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Psicologia e Psicologia e

EDUCAÇÃO
EDUCAÇÃO

Psicologia e EDUCAÇÃO
Irene Carmen Piconi Prestes
Catarina de Souza Moro

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Psicologia e
EDUCAÇÃO
Irene Carmen Piconi Prestes
Catarina de Souza Moro

2010
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ção por escrito dos autores e do detentor dos direitos autorais.

P936 Prestes, Irene Carmen Piconi; Moro, Catarina de Souza / Psicologia


e Educação. / Irene Carmen Piconi Prestes; Catarina de Souza Moro.
— Curitiba : IESDE Brasil S.A. , 2010.
424 p.

ISBN: 978-85-387-0836-0

1. Psicologia. 2. Educação. 3. Psicologia Educacional. I. Título.

CDD 370.15

Capa: IESDE Brasil S.A.


Imagem da capa: Jupiter Images/ DPI Images

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Irene Carmen Piconi Prestes

Mestre em Educação pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Graduada em


Psicologia pela Universidade Tuiuti do Paraná (UTP). Docente na UTP. Trabalha
como psicóloga escolar.

Catarina de Souza Moro

Doutora em Educação pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Mestre em


Psicologia da Infância e Adolescência pela UFPR. Especialista em Educação Infan-
til pela UFPR. Bacharel e Licenciada em Psicologia pela UFPR.

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Sumário
Histórico da Psicologia............................................................ 13
Cultura e humanização............................................................................................................ 13
Conhecimento espontâneo.................................................................................................... 14
Conhecimento científico ........................................................................................................ 15
História da ciência psicológica ............................................................................................. 17
No caminho da Psicologia científica .................................................................................. 19
Psicologia científica................................................................................................................... 21

O encontro entre a Psicologia e a Educação................... 33


Distinções entre Psicologia e Psicanálise........................................................................... 34
Contribuições da dimensão “psi” para as práticas educativas.................................... 35
A sala de aula: o professor/aluno/conhecimento........................................................... 39

Processos psicológicos básicos


do comportamento.................................................................. 53
Sensação........................................................................................................................................ 54
Percepção .................................................................................................................................... 56
Linguagem.................................................................................................................................... 57
Pensamento................................................................................................................................. 60
Memória........................................................................................................................................ 61

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Psicologia do desenvolvimento infantil............................ 75
A hereditariedade e o contexto sócio-histórico-cultural............................................. 76
Maturação..................................................................................................................................... 76
Diversidade humana . .............................................................................................................. 77
Diferenças individuais ............................................................................................................. 77
Psicologia do desenvolvimento infantil............................................................................. 77

Psicologia do desenvolvimento da adolescência........103


Desenvolvimento emocional...............................................................................................105
Desenvolvimento físico..........................................................................................................108
Desenvolvimento psicossocial segundo Erik Erikson.................................................110
Desenvolvimento intelectual...............................................................................................113

Problemas dos pais: crescendo com o outro................127


A família dos dias de hoje.....................................................................................................127
A responsabilidade social dos pais....................................................................................128
O que é ser mamãe e papai?................................................................................................134
A importância do laço família-escola................................................................................135
Níveis de crescimento.............................................................................................................137

Contribuições de Sigmund Freud


ao contexto educativo...........................................................149
Considerações iniciais sobre a teoria psicanalítica de Sigmund Freud................149
O inconsciente: objeto de estudo da Psicanálise.........................................................153
O aparelho psíquico................................................................................................................155
Processo de desenvolvimento psicossexual infantil...................................................156
Aplicação no contexto educativo.......................................................................................157

O campo transferencial.........................................................169
Aprender com o professor....................................................................................................172
O campo de transferência.....................................................................................................173

O desafio da diferença...........................................................191
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Contribuições de Henri Wallon
ao contexto educativo...........................................................207
A psicogenética de Henri Wallon........................................................................................207
O homem como ser geneticamente social.....................................................................208
Os quatro eixos fundamentais ...........................................................................................209
Conceitos importantes...........................................................................................................212
Etapas do desenvolvimento.................................................................................................213
A psicogenética walloniana e a Educação......................................................................214

Contribuições de Lev Vygotsky


ao contexto educativo...........................................................229
Papel da interação no desenvolvimento humano.......................................................231
O desenvolvimento e a aprendizagem: processos complementares...................232
Brincadeiras e jogos infantis................................................................................................233
Pensamento e linguagem.....................................................................................................235

Contribuições de Jean Piaget


ao contexto educativo...........................................................247
A inteligência: objeto de estudo para Piaget.................................................................248
Quatro conceitos fundamentais.........................................................................................249
Inteligência e desenvolvimento..........................................................................................250
Consciência moral....................................................................................................................252
O lugar do educador...............................................................................................................254
Momentos de aprendizagem..............................................................................................255
Construindo a autonomia.....................................................................................................255

Aprendizagem escolar e habilidades de estudo..........267


Aprender.....................................................................................................................................268
Aprendizagem escolar e o ato de estudar......................................................................269
Habilidades de estudo............................................................................................................271
Capacidades organizacionais..............................................................................................274
Capacidades motivacionais..................................................................................................274
Capacidades necessárias para uma aprendizagem eficiente...................................275

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Disciplina: uma retrospectiva histórica...........................287
O vínculo afetivo e o contexto escolar.............................................................................290
Os apelos da vida social.........................................................................................................291
Diferentes significados do termo disciplina...................................................................292
Relações de poder, autoridade e disciplina....................................................................293
A Escola Nova e a disciplina..................................................................................................294
A disciplina ingrediente da liberdade...............................................................................295

Percurso histórico da educação sexual na escola........311


Sobre o desenvolvimento psicossexual do homem....................................................314

Questões sobre o manejo


das dificuldades de aprendizagem...................................329
Dificuldades de aprendizagem...........................................................................................330
O que pensamos sobre nossas dificuldades?................................................................331
Ações para maximizar o potencial do aluno .................................................................336

A ação preventiva e a aprendizagem...............................347


Disgrafias.....................................................................................................................................347
Disortografia..............................................................................................................................349
Dislexias.......................................................................................................................................350
Discalculia...................................................................................................................................352
Transtorno por deficit de atenção com hiperatividade..............................................354

O fracasso escolar nos dias de hoje..................................369


O saber medicalizante e o fracasso escolar....................................................................371
Fracasso escolar e o contexto social..................................................................................372
Fracasso e contexto escolar..................................................................................................374
A dimensão “psi” e as situações de fracasso escolar....................................................375

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Valores humanos e o cotidiano escolar...........................391
Comunidade escolar pautada nos direitos humanos.................................................393
Ações da comunidade escolar.............................................................................................394
Construindo o conhecimento ............................................................................................395
Direitos humanos.....................................................................................................................396
Educar é um direito humano...............................................................................................396

Relações interpessoais e o grupo na escola..................407


Sociabilidade.............................................................................................................................408
Atitude.........................................................................................................................................410
Papel social.................................................................................................................................411
O grupo social...........................................................................................................................412
“Eu” e o grupo............................................................................................................................413
O papel do educador..............................................................................................................413

Anotações..................................................................................423

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Apresentação

Pretendemos com este livro refletir sobre a prática, sem esquecer de uma boa
fundamentação teórica, abordando temas atuais e interessantes. Não pretende-
mos oferecer modelos, mas sim possibilidades que o leitor possa adaptar à sua
prática na sala de aula.

No primeiro tema aparece como questão central o histórico da Psicologia. A


história de sua construção está ligada às exigências de conhecimento da humani-
dade, às demais áreas do conhecimento humano e aos novos desafios colocados
pela realidade socioeconômica, além da insaciável necessidade humana de com-
preender a si mesmo.

Trata-se de um trabalho interessante, complementado pelo segundo tema, que


inclui os processos psicológicos. Esse primeiro bloco de conceituação em conjunto
proporciona vários elementos para a reflexão e dá oportunidade para gerar novas
ideias que contribuam para melhorar a ação educativa.

Com o segundo bloco de temas discutimos o desenvolvimento humano. Estu-


dar o desenvolvimento significa conhecer a história do homem desde a concep-
ção até a morte, o que quer dizer que há características específicas de determina-
dos períodos a serem destacados, como: a infância, a adolescência, a vida adulta e
a velhice. O desenvolvimento é um processo complexo de integração e organiza-
ção de acontecimentos e experiências que ocorrem em cada idade do homem.

O desenvolvimento humano também é abordado a partir de uma visão teórica


psicodinâmica, por meio da Psicanálise Freudiana. Outros três enfoques teóricos
são apresentados: a Epistemologia e Teoria Genética, de Jean Piaget; a Psicologia
Histórico-cultural, de Lev S. Vygotsky; e a Psicogenética, de Henri Wallon. Pode-se
dizer que esses aportes teóricos tecem os fundamentos para se compreender a
relação entre o desenvolvimento emocional, cognitivo e social do ser humano.

Outro bloco de temas discute a responsabilidade social com o desenvolvimen-


to do ser humano para conviver com as mudanças nesta sociedade tão dinâmica,
entendendo que conviver, “viver com”, é um processo natural de agregação de
todos os seres vivos. Assim, apresentamos temas como relações interpessoais,
inteligências múltiplas, fracasso escolar e dificuldades de aprendizagem. Com-
preender o processo de ensino-aprendizagem e trabalhar para o sucesso escolar
é algo que almejamos, e por isso buscamos contribuições de autores que têm
refletido sobre essa temática tão complexa.

Irene Carmen Piconi Prestes e Catarina de Souza Moro

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Histórico da Psicologia

Irene Carmen Piconi Prestes


A dúvida é o início do conhecimento.

René Descartes

Para atender a amplitude da convergência entre a Psicologia e a Edu-


cação, iniciamos este texto contextualizando a história da ciência psicoló-
gica, apresentando seu objeto de estudo – o comportamento humano – e
abrindo, desse modo, o diálogo com a Educação. Nesse caminho, inicial-
mente, buscamos compreender o homem no processo de humanização.

Cultura e humanização
A cultura é o processo pelo qual o homem acumula as experiências
que é capaz de realizar, discerne entre elas, fixa aquelas de efeito favorável
e, como resultado da ação exercida, converte em ideias as imagens e lem-
branças, a princípio coladas à realidade sensível e, depois, generalizadas,
no contato inventivo com o mundo natural.

O mundo resultante da ação humana é um mundo que não mais po-


demos chamar de natural, pois se encontra cada vez mais humanizado,
ou seja, transformado pelo homem. E o trabalho do homem, ao mesmo
tempo em que transforma a natureza, adaptando-a às necessidades hu-
manas, altera o próprio homem, desenvolvendo suas potencialidades.

O homem muda as maneiras pelas quais age sobre o mundo, estabele-


cendo relações também mutáveis que, por sua vez, alteram a maneira de
sentir, perceber, pensar e agir.

A atividade relacional humana permite-lhe que a convivência não só fa-


cilite a aprendizagem e o aperfeiçoamento dos instrumentos, mas também
enriquece a afetividade resultante do relacionamento interpessoal. Destar-
te, o homem aprende a conhecer a natureza, as pessoas e a si mesmo.

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Histórico da Psicologia

O homem é um ser de linguagem e pensamento. O uso da palavra pelo homem


o caracteriza e o distingue dos outros seres vivos. Assim, podemos dizer que o
homem está imerso no universo simbólico, num campo de representação, de sen-
tidos e significados. O símbolo representa alguma coisa, fundamenta-se numa
convenção social da realidade humana, é versátil e flexível, quer dizer, a linguagem
é simbólica, pois coloca o humano em relação com o ausente, com a representa-
ção dos objetos e das coisas. Se a linguagem animal visa à adaptação a uma situa-
ção concreta, a linguagem humana intervém como um abstrato da situação. A pa-
lavra distancia o homem da experiência vivida, tornando-o capaz de reorganizá-la
numa outra dimensão (simbólica), que lhe dará um novo significado.

Assim, temos que o homem entra em contato com o mundo que o cerca de
duas maneiras: a primeira baseada nas experiências casuais, espontâneas, sus-
tentadas no “bom senso” e a outra baseada na experiência científica.

Essas duas abordagens do mundo coexistem em um mesmo tempo e em um


mesmo lugar, mas é bom lembrar que o ato de conhecer científico é um fato
histórico mais recente, pois a ciência moderna data do século XVII.

Conhecimento espontâneo
O bom senso é simplesmente o depósito intelectual indiferenciado resul-
tante da série de experiências fecundas do grupo social e do indivíduo, que se
transmite de forma não sistemática, por herança racional, e não em caráter de
conhecimento refletido.

O chamado conhecer espontâneo nasce diante da tentativa do homem em


resolver os problemas do mundo natural. Assim, um homem do campo sabe
plantar e colher segundo normas que aprendeu com seus pais, usando técnicas
particulares ao seu grupo social, e que se transformam lentamente em função
dos acontecimentos fortuitos com os quais se depara na sua vida diária.

Esse tipo de conhecimento é chamado empírico, porque se baseia na experiên-


cia cotidiana e comum das pessoas e se distingue da experiência científica por ser
feita sem planejamento rigoroso. É também um conhecimento ingênuo por não
ser crítico, não se colocar como problema, não se questionar enquanto saber.

Quando uma pessoa faz um bolo, ela segue a receita e a incorpora numa série
de informações para o melhor sucesso do seu trabalho. Sabe que, ao bater as claras
em neve, elas crescem e se tornam esbranquiçadas; que não convém abrir o forno

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Histórico da Psicologia

quando o bolo começa a assar, senão ele murcha; que a medida adequada de fer-
mento faz o bolo crescer. Se estiver fazendo pudim em banho-maria, sabe que uma
fatia de limão na água evita o escurecimento da vasilha, o que facilitará seu trabalho
posterior de limpeza. É provável que essa pessoa saiba tudo isso, mas não saiba por
que e como ocorrem esses fenômenos; não conhece, enfim, suas causas.

O conhecimento subjetivo depende de juízos pessoais a respeito das coisas,


ocorrendo o envolvimento das emoções e dos valores de quem observa. Assim,
é difícil para uma mãe, por exemplo, avaliar objetivamente a conduta do filho.
Do mesmo modo, se temos antipatia por alguém, é preciso esforço para reco-
nhecer, por exemplo, o seu valor profissional. Também, ao observar o compor-
tamento de povos com costumes diferentes dos nossos, tendemos a julgá-los a
partir dos nossos valores.

Por sua vez, o conhecimento espontâneo é fragmentário, pois não estabe-


lece conexões onde elas poderiam ser verificadas. Por exemplo, não é possível
ao homem comum perceber qualquer relação entre o orvalho da noite e o suor
que aparece na garrafa que foi retirada da geladeira, nem entre a combustão e
a respiração (que é uma forma de combustão discreta, ou seja, a queima dos ali-
mentos no processo digestivo para obter energia é também uma combustão).

É ainda um conhecimento particular, restrito a uma pequena amostra da realida-


de, a partir da qual são feitas generalizações muitas vezes apressadas e imprecisas.
O homem comum seleciona os dados observados sem nenhum critério de rigor, de
forma ametódica e fortuita, movido pelas emoções e restrito pela experiência vivida;
suas conclusões, portanto, não estão isentas de preconceitos e estereótipos.

Conhecimento científico
O conhecimento científico é uma conquista recente da humanidade: tem
apenas 300 anos e surgiu no século XVII. Isso não significa que antes dessa data
não houvesse nenhum saber rigoroso. Sócrates preocupava-se com a definição
dos conceitos, pelos quais pretendia atingir a essência das coisas, e Platão mos-
trava o caminho que a educação do sábio devia percorrer para ir da doxa (opi-
nião) à episteme (ciência).

A ciência moderna nasce com a determinação de um objeto científico, es-


pecífico de investigação, e com o método pelo qual se fará o controle desse co-
nhecimento. Cada ciência se torna uma ciência particular no sentido de ter um
campo delimitado de pesquisa.
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Histórico da Psicologia

A preocupação do cientista está na descoberta das regularidades que exis-


tem em determinados fatos. Por isso, a ciência é geral, isto é, as observações
feitas para alguns fenômenos são generalizadas e expressas pelo enunciado de
uma lei.

Vale ressaltar que as ciências são particulares na medida em que cada uma
privilegia setores distintos da realidade: a Física trata do movimento dos corpos;
a Química, da sua transformação; a Biologia, do ser vivo etc. No entanto, a ciência
é geral no sentido de suas conclusões não valerem apenas para os casos obser-
vados. Assim, ao afirmarmos que “o peso de qualquer objeto depende do campo
de gravitação”, ou que “a cor de um objeto depende da luz que ele reflete”, ou
ainda que “a água é uma substância composta de hidrogênio e oxigênio”, esta-
mos fazendo afirmações que são válidas para todos os corpos, todos os objetos
coloridos ou qualquer quantidade de água.

Enquanto o saber comum observa um fato a partir do conjunto dos dados


sensíveis que formam a nossa percepção imediata, pessoal e efêmera do mundo,
o saber científico é um fato isolado do conjunto em que se encontra normal-
mente inserido e elevado a um grau de generalidade: quando nos referimos à
“dilatação” ou ao “aquecimento” como fatos científicos, estamos muito distantes
dos dados sensíveis de um certo corpo em um determinado momento; além
disso, estabelecemos entre tais fatos uma relação de variação do tipo “função”.
Isso supõe uma capacidade de racionalização dos dados recolhidos, que nunca
aparecem como dados brutos, mas sempre passíveis de interpretação.

O mundo construído pela ciência aspira à objetividade: as conclusões podem


ser verificadas por qualquer outro membro componente da comunidade cientí-
fica, pois a racionalidade desse conhecimento procura despojar-se do emotivo,
tornando-se impessoal à medida do possível.

Para ser precisa e objetiva, a ciência dispõe de uma linguagem rigorosa, cujos
conceitos são definidos de modo a evitar ambiguidades. Essa linguagem se
torna cada vez mais precisa, à medida que utiliza a matemática para transformar
as qualidades em quantidades.

Outro elemento importante é o uso de instrumentos de medida (balança,


termômetro etc.) que permitem ao cientista ultrapassar a percepção imediata e
subjetiva da realidade e fazer uma verificação objetiva dos fenômenos.

A abordagem que a ciência faz da realidade permite a previsibilidade dos


fenômenos, o que, consequentemente, possibilita um maior poder para a trans-

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Histórico da Psicologia

formação da natureza. Dessa característica da ciência resulta o desenvolvimento


da tecnologia, que tem mudado o habitat humano timidamente a partir da Re-
volução Industrial, no século XVIII, e rapidamente no século XX. A ambiguidade
desse poder, que pode estar a serviço do homem ou contra ele, pode provocar
reflexões de caráter moral, em que são questionados os fins a que se destinam
os meios utilizados pelo homem: se servem ao seu crescimento espiritual ou se o
degradam; servem-se à liberdade ou às formas de dominação.

História da ciência psicológica


A Psicologia é produto da história humana. Dessa maneira, tem, por trás de si,
a contribuição de inúmeros homens que, em uma dimensão de tempo passado-
-presente, fizeram indagações, realizaram descobertas, inventaram técnicas e de-
senvolveram ideias, isto é, por trás de qualquer produção humana existe a História.

Essa história pode ser mais ou menos longa para os diferentes aspectos da pro-
dução humana. No caso da Psicologia, a história tem por volta de dois milênios.

Para compreender a diversidade com que a Psicologia se apresenta hoje, é


indispensável recuperar sua história. A história de sua construção está ligada às
exigências de conhecimento da humanidade, às demais áreas do conhecimen-
to humano e aos novos desafios colocados pela realidade econômica e social e
pela insaciável necessidade do homem de compreender a si mesmo.

A história do pensamento humano tem um momen-

Domínio público.
to áureo na Antiguidade, entre os gregos, particular-
mente no período de 700 a.C. até a dominação romana,
às vésperas da Era Cristã.

Os gregos foram os mais evoluídos nessa época.


Tais avanços permitiram que o cidadão se ocupasse
das coisas do espírito, como a Filosofia e a Arte. Alguns
homens, como Platão e Aristóteles, dedicaram-se a
compreender o espírito empreendedor do conquista-
dor grego, ou seja, a Filosofia começou a especular em
torno do homem e sua interioridade.

É entre os filósofos gregos que surge a primeira ten-


tativa de sistematizar uma Psicologia. O próprio termo
psicologia vem do grego psyché, que significa alma, e
Sócrates (469-399 a.C.).

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Histórico da Psicologia

de logos, que significa razão. Portanto, etimologicamente, Psicologia significa


“estudo da alma”. A alma era concebida como parte imaterial do ser humano e
abarcaria o pensamento, os sentimentos de amor e de ódio, a irracionalidade, o
desejo, a sensação e a percepção.

Os filósofos preocupavam-se em definir a relação do homem com o mundo.


Discutiam se o mundo existe porque o homem o vê ou se o homem vê um mundo
que já existe. Há, também, preocupação com o interior do homem e com a ma-
neira pela qual se relaciona consigo e com o ambiente. Apresentam as questões
existenciais humanas: Quem sou eu? Para onde vou? De onde venho?

É com Sócrates (469-399 a.C.), no entanto, que a Psicologia na Antiguidade


ganha consistência. Sua principal preocupação era com o limite que separa
o homem dos animais. Dessa forma, postulava que a principal característi-
ca humana era a razão. A razão permitia ao homem sobrepor-se aos instintos,
que seriam a base da irracionalidade. Ao definir a razão como peculiaridade do
homem ou como essência humana, Sócrates abre um caminho que seria muito
explorado pela Psicologia. Assim, as teorias da consciência são frutos dessa pri-
meira sistematização na Filosofia.

O Renascimento (século XV) marca uma época de transformações radicais no


mundo europeu. O mercantilismo leva à descoberta de novas terras (a América, o
caminho para as Índias, a rota do Pacífico) e isso propicia a acumulação de riquezas
pelas nações em formação, como a França, a Itália, a Espanha, a Inglaterra. Com a
transição para o capitalismo, começa a emergir uma nova forma de organização
econômica e social. Dá-se, também, um processo de valorização do homem.

As ciências também conhecem um grande avanço. Em 1543, Copérnico causa


uma revolução no conhecimento humano, mostrando que o nosso planeta não
é o centro do universo. Em 1610, Galileu estuda a queda dos corpos, realizando
as primeiras experiências da Física moderna. Esse avanço na produção de conhe-
cimentos propicia o início da sistematização do conhe-
Domínio público.

cimento científico, isto é, começam a se estabelecer


métodos e regras básicas para a construção do conhe-
cimento científico.

Nesse período, René Descartes (1596-1659), um dos


filósofos que mais contribuiu para o avanço da ciência,
postula a separação entre mente e corpo, afirmando
que o homem possui uma substância pensante, e que
o corpo, desprovido do espírito, é apenas uma máqui- René Descartes (1596-1659).

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Histórico da Psicologia

na como qualquer corpo físico (estrelas, pedras). Esse dualismo mente-corpo


(Discurso do Método, de 1637) torna possível o estudo do corpo humano morto,
o que era impossível nos séculos anteriores (o corpo era considerado sagrado
pela Igreja, por ser a sede da alma) e, dessa forma, possibilita o avanço da Ana-
tomia e da Fisiologia, que iriam contribuir em muito para o progresso da própria
Psicologia.

Para Descartes, os nervos eram ocos. Já o filósofo David Hartley (1705-


1757) considerava os nervos sólidos, pois transmitem impulsos de uma para
outra parte do corpo.

No caminho da Psicologia científica


No século XIX, o papel da ciência destaca-se e seu avanço torna-se necessá-
rio. O crescimento da nova ordem econômica – o capitalismo – traz consigo o
processo de industrialização, para o qual a ciência deveria dar respostas e solu-
ções práticas no campo da técnica. Há, então, um impulso muito grande para o
desenvolvimento da ciência, como sustentáculo da nova ordem econômica e
social, e dos problemas colocados por ela.

Nesse período, surgem homens como Hegel (1770-1831), demonstrando


a importância da história para a compreensão do homem, e Charles Darwin
(1809-1882) com a teoria evolucionista (1859) de sobrevivência: a espécie que
“dá certo” é a que se adapta ao seu meio ambiente. A ciência avança tanto que
passa a ser, para o homem, um referencial para a visão
de mundo. A partir dessa época, a noção de verdade Domínio público.

passa, necessariamente, a contar com o aval da ciên-


cia. A própria Filosofia adapta-se aos novos tempos,
com o surgimento do Positivismo, de Auguste Comte
(1798-1857), que postulava a necessidade de um rigor
científico na construção dos conhecimentos nas ciên-
cias humanas. Dessa forma, propunha o método da
ciência natural, a Física como modelo de construção
de conhecimento. Charles Darwin (1809-1882).

É em meados do século XIX que os problemas e temas da Psicologia, até então


estudados exclusivamente pelos filósofos, passam a ser também investigados pela
Fisiologia e pela Neurofisiologia, em particular. Os avanços dessa área levaram à for-

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Histórico da Psicologia

mulação de teorias sobre o sistema nervoso central, demonstrando que o pensa-


mento, as percepções e os sentimentos humanos eram produtos desse sistema.

Para se conhecer o psiquismo humano, passa a ser necessário compreender


os mecanismos e o funcionamento da máquina de pensar do homem – seu cé-
rebro. Assim, a Psicologia começa a trilhar os caminhos da Fisiologia, Neuroana-
tomia e Neurofisiologia.

Algumas descobertas são extremamente relevantes para a Psicologia. Por


exemplo, por volta de 1846, a Neurologia descobre que a doença1 é fruto da
ação direta de diversos fatores sobre as células cerebrais.

A Neuroanatomia descobre que a atividade motora nem sempre está ligada à


consciência, por não estar necessariamente na dependência dos centros cerebrais
superiores. Por exemplo, quando alguém encosta a mão em uma chapa quente, pri-
meiro tira-a da chapa para depois perceber o que aconteceu. Esse fenômeno chama-
se reflexo: o estímulo que chega à medula espinhal, antes de chegar aos centros ce-
rebrais superiores, tem lá mesmo uma ordem-resposta, que é tirar a mão.

O caminho natural que os fisiologistas da época seguiam, quando passavam


a se interessar pelo fenômeno psicológico enquanto estudo científico, era a Psi-
cofísica. Estudavam, por exemplo, a Fisiologia do olho e a percepção das cores.
As cores eram estudadas como fenômeno da Física, e a percepção, como fenô-
meno da Psicologia.

Por volta de 1860, temos a formulação de uma importante lei do campo da


Psicofísica. É a lei de Fechner-Weber, que estabelece a relação entre um estímu-
lo e a percepção-sensorial desse estímulo pelo organismo vivo. Esse fato permite
que se possa estabelecer um índice de medida para cada organismo da relação
estímulo-sensação. Segundo Fechner-Weber, a quantidade (fluxo, força, intensi-
dade) de sensação que o organismo é capaz de perceber depende diretamente da
quantidade (fluxo, força, intensidade) de estímulo que ele recebe. Ainda, verificou-
-se que há diferenças na percepção-sensorial de estímulos para cada organismo, o
que os levou a estabelecer o limiar diferencial de excitabilidade do organismo.

Essa lei teve muita importância na história da Psicologia porque instaurou


a possibilidade de medida do fenômeno psicológico, o que até então era con-
siderado impossível. Dessa forma, os fenômenos psicológicos vão adquirindo
status de científicos, porque, para a concepção de ciência da época, o que não
era mensurável não era passível de estudo científico.

1
Por doença, entendemos aqui a falta ou perturbação da saúde, qualquer moléstia ou enfermidade, sofrimento físico, mal.

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Histórico da Psicologia

Psicologia científica
A Psicologia formou-se no seio da Filosofia e, por muito tempo, foi parte es-
sencial dessa disciplina. A Psicologia contemporânea se caracteriza por uma
crise de emancipação perante a Filosofia. Desenvolveu-se da parte propriamen-
te filosófica do programa, a metafísica, e se constituiu como disciplina autôno-
ma; veio a ser, assim, a ciência da vida psíquica. Sendo essa vida conhecida pela
consciência, e não pelos sentidos, definiu-se também como o estudo dos fatos
da consciência.

Nos Estados Unidos, essa autonomia foi mais rapidamente conquistada. Não
possuindo tradição filosófica, propensos, além disso, ao concreto e ao útil, os
americanos encontraram-se na Psicologia aplicada.

Muitas ideias científicas tiveram que se desenvolver dentro da ciência antes


que a Psicologia pudesse surgir tal como concebida por seu fundador Wilhem
Wundt. A contribuição de Wundt é muito importante para o surgimento da Psi-
cologia experimental.

Wundt funda, na Universidade de Leipzig, na Ale-

Domínio público.
manha, em 1879, o primeiro laboratório para rea-
lizar experimentos na área da Psicofisiologia com o
uso de instrumentos de observação. Por esse fato
e por sua extensa produção teórica na área, ele é
considerado o pai da Psicologia moderna. Segui-
ram para a Alemanha muitos estudiosos dessa nova
ciência, como Fechner-Weber, Titchner e William
James. Seu status de ciência é obtido na medida em
que se “liberta” da Filosofia, que marcou sua história
até aqui, e atrai novos estudiosos e pesquisadores,
os quais, sob os novos padrões de produção de co- Wilhelm Wundt (1832-1926).
nhecimento, passam a:

 delimitar seu objeto de estudo (o comportamento, o psiquismo, a consci-


ência, fenômenos psíquicos);

 estabelecer seu campo de estudo, diferenciando-o de outras áreas de co-


nhecimento, como a Metafísica, Psicofísica e Neurofisiologia;

 elaborar métodos de investigação específicos ao seu objeto (comporta-


mento humano).

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Histórico da Psicologia

Wilhelm Wundt considerava distintas a Psicologia da Física e da Fisiologia. No


que se refere à causalidade física e psíquica do comportamento do homem, no
entanto, as entendia como ciências interdependentes na medida em que deve-
riam buscar as relações entre processos perceptivos conscientes e certos fenô-
menos da vida física.

Segundo Wundt, a base de todos os ajustamentos do organismo é um processo


psicofísico, uma reação orgânica acessível do lado fisiológico e do lado psicológico.

Dessa maneira, a visão wunditiana introduz uma noção importante: a do ca-


ráter unificador da atividade mental (sensação, percepção, vontade). No desen-
volvimento do indivíduo, a sensação vem primeiro. Ela é uma precursora neces-
sária da reflexão porque tem de haver primeiro um reservatório de impressões
ou experiências sensoriais para que o indivíduo seja capaz de refletir. A princi-
pal função da consciência é unificadora, ou seja, de estabelecer uma trama de
conteúdos mentais. Os elementos buscados são processos e envolvem aspectos
sensório-perceptuais e emocionais.

A partir de processos fisiológicos, formam-se, por exemplo, sensações e per-


cepções como de frio ou de calor. Estas se organizam em representações que,
por seu lado, podem ser acompanhadas de sentimentos que se organizam em
emoções, chegando a constituir estados afetivos. Assim, os atos de vontade
estão associados à mudança de estados afetivos, garantindo a integração da
consciência.

Cabe mencionar que para Wundt seu conceito de vontade não supõe apenas
um ato de escolha ou decisão consciente, mas representa uma de suas formas
mais complexas. Volição2 é uma função biológica e engloba manifestações afeti-
vas. Esse afeto imprime direção aos movimentos impulsivos, dirigindo-os a uma
meta ou indo contra uma meta.

Os estudos de Wundt possibilitaram a emergência e a ampliação do corpus


teórico da Psicologia, como: a Psicologia da forma, a Psicologia cognitiva, a Psi-
cologia complexa de Carl Jung, a Psicologia de abordagem sistêmica, a Psicolo-
gia Psicodramática, entre outras. E é importante destacar a Psicanálise ou Teoria
Psicanalítica, que se preocupa com as questões psíquicas do ser humano, mas
não decorre nem se opõe a nenhuma escola de pensamento psicológico. A Psi-
2
Volição: pode se estabelecer referência com o ato de querer da pessoa. Ato de vontade que se determina sobre as coisas. Exercício do querer e
fazer acontecer.

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Histórico da Psicologia

canálise interessa-se pelos processos do inconsciente do psiquismo e seus efei-


tos sobre o comportamento humano, um tópico ignorado pelos outros sistemas
de pensamento.

Apesar de a Psicologia ter sua origem na Alemanha, é no continente ameri-


cano que ela encontra campo para um rápido crescimento, resultado do grande
avanço econômico que colocou os Estados Unidos na liderança do sistema capi-
talista. É ali que nascem as primeiras abordagens em Psicologia, as quais deram
origem às inúmeras teorias que existem atualmente.

A Psicologia estuda o comportamento humano. É a ciência do homem,


considerado no todo e fazendo um todo com o seu contexto sociocultural.

Texto complementar

Fenômeno psicológico
(BOCK, 2000, p. 11-12)

A ideia de uma natureza humana em cada um de nós é uma das ideias


mais camufladoras que produzimos no conjunto de nossas concepções.
Pensar o homem a partir da natureza humana é encobrir toda história social
da constituição do humano. É pensar o homem como naturalmente humano.
Ocultar a determinação social do homem e descolá-lo da realidade social
que o constitui e lhe dá sentido é um trabalho ideológico que a Psicologia
precisa superar, pois esse trabalho de ocultamento permite que a Psicologia
se alinhe às construções ideológicas mais perversas em nossa sociedade, tor-
nando aquilo que é social e histórico em algo natural e universal, no qual não
se pode mexer e não se pode mudar.

Um homem que, ao transformar sua realidade para poder garantir sua


sobrevivência, vai também construindo seu mundo psicológico que estaria
assim diretamente ligado, enquanto características, possibilidades e limites,
à sociedade na qual ele se insere e se constitui.

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Pensar a partir da perspectiva histórica não significa apenas entender que


conforme o tempo vai passando e nossa sociedade modificando-se, nossas
concepções científicas também vão sofrendo modificações. Não, é mais do
que isso. É acreditar que, conforme vamos mudando nossas formas de vida,
vamos transformando nossas formas de ser. Vamos transformando nosso
mundo psíquico, em sua estrutura, em seus conteúdos, em sua dinâmica, em
suas possibilidades e em suas funções. Vamos constituindo um novo fenô-
meno psicológico dentro de nós que merecerá ser estudado e conceituado.
A ciência do homem muda não só porque são realizadas novas descobertas
sobre o homem, mas também porque o próprio homem muda.

Assim, voltando ao nosso eixo de pensamento, a natureza humana é uma


concepção que em nada nos ajuda, pois empobrece nossas leituras, atribuin-
do ao homem um conteúdo natural que deve ter todas as possibilidades de
desenvolvimento. Nas visões mais críticas, a sociedade deverá ser, então, ob-
servada e julgada enquanto facilitadora ou não do desenvolvimento dessa
natureza humana em potencial.

A ideia de condição humana


A ideia de condição humana torna-se muito mais rica. O homem passa
a ser visto como um ser que constrói as formas de satisfação de suas ne-
cessidades e faz isso com os outros homens. Essa é a sua condição. A cada
momento histórico é preciso que se compreenda como isso está se dando,
que necessidades estão colocadas e quais as formas de satisfação delas que
foram construídas; como o homem tem feito isso com os outros homens. Só
assim poderá compreender-se qual homem (e que psiquismo) se tem na-
quele momento histórico e naquela sociedade.

“No conjunto das relações sociais, mediadas pela linguagem, o indivíduo


vai desenvolvendo sua consciência. Com o desenvolvimento da consciência,
o homem sabe seu mundo, sabe-se no mundo, antecede as coisas do seu
mundo, partilha-as com os outros, troca, constrói e reproduz significados.

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Quando atua sobre o mundo, relacionando-se, apropria-se da cultura e ad-


quire linguagem; apropria-se dos significados e constrói um sentido pessoal
para suas vivências. Tem, assim, todas as condições para atuar com os outros,
criar cultura e elaborar significados. O homem se faz homem ao mesmo
tempo que constrói seu mundo” (BOCK, 1997, p. 26).

O homem
“Pensar o homem como possuidor de direitos naturais, pensar o homem
como livre e igual pressupõe a ideia de que existe uma natureza humana,
a mesma em todos os tempos e lugares. Isso é o mesmo que dizer serem
alguns elementos caracterizadores do homem, necessários e universais, efei-
tos de uma causa também necessária e universal: natureza. Ficam subesti-
madas as determinações sociais.

Indivíduo é uma ideia associada às noções de liberdade, autonomia,


igualdade enquanto direitos naturais, dotado de características e potenciali-
dades próprias, particulares; dotado de consciência individual e de emoções
particulares. A noção de indivíduo carrega consigo a ideia de um sentimento
profundo de identidade, que o iguala a todos os outros homens e, ao mesmo
tempo, carrega a ideia da posse de algo absolutamente único e irrepetível,
que o distingue dos outros. Para que tal noção se desenvolvesse, foram ne-
cessárias várias condições sociais.”

Dica de estudo
As Aventuras do Barão de Munchausen, direção de Terry Gilliam.

Esse filme apresenta a ideia da autonomia individual e da autodeterminação


movidos pela força interior que empurra o homem às suas maiores aventuras. Faz
uma crítica à valorização excessiva do individualismo em detrimento do reconhe-
cimento do coletivo, do grupo, da convivência civilizatória e humanizadora.

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Atividades
1. Qual a importância da atividade relacional humana?

2. Como estabelecer a relação do homem com a linguagem?

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Gabarito
1. A atividade relacional humana é importante porque o homem necessita do
outro no processo civilizatório e isso lhe permite que a convivência social
com o semelhante não só facilite a aprendizagem e o aperfeiçoamento dos
instrumentos, mas também enriqueça a afetividade resultante do relaciona-
mento interpessoal. Destarte, o homem aprende a conhecer a natureza, as
pessoas e a si mesmo.

2. O homem é um ser de linguagem e pensamento. O uso da palavra pelo ho-


mem o caracteriza e o distingue dos outros seres vivos. Assim, podemos dizer
que o homem está imerso no universo simbólico, num campo de represen-
tação, de sentidos e significados. O homem é um ser que fala. A palavra se
encontra no limiar do universo humano, pois é ela que caracteriza funda-
mentalmente o homem e o distingue do animal. A diferença está em que o
animal não conhece o símbolo, mas somente o índice. O índice é uma primei-
ra forma de signo, relacionado de forma fixa e única com a coisa a que se re-
fere e mantém relação natural-causal. Por exemplo, a marca de uma pegada
indica a passagem de alguém, a fumaça anuncia naturalmente que há fogo.
O símbolo, por outro lado, não é um efeito da coisa indicada. O símbolo re-
presenta alguma coisa, fundamenta-se numa convenção social da realidade
humana, é versátil e flexível, quer dizer, a linguagem é simbólica, pois coloca
o humano em relação com o ausente, com a representação dos objetos e
das coisas. Se a linguagem animal visa à adaptação a uma situação concre-
ta, a linguagem humana intervém como um abstrato da situação. A palavra
distancia o homem da experiência vivida, tornando-o capaz de reorganizá-la
numa outra dimensão (simbólica), que lhe dará um novo significado.

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O encontro
entre a Psicologia e a Educação

Irene Carmem Piconi Prestes


Assim como o espaço em branco é importante no poema,
assim como a pausa organiza a música, o saber pode brotar do silêncio.
O jorro contínuo de palavras pode ostentar apenas ansiedade.
O conhecimento pode instalar-se no entreato.

Afonso Romano de Sant’Anna

Nosso intuito, nesta aula, é fazer uma apresentação à luz de concep-


ções psicológicas para o desenvolvimento e conhecimento humano, ou
melhor, queremos saber como funcionam as conexões entre Psicologia,
Psicanálise e Educação. Para tanto, deixemos fluir as associações com
muita paixão e busquemos, em cada uma delas, seus fundamentos, suas
contribuições, para que tenhamos uma produção com efeitos no âmbito
educativo.

Tais associações e contribuições permitirão a inserção dos aspectos


psíquicos e a construção de um laço social entre essas áreas, em conso-
nância com as circunstâncias sócio-históricas atuais, de modo a contribuir
para a melhoria qualitativa do processo de ensinar e de aprender, já que
entendemos que o rendimento intelectual, por vezes, é dependente do
desenvolvimento afetivo.

Segundo Nóvoa (1999, p. 191)


[...] a clarificação dos mecanismos que estão em jogo nas situações concretas pode
estimular a mudança de relações e das práticas e incentivar o professor a investir no
sentido da transformação da sua própria realidade.

Colocar os conhecimentos psicológicos a serviço da educação implica,


para a prática docente, confrontar os conhecimentos teóricos, os métodos
pedagógicos e os procedimentos de ensino, numa constante atitude re-
flexiva. Portanto, nesta aula, busca-se criar situações de incertezas, de dú-
vidas, discutir suposições e, assim, criar um espaço para novas reflexões,
outros paradigmas educacionais.

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O encontro entre a Psicologia e a Educação

Distinções entre Psicologia e Psicanálise


Vale um alerta inicial para não tomarmos Psicologia e Psicanálise como sinô-
nimos. Um ponto de distinção entre elas é a compreensão do que seja persona-
lidade. Para a Psicologia, os componentes da personalidade derivam do latim
persona, que designa a máscara usada pelos atores de teatro, cujas expressões
correspondiam a caracteres fixos e induziam o espectador à expectativa de um
comportamento determinado. Decorre da noção do Direito que faz existir a
pessoa civil, sujeita a direitos e deveres, com um Registro Geral, ou seja, a identi-
dade civil do indivíduo. Porém, existe também a pessoa como consciência psico-
lógica. A personalidade representaria a identidade psíquica do sujeito.

O pensamento de Sigmund Freud alimentou essa visão de personalidade; en-


tretanto, o termo personalidade nunca foi utilizado na Psicanálise. Freud propôs
dois modelos de aparelhos psíquicos. Em 1900, apresenta os três níveis psíqui-
cos: o inconsciente, pré-consciente e consciente. Nos anos 1920, recorre a uma
nova distinção e apresenta as instâncias psíquicas: o id, o ego e o superego.

Em seu texto “A interpretação dos sonhos” (1900), Freud mostra como os pro-
cessos do sonho permitem compreender as formações do inconsciente. Ainda
que esse inconsciente esteja ligado à linguagem, à palavra, a uma representação
simbólica, o ego é o lugar da consciência e constrói-se para garantir o equilíbrio
psíquico da pessoa, sustentar sua identidade. O id permanece como sendo o
reservatório da energia psíquica, pulsional, inconsciente. O superego é definido
como a instância da lei, da crítica, da consciência moral. O conflito das forças
inconscientes é sempre constante. Assim, o sujeito freudiano é dividido, des-
centrado de si mesmo em consciente e inconsciente. Na Psicologia, há o caráter
unificador da personalidade, há possibilidade de resolução do conflito, de uma
adaptação social plena. Essa área do conhecimento fixa como objetivo o estudo
da personalidade e seus efeitos no comportamento humano. Embora não des-
conheçam o determinismo inconsciente, às vezes ignoram essa dimensão.

A Psicologia interessa-se fundamentalmente pelo ego e a Psicanálise pelo


sujeito do inconsciente. Grande contribuição nos trouxe o psicanalista Jacques
Lacan, que ampliou a concepção do aparelho psíquico em que o inconsciente
estrutura-se como uma linguagem.

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O encontro entre a Psicologia e a Educação

Contribuições da dimensão “psi”


para as práticas educativas
A proposta de inserção do campo psicológico no espaço escolar tem por
premissa focar as relações dos agentes escolares no entorno das questões do
processo educativo. Mais especificamente, trabalha com o ensino enquanto
ação criativa do educador na transmissão do conhecimento e com a aprendiza-
gem enquanto ação do aluno na apreensão do conhecimento.

Para tanto apresentamos um texto de Lopes (2002) para compreender um


modo de ensinar, importante quando se pensa em práticas educativas transfor-
madoras dos agentes escolares. Lopes (2002, p. 89) diz que:
Ensinar pode ser qualquer coisa, a qualquer pessoa, até a si próprio. Talvez só não se ensine
a ensinar. Ensinar vem do latim insignare e quer dizer, lá na sua origem, indicar, designar. Em
designar, há signar, de signum, palavra. Desde seus primeiros empregos, há em signum um
elemento que permite concluir pela existência de uma coisa ausente. Ou seja: ensinar é fazer
conhecer através de um signo (o signo é o que permite concluir a existência de uma coisa
ausente).

Sob essa perspectiva entende-se que o ato de ensinar pressupõe a relação entre
um ensinante e um aprendiz. Essa relação impõe uma interrogação: se alguém
ensina é porque alguém está aprendendo. Mas será que o aluno sempre está apren-
dendo? E o professor, também aprende nesse encontro? Convidamos o leitor a re-
fletir sobre isso. Vamos à consideração de Lopes (2002, p. 91) buscar essa resposta:
[...] proponho pensar que ensinar é um ato de fé [...] em sua origem [...], no latim, era fides
confiança, lealdade, fidelidade [...] Estamos falando em fé como confiança, lealdade, que tem
como valores fundamentais, engajamento e consentimento. O engajamento implica uma
atitude humana solidária com as circunstâncias sociais e históricas em que vive, e procura, pois,
ter consciência das suas consequências [...] Engajamento e consentimento no ato de ensinar
são parte de uma atitude subjetiva na qual estão presentes sujeitos [...] que é ter confiança em
fazer e fé em. No sujeito. No sujeito que é o ensinante; no sujeito que é o aprendiz.

Nessas considerações, Lopes explicita que ensinar consiste em reconhecer o


lugar subjetivo de sujeito, se tomarmos a dimensão “psi” pela via psicanalítica,
entendemos que o ensinar se sustenta num discurso, no que fala e no que é
falado, ou seja, circunscrito na linguagem, na palavra, no diálogo imerso num
espaço, num ponto. Assim, como está descrito no texto ilustrado “Meu ponto”,
de Leminski e Suplicy (2001).

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O encontro entre a Psicologia e a Educação

Meu ponto. (LEMINSKI; SUPLICY, 2001, s.p.)

De outra maneira, a linguagem, como representação simbólica, é instrumen-


to psicológico, no dizer vygotskyano, de mediação das relações essencialmente
humanas. Desse modo, também é possível destacar a relação entre a dimensão
psicológica e as práticas educativas presentes no engajamento, comprometi-
mento do sujeito que ensina e daquele que aprende.

Compreendemos, então, que o educar significa envolver o ser humano no


seu contexto sociocultural, construí-lo e esperar dele participação, no exercício
da sua cidadania.

Sob essa perspectiva, a Psicologia do desenvolvimento nos aponta uma visão


de evolução enquanto processo de apropriação da experiência histórico-social
pelo ser humano. Destacando o papel da interação de aspectos internos e ex-
ternos para o desenvolvimento humano, Davis (1994, p. 29) relata: “dados mais
recentes da embriologia indicam que o ambiente interno tem um papel central

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no desenvolvimento do embrião, assim como o ambiente externo é fundamen-


tal para o desenvolvimento pós-natal”.

Sob o ponto de vista da dimensão “psi“ de orientação interacionista, o conhe-


cimento é construído por meio das interações que o sujeito mantém com seu
ambiente, que tem uma função importante no desenvolvimento humano. Nesse
processo interativo, participam fatores internos e externos, formando uma rede
complexa de combinações entre o organismo e o ambiente. Vale destacar, aqui,
as contribuições de Jean Piaget e Lev Vygotsky às práticas pedagógicas que se
voltam para o planejamento do ensino (para a organização das condições de
aprendizagem), de modo que o processo de ensinar ocorra satisfatoriamente.

Nessa mesma direção, as contribuições do campo “psi” à tarefa educativa


nos remetem aos aspectos interativos entre os agentes escolares e a dimensão
psíquica (afetivo-emocional). Lopes (2002) e Almeida (2002) afirmam que se
encontram, na escola, o professor e o aluno, remetendo-nos a pensar a educa-
ção como um ato de responsabilidade, de paixão, de solidariedade. É também
um encontro do homem com a cultura. Cabe ao educador, na atividade edu-
cativa, a responsabilidade por construir e transmitir o mundo da convivência
humana em que seu aluno está ou vai estar inserido. Essa é a tarefa daquele
que quer educar, humanizar o mundo e, de alguma maneira, implicar os su-
jeitos que o habitam. Vale lembrar, aqui, que esse educador pode ser tanto o
professor quanto os pais.

Por meio da Psicanálise, vamos entender que o sujeito é um ser singular,


único, dotado de um psiquismo regido por uma lógica específica. É também
um indivíduo que participa das relações interpessoais e ocupa um lugar, esta-
belecendo laços com o contexto social no qual está incluído. O sujeito subjetivo
é movimento, é paixão, é desejo. É construído na relação com o outro sujeito,
com o outro ser humano que lhe fornece os elementos necessários para que se
insira no campo da cultura. Assim, processa-se a humanização e a subjetivação
que constrói o significado e o sentido do viver para cada sujeito. Dessa maneira,
entende-se que toda a relação de mim para comigo mesmo passa pela minha
relação com o outro. Abrindo a possibilidade para a transformação do mundo
inter e intrapessoal. Isso caracteriza a condição humana e o campo relacional do
homem o qual está, essencialmente, ligado ao outro.

Na poesia de Carlos Drummond de Andrade, podemos exercitar isso que em


cada um de nós não se explica, mas fala de nós, fala de si mesmo, que é o desejo
inconsciente.

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O outro
(DRUMMOND DE ANDRADE, 1997, p. 29)

Como decifrar pictogramas de há dez mil anos


se nem sei decifrar
minha escrita interior?
Interrogo signos dúbios
E suas variações calidoscópicas
A cada segundo de observação.
A verdade essencial
É o desconhecido que me habita.

Outro aspecto importante nessa reflexão remete-nos a outras intersecções


entre trabalho, ciência e cultura, as quais impõem, historicamente, a constru-
ção de um outro paradigma educativo que atenda às mudanças socioculturais e
tecnológicas da sociedade. O rápido avanço tecnológico e as mudanças no con-
texto sociocultural exigem outros modos de relacionar-se com o humano numa
construção coletiva e com seus desdobramentos à qualificação do profissional
da educação.

Segundo Gozo (2000, p. 179),


[...] faz-se, portanto, necessário que a escola adquira mobilidade, flexibilidade e identidade
própria que decidam formas educativas, curriculares e pedagógicas. A escola não deve ser
vista como fábrica ou oficina, como sugere a tradição funcionalista, mas o locus da preparação
do sujeito social para a vida, o que implica o desenvolvimento das subjetividades e da
personalidade humana livre.

Assim, vivemos um processo de passagem para uma atividade educativa vol-


tada aos princípios democráticos e de cidadania. Trata-se de inserir a escola em
um fazer pedagógico, curricular, funcionando numa dinâmica entre a liberdade
e o engajamento, permitindo o desenvolvimento de políticas educativas vol-
tadas às diversidades sociais, à autonomia, à equiparação de oportunidades e,
também, à diversidade no contexto escolar, no cotidiano das salas de aula.

Seguindo o pensamento de Carvalho (2000), pode-se dizer que a educação


é um processo demorado e não temos a certeza de que todos (os profissionais)
que se colocarem nessa situação construirão o perfil almejado, hoje tão necessá-
rio em um mundo de rápidas transformações, em que se espera do profissional
em educação dinamismo, criatividade, flexibilidade, autonomia e qualidades di-

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ferenciadas, como conhecimento das tecnologias da computação, além de boa


comunicação. Esse parece ser o perfil esperado do profissional em educação nos
dias atuais.

A sala de aula:
o professor/aluno/conhecimento
Tendo por referência a consideração da psicologia aplicada à educação com-
preendemos a sala de aula como campo relacional de ensino e de aprendiza-
gem, como espaço de possibilidades interativas, de trocas interpessoais, onde
a ação educativa deixa de exercer o controle e passa a ser uma atividade que
conduz ao crescimento e à flexibilidade para as mudanças dos agentes esco-
lares. O desenho abaixo ilustra, caricaturalmente, o que o olhar e a palavra do
professor, da escola tradicional despertavam no aluno: apenas o sentimento de
temor, na desconsideração da subjetividade, dos aspectos afetivos que envol-
vem o sujeito aprendiz.

(HARPER, 2003, p. 46. Adaptado.)

Autoritarismo pedagógico.

Já a proposta para os dias de hoje é que o educador tenha um olhar crítico-


-dialético. Entende-se a educação como uma visão de mundo a ser compartilha-
da com a comunidade escolar, como um processo de construção no qual os pro-
cedimentos sociais, políticos e culturais são desencadeados. O novo paradigma
educativo visa constituir uma rede de interdependências pessoais, para realizar
as diversas atividades pedagógicas. A experiência escolar é também uma rela-
ção consigo mesmo, uma relação com os outros agentes escolares e, finalmente,
é uma relação com o conhecimento.
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No processo de ensinar e de aprender, temos uma relação de três elementos:


o professor, o aluno e o conhecimento. No campo relacional de ensino e apren-
dizagem, que caracteriza a aquisição do conhecimento por meio das atividades
escolares, podemos destacar as funções, conforme Almeida (2002), do campo
imaginário, que remetem ao campo transferencial, campo do encontro entre
professor/aluno, da posição subjetiva dos sujeitos, porque ensinar depende do
educador, mas aprender depende do aluno. Souza (2002, p. 107) relata: “É do
aluno colocar-se ou não em movimento em direção ao saber”. Outro campo que
se nos afigura é o do simbólico, ou seja, o conhecimento presente na cultura, na
linguagem, no contexto sócio-histórico. E, finalmente, há o campo do real, que
se apresenta sem garantias, sem certezas de sucesso ou de fracasso escolar para
o professor e para o aluno.

Educar é um constante desafio, não é uma missão fácil para o educador. São
múltiplas as variáveis que interferem na atividade docente, como a formação e a
atualização profissional, as condições salariais, as jornadas de trabalho, os recur-
sos didáticos, entre outras, que decorrem das contingências do ­contexto social
e das políticas educacionais.

Como nos confirma Nóvoa (1999, p. 179):


[...] a mediocridade das condições de trabalho, os efeitos frustrantes da rotina e da normalização
impostas [...] associam-se aos problemas resultantes do baixo nível remunerativo, às múltiplas
solicitações exteriores, e levam o professor a responder às suas necessidades de afirmação e
de expansão fora da escola.

Dessa forma, não se pode questionar apenas as transformações no educar e


no ensinar, uma vez que essas são inseparáveis das transformações sociais mais
amplas.

A fim de concluir tem-se que, na via da dimensão “psi”, a subjetividade integra


a atividade educativa, desse modo, nos sugere que se deve criar um espaço na
escola em que o professor seja ouvido sobre sua experiência de educar, sobre
as dúvidas que cercam a atividade educacional, e sobre a solidão e as incertezas
que giram em torno das práticas pedagógicas. Segundo Almeida (2002, p. 105),
“só é capaz de educar e de ensinar aquele que suportar o fracasso constitutivo
do ato educativo”.

Dessa maneira, essa é uma ação escolar que fortalece a atividade docente,
quando o professor pode usar da palavra, do diálogo, da fala visando à significa-
ção, à construção de um sentido para sua existência como educador-desejante,
ainda, como pessoa afetiva aberta para aprender sempre.

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Por um momento, endossaríamos as palavras de Souza (2002, p. 114) sobre o


professor e o movimento de educar, que deveria ser de
[...] religar os professores à tradição que se encontra na raiz política de sua vocação. [...] é aquele que
professa e ensina uma ciência, uma arte, uma técnica, uma disciplina. É um mestre e é um perito. É
também aquele que professa publicamente sua crença numa verdade. Remeter os professores ao
seu nome significa afirmar, acima de tudo, o direito à transmissão, com todas as suas exigências
internas, é certo, mas com todos os seus efeitos imponderáveis, contra todas as manobras que
colocam o futuro do aluno como prefixado e num limite pré-indexado seu desejo.

Queremos finalmente dizer que, na atividade do professor, comparece a sub-


jetividade. Esse campo subjetivo nutre-se da interação interpessoal, da afetivi-
dade, dos sentimentos, da maneira de perceber o real e a significação que ocorre
em uma ou outra situação. Estas parecem variar sensivelmente, dependendo do
grupo étnico, religioso ou socioeconômico ao qual o sujeito pertence. Assim
brevemente aproximamos as áreas do conhecimento psicológico, psicanalítico
e educativo e justificamos a importância da conexão entre o “psi” e o educativo
para o pleno desenvolvimento do ser humano.

Texto complementar

Mobilização, atividade, sentido:


definição de conceitos
(CHARLOT, 2000)

Conforme um artigo de Francis Jacques, intitulado “De la signifiance”


(1987), um enunciado é significante se tiver um sentido (plano sintático, o
da diferença), se disser algo sobre o mundo (plano semântico, o da refe-
rência) e se puder ser entendido em uma troca entre interlocutores (plano
pragmático, o da comunicabilidade). “Significar é sempre significar algo a
respeito do mundo, para alguém ou com alguém”. Tem “significação” o que
tem sentido, que diz algo do mundo e se pode trocar com outros. Que será o
sentido, estritamente dito? É sempre o sentido de um enunciado, produzido
pelas relações entre os signos que o constituem, signos esses que têm um
valor diferencial em um sistema.

Ao traduzir (muito livremente...) essa análise, para utilizá-la fora de seu


campo, o da linguagem e da interlocução, proporei uma tripla definição:

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têm sentido uma palavra, um enunciado, um acontecimento que possam ser


postos em relação com outros em um sistema, ou em um conjunto; faz senti-
do para um indivíduo algo que lhe acontece e que tem relações com outras
coisas de sua vida, coisas que ele já pensou, questões que ele já propôs. É
significante (ou, por ampliação novamente, tem sentido) o que é comuni-
cável e pode ser entendido em uma troca com outros. Em suma, o sentido
é produzido por estabelecimento de relação, dentro de um sistema, ou nas
relações com o mundo ou com os outros.

