Sie sind auf Seite 1von 19

CENSURA POLÍTICA À MÚSICA POPULAR BRASILEIRA:

As ações da censura na ditadura civil-militar à MPB

Carolina Mary Medeiros1

Resumo: Este artigo destina-se a mapear e refletir brevemente sobre as formas de ações
da censura durante o período da ditadura civil-militar instaurada no Brasil na década de
1960, principalmente no que tange à Música Popular Brasileira (MPB) criada no referido
período histórico.

Palavras Chave: Ditadura Civil-Militar – Censura – Música Popular Brasileira.

1 Professora do Departamento de História do Colégio Pedro II – Campus Engenho Novo II. Integrante do
Curso de Especialização em Ensino de História da África do Departamento de História em parceria com a
PROPGPEC do Colégio Pedro II. Mestre em Sociologia pelo PPCIS da UERJ. Graduação em História pelo
IFCS-UFRJ.

2626
ENCONTROS – ANO 13 – Número 25 – 2º semestre de 2015

“Por esse pão pra comer, por esse chão pra dormir
A certidão pra nascer e a concessão pra sorrir
Por me deixar respirar, por me deixar existir
Deus lhe pague
Pelo prazer de chorar e pelo estamos aí
Pela piada no bar e futebol pra aplaudir
Um crime pra comentar e um samba pra distrair
Deus lhe pague.”
(Chico Buarque. Deus lhe pague. 1971).

Esse artigo destina-se a mapear, brevemente, as formas de ações da censura

durante o período da ditadura civil-militar instaurada no Brasil a partir da década de 60,

principalmente em sua relação com a Música Popular Brasileira produzida no período.

Entende-se por MPB, um segmento dentro do campo de produção musical mais amplo no

Brasil que privilegia, sobretudo neste período, letras de canções com forte cunho de

crítica ou crônica social, bem como parcela significativa das canções tendem a traduzir a

luta política de oposição à ditadura. Este segmento da produção de canções é consumido

principalmente por setores jovens de classe média urbana intelectualizada que dialogam

diretamente com as canções, fazendo delas suas trilhas sonoras, seja para a luta política,

seja para a revolução cultural e comportamental que promoviam.

Antes de uma análise específica das ações da censura à música popular brasileira,

é importante estabelecer o conceito de censura e, claro, compreender a censura

estabelecida durante o período militar a partir dos anos 1960. O histórico de ações de

repressão e censura no Brasil é bastante longo. As produções intelectuais e artísticas

sempre foram motivos de vigilância no país e instrumentos reguladores como lei de

imprensa e classificação etária são constantes no cotidiano brasileiro. Não só como

instrumentos impostos pelo Estado, mas instituições legitimadas por setores significativos

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA DO COLÉGIO PEDRO II – RIO DE JANEIRO


27
ENCONTROS – ANO 13 – Número 25 – 2º semestre de 2015

da sociedade brasileira que consideram o ato de vigiar o que é dito em livros, jornais,

teatro, música e cinema como atos normais e necessários.

Este braço repressor de censura do Estado de exceção estabelecido no Brasil do

período atuava em toda a produção cultural brasileira, seja ela audiovisual, teatral,

televisiva, cinematográfica ou musical. Nada que fosse produzido poderia ser difundido ao

público sem o crivo violento da censura e neste caso, não tratamos somente da violência

simbólica, mas por muitas vezes física. Entender as formas e mecanismos de ação do

Estado repressor é um trabalho fundamental e infinito. Estas reflexões são uma breve e

pequena contribuição.

Retornando à questão específica da censura, a ditadura militar estabelecida nos

anos 1960, não criou mecanismos da censura, mas os adequou aos seus interesses. Em

14 de março de 1967, entrava em vigor um conjunto de dispositivos de legais reunidos na

Lei n.5.2502. Estes dispositivos ficaram conhecidos como Lei de Imprensa e esta foi a

primeira regulamentação de censura estabelecida pelo regime. A censura à imprensa,

objeto de numerosos estudos3, se estabelecia como uma censura prévia aos textos,

sobretudo, de jornais e revistas. Aliás, é válido relembrar que a censura prévia era uma

atividade legal do Estado desde a Constituição de 1934, que introduziu, no sistema

jurídico, a censura prévia aos espetáculos de diversões públicas. A Constituição de 1937

aumenta a área de atuação da censura para a radiodifusão, o que foi ratificado pela

constituição de 1946 pós-abertura política com o fim do Estado Novo.

Os anos 1960 e 1970 consolidaram a indústria fonográfica e a televisiva, A música,

por exemplo, teve seu período de maior crescimento e junto à televisão marcou presença

2 BRASIL. Presidência da República. Lei no 5.250, de 9 de fevereiro de 1967. Lei que regula a liberdade de
manifestação do pensamento e de informação. Fonte: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5250.htm
3 Temos trabalhos importantes sobre a censura à imprensa podemos destacar: KUSHNIR, Beatriz. Cães de

guarda: jornalistas e censores, do AI-5 a constituição de 1988. São Paulo. Bomtempo. 2004. SOARES,
Gláucio Ary Dillon. A censura durante o regime autoritário. Revista Brasileira de Ciências Sociais, vol. 4,
n º 10, 1989.

