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1984
«Pour étre permanente – pour n’avoir aucune raison de cesser, quoi qu’il
puisse arriver – une recherche doit satisfaire à une double condition: d’être en
prise sur un désir non susceptible de se tarir, et d’être hors d’état d’aboutir
jamais».
Clément Rosset, Le Réel
«Ce que le savoir ne peut pas connaître, ce dont il ne veut rien savoir, ce sont
ses propres déchets pour autant que ces déchets ne se présentent pas comme un
simple reste (ratio), mais ce qui entraîne la raison à sa perte. La raison ne
peut jamais être intégralement rationnelle: il y a toujours une marge de silence,
une ZONE TROUBLÉ qui demandent raison à la raison de sa raison. C’est à
partir de cette pointe d’hétérogénéité, de ce point d’ébulition, dans la
fermeture du système qu’il faut interroger le savoir».
Sylvère Lotringer, Le «complexe» de Saussure
ÍNDICE
Introdução
Ópticas Fixas
A Câmara Escura da Fotografia
O Enigma da Visibilidade Fotográfica
Fotografia – Arte de Captura
O Dispositivo de Captura da Máquina Fotográfica
A Captura ou a Captividade da Imagem
As Posturas do Corpo Fotográfico (ou a Imobilidade da Presa)
Rumo à Versão Tecnológica da Fotografia
A Fotografia – Vitima da Versão Histórica Literária Reinante da Época
O Estilo Fotográfico
O Estilo como Ficção Reflexiva
O Estilo Fotográfico
Estilos em Devir
A Arte/Nevrose = Restituição da Lógica do Sistema
Estilos em Devir
A Especificidade Estética do Acto Fotográfico
A Fotografia como Representação Mimética do Real
O Percurso da Fotografia: da Restituição a Transformação do Real
Duas Modalidades da Violência: a Violência Interiorizada no Retrato e a
Série Hiperreal
A Desconstrução do Realismo Fotográfico
O Poder da Objectiva
Os Dispositivos Pulsionais do «COGITO FOTOGRÁFICO»
Dos Dispositivos Pulsionais aos Dispositivos Simbólicos da Cultura
A Captura no Retrato, ou a Vontade de Retrato
O Retrato e o Rosto
O Efeito Mimético e Simulacral do Auto-Retrato
A Deformação do Retrato ou o Devir animal na Pintura de Francis Bacon
INTRODUÇÃO
Sob a designação deste titulo genérico, será proposta uma reflexão analítica,
no decorrer deste trabalho, sobre o «SABER FOTOGRÁFICO». A abordagem não
pretende exibir os conhecimentos sumários colhidos em qualquer enciclopédia
das técnicas ou das artes, nem acentuar mais uma vez a versão historicista, ou os
nomes prestigiosos que personificaram a profissão. Desde os seus começos que a
Fotografia tem sido considerada como o «capítulo censurado» da história de arte.
Ora, interessa-nos para tal questionar o processo das técnicas e dos saberes no
domínio reservado das artes para tentar minimamente perceber a DEMORA da
intelligentsia artística em atribuir artisticidade à prática fotográfica. O desejo
teórico que nos move radica-se em indagar por que é que a fotografia veio a ser
apelidada de «ARTE MENOR» sem que isto nos leve por contágio, ou à
semelhança de qualquer ideologia a favor dos oprimidos, a querer reabilitá-la
perante as outras artes. Parece-nos pois que, muito antes da data histórica do
aparecimento da máquina fotográfica, toda a ARQUEOLOGIA SENSORIAL
7DERRIDA, J. – L’écriture et la différence, Paris, Ed. du Seuil, 1967, p. 45: «encore faudrait-il ... de revenir sur cette
métaphore de l’ombre et de la lumière (du se-montrer et du se-cacher), métaphore fondatrice de la philosophie occidentale comme
métaphysique... Toute l’hístoíre de notre philosophie est une photologie, nom donné à l’histoire ou au traité de la lumière».
Talvez que o Mito da Técnica se enxerte nesta vontade totalitária em
rectificar a não coincidência entre o PLANO e o REAL – por este esforço de
«maîtrise» e de acerto da ciência não é de todo domado, porque para além das
mais sofisticadas diabruras tecnológicas haverá sempre margem para o
impensado (a indeterminação), donde surgirão os fantasmas ou os «efeitos-
surpresa» que inicialmente não figuravam no horizonte programático da
tecnologia. Com isto não pretendo dizer que a ciência não diminua o grau de
indeterminação – sabemos bem já hoje que a ciência no seu limite de previsão se
deixa acompanhar por todo um aparato técnico e um ritual de prescrições e de
medidas de segurança e nas quais o homem se enquadra adscrito a um regime de
«razão observante», como mero vigia e espia dos funcionamentos normais e
patológicos da máquina. Contudo não basta, não é por se exorcizar o real que se
consegue abalar e pôr entre parênteses o inconsciente tecnológico das máquinas,
ou quanto a nós, a câmara bem escura da fotografia, que serviu a Freud como
metáfora do inconsciente8.
