julgamento. Efeitos das
decisões proferidas em habeas corpus.
Notas de Aula21
“(...)
LXVIII - conceder-se-á "habeas-corpus" sempre que alguém sofrer ou se achar
ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por
ilegalidade ou abuso de poder;
(...)”
“Súmula 693, STF: Não cabe “habeas corpus” contra decisão condenatória a pena
de multa, ou relativo a processo em curso por infração penal a que a pena
pecuniária seja a única cominada.”
“Súmula 694, STF: Não cabe “habeas corpus” contra a imposição da pena de
exclusão de militar ou de perda de patente ou de função pública.”
“Súmula 695: Não cabe “habeas corpus” quando já extinta a pena privativa de
liberdade.”
Veja que, nestas hipóteses de descabimento, não há qualquer ameaça, nem remota, a
direito de locomoção. Como exemplo, a vedação ao habeas corpus contra decisão de pena
de multa, eis que esta jamais se converterá em privação da liberdade, a teor do artigo 51 do
CP:
O artigo 579 do CPP previu a fungibilidade entre recursos, mas esta se estende
também à interposição de recurso quando seria cabível ação impugnativa autônoma, e vice-
versa, e também à fungibilidade entre uma ação desta estirpe e outra (um habeas corpus e
uma revisão criminal, por exemplo). Veja:
“Art. 579. Salvo a hipótese de má-fé, a parte não será prejudicada pela
interposição de um recurso por outro.
Parágrafo único. Se o juiz, desde logo, reconhecer a impropriedade do recurso
interposto pela parte, mandará processá-lo de acordo com o rito do recurso
cabível.”
Não cabe habeas corpus substitutivo de recurso de apelação, pela seguinte razão:
no habeas corpus, a cognição é bastante restritiva, porque ou se estará discutindo
controvérsia estritamente jurídica, dispensada dilação probatória; ou se estará diante de
constatação de fatos controversos, por meio de prova já produzida, preconstituída. A
apelação, por seu turno, tem cognição ampla, pelo seu efeito devolutivo amplo.
Surge uma regra: o habeas corpus substitutivo de recurso só pode versar sobre
matéria de direito, ou sobre matéria de fato que demande apenas constatação, e nunca
investigação, cotejo cognitivo, por parte do juízo. Sendo caso de necessidade de dilação
probatória fática, o habeas corpus é inadmissível.
Nada impede, porém, que haja um habeas corpus concomitante ao recurso de
apelação, como ocorre bastante quando se intenta deferir ao réu o direito de aguardar o
curso da apelação em liberdade, caso esteja preso. E veja que este habeas corpus é
interessante, eis que se a discussão do apelo em liberdade for deixada para a própria
apelação, será inútil, pois só será apreciado o mérito da apelação – incluído aí o pedido de
aguardo em liberdade – será apreciado apenas na sessão de julgamento do recurso, ou seja,
o réu ficou preso todo o tempo, até ali, restando prejudicado o pedido.
O habeas corpus substitutivo de recurso em sentido estrito, porém, é cabível, e até
mesmo corriqueiro, justamente porque este recurso tem efeito devolutivo restrito. Como
exemplo, o recurso em sentido estrito do artigo 581, V, do CPP, já visto, que guerreia a
decisão que caça a fiança: caberá o habeas corpus em substituição ao recurso; ou o inciso
IX do mesmo dispositivo, que trata da decisão que ignora a prescrição: o habeas corpus é
cabível, eis que a verificação da prescrição é matéria de simples constatação jurídica, não
demandando dilação probatória.
Já em alguns casos de cabimento de recurso em sentido estrito talvez não possa
haver esta substituição por habeas corpus. Como exemplo, o inciso IV do artigo 581 do
CPP, que determina este recurso contra a decisão que pronunciar o réu: em geral, para se
impugnar a pronúncia é necessário reexame fático analítico, o que extravasa o campo
cognitivo restrito do habeas corpus. Eventualmente, se a cognição for mínima, ou seja,
bastar mera constatação de fatos já expostos, o habeas corpus substitutivo será possível.