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA DO COLÉGIO PEDRO II – RIO DE JANEIRO


28
ENCONTROS – ANO 13 – Número 25 – 2º semestre de 2015

constante na vida dos habitantes das grandes cidades. Neste sentido, a produção artística

ou de diversões públicas tornavam-se uma preocupação ainda maior durante os governos

militares. Diferentemente da ditadura do Estado Novo, de 1937 a 1945 com Getúlio

Vargas, no âmbito da qual o intuito de construir uma hegemonia através do consenso era

muito maior, chegando a criar um órgão de propaganda do governo, Departamento de

Imprensa e Propaganda − o DIP −, na ditadura militar de 1964, apesar de tentativas como

“Brasil ame-o ou deixe-o” e “Eu te amo meu Brasil, eu te amo...”, o que vigorava durante o

regime militar era a repressão dura e crua.

(...) contrariamente ao Estado Novo, no período militar estudado nunca


houve, efetivamente, uma política de capitalizar as manifestações culturais
para seu projeto de hegemonia, nem através da AERP, no governo Médici,
nem através do SCDP (Serviço de Censura e Diversões Públicas) da
Polícia Federal, tendo a censura papel apenas silenciador...” (MOBY,
1994).

Mesmo em períodos de exceção, de autoritarismo, o Estado sempre tenta, através

do consenso, legitimar o seu poder, dando uma aparência de legalidade ao ilegal e

ilegítimo. A “revolução vitoriosa”, como o golpe de 1964 era intitulado pelos governos

militares posteriores, precisava ser institucionalizada e a próprio termo revolução dava

esse caráter legitimador do Estado, à medida que este só pode ter legitimação quando

eleito ou quando fruto de uma revolução vitoriosa.

Assim, a revolução vitoriosa, como Poder Constituinte, se legitima a si


mesma. Ela destitui o governo anterior e tem a capacidade de constituir o
novo governo. Nela se contém a força normativa inerente ao Poder
Constituinte. Ela edita normas jurídicas sem que nisto seja limitada pela
normalidade anterior à sua vitória.4

O Serviço de Censura de Diversões Públicas (SCDP) existia desde os anos 1940,

mas com caráter regional. Grupos de censores em cada Estado do país eram contratados

para análise da produção para “diversões públicas”, ou seja, canções, peças de teatros,

filmes para cinema, programas de televisão programação radiofônica e atividades

circenses. Nestas análises, a censura em forma de veto ou sugestões para possíveis


4 BRASIL. Poder Executivo. Ato Institucional de 9 de abril de 1964. Apud MOBY (1994).

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA DO COLÉGIO PEDRO II – RIO DE JANEIRO


29
ENCONTROS – ANO 13 – Número 25 – 2º semestre de 2015

modificações interferia diretamente na produção. Em 1961, o governo Jânio Quadros

através do Decreto 50.5185, concedeu às unidades Federativas o direito de censura,

mantendo o caráter regional das ações de censura.

Em 1965, iniciou-se um processo de centralização da atuação censória. Esta

tendência foi mantida pelo Decreto nº. 43, de 19666, que estabeleceu a exclusividade da

união para a execução de censura. Mas foi a partir de 1972 que o SCDP foi transformado

em Divisão de Censura de Diversões Públicas (DCDP), por meio do Decreto n. 70.665

(junho de 1972). A criação do DCDP ratificou a tendência de centralização do processo de

análise e censura dos produtos de diversões públicas. Desta forma, a produção cultural

deveria ser mandada diretamente para este órgão pertencente ao Departamento de

Polícia Federal (DPF) com sede em Brasília. O caso das canções e peças de teatro, de

acordo com a região, o DCDP redirecionava o produto cultural para os setores regionais

que continuaram existindo com o mesmo nome: Serviço de Censura de Diversões

Públicas (SCDP). O SCDP cuidava da produção cultural dos Estados sob o comando

central de Brasília. No caso das peças de teatro, por exemplo, o texto era censurado

pelos censores do DCDP em Brasília, mas eram os técnicos de censuro do SCDP

Estadual que acompanhava os ensaios gerais e também davam seus pareceres, podendo

ampliar a censura já feita ao texto, ou somente, confirmar que, nas apresentações, os

vetos foram mantidos. Os censores regionais funcionavam, neste sentido, como

responsáveis diretos pela fiscalização da censura, mas sempre, subordinados à censura

federal.

5 BRASIL. Presidência da República. Decreto nº 50.518, de 2 de maio de 1961. Diário Oficial da União,
seção 1 - 2/5/1961, página 4020 (Publicação Original).
6 BRASIL. Presidência da República. Decreto-Lei nº 43, de 18 de novembro de 1966. Fonte:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del0043.htm

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA DO COLÉGIO PEDRO II – RIO DE JANEIRO


30
ENCONTROS – ANO 13 – Número 25 – 2º semestre de 2015

No caso das canções, apesar da centralização imposta a partir do Decreto Lei

56.510 de 19657, que unificava os critérios para liberação das letras de músicas que

deviam ser censuradas somente em Brasília, os censores regionais também atuavam. A

partir do Decreto Lei, o requerente da censura seria o autor ou outorgante, anexando o

original de letra e duas cópias carbônicas sem borrão ou rasura. As verificações da

censura teriam prazo de 30 dias. Ficava claro, que os departamentos destinados à

repressão às artes e artistas se relacionavam intensamente. Assim, tanto o DCDP como