No decorrer destas considerações sobre a fotografia, convém-nos, por um
lado, não desligar a idade das positividades da idade das arqueologias e, por
outro, tentar mostrar como é que os «saberes» e as «técnicas» se imbricam sem
integralmente se cobrirem – abrindo assim caminho para um IMAGINÁRIO que
não deixa de retomar e de alterar reinventivamente a descoberta da máquina
fotográfica, que não tem cessado de mudar até ao momento presente.
Evidentemente que seria mais fácil dar por terminada esta questão e dizer que a
máquina fotográfica foi inventada por Nièpce e Daguerre em 1826. Mas no
prosseguimento deste trabalho interessa-nos mais realçar a problemática das
origens e da invenção em termos de «PROCESSO» ou de «OBRA ABERTA», do que
na modalidade de saberes constituídos ou acabados. É neste sentido que a
herança dos formalistas russos para alguma coisa nos serve.
A lógica das descobertas e das invenções, mesmo se ela necessita dos
enquadramentos circunstanciais do seu aparecimento, não fica confinada
8 KOFMAN, S. – Camera.obscura: De l’idéologie, Paris, Ed. Galilée, 1973, p. 38: «Quand Freud utilise le modèle de
l’appareil photographique, c’est pour montrer que tout phénomène psychique passe d’abord necessairement par une phase
inconsciente, par l’obscurité, le négatif, avant d’accéder à la conscience, de se développer dans la clarté du positif».
exclusivamente no acto genético dos começos – circula antes do arquivo para a
nova configuração dos saberes onde por sua vez é redimensionada através dos
recortes epistemológicos das ciências e das novas aquisições tecnológicas da
modernidade. Esta parece-nos ser a via para contornar os obstáculos
reducionistas que acabam sempre por desembocar no discurso linear do
progresso, ou no neodarwinismo triunfante da tecnologia.
Por razões outras que as de índole metafóríca, o recurso sistemático a Platão
e a Nietzsche9 permitir-nos-á analisar como é que o sistema de representação que
vigora no seio da metafísica ocidental nos surge ancorado na FOTOLOGIA e, ao
mesmo tempo, como é que através da filosofia Nietzschiana é possível
TRANSMUTAR o carácter ascético da IDEALIDADE que em Platão nos surge ligada
aos objectos matemáticos.
A idealidade para Nietzsche não assenta num edifício geométrico isento de
corruptibilidade, mas na PULSÃO, ou seja, no INSTINTO: «nestas energias vitais
infusas no corpo que determinam as crenças e até mesmo os conhecimentos». De
nada nos serve isolar Platão de Nietzsche, tanto um como outro restituem-nos a
lógica ambivalente do inconsciente definido por Freud. É a fotografia que
compete elucidar-nos sobre o «inconsciente da vista» (W. Benjamin), e isto a
partir das várias técnicas que ela hoje a si incorpora. A câmara escura exilada da
cena pública da visibilidade fará corpo camufladamente com a FOTOLOGIA ao
mesmo tempo que evidenciará que o inconsciente (à imagem da câmara escura) é
antes de mais um DISPOSITIVO DE CAPTURA.
A câmara escura é pois uma máquina/vestígio de uma cena primeira, onde
o real muda de roupa e se transmuta (isto se dermos todo o alcance psicanalítico
à palavra câmara = quarto). Ela não será TABULA RASA, mas o lugar de uma
INSCRIÇÃO CAPTIVA que reflecte duplamente a estrutura do olho regido por um
esquematismo cultural interiorizado seguidamente como natural. É sabido que a
câmara escura estrutura a realidade da sua inscrição a partir de um código
perspéctico directamente herdado e construído sobre o modelo da perspectiva
científica do Quattrocento. «A câmara não é opticamente nada mais que a
10 COMOLLI, J. L. – «Técnica e Ideologia», in Revista de Cinema nº 21, Agosto/Setembro 1975, Porto, Ed. A
Regra do Jogo, 1975, p. 45.
11 PANOFSKY E., – La perspective comme forme symbolique, Paris, Ed. de Minuit, 1975.
O ENIGMA DA VISIBILIDADE FOTOGRÁFICA
12 SIMONDON, G. – Du mode d’existence des objets techniques, Paris, Ed. Aubier Montaigne, 1969, p. 9: «La
culture se conduit envers l’objet technique comme l’homme envers l’étranger quand il se laisse emporter par la xenophobie
primitive».
Estatuto que nunca deixou de estar presente no decorrer da sua história.