Outrossim, não se pode pensar jamais em habeas corpus substitutivo de embargos
infringentes ou de nulidade. A razão é simples: quem conhece dos embargos infringentes ou
de nulidade é o próprio tribunal em que se prolatou a decisão não unânime – outro órgão,
de fato, mas na própria instância –, ao passo que a eventual impetração de habeas corpus
contra esta decisão faria com que seu julgamento fosse diretamente efetuado no STJ,
provocando supressão de instância.
Os recursos excepcionais, por seu turno, são livremente substituíveis por habeas
corpus: tanto o recurso especial quanto o extraordinário já são naturalmente alheios a
qualquer reexame fático, e a impetração do habeas corpus substitutivo fica, por isso,
bastante confortável.
Não custa repetir que o habeas corpus é uma nova ação penal, autônoma, com
escopo impugnativo. Logo, a consequência da impetração do habeas corpus substitutivo,
sem a interposição do recurso correspondente, é o trânsito em julgado da decisão
impugnada. A defesa deve ficar bem atenta a esta dinâmica, pois o habeas corpus nem
sempre será a melhor estratégia de defesa.
O habeas corpus substitutivo não tem que observar a tempestividade do recurso que
está substituindo: não é recurso, é ação autônoma.
O maior interessado em habeas corpus substitutivo é o réu preso, que está em busca
da celeridade. Réu solto não se preocupa com a velocidade do processo. Sendo caso em que
a impetração de habeas corpus substitutivo é interessante, como se identificar as matérias
que são ali passíveis de dedução? Quais os limites da dedução de matérias em habeas
corpus?
É simples: só se pode discutir em habeas corpus aquilo que, de qualquer forma,
mesmo que remota, perturbe o direito ambulatorial do paciente. Isto gera uma amplitude
tremenda à impetração. Pode-se discutir, por exemplo, até mesmo elementos subjetivos do
tipo, em sede de habeas corpus, ao se analisar o tipo em abstrato, sem exame de provas.
Entenda: pode, em habeas corpus, ser discutida a natureza do dolo daquele que, dirigindo
embriagado, atropela e mata alguém. Esta discussão se atém à forma jurídica do ânimo, se
dolo eventual ou culpa consciente – discussão não empírica que pode ser levada a cabo em
habeas corpus. Outro tema nesta linha: pode o impetrante discutir, em abstrato, se a pena
está adequada ou não, por constatar, por exemplo, que uma condenação pretérita não
transitada em julgado foi computada como reincidência, em afronta clara ao direito
aplicável. Mais um exemplo: réu processado por roubo com emprego de arma de fogo pode
impetrar habeas corpus quando a arma não foi encontrada, pelo que a circunstância legal
não pode ser considerada – e assim por diante. Não se discute o fato: se discute a
configuração jurídica dada ao fato que já se toma por pressuposto inconteste no processo.
Há ainda que se abordar o habeas corpus substitutivo de agravo em execução. Na
verdade, é a substituição mais comum, por um motivo claro: em execução, o réu está preso,
e a celeridade do habeas corpus lhe interessa em muito. Além disso, na execução penal, a
maioria absoluta das discussões são exclusivamente jurídicas, sendo poucos os casos de
necessidade de instrução probatória. Veja um exemplo: a perda de dias remidos em razão de
falta grave pode ensejar habeas corpus substitutivo ou não, dependendo do que se vai
questionar. Se o que for ser discutido é se a perda alcança todos os dias trabalhados, ou
apenas parte deles, é perfeitamente cabível o habeas corpus, pois é questão de direito puro
– a constitucionalidade de toda a perda; se a discussão for recair sobre o cometimento da
falta grave ou não, aí será caso de agravo em execução, não cabendo o habeas corpus,
porque demanda enfrentamento de questões fáticas, de cunho probatório. Outro exemplo: a
discussão sobre a imposição de exame criminológico ou não, que é de pura
constitucionalidade, permite habeas corpus; a discussão do resultado do exame, porém, não
permite a substituição – deve vir em agravo em execução. Na verdade, estes dois exemplos
– teor do exame criminológico e cometimento de falta grave – são praticamente os únicos
em que a substituição do agravo em execução pelo habeas corpus não é possível.
É claro que, na execução de pena de multa exclusiva, jamais haverá cabimento de
habeas corpus, pela simples impossibilidade de que venha a existir restrição ao direito
ambulatorial – a multa nunca será convertida em prisão.