SCDP faziam o serviço de censura, através de seus técnicos, mas enviavam dossiês de

artistas mais visados e censurados que passavam a ser vigiados pelos DOPS (Delegacia

de Ordem Política e Social). O DOPS se encarregava de enviar relatórios bimestrais das

atividades dos artistas à DCDP. O DCDP também pedia ao DOPS a operação de

apreensão de discos, como ocorreu com o LP de Chico contendo Apesar de Você. Em

alguns casos, os artistas eram intimados pelos DOPS para dar explicações sobre suas

canções. Chico Buarque recebeu diversas intimações do DOPS, tendo que prestar

esclarecimentos sobre algumas de suas canções na Rua da Relação aqui no Rio de

Janeiro. Segundo o compositor: “Eu conhecia todos lá na Relação. No começo ficava

tenso, depois acostumei, reservava sempre algum tempo, caso viesse a ser chamado.”8

O ambiente se era de asfixia generalizada. À medida que o tempo foi passando, as

ações da censura começaram a ser mais rígida, assumindo o seu auge a partir de 1968,

com o governo de Médici, representante da chamada linha dura das Forças Armadas, foi

o “golpe dentro do golpe” que institucionalizou os ideais e princípios da “revolução” e

continuou a “obra revolucionária”. Governando através de Atos Institucionais, em

dezembro de 1968, a linha dura do governo decreta o Ato Institucional n 5, o AI-5:

7 BRASIL. Presidência da República. Decreto Lei que aprovou o Regulamento Geral do Departamento
Federal de Segurança Pública. Diário Oficial da União, seção 1, 30/7/1965, Página 7470 (Retificação).
8
Entrevista de Chico Buarque em 1971. In: BAHIANA, Ana Maria. Nada será como antes: a MPB nos anos
70. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1980. p.33.

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA DO COLÉGIO PEDRO II – RIO DE JANEIRO


31
ENCONTROS – ANO 13 – Número 25 – 2º semestre de 2015

Esse modelo político-econômico de modernização, baseado no


trinômio segurança-integração-desenvolvimento e apoiado no
grande capital privado e estatal, no arrocho salarial, na cassação
das liberdades civis e numa rígida censura, ficaria conhecido por
“milagre brasileiro” e só iria dar os primeiros sinais de exaustão em
1974. (MOBY, 1994, p. 52)

Acabou-se o último sopro de liberdade que ainda se podia ter. Através dessa

medida, os militares poderiam invadir casas, prender suspeitos, torturar para conseguir

confissões, nomes de outros colegas participantes de movimentos contra o governo

imposto pela “revolução”. Iniciou-se uma caça aos elementos considerados subversivos e

a possíveis suspeitos. Todo e qualquer ato subversivo deveria ser reprimido para o bem-

estar da nação e para que se desse continuidade a obra revolucionária iniciada com o

golpe em 1964. O AI-5 visou, portanto, combater:

Atos nitidamente subversivos, oriundos dos mais distintos setores políticos


e culturais, comprovam que os instrumentos jurídicos, que a Revolução
vitoriosa outorgou à Nação para sua defesa, desenvolvimento, e bem-estar
de seu povo, estão servindo de meios para combatê-la e destruí-la.” 9

Tudo deve passar por uma censura prévia tanto no meio artístico como na própria

imprensa. Notícias como sucessão presidencial, possibilidade ou necessidade de práticas

democráticas e violação de direitos humanos devem ser vetadas. Proíbe-se ainda que se

reclame da censura ou que se discuta sua legitimidade, críticas ao governo e registro de

atividades subversivas. Ainda mais notícias vindas do mundo, sobre comunistas e

exaltação da imoralidade e, principalmente do homossexualismo. O Brasil que se queria

criar e difundir pelos meios de comunicação era um país cujo regime não se esgota, com

um mercado sempre próspero, sem problemas sociais maiores, sem homossexuais nem

comunistas. Um país da ordem, sem conflito.

Não se deve supor simplesmente que a censura era formada por ordens ridículas

de policiais despreparados, apesar da arbitrariedade contatada em muitos casos. Esta

9BRASIL. Presidência da República. Preâmbulo do Ato Institucional n 5, de 13 de dezembro de 1968.


Fonte: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/AIT/ait-05-68.htm

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA DO COLÉGIO PEDRO II – RIO DE JANEIRO


32
ENCONTROS – ANO 13 – Número 25 – 2º semestre de 2015

ideia difundida pelo senso comum durante e após o período da repressão política se

mostra na maioria dos casos infundada. Por trás dos policiais havia pessoas competentes

que se orientavam pela ideologia do regime. É nesse sentido que vemos documentos

como as notas mandadas à imprensa sobre as regras gerais da Censura, mostrando o

que vetar. Tais notas eram enviadas ora em nome da Polícia Federal, ora com os próprios

nomes de militares como foi o caso de General Antônio Bandeira, Coronel Moacir Coelho

e General Canepa (GASPARI, 1978).