Proponho-me, ainda, dando mais um passo à frente, sublinhar que esse


sentido é um sentido para alguém, que é um sujeito. Apoiar-me-ei agora
sobre Leontiev e sua teoria da atividade (LEONTIEV, 1975; ROCHEX, 1995).
Para Leontiev, o sentido de uma atividade é a relação entre sua meta e seu
móbil, entre o que incita a agir e o que orienta a ação, como resultado ime-
diatamente buscado. Retomemos o exemplo do crime. Que sentido terá
matar alguém? Sua morte (resultado do crime), o fato de livrar-me de quem
me incomoda (meta) permitem-me satisfazer o desejo que era o móbil do
crime. Nem a meta sozinha, nem o móbil sozinho me permitem entender o
sentido do ato, que se aclara somente se eu puser em relação essa meta e
esse móbil. Introduzindo-se aí a ideia de desejo (que não se encontra, expli-
citamente, na teoria de Leontiev), pode-se dizer que fazem sentido um ato,
um acontecimento, uma situação que se inscrevam nesse nó de desejos que
o sujeito é. Conforme escreve J. Beillerot, “não há sentido senão do desejo”.
(BEILLEROT et al., 1996).

Conviria, no entanto, distinguir o sentido enquanto “desejabilidade”,


valor (positivo ou negativo), e o sentido simplesmente ligado à significação.
Quando eu digo “isso tem realmente um sentido para mim”, estou indican-
do que dou importância a isso, que para mim isso tem um valor (ou, se isso
não tiver sentido, é porque, como dizem os colegiais, “não vale nada”). Mas,
quando digo que “não entendo nada”, isso quer dizer simplesmente que o
enunciado ou o acontecimento não tem significado.

Vale precisar também que uma coisa pode fazer sentido para mim sem que eu
saiba claramente por que, não saiba nem sequer que ela faz sentido. Toda a Psi-
canálise está aí para mostrar isto: não somos transparentes para nós mesmos.

Finalmente, vale destacar que a questão do sentido não está resolvida de


uma vez por todas. Algo pode adquirir sentido, perder seu sentido, mudar

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de sentido, pois o sujeito evolui, por sua dinâmica própria e por seu con-
fronto com os outros e o mundo.

O sujeito, cuja relação com o saber estudamos, não é, portanto, nem


uma misteriosa entidade substancial definida pela Razão, a Liberdade ou o
Desejo, nem um sujeito encerrado em uma inapreensível intimidade, nem
um sucedâneo de sujeito construído por interiorização do social em um psi-
quismo de ficção, mas, sim, um ser humano levado pelo desejo e aberto para
um mundo social no qual ele ocupa uma posição e do qual é elemento ativo.
Esse sujeito pode ser analisado de modo rigoroso: constitui-se através de
processos psíquicos e sociais que podem ser analisados, define-se como um
conjunto de relações (consigo, com os outros e com o mundo) que pode ser
conceitualmente inventariado e articulado.

Dica de estudo
DAVIS, Cláudia. Psicologia na Educação. São Paulo: Cortez, 1994. p. 104-105.

Procure aplicar o projeto 4 desse livro, no qual a autora trata de uma observa-
ção do cotidiano de uma sala de aula. Desenvolver a capacidade de observação
é um exercício que favorece o autoconhecimento, a descoberta das potenciali-
dades e limites pessoais. Favorece a convivência, a solidariedade com o outro.
Ainda, abre a possibilidade de transformar e criar atitudes que sejam educativas
e que possam ir ao encontro da satisfação, da realização pessoal e profissional e
da afetividade.

Atividades
1. Explique, com as suas palavras, como podemos compreender a sala de aula
tendo por referência as contribuições da dimensão “psi“ para a educação.

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2. Analise o texto “Triângulo do conhecimento”. Levante três pontos interessan-


tes do texto e discuta-os com seus colegas.

O triângulo do conhecimento procura traduzir a existência de três gran-


des tipos de saberes: o saber da experiência (professores); o saber da peda-
gogia (especialistas em ciências da educação); e o saber das disciplinas (es-
pecialistas dos diferentes domínios do conhecimento).

Nos períodos de inovação edu- Saber da


cacional, há uma certa tendência a experiência
valorizar a ligação dos professores
aos especialistas pedagógicos. Nos
momentos mais conservadores,
procura-se juntar o saber da experi-
ência ao saber das disciplinas. Atu-
Saber da Saber das
almente, o saber dos professores pedagogia disciplinas
tende a ser desvalorizado em favor
de um saber científico (da pedagogia ou das outras disciplinas).

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Um dos principais paradoxos na história dos professores reside no fato de


os tempos-fortes da reflexão científica em educação contribuírem para um
maior prestígio social da profissão, mas também, e simultaneamente, para
uma certa desvalorização dos seus saberes próprios. Na verdade, a afirmação
do saber da pedagogia (dos especialistas em ciências da educação) faz-se,
frequentemente, a partir de uma depreciação do saber da experiência (dos
professores). As práticas de racionalização do ensino contêm os elementos
de uma deslegitimação dos professores como produtores de saber.

(NÓVOA, Antonio (Org.). Profissão Professor. Porto, Portugal: Porto, 1999, p. 9-10.)

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Gabarito
1. A sala de aula é um espaço relacional de encontro de dois atores escola-
res: professor e aluno. Cada um carrega uma bagagem própria, histórias de
vida, experiências, significados e sentidos do viver, que se manifestam no
campo da sala de aula. Demonstrando que a dimensão subjetiva integra as
atividades educativas, daí a importância da consideração dos aspectos, dos
interesses dos alunos articulados aos planos de ensino capazes de canalizar
a atenção do aluno para o conhecimento. Ainda, a sala de aula é entendida
como uma manifestação grupal do humano, que necessita de um líder, de
regras, de objetivos claros a fim de garantir seu funcionamento saudável.

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2. Nessa questão se quer destacar o saber da experiência pessoal do profes-


sor como um dos alicerces do conhecimento, valorizando o saber próprio.
Indiretamente, aponta-se que na aprendizagem o saber do aluno deve ser
considerado no processo de ensinar. Ainda, na construção do conhecimento
integram-se vários saberes: do professor, das ciências da educação e de ou-
tras áreas afins ao conhecimento que se está construindo.

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Processos psicológicos
básicos do comportamento

Irene Carmen Piconi Prestes


Educar é agir para que cada um atinja a própria plenitude.

Antonio Nóvoa

Sabe-se que o homem utiliza diversas estratégias de processamento


(sensação, percepção, atenção, linguagem, pensamento) desde as formas
mais elementares de reflexo da realidade (processos por meio dos quais o
homem reflete índices particulares do mundo exterior ou sinais que indi-
cam o estado de seu organismo) até as formas mais complexas de capta-
ção dos meios exterior e interior.

O homem não vive em um mundo de pontos luminosos ou coloridos


isolados, de sons ou contatos, mas em um mundo de coisas, objetos e
formas, em um mundo de situações complexas. Independentemente de
ele perceber as coisas que o cercam (em casa, na rua, as árvores e o frescor
das manhãs) e as pessoas com quem se comunica, ele não está em con-
tato com sensações isoladas, mas com imagens inteiras. Assim, esses pro-
cessamentos psicológicos são sistemas funcionais complexos e ocorrem
por meio da participação de grupos de estruturas cerebrais, sendo que
cada qual oferece uma contribuição própria ao sistema cerebral.

Dessa maneira, objetiva-se neste capítulo compreender esses processos


psicológicos básicos, pois eles interferem nos processos de aprendizagem
do aluno, partindo do princípio de que a aprendizagem se dá no cérebro
e isso ocorre de forma sincronizada com outros sistemas, destacando-se
o sistema nervoso. Esse sistema recebe milhares de informações dos di-
ferentes órgãos sensoriais e, a seguir, integra todas elas para determinar
qual a resposta a ser executada pelo organismo, quer dizer, a organização
e a estruturação da experiência é mais importante que a pura quantidade
de experiências sensório-perceptivas. A aprendizagem cerebral se faz pela
diversidade de estímulos que recebe.

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Processos psicológicos básicos do comportamento

Padrões normais da infância – Processos psicológicos básicos

Idade
Audição/linguagem Visual/psicomotora
aproximada
Segue a luz com os olhos; segue o
1-2 meses Reage a sons inesperados, escuta sons.
movimento dos objetos.

Desloca o olhar entre um objeto e


3-5 meses Procura com os olhos o som; sorri. outro; agarra objetos. Retira um pano
do rosto.

Apanha objetos. Acompanha com o


6-7 meses Balbucia; produz sons diferentes.
olhar o deslocamento dos objetos.

Troca os brinquedos de mãos; mani-


8-9 meses Entende o não; diz palavras de duas sílabas.
pula dois objetos juntos.

Imita sons; usa duas a três palavras com Bate dois objetos; preensão em pin-
10-12 meses
significado. ça; encontra objetos ocultos.

Faz marcas com um lápis; coloca um


13-15 meses Olha figuras; reconhece seu nome.
objeto sobre o outro.

16-18 meses Conversa; procura fazer coro nas músicas. Rabisca livremente.

Forma pequenas frases com significado. Faz torres com objetos. Rabiscos cir-
19-21 meses
Observa-se uma aplicação no vocabulário. culares.

22-24 meses Escuta histórias; nomeia objetos. Copia traços verticais e horizontais.

Emprega o pronome eu, plural e verbos no Desenha formas primitivas e figuras


3 anos
indicativo. soltas. Princípio da figura humana.

Emprega o verbo no futuro e o possessivo Desenhos mais estruturados. Dese-


4 anos
meu. nha formas geométricas com ângulo.

Desenha a figura humana com deta-


5 anos Amplia seu vocabulário.
lhes; faz cópia do nome e de desenhos.

Sensação
As sensações referem-se à atividade do sistema nervoso que permitem ao
homem a impressão dos sinais, das propriedades e dos indícios dos objetos do
mundo exterior e do mundo interior. Está presente em todas as formas de vida
animal e pode ocorrer sem percepção. Por exemplo, um indivíduo pode ouvir
um som mas ser incapaz de dar significado ao que ouve. Os órgãos dos sentidos,
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Processos psicológicos básicos do comportamento

enquanto fenômenos psicológicos, ligam o homem ao mundo exterior e tanto


representam a fonte do conhecimento quanto a condição fundamental do de-
senvolvimento psíquico do indivíduo.

O estudo da evolução dos órgãos dos sentidos mostra que se especializaram


em refletir tipos especiais de formas objetivamente existentes de movimento da
matéria: receptores da pele refletem as influências mecânicas; receptores auditi-
vos refletem as oscilações sonoras; receptores visuais refletem certos diapasões
das oscilações eletromagnéticas. O processo das sensações se dá, portanto, a
partir da estimulação de áreas cerebrais táteis, auditivas, gustativas, olfativas e
visuais, que imprimem no organismo a sensação. Os estímulos que atuam sobre
o organismo são denominados de estímulos excitantes. A intensidade mínima
de excitação para produzir sensação é chamada de limiar de excitabilidade do
organismo. A quantidade de sensação depende da quantidade de estimulação.
Essa é a denominada Lei de Fechner-Weber, de 1860, que estabelece a relação
entre estímulo e sensação, permitindo a sua mensuração.

Na figura a seguir, é possível visualizar o cérebro e suas áreas funcionais.

Hemisfério direito
CORPO CALOSO (junção dos

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hemisférios esquerdo e direito)
CÓRTEX CEREBRAL
TÁLAMO (relé sensorial) (camada de matéria cinzenta de 3 a
4mm de espessura)
HIPOTÁLAMO
(comportamento instintivo: sede, CÓRTEX VISUAL (visão)
fome, agressão, sexo, medo)
FORMAÇÃO RETICULAR
HIPÓFISE (equilíbrio hormonal) (sono, vigília, atenção)

HIPOCAMPO (memória) CEREBELO (equilíbrio)

NÚCLEOS AMIGOALINOS
(controle dos comportamentos
instintivos) ÁREA SENSORIAL (sensações físicas)

ZONA MOTORAL LÓBULO PARIETAL (zona da associação


(movimento do corpo) de mensagens sensoriais)

LÓBULO FRONTAL LÓBULO OCCIPITAL


(tomada de decisões) (visão)

ÁREA DE BROCA ÁREA DE WERNICKE


(área motora da linguagem) (área receptora da linguagem)

ÁREA AUDITIVA CEREBELO (equilíbrio)

LÓBULO TEMPORAL MEDULA ESPINHAL


(memória da linguagem) (transmissão de mensagens)

BULBO OLFATIVO
(olfato e gesto)

Hemisfério esquerdo
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As mudanças no limiar de excitabilidade dependem das condições do meio e


são chamadas de adaptação dos órgãos dos sentidos às condições ambientais.

A mudança da sensibilidade que ocorre segundo o tipo de adaptação não


é imediata, requerendo certo tempo. O importante é que essas características
temporais são diferentes para os diversos órgãos dos sentidos. A adaptação é
um dos tipos mais importantes da sensibilidade, que sugere uma grande plas-
ticidade do organismo em seu processo de adaptação aos estímulos internos e
externos.

Aplicação educacional
Um exercício básico para desenvolver a capacidade sensorial é manter
atividade física regularmente e uma alimentação equilibrada, pois isso me-
lhora a circulação sanguínea, favorece a conexão entre os neurônios e o bom
funcionamento do cérebro.

Percepção
Pode-se afirmar que, no nível da sensação, não há integração, apenas impres-
são sensorial; é com o processo de percepção que se inicia o reconhecimento dos
estímulos sensoriais. Nesse nível, conforme as necessidades e capacidades do or-
ganismo, os estímulos sensoriais são integrados, interpretados e tornam-se signi-
ficativos. Dessa maneira, a percepção permite à espécie humana o conhecimento
dos objetos ao seu redor e dos fenômenos sensíveis que passam no meio.

O recém-nascido apresenta os sentidos não diferenciados, reagindo por meio


de reflexos, contudo, vai percebendo que os estímulos que lhe causam impres-
sões nem sempre são iguais: alguns são mais intensos, outros são mais rápidos
e outros, ainda, são mais constantes. As diferenças e as semelhanças das impres-
sões que a criança observa formam conjuntos perceptuais. Portanto, a percepção
integra as partes do todo numa nova unidade (gestalt). Essa integração depende
da organização do sistema nervoso e da integridade do organismo humano.

A percepção constitui a principal fonte de aquisição de experiências humanas.


Caracteriza-se como a atividade mental intermediária entre a sensação e o pensa-
mento. O papel das sensações e percepções no desenvolvimento harmonioso das
diferentes áreas do comportamento humano é indubitavelmente singular.

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Atualmente, a percepção é estudada pela Psicologia da gestalt, Psicologia


da forma. Essa escola do pensamento psicológico argumenta que a percepção
sensorial é única e depende da organização e do relacionamento especial exis-
tente entre as partes (figura-fundo) denominadas gestalts. Dessa maneira, figu-
ras-fundo constituem a unidade básica da percepção e formam a unidade do
significado. Isso significa que o organismo humano forma uma unidade sentir-
-pensar-agir. Dessa maneira, a percepção sensorial não decorre apenas de um
processo de recepção de estímulos ou da impressão sensitiva do meio sobre
o organismo: ela resulta essencialmente de uma relação especial da unidade
meio-organismo. O processo de percepção é dinâmico e é compreendido como
um constante aparecimento e desmoronamento de gestalts. Assim, o compor-
tamento humano se define por meio dessa particular organização das gestalts.
Então, aprender significa compreender uma situação global de forma a reagir
adequadamente em face dela. Aprende-se discernindo, compreendendo.

Aplicação educacional
A proposta é desenvolver a capacidade sensório-perceptiva de crianças.
Para isso, peça a elas que, com os olhos fechados, toquem diferentes superfícies
e objetos. Em seguida, peça que descrevam o que “sentiram” e “perceberam”.

Linguagem
A linguagem humana apresenta uma diferença fundamental em relação a
dos animais. Estes, por meio de um pequeno repertório de sons, gestos, são ca-
pazes de se comunicar e informar ordens. Já os humanos são capazes de formu-
lar e expressar conceitos abstratos, como amor e felicidade, que não são coisas
que se apresentam imediatamente aos sentidos, mas que estão representadas
simbolicamente. Linguagem e pensamento são processos interdependentes.
Enquanto se aprende a falar, desenvolve-se o pensamento pela possibilidade
que a linguagem permite de se abstrair das coisas e do tempo. A criança aprende
comportamentos verbais não só pela observação e percepção dos sons, mas por
meio de interações com o meio, ou seja, aprende fazendo. A linguagem é, sem
dúvida, o fator básico nos ajustamentos sociais e nos aspectos mais significati-
vos do desenvolvimento intelectual.

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Processos psicológicos básicos do comportamento

Para que haja linguagem falada, é necessário que os seguintes aspectos es-
tejam integrados:

 sensorial
– Representado pelo órgão da visão, da audição, para percep-
ção e captação;

 motor
– Representado pelos órgãos da articulação e formação vocal (cor-
das vocais, língua, lábios, véu palatino), para evocação e elaboração;

 psicológico
– Representa a experiência sensório-perceptiva significativa,
significado psicológico da linguagem.

Nos primeiros meses de vida até aproximadamente os nove meses, o bebê


desenvolve a linguagem interior, que permitirá a compreensão da linguagem
falada. Quando a linguagem interior estiver estabelecida em grau mínimo, a
criança começa a compreender. Esse processo de correlacionar as palavras
que recebe auditivamente com a experiência é a base da linguagem receptiva.
Depois de estabelecido esse momento, a criança começa a utilizar a linguagem,
expressivamente a palavra falada.

Evolução da linguagem
 0-2
meses: nessa fase pré-linguística, o bebê chora, grita quando sente
prazer ou desconforto frente a estímulos auditivos, visuais, táteis e cines-
tésicos. Apresenta reações reflexas.

 2-6
meses: começa a adquirir experiência concreta do próprio corpo e
do meio ambiente. Com linguagem espontânea, emite sons conscientes e
gestos pela mímica facial, balbucios.

 6-9
meses: linguagem de imitação. O bebê treina seus órgãos fonoarticu-
latórios, preparando-se para a formação de palavras, vocalizações, ritmo e
tons diferentes: ecolalia.

 9-12
meses: etapa compreensiva. A criança fala quando está sozinha. Pri-
meiras palavras com significado e vocabulário de 10 palavras.

 12-18
meses: compreende familiares e nomeia o que vê.

 18-24
meses: pensamento concreto. Refere-se a si mesma pelo próprio
nome. Controle voluntário sobre todo o aparelho vocal. Observa-se o apri-
moramento da expressão correta da linguagem.

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 3-5
anos: interiorização e consciência do seu próprio eu. Domina 1 500
palavras, sem captar totalmente seu significado. Pergunta “por quê?”

 6
anos: noções de relatividade, dependendo da posição do seu corpo. O
pensamento passa a ser lógico-concreto, deve saber pronunciar correta-
mente todos os sons da língua.

A aquisição da linguagem ultrapassa limites da simples transmissão e recep-


ção de estímulos sensoriais pelo organismo. A linguagem pode ser considerada
um sistema, meio pelo qual a experiência significativa é simbolizada. Por sim-
bolização, compreende-se a condição de interiorização das experiências e a
comunicação aos outros. Essa é uma marca distintiva da espécie humana que
é capaz de evocar, mentalmente, coisas que não se apresentam aos seus sen-
tidos e essa capacidade implica que as palavras, os sons, os gestos, enfim, os
sinais, sejam interpretados como um signo linguístico portador de uma intenção
comunicativa.

A linguagem desenvolve-se sem a necessidade de aprendizagem formal.


A criança incorpora a língua de sua comunidade nos primeiros anos de vida,
adquirindo um modo de expressão e de interação social dela dependente. O
processo de aquisição da linguagem apresenta um padrão de desenvolvimento
comum aos diferentes indivíduos nas diferentes línguas. É como define Stern-
berg (2000, p. 252):
A linguagem, como um meio organizado de combinar as palavras para fins de comunicação,
possibilita que nos comuniquemos com aqueles que nos rodeiam, tanto quanto ponderar
situações e processos que comumente não podemos ver, ouvir, sentir, tocar ou cheirar, inclusive
ideias que podem não ter qualquer forma tangível.

Sabe-se que, ao longo da evolução, o homem dominou inicialmente o siste-


ma auditivo, ou seja, primeiramente compreendeu a emissão vocal dos outros
e a fala, depois aprendeu a ler e a escrever. A criança não aprende primeiro a ler,
ela aprende a compreender e a usar a palavra falada. Promove-se o desenvolvi-
mento da linguagem, falando-se constantemente à criança o nome dos objetos,
descrevendo-se as atividades enquanto ocorrem e sempre se respondendo aos
balbucios da criança em tom de conversa.

Por essa razão, a base da aquisição da linguagem está na experiência sig-


nificativa. Assim, a Psicologia considera fundamental para o desenvolvimento
da linguagem que o significado tenha que ser adquirido antes que ocorra a
simbolização.

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Finalmente, a função da linguagem é viabilizar a expressão comunicativa, na


medida em que oportuniza a troca de experiências, a conquista do meio am-
biente que atua como fator de socialização, convertendo-se no principal instru-
mento de que se dispõem para atuar no mundo. No âmbito educacional, cabe
ao professor auxiliar o aluno na utilização correta da linguagem, de maneira a
facilitar a compreensão correta do vocabulário, a formação de conceitos, o uso
espontâneo e criativo da linguagem.

Aplicação educacional
A proposta para desenvolver a capacidade de linguagem é ouvir narrati-
vas de fatos vividos (relatos de experiências) e histórias. O ato de ouvir pode
ser entendido como uma forma de leitura, pois ele implica uma atribuição
de significado tanto quanto o ato de ler um texto escrito.

Pensamento
As estruturas cerebrais envolvidas na organização do pensamento proces-
sam qualquer raciocínio, gerando uma definição explicativa baseada em uma
reflexão, para expressar uma mensagem, ideia ou sentimento.

O pensamento se constrói a partir da coordenação de atividades motoras das


mais elementares como na interpretação sensório-perceptiva, no planejamento
da ação para pegar os objetos à sua volta, até às mais complexas como nas dedu-
ções lógico-matemáticas. Uma possível definição para a atividade do pensar é:
O pensamento é, assim, uma atividade pela qual a consciência ou a inteligência coloca algo
diante de si para atentamente considerar, avaliar, pesar, equilibrar, reunir, compreender,
escolher, entender e ler por dentro. (CHAUÍ, 1997, p. 153)

O pensamento é inseparável da linguagem, pois se considera que o homem


articula percepções, abstrai dados da sua experiência para manifestar-se, comu-
nicar algo a outrem, por exemplo, quando a criança chora, manifesta a necessi-
dade de chamar a atenção da mãe para ela. Verifica-se que o homem conven-
cionou alguns sinais universais para comunicar seu pensamento (os sinais de
trânsito, o cartaz de silêncio nos corredores dos hospitais, as cifras numéricas, a
própria língua). É com esse infinito conjunto de sinais que o homem se comuni-
ca com os outros e que o pensamento se socializa.

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Aplicação educacional
Um exercício interessante é solicitar às crianças que observem imagens,
fotos, pinturas, que traduzam alguns momentos sociais. Depois, pode-se
convidá-las a pensar em uma história baseada nas imagens vistas. Peça, em
seguida, que registrem por escrito a história que imaginaram.

Memória
A memória é a capacidade de registrar e de evocar informações passadas. Por-
tanto, podemos defini-la como “os meios pelos quais as pessoas recorrem ao co-
nhecimento passado, a fim de utilizá-lo no presente; os mecanismos dinâmicos as-
sociados à retenção e à recuperação da informação” (STERNBERG, 2000, p. 225).

É um processo mental humano para reter e guardar o tempo (passado-pre-


sente-futuro). A memória, como capacidade de recordar, conserva aquilo que a
pessoa vivenciou (passado) em determinado tempo e lugar e que não retorna-
rá jamais. Para a aprendizagem, é necessária a retenção de informações e essa
retenção depende da memória. Por exemplo, na pergunta de múltipla escolha
de uma prova objetiva, o que fazemos é usar nossa capacidade de memória de
reconhecimento de informações anteriormente armazenadas.

Os componentes da memória
 Componentes
objetivos: atividades físico-fisiológicas e químicas de gra-
vação e de registro cerebral das lembranças.

 Componentes
subjetivos: o significado emocional do fato para a pessoa,
a necessidade para a vida da pessoa.

Assim, o fato de o nosso cérebro gravar e registrar tudo não constitui a me-
mória, que consiste naquilo que foi gravado com um sentido ou com um signifi-
cado para nós e para os outros.

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As modalidades de memória
 Curto prazo: registro das informações, dos pensamentos da consciência
humana. Armazena informações por período limitado. É a capacidade de
lembrar, por exemplo, o número de telefone enquanto você está discando.

 Longo prazo: consolidação das informações, evocada por meio de pala-


vras ou para os procedimentos de execução. É a capacidade de recordar
grandes volumes de informação durante horas, semanas, anos e, em al-
guns casos, para sempre.

A capacidade de memória nos habilita a reconhecer, lembrar e recordar as


experiências. Lembramos espontaneamente e recordamos quando nos esfor-
çamos para lembrar. Agora, no momento em que perdemos a capacidade de
lembrar palavras ou construir frases, sofremos de afasia. Na afasia perdemos a
relação com os outros por meio da linguagem. Quando perdemos a capacidade
para lembrar e realizar gestos e ações motoras, sofremos de apraxia. Na apraxia1,
perdemos a relação com o nosso corpo e com o mundo das coisas. Essa é uma
forma de “esquecimento”. Esquecer é ficar privado de memória e perder alguma
coisa. Algumas vezes, porém, esquecer é um bem: esquecer alguma coisa terrí-
vel é ultrapassá-la para poder viver bem novamente.

Um importante distúrbio de memória é a amnésia. Deve ser diferenciada do


esquecimento diário, fenômeno natural que tende a aumentar com o avanço da
idade. Após os 40 anos, a capacidade de atenção diminui e, com isso, o registro
das informações fica comprometido. Ler, conversar, exercitar e estimular a criati-
vidade são importantes para diminuir essa tendência.

A memória revela-se como uma das formas fundamentais de nossa existên-


cia, que é a relação com o tempo, e, no tempo, com aquilo que está invisível,
ausente e distante, isto é, o passado. A memória é o que confere sentido ao pas-
sado como diferente do presente e do futuro.

Para desenvolver uma boa capacidade de memória, é importante que o pro-


cesso de aprendizagem apresente um conteúdo que realmente seja atrativo
e significativo, que desperte interesse, a expectativa de que alguma coisa vai
acontecer, quer dizer, que favoreça a atenção do indivíduo frente a um objeto.

1
Apraxia ou dispraxia: dificuldade na planificação motora, cujo impacto se reflete na capacidade de a pessoa coordenar
adequadamente os movimentos corporais.

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Aplicação educacional
A proposta é desenvolver a capacidade de memória, recuperando a
memória de curto e longo prazo. Um exercício simples é procurar lembrar-se
do que fez no dia. Depois procurar lembrar-se do que fez em datas festivas
anos atrás.

Um exercício interessante é ler uma lista de palavras uma vez e, em seguida,


experimentar repeti-las oralmente, sem olhar, na ordem em que foram lidas.

Ainda, poderíamos destacar outros processos psicológicos como a atenção que,


articulada à concentração, constrói os caminhos do processo de memória. Outro
processo básico importante é a motivação, que integra o organismo humano nas
manifestações comportamentais (respostas) frente às situações internas e externas.

Os processos psicológicos foram aqui apresentados separadamente para fins


didáticos, no entanto eles são interdependentes e se desenvolvem de acordo as
etapas evolutivas do homem (criança, adolescente e adulto) formando um siste-
ma psicológico complexo. Os processos psicológicos básicos do comportamen-
to integram-se num contexto interativo sócio-histórico-cultural do indivíduo na
medida das possibilidades internas e externas do mesmo.

Texto complementar

Expressão da emoção por meio do desenho


de uma criança hospitalizada
(SOUZA; CAMARGO; BULGAVOC, 2003, p. 101-104)

Introdução
[...] O presente trabalho surge da necessidade de refletir sobre o atendi-
mento psicológico à criança hospitalizada. Precisando melhor, este estudo
busca conhecer os meios e o processo utilizado por uma criança submetida
a um tratamento invasivo para expressar a sua vivência. Parte-se do pres-
suposto de que a expressão é um momento importante da compreensão e
elaboração simbólica. [...]

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Expressar o sofrimento?
[...] O presente estudo encontra seu referencial teórico nos fundamentos
que compreendem a emoção como base da construção do conhecimento,
não como desorganizadora do comportamento, não como forma de expres-
são com função de adaptação ou recuperação de resquícios do comporta-
mento animal, expressões inatas ou instintivas (DARWIN, 2000), mas como
função psicológica que, ao longo do desenvolvimento cultural, junto com as
outras funções psicológicas, vai formando um sistema psicológico complexo
e diversificado: um sistema em que a linguagem, devido ao seu caráter me-
diado, desempenha papel fundamental. [...]

[...] O desenho como atividade expressiva propicia, portanto, a objeti-


vação do plano mais interno, profundo e oculto do pensamento. Partindo
dessa tese, introduzimos o pressuposto de que o desenho, acompanhado da
linguagem oral no momento de sua produção, pode se transformar em um
meio de nos aproximarmos da trama afetivo-volitiva oculta atrás do pensa-
mento. Trama esta apontada por Vygotsky (1993) no final do livro Pensamen-
to e Linguagem. [...]

[...] Segundo Vygotsky (1993), o pensamento verbal apresenta-se como


um conjunto dinâmico e complexo, em uma série de planos mais externos
e até mais internos. Na prática seu caminho: parte do motivo ou intenção
(necessidades, interesses e impulsos, emoções), que desencadeia o pensa-
mento (nesse estágio, desprovido de forma linguística específica); passa pela
formalização desse pensamento (primeiro por sua formação e mediação na
linguagem interna) logo mediado pelos significados das palavras e termina
em palavras. [...]

[...] A proposta de propiciar à criança hospitalizada espaço para a expres-


são de suas emoções no desenho encontra fundamento, nos dizeres de
Sawaia (2000), na “emoção como positividade epistemológica, superando a
tradicional abordagem negativa, própria das teorias que analisam o homem
a reboque da sociedade”. (SAWAIA, 2000, p. 5) [...]

[...] No momento em que a criança desenha (atividade expressiva), ela ma-


terializa, em seu desenho, a imagem que criou internamente para dar conta

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das suas emoções, confirmando nossa ideia de que, por meio da materializa-
ção, a criança conhece, organiza e elabora sua emoção. [...]

[...] No desenho, a criança expressa o significado e sentido que vê nos


objetos, mas não desenha a realidade como ela é, e sim, a realidade concei-
tuada, como essa realidade é percebida e memorizada pela criança. Como
processos complexos, a memória e a imaginação transparecem no desenho
por meio dos esquemas figurativos dos objetos reais que fazem sentido para
a criança e que estão carregados de significação. [...]

Produções de Mel durante atendimento clínico


[...] Por meio de alguns recortes, iremos descrever o movimento realizado
por Mel no decorrer de uma sessão psicoterapêutica. [...]

[...] Durante o atendimento psicológico, Mel escolheu bonecos de fanto-


che, expressando seu desejo de “brincar de historinha”. [...]

[...] Mel escolheu os personagens da história do Chapeuzinho Vermelho,


mas desistiu do enredo ao constatar que estava faltando a vovozinha. [...]

“PSICÓLOGA: Você acha mesmo que não conseguiremos brincar sem a


vovozinha?

MEL (com expressão de contrariedade): Não.

PSICÓLOGA: E se fizermos uma história diferente?

Silêncio.

PSICÓLOGA: Mel, tive uma ideia e gostaria de saber o que você acha. [...].
Você poderia contar sobre a sua história. [...]

MEL: Eu quero brincar disso.

PSICÓLOGA: Assim como no livro de Chapeuzinho Vermelho tem dese-


nhos e palavras escritas, nossa história também irá ter. Então, você poderia
fazer os desenhos. O que acha?

Mel sorriu, solicitando canetinhas.”

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Mel brincando com suas irmãs e primos na casa da avó.

“PSICÓLOGA: Quem são estas pessoas?

MEL: Eu, minhas irmãs Fernanda e Suzana, Lucas e Jéssica.

PSICÓLOGA: O que vocês estão fazendo?

MEL: Brincando de escolinha na casa da minha vó.

PSICÓLOGA: Quem é a professora?

MEL: Minha irmã Suzana, ela tem 9 anos. [...]

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Mel e o pulmão enchendo de bolinhas e bichinhos.

“PSICÓLOGA: Quem é essa pessoa?

MEL: Eu.

PSICÓLOGA: O que você está fazendo?

MEL: Tô vindo de táxi para o hospital, meu pulmão tá com bolinha e


bichinho.

PSICÓLOGA: O que você sente?

MEL: Nada, mais tinha que tomá remédinho pra voltá lá em Marilena.”

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Dica de estudo
<http://geoilheus.tripod.com/gestalt.htm>.

Nesse site é possível apreciar algumas imagens um tanto quanto inusitadas.


Algumas delas têm alguns comandos que, se bem executados, dão resultados
interessantes. Observando essas imagens, estará se fazendo uso dos processos
psicológicos básicos como: atenção, concentração, percepção.

Atividades
1. Associe as colunas abaixo sobre as áreas cerebrais que integram as funções
psicológicas.

(a) Formação Reticular ( ) recepção da linguagem


(b) Lóbulo Frontal ( ) atenção
(c) Lóbulo Occipital ( ) motora da linguagem
(d) Área de Wernicke ( ) tomada de decisão
(e)Área de Broca ( ) visão
2. Como podemos justificar a importância de o professor conhecer os proces-
sos psicológicos?

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Referências
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Paulo: Escuta, 1998.

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BARROS, Célia. Pontos de Psicologia do Desenvolvimento. São Paulo: Ática,


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BEE, Helen. A Criança em Desenvolvimento. São Paulo: Happer, 1984.

BETTELHEIM, Bruno. Psicanálise da Alfabetização. Porto Alegre: Artmed, 1984.

BOWLBY, John. Apego: a natureza do vínculo. São Paulo: Martins Fontes, 1993.

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Gabarito
1. D, A, E, B, C

2. Pela interferência no ato de aprender dos processos psicológicos. Pela con-


cepção integral da educação do aluno em seus aspectos físicos, psíquicos,
sociais e afetivos. Tomando-se a referência da psicologia sócio-histórica, en-
tende-se que educar não se reduz a ensinar certa quantidade de conteúdos,
e sim de educar as habilidades de adquirir os conhecimentos, conduzindo o
professor ao papel de organizador do ambiente socioeducativo.

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Psicologia
do desenvolvimento infantil

Irene Carmen Piconi Prestes


Estudar o processo do desenvolvimento humano significa descrever a
evolução de um ser imaturo, dependente, incapaz de garantir a própria
sobrevivência, para um ser autônomo, com potencialidades, maduro e, se
possível, em harmonia com seu contexto sócio-histórico-cultural, ou seja,
significa descrever como a criança, o adolescente e o adulto crescem e se
desenvolvem. Assim, consideramos que o ser humano não é produto
apenas de sua cultura, nem tampouco puro resultado de sua herança
genética.

A descrição das mudanças evolutivas, como as taxas de crescimento,


as alterações fisiológicas ou a conformação anatômica, em si mesmas,
nada significam? O que interessa é saber o significado que o contexto
dá aos aspectos do desenvolvimento no decorrer da vida humana.

Desse modo, neste capítulo buscare-

Domínio público.
mos saber como a Psicologia do desen-
volvimento descreve e explica de que
maneiras o homem se comporta e muda
no decorrer do tempo e como essas mu-
danças podem ser compreendidas por
nós, uma vez que no contexto escolar en-
contram-se pessoas de diferentes idades
e com comportamentos próprios a cada
faixa etária.

Sigmund Freud (1856-1939).

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Psicologia do desenvolvimento infantil

A hereditariedade e o contexto
sócio-histórico-cultural
Houve, durante muitos anos, uma controvérsia na Psicologia a respeito de
comportamentos inatos ou aprendidos, da atuação predominante da heredi-
tariedade ou do contexto sociocultural na determinação de comportamentos
presentes na infância e mesmo na idade adulta.

A hereditariedade remete-nos às características específicas que afetam alguns


aspectos do desenvolvimento, como a velocidade com que aprendemos, nossa
estatura, nossa massa corporal. Por exemplo, a criança, ao nascer, traz uma ten-
dência para ser alta ou baixa, gorda ou magra. Essas potencialidades herdadas
serão atualizadas ou não em função do tipo de alimentação oferecido à criança,
da prática de exercícios físicos e de esportes, da ocorrência ou não de certas
doenças. Se o ambiente for favorável, a criança com tendência para alta estatura
irá desenvolver tal tendência. Assim sendo, o desenvolvimento físico e psicomo-
tor na infância é altamente dependente da maturação biológica, mas é também
suscetível à influência ambiental.

Desse modo, muitos fatores influenciam o crescimento e o desenvolvimento,


ou seja, não é totalmente determinado nem pelo ambiente nem pela genética
e sim por ambos. A tarefa básica do desenvolvimento é descrever a mistura par-
ticular de forças que afetam cada aspecto do desenvolvimento. O resultado que
observamos é tanto das características internas da criança quanto das influên-
cias ambientais, mas a relação entre as variáveis é mais complexa do que a mera
adição das duas. Hoje, o ponto de vista que predomina é o interacionista, ou
seja, o desenvolvimento humano é dependente da constituição biológica e da
influência do contexto sociocultural, particulares na vida de cada pessoa.

Maturação
A maturação refere-se ao processo de transformação ao nível das forças bio-
lógicas geneticamente programadas, que direcionam o crescimento em tama-
nho e o controle de movimentos corporais; a integração sensório-perceptiva; a
possibilidade de sentar, caminhar; padrões hormonais; a motricidade global e
fina para o funcionamento pleno do corpo. Essas sequências de padrões matu-
racionais são compartilhadas por todos os membros da nossa espécie.

Quando um bebê nasce, ele traz consigo tendências hereditárias, ligadas ao


seu impulso biológico para a vida, que incluem processos de maturação, para o
seu desenvolvimento e crescimento. Entretanto, esse desenvolvimento depen-
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Psicologia do desenvolvimento infantil

de, para sua efetivação, de um ambiente satisfatório de facilitação, que deve se


adaptar às necessidades constantes dos processos de maturação. A família, em
especial a mãe, que reconhece a dependência da criança e adapta-se às suas ne-
cessidades, oferece o que Winnicott1 (1982) chama de holding (ambiente) para o
bebê progredir no sentido do desenvolvimento.

Diversidade humana
Diversidade humana é um conceito antropológico que nos apresenta uma
sociedade plural. Compõem essa diversidade todos os segmentos populacio-
nais representados por culturas, etnias, raças, gênero, nacionalidades, crenças e
histórico do grupo social.

Diferenças individuais
As diferenças individuais são explicadas pela Psicologia e decorrem de traços
que podem ser de ordem física (idade, altura, peso) ou de ordem psicológica (es-
tilos de aprendizagem, comportamentos, aptidões, habilidades, tipologia física,
aspirações e sonhos, experiências de vida).

Psicologia do desenvolvimento infantil


A infância é marcada pelo período que vai desde o nascimento à puberda-
de. Historicamente, vista com indiferença, a criança não era percebida com ne-
cessidades diferentes das do adulto. A preocupação com o desenvolvimento da
criança começa a ocorrer no fim do século XIX, quando se iniciam os primeiros
estudos científicos sobre a infância e suas características específicas.

A psicologia do desenvolvimento infantil pretende descrever e explicar o pro-


cesso de evolução contínuo que a criança sofre, a partir de um código genético
que vai se transformando em razão da maturação e das interações com o meio. A
infância é uma fase do desenvolvimento com características próprias em função
de determinados acontecimentos significativos, assim considerados por causa
do importante papel que desempenham no comportamento posterior.

1
Donald Winnicott (1896-1971), médico, pediatra, psiquiatra inglês. Estudou o desenvolvimento psíquico infantil. São contribuições dele os con-
ceitos de mãe suficientemente boa e objetos transicionais. Ainda, refere-se ao desenvolvimento da criança nas categorias de dependência absoluta,
dependência relativa e a via que conduz à independência nas relações que estabelece com o outro.

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Psicologia do desenvolvimento infantil

O produto desenvolvimental para uma determinada criança é sempre resul-


tado de uma mistura de influências internas (inatas) e externas (meio). Nada é
determinado totalmente do interior ou totalmente do exterior.

Podemos dividir a infância em etapas, embora não haja concordância univer-


sal quanto ao número e limites demarcatórios, devido às próprias características
do processo do desenvolvimento. Segue uma das possíveis divisões:

 Primeira etapa – Corresponde ao primeiro ano de vida do bebê. Adapta-


ção às exigências do cotidiano familiar.

 Segunda etapa – Primeira infância, que inicia a partir do segundo ano. De-
monstra interesse por fotos, figuras e histórias. Curiosidade sobre as coisas:
“O que é isto?”. Aquisição da linguagem e reconhecimento corporal.

 Terceira etapa – Segunda infância. É o período escolar, brinca de faz de


conta. Formação do próprio estilo de aprendizagem.

 Quarta etapa – Terceira infância. Vai do período escolar à puberdade. Ma-


turação corporal e sexual. Reorganização da personalidade.

O padrão geral do crescimento ocorre de acordo com as mudanças do peso e


da altura desde o nascimento à maturidade, rápido na primeira infância, lento na
segunda e na terceira, rápido novamente durante o surto de crescimento da pu-
berdade, lento no final da adolescência e estabiliza-se por volta dos 20 anos.

As tabelas de correlações da idade, altura e peso devem ser usadas conside-


rando-se a origem étnica e familiar, o tamanho do esqueleto e os padrões de
crescimento individual.

Desenvolvimento pré-natal e o nascimento


Durante o período pré-natal, há
O que acontece no útero materno?
íntima interação entre fatores in-
ternos (inatos) e externos (meio).
Muitos fatores podem predispor a Tempo de
Atividades observáveis do feto
diversos tipos de distúrbios duran- gestação
Coração começa a pulsar; surgi-
te a gestação. Estado emocional da
3.ª semana mento das principais estruturas do
gestante, idade, alimentação, fator corpo.
RH, uso de drogas e doenças infec- Embrião toma forma humana; res-
8.ª semana
ponde aos estímulos.
ciosas são aspectos que podem in-
terferir no desenvolvimento do feto 12.ª semana Movimentos espontâneos do feto.
durante a gestação.
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O nascimento
O nascimento é o primeiro obstáculo a ser vencido pelo feto. Para nascer, ele
precisa deixar a segurança e a proteção do útero materno e enfrentar os estímu-
los do mundo externo, relativamente ameaçador.

O conceito sugerido por Otto Rank (1884-1939) do trauma do nascimento


pode ser discutido, mas com certeza o parto poderá representar uma experiên-
cia traumática, dependendo de como se processa o momento do nascimento
e seus efeitos no ajustamento inicial à vida fora do útero e até influir sobre o
desenvolvimento posterior da criança.

A experiência do nascimento contribui na impressão que o ser humano terá


da vida. Naturalmente, a impressão não é algo consciente, mas um registro in-
consciente na personalidade, o qual poderá fundamentar os tipos de comporta-
mentos às experiências posteriores.

De qualquer maneira, dificultado ou não, todos reconhecem que o nascimen-


to é sempre uma experiência importante para o ser humano.

O recém-nascido e a mãe
Em relação aos outros seres vivos, o ser humano, ao nascer, tem uma aparên-
cia de extrema fragilidade, não controla os processos fisiológicos, tem uma ex-
pressão indefinida das emoções, possui falta de maturidade das funções senso-
riais e motoras para enfrentar os problemas relativos à sua sobrevivência. Dessa
maneira, o bebê demanda cuidados maternos que têm muita importância para
seu crescimento e desenvolvimento.

Desde os primeiros instantes de vida, a função materna capacita o bebê a


ser de modo diferente conforme as condições sejam favoráveis. Assim, a tarefa
materna compreende em dar significado às verbalizações do recém-nascido.
Mas o estabelecimento do vínculo mãe-bebê não depende exclusivamente das
características da mãe; o bebê também influencia o ambiente ao seu redor. Por
exemplo, um bebê de temperamento difícil provoca reações em seus pais dife-
rentes daquelas que um bebê de temperamento fácil provocaria. Os pais têm
sentimentos diferentes e agem de modo diferente em relação a cada filho, em
função das características de cada um deles e das circunstâncias especiais que
estejam vivenciando.

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Psicologia do desenvolvimento infantil

Não podemos esquecer, no desenvolvimento das relações mãe-bebê, a


enorme importância do meio familiar, as influências exercidas pelo mundo ex-
terno e pelas outras pessoas do grupo familiar. O nascimento de uma criança
ocasionará uma redistribuição da energia emocional da família, bem como alte-
rações de status e de papéis.

Desenvolvimento físico
O bebê nasce com alguns sentidos funcionando regularmente e outros ainda
precariamente. Há dois princípios gerais que regem o ritmo do crescimento
físico do recém-nascido, conforme abaixo.

 O desenvolvimento ocorre no sentido cabeça-pés. A cabeça e o pescoço


atingem a maturidade antes das pernas.

 Ocorre no sentido centro-periferia. Isso significa, por exemplo, que a crian-


ça aprende a dominar os braços antes de aprender a dominar os dedos.

Os bebês nascem com alguns comportamentos reflexos, que são respostas


físicas desencadeadas involuntariamente por um estímulo específico. Em todos
os animais ocorrem respostas simples a certos estímulos, que, por serem tão au-
tomáticas, são chamadas de reflexos. A seguir, descrevemos alguns dos reflexos
presentes no primeiro ano de vida do bebê.

Reflexo Estímulo Resposta reflexa

Colocar seus calcanhares numa


Plantar Retira os pés da superfície.
superfície.
Dá passos que parecem coordena-
Marcha automática Segurá-lo sob o braço.
dos.

Babinsky Cócegas na sola dos pés. Abre os dedos em forma de leque.

Agarra-se, prende-se fortemente e


Agarrar Cócegas na palma das mãos.
pode ser erguido.
Estende os braços, pernas e dedos;
Moro (reflexo do abraço) Estímulo súbito.
joga a cabeça para trás.

Galant Estímulo nas costas. Curva o tronco; a bacia vai para trás.

Vira a cabeça, abre a boca; movimen-


Sucção Estímulo no rosto.
to de sucção.
Está presente ao nascer, mas ainda
Deglutição Alimentação.
não é coordenado com a respiração.

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Temos que, na infância, os diferentes sistemas e órgãos seguem ritmos diver-


sos de desenvolvimento. Por exemplo, o tecido genital é o último no desenvolvi-
mento. Cada tipo de tecido (muscular, ósseo, cutâneo) tem seu próprio modelo
de crescimento, que é relativamente independente das outras partes do corpo
ou dos outros tecidos.

Sabemos também que há períodos críticos no desenvolvimento. Isso sig-


nifica, por exemplo, que há um determinado momento em que a criança está
pronta, madura para aprender determinada resposta, como andar ou controlar
os esfíncteres. A aprendizagem dessa resposta deverá ocorrer nesse momento,
caso contrário será difícil recuperar a oportunidade, e o desenvolvimento fica
prejudicado.

As crianças que crescem em condições de severas privações de estimulação


dos sentidos e da inteligência, de alimentação e saúde, de relações sociais posi-
tivas têm seu desenvolvimento irreversivelmente prejudicado.

O cérebro atinge 80% do seu tamanho aos seis anos de idade.

Nesse sentido, podemos afirmar que o desenvolvimento físico depende da


maturação, embora possa ser influenciado positiva ou negativamente por fato-
res ambientais.

O desenvolvimento psicomotor
As possibilidades de desenvolvimento psicomotor do bebê resultam da ma-
turação de certos tecidos nervosos, aumento em tamanho e complexidade do
sistema nervoso central, crescimento dos ossos e músculos que evoluem de
acordo com a faixa etária. A atividade motora é essencial para o desenvolvimen-
to global da criança.

A integração sucessiva da motricidade implica a constante maturação orgâ-


nica associada às experiências pelas quais o indivíduo passa e a adaptação desse
corpo no ambiente. Dessa maneira, o desenvolvimento psicomotor caracteriza-
-se por comportamentos não aprendidos que surgem espontaneamente, desde
que o bebê seja estimulado e tenha condições adequadas para exercitar-se.

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Psicologia do desenvolvimento infantil

Idade
Condutas psicomotoras
aproximada
Em decúbito ventral, ergue a cabeça; movimentos circulares com a cabeça
1-2 meses
(queixo livre).

3-5 meses Chuta; ergue e sustenta a cabeça e o tórax.

6-7 meses Mantém-se sentado com apoio; quando está de bruços, rola pra ficar de costas.

8-9 meses Senta-se sem apoio; engatinha; vira-se no chão.

10-12 meses Fica de pé com apoio; dá passos com apoio; puxa-se para ficar de pé.

13-15 meses Caminha; sobe escadas com apoio das mãos.

Anda com desenvoltura; pega brinquedos no chão sem cair; empurra os


16-18 meses
brinquedos; sobe em cadeiras.

19-21meses Sobe e desce escadas com apoio; salta; corre.

22-24 meses Sobe e desce escada trocando os passos; senta-se à mesa.

3 anos Sobe e desce escada sem apoio; pula sobre uma corda com os dois pés.

4 anos Saltita.

5 anos Pula obstáculos com um pé só.

Esse desenvolvimento humano apresenta alguns padrões previsíveis:

 o desenvolvimento da noção da totalidade corporal (mostrando a evolu-


ção da apreensão da imagem do corpo no espelho e a exploração e reco-
nhecimento do próprio corpo);

 a evolução da preensão e da coordenação visomotora (evolução da fixa-


ção ocular; preensão e olhar);

 o desenvolvimento da função tônica e da postura em pé; reflexos arcaicos;

 além da estruturação espaçotemporal (tempo, espaço, distância e ritmo).

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Os atributos físicos e as avaliações culturais


Mais importantes que as diferenças físicas entre as pessoas são as avaliações e
significações dessas diferenças pela sociedade, a aceitação dessas avaliações sociais
pelo sujeito e o efeito sobre o conceito de si mesmo. Toda cultura, comunidade, grupo
de colegas e família demonstram ter atitudes avaliadoras dos atributos físicos. Assim,
a cultura define o que considera como a beleza da figura e da aparência humana.
Por exemplo, o pezinho deformado da mocinha chinesa e seus passos suaves, leves
e saltitantes eram considerados belos à figura feminina daquela cultura.

Um outro aspecto é a moda do grupo, que age como força poderosa para
que nele haja conformidade. A criança aprende cedo que ser diferente, ou não
se conformar aos padrões estabelecidos socialmente, é provocar a crítica, a re-
provação e a possível exclusão social. É mais garantido ser igual aos demais e
manter os mesmos ideais do grupo. Essa ênfase na conformidade que atua cons-
tantemente na vida da criança faz com que a percepção de qualquer diferença
seja causa da ansiedade.

O conceito que o indivíduo faz de si, portanto, é, em grande parte, reflexo das
opiniões que os outros têm dele. Essas opiniões interiorizam-se como se fossem
um conceito próprio. Uma vez aceitas, interiorizadas e incorporadas ao conceito
de si próprio, essas opiniões sociais atuam como forças poderosas a influir no
comportamento.

Nossa sociedade tem normas bem definidas dos valores que cabem à figura
feminina e à masculina. A criança torna-se sensível a esses valores sociais e, ao sen-
tir-se diminuída pelos outros devido a certas características, diminui a si mesma e
descobre que os seus desejos de boas relações são frustrados. Em consequência,
sofre distúrbios emocionais e reage sempre defensiva ou ofensivamente para en-
frentar essa situação desfavorável. Essa é uma das razões pelas quais as crianças
com necessidades especiais motoras têm, em conjunto, mais problemas emocio-
nais e de personalidade que as outras crianças, já que as diferenças físicas só têm
significado dentro do sistema de referência do grupo específico com o qual o indi-
víduo se identifica e se reconhece, como fazendo parte do grupo.

As diferenças físicas entre os sexos já estão presentes no feto. O bebê do


sexo masculino é maior em medidas e peso que o feminino. Essa inversão
temporária da diferenciação no tamanho físico é motivada por uma diferen-
ça de sexo em razão do amadurecimento relativo que, nas meninas, é maior
do que nos meninos.

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Desenvolvimento social e emocional


Um estudo importante é o de Erik Erikson2 sobre o desenvolvimento psicos-
social do ser humano. Erikson vê esse processo como a adaptação do homem
biológico ao contexto sociocultural e histórico. Afirma ele que, originariamente,
a natureza humana não é boa nem má, mas tem possibilidade de vir a ser uma
coisa ou outra.

A seguir, apresentamos um quadro do desenvolvimento psicossocial de Erik-


son que concebe a construção da identidade pessoal como um processo decor-
rente da relação do sujeito com a cultura, mediada pelos laços parentais. Cada
etapa do desenvolvimento psicossocial tem suas características específicas.
Desse modo, em cada um dos momentos de sua vida, o filho necessita de uma
atitude diferente dos pais.

Desenvolvimento psicossocial do ser humano

Crises
Idade Relações Aspectos
psicossociais Marcas psicossociais
aproximada interpessoais intrapessoais
infantis

Confiança X Ritmo e regulari-


Laços maternos, ali- Otimismo, confiança, es-
Até 1 ano dade, receber e
desconfiança. mentação. perança, segurança.
dar de si.

Controle de si e
Autonomia X vergo- Laços paternos, há- Livre-arbítrio, autonomia,
2 a 3 anos do outro: “deixa
nha, dúvida. bitos de higiene. vontade, escolha.
que eu faço”.

Desenvolvimento da
Laços familiares, lo- Começo, meio e consciência de si. Papel
3 a 7 anos Iniciativa X culpa.
comoção. fim das coisas. sexual. Estabelece ob-
jetivos e finalidades.

Dar provas de competên-


cia educacional, ocupacio-
Produtividade social Laços sociais (esco- nal (trabalho, realização
8 a 13 anos Socialização.
X inferioridade. las, igreja, clube). de tarefas), sentimento
de reconhecimento do
outro.

2
Erik Erikson nasceu na Suécia em 1902 e faleceu em 1994. Era um artista promissor quando decidiu estudar Psicologia e Psicanálise para com-
preender a criança. Propôs uma teoria do desenvolvimento diferente daquela de Freud. Para Erikson as pulsões têm caráter social. Sua teoria serviu
de base para as novas compreensões sobre o desenvolvimento infantil.

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Portanto, nunca se exagera quando se enfatiza a importância do bom relacio-


namento entre pais e filhos. Esse vínculo inicial é um dos eixos para os demais
relacionamentos interpessoais.

A pessoa que não elabora esses conflitos está alienada do contexto e apre-
senta um sentimento de desconfiança, pessimismo, sentimento de distância
dos outros e falta de adaptação social.

A socialização da criança inicia-se e tem seu funcionamento na família, cresce


por meio da interação com os pares, desenvolve-se e manifesta-se na escola,
continua a se expandir na adolescência para culminar na vida adulta. A base,
porém, sempre estará nos laços familiares. Se a ligação afetiva com os mem-
bros da família for positiva, possivelmente a criança passará a perceber todos os
demais como fonte de satisfação, de estabilidade e de confiança. Essa interação
também contribui para que a criança desenvolva um conceito de si mesma.

Ainda muito cedo, a criança é sensível à percepção de quem a aprecia e de


quem a rejeita. Pode estar munida de uma grande capacidade de socialização
e de desejo de cooperar com os colegas, mas, se for rejeitada por eles, poderá,
com a mesma intensidade, desenvolver atitudes negativistas e rebeldes.

Pais e professores desempenham um papel de agentes de socialização para


a criança. A interação da criança com o adulto é uma via de mão dupla, no sen-
tido de que as influências dos agentes de interação são recíprocas. Na escola, a
criança aprende e amplia sua visão de mundo e aprende que muitas pessoas de
valor existem ou existiram e realizam coisas. A criança precisa ser estimulada a
realizar as tarefas pelas quais demonstra interesse, bem como entrar em contato,
sem preconceitos, com a diversidade e as diferenças individuais. Assim, a criança
passa a desejar coisas e a obter reconhecimento.

Aplicação educacional
Uma atividade socializadora é o jogo. Por meio dele, a criança imagina e
vive situações de enriquecimento pessoal, ajudando na estruturação de sua
personalidade. O jogo auxilia na aquisição de hábitos que servirão de base
para o seu comportamento futuro no estudo, no trabalho, na organização e
no planejamento das atividades diárias.

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Desenvolvimento intelectual
A inteligência pode ser uma denominação usada para nomear processos que
julgamos que existam, mas que não têm uma realidade concreta; podem ser
apenas inferidos a partir dos comportamentos das pessoas. No meio social, a
inteligência é definida em termos de como a pessoa se comporta socialmente.
As opiniões que os homens têm sobre seus semelhantes baseiam-se em julga-
mentos sobre a sua inteligência: “ele é ‘sabido’”, “como o fulano é ‘esperto’”.

Dos estudos realizados sobre o desenvolvimento cognitivo, um ato pode ser


considerado inteligente quando apresentar um comportamento intencional.
Pode também ser considerado como a capacidade de adaptação ao meio ou a
novas situações. Quando falamos em inteligência, estamos nos referindo exata-
mente à possibilidade de variar os meios e formas de agir, em função da realiza-
ção de determinados objetivos.

Os pontos a seguir referem-se a algumas das maneiras pelas quais a inteli-


gência tem sido definida:

 capacidade criativa, capacidade de liderança e capacidade de análise;

 plasticidade ao enfrentar uma situação;

 habilidade para beneficiar-se da experiência;

 facilidade na aquisição de novos comportamentos;

 resultado obtido nos testes psicométricos de QI.

Alguns estudiosos desse tema são os psicólogos norte-americanos Daniel


Goleman e Howard Gardner. O primeiro se preocupa com a Inteligência Emo-
cional e demonstra que nossas possibilidades de sucesso na vida profissional
e pessoal são determinadas, em grande parte, pela maneira com que desen-
volvemos nossas emoções. Gardner propõe uma nova visão da inteligência em
sete diferentes competências, que se interpenetram às inteligências múltiplas.
E, finalmente, Jean Piaget, que fala em “qualidade” dessa inteligência que se de-
senvolve em função da interação da criança com o ambiente. O pesquisador dá
ênfase às mudanças sequenciais no pensamento e na lógica.