Dificilmente será cabível o habeas corpus de revisão criminal nos casos dos incisos
II e III do artigo supra, pela necessidade ínsita de revisão do acervo probatório, nestes
casos, o que extrapola o limite cognitivo do habeas corpus.
No inciso I, por seu turno, há duas situações distintas: a revisão criminal de decisão
que contraria evidência dos autos, e da que for contrária ao texto expresso da lei penal. No
primeiro caso, é quase imperativo o revolvimento probatório, que afasta a possibilidade de
habeas corpus substitutivo – a não ser que a contrariedade à evidência dos autos seja objeto
de mera constatação, por ser por demais óbvia. Por exemplo, se o réu que foi condenado era
menor de dezoito anos quando praticou a infração, constando dos autos sua certidão de
nascimento verdadeira inconteste, resta claro, sem dilação probatória, que a condenação é
errônea – basta simples constatação, e não investigação da idade do réu.
Na segunda hipótese deste inciso I, outrossim, há campo fértil para impetração de
habeas corpus substitutivo: a contrariedade de texto de lei é causa de impugnação que não
demanda qualquer dilação probatória. Vale dizer, ainda, que onde se lê “lei penal”, leia-se
também “lei processual penal”, pois o artigo 626 do CPP, já visto, permite anulação como
pedido de revisão criminal, o que identifica que o error in procedendo é passível de
discussão tanto na revisão como no habeas corpus que a vier substituir.
O artigo 623 do CPP traz os legitimados para a revisão criminal, e não alude ao MP
– sendo orientação clara da jurisprudência a real carência de legitimação do MP, neste caso.
A ilegitimidade do parquet se dá para evitar que a revisão criminal se preste a cumprir
qualquer finalidade pro societate, que é completamente inadmissível. A ilegitimidade é tão
sólida, neste caso, que acaba alcançando até mesmo o habeas corpus substitutivo da revisão
criminal. Veja que, a rigor, o MP teria legitimidade para o habeas corpus, como se vê no
artigo 654, caput, do CPP; contudo, em se tratando de substitutivo da revisão criminal, esta
legitimação seria burla ao artigo 623 do CPP.
“Art. 623. A revisão poderá ser pedida pelo próprio réu ou por procurador
legalmente habilitado ou, no caso de morte do réu, pelo cônjuge, ascendente,
descendente ou irmão.”
“Art. 654. O habeas corpus poderá ser impetrado por qualquer pessoa, em seu
favor ou de outrem, bem como pelo Ministério Público.
(...)”
O artigo 654 do CPP, supra, trata da legitimidade para impetração do habeas corpus,
pelo que vale revê-lo na íntegra:
“Art. 654. O habeas corpus poderá ser impetrado por qualquer pessoa, em seu
favor ou de outrem, bem como pelo Ministério Público.
§ 1º A petição de habeas corpus conterá:
a) o nome da pessoa que sofre ou está ameaçada de sofrer violência ou coação e o
de quem exercer a violência, coação ou ameaça;
b) a declaração da espécie de constrangimento ou, em caso de simples ameaça de
coação, as razões em que funda o seu temor;
c) a assinatura do impetrante, ou de alguém a seu rogo, quando não souber ou não
puder escrever, e a designação das respectivas residências.
§ 2° Os juízes e os tribunais têm competência para expedir de ofício ordem de
habeas corpus, quando no curso de processo verificarem que alguém sofre ou está
na iminência de sofrer coação ilegal.”
(...)
III - quando quem ordenar a coação não tiver competência para fazê-lo;
(...)”
Não há previsão legal expressa para a liminar em habeas corpus, mas esta é
admitida pela interpretação ontológica do artigo 654, § 2°, do CPP, supra transcrito, que
trata da concessão do habeas corpus de ofício: aplica-se a teoria dos poderes implícitos,
pois se o juízo pode conceder a ordem de ofício, em definitivo, que dirá concedê-la
precariamente, em juízo provisório.
“Art. 651. A concessão do habeas corpus não obstará, nem porá termo ao
processo, desde que este não esteja em conflito com os fundamentos daquela.”