Segundo essas notas mandadas constantemente à imprensa, ficavam vetadas

quaisquer notícias sobre a inconformidade com a censura de qualquer tipo; campanhas

de revogação dos Atos Institucionais, principalmente o AI5; contestação ao regime;

campanha de descrédito sobre política habitacional e mercado de capitais; tensão entre

Governo e Igreja e agitações nos meios sindicais e estudantis; publicidade sobre nações

ou pessoas comunistas; acusação de uso da violência por parte dos Órgãos de

Segurança; crítica sobre a situação econômico-financeira; notícias de choques armados

entre policiais e terroristas; pronunciamento de determinados políticos (especificado nos

pareceres) da Câmara; noticiar mortes ou prisão de elementos subversivos; notícias sobre

as atividades de Segurança Nacional; notícias sobre passeatas, manifestações, reuniões,

assembleias de estudantes. Fica claro, que o Estado, em suas instituições repressoras,

sabia exatamente o que queria censura. O que devia ser calado, silenciado, para que um

discurso de moralidade e fé nas instituições militares gritasse mais alto.

É importante fazer um parêntese sobre a ação dos censores. Em alguns estudos

ela aparece como despropositada, aleatória e ignorante, enfatizando erros absurdos e

famosos cometidos pelos censores. É famoso o relato de apreensões de livros como A

capital de Eça de Queiroz no lugar de O Capital de Marx. Em outros textos, a censura

aparece como meticulosa, centralizada e organizada ao extremo. Censores ultra-

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA DO COLÉGIO PEDRO II – RIO DE JANEIRO


33
ENCONTROS – ANO 13 – Número 25 – 2º semestre de 2015

competentes e muito bem orientados para que nada que interferisse nos preceitos

conservadores dos militares passasse. Esta dubiedade é bastante significativa à medida

que, apesar de como vimos, os órgãos responsáveis pela censura serem bastante

equipados e organizados em hierarquias rígidas como o SCDP, o DCDP e o DOPS, a

censura efetivamente dependia das ações de técnicos de censura que não

necessariamente eram graduados para tal trabalho, ou e, principalmente, também

estavam sujeitos as suas preferências e concepções. Um grau de subjetividade deve ser

visto como pertencente a todo o aparato de repressão. Neste sentido, apesar das

tentativas de uniformizar e centralizar a censura a partir do DCDP, os departamentos

censores sofriam com grande falta de critérios já que estavam também sujeitos a

impressões pessoais e subjetivismo.

Além disso, o número de censores não era tão grande ou suficiente para abarcar

toda a produção cultural. Havia limitações técnicas significativas. Em 1973, o número de

censores somavam 34 em Brasília, trabalhando pelo DCDP. Em 1978, formavam 45

censores, chegando aos 59 em 1981. Neste mesmo ano, somados os censores da DCDP

com todos os outros técnicos de censura dos Serviços de Censuras regionais formavam

um total de 221. As dificuldades técnicas eram tantas que em 1974, a Academia Nacional

de Polícia promoveu um “Curso de Transformação” para interessados em se tornar

censores.

Odette Martins Lanziotti foi técnica de censura durante quase toda a década de

1970 e trabalhava especificamente com letra de músicas. Aposentada da Polícia federal

desde 1980, a ex-censora de 85 anos contribui para os estudiosos com depoimentos

interessantes para pensar nesta dimensão mais subjetiva das ações da censura.

Muitas vezes, a gente reprovava a música, mas se sentia como se


estivesse se prostituindo, porque não concordava com aquilo. Mas os
censores tinham de ter o máximo de cuidado. Recebíamos muitas
orientações que deviam ser seguidas. Quem aprovasse uma música que

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA DO COLÉGIO PEDRO II – RIO DE JANEIRO


34
ENCONTROS – ANO 13 – Número 25 – 2º semestre de 2015

depois fosse reprovada em Brasília tinha de responder processo interno.


(...). Os censores eram saco de pancada. Recebiam ordens e tinham de
executá-las. Recebíamos orientações dos chefes. Algumas vezes, a
recomendação era prestar mais atenção na política, no duplo sentido.
Outras chamavam atenção para a apologia das drogas, para a
preservação dos bons costumes. As autoridades tinham supremo cuidado,
às vezes até em excesso. (LANZIOTTI, 2005)

Estes depoimentos esclarecem uma série de fatores interessantes. Apesar de

algumas canções serem censuradas por técnicos regionais que trabalhavam para o

SCDP, a vigilância sobre eles em Brasília através do DCDP era rigorosa. Em muitos

casos o clima de hierarquia e vigilância gerava um excesso de zelo que acabava vetando

além do necessário estabelecido pelo próprio regime. Eram comuns também os conflitos

entre os órgãos de censura, sobretudo o SCDP de São Paulo e do Rio de Janeiro, onde a

produção cultural era mais intensa e suas relações com o DCDP com sede em Brasília.

