Sie sind auf Seite 1von 208

Redefinições das fronteiras

entre o público e o privado


Implicações para a
democratização da educação
Vera Maria Vidal Peroni
Paula Valim de Lima
Carolina Rosa Kader
(Organizadoras)

Redefinições das fronteiras


entre o público e o privado
Implicações para a
democratização da educação

OI OS
EDITORA

2018
© Dos autores – 2018

Editoração: Oikos
Capa: Juliana Nascimento
Revisão: Carlos A. Dreher
Arte-final: Jair de Oliveira Carlos
Impressão: Rotermund

Conselho Editorial (Editora Oikos):


Antonio Sidekum (Ed.N.H.)
Avelino da Rosa Oliveira (UFPEL)
Danilo Streck (Unisinos)
Elcio Cecchetti (UNOCHAPECÓ e GPEAD/FURB)
Eunice S. Nodari (UFSC)
Haroldo Reimer (UEG)
Ivoni R. Reimer (PUC Goiás)
João Biehl (Princeton University)
Luís H. Dreher (UFJF)
Luiz Inácio Gaiger (Unisinos)
Marluza M. Harres (Unisinos)
Martin N. Dreher (IHSL)
Oneide Bobsin (Faculdades EST)
Raúl Fornet-Betancourt (Aachen/Alemanha)
Rosileny A. dos Santos Schwantes (Uninove)
Vitor Izecksohn (UFRJ)

Editora Oikos Ltda.


Rua Paraná, 240 – B. Scharlau
93120-020 São Leopoldo/RS
Tel.: (51) 3568.2848
contato@oikoseditora.com.br
www.oikoseditora.com.br

R314 Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a


democratização da educação / Organizadoras: Vera Maria Vidal Pe-
roni, Paula Valim de Lima e Carolina Rosa Kader – São Leopoldo:
Oikos, 2018.
206 p.; 16 x 23 cm.
ISBN 978-85-7843-788-6
1. Educação. 2. Política educacional – Relação – Público-privado. 3. De-
mocratização da educação. 4. Relação – Educação pública e privada. I. Pero-
ni, Vera Maria Vidal. II. Lima, Paula Valim de. III. Kader, Carolina Rosa.
CDU 37
Catalogação na Publicação: Bibliotecária Eliete Mari Doncato Brasil – CRB 10/1184
Sumário

Prefácio ...................................................................................................... 7
Introdução ................................................................................................. 9
La persistente mercantilización educativa y el agotamiento del
progresismo en América Latina. Lecciones del caso chileno ..................... 11
Víctor Orellana C.
Fronteras porosas entre la educación pública y la privada en Uruguay ...... 30
María Ester Mancebo
Privatización de la educación: el caso argentino ........................................ 47
Susana Vior
La educación venezolana en el contexto de desarrollo
de las tensiones entre lo público y lo privado ............................................ 61
Samuel H. Carvajal Ruíz
Paulina E. Villasmil Socorro
Una aproximación a la reforma educacional del Estado
Plurinacional de Bolivia: descripción y análisis inicial
sobre la formación de docentes ................................................................. 79
Jaqueline Marcela Villafuerte Bittencourt
Marìa Luz Mardesich Pérez
Implicações da relação público-privada para a democratização
da educação ............................................................................................. 93
Vera Maria Vidal Peroni
Os desafios para a consolidação do estado social e
de direito brasileiro e as consequências para a gestão
democrática da educação ........................................................................ 105
Daniela de Oliveira Pires
Relações do movimento empresarial na política educacional
brasileira: a naturalização da associação público-privada ........................ 115
Liane Maria Bernardi
Lucia Hugo Uczak
Alexandre José Rossi
Influências neoconservadoras na educação pública:
sujeitos em relação ................................................................................. 125
Paula Valim de Lima
Parcerias entre o público e o privado na gestão da educação básica
pública brasileira: Arranjos de Desenvolvimento da Educação (ADEs) ... 132
Elma Júlia Gonçalves de Carvalho
O protagonismo do setor privado na reforma do Ensino Médio
no Brasil – o Instituto Unibanco e suas relações ...................................... 147
Maria Raquel Caetano
A relação público-privada: a promessa “salvacionista” do
Instituto Airton Senna (IAS) para a educação brasileira .......................... 159
Luciani Paz Comerlatto
O público e o privado na educação profissional brasileira:
o caso do Pronatec ................................................................................. 171
Romir de Oliveira Rodrigues
A educação infantil: coisas da infância no Brasil ..................................... 190
Maria Otilia Kroeff Susin
Monique Robain Montano
Sobre os autores e as autoras .................................................................. 201

6
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Prefácio

Este livro integra-se num trajeto já longo de pesquisas empíricas, in-


terlocuções e debates teóricos internacionais em torno de temas centrais para
a teoria social e para a compreensão da realidade e das políticas públicas em
educação: o papel do Estado, a coordenação da ação coletiva e os projetos
societais em confronto em múltiplas arenas de ação e luta política. A equipa
coordenada por Vera Peroni vem aprofundando e interpelando estas ques-
tões teóricas centrais através de diálogos de pesquisas empíricas; umas e ou-
tras assumem implicações políticas inequívocas: as relações entre público e
privado modelam a distribuição de recursos e a afirmação de valores, que
dinamizam a ação política dos sujeitos e os seus resultados, definindo signi-
ficados e práticas que constituem a educação. Nesse sentido, se a educação
pode contribuir decisivamente para a democratização das sociedades, a sua
coordenação para ativamente fomentar a produção de desigualdades sociais,
através de modalidades privadas, tem efeitos e consequências de inequívoco
alcance.
As análises aqui desenvolvidas documentam a tendência global de
privatização em educação e ilustram, para o continente sul-americano, reali-
zações diversas e específicas em contextos nacionais cujas histórias, institui-
ções, forças e movimentos sociais modelam relações distintas entre público e
privado, desde a enraizada hegemonia da mercantilização no Chile à emer-
gente e progressiva diluição de fronteiras num quadro de consolidada provi-
são pública no Uruguai. Neste sentido, os diversos contributos ao longo do
livro enriquecem o debate, suscitando a busca de explicações complexas e de
interações de fatores, para aparentes contradições e ambiguidades, que susten-
tam a problematização da governação, do Estado e da educação como rela-
ção, terreno de ação e luta políticas em que projetos societais se confrontam.
As realidades socio históricas estudadas elucidam trajetórias de privati-
zação da educação com duração e etapas diversas (p. e. Argentina, Venezuela
ou Bolívia), historicamente impulsionadas por políticas distintas que mobi-
lizam atores e estratégias plurais (Brasil ou Venezuela). Neste quadro, quer o
Estado, quer as agências internacionais intervêm, geralmente favorecendo
ativamente a criação de novos espaços de atuação para os operadores priva-

7
Prefácio

dos (Brasil ou Chile), mas também, sobretudo o primeiro, por omissão de


resposta à procura de educação da população e/ou de regulação da provisão
(Brasil). A pluralidade de atores, de políticas e estratégias, de domínios e
processos socio históricos de privatização que estas análises iluminam e elu-
cidam constituem um significativo contributo para a compreensão e acumu-
lação de conhecimento de inegável relevância científica, social e política tendo
em vista a reconhecida participação dos processos estudados na formação
dos sujeitos e das comunidades, bem como na sustentação de projetos socie-
tais democráticos.

Fátima Antunes
Centro de Investigação em Educação (CIEd)/Instituto de Educação
Universidade do Minho-Portugal

8
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Introdução

Este livro contém as palestras apresentadas no I Seminário Nacional


“Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a
democratização da educação”, financiado pelo PAEP/ CAPES, realizado em
dezembro de 2017 em Porto Alegre-RS. O seminário foi um espaço de interlo-
cução entre pesquisadores acerca do projeto de pesquisa intitulado “Redefini-
ções das fronteiras entre o público e o privado: Implicações para a democrati-
zação da educação na América Latina: Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Uru-
guai, Venezuela”, cujo objetivo é analisar as múltiplas formas de relação entre
o público e o privado na educação em países latino-americanos, a fim de en-
tender como esta relação interfere na produção das políticas públicas na Amé-
rica Latina e suas implicações para a democratização da educação.
O livro pretende ser mais um instrumento para avançar no entendimen-
to sobre como países com trajetórias distintas em termos de papel do Estado
na consecução do direito à educação, vivenciam esse período particular do
capitalismo e as consequentes mudanças na relação entre o público e o pri-
vado. É a continuidade de dois livros organizados pelo GPRPPE (Grupo de
Pesquisa Relação entre o Público e o Privado na Educação), Redefinições das
fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação,
publicado em 2013, e Diálogos sobre as redefinições no papel do Estado e nas fron-
teiras entre o público e o privado na educação, publicado em 2015.
Este livro se organiza em dois blocos temáticos – um sobre América
Latina e outro sobre o Brasil. No primeiro, os palestrantes da Argentina,
Bolívia, Uruguai, Venezuela, Chile e Brasil apresentaram o panorama polí-
tico-econômico-social dos seus países, bem como as questões educacionais
(organização da educação, políticas e investimentos) com foco na relação
entre o público e o privado considerando este período particular do capitalis-
mo.
No segundo bloco, os pesquisadores do Grupo de Pesquisa Relação
entre o Público e o Privado na Educação – GPRPPE/UFRGS (organizador
do evento) – apresentam as pesquisas do grupo referentes ao histórico da
relação público-privada no Brasil, os sujeitos individuais e coletivos que pro-

9
Introdução

tagonizam essa relação histórica e atual, e as diferentes parcerias firmadas


entre público e privado nas diferentes etapas e modalidades da educação
brasileira.
O livro pretende contribuir para interlocução teórica, a partir da qual
será possível avançar significativamente em nossas pesquisas acerca da rela-
ção entre o público e o privado na América Latina, ampliando o diálogo
inicialmente proposto entre o grupo brasileiro e os grupos latino-americanos,
para que outros pesquisadores possam participar desta importante discussão
em um momento histórico de avanço na privatização do público.

10
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

La persistente mercantilización educativa y el


agotamiento del progresismo en América Latina:
Lecciones del caso chileno

Víctor Orellana C.

Introducción
Durante los años 90’ el eje de la discusión social y política en América
Latina fue el giro neoliberal y las resistencias que éste suscitó. Las agendas tanto
de los gobiernos civiles post-dictatoriales como de los organismos internacionales
estuvieron marcadas por orientaciones neoliberales, entre ellas, por políticas de
privatización de empresas y servicios públicos. Un punto clave de esta discusión
fue la privatización educativa (BELLEI; ORELLANA, 2015; LEVIN;
BELFIELD, 2002; PATRINOS; BARRERA-OSORIO; GUÁQUETA, 2009).
Por las resistencias que diferentes fuerzas sociales y políticas de carácter
popular sostuvieron contra estos cambios, muchos fueron en efecto detenidos e
incluso revertidos. Estas fuerzas se proyectaron en los 2000’ hacia el Estado,
inaugurando una ola de gobiernos progresistas en América Latina que intentaron
desarrollar procesos de democratización social y política. Empero, dada la crisis
actual de dichos gobiernos, y el avance de la derecha, se ha retomado de cierta
forma la discusión de la década de los 90’. El neoliberalismo parece hoy, incluso,
más amenazante. Adquiere la forma de restricción a la democracia formal incluso,
como se ha discutido para el caso brasilero (AVRITZER, 2017).
En educación, la agenda neoliberal de privatización ha sido también objeto
de múltiples críticas académicas, más allá de la crítica de los actores. Éstos
argumentos se han centrado en sus efectos nocivos tanto en equidad – para el
que hay un robusto acopio de evidencia – como en calidad (BALL; BOWE;
GEWIRTZ, 1995; CARNOY; MCEWAN, 2003; DUARTE; BOS; MORENO,
2010; VAN ZANTEN, 2003). Sin duda las fuerzas de resistencia popular en
América Latina, y este tipo de trabajos académicos, han jugado un papel en el
hecho que los mismos organismos internacionales que ayer impulsaron la
privatización hoy la relativicen (BONAL; VERGER, 2012). No obstante, como
decíamos, la agenda neoliberal parece tomar nuevos bríos en estos momentos.
El presente artículo intenta aportar con un marco conceptual para
abordar la discusión actual sobre privatización educativa. En ese ejercicio, trata

11
ORELLANA C., V. • La persistente mercantilización educativa y el agotamiento del progresismo en
América Latina. Lecciones del caso chileno

de superar las aproximaciones técnicas, puesto que aunque ellas han hecho su
aporte en demostrar la falta de realismo de las promesas neoliberales en
educación, es decir, han demostrado que la mercantilización de la enseñanza
no trae ni más libertad, ni igualdad, ni eficiencia (calidad); no alcanzan a
comprender el proceso socio-político en que determinadas fuerzas que impulsan
dichas medidas y logran materializarlas. Por esto mismo, tales estudios no
pueden transformarse en un conocimiento práctico, que sirva a las fuerzas
democráticas que resisten los avances de la mercantilización sobre los derechos
sociales y los servicios públicos. Esta pugna, a fin de cuentas, alude a un
enfrentamiento de fuerzas sociales y políticas que sostienen diferentes modelos
de sociedad, y ha de ser entendida en un sentido político e histórico antes que
técnico. No basta refutar como irracional o inefectivo determinado modelo de
sociedad, puesto que ello no resuelve los términos de su avance o su retroceso,
sino que ha de ser entendido como resultado de procesos políticos e históricos.

La crisis de la educación pública como parte


de la crisis del desarrollismo
Como sugiere Peroni, la relación entre educación pública y privada alude
a relaciones de fuerza en las sociedades (PERONI, 2015). El poder que ejerza
la labor educativa y el modo en que lo haga informa de la manera específica en
que esa sociedad cultiva su vida social, y por ende, se cultiva a sí misma.
Ello debe ser comprendido en términos históricos. Durante la construcción
de las repúblicas latinoamericanas las oligarquías dominantes sentaron las bases
de estados modernos, impulsando entonces, por supuesto, un desarrollo
importante de la educación pública (AROCENA, SUTZ, 2000; KRAWCZYK,
VIEIRA, 2012; NÚÑEZ, 1997; PUIGGRÓS, 2003). No obstante, tal desarrollo
fue limitado a las élites y sus círculos cercanos, problema que se arrastró a la
etapa desarrollista en el siglo XX, en que fueron fuerzas nacional-populares las
encargadas de impulsar los procesos de modernización. Estas fuerzas
desarrollaron con aún más energía la educación pública, expandiéndola hasta
incorporar capas medias y obreras urbanas. No obstante, tampoco lograron un
desarrollo universal de las coberturas básica y media, y salvo excepciones, las
macro-universidades públicas latinoamericanas no lograron – ni logran hasta
hoy – llegar al nivel de desarrollo de sus pares del primer mundo1.

1
En otro trabajo se ha discutido en detalle esto para varios países de la región (BELLEI; ORE-
LLANA, 2015). En el caso de la educación superior, también se ha trabajado el retraso de
nuestra capacidad científica respecto del primer mundo (ORELLANA, 2014). Los trabajos de
Atcon en los 60’ vinculaban la incapacidad de saltar a una segunda fase de industrialización
con la ausencia de una universidad moderna de investigación (ATCON, 2009).

12
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Más allá de falencias técnicas o falta de voluntad política, lo que subyace


al difícil desarrollo de la educación pública en la región es la permanencia de
poderes sociales, culturales y económicos que han impedido, en los hechos, la
instalación de dispositivos modernos de cultivo de la vida social (KRAWCZYK;
VIEIRA, 2012). Ello ha significado incluso un desarrollo limitado del propio
mercado moderno, dado que la tenencia de la tierra y la vida hacendal (en el
“fundo” chileno o el “ingenio” brasilero, por mencionar dos ejemplos) se deriva
de una presión política antes que de situaciones de competencia, e instala un
patrón de acumulación rentista antes que de agregación de valor en la
producción. Las dificultades de la industrialización impulsada por el Estado
están también suficientemente documentadas, el paso nunca dado entre la
industrialización de primera fase hacia la segunda fase, que requería de la
capacidad de producir bienes de capital (MARINI, 1991). En general, se trata
del problema de la dualidad estructural largamente discutido en América Latina,
debate que luego alcanza su mayor grado de desarrollo en el pensamiento
dependentista (CARDOSO; FALETTO, 1981). Así se postula que nuestras
dificultades para alcanzar el desarrollo provienen de una relación dialéctica
entre el predominio local de poderes tradicionales y retardatarios con la
inserción de nuestros países en el capitalismo mundial.
Así, mientras en los años 60’ en Europa y los Estados Unidos se discutía
sobre la reproducción cultural que la educación moderna produce, en América
Latina tal debate resulta inconducente: tales sistemas de reproducción cultural
no se han edificado hasta ser dominantes. No es que no tengan un efecto
reproductivo, es que lo que se ha llamado reproducción social transcurre bajo
canales no necesariamente modernos, ni urbanos ni racionales. El mérito de
las élites no se presenta como logro académico, sino que se impone de facto.
Así, mientras la reflexión de Bourdieu se polariza contra una educación pública
y universal (BOURDIEU, 1998; BOURDIEU; PASSERON, 1996), la de Freire
se construye precisamente porque ésta no existe en Brasil (FREIRE, 1970).
La crisis del desarrollismo, entonces, supone también una crisis de la
estrategia de las fuerzas nacional-populares de construir una educación pública
universal y unas universidades modernas de investigación (PIRES, 2015). Tales
insuficiencias, contradicciones y problemáticas no son responsabilidad del giro
neoliberal: le preceden y en gran medida se proyectan como su condición de
posibilidad. Esto porque las fuerzas democratizantes de tal período, en definitiva,
no logran ser hegemónicas bajo el Estado de Compromiso (PINTO, 1971).
Es precisamente ante dichas limitantes que el discurso neoliberal va a
penetrar, sea en momentos autoritarios – como en Chile – o en los gobiernos
civiles post-dictatoriales. El neoliberalismo no se proyecta como un retorno a
la sociedad tradicional, sino como un camino alternativo a la modernidad

13
ORELLANA C., V. • La persistente mercantilización educativa y el agotamiento del progresismo en
América Latina. Lecciones del caso chileno

dado las contradicciones e insuficiencias del Estado de Compromiso. En efecto,


a nivel global, el neoliberalismo aparece como una modernización más efectiva
que la impulsada bajo el control del Estado en el Bienestar. Esto es
particularmente claro cuando Friedman argumenta la privatización educativa
(FRIEDMAN, 1955).
Así, es fundamental aclarar que el neoliberalismo no encuentra en el
continente una educación pública moderna definitiva o universalmente
desarrollada, sino que halla precisamente, como elemento más saliente, su
incapacidad de constituirse en tal.

Las reformas de modernización en los 90’


De tal modo, las dificultades de la educación pública son el telón de
fondo para el desarrollo de la educación privada en la región. Esto ha sido
muy debatido en torno a la cobertura de la enseñanza, en todos los niveles.
Los organismos internacionales han argumentado en este sentido la necesi-
dad de salir del monopolio estatal educativo, como planteara Friedman el de-
bate ya en los años 50’. Si la reforma agraria en los 60’ era argumentada técni-
camente como necesidad de aumentar la productividad de la tierra, en los 80’
y sobre todo en los 90’ se argumentará del mismo modo la necesidad de salir
del monopolio público de la enseñanza, y con ello, avanzar en su privatización
(CHUBB; MOE, 1990; PATRINOS et al., 2009). En efecto, la ampliación de
la matrícula privada ha sido el vector más dinámico de expansión educativa en
la región desde entonces (BELLEI; ORELLANA, 2015).
No obstante, las reformas educativas del giro neoliberal no se agotan en
una promoción de la educación privada. Implican, principalmente, una
transformación del Estado, y por ende, de la misma educación pública. Son
dos los ejes fundamentales de reforma: la descentralización y la calidad
(MARTINIC; PARDO, 2000). La preocupación por la calidad es tan relevante
que Rama llama a la “tercera” reforma universitaria, la de los 90’, la reforma de
la calidad (RAMA, 2005).
Se trata de dos ejes que se presentan como técnicos – descentralización
y mejora/aseguramiento de la calidad2 –, y que se vinculan con la necesidad
de optimizar los procesos administrativos del Estado, bajo la égida del new
public management. También despuntan acá discursos democratizantes que
postulan la descentralización como una entrega de mayor determinación a

2
Acá vinculadas sintéticamente, las tradiciones de la mejora de calidad y del aseguramiento de
la misma son diferentes y provienen de fuentes históricas distintas. Un examen en detalle del
problema de la calidad de la educación de nivel superior se ha desarrollado en otro trabajo
(ORELLANA, 2015).

14
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

gobiernos locales y comunidades. Estas proclamas acompañan procesos de


traspaso de instituciones educativas de gobiernos centrales a entidades más
particulares, sean provincias, gobernaciones o municipios.
El debate de los 90’ en adelante se estructura ante la superposición de
dos fenómenos: expansión de la cobertura privada y transformaciones en el Es-
tado – educación pública incluida –. Así, mientras la privatización se ralentiza o
es superada en algunos casos – como ocurre en Venezuela o Bolivia-, y en gene-
ral nunca llega al grado de ser hegemónica sobre la educación pública en matrí-
cula – salvo en Chile –; las transformaciones en el Estado no sólo continúan
sino que se profundizan en las administraciones de los gobiernos progresistas.
Estos cambios involucran las llamadas medidas descentralizadoras, la instalaci-
ón de agencias de aseguramiento de la calidad en todos los niveles, la expropia-
ción a las universidades de competencias normativas y de administración de
los fondos destinados a investigación de las macro-universidades públicas y su
emplazamiento en agencias especiales, y en algunos casos, el cambio en el
financiamiento de traspasos directos a subsidios a la demanda y el estableci-
miento de aranceles en las universidades públicas3.
Qué tanto estas medidas son inocuas o técnicas, o bien cuánto comportan
elementos privatizantes, ha sido precisamente el debate desde entonces. Mientras
una variante del progresismo ha planteado que ellas representan la modernización
de una postura de izquierda al respecto, y suponen un control estatal sobre los
mercados (BRUNNER, 2008), otros han elaborado conceptos como el de
privatización encubierta para aludir a estas medidas (BALL; YOUDELL, 2007).

Las dificultades de la dicotomía público-privado y Estado-mercado


Como decíamos, mientras la expansión de la educación privada se esta-
biliza sin que amenace con superar a la pública en la mayoría de los países –
salvo excepciones –, lo cierto es que las dificultades de desarrollo de la educaci-
ón pública permanecen. En su seno, las reformas del new public management
han concentrado el debate porque, en lo sustancial, constituyen las únicas res-
puestas elaboradas de manera sistemática a esta crisis o parálisis, que se arras-
tra, como hemos visto, desde la crisis del desarrollismo.
El problema del debate entre tales medidas y sus críticos de izquierda,
es que resulta una discusión enormemente normativa. Esto porque los modelos
clásicos de Estado y educación que se instalaron en la etapa de la construcción
nacional o en el desarrollismo, resultan naturalizados y sacramentados.
Irónicamente, se olvida que esa misma educación pública moderna, incluso en

3
En otro trabajo hay un compendio sistemático de estas medidas (ORELLANA, 2014).

15
ORELLANA C., V. • La persistente mercantilización educativa y el agotamiento del progresismo en
América Latina. Lecciones del caso chileno

una de sus versiones más desarrollada y meritocrática como la francesa, fue


objeto de críticas fulminantes (BOURDIEU; PASSERON, 2009). Así, predomina
más bien una crítica moral a la privatización y a estas medidas, o bien, un análisis
técnico de sus resultados en indicadores medibles, los mismos que tal discusión
instala como barómetro. El debate se canaliza de dos modos entonces: a) en
una crítica general de la educación sometida a las medidas del new public
management que hace uso de conceptos residuales, negativos o patológicos para
concebirla, como ocurre con la crítica a la Universidad mutante (VERGER,
2008) o esquizofrénica (SHORE, 2010), a las evaluaciones docentes que resultan
terroríficas (BALL, 2003), a las nuevas políticas que producen des-aprendizaje
(DALE, 2005), etc.; o b) en una discusión enormemente tecnificada, en que se
intenta demostrar por la vía de complejos análisis estadísticos de resultados en
pruebas estandarizadas, si estas medidas son o no eficaces en igualdad y calidad
(BELLEI, 2009; DUARTE et al., 2010).
Estructurado el debate de este modo, los neoliberales responden de manera
sencilla: si la discusión se torna del tipo a), reclaman que los críticos son en
realidad conservadores que resisten no la privatización sino la modernidad en
general (BRUNNER, 2008; PATRINOS et al., 2009), y cuando se presenta del
tipo b), sugieren fortalecer las competencias del new public management
precisamente para obligar al mercado, y en general a las instituciones, a hacerlo
mejor. De ahí su obsesión con el liderazgo, como forma de construir e insertar
determinadas prácticas en la educación actual.
Si se quiere comprender la transformación reciente de la educación en
América Latina, el debate debe ser planteado de otro modo. No en un sentido
moral ni residual, puesto que la educación de mercado tanto como la pública
han de analizarse como proceso real antes que ideal o normativo; ni tampoco
en un sentido puramente técnico, pues los modos en que los indicadores son
construidos y el presupuesto epistemológico que subyace a ellos establece, desde
ya, los límites de esa discusión. Por supuesto, no se trata de despreciar la
estadística, sino de criticar la idea que la educación es, en lo fundamental, una
producción técnica de resultados objetivos medibles como competencias. La
educación es, ante todo, un fenómeno social y político.
Una manera de romper esta estructura de la discusión es criticar sus
conceptos madre o sus constantes. Hay dos polaridades que parecen ser
subyacentes a este dilema: lo público como opuesto a lo privado, y el Estado
como lo opuesto al mercado. Así, lo público se identifica con lo estatal, y lo
privado con el mercado. La primacía de estas antinomias está a la base de la
idea de privatización encubierta de Ball, donde la esfera pública adquiere, de
manera sustancial antes que formal, prácticas de la privada. Y estas oposiciones
están también a la base de la discusión más técnica, puesto que sirven de

16
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

clasificación de las instituciones como unidades de información – escuelas o


universidades – tomando el lugar de variables independientes.
El problema con este modo de plantear el debate es que ni lógica ni
históricamente la oposición de lo público con lo privado se corresponde con la
diferencia entre Estado y mercado. Además, hay diversas tradiciones
intelectuales que asocian lo público al Estado o bien al mercado: es, al final del
día, lo que opone a las grandes culturas liberales lideradas por Hobbes y Locke,
respectivamente. Así, en la discusión se puede defender lo público como
resultado del operar del mercado, o bien lo público como efecto de las políticas
estatales. Para la tradición arendtiana, por ejemplo, el Estado totalitario
representa el gran peligro de disolución de la esfera pública (ARENDT, 1974).
Para Friedman, en una posición distinta, el mercado es necesario en educación
precisamente en favor del interés público (FRIEDMAN, 1982).
Pero no se trata sólo de dificultades conceptuales. Son dificultades
concretas. En Chile, por ejemplo, la reforma educativa reciente (durante el
gobierno de Michelle Bachelet entre 2014 y 2018) expandió tanto el Estado
como la educación privada. El financiamiento estatal creció sustancialmente,
así como las regulaciones estatales se intensificaron. No obstante, la educación
privada continúa siendo hegemónica. Así, como sugiere Ruiz, no siempre más
Estado es menos mercado (RUIZ ENCINA, 2015). En el caso brasilero, el
Estado financia al mismo tiempo la expansión de la educación superior pública
y de la privada (BARREYRO, 2010; CHIROLEU, 2006), y emplea, cada vez
más, acuerdos o concesiones con entidades privadas en la formulación de sus
políticas (BERNARDI; UCZAK; ROSSI, 2015).

La oposición entre mercantilización y politización


de las relaciones sociales
Partir de la polaridad público-privado y sostenerla hasta la dicotomía
Estado-mercado, se constituye, en realidad, en lo que Bachelard llama un
obstáculo epistemológico (BACHELARD, 1987). Es un punto de fuga, un punto
de vista, que en su inicio ya nos limita el curso del debate, las posibilidades de
la observación.
No es que la polaridad público-privado sea inútil. Es que debe ser entendida
históricamente. El problema hoy no es la tensión entre una educación
comunitaria, católica o culturalmente diferenciada de la educación pública por
su carácter confesional, como se discutió en el siglo XIX4. Esta dicotomía entonces
expresaba la oposición entre sociedad moderna y comunidad tradicional. En

4
Para el caso chileno, un buen compendio de ese debate en el trabajo de Ruiz Schneider (RUIZ
SCHNEIDER, 2010).

17
ORELLANA C., V. • La persistente mercantilización educativa y el agotamiento del progresismo en
América Latina. Lecciones del caso chileno

realidad, el problema ahora es la relación de modos no capitalistas de actividad,


cualesquiera que sean – incluidos aquí el trabajo educativo y la política –, y
modos de actividad capitalistas.
Si partimos entonces por la dicotomía entre valor abstracto y política,
las cuestiones aparecen de un modo mucho más claro. Si se concibe el valor
como Marx lo hizo, es decir, como una mediación social entre el carácter
concreto de las prácticas y su expresión como partes de la totalidad social5, es
tal forma de poder alienado la que se opone a la política, como mediación
consciente entre actividades concretas y la totalidad social. Dicho sucintamente,
el dilema bajo el modelo neoliberal es si las actividades humanas pueden ser
completamente organizadas de acuerdo al valor – su producción organizada
como trabajo productivo que genera ganancia y su distribución como mercado,
la mayoría de las veces – o bien de acuerdo a consensos políticamente generados,
sedimentados en la cultura, y dialógicamente construidos6. Es decir, si las
prácticas humanas han de ser mercantiles o democráticas. Si han de organizarse
bajo el rodeo de la alienación capitalista, o pueden ser conscientemente
edificadas.
Tanto para el mundo gobernado por el valor abstracto como para el
gobernado por la política, se corresponden ciertas formas de esfera pública,
ciertas formas de Estado, y ciertas formas de entender los procesos técnicos.
Cuando gobierna la política, la esfera pública es deliberativa, está animada
por sujetos que se presentan como tales ante la totalidad social, como sujetos
discrecionales. Cuando gobierna el valor, la esfera pública es el mercado, los
objetos y los sujetos se presentan como cantidades de valor comparables unas
con otras, de ahí el espacio “público” que tal comparabilidad supone. En el
caso de la política como eje axial de las sociedades, el Estado se entiende como
productor de consenso antes que de violencia o aparato, es decir, predominan
sus instituciones electas y porosas a la sociedad7. Cuando gobierna el valor, el
Estado es fundamentalmente un aparato técnico que vigila y posibilita el operar
del mercado, y predominan sus instancias no electas, como tecnocracia o

5
Una buena y contemporánea reflexión sobre el problema del valor en esta perspectiva está en el
trabajo de Postone (POSTONE, 1978, 2006). También destacan los trabajos del economista
Anwar Shaikh (SHAIKH, 1977, 1990).
6
La polaridad propuesta encuentra cierto eco en la dicotomía habermasiana sistema-mundo de la
vida (HABERMAS, 1999).
7
Por supuesto, en su base, el Estado siempre es violencia. Pero cuando se expande la politicidad
de una sociedad, el Estado es también sensible a este proceso, e incorpora sujetos sociales con
mayor amplitud, fortaleciéndose su institucionalidad electa y sus vasos comunicantes con la
sociedad. La complejidad del Estado como suma de violencia y consenso ha sido largamente
estudiada (ENGELS, 2000; GRAMSCI, 1980). Para América Latina, ver el trabajo de Faletto
La especificidad del Estado en América Latina (FALETTO, 1989).

18
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

judicatura (AVRITZER, 2017). El estado, en este segundo caso, no lleva la


delantera en la producción de las relaciones sociales, sino que cede este papel
a los individuos, adquiriendo un carácter subsidiario (TORO, 2015).
Finalmente, los procesos técnicos cuando gobierna el valor son comprendidos
en virtud de sus necesidades: la transformación del trabajo vivo – de las
actividades – en cantidades de valor, y la comparación de dichos valores como
precios. He aquí, por ejemplo, un tremendo esfuerzo del pensamiento neoliberal
por cuantificar los procesos educativos (FARDELLA, 2016; FARDELLA;
SISTO, 2015). Cuando gobierna la política, al contrario, los procesos técnicos
tienden a considerarse los propios de todo antagonismo. La técnica no del
saber distributivo-estadístico, sino de la real-politik, de la reducción de la técnica
de la política a la técnica de la guerra.
Si el neoliberalismo consiste en la expansión de las relaciones sociales
capitalistas a lo que la discusión francesa alude como reproducción social, entonces
podemos decir que el neoliberalismo consiste en la mercantilización total de
la vida. Se trata de un modelo de sociedad que avanza sobre aspectos de la
misma que antes eran gobernados por la política o por otro tipo de poderes no-
capitalistas (por la familia, por ejemplo). En este campo cae la educación: si
como actividad social ella deviene parte de la valorización y circulación de
capital, o bien deviene parte del mundo de la vida, de la política como esfera de
deliberación entre sujetos.
El avance del proyecto de sociedad mercantil, sus ritmos y sus modos,
depende entonces de condiciones históricas: puede partir de las prácticas
mismas – desde la escuela – o desde el mercado, como puede partir desde el
Estado, siendo impuesto. A veces se desarrolla un mercado educativo o de
credenciales, pero las instituciones no se organizan en su interior de acuerdo
al valor. Mercadización no es lo mismo que mercantilización8. A veces sucede
lo contrario: se organizan de acuerdo al valor en su interior, pero la distribución
es estatalmente articulada. Así, el valor se instala en diversas esferas o ámbitos
sociales, en procesos que no son lineales ni continuos, pues se dan en medio
de tensiones con otras fuerzas sociales que impulsan, a su vez, su politización,
como base para la democratización de dichos procesos.
Como bien indica Postone, es el valor como mediación social la
característica más saliente del capitalismo, por encima incluso del mercado
como distribuidor o de la propiedad privada burguesa (POSTONE, 1978). Es
posible capitalismo – el siglo XX nos lo ha enseñado de sobra – tanto sobre la
base de la propiedad estatal como de la tecnocracia. Un sistema educativo
puede ser incorporado a la esfera del valor tal como las empresas públicas que

8
Así podemos procesar el gran debate sobre los cuasi-mercados.

19
ORELLANA C., V. • La persistente mercantilización educativa y el agotamiento del progresismo en
América Latina. Lecciones del caso chileno

explotan recursos naturales ya lo están, sin que cambie su carácter estatal. De


otro lado, un sistema privado puede ser incorporado al valor desde sus raíces
social-cristianas, sin que cambie tampoco su carácter privado. A veces, como
ocurre en Chile, el avance de la mercantilización es tal que desnaturaliza no
sólo a la educación pública, sino a cualquier proyecto educativo que quiera
escapar del imperativo de producir beneficios económicos como objetivo central
(ORELLANA; GUAJARDO, 2014). No es lo mismo tener una escuela para
impulsar el catolicismo – se esté o no de acuerdo con la doxa – que tenerla
para producir beneficios (sean estos lucro a retirar o simplemente excedentes).
Es que a cada uno de estos objetivos subyacen diferentes formas de racionalidad,
a decir de Weber, racionalidad de acuerdo a valores en el primer caso, y de
acuerdo a fines en el segundo. Es, literalmente, un mundo de diferencia.
Incluso es posible organizar la educación bajo la esfera del valor sin que
este se agregue en la “producción”, sino que sea capturado como renta. En
América Latina ha sido esta, lamentablemente, la forma que ha predominado
de mercantilización9. De ahí el inconducente debate sobre la calidad, que es la
forma en que el paradigma neoliberal entiende al valor en la educación. Acepta
su centralidad en ella – lo más importante de la educación es su calidad, nos
dicen – pero se pregunta, sin poder responderse satisfactoriamente, por qué la
calidad – el valor – es tan baja y cómo puede ser aumentado (ORELLANA,
2015). De este modo hay expansión del valor como mediación social incluso a
costa del mercado moderno, que se desarrolla de manera limitada, dado el
carácter oligopólico de la propiedad. El caso chileno resulta paradigmático en
tal sentido, puesto que el mercado sólo se instala como distribuidor social
relevante en el capital medio, es decir, en la educación escolar. Cuando el gran
capital se posiciona sobre la educación superior, rehúye de condiciones de
competencia, y más bien apuesta a capturar subsidios públicos (ORELLANA;
GUAJARDO, 2014). Que el gran capital educativo, en el país de mayor
penetración neoliberal, demande vivir del Estado, por supuesto que más
aumenta la confusión sobre estos asuntos.

Las etapas de asedio y asalto en la mercantilización educativa


Si la oposición es entonces entre mercantilización y democratización de
la educación, la relación entre uno y otro ha de entenderse como expresivo de
la relación de fuerzas que traban los sujetos históricos. Hecho el recorrido de
los acápites precedentes, podemos entonces retomar el problema de la crisis

9
En otro trabajo se discute sucintamente el rentismo educativo chileno como extensión, para los
servicios, del viejo patrón rentista de la tierra de la oligarquía (ORELLANA, 2017).

20
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

del desarrollismo y el giro neoliberal bajo los parámetros propuestos. Vale la


pena echar mano a la distinción que hace Gramsci entre guerra de movimientos
y guerra de trincheras, diferenciando entre etapas de asalto y asedio en la lucha
política. Cuando predominan los movimientos, la situación es caótica y las
posibilidades de viraje son altas: los sujetos se pueden plantear el asalto total
del poder. Cuando predominan las trincheras, los sujetos estabilizan una
relación de fuerza y tienden a asediar al contrincante, impidiendo su suministro,
dificultando su relación con la retaguardia, etc., pero renunciando a ataques
frontales.
La crisis del desarrollismo debe ser comprendida entonces como una
democratización social y política incompleta, producto de una suerte de em-
pate no resuelto entre los bloques nacional-popular y oligárquico. El predomi-
nio de los poderes oligárquicos entonces, y de las élites económicas en el neo-
liberalismo hoy, tiene un factor común: detener tales procesos de democratiza-
ción en la medida que dificultan el avance de la mercantilización10.
La estrategia neoliberal en los 90’ puede considerarse de ataque frontal
o asalto. De ahí la frase privatización salvaje. El problema para los neoliberales
es que aquella estrategia se erigió en un contexto de democracia formal en la
mayoría de los países. Los organismos internacionales presionaron a tal grado
a los estados que éstos se polarizaron enormemente con las fuerzas sociales y
políticas sobrevivientes de la etapa desarrollista, y éstas, por dicho contexto
democrático en lo formal, pudieron movilizarse.
Los sujetos populares y las capas medias, que entre sí guardaban enormes
diferencias sociales y políticas – como ocurría con el movimiento de piqueteros
y los cacerolazos en Argentina, por ejemplo – se articularon ante la radicalidad
del programa neoliberal. La pugna entre los Estados y los organismos internaci-
onales y estas fuerzas abrió una situación de guerra de movimientos, a decir de Gra-
msci. De ahí que se produjeran crisis políticas, no sólo situaciones de moviliza-
ción social. Estas fuerzas populares luego se proyectaron al Estado, como ocur-
rió en la misma Argentina con el ascenso del peronismo de signo Kirchnerista,
antes en Venezuela con Chávez, en Brasil con el PT de Lula, en Bolivia con Evo,
etc. La política entró en una guerra de trincheras. No obstante, en su paso por el
Estado las tensiones de estas complejas alianzas nacional-populares no desapa-
recieron, y sobre su base, los neoliberales cambiaron de táctica.
En efecto, la táctica neoliberal fue abandonar el choque frontal, y con-
centrarse en el asedio a estas complejas alianzas. El neoliberalismo ya no iba a

10
Se puede caracterizar de este modo a las dictaduras como dispositivos de contención de la
política. Esto tiene ecos de la idea de O’Donnel al respecto (GARCÍA LINERA; LACLAU;
O’DONNEL, 2010).

21
ORELLANA C., V. • La persistente mercantilización educativa y el agotamiento del progresismo en
América Latina. Lecciones del caso chileno

ingresar por la derecha formal, sino a través de los intersticios y contradiccio-


nes de las alianzas nacional-populares. Este asedio consistió en una presión a
sus cúpulas a pactar acuerdos transversales que adecuaban la forma Estado a
la mercantilización, sobre el supuesto de la modernización y expansión de los
servicios públicos. Esto fue agudizando la contradicción entre una élite de
tales procesos, más proclive a los acuerdos, de las fuerzas sociales en que éstos
se asentaban. Como bien indica Peroni, ello derivó incluso en una elaboración
intelectual más robusta, que combinaba elementos desarrollistas y neolibera-
les el liberal-desarrollismo o neo-desarrollismo (PERONI, 2015). Ruiz ha ela-
borado el concepto de progresismo neoliberal para aludir a este fenómeno como
proyecto político (RUIZ ENCINA, 2015).
No es que el programa del new public management sea “privatización
encubierta”. Es que transforma el Estado de un espacio político a uno anti-
político, es decir, tecnocrático. Ello puede ocurrir con o sin la participación de
privados, y no tiene un contenido oculto, sino más bien explícito en tal sentido.
Las cúpulas tecnocráticas de los nuevos gobiernos progresistas fueron,
lentamente, aplicando tales recetas en la medida que ellas aparecían como la
única modernización posible. En la estrategia de asedio, los poderes neoliberales
se constituyeron en fundaciones o entidades supuestamente caritativas o
filantrópicas, y no en partidos políticos formales de derecha. Esto fue un acierto.
Comenzaron lentamente a ocupar espacios en desmedro, por ejemplo, de los
docentes organizados o del movimiento estudiantil, y en algunos casos, incluso
llegaron a copar partes completas de los estados. Desde estas reformas, por
ejemplo, la educación comenzaba a comprenderse más como capital humano
que como relación política o democrática, y su valor era entendido justamente
como valor alienado – calidad – antes que como fuerza moral o edificante de
una determinada consciencia.
Así, mientras en el caso chileno tiene éxito el ataque frontal neoliberal,
y se edifican sus bases ya tempranamente en los 80’, en el resto de América
Latina – con la excepción de Perú y Colombia, en que también se avanza con
mayor celeridad – es este asedio el que se impone. Su resultado es un lento
desplazamiento del centro de gravedad de la política, desde la calle y las fuerzas
sociales que originaron el rechazo al neoliberalismo, a las cúpulas tecnocráticas
y la judicatura (AVRITZER, 2017). Es un movimiento de restricción de la
política, que impone al Estado un carácter tecnocrático y como tal, procesa
los conflictos con prescindencia de los sujetos sociales organizados. Éstos, a
su vez, son concebidos como base de apoyo clientelar, y se les receta planes
sociales o ayudas económicas en lugar de ser integrados como actores con
determinados proyectos de sociedad.

22
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Bajo tal esquema, la crítica del neoliberalismo de tipo moral como la


crítica técnica resultan ambas inocuas. La primera es desechada por la
tecnocracia, puesto que representa un malestar melancólico que añora una
vuelta al pasado. Lamentablemente, esto muchas veces es cierto. De tal modo,
el proceso de acumulación de fuerzas del asedio neoliberal en las cúpulas
tecnocráticas resulta, hasta cierto punto, atizado por estas críticas, en cuanto
afirman moralmente a los defensores del new public management como únicos
apóstoles de la modernidad. De ahí por ejemplo su obsesión con la tecnología
(BERNARDI et al., 2015; BID, 2010). Evidentemente, es falso que sus recetas
sean modernas en un sentido profundo: son abiertamente despolitizantes y
reducen la técnica, como ya se dijo arriba, al dilema de la cuantificación para
el valor. No obstante, también es cierto que la vieja universidad y la vieja escuela
pública están en crisis. Negar este hecho es el punto de partida de la crítica
moral, y por eso su vacío político, su incapacidad de al menos entorpecer el
proceso de acumulación de fuerzas del asedio neoliberal.
De otro lado, la crítica técnica, en la medida que está epistemológicamente
formulada bajo los mismos parámetros que sus contrincantes generaron, también
contribuye a la acumulación de fuerzas del asedio neoliberal incluso aunque no
lo desee. Esto porque, de comprobar – como de hecho ha ocurrido – que la
educación privada no lo hace mejor que la pública (DUARTE et al., 2010), que
las medidas de rendición de cuentas no producen mejora educativa ni de la
capacidad científica (DIDOU, 2007; VALENZUELA; ALLENDE, 2014), o
que la elección libre de escuela aumenta la segregación social (BALL et al.,
1995; BUTLER; VAN ZANTEN, 2007), terminan apuntalando el
fortalecimiento de las regulaciones estatales de tipo técnico o seudo-judiciales,
que presionan a las instituciones precisamente para que produzcan aquellos
beneficios que no generan por sí mismas. Si el problema es un déficit de calidad,
entonces el Estado ha de incrementar sus presiones. Lo mismo si hay un déficit
de integración social: el Estado ha de forzar una mayor mezcla. En definitiva,
se aumenta la capacidad punitiva del Estado en lugar de expandir la politización
de las relaciones sociales, como base para su democratización. En el caso
chileno, el poder punitivo del Estado es particularmente alto, y el grado en que
regula la tarea educativa es muy extenso11.
Mientras los neoliberales originalmente desarrollaron su incursión en
educación desde el punto de vista de la libertad de las familias y de la eficiencia
técnica (calidad) (CHUBB; MOE, 1990; FRIEDMAN, 1955), combinando
ambas cuestiones; ha sido el progresismo neoliberal el que ha intentado resolver

11
En otro trabajo se ha analizado esto en detalle (ORELLANA, 2015).

23
ORELLANA C., V. • La persistente mercantilización educativa y el agotamiento del progresismo en
América Latina. Lecciones del caso chileno

los términos de la mercantilización con la igualdad. Para ello presiona por una
mayor equidad técnicamente medida, del mismo modo que aboga por un mayor
subsidio público a la educación, independiente si es privada o pública. No es
casualidad que la agenda de los organismos internacionales en las últimas décadas
sea equidad y calidad. La idea de la educación como distribuidor de oportunidades
sociales, reducida finalmente a la configuración de la fuerza productiva de los
sujetos – a su capital humano, como dice el régimen – antes que a su preparación
como ciudadanos o personas, es así naturalizada y aceptada, y el papel del Estado
queda como simple garante de que tal agregación de valor ocurra, perdiendo su
sentido originalmente político (VIOR; RODRÍGUEZ, 2012).
Cuando entran en crisis hoy los gobiernos progresistas, entre otras
razones por el propio debilitamiento de las fuerzas sociales en que se asentaban,
los neoliberales evalúan la posibilidad de pasar del asedio al asalto. Poco
importa, en tal movimiento las críticas morales o técnicas a la privatización: lo
fundamental es comprender las bases del proceso de acumulación de fuerzas
de los sujetos que impulsan la mercantilización de la vida, de tal modo de
ofrecer una resistencia efectiva a ese proceso.

El desafío de las fuerzas democráticas del continente


El primer desafío de las fuerzas democráticas es aceptar que la crisis de la
educación pública no está resuelta. La universalización de las coberturas de
enseñanza básica y media aún no es total en la región, y nuestras universidades
participan escasamente en la elaboración científica mundial. Por ejemplo, en el
caso uruguayo, aun siendo claramente hegemónica la enseñanza pública en todos
los niveles, la dificultad de enraizamiento del Liceo alude a un proceso histórico
complejo, que aún marca antiguos mecanismos de diferenciación y exclusión
social (TEDESCO; TENTI FANFANI, 2004). El problema, entonces, no es
sólo oponerse a las medidas del new public management por sus bases filosóficas
o sus efectos, sino enfrentar sus causas.
Ello supone vincular un horizonte de modernidad con la educación
pública, superando sus taras y contradicciones históricas (AROCENA; SUTZ,
2000). La educación pública como futuro antes que como pasado, para la
construcción de un proyecto de sociedad capaz de convocar a amplias capas
de la población, no sólo a las bases docentes o a la izquierda política. Un
proyecto que pueda dificultar la acumulación de fuerzas neoliberal en el plano
intelectual también, sin reducirse a una queja melancólica contra el capitalismo
académico.
Este proyecto no puede ser puramente educativo, como resulta evidente.
De modo más general, los gobiernos progresistas se concentraron en la

24
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

redistribución de la renta, antes que en la construcción de nuevas relaciones


sociales o incluso de un capitalismo más desarrollado. La industrialización no
recuperó vuelo y la sociedad del conocimiento fue más bien un discurso que un
horizonte real. Es dicho déficit el que debe ser enfrentado, lo que alude más a
un proceso de creación y de imaginación social y política que de oposición a
una fórmula dada, sea neoliberal o de otro tipo.
Lo que subyace a esta discusión es el sentido de la educación como
expansión de la democracia, de la auto-determinación de nuestras sociedades,
como ejercicio de su libertad real. Las preguntas de Freire apuntaban en tal
dirección (FREIRE, 1970), y la crítica de los 60’ a las limitaciones del Estado
de Compromiso y del desarrollismo deben ser revisitadas, pero con ojos del
presente. El campesino analfabeto que motivara la reflexión de Freire hoy se
nos presenta de otro modo, como un sujeto cada vez más integrado al mercado,
cada vez más individualizado y mercantilizado, pero igualmente desprovisto
de autonomía, de capacidad de auto-producirse. Nuestro problema reside en
los escollos al desarrollo de la educación pública antes que en la ofensiva
neoliberal, porque depende de la expansión de la política como desafío antes
que en el rechazo del valor. La mejor defensa de la privatización actual en
curso, es la apertura de la educación pública a la sociedad, su desarrollo,
expansión y re-imaginación.
En América Latina la consigna ha de ser, entonces, la defensa de la
democracia contra el neoliberalismo. Pero ello no supone sólo la democracia
formal, o el Estado de derecho, sino la democracia como capacidad de auto-
determinación social. Democracia sin educación pública es virtualmente un
imposible. La defensa de la educación pública es su reformulación y
refundación, superar su burocratismo, su centralismo inútil, los ecos medievales
de una oligarquía académica estancada y justamente motejada por
“improductiva” por los tecnócratas, su glorificación del pasado y la mistificación
de sus jerarquías estamentales. Hay que superar la captura de la educación por
intereses corporativistas, y desarrollar de este modo una mayor determinación
de las personas sobre la misma. Hay que imaginar una educación pública de
futuro, que barra entonces con tales aspectos del pasado, como base para una
resistencia a la actual ofensiva neoliberal. Lo que se opone al valor en su papel
de mediación social, como hemos dicho, no es el “valor de uso”, que en este
caso sería una consideración particularista de la educación como valor en sí
mismo, sino la política, es decir, su relación consciente entre parte y sociedad.
Por eso es que la educación no puede ser de los profesores, académicos o de
los estudiantes, sino que ha de pertenecerle a la sociedad completa. Esto implica
imaginar no sólo su democracia interna, sino su relación porosa con las fuerzas
generales de la sociedad.

25
ORELLANA C., V. • La persistente mercantilización educativa y el agotamiento del progresismo en
América Latina. Lecciones del caso chileno

Nuestra batalla hoy, a fin de cuentas, es plantear una resistencia


constructiva, que vaya desconociendo al valor como mediación social y
transformando las relaciones educativas en unas más democráticas, y por eso,
más politizadas. Esto en todas las escalas: en el Estado, en la calle, en las
escuelas, en las universidades. Hay que demostrar que la educación pública
está más en el futuro que en el pasado, y con ello, derrotar a los neoliberales no
sólo con gente en las calles, sino también en un sentido social, político e
intelectual.

Referencias
ARENDT, H. (1974). Los orígenes del totalitarismo. Madrid: Taurus.
AROCENA, R.; SUTZ, J. (2000). La Universidad Latinoamericana del Futuro. México:
UDUAL.
ATCON, R. P. (2009). La universidad latinoamericana. Clave para un enfoque conjunto
del desarrollo social, económico y educativo en América Latina. Bogotá.
AVRITZER, L. (2017). The Two Faces of Institutional Innovation: Promises and Limits of
Democratic Participation in Latin America. Cheltenham, UK: Edward Elgar Publishing.
BACHELARD, G. (1987). La formación del espíritu científico. México: Siglo XXI.
BALL, S. J. (2003). The teacher’s soul and the terrors of performativity. Journal of
Education Policy, 18(2), 215–229. http://doi.org/10.1080/0268093022000043065
BALL, S. J.; BOWE, R.; GEWIRTZ, S. (1995). Markets, choice and equity in education.
Buckingham: Open University Press.
BALL, S. J.; YOUDELL, D. (2007). Hidden privatisation in public education. London.
BARREYRO, G. B. (2010). La educación superior en el primer gobierno de Lula da
Silva en Brasil: políticas, actores y grupos participantes. Revista de La Educación Superior,
34 (Enero-Marzo 2010), p. 105-116.
BELLEI, C. (2009). The public-private school controversy in Chile. In: CHAKRABARTI,
R.; PETERSON, P. E. (Eds.), School Choice Internacional. Exploring public-private
partnerships (p. 165-192). London: MIT Press.
BELLEI, C.; ORELLANA, V. (2015). Privatización de la educación en América Latina.
In: BELLEI, C. (Ed.), El gran experimento. Mercado y privatización de la educación
chilena (p. 109-128). Santiago: LOM.
BERNARDI, L. M.; UCZAK, L. H.; ROSSI, A. J. (2015). As relaçoes do Estado com
empresários nas políticas educacionais: PDE/PAR e guia de tecnologías educacionais.
In: PERONI, V. M. V. (Ed.). Diálogos sobre as redefiniçiões no papel do Estado e nas fronteiras
entre o público e o privado na educaçáo (p. 52-71). São Leopoldo: Oikos.
BID. (2010). Ciencia, Tecnología e Innovación en América Latina y el Caribe. Un compendio
estadístico de indicadores. Washington, D.C.
BONAL, X.; VERGER, A. (2012). The World Bank Education Strategy 2020/: Continuity,
rupture and omissions.

26
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

BOURDIEU, P. (1998). The State Nobility. Stanford: Stanford University Press.


BOURDIEU, P.; PASSERON, J.-C. (1996). La reproducción. Elementos para una teoría
del sistema de enseñanza. México: Fontamara.
BOURDIEU, P.; PASSERON, J.-C. (2009). Los herederos. Los estudiantes y la cultura.
2. ed. Buenos Aires: Siglo XXI.
BRUNNER, J. J. (2008). Educación superior en Chile. Instituciones, mercados y políticas
gubernamentales. Santiago: UDP.
BUTLER, T.; VAN ZANTEN, A. (2007). School choice: an European perspective.
Journal of Education Policy, 22(1), 1-5. <http://doi.org/10.1080/02680930601065692>.
CARDOSO, F. H.; FALETTO, E. (1981). Dependencia y desarrollo en América Latina:
ensayo de interpretación sociológica. Siglo Veintiuno Editores.
CARNOY, M.; MCEWAN, P. J. (2003). Does privatization improve education? The
case of Chile’s national voucher plan. In: PLANK, D. N.; SYKES, G. (Eds.). Choosing
Choice: School Choice in International Perspective (p. 1-28). Teachers College Press.
CHIROLEU, A. (2006). Políticas de educación superior en Argentina y Brasil/: de los
’ 90 y sus continuidades. Revista Sociedad Argentina de Análisis Político (SAAP), 2 (agosto
2006), 563-590.
CHUBB, J. E.; MOE, T. M. (1990). Politics, markets and America’s schools. Washington,
D.C.: The Brookings Institution.
DALE, R. (2005). The Potentialities of “La mesure en éducation”: the European Union’s
Open Method of Coordination and the Construction of a European Education Space
(Cahiers de la recherche sur l’éducation et les savoirs, n. 1).
DIDOU, S. (2007). Evaluación de la productividad científica y reestructuración de los
sistemas universitarios de investigación en América Latina. Educación Superior Y Sociedad,
1 (1), p. 3-18.
DUARTE, J.; BOS, M. S.; MORENO, M. (2010). ¿Enseñan mejor las escuelas privadas en
América Latina?
ENGELS, F. (2000). El origen de la familia, la propiedad privada y el Estado. Madrid:
Biblioteca Digital Espartaco.
FALETTO, E. (1989). La especificidad del Estado en América Latina. Revista de La
CEPAL, 38, p. 161-200.
FARDELLA, C. (2016). La universidad managerialista y los dispositivos de gestión
del cuerpo académico. Individualización y cuantificación de la experiencia laboral.
Talca.
FARDELLA, C.; SISTO, V. (2015). Nuevas regulaciones del trabajo docente en Chile.
Discurso, subjetividad y resistencia. Psicologia, Sociedade, 27 (1), p. 68-79.
FREIRE, P. (1970). Pedagogía del oprimido. Buenos Aires: Siglo XXI.
FRIEDMAN, M. (1955). The Role of Government in Education. Economics and the
Public Interest, 2 (2), p. 85-107. <http://doi.org/10.1007/BF02856577>.

27
ORELLANA C., V. • La persistente mercantilización educativa y el agotamiento del progresismo en
América Latina. Lecciones del caso chileno

FRIEDMAN, M. (1982). Capitalism and freedom. Chicago: The University of Chicago


Press. <http://doi.org/10.1016/j.ecosys.2009.09.003>.
GARCÍA LINERA, Á.; LACLAU, E.; O’DONNEL, G. (2010). Tres pensamientos
políticos: conferencias organizadas por las Facultades de Ciencias Sociales y de Filosofía
y Letras de la UBA. Buenos Aires: UBA Sociales Publicaciones.
GRAMSCI, A. (1980). Notas sobre Maquiavelo, sobre la política y sobre el Estado Moderno.
Buenos Aires: Nueva Visión.
HABERMAS, J. (1999). Teoría de la acción comunicativa. V. I: Racionalidad de la acción y
racionalización social. Madrid: Taurus.
KRAWCZYK, N. R.; VIEIRA, V. L. (2012). Uma perspectiva histórico-sociológica da
Reforma Educacional na América Latina. Argentina, Brasil, Chile e México nos anos 1990.
Brasilia: Liber Livro.
LEVIN, H. M.; BELFIELD, C. R. (2002). Education privatization/: causes, consequences
and planning implications. Paris.
MARINI, R. M. (1991). Dialéctica de la dependencia. México: Era.
MARTINIC, S.; PARDO, M. (Eds.). (2000). Economía política de las reformas educativas
en América Latina. CIDE-PREAL.
NÚÑEZ, I. (1997). Historia reciente de la educación chilena.
ORELLANA, V. (2014). Panorama actual de la educación superior en América Latina y el
Caribe (Apuntes. Educación y Desarrollo Post 2015, n. 6). Santiago.
ORELLANA, V. (2015). Calidad de la educación superior. Elementos para una
interpretación sociológica. Universidad de Chile.
ORELLANA, V. (2017). El eco hacendal en la educación superior chilena y los desafíos
de la universidad pública del siglo XXI. Anales de La Universidad de Chile, Santiago, 11,
p. 93-115.
ORELLANA, V.; GUAJARDO, F. (2014). Los intereses privados en la educación
chilena. Entre el afán lucrativo y el ideológico. Cuadernos de Coyuntura Nodo XXI, 3 (2),
p. 32-42.
PATRINOS, H. A.; BARRERA-OSORIO, F.; GUÁQUETA, J. (2009). The role and
impact of public-private partnerships in education. Retrieved from: <http://
www.voced.edu.au/content/ngv33776>.
PERONI, V. M. V. (Ed.). (2015). Diálogos sobre as redefinições no papel do Estado e nas
fronteiras entre o público e o privado na educação. São Leopoldo: Oikos.
PERONI, V. M. V. (2015). Implicações da relação público-privado para a democratização
da educação no Brasil. In: PERONI, V. M. V. (Ed.). Diálogos sobre as redefiniçiões no papel
do Estado e nas fronteiras entre o público e o privado na educaçao (p. 15-34). São Leopoldo:
Oikos.
PINTO, A. (1971). Desarrollo económico y relaciones sociales. In: Tres ensayos sobre
Chile y América Latina. Buenos Aires: Solar.

28
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

PIRES, D. de O. (2015). O histórico da relaçao público-privado e a formação do Estado


Nacional: implicações para a constituiçao da esfera pública. In: PERONI, V. M. V.
(Ed.). Diálogos sobre as redefiniçiões no papel do Estado e nas fronteiras entre o público e o
privado na educaçao (p. 35-51). São Leopoldo: Oikos.
POSTONE, M. (1978). Necessity, Labor, and Time: A Reinterpretation of The Marxian
Critique of Capitalism. Social Research, 45 (4), p. 739-788.
POSTONE, M. (2006). Tiempo, Trabajo y Dominacion Social: Una reinterpretación de la
teoría crítica de Marx. Madrid: Marcial Pons.
PUIGGRÓS, A. (2003). ¿Qué paso en la educación argentina? Breve historia desde la
conquista hasta el presente. Buenos Aires: Galerna.
RAMA, C. (2005). La política de educación superior en América Latina y el Caribe.
Revista de La Educación Superior, XXXIV (2) (134), p. 47-62.
RUIZ ENCINA, C. (2015). De nuevo la sociedad. Santiago: LOM-Fundación Nodo XXI.
RUIZ SCHNEIDER, C. (2010). De La República Al Mercado: Ideas Educacionales Y
Política En Chile. Santiago: LOM.
SHAIKH, A. (1977). Marx’s theory of value and the “transformation problem.” In:
SCHWARTZ, J. (Ed.). The subtle anatomy of capitalism (p. 106-139). Santa Mónica,
California: Goodyear Publishing Compnay.
SHAIKH, A. (1990). Valor, acumulación y crisis. Ensayos de economía política. Bogotá:
Tercer Mundo Editores.
SHORE, C. (2010). Beyond the multiversity: Neoliberalism and the rise of the
schizophrenic university. Social Anthropology, 18 (1), p. 15-29.
TEDESCO, J. C.; TENTI FANFANI, E. (2004). La reforma educativa en la Argentina.
Semejanzas y particularidades. In: Las reformas educativas en la decada de 1990. Un estudio
comparado de Argentina, Chile y Uruguay. Buenos Aires: BID.
TORO, J. (2015). Libertad de enseñanza y derecho a la educación en la historia constitucional
chilena. Análisis del desarrollo legal de la educación escolar 1810-2014. Santiago:
Universidad de Chile.
VALENZUELA, J. P.; ALLENDE, C. (2014). Trayectorias de Mejoramiento en el Sistema
Escolar Chileno/: Las Escuelas de Educación Básica 2002-2010 (Apuntes sobre
Mejoramiento Escolar n. 1). Santiago.
VAN ZANTEN, A. (2003). Middle-class Parents and Social Mix in French Urban
Schools/: reproduction and transformation of class relations in education. International
Studies in Sociology of Education, 13 (2), p. 107-124.
Verger, A. (2008). Cuando la educación superior se convierte en mercadería. Hacia una
explicación del fenómeno de la mercantilización en las universidades.
VIOR, S.; RODRÍGUEZ, L. (2012). La privatización de la educación argentina: un
largo proceso de expansión y naturalización. Pro-Posições, 2 (68), 91-104.

29
Fronteras porosas entre la educación pública
y la privada en Uruguay

María Ester Mancebo

Presentación
Desde fines del siglo XIX Uruguay construyó una educación pública
laica, gratuita y obligatoria y ello ha sido históricamente motivo de profundo
orgullo de sus ciudadanos. A lo largo de décadas el Estado jugó un rol
protagónico en el financiamiento público de la educación y la provisión directa
del servicio educativo. Este capítulo estudia en qué medida esta fuerte presencia
estatal en el campo educativo ha comenzado a cambiar en los últimos años y
hasta qué punto asistimos, en la segunda década del siglo XXI, a una
redefinición de las fronteras entre la educación pública y la privada.
Luego de esta introducción, el texto incluye una sección de presentación
del contexto sociopolítico en cuyo seno se desarrolló la educación uruguaya y
un apartado que describe, en clave institucional, el sistema educativo uruguayo.
Posteriormente se despliegan las principales políticas educativas desarrolladas
por los gobiernos del Frente Amplio – la “era progresista”1 –, se profundiza en
los límites entre la educación pública y la privada, y se dejan abiertas algunas
interrogantes a futuro.

Una mirada de larga duración al contexto sociopolítico


Uruguay es un pequeño país ubicado entre dos gigantes: con una superficie
de 176.215 km2, se ubica entre Argentina con 2.7 millones de km2 y Brasil con
8.5 millones de km2; su población total es de 3.369.000 de habitantes mientras
que la de Argentina asciende a 44 millones y la de Brasil a 207 millones; en
términos de Producto Bruto Interno, los 52 billones de dólares de Uruguay
contrastan con los 546 billones de Argentina y los 1.800 billones de Brasil.
A las diferencias notorias en cuanto a la escala del país, se agregan otras
referentes a la organización estatal y el funcionamiento del sistema político.

1
El término “era progresista” hace referencia a los gobiernos de la “tercera ola” de izquierdas
latinoamericanas caracterizada por el impulso de políticas públicas con énfasis en la igualdad
y la inclusión social (LANZARO, 2008).

30
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Argentina y Brasil son Estados federales descentralizados, al tiempo que Uruguay


es un país unitario, altamente centralizado, que ha desarrollado a lo largo de su
historia una democracia pluralista, un régimen de bienestar social de vocación
universalista y una dinámica societal amortiguadora e incrementalista.
En primer lugar, si bien en el siglo XX Uruguay atravesó dos regímenes
de facto2, la democracia fue consolidándose como régimen político estable,
con una fortísima incidencia de los partidos en la vida política en general y en
el proceso de toma de decisiones gubernamental en particular, en la llamada
“partidocracia” uruguaya (CAETANO; RILLA; PÉREZ, 1987). El sistema
bipartidista integrado por los dos partidos históricos nacidos en 1836 (Partido
Nacional y Partido Colorado) dio gradualmente paso a un sistema de
multipartidismo moderado que preservó la tónica de respeto al pluralismo
político; en este proceso la creación del Frente Amplio en 1971 constituyó un
hito de la mayor relevancia.
En segundo término, Uruguay sentó tempranamente las bases de su
régimen de bienestar social con orientación universalista aunque estratificado
(FILGUEIRA,1998): el Estado ha cumplido un rol de importancia en la
cobertura de riesgos sociales y la mayor parte de la población ha accedido a
sistemas de seguridad social, servicios de salud y educación, aunque
simultáneamente se gestaron fuertes diferenciaciones en el tipo de protección
social de las personas según su ocupación en el mercado de trabajo formal.3
En tercer lugar, tal como lo notó Real de Azúa (1984), a lo largo de su
historia la sociedad uruguaya ha sido nítidamente “amortiguadora”: “en el
Uruguay los conflictos sociales y políticos no llegan a la explosión, toda tensión
se ‘compone’ o ‘compromete’, al final, en un acuerdo” (1984, p. 11). Este rasgo
de amortiguación se asocia a un estilo marcadamente negociador en la
elaboración de políticas públicas, “incrementalista” en el sentido acuñado por
Lindblom en su famoso artículo de 19594.
En esta mirada de larga duración, un partido de izquierda, el Frente Amplio
(FA), ganó a fines del 2004 las elecciones nacionales por primera vez en la historia
uruguaya, sumándose a la ola de gobiernos “progresistas” gestada en esos años
en América Latina (LANZARO, 2008). Desde entonces, el FA ha encabezado

2
El primero entre 1933 y 1942 y el segundo desde 1973 y 1984.
3
En base a las herramientas conceptuales de Esping-Andersen, Filgueira (1998) construyó una
influyente tipología sobre los sistemas de bienestar latinoamericanos en el período 1930-80.
Dicha tipología clasifica a Chile, Uruguay y Argentina como países de “universalismo estrati-
ficado”, mientras que Brasil y México conforman un segundo grupo de países con regímenes
“duales” en términos de Filgueira; finalmente, el autor identifica regímenes excluyentes en
República Dominicana, Guatemala, Honduras, El Salvador, Nicaragua, Bolivia y Ecuador.
4
Véase Lindblom, 1992.

