Sie sind auf Seite 1von 144

GINECOLOGIA E OBSTETRíCIA

ginecologia e obstetrícia 257

1 Fisiologia menstrual

1. Eixo hipotalâmico-hipofisário-ovariano e esteroidogênese


ovariana
ͳͳ O ciclo menstrual pode ser dividido em esteroidogênese ovariana, ciclo menstrual propria-
mente dito, ciclo endometrial e muco cervical;

ͳͳ A molécula-chave para a produção dos hormônios esteroides nos ovários e nas suprarrenais
é o colesterol, principalmente o colesterol LDL;

ͳͳ Nas suprarrenais, o colesterol é transformado em androgênios: androstenediona e sulfato


de deidroepiandrosterona (SDHEA). Nos ovários, a esteroidogênese acontece em diferentes
camadas do órgão (teca interna e granulosa), com produção de estrogênios e progesterona;

ͳͳ Os folículos ovarianos contêm 2 camadas funcionais envolvidas na esteroidogênese: a teca


interna, com receptores para o hormônio luteinizante (LH), e a camada granulosa, com re-
ceptores para o hormônio folículo-estimulante (FSH);

ͳͳ O FSH e o LH são hormônios se-


cretados pela hipófise sob o estí-
mulo do GnRH, que é liberado pelo
hipotálamo de maneira pulsátil (1
pulso a cada 90 minutos na fase
folicular e a cada 220 minutos na
fase lútea), ou seja, o que muda é o
padrão de pulsatilidade na secre-
ção. Durante a 1ª e a 2ª fases do
ciclo menstrual, diversos fatores
estimulam a secreção do GnRH:
noradrenalina, histamina, aminoá-
cidos, neuropeptídios, adenosina,
substância P, óxido nítrico e os
próprios esteroides ovarianos;

ͳͳ Teoria das 2 células–2 gonadotro-


finas: o LH encontra um receptor
na membrana celular da célula da
teca interna e estimula a transfor- Figura 1 - Teoria das 2 células
mação de colesterol em androste-
nediona e testosterona. Por difusão, esses androgênios atingem a camada granulosa. O FSH
liga-se ao seu receptor específico e estimula a aromatase, possibilitando a transformação
dos androgênios em estrogênios: a androstenediona se transforma em estrona, e a testos-
terona, em estradiol.
258 SIC Resumão revalida

2. Ciclo menstrual propriamente dito


ͳͳ O ciclo menstrual normal começa no 1º dia de sangramento menstrual e tem duração média
de 25 a 35 dias;
ͳͳ Na ausência de fecundação, ocorre a degeneração do corpo lúteo, levando à diminuição da
produção de estrogênios e progesterona. Essa diminuição provoca a parada na inibição da
secreção de FSH e, consequentemente, o hormônio aumenta;
ͳͳ O aumento progressivo do FSH dá início ao processo de recrutamento folicular, que se
desenvolverá até as fases pré-antral e antral, secretando quantidades progressivamente
maiores de estradiol. Um desses folículos será o dominante;
ͳͳ Os fatores determinantes da dominância folicular são o maior número de receptores para
FSH em sua membrana celular e fluxo sanguíneo preferencial. O folículo dominante inibe o
crescimento dos outros folículos pela secreção de inibina B e produz quantidades crescentes
de estradiol; a quantidade de estradiol no líquido folicular determinará o folículo dominante;
ͳͳ O pico de estradiol acontece em aproximadamente 24 a 36 horas antes da ovulação e sina-
liza para o pico de LH, que ocorre 12 horas antes da ovulação;
ͳͳ No ovário, o que restou do folículo dominante transforma-se em corpo lúteo e passa a pro-
duzir estradiol e progesterona. A partir do momento da ovulação, inicia-se a 2ª fase do ciclo
menstrual, chamada de fase lútea;
ͳͳ Quando não há fecundação nem gravidez, as células do corpo lúteo sofrem apoptose, e
ocorre atresia do corpo lúteo, determinando queda acentuada dos níveis de estradiol e
progesterona. Tal diminuição da concentração hormonal resulta na alteração endometrial
irreversível.

3. Ciclo endometrial
ͳͳ Na 1ª fase do ciclo menstrual, ocorre a proliferação endometrial sob estímulo do estrogênio.
O endométrio aumenta de espessura e suas glândulas apresentam-se estreitas e tubulares.
Essa 1ª fase é conhecida como fase proliferativa;
ͳͳ Na 2ª fase do ciclo, há acúmulo de glicogênio, e as glândulas endometriais ficam edemacia-
das e tortuosas, com arteríolas dilatadas e espiraladas. Essa fase denomina-se secretora;
ͳͳ A 3ª e última fase endometrial é a menstruação, que ocorre por atresia do corpo lúteo,
levando à isquemia e à necrose do endométrio secundário a vasoespasmos das arteríolas
espiraladas;
ͳͳ Menstruação normal: duração de 2 a 8 dias; intervalo de 25 a 35 dias; volume de 20 a 80mL
por ciclo.

4. Muco cervical
ͳͳ O muco cervical também sofre alterações de acordo com as variações hormonais, para tornar-
se mais receptivo à passagem dos espermatozoides na fase pré-ovulatória e menos receptivo
na pós-ovulatória;
ginecologia e obstetrícia 259

ͳͳ Na 1ª fase do ciclo, as concentrações crescentes de estradiol determinam o aumento na


quantidade de muco, que fica também mais fluido e com maior filância. O muco cristaliza-se
em forma de “folha de samambaia” quando é colocado sobre uma lâmina e aquecido. Na 2ª
fase, o aumento progressivo da progesterona torna o muco mais viscoso e espesso, com
aspecto opaco.

Figura 2 - Concentrações hormonais durante o ciclo menstrual

Figura 3 - Ciclo endometrial

2 Planejamento familiar

1. Introdução
Consiste em medidas contraceptivas e pró-gestação, alcançadas por meio de orientação ade-
quada oferecida por equipe multidisciplinar, treinada para esse fim.
Índice de Pearl: utilizado para calcular a taxa de “falha” de cada método contraceptivo. Calcu-
lado pelo número de gestações ocorridas em 100 mulheres que usam o método em um período
de 12 meses.
260 SIC Resumão revalida

2. Métodos hormonais
A - Orais
- Monofásicos (todos os comprimidos têm a mesma dosagem de medicamentos);
Tipos - Bifásicos (2 dosagens diferentes na cartela);
- Trifásicos (3 dosagens).
São compostos de 2 esteroides sintéticos (etinilestradiol + progestogênio) ou de progestogênio exclusi-
Composição
vamente.
Mecanismo Há espessamento do muco cervical, dificultando a penetração e a ascensão dos espermatozoides,
de ação inibição da ovulação, alterações endometriais (hipotrofia/atrofia) e alterações da motilidade tubária.
Há falha de 0,1 gestação por 100 mulheres/ano (uso ideal) e de 6 a 8 gestações por 100 mulheres/
Eficácia
ano (uso rotineiro).
- Náuseas;
- Cefaleia;
- Edema;
- Acne;
- Irregularidade menstrual (escape);
Efeitos - Alterações de humor;
colaterais
- Depressão;
- Diminuição da libido;
- Maior ocorrência de eventos tromboembólicos (devido ao estado de hipercoagulabilidade promo-
vido pelo componente estrogênico);
- A intensidade dos efeitos dependente da dosagem hormonal e do tipo de progestogênio utilizado,
já que o estrogênio é o mesmo em todos os contraceptivos (etinilestradiol).
- Proteção contra:
· Gestação ectópica;
· Câncer de ovário;
· Câncer de endométrio;
· Moléstia Inflamatória Pélvica Aguda (MIPA);
Efeitos · Alterações fibrocísticas benignas da mama;
benéficos
· Miomas;
· Endometriose.
- Outros efeitos benéficos:
· Regularidade menstrual;
· Coadjuvante no tratamento e na prevenção da anemia ferropriva.
- Tabagistas com mais de 35 anos;
- Hipertensão arterial;
- Doença cardiovascular;
- Acidente vascular cerebral prévio;
- Trombose venosa profunda prévia;
- Diabetes mellitus grave;
Contrain- - Doença hepática ativa;
dicações
- Enxaqueca com aura;
- Colecistopatia;
- Uso de medicamentos que interfiram na absorção, como, por exemplo, alguns antibióticos e anticonvulsi-
vantes;
- Gestação;
- Amamentação;
- Imobilização prolongada.
ginecologia e obstetrícia 261

Contraceptivos orais compostos exclusivamente de progestogênios agem basicamente pelo espes-


samento do muco cervical, inibindo a ovulação em somente metade das pacientes. São indicados
Particulari-
na amamentação (já os estrogênios pioram a quantidade e a qualidade do leite e, por isso, não são
dades
recomendados) e em patologias que contraindiquem os estrogênios. Desogestrel 75µg é composto
exclusivamente por progestogênios e tem ação anovulatória.
Interações Algumas drogas reduzem o efeito contraceptivo se administradas com os contraceptivos orais: ri-
medica- fampicina, griseofulvina e barbitúricos. Outras sofrem redução no seu efeito terapêutico quando
mentosas usadas junto aos contraceptivos orais: guanetidina, insulina e dicumarol.
Modo de
Iniciar sempre no 1º dia da menstruação, e a duração varia pelo tipo de pílula utilizada.
usar

B - Injetáveis
Mensais ou Os mensais são combinados (estrogênios naturais e progestogênios) e os trimestrais são
trimestrais exclusivamente de progestogênios.
Os mensais são semelhantes aos contraceptivos orais, com espessamento do muco cer-
Mecanismo de ação
vical e inibição da ovulação.
Alta, com índice de falha entre 0,1 e 0,3 gestação por 100 mulheres/ano; o uso rotineiro
Eficácia
aproxima-se do uso ideal.
Os mais comuns são sangramento irregular, amenorreia e ganho de peso. Tais efeitos são
encontrados, com maior frequência, nos injetáveis trimestrais, juntamente com o retorno
Efeitos colaterais
mais demorado à fertilidade. Nos casos de contraceptivos mensais, os efeitos colaterais são
semelhantes aos dos contraceptivos orais.
- Injetáveis mensais: idênticas às dos contraceptivos orais;

Contraindicações - Injetáveis trimestrais (somente progestogênio): quase inexistentes; é o método de escolha


para pacientes com patologias graves, como doenças reumatológicas e cardíacas, e pa-
cientes no puerpério e em amamentação.

C - Transdérmicos, implante e anel vaginal


Características dos transdérmicos (EVRA®) e anel vaginal (NuvaRing®)
- São compostos de estrogênios sintéticos e progestogênios (não têm a 1ª passagem hepática);
- Têm vantagem posológica;
- Contraindicações: as mesmas dos contraceptivos orais;
- Efeitos colaterais: semelhantes aos dos contraceptivos orais (menor sensibilidade gástrica devido à via de ad-
ministração).

Características dos implantes (Implanon®)


- Contêm exclusivamente progestogênio, que é liberado em microdoses diárias;
- Ação por inibição da ovulação, espessamento do muco cervical e alterações endometriais;
- Alta eficácia, com taxa zero de gestação em 3 anos de seguimento;
- Efeitos colaterais mais comuns, que levam à interrupção do método: sangramento vaginal irregular, alterações
de humor, cefaleia e diminuição da libido;
- Possível uso por praticamente todas as pacientes que se adaptem ao método;
- Necessária troca a cada 3 anos.
262 SIC Resumão revalida

D - Sistema intrauterino liberador de levonorgestrel


Sistema que libera progestogênio continuamente no útero e age por alteração no muco cer-
vical e por efeitos endometriais diretos (supressão da camada funcional). Não são anovulatórios,
podendo ser encontradas ovulações em até 90% das usuárias.

E - Contracepção de emergência
Indicada para relações sexuais desprotegidas (falha do uso da anticoncepção ou ausência do
uso dela) e nos casos de violência sexual.
Atua inibindo a ovulação ou um adequado desenvolvimento do corpo lúteo, do endométrio ou
do muco cervical, ou alterando a fisiologia das tubas uterinas ou dos espermatozoides.
Existem relatos na literatura de gestação ectópica após falha deste método.

3. Métodos não hormonais


A - Métodos de barreira

- São os únicos métodos anticoncepcionais que protegem contra doenças sexualmente


transmissíveis, inclusive HIV/AIDS;
- Não apresentam contraindicações;
Preservativo e
- Recomenda-se mesmo quando associados a outro método contraceptivo;
camisinha feminina
- Índice de falha: é baixo no uso ideal (3 gestações por 100 mulheres/ano), mas no uso roti-
neiro esses números se elevam;
- Efeitos colaterais: sintomas alérgicos em indivíduos sensíveis ao látex ou aos lubrificantes.
- Tem baixa eficácia (20 gestações por 100 mulheres/ano);
- Deve ser utilizado com espermicidas;
Diafragma - Não tem contraindicações;
- Pode mudar o “tamanho ideal” ao longo da vida;
- Necessita de experiência da usuária para melhorar a eficácia.

B - Métodos comportamentais
Índices de falha São altos, pois dependem de intensa motivação do casal.
Baseia-se na abstinência periódica nos dias considerados férteis após o reconhecimento
Tabelinha
desse período.
Coito interrompido Consiste na ejaculação extravaginal e também tem altas taxas de falha.
Baseia-se na observação das características do muco cervical, mais fluido e elástico no
Muco cervical
período fértil.
Necessita de medidas diárias da temperatura oral, retal ou vaginal, em repouso, pela ma-
Temperatura basal
nhã; ovulação quando a temperatura se eleva em 0,5°C.
Método sintotérmico Associam-se os métodos do muco cervical e temperatura basal ou muco cervical e tabelinha.

4. Dispositivo intrauterino
Modelos
Há o dispositivo intrauterino (DIU) de cobre e o DIU com sistema liberador de levonorgestrel.
disponíveis
Mecanismo Dificulta a passagem dos espermatozoides no trato reprodutivo feminino. Para a Organização Mun-
de ação dial da Saúde, o mecanismo é a interferência em etapas prévias à fertilização.
Alta (0,3 gestação por 100 mulheres/ano). Deve ser trocado a cada 5 ou 10 anos (depende do
Eficácia
modelo utilizado).
ginecologia e obstetrícia 263

Efeitos
Compreendem dismenorreia, aumento do fluxo menstrual e sangramento intermenstrual.
colaterais
- Dismenorreia moderada a severa;
- Fluxo menstrual volumoso;
- Alterações anatômicas (útero bicorno ou didelfo, septos longitudinal ou transverso);
- Anemia;
- Promiscuidade sexual (maior risco de doenças sexualmente transmissíveis);
Contraindica- - MIPA;
ções - Antecedentes de 2 ou mais episódios de MIPA;
- Infecção puerperal;
- Cervicite purulenta;
- Sangramento genital não esclarecido;
- Tuberculose pélvica;
- Câncer de colo uterino ou corpo uterino.
DIU e O DIU deve ser retirado imediatamente após o diagnóstico de gestação intrauterina para evitar o
gestação abortamento espontâneo.
DIU e infec- O risco de aquisição de uma infecção pélvica numa mulher usuária de DIU ocorre apenas nos pri-
ção pélvica meiros 20 dias após a inserção. Não é necessário usar antibioticoterapia nesse período.
Informação
O DIU não é considerado abortivo, pois não interfere na fecundação.
importante

5. Lactação e amenorreia
- Inibição da função ovulatória nos 6 primeiros meses pós-parto, devido à hiperprolactinemia fisiológica e ao
hipoestrogenismo decorrentes da amamentação;
- Eficácia quando o aleitamento é exclusivo e se a mulher se mantém em amenorreia (falha de 2 gestações por 100
mulheres/ano); 90% delas retornam à ovulação antes de retornar à menstruação;
- Ausência de efeitos colaterais;
- Estimulação da amamentação e do vínculo mãe–filho.

6. Métodos definitivos de esterilização


- Realizada por meio de uma minilaparotomia, via vaginal ou por videolaparoscopia. Realização de
ressecção de uma porção da tuba, colocação de anel tubário ou grampo;
- Pode ser feita no pós-parto, pós-aborto, durante cesárea ou fora do ciclo gravídico-puerperal;
- Legislação brasileira:
Laqueadura · Só pode ser feita se a paciente tem plena capacidade civil, idade superior a 25 anos ou, pelo
Tubária (LT) menos, 2 filhos vivos (sem considerar o feto da gestação em curso);
· Deve-se respeitar um intervalo mínimo de 60 dias entre a manifestação do desejo de LT e a sua
realização e obter consentimento pós-informado assinado da paciente ou do casal, caso ela
tenha relação conjugal estável;
· Fora dessa situação, a LT só poderá ser realizada se a paciente estiver em risco de morte ou de
agravo à saúde em gestações futuras, comprovado por um relatório assinado por 2 médicos.
- Alta eficácia (taxas de falha de 0,15 gestação por 100 homens/ano);
Vasectomia
- Possível reversão do método, porém com resultados pobres.
- Colocação, por via endoscópica, de dispositivos semelhantes a pequenas molas de metal que são
Implante inseridas nos óstios tubários, causando a fibrose local e obstrução tubária definitiva;
endotubário
- Procedimento ambulatorial.
264 SIC Resumão revalida

3 Transtornos menstruais

1. Introdução
Menstruação
Características Normal Alterações Nomenclaturas
>35 dias Espaniomenorreia
Intervalo 21 a 35 dias
<21 dias Polimenorreia
Duração 2 a 8 dias >8 dias Hipermenorreia e hipermenorragia
>80mL/ciclo Menorragia
Volume 20 a 80mL/ciclo
<20mL/ciclo Oligomenorreia
Observação: metrorragia – sangramento fora do ciclo; sinusorragia – sangramento ao coito.

2. Hemorragia uterina disfuncional


Também conhecida como sangramento uterino disfuncional, é aquela que não obedece à fun-
ção menstrual normal e tem origem diversa de qualquer causa orgânica. Pode ser decorrente de
ciclos ovulatórios ou anovulatórios.
- Distúrbios no eixo Hipotalâmico-Hipofisário-Ovariano (H-H-O) – excesso ou falta de estrogê-
nios, falta de progesterona;
Etiopatogenia - Aumento das prostaglandinas;
- Distúrbios de outros órgãos (insuficiência hepática/cirrose, hipertireoidismo/hipotireoidismo);
- Alterações ponderais excessivas.
- Na adolescência: ciclos anovulatórios por imaturidade do eixo H-H-O;
- Na menacma:
· Anovulatórias: Síndrome dos Ovários Policísticos (SOP), hiperprolactinemia, insuficiência
Fisiopatologia
ovariana, estresse;
· Insuficiência lútea e hipermenorragia essencial.
- No climatério: insuficiência lútea, anovulação por insuficiência ovariana.
- Diversas intensidades são possíveis e os padrões de sangramento podem ser diversos:
Apresentação · Hipermenorragia;
clínica · Polimenorreia;
· Menorragia.
- Afastar quaisquer patologias orgânicas, por meio de anamnese/exame físico e exames com-
plementares;
- Diagnósticos diferenciais:
· Gravidez/abortamento;
· Moléstia inflamatória pélvica aguda;
· Mioma uterino;
Diagnóstico · Câncer de colo uterino;
· Câncer de endométrio;
· Coagulopatia;
· Hipotireoidismo;
· Doença hepática (afastado pela clínica e provas laboratoriais de função hepática);
· Corpos estranhos;
· Pólipos endometriais e cervicais;
· Uso de medicamentos (anticoagulantes etc.).
- Clínico: anti-inflamatórios não hormonais, progestogênios, danazol, anticoncepcionais hormo-
Tratamento nais, análogos do GnRH e sistema intrauterino medicado com progesterona;
- Cirúrgico: ablação endometrial, curetagem uterina e histerectomia.
ginecologia e obstetrícia 265

3. Hiperandrogenismo
É o excesso da concentração ou da ação dos androgênios na mulher, os quais são produzidos
a partir do colesterol pelas glândulas suprarrenais e pelos ovários e estão ligados à globulina
ligadora dos hormônios sexuais (SHBG) (80%) ou à albumina (19%), restando pequena fração livre
(1%) no plasma.
Principais androgênios na mulher
Androstenediona Produzida 50% nas suprarrenais e 50% nos ovários
Produzida 25% nos ovários, 25% nas suprarrenais e 50% por conversão periférica, princi-
Testosterona
palmente no tecido adiposo
Sulfato de deidroe-
piandrosterona 95% produzidos nas suprarrenais
(DHEA)

A SHBG aumenta com a administração de estrogênios (por exemplo, anticoncepcional oral) e


hormônio tireoidiano e diminui na obesidade, nos estados hiperinsulinêmicos (por exemplo, SOP)
e com a administração de androgênios.
Características
- Aumento da produção de androgênios ovarianos ou adrenais (tumor de ovário, SOP, síndrome
de Cushing);
- Uso de substâncias androgênicas (anabolizantes, progestogênios derivados da 19-nortestos-
Etiopatogenia terona);
- Diminuição da SHBG com aumento das taxas livres de androgênios circulantes (obesidade e
hiperinsulinemia);
- Diminuição do catabolismo e depuração dos androgênios.
- Leva tanto à redução dos caracteres essencialmente femininos quanto à virilização. Os prin-
cipais sinais são:
· Alopecia androgênica;
· Aumento de massa muscular;
· Engrossamento da voz;
· Aumento do clitóris;
Apresentação
· Alterações menstruais;
clínica
· Infertilidade por fator ovulatório;
· Abortamentos de 1º trimestre por insuficiência lútea;
· Hirsutismo;
· Acne;
· Obesidade centrípeta;
· Acantose nigricans.
- Feito por avaliações clínica e laboratorial:
· Anamnese;
· Exame físico;
· Dosagens séricas dos androgênios;
Diagnóstico
· Prolactina;
· TSH/T4 livre;
· FSH/LH;
· Ultrassonografia/tomografia/ressonância magnética de ovários e adrenais (excluir neoplasias).
- Clínico: perda de peso, anticoncepcional oral (dar preferência àqueles com progestogênios
com ação antiandrogênica, como acetato de ciproterona e desogestrel), drogas antiandrogê-
nicas (acetato de ciproterona, espironolactona, flutamida e finasterida), indutores da ovulação
Tratamento das para pacientes que desejam engravidar (citrato de clomifeno ou gonadotrofinas);
síndromes hipe- - Cirúrgico: cauterização laparoscópica dos ovários e ressecção em cunha dos ovários (drilling ova-
randrogênicas riano – pouco usado);
- Outros: tratamento estético para hirsutismo, acne e acompanhamento dermatológico;
- A metformina diminui a resistência a insulina e possibilita a restauração dos ciclos ovulatórios
nas pacientes com SOP e com resistência periférica a insulina.
266 SIC Resumão revalida

4. Síndrome dos ovários policísticos


É uma forma de hiperandrogenismo acompanhada por anovulação crônica, com etiopatoge-
nia ainda não definida.
Há aumento da produção androgênica, devido à hiperplasia das células tecais sob estímulo
do LH, que está aumentado em relação ao FSH (relação LH–FSH >2:1). Os níveis relativamente
baixos de FSH inibem a maturação folicular adequada e o fenômeno de dominância folicular,
persistindo folículos em estágios iniciais da maturação e em atresia, o que oferece o aspecto
policístico aos ovários.
O quadro clínico é composto de ciclos menstruais irregulares (espaniomenorreia ou amenor-
reia), hirsutismo, acne, alopecia, obesidade e ovários aumentados com múltiplos cistos.

Consenso de Rotterdam, 2003 (pelo menos 2 de 3 fatores)


- Irregularidade menstrual;
- Sinais clínicos e/ou bioquímicos de hiperandrogenismo (acne, hirsutismo, alopecia, aumento dos androgênios);
- Ovários policísticos à ultrassonografia.

Critérios diagnósticos propostos pela Androgen Excess and PCOS Society, 2006
- Hiperandrogenismo clínico e/ou bioquímico;
- Oligo-ovulação e/ou ovários policísticos;
- Exclusão de outras etiologias para hiperandrogenismo.

O diagnóstico é de exclusão. Devem-se pesquisar todas as outras causas de anovulação crô-


nica e hiperandrogenismo.
Tratamento
- Perda de peso;
- Drogas antiandrogênicas (acetato de ciproterona é o mais utilizado);
- Metformina (quando houver resistência periférica a insulina);
- Citrato de clomifeno (indutor de ovulação) nas pacientes que desejam engravidar.

5. Hiperprolactinemia
A secreção de prolactina (PRL) pela adeno-hipófise é controlada por constante inibição exer-
cida pela dopamina.
A PRL atua no crescimento e na dominância folicular com papel sinérgico às gonadotrofinas. Se
a PRL estiver elevada, determinam-se bloqueio da ação da aromatase, bloqueio da ação do FSH em
seus receptores e atresia folicular por bloqueio da maturação. Além da ação direta nos ovários, a
hiperprolactinemia pode inibir a secreção pulsátil do GnRH, alterando a função ovariana.
- Galactorreia;
- Amenorreia;
- Infertilidade;
- Acne;
Sinais e sintomas - Hirsutismo;
- Distúrbios visuais (aumento da hipófise e compressão do quiasma óptico);
- Sinais de hipoestrogenismo;
- Distúrbios menstruais (espaniomenorreia, oligomenorreia, insuficiência lútea);
- Redução da libido.
ginecologia e obstetrícia 267

- Uso de drogas (psicotrópicos, antidopaminérgicos, estrogênios, progestogênios, antide-


pressivos tricíclicos, opiáceos, cocaína);
- Tumores (microadenoma de hipófise, carcinoma broncogênico, hipernefroma);
- Privação de sono;
- Estresse;
- Exercício físico;
Etiologia - Coito;
- Gravidez;
- Lactação;
- Manipulação mamária;
- Doenças clínicas (hipotireoidismo, hiperplasia adrenal, insuficiência hepática, herpes-
zóster, queimaduras);
- Cirurgias mamárias.
- Anamnese completa, dosagem de PRL, dosagem de TSH:
· Se o PRL for superior a 100mg/mL: provável etiologia tumoral, que deverá ser investi-
gada mais profundamente com raio x de sela túrcica, tomografia de crânio, ressonân-
Diagnóstico
cia magnética e campo visual;
· Se o PRL estiver entre 25 e 100mg/mL: procurar causas diversas, desde uso de medi-
camentos a outras doenças endócrinas e da parede torácica.
- Indicado a pacientes sintomáticas ou com tumor de hipófise de grande extensão (ma-
croadenoma). Pacientes assintomáticas com microadenomas de hipófise não têm indi-
cação de tratamento. Pode ser clínico, cirúrgico ou radioterápico:
· Clínico: boa resposta terapêutica na maioria dos casos. As drogas mais utilizadas são a
bromocriptina, com posologia diária e efeitos colaterais como tontura, cefaleia, náu-
seas, depressão, alucinações, hipotensão ortostática; e a cabergolina, com posologia
semanal e menor incidência de efeitos colaterais;
Tratamento · Cirúrgico: ressecção transesfenoidal seletiva, reservada aos casos de tumor de hipófi-
se extenso (macroadenoma) refratário ao tratamento ou pacientes com intolerância
a medicação. O tratamento cirúrgico pode implicar complicações como meningite,
diabetes insipidus, fístulas liquóricas e pan-hipopituitarismo;
· Radioterapia: casos de recidiva de tumores após ressecção cirúrgica, redução de tu-
mores irressecáveis refratários a medicação e para os casos de tumores mistos. Seus
resultados são menos eficientes do que o tratamento cirúrgico, com resposta lenta e
insatisfatória na maioria dos casos.

Figura 1 - Hiperprolactinemia
268 SIC Resumão revalida

4 Endometriose

1. Introdução
É caracterizada pela presença de tecido en-
dometrial funcionante (glândula e/ou estroma
endometrial) fora da cavidade endometrial.
A adenomiose é a presença de tecido en-
dometrial no interior das fibras miometriais.
São locais em que os implantes podem de-
senvolver-se: ovários, ligamentos uterossacros,
trompas, bexiga, sigmoide, reto, peritônio pél-
vico, fígado, pulmões, pleura e outros. A endo-
metriose pélvica é a mais frequente. Ovários,
ligamentos uterossacros e fundo de saco de
Douglas são as localizações preferenciais. Na
pelve, os ovários constituem o local com maior
Figura 1 - Locais mais comuns
frequência de aparecimento da endometriose.

2. Etiologia
Há muitas hipóteses etiopatogênicas para explicar o desenvolvimento da doença estrogênio-
dependente, porém nenhuma está provada. A mais aceita propõe que o ambiente hiperestrogêni-
co seja fator predisponente ao seu desenvolvimento. As 2 teorias mais aceitas são:
ͳͳ Teoria da menstruação retrógrada: pela menstruação retrógrada, células endometriais
viáveis se aderem e penetram nas estruturas pélvicas. No entanto, 90% apresentam
menstruação retrógrada e apenas 10% delas apresentam endometriose, o que sugere
fatores genéticos e ambientais envolvidos;
ͳͳ Teoria da metaplasia celômica: baseia-se na transformação metaplásica espontânea das cé-
lulas mesoteliais derivadas do epitélio celômico localizado no peritônio e na pleura. Explica
a presença de tecido endometrial em localização fora da pelve, como na pleura, no pulmão
ou no joelho. Não há evidências clínicas que comprovem essa teoria.
São fatores de risco: antecedente familiar de 1º grau com endometriose, menarca precoce
e nuliparidade. São fatores protetores: o uso de contraceptivos hormonais, multiparidade e 1ª
gestação precoce (<18 anos).

3. Fatores de risco
Por ser uma doença estrogênio-dependente, todos os fatores que propiciam o ambiente hipe-
restrogênico podem favorecer o aparecimento de endometriose.
Os principais fatores de risco são antecedente familiar de 1º grau com endometriose, menarca
precoce, nuliparidade, gestação tardia, ciclos menstruais curtos, fluxo menstrual aumentado, es-
tenose cervical, raça branca e usuária de dispositivo intrauterino.
ginecologia e obstetrícia 269

Além dos fatores de risco, existem os fatores protetores: multiparidade, uso de contracepti-
vos hormonais, tabagismo, 1ª gestação precoce e prática de exercícios regulares.

4. Quadro clínico
Consiste em dismenorreia secundária de intensidade progressiva, dor pélvica crônica, dispa-
reunia de profundidade, infertilidade, alterações intestinais e urinárias durante a menstruação.
O exame físico pode ser normal ou revelar retroversão uterina fixa, dor ao toque vaginal com-
binado, aumento anexial, nódulos em fundo de saco vaginal ou espessamento dos ligamentos
uterossacros. A intensidade da dor não está relacionada à quantidade de tecido endometrial pre-
sente na cavidade abdominal, à extensão ou ao estadiamento da doença, mas relaciona-se ao
grau de invasão, às aderências e aos tipos de lesões.

5. Diagnóstico
A - Exames laboratoriais
CA-125 (sensibilidade e especificidade medianas; bom para seguimento evolutivo de casos já
confirmados), proteína sérica amiloide A (mais relacionada aos casos de acometimento intestinal),
outras provas de atividade inflamatória (PCR), anticardiolipinas IgM e IgG.

B - Exames de imagem
Ultrassonografias pélvica e transvaginal com preparo intestinal prévio, tomografia de pelve,
ressonância magnética, ecocolonoscopia.

C - Videolaparoscopia
É o padrão-ouro para o diagnóstico (acompanhada de confirmação anatomopatológica), pois
permite o estadiamento e o tratamento. O exame anatomopatológico é o único diagnóstico para
confirmação da endometriose.

- Tipos de lesões à videolaparoscopia

Figura 2 - Lesão negra: resulta do sangramento e da retenção de sangue


270 SIC Resumão revalida

Figura 3 - Lesão vermelha (“em chama de vela”): endometriose ativa circundada por estroma; lembra a superfície endometrial

Figura 4 - Lesão branca cicatricial

D - Diagnóstico diferencial
Miomatose, adenomiose, moléstia inflamatória pélvica crônica, torção ovariana, gestação ec-
tópica, infecção do trato uterino.
ginecologia e obstetrícia 271

E - Classificação
A Sociedade Americana de Medicina Reprodutiva classifica a endometriose de acordo com os
achados intraoperatórios.

Figura 5 - Classificação americana da endometriose

6. Tratamento
São objetivos alívio dos sintomas, melhora da qualidade de vida, evitar a progressão da doen-
ça e tratamento da dismenorreia e da infertilidade.
272 SIC Resumão revalida

A - Clínico
Contraceptivos orais ou injetáveis, progestogênios na 2ª fase do ciclo, derivados androgêni-
cos como danazol e gestrinona, implante subcutâneo de liberação de progestogênios e sistemas
intrauterinos de liberação de progestogênios (promover a decidualização dos focos de endome-
triose e alcançar um estado de hipoestrogenismo), análogos do GnRH (diminuir a secreção das
gonadotrofinas hipofisárias, determinando um estado de hipogonadismo hipogonadotrófico).

B - Cirúrgico
Cauterização de focos, lise de aderências, investigação da permeabilidade tubária, ressecção
de endometriomas ovarianos. Não é raro as pacientes necessitarem de mais de 1 abordagem
videolaparoscópica. As cirurgias laparotômicas também podem ser realizadas para diagnóstico
e tratamento, porém têm a desvantagem de limitar a visualização das cavidades pélvica e ab-
dominal. Em casos de manejo difícil e de a paciente já ter prole constituída, pode-se optar pela
ooforectomia bilateral com ou sem histerectomia.

C - Terapia de reposição hormonal


Pode ser realizada em pacientes com antecedentes de endometriose. No entanto, se a meno-
pausa for de causa cirúrgica (ooforectomia), devem-se aguardar de 18 a 24 meses para iniciá-la,
intervalo destinado à atrofia de eventuais focos residuais.
D - Alguns efeitos colaterais do tratamento medicamentoso
Cefaleia, mastalgia e alteração ponderal (contraceptivos hormonais), efeitos virilizantes (deri-
vados androgênicos), sintomas de síndrome do climatério (agonistas de GnRH). Pode haver perda
de massa óssea considerável com a utilização destes últimos. O tempo de uso dessas drogas não
deve ultrapassar 6 meses.

E - Prevenção de recidiva
A forma mais eficaz de prevenir ou retardar a recidiva é a gravidez, sendo que a maior chance
de ocorrer é de até 1 ano a partir da cirurgia. Caso esse não seja o desejo da paciente, os anticon-
cepcionais hormonais e o DIU de progesterona permitem um controle razoável.

7. Endometriose e infertilidade
Estadiamento
Estadios mais
Alterações anatômicas causadas pelas aderências ou cistos endometrióticos
avançados
Distúrbios ovulatórios (com altas taxas de anovulação), síndrome do folículo luteini-
Estadios iniciais zado não roto, alterações nas concentrações de substâncias inflamatórias e células no
fluido peritoneal, capazes até de fagocitar gametas e embriões

Não raramente, a obtenção de gestação é difícil, necessitando-se de técnicas de reprodução


assistida de baixa e alta complexidades. Nos estadios III e IV, a fertilização in vitro é a técnica mais
adequada para tentativa de gestação.

8. Endometriose e câncer
A doença aumenta o risco de câncer de ovário em 2 a 3 vezes, principalmente dos tumores
epiteliais de baixo grau.
ginecologia e obstetrícia 273

5 Climatério

1. Introdução e propedêutica
A - Climatério
É o período da vida da mulher em que há um declínio acentuado e progressivo da função ova-
riana, tendendo ao fim do patrimônio folicular e da capacidade reprodutiva. É a transição da vida
reprodutiva para a não reprodutiva.

B - Síndrome do climatério
É o conjunto de sinais e sintomas que podem acompanhar essa fase e que está relacionado à
queda da função ovariana.

C - Alterações fisiológicas
A redução do pool de folículos ovarianos leva à secreção de menores concentrações de estro-
gênios, especialmente o estradiol, e de inibina e ao aumento dos níveis de FSH. Ocorre crescimen-
to relativo da função do estroma ovariano, que, sob influência contínua do LH, produz androgê-
nios. Em algumas mulheres, surgem características virilizantes nessa fase (pelos no mento e no
buço, engrossamento da voz etc.).

Figura 1 - Concentração de hormônios femininos ao longo da vida

D - Sintomas típicos da síndrome climatérica


Palpitações, cefaleias, tonturas, insônia, parestesias, diminuição da memória, sintomas de-
pressivos, irritabilidade, diminuição da libido, osteoporose, aterosclerose, mastalgia, secura va-
ginal, dispareunia, prurido vulvar, corrimento, sangramento uterino anormal, polaciúria, disúria,
metrorragia, síndrome uretral, incontinência urinária, ostealgia, artralgia, mialgia, atrofia epidér-
mica, queda de pelos e cabelos, fogachos.

E - Pacientes que têm risco potencial de desenvolvimento ou piora da sua pato-


logia cardiovascular
Portadoras de insuficiência coronariana prévia, hipertensão arterial, diabetes mellitus, obesi-
dade, tabagismo ou com antecedente de doença cerebrovascular ou vascular periférica.
274 SIC Resumão revalida

F - Principais tumores malignos ginecológicos que acometem essa faixa etária


Mama (solicitar mamografia periodicamente – conforme rotina preconizada pelo sistema
BI-RADS®), colo de útero (solicitar colpocitologia oncótica periodicamente), corpo uterino e ová-
rios (solicitar ultrassonografia transvaginal periodicamente), vulva, vagina e cólon (solicitar colo-
noscopia, se julgar necessário).

G - Densitometria óssea
Em decorrência da depleção estrogênica, há aumento na velocidade da reabsorção óssea em
detrimento da formação. Nota-se aumento do remodelamento ósseo, com perda progressiva. É
necessário o acompanhamento por densitometrias ósseas sucessivas.

H - Pacientes de maior risco para osteoporose


Baixa estatura, magras e brancas; com antecedente familiar de osteoporose; que ingerem
álcool excessivamente; tabagistas; sedentárias; usuárias de medicamentos como anticonvulsi-
vantes, antiácidos e hormônios de tireoide; portadoras de outras patologias sistêmicas, como
insuficiência renal crônica, diabetes, síndrome de má absorção, hiperparatireoidismo, hipertireoi-
dismo, gastrectomia e anastomoses intestinais.

I - Rotina propedêutica básica


Anamnese + exames físicos completos, glicemia de jejum, colesterol total e frações, triglicé-
rides, colpocitologia oncótica, mamografia, ultrassonografia transvaginal, densitometria óssea.
Podem ser necessários colposcopia com biópsia dirigida, ultrassonografia das mamas e teste
de progesterona.

2. Tratamento
Visa à remissão dos principais sintomas, à prevenção de eventos mórbidos e à melhora da quali-
dade de vida.

A - Orientações dietéticas
Com a queda das necessidades energéticas e as alterações hormonais na pós-menopausa, há
aumento no risco de a mulher vir a desenvolver obesidade e doenças associadas, como dislipidemia,
diabetes e doenças cardiovasculares. Logo, é necessário estimular uma dieta benéfica, com vege-
tais, frutas, leite desnatado, carnes magras, entre outros alimentos saudáveis; além disso, se faz
necessária a ingestão de cálcio e vitamina D.

B - Orientações com relação aos hábitos de vida


Diminuir e evitar o abuso de bebidas alcoólicas e o tabagismo e praticar atividade física regular.

C - Indicações de Terapia de Reposição Hormonal (TRH)


Síndrome do climatério com sintomas pronunciados e prevenção da osteoporose.

D - Esquemas de TRH disponíveis


Vias oral, transdérmica, intramuscular, intrauterina e vaginal. Dá-se sempre preferência
aos estrogênios naturais (menor potencial para desencadear fenômenos tromboembólicos e
ginecologia e obstetrícia 275

alteração do perfil lipídico). É fundamental a associação de progestogênios quando a paciente


não é histerectomizada (a função da progesterona nos esquemas de TRH é exclusivamente
evitar a hiperplasia ou o câncer do endométrio).

E - Contraindicações à TRH
Sangramento vaginal de origem desconhecida, doença hepática aguda ou crônica, trombose
venosa profunda aguda, tromboembolismo agudo, câncer de mama ou de endométrio, endome-
triose, alterações congênitas do metabolismo lipídico.

F - Câncer de mama
O risco de câncer de mama aumenta após o uso consecutivo de TRH por período superior a 5
anos. A segurança do esquema terapêutico está diretamente relacionada à dose de hormônios
empregada. Recomenda-se sempre a menor dose necessária para o controle da sintomatologia,
pelo menor tempo possível.

G - Câncer de endométrio
Proteção com a adição obrigatória de progesterona ao esquema de TRH.

H - Moduladores seletivos dos receptores estrogênicos


Medicação de escolha para as pacientes com câncer de mama, porém requer vigilância cuida-
dosa do endométrio.

I - Tibolona
Ações estrogênica, progestogênica e androgênica. Propicia o alívio dos sintomas climatéricos,
atuando sobre a massa óssea e agindo favoravelmente sobre a libido. Requer os mesmos cuida-
dos de pacientes que utilizam terapia hormonal.

3. Tratamentos não hormonais

A - Utilização de fitoestrogênios
Sugere-se que os fitoestrogênios têm a capacidade de agir como antiestrogênios na pré-me-
nopausa e como estrogênios na pós-menopausa. Pesquisas com tal classe são recentes, por isso
muitos outros estudos são necessários para que se chegue a uma conclusão definitiva.