Em outro depoimento a censora Odette Lanziotti deixa escapar como a

subjetividade também era um fator importante no ato de censurar. Em entrevista ainda

para o Estado de São Paulo, quando ouvia por telefone trechos dos pareceres que

assinou, perguntou ao repórter,

Não tem aí uma música chamada Dois homens? Sou louca para encontrar
essa música. Era uma letra muito inteligente, bem elaborada, mas eu
sentia algo que não podia aprovar. Li de cima para baixo, de baixo para
cima e demorei muito a descobrir o que era. Não me lembro dos versos,
mas fazia apologia a dois homens juntos. Nunca mais vi esta música.
(LANZIOTTI, 2005)

A partir de 1968, tendo sido decretado em dezembro deste ano o Ato Institucional

nº 5 em que a linha dura militar golpeia o governo, a repressão chegou ao seu clímax. A

censura se acirrou, a tortura entrou na ordem do dia, e o que ocorreu no campo artístico

foi a diáspora cada vez maior de artistas e intelectuais de um lado, e as tentativas de

sobrevivência cultural camuflada e disfarçada em espaços mínimos, de outro.

Em relação ao campo da música especificamente, a política federal foi mais dura,

pois era a expressão preferida da juventude, com maior capacidade de reuni-la,

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA DO COLÉGIO PEDRO II – RIO DE JANEIRO


35
ENCONTROS – ANO 13 – Número 25 – 2º semestre de 2015

canalizando força para o movimento político, vide canção de protesto, quebrando o

silêncio e a paz dos cemitérios. Dessa forma, maior força de protesto, maior repressão.

Como declarou Gilberto Gil em entrevista ao Pasquim de março de 1970: “As aves daqui

não gorjeiam como as de lá - mas ainda gorjeiam.”

A abertura de Geisel trouxe à tona, com o afrouxamento da censura, o debate

sobre as consequências de uma política de controle rígidos dos meios de comunicação,

em termos de desenvolvimento social. Iniciou-se um debate sobre a censura em si e suas

consequências sociais. Nesse debate, são relevantes os artigos de Gustavo Dahl ao

Opinião em março de 1975. Diz ele:

Subordinada à área do Ministério da Justiça e vista de um ponto de vista


funcional, a competência da cultura é exclusivamente policial. (...)
crescendo no organismo que representa dentro da população a autoridade
do Estado, a censura tende a comportar-se dentro dos métodos e normas
desse mesmo organismo. Ou seja, a censura proíbe ou corta baseada na
mesma fonte de direito que permite o uso de armas pelos policiais ou fecha
com grades as prisões: a meta é a defesa da sociedade como um todo e a
repressão aos que estejam fora da lei (DAHL, 1975, parte I).

É à população como um todo que a censura se dirige. Suas conotações são

sociais, na medida em que atinge a todo um público dos meios de comunicação. Diferente

de um assaltante que é preso, pois as consequências referem-se só ao assaltado, ao

assaltante e a sua família. A censura produz cultura. Deixa de ser meramente policial

quando analisa aquilo que é bom ou ruim para a população,

Não é possível deixar de constatar em suas intervenções uma proposta de


comportamento humano, uma filosofia de vida. Esta proposta se manifesta
tanto no que é aprovado pela censura quanto no que ela condena, e
termina formando um sistema, que é ele mesmo integrante da cultura
nacional. (...). Na sociedade atual, a censura sempre presente na criação
ou expressão, participa do processo de informação ou da elaboração
artística, conjuntamente com o produtor de cultura. (DAHL, 1975, parte I).

Informação e cultura que demonstram a visão que o governo tem do país. Tal

concepção vai ao encontro de nossa ideia sobre a censura como co-autora imposta no

processo de produção artística. A censura não só silencia, mas exige que a produção

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA DO COLÉGIO PEDRO II – RIO DE JANEIRO


36
ENCONTROS – ANO 13 – Número 25 – 2º semestre de 2015

cultural seja feita a partir de um determinado discurso de ordem, moralismo e manutenção

das estruturas sociais, ainda que desiguais. Da mesma forma, este conceito abre espaço

para um aspecto produtivo da censura que obriga os autores a consumir essa produção e

a produzir segundo estas regras. A respeitabilidade da obra, dos autores e da tradição de

seu trabalho não é suficiente para sobrepor-se aos critérios repressivos. Além disso, o

censor não pode se separar de sua condição de brasileiro e, assim sendo, se vê retratado

nos filmes, peças e músicas.

No momento em que o censor censura, este cruzamento de função legal


com sua subjetividade o leva a censurar a si mesmo. Queira ou não
queira, pelo simples fato de ser brasileiro, daquele ser um produtor cultural
de seu grupamento social, de sua nação, o filme ou peça ou música que
estão sendo censurados são dele também. Há na censura um componente
de auto-agressão cultural muito forte, justificada pela necessidade de
manutenção da ordem. (DAHL, 1975, parte II.)

A criatividade, a invenção tem um compromisso etimológico com o novo, pois isso

está na raiz da atividade poética. A formação de novos valores, a invenção de novas

formas de expressão. A censura se compromete com a conservação, conservar formas e

valores já adquiridos, mantendo a ordem, dessa forma, pela via de um comportamento

estático a contrapor-se ao comportamento dinâmico da atividade poética.

Outro aspecto da análise é sobre o conceito de subdesenvolvimento do povo que

estaria contido na censura, já que se pensa na incapacidade da população adulta do país

de se ‘proteger’ dos atentados ao seu pudor e da subversão da ordem pública (que

também é sua). É preciso que a censura faça essa proteção, assim, não só uma

concepção de desenvolvimento, mas também de paternalismo está presente.