Tais são as figuras do habeas corpus: a parte autora pode ser qualquer pessoa, como
dispõe o artigo 654 do CPP. E veja que o termo “pessoa” se refere à personalidade jurídica,
seja pessoa jurídica ou física. Curiosamente, repare o seguinte: a Defensoria Pública não
tem personalidade jurídica, pelo que no habeas corpus impetrado por esta, na verdade, o
impetrante não é o órgão: é a pessoa física do defensor público oficiante.
O réu, impetrado, é o autor da coação ilegal, quem quer que seja. Nada impede que
um particular figure nesta posição, se ele é quem atua coagindo o paciente. Como exemplo,
suponha que em um hotel, o hóspede é impedido de sair do prédio porque não pagou a sua
conta: este inadimplemento contratual pode gerar retenção da bagagem, mas não do próprio
hóspede inadimplente, pelo que o constritor particular poderá ser impetrado em habeas
corpus.
Paciente, por óbvio, é a figura que padece da coação.
1.6. Contraditório no habeas corpus
Ocorre que esta súmula tem sido relativizada pelo próprio STF e pelo STJ, quando
na petição inicial, ou em petição avulsa, o impetrante expressamente afirmar que se valerá
da sustentação oral – caso em que a falta de notificação é causa de nulidade absoluta. É
claro que, faltante a notificação, mas tendo sido concedida a ordem, não se verifica tal
nulidade da sessão.
O parágrafo único deste artigo 664 do CPP trata do empate na votação do habeas
corpus pelo colegiado: haverá de prevalecer o que for mais favorável, ou seja, a concessão
da ordem.
Embora não tenha sido expressamente cancelada, a súmula está em desuso, pelo
seguinte argumento: se a turma recursal é composta por juízes de primeira instância, o
habeas corpus segue a regra geral da competência, que indica o órgão superior a estes
juizes como competente: o respectivo tribunal. Veja o HC 86.834, do STF:
Esta mudança de concepção acabou tendo outro reflexo: incluir o STJ na via
impugnativa autônoma dos atos das turmas recursais, porque da decisão do tribunal sobre o
habeas corpus contra ato da turma caberá recurso extraordinário e recurso especial. O STJ,
que é alheado do sistema recursal do JECrim, agora está, ao menos, presente no sistema
impugnativo autônomo destes órgãos.
Caso o direito que se pretenda discutir e resguardar for o direito do advogado em ter
acesso aos autos de inquérito, que é garantido pelo artigo 7°, XIV, do Estatuto da OAB, o
instrumento será o mandado de segurança, pois o paciente é o próprio advogado:
(...)
XIV - examinar, em qualquer repartição policial, mesmo sem procuração, autos de
inquérito, findos ou em andamento, ainda que conclusos à autoridade, podendo
copiar peças e tomar apontamentos;
(...)”
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
Questão 2
Dispõe a Lei no 9.503, de 23 de setembro de 1997, com a redação que lhe deu a Lei
nº. 11.705, de 19 de junho de 2008:"Art. 165. Dirigir sob a influência de álcool ou de
qualquer outra substância psicoativa que determine dependência: Infração - gravíssima;
Penalidade - multa (cinco vezes) e suspensão do direito de dirigir por 12 (doze) meses;
Medida Administrativa - retenção do veículo até a apresentação de condutor habilitado e
recolhimento do documento de habilitação.""Art.
277............................................................................................................................................
..... § 2º A infração prevista no art. 165 deste Código poderá ser caracterizada pelo agente
de trânsito mediante a obtenção de outras provas em direito admitidas, acerca dos notórios
sinais de embriaguez, excitação ou torpor apresentados pelo condutor. § 3º Serão
aplicadas as penalidades e medidas administrativas estabelecidas no art. 165 deste Código
ao condutor que se recusar a se submeter a qualquer dos procedimentos previstos no caput
deste artigo."Foi por isto que Elesbão ajuizou a ação de habeas corpus preventivo,
pretendendo que lhe seja concedida a ordem, a fim de não ser compelido a se submeter ao
bafômetro, porque, além do constrangimento público a que os policiais submetem os
motoristas, a medida viola o princípios da dignidade humana e aquele que assegura a
todos o direito de não produzir prova contra si próprio. Aduz que o teste do bafômetro é
até dispensável, porque pode ser substituído pelo exame clínico. Explique se a ordem deve
ou não ser concedida.
