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INTRODUÇÃO

“Que retiemble en sus cientros la tierra 1”! São estas palavras retiradas do hino nacional
mexicano, que dão título para o último comunicado2 que recolocou os zapatistas no centro da
cena política no final de 2016. Publicado em outubro deste ano, o documento assinado pelo
EZLN e pelo Congreso Nacional Indígena (CNI)3 apresenta a mais nova e polêmica
elaboração tática dos zapatistas, que foi encaminhada como a principal resolução do V
congresso. Para a surpresa de muitos a proposta em questão tinha o objetivo de construir uma
candidatura indígena para disputar as eleições presidenciais de 2018.
Apesar da celeuma suscitada pela proposta e pelas acusações de capitulação que
pulularam nas redes sociais, acredito que a maior parte das críticas se equivocaram ao tratar a
pretensa candidatura zapatista como uma simples submissão à política convencional, dada a
elaboração sob a qual está alicerçada. Conforme se pode ver no referido comunicado, a
candidatura impulsionada através do CNI, não só estaria referenciada nos princípios da
política zapatista: “servir y no servirse; representar y no suplantar; construir y no destruir;
obedecer y no mandar; proponer y no imponer; convencer y no vencer; bajar y no subir.” 4;
como estaria pautada por uma híbrida concepção de democracia de base, que encontra
inspiração nas perspectivas políticas dos setores mais progressistas do movimento indígena
mexicano. O que fazia com que a proposta apontasse para que:

(…) el Congreso Nacional Indígena nombré un Concejo Indígena de Gobierno (que es


como una Junta de Buen “Gobierno, pero nacional o sea en todo México), formado
por representantes mujeres y hombres de cada uno de los colectivos, organizaciones,
barrios, tribus, naciones y pueblos que están organizados en el Congreso Nacional
Indígena. O sea que este Concejo está formado por indígenas, y ellas y ellos son los
que van a gobernar el país. Ese Concejo Indígena de Gobierno es colectivo, o sea que

1
* Optei por citar os documentos que estão disponíveis na web por três motivos principais. O primeiro tem a ver
com o próprio objeto e o fato do zapatismo ser amplamente reconhecido como o primeiro movimento social a ter
se utilizado da internet como um âmbito da luta social. Em segundo lugar, recorro aos links pelo fato destes
facilitarem o acesso do leitor aos documentos e fontes primárias utilizados neste trabalho. O terceiro ponto tem a
ver com o fato de boa parte dos documentos produzidos pelo movimento terem sido preparados para a
publicação na web, sem que a inexistência de preocupação com a sua existência física tenha sido vista como um
problema; o que, inclusive, vale para uma série de movimentos e objetos de estudos mais atuais.
Em tradução livre: “Que trema o centro da terra”.
2
Este tipo de documento contribuiu significativamente para a construção da fama internacional que ainda hoje é
auferida pelo zapatismo. São insignes exemplos disto as seis Declarações da Selva Lacandona, assim como
outros comunicados utilizados para apresentar em momentos decisivos algumas importantes opções táticas e
estratégicas adotadas pelo movimento.
3
Para acessar o documento na íntegra, vide: http://enlacezapatista.ezln.org.mx/2016/10/14/que-retiemble-en-sus-
centros-la-tierra/
4
Para saber mais sobre o CNI: http://www.congresonacionalindigena.org/que-es-el-cni/
1
no una persona manda, sino que entre todas y todos hacen sus acuerdos para gobernar.
Ese Concejo Indígena de Gobierno no hace lo que se le ocurre, sino que toma en
cuenta lo que dicen los pueblos de todo México, indígenas y no indígenas.

Acredito que valha a pena iniciar esse trabalho tratando desta proposta, não só por
conta da sua relevância para o debate político atual, mas porque a sua análise pode ajudar com
a difícil tarefa de apresentar o objeto desta pesquisa, que é oriundo de outra realidade
geográfica, histórica, política e cultural. Para isto lançarei algumas balizas que poderão ajudar
na construção de uma imagem mais nítida do alvo das atenções deste estudo e seguindo por
este rumo, acredito que seja oportuno começar descrevendo o cenário em que o processo se
desenrola.

Continuamos no continente americano, mas vamos para o hemisfério norte. Apesar de


se tratar da menor das economias que compõe o NAFTA 5, de acordo com o FMI6, o México

5
Do inglês, North American Free Trade Agreement (NAFTA). Em português, “Tratado de Livre Comércio da
América do Norte”. Entrou em vigência no dia 1 de janeiro de 1994 e como se verá adiante possui estreita
relação com o fenômeno analisado nesta pesquisa.
6
FMI, World Economic Outloook Database (abril de 2017). In:
https://www.imf.org/external/pubs/ft/weo/2018/01/weodata/weorept.aspx
2
está no seleto grupo dos 15 maiores PIB do planeta e dentro da América Latina, em termos de
produção de riquezas, a sua economia só não supera a brasileira. Mas como é próprio da sua
condição latino-americana, em paralelo à riqueza da sua economia se destaca a enorme
desigualdade econômica que assola a sua população e lhe coloca no famigerado clube dos 25
países mais desiguais do mundo (OXFAM, 2015: p. 13).
Segundo o último censo7 realizado pelo INEGI (Instituto Nacional de Geografía y
Estadistica) no ano de 2010, a sua população total está estimada em exatos 112.336.538
habitantes. População esta, que está dividia entre as 31 unidades da federação que ao lado do
Distrito Federal compõem a república mexicana.

(fonte:
O país é herdeiro de uma das mais ricas histórias pré-colombianas. Não apenas por
conta da presença das grandes civilizações Maia e Asteca, mas pela enorme variedade de
povos que se desenvolveram na região e compuseram o complexo quadro econômico, político
e social que sustentaram a conformação dos grandes impérios mesoamericanos, cujos ecos
ainda podem ser ouvidos hodiernamente (Batalha, 2009).
A pujança da vida mesoamericana fez com que a conquista desta região não tenha sido
das tarefas mais fáceis. De tal sorte que o colossal choque com a civilização européia se
desdobrou em um genocídio que não encontra par na história da humanidade. As estimativas