B - Tratamento dos sintomas vasomotores e psíquicos


Para mulheres com contraindicação ou intolerância à TRH ou para as que não desejam reali-
zar tal tratamento, pode-se prescrever drogas como dopaminérgicos, antidepressivos, sedativos,
vasomotores ou substâncias com ação no eixo hipotalâmico-hipofisário, com o objetivo de aliviar
os sintomas presentes na pós-menopausa.
276 SIC Resumão revalida

Figura 2 - Tratamento dos sintomas

6 Moléstia inflamatória pélvica aguda

1. Introdução
Trata-se de quadro infeccioso que acomete o trato genital superior feminino (acima do orifício
interno do colo de útero), podendo envolver endométrio, miométrio, tubas uterinas, ovários e
ainda disseminar-se para a cavidade pélvica. Não se incluem, na definição de Moléstia Inflamató-
ria Pélvica Aguda (MIPA), os processos infecciosos ou inflamatórios decorrentes de manipulações
cirúrgicas prévias ou do ciclo gravídico-puerperal.
Os agentes etiológicos mais importantes são Neisseria gonorrhoeae e Chlamydia trachoma-
tis. Além desses, há uma flora polimicrobiana característica da doença inflamatória pélvica: bac-
térias Gram positivas e Gram negativas aeróbicas e anaeróbicas.

2. Quadro clínico
Tende a ser mais florido e exuberante, com dor pélvica aguda, leucorreia purulenta e abun-
Gonococo
dante, febre e instalação mais abrupta dos sintomas.
Tende a ser mais insidioso e frustro, com sintomas de longo prazo e menor intensidade,
Clamídia muitas vezes revelados somente pelas consequências tardias de infertilidade por fator tu-
boperitoneal.
Bactérias presentes na vagina e no colo de útero, preferencialmente no período pós-mens-
A infecção é trual, quando as condições locais de pH, a abertura do orifício uterino e a contratilidade ute-
ascendente rina favorecem a dinâmica ascendente. Os agentes ascendem pela endocérvice, causando
endocervicite aguda, endometrite e salpingite.
ginecologia e obstetrícia 277

Se as fímbrias das tubas uterinas se ocluírem como meio de proteção, a infecção ficará res-
trita nesse ambiente, levando ao aparecimento de piossalpinge, no quadro agudo, ou hi-
Infecção da
drossalpinge, como consequência futura. Nos casos em que não houver tempo de as tubas
cavidade pélvica
se ocluírem, a infecção pode atingir a cavidade pélvica, desenvolvendo pelviperitonite, com
abscesso em fundo de saco de Douglas ou no tubo ovariano.
São vulvovaginites e/ou cervicites, uso de DIU (primeiros 20 dias após a inserção), faixa etá-
Fatores de risco
ria abaixo de 30 anos, promiscuidade sexual e baixo nível socioeconômico.
Diagnóstico É realizado com base nos sinais, sintomas e exames subsidiários.
É composto por dor pélvica, corrimento vaginal, febre, sangramento genital, dor à palpação
Quadro clínico uterina e/ou anexial ao toque bimanual, dor à mobilização do colo uterino e massa ou es-
pessamento anexial.
Compreendem leucograma, urocultura, provas de atividade inflamatória (VHS, proteína C
Exames subsidiá-
reativa), ultrassonografia pélvica e transvaginal, tomografia/ressonância magnética e video-
rios
laparoscopia da região pélvica, provas de função renal, hepática e coagulograma.
Compreendem vulvovaginites, cervicites, pólipos e endometriose, gestação ectópica, abor-
Diagnósticos
tamento séptico, apendicite, infecção do trato urinário ou digestivo, nefrolitíase e doenças
diferenciais
inflamatórias intestinais, como retocolite ulcerativa e doença de Crohn.

Há uma corrente que defende outra subdivisão da MIPA com critérios maiores, menores
e específicos:
Maiores Dor à palpação anexial, dor à mobilização do colo uterino, dor pélvica infrapúbica
Febre (>37,8°C), massa pélvica, secreção vaginal e/ou endocervical purulenta, leucocitose
ao hemograma, PCR elevada, mais de 5 leucócitos por campo de aumento na secreção de
Menores
endocérvice avaliada à microscopia, comprovação laboratorial de infecção cervical pelo go-
nococo, clamídia ou micoplasma
Evidência histopatológica de endometrite, presença de abscesso túbulo-ovariano ou em
Específicos
fundo de saco de Douglas aos exames de imagem, laparoscopia evidenciando MIPA

Classificação da MIPA
Leve Corrimento vaginal e dor pélvica, sem comprometimento sistêmico
Corrimento vaginal, dor pélvica e febre, mas sem evidência de abscesso ou co-
Moderada
leções
Mesmo quadro clínico anterior, com coleções e abscesso e/ou grave compro-
Grave
metimento sistêmico

3. Tratamento
- Tratamento ambulatorial com antibióticos: cobertura de flora polimicrobiana Gram
positiva e Gram negativa, aeróbica e anaeróbica. Há vários esquemas possíveis:
· Cefoxitina 2g IM ou ceftriaxona 250mg IM, em dose única + doxiciclina 100mg VO,
MIPA leve
12/12h, por 14 dias + probenecida 1g VO, em dose única;
· Ofloxacino 400mg VO, 12/12h, por 14 dias + clindamicina 450mg VO, 6/6h, ou metro-
nidazol 500mg VO, 12/12h, por 14 dias + doxiciclina 100mg VO, 12/12h, por 14 dias.
- Tratamento hospitalar – a flora a ser coberta é a mesma, porém com terapia in-
travenosa:
MIPA moderada ou · Cefoxitina, 2g IV, 6/6h, ou cefotetana 2g IV, 12/12h + doxiciclina 100mg IV ou VO,
grave 12/12h;
· Penicilina G cristalina, 4.000.000 a 5.000.000UI IV, 4/4h + gentamicina 1,5 a 2mg/kg IV
ou IM, 8/8h, ou amicacina 7,5mg/kg IV ou IM, 12/12h + metronidazol 500mg IV, 8/8h.
Monitorização clínica - A cada período de 48 a 72 horas;
e laboratorial - Se houver resposta insatisfatória: tratamento cirúrgico, se possível, por via laparoscópica.
Tratamento de
Ceftriaxona 250mg IM em dose única e doxiciclina 100mg VO, 12/12h, por 14 dias
parceiros sexuais
278 SIC Resumão revalida

4. Complicações
A complicação imediata mais comum é o abscesso tubo-ovariano. A complicação tardia mais
frequente é a infertilidade, além de aumentar as chances de uma gravidez ectópica.
Outras complicações podem ser algia pélvica crônica, hidrossalpinge e síndrome de Fitz-
-Hugh-Curtis.
Estágio I (leve)
- Endometrite e salpingite aguda sem peritonite;
- Tratamento: ambulatorial.
Estágio II (moderada sem abscesso)
- Salpingite aguda com peritonite (pelviperitonite);
- Tratamento: hospitalar (internação devida aos sinais peritoneais).
Estágio III (moderada com abscesso)
- Salpingite aguda com obstrução tubária ou abscesso tubo-ovariano ou abscesso pélvico;
- Tratamento: hospitalar (internação devido aos sinais peritoneais ou presença de abscesso).
Estágio IV (grave)
- Presença de abscesso tubo-ovariano roto ou sinais de choque séptico;
- Tratamento: hospitalar com o auxílio de intervenção cirúrgica (laparotomia).

7 Infertilidade conjugal

1. Definição
Trata-se da incapacidade de obter gestação após 12 meses de atividade sexual regular, bem
distribuída ao longo do ciclo, sem uso de nenhum método contraceptivo. Um casal normal tem
taxa de fertilidade em torno de 20% ao mês. Diferente de esterilidade, que seria a incapacidade
permanente para a concepção.

2. Infertilidades primária e secundária


Será considerada infertilidade primária quando o casal nunca tiver tido filhos, mesmo que um
dos parceiros desse casal já tiver filhos de outro relacionamento.

3. Causas

Figura 1 - Causas de infertilidade conjugal Figura 2 - Causas de infertilidade feminina


ginecologia e obstetrícia 279

Figura 3 - Causas de infertilidade masculina

4. Fator ovulatório
É a diminuição da capacidade ovulatória, que ocorre progressivamente com a idade, e dis-
túrbios ovulatórios por alterações hormonais (hipotalâmicas, hipofisárias, ovarianas, tireoidia-
nas ou adrenais).

5. Fator tuboperitoneal
São afecções que levam a obstrução tubária, impedindo a fecundação. As causas mais impor-
tantes são infecções pélvicas, endometriose e aderências.

Figura 4 - Fator tubário: hidrossalpinge à esquerda

6. Roteiro propedêutico
Hemograma, tipagem sanguínea, sorologias (sífilis, rubéola, hepatites B e C, HIV, HTLV), es-
permograma (2 amostras), ultrassonografias pélvica e transvaginal, histerossalpingografia, dosa-
gens hormonais (FSH, LH, estradiol, prolactina, TSH, T4 livre).
280 SIC Resumão revalida

Figura 5 - Sinéquias uterinas e obstrução tubária bilateral

7. Conforme a necessidade
Podem ser realizados histeroscopia para avaliação intracavitária, biópsia de endométrio (para
verificar ocorrência de ovulação e datação menstrual) e teste pós-coito (avaliar fator cervical –
hostilidade do muco cervical).

8. Tratamento direcionado ao fator diagnosticado, quando possível


Alterações hormonais devem ser corrigidas, obstruções anatômicas passíveis de correção de-
vem ser desfeitas, e focos de endometriose devem ser tratados. No homem, fatores anatômicos
(como varicocele) podem ser corrigidos cirurgicamente.

9. Técnicas de baixa complexidade (in vivo)


ͳͳ Indução da ovulação com coito programado ou inseminação intrauterina;
ͳͳ Tratamento das causas ovulatórias, fator masculino leve e endometriose estadios I e II.
As condições para indicação de tais procedimentos são cavidade uterina íntegra, pelo menos
1 tuba normal, e sêmen adequado.
A indução da ovulação pode ser realizada com o uso de citrato de clomifeno (50 a 100mg/d,
do 3º ao 7º ou do 5º ao 9º dias do ciclo), gonadotrofinas de mulher menopausada (75 a 150mg/d a
partir do 2º dia do ciclo) ou gonadotrofina purificada ou recombinante (50 a 150UI/d).

10. Técnicas de alta complexidade (fertilização in vitro)


ͳͳ Fertilização in vitro clássica e com injeção intracitoplasmática de espermatozoide (ICSI);
ͳͳ Tratamento das causas por fator tuboperitoneal, fator masculino grave e endometriose.
ginecologia e obstetrícia 281

Figura 6 - ICSI

11. Complicações do tratamento


Podem surgir diversas complicações, desde cirúrgicas (quando se tenta esse tipo de aborda-
gem) até a síndrome de hiperestímulo ovariano. Vale lembrar que a gemelaridade é considerada
complicação desse tipo de tratamento.

8 Ética em Ginecologia e Obstetrícia,


abortamento legal e abuso sexual

1. Introdução
O médico deve exercer as suas atividades profissionais sempre considerando princípios éticos,
atitudes corretas e cautelosas, visando melhorar a condição do paciente e evitar sofrimentos
desnecessários.

2. Princípios fundamentais recomendados pela International


Federation of Gynecology and Obstetrics em 1994 para toco-
ginecologistas
A mulher tende a ser vulnerável por circunstâncias sociais, culturais e econômicas. O princípio
da autonomia enfatiza o importante papel que a mulher deve adotar na tomada de decisões,
com respeito aos cuidados de sua saúde. Os médicos devem observar a vulnerabilidade feminina,
solicitando expressamente sua opção e respeitando suas opiniões.
Quando for solicitada decisão relativa a cuidados médicos, as mulheres deverão receber
informações completas sobre as várias opções terapêuticas disponíveis, incluindo seus riscos
e benefícios.
282 SIC Resumão revalida

Quando um médico não for capaz ou não desejar praticar um ato por razões extramédicas,
ou contrárias ao que diz a sua consciência, deverá fazer todo o possível para oferecer adequada
referência.
Devido à natureza íntima dos cuidados obstétricos e ginecológicos, há a necessidade de pro-
teger a confidencialidade da paciente.
Além de oferecer cuidados ginecológicos e obstétricos, os profissionais têm a responsabilida-
de de considerar o bem-estar da mulher e a sua satisfação psicológica.
Ao oferecer os cuidados de saúde às mulheres, o princípio da justiça requer que sejam trata-
das com igual consideração, não importando a sua situação socioeconômica.

3. Consentimento esclarecido
O Código de Ética Médica, no Art. 46, veta ao médico efetuar qualquer procedimento sem
esclarecimento e consentimento prévios do paciente ou do responsável legal, salvo em caso de
risco de morte iminente.
O consentimento informado é um documento assinado pelo paciente ou pelo seu represen-
tante legal consentindo a realização de determinado procedimento diagnóstico ou terapêutico.
Ele garante a autonomia do paciente, delimitando a responsabilidade do médico que realiza os
procedimentos.
O termo também é obrigatório para inférteis e doadores. Apesar disso tudo, o que legitima o
ato médico não é a sua permissão, mas a sua indiscutível necessidade.

4. Prontuário médico
O prontuário médico é o conjunto de documentos padronizados, ordenados e concisos, desti-
nados ao registro de todas as informações referentes aos cuidados médicos e paramédicos pres-
tados.
O paciente pode ter acesso ao seu documento, se assim o desejar, solicitando cópias. A
família ou o seu representante legal têm o mesmo direito, caso o enfermo seja menor de idade
ou incapaz; caso contrário, deve haver autorização expressa por ele. Em caso de óbito ou na
ausência de condições de a paciente expressar tal autorização, as informações do prontuário
devem ser dadas sob a forma de laudo médico ou cópias.
O prontuário original não deve ser entregue a ninguém, somente cópias, e nenhuma outra
entidade tem direito a acessá-lo.

5. Segredo médico
Trata-se de um tipo de segredo profissional pertencente ao paciente. O médico só pode revelá
-lo em situações especiais, como justa causa, dever legal ou autorização expressa do paciente.

6. Abortamento
O abortamento é uma situação com a qual o médico é confrontado no exercício da especiali-
dade de Ginecologia e Obstetrícia. No Brasil, é permitido em apenas 3 situações: gravidez decor-
rente de estupro, risco de morte materna e fetos anencefálicos.
ginecologia e obstetrícia 283

Nos casos de estupro, são necessários autorização ou consentimento da gestante ou do res-


ponsável legal, consentimento informado, gestação inferior a 20 semanas.
Nos casos de gestação que implique risco de morte materna, são necessários avaliação multi-
profissional de, no mínimo, 2 médicos, consentimento informado e que essa seja a mais adequada
maneira de preservar a saúde da gestante.
O diagnóstico de anencefalia deve ser feito por exame ultrassonográfico realizado a partir da
12ª semana de gestação e deve conter:
I - Duas fotografias, identificadas e datadas: uma com a face do feto em posição sagital; a ou-
tra, com a visualização do polo cefálico no corte transversal, demonstrando a ausência da calota
craniana e de parênquima cerebral identificável.
II - Laudo assinado por 2 médicos, capacitados para tal diagnóstico.
A paciente tem o direito de interromper a gravidez, independente do tempo de gestação.
Em casos de abortamento ilegal, o médico deve manter o sigilo profissional e isentar-se de
comunicar o fato às autoridades responsáveis.

7. Violência sexual
A Convenção Interamericana para prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher (con-
venção de Belém do Pará – ONU) considera violência contra a mulher “todo ato baseado no gê-
nero que cause morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto na esfera
pública, quanto privada”.
A violência sexual repercute na saúde física – desde o risco de contaminação por Doenças
Sexualmente Transmissíveis (DSTs), entre elas, o HIV, até gravidez indesejada – e na saúde mental
da pessoa. É preciso entender que para quem sofreu tal crime o simples fato de ter de procurar o
sistema de saúde e/ou delegacia de polícia já é um agravo resultante dessa violência.
Para o atendimento de mulheres que sofreram violência sexual, deve ser definido local espe-
cífico, preferentemente fora do espaço físico do pronto-socorro ou da triagem, a fim de garantir a
necessária privacidade durante a entrevista e os exames. Para as avaliações clínica e ginecológi-
ca, é necessário espaço físico correspondente a um consultório médico. Os procedimentos para o
abortamento previsto por lei devem ser realizados em local cirúrgico adequado.
Os dados obtidos durante a entrevista, nos exames físico e ginecológico, resultados de exa-
mes complementares e relatórios de procedimentos devem ser cuidadosamente registrados no
prontuário.
É necessário que o serviço de saúde realize exame físico completo, exame ginecológico, coleta
de amostras para diagnóstico de infecções e coleta de material para identificação do provável
autor(a) da agressão, e que seja preenchida a “Ficha de Notificação e Investigação de Violência
Doméstica, Sexual e/ou Outras Violências”.
Em casos de gravidez, suspeita ou confirmada, deve-se considerar a demanda da mulher ou
da adolescente, identificando se manifesta ou não desejo de interromper a gravidez.
Não há impedimento legal ou ético para que o(a) médico(a) ou outro(a) profissional de saú-
de preste a assistência que entender necessária, incluindo o exame ginecológico e a prescrição
de medidas de profilaxia, tratamento e reabilitação. A gravidade da circunstância e os riscos da
violência sexual impõem à mulher o rigoroso cumprimento da atenção em saúde. A assistência à
saúde da pessoa que sofre violência sexual é prioritária, e a recusa infundada e injustificada de
atendimento pode ser caracterizada ética e legalmente como omissão.
284 SIC Resumão revalida

Após o atendimento médico, se a mulher tiver condições, poderá ir à delegacia para lavrar o
Boletim de Ocorrência Policial, prestar depoimento ou submeter-se a exame pelos peritos do Ins-
tituto Médico-Legal. Se, por alguma razão, não for mais possível a realização dos exames periciais
diretamente pelo Instituto Médico-Legal, os peritos poderão fazer o laudo de forma indireta, com
base no prontuário médico. Assim, os dados sobre a violência sofrida e suas circunstâncias, bem
como os achados do exame físico e as medidas instituídas, devem ser cuidadosamente descritos
e registrados em prontuário.
O Boletim de Ocorrência Policial registra a violência para o conhecimento da autoridade poli-
cial, que determina a instauração do inquérito e da investigação. O laudo do Instituto Médico-Le-
gal é um documento elaborado para fazer a prova criminal. A exigência de apresentação desses
documentos para atendimento nos serviços de saúde é incorreta e ilegal.
O atendimento de crianças e adolescentes em situação de violência sexual se submete aos
mesmos fundamentos éticos e legais. A assistência à saúde do menor de 18 anos deve observar
o princípio de sua proteção. Se a revelação dos fatos for feita para preservá-lo de danos, estará
afastado o crime de revelação de segredo profissional.

Métodos de anticoncepção de emergência hormonal


Métodos Doses Vias Observações
Levonorgestrel 0,75mg de levonorgestrel por comprimido Oral 2 comprimidos, dose única
1ª escolha 1,5mg de levonorgestrel por comprimido Oral 1 comprimido, dose única
2 comprimidos, a cada 12
Anticonceptivos hormonais orais combinados com 0,05mg
Método de Yuzpe Oral horas; total de 4 compri-
de etinilestradiol e 0,25mg de levonorgestrel por comprimido
midos
4 comprimidos a cada 12
Anticonceptivos hormonais orais combinados com 0,03mg
2ª escolha Oral horas; total de 8 compri-
de etinilestradiol e 0,15mg de levonorgestrel por comprimido
midos

Comparado ao levonorgestrel, o regime de Yuzpe apresenta maior taxa de falha.


A profilaxia das DSTs não virais em mulheres que sofreram violência sexual visa aos agen-
tes mais prevalentes e de repercussão clínica relevante. Está indicada nas situações de expo-
sição com risco de transmissão dos agentes, independentemente da presença ou da gravida-
de das lesões físicas e da idade da mulher.

Profilaxia das DSTs não virais em adultos e adolescentes com >45kg não gestantes
Vias de administra-
Medicações Apresentações Posologias
ção
Penicilina G 2.400.000UI (1.200.000 em cada nádega), dose
1.200.000UI IM
benzatina única
Ceftriaxona 250mg IM 250mg, dose única
Azitromicina 500mg VO 2 comprimidos, dose única

Profilaxia das DSTs não virais em gestantes, crianças e adolescentes com <45kg
Vias de administra-
Medicações Apresentações Posologias
ção
Penicilina G ben- Frasco/ampola com 150.000UI, 50.000UI/kg (dose máxima
IM
zatina 300.000UI, 400.000UI >2.400.000UI), dose única
250mg (acompanha diluente
Ceftriaxona IM Aplicação de 125mg (1mL)
de 2mL)
600mg/15mL ou 20mg/kg (dose máxima: 1g),
Azitromicina VO
900mg/22,5mL dose única
ginecologia e obstetrícia 285

Alternativa para a profilaxia das DSTs não virais


Medicações Adultos Crianças/adolescentes
50mg/kg/d, VO, 6/6h/d (sífilis/cla-
Estearato de eritromicina* 500mg VO, 6/6h/d (sífilis), ou 7 dias (clamídia)
mídia)
Ciprofloxacino** 500mg VO, dose única Contraindicação
* Pode acarretar significativos efeitos colaterais, como a intolerância gastrintestinal.
** Contraindicado a grávidas.

A imunoprofilaxia contra a hepatite B está indicada a casos de violência sexual nos quais ocor-
ra exposição a sêmen, sangue ou outros fluidos corpóreos do agressor.

Abordagem sorológica da hepatite B


HBsAg Anti-HBc IgM Diagnósticos Condutas
Infecção aguda (há, pelo menos, 15
(+) (+) Repetir HBsAg e anti-HBc IgM em 6 meses.
dias)
- Realizar em 15 dias:
· Anti-HBc IgM:
* (+) infecção aguda. Repetir HBsAg e anti
-HBc IgM em 6 meses;
Infecção precoce (há, pelo menos, * (-) fazer anti-HBc total;
(+) (-)
15 dias) ou hepatite crônica
* Se +, indica infecção crônica.
· Anti-HBs:
* (+) cura;
* (-) doença crônica.
(-) (+) Infecção aguda Repetir HBsAg e anti-HBc IgM em 6 meses.
Negativo ou não produz anticorpo Fazer vacinação e imunoglobulina humana anti
(-) (-)
(condição rara) -hepatite B (IGHAHB).

Mulheres imunizadas contra hepatite B, com esquema vacinal completo, não necessitam de
reforço ou de IGHAHB.

Vacina anti-hepatite B
- Aplicação intramuscular em deltoide;
0, 1 e 6 meses após a violência sexual
- Imunização ativa.
IGHAHB
- 0,06mL/kg;
- Aplicar IM em glúteo; Dose única
- Imunização passiva.

Critérios para recomendação de profilaxia pós-exposição sexual ao HIV


Recomendada
Violência sexual com penetração vaginal e/ou anal desprotegida com ejaculação sofrida há menos de 72 horas
Individualizar decisão
Penetração oral com ejaculação
Não recomendada
- Penetração oral sem ejaculação;
- Uso de preservativo durante toda a agressão;
- Agressor sabidamente HIV negativo;
- Violência sofrida há mais de 72 horas;
- Abuso crônico pelo mesmo agressor.
286 SIC Resumão revalida

Figura 1 - Uso do teste rápido para anti-HIV no agressor

Drogas e combinações preferenciais e alternativas


Classes de antirretroviral 1ª escolha 2ª escolha
ITRN Zidovudina (AZT) + lamivudina (3TC) Tenofovir* + 3TC
IP/r Lopinavir/ritonavir (LPV/r) Tenofovir
ITRN: inibidor da transcriptase reversa análogo de nucleosídeo ou nucleotídeo; IP/r: Inibidor da Protease associado a ritonavir.
* Contraindicação da protease associada a ritonavir.

Doses de antirretroviral para profilaxia da transmissão do HIV


para mulheres adultas e adolescentes*
Apresenta-
1ª escolha Vias de administração Posologias
ções
1 comprimido a cada 12 horas (
AZT/3TC 300mg/150mg VO
café e jantar)
2 comprimidos a cada 12 horas
LPV/r 200mg/50mg VO
(café e jantar)
* Esse esquema pode ser utilizado na gestação.

Profilaxia do HIV para crianças


Medicamen- Vias de administra-
Apresentações Posologias
tos ção
Solução oral, 10mg/mL, 180mg/m2/dose – 12/12h. Dose máxima:
AZT VO
cápsula 100mg 300mg/dose
4mg/kg/dose – 12/12h. Dose máxima:
Solução oral, 10mg/dL,
3TC VO 150mg – 12/12h, >12 anos: 150mg – 12/12h
comprimido 150mg
ou 300mg em dose única diária
Solução oral, Crianças <2 anos: 300mg/m2 – 12/12h,
80mg/20mg/mL crianças >2 anos: 230mg/m2 – 12/12h.
LPV/r VO
(LPV/r), comprimido Dose máxima: 200mg – 12/12h, adoles-
200mg/50mg (LPV/r) centes: 400mg – 12/12h
Observações: superfície corpórea (m2) = (peso x 4) + 7/peso + 9; peso em kg = 2 x idade + 8.
ginecologia e obstetrícia 287

Acompanhamento laboratorial após violência sexual


Admissão 2 semanas 6 semanas 3 meses 6 meses
Contéudo vaginal x x
Sífilis (VDRL ou RPR) x x x x
Anti-HIV x x x x
Hepatite B (HBsAg) x x x
Hepatite C (anti-HCV) x x x
Transaminases x x
Hemograma x x

O Código Penal não exige qualquer documento para a prática do abortamento nesse caso,
a não ser o consentimento da mulher. Assim, aquela que sofre violência sexual não tem o dever
legal de noticiar o fato à polícia.

9 Doenças benignas da mama

1. Mastites agudas
- Em geral, são associadas à lactação, sendo o agente mais frequente o Staphylococcus aureus
e, em menor frequência, o Staphylococcus epidermidis e o Streptococcus;
Características
- A principal forma de contaminação é a inoculação da bactéria a partir da orofaringe do lacten-
principais te, por meio de fissuras do mamilo ou pelos orifícios ductais;
- Mais comum em primíparas, geralmente entre a 2ª e a 5ª semanas de puerpério.
- Ingurgitamento mamário;
Fatores de risco - Fissuras;
- Má higiene local.
- Dor local;
- Febre;
Quadro clínico
- Hiperemia;
- Edema.
- Suspensão das mamas;
- Drenagem do leite excedente;
- Limpeza adequada do mamilo;
- Não suspensão da amamentação;
- Compressas frias;
- Analgésicos e Anti-Inflamatórios Não Hormonais (AINHs);
Tratamento - Antibióticos (cefalosporina de 1ª geração);

- Se houver abscesso mamário, recomendam-se:


· Drenagem cirúrgica;
· Cultura de secreção;
· Adequação de esquema antibiótico de acordo com resultado da cultura;
· Pode-se recomendar suspensão da amamentação.
288 SIC Resumão revalida

2. Mastites crônicas
A - Abscesso periareolar recidivante (recorrente)
- Em 90% dos casos, ocorre em tabagistas entre a 4ª e a 5ª décadas de vida;
- Não estão associadas à lactação;
Características - Ocorre por metaplasia escamosa e obstrução, por queratina, dos ductos terminais das mamas;
principais
- Há estase das secreções mamárias, dilatação dos ductos terminais e colonização destes por
bactérias, predispondo à infecção crônica e recorrente, com formação de abscessos que fistu-
lizam para a região periareolar e drenam espontaneamente.
Etiologia Gram negativos e anaeróbios
Diagnóstico Abscesso com fístula periareolar, febre baixa e linfonodomegalia dolorosa axilar
- Abandono do tabagismo;
- AINH;
Tratamento
- Antibióticos (metronidazol + cefalosporinas de 1ª ou 2ª gerações);
- Ressecção cirúrgica dos ductos acometidos e do trajeto fistuloso.

B - Mastite da ectasia ductal


Acomete mulheres por volta da 6ª década de vida, em decorrência da dilatação crônica dos ductos
Características terminais infra-areolares, seguida de acúmulo de detritos da descamação do próprio ducto e sub-
principais sequente rotura da parede ductal, com extravasamento desse material para o tecido intersticial
adjacente, ocasionando uma reação inflamatória. Não há concomitância de quadro infeccioso.
- Clínico: tumoração dolorosa retroareolar, com fibrose e retração da papila:
· Mamografia revela aumento da densidade na região retroareolar e pode ou não mostrar
Diagnóstico
ductos dilatados;
· A ultrassonografia mostra ductos com ectasia.
AINH e cuidados locais. A cirurgia fica restrita aos casos com tumor associado e no caso de não
Tratamento
haver resposta ao tratamento clínico.

Causas das mastites


Infecciosas
- Mastite aguda lactacional;
- Abscesso subareolar recidivante;
- Mastite tuberculosa;
- Mastite luética;
- Infecções:
· Virais: herpes-zóster;
· Bacterianas: actinomicose;
· Fúngicas: criptococose, blastomicose, esporotricose.
Não infecciosas
- Mastite da ectasia ductal;
- Doença de Mondor;
- Granuloma lipofágico;
- Mastite por óleo orgânico;
- Doenças sistêmicas: sarcoidose, lúpus eritematoso sistêmico, diabetes mellitus, infarto espontâneo.
ginecologia e obstetrícia 289

3. Lesões benignas da mama – cistos mamários

Características - Mais frequentes na pré-menopausa (4ª década de vida);


principais - Cisto simples com frequência de malignidade <1%.

Quadro clínico Lesões arredondadas, circunscritas e móveis, consistência amolecida ou endurecida à palpação

Ultrassonogra- Melhor exame para diferenciar cistos de lesões sólidas na mama (lesão circunscrita e anecoica
fia de mamas com reforço acústico posterior)

- Conduta expectante na maioria dos casos. Indicar punção aspirativa por agulha fina nos
casos de cistos dolorosos, que causam prejuízo estético, ou para diferenciação de lesões
sólidas;
Tratamento - Cirurgia na suspeita da citologia quando há recidiva após 2 ou 3 punções; ocorre massa re-
sidual pós-punção, e estão presentes vegetação intracística (não puncionar), cistos gigantes
(volume aspirado >50mL), líquido sanguinolento na punção, achados mamográficos suspeitos
após esvaziamento do cisto.

4. Lesões benignas da mama – fibroadenoma


- Tumor sólido benigno mais frequente das mamas; acomete mulheres na faixa etária entre 20 e
30 anos;

- Na maioria das vezes, são lesões unilaterais, móveis, bem delimitadas, ovais ou lobuladas, de
consistência fibroelástica, que atingem dimensões de até 3cm;
Características
principais - Quando ocorrem em mulheres mais jovens, com crescimento rápido e tamanho superior a
5cm, deve-se suspeitar da variante juvenil do fibroadenoma;

- São lesões hormônio-dependentes e expressam receptores para estrogênio e progesterona;

- A transformação do próprio fibroadenoma em lesão maligna é rara (0,1%).

Diagnóstico Ultrassonografia das mamas, punção por agulha fina ou biópsia por agulha grossa

- A conduta pode ser expectante, com seguimentos clínico e ultrassonográfico semestral nos
primeiros 2 anos, em mulheres jovens;
Tratamento - Se a paciente se sentir ansiosa, se houver prejuízo estético ou se a paciente apresentar fatores
de risco para desenvolvimento de câncer de mama, recomenda-se a exérese do fibroadeno-
ma, independente da idade.

5. Lesões benignas da mama – papiloma


- Tumor benigno secretor causado por proliferação dos ductos maiores, subareolares, em geral
Características único e podendo obstruir a luz do ducto;
principais
- Mais comum entre mulheres na pré-menopausa.

- Manifesta-se como fluxo papilar hemorrágico, espontâneo e intermitente. Pode haver espes-
samento retroareolar palpável. É a maior causa de fluxo hemorrágico;
Quadro clínico - Em 10% dos casos, ocorre papilomatose ou síndrome do papiloma múltiplo (lesões múltiplas
e periféricas, e fluxo papilar menos frequente). A papilomatose tem maior associação a carci-
noma ductal in situ e lesões atípicas da mama.

Tratamento Exérese cirúrgica do ducto acometido


290 SIC Resumão revalida

6. Dor mamária – alteração funcional benigna das mamas


- Principal causa de dor mamária na menacma, antigamente chamada displasia mamária;
Características - Estrogênio e prolactina são os principais hormônios envolvidos (retenção hídrica e de sódio,
principais e produção de mediadores inflamatórios);
- Não aumenta o risco de câncer de mama.
- Dor cíclica e intumescimento mamário, principalmente pré-menstrual, bilateral;
Quadro clínico
- Fatores emocionais que potencializam a reação dolorosa.
- Metilxantinas e cafeína;
Fatores - Estresse;
agravantes - Tabagismo;
- Hipotireoidismo.
Quadro histo-
Fibrose, proliferação epitelial leve e microcistos
lógico
Diagnóstico Especialmente clínico
- Orientação verbal, esclarecimento e tranquilização da paciente, sintomáticos (ácido gama-
linoleico, analgésicos, AINH, diuréticos, ansiolíticos e anticoncepcional oral, se desejar anti-
Tratamento concepção);
- Casos graves: antiestrogênicos (tamoxifeno, danazol).

7. Dor mamária – ectasia ductal e dor de origem extramamária


- Dilatação dos ductos com consequente acúmulo de secreção e inflamação periductal;
- Geralmente assintomática e pode ser causa de dor não cíclica;
Ectasia ductal - Acomete mulheres na pós-menopausa;
- O tratamento é realizado com a administração de analgésicos e anti-inflamatórios;
- Raramente há necessidade de exérese cirúrgica dos ductos acometidos.

Dor de origem - Costocondrite, neurite intercostal, radiculopatia cervical, angina, dispepsia e pleurite;
extramamária - O tratamento é específico, de acordo com a patologia.

10 Câncer de mama

1. Introdução
É a principal causa de morte por câncer entre as mulheres no Brasil, com maior incidência após
os 50 anos.
Para que surja um tumor de mama, é necessária uma alteração no DNA da célula, e, em 10 a
15% das vezes, essa alteração é herdada das gerações anteriores, porém nem todas as mulheres
com as células geneticamente alteradas desenvolvem a doença.
São genes envolvidos no processo de carcinogênese mamária: BRCA-1, BRCA-2, p53, c-erb-B2,
bcl-2, RAS, c-myc.
ginecologia e obstetrícia 291

O principal fator de promoção envolvido no carcinoma de mama é o estrogênio, que não causa
lesão genética, mas estimula a proliferação de células previamente alteradas.
As metástases são principalmente na mama contralateral, nos ossos, na pleura, nos pulmões,
no fígado e no cérebro.

Principais fatores de risco


- Sexo feminino;
- Idade entre 45 e 55 anos;
- Menarca precoce;
- Menopausa tardia;
- Nuligestas;
- Terapia de reposição hormonal por mais de 5 anos;
- Anticoncepcional oral por mais de 5 anos;
- Radiação ionizante;
- Câncer de mama prévio;
- Lesões mamárias com atipia;
- Antecedente familiar de 1º grau (mãe, irmã e filha) de câncer de mama;
- Presença de BRCA-1 e BRCA-2 mutados;
- Obesidade;
- Dieta rica em gordura;
- Ingestão alcoólica.

Câncer de mama Riscos familiares de 1º grau


Unilateral após 55 anos 1,5 vez
Unilateral entre 45 e 55 anos 2,5 vezes
Unilateral antes de 45 anos 4 vezes
Bilateral na pós-menopausa 6 vezes
Bilateral na pré-menopausa 8 vezes

Rastreamento
Idade Indicações
35 a 39 anos Mamografia basal
40 a 49 anos Anual ou bienal
≥50 anos Anual

2. Carcinoma ductal in situ


- Células tumorais intraductais, sem evidência, à microscopia, de invasão da membrana basal. Na maioria das
vezes, detectadas na forma subclínica, por meio de mamografia;
- Pode manifestar-se como fluxo papilar espontâneo, uniductal e unilateral, tipo “água de rocha” ou sanguinolento,
ou, ainda, como nódulo palpável;
- Mamografia mostra microcalcificações pleomórficas, lineares ou indeterminadas ou, mais raramente, nódulo ou
assimetrias focais. Diagnóstico por meio de biópsia por agulha grossa (core biopsy), biópsia a vácuo (mamoto-
mia) ou biópsia cirúrgica;
- Punção Aspirativa por Agulha Fina (PAAF) permite a identificação de células neoplásicas, mas não a diferencia-
ção entre tumor in situ e invasivo;
- O tratamento deve ser adequado a cada caso, a depender das características anatomopatológicas da lesão.
292 SIC Resumão revalida

3. Carcinoma lobular in situ


- Lesão de risco para o desenvolvimento de carcinoma invasor, e não de uma neoplasia propriamente dita;
- Sem sintomatologia ou achado mamográfico característico e é, na maioria das vezes, detectado quando realiza-
da biópsia por outra lesão ou sintoma suspeito;
- O risco de desenvolvimento de carcinoma invasor é de 10 a 25%, podendo ser ductal ou lobular, homo ou contralateral
à lesão;
- O seguimento com exame clínico deve ser semestral, e a mamografia, anual, complementada com ultrassonogra-
fia de mamas e ressonância magnética, se necessário;
- O tamoxifeno profilático deve ser oferecido, considerando os riscos e os benefícios dessa medicação.

4. Carcinoma ductal invasivo


- É o tipo mais frequente dentre os tumores malignos de mama (75%);
- Quadro clínico: o mais comum é o nódulo único, de consistência pétrea, pouco móvel e indolor. Os nódulos tor-
nam-se clinicamente evidentes a partir de 1cm e podem ser detectados precocemente por meio de exames de
rastreamento. Outros sintomas são retração ou abaulamento de pele e fluxo papilar semelhante ao do carcino-
ma ductal in situ; os gânglios axilares tornam-se aumentados, endurecidos e coalescentes quando comprome-
tidos pela neoplasia;
- A mamografia típica mostra nódulo de alta densidade radiológica, espiculado, com ou sem microcalcificações,
possível distorção do parênquima. À ultrassonografia, os nódulos são hipoecogênicos, irregulares ou arredonda-
dos, com margens indefinidas, e produzem sombreamento acústico posterior;
- Diagnóstico histológico: core biopsy (punção aspirativa por agulha de fragmento), mamotomia, biópsia incisional
ou excisional e exame de congelação ou parafina;
- Principais focos de metástases: ossos, pleura, pulmão e fígado.

5. Carcinoma lobular invasivo


- Difere do carcinoma ductal invasivo por apresentar células pequenas e monótonas em arranjo linear tipo “fila
indiana”. Apresenta alta porcentagem de multifocalidade e bilateralidade;
- Apresenta-se como espessamento mal definido, muitas vezes de difícil percepção ao exame clínico;
- Mamografia mostra área de assimetria focal e distorção do parênquima. A ultrassonografia pode mostrar área
de alteração textural;
- Diagnóstico anatomopatológico: pelos mesmos métodos descritos.

6. Carcinoma inflamatório
- O mais agressivo dos tumores malignos da mama. Caracteriza-se por evolução rápida e prognóstico desfavorá-
vel, com mortalidade de aproximadamente 90% em 1 ano se não tratado com quimioterapia;
- Em 50% dos casos, há envolvimento axilar no momento do diagnóstico e, em 25%, metástases a distância. Re-
presenta de 1 a 3% dos tumores malignos da mama;
- Caracteriza-se por aumento súbito do volume mamário, dor, eritema, espessamento difuso da pele (peau d’oran-
ge) e calor local;
- Mamografia mostra espessamento da pele e aumento difuso da densidade mamária;
- Tratamento: quimioterapia neoadjuvante (a doença é considerada sistêmica desde o diagnóstico), cirurgia e/ou
radioterapia e quimioterapia adjuvantes.
ginecologia e obstetrícia 293

Figura 1 - Carcinoma inflamatório

7. Doença de Paget
- Caracteriza-se por alterações eczematosas da aréola e da papila, geralmente é unilateral e corresponde a até 4%
dos casos de câncer de mama;
- As células são in situ, frequentemente associadas ao carcinoma ductal in situ;
- O diagnóstico é clínico, e a confirmação é feita por meio das biópsias da pele e da aréola;
- O prognóstico é mais relacionado à lesão subjacente do que à extensão da doença na pele;
- Tratamento: é realizado de acordo com o tipo e o estadiamento do tumor associado. Caso haja apenas a lesão
areolopapilar, a quadrantectomia central poderá ser realizada.

8. Fatores prognósticos (todas as neoplasias de mama)


- O status axilar é o principal fator prognóstico (pacientes com 1 a 3 linfonodos comprometidos têm prognóstico
melhor do que aquelas com 4 ou mais);
- Tamanho do tumor;
- Tipo histológico (piores prognósticos: lobular invasivo e ductal invasivo; melhores: coloide e medular);
- Graus histológico e nuclear (quanto mais indiferenciado, pior é o prognóstico);
- Receptores hormonais (melhor prognóstico: tumores receptores positivos para estrogênio e progesterona);
- C-erb-B2 (elevada expressão desse gene tem maior chance de não responder adequadamente à quimioterapia).