Resposta à Questão 2
“Artigo 8
Garantias Judiciais
“(...)
2. Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência
enquanto não se comprove legalmente sua culpa. Durante o processo, toda pessoa
tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas:
(...)
g) direito de não ser obrigado a depor contra si mesma, nem a declarar-se culpada;
(...)”
Ocorre que a Lei 9.503/97, no artigo 277, § 3°, não obriga o condutor a se submeter
ao exame de alcoolemia, mas lhe impõe um ônus administrativo caso não o faça, qual seja,
a incidência do artigo 165 do mesmo CTB:
“Art. 306. Conduzir veículo automotor, na via pública, estando com concentração
de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 (seis) decigramas, ou sob a
influência de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência:
(Redação dada pela Lei nº 11.705, de 2008)
Penas - detenção, de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição de se
obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.
Parágrafo único. O Poder Executivo federal estipulará a equivalência entre
distintos testes de alcoolemia, para efeito de caracterização do crime tipificado
neste artigo. (Incluído pela Lei nº 11.705, de 2008)”
Tema XVI
Habeas corpus (continuação): procedimento no juízo de primeiro grau e nos Tribunais. A prova no habeas
corpus: o que diz o STF - novas idéias. Habeas corpus e prisão disciplinar. O CPP e a CF. Habeas corpus e a
decisão recorrível ou recorrida. Cabimento e competência para julgar. Cabimento do instituto na prisão
mantida por particular. Trancamento de inquéritos e de processos. Mandado de segurança no processo
penal.
Notas de Aula22
1. Habeas corpus
Este instrumento é uma ação autônoma de impugnação, sem natureza recursal, tal
como a revisão criminal, mesmo que o CPP o insira no capítulo dedicado aos recursos. Sua
22
Aula ministrada pelo professor Orlando Monteiro Espíndola da Cunha, em 5/10/2009.
“Art. 647. Dar-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar na
iminência de sofrer violência ou coação ilegal na sua liberdade de ir e vir, salvo
nos casos de punição disciplinar.”
É cabível habeas corpus contra ato de particular. O STJ pacificou esta divergência,
em nível jurisprudencial, mas a doutrina ainda se divide: a primeira corrente defende que
não é possível, porque o cerceamento indevido da liberdade pelo particular contra outro é
crime, sujeitando-o à prisão em flagrante, e não a impetração de HC. Segunda corrente, a
do STJ, entende que como o HC possui maior espectro protetivo, sem restrição específica,
deve-se entender cabível em qualquer cerceamento de liberdade, mesmo praticado por
particular – diferentemente do o mandado de segurança, em que o ato deve necessariamente
vir do aparato estatal, ou de particular que esteja no desempenho de atividade estatal (como
o reitor de uma faculdade).
A corrente que veda a impetração contra ato de particular, capitaneada por Sérgio
Demoro e Damásio, interpreta sistematicamente o CPP, em que, a todo tempo, o HC é
mencionado como instrumento dedicado a atos constritivos praticados por autoridades,
como se vê no artigo 649 do CPP:
“Art. 649. O juiz ou o tribunal, dentro dos limites da sua jurisdição, fará passar
imediatamente a ordem impetrada, nos casos em que tenha cabimento, seja qual for
a autoridade coatora.” (grifo nosso)
A segunda corrente, que admite este cabimento – do STJ, de Tourinho e Ada, entre
outros –, interpreta o CPP à luz da CRFB, cotejando os dispositivos do mandamus e do HC,
para concluir, como dito, que não há no HC a restrição que há no mandado de segurança,
nos incisos LXVIII e LXIX do artigo 5° da CRFB:
“(...)
LXVIII - conceder-se-á "habeas-corpus" sempre que alguém sofrer ou se achar
ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por
ilegalidade ou abuso de poder;
LXIX - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo,
não amparado por "habeas-corpus" ou "habeas-data", quando o responsável pela
ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica
no exercício de atribuições do Poder Público;
(...)” (grifo nosso)
É claro que, para ser cabível, é preciso que não haja necessidade de dilação
probatória – a prova preconstituída é exigida no HC –, pois se for preciso produzir provas,
haverá inadequação da via eleita, impedindo o curso do HC. O HC permite exame de
provas, mas estas devem ser previamente produzidas, pois no seu curso não há momento
para instrução.