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A natureza da inteligência
A natureza da inteligência humana pode ser considerada uma capacidade
potencial do indivíduo. Essa potencialidade é de natureza inata e se desenvolve
desde a infância. O desenvolvimento, a eficiência e o aprimoramento da capacida-
de potencial depende das interferências, dos estímulos adequados que o indiví-
duo recebe e das modificações por doença que possam afetá-lo. Assim, o nível de
funcionamento intelectual é produto das influências hereditárias (inatas) e do
meio ambiente.

O ambiente e o desenvolvimento intelectual


Tem-se procurado estabelecer relações entre a inteligência e variáveis físicas,
culturais e ambientais. Entende-se por ambiente todas as experiências vividas
pela criança, na interação com o meio. Destacam-se, daí, as relações sociais que
interferem no desenvolvimento intelectual e que podem ser identificadas no
comportamento dos pais com seus filhos.

Pais que esperam que o filho saia-se bem e desenvolva-se rapidamente enfati-
zam a adequabilidade das atividades e a aquisição de novos comportamentos. Um
exemplo é quando os pais proporcionam uma estimulação adequada e significa-
tiva com materiais lúdicos, jogos e brinquedos que atendam à idade e nível de de-
senvolvimento da criança. Os pais que mantêm uma ligação afetiva com os filhos
e que o reforçam constantemente quando ele brinca, joga ou resolve problemas,
favorecem a motivação da criança e a encoraja a enfrentar novos desafios.

As diferenças de inteligências entre vários grupos têm sido de difícil de-


monstração. As diferenças de inteligência por sexo não se revelaram tão sig-
nificativas a ponto de determinar planejamentos educacionais adaptáveis
aos dois sexos. O mesmo se observa com relação à etnia.

Outra influência importante é a comunicação entre pais e filhos. Pais que


usam linguagem descritiva e clara (exatidão e detalhamento são adequados
com crianças de quatro anos) e falam a respeito dos objetos e pessoas com o
filho contribuem para o crescimento intelectual. Finalmente, vale destacar o am-
biente escolar e as relações professor-aluno, as quais interferem no desenvolvi-
mento cognitivo da criança.

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Medida da inteligência
Historicamente, a medida da inteligência surgiu com a necessidade de des-
cobrir quais crianças das escolas públicas francesas não possuíam capacidade
suficiente para aproveitar os ensinamentos que lhes eram ministrados.

Os psicólogos franceses Alfred Binet e Theodore Simon, em 1904, desenvol-


veram o conceito de idade mental que indicava o nível de inteligência atingido
pelo indivíduo. Elaboraram um conjunto de testes psicométricos de QI (quocien-
te de inteligência) e os aplicaram a grupos de alunos a fim de encontrar o grau
de desenvolvimento intelectual de cada um. Se uma criança em idade escolar
não conseguisse realizar mais que uma criança considerada retardada mental, é
porque também seria retardada. Se uma criança de seis anos realizasse apenas
os testes feitos geralmente por criança de quatro anos, ela apresentaria um re-
tardo de dois anos. Desse modo, Binet pôde identificar crianças retardadas ou
aquelas que não conseguiriam tirar proveito de um programa escolar regular.
Eles consideravam que a inteligência era basicamente uma capacidade de julga-
mento (bom senso prático, iniciativa, compreensão, raciocínio).

Os testes cumprem a finalidade de medir a inteligência de modo indireto, po-


dendo ser aplicados a grupos de pessoas ou individualmente. Os testes coletivos
desenvolveram-se enormemente em face da necessidade de medir a inteligên-
cia a fim de economizar tempo.

A eficiência intelectual atinge o seu ponto máximo por volta dos 20 anos
e permanece estável até os 35 anos, quando perdas começam a se tornar
aparentes até cerca dos 60 anos, época em que as perdas aumentam.

Nessa exposição, buscou-se apresentar um quadro da criança em desenvol-


vimento, a partir de diferentes aspectos, como físico, emocional, intelectual e
social. Todos esses aspectos estão inter-relacionados de muitas maneiras e de-
notam os processos pelos quais cada ser humano se desenvolve.

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Texto complementar

A utilização da chupeta
e o desenvolvimento sensório-motor oral
(ARAÚJO; SILVA; COUTINHO, 2009, p. 261-267)

Introdução
A forma de alimentar o lactente está diretamente relacionada às habili-
dades motoras orais. Daí considerar-se o tipo de alimento – natural/artificial
e a forma como é oferecido – peito/mamadeira, fatores determinantes no
desenvolvimento motor oral e alimentar infantil.

A substituição da amamentação natural por mamadeira pode desenca-


dear prejuízos no desenvolvimento sensório-motor oral, por falta da corre-
ta estimulação das estruturas orofaciais, e favorecer a instalação de hábitos
orais. Estes são caracterizados por padrões de contração muscular aprendi-
dos e regulados por arcos reflexos.

Os hábitos de sucção são ações adquiridas por repetições frequentes do


movimento de sugar, destacando-se o uso da chupeta. Os hábitos orais têm
sido amplamente estudados por profissionais de saúde por repercutir no
desenvolvimento crânio-facial, comprometendo aspectos morfológicos e
motores. A motricidade orofacial decorre da ação dos grupos musculares en-
volvidos, repercutindo principalmente nas funções como respiração, sucção,
mastigação, deglutição e fonoarticulação, consideradas funções vitais.

O processo de desenvolvimento funcional da alimentação, iniciado no


primeiro mês de vida envolve integração sensório-motora da deglutição
com a respiração, coordenação mão-olho, adequação do tônus muscular e
postura e maturação psicossocial.

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Por outro lado, há vários estudos sobre o desenvolvimento da sucção


em neonatos, nos quais os critérios utilizados como rotina são anamnese e
avaliação sensória-motora oral, além da observação da sucção não nutritiva,
nutritiva e da deglutição.

Este artigo tem como objetivos verificar parâmetros do desenvolvimento


sensório-motor oral de lactentes no terceiro mês de vida, com e sem o hábito
de chupar chupeta, além de identificar a frequência do uso da chupeta entre
crianças em aleitamento materno e crianças que iniciaram o desmame.

Métodos
Estudo observacional com corte transversal, considerando-se o desenvol-
vimento sensório-motor oral das crianças que utilizavam chupeta, compara-
do ao desenvolvimento das crianças não expostas a esse utensílio.

Desenvolvido na Maternidade Professor Bandeira Filho, “Hospital Amigo


da Criança” desde 2002, conveniada ao Sistema Único de Saúde e pertencen-
te ao Distrito Sanitário V, da Prefeitura da Cidade do Recife, Pernambuco.

A população foi constituída por 74 crianças com três meses de idade, acom-
panhadas no ambulatório de Puericultura daquela maternidade, nascidas a
termo (idade gestacional ao nascimento igual ou maior que 37 semanas). Nor-
malmente, houve registro do Capurro Somático. Não constando esse dado, se-
guiu-se, na ordem: data da última menstruação e ultrassonografia; condições
clínicas compatíveis com bons índices de vitalidade, ou seja, índice de Apgar
igual ou maior que sete; peso ao nascer adequado para a idade gestacional.
Além disso, foram critérios de inclusão ausência de malformações ou doenças
que pudessem interferir no desenvolvimento psicomotor.

Os critérios de exclusão foram estabelecidos por fatores que pudessem


prejudicar ou mesmo retardar o início da prática do aleitamento natural:
transtornos clínicos neonatais e pós-natais; alterações genéticas e/ou neuro-
lógicas; más-formações que interferissem na alimentação; problemas mater-
nos físicos e/ou psíquicos que inviabilizassem a amamentação, como Síndro-
me da Imunodeficiência Adquirida, mastectomia e alterações mentais.

A avaliação fonoaudiológica aconteceu por meio de observação e manuseio


das estruturas orofaciais, registrando-se detalhadamente aspectos referentes à
postura habitual dessas estruturas e às respostas da criança ao estímulo táctil.

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Com o objetivo de melhor controlar as avaliações individuais realizadas,


bem como ter material suficiente para comparação e análise, todas as crian-
ças foram filmadas na postura de repouso e durante o manuseio.

Os dados sobre o desenvolvimento sensório-motor oral e de alimenta-


ção foram registrados em protocolo preestabelecido. Cada criança teve seus
dados registrados individualmente e por data de retorno, considerando a
variação de dez dias antes ou depois da data do nascimento.

A equipe de coleta foi constituída por uma pesquisadora responsável e


quatro estudantes do sexto período do curso de Fonoaudiologia. A pesqui-
sadora responsável realizou treinamento específico para fins de coleta, expli-
cando detalhadamente os aspectos questionados e avaliados. Foi realizado
estudo piloto, com avaliação dos protocolos e desempenho da equipe.

O protocolo de avaliação foi elaborado pela pesquisadora, baseado na


evolução do desenvolvimento normal de zero a três meses proposto pelo
Conceito Neuroevolutivo – Bobath e por Alexander, Boheme e Cupps.

Como variáveis de análise foram considerados hábitos de sucção de chu-


peta e dedo, alimentação e o desenvolvimento sensório-motor oral – contro-
le cervical, postura habitual global, de lábios e língua, reações orais, respos-
tas ao estímulo sensorial –, aos três meses de idade.

Os bebês foram inicialmente observados no colo da mãe e, em segui-


da, em mesa de superfície macia e avaliados nas posturas prono, supino e
puxado para sentar. Nesse momento, verificava-se controle cervical e postu-
ra global – padrão de movimento simétrico ou assimétrico.

Em relação aos aspectos sensório-motores orais, foram observados: pos-


tura habitual dos lábios – aberta, entreaberta e fechada; postura habitual da
língua – anterior, entrearcos e posterior; resposta aos reflexos orais de procu-
ra, sucção e mordida; sensibilidade intra e extraoral.

A investigação do reflexo de procura foi realizada por toque em região


perioral, sendo resposta positiva o giro da cabeça em direção ao estímulo,
seguido de abertura oral.

O reflexo de sucção foi avaliado por resposta à sucção rítmica diante de es-
tímulo com dedo enluvado na porção anterior da língua e/ou palato duro.

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A mordida fásica foi testada por meio de toque na região lateral da gen-
giva. A presença de movimentos rítmicos sequenciados de abertura e fecha-
mento oral demonstrava resposta positiva.

Para investigação da sensibilidade intra e extraoral foram realizados


toques nas regiões da face e cavidade oral, utilizando mãos enluvadas ou
brinquedo de borracha. Como comportamento de aproximação, teve-se ex-
pressão de interesse e satisfação; e de afastamento/recusa ao estímulo.

Esta pesquisa atende ao Conselho Nacional de Saúde, Resolução 196/96,


sendo previamente aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro de
Ciências da Saúde da Universidade Federal de Pernambuco, sob o n.º 292/2005.
Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclareci-
do e consentiram a divulgação dos resultados.

Os dados colhidos foram digitados em dupla entrada, com checagem e


validação de informação. O software utilizado na formatação do banco e na
análise estatística foi o EpiInfo versão 6.04.

Os dados foram submetidos à análise estatística, envolvendo o teste Qui-


quadrado de associação de Pearson. O nível de significância utilizado foi de
5,0% (p≤0,05).

Resultados
A amostra foi constituída por 74 crianças com 90 dias de idade mais ou
menos dez dias (90,0; DP6, 9 dias) e suas mães. Houve discreto predomínio
de crianças do sexo masculino (54,1%). A idade das mães variou entre 15 e 40
anos (23,5; DP5, 2 anos), havendo maior concentração de faixa etária entre
20 e 29 anos (63,5%).

Com referência ao desenvolvimento global, 60 lactentes (81,1%) manti-


nham postura assimétrica em relação ao corpo e 61 (82,4%) não apresenta-
vam controle cervical. Houve resposta positiva para reflexos orais de procura
em 44 bebês (59,5%) e de sucção em 71 (95,9%) crianças. A mordida fásica foi
observada em todos os participantes.

A postura habitual aberta de lábios predominou em 71 crianças (95,9%),


assim como a língua projetada em 72 (97,3%). Foram encontradas reações
de afastamento em 63 sujeitos (85,1%).

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[...]

Para as crianças não usuárias de chupeta houve melhor resposta aos re-
flexos orais de procura e sucção e a língua espontaneamente estava mais
posteriorizada.

Aos três meses de vida, 52 crianças (quase 70,0%) estavam em aleitamen-


to materno exclusivo.

Das 22 (30,0%) que iniciaram o desmame, 13 (59,1%) o fizeram no primei-


ro mês de vida, com introdução da mamadeira.

O uso de chupeta esteve presente em 21 crianças (28,4%), com início nos


primeiros quinze dias de vida.

[...]

Discussão
Neste estudo, as mães mais jovens foram as que mais ofereceram chu-
peta aos seus filhos. A idade materna constitui fator importante na prática
do aleitamento, à medida que mães mais jovens tendem a desmamar seus
filhos precocemente, bem como introduzir a chupeta, por influência de avós
ou vizinhos.

O hábito de usar chupeta prevaleceu em crianças que não estavam mais


sendo exclusivamente amamentadas. Isso ratifica o que vem sendo descrito
na literatura: a instalação de hábitos orais está frequentemente associada ao
desmame, seja na qualidade de determinante ou como indicativo de dificul-
dades em manter a amamentação natural.

Em relação à postura global, o padrão assimétrico e a ausência do con-


trole cervical aos três meses foram prevalentes nas crianças participantes.
Entretanto, nas que não utilizavam chupeta, registra-se com mais frequência
a postura simétrica, apesar do mesmo não acontecer com relação ao contro-
le cervical. É possível inferir que esses achados podem estar relacionados à
idade das crianças, visto ser em torno dos três meses que tem início ocon-
trole cervical.

Nesse sentido, no terceiro mês de vida, a criança começa a assumir uma


postura simétrica, demonstrando aumento de atividades orientadas para

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linha média corporal. O controle cervical e de ombros é iniciado por maior


ativação da musculatura dessas estruturas bilateralmente. A cabeça se posi-
ciona mais na linha média por ação dos flexores contra gravidade.

Com referência aos reflexos orais de procura e sucção, não houve diferen-
ça significante entre os bebês usuários e não usuários de chupeta, encon-
trando melhor resposta, no entanto, neste último grupo.

A mordida fásica esteve presente em todas as crianças da amostra, cons-


tatando-se resposta normal nessa faixa etária. Esta é uma reação de defesa
caracterizada por fechamento/abertura rítmica mandibular, em resposta ao
estímulo tátil nas gengivas.

A língua em postura habitual esteve mais posteriorizada na população sem


chupeta, demonstrando maior maturação nesse aspecto. Língua menos pro-
jetada apresenta maior mobilidade, facilita a formação e propulsão do bolo
alimentar, além de permitir a introdução da alimentação complementar.

O aleitamento materno exclusivo aos três meses de idade predominou


em não usuários de chupeta. Provavelmente, pelo fato de a coleta ocorrer
em maternidade credenciada à “Iniciativa Hospital Amigo da Criança”, carac-
terizada pela atenção ao aleitamento materno desde a assistência pré-natal,
durante o período de internação hospitalar e seguimento na puericultura.
No entanto, o uso da chupeta é uma prática cultural muito utilizada, mesmo
em populações orientadas a não oferecê-la.

Os primeiros meses de vida do lactente são marcados por mudanças nas


relações anatômicas do corpo, incluindo-se cavidade oral, faringe e laringe.
No desenvolvimento oral e no global, a precisão dos movimentos progride à
medida que a habilidade de dissociação de movimentos é adquirida. Assim, a
língua se move com a mandíbula, não sendo capaz de fazê-lo isoladamente.

Com o crescimento da criança, acontecem alterações anatômicas e fisio-


lógicas do sistema sensório-motor oral. A mandíbula estende-se para baixo
e para frente, aumentando o espaço intraoral, o que favorece mudança do
padrão de mobilidade das estruturas orais pelo fato de a língua estar mais
posteriorizada, ou seja, melhor posicionada em cavidade oral. Por outro lado,
há incremento da atividade labial com maior oclusão.

A maturação normal da sucção e da deglutição pode ser verificada pela


competência motora oral, organização neurológica e maturidade gastrintes-

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tinal, que dependem de fatores internos e externos à criança. Dos fatores


internos, ressaltam-se saúde geral, experiência alimentar, habilidade para
coordenar a respiração e prontidão para a alimentação. Constituem fatores
externos, a quantidade e velocidade do fluxo de leite e o tipo de apoio ofere-
cido pelas mães durante a alimentação.

O desenvolvimento facial após o nascimento sofre interferência do traba-


lho muscular decorrente da sucção para extração do leite. Nessa atividade,
a mandíbula realiza movimentos de abertura e fechamento, promovendo
crescimento do terço anterior da face e prevenindo más oclusões. O con-
trole motor oral evolui a partir da atividade muscular específica, na medida
em que ocorre também evolução no desenvolvimento motor global. Como
resultado, o bebê aceita novas experiências alimentares no tocante à consis-
tência e textura, favorecendo o desenvolvimento sensório-motor oral.

A maioria dos estudos referentes às consequências de mamadeira e chu-


peta no desenvolvimento orofacial se dá com crianças maiores, a partir do
primeiro ano. Esses trabalhos constatam alteração na oclusão labial por ação
ineficiente da musculatura responsável e postura habitual atípica de língua,
como sinais de hipotonia e protrusão. Indicam, ainda, alterações de arcos
dentários com consequências em oclusão e articulação dos fonemas.

Assim, é possível inferir que a motricidade orofacial é beneficiada por


meio do aleitamento materno, visto que envolve diversos músculos, o que
não ocorre na alimentação por meio da mamadeira, quando o trabalho pre-
dominante é realizado pelos músculos bucinadores. Acrescenta-se a esse
aspecto a possibilidade de não saciar a necessidade de sucção dos bebês,
que se tornam mais suscetíveis a desenvolverem hábitos de sucção de chu-
peta e/ou dedo. A prática do aleitamento materno exclusivo, então, pode
minimizar a aquisição do hábito de chupeta, frequentemente encontrado
em crianças que não mamaram.

Conclusão
Em crianças não usuárias de chupeta, encontrou-se com maior frequência
padrão motor global simétrico, melhor resposta aos reflexos orais de procura
e sucção, postura de língua em posição mais posteriorizada.

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Além disso, verificou-se que crianças aos três meses aleitadas exclusi-
vamente no peito frequentemente não utilizam chupeta. Por outro lado,
registra-se com maior frequência o uso de chupeta entre as que já haviam
iniciado o desmame.

Apesar de esta pesquisa mostrar-se limitada por ser um corte transversal


e conter amostra relativamente pequena, contribui para melhor compreen-
são do impacto da instalação de hábitos orais no desenvolvimento sensorial
e motor de bebês.

Dica de estudo
Ponte para Terabítia, direção de Gabor Csupo, 2009.

Ponte para Terabítia apresenta a história de Jess e sua amiga Leslie. O filme
discorre sobre aspectos do desenvolvimento global infantil e é interessante
observar, inicialmente, o perfil de cada criança e depois a transformação deles
quando se tornam amigos. Esse aspecto é mais visível em Jess. O filme também
retrata a condição criativa do pensamento infantil.

Atividades
1. Levante pontos importantes sobre o desenvolvimento infantil.

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2. Defina maturação e sua relação com o desenvolvimento humano.

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Gabarito
1.

 Estudar o desenvolvimento significa descrever a evolução de um ser de-


pendente e imaturo para um ser autônomo com potencialidades.

 Deve-se considerar a diversidade e as diferenças individuais para compre-


ender o desenvolvimento do indivíduo.

 Cada área do desenvolvimento (física, psíquica, social, cognitiva) tem suas


peculiaridades e seu ritmo próprio em cada fase da vida humana (criança,
adolescente, adulto).

2. Maturação se refere ao processo de transformação ao nível das forças bioló-


gicas geneticamente programadas. Maturação não é sinônimo de desenvol-
vimento, e sim um dos aspectos do desenvolvimento global do homem. Diz
respeito especificamente ao desenvolvimento físico.

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Psicologia do desenvolvimento
da adolescência

Irene Carmen Piconi Prestes


De acordo com a complexidade do tema adolescência em que se re-
lacionam a Psicologia e a Educação, almeja-se neste capítulo salientar os
aspectos pertinentes à adolescência, os quais devem ser tomados como
essenciais quando o que se quer é aproximar os processos do aprender ao
contexto educacional.

É importante destacar que o processo da adolescência atualiza e reflete


todos os conflitos, tramas e tensões conquistados no desenvolvimento do
indivíduo para a reelaboração da identidade pessoal. O adolescente apre-
senta flutuações progressivas e regressivas em seu funcionamento psíqui-
co, ora funcionando como uma criança, ora como um adulto. Isso marca
o aparecimento do que se denomina de conflito universal, que significa o
desejo de permanecer sob a proteção, relutância em assumir responsabi-
lidades, resistência em colaborar com os adultos e receio de ser criticado
nas suas decisões. Já para o adulto que se relaciona com o adolescente,
observa-se que essa convivência mobiliza no adulto sentimentos como
necessidade de manter o domínio, o temor de que ele venha a sofrer se
não estiver sob sua proteção, o preconceito de que os jovens não sejam
capazes de ser autônomos, o ciúme do filho quando ele se relaciona com
outras pessoas. Nessa perspectiva, ao estudar a adolescência, é necessá-
rio considerar as modificações próprias da adolescência, o incremento das
pressões psíquicas e o processo das mudanças físicas bem como a relação
do adolescente com as exigências da família e da sociedade. Assim, no
estudo da adolescência coexistem, de modo inseparável e interdepen-
dente, o biológico, o sociocultural e o psicológico.

Com base nessas informações, podemos entender adolescência segun-


do Aberastury (1981, p. 89): “literalmente, adolescência [...] significa a con-
dição ou o processo de crescimento. O termo se aplica especificamente ao
período da vida compreendido entre a puberdade e o desenvolvimento
completo do corpo”.

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Psicologia do desenvolvimento da adolescência

Aberastury (1981) destaca que a harmonia interna surge a partir de uma rela-
ção afetiva significativa e positiva com os pais e da capacidade criativa que eles
proporcionam. Esse equilíbrio com o mundo interno possibilita a relação com os
outros e estabelece a identidade do adolescente.

Assim, verifica-se que a adolescência refere-se às mudanças no comporta-


mento e no status social, podendo ser definida amplamente.

Adolescência é:

 um período de transição entre a dependência infantil rumo à autos-


suficiência adulta;

 uma experiência de vida marginal na qual novas experiências que dis-


tinguem o comportamento da criança do comportamento do adulto
em uma determinada sociedade têm que ser feitas;

 o período que se estende aproximadamente dos 12 até os 21 anos,


com grandes variações individuais e culturais;

 o período de ajustamento sexual, social, ideológico, vocacional e de luta


pela emancipação.

(ABERASTURY, 1981)

A adolescência, como todo período de transição, tem características consti-


tucionais e do meio histórico-social e cultural em que se manifesta. O ambiente
social atual reserva aos jovens um lugar repleto de novas experiências. Desse
modo, o ambiente é importante para a maturidade do adolescente. Por maturi-
dade, entende-se o estado em que o indivíduo domina o seu ambiente, mostra
uma certa unidade de personalidade e é capaz de perceber, adequadamente, o
mundo e a si mesmo.

É possível, didaticamente, dividir a adolescência em três grandes períodos:


pré-puberdade, puberdade e pós-puberdade, cada um com características sig-
nificativas para o crescimento do adolescente. O período da pré-puberdade abre
os caminhos para a adolescência e o aspecto que se destaca é o desenvolvimen-
to físico; já na puberdade privilegia-se o desenvolvimento psíquico; e, o terceiro
período – a pós-puberdade – é o desenvolvimento social que recebe atenção
privilegiada do adolescente.

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Pré-puberdade Puberdade Pós-puberdade


11-13 anos 13-18 anos 18-21 anos
Desenvolvimento

Privilegia os aspectos físicos


devido às transformações cor-
Maturidade reprodutiva. Liga-
porais e hormonais. Desen-
físico

ções sexuais que vão do auto-


volvimento da pubescência, Atinge a plenitude.
erotismo até a heterossexuali-
despertar para a sexualidade.
dade genital.
Conformação física desajeitada
e desengonçada.

Objeto de identificação fora da


Desenvolvimento

família, por oposição à depen-


Privilegia os aspectos psíquicos.
dência familiar. Colorido erótico
Processo de perda e lutos de
psíquico

nas percepções. Conflito univer-


imagos internas. Contradição in- Elaboração dos pontos desen-
sal, o jovem pende entre atitu-
terna da identidade. Sentimento cadeados no período anterior.
des de autoconfirmação ou de
de impotência frente à realidade
convencimento de sua superio-
concreta.
ridade sobre os pais e atitudes
regressivas de submissão.
Desenvolvimento
intelectual

Amplia e enriquece o universo Amplia e enriquece o universo Amplia e enriquece o universo


cognitivo (estudos da teoria psi- cognitivo (estudos da teoria psi- cognitivo (estudo da teoria psi-
cogenética de Jean Piaget). cogenética de Jean Piaget). cogenética de Jean Piaget).

As transformações da imagem
Privilegia os aspectos sociais.
física acarretam dificuldades de
Valores contraditórios e ambí-
ajustamento e a preocupação
guos do contexto sociocultural.
Desenvolvimento

com a maneira pela qual os ou- Falta comprometimento social.


Elaboração da temporalidade
tros o percebem. A sensualidade Posição social indefinida. Troca
(ontem – hoje – amanhã). Con-
ameaça a segurança do indiví- de papéis sociais. Forte presença
social

duta social de responsabilidade,


duo. Posição de embaraço social. de ídolos e autoridades. A luta
culpa, cooperação, solidarieda-
O sistema político totalitário atrai pela independência torna-o in-
de. Elaboração da identidade
mais por fornecer identidades capaz de estabelecer laços afeti-
pessoal, definição profissional,
adequadas e grupais, já o siste- vos intensos (dependência).
expectativa na escolha do par-
ma democrático é menos atrati-
ceiro sexual e participação co-
vo porque envolve livre-arbítrio
munitária sociopolítica.
e não dá uma identidade.

Desenvolvimento emocional
Aqui vamos discorrer sobre a vida emocional na adolescência sem nos ater-
mos a uma fonte teórica. Se fosse possível refazer o caminho da construção da
identidade pessoal do indivíduo, desde o estado de indiferenciação e fusão com
a mãe até a aquisição de sua identidade adulta, poderíamos descrever tal identi-

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dade dizendo que, inicialmente, para o bebê, o universo é ele próprio envolvido
no útero materno. Após o nascimento, a criança, nos primeiros anos de vida, crê
que o mundo existe para servi-la, impera a onipotência do pensamento infantil.
Mais tarde, dá-se conta de que o mundo existe independente dela e estabelece
uma relação interativa com o mundo no processo de aprendizagem. E, finalmen-
te, quando chega a adolescência, aceita as suas limitações humanas e é capaz
de conviver com os outros segundo normas, valores, leis já estabelecidas social-
mente. Sabemos que, no desenvolvimento da identidade, o psiquismo exerce
papel de elemento motivador para a atividade humana. Mas, se a vida emocio-
nal é uma força altamente positiva, ela também pode se transformar em força
destrutiva e desintegradora.

A identidade
Identidade é a consciência do “eu individual” que o indivíduo tem como um
ser no mundo; começa na infância com a noção da individualidade do corpo. A
identidade é o conhecimento por parte de cada indivíduo da condição de ser uma
unidade pessoal, separada e distinta dos outros, permitindo-lhe reconhecer-se o
mesmo a cada instante de sua evolução, correspondendo, no plano social, à re-
sultante de todas as identificações prévias feitas até o momento considerado. O
conceito operativo de identidade está formulado a partir das noções dos vínculos
de integração espacial, temporal e social do sentimento de identidade, os quais
vão compor a dinâmica do funcionamento mental (GRIMBERG, 1971).

Leon Grimberg (1971), psicanalista argentino, ao estudar a questão da identi-


dade, a descreve como resultante da integração de três aspectos:

 o vínculo de integração espacial está relacionado com a imagem cor-


poral, ou seja, a representação que o indivíduo tem de seu próprio corpo
com características que o tornam único;

 o vínculo de integração temporal corresponderia à capacidade do indi-


víduo de recordar-se do passado e imaginar-se no futuro, ou seja, é a base
do sentimento da mesmidade, que é a capacidade de seguir sentido-se o
mesmo ao longo da vida, apesar do influxo das mudanças que ocorrem
interna ou externamente;

 o vínculo da integração social diz respeito às inter-relações pessoais, ini-


cialmente com as figuras parentais e posteriormente com todas as figuras
de relevância afetiva para o indivíduo no decurso de sua existência.

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Poderíamos ainda acrescentar que o sentimento de identidade é função de


um equilíbrio dinâmico entre os três vértices do triângulo que se segue.

O que eu penso que eu sou


X

Sentimento de
identidade

X X

O que eu penso que


O que os outros os outros pensam
pensam que eu sou que eu sou

Experiências significativas
para a estruturação da identidade
A frustração
O “não” é uma experiência que se caracteriza por ser uma interdição que frus-
tra a criança. Os pais são as figuras que frustram a criança e o adolescente. Essa
experiência é estruturante dos limites corporais, físicos e psíquicos do sujeito em
desenvolvimento.

Em determinado momento, quando uma criança ou adolescente diz “não”,


ela pode estar querendo dizer aos pais que é independente deles, que é um
sujeito com desejos próprios, com uma identidade, que pensa por si, logo, existe
como pessoa. Por outro lado, pode, também, estar tomando uma posição de
desafio, de onipotência (egocentrismo, narcisismo); pode estar querendo dizer
que sabe tudo, que não precisa dos adultos. Assim, a experiência da frustração,
então, organiza, dá continente, dá limite ao adolescente (OUTEIRAL, 1994).

Sabe-se que, se uma criança ou um adolescente for continuamente frustrado,


ele pode ser levado a apresentar-se com agressividade, a manter pouca vincula-
ção social, a ter problemas de comunicação, a agir com imaturidade, desconfian-
ça e, inclusive, ser incapaz de compreender regras.
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A elaboração dos processos de luto


Emocionalmente, a adolescência é um período confuso, doloroso, no qual o
adolescente enfrenta o mundo sem estar preparado para os relacionamentos
sociais. Essas relações levam o adolescente a lutar por emancipar-se dos pais em
todos os aspectos (físico, afetivo, social e cognitivo). Desse modo, processam-se os
lutos de perdas da condição infantil e as aquisições da condição de ser adulto.

Lutos Implicam Conduta do adolescente

Expressão através da ação motora (ac-


Corpo infantil Alteração do esquema corporal na me-
ting-out). Manejo onipotente das ideias
dida em que se produzem as mudanças
X (intelectualização). Fenômeno da des-
no corpo, sente-se um espectador im-
corpo adulto personalização (negação da realidade
potente.
biopsíquica).
Identidade infantil Dependência x independência. Confu- Manejo psicopático do afeto. Conduta
X são de papéis. Manejo onipotente do irreal e infantil com aparente dependên-
identidade adulta pensamento. cia. Dissocia pensamento de afeto.
Pais infantis Processo de negação das mudanças que Evita a solidão identificando-se com
X ocorrem na imagem dos pais. Separação grupos. Falta de elaboração conceitual.
pais adultos do conhecido e seguro mundo familiar. Distorção da percepção.

Protege as relações amorosas. Aceita


Sexualidade Mudanças corporais. Papel procriador. sua sexualidade e se ajusta ao papel se-
xual adulto.

Desenvolvimento físico
A adolescência fica marcada por uma sequência de modificações físicas, va-
riando para cada indivíduo a velocidade e a intensidade das transformações so-
máticas, como força muscular, crescimento em estatura, ciclo hormonal, surgi-
mento dos caracteres sexuais secundários para o menino e para a menina. O “eu
individual” começa na infância com a noção da individualidade do corpo.

A imagem corporal é uma representação condensada das experiências pas-


sadas e presentes, reais ou fantasiadas, do corpo do indivíduo. Ela contém expe-
riências conscientes e inconscientes. É um conjunto de informações que cons-
tituem um sujeito diante de si, do outro e do mundo. A estrutura da imagem
corporal é determinada por:

 percepção subjetiva da aparência e habilidade à função;

 fatores psicológicos internalizados;


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 fatores sociológicos (a imagem corporal é também função dos papéis que


ao corpo são atribuídos pela cultura prevalente num momento dado).

À medida que o corpo vai se transformando e adquirindo novos contornos


anatômicos e físicos, o adolescente vai gradualmente identificando-se com a
imagem corporal definitiva de seu sexo. Via de regra, ocorre um conflito entre a
imagem idealizada e a imagem real do corpo em transformação. Reside aí a raiz
das ansiedades dos adolescentes com respeito a seus atributos físicos e a capaci-
dade de atrair o sexo oposto. Portanto, a experiência de vida na adolescência e a
integração com os outros da comunidade vão desenvolvendo principalmente as
suas relações socioafetivas, que contribuirão, assim, na formação de sua imagem
e de seu esquema corporal.

Diferenças individuais
nos padrões de crescimento
Observa-se, em ambos os sexos, no fim da infância, uma rápida modificação
na conformação anatomofisiológica. A força muscular aumenta linearmente
em ambos os sexos; para os meninos verifica-se também um aumento na força
física. Também as habilidades motoras que requerem coordenação, agilidade
e velocidade crescem em ambos os sexos, no entanto, em momentos diferen-
tes: as meninas têm amadurecimento precoce e os meninos, amadurecimento
tardio. Dessa maneira, são os meninos que se sentem durante mais tempo com
uma forma física sexualmente menos apropriada e os que mais frequentemente
podem sofrer problemas de ajustamento.

Os jovens que alcançam a maturidade tarde são magros, de músculos pobres,


infantis e pouco atraentes. A diferença na atração física é mais acentuada aos 15
e 16 anos.

As jovens com maturação tardia são mais expressivas ao compararem-se


quanto a serem faladoras ou caladas, ativas ou paradas, vivas ou indiferentes,
risonhas ou sérias. Isso sugere uma persistência das formas infantis de ativida-
des. Uma correria constante e uma persistente e barulhenta troca de gritos e
comentários são mais característicos dos anos da pré-adolescência que dos anos
posteriores.

As crianças de amadurecimento tardio são tidas como relativamente menos


inibidas nas situações sociais, mas, ao mesmo tempo, mais tensas. A avaliação do

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interesse no sexo oposto mostra que as crianças que amadurecem cedo ficam
acima da média do grupo.

O crescimento em estatura atinge seu ponto máximo aos 21 anos para os me-
ninos. Para as meninas, por ocasião da menarca, o crescimento reduz-se muito.
As variações no físico podem conduzir a limitações sociais, mas quando a con-
dição é complicada por falta de meios para adquirir aptidões socialmente úteis
ou necessárias, a expectativa social é mantida e reforçada por limitações reais de
capacidades.

A pessoa que sofre de uma incapacidade real carrega um fardo duplo. Não
só a sociedade a diminui, como fica também incapaz de conseguir algumas das
aptidões que a tornam um cidadão útil.

Desenvolvimento psicossocial
segundo Erik Erikson
Sob o ponto de vista físico, existe uma gradual e progressiva transformação
entre o corpo infantil e o corpo adulto. Se a maturação anatomofisiológica é, por
sua universalidade, comum a toda a espécie humana, o modo como se processa
o amadurecimento, isto é, o modo como a criança passa da dependência à inde-
pendência adulta, varia de cultura para cultura.

Em certos grupos sociais, o processo para a vida adulta é lento, gradual, contí-
nuo; o indivíduo deixa paulatinamente a infância e vai se revestindo da condição
adulta de modo atraumático, suave e sensível.

É impossível compreender o adolescente sem se considerar o contexto socio-


cultural e histórico em que ele vive, da mesma forma que é impossível entender
o contexto sem conhecer seus cidadãos.

Assim, apresentamos o desenvolvimento psicossocial proposto por Erik Erikson.


Para ele, a organização da identidade na adolescência é um momento de transfor-
mação e de síntese de identificações e de interações com o meio.

A principal tarefa do adolescente é responder à pergunta: “Quem sou eu?” Ao


conseguir definir sua identidade sexual, profissional e ideológica, o adolescente
começa a considerar-se uma pessoa com capacidade de percepção correta do
mundo e de si mesmo.

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Nessa idade, raramente o jovem se identifica com seus pais; ao contrário,


rebela-se contra o domínio deles, seu sistema de valores e sua intromissão na
vida particular dos filhos, pois o adolescente tem de separar sua identidade da
de seus pais.

O adolescente tem uma necessidade intensa de pertencer a um grupo social.


Os companheiros de idade, a roda de amigos e a turma ajudam o indivíduo a
encontrar sua própria identidade no contexto social.

Só após ter firmado sua identidade, o adolescente estará pronto para parti-
cipar de uma união sexual efetiva e estabelecer vínculos mais duradouros, para
manter uma que incluem relacionamentos afetivos e amizade profundas. Para
enfrentar o casamento, o jovem precisa ter um sentimento que suporte as dife-
renças, pois o casamento é uma ameaça de perda da independência e do con-
trole da própria vida.

Modelo de Erik Erikson das crises psicossociais

Idade Crises Relações Aspectos Marcas


aproximada psicossociais interpessoais intrapessoais psicossociais

Identidade Identificações pessoais e


X sociais, lealdade, fidelidade,
Relacionamento
14 a 19 anos Quem eu sou? igualdade, sentimento de
confusão de de pares.
identidade psicossocial, sen-
papéis timento de pertencimento.

Intimidade Laços sociofami-


Importa satisfazer necessi-
liares (amizades, O encontro
20 a 30 anos X dades, relacionamento de
competitividade, “eu e o outro”.
solidariedade amor, afetividade, união.
sexo, cooperação).

Genetarividade
Laços sociofami- Realização, Cuidar de si e do outro, com-
30 a 50 anos X
liares, maturidade. felicidade. prometimento social.
interiorização

Integridade
Atenção dirigida Importa o ser e Sabedoria, reflexão e aceita-
60 anos X
ao ser humano. não o ter. ção da vida.
desespero

“Eu” em interação com os outros


Acredita-se que, para que uma criança aprenda, é necessário que ela tenha
o desejo de aprender. E que, sobretudo, o desejo dos pais a autorizem. Como

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afirma Mannoni (1981), as crianças andam não só porque têm pernas, mas
porque seus pais o permitem.

Para Bowlby (1993), a existência de um filho com problema representa uma


ruptura para os pais. As expectativas construídas em torno do filho idealizado
tornam-se insustentáveis, pois existe um processo de projeção geracional dos
pais, que esperam dos filhos que cumpram expectativas dos avós que eles, pais,
não realizaram. Esse processo torna pais, filhos e avós reféns da mesma cadeia
transgeracional: um vai tentar cumprir o que o outro não cumpriu e que agora
ele espera que o seu filho cumpra.

Vistos como uma projeção dos pais, esses filhos representam a perda de
sonhos e esperanças e a obrigatoriedade em lidar com as limitações e fazem
com que muitos pais se sintam despreparados para a tarefa de educar os filhos.

Podemos afirmar, a partir dos estudos desses autores, que o sujeito nasce
com as potencialidades de vir a ser, a qual só se concretizará quando estabelecer
relações e laços com o outro. Fica, pois, claro, que a herança constitucional (seja
ela biológica ou psíquica) será condição necessária, mas não suficiente para o
processo de constituição da identidade pessoal do indivíduo.

“Eu” e a sociedade
Os jovens, mobilizados em função de suas transformações internas, perce-
bem as ambiguidades e as contradições sociais como agentes da transformação
social. Querem transformar a si próprios, os outros e o mundo como um todo e,
dentro de certos limites, esta é uma atitude saudável e desejável.

Ao longo do processo de desenvolvimento, o adolescente vai abandonando


as fantasias idealizadas e vai buscando uma posição adequada e saudável no seu
contexto sociocultural. Os papéis sociais variam de acordo com a cultura, o sexo,
a idade, o status socioeconômico, entre outros.

Mas, por outro lado, a constatação dessas ambiguidades sociais pode desen-
cadear diferentes reações do adolescente, desde uma militância transformadora,
uma violenta contestação política, até a busca de uma cultura alternativa, com
uso de drogas, em um outro extremo. Muitas dessas reações distanciam-se de
uma preocupação com os outros, com o coletivo e rompem com os laços sociais
e culturais que os sustentavam.

Esse é o risco que se corre por viver nos dias de hoje, quando o que se impõe
é um caminho rumo ao ideal individualista, ao prazer imediato e instantâneo,
muito adequado ao capitalismo.

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Vivemos em uma mudança contínua, e o sujeito vale mais pelo que ele tem,
pelo que possui, do que por si mesmo, pelo seu ser. Convivemos em uma so-
ciedade do universal, da integração mundial com a globalização, com tecno-
logias avançadas, satélites de comunicação e comunicação virtual. O Mercosul
e a União Europeia apontam para um mundo sem fronteiras e limites para o
homem, num apagamento das diferenças culturais e da história individual. Essas
constatações com relação à representação do mundo atual e dos indivíduos pro-
duzem um choque na nossa afetividade e interferem nas nossas relações inter e
intrapessoais.

No processo de educação da criança, Dolto (1999) destaca que é importante


preparar a criança para que ela tenha meios de se fazer estimar por pessoas que
não sejam apenas do meio familiar. A autora alerta ser perigoso que o adoles-
cente ainda se sinta indispensável para sua mãe. É necessário que a criança/ado-
lescente tenha o que oferecer de si aos outros para a construção de novos laços
afetivos, sociais, que se revelarão nos relacionamentos interpessoais na escola,
no trabalho e na vida profissional.

Desenvolvimento intelectual
Do nascimento à adolescência, a inteligência evolui qualitativamente, segun-
do a teoria epistemológica genética de Jean Piaget. Esse autor apresenta etapas
para o desenvolvimento da inteligência: sensório-motor, pré-operatório, opera-
tório concreto e operatório formal. Uma ação inteligente reside na capacidade
de se adaptar ao meio.

Com relação ao desenvolvimento intelectual, sabemos que a criança apre-


senta momentos em que está mais sensível a novas aprendizagens. Desse
modo, um desafio para os adultos, pais e professores é fazer com que as tare-
fas da aprendizagem correspondam ao nível de desenvolvimento cognitivo em
que está a criança ou o adolescente. Isso quer dizer que precisamos não apenas
saber o que ensinar para a criança ou o modo como ensiná-la, mas, sobretudo, é
preciso saber quando ela está pronta para aprender as várias tarefas intelectuais.
Depois dessa época, naturalmente, ela continuará a aprender, porém suas estru-
turas cognitivas não se submeterão mais a qualquer modificação.

O desenvolvimento intelectual se processa com padrões individuais de reação


diante da estimulação cognitiva. A partir dessa afirmação, podemos evitar dois
inconvenientes: primeiro, o de ensinar a criança antes que ela esteja pronta para

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aprender e, segundo, perder uma oportunidade preciosa de ensiná-la muito


tempo após o momento adequado.

Finalmente, temos de entender que, embora se descreva separadamente


sobre o afetivo e o cognitivo, sabemos que a afetividade é a energia, a força que
impulsiona a ação (desejos, amor, pulsão, vontade) e a inteligência fornece os
meios, os caminhos à ação na conquista do desenvolvimento verdadeiramente
humano.

Texto complementar

A adolescência, a criatividade, os limites e a escola


(OUTEIRAL, 1994, p. 33-40)

A adolescência é um momento muito criativo em função, entre outras


coisas, de ser um período de transformações. Nessa etapa da vida se con-
quista o chamado pensamento formal, que oportuniza à pessoa raciocinar
sobre hipóteses e elaborar conclusões a partir delas.

Essa nova possibilidade de pensamento, exercitada pelo adolescente em


seu dia a dia, propicia-lhe um novo tipo de relação com o mundo adulto. [...]
O caráter mágico que se estabelece entre o pensado e o exequível cria um
espaço importante para desenvolver a criatividade que, de início, mostra-se
através de uma atividade impulsiva, difusa, caótica desde a ótica dos adultos,
mas perfeitamente normal. Aos poucos, a atividade criativa vai assumindo
um perfil mais definido, mais integrado e produtivo. O período de transição,
entretanto, necessita de um ambiente propício capaz de suportar as tensões
dos momentos iniciais desse processo criativo peculiar tanto na família como
na escola. A criatividade na adolescência articula-se necessariamente com a
noção de limites. Limite é uma palavra que tem, muitas vezes, uma cono-
tação negativa, ligada erroneamente à repressão, proibição, interdição [...].
No entanto, limite é algo muito além disso: significa a criação de um espaço
protegido dentro do qual o adolescente poderá exercer sua espontaneidade
e criatividade sem receio e riscos. [...]

Um exemplo nos reporta a uma situação em que um grupo de crianças,


de 10 a 12 anos, mostrava-se agitado, com agressões e baixo rendimento

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escolar. A bagunça estendia-se a todos os momentos em que estavam na


escola. Um professor observou que brincavam aos empurrões e lhe pareceu
que, assim, buscavam um contato físico entre si. Essa observação cuidadosa e
oportuna fez com que o Serviço de Orientação Educacional (SOE) reunisse o
grupo para conversar sobre o que estava acontecendo. Os assuntos trazidos
evidenciaram que a puberdade estava produzindo toda a turbulência e que
mais que agitados estavam, realmente, excitados, davam puxões e empur-
rões, faziam frequentes reuniões dançantes e chamavam de “galinha” uma
menina que, precocemente, apresentava os primeiros sinais da puberdade
e que com suas características sexuais secundárias provocava ansiedade na
turma, que tentava, então, queimá-la numa versão púbere da inquisição. As
reuniões no SOE ofereceram um limite, um espaço e um tempo protegido,
que propiciou substituir a agitação pela verbalização dos conflitos. [...]

Colocar limites significa envolvimento, conter o adolescente, suportar


suas reclamações e protestos, enfim, enfrentar dificuldades. Os adultos po-
derão também ter dificuldades em colocar limites em função de problemas
com seus pais [...].

A escola tem um significado primordial para o adolescente. [...] A função


da escola é educar [...]. Mas qual escola? Essa é uma pergunta que os pais se
fazem com frequência e que é exatamente necessária, pois uma criança ou
um adolescente poderá ou não se adaptar em um determinado ambiente
escolar. As escolas são instituições com culturas diferentes e têm significa-
dos diferentes para diferentes alunos. A escola, a sala de aula, é um lugar
imaginário, diferente do espaço real das cadeiras, classes e salas. Ela é o que
o aluno percebe a partir de sua história, seus desejos e seus medos. Nas esco-
las, acontece um interjogo de forças inconscientes que se cruzam, se opõem,
se conflitam ou se reforçam. [...]

Um adolescente, com dificuldades de organização, poderá se beneficiar


(ou não) de um ambiente escolar mais estruturado e de limites mais precisos,
sendo necessário avaliar, em cada caso, a situação, buscando conhecer como
funciona determinada escola e, se necessário, buscando ajuda profissional
especializada. As simplificações do tipo: “meu filho é tímido, portanto precisa
de uma escola mais liberal” ou “como ele não tem limites, uma escola mais
rígida irá ajudá-lo” não são verdadeiras. [...]

As escolas, por seu lado, têm o que chamamos de um “currículo mani-


festo” e um “currículo oculto”, ou seja, aquilo que manifestamente é dito e/

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ou escrito, e a verdadeira prática no dia a dia da sala de aula. [...] O processo


de educação/escola é hoje alvo de questionamentos que se situam basica-
mente em dois polos: a Educação tradicional, na qual nós fomos formados,
em contraposição à Educação progressista, que propõe uma relação mais
prazerosa com o conhecimento.

A primeira nos oferece algumas garantias, já que nos tornamos adultos,


pelo menos supostamente aptos. Mas nem todos viveram essa experiência
como proporcionando prazer, alegria e satisfação em aprender, como se
deve o processo educacional.

A segunda, dita progressista, tem favorecido, em alguns casos, a obten-


ção de uma relação mais tranquila e flexível com o mundo do conhecimento
e [o desenvolvimento de] boa capacidade para pensar de forma autônoma.
Não pode garantir, no entanto, o montante de conhecimentos e cultura geral
antes obtido.

As dúvidas quanto à adequação de um ou outro modelo ou de uma sín-


tese dos dois não são privilégios dos pais, mas dos educadores também. A
escola, a Educação, vive um momento de perplexidade, sem definição de
como conciliar as necessidades do mundo moderno, de uma sociedade em
mudança permanente, em crises de valores, e uma proposta educacional que
prepare o “homem do futuro”. Temos que pensar, então, que nem sempre a
escola “tem razão” e que muitas vezes a apreciação do adolescente é correta.
A escola é feita por pessoas que lidam melhor ou pior com determinadas
circunstâncias. Os pais têm de estar atentos para situações que se derivam
desses fatos. Qualquer “manual de educação moderna” aponta como pres-
suposto a necessidade de respeitar as características individuais do aluno;
entretanto, o que se verifica na prática é a realização de um ensino massi-
ficado, em grandes escolas de turmas enormes de alunos, mais ao estilo de
uma linha de montagem industrial. Como exemplo, verifica-se, também, não
raramente, a dificuldade que os professores e a própria escola têm para “re-
provar” um aluno quando ele não conseguiu dominar um número X de co-
nhecimento em um tempo Y, e acabam colocando na família e/ou no próprio
aluno a resistência em aceitar a reprovação, como desculpa de sua própria
insegurança. Os professores, muitas vezes, não toleram as dificuldades de
um determinado aluno porque sentem essas dificuldades como uma “ferida
narcísica” em sua capacidade de ensinar.

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Os pais e professores deverão saber, por outro lado, que esses serão os
“recipientes” de impulsos, fantasias, emoções e pensamentos mais ou menos
conscientes que os adolescentes têm em relação aos seus próprios pais. Amor
e agressividade, originalmente dirigidos aos pais serão “transferidos” para os
professores. Poderá acontecer que um adolescente, irritado com seus pais,
tenha com estes uma atitude aparentemente “adequada”, extravasando com
um professor toda a “bronca” com eles. O professor ficará surpreso com a
atitude do aluno, mas sua experiência e intuição lhe farão perceber que “algo
se passa”. Os pais, chamados à escola pelas atitudes do filho, poderão não
compreender o que acontece, já que ele está tão “calmo em casa” [...].

E não serão apenas os sentimentos agressivos que serão transferidos


desse modo. Os amorosos também. [...] Esse amor tem um aspecto incestuo-
so, produzindo ansiedade e culpa, o que poderá se manifestar de uma forma
sublimada, através de um grande interesse em aprender ou ao contrário, por
um desinteresse pela matéria. Algumas dificuldades escolares na adolescên-
cia se assemelham a situações desse tipo. É interessante lembrar, também,
que trabalhar com adolescentes desperta o adolescente que existe dentro
dos adultos, e isso poderá desenvolver nos professores distintos sentimen-
tos por um determinado adolescente que lhes evoque as situações de vida
de sua própria adolescência.

O que confere à escola importância vital no processo de desenvolvimen-


to do adolescente é o fato de ela ter a característica de ser uma simulação da
vida, na qual existem regras a serem seguidas, mas que se pode transgredi-
las sem sofrer as consequências impostas pela sociedade, e ser uma oportu-
nidade de aprender com a transgressão.

Deve-se levar em conta, também, que a relação do aluno com a escola é


afetada pela significação que os pais dão a ela, aos estudos de seu filho e às
relações dele com os demais. Pais que tenham sido submetidos a uma esco-
larização muito rígida podem inconscientemente buscar uma escola permis-
siva que “compense” a sua vivência escolar de sofrimento. Podem, por outro
lado, fazer com que seus filhos sofram tanto quanto eles e “passem” por tal
situação para poderem se tornar “tão educados” quanto eles. [...]

Mas a escola não oportuniza somente a relação com o saber, e, como uma
atividade eminentemente grupal, tem também funções de socialização. Em
busca de sua identidade, o adolescente encontra na microssociedade da escola

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um sistema de forças que atuam sobre ele, onde, entre outras coisas, reedita seu
ciúme fraterno, compete, divide, rivaliza, oprime e é oprimido, ou seja, reproduz
o sistema social. É por essa razão que a escola, muitas vezes, pode detectar difi-
culdades no processo de desenvolvimento do aluno, que aparece por inteiro na
busca de si mesmo, e seu olhar sobre o que ele é, em geral, menos comprometi-
do emocionalmente do que acontece com os pais. [...]

É muito importante, também, que exista uma relação de confiança entre


a família e a escola escolhida, evidentemente, pelos pais para educar seus
filhos, isto é, para que os “auxilie” a educar seus filhos. Vemos, com frequência
os pais criticarem a filosofia pedagógica da escola escolhida na presença dos
próprios filhos de uma forma que resulta improdutiva [...].

É extremamente necessário que se evitem dissociações em que os pais


criticam a escola (projetando na instituição todos os aspectos negativos do
processo ensino-aprendizagem e, por vezes, da conduta de seus filhos) e que
a escola, por sua vez, faça o mesmo (projetando na família todas as incompe-
tências, falta de colocação de limites, falta de participação etc.) [...].

A família e a escola deverão compreender que, eventualmente, é melhor


uma troca de escola do que submeter o adolescente a um ambiente que não
lhe é adequado e, para isso, é necessário, às vezes, experimentar mais de uma
instituição. [...] Essa escola não precisará, inclusive, reproduzir os valores fami-
liares, propiciando, dessa forma, outros modelos identificadores para o adoles-
cente, que, assim, terá mais elementos para constituir sua identidade [...].

Dica de estudo
<www.joseouteiral.com>.

José Outeiral é médico psiquiatra, psicoterapeuta de grupo, especialista em


psiquiatria de adultos, crianças e adolescentes. Em seu site, encontram-se vídeos,
artigos, livros, contatos para atualizar-se sobre o tema da adolescência.

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Atividades
1. O que é possível interpretar a partir da seguinte afirmação de Maud Man-
noni: “as crianças andam não só porque tem pernas, mas porque seus pais o
permitem”.

2. Estabeleça a relação entre a adolescência e a maturação.

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Psicologia do desenvolvimento da adolescência

Gabarito
1. É importante destacar que as relações de pais e filhos são constituintes, os
pais são corresponsáveis no desenvolvimento do filho. A autonomia, inde-
pendência do filho, começa na relação com os pais, que devem lhe conferir
desafios constantemente de acordo com as suas capacidades. Ou melhor, o
adulto serve de referência para a elaboração dos conflitos presentes na ado-
lescência.

2. A maturação é o fator desencadeante para a adolescência, o que não signi-


fica dizer que são sinônimos já que a maturação refere-se apenas ao desen-
volvimento físico e a adolescência envolve aspectos inseparáveis e interde-
pendentes relativos ao biológico, sociocultural e psicológico do indivíduo.

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Problemas dos pais: crescendo com o outro

Irene Carmem Piconi Prestes


Você me diz que seus pais não entendem.
Mas você não entende seus pais.
Você culpa seus pais por tudo.
Isso é absurdo.
São crianças como você.
O que você vai ser quando você crescer?

Renato Russo

A família dos dias de hoje


Tem-se discutido muito sobre a relação pais/filhos e a tarefa dos pais
em educar filhos em diferentes campos do saber: Pedagogia, Direito,
Medicina, Sociologia, Psicologia, Psicanálise, entre outros. Neste texto,
propõe-se olhar essa relação a partir da dimensão psíquica, quer dizer,
voltada à subjetividade, à afetividade, aos significados e sentidos que
pais e filhos dão, consciente e inconscientemente, a esse encontro que
se mostra difícil para ambos nos dias hoje.

Trata-se então de refletir sobre os impasses, ambiguidades e contradi-


ções vividas por eles. Do lado dos filhos, estes se mostram atônitos, para-
lisados quando confrontados com a multiplicidade de opções e liberdade
de escolhas sobre seus afazeres. Do lado dos pais, a angústia revelada na
impossibilidade de dizer “não” e de sustentar seus efeitos diante do filho,
sem esmorecer, vacilar ou ceder.

Nessa perspectiva, observam-se pais com pouca implicação e disponi-


bilidade em estar com os filhos. Para suprir a ausência, equivocadamente,
presenteiam os filhos com excesso de objetos, de coisas, de consumismos,
de descartáveis; são presentes embrulhados em angústia, que podem au-
mentar a ansiedade no estabelecimento dos laços pessoais. E, por vezes,

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Problemas dos pais: crescendo com o outro

esses embrulhos despertam a culpa nos filhos por verem seus pais fazendo
tantos sacrifícios para lhes dar tudo, até aquilo que não têm.

Assinalando as mudanças ocorridas na organização familiar, enquanto estru-


tura de sustentação do sujeito, percebe-se que a educação dos filhos assume um
caráter de maior permissividade junto aos pais, permitindo uma antecipação à
liberdade e à autonomia dos filhos; eles esquecem que os filhos necessitam do
apoio, do suporte, do balizamento, do amparo dos pais para um crescimento
saudável. Nessa dinâmica familiar, temos visto a crescente “crise de gerações”, a
dificuldade no relacionamento pais/filhos, a fragilidade nos laços familiais. Ob-
serva Ariès (1981, p. 238): “O sentimento da família não se desenvolve quando
a casa está muito aberta para o exterior: ele exige um mínimo de segredo”. De
outro modo, a família é vista como lugar de referência social capaz de produzir
através de sua interferência efeitos no comportamento social do filho.

Ao lado disso tem-se o educar e, como muito bem nos diz Charlot (2000, p. 53),
[...] a educação é uma produção de si por si mesmo, mas essa autoprodução só é possível
pela mediação do outro e com a sua ajuda [...] Toda a educação supõe o desejo, como força
propulsionadora que alimenta o processo. Mas só há força de propulsão porque há força
de atração: o desejo sempre é “desejo de”, a criança só pode construir-se porque o outro e o
mundo são humanos e, portanto, desejáveis.

Se recorrermos à história da educação das crianças e seu contexto familiar,


temos que a preocupação com a educação instala-se no seio da sociedade com
as mudanças sócio-político-culturais ocorridas durante o século XX. As pessoas
foram aprendendo a respeitar, a dar lugar, a dar voz às crianças, mas essa atitude
não foi sempre vigente nas relações educativas com o infante.