31
ESTER MANCEBO, M. • Fronteras porosas entre la educación pública y la privada en Uruguay

el gobierno nacional con tres presidencias sucesivas: Tabaré Vázquez (2005-2010),


José Mujica (2010-2015) y nuevamente Tabaré Vázquez (2015-2020).
El FA asumió el gobierno luego de la crisis económica más profunda de
la historia uruguaya (2002-2004) y consiguió concretar un crecimiento
económico muy importante: el PBI del 2004 era de 13.686 mil millones de
dólares, el del año 2016 ascendió a 52.420 mil millones.5 Concomitantemente,
la tasa de desempleo bajó sustantivamente en el período: del 14% en el 2006 se
pasó a 8.1% en el 2016.6 La pobreza se redujo significativamente, de 36.6% en
el 2005 a 3.9% en el 2014; lo mismo ocurrió con la indigencia (3.9% y 0.7% en
los dos años citados) y bajó la desigualdad medida por el Índice de Gini (0.46
y 0.38, respectivamente).7
Además de las políticas económicas que favorecieron el crecimiento, en
el plano social el gobierno del FA impulsó una serie de políticas públicas pro-
igualdad, entre las que se destacaron una importante reforma de la salud con
la creación del “Sistema Nacional Integrado de Salud”, la re-instalación de los
“Consejos de Salarios” que históricamente habían permitido la negociación
colectiva en materia laboral, la despenalización del aborto, el matrimonio
igualitario y la regulación legal del cannabis8. En un sólido estudio sobre las
reformas sociales realizadas en Uruguay entre los años 2005 y 2014 De Armas
concluye que la matriz de bienestar del país experimentó un cambio profundo:
Si bien no es posible afirmar que se haya producido una transición completa
desde el tipo “universalista estratificado” que ha caracterizado – y aún define
– al régimen de bienestar doméstico hacia una variante universalista (el tipo
de régimen que construyeron las clásicas socialdemocracias europeas a
mediados del siglo pasado, en un contexto histórico y político muy diferente
al del presente), resulta posible identificar tendencias de cambio que van en
la dirección de construir, en las distintas áreas o “pilares” de la arquitectura
de bienestar doméstica, un formato más universalista, menos estratificado,
más equitativo y con una mayor intervención del Estado (expresión de una
tendencia a la des-mercantilización de la protección social y la formación de
capital humano) (2017, p. 347).

En este contexto cabe preguntarse cómo ha incidido la llegada del Frente


Amplio sobre el desarrollo de la educación uruguaya, en qué medida este
gobierno de izquierda ha enfrentado los profundos desafíos educativos del país
y en qué grado se ha recurrido a la alianza público-privado en esta arena de
política pública.

5
Véase https://datos.bancomundial.org/pais/uruguay.
6
Véase https://www.mef.gub.uy/10475/1/mef/empleo-y-desempleo.html.
7
DE ARMAS, 2017.
8
Para un panorama general de las políticas públicas de los dos gobiernos frentistas véase BEN-
TANCUR y BUSQUETS, 2016.

32
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

El sistema educativo uruguayo en clave institucional


Si se entienden las instituciones como “reglas de juego” en cuyo marco
se produce la interacción humana y se reconoce que tales reglas deben ser
diferenciadas en función del ámbito en el que rigen (NORTH, 1995; ACUÑA;
CHUDNOVSKY, 2013), se constata que en la educación uruguaya han tenido
gran relevancia y persistencia tres instituciones: el “Estado Docente”, el
centralismo, y la escuela común y universal.9
Históricamente el Estado uruguayo mostró una fortísima presencia en
educación. Dicha presencia se gestó a fines del siglo XIX con la reforma de
José Pedro Varela en pos de una escuela primaria laica, gratuita y obligatoria,
se consolidó a lo largo de todo el siglo XX y se expresa en la actualidad en la
significativa participación del Estado en la provisión directa del servicio: más
allá de leves oscilaciones anuales, la distribución histórica de la matrícula de
nivel primario y medio ha sido de 85% en los centros educativos públicos y
15% en los privados. En efecto, si se consideran todos los niveles de educación
formal, desde la educación de la primera infancia hasta la educación terciaria,
se observa que la matrícula pública era de 85% en 1990 y 83% en el 2014,
frente al 15% y 17%, respectivamente, de matrícula privada (Tabla nro. 1).

Tabla nro. 1: Número total de estudiantes en todos los niveles de educación


formal en Uruguay según tipo de administración (pública y privada). Años
seleccionados. En miles y en porcentajes

Tipo de administración 1990 1999 2004 2009 2014


Pública 648 (85%) 723 (86%) 804 (87%) 815 (84%) 811 (83%)
Privada 110 (15%) 121 (14%) 117 (13%) 159 (16%) 171 (17%)
Total 758 (100%) 844 (100%) 921 (100%) 974 (100%) 982 (100%)

Fuente: De Armas, 2017.

Nota: Se incluyeron los siguientes niveles de educación: primera infancia,


inicial y primaria, media básica, media superior, educación terciaria, formación
en educación (Magisterio y Profesorado), educación terciaria universitaria. Se
excluyó la educación no formal.
Por otro lado, siempre ha habido una neta subordinación funcional y
curricular del sector privado al sector público a través del mecanismo de la
“habilitación”: las escuelas privadas que desean expedir certificados legalmente

9
Véase FERNÁNDEZ y MANCEBO (2015).

33
ESTER MANCEBO, M. • Fronteras porosas entre la educación pública y la privada en Uruguay

válidos para sus estudiantes deben aplicar los planes de estudio, los programas,
los reglamentos de pasajes de grado y el calendario de la educación pública; si
no lo hacen, las escuelas privadas solo obtienen el estatus de “autorizadas”10.
Por ello, la casi totalidad de los centros privados siguen estrictamente las normas
de la enseñanza pública y hacen uso de sus márgenes de autonomía en tiempos
y espacios pedagógicos complementarios a los regulados oficialmente.
La segunda institución de larga data en Uruguay está conformada por
la centralización del gobierno y la gestión de la educación. La amplísima
mayoría de las decisiones son tomadas por las autoridades de la Administración
Nacional de Educación Pública (ANEP) radicadas en Montevideo quienes
resuelven sobre un amplio abanico de temáticas: la organización de la
enseñanza y la administración del personal, la planificación y programación,
la evaluación del rendimiento estudiantil, la evaluación docente y el manejo
de los recursos financieros, la dotación y distribución de la infraestructura
educativa.
La tercera institución históricamente relevante ha sido la escuela común
y universal. Uruguay apostó a una escolarización básica universal en un único
formato escolar. En tal sentido, el sistema educativo público uruguayo ha
buscado asegurar simultáneamente el universalismo en el acceso a la educación
desde el nivel pre-primario hasta el terciario, y la uniformidad de la oferta en el
entendido que ello constituye el camino óptimo para asegurar la equidad en
educación. Por ello, en reiteradas ocasiones, la introducción de innovaciones
pedagógicas de carácter piloto y/o focalizado ha sido interpretada como una
desviación que amenaza la igualdad de oportunidades educativas.

Las políticas educativas de la “era progresista” (2005-2017)


En la “era progresista” las principales políticas educativas han transitado
por la aprobación de una Ley General de Educación (LGE), el aumento
presupuestal, la expansión de la educación inicial y el desarrollo de políticas de
inclusión.
La Ley General de Educación (LGE)11 del año 2008 enuncia el derecho
a la educación como un derecho humano fundamental (artículo 1), declara a
la educación como un bien público universal y compromete al Estado a respetar
la diversidad y asegurar la inclusión educativa (artículos 2 al 8). También
impulsa la noción de educación a lo largo de la vida, propone los derechos
humanos como marco de referencia para la labor educativa y sostiene que

10
Los alumnos de estas escuelas deben rendir exámenes de acreditación al final del ciclo primario.
11
Ley nro. 18.437 que entró en vigencia el 8 de diciembre del 2008.

34
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

ellos deben atravesar todo el sistema educativo. En cuanto a la obligatoriedad


escolar la LGE incrementó a catorce años la educación obligatoria: dos años
de educación inicial (4 y 5 años), seis de primaria, tres de educación media
básica y tres de educación media superior.
En este período también se ha constatado una nítida apuesta a incrementar
el presupuesto educativo. El gasto educativo pasó de representar apenas un 3,2%
del producto en 2004 a un 4,5% en 2009 y un 4,7% en 2013. Sumado a ello, la
participación de la educación en el gasto público del gobierno central se
incrementó de 18,7% en 2004 a 28,2% en 2013 y, en términos reales, el aumento
del gasto público en educación fue de 133% (Tabla nro. 2) (INEEd, 2014). Este
reforzamiento de los recursos dirigidos a la educación se tradujo en una mejora
importante de los niveles salariales de los docentes y de la infraestructura escolar.

Tabla nro. 2: Aumento del presupuesto educativo en Uruguay. Años seleccionados

Años Gasto público en educación Gasto público en educación


como % del PBI como % del gasto total en
educación
Promedio 1974-2004 2.4 __
2004 3.2 71
2013 4.7 75

Fuente: De Armas, 2017.

En tercer lugar, Uruguay ha avanzado sustantivamente en la expansión


de la educación inicial y se ubica en el umbral de la universalización de este
nivel educativo. Así, entre 2006 y 2016, la cobertura educativa aumentó de
95% a 99% en niños de 5 años y de 77% a 91% en niños de 4 años. Entre los
niños de tres años la educación no es aún universal pero también creció la
cobertura, del 46% se llegó a 68% (INEEd, 2017).
En cuarto término, como respuesta a la problemática de exclusión
educativa12, el gobierno del FA desarrolló numerosos programas de inclusión.
En un estudio publicado en el 2014 el Instituto Nacional de Evaluación
Educativa (INEEd) identificó un total de 132 programas “complementarios”
orientados a uno o varios de los siguientes objetivos de inclusión educativa:
culminación de nivel, retención de estudiantes, re-vinculación de estudiantes
y aprendizajes. La gran mayoría de estos programas fueron focalizados y

12
Una conceptualización de la exclusión educativa y su dimensionamiento para el caso uru-
guayo se encuentra en MANCEBO y MÉNDEZ, 2012.

35
ESTER MANCEBO, M. • Fronteras porosas entre la educación pública y la privada en Uruguay

reunieron una cobertura relativamente baja en relación a la población total de


la educación pública en los ciclos primario y medio (Tabla nro. 3). En la
implementación se combinó un fuerte liderazgo de la ANEP con una apuesta
a la inter-institucionalidad13, lo cual ha significado la irrupción de nuevos actores
políticos y sociales en el campo educativo.

Tabla nro. 3: Cobertura de los programas de inclusión educativa en Uruguay.


Año 2014

Matrícula educación pública 2014 Matrícula programas por % cobertura 2014


ciclo educativo de inclusión
Primaria 266,376 77,653 29,2
Educación secundaria general 222,935 54,745 24,6
Educación media técnica 90,813 16,604 18,3

Fuente: Elaboración propia en base a los datos de la División de Investigación, Evaluación


y Estadística del CODICEN; Estadística CETP.

A pesar de la centralidad asignada a la educación en la agenda política,


los gobiernos del FA del período 2005-2017 no han conseguido revertir los
serios problemas de equidad educativa del ciclo medio. Según datos del INEEd
(2017), en el 2016 solamente un 40% de los jóvenes de 24 años lograba finalizar
la educación media y apenas un 70% de los jóvenes de 19 años lograba termi-
nar el ciclo básico, un nivel de egreso que es bajo y se ha mantenido estable en
la última década. Más aún, múltiples investigaciones nacionales mostraron la
fortísima incidencia del contexto socioeconómico de los hogares y de los cen-
tros educativos sobre las trayectorias educativas de los estudiantes, por lo que
la probabilidad de desafiliación de la educación media crece significativamen-
te para los adolescentes y jóvenes de los sectores más desfavorecidos social-
mente (CARDOZO, 2010; FERNÁNDEZ, 2010; FILARDO, 2010; ARISTI-
MUÑO; DE ARMAS, 2013).
En definitiva, solo el 40% de los jóvenes completa la educación media y
el origen socioeconómico del alumnado condiciona fuertemente el egreso de
este ciclo, lo cual resulta particularmente llamativo en el contexto sociopolítico
descriptivo anteriormente: en los últimos años Uruguay consolidó su
democracia, abatió la pobreza, mejoró en términos de desigualdad social, pero
en educación los jóvenes de los sectores altos cuentan con cinco veces más

13
El término “inter-institucionalidad” refiere al involucramiento de diversas instituciones esta-
tales en la ejecución de las políticas públicas (CUNILL GRAU, 2005).

36
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

probabilidad de egresar de la escuela media que los jóvenes de los sectores


bajos (Gráfico nro. 1).

Gráfico nro. 1: Porcentaje de egresados de ciclos de educación obligatoria


cuatro años después de la edad teórica según ingreso de los hogares. Año 2015

Fuente: INEEd, 2017.

En otros términos, durante los tres gobiernos del FA que se han sucedido
desde el 2005 a 2017, Uruguay procesó una serie importante de cambios sociales
proigualdad y materia educativa, puso en marcha algunas iniciativas
gradualistas. No se apostó, sin embargo, a una reforma sistémica que enfrentara
drásticamente los serios indicadores de desigualdad educativa 14. Como
resultado de esta dualidad, en la región hoy Uruguay presenta simultáneamente
la mejor distribución de la riqueza y la mayor influencia del contexto
socioeconómico sobre la probabilidad de egreso de la educación media.

La porosidad de las fronteras entre la educación pública


y la privada en la “era progresista”
Como se vio, Uruguay estableció a lo largo del siglo XX una presencia
estatal robusta en el campo educativo. Cuando en los años 90 la región
latinoamericana participó de una ola de reformas educativas que adoptó, en
varios países, una tónica privatizadora, Uruguay procesó una reforma de
orientación netamente estatista (1995-2000): en cuanto a la provisión del
servicio educativo, el Estado preservó su fuerte participación en todos los niveles
educativos (desde la educación inicial hasta la terciaria desde el punto de vista
del financiamiento), el gasto público en educación creció del 2.3% al 3.2% del

14
Para una explicación del bloqueo del cambio educativo en los gobiernos del FA, véase MAN-
CEBO y LIZBONA (2016b).

37
ESTER MANCEBO, M. • Fronteras porosas entre la educación pública y la privada en Uruguay

Producto Bruto Interno y se reforzó el papel rector del Estado. Cierto es que
en esos años se escucharon algunas voces liberales favorables a la creación de
un sistema “no friedmaniano de cheques educativos” (DA SILVEIRA, 1995)
pero tales voces no reunieron apoyos políticos mayores.
¿Cómo ha sido la evolución de la relación público-privado en el siglo
XXI?, ¿en qué medida se mantuvo inalterada esa relación en la era progresista?
Para dar respuesta a estas preguntas procederemos en dos pasos: primero
presentaremos la evolución de la matrícula por forma de administración y, en
un segundo momento, recurriremos a Ball (2012) quien define la desestatización
como el proceso por el cual tareas y servicios previamente desarrollados por el
Estado pasan a ser llevados a cabo por otros actores como las empresas y las
organizaciones filantrópicas, los que establecen relaciones variadas entre ellos
y con las diversas áreas del Estado.
Los datos sobre la evolución de la matrícula por niveles según forma de
administración se presentan en la Tabla nro. 4. Como se ve, la matrícula global
pública representaba el 85.7% en el 2004, bajó a 79.3% en el 2009 y a 77.6% en
el 2014, con el consecuente ascenso de la matrícula privada de 14.3% a 20.7%
y 22.4%.
El desglose por niveles educativos resulta fundamental y muestra tres
situaciones diferentes. Primero, en formación docente y en la educación técnica
la presencia estatal se mantuvo hegemónica y la oferta privada sigue siendo
prácticamente inexistente, por razones muy distintas: los futuros maestros y
profesores no provienen de los sectores más favorecidos de la sociedad y los
ingresos que esperan recibir una vez que terminen la carrera no son altos, por
lo cual el pago de la formación docente es muy difícil y/o poco atractivo; en el
caso de la educación técnica, la puesta en marcha y desarrollo de una buena
oferta representa altos costos para los potenciales proveedores privados del
servicio educativo.
Segundo, en primaria el aumento de la participación privada fue de casi
cinco puntos porcentuales y en la educación media tanto básica como superior
fue de entre uno y dos puntos porcentuales; se trata pues de un incremento
tenue del alumnado que accede al servicio educativo mediante “pago de
bolsillo” lo cual requiere un monitoreo a futuro para ver si la tendencia se
confirma o no.
Tercero, en la educación universitaria y en la educación en la primera
infancia e inicial el crecimiento de la matrícula privada fue importante. En el
primer caso representaba el 10.7% en el 2004 y llegó al 20.1% en el 2014, con
lo cual la participación privada se duplicó. Nótese que la matrícula universitaria
estatal también creció en forma importante en el período (de 70.156 a 85.987
estudiantes), lo que supone un avance del Estado como proveedor directo de

38
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

servicios educativos a nivel superior, sin perjuicio de lo cual hoy la participación


privada representa un quinto de la matrícula universitaria total, lo cual
constituye una transformación de envergadura en un país que no tuvo
universidades privadas hasta 1984.
En la educación de la primera infancia e inicial el crecimiento de la
matrícula privada fue muy relevante en estos años: era del 39.8% en el 2004,
subió a 51.9% en el 2009 y llegó a 55.1% en el 2014. Frente a esta evolución,
corresponde realizar una precisión metodológica: las distintas fuentes de
información estadística aplican criterios diversos para contabilizar la matrícula
de los Centros de Atención a la Infancia y la Familia (CAIF)15, centros que
atienden a niños menores de cuatro años, son gestionados por asociaciones
civiles sin fines de lucro”, están regulados por el Estado y se financian con
transferencias que reciben del Estado en función del número de niños que
atienden. Pues bien, en el Anuario Estadístico de Educación que elabora el
Ministerio de Educación y Cultura se contabiliza la matrícula de los CAIF
como “público/privada”, en el estudio de De Armas (2017) se la considera
“pública” y en este artículo se la clasificó como “privada” en el entendido que
se trata de un caso de subsidio estatal a una oferta educativa no estatal.
Nuestra clasificación de la matrícula CAIF como “privada” se
fundamenta en dos criterios: por un lado, la gestión no está en manos del
Estado sino de asociaciones civiles; por otro, con un enfoque comparado, no
hay diferencias entre esta forma de administración y la de los establecimientos
particulares subvencionados del paradigmático caso chileno de subsidio a la
demanda.16
Ahora bien, sobre la base de la conceptualización de Ball (2014, 2012,
2007) es posible plantear una serie de indicadores de “desestatización” de la
educación que permitan avanzar en el análisis del caso uruguayo. La Tabla
nro. 4 presenta tales indicadores y adelanta la situación de la educación
uruguaya respecto a cada uno de ellos al año 2017.

15
El Plan CAIF fue fundado en 1988 durante el primer gobierno postdictadura.
16
Desde la reforma introducida por Pinochet el sistema educativo chileno es tripartito: hay esta-
blecimientos públicos (“municipales”), “particulares pagos” (el pago de la matrícula es reali-
zado por las familias de los estudiantes) y “particulares subvencionados” (las escuelas reciben
vouchers en función del número de estudiantes matriculados). Véase COX, 2012.

39
ESTER MANCEBO, M. • Fronteras porosas entre la educación pública y la privada en Uruguay

Tabla nro. 4: Indicadores de “desestatización” de la educación uruguaya. Año


2017

Indicadores Situación de la
educación uruguaya
1. Las escuelas se rigen por una “rendición de cuentas” No
(“accountability”) de mercado en la cual se otorga particular
relevancia a los resultados.
2. Los padres eligen las escuelas de sus hijos. No
3. Las escuelas son autónomas para innovar y fijar los salarios No
docentes.
4. Se contratan servicios estatales a proveedores privados. No
5. Se establecen asociaciones entre lo público y lo privado. Sí
6. Se recurre a Organizaciones No Gubernamentales (ONG) Sí
y/o fundaciones para la provisión del servicio educativo.
7. Se promueve la actividad filantrópica y los sponsors para Sí
el financiamiento de programas educativos.

Fuente: elaboración propia en base a Ball, 2012.

Respecto al primer indicador debe señalarse que en las últimas dos


décadas Uruguay creó un sistema de medición de resultados educativos pero
el mismo no ha sido utilizado para instaurar una modalidad de rendición de
cuentas de mercado. Desde 1996 en adelante la ANEP y el INEEd han llevado
adelante distintas evaluaciones estandarizadas en primaria y en educación
media, evaluaciones que han sido en algunos casos nacionales y en otros
internacionales. No obstante, la difusión de resultados ha sido siempre realizada
sin identificación de las escuelas, con lo cual se ha evitado la instalación de
una dinámica de competencia entre ellas.
En segundo lugar, en el ámbito público los padres no pueden elegir las
escuelas a las que concurren sus hijos ya que la asignación de los estudiantes a
los centros educativos es realizada centralmente en función de los domicilios;
por otra parte, como se vio en el párrafo anterior, los padres no cuentan con
información desagregada sobre la calidad del servicio educativo de cada centro
educativo, más allá del prestigio que algunas instituciones han ganado a través
de mecanismos informales.
En tercer lugar, los márgenes de autonomía escolar son estrechos ya que
el gobierno de la educación decide centralmente el currículum escolar, los
formatos escolares, el calendario, y controla el cumplimiento de las pautas
oficiales a través de la llamada “Inspección” escolar, la que históricamente ha
ejercido más un rol de vigilancia burocrática que de orientación profesional.

40
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Adicionalmente, los salarios son completamente homogéneos en todo el


territorio nacional dado que en la educación pública la estructura salarial está
ligada a la carrera docente y las horas efectivas se pagan según el escalafón
docente (MANCEBO, 2016a).
Respecto a la contratación de servicios estatales a proveedores privados,
podría mencionarse la construcción de infraestructura educativa a través de
contratos de participación público-privada.17 De acuerdo a los datos presentados
por Bordoli et al (2017), en el 2017 se encontraban en proceso de adjudicación
contratos para la construcción de 150 obras para la ANEP y 60 obras para el
INAU. También podría hacerse referencia a las licitaciones periódicas que
realiza el Consejo de Educación Secundaria para contratar el servicio que se
da en las cantinas que funcionan en los liceos de todo el país.18 De todas maneras,
en ninguno de estos casos se trata de la contratación por parte del Estado de
servicios pedagógicos, razón por la cual se asignó valor negativo a este indicador.
Estos cuatro indicadores asumen signo negativo en el proceso de
desestatización en la educación uruguaya, pero los restantes indicadores arrojan
evidencia de un tenue proceso de privatización. Así, la gran expansión de la
educación en la primera infancia (0 a 3 años) se produjo fundamentalmente a
través de la asociación entre lo público y lo privado, más específicamente a
través del Plan CAIF. Los centros CAIF son privados, están gestionados por
organizaciones no gubernamentales19 y reciben financiamiento público en
función de la matrícula. En el momento de su nacimiento hacia fines de los
años 80 el Plan CAIF tenía 24 centros y una matrícula total de 1.200 niños, en
el 2004 el número de centros había crecido a 271 y la matrícula a 24.412 niños;
en el 2014, luego de los dos primeros gobiernos del Frente Amplio, la cantidad
de centros era de 364 y la matrícula de 49.054.
En otros ámbitos educativos también se ha recurrido a Organizaciones
No Gubernamentales (ONG) y/o fundaciones para la provisión del servicio
educativo. En la educación formal pública, puede mencionarse el Programa

17
Véase Ley 18.786 del 2011. Los contratos se otorgan por un período de 20 años y la normativa
establece que “el privado debe financiar todos los costos derivados tanto de los estudios, el
diseño, la construcción y el equipamiento de las obras, así como todos los costos derivados del
cumplimiento del contrato. También deberán proporcionar otros servicios que comprenden
las tareas de limpieza rutinaria y profunda, así como la seguridad en los predios y edificios de
todas las obras...” (BORDOLI et al, 2017: 30).
18
https://www.ces.edu.uy/index.php/licitaciones.
19
Según el estudio de UNICEF-PNUD-INAU-CAIF (2004), las organizaciones de la sociedad
civil que están a cargo de centros CAIF son variadas: predominan las asociaciones de vecinos
(59%), seguidas de iglesias y fundaciones (con 17% y 15% de los centros); también hay organi-
zaciones vinculadas a la política, las fuerzas armadas, cooperativas de trabajadores, sindicatos
e intendencias.

41
ESTER MANCEBO, M. • Fronteras porosas entre la educación pública y la privada en Uruguay

de Aulas Comunitarias, uno de los principales programas de inclusión


educativa: las aulas comunitarias son espacios en los que se desarrolla el primer
año del ciclo básico de educación media para adolescentes entre 13 y 17 con
riesgo de desafiliación educativa; el Programa se inició en el 2007 y funcionó
mediante la contratación por parte del Estado a ONGs que han prestado el
servicio educativo.
Por otra parte, el Instituto Nacional del Niño y Adolescente del Uruguay
(INAU) ha llevado adelante una parte importante de las políticas públicas de
infancia a través de convenios con prestadores privados: del total de 86.687
personas atendidas por el INAU, 10.094 fueron atendidas por el propio INAU
y 76.603 por distintas modalidades de convenio con privados; entre tales
modalidades interesa destacar el papel de los Clubes de Niños y los Centros
Juveniles en el campo de la educación no formal.20
En cuanto al indicador “promoción de la actividad filantrópica y los
sponsors para el financiamiento de programas educativos” puede señalarse
que la reforma tributaria del 2007, realizada durante la primera presidencia de
Tabaré Vázquez, habilitó las exoneraciones fiscales a empresas que bajo el
régimen de “donaciones especiales” financien proyectos de instituciones de
enseñanza, investigación, salud y apoyo a la niñez. Ello se traduce en que
cada 100 pesos donados, 81 pesos son de resignación fiscal y 19 son costos de
la empresa, tal como consignan Bordoli et al (2017).21
Al amparo de esta normativa ha aumentado el número de instituciones
de educación media de gestión privada con financiamiento del Estado por
renuncia impositiva. Al Liceo Jubilar creado en el 2002 se sumaron el Liceo
Impulso, el Liceo Providencia, el Liceo Francisco, el Liceo Espigar, Los Pinos
y Ánima. Además de las donaciones de las empresas, estos centros reciben
otros ingresos como donaciones de particulares, donaciones del exterior, entre
otros. Se trata de instituciones ubicadas en zonas desfavorecidas socialmente,
que reclutan una población estudiantil vulnerable y en general han sido
monitoreadas y evaluadas. De las siete instituciones, dos son laicas (Impulso y

20
Los Clubes de Niños son centros socioeducativos de atención diaria, funcionan en contra
horario escolar (matutino y/o vespertino) y realizan actividades educativas, lúdico-recreati-
vas, de apoyo pedagógico, de asistencia, y de promoción y circulación socio-cultural para el
desarrollo de los niños, niñas y adolescentes participantes. Los centros juveniles trabajan con
los jóvenes y adolescentes que acuden a los centros, promoviendo actividades educativas, de
participación ciudadana e identidad, actividades recreativas, artísticas, deportivas, formación
en salud y nutrición.
21
Cabe notar que este régimen se sumó la histórica renuncia fiscal que el Estado uruguayo rea-
liza por mandato constitucional. La Constitución establece que las instituciones de enseñanza
privada y las culturales están exoneradas de impulsos nacionales y municipales, como subven-
ción por sus servicios.

42
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Espigas) y cinco confesionales, seis están radicadas en Montevideo y una en el


interior del país.
En forma complementaria a la información sobre los indicadores quinto,
sexto y séptimo, la Tabla nro. 5 da cuenta en forma precisa de la distribución del
esfuerzo financiero total que Uruguay dirige hoy a la educación, discriminan-
do el carácter público y privado del financiamiento y la prestación.

Tabla nro. 5: Distribución del esfuerzo financiero total dirigido a educación,


según naturaleza del financiamiento y de la prestación. En porcentajes. Año
2015

Financiamiento Prestación
Pública Privada Total
Público Financiamiento público Financiamiento público
y prestación pública y prestación privada (CAIF)
65.8 1.9 74.4
Renuncia fiscal y Renuncia fiscal y
prestación pública prestación privada
0.04 6.7
Privada Donaciones de empresas a Donaciones de empresas
instituciones públicas a instituciones privadas
0.01 0.03 25.6
Gasto de hogares en materiales Gasto de hogares a
y servicios de apoyo en instituciones sin fines de lucro
educación pública en instituciones privadas
0.8 24.7
Total 66.7 33.3 100

Fuente: INEEd, 2017.

A modo de cierre
En el siglo XX el Estado ocupó un lugar estratégico en la gobernanza
del sistema educativo por tres razones: fue la principal fuente de financiamiento,
participó directamente en la provisión del servicio educativo y ejerció
activamente la conducción de la educación pública y la privada. En lo que va
del siglo XXI el Estado mantiene su rol protagónico en el ámbito educativo
pero las fronteras entre la educación pública y la privada muestran una
crecientemente porosidad.
En el 2005 la llegada al gobierno nacional del Frente Amplio se tradujo
en múltiples políticas públicas orientadas al logro de mayores niveles de igualdad
y, de hecho, en estos años el país avanzó sustantivamente en el abatimiento de la

43
ESTER MANCEBO, M. • Fronteras porosas entre la educación pública y la privada en Uruguay

pobreza y la indigencia, en el acortamiento de las brechas entre sectores sociales


y en la concreción de múltiples medidas antidiscriminatorias.
Durante los tres gobiernos de izquierda la educación ha sido prioridad
en la agenda pública y la agenda de gobierno y en torno a ella se instrumentó
un plan de transformación gradual que permitió contar con más recursos,
incrementar los salarios docentes, mejorar la infraestructura escolar, expandir
el acceso a la educación y poner en marcha políticas de inclusión focalizadas.
Estos avances fueron realizados preservando la matriz estatal clásica, a
juzgar por los valores de varios de los indicadores del set seleccionado en este
capítulo para medir el grado de “desestatización” (BALL, 2012): no hay
accountability de mercado, los padres no eligen las escuelas de sus hijos, las
escuelas no son autónomas y la contratación de servicios pedagógicos a
proveedores privados es casi nula. Por otra parte, en términos globales, la
matrícula del sector público se ha mantenido relativamente estable.
No obstante, en estos años también se ha recurrido a instrumentos de
política pública22 orientados a la “desestatización”: la asociación entre lo
público y lo privado, la contratación de organizaciones no gubernamentales
para la provisión del servicio educativo, y la promoción de la actividad
filantrópica para financiar programas educativos.
Por lo anterior, hoy es posible hablar de una creciente porosidad de las
fronteras entre la educación pública y la privada en Uruguay, lo cual abre varias
interrogantes que futuras investigaciones deberán abordar: ¿cómo se explica que
tres gobiernos de izquierda hayan transitado por la ruta de la desestatización?,
¿cuál ha sido la incidencia de organismos como el Ministerio de Desarrollo So-
cial o el Instituto Nacional del Niño y Adolescente del Uruguay en el desarrollo
de políticas educativas desestatizadoras?, ¿cuál ha sido la incidencia de organis-
mos como el Ministerio de Desarrollo Social o el Instituto Nacional del Niño y
Adolescente del Uruguay en el desarrollo de políticas educativas desestatizado-
ras?, ¿en qué medida estos poros en los límites entre lo público y lo privado se
profundizarán en los próximos años?, ¿por qué tales intersticios son práctica-
mente invisibles para la ciudadanía?

Referencias
ACUÑA, C.; CHUDNOVSKY, M. (2013). Cómo entender las instituciones y su relación
con la política: lo bueno, lo malo y lo feo de las instituciones y los institucionalismos.
In: ACUÑA, C. (Comp.). Cuánto importan las instituciones. Gobierno, Estado y actores
en la política argentina. Bs. As.: Siglo Veintiuno Editores.

22
“Medios o dispositivos de los que disponen los gobiernos para implementar políticas” (HAR-
GUINDÉGUY, 2013, p. 204).

44
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

ARISTIMUÑO A.; DE ARMAS, G. (2013). La transformación de la educación media


en perspectiva comparada. Tendencias y experiencias innovadoras para el debate en
Uruguay. Colección Innovar en Educación. Montevideo: UNICEF.
BALL, S. (2014). Globalización, mercantilización y privatización: tendencias
internacionales en Educación y Política Educativa. Archivos Analíticos de Polìticas
Educativas, 22 (41). Disponible en: <http://dx.doi.org/10.14507/epaa.v22n41.2014>.
BALL, S. (2012). The reluctant State and the beginning of the end of state education.
Journal of Educational Administration and History, 44: 2. Disponible en: <http://
dx.doi.org/10.1080/00220620.2012.658764>.
BALL, S.; YOUDELL, D. (2007). Hidden privatisation in public education. Preliminary
report. Education International 5th World Congress. Disponible en: <http://pages.ei-ie.org/
quadrennialreport/2007/upload/content_trsl_images/630/Hidden_privatisation-
EN.pdf>.
BENTANCUR, N.; BUSQUETS, J. (Ed.) (2016). El decenio progresista. Las políticas
públicas de Vázquez a Mujica. Montevideo: Ed. Fin de Siglo-Instituto de Ciencia Política.
BORDOLI, E.; MARTINIS, P.; MOSCHETTI, M.; CONDE, S.; ALFONZO, M.
(2017). Privatización educativa en Uruguay: políticas, actores y posiciones. Internacional
de la Educación. Disponible en: <http://ei-ie-al.org/sites/default/files/docs/
2017_eiresearchinstitute_uruguay.pdf>.
CAETANO, G.; RILLA, J.; PÉREZ, R. (1987). La partidocracia uruguaya: historia y
teoría de la centralidad de los partidos políticos. En: Cuadernos del CLAEH, nro. 44.
Montevideo: CLAEH.
CODICEN – División de Investigación, Evaluación y Estadística (2017). Observatorio
de la educación. Disponible en: <https://www.anep.edu.uy/observatorio/paginas/
tendencias_departamentales>.
COX, C. (Ed.) (2012). Política y políticas educacionales en Chile 1990-2010. In: Revista
Uruguaya de Ciencia Política, nro. 21, v. 1. Montevideo: UdelaR-Instituto de Ciencia
Política.
DA SILVEIRA, P. (1995). La Segunda Reforma. Montevideo: CLAEH / Fundación
Banco de Boston.
DE ARMAS, G. (2017). Reformas sociales y giro a la izquierda en Uruguay (2005-2014).
Tercer movimiento en la historia de un Estado de Bienestar centenario”. Tesis de
Doctorado en Ciencia Política presentada en la Universidad de la República, Uruguay.
FERNÁNDEZ, T.; MANCEBO, MA. E. (2015). Las políticas de inclusión educativa
en Uruguay: ¿erosión de la matriz institucional clásica de la arena educativa? En:
Revista Latinoamericana de Políticas y Administración de la Educación, nro. 3. ISSN 2408-
4573. p. 71-89. Bs. As. Universidad Nacional de Tres de Febrero.
FILGUEIRA, F. (1998). “El nuevo modelo de prestaciones sociales en América Latina:
Eficiencia, residualismo y ciudadanía estratificada, en: ROBERTS, B. Ciudadanía y
Política Social Latinoamericana. Costa Rica: Ed. FLACSO/SSRC.
HARGUINDÉGUY, J. B. (2013). Análisis de políticas públicas. Madrid: Ed. Tecnos.

45
ESTER MANCEBO, M. • Fronteras porosas entre la educación pública y la privada en Uruguay

INEEd (2014). Informe sobre el estado de la educación en Uruguay 2014. Montevideo: INEEd.
INEEd (2017). Informe sobre el estado de la educación en Uruguay 2015-2016. Montevideo:
INEEd.
LANZARO, J. (2008). La tercera ola de las izquierdas latinoamericanas: entre el
populismo y la social-democracia. Estudio/Working Paper 91/2008. VI Seminario de
Investigación. Master en Democracia y Gobierno. Departamento de Ciencia Política.
Universidad Autónoma de Madrid. 2008. <http://portal.uam.es/portal/page/portal/
UAM_ORGANIZATIVO/Departamentos/CienciaPoliticaRelacionesInternacionales/
publicaciones%20en%20red/working_papers/Lanzaro%20WP%2091_2008.pdf 10/
10/2010>.
LINDBLOM, Ch. (1992). La ciencia de “salir del paso”. In: AGUILAR VILLANUEVA,
L. (Comp.) La hechura de las políticas. México D. F.: Porrúa.
MANCEBO, MA. E. (2016a). La transformación frustrada: condiciones de trabajo y
carrera docente en Uruguay (2005-2014). In: Propuesta Educativa, nro. 45. ISSN 1995-
7785. Bs.As.: FLACSO.
MANCEBO, M. E.; LIZBONA, A. (2016b). El statu quo en la educación obligatoria:
entre la partidocracia, los sindicatos y el fantasma de la Reforma Rama. In:
BENTANCUR, N.; BUSQUETS, J. (Ed.). El decenio progresista. Las políticas públicas
de Vázquez a Mujica. Montevideo: Ed. Fin de Siglo-Instituto de Ciencia Política.
MANCEBO, MA. E.; VAILLANT, D.; LLAMBÍ, C.; GONZÁLEZ, G.; PIÑEIRO, L.
(2016c). “Understanding the effects of educational governance in Chile and Uruguay”.
In: ANGELESCU, R.; PERRY, G. Improving access and quality of public services in
Latinamerica. To govern and to serve. Palgrave-MacMillan. ISBN 978950464922-9. p.
137-182.
MANCEBO, MA. E.; MÉNDEZ, N. (2012). La exclusión educativa en los países del
Cono Sur: aproximación conceptual y dimensionamiento. Revista de Ciencias Sociales,
nro. 30, p. 117-138. Montevideo: FCS.
MANCEBO, MA. E. (2010). Las políticas de inclusión educativa: una nueva mirada
sobre un viejo problema. In: SERNA, M. (Ed.). Desarrollo y desigualdad en Uruguay: una
relación en debate. Montevideo: CLACSO-FCS.
MINISTERIO de Educación y Cultura (MEC) (2014). Anuario Estadístico de Educación.
Disponible en: <www.mec.gub.uy/innovaportal/file/.../1/mec-anuario-estadistico-
educacion-2014.pdf>.
MINISTERIO de Educación y Cultura (MEC) (2016). Panorama de la Educación.
Disponible en: <http://www.mec.gub.uy/innovaportal/file/11078/1/mec-panorama-
educacion-2016.pdf>.
NORTH, D. (1995). Instituciones, cambio institucional y desempeño económico. México: FCE.
REAL DE AZÚA, C. (1984). Uruguay, ¿una sociedad amortiguadora? Montevideo: CIESU.
UNICEF-PNUD-INAU-CAIF (2004). 25 años del Plan Caif. Una mirada en profundidad
a su recorrido programático e institucional. Disponible en: <https://www.unicef.org/
uruguay/spanish/25-anos-CAIF-web.pdf>.

46
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Privatización de la educación:
el caso argentino

Susana Vior

En trabajos anteriores planteamos que, analizar teórica y empíricamente


las características del proceso de privatización experimentadopor la educación
argentina, exigía revisar algunos momentos significativos en el desarrollo de
nuestra política educacional (Vior, Rodríguez, 2012). El presente texto retoma
cuestiones ya planteadas y se propone identificar algunos hilos conductores
presentes a lo largo de más de un siglo.
De acuerdo con la orientación democrático liberal de la Constitución
que sentó las bases de la unidad nacional a mediados del siglo XIX, nuestro
país tiene un sistema educativo mixto con fuerte desarrollo público, pero ha
vivido momentos de tensión por los avances de los sectores impulsores del
desarrollo privado en los diferentes niveles y modalidades de la educación. La
cuestión de la existencia , el reconocimiento de estudios y el financiamiento
estatal de la enseñanza privada ha constituido una larga discusión sobre el
control de las escuelas y la educación, entablada, fundamentalmente, entre el
Estado y la Iglesia desde la Convención que en 1853 sancionó la Constitución
Nacional. La pugna por el poder estuvo siempre presente. Durante un siglo, se
enfrentaron, por un lado los defensores del principio de subsidiariedad del
Estado en educación y de los derechos naturales de la familia y la Iglesia y, por
otro, quienes aun con matices sostuvieron la concepción del Estado docente.
Se produjeron fuertes debates sobre, entre otros temas, la libertad de enseñanza,
la organización de la escuela primaria, la facultad de otorgar títulos, la
formación de maestros y profesores, los presupuestos para el área, el
reconocimiento de universidades privadas.
El debate fue apagándose progresivamente hasta llegar a la situación
actual, en la que hay muestras de preocupación en diferentes sectores o grupos
sociales por el crecimiento de las instituciones privadas, hay consignas
partidarias contra su financiamiento por parte del Estado, pero no parece haber
decisión de dar un debate político fundado, abierto, que ponga foco en la
situación presente y aporte a su desnaturalización, condición necesaria para
una propuesta democrática y democratizadora de la educación.
La realización del Congreso Pedagógico Nacional (1984/1986) y de los
debates de las leyes que “transformaron” el sistema educativo en la década de

47
VIOR, S. • Privatización de la educación: el caso argentino

1990: Ley de Transferencia de instituciones educativas del Estado nacional a


las provincias(1991), Ley Federal de Educación (1993) y Ley de Educación
Superior (1995), la sociedad argentina parece haber aceptado no debatir
políticamente cuestiones tales como, por ejemplo, el financiamiento y el
gobierno de la educación, los aportes públicos a la enseñanza privada, el trabajo
y la formación de los docentes, las condiciones para la enseñanza y el
aprendizaje, la relación entre educación y trabajo. Las discusiones raramente
van más allá de”cuestiones técnicas que mejoren la calidad”.
Entre 2003 y 2015 la matrícula de la enseñanza privada aumentó el 64,7%
en el nivel inicial, 27,3% en el primario y 23,3% en el secundario, mientras en
la educación pública los aumentos fueron del 27,6% en inicial y 14% en
secundaria, con una caída del 13,7% en primaria (situación que, por primera
vez, se observa en ese nivel durante un gobierno constitucional y que no parece
responder a una disminución del grupo etario correspondiente). A nuestro
entender, son cambios que, iniciados a mediados del siglo veinte, se
profundizaron a posteriori de la crisis económica y social de 2001/2002.
E mayor crecimiento del sector privado en los tres niveles de la educación
básica común y la fuerte disminución en el número de alumnos en las escuelas
primarias públicas que se registra en ese período, parecen justificar la
preocupación que expresan diferentes sectores políticos, sociales, académicos
ante la expansión de un sector mayoritariamente integrado por escuelas
confesionales, que recibe aportes estatales para cubrir entre el 60% y el 100%
de sus gastos en personal docente, aportes que no resultan transparentes,que
no son siempre el resultado de un proceso de distribución equitativa según las
condiciones socioeconómicas de la población que atienden, ni son auditados
por los organismos públicos correspondientes a través de supervisores conla
necesaria formación económico-contable (Mezzadra, Rivas, 2010).
Las últimas dos décadas se han publicado numerosos trabajos sobre las
características que asumió la expansión de la matrícula en los establecimientos
privados en los diferentes niveles y modalidades del sistema educativo.
Narodowski, Moschetti y Gottau (2017) en un artículo reciente revisan varios
textos que procuran explicar ese proceso y los agrupan según “explicaciones
paradigmáticas” al tiempo que dan cuenta de las limitaciones que tiene cada
uno de esos intentos explicativos.
Para algunos investigadores la privatización es consecuencia de la mejora
de los ingresos de las familias y de “huida” hacia la escuela privada, aunque
no pueda confirmarse empíricamente que “a mayor nivel de ingresos le
corresponde necesariamente un incremento de la matrícula privada”. Siguiendo
esta explicación, al mejoramiento de las condiciones de vida de la población
correspondería “una política educativa resignada al vaciamiento de las escuelas

48
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

públicas”. Los estudios comparados muestran que la experiencia internacional


da cuenta de la situación contraria en muchos países.
Otros trabajos asignan el fenómeno de “trasvase” a las huelgas docentes,
aunque también dan cuenta de la existencia del fenómeno de “maestro ausente”
o “escuela cerrada” como factores que podrían estar incidiendo. En algunos
casos se considera que los padres hacen “una elección racional” en función de
la calidad académica de las escuelas expresado en el desempeño en las pruebas
de evaluación, aunque probablemente esos resultados sean, en gran medida,
consecuencia de la situación socioeconómica de sus alumnos.
Una interpretación muchas veces presente es la de la “autosegregación”:
las familias eligen estar entre iguales y se resguardan eligiendo escuelas privadas.
En una sociedad crecientemente polarizada, en la que han aumentado las
diferencias en los parámetros de consumo de cada sector, la elección escolar es
un componente más de ese proceso más amplio.
La hipótesis de la privatización como efecto del neoliberalismo, en tanto
plantea que la acentuación del fenómeno no se dio, en Argentina, en la década
neoliberal por excelencia (la de 1990) sino a partir del postneoliberalismo
iniciado en 2002. Desde nuestro punto de vista cabe discutir, tanto el carácter
de esa etapa definida como postneoliberal, cuanto el hecho de que la hegemonía
de las concepciones políticas, sociales, económicas, culturales no se da
mecánicamente ni en forma inmediata a partir de la introducción del proyecto
ni en todos los sectores sociales simultáneamente. Algunos movimientos de
las conductas de cambio son espontáneos o casi espontáneos de las propias
familias. Finalmente, la expansión de la matrícula privada sería consecuencia
tanto de la demanda como de políticas públicas de desregulación y
financiamiento que favorecieron al sector.
Estaba ya, en un artículo (Krawczyk, y otras, 1985) escrito durante el
proceso de recuperación de las instituciones constitucionales, en vísperas del
Congreso Pedagógico Nacional - ámbito en el cual debían perfilarse los
lineamientos orientadores de una política educativa igualadora de
oportunidades y posibilidades y cuando la preocupación central era la
democratización del sistema - nos planteamos la necesidad de cuestionar viejos
mitos acerca de la identificación entre privatización y segmentación educativa.
Analizando la evolución de los dos sectores educacionales surgió el interrogante
acerca de por qué razón, si bien era en los gobiernos militares cuando aparecía
con más énfasis el discurso subsidiarista no se había producido, en esos períodos,
la mayor expansión del sector privado. En ese momento nuestra hipótesis fue
que la respuesta debía buscarse en las políticas económicas con consecuencias
recesivas, que siempre significaron disminución del poder adquisitivo del salario
y empeoramiento de las condiciones de vida de las capas más bajas de la clase

49
VIOR, S. • Privatización de la educación: el caso argentino

media, ya que el proyecto privatizador entraba en contradicción con las


condiciones que creaba su política económica. Ahora resulta claro que en 1984
en Argentina sólo teníamos experiencias altamente recesivas a partir de los
sucesivos golpes de Estado vividos a partir de 1930. Luego sufrimos situaciones
de crisis en 1989, 1999 y 2001/2002, con gobiernos de diferentes partidos,
todos constitucionalmente electos, cuyas políticas y sus resultados, exigen una
mirada más profunda y cuidadosa.
No parece ser ésta la mirada que llevó, en junio de 2013, a que la
Dirección Nacional de Información y Evaluación de la Calidad Educativa del
Ministerio de Educación, publicara el documento “A propósito del debate sobre la
evolución de la matrícula en el sector privado”, intentando minimizar el fenómeno,
explicar el decrecimiento de la matrícula en la escuela primaria pública y el
incumplimiento de algunas metas establecidas en 2005 por el texto de la Ley
de Financiamiento Educativo, como son la extensión de la jornada escolar y
la elevación de la tasa de egreso del nivel secundario. Un espacio significativo
del documento está dedicado al proceso seguido por la matrícula privada1 y,
sin brindar mayor información, se sostiene que no “habilita hablar de
privatización” pues “resulta muy significativo que mientras el porcentaje de
alumnos que asiste a establecimientos privados ha crecido, en los últimos años
los fondos públicos transferidos a este sector de enseñanza se han mantenido
en el orden del 13% del presupuesto consolidado, lo que debe interpretarse
como una decisión de privilegiar el financiamiento de la educación pública”
(pág.7) y concluye que el proceso es atribuible a que “las familias cuentan con
mayores ingresos para solventar gastos educativos”. Enumera factores que
pueden explicar el fenómeno: preferencias ideológicas o religiosas, la búsqueda
de escuelas con jornada completa, de establecimientos que brindan un
“sentimiento de mayor orden o previsibilidad en el calendario escolar”,
“legítimas aspiraciones sociales que algunas familias entienden que pueden
tramitarse mejor en una escuela privada”. Sin explicitación de fundamentos
objetivos cierra el documento afirmando que el “sistema educativo en su
conjunto, y la educación pública en particular, han atravesado un período
reciente de mejora y desarrollo significativos, tanto en aspectos cuantitativos
como cualitativos” advirtiendo que “lo que falta o los debates aun pendientes
no deben hacernos perder de vista este punto”.

1
Vale recordar que la intervención del INDEC, en enero de 2007, privó de información confiable
al respecto. En el Censo Nacional de Población y Vivienda 2010 no se preguntó, por ejemplo,
sobre asistencia a la enseñanza pública o privada, dato indispensable para identificar cuáles
son los sectores sociales que realizan este movimiento de “trasvase” de la matrícula escolar.

50
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Un siglo de continuado avance: del liberalismo al neoliberalismo


Nuestras instituciones educativas integraron, ya en el período colonial,
un protosistemamixto (público/privado) con fuerte presencia de la Iglesia
Católica. Como expresáramos anteriormente, a partir de 1853 se abrió una
etapa de fuerte enfrentamiento entre sectores liberales y partidarios del
conservadurismo católico, que tuvo como eje la interpretación del “derecho
de enseñar y aprender” establecido en el último párrafo del artículo 14 de la
Constitución Nacional2. A lo largo de las décadas de 1860 y 1870 el Estado
asumió la creación de Colegios Nacionales y Escuelas Normales en todo el
país, política que despertó la reacción de quienes defendían la primacía de la
Iglesia en educación y, sobre todo, en la formación de quienes aspiraran a
estudios universitarios. Así, en 1878, tras fuertes debates se sanciona la ley 934
de Libertad de Enseñanza que reglamenta el art. 14 de la Constitución y
establece que los alumnos de los colegios particulares o provinciales tendrían
derecho de presentarse a examen de las materias correspondientes a la
enseñanza secundaria de los Colegios Nacionales ante cualquiera de éstos,
siempre que acreditaran haber seguido cursos regulares en colegios que llenaran
las condiciones establecidos en la ley que, en su art. 2, exigía exámenes ante
tribunales mixtos, cualesquiera fueran las calificaciones del alumno en el colegio
de origen. A pesar de la precisión del texto legal - que refiere a los colegios de
la modalidad Bachillerato - un decreto del Poder Ejecutivo de julio de 1897
por presión de los sectores privatistas, realizó una interpretación “sesgada” de
la ley, concediendo a diversas congregaciones católicas la incorporación de
establecimientos de otras modalidades, fundamentalmente escuelas normales
privadas para la formación de maestros.
La pretensión de autonomía de los establecimientos privados, el rechazo
por su carácter de instituciones adscriptas, subordinadas a la enseñanza oficial,
se manifestó públicamente y/o a través de presiones sobre los sucesivos
gobiernos. Así, en 1928, durante la segunda presidencia de H. Yrigoyen (Partido
Radical), se autorizó la eximición de examen, ante los Colegios públicos, a los
alumnos de las escuelas privadas que tuvieran un promedio anual de siete o
más puntos, medida que había sido rechazada por el gobierno, también radical,
de M.T. de Alvear. En 1932 el gobierno militar surgido del golpe fascista de
1930 (presidente Gral. Uriburu, Ministro Adolfo Bioy) dejó sin efecto la

2
H. F. Bravo (1983) ha hecho valiosos aportes respecto de la interpretación del texto constitucional
en el sentido de que “Es preciso tener en cuenta la distinción entre derecho de aprender y
derecho de enseñar, en tanto el primero es el derecho “fin”, al cual está subordinado el segundo,
por ser un derecho “medio”. En el ejercicio de este último derecho tiene su existencia la
enseñanza privada”.

51
VIOR, S. • Privatización de la educación: el caso argentino

autorización de Yrigoyen. Poco después el Gral Justo, elegido presidente a


través de elecciones fraudulentas, y su Ministro M. de Iriondo, restituyeron el
derecho a eximición.
Si bien los casos que hemos citado podrían considerarse como
“coyunturales”, analizándolos en un tiempo más largo pierden su carácter de
“excepcionales” para convertirse en momentos de un proceso de avance de la
privatización en educación. En lo que sigue se exponen, sintéticamente,
ejemplos de medidas adoptadas a lo largo del siglo respecto del financiamiento,
la supervisión estatal, la formación y el ejercicio de la docencia en el ámbito
privado; medidas que facilitaron y/o promovieron no sólo su expansión
cuantitativa, sino lo que algunos autores denominan la progresiva
“publificación” del sector (Gamallo, 2015)

La formación de docentes
En la década de 1930 comienza la ruptura del “normalismo” como
corriente filosófico- político-pedagógica identificada con la educación pública,
popular, laica y con énfasis en el saber científico. Desde el aparato estatal se
adoptan medidas política e ideológicamente coherentes con la orientación del
nacionalismo católico del golpe militar que derrocó al presidente Yrigoyen,
procurando limitar el número de estudiantes de magisterio mientras se amplía
el apoyo al sector privado, mayoritariamente propiedad de la Iglesia Católica,
que alcanza un fuerte crecimiento3 y mayor autonomía. En octubre de 1936 se
organiza la Inspección Técnica General de Enseñanza Incorporada. Es decir
que, como parte de un proyecto político que lucha por ampliar su autonomía,
logran crear un espacio propio de conducción técnico-pedagógica.
La matrícula continuó creciendo y se acentuaron las diferencias entre
ambos tipos de establecimientos y entre las condiciones de trabajo de docentes
y estudiantes: escuelas públicas cuya matrícula excedió la capacidad de
infraestructura, equipamiento y material didáctico, vs. pequeños o medianos
establecimientos privados, en muchos casos adecuadamente dotados. Diferentes
medidas, selectivas y restrictivas respecto de la formación de docentes, siguieron
y/o se profundizaron en las décadas siguientes constituyendo una política
coherente de ajuste del sector público y de apertura para la expansión del sector
privado. Así en 1969, al decretarse el pasaje de la formación de maestros al
nivel terciario, el 32% de los establecimientos eran públicos y el 68% privados.

3
El número de establecimientos privados de enseñanza media normal pasó del 26% del total, en
1930, al 58% en 1946.

52
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

El Anteproyecto de Ley Orgánica de Educación de 1968, que se intentó


imponer durante la presidencia de facto del GralOnganía (Secretario de Estado
de Educación José M. Astigueta) también da cuenta del papel subsidiario
asignado al Estado en materia de perfeccionamiento y actualización de los
docentes, al afirmar que “el Estado otorgará apoyo moral y material a la
iniciativa no estatal para la capacitación que responda a las exigencias de
análogos cursos ofrecidos por los órganos estatales”.4
Para dar cuenta de la continuidad del proceso privatizador, y a pesar de
las diferencias entre provincias, vale el caso de una jurisdicción: en la Ciudad
Autónoma de Buenos Aires había en 2015, 29 institutos públicos y 59 privados
dedicados a la formación de maestros y profesores para la educación inicial,
primaria y secundaria.

El financiamento
Hasta la década de 1940 el segmento privado fue creciendo, lenta pero
sostenidamente hasta lograr que el Estado creara un sistema de subsidios para
el pago de salarios docentes, que se consolidó y mantuvo hasta la actualidad.
En 1947 se consolida una relación entre el Estado y la Iglesia Católica,
que tiene como antecedentes los acuerdos alcanzados con los sectores
nacionalistas que accedieron al poder por el golpe militar de 1943 y convocaron
a elecciones generales en los últimos meses de 19455.
En primer lugar, en el mes de abril se aprobó la ley 12.9786 que ratificó
el decreto 18.411 del 31 de diciembre de 1943, que había implantado la
enseñanza de la religión católica en todas las escuelas de enseñanza primaria y
secundaria. En segundo lugar, en el mes de setiembre se sancionó la ley 13.047,
conocida como “Estatuto del Docente Privado”, que reglamentó el ejercicio
de la docencia en esos establecimientos y que, si bien mejoró sus condiciones
salariales no las igualó a las de los docentes de la educación pública. Directivos

4
La reforma educativa propuesta generó un rechazo social tan amplio que el gobierno, durante
la presidencia del Gral. Lanusse en 1972 debió dejarla sin efecto.
5
A través de la Pastoral del 15 de noviembre de 1945, leída en todas las iglesias, los obispos
expresaron claramente su preferencia respecto de los partidos y candidatos en pugna para las
elecciones de febrero de 1946, en las que Juan D. Perón fue electo por primera vez como
Presidente de la Nación: “Ningún católico puede afiliarse a partidos o votar a candidatos que
inscriban en sus programas los principios siguientes:...”2.La supresión de las disposiciones
legales que reconocen los derechos de la religión, y particularmente del juramento religioso y
de las palabras en que nuestra Constitución invoca la protección de Dios, fuente de toda razón
y justicia; porque tal supresión equivale a una profesión pública y positiva de ateísmo nacional.
3. El laicismo escolar....” (en Ciria, A., 1968)
6
Derogada por ley 14.401, en junio de 1955, como consecuencia del enfrentamiento entre el
gobierno y la Iglesia durante el segundo mandato del Gral. Perón.

53
VIOR, S. • Privatización de la educación: el caso argentino

y docentes del sector privado pasaron a cobrar un mínimo del 60% de los sueldos
que cobraban quienes trabajaban en el sector público. La ley se convirtió en un
instrumento para el otorgamiento de subsidios estatales al sector, aportes que
significaron (y significan) importantes ingresos para la Iglesia Católica, la mayor
propietaria de escuelas privadas del país. La norma hizo “recaer el costo de
esta mejora no en los propios institutos o en los usuarios de los institutos
privados, sino en el conjunto de la comunidad” (Pitelli, Somoza Rodríguez,
1997: 61).
M.J. Lubertino (1987) afirma que “...con esta conquista la iglesia iniciará
un profético cambio de estrategia, que le permitirá en el futuro no luchar más
por las estructuras del sistema educativo estatal para impartir sus enseñanzas,
sino valerse de sus propias estructuras, solventando sus gastos con el
Presupuesto de la Nación”.
Por otro lado, la Constitución Nacional resultante de la reforma de 1949,
en su Cap.III, art. 37, inc.IV, al establecer que “La educación y la instrucción
corresponden a la familia y a los establecimientos particulares y oficiales que
colaboren con ella, conforme a lo que establezcan las leyes” realiza una
afirmación muy fuerte dando rango constitucional a los principios filosóficos,
políticos y educacionales expresados en la Encíclicadel Papa Pío XI
DiviniIlliusMagistri sobre La educación cristiana de la juventud en diciembre de 1929.7
El período de gobierno desarrollista de Arturo Frondizi (Ministro Luis
Mac Kay/ Secretario de Educación Antonio Salonia) surgido de un acuerdo
electoral con el Partido Justicialista, da continuidad al avance del sector privado
a través de diversa normativa, como por ejemplo el decreto 12179 de octubre

7
… “es derecho inalienable de la Iglesia, y al mismo tiempo deber suyo inexcusable, vigilar la
educación completa de sus hijos, los fieles, en cualquier institución, pública o privada, no
solamente en lo referente a la enseñanza religiosa allí dada, sino también en lo relativo a cualquier
disciplina y plan de estudio”… “Esta vigilancia de la Iglesia, lejos de crear inconveniente alguno,
supone la prestación de un eficaz auxilio al orden y al bienestar de las familias y del Estado,
manteniendo alejado de la juventud aquel veneno que en esta edad inexperta y tornadiza suele
tener más fácil acceso y más rápido arraigo en la vida moral”… “en casos, generalmente
excepcionales, el Estado no se subroga en el puesto de la familia, sino que suple el defecto y lo
remedia con instituciones idóneas, de acuerdo siempre con los derechos naturales de la prole y
los derechos sobrenaturales de la Iglesia”… “el Estado puede y debe resolver el problema
educativo con mayor prudencia y facilidad si deja libre y favorece y sostiene con subsidios
públicos la iniciativa y la labor privada de la Iglesia y de las familias. La posibilidad de esta
política educativa, satisfactoria para las familias y sumamente provechosa para la enseñanza y
la tranquilidad pública, está comprobada por la experiencia de varias naciones, en las cuales, a
pesar de la diversidad de confesiones religiosas,los planes de enseñanza de las escuelas respetan
enteramente los derechos educativos de las familias, no sólo en lo concerniente a la enseñanza
–pues existe la escuela católica para los alumnos católicos–, sino también en todo lo relativo a
una justa y recta ayuda financiera del Estado a cada una de las escuelas escogidas por las
familias”.

54
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

de 1960 que otorga autonomía a los institutos privados, los que pasan a ser
“considerados como unidades administrativas técnico-docentes de gestión
propia” y a “aplicar el régimen de calificaciones, exámenes y promociones
vigente en el orden oficial”.8 A partir de ese momento, y durante algunos años,
se tomaron pruebas anuales, cuatrimestrales o trimestrales que podrían dar
cuenta de alguna supervisión de la calidad del trabajo en el sector privado,
pero no hay registro de antecedentes de control alguno sobre esas pruebas.

El ejercicio de la docencia privada


Recién en 1958, luego de largas luchas sindicales, se sanciona la Ley
14473 (Estatuto del Docente) que equipara a los docentes de los ámbitos público
y privado. La ley tiene un capítulo en el que se enuncian disposiciones especiales
para la enseñanza adscripta. Comprende al personal docente de las plantas
funcionales reconocidas por la normativa, y establece que recibirían una
remuneración mensual idéntica a la que en igualdad de especialidad, tarea y
antigüedad, percibiera el personal similar de los establecimientos oficiales.
El breve período constitucional 1973/1976 permitió la aprobación del
Estatuto del Docente Privado (ley 20614) que dio estabilidad en el cargo al
personal de esos establecimientos. El texto fue producto de dos proyectos
presentados en la Cámara de Diputados de la Nación, uno por el diputado
comunista Juan Carlos Comínguez (integrante de la Alianza Popular
Revolucionaria) y otro por el diputado del Partido Popular Cristiano Carlos
Auyero (integrante del Frente Justicialista de Liberación), y de modificaciones
impuestas por el Senado que justificaban el despido en caso de “contradicción
ideológica entre la enseñanza impartida por el docente y los objetivos del colegio
o instituto privado”.
Esas modificaciones no parecieron suficientes, la ley fue derogada por
la dictadura en agosto de 1976. La estabilidad de los trabajadores de la
educación privada no fue restablecida, aun hoy su régimen laboral se encuadra
en las condiciones de empleados de comercio.

Un “único” sistema educativo


En el ya referido Anteproyecto de ley de la Revolución Argentina (dictadura
1966/1973) la derecha católica introdujo, por primera vez, la posibilidad de legislar
8
El decreto estableció que, al cierre de cada término lectivo, se realizaran en esas instituciones
exámenes escritos de tres asignaturas elegidas por el entonces denominado Servicio Nacional
de Enseñanza Privada. La nota que los estudiantes obtuvieran en esa prueba, que debía ser
incorporada al Archivo de Documentación Oficial, se promediaba con la nota promedio del
término lectivo.

55
VIOR, S. • Privatización de la educación: el caso argentino

en una sola norma, sobre la que denomina educación “pública, de iniciativa estatal
y no estatal”, que constituye el “sistema federal de educación”.
El documento en su art.5 planteaba que todo “habitante de la República
tiene derecho a recibir educación en establecimientos públicos estatales o no
estatales, sin otros límites que los impuestos por el bien común, la moral y las
buenas costumbres”
En su art. 20° preanunciaba el principio de libertad de elección que se
hizo efectivo casi treinta años después: “El principio de igualdad de
oportunidades constituye la expresión del derecho natural de los padres del
educando menor, para elegir libremente y sin quedar forzados por motivos de
índole económica, los institutos, maestros, métodos y medios que juzguen aptos
para la formación moral e intelectual de sus hijos menores”.
La propuesta afirmaba, finalmente, que la ayuda económica a la
enseñanza privada “será acordada para el pago de sueldos de profesores y
también para facilitar su equipamiento, ampliaciones edilicias, y expansión”
siempre que cumplieran con los requisitos para su funcionamiento.