Ao ser utilizada como técnica predominante da representação do visível, a
fotografia é colocada ao nível de um mero serviço público e quando muito só
chega a ser apreciada quando começa a comprovar que melhor que outra técnica
poderá vir a RESTITUIR o passado em DOCUMENTO – ou ainda, quando rivaliza
com o retrato pictural e o excede em precisão e em fidelidade. Razão de sobra
que a leva a aparecer na companhia e partilhando os mesmos espaços que a
classe dominante e a legitimar ideologicamente o social; as encomendas chovem
por parte do estado e o fotógrafo não tem mãos a medir. Entre o retrato do
monarca e o da famlia do príncipe, apetrecha para as gerações presentes e
futuras o reino em efígies de papel – alia-se ao poder religioso, civil e visualiza o
ordenamento social do território, respeitando rigorosamente o ritual dos
acontecimentos e das datas. Contudo a história da fotografia que hoje temos não
é especialmente a dos episódios da MITOLOGIA DA CONVENÇÃO SOCIAL, mas
antes aquela que anonimamente se furtou das malhas da grande indústria e que
se foi constituindo discretamente ao lado do delírio da indústria nascente e dos
cânones da praxe. A ideologia do século XIX, a das artes e do progresso, surge-
nos já bem retratada muito antes de a fotografia aparecer, na objectividade e na
fidelidade da «REPRESENTAÇÃO PICTURAL». É deveras curioso como Sartre
analisa sociologicamente a «representação pictural», vendo nela a forma acabada
da «arte-nevrose»13, que ele define, de maneira eloquente, como a expressão
ideológica da burguesia por volta de 1850.
Neste seguimento poder-se-ia perguntar que tipo de função é que a
burguesia do século XIX prescreve aos seus pintores e escritores, senão a de que
estes disponham do seu próprio poder, em ordem a OCULTAR a relatividade
histórica e social14. A fotografia não foge à facilidade deste programa de
imposição. Desde logo é apropriada pela classe dirigente, neste contexto de
justificação ideológica do social, e contribui magistralmente, ao lado das
central da tese defendida por Foucault: «o século XIX legou-nos uma ciência das ‘profundezas’ (da alma e da
sociedade)».
FOTOGRAFIA – ARTE DE CAPTURA
ESQUEMATIZANTE E CAPTURADORA.
25 VANLIER, H. – Philosophie de la Photographie, France, Les Cahiers de la Photographie (hors serie), 1983, p.
11.
26 BARTHES, R. – O Grau zero da escrita, Lisboa, Ed. 70, 1977, p. 19: «pela sua origem biológica, o estilo situa-
se fora da arte, ou seja, fora do pacto que liga o escritor à sociedade. Portanto, podemos imaginar autores que
prefiram a segurança da arte à solidão do estilo».
fotografia» e perceber por que é que há artistas que preferem a segurança da arte
à SOLIDÃO DO ESTILO.
Se a fotografia nos tem legado uma história de solidão – talvez seja por ela
estar doente e PRENHE DE ESTILO – talvez seja por aí que ela venha a contaminar
e a esclarecer o LAÇO ENIGMÁTICO que une a CURIOSIDADE, ou a sua
modalidade ausente (a RECORDAÇÃO), à ACTIVIDADE PREDADORA – (o tema-
ficção de Blade Runner).
contraída pelo artista, em relação a este deus anónimo ou a esta «black box» figura
do (o)culto.
Perante estas duas versões excessivas cabe-nos fazer prosseguir um outro
tipo de reflexão genérica sobre o estilo .
– Será que o que caracteriza o estilo de pensar seja sempre uma perda de
velocidade resultante de uma paragem/estacionamento provocada por um
obstáculo?
– Será que a luz ser-nos-ia mais visível se ela não incluísse o obstáculo
gerador de sombra, espécie de medicamento, ou de filtro para a vista?
O que nos cega tanto ao nível do pensar como ao nível do ver é a tendência
racional constante em querer destrinçar à viva força o que por natureza é
misturado e híbrido. O nosso estilo de percepção e de conjectura em virtude desta
predisposição para a clareza é comanditado pela clarividência de um ideário de
razão através do qual é postulado ou mesmo até reivindicado o único como a
categoria da totalidade. Anseio metafísico ao qual a história responde
lamechamente que a todo o percurso corresponde um ponto de chegada. O
comboio da razão ao partir chegará ao seu destino e, para cúmulo de segurança e
de previsibilidade, Hegel espera-o no terminus – erigindo por este acto o tribunal
da razão em instância terminal (suprema) de todos os percursos e obrigando a
que todos os trajectos passem inevitavelmente pelo mesmo ponto, o que implica
que a dialéctica se encarregue de resolver a catástrofe.