A responsabilidade social dos pais


Um primeiro ponto sobre a questão da responsabilização parental trata da
decisão de ter filhos, que está atrelada ao desejo de dar continuidade à existên-
cia familiar, dar conta de uma “expectativa” afetiva e de um ideal parental. Essa
escolha confronta os pais sobre o modo como conduzem e conduzirão a pró-
pria vida, também lhes possibilita uma permanente atualização de si mesmos, de
suas crenças, dos seus sentimentos, da sua história pessoal, nos encontros com
o filho.

Do ponto de vista social, os pais funcionam como grupo de referência aos


filhos. Uma vez que o bebê ao nascer apresenta uma “dependência absoluta do
adulto” (WINNICOTT, 1999), a natureza da responsabilidade dos pais é ética na
tarefa de educar os filhos. Vale aqui lembrar que compreendemos por ética o
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Problemas dos pais: crescendo com o outro

espaço relacional balizado por normas, regras que viabilizam as relações dos
homens uns com os outros e têm por princípio o respeito às diferenças individu-
ais como único meio de se atingir a igualdade social. A ética da responsabilida-
de, do reconhecimento e do pertencimento do outro na cultura.

Acerca do traço de “desamparo humano”, a psicanalista Brunetto discorre


sobre o desamparo primordial humano ao nascer verificado na incapacidade do
seu organismo em sobreviver; esse traço acompanhará o homem nos laços so-
ciais, o “desamparo inicial criará a necessidade de ser amado que acompanhará
por toda a vida” (BRUNETTO, 2008, p. 23) o que quer dizer que damos pouco
valor à vida para a humanidade, à necessidade de ser acolhido, amado e educa-
do em todo o seu viver, já que para sobreviver necessitamos do outro.

Um segundo ponto: no mundo atual está cada vez mais difícil encontrarmos
um denominador comum sobre o que é certo ou errado, entre aquilo que é o tra-
dicional e o moderno, entre o desconhecido e o conhecido. Os pais questionam
como impor limites, como educar, sem ser severos demais, sem tomar posições
extremas. O que podemos afirmar é que, com diálogo, amor e confiança mútuas
entre pais e filhos, a tarefa de “educar” terá maior sucesso.

E é nesse sentido que procuramos encontrar subsídios para auxiliá-los no


processo de educar filhos.

A seguir, o leitor verá um quadro proposto por Erik Erikson (apud DELDIME,
1999) para o desenvolvimento psicossocial. Esse autor concebe a construção da
identidade pessoal como um processo decorrente da interação da criança no
seu ambiente relacional, quer dizer, dependente da mediação que os pais es-
tabelecem com ela no contexto sociocultural. Cada etapa do desenvolvimento
psicossocial tem suas características específicas. Desse modo, em cada um dos
momentos de sua vida, o filho necessita de uma atitude diferente dos pais. Ob-
serve o quadro abaixo e acompanhe o percurso do desenvolvimento psicosso-
cial do ser humano, apresentado por Erik Erikson.

Estágios
(DELDIME, 1999, p. 169)

Idades Crises psi- Abrangência Modalida-


psicos- Virtudes de Erikson e
cossociais das relações des psicos-
sexuais de aproximativas de Erikson significativas qualidades dominantes
sociais
Freud
Esperança: a fim e con-
vicção de que desejos
Oral-respira-
Confiança podem ser acolhidos a
tório cinesté- Mãe ou substi- Receber, dar
0-1 X despeito das “sombrias
sico (incorpo- tuto materno em troca
desconfiança necessidades e das raivas
rativo)
que marcam o início da
existência“.

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Problemas dos pais: crescendo com o outro

(DELDIME, 1999, p. 169)


Estágios
Idades Crises psi- Abrangência Modalida-
psicos- Virtudes de Erikson e
cossociais das relações des psicos-
sexuais de aproximativas de Erikson significativas qualidades dominantes
sociais
Freud
Vontade: a determinação
Anal- Autonomia de exercer ao mesmo tem-
-uretral, po a livre escolha e a res-
0X Reter, deixar
muscular 2-3 Pais trição pessoal a despeito
vergonha, ir
(retentivo, da vergonha e da dúvida
eliminador) dúvida experimentadas durante a
infância.
Finalidade: “a coragem
de encarar e de perseguir
Genital infan- Iniciativa Terminar
objetivos válidos sem ser
til, locomotor, X as coisas,
3-6 Família-base inibido pela derrota das
(intrusivo, culpabili- colocá-las
fantasias infantis, pela cul-
inclusivo) dade junto
pa e pelo medo inerente
da punição“.
Competência: o livre uso
Trabalho Vizinhos ou da habilidade e da inteli-
Latência 7-12 aprox. X colegas de gência para efetuar tarefas
inferioridade escola “sem ser limitado pela
inferioridade infantil“.
Grupos de
Fidelidade: livre apoio às
Identidade pares e grupos Ser ou não
Puberdade e lealdades asumidas a des-
12-18 aprox. X exteriores; ser; partilha
adolescência peito das contradições nos
difusão modelos de de si mesmo
sistemas de valores.
liderança
Associações de Amor: devoção mútua –
Intimidade e Perder-se e
Maturidade 20-30 anos amizade, sexo, sempre ultrapassam os
solidariedade reencontrar-
genital aprox. competição, antagonismos inerentes,
X isolamento -se no outro
cooperação em uma função partilhada.
“Generativi- Trabalho
Desvelo: cuidado das obri-
dade“ dividido com Realizar,
30-50 aprox. gações geradas pelo amor,
X pessoas da cuidar para
necessidade ou acidente.
interiorização casa
Ser, depois
Integridade Sabedoria: atitude des-
Humanidade: de ter sido;
além de 50 X prendida em relação à vida
minha espécie aceitar não
desespero e em face da morte.
ser mais

Encaminhando a questão do lado dos filhos, assinala-se que eles ficam


à espera de afetividade, da possibilidade de compartilhar e, quando isso não
acontece, acabam por querer chamar a atenção de alguma forma, às vezes nega-
tiva, exibindo problemas de aprendizagem, inibições e fracasso escolar. Podem
também, quando não estão na escola, estar nas ruas, recebendo ­influências
de padrões de conduta inadequados, conturbando suas relações sociais e a
­maneira como veem e significam o mundo. Considera-se que a criança procura
um modelo de comportamento e, na ausência dos pais, absorve os padrões de
atitude das ­pessoas que a cercam.

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Problemas dos pais: crescendo com o outro

Do lugar de pais, sabemos que educar filhos não é uma tarefa fácil ou isenta
de culpa. No entanto, alguns pais ainda optam por criar filhos obedientes, con-
formados, alienados na organização social, talvez para não se comprometerem
mais tarde. Esses filhos, quando adultos, poderão apresentar atitudes de inibição
e não saberão dar opiniões, sugestões, nem defender suas convicções. E o mundo
atual tem outras formas de sociabilidade que exigem iniciativa, criatividade, au-
tonomia, independência de ideias e atitudes das pessoas. Destarte, atrela-se o
futuro dos filhos à educação que receberam dos pais. Assim, dependendo da
educação, do modo como significou e o sentido que deu a sua vivência de filho,
quando adulto, poderá demonstrar muitas qualidades, cabendo-lhes a capaci-
dade de gerir com responsabilidade e segurança a sua própria vida.

Em um texto de Shinyashiki (1992, p. 40-41), encontramos alguns indicadores


que talvez possam subsidiar pais angustiados na tarefa de educar filhos:

“Educar é estimular a criança a agir por si própria.

É dar orientações para ajudá-la a desenvolver a autonomia e a respon-


sabilidade.

É deixar que ela experimente a vida mesmo que tenha de se arriscar um


pouco.

É deixá-la viver, experimentar suas emoções, valorizar cada ­conquista.

É ajudá-la a superar desafios sem substituí-la nessa luta.

É conversar e conversar e conversar.

É escutar e escutar e escutar.

Educar é ver o filho aprender a subir a escada resistindo à tentação de


levá-lo ao colo.

Educar é desenvolver nos filhos o senso crítico para saber o que é real-
mente importante para eles e, a partir daí, aprimorar a capacidade de realizar
seus objetivos”.

A partir do exposto até o momento, salientamos que para educar filhos, os


pais (educadores) precisam ter certeza de que educar é importante. É preciso
acreditar que transmitir limites, valores, desejos ao filho é iniciar o processo de
compreensão do outro e de convivência com o outro. Os pais precisam com-

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Problemas dos pais: crescendo com o outro

preender que as crianças só respeitarão seus semelhantes se aprenderem quais


são seus limites (corporal e psíquico). E isso só será viável se os pais alicerçarem
a tarefa de educar filhos na responsabilização, na tomada de iniciativa e na coe-
rência. Por responsabilização entende-se que o sujeito deve interrogar-se sobre
o que é preciso ser realizado, entendendo que é autor de suas ações e escolhas
(ainda que inconsciente). A tomada de iniciativa significa a condição de lidar
com o erro de maneira assertiva. É preciso aprender a redirecionar o curso da
vida, a partir das experiências, dos acertos e desacertos. E, finalmente, a coerên-
cia, é preciso que o pai reflita sobre se o seu comportamento traduz os traços
que quer ver no seu filho.

E são os pais que fornecem à criança os significantes primordiais, os traços


fundamentais sobre os quais o sujeito psíquico vai montar sua história de signi-
ficados e sentidos. Segundo Prestes (2001, p. 186), “[...] o homem constrói con-
ceitos que não traduzem um conhecimento da realidade, e sim, uma articulação
significante para o homem lidar com a realidade”. Pais e filhos precisam apren-
der que, para satisfazer seus desejos, têm que articulá-lo ao direito do outro, em
outras palavras, seus desejos são o desejo do outro. Ainda, o ato humano prevê
a responsabilização do homem, uns com os outros. Portanto, o encontro pais/
filhos significa crescer com o outro, numa relação de permanente troca, de cons-
trução de novos significados e sentidos, para um viver harmônico.

Ilustramos com este belíssimo poema de Carlos Drummond de Andrade, que


nos convida a refletir sobre os laços essencialmente humanos.

Verdade
(DRUMMOND DE ANDRADE, 1997, p. 41)

“[...] Assim não era possível atingir toda a verdade,


porque a meia pessoa que entrava
só trazia o perfil de meia verdade.
E sua segunda metade
Voltava igualmente com meio perfil.
E os meios perfis não coincidiam [...]
Chegou-se a discutir qual a metade mais bela.
Nenhuma das duas era totalmente bela.
E carecia optar. Cada um optou conforme
Seu capricho, sua ilusão, sua miopia”.

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Problemas dos pais: crescendo com o outro

Um último ponto para concluir este momento é lembrar que o ser humano,
ao nascer, não tem ainda uma ética definida. E são os pais que têm essa tarefa
fundamental e espetacular. Segundo o psicanalista Françoise Dolto (1999, p. 30),
“o ser humano é marcado pelos contatos verdadeiros que manteve com o cons-
ciente e o inconsciente das pessoas que viviam à sua volta, a mãe em primeiro
lugar, o pai, e as primeiras pessoas que faziam o papel do outro de sua mãe”.
Somos marcados pelas relações que nos afetam, que nos possibilitam construir
um sentido para nossa existência.

Sendo assim, o que a autora destaca é que a primeira marca transmitida na


relação parental do bebê é o nome próprio, que se recebe da família, ao nascer.
Desse modo, o bebê tem existência reconhecida na sua família, a nível biológico
e simbólico, pois carrega no seu nome toda a descendência, a história familiar,
transmitindo para as novas gerações essas marcas, heranças culturais, tão im-
portantes, que conferem ao homem sua humanidade. Somente depois de obter
o reconhecimento familiar é que a pessoa buscará o seu lugar social, na escola,
no início, e depois na carreira profissional.

Sabemos que não existem regras que se adaptem a todas as realidades fa-
miliares, não existe uma receita, mas indicações de como alcançar os objetivos
propostos.

(TONUCCI, 1988, p. 27)

Onde é o mundo?
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Problemas dos pais: crescendo com o outro

O que é ser mamãe e papai?


Nas páginas anteriores enfocamos as contribuições do campo “psi” para a
tarefa dos pais de educar filhos, discorremos sobre a responsabilidade dos pais
ao construir laços sociais com os filhos e, ainda, a importância da relação pais/
filhos para a estruturação da subjetividade, da personalidade do sujeito. Neste
momento vamos nos deter na posição, no lugar subjetivo de mãe e de pai para
com filho.

Talvez devêssemos iniciar trabalhando com as palavras mamãe e papai.

Desse modo, quando falamos em termos psíquicos, essas palavras designam


funções psíquicas a serem cumpridas pelos pais na relação que têm com o bebê,
com o filho; essas funções são necessárias para o desenvolvimento psíquico (afe-
tivo e emocional) saudável da criança.

A função de pai designa um papel, uma posição discursiva na relação com


o outro que não se aplica de forma alguma à realidade, legal ou genética. Há
pais (homens) que cuidam de seu filho porque ficam em casa enquanto a mãe
(mulher) sai para trabalhar; há pais que são babás de seus filhos porque estão
desempregados, responsabilizando-se pelos serviços domésticos e pelos cuida-
dos com os filhos.

Na atualidade, multiplicam-se as situações de investigação de paternidade,


por meio dos testes de DNA que visam descobrir quem é o pai biológico. E o
que dizer dos casos de inseminação artificial? Como fica, de fato, a paternidade?
Quem é o pai?

A psicanalista infantil Dolto (1999, p. 103) discorre sobre essas funções psíqui-
cas: função materna e função paterna.
É um papel: ma-mã quer dizer que vem em mim para me fazer eu. É mole, ma-mã é o alimento,
isso passa no tubo digestivo, é maleável, ao passo que pa-pa é a dureza da partida, e a tristeza
pelo fato de que essa pessoa se vá e volte; é algo duro, a partida, e isso em todas as línguas.
A palavra “papai” quer dizer a pessoa a quem se ama e que vai, que volta (há uma ruptura),
ao passo que “mamãe” é o continuum. Mas o pai de nascimento é um homem, a mãe de
nascimento é uma mulher, e nem sempre é uma mamãe. Muitas mães de nascimento não são
mamães, e muitas mamães são mais maternais que as mães de nascimento. Elas assumem a
função de mamãe, porque cuidam da criança.

Dessa maneira, entendemos que essas duas funções são desempenhadas


pelos pais na relação com o filho e contribuem na inscrição dos primeiros traços
psíquicos, e estarão presentes inconscientemente nas relações interpessoais,
nos laços sociais do sujeito.

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Problemas dos pais: crescendo com o outro

A função maternal é entendida como aquela que provê o bebê com seguran-
ça, confiabilidade, acolhimento, afeto e proteção. Inclui também a construção da
rotina cotidiana. Já a função paterna destaca-se por cumprir um papel de corte,
de inscrição dos limites, da lei psíquica, quer dizer, o superego. Ou, ainda, a cons-
ciência moral de cada sujeito, permitindo, desse modo, uma convivência social
­harmoniosa, produtiva e saudável.

Bernardino (1995, p. 15) diz que:


Cada um tem que percorrer um caminho para responder a essa pergunta. E, nesse percurso,
é um lugar para si que acaba encontrando, é o “quem sou eu”? que se decifra. É na certeza de
ser filho desta mulher que me ama, me olha, me fala e me diz ser minha mãe que encontro
uma trilha a seguir – é assim que tenho que ser [...] para ela. Mas é na dúvida sobre este que ela
nomeia como meu pai que vou buscar meu reconhecimento próprio. [...] ponho-me na busca
de um novo lugar – não mais para a mamãe, mas para mim. Ou seja: o pai aponta para um
lugar além do desejo da mãe.

Assim se constitui a dimensão psíquica do sujeito e o modo como ele sig-


nifica subjetivamente as funções materna e paterna, e responde à questão de
“quem eu sou?”. Demonstra-se, assim, o homem como um sujeito afetivo que
não é desvinculado do intelectual.

A importância do laço família-escola


Neste momento do texto destacamos a importância dos laços familiares com
a escola. Pode-se dizer que o laço família-escola é importante à articulação do
afetivo e do intelectual.

A escola deve cumprir sua função social para o sujeito trabalhar os valores
mais gerais, envolvendo situações problemáticas atuais e urgentes, visando à
emancipação do aluno, do cidadão, no processo de escolarização. Dessa manei-
ra, a integração da família com a escola proporciona a formação do cidadão para
além da de aluno, o sujeito é integrante de uma comunidade relacional e tem
responsabilidade com o seu ambiente participando solidariamente.

Laços família-escola
Buscando o laço família-escola temos que as ideias apresentadas nos PCNs
também devem servir de alicerces à família na educação dos filhos, por exem-
plo, o diálogo, que é um recurso essencial à inserção na cultura. O diálogo, como

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Problemas dos pais: crescendo com o outro

destacam os PCNs, é uma arte a ser ensinada e cultivada, acontece quando se dá


lugar à criança para opinar, refletir quando os pais têm voz ativa, enquanto adulto/
educadores. Ainda, o diálogo supõe considerar o que o outro tem a dizer sem que
se busque unicamente impor visões de mundo. É na família que a criança, inicial-
mente, vivencia valores humanos como: justiça, solidariedade, respeito mútuo,
que terão continuidade nas relações escolares. A atitude solidária deve permear as
relações afetivas de pais/filhos, e, ainda, a oportunidade de vivenciar a justiça no
funcionamento familiar é um aprendizado que terá seus desdobramentos no am-
biente escolar. Dessa maneira, a direção que o homem dá à sua vida é o resultado
de premissas construídas, inicialmente, na família, e mantidas e/ou atualizadas no
ambiente escolar para uma atitude solidária na comunidade.

Um autor interessante para pensarmos o laço família-escola é Vygotsky que


liga o desenvolvimento do sujeito à sua relação com o ambiente sociocultural. O
que significa dizer que todas as relações significativas contribuem para o desen-
volvimento da pessoa nos espaços da família e da escola. Para Vygotsky (1998),
um dos principais defeitos da prática educativa é a separação dos aspectos in-
telectuais de um lado, e os afetivos de outro, pois o funcionamento psicológico
tipicamente humano, segundo ele, é o intelectual e o afetivo. Daí decorre a im-
portância dos laços familiares e que antecedem os laços escolares.

Na psicologia desenvolvimentista da educação vygotskyana (VYGOTSKY,


1998, p. 161), pode-se descrever seis níveis de crescimento, como se segue:

Atividades perceptuais e de Contato intuitivo e emocional entre criança


0-1 ano
apreensão e adulto.

Atividades de manipulação Pensamento visual e perceptivo, competên-


1-3 anos
de objetos cia para linguajar.

Funções simbólicas, imaginação criadora,


3-7 anos Atividades de jogos
coordenação social.

Operações mentais intencionais, esquemas


7-11 anos Atividades de aprendizagem mentais para solução de problemas, pensa-
mento reflexivo.

Resolução de problemas da vida cotidiana,


Atividades de comunicação
11-15 anos compreensão do ponto de vista de outrem,
social
submissão às regras sociais.

Interesses cognitivos e vocacionais novos,


Atividades de aprendizagem
15-17 anos compreensão dos elementos do trabalho de
vocacional
pesquisa, elaboração de projetos de vida.

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Problemas dos pais: crescendo com o outro

Níveis de crescimento
Pelas razões anteriormente descritas, compreende-se que, para o indivíduo
se desenvolver, é preciso que a afetividade esteja equilibrada com as ações am-
bientais e as interações sociais, no âmbito escolar. O grande pilar afetivo é a famí-
lia, as experiências e as vivências que traz consigo para o ambiente escolar.

Outro autor, Henry Wallon (apud La Taille, 1992), descreve que a origem da
vida afetiva da pessoa está no funcionamento fisiológico, marcado, por exem-
plo, na atividade alimentar, que apresenta três tipos de reações:

1.ª De natureza interoceptiva – Funções de nutrição (estímulos do trato di-


gestivo).

2.ª De natureza proprioceptiva – Funções ligadas ao equilíbrio e aos movi-


mentos (estímulos a nível muscular, tocar, segurar no colo).

3.ª De natureza exteroceptiva – Funções da rotina cotidiana (estímulos nas


atividades de banho, trocar as fraldas, o olhar frente a frente mãe/bebê).

“As sensibilidades intero e proprioceptivas determinam as nuances agradável


e desagradável, introspecção da vida afetiva; quanto à sensibilidade exterocep-
tiva, ela está voltada para o conhecimento do mundo exterior” (DELDIME, 1999,
p. 54).

A proposta walloniana considera o desenvolvimento intelectual dentro de


uma cultura humanizada. A abordagem é sempre a de considerar a pessoa como
um todo. Elementos como afetividade, emoções, movimento e espaço físico en-
contram-se num mesmo plano.

A partir desse referencial, observamos a importância do papel da família, da


posição dos pais, da inscrição das funções maternas e paternas para o desenvol-
vimento global da criança.

Após essas considerações, pressupõe-se que os pais precisam refletir sobre


o seu lugar, a sua função no processo de educar filhos. Partindo da premissa de
que as circunstâncias, as necessidades e as escolhas impõem às pessoas funções,
posições e papéis particulares, os pais, na parceria com os filhos, têm o desafio
de transformar essa experiência em momentos de crescimento para todos, vi-
sando ao fortalecimento dos laços familiares, à circulação do afeto e do o amor.

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Problemas dos pais: crescendo com o outro

É nesse contexto que precisamos olhar atentamente e observar a família e


as relações parentais nos dias de hoje. Há uma indefinição em relação ao que
se pode esperar dos pares, gerando, por vezes, um sentimento de isolamento,
insatisfação e solidão. Dessa maneira, para um novo olhar é preciso manter uma
atitude reflexiva constante, por meio da compreensão, da solidariedade e da
aceitação incondicional do outro.

Finalmente, essa proposta sugere que a educação deve desenvolver o conhe-


cimento ajustado de si mesmo e o sentimento de confiança em suas capacidades
afetiva, física, cognitiva, ética, estética, de inter-relação pessoal e de inserção social,
para agir com perseverança na busca de conhecimento e no exercício da cidadania.

Texto complementar

O “filho do homem”:
obrigado a aprender para ser
(uma perspectiva antropológica)
(CHARLOT, 2000, p. 51-54)

Quem se torna um sujeito, é educado e se educa é um filho do homem: a


condição primacial do indivíduo humano deveria ser o fundamento basilar
de qualquer teoria da educação, qualquer que seja a disciplina a que se filie.

Nascer é estar submetido à obrigação de aprender.

Kant já escrevia, no fim do século XVIII: “O homem é a única criatura que


precisa ser educada [...] Por ser dotado de instinto, um animal, ao nascer,
já é tudo o que pode ser; uma razão alheia já cuidou de tudo para ele. O
homem, porém, deve servir-se de sua própria razão. Não tem instinto e deve
determinar ele próprio o plano de sua conduta. Ora, por não ter, de imediato,
capacidade para fazê-lo, mas, ao contrário, entrar no mundo, por assim dizer,
em estado bruto, é preciso que outros o façam para ele” [...].

O essencial já está aí: o homem não é, deve tornar-se o que deve ser; para
tal, deve ser educado por aqueles que suprem sua fraqueza inicial e deve edu-
car-se, “tornar-se por si mesmo”.

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Problemas dos pais: crescendo com o outro

Esse inacabamento do homem foi pensado pelos cientistas como pre-


maturação: tudo ocorre, com efeito, como se o homem nascesse com seu
desenvolvimento inconcluso e devesse ser acabado fora do útero. Também
nasce frágil, mas igualmente provido de uma grande plasticidade; não é de-
finido por instintos: define-se ao longo de uma história. [...]

Mas a prematuração do homem é apenas uma face da condição


humana, inseparável de sua outra face: o homem sobrevive por nascer
em um mundo humano, preexistente, que já é estruturado. [...]

É verdade que a criança está mal-equipada ao nascer, mas ela beneficia-


-se da “fabulosa riqueza de seu equipamento social excentrado”. Em outras
palavras, a essência originária do indivíduo humano não está dentro dele
mesmo, mas sim fora, em uma posição excêntrica, no mundo das relações
sociais. A humanidade (no sentido de “ser homem”), em oposição à anima-
lidade (o “ser animal”), não é um dado presente por natureza em cada indi-
víduo isolado, é o mundo social humano; e cada indivíduo natural torna-se
humano ao “hominizar-se” através de seu processo de vida real no âmago
das relações sociais. Ou seja, a condição humana não é apenas a ausência
do ser na criança que nasce; é também o ingresso em um mundo onde o
humano existe sob a forma de outros homens e de tudo o que a espécie
humana construiu anteriormente. A educação é essa apropriação, sempre
parcial, de uma essência excêntrica do homem. [...]

Por sua condição, o homem é um ausente de si mesmo. Carrega essa au-


sência em si, sob forma de desejo. Um desejo que sempre é, no fundo, desejo
de si, desse ser que lhe falta, um desejo impossível de saciar, pois saciá-lo
aniquilaria o homem enquanto homem.

Mas, por sua condição também, o homem é uma presença fora de si.

Está presente nesse outro que, muito concretamente, lhe permite sobre-
viver e que também é um homem. Esse outro, por ser a figura do humano, é
objeto de desejo, em formas complexas. É objeto de amor, pois ele é aquilo
que eu preciso; e, indissociavelmente, objeto de ódio, pois sua existência em
si mesma atesta que eu não resumo a totalidade do humano.

Mas o homem está presente também sob a forma de um mundo, um


mundo humano produzido pela espécie ao longo de sua história e que existe
antes da criança, sob a forma de estruturas, ferramentas, relações, palavras e
conceitos, obras.

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Essa ausência de si mesmo/presença em si fora de si mesmo é a pró-


pria condição do homem. Constitui-o como sujeito e mantém a dinâmica
do desejo, que não pode ser reduzido a uma pulsão orgânica em busca de
objeto. Mas nem por isso esse sujeito se reduz ao desejo e à relação com
o outro enquanto pessoa. É também um corpo “engajado” em um mundo
onde deve sobreviver, agir, produzir, mesmo que, em um primeiro tempo,
essa necessidade seja assumida por outros. O mundo não se sobrepõe a um
universo onde estariam apenas o sujeito e o outro, unidos e divididos em
relações de desejo. O mundo está aqui, imediatamente; nele, o outro e a al-
teridade assumem formas “concretas”, sociais. Mesmo sendo a estrutura fun-
damental do sujeito, o desejo ainda é “desejo de” e esse “de” remete a uma
alteridade que tem uma forma social, quer se trate do outro como pessoa,
quer como objeto do desejo.

Por isso mesmo, nascer significa ver-se submetido à obrigação de apren-


der: aprender para construir-se, em um triplo processo de “hominização” (tor-
nar-se homem), de singularização (tornar-se um exemplar único de homem),
de socialização (tornar-se membro de uma comunidade, partilhando seus
valores e ocupando um lugar nela). Aprender para viver com outros homens
com quem o mundo é partilhado. Aprender para apropriar-se do mundo, de
uma parte desse mundo, e para participar da construção de um mundo pre-
existente. Aprender em uma história que é, ao mesmo tempo, profundamen-
te minha, no que tem de única, mas que me escapa por toda parte. Nascer,
aprender é entrar em um conjunto de relações e processos que constituem
um sistema de sentido, onde se diz quem eu sou, quem é o mundo, quem
são os outros.

Esse sistema se elabora no próprio movimento através do qual eu me


construo e sou construído pelos outros, esse movimento longo, complexo,
nunca completamente acabado, que é chamado educação.

A educação é uma produção de si por si mesmo, mas essa autoprodução


só é possível pela mediação do outro e com sua ajuda. A educação é produ-
ção de si por si mesmo; é o processo através do qual a criança que nasce ina-
cabada se constrói enquanto ser humano, social e singular. Ninguém poderá
educar-me se eu não consentir, de alguma maneira, se eu não colaborar;
uma educação é impossível, se o sujeito a ser educado não investe pessoal-
mente no processo que o educa. Inversamente, porém, eu só posso educar-
-me numa troca com os outros e com o mundo; a educação é impossível, se

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a criança não encontra no mundo o que lhe permite construir-se. Toda edu-
cação supõe o desejo, como força propulsionadora que alimenta o processo.
Mas só há força de propulsão porque há força de atração: o desejo sempre
é “desejo de”; a criança só pode construir-se porque o outro e o mundo são
humanos e, portanto, desejáveis.

Chega-se à mesma conclusão raciocinando-se a partir dos educadores


e da sociedade, que têm o projeto de formar a criança. Para reproduzir-se,
devem produzir filhos; engendrá-los, mas também produzi-los como seus
filhos, membros de uma família e de uma sociedade num momento da his-
tória. Essa produção, no entanto, apresenta um caráter particular: a criança
é ao mesmo tempo a “matéria-prima” e o operador imediato do processo,
processo que os educadores só podem conceber e mediar. [...]

Dado que a criança nasce inacabada, deve construir-se e só pode fazê-lo


de “dentro”, a educação é produção de si próprio. Dado que a criança só pode
construir-se apropriando-se de uma humanidade que lhe é “exterior”, essa
produção exige a mediação do outro. A educação não é subjetivação de um
ser que não seria sujeito; o sujeito está sempre aí. A educação não é sociali-
zação de um ser que não fosse já social: o mundo, e com ele a sociedade, já
está sempre presente. [...]

Dica de estudo
SALINGER, J. D. O Apanhador no Campo de Centeio. São Paulo: Editora do
autor, 1951.

Essa obra lança questões a fim de compreender a adolescência, na medida


em que apresenta o pensamento-jovem distinto do infantil, com significados e
sentidos particulares. Retrata os conflitos vividos pelo personagem Holden Cau-
fied, de 16 anos, filho de uma família rica, que estudava num internato e retorna
para casa. Nesse percurso, Caufield faz reflexões sobre sua vida e trava conversas
com outros personagens significativos afetivamente para ele: professor, ex-na-
morada e sua irmã. Nos diálogos, as contradições, as ambiguidades e os conflitos
vividos por Caufield retratam os paradoxos internos desse jovem adolescente e
que nos parecem atuais e pertinentes à leitura dos pais para um encontro ético
e moral com os filhos.

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Problemas dos pais: crescendo com o outro

Atividades
1. Construa uma explicação que justifique a frase: Pais e filhos – impasses de
um encontro de gerações.

2. No texto complementar: “O ‘filho do homem’: obrigado a aprender para ser”


o autor apresenta a afirmação: nascer é estar submetido à obrigação de
aprender. Explique com suas palavras o significado dessa afirmação.

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Gabarito
1. Um dos pontos a serem considerados é que as crianças de hoje são educadas,
muitas vezes, numa estrutura familiar distinta daquela que seus pais viveram.
Outro ponto é tomar a dependência afetiva humana do outro, ao nascer, so-
mos dependentes dos cuidados do outro pra sobreviver, e aí se inscreve um
laço afetivo que talvez nunca chegue a uma independência emocional ab-
soluta e essa é uma das tarefas que o filho tem de elaborar. Outro ponto são
as projeções que os pais fazem de seus desejos no filho, as expectativas co-
locadas nos ombros dos filhos como herdeiros dos pais. Na desconsideração
do desejo próprio, das particularidades do filho. Outro ponto é entender que
emocionalmente, para que o filho se torne independente, adulto, para que
adquira uma identidade pessoal, terá que opor-se aos pais, às suas ideias, aos
seus valores e caberá aos pais, na tarefa de educadores, suportar e entender
que essa é uma fase de elaboração, para a construção de novos vínculos com
a família e a sociedade.

2. Espera-se que a resposta esteja circunscrita aos aspectos educativos essen-


ciais ao ser humano, às trocas interpessoais adulto-criança. Entende-se que a
educação é possível desde que mediada pelo outro (adulto, pais, professor).
Educa-se o sujeito, que nasce “produto inacabado”, e terá que se construir
humano, social e singular. “Ninguém poderá educar-me se eu não consentir,
de alguma maneira, se eu não colaborar, uma educação é impossível, se o
sujeito a ser educado não investe pessoalmente no processo que o educa”.

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Contribuições de Sigmund
Freud ao contexto educativo

Irene Carmen Piconi Prestes


Gosto de dizer. Direi melhor: gosto de palavras.
As palavras são para mim corpos tocáveis, sereias visíveis,
sensualidades incorporadas.

Fernando Pessoa

Considerações iniciais
sobre a teoria psicanalítica de Sigmund Freud
Discorrer sobre a teoria psicanalítica é um desafio para nós. Freud al-
terou radicalmente o modo de pensar a vida psíquica. A investigação sis-
temática desses problemas levou-o à criação da Psicanálise. Quais são os
fundamentos da obra freudiana? Para tentar compreendê-los, vamos pro-
curar percorrer sua vasta obra desde os seus primeiros passos.

Aspectos biográficos
1856 – Nasce em 6 de maio, na cidade de Freiberg, que pertencia à
Áustria. Aos quatro anos de idade, mudou-
Domínio público.

-se para Viena com a família. Nessa cidade,


Freud vai crescer, estudar e trabalhar.

1873 – Ingressa na universidade de Me-


dicina e conhece seus grandes mestres.

1886 – Casa-se com Martha Bernays. In-


teressa-se pelos estudos de neuropsiquia-
tria. Estuda a anatomia do sistema nervoso.
Sigmund Freud (1856-1939).
Abre seu consultório em Viena.

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Contribuições de Sigmund Freud ao contexto educativo

1891 – Pratica hipnose e trabalha o método catártico com seus


pacientes.

1895 – Escreve o projeto para uma psicologia científica.

1896 – A palavra psicanálise é empregada pela primeira vez. Nasce na


Suíça Jean Piaget. Nasce na Rússia Lev Vygotsky.

1900 – Publica A Interpretação dos Sonhos, livro hoje considerado sua


obra principal.

1901 – Publica Psicopatologia da Vida Cotidiana.

1903 – Funda o núcleo Sociedade Psicológica das Quartas-Feiras, primeiro


grupo de estudiosos da Psicanálise.

1905 – Publica Três Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade.

1909 – Apresenta as cinco conferências de iniciação na Psicanálise, na


Universidade Clark, nos Estados Unidos.

1923 – Descobre um câncer na boca. Submete-se a uma série de trata-


mentos e cirurgias.

1926 – Funda a Sociedade Psicanalítica de Paris.

1939 – Último ano de sua vida. Vítima das perseguições nazistas, refugia-
-se em Londres, Inglaterra. Morre aos 83 anos, no dia 23 de setembro.

Sobre o contexto intelectual da época, verificamos que tal como acontece


com todas as escolas de pensamento, o movimento psicanalítico teve antece-
dente intelectual e cultural definidos. Duas fontes principais de influência foram
as primeiras especulações filosóficas acerca da natureza de fenômenos psicoló-
gicos inconscientes e os primeiros trabalhos no campo da psicopatologia.

A noção de inconsciente era parte integrante do Zeitgeist1 europeu da década


de 1880, época em que Freud iniciava sua prática clínica. Além de ser do interes-
se dos profissionais, a ideia de inconsciente também era considerada assunto da
moda para as conversas em geral. Um livro chamado Filosofia do Inconsciente,
de Hartmann, publicado em 1869, era tão popular que teve nove edições entre
esse ano e 1882. Nos anos 1870, outros livros foram publicados na Alemanha e
continham a palavra inconsciente no título (SCHULTZ, 1992).
1
Zeitgeist: “espírito do tempo”, termo alemão que designa o espírito de uma época, as características gerais de um período.

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Contribuições de Sigmund Freud ao contexto educativo

Desse modo, verifica-se que antes dos estudos de Freud sobre o inconsciente
outros pesquisadores já discutiam a mente inconsciente. O mérito de Freud está
em propor um modo de estudá-la. Muitos outros aspectos também já estavam
sendo estudados, como a sexualidade e os sonhos.

O desenvolvimento da psicanálise não se deu no âmbito da psicologia aca-


dêmica, assim, não se opôs à ordem vigente que era a da psicologia de Wundt,
nem a qualquer outra escola de pensamento psicológico. A Psicanálise não tinha
vínculo direto com os movimentos evolutivos e revolucionários da psicologia
acadêmica. O estudo freudiano da personalidade humana e dos seus distúrbios
estava bem afastado da psicologia experimental acadêmica.

A preocupação de Freud era mais ampla, ou seja, a personalidade humana


global, e não funções específicas como a percepção, a sensação e o compor-
tamento. A Psicologia tinha adotado o método de investigação experimental,
em que cada pequeno aspecto do comportamento era isolado para estudo por
um breve tempo no laboratório. A Psicanálise se ocupava do ser humano inteiro
durante um longo período de tempo, colhendo dados sobre todos os aspectos
da história de vida das pessoas. Os psicólogos, mergulhados no rigor da ciência,
buscando definições precisas e operacionais para os seus conceitos, não gosta-
vam das ideias freudianas, que não podiam ser quantificadas nem vinculadas
com variáveis empíricas concretas. Termos como ego, id e transferência (próprios
da Psicanálise) eram reprovados por psicólogos que só queriam trabalhar em
termos específicos de estímulo-resposta.

Para descobrir aquilo a que Freud se opunha, é importante considerar o pen-


samento que vigorava na clínica psiquiátrica na área em que ele trabalhava.
A preocupação primordial de Freud não era curar pessoas, mas esclarecer a dinâmica que
subjaz ao comportamento humano. Ele via a si mesmo mais como cientista do que como
terapeuta e considerava suas técnicas de livre associação e análise de sonhos instrumentos de
pesquisas para coleta de dados. (SCHULTZ, 1992, p. 342)

A Psicanálise se desenvolveu em oposição à orientação dada aos tratamentos


psiquiátricos. À medida em que o trabalho com os doentes mentais progredia,
alguns médicos entendiam que os fatores emocionais tinham muito mais im-
portância que lesões cerebrais ou outras possíveis causas físicas. Os estudos do
médico francês Jean Charcot (1825-1893) e de seu discípulo Pierre Janet (1859-
1947) no tratamento dos mentalmente perturbados ajudou a mudar as crenças
da psiquiatria, que passaram da escola somática para a escola mental ou psíqui-
ca. Os médicos começaram a pensar em termos da cura de distúrbios emocio-
nais tratando a mente em vez do corpo.

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Outro aspecto do clima intelectual da época que influenciou a direção dos


estudos freudianos foi a atitude diante do sexo, na Viena do final do século pas-
sado. Considera-se que, como o contexto histórico, social e cultural na época de
Freud era muito repressivo e religioso, ele estava muito além do seu tempo ao
discutir questões sexuais com tanta franqueza. A Viena da virada do século era
uma sociedade aberta e essa aceitação generalizada da sensualidade não era
acompanhada por sentimentos de culpa nem por repressão (SCHULTZ, 1992).

A curiosidade pelos assuntos sexuais era visível no cotidiano vienense e na


literatura. Nos anos antes de Freud apresentar a Psicanálise, tendo por base a
sexualidade, foram publicados muitos artigos científicos sobre doenças sexuais,
sexualidade infantil e supressão de impulsos sexuais e seus efeitos sobre a saúde
física e mental. Em 1845, o médico Adolf Patze afirmou que o impulso sexual
estava presente em crianças já aos três anos, o que foi afirmado em 1867 pelo
renomado psiquiatra britânico, Henry Maudsley. Em 1886, Krafft-Ebing publicou
seu sensacional livro Psicopatia Sexual. Em 1897, o médico vienense Albert Moll
escreveu um livro sobre a sexualidade na criança e seu amor pelo genitor do
sexo oposto. Até a palavra libido, que tanta importância assumiria na Psicanálise,
já estava em uso e com o mesmo sentido dado por Freud. Desse modo, conclu-
ímos que boa parte do componente sexual do seu trabalho fora antecipado de
uma ou de outra forma (SCHULTZ, 1992).

A sexualidade, como forma assumida por Sigmund Freud, em 1900, não


se limita à genitalidade. O termo designa a forma como são reconhecidos,
diferenciados e significados os dois sexos pelo inconsciente.

Aqui, é interessante destacarmos as diferentes definições do termo sexuali-


dade. Em 1838, o termo sexo passa a ser ampliado e vai se desdobrar em: neces-
sidade (física, biológica), prazer (físico, psíquico) e desejo (imaginação, simbo-
lização). Esse alargamento fez com que o sexo viesse a ser encarado como um
fenômeno mais global. Assim, a sexualidade passa a estar presente na história
individual de cada pessoa, no cotidiano, dando sentidos e significados inespera-
dos e ignorados a ações, palavras, emoções, sonhos, humor, erros, lapsos, enga-
nos, e também atividades sociais (como o trabalho, a religião, a arte, a política)
que, aparentemente, nada têm de sexual. Dessa maneira, cada palavra, cada sím-
bolo tem um significado particular para cada pessoa.

Concluímos que foram muitas as influências recebidas por Freud, decorren-


tes do Zeitgeist. Assim, a revolucionária contribuição freudiana situou-se princi-
palmente na capacidade de recorrer a diversificadas ideias e, a partir delas, de-
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senvolver um sistema coerente na busca incessante em descobrir a fonte que


anima o ser humano.

Finalmente, Freud pertence ao pequeno grupo de estudiosos que foram es-


senciais na história da civilização ao modificarem o modo como pensamos a
nosso próprio respeito.
A genialidade de Freud está em ele haver compreendido que, para apreender as causas secretas
que movem um ser, que movem esse outro que sofre e a quem o analista escuta, é preciso,
primeiro, e acima de tudo, descobrir essas causas em si mesmo, refazer em si – enquanto se
mantém o contato com o outro que está diante de nós – o caminho que vai de nossos próprios
atos a suas causas. (NASIO, 1995, p. 14)

O inconsciente:
objeto de estudo da Psicanálise
A Psicanálise apresenta o inconsciente humano2 como foco de atenção prin-
cipal dos seus estudos. Os sonhos são manifestações do inconsciente e Freud
descobrira que os sonhos do paciente poderiam ser uma rica fonte de material
emocional significativo. Desse modo, os sonhos, com frequência, eram indica-
tivos das causas subjacentes de um distúrbio psíquico. Freud acreditava que o
material apresentado na descrição de um sonho guardava algum significado,
podendo ser resultado de algum elemento presente no inconsciente. Assim,
conclui-se que o sonho representa uma satisfação mascarada do desejo incons-
ciente. O sonho possui dois tipos de conteúdo: o manifesto e o latente. O conteú-
do manifesto do sonho é a história contada, narrada pelo sonhador. O conteúdo
latente contém o verdadeiro significado do sonho, e constitui o seu significado
oculto ou simbólico. Para interpretar o sentido oculto do sonho, deve-se partir
do conteúdo manifesto para o latente, isto é, interpretar por meio da livre asso-
ciação que o sonhador faz do seu sonho, associado aos eventos da sua história
pessoal.

A posição de Freud é a de que, no comportamento cotidiano de cada pessoa,


ideias inconscientes lutam por manifestar-se e são capazes de modificar o pen-
samento e o comportamento dela. O que poderia parecer lapsos linguísticos ou
atos de esquecimento casuais pode significar reflexos de motivos reais, embora
não reconhecidos, consistindo, portanto, em manifestações do inconsciente.
Compreender que o inconsciente é o cérebro ou algo no interior da cabeça das pessoas, ou
2
Conteúdo ausente em um dado momento da consciência [...] instância constituída de elementos recalcados que se recusam a chegar instância
do ego [...] lugar de um saber constituído por um material literal, desprovido em si mesmo de significação, que organiza, a percepção, bem como
grande parte da economia orgânica (CHEMAMA, 1995).

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ainda, uma fonte de motivos que explicam o que de outra maneira ficaria pouco razoável, como
o medo de ratos, de cobras ou a necessidade de mutilação, de flagelação, de ser o melhor.

A teoria psicanalítica apresenta-nos o inconsciente como um sistema lógico, que supomos


opere no psiquismo humano sem no entanto afirmar que em si mesmo seja desta ou daquela
maneira, seja isto ou aquilo. A interpretação é a única forma psicanalítica do inconsciente, ou
melhor, dele só sabemos pela interpretação. (HERMANN, 1984)

O método de estudo da Psicanálise


O método de estudo proposto por Freud chama-se associação livre. Essa
proposição metodológica difere muito da psicologia de Wundt. Nessa técnica, o
paciente deita no divã e é convidado a falar aberta e espontaneamente, dando
completa expressão a qualquer ideia, por mais embaraçosa, irrelevante ou tola
que pareça. O objetivo da psicanálise freudiana é trazer à percepção consciente,
lembranças ou pensamentos reprimidos. Freud acreditava que, no material reve-
lado durante a livre associação, desejos do inconsciente viriam à tona, e que esse
material não estava sujeito à escolha consciente do paciente.

A narrativa espontânea do paciente revela conteúdos inconscientes que são


forçados a entrar em sua consciência, permitindo-lhe operar no inconsciente.
Freud advertia que só psicanalistas que usassem suas técnicas estariam qua-
lificados para julgar o valor científico de suas descobertas. Ele escreveu que a
pesquisa psicanalítica mediante a livre associação tinha como base um número
incalculável de observações e experiências, e só alguém que repetiu essas ob-
servações em si e nos outros tem condições de chegar a um julgamento pessoal
a respeito da Psicanálise.

Instinto e pulsão
A psicanálise freudiana faz uma distinção entre os termos instinto e pulsão.
Para Freud, os instintos são os fatores biológicos que liberam energia mental.
“Instinto” denota e descreve um processo programado ao nível do corpo e do
comportamento fixado por hereditariedade. O termo usado por Freud para des-
crever o comportamento dos seres humanos era Trieb3, mais bem traduzido por
impulso ou pulsão. Assim, para Freud, o termo pulsão parece ser mais adequado,
pois considera que o impulso (ou pulsão) não decorre de predisposições herda-
das, referindo-se antes à fonte de excitação no interior do corpo. O termo pulsão
é tratado como um conceito limite entre o que está ao nível do orgânico, do
físico-químico e do psíquico.

3
Trieb é um substantivo alemão que corresponde ao verbo treiben, que significa impulsionar ou impelir algo, alguém.

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Consciente e inconsciente
“Consciente” e “inconsciente” correspondem à primeira tópica freudiana dos
estudos psíquicos. O nível psíquico do consciente é a porção visível, presente
durante o estado de vigília4 da pessoa. É uma parte pequena e insignificante
do psiquismo, representando somente um aspecto superficial da personalidade
total. Já o nível do inconsciente é vasto e poderoso e contém as pulsões que são
a força propulsora de todo o comportamento humano.

O aparelho psíquico
Freud organiza uma proposição de estrutura psíquica em três instâncias: id,
ego e superego. Na medida em que o indivíduo se desenvolve, organizam-se seu
psiquismo e sua personalidade. Na dinâmica da vida psíquica a tensão entre as
instâncias nunca se esgota. Esquematicamente, podemos tentar agrupar as ins-
tâncias deste modo:

Id Ego Superego

 Inibe a satisfação do Id
 Satisfação global
 Satisfação imediata  Regras de conduta (cer-
Objetivo na  Regulação da realidade
 Exigências impensadas to/errado)
dinâmica psíquica  Manter nível de tensão
 Descarregar tensão  Busca a perfeição na di-
confortável
nâmica do sistema psíquico

Desconhece juízos de valo-  É o juiz dos valores


Opera com a lei res (bem/mal)
Conhece juízos de valores
 Consciência moral

 Busca interação perma-


nente com a realidade  Limites, ordem e auto-
Interação com o  Funções memória, per- ridade
Desconsidera a realidade
mundo exterior cepção, ordenação temporal  Exigências sociais e cul-
dos procedimentos mentais turais
de realidade

Opera com o Princípio do prazer e da re-


Princípio do prazer Princípio da realidade
mundo exterior alidade

Componente Biológico Psicológico Sociocultural

Por fim, temos que essas três instâncias psíquicas organizam-se como um sis-
tema inseparável e interdependente. Em consequência, há um conflito intermi-

4
Estado de privação ou falta do sono, com a pessoa permanecendo acordada.

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nável no interior da personalidade humana pelas forças que advêm da energia


psíquica decorrente das instâncias psíquicas (id, ego, superego). O ego está numa
posição difícil, pressionado por forças insistentes e opostas vindas do id e do
superego. Ele tem de adiar os anseios incessantes do id, perceber e manipular a
realidade para aliviar as tensões das pulsões do id e lidar com o anseio de perfei-
ção do superego.

É importante considerar que esse aparelho psíquico não existe em si mesmo,


decorre do desenvolvimento do indivíduo. De outro modo, foi construído para
pensarmos que o campo subjetivo se constitui para o sujeito em consequência
do contato com as realidades culturais, especialmente nas relações parentais e
em determinadas circunstâncias sociais.

Processo de desenvolvimento
psicossexual infantil
Freud acreditava que o processo de estruturação e de funcionamento da
personalidade do adulto era estabelecido nos primeiros anos de vida, estando
quase completamente formado por volta dos cinco anos de idade. O desenvol-
vimento psicossexual da criança passa por uma série de etapas (oral, anal, fálica,
latência). No decorrer dessas etapas, as crianças são consideradas autoeróticas,
isto é, elas obtêm prazer erótico ou sensual ao estimular as zonas erógenas do
corpo ou ao serem estimuladas pelos pais. Essas descobertas freudianas colo-
cam a sexualidade no centro da vida psíquica e, assim, configura-se a existência
da sexualidade na vida infantil.

A seguir, apresentamos alguns dos principais aspectos dessas etapas.

Oral Anal Fálica Latência

Idade
0-1 ano 2-4 anos 5-6 anos a partir de 7 anos
aproximada

Gratificação para
Boca, sugar, mor- Diferença sexual
Erotização der, engolir.
o controle esfinc-
anatômica.
As relações sociais.
teriano.

Canais uretrais e Erotização do


Satisfação erótica Seio. ânus.
Grupo social
próprio corpo.

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Oral Anal Fálica Latência

Posição infantil na
Dar provas da sua
interação com o Receptiva. Ativa. Curiosa.
competência.
meio

Integração das
Aparelho Integração das ins-
Diferenciação do Diferenciação instâncias
tâncias psíquicas id,
psíquico ego. do superego. psíquicas id, ego, ego, superego.
superego.

Hábitos de higie-
Identidade se- Processo de
Processos alimen- ne pessoal são
Complementações tares. aprendidos, xual e um obje-
to sexual. escolarização.
socialização.

Aplicação no contexto educativo


Destacamos, então, as principais descobertas da Psicanálise:

 a vida sexual inicia-se, com manifestações claras, logo depois do nasci-


mento, estabelecendo, assim, as etapas psicossexuais;

 os conceitos sexual e genital são distintos para Freud. O primeiro é o con-


ceito mais amplo e inclui muitas atividades que não têm nenhuma relação
com os órgãos genitais;

 a primeira tópica freudiana define inconsciente, pré-consciente e consciente.


A segunda tópica conceitua o aparelho psíquico: id, ego e superego.

Algumas pesquisas comprovaram os processos inconscientes e sua influência


sobre os pensamentos e o comportamento, sugerindo que as influências podem
até ser mais profundas do que Freud afirmava.

Tendo por referência essas considerações, entende-se que Freud destaca a


interferência de aspectos subjetivos, inconscientes na aprendizagem. Propõem
que na sala de aula se dê lugar ao desejo do aluno, ao aprender. O professor é
aquele que oferece possibilidades de aprendizagem ao aluno, observa-o e refle-
te com ele sobre o conhecimento conquistado. O professor informa, problema-
tiza, interroga e ajuda a pensar.

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Contribuições de Sigmund Freud ao contexto educativo

Texto complementar
O saber ser: competências e habilidades
(MACEDO, 2002, p.14-18)

Nossa escola sempre foi pautada pela prioridade como compromisso


ou ideal de ensinar conhecimentos ou conteúdos disciplinares. As atitudes,
competências, habilidades e valores também eram trabalhados, mas como
meios para o ensino das matérias. Além disso, mesmo a escola pública era
seletiva, ou seja, as crianças que não preenchessem minimamente as exi-
gências nos dois âmbitos, segundo a avaliação dos professores, eram pouco
a pouco excluídas ou reprovadas. A permanência das crianças na escola de-
pendia, portanto, de aprender os conteúdos escolares e se comportar se-
gundo suas exigências ou expectativas. Só que hoje a situação mudou: todas
as crianças têm direito de realizar sua Educação Básica na escola e essa não
pode mais usar a repetência ou exclusão como “armas” para garantirem, de
modo seletivo, uma certa aprendizagem significativa de seus alunos.

Hoje, quando a escola se torna para todos, quando as crianças adquiri-


ram o direito de estudar, não dá mais para defender como tema principal
na escola o domínio de conteúdos mais relacionados com matérias discipli-
nares; desenvolver habilidades, competências ou atitudes favoráveis a isso,
bem como à própria convivência no contexto escolar tornou-se fundamen-
tal. Mas não é suficiente mudar uma lei ou definir novas prioridades. Há de
se ter também espaço, tempo, recursos, formação docente e estrutura curri-
cular condizentes com essa nova situação.

Como desenvolver e avaliar competências e habilidades na escola, con-


siderando sua atual estrutura e funcionamento, em que as matérias ainda
continuam como fim ou meta e não como meio ou recurso? Essa é uma per-
gunta que fazemos com angústia, queixa e sentimentos de insuficiência em
todos os sentidos, pois nos parece difícil articular desenvolvimento de com-
petências e habilidades com ensino de conteúdos.

Na escola, repete-se, imita-se ou expressa-se o que acontece na socieda-


de em geral. Também na escola nem sempre sabemos diferenciar e integrar
o ser, o ter e o parecer. Parecer, por exemplo, refere-se ao fingir que se ensina

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ou que se aprende, quando em verdade não é isso que está ocorrendo de


fato. Corresponde à malícia de um contrato pedagógico em que o aluno –
para ser aprovado ou reconhecido – tem que fazer certas coisas que não são
da ordem da aprendizagem. Refere-se ao jogo pedagógico em que a vista
grossa, a insinuação, o faz de conta, certos acordos se afastam ou ocupam o
lugar do processo de aprendizagem em seu sentido mais rigoroso.

Às vezes vai melhor na escola aquele que finge, que sabe agradar o pro-
fessor, que insiste na obtenção de uma melhor nota, que reclama em uma
linguagem que funciona, que entende as malícias do jogo escolar. O mesmo
não ocorre, às vezes, com os excluídos, os desgraçados em uma sociedade in-
justa como a nossa, pois podem ser apenas peças desse jogo. Como romper
esse círculo vicioso? Então, o que se chama de cultura escolar, de ofício de
aluno, muitas vezes está mais a serviço de um jogo de cena do que a favor do
trabalho escolar, que ensina e que faz aprender a todos.

O mesmo poderíamos dizer sobre o ter, sobre essa escola acumulativa,


que dá prioridade aos conteúdos, em que nela tudo é essencial e imposto
a todos sem diferenciação ou singularidade: os mesmos livros, as mesmas
provas, as mesmas aulas, o mesmo professor, a mesma classe superlotada.
Reparem o paradoxo: a mesma escola que se abre para a comunidade, rece-
bendo todas as crianças, na diversidade e singularidade que as constituem,
continua praticando, no mesmo espaço e tempo didáticos, os mesmos recur-
sos e formas de avaliação. É possível continuar sendo uma escola pedagogi-
camente indiferenciada e ao mesmo tempo comprometida com a aprendi-
zagem significativa e a inclusão de todas as crianças?

Queria agora comentar sobre a Educação como algo impossível, tal como
são, segundo Freud, os atos de governar e analisar. Até porque hoje a educação
impossível tornou-se, na escola, necessária, pois é obrigatória ou compulsória
para todas as crianças. A Educação é impossível porque labuta simultanea-
mente entre dois extremos: de um lado, a heteronomia, porque pressionamos
as crianças, de cima para baixo, para aprenderem aquilo que julgamos fun-
damental para elas e para que mais tarde possam nos substituir. Autonomia,
porque, ao mesmo tempo, as crianças como seres dependentes e precários
precisam se desenvolver e se libertar de muitos tipos de restrições.

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A Educação é impossível porque temos dois movimentos de forças opos-


tas, um que pede libertação, autonomia, que pede que a criança tenha opor-
tunidade de ser o máximo que possa ser dentro de seus recursos. Ao mesmo
tempo, na perspectiva dos adultos, tem um processo de pressão, domina-
ção ou domesticação, mesmo que tudo isso seja justificado para o bem das
crianças. Essa tensão entre autonomia e heteronomia, com a escola com-
pulsória, alcançou hoje uma intensidade muito grande. Como coordenar o
direito universal das crianças de poderem ser com a exigência dos adultos de
que devem ser isso ou aquilo?

Por isso acho interessante o diálogo entre Psicanálise e Pedagogia porque,


com a educação compulsória, a questão do desejo de saber, o desejo de
saber com este professor, com esses colegas, nesta escola, nestas condições
em que a sociedade oferece para a aprendizagem. Como combinar educação
compulsória com desejo de saber? Com desejo de saber nessas condições?

Para problematizar as dificuldades dessa relação, suponham, por exem-


plo, em uma cultura como a nossa, que valoriza tanto o futebol, que obrigas-
se, por exigência da lei, que os meninos entre 6 e 18 anos praticassem esse
esporte todos os dias úteis. Minha questão não significa que tenha saudade
ou que deseje a volta de uma escola seletiva, discriminatória, excludente,
injusta; apenas quero lembrar os novos desafios que temos que enfrentar
em uma escola ou Educação que se quer para todos e o quanto podem
ser úteis as contribuições da Psicanálise para a superação de alguns desses
problemas.

Dica de estudo
Psicanálise e Educação: sobre Hefisto, Édipo e outros desamparados dos dias de
hoje, de Andrea Brunetto, Editora da UFMS.

O texto aborda as contribuições da psicanálise na área da educação, quando


se trata de incluir a pessoa com deficiência. Interroga sobre como lidar com
crianças capturadas bem longe do ideal de perfeição num mundo de exigências
cada vez mais aterradoras.

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Atividades
1. Destaque três pontos que você considera importantes acerca da Psicanálise.

2. Agora, vamos aproximar a Psicanálise da Educação. Correlacione os pontos


destacados (que você listou no item 1) com a escola, a sala de aula, o profes-
sor e outros que você considera interessantes.

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Gabarito
1.

