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Maria rezava. Sempre. Todas as noites Maria rezava.

Ali, no canto da parede,


junto ao seu altar onde figuravam as imagens de seus santos. Maria era devota, ou como
ela mesma dizia batendo no peito, Católica Apostólica Romana. Sempre na mesma hora,
sempre portando o mesmo terço, herança de sua mãe morta, sempre acendendo uma vela,
símbolo do Cristo, luz do mundo. Maria rezava. Céus, como rezava! Ajoelhada e com a
fronte encurvada quase que com vergonha de encarar os santos. Estava ali... perfeita
imagem de contrição. Rezando... rezando... rezando...
O marido, José, também rezava. Mas não como ela. Para ele sua principal devoção
era prover a casa. Sua oração matinal era um sinal da Cruz antes de ir para a roça. E
apreciar as belezas que o Papai do céu havia criado. Entretanto, era como Maria, católico
devoto, e católico antigo, daqueles que faziam de tudo para que a Fé fosse a fé de sua
família, ainda que a ferro e a fogo. Mas a função de rezar não era sua. Era de Maria.
Haviam os filhos, seis ao todo. Três meninos e três meninas. Estes, mal rezavam,
o único sinal de fé deles era a “bênção Pai e mãe”. Porém deveriam ficar comportados
enquanto sua mãe rezava. O que eles cumpriam à risca. Menos Julinha, que tinha seis
anos e não entendia porque a mãe falava tanto sozinha e quase sempre a mesma coisa.
- Mãe... tô com fome – choramingava.
- Psiu! Cala a boca, moleca! Não vê que ela tá rezando? – dizia algum dos irmãos.
- Mas ela demora muito! Já que ela quer conversar, traz Pe. Ciço pra cozinha e
continua a conversa, acho que ele não reclama!
- Julinha, Julinha! Falo nada! – Relhava outro irmão.
Certa noite, porém, Maria foi colocar os meninos na cama e dar um beijo de boa
noite em cada um quando a Julinha perguntou:
- Mãe, santo tem medo do escuro?
- Que é isso, menina! Olha o respeito! – Respondeu se benzendo.
- Então por que a senhora sempre acende uma vela para eles?
Maria respirou fundo e olhou para a menina que lhe interrogava. Na verdade, ela
nunca se preocupou em saber o porque de ela rezar assim, mas a pergunta de uma criança
faz com que a gente procure uma resposta pra tudo.
- É uma forma de respeito, minha filha.
- E o que a vela tem a ver com isso?
- Ah, minha filha, pra pedir a iluminação de Deus. Pra que ele nos escute... nos
proteja. Coisas assim.
- E Deus só escuta quem tiver com vela?
- Não... claro que não... a vela é apenas um jeito de respeitar, entendeu? Se você
quiser rezar sem vela, pode rezar.
- Entendi, mãe.
- Tá bom, então agora vai dormir que amanhã tem que levantar cedo.
- Boa noite, mãe...
Antes de dormir, Maria rezou mais uma vez. Pediu a Deus perdão pelas besteiras
de sua filha; Era devota demais para lembrar que Deus sabia que ela era uma criança. Para
garantir a chegada de sua prece, acendeu uma velinha junto da imagem de Jesus e foi
dormir também. Maria adormeceu tão profunda e devotadamente que nem se lembrou de
fechar a janela da sala.
Naquela mesma noite o vento soprou e balançou as cortinas que tocaram na vela
acesa. O fogo logo espalhou pelo telhado de madeira atingiu toda a casa. Quando José e
Maria acordaram, o quarto das crianças estava em chamas. Os mais velhos conseguiram
fugir, menos Julinha.
Maria Chorou. Maria Rezou. Maria gritou. Se bateu.
No outro dia, não havia velas no velório. Nem nunca mais houve velas naquela
casa. Mas Maria continuou rezando. Porém o fogo agora queimava por dentro. Maria
continuou rezando. Rezando. Rezando.
Ela nunca entendeu o porque daquilo... e nunca rezou para isso. Ela rezava apenas
para aceitar. O que ela nunca soube responder para si mesma era se santos tinham ou não
medo do escuro.

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