Um fato que a própria censura evidencia é sobre a utilidade social da arte e sobre a

importância da arte no período de ditadura. Ou seja, não se censuraria tanto aquilo que

não tivesse relevância. Os departamentos de censura sabiam o quanto a música era um

instrumento importante na luta política do período. Como diz Chico,

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA DO COLÉGIO PEDRO II – RIO DE JANEIRO


37
ENCONTROS – ANO 13 – Número 25 – 2º semestre de 2015

... às vezes me passa pela cabeça se a música, mesmo a música de forma


mais revolucionária, teria mesmo condições de alterar, em alguma coisa, o
processo político. Agora proíbem tanto que sou obrigado a acreditar que
uma música, uma peça de teatro, um filme, importam, de fato, dentro de
um contexto geral. Essa é uma impressão de fora para dentro, causadas
pelas proibições. (CHICO BUARQUE, 1976)

E ainda − ele transmite como é complicado ser supervisionado pela censura:

Há uma geração que nasceu dentro da censura, para a qual o certificado de


liberação é tão normal e necessário quanto a carteira de identidade. Para
mim, para uma geração que se criou quase sem censura, é chocante ter
que mandar textos, às vezes muito íntimos - toda criação requer um
entrega muito particular -, para um funcionário examinar, dizer se pode ser
divulgado ou não. (CHICO BUARQUE, 1976)

Cabe ressaltar, ainda, que muitos compositores, ainda que tendo produzido com

status e locais diferentes dentro do campo musical, como Gonzaguinha (Luís Gonzaga

Jr.) Tayguara, Milton Nascimento, Jards Macalé, Ivan Lins, Caetano, Gilberto Gil, dentre

outros, tiveram que aprender o jogo da censura para aí sim conseguir produzir em tempos

de repressão. Ou seja, para transgredir a ordem é preciso conhecê-la. Seria preciso, pois

reconhecer o jogo da censura e entrar nele para poder driblá-lo. Desta forma, se

estabelecem os diálogos entre as ações dos censores, sob a imposição dos

departamentos de censura, e a produção cultural. É neste sentido, que o conceito de co-

autoria se insere. Não que o diálogo ocorra num mesmo sentido. Produtor musical e

censores não estão do mesmo lado, não falam a mesma língua e não tem o mesmo

objetivo. Mas como o diálogo é imposto e inevitável, a voz produzida pelos censores e

departamentos de censura se impõe na co-autoria da produção cultural. Duas canções,

uma chamada Geraldinos e Arquibaldos de composição de Gonzaguinha, e outra

chamada Aprendendo a jogar, de composição de Guilherme Arantes, mostram isso

perfeitamente, ou seja:

(...) Matilda, Matilda,


no campo do adversário
É bom lutar com muita calma
Procurando pela brecha pra poder ganhar (1975)

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA DO COLÉGIO PEDRO II – RIO DE JANEIRO


38
ENCONTROS – ANO 13 – Número 25 – 2º semestre de 2015

Vivendo e aprendendo a jogar


Nem sempre ganhando
Nem sempre perdendo,
Mas aprendendo a jogar. (1980)

As formas de lutas variavam como nos mostra Moby (1994), mas em todas elas −

sejam as que primam pela metáfora e sutileza nas letras como é o caso das canções de

Chico, Milton Nascimento, Tayguara, Ivan Lins, sejam as que lutam de forma mais direta

como as de Gonzaguinha (apesar desse compositor notificar na canção Geraldinos e

Arquibaldos que era preciso mais cautela), seja pela canção marginal de Jards Macalé e

Torquato Neto − era preciso reconhecer a obviedade do período, ou seja, vivia-se numa

ditadura militar que colocava toda a forma de manifestação artística sob censura e

repressão.

É sempre válido frisar que as várias tentativas dos compositores de refazer a

música, não eram para agradar a censura, ou para pôr outra letra na mesma melodia,

mas para refazer a letra para que, mesmo tendo sido modificada, transmitisse a mesma

mensagem desejada pelo compositor. Assim, o jogo continuava sempre, a censura vetava

versos, impunha outros, e os compositores aprendiam seu jogo para na próxima canção

manter a mensagem desejada através de uma forma que satisfizesse ao gosto dos

censores. A censura tentava modificar o conteúdo e os artistas, mudavam a forma para

manter o conteúdo.