 Sexualidade – fenômeno global, ligado ao desejo e à simbolização do hu-


mano.

 Inconsciente – no psiquismo humano guarda o inconsciente e que dele


sabemos pela interpretação.

 Constituição do aparelho psíquico id, ego, superego na interação com o


meio exterior – é na relação eu-outro que constituímos o nosso psiquismo.

2.

 Saber que a sexualidade envolve a simbolização, a significação e a lingua-


gem é importante, pois na escola, na sala de aula, o elemento que media
a relação professor-aluno é a linguagem.

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Contribuições de Sigmund Freud ao contexto educativo

 Saber que o inconsciente é ativo no psiquismo é importante na sala de


aula para “confortar” o professor de que aquilo que ele transmite será in-
terpretado e terá um significado próprio para o aluno, que nem sempre
corresponde ao que o professor quis ensinar.

 Saber que o psiquismo é relacional é importante para a escola, na sala de


aula, para que se valorizem e se cuidem das relações interpessoais no con-
texto educativo, a comunicação é importante na transmissão dos valores.

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O campo transferencial

Irene Carmem Piconi Prestes


[...] não me parece haver uma única razão de peso para negar às crianças
o esclarecimento que sua sede de saber exige.

Sigmund Freud

Inicialmente salientamos que a produção do conhecimento no contex-


to escolar relaciona-se aos processos cognitivos, à aprendizagem escolar e
ao desenvolvimento humano, para tanto, entendemos que nas investiga-
ções desses processos, devemos considerar que os mesmos são dinâmicos
e de natureza psicológica e envolvem o sujeito que ensina e o sujeito que
aprende. Dessa maneira, as páginas a seguir apresentam a contribuição
da dimensão “psi” à educação, procurando estabelecer na relação entre
o sujeito que ensina e o sujeito que aprende uma organização do espaço
educativo a partir do conceito psicanalítico de transferência.

A fim de discorrer sobre o fenômeno da transferência, tomamos espe-


cialmente as considerações freudianas apresentadas nos textos: A Dinâ-
mica da Transferência (1912) e Observações sobre o Amor de Transferência
(1914), quando Freud conceitua a transferência como uma manifestação
do inconsciente que permeia qualquer relação humana, destarte, é um
fenômeno que está presente na relação professor-aluno.
[...] Revelada no campo específico da relação médico-paciente, Freud se deu conta da
constância com que a transferência também ocorria nas diferentes relações estabelecidas
pelas pessoas no decorrer de suas vidas. Entendida como a repetição de protótipos infantis
vivida com uma sensação de atualidade acentuada, nada impede que a transferência se
dirija ao analista ou a qualquer outra pessoa. (KUPFER, 1989, p. 88)

Desde que Freud definiu o conceito do inconsciente (1905) e nos fez


conhecer uma outra dimensão “psi” que interfere nos comportamentos,
nas atitudes, na visão de mundo e no equilíbrio emocional do sujeito e
nas relações com o ambiente, a transferência está presente como um dos
conceitos fundamentais da psicanálise.

O ser humano, espécie animal dotada da condição de linguagem e


pensamento, reveste-se de uma estrutura psíquica (de afetos, sentimen-
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O campo transferencial

tos, significados, sentidos e desejo) com inúmeras formações inconscientes.


Essas formações lhe concedem uma existência singular, particular, única e com
efeitos no seu modo de existir, nas relações intra e interpessoais. Propiciando,
por consequência, uma maneira peculiar de interação do sujeito com seu am-
biente social.

Por tais razões, considera-se que as relações humanas estão recheadas de


significações “psi” que transparecem no comportamento, na atitude, na visão
de mundo, no modo de perceber as coisas ao redor, porque eles se encontram
vinculados aos significados e sentidos dados às experiências pessoais, à história
de vida. Essas experiências significativas envolvem o existir do humano como
um todo, dando significados e sentidos inesperados e ignorados a gestos, a pa-
lavras, a sonhos, a erros, a tristezas, ao trabalho, ao aprender e ao ensinar que, à
primeira vista, nada têm de significativo para cada um de nós.

Os significados e sentidos simbólicos construídos por efeitos das relações


com as pessoas também vão se manifestar no ambiente escolar, ou melhor, o
professor tem uma percepção, um saber inconsciente sobre seu aluno que inter-
fere nos processos de ensino-aprendizagem, ainda, o adulto construiu historica-
mente uma mentalidade sobre a criança que diz das interpretações subjetivas
ao lugar (de pertencimento e reconhecimento) dado à infância.

A psicanalista Kupfer (1989, p. 79) remete a questão a Freud e endossa sua


posição, citando:
Freud, por sua própria posição frente ao conhecimento, gostava de pensar nos determinantes
psíquicos que levam alguém a ser um desejante de saber. Nessa categoria, incluem-se os
cientistas, que devotam a vida à pergunta por quê, e às crianças que, a partir de um determinado
momento, bombardeiam os pais com por quês.

Quer dizer, interrogam o outro acerca de questões particulares na busca do


saber.

Essa fase é descrita no senso comum como a “fase dos porquês” e verifica-se
que, por vezes, é difícil ao adulto/educador acolher essa fase da criança/aluno,
sendo esta rotulada de “chata”, “entediante”, “metida a adulto”. O que o adulto
não percebe é que sustentar, dar lugar a essa “fase” da criança vai favorecê-la a
desenvolver o pensamento reflexivo-crítico, a condição opinativa e a tomada de
decisão, importantes marcas para a vida adulta.

Essa posição questionadora da criança, seguindo o pensamento freudiano, a


conduzirá, também, no seu processo de escolarização, quando inicia sua busca
pelo desejo de saber, de conhecer e de aprender. Nesse momento, será acompa-

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O campo transferencial

nhada pelo educador, que lhe fornecerá as experiências escolares significativas


para o seu aprender.

Entendendo-se a função do educador como mediador do conhecimento e


que o aluno traz ao contexto da relação professor-aluno suas compreensões e
elaborações próprias.

A criança começa a desvendar o mundo das letras e dos números, ou melhor,


estará aprendendo com a parceria do adulto/educador. Tem-se aqui um marco
da contribuição da teoria psicanalítica. Para Freud, a capacidade cognitiva do
homem decorre do processo de significação e sentido psíquico inconsciente;
para além de uma maturação orgânica, as relações com os objetos e o ambien-
te social é que de fato importam. Pois dizem de como as experiências estão
sendo significadas e qual o sentido inconsciente que a criança/aprendiz dá a
elas.

Para Freud, esse processo começa quando a criança “quer saber sobre algo”,
interroga a existência humana, de onde eu vim? Para onde eu vou? Quem eu
sou? No momento que desperta para a diferença entre os sexos, o homem e a
mulher, quando faz distinção de gênero, analogias, ordenações, classificações,
entre outras operações mentais lógicas.

A descoberta da diferença sexual anatômica pela criança é ainda reconhecida


pelo adulto, que faz marcações claras do que pertence ao campo do homem e
da mulher. Como exemplo, lembremo-nos das atividades esportivas na escola,
nas quais o futebol é para meninos, lugar de menina é na arquibancada como
torcedora. Os brinquedos e brincadeiras são outros exemplos que, sem dúvida,
delimitam a diferença entre os sexos. As crianças vão estender essas diferenças
ao mundo das letras e dos números e às relações interpessoais ao seu redor e
concluirão, para si mesmas, que as pessoas pensam, escolhem e fazem coisas
diferentes umas das outras.

Após essas considerações, podemos levantar a seguinte questão: o que é


aprender para Freud? Kupfer (1989) diz que aprender, para a Psicanálise freu-
diana, supõe a presença de um outro, de um professor, colocado numa de-
terminada posição. Sendo assim, o ato de aprender sempre pres­supõe uma
relação com outra pessoa. Aprender é aprender com alguém num espaço
transferencial educativo em que o educador é quem acolhe, que oferece ao
aluno o lugar de aprendiz, e que reconhece nos seus questionamentos, per-
guntas e comentários, a possibilidade de construir o desejo de saber, de co-
nhecer e de aprender.

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O campo transferencial

Aprender com o professor


Nesse ponto, iremos destacar a partícula “com”, pois é importante para o tema
que desenvolvemos, a Transferência e a Ação Educativa. Para Freud, o trabalho
inicial do professor deve ser com o estabelecimento do campo transferencial de
trocas subjetivas entre professor e aluno. Esse é o campo relacional e essencial-
mente característico do ser humano. Considera-se que a subjetividade refere-se
à capacidade do sujeito de perceber o sentido, de fazer alguma coisa com ele
e de produzir outro sentido, quer dizer, a cada encontro do sujeito com outro
sujeito, abre-se a possibilidade de um sentido novo.

A partir do exposto, sugere-se ao professor que antes da apresentação do


conteúdo correspondente à disciplina e ao plano de ensino previsto, o profes-
sor deve dirigir sua atenção para a dimensão psicológica subjetiva que se ca-
racteriza por estabelecer a relação de vínculo, de confiança e de empatia entre
professor/aluno. Segundo Kupfer (1989, p. 87), “por isso, pode-se dizer que, da
perspectiva psicanalítica, não se focalizam os conteúdos, mas o campo que se
estabelece entre o professor e seu aluno, que estabelece as condições para o
aprender, sejam quais forem os conteúdos”. De onde podemos concluir que o
que importa é a relação com o aluno, o que importa é o campo do discurso (da
linguagem, das palavras) entre professor e aluno.

Sigmund Freud (1969, p. 286), num discurso proferido no ano de 1914, em


comemoração ao 50.o aniversário de fundação do colégio em que estudou dos 9
aos 17 anos, em Viena, diz:
Minha emoção ao encontrar meu velho mestre-escola adverte-me de que, antes de tudo, devo
admitir uma coisa: é difícil dizer se o que exerceu mais influência sobre nós e teve ­importância
maior foi a nossa preocupação pelas ciên­cias que nos eram ensinadas, ou pela personalidade de
nossos mestres. É verdade, no mínimo, que esta segunda preocupação constituía uma ­corrente
oculta e constante em todos nós e, para muitos, os caminhos das ciências passavam apenas
através de nossos professores. Alguns detiveram-se a meio caminho dessa estrada e para uns
poucos – por que não admitir outros tantos? – ela foi por causa disso ­definitivamente bloqueada.

Destarte, compreendemos que isso se configura, no mundo atual, num


grande desafio à educação e ao educador. Desse modo, refere-se à formação
profissional do professor, a qual deve estar atualizada à luz das novas concep-
ções, decorrentes do desenvolvimento no campo da Ciência e da Filosofia, ocor-
rido no século XX.

Segundo o autor Nóvoa (1999, p. 178):


o professor vive com grande intensidade este período da sua existência, mas o sentido dos
caminhos que percorre pode ser diferente. Tenta ocupar plenamente o seu espaço de trabalho

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e se forem encontradas vias de aprofundamento da profissão – na gestão da escola, em tarefas


de formação pedagógica, através da colaboração em experiências inovadoras – o professor
poderá desenvolver um trabalho intenso, diversificado e enriquecedor, de forma gratificante
pela retribuição afetiva e pelo significado social encontrado.

Outro ponto essencial a ser considerado é a escola, a qual, para estar atualiza-
da com o seu tempo, terá que ser reconstruída. E, por quem? Fundamentalmen-
te, por educadores.

Esse desafio constitui uma mudança de paradigma do processo pedagógico,


que se inicia por meio da atitude reflexiva do educador, interrogando-se sobre
o desejo de saber do aluno em sua relação com o seu desejo de ensinar; assim,
deverá (des)construir as próprias concepções, (re)definindo-as, dando outra di-
reção e buscando novos objetivos e, principalmente, outros significados para as
práticas pedagógicas, pois as interpretações que o professor faz desse encontro
professor-aluno interferem no processo ensino-aprendizagem e isso significa
dizer que estamos todos ligados pelo fato de o que o outro é, em relação a nós.

Um dos maiores desafios para o educador é a constante atualização da sua con-


cepção de “conhecimento”. Segundo o filósofo Edgar Morin (1999), atualmente, o
conhecimento significa um processo de construção contínuo, significa saber-poder
reorganizar as informações no seu contexto, ao todo ao qual pertence. Quer dizer,
contextualizar o conhecimento, conferindo-lhe significado e sentido ao sujeito.

Desse modo, construir uma educação que possibilite enlaçar os conhecimen-


tos às políticas sociais significa construir para a prática da cidadania, com a res-
ponsabilidade social do eu com o outro; ou melhor, que permita aprendizagens
significativas ao sujeito que aprende e ao sujeito que ensina.

O campo de transferência
A transferência, dependendo do seu manejo pelo professor, permite que o
aluno apresente um particular interesse pelo mestre e pelo saber; o professor
pode acreditar imaginariamente que tenha o poder sobre o saber do aluno. Isso
produz um efeito imaginário e põe o aluno a trabalho, a produzir lembranças e
a fazer associações. O que se transfere, na relação com o outro, são imagens que
se relacionam com as antigas vivências significativas com outras pessoas, espe-
cialmente com as figuras materna e paterna.

A transferência, sendo um conceito fundamental da teoria psicanalítica e


sendo também uma experiência do particular, faz pensar sobre o lugar do profes-
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sor – suporte dos fenômenos de transferência na relação interpessoal. Entende-


-se a transferência como sendo “aquilo que se transfere”, que se movimenta, que
adquire outro sentido, quando se desloca de um lugar para outro, ou melhor,
quando se deslocam os afetos e os significados da história de vida de cada um.

No espaço da relação transferencial professor-aluno, Almeida (2002, p. 97) diz:


[...] o que está em jogo é o que representa este ou aquele aluno no inconsciente do professor,
na sua constelação de insígnias, e de que lugar, imaginário ou simbólico, ele responde ao
desejo de saber do aluno ou à sua obstinação de nada querer saber.

Ainda, a transferência constitui condição de trabalho para o professor, mas


também é o que obstaculiza o trabalho. Vamos ilustrar esse conceito com um
belíssimo texto retirado do livro Sonhos de Transgressão, de Fátima Mernissi
(1996, p. 237), que narra o seguinte momento:
Naquela tarde memorável, tive a estranha sensação de que alguém estava manipulando o
crescimento de asas ou incutindo visões de voos no pátio aparentemente tranquilo.

Mas quem estaria efetuando a magia? Calei-me, apurei os ouvidos e olhei em volta. As
mulheres, absorvidas nos seus bordados, estavam divididas em duas equipes. Cada uma
concentrava-se, em silêncio, fixando a atenção no seu próprio desenho. Mas, quando se fazia
esse tipo de silêncio completo no pátio, significava que uma guerra sem palavras estava em
andamento. E quem olhasse atentamente para os projetos de bordados saberia em torno
do que se estava travando tal guerra: o eterno conflito entre o taqlidi (tradicional) e o asri
(moderno). Chama e mamãe, representantes do lado moderno, estavam bordando um objeto
que fugia aos modelos convencionais e parecia a asa de um grande pássaro, estendida em
pleno voo. Não era a primeira vez que se inspiravam num pássaro voando, mas o impacto
da imagem continuava forte como sempre, porque o outro lado, tendo à frente a avó lalla
Mani e lalla Radia, havia condenado a obra, como o havia feito em relação às anteriores, sob a
alegação de que não ficava bem para suas criadoras escolher semelhante tema. O desenho do
outro lado era sobre um tema tradicional. Tia Habiba estava do lado tradicional, trabalhando
com a equipe no mesmo mrema (tear), mas somente porque não podia se permitir declarar-se
abertamente revolucionária. Bordava em silêncio, metendo-se com a sua (modesta) vida.

Assim, deslocam-se na transferência significados e sentidos, quando o desejo


se liga a um elemento muito particular, que ocorre de um lugar a outro, dos
sonhos da modernidade aos bordados revolucionários, os quais movimentam-
-se na obra de suas autoras.

Nas relações educacionais, constata-se, então, que o professor se apropria


desse lugar especial onde o aluno o coloca, inconscientemente. Acreditando ser
essa pessoa especial para o aluno, verifica-se o poder atribuído ao professor, esta-
belecido nesse campo de relação transferencial. Na leitura de Kupfer (1989, p. 92):
“O desejo transfere sentido e poder à figura do professor, que funciona como mero
suporte esvaziado de seu sentido próprio enquanto pessoa”.

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Do lado do aluno constata-se que o que quer do seu professor na relação


transferencial é que ele suporte esse lugar vazio e permaneça ali onde o colocou,
mas, acreditem, não é nada fácil estar aí. Devemos lembrar que esse professor é,
também, um sujeito marcado pelo seu desejo inconsciente, por suas histórias de
vida. Sendo assim, na posição de mestre, tenderá a abusar do lugar que ocupa,
submetendo seu aluno, impondo-lhe suas próprias concepções, valores e mode-
los preconcebidos do aluno idealizado. Isso significa que o encontro professor-
-aluno se dá nesse cenário das formações inconscientes de significados e senti-
dos; o que quer que seja dito e comunicado ali, será interpretado por eles, desde
esse lugar suposto no outro, no espaço da transferência.

Mais uma vez salientamos que as pessoas estão enlaçadas umas às outras na
transferência, que se caracteriza por:

 ser uma manifestação inconsciente;

 acontecer nas diferentes relações entre as pessoas decorrentes dos laços


afetivos que tiveram ou têm com o outro;

 ser uma repetição de protótipos, de imagos infantis, vividos com uma sen-
sação de atualidade acentuada;

 o professor poder tornar-se a figura a quem são endereçados os interesses


de seu aluno, porque é objeto de uma transferência. E o que se transfere
são experiências vividas primitivamente, nas relações parentais;

 buscar-se a atualização de significados e sentidos dados à história pessoal


na relação transferencial professor-aluno;

Na relação professor-aluno, a transferência se produz quando o desejo de


saber do aluno se apega a um elemento particular que é a pessoa do professor.

A partir do exposto, entendemos que a forma pela qual o educador responde


ao laço transferencial, na sua relação com o aluno, é fundamental para que ele
possa realizar seu desejo de saber e seu trabalho de aprendiz. Finalmente, tomar
a transferência no espaço educativo significa que o professor, ao confrontar-se
com o aluno, deve sempre colocar a seguinte interrogação: como eu sou na re-
lação com o outro meu aluno?

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Texto complementar

A passagem dos anos e o percurso profissional


(NÓVOA, 1999, p. 178-191)

O progressivo domínio das estruturas de trabalho, a segurança decorrente


da estabilidade no emprego e da permanência numa escola facilitam, numa
segunda fase da carreira, a transferência das preocupações dominantes para
as tarefas pedagógicas centradas, principalmente, nos alunos. Assim, a ques-
tão que agora se põe é: como é que se deve ser para os conseguirem... Como
em outras profissões, os professores do grupo etário dos trinta anos parecem
viver um fenômeno de apropriação das múltiplas dimensões do trabalho e
das suas regras, procuram descobrir e experimentar as suas competências,
redimensionam as suas aspirações, comportam-se de maneira a afirmar-se, a
fazer reconhecer a sua identidade profissional.

Nessa idade, sente-se já o tempo correr e, se na fase anterior era domi-


nante a preocupação pelo futuro a construir, agora é a forma de ocupar ple-
namente o presente que mais importa; se ontem se refletiam as finalidades
do trabalho, hoje pensa-se mais nas modalidades de ação.

Sentimentos de autonomia, ambição, segurança, competência, expan-


são, extroversão marcam as relações do indivíduo consigo mesmo, com
os outros, com a profissão. O professor vive com grande intensidade esse
­período da sua existência, mas o sentido dos caminhos que percorre pode
ser diferente. Tenta ocupar plenamente o seu espaço de trabalho e se forem
encontradas vias de aprofundamento da profissão – na gestão da escola, em
tarefas de formação pedagógica, através da colaboração em experiências
inovadoras – o professor poderá desenvolver um trabalho intenso, diversi-
ficado e enriquecedor, de forma gratificante pela retribuição afetiva e pelo
significado social encontrado.

Num outro sentido, a mediocridade das condições de trabalho, os efeitos


frustrantes da rotina e da normalização impostas (pelos programas, pela rigi-
dez da compartimentalização de tempos e de espaços, pelos processos estere-
otipados de trabalho e de avaliação institucional aceitos etc.) ­associam-se aos
problemas resultantes do baixo nível remunerativo, às múltiplas solicitações

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exteriores, e levam o professor a responder às suas necessidades de afirma-


ção e de expansão fora da escola. À escola dá-se, nessas situações, apenas o
mínimo essencial à manutenção de uma imagem de competência profissional
restrita – rotinizam-se as aulas, repetindo, ano após ano, os mesmos esque-
mas, transmitindo/impondo os conteúdos dos programas escolares, seguindo
acriticamente o manual, classificando/hierarquizando/selecionando os alunos
– e o essencial da atividade desenvolve-se noutros locais: são as explicações,
os colégios, a elaboração de compêndios, as múltiplas ocupações permitidas
pela formação específica (Engenharia, Contabilidade etc.) ou até a venda de
computadores, joias, vestuário, compondo o ordenado: o núcleo central de
interesse e de investimento pode apenas deslocar-se para a vida familiar e
social, confirmando a imagem do professor como sendo um semiprofissional.
Essa situação é, em geral, vivida com sentimentos de desencanto e ceticismo e
traduz-se em atitudes desculpabilizantes, de fechamento em relação às neces-
sidades e às possibilidades reais de intervenção e mudança na escola, de opo-
sição passiva, desencorajante, implícita nas atitudes, aos esforços de inovação
desenvolvidos por colegas e por outros atores da cena escolar.

A fuga à escola, às condições limitadoras da profissão, que se concre-


tiza, nessa fase, por um progressivo desinvestimento, mas que mantinha
a presença do docente no espaço escolar, tende hoje a fazer-se de outra
forma, aproveitando as múltiplas solicitações de diferentes organismos
(universidades, museus, bibliotecas, autarquias, gabinetes de estudo etc.)
que reconhecem a competência científica e/ou pedagógica de professores
jovens e/ou procuram beneficiar-se da sua disponibilidade e das facilidades
de recrutamento [...].

Tentar diversificar o trabalho, procurar dimensões mais criativas e en-


riquecedoras para a atividade cotidiana, talvez contribuir para recompor
a imagem diminuída da profissão – mostrar que se é capaz de fazer outra
coisa – são os objetivos confessados dessa tendência para a fuga às rotinas
do espaço escolar. No entanto, as expectativas em relação a essa opção são
ambíguas porque se reconhece que a situação de colocação nesses organis-
mos, sendo precária, associa-se à consideração negativa do estatuto docente
para colocar o professor numa posição de sujeição facilitadora da apropria-
ção por outros da autoria das suas realizações. Por outro lado, as condições
de regresso à escola, quando se sai por uns tempos para fazer outra coisa,
também parecem envolver alguns problemas. Se muitos professores gosta-

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riam de sair, mas apenas alguns têm essa oportunidade, não estaremos pe-
rante mais uma situação assimétrica geradora de conflitos não explicitados?
Que expectativas e receios moldarão as atitudes de uns e outros? Que efeitos
bloqueadores terão nas relações de trabalho?

O mesmo rigor afirmativo se manifesta em procurar, longe da escola,


corresponder a uma necessidade de realização criativa e enriquecedora, ou
a descobrir, no espaço escolar, áreas de expansão e desenvolvimento; isso
se pressente nas críticas às estruturas mestras do sistema de ensino. Assim,
alguns professores, tendo eles mesmos passado por uma experiência de
aprendizagem participada e ativa (por exemplo: investigação em trabalho
de grupo no secundário ou superior, formação inicial integrada), sentem-se
seguros para fazer críticas, ou comparações, que rompem o discurso come-
dido, aparentemente consensual, que funciona na escola [...].

Vivemos um tempo de fascínio pela imagem, pelo espetáculo que parece


captar-nos, envolver-nos no movimento, no efêmero, esvaziando memórias,
quebrando o sentido das coisas que garantiam estabilidade e segurança.

A vida cotidiana esconde-se concreta e dramática atrás das aparências; a


consciência da imprevisibilidade, a percepção de que muitos processos esca-
pam à capacidade de intervenção do homem comum condiciona o desejo de
participação, reprime a vontade de intervenção do homem comum, reprime
a vontade de indignação, convida ao isolamento, ao retorno ao mundo estrei-
to das relações imediatas e superficiais, da valorização dos objetos e da sua
posse. Sistemas de informação poderosos difundem representações seduto-
ras e tranquilizantes do mundo e da sociedade, embora, um pouco por todo
o lado, explosões de violência invadam a cena, impondo verdades, atestando
contradições, alertando para pontos de ruptura anunciados para o futuro.

A desordem, a complexidade desse tempo de mudança, de passagem,


insinua-se na escola, revela-se na fluidez do ambiente que nela se vive, na di-
versidade de mensagens que se captam no cenário dos seus espaços, na evo-
lução, por vezes contraditória, das relações partilhadas pelos protagonistas.

O sistema de ensino herdou do passado o fechamento à diversidade, o


elitismo, a submissão aos formalismos sociais e acadêmicos, o sentido da tra-
dição e da continuidade. Adapta-se mal à modernidade, à necessidade de
alargar e generalizar a formação a todos, de aceitar e de gerir novos saberes;
por desvios, gerou a massificação, a regularidade e o conformismo.

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O professor vive, no seu cotidiano de trabalho, as contradições que pres-


sente, mas que não tem espaço para esclarecer nem oportunidade de apro-
fundar; atormentam-no inquietações que não partilha porque tem medo de
perder a face, de fragilizar a imagem de sucesso que procura compor.

O ofício de professor conduz a pessoa, o profissional, a comprometer-se


com um discurso que celebra os valores da democratização, da cooperação
e da solidariedade, mas lhe exige também que atue hierar­quizando, sele-
cionando, impondo a concorrência e a competição. É nesse contexto ­social,
cruzado com o seu mundo profissional, que, no nosso estudo, procuramos
situar o professor do ­ensino secundário, considerando que aquilo que diz e
faz é mediatizado pelo seu corpo, pelos seus afetos, seus sonhos, seus fan-
tasmas, suas convicções.

A identidade profissional construída em interação com o universo de tra-


balho, modelada pelas suas regras e pelas representações que o estruturam,
mantém um núcleo genético central que o mundo da vida contribui para
enriquecer e aperfeiçoar. Por outro lado, inscrevem-se no ofício de professor
e na maneira pessoal de o habitar múltiplos fatores sociais e institucionais
que, interatuando, orientam percursos profissionais por meio de configura-
ções próximas, linhas semelhantes de evolução. Com traços comuns a esses
percursos, o nosso estudo permitiu-nos destacar:

 as condições iniciais da profissão são, em geral, de insegurança, de


instabilidade e de sobrevivência. Tornam-se geradoras de ansie­dade,
opressivas, alienantes, multiplicadoras de receios e desconfianças,
opondo-se às necessidades reais de um desenvolvimento vocacional
harmonioso. Mantêm-se no arquivo da memória e podem ser (re)atu-
alizadas ao longo do percurso profissional nos períodos de questiona-
mentos, de tensão, de procura de reajustamento na vida;

 a estrutura da carreira profissional, como em outras profissões, não


considera as necessidades intrínsecas de desenvolvimento pessoal
– diferenciado, mas potencialmente equivalentes em todas as ida-
des – e por isso dificilmente se ajusta à evolução da estrutura de
vida. No entanto, desde o início da carreira, é possível distinguir
duas linhas orientadoras do sentido dado à profissão que parecem
aprofundar-se e distanciar-se significativamente, por volta da crise
da meia-idade;

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 uma que se caracteriza pela valorização dos aspectos burocráticos,


pelo sentido de continuidade e de aceitação resignada das disposi-
ções hierárquicas; manifesta-se pelo isolamento na ação pedagógica,
conduz ao fechamento em relação às mudanças, a um certo ceticis-
mo e ressentimento em relação aos outros, à amargura em relação à
profissão, à crença em determinismos cegos no desenvolver das situ-
ações;

 outra, que encontra sentido na inovação, no acolher da diversidade, e


se alicerça na partilha, nas experiências e no trabalho, no questiona-
mento das situações; caracteriza-se pela capacidade de contextualizar
os acontecimentos e os fatos, de perceber os olhares dos outros, pela
vontade de intervir nos processos, pela persistência na apropriação de
conhecimentos favoráveis ao desenvolvimento profissional;

 a forma mais feliz de prosseguir a carreira parece decorrer, como nou-


tras profissões, de: estar atento e aceitar a aventura, os riscos, os desa-
fios; considerar e prosseguir grandes metas finais, distinguindo-as dos
objetivos realizáveis a curto prazo; manter um certo grau de liberda-
de; analisar a experiência própria e reconhecer o valor dos erros e dos
acertos; escutar e reconhecer a razão dos outros; repensar a sua vida
e reviver cada dia.

A identificação desses traços gerais não contradiz a existência concreta


do cruzamento de múltiplas dinâmicas, delineando a configuração da vida
profissional de cada um, resultantes de circunstâncias pessoais, familiares,
institucionais. Assim, embora se reconheça a estreita articulação entre os
percursos profissionais e múltiplos contextos nos quais ganham sentido, não
parece que se possa aceitar que os fatores restritivos (a centralização burocrá-
tica, a esclerose dos currículos e programas, a falta de estímulos na carreira,
as más condições de trabalho, por exemplo) funcionem como determinantes
absolutos das respostas. À função docente se facilitará a desocultação das
condições reais de trabalho, se permitirá a conscientização dos processos e
a aquisição das chaves teóricas da sua explicação, se criarão, assim, as con-
dições para gerir e ultrapassar dificuldades. A clarificação dos mecanismos
que estão em jogo nas situações concretas pode estimular a mudança de
relações e das práticas e incentivar o professor a investir no sentido da trans-
formação da sua própria realidade.

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De há muito que se defende que a escola é uma instituição conservado-


ra, que funciona em conformidade com o instituído, procurando preservar
valores, costumes e representações. Mas sabe-se, também, que é uma orga-
nização que, visando à continuidade e à coerência, é ainda capaz de abrigar
contradições e conflitos pela introdução de novas ideias, um espaço onde a
mudança penetra difusa, mas persistente, através da afirmação dos prota-
gonistas, onde, em resumo, os indivíduos estão em ato, negociando os seus
projetos, tendendo a fazer viver e evoluir a própria estrutura institucional.

É essa dimensão dinâmica da escola que a pode perspectivar em termos


de devir, que importa valorizar quando se reconhece o esgotamento, a todos
os níveis, dos modelos burocratizados de organização hierarquizada e es-
tritamente regulada, vitimados pelo seu próprio fechamento que não lhes
permite acompanhar o ritmo vertiginoso das mudanças tecnológicas e so-
ciais. Perante a complexidade crescente, os sistemas, como o que a escola é,
devem flexibilizar-se, diferenciar organicamente as suas estruturas e aligeirá-
-las, fazer fluir a informação, aprofundar e dialetizar as relações. É nesse
quadro que pensamos o futuro do complexo ofício de professor como agente
social, favorecendo pela sua ação esclarecida e interventiva o que permite o
nascimento de uma cultura, de uma nova ordem: procurando elaborar novas
e consistentes significações; utilizando a criação e o imaginário na reformali-
zação da sua atividade; fazendo prevalecer princípios de organização claros,
abertos, flexíveis, nas relações entre as pessoas, na relação da escola com o
conhecimento e na concepção da forma de se situar no mundo.

Dica de estudo
NUNES, Marcia Regina Mendes. Psicanálise e Educação: pensando a relação
professor-aluno a partir do conceito de transferência. Colóquio do LEPSI do IP/
FE-USP, jun. 2006.

Esse texto decorre da pesquisa de mestrado da autora, que teve por objetivo
contribuir para a área da educação, destacando a importância de o professor
conhecer a relação transferencial, a função de saber que ocupa nessa relação
perante o aluno. Visa elucidar acerca da transferência na relação professor-aluno
e o poder que o professor tem nas mãos como um interlocutor privilegiado.

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Atividades
1. Tomamos a inspiração do grande poeta Fernando Pessoa, com seu heterô-
nimo1 Ricardo Reis, e ressaltamos que o pensamento é emoção, é paixão, é
criação. O leitor há de perceber o estilo genial de Pessoa, uma das figuras
mais importantes e curiosas da literatura. O poema a seguir descreve sobre
um dos aspectos da dimensão psicológica a ser considerado na prática edu-
cativa. Explique-o.

Odes escolhidas
Ricardo Reis

Sim, sei bem


Que nunca serei alguém.

Sei de sobra
Que nunca terei uma obra

Sei, enfim,
Que nunca saberei de mim. Sim, mas agora,
Enquanto dura esta hora,
Este luar, estes ramos,
Esta paz em que estamos,
Deixem-me crer
O que nunca poderei ser.

1
Heterônimo: (em Literatura) nome imaginário que um criador identifica como o autor de obras suas e que, à diferença do pseudônimo, designa
alguém com qualidades e tendências marcadamente diferentes das desse criador. (HETERÔNIMO. In: HOUAISS. Rio de Janeiro. Objetiva, 2004) .

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2. Retire do texto desta aula três pontos que justificam o campo transferencial
e a ação educativa.

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Gabarito
1. O poema trata da dimensão psíquica humana inconsciente, sua subjetivida-
de, os sentidos e os significados dados em consequência das relações com o
outro. Por subjetivo, considera-se a capacidade do sujeito de perceber o sen-
tido, de fazer alguma coisa com ele e de produzir outro sentido, quer dizer, a
cada encontro de sujeito com o outro, abre-se a possibilidade de um sentido
novo, isso vai se dar num campo de transferência (sujeito com sujeito).

2.

 No campo da relação transferencial, proposto pela psicanálise, o que está em


jogo é o que representa este ou aquele aluno no inconsciente do professor.

 Transferência como um conceito fundamental da teoria psicanalítica trata


da experiência do particular, faz pensar sobre o lugar do professor como

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O campo transferencial

suporte de transferência na relação com o aluno; o desejo do aluno deve


aflorar em detrimento ao desejo do professor.

 Transfere-se (inconsciente) na relação com o outro as imagens que se relacio-


nam com as antigas vivências (de significados e sentidos) com outras pesso-
as, especialmente com as figuras significativas afetivo-emocionalmente.

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O desafio da diferença

Irene Carmem Piconi Prestes


Educar criativamente é dar oportunidade a pessoas e grupos de pensar e agir em
constante diálogo, sentindo e fazendo emergir o verdadeiro aprendizado, que consiste na
descoberta daquilo que já sabemos.

Ortiz

Iniciamos este texto com a descrição de uma situação comum viven-


ciada em sala de aula que revela modos de interação professor-aluno, e
que serve como situação mobilizadora para nossas reflexões sobre o tema
desta aula.

Esta é a descrição de uma aula de Matemática na Educação Fundamen-


tal. Nesse exemplo, vemos a dificuldade que enfrenta o professor em re-
fletir com seus alunos sobre a situação problemática que se apresenta à
sua frente.

O professor Neil, após a exposição do conteúdo, solicita que os


alunos resolvam o problema que está no quadro-negro. Um dos
alunos dispõe-se a resolvê-lo no quadro, enquanto outro aluno re-
solve sozinho e comunica ao professor que o resultado foi o mesmo,
embora o caminho utilizado tenha sido diferente daquele encontra-
do pelo seu colega. Imediatamente, questiona o professor sobre o
método que utilizou, se está certo ou errado, como fica a solução do
problema. O professor diz qualquer coisa que não parece ter conexão
com a questão do aluno e esse vai ao quadro resolver o problema do
seu jeito. Observa-se que o aluno volta ao seu lugar e o professor con-
tinua seu trabalho de circular pela sala para verificar como os outros
estão resolvendo o exercício. Outra aluna diz que não sabe resolver, e
o professor esclarece que ela decorou um modo de fazer o exercício e
agora que está diante de algo diferente do que ela sabe, tem dificul-
dade de encontrar a solução para o problema, ficando paralisada, sem
encontrar a resposta, e assim segue a aula. O professor tira a dúvida do
aluno, mas não há o acolhimento ao aluno, não há um diálogo entre

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O desafio da diferença

eles sobre as possíveis soluções do problema, nada que lembre uma atitude
de motivação, inquietação, curiosidade, que aponte para o desafio diante da
situação-problema.

Tomando esse caso a partir da dimensão “psi”, do campo subjetivo presente


nas relações intra e interpessoais, temos que o estilo e a direção do trabalho
do professor às questões de seus alunos não exploram com eles as situações
problemáticas. O professor não parece estar preocupado em refletir sobre a sua
ação educativa, pois tem respostas estereotipadas. Não está disponível a refletir
com o aluno que está ali com ele, a pensar sobre a atividade junto ao aluno.

Salientamos que o mundo atual tende a negar a subjetividade, os aspectos


afetivos e emocionais de cada pessoa, valorizando os processos da consciência,
do eu, que exigem respostas rápidas e, rapidamente, as coisas estão sendo su-
peradas. Parece-nos que cabe como tarefa da Educação e, como um desafio à
prática do educador, criar momentos em que o desejo do aluno possa aflorar,
oferecendo-lhe oportunidades de reflexão, de reconhecimento, de valorização
de sua opinião para que se envolva e se implique com o “seu aprender” e valo-
rize a riqueza da experiência do conhecer. Isso nos confirma Vitkowski (2000,
p. 151) quando discute a formação profissional do professor:
[...] denominado prático-reflexivo, propõe formar um profissional que se torne capaz de
refletir na e sobre a sua prática, refazendo inclusive os processos que orientam a sua reflexão.
Busca-se, desse modo, ressignificar e valorizar a riqueza da experiência que reside na prática
dos professores [...]”

Dessa maneira, diríamos ao prof. Neil que é competência do educador refletir


permanentemente sobre a relação professor-aluno e o sucesso no ensinar e no
aprender e, ainda, que a missão do educador tem a ver com a estrutura da edu-
cação, com a concepção de ser humano.

Como nos indica Aquino (2002, p. 16) “às instituições sociais, incluindo as es-
colas, pouco restaria além de sofrer na pele as influências advindas das esferas
maiores, em especial do modelo econômico. Daí a cadeia de inevitáveis exclu-
sões, violências, malogros.”

Finalmente, verificamos que há interdependência de muitos aspectos pre-


sentes nos ditos problemas educacionais: fracasso e evasão escolar, violência e
indisciplina escolar, distúrbios de aprendizagem e de comportamento.

Outro ponto a refletir do caso citado é o modo de avaliação do professor Neil.


O nosso sistema educacional apresenta uma dinâmica de funcionamento que
predetermina e orienta a continuidade do processo de escolarização, em todos
os níveis, desde a Educação Fundamental até a Educação Superior, por meio de

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O desafio da diferença

provas de competência às quais o aluno deve se submeter para obter o sucesso


e a ascendência na escolarização. Dar provas da competência é determinante
para a aprovação escolar. Esses determinantes encontram-se organizados na
proposta curricular, nos planos de ensino, nas avaliações e nos planos de aula.
Assim, a ação educativa está sustentada no ideal de controle do tipo “eu (edu-
cador) sei o que você (aluno) deve saber”, que marca as práticas educativas e o
cotidiano relacional na sala de aula.

Dessa maneira, a prática pedagógica prevê que o ensino tem por objetivo
transmitir os ­conteúdos necessários que garantam a continuidade do processo
de escolarização do aluno. Após o que lhe foi ensinado, o que o aluno aprende?
Para o professor ter certeza de que ensinou e de que o aluno aprendeu, impõe
um certo número de avaliações. Vamos refletir! Se o aluno não aprendeu o que
se ensinou, nem por isso ele aprendeu errado. Pode ter aprendido o certo, só
que a prova não quer que ele diga o que aprendeu, mas tão somente o que
o professor pretendeu ensinar. O que há, então, é uma questão de posição, de
lugar subjetivo do professor e do aluno frente ao objeto do conhecimento. Na
posição de aprendiz em que está o aluno, ele não terá a ­oportunidade de provar
o que aprendeu, porque o que o professor lhe exige é que ele dê provas sobre o
que lhe foi ensinado; de certo modo, que demonstre a ­sabedoria do professor.

Queremos aqui fazer um alerta, pois tanto no ensinar, quanto nas avaliações
(provas) que o aluno fará, o que temos, na realidade, é uma aposta.

Nessa perspectiva pedagógica, a base do ensino tem a preocupação com a


coincidência entre ensinar e aprender, desconsiderando, na aprendizagem, os
aspectos sociais e psíquicos envolvidos no processo do aprender.

Desse modo, ficam as atividades educativas impossibilitadas de trabalharem


pela ressignificação dos conteúdos pelo aluno, a partir da relação transferencial
estabelecida com o professor na sala de aula.

Assim, as metas pedagógicas ignoram a realidade da condição humana, que


a teoria psicanalítica aponta, justamente, o caráter essencialmente humano, o
campo relacional em que temos dois sujeitos em interação, professor/aluno.

Por essas razões, vemos que essa lógica favorece a exclusão social, impedindo
a circulação da diferença dos afetos e da singularidade, pois trabalha pelo viés do
ideal de aluno almejado pelo professor. Encontramos, em Azevedo (2003, p. 91),
[...] um reforço para essas considerações. Esse autor diz que: os elementos analisados
demonstram que esse processo reforça as desigualdades sociais e produz uma escola que
trabalha o conhecimento fragmentado, isolado, sem o estabelecimento de nexos entre os
diferentes campos do conhecimento, abstraindo as disciplinas do contexto da totalidade,
das redes onde se articulam as interfaces multidisciplinares, os olhares interdisciplinares e as
sínteses transdisciplinares.

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O desafio da diferença

Ainda, tomando a via “psi“ pela psicanálise, temos que o conhecimento é


apreendido, quase sempre, inconscientemente, mais do que é ensinado. Assim,
os estudiosos entendem que o professor se forma no percurso de sua vida pes-
soal e profissional. E esse é um percurso de formação contínua e, de preferência,
num ambiente de aprendizagem favorável. Essa aprendizagem exige do profes-
sor uma postura, uma atitude reflexiva para o exercício da sua atividade docen-
te. A tarefa educativa almeja uma ressignificação, a ser feita pelo educador, de
sua ação junto aos alunos.

Seguindo nessa mesma direção, as considerações de Azevedo (2003, p. 101)


ilustram essa importante questão, quando diz que:

[...] a gênese da escola está subordinada a [...] concepções, a [...] práticas educativas, cujos
princípios foram (ou são) a essência da formação dos educadores. Os professores aprenderam
em sua história como alunos e em sua preparação profissional nas escolas formadoras que o
professor ensina e o aluno aprende. Mesmo que as instituições formadoras trabalhem com
novas concepções de conhecimento, a falta de reflexão conectada à prática concreta não
repercute nas ações do cotidiano da escola. Dessa forma, em relação à prática docente, ele (o
mestre) continua listando os conteúdos importantes, definindo as estratégias didáticas, como
se seus alunos fossem um conjunto homogêneo. Todos são tratados iguais, mas, infelizmente,
nem todos podem aprender. Não estão preparados, são responsáveis pelo seu próprio fracasso.
O professor não pode parar, tem que dar conta de ensinar o programa de sua disciplina, com
seus conteúdos essenciais, sem os quais o nível do ensino pode cair.

Seguindo essas ideias e o caso apresentado do prof. Neil podemos concluir


que, ainda hoje, as ações educativas do professor, bem como o seu fazer cotidia-
no, parecem ser no sentido de assegurar a possibilidade de sujeição do aluno
à sua figura de mestre ou senhor, também aqui requerida para que a educa-
ção siga ilesa em seus desígnios. Desse modo, reconhecemos apenas o ideal de
aluno e o desejo do mestre, que quer dizer acreditar que é possível educar ou
que, no exercício de ser professor, se é capaz de educar sem perdas e danos.

Para o autor Nóvoa (1999, p. 180)

[...] o professor vive, no seu cotidiano de trabalho, as contradições que pressente, mas que não
tem espaço para esclarecer nem oportunidade de aprofundar, atormentam-no inquietações
que não partilha porque tem medo de perder a face, de fragilizar a imagem de sucesso que
procura compor.

A professora e psicanalista Almeida (2002, p. 99) interroga sobre algumas


questões fundamentais do campo educativo, sobre a posição subjetiva do aluno
e do professor e nos diz que

[...] tomar a criança como aluno-ideal significa, na economia narcísica do educador, colocá-la
no lugar de eu-ideal, investi-la narcisicamente para que ela realize o ideal que ele mesmo não
pode realizar. Por meio de demandas idealizadas, o educador endereça à criança o pedido de
que ela responda do lugar da ordem da perfeição, na ilusão de que é possível.

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O desafio da diferença

Ora, mas será sempre assim? O aluno resistirá sempre a interrogar suas ver-
dades como sujeito de desejo, para que seu professor reine em sua cátedra de
mestre e seja o único a desejar? Até quando o estudante necessitará da indis-
ciplina, da violência, da ironia ou, na mesma ordem, do enquadramento e do
conformismo para anunciar que há uma descontinuidade gritante na relação
pedagógica que lhe cala o desejo?

Encontramo-nos, atualmente, frente a uma crise que será ultrapassada, se


pudermos construir outra postura, um novo estilo de transmissão do conheci-
mento pelo educador, outra relação professor-aluno. Que se coloque a prática
da dúvida, da desconfiança permanente do fazer pedagógico, que se desequi-
libre a certeza das ações escolares e, assim, se dê possibilidades de transformar.
É necessário (re)construir, (res)significar o trabalho docente, por exemplo, apro-
veitando as condições para a melhoria e qualificação profissional e pessoal. Pos-
sibilitando, desse modo, a convivência com a diversidade na aprendizagem e no
campo educacional.

Nessa perspectiva, uma das metas é (re)construir a concepção de conheci-


mento como sendo um processo que se constrói no estabelecimento da relação
eu-outro (professor-aluno), dinâmico e contínuo. O ato do conhecer permite à
pessoa desenvolver suas habilidades e competências para que ela possa colo-
car-se à disposição do outro, identificando-se e interferindo nos problemas e
desafios do seu contexto escolar e social. Tudo isso permitirá ao educador dirigir
o trabalho educativo com a finalidade de resgatar o ser humano como sujeito
sócio-histórico-cultural.

Azevedo (2003, p. 12) lembra que


[...] os educadores, em geral, têm pouca afinidade com a visão dialética da realidade dinâmica,
do contraditório, onde o sujeito que transforma é transformado pela realidade, onde o
conhecimento é um processo mutante, ferramenta-meio para a permanente construção de
novas sínteses.

Alerta-nos, assim, para uma formação de professores atualizada em outras


áreas do saber, como: a Filosofia, a Psicologia, a Sociologia e a Psicanálise, já que
constatamos que a prática escolar é tratada como repasse de informações, me-
morização de conteúdos. Esta impede a compreensão e a construção de novos
modos de relação interpessoal, seja no contexto escolar ou no social. Podemos
argumentar, na defesa da manutenção dessa prática, aspectos como: a globa-
lização, os avanços científicos e a acelerada mudança na tecnologia, o volume
de informações que recebemos diariamente, no qual se apresentam os conhe-
cimentos novos, mas como impossíveis de serem assimilados e transmitidos ao

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O desafio da diferença

ser humano rapidamente, via escolarização. Um outro argumento que sustenta


essa prática é a manutenção de disciplinas isoladas, de níveis hierarquizados de
escolaridade que têm pouca ligação com a vida pessoal dos alunos e com a pos-
sibilidade de responderem às exigências do mundo contemporâneo.

A constante atualização do professor é um caminho para construir um outro


paradigma do fazer pedagógico, de modo a propiciar novas significações, bus-
cando uma educação que estabeleça relação entre o conteúdo escolar e a so-
ciedade, e entendendo que o espaço educacional é essencialmente o espaço
das relações humanas na sua dimensão individual, singular e diferente, como
também coletiva, social e de grupo. Este é, então, o verdadeiro desafio do edu-
cador: o da convivência com a diferença do sujeito, com a diversidade para além
do ideal de aluno.

Seguindo a direção da investigação sobre a posição subjetiva (afetivo-emo-


cional) do professor e do aluno, Almeida (2002, p. 100) dirá que:
[...] quando o professor não responde ao aluno do lugar daquele que tudo sabe, mas sim
daquele que conhece e que toma esse conhecimento não como uma verdade, mas como
uma convicção culturalmente aceita e socialmente compartilhada, o professor ocupa o lugar
de mediador do objeto de conhecimento, o qual marca a entrada de um terceiro na relação
professor/aluno. Somente ocupando este lugar é que o professor tem chances de reverter as
questões imaginárias e narcísicas que se mesclam no campo educativo. Isso implica que o
educador renuncie ao ideal de completude narcísica imaginária e à ilusão de que é possível
gestar por obra dos ideais e normas educativas.

E, com isso, chegamos ao ponto em que o ato de ensinar instala-se não no


campo da moral e sim no campo da ética. Esse debate nos conduz a interrogar
sobre princípios, subjetividade, comprometimento no ensinar e no aprender. O
campo da ética é refletido pela Psicanálise e pela Filosofia. O campo da moral
pertence à religião e às normas de comportamento.

Confirma Nóvoa (2002, p. 23) que “o desafio dos profissionais da área escolar
é manterem-se atualizados sobre as novas metodologias de ensino e desenvol-
verem práticas pedagógicas eficientes”.

Partimos, então, para uma educação em que o educador se reconhece como


incapaz de atender, de corresponder às exigências de perfeição, de previsibi-
lidade, de sucesso, de certezas que o ideal-imaginário sociocultural lhe impõe
constantemente, para atender um aluno real sócio-histórico de carne, ossos e
desejo. Assim, a atividade docente implica a ação de um sujeito em seu mundo
do trabalho e no exercício de uma prática profissional. Uma educação que se
fará contextualizada e refletida permanentemente pelo educador, pela escola

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e pelo sistema educacional. Para isso, a criatividade, o envolvimento e a ima-


ginação se colocam como importantes aliados para o educador. Finalmente, é
preciso lembrar que ensinar nunca foi fácil. A verdade é que se educa pelo que
se é e não pelo que se idealiza. E o desafio ao educador (professor, pai) é acolher
a diferença, o diferente (aluno, aprendiz, o outro).

Texto complementar

A escola como ela é: o aqui-agora escolar


(AQUINO, 2002)

Em junho passado, a Nova Escola recebeu uma carta de duas educadoras


da rede municipal de São Paulo contendo críticas à minha coluna sobre a
segregação dos supostos alunos-problema (“Quando os últimos serão os pri-
meiros”, edição 151, abril de 2002), inspirada na história do rapaz João.

Entre outras considerações, sou por elas qualificado de ingênuo, simplifi-


cador da dura realidade sociocultural do alunado e, enfim, representante de
uma corrente de pensamento nomeada genericamente de “liberal”. Restam-
-me duas alternativas: recusar os argumentos ou problematizá-los publica-
mente. Escolho a segunda.

No ano de 1980, uma certa tendência sociologizante (à qual parece se as-


sociar o pensamento das colegas) tomou de assalto as produções acadêmi-
cas em educação no Brasil, fazendo eco até hoje entre nossos profissionais.
Essa tendência diz respeito a uma maneira bastante específica – mas ainda
em moda – de compreender os revezes escolares como consequência, mais
ou menos imediata, de entraves estruturais de múltiplas ordens: social, polí-
tica, econômica, cultural etc.

Às instituições sociais, incluindo as escolas, pouco restaria além de sofrer


na pele as “influências” advindas das esferas maiores, em especial do modelo
econômico. Daí a cadeia de inevitáveis exclusões, violências malogros.

Não se afiliar a essa corrente dominante no cenário escolar equivaleria a


ser fragmentário, individualista, tendencioso – do que discordo em gênero,
número e grau!

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Isso porque não se pode admitir que as escolas sejam marionetes (e seus
profissionais reféns) das imposições exteriores. Algo de novo irrompe a cada
dia nas relações escolares, algo que pode, sim, refundar o mundo com base
na extraordinária do conhecimento – desde que dele não abdiquemos. E essa
parece ser a tarefa política crucial do educador brasileiro hoje: fazer valer, a
todo custo, aquilo que só as escolas podem e sabem fazer.

Em nome da camisa de força do entorno, quase sempre nos esquecemos


de que entre as condições exteriores e o cotidiano escolar há muito mais
mistérios do que imaginam nossas vãs pedagogias. Uma e outra instâncias
não se espelham de modo algum.

É necessário, portanto, desconfiar ininterruptamente de nosso apático


bom-senso pedagógico. Bom-senso sempre pronto a encontrar justificativas
para os tantos fracassos escolares – como exemplo, temos o reducionismo
sociologizante (o “fora” que nos persegue) e psicologizante (o “antes” que
nos assombra). Bom-senso raramente disposto a encontrar a potência mi-
cropolítica do aqui-agora escolar.

Sem o “fora” nem o “antes”, a vida nas escolas sem dúvida ganhará maior
autonomia e seus profissionais, mais fôlego. É o aqui-agora e ponto final!

A compreensão dos enigmas escolares deveria, enfim, aproximar-se mais


da plasticidade do olhar sempre inédito dos artistas e filósofos – e menos da
miopia retroativa dos sociólogos e psicólogos com suas listas de impossibi-
lidades... Oxalá possamos, desse modo, recuperar a confiança de que o tra-
balho escolar é ocasião necessária e suficiente para a reinvenção do mundo
atual e de seus habitantes.

Por que não tentar?

Dica de estudo
Entre os Muros da Escola, direção de Laurent Cantet, vencedor da Palma de Ouro
em Cannes, 2008.

Baseado em livro homônimo de François Bégaudeau. Relata a experiência do


professor de francês que enfrenta o desafio de convencer um grupo eclético de

198 Este material é parte integrante do acervo do IESDE BRASIL S.A.,


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alunos de que vale a pena ler e estudar. Retrata o dia a dia em um colégio públi-
co de Ensino Médio na periferia parisiense, frequentado por filhos de imigrantes
(China, Mali, Antilhas, Tunísia), lugar de mistura étnica e social, onde há barreiras
com o idioma, preconceito racial e a realidade da escola é crítica.

Atividades
1. Agora que você leu o texto da aula, destaque quatro pontos que você consi-
dera relevantes, inquietantes e significativos à atitude educativa reflexiva.

2. Explique o que significa considerar no processo de aprender a diversidade e


diferença individual.

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Gabarito
1. Espera-se que as respostas estejam circunscritas aos seguintes pontos:

 refletir sobre sua prática, se está possibilitando ao aluno uma atitude de


inquietação, de curiosidade diante da situação-problema;

 criar momentos em que o desejo do aluno possa aflorar;

 refletir sobre o campo relacional professor-aluno, o sucesso no ensinar e


no aprender, a missão do educador nos dias de hoje;

 atualização profissional constante.

2. Inicialmente entender que a diferença tomada a partir da dimensão psicoló-


gica refere-se às diferenças individuais decorrentes de idade, história escolar
e pessoal, estilos de aprendizagem, potencialidades, habilidades, interesses
e aspirações particulares. A diversidade tomada pelo viés antropológico e
sociológico trata da diversidade humana e é um fato numa sociedade plural.
Integra todos os segmentos populacionais representados por etnias, raças,
nacionalidades, culturas. Num segundo momento, espera-se que a resposta
possa tratar da atitude do educador frente à diversidade cultural e às dife-
renças individuais do aprendiz, que é de acolher o aluno, mediar a relação
professor-aluno pela linguagem, reconhecer a condição humana e o caráter
essencialmente humano que estão no campo relacional (consciente/incons-
ciente). Reconhecer no processo de aprender a presença dos aspectos sub-
jetivos (afetivos e emocionais) entre os dois sujeitos (professor/aluno).

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Contribuições de Henri Wallon
ao contexto educativo

Catarina de Souza Moro


Os sentimentos modificam o pensamento, a ação e o entorno, a ação modifica o pen-
samento, os sentimentos e o entorno, o entorno influi no pensamento, nos sentimentos e
na a ação, os pensamentos influem no sentimento, na ação e no entorno.

José Antônio Marina

Tratar do desenvolvimento humano, no campo da Psicologia do de-


senvolvimento1, segundo a abordagem psicogenética2 de Henri Wallon,
é de grande importância. Para compreender a relação entre o desenvolvi-
mento emocional, cognitivo e social do ser humano, principalmente nos
momentos de transição entre um nível de desenvolvimento e outro, na
ocorrência de mudanças qualitativas importantes.

A psicogenética de Henri Wallon


1879 – Nasceu em 15 de junho em Paris, França.
Domínio público.

1902 – Forma-se em Filosofia. Leciona no Liceu Bar-


le-Duc por um ano.

1908 – Forma-se em Medicina. Assistente do pro-


fessor histopatologista Nageotte.

1914-1918 – Primeira Guerra Mundial. Atua como


Henri Wallon.
médico no exercito francês no cuidado às pessoas
com distúrbios psiquiátricos.

1925 – Funda o Laboratório de Psicologia Biológica da Criança. Pu-


blica sua tese de doutorado: A Criança Turbulenta.

1
Para Deldime (1999, p. 12), a Psicologia do desenvolvimento refere-se ao “estudo do desenvolvimento que repousa sobre dados quan-
titativos e qualitativos que evoluem com o tempo. As transformações quantitativas são relativamente fáceis de mensurar. O estudo dos
aspectos qualitativos é mais complexo. De fato, se o desenvolvimento se apresenta como um processo ininterrupto, seu ritmo não é,
necessariamente, uniforme e contínuo: progressões rápidas são seguidas de periodos de estagnação, verdadeiras regressões são segui-
das, às vezes, por uma mudança brusca e total da personalidade”.
2
O termo psicogenética refere-se ao estudo da gênese, ou seja, das origens dos processos psicológicos humanos.

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Contribuições de Henri Wallon ao contexto educativo

1929 – Professor da Universidade Sorbonne. Vice-presidente do Grupo


Francês de Educação Nova.

1939-1945 – Segunda Guerra Mundial. Participa das forças de resistência


contra o nazismo. Perseguido e preso.

1945 – Publica As Origens do Pensamento da Criança. Lança a Revista En-


fance para expor novas ideias no mundo da educação.

1946 – Presidente do Grupo Francês de Educação Nova. Coordena o pro-


jeto de reforma do ensino. Revoluciona o sistema de ensino da França.

1962 – Morre em Paris.