“(...)
LXI - ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e
fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão
militar ou crime propriamente militar, definidos em lei;
(...)”
O artigo 142, § 2°, da CRFB, dispõe que não é cabível o HC nestes casos,
expressamente:
“Art. 142. As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela
Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com
base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da
República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais
e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.
(...)
§ 2º - Não caberá "habeas-corpus" em relação a punições disciplinares militares.
(...)”
Contudo, o STF tem entendido que esta vedação se dirige unicamente à discussão
do mérito da prisão, que é insindicável pelo judiciário, não sendo vedada a impetração de
HC para discutir os pressupostos de legalidade desta prisão: o militar não poderá discutir
em HC aspectos insindicáveis pelo Judiciário, mas poderá impetrar a ordem para promover
controle de legalidade da prisão, tais como a incompetência da autoridade, a inexistência de
previsão da sanção para seu caso, e outros aspectos de legalidade do ato prisional. Para o
STF, são pressupostos de legalidade da prisão, discutíveis em HC: a hierarquia; o poder
disciplinar, a natureza da penalidade disciplinar, e o ato relativo à função.
Veja o HC 70.648, do STF:
Debalde tal julgado, bem antigo, Paulo Rangel entende que não, pois o instrumento
seria o mandado de segurança, ante a remota conexão entre esta identificação e o direito
ambulatorial: o direito a não ser identificado é autônomo, e conta com ampla legislação
sobre seu alcance.
Seria cabível HC contra ato que impede a vista de autos de inquérito, mas hoje cabe
a reclamação, diretamente endereçada ao STF, porque a questão é sumulada em enunciado
vinculante, hoje: o STF entende que o advogado constituído pode ter acesso aos atos, mas
apenas às diligências já realizadas e devidamente documentadas, conforme o teor da
recente súmula vinculante 14:
O HC per saltum é também vedado, com base na súmula 691 do STF, supra. Este
HC é inadmissível, porque é verdadeira supressão de instância. Contudo, como se vê, o
STF admite-o, não expressamente, mas sim a título de HC de ofício quando a ilegalidade é
gritante.
Veja abaixo alguns julgados confirmando a vedação sumular, e outros
excepcionando-a:
“HC 79238 / RS (STF – 1ª TURMA – DJ 06-08-1999). EMENTA: "Habeas
corpus". - Em caso análogo ao presente, esta Primeira Turma, ao julgar a questão
de ordem que levantei no HC 76.347, não conheceu deste por acórdão cuja ementa
é esta: "Habeas corpus". Questão de ordem. Inadmissibilidade de "habeas corpus"
em que se pretende seja concedida liminar por esta Corte substitutiva de duas
denegações sucessivas dessa liminar pelos relatores de dois Tribunais inferiores a
ela, mas dos quais um é superior hierarquicamente ao outro. - A admitir-se essa
sucessividade de "habeas corpus", sem que o anterior tenha sido julgado
definitivamente para a concessão de liminar "per saltum', ter-se-ão de admitir
conseqüências que ferem princípios processuais fundamentais, como o da
hierarquia dos graus de jurisdição e o da competência deles. "Habeas corpus" não
conhecido.”
concedido de ofício para esse fim. Pedido prejudicado. Crime contra a ordem
tributária não se tipifica antes do lançamento definitivo de tributo devido.”
2. Não existe perda do interesse de agir de acusado, uma vez que ele permanece
submetido ao cumprimento das condições estipuladas pelo sursis, sob pena de
retomada do curso da ação penal, acompanhada de todos os inconvenientes dela
decorrentes e sobejamente conhecidos.
3. Nada impede que seja examinada, pelo Tribunal estadual, a questão acerca da
tipicidade da conduta descrita na inicial acusatória e a da presença de justa causa
para ação penal, porquanto a formalização da suspensão condicional do processo
pressupõe o recebimento da denúncia pelo Juízo de primeiro grau.
4. Habeas corpus concedido para determinar que a Corte a quo examine o mérito
da ordem originária, como entender de direito.”
tributária, cujo tributo seria devido ao mesmo ente, cujos interesses não estavam
confiado a seu patrocínio.”