9. Tratamento
Tratamento cirúrgico envolvendo cirurgias radicais (mastectomias) e conservadoras
Retirada de toda a glândula mamária, músculos peitoral maior e me-
Mastectomia radical à Halsted
nor e esvaziamento axilar dos níveis I, II e III de Berg
Mastectomia radical modificada à Patey Preservação do músculo peitoral menor
Mastectomia radical modificada Preservação de ambos os músculos peitorais e realização somente
à Auchincloss-Madden do esvaziamento dos gânglios da base da axila (nível I)
Exérese exclusiva do tumor (quase nunca utilizada nos casos de tu-
Tumorectomia
mores malignos das mamas)
Forte semelhança à tumorectomia; retirada de pouco de tecido ma-
Setorectomia
mário ao redor do tumor
Retirada do tumor com parte da mama ao redor, fragmento de pele
e esvaziamento dos 3 níveis axilares (indicada para tumores de até 2
Quadrantectomia clássica
a 2,5cm ou em tumores maiores, desde que as margens de tecido ao
redor estejam livres deles)
- Sempre que se faz qualquer cirurgia conservadora, é mandatória a radioterapia (tumores malignos);
- O tratamento adjuvante é realizado com radioterapia, quimioterapia e hormonoterapia.
294 SIC Resumão revalida

11 Exames complementares em Mastologia

1. Métodos de imagem
A - Mamografia

Figura 1 - Procedimento mamográfico

Este é o único exame comprovadamente eficaz para


o rastreamento de lesões da mama, que apresenta sen-
sibilidade de 85%, e é melhor para as mamas lipossubs-
tituídas do que para as mamas densas. Com os progra-
mas de rastreamento, houve diminuição de até 30% da
mortalidade por câncer de mama. Atualmente, a mamo-
grafia digital apresenta maior acurácia na identificação
de microcalcificações, sobretudo em mamas densas.

Figura 2 - Mamografia normal (BI-RADS® 1)

A mamografia de rastreamento deve


ser realizada em 4 incidências (2 em cada
mama): craniocaudal e oblíqua medio-
lateral. Quando necessário, podem ser
utilizadas incidências adicionais, com-
pressão localizada e/ou magnificação de
Figura 3 - Mamografia com mamas densas (BI-RADS® 0)
determinada área.
ginecologia e obstetrícia 295

Com o intuito de padronizar os laudos mamográficos, o Colégio Americano de Radiologia criou


o BI-RADS® (Breast Imaging-Report and Data System), que atualmente está na sua 4ª edição.
Este consiste na classificação dos achados radiológicos em categorias, conferindo risco de malig-
nidade para cada uma. Preferencialmente, deve ser dada uma classificação de BI-RADS® para o
exame completo, incluindo mamografia e ultrassonografia, quando necessário.

Classificação de BI-RADS®
0 Inconclusivo Necessita de avaliação adicional.
Exame nor-
1 Há 0% de chance de malignidade.
mal
Há 0% de chance de malignidade; são os nódulos hialinizados, calcificações arredondadas,
Achados
“em pipoca”, “em leite de cálcio” (dos cistos), “em casca de ovo”, linfonodos intramamários,
2 mamográficos
assimetria global e microcalcificações puntiformes regulares de distribuição difusa ou dis-
benignos
persa. Conduta: mamografia anual.
Menos de 2% de malignidade; são as microcalcificações agrupadas, puntiformes e regula-
res, redondas ou ovais, as assimetrias focais e os nódulos sólidos não palpáveis, circunscri-
tos, não calcificados, com forma redonda, oval ou macrolobulada. A recomendação é que
Achados pro-
os achados BI-RADS® 3 sejam reavaliados após 6 meses (somente no lado afetado). Se não
3 vavelmente
houver modificação no período, repete-se o exame, agora bilateral, após 6 meses e, diante
benignos
da estabilidade da lesão, um novo controle pode ser realizado depois de 12 meses (24 após
o 1º exame). Após 2 anos de estabilidade, pode-se mudar a categoria para BI-RADS® 2. A
categoria 3, à ultrassonografia, inclui cistos complicados e aglomerado de microcistos.
- 2 a 90% de chance de malignidade; são os nódulos sólidos, regulares, porém palpáveis (4A
– suspeita leve); os nódulos com margens indeterminadas (4B – suspeita moderada); e as
microcalcificações irregulares (4C – suspeita forte). As microcalcificações são:
Achados - Com distribuição regional, segmentar, linear ou focal (não as tipicamente benignas), mes-
4 mo que apresentem morfologia uniforme;
suspeitos
- Agrupadas, algumas com morfologia diferente das demais;
- Puntiformes, de tamanhos variados, agrupadas;
- Agrupadas, que não estavam presentes em exame anterior.
Achados
90% ou mais de chance de malignidade; são os nódulos espiculados, as microcalcificações
5 altamente
“em letra chinesa” e as de distribuição segmentar ou linear.
suspeitos
Achados já
confirmados Os nódulos espiculados do carcinoma ductal invasivo e as microcalcificações pleomórficas
6
por biópsia típicas do carcinoma ductal in situ são classificados como BI-RADS® 6.
como malignos

Figura 4 - BI-RADS® 1
296 SIC Resumão revalida

Figura 5 - (A) e (B) fibroadenomas parcialmente calcificados; (C) calcificações vasculares e (D) gânglio intramamário (BI-RADS® 2)

Figura 6 - Massa não palpável, redonda, oval ou lobulada e circunscrita: (A) fibroadenoma e (B) cisto simples (BI-RADS® 3)

Figura 7 - Mamografia com nódulo espiculado de mama (setas – BI-RADS® 5)


ginecologia e obstetrícia 297

B - Ultrassonografia e ressonância nuclear magnética


A ultrassonografia de mama e a ressonância nuclear magnética têm papéis complementares
no diagnóstico das lesões mamárias. Enquanto a 1ª tem grande importância na diferenciação de
tumores sólidos e císticos, a 2ª é o melhor método para a avaliação de próteses mamárias. Nos
últimos anos, alguns trabalhos mostraram a eficácia da ressonância na identificação de multifo-
calidade dos tumores, sobretudo em mamas densas.
Principais indicações de ultrassonografia mamária
- Rastreamento de câncer em jovens (com risco elevado) ou em mamas densas;
- Avaliação de nódulos evidenciados na mamografia, principalmente para verificar a presença de conteúdo líquido;
- Guiar a aspiração de cistos;
- Orientação de biópsia de nódulos por agulha grossa (core biopsy) ou mamotomia;
- Diagnósticos de ginecomastia;
- Avaliação de mastite, para verificar a presença de abscessos;
- Avaliação de mamas após cirurgia seguida de radioterapia ou reconstrução mamária.

As imagens suspeitas à ultrassonografia são aquelas sólidas, que provocam sombra acústica
posterior, sendo irregulares ou microlobuladas e que não apresentam seu maior eixo paralelo à
pele. Essas são lesões caracterizadas como BI-RADS® 5 à ultrassonografia.
A ressonância avalia não apenas a morfologia das lesões, mas também seu padrão de capta-
ção de contraste. Dessa forma, são suspeitas as lesões que apresentam uma rápida captação e
wash out do contraste.

Figura 8 - Ultrassonografia de mama: (A) cisto simples – imagem anecoica, com reforço acústico posterior – e (B) cisto complexo
com imagem sólida no interior do cisto (seta)

Risco de malignidade, tipo de lesões e plano de tratamento de acordo com as categorias BI


-RADS® para ultrassonografia:
Mamografia (se ainda não foi realizada), ressonância magné-
Categoria 0 Necessita de avaliação adicional. tica e comparação com exames anteriores
Negativa, com chance de 5:10.000 de
câncer. Deve haver continuado ras- Sem achados ultrassonográficos (é necessário haver correla-
Categoria 1 treamento mamográfico anual para ção com mamografia)
mulheres de 40 anos ou mais.
- Cistos simples;
Achado benigno (não canceroso); tra- - Cistos com debris;
Categoria 2 ta-se do mesmo valor estatístico e - Cistos septados;
plano de seguimento da categoria 1. - Linfonodo intramamário;
- Alterações pós-cirurgia ou radioterapia.
298 SIC Resumão revalida

- Nódulo hipoecoico sólido:


· Ovalado com eixo anteroposterior menor do que o trans-
verso;
· Ecotextura homogênea;
Achado provavelmente benigno, · Parede regular ou com até 3 lobulações;
havendo menos de 2% de chance de · Com ou sem reforço posterior;
Categoria 3 · Sem atenuação posterior.
câncer. Solicitar nova mamografia
em 6 meses. - Nódulo hipoecoico:
· Áreas com ecotextura mista, que possam representar abs-
cesso;
· Nódulo com escassos ecos, que pode representar cisto
com líquido espesso ou nódulo sólido.
- Nódulo hipoecoico, sólido:
· Ovalado, com eixo anteroposterior maior do que o trans-
verso (4C);
· Ecotextura heterogênea ou mista (4B);
Anormalidade suspeita, com possi- · Parede com mais de 3 lobulações (4B);
bilidade de câncer em 25 a 50% dos · Parede irregular (4B);
Categoria 4 casos, requer biópsia; é dividida em · Com sombra posterior (4B).
4A – suspeita leve –­ , 4B – suspeita - Nódulo com características morfológicas de categoria 3, po-
moderada e 4C – suspeita forte. rém palpável (4A);
- Cisto com vegetação no interior (4B);
- Áreas irregulares com ecotextura heterogênea, sem história
de cirurgia (4C).
Altamente sugestiva de malignida-
de, sempre deve ser biopsiada, pois
a chance de câncer varia de 75 a Nódulo hipoecoico, sólido, com eixo anteroposterior maior do
Categoria 5 99%; nos casos de biópsia negativa que o transverso, ecotextura heterogênea, parede irregular,
para câncer, ela deve ser repetida, com sombra posterior
pois há possibilidade de ter sido fei-
ta fora da área suspeita.
Categoria 6 Já apresenta diagnóstico de câncer. Avaliação de resposta à quimioterapia

2. Métodos de biópsia
Basicamente, são 3 os métodos de bióp-
sia de lesões da mama. Podem ser realiza-
dos sem o auxílio de outros métodos de
imagem. No caso das lesões palpáveis ou
das não palpáveis, podem ser realizados
sob orientação mamográfica (estereota-
xia) ou ultrassonográfica. Toda lesão clas-
sificada à mamografia como BI-RADS® 4
ou 5 deve ser avaliada por meio de estudo
anatomopatológico. Principalmente tratan-
do-se de lesões com microcalcificações, é
imprescindível radiografar a peça retirada
a fim de verificar se contém a lesão.
Figura 9 - Método PAAF (Punção Aspirativa
A - Punção biópsia por agulha fina por Agulha Fina)

Trata-se de um método simples e de baixo custo que consiste na aspiração, com a utilização de
seringa e agulha, de células das lesões. O estudo citológico é realizado e permite avaliar a caracte-
rística das células retiradas, mas não permite diferenciação entre tumores in situ e invasivos. Está
indicada no esvaziamento de lesões císticas das mamas ou na avaliação de nódulos sugestivos
de fibroadenomas.
ginecologia e obstetrícia 299

B - Core biopsy ou punção biópsia por agulha grossa

Figura 10 - Core biopsy

O método é feito com uma pistola apropriada na qual é acoplada uma agulha de calibre su-
perior à agulha de PAAF. Permite a retirada de fragmentos de tecido, podendo, assim, distinguir
entre tumores in situ e invasivos. Deve ser realizada com anestesia na pele, o que não é neces-
sário no caso da PAAF. Está mais indicada no caso de nódulos, visto que, para microcalcificações,
seu valor preditivo negativo é muito baixo, já que a amostra é muito pequena. Sendo assim, pode
não ser representativa.

C - Mamotomia
Trata-se do método mais recente, que consiste na retirada de fragmentos maiores do que os
da core biopsy, por meio da utilização de agulha de maior calibre, acoplada a um sistema a vácuo.
Tem a vantagem de apresentar menos sangramento e, por retirar fragmentos maiores de tecido,
tem melhor sensibilidade no caso de microcal-
cificações (pois fragmentos muito pequenos
podem não conter microcalcificações). Além
disso, a mamotomia permite a retirada de nó-
dulos de 1 a 1,5cm de diâmetro, poupando a pa-
ciente de ser submetida a procedimento cirúr-
gico, nos casos de nódulos benignos. Também
é necessária anestesia local. Sendo assim, está
mais indicada para a biópsia de microcalcifica-
ções e pequenos nódulos, que podem ser com-
pletamente retirados com esse procedimento.
Alguns resultados anatomopatológicos,
quando por core biopsy ou mamotomia, ne-
cessitam de ampliação cirúrgica de toda a
área em questão, uma vez que podem não re-
presentar fielmente toda a lesão. É o caso de
alguns resultados: hiperplasia atípica, neopla-
sia intraepitelial lobular de padrão não clássi-
co, neoplasia intraepitelial lobular grau II ou
III, lesões papilíferas, cicatriz radiada, tumor
Figura 11 - Mamotomia
filoide, mucocele e lesão fibroepitelial com es-
troma hipercelular. Fonte: Megaimagem.
300 SIC Resumão revalida

12 Vulvovaginites e cervicites

1. Vaginose bacteriana

Agentes Flora polimicrobiana, com predomínio de Gardnerella vaginalis e anaeróbios

Queixas clí-
Corrimento acinzentado, fluido e de odor fétido, com piora pós-coito e pós-menstrual
nicas

Desequilíbrio da flora normal, com redução acentuada dos lactobacilos (bacilos de Döderlein) e
Etiopatogenia
intensa proliferação dos outros micro-organismos

pH vaginal >4,5

Branco-acinzentado, fluido, em quantidade discreta a moderada, sem sinais inflamatórios nas


Corrimento
paredes vaginais, ectocérvice ou vulva, porém muito fétido (odor de “peixe podre”)

- Presença de 3 dos 4:
· Características clínicas do corrimento;
Diagnóstico · Medida do pH vaginal >4,5;
· Exame a fresco do conteúdo vaginal com presença das células-chave (clue cells);
· Teste das aminas positivo (gota de KOH, liberação das aminas voláteis que têm odor fétido).

- Derivados imidazólicos;

- Metronidazol 2g VO, em dose única, ou 500mg VO, 12/12h, por 7 dias, associado a creme vaginal
Tratamento de metronidazol por 7 noites, quando os sintomas locais são muito intensos;

- Outras drogas: secnidazol 2g VO, em dose única, ou tinidazol 2g VO, em dose única;

- 1º trimestre de gestação: substituir metronidazol por ampicilina 500mg VO, 6/6h, por 7 dias.

Figura 1 - Vaginose bacteriana


ginecologia e obstetrícia 301

2. Candidíase vulvovaginal
Agente Candida albicans (90% dos casos) ou outras espécies
Prurido ou ardor vulvovaginal, corrimento branco grumoso, aderido às paredes vaginais, e
Queixas clínicas
vagina e vulva hiperemiadas
Etiopatogenia Intensa proliferação por esporulação do patógeno, causando leucorreia característica
pH vaginal Ácido (entre 3,5 e 4,5)
Período pré-menstrual, quando a concentração dos hormônios esteroides é máxima, com al-
Época preferencial
tas taxas de glicogênio, que se converte em ácido láctico, acidificando o meio vaginal
Branco ou branco-amarelado, grumoso, em placas aderentes, com aspecto “de leite talhado”
Corrimento
(o processo inflamatório é exuberante, com ardor, hiperemia e pruridos vaginais e vulvares)
Clínico (pode-se realizar o exame a fresco do conteúdo vaginal com microscopia óptica – vi-
sualização dos filamentos do fungo –; bacterioscopia com coloração pelo método de Gram,
Diagnóstico
com identificação das hifas e esporos que são Gram positivos; cultura para fungos em meio
de Sabouraud ou Nickerson)
- Evitar roupas íntimas de tecidos sintéticos, roupas muito justas ou úmidas por tempo prolongado;
- Alcalinização do meio vaginal com bicarbonato de sódio;
- Tratamento sistêmico: fluconazol 150mg VO, em dose única (recomendado pelo Centers for
Tratamento Disease Control and Prevention), itraconazol 200mg VO, 12/12h, por 1 dia, ou cetoconazol
400mg/d, durante 5 dias;
- Tratamento tópico: cremes vaginais de derivados imidazólicos (miconazol, clotrimazol, bu-
toconazol, terconazol e tioconazol), com aplicações noturnas, por 7 dias, ou óvulos em dose
única. Ou, ainda, nistatina utilizada por 10 a 14 dias.
Alta ocorrência de candidíase vaginal, devendo ser tratada. Recomendável que se evitem os de-
Na gravidez
rivados imidazólicos, podendo-se empregar medidas locais e tratamento tópico com nistatina

Figura 2 - Candidíase vaginal

3. Tricomoníase
Agente Trichomonas vaginalis
Corrimento vaginal abundante, amarelo-esverdeado, fétido, com sintomas irritativos locais e,
Queixas clínicas
eventualmente, disúria, polaciúria e dispareunia
Etiopatogenia Considerada doença sexualmente transmissível
pH vaginal >5
Época preferencial
Pós-coito ou período pós-menstrual
de aparecimento
Amarelo ou amarelo-esverdeado, abundante, fluido, bolhoso e fétido, acompanhado de sinais
Corrimento
inflamatórios exuberantes, como colpite e mucosa com “aspecto de framboesa” (tigroide)
Clínico (pode ser realizado o exame a fresco do conteúdo vaginal, evidenciando meio rico
Diagnóstico em leucócitos, podendo também ser vistos protozoários com flagelos, cultura em meio de
Diamond, PCR para Trichomonas)
302 SIC Resumão revalida

- Derivados imidazólicos sistêmicos para ampliar a cobertura também aos outros reservató-
rios, como o trato urinário;
- Metronidazol 2g VO, em dose única ou estendida para 500mg VO, 8/8h, por 5 a 7 dias;
- Associar tratamento tópico com metronidazol VV, por 7 noites consecutivas, quando a sin-
Tratamento
tomatologia for intensa;
- Opções: derivados imidazólicos, como secnidazol 2g VO, dose única, ou tinidazol 2g VO;
- Por ser uma doença sexualmente transmissível, o parceiro sexual deve ser sempre tratado,
recebendo o mesmo esquema do metronidazol, secnidazol ou tinidazol por via sistêmica.

Agentes causado-
O diagnóstico é feito pela coleta de secreção endocervical e culturas específicas ou PCR.
res de cervicites
A bacterioscopia visualiza diplococos Gram negativos intracelulares (no interior dos leucóci-
Gonococo
tos) aos pares; cultura realizada no meio específico de Thayer-Martin.
O isolamento em culturas celulares é considerado padrão-ouro. Alternativas à cultura: méto-
Clamídia dos de detecção de antígenos, por meio de anticorpos fluorescentes ou imunoensaios enzi-
máticos (imunofluorescência) ou PCR específica.
Os sintomas são inespecíficos, como prurido, corrimento vaginal purulento, disúria, urgência
Quadro clínico
miccional, dispareunia, sangramento intermenstrual ou pós-coito.
- Neisseria gonorrhoeae: ceftriaxona 250mg, IM em dose única, ou ciprofloxacino 500mg
VO, em dose única (áreas de alta resistência bacteriana). Outras opções terapêuticas: nor-
floxacino 800mg VO, em dose única, cefotaxima 1g VO, em dose única, penicilina benzatina
4.800.000UI, em dose única associada a probenecida 1g VO, tetraciclina 500mg VO, 6/6h,
Tratamento por 7 dias, tianfenicol 2,5g VO, em dose única (zonas de baixa resistência);
- Chlamydia trachomatis: doxiciclina 100mg VO, 12/12h, por 14 dias; opção: eritromicina
500mg VO, 6/6h, por 10 a 15 dias;
- Devido à alta prevalência de infecção coexistente por gonococo e clamídia, recomenda-se
sempre o tratamento combinado para os 2 agentes.

Figura 3 - Tricomoníase

4. Vulvovaginites não infecciosas


Vaginite atrófica
Causas Hipoestrogenismo, principalmente na menopausa e no pós-parto
Dispareunia, secura e prurido vaginal, mucosa vaginal pálida, seca, delgada e com diminui-
Sinais e sintomas
ção da rugosidade e elasticidade
Tratamento Estrogênio tópico e lubrificantes íntimos

Vaginose citolítica
Causas Elevação da população de lactobacilos e diminuição do pH vaginal
Sinais e sintomas Corrimento vaginal branco e grumoso, ardor e prurido genital
Tratamento Duchas ou banhos de assento com bicarbonato de sódio 2 a 3 vezes por semana
ginecologia e obstetrícia 303

13 Neoplasia intraepitelial cervical e lesões


pré-invasivas do colo de útero

1. Colo
O colo uterino é revestido por 2 tipos epiteliais distintos: epitélio pavimentoso estratificado,
envolvendo sua porção ectocervical ou vaginal, e epitélio cilíndrico simples (mucosa glandular),
revestindo o canal endocervical. A transição entre tais epitélios é a junção escamocolunar (JEC)
ou zona de transformação (área de maior suscetibilidade para o desenvolvimento de neoplasias).
O epitélio pavimentoso estratificado apresenta 3 extratos celulares distintos:
1 - Camada profunda: constituída por 2 tipos celulares – camada basal (células pequenas e
arredondadas) e camada parabasal (de células maiores, com núcleos grandes e vesiculosos).
2 - Camada intermediária: constituída por tipos celulares poligonais, citoplasma rico em glico-
gênio e núcleo de tamanho intermediário.
3 - Camada superficial: com células orangiófilas, núcleo picnótico, tão menor quanto mais ma-
duro o epitélio.
O epitélio escamoso é multiestratificado, composto de células basais de reposição com nú-
cleos arredondados ativos e citoplasma escasso, e situa-se diretamente sobre a membrana basal,
que separa o epitélio do tecido conjuntivo subjacente. As células das camadas mais superficiais
vão se tornando mais especializadas, diferenciadas para proteção, ou seja, núcleos picnóticos
inativos com citoplasmas abundantes ricos em glicogênio.
O epitélio glandular é constituído por camada única de células, com seu núcleo situado na
parte basal do citoplasma, sendo algumas dessas células ciliadas.
Ambos os epitélios estão separados do tecido conectivo subjacente por meio da membrana
basal, de grande importância no estudo e no prognóstico das neoplasias do colo.
A JEC corresponde ao encontro desses 2 tipos de epitélio e, ao exame físico especular, pode
apresentar-se evertida (fora do canal endocervical) ou invertidamente (dentro do canal endocer-
vical). A topografia da JEC é influenciada por múltiplos fatores, como faixa etária, paridade, anti-
concepção hormonal, traumatismo e infecções. A observação da JEC durante os exames gineco-
lógicos e colposcópico é fundamental, pois pode conter transformações celulares precursoras de
lesões cancerosas. Vale ressaltar que, na gestação, há maior exposição da JEC, fator que favorece
a indicação da citologia oncótica.
Ao exame ginecológico, divide-se o colo em ectocérvice e endocérvice. A ectocérvice com-
preende a parte do colo uterino que é visível ao exame especular, compreendida da borda interna
do orifício externo do colo até a junção deste com os fórnices vaginais, enquanto a endocérvice
corresponde ao canal endocervical. Desta forma, ectocérvice e endocérvice não se correlacionam
com um tipo específico de epitélio (estratificado ou glandular).
A zona de transformação representa a área de transição entre os 2 epitélios e é onde há a
transformação do epitélio colunar em pavimentoso estratificado por meio do processo de me-
taplasia. Portanto, essa é uma região histológica do colo mais suscetível à atuação de agentes
promotores de modificações celulares (como o papilomavírus – HPV), que, futuramente, podem
resultar em lesões pré-invasivas e mesmo invasoras do colo uterino.
304 SIC Resumão revalida

Figura 1 - Seguimento no caso de colpocitologia oncótica alterada

2. Neoplasias intraepiteliais cervicais


As NICs do colo uterino correspondem a um grupo de alterações da maturação celular restri-
tas ao epitélio (não invadem a membrana basal) e são graduadas segundo a proporção de células
imaturas atípicas e o grau de discariose.
Essas lesões são caracterizadas pelo aumento da relação núcleo–citoplasma, atipias nuclea-
res e mitoses e, geralmente, são acompanhadas de sinais citológicos indicativos de infecção pelo
HPV. Histologicamente, podem ser classificadas em 3 graus de gravidade: NIC I, II ou III. Por outro
lado, atualmente há tendência em agrupar tais lesões em 2 grandes categorias: lesões de baixo
grau (NIC I) e de alto grau (NIC II e III). Embora tal classificação sugira aspecto evolutivo entre
as NICs, tal padrão não é necessariamente observado. São classificações realizadas pelo exame
histopatológico proveniente da biópsia por colposcopia.

A - Etiologia/história natural

Figura 2 - Evolução/etiologia das lesões pré-malignas

Vários estudos mostram relação direta entre a presença do HPV e as NICs. Alguns tipos de
HPV agregam-se ao genoma celular e fazem com que as células se desviem de seu processo
natural de maturação, formando um novo tipo celular anárquico e displásico e iniciando a carci-
nogênese do colo uterino.
ginecologia e obstetrícia 305

Figura 3 - Roteiro para rastreamento utilizando citologia e teste de DNA-HPV

Existem, atualmente identificados, mais de 200 tipos diferentes de HPV. Quanto ao seu po-
tencial carcinogênico, podemos dividir os subtipos do HPV em 2 grandes grupos:
ͳͳ Baixo risco (grupo A): 6, 11, 42, 43, 44 – maior relação com condilomas;
ͳͳ Alto risco (grupo B): 16, 18, 31, 33, 35, 39, 45, 51, 52, 56, 58 – relação direta com NIC e carci-
noma invasor.
Resumo do HPV
- Está relacionado com, aproximadamente, 90% das NICs;
- Provoca o aparecimento de células coilocitóticas (hipercromasia nuclear, binucleação, atipia, formação de halo
ao redor do núcleo);
- Pode permanecer oculto (paciente assintomática), formar lesões condilomatosas (verrucosas) e lesões pré-neo-
plásicas (NICs) e neoplásicas;
- Pode incorporar o genoma viral às células, causando indiferenciação e mitoses, fenômeno ligado aos genes
E6 e E7;
- Os tipos de HPV de alto risco (grupo B) para associação ao câncer de colo uterino são 16, 18, 31, 33 e 45;
- Os tipos de HPV de baixo risco (grupo A) são o 6 e 11, mais relacionados aos condilomas.

B - Prevenção
Atualmente, são comercializados no Brasil 2 tipos de vacinas contra o HPV, com o objetivo de
prevenir a primoinfecção do colo uterino pelo vírus. O 1º tipo é denominado de bivalente (apenas
contra os subtipos de alto risco 16 e 18), e o 2º, de tetravalente (contra subtipos de alto risco 16 e
306 SIC Resumão revalida

18, assim como os de baixo risco 6 e 11). Elas conferem imunidade à mucosa vaginal baseada em
IgG, que deve evitar a penetração do vírus no ambiente intracelular. Preconizadas para meninas
entre 9 e 26 anos, antes do 1º contato sexual ou do 1º contato com o vírus, são realizadas em 3
doses, em um intervalo de 6 meses (zero, 2 e 6 meses).
As pesquisas mostram que essa imunização tem durabilidade de 5 a 10 anos, e o seguimento
no tempo poderá comprovar se efetivamente há diminuição da incidência de câncer de colo ute-
rino entre as mulheres imunizadas.

C - Classificação
NIC I
- Caracteriza-se pela substituição de menos de 1/3 da espessura do epitélio por células imaturas e atípicas;
- As alterações mais comuns observadas à citologia são:
· Grau leve de discariose;
· Presença de células superficiais com núcleos atípicos acompanhada de coilocitose (lesão sugestiva da infecção
pelo HPV);
· Quando coradas pela técnica de Papanicolaou, essas lesões apresentam células escamosas de núcleos gran-
des, hipercromasia e/ou halo citoplasmático de reforço.
NIC II
- Caracteriza-se por alterações celulares que ocupam até 2/3 da espessura do epitélio escamoso;
- Alterações mais comuns:
· Diferenciação celular incompleta nas camadas superiores;
· Células intermediárias encontradas na camada superficial com núcleos atípicos.
- Ao exame de Papanicolaou, observam-se células escamosas atípicas menores do que as células superficiais, com
características tintoriais de célula intermediária.
NIC III
- O distúrbio de maturação é mais extenso e caracterizado pela substituição total ou de pelo menos mais de 2/3
da espessura epitelial por células escamosas do tipo basal ou parabasal;
- Alterações:
· Alta relação núcleo-citoplasmática;
· Hipercromasia;
· Mitoses atípicas;
· Contornos celulares atípicos.
- As células (basais ou parabasais) com essas alterações dispõem-se ao longo do epitélio sem qualquer organi-
zação, verticalizadas, mimetizando a disposição que assumem na camada basal de epitélios normais. Quando
este último comportamento é identificado, a lesão assume aspecto dito basaloide;
- O exame colpocitológico (Papanicolaou) permite a identificação de células imaturas e atípicas de núcleos
nus e volumosos, com cromatina disposta “em sal e pimenta”. Essa característica foi considerada típica dos
carcinomas in situ.

D - Diagnóstico
O diagnóstico das NICs é baseado no tripé colpocitologia, colposcopia e exame anatomopato-
lógico. A colpocitologia já passou por diversas classificações desde 1942, quando foi inicialmente
apresentada. Em 1998, surgiu a 1ª edição de Bethesda, cuja mudança primordial foi a alteração das
conhecidas “classes de Papanicolaou”, até então utilizadas, por uma nova nomenclatura que consi-
derava diversos aspectos: adequação do material coletado, idade da paciente, data da última mens-
truação, gestação, presença de hemorragia, uso de hormônios e quaisquer outras informações que
pudessem gerar alterações no resultado da citologia. Apesar de mais detalhista, a classificação de
Bethesda está sujeita a inúmeras críticas (difícil reprodutibilidade, desconhecimento por parte da
ginecologia e obstetrícia 307

população médica em geral). Sua última revisão foi feita em 2001 e é atualmente adotada. Ela pouco
difere da última, publicada em 1991, sendo que a mudança conceitual importante entre elas foi a
substituição do termo “diagnóstico” por “interpretação” ou “resultado”, enfatizando que a citologia
oncótica pela coloração de Papanicolaou não é um diagnóstico definitivo, mas sim uma triagem
para, se necessário, posterior confirmação com análise anatomopatológica realizada em material
de biópsia coletada na colposcopia.
Mantém-se a classificação principal:
ͳͳ Lesões intraepiteliais de baixo grau: LSIL;
ͳͳ Lesões intraepiteliais de alto grau: HSIL.
As células atípicas de significado indeterminado, na classificação de 1991 denominadas AS-
CUS, e agora apenas ASC, foram subdivididas em 2 categorias: ASC-US e ASC-H, em que a segun-
da é uma lesão que não podemos descartar (de alto grau).
O termo AGUS, de 1991, foi substituído por AGC (células glandulares atípicas) e inclui-se na
categoria de Adenocarcinoma In Situ (AIS) endocervical.

Classificação citológica de Papanicolaou, 1942


Classe I Epitélio normal
Classe II Alterações inflamatórias
Classe III Displasias
Classe IIIa Leve
Classe IIIb Moderada
Classe IIIc Acentuada
Classe IV Carcinoma in situ
Classe V Carcinoma invasor

ASCUS é a sigla em inglês para “atipias de células escamosas de significado indeterminado”


e consiste em alguns achados citológicos não malignos, possivelmente associados a micro-orga-
nismos agressores, como os causadores de vulvovaginites e o próprio HPV. Quando o aspecto
citológico é mais grave, diz-se ASC-H, ou seja, atipias em células escamosas em que não se pode
afastar lesão de alto grau. Há várias condutas possíveis quando se encontra ASC-US na citopato-
logia, sendo a mais adotada a repetição da colpocitologia oncótica em até 6 meses, mas também
não estando errado enviar a paciente diretamente para colposcopia com biópsia, se necessário.
Por outro lado, no caso de diagnóstico citopatológico de ASC-H, a realização de colposcopia com
biópsia imediatamente é mandatória.
AGUS e AGC são a mesma sigla inglesa para “atipias de células glandulares de significado in-
determinado”, que podem ou não ter relação com neoplasia intraepitelial, mas são consideradas
mais graves do que a ASC-US. Têm maior risco de associar-se à lesão intraepitelial escamosa de
alto grau (NIC II e NIC III) identificada no anatomopatológico, motivo pelo qual requerem colpos-
copia com biópsia imediata.
Ao longo do tempo, a classificação de Papanicolaou foi sendo modificada, e as 5 classes ori-
ginais foram se relacionando com processos reativos, pré-neoplásicos e neoplásicos, como já
descrito; evolução decorrente de melhores entendimentos sobre biologia tumoral, que permitiu,
inclusive, estabelecer o conceito de NIC e a associação do câncer de colo uterino a HPV.
Sempre que se encontra um achado citológico alterado, propõe-se a investigação com a col-
poscopia, cujas principais indicações são clínicas (alterações do exame físico) ou citológicas. A
função mais importante da colposcopia é identificar a lesão e delinear sua extensão para uma
biópsia dirigida.
308 SIC Resumão revalida

O exame consiste na visualização do colo e da vagina por meio de colposcópio, que permite
aumento de 6 a 40 vezes da imagem da zona analisada. Tal exame é realizado com o auxílio de
soluções, como soro fisiológico, ácido acético a 2 e a 5% e solução iodada de lugol.
A partir da aplicação da solução de ácido acético, surgirão as figuras colposcópicas, algumas
compatíveis com a normalidade (achados colposcópicos normais) e outras sugestivas de altera-
ções no epitélio estudado (achados colposcópicos anormais), a saber:
1 - Epitélio acetobranco: plano, micropapilar ou microinvolução.
2 - Pontilhado.
3 - Mosaico.
4 - Leucoplasia.
5 - Vasos atípicos.
Nas lesões pré-cancerosas, o que se nota é a acentuação das figuras descritas como os acha-
dos colposcópicos anormais, tornando-as distintas de simples alterações inflamatórias/infeccio-
sas. Por meio da colposcopia, não podemos determinar com exatidão o grau de lesão, mas so-
mente supor sua existência e determinar a topografia correta para exploração mais detalhada e
eventual tratamento.
Uma vez realizada a biópsia dirigida, respeitando os preceitos colposcópicos, encaminha-se o
material para estudo anatomopatológico para posterior definição do tratamento.

E - Tratamento
Evidências atuais sugerem que as lesões de alto grau (NIC II e NIC III) devem ser tratadas com
métodos excisionais (conização), ao passo que lesões de baixo grau (NIC I) permitem conduta mais
conservadora, pelo fato de até 70% das NICs I poderem regredir espontaneamente, contanto que
haja adequação dos métodos diagnósticos e adesão da paciente.

Evidências nas quais os princípios do tratamento são baseados


- A gravidade da lesão é definida pela histopatologia (não se pode concluir a partir do exame de Papanicolaou;
é necessária a confirmação histológica);
- Uso de técnicas de biologia molecular (captura híbrida, PCR para HPV) pode ser útil, mas não indica trata-
mento;
- Tratar sempre as lesões de alto grau por métodos excisionais (NIC II e NIC III), pois se sabe que, caso não sejam
tratadas, 1 em cada 10 evoluirá para câncer invasor em algum momento durante a vida da mulher;
- Quanto às lesões de baixo grau (NIC I), as evidências sugerem que regressões espontâneas devem ocorrer e
que esse grupo não está necessariamente associado à progressão para o câncer invasor ao longo do tempo.
O tratamento conservador exige adesão da paciente e disponibilidade de material para acompanhamentos
colpocitológico e colposcópico.

O tratamento é baseado nos métodos excisionais (retirada da área acometida) ou de destrui-


ção local. Os métodos excisionais são biópsia por bisturi, conização do colo uterino com laser ou
CAF e histerectomia total abdominal ou vaginal.
Os métodos de destruição local são:
ͳͳ Crioterapia;
ͳͳ Eletrocoagulação;
ͳͳ Laser;
ͳͳ CAF.
ginecologia e obstetrícia 309

Figura 4 - Tratamento pós-colposcopia (após citologia alterada)

Se há suspeita de câncer invasor, o método excisional deve ser o de escolha. Caso a lesão pe-
netre no canal endocervical, está contraindicado o método de destruição local. No caso de discor-
dância dos exames citológicos, colposcópicos e anatomopatológico, indica-se o método excisional.
Desta maneira, deve-se lembrar de priorizar sempre os métodos excisionais, pois, além de
retirarem as lesões, permitem a análise das peças para histologia e verificação de margens.
Caso se opte por métodos de destruição local, deve-se responder afirmativamente às pergun-
tas seguintes:
ͳͳ A colposcopia foi satisfatória?
ͳͳ A pesquisa do canal endocervical foi negativa?
ͳͳ Os limites da lesão estão bem definidos?
Se as condições citadas foram preenchidas afirmativamente, pode-se realizar o tratamento
com destruição local. Caso contrário, opta-se pelo método excisional.

Tratamento de lesões pré-invasivas do colo uterino


O tratamento conservador dá-se com controle colpocitológico trimestral no 1º ano
NIC I
e semestral no 2º.
Regressão Aproximadamente, 70% dos NICs I regridem espontaneamente.
- Imunossupressão;
Indicações de coniza-
- NIC I persistente por mais de 1 ano;
ção em NIC I
- NIC I recidivante.
Realizar conização por:
- Bisturi frio;
NIC II e III
- Laser de CO2;
- CAF.
Trata-se de um método diagnóstico e terapêutico caso o grau histológico seja de lesão
Conização
neoplásica intraepitelial.
Grau histológico indi-
cando câncer de colo Sugere estadiamento específico, para avaliar o tipo de tratamento.
uterino invasor
Deve ser feito com base na citologia e na colposcopia; a confirmação é dada somente
Diagnóstico de NIC
com a histologia (biópsia dirigida ou conização).
310 SIC Resumão revalida

14 Câncer de colo uterino

1. Introdução
O câncer de colo uterino apresenta altas taxas de incidência nos países em desenvolvimento
e forte associação a condições precárias de vida, baixos índices de desenvolvimento humano, au-
sência ou fragilidade das estratégias de educação comunitária (promoção e prevenção em saúde)
e dificuldade de acesso a serviços públicos de saúde para o diagnóstico precoce e o tratamento
das lesões precursoras.
- Infecção pelo papilomavírus humano (HPV);
- Alta paridade;
- Grande número de parceiros;
Fatores de risco - Coitarca precoce;
- Baixo nível socioeconômico;
- Tabagismo;
- Imunossupressão.
As portadoras podem apresentar:
- Corrimento fétido;
- Sangramento genital irregular;
- Sinusorragia;
Quadro clínico - Caquexia;
- Disúria, oligúria e perda involuntária de urina por fístulas;
- Dispareunia;
- Tríade clínica de acometimento da parede pélvica: edema unilateral do membro infe-
rior, lombociatalgia e hidronefrose.