La década neoliberal
Ante una crítica situación económica y política, en julio de 1989 el
presidente Alfonsín entrega anticipadamente el gobierno al recién electo Carlos
Menem, candidato por el Partido Justicialista. Rápidamente aparecen
manifestaciones en educación, del proceso más amplio de privatización de
grandes empresas estatales, servicios públicos, sistema financiero, etc., sufrido
por la Argentina en las últimas dos décadas. En un trabajo ya referido (Vior /
Rodríguez, 2012) revisamos algunos momentos significativos en el desarrollo
de la política educacional del período, y afirmamos que la transformación
educacional no constituyó una consecuencia sino un componente decisivo del
modelo implantado.
Durante el gobierno justicialista de Carlos Menem, en marzo de 1991,
con el objetivo de “revisar los criterios de distribución del aporte estatal
destinado a solventar los haberes del personal docente de los Institutos Privados
incorporados a la Enseñanza Oficial, contenidos en el Decreto N° 15 del 2 de
enero de 1964” y considerando que “deben participar...las entidades intermedias
de la enseñanza para que haya mayor transparencia, claridad y precisión en
las conclusiones a que se arribe...” el Ministro de Educación, Antonio Salonia,
crea por resolución ministerial N° 286 la Comisión de Reforma y Actualización
del Decreto 15/64 integrada por un representante de cada una de las siguientes
Asociaciones o Consejos: Superior de Educación Católica, de Educación
Cristiana Evangélica, Superior de Enseñanza Israelita, de Institutos de

56
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Enseñanza Privada, de Rectores de Enseñanza Privada, de Entidades de


Enseñanza Privada, de Institutos Privados Especiales, y dos Supervisores de
Organización Escolar por la Superintendencia de la Enseñanza Privada.
Como resultado del trabajo de la Comisión, representativa de esos
diversos sectores propietarios de establecimientos privados, en diciembre de
1991 el presidente Menem y su ministro Salonia firman el Decreto 2542/91que
introduce, en su art. 1°, un principio caro a la Nueva Derecha: la libertad de
elección, al enunciar que “A fin de asegurar la opción de los padres de elegir la
escuela para sus hijos, en el marco de la libertad de enseñar y aprender que
garantiza la Constitución Nacional, el Estado contribuirá a la financiación de
los Institutos Incorporados a la Enseñanza Oficial, de conformidad con las
normas del presente decreto”.
En el caso de los establecimientos que perciben aranceles, la contribución
del Estado podría alcanzar el 80%, pero llegaría al 100% para los meses de
enero y febrero y el sueldo anual complementario. En el caso de los
establecimientos gratuitos, el financiamiento “alcanzará el cien por ciento de
los sueldos del personal directivo, docente y docente auxiliar, incluidas las
contribuciones patronales durante los doce meses y los sueldos anuales
complementarios.”
Las solicitudes de financiamiento estatal pasan a resolverse sólo en el
ámbito de la Superintendencia Nacional de la Enseñanza Privada del Ministerio
de Educación, sin intervención del Ministerio de Economía ni de la Secretaría
de Hacienda, lo que sí establecía el decreto 15/64.
En el mismo mes, en plena etapa de plan económico de ajuste fiscal, se
sanciona la Ley N° 24049 que aprobó la transferencia de todas las instituciones
educativas de nivel primario y secundario del Estado nacional a las provincias
y a la Ciudad Autónoma de Buenos Aires, asegurando las prerrogativas del
sector privado. En su artículo 23 afirma que “Los servicios educativos de gestión
privada que se transfieren quedan garantizados para que se sigan prestando
con respeto de los principios de la libertad de enseñanza y los derechos
emergentes de la normativa nacional sobre la materia. Consecuentemente,
podrán mantener sus características doctrinarias, modalidades curriculares y
pedagógicas y el estilo ético formativo propios, en el ámbito de las jurisdicciones
receptoras. Éstas mantendrán el régimen de aportes a la enseñanza privada en
concordancia con el fijado en el orden nacional, en lo que hace a montos,
proporciones y destino a los servicios transferidos”.
La ley autorizó también la transferencia de los institutos de educación
superior no universitaria en el momento en que el Poder Ejecutivo (PEN) lo
considerara conveniente. Dos semanas fue el tiempo que demoró el PEN en

57
VIOR, S. • Privatización de la educación: el caso argentino

incluir a esas instituciones. Las provincias debieron crear organismos y generar


recursos para la supervisión pedagógica y el financiamiento de una importante
cantidad de instituciones y docentes privados hasta entonces dependientes del
Estado nacional, en condiciones comparativamente mejores que el segmento
público transferido.
La sanción de la Ley Federal de Educación (Nº 24195) otorgó, en 1993,
respaldo legal definitivo a las pretensiones del sector privado, al definir a toda
la educación como pública y diferenciar a las instituciones por el tipo de gestión,
estatal o privada. Recordemos que en 1968 la autonomía creciente del sector
privado había sido acompañada, en el gobierno de facto del Gral. Onganía,
por un discurso que abandonó la diferenciación entre ´oficial/público´ y
´particular/privado´- base de legitimación de la educación estatal garante de
los intereses comunes - para sustituirla por la distinción entre ´público de gestión
estatal´ y ´público de gestión privada´, ocultando la propiedad de las
instituciones y el status diferenciado de sus docentes, tratados como empleados
de comercio y no como funcionarios públicos.
El avance de la Nueva Derecha sobre la educación pública, con sus
componentes neoliberal y neoconservadora, se realizó sobre un sistema
educativo con un grado de privatización importante. El Estado garantizó,
mediante nuevas regulaciones, condiciones de financiamiento que aseguraron
la “rentabilidad” y una cierta “calidad” de un sector privado subsidiado, y
reforzó la segmentación del sistema educativo según condición socio-económica
de los alumnos.
En cuanto a la orientación neoconservadora, quedó explícita en el art.4
de la Ley Federal, al afirmar que “Las acciones educativas son responsabilidad
de la familia, como agente natural y primario de la educación, del Estado
nacional como responsable principal, de las provincias, los municipios, la Iglesia
Católica, las demás confesiones religiosas oficialmente reconocidas y las
organizaciones sociales”, que se constituyen, junto a las “instituciones
educativas estatales”, como “entidades de gestión privadas reconocidas” (art.
7) que mantienen su normativa histórica” (Capítulo V, arts. 36 a 38).
Si hacemos un inventario de lo sucedido a lo largo de la década de 1990,
la afirmación de M.J. Lubertino anteriormente citada parece, por lo menos,
débil: la Iglesia siguió luchando por jugar un papel decisivo en la aprobación
de la Ley Federal de Educación, participó de la elaboración de las condiciones
para la transferencia de sus establecimientos a las provincias y de su
financiamiento, y cuestionó, hasta que logró modificar, desde concepciones
preconciliares, los Contenidos Básicos Comunes propuestos por las Comisiones
de científicos y expertos contratados por el Ministerio de Educación nacional
para su elaboración.

58
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Para seguir estudiando


A la luz de lo ocurrido a partir de los años ´90 se hace necesario analizar
también la participación de los diferentes grupos de poder en la definición,
elaboración e implementación de las políticas para el área. La Iglesia católica
desde siempre, diferentes grupos religiosos, evangélicos y judíos que responden
a sectores tradicionalistas y sionistas, empresarios, entidades representativas
de diferentes comunidades nacionales hacen lobby, hoy, a través de su
participación en diversas instancias institucionales.
Desde nuestro punto de vista, uno de los indicadores de esta nueva
situación se expresa en la integración del Consejo Económico-Social - creado
por la Ley Federal (1993) como órgano consultivo del Consejo Federal de
Educación y refrendado por la Ley de Educación Nacional (2006) autocalificada
como anti-neoliberal - con “representantes de las organizaciones gremiales
empresarias de la producción y los servicios, la Confederación General del
Trabajo y el Consejo de Universidades”. Para permitir la posibilidad de mayor
presencia privada se sustituyó a la representación del Consejo Interuniversitario
Nacional (integrado sólo por las Universidades públicas) por la del Consejo de
Universidades, en el que las Universidades privadas son mayoría.
Los procesos de reestructuración del Estado y de la sociedad y las
reformas educacionales articuladas con ellos, compartidos en muchos aspectos
por la mayoría de los países de América Latina, probablemente resultaron en
el caso argentino mucho más dramáticos, por haber sido el país de la región
que, históricamente, había alcanzado momentos de altos porcentajes de la renta
en manos de los trabajadores, y de alto grado de desarrollo en los sistemas de
salud y educación públicos.
Para seguir estudiando la relación entre educación pública y educación
privada, proponiéndonos ahora encarar una mirada abarcadora del conjunto
de nuestros países, seguramente no podremos obviar el papel jugado por los
organismos internacionales, sean de apoyo y asesoramiento como UNESCO
y CEPAL, o de financiamiento como el Banco Mundial, el Banco
Interamericano de Desarrollo,fundamentalmente a partir de la crisis de la deuda
externa en la década de 1980.

Referencias
BRAVO, H. F. Educación popular, CEAL: Buenos Aires, 1983.
CIRIA, A. Partidos y poder en la Argentina moderna (1930-1946), E. Jorge Alvarez, Bs. As., 1968.
CONSEJO NACIONAL DE DESARROLLO (CONADE) Educación, recursos
humanos y desarrollo económico-social: situación presente y necesidades futuras. 2vs. Buenos
Aires, 1968.

59
VIOR, S. • Privatización de la educación: el caso argentino

Constitución Nacional Justicialista (1949) Ministerio de Educación de la Nación, Bs.


As., 1952.
GAMALLO, G. La “publificación” de las escuelas privadas en Argentina. Revista SAAP,
v. 9, n. 1, Buenos Aires, mayo 2015.
KRAWCZYK, N.; MALAJOVICH, A. M.; VIOR, S. Aportes para una desmitificación,
Revista Argentina de Educación, Buenos Aires, año 4, Nro. 6, 1985.
LUBERTINO BELTRÁN, M. J. Perón y la Iglesia, CEAL, Bs. As, 1987.
MEZZADRA, F.; RIVAS, A. Aportes estatales a la educación de gestión privada en la
provincia de Buenos Aires, Doc. de trabajo, n. 51, CIPPEC, Buenos Aires, 2010.
MINISTERIO DE EDUCACIÓN, DINIECE, A propósito del debate sobre la evolución de
la matrícula en el sector privado, Buenos Aires, 2013.
MINISTERIO DE EDUCACIÓN, DINIECE, Anuario estadístico educativo, 2016.
Disponible en: <http://portales.educacion.gov.ar/diniece/2014/05/24/anuarios-
estadisticos/>. Acceso en: diciembre/2017.
MORDUCHOWICZ, A. El financiamiento educativo en Argentina: Problemas
estructurales, soluciones coyunturales. IIPE/UNESCO, Buenos Aires, 2002.
NARODOWSKI, M.; MOSCHETTI, M.; GOTTAU, V. El crecimiento de la educación
privada en Argentina: ocho explicaciones paradigmáticas. Cadernos de Pesquisa, Sao
Paulo, 2017. Disponible en: <http://dx.doi.org/10.1590/198053143853>. Acceso en:
enero/2018.
OREJA CERRUTI, M. B.; VIOR, S. “La educación y los organismos internacionales
de crédito. Préstamos y recomendaciones para América Latina (2000-2015)”. En: Journal
of Supranational policies of education, n. 4, 2016.
Pio XI. CARTA ENCÍCLICA DIVINI ILLIUS MAGISTRI SOBRE LA
EDUCACIÓN CRISTIANA DE LA JUVENTUD. 31 de diciembre de 1929, Libreria
Editrice Vaticana.
PITELLI, C.; SOMOZA RODRÍGUEZ, M. “La enseñanza religiosa en las escuelas
públicas durante el primer peronismo (1943-1955)”. In: CUCUZZA, H. R. (Dir.).
Estudios de la historia de la educación durante el primer peronismo, 1943-1955. UNLuján/
Ed. Los Libros del Riel, 1997.
VIOR, S. E.; MISURACA, M. R. Conservadurismo y formación de maestros. Revista
Argentina de Educación, Año XVI, N° 25, AGCE, Buenos Aires, 1998.
VIOR, S. E.; RODRÍGUEZ, L. R. La privatización de la educación argentina: un
largo proceso de expansión y naturalización. Pro-Posicoes, v. 23, n. 2, 2012.
VIOR, S.; OREJA CERRUTI, M. B. “O Banco Mundial e a sua influencia na definiçào
de políticas educacionais na América Latina (1980-2012)”. In: A Demolição de direitos,
Rio de Janeiro: Fiocruz. ISBN: 978-85-98768-78-6, 2015.

60
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

La educación venezolana en el contexto


de desarrollo de las tensiones entre
lo público y lo privado

Samuel H. Carvajal Ruíz


Paulina E. Villasmil Socorro

Introducción
El presente ensayo intenta reflejar de manera sintética el vasto y com-
plejo proceso histórico-político de configuración de la relación entre la educa-
ción pública y la privada en Venezuela. Se trata de un fenómeno afectado por
múltiples dimensiones, matizado por tensiones, controversias y particularida-
des que posteriormente tuvieron influencias en fenómenos y decisiones de
carácter político, algunas de ellas de gran calado por su permanencia como
legado en el transitar de la educación venezolana.
Este esfuerzo teórico-intelectual no pretende abordar la amplia y compleja
trama de relaciones y momentos que han caracterizado la configuración del
objeto reseñado y estudiado. Más bien, pretende exponer algunos apuntes
significativos a los efectos de contribuir en el estudio de la conflictiva relación de
lo público y lo privado en el ámbito de la educación nacional.
Con esta finalidad se destaca el Decreto de Instrucción Pública de 1870
promulgado durante el gobierno del presidente Antonio Guzmán Blanco, el
cual expresa nítidamente una apuesta por un proyecto educativo popular y
laico. Esto supuso un hito histórico al sentar las bases para la constitución de
un sistema educativo nacional con repercusiones sobre la influencia de la Igle-
sia Católica en ese campo, como expresión embrionaria del proyecto de la
educación privada en el país.
En este breve y ajustado recorrido se exponen algunas manifestaciones
de este complejo proceso a lo largo del siglo pasado hasta recalar en el tránsito
histórico actual en el que, de manera renovada, se izan las banderas en defensa
de la educación pública, gratuita y laica, así como la libertad de enseñanza y
de pensamiento, ante las afinadas y sutiles estrategias de cooptación de lo
público diseñadas y experimentadas por el capitalismo en su expresión político-
cultural neoliberal.

61
CARVAJAL RUÍZ, S. H.; VILLASMIL SOCORRO, P. E. • La educación venezolana en el contexto
de desarrollo de las tensiones entre lo público y lo privado

Dadas las características y alcances de este texto, se insistirá en aquellos


hechos que consideramos significativos a los propósitos de la temática
planteada, a riesgo de excluir otros aspectos también relevantes de este complejo
y amplio proceso histórico.

Un punto de partida
El contexto de desarrollo de la educación en el país posterior a la
configuración de la Venezuela desprendida de la Gran Colombia se caracterizó
por la inestabilidad política producto de las confrontaciones político-militares
sucedidas a partir de 1830. Este hecho se erige como un obstáculo definitivo
en la concepción de la política dirigida a desarrollar la educación nacional.
En 1870, cuando Venezuela aún transitaba por la compleja ruta de las
confrontaciones caudillistas, en el contexto de una difícil construcción e
integración nacional, luego de la ruptura del proyecto Bolivariano de la Gran
Colombia, el presidente Antonio Guzmán Blanco promulga el Decreto del 27 de
junio de 1870 sobre Instrucción Primaria gratuita y obligatoria. Dicho decreto
representó uno de los pilares fundamentales de la educación pública del país y
con ello la emergencia del Sistema Educativo venezolano.
No es un hecho menor el tema de la Guerra Federal y su vinculación
con este importante decreto educativo. La desmembración de la Gran Colombia
tiene como principal repercusión en el país la disputa del poder político por
parte de las élites políticas, económicas y militares. Los conservadores,
principales promotores de la ruptura, se sentían fuertes bajo el liderazgo de
José Antonio Páez, prócer de la Independencia e importante jefe político-
militar, después de El Libertador Simón Bolívar, quien logró aglutinar diferentes
facciones y sectores sociales, tanto de la élite comercial heredera de la colonia
como a los latifundistas de nuevo cuño, devenidos del proceso independentista.
Sin embargo, el interés que concitaba el control del poder por parte de las
élites políticas, militares y comerciales, restó importancia a la implementación
de políticas educativas definidas, por parte de Estado emergente, el tema educativo
fue un asunto secundario, residual.
La promulgación del mencionado decreto de instrucción pública
imprimió un salto cualitativo en materia educativa respecto a la historia reciente
de la república y a la dinámica ya observada en la acción de los gobiernos
precedentes. Bajo esta norma se crea el Ministerio de Instrucción Pública, como
entidad fundamental para echar a andar la institucionalidad estatal venezolana
responsable de regular, velar y garantizar el derecho supremo de la educación
de las generaciones futuras. Se trata, en consecuencia, de un hito clave para
comprender la evolución de la educación pública y su correlato en el ámbito
privado en Venezuela.

62
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Lo público y lo privado en la educación venezolana


El decreto guzmancista de finales del siglo XIX representó para el futuro
de la educación pública venezolana un avance significativo, puesto que propició
las bases para la configuración posterior del sistema público de enseñanza.
Como se afirma anteriormente, en un primer momento, permitió la creación
de nuevos centros de enseñanzas, regular sus pautas de funcionamiento y
diseñar un currículum común para la educación primaria.
Guillermo Luque (2001) sostiene que durante ese período de hegemonía
política guzmancista: […] se produjeron medidas dirigidas al fomento de la educación
por el Estado con una orientación nacional, laica y popular (p. 106).
Este decreto tuvo una rápida repercusión en la educación nacional, al
punto de alcanzar, en escasos cinco años, 482 escuelas en todo el país, entre
federales y municipales; a esta cifra se suman 172 centros educativos privados.
Esta tendencia de crecimiento cuantitativo de la cobertura escolar impulsada
por el Decreto de Instrucción Pública se refleja en la multiplicación de la
matrícula escolar, acompañada por la creación de nuevos centros de enseñanza
primaria, tanto de titularidad federal como municipal.1
La desidia manifiesta del poder político, centrado en reformas constitu-
cionales y procesos constituyentes como mecanismos dirigidos a preservar el
control del Estado, en detrimento de las políticas de desarrollo para la repúbli-
ca emergente, acentuó el poder de las entidades religiosas en la educación. La
escolarización obedecía más a una obra “social de caridad cristiana” impulsa-
da por la Iglesia Católica y congregaciones afines a esta, pese a las tenues
manifestaciones de la escuela pública como entidad orgánica, asumida como
responsabilidad suprema por el Estado.
Precisamente, es este giro ideológico hacia el laicismo educativo incor-
porado a la educación nacional uno de los principales factores que coloca en
“pie de guerra” a la institución eclesiástica católica en contra del gobierno de
Antonio Guzmán Blanco. Algunas manifestaciones de estas tensiones se tra-
ducen en la práctica, en propuestas del gobierno dirigidas a la creación de una
iglesia independiente de Roma; además, se toman medidas administrativas y
patrimoniales con incidencia directamente en los intereses de la Iglesia; así
como, la instauración del matrimonio civil, la secularización de los cemen-
terios, entre otras acciones que contravenían los ámbitos de influencia contro-
lados por esta congregación religiosa.

1
De acuerdo con Luis Antonio Bigott (1995) en su obra: “Ciencia, Educación y Positivismo en
el Siglo XIX Venezolano”. Estudios, Monografías y Ensayos. N° 169. Para el año de 1881 las
1.148 escuelas federales creadas albergaban a 43.627 alumnos y las 536 escuelas municipales
existentes para ese año, un total de 17.386.

63
CARVAJAL RUÍZ, S. H.; VILLASMIL SOCORRO, P. E. • La educación venezolana en el contexto
de desarrollo de las tensiones entre lo público y lo privado

En este sentido, el protagonismo de la Iglesia Católica en materia


educativa señala una relación con el Estado, unas veces de correspondencia,
otras de contradicción, en la configuración de los espacios de influencia y límites
entre la educación pública y la privada en el país.
Por ello, el hito histórico de la promulgación del Decreto de Instrucción
Pública por el gobierno del presidente Guzmán Blanco es de vital importancia,
entre otras razones porque, aparte de ser concebido como un instrumento de
la hegemonía liberal y mecanismo para ampliar su influencia política e
ideológica en la sociedad venezolana, también viene a cumplir el papel de
“muro de contención” ante la pretensión eclesiástica de extender su influencia
en la educación nacional.
El Código de Instrucción Pública de 1897, decretado bajo el gobierno
de Joaquín Crespo, aparte de incorporar aspectos ordenadores y funcionales
del incipiente sistema educativo nacional, constituyó otro punto de inflexión
importante en los desencuentros históricos entre el poder constituido y la Iglesia
Católica. El Artículo 17 del mencionado instrumento jurídico relega a un papel
optativo la formación religiosa cuando estableció: La Instrucción Primaria
voluntaria comprende todas las materias que los poderes públicos juzguen conveniente
enseñar en los planteles de Instrucción, y que es potestativo a los venezolanos aprender o
no. Pertenece a ella la instrucción religiosa (p. 426-427).
Previamente, este Código reconoce y demarca los términos tanto de la
“Instrucción” pública como la privada en Venezuela. En este sentido, establece
en el Artículo n. 1: la instrucción: […] pública es la sostenida por las rentas de la
nación, los estados o los municipios; la privada es la que se adquiere en familia o se da
por particulares, a domicilio o en establecimiento creados a los efectos (p. 424-425).

Las tensiones entre lo público y lo privados.


Apuntes sobre el siglo XX
El siglo XX venezolano se inicia con la dictadura de Cipriano Castro,
líder de La Revolución Restauradora, posteriormente liderada por Juan Vicente
Gómez, cuyo gobierno ocupó las cuatro primeras décadas del siglo pasado.
En relación con este momento histórico, acota el historiador Guillermo Luque
lo siguiente:
La Restauradora, en tanto que movimiento político-militar iniciado por
Cipriano Castro desde la frontera colombiana, trajo consigo el principio del
fin de los caudillos regionales: la centralización política, administrativa y
militar fueron las bases del nuevo gobierno que se inauguró con la consigna
de “Nuevos hombres, nuevos ideales y nuevos procedimientos.2

2
LUQUE, 2001, p. 113.

64
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Este hecho se traduce en un paso significativo en la centralización del


poder político como mecanismo ordenador de las relaciones de poder entre
los otrora focos de inestabilidad política del país, producto de la confrontación
armada entre los liderazgos regionales.
En relación con este proceso, Bautista Urbaneja sostiene: Es posible que
algunos discutan el que la centralización sea un proceso positivo. Sin embargo, en las
circunstancias históricas del momento, no parece que fuera posible la eliminación del
caudillismo sin un proceso concomitante de centralización.3
Tal contexto caracterizado por la decadencia del “Liberalismo amarillo”4,
favorece la emergencia de otros liderazgos y actores políticos en la vida nacional.
Diversas fuentes5 coinciden en señalar que el proceso iniciado por Cipriano
Castro y continúa J.V. Gómez, fue un período signado por tenues y/o escasos
avances en materia educativa.
En cuanto a este asunto, Rodríguez (2008) describe a grandes rasgos los
ejes medulares en la materia para ese período. En este sentido, explica:
En lo referido a políticas del sistema escolar, se favoreció la educación laica,
el estado docente, las escuelas privadas, la organización centralizada del
sistema, la reglamentación de las funciones de los organismos del Ministerio
de Instrucción y de sus funcionarios, la coeducación y, como mencionamos
anteriormente, la política expresa de atención preferencial a pocos estudiantes
por sobre la inclusión de las mayorías (p. 8).

Más adelante matiza las acciones del gomecismo educativo, introduciendo


atisbos de dudas respecto a la concreción de tales políticas, cuando advierte:
Quedan dudas sobre la verdadera aplicación de muchas de esas disposiciones
tanto en sus aspectos positivos como en las prohibiciones expresas. Las
condiciones reales en las escuelas, como las condiciones de vida de la mayoría
de la población, las dificultades para la supervisión, las carencias de recursos
[…] revelaban un distanciamiento entre las reglamentaciones y las prácticas
(p. 8).

Sin embargo, queda demostrado el interés de orientar la educación hacia


las necesidades de formación de las élites. Abreu Suárez (2014) sostiene que:
El período simbolizado entre Castro y Gómez es calificado como el escenario
de la educación de las élites liberales, en esos años el presupuesto educativo

3
BAUTISTA URBANEJA, D. La política venezolana desde 1899 hasta 1999. Temas de Formación
sociopolítica. Caracas: Centro Gumilla – Publicaciones UCAB, 2002, p. 16.
4
Hace referencia al movimiento político – ideológico liderado por el presidente Antonio Guz-
mán Blanco, que ocupó el período comprendido entre 1870 y 1899, durante el cual Venezuela
tuvo diez presidentes de la república, entre ellos el propio Guzmán Blanco, y en el que se
emprendieron reformas en los ámbitos político, económico, militar, social y cultural dirigidas a
modernización del país.
5
LUQUE, G., 2001; RODRÍGUEZ, N., 2008; DUPLA, F. J., 2010, 2014.

65
CARVAJAL RUÍZ, S. H.; VILLASMIL SOCORRO, P. E. • La educación venezolana en el contexto
de desarrollo de las tensiones entre lo público y lo privado

fue muy reducido y el cierre de las universidades una constante como


estrategias de dominación y miedo al adversario (p. 127).

Esta apuesta por la formación de las élites decanta la acción educativa


del régimen gomecista, traducida en su inclinación a abrir mayores espacios
de participación de la Iglesia y de otros actores privados en el sector educativo.
Coincide este hecho con la introducción orgánica de las ideas positivistas en el
currículo de educación primaria. Mora-García (2004) reseña este hecho
resaltando que, para 1911, se introducen en el Diseño Curricular Nacional las
ideas del positivismo, impulsadas por el entonces Ministro de Instrucción
Pública, el intelectual José Gil Fortoul, las cuales tienen expresión material en
los […] primeros programas para la instrucción primaria venezolana.6
Este hecho configura el precedente y escenario cultural para determinar
la orientación de la política educativa hacia la formación de las élites funcionales
a los intereses políticos e ideológicos de la dictadura de J. V. Gómez. J. Pascual
Mora-García esgrime la presencia del positivismo en la educación y
concretamente en el mencionado diseño: […] hizo posible que una élite tuviese la
oportunidad de monopolizar el saber, y sacrificar a la gran masa de la población a la
ignorancia y el atraso.7
En concordancia con esta orientación política e ideológica, el Gomecis-
mo marca un hito sin precedentes en la historia de la educación republicana, al
abrir sin restricciones este ámbito a la participación privada. Es en la gestión del
ministro de Instrucción Pública del régimen Felipe Guevara Rojas cuando se
inicia la “contrarreforma en la instrucción pública”8 inspirada en el marco
ideológico del “liberalismo absoluto”, el cual deroga el Código de Instrucción
Pública de 1912 y establece, refrendado por los órganos del Estado:
Toda persona en el pleno ejercicio de sus derechos civiles, puede fundar
establecimientos docentes y enseñar cualquier ramo de los conocimientos,
sin necesidad de plena licencia, ni sujeción a reglamentos, programas,
métodos o textos oficiales.9

Este proceso de “contrarreforma se materializa”, porque, contrario a A.


Guzmán Blanco, el Gomecismo restaura las relaciones con la Iglesia Católica,
institución con mayor influencia y amplia organización orientada a la función
educativa privada. Duplá (2014) describe este cambio de actitud gubernamental
señalando que a finales del siglo XIX: […] se permitió el regreso de las congregaciones
religiosas que habían sido expulsadas en tiempos de Guzmán Blanco.10

6
Pascual MORA-GARCÍA, J. P., 2004, p. 56.
7
Pascual MORA-GARCÍA, J. P., 2004, p. 57.
8
LUQUE, G., 2001, p. 122.
9
Citado en LUQUE, G., p. 125.
10
DUPLÁ, F. J., 2014, p. 116.

66
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Según Duplá F. J.: Al finalizar el gobierno de Gómez había cincuenta colegios


y diecisiete congregaciones religiosas en el país que se dedicaban mayoritariamente a la
educación.11 Este hecho no solo significó un cambio de postura en el protago-
nismo de la Iglesia Católica en la educación nacional, sino también un repun-
te de la iniciativa privada en la educación impulsada por este cambio de esce-
nario favorable a los intereses educativos eclesiásticos, como expresión de una
nueva “época de colaboración” entre el Estado y la Iglesia.12
Pese a esta relación, el gobierno de J.V. Gómez se mantuvo firme ante las
exigencias de las altas autoridades de la Iglesia, las cuales demandaban incluir la
enseñanza de la religión como asignatura obligatoria y […] protestaron el
sometimiento de la educación privada al Estado establecida en la nueva Ley13 de 1924
[…], justificado […] en el principio absoluto de libertad de enseñanza.14

El post Gomecismo y el Trienio Adeco15


La muerte del dictador Juan Vicente Gómez en diciembre del año 1935,
dio paso la ascensión a la presidencia de la República del General Eleazar
López Contreras, Ministro de Guerra y Marina del dictador. Con ello se
garantiza la continuidad del Gomecismo y, paralelamente, una lenta transición
hacia vías democráticas de gobierno. Este momento histórico comprendido
entre 1936 y 1941, se caracterizó por la apertura política progresiva expresada
en el reconocimiento de los partidos políticos y en una ligera recuperación de
las libertades de participación política, gremial y sindical.
La designación en 1936 del escritor y poeta Rómulo Gallegos como
Ministro de Instrucción Pública es expresión de esta apertura política y cultural.
Entre las reformas introducidas por el nuevo ministro destaca el cambio de
denominación de la institución educativa a Ministerio de Educación Nacional.
Ese mismo año, se realiza la Primera Convención Nacional del Magis-
terio Venezolano que representa el punto de partida de la Federación Venezo-
lana de Maestros, iniciativas impulsadas por la Sociedad Venezolana de Ma-
estros de Instrucción Primaria (SVMIP) creada en el año 1932, por el empuje
del notable maestro e intelectual venezolano Luis Beltrán Prieto Figueroa y
otros ilustres maestros de la época. Este dato es relevante, porque es Prieto
Figueroa quien años después será Ministro de Educación y va a fundamentar
la doctrina del Estado Docente en el país.

11
DUPLÁ, F. J., 2014, p. 116
12
2014, p. 116.
13
Ley de Instrucción Pública de 1924.
14
2014, p. 130.
15
El Trienio Adeco es un período de tiempo comprendido entre de 1945-1948, gobernado por el
partido socialdemócrata Acción Democrática.

67
CARVAJAL RUÍZ, S. H.; VILLASMIL SOCORRO, P. E. • La educación venezolana en el contexto
de desarrollo de las tensiones entre lo público y lo privado

Luego de un largo período de estancamiento, la gestión liderada por


Rómulo Gallegos promueve una serie de reformas16 en consonancia con el
proceso de apertura política que apunta hacia su recuperación, muy a pesar de
la pervivencia de un marco legislativo de la educación nacional de herencia
gomecista.
La dirección política en materia educativa es mantener la línea de
“colaboración” entre el Estado y el sector privado con repercusión en el
“beneficio” de toda la población. Se trata de preservar los aspectos ya normados
en las legislaciones del gomecismo, con el matiz determinante de los “tiempos
de apertura política” experimentados para entonces. También significa el
control de la función pública de la educación por parte del Estado, como garante
del acceso a este derecho para toda la sociedad.
En 1940, al final del período de gobierno de López Contreras, se
promulga en julio de ese año la Ley de Educación Nacional. Cabe destacar
con la ayuda de Peña Rosales que:
La importancia de esta Ley se fundamenta en su orientación al pretender
disminuir los privilegios, a personas e instituciones en el campo educativo,
refiriéndose fundamentalmente a los privilegios de la educación con
orientación de la Iglesia Católica, convirtiéndose en un instrumento de lucha
de los educadores por una educación laico y de carácter público.17

El general Isaías Medina Angarita sustituye a López Contreras en el


poder, luego de un ensayo de elecciones presidenciales de tercer grado que,
según algunos autores18, eran susceptibles de ser manipuladas. El período de
Medina Angarita se caracterizó por la profundización de las reformas y
garantías democráticas iniciadas en el gobierno anterior. En este sentido, se
incorporan una serie de cambios para garantizar la elección directa de los
diputados, se aprueba el derecho al voto para las mujeres en las elecciones a
los Consejos Municipales, entre otras acciones democratizadoras.19
La política educativa en este período es, básicamente, una continuidad
de los años precedentes; ésta tiene como ejes fundamentales el avance en las

16
Luís PEÑA ROSALES (2001) sintetiza las líneas orientadoras del Programa de Reformas de
Febrero; de ellas sólo destacaremos, según nota textual, que: Se hacía necesario el establecimiento
de nuevas escuelas y la reorganización de las existentes, para lo cual el gobierno contrataría el personal
docente necesario, reorganizaría las escuelas primarias tanto urbana como rurales, dando atención a la
construcción de edificios, escuelas primarias modelos, a la divulgación cultural mediante escuelas
ambulantes, promovería conferencias de especialistas, bibliotecas populares, la radio, así como la
protección de las iniciativas privadas que redundaran en beneficio de la educación de la mayoría de la
población (p. 165).
17
PEÑA ROSALES, L., 2001, p. 171.
18
BAUTISTA URBANEJA, D., 2002, p. 61
19
BAUTISTA URBANEJA, D., 2002, p. 62.

68
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

campañas de alfabetización, la ampliación de la cobertura matricular escolar,


las preocupaciones por una mejor formación de los maestros, entre otros rasgos.
La Ley de Instrucción Pública del año 1941 no introduce nada diferente
respecto a la doctrina del Estado Docente, lo cual permite inferir que se
mantienen los límites demarcados previamente en relación con el protagonismo
del sector privado en la educación nacional, la Iglesia Católica sigue ejerciendo
el protagonismo en ese sector. En este orden de ideas, la Constitución de la
República de 1945 también preserva esta doctrina, calcada de la Constitución
de 1936.
En octubre de 1945, el presidente Medina Angarita es desalojado del
poder mediante un Golpe de Estado materializado por una coalición cívico –
militar, instigada y representada en la parte civil por el partido Acción Demo-
crática, organización política que se funda en el contexto de las libertades polí-
ticas recién conquistadas y garantizadas por el gobierno del depuesto presi-
dente Medina Angarita. Esta nueva formación política, liderada por Rómulo
Betancourt planifica y ejecuta la asonada golpista con un sector de la oficiali-
dad militar joven, encabezada por el Mayor Marcos Evangelista Pérez Jimé-
nez. El gobierno surgido del golpe de Estado es asumido de manera temporal
por una Junta de Gobierno. Con esta acción política se da inició al denomina-
do Trienio Adeco.
Un aspecto polémico que marca las tensiones entre la Junta de Gobierno
y el sector privado de la educación representado por la Iglesia, fue la
promulgación del Decreto Ejecutivo n. 321, relativo al sistema de calificaciones,
considerado por la representación eclesiástica como discriminatorio […] entre
los institutos oficiales y privados […]20 Este hecho marca la línea de relación entre
el liderazgo político emergente y la Iglesia Católica, el cual se caracterizará
por las fluctuaciones coyunturales y la resistencia a la figura del Estado Docente
como doctrina básica de estos nuevos actores políticos.
En 1947, se promulga una nueva Constitución de la República que
consagra la doctrina del Estado Docente. El texto constitucional le otorga a la
institucionalidad pública el control y supervisión de la educación. Cabe resaltar
varios aspectos cruciales aquí contenidos. El primero derivado de la lectura
del Artículo 53 el cual garantiza el derecho a la educación para todos los
ciudadanos habitantes del país; se asume la educación como función
insoslayable del Estado. El segundo asunto expresado en el Artículo 55,
establece la libertad de enseñanza, en la que […] toda persona natural o jurídica
puede dedicarse libremente a las ciencias o a las artes, y fundar cátedras y establecimientos

20
DUPLÁ, F. J., 2014, p. 13.

69
CARVAJAL RUÍZ, S. H.; VILLASMIL SOCORRO, P. E. • La educación venezolana en el contexto
de desarrollo de las tensiones entre lo público y lo privado

para la enseñanza de ellas, bajo la suprema inspección y vigilancia del Estado.21 Y,


como tercer aspecto, lo señalado en el Artículo 56, según lo cual: La iniciativa
privada en materia educacional merecerá el estímulo del Estado, siempre que se acuerde
con los principios contenido en esta Constitución y en las leyes.22

La dictadura de Marcos Evangelista Pérez Jiménez


Ese mismo año la Junta de Gobierno convoca elecciones presidenciales
en las que resulta ganador Rómulo Gallegos, candidato de Acción Democrática
(AD). Se trata de un período de gobierno de corta duración (apenas nueve
meses, del 15 de febrero al 24 de noviembre de 1948), interrumpido por un
nuevo golpe de Estado liderado esta vez por el Coronel Pérez Jiménez, que
depone a Gallegos de la presidencia acabando así con el “Trienio Adeco”. De
esta manera se abre un nuevo ciclo histórico político con la dictadura
perezjimenista como protagonista de primer orden.
Una de las primeras acciones de la dictadura es derogar la Ley de
Educación, la cual es sustituida por un Estatuto Provisional de Educación23
hasta la aprobación en 1955 de la nueva Ley de Educación del régimen
perezjimenista.24 Con la derogación de la Ley de Educación del año 47, se
puede deducir que esta acción pospone la aplicación y el desarrollo de la
doctrina sobre el Estado Docente desarrollada durante el Trienio. El marco de
este retroceso lo propone la nueva constitución de 1953, en esta se concibe a la
educación como un deber y un derecho social individual, que, de acuerdo con
Humberto Medina, redujo drásticamente las disposiciones contenidas en la
constitución de 1947.25
Con la asunción y consolidación de la dictadura los intereses de la Iglesia
Católica y del sector privado en general respecto a la educación se vieron
favorecidos.
De acuerdo con Duplá: La dictadura perezjimenista (1952-1958) significó
para la educación católica un período de crecimiento y de buenas relaciones con el
gobierno.26 Ahora, la otrora beligerante Asociación Venezolana de Educación

21
ASAMBLEA NACIONAL CONSTITUYENTE, 1947, p. 10.
22
ASAMBLEA NACIONAL CONSTITUYENTE, 1947, p. 10.
23
De acuerdo con Miguel Ángel MUDARRA (1972) el Estatuto Provisional de Educación re-
presenta un retroceso a las formas y principios de Ley de Educación Nacional de 1940 y
predecesoras. Sin embargo, reconoce algunos asuntos esenciales de la ley de 1948, como por
ejemplo, la libertad de enseñanza y la clasificación de la educación en público y privada, p. 186.
24
BONILLA-MOLINA, L., p. 30.
25
MEDINA, H. (1996). Evolución Constitucional de la Educación Venezolana. 1811-1961. Valencia:
Secretaría de Cultura del Gobierno de Carabobo, p. 196.
26
Duplá, F. J., 2014, 119.

70
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Cristiana (AVEC) en el período del Trienio Adeco se fundía en los intereses


político ideológicos del régimen de fuerza perezjimenista, al punto que el mismo
autor reconoce: La bonanza social llevó consigo un debilitamiento de la AVEC en el
sentido de no encontrar opositor frente al que compactarse.27
Reconoce Duplá que en el período de la dictadura se triplicó la matrícula
de inscritos en educación primaria del sector privado y, en consecuencia, los
colegios de adscripción católica experimentaron un crecimiento exponencial
para este nivel. La clave, según el precitado autor es que: La educación oficial
dejó de ser ideológica y pasó a ser tecnocrática.28
Luego, ya cuando se vislumbraba el final de la dictadura perezjimenista
y ésta dejó de ser funcional a los intereses del poder eclesiástico, se produce
una mutación por parte de la Iglesia hacia posturas antidictatoriales, expresadas
en posturas públicas contrarias a los intereses del régimen, para aparecer
oportunamente en la “fotografía” de los que lo adversaron.

Expresiones de las tensiones entre lo público


y lo privado en la IV República29
La caída del régimen perezjimenista producto de la resistencia sostenida
de factores democráticos, fundamentalmente de los partidos de izquierda
encabezados por el Partido Comunista de Venezuela, desembocan en la rebelión
popular del 23 de enero de 1958, la misma fuerza exitosamente la renuncia y
huida del dictador. Se abre así un período político de más de cuatro décadas en
el que se refleja una evolución asimétrica de la educación en el país,
expresándose de manera especial en el nivel de educación primaria. En este
nivel se reportan importantes avances en la expansión matricular y en el número
de colegios construidos; de igual forma, se observa el crecimiento significativo
de instituciones de educación universitaria que vienen a apuntalar la obra del
Instituto Pedagógico de Caracas, en la formación de los docentes, entre otros
aspectos destacables.
La Junta de Gobierno creada producto de la rebelión de enero de 1958,
declara la vigencia de la Constitución 1953. Asimismo, esta entidad política
gestiona la situación política del país y convoca en enero de 1961 un proceso

27
DUPLÁ, F. J., 2014, p. 119.
28
2014, p. 119.
29
Se trata de la denominación que recibe un período de la vida política de Venezuela, compren-
dido entre 1958, con la caída de la dictadura de Pérez Jiménez y cuyo soporte programático-
ideológico es el Pacto de Punto Fijo hasta el triunfo democrático del presidente Hugo Rafael
Chávez Frías y la convocatoria de la Asamblea Nacional Constituyente que desemboca en la
aprobación por referendo popular de la Constitución de la República Bolivariana de Venezue-
la el año 1999.

71
CARVAJAL RUÍZ, S. H.; VILLASMIL SOCORRO, P. E. • La educación venezolana en el contexto
de desarrollo de las tensiones entre lo público y lo privado

constituyente, en que se redacta y aprueba la nueva Constitución de la república.


Acto seguido se convocan elecciones presidenciales ganadas por el candidato
de Acción Democrática, Rómulo Betancourt en diciembre de ese año.
La Constitución de 1961 recupera algunos aspectos de la constitución
de 1948 derogada por la dictadura, fundamentalmente en lo referido a la
doctrina del Estado Docente. De igual manera, propone el espíritu y los
principios doctrinarios de la educación nacional al establecer que la educación
pública será gratuita y obligatoria, cuya dirección y supervisión estará bajo el
control y responsabilidad del Estado. Un dato significativo de la recién aprobada
constitución es que deja entrever la posibilidad de cobrar la matrícula a aquellos
estudiantes cursantes de estudios universitarios y de educación especial […]
cuando se trate de personas provistas de medios de fortuna.30
Pese a este nuevo marco constitucional, la Ley Orgánica de Educación
de 1955 siguió en vigencia por espacio de casi tres décadas, cuando en julio de
1980 se promulga el nuevo marco normativo para la educación venezolana.
Éste no es un hecho menor, pues podría interpretarse que la recién estrenada
(y en construcción) institucionalidad democrática podía andar a la perfección
montada sobre los rieles ideológicos del autoritarismo perezjimenista.
Cabe recordar que el espíritu de la ley del 55 fue abrazado por las élites
políticas, religiosas y los sectores más conservadores de la sociedad de entonces.
Muestra de ello fue la complacencia de la Iglesia en cuanto a cómo había
crecido su influencia en el ámbito educativo a partir de la promulgación de
dicha ley. Incluso, ya en el período de la IV República, la Iglesia mostraba su
euforia porque:
La postura de Acción Democrática, una vez recuperado el poder después de
la dictadura, fue muy distinta de la que tuvo en el trienio 1945-1948.
Abandonó los tratos con el comunismo y optó por un entendimiento nacional
entre los principales partidos en el Pacto de Punto Fijo31.32

No es menos importante esta reseña del Pacto de Punto Fijo porque


éste va a marcar las relaciones no sólo entre las cúpulas partidistas del status
quo, sino que será un referente en las demás relaciones tejidas en la sociedad,

30
CONSTITUCIÓN DE LA REPÚBLICA DE VENEZUELA, Art. 78, 1961.
31
Se trató de un pacto de las élites de partidos Acción Democrática (Socialdemocracia), COPEI
(Socialcristianos) y Unión Republicana Democrática (Nacionalista) alineados a la política
hegemónica de los EE.UU. en la región, que se traduce en un acuerdo entre las cúpulas para
gobernar el país, la defensa de la democracia representativa y la alternabilidad en el poder; de
dicho pacto fue excluido el Partido Comunista de Venezuela, una de las organizaciones polí-
ticas junto con Acción Democrática de mayor capacidad de movilización en el pueblo, con un
amplio tejido organizativo sindical y puntal en el derrocamiento de la dictadura de Pérez
Jiménez.
32
DUPLÁ, F. J., 2014, p. 119.

72
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

entre los sectores económicos, religiosos y sociales, en general. Este “pacto de


no agresión” entre las élites servirá de base para que la educación privada
amplíe su radio de acción e influencias, con ello el de la Iglesia Católica como
principal y más importante actor en esta materia.
Un hito importante de este período lo constituye la promulgación de la
Ley Orgánica de Educación (LOE) el 26 de julio de 1980. Se trata de un docu-
mento normativo alineado a la doctrina de la Constitución de1961, el cual
sintetiza el espíritu del Pacto de Punto Fijo y que llegaba con casi tres décadas
de retraso. Esta ley es redactada y aprobada durante el gobierno socialcristia-
no del presidente Luis Herrera Campins.
La figura del Estado Docente pervive aunque ya más matizado. Décadas
de gobiernos caracterizados por la alternabilidad representativa entre AD y
COPEI van fraguando un tipo de relación con los actores económicos y
religiosos la cual facilita el crecimiento exponencial de la educación privada
en detrimento de la educación pública.
El Estado se convierte en financista de la educación privada ofrecida
por las instituciones vinculadas a la Iglesia agrupadas en la AVEC, bajo la
coartada de la acción social de la Iglesia a través de la red de centros educati-
vos “Fe y Alegría”, por lo que hasta la fecha no ha recibido ningún reconoci-
miento público sobre esta cuantiosa inversión.
En este período cobra fuerza la presencia en el ámbito educativo de las
instituciones escolares seglares, que entran en competencia con la tradición de
los colegios privados confesionales, la mayoría de ellos controlados por la Iglesia
Católica. Este crecimiento de la educación privada viene asociado y reforzado
al deterioro generalizado de la educación pública y que, de manera especial, se
manifiesta en la Educación Básica33 durante las décadas de los años 80 y 90.

La Revolución Bolivariana y la agudización de las contradicciones


en las tensiones entre lo público y lo privado
El triunfo electoral del entonces candidato Hugo Rafael Chávez Frías
en diciembre de 1998, liderando la fórmula del Movimiento Quinta República,
aglutinando prácticamente el arco político de la izquierda venezolana y otras
fuerzas políticas y movimientos sociales, rompe con cuatro décadas de
gobiernos alineados al Pacto de Punto Fijo.
Por su parte los actores políticos, económicos y sociales tradicionales,

33
La Ley Orgánica de Educación de 1980, en su ordenamiento del Sistema Escolar fundamenta
el Subsistema de Educación Básica que estaba integrado por los seis (6) años de Educación
Primaria y tres (3) de Educación Secundaria o media.

73
CARVAJAL RUÍZ, S. H.; VILLASMIL SOCORRO, P. E. • La educación venezolana en el contexto
de desarrollo de las tensiones entre lo público y lo privado

herederos del Pacto de Punto Fijo, se agruparon en torno a la candidatura del


Gobernador Enrique Salas Römmer, representante de la derecha empresarial
cuyo programa electoral proyectaba la continuidad en la aplicación de las
políticas neoliberales, iniciadas en el gobierno del presidente Jaime Lusinchi y
continuadas por los gobiernos de Carlos Andrés Pérez, Ramón J. Velásquez y
Rafael Caldera.
La principal oferta electoral de Chávez fue la convocatoria de una
Asamblea Nacional Constituyente, con el objeto de remover todas las
estructuras políticas, sociales y económicas del país para “[…] la refundación
de la Patria”, tal como se lee en el preámbulo de la Constitución de 1999. El
viejo orden político estaba convencido del riesgo que acarrearía para sus
intereses grupales y de las élites nacionales, garantes de los intereses económicos
transnacionales, la ascensión a la presidencia de la república de un candidato
con el perfil del Comandante Chávez. Por tanto, estuvieron decididos a plagar
de obstáculos la incipiente gestión de gobierno del recién electo presidente. En
un principio, se trataba de torcer su voluntad de transformación mediante la
cooptación de los cuadros más importantes de este proyecto político, para luego,
de manera abierta, buscar las vías de desalojarlo del gobierno a través de
medidas de fuerza.
Este proceso constituyente ocurre durante el año 1999, y la nueva Cons-
titución de la República Bolivariana de Venezuela se aprueba en referendo
popular el 15 de diciembre de ese año. Este paso político supone el replantea-
miento de todo el entramado institucional del Estado, el cual tuvo especial
repercusión en la política educativa, además, se tradujo en un reforzamiento
de su posición como garante fundamental de este derecho, tal vez recuperan-
do la esencia de la doctrina del Estado Docente expuesta en la constitución
de 1948, al expresar: El Estado la asumirá como función indeclinable y de máximo
interés en todos sus niveles y modalidades […]34 Otro aspecto destacable es la
ampliación de la gratuidad de la educación, como se expresa en el Art. 103:
La impartida en las instituciones del Estado es gratuita hasta el pregrado universita-
rio.35
En principio la doctrina constitucional se erige como corta fuegos de la
dinámica privatizadora que venía tomando cuerpo desde hacía varios años en
el país. Se heredaba un escenario minado, favorable a las políticas dirigidas a
favorecer la desregulación del sector educativo, producto de las influencias
que tuvieron las reformas educativas de corte neoliberal realizadas en la región

34
ASAMBLEA NACIONAL CONSTITUYENTE. Constitución de la República Bolivariana de
Venezuela, 1999, Art. 102, p. 204.
35
1999, Art. 103, p. 204-205.

74
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

desde finales de la década de los años 70, y que tomó un impulso inusitado en
las décadas de los años 80 y 90.
Las primeras acciones del gobierno del presidente Chávez tuvieron como
centro la recuperación de la educación en general y particularmente el nivel de
educación primaria, que había experimentado un deterioro progresivo producto
de problemas endémicos mal resueltos. El proyecto de las Escuelas
Bolivarianas36 se erige como la política bandera de la Revolución Bolivariana
dirigida al sector. En principio permite detener los altos índices de deserción
observados en el país.
De igual manera opera un giro por parte del Estado respecto a décadas
anteriores, enfocado ahora en recuperar la iniciativa en materia educativa. En
esta dirección se multiplican las medidas orientadas a fortalecer la presencia
pública mediante diversos programas y medidas político-administrativas las
cuales evidencian esta nueva situación. Este proceso viene acompañado de
una discusión nacional promovida desde la base del movimiento magisterial,
expresado en “La Constituyente Educativa”. Este espacio de consulta nacional
constituyó aportes trascendentales por la hondura de las propuestas contenidas
en el Proyecto Educativo Nacional.
En este contexto, en octubre del año 2000 se firma el Convenio Integral
de Cooperación Cuba – Venezuela, el cual constituye el marco de intercambio
en diversas materias, entre otras la asistencia técnico-pedagógica.
Las políticas públicas en educación implementadas por el gobierno del
presidente Chávez también fueron escenario de las confrontaciones y tensiones
que se vienen sucediendo en la dinámica política del país. Los viejos actores
de la política confrontan, por todas las vías, recursos y argumentos, toda acción
de gobierno. El ámbito educativo reagrupa al sector eclesiástico, a los
conservadores, así como a los voceros de la no participación del Estado, es
decir, los empresarios de la educación, en un sólo bando.
Estos nuevos reacomodos y coaliciones se estrenan primero en contra
del Proyecto de las Escuelas Bolivarianas en 1999; y posteriormente, en
oposición al Decreto 1.011, el cual fundamentaba la creación de los
“supervisores itinerantes”. El argumento principal de los sectores opuestos al
nuevo rol de esta figura administrativa era la supuesta imposición arbitraria de
estos supervisores. Finalmente, el decreto no se aplicó; cuestión celebrada por

36
Según la Revista Educativa Educere: “El Proyecto de Escuelas Bolivarianas constituye una
política del Estado venezolano, dirigida a afrontar las limitaciones del sistema escolar en los
niveles de preescolar y básica en su primera y segunda etapa. La propuesta se inscribe en el
proceso de transformaciones políticas y sociales que vive el país y de la alta prioridad que se le
otorga a la educación dentro de ese proceso”.

75
CARVAJAL RUÍZ, S. H.; VILLASMIL SOCORRO, P. E. • La educación venezolana en el contexto
de desarrollo de las tensiones entre lo público y lo privado

los factores contrarios al Gobierno Bolivariano que percibieron este retroceso


del gobierno como una victoria de la Sociedad Civil.37
Otro episodio que testifica sobre las tensiones entre el sector privado de
la educación y el Gobierno Bolivariano, meses previos al Golpe de Estado de
abril de 2002, se escenifica a partir de agosto de 2001, en la Comisión Educación
de la Asamblea Nacional en ocasión de la presentación de Proyectos de Ley
de Educación de los dos grandes bloques de poder en pugna: el bolivariano, el
cual defendía la doctrina educativa de la constitución y la amalgama de intereses
sintetizados en la “sociedad civil”, defensores de las tesis neoliberales en
educación.
En este espacio legislativo se suscitó un intenso debate cuyo reflejo era
la confrontación entre doctrinas educativas contrapuestas. En definitiva, se
trataba de proyectos políticos que marchaban en direcciones contrarias. Pasaron
ocho años, concretamente hasta agosto de 2009, para que finalmente se
aprobara la nueva Ley Orgánica de Educación, ajustada a los principios y
doctrinas constitucionales.
También merece un breve comentario el capítulo referido a las Misiones
Educativas38 emprendidas por el Gobierno Bolivariano, producto del Convenio
de Cooperación Cuba – Venezuela. La emergencia de las misiones viene
justificada porque […] el aparato burocrático del Estado no brindaba las respuestas
adecuadas y eficientes ante los profundos problemas que se fueron acumulando durante
más de cuatro décadas.39 El despliegue de las Misiones Educativas activó a todos
los actores políticos y empresariales representantes del viejo régimen, los cuales
hicieron frente común en contra de estas iniciativas políticas del gobierno del
presidente Chávez.
El impacto de estos programas educativos en la sociedad fueron comba-
tidos desde las diversas tribunas académicas y mediáticas mediante una feroz
campaña dirigida a cuestionar la legitimidad, validez y calidad de los novedo-
sos métodos educativos implementados para atacar eficaz y organizadamente
la herencia de atraso cultural en la que se encontraba la sociedad venezolana.

37
Cabe destacar que estos acontecimientos ocurren a finales del año 2000, lo cual puede inter-
pretarse como la gestación del proceso primario de acumulación de fuerzas de los factores
políticos, económicos-empresariales, académicos e intelectuales de la oposición venezolana,
el cual va a desembocar en el Golpe de Estado contra el presidente Chávez, en abril de 2002.
Bajo la denominación de “Sociedad civil” se agrupan la Iglesia Católica y de otras confesiones
religiosas, así como los afiliados a la Cámara Venezolana de Educación Privada CAVEP, que
reúne a los empresarios de la educación en el país.
38
Las Misiones educativas se iniciaron con la Misión Robinson que implementa el programa de
alfabetización “Yo sí puedo”; la Misión Rivas y Sucre, para atender la necesidad de prosecuci-
ón y culminación de estudios en bachillerato y de formación universitaria respectivamente
39
Ministerio de Comunicación e Información. Misiones Bolivarianas, p. 8, 2007.

76
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

En este orden de ideas, un aspecto que concita también la oposición


firme de los eclesiásticos y empresariales, es el referido a las normas dirigidas
a redefinir la relación escuela – familia – comunidad. Un primer antecedente
es la Resolución 751, la cual propuso una nueva relación entre estos factores
socio-comunitarios, para ampliar el sentido y alcances culturales de la escuela.
Con esta resolución se pretendía convocar, como miembros de la comunidad
educativa, a otros actores más allá de la escuela.
La resolución no se aplicó, fundamentalmente, debido a la negativa de
los representantes de la Iglesia y empresariales a la aplicación de tal medida.
Esta resolución es el antecedente de otra norma, la Resolución 058, cuya
finalidad es similar a la anterior, pero incluye como instancia sustitutoria la
creación de los Consejos Escolares como instrumento que contribuirá en la
“[…] formación de la nueva ciudadanía”. Pese a las resistencias ya conocidas,
esta resolución se aplicó y sigue en vigencia.
Como apunte final en esta rápida reflexión sobre las tensiones entre lo
público y lo privado en el ámbito educativo venezolano, se refiere a las
manifestaciones observadas en la construcción del marco normativo apegado
a la doctrina constitucional emergente. En líneas precedentes se resaltaba la
moratoria en la aprobación de la nueva Ley Orgánica de Educación, la cual
esperó hasta el año 2009 para su materialización, no sin antes generar una
profunda discusión social sobre el modelo de educación que requería el país.
Nuevamente entraron en conflicto los intereses históricamente en pugna.
Finalmente la Ley Orgánica fue aprobada por la mayoría parlamentaria del
bloque bolivariano en la Asamblea Nacional el 13 de agosto de 2009.

Apunte final
Venezuela actualmente es escenario de una confrontación definitiva que
se expresa en varios órdenes, ésta tiene y tendrá repercusiones en toda la región
nuestramericana. Uno de estos espacios en pugna, decididamente estratégico,
es el cultural. Se trata de una colisión de modelos, entre uno excluyente, elitista,
segregacionista y profundamente antidemocrático promovido por fuerzas
políticas, intelectuales y económicas, caracterizadas por su corporativismo e
inscritas en la lógica del capital y otras que apuestan por la democracia,
inclusión, justicia social, la dignificación y protagonismo organizado de los
pueblos. No es una confrontación de nuevo cuño, es histórica. La educación
pública hoy amenazada, es también escenario de tal enfrentamiento. El futuro
de la educación pública al alcance y al servicio de las mayorías, plural, laica,
gratuita y democrática, no cooptada por grupos empresariales, necesariamente
pasa por superar la compleja y difícil coyuntura actual que experimenta la
Revolución Bolivariana.

77
CARVAJAL RUÍZ, S. H.; VILLASMIL SOCORRO, P. E. • La educación venezolana en el contexto
de desarrollo de las tensiones entre lo público y lo privado

Referencias
ABREU SÚAREZ, Alirio. Una mirada a las políticas educativas del Estado venezolano
desde el Ilustre americano (1870) al Benemérito (1935). Perspectivas. Revista de historia,
geografía, arte y cultura. Año 2, n.° 3, p. 119-136, 2014.
ASAMBLEA NACIONAL CONSTITUYENTE. Constitución de la República Bolivaria-
na de Venezuela, 1999, Art. 102, p. 204.
ASAMBLEA NACIONAL CONSTITUYENTE. Constitucional de los Estados Unidos de
Venezuela. Caracas: Imprenta Nacional, 1947.
BAUTISTA URBANEJA, Diego. La política venezolana desde 1899 hasta 1999. Temas
de Formación sociopolítica. Caracas: Centro Gumilla – Publicaciones UCAB, 2002.
BONILLA-MOLINA, Luis. Historia breve de la Educación en Venezuela. Caracas: Ediciones
Gato Negro, 2004.
CONGRESO DE LOS ESTADOS UNIDOS DE VENEZUELA. Código de Instrucción
Pública, 1897.
DUPLÁ, Francisco Javier. La educación en Venezuela. Temas de formación sociopolítica,
n. 25. Caracas: Centro Gumilla – Publicaciones UCAB, 2010.
DUPLÁ, Francisco Javier. 75 años de la educación venezolana. Revista SIC. Abril 2014,
p. 115-126.
LUQUE, Guillermo. Gomecismo y Educación: Reforma, Contrarreforma y Nuevas
Reformas. 1900-1930. Revista Investigación y Postgrado, v. 16, n. 2, p. 103-133, 2001.
MEDINA, H. Evolución Constitucional de la Educación Venezolana. 1811-1961. Valencia:
Secretaría de Cultura del Gobierno de Carabobo, 1996, p. 196.
MORA-GARCÍA, José Pascual. El curriculum como historia social. Revista de Teoría y
Didáctica de las Ciencias Sociales. Mérida-Venezuela. Enero-Diciembre, n. 9, p. 49-74,
2004.
MUDARRA, Miguel Ángel. Historia de la Legislación Escolar Contemporánea en Venezuela.
Caracas: Monte Ávila Editores C.A., 1972.
PEÑA ROSALES, Luis. La reforma educativa en el gobierno del Presidente Eleazar
López Contreras. Presente y Pasado. Revista de Historia, v. 6, n. 11/12, enero-diciembre,
p. 160-172, 2001.
RODRÍGUEZ, Nacarid. Tres momentos en la vida de Alirio Arreaza, Autor de
Apuntaciones Didácticas. In: LUQUE, G. (Coord.). Apuntaciones Didácticas de Alirio
Arreaza, estudio preliminar. Biblioteca Pedagógica Simón Rodríguez. Caracas: Editorial
El Perro y la Rana, 2008.

78
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Una aproximación a la reforma educacional


del Estado Plurinacional de Bolivia:
descripción y análisis inicial sobre
la formación de docentes

Jaqueline Marcela Villafuerte Bittencourt


María Luz Mardesich Pérez

Introducción
El presente artículo es resultado del trabajo elaborado para el I Seminário
Nacional Redefinições das fronteiras entre o Público e o Privado: Implicações para a
democratização da educação realizado en diciembre de 2017 en Porto Alegre-RS
/ Brasil. Este evento dio lugar a la presentación de una aproximación al proceso
de transformación educativa vigente en Bolivia. El artículo intenta recoger los
alcances de los procesos de transformación estructural que se viven actualmente
en Bolivia, que vienen dados desde una nueva Constitución Política del Estado
(2009) así como desde la implementación de la Ley de Educación n. 070 Avelino
Siñani-Elizardo Pérez (2010) y su modelo sociocomunitario productivo en el
sistema educativo plurinacional, particularmente en la formación docente.
Inicialmente se presenta una contextualización de la actual normativa
para posteriormente hacer un abordaje de lo que constituye el modelo
sociocomunitario productivo en el sistema plurinacional de formación docente.
Finalmente, se realizan algunas consideraciones que ayudan en la tentativa de
responder a la siguiente pregunta: ¿Está Bolivia en un movimiento diferente
dentro de la tendencia histórica de la privatización en América Latina?

Contextualización
Una de las tendencias más evidentes en las sociedades democráticas
occidentales, en las últimas décadas, ha sido la de atender a los derechos sociales
sin que se deje de atender a los intereses del mercado y del capital. Contradic-
toriamente, en América Latina hemos visto este crecimiento de forma muy
variada, particularmente Bolivia, país que ha realizado este movimiento de
forma más profunda, redefiniendo el papel del Estado de forma estructural, a
partir de la promulgación de su nueva Constitución, comúnmente llamada
“Refundación del Estado”.

79
VILLAFUERTE BITTENCOURT, J. M.; MARDESICH PÉREZ, M. L. • Una aproximación a la reforma educacional
del Estado Plurinacional de Bolivia: descripción y análisis inicial sobre la formación de docentes

Ciertamente, sabemos que discutir la cuestión del papel del Estado es,
como afirma Graciarena (1984, p. 39), “asomarse a la Torre de Babel. Más
aún, si se la trata en un marco singular y contradictorio como el de América
Latina”. Esta región tiene una historia donde los paradigmas se presentan de
forma muy híbrida, después del periodo de democratización, en los años 1990
a 2000, es decir, con el fin de las dictaduras, hubo un periodo de crecimiento
de las ideas neoliberales, sin embargo, la ascensión de gobiernos progresistas
ha dado un tono diferente a la “abigarrada” silueta del sur.
Es importante destacar que en Bolivia se vive actualmente un proceso de
cambio estructural a nivel nacional que ha implicado la promulgación de una
nueva Constitución Política del Estado en febrero de 2009. Este nuevo
ordenamiento ha tenido como eje principal promover un cambio substancial,
que va desde la decisión de abandonar la concepción de República hasta la
adopción del concepto de Estado Plurinacional. Lejos de ser apenas un cambio
en la denominación del país, éste trajo consigo un movimiento profundo en la
base de la sociedad boliviana, en términos culturales, económicos y resignificando
la propia democracia (SARZURI-LIMA, 2011 y LASERNA, 2010).
Esa reestructuración es una respuesta histórica a algunos de los conflictos
que se construyeron desde el tiempo colonial y que llega apoyada en una serie
de ideas nacionalistas-populares y la lucha contra la dominación de:
[…] varios grupos instituidos, que gestionan y reproducen estructuras, pero
que también las modifican y, en principio, las crean, no por plasmación directa
de sus voluntades en objetividades sociales, sino como resultado de la
sobredeterminación de todas las prácticas sociales y políticas en la que, sin
embargo, un grupo (que puede ser plural) impone sus direcciones, sus valores
y su fuerza física y cultural (TAPIA, 2009, p. 9).

En esta estera es posible reconocer en el Movimiento al Socialismo


(MAS) – partido político que está en el poder – tres grupos de sujetos que
tienen en común las ideas de un nuevo status quo y ellos son: los indigenistas,
inicialmente simbolizado por el ex-canciller David Choquehuanca, cuya tarea
era dar visibilidad internacional al discurso que entra en vigencia, es quien
maneja la idea de una necesaria “revolución democrática y cultural,” con la
cual buscan llevar a cabo un proceso de descolonización. El segundo grupo, es
el que está conformado por los intelectuales orgánicos del socialismo, su
representante más importante es el actual vicepresidente Álvaro García Linera,
su ideario es el de expansión de la intervención del Estado en todos los aspectos.
Para Laserna (2009, p. 39):
Este grupo se nutre de militantes de la vieja izquierda estatista que abarca
desde ideólogos marxistas hasta tecnócratas dispuestos a reeditar la
industrialización por sustitución de importaciones que alentó la Comisión
Económica para América Latina y el Caribe (CEPAL) en los años de 1950 y

80
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

1960. La transición al socialismo consiste, para este grupo, en afianzar un


estatismo nacionalista en la economía.