7
Vide: http://www.inegi.org.mx/lib/olap/consulta/general_ver4/MDXQueryDatos.asp?proy=cpv10_pt
3
mais moderadas, aceitas até pelos órgãos das Nações Unidas, apontam para a existência de
uma população nativa de cerca 57 milhões de habitantes para todo o continente e de 47
milhões apenas para a região que ficou sob ingerência ibérica. Em função das inúmeras
guerras de conquista e das doenças trazidas de além-mar, bastaram cem anos para fazer com
que a população autóctone fosse assustadoramente reduzida a 10% do que fora antes do
choque das civilizações (CEPAL, 2015).
Mas mesmo a hecatombe da conquista não foi capaz de exterminar as populações que
já estavam estabelecidas no atual continente americano; muito menos do que nos dias atuais
se compreende como o território mexicano, que de acordo com o relatório da CEPAL
(Comissão Econômica para América Latina e o Caribe)8, concentra a maior população
indígena da América Latina. Segundo o estudo publicado em 2015, no início da década atual a
população indígena radicada no México estaria na casa dos 17 milhões de pessoas; que
representavam expressivos 15,1% da população total deste país. É valido destacar que se trata
de uma população consideravelmente heterogênea, que abrange 78 povos 9 estabelecidos em
praticamente todo o território nacional (ibid).
Como não poderia ser diferente, as influências indígenas sobre a sociedade mexicana
são extremamente marcantes e além de poderem ser vistas por todos os âmbitos do complexo
social que na antropologia é designado pelo conceito de cultura - que abarca variados aspectos
materiais e imateriais, ou seja, toda a gama de produções humanas 10 –, podem ser captadas
para além disto, de forma ainda mais imediata através dos traços fenotípicos de boa parte da
sua população. Apesar de tudo isto, desde a conquista espanhola os indígenas incrivelmente
sempre estiveram à margem desta sociedade (Batalha, 2009).
A referida proposta de candidatura zapatista, portanto, se inseriria neste quadro mais
amplo, tendo no intento de reversão desta tendência um dos seus objetivos declarados.
Acredito que também mereça destaque o fato de o documento utilizado para publicizar a
decisão pela construção da candidatura, enfatizar que o seu objetivo não seria vencer as
eleições – ilusão que a experiência do movimento indígena não autoriza – e sim garantir que
8
CEPAL. Povos indígenas na América Latina: Avanços na última década e desafios pendentes para a garantia de
seus direitos. Nações Unidas: CEPAL, 2015.
9
O conceito de povos remete a quatro fatores primordiais: “o reconhecimento da identidade, a origem comum, a
territorialidade e a dimensão linguística e cultural” (CEPAL, 2015: p. 39).
10
“[...] E. F. Tylor (1871) define a cultura através do desenvolvimento mental e organizacional das sociedades,
como "esse todo complexo que inclui os conhecimentos, as crenças religiosas, a arte, a moral, os costumes e
todas as outras capacidades e hábitos que o homem adquire enquanto membro da sociedade", a antropologia
cultural americana, uns sessenta anos mais tarde, insiste no desenvolvimento material e técnico e na transmissão
do património social. Segundo os culturalistas, a cultura, enquanto modo de vida de um povo, é uma aquisição
humana, relativamente estável mas sujeita a mudanças contínuas que determina o curso das nossas vidas sem se
impor ao nosso pensamento consciente.” (DICIONÁRIO DE SOCIOLOGIA, P. 111-112)
4
as demandas indígenas aparecessem de forma genuína na corrida eleitoral de 2018. Tal
expediente tinha o objetivo de impedir que algum candidato oportunista buscasse se apropriar
das demandas indígenas para fazer estelionato eleitoral, garantindo que a figura escolhida por
uma parcela significativa do movimento indígena vocalizasse e defendesse o programa
político que foi coletivamente construído pela militância indígena.
Neste sentido a iniciativa poderia ser vista como uma tentativa de mesclagem dos
princípios da democracia zapatista com as possibilidades oferecidas pela democracia
representativa parlamentar. Na prática, esta formulação representaria simultaneamente a
crítica e o questionamento do paradigma representativo. Pois, de forma objetiva a candidatura
indígena, se colocava como uma alternativa ao status quo parlamentar, através desta original
leitura das possibilidades abertas pelo paradigma da democracia representativa; dado o
diferenciado enfoque com que procurava construir a relação da sua candidata à presidência
com o setor da sociedade ao qual ela estaria mais diretamente vinculada – mesmo que sem
recusar as regras do jogo parlamentar.
Apesar disto tudo, a originalidade da proposta não foi suficiente para acalmar os
espíritos mais críticos acerca dos problemas inerentes à participação nas eleições, que desta
vez fizeram parte do espetáculo zapatista, do lado dos que viram a excentricidade zapatista
como algo negativo. É muito importante lembrar que esta foi apenas mais uma dentro de uma
longa série de elaborações táticas inusitadas, que em boa medida contribuíram para que o
movimento se tornasse amplamente conhecido nacional e internacionalmente, a partir do
insólito levante armado de janeiro de 1994, quando correram pelo mundo as imagens de um
exército indígena maltrapilho e precariamente armado.
Desde que a sublevação colocou fim à fase de atuação estritamente clandestina do EZ,
a atividade pública do movimento rumou por um caminho em que iniciativas como esta,
periodicamente fizeram parte do amplo repertório tático por meio do qual os zapatistas
buscaram ampliar a sua influência à nível nacional, com o intuito de construir uma correlação
de forças que fosse favorável à conquista dos seus objetivos estratégicos. Desta forma,
acredito que o assombro com que a proposta foi recebida, está em boa medida relacionado
com a imagem que o movimento capitaneou a partir de 2005 com o impulsionamento da Otra
Campaña11. Pois, mesmo que a efetividade da OC possa ser questionada, o fato é que a sua
11
Para ver em detalhes a proposta da Otra Campaña, vide: Sexta Declaración de La Selva Lacandona
http://enlacezapatista.ezln.org.mx/2005/06/30/sexta-declaracion-de-la-selva-lacandona/; Informe sobre los
trabajos preparatórios de ‘La Outra Campaña’: http://enlacezapatista.ezln.org.mx/2005/08/02/ezln-informa-
sobre-trabajos-preparatorios-de-la-otra-campana-la-cita-es-en-territorio-del-caracol-de-la-garrucha/ Invitación a
la Primera Plenaria de La” Outra” Campaña: http://enlacezapatista.ezln.org.mx/2005/09/14/de-la-primera-
sesion-plenaria-de-la-otra-campana/
5
realização garantiu uma grande projeção midiática para o movimento, que mais de 10 anos
após a sublevação do EZ se viu outra vez no centro das atenções, vocalizando uma
contundente e radical crítica à política institucional.12
O efeito midiático da OC foi tão forte que a campanha passou a ser tida como uma
marca registrada do movimento, o que em alguma medida ocorreu em detrimento de uma
apreensão plena da sua trajetória política. O superdimensionamento da OC fez com que
algumas das movimentações anteriores dos zapatistas que representaram claras aproximações
da criticada política tradicional – e que inclusive cumpriram um importante papel na
formulação da proposta de criação de otra política -, acabassem sendo perdidas de vista.
O registro realizado por Soares (2015: p. 306) de algumas das atividades com maior
apelo midiático, que foram realizadas antes do impulsionamento da OC é bastante ilustrativo
sobre o ponto para o qual gostaria de chamar a atenção:

O primeiro desses grandes eventos foi a Convenção Nacional Democrática


(CND), encontro, a propósito, onde se inaugura o primero aguascalientes em
1994. Depois dela poderíamos citar a realização do Fórum Nacional Indígena,
o Encontro Nacional de Comitês Civis para o Diálogo Nacional, o Fórum
Especial para a Reforma de Estado e o Primeiro Encontro Interamericano
contra o Neoliberalismo e pela Humanidade (que ficaria conhecido
popularmente nos meios ativistas como o “Primeiro Intergaláctico”, sendo
posteriormente realizado em vários países do mundo, inclusive no norte do
Brasil), todos eles em território zapatista durante o ano de 1996. [...] No
universo dessas grandes ações nacionais e internacionais de manifestações
públicas, também é importante inserir algumas mobilizações de Chiapas até a
cidade do México, como a Marcha dos 1.111 zapatistas, ocorrida em 1997, e a
já citada Marcha da Dignidade Indígena, ocorrida em 2001.

Por isto, para entender o conteúdo da atual proposta é necessário não desconsiderar
esta parte da história do movimento, que aliás é essencial para captar o âmago da formulação
que sustentou a Otra Campaña. Tal análise obviamente não pode ser realizada em abstrato,
mas precisa levar em consideração através de um prisma ampliado, o processo histórico do
qual ela é tributária. Sem deixar de fora os seus altos e baixos, os erros e acertos, assim como
as derrotas sofridas do movimento, para não perder de vista a relação dos meandros do
conflito levado à cabo pelos zapatistas com as elaborações táticas impulsionadas pelo EZLN
para tentar superar os obstáculos que se colocaram no caminho do movimento na luta pela sua
sobrevivência política.

12
Curiosamente, um dos principais embates políticos levados à cabo pela OC naquela época estiveram
relacionados com a candidatura do recém eleito presidente do México, André Manuel López Obrador, que já
naquela época se colocava como o principal expoente da esquerda institucional mexicana.
6
Para isto é fundamental antes de qualquer coisa, ter em mente que o EZ está envolvido
em uma guerra e que a guerra não é travada apenas pelas armas 13. Todo confronto bélico,
como dirão os principais teóricos da guerra de Sun Tzu à Foucault, é essencialmente político
(Saint-Pierre, 2000). Só tendo clareza a respeito disto é que se torna possível compreender,
como um conflito tão assimétrico como o que se abriu em Chiapas a partir de 1994 – onde o
poderio bélico do exército mexicano é assombrosamente superior ao dos rebeldes -, não fora
resolvido estritamente pelo aspecto militar. Apenas tendo em mente os limites políticos
inerentes à guerra - que, diga-se de passagem, foram muito habilmente trabalhados pelo
movimento ao longo das duas últimas décadas – é que se pode compreender não só a
resistência, como a contra-ofensiva zapatista que se dá com a guinada estratégica, objetivada
na opção pelo autogoverno a partir de dezembro de 1994. E neste sentido, por mais que - após
o rechaço da sociedade civil à confrontação bélica, já nos primeiros dias da guerra 14 – o
confronto armado não tenha sido o fator decisivo no conflito, o papel do fator militar não
pode em hipótese alguma ser desprezado, sem que traga em prejuízos para a compreensão da
evolução dos acontecimentos.
Pois, sem entender que o cálculo político do Estado para a solução do conflito parte da
compreensão de que uma considerável parcela da população indígena de Chiapas está
organizada, armada e disposta a lutar pelas suas demandas até as últimas conseqüências 15, não
é possível imaginar que o que foi realizado em Chiapas pudesse ser tolerado. É evidente que
são essenciais fatores como: a capilaridade do EZ entre as várias comunidades indígenas deste
estado; sua exemplar capacidade de disputar a narrativa do conflito com os oligopólios
midiáticos, assim como a construção de redes de solidariedade com amplitude internacional.
Mas estes fatores isolados não seriam suficientes para sustentar a experiência do autogoverno.