Nesse trecho da entrevista que Chico fez à Revista Veja em 1971, fica claro essa

ligação de reconhecer a censura e da própria introdução, extremamente impositiva e

forçada, da censura no momento de criação artística. A censura arromba a porta da

canção brasileira, não só porque interdita, porque impede e porque cala, mas porque

impõe o que tem que ser feito, o que pode ser feito e o que deve ser feito, como uma

espécie de co-autora imposta à força e aceita pelos autores muito a contragosto. Esse

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA DO COLÉGIO PEDRO II – RIO DE JANEIRO


39
ENCONTROS – ANO 13 – Número 25 – 2º semestre de 2015

trecho se torna interessante, nesse sentido, porque mostra como a censura passa a atuar

diretamente na produção da música. Ou seja, Chico passa a compor tendo em vista o

espírito da censura. Ele transmite:

É claro que cheguei à autocensura. Mas, dentro desse limite que já me


coloquei, eu acho que ainda tenho campo para fazer o negócio. Esse tipo
de música eu tenho feito, que para mim é uma coisa nova, é a razão de eu
fazer um disco novo. Elas estão dentro do limite, que, eu acho, no espírito
da censura, podem passar. Agora, se eles me fizerem recuar mais, eu
paro. Quando eu mando três músicas para a censura e me liberaram uma,
essa não me dá vontade de gravar. Não é só o problema de ter que fazer
36 músicas para completar um Lp - o que me dá um trabalhão. É que vai
ficar uma visão mutilada e o que me interessa realmente é mandar o
recado inteiro.” (CHICO BUARQUE, 1971)

No show Phono 73, produzido para divulgar o cast MPB da gravadora Phonogram,

o microfone de Chico entrou em pane na hora em que ele tentou dizer: “Não me deixaram

cantar minha música. Não faz mal, faço outras” (MOBY, 1994, p. 136). Se referia a

canção Cálice composta em parceria com Gil e vetada pela censura. A perseguição a

Chico foi implacável e se tornou antológica na história da resistência à ditadura militar.

Chico assim como Milton começou a se utilizar de uma linguagem metafórica, hermética,

que visava colocar suas mensagens nas entrelinhas, na linguagem de frestas.

Milton Nascimento padecia de mal semelhante. No Lp Milagre dos Peixes é

interessante notar as táticas para expressar suas emoções, usando a voz como

instrumento musical e assim derramar todo o conteúdo emocional do que estava vivendo,

sem o auxílio da palavra, interditada por esse parceiro inesperado - a censura. A censura

vetou as letras de Hoje é dia d’el Rei; Escravos de Jó; Cadê, e Diálogo entre Pai e Filho.

Por “estar curtindo no momento exatamente essas músicas”, Milton decidiu gravar apenas

as melodias, superpondo-lhes ruídos, gritos lamentações, ainda que isso, às vezes,

agredisse os arranjos. Milton desabafa: “Fica para outra vez. Não vamos parar de compor

por causa de todas essas dificuldades”. (SOUZA, 1973). Chico também, como veremos,

se utilizava deste mesmo mecanismo. Para parte do público consumidor de MPB,

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA DO COLÉGIO PEDRO II – RIO DE JANEIRO


40
ENCONTROS – ANO 13 – Número 25 – 2º semestre de 2015

sobretudo jovens urbanos mais intelectualizados, a melodia sem letra evidenciava a

intervenção da censura.

Gonzaguinha, outro exemplo no campo da música de luta contra a ditadura,

declarou que as rádios recebiam sugestões para não tocarem suas músicas. Pedia ao

público em seus shows que divulgassem suas músicas no boca a boca como única forma

de ver sua obra divulgada. A repressão política, dessa forma, se une a indústria cultural

contra a MPB. Algumas gravadoras, como é o caso da Odeon, receberam ameaças de

perderem seu registro caso lançassem determinados Lps. O caso refere-se a um Lp de

Tayguara, que, enquanto era cantor de canções românticas nos festivais, não fora

molestado. É válido ressaltar a ambiguidade deste importante ator na relação que se

pretende analisar entre as ações de censura, as canções e os produtores culturais: as

gravadoras. A posição desta parte industrial da cultura se tornou ambígua dado o objetivo

mercadológico maior. Ou seja, quando os vetos se tornavam maiores, ameaçando os

lucros, como no caso de Tayguara, a indústria cultural sucumbia aos desígnios das

instituições censoras.

Esta análise aponta para um aspecto importante que não pretendo aprofundar

neste momento artigo, mas é válido ressaltá-lo. As ações da censura para alguns

compositores contribuíram para a produção de um capital simbólico importante no campo

musical (BOURDIEU, 1996). E também revertido em capital financeiro para as gravadoras

já que compositor de protesto era, como no caso de Chico Buarque, venda garantida aos

consumidores de MPB que viam na arte uma possibilidade de luta e incentivo para o

enfrentamento à ditadura militar. Chico, como exemplo, começou como um compositor

popular e estourou com sucessos como a banda, gerando um lucro garantido. Diante das

mudanças em sua trajetória, numa proposta de enfrentamento político maior, como vimos,

o compositor continuou vendendo bem, já que a aura ou o capital simbólico (cf.

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA DO COLÉGIO PEDRO II – RIO DE JANEIRO


41
ENCONTROS – ANO 13 – Número 25 – 2º semestre de 2015

BOURDIEU, 2002) de compositor maldito era muito consumido por parte do público que

lutava contra a ditadura. Para outros compositores, como foi Tayguara, as ações de

censura foram devastadoras, impedindo carreiras e silenciando sua arte.