El tercer grupo es el representado por el Presidente Evo Morales Ayma


cuya raíz está en los “movimientos sociales”. Este grupo tiene un papel
protagonista desde la ascensión al poder, hasta la sustentación de las propuestas
de cambio. Se trata de las organizaciones populares de sindicatos, juntas
vecinales y otros grupos que son el cimiento de esta nueva estructura del Estado
Plurinacional de Bolivia.
De este modo es posible reconocer las ideas de estos sujetos en las direc-
trices que orientan la construcción del nuevo Estado Plurinacional y como
consecuencia de ello la Ley Educativa Avelino Siñani-Elizardo Pérez, pro-
mulgada en diciembre de 2010. Así se pone en marcha un proceso de transición
curricular que avanza lentamente y que será expuesto más adelante.
El texto constitucional define el ingreso de Bolivia a la era de un Estado
Plurinacional, Comunitario y con autonomías, por ello, el Art. 1° señala que:
Bolivia se constituye en un Estado Unitario Social de Derecho Plurinacional
Comunitario, libre, independiente, soberano, democrático, intercultural,
descentralizado y con autonomías. Bolivia se funda en la pluralidad y el
pluralismo político, económico, jurídico, cultural y lingüístico, dentro del
proceso integrador del país (CPE, 2009).

De allí deriva la necesidad de vincular este modelo de Estado con el tipo


de Educación establecido en la norma constitucional y a su vez, da lugar a un
conjunto de políticas públicas que se van consolidando paulatinamente.
A su vez, el Art. 77, apartado II de la CPE (2009) establece:
El Estado y la sociedad tienen tuición plena sobre el sistema educativo, que
comprende la educación regular, la alternativa y especial, y la educación
superior de formación profesional. El sistema educativo desarrolla sus
procesos sobre la base de criterios de armonía y coordinación.

Los aspectos destacados líneas arriba dan cuenta por un lado, de las
bases fundamentales del tipo de Estado que se quiere construir, y, por otro, la
necesidad de que tal Estado asuma la tuición plena sobre todo el Sistema
Educativo Nacional para concretar todo lo que se propone en sintonía con lo
que considera que la sociedad requiere.
Para lograr todo ello se implementa el Plan Nacional de Desarrollo
Económico y Social (PND), ofertado ya en la época pre-electoral por el actual
gobierno, que plantea el desarrollo del país en dirección a la construcción de
una “Bolivia digna, soberana y productiva para vivir bien” El PDN, como se
lo denomina por sus siglas, está basado en cuatro áreas estratégicas nacionales:
Estrategia económica: Bolivia Productiva, basada en los sectores que
conforman la matriz productiva y los que coadyuvan a su funcionamiento.

81
VILLAFUERTE BITTENCOURT, J. M.; MARDESICH PÉREZ, M. L. • Una aproximación a la reforma educacional
del Estado Plurinacional de Bolivia: descripción y análisis inicial sobre la formación de docentes

Estrategia sociocomunitaria: Bolivia Digna, incluye los sectores


distribuidores de factores y medios de producción así como servicios sociales.
Estrategia de relacionamiento internacional: Bolivia Soberana, com-
prende las relaciones económicas, políticas y culturales e incluye a los sectores
vinculados con el comercio e intercambio de bienes, servicios y capitales.
Estrategia del poder social: Bolivia Democrática, comprende a los
sectores que promoverán el poder social territorializado.
Un documento que complementa la visión del PND es la Agenda
Patriótica 2025 elaborada el año 2013. En correspondencia a la finalidad de la
Educación de consolidar el Estado Plurinacional, la Agenda Patriótica (AP)
muestra una visión de país para el año 2025 con mejores condiciones de vida
para los bolivianos en los ámbitos de salud, educación, deportes, integración,
con soberanía alimentaria y con acceso soberano al Océano Pacífico.
La agenda tiene una concepción estratégica de país, cuya mayor virtud
es retomar la planificación y con tal medida técnica se busca la erradicación de
la extrema pobreza, la universalización de los servicios básicos, salud, educación
y deportes; soberanía financiera, productiva y alimentaria, entre otros puntos
de cara al Bicentenario del país (AP, 2013).
Las estrategias para la recuperación de la dignidad y soberanía están
siendo viabilizadas a través de diferentes proyectos y programas dirigidos al
cambio y la mejora de los servicios de educación, salud, saneamiento básico,
seguridad social, vivienda e infraestructura pública, etc.
Como señala Mardesich (2014, p. 13), paralelamente al proceso de trans-
formación que está viviendo el Estado y que se manifiesta en los documentos
anteriormente expuestos, el Sistema Educativo Plurinacional también está
pasando por una profunda transformación que está en estrecha corresponden-
cia con lo señalado líneas arriba. Actualmente se viene implementando la Nueva
Ley Educativa 070 Avelino Siñani-Elizardo Pérez que plantea cambios signi-
ficativos con el enfoque educativo sociocomunitario productivo. Con el pro-
pósito de constituir una nueva cultura de Estado, desde el ámbito educativo se
pretende desarrollar cuatro revoluciones1.
Revolución del conocimiento, que significa cambiar la educación banca-
ria que han generado los anteriores sistemas a través de una descolonización del
conocimiento, pero a la vez, recuperando la riqueza de nuestra cultura para cre-
ar una sociedad con identidad propia. Esta revolución requiere, cambiar la

1
Extraído de la exposición del Sr. Viceministro de Educación Regular, Lic. José Quiroz en el
acto de inauguración del Taller de Ajuste y Revisión del Currículo Base de los niveles Inicial y
Primario, realizado en Sacaba (Cochabamba) el 2 de octubre de 2013, así como de una entre-
vista posterior a la exposición el mismo día.

82
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

práctica del docente centrada hasta ahora en cuestiones de corte pedagógico,


circunscritas al aula, poco vinculadas a la realidad social. La revolución del
conocimiento pasa por una práctica pedagógica renovada, innovadora, refle-
xiva, crítica, mediadora entre el saber y la realidad.
Revolución productiva-tecnológica, referida a la articulación entre la
teoría y la práctica que se concreta en los conocimientos científicos, se vincula
a los problemas de producción que tiene el contexto local, municipal, nacional
para cambiar el sistema productivo de Estado. Para ello, existe la necesidad de
incidir – en el aula – en la utilidad y aplicabilidad del conocimiento.
Revolución democrática social, busca reducir los niveles de exclusión,
discriminación, etc. pero no sólo como tarea propia del maestro, sino también
generando corresponsabilidad de padres y madres de familia, de la escuela y
de la comunidad. Este tipo de revolución, debe permitir que toda la sociedad
asuma responsabilidad en la transformación del Estado.
Revolución ética, significa transformar la conciencia de las personas.
No depredar a la madre tierra, ni mantenerse en la visión antropocéntrica,
sino más bien generar una conciencia ecológica colectiva que posibilite la
convivencia armónica entre el hombre y la naturaleza. La concepción
biocéntrica es asumida como política de Estado, es incluyente e integral pues
promueve valores sociocomunitarios en todo el proceso pedagógico.
Es importante reconocer que los procesos que se viven como país eran
necesarios, principalmente, por la preocupación en garantizar el derecho
fundamental a la educación, por el legado histórico de la educación boliviana
que como Bittencourt y Chávez (2007) afirman, fue construida a partir de una
“dicotomía entre lo rural y lo urbano”, hecho que representaba una división
racial y no apenas una división geográfica o regional. Lo que significa que la
revolución planteada es una unificación del sistema educativo pensado en el
ciudadano boliviano único, al mismo tiempo, en que se plantea el respeto
delante de su cultura, lengua y costumbres. Todo ello expresado en el primer
capítulo de la Ley 070 de 2010:
Artículo 1.
1) Toda persona tiene derecho a recibir educación en todos los niveles de
manera universal, productiva, gratuita, integral e intercultural, sin
discriminación.
2) La educación constituye una función suprema y primera responsabilidad
financiera del Estado, que tiene la obligación indeclinable de sostenerla,
garantizarla y gestionarla.
3) El Estado y la sociedad tienen entuición plena sobre el sistema educativo,
que comprende la educación regular, la alternativa y especial, y la educación
superior de formación profesional. El sistema educativo desarrolla sus
procesos sobre la base de criterios de armonía y coordinación.

83
VILLAFUERTE BITTENCOURT, J. M.; MARDESICH PÉREZ, M. L. • Una aproximación a la reforma educacional
del Estado Plurinacional de Bolivia: descripción y análisis inicial sobre la formación de docentes

4) El sistema educativo está compuesto por las instituciones educativas


fiscales, instituciones educativas privadas y de convenio.
5) Las educaciónes unitaria, pública, universal, democrática, participativa,
comunitaria, descolonizadora y de calidad.
6) Las educaciónes intracultural, intercultural y plurilingüe en todo el sistema
educativo.
7) El sistema educativo se fundamenta en una educación abierta, humanista,
científica, técnica y tecnológica, productiva, territorial, teórica y práctica,
liberadora y revolucionaria, crítica y solidaria.
8) Las educaciónes obligatoria hasta el bachillerato.
9) La educación fiscal es gratuita en todos sus niveles hasta el superior.

Llama la atención al ítem 2 que está directamente relacionado con el


compromiso que la legislación asume al colocar que esta es la primera respon-
sabilidad financiera del Estado. Este es sin duda un avance muy importante al
garantizar recursos para que esta revolución educativa se haga realidad.
Interesa, también remarcar que el ítem 8 que resalta la obligatoriedad
sin hacer diferenciación de género o de edad. De este modo, se garantiza, por
ejemplo, que las niñas bolivianas tengan las mismas oportunidades, que
históricamente no las tenían.

La formación docente en el sistema plurinacional


Otra revolución puesta en marcha con la Ley Avelino Siñani-Elizardo
Pérez (2010, art. 32) está en la formación de maestros. Ella orienta que ésta sea
única, fiscal, gratuita, continua y diversificada – unificando el sistema rural y
urbano. Única en cuanto a jerarquía profesional y calidad pedagógica, científica.
Fiscal y gratuita porque el Estado asume toda la responsabilidad en la formación
de los maestros. Diversificada, porque responde a las características geográficas
económicas, productivas y socioculturales. Todo el subsistema de formación
docente es eminentemente intracultural, intercultural y plurilingüe atendiendo
a la diversidad lingüística, cultural y geográfica del país, orientada a formar a los
nuevos maestros en el marco de la educación productiva y comunitaria a partir
de los saberes y conocimientos de las naciones indígenas-originarias y las
características de los diferentes sectores populares y sociales.
Asimismo, tiende a garantizar una sólida formación en las ciencias de
la educación, sociales, humanísticas, naturales, exactas, técnica, artística y
disciplinas en las cuales se especializa.
Los Institutos Normales Superiores y otros Centros de Formación
Docente estatales, se transforman en Escuelas Normales Superiores de
Formación de Maestros conformando el Subsistema Nacional de Formación
Docente, bajo tuición del Ministerio de Educación y forman maestros para los
subsistemas de educación regular, alternativa y especial de acuerdo a la siguiente
nomenclatura:

84
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Cuadro n. 1: Especialidades en la Formación Docente

Nivel Especialidades
Licenciatura en Educación Inicial en
familia comunitaria
Licenciatura en Primaria Básica
Educación Primaria vocacional
comunitaria vocacional Primaria Avanzada Ciencias Exactas
vocacional Ciencias Naturales
Ciencias Sociales
Lenguaje y Literatura
Licenciatura en Educación Secundaria Matemática
Comunitaria productiva Ciencias Naturales (Física, Química,
Biología y Geografía)
Lenguaje y Literatura
Educación en lenguas
Filosofía, Psicología y Cosmovisión
Ciencias Sociales(Mención en: Historia,
Sociología, Antropología, Educación
ciudadana)
Educación artística
Mención en:
Educación musical, danza y teatro
Artes plásticas y visuales
Educación física y disciplinas deportivas
Licenciatura en Educación Alternativa y Educación especial
especial – Educación Popular comunitaria
y Educación para la diversidad

Fuente: Compendio de documentos curriculares (2008).

El Ministerio de Educación otorga el título de Maestro en el grado de


Licenciatura con reconocimiento del Escalafón del magisterio.2 El Escalafón
sólo reconoce a los formados en las Escuelas Superiores de Maestros. El tiempo
de estudio comprende 5 años para todos los niveles, áreas y modalidades del
Sistema Educativo Plurinacional, estando garantizada su inserción laboral en
las diferentes regiones del país3.

2
El Escalafón del magisterio es la norma legal que regula la jerarquización de la carrera docente
de acuerdo a la trayectoria profesional de los maestros tanto en años de servicio como en remu-
neración salarial.
3
En Bolivia, quienes se forman para ser maestros están habilitados para incorporarse automáti-
camente al sistema público, y el Estado garantiza la inamovilidad funcionaria. Ello no sucede

85
VILLAFUERTE BITTENCOURT, J. M.; MARDESICH PÉREZ, M. L. • Una aproximación a la reforma educacional
del Estado Plurinacional de Bolivia: descripción y análisis inicial sobre la formación de docentes

Los docentes y directivos de las Escuelas Superiores de Formación de


maestros, están conformados por profesionales con título de maestro y grado
académico igual o superior al nivel de grado que ejercen.
Se crea la Universidad Pedagógica de postgrado, de carácter estatal y
parte del Sistema Educativo Plurinacional, bajo la administración del Ministerio
de Educación orientada a promover la investigación científica educativa y la
formación permanente de maestros del Estado Plurinacional.
Como señalan Mardesich y cols. (2012, p.26), de los aspectos nuevos en
la ley en el ámbito de la formación de maestros, se pueden destacar los
siguientes:
– La formación de maestros es responsabilidad del Estado.
– El proceso de formación docente comprende cinco años, que posibilitan
el grado académico de licenciatura.
– La formación postgradual está a cargo de la Universidad Pedagógica,
dependiente del Ministerio de Educación, con el propósito de atender la
cualificación docente a través de cursos de especialización, maestría y doctorado
para los maestros con grado de licenciatura así como para promover la
investigación en el campo educativo.
– La educación trilingüe que exige a los maestros la capacidad de
comunicación en castellano, una lengua originaria y una lengua extranjera.
– Se incide en la necesidad de formar maestros con capacidad de
incorporar el manejo de las nuevas tecnologías de la información y
comunicación en la tarea educativa.
– En este momento el Diseño Curricular Base (DCB) para la formación
docente está en proceso de implementación en las Escuelas Superiores de
formación de maestros.
– Los maestros formados con planes anteriores al nuevo diseño, deben
realizar el Programa de Formación Complementaria (PROFOCOM) con el
propósito de alcanzar el nivel de licenciatura.4

La estructura de formación de maestros


La estructura de formación de maestros y maestras del Sistema Educativo
Plurinacional comprende: a) formación inicial, b) formación continua y c)
formación postgradual que está a cargo del Ministerio de Educación, mediante

en otras profesiones, pues para acceder a un espacio laboral en el sistema público, el resto de los
profesionales deben pasar por procesos de selección que los habiliten para ejercer su carrera. A
ello se denomina Profesión libre.
4
Los maestros formados con planes anteriores se graduaban con el Nivel de Técnico Superior y
debían complementar su formación en alguna universidad para optar por el grado de licencia-
tura.

86
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

el Subsistema de Formación Superior de Formación Profesional a través de la


Dirección General de Formación de Maestros. Las políticas, los lineamientos
y estrategias operativas oficiales tanto para la formación inicial como para la
formación continua y postgradual están a cargo de estas instancias.
Para cada uno de los componentes de la formación de maestras y
maestros se tienen establecidas las instancias que asumen responsabilidad en
el proceso formativo.

a) Formación inicial
Las Escuelas Superiores de Formación de Maestras y Maestros (ESFM)
son las instituciones que, en forma exclusiva, tienen a su cargo la oferta y el
desarrollo de programas académicos de formación inicial de maestras y
maestros de acuerdo al Art. 36, de la Ley Avelino Siñani-Elizardo Pérez.
Estas instituciones son de carácter desconcentrado y dependientes de la
Dirección General de Formación de Maestros (DGFM), y su estructura está
conformada por: Directivos, Coordinadores, Docentes, Administrativos,
Personal académico de servicio y estudiantes.
Las Unidades Académicas (UA’s) son entidades desconcentradas
dependientes de las Escuelas Superiores de Formación de Maestros cuya
máxima autoridad es el Coordinador o la Coordinadora. Por ejemplo, en el
departamento de Cochabamba existe la Escuela Superior de Formación de
Maestros “Simón Rodríguez”, cuyas unidades académicas se encuentran en
las provincias de Sacaba, Quillacollo y Chapare.
La perspectiva es transformar las Escuelas Superiores de Formación de
Maestras y Maestros a partir del siguiente objetivo:
Desarrollar como centros de excelencia académica procesos que garanticen
la formación integral de maestras y maestros para el Sistema Educativo
Plurinacional, comprometidos con la democracia, las transformaciones
sociales, la inclusión plena de todas las bolivianas y bolivianos con alto nivel
académico en las especialidades, la práctica educativa comunitaria y la
generación de innovaciones en el ámbito pedagógico y la construcción de
conocimientos, con compromiso social y vocación de servicio, integrando
comunidad y descolonización de la educación y del Vivir Bien en comunidad
(DCB, 2012, p. 25).

b) Formación continua
La Unidad Especializada de Formación Continua (UNEFCO) es la
instancia que está a cargo del diseño, organización, ejecución y evaluación de
los procesos de formación continua para personal docente, técnico,
administrativo del Sistema Educativo Plurinacional en correspondencia con
el Art. 40 de la Ley Avelino Siñani-Elizardo Pérez.

87
VILLAFUERTE BITTENCOURT, J. M.; MARDESICH PÉREZ, M. L. • Una aproximación a la reforma educacional
del Estado Plurinacional de Bolivia: descripción y análisis inicial sobre la formación de docentes

La UNEFCO es una unidad desconcentrada del Ministerio de Educación


con presencia en todo el país, tiene dependencia directa del Ministerio de Educación
y dependencia funcional del Viceministerio de Educación Superior de Formación
Profesional, a través de la Dirección General de Formación de Maestros.
A través de la Red Plurinacional de Centros de Formación Continua,
desarrolla procesos sistemáticos, variados, sostenidos y acreditados de formaci-
ón continua en todo el país con pertinencia y relevancia cultural y lingüística,
y su principal objetivo es:
Desarrollar procesos de formación continua para maestras y maestros en
ejercicio personal técnico-administrativo del Sistema Educativo Plurinacional,
orientados a su actualización y capacitación para mejorar la calidad de la gestión,
de los procesos, de los resultados y del ambiente educativo, fortaleciendo las
capacidades innovadoras de los educadores, su compromiso social y vocación
de servicio, incorporando estrategias de formación en la práctica y de formación
para la práctica que mejoren la calidad educativa (DCB, 2012 p. 26).

c) Formación postgradual
La Universidad Pedagógica “Mariscal Sucre” es la instancia responsable
de la implementación de procesos de formación postgradual cuyo énfasis es la
investigación educativa y la generación de personal altamente cualificado para
las tareas educativas, de planificación y de gestión en el Sistema Educativo
Plurinacional como lo establece el Art. 39 de la Ley 070.
Siendo una Universidad de régimen especial, la Universidad Pedagógica, tiene
dependencia directa del Ministerio de Educación, mediante el Viceministerio
de Educación Superior de Formación Profesional y la Dirección General de
Formación de Maestros.

En el Gráfico 1, observamos esta dinámica:

88
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Su principal objetivo es:


Desarrollar procesos de formación postgradual de alto nivel académico, con
énfasis en la investigación educativa y la práctica educativa comunitaria,
orientados a la cualificación en las especialidades, la recuperación-producción
de conocimientos y la pertinente resolución de problemas de la realidad en
el ámbito educativo, consolidando enfoques y prácticas educativas que
respondan a la realidad y necesidades del Estado Plurinacional, por tanto
los programas de formación postgradual que oferta la Universidad
Pedagógica, tienen alcance a nivel nacional y se constituyen en una
oportunidad de profundización en la formación profesional en las diversas
especialidades, en investigación, planificación y gestión educativa a maestras,
maestros y personal técnico administrativo del Sistema Educativo
Plurinacional (DCB, 2011, p. 26).

Programa de Formación Complementaria (PROFOCOM)


El año 2013 inicia la transformación educativa en las aulas de todo el
territorio nacional con primero de primaria y primero de secundaria. Muchas
son las expectativas pero también las críticas e incertidumbres que se generan
puesto que al parecer no todas las condiciones institucionales y curriculares
estaban dadas para su respectiva implementación. La primera de esas condici-
ones, la formación de los maestros, fue asumida por el Programa de Formaci-
ón Complementaria (PROFOCOM) con el propósito de que los educadores se
apropien del modelo pedagógico.
El año 2014, cuando dicha transformación llega a todos los niveles y
años de escolaridad, persiste aún la desinformación, a pesar de que la mayoría
de los profesores son parte del PROFOCOMy, de la existencia de diversos
materiales bibliográficos orientativos que se hallan a disposición del público
en general en la plataforma del Ministerio de Educación. Las interpretaciones
que se han venido desarrollando desde distintas instancias no siempre han
respondido a ese propósito inicial de ayudar a comprender de qué se trata esta
nueva manera de entender el proceso pedagógico. Los educadores sienten el
peso de realizar su trabajo en el marco de la incertidumbre, del escepticismo y
de la desconfianza de saber si lo que están haciendo está bien o no.
El PROFOCOM, para maestros en ejercicio con grado de técnico supe-
rior, tiene una duración de 4 semestres, tiempo en el que se desarrollan 20
unidades de formación y 2.400 horas, poniendo énfasis en la aplicación de
aula y en la comunidad. El proceso culmina con un producto grupal de siste-
matización de experiencias en un ámbito del modelo educativo sociocomuni-
tario productivo que se logra con la suma de productos individuales consisten-
tes en un texto didactizado o producción audiovisual corta.
Una vez concluida la anterior fase, los maestros pueden continuar su
proceso formativo con el programa de maestría que dura cinco semestres en el

89
VILLAFUERTE BITTENCOURT, J. M.; MARDESICH PÉREZ, M. L. • Una aproximación a la reforma educacional
del Estado Plurinacional de Bolivia: descripción y análisis inicial sobre la formación de docentes

que se desarrollan 24 unidades de formación con 3.264 horas académicas en


las que se pone énfasis a la investigación y la innovación educativa. El proceso
culmina con un producto individual que consiste en la realización de una
investigación-acción desde la perspectiva del enfoque sociocrítico que se
constituya en un aporte a la mejora de la implementación del modelo educativo
sociocomunitario productivo.
Este momento de transformación educativa debiera ser asumido por los
educadores como una oportunidad para recoger la experiencia acumulada de
los años anteriores, aunar esfuerzos para lograr una comprensión adecuada
del desarrollo curricular, fortalecer la comunidad educativa, y a la vez, compartir
con los demás actores educativos el alcance de la verdadera transformación de
la realidad a la que está orientada el modelo sociocomunitario productivo.

Consideraciones finales
Una premisa para el modelo sociocomunitario productivo es concebir
la educación como instrumento de transformación, que se traduce en un
conjunto de políticas públicas que consideran que la educación debe promover
instituciones educativas que acojan a todos los bolivianos y bolivianas,
independientemente de sus condiciones físicas, sociales, culturales, económicas,
etc. Por tanto, la educación debe dar el paso de la cultura de la exclusión a la
cultura de la diversidad y de la inclusión, razón por la que se han promovido
un conjunto de normas que son parte de la revolución social y que debieran
repercutir en la transformación estructural del Estado.
En el ámbito de la formación docente, si bien el PROFOCOM, ha
movilizado a miles de docentes en el país, con el propósito de concretar una
práctica pedagógica que articule lo social, lo comunitario y lo productivo desde
una nueva perspectiva descolonizadora. Para comprender aquello se necesita
trasladar la formación recibida a la práctica concreta con una actitud optimista
e innovadora frente a esta nueva manera de entender el proceso pedagógico,
que aún no se percibe, puesto que como toda acción educativa, llevará aún
algún tiempo para poder evaluar los resultados.
Ciertamente, esta serie de cambios no han ocurrido sin conflictos. Hay
una fricción constante inclusive dentro de los grupos que componen el gobier-
no. En el caso de los maestros y el gobierno se siente un proceso de constante
tensión, que año tras año se retoma provocado por la aprobación e implemen-
tación de la ley educativa, que pese a los consensos logrados con los sectores
sociales aún trae muchas complicaciones en su aplicación práctica, como lo
señalan los propios educadores, que pese a todo continúan divididos en sindi-
catos de profesionales urbanos y rurales.
Todos estos conflictos nos muestran que, si bien, hay un discurso de cambio
y mejora por parte del gobierno, la realidad es otra, pues hace falta verdadera

90
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

voluntad política para resolver los principales problemas de la población que


repercutan en la mejora de las condiciones de vida, la generación de verdaderos
consensos con los sectores sociales afectados, pues lo contrario representa que
las medidas políticas asumidas no responden a las necesidades socioeconómicas
latentes provocando un descontento del proceso vivido con un cuestionamiento
serio a la democracia representativa así como el acceso al poder de los sectores
sociales e indígenas que actualmente se encuentran en el gobierno.
Es en este escenario en el que se ubica la educación en general y la for-
mación docente en particular, por ello cabe también la necesidad de puntuali-
zar hacia dónde apunta el modelo educativo sociocomunitario productivo, del
cual estamos tomando conocimiento.
Finalmente concordamos con los imperativos levantados por Magdalena
Cajías de la Vega (2011), al referirse a la transformación en curso: es necesaria
la participación activa de los profesores en los procesos decisorios de la
educación a nivel local y nacional; hay que ampliar la discusión de la Formación
Docente con profesores, estudiantes, padres, instituciones formadoras y otros
segmentos de la sociedad; se necesita reestablecer lazos y mecanismos entre
los diferentes sistemas educacionales para llegar a un denominador común
sobre la calidad del conjunto de la educación boliviana, como medio de
disminuir las diferencias; discutir el currículo de las Escuelas Superiores de
Formación de Maestros en los aspectos del uso de lenguas y el trato con las
culturas de pueblos originarios, entre otros (CAJÍAS DE LA VEGA, 2011).
Tendríamos mucho más para aportar en esta discusión, sin embargo,
creemos que ya hacemos una parte al mostrar el nuevo rumbo de la Formación
de los Profesores en el Estado Plurinacional de Bolivia. Creemos que
parcialmente respondimos a la cuestión sobre si es: ¿Un movimiento diferente
dentro de la tendencia histórica de la privatización en América Latina? La
respuesta es que sí, todo este proceso demuestra ser diferente, claro que aún
queda espectro analítico para verificar si el contenido de las propuestas
pedagógicas será suficiente para responder las cuestiones de la sociedad
boliviana, solo la historia de la educación nos dirá.

Referencias
BITTENCOURT, Jaqueline Marcela Villafuerte; CHÁVEZ, María Isabel Torrico. A
Dicotomia da Organização Educacional Boliviana: Uma Análise Histórica. Porto
Alegre: Anais. 13º Encontro da Associação Sul-Rio-Grandense de Pesquisadores em História da
Educação – Asphe. 2007.
CAJÍAS DE LA VEGA, Magdalena. Continuidades y Rupturas: el proceso histórico
de la formación docente rural y urbana en Bolivia. Programa de Investigación Estratégica
en Bolivia. La Paz, 2011.

91
VILLAFUERTE BITTENCOURT, J. M.; MARDESICH PÉREZ, M. L. • Una aproximación a la reforma educacional
del Estado Plurinacional de Bolivia: descripción y análisis inicial sobre la formación de docentes

CPE: ESTADO PLURINACIONAL DE BOLIVIA. Constitución Política del Estado


Plurinacional de Bolivia. Gaceta Oficial de Bolivia. La Paz, 2009.
GACETA OFICIAL DE BOLIVIA. Plan de Desarrollo Económico y Social, Estado
Plurinacional de Bolivia en el marco del desarrollo integral para vivir bien 2016-2020. Disponible
en: http://www.planificacion.gob.bo/pdes/. Acceso en: ago. 2017.
GACETA OFICIAL DE BOLIVIA. Ley de la Educación Avelino Siñani-Elizardo
Pérez, n. 070, Gaceta Oficial de Bolivia. La Paz, 2010.
GRACIARENA. Jorge. El Estado latinoamericano en perspectiva. Figuras, crisis,
prospectiva, 1984. Disponible en: http://publicaciones.sociales.uba.ar/index.php/
entramadosyperspectivas/ article/view/535/473. Acceso en: sep. 2017.
LASERNA. Roberto. Mire, la democracia boliviana, en los hechos… Centro de Estudios de
la Realidad Económica y Social, Fundación Milenio, 2009. Disponible en: Latin
American Research Review, Special Issue © 2010 by the Latin American Studies
Association. Acceso en: ago. 2017.
LUNA, Dario. Transición a una educación revolucionaria, democrática y cultural, Ley 070
Ministerio de Educación. Marzo 12, 2013. Disponible en: <http://educacionbolivia.com/
ley-070-una-revolucion-democratica-y-cultural/>. Acceso en: jun. 2017.
MARDESICH, María Luz; GARCIA, Ana María; VELASCO, Oscar. La formación
Docente en Bolivia. “Nuevos retos de la profesión docente”. III Seminario Internacional de
la Red Europea y Latinoamericana de la profesión docente. Disponible en: <http://www.ub.edu/
relfido/docs/NUEVOS_RETOS_DE _LA_PROFESION_DOCENTE.pdf>. Acceso en:
jul. 2017.
MARDESICH, María Luz. Una mirada al Currículo Base del Sistema Educativo
Plurinacional. Colección Perspectiva Pedagógica. Editorial Verbo Divino, 2014.
MARDESICH, María Luz; GARCÍA, Ana María; VELASCO, Oscar. Un desafío para
la educación: Formar docentes. La formación docente en Bolivia. Editorial Académica
Española, Saarbrücken, Alemania, 2012.
MINISTERIO DE EDUCACIÓN DE BOLIVIA. Currículo Base del Sistema Educativo
Plurinacional. Currículo Subsistema de Educación Regular. Serie currículo. Documento
de trabajo. 2012.
MINISTERIO DE EDUCACIÓN DE BOLIVIA. Currículo de formación de maestras y
maestros del Sistema Educativo Plurinacional, Ministerio de Educación, s/e, La Paz, 2011.
MINISTERIO DE EDUCACIÓN DE BOLIVIA. Diseño Curricular Base de la Educación
Boliviana: Avances y tensiones. Campaña Boliviana por el Derecho a la Educación. Ed.
Agencia Española de Cooperación Internacional para el Desarrollo, La Paz, 2012.
MINISTERIO DE EDUCACIÓN DE BOLIVIA. Periódico mensual Comunidad – Abril,
51, 2017.
TAPIA, Luis. La coyuntura de la autonomía relativa del estado. Editorial Muela del Diablo,
La Paz, 2009.
SARZURI-LIMA. Marcelo. Descolonizar la educación: Elementos para superar el
conservadorismo y funcionalismo cultural. Integra Educativa, v. IV, n. 3, 2011.

92
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Implicações da relação público-privada


para a democratização da educação

Vera Maria Vidal Peroni

Este texto parte de uma pesquisa que analisa como as redefinições no


papel do Estado reorganizam as fronteiras entre o público e o privado, materi-
alizando-se das mais diferentes formas na educação básica pública e suas im-
plicações no processo de democratização da educação.
A perspectiva teórico-metodológica é a de que a relação entre o público
e o privado na política educacional é parte constitutiva das mudanças sociais e
econômicas. A política educacional é aqui entendida como uma política social
e, assim, resultado de reclames populares (VIEIRA, 1998). É tratada como a
materialização das mudanças que estão ocorrendo no movimento do real da
sociedade e não simplesmente determinada pelas mudanças sociais e econô-
micas, mas como parte constitutiva dessas mudanças.
Assim, Estado e sociedade civil são perpassados por: correlação de for-
ças (GRAMSCI, 1989) de sujeitos individuais ou coletivos (THOMPSON,
2012), situados em um contexto histórico e geográfico (HARVEY, 2008), per-
passados por projetos societários de classe distintos. Classe é aqui entendida
na concepção de Thompson, como processo e relação, que se materializa no
movimento do real com especificidades tanto econômicas quanto culturais de
cada período histórico:
[...] classe não é categoria estática, é uma categoria histórica descritiva de
pessoas numa relação no decurso do tempo e das maneiras pelas quais se
tornam conscientes das suas relações, como se separam, unem, entram em
conflito, formam instituições e transmitem valores de modo classista
(THOMPSON, 2012, p. 260).

E neste mesmo sentido, Chauí (2016, p. 19) aponta que classe social
“não é um dado fixo, determinado apenas pelas determinações econômicas,
mas um sujeito social, político, moral e cultural que age, se constitui, interpre-
ta a si mesma e se transforma por meio da luta de classes”. A autora conclui
que “ela é uma práxis, um fazer histórico” (CHAUÍ, 2016, p. 21).
Nesse sentido, não tratamos a relação público-privado apenas como uma
contraposição entre Estado e sociedade civil, já que entendemos que ambos

93
PERONI, V. M. V. • Implicações da relação público-privada para a democratização da educação

são construídos por sujeitos individuais e coletivos1 em um processo histórico


de correlação de forças e perpassados por interesses mercantis. Portanto, em
nossas pesquisas, o privado é vinculado ao mercado e ao neoconservadoris-
mo, com implicações para a democratização da educação (PERONI, 2015).
Democracia é aqui entendida como materialização de direitos e de igual-
dade social2 (WOOD, 2003) e “coletivização das decisões” (VIEIRA, 1998),
com efetiva participação na elaboração de políticas com base na prática social
crítica e autocrítica no curso de seu desenvolvimento (MÉSZÁROS, 2002). É
importante ressaltar a especificidade brasileira na análise das redefinições do
papel do Estado, pois os avanços das lutas por direitos sociais ocorreram no
momento pós-ditadura, na década de 1980, mesmo período de crise capital
(MÉSZÁROS, 2002; HARVEY, 1989), período em que o capitalismo propu-
nha um conjunto de estratégias para retomar o aumento das taxas de lucro,
reduzindo direitos, com graves consequências para a construção da democra-
cia e da efetivação dos direitos sociais, materializados em políticas públicas,
dando lugar ao que temos chamado de “naturalização do possível” (PERO-
NI, 2003; 2006; 2013).
O texto está dividido em duas partes. Na primeira, apresenta o neolibe-
ralismo, terceira via e terceiro setor, pela importância que tem para o debate
que realizamos sobre as justificativas propostas pelos governos para atuarem
com o terceiro setor, e apresenta um debate acerca de como este processo está
ocorrendo na educação pública. Na segunda parte, apresentamos como este
processo está se materializando no Brasil.

As redefinições no papel do Estado e os processos


de privatização da educação
Entendemos que o diagnóstico do capital de que o Estado culpado pela
crise e o mercado deve ser o padrão de padrão de qualidade, está na raiz do
avanço da privatização do público. As fronteiras entre o público e o privado
têm-se modificado no contexto atual de crise do capitalismo e suas estratégias
de superação – neoliberalismo, globalização, reestruturação produtiva e ter-
ceira via – redefinem o papel do Estado, principalmente para com as políticas
sociais. O neoliberalismo e a terceira via, atual socialdemocracia, têm o mes-
mo diagnóstico de que o culpado pela crise atual é o Estado e o mercado como
parâmetro de qualidade.

1
Sujeitos individuais e coletivos na concepção de Thompson (1981).
2
Sobre a não separação entre o econômico e o político, ver Wood (2003).

94
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

O papel do Estado para com as políticas sociais é alterado, pois, com esse
diagnóstico, as prescrições são racionalizar recursos e esvaziar o poder das insti-
tuições, já que instituições públicas são permeáveis às pressões e demandas da
população e improdutivas, pela lógica mercadológica. Nessa perspectiva, a res-
ponsabilidade pela execução e direção das políticas sociais deve ser repassada
para a sociedade. Assim sendo, tanto o neoliberalismo quanto a terceira via,
trazem implicações para o projeto democrático, por quererem esvaziar as insti-
tuições públicas das decisões. O neoliberalismo, porque acredita que a democra-
cia é responsável pelas demandas sociais que provocam a distribuição de rendas
através das políticas públicas, ocasionando o déficit fiscal. A terceira via, por
sua vez, por ter o mesmo diagnóstico de crise do Estado, sua proposta de refor-
má-lo passa por princípios gerenciais, com a lógica da sociedade civil empreen-
dedora que também deve executar as tarefas do Estado (PERONI, 2013). De
alguma forma, as duas teorias propõem o repasse para a sociedade, em alguma
medida, da direção e da execução das políticas sociais (PERONI, 2016).
E o que permanece com a propriedade estatal também passa a ter a
lógica de mercado. É o que Clarke e Newman (2012, p. 358) chamam de esta-
do gerencial: “[...] mesmo onde os serviços públicos não foram totalmente
privatizados (e muitos permaneceram no setor público), era exigido que tives-
sem um desempenho como se estivessem em um mercado competitivo”. No
livro The Managerial State, Clarke e Newman (2006) apontam para redefinições
no papel do Estado, ressaltando que não significa que ele tenha diminuído,
mas apenas modificado sua atuação: “O estado tem se retirado em alguns
aspectos, seus poderes e aparelhos têm sido expandidos em outros – transfe-
rindo responsabilidades, mas simultaneamente criando as capacidades de fis-
calização e reforço para garantir que estas responsabilidades estão sendo cum-
pridas” (CLARKE; NEWMAN, 2006, p. 126).
Wood (2014) analisa o papel do Estado neste período particular do ca-
pitalismo, de financeirização e globalização, destacando que, ao contrário do
que apontam os teóricos neoliberais, o Estado não é nada mínimo, pelo con-
trário, “o capital global ainda (na verdade, mais do que nunca) exige uma or-
dem política, social e legal rigidamente regulada e previsível” (WOOD, 2014,
p. 11). Dialogando com os autores que tratam do fim da importância do Esta-
do e a ascensão de uma nova governança global, a autora argumenta: “A for-
ma política de globalização é, mais uma vez, não um Estado global, mas um
sistema global de múltiplos Estados locais, estruturados numa relação com-
plexa de dominação e subordinação” (2014, p. 28).
Para Wood (2014), o capitalismo global é o que é não somente por ser
global, mas acima de tudo por ser capitalista. Os problemas associados à glo-
balização “não existem simplesmente porque a economia é global, ou porque

95
PERONI, V. M. V. • Implicações da relação público-privada para a democratização da educação

as empresas globais são incomparavelmente cruéis, nem mesmo por serem


excepcionalmente poderosas [...] a globalização é o resultado e não a causa”.
E assim, “o problema não é de uma ou outra empresa, desta ou daquela agên-
cia internacional, mas do sistema capitalista em si [...]” (WOOD, 2014, p. 25).
Assim como Wood, destacamos a importância do Estado no processo
atual de acumulação do capital. Entendemos as políticas sociais como resulta-
dos de um processo de correlação de forças. Portanto, entendemos a impor-
tância de tornar o Estado mais público, democrático e garantidor de direitos.
Como apontamos no início do texto, direitos sociais materializados em
políticas são parte do conceito de democracia. Mas, para que este direito se
materialize, alguém deve ter o dever de assegurá-lo. Entendemos assim, que o
Estado, enquanto poder público deve ser o responsável pelo direito. Neste senti-
do, analisamos criticamente as posições que repassam para a sociedade ou ao
indivíduo a execução do que seriam seus direitos conquistados historicamente.
Robertson e Verger (2012) também questionam que, neste período de gran-
de ofensiva do capital e de várias formas de mercantilização do público, as re-
ponsabilidades pelo direito à educação ficam diluídas: “[...] Quem é a autorida-
de relevante? Quem é afetado pelas decisões de vários governos, empresas trans-
nacionais, fundações, agências internacionais e consultores? Quem deve ser pro-
curado para prestar contas? (ROBERTSON; VERGER, 2012, p. 1151).
Vivenciamos internacionalmente um grande avanço no processo de
mercantilização da educação. Rikowski (2014) nos ajuda a entender tal pro-
cesso, quando apresenta os conceitos de mercantilização, comoditização e
capitalização. E, cita Marginson (1997)3, que apresenta a “mercantilização”
como uma síntese das tendências dos mercados na educação, composta dos
processos sociais e econômicos que fomentam para o desenvolvimento, a in-
tensificação e a força dos mercados na educação e outras áreas da vida social.
Ainda citando Marginson (1997), Rikowski (2014, p. 28) apresenta cinco ca-
racterísticas necessárias para o estabelecimento de um mercado educacional:
1) mercados envolvem a produção de commodities (que são compradas e vendi-
das); 2) há um campo de produção definido (por exemplo, escolaridade, for-
mação ou ensino superior); 3) há uma troca monetária entre produtor e con-
sumidor de commodities; 4) existem relações de concorrência entre os produto-
res; 5) há mercado de subjetividades – as atitudes e comportamentos adequa-
dos ao mercado de produção, consumo e troca. Verificamos que o processo de
mercantilização envolve tanto a educação quanto a mercadoria (ROBERT-
SON; VERGER, 2012, ADRIÃO, 2009, ADRIÃO; GARCIA, 2014), quanto
às atitudes e comportamentos vinculados ao mercado de produção, que temos
chamado na nossa pesquisa de conteúdo da educação (PERONI, 2015, 2016).

3
Marginson (1997). Mercados em Educação, p. 5-6, ênfase no original.

96
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Christian Laval (2004) também apresenta várias formas de mercantili-


zação na educação: a que destina a escola a fornecer mão de obra adaptada
às necessidades da economia; a intervenção mais direta das empresas na pe-
dagogia, conteúdos escolares, validação das grades curriculares e diplomas,
que pretende instituir nas escolas a lógica de mercado; empresas adotando
escolas e interferindo nos seu programa educativo; publicidade, através do
financiamento de artigos escolares com o logo da empresa; parcerias, como
a compra e venda de grades curriculares. Laval (2004) observa, ainda, que
esses movimentos geram dois tipos de fenômenos: a escola como mercado
(publicidade ou venda de produtos) e a escola como produtora de mercado-
rias específicas (suportes e conteúdos de ensino). Verificamos em nossa pes-
quisa (PERONI, 2016) que, mais do que privatizar escolas, importa ao mer-
cado interferir na política educacional, principalmente nos casos de parceri-
as dos Institutos Ayrton Senna e Unibanco com escolas do ensino funda-
mental e médio, em que o conteúdo da educação é monitorado, com metas
estabelecidas pelos institutos, o que Laval chama de “mercadorias específi-
cas”. Licínio Lima (2013), ao tratar do conceito de privatização, apresenta a
multiplicidade de formas, o que confere com o que temos encontrado em
nossas pesquisas (PERONI, 2013, 2016).
[...] muitas e diferentes coisas, desde a erosão das responsabilidades estatais
em benefício de privados, desregulação, concessão a privados, parcerias,
construção de redes nacionais de ensino, já não públicas, mas híbridas ou
baseadas em parcerias público-privadas, escolas públicas com estatutos de
fundação e regidas pelo direito privado, escolas públicas cuja gestão foi con-
cessionada a privados, financiamento através da captação de alunos e res-
pectivos “cheques-ensino” pagos pelo Estado, interferência crescente no cur-
rículo, na prática pedagógica, na avaliação, etc., por parte de instituições
privadas, empresas, fundações, organizações não-governamentais diversas,
ou do chamado “terceiro setor” (LIMA, 2013, p. 178-179).

Ball e Olmedo (2013) destacam o papel da filantropia, historicamente


presente na relação entre o público e o privado, nas políticas sociais: “O que
há de ‘novo’ na ‘nova filantropia’ é a relação direta entre o ‘doar’ e os ‘resulta-
dos’ e o envolvimento direto dos doadores nas ações filantrópicas e nas comu-
nidades de políticas. [...]” (BALL; OLMEDO, 2013, p. 33). Os autores apon-
tam que as mudanças na filantropia tradicional ocorreram em três etapas “[...]
da doação paliativa (ou seja, a filantropia tradicional ou a ‘filantropia 1.0’) à
filantropia para o desenvolvimento (‘filantropia 2.0’), e, finalmente, à doação
‘rentável’, constituindo aquilo que é chamado de ‘filantropia 3.0’.” (BALL;
OLMEDO, 2013, p. 34). Ball e Olmedo (2013) acrescentam que essa terceira
etapa da filantropia ocorre através das redes:
[...] para entender o trabalho das “novas” organizações filantrópicas e seus
“parceiros”, precisamos considerá-los não sob uma perspectiva individual,

97
PERONI, V. M. V. • Implicações da relação público-privada para a democratização da educação

como atores isolados, mas sim como nós interconectados que operam de
acordo com lógicas de rede e configuram suas agendas e ligações de formas
mutantes e fluídas (BALL; OLMEDO, 2013, p. 40).

Em nossas pesquisas, trabalhamos com a perspectiva de que a mercadi-


zação da educação pública não é uma abstração; ela ocorre via sujeitos e pro-
cessos. Sujeitos individuais e coletivos (THOMPSON, 1981) estão cada vez
mais organizados, em redes do local ao global, com diferentes graus de in-
fluência e que falam de diferentes lugares: setor financeiro, organismos inter-
nacionais, setor governamental. Algumas instituições têm fins lucrativos e
outras não (ou não claramente), mas as redes são sujeitos (individuais e coleti-
vos) em relação, com projeto de classe (PERONI, 2016).
Ball e Junemann (2012) ressaltam que as fronteiras entre filantropia,
negócios e setor público foram movidas e que as mudanças são endógenas e
exógenas (dentro e fora do setor público). Tais mudanças ocorrem através da
disseminação de valores e práticas de empreendimento, empreendedorismo e
transposição do discurso internacional do gerencialismo. Nesse contexto, no-
vos valores, modos de ação e formas de autoridade moral crescem, enquanto
outras são diminuídas ou derivadas. Observa-se que as diminuídas e deriva-
das, não por acaso, são os sindicatos, movimentos sociais e instituições vincu-
ladas às classes populares.
Outro aspecto da nova filantropia, vinculado aos resultados, é que os
financiadores querem ver e mensurar os impactos. Os autores discorrem ainda
sobre o venture capitalism, capitalismo de risco, isto é, eles querem ver o retor-
no, mas aceitam riscos. E, assim, os filantropistas tomam as decisões de onde
investir o seu dinheiro, influenciando ou definindo as políticas sociais em ge-
ral e, em particular, as educacionais. A filantropia estratégica busca projetos
inovadores. Os autores ressaltam que, se o projeto prova a sua eficácia, é apre-
sentado aos governos para ampliá-lo e financiá-lo. Os empresários têm investi-
do em projetos-piloto (BALL; JUNEMANN, 2012). Foi o que verificamos
com o Instituto Unibanco: o Programa Jovem de Futuro passou por uma fase
piloto, de validação da tecnologia, até se transformar em política pública (PE-
RONI; CAETANO, 2015).
Ball e Junemann (2012) acentuam também que a localização na rede é
chave para o capital social. As redes são feitas de capital social que pode ser
desenvolvido, investido e acumulado, e se notabilizam por apresentar um in-
tenso fluxo de ideias e pessoas entre o público e o privado. Os participantes
são multifacetados: atores individuais podem ser envolvidos nas redes em uma
variedade de modos (significados e tipos de influência). Foi o que se constatou
na pesquisa, nas redes do Instituto Ayrton Senna (ADRIÃO, PERONI, 2010),
Instituto Unibanco (PERONI, 2016, PERONI; CAETANO, 2015) e do Movi-
mento Todos pela Educação (BERNARDI; UCZAK; ROSSI, 2015).

98
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Robertson e Verger (2012) destacam a influência do setor privado em


todas as instâncias da educação: “[...] as PPPEs permitiram seu rápido avan-
ço, dado que o setor privado está agora profundamente enraizado no coração
dos serviços públicos educacionais, em todos os níveis, desde a política e a
pesquisa até a aprendizagem nas salas de aula (ROBERTSON; VERGER, 2012,
p. 1149). Foi o que constatamos em nossas pesquisas, o privado atuando das
mais diferentes formas e em todos os níveis, desde as instâncias de decisão,
ministérios, secretarias de educação até a sala de aula, conforme apresentare-
mos no próximo item.

Múltiplas formas de materialização do privado


na educação básica pública no Brasil
As redefinições no papel do Estado implicam o processo de democrati-
zação e a minimização de direitos universais e de qualidade para todos, o que
traz consequências para as populações de todo o mundo; no entanto, em paí-
ses que viveram ditaduras e um processo recente de luta por direitos materiali-
zados em políticas, o processo de privatização é ainda mais danoso.
No Brasil, o Estado foi, historicamente, vinculado aos interesses priva-
dos (FERNANDES, 1987; VIEIRA, 1998; PIRES, 2015). Após o último perío-
do de ditadura, a partir de meados dos anos 1980, entrou na pauta da socieda-
de, mesmo que de forma tímida, o processo de democratização, participação,
coletivização das decisões, assim como direitos sociais materializados em po-
líticas. Ao mesmo tempo, os processos de neoliberalismo, reestruturação pro-
dutiva e financeirização redefiniam o papel do Estado para com as políticas
sociais, com um diagnóstico de crise fiscal e redução de custos.
Assim, ocorreram avanços inegáveis no acesso à educação, no entanto,
com os “recursos possíveis” e, muitas vezes, em detrimento de salários e con-
dições de trabalho dos profissionais da educação. A ampliação de direitos pela
universalização do acesso, inclusão de alunos com necessidades especiais, maior
participação na vida escolar não foi seguida de condições materiais com a
mesma intensidade das mudanças.
Vivemos a contradição de que, ao mesmo tempo em que a privatização
do público é cada vez maior, também, em um processo de correlação de for-
ças, estamos avançando lentamente em alguns direitos materializados em po-
líticas educacionais. Trata-se de direitos que foram reivindicados no processo
de democratização, nos anos 1980, e materializados em parte na Constituição
Federal de 1988 e na Lei de Diretrizes e Bases (LDB) de 1996, como a gestão
democrática da educação, a educação básica entendida como educação infan-
til, fundamental e média, a gratuidade da educação pública, entre outros. As-
sim, ao mesmo tempo em que ocorrem algumas conquistas sociais para a de-

99
PERONI, V. M. V. • Implicações da relação público-privada para a democratização da educação

mocratização da educação, em um processo de correlação de forças, verifica-


se a organização de setores vinculados ao mercado, influenciando as políticas
educativas das mais diversas formas.
A garantia do acesso à educação pública foi ampliada, o que considera-
mos um avanço nesse processo. No entanto, também verificamos a presença
cada vez maior do privado mercantil atuando de diferentes formas na educa-
ção pública. Por isso, entendemos que relação entre o público e privado não se
refere apenas à questão de propriedade, e não se trata de uma contraposição
entre Estado e sociedade civil, já que Estado e sociedade civil são perpassados
por correlações de forças de classes sociais e projetos societários distintos.
No Brasil, mais de 80% da população matriculada no ensino fundamen-
tal e médio está na rede pública, conforme notas estatísticas do Censo Escolar
2016. A rede privada tem apenas 18,4% do total de matrículas na educação bási-
ca.4 A oferta aumentou para quem historicamente não teve acesso, e esta amplia-
ção ocorreu na escola pública. O “conteúdo da educação” foi privatizado.
Nossas pesquisas demonstram que, no Brasil, o processo de privatização
do público ocorre tanto através da direção como da execução, ou de ambas.
No processo de direção, destacamos o Movimento Todos pela Educação,
em que os empresários acabam influenciando o Governo Federal, tanto na agenda
educacional quanto na venda de produtos educativos (ROSSI; BERNARDI;
UCZAK, 2013), e a assessoria do grupo internacional McKinsey, Company ao
governo federal (BITTENCOURT; OLIVEIRA, 2013). E atualmente o avanço
do neoconservadorismo é evidenciado na pesquisa de Lima (2017) sobre o Mo-
vimento escola sem Partido e Peroni, Caetano, Lima, 2018 sobre sujeitos vincu-
lados ao mercado e ao neoconservadorismo, organizados em redes
No processo de privatização via execução, pesquisamos a expansão da
oferta via terceiro setor nas creches comunitárias (SUSIN; MONTANO, 2015),
nos Programas de Educação de Jovens e Adultos, como o Brasil Alfabetizado
(COMERLATTO; MORAES, 2013), e de educação profissional, como o PRO-
NATEC (Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego) (RO-
DRIGUES; SANTOS, 2015) e de Educação Especial (BOROWSKY, 2013).
E quando ocorre via execução e direção, verificamos nos estudos sobre
as parcerias, em que instituições privadas definem o conteúdo da educação e
executam sua proposta através da formação, da avaliação do monitoramento,
premiação e sanções que permitem um controle de que seu produto será exe-
cutado (ADRIÃO; PERONI, 2010, 2011). Verificamos que as parcerias entre
os Instituto Unibanco (IU) e Instituto Airton Senna (IAS) com escolas públi-
cas trabalham definindo políticas, com a concepção, acompanhamento e ava-

4
(https://brasilemsintese.ibge.gov.br/educacao.html Acesso em: 27 nov. 2017).

100
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

liação da educação nas redes públicas parceiras. Na justificativa de sua atua-


ção, apresentam problemas na qualidade de ensino e assumem o que seriam
tarefas do Estado para com as políticas públicas de educação. As metodologi-
as empregadas são padronizadas e replicáveis, ao contrário das propostas de
reestruturação produtiva, do próprio capital, que propõem a formação de um
trabalhador criativo, que responda rapidamente às demandas com capacidade
de raciocínio e trabalho em equipe.
Os institutos definem o que deve ser feito, desde o Secretário de Educa-
ção até os professores e alunos. A proposta é baseada na gestão gerencial, os
dois participam do Movimento Todos pela Educação (MTE), que tem atuado
decisivamente na direção das politicas educativas, trazendo a lógica de merca-
do para o sistema público em todos os seus níveis. Assim, atuam desde a dire-
ção da política através do MTE, até a sala de aula, via parcerias, onde exercem
monitoramento (SIASI e SGT) e premiação e sanções introduzindo valores
competitivos e meritocráticos para o sistema.

Considerações finais
É importante destacar as especificidades de um país que saiu de uma
ditadura, e estava dando os primeiros passos na conquista por direitos materia-
lizados em políticas, quando vivenciou os processos de naturalização da perda
de direitos no período de ajuste fiscal e de implementação das estratégias de
superação da crise do capital de neoliberalismo, reestruturação produtiva, fi-
nanceirização e terceira via, que redefiniam o papel do Estado como principal
garantidor dos direitos sociais materializados em políticas.
Assim, verificamos que, se por um lado o Brasil avançou na materializa-
ção de direitos em políticas, por outro avançou também no processo de priva-
tização do público, tanto através da execução quanto da direção das políticas
educacionais. O Brasil não tem um histórico democrático, e a privatização do
público é uma realidade “naturalizada” em nossa cultura. No entanto, no perí-
odo pós-ditadura, em um processo de correlação de forças com essa lógica
historicamente instaurada, no período de democratização, iniciou-se um mo-
vimento de repensar o público, o Estado, com a participação efetiva da socie-
dade. E entende-se que a participação envolve um longo aprendizado que ocorre
na experiência.5
A participação é fundamental para o avanço da democracia. Portanto,
quando se criticam as entidades privadas definindo ou executando as políticas
públicas, estamos, em parte, apontando para as instituições com interesses
mercantis no processo de direção, que trazem a lógica de mercado, com per-

5
Experiência, conforme Thompson (1981).

101
PERONI, V. M. V. • Implicações da relação público-privada para a democratização da educação

das para a concepção de democracia, como coletivização das decisões, na de-


finição de políticas (VIEIRA, 1998); e também, para a perda da responsabili-
dade do Estado no processo de execução como a responsável pelas políticas
universais e pela perda para a concepção de democracia como direitos sociais,
materializados em políticas universais (para todos e com qualidade), a demo-
cracia como igualdade social materializada em políticas públicas.
Com base nos conceitos do início do texto, de que o Estado, assim como
o capital, é entendido como relação ou processo em um movimento de sujeitos
em correlação de forças de classes sociais e projetos societários distintos, perce-
bem-se as redes como sujeitos em relação com objetivos de classe. Analisamos
como a lógica mercantil tem participado ativamente da direção e da execução
das políticas sociais. E como a presença desses sujeitos, que passam a influenci-
ar fortemente as políticas sociais, deixa as responsabilidades ficarem cada vez
mais diluídas quanto aos direitos materializados em políticas sociais.

Referências
ADRIÃO, Theresa. Indicações e Reflexões sobre as Relações entre Esferas Públicas e
Privadas para a Oferta Educacional no Brasil. Revista Políticas Educativas, v. 3, n. 1,
p. 48-64, 2009.
ADRIÃO, Theresa; GARCIA, Teise. Subsídio Público ao Setor Privado: reflexões sobre
a gestão da escola pública no Brasil. Revista Políticas Educativas, v. 7, n. 2, p. 110-122, 2014.
ADRIÃO, T.; PERONI, V. Análise das consequências de parcerias firmadas entre
municípios brasileiros e a Fundação Ayrton Senna para a oferta educacional. Relatório
de pesquisa. 2010.
ADRIÃO, T.; PERONI, V. Consequências da atuação do Instituto Ayrton Senna para
a gestão da educação pública: observações sobre dez casos em estudo. Revista Práxis
Educativa, Ponta Grossa, v. 6, n. 1, jan./jul. 2011.
BALL, S.; JUNEMANN, C. Networks, new governance and education. Bristol: Policy Press.
2012.
BALL, S.; OLMEDO. A. A “nova” filantropia, o capitalismo social e as redes de polí-
ticas globais em educação. In: PERONI, V. (Org.). Redefinições das fronteiras entre o públi-
co e o privado: implicações para a democratização da educação (p. 33-47). Brasília: Li-
ber Livro. 2013.
BERNARDI, L.; UCZAK, L.; ROSSI, A. As relações Estado com empresários nas
políticas educacionais: PDE/PAR e guia de tecnologias educacionais. In: PERONI,
Vera (Org.). Diálogos sobre as redefinições no papel do Estado e nas fronteiras entre o público
e o privado na educação. São Leopoldo: Oikos, 2015, p. 15-34. Disponível em: <https://
plone.ufrgs.br/gprppe>, 2015, p. 52 a 71.
BITTENCOURT, J.; OLIVEIRA, M. de F. A influência das consultorias internacio-
nais nas decisões das políticas educacionais no Brasil. In: PERONI, V. (Org.). Redefini-

102
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

ções das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação.
Brasília: Liber Livro, 2013, p. 175-197.
BOROWSKY, F. A relação entre a educação pública e a privada na Educação Especial
brasileira. In: PERONI, V. (Org.). Redefinições das fronteiras entre o público e o privado:
implicações para a democratização da educação. Brasília: Liber, 2013, p. 308-326.
CHAUI, Marilena. A nova classe trabalhadora brasileira e a ascensão do conservado-
rismo In: CLETO, Murilo; DORIA, Kim; JINKINGS, Ivana (Orgs.). Por que gritamos
golpe? Para entender o impeachment e a crise política no Brasil. São Paulo: Boitempo,
2016, p. 15-22.
CLARKE, John; NEWMAN, Janet. The Managerial State. Londres: SAGE publications
Ltd, 2006. p. 126.
COMERLATO, D. M.; MORAES, J. C. AlfaSol e Programa Brasil Alfabetizado: a
parceria público-privado nas políticas de educação de jovens e adultos. In: PERONI, V.
(Org.). Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democrati-
zação da educação. Brasília: Liber Livro, 2013, p. 327-346.
FERNANDES, F. A Revolução burguesa no Brasil. 3. ed. Rio de Janeiro: Guanabara,
1987.
GRAMSCI, A. Maquiavel a Política e o Estado Moderno. Rio de Janeiro: Civilização Bra-
sileira, 1989.
HARVEY, D. Condição pós-moderna. 4. ed. São Paulo: Loyola. 1989
HARVEY, D. O Neoliberalismo: história e implicações. São Paulo: Loyola, 2008.
LAVAL, Christian. A Escola não é uma Empresa. O neo-liberalismo em ataque ao ensino
público. Londrina: Ed. Planta, 2004.
LIMA, L. C. Privatização da educação no contexto da(s) ‘Terceira(s) Via(s)’: uma ca-
racterização em análise. Currículo sem Fronteiras, v. 13, n. 2, p. 177-181, maio/ago. 2013.
LIMA, Paula Valim. Escola sem sentido: Implicações da Escola sem Partido para a de-
mocratização da educação pública. Graduação em Educação, Faculdade de Educa-
ção, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2017.
MÉSZÁROS, I. Para além do Capital. São Paulo: Boitempo Editorial; Campinas: Edito-
ra da UNICAMP, 2002.
PERONI, V.; CAETANO, R. Ensino Médio no Brasil e a proposta educacional do
Instituto Unibanco: considerações sobre a mercantilização da educação pública. In:
PERONI, V. M. (Orgs.). Diálogos sobre as redefinições no papel do Estado e nas fronteiras
entre o público e o privado na educação. V. 1. São Leopoldo: Oikos, 2015, p. 89-107.
PERONI, V. Política educacional e papel do Estado no Brasil dos anos 90. São Paulo: Xamã.
2003.
PERONI, V. As relações entre o público e o privado nas políticas educacionais no
contexto da terceira via. Currículo sem Fronteiras, 13(2), 234-255. 2013.
PERONI, V. Implicações da relação público-privada para a democratização da educa-
ção no Brasil. In: PERONI, Vera (Org.). Diálogos sobre as redefinições no papel do Estado e

103
PERONI, V. M. V. • Implicações da relação público-privada para a democratização da educação

nas fronteiras entre o público e o privado na educação. São Leopoldo: Oikos, 2015, p. 15-34.
Disponível em: <https://plone.ufrgs.br/gprppe>, 2015.
PERONI, Vera. Implicações da relação público-privada para a democratização da educação no
Brasil. Tese (promoção a Professor Titular da Carreira do Magistério Superior), UFRGS.
2016. Disponível em: <https://plone.ufrgs.br/gprppe>.
PERONI, V.; CAETANO, R. Ensino Médio no Brasil e a proposta educacional do Ins-
tituto Unibanco: considerações sobre a mercantilização da educação pública. In: PE-
RONI, V. M. (Orgs.). Diálogos sobre as redefinições no papel do Estado e nas fronteiras entre o
público e o privado na educação. V. 1. São Leopoldo: Oikos, 2015, p. 89-107.
PERONI, V.; CAETANO, R.; LIMA, P. Reformas educacionais de hoje: as implica-
ções para a democracia. Revista Retratos da Escola, Brasília, v. 11, n. 21, p. 415-432, jul./
dez. 2017. Disponível em: <http//www.esforce.org.br>. p. 415-432.
PERONI, Vera Maria Vidal; SUSIN, Maria Otilia Kroeff; MONTANO, Monique Ro-
bain. A relação público privada na educação infantil: um estudo sobre a qualidade nas cre-
ches comunitárias. Aguardando Publicação. 2015.
PIRES, D. A construção histórica da relação público-privada na promoção do direito à educação
no Brasil. 2015. Tese (Doutorado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em
Educação, Faculdade de Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Por-
to Alegre. 2015.
RIKOWSKI, Glenn. Crises in Education, Crises of Education. A paper prepared for the
Philosophy of Education Seminars at the University of London Institute of Education
2014-15 Programme, 22nd, October 2014. p. 28.
ROBERTSON, S.; VERGER, A. A origem das parcerias público-privadas na gover-
nança global da educação. Educação e Sociedade, 33 (121), p. 1133-1156, 2012.
RODRIGUES, R.; SANTOS, M. O Pronatec na fronteira entre o público e o privado.
In: PERONI, Vera (org.). Diálogos sobre as redefinições no papel do Estado e nas fronteiras
entre o público e o privado na educação. São Leopoldo: Oikos, 2015, p. 108-128.
ROSSI, Alexandre; BERNARDI, Liane Maria; UCZAK, Lucia Hugo. Relação Públi-
co-Privada no Programa de Desenvolvimento da Educação: uma análise do Plano de
Ações Articuladas. In: PERONI, Vera (Org.). Redefinições das Fronteiras entre o Público e o
Privado: Implicações para a democratização da educação. Brasília: Liber Livros, 2013.
SUSIN, M. O. A qualidade na educação infantil comunitária em Porto Alegre: estudo de caso
em quatro creches conveniadas. Tese (Doutorado), UFRGS, 2009.
THOMPSON, E. P. A miséria da teoria ou um planetário de erros. Rio de Janeiro: Zahar, 1981.
THOMPSON, E. P. As peculiaridades dos ingleses e outros artigos. Campinas: Editora UNI-
CAMP, 2012, p. 75-286.
VIEIRA, E. O Estado e a sociedade civil perante o ECA e a LOAS. Serviço Social,
Sociedade, n. 56, p. 9-23, 1998.
WOOD, Ellen M. Democracia contra o capitalismo: a renovação do materialismo históri-
co. São Paulo: Boitempo Editorial, 2003.
WOOD, Ellen M. O Império do capital. São Paulo: Boitempo, 2014.

104
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Os desafios para a consolidação do estado social e


de direito brasileiro e as consequências para
a gestão democrática da educação

Daniela de Oliveira Pires

Introdução
O objetivo do artigo é analisar, a partir do processo de abertura política
e democrática do país nos anos 1980, a construção do Estado democrático e
social de direito, ainda em desenvolvimento, portanto, incompleto e inacaba-
do, e os avanços e retrocessos, ou seja, os desafios relacionados à implementa-
ção da gestão democrática da educação básica. O estudo pretende demonstrar,
por meio da correlação de forças sociais do período de transição democrática,
caracterizada a posteriori pela propagação das orientações políticas do neolibe-
ralismo e da terceira via, que empreenderam uma espécie de disputa entre
duas formas de gestão para a educação pública, a gestão democrática e a ges-
tão gerencial. A metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica e documen-
tal, dialogando com autores como Florestan Fernandes (2005), Vera Peroni
(2003), José Willington Germano (1994) e Evaldo Vieira (2001), dentre ou-
tros. O trabalho foi estruturado em duas partes de desenvolvimento. Na pri-
meira parte do estudo, será mencionado o processo de redemocratização dos
anos 1980, com destaque para a organização do Fórum em Defesa da Educa-
ção Pública, bem como a correlação de forças que marcou o embate educacio-
nal na Assembleia Constituinte de 1987 e que definirá, na Constituição Fede-
ral de 1988, ações do setor público e do privado (com e sem fins lucrativos),
assim como o do público não estatal e o da propagação do neoliberalismo,
com consequências para a democratização da gestão da educação.
No item seguinte, tendo por base a crise do capitalismo dos anos 1970 e
consequentes ajustes econômicos e fiscais no âmbito interno dos estados e a
frágil democracia brasileira, serão analisadas as tendências políticas de con-
centração do poder tanto nos regimes militares quanto na elite econômica re-
presentante do capital financeiro, bem como a fragilização das políticas públi-
cas sociais que seriam responsáveis pelas respectivas crises, conforme diagnós-
tico dos neoliberais e da terceira via, orientações políticas e econômicas hege-
mônicas, respectivamente, nos anos 1980 e 1990. Apresentamos dois proces-

105
PIRES, D. de O. • Os desafios para a consolidação do estado social e de direito brasileiro
e as consequências para a gestão democrática da educação

sos que entraram em contradição com a política de valorização da educação


pública e dos mecanismos de gestão democrática, defendida pelos movimen-
tos sociais que se estruturavam nos anos de 1980 e a crise do capitalismo inici-
ada ainda nos anos 1970. As redefinições do papel do Estado, frente às crises
do capital, apregoadas pelos teóricos do neoliberalismo e da terceira via, de-
fensores da minimização das políticas públicas sociais, institucionalizaram a
parceria público-privada na oferta da educação, com implicações para a de-
mocratização da educação.
Nas considerações finais, sustenta-se o distanciamento existente entre a
promoção do direito à educação apregoado pelos aparatos legais e a concreti-
zação da gestão democrática da educação, quando as ações e programas go-
vernamentais primam pela sua mercantilização e privatização, reconfiguran-
do a atuação estatal na oferta de políticas públicas sociais, repassando a exe-
cução para a iniciativa privada, acrescido do fato de que a redemocratização
do Estado brasileiro ainda é um processo em construção, com avanços e retro-
cessos, limites e possibilidades.