O estilo fotográfico
A natureza que fala à câmara é diferente daquela que fala ao olho, diferente
presente de façon exemplaire la characteristique de tout instrument de production, à savoir celle d’obéir à un code symbolique qui
sobretudo pelo facto de que, em vez de um espaço elaborado pela consciência, é
um espaço elaborado inconscientemete que intervém. É pois por intermédio da
câmara que nós chegamos a conhecer algo ligado ao inconsciente óptico. Ao
inconsciente óptico de Benjamin polarizado no humano junta-se o inconsciente
tecnológico polarizado no instrumento. Uma primeira conclusão a que chegamos
será a de que a fotografia resulta em parte de uma acção estruturante do
inconsciente tecnológico.
O segundo elemento a ponderar é que será impossível falar de estilo ou de
desvio sem tomar em consideração as normas ou as CONVENÇÕES
n’a nullement besoin d’être institué par une convention préliminaire, dans la mesure où il obéit déjà aux conventions plus
maneira transparente, outras vezes de maneira problemática – isto porque entre
a máquina e a POLIVALÊNCIA DO REAL se intrometem ou interpõem um outro
olhar capaz de fazer oscilar a imagem e de tornar visíveis as semi-estruturações
latentes que dão consistência à visibilidade que corre efemeramente na superfície
da foto.
31 MORA, G. – Les Cahiers de la Photographie, nº 5 (Du Style), Paris, L’Association de Critique Contemporaine
ecológico da cultura – como se fosse possível eliminar ou rasurar a inscrição, sem
contrair dívida por esse mesmo gesto com a regressão. Beco infernal da razão. Se
os estilos estão afeitos cada vez mais à OSCILAÇÃO é porque eles deslizam entre
dois pólos, o negativo e o positivo, tentando pela figura do NEUTRO devolver
INDICIALMENTE a PERTURBAÇÃO (o turvo) de uma imaginação a contas com o
RESÍDUO de uma LEMBRANÇA. Nada melhor do que a fotografia para nos
devolver na imobilidade um estilo de pensar de origem MELANCÓLICA – à
elaboração do qual voltaremos mais tarde.
Estilos em devir
en Photographie, 1982, p. 4.
caracterizar a ESPECIFICIDADE ESTÉTICA do acto fotográfico no decorrer do
próximo capítulo. Parece-nos ter que traçar o percurso fotográfico em torno da
questão do realismo, ou dos modos de representação do real. A pequena história
da fotografia poderá já ser hoje desdobrada em três fases caracterizadoras de
estilo.
A fotografia como espelho do real (o discurso mítico), a fotografia como
transformação do real (discurso do código) e a fotografia como vestigio ou «trace»
de um real (o discurso da indicialidade).
33 ARNHEIM, R. – «On the nature of photography» (texto traduzido em italiano in Rivista di storia e critica della
fotografia, II, 2, 1981).
34 BARTHES, R. – A câmara clara, Lisboa, Ed. 70, 198l, p. 24 .
a resistência nevrótíca à mudança. Ora, para podermos vir a pensar a «ontologia
da imagem fotográfica» e a pensá-la «em si» através de uma nova elaboração,
teremos que nos demarcar destas duas posições bem «medianas»: o retrato
sociológico da apropriação da foto pelos seus usos sociais, e a carga normativa da
tradição literário-pictural da estética que sempre tem rejeitado a fotografia do
lado da «technê».
É em torno do problema do realismo que é possível abordar o estatuto
específico da fotografia. Como é que a fotografia ADERE ao real? Através de que
modalidades de representação é que a fotografia acusa ou sonda o real? Ou seja –
que tipo de relação é que liga a imagem fotoquímica ao seu referente?
Toda a reflexão sobre a fotografia nos remete para uma ANTERIORIDADE
do real – ao qual temos acesso mediante um processo diferido. Uma vez que a
imagem fotográfica não é o real – ela simplesmente o representa, acusando-o
através de uma DISTÂNCIA de espaço/tempo. O real através de uma imagem
fotográfica surge-nos DEVOLVIDO, através do «taken-picture», o que nos chega
restituído ou produzido é uma das modalidades possíveis que a fotografia tem de
nos apresentar/representar: não todo o real, mas parte deste. Ora, parece-nos
importante traçar o percurso histórico das diversas modalidades que a fotografia
tem de nos presentear o real, para não dissocíarmos a estética fotográfica dos
diversos estilos de representação fotográfica, de maneira a identificarmos na
imagem fotográfica a «diferença de tratamento» a que foi sujeito o referente. É
possível pois resumir este trajecto que vai da VEROSIMILHANÇA AO INDICE em
torno de três posições teóricas – ou de três modalidades de produção fotográfica.
Uma primeira em que a fotografia nos surge como reflexo mimético do
real, uma segunda em que a fotografia atesta uma transformação do real e uma
terceira, finalmente, em que a fotografia reinscreve indicialmente o vestígio de
um real deixado.