Um caso interessante que evidencia não só a repressão e a censura que invadiam

o país, mas ainda a importância do campo musical no período, importância esta

considerada e muitas vezes usada pela ditadura, foi a visita de Caetano Veloso ao Brasil,

que estava exilado em Londres. Isso ocorreu em 1971 quando Caetano voltou do exílio

para participar das comemorações dos 40 anos de casamento dos pais. Foi pego no

aeroporto e submetido a uma “entrevista” de 6 horas, na qual, além de tentarem obrigar o

artista a compor uma canção de exaltação ao governo, exigiam que ele não cortasse o

cabelo ou fizesse a barba, para aparentar normalidade e demonstrar que não houve

violência por parte do governo. Caetano teria ainda que participar de um programa de TV

para poder passar um mês no país. Esses esforços fariam de Caetano um testemunho da

normalidade do regime. Nesse episódio, mostra-se, ainda, a importância que tais artistas

tomaram não só no campo musical e artístico, mas no contexto político do país. A canção

que Caetano se negou a fazer exibiria ao público uma falsa normalidade e usaria o status

do compositor em benefício do governo.

Essa tentativa de usar o status do compositor em benefício do sistema também

ocorreu com Chico. Apesar de tudo, ou melhor, “apesar de você”, Chico Buarque, além de

exercer enorme influência sobre o público jovem universitário dos anos 1970, era um

compositor elogiado por todos não só do meio artístico, mas pelo público em geral. A

própria ditadura militar se utilizou dessa autoridade e influência do compositor quando

exibiu um comercial para o alistamento militar, tendo como música fundo A Banda,

composta por Chico Buarque em 1966. Chico protestou, mas espertamente a ditadura

colocou a culpa na agência de propaganda que havia produzido o comercial.

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA DO COLÉGIO PEDRO II – RIO DE JANEIRO


42
ENCONTROS – ANO 13 – Número 25 – 2º semestre de 2015

Inúmeros seriam os exemplos e a possibilidade de análise das ações da censura

na produção de um discurso moralizante, das formas de silenciar um discurso

revolucionário e libertário que gritava das canções da MPB do período. Igualmente seriam

múltiplas as táticas utilizadas pelos compositores para continuar “jogando no campo do

adversário” e passando sua mensagem “subversiva” aos ouvidos sempre atentos de um

público jovem urbano, intelectualizado e, porque não dizer, engajado com a luta política

que se estabeleceu com o endurecimento da ditadura militar.

Aqui nos coube um breve pulsar de reflexão. Contribuição pequena para o

importante ofício do historiador em iluminar este período da história brasileira, sobretudo

em momentos de instabilidade política como o que vivenciamos na atualidade. Momentos

em que as classes médias, as mesmas que se uniram ao golpe militar dos anos 1960 e

apoiaram organicamente a censura neste país, reeditam o mesmo discurso conservador e

idealizador do período de repressão instaurado pela ditadura civil-militar. É ainda preciso

estar atento e forte. Esclarecer aos jovens que não viveram regimes de exceção a ponto

de não querer vivê-los. E combater os que ainda se levantam contra as liberdades,

violentamente conquistadas, por uma geração que não ousou se calar.

Referências

BAHIANA, Ana Maria. Nada será como antes: a MPB nos anos 70. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 1980.
BOURDIEU, Pierre. As regras da arte − gênese e estrutura do campo literário. Rio de
Janeiro: Companhia das Letras. 1996.
_______. O poder simbólico. 5 ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002.
BUARQUE, Chico. “Eu só podia resistir”. Entrevista. Revista Veja. 27/10/1976.
________. De novo na roda viva. Entrevista. Revista Veja.15/09/1971.
DAHL, Gustavo. Censura e Cultura (I). Opinião. 21/03/1975.
________. Censura e Cultura (II). Opinião. 28/03/1975.
GASPARI, Élio. Documentos da censura. In: Jornal do Brasil, Caderno Especial,
18/06/1978.

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA DO COLÉGIO PEDRO II – RIO DE JANEIRO


43
ENCONTROS – ANO 13 – Número 25 – 2º semestre de 2015

KUSHNIR, Beatriz. Cães de guarda: jornalistas e censores, do AI-5 a constituição de


1988. São Paulo: Bomtempo, 2004.
LANZIOTTI, Odette Martins. “Era como se a gente estivesse se prostituindo, diz ex-
censora.” O Estado de São Paulo, 10/01/2005.
SOARES, Gláucio Ary Dillon. A censura durante o regime autoritário. Revista Brasileira
de Ciências Sociais, n. 10, vol. 4, 1989.
SOUZA, Tarik. Sem palavras. Revista Veja. 11/07/1973.
MOBY, Alberto. Sinal fechado – a música popular brasileira sob censura. Rio de
Janeiro: Obra Aberta, 1994.

THE CENSORSHIP POLICY TO THE BRAZILIAN POPULAR MUSIC:


Censorship Practices during the civil-military dictatorship.

Abstract: This article intends to map out and reflect briefly upon the forms of
institutionalised censorship practices during the civil-military dictatorship, which was
established in Brazil in the decade of the 1960s. Bearing in mind the mentioned historical
period, this study addresses censorship practices regarding the Brazilian Popular Music
(MPB).

Keywords: Civil-Military Dictatorship – Censorship – Brazilian Popular Music (MPB).

Recebido em: 25/10/2015


Aprovado em: 26/11/2015.

DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA DO COLÉGIO PEDRO II – RIO DE JANEIRO


44

Das könnte Ihnen auch gefallen