2. Diagnóstico
Deve ser realizado em mulheres de 25 a 60 anos, 1 vez por ano, e, após 2 exames anuais
Exame citopatológico consecutivos negativos, a cada 3 anos. É uma estratégia segura e eficiente para a de-
tecção precoce do câncer de colo uterino.
- Inicia-se a partir de uma lesão pré-invasiva (displasia cervical e carcinoma in situ);
Câncer de colo uterino - Curável em até 100% dos casos, já que normalmente progride de modo lento, por
anos, antes de atingir o estágio invasor da doença.
Exame colpocitopato- As pacientes com diagnóstico de lesões intraepiteliais de baixo e alto graus devem ser
lógico avaliadas por colposcopia.
Confirmação diagnóstica Sempre deve ser feita por biópsia dirigida por colposcopia.
O câncer de colo se propaga por 3 vias:
- Contiguidade: paramétrios, paracolpo, bexiga e reto;
Propagação - Continuidade: vagina e corpo uterino;
- Via linfática: inicialmente para linfonodos paracervicais, parametriais, obturadores,
ilíacos internos e externos e, posteriormente, linfonodos ilíacos comuns, para-aórti-
cos e inguinais.
Anatomia patológica O tipo histológico mais comum é o carcinoma de células escamosas.
ginecologia e obstetrícia 311

3. Estadiamento
Estadios Parâmetros
0 Carcinoma in situ (carcinoma pré-invasivo)
I Carcinoma de cérvice confinado ao útero (extensão ao corpo que deve ser desprezada)
Carcinoma invasivo, diagnosticado somente pela microscopia; todas as lesões visíveis macroscopi-
Ia
camente (mesmo com invasão superficial) como estadio Ib
Ia1 Invasão estromal de até 3mm em profundidade com uma extensão horizontal ≤7mm
Ia2 Invasão estromal entre 3 e 5mm em profundidade com uma extensão horizontal ≤7mm
Ib Lesão clinicamente visível, limitada ao colo ou lesão microscópica >Ia2
Ib1 Lesão clinicamente visível ≤4cm em sua maior extensão
Ib2 Lesão clinicamente visível >4cm em sua maior dimensão
II Tumor que invade além do útero, sem atingir a parede pélvica ou o terço inferior da vagina
IIa Sem invasão do paramétrio
IIb Com invasão do paramétrio
Tumor que se estende à parede pélvica, comprometendo o terço inferior da vagina ou causando
III
hidronefrose ou exclusão renal
IIIa Tumor que compromete o terço inferior da vagina, sem extensão à parede pélvica
IIIb Tumor que se estende à parede pélvica ou causa hidronefrose ou exclusão renal
IV Tumor metastático
IVa Tumor que invade a mucosa vesical ou retal ou que se estende além da pelve verdadeira
IVb Metástases a distância

Figura 1 - Estadiamento do câncer de colo uterino


312 SIC Resumão revalida

4. Condutas
- Repetição do exame citopatológico em 6 meses;
- Alto grau de remissão espontânea;
- Colposcopia é desnecessária para acompanhamento desses casos;
Lesão intraepitelial
de baixo grau - Na repetição da citologia com resultado negativo em 2 exames consecutivos, a paciente
deve retornar à rotina de rastreamento citológico;
- Na repetição da citologia com resultado positivo (qualquer atipia celular), a paciente deve
realizar colposcopia.
- Todas as pacientes com citologia sugestiva de lesão de alto grau devem realizar colpos-
copia;
- Se o resultado da biópsia for lesão de alto grau, a recomendação será a conização do colo
Lesão intraepitelial uterino por Cirurgia de Alta Frequência (CAF) ou conização com bisturi a frio;
de alto grau - Se a biópsia for negativa ou apresentar diagnóstico de menor gravidade, repetir a citologia
em 3 meses e adotar conduta específica, de acordo com esse novo laudo citopatológico;
- Se a biópsia demonstrar diagnóstico de carcinoma invasor, a paciente deverá ser tratada
conforme procedimento específico.
- Todas as pacientes com citologia sugestiva de adenocarcinoma in situ ou invasor deverão
ser encaminhadas para realização de colposcopia;
- Se a colposcopia mostrar lesão, a biópsia deverá ser realizada para excluir invasão;
- Se o resultado histopatológico da biópsia não demonstrar lesão invasora, recomenda-se
Adenocarcinoma a realização de conização; caso seja confirmada a invasão, a paciente deverá ser encami-
in situ ou invasor nhada para tratamento específico;
- Investigação complementar endometrial e anexial (biópsia endometrial ou exame de imagem)
em pacientes com mais de 40 anos, assim como nas mais jovens com sangramento vaginal
anormal, toda vez que apresentarem citologia compatível com atipia glandular de significado
indeterminado.
- Linfadenectomia é desnecessária;
- Conização com bisturi ou laser (para mulheres que optam pela preservação da fertilida-
de); o tratamento é suficiente para os casos em que não há invasão do espaço vascular e
linfático, e o cone apresenta margens livres;
Lesões microinvaso-
ras ≤3mm – estadio - Histerectomia simples constitui o tratamento-padrão para esse estadio. A ooforectomia
Ia1 deve ser evitada em pacientes jovens. Naquelas com prolapso genital, a opção é a histe-
rectomia vaginal;
- Radioterapia (para pacientes sem condições cirúrgicas, devido à presença de doenças
associadas); essas mulheres devem ser tratadas com irradiação intracavitária, sem ne-
cessidade de radioterapia externa.
- Cirurgia radical: histerectomia total com ligadura da artéria uterina na origem (artéria
ilíaca interna), parametrectomia e colpectomia do terço superior da vagina ou com li-
gadura das artérias uterinas no cruzamento com o ureter, e parametrectomia medial,
sempre associada a linfadenectomia pélvica (Wertheim-Meigs). A ooforectomia deve ser
evitada em pacientes na menacma. Para pacientes com prolapso uterino, há a alternativa
de histerectomia radical vaginal (Schauta) com linfadenectomia extraperitoneal;
Estadios Ia2 e Ib1 - Radioterapia externa para pacientes submetidas ao tratamento cirúrgico que apresen-
tem comprometimento ganglionar, doença parametrial residual ou margens cirúrgicas
comprometidas. Outros fatores de risco podem ser indicação de radioterapia adjuvante
(pacientes com estadio Ib), invasão superior a 1/3 do estroma do colo uterino e invasão
do espaço linfovascular;
- Radioterapia exclusiva (externa mais intracavitária) para pacientes sem condições clínicas
para cirurgia.
ginecologia e obstetrícia 313

- O tratamento cirúrgico pode ser indicado com intenções curativas;


- A histerectomia deve incluir a parametrectomia até a porção lateral e a retirada de terço
Estadio Ib2 cranial da vagina, além da linfadenectomia pélvica;
- Alternativas à cirurgia: radioterapia externa associada a braquiterapia como tratamento
exclusivo ou associação de radioterapia e quimioterapia, seguida ou não de cirurgia.
- Radioterapia exclusiva ou histerectomia radical resulta em taxas de cura de 75 a 80%;
Estadio IIa
- A escolha do método depende da extensão da lesão tanto no colo como na parede vaginal.
- Neoplasias classificadas nos estadios IIb, IIIa, IIIb e IVa;
- O melhor esquema de tratamento para esse grupo de pacientes não está definido;
Câncer de colo local-
- Alternativas para tratamento das pacientes com tumores avançados: quimiossensibiliza-
mente avançado
ção, radioterapia exclusiva, quimioterapia neoadjuvante seguida de radioterapia e cirur-
gia, quimioterapia neoadjuvante seguida de cirurgia, exenteração pélvica.

5. Fatores prognósticos e seguimento


Estadiamento, comprometimento linfonodal, tipo histológico, grau de diferenciação ce-
Fatores
lular, diâmetro tumoral, envolvimento parametrial, invasão angiolinfática ou vascular,
prognósticos
idade da paciente
Independente da modalidade de tratamento a que a paciente foi submetida, o ideal preco-
nizado é:
- Avaliação por meio de citologia, colposcopia do fundo vaginal e toque retal a cada 3 meses
Seguimento
nos 2 primeiros anos;
- Do 2º ao 5º anos, os controles indicados podem ser realizados a cada semestre;
- Após o 5º ano, o controle é anual.

15 Patologias pré-neoplásicas e câncer


do corpo uterino

1. Patologias pré-neoplásicas
A - Introdução
O acometimento do corpo uterino por lesões neoplásicas ou pré-neoplásicas pode ocorrer em
qualquer porção, porém as lesões endometriais são as mais comumente encontradas, seguidas
do miométrio.

B - Lesões pré-neoplásicas
a) Pólipos

Trata-se de proliferações epiteliais localizadas no endométrio, geralmente por estímulo es-


trogênico focal. São classificados como atróficos, glandulares ou hiperplásicos, ou ainda ade-
nomiomas. O quadro clínico se caracteriza por hemorragia uterina, na forma de menorragia ou
metrorragia mesmo na pós-menopausa, além de aumento da secreção vaginal, infertilidade e
dismenorreia. Alguns casos podem apresentar saída da massa pelo orifício externo do colo.
O diagnóstico, na maioria das vezes, é um achado frequente entre menopausadas que reali-
zam a ultrassonografia transvaginal por um espessamento endometrial focal, pois muitas mulhe-
res são assintomáticas. O tratamento consiste em realizar a exérese do pólipo.
314 SIC Resumão revalida

b) Hiperplasia endometrial
Trata-se do aumento da espessura endometrial por ação estrogênica persistente sem a con-
traposição da progesterona. A apresentação clínica cursa com sangramento uterino anormal,
mas também pode ser assintomática.
O diagnóstico é realizado por meio da avaliação da cavidade endometrial (vídeo-histeroscopia),
ou de dilatação e curetagem com estudo anatomopatológico do produto obtido. Normalmente, es-
ses exames são mandatórios a mulheres que apresentam sangramento uterino anormal e ecoendo-
metrial ≥4mm pós-menopausa, ou aos casos com ecoendometrial ≥8mm mesmo sem sangramento.
O tratamento depende de vários fatores, como presença ou ausência de atipias celulares, ida-
de e paridade, desejo reprodutivo ou não.
Quando há atipias, a conduta cirúrgica com histerectomia é a mais empregada, porém, em
caso de mulher com desejo reprodutivo, primeiramente o tratamento é clínico, com progestogênio
e controle rigoroso endometrial; após a gestação, deve-se proceder com histerectomia total
abdominal. Quando não apresenta atipias, o tratamento, já descrito, é a utilização de progestogênio.

2. Câncer de endométrio
A - Introdução
Está associado a estímulo estrogênico prolongado. Fatores de risco são anovulia crônica, me-
narca precoce, menopausa tardia, nuliparidade, obesidade (maior transformação periférica nos
adipócitos de androstenediona em estrona) e terapia de reposição hormonal sem progestogênios.
Considerando mulheres que usam terapia de reposição hormonal e tamoxifeno, deve-se rea-
lizar a avaliação ultrassonográfica periódica, com o objetivo de identificar espessamento endo-
metrial que, se presente, necessita de investigação complementar para confirmar o diagnóstico.
Uma paciente com sangramento uterino anormal, após os 40 anos, deve ser submetida a
investigação da cavidade uterina. Essa investigação inclui a obtenção de material para estudo
histopatológico, na suspeita de proliferação endometrial, pois o quadro clínico corresponde a san-
gramento anormal (principal sinal), dor pélvica, corrimento, massa abdominal e emagrecimento.
Esse câncer pode ser classificado como endometrioide (90% dos casos), seroso papilífero, epi-
dermoide e de células claras. O carcinoma endometrioide é um tumor estrogênio relacionado típico,
com tendência familiar e comportamento menos agressivo, e desenvolve-se mais frequentemente
a partir de endométrios hiperplásicos. O carcinoma seroso e o de células claras não estão relaciona-
dos ao estímulo estrogênico e são os principais representantes do grupo de neoplasias de alto risco.
Dissemina-se por invasão miometrial, atingindo vasos sanguíneos e linfáticos. Células tumo-
rais também podem chegar à cavidade peritoneal, por meio das tubas uterinas. As metástases
ocorrem para pulmões, fígado, ossos e cérebro.
ͳͳ Fatores prognósticos: tipo e grau histológicos, invasão miometrial, invasão cervical, presen-
ça de metástases linfonodais, anexiais e extragenitais;
ͳͳ Prevenção: perda de peso, uso de contraceptivos orais e associação de progestogênios a
estrogênios empregados durante a terapia de reposição hormonal.

B - Tratamento
Todas as pacientes devem ter um diagnóstico histológico antes do início do tratamento. Esse
material pode ser obtido tanto por curetagem como por biópsia de endométrio.
ginecologia e obstetrícia 315

Estadios Tratamento
- Confinado ao corpo uterino;
- Com frequência, detectado em estadios precoces de sua evolução. A cirurgia constitui modalidade
terapêutica primária nos estadios clínicos iniciais e intermediários;
- A cirurgia deve cumprir 2 finalidades: estadiar a doença e, ao mesmo tempo, tratá-la. Cirurgia-pa-
I drão: histerectomia total e salpingooforectomia bilateral;
- Colher líquido peritoneal e realizar exploração da cavidade peritoneal e linfadenectomia pélvica.
Pode-se prescindir da linfadenectomia para-aórtica nos tumores endometrioides, bem diferencia-
dos, e nos casos em que, ao exame intraoperatório do útero, a doença não ultrapassa a metade da
espessura do miométrio.
- Há progressão do câncer endometrial para o canal cervical;
- Pode determinar sua propagação pelos linfáticos cervicais;
- A possibilidade da extensão do tumor aos paramétrios e à porção superior da vagina indica uma
cirurgia mais ampla: histerectomia radical modificada com linfadenectomia pélvica;
II
- A radioterapia é um método alternativo para a esterilização das metástases dos paramétrios, da
porção superior da vagina e dos linfonodos pélvicos;
- No caso de pacientes com contraindicação clínica à cirurgia, deve-se realizar radioterapia exclusiva,
considerando cada caso (braquiterapia e radioterapia externa). Os resultados são piores.
- Excede os limites do útero, com comprometimento de 1 ou ambos os anexos, paramétrios, linfono-
dos pélvicos ou para-aórticos;
- Se houver progressão do tumor para o abdome superior, indicam-se histerectomia total abdominal,
III salpingooforectomia bilateral, citologia peritoneal, omentectomia, biópsias múltiplas, inspeções
subdiafragmática e hepática;
- Tratamento adjuvante após cirurgia: radioterapia externa pélvica e braquiterapia, ou quimioterapia
seguida de radioterapia pélvica.
- Compromete órgãos da pelve (bexiga, reto ou ambos) ou há metástases intra-abdominais e a distância;
- Tratamento com intenção paliativa: tratamento sistêmico, radioterapia e cirurgia;
IV
- O tratamento das metástases a distância pode ser feito com hormonoterapia (progestogênios) ou ra-
dioterapia local.

16 Câncer de ovário

1. Introdução
Trata-se do câncer ginecológico mais difícil de ser diagnosticado e o de maior letalidade. A sobrevi-
da global é de apenas 30 a 40% em 5 anos, pois a maioria das pacientes tem a doença diagnosticada
em estadios avançados, situação em que as opções de tratamento são apenas parcialmente efetivas.

Etiologia Multifatorial, incluindo fatores reprodutivos, familiares e pessoais


Efeitos prote-
Multiparidade e uso de contraceptivos hormonais orais combinados
tores
- Extensão da doença;
- Características biológicas intrínsecas do tumor (tipo e grau histológico);
Fatores de
prognóstico - Tipo de tratamento recebido (citorredução ótima, quimioterapia com derivados da platina);
- Efeito que o tratamento realizado teve sobre o tumor (resposta completa/parcial) ou sobre
a paciente (efeitos colaterais: mielossupressão etc.).
- CA-125: marcador mais conhecido e utilizado na monitorização da resposta ao tratamento
adjuvante e na detecção precoce de recorrência do tumor após tratamento. O desempenho
Marcadores é melhor para os tumores serosos e endometrioides;
- Alfafetoproteína;
- Beta-HCG.
316 SIC Resumão revalida

Ultrassonografia Método associado aos marcadores tumorais na tentativa de rastreamento


- Recomendada nos seguintes casos:
Intervenção · Pacientes com história familiar de câncer de ovário, mama ou cólon (parentes de 1º grau);
cirúrgica · Avaliação ultrassonográfica na qual se encontrou massa complexa ou pacientes que apre-
sentem CA-125 com níveis >35UI/mL.
Preocupante quando apresenta cápsula espessa, septos espessos, vegetações ou componen-
Massa anexial
tes sólidos em seu interior (massa complexa)

2. Tumores de baixo potencial de malignidade


- Atingem a mesma faixa etária que os tumores malignos (5ª década de vida);
Incidência
- Têm menor incidência entre mulheres que usaram contraceptivos orais.
Podem ser totalmente assintomáticos ou apresentar sintomas como dismenorreia, altera-
Quadro clínico
ções menstruais e dor e/ou aumento do volume abdominal.
- É sugerido por meio de ultrassonografia associada ao CA-125. À ultrassonografia, a imagem
mais típica é tumoração sólida, cística, com septos espessos, normalmente >1mm;
Diagnóstico
- O CA-125 tende a apresentar valores de até 35UI/mL;
- A laparotomia com biópsia de congelação confirma o diagnóstico.
- O tratamento a pacientes sem desejo reprodutivo é a histerectomia total abdominal com
salpingooforectomia bilateral;
Tratamento - Mulheres jovens com tumores estadio Ia podem ser tratadas por meio de salpingoofo-
rectomia unilateral;
- Sugere-se que, após a paciente ter completado sua prole, seja realizada cirurgia radical.

3. Tumores malignos
Têm escassa sintomatologia no início da doença e altas taxas de mortalidade. Qualquer au-
mento de volume ovariano deve ser seguido criteriosamente, e toda tumoração presente no
ovário deve ser considerada suspeita para neoplasia.

- Quando há sintomatologia inicial, é inespecífica e insidiosa, e, com a progressão da doença,


podem ocorrer aumento do volume abdominal, dispepsia, flatulência, eructações, emagre-
Quadro clínico cimento, inapetência e fraqueza;
- A ascite instala-se quando existe um avanço do processo consumptivo e, tardiamente, a
paciente se torna caquética.
Hereditariedade, maior nível socioeconômico, menarca precoce e menopausa tardia, nulipari-
Fatores de risco
dade, irradiação prévia etc.
- A cirurgia é o tratamento mais importante e baseia-se no princípio de citorredução (deixar a
menor massa tumoral possível; o ideal é que restem, no máximo, 2cm de tumor). Além disso,
inclui, obrigatoriamente, histerectomia total abdominal, salpingooforectomia bilateral, pesquisa
de células neoplásicas em líquido ascítico ou no lavado peritoneal, biópsia múltipla do peritônio
pélvico, goteiras parietocólicas e diafragma, além dos linfonodos pélvicos e para-aórticos;
- A disseminação dá-se por contiguidade, pela via linfática e pelo implante de células que
ficaram sobrenadando no líquido ascítico ou que se mobilizaram com os movimentos respi-
Tratamento ratórios ou peristálticos;
- Nos estadios mais avançados, a radioterapia pode ser empregada no tratamento ou como
método paliativo, e os melhores resultados são encontrados nas pacientes com menores
massas tumorais;
- A quimioterapia também tem papel importante na adjuvância;
- São drogas empregadas: agentes alquilantes, drogas do grupo da cisplatina, antraciclinas,
metotrexato e fluoruracila. O tamoxifeno e os progestogênios têm pouco efeito no trata-
mento do câncer de ovário.
ginecologia e obstetrícia 317

17 Fisiologia da gestação

1. Desenvolvimento da gestação e decidualização


O embrião alcança a cavidade uterina por volta do 4º ou 5º dia pós-fecundação, em um estágio
chamado mórula. Quando se encontra no estágio de blastocisto, o embrião fixa-se no endomé-
trio, ocorrendo a nidação. Esse processo acontece cerca de 7 a 10 dias após a ovulação.
A partir da ocorrência da implantação, as células endometriais sofrem a transformação de-
cidual. Morfologicamente, as células deciduais são volumosas, poliédricas ou arredondadas, com
núcleo arredondado e vesicular, citoplasma claro e circundado por membrana translúcida. São
funções da decídua proteger o ovo da destruição e assegurar-lhe o alimento na fase inicial da
placentação.
As decíduas parietal e basal apresentam 3 camadas: superficial, média e profunda (ou basal).
As 2 primeiras destacam-se com a dequitação. A zona basal remanescente irá refazer o endomé-
trio após o parto.

2. Hormonologia gestacional
A produção esteroidogênica da placenta começa entre 35 e 47 dias após a ovulação. Antes
desse período, a gravidez depende da produção de progesterona pelo corpo lúteo. Durante as 4
primeiras semanas de gestação, o aumento da progesterona na circulação materno-fetal é de-
corrente da sua produção pelo corpo lúteo, sendo, posteriormente, produzida pelas células do
sinciciotrofoblasto na placenta.
A placenta é fonte de hormônios esteroides, enzimas fetais e enzimas placentárias que tra-
balham conjuntamente na produção de estrogênios. O colesterol materno é o principal precursor
da progesterona produzida pela placenta. A produção de progesterona não depende das enzimas
fetais, mas de enzimas placentárias.

Funções dos hormônios na gestação


Progesterona
- Manutenção da quiescência do miométrio;
- Inibição dos receptores de prolactina na mama e das contrações uterinas;
- Desenvolvimento do parênquima mamário;
- Responsabilidade pela imunossupressão relativa.
Estrogênio
- Crescimento uterino;
- Aumento de fluxo sanguíneo local.
Gonadotrofina coriônica humana (HCG)
- Produzida pelo sinciciotrofoblasto a partir do 3º dia pós-fertilização;
- Principal função: manter o corpo lúteo;
- Detectada no sangue materno a partir do 8º dia após a fecundação;
- Atinge seu pico entre 60 e 90 dias de gestação e declina a partir do 2º trimestre;
- Sua concentração é duplicada a cada 48 a 72 horas no 1º trimestre.
318 SIC Resumão revalida

3. Diagnóstico de gestação
Os sinais, sintomas e achados laboratoriais que sugerem ou determinam a gravidez podem
ser classificados em evidência presuntiva, sinais de probabilidade e sinais de certeza de gravidez.

A - Sinais de certeza
ͳͳ Batimento cardíaco fetal;
ͳͳ Ultrassonografia transvaginal = embrião com comprimento cabeça–nádegas >5mm (7 a 8
semanas);
ͳͳ Sonar Doppler = 12 semanas;
ͳͳ Pinard = 18 a 20 semanas;
ͳͳ Movimentação fetal (16 a 20 semanas de gestação). Existe discórdia na literatura quanto ao
fato de ser movimentação fetal referida pela mãe ou percebida pelo médico.

B - Sinais e sintomas de presunção


ͳͳ Atraso menstrual (principalmente em mulheres com ciclos menstruais regulares);
ͳͳ Presença de náuseas ou vômitos (supostamente pelo aumento do HCG);
ͳͳ Polaciúria (a anteflexão acentuada do útero comprime a bexiga e causa micção frequente);
ͳͳ Alterações mamárias (mastalgia, aumento da circulação venosa).

C - Evidências prováveis de gestação


Eram usadas no passado para diagnóstico. Esses sinais podem ser notados nos órgãos geni-
tais e em outros órgãos e sistemas do organismo materno e são conhecidos por epônimos.

Órgãos Características
- Cloasma (máscara gravídica): pigmentação difusa ou circunscrita, de tonalidade escura e mais
nítida nas áreas muito expostas à luz (face, nariz e região zigomática). A hiperpigmentação
Face parece ser consequente a uma hiperfunção do lobo anterior da hipófise, com hipersecreção de
hormônio melanotrófico;
- Sinal de Halban: lanugem na testa, juntamente aos limites do couro cabeludo.
- Hunter (aréola secundária);
Mamas - Rede venosa de Haller;
- Tubérculos de Montgomery (hipertrofia das glândulas sebáceas).
- Holzapfel – preensibilidade uterina aumentada; peritônio rugoso;
- Consistência uterina amolecida;
- Contrações de Braxton Hicks;
Superfície
- Hegar – amolecimento do istmo, permitindo sua movimentação;
- McDonald – o útero pode ser refletido como dobradiça, pelo amolecimento do istmo;
- Landin – amolecimento localizado do istmo.
Útero
- Piskacek – abaulamento localizado no local de implantação do ovo;
Forma
- Nobile-Budin – preenchimento dos fundos de saco laterais.
- Puzos – rechaço fetal;
- Osiander – pulso vaginal;
Outros
- Hartmann – sangramento decorrente de implantação ovular que ocorre após
cerca de 7 a 8 dias da concepção.
Jacquemier, Jacquemier-Kluge ou Jacquemier-Chadwich (coloração violácea da vagina, do vestí-
Vulva e vagina
bulo e do meato urinário)
ginecologia e obstetrícia 319

4. Ultrassonografia no início da gestação


Permite identificar o saco gestacional intraútero quando os níveis séricos de beta-HCG estão
entre 1.000 e 2.000mUI/mL. Os batimentos cardíacos do embrião devem ser identificados quan-
do este atinge 5mm de comprimento cabeça–nádegas (entre 7 e 8 semanas).
A frequência cardíaca fetal deve estar entre 110 e 160bpm. O saco gestacional pode ser avalia-
do quanto à sua forma, regularidade, local de implantação e medida de seus diâmetros.
A gestação será dita anembrionada quando não se identifica embrião em saco gestacional
com diâmetro médio >17mm ou quando não se identifica imagem de vesícula vitelínica com saco
gestacional de 11mm de diâmetro médio.

5. Resumo de conceitos
Fecundação União dos gametas
Segmentação Série de divisões celulares sucessivas no zigoto
Nidação Fixação e invasão do embrião no endométrio
Transformação decidual Modificação histológica sofrida pelo endométrio

6. Resumo de achados ultrassonográficos – via transvaginal


Características Achados de imagem
- Beta-HCG entre 1.000 e 2.000; - Identificação de saco gestacional intraútero;
- Diâmetro do saco gestacional:
· Máximo – >20mm; - Identificação de embrião dentro do saco gestacional;
· Médio – >17mm.
- Comprimento cabeça–nádegas >5mm. - Identificação de batimentos cardíacos embrionários.

18 Modificações locais e sistêmicas no


organismo materno

1. Modificações locais
A - Útero
Volume
O estímulo hormonal leva a hipertrofia e hiperplasia celular, causando modificações de peso e volume uterinos; ao
final da gestação, o útero gravídico pesa cerca de 1kg e tem capacidade de 4 a 5L.
Consistência
Há o amolecimento de todo o órgão, principalmente nas regiões do istmo (sinal de Hegar) e do colo uterino (sinal
de Goodell), tornando o útero mole e pastoso.
Forma
Até a 20ª semana de gestação, o útero adquire forma esférica; pouco depois, há a transformação da forma glo-
bosa para a cilíndrica.
Situação
No 1º trimestre, o útero acentua a sua atitude fisiológica de anteversoflexão, ocasionando compressão vesical
e polaciúria. Após esse período, verifica-se dextroversão do órgão; o colo de útero é deslocado posteriormente.
Coloração
Devido ao maior afluxo sanguíneo à região genital, o corpo, o istmo e o colo de útero tornam-se violáceos.
320 SIC Resumão revalida

B - Ovários
Não há maturação de novos folículos, e o corpo lúteo persiste até a 12ª semana. Quando a
produção de gonadotrofina coriônica humana começa a declinar, o corpo lúteo regride, ficando
com metade do seu volume máximo próximo ao termo da gestação.

C - Vulva e vagina
Vagina e vulva sofrem tumefação. A mucosa vaginal torna-se edematosa, mole e flexível. O
tecido conjuntivo torna-se mais frouxo, e a musculatura lisa fica hipertrofiada para suportar a
distensão que ocorre durante o parto. A vascularização da vagina intensifica-se, e as veias se
hipertrofiam.
Há aumento das secreções vaginais e da concentração de glicogênio livre, com diminuição do
pH vaginal.

D - Mamas
Verifica-se o aumento do volume mamário; as veias superficiais da mama tornam-se dilatadas
(rede venosa de Haller) e visíveis sob a pele. O mamilo é saliente e mais pigmentado, com glându-
las sebáceas hipertrofiadas (tubérculos de Montgomery). Há hiperpigmentação e aparecimento da
aréola secundária (sinal de Hunter).

2. Modificações sistêmicas
A - Sistema osteoarticular
As articulações das gestantes, especialmente o pube, e as articulações sacroilíacas e
sacrococcígeas tornam-se relaxadas devido aos efeitos do estrogênio e da progesterona; as
cartilagens articulares aumentam a sua vascularização e a hidratação com os ligamentos
articulares, tornando-se estes mais distendidos.

B - Sistema digestório
O aumento da pressão intraperitoneal e a diminuição da resistência do esfíncter esofágico
inferior favorecem o refluxo gastroesofágico.
Ação da progesterona: maior tempo de esvaziamento gástrico e diminuição do peristaltismo
intestinal (favorece pirose retroesternal, sensação constante de plenitude gástrica e constipação
intestinal). Ação na musculatura lisa da vesícula biliar, diminuindo a contratilidade e o trânsito do
órgão, o que aumenta o risco de formação de cálculos biliares.
Observa-se aumento significativo nos níveis séricos de fosfatase alcalina, a concentração
plasmática de albumina diminui cerca de 20%, e ocorre aumento da produção de alfa e beta-
globulinas.
Anorexia e náuseas são relativamente comuns no 1º trimestre da gestação.

C - Sistema circulatório
As alterações mais importantes acontecem no débito cardíaco e na distribuição dos fluxos
sanguíneos aos diversos sistemas. Ocorre também aumento da frequência cardíaca de repouso e
do débito cardíaco, o que contribui para a elevação de 30 a 50% no rendimento cardíaco.
ginecologia e obstetrícia 321

Observa-se redução dos níveis da pressão arterial, causada pelo desenvolvimento da placen-
ta, território de baixa resistência que funciona como fístula arteriovenosa e diminui a resistência
vascular periférica. A pressão diastólica reduz mais significativamente, e os menores valores de
pressão arterial são encontrados no 2º trimestre. A partir de então, esses níveis ascendem até
atingirem valores pré-gravídicos, próximos ao termo.
O útero aumentado comprime a veia cava inferior, dificultando o retorno venoso e podendo
acarretar o aparecimento de edemas e varizes nos membros inferiores, na vulva e no plexo he-
morroidário.

D - Sangue
A volemia aumenta até 50% durante a gestação, atingindo valores máximos próximos à 28ª
semana. A hipervolemia resulta do aumento do volume plasmático e do número de células sanguí-
neas; os valores da hemoglobina e do hematócrito diminuem entre o 3º e o 5º meses de gestação,
pois o aumento do volume eritrocitário é inferior ao do volume plasmático (“anemia dilucional”).
Observa-se relativa leucocitose, com leucograma podendo atingir até 15.000 células. O nú-
mero de plaquetas diminui ligeiramente, evento decorrente da hemodiluição e do aumento do
consumo.
O nível de fibrinogênio do plasma se eleva, e todos os fatores de coagulação também se en-
contram aumentados, exceto XI e XIII. Esse estado “pró-coagulante” da gestação gera maior sus-
cetibilidade à ocorrência de trombose vascular e/ou tromboembolias.

Figura 1 - Modificações sanguíneas durante a gestação

E - Sistema respiratório
O volume corrente aumenta de 30 a 40% durante a gravidez; ocorre a diminuição progressiva
do volume expiratório de reserva e do volume residual, com consequente redução da capacidade
residual funcional. Entretanto, a capacidade total pulmonar não é alterada.
A frequência respiratória cresce discretamente, e a ventilação por minuto aumenta signifi-
cativamente. Em virtude da hiperventilação, ocorrem pequeno aumento na pO2 e diminuição da
pCO2 arteriais. O aumento na excreção renal do bicarbonato compensa metabolicamente essa
alcalose respiratória.
322 SIC Resumão revalida

F - Sistema urinário
O fluxo plasmático renal e a taxa de filtração glomerular aumentam em até 50%, e, como
consequência, observam-se aumento no clearance de creatinina e diminuição nas concentrações
plasmáticas de ureia e creatinina.
O aumento na taxa de filtração glomerular da glicose, sem alteração de sua capacidade de
reabsorção tubular, provoca o aparecimento de glicosúria em pequenas quantidades. Pela mes-
ma razão, até 300mg de proteína podem ser encontrados, ao dia, na urina das gestantes.
A ação miorrelaxante da progesterona nos ureteres e a dextrorrotação do útero provocam
estase urinária ureteral. A alteração (relativa) da imunidade da gestante predispõe a infecção
urinária. Assim, bacteriúria assintomática deve ser sempre tratada durante a gestação.

G - Sistema endócrino
A secreção de prolactina aumenta durante a gestação. Os níveis séricos de FSH e LH estão mais
baixos do que os das mulheres não grávidas. As taxas de TSH não estão aumentadas. Apesar de
ocorrer aumento de tri-iodotironina (T3) e tiroxina (T4), não é encontrado aumento na taxa de T3 ou
T4 livre no plasma (proteínas carregadoras dos hormônios tireoidianos também aumentam).
Ocorre aumento da glândula tireoide, sendo possível a palpação já no 1º trimestre.
A secreção de aldosterona eleva-se, prevenindo a perda de sódio pela urina. O aumento da
glicemia materna é causado pela ação de hormônios placentários anti-insulinêmicos; ocorre res-
posta pancreática da gestante com incremento na produção de insulina, visando manter normais
os níveis circulantes de glicose.

H - Postura e deambulação
O centro de gravidade da gestante é alterado na medida em que o útero e as mamas aumen-
tam de tamanho. Para compensar e conseguir se manter em pé com equilíbrio, a gestante empina
o ventre, joga o corpo para trás e afasta os pés para ampliar o polígono de sustentação. Assim,
observa-se a marcha típica da gestante, a “marcha anserina”.

I - Pele
A hiperpigmentação cutânea é frequente, especialmente na face (cloasma gravídico), nas mamas
(aréolas primária e secundária) e no abdome (linha nigra). Estrias gravídicas, por sua vez, podem
aparecer na região do abdome, da raiz das coxas e das mamas. Pode, ainda, haver o aparecimento
de telangiectasias na face, no pescoço e no tronco, devido aos altos níveis de estrogênio circulantes.

3. Metabolismo
A - Minerais
O que se observa na gestação normal são pequenas alterações iônicas e hormonais que visam
manter a homeostase de cálcio, fósforo e magnésio ao longo de todo o período, possibilitando a
oferta adequada desses íons ao feto.
Há redução do cálcio total sem alteração significativa do cálcio iônico, certamente causada
pela hemodiluição.
As taxas de magnésio estão diminuídas até o 3º mês de gestação e, por volta do 8º mês, en-
contram-se nos valores mínimos. A concentração de fósforo permanece inalterada durante toda
a gestação.
ginecologia e obstetrícia 323

As demandas de ferro estão elevadas, principalmente na 2ª metade da gestação. O feto re-


quer grande porção dos estoques de ferro da mãe, por isso é necessária a suplementação desse
elemento durante a gravidez.

B - Equilíbrio hidroeletrolítico
Durante a gestação, observa-se retenção hídrica, e esse aumento de volume de água ocasiona
retenção proporcional de sódio, mediado pelo sistema renina–angiotensina–aldosterona, que
visa manter a osmolaridade plasmática. A quantidade total de sódio e potássio é maior na gestação,
porém, por estarem diluídos, a concentração sérica desses íons está diminuída nesse período.

C - Carboidratos
Na gestação normal, observam-se leve hipoglicemia de jejum, hiperglicemia pós-prandial e hipe-
rinsulinemia.
A hipoglicemia de jejum deve-se ao consumo contínuo de glicose pelo feto.
A hiperglicemia pós-prandial é explicada pelo aumento da resistência periférica a insulina,
e acredita-se que tal resistência pode ser ocasionada por hormônios placentários, estrogênios,
progesterona e cortisol.
A hiperglicemia estimula o pâncreas materno, onde vai haver hiperplasia e hipertrofia de cé-
lulas betapancreáticas, que produzem e secretam maiores quantidades de insulina na circulação
sanguínea materna, resultando em uma hiperinsulinemia compensatória.

D - Proteínas
As proteínas totais estão aumentadas em valores absolutos, porém, em virtude da hemodilui-
ção gestacional, suas concentrações séricas estão diminuídas.

E - Lipídios
As concentrações plasmáticas de lipídios, apolipoproteínas e lipoproteínas ficam mais altas
na gestação.
A maior produção de hormônios favorecedores de lipólise (glucagon, HPL e GH) aumenta a
disponibilidade de ácidos graxos livres no plasma materno. A lipólise e a hiperinsulinemia facili-
tam a ocorrência de cetose materna em vigência de jejum prolongado.

4. Resumo de alterações sistêmicas


Sistemas Alterações
Osteoarticular Relaxamento de ligamentos e cartilagens
Relaxamento de musculatura de esfíncteres, lentificação de esvaziamento gástrico e di-
Digestório
minuição do peristaltismo intestinal
- Aumento do débito e do rendimento cardíaco;
Circulatório
- Queda da pressão arterial especialmente no 2º trimestre.
Sangue Aumento da volemia em até 50%; hemodiluição
- Hiperventilação;
Respiratório
- Alcalose respiratória compensada pela excreção renal de bicarbonato.
- Aumento da filtração glomerular;
Urinário
- Glicosúria e proteinúria fisiológicas.
Endócrino Aumento de T3 e T4 totais, porém com fração livre inalterada
Postura e deambulação Marcha típica da gestante, a “marcha anserina”
- Hiperpigmentação cutânea;
Pele - Estrias gravídicas;
- Telangiectasias.
324 SIC Resumão revalida

19 Relações uterofetais

1. Introdução
As relações do feto com a bacia materna e com o útero definem a estática fetal.

2. Atitude fetal
Relação das diversas partes fetais entre si.
Geralmente, o concepto apresenta-se em flexão generalizada, o que será chamado ovoide fetal.

3. Situação fetal
Relação entre o maior eixo uterino com o maior eixo fetal.
Podem existir 3 situações: longitudinal, transversal ou oblíqua. A longitudinal é a mais fre-
quente nas gestações a termo, e o feto repousa seu maior eixo sobre o maior eixo uterino. A trans-
versa é muito incomum (1%) nas gestações a termo e pode estar relacionada a multiparidade,
placenta prévia, leiomiomas submucosos e anomalias uterinas. A oblíqua é instável, de transição
e posteriormente irá tornar-se longitudinal ou transversa.

4. Apresentação fetal
É a região fetal que ocupa a área do estreito superior da pelve materna e nela irá se insinuar.
É definitiva no penúltimo ou até mesmo no último mês da gestação. Nas situações longitudinais,
podem ocorrer 2 apresentações: cefálicas ou pélvicas. Nas situações transversas, o ombro está
em contato com a região do estreito superior da bacia, e temos, obrigatoriamente, a apresenta-
ção córmica.
Em 96,5% das gestações, observa-se o feto em apresentação cefálica; em apresentação cefá-
lica fletida em 95,5%; e cefálica defletida em 1%.

Figura 1 - Pontos de referência e linhas de orientação fetais


ginecologia e obstetrícia 325

Figura 2 - (A) Apresentação cefálica; (B) apresentação pélvica e (C) apresentação córmica

A - Apresentação cefálica fletida


É a mais comum. A cabeça fetal posiciona-se com o mento próximo ao esterno, deixando como
seu ponto de referência a fontanela posterior ou lambda. Pode ser chamada também de cabeça
fletida de vértice, occipício ou craniana.

B - Apresentação cefálica defletida


Em algumas situações, o mento do feto afasta-se do esterno em uma variedade de graus, o
que denominará as deflexões.
A deflexão do polo cefálico pode ocorrer em 3 graus:
ͳͳ Parcial deflexão (1º grau): apresentação bregmática;
ͳͳ Parcial deflexão (2º grau): apresentação de fronte;
ͳͳ Deflexão máxima (3º grau): quando o pescoço fetal está muito distendido e o dorso fetal
encosta no polo cefálico; apresentação de face.

Figura 3 - (A) Apresentação cefálica fletida; (B) defletida de 1º grau; (C) defletida de 2º grau e (D) defletida de 3º grau

C - Apresentações anômalas (pélvica e córmica)


A apresentação pélvica ocorre em 3 a 4% das gestações a termo. Uma questão a lembrar é que
a frequência das apresentações pélvicas é maior nas gestações pré-termo do que nas gestações
a termo. Diversos fatores podem predispor às apresentações pélvicas, como malformações fetais
ou uterinas, gemelaridade, prematuridade, anencefalia ou hidrocefalia, tumores uterinos, vícios
pélvicos, brevidade de cordão umbilical, inserção anômala da placenta etc.
326 SIC Resumão revalida

O ponto de referência será sempre o sacro, e a linha de orientação é o sulco interglúteo.


Em 0,5% das gestações, observa-se o feto em apresentação córmica, correspondente à situação
transversa.

5. Posição fetal
É a relação do dorso fetal com pontos de referência do abdome materno; pode ser direita,
quando o dorso do feto se localiza à direita do abdome materno, ou esquerda, quando o dorso
se localiza à esquerda do abdome materno. A posição mais comum no final da gestação é à es-
querda, pois o útero é pouco rodado para a direita, e a presença do cólon sigmoide e do reto, à
esquerda, impulsiona o dorso fetal anteriormente.

6. Variedade de posição
É a relação entre os pontos de referência fetal com os da pelve materna (pube e sacro). Os
pontos de referência fetais e as linhas de orientação variam com a apresentação.
Para nomear as variedades de posição, é utilizado o emprego de 3 letras, que definem a apresen-
tação, o lado materno para o qual esse ponto está voltado e a sua variedade. A 1ª letra refere-se ao
feto (O – Occipício, M – Mento, e assim por diante). A 2ª e a 3ª referem-se aos pontos de referência
maternos (lado materno para o qual se orienta esse ponto e a variedade de posição, respectivamente).
Apresentações Pontos de referência Letras utilizadas Linhas de orientação
Cefálica fletida Lambda O Sutura sagital
Bregma (1º grau) Bregma B Sagitometópica
Fronte (2º grau) Glabela N (Naso) Sutura metópica
Face (3º grau) Mento M Linha facial
Pélvica Sacro S Sulco interglúteo
Córmica Acrômio A --

Figura 4 - Oito variedades de posição na apresentação cefálica fletida: (OP) occipitoposterior; (OEA) occipitoesquerda anterior;
(OET) occipitoesquerda transversa; (OEP) occipitoesquerda posterior; (ODA) occipitodireita anterior; (ODT) occipitodireita transver-
sa; (ODP) occipitodireita posterior e (OS) occipitossacra
ginecologia e obstetrícia 327

20 O parto

1. Introdução
A sequência de contrações uterinas coordenadas e involuntárias que resultam no apaga-
mento e na dilatação do colo uterino, simultaneamente à descida fetal, quando associadas aos
puxos e às contrações voluntárias da parede abdominal, na expulsão dos produtos da gestação,
denomina-se trabalho de parto. E o conjunto dos movimentos passivos que o feto executa no
transcurso do canal de parto é denominado mecanismo de parto.

2. Mecanismo de parto nas apresentações cefálicas fletidas


ͳͳ Ocorre em 95,5% das gestações. Pode ser dividido em 6 fases: insinuação, descida, ro-
tação interna, desprendimento do polo cefálico, rotação externa e desprendimento do
ovoide córmico;
ͳͳ A insinuação consiste na passagem do maior diâmetro fetal perpendicular à linha de orien-
tação por meio do estreito superior da bacia. A sutura sagital é a linha de orientação;
ͳͳ Durante a insinuação e a descida, ocorrem movimentos de inclinação lateral da apresenta-
ção, denominados assinclitismo;
ͳͳ O assinclitismo é anterior quando o parietal anterior desce adiante do posterior, fazendo
que a sutura sagital fique mais próxima do promontório. O assinclitismo é posterior quando
o parietal posterior desce adiante do anterior, com a consequente aproximação da sutura
sagital do pube; este último é o mais frequente e mais encontrado em primigestas;
ͳͳ Na ausência de flexão lateral, quando a sutura sagital está equidistante do pube e do pro-
montório, ou seja, paralela aos planos da pelve, diz-se que há sinclitismo;
ͳͳ A insinuação estará completa quando se notar a presença do polo cefálico no plano zero de
DeLee;
ͳͳ A descida inicia-se desde o trabalho de parto e é caracterizada pela migração do polo cefá-
lico até o assoalho pélvico materno, ou seja, irá preencher a escavação;
ͳͳ Uma forma de definir a altura da apresentação ou o seu grau de descida é o método de-
nominado como planos de DeLee; o plano zero é considerado o nível das espinhas ciáticas;
acima desse, temos os planos -1, -2, -3, -4; abaixo, estão os planos +1, +2, +3, +4 (vulva);
ͳͳ A rotação interna é caracterizada pelo movimento de rotação da cabeça do feto que leva-
rá a sutura sagital a se orientar no sentido anteroposterior do estreito inferior da bacia
materna. Nas cefálicas fletidas, o ponto de referência é a fontanela lambdoide, que vai se
locar abaixo do pube;
ͳͳ Desprendimento cefálico: ao término da rotação interna, a cabeça fetal desprende-se com o
auxílio da retropulsão do cóccix; nas cefálicas fletidas, o desprendimento é por movimento
de deflexão;
ͳͳ Rotação externa: volta do occipício à posição encontrada antes da rotação interna;
328 SIC Resumão revalida

ͳͳ Desprendimento do ovoide córmico: desprendimento por completo do polo cefálico, em se-


guida da cintura escapular e, para finalizar, do polo pélvico.
Cefálicas fletidas
Ponto de referência Occipício (lambda)
Linha de orientação Sutura sagital
Desprendimento Deflexão

3. Mecanismo de parto em apresentação bregmática


A cabeça do feto pode apresentar-se parcialmente fletida, com apresentação da fontanela
anterior. Essa apresentação define a deflexão de 1º grau ou apresentação bregmática.
ͳͳ Causas: vício pélvico, feto pequeno, laceração perineal, rotura prematura das membranas
ovulares e placenta prévia.
Cefálicas defletidas de 1º grau
Ponto de referência Bregma
Linha de referência Sutura sagitometópica
Desprendimento Flexão seguida por deflexão

4. Mecanismo de parto em apresentação de fronte


Quando a cabeça fetal assume uma posição parcialmente estendida, podemos definir a defle-
xão de 2º grau ou apresentação de fronte.
Das apresentações cefálicas, esta é a que apresenta maior frequência de distocias. Os fatores
causais podem ser vício pélvico, tumores prévios, multiparidade, vícios de conformação uterina,
feto volumoso, placenta prévia ou malformações fetais (dolicocefalia).
Atualmente, a apresentação de fronte é considerada indicação de parto cesárea.