13
Para entender a posição dos zapatistas neste debate, vide: Entrevista com La Jornada.Subcomandante Marcos:
Lo decisivo en uma guerra no es el enfretamiento militar, sino la política que se puene en juego en esto conflito.
http://enlacezapatista.ezln.org.mx/1994/02/04/entrevista-con-la-jornada-subcomandante-marcos-lo-decisivo-en-
una-guerra-no-es-el-enfrentamiento-militar-sino-la-politica-que-se-pone-en-juego-en-ese-enfrentamiento/
14
“[…] sólo duró 12 días esta pesadilla, pues otra fuerza superior a cualquier poder político o militar se impuso a
las partes en conflicto. La Sociedad Civil asumió el deber de preservar a nuestra patria, ella manifestó su
desacuerdo con la masacre y obligó a dialogar; […] Reiteramos nuestra disposición a una solución política en el
tránsito a la democracia en México. Llamamos a la Sociedad Civil a que retome el papel protagónico que tuvo
para detener la fase militar de la guerra y se organice para conducir el esfuerzo pacífico hacia la democracia, la
libertad y la justicia. El cambio democrático es la única alternativa de la guerra.” Segunda Declaración de La
Selva Lacandona. Disponível em: http://enlacezapatista.ezln.org.mx/1994/06/10/segunda-declaracion-de-la-
selva-lacandona/
15
“[...] Los Comités Clandestinos Revolucionarios Indígenas son indestructibles, tienen desde que fueron
formados un escalafón de mando. Si uno o varios caen, ya otro o ya varios toman su lugar y sus relevos futuros
se alistan. Tendrán que aniquilarnos a todos, absolutamente a todos, para detenernos por vía militar. Y siempre
les quedará la duda de si no habrá quedado alguno por ahí que vuelva a iniciar todo.” In: Carta de Marcos sobre
la paz que algunos piden. Vide: http://enlacezapatista.ezln.org.mx/1994/01/13/sobre-la-paz/
7
Portanto, com o desenvolvimento desta pesquisa concluí que a perspectiva mais
acurada para realizar a análise da trajetória do movimento, é compreendê-la enquanto um
epifenômeno da guerra que se inicia com o levante armado de janeiro de 1994. É evidente que
cada formulação tática impulsionada pela organização político-militar deve ser vista em
particular, levando em consideração as especificidades próprias à conjuntura que subsidia a
elaboração; mas sem levar em consideração o “cabo de guerra” do EZ contra o Estado, não é
possível entender onde querem chegar os zapatistas com as suas “extravagâncias”. A meu ver,
é a incompreensão disto que está por trás do assombro de alguns observadores e do espanto
que em via de regra acompanha as iniciativas impulsionadas pelo movimento.
Foi assim quando o movimento decidiu aceitar o convite do governo mexicano para
negociar um armistício ainda em fevereiro de 1994 - mesmo sabendo do enorme risco que tal
iniciativa poderia trazer para o movimento -; foi assim quando da realização da Convenção
Nacional Democrática (CND); ainda em 1996, também foi com a realização do Encontro
Intergaláctico16 e na criação do Congreso Nacional Indígena (CNI), ou mesmo com a OC já
na década de 2000. Através da análise de cada uma destas elaborações é possível colocar a
prova esta chave analítica e demonstrar a sua acurácia enquanto fio condutor para a
interpretação da história do zapatismo.
Em fevereiro de 1994 quando se iniciaram as conversações para a solução do conflito,
os zapatistas tinham a clara compreensão de que - mesmo não sendo possível alcançar os seus
objetivos em uma mesa de negociações com o governo -, ao não aceitarem dialogar estariam
dando um poderosíssimo trunfo político para o seu inimigo. Logo, por entenderem que o
rechaço às negociações implicaria em perda de força social, o movimento se empenhou em
garantir que o previsível fracasso das negociações, ou que algum eventual problema
decorrente da realização das negociações (como a hostilização, ou o prejuízo da integridade
física de algum dos representantes do governo) não pudesse ser atribuído ao movimento. E foi
com o foco voltado para a disputa pela narrativa hegemônica sobre os acontecimentos, que a
meticulosa escolha do local para as conversações passou ao primeiro plano das atenções da
direção do movimento.17
O sumário exercício acima não passa de uma singela demonstração do acerto desta
perspectiva no enfoque da trajetória do EZ. Seria possível fazer o mesmo esforço de análise
16
Encuentro Intergalático foi como ficou conhecido o Primeiro Encuentro Interamericano pela Humanidad y
contra el neoliberalismo.
17
Para ver em detalhe: “Entrevista con La Jornada. Subcomandante Marcos: lo decisivo en una guerra no es el
enfrentamiento militar, sino la política que se pone en juego en ese enfrentamiento”:
http://enlacezapatista.ezln.org.mx/1994/02/04/entrevista-con-la-jornada-subcomandante-marcos-lo-decisivo-en-
una-guerra-no-es-el-enfrentamiento-militar-sino-la-politica-que-se-pone-en-juego-en-ese-enfrentamiento/
8
com todas as formulações acima citadas, assim como com outras menos expressivas que
sequer foram mencionadas. Não obstante, tal esforço estaria para além dos objetivos traçados
para este texto, de modo que retornarei a proposta de candidatura à presidência, buscando
ressaltar outros aspectos que podem ser úteis para a apresentação de traços fundamentais do
objeto.
Neste sentido, é pertinente voltar à proposta para buscar extrair o que ela contém em
termos de realidade política. Por este viés, o primeiro ponto a ressaltar é o fato de que esta
proposta não está descolada da realidade do movimento indígena, mas possui forte inspiração,
tanto no que existe em escala local - na concretude da escala local própria à experiência de
autogoverno protagonizada pelos zapatistas - quanto no que existe escala nacional - em
termos de diretriz programática - para as frações mais progressistas do movimento indígena
mexicano. Portanto mais do que uma inovação, trata-se do reflexo ampliado de algo que já
vem sendo impulsionado por um setor expressivo do movimento indígena mexicano e que
encontra no autogoverno construído pelos zapatistas a sua objetivação mais concreta. Por este
prisma, a proposta de candidatura à presidência tem um significativo valor heurístico, porque
a sua forte relação com a concepção de democracia zapatista - que sustenta o seu sistema
político e está condensada no oximoro do “mandar obedecendo” 18 - oferece uma interessante
entrada para a análise da realidade chiapaneca.
Mas antes disto, acredito que seja importante fazer outra rápida digressão para tentar
localizar a experiência zapatista no processo histórico geral, apontando para a proximidade
que o lema zapatista estabelece com as experiências históricas mais radicalizadas de
democracia direta, ou, de base, cujas expressões mais conhecidas no Brasil estão na Comuna
de Paris (Samis, 2001), na primeira fase da Revolução Russa (Tragtenberg, 19 ) e na
autogestão social promovida pelos republicanos na Guerra Civil Espanhola (Mintz, 2016;
Rodrigues, 2016). Pois, apesar das especificidades próprias a cada um destes processos, ainda
que sumariamente é possível estabelecer um denominador comum entre eles, no esforço
realizado em prol do estabelecimento de relações o mais estreitas possíveis entre
representante(s) e representado(s). Este esforço está expresso no conceito de delegação de
responsabilidade, cujo conteúdo genuíno se pauta no fato de que nestas experiências
históricas de democracia direta, o mandato não confere plenos poderes para o representante
durante um determinado período. Pelo contrário, busca definir da forma mais precisa possível