Há uma só exceção a esta dinâmica: se o ato coator for praticado por juiz do
trabalho, em sendo observada a competência pelo foro, seria competente para o HC o
respectivo TRF, por conta da previsão constitucional desta competência para julgamento do
juiz do trabalho, no artigo 108, I, “a”, da CRFB:
“Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar: (Redação dada pela
Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
(...)
IV os mandados de segurança, habeas corpus e habeas data, quando o ato
questionado envolver matéria sujeita à sua jurisdição; (Incluído pela Emenda
Constitucional nº 45, de 2004)
(...)”
Por isso, mesmo que o TRF seja competente para julgar o juiz do trabalho, o TRT é
competente para julgar HC contra seus atos. Mas veja que, mesmo julgando o HC, a Justiça
do Trabalho não exercerá nunca jurisdição penal, como se vê na ADI 3.684:
Recentemente, porém, houve mudança de posição do STF, que deve ser observada,
mesmo que a súmula ainda não tenha sido formalmente cancelada: a corte entende que é
competência do respectivo tribunal de justiça. Veja:
Contra ato do juiz do juizado, há quem defenda ser a turma recursal, mas há outra
corrente defendendo ser o próprio tribunal, assim como a turma recursal, pois, tal como
eles, são todos juizes, submetidos ao foro do respectivo tribunal. Veja HC abaixo, do TJ/RJ:
1.4. Procedimento do HC
Três são as figuras importantes no HC: a autoridade coatora, aquela que produz o
ato de coação atacado; o paciente, aquele que tem seu direito de locomoção violado; e o
impetrante, que é quem postula a concessão da ordem – que pode ou não se confundir com
a figura do paciente.
Primeira assertiva que se deve fazer é de que é pacífica a admissibilidade de liminar
em HC, mesmo que não haja previsão legal expressa neste sentido.
No procedimento em primeiro grau, não há previsão de prestação de informações
pela autoridade coatora, previsão esta que só existe em segundo grau. Contudo, por
interpretação analógica, permite-se a prestação de informações também em primeiro grau.
O mesmo se dá com a oitiva do MP, prevista expressamente no HC em segundo grau, mas
não no primeiro: a jurisprudência é pacífica em entender necessária esta manifestação do
parquet também em primeiro grau.
O assistente de acusação não é ouvido no HC, em qualquer caso. O querelante,
quando o HC é impetrado em sede de ação penal privada, pode se manifestar.
Ocupa o pólo passivo do HC a autoridade coatora, em regra. Contudo, há quem
entenda que, na ação penal privada, se o querelado impetra HC, o querelante deverá ocupar
o pólo passivo.
A prova, no HC, deve ser preconstituída, não havendo dilação probatória no seu
curso. É claro que há exame de provas, neste writ, mas não há fase de produção de provas
em seu curso – devem vir todas preconstituídas. Neste sentido, veja alguns julgados do
STF:
Por conta desta limitação probatória, não é possível a utilização do HC para postular
absolvição. Veja o seguinte julgado do STJ:
“Súmula 267, STF: Não cabe mandado de segurança contra ato judicial passível de
recurso ou correição.”
Sobre este tema, três eram as posições antes da Lei 12.016/09. A primeira defendia
que se há recurso, simplesmente não cabe mandado de segurança, interpretando
literalmente a súmula acima. A segunda entendia que, se o recurso cabível não tem efeito
suspensivo, o mandado é cabível, de forma a prevenir o dano causado pela vigência da
decisão. E a terceira, variante da segunda, dizia que se o recurso não tem efeito suspensivo,
é cabível o mandado, mas ainda assim é necessária a interposição concomitante do recurso
– quando o mandado assumirá efeitos exclusivamente de conferir efeito suspensivo a este
recurso. O que se levava em conta era se o recurso, por si só, poderia reparar o dano
eventual, ou se a impetração era necessária para tanto.
O artigo 5°, II, da Lei 12.016/09, porém, parece ter posto fim à discussão:
se encontra sujeita. Neste caso, mesmo com o recurso tendo efeito suspensivo, a doutrina
tem admitido a impetração concomitante do mandamus, ainda hoje.