Os anos 1980 e 1990: a defesa da gestão democrática


da educação e a propagação do neoliberalismo
Os anos 1980 foram marcados pelo aprofundamento da crise econômi-
ca em escala internacional e nacional e também pelo processo de redemocrati-
zação que ocorre de forma lenta e gradual no país. Em que pese, Florestan
Fernandes, afirma que houve a manutenção e o controle da hegemonia das
forças militares em razão do que o autor definiu como “pactos pelo alto” (FER-
NANDES, 2005), que retorna ao regime democrático, mas com a permanên-
cia da influência militar nos poderes executivo, legislativo e judiciário, o que
acaba promovendo consequências para a democratização da educação. Nos
primeiros anos de 1980, resta claro o esgotamento do regime civil-militar bra-
sileiro, devido aos questionamentos da sociedade e por parte dos organismos
internacionais sobre as graves violações aos direitos humanos e a profunda
crise econômica já em andamento.
Existem dois processos que influenciaram a definição da política públi-
ca educacional nesse período histórico e que entraram em contradição com a
valorização da educação pública e democrática defendida pelos movimentos
sociais que se estruturavam a partir dos anos 1980, quais sejam, a crise do
capitalismo e a propagação do neoliberalismo. Nesse aspecto, reside uma con-
tradição importante, como forma de compreender os limites e as possibilida-
des da democratização da gestão da educação básica, pois, enquanto o Brasil
(e os demais países latino-americanos) lutavam pelo fim das ditaduras civil-

106
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

militares, pela defesa da escola pública, da gestão democrática e de uma maior


participação do governo na sua promoção, mundialmente está havendo um
processo inverso, uma vez que, a partir do avanço do neoliberalismo, tem-se o
estímulo à privatização dos direitos sociais, a não intervenção do Estado na
economia e a maximização da influência dos organismos financeiros mun-
diais. É neste processo histórico de avanços (internos) e retrocessos (interna-
cionais) que a educação pública e democrática volta ao debate nacional. Uma
das manifestações sociais deste período foi o Fórum Nacional em Defesa da
Escola Pública (FNDEP). O principal objetivo do FNDEP era a organização
de um processo constituinte que levasse a discussão de uma nova constituição
para o país. Segundo Vera Peroni:
O fórum foi oficialmente lançado em Brasília, em 9 de abril de 1987, na
Campanha Nacional em Defesa da Escola Pública e Gratuita, tendo sido
denominado, inicialmente, de Fórum da Educação na Constituinte em De-
fesa do Ensino Público e Gratuito (PERONI, 2003, p.75).

Dentre as suas reivindicações, duas questões se destacavam, a luta con-


tra a ditadura civil-militar (1964-1985) e a defesa da educação pública. As de-
mandas contidas nas pautas do movimento sociais expressam o repúdio da
sociedade com a forma como a política educacional brasileira havia sido con-
duzida pelo governo militar, caracterizada pelo seu viés privatizante e de recu-
sa ao caráter social e coletivo do ensino. A resposta dos setores privados foi
imediata, reafirmando a correlação de forças sociais entre o público e o priva-
do durante o processo constituinte de 1987.
Durante o processo constituinte, as principais forças que se opuseram ao
FNDEP, segundo Gohn (1994), foram as escolas particulares privadas por
meio da Federação Nacional de Estabelecimentos de Ensino (Fenem) e o
setor privado confessional, por intermédio da Associação Brasileira de Es-
colas Superiores Católicas (Abesc) e da Associação da Educação Católica
(PERONI, 2003, p. 76).

Durante o processo constituinte de 1987-1988, o fortalecimento da bi-


polaridade entre os defensores da escola pública e dos setores privados eviden-
cia algumas questões candentes, como o ensino religioso nas escolas públicas,
a gestão democrática. Neste ponto, podemos afirmar que no debate constituinte
que definiu as diretrizes educacionais que seriam incorporadas no texto final
da Constituição de 1988, consagraram-se duas tendências: o reconhecimento
legal das instituições privadas com fins lucrativos e a lógica do público não
estatal. Tal conjuntura impulsionará a parceria das entidades do terceiro setor
com o setor público na promoção dos direitos sociais, dentre eles a educação,
pois apenas 10 (dez) anos após a promulgação da Constituição de 1988, são
editadas, respectivamente a Lei n. 9.637/98, que trata das Organizações Soci-

107
PIRES, D. de O. • Os desafios para a consolidação do estado social e de direito brasileiro
e as consequências para a gestão democrática da educação

ais (OS) e a Lei n. 9.790/99, das Organizações da Sociedade Civil de Interesse


Público (OSCIPS) que fortalecem a tendência já difundida mundialmente da
sociedade civil atuar diretamente na promoção dos direitos sociais.
Este contexto é de aprofundamento da relação entre o público e o priva-
do no campo de atuação das políticas sociais, uma vez que tal obrigação deixa
de ser exclusiva do Estado, pois vem sendo descentralizada para os entes pri-
vados. A educação brasileira foi bastante influenciada, a partir da década de
1990, pelas reformas empreendidas pelo Estado brasileiro, principalmente
durante o primeiro mandato do Presidente Fernando Henrique Cardoso (1994-
1998). Essas reformas receberam uma forte influência dos organismos inter-
nacionais, uma vez que os governos estavam economicamente atrelados a es-
ses organismos, entre os quais, o Fundo Monetário Internacional (FMI), o
Banco Mundial, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciên-
cia e a Cultura (UNESCO), a Organização Internacional do Trabalho (OIT),
a Organização Mundial do Comércio (OMC) e a Comissão Econômica para
América Latina e Caribe (CEPAL). A reforma educacional em curso no Brasil
colocava a educação como um eixo entre a reforma e a produtividade e objetiva-
va assegurá-la para todos, desde que fosse eficiente. Dessa maneira, ocorreram
mudanças de ordem prática no sistema educativo, tais como maior flexibilida-
de, descentralização e competitividade, o que acarretava em marcos conceituais
educativos e transformava o Estado num mero fiscalizador das políticas educa-
cionais. Como consequência, as escolas e os processos educacionais se viram
diante de uma lógica que não privilegiava o ideário democrático do ensino, mas,
sim, a lógica de mercado e da competição, ou seja, a lógica gerencial.
Nesse contexto, o Governo Federal promulgou, em 1995, o Plano Dire-
tor de Reforma do Aparelho do Estado – PDRAE, que possuía entre as suas
premissas principais o estímulo à realização das parcerias entre a esfera públi-
ca e a privada na promoção dos direitos sociais. De acordo com o PDRAE, a
esfera privada passa a atuar não como um mero colaborador do Estado, mas
como um verdadeiro substituto do ente estatal, no campo de atuação dos di-
reitos sociais e, dentre eles, a educação, com consequências para a gestão de-
mocrática. É com a edição do plano diretor que passa a se configurar a redefi-
nição do papel do Estado, que deixava de ser o responsável direto pela promo-
ção das políticas públicas sociais, tornando-se apenas o regulador desse desen-
volvimento. A educação, quando é vista unicamente sob a perspectiva do pú-
blico não estatal, se transforma gradativamente em um serviço, exigindo tão
somente que sua prestação ocorra de forma eficiente, visando apenas à produ-
ção de resultados. Por se tratar de um serviço, ou ainda, de um bem de consu-
mo, deve atender às necessidades do mercado. Ao contrário do que se possa
pensar, a relação público-privada não permitirá que a totalidade da sociedade

108
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

civil passe a ser detentora do conhecimento disputado dentro da ordem capi-


talista.
O que prevalece é que a sociedade civil, no atual contexto de crise eco-
nômica, acaba se responsabilizando pelas políticas sociais. A sociedade passa
a vincular-se às organizações do terceiro setor, legalmente reconhecidas, e a
firmar parcerias com o poder público, agindo no cumprimento das obrigações
que o Estado deixa de executar. Para Lucia Bruno:
[...] falam e procuram justificar a redução dos investimentos estatais nas
políticas sociais, transferindo parte da responsabilidade sobre esses serviços
para a própria classe trabalhadora, que além de sua jornada de trabalho
diária (quando a tem), deve também assumir uma segunda, durante a qual
haverá de produzir para si mesma aquilo que o Estado se desobrigou de
fornecer-lhe. Outra parte desses serviços é transferida para o setor privado,
onde estes são produzidos como mercadoria, operando-se assim a expansão
do mercado de bens e serviços consumidos pela classe trabalhadora. Esse
processo é bastante visível no caso da educação (BRUNO, 2002, p. 27).

Quando a educação passa a ser promovida essencialmente por interes-


ses particulares, faz com que os cidadãos não participem do controle dos bens
produzidos em sociedade, entre eles, o próprio conhecimento. Quem acaba
controlando ou é uma pequena parcela da sociedade ou ainda o mercado,
quando a sua execução é transferida para o setor privado, evidenciando um
estímulo à competitividade entre os alunos, o distanciamento dos princípios
da gestão democrática, a premiação por desempenho, a ênfase nos resultados
e a diminuição da autonomia dos professores. O acréscimo de eficiência na
educação é um dos principais argumentos defendidos para a mudança na esfera
de atuação das políticas educacionais, uma vez que a esfera privada é considera-
da como “mais eficiente” que a esfera pública. De acordo com Lisete Arelaro:
Adotando estas políticas na área educacional, onde a prestação da baixa
qualidade da educação pública oferecida justifica a tese de que a adoção
destas “estratégias” – ainda que aparentemente provisórias – colaborariam
(pois elas são “parceiras”) para tornar mais eficientes o trabalho educativo e
os projetos das escolas, certamente a gestão democrática, com participação
popular sempre crescente e suas intermináveis discussões, reuniões, suges-
tões e cobranças, é empecilho a ser superado, por desnecessário (ARELA-
RO, 2007, p. 916).

Para os que defendem a adoção da relação público-privada na educa-


ção, entende-se que a gestão democrática se torna um empecilho na busca por
resultados mais eficientes. Não podemos esquecer que a gestão democrática é
uma conquista constitucional. Somente a partir da Constituição de 1988 que a
gestão democrática do ensino e da escola foi erigida à categoria de princípio
constitucional, após a correlação de forças do período que antecedeu a pro-
mulgação da Carta Política de 1988. De acordo com Juliana S. Lumertz:

109
PIRES, D. de O. • Os desafios para a consolidação do estado social e de direito brasileiro
e as consequências para a gestão democrática da educação

Diversas entidades nasceram neste período da luta contra a ditadura expres-


sando esta correlação de forças. Entre elas, destacam-se as propostas feitas
durante a IV Conferência Brasileira de Educação (CBE), em 1986, na qual
foram debatidas propostas a serem incorporadas na Constituição Nacional.
O documento resultante daí foi a “Carta de Goiânia”, que incluía mecanis-
mos de democratização da gestão da educação, como, por exemplo, a edu-
cação entendida como direito de todos, sendo gratuita e laica nos estabeleci-
mentos públicos; ensino fundamental obrigatório, com duração de oito anos;
garantia do Estado à sociedade civil do controle e execução da política edu-
cacional por colegiados constituídos democraticamente; participação e me-
canismos de controle social efetivo assegurados pelo Estado. Outro movi-
mento importante foi o Fórum de Educação na Constituinte em Defesa do
Ensino Público e Gratuito (mais tarde passou a chamar-se de Fórum Naci-
onal em Defesa da Escola Pública – FNDEP, que atuou na constituinte e na
elaboração da Lei de Diretrizes e Bases – LDB). Seu lançamento ocorreu
por meio da “Campanha Nacional pela Escola Pública e Gratuita” e acom-
panhado pelo “Manifesto em Defesa da Escola Pública e Gratuita”. O Fó-
rum surgiu como um espaço para debater a construção de um projeto para a
educação como um todo e não somente para a escola, lutando pela redemo-
cratização da educação e objetivando a elaboração de uma carta magna
para o país (LUMERTZ, 2007, p. 38).

Entre os seus mecanismos, estão a participação de todos os sujeitos en-


volvidos na educação, tais como professores, alunos, funcionários e pais, nos
processos de tomada de decisões da escola; entretanto, tal conquista acaba por
significar um empecilho quando se buscam exclusivamente resultados e mais
eficiência da educação. Em que medida o princípio da gestão democrática da
educação básica passou a significar um problema para a educação? Qual o
objetivo de uma educação que se pretende eficiente e que não leva em conside-
ração os princípios democráticos da escola? Para os teóricos da terceira via, a
participação é defendida, porém, com outro sentido. Significa, em sua essên-
cia, que a sociedade civil, quando exerce seu direito de participação, o faz na
medida em que assume a responsabilidade pela execução das políticas públi-
cas sociais.
Nesse contexto, incluem-se as novas formas de atuação do estado no
campo educacional, entre elas, a descentralização, a privatização, a focaliza-
ção e a terceirização, como consequência da forte influência da ideologia neo-
liberal, destacada pela autora. O que se constata é uma alteração na relação
entre o estado e a sociedade, que vai mudar significativamente a lógica dentro
dos sistemas de ensino. Nesse sentido, a escola se vê diante de uma lógica que
não privilegia o ideário democrático do ensino, e, sim, a lógica de mercado e
da competição, tendo como resultado a mercantilização dos sistemas de ensi-
no. Nesse sentido, de acordo com Vera Lúcia A. de Brito:
As lutas pela democratização da sociedade brasileira, os movimentos em
prol da educação pública, a organização do setor da saúde, os movimentos

110
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

sociais vão expressar uma negação da identificação da relação público-esta-


tal e reivindicar um conjunto de políticas sociais, articuladas com a inserção
dos brasileiros na sociedade, enquanto portadores de direito (BRITO, 2003,
p. 136).

Para tanto, quando se faz referência à educação, trata-se de um direito,


uma conquista e uma garantia constitucional, que enseja a obrigação do ente
estatal, pois estamos tratando de um direito assegurado a todos os cidadãos,
não podendo ser visto com uma mera concessão ou um serviço que é prestado
a um cliente. Ainda sobre a gestão da escola, Christian Laval faz referência ao
fato de que “o novo modelo escolar e educativo que tende a se impor está
fundamentado, inicialmente, na sujeição mais direta da escola à razão econô-
mica. Ele depende de um ‘economizou’, aparentemente simplista cujo axio-
ma principal é que as instituições, em geral, e as escolas, em particular, só têm
sentido dentro do serviço que elas devem prestar às empresas e à economia”
(LAVAL, 2004, p. 03).
De acordo com Evaldo Vieira: quanto às políticas educacionais, sendo
essa uma política social de responsabilidade exclusiva do Estado, analisada a
partir de categorias restritas do pensamento neoliberal, vincula-se à crise pela
qual passam os sistemas de ensino à atuação exclusiva da esfera pública. Des-
sa forma, a solução pensada pelos teóricos do neoliberalismo é orientar a polí-
tica educacional a partir dos preceitos que dirigem os mercados, ou seja, para
o setor privado. Ainda de acordo com o autor:
Na democracia liberal, portanto a política social toma como alvo a igualda-
de de cidadania para homens pertencentes à sociedade orientada pelo mer-
cado e caracterizada pela desigualdade econômica. Por isto, a política eco-
nômica está atrelada à política social, mas se colocando normalmente aci-
ma desta. Os direitos sociais integrantes da cidadania podem mitigar a desi-
gualdade dos homens e até contribuir à mudança nas condições de produ-
ção, não abolindo a situação desproporcional estabelecida entre os poucos
possuidores de capital e os muitos vendedores da força de trabalho (VIEI-
RA, 1992, p. 97).

O direito à educação enseja a correlata obrigação do Estado em prestá-


la, isto é, um dever, que importa na necessária observância dos princípios que
orientam a atividade estatal, quer sejam expressas, como a legalidade e a im-
pessoalidade, quer sejam implícitas, como o princípio da continuidade dos
serviços públicos. A educação, enquanto um direito de todos, conforme está
disposto de forma expressa no art. 205, da Carta Magna de 1988, estabelece
que o Estado seja o titular na promoção da educação. Conforme dispõe o art.
205: “A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promo-
vida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desen-
volvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualifi-

111
PIRES, D. de O. • Os desafios para a consolidação do estado social e de direito brasileiro
e as consequências para a gestão democrática da educação

cação para o trabalho”. Entretanto, percebe-se que a influência da elite diri-


gente no Brasil é determinante, na medida em que nem a Constituição de 1988
é resguardada, evidenciando de acordo com Geraldo Magela P. Leão, uma
postura “pseudodemocrática”. Ademais, segundo o autor,
A ampliação do poder privado nas escolas, seja por meio da exploração
direta do mercado educacional, seja por meio da imposição de uma lógica
administrativa legitima os interesses do capital. Estamos no seio de uma
complexidade em que o capital adquire novos contornos e legitima a sua
interpretação sobre a crise educacional, aliando discurso conservador e so-
luções pseudodemocráticas (LEÃO, 2003, p. 121).

É necessário, no caso da educação, pensá-la enquanto uma autêntica


política social, de natureza pública, o que significa, em linhas gerais, vislum-
brar a premissa do poder estatal em ação, comprometido em estimular políti-
cas sociais públicas que garantam o acesso, a qualidade e a permanência dos
educandos nos sistemas de ensino, o que equivale afirmar, a sua democratiza-
ção. Portanto, é fundamental entender como a política educacional está se
materializando nesse momento particular de crise do capitalismo, sendo neces-
sária uma reflexão acerca das transformações sociais e políticas que o nosso país
e a educação atravessaram ao longo do seu processo histórico, tendo por base a
gradativa “desresponsabilização” da esfera pública em promover a efetividade
dos direitos sociais, em especial da educação e a necessidade de fortalecer a
democracia enquanto um valor e um fundamento do Estado brasileiro.

Considerações finais
Os anos 1980 marcaram o esgotamento do Estado de exceção, oriundo
de um golpe civil-militar, e a luta dos movimentos sociais pela redemocratiza-
ção da educação pública, dos quais destaquei o Fórum Nacional em Defesa
da Escola Pública. Todavia, nesse mesmo momento, os Estados Unidos e a
Inglaterra difundiam mundialmente a orientação neoliberal, que, entre suas
premissas, constam a privatização dos setores sociais e a não intervenção do
Estado na economia. É nesse contexto que a Constituição de 1988 foi promul-
gada. Ela consagrou, além da esfera do público e do privado, uma nova catego-
ria, o confessional ou filantrópico, que significava a ação particular, mas com
um sentido público, o chamado público não estatal. As entidades públicas não
estatais foram amplamente estimuladas a partir dos anos 1990, com o advento
das parcerias público-privadas, entre o estado e as entidades do terceiro setor,
que se qualificaram juridicamente como entidades de direito privado sem fins
lucrativos. Nesse aspecto residiu uma das maiores inquietações do estudo, pois,
quando o Estado se aproximava da titularidade da promoção da educação em
uma perspectiva democrática, admitindo a sua função e empenhando esforços

112
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

para executá-la, as forças sociais privatizantes se organizavam para deslegiti-


mar essas pretensões.
A valorização das entidades do terceiro setor é parte da consolidação de
uma orientação política que surge na Inglaterra definida como terceira via,
estruturada por Antony Giddens, que se coloca como uma alternativa à antiga
socialdemocracia e ao neoliberalismo. Entre as suas características estão o es-
tímulo ao voluntariado, a desresponsabilização na execução direta das políti-
cas sociais pelo poder público – repassando para a sociedade civil – e o incen-
tivo à meritocracia. Para Giddens, é necessário “democratizar a democracia”
(GIDDENS, 1999).
A estratégia é justificar a desobrigação estatal com um discurso envol-
vente, o qual a sociedade civil acabou legitimando ao assumir a execução das
políticas sociais. Isso fortalece indiretamente o empresariado na educação, que
com instituições bancárias, grandes conglomerados empresariais e setores da
mídia passam a identificar possibilidades bastante rentáveis quando assumem
funções estatais em relação aos direitos sociais, sendo essa atitude estimulada
pelo Estado por meio de incentivos fiscais e financeiros.
A educação é parte constitutiva de um determinado movimento históri-
co, no qual está inserida, sendo parte constitutiva de um Estado Democrático
e Social de Direito, em construção, pois sequer atingiu a sua plenitude, não
podendo ser analisada, portanto, sem a intermediação dos fatores políticos e
econômicos que primam pela lógica da competividade e da lucratividade, le-
vando à seguinte conclusão que, enquanto não vencermos a lógica histórica
de apropriação dos espaços de decisão pública por setores privados hegemôni-
cos, a democratização da escola e dos processos educacionais não conseguirá
se consolidar, conforme estabelece a Carta Política de 1988. Essa relação refle-
te a noção do público no Estado brasileiro como um espaço privilegiado para
a manutenção dos privilégios privados e do status quo. Somente conseguire-
mos ultrapassar o atual estágio do nosso desenvolvimento com a ruptura da
ordem vigente que historicamente se estruturou. Uma alteração nessa conjun-
tura somente acontecerá por intermédio de uma maior conscientização e or-
ganização da coletividade, que deverá exercer o seu papel, não assumindo fun-
ções estatais, mas fornecendo a pauta para a elaboração das políticas públicas
educacionais, que deverá primar pelo todo e não apenas para uma parte histo-
ricamente privilegiada, acrescida da necessidade de valorizarmos a matriz e o
fundamento do Estado de direito brasileiro, impulsionando, assim, para a tran-
sição completa para a democracia.

113
PIRES, D. de O. • Os desafios para a consolidação do estado social e de direito brasileiro
e as consequências para a gestão democrática da educação

Referências
ARELARO, Lisete R.G. Formulação e implementação das políticas públicas em edu-
cação e as parcerias público-privadas: impasse democrático ou mistificação política?.
Educ. Soc. [online]. 2007, v. 28, n. 100 [citado 2008-02-11], p. 899-919. Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo>.
AZEVEDO, Janete M. Lins. A Educação como Política Pública. São Paulo: Autores Asso-
ciados, 1997.
BRITO, Vera Lúcia Ferreira Alves. O Público e o Privado e a Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional. Faculdade de Educação. Tese de Doutorado. UFMG, 1995.
BRUNO, Lucia. Gestão da Educação: Onde Procurar o Democrático? In: OLIVEI-
RA, Dalila Andrade; ROSAR, Maria de Fatima Felix (Orgs.). Política e Gestão da Edu-
cação. Belo Horizonte: Autêntica, 2002.
FERNANDES, Florestan. A Revolução Burguesa no Brasil. São Paulo: Globo, 2005.
GIDDENS, Anthony. A Terceira Via. Reflexões sobre o Impasse Político Atual e o Fu-
turo da Socialdemocracia. Rio de Janeiro: Record, 1999.
GERMANO, José Willington. Estado Militar e Educação no Brasil (1964-1985). 2. ed. São
Paulo: Cortez, 1994.
HARVEY, David. A condição Pós-Moderna. São Paulo: Loyola, 1989.
LAVAL, Christian. A escola não é uma empresa. O neoliberalismo em ataque ao ensino
público. Londrina: Planta, 2004.
LEÃO, Geraldo Magela Pereira. “Novas” Estratégias da Gestão Privada da Educação
Pública. In: OLIVEIRA, Dalila Andrade; DUARTE, Marisa R. T. Política e Trabalho na
Escola. Administração dos Sistemas Públicos de Educação Básica. Belo Horizonte:
Autêntica, 2003.
LUMERTZ, Juliana Selau. A Parceria Público-Privada na Educação: Implicações para a
Gestão da Escola. 2007. Dissertação (Mestrado) – UFRGS, Porto Alegre, 2007.
PERONI, Vera M. Vidal. Política educacional e papel do Estado no Brasil dos anos 90. São
Paulo: Xamã, 2003.
SANFELICE, José Luis. Da escola estatal burguesa à escola democrática e popular:
considerações historiográficas. In: LOMBARDI, José Claudinei; SAVIANI, Derme-
val; NASCIMENTO, Maria Isabel Moura (orgs.). A Escola Pública no Brasil: História e
historiografia. Campinas: Autores Associados, 2005.
VIEIRA, Evaldo. Estado e Miséria no Brasil. De Getúlio a Geisel. São Paulo: Cortez,
1992.
VIEIRA, Evaldo. Os direitos e a política social. Cortez: São Paulo, 2001.
VIEIRA, Evaldo. A Ditadura Militar: 1964-1985 (momentos da República brasileira).
São Paulo: Cortez, 2014.

114
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Relações do movimento empresarial


na política educacional brasileira:
a naturalização da associação
público-privada

Liane Maria Bernardi


Lucia Hugo Uczak
Alexandre José Rossi

O setor privado sempre esteve presente na educação brasileira, mas ao


longo do tempo foi assumindo diferentes formas, especialmente a partir dos
anos de 1990, sob influência da Conferência Mundial de Jomtien e da necessi-
dade de “produção de uma nova sociabilidade, mais adequada aos interesses
privados do grande capital nacional e internacional” (SHIROMA; GARCIA;
CAMPOS, 2011, p. 227). Neste contexto a agenda educacional torna-se cen-
tral, sendo proposta a reforma da educação e da escola para que se tornasse
mais eficaz às novas demandas do capital.
Nesse sentido, o setor privado mercantil está demarcando sua posição
de classe na construção de políticas públicas, através de arranjos como o
movimento Todos pela Educação – TPE, convocado em 2006 pela financei-
ra Itaú Unibanco Participações S.A. em parceria com empresários do país.
Em 2014 o TPE tornou-se uma organização social sem fins lucrativos e cons-
titui-se atualmente como uma rede política que envolve intelectuais, empre-
sas públicas e privadas, cujos interesses heterogêneos se articulam em torno
da intervenção na educação (VOSS, 2011) e se definem como “especialistas
em educação”.
Desde sua criação, o movimento passou a atuar intensamente junto aos
órgãos governamentais e movimentos educacionais, incorporando no seu dis-
curso reinvindicações históricas da luta pela democratização da educação como
ampliação da escolaridade e sua qualificação. Porém, reinterpretam a forma
de executá-la, oferecendo o arquétipo empresarial e a gestão gerencial como
modelo, reposicionando “a função social da educação e da escola, destituin-
do-as, contudo, do seu caráter público” (SHIROMA; GARCIA; CAMPOS,
2011, p. 227).

115
BERNARDI, L. M.; UCZAK, L. H. ROSSI, A. J. • Relações do movimento empresarial
na política educacional brasileira: a naturalização da associação público-privada

Fruto do processo de democratização do país e de muita luta, a classe


trabalhadora brasileira conquistou o acesso à educação. Porém, a consolida-
ção deste processo permanece em disputa, bem como a sua qualificação (aces-
so, permanência e sucesso). Então é preciso atenção a este movimento de
classe e construção de consensos em torno da ação e da influência dos em-
presários e suas parcerias com os governos para a elaboração e a execução de
políticas educacionais.
Só podemos ver o movimento de classe como uma formação social e
cultural que opera num dado período histórico e que, portanto, não é estático,
ao contrário, está sempre mudando. Adotamos a definição de classe a partir
de Thompson (1991) que não a vê como uma categoria ou estrutura, mas como
um processo, como algo que ocorre e pode ser demonstrado nas relações hu-
manas e que unifica a experiência e a consciência. Classe não é fruto de um
planejamento prévio nem objeto comandado por sujeitos externos ao proces-
so; ela acontece quando os sujeitos “sentem e articulam a identidade de seus
interesses entre si e contra outros homens cujos interesses diferem [...]”
(THOMPSON, 1987, p. 9). Se a classe é perceptível apenas no processo, a
descoberta da consciência de classe ocorre na medida em que vivemos as situ-
ações de classe, de como as experiências se materializam em valores, ideias e
instituições.
Antônio Gramsci (2002, p. 62) destacou que a construção do consenso
pode ocorrer de duas formas: como “domínio” e como “direção intelectual e
moral”. Então, se o consenso não for constituído pela imposição da força,
precisamos atentar para a forma como se produz a hegemonização de um pen-
samento, de que forma os grupos sociais e as classes se organizam, qual a corre-
lação de forças e como acontece a disputa na sociedade – a luta de classes.
Assim ao olharmos para as políticas públicas de educação, considera-
mos que elas não são estáticas e que precisamos observar como ocorre a coali-
zão de interesses, quem tem permissão ou condições de estabelecer o que e o
como da política, ou seja, o jogo que perpassa a política desde sua formulação
até a execução, “a política da política” (GALE, 2003, p. 122).
Neste caso, destacamos algumas ações que a classe empresarial mercan-
til, organizada a partir do TPE, tem no processo educacional brasileiro, do
ponto de vista de disputa de projeto societário, tanto na determinação do con-
teúdo da proposta educacional quanto na ampliação das possibilidades de lu-
cros e de influência ou de hegemonia (ROSSI; BERNARDI; UCZAK, 2017).
Para fins de organização desta exposição apresentaremos quatro focos de ação
do TPE: A ação do movimento na primeira década (2006/2016) com a cons-
trução de suas propostas e a naturalização da sua influência junto ao Plano de
Ações Articuladas – PAR – e nas alterações da legislação educacional. E na

116
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

sequência, a sua relação com as políticas educacionais no momento atual, em


que destacaremos a ação junto ao Plano Nacional de Educação e na discussão
da Base Nacional Comum.

O movimento empresarial Todos Pela Educação: a ação no PAR


O Plano de Ações Articuladas – PAR é uma política federal decorren-
te do Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação, criado em 2007,
cujo nome já sugere um imbricamento do governo com o movimento empre-
sarial, como já destacaram Dermeval Saviani (2007), Nora Rut Krawczyk
(2000), Regina Cestari de Oliveira (2012), Olinda Evangelista e Roberto Leher
(2012). Essa sintonia é amplamente divulgada pelo TPE como podemos ver
em seu site:
[...] em sintonia com o MEC, Consed (Conselho Nacional de Secretários da
Educação) e Undime (União Nacional dos Dirigentes Municipais de Edu-
cação), numa parceria pioneira, em que o objetivo principal é garantir edu-
cação de qualidade a todas as crianças e jovens brasileiros até 2022, ano que
o Brasil celebra o bicentenário da Independência (http://
www.todospelaeducacao.org.br/educacao-na-midia/indice/574).

Como já destacamos em publicações anteriores1 o Plano de Metas tra-


zia em suas diretrizes o estímulo às parcerias privadas, e, ao aderir ao plano,
estados e municípios realizavam um planejamento educacional partindo de
um diagnóstico local (em plataforma digital criada pelo MEC com assistência
técnica da UNESCO). A partir da assinatura do compromisso, cada rede pú-
blica elaborava seu PAR, ficando apto a receber assistência técnica e financei-
ra do Ministério da Educação.
Para auxiliar os entes federados, o MEC elaborou o Guia de Tecnologi-
as Educacionais, que é um documento que contém a descrição de diversas
tecnologias e informações suplementares acerca de materiais pedagógicos ela-
borados por instituições ou empresas públicas e/ou privadas, pré-qualificadas
segundo um aviso de chamamento público do ministério.
Quando observamos o guia, constatamos a presença do setor privado
em quase todas as categorias, como podemos ver no quadro a seguir:

1
ROSSI, BERNARDI, UCZAK (2013); BERNARDI, UCZAK, ROSSI (2015), ROSSI, BER-
NARDI, UCZAK (2017).

117
BERNARDI, L. M.; UCZAK, L. H. ROSSI, A. J. • Relações do movimento empresarial
na política educacional brasileira: a naturalização da associação público-privada

Quadro 1: Tecnologias educacionais

Item Categoria Tecnologia desen- Tecnologia Total


volvida pelo MEC externa ao MEC
2009 2011 2009 2011 2009 2011
1 Gestão da Educação 09 11 06 07 15 18
2 Ensino Aprendizagem 04 09 51 51 55 60
3 Formação dos profissionais
da educação 10 12 14 15 24 27
4 Educação Inclusiva 06 11 01 01 07 12
5 Portais Educacionais 04 05 12 11 16 16
6 Diversidade e Educação de
Jovens e Adultos 10 17 07 11 17 28
7 Educação Infantil - - - 08 - 08
TOTAL 43 65 91 104 134 169

Fonte: Quadro elaborado pelos autores a partir dos Guias de Tecnologias Educacionais,
2009 e 2011/2012.

A relação do setor privado com o Governo Federal a partir do PAR e do


Guia de Tecnologias é visível tanto na influência e interlocução na elaboração
da política quanto na oferta de soluções para os problemas da educação. À
guisa de exemplo, citamos o Instituto Unibanco, membro do conselho de go-
vernança e sócio fundador do TPE, que ofertava três programas no Guia de
Tecnologias: Jovem de Futuro, Projeto entre jovens e Gestão da Educação. Ou
seja, os empresários tornaram-se clientes do Estado.

A relação do TPE com a reformulação


de políticas educacionais
Os movimentos sociais historicamente protagonizaram a luta pela de-
mocratização da educação, pela melhoria da qualidade e equidade, pela am-
pliação da cobertura do atendimento. Algumas dessas bandeiras de luta ao
longo do tempo foram apropriadas pelo TPE como metas suas e que, no pro-
cesso de promoção de políticas, foram gradativamente materializadas tam-
bém na legislação educacional brasileira. O quadro a seguir evidencia algu-
mas bandeiras e a relação com as propostas governamentais.

118
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Quadro 2: Propostas do TPE e Políticas Governamentais

TPE POLITICAS GOVERNAMENTAIS


Meta 1 EC 59 –11/11/2009 Lei n. 12.796 de 04/04/2013
Toda criança e jovem de (LDB) Lei n. 13.005 de 25/06/2014 – PNE.
4 a 17 anos na escola.
Meta 2 Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade
Toda criança plenamente Certa – Portaria n. 867, de 4/07/ 2012. Lei n.
alfabetizada até os 8 anos. 13.005 de 25/06/2014 – PNE.
Meta 3
Todo aluno com aprendizado Política de Correção Fluxo – PAR/ GUIA.
adequado ao seu ano.
Meta 4 Pacto pelo Fortalecimento do Ensino Médio –
Todo jovem de 19 anos com Ensino Portaria n. 1.140, de 22/11/2013.
Médio concluído. Base Nacional Curricular EM.
Meta 5
Investimento em Educação ampliado 18 programas de gestão no Guia Lei n. 13.005
e bem gerido. de 25/06/2014 – PN.

Fonte: BERNARDI, UCZAK, ROSSI (2015). Atualizado pelos autores em 2017.

O que queremos destacar é que não se trata de uma equivalência direta


ou a conversão das metas do TPE em programas e políticas educacionais, mas
que, dada a relação estabelecida entre os empresários e o Governo Federal na
discussão, elaboração e implementação das políticas, entendemos que há uma
grande influência desse segmento na tomada de decisões.
Observemos que as metas do TPE avigoram os objetivos estabelecidos
na Conferência Mundial de Educação para Todos realizada em 1990 em Jom-
tien, evento em que o Brasil participou e comprometeu-se com alcance das
metas, assinando o plano de ação elaborado na ocasião. A ampliação do tem-
po de permanência na escola com aprendizagem, assim como a expansão da
obrigatoriedade, sempre foi reivindicada pelos movimentos educacionais em
defesa da escola pública, e esta ideia é um consenso na sociedade brasileira.
Ao mesmo tempo em que reconhecemos e valorizamos a importância da am-
pliação da escolarização, entendemos pertinente questionarmos qual o inte-
resse dos empresários por essa causa e qual o conteúdo da proposta por eles
defendida.
Quanto às metas 2 e 4 propostas pelo TPE, entendemos que possam ter
provocado a criação de dois pactos elaborados pelo Governo Federal: Pacto
Nacional pela Alfabetização na Idade Certa e Pacto Nacional pelo Fortaleci-
mento do Ensino Médio. Já nas metas 3 e 5 podemos perceber que, além do

119
BERNARDI, L. M.; UCZAK, L. H. ROSSI, A. J. • Relações do movimento empresarial
na política educacional brasileira: a naturalização da associação público-privada

imbricamento com as políticas governamentais, o TPE se coloca “por dentro”


da política ao ofertar soluções no Guia de Tecnologias Educacionais, tornan-
do-se potenciais clientes do Estado.
Repetimos aqui uma questão que temos pontuado em diversos espaços:
é necessário atentarmos para a forte presença dos empresários reunidos no
TPE e sua relação com o Estado. Reforçamos a ideia de que eles se “apropria-
ram do discurso historicamente construído pelos movimentos sociais em defe-
sa da escola pública gratuita e de qualidade e que, a sua materialização, vincu-
laram seus interesses de classe” (ROSSI; BERNARDI; UCZAK, 2017, p. 371).

A relação do TPE com o Plano Nacional de Educação


Outra ação que destaca o fortalecimento do TPE, enquanto movimento
de classe, que se articula em rede e amplia seu movimento agregando novos
integrantes, é sua ação na elaboração e no monitoramento do Plano Nacional
de Educação – PNE.
As ações do TPE se evidenciam desde o apoio a um projeto de Plano
elaborado pelo empresariado – que disputou com o Plano construído nas Con-
ferências Nacionais de Educação, com ampla participação da sociedade (PE-
RONI, FLORES, 2014) – até a materialização das suas propostas na Lei 13.005/
2014 que aprovou o PNE 2014-2024, com 20 metas. Não faremos a discussão
uma a uma, mas exemplificaremos com a questão do financiamento, cuja cor-
relação de forças consagrou o financiamento público para a educação, mas ao
mesmo tempo abriu possibilidades de repasses públicos ao setor privado, con-
forme podemos observar no artigo 5º, parágrafo 4º da lei:
§ 4o O investimento público em educação a que se referem o inciso VI do
art. 214 da Constituição Federal e a meta 20 do Anexo desta Lei engloba os
recursos aplicados na forma do art. 212 da Constituição Federal e do art. 60
do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, bem como os recursos
aplicados nos programas de expansão da educação profissional e superior,
inclusive na forma de incentivo e isenção fiscal, as bolsas de estudos con-
cedidas no Brasil e no exterior, os subsídios concedidos em programas de
financiamento estudantil e o financiamento de creches, pré-escolas e de edu-
cação especial na forma do art. 213 da Constituição Federal (BRASIL, 2014)
(Grifos nossos).

Isso, por si só, já demonstra a influência do movimento empresarial,


mas essa hegemonia se amplia quando o TPE passa a atuar no monitoramen-
to do plano através do Observatório do PNE, que é composto por 24 institui-
ções que inclui o próprio movimento empresarial e as demais são na maioria
organizações do setor privado, parceiras ou mantenedoras do TPE e organis-
mos internacionais como Unesco e Unicef.

120
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

O observatório é uma plataforma on line que tem como objetivo monito-


rar os indicadores de cada uma das 20 metas do plano, subsidiando com dados
(fornecidos pelo MEC e FNDE) e com estudos e pesquisas sobre educação
brasileira. Uma dessas elaborações é a publicação pelo TPE do “Anuário Bra-
sileiro da Educação Básica”, cujas avaliações dos dados são realizadas por
membros ativos do movimento e que neste espaço reforçam a defesa de suas
propostas e consensos, contribuindo para a naturalização do processo de in-
serção do privado na educação pública.

A relação do TPE com a Base Nacional Comum Curricular – BNCC


De longa data discute-se no Brasil a formação de uma base curricular
comum ao país. A Constituição Federal de 1988 já previa no artigo 210: “Se-
rão fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira a as-
segurar formação básica comum e respeito aos valores culturais e artísticos,
nacionais e regionais”. Posteriormente, a Lei de Diretrizes e Bases da Educa-
ção (LDB), aprovada em 1996 reforçou essa discussão. Ainda dessa década
tivemos a definição dos Parâmetros Curriculares Nacionais. Nos anos 2000, o
Conselho Nacional de Educação elaborou e aprovou as novas Diretrizes da
Educação, para as diferentes etapas e modalidades. No último Plano Nacio-
nal de Educação, Lei Federal n. 13.005/2014, definiu que a construção da
base curricular ficou estabelecida nas metas 2 e 3, ensino fundamental e mé-
dio; na meta 7, avaliação, e meta 15, sobre formação de professores.
Um sujeito coletivo que teve grande destaque na elaboração da BNCC,
foi o Movimento pela Base Nacional Comum – MBNC, cujos integrantes que
representam essa organização estão majoritariamente presentes no Movimen-
to Empresarial Todos pela Educação, o que, portanto, nos permite afirmar que
continuam a pautar e influenciar os rumos das políticas educacionais.
Criado em 2013, o Movimento pela Base Nacional Comum – MBNC se
define como um grupo não governamental de “profissionais da educação”
que atuam junto ao processo de construção da Base Nacional Comum Curri-
cular, a fim de contribuir qualitativamente com a BNCC. Chama-nos a aten-
ção que a criação do Movimento pela Base é do ano de 2013, portanto anterior
à Portaria n. 592, de 17 de junho de 2015, que institui a comissão de especia-
listas para a elaboração da proposta da Base Nacional Comum Curricular.
Analisando a composição do MBNC, constatamos que, de um total de
64 membros, mais da metade dos sujeitos do Movimento pela Base Nacional
Comum (53%) são membros do TPE, ou seja, 28 sujeitos e ainda outros seis
são representantes das instituições parceiras ou mantenedoras do TPE, totali-
zando 34 sujeitos individuais ou coletivos com relação direta com o TPE. Além

121
BERNARDI, L. M.; UCZAK, L. H. ROSSI, A. J. • Relações do movimento empresarial
na política educacional brasileira: a naturalização da associação público-privada

disso, identificamos mais quatro sujeitos que têm relação indireta com o TPE
através de suas parcerias com as instituições que compõem o TPE. Chama-
nos a atenção que os mesmos sujeitos do TPE integram o MBNC.
Mais uma vez se observa a atuação de um grupo majoritariamente com-
posto por empresários, mas que se autodenominam ora “especialistas”, ora
“profissionais da educação”, influenciando na agenda de políticas governa-
mentais.
Além disso, o processo de implementação da base demandará o alinha-
mento dela com outras políticas, como avaliação e formação de professores.
Tendo em vista que mais da metade dos integrantes do MBNC são simultane-
amente integrantes do TPE, e que os dois movimentos têm os objetivos seme-
lhantes, será que também se tornarão clientes do Estado na oferta de soluções
e estratégias para implementação da base?
Observamos que, anteriormente à aprovação da base pelo MEC o MBNC
já havia disponibilizado em sua página o Guia de Implementação da BNCC
criado em parceria com o Conselho Nacional de Secretários de Educação –
Consed e União dos Dirigentes Municipais de Educação – Undime, com o
apoio do TPE e da Comunidade Educativa CEDAC2.
Ou seja, destacamos outra vez o movimento empresarial protagonizan-
do a elaboração da política na pauta e no conteúdo, criando a necessidade de
novos serviços e produtos educacionais e colocando-se como potencial parcei-
ro para solucionar aquilo que eles identificam como “problemas da educação
brasileira”.

Considerações finais
Afirmamos que o setor privado historicamente esteve presente influen-
ciando na definição de políticas educacionais brasileiras e neste momento evi-
denciamos a movimentação de classe assumindo uma nova forma de atuação,
através da organização dos empresários no Movimento Todos pela Educação
e no Movimento pela Base Nacional Comum.
Os empresários se apropriaram de bandeiras de luta dos movimentos
sociais e educacionais e as ressignificaram, construindo consenso em torno da
ideia de um grande pacto de “educação para todos”, nos moldes da gestão
empresarial. Evidenciamos, na última década, o entrelaçamento no discurso,
nas relações e nas ações, comparando as propostas do TPE com as alterações
na legislação brasileira, desde emendas constitucionais, a LDB, entre outras.

2
A comunidade Educativa CEDAC é uma OSCIP que trabalha desde 1997 pela melhoria das
condições de aprendizagem nas redes públicas. Disponível em: <http://
www.comunidadeeducativa.org.br/>. Acesso em: 11 set. 2017.

122
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Não se trata de simples transferência, mas de coalizão de interesses, em que a


classe empresarial atua, construindo a hegemonia e definindo a direção da
política.
Apresentamos a atuação junto a algumas políticas do Governo Federal,
como interlocutores na sua definição e também como fornecedores de produ-
tos pedagógicos, a exemplo das apresentadas no Plano de Ações Articuladas.
Também destacamos o fortalecimento atual do TPE através da criação
de novos arranjos, em que agregam novos sujeitos individuais ou coletivos, ou
os mesmos integrantes do movimento se articulam na composição de novas
redes de atuação, das quais destacamos a do Observatório do PNE e da com-
posição do Movimento pela Base Nacional Comum. Demonstramos como os
empresários se anteciparam ao Governo Federal criando um movimento que
defendeu uma proposta de base e ofertou um guia de sua implementação. Re-
afirmamos que esse é um movimento de classe, que defende um projeto de
nação.

Referências
BASE Nacional Comum. Produção de Ministério da Educação. Realização de Minis-
tério da Educação. Brasília: Ministério da Educação, 2017. P, B. Disponível em: <ht-
tps://www.youtube.com/watch?time_continue=1,v=g2_9XIE18NA>. Acesso em: 06
out. 2017.
BRASIL, MEC/SASE. Planejando a próxima década conhecendo as 20 metas do Pla-
no Nacional de Educação. Brasília, 2014.
BRASIL, 88. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/
constituicaocompilado.htm>.
BERNARDI, Liane M.; UCZAK, Lucia H.; ROSSI, Alexandre J. As relações do Esta-
do com empresários nas políticas educacionais: PDE/PAR e Guia de Tecnologias Edu-
cacionais. In: PERONI, V. M. (Org.). Diálogos sobre as redefinições do papel do Estado e nas
fronteiras entre o público e o privado na educação. São Leopoldo: Oikos, 2015, p. 52-71.
EVANGELISTA, Olinda; LEHER, Roberto. Todos pela Educação e o Episódio Cos-
tin no MEC: A Pedagogia do Capital em Ação na Política Educacional Brasileira.
Trabalho Necessário. Disponível em: <www.uff/trabalhonecessario>. Ano 10, n. 15, 2012.
GRAMSCI, Antonio. Cadernos do Cárcere. V. 3, 3. ed. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 2002.
GALE, Trevor. Realising Policy: The Who na how of policy production. In: LIN-
GARD, Bob; OZGA, Jenny. The Routledge Falmer Reader in Education Policy and Politics.
Milton Park, England: Routledge, 2003.
KRAWCZYK, Nora. A construção social das políticas educacionais no Brasil e na
América Latina. In: KRAWCZYK, Nora; CAMPOS, Maria M.; HADDAD, Sérgio

123
BERNARDI, L. M.; UCZAK, L. H. ROSSI, A. J. • Relações do movimento empresarial
na política educacional brasileira: a naturalização da associação público-privada

(Orgs.). O cenário educacional latino-americano no limiar do século XXI: reformas em deba-


te. São Paulo: Autores Associados, 2000, p. 1-11.
MBNC. Necessidade e Construção de uma Base Nacional Comum. 2015. Disponível em:
<http://movimentopelabase.org.br/wp-content/uploads/2015/09/Necessidade-e-
construcao-Base-Nacional-Comum.pdf>. Acesso em: 12 set. 2017.
OBSERVATÓRIO. Disponível em: <http://www.todospelaeducacao.org.br/indicado-
res-da-educacao/observatorio-pne/>. Acesso em: 01 out. 2017.
OLIVEIRA, Regina Tereza Cestari de. O Plano de Ações Articuladas em municípios
sul-mato-grossenses e suas implicações para a gestão democrática da educação básica.
Acta Scientiarum. Education, Maringa, v. 34, n. 2, p.291-300, july-dec., 2012.
O MOVIMENTO. Disponível em: <http://movimentopelabase.org.br/o-movimento/>.
Acesso em: 30 set. 2017.
PERONI, Vera; CAETANO, Maria Raquel. O público e o privado na educação. Proje-
tos em disputa? In: Retratos da Escola / Escola de Formação da Confederação Nacional dos
Trabalhadores em Educação (Esforce), v. 9, n.17, jul./dez. 2015. Brasília: CNTE, 2015
PERONI, Vera Maria Vidal; FLORES, Maria Luiza Rodrigues. Sistema nacional, pla-
no nacional e gestão democrática da educação no Brasil: articulações e tensões. Porto
Alegre. Educação, v. 37, n. 2, p.180-189, maio-ago. 2014.
ROSSI, Alexandre José; BERNARDI, Liane Maria; UCZAK, Lucia Hugo. Relações
entre Estado e empresários no PDE/PAR: algumas contradições na política educacio-
nal brasileira. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, Goiânia, v. 33,
n. 2, p. 355-376, 2017.
ROSSI, Alexandre; BERNARDI, Liane Maria; UCZAK, Lucia Hugo. Relação Públi-
co-Privada no Programa de Desenvolvimento da Educação: uma análise do Plano de
Ações Articuladas. In: PERONI, Vera (Org.). Redefinições das Fronteiras entre o Público e
o Privado: Implicações para a democratização da educação. Brasília: Liber Livros, 2013.
SAVIANI, Dermeval. Plano de Desenvolvimento da Educação: análise do projeto do
MEC 2007. Educação e Sociedade, Campinas, v. 28, n. 100 – Especial, p. 1231-55, out.
2007.
SHIROMA, Eneida Otto; GARCIA, Rosalba Maria Cardoso; CAMPOS, Roselane
Fátima. Conversão das “almas” pela liturgia da palavra: uma análise do movimento
Todos pela Educação. In: BALL, Stephen J.; MAINARDES, Jefferson. Políticas educa-
cionais: questões e dilemas. São Paulo: Cortez, 2011, p. 222-248.
THOMPSON, E. P. A miséria da teoria ou um planetário de erros. Uma crítica ao pensa-
mento de Althusser. Rio de Janeiro: Zahar, 1991.
THOMPSON, E. P. Formação da classe operária inglesa. v. 1. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
1987.
VOSS, Dulce Mari da Silva. O Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE): con-
textos e discursos. Pelotas: Cadernos de Educação: FaE/PPGE/UFPel, jan./abr., 2011.

124
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Influências neoconservadoras
na educação pública:
sujeitos em relação

Paula Valim de Lima

Introdução
Neste artigo são apresentadas discussões sobre como diferentes sujeitos
vinculados a tendências neoconservadoras vêm influenciando a política edu-
cacional brasileira e as implicações para a democratização da educação públi-
ca. Temos assistido, especialmente no período pós-golpe de 2015, a uma as-
censão de grupos com vinculação conservadora que buscam influenciar na
direção e o no conteúdo da educação pública, atuando especialmente no âm-
bito da política educacional brasileira. Como expressão disso, neste período,
destacam-se o movimento Escola sem Partido e Movimento Brasil Livre.
Parte-se do entendimento de que a política educacional é parte constitu-
tiva das mudanças sociais e econômicas (PERONI, 2006) em um processo de
relação em que Estado e sociedade civil são partes constitutivas do movimen-
to de correlação de forças (GRAMSCI, 1982) entre sujeitos (THOMPSON,
1981), perpassados por projetos societários distintos.

A centralidade da aliança de diferentes sujeitos


Os sujeitos destacados para esta análise, apesar de apresentarem algu-
mas contradições internas, têm em comum em suas práticas e discursos ele-
mentos significativos que extrapolam o campo educacional, englobando as-
pectos sociais gerais, mas que interferem diretamente no conteúdo da educa-
ção. Ora com caráter mais notadamente neoliberal, ora mais conservador, es-
tes grupos têm a centralidade de sua aliança na censura e na interdição do
discurso e do trabalho dos professores.
A censura se coloca como estratégia de cerceamento de práticas educa-
tivas que se propõem transgressoras, questionam o pensamento hegemônico e
procuram construir alternativas à lógica do capital, buscando a construção de
uma educação emancipatória como exercício de práticas democráticas e de
cidadania. Nesse sentido, seu objetivo

125
LIMA, P. V. de • Influências neoconservadoras na educação pública: sujeitos em relação

[...] é romper com a possibilidade de construção de uma educação vincula-


da às questões e valores sociais, políticos e culturais existentes na diversida-
de, e que possibilitam o exercício de uma prática democrática na escola [...],
substituindo-a por uma educação sem espaço de participação, que promova
a preservação acrítica do sistema capitalista e, consequentemente, das suas
desigualdades (LIMA, 2017, p. 44).

Para além disso, e por isso mais fortemente defendida, a censura é justi-
ficada como forma de garantir a moralidade e a tradição, impedindo que pro-
fessores e professoras subvertam os valores morais tradicionais (PERONI;
CAETANO; LIMA, 2018), valores estes que, segundo Harvey (2008), são
[...] centrados no nacionalismo cultural, na retidão moral, no cristianismo
(de uma certa moralidade evangélica) nos valores familiares e em questões
de direito à vida, assim como no antagonismo a novos movimentos sociais
como o feminismo, os direitos homossexuais, a ação afirmativa e o ambien-
talismo (HARVEY, 2008, p. 94).

Nesse sentido, o ponto da agenda neoconservadora que melhor expres-


sa a tentativa de preservação da moralidade e da tradição no campo da educa-
ção é o combate à chamada “ideologia de gênero”, buscando limitar a discus-
são acerca de qualquer assunto relacionado às questões de gênero e sexualida-
de nas escolas, partindo do pressuposto de que dialogar sobre as diferentes
possibilidades de expressão do gênero e da sexualidade não somente abre es-
paço como incentiva à subversão dos arranjos familiares tradicionais conside-
rados pelos conservadores como “naturais, de origem divina e indispensáveis
à reprodução da vida social” (MIGUEL, 2016, p. 598). Limitar essa discus-
são, entretanto, acarreta no impedimento do combate ao preconceito e à into-
lerância e à manutenção das desigualdades.
Mesmo antes da ascenção do debate acerca da “ideologia de gênero”,
estes grupos vinham fazendo forte oposição às políticas de diversidade, de
modo geral, de combate à homofobia, às formas inclusivas e diversas de famí-
lia, entre outras, conformando-se o que Ximenes (2016) veio a chamar de “ve-
tos conservadores” impostos contra programas e planos governamentais. O
primeiro voltado ao 3º Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH),
em 2003, em que o campo conservador fez frente às ações que promoviam
direitos sexuais e reprodutivos, laicidade do Estado, educação para os direitos
humanos, entre outros; o segundo foi o veto ao material Escola sem Homofo-
bia, apelidado pelos conservadores como “kit gay”, que visava a formação de
professores e equipes para o tratamento do tema nas escolas (2011); o terceiro
relacionado ao Plano Nacional de Educação (PNE) 2014-2024 (Lei n. 13.005/
2014), em que a campanha conservadora conseguiu excluir do documento
quaisquer menções às questões de gênero e sexualidade (XIMENES, 2016). O
mesmo aconteceu na elaboração dos Planos Estaduais e Municipais de Edu-

126
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

cação pelo Brasil afora, em que foram suprimidas questões relacionadas à equi-
dade de gênero e sexualidade.
Mais recentemente, os grupos conservadores, com mais força do que
antes, atuaram nas negociações políticas acerca da elaboração da Base Nacio-
nal Comum Curricular, especialmente a partir da sua segunda versão em 2016,
buscando excluir do currículo definido pelo documento “demandas político-
partidárias, raciais, de gênero e de sexualidade” (MACEDO, 2017, p. 517), em
consonância não somente com a pauta do combate à “ideologia de gênero”,
mas também de uma suposta “doutrinação ideológica” por parte dos profes-
sores, duas bandeiras prioritárias do Escola sem Partido e do Movimento Bra-
sil Livre.

Escola sem Partido


O Escola sem Partido é um movimento criado em 2004, que conquistou
maior expressão e adesão nos últimos anos. É construído por diferentes sujei-
tos, individuais e coletivos (THOMPSON, 1981), que se relacionam e formam,
juntos, uma rede organizada para o avanço do projeto. Além de disputar a
opinião pública e conquistar adesão do “senso comum”, desde 2013 diversos
projetos de lei vem sendo apresentados nas diferentes instâncias parlamenta-
res, buscando a inserção do chamado Programa Escola sem Partido na legisla-
ção da educação nacional, bem como nos sistemas municipais e estaduais de
ensino.
O movimento, nesse sentido, dedica-se a conquistar aliados no campo
legislativo que atuam como porta-vozes do movimento nas casas legislativas –
como exemplos, temos o Vereador de Porto Alegre Valter Nagelstein (PMDB),
proponente do PL 124/201 na Câmara Municipal; o Deputado Estadual Mar-
cel Van Hatten (PP), proponente do PL 190/2015, que tramita na Assembleia
Legislativa do Rio Grande do Sul; o Deputado Federal Izalci Lucas (PSDB) e
o Senador Magno Malta (PR), autores dos Projetos de Lei 867/2015 e 193/
2016, que tramitam na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, respecti-
vamente, sendo que os dois últimos buscam a inclusão do Programa Escola
sem Partido na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei n. 9.394, de 20 de
dezembro de 1996).
A figura abaixo apresenta alguns dos sujeitos que estabelecem, ou esta-
beleceram em algum momento, relação com o ESP. A propósito da figura,
será possível perceber que se vinculam ao ESP sujeitos de diferentes setores da
sociedade, com destaque ao Movimento Brasil Livre (MBL), que será analisa-
do em seguida.

127
LIMA, P. V. de • Influências neoconservadoras na educação pública: sujeitos em relação

Figura 1: Rede de Escola sem Partido

Fonte: LIMA, 2017.

Uma descrição mais detalhada dos sujeitos e suas relações pode ser en-
contrada em publicações anteriores1. O que se percebe é o envolvimento de
diferentes setores da sociedade, mas com uma participação quase ínfima de
professores e instituições de educação. Cabe destacar que a vinculação dos
sujeitos ao movimento se deu em diferentes tempos e por diferentes razões/
motivações. Assim como a pauta do ESP, que se iniciou voltada ao combate à
doutrinação ideológica e, mais tarde, tem incorporado o debate da “ideologia
de gênero”, os aliados do movimento também se dividem mais ou menos des-
sa maneira. As relações se dão em especial com sujeitos vinculados a igrejas,
cuja pauta se volta para a discussão sobre a “ideologia de gênero”, e vincula-
dos a entidades, partidos ou movimentos neoliberais, que endossam a suposta
necessidade de combater a doutrinação ideológica.

Movimento Brasil Livre


O MBL, que se intitula “uma entidade sem fins lucrativos que visa mo-
bilizar cidadãos em favor de uma sociedade mais livre, justa e próspera”2, foi
fundado em novembro de 2014, mas tem sua origem em articulações que ocor-

1
Ver PERONI, CAETANO, LIMA, 2018.
2
Disponível em: <https://www.facebook.com/pg/mblivre/about/?ref=page_internal>. Aces-
so em: 13 mar. 2018.

128
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

riam já em 2013, à época das Jornadas de Junho, manifestações em defesa do


transporte público, que tomaram o Brasil. Segundo a reportagem “A nova rou-
pa da direita”3 de Marina Amaral (2016), o MBL é nada mais que um nome
fantasia da Estudantes pela Liberdade (EPL). O movimento surgiu como uma
“marca” para a EPL se promover nas manifestações, já que a legislação esta-
dunidense impede a atuação política das fundações americanas:
Juliano Torres, o diretor executivo da EPL, foi mais claro sobre a ligação
entra o EPL e o Movimento Brasil Livre [...] “Quando teve os protestos em
2013 pelo Passe Livre, vários membros do Estudantes pela Liberdade queri-
am participar, só que, como a gente recebe recursos de organizações como a
Atlas e a Students for Liberty, por uma questão de imposto de renda lá, eles
não podem desenvolver atividades políticas. Então a gente falou: “Os mem-
bros do EPL podem participar como pessoas físicas, mas não como organi-
zação para evitar problemas. Aí a gente resolveu criar uma marca, não era
uma organização, era só uma marca para a gente se vender nas manifesta-
ções como Movimento Brasil Livre [...]” disse em entrevista (AMARAL,
2016).

Figura 2: Rede MBL

Fonte: LIMA, 2018.

3
Disponível em: <https://apublica.org/2015/06/a-nova-roupa-da-direita/>. Acesso em: 13 mar.
2018.

129
LIMA, P. V. de • Influências neoconservadoras na educação pública: sujeitos em relação

Conforme mostra a imagem, a EPL é a versão brasileira da Students for


Liberty (SFL), uma organização estudantil internacional, fundada em 2008,
que está presente em 40 países, sendo 18 na América Latina com mais de 40
grupos organizados4. A SFL é vinculada e financiada pela Atlas Network,
uma rede de fundações da direita liberal, sediada nos EUA, à qual são ligados
diversos institutos nacionais e internacionais, entre eles os think tanks brasilei-
ros Cato Institute, o Instituto de Estudos Empresariais (IEE), o Instituto Libe-
ral, Instituto Mises Brasil e o Instituto Millenium (IMil). Além destes, uma
série de outros think tanks vinculados à Atlas estão espalhados pelo mundo
(482 institutos em 92 países), sendo mais de 80 na América Latina.
Por conta da vinculação à Atlas Network, o MBL nasce com viés neoli-
beral, com um discurso voltado à liberdade individual e de mercado, à redu-
ção do Estado e assumindo como pauta prioritária o combate à corrupção. É
isso que leva o movimento a assumir a postura de oposição ao Governo Fede-
ral (ao Partido dos Trabalhadores, mais notadamente) desde sua fundação,
garantindo o protagonismo nas manifestações pró-impeachment de Dilma
Rousseff no ano de 2015. Com o passar dos anos, a atuação do MBL deu uma
guinada, extrapolando a pauta do liberalismo econômico, inserindo-se nas
discussões de fundo moral.
Tanto pela perspectiva antipetista, quanto pela defesa da moralidade, o
MBL se aliou ao movimento Escola sem Partido de tal maneira que se apre-
senta hoje como um dos maiores porta-vozes do projeto, inclusive tendo apro-
vado como diretriz no seu primeiro congresso a apresentação do projeto em
legislativos estaduais e municipais (LIMA, 2017). Com isso, a “doutrinação
ideológica” e a “ideologia de gênero” passam a aparecer como dois grandes
inimigos a serem combatidos pelo movimento.

Considerações finais
Tanto o MBL quanto o Escola sem Partido são sujeitos coletivos que
buscam influenciar cada vez mais na prática e na política educacional, com-
preendendo que a educação se apresenta como um campo importante na cor-
relação de forças por projetos societários distintos, porque ela pode subsidiar,
a um só tempo, duas coisas opostas: a transgressão à ordem social vigente, ou
a sua manutenção. Assim, estebelece-se, grosso modo, um projeto educativo
(certamente vinculado a um projeto societário) que objetiva a manutenção das
estruturas de opressão e exclusão da diversidade e a manutenção das desigual-

4
Disponível em: <https://www.studentsforliberty.org/eslib/>. Acesso em: 13 mar. 2018.

130
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

dades sociais, sob a prerrogativa da conservação de valores e costumes morais


tradicionais.

Referências
GRAMSCI, A. Os intelectuais e a organização da cultura. Rio de Janeiro: Civilização Bra-
sileira, 1982.
HARVEY, David. O Neoliberalismo: história e implicações. São Paulo: Loyola, 2008.
LIMA, Paula Valim de. Escola sem sentido: implicações do Escola sem Partido para a
democratização da educação pública. UFRGS. Trabalho de Conclusão de Curso de
Graduação, 2017.
MACEDO, Elizabeth. As demandas conservadoras do movimento Escola sem Partido
e a Base Nacional Curricular Comum. Educ. Soc., v. 38, n. 139, p. 507-524, 2017.
MIGUEL, Luis Felipe. Da “doutrinação marxista” à “ideologia de gênero” – Escola
sem Partido e as leis da mordaça no parlamento brasileiro. Revista Direito e Práxis, v. 7,
n. 15, 2016, p. 590-621.
PERONI, Vera. Mudanças na configuração do Estado e sua influência na política edu-
cacional. In: PERONI, Vera; BAZZO, Vera Lúcia; PEGORARO Ludimar (Orgs.). Di-
lemas da educação brasileira em tempos de globalização neoliberal: entre o público e o priva-
do. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2006, p. 11-24.
PERONI, V. M. V.; CAETANO, M. R.; LIMA, Paula Valim de. Reformas educacio-
nais de hoje: as implicações para a democracia. Retratos da Escola, v. 11, p. 415-432,
2018.
THOMPSON, E. P. A miséria da teoria ou um planetário de erros. Rio de Janeiro: Zahar,
1981.
XIMENES, Salomão. O que o direito à educação tem a dizer sobre o Escola sem Par-
tido. In: A ideologia do movimento Escola sem Partido: 20 autores desmontam o discurso.
Ação Educativa Assessoria, Pesquisa e Informação (org.). São Paulo: Ação Educativa,
2016, p. 49-58.