O homem como ser geneticamente social


Wallon sempre tratou o desenvolvimento psicológico humano, buscando
uma perspectiva de totalidade, de não separação entre polos que geralmente
eram tratados como opostos, por exemplo: corpo e mente, razão e emoção. Para
esse autor, o ser humano só pode ser entendido a partir de suas condições or-
gânica (seus limites biológicos) e histórica (conjuntura social e cultural, na qual
o sujeito está inserido). O núcleo que estruturou todo o trabalho de Wallon foi
justamente a questão da pessoa completa, de como ocorre a transformação de
um organismo indiferenciado em um indivíduo com suas particularidades.

Para Wallon, as abordagens psicológicas que existiam na época (aproximada-


mente 1920) eram insuficientes para explicar a natureza humana: a psicologia
introspectiva, idealista, considerava o sujeito à parte do mundo material e obje-
tivo; a psicologia de base biológica, organicista, na qual o sujeito é visto exclu-
sivamente como produto do cérebro e, ainda, a psicologia positivista, em que o
sujeito é considerado somente nas suas reações ao meio. Com isso, ele buscou
no materialismo dialético tanto o fundamento epistemológico, como o método
de análise de sua teoria.

Wallon realizou estudo centrado na criança contextualizada, onde o ritmo


no qual se sucedem as etapas do desenvolvimento é descontínuo, marcado por
rupturas, retrocessos e reviravoltas, provocando em cada etapa profundas mu-
danças nas anteriores. Nesse sentido, a passagem dos estágios de desenvolvi-
mento não se dá linearmente, por ampliação, mas por reformulação, instalando-
-se no momento da passagem de uma etapa a outra, crises que afetam a condu-
ta da criança (CARVALHO, 2002).
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Contribuições de Henri Wallon ao contexto educativo

Wallon também elegeu a observação como o instrumento privilegiado para


ter acesso à atividade da criança em seus contextos. Só assim, para ele, poderia
se ter o necessário para compreender o real significado de cada uma das mani-
festações da criança.

Não interessava a esse autor escolher e isolar do conjunto maior – a pessoa


concreta – este ou aquele aspecto do desenvolvimento. Wallon entendia a pessoa
como um conjunto funcional resultante da integração dos aspectos cognitivo, afe-
tivo e motor. Esse processo de se tornar pessoa se realiza a partir da interação com
outros sujeitos, inclusive nas interações contraditórias e de oposição aos outros.

Para Wallon, o desenvolvimento humano se dá num movimento contínuo que


enfatiza ora a dimensão intrapessoal, em relação ao próprio sujeito, quando este
se volta para dentro, para sua estruturação interna; ora a interpessoal, externa, em
relação aos outros e as relações com estes, buscando uma estruturação social.

Wallon embasou sua teoria em quatro eixos fundamentais que se comunicam


o tempo todo: a afetividade, o movimento (no sentido de atividade motora), a
inteligência e a formação do eu como pessoa. Desde seu primeiro trabalho, inti-
tulado A Infância Turbulenta, para o qual ele observou crianças com problemas
de desenvolvimento e de aprendizagem (epilepsia, atraso mental, problema
psicomotor), e que foi publicado originalmente em 1925, esses temas estão
presentes.

Os quatro eixos fundamentais

Afetividade
Esse tema compreende as emoções e os sentimentos; as primeiras têm um
caráter mais corporal e pontual, sendo acompanhadas de mudanças fisiológicas
(rubor da face) e tônicas (musculatura tensa). Já os sentimentos são menos cor-
porais e mais duradouros.

As emoções, para Wallon, têm papel preponderante no desenvolvimento da


pessoa. É por meio delas que exteriorizamos nossos desejos e vontades. Para
Heloysa Dantas, professora da Faculdade de Educação da Universidade de São
Paulo, estudiosa da obra de Wallon há mais de 20 anos, “a emoção é altamente
orgânica, altera a respiração, os batimentos cardíacos e até o tônus muscular,

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tem momentos de tensão e distensão que ajudam o ser humano a se conhecer”


(1998). Segundo essa autora, a raiva, a alegria, o medo, a tristeza, e outros sen-
timentos mais profundos ganham função relevante na relação da criança com
o meio. A emoção causa impacto no outro, tende a se propagar no meio social,
pois contagia quem está naquele entorno.

A emoção ocupa um lugar importante na teoria Walloniana: em um primeiro


momento o ser humano possui um comportamento totalmente emocional que
se transforma ao longo da infância, até atingir um estado categorial, racional. A
razão nasce da emoção, vem depois dela e a ela se opõe, como se houvesse uma
disputa entre o domínio de uma ou de outra.
As emoções podem ser consideradas, sem dúvida, como a origem da consciência, visto que
exprimem e fixam para o próprio sujeito, através do jogo de atitudes determinadas, certas
disposições específicas de sua sensibilidade. Porém, elas só serão o ponto de partida da
consciência pessoal do sujeito por intermédio do grupo, no qual elas começam por fundi-lo
e do qual receberá as fórmulas diferenciadas de ação e os instrumentos intelectuais, sem os
quais lhe seria impossível efetuar as distinções e as classificações necessárias ao conhecimento
das coisas e de si mesmo. (WALLON, 1986, p. 64)

O significado das emoções e como elas nascem só pode ser entendido a partir
das ações no meio humano, nas interações entre pessoas e não na ação sobre o
meio físico. De certa forma, Wallon está defendendo a ideia de que o humano só
existe entre outros humanos.

Movimento
É muito conhecida a expressão walloniana “do ato ao pensamento” ou “do ato
motor ao ato mental”. De acordo com o autor, a atividade mental tem origem na
estrutura orgânica e na ação que essa estrutura possibilita. O movimento tem
papel fundamental tanto para a afetividade e a emoção como para a inteligên-
cia ou a cognição. Para compreender melhor essa ideia, é necessário pensarmos
que os músculos são responsáveis pelo movimento – função cinética e por man-
terem sua própria tensão ou relaxamento – função tônica.

Para Wallon, a imitação é uma ação motora, física, que manifesta as origens
motoras, gestuais, do ato mental. Aos poucos, a atividade cognitiva integra o
movimento, o ato motor torna-se interno, diminuindo a atividade motora ex-
terna. É em função dessa relação que percebemos a diferença de movimenta-
ção entre, por exemplo, as crianças com menos de sete anos e as crianças mais
velhas. Galvão (1995, p. 76) enfatiza que esse processo é lento e gradual e de-

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pende, além das condições neurológicas de cada criança, de outros fatores de


ordem social – as aquisições da linguagem e do conhecimento de mundo.

Inteligência
Estudos realizados por Wallon com crianças entre seis e nove anos mostram
que o desenvolvimento da inteligência depende essencialmente de como cada
uma faz as diferenciações com a realidade exterior. Primeiro porque, ao mesmo
tempo, suas ideias são lineares e se misturam – ocasionando um conflito per-
manente entre dois mundos, o interior, povoado de sonhos e fantasias; e o real,
cheio de símbolos, códigos e valores sociais e culturais. Nesse conflito entre si-
tuações antagônicas ganha sempre a criança. É na solução dos confrontos que a
inteligência evolui. Wallon diz que o sincretismo (mistura de ideias num mesmo
plano), bastante comum para a criança com menos de seis anos, é fator determi-
nante para o desenvolvimento intelectual. Daí se estabelece um ciclo constante
de boas e novas descobertas.

A linguagem é fundamental na evolução do pensamento: ao mesmo tempo


que o exprime, torna-o conhecido por outras pessoas; auxilia na sua organização
e estruturação. A linguagem e outras formas de simbolização são necessárias
para que o pensamento se torne mais objetivo: vai se tornando possível substi-
tuir formas muito particulares e não convencionais, que nem todo o grupo co-
nhece, por outras, mais convencionais e, portanto, compartilhadas por outras
pessoas.

A formação do eu como pessoa


A construção do eu depende essencialmente do outro. Seja para ser referên-
cia, seja para ser negado. Wallon utiliza os termos diferenciação e individuação
para indicar o “tornar-se pessoa”.

Principalmente a partir do instante em que a criança começa a viver a cha-


mada crise de oposição, aproximadamente aos três anos de idade, quando a
negação do outro funciona como uma espécie de instrumento de descoberta
de si própria, hora de saber quem se é, quem “eu” sou. Imitar o outro, seduzir,
chantagear, agredir ou fazer birra são comportamentos comuns nessa fase. No
percurso de construção da pessoa, a raiva e a dor também são elementos que
constituem esse “eu concreto”.

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Em todos os momentos, não apenas na primeira infância, a diferenciação entre


o eu e o outro é importante na definição que cada sujeito faz ou tem de si próprio.
Esse é um exercício constante: enquanto vivemos, estamos nos tornando pessoas.

Conceitos importantes
Para explicar a dinâmica entre eixos fundamentais, Wallon recorre ao que ele
chamou de leis. Iremos apresentar cada uma delas e explicar a ideia essencial.

Lei da preponderância funcional


Diz respeito à sucessão entre as três dimensões ou aspectos – motora, afetiva
e cognitiva, sendo que cada dimensão ou aspecto prepondera, alternadamen-
te, ao longo do desenvolvimento do homem. A função motora predomina nos
primeiros meses de vida da criança, enquanto as funções afetivas e cognitivas
se alternam ao longo de todo o desenvolvimento, ora visando à formação do
eu (predominância afetiva), ora visando ao conhecimento do mundo exterior
(predominância cognitiva).

Lei da alternância funcional


Indica duas direções opostas que se alternam ao longo do desenvolvimento:
uma centrípeta (força para dentro), voltada para a construção do eu, e a outra
centrífuga (força para fora), voltada para a elaboração da realidade externa e
do universo que a rodeia. Essas duas direções se manifestam alternadamente,
constituindo o ciclo da atividade funcional.

Lei da integração funcional


Diz respeito ao mesmo tempo à diferenciação e à integração das novas pos-
sibilidades às dos estágios anteriores, que não são suprimidas ou sobrepostas,
mas, pelo contrário, as conquistas anteriores são integradas às conquistas atuais.
Ocorre também a integração dos três subconjuntos funcionais – motor, afetivo e
cognitivo – para constituir o último e quarto subconjunto funcional, denomina-
do por Wallon de pessoa. Para Wallon, em qualquer momento ou fase do desen-
volvimento, a pessoa é sempre uma pessoa completa.

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Etapas do desenvolvimento
Wallon identificou a existência de etapas diferenciadas durante o desenvol-
vimento, principalmente da criança e do jovem, que se caracterizavam por ne-
cessidades e interesses distintos entre si e que, ao mesmo tempo, mantinham
determinada unidade em cada fase. Essas fases, etapas ou estágios têm relação
entre si, pois uma prepara o que irá se desenrolar na seguinte, assim como a
atual depende do que aconteceu na fase precedente.

Quadro 1 – Os estágios do desenvolvimento humano segundo Wallon

Estágios / faixas etárias/


Subestágios/faixas etárias/caracterização
preponderância funcional

Impulsividade motora pura – 0 a 2/3 meses.


Predomínio dos reflexos e das reações fisiológicas (espasmos, gritos).
Impulsivo e emocional
0 a 1 ano
Emocional ou tônico-emocional – 3 a 12 meses.
Centrípeto – Edificação do
Preponderância das expressões emocionais como modo dominante
sujeito das relações criança–meio. Simbiose afetiva.
Começo de sistematizações dos exercícios sensório-motores.

Sensório-motor – 12 a 18 meses.
Sensório-motor e projetivo Comportamento de orientação, investigação e exploração do espaço
1 a 3 anos circundante, ampliado pela locomoção.
Centrífugo –
Estabelecimento de Projetivo ou de ideomovimentos – 18 meses a 2/3 anos:
Imitação, linguagem, atividade simbólica, representação. Apareci-
relações com o mundo mento da inteligência representativa.

Crise de oposição – 3 anos.


Independência progressiva do eu. Uso do meu e teu, consciência das
diferenciações entre ela e o outro, sentimento competitivo e de do-
minação.

Personalismo Idade da graça – 4 anos.


3 a 6 anos Sedução do outro, chama a atenção para si, quer ser admirada e apro-
vada. Importância da expressão espontânea e do jogo (alternância
Centrípeto entre realidade objetiva e subjetividade).

Representação de papéis – 5 a 6 anos.


Imitação de personagens, necessidade de se identificar com a realidade.

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Idade da razão – 6 a 7 anos.


Interesse desloca-se do eu para as coisas. Poder de autodisciplina
mental, atenção.

Categorial 7 a 9 anos.
6 a 11/12 anos Constituição de redes de categorias dominadas pelos conteúdos con-
Centrífugo cretos, relações de classificação.

9 a 11 anos.
Aproximação da objetividade de percepção e pensamento do adulto.
Conhecimento operativo racional.

Puberdade e adolescência Idade da metafísica. Retorno ao eu-corporal e ao eu-psíquico, nova


a partir dos 11/12 anos crise de oposição. Retirada do pensamento sobre si mesmo, tomada
de consciência de si mesmo no tempo (inquietudes existenciais).
Centrípeto

A psicogenética walloniana e a Educação


Para Wallon, a Educação precisa ser compreendida em seus papéis social e
político, sobre os quais devemos refletir sempre para que possamos superar o
dilema entre o autoritarismo das práticas tradicionais e o espontaneísmo, próprio
de algumas práticas renovadas. Também é preciso entender as relações comple-
xas, de determinação recíproca, que existem entre indivíduo e sociedade.

Uma pedagogia inspirada na psicogenética walloniana não considera o de-


senvolvimento intelectual, a meta máxima e exclusiva da Educação. A escola
deve oferecer oportunidades para que as dimensões objetiva e subjetiva se al-
ternem; em termos curriculares isso deveria se refletir na integração entre a arte
(favorece a expressão de estados e vivências subjetivas) e a ciência (aquisição,
incorporação do conhecimento).

Wallon chama de humanismo ampliado a concepção que implica a plena re-


alização humana em cada indivíduo. A pessoa completa só é concebida em sua
forma universal e a ela é atribuído o poder de compreender, ponderar e escolher.
O trabalho na área educacional, tendo como premissa a perspectiva walloniana,
implica no redimensionamento do ambiente escolar.

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Heloysa Dantas (1998, p. 112) afirma:


Em uma sala vazia, uma criança não pode exercer atividade livre; sua liberdade cresce na medida
em que lhe são oferecidas possibilidades de ação, isto é, opções. Nesse sentido a liberdade da
criança não implica a demissão do adulto: pelo contrário, expandi-Ia implica o aumento das
ofertas adequadas às suas competências em cada momento do desenvolvimento.

No início do século passado, Wallon dizia que a escola deve proporcionar for-
mação integral (intelectual, afetiva e social) às crianças. Se hoje essa é uma ideia
comum, naquele tempo pode ter causado algum mal-estar.

Wallon talvez seja o pioneiro em considerar que para a escola e para dentro
da sala de aula vão, além da cabeça, o corpo da criança e também suas emoções.
Isso implica rever a forma do fazer pedagógico, implica humanizar a inteligência,
humanizar a razão.

Diferentemente dos métodos tradicionais (que priorizam a inteligência e o


desempenho em sala de aula), a proposta walloniana põe o desenvolvimento
intelectual dentro de uma cultura mais humanizada. A abordagem é sempre a
de considerar a pessoa como um todo. Elementos como afetividade, emoções,
movimento e espaço físico se encontram num mesmo plano.

A teoria de Henri Wallon ainda é desconhecida entre a maioria dos profes-


sores. E uma vez conhecida irá requerer que seja compreendida, pois ainda se
constitui um desafio pensar na valorização da afetividade (emoções) como ele-
mento essencial no desenvolvimento do aluno.

Segundo sua teoria, as emoções se relacionam ao espaço, às possibilidades


ou não de movimentação e às relações entre as pessoas. Contudo, a escola in-
felizmente insiste em imobilizar a criança numa carteira e a restringir suas inte-
rações, limitando a manifestação das emoções e do pensamento, tão necessária
para o desenvolvimento completo da pessoa.

Sobre o professor
Especificamente sobre o papel do professor, duas lições são particularmente
importantes. A primeira é que somos pessoas completas: com afeto, cognição e
movimento, e nos relacionamos com um aluno, também pessoa completa, inte-
gral, com afeto, cognição e movimento. A segunda é que somos componentes

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Contribuições de Henri Wallon ao contexto educativo

privilegiados do meio de nosso aluno. Vale observar que Wallon utiliza a primei-
ra pessoa do plural para referir-se aos professores, incluindo-se.

A concepção do professor como pessoa completa e como mediador da cultura


de seu tempo (um cultivador, portanto, das novas aptidões possibilitadas por ela)
traz uma importante questão: que tipo de formação deve ser propiciada à pessoa
do professor, para que, em seu encontro com a pessoa do aluno, seja capaz de
desempenhar bem o seu papel de mediador da cultura de seu tempo?

É necessário investir na formação da pessoa do professor, principalmente


na formação continuada. Considerando a sua experiência na escola, diante do
aluno, lugar em que ele se constitui professor. A esse respeito nos diz Wallon
(1975, p. 366): “A formação psicológica dos professores não pode ficar limitada
aos livros. Deve ter referência perpétua nas experiências pedagógicas que eles
próprios podem pessoalmente realizar”.

Almeida (1999, p. 103) enfatiza:


Na raiz do pensamento pedagógico walloniano há uma especificidade assinalada ao professor:
ele é o eixo da atividade pedagógica. [...] o professor deve atuar como arguto observador, no
sentido de articular, sempre que possível, os aspectos afetivo e intelectual, ambos inseparáveis
e presentes na atividade pedagógica.

A meta é ajudar na construção de pessoas completas. Wallon acreditava que


todos deveriam ter oportunidades iguais, inclusive ao respeito e à singularidade,
e para isso é necessário haver escola para todos, onde cada um possa encontrar,
segundo suas aptidões, todo o desenvolvimento intelectual, estético e moral
que for capaz de assimilar. Oferecida uma base comum, deve-se também pro-
piciar condições para que a criança, experimentando, descubra suas tendências
de acordo com seu estágio de desenvolvimento.

É nesse parâmetro que a interdisciplinaridade entre psicologia e educação


se faz necessária. Wallon propõe uma relação de simetria e complementaridade
entre essas duas áreas, pois a escola é um meio formador da personalidade total
do indivíduo na nossa sociedade, portanto o que acontece ali deve ser estudado
na sua especificidade, auxiliando na constituição do conhecimento psicológico
sobre a criança (CARVALHO, 2002).

Wallon afirma que o meio e a cultura condicionam os valores morais e sociais


que a criança irá incorporar, e que devem ser cultivados os valores de solidarie-
dade e justiça. Insiste na importância de o professor conhecer as condições de
existência de seu aluno, para saber quais valores estão sendo cultivados, e saber
como cultivar aqueles que são seu objetivo.

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Contribuições de Henri Wallon ao contexto educativo

Texto complementar

Contribuições de H. Wallon para a reflexão


sobre questões educacionais
(MAHONEY, 2000, p. 18-21)

A professora Heloysa, em seu relato, destacou duas experiências recentes


que tiveram como eixo referencial princípios wallonianos para a Educação. A
primeira deu origem ao Projeto Letras e Livros, iniciado em 1989, já incorpo-
rado por duas escolas municipais de São Paulo.

A questão que desencadeou o projeto foi a multirrepetência de crianças


não alfabetizadas no 1.º ano.

A professora Heloysa fez as experiências como assessora do Núcleo da


Faculdade de Educação da USP e, na primeira, contou com a colaboração
da coordenadora desse Núcleo, Elisabeth Camargo Prado. A experiência está
relatada em capítulo do livro Alfabetização Hoje (1994, p. 94). Logo de início,
a afirmação:
A paisagem da década de 1990 oferece aos olhares do observador uma grande mudança,
em relação aos anos 1970 nesta matéria. A criança carente, necessitada de “educação
compensatória”, cede lugar ao professor malformado, no banco dos réus. Sem dúvida isso
é um avanço: no mínimo traz a responsabilidade para o campo da ação do adulto.

Com isso, as autoras quiseram apontar que o discurso, que acaba sendo
interiorizado pela sociedade, carrega uma análise personalista da origem do
fracasso escolar e não leva à solução alguma. Absurdo colocar a responsabi-
lidade desse fracasso nos ombros do professor individualmente.

Wallon chama a atenção para as análises que fragmentam os conjuntos,


transformando-se em análises superficiais.

A questão da alfabetização é multidimensional e sua análise requer apro-


ximar todos os fatores em suas múltiplas relações, para começar a iluminar
caminhos. Enquanto isso não se dá, é possível acrescentar com sucesso al-
gumas atividades de apoio à ação do professor em sala de aula. É o que nos
mostra a experiência do Projeto Letras e Livros.

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Contribuições de Henri Wallon ao contexto educativo

O projeto começou com crianças de 10, 11 e 12 anos, multirrepetentes


na 1.ª série.

Aos poucos foi adquirindo um caráter preventivo. Em 1991, as crianças


que não reconheciam letras já eram encaminhadas para o Projeto, a partir de
uma entrevista com a coordenadora, no ato da matrícula. Recebiam então
tripla atenção: a da sala de aula, a do reforço da professora com grupos me-
nores e a do Projeto, no qual a atuação era individualizada.

O projeto apenas acrescentou pequenos espaços de intimidade ao redor


da leitura na biblioteca. Inicialmente, meia hora durante o período de aulas;
depois, a pedido dos professores, fora desse horário.

As atividades eram simples: ler o livro para a criança; ler o livro com a crian-
ça, apenas completando as lacunas, como mediador. O leitor era sempre a
criança, que também escolhia o livro; ao completar a leitura de uma história,
conversar sobre ela, discuti-la. Não para avaliar a compreensão do texto, pela
qual a criança é julgada, mas “colocá-la na situação de juiz que avalia e julga
os personagens e o autor” (DANTAS). Esse é o caráter lúdico da leitura.

A biblioteca foi considerada o lugar ideal para esse trabalho: quando as


crianças se distraem é porque “descobriram outro livro mais interessante e a
‘dispersão’ é com frequência mais produtiva do que a proposta” (DANTAS).

Foi um procedimento pouco oneroso: bastaram duas estagiárias e o


espaço da biblioteca.

Esses espaços de intimidade, como os chama a professora Heloysa, deram


oportunidade à criação e à testagem de novos recursos para alfabetização:
jogos, desenhos etc.

O projeto se propôs não só a desenvolver a competência da leitura, como


também o prazer de ler.

No treino da equipe, foi mais difícil aprender a criar uma atmosfera que
permitisse à criança “borboletear” de um livro para outro em função do seu
gosto e sua fantasia do que aprender a trabalhar com a competência.
Abandonar a história “chata” em busca de outra mais atraente é algo inquietante para a
maioria dos adultos. É preciso ter vivido com intensidade e frequência o encantamento
das histórias bem narradas para ser capaz disso. Talvez essa seja a qualificação mais
necessária do profissional para esse trabalho. (DANTAS)

Como resultado do projeto, a reprovação foi zerada.

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Contribuições de Henri Wallon ao contexto educativo

A professora Heloysa participou do projeto até 1996. Agora está produ-


zindo um livro sobre oficina de jogos alfabetizadores interativos – que é uma
oficina de produção de material junto com as crianças. Todo final de ano os
alunos preparam um livrinho com textos feitos por eles mesmos e a suges-
tão é que eles mesmos imprimam. Com quais ideias Wallon colaborou?

Wallon acentua no desenvolvimento da criança a tendência da sociali-


zação para individuação, do sincretismo com o outro para a distinção em
relação a ele.

Os espaços de intimidade favorecem essa discriminação, pois o ser que se


constrói é singular e a relação com a singularidade deve ser respeitada.

A escola facilita o desenvolvimento da criança, oferecendo espaços de


diferenciação dentro e fora do grupo. Cultivar a convivência com o grupo,
sem perder a referência do individual, é indispensável.

As escolas parecem oscilar entre esses dois polos, como se eles fossem
incompatíveis.

Existe, ainda arraigada no discurso da área da educação, a associação


entre pedagógico e público, isto é, fazer um trabalho individual soa mais a
terapêutico que pedagógico. Existe também a associação entre social e cole-
tivo, como se o interindividual não fosse social.

Outra distinção feita na teoria de Wallon e que se mostrou bastante pro-


dutiva foi a distinção entre emoção e afetividade.

Para Wallon, afetividade é um conceito amplo, que inclui um componen-


te orgânico, corporal, motor, plástico (emoção), um componente cognitivo,
representacional (sentimentos).

Na sua entrevista, a professora Heloysa explica:


As crianças eram atendidas individualmente, na biblioteca, com uma deliberada
intervenção na temperatura afetiva-emocional, ou melhor, elevação da temperatura
afetiva e diminuição da emocional. Como a situação é individual e Wallon oferece muitas
pistas sobre isso, os professores são instigados a observar postura, respiração, brilho
no olhar. Como Wallon diz: olhar o corpo... No começo as crianças eram tão ansiosas
que respiravam mal e se cansavam depressa. O cansaço tinha a ver com a emoção. À
medida que percebiam a situação não ameaçadora, iam relaxando, e o tempo produtivo
aumentava. O cansaço, a gente aprendeu, estava ligado à emoção e a sentimentos de
medo e de raiva. Então, era uma intenção deliberada compor uma atmosfera afetiva.
Wallon entrava principalmente com essa contribuição. Do ponto de vista emocional,
reduzir o medo da criança em relação ao livro. Como? Pela redução da ameaça... Nenhuma

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Contribuições de Henri Wallon ao contexto educativo

ameaça, nenhuma avaliação, nem perguntar se entendeu o que leu ou o que escreveu.
Nunca era julgada... Isso dava uma distensão que aparecia rapidamente na conduta da
criança. Ter clara a distinção entre emoção e afetividade é útil, porque dá ao educador mais
um elemento para conhecer o aluno e adequar suas atividades. A emoção, ao se expressar
pelo corpo, dá ao bom observador indícios de como o aluno está se posicionando ante
as várias exigências da escola: assustado, com medo, com raiva ou com tranquilidade,
prazer, alegria.

Dica de estudo
Criança Turbulenta – estudo sobre os retardamentos e das anomalias do desen-
volvimento motor e metal, de Henri Wallon, Editora Vozes.

Essa obra trata do indivíduo integralmente, elaborada a partir de 214 depoi-


mentos de crianças que sofrem de um psiquismo profundamente deteriorado
ou perturbado, na maioria dos casos, por distúrbios mentais. Mas Wallon tem
uma incessante preocupação em apreender a totalidade do ser infantil, conside-
rando-o como sujeito, como pessoa, a partir de uma psicologia diferencial.

Atividades
1. Wallon propõe uma sequência de desenvolvimento para a construção do eu
que vai da criança até a adolescência. Faça uma descrição do período que
está cronologicamente situado entre os 3 e 6 anos.

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2. Qual a definição de Psicologia do desenvolvimento proposta por Deldime?

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Gabarito
1. Etapa do personalismo que se caracteriza por comportamentos de oposição
da criança na tentativa de marcar sua independência do outro e se autoafir-
mar no grupo, no meio. Esse movimento favorece a discriminação do Eu e
inscreve sentimentos de competição e de dominação. Um 2.º tempo aos 4
anos verifica-se uma aproximação sedutora para com o outro. Aos 6 anos é
possível para a criança trabalhar com a representação de papéis, adora tea-
tralização.

2. O autor procura destacar a complexidade do desenvolvimento humano e


alerta para as oscilações que são possíveis de ocorrer. Para ele o estudo do

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Contribuições de Henri Wallon ao contexto educativo

desenvolvimento psicológico humano repousa sobre dados quantitativos e


qualitativos que evoluem com o tempo. As transformações quantitativas são
relativamente fáceis de mensurar. Já o estudo dos aspectos qualitativos é
mais complexo. De fato, se o desenvolvimento se apresenta como um pro-
cesso ininterrupto, seu ritmo não é, necessariamente, uniforme e contínuo:
progressões rápidas são seguidas de períodos de estagnação, verdadeiras
regressões são seguidas, às vezes, por uma mudança brusca e total da perso-
nalidade.

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Contribuições de Lev Vygotsky
ao contexto educativo

Catarina de Souza Moro


O objetivo principal de Vygotsky (1896-1934) era estudar os processos
de transformação do desenvolvimento humano. Ele deu especial impor-
tância aos mecanismos psicológicos mais sofisticados, que chamou de
funções psicológicas superiores, típicas da espécie humana, como contro-
le consciente do comportamento, atenção e memória voluntária, pensa-
mento abstrato, raciocínio dedutivo, capacidade de planejamento, entre
outras.

Mesmo não conhecendo pessoalmente Wallon, entendia, como este,


que as abordagens psicológicas da época para explicar o ser humano,
baseadas no empirismo (ciência natural) e no idealismo (ciência mental),
não estavam adequadas. Fundamentou seus estudos nos princípios e mé-
todos do materialismo dialético, pois buscava compreender o aspecto
intelectual humano e construir uma “nova psicologia” que sintetizasse e
transformasse as duas abordagens anteriores.

Trabalhou com Alexander R. Luria (1902-1977) e com Alexei N. Leontiev


(1904-1979), seus principais colaboradores, e com eles formou um grupo
de intelectuais importantes na Rússia daquela época.

No final da década de 1920 e início dos anos 1930, dedicou-se mais ao


estudo da aprendizagem e do desenvolvimento infantil. Vygotsky recor-
reu à infância para explicar o comportamento humano em geral, consi-
derando-a o centro da história do desenvolvimento cultural das pessoas.
Seu objetivo, portanto, não era o de desenvolver uma teoria do desenvol-
vimento infantil especificamente.

Reconhecia a semelhança de interesses entre ele e Piaget, pois co-


nheceu algumas das obras desse autor. Ambos estavam interessados no
estudo da gênese dos processos psicológicos.

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Contribuições de Lev Vygotsky ao contexto educativo

Sua obra é considerada inacabada, pois Vygotsky faleceu muito cedo, em


1934, com menos de 38 anos de idade.

Até o momento atual, no Brasil, não tivemos acesso a toda a sua produção
intelectual, algumas não foram editadas nem na Rússia. Por questões políticas,
entre 1932 e 1956, a publicação de suas obras foi proibida na própria União So-
viética. No Brasil, somente em 1984 foi publicado o livro A Formação Social da
Mente, a partir de uma organização de trabalhos dele, feita por pesquisadores
norte-americanos.

Dados biográficos
1896 – Nasceu em 17 de novembro, na cidade de
Domínio público.

Orsha na Bielo-Rússia.

1911 – Vai à escola, pois até o momento fora educa-


do com tutores. Dominava cinco idiomas (alemão,
latim, francês, inglês, hebraico).

1913 – Estudou Direito, História, Filosofia e Literatu-


ra na Universidade de Moscou.

Lev Vygotsky (1896-1934). 1917-1923 – Escreve críticas literárias. Fundou uma


editora, uma revista literária e um laboratório de psicologia no Instituto de
Treinamento de Professores.

1920 – Descobre que tem tuberculose.

1925 – Publica Psicologia na Arte, na Rússia.

1924 – Casa-se com Rosa Smekhova, tiveram dois filhos.

1934 – Morre em 11 de Junho. Publicação do livro Pensamento e Lingua-


gem na Rússia.

1962 – Publicação de Pensamento e Linguagem nos EUA.

1987 – Publicação de Pensamento e Linguagem no Brasil.

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Contribuições de Lev Vygotsky ao contexto educativo

Papel da interação
no desenvolvimento humano
Para Vygotsky, a estrutura orgânica e fisiológica humana (inata) não é sufi-
ciente para produzir o indivíduo. As características individuais dependem da
interação do ser humano com o meio físico e social. Para esse autor, existe uma
ação recíproca entre o organismo e o meio.

O desenvolvimento do ser humano não é algo previsível, universal, linear ou


gradual. Está intimamente relacionado ao contexto histórico-cultural em que a
pessoa se insere e se processa de forma dinâmica. Daí a importância do papel da
interação social no desenvolvimento do ser humano.

Desde o nascimento, o bebê está em constante interação com os adultos que


auxiliam na sua relação com o mundo. Os adultos procuram que as crianças in-
corporem a sua cultura, atribuindo significados às condutas e aos objetos cultu-
rais que se formaram ao longo da história. Assim, o comportamento da criança
recebe influências dos costumes e objetos de sua cultura.

Por meio dos adultos, as crianças assimilam ativamente aquelas habilidades


que foram construídas pela história social ao longo de milênios (andar, sentar,
controlar os esfíncteres, falar etc.). O adulto, no cotidiano, vai mediando o olhar
da criança sobre o mundo e sobre si mesma. Aos poucos, esse conhecimento vai
se transformando em conceito, a partir da atividade cognitiva e instrumental. O
conhecimento é, portanto, resultado de um longo processo de comunicação e
compreensão partilhadas desde o nascimento.

Para Vygotsky, a apropriação do conhecimento pelo ser humano decorre das


interações entre as pessoas, das mediações propiciadas pelos indivíduos mais
experientes, em uma determinada cultura. Apropriar-se do conhecimento é uma
possibilidade, pois não é uma capacidade que nasce com o indivíduo. Vygotsky
estabelece dois tipos de conceitos:

 cotidianos (espontâneos) – Adquiridos pela experiência direta, não requi-


sitando do aprendiz intencionalidade, generalização, elaboração cognitiva.

 científicos (intelectuais) – Adquiridos pela atividade instrumental e cogniti-


va, pressupondo atenção e memória voluntárias, capacidade de uso de signos
e da abstração, ou seja, requerem condições específicas para sua apropriação,
podendo e devendo se desenvolver em função da atividade escolar1.
1
Para um aprofundamento dessa questão ver O Pensamento e a Linguagem, cap. 5 e 6, do próprio autor.

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Contribuições de Lev Vygotsky ao contexto educativo

O pensamento da criança diferencia-se do pensamento do adulto, tanto na


sua estrutura, composição, como no seu funcionamento. A característica essen-
cial do pensamento infantil é a dependência da experiência imediata (VYGOTSKY,
1993). Gradualmente, a criança irá tomando consciência de sua própria ativida-
de mental, aprendendo a prestar atenção ao seu pensamento sobre o objeto e
não apenas ao objeto em si (percepção imediata), realizando generalizações, até
ter o domínio de um determinado conhecimento.

Para Vygotsky, o desenvolvimento do psiquismo humano é sempre media-


do pelo outro (outras pessoas do grupo cultural) que indica, delimita e atribui
significados à sua realidade. As conquistas individuais resultam de um processo
compartilhado.

O desenvolvimento e a aprendizagem:
processos complementares
Vygotsky defende que desenvolvimento e aprendizagem são processos com-
plementares e, diferente das abordagens de caráter mais maturacionista (que
dizem dever se alcançar um nível tal de desenvolvimento para então poder
ocorrer a aprendizagem), indica que a aprendizagem pode vir antes do desen-
volvimento, servindo como alavanca para o mesmo.

Nesse sentido, observando o que acontece com as crianças, o autor levantou


duas ideias importantes. Uma delas diz respeito ao que ele observou, de fato, e
que ele denominou nível de desenvolvimento real (NDR) – que é o resultado de
certos ciclos de desenvolvimento e de aprendizagem já completados, refere-se
àquilo que as crianças conseguem fazer por si mesmas, sem precisar de ajuda. Na
visão tradicional, é o que se acreditava ser o indicativo da capacidade mental das
crianças. O NDR diz respeito aos produtos finais do desenvolvimento, aos frutos.

A outra ideia veio do julgamento feito por Vygotsky em relação à insuficiência


do conceito de NDR para tratar do quanto e de como as crianças aprendiam.

Vygotsky percebeu que algumas vezes uma criança é capaz de resolver um


problema: depois de receber pistas; depois de ter visto o problema resolvido,
por um adulto ou por uma criança mais experiente; ao completar a solução que

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Contribuições de Lev Vygotsky ao contexto educativo

fora iniciada pelo professor; se resolvê-lo em colaboração com outras crianças.


Vygotsky denominou essa ideia de zona de desenvolvimento proximal (ZDP).

O conceito de ZDP dá condições de caracterizar o desenvolvimento mental


que irá ocorrer, permite-nos saber como e se ela será capaz de aprender algo.
Indica os domínios de conhecimento que estão em processo, os brotos e flores.

Em alguns artigos, textos e livros sobre a teoria vygotskyana, encontramos


um terceiro conceito – nível de desenvolvimento proximal (NDP), que é quase si-
nônimo da ZDP e que entendemos – juntamente com Duarte (2000, p. 19) – não
ser um conceito fundamental para se compreender essa dinâmica do processo
de aprendizagem que Vygotsky quis evidenciar.
[...] o aprendizado desperta vários processos internos de desenvolvimento, que são capazes
de operar somente quando a criança interage com pessoas em seu ambiente e quando em
cooperação com seus companheiros. Uma vez internalizados, esses processos tornam-se parte
das aquisições de desenvolvimento independente da criança. (VYGOTSKY, 1994, p. 101)

A internalização foi outro conceito criado por Vygotsky para fazer referência à
reconstrução interna que cada indivíduo passa a fazer de uma operação que ini-
cialmente era externa a ele. Esse processo pode ser prontamente visto em uma
conversa bem construída. As crianças podem ser iniciadas em novos padrões de
pensamento, quando se envolvem em diálogos com seus pares.

Na internalização, um processo interpessoal é transformado num processo


intrapessoal e essa transformação é resultado de uma série de eventos ocorridos
ao longo do desenvolvimento, que foram mediados por instrumentos e signos,
com destaque para a linguagem.

Brincadeiras e jogos infantis


O paradoxo fundamental do jogo consiste em que, sendo uma atividade maximamente livre,
encontrando-se sob o poder das emoções, é a fonte de desenvolvimento do caráter voluntário e
de tomada de consciência, por parte da criança, de suas ações e de seu próprio eu.

Daniel Elkonin

As descobertas sobre a importância da brincadeira e dos jogos infantis são prin-


cipalmente dos pedagogos e psicólogos russos2, tendo começado com os trabalhos
de Vygotsky, que definem o jogo infantil como fato social, produzido e vivido por
crianças historicamente situadas, em função de um determinado contexto cultural.
2
Os nomes de maior destaque são: Makarenko, Leontiev e Elkonin 2005. (Ver MAKARENKO, 2005; VYGOTSKY; LURIA; LEONTIEV,
1994; ELKONIN, 1998).

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A brincadeira, uma das atividades principais das crianças pequenas, tem na-
tureza social, relacionada às condições concretas da criança na vida em socieda-
de. Assim, conforme Elkonin (1998), em virtude do novo espaço que a criança
passou a ocupar na sociedade, criaram-se traços específicos na sua atividade,
que então se comporta de forma peculiar e distinta de outros períodos da vida.
Logo, pela impossibilidade de a criança inserir-se por inteiro nas atividades de
trabalho dos adultos que a cercam, ela o faz mediante a brincadeira.

A importância desse tema fez com que hoje inúmeros pesquisadores se


ocupem do mesmo e, assim, não se corra o risco de eliminar o lúdico do cotidia-
no escolar, principalmente da pré-escola. Brincar e aprender não são atividades
contrárias entre si, mas complementares. Nas brincadeiras, a criança adquire co-
nhecimentos, desenvolve o pensamento, analisa as situações em que está envol-
vida e, além de refletir a realidade, transforma-a ativamente, criando, inventan-
do, resolvendo problemas do próprio jogo e outros.

Deve ter ficado claro que, ao nos referirmos ao jogo, à brincadeira, estamos fa-
lando da atividade, da ação infantil, que pode implicar a criação de uma situação
imaginária por parte da criança (VYGOTSKY, 1994). Nessa atividade, o brinquedo
– o objeto – é concebido como um instrumento sociocultural, um mediador que
transmite valores e imagens.

É fundamental lembrarmos que o brincar de faz de conta (jogo de papéis,


jogo dramático, também chamado por Elkonin de jogo protagonizado) é muito
frequente entre crianças de dois a seis anos. Esse tipo de brincadeira acontece
quando a criança:

 transforma objetos presentes, ou seja, atribui a eles significados diferentes


daqueles que possuem na realidade;

 transforma os ambientes para servirem aos seus propósitos;

 representa o papel de alguns personagens, sejam pessoas (mãe, pai, pro-


fessora, super-herói) ou animais e, nesse caso, assume com o corpo suas
características físicas (seus braços viram asas, anda de quatro);

 utiliza objetos inanimados como se tivessem vida.

Nessas brincadeiras, a criança representa, pois já pôde constituir em seu pen-


samento, imagens, símbolos e ideias que vão sendo analisadas, confrontadas e
diferenciadas, criando uma possibilidade para evolução daquele pensamento
inicial.

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Aos olhos das pessoas que não compreendem a importância do brincar no


desenvolvimento humano, a brincadeira em sala pode dar a impressão de desor-
ganização, de ambiente não propício à aprendizagem. A organização, no entan-
to, está na própria brincadeira.

Pensamento e linguagem
Vygotsky tem dentro da sua teoria psicológica uma teoria da linguagem.
Importava para ele, principalmente, a relação entre pensamento e linguagem.
Segundo Teresa C. Rego, professora e pesquisadora brasileira, tanto o domínio
da linguagem falada como da linguagem escrita representam “um novo e con-
siderável salto no desenvolvimento da pessoa” (REGO, 1995, p. 68). A criança, ao
adquirir essas capacidades, desenvolve modos de se relacionar mais complexos
e sofisticados.

A linguagem fornece os conceitos e as formas de organização do real que


constituem a mediação entre o sujeito e o objeto de conhecimento. A compre-
ensão das relações entre pensamento e linguagem é, pois, essencial para a com-
preensão do funcionamento psicológico do ser humano (OLIVEIRA, 1993, p. 43).

Por volta de 1930, Vygotsky já fazia críticas à visão restrita sobre o ensino-
-aprendizagem da escrita como uma habilidade especificamente motora. Para ele,
esse é um processo de maior complexidade e que se inicia inclusive muito antes
de a criança ir para a escola e de pegar um lápis na mão. Nas palavras do autor:
Até agora, a escrita ocupou um lugar muito estreito na prática escolar, em relação ao papel
fundamental que ela desempenha no desenvolvimento cultural da criança. Ensina-se as
crianças a desenhar letras e construir palavras com elas, mas não se ensina a linguagem escrita.
Enfatiza-se de tal forma a mecânica de ler o que está escrito que se acaba obscurecendo a
linguagem escrita como tal. (VYGOTSKY, 1994, p. 119)

Seguindo a linha e as hipóteses de Vygotsky, Luria realizou, na década de


1930, um trabalho sobre o desenvolvimento da escrita na criança e criou uma
sequência na gênese da escrita.

De lá para cá, algumas ideias e práticas em relação ao ensino da linguagem


escrita mudaram, outras não. Mas com certeza a contribuição da abordagem
desses autores foi de grande importância. Para todos esses pesquisadores, a es-
crita é considerada, depois do gesto, da fala, do brinquedo e do desenho, um
dos últimos simbolismos. Segundo eles, todos esses simbolismos anteriores
contribuem com a aquisição da escrita.

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Ao considerar que a aprendizagem é essencialmente social em sua origem,


Vygotsky valoriza o trabalho de grupo e a aprendizagem em cooperação. A cola-
boração entre pares é vista como vantajosa no processo sociocognitivo, os indi-
víduos colaboram entre si em um ambiente cooperativo de aprendizagem, em
pequenos grupos, nos quais a interação social, a negociação e a partilha podem
legitimamente ocorrer. Isso é muito diferente em um ambiente oposto, a sala
de aula mais tradicional, centrada no professor, com as interações limitadas às
iniciadas pelo professor com cada aluno, individualmente ou mesmo com toda
a turma.

Teresa C. Rego (1995) sintetiza em cinco pontos principais as contribuições


de Vygotsky para a aprendizagem.

 O papel insubstituível da escola no processo de apropriação da cultura e


dos conhecimentos acumulados pelos indivíduos mais novos. Na escola,
o conhecimento deve ser sistematizado para que as crianças sejam desa-
fiadas a aprender.

 A ideia relacionada ao conceito de ZDP que requer qualidade no trabalho


pedagógico para obter avanços no desenvolvimento do aluno.

 A importância do outro na construção do conhecimento, sendo esse ou-


tro todas as pessoas que interagem com os alunos, não só os próprios co-
legas, como também as pessoas mais experientes que ele. Inclui-se aqui a
importância da heterogeneidade entre o grupo de alunos, pois diferentes
níveis de conhecimento é que permitem as trocas e ajudas e a ampliação
das capacidades de cada um.

 Novo enfoque para a imitação no processo de aprendizagem, que não é


sinônimo de cópia e pode, ao contrário, ampliar a capacidade intelectiva
do aluno.

 O professor não é visto como exclusivo na construção do conhecimento


pelo aluno, mas continua tendo um papel fundamental: é ele quem faz a
mediação das interações dos alunos com o conhecimento e dos alunos
entre si. Explicar, questionar, argumentar contra ou a favor são essenciais
para a ampliação do conhecimento dos alunos. É o professor que deverá
conhecer seu aluno a ponto de considerar o que eles já sabem e o que po-
derão saber. ”[...] o aprendizado humano pressupõe uma natureza social
específica e um processo através do qual as crianças penetram na vida
intelectual daquelas que a cercam” (VYGOTSKY, 1994, p. 99).

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Texto complementar

Juntos eles aprendem melhor


Na Educação Infantil, misturar turmas de idades diferentes ajuda a construir
conhecimento. Veja como planejar os momentos de interação
(MARANGON, 2003)

A troca de experiências em sala de aula é uma rica fonte de aprendiza-


do. Na Educação Infantil, essa prática pode se tornar ainda mais produtiva
quando há o convívio entre turmas de idades diferentes. Apesar de nas cre-
ches e pré-escolas os alunos serem agrupados por faixa etária, não é difí-
cil organizar momentos de convivência entre os mais velhos e os novinhos.
Nesse tipo de parceria, há avanços para todos.

Segundo o pensador russo Lev Vygotsky (1896-1934), é por meio do con-


vívio com o outro que o homem se constitui. “Se alguém cresce isolado da
sociedade, não desenvolve características básicas do ser humano, como a fala”,
explica Teresa Rego, professora da Faculdade de Educação da Universidade de
São Paulo (USP). Em uma brincadeira de faz de conta, por exemplo, os mais
novos têm o hábito de imitar as atitudes dos maiores. “Essa ação potencializa
o desenvolvimento”, afirma Rosana Dutoit, coordenadora da Abaporu Consul-
toria e Planejamento em Educação. O caminho inverso também acontece. A
criança maior percebe que a mais nova é diferente dela e que, por isso, tem
algumas limitações que precisam ser respeitadas. A interação não é simples,
mas tem peso importante na evolução do conhecimento dos pequenos.

Mas fique atento: reunir classes de diferentes níveis sem um objetivo es-
pecífico produz como resultado apenas um aprendizado espontâneo. O rela-
cionamento entre faixas etárias diversas só leva a um salto, de fato, se ocorrer
durante ações planejadas para favorecer e potencializar a aprendizagem de
um novo conteúdo ou de uma nova habilidade.

Um programa para a escola inteira


Na Creche Central da USP, localizada na capital paulista, os momentos de
convívio entre grupos heterogêneos fazem parte da Proposta Pedagógica

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e estão incluídos no planejamento de todos os educadores. Se o objetivo é


melhorar a convivência entre as crianças, uma tarefa de pintura ou de escrita
pode ser proposta. Não se pode perder de vista, no entanto, que o conteú-
do principal é interação e não Artes Visuais ou linguagem. Além disso, é ne-
cessário planejar pensando em todas as turmas, pois só assim será possível
propor um trabalho que abranja os diferentes níveis de desenvolvimento.

Lá as crianças são agrupadas em três módulos, de acordo com a idade:


um de quatro meses a dois anos e meio, outro de três e quatro anos e o ter-
ceiro de cinco a sete anos. Todos os dias, quando chegam à escola, meninos
e meninas encontram espaços previamente organizados pelas educadoras
para brincar com os coleguinhas de seu módulo – que já têm integrantes de
idades variadas. Lá ficam durante uma hora e meia.

Uma vez por semana acontece um outro tipo de encontro em que toda
a escola se envolve. Nessa hora, a garotada não tem apenas contato com os
membros do seu módulo. Para recepcionar os visitantes das demais turmas,
cada uma elabora um tipo de dinâmica. No parque, a meninada brinca so-
zinha ou agrupada e tem a possibilidade de escolher com que se divertir:
tanque de areia, escorregador, gira-gira, trepa-trepa etc. Em sala de aula, nos
cantos de leitura, salão de beleza, jogos e outras atividades comuns na Edu-
cação Infantil, a relação se processa da mesma maneira. “O objetivo é fazer
com que todos se conheçam”, explica Clélia Cortez, coordenadora pedagó-
gica da instituição.

Convivência: a base do desenvolvimento


O teórico Lev Vygotsky construiu o conceito de sociointeracionismo. Em
sua obra, ele defende que o ser humano é o resultado da interação com o
meio em que vive. Portanto, para potencializar o desenvolvimento de uma
criança, é preciso que ela se relacione com outras. É dele o conceito de zona
de desenvolvimento proximal, a distância entre aquilo que um indivíduo já
sabe fazer sozinho e o que é capaz de realizar com a ajuda do outro. Com
base nisso, depreende-se a ideia de que os pequenos precisam se relacionar
não apenas com seus pares. Os mais velhos fazem coisas que os menores
ainda não conseguem realizar sozinhos e isso é um convite ao aprendizado.
E o trabalho pode ajudar você também. “Às vezes a dificuldade de um aluno
não é corretamente interpretada pelo educador, mas é sinalizada com muita
tranquilidade pelos colegas”, diz a professora Teresa Rego.

[...]

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Dica de estudo
Poema Pedagógico, de Anton Makarenko, Editora 34.

Anton Makarenko (1888-1939) é natural da Ucrânia. Contribuiu para a revolu-


ção na prática pedagógica. Seu método do coletivo propunha organizar a escola
como coletividade, levar em conta os sentimentos dos alunos. Deu lugar de des-
taque à infância e seus efeitos à psicologia do desenvolvimento humano. Traba-
lho e disciplina são eixos estruturantes da ação educativa de Makarenko.

Atividades
1. Qual a compreensão de desenvolvimento proposta por Vygotsky?

2. O que significa zona de desenvolvimento proximal (ZDP), para Vygotsky?

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Contribuições de Lev Vygotsky ao contexto educativo

Gabarito
1. Vygotsky entende que o desenvolvimento humano não é algo previsível,
universal, linear ou gradual, mas sim que está intimamente relacionado ao
contexto histórico-cultural em que a pessoa se insere, e se processa de forma
dinâmica.

2. Vygotsky percebeu que algumas vezes uma criança é capaz de resolver um


problema: depois de receber pistas; depois de ter visto o problema resolvido,
por um adulto ou por uma criança mais experiente; ao completar a solução
que fora iniciada pelo professor; se resolvê-lo em colaboração com outras
crianças.

O conceito de ZDP dá condições de caracterizar o desenvolvimento mental


que irá ocorrer, permite-nos saber como e se ela será capaz de aprender algo.
Indica os domínios de conhecimento que estão em processo, os brotos e
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Contribuições de Jean Piaget
ao contexto educativo

Catarina de Souza Moro


A teoria piagetiana é amplamente conhecida, mas não em essência.
Isso porque o que mais se divulga é a descrição do desenvolvimento cog-
nitivo ou intelectual, por meio dos estágios, etapas ou períodos1. Piaget
trabalhou com muitos outros conteúdos e, inclusive, deu maior importân-
cia a eles do que à sequência do desenvolvimento cognitivo em etapas.
Falaremos dessas diferentes contribuições.

Dados biográficos
1896 – Nasceu em agosto, em Neuchatel
Domínio público.

(Suíça).
1907 – Escreve seu primeiro artigo cien-
tífico.
1918 – Recebe o título de Doutor em Ci-
ências Naturais.
1919 – Estuda Psicologia, Lógica e Filoso-
fia na Universidade de Sorbonne.
Jean Piaget (1896-1980).
1921 – Trabalha no Instituto Jean-Jacques
Rousseau, estuda a influência do ambiente social e da linguagem sob
o pensamento infantil.
1924-1934 – Publica as primeiras obras em seu estudo sobre as
crianças.

1936 – Publica o primeiro volume da trilogia sobre as origens da


inteligência na criança.

1
Diferentes termos podem ser utilizados (período, estágio, fase, etapa, idade etc.) para se referir aos quatro momentos distintos no
desenvolvimento cognitivo, segundo Piaget. Neste texto, utilizaremos mais de um, sempre como sinônimos.

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1955 – Cria o Centro Internacional de Epistemologia Genética, em Genebra.

1969 – É premiado pela contribuição revolucionária acerca da natureza


do conhecimento humano.

1975 – Publica A Equilibração das Estruturas Cognitivas.

1980 – Morre aos 84 anos, trabalhando e pesquisando sobre o sujeito


cognitivo.

A partir de 1920, Piaget passou a se dedicar à pesquisa de como o ser humano


se torna conhecedor do mundo que o cerca; suas ideias sobre o conhecimento
enquanto processo, então, vão ficando claras. Com isso, duas hipóteses são fun-
damentais: o conhecimento se relaciona aos diferentes modos de ação e esque-
mas de pensamento dos indivíduos; os avanços e conquistas dos indivíduos são
reconstruções de conquistas anteriores.

A inteligência: objeto de estudo para Piaget


Para Piaget, a inteligência é uma condição de vida: todo organismo vivo é,
para ele, um organismo inteligente. Isso porque, para manter-se vivo, precisa
adaptar-se às condições de seu meio e a adaptação depende da capacidade de
se autorregular, reconstruir-se internamente, realizar trocas que lhe são vitais.

A inteligência constitui-se nessa dinâmica do viver, portanto, não é um estado,


não está dada ou acabada, neste ou naquele momento. A inteligência é o mo-
vimento, um processo que implica outros para sua ativação e manifesta-se nas
constantes trocas entre indivíduo e meio. Constitui-se uma parte integrante da
totalidade fisiológica do indivíduo; não se origina no aspecto da Biologia, nem é
um resultado dela, mas com ela tem relação.

Existem alguns fatores que interferem no processo de desenvolvimento e na


constituição do conhecimento dos indivíduos, ou seja, na inteligência de cada
um de nós. Segundo Piaget, esses fatores são:

 maturação biológica;

 experiência com objetos (experiências físicas);

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 transmissão social (informações que o adulto passa à criança);

 equilibração.

Esse último fator é o que contrabalança os outros três, ou seja, equilibra a


nova descoberta com todo o conhecimento até então construído pelo sujeito.

Quatro conceitos fundamentais


Vários conceitos trazidos por Piaget, da Biologia, passam a ser importantes
para entender como funciona e como se estrutura o desenvolvimento intelectu-
al humano. Todo organismo é uma totalidade que tende, constantemente, para a
organização e o equilíbrio.

Todo ato vital, manifesta, implicitamente, um certo grau básico de organiza-


ção, qualquer forma de vida apresenta uma estrutura original. Na ação simples
de um protozoário, bem como na de um bebê humano existe uma organização.
Não existem atos isolados, todos fazem parte de um conjunto muito complexo
que possui uma finalidade: a conservação no tempo da unidade biológica.

De acordo com Piaget, a organização e a adaptação são dois processos com-


plementares de um mesmo mecanismo, sendo o primeiro a parte interna de um
ciclo, e o segundo, o aspecto externo.

A adaptação é um processo dinâmico que compreende duas funções: assimi-


lação e acomodação. Todo e qualquer ato inteligente pressupõe uma concepção
ou interpretação da realidade exterior, ou seja, uma assimilação do externo ao
conhecimento já existente. Entende-se por assimilação a necessidade de incor-
porar situações novas às antigas, já presentes na mente. Enquanto acomodação
é a transformação que a experiência existente tem de sofrer para que possa in-
corporar o novo que foi recém-assimilado.

Quando os esquemas de ação da criança não conseguem assimilar determi-


nada situação, o organismo desiste e não realiza a acomodação ou se modifica,
ou seja, acomoda a nova realidade. São as inúmeras e diferentes acomodações
que levam à construção de novos esquemas de assimilação, dinamizando o de-
senvolvimento cognitivo.

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Os esquemas de ação representam a forma de agir do organismo frente à re-


alidade, podendo inclusive deformá-la. Um exemplo é quando a criança brinca
de faz de conta e, para ela, uma régua é um pente. Os esquemas de ações que
o sujeito exibe ditadas por sua organização interna em dado momento tendem
a uma complexidade crescente na medida em que o sujeito interage com o
objeto. O desenvolvimento depende, portanto, da reorganização de esquemas
de ação.

À medida que o ser humano evolui, os esquemas vão se tornando cada vez
mais diversos, o que implica níveis de organização mais complexos das ações de
conhecer. É por meio da pluralidade de esquemas que o sujeito pode cada vez
mais compreender a realidade que o cerca, atribuindo significações aos fenôme-
nos desta.

O conhecimento é considerado não como um estado, mas como um processo.


Relevante, para Piaget, é como ocorre a passagem de um estado de conheci-
mento para outro, muito mais do que os estados em si.

Inteligência e desenvolvimento
Juan Delval, um autor piagetiano da atualidade, em seu livro Crescer e Pensar:
a construção do conhecimento na escola, trata de forma clara o progresso psico-
lógico observado por Piaget. Delval (1998) consegue informar a característica
principal de cada estágio do desenvolvimento, bem como a qualidade de pensa-
mento que inaugura o estágio seguinte, uma vez que o próprio Piaget e os auto-
res que compreenderam bem seu legado destacam que o aspecto cronológico,
ou seja, a idade, não é o fator determinante de se estar num ou noutro estágio. O
mais importante é a característica de pensamento em cada fase.

Assim, logo após o nascimento, a criança começa a interagir com seu meio
(social e físico) por meio de reflexos. As ações se modificam e são principalmen-
te de ordem perceptual, sensorial e motora: a criança experimenta e reage ao
ambiente. Diz-se que a inteligência da criança neste primeiro período, chamado
sensório-motor, é a inteligência prática. A criança age sobre o ambiente de forma
direta, pois ainda não desenvolveu totalmente a capacidade representativa.