5. Mecanismo de parto em apresentação de face


Pescoço fetal estendido por inteiro, de forma que o occipital e o dorso entram em contato,
deixando a face mais anterior ao canal de parto, denomina-se defletida de 3º grau ou apresenta-
ção de face.
As principais causas são polidrâmnio, amniorrexis precoce com saída intempestiva do lí-
quido amniótico, ventre materno “em pêndulo”, vício pélvico, tumores prévios, bócio fetal
congênito e malformações fetais. Há indicação de parto cesárea nas variedades de posição
mentoposterior.

Cefálicas defletidas de 3º grau


Ponto de referência Mento
Linha de referência Linha facial
Desprendimento Flexão
ginecologia e obstetrícia 329

6. Apresentações pélvicas
Normalmente, o ponto de referência nessas apresentações é o sacro e a linha de orientação
é o sulco interglúteo.

A - Insinuação
A orientação da pelve é no sentido de dispor o diâmetro bitrocanteriano em um dos oblíquos
ou transversos da bacia materna, sendo finalizada quando este diâmetro transpõe o estreito su-
perior da pelve materna.

B - Descida e rotação
Acontece uma rotação de 45°, e o bitrocanteriano é orientado em relação ao diâmetro antero-
posterior, em correspondência com a conjugata exitus.

C - Desprendimento pélvico
Diferente da apresentação cefálica, a medida de flexionar a apresentação é laterolateral, e
não anteroposterior.

D - Desprendimento das espáduas


Geralmente, a espádua anterior é a 1ª a se apresentar, e, logo em seguida, com a retropulsão
do cóccix, a espádua posterior também se apresenta. No entanto, com o diâmetro bisacromial
em relação ao diâmetro transverso do estreito superior, as espáduas se desprendem esponta-
neamente.

E - Desprendimento da cabeça derradeira


Flexão da cabeça e rotação, permitindo que o suboccipício fique localizado abaixo do pube. A
cabeça fetal irá se desprender, liberando em seguida as circunferências suboccipitomentoniana,
suboccipitofrontal e suboccipitobregmática (manobra de Bracht).

7. Assistência clínica ao parto


ͳͳ Clinicamente, o parto pode ser dividido em 4 períodos: período de dilatação, período expul-
sivo, dequitação e 4º período;
ͳͳ Pródromo de trabalho de parto: presença de contrações uterinas irregulares e arrítmicas;
inicia-se entre 30 e 36 semanas de gestação e pode durar semanas;
ͳͳ Pode ocorrer saída do tampão mucoso endocervical, precedendo o parto em vários dias.

A - Período de dilatação
ͳͳ Contrações uterinas dolorosas, rítmicas, frequentes, com duração e intensidade de forma
suficiente para iniciar o esvaecimento e simultânea dilatação cervical;
ͳͳ A duração desse período varia entre primíparas e multíparas; nas primíparas, é maior, che-
gando a 24 horas;
ͳͳ Esse período é dividido em 2 etapas:
330 SIC Resumão revalida

• Fase de latência: há contrações uterinas regulares, início da dilatação cervical e descida


do polo cefálico, com duração média de 8 a 18 horas. As contrações, apesar de presentes,
não são suficientes para o esvaecimento e a dilatação completa cervical;

• Fase ativa: o progresso franco da dilatação é iniciado, e então esta fase é caracterizada
como fase ativa do trabalho de parto. Nesta fase, espera-se dilatação média de 1,2cm/h
nas primíparas e 1,5cm/h nas multíparas (em regra, considera-se a média de 1cm/h).

ͳͳ Diagnóstico: contrações uterinas rítmicas, dolorosas e coordenadas, com intervalos ≤10 mi-
nutos e duração de 45 a 60 segundos;

ͳͳ Nas multíparas, ocorrem esvaecimento e dilatação simultaneamente; nas primíparas, esses


eventos ocorrem separadamente, com o início da dilatação após o esvaecimento do colo
uterino;

ͳͳ Durante o período de dilatação do trabalho de parto, a frequência das contrações uterinas


varia de 2 a 5 episódios a cada 10 minutos. A intensidade das contrações oscila entre 30 e
50mmHg; a intensidade mínima necessária para que ocorra dilatação do colo é de 15mmHg;

ͳͳ As contrações uterinas têm origem junto à implantação das trompas uterinas; cada contra-
ção é autônoma e irradia-se em todos os sentidos, prevalecendo a propagação no sentido
descendente. A partir desse processo se obtém o tríplice do gradiente descendente de do-
minância fúndica, em que a contração uterina inicia-se no fundo uterino e é mais intensa e
duradoura nesse local;

ͳͳ Tríplice gradiente descendente: a contratilidade uterina obedece ao sentido descendente


da propagação, há maior duração da contração próxima ao seu ponto de origem, e a sua
intensidade é decrescente, à medida que se aproxima do colo;

ͳͳ A amniotomia pode ocorrer em diferentes momentos do trabalho de parto. Ela é considera-


da precoce quando a rotura ocorre com dilatação do colo <6cm, oportuna quando a dilata-
ção é de 6 a 8cm e tardia após esse momento.

B - Período expulsivo
ͳͳ Acontece quando a dilatação cervical está finalizada e termina com o desprendimento total
do feto;

ͳͳ A duração deste período pode variar, principalmente levando em consideração o número


de paridade da paciente e a realização de analgesia de parto: nas primigestas, a duração
mínima é de 60 minutos, quando sem analgesia, e de, no máximo, 120 minutos nas pacien-
tes com analgesia de trabalho de parto. Nas multíparas, a duração mínima é de 30 minutos,
quando sem analgesia, e a máxima, de 60 minutos, quando for realizada a analgesia;

ͳͳ Há metrossístoles involuntárias de intensidade de 50mmHg, com frequência de 5 contra-


ções em 10 minutos, aparecimento dos puxos para auxiliar a impelir o feto por meio do canal
de parto;

ͳͳ A episiotomia não é necessária em todas as pacientes, as suas incisões podem ser mediana
ou mediolateral; a episiotomia mediana é mais fisiológica, possibilita menor perda sanguí-
nea e menos dor no pós-operatório. No entanto, a episiotomia mediolateral direita é a mais
utilizada, por apresentar menor risco de lesão da musculatura do esfíncter externo do ânus.
ginecologia e obstetrícia 331

C - Dequitação
Inicia-se após o desprendimento fetal e é finalizado com a saída da placenta. As contrações
uterinas ainda estão presentes, porém neste momento são indolores, menos frequentes, entre-
tanto mais intensas. Ajudam no descolamento, na descida e na expulsão da placenta e asseguram
a hemostasia. Ocorre entre 5 e 10 minutos após o período expulsivo e é considerada prolongada
quando ultrapassa 30 minutos. Pode ocorrer por 2 mecanismos:
ͳͳ Descolamento central (Baudelocque-Schultze): observado em 75% dos casos e reconhecido
pela saída da placenta e, em seguida, pelo sangramento vaginal. A placenta encontra-se na
parte superior do útero e desprende-se pela face fetal;
ͳͳ Descolamento marginal (Baudelocque-Duncan): observado em 25% dos casos e reconhe-
cido pela presença de sangramento vaginal antes da exteriorização da placenta, que se
encontra na parede lateral do útero, e se desprende pela borda inferior.
A placenta descola-se da parede uterina no nível da camada esponjosa; a camada basal rema-
nescente propiciará a reepitelização do endométrio.

D - 4º período
Caracterizado pela 1ª hora após a dequitação. Nesse intervalo de tempo, esperam-se a esta-
bilização dos sinais vitais maternos e a consolidação da hemostasia uterina, que acontece por 2
mecanismos principais:
ͳͳ Miotamponamento: oclusão dos vasos miometriais pela retração muscular;
ͳͳ Trombotamponamento: os vasos são obliterados por trombose vascular.

8. Hemorragia puerperal
É a hemorragia pós-parto que cursa com perda sanguínea suficiente para causar instabilidade
hemodinâmica de grande importância.
ͳͳ Os sinais e sintomas clínicos podem variar entre palpitações, vertigem, fraqueza, sudorese,
taquicardia, agitação, palidez, podendo chegar a oligúria/anúria e colapso;
ͳͳ Fatores como macrossomia fetal, gemelaridade, hemorragia pós-parto, parto cesárea em
gestação prévia, dequitação prolongada, parto assistido, trabalho de parto prolongado, en-
tre outros, são predisponentes para a ocorrência de hemorragia puerperal;
ͳͳ Existem 4 principais fatores responsáveis para a ocorrência da hemorragia puerperal. São
eles:
• Alteração do tônus uterino;

• Trauma de canal de parto;

• Retenção do tecido placentário ou de membranas;

• Coagulopatias.

A conduta seria massagem uterina bimanual, drogas que ajudam na contratilidade das fi-
bras musculares do útero, sendo as mais utilizadas a ocitocina, a metilergometrina e o miso-
prostol, e medidas cirúrgicas, como ligadura de artérias uterinas, das artérias hipogástricas,
sutura de B-Lynch ou histerectomia, deverão ser realizadas quando todas as alternativas já
citadas falharem.
332 SIC Resumão revalida

9. Distocia de ombros

A - Conceito
Impactação do ombro anterior contra a sínfise púbica após desprendimento da cabeça fetal.
Quando o diâmetro bisacromial é maior do que o diâmetro anteroposterior (conjugata obstétrica).

B - Incidência
ͳͳ Variável: 0,3% em fetos de 2.500 a 4.000g;
ͳͳ 5 a 7% em fetos de 4.000 a 4.500g;
ͳͳ Cerca de 50% ocorrem em fetos de peso normal.

C - Fatores de risco
ͳͳ Episódio anterior de distocia de ombro;
ͳͳ Diabetes gestacional;
ͳͳ Pós-datismo;
ͳͳ Macrossomia fetal;
ͳͳ Baixa estatura materna;
ͳͳ Ganho de peso materno excessivo durante o pré-natal;
ͳͳ Pelves anômalas;
ͳͳ 1º (fase de dilatação) e/ou 2º (fase de descida) períodos prolongados;
ͳͳ Uso de fórcipe ou vácuo-extrator.

D - Complicações
ͳͳ Maternas: traumas e lacerações perineais, hemorragias pós-parto/atonia uterina/ruptura
uterina, diástase de sínfise púbica;
ͳͳ Fetais: lesões de plexo braquial, fraturas de clavícula e úmero, hipóxia fetal.

E - Diagnóstico
Quando da saída do polo cefálico, este se retrai contra o períneo (sinal “da tartaruga” ou “ca-
beça encravada”) e não se consegue desprender as espáduas, pelas manobras habituais, após um
tempo igual ou maior do que 60 segundos.

F - Tratamento
Nessa situação, nunca exercer força em excesso à cabeça ou ao pescoço fetal e evitar aplicar
pressões sobre o fundo uterino. Esses procedimentos causarão lesões maternas e/ou fetais e
desperdiçarão um tempo valioso. É importante que a gestante mantenha a calma. Em fetos
não comprometidos, com trabalho de parto normal, transcorrerão 7 minutos antes que o pH
do cordão alcance um nível de risco (6,97), tempo suficiente para realização das manobras sem
intempestividade.
Seguir a seguinte sequência:
ͳͳ Pedir ajuda: outro obstetra, enfermeira, neonatologista, anestesiologista. Checar condições
cirúrgicas do centro obstétrico e material de ressuscitação neonatal;
ginecologia e obstetrícia 333

ͳͳ Levantar as pernas (manobra de McRoberts): consiste na flexão das coxas maternas sobre o
abdome, aumentando o diâmetro anteroposterior da pelve e diminuindo a lordose lombos-
sacra. Eficácia de 40% quando usada isoladamente e de 50% quando associada a pressão
suprapúbica;
ͳͳ Pressão suprapúbica externa (manobra de Rubin I): realiza-se pressão suprapúbica sobre as
costas do feto, com o objetivo de abduzir o ombro e fazê-lo passar sob a sínfise. Não fazer
simples compressão vertical do ombro contra a sínfise, impactando-o contra a mesma. Isso
apenas acarretará trauma materno-fetal;
ͳͳ Avaliar episiotomia: realizá-la apenas quando da necessidade de outras manobras, com
o intuito de facilitar a introdução dos dedos ou da mão. Lembrar que a distocia de om-
bro é uma impactação óssea e a realização da episiotomia não fará com que o ombro
seja liberado;
ͳͳ Retirada do braço posterior: palpar o braço posterior até a dobra do cotovelo e, ao fazer
pressão nesta, o antebraço irá fletir sobre o braço, permitindo ao obstetra apreendê-lo,
agarrar a mão fetal e puxá-la suavemente para fora, desprendendo o braço posterior e de-
pois o ombro. Isso reduzirá o diâmetro bisacromial, e, então, o ombro anterior passará sob
a sínfise púbica e sairá;
ͳͳ Toque e manobras internas: manobras que visam girar o ombro anterior nos planos oblí-
quos e sob a sínfise púbica. Necessitam de episiotomia ampliada:
• Rubin II: abdução do ombro anterior (2 dedos são introduzidos na vagina e realiza-se com-
pressão posterior no ombro anterior do feto, empurrando-o em direção ao feto). Manter a
manobra de McRoberts enquanto ela é executada;
• Woods (parafuso): Usando-se as 2 mãos, associa-se à manobra de Rubin II uma pressão
bidigital na face anterior do ombro posterior, aduzindo este ombro e, ao mesmo tempo,
abduzindo o anterior, fazendo o feto rodar no sentido horário;
• Woods invertida (reversa): usando-se as 2 mãos, faz-se pressão bidigital na face anterior
do ombro anterior e, ao mesmo tempo, na face posterior do ombro posterior, objetivando
rodar o feto no sentido anti-horário, desfazendo-se a impactação.
ͳͳ Alterar a posição (manobra de Gaskin): posicionar a paciente sobre os 4 membros, apoiada
sobre as mãos e pernas. Aumenta a conjugata obstétrica em 1cm. Liberar o ombro posterior
com uma suave tração descendente.

G - Medidas heroicas
Quando da falha das manobras anteriores:
ͳͳ Fratura proposital da clavícula: reduz o diâmetro bisacromial;
ͳͳ Manobra de Zavanelli: reposicionamento cefálico para dentro da pelve, seguindo o mecanis-
mo inverso exato da exteriorização cefálica. Exige anestesia e tocólise;
ͳͳ Relaxamento muscular (halotano ou nitroglicerina);
ͳͳ Cirurgia abdominal com histerotomia: cesárea sob anestesia geral. O cirurgião gira o feto
para a posição transabdominal e se rodam os ombros. A extração vaginal é feita por um 2º
médico;
ͳͳ Sinfisiotomia: anestesia-se localmente a sínfise púbica, incisiona-se a pele, afasta-se lateral-
mente a uretra, eleva-se a bexiga e se cortam os ligamentos.
334 SIC Resumão revalida

10. Resumo de conceitos


Tempos Ações
- Passagem do diâmetro biparietal através do estreito superior da bacia;
Insinuação: descida - Passagem do polo cefálico ao estreito inferior da pelve materna;
- Flexão e assinclitismos.
Rotação interna: despren- - Colocação de linha de orientação no diâmetro anteroposterior da bacia materna;
dimento cefálico - Auxílio da retropulsão do cóccix; movimento de deflexão.
Rotação externa: despren- - Retorno do occipício à orientação observada antes da rotação interna;
dimento do ovoide pélvico - Desprendimento da cintura escapular e do polo pélvico.
- Contrações rítmicas e regulares:
Dilatação: fases de latên-
· Até 3cm de dilatação; alterações cervicais de forma lenta;
cia e ativa
· Após 3cm de dilatação; aproximadamente 1cm/h.
- Início após dilatação total (10cm); duração conforme paridade e analgesia;
Expulsivo
- Risco de sofrimento fetal agudo.
- Mecanismo central ou lateral; duração de até 30 minutos (maioria dos casos em
Dequitação (4º período) 5 minutos);
- Hemorragias: alteração de tônus responsável por 70% dos casos.

21 Puerpério

1. Definição
Compreende o período a partir da dequitação ao retorno das condições pré-gravídicas do
organismo materno. É importante lembrar, entretanto, que é nesse período que a mama atinge o
seu desenvolvimento máximo. Tem duração de 6 a 8 semanas e pode ser dividido em:
ͳͳ Imediato: a partir do 1º ao 10º dia;
ͳͳ Tardio: do 11º ao 42º dias;
ͳͳ Remoto: do 43º dia em diante.

2. Modificações locais
- Útero
A involução uterina ocorre com a redução de 1cm por dia; no 12º dia pós-parto, o fundo uterino
está na altura da borda da sínfise púbica.
Há 2 camadas na decídua remanescente: a superficial, onde estão os lóquios; e a profunda,
onde há regeneração do endométrio.
Os lóquios originam-se da ferida placentária e podem ser classificados em:
ͳͳ Vermelhos (lochia rubra): até o 3º dia pós-parto; são estéreis;
ginecologia e obstetrícia 335

ͳͳ Escuros (lochia fusca): do 3º ao 10º dias pós-parto;


ͳͳ Amarelos (lochia flava): a partir do 10º dia;
ͳͳ Brancos (lochia alba).
O colo uterino fecha-se no decorrer das contrações do pós-parto e constitui o aspecto de fenda.
O retorno da menstruação depende se a mulher amamentou ou não. Caso ela não tenha ama-
mentado em aproximadamente 45 dias, a menstruação retornará.

3. Modificações sistêmicas
É normal a temperatura estar um pouco elevada em até 24 horas após o parto.
A pressão arterial tende a normalizar-se no puerpério imediato. O débito cardíaco se eleva,
com a melhora do retorno venoso, e a volemia tende a permanecer elevada até 6 semanas do
pós-parto.
Pode haver queda da hemoglobina e do hematócrito.
A lactopoese inicia-se com o aumento de ocitocina, prolactina e hormônio do crescimento;
sendo assim, o estrogênio, a progesterona e o hormônio lactogênio apresentam-se diminuídos.

4. Cuidados no puerpério
ͳͳ Avaliar rigorosamente os sinais vitais e o sangramento vaginal;
ͳͳ Estimular a deambulação precoce;
ͳͳ Avaliar as condições emocionais das puérperas. Atenção aos distúrbios psiquiátricos (blues
puerperal, depressão puerperal e psicose puerperal);
ͳͳ Só é permitido reiniciar atividade sexual após 40 dias do parto.

5. Amamentação
Os cuidados com as mamas e o incentivo e a orientação quanto à amamentação devem ser
iniciados no pré-natal.
Estimular a amamentação logo após o nascimento, o que irá reforçar o vínculo mãe–filho.
Previne problemas mamários, além de auxiliar a involução uterina.
A mastite puerperal tem, como manifestações clínicas, mama endurecida, hiperemiada e com
hipertermia local, mastalgia, febre alta e prostração. O agente etiológico principal é o Staphylo-
coccus aureus. O tratamento a ser realizado implica a não suspensão da amamentação, a orde-
nha, a aplicação de compressa fria, analgésicos e anti-inflamatórios, bem como antibioticoterapia
com cefalexina 2g/d, por 10 dias. As mastites, quando não tratadas, podem evoluir com abscesso
mamário. O tratamento do abscesso, quando presente, consiste na drenagem cirúrgica da coleção
purulenta e na antibioticoterapia.

6. Recomendações de contracepção a mulheres lactantes


O retorno da ovulação é variável, logo a infertilidade causada pela amamentação é imprevisí-
vel. Assim, medidas de planejamento familiar devem ser instituídas para os bem-estares materno
e do recém-nascido.
336 SIC Resumão revalida

Os métodos não hormonais são uma ótima escolha no puerpério, devendo o médico respeitar
a escolha da paciente. O DIU (dispositivo intrauterino) pode ser colocado logo após o parto ou 40
dias após o nascimento; não deve ser colocado, portanto, nesse intervalo.
O diafragma está indicado nas 6 semanas após o parto.
Já os métodos hormonais, quando se fala em contraceptivos combinados, são contraindica-
dos por interferirem no leite materno.
Os progestogênios isolados estão indicados. Podem-se utilizar os orais, os injetáveis, os im-
plantes subdérmicos e, até mesmo, o DIU de levonorgestrel.

22 Assistência pré-natal

1. Recomendações gerais
Todas as gestantes devem realizar o pré-natal, que deve ser iniciado logo após o diagnós-
tico de gravidez.
Como prevenção de malformações fetais e defeitos no sistema nervoso central (tubo neural),
é indicado o uso do ácido fólico nos 3 meses que antecedam a concepção até a 8ª semana de
amenorreia. A dose utilizada é de 0,4 a 0,8mg/d (rotina) e de 4mg/d no caso de mulheres com
antecedentes obstétricos de malformação do tubo neural ou com dieta pobre em ácido fólico
(pressupõe baixos níveis séricos de ácido fólico).
A suplementação de ferro, normalmente com sulfato ferroso, deve ser iniciada a partir da 20ª
semana de gestação.
O Ministério da Saúde e a FEBRASGO (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia
e Obstetrícia) recomendam, no mínimo, 6 consultas, porém, considerando pacientes que tiverem
intercorrências durante a gestação ou gestantes de alto risco, o número de consultas aumenta.

2. Antecedentes
Deve ser realizada uma anamnese minuciosa na busca de dados que permitam a avaliação
ginecológica e obstétrica atual e pregressa, em virtude de guiar o pré-natal de maneira adequada.
Na anamnese, devem estar presentes:
ͳͳ Idade (extremos de idade versus riscos);
ͳͳ Etnia (doenças e anatomia associadas a etnia);
ͳͳ Queixa atual (leucorreia, edema, varizes, entre outras);
ͳͳ Hábitos e antecedentes pessoais (doenças atuais e crônicas, medicamentos, vícios);
ͳͳ Antecedentes ginecológicos e obstétricos.
É necessário investigar a presença de doenças ginecológicas, como mioma, pólipos, moléstia
inflamatória pélvica aguda, entre outras, que possam vir a interferir na gestação atual.
Nos antecedentes obstétricos, devem-se investigar patologias presentes em gestações ante-
riores, como doença hipertensiva específica da gestação, diabetes gestacional, história de aborto,
malformações fetais.
ginecologia e obstetrícia 337

Também é importante saber:


ͳͳ Via dos partos anteriores;
ͳͳ Antecedentes familiares (doenças hereditárias, por exemplo);
ͳͳ História obstétrica atual.

3. Cálculo da idade gestacional e data provável do parto


Para o cálculo da idade gestacional, é preciso saber a Data da Última Menstruação (DUM).
A regra de Näegele é utilizada para o cálculo da Data Provável do Parto (DPP), e também se
utiliza a DUM:
ͳͳ Somam-se 7 ao dia e, no mês, retiram-se 3; em caso de mudança de mês, subtraem-se 2 do mês.
Exemplos
1 - DUM = 13.09.2015. 13 + 7 = 20; 9 - 3 = 6
Logo, DPP = 20.06.2016.
2 - DUM = 27.06.2015. 27 + 7 = 34 (30 + 4) = muda-se o mês; 6 - 2 = 4
Logo, DPP = 04.04.2016.

A ultrassonografia do 1º trimestre é útil quando a paciente não se recorda da DUM.

4. Exame físico
Deve ser completo, avaliando o peso e a pressão arterial, examinando as mamas em busca
de alguma alteração na própria mama, na aréola ou nos mamilos, realizando a medida da altura
uterina; quando esta está alterada, deve-se pensar nas possíveis patologias:
ͳͳ Aumentada: macrossomia fetal, gemelaridade, polidrâmnio, erro de data;
ͳͳ Diminuída: oligoâmnio, restrição do crescimento fetal, situação transversa, erro da data.
A medida é feita com a fita métrica, da sínfise púbica até o fundo uterino. Devem-se realizar,
também, a palpação obstétrica e, além do exame físico obstétrico-ginecológico, em busca de pa-
tologias que possam interferir no canal de parto, exame especular e ao toque vaginal.

Ganho de peso na gestação (de acordo com o estado nutricional da gestante)


- Baixo peso: 12,5 a 18kg;
- Adequado: 11,5 a 16kg;
- Sobrepeso: 7 a 11,5kg;
- Obesidade: 5 a 9kg.

5. Exames subsidiários de acordo com o Ministério da Saúde


A - Exames gerais
São exames solicitados na 1ª consulta:
ͳͳ Hemograma;
ͳͳ Tipagem sanguínea e fator Rh;
ͳͳ Coombs indireto (se Rh negativo);
ͳͳ Glicemia de jejum;
338 SIC Resumão revalida

ͳͳ Teste rápido de triagem para sífilis e/ou VDRL;


ͳͳ Teste rápido diagnóstico anti-HIV;
ͳͳ Anti-HIV;
ͳͳ Toxoplasmose IgM e IgG;
ͳͳ Sorologia para hepatite B (HBsAg);
ͳͳ Exame de urina e urocultura;
ͳͳ Ultrassonografia obstétrica (não obrigatório);
ͳͳ Citopatológico de colo de útero (se necessário);
ͳͳ Exame da secreção vaginal (se clínica);
ͳͳ Parasitológico de fezes (se houver indicação clínica);
ͳͳ Eletroforese de hemoglobina (se a gestante for negra, tiver antecedentes familiares de
anemia falciforme ou apresentar história de anemia crônica).
2º trimestre:
ͳͳ Teste de tolerância a glicose com 75g (se a glicemia estiver acima de 85mg/dL ou se hou-
ver fator de risco – 24ª e 28ª semanas);
ͳͳ Coombs indireto (se for Rh negativo).
3º trimestre:
ͳͳ Hemograma;
ͳͳ Glicemia em jejum;
ͳͳ Coombs indireto (se Rh negativo);
ͳͳ VDRL;
ͳͳ Anti-HIV;
ͳͳ Sorologia para hepatite B (HBsAg);
ͳͳ Repetição do exame de toxoplasmose se IgG não reagente;
ͳͳ Urocultura + urina tipo I;
ͳͳ Bacterioscopia de secreção vaginal (a partir de 37 semanas de gestação).
A pesquisa do Streptococcus do grupo B deve ser realizada entre 35 e 37 semanas de gesta-
ção. Quando positivo, a paciente deve ser tratada no momento do parto.

B - Ultrassonografia
A ultrassonografia durante o pré-natal para gestações de baixo risco não é indicada, segun-
do a Organização Mundial da Saúde. A partir da 8ª semana de gestação, no entanto, pode ser
solicitada para avaliar o saco gestacional e os batimentos cardíacos fetais e confirmar a idade
gestacional.
A medida da translucência nucal tem como finalidade rastrear cromossomopatias, e o perío-
do em que deve ser realizada está entre a 11ª e a 14ª semanas de gestação.
A ultrassonografia morfológica, por sua vez, deve ser realizada no período entre a 20ª e
a 24ª semanas de gestação. É a partir dela que se podem observar as malformações fetais.
E a ultrassonografia obstétrica tem como base a avaliação do crescimento fetal, o volume
do líquido amniótico, a localização e a maturidade placentária, a apresentação e o bem-es-
tar fetal, por meio do perfil biofísico do feto.
ginecologia e obstetrícia 339

6. Realização de ultrassonografia
Resumo de aplicação
(não recomendado para baixo risco, de acordo com a Organização Mundial da Saúde)
Época Principais utilidades
- Datação da gestação;
1º trimestre - Verificação do número de fetos, da corionicidade e da amnionicidade;
- Rastreamento de cromossomopatias (translucência nucal – 11 a 14 semanas).
- Datação da gestação (erro de 10 a 15 dias);
2º trimestre
- Morfológico.
- Crescimento e desenvolvimento fetal;
- Posição e maturidade da placenta;
3º trimestre
- Líquido amniótico;
- Provas de vitalidade fetal (perfil biofísico fetal e Doppler).

23 Drogas e gestação

1. Introdução
Classificação da Food and Drug Administration (FDA) de drogas na gravidez:

Categorias Interpretações
A Estudos bem controlados e adequados, em mulheres grávidas, não demonstram risco para o feto.
Estudos em animais em reprodução não demonstraram risco fetal, mas não existem estudos contro-
B
lados em grávidas ou estudos em animais em reprodução que mostram efeito adverso.
Risco não pode ser excluído: não existem estudos positivos em humanos e em animais para ris-
C co fetal ou simplesmente inexistem estudos. Contudo, os benefícios potenciais justificam o risco
potencial.
Evidência positiva de risco: dados de investigação ou após liberação no mercado mostram risco para
D
o feto. Mesmo assim, os benefícios potenciais podem sobrepujar o risco.
Contraindicação na gravidez: estudos em animais e humanos, ou relatados de investigação ou após
X
liberação no mercado, mostraram risco fetal, que claramente é maior do que os benefícios potenciais.

2. Adoçantes artificiais
A sacarina não é teratógena, porém tem potencial carcinogênico; o uso do ciclamato é con-
trovertido. Quanto ao aspartame, seus componentes (metanol, ácido aspártico e fenilalanina) são
bem tolerados pelo concepto; deve ser dada atenção às portadoras de fenilcetonúria.

3. Aminoglicosídeos
Amicacina, estreptomicina, gentamicina, netilmicina e tobramicina têm potencial de ototoxici-
dade no feto. Neomicina, pouco absorvida, pode ser utilizada.
340 SIC Resumão revalida

4. Analgésicos
Entre os não opioides, baixas doses de ácido acetilsalicílico são seguras, porém o uso contínuo
de altas doses está contraindicado. São seguros, também, o paracetamol e a dipirona, quando
ministrados em doses terapêuticas e descontínuas. Quanto a opioides, codeína, meperidina, me-
tadona e morfina, se ministrados por tempo prolongado e próximo ao parto, podem causar de-
pressão respiratória e síndrome de privação no recém-nascido.

5. Andrógenos
O danazol é contraindicado por determinar malformações genitais e abortamento.

6. Anfenicóis
O cloranfenicol deve ser evitado próximo ao parto; não há estudos controlados do tianfenicol.

7. Anorexígenos
Anfepramona, femproporex, mazindol, quitosana e sibutramina são contraindicados durante
a gestação. Embora não existam estudos controlados, há relatos de restrição de crescimento
fetal, parto prematuro e maiores morbidades materna e perinatal.

8. Ansiolíticos e hipnóticos
O grande contingente é constituído pelos diazepínicos. Esse grupo de medicamentos era res-
ponsabilizado pela maior incidência de lábio leporino e fenda palatina, porém estudos recentes
com alprazolam e diazepam não confirmaram essas suspeitas. O flunitrazepam, por sua vez, é
contraindicado.
Os barbitúricos fenobarbital e tiopental podem determinar hemorragia e síndrome de priva-
ção, e deve ser avaliada a relação risco–benefício.
Ainda não há estudos controlados para bromazepam, buspirona, clorazepato, clordiazepóxi-
do, cloxazolam, etomidato, lorazepam, midazolam, nitrazepam, pimetixeno, triazolam, zaleplona,
zolpidem e zopiclona.

9. Antagonistas dos receptores de angiotensina


Candesartana, irbesartana, losartana, telmisartana e valsartana, por não apresentarem estu-
dos controlados, não são indicadas para o uso durante a gestação.
Losartana é considerada uma droga de categoria C no 1º trimestre de gestação e categoria D
nos 2º e 3º trimestres.

10. Antiácidos
O uso prolongado de sais de magnésio pode provocar diarreia; os sais de cálcio e alumínio
favorecem a constipação. Altas doses, ministradas por tempo prolongado, podem provocar hi-
percalcemia e hipermagnesemia no recém-nascido. Quando necessário, o uso deve ser pontual.
ginecologia e obstetrícia 341

11. Antiagregantes plaquetários


Buflomedil, dipiridamol, pentoxifilina, ticlopidina e tirofibana ainda não foram testados em
estudos controlados. O ácido acetilsalicílico pode ser empregado em baixas doses. Altas doses
(>6g/d), por períodos prolongados, devem ser evitadas, pois alteram o mecanismo de homeosta-
se materno e fetal.

12. Antiarrítmicos
A amiodarona produz malformações em animais, porém há pouca experiência em humanos.
A lidocaína pode provocar depressão do sistema nervoso central no recém-nascido, enquanto
a adenosina, a mexiletina e a propafenona não apresentam utilização em estudos controlados.
Digoxina, disopiramida, procainamida e quinidina, em doses terapêuticas, não apresentam con-
traindicações.

13. Anticoagulantes
É fundamental o uso de heparina no período embrionário e próximo ao termo nos casos em
que é necessária a anticoagulação. Entre essas 2 etapas, podem ser ministrados derivados cuma-
rínicos do tipo varfarina. Heparinas de baixo peso molecular, enoxaparina, dalteparina e nadro-
parina, apesar de ainda não constarem de estudos bem controlados, aparentemente, são seguras
e usadas rotineiramente na prática clínica.

14. Antidepressivos
O uso de amitriptilina e imipramina está associado a malformações. Amineptina, clomipra-
mina, mirtazapina, reboxetina e tianeptina, bem como os inibidores da monoaminoxidase, não
apresentam estudos controlados. O emprego de fluoxetina, nortriptilina, paroxetina e sertrali-
na é seguro. Estudos recentes demonstraram que o carbonato de lítio, estabilizador de humor
indicado para o tratamento de depressão bipolar, pode promover malformações cardiovascu-
lares e polidrâmnio.

15. Antidiabéticos
Hipoglicemiantes orais, acarbose, clorpropamida, fenformina, glibenclamida, glimepirida, gli-
pizida, repaglinida e rosiglitazona são contraindicados. Por ser a glicemia muito lábil durante a
gestação, o medicamento mais indicado para o controle da gestante diabética é a insulina.
Estudos recentes indicam que a metformina pode ser droga eficaz para utilização durante a
gestação, desprovida de efeitos deletérios/teratogênicos para o feto.

16. Antidiarreicos
A loperamida não tem contraindicação; racecadotrila e atropina/difenoxilato não apresentam
estudos controlados. A furazolidona pode provocar anemia em deficientes de glicose-6-fosfato
desidrogenase.
342 SIC Resumão revalida

17. Antieméticos
O uso da clorpromazina é controvertido; no termo, pode provocar hipotensão no recém-
nascido. Metoclopramida, dimenidrinato, ondansetrona e meclizina aparentemente são drogas
seguras.

18. Antienxaqueca
Derivados do “ergot” não devem ser utilizados. Isometepteno e propifenazona têm de ser
evitados no 1º trimestre e por tempo prolongado. Naratriptana, pizotifeno, rizatriptana, suma-
triptana e zolmitriptana não foram objetos de estudos controlados.

19. Antiepilépticos
Ácido valproico, carbamazepina, clonazepam, fenitoína e primidona promovem malformações
múltiplas, principalmente da face; o fenobarbital causa malformações menores, e o clobazam
está associado à hipotonia do recém-nascido. A tendência é a indicação de monoterapia com a
menor dose possível.

20. Antiespasmódicos
Embora sejam consagradas pelo uso como medicamentos seguros, a atropina, a homatropina
e a N-butilescopolamina não apresentam estudos controlados.

21. Antifúngicos
Alguns medicamentos, como anfotericina B, anfotericina B lipossomal, clotrimazol, miconazol
e nistatina, pouco absorvíveis, podem ser utilizados. Butoconazol, cetoconazol, fluconazol, gri-
seofulvina, metronidazol, secnidazol e tinidazol têm uso recomendado a partir do 2º trimestre,
por serem potencialmente teratogênicos. Ainda não há estudos controlados sobre os efeitos de
econazol, fenticonazol, isoconazol, itraconazol, oxiconazol, sertaconazol, terconazol e tioconazol.

22. Antiflatulento
A dimeticona é droga segura para uso durante a gestação.

23. Anti-helmínticos
Este grupo de medicamentos deve ser utilizado somente após o 2º trimestre, embora alben-
dazol, mebendazol, piperazina e tiabendazol não sejam teratogênicos ou embriotóxicos. Iver-
mectina, levamisol, niclosamida, oxamniquina, pirantel, pirvínio e praziquantel não têm estudos
controlados.

24. Anti-heparínico
A protamina, apesar de bastante empregada, não tem estudos controlados sobre seus efeitos
durante a gestação.
ginecologia e obstetrícia 343

25. Anti-histamínicos
A terfenadina está associada a abortamento, polidactilia e redução de membros, enquanto a
feniramina promove malformações oculares e auriculares. Astemizol, carbinoxamina, clemastina,
clorfeniramina, dexclorfeniramina, ebastina, fexofenadina e hidroxizina não têm estudos contro-
lados. Azatadina, loratadina e prometazina, conforme estudos recentes, podem ser ministradas.

26. Anti-inflamatórios
Anti-inflamatórios não hormonais, sejam derivados dos salicilatos (ácido acetilsalicílico), do
indol (benzidamina, glucametacina, indometacina), do ácido propiônico (cetoprofeno, ibuprofeno,
naproxeno), do ácido fenilacético (diclofenacos sódico e potássico), do ácido antranílico (ácido me-
fenâmico), dos pirazolônicos (butazona cálcica, fenilbutazona, feprazona, oxifembutazona), dos
oxicans (meloxicam, piroxicam, tenoxicam), dos sulfamídicos (nimesulida) ou da nabumetona, são
inibidores das prostaglandinas e não teratogênicos. Ministrados no 3º trimestre, podem promo-
ver gravidez prolongada por inibição do trabalho de parto, disfunção renal fetal, oligoâmnio e
oclusão precoce do ducto arterioso, levando à hipertensão pulmonar primária do recém-nascido.
Os derivados coxibes celecoxibe e rofecoxibe não têm especificidade exclusiva para a ci-
cloxigenase-2 e também estão contraindicados após a 32ª semana, a exemplo dos demais an-
ti-inflamatórios. Os anti-inflamatórios hormonais beclometasona, betametasona, cortisona,
dexametasona, prednisolona e prednisona são empregados com numerosos benefícios para o
binômio fetomaterno, em especial na prevenção da síndrome do desconforto respiratório e de
hemorragias intracranianas. O emprego prolongado desse grupo de fármacos pode, entretanto,
determinar agravamento da síndrome do desconforto respiratório, da hipoplasia e da insufi-
ciência da suprarrenal.

27. Antimaláricos
Mefloquina e quinino devem ser sempre evitados, por determinarem, respectivamente, efei-
tos adversos sobre o concepto e maior frequência de abortamento. Cloroquina e hidroxicloroqui-
na têm indicação controversa.

28. Antipsicóticos
Clorpromazina, haloperidol e promazina não são deletérios para o feto, quando usados em
pequenas doses, em qualquer época da gravidez. Tiaprida é contraindicada.

29. Antitireoidianos
Propiltiouracila atravessa a placenta, e o feto pode apresentar leve hipotireoidismo. Reco-
menda-se o uso da menor dose possível para controlar a crise tireotóxica.

30. Antiulcerosos
Cimetidina, famotidina, pantoprazol e ranitidina não têm contraindicação. O lansoprazol e o
omeprazol não foram adequadamente testados durante a gestação. O misoprostol está absolu-
tamente contraindicado.
344 SIC Resumão revalida

31. Bloqueadores dos canais de cálcio


Diltiazem, felodipino e nimodipino não apresentam toxicidade em embriões humanos. Nifedi-
pino e verapamil podem reduzir o fluxo uteroplacentário, porém não são formalmente contrain-
dicados.

32. Bloqueadores dos receptores alfa e beta-adrenérgicos


O atenolol e o propranolol não apresentam toxicidade fetal, embora estejam associados a res-
trição de crescimento fetal, baixo peso ao nascer, bradicardia fetal, depressão respiratória, hipo-
glicemia neonatal e policitemia quando utilizados em altas doses. A metildopa (inibidora central
dos receptores alfa-adrenérgicos) e o pindolol são medicamentos seguros na gestação.

33. Broncodilatadores
Salbutamol, teofilina e terbutalina devem ser evitados no 1º trimestre. Aminofilina e fenoterol
não apresentam contraindicações.