35 BAUDELAIRE, Ch. – Curiosités Esthétiques, Genève, Ed. du Milieu du Monde, s.d., p. 270.
A imagem fotográfica à partida retrata o funcionamento do medium; ela é
antes de mais «index sui» através evidentemente de uma representação segunda
(tardia) do real. Enquanto medium, a fotografia surge marcada por uma
configuração que a distingue de todos os outros modos de representar. A
singularidade técnica de que dispõe leva-a a num primeiro tempo a ser
combatida e invejada, o que não vai sem implicar em relação a ela própria, por
parte das outras artes, uma certa ambivalência. As atitudes de Baudelaire e de E.
Delacroix são sintomáticas do mal-estar que se gerou nos meios académicos do
século XIX – o do olhar profundamente arcaico da época em relação à mutação
técnica – materializada no novo representar fotográfico.
É em torno do realismo, ou seja, dos modos de representação do real, que
se situa a questão fundamental a partir da qual será possível, no dizer de A.
Bazin, definir a «antologia da imagem fotográfica». Numa primeira fase, a fotografia é
abordada como «prova do real»; sublinha-se exageradamente a neutralidade da
máquina e como correlato implícito a «ausência da intervenção humana». A
fotografia é a reprodução mimética da fisionomia sensível do mundo através de
uma «génese automática». A fotografia é pensada como representação do real. O
que a caracteriza como representação do real é a sua capacidade mimética: «a
foto é espelho do real»36. As metáforas correntemente utilizadas no decorrer do
século XIX para designar a visão artística não deixam de assinalar o mesmo
aspecto. Todas elas giram em torno da óptica e mais concretamente do espelho.
Compara-se a pintura a um espelho. Na literatura, Stendhal define o romance
como «un miroir qu’on promène le long du chemin» e Flaubert não se cansa de insistir
«sejamos vidro-de-aumento da verdade externa».
Ora, no próprio momento em que os realistas apregoam a quatro ventos a
objectividade e reclamam que o artista seja o escrupuloso transcritor, ou copista
do real, a fotografia surge acabando por imprimir um forte abalo à estética do
realismo. O aparecimento da fotografia põe em causa a objectividade e a precisão
da representação mimética da pintura, afectando as modalidades da prática do
desenho e do retrato, e entretanto faz vacilar o rigor da teoria mimética das
academias, acabando finalmente por EXCEDER em objectividade e precisão a
representação realista e naturalista reinante da época. A fotografia surge assim,
no dizer de A. Bazin, como o acontecimento mais importante da história das
artes plásticas: «ela permitiu à pintura ocidental desembaraçar-se definitivamente
da Obsessão realista e encontrar a sua autonomia estética»37. Em virtude do
impacto da representação fotográfica e das técnicas da reprodução mecânicas já
aludidas por W. Benjamin, no mundo da época, nova viragem se vai perfilar
tanto no domínio teórico como no campo do exercício artístico. O realismo, que
até então era quase canonizado como o modelo artístico por excelência,
doravante é considerado como «negação da arte». Outro estilo emerge retocado
desta vez pela subjectividade e pela idealização, que irá criticar a imitação
passiva,ou o «topos do artista-macaco de imitação» (artiste-singe), a partir da
concepção do «belo ideal moderno» assente numa teoria da EXPRESSÃO; falar-se-
á, pois, de IMITAÇÃO EXPRESSIVA. A enciclopédia francesa dirá: «Toda a obra
de arte reflecte a personalidade do seu autor; A placa fotográfica não interpreta,
somente regista».
O estratagema a partir do qual é possível demarcar a fotografia e fundar a
separação entre ela e as artes é mais uma vez evocado através do argumento de
índole humanista: «A reprodução da natureza pelo homem nunca será uma
reprodução; será sempre uma interpretação», argumento que agita
implicitamente a velha querela entre a máquina e o homem, a técnica e a arte, e
o arraigado preconceito ligado ao carácter mecânico das artes, entre as quais
figura a fotografia.
36 DUBOIS, Ph. – L’Acte Photographique, Paris, F, Nathan 1983, p. 21: «la photographie, qu’on soit pour ou contre y
est massivement considrée comme une imitation on ne peut plus parfaite de la réalíté».
37 BAZIN, A. – «Ontologie de l’image photographique», in Qu’est-ce que le cinéma, Paris, Ed. du Cerf, 1958, vol.
I, pp. 16-17.