Uma das maiores conquistas da criança nessa fase é exatamente o início


dessa conquista, demonstrada por meio das imitações, das referências a obje-
tos ou pessoas que não estão presentes, por meio de um gesto, ação ou outro
objeto. Outra conquista que se inicia e é concluída nesse período é a construção
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da noção do objeto como algo independente dela e de suas ações – o chocalho


não deixa de existir porque ela não o esteja vendo. Piaget chamou essa capa-
cidade de “permanência do objeto”, a qual tem relação com uma característica
importante do pensamento adulto – a abstração, capacidade de criar, de pensar
sobre o que não está presente, mas que se relaciona com o que estamos fazen-
do, sentindo ou querendo.

No estágio seguinte, o pré-operatório, a criança passa da ação direta à ação


mediada. Isso significa que a criança conquistou a capacidade de represen-
tar, simbolizar. Sua relação com o mundo não é mais exclusivamente direta,
ela se relaciona por meio das imagens que construiu sobre o mundo, por
meio da linguagem oral, do jogo simbólico, do faz de conta, do desenho, das
imagens mentais, da linguagem escrita. É forte nesse período a influência da
linguagem, em virtude do acesso ampliado que ela possibilita para o conheci-
mento do mundo.

A primeira parte do período pré-operatório, os dois primeiros anos, é a fase


do pensamento intuitivo, pois a criança dá respostas a partir de suas crenças,
ou seja, não justifica, prova ou consegue demonstrar o que está dizendo. Essa
condição tem relação com o pensamento egocêntrico, característico dessa fase:
a criança só reconhece e compreende o mundo a partir do seu ponto de vista, o
ponto de vista do outro é algo impossível para ela. Com isso, a impressão que se
tem é que a criança dá explicações mágicas para a realidade.

Nos últimos anos desse período, surge outra forma de compreender o mundo
– o pensamento preconceitual. A criança começa a organizar aspectos que até
então pareciam não ter relação entre si, compreende melhor os atributos das
situações e dos objetos e, decorrente disso, compreende as mudanças nas situ-
ações. Para Piaget esse é o momento de início do pensamento lógico, sistemati-
zado, que permite ir além daquilo que é imediatamente percebido.

Várias pesquisas de Piaget relacionaram as interpretações das crianças – a


partir dos 4/5 anos e até os 12/13 anos – a problemas e propriedades lógico-
-matemáticas e físicas, e constituíram as conhecidas provas piagetianas ou diag-
nóstico operatório2.

O estágio seguinte é conhecido como operatório concreto. Nessa fase, a crian-


ça e o pré-adolescente constroem lógicas de relações e de classes, que as auxi-
2
O diagnóstico operatório integra muitas das avaliações psicopedagógicas feitas atualmente. Geralmente é objeto de estudo em cursos de espe-
cialização na área, por constituir-se um recurso avaliativo importante. Maria Lúcia Weiss, autora brasileira, tem uma obra intitulada Psicopedagogia
Clínica: uma visão diagnóstica dos problemas de aprendizagem escolar (Editora DP&A), na qual trata do assunto pormenorizadamente.

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liam a organizar melhor seu entendimento e sua ação sobre a realidade; conti-
nuam apegados às situações concretas nas quais se encontram, mas aplicam
algumas noções lógicas.

No último estágio, o operatório formal, o adolescente começa a pensar de


forma hipotético-dedutiva e aplicar conceitos básicos do pensamento científico.
O raciocínio nessa fase ultrapassa o real e concreto, o que o sujeito conhece e
está presente. Ele pensa sobre possibilidades, proposições, combinações mais
complexas, ampliando suas possibilidades de resolução de problemas.

As descobertas de pesquisadores que seguem a teoria de Piaget permitiram


desfazer um equívoco que existia antes: o de que todas as pessoas teriam as
mesmas competências de pensamento formal. Hoje, sabe-se que isso depende
da área de especialização e do cotidiano das pessoas. A forma como se utiliza o
pensamento formal varia de pessoa para pessoa, de uma cultura para outra e
depende também das exigências a que o indivíduo está submetido.

Consciência moral
Piaget se ocupou em desvendar a gênese (origem e mudanças) da consciên-
cia moral em crianças. Suas pesquisas e investigações nessas áreas deram-se por
meio dos jogos de regras.

O desenvolvimento da moralidade, assim como o desenvolvimento cogni-


tivo, segundo Piaget, foi dividido em estágios. Cada estágio superior incorpora
o estágio anterior. A passagem de um estágio para outro também se dá pelos
processos de assimilação e acomodação.

Foram descritos três estágios ou três níveis de consciência moral.

 Anomia: não há consciência da existência de regras, nem distinção entre o


certo e errado. As crianças desse nível são incapazes de seguir regras. Isso
ocorre frequentemente com crianças de até aproximadamente dois anos.

 Heteronomia: período em que surge o respeito às regras, não por com-


preendê-las, mas pela imposição de pessoas com maior autoridade (pais,
adultos, professores). Entende-se as regras como exteriores à criança e às
pessoas; as regras são imutáveis. É o período no qual a crença é a de que
a boa criança é a que segue a regra dos adultos. O respeito é unilateral e
característico da criança entre dois a seis anos, principalmente. A ideia de
justiça é confundida com a ideia de lei e autoridade.
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 Autonomia: a partir dos seis anos, a criança começa a compreender as re-


gras como acordos acertados entre as partes: “a regra do jogo se apresenta
à criança não mais como uma lei exterior, sagrada, enquanto imposta pelos
adultos, mas como o resultado de uma livre decisão, e como digna de res-
peito na medida em que é mutuamente consentida” (PIAGET, 1994, p. 60).

Para formar um sujeito autônomo, é necessário que a autoridade adulta seja


diminuída e o respeito mútuo seja desenvolvido. Não parece possível desenvol-
ver a autonomia em um ambiente autoritário.

Diante do universo escolar dos dias de hoje, tão fortemente marcado pela
incompreensão, violência, indisciplina, entre outros, a contribuição de Piaget
com essa temática tem tido continuidade. Um nome sempre lembrado é o de
Lawrence Kohlberg que, junto com outros pesquisadores, ampliou e deu conti-
nuidade aos estudos sobre o juízo moral. Entre os autores brasileiros que têm se
ocupado desse tema, o professor Yves de la Taille tem uma contribuição signifi-
cativa3 para se pensar a relação entre juízo moral, limites e disciplina no contexto
da escola.

Emilia Ferreiro (1985) reconhece que Piaget não se ocupou em desenvolver


uma teoria sobre leitura e escrita, sequer escreveu algo sobre o tema. Contudo,
essa autora vê a teoria de Piaget não de modo restrito, limitado aos conhecimen-
tos lógico-matemáticos e físicos, mas como uma teoria geral dos processos de
aquisição do conhecimento. Dessa forma, com as descobertas e teses de Piaget,
foi possível encontrar o sujeito cognoscente – a criança que procura ativamen-
te compreender o mundo que a rodeia e busca resolver as questões que este
mundo provoca – na aprendizagem da língua escrita.

Não iremos tratar aqui, pela abrangência do conteúdo em si, mas é impor-
tante marcarmos essa relação entre a psicogênese da língua escrita, de Emilia
Ferreiro, e as teses de Piaget.

Piaget, por meio de suas pesquisas, concluiu que “o conhecimento se forma e


evolui por meio de um processo de construção”. Para esse autor, a criança torna-
-se conhecedora agindo como o cientista que observa a realidade, interroga-
se sobre ela, investiga-a, levantando hipóteses e elaborando uma teoria ou um
estudo crítico da realidade.

Com isso, os educadores encontraram explicação para o processo de apren-


dizagem, estabelecendo-se a ponte entre a psicogenética piagetiana e a Edu-
3
Destacam-se duas obras: LA TAILLE, Y. de. Limites: três dimensões educacionais. São Paulo: Ática, 1998; e: LA TAILLE, Y. de. Vergonha, a Ferida
Moral. Petrópolis: Vozes, 2002.

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cação: a criança aprende construindo e reconstruindo suas próprias hipóteses


sobre a realidade que a cerca. A própria consideração sobre o erro da criança
foi modificada: passou-se a entender o erro como uma etapa necessária do pro-
cesso de construção do conhecimento e não como uma inaptidão por parte do
aprendiz.

Surgiu, então, o construtivismo, que possui três princípios básicos:

 respeito à produção do aluno;

 condições para o aluno testar suas hipóteses;

 oportunidade para os trabalhos em grupo, o que facilita o aprendizado.

O lugar do educador
Tendo por base os princípios construtivistas, o professor redimensiona o seu
trabalho: deve deixar de transmitir o conhecimento para passar a ser o articu-
lador da relação entre o sujeito que aprende e o objeto do conhecimento. Isso
significa realizar uma intervenção planejada para favorecer a ação do aprendiz
sobre o objeto. Ação essa que se encontra na origem da aprendizagem.

Para o exercício dessa articulação, o professor precisa ter instrumentos para


detectar com clareza o que seus alunos já sabem e o que eles não sabem. Para
isso necessita de um conhecimento consistente do objeto a ser apreendido e de
informações sobre o processo de construção, que lhe permite favorecer, anteci-
par o caminho pelo qual o aluno vai se apropriar desse conhecimento.

O professor é alguém que, em cada momento, em cada circunstância, toma


decisões pedagógicas conscientes: não se limitando a corrigir ou deixar errada
uma compreensão do aluno, pois, além de informar e respeitar a hipótese do
aluno, ele pode problematizar, questionar, ajudar a pensar.

Em uma proposta pedagógica embasada na teoria construtivista, o professor


vê, olha e escuta o aluno, interroga-se sobre ele, sobre o processo que está per-
correndo e aí define a ação. Essa ação é a expressão da hipótese formulada por
ele através da leitura que faz da sua turma. O professor ativo é sujeito da sua prá-
tica docente e, para construir sua competência, o único caminho é o da reflexão
sobre seus procedimentos.

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Momentos de aprendizagem
Dois aspectos são importantes na organização das situações de aprendiza-
gem dos alunos:

 o conteúdo trabalhado deve manter suas características de objeto sociocul-


tural real, sem transformar-se em objeto escolar vazio de significado social;

 a organização da tarefa pelo professor deve garantir a máxima circulação de


informações possíveis. É importante que os alunos considerem o que já sa-
bem, enfrentem contradições e pensem sobre o conteúdo em torno do qual
o professor organizou a tarefa. Também é necessário que os alunos resolvam
problemas e tomem decisões, em função do que se propõem produzir.

Nessa perspectiva de trabalho, a avaliação caracteriza-se por um momento


de reflexão crítica e tomada de decisão para o professor. Serve para desvelar
o processo para conhecer. Sem avaliar não se conhece e sem conhecer não se
pode confiar. Para se trabalhar de acordo com a realidade, é preciso saber ler
essa realidade. Conhecê-la, portanto, é fator desencadeador de uma decisão
consciente  e uma organização dos novos rumos da intervenção do professor.

Assim, é necessário não um ou outro instrumento específico, mas conhecer


a trajetória do aluno, e isso requer muitas informações sobre a caminhada dele.
Pode-se dizer, então, que a avaliação serve para conhecer, diagnosticar a reali-
dade, o avanço, pelo confronto entre os objetivos a serem alcançados, sobre os
quais o professor tem de ter tanta clareza, quanto do percurso feito pelo aluno.

Construindo a autonomia
A proposta construtivista não é sinônimo de espontaneísmo, liberalismo. É
uma proposta que tem objetivos a serem alcançados. E o maior deles é que os
alunos conquistem a autonomia, que pressupõe a capacidade de transformar,
de tomar decisões próprias, de buscar novas soluções para os problemas que
enfrenta, pela coordenação interna do seu ponto de vista com o das demais pes-
soas envolvidas no processo de decisão.

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Texto complementar

Fala, mestre!
(MACEDO, 2005, p. 38-42)

É possível ensinar disciplina?

Sim. Disciplina é uma competência escolar que as crianças aprendem


como qualquer conteúdo. Condição para realizar um trabalho com êxito, é
uma matéria interdisciplinar, porque dela dependem todas as outras.

A disciplina vem de casa?

Para alguns educadores, sim. Quem considera a disciplina uma coisa que
se tem ou não se tem possui uma visão moralizante – que transforma uma
competência numa questão de valor. Para eles, a disciplina depende da força
de vontade do aluno ou da determinação dos pais. Essa visão atribui culpa
em caso de indisciplina. De fato, na escola exclusiva, anterior à atual, sele-
cionavam-se os alunos e ficavam de fora aqueles que não se ajustavam ao
comportamento desejado. Nesse caso, disciplina era mesmo um prerrequi-
sito para a escola. Hoje, comportadas ou não, todas as crianças têm direito a
estudar.

Qual o principal erro da escola em relação à disciplina?

É pensar que existe um único tipo de disciplina e que ela só pode ser im-
posta. Minha ideia é que disciplina é um trabalho de todos em sala de aula.
Constrói-se a melhor forma de acordo com a necessidade. Numa aula tradi-
cional, expositiva, enquanto o professor fala ou escreve no quadro-negro,
os alunos devem ficar quietos, prestar atenção e copiar. Acontece que hoje
temos muitas propostas pedagógicas. Cada cultura escolar e cada atividade
em sala de aula tem uma disciplina adequada a seu desenvolvimento. De-
pendendo da situação, a melhor pode ser o silêncio ou as crianças pergun-
tando, ou conversando entre si.

É possível ensinar disciplina pelo exemplo?

Sim. Um erro comum é achar que a falta de disciplina é sempre do outro.


Fala-se muito que as crianças de hoje não têm limites. É verdade. Mas nós,

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adultos, também não temos. Em uma sociedade como a nossa, um dia se


almoça de manhã, outro dia de tarde, outro dia enquanto se fala ao celular.
Nós é que não temos rotinas para organizar a vida das crianças. Entendemos
os motivos da nossa “indisciplina” porque sabemos que para muitas pessoas
a regularidade se tornou impossível. Mas, se nós não somos disciplinados,
por que esperamos um comportamento regular das crianças, como se fosse
uma coisa natural, espontânea, quase herdada? Podemos conquistar o aluno
para um projeto de disciplina conseguindo a admiração dele. Em sua origem,
a palavra disciplina tem a ver com discípulo. Discípulo é uma pessoa que tem
alguém como modelo e se entrega pelo valor que atribui a essa pessoa. Com
o tempo, perdeu-se o elemento de referência que havia antigamente. Isso
tem de ser novamente conquistado, pouco a pouco, pelos dois lados.

A disciplina que se aprende na escola serve para a vida toda?

A gente tem de pensar a disciplina ao mesmo tempo como fim e como


meio. É um fim porque podemos desenvolver atitudes como concentração,
responsabilidade, interesse. Essas coisas viram ferramentas pessoais e de tra-
balho. Disciplina é também um meio, um instrumento sem o qual as coisas
não acontecem – ou acontecem fora do prazo ou dos padrões.

A disciplina ajuda a desenvolver a autonomia?

Disciplina é, cada vez mais, autodisciplina. Um exemplo é a lição de casa.


Hoje em dia a maioria das famílias não tem um adulto com tempo disponível
para fiscalizar o dever. A própria criança aprende a administrar essa tarefa e,
se necessário, ela pede socorro. A autonomia é uma conquista, um aprendi-
zado complexo e longo pelo qual as crianças desenvolvem a disciplina para
dar conta de suas tarefas.

O que é ser uma pessoa disciplinada?

Ser disciplinado significa ter um comportamento subordinado a regras.


Mas o que é regra? Algo que se constrói por consentimento. É como em um
jogo. As regras são arbitrárias, mas a criança aceita porque gosta de jogar.
Sem regra, não há jogo. Para definir regras, usamos o recurso da democracia.
A classe toda discute, sob a condição de que todos aceitem o que a maioria
decidir. O problema é que a minoria pode se recusar a cumprir. Deve-se com-
binar previamente que a não observação das regras implicará punições ou

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perdas. Um dos motivos que nos levam a aderir à disciplina são as consequên-
cias de não nos entregarmos a ela. Convencer é diferente de impor.

Todas as obrigações devem ser submetidas a discussão?

Não. Por exemplo: muitos pais perguntam aos filhos se eles querem comer.
Eu não acho que seja uma boa pergunta. Porque, se o filho disser que não
quer comer, como fica? A melhor pergunta é o que ele quer comer, dando
opções. Dar autonomia não significa abrir mão do seu papel de líder e de res-
ponsável por certas coisas. Se você submeter tudo à opinião da maioria das
crianças, a curto prazo elas vão decidir pelo pior. Primeiro, tenta-se conven-
cer. O último recurso é impor. É errado tentar tratar como homogêneo algo
desigual como a relação adulto e criança ou a relação professor e aluno.

As crianças conseguem entender a importância da disciplina?

Em 1930, Piaget escreveu um livro importante, O Julgamento Moral da


Criança, e mostrou que mesmo as bem pequenas já têm valores como o
gosto pelas regras, pela disciplina, pelo fazer benfeito e por se entregar a
uma tarefa coletiva. Só que o adulto não percebe. Piaget provou que é pos-
sível ver isso usando o exemplo das brincadeiras. A própria garotada se au-
torregula e se submete a regras coletivas. Piaget analisou como o respeito
entre iguais promove o desenvolvimento da criança. Muitos pais e professo-
res sabem compartilhar com ela a necessidade de uma regra de forma que a
criança até reclama, mas aceita, entendendo que é o melhor.

[...]

A disciplina e a ordem podem prejudicar a criatividade?

Rigidez é uma coisa, rigor é outra. Os artistas, que trabalham com criação,
costumam ser super rigorosos. Já rigidez é acreditar que uma coisa só pode
ser feita de um jeito, definido arbitrariamente. A disciplina está do lado da
criação, mas não é uma só. Alguns trabalham de dia, outros à noite; alguns
de um modo, outros de outro. A maior parte dos artistas tem de cumprir
prazos, se impõe tarefas. Se não houver disciplina, você para no meio, esque-
ce. Acontece que muitas vezes nós, adultos, usamos o discurso do rigor para
defender nossa rigidez ou nossa incapacidade de lidar com as situações.

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Dica de estudo
<www.youtube.com/watch?v=_CGu08gXTC4&feature=related>.

Vídeo que apresenta uma entrevista com Jean Piaget.

Atividades
1. Descreva os princípios do construtivismo.

2. Segundo Piaget, quais os fatores que interferem no processo de desenvolvi-


mento e na constituição do conhecimento dos indivíduos?

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Gabarito
1. Respeito à produção do aluno, condições para o aluno testar suas hipóteses
e oportunidades para os trabalhos em grupo, o que facilita a aprendizagem.

2. Maturação biológica; experiência com objetos; transmissão social e equili-


bração.

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Aprendizagem escolar
e habilidades de estudo

Irene Carmen Piconi Prestes


Nosso propósito neste capítulo é refletir sobre as interferências
dos hábitos de estudo no modo de aprender do aluno, uma vez que
entendemos que contribuem no desempenho e sucesso escolar

Abordar o assunto habilidades de estudo remete-nos a questões como:

 eu sei estudar?

 uso meu tempo para o estudo de maneira eficaz?

 quantas horas de estudo são necessárias para se ter sucesso nas


avaliações escolares?

 a criança aprende mais que o adulto?

Em outras palavras, tratar dos hábitos de estudo implica considerar


muitas variantes que o envolvem, entre elas o próprio estudar, a aprendi-
zagem, as habilidades, a inteligência.

A primeira questão que destacamos refere-se ao desenvolvimento cog-


nitivo do ser humano. A partir dos estudos realizados sobre a temática do
desenvolvimento humano pelos pesquisadores Sternberg (2000) e Lindgren
(1982), pode-se garantir que, à medida que ficamos mais velhos, tornamo-
-nos capazes de associações mais complexas entre o pensamento e o com-
portamento. Os pesquisadores defendem a ideia de que, ao longo do curso
do desenvolvimento, parecemos obter controle mais sofisticado sobre nosso
próprio pensamento e aprendizado. Sternberg (2000, p. 395) destaca que,
[...] com a idade, empenhamo-nos em um processamento da informação mais completo.
As crianças mais velhas codificam mais informações provenientes de problemas
do que as mais jovens e, portanto, aquelas têm maior probabilidade de resolver os
problemas com exatidão. Mesmo durante a vida adulta, continuamos a acumular
conhecimento ao longo da duração média de vida. [...] tornamo-nos progressivamente
capazes de compreender relações sucessivamente mais complexas por todo o curso do
desenvolvimento. Finalmente, com o passar do tempo, desenvolvemos uma crescente
flexibilidade em nossos usos de estratégias ou de outra informação. À medida que
envelhecemos, ficamos menos vinculados ao uso da informação apenas em um único
contexto e aprendemos como aplicá-la em uma variedade maior de contextos. Podemos
até obter maior sabedoria sobre nós mesmos e sobre o mundo que nos rodeia.
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Aprendizagem escolar e habilidades de estudo

Outra questão tão importante quanto a anterior é a necessidade de mensurar


o estudo pelo tempo que se despendeu com ele e sua relação com o aproveita-
mento, quer dizer, com os resultados satisfatórios nas avaliações escolares. Nérici
(1970) e Fernandes (1979) pesquisaram sobre as habilidades de estudo e alertam
para o fato de que não basta analisar os hábitos de estudo apenas pelo conjunto
de ações a serem realizadas para se atingir determinado fim, ou seja, pelo resulta-
do satisfatório. Mais do que isso, é necessário examinar os conceitos fundamentais
e o conjunto de ações que se referem às habilidades de estudo para ampliar a
compreensão sobre essa temática e sua importância na aprendizagem escolar.

Aprender
Tomemos, inicialmente, o enfoque de Kupfer (1989b) que é essencialmente
freudiano. A referência da Psicanálise de Sigmund Freud destaca que o ponto de
partida é investigar o motivo que leva alguém a ter desejo pelo conhecimento,
pela aprendizagem. Isso ocorre quando a criança questiona o mundo através
de inúmeros porquês; ela quer, na verdade, responder a duas questões existen-
ciais: por que nascemos e por que morremos, que correspondem sobremaneira
à sua origem e ao seu destino. O importante nesse processo investigativo é que
a criança revela-se curiosa com as coisas ao seu redor, está implicada em pensar,
duvidar, descobrir diferenças nas opiniões das pessoas (pais, professores).

Essa posição da criança não é fator determinante para a aprendizagem, mas


é uma variante significativa, pois quando uma criança, pela primeira vez, tem
contato e apreende a realidade ao seu redor através de um raciocínio que ela
mesma edificou, revela sua condição de sujeito desejante.

O encontro com a escola faz-se necessário uma vez que a criança não apren-
de sozinha e geralmente os pais não podem lhe dedicar tempo para o ensino.
Daí o papel do professor. Como nos demonstram os três enfoques teóricos:
da Psicogenética de Henri Wallon, da Epistemologia e teoria genética de Jean
Piaget e da Psicologia histórico-cultural de Lev Vygotsky, que identificaram que
a relação professor-aluno é mediada pelo diálogo, afeto, laço que se constrói
entre eles. Daí a primeira conclusão sobre a questão do aprender: para Kupfer
(1989b) aprende-se com alguém que, pela importância, nos influencia, ainda
que as verdades ditas possam ser futuramente superadas, esse momento é de-
nominado de campo transferencial entre professor-aluno. Assim, restará legiti-
mada a crença, a confiança do aluno no professor, naquele cuja posição tem
importância e é capaz de influenciar seu desejo de saber.

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Aprendizagem escolar e habilidades de estudo

Aprendizagem escolar e o ato de estudar


Tendo por referência os estudos de Piaget (1994), e seus colaboradores, con-
sidera-se ato de inteligência o exame da capacidade de aprender, que acontece
a partir da experiência e da adaptação ao ambiente circundante. Verifica-se que
também a aprendizagem está relacionada ao estudar, como ato que externaliza
a capacidade de ser inteligente. Dessa maneira, inter-relacionam-se aprendiza-
gem, inteligência e o ato de estudar. Como já citado anteriormente, são variáveis
importantes para os hábitos de estudo.

Ferreira (1986) define estudar como a aplicação da inteligência, a observação


de algo ou mesmo a frequência num curso qualquer. Têm-se, portanto, vários
significados do termo estudar que atingem inúmeras situações, além daquela
segundo a qual “estudar é ser estudante”. Uma outra definição afirma que estu-
dar é ir à procura da verdade, é um processo dinâmico de saber, procurar, saber
outra vez e recomeçar esse ciclo, demonstrando, assim, que o conhecimento é
construído na interação com o outro.

Em outra via de significação, estudar encontra correspondência com traba-


lhar, exigindo empenho, obediência, dedicação e doação do estudante, assim
como do operário.

Como é possível perceber, o ato de estudar significa ação do estudante.


Mesmo que o estudante esteja “passivo”, ouvindo o professor sem nada questio-
nar, ler ou escrever, estará ele ainda assim raciocinando de forma a compreender
o que está sendo dito. Segundo Martins (2006b), o estudante emite esforços no
sentido de assimilar o que está sendo dito para que também possa compartilhar
daquela informação. Estudar, enfim, é a ação que tem por fundamento compre-
ender o que ainda não está incluído no repertório do saber individual.

Vale observar que o ato de estudar começa em casa e continua na sala de


aula. Assim, ações concretas para o estudar podem ser incentivadas na família,
quando, por exemplo, os pais leem histórias para os filhos. Na sala de aula, o
estudante deve estar informado sobre o que será tratado e munido de material
para fazer anotações daquilo que foi enfatizado pelo professor. Durante a aula,
o ideal é fazer anotações sintéticas que possibilitem compreensão do que foi
abordado. As dúvidas devem ser destacadas.

Pozobon (2006) acrescenta que todo trabalho que envolve a aprendizagem


nunca está centrado apenas em quem aprende (estudante) ou em quem ensina
(professor), mas sempre nas relações entre os que ensinam (professores, familiares
e seu contexto cultural) e todos que aprendem (crianças, familiares, professores).

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Aprendizagem escolar e habilidades de estudo

A aprendizagem decorre do conjunto dos processos psicológicos perceptu-


ais, conceituais, linguísticos e motivacionais, os quais denominamos atos criati-
vos do indivíduo.

Na atualidade, o homem está imerso em uma tal quantidade de estímulos, que


é impossível absorvê-los e percebê-los na sua totalidade. Por essa razão, a vida
atual revela a necessidade de um constante aprimoramento das habilidades hu-
manas. Isso quer dizer que é preciso despertar a capacidade criativa do indivíduo
para buscar soluções de problemas ou pensamentos imaginativos e originais.

Entende-se criatividade como uma capacidade inerente ao ser humano que


possibilita a expressão de ideias únicas frente a situações desafiadoras ou con-
flituosas para o sujeito. Sob esse ponto de vista, criatividade, enquanto capa-
cidade humana, é a obtenção de novas correlações do conhecimento e ideias
acumuladas, formando novas táticas ou estruturas que resolvam um problema
de forma incomum.

Por essa razão, o indivíduo criativo, do ponto de vista cognitivo, apresenta


capacidade de desenvolver uma percepção imediata e mediata, flexibilidade,
variações e agilidade em organizar conceitos de forma a obter novas e inéditas
formas de argumentos.

A percepção é uma atividade contínua do cérebro na busca por identificar


objetos e eventos do dia a dia, mas que para desenvolver a criatividade necessi-
tada das inter-relações estabelecidas com o mundo exterior. O ato criativo acon-
tece à medida que a criança interage com o ambiente familiar e escolar, testando
seus limites. Assim, o meio deve oferecer condições ao pleno exercício do com-
portamento exploratório e da atitude ativa, incentivando o uso da imaginação,
da fantasia, do brincar e jogar, do questionamento constante, da correlação das
coisas que acontecem em frente a seus olhos, ouvidos e mãos. Os componentes
de uma ação criativa podem ser observados na quebra de padrões de compor-
tamentos estabelecidos na educação familiar ou escolar, numa solução original,
no enfrentamento de situações de risco, estando em harmonia com o meio.

Assim, o ser criativo olha os objetos e eventos na busca constante por novida-
de, com desprendimento para ver o todo sem preconceito e sem temor de errar.

Portanto, a criatividade serve muito para explorar o desconhecido e para isso


precisa ter em mente que frequentemente vamos errar. Para ampliar nosso po-
tencial criativo, é preciso um ambiente que desperte a curiosidade, que seja aco-
lhedor, incentivador, estimulador e seguro para que o indivíduo possa se aven-
turar em situações desafiadoras e desconhecidas.
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Aprendizagem escolar e habilidades de estudo

Habilidades de estudo
Para alguns, hábito é o costume de se fazer algo de modo natural, sem preci-
sar de uma ordem mental. Quando, por qualquer motivo, interrompe-se a rotina
do hábito, a pessoa experimenta a sensação incômoda de que alguma coisa está
lhe faltando.

Há também quem defenda a ideia de que não precisa necessariamente conter


esse elemento de falta, de sensação de prejuízo quando da ausência daquela
prática costumeira.

Hábitos são, segundo os estudos de Woolfolk (2000), repetições periodica-


mente realizadas de um dado procedimento. Vale ressaltar que só será habitual
aquilo que tiver o caráter de repetição, não podendo ser classificado de hábito
o que se modifica a cada novo agir. A periodicidade também é elemento es-
sencial, já que o hábito exige uma determinada frequência, uma certa regula-
ridade. Assim, o estudante deve definir quando estudar, criando um hábito e
explorando e ampliando o próprio ritmo de aprendizagem, habilidades muito
importantes para o desenvolvimento do hábito de estudo. O que se recomenda
é acostumar-se a estudar regularmente, de acordo com um plano de estudo. É
importante que o estudante adquira o hábito de ler revistas, jornais e livros (téc-
nicos e de literatura).

De acordo com os pesquisadores Nérici (1970, p. 20-37) e Fernandes (1979,


p. 147-152), uma habilidade se externaliza através de uma conduta, pois é um
conjunto de ações com a finalidade de se atingir determinado objetivo, que não
é outro, senão o de obter resultados satisfatórios com aquelas rotinas.

Assim, outra questão a abordar nesse tema (habilidades de estudo) é a sua re-
lação com o resultado satisfatório, o sucesso que se produz ao praticá-lo. Deve-
-se considerar que os efeitos produzidos tendem a ser influenciados por alguns
fatores, tais como regularidade, atitude, tempo, planejamento, cultura etc. Fre-
quentemente, diz-se que entre as boas condutas de estudo estão:

 na leitura, detectar ideias chaves do texto e construir significados;

 usar a agenda para anotar as tarefas escolares;

 planejar seu dia de estudo;

 estipular um horário e local apropriado para estudar.

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Aprendizagem escolar e habilidades de estudo

Assim, constroem-se hábitos de estudo com possibilidades de resultados sa-


tisfatórios. Quando isso não ocorre, tem-se atitudes negativas que levam a um
agir no sentido de não aprender e, consequentemente, ao fracasso escolar.

O fracasso escolar é definido como uma ruína, um mau êxito e aparece no


sistema educacional como um dos problemas mais analisados e estudados, e
sem solução até o momento. Nessa busca, ora se culpa a família, ora se culpa o
aluno, ora uma determinada classe social, ora o professor. Procurar culpados é
uma solução simplista que desconsidera a complexidade dessa problemática,
que merece ser discutida profundamente.

A seguir apresentamos algumas estratégias de estudo, propostas por Nérici


(1970). Iniciamos pelo processo de memorização. Abaixo, destacamos alguns
atos que auxiliam no desenvolvimento da memória.

 Fazer perguntas a si próprio para testagem.

 Recordar-se dos pontos principais da matéria que acabou de estudar.

 Ler e repetir sem olhar o material de estudo organizado.

 Reproduzir quadros, diagramas, fórmulas etc.

 Discutir o material de estudo com outras pessoas que detenham algum co-
nhecimento sobre ele. Estudar em grupo permite trocar informações com
os colegas sobre o que cada um entendeu sobre determinado assunto.

A atenção ao material é importante para desenvolver habilidades. Antes de


estudar, o estudante deve providenciar tudo o que for preciso, já que muito ma-
terial na mesa de trabalho pode atrapalhar. Organização é fundamental. E, por
isso, o estudante precisa dispor adequadamente o material que for usar, de forma
a facilitar o reinício na próxima vez. O material de estudo deve estar sempre em
boas condições de uso.

Fernandes (1979), ao tratar de técnicas de estudo, estabelece que o estudo


exige técnica e que a teoria tem que ser revista na prática. Entre outros pontos
de sua obra, expõe a importância da autoavaliação, ou seja, de verificar se houve
um aproveitamento satisfatório do texto ou matéria estudados.

No tocante ao processo da atenção dispensada no ato de estudar, a autora diz


que depende do interesse que desperta o assunto e a disponibilidade do estu-
dante em dar sentido ao texto estudado. Sobre o interesse, Fernandes (1979) diz
que “quando se conhece alguns valores de um assunto, desperta-se o interesse

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Aprendizagem escolar e habilidades de estudo

para o seu conhecimento”. Com o despertar do interesse, os sentidos e signifi-


cados deverão posicionar-se em prontidão. Na sequência de sua obra, esclarece
sobre a importância da riqueza de vocabulário, o que comprovadamente facilita
a compreensão. Quanto mais palavras e construções gramaticais se dispõem no
repertório, mais se permitirá conhecer com elas. Fernandes (1979) complementa
que, para ampliar a capacidade de aprender, é interessante usar a estratégia de
construir esquemas e, para tanto, é necessário observar alguns procedimentos,
conforme abaixo.

 Direcionamento do interesse.

 Disponibilização dos sentidos.

 Uma leitura breve, sublinhando-se as frases de efeito.

 Na segunda leitura, fazer um esquema de acordo com a orientação do


texto.

Com relação à compreensão do texto, Fernandes (1979) sugere a confronta-


ção do texto com dados da realidade, ou seja, confrontar o que se lê com o que
se conhece acerca do assunto.

Como regra geral, deve-se dedicar cerca de duas horas diárias de estudo. Em
vez de uma vigília noturna de estudo antes da prova, é melhor fazer uma revisão
rápida dos conceitos fundamentais e ter uma boa noite de sono.

Ao enfrentar provas, o ideal é fazer uma leitura do conjunto da prova antes


de começar a responder, para se ter uma ideia do volume e da dificuldade das
questões. É indicado começar a responder as questões mais fáceis e de respostas
mais rápidas e, depois de terminar a prova, revê-la de forma crítica, para corrigir
pequenos erros decorrentes da distração. Uma prova não tem apenas a função
de medir algo, mas é também oportunidade de repensar o processo de apren-
dizagem. Pode-se combinar com os professores um retorno, se possível rápido,
das avaliações realizadas, utilizando os resultados obtidos como o indício de ne-
cessidades de estudo.

Um estudo é eficaz quando se torna significativo, isto é, quando os novos


conhecimentos e informações são assimilados pessoalmente, podendo ser reu-
tilizados em outras situações.

Não há receitas mágicas para um estudo bem-sucedido, e cada pessoa deve de-
senvolver seu próprio estilo cognitivo. O ato de estudar envolve o desenvolvimen-

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Aprendizagem escolar e habilidades de estudo

to dos processos psicológicos básicos do comportamento e de capacidades de au-


tocontrole, classificadas em três áreas: capacidades organizacionais, capacidades
motivacionais e capacidades necessárias para uma aprendizagem eficiente.

Capacidades organizacionais
Desenvolver um hábito de estudo pressupõe assumir responsabilidades com
um plano de estudo. Daí a necessidade de se escolher um local calmo e ade-
quado para trabalhar, como um canto na biblioteca ou um local acolhedor em
casa, se possível longe de qualquer distração, para garantir a concentração. A luz
também é importante, de preferência natural e sem sombras. Evite as lâmpadas
fluorescentes.

É importante distribuir o tempo de forma apropriada pelas várias matérias


que se está estudando. A orientação é não gastar demasiado tempo com as ma-
térias preferidas, em prejuízo daquelas de que não gosta ou acha difícil. Assim,
é importante estabelecer uma rotina semanal para estudo, distribuindo todas
as disciplinas e reservando um tempo para outras atividades e para o lazer. É
recomendável reservar mais tempo para as disciplinas mais difíceis e deixar um
tempo razoável para outras.

Uma forma fácil de fazer uma organização do tempo é usar um calendário se-
manal. Além disso, também se pode construir uma lista diária de tarefas a fazer.
É mais eficaz dedicar o tempo de estudo aos assuntos específicos do que estudar
genericamente. Isso significa, por exemplo, dedicar um período de tempo parti-
cular a um determinado capítulo ou a um determinado conjunto de problemas.

Capacidades motivacionais
Uma ideia para motivar seus alunos é começar com uma tarefa fácil e interes-
sante, alguma coisa que propicie um sentimento de satisfação. Outras formas de
iniciar o estudo pode ser revisar ou relembrar os pontos principais da última aula
ou sessão de estudo.

É interessante estabelecer objetivos realistas a serem atingidos a curto


(semana a semana), médio (mês a mês) e longo prazo (anual). Isso pode conduzir
o aluno a um sentimento de motivação face ao estudo, dado que provavelmente
conseguirá atingir as metas propostas.

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Aprendizagem escolar e habilidades de estudo

Motivo pode ser definido como “uma condição interna relativamente dura-
doura que leva o indivíduo ou que o predispõe a persistir num comportamento
orientado para um objetivo, possibilitando a transformação ou a permanência
da situação” (SAWREY; TELFORD, 1976, p. 18). É o processo pelo qual o homem
é, consciente ou inconscientemente, provocado a agir com intencionalidade na
busca do prazer e da satisfação.

Os motivos constituem o aspecto dinâmico do processo educacional, re-


presentando um dos requisitos básicos de toda a aprendizagem formal. Assim,
deve-se reconhecer que tanto o conteúdo como os métodos de ensino devem
respeitar os motivos individuais e os da comunidade social onde vive o aluno.

Um aluno com motivação para aprender apresenta tendência a considerar


as atividades escolares significativas e de valor e a tentar extrair delas os bene-
fícios escolares esperados. Cabe ao professor tornar os alunos produtivamente
envolvidos com o trabalho escolar, desenvolver a longo prazo a motivação de
aprender, para que sejam capazes de “educar-se durante toda a vida”, e, assim,
torná-los cognitivamente envolvidos, isto é, fazê-los pensar profundamente
sobre o que estudam.

Capacidades necessárias para


uma aprendizagem eficiente
Vários estudos têm comprovado que a intenção de aprender, só por si, não
é suficiente. Por exemplo, um elemento importante na memorização dos con-
teúdos é o fato de envolverem alguma atividade significativa decorrente dos
conteúdos a aprender.

Assim, é aconselhável orientar os alunos para que revisem regularmente as


anotações das aulas, resumos e condensados num quadro que permita uma
boa memorização do conteúdo. Ensine-os a fazer uso de diagramas e setas, que
permitam uma clara compreensão dos tópicos e subtópicos, bem como a distin-
ção dos exemplos do tema principal.

A família e a escola são agentes responsáveis pela aprendizagem dos alunos, e é


preciso que, de alguma forma, possam transmitir o conhecimento utilizando-se de
técnicas variadas. Esse trabalho é para desenvolver a autonomia e responsabilidade
nos estudantes, para que venham assumir o estudo como um compromisso deles
com o professor, sem afastar os pais de acompanhá-los nas suas tarefas escolares.

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Reiteramos, com Fernandes (1979), o que fora dito no início desta exposição:
são indispensáveis para o aprender, a ação, o trabalho e a atividade do sujeito na
busca do conhecimento. Segundo Fernandes (1979, p. 149), “para alguma coisa
ser conhecida ou adquirida, é necessário um sujeito que possa assimilar o co-
nhecimento ou adquirir a habilidade”.

Texto complementar

Diretrizes sobre estudar


(WOOLFOLK, 2000, p. 276)

Assegure-se de que você tem o conhecimento declarativo necessário


(fatos, conceitos, ideias) para entender novas informações.

Exemplos:

1 – Mantenha acessíveis definições de vocabulário-chave enquanto você


estuda.

2 – Revise fatos e conceitos requeridos antes de tentar novo material.

Descubra que tipo de prova o professor vai fazer (dissertação, resposta


curta) e estude o material com aquilo em mente.

Exemplos:

1 – Para uma prova com questões detalhadas, pratique respostas escritas


a possíveis perguntas.

2 – Para uma prova de múltipla escolha, use mnemônicos para lembrar


definições de termos-chave.

Assegure-se de que você está familiarizado com a organização dos


materiais a serem aprendidos.

Exemplos:

1 – Revise os títulos, introduções, frases do tema e resumo do texto.

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2 – Esteja alerta para palavras e frases que sinalizem relacionamentos, tais


como por outro lado, porque, primeiro, segundo, entretanto, desde que.

Conheça suas próprias habilidades cognitivas e use-as delibera-


damente.

Exemplos:

1 – Use exemplos e analogias para relacionar material novo com algo que lhe
interesse e que você entenda bem, tal como esportes, passatempos ou filmes.

2 – Se uma técnica de estudo não está funcionando, tente outra – o obje-


tivo é ficar envolvido, não usar uma estratégia particular.

Estude a informação correta da maneira correta.

Exemplos:

1 – Assegure-se de que você sabe temas e leituras que a prova irá cobrir.

2 – Dedique seu tempo a material importante, difícil e desconhecido que


será exigido para a prova ou tarefa.

3 – Mantenha uma lista de partes do texto que lhe dão problema e dedi-
que mais tempo àquelas páginas.

4 – Processe as informações importantes completamente, usando mne-


mônicos, formando imagens, criando exemplos, respondendo perguntas,
tomando notas em suas próprias palavras e estendendo-se sobre o texto.
Não tente memorizar as palavras do autor – use as suas próprias.

Monitore sua própria compreensão

Exemplos:

1 – Use questionamentos para checar seu entendimento.

2 – Quando a velocidade de leitura diminui, decida se a informação no


trecho é importante. Se for, anote o problema a fim de poder reler ou peça
ajuda para entender. Se ela não for importante, ignore-a .

3 – Verifique seu entendimento, trabalhando com um amigo e fazendo


perguntas um ao outro.

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Dica de estudo
<www.unoeste.br/FIPP/gapa/inventario.htm>.

Esse site apresenta uma pesquisa que se utiliza de um inventário de hábitos


de estudo. Através dessa pesquisa é possível avaliar como a pessoa procede no
ato de estudar, sendo uma ferramenta importante quando se quer melhorar os
processos educativos. O inventário permite uma autoavaliação e reflexão sobre
as habilidades de estudo.

Atividades
1. Apresente uma definição de hábitos de estudo.

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2. Discorra sobre o significado do “ato de estudar”.

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1 Hábitos são, segundo os estudos de Woolfolk (2000), repetições periodica-
mente realizadas de um dado procedimento. Vale ressaltar que só será ha-
bitual aquilo que tiver o caráter de repetição, não podendo ser classificado
de hábito o que se modifica a cada novo agir. A periodicidade também é
elemento essencial, já que o hábito exige uma determinada frequência, uma
certa regularidade. Assim, o estudante deve definir quando estudar, criando
um hábito e explorando e ampliando o próprio ritmo de aprendizagem, ha-
bilidades muito importantes para o desenvolvimento do hábito de estudo.
O que se recomenda é acostumar-se a estudar regularmente, de acordo com
um plano de estudo. É importante que o estudante adquira o hábito de ler
revistas, jornais e livros (técnicos e de literatura).

2. Ferreira (1986) define estudar como a aplicação da inteligência, a observa-


ção de algo ou mesmo a frequência num curso qualquer. Têm-se, portanto,
vários significados do termo estudar que atingem inúmeras situações, além
daquela segundo a qual “estudar é ser estudante”. Outra definição afirma que
estudar é ir à procura da verdade, é um processo dinâmico de saber, procurar,
saber outra vez e recomeçar esse ciclo, demonstrando, assim, que o conhe-
cimento é construído na interação com o outro. Em outra via de significação,
estudar encontra correspondência com trabalhar, exigindo empenho, obe-
diência, dedicação e doação do estudante, assim como do operário. Como é
possível perceber, o ato de estudar significa ação do estudante. Mesmo que
o estudante esteja “passivo”, ouvindo o professor sem nada questionar, ler ou
escrever, estará ele ainda assim raciocinando de forma a compreender o que
está sendo dito. Segundo Martins (2006), o estudante emite esforços no sen-
tido de assimilar o que está sendo dito para que também possa compartilhar
daquela informação. Estudar, enfim, é a ação que tem por fundamento com-
preender o que ainda não está incluído no repertório do saber individual.

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Disciplina:
uma retrospectiva histórica

Irene Carmen Piconi Prestes


Neste capítulo apresentamos uma retrospectiva da alguns aspectos
que envolvem a disciplina escolar e seus desdobramentos, seja a disciplina
doméstica, profissional, acadêmica ou pessoal. Esperamos que os pontos
aqui descritos contribuam para ações saneadoras frente à problemática
da indisciplina escolar nos dias de hoje. Como nos indica Silva (1998, p. 1)
“a prática educacional que tenciona contribuir para a transformação social
é inseparável do exercício inequívoco e consciente da disciplina”.

O primeiro ponto que vamos discorrer visa associar o ato disciplinar ao


desenvolvimento da criança e do adolescente. Entendemos que a mani-
festação de um comportamento disciplinado articula-se ao momento no
desenvolvimento em que se encontra a criança e o adolescente para que
responda adequadamente as questões que dizem respeito às regras, à or-
ganização e às normas que regulam as práticas educativas.

Geralmente, entre os seis e sete anos de idade, a criança inicia no


mundo das letras; porém, verifica-se que ela está iniciando sua vida esco-
lar cada vez mais cedo. Encurta-se a infância – o período em que a semen-
te brotada começa a desabrochar – vivendo um processo que antecipa
a criança, o adolescente em adulto (o apelo à imagem sexual da mídia,
a rotina de atividades extracurriculares). O ser humano, ao contrário dos
animais, é totalmente dependente nos seus primeiros anos de vida. E essa
dependência não se refere somente ao seu corpo, uma vez que também
sua inteligência e sua sensibilidade estão sendo desenvolvidas.

Segundo Leite, Salles e Oliveira (2000, p. 5-9), quanto mais cedo co-
locamos a criança em situações rigidamente estruturadas e conduzidas,
menos possibilidade terá ela de chegar a encontrar seu jeito de ser, sua vo-
cação, sua afetividade. Sua espontaneidade é comprometida pela neces-
sidade de cumprir tarefas predeterminadas e ter um desempenho que lhe
assegure uma boa colocação dentro da escola de valores situados entre o
êxito e o fracasso. As variadas atividades de caráter psicológico e físico são
estímulos para a produção de caminhos mentais e para o armazenamento
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Disciplina: uma retrospectiva histórica

das informações no cérebro. Essas informações serão exigidas no futuro em situa-


ções complexas do jogo humano, facilitando a aprendizagem e caracterizando
a prontidão motora.

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Outro detalhe importante dessa fase do crescimento infantil relaciona-se à
não uniformidade do crescimento corporal, sendo que se observa um amadure-
cimento na seguinte ordem: primeiro, pés e mãos; depois, pernas e antebraços;
e, por último, coxas e braços. Desse modo, os jogos e brincadeiras desenvolvidos
pelo professor devem seguir o princípio da maturação física da criança. O me-
tabolismo dela é muito elevado, em torno de 20% a 30% maior que do adulto,
gerando a necessidade de maior ingestão e balanceamento de nutrientes ali-
mentares, assim como da regularidade na oferta de alimentos, como afirmam
Leite, Salles e Oliveira (2000, p. 9-10).

Dos cinco aos sete anos (fase pré-escolar), há um elevado instinto de movi-
mento e vivência lúdica, uma grande curiosidade pelo desconhecido, que con-
firma a necessidade de experiências múltiplas motoras, intrínsecas e evidencia-
das nos jogos. A capacidade de concentração da criança é de aspecto médio a
baixo e, portanto, os jogos longos e de raciocínio lógico devem ser introduzidos
de maneira lenta e gradual nos grupos infantis.

Dos sete aos dez anos (idade escolar), há um despertar por atividades físicas
esportivas, desenvolve-se naturalmente uma atitude otimista em relação aos
jogos, além da assimilação rápida de conhecimentos e habilidades, mas há um
baixo nível de fixação de movimentos, que devem ser repetidos diversas vezes.
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Também nota-se que a família e amigos e/ou companheiros são agentes funda-
mentais para o desenvolvimento social da criança.

Dos dez aos doze anos (pubescência), constata-se a melhor idade para a
aprendizagem motora com melhorias nos níveis de força, rápida maturação
morfológica e funcional. A união desses elementos dá condições ao pleno de-
senvolvimento motor, como concluem Leite, Salles e Oliveira (2000, p. 12-14).

Dos doze aos quinze anos (puberdade), observa-se uma grande variação no
comportamento psicológico: uma instabilidade emocional, apesar do alto nível
intelectual. Há uma grande necessidade de vivência em grupo, assim como ne-
cessidade de autorrealização no grupo em que o jovem está inserido. O aumen-
to brusco do nível de testosterona e a irrupção da sexualidade são identificados,
como concluem Leite, Salles e Oliveira (2000, p. 12-14).

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Ainda em Leite, Salles e Oliveira (2000), vemos que o desenvolvimento mental


humano é influenciado por quatro fatores inter-relacionados:

 maturação – Amadurecimento físico especialmente do sistema nervoso


central;

 experiência – Manipulação de objetos, movimentos corporais e pensa-


mentos sobre os objetos concretos;

 interação social, jogos – Conversas e trabalho com outros indivíduos, es-


pecialmente outras crianças;

 equilibração – É o processo de reunir maturação, experiências e socializa-


ção de modo a construir e reconstruir estruturas mentais.
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O vínculo afetivo e o contexto escolar


Desde pequenos, os seres humanos têm a necessidade de cuidados por parte
de outrem. Durante o período de formação da personalidade existem algumas
circunstâncias fundamentais a serem desenvolvidas. O vínculo afetivo é um ele-
mento primordial nessa categoria.

Segundo Ballone (2006, p. 2), a escola oferece um ambiente propício para a


avaliação emocional das crianças e dos adolescentes por ser um espaço social
relativamente fechado, intermediário entre a família e a sociedade. É na escola
que a performance dos alunos pode ser avaliada e eles podem ser comparados
estatisticamente com seus pares, com seu grupo etário e social.

Dentro da sala de aula, há situações psíquicas significativas, nas quais os pro-


fessores podem atuar tanto beneficamente quanto, consciente ou inconsciente-
mente, agravando problemas emocionais dos alunos. Os alunos podem trazer
consigo um conjunto de situações emocionais, intrínsecas ou extrínsecas, de sua
própria constituição emocional e podem apresentar as consequências de suas
vivências sociais e familiares.

Entre as questões externas à personalidade capazes de se traduzir em pro-


blemas emocionais, encontram-se as dificuldades adaptativas da adolescência.
Na infância também há momentos estressantes, como as mudanças, as novida-
des, as exigências adaptativas, uma nova escola ou, simplesmente, a adaptação
à adolescência. É exatamente nessas fases de provação afetiva e emocional que
vêm à tona as características da personalidade de cada um, as fragilidades e di-
ficuldades adaptativas.

Ballone (2004, p. 3) também alerta que não se pode considerar que todas as
crianças devam sentir e reagir da mesma maneira aos estímulos e às situações
ou, o que é pior, acreditar que submetendo indistintamente todos alunos às
mais diversas situações, quaisquer dificuldades adaptativas, sensibilidades afeti-
vas, traços de retraimento e introversão se corrigiriam diante desses desafios ou
diante da possibilidade do ridículo.

Como se sabe, a escola é um universo de circunstâncias pessoais e existen-


ciais que requerem do educador uma boa dose de bom senso, quando não, uma
abordagem direta com alunos que acabam demandando uma atuação muito
além do posicionamento pedagógico e metodológico da prática escolar.
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Segundo Uliane (2006, p. 1-3), o desempenho escolar satisfatório é muito im-


portante para a integração da personalidade infantil e o desenvolvimento da
autoestima. Por isso, é bom lembrar alguns fatores que provocam na maioria um
estado de inquietação e tensão muito grande:

 ênfase exagerada nas provas e avaliações;

 despotismo de alguns professores que detêm o sistema de punições e re-


compensas;

 ameaça de pais muito exigentes e repressores, que privam de afeto e aten-


ção o filho mal-sucedido;

 falta de exercício físico ao ar livre, de alimentação balanceada etc.

Sem se sentir apoiada e ajudada pelos professores e pais, a criança, mesmo


tendo potencial da inteligência, aos poucos vai se convencendo de que é real-
mente incapaz de aprender. Ela pode terminar o ano escolar levando consigo a
marca da humilhação e do fracasso, a certeza de que não conseguiu êxito porque
é menos dotada, menos inteligente, considerando-se inferior aos outros. Ela
pode sentir que não adianta continuar se esforçando e acaba por desistir porque
não consegue compreender o que a escola espera dela. Esse é o momento em
que a criança mais precisa de compreensão, do apoio dos pais, e de segurança,
pois terá que possuir coragem e energia para enfrentar as dificuldades do ano
seguinte e a vergonha de ser o aluno repetente, como conclui Uliane (2006).

Os apelos da vida social


Um outro ponto é discorrer sobre as manifestações da sexualidade e o apelo do
social articulados, agora, com a escolarização e as exigências escolares. A passagem
para o 6.º ano, aos 11 anos de idade, é marcada por interferências que acabam por
redimensionar a vida estudantil e as perspectivas pessoais, além de exigir do sujeito
a consolidação da autonomia estudantil já anunciada em anos anteriores. Contudo,
a despeito das crescentes exigências escolares, o aluno projeta-se progressivamente
para fora das “instâncias estritamente pedagógicas”, tal é a força dos focos de de-
senvolvimento, do impacto das recentes descobertas e do conflito de sentimentos
aí envolvidos. Os processos de luto gerados pelas sucessivas perdas, o crescente in-
teresse por temas não considerados pela escola, a busca de identidade, o desejo de
responder a perguntas como “quem sou” e “o que quero” são, segundo Leite, Salles
e Oliveira (2000, p. 16), elementos desestruturantes e, simultaneamente, elementos
constituintes do amadurecimento e inserção na vida adulta.

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O dia a dia escolar é conturbado pelos fortes apelos de ordem sexual, afetiva,
econômica, ideológica e social. Assim que o aluno reconhece a importância do
ensino, ele o faz em nome de metas futuras, certamente externas ao perímetro
escolar ou aos objetivos estritamente escolares. Em síntese, a escola deixa de ser
o eixo central da vida do aluno. Os conflitos entre a escola e os apelos da vida
social, tão frequentes nos alunos do Ensino Médio (15 a 17 anos), já aparecem
muitas vezes entre os pré-adolescentes.

Diferentes significados
do termo disciplina
Para tratar de disciplina, historicamente, recorremos à autora Estrela (1992, p.
15-16), que esclarece as diferentes significações dadas ao termo disciplina: pu-
nição; dor; instrumento de punição; direção moral; regra de conduta para fazer
reinar a ordem numa coletividade; obediência a essa regra.

Por isso, para muitos, o termo disciplina tornou-se pejorativo. Em contraparti-


da, o termo indisciplina tende a ser definido pela negação ou privação da disci-
plina ou pela desordem proveniente da quebra da regra estabelecida.

Podemos entender que há vários tipos de disciplina: familiar, escolar, militar,


religiosa, desportiva, partidária, sindical. Toda disciplina/indisciplina tem seu
contexto sócio-histórico, seu tempo, sua sociedade, e cada uma vive sua especi-
ficidade, trazendo como objetivo de uma harmonia social.

Toda educação visa à inserção do


Corel Image Bank.

indivíduo numa sociedade que preten-


de ser ordenada e harmônica. Assim, a
disciplina social transforma-se num
fim educativo de caráter mediato e a
disciplina educativa assume, simulta-
neamente, o caráter de fim imediato e
de meio da Educação.

Estrela (1992, p. 25-26) apresenta uma analogia, dizendo que, se a aprendiza-


gem e a interiorização de regras sociais se apresentam como um fim educativo,
também a ação pedagógica está ligada às aprendizagens institucionalmente or-
ganizadas com uma finalidade educativa.

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A autora faz um breve relato no que diz respeito à história evolutiva da edu-
cação e à disciplina, explicando que, nas sociedades ocidentais, as práticas dis-
ciplinares seguem etapas e obedecem a princípios semelhantes. O conceito de
disciplina inicialmente aparece ligado à conformidade exterior compreendida
como regras e costumes, avança para uma conformidade simultânea entre exte-
rior e interior e alcança a perspectiva que valoriza principalmente a interiorida-
de, ou o engajamento livre do ser.

No pensamento grego, vemos a ideia da necessidade de uma ordem e har-


monia interior (realização do ser) que correspondia a uma ordem e harmonia
externa (pólis).

O cristianismo acentua a ideia de interioridade (valoriza o espírito e desvalori-


za a matéria, fonte de pecado e desordem) e de uma disciplina que exige adesão
íntima e boa vontade, trazendo consigo uma carga ético-religiosa ligada ao pen-
samento de que a vida humana tem um fim transcendente: a busca do reino de
Deus. Essa concepção de disciplina perdurou até o século XIX e desvaneceu-se
gradualmente devido às novas concepções educativas que puseram em discus-
são a Educação Tradicional e os fundamentos filosóficos e com a modificação
das condições de vida a que não foram alheios os conflitos mundiais.

A carga ético-religiosa se dissolve num vazio axiológico ou se modifica numa


carga ético-política na Educação Nova, em especial na educação “socialista”, para
qual disciplina é moral e política.

Os autores Medeiros (2006, p. 2) e Estrela (1992, p. 75-80) em seus estudos


sobre a disciplina enfatizam ainda a importância de entender a evolução educa-
tiva para perceber o que se passa hoje nas escolas e nas salas de aula.

Relações de poder, autoridade e disciplina


Para Estrela (1992, p. 78-82), apesar das modificações profundas pelas quais
a escola vem passando na contemporaneidade, subsistem nela heranças do
poder centralizado no professor. O professor era, e em muitos casos ainda é,
aquele que detinha o saber, o conhecimento, monopolizando ou centralizan-
do a comunicação e, com isso, limitando o pensamento, a criatividade e as ex-
periências do aluno, considerado mero receptor. A relação estabelecida era de
dominação-submissão, tendo o aluno a ilusão de participação, minimizando os
aspectos relacionais.