34. Cefalosporinas
As cefalosporinas de 1ª geração (cefalotina, cefazolina, cefalexina, cefadroxila), de 2ª gera-
ção (cefoxitina, cefuroxima, cefaclor), de 3ª geração (ceftriaxona, ceftazidima, cefotaxima) e de
4ª geração (cefepima) não têm qualquer contraindicação.

35. Diuréticos
São contraindicados no 1º trimestre, pelo risco de malformações fetais e, próximo ao termo,
pela maior incidência de oligoâmnio e hipoglicemia, hiponatremia e hipocalemia neonatais. In-
cluem-se os tiazídicos (hidroclorotiazida, clortalidona), diuréticos de alça (furosemida, bumetani-
da) e poupadores de potássio (espironolactona, amilorida).

36. Estrogênios
O uso de anticoncepcionais orais, clomifeno, dietilestilbestrol, estradiol, estriol e estrogênios
conjugados é contraindicado, pois essas drogas podem promover múltiplas malformações.

37. Hipolipemiantes
Atorvastatina, cerivastatina, lovastatina e sinvastatina estão formalmente contraindicadas.

38. Hipotensores com ação inotrópica


Digoxina é uma droga segura, e dobutamina e dopamina apresentam poucas referências
quanto ao uso na gestação.

39. Hormônios tireoidianos


Calcitonina, levotiroxina e liotironina não apresentam contraindicações.
ginecologia e obstetrícia 345

40. Inibidores da enzima conversora de angiotensina


O uso do captopril e do enalapril não é deletério no 1º trimestre, pois não há potencial te-
ratogênico. A partir do 2º trimestre, determinam oligoâmnio (devido à anúria fetal), contratura
de membros, deformidades faciais, hipoplasia pulmonar, prematuridade, hipotensão neonatal e
persistência do ducto arterioso.

41. Macrolídeos
Estearato de eritromicina e espiramicina não apresentam contraindicações. Azitromicina, cla-
ritromicina e roxitromicina não apresentam estudos controlados.

42. Penicilinas
Penicilina G (procaína e benzatina), oxacilina, ampicilina, amoxicilina e outros derivados da
penicilina não têm contraindicação.

43. Quinolonas
Ciprofloxacino, levofloxacino, lomefloxacino e norfloxacino não devem ser utilizados duran-
te a gestação, pois promovem malformações em fetos de animais. Não há estudos controlados
em humanos.

44. Sulfas
Sulfadiazina, sulfametoxazol e sulfassalazina devem ser evitadas no 3º trimestre. Essas dro-
gas competem com a bilirrubina pelas proteínas carreadoras, podendo determinar hiperbilirru-
binemia neonatal.

45. Tetraciclinas
Tetraciclina e doxiciclina estão contraindicadas na gestação. Essas drogas podem causar alte-
rações dentárias, inibição do crescimento da fíbula, prematuridade e óbito fetal.

46. Tuberculostáticos
Etambutol, etionamida, isoniazida, pirazinamida e rifampicina podem ser usados sem prejuízo
fetal. A estreptomicina deve ser evitada.

47. Vasodilatadores
Diazóxido pode causar hipoglicemia, hiperbilirrubinemia e trombocitopenia neonatais. Nitro-
glicerina, isossorbida e nitroprussiato de sódio apresentam poucos estudos.
346 SIC Resumão revalida

24 Gestação gemelar

1. Introdução
A gestação múltipla é definida como aquela proveniente de 1 ou mais ciclos ovulatórios, re-
sultando no desenvolvimento de mais de 1 embrião ou na sua divisão, independentemente do
número final de recém-nascidos.

2. Incidência
Alguns fatores demográficos interferem na frequência de gestações dizigóticas; sua ocorrên-
cia é mais comum quando há história familiar materna e com o aumento da idade materna e da
paridade. No entanto, o uso cada vez mais frequente de medicações para a indução da ovulação e
a transferência de múltiplos embriões por ciclo de reprodução assistida são os principais respon-
sáveis pelo aumento acentuado observado ao longo das últimas décadas.

3. Fatores de risco
- Utilização de técnicas de reprodução assistida;
- Idade materna (até os 37 anos);
- Multiparidade (1,5% em primigestas e 3% em quartigestas);
- Etnia: maior incidência em negras quando comparadas a caucasianas e asiáticas (1/155);
- Demora da passagem do ovo fecundado nas trompas;
- Ocorrência de microtraumas no blastocisto durante a manipulação realizada nos procedimentos de reprodução
assistida.

4. Zigoticidade e corionicidade
As gestações múltiplas podem ser classificadas segundo a zigoticidade ou a corionicidade:
ͳͳ As gestações dizigóticas resultam da fecundação de mais de 1 óvulo, e os embriões apresen-
tam materiais genéticos diferentes;
ͳͳ As gestações monozigóticas resultam da divisão de massa embrionária inicial única, e os
embriões resultantes apresentam carga genética idêntica.
Aproximadamente 2/3 das gestações gemelares naturalmente concebidas são dizigóticas, e
1/3, monozigóticas.
Nas gestações dizigóticas, cada embrião desenvolve seus próprios cório e âmnio (são sempre
dicoriônicas e diamnióticas). As monozigóticas, por sua vez, têm corionicidade e amnionicidade
variáveis, conforme o momento em que ocorre a divisão da massa embrionária. Em cerca de 25%
dos casos, quando a divisão do blastocisto ocorre em até 72 horas, podem ser encontrados 2 pla-
centas e 2 sacos amnióticos (gestação dicoriônica diamniótica). Em 74% dos casos, a divisão acon-
tece entre o 4º e o 8º dias após a fertilização, quando já ocorreu a diferenciação das células que
dão origem ao cório, resultando em 1 placenta e 2 cavidades amnióticas (gestação monocoriônica
diamniótica). Em aproximadamente 1% dos casos, a divisão do blastocisto ocorre entre o 8º e o 13º
dias após a fertilização, isto é, quando já se formaram a placa coriônica e o saco amniótico, dando
origem às gestações monocoriônicas monoamnióticas.
ginecologia e obstetrícia 347

Os gêmeos unidos são resultantes da falha da separação completa dos embriões e ocorrem
quando o processo de divisão é tardio (ao redor do 15º ao 17º dias).

5. Diagnóstico
A corionicidade sempre pode ser determinada com exatidão por meio de ultrassonografia reali-
zada precocemente. A presença de monocorionicidade (única placenta) sempre implica monozigo-
ticidade; por outro lado, as gestações dicoriônicas (2 placentas) podem ter origem monozigótica
ou dizigótica. Nesses casos, o diagnóstico pode ser feito somente quando há discordância entre
os sexos fetais ou pode ser investigado por meio de estudos do DNA (gêmeos com sexos dife-
rentes são sempre dizigóticos e dicoriônicos, enquanto gêmeos do mesmo sexo podem ser tanto
monozigóticos como dizigóticos).
As complicações fetais são mais frequentes nas gestações monocoriônicas em comparação
com as dicoriônicas. Portanto, na prática, a determinação da corionicidade, em vez da zigoticida-
de, é o fator mais importante para a conduta pré-natal e o principal determinante do prognóstico
gestacional.
Nas gestações monocoriônicas, a partir da 6ª semana, pode-se identificar mais de 1 embrião no
interior do mesmo saco gestacional, e o âmnio se torna visível a partir da 8ª semana. No final do 1º
trimestre, há a fusão das membranas amnióticas adjacentes, dando origem a um septo fino entre
as 2 cavidades amnióticas que se insere de maneira abrupta na placenta, formando o sinal do “T”.
Do ponto de visto clínico, os sinais e sintomas relacionados à gestação gemelar são volume
uterino maior do que o esperado para a idade gestacional (via de regra, a altura uterina é 5cm
maior do que a esperada entre 20 e 30 semanas gestacionais), presença de 2 polos cefálicos
à palpação, ausculta de 2 ritmos cardíacos com frequências diferentes entre si e diferentes da
mãe. Todos esses achados são tardios e podem ser facilmente falseados. Atualmente, a reali-
zação da ultrassonografia durante o 1º trimestre permite diagnosticar, com segurança, pratica-
mente todos os casos.

6. Complicações fetais
Do ponto de vista fetal, a gemelaridade aumenta as chances de complicações como óbito fetal,
malformações fetais, acidentes de cordão e apresentação fetal anômala durante o trabalho de
parto. O diagnóstico de baixo peso ao nascer é frequente devido à maior incidência de prematu-
ridade e restrição do crescimento fetal. Algumas das intercorrências são exclusivas de gestações
múltiplas, como a síndrome da transfusão fetofetal e a discordância entre os fetos quanto a alte-
rações morfológicas, alterações de vitalidade fetal e alterações do crescimento fetal.
A duração média da gestação gemelar é de aproximadamente 35 semanas e, para as gesta-
ções trigemelares, de 32 semanas. Assim, o parto prematuro ocorre em 30 a 50% dos casos, e,
devido à alta frequência, a prematuridade é o principal fator determinante das elevadas taxas de
morbidade e mortalidade associadas a esse tipo de gestação. O prognóstico dos recém-nascidos
prematuros de gestações múltiplas é similar ao observado em gestações únicas da mesma idade
gestacional. O risco de parto pré-termo é maior nas gestações monocoriônicas.
Em alguns casos, pode ocorrer a parada do desenvolvimento de somente 1 dos embriões.
Exceto pelo diagnóstico ultrassonográfico, a maioria desses casos não apresenta quaisquer ma-
nifestações clínicas ou repercussões para o feto remanescente; eventualmente, a gestante pode
apresentar queixa de sangramento vaginal. Quando a parada do desenvolvimento embrionário
348 SIC Resumão revalida

ocorre durante o 1º trimestre da gestação, frequentemente há reabsorção completa dos tecidos,


e não são encontrados indícios no momento do parto ou no exame histopatológico da placenta.
Também a gestação gemelar é fator de risco para o óbito fetal. Quanto mais precoce o óbito
fetal, menor a chance de sobrevida do feto remanescente, principalmente nos casos em que os
fetos são de sexos concordantes. Nas gestações em que ocorre óbito de 1 dos fetos, há risco au-
mentado para óbito, presença de sequelas neurológicas e parto pré-termo do outro feto.

7. Complicações específicas
A síndrome de transfusão fetofetal é uma complicação específica e exclusiva das gestações
monocoriônicas: acontece em cerca de 10 a 15% destas. O mecanismo primário da doença consis-
te na transferência desigual de sangue entre as circulações dos 2 fetos por meio de anastomoses
vasculares placentárias do tipo arteriovenosas, que funcionam como se fossem fístulas.
O gêmeo-doador apresenta anemia e restrição do crescimento fetal grave acompanhados de
oligúria e oligoidrâmnio, enquanto o gêmeo-receptor apresenta sobrecarga circulatória e policite-
mia, o que pode levar a desenvolvimento de insuficiência cardíaca e hidropisia fetal. A ocorrência
de polidrâmnio no feto-receptor leva ao aumento da pressão intrauterina, o que pode prejudicar
ainda mais a circulação placentária.
Os casos graves, em que ocorre o desenvolvimento de polidrâmnio agudo, manifestam-se en-
tre 16 e 24 semanas de gestação. Quando não tratados, esses casos estão associados a taxas de
mortalidade de 80 a 100%. Isso se deve, especialmente, às altas taxas de óbito fetal espontâneo
de 1 ou ambos os fetos, abortamento, amniorrexis prematura e parto prematuro. A morte de um
dos fetos (geralmente o receptor morre antes) leva à ocorrência de alterações hemodinâmicas
que resultam em hipovolemia acentuada do feto sobrevivente, com alta morbidade (especialmen-
te sequelas neurológicas) e alta mortalidade.
Os achados ultrassonográficos que caracterizam a síndrome de transfusão fetofetal estão na
Tabela a seguir:
- Gestação gemelar com confirmação ultrassonográfica da monocorionicidade durante o 1º trimestre da ges-
tação. Nos casos sem diagnóstico precoce da corionicidade, o exame ultrassonográfico deverá demonstrar
gestação gemelar com fetos do mesmo sexo, massa placentária única e membrana interamniótica fina;

- Os fetos não devem apresentar malformações estruturais;

- Polidrâmnio na cavidade amniótica do feto receptor, cuja bexiga urinária se apresenta distendida;

- Oligoidrâmnio na cavidade do feto doador, cuja bexiga urinária muitas vezes não é identificável;

- O receptor, geralmente, tem biometria compatível à idade gestacional e, nos casos graves, pode apresentar
sinais de comprometimento da função cardíaca, além de hidropisia;

- O doador apresenta, frequentemente, restrição do crescimento fetal e alterações no Doppler das artérias umbi-
licais, como aumento dos índices de resistência e/ou diástole zero ou reversa.

Algumas técnicas foram propostas para o tratamento dessa complicação, com o objetivo de
melhorar a sobrevida dos fetos. A seguir, serão descritas algumas dessas técnicas.

A - Amniodrenagem
O polidrâmnio, quando progressivo, leva ao desconforto materno e torna o útero tenso à pal-
pação. A remoção do excesso de líquido amniótico por meio da amniocentese, procedimento de
fácil execução e que não requer material especial, alivia o polidrâmnio associado à síndrome de
transfusão fetofetal e reduz o risco de amniorrexis e trabalho de parto prematuro, prolongando,
ginecologia e obstetrícia 349

dessa forma, a duração da gestação. É frequente a formação repetitiva do polidrâmnio; nesses


casos, o procedimento pode ser repetido (de 1 a 6 intervenções durante a gestação).
Em estágios avançados, a taxa de sobrevida de pelo menos 1 feto após o tratamento é de 40%,
e a taxa de sobrevida dos 2 fetos é de 20%. O risco de sequelas neurológicas varia de 17 a 33%.
As complicações do procedimento ocorrem em aproximadamente 5 a 10% dos casos e in-
cluem óbito fetal ou abortamento até 48 horas após, amniorrexis e descolamento prematuro de
placenta.

B - Cirurgia endoscópica intrauterina com laser


Essa cirurgia se baseia no exame direto da superfície placentária, por meio de fetoscopia, para
identificação e coagulação com laser dos vasos que cruzam o equador delimitado pela membrana
interamniótica e comunicam uma metade funcional da placenta com a outra. Esse método age
especificamente na fisiopatologia da doença. É um procedimento realizado em poucos centros de
referência, pois requer material especializado e treinamento apropriado.
Em estágios avançados, a taxa de sobrevida de apenas 1 feto após o tratamento é de 75%; dos
2, é de 40%; a incidência de sequelas neurológicas é de 4,2%.
As complicações associadas ao método são as mesmas que as descritas para a amniodrena-
gem, entretanto a morbidade materna é maior, por ser um procedimento mais invasivo.

C - Septostomia
A septostomia consiste na criação de um orifício na membrana interamniótica comunicando
as 2 cavidades amnióticas. É realizada junto com a amniodrenagem, empregando-se o mesmo
material. A taxa de sobrevida é de 40 a 83%, e o mecanismo de atuação se dá pelo efeito combi-
nado do alívio do polidrâmnio com o equilíbrio entre as pressões das cavidades amnióticas. Essa
técnica apresenta os mesmos riscos descritos para a amniocentese e o risco específico de entre-
laçamento dos cordões, uma vez que a gestação está sendo transformada em monoamniótica.

D - Feticídio seletivo
a) Transfusão fetofetal
O feticídio seletivo representa a interrupção seletiva da vida de 1 dos gêmeos e deve ser rea-
lizado por meio de técnica que evite o comprometimento circulatório do gemelar sobrevivente.
É somente indicado aos casos em que há sinais de morte intrauterina iminente de 1 dos fetos. As
taxas de sobrevida são de, no máximo, 50%, e o número de casos relatados até hoje é pequeno. As
técnicas empregadas incluem clampeamento do cordão umbilical por intermédio de fetoscopia e
embolização vascular guiada pela ultrassonografia. Os riscos maternos associados ao tratamento
dependem da técnica empregada.

b) Discordância de peso entre os fetos


A discordância de crescimento fetal pode ser definida de diferentes formas:
ͳͳ Diferença de peso em valores absolutos de 250 a 300g entre o gêmeo maior e o menor;
ͳͳ Diferença de desvio-padrão de peso entre os gêmeos em tabela predefinida;
ͳͳ Diferença entre os perímetros abdominais fetais >20mm.
Tal discordância acontece em 5 a 15% das gestações gemelares e está associada ao aumento
do risco de óbito fetal e de mortalidade neonatal. Pode ser decorrente de diferenças na pla-
350 SIC Resumão revalida

centação e no potencial genético individual (nas gestações dizigóticas), anormalidades de in-


serção do cordão, discordância quanto a malformações congênitas e síndromes genéticas e/ou
infecção congênita; nuliparidade materna, gestações monocoriônicas e ocorrência de síndro-
me de transfusão fetofetal também estão relacionadas à maior incidência de discordância de
crescimento fetal. Nos casos com discordância de peso fetal sem causa aparente, a morbidade
neonatal está relacionada à corionicidade e à ocorrência de restrição do crescimento, e não à
discordância propriamente dita.
Não existem evidências que indiquem a resolução dos casos somente em função da ocorrên-
cia de crescimento fetal discordante.

c) Gêmeo acárdico

A ocorrência de gêmeo acárdico é de cerca de 1% das gestações monocoriônicas e representa


o grau máximo de anormalidade vascular nessas gestações.
O gemelar anormal apresenta múltiplas malformações estruturais, que incluem ausência do
coração ou presença de órgão rudimentar, e ausência do polo cefálico, associada ou não a al-
terações dos membros superiores. O tronco pode estar presente, podendo desenvolver edema
acentuado, ou, ainda, apresentar-se como uma massa amorfa.
Tais fetos não sobrevivem após o nascimento, em virtude das múltiplas e graves anormalida-
des. Sua perfusão sanguínea intrauterina se mantém graças à presença de anastomose arterioar-
terial com o outro feto. O gemelar normal (doador), atuando como bomba para o feto anormal
(acárdico), morre em 50 a 70% das gestações, devido a insuficiência cardíaca congestiva ou parto
pré-termo decorrente de polidrâmnio grave.
O tratamento desses casos é realizado por meio da oclusão do fluxo sanguíneo para o gêmeo
acárdico, por ligadura endoscópica, coagulação com laser do cordão umbilical ou embolização dos
vasos umbilicais dentro do abdome do feto acárdico por intermédio da injeção de álcool absoluto.
Nos casos de gestação em fase tardia (próximo à viabilidade do feto normal), o tratamento con-
siste na realização do parto.

8. Gestação monoamniótica
As gestações gemelares monoamnióticas estão associadas ao risco de 50 a 75% de óbito fetal
intrauterino devido, principalmente, ao enovelamento dos cordões umbilicais e à consequente
interrupção do fluxo sanguíneo. Outros fatores associados às perdas fetais são as malformações
e o parto prematuro.
O diagnóstico dessas gestações é baseado na demonstração da presença de 2 fetos no interior
do mesmo saco gestacional, sem membrana interposta, ou na demonstração do enovelamento
do cordão umbilical no exame de Doppler com fluxo colorido.
O momento ideal para a interrupção da gestação é motivo de controvérsias; alguns autores
indicam a realização do parto na 32ª semana, enquanto outros consideram que o risco de óbito
súbito diminui no 3º trimestre, o que justificaria retardar o momento do parto. Esse limite deve
ser estabelecido individualmente, de acordo com as condições disponíveis de cuidados intensi-
vos neonatais.

- Gêmeos unidos
A união dos gêmeos é um evento raro, que acomete aproximadamente 1 a cada 50.000 ges-
tações. O diagnóstico ultrassonográfico é possível a partir da identificação de gestação gemelar
ginecologia e obstetrícia 351

com massa placentária única, falha na demonstração de membrana interamniótica e fetos que
não se separam.
A união pode ser anterior (toracópagos, onfalópagos ou tóraco-onfalópagos), posterior (pi-
gópagos), dos polos cefálicos (craniópagos) ou caudal (isquiópagos). O prognóstico depende do
local de união, dos órgãos envolvidos e da extensão da união, além da presença de eventuais
malformações associadas. Geralmente, o prognóstico é definido pela possibilidade de correção
de cardiopatias frequentemente encontradas. É obrigatória a ecocardiografia fetal no pré-na-
tal. Quando o prognóstico é ruim, o parto pode ser por via vaginal e depende, especialmente,
das dimensões dos fetos.

9. Resolução da gestação e parto


A idade gestacional ideal para a resolução das gestações gemelares é controversa. Recomen-
da-se a resolução das gestações monocoriônicas na 36ª semana e das dicoriônicas entre a 37ª e
a 38ª semanas.
As complicações mais comuns do parto na gestação múltipla são as distocias funcionais, apre-
sentação fetal anômala, prolapso de cordão, descolamento prematuro de placenta e hemorragias
pós-parto.
A via de parto ainda é discutível. Alguns estudos sugerem que a cesárea eletiva poderia redu-
zir em até 75% o risco de óbito perinatal em gestações a termo. As complicações relacionadas ao
parto vaginal devem-se, principalmente, ao risco de óbito do 2º gemelar por anóxia.
Para a escolha da via de parto, são consideradas as apresentações dos fetos e a idade
gestacional. Para gestações a termo, quando o 1º gemelar ou ambos são cefálicos, não ha-
vendo outras complicações, pode-se optar pela via vaginal. Em casos em que o 1º gemelar
não é cefálico ou apresenta peso estimado menor do que o 2º (com diferença ≥500g), opta-se
pela cesárea. O mesmo vale para gestações pré-termo com fetos viáveis ou em que o peso
estimado seja <1.500g.
Após o nascimento do 1º gemelar, é importante manter o cordão deste clampeado para evitar
a exsanguinação do outro feto. Procede-se, então, à amniotomia da 2ª bolsa e aguarda-se a evolu-
ção por um período máximo de 10 minutos. Ocorrendo insinuação e boa evolução nesse período,
procede-se à assistência ao parto vaginal. Não ocorrendo a insinuação ou se a apresentação do 2º
gemelar for córmica, pode-se realizar versão interna e extração pélvica antes de haver o enluva-
mento fetal pelo útero contraído. Quando ocorre o enluvamento, a fim de tentar evitar a cesárea
no 2º gemelar, podem ser utilizadas drogas anestésicas inalatórias que promovem o relaxamento
uterino e permitem manobras obstétricas.
Algumas distocias são específicas de gestações gemelares. Entre elas, destacam-se:
ͳͳ Compactação: insinuação completa e simultânea dos polos fetais de ambos os gêmeos, im-
pedindo sua descida;
ͳͳ Colisão: contato de um gêmeo com o outro, impedindo a descida de um deles;
ͳͳ Encravamento mútuo: adaptação completa da superfície inferior do mento de 1 dos gêmeos
ao mento do outro gemelar;
ͳͳ Impactação: encaixe de parte de 1 dos gêmeos com o outro, com insinuação simultânea.
352 SIC Resumão revalida

25 Prematuridade

1. Introdução
Definição pela Organização Mundial da Saúde: todo Recém-Nascido (RN) vivo com menos de
Prematuro
37 semanas completas de gestação
RN de baixo peso Com menos de 2.500g, não importando a idade gestacional

Fatores de risco
Obstétricos
- Infecção amniótica;
- Rotura prematura de membranas;
- Alterações hormonais;
- Sangramentos vaginais de 1ª e 2ª metades;
- Placenta prévia;
- Descolamento prematuro de placenta;
- Incompetência cervical;
- Gemelaridade/polidrâmnio;
- Malformações fetais e placentárias;
- Partos prematuros anteriores.
Ginecológicos
- Amputação do colo uterino;
- Malformações uterinas;
- Miomas.
Epidemiológicos
- Baixo nível socioeconômico;
- Desnutrição;
- Gravidez indesejada;
- Estresse;
- Assistência pré-natal inadequada;
- Fumo;
- Drogas.
Clínico-cirúrgicos
- Doenças maternas;
- Procedimentos cirúrgicos na gravidez.
Iatrogênicos
Desconhecidos

2. Identificação do risco e manejo no trabalho de parto prematuro


Devem-se analisar:
ͳͳ Mudanças da contratilidade uterina: contrações rítmicas e frequentes, características do
trabalho de parto;
ͳͳ Mudanças bioquímicas que sugiram parto prematuro (interleucinas 6 e 8, hormônio libe-
rador da corticotrofina, fibronectina fetal e proteína-1 fosforilada ligada ao fator de cresci-
mento insulina-símile);
ginecologia e obstetrícia 353

ͳͳ Características do colo uterino: quando <20mm e com dilatação, é considerado de alto risco
para prematuridade, portanto se deve proceder com repouso, uso de progesterona e, quan-
do necessário, circlagem, abstinência sexual e pesquisa de infecções geniturinárias.
Fibronectina fetal: uma glicoproteína de alto peso molecular produzida pelo trofoblasto, cuja
função é assegurar a aderência do blastocisto à decídua. Normalmente, está presente no con-
teúdo cervicovaginal durante as primeiras 20 semanas de gestação. Após a 22ª semana, ocorre a
fusão do âmnio com o cório, e a fibronectina desaparece da vagina até a 36ª semana, a menos que
haja rotura de membranas, presença de fator mecânico que separe o cório da decídua ou diante
de um processo inflamatório, infeccioso ou isquêmico na interface materno-fetal. Tem elevado
valor preditivo negativo, que varia de 81 a 96%, fato que a torna muito útil para afastar o risco de
parto prematuro nas 2 a 3 semanas seguintes à realização do teste. Além de tudo isso, é aplicada
basicamente em 2 grupos:
ͳͳ Gestantes sintomáticas, com queixas de contrações uterinas;
ͳͳ Gestantes assintomáticas, mas de alto risco para prematuridade (antecedente de parto pre-
maturo espontâneo e gestação gemelar).
Coleta: deve ser realizada em gestante apenas nas seguintes condições:
ͳͳ Idade gestacional entre 22 e 36 semanas;
ͳͳ Bolsa íntegra;
ͳͳ Dilatação cervical <3cm;
ͳͳ Ausência de sangramento genital;
ͳͳ Ausência de relação sexual nas últimas 24 horas.
Identificado o trabalho de parto verdadeiro, deve-se considerar se há condições favoráveis
para inibir o trabalho de parto, ou seja, se o ambiente intrauterino não está em condições desfa-
voráveis para manter a gestação. Se as condições são favoráveis para a inibição das contrações
uterinas, deve-se proceder a hidratação parenteral e repouso absoluto e, quando necessário, ini-
ciar o uso de tocolíticos.
Condições ao uso de tocolíticos
- Período de latência do trabalho de parto;
- Dilatação cervical <3cm;
- Esvaecimento não pronunciado;
- Idade gestacional entre 22 e 34 semanas;
- Contrações uterinas rítmicas.

Contraindicações à tocólise
- Óbito fetal;
- Sofrimento fetal;
- Malformações fetais incompatíveis com a vida;
- Restrição do crescimento fetal;
- Rotura das membranas ovulares;
- Infecção amniótica;
- Descolamento prematuro da placenta;
- Placenta prévia sangrante;
- Síndrome hipertensiva grave;
- Diabetes insulinodependente instável;
- Cardiopatias descompensadas;
- Hipertireoidismo;
- Anemia falciforme.
354 SIC Resumão revalida

Corticoterapia
- Deve ser administrada entre a 26ª e a 34ª semanas de gestação;
- Age no pneumócito II, estimulando a produção de surfactante pulmonar;
- Diminui o risco de membrana hialina, hemorragia intracraniana e síndrome da angústia respiratória;
- Betametasona 12mg IM, 1x/d, por 2 dias;
- Dexametasona 6mg IM, 12/12h, por 2 dias;
- Idealmente, realizar apenas 1 ciclo e, no máximo, 2;
- Utilizada em conjunto com beta-agonistas, parece aumentar o risco de edema pulmonar; utilizar após a tocólise.

A seguir, os principais uterolíticos:

ͳͳ Beta-agonistas:
• Terbutalina, salbutamol, isoxsuprina, fenoterol e ritodrina, que atuam no relaxamento da
fibra muscular uterina. Essas drogas, por atravessarem a placenta, podem causar alguns
efeitos colaterais no feto, dentre eles taquicardia, hiperinsulinismo, hipoglicemia, hipoca-
lemia e hipotensão arterial;
• Quando se alcança a dose mínima adequada para cessar as contrações, é mantida por 24
horas. Após isso, se deve diminuí-la de 20 em 20 minutos, até a interrupção completa.
Caso as contrações retornem, o procedimento pode ser reiniciado;
• Durante o uso da medicação, deve-se fazer a monitorização dos sinais vitais materno e
fetal, além das auscultas pulmonar e cardíaca materna.
ͳͳ Nifedipino (1ª escolha – Ministério da Saúde):
• 10mg VO (a cada 20 minutos), até 4 doses, ou 20mg VO, em dose única;

• Se necessário, 20mg após 90 a 120 minutos se a atividade uterina persistir;

• Se após a 2ª dose mantiver atividade uterina, considerar falha terapêutica e utilizar outro
agente;
• A dose de manutenção é de 20mg VO, a cada 4 a 8 horas, por, no máximo, 72 horas;

• As contraindicações são: hipotensão materna (pressão arterial <90x50mmHg) e bloqueio


atrioventricular.
ͳͳ Sulfato de magnésio:
• Trata-se de uma opção quando não se pode utilizar o beta-agonista, agindo na fibra mus-
cular como um antagonista do cálcio;
• Pode ser utilizado em:

* Gestações com menos de 30 semanas;


* Imediatamente antes do parto;
* 4g por via intravenosa;
* Alguns estudos mostram proteção do sistema nervoso central do feto;
* Observação: não consta no protocolo do Ministério da Saúde.
ͳͳ Inibidores de prostaglandinas:
• Agem na enzima cicloxigenase, inibindo-a.
ginecologia e obstetrícia 355

ͳͳ Antagonistas da ocitocina:
• Atosibana;

• Menos efeitos colaterais;

• Alto custo.

3. Trabalho de parto prematuro


Caso não haja condições para a inibição do trabalho de parto prematuro, deve ser realizado o
parto. Nesse caso, o objetivo será oferecer à mãe e ao feto boa assistência, sendo necessários um
bom berçário e uma unidade de terapia intensiva neonatal. A escolha da via, por sua vez, depen-
derá das condições maternas, como integridade das membranas ovulares, e das condições fetais,
como apresentação fetal.

4. Profilaxia de estreptococo do grupo B


ͳͳ Flora vaginal/retal;
ͳͳ Transmissão durante trabalho de parto;
ͳͳ Morbidade/mortalidade neonatal;
ͳͳ Cultura perineal com 35 a 37 semanas de gestação para pesquisa de colonização:
• Fatores de risco:

* Parto prematuro;
* RMO >18 horas;
* Febre durante trabalho de parto;
* História prévia;
* Infecção do trato urinário por estreptococo do grupo B (mesmo já tratada);
* RN com infecção em gestação prévia.
• Antibioticoterapia (sugestões):

* Penicilina G cristalina:
¤ 5.000.000UI (dose de ataque);
¤ 2.500.000UI, 4/4h, até o parto.

* Ampicilina:
¤ 2g (dose de ataque);
¤ 1g, 4/4h, até o parto.

* Clindamicina:
¤ 900mg, 8/8h, até o parto.

* Eritromicina:
¤ 500mg, 6/6h, até o parto.
356 SIC Resumão revalida

26 Restrição do crescimento fetal

1. Introdução
ͳͳ É a 2ª principal causa de morbidade e mortalidade perinatal;
ͳͳ A Restrição do Crescimento Fetal (RCF) traduz a existência de um processo patológico capaz
de modificar o potencial de crescimento fetal e promover alterações importantes no Recém-
Nascido (RN); nem todos os RNs com percentil <10 têm características patológicas. Alguns
são constitucionalmente pequenos;
ͳͳ A morbidade perinatal é maior entre os RNs com RCF: hipóxia, aspiração de mecônio, hipo-
glicemia, hipocalcemia, policitemia, hipotermia, hemorragia pulmonar e prejuízo no desen-
volvimento neuropsicomotor.
Pode-se classificar a RCF em 3 tipos:
- A causa ocorre logo no início da gravidez;

Tipo I (simétrico) - O RN é pequeno, porém suas medidas são proporcionais;


- Fatores envolvidos: genética, infecções congênitas, drogas e radiações ionizantes; não sen-
do a forma mais comum, com prognóstico ruim.
- A causa ocorre no feto por volta do 3º trimestre da gestação;
- RN com medidas desproporcionais, sendo o abdome o mais comprometido;
Tipo II
(assimétrico) - Fatores envolvidos:
· Insuficiência placentária, fatores fetais;
· Forma mais frequente, com bom prognóstico.
- A causa ocorre no 2º trimestre da gestação;
Tipo intermediário - O RN apresenta defeitos em ossos longos e cefálico;
- Fatores envolvidos: desnutrição, alguns fármacos, tabagismo e álcool.

2. Etiologia
Divisão em fetal, materna ou placentária:
ͳͳ Causas fetais: alterações genéticas (cromossomopatias, triploidias, síndrome de Turner e
mosaicismos), defeitos do tubo neural, acondroplasia, condrodistrofias, osteogênese imper-
feita, demais malformações;
ͳͳ Causas maternas: infecções congênitas por vírus, bactérias ou protozoários; uso de drogas e
substâncias tóxicas, tabagismo, radiações ionizantes, desnutrição, doenças clínicas (anemia,
síndromes hipertensivas, cardiopatias, diabetes, lúpus);
ͳͳ Causas placentárias: patologias placentárias (placenta prévia, placenta circunvalada, co-
rioangiomas, inserção velamentosa de cordão, artéria umbilical única), transferência pla-
centária deficiente (presença de trombos e infartos placentários).

3. Diagnóstico
Deve-se avaliar, em conjunto, 3 parâmetros principais, além da anamnese minuciosa:
ͳͳ O exame físico materno deve incluir o ganho de peso. Este poderá ser guia com relação ao cres-
cimento fetal;
ͳͳ A medida da altura uterina é um método de screening que vai estabelecer se há RCF. Porém,
na presença de algumas situações, como gestação gemelar, polidrâmnio, situação transver-
sa e obesidade extrema, pode gerar erro no valor da medida;
ginecologia e obstetrícia 357

ͳͳ A ultrassonografia deverá ser realizada para obter valores como diâmetro biparietal, Cir-
cunferência Cefálica (CC), Circunferência Abdominal (CA), relação CC–CA, comprimento do
Fêmur (F), relação F–CA, estimativa de peso fetal e medida do volume do líquido amniótico.

4. Conduta assistencial
ͳͳ Nos dias de hoje, ainda não existe tratamento para deter a evolução da RCF;
ͳͳ Caso haja conhecimento da etiologia da RCF, deve-se iniciar o seu tratamento específico;
ͳͳ A ultrassonografia morfológica fetal e a ecocardiografia fetal devem ser realizadas na pre-
sença de RCF antes da 28ª semana;
ͳͳ No último trimestre, normalmente, a etiologia da RCF é devida a insuficiência placentária;
portanto, o acompanhamento da vitalidade fetal é sempre muito importante;
ͳͳ Cardiotocografia anteparto, perfil biofísico fetal e dopplervelocimetria são bons métodos
para avaliação fetal e prognóstico da RCF.

Figura 1 - Decisões para restrição de crescimento fetal

5. Assistência ao parto
Na maioria dos casos, a via de parto será escolhida dependendo da situação em que o feto se
encontra, porém, em casos de malformações fetais, o parto vaginal é priorizado.
Quando se optar pela via vaginal, deve-se proceder normalmente, porém sempre se lembrar
de manter o controle da vitalidade fetal, peso ser >1.500g e o feto ter boa oxigenação. O clampea-
mento do cordão umbilical deve ser precoce.
358 SIC Resumão revalida

27 Síndromes hipertensivas na gestação

1. Introdução
São a maior causa de morbimortalidade materna e fetal, sendo 45% das mortes maternas por
eclâmpsia.
As síndromes hipertensivas na gestação compreendem:
ͳͳ Hipertensão Arterial Crônica (HAC);
ͳͳ Doença Hipertensiva Específica da Gestação (DHEG);
ͳͳ Eclâmpsia;
ͳͳ Síndrome HELLP;
ͳͳ Hipertensão gestacional;
ͳͳ HAC + DHEG superajuntada.

2. Pré-eclâmpsia
ͳͳ Compreende: desenvolvimento de hipertensão e proteinúria após a 20ª semana de gesta-
ção, com desaparecimento até 12 semanas após o parto. Constitui exceção moléstia tro-
foblástica gestacional, situação na qual pode aparecer antes da 20ª semana;
ͳͳ Hipertensão: PA >140x90mmHg (2 medidas);
ͳͳ Proteinúria: >300mg/d ou >1g/L ou 1+ em 2 medidas de amostra isolada de urina;
ͳͳ Fatores de risco: número de paridade (primigestas), história familiar de Pré-Eclâmpsia
(PE), extremos de idade de vida reprodutiva, gestação múltipla, gestação molar, HAC,
hidropisia fetal, doenças do colágeno;
ͳͳ Pacientes com PE podem apresentar o fluxo uteroplacentário diminuído, que diminuirá a oxi-
genação do tecido trofoblástico, aumentando o tromboxano A2 e diminuindo as prostacicli-
nas, ocasionando vasoespasmo generalizado e, então, aumento da PA; com isso, ocorre alte-
ração da coagulação e da permeabilidade capilar, podendo gerar insuficiência placentária com
restrição do crescimento fetal, sofrimento fetal crônico e, eventualmente, óbito intrauterino.
Classificação (Ministério da Saúde)
Grave
- Pressão diastólica ≥110mmHg;
- Proteinúria ≥2g/24h ou 2+ em fita urinária;
- Oligúria (<500mL/d ou 25mL/h);
- Creatinina >1,2mg/dL;
- Sinais de encefalopatia hipertensiva (cefaleia e distúrbios visuais);
- Dor epigástrica ou no hipocôndrio direito;
- Evidência clínica e/ou laboratorial de coagulopatia;
- Plaquetopenia (<100.000/mm3);
- Aumento de TGO, TGP, DHL e bilirrubinas;
- Presença de esquizócitos em sangue periférico.
ginecologia e obstetrícia 359

Outros sinais que podem sugerir o diagnóstico


- Acidente vascular cerebral;
- Sinais de insuficiência cardíaca, ou cianose;
- Presença de restrição do crescimento fetal e/ou oligoâmnio.

Conduta na PE:
Avaliação laboratorial e sua justificativa para gestantes que desenvolvem hipertensão após a 2ª
metade da gravidez ou que apresentam agravamento de hipertensão prévia
Exame Justificativa
A hemoconcentração apoia o diagnóstico de pré-eclâmpsia e é um
Hemoglobina e hematócrito indicador de gravidade. Os valores podem estar diminuídos, entre-
tanto, se a doença é acompanha de hemólise.
Contagem de plaquetas A trombocitopenia sugere pré-eclâmpsia.
Quantificação da excreção de proteína na Hipertensão na gravidez com proteinúria deve ser considerada pré
urina -eclâmpsia (pura ou sobreposta) até prova em contrário.
Níveis anormais ou em elevação da creatinina, especialmente com
Nível sérico de creatinina
oligúria, sugerem pré-eclâmpsia grave.
Níveis séricos aumentados de ácido úrico sugerem o diagnóstico de
Nível sérico de ácido úrico pré-eclâmpsia e correlacionam-se com restrição de crescimento in-
trauterino.
Níveis séricos de transaminases em elevação sugerem pré-eclâmp-
Níveis séricos de transaminases
sia grave com envolvimento hepático.
Nível sérico de albumina, desidrogenase lác-
Em gestantes com doença grave, estes exames indicam a extensão
tica, esfregaço sanguíneo e perfil de coagula-
da lesão endotelial (hipoalbuminemia), incluindo trombocitopenia.
ção (TAP, KPTT e coagulograma)
360 SIC Resumão revalida

Figura 1 - Acompanhamento pré-natal

ͳͳ Situações de emergência hipertensiva: hidralazina 5mg IV, a cada 15 minutos, para reduzir
níveis da pressão arterial média em 30%;
ͳͳ Tratamento da eclâmpsia: internar, assegurar vias aéreas pérvias e oxigenação adequada,
aspiração de secreções e sonda vesical de Foley, administrar sulfato de magnésio e anti-hi-
pertensivo, tentar estabilização materna e resolução se possíveis na viabilidade fetal ou se
as complicações assim o exigirem. Esquemas do sulfato de magnésio:
• Pritchard: ataque – 4g IV, 10g IM (5g em cada nádega) – e manutenção – 5g IM, 4/4h;

• Zuspan: ataque – 4g IV, 8mL de sulfato de magnésio 50%, 12mL de água destilada – e
manutenção – 1 a 2g/h IV em bomba de infusão, 100mL/h;
ginecologia e obstetrícia 361

• Sibai: ataque – 6g IV, em 20 minutos – e manutenção – 2 a 3g/h, 24 horas após parto;

• Durante a administração do sulfato de magnésio, deve-se avaliar o reflexo patelar, o dé-


bito urinário (>25mL/h) e a frequência respiratória. Caso um desses parâmetros esteja
alterado, deve-se administrar:

* Antídoto: gluconato de cálcio a 10% (10mL IV, por 3 minutos).

ͳͳ Tratamento da síndrome HELLP: quando houver viabilidade fetal, será indicada a interrup-
ção da gestação. Entretanto, em situações de extrema imaturidade fetal, o parto muito pre-
maturo pode significar péssimo prognóstico perinatal.

Tratamento da síndrome HELLP


- Parto (viabilidade);
- Corticoterapia: benefício duvidoso:
· Dexametasona 10mg, IV 12/12h (benefício materno);
· Sempre que plaquetas ≤50.000/mm3.
- Transfusão de plaquetas:
· <20.000/mm3;
· <50.000/mm3 quando cesárea.
- Via de parto: indicação obstétrica.