131
Parcerias entre o público e o privado na
gestão da educação básica pública brasileira:
Arranjos de Desenvolvimento da Educação (ADEs)
Elma Júlia Gonçalves de Carvalho

Introdução

Nos últimos anos, vêm sendo configuradas novas estratégias de redefi-


nição do relacionamento entre Estado e empresas privadas para fins de presta-
ção de serviços públicos, as quais correspondem à emergência de um novo
conceito de governação, tendo por referência o modelo gerencial de adminis-
tração pública. Nessa perspectiva, separam-se as funções de planejamento e
de execução/prestação das políticas públicas e se redirecionam as formas de
gestão e de intervenção do Estado, de um lado, mantendo seu papel regulador
e coordenador e, de outro, promovendo a progressiva descentralização admi-
nistrativa e financeira para estados, municípios e instituições, além de abrir
espaços para a participação do terceiro setor, por meio de parcerias, contratos
de gestão e outras formas de conveniamentos, em funções e serviços que ante-
riormente eram de sua responsabilidade direta.
No campo educacional brasileiro Adrião e Borghi (2008) destacam as
parcerias e as diferenciam em três possíveis modalidades: a) a compra de “sis-
temas de ensino” privados pela rede pública, na forma de materiais didáticos
(em geral apostilados); b) a subvenção de vagas em instituições privadas; c) a
“assessoria na gestão” da educação básica pública.
A estratégia mais recente são os Arranjos de Desenvolvimento da Edu-
cação (ADEs). Elaborados com base na nova perspectiva da administração
pública, tais arranjos correspondem à busca por novas formas de coordenação
e de cooperação intergovernamental, bem como à institucionalização de uma
nova modalidade de parceria público-privada, ou seja, entre institutos e fun-
dações ligados a empresas privadas e a organizações diversas, com foco na
melhoria da qualidade da educação básica brasileira.
Neste texto, focalizaremos o Arranjo da Associação de Municípios da
Grande Florianópolis – Granfpolis em parceria com o Instituto Positivo. A
hipótese é de que esse tipo de parceria, mais do que um instrumento de solu-
ções colaborativas que transpõem a administração pública, configura-se como

132
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

uma nova estratégia para que o setor privado influencie diretamente a gestão
dos sistemas públicos de educação, essencialmente os municipais, considera-
dos “protagonistas e atores centrais do processo que visa assegurar o direito às
duas primeiras etapas da Educação Básica (Educação Infantil e Ensino Fun-
damental)” (BRASIL, 2011, p. 4) e, ao mesmo tempo, expanda e controle o
mercado educacional.

A proposta de Arranjos de Desenvolvimento da Educação (ADEs)

Os “Arranjos de Desenvolvimento da Educação” (ADEs) são apresen-


tados como um instrumento de gestão pública para a melhoria da qualidade
social da educação em determinado território, tendo como foco, entre outros
aspectos, o acesso, a permanência, a aprendizagem e a conclusão de estudos.
Segundo Parecer CNE/CEB nº 9/2001, por meio de uma ação conjunta com
o Ministério da Educação (MEC) e outros parceiros, seus objetivos centrais
são desenvolver uma metodologia de apoio a municípios de maior vulnerabili-
dade social e econômica, alavancar ações e indicadores educacionais, contri-
buir para a construção de um Sistema Nacional de Educação (SNE) e para a
operacionalização do regime de colaboração1 entre a União, os Estados, o Dis-
trito Federal e os Municípios na organização de seus sistemas de ensino, con-
forme previsto no Art. 211 da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 2011a).
A instituição do SNE passa “necessariamente pela via complementar
do regime de colaboração, que dará materialidade e caráter de compulsorieda-
de às responsabilidades, corresponsabilidades, atribuições concorrentes, com-
plementares e colaborativas entre os entes federados e os sistemas de ensino”
(ARAÚJO, 2013, p. 799). No entanto, cabe mencionar que ainda não existe
uma normatização do SNE e do regime de colaboração2, o que abriu espaço

1
Conforme Araújo (2013, p. 788), o “regime de colaboração é um instituto jurídico e político
que regulamenta a gestão associada dos serviços públicos, sendo afeto às competências materiais
comuns previstas no art. 23 da Constituição Federal de 1988. As competências materiais comuns
podem ser definidas como aqueles serviços públicos que devem ser prestados por todos os entes
federados, sem preponderância e de forma cumulativa, para garantir a equalização das condições
de vida em todo o território de um Estado organizado em bases federativas. Neste sentido, o
regime de colaboração é um dos mecanismos da matriz cooperativa ou intraestatal do
federalismo”.
2
Araújo (2013, p. 793) lembra-nos que: “A falta de regulamentação do regime de colaboração
no Brasil não ocorreu por falta de tentativas. Foram elaborados cinco projetos de lei que
abordavam o regime de colaboração na educação, de 1988 até o ano de 2010, todos de iniciativa
do Legislativo. Entretanto não houve debate sobre a matéria, uma vez que foram arquivados
sem relatoria, por fim de legislatura ou por trâmite indevido”. Segundo a autora, a necessidade
de uma reforma de fiscal e de repactuação do federalismo brasileiro, de modo a distribuir recursos
segundo as reponsabilidades e definir com clareza a função supletiva da União para a oferta da
educação básica, são os principais obstáculos.

133
CARVALHO, E. J. G. de • Parcerias entre o público e o privado na gestão da educação básica
pública brasileira: Arranjos de Desenvolvimento da Educação (ADEs)

para que os setores empresariais ligados ao movimento empresarial Todos Pela


Educação (TPE) propusessem o modelo de ADEs. A proposta foi aprovada
pelo Conselho Nacional de Educação (CNE/CEB) com base no Parecer nº
09/2011 e regulamentada pela Resolução CNE/CEB nº 01/2012.
Em 28 de setembro de 2011, buscando transformar os ADEs em uma
“política de Estado” (BRASIL, 2011a) e, assim, promover e estimular a insti-
tucionalização e a implantação de arranjos educativos, foi apresentado no
âmbito do legislativo o Projeto de Lei nº 2.417/20113 (BRASIL, 2011b), de
autoria do Deputado Alex Canziani (PTB-PR).
A principal estratégia para sua implementação repousa na concepção de
trabalho em rede. A ideia é, por esse meio, alavancar ações colaborativas e coor-
denadas das instituições públicas responsáveis pela educação nos municípios
articulados, incluindo ou não a participação das “instituições privadas e não-
governamentais [tais como empresas e organizações diversas], mediante convê-
nios ou termos de cooperação, sem que isso represente a transferência de recur-
sos públicos para estas instituições e organizações” (BRASIL, Art. 2º, § 1º, 2012).
Caracterizado como um regime de colaboração horizontal, o modelo é
aberto para que os municípios atuem coletivamente, em colaboração vertical
com Estados e Ministério da Educação, mas também em parceria com institu-
tos e fundações ligadas a empresas privadas. Configura-se, portanto, como um
“novo” tipo (ARGOLLO; MOTTA, 2015).
A proposta pressupõe a cooperação das instituições e organizações edu-
cacionais que atuam em área territorial comum, o que implica formas de as-
sociativismo territorial horizontal e de trabalho em rede. Um dos caminhos pro-
postos para o associativismo territorial é o modelo de consorciamento intermu-
nicipal. Vistos como um importante instrumento de cooperação técnica e fi-
nanceira para resolver problemas comuns que transcendem a territorialidade
municipal, os “consórcios públicos também podem se constituir num importan-
te espaço de diálogo e fortalecimento das relações entre o poder público e as
organizações da sociedade civil, articulando parcerias, convênios, contratos e ou-
tros instrumentos congêneres ou similares, facilitando o financiamento e a gestão
associada ou compartilhada dos serviços públicos” (BRASIL, 2011, p. 8).
Entretanto, os consórcios intermunicipais, existentes desde a Lei nº
11.107/2005, que autoriza a gestão associada, só podem ser aplicados entre en-

3
A proposição encontra-se atualmente sujeita à apreciação do Plenário em regime de prioridade.
Em 07/10/2011, foi apensado ao PL nº 7420/2006, de autoria da deputada Raquel Teixeira
(PSDB-GO), que “Dispõe sobre a qualidade da educação básica e a responsabilidade dos gestores
públicos na sua promoção” e, em 11/06/2013, foi apensado ao Projeto de Lei nº 5519/2013,
de autoria do Deputado Paulo Rubem (PDT-PE), que “Institui o Sistema Nacional de
Educação”.

134
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

tes federados públicos, excluindo empresas e organizações não governamentais


(ARAÚJO, 2012). Esse aspecto expõe o limite jurídico e legal da proposição.
A questão do financiamento da educação no formato de ADEs encon-
tra-se ainda indefinida. Entretanto, é possível identificar esforços por parte do
Ministério da Educação (MEC), por meio da Secretaria de Articulação com
os Sistemas de Ensino (SASE), para encontrar alternativas. Têm sido analisa-
das possibilidades de utilização de recursos do Fundo de Manutenção e De-
senvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educa-
ção (Fundeb) para projetos e programas implementados de modo consorciado
ou em forma de ADEs. Essa foi uma das atribuições do grupo de trabalho cria-
do pelo MEC, por meio da Portaria nº 1.238, de 11 de outubro de 2012, com a
finalidade de elaborar estudos sobre a implementação do regime de colabora-
ção na forma de ADEs. Os trabalhos foram concluídos em julho de 2015,
gerando um relatório final divulgado pelo MEC (BRASIL, 2015).
A incorporação dos ADEs ao “Plano Nacional de Educação – PNE
(2014/2024)” foi mais um passo decisivo para o fortalecimento dos vínculos
entre os arranjos e o regime de colaboração. No § 7º do Artigo 7º da Lei nº
13.005, de 25 de junho de 2014, que aprova o Plano Nacional de Educação,
consta: “O fortalecimento do regime de colaboração entre os Municípios dar-
se-á, inclusive, mediante a adoção de arranjos de desenvolvimento da educa-
ção” (BRASIL, 2014, p. 46).
A construção, a institucionalização e a implementação do modelo de
ADEs têm contado com forte atuação do setor empresarial-financeiro, apoia-
do pelo poder legislativo, pelo Conselho Nacional de Educação (CNE), pelo
Ministério da Educação (MEC) especialmente por meio da Secretaria de Arti-
culação com os Sistemas de Ensino (SASE), pela União Nacional dos Diri-
gentes Municipais de Educação (UNDIME) e pelas agências internacionais,
como o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e a Organização
das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO).
Desde o ano de 2009, várias instituições vêm assumindo o compromis-
so de apoiar as secretarias municipais de educação de diferentes lugares4 do

4
No período entre 2009 a 2017 foram registradas as seguintes experiências de Arranjos de
Desenvolvimento da Educação: ADE/Recôncavo da Bahia (12 municípios); ADE/Linha Férrea
de Carajás (20 municípios); ADE/Pará Sudeste (07 municípios); ADE/Pará Nordeste (09
municípios); ADE/Rio Tocantins (12 municípios); ADE/Agreste Meridional de Pernambuco
(22 municípios); ADE/Paraná (20 municípios); ADE/Sergipe (05 municípios); ADE/Rio Doce
(10 municípios); ADE/Vale do Jequitinhonha (24 municípios); ADE/Chapada Diamantina
(15 municípios); ADE/Xingu (11 municípios); ADE/Noroeste de São Paulo (microrregião de
Votuporanga) – ADE/Noroeste Paulista (46 municípios); ADE/ Mesorregião de São Jose do
Rio Preto – Arranjo Saber (10 municípios); ADE/Vale do Itajaí – ADE/GoGemfri (11
municípios); ADE/Leste de Santa Catarina – ADE/Granfpolis (22 municípios); ADE/Rio

135
CARVALHO, E. J. G. de • Parcerias entre o público e o privado na gestão da educação básica
pública brasileira: Arranjos de Desenvolvimento da Educação (ADEs)

país na gestão de suas redes de ensino por meio da implantação dos “Arranjos
de Desenvolvimento da Educação” (ADEs). Entre elas estão, o Instituto Vo-
torantim, a Fundação Vale, o Instituto Gerdau, a Fundação Itaú Social, o
Instituto Ayrton Senna e o Instituto Positivo.

ADE-Granfpolis em parceria com o Instituto Positivo [2015-2017]

Na pesquisa5 que deu origem a este capítulo, dedicamo-nos ao estudo


do ADE/Granfpolis estabelecido em parceria com o Instituto Positivo [2015-
2017].
A Associação dos Municípios da Região da Grande Florianópolis –
Granfpolis foi fundada em 1969 com o objetivo de promover o desenvolvi-
mento integrado da região. Os municípios participantes são: Águas Mornas,
Alfredo Wagner, Angelina, Anitápolis, Antônio Carlos, Biguaçu, Canelinha,
Florianópolis, Garopaba, Governador Celso Ramos, Leoberto Leal, Major
Gercino, Nova Trento, Palhoça, Paulo Lopes, Rancho Queimado, Santo Amaro
da Imperatriz, São Bonifácio, São João Batista, São José, São Pedro de Alcân-
tara e Tijucas.

Grande do Sul – ADE Norte Gaúcho (29 municípios). Ao todo foram 285 municípios envolvidos
em 17 arranjos, sendo que alguns seguem ativos e outros não (ABRUCIO, 2017).
5
A pesquisa, que tem como título “A crescente influência do empresariado na elaboração e na
execução de políticas públicas para a educação básica brasileira”, está sendo desenvolvida no
Pós-Doutorado, na Linha de Pesquisa Políticas e Gestão dos Processos Educacionais do
Programa de Pós-Graduação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), sob a
supervisão da Prof.ª Dr.ª Vera Maria Vidal Peroni.
6
A área gráfico-editorial é composta de duas empresas: a POSIGRAF, uma das maiores gráficas
da América Latina com filiais e representações em todo o Brasil, Mercosul e Estados Unidos,
é responsável pela impressão de livros e materiais didáticos das escolas; a POSITIVO,
especializada no segmento educacional, edita, publica e comercializa livros didáticos,
paradidáticos e de literatura, atlas e dicionários. Na área de informática, a Positivo Tecnologia
fabrica notebooks, desktops, smartphones, tablets, sendo líder no segmento de tecnologia
educacional na América Latina. Disponível em: <http://www.positivo.com.br/pt/grafica>.
Acesso em: 03 nov. 2017.

136
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Quadro 1: Mapa do território do ADE/Granfpolis, em Santa Catarina

Fonte: POSITIVO; GRANFPOLIS, 2017, p. 6.

O Grupo Positivo é uma holding brasileira sediada em Curitiba. Funda-


do na década de 1970, atua no ramos da educação privada (escolas, universi-
dade e cursos pré-vestibular), no gráfico-editorial e no da informática6. Segun-
do informações obtidas em seus sites e no Relatório de Sustentabilidade – 2014/
2015 (INSTITUTO POSITIVO, 2016), o Grupo Positivo lidera o ranking das
maiores empresas do setor de educação; seus clientes são aprendizes, gover-
nos e organizações públicas e privadas7.
Na área educacional, seus produtos são destinados ao Sistema Positivo
de Ensino e ao Sistema de Ensino Aprende Brasil8. O primeiro oferece recur-
sos pedagógicos, didáticos e administrativos para gestores, professores, alunos
e famílias de suas escolas conveniadas. O segundo oferece um conjunto espe-
cífico de soluções para a rede de ensino municipal pública: livro didático inte-
grado, livro digital, assessoria pedagógica presencial e a distância, ambiente
digital. Esse sistema possui dois métodos de avaliação: o Sistema de Avalia-

7
Escolas de mais de 40 países utilizam soluções desenvolvidas pela divisão de Tecnologia
Educacional da Positivo Informática. No Brasil, como suas soluções estão inseridas no Guia
de Tecnologias do MEC, seu trabalho está presente em cerca de 14 mil escolas. Na rede privada,
562 mil alunos utilizam as apostilas do Positivo; na rede pública de ensino, 331 mil. Disponível
em: <http://www.positivo.com.br/>. Acesso em: 18 out. 2017.
8
Segundo matéria divulgada em dezembro de 2017: “Atualmente, o Sistema de Ensino Aprende
Brasil está presente em mais de 2 mil escolas públicas, em cerca de 220 municípios brasileiros”.
Disponível em: <http://www.laranjeirasdosul.pr.gov.br/mobile/exibe_noticia.php?id=239>.
Acesso em: 19 fev. 2018.

137
CARVALHO, E. J. G. de • Parcerias entre o público e o privado na gestão da educação básica
pública brasileira: Arranjos de Desenvolvimento da Educação (ADEs)

ção Positivo – Hábile9 e o Sistema de Monitoramento Educacional do Brasil –


SIMEB10: ambos subsidiam o trabalho de professores, gestores de escolas e
secretarias de educação.
Em 2012, para a gestão do seu investimento social, o Grupo Positivo
criou o Instituto Positivo, uma organização sem fins lucrativos que assumiu a
educação básica como principal eixo de atuação. No Relatório de Sustentabi-
lidade do Grupo Positivo referente aos anos de 2014/2015, consta: “Temos
trabalhado para ampliar o impacto de nossas ações e de nossos investimentos
e, em 2015, definimos a educação pública como nossa prioridade” (ISTITU-
TO POSITIVO, 2016, p. 35).
Conforme indicado no website do Instituto Positivo, seu objetivo é “me-
lhorar e qualificar a educação pública brasileira”. Nesse site, está explicitada
também sua forma de atuação: “Escolhemos o Regime de Colaboração como
estratégia de atuação, pois entendemos que a colaboração entre sistemas de
ensino será fundamental para gerir mudanças sistêmicas, contínuas e que re-
duzam a inequidade tão presente na educação brasileira”. A atuação do Insti-
tuto Positivo é dividida em duas grandes áreas: 1) Produção e Disseminação
de Conhecimentos; 2) Implantação dos Arranjos de Desenvolvimento da Edu-
cação11.
A adoção do Arranjo de Desenvolvimento da Educação (ADE) como
metodologia de ação tem por “objetivo de tornar o Instituto uma referência

9
O Hábile é um Sistema de Avaliação Positivo de coleta e de sistematização de informações a
respeito do desempenho dos alunos. Por meio de testes, avaliam-se as competências e as
habilidades em língua portuguesa, matemática e ciências. Conforme consta na página da Editora
Positivo: “Toda escola deve, sempre que possível, refletir sobre suas políticas e práticas internas,
para garantir a qualidade dos seus processos educativos. Com o objetivo de contribuir com
esse importante propósito, a Editora Positivo desenvolveu o Hábile – Sistema de Avaliação
Positivo, um produto pedagógico destinado à avaliação educacional externa de aprendizagem
em larga escala. Visa a colaborar com a equipe pedagógica da escola, analisando os resultados
de suas políticas, práticas internas e processos de ensino e aprendizagem, assim como contribuir
com a qualidade de ensino do país”. O sistema envolve a verificação e o monitoramento do
desempenho dos estudantes. Disponível em: http://www.editorapositivo.com.br/outras-
solucoes-educacionais/habile/ Acesso em: 03 nov. 2017.
10
“O Sistema de Monitoramento Educacional do Brasil (SIMEB) é uma ferramenta tecnológica
que contribui com a gestão educacional, o diagnóstico, o planejamento e o monitoramento
das metas estabelecidas para a rede de ensino. Por meio de dados oficiais disponibilizados
pelo Governo Federal, tais como: MEC, Inep, Unicef, censos, exames oficiais (Prova Brasil)
e questionários feitos pela Editora Positivo, as informações são inseridas no sistema e
tabuladas. O SIMEB traduz esses indicadores em informações organizadas em relatórios
detalhados que destacam os desafios e as potencialidades da educação”. Disponível em:
<http://www.editorapositivo.com.br/sistemas-de-ensino/aprende-brasil/#simeb>. Acesso
em: 03 nov. 2017.
11
Disponível em: <http://instituto.positivo.com.br Acesso em: 28 nov. 2017>. Acesso em: 03
nov. 2017.

138
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

em estudos sobre a temática de ADEs12 e, principalmente, contribuir para no-


vas iniciativas de implantação”13. Conforme mencionado, por meio desse ins-
trumento de gestão pública da educação, o Instituto assumiu “o compromisso
de apoiar as secretarias municipais de educação a implantarem um modelo
estratégico de cooperação”14.
Em 2015, teve início a primeira experiência15 com o ADE/Granfpolis,
destinado a “[...] produzir materiais de referência que visam inspirar e apoiar
municípios a criar seus próprios arranjos” e “atuar como um agente fomenta-
dor da metodologia no Brasil” (INSTITUTO POSITIVO, 2016, p. 41).
O ADE/Granfpolis, desenvolvido pelo Instituto Positivo em parceria
com a Associação de Municípios – Granfpolis, conta com a participação de 22
Municípios da região leste de Santa Catarina. Embora tenha sido lançado ofi-
cialmente em novembro de 2015 com previsão para conclusão no final 2017, o
prazo foi estendido, na perspectiva de que 2018 traga “a oportunidade de
ampliação da profundidade técnica do trabalho relacionado às metas e da
ampliação do seu alcance” (INSTITUTO POSITIVO; GRANFPOLIS, 2017,
p. 24). Considerando os municípios participantes do ADE nesse território, a
experiência envolve “463 escolas” públicas municipais que atendem a “86.990
alunos da ‘Educação Básica’” (INSTITUTO POSITIVO; GRANFPOLIS,
2017, p. 5). Em 2016, o volume de alunos indicado era de “83.775”, assim
distribuídos: “30.188 alunos nos anos iniciais, 18.937 nos anos finais, 16.953
nas pré-escolas, 14.053 nas creches, 3.553 na EJA, 1.456 na Educação Especial”
(INSTITUTO POSITIVO; GRANFPOLIS, 2016, p. 6).
Conforme consta na website do Instituto Positivo, na metodologia de
trabalho estavam previstas a seguintes etapas para a implantação do ADE/
Granfpolis:

12
“Para contribuir com a disseminação de informações sobre Regime de Colaboração, foi criada,
no Instituto Positivo, em 2017, a área de produção e disseminação de conhecimento. Ela tem
por propósito identificar e disseminar experiências, estudos e metodologias que demonstrem
como o Regime de Colaboração está contribuindo para qualificar os processos de gestão
administrativa e pedagógica da Educação. Além disso, também se propõe a produzir estudos
conforme forem identificadas temáticas que ainda precisam de aprofundamento de análises
nesta área”. Disponível em: <http://instituto.positivo.com.br/programas/producao-e-
disseminacao-de-conhecimento/>. Acesso em: 01 mar. 2018.
13
Notícia disponível em: <http://www.institutopositivo.org.br/pt/investimento/publicacoes/
2>. Acesso em: 18 out. 2017.
14
Disponível em: <http://www.fiesp.com.br/indices-pesquisas-e-publicacoes/case-grupo-
positivo/>. Acesso em: 03 nov. 2017.
15
A segunda experiência teve início em 2016, quando foi estabelecida uma parceria com o
Colegiado em Gestão da Educação da Associação dos Municípios da Foz do Rio Itajaí – ADE
Co-GEMFRI, envolvendo 11 municípios. Disponível em: <http://instituto.positivo.com.br/
programas/adecogemfri/>. Acesso em: 03 nov. 2017.

139
CARVALHO, E. J. G. de • Parcerias entre o público e o privado na gestão da educação básica
pública brasileira: Arranjos de Desenvolvimento da Educação (ADEs)

1ª Etapa – Mobilização dos Municípios


Apresentação da proposta aos secretários de educação, prefeitos e outros
profissionais/organizações relevantes. Os representantes dos Municípios, em
comum acordo com a proposta, assinam termo de parceria e elegem, entre
os secretários de educação, um líder que os representará coletivamente.
2ª Etapa – Levantamento de indicadores
O Instituto Positivo conduzirá a realização do diagnóstico educacional e
situacional do território, a fim de identificar os principais pontos de atenção
para a melhoria da educação dos municípios. Os secretários de educação
deverão discutir conjuntamente tais indicadores visando a identificação das
prioridades para a construção de um plano de ação territorial.
3ª Etapa – Construção de um plano de ação conjunto
Com base nos indicadores levantados, os Municípios construirão um plano
de ação territorial em que elegerão prioridades a serem atendidas. No plano
de ação serão apresentadas metas, prazos e responsáveis.
4º Etapa – Execução do plano de ação
Os Municípios, apoiados por parceiros locais ou nacionais, executarão o
plano de ação do território.
5ª Etapa – Implantação do Conselho Consultivo
O Instituto Positivo estimulará a formalização de um espaço aberto de de-
bate entre os parceiros do programa, com os objetivos de:
• Apresentar e debater os resultados obtidos pelo programa
• Buscar soluções para desafios relacionadas ao atingimento das metas
• Debater novas ideias e rumos para a sustentabilidade do programa
Serão convidados a fazer parte desse conselho os representantes de movi-
mentos da sociedade civil, Undime, Conselhos Estaduais, Federação das
Indústrias, Representantes da Academia, empresários locais, entre outros.
6ª Etapa – Monitoramento do plano de ação
O Instituto Positivo, em parceria com os municípios e parceiros, realizará o
monitoramento dos projetos, prazos e resultados.
7ª Etapa – Avaliação do processo:
O Instituto Positivo, em parceria com os municípios e parceiros, procederá a
avaliação do programa, a fim de consolidar os resultados, os aprendizados e
as possibilidades de encaminhamentos futuros (Disponível em: http://
www.institutopositivo.org.br/pt/projeto/21-arranjos-de-desenvolvimento-
da-educacao-ade Acesso em: 18 out. 2017).

Para o Instituto Positivo, a gestão mais horizontalizada é aquela que


tem a colaboração como seu eixo norteador. No entanto, não basta ter o dese-
jo de colaborar, é preciso também aprender a trabalhar em rede, bem como
adotar um método que permita que a colaboração seja traduzida em ações16.
Assim, com base no diagnóstico educacional e situacional do território e na
identificação dos principais pontos de atenção para a melhoria da educação
dos municípios, “o modelo estimula a construção e o monitoramento de um

16
Para obter informações mais detalhadas, consultar: <http://www.institutopositivo.org.br/pt/
noticia/154-artigo-solucoes-colaborativas-para-a-educacao-brasileira>. Acesso em: 03 nov. 2017.

140
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

plano de ação conjunto entre os municípios, voltado à troca de experiências e


melhoria da educação” no referido território17. Cabe destacar que o Instituto
já desenvolveu o “Sistema de Monitoramento Educacional do Brasil” (SIMEB)
e o Hábile, ferramentas tecnológicas criadas para acompanhar e informar, por
meio de indicadores, o grau de desenvolvimento das políticas educacionais do
município e auxiliar a gestão da educação.

Quadro 2: Estrutura de governança do Programa

Fonte: INSTITUTO POSITIVO, 2016, p. 7.

Para a execução do plano de ação, foram fixadas quatro metas a ser


alcançadas pelas redes de ensino até o final de 2017. São elas:
1. Implementar e consolidar um processo de “Avaliação Externa Territorial
de Aprendizagem Escolar” abrangendo 100% dos municípios que compõem
o ADE/Granfpolis, visando compreender o fenômeno da não aprendiza-
gem identificada em todo o Ensino Fundamental e da consequente retenção
escolar.
2. Qualificar o fluxo escolar junto a todas as turmas do Ensino Fundamen-
tal no território da ADE/Granfpolis e reduzir a taxa atual média geral de
distorção idade/ano de 12,3% para 8%, consolidando políticas públicas ter-
ritoriais que promovam a (re)orientação curricular e didático-pedagógica
dos estudantes.
3. Desenvolver documento contendo propostas de aplicação dos recursos
do FUNDEB a partir do percentual determinado na Lei Federal n° 11.494,
de 20 de junho de 2007, que regulamenta o Fundo de Manutenção e Desen-

17
Informações disponíveis em: http://www.institutopositivo.org.br/pt/investimento/regime-de-
colaboracao/1>. Acesso em: 03 nov. 2017.

141
CARVALHO, E. J. G. de • Parcerias entre o público e o privado na gestão da educação básica
pública brasileira: Arranjos de Desenvolvimento da Educação (ADEs)

volvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Edu-


cação – FUNDEB, para criar opções de implementação de 1/3 de hora ati-
vidade junto a 100% dos professores do ADE/Granfpolis;
4. Desenvolver um Programa de Avaliação Institucional que permita diag-
nosticar a organização e o funcionamento dos Sistemas Municipais de Ensi-
no nos aspectos micro e macro institucionais (INSTITUTO POSITIVO;
GRANFPOLIS, 2017, p. 10).

Na avaliação ocorrida no ano de 2016, consta: “o ADE já passou pelas


fases de diagnóstico, construção do plano de ação e segue agora para a execu-
ção do plano de ação, que deverá acontecer até dezembro de 2017”18.
De acordo com informações obtidas nos sites do Instituto Positivo e da
Granfpolis, dentre as várias ações desenvolvidas desde o lançamento oficial
do Programa em 2015, podemos destacar a aplicação, em 2016, da prova Hábi-
le, destinada à avaliação educacional externa de aprendizagem em larga esca-
la, com um total 17.900 provas19. Foram avaliados alunos do 2º ao 5º ano, nas
disciplinas de Português e Matemática, com o “objetivo de identificar as po-
tencialidades e fragilidades do aprendizado para, posteriormente, desenvolver
estratégias de colaboração para o avanço da educação no território”20.
Tendo passado pelas fases de diagnóstico e de construção do plano de
ação, o ADE iniciou a execução do plano de ação, no qual estavam previstas
quatro metas. “A meta 1 prevê que até o final de 2017 o programa deve insti-
tuir, implementar e consolidar processo em larga escala, de “Avaliação Exter-
na Territorial de Aprendizagem Escolar” abrangendo 100% dos municípios
[...]”. O objetivo do Instituto Positivo para 2017 “é implantar as ações previs-
tas na Meta 2”, com a finalidade de “reduzir de 12.8% para 8% a distorção
idade/série, ou seja, reduzir as desistências e reprovações na educação bási-
ca”, abrangendo “cerca de 5 mil alunos”21.
Em 2016, técnicos educacionais e gestores municipais passaram por
cursos de capacitação sobre as ferramentas de financiamento, planejamento e
desenvolvimento de projetos da educação pública em regime de colaboração
entre os municípios e o Governo Federal. Também foram encaminhadas as dis-
cussões sobre a implantação da hora-atividade no magistério e sobre a atuali-
zação dos planos municipais de educação.

18
Disponível em: <http://www.institutopositivo.org.br/pt/noticia/92-programa-ade-secretarios-
de-educacao-participam-de-painel-sobre-avaliacao-de-aprendizagem>. Acesso em: 03 nov.
2017.
19
Disponível em: <http://granfpolis.org.br/noticias/index/ver/codMapaItem/42699/
codNoticia/390657>. Acesso em: 03 nov. 2017.
20
Informação disponível em: <http://granfpolis.org.br/noticias/index/ver/codMapaItem/
42699/codNoticia/394996>. Acesso em: 03 nov. 2017.
21
Mais detalhes em: <http://granfpolis.org.br/noticias/index/ver/codMapaItem/42699/cod
Noticia /394996>. Acesso em: 03 nov. 2017.

142
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

No ano de 2017, foram realizados encontros entre secretários de educa-


ção e orientadores pedagógicos da região, com o fim de dar prosseguimento às
ações acordadas e discutir as metas do ADE e dos cursos de formação de profes-
sores. As ações têm sido desenvolvidas com o apoio direto da Secretaria de Ar-
ticulação dos Sistemas de Ensino (SASE) e do Ministério da Educação (MEC).
Nesse mesmo ano, na busca de atingir a Meta 2, ou seja, “reduzir a média geral
de distorção idade/ano de 12,3% para 8%”, o Programa passou a contar tam-
bém com o apoio do Instituto Ayrton Senna. Atualmente, são quatro os proje-
tos em andamento: Se Liga, Acelera Brasil, Fórmula da Vitória e Gestão de
Alfabetização (INSTITUTO POSITIVO; GANFPOLIS, 2017, p. 14).
Observando a metodologia e as ações desenvolvidas nas diferentes eta-
pas do projeto, podemos afirmar que o modelo se coaduna com a perspectiva
do modelo de administração empresarial, alinhando decisões (metas conjun-
tas) e ações a processos de avaliação e a indicadores de “qualidade” direciona-
dos a alavancar resultados. Assim, as redes municipais de ensino são reorgani-
zadas conforme a lógica da gestão privada, estrategicamente orientada para o
cumprimento de metas de desempenho e para a obtenção de resultados, moni-
torados por meio de avaliações externas de aprendizagem em larga escala,
com evidente impacto sobre a organização do trabalho didático-pedagógico e
sobre a gestão das instituições escolares (PERONI, 2013).
Em relação aos recursos para o desenvolvimento do projeto podemos
considerar que a atuação do Instituto Positivo insere-se na perspectiva da filan-
tropia 3.022, marcada, segundo Ball e Olmedo (2013, p. 33), pelo “envolvimen-
to direto dos doadores nas ações filantrópicas e nas comunidades de políti-
cas”, explorando a compatibilidade entre lucro e filantropia e expandindo as
oportunidades de negócios e o alcance das forças de mercado. Para Ball (2014,
p. 122), a filantropia 3.0 “está assentada em três princípios de trabalho: “am-
pliar e adequar as organizações sem fins lucrativos”, comprometendo grandes
lotes de financiamento por longos períodos de tempo; ênfase na avaliação e na
gestão de desempenho; e a promoção de relações “investidor-investido” com
base em ‘engajamento consultivo”.
Conforme o Relatório de Sustentabilidade do Grupo Positivo referente
aos anos de 2014/2015, “outro objetivo para 2016 é orientar os municípios
para que possam captar recursos dentro e fora do Brasil” (INSTITUTO POSI-
TIVO, 2016, p. 42). Em julho de 2017, dirigentes da Associação dos Municípi-
os da Região Grande Florianópolis (GRANFPOLIS), da Associação dos Mu-

22
Em relação ao escopo e aos objetivos da filantropia tradicional, os autores identificam uma
mudança em três etapas: “da caridade paliativa (ou seja, a filantropia tradicional ou a ‘filantropia
1.0’) à filantropia para o desenvolvimento (‘filantropia 2.0’), e, finalmente, à doação ‘rentável’,
constituindo aquilo que é chamado de ‘filantropia 3.0’” (BALL; OLMEDO, 2013, p. 34).

143
CARVALHO, E. J. G. de • Parcerias entre o público e o privado na gestão da educação básica
pública brasileira: Arranjos de Desenvolvimento da Educação (ADEs)

nicípios da Região da Foz do Rio Itajaí (AMFRI) e do Instituto Positivo


(IP) reuniram-se para estudar as possibilidades de utilização de recursos
do FUNDEB nos ADEs. Foram analisados “os estatutos sociais das associa-
ções e das suas principais semelhanças e diferenças entre os consórcios e de-
mais formas de organização não governamental a fim de determinar a possibi-
lidade de firmar [parcerias] com o MEC/SASE”23.
A conclusão foi de que os levantamentos preliminares “indicam não ha-
ver incoerência em promover e induzir a ação de colaboração e cooperativa en-
tre sistemas e entes federativos a partir da atual legislação do Fundeb (Lei nº
11.494, de 20 de junho de 2007),” já que esta “permite tratamento a respeito da
distribuição da parcela de recursos da complementação da União”. Assim, fo-
ram agendadas novas reuniões para determinar os encaminhamentos futuros24.

Considerações finais

Os ADEs se apresentam como uma das soluções colaborativas entre os


entes federados e a sociedade civil para a melhoria da “qualidade” social da
educação. No entanto, esse instrumento de gestão para assegurar o direito à
educação em determinado território transpõe os limites da administração pú-
blica, podendo contar com a participação direta de instituições privadas e não
governamentais para auxiliar na gestão das redes municipais de ensino.
A priori, esse modelo de colaboração parece não envolver a transferên-
cia de recursos públicos para instituições privadas e não governamentais, con-
figurando uma abordagem “filantrópica”. Porém, analisando criticamente, in-
dagamos: quais seriam os objetivos subjacentes aos grupos empresariais que,
atuando no mercado educacional e oferecendo serviços e produtos com fins
de lucro, a exemplo do Grupo Positivo, assumem o compromisso de acompa-
nhar a implementação e o desenvolvimento da proposta em territórios educa-
tivos, tais como o ADE-Ganfpolis?
De nossa perspectiva, a experiência dos ADEs revela-se como uma nova
estratégia do setor empresarial para: regulamentar novas formas de parcerias
público-privadas; abrir novas oportunidades de negócios, ampliar as possibili-
dade de as empresas parcerias assegurarem vantagens competitivas na expan-
são e no controle do mercado educacional, abrirem outras dimensões para o
marketing e estabelecerem novas relações com lideranças do governo e das
comunidades locais; redesenhar os mecanismos de gestão das redes munici-

23
Conforme notícia disponível em: <http://www.granfpolis.org.br/noticias/index/ver/
codMapaItem/42699/codNoticia/433917>. Acesso em: 30 out. 2017.
24
A notícia pode ser consultada em: <http://www.institutopositivo.org.br/pt/noticia/153-
granfpolis-e-amfri-buscam-recursos-federais-para-os-ades>. Acesso em: 30 out. 2017.

144
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

pais públicas de ensino, abrindo espaços para a atuação direta de empresas


privadas na gestão da educação pública; e direcionar a transferência de recur-
sos públicos prioritariamente para os interesses privados-mercantis.
Assim, essa nova metodologia, ao envolver a atuação direta do empre-
sariado na gestão das redes municipais de educação, evidencia novas estraté-
gias do capital para ampliar os espaços de acumulação, bem como para con-
formar a construção de um sistema nacional de educação circunscrito ao “com-
promisso” do setor público com os interesses do setor privado, o que terá pro-
fundas consequências na materialização do direito à educação e na democra-
tização da gestão da educação pública (PERONI, 2013; 2015).

Referências
ABRÚCIO, L. F. Cooperação Intermunicipal: experiências de Arranjos de Desenvolvi-
mento da Educação no Brasil. Colabora Educação; Instituto Positivo, 2017. Disponí-
vel em: <http://instituto.positivo.com.br/wp-content/uploads/2017/11/
Coopera%C3%A7%C3%A3o-Intermunicipal-livro-virtual.pdf>. Acesso em: 27 nov.
2017.
ADRIÃO, T.; BORGHI, R. Parcerias entre prefeituras e esfera privada: estratégias pri-
vatizantes para a oferta da educação pública em São Paulo. In: ADRIÃO, T.; PERO-
NI, V. (Orgs.). Público e privado na educação: novos elementos para o debate. São Paulo:
Xamã, 2008, p. 99-110.
ARAÚJO, G. C. de. Federalismo cooperativo e arranjos de desenvolvimento da educa-
ção: o atalho silencioso do empresariado para a definição e regulamentação do regime
de cooperação. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, v. 28, n. 2, p.
515-531, maio/ago. 2012.
ARAÚJO, G. C. Federalismo e políticas educacionais no Brasil: equalização e atuação
do empresariado como projetos em disputa para a regulamentação do regime de cola-
boração. Educ. Soc., Campinas, v. 34, n. 124, p.787-802, jul./set. 2013.
ARGOLLO, J.; MOTTA, V. Arranjos de desenvolvimento da educação: regime de co-
laboração de ‘novo’ tipo como estratégia do capital para ressignificar a educação públi-
ca como direito. Universidade e Sociedade, ANDES-SN, n. 56, p. 44-57, ago. 2015.
BALL Stephen J.; OLMEDO, Antonio. A “nova” filantropoia, o capitalism social e as
redes de políticas globais em educação. In: PERONI, Vera Maria Vidal (Org.). Redefini-
ção das fronteiras entre público e privado: implicações para a democratização da educação.
Brasília: Liber Livro, 2013.
BALL, S. Educação Global S.A.: Novas redes politicas e o imaginário neoliberal. Ponta
Grossa: UEPG, 2014.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF:
Senado Federal, 1988.

145
CARVALHO, E. J. G. de • Parcerias entre o público e o privado na gestão da educação básica
pública brasileira: Arranjos de Desenvolvimento da Educação (ADEs)

BRASIL. Parecer nº 9, de 30 de agosto de 2011. Análise de proposta de fortalecimento e


implementação do regime de colaboração mediante arranjos de desenvolvimento da
educação. Brasília, DF: CNE/CEB, 2011a. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/
index.php?option=com_ docman&view=download &alias =8851-pceb009-11-
pdf&category_slug=setembro-2011-pdf& Itemid=30192>. Acesso em: 24 ago. 2017.
BRASIL. Projeto de Lei nº 2.417/2011. Dispõe sobre Arranjos de Desenvolvimento da
Educação (ADE). Câmara dos Deputados, 2011b. Disponível em: <http://
www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=521950>.
Acesso em: 20 out. 2017.
BRASIL. Resolução nº 1, de 23 de janeiro de 2012. Dispõe sobre a implementação do
regime de colaboração mediante Arranjo de Desenvolvimento da Educação (ADE)
como instrumento de gestão pública para a melhoria da qualidade social da educação.
Brasília, DF: MEC/CNE/CEB, 2012a. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/
index.php?option=com_docman&view= download&alias=9816-rceb001-12&Ite-
mid=30192>. Acesso em: 24 ago. 2017.
BRASIL. MEC. Portaria nº 1.238, de 11 de outubro de 2012b. MEC, 2012c Disponível
em: <http:// pne.mec.gov.br/images/pdf/Noticias/
Portaria_1238_2012_GT_ADE_consolidado.pdf>. Acesso em: 07 out. 2017.
BRASIL. Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014. Aprova o Plano Nacional de Educação
e dá outras providências. Diário Oficial da União, Seção 1. Brasília, DF, 26 jun. 2014.
Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/2014/lei-13005-25-junho-
2014-778970-publicacaooriginal-144468-pl.html>. Acesso em: 24 set. 2017.
BRASIL. MEC. Relatório Final do GT-ADE Portaria nº 1.238, de 11 de outubro de 2012.
Brasília, 2015. Disponível em: <http://pne.mec.gov.br/images/pdf/publicacoes/
Relatorio_GT_ADE _ jul_15.pdf>. Acesso em: 07 nov. 2017.
INSTITUTO POSITIVO; GANFPOLIS. Arranjo de Desenvolvimento da educação ADE/
GRANFPOLIS. Revista de Resultados. 2017. Disponível em: <http://
instituto.positivo.com.br/>. Acesso em: 27 nov. 2017.
INSTITUTO POSITIVO; GANFPOLIS. Programa de Arranjos de Desenvolvimento da
Educação ADE/GRANFPOLIS. Resultados 2015/2016. 2016. Disponível em: <http://
instituto.positivo.com.br/wp-content/uploads/2017/11/
VS_Revista_IP_ADE_DEZ16.pdf>. Acesso em: 27 nov. 2017.
PERONI, V. M. V. A privatização do público: implicações para a democratização da
educação. In: PERONI, V. M. V. (Org.) Redefinições das fronteiras entre o público e o privado:
implicações para a democratização da educação. Brasília: Liber Livro, 2013, p. 9-32.
POSITIVO. Relatório Sustentabilidade de 2014/2015. Disponível em: <http://
positivo.com.br/ instituto/ sustentabilidade/>. Acesso em: 25 out. 2017.

146
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

O protagonismo do setor privado na reforma


do Ensino Médio no Brasil
– o Instituto Unibanco e suas relações

Maria Raquel Caetano

Introdução
O Ensino Médio no Brasil sempre esteve no centro de disputas. Uma de
suas características históricas é a dualidade, ou seja, divisão pautada na divi-
são social do trabalho, que distribui os homens pelas funções intelectuais e
manuais, segundo sua origem de classe, em escolas de currículos e conteúdos
diferentes” (NASCIMENTO, 2007, p. 78). Desde os anos 30 do século passa-
do, esse tema esteve no centro dos debates entre a divisão do ensino profissio-
nal, voltado para as camadas populares, e o ensino propedêutico, que garantia
o acesso ao ensino superior utilizado principalmente pelos jovens de famílias
abastadas. Com o advento da Lei n. 9.394/96 (LDB), o Ensino Médio passou
a integrar a Educação Básica, encerando o ciclo dessa educação compreendi-
da como básica para a plena formação do cidadão.
O “Novo Ensino Médio” instituído através de Medida Provisória e que
se transformou na Lei 13.415/2017, altera a Lei de Diretrizes e Bases da Edu-
cação no que se refere à organização curricular e pedagógica do EM. O artigo
36 da LDB passa a ter nova redação, que estabelece que “O currículo do ensi-
no médio será composto pela Base Nacional Comum Curricular e por itinerá-
rios formativos” (BRASIL, 2016), a serem definidos pelos sistemas de ensino.
Assim, o currículo passará a ter uma primeira parte comum a todos os estu-
dantes, tendo como foco a Base Nacional Comum Curricular – BNCC e a
segunda parte, com cinco itinerários formativos que será, segundo o MEC,
escolha de cada estudante. Indagamos se as escolas públicas terão condições
de oferecer os diferentes itinerários formativos, bem como a escola de tempo
integral, cuja lei não apresenta o conceito de educação integral podendo ser
apenas ampliação de carga horária.
A lei também permite a realização de parcerias público-privadas para a
formação técnica e profissional e realização de convênios para oferta de cur-
sos a distância aprofundando a mercantilização da educação. A mercantiliza-
ção da educação básica compõe “não apenas a definição das finalidades e

147
CAETANO, M. R. • O protagonismo do setor privado na reforma do Ensino Médio no Brasil
– O Instituto Unibanco e suas relações

concepções que orientam os processos formativos escolares, mas também o


financiamento público para a oferta privada da educação” (SILVA; SCHEI-
BE, 2017, p. 27).
Juntando-se a isso, destaca-se que a maioria das matrículas do Ensino
Médio está na rede estadual com um total de 84,8% de matriculas e concentra
96,9 % dos alunos da rede pública1. Os dados mostram a importância das
redes estaduais na participação e efetivação de projetos de EM e por conse-
guinte do Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Educação – CON-
SED. No contexto dos dados apresentados, as políticas públicas para o Ensino
Médio (EM) deveriam ter como principal pressuposto o compromisso com a
universalização desse direito social oferecido, construido e executado pelo se-
tor público.
No Brasil, essa disputa fica ainda mais clara quando examinamos o pe-
ríodo pós-golpe, com o apoio de parte do empresariado nacional, que visa
radicalizar a reforma do Estado iniciada em 1990. O objetivo é “privatizar
tudo o que for possível”, tanto na infraestrutura econômica quanto na infraes-
trutura social (FAGNANI, 2017, p. 11) para diminuir o tamanho do Estado
que segundo os neoliberais gastou demais com políticas sociais.
Ao mesmo tempo que a crise que atinge as políticas sociais, a PEC n. 55,
ao congelar por vinte anos o investimento público na área social, reserva toda
a riqueza produzida para ganhos do capital. “Ela representa, sem dúvida, as
forças sociais que golpearam a democracia brasileira e constitui-se na maior
agressão às conquistas de direitos da classe trabalhadora desde o fim da escra-
vidão” (FRIGOTTO, 2017, p. 366). Dessa forma, destrói o Estado como agente
de garantia de direitos universais. A reforma do EM “não só o inviabiliza como
educação básica de qualidade, como o privatiza por dentro” (FRIGOTTO,
2017, p. 377).
O caso da reforma do Ensino Médio através do “Novo Ensino Médio”,
vem mostrando a disputa por projetos distintos, entre o público e o privado,
que tem no centro “a direção e o conteúdo da educação pública brasileira”. A
reforma do Ensino Médio no Brasil foi capitaneada por empresas atuantes no
mercado, que se unem sob a forma de instituições não lucrativas através de
institutos, fundações, organizações, entre outros com o objetivo de influenciar
as políticas públicas de educação, influenciar no conteúdo da proposta educa-
cional e criar mercados para seus produtos. Apresentaremos neste artigo pes-
quisas realizadas (PERONI; CAETANO, 2014, 2015, 2016; CAETANO, 2015;
2016; RIBEIRO; GABROWSKI; MARÇAL, 2017; RIBEIRO, 2013) que têm

1
Conforme dados do Censo de 2016.

148
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

o Instituto Unibanco como um dos agentes centrais que influenciam a educa-


ção e recentemente a reforma do Ensino Médio no Brasil.

As reformas educacionais e o novo Ensino Médio


O projeto de Lei 6.840/2013, que tramitou no Congresso Nacional des-
de 2013, propunha alterações na Lei 9.634/1996, a Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional (LDBEN). A alteração principal é a organização dos
currículos do Ensino Médio por áreas do conhecimento, conforme texto de
justificativa da proposta. Pela declaração, os estudantes poderiam escolher, no
terceiro ano do Ensino Médio, entre diferentes opções formativas: Lingua-
gens, Matemática, Ciências da Natureza, Ciências Humanas e Formação Pro-
fissional.
O PL 6.840/2013 (BRASIL, 2014), debatido na Câmara, já previa um
processo de flexibilização do currículo e implementação do Ensino Médio em
tempo integral com ênfase na formação técnica profissional. Contudo, essa
escolha se daria somente na última série do Ensino Médio. No projeto de lei já
se anunciavam as parcerias com o setor privado e com o terceiro setor e tam-
bém o ensino noturno e a formação de professores para o Ensino Médio, que
desaparecem na medida provisória divulgada por Mendonça Filho, Ministro
da Educação.
Em artigo sobre o tema, Carvalho e Camargo, ao fazerem a crítica, ex-
plicam que:
Questionada pela sociedade e combatida firmemente pelos estudantes se-
cundaristas, que promoveram o maior Movimento de Ocupação de escolas
que o país já conheceu, a MP tramitou, mesmo assim, pela câmara e senado
sem abrir nenhuma possibilidade de diálogo. No senado, recebeu a chancela
do senador Pedro Chaves (PSC), que é empresário e dono de um dos maio-
res conglomerados educacionais do Brasil, a UNIDERP (Universidade para
o Desenvolvimento do Estado e Região do Pantanal), o CESUP (Centro de
Ensino Superior Prof. Plínio Mendes dos Santos) e o MACE (Moderna Asso-
ciação Campograndense de Ensino), sediados no Mato Grosso do Sul. Nas
mãos de Pedro Chaves, a MP sofreu alterações que reforçaram ainda mais o
seu caráter privatista, abrindo a possibilidade de criação do ensino médio no-
turno por via modular e a distância e introduzindo no artigo 6° da referida
MP, a “complementação pedagógica” como possibilidade de admissão de
professores para o Ensino Médio (CARVALHO; CAMARGO, 2017, p. 8).

Após o impeachtment da presidente Dilma em 2016, no dia 22 de setem-


bro, o governo Michel Temer aprovou rapidamente a Medida Provisória 746/
2016 em regime de urgência. Essa MP se converteu na Lei n. 13.415 de 16 de
fevereiro de 2017. A reforma apresenta características de uma grande aliança
entre instituições privadas, como a Fundação Lemann, o Instituto Ayrton Sen-

149
CAETANO, M. R. • O protagonismo do setor privado na reforma do Ensino Médio no Brasil
– O Instituto Unibanco e suas relações

na, o Instituto Unibanco, o Todos pela Educação, Fundação Roberto Mari-


nho, entre outros, e os partidos políticos que sustentaram o impeachment da
presidente Dilma.
Não existe consenso sobre a centralidade da reforma no currículo, sem
questionar a infraestrutura das escolas, bibliotecas, laboratórios, a formação e
a valorização dos professores, ou seja, todos os insumos para que a educação
aconteça com qualidade em todos os níveis.
Na busca por implementar o Novo Ensino Médio nos estados, em 17 de
julho de 2017, o Ministério da Educação (MEC) divulgou a solicitação de
apoio financeiro ao Banco Mundial e ao Banco Interamericano de Desenvol-
vimento – BIRD. Os eixos de apoio à reforma são: formação de professores,
construção de currículos e estudos de viabilidade das redes, sendo que 221
milhões de dólares irão para o Programa para Resultados (PforR) que serão
medidos por indicadores acordados entre o MEC e o banco, e 21 milhões de
dólares para assistência técnica que deverá oferecer serviços de consultorias
especializadas (BRASIL, 2017).
No campo das reformas educacionais em nível global, o Banco Mundial
lançou, em 2012, o documento intitulado “Aprendizagem para Todos” – Es-
tratégias Educativas 2020 para a educação (BANCO MUNDIAL, 2011). As
reformas educacionais propostas pelo banco vão além do foco dos insumos
materiais e concentram-se mais nos resultados e em soluções de gestão e de
governança. A gestão para resultados passa a ser pré-requisito para a conces-
são do financiamento. O documento Estratégias Educativas é, provavelmente,
o documento político com o qual o BM posiciona-se de forma mais clara como
o líder da reforma intelectual no domínio da ajuda ao desenvolvimento (VER-
GER; BONAL, 2011). As estratégias propostas pelo BM se concentram em
três grandes áreas: geração e intercâmbio de conhecimento, apoio técnico e
financeiro e parcerias estratégicas. Além disso,
o BM fornecerá: avaliação do sistema e ferramentas de comparação com
dados de informação para avaliar a capacidade de um sistema educacional
para melhorar os sistemas de aprendizagem; avaliações da aprendizagem e
realização de objetivos que abranjam as competências básicas de leitura e
aritmética, bem como outras incluindo pensamento crítico, solução de pro-
blemas e aptidões para trabalhar em equipe; e avaliações de impacto e outro
trabalho analítico que possam informar políticas e intervenções, juntamente
com o intercâmbio de conhecimentos e debate que facilitem a aprendizagem
entre países parceiros e organizações (BANCO MUNDIAL, 2011, p. 8).

Faz parte dos objetivos do BM aumentar o conhecimento sobre o papel


do setor privado na educação e ajudar os países a criarem ambientes de políti-
ca e estruturas normativas que alinhem esforços do setor privado por meio de
parcerias estratégicas no nível local e global, visando melhorar os sistemas

150
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

educacionais. Segundo o Banco, “as entidades privadas são fornecedores im-


portantes de serviços de educação até para as comunidades mais pobres, espe-
cialmente em áreas que os governos não chegam” (BM, 2011, p. 20). A estra-
tégia atual coloca maior ênfase na importância do setor privado e apoia, aber-
tamente, o papel das instituições de ensino privadas com fins lucrativos. Ela
acredita que o setor privado pode ser benéfico para os pobres (VERGER; BO-
NAL, 2011).
A privatização não significa a venda da educação e da escola pública
para o capital privado, mas uma ampla e complexa diversidade de tendências
concretizadas através de parcerias, terceirização, atuação de organizações so-
ciais e outras (LIMA, 2013) aderindo às imposições da lógica do mercado.
As ofertas privadas podem ser realizadas por meio de contratos ou sub-
venções como é o caso da aquisição de material apostilado por sistemas públi-
cos (ADRIÃO; GARCIA, 2014), a gestão da escola e da sala de aula, como é
o caso do Instituto Unibanco (PERONI, 2015; PERONI; CAETANO, 2015) e
do Instituto Ayrton Senna no Brasil (ADRIÃO; PERONI, 2010; CAETANO,
2013; COMERLATO, 2013). Inclui-se, também, a oferta de pacotes educati-
vos, materiais digitais, orientações pedagógicas, hardwares e softwares educati-
vos e procedimentos de avaliação, conforme estudos de Ball e Youndell (2007)
e Robertson (2012).
A escola, conforme Ball e Youndel (2007), funcionaria como uma em-
presa, de maneira que os sistemas educativos atuariam como quase-mercados,
com base em critérios como seleção de estudantes e política de resultados.
Com a introdução dos quase-mercados, a educação como direito social passa
a ser relativizada, pois promove uma lógica de cunho privado, em que a edu-
cação é reduzida à condição de mercadoria.
Os problemas educacionais têm sido considerados por esses grupos,
como resultado da má gestão e desperdício do Estado, como falta de produti-
vidade, qualidade e falta de esforço por parte do corpo docente que ainda uti-
liza métodos, currículos e formas antiquadas de educar. Justifica-se com isso,
a adoção dos conceitos empresariais de produtividade, eficiência, eficácia e
competitividade para solucionar os problemas enfrentados pela educação.
Com o empréstimo do Banco Mundial e BIRD, as instituições também
disputam e/ou compartilham o financiamento dos programas nos estados,
através dos contratos de gestão, termos de cooperação ou outros, pois são ob-
jetivos do BM as parcerias com o setor privado. Essa ambiência privada já
estava sendo consolidada por diferentes instituições em diversos estados como
Pernambuco, Pará, Espírito Santo, Rio Grande do Norte e São Paulo.
Uma das questões fundamentais que consideramos com o avanço das
investidas do setor privado, é a divulgação do pensamento hegemônico de

151
CAETANO, M. R. • O protagonismo do setor privado na reforma do Ensino Médio no Brasil
– O Instituto Unibanco e suas relações

modelos baseados em empresas e das ideias de uma determinada classe que


esses sujeitos representam, alterando o conteúdo da educação. Freitas (2014)
diz que o caminho seguido é o mesmo que os empresários americanos segui-
ram nos últimos 30 anos:
1.Enfatizar a crise da educação e a necessidade de reformar a política edu-
cacional; 2. Uma ênfase no direito à aprendizagem com dupla limitação: a)
fala-se de direito à aprendizagem e não de direito à formação humana, à
educação; b) e restrita ao ambiente da escola, portanto isolada de importan-
tes ligações com a vida (2014, p. 51).

Os principais sujeitos envolvidos na reforma do Ensino Médio, se apre-


sentam como sujeitos individuais ou coletivos através de instituições públicas
e privadas que atuam no setor educacional, institutos e fundações ligados a
grandes empresas nacionais e internacionais, bem como instituições financei-
ras ligadas ao mercado de capitais, visando construir um projeto hegemônico
de educação e de sociedade (PERONI; CAETANO; LIMA, 2018). Entre os
principais sujeitos atuantes no Ensino Médio está o Instituto Unibanco.

Instituto Unibanco e o protagonismo do setor privado


Criado em 1982, o Instituto Unibanco (IU), conforme ele mesmo, atua
para a melhoria da educação pública no Brasil. É uma das instituições respon-
sáveis pelo investimento social privado do Itaú Unibanco que é o maior banco
privado da América Latina.
Atua na concepção, desenvolvimento, implementação e avaliação de
soluções aplicadas a projetos de gestão educacional, na produção e difusão de
conhecimento por meio de pesquisas, estudos e debates focados em soluções
baseadas em evidências empíricas e na investigação científica e apoio e fomen-
to a projetos e iniciativas alinhados aos desafios do Ensino Médio. Seu princi-
pal projeto é o Jovem de Futuro, também considerada tecnologia educacional
pelo MEC. Com foco na melhoria dos resultados e na produção de conheci-
mento sobre o Ensino Médio e Gestão (Observatório da Educação – Ensino
Médio e Gestão), o Instituto Unibanco também se dedica a elaborar e imple-
mentar soluções de gestão – na rede de ensino, na escola e em sala de aula,
cujo argumento é a capacidade efetiva das escolas públicas de garantir o direi-
to à aprendizagem de todos os estudantes. O Jovem de Futuro é implementa-
do nas redes estaduais de educação dos estados de Goiás, Ceará, Espírito San-
to, Pará, Piauí e Rio Grande do Norte (UNIBANCO, 2016).
Na última década, o IU vem direcionando suas ações para o EM. Opera
com uma série de instituições tanto públicas, representada pelo Ministério da
Educação e secretarias estaduais de educação, quanto de parceiros do mundo
privado mercantil, através de parcerias público-privadas e contratos de gestão

152
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

para viabilizar a implantação do Jovem de Futuro (JF) nas redes públicas de


Ensino Médio. Destaca-se que a partir de 2008 passa a atuar nas redes e esco-
las públicas estaduais com o JF, em 2009 como tecnologia educacional do
MEC e em 2011 integra o Programa Ensino Médio Inovador (PROEMI) do
MEC. Essa é sua principal estratégia, além de construir direcionamento públi-
co a partir de 2011, em seminários, congressos, palestras, trazendo experiências
internacionais como modelo a ser seguido. A seguir apresentamos a rede de
relações estabelecidas entre Instituto Unibanco e demais instituições para exe-
cução de seus programas e ações nos sistemas e escola públicas do país.

Figura 1: O Instituto Unibanco e suas relações com os segmentos empresariais


no Ensino Médio

Fonte: UNIBANCO, 2017. Elaborado por CAETANO, 2018.

Os grupos que se relacionam com o IU são formados por sujeitos que


atuam basicamente no mercado. É importante destacar que, ao mapear os su-
jeitos, encontramos praticamente os mesmos que atuam em outros movimen-
tos, como o Movimento pela Base Nacional Comum (Fundação Lemann) e o
Todos pela Educação.
Como principal tecnologia do IU, apresenta-se o Jovem de Futuro que
visa instituir nas escolas públicas o foco na melhoria dos resultados, elaborar e
implementar soluções de gestão nas redes de ensino, nas escolas e em salas de
aula. Ele opera com uma série de instituições através de parcerias público-
privadas para viabilizar a elaboração e implantação dessas ações. Essa é sua
principal estratégia, além de construir direcionamento público em outras ati-

153
CAETANO, M. R. • O protagonismo do setor privado na reforma do Ensino Médio no Brasil
– O Instituto Unibanco e suas relações

vidades, atuando com o principal veículo de mídia brasileiro, a Rede Globo.


Para cada área de atuação do IU, há um conjunto de parceiros como mostra a
figura 1. Apresentaremos sujeitos individuais e coletivos ligados a alguns pro-
jetos do IU para compreender como essas instituições se organizam. Nesse
texto vamos abordar o projeto Qualidade do Ensino Médio e Fortalecimento
Institucional.
No projeto Qualidade do Ensino Médio são parceiros a Fundação Le-
mann, O Instituto Inspirare, o Todos pela Educação e o INEP. A Fundação
Lemann é presidida por Jorge Paulo Lemann, milionário brasileiro. A funda-
ção atuou de forma decisiva na construção da Base Nacional Curricular Co-
mum – BNCC que possui relação com a reforma do Ensino Médio. A reforma
do Ensino Médio foi assinada pelo presidente um mês depois da nomeação de
Teresa Pontual, ex-bolsista da Fundação Lemann, para a Diretoria de Currí-
culos e Educação Integral do MEC, uma representante dos jovens universitá-
rios chamados de Lemann fellows, cujo grupo interfere no MEC desde a discus-
são sobre o Plano Nacional de Educação, em 2013. Além disso, a fundação
adquiriu a Revista Nova Escola e a Gestão Escolar, da Fundação Victor Civi-
ta, que têm como foco de atuação a formação de professores e gestores escola-
res. A Fundação Lemann é mantenedora do Todos pela Educação.
Outro parceiro nesse projeto é o Instituto Inspirare, presidido por Ber-
nardo Gradin, bilionário brasileiro. O instituto está envolvido na proposta de
“educação integral na prática”, plataforma que “disponibiliza recursos para
apoiar gestores e equipes técnicas na implementação de programas de educa-
ção integral. O Todos pela Educação (TPE), também participa desse projeto.
É uma ONG cujo presidente é Jorge Gerdau Johannpeter, um dos maiores
bilionários brasileiros. O TPE se consagrou como influência nas políticas pú-
blicas de educação. Tem como mantenedores: Fundação Lemann, Itaú, Uni-
banco, Bradesco, Natura, Gerdau, Votorantin, Telefônica, Gol e Instituto Pe-
nínsula. A Rede Globo é um de seus parceiros.
No Fortalecimento Institucional são parceiros o Consed – Conselho
Nacional de Secretários Estaduais de Educação, que vem atuando fortemente
com parcerias privadas e elaborou uma Carta de Princípios propondo ao MEC
a flexibilização do currículo do EM. Para elaborar a carta, o Consed contou
com dois estudos realizados por instituições privadas coordenadas pela Fun-
dação Carlos Chagas em parceria com a Fundação Victor Civita, o Instituto
Unibanco, Fundação Itaú Social, Itaú BBA e Instituto Península. Outra pes-
quisa realizada entre 2015 e 2016 foi desenvolvida pelo Instituto Unibanco,
Consed e o Movimento pela Base Nacional Comum e procurou verificar o
panorama do Ensino Médio no Brasil e a distribuição dos tempos por áreas e
componentes curriculares. Além de defender a proposta do Novo Ensino Mé-

154
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

dio, Deschamps, que era presidente do Consed à época, foi indicado para o
Conselho Nacional de Educação que será responsável por discutir e aprovar a
BNCC.
O GIFE – Grupo de Institutos Fundações e Empresas é a associação
dos investidores sociais do Brasil, sejam eles institutos, fundações ou empre-
sas. Atua no tema do investimento social privado. Possui 137 associados, que
somados, investem 2,9 bilhões na área social, operando projetos próprios ou
viabilizando os de terceiros. O conselho é formado, entre outros, pela Rede
Globo e a Fundação Roberto Marinho, o Instituto Unibanco, Fundação Ford,
Instituto Votorantim, Fundação O Boticário.
A Parceiros da Educação, parceira do projeto de Fortalecimento Insti-
tucional, é uma OSCIP (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público)
que trabalha por uma educação pública de qualidade no Brasil. Atua em dois
focos: promover a parceria entre empresas, empresários e organizações da so-
ciedade civil com escolas públicas, visando a melhoria do desempenho acadê-
mico dos alunos, e apoiar o governo na adoção de políticas públicas consisten-
tes que promovam a qualidade da educação pública. Atua em São Paulo e Rio
de Janeiro. Fazem parte do Comitê Consultivo: Jair Ribeiro do Banco Indus-
val, Partners e Fernão Bracher do Itaú BBA. Do conselho consultivo fazem
parte representantes das seguintes empresas: Itaú BBA, Península Participa-
ções, Iguatemi, Loducca Comunicação, Fundação Bradesco, Fundação Iochpe,
Votorantin, UBS, BTG Pactual, Suzano Papel e Celulose. A Fundação Le-
mann é parceira institucional.
Se levarmos em consideração os pontos principais da Reforma do Ensi-
no Médio: currículo (base nacional comum), educação integral, financiamen-
to, e considerando que a totalidade das matriculas está na rede estadual de
ensino, podemos entender a organização dos sujeitos individuais e coletivos
na promoção de políticas e no delineamento de ações para serem colocadas
em prática. Sobre a forma de atuação na educação, Freitas (1995, p.127) ob-
serva que os ensinos básico e técnico vão estar na mira do capital pela sua
importância na preparação do novo trabalhador. Assim a educação será cen-
trada nos métodos e resultados. Conforme o autor, os determinantes sociais
da educação e o debate ideológico poderão ser considerados secundários –
uma perda de tempo motivada por um excesso de politização da área educaci-
onal. (FREITAS, 1995, p.127). Concordamos com as observações de Freitas
no sentido de que o investimento das instituições privadas será em como fazer
para obter resultados rápidos nas avaliações. A base nacional comum ligada a
reforma do ensino médio já determina que as disciplinas obrigatórias são por-
tuguês e matemática, considerados prioritários para o currículo, deixando como
opção disciplinas como sociologia, filosofia, história, artes entre outras.