O PERCURSO DA FOTOGRAFIA: DA RESTITUIÇAO À
TRANSFORMAÇAO DO REAL
38 BARTHES, R. – «Le Message photographique», Communications nº 2l, Paris, Ed. du Seuil, 1961, p.
Frente a esta constante interpretativa, não nos é possvel adoptar o
comportamento ou a boa vontade teórica de alguns críticos, que tentam dizer
que Barthes defende neste último livro uma concepção menos mimética do que
nos primeiros escritos. Pretensão ignara dos críticos, que pensam que a teoria
mimética é uma concepção antiquada, ou uma fase histórica completamente
arquivada na prateleira da história do século XIX. Ora, parece-nos que não é
pelo facto de termos alojado parte do século XIX no cenário emoldurado de uma
ideologia naturalista e de termos confinado a representação artística na
representação mimética do real que por este meio decretamos morte histórica à
TEORIA MIMÉTICA DA REPRESENTAÇÃO. Roland Barthes nunca teve a pretensão
de ser post-moderno ao falar da fotografia. O mimetismo estatuário da imagem
não é através dos seus escritos ilibado, mas «mimado» e retocado, atravésda
«reinvenção» inventiva do estilo. O essencial da posição de Barthes perdura,
mesmo que tenha havido mudança de estilo. Enquanto que em 1961 Barthes se
situava com a sua primeira formulação no espaço público da análise da imagem
fotográfica da publicidade, no segundo livro move-se artes no espaço PRIVADO do
álbum, ou seja, no intimismo da câmara: o enfoque conferido à imagem
fotográfica nem por isso foi modificado, mas desta vez apenas «sentido».
Por outro lado, e para além do ponto de vista de Barthes, a teoria mimética
é tão arcaica (basta ler o Sofista de Platão) como moderna. O mimetismo é de
origem «ANIMALAR», é uma armadilha à alteridade. Não é necessário estar à
espera do homem para nos inteirarmos do alcance deste estratagema; ele já era
comportamento animal, ou seja, comportamento de captura, de ataque e de
defesa no reino vegetal e animal39. O camaleão é o primeiro retratista do meio
ambiente que baralha os contornos do real com a representação e vice-versa,
problematizando através desta artimanha o alcance da velha questão filosófica: o
que é primeiro, o real ou a representação? A resposta é dada na RELAÇÃO –o
que é primeiro, o modelo ou a cópia? A resposta teve sempre tendência a ser
dada pela anterioridade do modelo. Se Platão desconsidera a imagem, é porque
39 DERRIDA, J. – Mimesis des articulations, Paris, Ed. Flammarion, 1975, p. 14: «La morale est peut-être toujours
d’imitation; Mimesis en revanche trace ou retrace des gestes d’une autre éthique, d’un autre code ou d’une prescription altérée...
(Le caméleon lui-même est une, et même plusieurs variétés de plantes grecques; Voy-Pline, H. N., 22.47)».
vê nela, antes de mais, degradação ontológica do modelo; quer isto dizer que a imagem
está sujeita à corruptibilidade que caracteriza a representação e como tal deixa
de aludir correctamente à excelência do MODELO limitando-se a ser um mero
reflexo pálido da ideia. Ora, se o século XIX se mede no confronto com a
reprodução mimética do real e se a fotografia nasce na SÓSIA, é porque toda a
representação nos surge atravessada por uma DUPLICIDADE ou por uma espécie
de MISTURA ENERGÉTICA, que não cessa de aludir à ALTERIDADE de um real
que escapa e deixa RESTO ou RASTO na representação. «A imagem é, por
natureza, deíctica, designa mas não define; nela há sempre um RESÍDUO de
contigêncía, que apenas pode ser apontada com o dedo. Semiologicamente, a
imagem vai sempre muito mais longe que o significado, em direcção à pura
materialidade do referente»40. O que fundamenta pois o real é que ele resiste ao
terrorismo ou à violência do conceito – o que não justifica evidentemente a
preguiça mental, ou que venha a resvalar-se para o nirvana turvo dos msticos. A
«mimesis» surge-nos teotizada por René Girard, como «la puissance essentielle
d’intégration culturelle», o que implica uma alta dose de violência interiorizada. É
neste sentido que a representação, toda ela «SACRIFICIAL», e que a fotografia
pratica sem cessar a perda do real, através de uma modalidade temporal ligada à
lembrança. Ela é, pois, por esta mesma razão, uma «arte melancólica» que se
refere a uma exterioridade que lhe escapa, e que ela a cada passo, pela repetição
frenética do disparo fotográfico, procura vertiginosamente captar.
41 FLEIG, A. – «Ecce homo – Sur un corps à corps rompu», Les Cahiers de la Photographie nº 24, Paris, ACCP,
menosprezar, pelo contrário, elas permitir-nos-ão fundamentar um outro tipo de
análise proveniente de um outro horizonte teórico. Salientámos várias vezes o
carácter automático e objectivo da reprodução fotográfica, induzindo por essa via
o modo como é que se processa a restituição fotoquímica do real, mas nem
sempre nos foi possível desconstruir a magia tecnológica do «ex opere operatum» da
produção fotográfica, fundado na maior parte das vezes sobre uma teoria
mimética.