18
Nos capítulos 2 e 3 discorro sobre o conceito de “mandar obedecendo” e evidencio a sua evolução histórica.
Demonstro a resignificação desta formulação, através do cotejamento da formulação original das FLN - de cariz
ultra verticalista e hierárquico – com o lema zapatista – marcadamente horizontalista e libertário.
9
as ações que podem e devem ser realizadas por um delegado, através das decisões tomadas
pela base, na instância coletiva à qual ambas as partes se vinculam. Outro fator importante
dentro desta formulação, tem a ver com o fato de a delegação poder ser revogada a qualquer
instante em que a base conclua não estar sendo devidamente representada. Trata-se, portanto,
de uma concepção drasticamente distinta da democracia representativa parlamentar, em que a
vigência do mandato, na prática, confere autonomia para o mandatário realizar o que acreditar
ser conveniente.
Este breve desvio é pertinente, porque é esta mesma concepção de democracia que
sustenta o sistema político que alicerça o poder paralelo zapatista. Seria extremamente
interessante poder ver como seria enfrentado, um muito provável problema gerado por
divergências entre as posições construídas autonomamente pela estrutura basista do Consejo
Indigena de Gobierno (CIG) e uma discrepante posição final da governante indígena, forçada
pela lógica de Estado. Tendo em vista que apesar dos princípios basilares da sua proposta de
governo, a mesma estaria submetida as regras constitucionais próprias ao sistema político
mexicano; o que excluiria uma eventual revogação de mandato do rol das possíveis soluções
para um problema como o hipoteticamente aventado.
Mas mais do que conjecturar sobre insólitas e curiosas situações, cabe destacar que
através da construção do CIG com representantes de todos os “colectivos, organizaciones,
barrios, tribus, naciones y pueblos que están organizados en el Congreso Nacional Indígena”
o EZ não só constrói uma ponte com o que existe de mais avançado para as perspectivas
reformistas da região19, como vai além das mesmas. Sem entrar no mérito da efetividade,
viabilidade, ou mesmo do significado desta proposta, cabe destacar que se trata de uma
formulação original, que em alguma medida busca fundir os postulados centrais da
democracia direta de cariz anti-capitalista e anti-estatal com o sistema representativo
republicano burguês.
O fato da proposta não ter sido efetivada, já que o esforço do CNI não foi capaz de
levantar as 866.593 assinaturas necessárias para a validação da candidatura indígena 20, coloca
para as futuras pesquisas em teoria política, pelo menos dois desafios. O primeiro de caráter
mais analítico, teria a tarefa dissecar a proposta nos seus meandros, localizando-a dentro da
teoria democrática para buscar aferir da forma mais precisa possível o que existe (se é que
existe algo) de inovador nesta proposição. O segundo deveria dar conta de compreender o
19
Citar os exemplos do PSOL no Brasil, assim como os bolivianos, venezuelanos e equatorinos.
20
Os zapatistas conseguiram apenas 291.955 assinaturas, ou seja aproximadamente um terço do volume
necessário. Para maiores detalhes vide: https://www.telemundo48elpaso.com/noticias/mexico/lideres-zapatistas-
ezln-reaparecen-con-criticas-al-sistema-electoral-y-a-candidatos-480031943.html
10
significado do malogro no impulsionamento desta tática, principalmente, no que tange aos
seus desdobramentos para o futuro do zapatismo. Aqui - felizmente - me cabe apenas
aproveitar o ensejo da proposta para tratar da realidade geográfica, política e cultural
enfrentada pelo movimento indígena no México, para tentar construir uma imagem mais clara
do objeto de estudo desta pesquisa e do enfoque com o qual pretendo abordar o mesmo.
Neste sentido, cabe ressaltar que a proposta de criação do CIG, está fortemente
inspirada na experiência de autogoverno zapatista, cujo principal objetivo é garantir que as
inúmeras pequenas comunidades, que se espalham pelas zonas rurais das cabeceras
municipales – que para o nosso referencial socioespacial brasileiro seriam como as pequenas
cidades interioranas que concentram a maior parte do aparato burocrático e repressivo do
Estado, assim como os serviços mais básicos –, encontrassem representação a partir da
unidade organizativa à qual escolhessem se vincular. O CIG, portanto, buscava adaptar a
realidade do autogoverno zapatista para as variadas possibilidades de conformação de unidade
expressa por “colectivos, organizaciones, barrios, tribus, naciones y pueblos”.
Mais do que reforçar o que foi dito anteriormente, acerca da relação entre o
significado das elaborações táticas impulsionadas pelo movimento e os objetivos estratégicos
de transformação social do EZLN; é importante buscar demonstrar como a proposta se
relaciona com os desafios colocados pela variável “tempo”, que faz da experiência zapatista a
mais longeva das experiências de democracia direta também pode ser vista como uma nova
fase os gargalos enfrentados por esta experiência radical de democracia Dos dias 11 a 14 de
dezembro deste ano, o EZLN realizou uma arrojada manobra militar por meio da qual
conseguiu romper o cerco ao qual foi submetido pelo exército mexicano e fez isto, sem
disparar um tiro sequer. Mais do que um impressionante movimento militar que lembra os
incríveis feitos do general Giap na guerra do Vietnã, a operação significou uma substantiva
guinada estratégica do movimento. A partir daí os zapatistas abandonam a estratégia que pode
ser apreendida na Primeira Declaração da Selva Lacandona 21, que estava orientada pela
conformação de um amplo movimento nacional pautado pelo programa político apresentado
pelos zapatistas e que tinha na tomada do Estado o seu principal objetivo estratégico;
passando a se pautar pela construção do autogoverno nas regiões sob influência do
movimento zapatista em Chiapas. A ruptura do cerco e a criação dos Municípios Autônomos
21
Este é o primeiro documento publicizado pelo movimento. Nele está contida a declaração de guerra ao Estado
e a disposição do EZ de levar o conf Para ver o documenta na integra:
http://enlacezapatista.ezln.org.mx/1995/01/01/tercera-declaracion-de-la-selva-lacandona/lito sob os termos
contidas na Convenção de Genebra. É difundido no dia 1 de Janeiro de 1994 e lido na cidade de San Cristóbal de
Las Casas durante a sua ocupação. A leitura deste documento ainda hoje é uma das mais famosas e fortes
imagens do movimento.
11
Rebeldes Zapatistas (MAREZ) são, portanto, o primeiro ato da construção do autogoverno,
que será estratégica e politicamente explicada através da Terceira Declaração da Selva
Lacandona22.
De modo concreto, a criação dos MAREZ expressa uma reconfiguração da região a
partir de outra lógica organizativa, cujo cerne está nas comunidades indígenas e não mais na
disposição do aparato burocrático estatal e nos serviços básicos oferecidos nas cabeceras
municipales. É essencial destacar que a estrutura administrativa criada pelos zapatistas não
aboliu o aparato estatal dentro de Chiapas, já que desde o princípio se desenvolveu em
paralelo a este. De forma esquemática e apenas à título de ilustração é possível dizer que a
criação dos MAREZ23 representa um desmembramento do território das cabeceras
municipales, ou, uma reconfiguração do território destas. De forma esquemática é possível
afirmar que a reorganização político-administrativa promovida pelos zapatistas no território
hegemonizado pelo movimento de certo modo resulta na criação de subdivisões na estrutura
administrativa oficial. Ou seja, onde antes havia apenas uma única instância administrativa
municipal, com a criação dos MAREZ passam a existir pelo menos duas – no caso concreto
mais impressionante dezoito. O esforço da reestruturação político-administrativa promovida
pelos zapatistas está, portanto, orientado para empoderar as unidades organizativas que se
constituíram a partir das realidades vivenciadas pelas pequenas comunidades indígenas que
estão espalhadas pela zona zapatista. Nesta força tarefa, determinante para a sobrevivência do
movimento, centenas de comunidades foram reagrupadas em torno dos trinta e oito MAREZ
criados em 1994 a partir da avaliação do próprio movimento acerca dos aspectos geográficos,
infraestruturais, políticos, econômicos e culturais que na prática uniam ou separavam as
comunidades (Spinelli, 2007).
Seria interessante para esta apresentação, precisar o contingente populacional ou
mesmo o número de comunidades que compõem os MAREZ, mas como é próprio da
realidade de movimentos sociais, a variação na amplitude da sua base é uma constante que
está diretamente ligada à evolução das lutas. Logo, nos momentos em que ocorrem
importantes conquistas há um sensível crescimento da base e da influência do movimento
sobre o locus e os sujeitos abarcados pela atuação do movimento. O mesmo em sentido
inverso vale para os momentos em que o movimento é derrotado. De modo que, tendo em
vista os objetivos desta apresentação, me parece um esforço inócuo procurar trabalhar com
22
Para ver o documenta na integra: http://enlacezapatista.ezln.org.mx/1995/01/01/tercera-declaracion-de-la-
selva-lacandona/
23
Para ver o documento em que o CCRI-CG anuncia a criação dos MAREZ:
http://enlacezapatista.ezln.org.mx/1994/12/19/creacion-de-municipios-autonomos/
12
dados precisos sobre os contingentes das bases de apoio zapatistas, já que tais dados estariam
estritamente vinculados à momentos muito específicos da história do movimento; sendo
suficiente para atingir os objetivos aqui procurados, trabalhar com uma ideia aproximada do
contingente populacional envolvido na experiência de autogoverno zapatista.
Chiapas é o sétimo estado mais populoso do México e a sua população, segundo os
dados do já citado último censo mexicano, foi estimada em 4.796.58024.
Las tierras chiapanecas suman más de 74.000 kilométros cuadrados. Al norte,
líneas imaginarias que cruzan ríos caudalosos, pantanos y humedas llanuras
las separan de Tabasco. Al oeste, las montañas todavía cubiertas en gran parte
de selva de la Sierra Atravesada, límite colonial entre los reinos de México y
Guatemala, las dividen de Oaxaca y Veracruz. Al este hay una frontera
internacional marcada por líneas rectas y ríos que surgió del tratado de 1882,
dividiendo Guatemala y a México. AL sur se encuentra con el mar, el océano
Pacífico, uno de los límites que menor importancia ha tenido en el desarrollo
chianeco a pesar de los 200 kilométros de litoral. (MAZA, 1994: p. 19)

Possui uma topografia extremamente complexa, composta por uma série de acidentes
geográficos, que tem nos altos, cañadas e na Selva Lacandona o cenário em que se desenrola
a maior parte do processo aqui analisado, já que é nesta região em que se encontram a maior
parte das comunidades zapatistas. Através do mapa a seguir é possível visualizar a forma
como estão divididas as bases de apoio zapatistas pelo território chiapaneco.

MUNICÍPIOS COM PRESENÇA ZAPATISTA EM 1996

24
Vide: http://www.inegi.org.mx/lib/olap/consulta/general_ver4/MDXQueryDatos.asp?proy=cpv10_pt
13
Para se ter uma ideia mais precisa acerca da realidade desta região vale a pena recorrer
mais uma vez aos números do INEGI. Chiapas é um estado que tem o carro-chefe da sua
economia no campo e a sua configuração socioespacial está fortemente condicionada por isto.
Tuxtla Gutierrez que é a capital e a maior cidade do estado, possui uma população de pouco
mais de 500 mil habitantes e em terras chiapanecas só existem outras duas cidades com mais
de 100 mil habitantes, Tapachula e San Cristóbal de Las Casas. Do universo de 111
municípios que existentes no Estado, a esmagadora maioria tem populações que não alcançam
a marca das 50 mil pessoas. Somadas as populações das 4 maiores cidades do estado, cujas
populações superam a casa dos 50 mil habitantes, tem-se um contingente populacional total
estimado em 955.330 habitantes.
Isto quer dizer que mais de 80% da população do estado vive em municípios
consideravelmente pequenos. Para demonstrar isso de modo ainda mais claro, basta somar os
contingentes de todas as cidades que não extrapolam a marca dos 15 mil seres, para ver
através deste recorte da demografia chiapaneca que setenta por cento da sua população está
radicada em cidades com menos de 10 mil habitantes. Pois, conforme os dados censitários, a
estimativa total para a população destas cidades atinge a marca das 1.707.425 pessoas.
Fechando ainda um pouco mais o recorte, percebe-se que entre a parcela da população
que vive nas menores cidades, 813.649 habitantes vivem em núcleos compostos por menos de