155
CAETANO, M. R. • O protagonismo do setor privado na reforma do Ensino Médio no Brasil
– O Instituto Unibanco e suas relações

Considerações finais
O Ensino Médio que visa a formação da juventude brasileira passa a
ser alvo dos interesses do capital, representado pelo setor privado para quali-
ficar as novas formas de organização do trabalho produtivo, além de influen-
ciar o conteúdo que será abordado nas escolas públicas através de seus méto-
dos de negócios, ou seja, novas formas de gestão, ensino apostilado, projetos
padronizados, avaliações em escala e para resultados, entre outros. São as
diferentes formas de privatização que vêm ocorrendo a partir e/ou como
consequência das reformas da gestão pública, instituindo reformas educati-
vas de forma global.
O setor privado atua como protagonista sobre a educação pública com
base em uma atuação em rede capaz de influenciar políticas públicas e legiti-
mar a prática da filantropia através da solidariedade entre os empresários.
O Instituto Unibanco, como apresentamos, é um dos principais influen-
ciadores da reforma do Ensino Médio. Ele atua através de soluções/progra-
mas a serem implantados nos sistemas estaduais de ensino, direcionando o
que deve ser feito e como deve ser feito.
É o setor privado que vem direcionando a política do Ensino Médio em
bases gerencialistas, com programas prontos, padronizados, cujo conteúdo,
entre outros, visa o controle das ações da educação e da escola na busca de
resultados para as avaliações em larga escala e, ideologicamente, o conteúdo
da educação pública através do cerceamento do currículo do Ensino Médio.

Referências
ADRIÃO, T.; GARCIA, T. Subsídio público ao setor privado: reflexões sobre a gestão
da escola pública no Brasil. Políticas Educativas, Porto Alegre, v. 7, n. 2, p. 110-122.
ADRIÃO, Theresa; PERONI, Vera. Análise das consequências de parcerias firmadas entre
municípios brasileiros e a Fundação Ayrton Senna para a oferta educacional, 2010. (Relatório
de pesquisa).
BALL. Stephen. Educação Global S. A. Novas redes políticas e o imaginário neoliberal.
Ponta Grossa, UEPG, 2014.
BALL, S.; YOUDELL, D. Hidden Privatisation in Public Education. Institute of Education,
University of London, Bruxelas, 2008.
BANCO MUNDIAL. Aprendizagem para todos: Estratégia 2020 para a Educação do Grupo
Banco Mundial. Resumo executivo. Washington, DC: Banco Mundial, 2011.
BRASIL. Constituição Federal de 1988, atualizada até a Emenda Constitucional nº 95 de
15 de dezembro de 2016. Disponível em: <http:// http://www2.camara.leg.br/ativida-
de-legislativa/legislacao/ Constituicoes_Brasileiras/constituicao1988.html>. Acesso em:
15 out. 2017.

156
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

BRASIL. Ministério da Educação. Ministério da Educação vai buscar apoio para implemen-
tação do Novo Ensino Médio. Noticia 17.7.2017. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/
ultimas-noticias/211- 218175739/51871-ministerio- vai-buscar- apoio-para- implemen-
tar-novo- ensino-medio>. Acesso em: 17 out. 2017.
BRASIL. Medida Provisória n. 746 de 22 de setembro de 2016. Disponível em: <https://
www.planalto. gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2016/Mpv/mpv746.htm>. Acesso em:
10 set. 2017.
CAETANO, Maria Raquel. Relações entre o Público e o Privado: a gestão pedagógica da edu-
cação no Programa Circuito Campeão do Instituto Ayrton Senna (2007-2010). 2013. 303
f. Tese (Doutorado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação, Faculda-
de de Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2013.
CAETANO, M. R. O Ensino Médio no Brasil e o Instituto UNIBANCO: um caso de
privatização da educação pública e as implicações para o trabalho docente. Revista
Educação e Emancipação, v. 9, p. 122-139, 2016.
CAETANO, M. R. Ensino Médio no Brasil e privatização do público: o caso do Insti-
tuto Unibanco. Universidade e Sociedade, Brasília, v. XXIV, p. 84-99, 2015.
CAETANO, M. R.; PERONI, V. M. V. Ensino Médio no Brasil e a proposta educacio-
nal do Instituto Unibanco: considerações sobre a mercantilização da educação públi-
ca. In: PERONI, V. M. V. (Org.). Ensino Médio no Brasil e a proposta educacional do Institu-
to Unibanco: considerações sobre a mercantilização da educação pública. São Leopol-
do: Oikos, 2015, v. 1, p. 89-107.
CARVALHO, S. R.; CAMARGO, M. H. D. M. O 746 e a desconstrução da licenciatura:
estudo sobre a precarização do trabalho docente. In: Anais da Jornada do XIV HISTEDBR:
pedagogia histórica-crítica, educação e revolução: 100 anos da Revolução Russa. Orga-
nização de Andrá Paulo Castanha e outros. Foz do Iguaçu, 2017.
COMERLATTO, Luciani Paz. A Gestão da Educação no Contexto da Sociedade Capitalista:
a parceria público privado. 2013. Tese (Doutorado em Educação) – Programa de Pós-
Graduação em Educação, Faculdade de Educação, Universidade Federal do Rio Gran-
de do Sul, Porto Alegre, 2013.
FAGNANI. Eduardo. O fim do breve ciclo da cidadania social no Brasil (1988-2015). Texto
para Discussão. Unicamp. IE, Campinas, n. 308, jun. 2017.
FREITAS. Luis Carlos. Os empresários e a política educacional: como o proclamado
direito a educação de qualidade é negado na prática pelos reformadores empresariais.
Germinal: Marxismo e Educação em Debate, Salvador, v. 6, n. 1, p. 48-59, jun. 2014.
FREITAS, Luis Carlos. Crítica da organização do trabalho pedagógico e da didática. Campi-
nas, SP: Papirus, 1995. (Coleção Magistério: Formação e trabalho pedagógico).
LIMA, Licínio Carlos. Apresentação dossiê – Privatização da educação no contexto
da(s) &quot; Terceira(s) Via(s)”: uma caracterização em análise. Currículo Sem Fronteiras,
v. 13, n. 2, p. 177-181, maio/ago. 2013.
LOPES, Kátia de Carvalho. Educação Pública como Nicho de Investimento Social Privado.
Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Federal de Santa Catarina, Flo-
rianópolis, 2010.

157
CAETANO, M. R. • O protagonismo do setor privado na reforma do Ensino Médio no Brasil
– O Instituto Unibanco e suas relações

MOTTA, V. C.; FRIGOTTO, G. Por que a urgência da reforma do ensino médio? Me-
dida Provisória n. 746/2016 (Lei n. 13.415/2017). Educação & Sociedade (Impresso), v.
38, p. 355-372, 2017.
NASCIMENTO, Manoel Nelito M. Ensino médio no Brasil: determinações históricas.
Publicações UEPG Ci. Hum., Ci. Soc. Apl., Ling., Letras e Artes, Ponta Grossa, jun. 2007.
Disponível em: <http://&lt;www.revistas2.uepg.br/index.php/sociais/article/downlo-
ad/2812/2097&gt;>. Acesso em: 2 out. 2017.
PERONI, Vera Maria Vidal. Implicações da relação público-privada para a democrati-
zação da educação no Brasil. In: PERONI, Vera Maria Vidal (Org.). Diálogos sobre as
redefinições do papel do Estado e sobre as fronteiras entre o público e o privado. São Leopoldo:
Oikos, 2015, p. 15-34.
PERONI, V. M. V.; CAETANO, M. R.; LIMA, P. V. de. Reformas educacionais de
hoje: as implicações para a democracia. Revista Retratos da Escola, Brasília, v. 11, n. 21, p.
415-432, jul./dez. 2017. Disponível em: <http//:&lt;http//www.esforce.org.br&gt>.
Acesso em: 2 jan. 2018.
PERONI, V. M. V.; CAETANO, M. R. Atuação em Rede e o Projeto Jovem de Futuro:
a privatização do público. Educação e Realidade, v. 41, p. 407, 2016.
PERONI, V. M. V.; CAETANO, M. R. Relações entre o público e o privado na educa-
ção: o Projeto Jovem de Futuro do Instituto Unibanco. Educação, Rio Claro (online),
v. 25, p. 533-546, 2015.
PERONI V. M.; CAETANO, M. R. O público e o privado na educação. Projetos em
disputa? Revista Retratos da Escola, Brasília, v. 9, n. 17, p. 337-352, jul./dez. 2015.
PERONI, V. M. V. ; CAETANO, M. R . Relações entre o público e o privado e a forma-
ção de professores no programa jovem de futuro do Instituto Unibanco. Revista @mbien-
teeducação, v. 7, p. 537, 2014.
RIBEIRO, J. A. R.; GRABOWSKI, G.; MARÇAL, F. A. Ensino Médio no Brasil –
Projetos em Disputa: afinal quais os resultados da gestão por resultados? Revista Políti-
cas Educativas, Santa Maria, v. 10, n. 2, p. 37-50, 2017.
ROBERTSON, Susan L. A estranha não morte da privatização neoliberal na Estratégia
2020 para a educação do Banco Mundial. Revista Brasileira de Educação, v. 17, n. 50,
maio-ago. 2012.
SILVA, M. R. S.; SCHEIBE, L. Reforma do ensino médio: pragmatismo e lógica mer-
cantil. Revista Retratos da Escola, Brasília, v. 11, n. 20, p. 19-32. 2017.
UNIBANCO. Instituto. Seminário Currículo. Materiais. Disponível em: <http://
www.seminariocurriculo.org.br/site/2017/#inicio>. Acesso em: 2 set. 2017.
VERGER, Antoni; BONAL, Xavier. La estrategia educativa 2020 o las limitaciones del
Banco Mundial para promover el “aprendizaje para todos”. Educação &amp. Sociedade,
Campinas, v. 32, n. 117, out.-dez. 2011.

158
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

A relação público-privada: a promessa


“salvacionista” do Instituto Airton Senna (IAS)
para a educação brasileira

Luciani Paz Comerlatto

Privatizaram sua vida, seu trabalho,


sua hora de amar e seu direito de pensar.
É da empresa privada o seu passo em frente,
seu pão e seu salário.
E agora não contente querem privatizar
o conhecimento, a sabedoria, o pensamento,
que só à humanidade pertence.
(Bertold Brecht)

Esse artigo é baseado na apresentação que realizei no I Seminário Nacio-


nal “Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para
a democratização da educação”. Na ocasião, enquanto membro do Grupo de
pesquisas relação público-privado na educação (GPRPPE), fiquei responsável
por problematizar a relação público-privado no campo do Ensino Fundamen-
tal, trazendo como exemplo a parceria do Instituto Airton Senna (IAS) com a
rede pública de ensino. Nesse artigo não irei centrar no ensino fundamental,
mas na promessa “salvacionista” do IAS para a educação brasileira.
A escolha pelo Instituto Airton Senna se deu pela sua abrangência e
implicações na educação brasileira. O IAS tem sido objeto de estudo e investi-
gação de professores, gestores, acadêmicos e pesquisadores em geral no Brasil.
No grupo acima referido, várias monografias, dissertações, teses e artigos apro-
fundam esse debate.1 A exemplo disso, cito a tese que defendi em 2013, intitu-
lada: “A Gestão da Educação no contexto da sociedade capitalista: a parceria
pública privada”2, em que apresento a problematização sobre as implicações
da parceria do Instituto Airton Senna, através do programa Gestão Nota 10,
na gestão da educação da Rede Municipal de Joinville/Santa Catarina, tendo
como categoria de analise a gestão democrática da educação.

1
Ver: <https://plone.ufrgs.br/gprppe>. Acesso em: fev. 2018.
2
D i s p o n í ve l e m : < h t t p : / / w w w. l u m e. u f r gs. b r / b i t s t re a m / h a n d l e / 1 0 1 8 3 / 7 1 2 8 1 /
000879226.pdf ?sequence=1>. Acesso em: fev. 2018.

159
COMERLATTO, L. P. • A relação público-privada: a promessa “salvacionista”
do Instituto Airton Senna (IAS) para a educação brasileira

A partir dessa exposição inicial, organizo o desenvolvimento da temáti-


ca em duas partes. Na primeira, contextualizo algumas questões sobre a edu-
cação no contexto da crise da sociedade capitalista. Na segunda, apresento o
Instituto Airton Senna, sua origem, prática de gestão, lista de programas, dan-
do ênfase ao programa Gestão Nota 10, tendo em vista aprofundar a reflexão
sobre a promessa “salvacionista” de uma educação de “sucesso” para o cená-
rio brasileiro e as decorrências nos processos democráticos.
Parto da tese de que a parceria pública privada na educação brasileira
representa o que Bertold Brecht cita, conforme epígrafe acima: “privatizar o
conhecimento, a sabedoria, o pensamento, que só à humanidade pertence”. É
a educação a serviço da produção de mãos inteligentes para servir ao mercado
de trabalho, à empresa capitalista (COMERLATTO, 2013).

Algumas questões sobre a educação


no contexto da crise da sociedade capitalista
Durante a transição do século XX para o século XXI, vivenciamos no
Brasil, a expansão de uma crise global, dos países capitalistas, que é identifica-
da, abordada e explicada de diferentes formas, dependendo da particularidade
de cada um, e também do referencial teórico.
De qualquer forma, destacam-se duas grandes vertentes, uma que afir-
ma que a crise é do Estado, por que entre outras “justificativas”, gastou muito
com as políticas públicas sociais. E a outra afirma que a crise é do sistema
capitalista, que no processo histórico precisa se redesenhar, criar novas estra-
tégias, para “renascer” mais forte, desencadeando mais lucro a uma minoria
da humanidade.3
Parto da premissa que a crise é do sistema capitalista. E que a educação
no Brasil sofre alterações importantes em termos teóricos metodológicos, en-
quanto sofre as consequências e é parte constitutiva dessa crise. Nesse contex-
to, destaco um movimento contraditório, na concepção da gestão educacio-
nal, através do texto da Constituição Federal de 1988, que, por um lado, con-
sagrou a gestão democrática, mas, por outro, seguiu os interesses relacionados
à educação privada, atendendo às pressões dos setores confessionais (OLI-
VEIRA; FONSECA, 2005, p. 156-157) e empresariais. Todavia, através do
Plano Diretor de Reforma do Aparelho do Estado (PDRAE) e da Emenda
Constitucional n. 19, de junho de 1998, foi legitimada a lógica do mercado na
gestão educacional, significando a diminuição da máquina pública e afirmando
a racionalidade administrativa, como meio de superar as dificuldades sociais.

3
Para aprofundamento sobre a crise do sistema capitalista, ver COMERLATTO (2013).

160
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

O capital, mediante as relações de poder, impõe suas diretrizes e sua


lógica ao Estado e, mediante ele, às relações sociais e à educação. A sociedade
capitalista só consegue sobreviver às suas próprias contradições devido aos
processos alienantes e mistificados de dominação. E, nesse sentindo, o con-
texto educacional é alvo do capital, tanto como mercado a ser explorado, como
forma de dominação ideológica. Isso por que a educação, conforme Paulo
Freire, não muda o mundo, mas muda as pessoas, e as pessoas mudam o mun-
do. Ou seja, a educação escolar, enquanto formadora de opinião, de sujeito
histórico social, se fortalece e se torna um campo mais atrativo aos olhos da
empresa capitalista, que a compreende também como formadora de mão de
obra e de “adestramento” político social. O que, de certa forma, “explica” a
“fúria” da classe capitalista e alienados, erguendo bandeiras em nível nacional
e internacional, em prol da “Escola Sem Partido”4. Isso como se a escola pu-
desse deixar de lado a sua principal função político-social, que é a de contri-
buir no processo de formação do sujeito histórico na integralidade, tendo em
vista o viver bem no coletivo, com o coletivo e para o coletivo, a emancipação
cidadã.
Contraditoriamente, identificamos na educação brasileira dois grandes
movimentos políticos: um de iniciativa de alguns intelectuais orgânicos e dos
movimentos sociais em prol de uma educação democrática, emancipatória,
outro de iniciativa liberal empresarial, pautada nos pressupostos teóricos me-
todológicos da empresa capitalista a serviço de uma educação tecnicista, “apo-
lítica”, tendo em vista a formação do sujeito moldado para o mercado.
Uma das estratégias de inserção da classe dos capitalistas no campo da
educação é a do discurso, principalmente midiático, sobre a precarização da
escola pública, tanto em nível de infraestrutura, quanto em macroestrutura.
Esse discurso é oportunista, pois, no Brasil, de fato estamos vivenciando um
longo período de dificuldades no campo da educação pública: falta de profes-
sores e funcionários, baixos salários dos trabalhadores da educação, atrasos e
ou parcelamentos dos salários, fechamento de escolas, principalmente do cam-
po. No entanto, compreendo que esse cenário, não pode ser entendido apenas
como decorrente de uma “má gestão”, como o senso comum e/ou a classe dos
capitalistas, afirmam. Segundo minha compreensão, essa precarização deve
ser analisada num contexto de relação entre o político e o econômico.
As parcerias público-privadas e/ou o mercado têm se ocupado em afir-
mar que possuem a receita para a aprendizagem para o sucesso escolar, como
um serviço prestado a clientes. De acordo com Comerlatto (2013), o IAS é um

4
Veja: <https://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/165963/001046625.pdf ?sequence=1
para aprofundar esse debate, ver (LIMA, 2017).

161
COMERLATTO, L. P. • A relação público-privada: a promessa “salvacionista”
do Instituto Airton Senna (IAS) para a educação brasileira

exemplo dessa promessa salvacionista da educação. Nesse sentindo, Lima


(2012, p. 33) afirma que “[...]a ideia de escolha das oportunidades de aprendi-
zagem passou a ser central, fruto de estratégias e racionalidades individuais,
típicas de clientes e de consumidores de uma ‘indústria de prestação de servi-
ços’”. Dessa forma, a aprendizagem enquanto mercadoria aparece como mais
um produto no mercado que os clientes podem consumir. E, enquanto produ-
to, a propaganda aparece. A exemplo disso, o Instituto Airton Senna.

O Instituto Airton Senna


O IAS foi criado em 1994, após a morte do piloto Airton Senna, por
Viviane Sena. Ele se autodenomina como uma entidade do “terceiro setor” e
se intitula como uma Organização Não Governamental brasileira (ONG), sem
fins lucrativos. Segundo Pires (2009, p.78)
O Instituto Ayrton Senna (IAS) está revestido sob a forma de uma Organi-
zação Não Governamental (ONG). A expressão ONG, juridicamente, não
existe, ou seja, não existe uma legislação específica que trate desse assunto,
sendo que, segundo a ABONG – Associação Brasileira de Organizações
Não Governamentais, – em âmbito mundial, a expressão ONG surgiu pela
primeira vez na Organização das Nações Unidas (ONU) após a Segunda
Guerra Mundial, para designar organizações supranacionais e internacio-
nais que não foram estabelecidas por acordos governamentais.

Desde a sua criação até os dias atuais, o IAS é presidido por Viviane
Senna, irmã de Airton Senna. E conta com um conselho consultivo no mo-
mento da tomada de decisões. Além desse conselho, o IAS apresenta parcerias
com diversas empresas, atuantes em várias áreas e de variados portes, enquan-
to apoiadoras estratégicas e conselheiras em potencial: bancos, telemarketing,
telefonias, fábricas de cosméticos e etc., tais como Itaú, Itaucard, P&G, Alli-
anz, Coelba, Cosern, Celpe, Neoenergia, Droga Raia, Editora MOL, Funda-
ção Volkswagem, Suzano papel e celulose, Instituto Natura.
A participação desses sujeitos está de acordo com a crescente perspecti-
va da inserção do privado no público e a redefinição do público pelo privado.
Ou seja, a ideia de que a escola deve assumir os padrões de produtividade da
empresa e/ou do mercado, primando pelos resultados medidos mercadologi-
camente. Nesse sentindo, justificam a formação do conselho consultivo por
empresários e não por educadores e/ou intelectuais orgânicos e a “certeza”
por parte do IAS da importância do “saber” dos empresariados e/ou do mer-
cado, na gestão da educação.
Claudio de Moura e Castro, em um artigo publicado na Revista Educa-
ção em Cena (2007, p. 31), afirma que:

162
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Estima-se que, no Brasil, a iniciativa privada movimente, por ano, pelo me-
nos 4,7 bilhões de reais na área social. E mais da metade vai para a Educa-
ção. A fragilidade crônica da nossa Educação criou espaço para as iniciati-
vas das empresas e de outras organizações não governamentais. E por boas
razões, pois, já que o Estado é frágil nesse setor, não adianta lamentar passi-
vamente a sua inação ou incompetência. É agir com mais força e aprender a
agir com mais eficácia. Assim, temos assistido a uma evolução nos estilos
de participação empresarial no ensino, já que os empresários não encontra-
ram modelos que ensinem o que fazer diante de uma Educação pública ca-
tastrófica.

De acordo com o autor acima, a participação do empresariado na edu-


cação refere-se principalmente ao investimento de recursos para suprir as “de-
ficiências” do Estado na educação. No entanto, essa inserção remete a uma
nova configuração no conteúdo e na forma de conceber a gestão do educacio-
nal, escolar e de sala de aula. Esta configuração incorpora modelos replicáveis
e uma política educacional heterônoma. De acordo com Viviane Senna, o mé-
todo de ensino não é o que mais importa. E, sim, a gestão e o gerenciamento
do processo de aprendizagem e de ensino, contemplando duas frentes: fazer e
influir. De acordo com informações presentes no site do IAS5.
No campo do fazer, o IAS afirma que:
[...] passamos a estabelecer parcerias com secretarias estaduais e municipais
de ensino para produzir conhecimentos, formar educadores e pilotar so-
luções educacionais escaláveis que pudessem inspirar práticas e políticas
de educação qualquer região do País. Funcionando como uma espécie de
“laboratório” para desenvolvimento e disseminação de inovações educacio-
nais, nossas soluções passaram a beneficiar até 2 milhões de crianças e jo-
vens anualmente, em praticamente todos os estados do Brasil.6

Já no campo do Influir,
[...] trabalhamos para advogar pela causa da educação, mobilizando as pes-
soas para agir em prol dela e promovendo sua capacitação para que pudes-
sem dar seu melhor. Como educação é uma causa de todos, passamos a
conduzir ações de advocacy, mobilização e capacitação não apenas para
educadores e gestores educacionais, mas também para jornalistas, em-
presários, promotores de justiça e uma série de outros atores sociais que
também podem e devem contribuir com a causa dentro dos seus campos
de atuação.7

Para o IAS essas duas frentes “fazer e influir” são iniciativas e soluções
para o sucesso escolar, executadas pelas mãos do professor, mas elaboradas

5
Disponível em: <http://institutoayrtonsenna.org.br/pt-br/Atuacao.html>. Acesso em: fev. 2018.
6
Disponível em: <http://www.institutoayrtonsenna.org.br/pt-br/instituto.html#historia>. Aces-
so em: fev. 2018.
7
Disponível em: <http://www.institutoayrtonsenna.org.br/pt-br/instituto.html#historia>. Aces-
so em: fev. 2018.

163
COMERLATTO, L. P. • A relação público-privada: a promessa “salvacionista”
do Instituto Airton Senna (IAS) para a educação brasileira

pela “cabeça pensante” do instituto, em diálogo com outros sujeitos sociais


que atuam em diferentes setores da sociedade, adotando o modelo de gestão
organizado de forma hierárquica. À gestão do IAS compete pensar, elaborar,
definir os programas educacionais; à gestão da rede de ensino cabe organizar a
publicização dos programas para a efetiva execução das ações e metas, estabe-
lecidas pela gestão do IAS. E à gestão da escola incumbe a responsabilidade
em pensar a forma de otimizar o tempo para a execução das ações e metas da
Rede de Ensino, estabelecida pelo IAS.
A metodologia utilizada pelo Instituto para as diferentes gestões acima
citadas ocorre através de um processo de capacitação, que promete ensinar ao
professor a fórmula do sucesso, da garantia da aprendizagem, dos melhores
resultados, ignorando a totalidade em que a educação com qualidade social se
materializa. Conforme, Viviane Senna (2009):8
Salário e falta de infraestrutura não podem ser usados como impedimentos
à qualidade da Educação. A remuneração do professor, assim como as
condições que ele tem para trabalhar, é essencial. Essa bandeira tem de ser
defendida, sim, mas ensinar com qualidade precisa acontecer paralelamen-
te. Nossa experiência mostra claramente que esses obstáculos não são de-
terminantes na melhoria do ensino. Se isso fosse verdade, estaríamos con-
denando a maior parte da população ao fracasso educacional, já que a
maioria das crianças e dos jovens vive em condições socioeconômicas
desfavoráveis.

De acordo com Viviane Senna, as condições econômicas não podem


implicar na “qualidade” do ensino. Contudo, é importante atentar que no do-
cumento denominado Instrumento Particular de Parceria9, onde constam os ob-
jetivos e as metas da rede, as responsabilidades da prefeitura e do IAS, todas as
considerações são definidas pelo contratante e impostas ao contratado, como
exigência de adesão à parceria. E para além disso, conforme (COMERLAT-
TO, 2013, p. 152), “todas as obrigações de cunho econômico, presentes no
documento, são de responsabilidade do contratante e não do contratado”.
A promessa salvacionista para os problemas educacionais, de melhorias
de qualidade e de resultados, é a grande bandeira do IAS, que, segundo infor-
mações do site10, em 2015, divulgou possuir mais de oitenta empresas parcei-
ras, dois mil e oitocentos doadores ativos; atuando em dezessete estados, mais
seiscentos e sessenta municípios, atingindo mais de setenta mil profissionais
por ano e um milhão e novecentos mil alunos, contabilizando mais de

8
Disponível em: <http://institutoayrtonsenna.org.br/pt-br.html>. Acesso em: fev. 2018.
9
O conteúdo apresentado foi extraído do Instrumento particular de parceria do IAS com a Rede
Municipal de Joinville. Ver (COMERLATTO, 2013).
10
Disponível em: <http://institutoayrtonsenna.org.br/pt-br.html>. Acesso em: fev. 2018.

164
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

34.902.311,00 (trinta e quatro milhões, novecentos e dois mil e trezentos e


onze reais, investidos em 2015.
Essa abrangência do IAS, na educação brasileira, se dá através dos seus
programas, os quais ele denomina como soluções educacionais, perpassando
a gestão pública, gestão escolar e gestão de sala de aula em todos os níveis e
modalidades de ensino, conforme quadro abaixo.

Quadro I: Programas do IAS

Ensino Fundamental Ensino Fundamental Ensino Médio


Anos Iniciais Anos Finais
Gestão da política de Gestão da política de
alfabetização alfabetização
Letramento em programação Letramento em programação
Acelera Brasil Acelera Brasil
Se liga Se liga
Rede nacional de ciência Rede nacional de ciência Rede nacional de ciência
para educação para educação para educação
Gestores de rede Gestores de rede Gestores de rede
Educação pelo esporte Educação pelo esporte Educação pelo esporte
Gestão nota 10 Gestão nota 10 Gestão nota 10
Superação Jovem Superação Jovem
Fórmula da vitória Educação Integral para o
Ensino Médio (SC)
Educação Integral para
o Ensino Médio (RJ)

Fonte: Elaborado por Comerlatto (2018), baseado no site do IAS.11

Para o IAS, o programa Gestão Nota 10 é o grande precursor de estabe-


lecimento de metas e ações de qualidade, tanto para as secretarias de educação
quanto para os gestores educacionais, devido ao seu caráter gerencial e proce-
dimentos administrativos. Para ele, a qualidade da educação pública passa por
um processo de hierarquização, devidamente apontado e garantido pelas ges-
tões envolvidas. Esses processos se referem aos resultados de eficácia e eficiên-
cia na implementação dos seus programas, fruto da sua visão particular de
educação e ensino, que prima pelo produto final.

11
Disponível em: <http://institutoayrtonsenna.org.br/pt-br/Atuacao.html>. Acesso em: mar. 2018.

165
COMERLATTO, L. P. • A relação público-privada: a promessa “salvacionista”
do Instituto Airton Senna (IAS) para a educação brasileira

A afirmação do IAS do papel da gestão na promoção de um “ensino de


qualidade” através de um processo de identificação dos problemas, requer a
aceitação de uma proposta heterônoma de educação, na “promoção de solu-
ções de superação”, sem considerar todas as instâncias das gestões envolvidas.
Pois, conforme já falamos acima, a gestão do IAS faz o diagnóstico dos proble-
mas e define as soluções. Ou seja, a gestão do IAS pensa, elabora e decide o
que é importante para o “sucesso escolar”; posteriormente repassa para a ges-
tão da rede, que tem a tarefa de administrar as estratégias de controle e padro-
nização da execução dos programas e encaminha para a escola, que tem, por
sua vez, o papel de pensar a melhor forma de otimizar o tempo e se organizar
para atingir as metas e ações definidas pelo IAS, através de um processo de
amestramento, contraditório com a gestão democrática da educação.
De acordo com Lima (2012, p. 29), a educação, enquanto direito huma-
no, comporta limites normativos, éticos-políticos e morais, que são incompa-
tíveis com os fenômenos de amestramento, endoutrinamento ou condiciona-
mento dos seres humanos. Logo, o slogan utilizado pela gestão gerencialista da
educação do IAS, de “solucionar” os problemas da educação pública, de ser o
salvador, é de acordo com Freire (1997), “típico da educação como prática de
domesticação”.
Ao falar da “fascinação da administração escolar pela empresa”, Laval
(2004), expõe, através do exemplo francês, na mesma perspectiva de Lima e de
Freire, a crítica ao caráter mítico, o discurso de “encantamento” e de “evange-
lização” proferido pelas empresas que insistem em se colocar como donas da
“verdade”, com o poder de “salvação”, diante dos problemas enfrentados pela
educação pública, cujo diagnóstico já é pré-definido como de ineficiência e
ineficácia de gestão, por parte do Estado.
O caráter mítico da gestão gerencialista, fortalece a relação de subordi-
nação das redes em relação ao IAS, devido à ausência do caráter científico e
argumentativo. Ou seja, o poder público contrata e financia os serviços, mas
quem estabelece, “põe” as condições e as regras é o Instituto.

166
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Quadro 2: Responsabilidades dos gestores no programa Gestão Nota 10

Governador/ • Adotar o programa como política pública, isto é, como proposta de estrutura-
Prefeito ção da Secretaria de Educação para a prática da equidade e da qualidade da
aprendizagem, no estado ou no município.
• Garantir a adoção dos instrumentos legais necessários à implantação da po-
lítica educacional definida.
• Assegurar os recursos humanos, materiais e financeiros compatíveis com o
programa e com a política educacional estabelecida.
• Priorizar os aspectos técnicos em detrimento dos político-partidários.
• Acompanhar os resultados e o cumprimento das metas definidas pela Secre-
taria de Educação.
• Delegar ao Secretário de Educação a execução do programa, dando-lhe a
autonomia e o apoio que a função exige.
Secretário de • Alinhar-se com as determinações do governo/prefeito e assegurar o progra-
educação ma Gestão Nota 10 como ação estrutural da Secretaria de Educação.
• Diagnosticar/conhecer o perfil de atendimento da rede de ensino e dos alu-
nos.
• Integrar as redes de ensino.
• Garantir diretores de escola com competência técnica, selecionados por pro-
vas, comprometidos com a política da Secretaria de Educação e responsabiliza-
dos pelos resultados e alcance das metas.
• Integrar ações, resultados e práticas dos projetos às demais ações da secreta-
ria.
• Garantir o cumprimento do mínimo legal de 200 dias letivos/800 horas.
• Adotar EJA para os maiores de 15 anos.
• Adotar política de alfabetização para a 1ª série do Ensino Fundamental.
• Acompanhar o desenvolvimento e os resultados do programa.
Coordenador • Analisar a implementação da política educacional.
do programa Subsidiar as decisões da Secretaria de Educação com os dados relevantes à
Gestão Nota política educacional.
• Atuar ativamente no processo de definição das metas relativas a cada indica-
dor do sucesso educacional.
• Receber e analisar o consolidado dos dados referentes ao funcionamento e à
autonomia de todas as escolas.
• Gerenciar mensalmente o alcance das metas pelas escolas.
• Acompanhar o desenvolvimento das ações e analisar os dados consolidados
do programa, de forma integrada e articulada com os demais setores/coorde-
nações da Secretaria de Educação.
• Apoiar, fortalecer e orientar em serviço os superintendentes escolares para o
alcance das metas do seu grupo de escolas, com base nas informações por eles
levantadas e também na observação direta sobre as escolas.
• Rever sistematicamente a aplicabilidade das normas e leis educacionais, com
vistas à melhoria contínua dos resultados e ao alcance das metas.
Diretor • Garantir a implementação da política educacional definida pela Secretaria
de Educação.
• Implementar as autonomias administrativa e pedagógica, e a gestão financei-
ra na escola, de acordo com o estabelecimento pela Secretaria de Educação.
• Responsabilizar-se pelos resultados da escola.
• Coletar, analisar e consolidar os dados referentes ao funcionamento da es-
cola e repassá-los ao superintendente escolar.

167
COMERLATTO, L. P. • A relação público-privada: a promessa “salvacionista”
do Instituto Airton Senna (IAS) para a educação brasileira

• Acompanhar e avaliar a atuação e o resultado do trabalho do coordenador


pedagógico da escola e dos professores.
• Liderar os membros da comunidade escolar no alcance das metas da escola
• Trabalhar em conjunto com o superintendente escolar na constante busca da
melhoria da qualidade da aprendizagem.
Superintendente • Acompanhar a implementação da política educacional municipal/estadual.
• Ser o elo entre a escola e a Secretaria de Educação no processo de implemen-
tação das ações do programa.
• Acompanhar, nas escolas sob sua responsabilidade, a implementação das au-
tonomias administrativa e pedagógica, e da gestão financeira.
• Pactuar com o diretor, no início do ano, as metas da escola, de acordo com as
metas definidas pela Secretaria de Educação para a rede de ensino.·
Responsabilizar-se, conjuntamente com o diretor, pelo cumprimento do ca-
lendário escolar, pelos resultados e pelo alcance das metas da escola.
• Apoiar o diretor na integração e articulação dos projetos desenvolvidos na
unidade escolar, tais como: Se Liga, Acelera Brasil, Circuito Campeão e Ges-
tão Nota 10.
• Gerenciar mensalmente o alcance das metas do grupo de escolas sob sua
responsabilidade, por meio das rotinas da Sistemática de Acompanhamento.
• Avaliar o desempenho e fortalecer a liderança do diretor, assim como capaci-
tá-lo em serviço para atuar de forma integrada com a comunidade escolar.

Fonte: Comerlatto (2013).

Nesse sentindo, conforme quadro acima, a subordinação desencadeia


uma sobreposição de valores, pois o município parceiro se volta mais à cor-
respondência das exigências dos programas, do que ao pensar criticamente
uma educação com qualidade, compatível com a realidade universal e parti-
cular, em que a sua comunidade está inserida. Para Lima (2012, p. 43) a
subordinação:
Tem sido justificada a partir de um novo tipo de pedagogismo, de extração
econômica e gerencial, baseada nas vantagens de uma aprendizagem adap-
tativa e funcional a que, em muitos casos, nos poderemos ver normativa-
mente forçados a recusar o epíteto de educativa.

Lima expõe a contradição da educação sob a lógica de subordinação,


que, no caso do IAS, é condição primordial para promessa da “melhoria da
qualidade”, sob sua concepção, a qual aparece como sinônimo de melhoria de
resultados. Outro exemplo disso é a prescrição sobre os Deveres do diretor esco-
lar, extraído do manual referência de gestão do IAS, Gerenciando uma escola
eficaz12. Nele estão definidas as ações diárias, semanais, mensais, bimestrais,
semestrais e anuais, impostas de forma heterônoma ao diretor.

12
Disponível em: <https://xa.yimg.com/kq/groups/.../name/gerenciando_a_escola_eficaz
_001_050.pdf>. Acesso em: mar. 2018.

168
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Algumas considerações
Segundo o meu entendimento, conforme Lima (2012, p. 33), a substi-
tuição das categorias educacionais qualitativas por categorias quantificadoras
desencadeia a padronização do conhecimento, da aprendizagem, “como se
todos os ‘ambientes de aprendizagem’, e de vida, fossem iguais e não influen-
ciados por relações de poder, de classe e de gênero”. Em vez disso, dever-se-ia
reconstruir os significados das categorias, desde o seu contexto histórico so-
cial, político, econômico e cultural.
Contudo, independente das consequências dessa lógica de gestão edu-
cacional, que se centra na garantia dos resultados, abstraindo dos processos
dos sujeitos, verificamos a crescente adesão do poder público aos programas
que seguem essa perspectiva. Essa aderência nacional sinaliza um “monopó-
lio” ideológico na educação brasileira, sob a lógica público/privado, monopó-
lio pautado nos ditames da classe dos capitalistas.
Nesse contexto, conforme já destaquei na minha tese (COMERLAT-
TO, 2013), a forma de gerir do instituto é alicerçada na centralização, abstra-
ção e tecnicismo. Por meio da sua proposta organizacional heterônoma, estra-
tégica e gerencialista, abstrai das condições histórico-sociais dos sujeitos da
educação, desconsiderando a sua forma de viver, representar, pensar, criar,
criticar e transformar, reduzindo-os a sujeitos executores de tarefas, replicado-
res de propostas heterônomas, impondo-lhes um processo de coisificação das
relações humanas.
Entendo que o caráter mítico salvacionista do IAS é a sua maior estraté-
gia de sucesso para a efetivação daquilo que Lima chama de adestramento e
doutrinamento do sujeito. Ou seja, o IAS está em posse dos discursos que
afirmam que a educação pública brasileira está decadente, em crise e que o
problema é a gestão pública, por estar desvinculada da “boa qualidade”, me-
dida por resultados quantificados e metas, à base de indicadores mercadológi-
cos. E, ao mesmo tempo, promove nos seus parceiros, a ideia da existência de
uma receita de sucesso, a do IAS, ofertada como um serviço a clientes, frente
aos desafios que fazem parte da educação pública brasileira.
O IAS afirma que a educação de boa qualidade acontece independente-
mente das questões econômicas salariais. Para o instituto, qualquer escola,
mesmo as mais pobres e com as piores infraestruturas, podem se tornar efica-
zes. No entanto, no Instrumento Particular de Parceria, o instituto se resguar-
da de toda e qualquer obrigação econômica, relacionada aos recursos huma-
nos, materiais e financeiros, impondo essas obrigações à rede parceira, como
condição de possibilidade para efetivar a parceria. Assim, as exigências con-
tratuais do IAS para com as redes de ensino contratante estão em contradição
com os fundamentos teóricos da sua proposta educacional.

169
COMERLATTO, L. P. • A relação público-privada: a promessa “salvacionista”
do Instituto Airton Senna (IAS) para a educação brasileira

Compreendo que a inserção das parcerias público-privadas no campo


da educação é um meio que a classe dos capitalistas encontrou para privatizar
a capacidade de conhecimento, sabedoria, pensamento da classe trabalhado-
ra, a fim de educá-los para serem “mãos inteligentes”, visando à produção de
bens e ao consumo, desencadeando assim, o esvaziamento da autonomia, da
participação e da democracia, tão importantes na constituição do sujeito his-
tórico social/coletivo e emancipatório.

Referências
COMERLATTO, Luciani Paz. A gestão da educação no contexto da sociedade capitalista: a
parceria público privada. Tese (Doutorado em Educação) – Programa de Pós-Graduação
em Educação, Faculdade de Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
Porto Alegre, 2013.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. Paz e Terra, 1997.
LAVAL, Christian. A escola não é uma empresa: o neo-liberalismo em ataque ao ensino
público. Londrina: Editora Planta, 2004.
LIMA, Licinio. Aprender para ganhar, conhecer para competir: sobre a subordinação da
educação na sociedade da aprendizagem. São Paulo: Cortez, 2012.
LIMA, Paula Valim. Escola sem sentido: Implicações do Escola sem Partido para a de-
mocratização da educação pública. Graduação em Educação, Faculdade de Educa-
ção, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2017.
OLIVEIRA, João Ferreira de; FONSECA, Marília. A educação em tempos de mu-
dança: reforma do Estado e educação gerenciada. Impulso, Piracicaba, v. 16, p. 55-68,
2005.
PIRES, Daniela de Oliveira. A configuração jurídica e normativa da relação público-privada
no Brasil na promoção do direito à educação. Dissertação (Mestrado em Educação) – Pro-
grama de Pós-Graduação em Educação, Faculdade de Educação, Universidade Fede-
ral do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2009.
SENNA, Viviane. Responsabilidade de todos. Educação em Cena, v. 1, n. 1, p. 5, jul.
2007. Disponível em: <http://senna.globo.com/institutoayrtonsenna/quem_somos/
publicacoes/educacao_em_cena/EducacaoEmCena_Julho_07.pdf>. Acesso em: 15
maio 2009.

170
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

O público e o privado na
educação profissional brasileira:
o caso do Pronatec

Romir de Oliveira Rodrigues

Nestes primeiros anos do século XXI, a Educação Profissional e Tecno-


lógica (EPT) brasileira tem se caracterizado por um conjunto de projetos e
programas marcados pela dialética conservação-mudança que dialogam com
os requerimentos do modelo de desenvolvimento em curso. Estabeleceu-se,
assim, uma agenda para a educação brasileira, na qual o debate sobre a quali-
ficação para o trabalho, em todos os seus níveis e modalidades, assumiu uma
posição central e tornou-se um campo de disputa entre os vários sujeitos, pú-
blicos e privados, envolvidos com essa modalidade de ensino.
Neste cenário, o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e
Emprego – Pronatec, criado pelo governo brasileiro por meio da Lei 12.513,
em 26 de dezembro de 2011, articulava um conjunto de ações que visavam,
prioritariamente, ampliar a oferta de vagas na EPT brasileira. Com a proposta
inicial de atender oito milhões de beneficiados e investimento superior a 14
bilhões, referente ao período 2011-2014, o programa ocupou o centro do deba-
te sobre a Educação Profissional e se estruturava por meio de parcerias entre
agentes públicos e privados para o atendimento de suas metas.
Ao localizar o Pronatec em uma fronteira relacional entre os setores
público e privado, este texto tem como objetivo analisar o papel hegemônico
desempenhado pelos Sistemas Nacionais de Ensino – Sistema S – nas diferen-
tes fases da implantação desta política pública, em especial na execução, e os
limites originados por este protagonismo no atendimento das classes popula-
res e no alcance do programa.
Sistematizando a apresentação realizada durante o I Seminário Nacio-
nal “Redefinições das fronteiras entre o Público e o Privado”, promovido pela
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre, em dezembro
de 2017, este texto está estruturado em três seções que buscam focalizar aspec-
tos específicos apesar de estarem efetivamente articuladas. A primeira seção
apresenta os principais elementos que caracterizam a trajetória da Educação
Profissional brasileira, objetivando contextualizar o Pronatec neste processo.
Partindo da caracterização do programa como uma política na fronteira entre

171
RODRIGUES, R. de O. • O público e o privado na educação profissional brasileira: o caso do Pronatec

os setores público e privado, a segunda seção analisa a centralidade que o Sis-


tema S assumiu na elaboração e execução do programa. A terceira seção apre-
senta algumas considerações sobre o alcance do Pronatec enquanto uma polí-
tica pública de formação profissional em um cenário marcado pelo aprofun-
damento do projeto de desenvolvimento dependente e associado que caracte-
riza a economia brasileira.
É importante salientar que este artigo possui uma dupla vinculação:
apresenta parte dos resultados da pesquisa que originou a tese “No caminho
do curupira: o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego –
Pronatec – e as relações público-privadas”, defendida junto ao Programa de
Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul
– UFRGS; e sistematiza um conjunto de discussões desenvolvidas junto aos
grupos de pesquisa “Parcerias entre sistemas públicos e instituições do tercei-
ro setor: Brasil, Argentina Portugal e Inglaterra e as implicações para a demo-
cratização da educação”, no período de 2011 a 2014, e “Implicações da rela-
ção público-privada para a democratização da educação”, com início em 2014
e ainda ativo, ambos coordenados pela Professora Doutora Vera Maria Vidal
Peroni, da UFRGS.

Elementos de contextualização da Educação Profissional brasileira


Em certa medida, a trajetória da Educação Profissional do Brasil se con-
funde com a formação da própria classe trabalhadora operária brasileira, em
especial a partir do predomínio do capitalismo de base industrial e urbana ao
longo do século XX. Esse processo historicamente recente, marcado por con-
tradições, representou a superação do padrão econômico colonial, baseado
exclusivamente na produção de bens primários – com destaque inicial para a
produção açucareira e, posteriormente, a do café – com o uso intensivo de
mão de obra escrava africana e indígena, em grandes latifúndios e voltada para
atender as demandas do mercado externo.
Tendo permanecido praticamente intocada até a instalação da República,
essa matriz econômica colonial teve um impacto determinante sobre a forma
como a educação e a qualificação profissional se desenvolveram no Brasil. Nes-
se sentido, destaca-se o fato de que, por muito tempo, o trabalho, especialmente
o que demandava esforço físico e o uso das mãos, esteve vinculado a atividades
desenvolvidas pelos escravos, originando um “preconceito contra o trabalho
manual, inclusive e principalmente daqueles que estavam socialmente mais pró-
ximos dos escravos: mestiços e brancos pobres” (CUNHA, 2005, p. 16).
Nesse sentido, com o fim do regime escravocrata no Brasil, ocorre a
transformação do escravo em trabalhador assalariado visando atender às ne-

172
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

cessidades das novas relações de trabalho que caracterizavam o modelo parti-


cular do sistema do capital em implantação e, para isto, era preciso reposicio-
nar o trabalho como central à sociedade e impregnado de valores positivos.
Essa intencionalidade era obtida, entre outros processos, pela caracterização
da vadiagem como crime e a constituição das classes pobres como sinônimo
de classes perigosas (CHALHOUB, 2001) e com a introdução da educação
profissional como forma de resolver a questão social (CUNHA, 2000). Por-
tanto, a vinculação entre a formação profissional e o atendimento das classes
mais pobres acaba por ocupar uma posição central na organização da educa-
ção brasileira.
Em sua evolução, esta relação acaba por conformar caminhos formati-
vos próprios para cada classe social, estabelecendo uma dualidade estrutural
que visava adequar o sistema educativo aos novos requisitos surgidos na estei-
ra das transformações do modelo de organização produtiva em instauração.
Marcado por uma clara divisão social e técnica do trabalho, este modelo aca-
bava por demandar processos de educação distintos para os dirigentes e para
os trabalhadores (KUENZER; GRABOWSKI, 2006).
Esse dualismo estrutural é identificado por Otaíza de Oliveira Romane-
lli (2005) como central para a compreensão da geração de um sistema “parale-
lo” de ensino profissionalizante, especialmente caracterizado pela criação dos
Sistemas Nacionais de Aprendizagem – o Sistema S – que ofertavam cursos de
menor duração e com estreito vínculo aos requerimentos das empresas. Na
direção oposta, o sistema oficial de ensino secundário caracterizava-se por ofe-
recer, predominantemente, cursos de caráter propedêutico, mesmo quando
revestido de um viés de educação profissional.
Central nesse movimento de estruturação de um sistema paralelo de
ensino voltado para a educação profissional foi a criação, em 1931, do Institu-
to de Organização e Racionalização do Trabalho – IDORT, que se tornou o
principal centro irradiador da doutrina taylorista como caminho seguro para a
prosperidade do país. Visando convencer não apenas os trabalhadores, mas
também a parcela do setor industrial ainda atrelada a práticas consideradas
ultrapassadas, os ideólogos do IDORT propunham uma educação voltada para
“ampliar o consumo racional da mão de obra e aumentar, quantitativamente e
qualitativamente, a produção, diminuindo o desgaste natural das máquinas
e extraindo do sobre-trabalho uma margem maior de lucro” (SOUZA, 2013,
p. 134-135). Toma relevo o fato de que dirigentes do IDORT, como Roberto
Simonsen e Roberto Mange, terem integrado diversas comissões técnicas cria-
das pelo governo Vargas para apresentar propostas para a qualificação dos
trabalhadores e, com isso, fortalecer o projeto de desenvolvimento varguista
(MÜLLER, 2013).

173
RODRIGUES, R. de O. • O público e o privado na educação profissional brasileira: o caso do Pronatec

Desta mescla entre a ingerência dos industrialistas com a intencionali-


dade do governo, ocorre, na década de 1940, o início da criação do Sistema S1
com a fundação do SENAI, em 1942, do SESI, em 1946, e do SENAC e SESC,
em 1946, com o objetivo de dar sustentabilidade para as políticas de desenvol-
vimento implantadas pelo governo Vargas, em especial, a necessidade de ga-
rantir mão de obra para a expansão industrial. Segundo Silvia Maria Manfredi
(2002, p. 182), a estruturação do SENAI e do SESI está inserida na estratégia
utilizada pelos industriais paulistas para doutrinar os trabalhadores e promover
uma paz social alicerçada “nas premissas de colaboração entre capital e traba-
lho e na representação de que o desenvolvimento industrial conveniente aos
empresários também interessava aos trabalhadores e a todos os brasileiros”.
Ao longo de sua trajetória, o SENAI – podendo ser extrapolado para as
outras instituições do Sistema S – consolidou uma posição hegemônica como
padrão para o fornecimento de profissionalização e qualificação para a força
de trabalho brasileira. Esta hegemonia está assentada, entre outros fatores: (i)
na integração entre os diferentes Governos e a CNI2, cujos representantes inte-
graram de forma permanente os órgãos de planejamento e assessoramento
para as políticas industriais (MÜLLER, 2013); e (ii) na aceitação dos empre-
sários – posteriormente ampliada para os demais setores da sociedade – de
que o modelo de ensino aplicado pelo SENAI era carregado de atributos que
remetiam o Brasil para outro patamar civilizatório (SOUZA, 2013).
Ao longo de sua existência, o Sistema S passou por várias alterações e
adequações, desdobrando-se em outras entidades para acompanhar as mudan-
ças das conjunturas históricas e do seu próprio desenvolvimento como organi-
zação social (MANFREDI, 2002; CUNHA, 2005). Esse sistema chegou aos
dias atuais como “o maior sistema brasileiro de atuação no campo da educa-
ção profissional em seus diversos níveis: qualificação básica, educação técnica
e tecnológica” (GRABOWSKI, 2010, p. 105).
Essa dimensão atual do Sistema S está associada diretamente ao fato de
ocorrer um ingresso fixo e permanente de recursos públicos3, “provenientes
das contribuições compulsórias incidentes sobre a folha de pagamento das
empresas de determinados setores, arrecadadas pelo Instituto Nacional de Segu-

1
O Sistema S é formado atualmente pelas seguintes instituições: Serviço Nacional de Aprendi-
zagem Industrial (SENAI), Serviço Social do Comércio (SESC), Serviço Social da Indústria
(SESI), Serviço Nacional de Aprendizagem do Comércio (SENAC), Serviço Nacional de Apren-
dizagem Rural (SENAR); Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo (SESCO-
OP), Serviço Brasileiro de Apoio a Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE), Serviço Nacional
de Aprendizagem Setor Transporte (SENAT) e Serviço Social de Transporte (SEST).
2
Confederação Nacional da Indústria.
3
Para maior aprofundamento sobre a distribuição dos recursos públicos para o Sistema S, indi-
camos a tese de Gabrowski (2010), em especial o item 2.3.2.

174
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

ridade Social (INSS), órgão do governo federal” (MANFREDI, 2002, p. 193).


Como lembra Grabowski, apesar de ser inegável a competência do trabalho
desenvolvido pelo Sistema S na qualificação profissional e nas áreas sociais,
“muito há de fazer pela educação básica, na educação profissional e na assis-
tência social, enquanto retorno social dos investimentos que tem recebido da
sociedade brasileira” (GRABOWSKI, 2010, p. 109).
Os elementos apresentados nesta seção permitem compreender elemen-
tos históricos que contribuíram para a desvalorização do trabalho manual e
prático em nossa sociedade, consolidados na estrutura dual da educação, em
especial no ciclo secundário e, nesse contexto, a emergência de um sistema
específico para a qualificação profissional – o Sistema S – que passa a hegemo-
nizar vários processos na educação profissional brasileira. Esta retomada ad-
quire maior significado devido ao fato de ter sido este Sistema, em especial o
SENAI e o SENAC, o principal agente de execução do Pronatec.

O Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego –


Pronatec: uma política na fronteira entre o público e o privado
Caracterizar o Pronatec como uma política de fronteira é colocá-lo em
um espaço de disputa e de conflito, é provê-lo de um movimento originado
nas tensões entre campos sociais heterogêneos e dotados de parcelas diferen-
tes de poder e de formas de exercê-lo. Localizar a análise do programa na
fronteira entre as esferas pública e privada significa considerá-lo permeável
aos pressupostos desses campos e, portanto, se constitui como resultado, sem-
pre provisório, da correlação de forças ao longo de sua trajetória.
Este debate, que coloca o par dialético público-privado como chave de
interpretação das alterações na forma de provisão da educação na sociedade
atual, em especial a brasileira, tem sido central no grupo de pesquisa coorde-
nado pela professora doutora Vera Maria Vidal Peroni, na Universidade Fede-
ral do Rio Grande do Sul, (PERONI, 2013; PERONI, 2015). Nas produções
do grupo, como reforça Vera Peroni (2013b, p. 10), é evitado o estabelecimen-
to de contraposições limitadoras entre Estado e sociedade civil que devem ser
referenciados teoricamente como “interesses públicos e privados em uma so-
ciedade de classes que perpassam o Estado e a sociedade civil”. Em diálogo
com Thompson, Peroni (2015b) incorpora a perspectiva do movimento e da
historicidade dos fenômenos sociais e defende que as diferentes combinações
entre o público e o privado estão integradas às mudanças sociais e econômicas
das últimas décadas e se constituem enquanto relação e processo e não como
simples determinação. Neste sentido, a autora esclarece que “tanto o Estado
quanto a sociedade civil são partes constitutivas do movimento de correlação

175
RODRIGUES, R. de O. • O público e o privado na educação profissional brasileira: o caso do Pronatec

de forças de sujeitos situados em um contexto histórico e geográfico, perpassa-


dos por projetos societários distintos” (PERONI, 2015b, p. 15-16).
Ao desdobrar as várias dimensões que estão envolvidas na trajetória de
elaboração e implantação do Pronatec é possível percebê-lo como originário
de uma correlação de forças específica que colocou diferentes sujeitos dos se-
tores público e privado em disputa para dar sentido e direção ao programa.
Este processo estava instalado desde a fase de elevação da formação e qualifi-
cação dos trabalhadores ao patamar de problema nacional e, portanto, de-
mandador de políticas públicas para seu equacionamento e persistiu até a fase
de execução.
Neste sentido, ao avaliar o contexto econômico e social anterior ao Pro-
natec, caracterizou-se pela controvérsia sobre a existência de um “apagão” de
mão de obra como um obstáculo para a manutenção do ciclo positivo que a
economia brasileira experimentava no final da primeira década do século XXI.
Capitaneado pelos setores empresariais, foi colocado o argumento, amplamente
difundido nos meios de comunicação de massa, que um entrave central para a
continuidade do processo de crescimento econômico era a baixa produtivida-
de do trabalhador brasileiro, consequência de uma educação precária e que
não correspondia às necessidades do mercado de trabalho. Evidencia-se, as-
sim, um deslocamento da culpa pelos atrasos no desenvolvimento brasileiro
para os trabalhadores, deixando-se de analisar os limites do próprio modelo
de desenvolvimento carreado pelas classes dominantes.
Em direção contrária, Frigotto e Ciavatta (2011) afirmam que essa ima-
gem da existência de um “apagão de mão de obra” ou de um “apagão educa-
cional” remete a uma situação conjuntural e provisória, que pode ser superada
com ações direcionadas e efetivas. Tal interpretação, porém, deixa opaco o
fato de que as determinações últimas do chamado “apagão” estão vinculadas à
imposição da classe dominante brasileira de “um projeto societário de capitalis-
mo dependente, associando-se de forma subordinada aos centros hegemônicos
do grande capital e dos organismos internacionais, que representam seus inte-
resses” (FRIGOTTO; CIAVATTA, 2011, p. 632). Nesse sentido, as reformas
educacionais que foram implantadas nas últimas décadas no Brasil seguiram o
ideário desse projeto, e nele não está previsto, por exemplo, a universalização do
Ensino Médio ou a formação integral dos trabalhadores. Assim, ao reconhece-
rem a existência de lacunas e defasagens na escolarização das classes trabalha-
doras, os autores concluem que aqueles a proclamar “o apagão educativo, por
sua posição de classe, não percebem que o mesmo é cria ou produto de suas
decisões e políticas” (FRIGOTTO; CIAVATTA, 2011, p. 632-633).
Outros estudos, como os conduzidos por Nascimento (2011), IPEA
(2013) e Nonato et al. (2012), reforçam o questionamento quanto ao cenário

176
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

de “apagão de mão de obra” a partir do trabalho com dados originados em


análises de séries históricas. Estas pesquisas indicam que, com exceções ocor-
ridas em setores produtivos muito específicos, não se configurou no Brasil um
cenário de contingenciamento de mão de obra qualificada no período analisa-
do. Em sentido contrário, foram as ocupações de menor qualificação, associa-
das ao trabalho simples, que mais geraram empregos, com destaque para a
construção civil e o setor de serviços. Dois elementos para serem agregados
nesta análise são: (i) o aumento na escolaridade da população brasileira nas
últimas décadas a ponto de, no final da primeira década dos anos de 2000,
40,4% da população em idade ativa apresentar nível médio e/ou superior; e
(ii) a análise da evolução dos rendimentos por anos de estudo para o mesmo
período demonstrar que os maiores aumentos nos rendimentos médios men-
sais se concentraram nas faixas de menor escolaridade (NONATO et al., 2012;
IPEA, 2013). Em conjunto, estes dados indicam uma tendência que contradiz
a perspectiva da existência de um “apagão de mão de obra” e, no caso brasilei-
ro, relativiza as bases da Teoria do Capital Humano que associa, de forma
direta, aumento da escolaridade com a obtenção de maiores rendimentos.
Apesar da existência desses contrapontos, o discurso da existência de
um “apagão de mão de obra” que demandava um processo acelerado de qua-
lificação dos trabalhadores para aumentar a produtividade e ampliar a compe-
titividade dos produtos brasileiros em um mercado globalizado foi incorpora-
do ao Projeto de Lei do Pronatec. Soma-se a este pressuposto a adoção das
parcerias entre os setores público e privado como estratégia central para a exe-
cução do programa e, com isto, a reafirmação do setor privado, em especial o
Sistema S, como referência e padrão de qualidade para a educação profissio-
nal brasileira Desta forma, os requerimentos específicos deste setor e sua for-
ma de organização e gestão passaram a balizar a execução do programa. A
rápida passagem pelo Congresso Nacional, que durou apenas seis meses, de-
monstra o grau de convergência que acompanhou a tramitação do programa,
motivado, principalmente pela aceitação do cenário de “apagão” de mão de
obra e seus impactos negativos para o crescimento da economia do país e pela
a valorização do setor privado, em especial do Sistema S, considerado o deten-
tor da expertise necessária para desenvolver a formação técnica dos trabalha-
dores em nosso país.
É possível identificar na arquitetura do Pronatec vários marcadores in-
dicando o privilegiamento da oferta privada, em especial do Sistema S. A ava-
liação das iniciativas do programa aponta, para uma condição inicial de equi-
líbrio na oferta, pois duas, “Expansão da Rede Federal” e “Brasil Profissio-
nalizado”, eram voltadas exclusivamente para a rede pública, e duas eram
voltadas diretamente para o setor privado, a “Ampliação da Capacidade do

177
RODRIGUES, R. de O. • O público e o privado na educação profissional brasileira: o caso do Pronatec

Sistema S” e o “Acordo de Gratuidade”. As demais previam a oferta simultâ-


nea por agentes públicos e privados, a “Rede E-Tec Brasil”, o “Fies-Técnico” e
o “Bolsa-Formação”.
Porém, quando se analisa o investimento efetivamente realizado em
quatro das principais iniciativas do Pronatec – Tabela 1 –, o direcionamento
para o setor privado começa a transparecer. Os recursos envolvidos nestas ini-
ciativas atingiram a expressiva quantia de R$ 10,2 bilhões durante o período
de 2011 e 2014, com destaque para o “Bolsa-Formação” que respondeu por
78% do total e foi oferecido majoritariamente pelo setor privado. As iniciati-
vas voltadas prioritariamente para o setor público, “Expansão da Rede Fede-
ral”, “Brasil Profissionalizado” e “Rede E-Tec”, em conjunto, absorveram ape-
nas 22% desses recursos.

Tabela 1: Execução orçamentária acumulada das iniciativas do Pronatec –


Brasil – 2011 e 2014 – Em Reais (milhões)

Iniciativas Autorizado Liquidado Execução


Orçamentária*
Bolsa-Formação 8.438 8.011 95%
Expansão da Rede Federal 7.240 1.520 21%
Brasil Profissionalizado 1.357 341 25%
Rede e-Tec 652 379 58%
Total 17.687 10.251 58%

* Execução orçamentária = Valor executado/Valor autorizado.


Fonte: Siga Brasil e SETEC. TCU (2015, p. 6). Adaptação nossa.

Nesta perspectiva, é relevante retomar a participação do Sistema S como


centro de gravidade do programa e, por isso, contemplado como beneficiário
direto e preferencial em muitas de suas iniciativas. Dentre os vários elementos
que demarcam esta focalização, destacam-se três: (i) a transformação do Siste-
ma S em referência para a organização do Pronatec; (ii) a predominância na
oferta de cursos de Formação Inicial e Continuada – FIC – e Técnicos na
modalidade concomitante; e (iii) a concentração dos recursos financeiros do
programa nestas instituições.
O primeiro elemento está relacionado ao fato do Sistema S ter sido agente
na construção do programa e sua estrutura particular tomada como referência
para a definição da forma de oferta e formato dos cursos. Das diversas razões
que justificam a hegemonia do Sistema S como padrão na oferta de formação
profissional no Brasil – em um processo de dominância por expertise – podem

178
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

ser elencadas a existência de um efetivo histórico de oferta de serviços de qua-


lidade, com inegável contribuição para o desenvolvimento do setor produtivo
nacional, e a construção de um imaginário social na classe trabalhadora que
atrela a participação nos cursos oferecidos nestas instituições com a obtenção
de melhores colocações no mercado de trabalho.
Soma-se a isto o fato de, desde o período varguista, seus dirigentes te-
rem integrado instâncias de decisão e planejamento ao longo dos vários gover-
nos e, com isso, incidirem na própria trajetória da educação profissional. Isto
fica claro quando, ao analisar os grandes programas de formação profissional
– PIPMO, PLANFOR e PNQ –, fica evidenciado o papel central destas insti-
tuições tanto no momento de elaboração das políticas, quanto da sua realiza-
ção (BARRADAS, 1986; CÊA, 2006; KUENZER, 2006; GRABOWSKI,
2010). Da mesma forma que no Pronatec, ao serem desenhados, esses progra-
mas e planos emularam em seus pressupostos e estratégias a forma como o
Sistema S ofertava seus cursos, facilitando o processo de execução por parte
dessas instituições, especialmente se comparado com o setor público que pos-
sui um conjunto de limitações legais para desenvolver suas atividades. Portan-
to, desde os anos de 1940, essas instituições são protagonistas na definição das
políticas para a EPT, atuando de forma paralela e autônoma em relação ao
sistema federal, apesar de seus recursos serem, em grande parte, públicos.
O segundo elemento que indica a centralidade do Sistema S no Prona-
tec pode ser percebido na priorização da oferta em cursos de educação pro-
fissional de nível médio de forma concomitante e de formação inicial e con-
tinuada – FIC. Apesar de suas especificidades, ambas acabam por focalizar no
treinamento de mão de obra com o objetivo de atender estritamente às deman-
das do mercado de trabalho e, em muitos casos, garantir um fluxo permanente
de trabalhadores habilitados para desenvolver tarefas de baixa complexidade
como estratégia de regulação dos salários. Esta forma de oferta se contrapõe
as políticas para a EPT que estavam sendo desenvolvidas anteriormente pelo
Governo Federal, baseadas na integração entre educação, trabalho, ciência e
tecnologia, com destaque para a criação dos Institutos Federais – IF – e pro-
gramas como o Proeja. Neste sentido, a retomada de uma perspectiva mais
tecnicista, com o retorno da concomitância e oferta de cursos FIC de curta
duração no âmbito do Pronatec deve ser relacionada ao fato de serem estas
modalidades de oferta o formato preferencial dos cursos oferecidos pelos inte-
grantes do Sistema S. Desta forma, essas instituições precisam apenas replicar
suas técnicas e tecnologias pedagógicas, seus currículos e materiais didáticos,
além de já possuírem um corpo docente adaptado para desenvolvê-los. A aná-
lise da distribuição de matrículas da EPT brasileira pelas modalidades de ofer-
ta respalda esta linha de raciocínio, pois registra que a oferta privada de cursos

179
RODRIGUES, R. de O. • O público e o privado na educação profissional brasileira: o caso do Pronatec

concomitantes passou de 49,79%, em 2011, para 66,22%, em 2014. No mes-


mo período, as matrículas na rede privada na modalidade integrada caíram de
8,17% para 6,04%.4
O terceiro elemento que demonstra o papel protagonista do Sistema S
no Pronatec se cristaliza na análise sobre a transferência de recursos para esta
instituição, especialmente no “Bolsa-Formação”.5 Esta iniciativa, voltada pri-
oritariamente para atendimento das classes mais vulneráveis socialmente, foi
a que gerou maior impacto no contexto do programa e contemplou a realiza-
ção de 4,3 milhões de matrículas no período de 2011 a 2014, sendo que o
Sistema S, com destaque para o SENAI e SENAC, respondeu por praticamen-
te 70% deste total. Esta oferta ocorreu massivamente, 89% do total, em cursos
FIC que, como frisado anteriormente, correspondem à cultura institucional
do Sistema S. Maior relevo assume esta questão quando se analisam os dados
referentes às transferências de recursos federais, no escopo da ação orçamen-
tária 20RW que corresponde aos valores disponibilizados para a execução do
Pronatec, especialmente do “Bolsa-Formação” – Tabela 2. É possível verificar
que, durante o período de 2011 a 2015, o Sistema S absorveu, em média, 94%
dos recursos totais, correspondendo a praticamente R$ 7,5 bilhões, enquanto
os Governos Estaduais em conjunto obtiveram, em média, apenas 6,7% do
total no mesmo intervalo de tempo, representando pouco mais de R$ 500 mi-
lhões.