Atenção
De acordo com o Ministério da Saúde:
- PE leve: gestação não deve ultrapassar 40 semanas;
- PE grave: gestação não deve ultrapassar 34 semanas.

3. Hipertensão arterial crônica


É classificada com a presença de nível pressórico ≥140x90mmHg, termo que se refere a qual-
quer doença hipertensiva antes da gestação e inclui, também, hipertensão essencial latente, iden-
tificada pela 1ª vez antes da 20ª semana de gestação. Pode ser classificada:

ͳͳ Quanto ao aparecimento: em primária (93%) ou secundária (nefropatias, feocromocitoma,


coarctação de aorta);

ͳͳ Quanto às associações: não complicadas ou complicadas (cardiopatias, nefropatias, PE so-


breposta);

ͳͳ Quanto aos valores pressóricos: PA diastólica <110mmHg (leve) ou PA diastólica ≥110mmHg


(grave).

A conduta na HAC não complicada é o controle com dieta e baixas doses de hipotensor,
acompanhamento ambulatorial e da vitalidade fetal (a partir de 34 semanas) e levar a gestação
até 40 semanas.

Na HAC complicada com PE sobreposta, proceder à internação; caso a vitalidade esteja pre-
servada, manter até a 37ª semana; se houver piora materna ou fetal, está indicada resolução.
362 SIC Resumão revalida

28 Síndromes hemorrágicas da
1ª metade da gestação

1. Abortamento
ͳͳ Compreende a perda do concepto com até 20 semanas ou expulsão do produto da concep-
ção com menos de 500g;
ͳͳ Pode ser espontâneo ou provocado e precoce (antes de 12 semanas) ou tardio (12 a 20 se-
manas).

A - Etiologia
a) Fatores fetais

Anomalias morfológicas, cromossômicas (principalmente antes da 12ª semana de gestação) e


genéticas. As principais são as trissomias.

b) Fatores maternos
Endocrinopatias, infecções, desnutrição, causas imunológicas, insuficiência luteínica, doenças
debilitantes, malformações uterinas, incompetência istmocervical, miomatose, sinéquias uteri-
nas, distopias uterinas, além dos traumas físicos.

Classificações Diagnósticos Tratamentos


- Sangramento vaginal discreto a moderado
Ameaça de aborto ou + cólica, sem modificação cervical;
Repouso + antiespasmódicos
aborto evitável - Descolamento corioamniótico à ultrassono-
grafia (USG).
- Se Idade Gestacional (IG) <12 semanas:
- Hemorragia vaginal moderada a grave + curetagem (CTG) uterina ou vacuoaspi-
cólicas fortes + dor no baixo-ventre + colo ração;
Abortamento inevitá- uterino pérvio + embrião no canal cervical; - Se IG >12 semanas: ocitocina até a elimi-
vel ou em curso
- Anemia, taquicardia, hipotensão, choque nação do feto e anexos + USG;
hipovolêmico. - Se não houver eliminação completa: CTG
ou vacuoaspiração.
- Colo impérvio: dilatação do colo com
Sangramento genital + cólica + colo dilatado velas de Hegar ou misoprostol + CTG ou
Abortamento incom- ou não + restos ovulares no orifício externo aspiração manual intrauterina;
pleto cervical ou não + USG transvaginal eviden-
ciando eco endometrial >15mm - Colo pérvio: conduzir como abortamento
inevitável.
Sangramento genital + cólicas que cessam
Abortamento com-
espontaneamente + colo impérvio + USG Orientações
pleto
evidenciando eco endometrial fino e regular
Calafrios e febre + dor referida + taquicardia
Abortamento infec- Esvaziamento uterino + antibioticoterapia
+ secreção fétida e purulenta proveniente do
tado de amplo espectro
canal cervical + colo pérvio
ginecologia e obstetrícia 363

Além dos abortos classificados, existem:

B - Aborto retido
ͳͳ Em que há a morte assintomática do embrião, com redução dos sintomas da gestação, e
o crescimento uterino não é compatível com a IG. O batimento cardíaco fetal à USG está
ausente;
ͳͳ Retenções prolongadas podem causar distúrbios de coagulação e infecções (é muito raro);
ͳͳ A conduta neste tipo de aborto é:
• Se IG <12 semanas, estão indicadas dilatação e CTG ou vacuoaspiração;

• Se IG >12 semanas, a ocitocina está indicada até a eliminação do feto e dos anexos.

C - Abortamento habitual
ͳͳ É definido por 3 interrupções sucessivas da gestação;
ͳͳ É primário, quando não precedido de gestação e com evolução normal, e secundário, quan-
do sucedido por 1 ou mais gestações chegadas ao termo;
ͳͳ Etiologia: anomalias cromossômicas (10%), insuficiência luteínica, incompetência istmocer-
vical, malformações uterinas.

2. Gestação ectópica

A - Introdução
Gestação ectópica é a nidação e o desenvolvimento do ovo fora da cavidade uterina. O local
mais frequente é a tuba uterina, e, nesta, a região ampular é a mais acometida.

Figura 1 - Locais e frequência de gestação ectópica


364 SIC Resumão revalida

São fatores de risco doença inflamatória pélvica (clamídia), endometriose, gravidez tubá-
ria prévia, cirurgia tubária prévia, cirurgia abdominal prévia, salpingite ístmica nodosa (ver-
dadeiros divertículos), endometriose ou leiomiomas, mulheres expostas ao dietilestilbestrol
in utero, história de infertilidade, falha de DIU (dispositivo intrauterino de cobre ou proges-
tativo), tabagismo.

B - Diagnóstico
ͳͳ Clínico: dor abdominal é o sintoma mais comum; outros sintomas são sangramento vaginal,
atraso menstrual, massa anexial dolorosa, mobilização dolorosa do colo uterino. Podem
estar presentes sinais de peritonite e abaulamento do fundo de saco vaginal posterior;
ͳͳ Laboratorial: o beta-HCG, nas gestações ectópicas, aumenta menos de 54% em 48 horas;
ͳͳ Ultrassonográfico: por meio da USG transvaginal, o saco gestacional intrauterino deverá
ser visualizado sempre que o nível do beta-HCG estiver entre 1.000 e 2.000mUI/mL; a USG
transvaginal pode identificar saco gestacional extrauterino com embrião com ou sem bati-
mentos cardíacos, saco gestacional extrauterino com vesícula vitelínica, anel tubário, massa
sólida ou complexa;
ͳͳ Laparoscopia: também pode ser útil no diagnóstico.

C - Tratamento
ͳͳ Gravidez ectópica rota: salpingectomia por laparotomia;
ͳͳ Gravidez ectópica íntegra:
• Com prole constituída: salpingectomia;

• Desejo de gestação: ectópica ≤4cm no maior diâmetro, beta-HCG ≤5.000mUI/mL e líquido


livre apenas na pelve – tratamento clínico com metotrexato (MTX).
ͳͳ Modalidades de tratamento clínico: medicamentoso (MTX) e expectante. Decide-se por tra-
tamento clínico expectante se os valores de beta-HCG estão decrescentes em 2 dosagens
consecutivas entre 24 e 48 horas e não houver batimentos cardíacos embrionários à USG.
Do contrário, opta-se por tratamento clínico medicamentoso com MTX.

3. Doença trofoblástica gestacional


ͳͳ Origina-se de alterações que atingem o produto conceptual, mais especificamente o tro-
foblasto;
ͳͳ Cursa com degeneração hidrópica das vilosidades coriônicas acompanhadas de hiperplasia
dos elementos trofoblásticos ou anaplasia consequente ao processo neoplásico benigno do
trofoblasto.

A - Formas clínicas
ͳͳ Doença benigna: mola hidatiforme (pode ser completa ou parcial);
ͳͳ Doença maligna: mola invasora, coriocarcinoma, tumor de leito placentário e mola metas-
tática.
Molas parcial e total são diferentes quanto a histopatologia, padrões cromossômicos e apre-
sentação clínica.
ginecologia e obstetrícia 365

Mola parcial Mola total


Triploide, 69, XXX (90%); 69, XXY, 46,
Cariótipo Diploide, 46, XX (90%); 46, XY (10%)
XX ou 46, XY (10%)

Degeneração vesicular hidrópica (aco- Degeneração hidrópica intensa (alteração de todos os


Histopatologia mete parte dos vilos) em meio a vilos vilos) com atipia e hiperplasia trofoblástica e ausência
normais de partes fetais ou anexos

Malignização 5 a 10% 10 a 20%

Sangramento genital com perda ou não de vesículas,


Sangramento genital incomum, beta
Quadro clínico crescimento uterino maior do que o esperado, beta-
-HCG elevado
-HCG muito elevado e presença de cistos teca-luteínicos

Não característica, com sinais suges-


USG tivos (degeneração placentária, feto Característica, com vesículas coriônicas
com malformações)

ͳͳ Mola hidatiforme invasora: pode ser completa ou incompleta, apresenta vilos alterados que
penetram no miométrio e seus vasos. Não é indício de natureza neoplásica;
ͳͳ Mola hidatiforme metastática: apresenta capacidade de invasão vascular. Os locais mais co-
muns são a vagina e os pulmões. Não está obrigatoriamente associada à invasão miometrial;
ͳͳ Coriocarcinoma: origina-se de qualquer tipo de gestação (a termo, abortamento, ectó-
pica, molar e, excepcionalmente, teratomas). Apresenta elevado poder de infiltração
local (vascular) e disseminação a distância (hematogênica). Podem ocorrer metástases
para os pulmões, o cérebro, os rins, o fígado e o trato gastrintestinal. Histologicamente,
apresenta estrutura bilaminar semelhante ao trofoblasto do blastocisto, atipia citológi-
ca e atividade mitótica; macroscopicamente, apresenta nódulos hemorrágicos únicos ou
múltiplos, bem circunscritos com área central de necrose hemorrágica;
ͳͳ Tumor trofoblástico do sítio placentário: constitui-se de trofoblasto intermediário. Mi-
croscopicamente, apresenta células do citotrofoblasto e células multinucleadas, ausência
de acentuada necrose, invasão vascular com ausência de crescimento celular no interior
dos vasos; macroscopicamente, apresenta massa branco-amarelada que invade o endo-
métrio e projeta-se para a cavidade endometrial (aspecto polipoide). Tem baixa produção
de HCG e elevada síntese de Hormônio Lactogênico Placentário (HLP).

B - Sinais e sintomas
a) Mola invasora

Sangramento vaginal irregular, discreto aumento do volume uterino.

b) Mola metastática e coriocarcinoma

ͳͳ Apresentam quadro clínico bem semelhante e vão depender dos locais de implantação da
metástase;
ͳͳ Metástases vaginais: massas vinhosas de tamanho variável, que podem prolongar-se para o
interior da cavidade pélvica com hemorragia abundante;
ͳͳ Metástases pulmonares: lesões assintomáticas ou oligossintomáticas, com diagnóstico por
exame radiológico de rotina.
366 SIC Resumão revalida

c) Tumor trofoblástico do sítio placentário

Sangramento genital anômalo ou amenorreia, e ausência de alterações sistêmicas.

C - Diagnóstico
a) Dosagem de HCG

Produzido pelo sinciciotrofoblasto e marcador tumoral.

b) USG

ͳͳ Imagens císticas ecogênicas no interior da cavidade uterina;


ͳͳ Útero de dimensões aumentadas para a IG;
ͳͳ Aumento ovariano – formações císticas.

c) Arteriografia

Detecção de metástases intra-abdominais (pélvicas e hepáticas).

d) Radiografia simples

Detecção de metástase pulmonar.

e) Tomografia computadorizada

Detecção de metástases do sistema nervoso central.

D - Tratamento
ͳͳ Esvaziamento uterino por CTG uterina ou vacuoaspiração;
ͳͳ Administração de ocitócitos e derivados da ergotamina durante o procedimento;
ͳͳ Pacientes idosas ou sem interesse gestacional futuro: histerectomia com preservação dos
ovários com cistos teca-luteínicos;
ͳͳ Molas parciais com feto vivo: aguardar a maturidade fetal, interrupção da gestação e trata-
mento do quadro molar;
ͳͳ Administração de imunoglobulina anti-Rh em pacientes Rh negativo;
ͳͳ As molas “malignas” requerem quimioterapia e/ou cirurgia;
ͳͳ Seguimento pós-molar;
ͳͳ HCG: intervalos semanais até 3 dosagens negativas consecutivas (remissão temporária), 1
dosagem quinzenal e dosagens mensais até 6 meses após o 1º resultado negativo (remissão
espontânea) e até 1 ano se quimioterapia;
ͳͳ Radiografia simples: mensalmente até a remissão;
ͳͳ Exame pélvico: mensalmente até a remissão;
ͳͳ Anticoncepcional oral: início após o esvaziamento. Pacientes não devem engravidar por,
pelo menos, 12 meses.
ginecologia e obstetrícia 367

29 Síndromes hemorrágicas da
2ª metade da gestação

1. Descolamento prematuro da placenta

A - Introdução
O Descolamento Prematuro da Placenta (DPP) é a separação da placenta normalmente in-
serida no corpo uterino, em gestação com idade gestacional superior a 20 semanas antes da
expulsão do feto.
Causas:
ͳͳ Traumáticas: traumas propriamente ditos, brevidade do cordão umbilical, rotura prematura
das membranas amnióticas após descompressão uterina brusca, retração uterina abrupta
após expulsão do 1º gemelar, mioma uterino e polidrâmnio;
ͳͳ Causas não traumáticas: hipertensão arterial sistêmica, uso de cocaína, tabagismo e alcoo-
lismo, idade e paridade avançada, pré-eclâmpsia/eclâmpsia, trombofilias, multiparidade,
DPP em gestação anterior e abortamento provocado anterior.
A fisiopatologia cursa com a sufusão de sangue, ocasionando hematoma retroplacentário,
que irá fazer compressão dos vasos e consequentemente evoluir diminuindo o fluxo placentário
e causar DPP.
Quanto maior a área placentária descolada, maior o risco de comprometimento fetal.

B - Diagnóstico
Clínico (sinais e sintomas)
- Dor abdominal súbita;
- Contrações frequentes;
- Sinal de Mello e Figueiredo;
- Hemorragia externa ou interna;
- Palidez cutâneo-mucosa e hipotensão;
- Sudorese, taquicardia e pulso fino;
- Diminuição do débito cardíaco;
- Sinais de coagulação intravascular disseminada: petéquias, equimoses e hematomas;
- Sangramento vaginal;
- Palpação: útero lenhoso e doloroso;
- Amnioscopia: hemoâmnio;
- Altura uterina: aumento progressivo.
Ultrassonografia
- Identifica a localização da placenta e possibilita o diagnóstico diferencial com placenta prévia;
- Achados ultrassonográficos:
· Coágulo retroplacentário;
· Hematoma marginal;
· Hematoma subcoriônico;
· Hematoma intra-amniótico;
· Elevação da placa coriônica;
· Aumento heterogênico da espessura da placenta.
368 SIC Resumão revalida

C - Conduta
ͳͳ Esvaziamento da cavidade uterina: maior brevidade possível;
ͳͳ Rompimento de bolsa das águas: reduz a compressão da veia cava inferior, melhora a hiper-
tonia uterina, coordena as contrações, diminui a pressão intrauterina, diminui a instalação
de coagulopatias, diminui a hemorragia, dificulta a ampliação da área de descolamento,
evidencia o hemoâmnio, induz ou acelera o trabalho de parto;
ͳͳ Gestações com feto vivo e maior do que 28 semanas: amniotomia precoce e cesárea;
ͳͳ Gestações com feto morto ou com idade gestacional abaixo da viabilidade (<28 semanas):
repor volemia, repor fator de coagulação, restaurar o equilíbrio metabólico e aguardar o
parto vaginal de 4 a 6 horas; caso não ocorra, proceder a cesárea;
ͳͳ Histerectomia: em casos de atonia uterina, com sangramento vaginal incoercível e não res-
ponsivo ao uso de ocitócito, uso de misoprostol, massagens, cirurgia de B-Lynch e ligadura
das artérias hipogástricas.

2. Placenta prévia
A - Introdução

ͳͳ É a inserção da placenta no segmento infe-


rior acima da 28ª semana de gestação;
ͳͳ Os fatores predisponentes são idade ma-
terna avançada e multiparidade (os prin-
cipais), cesárea anterior (principal fator de
risco), outras cicatrizes uterinas (miomec-
tomia), curetagens uterinas de repetição,
endometrite, miomatose uterina, gemela-
ridade, antecedente de placenta prévia e
tabagismo;
ͳͳ Pode ser classificada em:
• Lateral: entre 2 e 7cm do orifício interno;

• Marginal: atinge o orifício interno (sem


ultrapassá-lo) ou 2cm do orifício interno;
• Centroparcial: oclui parcialmente o orifí-
cio interno;
• Centrototal: oclui completamente o ori-
fício interno.
ͳͳ Sinais e sintomas: hemorragia vaginal no
3º semestre, de início súbito, indolor, rein-
cidente, imotivada, progressiva, de cor ver- Figura 1 - Modalidades anatômicas da placenta pré-
via: (A) centrototal; (B) centroparcial; (C) marginal e
melho-vivo e quantidade variável; (D) lateral
ͳͳ Associação a acretismo placentário é
usualmente encontrada.
ginecologia e obstetrícia 369

B - Diagnóstico
ͳͳ Quadro clínico;
ͳͳ Exame físico: batimento cardíaco fetal normal; exame especular que pode determinar ori-
gem do sangramento; toque vaginal deve ser realizado com extremo cuidado, já que pode
causar intensa hemorragia; tônus e volume uterino normais;
ͳͳ Ultrassonografia obstétrica: pseudomigração placentária;
ͳͳ Ressonância magnética: acretismo placentário.
DPP Placenta prévia
Início Súbito, grave desde o começo Insidioso, com gravidade progressiva
Hemorragia Oculta em 20% dos casos, única, dolorosa Visível, de repetição, indolor
Sangue Escuro Rutilante
Sofrimento fetal Grave e precoce Ausente ou tardio
Hipertonia Típica Ausente
Hipertensão Típica Rara
Sinais de anemia grave que não mantêm rela- Sinais de anemia proporcional às perdas
Estado
ção com as perdas sanguíneas externas sanguíneas
Ultrassonografia Pode ser normal Confirmatória do diagnóstico

C - Tratamento
ͳͳ Para intervir, precisamos primeiramente considerar: vulto da hemorragia, idade gestacio-
nal, variedade da placenta prévia e proximidade do fim do parto;
ͳͳ Gestações <37 semanas: a conduta é expectante, ou seja, deve-se internar a paciente, mo-
nitorizar os sinais vitais maternos e a vitalidade fetal, controlar hemoglobina e hematócrito,
fazer corticoterapia (26 a 34 semanas);
ͳͳ Gestações a termo:
• Placenta prévia lateral e marginal: parto normal com amniotomia imediata;
• Placenta centroparcial: cesárea;

• Placenta centrototal: cesárea com feto vivo ou morto.

30 Diabetes e gestação

1. Definição
O diabetes gestacional é caracterizado por intolerância a carboidratos e glicose, diagnostica-
do pela 1ª vez na gestação, independente do perfil glicêmico do pós-parto.
Do início da gestação até a 24ª semana ocorre a 1ª fase, que é anabólica; com o aumento do
Hormônio Lactogênio Placentário (HLP), ocorrerão hipertrofia e hiperplasia das células Β, haverá
aumento da insulina, com consequente diminuição da glicemia materna de jejum e, então, inibição
da gliconeogênese.
A partir da 24ª semana até o final da gestação ocorre a 2ª fase, considerada catabólica;
a placenta aumentará a produção de hormônios hiperglicemiantes, contudo haverá aumento
370 SIC Resumão revalida

da resistência periférica a insulina materna, ocasionando hiperinsulinismo, com diminuição da


reserva de glicogênio e gordura e então aumento da gliconeogênese.
Nas portadoras de diabetes gestacional, o aumento da quantidade de produção de insulina
pelo pâncreas materno não é suficiente para controlar a alta resistência periférica a insulina.

A - Classificação
A classificação do diabetes gestacional pode ser a seguinte:
ͳͳ Diabetes pré-gestacional:
• Tipo I ou insulinodependente;
• Tipo II;
• Diabetes por outras causas: alterações locais/genéticas.
ͳͳ Diabetes Mellitus Gestacional (DMG):
• A1: controle com dieta e exercício;
• A2: controle necessita de insulina.

B - Rastreamento
O rastreamento pode ser clínico ou laboratorial. A gestante será considerada de alto risco
para DMG, com rastreamento clínico positivo, se tiver 1 dos itens a seguir:
Fatores de risco
- Idade igual ou superior a 35 anos;
- IMC >25kg/m2 (sobrepeso e obesidade);
- Antecedente pessoal de diabetes gestacional;
- Antecedente familiar de diabetes mellitus (parentes de 1º grau);
- Macrossomia ou polidrâmnio em gestação anterior;
- Óbito fetal sem causa aparente em gestação anterior;
- Malformação fetal em gestação anterior;
- Uso de drogas hiperglicemiantes (corticoides, tiazídicos);
- Síndrome dos ovários policísticos;
- Hipertensão arterial crônica.
Na gravidez atual, em qualquer momento
- Ganho excessivo de peso;
- Suspeita clínica ou ultrassonográfica de crescimento fetal excessivo ou polidrâmnio.

- Protocolo do Ministério da Saúde:


Todas as gestantes (independentemente de apresentarem fator de risco):
ͳͳ Devem realizar dosagem de glicemia no início da gravidez, antes de 20 semanas, ou tão logo
seja possível;
ͳͳ Rastreamento é considerado positivo se glicose plasmática de jejum é igual ou superior a
85mg/dL e/ou na presença de qualquer fator de risco para o diabetes gestacional;
ͳͳ Ausência de fatores de risco e glicemia de jejum ≤85mg/dL: rastreamento negativo; repetir
a glicemia de jejum entre a 24ª e 28ª semana de gestação.
Gestantes com rastreamento positivo (glicemia de jejum de 85mg/dL a 125mg/dL e/ou com
qualquer fator de risco):
ginecologia e obstetrícia 371

ͳͳ Confirmação diagnóstica: TOTG 75g 2h:


• Jejum (95);
• Após 1 hora (180);
• Após 2 horas (155).
ͳͳ Dois valores alterados confirmam o diagnóstico;
ͳͳ Único valor alterado indica a repetição na 34ª semana.

2. Diabetes gestacional
Exames complementares nos casos de DMG
- Hemoglobina glicada;
- Glicemia capilar;
- Colesterol total;
- Colesterol (HDL);
- Triglicérides;
- Creatinina;
- Ácido úrico;
- Pesquisa de elementos anormais/sedimento na urina;
- Eletrocardiograma;
- Clearance de creatinina;
- Potássio;
- Proteinúria de 24 horas;
- Microalbuminúria;
- Ecografia gestacional de acordo com o protocolo do Ministério da Saúde.

Indicação de avaliação fetal de acordo com gravidade do diabetes


Diabetes gestacional Gestantes diabéticas Gestantes diabéticas
bem controlado com insulinodependentes insulinodependentes com
dieta sem vasculopatia vasculopatia
Ultrassonografia e 18 a 20 semanas ou no
18 a 20 semanas 18 a 20 semanas
ecografia inicial diagnóstico
Início da contagem de
Não indicada 26 a 28 semanas 26 a 28 semanas
movimentos fetais
Início da avaliação do
28 semanas 28 semanas 26 a 28 semanas
crescimento fetal
Periodicidade da ava-
liação do crescimento Cada 4 semanas Cada 4 semanas Cada 4 semanas
fetal
Cardiotocografia basal
Não indicada Início em 32 semanas Início em 28 a 32 semanas
ou perfil biofísico fetal
Periodicidade da car-
2 vezes por semana, poden- 2 vezes por semana, podendo
diotocografia basal ou Não indicada
do alternar os 2 exames alternar os 2 exames
perfil biofísico fetal
Dopplerfluxometria da
Não indicada Não indicada Indicada
artéria umbilical fetal
Possivelmente, anterior ao
Com evidência de maturidade
Limite para o parto 40 semanas termo, dependendo das con-
pulmonar ou 38 semanas
dições materno-fetais
372 SIC Resumão revalida

A - Tratamento
Baseia-se em:
ͳͳ Dieta fracionada:
• 1.800 a 2.000 calorias;
• 50% carboidratos;
• 30 a 35% lipídios;
• 15 a 20% proteínas;
• Menos de 10% de gorduras não saturadas.
ͳͳ Atividade física auxilia no controle dos níveis glicêmicos, pelo aumento da atividade da in-
sulina ao receptor, diminuindo a resistência periférica à sua ação e aumentando o consumo
de glicose;
ͳͳ Insulinoterapia é indicada quando dieta e exercício físico não alteram os níveis glicêmicos.
Tem, como base, (NPH) 0,3 a 0,5UI/kg/d, 2/3 pela manhã e 1/3 às 22 horas; e dose empírica
de 0,7UI/kg/peso;
ͳͳ Conduta obstétrica:
• DMG controlada: até 40 semanas;
• DMG associada a hipertensão arterial crônica, macrossomia fetal, difícil controle metabó-
lico: antecipar o parto;
• Via de parto: vai depender das condições obstétricas.

Conduta durante o trabalho de parto – gestantes em trabalho de parto espontâneo


- Dosagem de glicemia na admissão;
- Suspender uso de insulina;
- Permitir ingestão de líquidos claros na fase de latência;
- Iniciar solução salina;
- Monitorizar glicemia de 2 em 2 horas na fase de latência e de 1 em 1 hora na fase ativa;
- Níveis de glicemia capilar: mantidos entre 70 e 110mg/dL;
- Se glicemia <70mg/dL: SG a 5% a 100 a 150mL/h;
- Se glicemia >100mg/dL: insulina (IV) 1,25U/h.

ͳͳ Indução programada do parto:


• Início da manhã;

• Se preparo do colo (exemplo: misoprostol):

* Manter a dieta e o regime usual de insulina até início do trabalho de parto e, depois,
seguir com protocolo de trabalho de parto espontâneo.
• Se indução (ocitocina):

* Manter dose usual de insulina na noite anterior, suspender insulina no dia da indução e
seguir com protocolo de trabalho de parto espontâneo.
ͳͳ Cesárea programada:
• Programar para o início da manhã;
• Suspender dieta na noite anterior. Oferecer um lanche reforçado e líquidos em maior
quantidade antes do jejum;
• Manter dose de insulina na noite anterior;
• Suspender insulina da manhã;
ginecologia e obstetrícia 373

• SG a 5% 100 a 150mL/h até o parto;


• Monitorizar glicemia de 4 em 4 horas até o parto;
• Fluidos intraparto a critério do anestesiologista.

B - Complicações fetais e maternas


a) Maternas

Polidrâmnio, trabalho de parto prematuro, doença hipertensiva exclusiva da gravidez, risco de


hipotonia, hemorragia pós-parto e lesões do canal de parto, risco aumentado de rotura prematu-
ra das membranas ovulares, monilíase vaginal, toxemia gravídica. Piora de lesões em órgãos-alvo
maternos devido à descompensação do diabetes.
b) Fetais
Malformações fetais e congênitas, macrossomia fetal, síndrome do desconforto respiratório,
abortamentos, hipoglicemia, óbito fetal, traumas de parto, icterícia, policitemia, risco aumentado
de obesidade e diabetes mellitus na idade adulta, hipertensão e dislipidemia na vida adulta.

31 Amniorrexis prematura

1. Introdução
Trata-se da rotura espontânea das membranas amniótica ou coriônica antes do início do tra-
balho de parto, independente da idade gestacional.
Chama-se de período de latência o intervalo entre a rotura espontânea e o início do trabalho
de parto. Esse período varia em razão inversa à idade gestacional em que ocorre a ruptura. Será
pré-termo quando ocorrer antes de 37 semanas – a evolução para o trabalho de parto ocorrerá
em até 7 dias na maioria dos casos –, e será a termo quando as pacientes evoluírem para trabalho
de parto em 24 horas.
As membranas ovulares exercem um importante papel para manter a boa vitalidade fetal.
Quando há quebra dessa barreira antes do período adequado, os processos fisiológicos ficam
prejudicados.

2. Etiologia
A etiologia é multifatorial. São fatores que alteram a estrutura das membranas:
ͳͳ Hiperdistensão uterina (polidrâmnio, gemelaridade);
ͳͳ Fatores mecânicos (contrações uterinas, movimentação fetal);
ͳͳ Alteração da integridade cervical (incompetência istmocervical);
ͳͳ Fatores intrínsecos (deficiência de alfa-1-antitripsina, síndrome de Ehlers-Danlos);
ͳͳ Alteração da oxigenação tecidual (tabagismo);
ͳͳ Diminuição da atividade imunológica bactericida do líquido amniótico.
O principal fator etiológico relaciona-se com infecção ascendente da flora vaginal. Os princi-
pais agentes etiológicos são Streptococcus do grupo B, Gardnerella vaginalis, Neisseria gonor-
rhoeae, E. coli, Bacteroides sp., peptoestreptococos e Enterococcus.
374 SIC Resumão revalida

3. Diagnóstico
A - Clínico
ͳͳ A queixa clínica deve ser sempre valorizada. Em 80 a 90% das vezes, o diagnóstico é clínico;
ͳͳ Perda de líquido (momento da perda, quantidade, aspecto, odor, coloração);
ͳͳ Dor no baixo-ventre;
ͳͳ Secreção vaginal fétida;
ͳͳ Febre;
ͳͳ Taquicardia;
ͳͳ Inspeção da vulva (saída de líquido pela rima vulvar);
ͳͳ Exame especular (saída de líquido amniótico pelo orifício cervical: claro, com ou sem gru-
mos, mecônio);
ͳͳ Manobra de Tarnier: elevação da apresentação do fundo uterino;
ͳͳ Altura uterina menor do que o esperado.

B - Laboratorial
a) Medida do pH vaginal (normal = 4,5 a 6)
ͳͳ Fenol vermelho 0,1% pH >7 (coloração rósea);
ͳͳ Papel de nitrazina pH >6 (coloração azul).
b) Teste do azul de Nilo 0,1% (pesquisa de células fetais)
ͳͳ Orangiófilas (a partir de 32 semanas);
ͳͳ Teste de Ianneta: coleta de material do fundo de saco vaginal. Coloca-se na lâmina e o aque-
ce: então, se a secreção é amarronzada, ausência de líquido; se a secreção é incolor, líquido
amniótico;
ͳͳ Cristalização do conteúdo vaginal: coleta de material da vagina ao microscópio óptico,
formação arboriforme (“folha de samambaia”) = líquido amniótico.
c) Alfa-1-microglobulina placentária
ͳͳ O melhor teste para confirmação de amniorrexis prematura é a pesquisa de alfa-1-micro-
globulina (PAMG-1) placentária em meio vaginal. A PAMG‐1 é uma proteína abundante no
líquido amniótico, mas escassa na vagina; quando detectada nas secreções vaginais coleta-
das durante exames ginecológicos, é altamente sensível para o diagnóstico de ruptura de
membranas ovulares. O nome comercial do teste é AmniSure®.

C - Imagem
ͳͳ Ultrassonografia:
• Avaliação do Índice de Líquido Amniótico (ILA):
* 8 a 18 → normal;
* <8 → diminuído;
* <5 → oligoâmnio.
• Idade gestacional;
• Grau da placenta;
• Perfil biofísico fetal;
• Deformidades esqueléticas;
• Hipoplasia pulmonar.
ginecologia e obstetrícia 375

4. Complicações
ͳͳ Oligoidrâmnio e aumento do risco de deformidades: orelhas dobradas, nariz achatado, pele
enrugada, pé torto e contraturas musculares;
ͳͳ Hipoplasia pulmonar: em gestações entre a 24ª e a 26ª semanas;
ͳͳ Prematuridade;
ͳͳ Corioamnionite, que pode levar a quadro de sepse materna e, se não tratada, até morte
da gestante. A infecção fetal predispõe a pneumonia, sepse e infecção do trato urinário no
período neonatal;
ͳͳ Hipóxia e asfixia fetal por compressão funicular decorrente da diminuição do volume do
líquido amniótico.

5. Conduta
ͳͳ Corticoterapia (benefício fetal):
• Betametasona 12mg IM, 2 doses, com intervalo de 24 horas;
• Aceleração da maturação pulmonar fetal (diminui síndrome da angústia respiratória aguda);
• Diminuição de enterocolite necrosante, leucomalácia periventricular, hemorragias in-
traventriculares.
ͳͳ Antibioticoterapia:
• Melhora os resultados perinatais;

• Reduz risco de:


* Parto pré-termo em 1 semana;
* Infecções maternas;
* Infecção neonatal.
• Infecções associadas (Chlamydia, Mycoplasma, Ureaplasma):
* Estearato de eritromicina 500mg VO, 6/6h, por 7 dias;
* Azitromicina 1g VO, dose única.
ͳͳ Vários esquemas propostos:
• Antibiótico derivado da penicilina + macrolídeo (por 7 dias);

• Ampicilina 2g IV, 6/6h, por 48 horas, seguida por 5 dias de amoxicilina 500mg VO, 8/8h,
ou 875mg VO, 12/12h, de azitromicina 1g VO, em dose única.
Avaliação do estado fetal
- Ausculta de batimentos cardiofetais 2 a 3 vezes ao dia;
- Contagem de movimentos fetais pela mãe 2 vezes ao dia (após almoço e jantar);
- Cardiotocografia diária ou no mínimo 2 vezes por semana;
- Perfil biofísico fetal diário para gestantes com ILA <5cm e 2 vezes por semana para gestantes com ILA >5cm;
- Avaliação de volume do líquido amniótico por ecografia de 2 em 2 dias.

Indicação de resolução da gestação


- Alteração da vitalidade fetal;
- Diagnóstico de infecção intra-amniótica;
- Idade gestacional: 34 semanas.
376 SIC Resumão revalida

- Corioamnionite
ͳͳ Interrupção da gestação;
ͳͳ Contraindicação de corticosteroides;
ͳͳ Hipertermia >37,8°C;
ͳͳ Leucocitose materna ascendente;
ͳͳ Sensibilidade ou dor à mobilização uterina;
ͳͳ Taquicardias materna e/ou fetal;
ͳͳ Odor fétido no líquido amniótico;
ͳͳ Tratamento:
• Ampicilina 2g IV, 6/6h, – 7 dias após o parto;
• Penicilina G 5.000.000UI, 4/4h, e gentamicina 60 a 80mg, 8/8h.

Observação
Deve-se manter o antibiótico até 48 horas sem febre.

Figura 1 - Decisões para o manejo da rotura prematura de membranas


ginecologia e obstetrícia 377

32 Infecções bacterianas na gestação

1. Introdução
Doenças bacterianas são uma importante causa de morbidade obstétrica, especialmente pre-
maturidade, e devem ser rapidamente investigadas, diagnosticadas e tratadas. Nas situações de
doenças sexualmente transmissíveis, os parceiros também devem ser tratados.

2. Clamídia
A Chlamydia trachomatis (clamídia) é considerada uma das causas mais comuns de doença
sexualmente transmissível.
A infecção materna pode manifestar-se sob a forma de uretrite não gonocócica, cervicite mu-
copurulenta, salpingite aguda ou conjuntivite, apesar de tratar-se de infecção assintomática na
maioria dos casos.
A transmissão para o feto acontece por contato direto, após a rotura das membranas. Dos
recém-nascidos de mães com infecção cervical, 1/3 desenvolve conjuntivite de inclusão e 10%
apresentam pneumonia nos 3 primeiros meses de vida.
Nas gestantes infectadas, porém assintomáticas, a presença dessa bactéria no colo uterino
acarreta maior taxa de parto prematuro, rotura prematura de membranas e mortalidade perina-
tal. Da mesma forma, a infecção recente, diagnosticada pela presença de anticorpos do tipo IgM,
aumenta o risco de parto prematuro e rotura prematura de membranas. Não há evidências de
que a infecção por clamídia esteja relacionada a maior incidência de corioamnionite ou endome-
trite puerperal.
O diagnóstico da infecção, essencialmente laboratorial, consiste na identificação da bactéria
ou de elementos que indiquem sua presença em material coletado da endocérvice ou da uretra
da gestante.
O exame laboratorial mais sensível e específico para o diagnóstico é a imunofluorescência
direta (altas sensibilidade e especificidade). Outros métodos diagnósticos que podem ser em-
pregados são citologia com coloração pelo Giemsa, sorologia e cultura. A realização da cultura é
limitada pela necessidade de utilizar meios especiais, com custo muito elevado.
O tratamento deve ser feito com eritromicina, na dose de 500mg por via oral, a cada 6 horas,
durante 7 a 10 dias; o uso de tetraciclinas e seus derivados está formalmente contraindicado
durante a gestação.

3. Linfogranuloma venéreo
Esta doença sexualmente transmissível é provocada por clamídias dos sorotipos L1, L2 e L3.
Apesar de infrequente, a doença pode complicar a gestação e o parto.
A infecção genital primária é assintomática ou oligossintomática. Pode-se suspeitar de infec-
ção quando há o acometimento dos linfonodos inguinais, às vezes com supuração local. Além do
378 SIC Resumão revalida

processo inflamatório, pode haver comprometimento do sistema linfático do trato genital inferior
e de tecidos vizinhos. Fibrose do canal de parto, estenose do reto e elefantíase vulvar podem
resultar de tal comprometimento. Nesses casos, pelo elevado risco de roturas perineais, o parto
por via vaginal é contraindicado.
A confirmação do diagnóstico pode ser alcançada por meio de reação imunológica específica
ou por biópsia das áreas atingidas.
O tratamento, durante a gestação, deverá ser feito com sulfas ou eritromicina, na dose de
500mg por VO, a cada 6 horas, durante 21 dias.

4. Gonorreia
A gonorreia é uma doença infecciosa aguda, transmitida pelo contato sexual, causada por um
diplococo Gram negativo intracelular, a Neisseria gonorrhoeae.
A gravidez parece alterar, significativamente, a evolução da infecção gonocócica; nesse perío-
do, a doença apresenta-se com uma variedade de sintomas clínicos, que vão desde um quadro
assintomático ou oligossintomático até curso com formas graves. Na maioria das vezes, a infec-
ção atinge o colo de útero, a uretra e as glândulas vestibulares e parauretrais. Os sintomas, iguais
aos da doença na mulher não grávida, incluem corrimento vaginal (mucopurulento, amarelado e
fétido), disúria e polaciúria, que aparecem dentro de 1 semana após a infecção.
Quando a infecção acontece antes da obliteração da cavidade uterina pela fusão coriodecidual
(por volta da 18ª semana), pode ocorrer disseminação ascendente, envolvendo a cavidade uterina
e tubas, levando a salpingite aguda e, invariavelmente, abortamento espontâneo infectado.
Além de doença pélvica mais grave, a gestante também está mais sujeita a apresentar formas
disseminadas da doença, caracterizadas por hipertermia, poliartralgia migratória, artrite séptica,
tenossinovite e dermatite pustulosa. Excepcionalmente, ocorrem endocardite e meningite.
O diagnóstico é obtido pela visualização dos diplococos Gram negativos intracelulares em es-
fregaços dos locais suspeitos. Infelizmente, a sensibilidade do método é alta apenas nos quadros
de uretrite em homens. Para as mulheres, para a confirmação diagnóstica, além do esfregaço,
sempre deve ser realizada cultura em meio de Thayer-Martin.
As opções de tratamento da gonorreia estão descritas na Tabela a seguir:

Agentes Opções Medicamentos Doses Vias Intervalos Duração


1ª Azitromicina 1g VO 1x Dose única
6/6h 7 dias
Clamídia 2ª Eritromicina 500mg VO
12/12h 14 dias
3ª Amoxicilina 500mg VO 8/8h 7 dias
1ª Ceftriaxona 250mg IM 1x Dose única
2ª Azitromicina 2g VO 1x Dose única
Cefotaxima 500mg IM 1x Dose única

Gonococo Cefoxitina 2g IM 1x Dose única
4ª Ampicilina 2 a 3g VO 1x Dose única
Para alér-
Espectinomicina 2g IM 1x Dose única
gicas
ginecologia e obstetrícia 379

Figura 1 - Corrimento vaginal sem microscopia

5. Estreptococo do grupo B
O estreptococo beta-hemolítico do grupo B (Streptococcus agalactiae) coloniza o trato gas-
trintestinal baixo e a vagina em 15 a 30% das mulheres de maneira assintomática. Em apenas 1 a
3% das gestantes colonizadas, causa infecções graves.
A infecção pelo estreptococo beta-hemolítico do grupo B (EGB) tem sido associada a várias
complicações, entre as quais aborto infectado, parto prematuro, rotura prematura de membra-
nas ovulares, corioamnionite, endometrite, endocardite, osteomielite e sepse puerperal, assim
como graves infecções fetais e neonatais.
A infecção neonatal é adquirida do trato genital materno. A bactéria atinge a cavidade am-
niótica por disseminação ascendente a partir do colo de útero, independente da integridade das
membranas, assim como na passagem do feto pelo canal de parto.
Apesar de existirem fatores de risco para o desenvolvimento da infecção neonatal, como par-
to prematuro, rotura prolongada das membranas (>18 horas), febre durante o trabalho de parto
e colonização materna, aproximadamente 1/3 das infecções e 10% da mortalidade neonatal ocor-
rem em recém-nascidos a termo, sem nenhum fator de risco para infecção ser identificado.
380 SIC Resumão revalida

Das 2 categorias de infecção neonatal provocada pelo EGB, a de instalação precoce é a única
obstetricamente previsível. Ocorre também intraútero ou na 1ª semana de vida e associa-se a
pneumonia neonatal, septicemia e altas taxas de mortalidade (de 10 a 20%).
O diagnóstico é feito por meio das culturas vaginal e anorretal. Melhores resultados são obser-
vados quando se usam meios de cultura seletivos, que incluem antibióticos inibidores do cresci-
mento de outras bactérias. A bacterioscopia pelo Gram não é recomendada, em razão das baixas
sensibilidade e especificidade (pela presença frequente de estafilococos e outros estreptococos).
O achado em uroculturas rotineiras, mesmo em pequena quantidade, indica colonização mater-
na intensa e maior suscetibilidade à infecção. Essas gestantes são mais propensas a rotura prematu-
ra de membranas, parto prematuro e óbito intrauterino. Gestantes diabéticas são particularmente
propensas a endocardite pelo EGB, e seus conceptos constituem grupo de alto risco para infecção.
A melhor época para a realização de cultura está entre 35 e 37 semanas de gestação. Esse
procedimento em período gestacional mais precoce permite uma melhor avaliação em relação ao
risco de trabalho de parto prematuro, entretanto o tratamento das gestantes em períodos mais
precoces permite a recolonização dessas mulheres já tratadas.
A melhor forma de evitar a infecção neonatal pelo EGB é a profilaxia com antibióticos durante
o trabalho de parto. A profilaxia antibiótica deve ser realizada em todas as gestantes de risco (fa-
tores listados) ou para aquelas com cultura perineal positiva. Independentemente da estratégia
para a indicação da antibioticoprofilaxia, a ocorrência de bacteriúria por EGB durante a gestação
é sinônimo de quimioprofilaxia intraparto, independente do resultado da cultura perineal (que
nem é necessária nesses casos) ou da realização do tratamento adequado da infecção urinária.
Em todos esses casos, deve-se prescrever no período intraparto penicilina G na dose de
5.000.000UI, como dose de ataque, e 2.500.000UI, a cada 4 horas até o parto. Como alternativa,
pode ser empregada ampicilina 2g na dose de ataque, e 1g, a cada 4 horas até o parto. Diante de
alergia a penicilina, pode-se empregar clindamicina 900mg IV, a cada 8 horas, até o parto, ou eri-
tromicina 500mg IV, a cada 6 horas, até o parto. Caso a cepa seja resistente ou a suscetibilidade
a eritromicina ou clindamicina seja desconhecida, com risco de anafilaxia ao uso de penicilina e
derivados, prescrever vancomicina 1g, a cada 12 horas, até o parto.
O American College of Obstetricians and Gynecologists orienta a não realização rotineira da
profilaxia em gestantes colonizadas submetidas a cesariana antes da ruptura de membranas.
Fatores de risco para infecção pelo Streptococcus do grupo B
- Trabalho de parto prematuro;
- Rotura prolongada de membranas (>18 horas);
- Febre durante o trabalho de parto;
- História de infecção do trato urinário por EGB;
- Recém-nascido infectado em gestação prévia.