14
mil pessoas. Tais dados são importantes porque ajudam a ilustrar uma das principais
características do objeto desta pesquisa, que tem a ver com a base comunitária sobre a qual se
alicerçam o movimento e a experiência do autogoverno por ele protagonizada.
Como já foi dito anteriormente, a grande maioria dos MAREZ foram criados a partir
do desmembramento de municipalidades cujo núcleo urbano - em função da precariedade da
infraestrutura e dos serviços de transporte colocados à disposição das comunidades - no mais
das vezes praticamente não são acessíveis às suas populações. É necessário complementar as
informações que tratam da realidade socioespacial chiapaneca destacando que, em boa parte
dos casos, as distâncias existentes entre as comunidades e as cabeceras municipales chegam a
ter centenas de quilômetros. Em via de regra, as estradas responsáveis por fazer a sua
conexão, não são pavimentadas e se caracterizam por possuírem um péssimo estado de
conservação. Isto faz com que as idas às cidades se desdobrem em exaustivas horas de
viagem, dada a condição que, em via de regra, o serviço de transporte é ofertado.
Afora que nos núcleos urbanos - mesmo nos menores - as populações tendem a ser
predominantemente ladinas25 - não indígena - e em decorrência da nefasta herança colonial, a
sociabilidade experienciadas pelos indígenas nestes espaços não costuma ser aprazível.
Segundo Hilsenbeck (2007: p, 56), o preconceito e a discriminação a qual os indígenas estão
submetidos chega a ser pior que o vivenciado pela população negra no sul dos EUA antes do
movimento pelos direitos civis e a derruba das leis segregacionistas. O que contrasta de forma
muito acentuada com a realidade comunitária - que apesar de todos os problemas que possa
ter -, que se desenvolve dentro de um ambiente mais igualitário, onde as pessoas se percebem
como comuns. E este é um dos fatores que está na base da sociabilidade diferenciada que
começa a ser construída já no processo de colonização da selva e que tem no autogoverno
zapatista um dos seus desdobramentos mais impressionantes.
Acredito que abordar estas questões seja essencial para elucidar o processo de criação,
desenvolvimento e massificação do EZLN, porque o exército indígena não é o simples
resultado de uma ideia genial, mas um corolário do acúmulo de experiências auferidas nas
décadas de lutas protagonizadas pelo movimento indígena chiapaneco antes do seu advento.
Logo, compreender este desdobramento do movimento indígena implica em apreender, ainda
que em linhas gerais, os antecedentes desta história.
Mas antes de tratar propriamente da formação do movimento indígena de Chiapas é
importante lançar alguns marcos referenciais que dizem respeito a conformação do território

25

15
chiapaneco. O primeiro ponto que merece ser destacado, tem a ver com o fato de que até o
ano de 1824 o estado fez parte da Capitania Geral da Guatemala. Fato que quando visto ao
lado da considerável distância geográfica para com os principais centros urbanos mexicanos,
fazem com que Chiapas possua uma realidade política e cultural muito própria (DIAZ, 2015:
p. 39). Fato que pode ser comprovado através da forma singular com que o evento político-
social mais importante da história contemporânea do México chega ao estado.
A revolução mexicana é um processo extremamente complexo que não será enfrentado
exaustivamente aqui. Portanto, me concentrarei apenas em algumas questões que exerceram
forte influência sobre a realidade social chiapaneca e conseqüentemente condicionaram o
objeto deste estudo.
Por esta ótica, o primeiro ponto a merecer ênfase, tem a ver com o próprio caráter do
processo. Ao contrário das perspectivas históricas sobre as revoluções mais conhecidas do
século XX - como a Russa (1917), Chinesa (1949), ou Cubana (1959) -, em que as narrativas
hegemônicas foram construídas a partir da ótica dos vencedores, para o caso da revolução
mexicana esta tarefa não é tão simples, dada a dificuldade encontrada para identificar um
expoente que tenha sido tão hegemônico durante todo o processo, ou que condense o legado
político e social que se consolida no período pós-revolucionário. Pois, se trata de um processo
multifacetado, cuja evolução é melhor compreendida quando se leva em consideração as
realizações produzidas em paralelo por cada uma das principais forças políticas, que se
desenvolveram a partir da conformação de perspectivas políticas e sociais que podem ser
identificadas através das suas principais lideranças. Mas para isto, tais lideranças precisam ser
compreendidas como figuras que desfrutaram de grande legitimidade e considerável força
social com alcance regional, por terem tido a capacidade de colocar em funcionamento um
mecanismo de retroalimentação, em que a contemplação dos anseios e demandas
predominantes entre determinados setores da sociedade, se desdobrou na força social
desfrutada pela sua respectiva liderança, que estava alicerçada no grau de mobilização e
participação deste setor com o processo revolucionário.
Este prisma facilita a compreensão da conformação das variadas forças
revolucionárias que na memória social estão confundidas com os nomes de Francisco Villa e
Emiliano Zapata - que expressam de forma mais genuína a participação e as demandas das
camadas populares -, mas que não podem ser tomadas como as únicas forças políticas com
relevância entre as forças revolucionárias. O arco de forças constitucionalistas ainda envolvia
outras lideranças regionais que estão ligadas a realidades socioeconômicas e bases sociais de

16
caráter diferenciado, como são os casos do próprio Francisco Madero – que entrou para a
história como o detonador do processo revolucionário -, Venustiano Carranza, Alvaro
Obregón, ou, Plutarco Elias Calles; para ficar apenas entre àqueles que se tornaram presidente
ainda nas década de 1910 e 1920. Figuras que apesar de hodiernamente não desfrutarem da
mesma popularidade de Villa e Zapata, tiveram considerável peso no processo revolucionário
em função dos vínculos políticos que construíram com os setores urbanos, radicados na região
central do território mexicano, onde estão localizadas as cidades mais importantes do ponto de
vista da economia capitalista. Fato que em alguma medida, inclusive viabilizou uma
significativa aproximação destas figuras com a própria classe trabalhadora organizada destas
cidades.
Desta forma, a partir da apreensão das perspectivas políticas que possuem mais solidez
em cada uma das regiões, o processo pode ser dividido em pelo menos três vias que se
desenvolveram com ritmos próprios e no desenrolar da revolução se revezaram no exercício
da hegemonia. Tem-se assim a conformação do bloco constitucionalista, com as seguintes
forças: o exército do sul, de base predominantemente camponesa, ligado à figura de Zapata no
estado de Morelos, e com hegemonia sobre boa parte do sul do país; o exército do norte,
bastante identificado com a figura de Pancho Villa, de composição também majoritariamente
camponesa e cuja base estava centrada no estado de Chihuahua, mas possuía grande alcance
sobre todo o norte do pais; e o exército constitucional de matiz mais liberal, ligado aos
maiores centros urbanos mexicanos e suas respectivas forças sociais - que conforme já foi
apontado produziu os primeiros presidentes mexicanos no período pós-revolucionário.
Traçar este quadro é necessário para evidenciar o caráter contrastante entre o
desenvolvimento dos acontecimentos no campo e na cidade, assim como para destacar a
heterogeneidade que marca o processo e encontra em Chiapas um dos seus expoentes mais
expressivos. Ao contrário do que ocorreu nos estados em que os eventos que culminaram na
conformação da torrente revolucionária foram engendrados por lideranças políticas locais, em
Chiapas as lutas revolucionárias se desenvolveram tardiamente, apenas a partir de 1914. É a
chegada do general Jesus Augustin Castro - aliado daquele que viria ser a partir de 1917 o
trigésimo sétimo presidente mexicano, Venustiano Carranza -, que marca o início dos embates
pela radical transformação da realidade política, econômica e social em solo chiapaneco.
Diferentemente dos locais em que as demandas revolucionárias culminaram no
protagonismo político de expressivas parcelas dos setores populares, em Chiapas foi a elite
econômica local quem deteve o papel mais importante no plano político e militar, apesar de

17
não terem se colocado ao lado dos setores revolucionários, mas justamente do lado oposto, na
conformação da resistência ao seu avanço pelo estado.
“Es um echo ampliamente aceptado que La Revolución mexicana iniciada en
1910 fue forjándose de un conjunto de movimientos regionales. En Chiapas
surgió un movimiento de resistencia a la Revolución encabezado por los
hacendados conocidos localmente como “mapaches”, quienes lograron
manejar el “sentimiento chiapaneco” para incluir a peones y campesinos en
general como la tropa que se enfrentó al ejército federal de la Revolución. Los
“mapaches” triunfaron y obligaron al gobierno central a negociar las
condiciones en que Chiapas se incorporó al nuevo orden.” (PUIG, 1994: p. 17)
REBOLAR PRA ENCAIXAR ISSO
“O núcleo do pacto social fundador do Estado mexicano até os anos 90 do século
XX foi estabelecido durante a longa revolução mexicana iniciada em 1910. No que diz
respeito às massas rurais o pacto social foi cristalizado no artigo 27 da Constituição de
1917: a chamada Lei do Ejido era a garantia da propriedade social da terra para usufruto
de comunidades rurais e povos originários e fundamentou juridicamente a reforma
agrária no país até 1992 (Bórquez e Ventura, 2005: 50). Desde as reivindicações dos
camponeses zapatistas de 1910, terras, florestas e recursos hídricos foram expropriados
dos grandes latifundiários pelo conjunto de revoltas agrárias e insurreições armadas no
campo que caracterizam a revolução social mexicana até a conquista da Lei Agrária de
1915 e a promulgação da Constituição de 1917.
VER PÁGINO 200 DO CÁSSIO
A efetividade da resistência destes grandes proprietários de terra é tão contundente que
a redistribuição de terras e a reconfiguração das elites econômicas e políticas promovidas pela
revolução - que são as formas mais concretas com que a revolução se materializou no campo
-, não podem ser percebidas em Chiapas antes de meados da década de 1930. Já que o poder
da elite chiapaneca se institucionaliza no início da década de 1920, no governo de Alvaro
Obregón (1920-1924):

El gobierno de Obregón pactó con la oligarquía terrateniente local y a cambio


de su apoyo político dejó intacta su dominación sobre los campesinos y los
pueblos indios. Ese pacto fue, para la oligarquía chiapaneca, una etapa más de
su historia de “modernización” desde arriba sin cambio en las relaciones
sociales: ferrocarriles, carreteras, capitales, administración estatal, todo
montado sobre una oscura y terrible relación servil mantenida por la fuerza y
la ignorancia sobre los habitantes del campo chiapaneco, negado no sólo en su
condición de ciudadanos mexicanos sino casi también en la de seres
humanos.” (GILLY, 2002: p. 45-46)

Segundo Andreo (2010: p, 34), em virtude da constatação da impossibilidade de


derrotar a elite agrária chiapaneca, Obregón nomeou como Chefe das operações militares do
Exército Federal e governador de Chiapas, Tiburcio Fernández Ruiz, um dos líderes
mapaches em troca do apoio político deste setor. Tais fatores fizeram com que a revolução
mexicana não tenha representado uma mudança significativa na condição econômica, social e
18
política dos indígenas chiapanecos. O que de acordo com Gilly (2002: p. 52), fez com que
para este setor o imaginário acerca da revolução mexicana, estivesse mais relacionado ao
governo nacionalista de Lazaro Cárdenas (1936-1940) do que da revolução de Villa e Zapata.
Pois, foi somente neste governo que se tornou possível para esta parcela da sociedade
vivenciar algumas das transformações operadas pela revolução na maior parte do país ainda
na década de 1910, como a abolição da peonaje26 (espécie de servidão) por dívida e o início
de uma reforma agrária.
Este autor defende que a partir da década de 1930, a reação conservadora iniciada com
Obregón leva a cisão da elite mexicana. Tal fragmentação da elite econômica teria culminado
no surgimento de uma ala radicalmente nacionalista, que acaba sendo encabeçada por Lazáro
Cardenas e alcança a presidência em 1934.