Pode o mandado de segurança ser utilizado para dar efeito suspensivo ao recurso,
quando, por exemplo, alvejar uma decisão que concedeu a liberdade provisória em caso em
que esta era vedada? Veja que esta decisão só desafia recurso em sentido estrito, que tem
somente efeito devolutivo. A jurisprudência tende a negar a admissibilidade de mandado de
segurança para atribuir efeito suspensivo ao recurso em sentido estrito, ou recurso similar
(como o agravo em execução), sobremaneira quando em prol da acusação. Veja:
afastados de suas funções, até o trânsito em julgado do processo criminal pelo qual
responde, excetuando-se, contudo, as parcelas estritamente ligadas ao exercício da
atividade. Precedentes.
2. Recurso conhecido e parcialmente provido.”
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
contra o sistema financeiro nacional. Crimes ditos societários. Tipos previstos nos
arts. 21, § único, e 22, caput, da Lei 7.492/86. Denúncia genérica. Peça que omite a
descrição de comportamentos típicos e sua atribuição a autor individualizado, na
qualidade de administrador de empresas. Inadmissibilidade. Imputação às pessoas
jurídicas. Caso de responsabilidade penal objetiva. Inépcia reconhecida. Processo
anulado a partir da denúncia, inclusive. HC concedido para esse fim. Extensão da
ordem ao co-réu. Inteligência do art. 5º, incs. XLV e XLVI, da CF, dos arts. 13, 18,
20 e 26 do CP e 25 da Lei 7.492/86. Aplicação do art. 41 do CPP. Votos vencidos.
No caso de crime contra o sistema financeiro nacional ou de outro dito "crime
societário", é inepta a denúncia genérica, que omite descrição de comportamento
típico e sua atribuição a autor individualizado, na condição de diretor ou
administrador de empresa.”
Tema XVII
Agravo em execução. Agravo regimental. Reclamação. Natureza jurídica. Constitucionalidade. Base legal.
Procedimento: prazo. Efeitos.
Notas de Aula23
“Art. 197. Das decisões proferidas pelo Juiz caberá recurso de agravo, sem efeito
suspensivo.”
Este agravo é o recurso cabível contra todas as decisões do juiz da execução penal.
Ele segue o rito do recurso em sentido estrito, como deixa depreender a súmula 700 do
STF, e por isso seu prazo de interposição é de cinco dias. Também o juízo de retratação é
cabível, tal como no recurso em que se espelha, tendo também este efeito regressivo.
“Súmula 700, STF: É de cinco dias o prazo para interposição de agravo contra
decisão do juiz da execução penal.”
23
Aula ministrada pelo professor Orlando Monteiro Espíndola da Cunha, em 5/10/2009.
Por seguir o recurso em sentido estrito, este agravo em execução tem a si aplicáveis
todas as disposições daquele recurso. Veja a este respeito os julgados abaixo, do STJ:
Este agravo é interposto no próprio tribunal, como se sabe, e não no órgão ad quem,
como é a regra dos agravos de instrumento.
Uma curiosidade: se o HC é impetrado por prisão civil por dívida, esta matéria não
é criminal, mas mesmo assim o agravo de instrumento contra inadmissão de recursos
excepcionais é tido por matéria criminal, e por isso aplica-se a Lei 8.038/90, e não o CPC.
Não é possível ao relator do agravo em execução julgar o mérito do recurso, mesmo
que favorável ao acusado, por aplicação analógica do artigo 557 do CPC. A dinâmica é
incompatível. Veja o julgado abaixo:
pelo MP; a falta de apreciação pelo juiz da promoção de arquivamento feita pelo MP, com a
remessa ao delegado para continuar as investigações; e outras interlocutórias, que,
irrecorríveis, possam despertar reclamação.
Casos Concretos
Questão 1
O júri desclassificou o crime de homicídio tentado para outro que não era de sua
competência e o juiz, após dissolver o conselho, determinou que a vítima fosse submetida a
exame médico-legal complementar, a fim de ficar esclarecida a natureza de suas lesões. O
réu, por seu defensor, requereu que o juiz requisitasse o boletim do atendimento médico ao
ofendido. O Ministério Público protestou sem êxito. Nas circunstâncias, indaga-se qual o
remédio processual que o Ministério Público pode adotar para manifestar o seu
descontentamento.
Resposta à Questão 1
Questão 2
Resposta à Questão 2