Observação
De acordo com o Ministério da Saúde do Brasil, gestantes com cultura negativa para EGB na atual gestação não
precisam de profilaxia em nenhuma situação.

6. Cancro mole
Doença de transmissão sexual, caracteriza-se por múltiplas úlceras dolorosas, de bordas não
endurecidas, localizadas principalmente nos grandes e pequenos lábios, no introito vaginal e na
vagina. Surgem após período de incubação de até 8 dias. Em geral, as lesões são acompanhadas
de linfadenopatia inguinal homolateral extremamente dolorosa. As lesões iniciais são pequenas
ginecologia e obstetrícia 381

pápulas eritematosas, que logo se transformam em pústulas vesiculares, as quais se rompem,


surgindo as úlceras características.
O diagnóstico clínico é confirmado pela identificação do H. ducreyi em esfregaços da borda ou
da base das lesões ulceradas e corados pelos métodos de Gram ou Giemsa. Também é útil a cul-
tura desse material ou de aspirados do bubão, em meios especiais, uma vez que a bactéria cresce
com dificuldades somente em ágar sangue.
Pela frequente associação a sífilis primária, sempre deve ser realizada investigação sorológica
concomitante, assim como a pesquisa do Treponema em campo escuro.
A gravidez não parece alterar a evolução da doença. Não há relato de contaminação fetal ou
neonatal pelo bacilo. O tratamento consiste em alívio sintomático das lesões com uso local do
permanganato de potássio.
Vários esquemas de tratamento sistêmico podem ser empregados: eritromicina 500mg, por
via oral, 6/6h, por 7 dias, ou ceftriaxona 250mg intramuscular, em dose única, ou associação de
sulfametoxazol 800mg e trimetoprima 160mg por via oral, 12/12h, durante 1 semana. As lesões
desaparecem 2 semanas após o início do tratamento.

7. Donovanose
A donovanose (ou granuloma inguinal) é causada por bactéria Gram negativa, Donovania
granulomatis, e se apresenta como reação granulomatosa cutânea crônica na genitália externa e,
por vezes, nas regiões anal e perianal.
Trata-se de doença de transmissão sexual pouco contagiosa, característica de regiões tropi-
cais e subtropicais, associada a baixo nível socioeconômico e condições precárias de higiene.
O período de incubação varia de alguns dias a 2 meses. Inicialmente, surgem pápulas indolo-
res, que posteriormente se ulceram e evoluem como tecido de granulação. Em casos de propaga-
ção linfática, pode ser encontrada linfadenopatia regional.
O diagnóstico é confirmado pela identificação dos corpúsculos de Donovan em fragmentos
biopsiados das lesões ulceradas e corados pelos métodos de Giemsa ou Wright.
Durante a gestação, a donovanose é tratada com a associação de sulfametoxazol 800mg e tri-
metoprima 160mg por via oral, 12/12h, durante 21 dias, ou com cloranfenicol 500mg via oral, 6/6h,
pelo mesmo período, observadas as restrições impostas pela gestação ao uso dessas drogas.

Síndromes Sintomas mais comuns Sinais mais comuns Etiologias mais comuns
- Corrimento vaginal e
- Vulvovaginite infecciosa:
prurido; - Edema de vulva;
· Tricomoníase;
Corrimento va- - Dor à micção; - Hiperemia de vulva;
· Vaginose bacteriana;
ginal - Dor durante relação - Corrimento vaginal e/ou
· Gonorreia;
sexual; cervical.
· Infecção por clamídia.
- Odor fétido.
- Dor ou desconforto - Corrimento cervical; - Gonorreia;
Desconforto ou
pélvico; - Dor à palpação abdominal; - Infecção por clamídia;
dor pélvica na
- Dor durante relação - Dor à mobilização do colo; - Infecção por germes;
mulher
sexual. - Temperatura >37,5°C. - Anaeróbios.
- Sífilis;
- Úlcera genital;
- Cancro mole;
Úlcera genital Úlcera genital - Aumento de linfonodos
- Herpes genital;
inguinais.
- Donovanose.
Fonte: adaptado de “Controle das doenças sexualmente transmissíveis”, Ministério da Saúde.
382 SIC Resumão revalida

8. Infecção urinária na gravidez


As transformações anatômicas e fisiológicas que acontecem no trato urinário durante a
gestação facilitam o desenvolvimento de infecções urinárias sintomáticas em mulheres, que
muitas vezes já apresentam bacteriúria no momento da concepção. A compressão extrínseca
dos ureteres pelo útero gravídico e a redução de seu peristaltismo provocada pela proges-
terona provocam dilatação progressiva das pelves renais e ureteres. Essas alterações, junto
com o aumento do débito urinário, levam a estase urinária. A estase é favorecida, ainda,
pela diminuição do tônus vesical, com consequente aumento da capacidade da bexiga e seu
esvaziamento incompleto, provocando refluxo vesicoureteral. Além disso, os rins perdem sua
capacidade máxima de concentrar a urina, o que diminui a atividade antibacteriana, e passam
a excretar quantidades maiores de glicose e aminoácidos, fornecendo meio apropriado para
a proliferação bacteriana.

Há associação entre infecção do trato urinário e piora do prognóstico gestacional. Dentre


as principais complicações, devem-se citar o trabalho de parto e parto prematuros, rotura
prematura de membranas ovulares, restrição de crescimento fetal, recém-nascidos de baixo
peso e óbito perinatal. Gestações complicadas por infecção urinária estão associadas ao do-
bro da mortalidade fetal observada em gestações normais. Outras complicações da gestação
têm sido associadas às infecções urinárias, entre elas pré-eclâmpsia, anemia, corioamnionite,
endometrite e sepse.

Após o diagnóstico clínico de infecção urinária, devem ser solicitados exames de urina
tipo I, urocultura e antibiograma. Na maioria dos casos, a instituição do tratamento é rea-
lizada antes do resultado da cultura de urina. É considerada urocultura positiva quando há
100.000UFC/mL sem tratamento prévio e 10.000UFC/mL quando houve tratamento prévio.
A escolha do antibiótico deve considerar o perfil microbiológico e a sensibilidade dos agentes
etiológicos mais prevalentes aos antibióticos, bem como a segurança da sua utilização duran-
te o período gestacional.

Gestantes com pielonefrite devem ser internadas. Além dos exames de urina, recomen-
dam-se hemograma completo, hemocultura, dosagem de creatinina sérica e eletrólitos. A
antibioticoterapia deve ser parenteral até o paciente permanecer afebril. Quando afebril,
pode-se alterar a via de administração para via oral até completar 14 dias de tratamento.
Primeiramente, podem ser utilizadas as cefalosporinas de 1ª geração (cefazolina 1g, 8/8h, e
cefalotina 1g, 6/6h) ou, em casos mais complicados, cefalosporinas de 3ª geração (ceftriaxo-
na 1g, 12/12h). Esses esquemas terapêuticos podem ser alterados conforme o resultado do
antibiograma. Os sintomas devem regredir em 48 a 72 horas após instituição do tratamento;
caso isso não ocorra, deve-se proceder à investigação de outros diagnósticos. Após 1 semana
do tratamento, realizar outro exame de urocultura; se o resultado for negativo, repetir exame
mensalmente até o parto. Após tratamento, recomenda-se profilaxia com nitrofurantoína em
dose de 100mg por VO ao dia até o parto.
ginecologia e obstetrícia 383

Figura 2 - Condutas para úlcera genital

33 Síndrome da imunodeficiência
adquirida e gestação

1. Introdução
Sua etiologia é o vírus da imunodeficiência humana (HIV), um retrovírus.
A transmissão vertical tem sido a forma mais comum de disseminação do vírus entre crianças,
e suas vias de disseminação não são totalmente esclarecidas, mas podem ocorrer por exposição
da mucosa fetal a secreções ou a sangue materno no intraparto, no aleitamento materno e por
via transplacentária.
O diagnóstico da infecção fetal pode ser realizado por cordocentese, porém esse método, por
ser invasivo, apresenta risco de contaminação fetal no momento da punção; o diagnóstico mater-
no, por vezes, ocorre durante as consultas pré-natais, em que são solicitadas todas as sorologias.
As gestantes normalmente já são imunocomprometidas; logo, quando há gravidez associada
à infecção pelo vírus da AIDS, essas mulheres ficam mais predisponentes a infecções oportunis-
tas, que podem resultar em complicações sérias tanto para a gestante como para o feto.
A infecção mais comum é a pneumonia por Pneumocystis jirovecii, e é possível realizar sua
profilaxia primária com sulfametoxazol e trimetoprima.
384 SIC Resumão revalida

2. Assistência pré-natal
As gestantes soropositivas para HIV devem ser seguidas como de alto risco e, portanto, en-
tram nos critérios do pré-natal de alto risco. Devem ser feitas consultas mais frequentes, exames
de rotina com intervalos menores do que o normal e exames complementares mais específicos,
como ultrassonografia e avaliação da vitalidade fetal mais frequente.
ͳͳ Durante o período do pré-natal, o obstetra deve solicitar não apenas as sorologias indicadas
pelo Ministério da Saúde, mas também a carga viral e os marcadores celulares (CD4+/CD8+),
para verificar o nível de progressão da doença; infecções sexualmente transmissíveis como
clamídia e gonococo devem ser pesquisadas também;
ͳͳ Sempre realizar profilaxia com drogas antirretrovirais a partir da 14ª semana de gestação
(profilaxia tríplice), para reduzir a transmissão vertical. A orientação de tratamento (não
apenas de profilaxia) dependerá de critérios clínicos e laboratoriais;
ͳͳ Manter AZT durante o trabalho de parto até o clampeamento do cordão umbilical;
ͳͳ Os esquemas antirretrovirais combinados devem conter, sempre que possível, zidovudina e
lamivudina, associados a nelfinavir ou nevirapina. Na escolha entre o nelfinavir e a nevira-
pina, deve-se considerar a idade gestacional, o grau de imunodeficiência materna, a carga
viral, o potencial de adesão ao acompanhamento clínico e o uso dos medicamentos;
ͳͳ O nelfinavir é o mais indicado a gestantes com idade gestacional inferior a 28 semanas e a
mulheres com imunodepressão mais acentuada;
ͳͳ Por causa do seu potencial teratogênico, o efavirenz e a hidroxiureia estão proscritos para
uso na gestação.

Fatores relacionados à transmissão vertical do HIV


Fatores inerentes ao recém-nascido
- Prematuridade;
- Baixo peso ao nascer;
- Aleitamento materno.
Fatores maternos
- Estado clínico e imunológico;
- Presença de outras doenças sexualmente transmissíveis;
- Presença de outras coinfecções;
- Estado nutricional;
- Tempo de uso de antirretroviral.
Fatores obstétricos
- Duração da rotura das membranas ovulares;
- Via de parto;
- Presença de hemorragia intraparto.
Fatores virais
- Carga viral;
- Genótipo viral;
- Fenótipo viral.
ginecologia e obstetrícia 385

Imunização para
gestantes soropositivas Recomendações
para HIV
Vacina para pneumococo É considerada.
- É indicado o reforço caso a última dose tenha sido administrada há mais de 5 anos;
Vacina para tétano e
difteria (dT) - Se a gestante não for vacinada ou o estado vacinal for desconhecido, indicar 3
doses (esquema padrão).
- Recomendada para as gestantes suscetíveis (anti-HBs negativo), em situação de
risco;
Vacina para hepatite B
- A dose deve ser o dobro daquela recomendada pelo fabricante: momentos 0, 1, 2
e 6 ou 12 meses.
- Recomendada a gestantes suscetíveis (anti-HBs negativo), usuárias de drogas
Imunoglobulina humana que compartilham seringas e agulhas, aquelas que tenham tido contato sexual
para desprotegido com pessoas HBsAg positivo ou em caso de vítimas de violência
vírus da hepatite B (HBIg) sexual;
- Deve ser iniciada ainda nos primeiros 14 dias de exposição.
- Recomendada para as gestantes suscetíveis (anti-HVA negativo) coinfectadas com
Vacina para vírus da hepati- hepatite B ou C;
te A (HVA)
- Realizar 2 doses com intervalo de 6 meses.
Está recomendada anualmente para as infectadas pelo HIV, antes do período da
Influenza
influenza. Vacina inativada trivalente, 1 dose anual, pode ser feita na gestação.
Imunoglobulina para Vírus Está recomendada a gestantes suscetíveis (anti-VVZ negativo), após exposição em
da Varicela-Zóster (VVZ) ambiente doméstico, hospitalar ou com vizinhos próximos.

3. Assistência ao parto
ͳͳ Alguns serviços preconizam a lavagem do canal vaginal quando em trabalho de parto, na
tentativa de remover as secreções maternas do canal de parto;
ͳͳ Está formalmente indicada a administração de AZT 2mg/kg IV, na 1ª hora, seguida de infu-
são contínua de 1mg/kg por hora até o parto. É imprescindível que a parturiente receba, no
mínimo, 3 horas de AZT (1 hora de ataque e 2 horas de manutenção) via intravenosa antes
do parto;
ͳͳ O obstetra deve procurar não realizar medidas invasivas tanto no pré-parto como no in-
traparto, ou seja, a amniotomia, o uso de fórcipe, o vácuo extrator e a episiotomia, por
exemplo, devem ser evitados;
ͳͳ O clampeamento do cordão deve ser imediato, e o recém-nascido não deve ter contato com
o sangue ou as secreções maternas;
ͳͳ É indicada antibioticoprofilaxia com cefalosporina de 1ª geração nas doses usuais;
ͳͳ Embora haja evidência de que a cesariana possa colaborar para a redução da transmissão
perinatal do HIV, mesmo quando a carga viral é <1.000 cópias/mL, há dúvida se, nessa situa-
ção, o benefício adicional ultrapassaria os riscos de complicações para a mulher associados
a esse procedimento.

O Ministério da Saúde recomenda que a escolha da via de parto obedeça ao seguinte proto-
colo (Tabela a seguir):
386 SIC Resumão revalida

Idade gestacional
Cargas virais Recomendações
(na ocasião da aferição)
1 ≥1.000 cópias/mL ou desconhecido ≥34 semanas Parto por operação cesariana eletiva
2 <1.000 cópias/mL ou indetectável ≥34 semanas Via de parto por indicação obstétrica

Nas gestantes que não realizaram a profilaxia com antirretroviral e estão em trabalho de par-
to, para considerar a via de parto, o obstetra deverá agir de acordo com a fase em que o trabalho
de parto se encontra. A operação cesariana eletiva é realizada antes do início do trabalho de par-
to, encontrando-se as membranas amnióticas íntegras ou com ruptura de menos de 2 horas. Já o
parto vaginal é geralmente indicado quando há trabalho de parto franco.
Para efeito de indicação da via de parto, considerar também carga viral desconhecida àquela
que tenha sido aferida antes da 34ª semana de gestação.

4. Puerpério
Algumas medidas podem ser evitadas ou tomadas no pós-parto e auxiliam a gestante:
ͳͳ A gestante não necessita ficar em isolamento, porém a individualização do quarto pode cur-
sar como benefício tanto para a gestante como para os profissionais da saúde, que poderão
orientá-la e assim tornar efetivas as medidas profiláticas que são necessárias no puerpério;
ͳͳ A amamentação, nesses casos, está contraindicada, e o enfaixamento das mamas como
1ª medida para suprimir a lactação é aconselhável. A bromoergocriptina (2,5mg, 1 ou 2x/d)
ou lisurida (0,2mg, 2 ou 3x/d) podem ser indicadas em algumas pacientes;
ͳͳ Faz parte da assistência puerperal a indicação do melhor método contraceptivo para pa-
cientes HIV positivo; assim, os anticoncepcionais hormonais orais são indicados, a laquea-
dura tubária pode ser realizada com a finalidade de prevenir a transmissão vertical, e o DIU
(dispositivo intrauterino) é contraindicado. Porém, o uso do preservativo deve ser associado
a todas essas formas de contracepção, por impedir a transmissão sexual do HIV ou evitar
exposições repetitivas ao vírus, fator associado à progressão da doença.

Figura 1 - Profilaxia primária para infecções oportunistas


ginecologia e obstetrícia 387

34 Sífilis e gestação

1. Agente etiológico
Treponema pallidum (sensível a penicilina).

2. Transmissão
ͳͳ Ato sexual (mais frequente);
ͳͳ Exposição a sangue ou instrumentos contaminados;
ͳͳ Transmissão vertical:
• Irá resultar em sífilis congênita;
• Mais comum no 3º trimestre, porém mais grave no 1º;
• Nem sempre que houver infecção placentária haverá infecção fetal, e vice-versa.

3. Diagnóstico

A - Clínico
a) Sífilis adquirida (materna) – recente (1º ano após contaminação) e tardia (após o 1º ano)

A recente compreende as fases primárias e secundárias da doença, incluindo, também, a fase


latente precoce. As manifestações clínicas frequentes na gestante podem ser maior polimorfismo
da lesão primária, com borda amolecida, podendo ser dolorosa ou não, e alterações ganglionares.
As lesões de pele do tipo roséolas, sifílides, condiloma plano e alopecia, estas com ausência de
prurido, marcam a fase posterior ao aparecimento do cancro duro.
Já a tardia, compreende as formas latente e terciária. As manifestações clínicas que podem
estar presentes são alterações cutâneas (nódulos), cardiovasculares e nervosas.

b) Sífilis congênita – recente (diagnóstico até o 2º ano de vida) e tardia


(diagnóstico após 2º ano de vida)

B - Testes sorológicos
ͳͳ VDRL (teste inespecífico):
• Reação cruzada (Chagas, mononucleose, hanseníase);
• Útil para rastreamento e controle de tratamento;
• Quando positivo, realização de teste específico (FTA-ABS).
ͳͳ FTA-ABS (teste específico).

C - Pesquisa em campo escuro


Pesquisa do TP, melhor maneira de confirmar o diagnóstico.
388 SIC Resumão revalida

4. Infecção congênita
ͳͳ Possibilidade de causar abortamento, óbito fetal, crescimento fetal restrito, prematuridade
e sífilis congênita;
ͳͳ Sífilis materna não exacerbada pela gestação.

5. Sífilis congênita
ͳͳ Exantema maculopapular, condiloma plano, pênfigo palmoplantar, hepatoesplenomegalia
e linfadenopatia;
ͳͳ Lesões ósseas (osteocondrite, fronte olímpica, dentes de Hutchinson, tíbia “em sabre”, pa-
lato “em ogiva”);
ͳͳ Coriorretinite;
ͳͳ Surdez;
ͳͳ Retardo mental e hidrocefalia.

6. Tratamento
ͳͳ Início precoce e doses adequadas;
ͳͳ Penicilina benzatina 2.400.000UI IM (1.200.000 em cada nádega), semanalmente, durante
3 semanas se sífilis latente tardia, terciária ou com evolução sem tempo determinado;
ͳͳ Se sífilis primária, secundária e latente, realizar o mesmo esquema anterior, mas em
dose única;
ͳͳ Se a paciente for alérgica a penicilina, proceder a dessensibilização e, caso falhe, administrar
estearato de eritromicina, porém, nesse caso, o feto não é considerado tratado durante a
gravidez;
ͳͳ Tratamento do parceiro.

Classificação da sífilis de acordo com


o Ministério da Saúde

Recente (me- Formas primá-


nos de 1 ano ria, secundária e
de evolução) latente recente
Sífilis
adquirida
Tardia (mais de Formas latente
1 ano de evo- tardia e ter-
lução) ciária

Casos diagnos-
Recente ticados até o 2º
ano de vida
Sífilis
congênita
Casos diagnos-
Tardia ticados após o
2º ano de vida
Figura 1 - Avaliação da sífilis no pré-natal
ginecologia e obstetrícia 389

Tratamento inadequado para sífilis materna


- Tratamento realizado com qualquer medicamento que não seja a penicilina;

- Tratamento incompleto, mesmo tendo sido feito com penicilina;

- Tratamento inadequado para a fase clínica da doença;

- Instituição de tratamento dentro do prazo dos 30 dias anteriores ao parto;

- Ausência de documentação de tratamento anterior;

- Ausência de queda dos títulos (sorologia não treponêmica) após tratamento adequado;

- Parceiro sem tratamento ou tratado inadequadamente ou quando não se tem a informação disponível sobre o
seu tratamento.

Observação
A condição de parceiro não tratado caracteriza tratamento materno inadequado e, por conseguinte, a criança será
considerada caso de sífilis congênita.

35 Toxoplasmose e gestação

1. Agente etiológico
Toxoplasma gondii.

2. Transmissão
ͳͳ Contato com fezes de felinos (jardinagem, animais de estimação);
ͳͳ Ingestão de ovos ou carnes contaminados (carne mal cozida ou crua, verdura mal lavada);
ͳͳ Contato de terra com mucosas ou tecidos lesionados;
ͳͳ Transmissão vertical:
• Mais comum no 3º trimestre, porém mais grave no 1º trimestre;

• Apenas durante infecção aguda e primoinfecção.

Observação
Existem 2 formas de infecção, a circulante (taquizoíto) e a latente (cistos).

ͳͳ Prevenção da infecção:
• Lavar as mãos ao manipular alimentos;

• Lavar bem frutas, legumes e verduras antes de ingeri-las;

• Não ingerir carnes cruas, mal cozidas ou mal passadas, incluindo embutidos (salame,
copa etc.);
390 SIC Resumão revalida

• Evitar contato com o solo e terra de jardim; se indispensável, usar luvas e lavar bem as
mãos após;

• Evitar contato com fezes de gato no lixo ou no solo;

• Após manusear a carne crua, lavar bem as mãos, assim como toda a superfície que entrou
em contato com o alimento e todos os utensílios utilizados;

• Não consumir leite e seus derivados crus, não pasteurizados, seja de vaca ou de cabra;

• Propor que outra pessoa limpe a caixa de areia dos gatos e, caso não seja possível, limpá
-la e trocá-la diariamente, utilizando luvas e pazinha;

• Alimentar os gatos com carne cozida ou ração, não deixando que estes ingiram caça;

• Lavar bem as mãos após contato com os animais.

3. Diagnóstico
A - Materno
a) Clínico

A maior parte das gestantes é assintomática, e o seu diagnóstico normalmente é realizado


durante os exames de rotina do pré-natal.

As manifestações clínicas mais frequentes, quando presentes, são linfonodomegalia, febre,


hepatoesplenomegalia e eventual rash cutâneo.

b) Laboratorial: sorologia materna

ͳͳ Perfil sorológico:

• IgG positivo: cicatriz sorológica;

• IgM positivo: possível infecção aguda;

• Teste de avidez, imunofluorescência indireta;

• Determinação da avidez de IgG: maturidade da resposta imunológica, maior capacidade


de ligação e avidez da imunoglobulina. Se o resultado do teste for uma resposta baixa à
IgG, sugere-se primoinfecção recente; quando o resultado revelar uma resposta alta à IgG,
indica-se infecção tardia. O intervalo de tempo para modificar o valor do teste de avidez,
ou seja, elevar a IgG, pode variar, não havendo tempo específico.

B - Fetal e recém-nascido
a) Infecção fetal

ͳͳ Invasivos:
ginecologia e obstetrícia 391

• Cordocentese (pesquisa de IgM no feto);

• Amniocentese (padrão-ouro, PCR no líquido amniótico).

ͳͳ Não invasivo:

• Ecografia.

b) No recém-nascido

Raio x de crânio, ultrassonografia transfontanela, fundo de olho e análise anatomopatológica


da placenta.

4. Infecção congênita
É dividida em 2 grupos:

ͳͳ Infecção congênita: doença adquirida por meio da infecção materna no 2º ao 6º mês de


gestação;

ͳͳ Infecção assintomática: doença adquirida no 3º trimestre de gestação.

Pode causar óbito fetal, abortamento, prematuridade, restrição do crescimento fetal e toxo-
plasmose congênita.

5. Toxoplasmose congênita
Coriorretinite, hidrocefalia e microcefalia, calcificações cerebrais, convulsão e retardo mental,
hepatoesplenomegalia, pneumonite e erupção cutânea.

6. Tratamento
ͳͳ Início imediato (gestante sintomática ou não): espiramicina 3g/d (diminui o risco de trans-
missão vertical, mas não trata o feto);

ͳͳ Se o feto estiver infectado, intercalar espiramicina com sulfadiazina (3g/d) + pirimetamina


(50mg/d) + ácido folínico (10mg/d) a cada 3 semanas;

ͳͳ A sulfadiazina deve ser interrompida nas 2 semanas que antecedem o parto.


392 SIC Resumão revalida

Resultados Ecogra-
Situação Interpretação Conduta Seguimento
IgG IgM fia

Imunidade remo-
ta; gestante com
Não há necessidade de
Positiva Negativa doença antiga -- --
sorologias.
ou toxoplasmose
crônica

Realizar programa de
Repetir a sorologia
prevenção primária
Nega- de 2 em 2 ou 3 em
Negativa Suscetibilidade (ver a seguir conduta --
tiva 3 meses e no mo-
em caso de sorocon-
mento do parto.
versão).

Fazer automaticamente
o teste de avidez de
IgG na mesma amostra.
Avisar a paciente e/
- Ecografias
ou o médico assistente
normais: manter
imediatamente.
espiramicina até
- Avidez forte: infec- o parto;
ção adquirida antes
- Ecografia alte-
Possibilidade de da gestação. Não há Ecogra-
rada: mudar para
Positiva Positiva infecção durante necessidade de mais fia fetal
esquema tríplice
a gestação testes. Infecção adqui- mensal
(após as 18 sema-
rida antes da gestação.
nas).
Não há necessidade de
1ª sorologia no mais testes; Investigação com-
1º trimestre da pleta do recém-
- Avidez fraca: possi-
gestação nascido.
bilidade de infecção
adquirida na gestação.
Iniciar espiramicina
imediatamente.

- Ecografias
normais: manter
espiramicina até o
parto;

- Ecografia alterada:
mudar para esque-
ma tríplice (após as
- Iniciar espiramicina
18 semanas);
imediatamente;
Infecção muito Ecogra- Investigação com-
Nega- - Repetir sorologia em
Positiva recente ou IgM fia fetal pleta do recém-
tiva 3 semanas;
falso positivo mensal nascido;
- IgG positivo: confir-
- IgG continua ne-
ma a infecção.
gativa: suspender
espiramicina. Pre-
venção primária;

- Repetição da
sorologia de 3 em
3 meses e no mo-
mento do parto.
ginecologia e obstetrícia 393

Resultados Ecogra-
Situação Interpretação Conduta Seguimento
IgG IgM fia

- Ecografia nor-
mais: manter
espiramicina até o
parto;
Imunidade remo-
- Ecografia alte-
ta; gestante com Ecogra-
Não há necessidade de rada: mudar para
Positiva Negativa doença antiga fia fetal
novas sorologias. esquema tríplice
ou toxoplasmose mensal
(após as 18 sema-
crônica
nas).
Investigação com-
pleta do recém-
nascido.

Programa de preven-
ção primária. Repetir a
sorologia de 2 em 2 ou
Nega-
Negativa Suscetibilidade de 3 em 3 meses e no -- --
tiva
momento do parto (ver
a seguir conduta em
caso de soroconversão).

- Ecografias
Se a gestação tiver normais: manter
menos de 30 semanas: espiramicina até o
iniciar espiramicina. parto;
Gestante com 30 - Ecografia alte-
Possibilidade de semanas ou mais de Ecogra-
rada: mudar para
Positiva Positiva infecção durante gestação: iniciar dire- fia fetal
1ª sorologia após esquema tríplice
a gestação tamente com esquema mensal (após as 18 sema-
o 1º trimestre tríplice. nas).
Fazer teste de avidez Investigação com-
de IgG. pleta do recém-
nascido.

- Ecografias
normais: manter
espiramicina até o
parto;
- Ecografia alte-
rada: mudar para
esquema tríplice
(após as 18 sema-
Iniciar espiramicina nas);
Infecção muito imediatamente. Re- Ecogra-
Nega-
Positiva recente ou IgM petir sorologia em 3 fia fetal - Investigação
tiva
falso positivo semanas. IgG positivo: mensal completa do re-
confirma a infecção. cém-nascido;
- IgH continua
negativa: suspen-
der espiramicina.
Prevenção primá-
ria. Repetição da
sorologia de 3 em
3 meses e no mo-
mento do parto.
394 SIC Resumão revalida

Resultados Ecogra-
Situação Interpretação Conduta Seguimento
IgG IgM fia
Exceção: 1ª sorologia
(negativa) bem no
início da gestação e
exame subsequente
no final da gestação
ou no momento do
parto com IgG muito
Possibilidade de alta: possibilidade
falso negativo da de infecção durante
IgG na amostra a gestação com IgM
anterior, por muito fugaz.
Positiva Negativa -- --
método inade-
quado; provável Analisar também a
imunidade re- possibilidade de IgM
mota falso negativo.
Se possibilidade de
infecção adquirida na
gestação, iniciar com
esquema tríplice.
Investigação completa
do recém-nascido.
Repetir a sorologia
Nega- Manter o programa de
Negativa Suscetibilidade -- no momento do
tiva prevenção primária.
parto.
Amostras A paciente e/ou médi- - Ecografias
subsequentes, co devem ser avisados normais: manter
na gestante, pelo laboratório, para espiramicina até
inicialmente não retardar a condu- o parto;
com IgG-/IgM- ta. Se a gestação tiver - Ecografia alte-
Certeza de in- menos de 30 semanas: Ecogra- rada: mudar para
Positiva Positiva fecção durante a iniciar imediatamente fia fetal esquema tríplice
gestação com espiramicina. mensal
(após as 18 sema-
Se a gestação tiver 30 nas).
semanas ou mais: ini- Investigação com-
ciar diretamente com pleta do recém-
esquema tríplice. nascido.
Iniciar espiramicina
imediatamente. Re-
petir sorologia em 3 - Ecografias
semanas. IgG positivo: normais: manter
confirma a infecção. espiramicina até
o parto;
Se a gestação tiver 30
semanas ou mais: ini- - Ecografia alte-
Infecção muito Ecogra-
Nega- ciar diretamente com rada: mudar para
Positiva recente ou IgM fia fetal
tiva esquema tríplice. esquema tríplice
falso positivo mensal
(após as 18 sema-
IgG continua negativa:
nas).
suspender espiramici-
na. Prevenção primá- Investigação com-
ria. Manter sorologia pleta do recém-
de 2 em 2 ou 3 em 3 nascido.
meses e no momento
do parto.
ginecologia e obstetrícia 395

36 Isoimunização Rh

1. Introdução
A isoimunização ou aloimunização é causada pela exposição materna a antígenos eritrocitá-
rios não compatíveis. As possíveis etiologias são:

ͳͳ Hemorragia transplacentária;
ͳͳ Hemorragia fetomaterna;
ͳͳ Transfusão de sangue incompatível;
ͳͳ Usuárias de drogas intravenosas;
ͳͳ Biópsia de vilosidades coriônicas;
ͳͳ Amniocentese;
ͳͳ Cordocentese;
ͳͳ Transfusão intrauterina;
ͳͳ Manipulação obstétrica;
ͳͳ Abortamento: induzido >espontâneo;
ͳͳ Gravidez ectópica;
ͳͳ Síndromes hemorrágicas.

Em quase 100% dos casos, deve-se à incompatibilidade ABO e Rh, e agentes atípicos são uma
pequena parcela (2%).

A sensibilização materna ocorre após exposição primária aos antígenos eritrocitários desco-
nhecidos. Primeiramente, é produzida IgM, que não atravessa a barreira placentária devido ao
seu grande peso molecular; na exposição secundária ao antígeno desconhecido, ocorre a produ-
ção de IgG, que ultrapassa a barreira placentária, aderindo à membrana dos eritrócitos ativando
o sistema reticuloendotelial do baço causando hemólise fetal, além da hemólise, que pode causar
anemia fetal, hidropisia fetal, kernicterus, até o óbito fetal.

A hemorragia fetomaterna pode ocorrer em procedimentos como biópsia de vilo corial,


amniocentese, cordocentese, transfusão intrauterina, manipulação obstétrica (versão inter-
na, extração manual da placenta etc.), abortamento, gestação ectópica e síndromes hemor-
rágicas (ameaça de abortamento, placenta prévia, descolamento prematuro de placenta). Em
todas essas situações, preconiza-se a administração de imunoglobulina anti-Rh para a pre-
venção da aloimunização.
396 SIC Resumão revalida

2. Diagnóstico e investigação

Figura 1 - Diagnóstico e investigação

Na 1ª consulta do pré-natal, deve-se solicitar a tipagem sanguínea materna, se gestante Rh


negativo, deve-se determinar o Rh do parceiro. Se o parceiro for Rh negativo, haverá ausência de
risco; se Rh positivo ou desconhecido, deve-se realizar a genotipagem/Coombs indireto.
O teste de Coombs indireto avalia se o feto está em risco, não predispõe com acurácia a
gravidade da doença e deve ser realizado na 1ª consulta do pré-natal (16ª a 18ª semana) e,
posteriormente, a cada 4 semanas, nos casos de gestantes Rh negativo. Nos títulos de anti-
corpos ≤1:8, o risco é mínimo para acometimento grave; se títulos de Coombs indireto ≥1:32,
indica-se avaliação fetal.

A - Ultrassonografia
Avalia alterações morfológicas que a doença provoca no feto e na placenta, alterações na ati-
vidade biofísica do feto, no volume do líquido amniótico e no fluxo sanguíneo fetal.

B - Sinais de anemia fetal na ultrassonografia


ͳͳ Espessamento e alteração da ecogenicidade placentária;
ͳͳ Derrame pericárdico: sinal precoce de anemia – alteração na função hepática;
ͳͳ Aumento do líquido amniótico;
ͳͳ Ascite fetal: discreta, devido a hipertensão portal;
ͳͳ Edema subcutâneo;
ginecologia e obstetrícia 397

ͳͳ Derrame pleural;
ͳͳ Dilatação da veia umbilical.

C - Dopplervelocimetria da artéria cerebral média


ͳͳ Avalia a velocidade máxima do fluxo da artéria cerebral média, que quando aumentada é
preditiva de anemia fetal;
ͳͳ Substituição da amniocentese: ↓ risco de perda da gestação;
ͳͳ É um método não invasivo, que gera resultado imediato;
ͳͳ A avaliação deve ser iniciada na 18ª semana e repetida semanalmente.

D - Cardiotocografia
É um método não invasivo, que avalia a vitalidade fetal, feito para acompanhamento durante
seguimento ultrassonográfico após a 34ª semana. O padrão sinusoidal à cardiotocografia é carac-
terístico de fetos comprometidos.

E - Amniocentese
É um método invasivo, de
análise, por meio de espectro-
fotometria, da concentração de
bilirrubina no líquido amniótico,
estimando o grau de hemólise
fetal. A bilirrubina é transporta-
da pela placenta para circulação
materna, sendo metabolizada no
fígado. Uma pequena quantida-
de entra no ciclo êntero-hepáti-
co fetal e é redistribuída e excre-
tada no líquido amniótico pelo
fluido pulmonar.

F - Cordocentese
É um método invasivo, que
não deve ser realizado antes da
17ª semana de gestação, pois a
hemólise fetal na aloimunização
Rh necessita da maturação do
sistema reticuloendotelial, que
começa a ocorrer a partir dessa
idade gestacional.
Realiza a avaliação direta do
tipo sanguíneo do feto e dos ní-
veis de hemoglobina e hemató-
crito e é utilizada, também, como Figura 2 - Seguimento de isoimunização Rh com antecedente de
via de tratamento da anemia. acometimento
398 SIC Resumão revalida

Figura 3 - Seguimento de isoimunização Rh com 1ª gestação afetada

3. Terapêutica fetal
A - Transfusão intrauterina
Iniciada a partir da 16ª semana de gestação e repetida até que se tenha uma Idade Gestacional
(IG) segura para seguir um tratamento neonatal.
O 1º passo dá-se pela cordocentese (guiada por ultrassonografia/local da punção) e pela
transfusão na veia.
Devem-se utilizar concentrados de glóbulos tipo O negativo para o antígeno RhD ou outro
antígeno para o qual a gestante seja aloimunizada.
A transfusão intrauterina (TIU) é repetida visando manter o hematócrito fetal acima de 27 a
30%, tomando-se por base o declínio do hematócrito fetal de 1% ao dia.
Sobrevida de 94% para fetos não hidrópicos e 74% para fetos hidrópicos.

B - Transfusão intraperitoneal
Realizada quando não se pode fazer a TIU. Em casos de dificuldade de punção vascular:
ͳͳ Placenta localizada na parede posterior;
ginecologia e obstetrícia 399

ͳͳ O concepto, pela sua posição, impede a punção do cordão umbilical;


ͳͳ Fetos hidrópicos (absorvem irregularmente o sangue infundido na cavidade peritoneal).

C - Outros
ͳͳ Prometazina: atua por meio da imunossupressão reduzindo ligação Ag-Ac, devendo ser ini-
ciada a partir da 14ª à 16ª semana gestacional;
ͳͳ Imunoglobulina intravenosa: TIU de IgG em altas doses deve ser administrada antes da
presença de anemia na dose de 0,4g/kg, por 3 dias consecutivos, e repetir a cada 3 semanas;
ͳͳ Plasmaférese: substitui o plasma contendo Ac por plasma, albumina e solução salina. Pode
ser realizada no início da gestação.

4. Prevenção
A imunoglobulina anti-D faz um bloqueio dos sítios antigênicos, evitando que os antígenos
entrem em contato com os linfócitos do hospedeiro.

O teste de Coombs indireto deve ser negativo antes da administração da imunoglobulina,


indicando que a gestante não foi sensibilizada. O teste de Coombs direto tem como objetivo pes-
quisar a presença de anticorpos nos eritrócitos fetais.

Se o Coombs indireto da mãe for negativo e o recém-nascido for Rh positivo, é necessário ad-
ministrar imunoglobulina anti-D à mãe. Caso o Rh do recém-nascido não tenha sido determinado,
isto é, seja duvidoso, e a gestante for receber alta, administrar imunoglobulina.

Indicação para administração de imunoglobulina anti-D:

ͳͳ Gestantes Rh não sensibilizadas entre a 28ª e a 34ª semanas;

ͳͳ Pós-parto de recém-nascido Rh positivo em até 72 horas;

ͳͳ Abortamento;

ͳͳ Gravidez molar e ectópica;

ͳͳ Óbito intrauterino;

ͳͳ Feto natimorto;

ͳͳ Após procedimento invasivo;

ͳͳ Síndromes hemorrágicas (repetir a cada 12 semanas até o parto);

ͳͳ Trauma abdominal;

ͳͳ Após transfusão de sangue incompatível.

De acordo com o Ministério da Saúde, a imunoglobulina deverá ser administrada até 72 horas
após o parto ou evento obstétrico, mas há evidências de proteção contra sensibilização se admi-
nistrada até 13 dias, e há recomendações para que seja administrada em até 28 dias.

Das könnte Ihnen auch gefallen