“O grupo cardenista se baseava em uma política nacionalista. Valorizava os


ejidos porque os entendia como uma célula econômica fundamental para a
sustentação do mercado nacional mexicano.
Em seu governo, Lázaro Cárdenas (1934-1940) buscou defender os ejidos da
ação predatória do mercado, financiando adubos, implementos agrícolas e
garantindo preços mínimos para a produção. O problema agrário foi visto por
Cárdenas como principal problema mexicano. Ao final de seu governo as
terras aráveis sob organização ejidal passaram de 13% para 47%.” (ANDREO,
2010: p. 35)

Se a passagem acima não é suficiente para deixar patente a importância de Cárdenas


para o avanço da reforma agrária no México, acredito que os dados aportados por Spinelli
(2011) ajudam a ilustrar este quesito. Segundo este último, a comparação dos dados que
refletem em milhões hectares as concessões de terras para camponeses, entre os períodos de
1910 à 1934 com o sexênio de Cárdenas, apontam que nos 24 anos que separam o início da
revolução à chegada de Lázaro ao poder foram distribuídos 10 milhôes de hectares, enquanto
no seu governo - num período quatro vezes mais curto mas em um cenário de radicalização
das lutas no campo - foram concedidos 19 milhões de hectares (Spinelli, 2011: p. 68).
Spinelli não se esquece de destacar a importância do protagonismo popular, tanto no
que tange a implementação das reformas realizadas por este governo, como antes mesmo
disto, ainda na criação da base social que viabilizou a sua chegada ao poder. Este autor
complementa o trabalho de Andreo (2010), que com a sua leitura mais voltada para analisar as
26
“Em troca do direito de viver na fazenda e de um pedaço de terra onde sua família podia plantar e criar
animais, os peones indígenas eram obrigados a submeter-se a um rígido e extenuante calendário de obrigações
em benefício do finquero, podendo ser expulsos por qualquer tipo de desobediência e recebendo um salário
abaixo daquele pago na cabecera pela mesma quantidade de serviços. Os indígenas submetidos a este tipo de
relação semi-servil são denominados peones acasillados.” (ANDREO, 2011: p. 40)
19
movimentações no andar de cima da sociedade, acaba deixando de apontar que não é só a elite
mexicana racha durante a década de 1930, mas a sociedade como um todo. Spinelli, portanto,
acerta ao expandir o foco apontando para a compreensão de um bloco cardenista, que mais do
que vocalizar os anseios da fração nacionalista da elite mexicana, estava estreitamente
relacionado com os setores progressistas que encontravam no nacionalismo um denominador
comum. Ainda assim o autor não deixa de apontar que esta diretriz em comum não foi capaz
de apagar as divergências táticas e estratégias próprias às variadas perspectivas acerca dos
meios pelos quais o programa nacionalista seria realizado.
É neste sentido que Spinelli afirma que governo de Cárdenas pode ser compreendido
como um freio ao ascenso popular do qual é tributário. Pois, ao passo que o seu governo
atende uma série de demandas populares, a institucionalização destas demandas transformou
o Estado na única arena política tida como legítima e por consequência se desdobrou em um
franco prejuízo da independência e da autonomia política dos setores populares; o que
inclusive foi fundamental para a construção do caminho que garante a chegada de Cárdenas
ao poder (Spinelli: 2011: p. 67-68).
Mas como se pode inferir da atual condição dos indígenas mexicanos, as medidas
implementadas no governo de Cárdenas foram insuficientes para atender as demandas
históricas desta parcela da população. Na realidade o saldo deste governo é um retrocesso da
histórica pauta indígena, já que na década seguinte há uma nova reação contra o avanço destas
demandas com a crise do modelo nacional desenvolvimentista. Segundo Andreo (2010: p. 37),
“o período de 1940 a 1970 caracterizou-se pelo refluxo das mobilizações indígenas surgidas
durante o sexênio Lázaro Cárdenas e, desde a década de 1940 por uma efetiva colocação em
prática, através do “Instituto Nacional Indíngena” (INI), das práticas indigenistas”.

Este passeio pela Revolução Mexicana é importante para a construção do


enquadramento em que se inicia um dos aspectos mais importantes para a formação do
zapatismo: o processo de ocupação permanente da Selva Lacandona. Mas antes de falar da
colonização da região é importante fazer um amplo, embora brevíssimo recuo, para registrar
alguns importantes aspectos relativos a conformação socioespacial da selva. Antes mesmo da
conquista espanhola, a região da selva já havia sido ocupada por alguns povos em virtude da
dinâmica própria à realidade mesoamericana.

Chiapas está asentado justamente sobre la única ruta terrestre entre el norte y
el sur de nuestra área cultural, Mesoamérica, así como entre Norteamérica y
Sudamérica. Por esta razón, las influencias culturales de otras etnias que han
20
pasado por el istmo han afectado a las etnias de Chiapas con grandes
corrientes que surgieron fuera de sus fronteras y que llegaron o cruzaron su
territorio para afectar áreas mas allá de los límites. (WHITING, 1994: p. 55)

Segundo este mesmo autor, ao menos dois milênios e meio de considerável atividade
social antecedem a chegada dos espanhóis na região. Durante este período, a ocupação da
selva esteve relacionada a diversos fatores, que abarcam das simples demandas determinadas
pela conquista da subsistência por parte de grupos nômades às complexas movimentações
suscitadas tanto por motivações conflituosas quanto por cooperativas; ou seja, os dois mil e
quinhentos anos de história que antecedem à chegada dos espanhóis à região são perpassados
tanto pela ocupação casual, como pelas guerras, alianças políticas e atividades comerciais
realizadas pelas “famílias étnicas originales de chiapas”.
Estes elementos arqueológicos merecem ser mencionados porque a abordagem em
longuíssima duração ajuda a evidenciar a conformação do processo analisado, tanto no que
diz respeito à seus marcos socioespaciais (derivados dos milênios de ocupação do território).
Com os embates com os conquistadores espanhóis, dimensão ideológica, que passa a ser
construída através dos valores de bravura e resistência mobilizados pela narrativa que os toma
como uma constante na história da região, desde os primeiros embates com os conquistadores
espanhóis.
O próprio caráter tardio da anexação do território chiapaneco à federação mexicana
tem bastante a ver com a dificuldade encontrada pelos espanhóis para dominarem a região;
dada a capacidade de resiliência que foi forjada pelas etnias maias, que souberam utilizar a
seu favor as adversidades que a geografia da região oferecia para a sua incorporação ao
circuito econômico colonial, que fora construído para desempenhar um papel subordinada ao
desenvolvimento do capitalismo.

[...] Así, La Selva Lacandona se convirtió muy pronto - seguramente siempre


lo fue y seguirá siendo – en un refugio para los indios que, a veces de manera
individual o también comunal, escapaban de la nueva circunstancia que
imponía el proceso de conquista, y este áspero territorio y sus moradores
fueron un obstáculo, al que podríamos calificar de insalvable, para el avance
de la dominación española. (PONS, 1994: 130)

O que vale para a Conquista, também vale para o período colonial. Segundo Pons
(1994: p. 132), as armas não foram capazes de apaziguar a região e foi necessário recorrer á
religião para dar fim à “Tierra de Guierra” (que era a forma como a região ficou conhecida
nos albores da conquista). A situação da região era tão complexa que a Coroa Espanhola se