A desconstrução deste realismo fotográfico que caracterizou parte da
sensibilidade estética do s6culo XIX permite-nos pôr em evidência a passagem da
imagem da realidade à REALIDADE AUTÓNOMA da imagem. A fotografia, ao
recuperar o realismo e o naturalismo concretizado no exercício da pintura,
funcionalizou em prática corrente o que até então era o resultado cuidado dos
«ademanes» lentos do estilo das academias. Não s6 recuperou, como PRECIPITOU
1981, p. 49.
discursos institucionais, regulam-se por uma ideologia a 100% de comunicação, à
qual corresponde como alvo, do outro lado do jornal, da televisão e da rádio, este
robusto homem-médio que ao ler, ver e ouvir engole sem mastigar a cultura
massmediática (ao alcance de todos), assente na medíocre MEDIOCRACIA dos
media. O mal-entendido subjacente a toda esta produção mimética de reflexos e de
tiques culturais, servidos na modalidade restrita de um self-service, ou de um
reader’s digest massmediático, reside na cumplicidade da escrita com o poder, como
se a escrita tivesse que seguir a risca a óptica da política dominante e ser-lhe fiel,
limitando-se apenas a ser a grande «divulgona» que massifica o real em versão, e
censura, apelidando de hermético, todo o discurso minoritário que não se
subscreve clareza institucional dos códigos dominantes de produção e de leitura.
Nesta onda, assistimos cada vez mais à proliferação de enunciados genéricos e ao
terrorismo de uma cultura mediática que nunca chega a problematizar o real
para além da estereotipia constitutiva do SENSO COMUM. Escrever, pensar, não é
problematizar o real, mas devolver em grandes tiragens toda uma gama de
reflexos e de tiques, através dos quais se venha a cimentar, a partir dos
ingredientes depositados, uma configuração de conduta colectiva, assente na
UNIFORMIZAÇÃO totalitáría dos desejos, linguagens e gostos. Este objectivo
ilustra a mecânica da política pavloviana, que remodelam liga exclusivamente a
reflexão, subordinando-a ao jogo e aos estudos apurados dos efeitos a
desencadear junto do receptor; quer isto dizer, se houve secreção, a mensagem
poderá assegurar-se de dar resposta à necessidade criada. Talvez que hoje seja a
publicidade o espaço reflexológico por excelência, que venha a ditar normas à
validade e à oportunidade dos discursos a fazer circular e a publicar.
Porquê todo este percurso crítico em oblíquo numa reflexão sobre a
fotografia? A razão é simples. Parece-nos dificilmente poder isolar a fotografia de
todo o resto, ou separá-la dos usos e dos comentários a que ela continua sujeita.
O que para nós é sintomático tem sido o papel que ela tem desempenhado como
técnica de comunicação ou de conformação social aos códigos dominantes do
sistema que chegam até nós, evocados através das denominações da
«objectividade», da «realidade» e das «representações justas». Como evidenciar a
autonomia deste objecto (a imagem fotográfica), tão afeito aos valores e às
manipulações doutrinárias do sistema, senão através de uma DESMONTAGEM
O poder da objectiva
livre de Didier Franck, est... de chercher à ‘défaire ce que Husserl s’efforce de constituer’: il s’agit (selon P. Guernancia) de
A captura esttica nem sempre consegue escapar à força cega dos códigos e
não são raras as vezes que a vemos abandonar a predação e os dispositivos
pulsionais a ela ligados para se entregar à aplicação minuciosa das regras do
«fazer artístico», trocando assim a errância pulsional dos afectos pelos dispositivos
simbólicos da crença que caracteriza a gregaridade social. Nem mesmo com esta
troca a representação consegue escapar à modalidade obsessional que a
comanda, visto que, em última instância, o que a funda assenta na insistência de
algo que resiste a ser dito ou mostrado. Quer isto dizer que nunca haverá uma
«presa» que elimine por completo a predação, ou que transforme radicalmente o
destino do caçador, o que seria cair no milagroso. O devaneio do caçador exerce-
se fora da crença do objecto total e daí nunca haverá uma relação cansada com o
«achado». O que ocasiona a predação é o carácter contingente e provisório de
todas as pequenas surpresas com que a divindade o visita na animalidade das
sensações através das quais a idealidade abstracta da ideia reveste fígura palpável
para de novo fulgurantemente desaparecer. É através deste relâmpago fortuito
que ele (o caçador-artista) entrevê a primitividade transcendental que o suplanta e
o obriga constantemente a deslocar. Estamos frente a uma PAIXÃO CÍCLICA. A
conduta do caçador, como a do «fotografo-artista», retrata numa configuração
económica de natureza indicial, que em vez de cair em representações ascéticas
de poupança, se caracteriza por actividades excessivas, organizadas em torno de