Tabela 2: Transferência de Recursos Federais – Ação 20RW – Apoio à Forma-


ção Profissional, Científica e Tecnológica – Pronatec – Total, Sistema S, Go-
vernos Estaduais e Fundações – 2011/2015 – Em reais

Ano Sistema S % Governos % Fundações % Total %


(em R$) Estaduais (em R$) (em R$) % (em R$)
2015 1.321.393.229,20 94,2 64.545.862,16 4,6 16.704.814,81 1,2 1.402.643.906,20
2014 2.581.208.152,00 93,3 153.629.300,00 6,0 17.311.944,00 0,7 2.552.149.396,00
2013 2.065.021.070,00 89,5 240.242.150,00 10,4 2.921.000,00 0,1 2.308.184.220,00
2012 1.241.426.564,50 93,0 76.754.000,00 5,8 15.530.200,00 1,2 1.317.754.564,50
2011 208.261.704,50 100 — — — — 208.261.704,50

Fonte: Portal da Transparência/CGU/Governo Federal.

4
Dados INEP/MEC.
5
O “Bolsa-Formação” ocorre em duas modalidades: “Estudante e Trabalhador”. A “Bolsa-For-
mação Estudante”, é voltada para alunos devidamente matriculados nas redes públicas de en-
sino médio e se caracteriza pela oferta de cursos técnicos de nível médio, de forma concomitan-
te, segundo o Catálogo Nacional de Cursos Técnicos. Já a “Bolsa-Formação Trabalhador”
atende trabalhadores, inclusive agricultores familiares, silvicultores, aquicultores, extrativistas
e pescadores, beneficiários titulares e dependentes dos programas federais de transferência de

180
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Esta transferência significativa de recursos para o Sistema S elevou a


participação destas instituições no total de recursos repassados para entidades
sem fins lucrativos6 considerando todas as ações do Governo Federal – Tabela
3. Em 2009, portanto, anterior ao lançamento do Pronatec, a fatia do SENAI
correspondia a apenas 0,27% e a do SENAC a residuais 0,02% do total destes
recursos, chegando, em 2014, quando finaliza a primeira etapa do programa, a
14,77% e 7,93%, respectivamente. Estes dados cristalizam a importância do
Sistema S como principal operador e principal beneficiário do Pronatec.

Tabela 3: Transferência de recursos federais para entidade sem fins lucrativos


– Total, SENAI e SENAC – 2009/2015 – Em reais

Ano Total (R$) SENAI (R$) % sobre total SENAC (R$) % sobre total
2009 3.844.950.930,95 10.761.363,39 0,27 1.007.500,00 0,02
2010 5.390.872.610,35 13.180.460,65 0,24 1.406.810,43 0,02
2011 5.401.112.708,56 134.675.627,16 2,49 83.744.193,50 1,54
2012 7.187.439.254,42 813.789.004,18 11,32 383.179.733,50 5,33
2013 9.582.561.317,49 1.163.126.501,47 12,13 719.096.760,00 7,50
2014 10.539.464.686,46 1.556.802.568,59 14,77 836.137.030,00 7,93
2015 8.265.850.139,85 823.533.726,25 9,96 430.000.000,00 5,2

Fonte: Portal da Transparência/CGU/Governo Federal.

Estes elementos evidenciam que a estrutura do Pronatec foi desenhada


tendo o Sistema S como modelo, e, devido a isto, acabou por potencializar sua
capacidade de execução. Enquanto a Rede Federal teve que fazer um conjunto
de adaptações e criar uma normatização específica para desenvolver ações do
programa, a ponto de constituir uma rede de atendimento praticamente para-
lela, o Sistema S manteve suas práticas usuais, apenas ampliando o atendi-
mento.
Neste sentido, é importante retomar que para viabilizar a absorção des-
te potencial aumento na demanda originado a partir da implantação do Pro-
natec foi prevista uma iniciativa específica, “Ampliação da Capacidade do Sis-
tema S”, que consistia em uma linha de crédito, via BNDES, para a ampliação
e qualificação da rede física e dos equipamentos do Sistema S. Ou seja, no

renda, pessoas com deficiência, povos indígenas, comunidades quilombolas, bem como ado-
lescentes e jovens em cumprimento de medidas socioeducativas, com a oferta de cursos de
formação inicial e continuada de, no mínimo, 160h e regulamentados pelo Guia Pronatec de
Cursos FIC.
6
As instituições integrantes do Sistema S são enquadradas como entidades sem fins lucrativos
no orçamento da União.

181
RODRIGUES, R. de O. • O público e o privado na educação profissional brasileira: o caso do Pronatec

planejamento do programa foram criadas estratégias para direcionar recursos


para estas instituições que acabam por colocar em cheque o chamado “Acordo
de Gratuidade”, firmado em 2008, entre o Governo Federal e SENAI, SE-
NAC, SESI e SESC. Apesar de não ter uma comprovação contábil, é possível
inferir que estes novos recursos superam a possível diminuição de receita ad-
vinda do cumprimento das metas do acordo que previam a ampliação da ofer-
ta de cursos gratuitos por estas instituições – chegando ao limite de 66,66% da
RLCC7 a partir de 2014. Esta questão de serem os recursos do Pronatec uma
reparação para as possíveis perdas originadas pelo “Acordo de Gratuidade” é
reforçada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (2011)
e encontra guarida na comparação entre os dados de matrículas de SENAI e
SENAC relativas ao “Bolsa-Formação” e ao “Acordo de Gratuidade”. Segun-
do dados do TCU (2015), foram realizadas 2.644.744 matrículas no “Bolsa-
Formação”, superando em 49.850 matrículas as efetivadas dentro do “Acordo
de Gratuidade”. Tendo em vista que se trata da oferta das mesmas modalida-
des de cursos, principalmente os de Formação Inicial e Continuada, portanto
com custos bastante similares, somente os recursos envolvidos no “Bolsa-For-
mação” seriam suficientes para repor uma possível queda de arrecadação de-
vido à ampliação da oferta gratuita para atingir as metas do acordo.
A própria efetividade do acordo é questionada pelo TCU quando iden-
tifica problemas no acompanhamento das metas, especialmente pelo fato de
serem consolidadas nacionalmente, impedindo a avaliação do desempenho
regionalizado. Neste sentido, é colocada em relevo a possibilidade de existi-
rem regiões inteiras sem a oferta de cursos gratuitos, e são realizados questio-
namentos quanto à própria pertinência e qualidade dos cursos oferecidos em
relação ao contexto produtivo local.
Este deslocamento entre a oferta realizada e as demandas efetivas do
arranjo produtivo local ocorre concomitantemente com a resistência das insti-
tuições do Sistema S em adaptar seus cursos às características específicas das
populações prioritárias do programa, notadamente na oferta do “Bolsa-For-
mação”. Esta situação foi caracterizada em estudo da SAGI/MDS (2014) como
“oferta de prateleira”, significando que, especialmente o SENAI e o SENAC,
colocam-se como detentores das melhores práticas. Dessa forma, a oferta de
cursos ocorria com base nas grades e nos horários que atendiam aos requeri-
mentos da gestão das unidades, por meio de currículos replicáveis que exigiam
uma base de conhecimentos prévios. Ao impor esses limites para a realização
dos cursos e negar a efetiva história de vida das pessoas que os acessam, essas

7
Receita Líquida da Contribuição Compulsória Geral – RLCC.

182
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

instituições se posicionam acima do interesse público e estabelecem processos


que reforçam o histórico de exclusão social e de insucesso educativo que mar-
ca a trajetória dessas populações.
Este predomínio na realização de cursos “de prateleira”, voltados para
atender as demandas dos ofertantes e não das populações prioritárias do Pro-
natec, determinou uma situação de “captura institucional do programa” por
parte das instituições ofertantes (SAGI/MDS, 2014). É importante resgatar
que esta “captura” não ocorreu apenas na fase de execução, com a intransi-
gência na adaptação de procedimentos, horários e currículos, mas esteve pre-
sente desde o processo de planejamento do programa. Portanto, não se trata
de uma consequência, um descompasso entre as determinações legais e as prá-
ticas dessas instituições, mas, sim, de um processo estrutural ao Pronatec vin-
culado tanto à adoção do Sistema S como padrão de oferta quanto à participa-
ção de seus representantes nas instâncias de definição ao longo da trajetória
do programa.
Parte importante desta construção se deu no estabelecimento de critérios
de definição dos custos envolvidos na realização dos cursos e na definição dos
mecanismos para o repasse e a prestação de contas dos recursos no âmbito do
programa. Enquanto as instituições da rede federal possuem um conjunto de
procedimentos administrativos para receber os recursos e, portanto, passíveis
de terem um acompanhamento mais transparente por parte da sociedade e
dos órgãos de controle, o mesmo não aconteceu com o setor privado. Segundo
relatórios do TCU (2015) e da CGU (2014), foi identificada uma significativa
área cinzenta em relação à correta utilização dos recursos direcionados para
estas instituições. Tendo como principal limite para o correto acompanhamento
da execução o fato do Pronatec utilizar como critério para o repasse dos recur-
sos apenas o número de matrículas e não realizar uma verificação consistente
da efetividade dos cursos realizados, foram destacados os seguintes proble-
mas: (i) as planilhas de custos de cursos do Sistema S não possuíam uniformi-
dade e apresentavam itens, como repasses para confederações e federações,
sem justificativa e, além disso, incorporavam custos relativos a todos os tipos
de cursos oferecidos pelas instituições, inclusive ensino superior, que não esta-
vam previstos no objeto da ação; (ii) as Instituições de Ensino Superior e Esco-
las Técnicas privadas ofereciam cursos para os estudantes do “Bolsa-Forma-
ção” com custos superiores aos oferecidos para os estudantes regulares e des-
consideravam a inexistência de inadimplência em suas planilhas de custos,
tendo em vista a garantia do repasse de recursos públicos; e (iii) a diferença
entre as matrículas pactuadas e as efetivamente realizadas gerava um recurso
excedente que deveria ser corrigido nas edições seguintes. Porém, como reco-
nhecem o TCU (2015), estas pendências não geravam um registro específico.

183
RODRIGUES, R. de O. • O público e o privado na educação profissional brasileira: o caso do Pronatec

Elas eram incorporadas nas pactuações seguintes e acabavam sem uma presta-
ção de contas efetiva.
As questões até agora apresentadas não estão vinculadas a um coman-
do unilateral do Sistema S, mas, sim, integradas à perspectiva conciliatória
com que o Governo Federal buscava articular uma frente política bastante he-
terogênea composta pelos grandes empresários brasileiros, principalmente os
ligados ao setor produtivo, “parte da baixa classe média, a maior parte da
classe operária, do campesinato e dos trabalhadores da massa marginal” (BOI-
TO JÚNIOR, 2016, p. 27). Esta frente ampla e instável, amalgamada por um
discurso desenvolvimentista e com nuances nacionalistas, era impulsionada
pelo crescimento econômico e por políticas de distribuição de renda. Esta ca-
racterização sintética da estratégia construída pelos governos petistas na ten-
tativa de articular sujeitos históricos com interesses diversos e conflitivos for-
nece um substrato importante para compreender alguns movimentos aparen-
temente opostos que configuraram as políticas da EPT brasileira no período
em foco, com destaque para o Pronatec.
Um desses movimentos foi a expressiva ampliação da rede federal de
educação profissional, com a criação dos Institutos Federais, que passou de
144 estabelecimentos, em 2006, para 574, em 2015. Este crescimento foi acom-
panhado por um incremento de 294,95% no número de matrículas no mesmo
período, correspondendo, em números absolutos, ao ingresso de 235.604 no-
vos estudantes – Gráfico 1. Este movimento de expansão da oferta da rede
federal demandou investimentos que, de 2011 a 2014, atingiram pouco mais
de 1,5 bilhão. Este valor representa apenas 21% do total autorizado, demons-
trando um contingenciamento ao longo do período e a canalização dos recur-
sos para atender outras iniciativas do programa. É importante destacar, neste
cenário, que custos importantes, como o pagamento dos docentes e técnicos e
da rede de serviços terceirizados responsáveis por garantir o funcionamento
dos IFs, possuem outras origens orçamentárias. Os recursos para a expansão
da rede federal que passaram pelo Pronatec estavam direcionados para a am-
pliação e a qualificação da rede física com o objetivo de atender o aumento
potencial de demanda com a execução do programa.

184
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Gráfico 1: Matrículas na Educação Profissional – Integrado, Concomitante e


Subsequente por rede ofertante* – 2007-2016 – Brasil

* Rede pública consolidando a oferta das redes municipais, estaduais e federal.


Fonte: INEP/MEC.

Esta questão dos investimentos na ampliação do setor público para a


oferta de EPT expõe limites não só quando contrastada com os volumosos
recursos repassados para o Sistema S, mas também em relação às Instituições
de Ensino Superior e Escolas Técnicas privadas que ingressaram no programa
a partir de 2013. Essas instituições passaram a atuar, principalmente, na oferta
de vagas no Fies-Técnico e no “Bolsa-Formação”, concentrando-se mais nos
cursos Técnicos de Nível Médio na modalidade subsequente. Mesmo assim,
dados do INEP/MEC indicam que foi repassado para estas entidades aproxi-
madamente 1,6 bilhão de reais, no período de 2013 a 2015, para pagamento de
526.789 bolsas para estudantes, majoritariamente selecionados pelo Sisutec.
Ou seja, mesmo em um período menor de tempo, as IES e Escolas Técnicas
privadas receberam um recurso maior que a rede federal, indicando uma das
origens do contingenciamento das verbas referido anteriormente.
Mesmo com as limitações orçamentárias que acompanharam o proces-
so, foi realizada uma ampliação da oferta pública em uma dimensão inédita
na trajetória da EPT, aliada com a retomada do protagonismo da rede federal
e a tentativa do Governo Federal assumir o controle sobre o planejamento da
educação profissional. Este movimento pode ser identificado no próprio esta-
belecimento do Pronatec como aglutinador de atividades e de recursos que se
achavam espalhadas em várias instâncias e ministérios e na definição da SE-
TEC/MEC para coordenar o programa.
Todos estes aparentes conflitos encontram um caminho para sua reso-
lução quando se percebe o Pronatec inserido no movimento estratégico dos
governos Lula e Dilma. Visando garantir a consolidação da sua ampla frente

185
RODRIGUES, R. de O. • O público e o privado na educação profissional brasileira: o caso do Pronatec

de sustentação política eram desenvolvidas ações que direcionavam recursos


para contentar os diversos grupos envolvidos. Portanto, o programa deve ser
localizado nesta zona de fronteira relacional entre o público e o privado, per-
meável aos movimentos que caracterizam cada um desses campos e, ao mes-
mo tempo, carregado de barreiras que tentam direcionar seus fluxos e privile-
giar a expansão do capital.

Considerações finais sobre o Pronatec:


tímidos avanços nos limites do sistema do capital
Em sua particularidade, o Pronatec se constituiu em uma política de
formação e qualificação da força de trabalho que, concomitantemente, se ca-
racterizou por ser um espaço/tempo de entrega e de resistência. Espaço/tem-
po de entrega por apostar no caminho da conciliação, agregando o setor priva-
do como protagonista na construção e na execução do programa e, com isso,
viabilizando seu acesso facilitado aos recursos públicos. Espaço/tempo de re-
sistência por acreditar que, ao financiar os agentes privados, conseguiria im-
por direcionamentos e incorporar populações que historicamente foram ex-
cluídas do acesso a processo de qualificação e, ao mesmo tempo, diminuir o
antagonismo em relação às iniciativas que ampliavam a oferta pública de edu-
cação.
Ao observar o Pronatec desde uma perspectiva nacional, é perceptível
que este se consolidou muito mais como um espaço/tempo de entrega, refém
de sua própria estratégia. Ao articular com o setor privado, em especial o Sis-
tema S, quedou-se por ele articulado. Ao estabelecer o diálogo com as deman-
das do mercado, acabou por elas estabelecido. Ao promover a qualificação dos
trabalhadores para uma inserção substantiva no mundo do trabalho, resultou
em uma formação precária para uma eventual absorção pelo mercado de tra-
balho. Ao propor-se como caminho para avançar na construção de uma na-
ção, não percebeu que muitas vezes andava para trás.
Fica evidenciado, assim, que o principal limite para a capacidade de
intervenção do Pronatec, podendo ser ampliado para as demais políticas pú-
blicas educativas implantadas nos primeiros quinze anos do século XXI, é a
manutenção e o aprofundamento do projeto de desenvolvimento dependente
e associado que caracteriza a economia brasileira. Enquanto a organização da
produção estiver voltada para atender as demandas de um sistema global, ex-
pansionista, concentrador de riquezas e totalitário, tornam-se muito reduzi-
dos os espaços para o desenvolvimento de projetos que valorizem as potencia-
lidades criativas locais para, desta forma, superar a situação de dependência
econômica e cultural em relação às nações centrais do capitalismo. Neste sen-
tido, uma vez tendo sido o Pronatec desenhado para atuar dentro desses limi-

186
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

tes, pode-se inferir que, mesmo em um cenário no qual o protagonismo fosse


totalmente público, as barreiras impostas pelo sistema do capital acabariam
reduzindo a capacidade indutora de mudanças de seus processos.
A construção de outro projeto societário mais justo e solidário, orienta-
do a partir da ótica do trabalho e não do capital, é um caminho longo e que
passa, necessariamente, por processos educativos que contribuam para a for-
mação integrada e ampliada dos trabalhadores. Não se pode esperar, porém,
que a educação, principalmente quando reduzida a dimensão da garantia do
acesso, venha a alterar significativamente o quadro econômico e social. Talvez
esta tenha sido a maior fragilidade do Pronatec. Ao agir apenas na temporali-
dade do presente e apostar na qualificação dos trabalhadores enquanto ampli-
ação de suas possibilidades de ingresso no mercado de trabalho, não construiu
mecanismos para contribuir para uma substantiva emancipação das classes
subalternas que acessaram seus cursos. Portanto, se não pode ser desconside-
rada a dimensão dos possíveis impactos na vida particular das pessoas que
participaram do programa, afinal a história se move dialeticamente e não se
volta para o mesmo lugar, eles se tornam residuais em relação ao montante de
recursos envolvidos.
O Pronatec deve ser compreendido, portanto, a partir de suas contradi-
ções e por adquirir sentido quando contrastado com a totalidade que o gerou e
a qual, dialeticamente, ele materializa. Muito mais permanência do que mu-
dança, muito mais preso ao passado que conectado ao futuro, muito mais con-
formação do que emancipação.

Referências
BARRADAS, Anésia Maria da Silva. “Fábrica PIPMO” – uma discussão sobre política de
treinamento de mão de obra no período 1963-82. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas,
1986. Dissertação (Mestrado em Educação) – Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Var-
gas – Instituto de Estudos Avançados em Educação/Departamento de Administração
de Sistemas Educacionais, 1986.
BOITO JÚNIOR, Armando. Os atores e o enredo da crise política. In: JINKINGS,
Ivana; DORIA, Kin; CLETO, Murilo. Por que gritamos golpe? Para entender o impeach-
ment e a crise política no Brasil. São Paulo: Boitempo, 2016.
BRASIL. Lei n. 12.513, de 26 de outubro de 2011. Institui o Programa Nacional de
Acesso ao Ensino Técnico e Emprego – Pronatec. Disponível em: <http://
www.jusbrasil.com.br/legislacao/anotada/10487328/lei-12513-11>. Acesso em: 10
maio 2012.
CÊA, Georgia Sobreira dos Santos. PLANFOR, reforma do Estado e acumulação
flexível: tecendo fios invisíveis. Educere et educare, Cascavel, v. 1, n. 2, p. 229-244, jul./
dez., 2006.

187
RODRIGUES, R. de O. • O público e o privado na educação profissional brasileira: o caso do Pronatec

CHALHOUB, Sidney. Trabalho, lar e botequim: o cotidiano dos trabalhadores no Rio de


Janeiro da belle époque. 2. ed. Campinas: Editora da Unicamp, 2001.
CNTE. Os riscos do Pronatec para a educação técnica profissional. Retratos da Escola,
v. 5, n. 8, p. 179-184, jan./jul., 2011.
CONTROLADORIA GERAL DA UNIÃO. Relatório de Auditoria Anual de Contas n.
201406282. Brasília: CGU, 2014. Disponível em: <http:// sistemas2.cgu.gov.br/relats/
uploads/RA201406282.pdf>. Acesso em: 25 maio 2016.
CUNHA, Luiz Antônio. O ensino profissional na irradiação do industrialismo. 2. ed. São
Paulo: Editora UNESP; Brasília: FLACSO, 2005.
CUNHA, Luiz Antônio. O ensino industrial-manufatureiro no Brasil. Revista Brasileira
de Educação. Rio de Janeiro, n. 14, p. 89-193, maio/jun./jul./ago. 2000.
FRIGOTTO, Gaudêncio; CIAVATTA, Maria. Perspectivas sociais e políticas da for-
mação de nível médio: avanços e entraves nas suas modalidades. Educação e Sociedade,
Campinas, v. 32, n. 116, p. 619-638, jul./set., 2011.
GRABOWSKI, Gabriel. Financiamento da educação profissional no Brasil: contradições e
desafios. Porto Alegre: UFRGS. Tese (Doutorado em Educação) – Programa de Pós-
Graduação em Educação, Faculdade de Educação, Universidade Federal do Rio Grande
do Sul, Porto Alegre, 2010.
IPEA. Um retrato de duas décadas do mercado de trabalho brasileiro utilizando o
Pnad. Comunicados do Ipea, Brasília, n. 160, outubro, 2013.
KUENZER, Acacia Zeneida. A Educação Profissional nos anos 2000: a dimensão
subordinada das políticas de inclusão. Educação e sociedade, Campinas, v. 27, n. 96,
p. 877-910, out. 2006.
KUENZER, Acacia Zeneida; GRABOWSKY, Gabriel. Educação Profissional: desafi-
os para a construção de um projeto para os que vivem do trabalho. Perspectiva, Floria-
nópolis, v. 14, n. 1, p. 297-318, jan/jun. 2006.
MANFREDI, Silvia M. Educação Profissional no Brasil. São Paulo: Cortez, 2002.
MÜLLER, Meire T. A Educação Profissionalizante no Brasil e no SENAI: a formação
para o trabalho. In: BATISTA, Eraldo L.; MÜLLER, Meire T. (Orgs.). A Educação
Profissional no Brasil: história, desafios e perspectivas para o século XXI. Campinas:
Editora Alínea, 2013.
NASCIMENTO, Paulo A. Meyer. Há escassez generalizada de profissionais de carrei-
ras técnico-científicas no Brasil? Uma análise a partir de dados da CAGED. In: IPEA.
Mercado de Trabalho: conjuntura e análise, Brasília, n. 49, ano 16, nov., 2011.
NONATO, Fernanda J. A. P.; PEREIRA, Rafael H. M.; NASCIMENTO, Paulo A. M;
ARAÚJO, Thiago C. O perfil da força de trabalho brasileira: trajetórias e perspectivas.
In: IPEA. Mercado de Trabalho: conjuntura e análise, Brasília, n. 51, ano 17, maio, 2012.
PERONI, Vera M. V. (Org.). Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implica-
ções para a democratização da educação. Brasília: Liber Livro, 2013.

188
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

PERONI, Vera M. V. A privatização do público: implicações para a democratização


da educação. In: PERONI, Vera M. V. (Org.). Redefinições das fronteiras entre o público e o
privado: implicações para a democratização da educação. Brasília: Liber Livro, 2013b.
PERONI, Vera M. V. (Org.). Diálogos sobre as redefinições no papel do Estado e nas fronteiras
entre o público e o privado na educação. São Leopoldo: Oikos, 2015.
PERONI, Vera M. V. Implicações da relação público-privada para a democratização
da educação no Brasil. In: PERONI, Vera M. V. (Org.). Diálogos sobre as redefinições no
papel do Estado e nas fronteiras entre o público e o privado na educação. São Leopoldo: Oikos,
2015b.
ROMANELLI, Otaíza de O. História da Educação no Brasil. 29. ed. Petrópolis: Vozes,
2005.
SAGI/MDS. Estudo qualitativo com egressos e desistentes, representantes das unidades ofertan-
tes e interlocutores municipais do Pronatec – Brasil Sem Miséria. Brasília: MDS/Secretaria
de Avaliação e Gestão da Informação, 2014.
SOUZA, Elisabete G. Educação Profissional no Brasil (1940-1950): a aprendizagem
industrial como modelo de ensino. In: BATISTA, Eraldo L.; MÜLLER, Meire T.
(Orgs.). A Educação Profissional no Brasil: história, desafios e perspectivas para o século
XXI. Campinas: Editora Alínea, 2013.
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. Relatório TC 008.089/2015-9: Levantamento.
Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego – Pronatec. Brasília,
2015. Disponível em: <http:// portal.tcu.gov.br/ lumis/portal/file/file
Download.jsp?fileId= 8A8182A151356F960151A1E2C55E207F,inline=1>. Acesso em:
12 ago. 2016.

189
A educação infantil:
coisas da infância no Brasil

Maria Otilia Kroeff Susin


Monique Robain Montano

Introdução
O presente texto abrange o conteúdo apresentado no I Seminário Na-
cional “Redefinições das Fronteiras entre o Público e o Privado”, realizado
de 05 a 08 de dezembro de 2017, pelo Grupo de Pesquisa Relações entre o
Público e o Privado na Educação da Universidade Federal do Rio Grande do
Sul (GPRPPE/UFRGS), coordenado pela professora Doutora Vera Maria
Vidal Peroni.
O trabalho apresentado é um segmento da pesquisa do referido grupo
que analisa os atores e as propostas de educação presentes na parceria público
e privado, em suas diferentes etapas e modalidades da educação básica. É apre-
sentado o aparato legal que serve de base para a organização da educação no
Brasil, com ênfase na educação infantil, primeira etapa da educação básica,
objeto de pesquisa das autoras, bem como a aplicação do recente marco legal
para regularização jurídica das parcerias com organizações da sociedade civil
na oferta da educação para crianças de zero a seis anos de idade.
Para ser dada concretude às análises feitas, é apresentada a tabela que
registra a evolução da oferta da educação infantil por meio de parcerias, desde
a permissão do repasse de recursos públicos a essas organizações na lei do
financiamento da educação até os dias de hoje. Será analisada ainda a sua
regulamentação nos municípios de Porto Alegre e São Paulo, com início de
vigência em 2017.
As considerações finais apontam para as decorrências em relação à
parceria entre o público e o privado na educação infantil, ao mesmo tempo
em que deixam em aberto um caminho para a continuidade e o aprofunda-
mento da pesquisa neste período em que a perda de direitos sociais vem sen-
do feita no Brasil por meio de mudanças constitucionais que ainda não havi-
am sido consubstanciadas como direitos do cidadão, por meio de políticas
públicas.

190
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Histórico: situando a educação infantil no Brasil


A nação brasileira é organizada em entes federados autônomos, com
igualdade de direitos e responsabilidades. No caso da educação, há a reparti-
ção de responsabilidades entre a União, os estados, o Distrito Federal e os
municípios. A oferta e o financiamento da educação infantil, por exemplo, é
responsabilidade dos municípios. A sua normatização dá-se em nível federal,
cuja legislação pode ser adequada aos respectivos sistemas desde que respeita-
dos os princípios estabelecidos pela lei maior.
No Brasil, a educação infantil se compõe de creches para crianças de
zero a três anos e pré-escolas para crianças de quatro a cinco/seis anos de
idade, considerando que a idade estabelecida para ingresso no ensino funda-
mental é de seis anos completados até 31 de março do ano da matrícula. O
tempo de permanência das crianças na escola infantil pode ser em jornada
parcial (no mínimo 4 horas) ou jornada integral (no mínimo 7 horas).
A educação infantil no país é direito de toda a criança a partir de zero
até seis anos de idade, desde 1988, com o advento da Constituição da Repúbli-
ca Federativa do Brasil, documento legal que consigna todos os direitos e de-
veres do povo brasileiro. A educação a partir dos quatro anos até os cinco/seis
anos de idade foi instituída como primeira etapa da educação básica e consa-
grada como direito público subjetivo1 pela Emenda Constitucional/EC n. 59,
de 11 de novembro de 2009. Uma emenda constitucional significa uma altera-
ção na Constituição Brasileira feita num texto específico e, no caso da EC 59/
2009, significou a ampliação do direito à educação, tornando obrigatório o
ensino dos quatro até os dezessete anos de idade a todas as crianças e jovens
brasileiros, inclusive para aqueles que não tiveram acesso na idade própria,
que é o caso da educação de jovens e adultos.
O avanço no direito à educação das crianças pequenas brasileiras teve
desdobramentos anteriores, como foi o caso da inclusão da educação infantil
na renovação do fundo que financiava a educação pública, abrangendo tam-
bém essa etapa da educação que se efetivou pela Lei n. 11.494, de 20 de junho
de 2007, dando origem ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Edu-
cação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação – FUNDEB. O
primeiro fundo criado foi o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do
Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério – FUNDEF de 1996,
com posterior implementação, a partir de janeiro de 1998, que abrangia so-

1
O direito público subjetivo está gravado na Constituição Federal como direito indiscutível e
exigível do Estado, cujo cumprimento pode ser objetivado por meio de ação liminar quando da
ausência de políticas públicas que o garantam.

191
SUSIN, M. O. K.; MONTANO, M. R. • A educação infantil: coisas da infância no Brasil

mente o ensino fundamental; conforme sua designação, ignorava a educação


infantil, o ensino médio, a educação especial e a educação de jovens e adultos.
No entanto, o avanço representado pela lei do FUNDEB, no que tange
aos recursos destinados à educação infantil, tem seu significado maculado pelo
Art. 8º da referida lei, quando admite a distribuição dos recursos que com-
põem o fundo não somente para os alunos matriculados nas respectivas redes
de educação pública, mas incluindo nessa distribuição as instituições comuni-
tárias, confessionais ou filantrópicas sem fins lucrativos e conveniadas com o
poder público, que atendam a crianças em creches, ou seja, crianças de até três
anos, bem como às crianças de pré-escola (quatro e cinco anos), até a universa-
lização desta etapa da educação básica prevista no Plano Nacional de Educa-
ção de 2014/2024.
Com a lei do FUNDEB, institucionaliza-se, oficial e legalmente, a par-
ceria do público e do privado para a oferta da educação infantil no país. Em
que pese a ampliação de vagas asseguradas por esta prática, há que se pautar
as fortes implicações para a sua democratização2,
pois repassa a responsabilidade para a sociedade fazer do jeito que é possí-
vel, trazendo diferenças no atendimento conforme a situação social de cada
comunidade. Apesar de ser um atendimento feito pela “sociedade”, a comu-
nidade não participa das decisões e aceita o que tem. A qualidade não é
questionada, principalmente pelos que mais precisam, pois consideram que
é melhor esse atendimento, do que não ter acesso à educação infantil. Ocor-
re assim o que chamamos de naturalização do possível com a minimização
de direitos, uma vez que fica diluído de quem é o dever (PERONI; SUSIN;
MONTANO, 2015, p. 14).

A citação acima, do texto intitulado “A Relação Público-Privada na


Oferta da Educação Infantil em Porto Alegre”, contempla o conteúdo de pes-
quisas feitas nesse município, capital do estado do Rio Grande do Sul/Brasil,
e aguarda publicação.
Também consta do texto constitucional o estabelecimento em Lei do
Plano Nacional de Educação. A educação, enquanto direito social e fortaleci-
mento da escola pública sempre em disputa, tem sua história marcada pelos
movimentos sociais da sociedade civil, mobilizando setores da educação no
Brasil, que são os congressos de educação, dos quais se destaca o Congresso
Nacional de Educação/CONAE, no ano de 2010, que produziu mais um Pla-
no Nacional de Educação/PNE, aprovado pela Lei Federal n. 13.005, de 25

2
O conceito de democratização evidenciado pelas autoras é entendido como “coletivização das
decisões (VIEIRA, 1998), direitos sociais materializados em políticas (WOOD, 2003) e a ela-
boração de políticas através da prática social crítica e autocrítica no curso de seu desenvolvi-
mento (MÉSZÁROS, 2002) [...]” PERONI; SUSIN; MONTANO (2015, p. 13 e 14).

192
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

de junho de 2014 com vigência de 2014 até 20243. Como conteúdo, cujos des-
dobramentos trazem consequências para a educação infantil, cita-se a Meta 1:
[...] universalizar, até 2016, a educação infantil na pré-escola para as crian-
ças de 4 (quatro) a 5 (cinco) anos de idade e ampliar a oferta de educação
infantil em creches de forma a atender, no mínimo, 50% (cinquenta por cen-
to) das crianças de até 3 (três) anos até o final da vigência deste PNE.

O cumprimento desta meta não se efetivou conforme definido no PNE,


e os números da educação infantil no Brasil estão a comprovar o que se afir-
ma, inclusive quanto à responsabilização da sociedade civil no atendimento
desse direito, o que é reforçado pela nova lei dos acordos e convênios entre
poder público e sociedade civil tratada na continuidade desse texto, bem como
os desdobramentos já presentes em Porto Alegre/RS e em municípios de ou-
tros estados.
Na tabela 1 abaixo, a referência às matrículas das escolas privadas in-
cluem aquelas relativas à parceria com a sociedade civil, pois os números di-
vulgados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio
Teixeira/INEP não fazem esta discriminação.

Tabela 1: Evolução das matrículas da educação infantil em escolas públicas e


privadas no Brasil
Ano 2008 2009 2011
0 a 3anos 4 a 5anos 0 a 3anos 4 a 5anos 0 a 3anos 4 a 5anos
Matrículas 1.143.430 3.849.829 1.252.765 3.735.751 1.471.379 3.555.277
Escolas
públicas
Matrículas 608.306 1.117.696 643.598 1.130.517 835.798 1.141.348
Escolas
privadas

3
Anterior ao PNE 2014/2024, tivemos a Lei n. 010172 de 9 de janeiro de 2001 que “Aprova o
Plano Nacional de Educação e dá outras providências”, em cujos objetivos e metas relativos à
educação infantil, constava: 1.3 Objetivos e Metas1 1. Ampliar a oferta de educação infantil de
forma a atender, em cinco anos, a 30% da população de até 3 anos de idade e 60 % da popula-
ção de 4 a 6 anos (ou 4 e 5 anos) e, até o final da década, alcançar a meta de 50% das crianças
de 0 a 3 anos e 80% das de 4 a 5 anos. Tratava-se de um Plano Decenal, cujas metas da Educa-
ção Infantil, dentre outras, não se efetivaram.

193
SUSIN, M. O. K.; MONTANO, M. R. • A educação infantil: coisas da infância no Brasil

Ano 2013 2015 2017


0 a 3anos 4 a 5anos 0 a 3anos 4 a 5anos 0 a 3anos 4 a 5 anos
Matrículas 1.730.877 3.643.231 1.937.212 3.687.789 2.226.173 4.919.690
Escolas
públicas
Matrículas 999.242 1.217.250 1.111.860 1.235.369 1.180.623 1.182.245
Escolas
privadas

Fonte: Tabela construída pelas autoras com base nos dados disponibilizados nos censos
educacionais 2008, 2009, 2011, 2013, 2015 e 2017. INEP Educação Básica. Disponível em:
<http://portal.inep.gov.br/sinopses-estatisticas-da-educacao-basica>.

Ainda, trazendo consequências para a educação infantil, está a lei


n. 12.796, de 4 de abril de 2013 que dá nova redação ao artigo 31 da lei federal
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional/LDBEN n. 9.394, de 22 de de-
zembro de 1996, que define, entre outras, a avaliação do desenvolvimento das
crianças, mediante acompanhamento sem finalidades de promoção. No en-
tanto, a avaliação proposta pelos movimentos sociais e por teóricos da educa-
ção infantil difere da avaliação acima, por estar centrada em todo o sistema
educativo, desde as condições físicas e materiais dos espaços ocupados, bem
como no processo pedagógico desenvolvido nesta etapa da educação, em con-
traposição a uma avaliação meritocrática4 que responsabiliza crianças e pro-
fessor, ignorando todos os elementos necessários e indispensáveis à aprendi-
zagem das crianças pequenas.

Leis que fomentam a parceria


No Brasil, vivencia-se a minimização do Estado para com as políticas
sociais, prática fomentada pelos ditames neoliberais fortemente incrementa-
dos pelo atual governo brasileiro. Exemplos disso é a Proposta de Emenda à
Constituição n. 55, de 2016 – Proposta de Emenda Constitucional que limita
os gastos públicos relativos à assistência social, educação, cultura, saúde e
previdência social por vinte exercícios fiscais, o que equivale a vinte anos, e
ainda a perda de direitos sociais por meio da recente reforma trabalhista, apro-
vada pelo Congresso Nacional e em vigência desde 2017, que flexibiliza a

4
Por meritocracia entende-se aquela avaliação baseada no mérito, a partir de um modelo pré-
estabelecido e que responsabiliza o sujeito pelas suas aprendizagens, ignorando as diferenças
no modo e nos tempos de aprender, bem como as diferentes oportunidades que cada criança
vivencia nas suas experiências familiares e sociais, considerando que se vive em uma sociedade
de classes, conforme já evidenciado no corpo deste texto.

194
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

legislação brasileira, precarizando as relações de trabalho e as políticas so-


ciais, conforme exigências do capital internacional.
A atual limitação dos gastos públicos traz implicações para a educação,
tornando os cidadãos e as organizações da sociedade civil reféns da precariza-
ção, uma vez que estas farão o atendimento da educação infantil com recursos
mais reduzidos. Em pesquisa realizada no município de Porto Alegre, Peroni,
Susin e Montano (2015) constataram a diferença de 27% a menos entre o valor
repassado para as instituições conveniadas em relação ao repassado pelo FUN-
DEB para o poder público.
A Lei n. 13.019/2014 que dispõe sobre o ordenamento jurídico da par-
ceria resultou de estudos e propostas realizadas por um Grupo de Trabalho/
GT5 criado em 2011 pela então presidenta Dilma Rousseff, como fruto de
promessa de campanha frente à demanda de representantes de movimentos
sociais, institutos e fundações privadas, organizações não governamentais/
ONGs e entidades religiosas.
A lei acima é flexibilizada pelas alterações da Lei 13.204/2015, dentre
as quais se ressalta a não exigência do detalhamento de informações impor-
tantes com relação à prestação de contas.
O novo regramento jurídico para as parcerias entre as organizações da
sociedade civil e a administração pública é entendido como uma forma de
disciplinar esse processo. Os diferentes entes federados deverão regulamentar
a lei, em nível local, detalhando especificidades, conforme abordado no proje-
to de dissertação de Montano (2017).
A partir da nova lei, as parcerias entre a administração pública e a socie-
dade civil serão pautadas pelo interesse recíproco em regime de mútua colabo-
ração atendendo finalidades de interesse público, quando o ente federado pro-
cederá ao chamamento público, mas as instituições também poderão fazer
propostas de parceria ao ente federado. Como exemplo cita-se o município de
São Paulo, capital, cujo Decreto n. 57.575/2016, na Seção II Do Procedimen-
to de Manifestação de Interesse Social, institucionaliza a manifestação do in-
teresse da sociedade civil e dispõe:
Art. 16 – Fica instuído o Procedimento de Manifestação de Interesse Social/
PMIS como instrumento por meio do qual as organizações da sociedade
civil, movimentos sociais e cidadãos poderão apresentar propostas à Secre-

5
O Grupo de Trabalho/GT foi criado pelo “Decreto 7.568, de 16 de setembro de 2011, que
dentre seus artigos, dispõe sobre a instituição do GT, coordenado pela Secretaria Geral da
Presidência da República e constituído com representação da Casa Civil da Presidência da
República, da Controladoria-Geral da União, da Advocacia-Geral da União, do Ministério da
Justiça, do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, do Ministério da Fazenda, por
representantes do governo e por entidades da sociedade civil” (MONTANO/2017. Projeto de
Dissertação qualificado em outubro de 2017).

195
SUSIN, M. O. K.; MONTANO, M. R. • A educação infantil: coisas da infância no Brasil

taria, à Subprefeitura ou ao ente da Administração Indireta competente, para


avaliação da possibilidade de realização de um chamamento público objeti-
vando a celebração de parceria.

As alterações sofridas pela referida Lei n. 13.204/2015 vêm no sentido


de fortalecer os interesses da sociedade civil no que se refere às instâncias deci-
sórias sobre as parcerias, bem como no processo de avaliação dos serviços
oferecidos. Da mesma forma, atendem às prerrogativas da administração ge-
rencial, cujos indicadores para a avaliação dos resultados poderão ser um ou
outro, ou seja, qualitativos ou quantitativos, podendo o gestor priorizar a quan-
tidade em detrimento da qualidade. Flores e Susin (2011, p. 241), referindo-se
à perspectiva de superação da dicotomia quantidade/qualidade, consideram
“[...] ser inadequada a separação das questões do direito ao acesso à qualidade
[...]”.
Segundo Evandro Aparecido dos Santos, Auditor Estadual de Controle
Externo do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso do Sul,
[...] esse novo diploma regulatório das parcerias entre a Administração Públi-
ca e as organizações da sociedade civil coaduna com a visão do Modelo Ge-
rencial de Administração proposto pelo Plano Diretor da Reforma do Apare-
lho do Estado (1995, p. 43), visão focada na eficiência e na construção de
resultados, especialmente no que tange à publicização (SANTOS, 2015, p. 2).

A visão gerencial de administração tem seus princípios baseados na efi-


ciência e eficácia, muito próprios do modelo de administração de empresas
voltadas ao mercado e baseadas em resultados eficientes, sempre buscando
superar metas, o que entra em conflito com os compromissos da educação
infantil a serem alcançados pelos sistemas de ensino no que tange à qualidade
da oferta.
Com a nova lei para a efetivação da transparência, bem como do con-
trole público no acompanhamento das parcerias, a administração pública de-
verá divulgar por website a relação das parcerias e os seus respectivos planos de
trabalho. Por sua vez, as organizações da sociedade civil deverão “divulgar na
internet e em locais visíveis de suas sedes sociais e dos estabelecimentos em que
exerçam suas ações, todas as parcerias celebradas com a administração públi-
ca” (Redação dada pela Lei n. 13.204, de 2015). Segundo Montano (2017),
quanto à obrigatoriedade dessa prática, “depreende-se que a infraestrutura e a
rede tecnológica deverão estar acessíveis a todas as instituições” (Projeto de
Pesquisa, 2017, p. 49). No entanto, em pesquisa realizada por Susin (2013) em
creches comunitárias conveniadas com o poder público em Porto Alegre, o
acompanhamento, que deveria ser feito por meio da participação em reuniões
da comunidade com a instituição, não se efetivava ou por dificuldade de aces-
so a informações que permitissem às famílias fazê-lo, ou até mesmo porque a
comunidade entendia que essa oferta era uma benesse a qual não podia ques-

196
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

tionar para não perder a vaga. A educação infantil para todas as crianças ain-
da não é vista como um direito.
Outra flexibilização trazida pela lei em análise é a possibilidade de cria-
ção de redes de organizações da sociedade civil para a realização da parceria,
na qual somente a organização celebrante tem6 sua vinculação com o poder
público via parceria, sendo que o conteúdo do plano de trabalho é um único e
poderá ser desenvolvido em todas as instituições que farão parte deste pool.
Nesse sentido, problematiza-se a padronização dos aspectos pedagógicos ig-
norando a diversidade da cultura, dos hábitos e dos costumes da região onde
estão inseridas as famílias e as crianças pequenas que são os sujeitos dessa
educação. Essa prática abre possibilidades para a introdução, na educação in-
fantil, do trabalho pedagógico desenvolvido por sistemas apostilados de edu-
cação, cujo conteúdo, adequado à Base Nacional Comum Curricular, poderá
ser unificado em todo o país conforme interesse das organizações privadas
que atuam nesse ramo, fazendo da educação um negócio.
Conforme a LDBEN, no que se refere à formação dos profissionais da
educação infantil, a habilitação desejada é a de nível superior, em curso de
licenciatura plena (Pedagogia), admitida a formação mínima para o exercício
do magistério, a oferecida em nível médio, na modalidade normal, o que se
estende também para os cinco primeiros anos do ensino fundamental. Na prá-
tica, ainda há profissionais sem a formação mínima que atuam como auxilia-
res do professor titular por grupo de crianças. Em muitos casos, as crianças
com jornada integral ficam, em um dos turnos, sob os cuidados desses traba-
lhadores sem a devida formação.
Corrobora com esta afirmação o Decreto Municipal n. 19.775, de 27 de
junho de 2017, com vigência no ano de 2018, que regulamenta a aplicação da
lei da política de parceria do município de Porto Alegre com entidades da
sociedade civil e os documentos exarados pela Secretaria Municipal de Edu-
cação.
Em atendimento ao decreto em questão, a Secretaria Municipal de Edu-
cação/SMED emitiu documento em que pauta o conteúdo do Termo de Cola-
boração. No seu Anexo II, apresenta uma tabela (tabela II especificamente)
que orienta a organização dos grupos etários/enturmação das crianças e o
quadro profissional correspondente; ali não é exigido professor habilitado,
aparecendo somente o termo “Profissional de Apoio” para o ano de 2018,
tanto nos grupos de Berçário I e II, quanto no Maternal I e II. Os Berçários só

6
De acordo com a nova legislação, há dois tipos de termos: o de fomento e o de colaboração,
sendo que o primeiro parte do interesse da organização social, e o segundo parte da adminis-
tração pública. Há ainda, o acordo de cooperação que não envolve repasse de recursos.

197
SUSIN, M. O. K.; MONTANO, M. R. • A educação infantil: coisas da infância no Brasil

contarão com o professor habilitado em 2020. Os maternais I e II terão profis-


sional habilitado em 2019 (Edital 02/2017, p. 8 e 9). Portanto, no documento
orientador da política de conveniamento com as Organizações da Sociedade
Civil/OSCs, o poder público, em Porto Alegre, desconsidera a lei de Diretri-
zes e Bases da Educação Nacional no que se refere à formação dos adultos que
atuam com as crianças, trazendo à tona práticas já superadas, a de que o pro-
fissional que trabalha com as crianças pequenas de berçário e maternal não
carece de habilitação, desvalorizando e desqualificando o profissional e a edu-
cação infantil nos primeiros anos de vida das crianças.
A educação infantil, em que pese os anos de luta pela qualificação e
pela universalização desta etapa da educação básica, ainda está a caminhar a
passos lentos e, em muitos casos, a retroceder nas suas conquistas.

Considerações finais
O direito à educação infantil, mesmo que consagrado em lei, resta fragi-
lizado quando o poder público repassa suas obrigações de oferta para organi-
zações da sociedade civil. A ampliação do acesso, com parcos recursos para
dar conta da competência pública, não assegura a democratização do direito
na medida em que o aumento do número de matrículas, em espaços de quali-
dade duvidosa, não significa direito assegurado.
Ademais, a diversidade social brasileira não permite que os dados sobre
o acesso das crianças pequenas à educação sejam analisados isoladamente,
pois as condições socioeconômicas das famílias são muito diferenciadas, pro-
duzindo distintas infâncias, com necessidades e demandas muito desiguais e
em nível acentuado de carências e precariedades que exigem atendimento ur-
gente e qualificado.
A educação infantil passa a ser responsabilidade do setor privado, que a
oferta por meio da sociedade civil seja em associações de bairro, grupos religi-
osos ou instituições com ou sem fins lucrativos. Assim, a direção é de respon-
sabilidade da sociedade civil. O poder público financia (a baixo custo) e de-
manda o objeto da parceria (atendimento da educação infantil) para o plano
de trabalho. No entanto, o trabalho pedagógico é definido pelas instituições
ofertantes, assim como cabe a elas a responsabilidade pela capacitação dos
profissionais, pelas condições para execução do projeto e pelo cumprimento
das metas fixadas.
A ausência do controle social e o afastamento do Estado no acompa-
nhamento do trabalho destas instituições, bem como a supervisão sob denún-
cia e de forma bastante morosa evidenciam a omissão do acompanhamento e
da fiscalização, tanto por parte do Estado quanto da sociedade civil ou mesmo
dos órgãos fiscalizadores dos sistemas de ensino.

198
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Assim, a educação infantil, como direito público subjetivo, ainda não se


efetivou na infância das crianças brasileiras, tanto pelas características da sua
oferta quanto pelos regramentos jurídicos postos em prática até aqui. O alerta
que se faz é de que esse período não tem como ser recuperado nas vidas dessas
crianças.

Referências
BRASIL. Lei n. 010172. Aprova o Plano Nacional de Educação e dá outras providên-
cias. Janeiro de 2001.
BRASIL. Lei n° 11.494, de 20 de junho de 2007. Regulamenta o Fundo de Manuten-
ção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Edu-
cação – FUNDEB, de que trata o art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais Tran-
sitórias; altera a Lei no 10.195, de 14 de fevereiro de 2001; revoga dispositivos das Leis
nos 9.424, de 24 de dezembro de 1996, 10.880, de 9 de junho de 2004, e 10.845, de 5 de
março de 2004; e dá outras providências.
BRASIL. Lei n. 13.019, de 31 de Julho de 2014. Estabelece o regime jurídico das par-
cerias entre a administração pública e as organizações da sociedade civil, em regime de
mútua cooperação.
BRASIL. Lei n° 13.204, de 14 de dezembro de 2015. Altera a Lei no 13.019, de 31 de
julho de 2014, “que estabelece o regime jurídico das parcerias voluntárias, envolvendo
ou não transferências de recursos financeiros, entre a administração pública e as orga-
nizações da sociedade civil, em regime de mútua cooperação, para a consecução de
finalidades de interesse público; define diretrizes para a política de fomento e de cola-
boração com organizações da sociedade civil; institui o termo de colaboração e o ter-
mo de fomento; e altera as Leis ns. 8.429, de 2 de junho de 1992, e 9.790, de 23 de
março de 1999”; altera as Leis ns. 8.429, de 2 de junho de 1992, 9.790, de 23 de março
de 1999, 9.249, de 26 de dezembro de 1995, 9.532, de 10 de dezembro de 1997, 12.101,
de 27 de novembro de 2009, e 8.666, de 21 de junho de 1993; e revoga a Lei n. 91, de 28
de agosto de 1935.
FLORES, Maria Luiza Rodrigues; SUSIN, Maria Otilia Kroeff. Expansão da Educa-
ção Infantil através da parceria público-privada: algumas questões para o debate (quan-
tidade versus qualidade no âmbito da educação). In: Redefinições da Fronteira entre o
público e o privado: implicações para a democratização da educação/organizadores:
PERONI, Vera Maria Vidal; ROSSI, Alexandre José (Orgs.). Porto Alegre: Programa
de Pós-Graduação em Educação da UFRGS, Gráfica e Editora UFPEL, 2011.
MONTANO, Monique Robain. A parceria público privado a partir do Marco Regulatório da
Sociedade Civil – MROSC na oferta da educação infantil em Porto Alegre. Projeto de
Dissertação/2017.
PERONI, Vera Maria Vidal; SUSIN, Maria Otilia Kroeff; MONTANO, Monique Ro-
bain. A relação público privada na educação infantil: um estudo sobre a qualidade nas cre-
ches comunitárias. Aguardando Publicação. 2015.

199
SUSIN, M. O. K.; MONTANO, M. R. • A educação infantil: coisas da infância no Brasil

PORTO ALEGRE. Decreto n. 19.775, de 27 de junho de 2017. Regulamenta a aplica-


ção da Lei Federal n. 13.019, de 31 de julho 2014 – que estabelece o regime jurídico das
parcerias entre a administração pública e as organizações da sociedade civil, em regi-
me de mútua cooperação, para a consecução de finalidades de interesse público e recí-
proco, mediante a execução de atividades ou de projetos previamente estabelecidos em
planos de trabalho inseridos em termos de colaboração, em termos de fomento ou em
acordos de cooperação, define diretrizes para a política de fomento, de colaboração e
de cooperação com organizações da sociedade civil. 2017.
PORTO ALEGRE. Decreto n. 19.905, de 28 de dezembro de 2017. Altera o Decreto n.
19.775, de 27 de junho de 2017, que regulamenta a aplicação da Lei Federal n. 13.019,
de 31 de julho 2014 – que estabelece o regime jurídico das parcerias entre a administra-
ção pública e as organizações da sociedade civil, em regime de mútua cooperação,
para a consecução de finalidades de interesse público e recíproco, mediante a execução
de atividades ou de projetos previamente estabelecidos em planos de trabalho inseridos
em termos de colaboração, em termos de fomento ou em acordos de cooperação, defi-
ne diretrizes para a política de fomento, de colaboração e de cooperação com organiza-
ções da sociedade civil. 2017.
SANTOS, Evandro Aparecido dos. O novo marco regulatório das parcerias voluntárias: con-
siderações sobre a lei n. 13.019/2014. Tribunal de Contas do Mato Grosso do Sul.
Revista semestral, nov. 2015.
SÃO PAULO. Decreto n. 57.575, de 29 de dezembro de 2016, “Dispõe sobre a apli-
cação, no âmbito da Administração Direta e Indireta do Município, da Lei Federal
n. 13.019, de 31 de julho de 2014, alterada pela Lei n. 13.204, de 14 de dezembro de
2015, que estabelece o regime jurídico das parcerias com organizações da sociedade
civil.” 2016.

200
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

Sobre os autores e as autoras

VERA MARIA VIDAL PERONI


Vera Maria Vidal Peroni é doutora em Educação e professora da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) nos cursos de graduação e pós-
graduação em Educação. Coordena grupo de pesquisa sobre a relação entre o
público e o privado na educação (GPRPPE). Sua pesquisa mais recente trata
das “Implicações da relação público-privada para a democratização da educa-
ção na América Latina: Uruguai, Argentina, Venezuela, Chile, Bolívia e Brasil
Implicações da relação público-privada para a democratização da educação”.

VICTOR ORELLANA
Víctor Orellana es Sociólogo y Mg. en Ciencias Sociales de la Universidad de
Chile. Cursa estudios de Doctorado en Cs. Sociales en la misma casa de estu-
dios, donde además se desempeña como docente e Investigador Asistente del
Centro de Investigación Avanzada en Educación (CIAE). Sus áreas principa-
les de investigación son sociología de la educación, mercantilización educati-
va, educación superior y estructura de clases. Es Director de Investigación de
la Fundación Nodo XXI, y durante 2017 se desempeñó como vocero en edu-
cación en la campaña presidencial de la coalición Frente Amplio.

MARÍA ESTER MANCEBO GONZÁLEZ


María Ester Mancebo González es Doctora en Ciencias Humanas (opción
Educación) por la Universidad Católica del Uruguay, tiene una Maestría en
Ciencias Sociales (opción Ciencia Política) por FLACSO – Argentina y es Pro-
fesora de Historia egresada del Instituto de Profesores Artigas de Uruguay.
Actualmente se desempeña como Profesora Titular (grado 5) en régimen de
dedicación total en el Departamento de Ciencia Política (DCP) de la Facul-
tad de Ciencias Sociales (FCS) de la Universidad de la República (UdelaR).
En el Sistema Nacional de Investigadores de Uruguay está categorizada como
Investigadora Nivel II. Es docente de grado y postgrado de Políticas Educati-
vas y de Políticas Públicas, temáticas en las que desarrolla su investigación y
en las que ha publicado numerosos artículos en libros y revistas especializadas
en el ámbito nacional e internacional. Profesionalmente desarrolló activida-
des en CEPAL (Oficina de Montevideo, 1989-1995), Administración Nacio-
nal de Educación Pública (1995-1999), UNICEF-Uruguay (2002-2004) y Mi-
nisterio de Desarollo Social (2005-2009).

201
Sobre os autores e as autoras

LAURA RODRÍGUEZ
Profesora en Historia (INSP “JVG”), Licenciada en Ciencias de la Educación
(UBA) y Magister en Polìtica y Gestión de la Educación (UNLu), Doctoran-
da en Cs Sociales (UBA). Profesora ordinaria de la División Socio-Histórico
Política del Departamento de Educación de la Universidad Nacional de Luján
en el equipo de Política Educacional. Co-Directora del Proyecto de Investi-
gación “Estado, Universidad y Tercer Sector. Nuevas articulaciones entre lo
público y lo privado: sus consecuencias para la democratización de la Edu-
cación”. Secretaria de Investigación, Posgrado y Extensión del Departamento
de Educación de la UNLu. Investigadora en temáticas relacionadas con las
políticas públicas, el papel del Estado, la política y el gobierno del sistema
universitario, y las transformaciones generales de la educación desde la pers-
pectiva de la Economía Política.

SUSANA E. VIOR
Profesora Emérita en Política Educacional, Directora de la Maestría en Políti-
ca y Gestión de la Educación (1996/2016) Decana del Departamento de Edu-
cación (1984/1991) Universidad Nacional de Luján. Investigadora I en el Pro-
grama Nacional de Profesores del Investigadores (Argentina). Coordinadora
del Seminario Internacional sobre Formación de Profesores Mercosur/Cono-
sur. Há publicado libros y artículos sobre política educacional en Argentina,
Brasil, Chile, México, España.

SAMUEL H. CARVAJAL RUIZ


(Upata, Bolívar – Venezuela). Licenciado en Educación por la Universidad
Central de Venezuela (1990); obtuvo los grados de Magíster en Educación por
la Universidad Central de Venezuela (1995) y de Magíster en Innovación y
Sistema Educativo por el Departament de Pedagogía Aplicada de la Universi-
tat Autònoma de Barcelona (Barcelona, Catalunya, 1998). Doctor en Ciencias
de la Educación (2002) por esta misma universidad. Autor de varios artículos
sobre políticas públicas en educación. Docente-investigador del Núcleo Re-
gional de Educación Avanzada – Caracas de la Universidad Nacional “Simón
Rodríguez”, coordinador de los programas de Especialización en Currículo y
Gestión del Desarrollo Social. Profesor invitado de universidades de Argenti-
na y Chile. Coordinador del Seminario Internacional de Investigación sobre la
Formación de Profesores del Mercosur – Cono Sur.

PAULINA E. VILLASMIL SOCORRO


(Maracaibo, Zulia – Venezuela). Licenciada em Educación por la Universidad
del Zulia (1990); tiene el grado de Magíster en Didáctica y Organización Es-

202
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

colar por la Universidad Complutense de Madrid (2002), actualmente cursa el


Programa de Doctorado en Ciencias para el Desarrollo Estratégico en la Uni-
versidad Bolivariana de Venezuela (Maracaibo, Zulia – Venezuela). Es autora
de varios artículos sobre políticas públicas en educación. Docente-investiga-
dora de la Universidad Nacional Experimental “Rafael María Baralt; coordi-
na la Unidad para la Formación en Investigación e Innovación de esta univer-
sidad. Miembro del Equipo del Seminario Internacional de Investigación so-
bre la Formación de Profesores del Mercosur – Cono Sur.

JAQUELINE MARCELA VILLAFUERTE BITTENCOURT


Mestre e doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do
Sul (UFRGS), professora na Escola de Administração no curso de Adminis-
tração Pública e Social da UFRGS, pesquisadora do Núcleo de Estudos Políti-
cos e Administrativos (NEPA). Temas: Análise de Políticas Públicas, Gestão
Democrática, Estudos Comparados, Planejamento e Financiamento em Edu-
cação e a Relação entre o público e o privado.

MARÍA LUZ ISOLDA MARDESICH PÉREZ


Mestre em Formação Docente e Inovação Educativa pela Universidad de Bar-
celona – Espanha. Mestre em Educação pela Universidad Mayor de San Si-
món – Cochabamba/Bolivia. Bacharel em Administración Escolar pela Uni-
versidad Mayor de San Simón – Cochabamba/Bolivia. Com ampla experiên-
cia como professora do ensino superior. Interesses: Organización de la Ani-
mación Pedagógica en el Complejo Educativo Branco Petricevic; Diagnóstico
de la Educación Privada en Cochabamba. Psicología Evolutiva; Evaluación
académica de los Institutos Normales Superiores.

DANIELA DE OLIVEIRA PIRES


Professora Adjunta da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) nos cur-
sos de licenciatura. Doutora e Mestra em Educação pela Universidade Federal
do Rio Grande do Sul (UFRGS). Integrante do Grupo de Pesquisa, GPRPPE
(Grupo de Pesquisa: Relações entre o Público e o Privado na Educação), vin-
culado ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Fede-
ral do Rio Grande do Sul (PPGEDU/UFRGS). Tem experiência nas áreas da
Educação, com ênfase na Gestão de Processos Educacionais, Política Pública
Educacional, atuando principalmente nos seguintes temas: Estado e política
educacional, gestão educacional brasileira, relação público-privada e educa-
ção em direitos humanos. Atualmente, participa da pesquisa que trata das “Im-
plicações da relação público-privada para a democratização da educação.

203
Sobre os autores e as autoras

LIANE MARIA BERNARDI


Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, pro-
fessora aposentada da Rede Pública Municipal de Porto Alegre, Pesquisadora
do GPRPPE – Grupo de Pesquisa Relação entre o Público e o Privado na
Educação – atua na linha de pesquisa “Política e gestão da educação”.

LUCIA HUGO UCZAK


Possui graduação em Pedagogia e Especialização em Supervisão Escolar pelo
Centro Universitário La Salle. Mestrado e Doutorado em Educação pela Uni-
versidade Federal do Rio Grande do Sul. Atualmente é professora adjunta da
Universidade Feevale. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em
Políticas Educacionais e Supervisão Escolar.

ALEXANDRE JOSÉ ROSSI


Graduado em Filosofia e Especialista em Educação pela Universidade Esta-
dual do Oeste do Paraná (2007). Mestre (2010) com a dissertação Avanços e
limites da política de combate à homofobia: uma análise do processo de im-
plementação das ações para a educação do “Programa Brasil sem Homofo-
bia” e Doutor (2016) em Educação com a tese “Políticas de Diversidade na
Educação: uma análise dos documentos finais das CONAEs, DCNs e PNE”
pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, junto à linha de pesquisa de
Políticas e Gestão de Processos Educacionais. Organizador do livro “Políticas
Educacionais em Tempos de Redefinição no Papel do Estado: implicações
para a democratização da educação”. É autor de capítulos nos livros “Diversi-
dade e Educação: intersecções entre corpo, gênero e sexualidade, raça e etnia”
e no livro “Diversidade Cultural: viver diferenças e enfrentar desigualdades na
educação”, entre outros. Tem se dedicado ultimamente aos seguintes temas:
Sociedade civil, Estado, Políticas Públicas, Política de combate à homofobia,
Políticas de Diversidade na Educação Brasileira.

PAULA VALIM DE LIMA


Graduada em Pedagogia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Membro do Grupo de Pesquisa Relações entre o Público e o Privado na Edu-
cação (GPRPPE). Trabalha como professora do Ensino Fundamental no Cen-
tro de Ensino Médio Pastor Dohms – Unidade Zona Sul.

ELMA JÚLIA GONÇALVES DE CARVALHO


Pós-Doutoranda pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Doutora
em Educação pela Universidade Metodista de Piracicaba. Docente do Depar-
tamento de Teoria e Prática da Educação e do Programa Pós-Graduação em
Educação da Universidade Estadual de Maringá. Maringá, PR – Brasil.

204
Redefinições das fronteiras entre o público e o privado: implicações para a democratização da educação

MARIA RAQUEL CAETANO


É formada em Educação pela UFRGS, professora do Instituto Federal de Edu-
cação, Ciência e Tecnologia Sul-riograndense – IFSUL. Integra o Grupo de Pes-
quisa: Relações entre o Público e o Privado na Educação (GPRPPE UFRGS).

LUCIANI PAZ COMERLATTO


Luciani Paz Comerlatto é professora adjunta na Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (UFRGS). Graduada em História; Especialista em Psicopeda-
gogia; Mestre e Doutora em Educação. Tem experiência docente desde 1988
na educação básica, e desde 2001 no ensino superior, em nível de graduação e
pós-graduação. Apresenta como principais áreas de atuação, disciplinas e pes-
quisas voltadas às Políticas e Gestão de processos educacionais; Educação do
Campo, Formação de professores. É integrante do grupo de pesquisa: “Rela-
ções entre o Público e o Privado na Educação (GPRPPE)” do PPGEDU/
UFRGS. Suas pesquisas mais recentes tratam das implicações da relação pú-
blico e privado para a democratização da educação e também sobre o poten-
cial crítico emancipador da educação popular do campo.

ROMIR DE OLIVEIRA RODRIGUES


Romir de Oliveira Rodrigues é Graduado em Geografia pela Universidade
Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS. Tem Mestrado e Doutorado em Edu-
cação pela UFRGS, na área de Políticas Públicas da Educação, com foco nas
relações público-privado envolvendo, principalmente, questões relativas ao
Ensino Médio e à Educação Profissional. Atualmente é professor no Instituto
Federal do Rio Grande do Sul – Campus Canoas e integrante do grupo de
pesquisa “Implicações da relação público-privada para a democratização da
educação”, coordenado pela Professora Doutora Vera Peroni, na UFRGS.
Possui publicações nacionais e internacionais sobre políticas públicas para o
Ensino Médio e Educação Profissional e Tecnológico, questões curriculares e
educação do campo.

MARIA OTILIA KROEFF SUSIN


Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul/
UFRGS. Professora aposentada da Rede Municipal de Ensino de Porto Ale-
gre. Integrante do Grupo de Pesquisa: Relação entre o Público e o Privado na
Educação, tem como foco de pesquisa a oferta da educação infantil, enquanto
direito público a ser assegurado a todas as crianças e suas famílias.

205
Sobre os autores e as autoras

MONIQUE ROBAIN MONTAN


Possui graduação em Pedagogia, especialização pela UFRGS, Mestranda em
Políticas Públicas e Processos Educacionais. É professora da Rede Municipal
de Ensino de Porto Alegre, atuando no Conselho Municipal Educação. Tem
experiência na área de Educação, com ênfase em Gestão, atuando principal-
mente nos seguintes temas: políticas públicas, democratização, inclusão, di-
versidade e educação especial.

206

Das könnte Ihnen auch gefallen