21
viu forçada a ceder e permitiu que os ideais revolucionários do padre dominicano Las Casas
fossem implementadas na região, como um último recurso contra os indômitos indígenas.
Não obstante, a conquista através do Espírito a médio prazo acarretou em
conseqüências perniciosas para a Coroa que precisou lidar com diversas revoltas religiosas,
que foram impulsionadas por leituras autorais do evangelho. Tais leituras foram possíveis
porque ao lado do progressismo dominicano (que auferia alma e não aceitava a matança dos
povos tradicionais), havia alguns limites objetivos que forçaram os religiosos espanhóis a
irem além na construção da sua diferenciada relação com os povos indígenas. A falta de
braços, os limites lingüísticos e as reticências autóctones à confiança nos caxlanes (brancos
em tzeltal), fizeram com que a missão chiapaneca se abrisse de forma singular para as
populações indígenas, ao ponto de formar catequistas e diáconos entre as etnias da região. Foi
esta incorporação dos indígenas ao corpo da Igreja que permitiu o surgimento desta leitura
autoral da bíblia, através da diferenciada abordagem evangélica levada à cabo pelos diáconos
indígenas, mas principalmente, pela tradução da bíblia para o idioma Maia que deu origem a
uma leitura revolucionária da narrativa bíblica. Se com o movimento encabeçado por Lutero,
à principal questão se voltou para o questionamento da submissão da Igreja aos interesses do
Vaticano, no caso indígena há uma interpretação autoral do evangelho que posiciona os
indígenas como o alvo da mensagem divina e os espanhóis como a encarnação do mal.
Foi esta fusão da cosmovisão bíblica com a realidade indígena que conformou o
horizonte ideológico que impulsionou as revoltas religiosas do período colonial que tiveram
Chiapas como palco.
(...) Así, tanto en la rebelión de Cancuc de María Candelaria en el siglo XVIII
como en la de Chamula, de Pedro Díaz Cuscat, y de “las piedras parlantes” en
el siglo XIX, la reforma religiosa pasa por la ordenación de sacerdotes y
obispos indios, por la sacralización de su propia virgen y de su propio cristo
(crucifixión de un joven indio en Chamula), por la incorporación del culto
oracular de raíz profética, de algunas divinidades prehispánicas del culto
popular local, a veces asociados a los santos cristianos, y de rituales
autóctonos, a la nueva religión. Los indios rebeldes se consideran el verdadero
Pueblo de Dios frente a los españoles y criollos tachados de “judíos” por no
practicar los valores evangélicos. Los nuevos sacerdotes y sacerdotisas no sólo
desplazan a los clérigos españoles o mestizos, sino también sustituyen a la
jerarquía india tradicional, manipulada por los ladinos, de las comunidades.
Ellos son escogidos entre los “fiscales”, i.e. catequistas formados por los
sacerdotes oficiales para enseñar la doctrina a los jóvenes, o sea, son líderes
ilustrados y respetados, pues ostentan cargos religiosos en sus comunidades.”
(BENQUET, p. 9-10)

22
De tal forma que, da conquista à colônia e da colônia aos dias atuais, a região que nos
albores da colonização ficou conhecida com “Tierra de Guierra” se consolidou como um
bastião da resistência indígena.

em boa medida foi subsumida da milenar ocupação, significada por uma narrativa de
bravura resistência). apreensão do processo de conformação socioespacial em longuíssima
duração, já que segundo a classificação ocidental as etnias que na classificação Ainda no que
diz respeito à longa duração atestando uma sensível continuidade . da selva foi habitada pelos
indígenas em diversos momentos, embora de forma episódica, como retaguarda para os
reveses sofridos em lutas de resistência ao domínio espanhol. O que aponta para importantes
questões que perpassam a conformação simbólica deste espaço. Estando a primeira delas
expressa na secular tradição de resistência e combatividade dos indígenas desta região, cujos
momentos de extrema belicosidade podem ser identificados com estas manobras evasivas para
a selva, que tinham o intuito de tentarem garantir a sobrevivência dos revoltosos às derrotas
sofridas na guerra pela melhoria das suas condições de vida. A segunda delas, tem muito a ver
com a primeira, já que diz respeito à simbologia atribuída aos confins da Selva em função da
significação que este espaço adquire com estas primeiras incursões; que remetem aos valores
de bravura, intrepidez, resiliência etc. Valores estes que em boa medida estiveram presentes
no processo de colonização.

um processo de mecanização do campo, que se desdobra por um lado na diminuição da


necessidade de braços para a execução do trabalho nas plantações e nas fazendas de gado.
A realização deste trabalho está em estreita relação com os desenvolvimentos
realizados bispo Samuel Ruiz no plano da teologia. A inspiração da teologia da libertação se
desdobra em Chiapas em uma formulação original estreitamente influenciada pela realidade
vivenciada pelo Bispo de San Cristóbal no processo de constituição das comunidades
silvícolas.

desenvolve uma perspectiva teológica autoral que ficou conhecido com teologia
autóctone, ou indígena.
A diocese inspirada em tais ideais desempenha um papel de primeira ordem no
processo de colonização da selva e consequentemente no processo de criação das
comunidades que vão se radicar na região.

23
O trabalho da Igreja
Este processo encontra o seu apogeu na realizaçõa do Congresso Indígena de Chipas
em 1974. Deste congresso participam … comunidades de … etnias.
Participaram da preparação e organização do Congresso assessores (militantes de
esquerda vinculados ou não a organizações politicas)
e por sua vez estão articulados através das cinco Juntas de Bom Governo (JBG)27, por
meio das quais os zapatistas se organizam para autogovernarem o território sob sua influência.
Trata-se portanto de um processo que culminou na formulação de um sistema político
construído de baixo para cima, partindo da unidade mais simples em direção à conformação
de unidades mais complexas. O que na prática se desdobra em tomadas de decisões seguem o
seguinte sentido: partem das comunidades, passam pelos MAREZ, para por fim se
desdobrarem em políticas gerais construídas nos caracoles e implementadas pelas JBI
(Spinelli, 2007).
Trata-se de um sistema político em que as possibilidades de participação individual
são elevadíssimas e variadas, já que além de todos os membros da comunidade estarem aptos
à desempenhar as funções de representação; além do que os representados ainda são
constantemente convocados a se posicionarem sobre as questões de interesse geral, seja à
nível local para tratar de questões próprias à comunidade, ou de caráter mais geral que dizem
respeito as dimensões mais amplas do conglomerado político ao qual estão vinculados. Como
teriam sido agora, no caso da candidatura indígena e foram no passado quando da decisão
pela declaração de guerra ao Estado mexicano.

O que coloca uma questão extremamente inquietante acerca do malogro da


candidatura, já que em todo o México os zapatistas não conseguiram mais do que 290 mil
assinaturas. Neste sentido, é de se supor que o contingente abarcado pelo zapatismo hoje em
dia está aquém disto? Ou é possível imaginar que as comunidades após aprovarem a proposta
de impulsionamento da candidatura indígena se recusaram a se empenhar na sua construção

27
As JBI estão sediadas nos caracoles, que são como as sedes da administração zapatista. Se tratam de cinco
estruturas prediais bastante simples, que foram construídas pelos próprios indígenas e estão espalhadas pela
região, com o intuito de viabilizar a organização da a economia, educação, saúde, segurança etc., ou seja, os
caracoles tem o objetivo de organizar de forma autônoma o cotidiano das comunidades zapatistas. São portanto
nestas sedes que as delegações de cada um dos MAREZ pertencentes à determinada JBI se encontram para tomar
as decisões que dizem respeito a realização do autogoverno.

24
através da simples concessão de uma assinatura? Ou pior, a articulação do CNI que teria
representantes espalhados em todo o México não chega a isto? De uma forma ou de outra o
quadro é extremamente trágico.

Não obstante, é essencial realizar algumas ponderações e destacar os limites da


experiência zapatista. A primeira ponderação diz respeito ao alcance da experiência.
Conforme, é possível ver no mapa abaixo, a porção do território sobre controle zapatista não é
mais do que metade do território chiapaneco, afora que além disto, é necessário problematizar
a noção de zona liberada, já que nem todas as comunidades da região são bases de apoio do
movimento. Ou seja, existem comunidades que não fazem parte das JBI, nem dos MAREZ, e
se mantém sob controle do aparato estatal mexicano. Portanto, existe em Chiapas uma
situação que pode ser aludida a partir do conceito leniano da dualidade de poder (Lenin, 20 )
Apesar deste conceito ter sido cunhado pelo revolucionário russo para descrever a
situação que se desenvolveu na Rússia antes da tomada do poder governamental pelo partido
bolchevique em 1917, o recurso à ele pode ajudar a avançar na construção de uma imagem
mais nítida sobre a situação existente em Chiapas. Para Lenin a dualidade de poder designava
a coexistência de sistemas políticos distintos. De um lado estava o aparato estatal, com o
parlamento e suas forças repressivas e do outro lado estavam os soviets - conselhos de
operários, camponeses e soldados – com as suas comissões, congressos e milícias populares,
que possuíam autonomia e independência perante o Estado.
Os conselhos foram importantes para o processo revolucionário soviético, porque foi
através deles que os trabalhadores construíram força social suficiente para superar o aparelho
de Estado e instaurar outro regime de poder, 28 no desenrolar da crise generalizada que se
abateu sobre o império russo com o seu fracasso na Primeira Guerra Mundial. Por mais que o
processo soviético parta da experiência de luta acumulada pela classe trabalhadora russa e
mais especificamente, pelo movimento operário desde o final do século XIX, não é possível
dizer que o processo foi deliberadamente preparado. Ou seja, que alguma estrutura
organizativa tenha sido constituída com o objetivo de desencadeá-lo a partir de determinada
orientação estratégica. Trata-se, portanto, de uma reação extremamente perspicaz à vaga
aberta com o esgarçamento da ordem desencadeada pela profunda crise que se abate sobre a
sociedade russa.