um significante flutuante, cuja função é a de fazer circular, através de uma lógica de
lugares, uma economia de abundância regida sob o principio de equivalência. É
assim que a cada visão corresponde uma reminiscência, a cada dito um não dito,
e a cada pensamento uma imagem do corpo. A dinâmica destas
correspondências não deve ser lida por nós como o resultado tardio de um estado
avançado de sofisticação cultural, pois ela verifica-se já, na própria organização
económica do pensamento mítico, como no-lo confirma Mircea Eliade: «il ne faut
pas croire que la cohérence théorique est necessairement le résultat d’une réflexion systematique:
elle s’impose déjà au stade de l’image et du symbole, elle fait partie integrante de la pensée
pousser la phénoménologíe à sa limite en interrogeant ce qu’elle dit du temps et d’autrui et, cela étant, de mettre en question la
mythique»49. O que o pensamento mítico acusa é o FUNDO PULSIONAL do excesso
que ele quer a todo custo resolver ou evitar, dando-lhe FORMA ou capturando-o,
quer seja na fixidez repetitiva do rito, ou na sedução harmoniosa do mito. Este
esforço de «maîtrise» irá possibilitar que a linguagem se organize e que o
inconsciente considerado como RESERVA de surpresa se venha a familiarizar sob
a acção reguladora do «récit». Porém, tal procedimento societário ou socializante
do inconsciente, sob a acção constrangedora duma gramática ordeira, não irá
sem provocar, em contrapartida, a ressurgência do fantasma oculto na
estereotipia. Entre a produção simulacral de hoje e as astúcias e artimanhas da
mitologia dos tempos recuados, a diferença não é enorme; trata-se em ambos os
casos de pôr em evidência, através de condutas desviadas, o que o estereotipo
necessariamente é obrigado a eliminar a fim de poder valer eficazmente como
máquina territorial de socialização.
50 MAYER & PIERSON – La photographie considerée comme art et comme industrie, Paris, 1855, p. 17.
contraído em que o fotógrafo, mediante um exercício de poder técnico e
humanista, afronta e administra ao paciente um «SABER PRÁTICO» e que este
assume, aceitando ser iniciado pelo fotógrafo às regras requeridas, para obter
depois a fotografia.
O retrato acaba por retratar não só o «retratado», mas apontar,
fundamentalmente através dele, para toda a sujeição do corpo à armação
conveniente dos cânones estéticos que regem a prática fotográfica. O retrato é
pois calculado, organizado e tecnicamente concebido em referência, consciente
ou não, a uma ideologia estética socialmente determinada, no fito de vir a
produzir efeitos sociais bem definidos O corpo do retrato é a tal ponto investido
por toda uma gama de saberes e de expedientes constrangedores, que não nos
parece forçado considerar a PRÁTICA DO RETRATO, usando a terminologia de
M. Foucault, como uma «tecnologia política do corpo»51. O fotógrafo intervém
como um conhecedor, através do dispositivo da máquina, nos mecanismos
íntimos que comandam a leitura da POSE CORPORAL e já não se contenta com a
restituição da semelhança física. Procura antes, através da mestria dos meios
técnicos (a escolha dos enquadramentos, a organização dos acessórios, a direcção
da luz, a distribuição dos claros/escuros e do emprego dos fundos) exprimir
fotograficamente a personalidade do seu cliente. Como afirma Disderi em 1855,
«é necessário que (o fotógrafo) adivinhe o que é o modelo e que ele pressinta
espontaneamente o seu carácter, a sua vida íntima e os seus hábitos; é preciso que
ele BIOGRAFIE»52.
A prática fotográfica alia-se assim à FISIOGNOMONIA, ciência de
observação, muito em voga desde o século XVI, que pretende conhecer o
carácter humano através das exteriorizações sensíveis espalhadas no rosto.
O retrato e o rosto
Em virtude dos baixos preços das provas, por volta de 1850, a prática do
53 DELEUZE, G. – Mille Plateaux, Paris, Ed. de Minuit, p. 205 (chapitre: «année zéro – visagéite».
idolatria fotográfica quase sempre IMOBILIZA o processo da cinematografia da
significação para perscrutar metafisicamente a ausência espalhada do que
perpassa no rosto – e para, a partir do fantasma e do seu suplemento imaginário,
dar corpo à visão; é nesta procura de ILUSÃO e de CULTO que o homem no rosto
se revela ANIMAL RELIGIOSO ou o animal por excelência, enfermo ou captivo da
representação.
O EFEITO MIMÉTICO E SIMULACRAL DO AUTO-RETRATO
63 THOM, R. – Conférence donnée le 22 avril 1982 à l’Auditoire Piaget, UN II, Genève: «Local et global dans
l’oeuvre d’art»
64 WORRINGER, W. – Abstraction et Eínfühlung, Paris, Ed. Klincksieck, 1978.
gesto soberano de espera activa, que espreita sem cessar o «instante mutante» em
que o devir da sensação coincidirá com o auge da fulgurância do meio-dia
nietzchiano da (i)localização da passagem.