28
Vale destacar que para vários teóricos a tomada do poder governamental pelos bolcheviques em 1917 se
desdobra no esvaziamento do regime político instaurado pelos sovietes em prol da restauração do aparato
estatal. Para acompanhar este debate em profundidade, ver: TRAGTENBERG (20..) João Bernardo (200)
25
A distância entre os processos neste quesito não invalida a inferência que continua a
ajudar na construção de uma imagem mais nítida acerca do processo chiapaneco, apesar de ser
essencial frisar que a experiência zapatista possui uma abrangência geográfica e populacional
extremamente menor do que a soviética, além de não abarcar a mesma heterogeneidade de
sujeitos própria ao processo revolucionário soviético, já que está assentada sob uma base
quase que exclusivamente camponesa.
Neste sentido, é importante ter clara a enorme violência representada pelo genocida
processo da conquista espanhola e os desdobramentos que a hecatombe da colonização trouxe
para as milenares culturas pré-colombianas. Através do processo que se iniciou com a
colonização espanhola e seguiu pelos séculos subsequentes com a conformação do estado
nacional mexicano, numa condição de país de desenvolvimento capitalista tardio, o indígena
mexicano - sem detrimento da pujança e da riqueza étnico cultural própria dessa condição -
transformou-se, em suma, em camponês. O que em primeiro lugar quer dizer que, o seu estilo
de vida está subsumido do modo de produção camponês, cujo cultivo da terra está
subordinado ao mercado capitalista; e em segundo lugar que, consequentemente, as suas
possibilidades estão delimitadas pelo funcionamento da economia de mercado, já que a
autossuficiência não se coloca entre as alternativas disponíveis para as comunidades
indígenas, além do fato que a sua produção tem o seu preço definido pelo mercado. E neste
sentido, a definição dos temos em que as operações comerciais são realizadas facilmente se
desdobram em um estreito gargalo para o avanço do processo de melhoria das condições de
vida da população.
Independentemente da enorme polêmica sobre o papel do camponês dentro das teorias
e estratégias para a realização da revolução social, fato é que na região em que o movimento
zapatista se desenvolveu, não se caracteriza por um efusivo desenvolvimento da atividade
econômica capitalista. As comunidades indígenas se caracterizam pelo enorme grau de
pobreza e precariedade material que as assola e evidentemente, tais limites materiais se
desdobram em limites políticos para o avanço do processo político zapatista, cujo objetivo
precípuo é melhorar as condições de vida das comunidades. Ainda assim, mesmo com a
enorme precariedade de recursos que ainda caracterizam a região, existe um notório contraste
entre as condições de vida experienciadas dentro das comunidades zapatistas e nas
comunidades não zapatistas.

26
Confirmando a suspeita dos zapatistas as reações à proposta foram em sua maioria
negativas. Houve tanta simplificação acerca do conteúdo da proposta que o Subcomandante
Galeano – antigo Subcomandante Marcos29 - publicou outro texto30 um mês após o
supracitado comunicado, para esclarecer algumas questões. Entre tais, merecem ser
destacadas, tanto a explicação caráter da proposta - que foi igualada à uma candidatura
convencional, quando se tratava de uma elaboração diferenciada inspirada nos princípios
zapatistas -, quanto o resgate de alguns episódios em que houvera certa aproximação dos
zapatistas para com a política institucional.

O movimento teria entrado em uma crise terminal (como já disseram algumas vozes
em outros vários momentos)? Para um movimento com a envergadura do zapatismo - que já
arrastou centenas de milhares de pessoas pela Cidade do México e mobilizou milhões pessoas
mundo a fora pela causa indígena - o fracasso com a viabilização da candidatura indígena é
uma fragorosa demonstração de fragilidade, ou não? Se sim, como o Estado mexicano reagirá
à isto, neste momento em que a balança pende para as forças de direita em toda a América
Latina? O fracasso da proposta é um sinal do desgaste do movimento, ou se trata de um
rechaço mais profundo à política parlamentar com a qual a intentona zapatista teria sido
identificada? Enfim, estas são algumas das questões cujos desdobramentos exercerão enorme
influência sobre o futuro do zapatismo, assim como tendem a pautar o atual debate sobre o
movimento e não nos cabe aqui muito mais que assinalá-las.
Fiz questão de iniciar este trabalho trazendo esta questão, para evidenciar uma das
principais questões que me acompanharam ao longo desta pesquisa e que a meu ver
demonstram como a imagem do EZLN e do zapatismo ainda hoje são consideravelmente
distorcidas; sendo a própria incompreensão das diferenças existentes entre uma coisa e a outra
- organização político-militar e movimento de massas - bastante sintomática.
A meu ver, os dois documentos até aqui citados, são suficientes para dissolver a
celeuma que se formou em torno da tentativa do EZLN de impulsionar uma candidatura a
partir da sua articulação mais ampla com o movimento indígena mexicano, que se materializa
29
30
Vide: http://enlacezapatista.ezln.org.mx/2016/11/17/una-historia-para-tratar-de-entender/
27
no CNI. É importante deixar claro que o Congreso Nacional Indígena é mais uma das várias
sagazes mediações táticas por meio das quais o zapatismo expandiu a sua influência política
após o Levante de 1994. Criado em 1996, após a consolidação da perspectiva identitária e
multiculturalista em detrimento da perspectiva socialista clássica - que está
inextrincavelmente ligada a criação do EZLN em 1983 -, a criação do CNI vem no bojo de
uma série de inciativas que apontaram para a abrupta guinada estratégica impulsionada pelo
movimento após o malogro da tentativa de tomada do poder pela via armada. Para captar isto
por contraste, basta a leitura da Primeira e da Terceira Declaração da Selva Lacandona.

No primeiro documento por meio do qual o EZLN declara guerra ao Estado mexicano
e apresenta as suas intenções, para perceber a dimensão da guinada estratégica que está
concluída em 1996 e pode ser nitidamente percebida com a criação do CNI e com a
reorientação da luta para o autogoverno.
só pode ser satisfatoriamente compreendida através de um resgate mais profundo do período
que antecede a militância pública e massiva que tornou o movimento internacionalmente
conhecido. em que a nebulosa squecidos até são ser passados em revisão, em um balanço
crítico da história recente do movimento que possui o claro intuito de justificar a proposta
elaborada pelos zapatistas, assim como esclarecer alguns dos seus aspectos que teriam sido
desprezados. Com este breve resgate da sinuosa trajetória pública do EZLN, o subcomandante
foi capaz de evidenciar que o zapatismo sempre esteve muito distante da mítica aura
anarquista, que foi atribuída ao movimento nestes últimos vinte e dois anos.

Apesar de apenas isto ser suficiente para dissolver a celeuma gerada – em boa medida
- pelo tratamento simplista da proposta zapatista 31 para uma possível participação nas eleições
presidenciais de 2018, acredito que o surgimento desta polêmica merece destaque, pois é uma
clara expressão do desconhecimento que ainda paira sobre a história do movimento. Não só
no que diz respeito a fase de atividade pública que se abre com o Levante Armado de janeiro
de 1994, mas principalmente no que se refere à fase anterior, quando a atuação política do
movimento guardara rigorosa clandestinidade.
São muitos os que se interessam pelo zapatismo e desconhecem o fato de que uma
década de árduo trabalho político - desenvolvido nas sombras da selvas no sudeste mexicano -
separam a primeira aparição pública do exército da sua fundação, em 17 de novembro de

31

28
1983. O que dizer se pode dizer então, da história que antecede a fundação do EZLN; do
processo de amadurecimento desta proposta e das razões que levaram uma série de pessoas a
abandonarem a sua vida profissional e afetiva para se dedicar integralmente a construção de
um projeto de mundo novo?
Existe certa ambiguidade no que se refere ao número de militantes 32, mas não há
dúvidas de que os militantes que fundam o EZLN nos idos anos 80, estão diante de uma
realidade muito distinta da vivenciada pelo movimento de massas que na década seguinte, a
partir da Selva Lacandona redefinirá a agenda política mexicana e influenciará movimentos
sociais por todo o mundo33.
As imagens dos indígenas tomando de assalto sete cidades do estado de Chiapas são
sem dúvidas umas das mais impactantes da última década do século XX. Eram àqueles os
tempos do “fim da história”, quando os apologetas do capitalismo bradavam aos quatro cantos
do planeta que o neoliberalismo seria o que a humanidade havia produzido de mais avançado
em termos de organização da vida em sociedade e que nesta âmbito não restariam alternativas
após o colapso da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. Não sendo isto o suficiente,
aquele insólito exército indígena maltrapilho e toscamente armado – uma parte significativa
dos indígenas portavam armas de caça ou mesmo armas falsas, produzidas com madeira -
decidiu se levantar exatamente no mesmo dia em que o México era alçado a condição de
modelo para a América Latina, passando a fazer parte do NAFTA 34. Na época este tratado
representava o primeiro importante passo da política externa estadunidense em direção à
construção da Área Livre de Comércio das Américas (ALCA). De tal forma que a insurgência
zapatista acabou por ter o seu impacto potencializado, já que incindiu sobre o ponto
nevrálgico daquela conjuntura e neste sentido, o impacto auferido pela ação no presente se
desdobrou em certo detrimento da compreensão do processo do qual fora resultado.

O fato de se tratar de uma organização política clandestina e da sua atuação entre os


movimentos sociais Apesar das divergências de abordagem e perspectivas existentes, os
trabalhos de Díaz (2015), Harvey (2000) e Saavedra (2007) – para ficar apenas em insignes
exemplos – não só evidenciam a riqueza heurística do processo que vai da fundação do EZ ao
Levante, como demonstram a complexidade desta história, eivada de sujeitos e projetos
coletivos que acabam por condicionar este amálgama denominado de movimento zapatista.

32

33
34

29
São vários movimentos sociais, associações de produtores, organizações políticas e
instituições - como a Igreja – que constituem o caudal em que o zapatismo foi se
conformando enquanto um projeto político autônomo.
Mas para além do zapatismo enquanto alternativa política, o exército popular que
impulsiona o movimento, surge de um projeto político que começa a ser impulsionado por um
grupo de jovens numa localidade consideravelmente distante de Chiapas, alguns anos antes da
sua fundação na década de 1980.

30

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