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O professor, sem muitas vezes ter consciência disso, institui “a organização monárquica” da
sala de aula, exteriorizada por um conjunto de privilégios inerentes à sua função: o professor
seleciona o saber e os recursos permitidos para o acesso a esse saber; dita normas e controla
os comportamentos; arbitra as matérias de disputa; condiciona os sentimentos ao condicionar
a possibilidade da sua exteriorização; controla as relações humanas na sala de aula; determina
os critérios do que é bom, verdadeiro, belo, útil, correto. (ESTRELA, 1992, p. 17-18)

Apesar do discurso liberalizante sobre as regras da aula, observamos o predo-


mínio daquelas que constituíram o pilar da Pedagogia tradicional: o aluno deve
estar calado, quieto, atento, ser obediente e respeitador.

Como escreveram Pereira (2006, p. 2) e Estrela (1992, p. 25-36), para se chegar


a essa ordem disciplinar, o professor mobilizava os recursos didáticos e relacio-
nais, cultivando a impessoalidade e a distância, ou, pelo contrário, tentando se-
duzir pela proximidade e simpatia. Também instituía um sistema de recompen-
sar, punir e manipular a competição.

A disciplina consentida leva o aluno a

Domínio público.
compreender e a aderir voluntariamente às
regras do jogo que ele se vê obrigado a jogar.
Para o que se propõe, essa Pedagogia é bem
coerente com seus pressupostos e objetivos,
mas Estrela (1992) questiona se é realmente
adequada e suficiente à formação do cidadão
que hoje vive em democracia, em um mundo
complexo e instável.

A Escola Nova e a disciplina


Os críticos da escola tradicional denunciam o caráter repressivo das suas prá-
ticas. Eles abrem as portas a uma Pedagogia de existência afetiva e pretendem
anular a relação pedagógica de dominação-subordinação, substituindo-a por
uma relação de liberdade e cooperação.

A introdução, na sala de aula, de material didático que o aluno pode manu-


sear livremente constitui-se em uma revolução pedagógica inaugurada por
Maria Montessori, nos anos 1950. O professor deixa de ser o transmissor direto
do saber e passa a ser o organizador do ambiente de aprendizagem. Esse am-
biente deve ser estimulante, proporcionando ao aluno o interesse e a participa-
ção livre, incentivando-o ao desenvolvimento da sua autonomia.

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Para Montessori (apud ESTRELA, 1992, p. 19), disciplina não se obtém com
sermões ou ordens, mas é resultado do respeito pelas leis naturais e pelos princí-
pios de trabalho e de liberdade. “Disciplina não é, pois, um fim, mas um caminho
que permitirá à criança saborear as alegrias da ordem interior, atingidas graças a
conquistas sucessivas” (ESTRELA, p. 21). A Escola Nova se volta, portanto, a uma
educação democrática.

A formação do cidadão responsável e participante pressupõe uma educação


que permita o exercício da liberdade e da responsabilidade. A disciplina deixa
de ser externa, coercitiva, para dar espaço ao autocontrole e ao autogoverno. A
responsabilidade da Pedagogia ativa está baseada no interesse e no respeito a
leis naturais de desenvolvimento infantil, proporcionando, assim, a conquista de
autonomia e de autodisciplina. Segundo Estrela (1992, p. 21), “a manutenção da
disciplina não exclui as sanções, mas a criança submete-se a elas mais facilmen-
te, porquanto contribui para a elaboração das regras e se sente responsável pela
sua preservação. Não exclui também a intervenção do adulto que não se demite
de seu papel de adulto”.

A disciplina ingrediente da liberdade


Os movimentos pedagógicos do começo do século XX valorizavam a autodis-
ciplina enquanto expressão de ordem interior, porém sem desvalorizar a ordem
exterior. A escola tradicional invertia essa ordem. As perspectivas não diretivas
questionam a própria noção de disciplina de Carl Rogers (apud ESTRELA, 1992, p.
22-23), quando ele afirma que o indivíduo tem em si mesmo o princípio do seu
desenvolvimento, da autodisciplina e a Educação não deve impedir o desenvol-
vimento pessoal, deve funcionar como um suporte, uma facilitação ao desenvol-
vimento do eu. O autor relata que a noção do eu (de si mesmo) se reconhece e se
afirma na relação com os outros.

Assim, o grupo será algo propício para estabelecer essa congruência; desde
que exista harmonia entre o eu e a experiência do eu, a qual não será negada ou
recalcada. Então, o grupo, um lugar de troca livre, torna-se o lugar de apropria-
ção e de construção do saber. O professor passa a ser o facilitador, desde que ele
tenha uma atitude de autenticidade, de consideração incondicional positiva, de
compreensão empática. Os conflitos não se resolvem com censuras ou punições.
Caso haja sanções, cabe ao grupo tomar medidas referentes àquele indivíduo
que prejudica o seu funcionamento.

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Em seu livro sobre disciplina, Tiba (1996, p. 27) diz que a indisciplina é o maior
mal da educação moderna:
Uma das piores coisas da indisciplina é a falta de organização interna do indivíduo. A pior
consequência é a queda da qualidade de vida. Não só de si mesmo, mas de todas as pessoas
que dele dependerem. Não dá para contar com os indisciplinados para atividades de
responsabilidade, eles funcionam conforme manda sua indisciplina e não seus compromissos.
Então, quando adulta a pessoa não conseguirá se adaptar a qualquer atividade pessoal ou
profissional. A falta de disciplina atrapalha a vida das pessoas porque confundem isso com
liberdade. A disciplina é um ingrediente da liberdade. Não há meio termo. Para ter esta
disciplina é necessário se voltar para a saúde social e não apenas para o bem-estar pessoal.

Considerando alguns movimentos pedagógicos, Estrela (1992, p. 17-23) e


Medeiros (2006, p. 3) ressaltam a evolução do conceito de disciplina, que ini-
cialmente associava-se à imposição, depois, com consentimento e, por fim, com
autodisciplina. Essa evolução de atitudes geradoras de heteronomia para as ati-
tudes e estimuladoras de autonomia parece assemelhar-se com o processo da
formação do caráter individual, visto que, nos primeiros anos de vida, a disciplina
assenta-se muito na imposição, avançando nos anos seguintes para a disciplina
consentida e, finalmente, desta para autodisciplina.

Assim, Estrela (1992, p. 29-32) enfatiza a responsabilidade da Pedagogia ba-


seada nos interesses e respeito às leis naturais do desenvolvimento infantil e
ressalta a importância da conscientização do aluno em se responsabilizar pelas
suas ações que o leva a refletir sobre suas decisões. Chama a atenção, porém,
para a necessidade de qualificação profissional dos alunos, que precisam con-
quistar competência tanto nas técnicas como nas relações.

Em Tiba (1996), vemos aspectos negativos da falta de disciplina, sejam eles


externos ou internos. O autor também destaca que é impossível negar que a dis-
ciplina estudantil apropriada é necessária para o processo de ensino-aprendiza-
gem e para o desenvolvimento mais amplo do aluno. Já Garcia (2001) comenta
sobre a dificuldade de definir e conceituar disciplina, e também destaca que a
disciplina está sempre inserida num contexto histórico e filosófico-político.

Em Rogers (apud ESTRELA, 1992, p. 22-23) fica clara essa relativização. Se por
um lado é difícil defini-la, por outro poderíamos pensar que o próprio conheci-
mento traz uma subversão às regras disciplinares adotadas por um determinado
grupo. Aqui temos um paradoxo entre o coletivo e individual, visto que nas abor-
dagens modernas a disciplina precisa ser acompanhada de autonomia e, acima
de tudo, ser reflexo de um processo de mobilização interior do aluno (GARCIA,
2001, p. 42-43).

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Em uma abordagem preventiva, Garcia (2001, p. 43) indica que “a disciplina


encontra-se naturalmente favorecida em ambientes escolares verdadeiramente
humanos, em espaços democráticos onde se cultiva o diálogo e a afetividade,
em que se pratica a observação e a garantia dos direitos humanos”. Esse educa-
dor também afirma que a indisciplina é expressão viva, comunicante, porém ci-
frada, que usualmente manifesta causas situadas não apenas na individualidade
dos alunos, mas também na própria escola.

Garcia (2001, p. 46) conclui seu ensaio “A indisciplina no cotidiano da escola”,


enfatizando o objetivo preconizado pela Unesco e também inserido no texto dos
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), expresso na ideia de aprender a ser:
Aprender a ser pode ser uma viagem tempestuosa. Mas, apesar de conhecer as zonas de perigo
e os ancoradouros mais seguros, aos educadores não cabe impossibilitar que os educandos
naveguem, ou traçar completamente os percursos exatos a serem realizados. Embora possam
os educadores oferecer mapas de referência, são os educadores timoneiros que precisam
desenvolver por si mesmos, e em si mesmos, senso de direção.

De fato, educandos e educadores são companheiros de viagem, pois estes encontram na


escola a oportunidade de experimentar o mesmo tipo de busca que os educandos. Assim,
a indisciplina representa também uma pergunta para todos os educadores: estamos, afinal,
através da escola, ensinando e aprendendo a ser?

Texto complementar

Indisciplina na escola: uma reflexão


sobre a dimensão preventiva
(GARCIA, 1999, p. 105-107)

[...]

Considerações sobre encaminhamentos preventivos


A seguir, apresentam-se algumas considerações sobre encaminhamentos
disciplinares preventivos em nível de escola que têm se mostrado efetivos,
tanto segundo nossa observação quanto de acordo com a literatura especia-
lizada (ABUD; ROMEU, 1989; LASLEY; WAYSON, 1982; GETTINGER, 1988; VAS-

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CONCELLOS, 1995). Tais estudos indicam que uma diretriz disciplinar ampla,
de base preventiva, é o melhor recurso que uma escola pode desenvolver.

Um dos aspectos bem documentados por estudos comparativos reside


na existência de diferenças significativas entre escolas pouco disciplinadas e
escolas muito disciplinadas (LASLEY; WAYSON,1982). Aquelas que têm baixa
incidência de problemas disciplinares não são o produto do acaso ou de
programas de curto prazo. Revelam elementos comuns, quando observa-
das comparativamente. Um desses elementos é a existência de uma postu-
ra comum entre os profissionais da escola, com base num compromisso de
estabelecer e manter uma disciplina estudantil apropriada, entendida como
uma condição necessária para o processo de ensino-aprendizagem.

O primeiro ponto a ser destacado refere-se à necessidade de as escolas


desenvolverem uma diretriz disciplinar de base pedagógica ampla, legiti-
mada pela comunidade escolar, consonante com seu projeto político-peda-
gógico. Tal diretriz deve incluir o desenvolvimento de orientações (regras e
procedimentos) disciplinares claras e de base ampla, as quais ganham em
legitimidade à medida que são desenvolvidas com a participação dos estu-
dantes, tornadas claras e conhecidas de toda a comunidade envolvida com a
escola. A participação dos alunos é um elemento importante, pois favorece o
sentimento de pertença e implica o exercício de algum grau de poder sobre
as disposições coletivas, bases na criação de um senso de responsabilida-
de comum e um elemento de motivação (D’ANTOLA, 1989b). É necessária,
ainda, uma disseminação ampla dessas orientações comuns, que assegure
que todos os estudantes, pais e profissionais da escola tenham claras as ex-
pectativas sociais e pedagógicas que estarão sendo praticadas pela escola.
Em oposição ao enfoque autocrático, a abordagem democrática tende a ofe-
recer melhores resultados não apenas em termos das atitudes, mas também
do envolvimento e participação dos estudantes na escola (GORDON, 1999).

É importante ressaltar que tal diretriz disciplinar não deve se restringir


a estabelecer um conjunto de normas que organizem o ambiente escolar,
mas deve também orientar a própria cultura daquilo que a comunidade
deseja em termos de desenvolvimento disciplinar. Afinal, a disciplina deve
ser também um objetivo educacional (ABUD; ROMEU, 1989, p. 89).

Essa política disciplinar deve partir de um conceito operacional claro


quanto ao que considera “disciplina” e de um processo de reflexão através

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do qual se estabeleçam parâmetros disciplinares que estarão informando e


norteando as estratégias e procedimentos a serem observados pela comuni-
dade escolar. É importante, além disso, que essa diretriz disciplinar combine
encaminhamentos preventivos e interventivos, na forma de práticas de sala
de aula em particular (que incluem a introdução, no currículo, de elementos
para o desenvolvimento moral e aprendizagem cooperativa, por exemplo),
tendo por complemento disposições disciplinares de base mais ampla, re-
lativas à escola como um todo, e que sejam conhecidas e reiteradas pelos
diversos profissionais que nela estejam atuando.

Ainda, escolas bem disciplinadas tendem a conjugar uma política de valo-


rização da aprendizagem e uma disposição crítica diante das condições que
a inibem. Um outro aspecto importante, então, reside no cultivo de expecta-
tivas elevadas quanto ao desempenho escolar, socialização e comportamen-
to dos estudantes. Se desejamos uma escola bem disciplinada é importante
compartilhar e comunicar, aos estudantes, expectativas que reflitam uma
apreciação quanto a suas potencialidades e que expressem a visão de que
eles devem assumir suas próprias responsabilidades junto à escola.

Outro elemento preventivo relevante está no ambiente da escola


(ABUD; ROMEU, 1989; VASCONCELLOS, 1995), que deve ser verdadeira-
mente humano, no sentido de constituir um espaço democrático onde se
cultiva o diálogo e a afetividade humana, em que se pratica a observação e
garantia dos direitos humanos (constitucionais). Esse clima caloroso deve
refletir um conhecimento e preocupação quanto aos estudantes enquanto
pessoas, tendo em vista suas condições concretas, individualidades e sin-
gularidades. Na prática, se desejamos que a educação escolar represente
mudança (FREIRE, 1991), deve-se cultivar uma postura – sobretudo entre
os professores – de interesse e compromisso pelas metas, realizações e
problemas dos estudantes, bem como de apoio às suas atividades curricu-
lares e extracurriculares.

Um outro aspecto refere-se ao papel da direção da escola. Parece particu-


larmente importante que esta seja “visível” e atue de modo a oferecer enco-
rajamento e suporte a professores e alunos. A visibilidade aqui considerada
diz respeito à presença constante da direção nos diversos espaços da escola,
onde deve exercer, de modo informal, relacionamentos com professores e
estudantes, em nível pessoal e que expresse interesse pelas suas atividades.
Também é importante a relação formal entre direção e corpo docente. Aos
professores deve ser delegada responsabilidade para lidar com as questões

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disciplinares de rotina; as questões mais sérias devem ser tratadas em par-


ceria com as pessoas ou grupo responsáveis pela orientação disciplinar (pe-
dagógica). É necessário, portanto, que os professores desenvolvam e con-
quistem maior autonomia para lidar com a indisciplina de sala de aula. Isso
não significa deixá-los a sós com a indisciplina de sala de aula, mas fomentar
um trabalho em parceria, baseado em responsabilidades claramente defini-
das e no auxílio estratégico em situações de intervenção da equipe de apoio
pedagógico.

Finalmente, é preciso considerar a necessidade de estreitar as relações


entre escola e comunidade. O avanço disciplinar na escola parece requerer
um alto nível de comunicação e relações democráticas com as comunidades
a que atendem (D’ANTOLA, 1989b; GUIMARÃES, 1985). Entretanto, essa nem
sempre é a realidade vivida pelas escolas. Nesse sentido, uma meta ainda a
ser atingida seria ampliar o grau de envolvimento dos pais nas atividades
para as quais são solicitados, seja nas discussões pertinentes às questões
pedagógicas como às atividades extracurriculares ou mesmo de gestão, in-
cluindo a questão da indisciplina. Para isso, é fundamental manter a comuni-
dade informada quanto às metas, realizações e atividades escolares.

Intervenção em escolas sob crise


Em escolas particularmente afetadas por desordem e que apresentam
contextos de perigo potencial ou efetivo aos estudantes e professores, de-
terminados procedimentos se fazem necessários como forma de produzir
melhorias reais em seu ambiente. Nesse contexto, mostra-se como solução
recorrer a estratégias de desenvolvimento institucional e desencadear um
processo de reestruturação (ou elaboração!) de programas disciplinares e de
ensino, visando obter melhorias significativas tanto no comportamento es-
tudantil quanto no seu desempenho escolar.

Assim, não se trata apenas de focalizar o comportamento dos alunos. É


necessário considerar todos os aspectos do seu desenvolvimento psicos-
social em relação à qualidade da educação oferecida pela escola. O fato de
o aluno não aprender, e por consequência experimentar insucesso escolar,
pode estar na base da sua indisciplina (ABUD; ROMEU, 1989, p. 85). Esse pro-

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cesso, que requer meses ou mesmo anos de trabalho coletivo, deverá incor-
porar a criação de grupos de trabalho responsáveis por avaliar, planejar e de-
sencadear determinadas mudanças e avanços na escola. Sob esse enfoque,
será favorável uma revisão não apenas na política disciplinar (caso exista!)
bem como no próprio currículo da escola (GORDON, 1999).

Esse processo constitui uma oportunidade de exercício democrático


dentro da comunidade escolar. Daí a importância da contribuição dos estu-
dantes (D’ANTOLA, 1989b).

Acrescente-se a importância de introduzir inovações educacionais que


melhor instrumentalizem alunos e professores. Assim, por exemplo, pode
ser interessante desenvolver, nos alunos, novas habilidades de estudo, bem
como introduzir estratégias de aprendizagem cooperativa – o que muito
provavelmente vai requerer um avanço na formação continuada, em servi-
ço, dos professores. Além disso pode ser importante gerar modificações na
atmosfera e na imagem da escola, através, por exemplo, de atividades extra-
curriculares, envolvendo a comunidade escolar como um todo, que ajudem
a melhorar a estima pela escola e o valor desta perante os estudantes. Será
importante, também, estimular a valorização do próprio papel da escola na
vida dos estudantes. A escolarização hoje não está mais associada a vanta-
gens socioeconômicas efetivas para muitos alunos, e teria, consequente-
mente, perdido parte de seu “valor”. Essa crise de significado quanto ao papel
da escola reflete uma crise social mais ampla de valores e deve ser encarada
sob esse nível de complexidade.

Outra melhoria seria oferecer serviços especiais, tais como aconselha-


mento e supervisão, sobretudo para aqueles alunos com problemas discipli-
nares mais sérios e/ou crônicos. Finalmente, deve-se enfatizar a necessidade
de ampliar a comunicação e o envolvimento dos pais nos processos decisó-
rios da escola, como elemento essencial à mudança que se deseja obter. A
participação destes revela-se um elemento crítico para melhorar a ordem
nas escolas com problemas disciplinares (ABUD; ROMEU, 1989; D’ANTOLA,
1989b).

[...]

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Dica de estudo
Relação Pedagógica, Disciplina e Indisciplina na Aula, de Maria Estrela, Porto
Editora.

Esse livro aborda diferentes aspectos essenciais para a reflexão do tema e


sugere ações educativas saneadoras.

Atividades
1. Comente a afirmativa de Garcia (1999, p. 1): “A indisciplina tem sido intensa-
mente vivenciada nas escolas, apresentando-se como uma fonte de estresse
na relações interpessoais, particularmente quando associada a situações de
conflito em sala de aula”.

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2. O que é indisciplina escolar nos dias de hoje?

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Gabarito
1. O primeiro ponto é entender que a problemática da indisciplina escolar é
complexa e que deve ser investigada amplamente. Para tanto, deve-se pen-
sar sobre a concepção de indisciplina escolar, a relação entre a disciplina fa-
miliar e a disciplina escolar, já que a disciplina é um processo que começa
na relações familiares, por exemplo, no modo como as crianças aprendem
a obter atenção e reconhecimento familiar. Outro ponto é pensar sobre a
interação entre a indisciplina e o desenvolvimento psicossocial da criança e
do adolescente.

2. É uma questão complexa de causas, causas externas( os meios de comunica-


ção, a violência social, o ambiente familiar e escolar) e causas internas (dizem
respeito à subjetividade e ao perfil pessoal do aluno).

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Percurso histórico
da educação sexual na escola

Irene Carmen Piconi Prestes


Nosso propósito, neste capítulo, é refletir sobre o tema da educa-
ção sexual nas escolas. Discorreremos sobre o conceito de sexualidade
humana, e faremos uma retrospectiva histórica do tema da sexualidade
aplicada ao espaço educativo escolar, sob a ótica de vários autores.

O tema da sexualidade ganhou os meios de comunicação e entrou ex-


plicitamente nas casas, no trabalho, nos locais de lazer e principalmen-
te nas escolas. Mas, apesar de estar presente no dia a dia das pessoas, as
dúvidas e os tabus permanecem, e a manifestação da sexualidade pela
criança e pelo adolescente continuam a representar um grande problema
para os adultos.

Quando o assunto a ser discutido é educação sexual na escola, vale


uma retrospectiva histórica sobre o início desse tema, o qual, segundo
Berge (1976, p. 11-13), traz situações extremas e distintas. A França recebe
referência especial devido a Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), que veio
combater a neutralidade com a qual o assunto era tratado ainda no século
XVIII. Para ele, antes da puberdade, “o indivíduo não estava nascido, do
ponto de vista do sexo”; isso significa que antes da puberdade não havia
maturidade sexual genital para o sexo. Mesmo assim, compreendia a im-
portância dessa educação para impedir o que ocorria na época, em con-
siderar a sexualidade um ato imoral. Rousseau (apud BERGE, 1976, p. 12)
ainda dividiu a sexualidade em “ideal de pureza” e “ideal de verdade”. No
primeiro caso, o que fatalmente ocorria era a criação de tabus e uma edu-
cação sexual negativa, tais eram os “perigos” anexados à vida sexual dos
indivíduos. Em contrapartida, também se vislumbrava um “liberalismo
mundano”, que pretendia combater aquela educação negativa. Na segun-
da tendência apontada por Rosseau retirava-se a mistificação e em seu
lugar colocava-se o naturismo e até o nudismo.

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No Brasil, segundo Yara Sayão (1997), foi somente no início do século XX que
surgiram as primeiras ideias sobre educação sexual. Essas ideias vieram da Europa
e visavam ao combate à masturbação, às doenças sexualmente transmissíveis,
além do preparo da mulher para a função de esposa e mãe.

Na década de 1920, após algumas reivindicações feministas, a educação


sexual agregou novos objetivos, entre eles a proteção à infância e à maternida-
de. Em 1928, o Congresso Nacional de Educadores aprovou o programa de edu-
cação sexual nas escolas. Em 1930, no Rio de Janeiro, o Colégio Batista incluiu
no currículo escolar o ensino da evolução das espécies e da educação sexual. O
programa fazia uma análise do papel da mulher na reprodução e mais tarde foi
incluso o estudo do comportamento sexual masculino. O professor responsável
pela implantação do programa de educação sexual na escola sofreu processo
jurídico e foi demitido.

Novas iniciativas só vão acontecer em 1960, como afirma Sayão (1997, p.


9-25), com a publicação dos livros do padre Charboneau, baseados na moral
católica, bastante divulgados entre pais e educadores. Nessa década, algumas
escolas públicas e privadas adotaram programas de educação sexual. Entre 1964
a 1969, no Rio de Janeiro, os colégios Pedro de Alcântara, André Maurois, Infante
Dom Henrique e Orlando Roucas adotam o ensino de educação sexual em seus
currículos.

Referindo-se ao estado de São Paulo, Sayão (1997, p. 9-25) ainda comenta


que, entre 1954 e 1970, o Serviço de Saúde Pública do Departamento de Assis-
tência ao Escolar oferecia aulas de orientação sexual a meninas da 5.ª série. Esse
serviço era ministrado por educadores sanitaristas e professores que transmi-
tiam informações sobre as transformações da puberdade. O programa foi inter-
rompido por determinação da Secretaria da Educação do Estado.

No período de 1963 a 1968, foram desenvolvidos alguns trabalhos na área da


sexualidade com os alunos do Colégio de Aplicação Fidelino Figueiredo. Os gi-
násios vocacionais de São Paulo tiveram educação sexual em seus currículos, no
período de 1961 a 1969. O Ginásio Estadual Pluricurricular Experimental, entre
1966 a 1969, também incorporou a educação sexual em seu currículo.

No Rio de Janeiro, em 1968, foi apresentado pela deputada Júlia Steimbruck


um projeto de lei que propunha a introdução obrigatória da educação sexual em
todas as escolas do país. Em 1970, o projeto estava para ser aprovado, pois tinha
muito apoio de deputados, intelectuais e educadores, mas a Comissão Nacional

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de Moral e Civismo não aprovou a introdução da educação sexual nas escolas.


Nesse período, afirma Sayão (1997, p. 9-25), o Brasil passou um período de inten-
sa repressão, que resultou na interrupção da maioria dos trabalhos existentes de
educação sexual nas escolas.

O tema “educação sexual na escola” voltou a ser mencionado em programas


de educação da saúde pelo Conselho Federal de Educação, em 1974, e em guias
curriculares para o Ensino Fundamental do estado de São Paulo, em 1975. No
período, entre 1975 a 1979, a Secretaria de Educação de São Paulo impediu a
oficialização da educação sexual nas escolas, alegando que ela era de responsa-
bilidade exclusiva da família. Entre 1979 e 1980 foram realizados congressos de
educação sexual nas escolas, os quais despertaram grande interesse educacio-
nal; mas, devido às condições precárias de trabalho e alterações político-admi-
nistrativas nas secretarias de educação do estado, não obtiveram continuidade.

No âmbito extraescolar, Sayão (1997, p. 9-25) conta que, no início dos anos
1980, houve a veiculação e divulgação de questões ligadas à sexualidade. Sur-
giram serviços telefônicos, programas de televisão de Marta Suplicy e também
enciclopédias e fascículos vendidos em bancas de jornal, todos destinados a res-
ponder questões sobre sexo. Aconteceram também congressos e encontros pro-
fissionais, em que educadores, médicos e cientistas sociais debateram o tema.
Isso contribuiu para intensificar as ações sobre a inserção da educação e orien-
tação sexual nas escolas.

Durante a década de 1980, aumentaram as iniciativas na rede privada de


ensino em vários estados e também em escolas de orientação religiosa, por
causa do aumento da gravidez indesejada entre adolescentes, o aborto e o sur-
gimento da aids.

A temática da sexualidade foi introduzida, nessa época, apenas por meio de


palestras, encontros ou debates a cargo de psicólogos ou médicos, além dos
conteúdos relativos à reprodução humana na disciplina de Ciências.

Em 1989, a Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, sob responsa-


bilidade do professor Paulo Freire, decidiu implantar a educação e orientação
sexual inicialmente nas escolas de Ensino Fundamental. Nessa intervenção, os
professores recebiam um curso inicial e acompanhamento continuado em su-
pervisão semanal. Essa formação estava sob responsabilidade do Grupo de Tra-
balho e Pesquisa em Orientação Sexual. Em 1992, esse trabalho atingiu cerca de
12 mil alunos das escolas municipais de São Paulo.

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A partir disso, a Secretaria Municipal de Educação de Porto Alegre criou um


projeto similar. Na década de 1990, as redes municipais de ensino de Florianó-
polis, Recife, Campo Grande, Goiânia, Belo Horizonte e Santos também introdu-
ziram a educação e orientação sexual nas escolas.

Nesse período algumas instituições não governamentais se voltaram para a


produção de material e formação de profissionais da educação para o trabalho
de educação, orientação sexual e prevenção de doenças sexualmente transmis-
síveis, como a aids.

Nessa breve descrição histórica sobre a temática da sexualidade nas esco-


las apresentada, Sayão (1997) destaca o ano de 1995, quando o Ministério da
Educação coordena a elaboração dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN)
para o Ensino Fundamental, documento que propõe incluir a orientação sexual
como um dos “temas transversais” a serem abordados no Ensino Fundamental
de forma articulada com as disciplinas e outros temas como ética, saúde, meio
ambiente e pluralidade cultural. É o que traz a citação de Niskier (1996, p. 11):
Alguma forma há de ser encontrada no Brasil para que aumente o nível de informação quanto
ao planejamento familiar, que depende fundamentalmente de informações educativas e
culturais. O país tem sido tímido e até omisso em enfrentar o problema ou enfrentar com uma
certa dose de pudor. Informação, educação sexual, métodos adequados de contracepção são
os requisitos principais para o equilíbrio, a justiça e a consciência social.

Sobre o desenvolvimento
psicossexual do homem
A sexualidade é um atributo do homem e está integrada ao processo de desen-
volvimento do ser humano, desde o nascimento até a morte. Compreende-se que
a sexualidade é muito mais do que simplesmente ter um corpo desenvolvido, apto
a procriar e que apresenta necessidades sexuais. Para Louro (1999), muitos consi-
deram que a sexualidade é uma característica que todos possuem “naturalmente”,
sem levar em conta a sua dimensão social e política e o seu caráter construído. No
entanto, a sexualidade envolve rituais, linguagens, fantasias, representações, sím-
bolos e convenções que são profundamente culturais e plurais.

A sexualidade humana constitui-se a partir de três elementos primordiais: o


potencial biológico, o processo de socialização e a capacidade psicoemocional.
Conforme Kaplan (1981), a sexualidade é diversificada e determinada por uma in-

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teração complexa de elementos inter-relacionados: identidade sexual, identidade


de gênero, comportamento sexual e relacionamento do indivíduo com o outro.

No desenvolvimento psicossexual do indivíduo, atitudes psicológicas para com


a sexualidade e atitudes em relação ao parceiro estão correlacionadas e afetam o
comportamento sexual do indivíduo. Ver a si mesmo como um ser sexual, adaptar-
-se às respostas de seu corpo e formar ligações amorosas afetam o autoconceito e
o relacionamento do indivíduo com seus pares (KAPLAN, 1981, p. 28-46).

Para Osório (1992, p. 41-43), a sexualidade é um elemento estruturador da


identidade do adolescente, o que se dá em grande parte através da representa-
ção mental que o mesmo tem de seu corpo, sendo comum nessa fase a preocu-
pação entre meninas e meninos a respeito de distorções da imagem que têm de
si mesmo e do tamanho de seus órgãos sexuais.

Observando os trabalhos que envolvem a temática da sexualidade, vê-se que


eles geralmente abordam apenas os aspectos biológicos. Além de oferecer um
modelo de relação familiar perfeito e fundamentado na tradicional moral cristã,
não discutem os sentimentos e emoções decorrentes do processo educacional
e vivencial do indivíduo em relação à sua sexualidade.

O termo sexualidade envolve uma série de valores e atitudes, mas geralmente é


empregado restritamente a relações genitais. Como nos explica Delatre (1999, p. 15),
[...] a sexualidade é inerente à vida e à saúde, tem grande importância no desenvolvimento
e na vida psíquica das pessoas, pois, além da sua potencialidade reprodutiva, relaciona-se
com a busca do prazer, necessidade fundamental dos seres humanos. É construída ao longo
da vida, da história pessoal de cada um desde sua infância, na teia de relações interpessoais
que se estabelece entre o indivíduo e o ambiente no qual vive. É um fator importante para o
desenvolvimento da personalidade de qualquer pessoa. Portanto, não deve ser recriminada,
mas sim tratada como algo saudável e natural.

Observa-se que falar sobre sexo nas escolas continua sendo uma tarefa não
muito fácil. Nérici (1971) comenta as contradições de pais que acham que a
escola seria apropriada para informar sobre assuntos sexuais, contra outros que
acham importuno esse tema em tal local. O autor ainda comenta que a educa-
ção sexual na escola deve atender ao nível de maturidade dos alunos, variar o
grau de condições para se falar sobre o assunto e, além disso, é preciso adequar
o público, precisando em certo momento separá-los por sexo. O autor completa
explicando que a escola deve transmitir o conteúdo de educação e orientação
sexual associados às demais atividades sociais e extracurriculares. Finalmente,
considera a escola o espaço adequado para o diálogo, reflexão, questionamento
sobre postura, tabus e valores a respeito dos relacionamentos e comportamen-

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tos sexuais, que visem propiciar aos jovens a possibilidade do exercício de sua
sexualidade de forma responsável e prazerosa.

Para Negromonte (1961, p. 19-26), é de responsabilidade do educador falar


sobre as questões que envolvem a sexualidade humana. O educador tem o
dever de preparar os homens para viverem no seu tempo, e não no tempo pas-
sado, pois a mudança de linguagem, costumes e valores são velozes entre cada
geração, tornando difícil a compreensão entre ambos. O que serviu para uma
geração superar seus conflitos sexuais dificilmente serve para a seguinte.

Goldberg (1988, p. 25-33) e Nérici (1971, p. 15-17) defendem a ideia de que a


educação, e não somente a sexual, deve preparar para a vida. A educação sexual
é mais do que informação sexual, é fazer com que a pessoa saiba o sentido social
do sexo, integrando-o, sem repressões e desvirtuamentos da função sexual.

Bernardi (1985) alerta para um equívoco: muitos trabalhos de educação


sexual podem ser chamados de educação para o matrimônio, pois têm por ob-
jetivo o controle da sexualidade, normalmente dando lições com informações
biológicas, normas, morais e conhecimentos do que é lícito. O autor acredita
que a educação sexual deveria liberar frustrações e valorizar conteúdos positi-
vos, mas pensa que, para os educadores, os conteúdos válidos são a estabiliza-
ção institucional, a constituição da família tradicional, a fidelidade e a procria-
ção. O autor alerta para o ingrediente ilusório dessa forma de transmissão: aos
jovens propõem-se atividades alternativas, numa tentativa de adiar a satisfação
de seu erotismo. Bernardi (1985, p. 13-18) diz que a intenção não é educar para o
exercício da sexualidade, mas sim para uma repressão sexual. Sobre o educador,
explica que ele se mostra distante e invulnerável, defensor dos perigos sexuais
de ordem física, moral e psíquica, convoca a família como a única responsável e
a autoridade máxima sobre a sexualidade dos filhos e que cabe a ela mostrar o
modelo ideal de comportamento sexual.

Correa (2003, p. 8-11) destaca as etapas da infância e da adolescência como


momentos significativos para o desenvolvimento humano, e lembra que esses
momentos são passados em um grande tempo na escola. Assim, cabe à escola
também a tarefa de educar para o exercício de uma sexualidade saudável. A
autora explica que a educação sexual deve abranger a participação da família, dos
professores, dos funcionários e dos alunos. Deve-se trabalhá-la multidisciplinar-
mente, proporcionando a todos um crescimento interior, maturidade e saúde. É

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importante que a comunicação entre pais e filhos não se esgote para que os pais
continuem sendo fontes de confiança, experiência e influência para os filhos.

Para Meirelles (1997, p. 25-38), sexualidade, família e educação são processos


criativos, dinâmicos, em contínua transformação. Portanto, para se pensar em
sexualidade na escola, primeiramente precisamos nos questionar qual sexuali-
dade, com que tipo de família, em qual escola.

Para Lorencini Júnior (1997, p. 83-103), o indivíduo sofre a todo momento in-
fluências do que denomina de “cultura da sexualidade”. Influências advindas da
família, dos meios de comunicação, da religião ou da escola pressionam, exigem
e moldam o indivíduo para adaptá-lo aos padrões de comportamento impostos
pela sociedade.

As ações educativas podem ser informais ou formais e ser desenvolvidas para


atingir objetivos definidos, como é o caso da educação sexual nas escolas.

A escola, como qualquer outro ambiente social (igreja, clube, grupo de fute-
bol etc.), desempenha papel importante na transmissão informal de conheci-
mentos ligados à sexualidade. Na instituição escolar, estão presentes as concep-
ções de gênero sexual, que são atravessadas pelas concepções de masculinidade
e feminilidade e pelas formas de sexualidade de uma dada sociedade. A partir
da assimilação dos conteúdos informados nesses diversos contextos, o indiví-
duo internaliza os comportamentos sociais próprios de um determinado papel
sexual que lhe foi ensinado, passando a assumir uma identidade sexual, como
“ser homem” ou “ser mulher”, modelos copiados de uma matriz que lhe foi ditada
pela sociedade em que cresceu.

A partir dessas colocações, pode-se concluir que o simples fato de interagir-


mos uns com os outros faz com que todos sejam, de certa forma, educadores
sexuais. O preparo para tratar de questões ligadas à sexualidade, então, tem
pouco a ver com formação acadêmica do educador, mas muito com sua postu-
ra frente à vida e à sexualidade. Portanto, o educador, para transmitir aos seus
alunos conhecimentos na área da sexualidade, leva em conta o modo de vida
deles, seus valores e suas ideias. Além de se dispor a trazer informações científi-
cas, pode criar oportunidades para um permanente diálogo e para a discussão
das questões que chegam à sala de aula, colaborando efetivamente para a for-
mação de seus alunos como cidadãos, para que estes tenham uma vida melhor
e mais saudável.

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Texto complementar

Sexualidade debatida dentro da escola


(CARVALHO, 2009)

Sexualidade não pode ser tratada apenas como sexo. É um conjunto de


sentimentos e relacionamentos, estabelecido desde que a pessoa nasce. Se-
xualidade nada mais é do que conhecer a si próprio. Dependendo da idade,
ela deve ser encarada de diferentes formas, mas não pode ser esquecida ou
negligenciada. Situações do cotidiano e orientações sutis podem estimular
a discussão sobre o assunto, especialmente com as crianças. Ninguém pode
se esquecer de incluí-las nessa discussão.

Tudo começa com perguntas sobre a nossa existência. Depois, vêm


tantos outros questionamentos. As discussões sobre como se relacionar com
o mundo e com os outros começam logo cedo. Um exemplo é a história dos
meninos não poderem brincar com as meninas. “Brinco mais com as meni-
nas. Os meninos correm atrás da gente”, afirma Helena, de 5 anos, aluna do
ensino infantil do Colégio Marista Santa Maria. “Meninos às vezes brincam
com as meninas. Brinco com os meus amigos de polícia e ladrão. Mas as me-
ninas também podem participar”, diz João Lourenço, de 6 anos, aluno da
mesma escola.

Dentro da programação do colégio com as crianças do ensino infantil,


estão alguns objetivos, como expressar, distinguir e saber o significado dos
sentimentos, necessidades, preferências e ideias, com a intenção de desen-
volver o autoconhecimento e a autoestima; saber relacionar-se com outras
pessoas; e experimentar papéis no faz de conta para ampliar o convívio
social. Todos esses itens são muito importantes na formação da criança, se-
gundo Danielle Barriquello, assessora pedagógica do Colégio Marista Santa
Maria. [...]

[...] Danielle afirma que as perguntas das crianças sempre vão existir. Tudo
depende da maneira como se escuta o questionamento. “Na sexualidade,
estamos lidando com a questão dos gêneros, jogos, brincadeiras, escolhas,
preconceitos, relações de poder. Cabe à família e à escola fazer com que esse
seja um assunto não velado. A sexualidade é algo além dos aparelhos re-

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produtores. É importante saber os nomes das partes do nosso corpo, mas


também é importante o faz de conta, no qual se espelha o relacionamento
em família e com outras pessoas”, comenta.

Para a diretora do Departamento de Ensino Fundamental da Secretaria


Municipal de Educação, Nara Luz Chierighini Salamunes, uma das maneiras
de se tratar a sexualidade com crianças é aproveitar situações do cotidiano.
Os pequenos sempre manifestam a curiosidade e a sexualidade é um tema
de muita curiosidade. As crianças acabam levando suas dúvidas para dentro
da escola. “Não existe uma disciplina de educação sexual nos primeiros anos.
Mas sempre se aborda a história do papel da mulher na sociedade, as dife-
renças físicas entre homens e mulheres, doenças sexualmente transmissíveis,
por exemplo. Hoje em dia, não se pode esperar a adolescência para discutir
natalidade”, esclarece. Quando se fala de sexualidade, também se aprende
sobre as responsabilidades, opções e direitos que todos têm diante do seu
corpo.

Pais e professores têm papel muito importante.

Quando os pais ou professores falarem sobre sexualidade com as crian-


ças, eles devem se despir de qualquer tipo de valor ou preconceito. [...]

Nara Luz Chierighini Salamunes, da Secretaria Municipal de Educação,


acredita que a sexualidade deve ser tratada de maneira aberta, sem precon-
ceitos de qualquer ordem. A mesma opinião é compartilhada pela psicope-
dagoga Marilza Regazzo Grabarski. “Você não vai dar todas as explicações
técnicas para uma criança. Vai abaixar na altura dela, dar uma explicação de
leve. Nem os pais nem os professores podem dar suas opiniões sobre o as-
sunto. Mas as escolas só devem passar as informações. A formação final é da
família. Infelizmente, a família está delegando essa função somente para a
escola, que não dá conta”, avalia. [...]

[...] Para Júlia Valéria Cordellini, coordenadora do Programa do Adolescen-


te da Secretaria Municipal de Saúde, a escola é um dos espaços ideais para a
discussão da sexualidade, pois trabalha a formação curricular e humana. “A
escola não pode fugir desse papel. Ela não pode somente transmitir conhe-
cimento. Na infância, é preciso usar muito o lado lúdico”, declara.

Além da questão dos relacionamentos, a educação sexual na infância


também é importante por causa de uma triste estatística: a violência sexual

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contra crianças. “A criança, às vezes, é educada só para obedecer e se deixa


abusar. É preciso ensinar sobre como se relacionar com o próprio corpo, jus-
tamente para evitar uma violência sexual”, ensina Júlia. Interação e simplici-
dade nos esclarecimentos. [...]

[...] A aluna Maria Fernanda, de 9 anos, que estuda na 3.ª série do Ensino
Fundamental do Colégio Santa Maria, conta que ela e seus colegas de classe
assistiram a um vídeo que tratava sobre a sexualidade, em uma linguagem
simples de ser compreendida. Após a sessão, os alunos colocaram suas dúvi-
das na caixinha de perguntas. Os questionamentos foram trabalhados pela
professora. “Tinha perguntas sobre vários assuntos, como por exemplo, de
onde vem o espermatozoide e quantos meses demorava para formar um
bebê. Quando perguntavam para a gente, eram sempre as mesmas pessoas
que diziam. A maioria não quis responder ou não sabia”, afirma. [...] Para o
aluno Rafael, de 10 anos, também da 3.ª série do Ensino Fundamental da
mesma escola, os meninos podem conviver pacificamente com as meninas.
Mas faz um ressalva: nos momentos de esporte, meninas só jogam caçador e
os meninos só querem saber de futebol. Se não quer participar da partida de
futebol, não resta outra alternativa a não ser ficar com as garotas.

Rafael comenta que vários tipos de discussões entram nas assembleias


promovidas dentro da sala de aula. Um dos assuntos que aparecem é justa-
mente a sexualidade. “Ainda usamos a caixinha de perguntas e participamos
da assembleia”, explica. Um dos temas que entram nessa discussão é chamar
outros meninos de bicha ou gay, mesmo os garotos argumentando que não
usam os termos para ofender. Mas o assunto está presente e precisa ser dis-
cutido. Afinal, sexualidade trata das relações e sentimentos de qualquer ser
humano.

Dica de estudo
<http://educadores.programa-ato.com.br>.

O programa Ato trabalha para a atenção e orientação à saúde sexual reprodu-


tiva. Visa fornecer informações sobre a sexualidade responsável para o público
adolescente.

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Atividades
1. Destaque pontos relevantes para pensar o tema da sexualidade aplicado no
contexto escolar.

2. Indique quatro aspectos que apontam para a complexidade da sexualidade


na escola e que devem ser considerados nos planos de ação educacionais.

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Gabarito
1. Situações do cotidiano da vida estimulam a discussão do assunto, pois tudo
começa com perguntas sobre a nossa existência; sexualidade como um dos
temas transversais do sistema educacional abordado de diversas formas em
diferentes momentos; o tema sugere que a interação família-escola é essen-
cial, onde as pessoas devem encarar a sexualidade não apenas como sexo e
sim como um campo vasto de relações.

2. Do histórico da educação sexual, os avanços e retrocessos para a implanta-


ção do tema nas atividades escolares. A inter-relação entre o tema da educa-
ção sexual e a política nacional. O conceito de sexualidade como: biológica,
social e psicoemocional. A sexualidade aplicada na atividade escolar ainda é
um tema tabu.

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Questões sobre o manejo
das dificuldades de aprendizagem

Irene Carmen Piconi Prestes


Ver a criança perseguindo o conhecimento,
não o conhecimento perseguindo a criança.

Bernard Shaw

Compreender as dificuldades de aprendizagem e trabalhar para o


sucesso escolar é algo que almejamos, por isso vamos buscar contribui-
ções de autores que têm refletido sobre essa temática tão complexa. Vitor
Fonseca (1995) considera que, diante da expansão da democratização do
ensino, a escola perdeu sua função sociocultural, prevalecendo o êxito
escolar como condição necessária para manter o equilíbrio do sistema
social. A escola, na sua dimensão produtiva, faz do aluno matéria-prima
e do educador, o instrumento de produção. Ambos, vítimas do sistema
socioeducacional. O autor destaca também que é imprescindível a iden-
tificação precoce das dificuldades de aprendizagem para o resgate da
função cultural da escola.

Podemos observar que as dificuldades escolares que levam a pro-


blemas de ajustamento ou aprendizagem (com consequente fracasso,
evasão, exclusão e reprovação escolar) decorrem da criança, da família e
da escola. A aprendizagem em um contexto pedagógico significativo, no
qual o aluno está implicado com o seu aprender, é mais eficiente do que
em um contexto com dificuldade interativa e com pouca participação do
aluno, em que ele é mero cumpridor de ordens do professor. Assim, as
dificuldades de aprendizagem são decorrentes de uma complexidade de
fatores, como vemos a seguir.

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Questões sobre o manejo das dificuldades de aprendizagem

Dificuldades de aprendizagem
Situações ligadas à criança
 Nível de maturidade (orgânica).

 Condições físicas desfavoráveis (desenvolvimento dos processos básicos,


deficiências físicas, doenças).

 Condições psíquicas desfavoráveis (instabilidade afetiva, ansiedade, falta


de motivação).

Situações relacionadas à família


 Condições sociais desfavoráveis (pais ausentes, doentes, em desarmonia,
criança que trabalha).

 Problemas socioeconômicos, que contribuem e às vezes até determinam


a dificuldade escolar.

Situações relacionadas à escola


 Condições pedagógicas desfavoráveis (professores problemáticos, méto-
dos de ensino e programas mal formulados, avaliação inadequada).

 Condições físicas e financeiras desfavoráveis.

Crianças “com problemas escolares”


As crianças “com problemas escolares”, quer dizer, que estão apresentan-
do alguns obstáculos no aprender, podem ser enquadradas nas seguintes
possibilidades:
 a criança é ajustada à escola, mas não consegue aprender;
 a criança aprende bem, mas não está adaptada à escola;

 as duas anteriores ao mesmo tempo.

A preocupação principal, então, é encontrar maneiras de trabalhar com o


aluno de modo que ele aprenda significativamente e possa utilizar esse conhe-

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Questões sobre o manejo das dificuldades de aprendizagem

cimento na sua vida, na escola e na família. Sendo assim, é fundamental com-


preender o aluno na sua totalidade e não o classifica com palavras que podem
não dizer nada a seu respeito. Por exemplo, o que significa dizer que o aluno é
repetente? A repetência como rótulo não explica nada, não auxilia o professor a
lidar com aquele aluno. Em cada caso, a reprovação tem um papel diferente na
vida do aluno e afeta de um certo modo seu processo de aprendizagem.

O que pensamos
sobre nossas dificuldades?
Estudos como os de Mantovanini (2001) têm salientado que se deve consi-
derar, nas dificuldades escolares, aspectos relativos à subjetividade na relação
professor-aluno. Em outras palavras, deve-se
[...] pensar o fracasso escolar não como uma questão de a criança ter, ou não, um certo domínio
cognitivo, mas em função do que pensamos sobre ela ou sobre suas dificuldades. Ou seja, a
posição em que o professor coloca a criança ou como ela mesma se coloca frente ao saber
escolar, faz uma diferença significativa. O que pensamos sobre nossas dificuldades ou relações
com as coisas? (MANTOVANINI, 2001, p. 10)

Uma das maneiras de lidar com as dificuldades escolares do aluno é buscar


fazer uma sondagem histórica das áreas em que ele tem maior facilidade de
aprendizagem e das necessidades que ele apresenta, quer na escola, quer em
quaisquer outros espaços sociais em que interaja. Nesse processo de diagnósti-
co, o professor é um elemento que possui um papel de destaque, pois, ao locali-
zar em que ponto as dificuldades ocorrem, já constituiu um passo, um caminho
para o aluno vir a ter sucesso escolar.

Ainda, com relação às condições envolvidas na aprendizagem, observa-se


que muitas das queixas apresentadas pelos professores não se referem direta-
mente a dificuldades de aprendizagem, mas a problemas de conduta e fatores
emocionais do aluno (é impulsivo, agride os colegas, é irrequieto, é distraído).
Para lidar com esses problemas, também é necessário que haja uma compreen-
são mais global do aprendiz e não uma rotulação do seu comportamento.

Ser irrequieto ou distraído pode ser a forma de comportamento de um aluno


com dificuldades de compreensão do que se passa na sala de aula. Não é possí-
vel remediar condutas inadequadas sem compreender a criança que apresenta
essas condutas. Procurar discutir os critérios que o professor utiliza para clas-
sificar os alunos em bons ou maus e entender a dificuldade num âmbito mais
amplo pode ser de muita ajuda e alterar o destino escolar de uma criança.
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Questões sobre o manejo das dificuldades de aprendizagem

Considera-se que o professor torna-se mais seguro à medida que aprende a


ordenar informações sobre os seus alunos e amplia o seu conhecimento sobre
o desenvolvimento deles, conseguindo assim avaliar e compreender melhor os
diversos comportamentos para solucionar com mais acerto as dificuldades que
encontra (NOVAES, 1990).

Linhares (1993), quando discute o fracasso escolar, aponta para a existência


de relação entre dificuldades de aprendizagem e baixo autoconceito, aceitação
e popularidade perante os colegas. Verifica-se, pois, que é no início do proces-
so de escolarização que as experiências positivas no aprender a ler e escrever
associam-se ao desenvolvimento do autoconceito e da autopercepção.

A psicóloga Maria Novaes (1990), na análise da dificuldade de aprendiza-


gem, diz que é sempre interessante refletir sobre a distinção entre capacidade
de aprendizagem, rendimento escolar e nível de escolaridade. A capacidade de
aprendizagem é a potencialidade para aprender ligada ao nível intelectual do
aluno e correlacionada com o desenvolvimento dos processos psicológicos bá-
sicos do comportamento. O nível de escolaridade refere-se ao conhecimento
adquirido pelo aluno e, finalmente, o rendimento escolar é a quantidade conse-
guida pelo aluno ao realizar suas atividades e tarefas escolares, estando relacio-
nado ao gasto de energia dispensada.

As dificuldades de aprendizagem constituem dificuldades no desenvolvi-


mento da linguagem, desenvolvimento motor, emocional e social. A dislexia1 e
a disgrafia2 estão relacionadas à leitura e à escrita e têm, como causa possível,
deficits no desenvolvimento das funções perceptivo-motoras. É possível obser-
var, ainda, que problemas de concentração, atenção, memória, motivação são
também comuns nos alunos com dificuldades de aprendizagem.

Segundo Fonseca (1995), a definição de dificuldade de aprendizagem que


reúne maior consenso é a do National Joint Committee of Learning Disabilities
que compreende o seguinte conteúdo:
[...] dificuldade de aprendizagem é um termo geral que se refere a um grupo heterogêneo
de desordens manifestadas por dificuldades significativas na aquisição e utilização da
compreensão auditiva, da fala, da leitura, da escrita e do raciocínio matemático. Tais desordens,
consideradas intrínsecas ao indivíduo, presumindo-se que sejam devidas a uma disfunção do
sistema nervoso central, podem ocorrer durante toda a vida. Problemas na autorregulação do
comportamento, na percepção social e na interação social podem existir com as dificuldades de
aprendizagem. Apesar das dificuldades de aprendizagem ocorrerem com outras deficiências
(por exemplo, deficiência sensorial, deficiência mental, distúrbios socioemocionais) ou
com influências extrínsecas (por exemplo, diferenças culturais, insuficiente ou inapropriada
instrução etc.), elas não são o resultado dessas condições. (FONSECA 1995, p. 71)

1
Dislexia: problemas de leitura ligados a alterações espaçotemporais que levam à confusão, troca e omissão de letras, por exemplo, m e n, p e q,
b e d.
2
Disgrafia: dificuldades na escrita. Os problemas estão relacionados com o componente motor da escrita (forma das letras, espaço entre palavras,
pressão do traço) com a soletração e com a produção de texto escrito.

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Ao acompanharmos as definições apresentadas pelos autores Mantovanini


(2001), Novaes (1990), Linhares (1993) e Fonseca (1995) verificamos que não há
um consenso, já que umas destacam, como causa das dificuldades de apren-
dizagem, os fatores internos e individuais e outras, fatores externos e sociais.
Muitos estudos científicos são necessários para que se consiga planejar uma
ação educativa de cunho preventivo que atenda as reais necessidades educa-
tivas do aluno. A partir desse panorama, a proposta é refletir sobre o processo
ensino-aprendizagem e sobre as características do aluno e do professor.

Para isso, apresentamos uma lista de verificação com um conjunto de sinais


que podem ser indicadores dos problemas que o aluno pode ter e que condu-
zem à dificuldade de aprendizagem (DA). Essa lista está presente no artigo sobre
o tema escrito por Luis Correia (2000).

Quadro 1 – Dificuldades de aprendizagem

Lista de verificação
Conjunto de sinais que podem ser indicadores de DA.
O indivíduo tem problemas em:
Organização Desportos Compreensão da leitura Recordar eventos

Conhecer as horas, os dias da Soletrar Estudar para os testes


Linguagem falada ou escrita
semana, os meses e o ano
Escrever histórias e textos
Comportamento social
Gerir o tempo Aquisição da fala
Atenção e concentração
Completar tarefas Articular Iniciar e manter amizades
Encontrar objetos pessoais Aprender vocabulário novo Completar tarefas Julgar situações sociais
Executar planos Agir depois de pensar
Encontrar as palavras certas Impulsividade
Tomar decisões Esperar
Rimar palavras Tolerância à frustação
Estabelecer prioridades
Diferenciar palavras simples Relaxar
Interações
Sequencialização Manter-se atento (sonhar
Leitura e/ou escrita [dá erros Aceitar mudanças nas rotinas
Manipular objetos pequenos frenquentes tal como reversões acordado)
diárias
(b/d), inversões (m/w), trans- Distração memória
Desenvolver aptidões de inde-
pendência pessoal posições (carro/cama)] Interpretar sinais não verbais
Recordar instruções
Cortar Seguir instruções
Trabalhar em cooperação
Recordar fatos
Estar atento ao que o rodeia (muito Compreender ordens
dado a acidentes/ Aprender matérias novas
tropeça com frequência) Contar histórias
Transpor sequências numéricas
Desenhar Discriminar sons
Identificar sinais aritméticos
Escrever Responder a perguntas
(+, –, x, :, =)
Subir e correr Compreender conceitos
Identificar letras

Nota: essa lista de verificação pretende ser uma guia para pais e profissionais. Não deverá ser utilizada isoladamente, mas poderá construir uma
via que eles possam vir a considerar uma avaliação mais exaustiva. Todas as crianças exibem um ou mais destes comportamentos, de tempos
a tempos, ao longo da sua infância pelo que se chama a atenção para o fato que não se devem tirar ilações com base na aplicação dessa lista
por si só. Contudo, a exibição frequente de um grupo desses comportamentos pode ser considerada com um indicador para a procura de uma
consulta, ou para a efectação de observações ou avaliações posteriores.

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Para além dessa lista de verificação, apresentamos também, no quadro que


se segue, quatro listas por nível escolar, contendo um conjunto de primeiros
sinais a observar no que diz respeito às dificuldades de aprendizagem. Essa lista
também está presente no artigo sobre o tema escrito por Luis Correia (2000).

Quadro 2 – Dificuldades de aprendizagem

O que observar? Alguns sinais iniciais a se ter em conta

Pré-escola Níveis iniciais Níveis médios Níveis superiores

Dificuldades em ar-
Problemas de articu- Atraso na decodifi- Compreensão pobre gumentar. Problemas
lação. Aquisição lenta cação da leitura. Di- da leitura. Pouca par- na aprendizagem de
Linguagem de vocabulário. Falta ficuldades em seguir ticipação verbal na línguas estrangeiras.
de interesse em ouvir instruções. Soletração classe. Problemas com Expressão escrita fra-
histórias. pobre. palavras difíceis. ca. Problemas em re-
sumir.

Dificuldades em re-
Problemas na apren-
cordar fatos. Proble- Dificuldade em recor- Problemas em estudar
dizagem de números,
mas de organização. dar conceitos mate- para os testes. Dificul-
Memória alfabeto, dias da se-
Aquisição lenta de máticos. Dificuldade dades na memória de
mana etc. Dificuldade
novas aptidões. Sole- na memória imediata. longo prazo.
em seguir rotinas.
tração pobre.

Problemas em perma-
Impulsividade, difi- Inconstante. Difícil au-
necer sentado (quieto). Problemas de memó-
culdade em planifi- tocontrole. Fraca capa-
Atenção Atividade excessiva.
car. Erros por deslei- cidade para perceber
ria devido à fraca aten-
Falta de persistência ção. Fadiga mental.
xo. Distração. pronomes.
nas tarefas.

Problemas na aqui-
sição de comporta- Instabilidade na pre-
Manipulação inade-
mentos de autonomia ensão do lápis. Proble-
quada do lápis. Escri- Diminuição da rele-
Motricidade (exemplo: apertar os mas na componente
ta ilegível, lenta ou vância da motricida-
fina atacadores dos sapa- grafomotora da escrita
incosistente. Redun- de fina.
tos). Desajeitado. Re- (forma das letras, pres-
dância em escrever.
lutância para desenhar são do traço etc.).
ou tracejar.

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O que observar? Alguns sinais iniciais a se ter em conta

Pré-escola Níveis iniciais Níveis médios Níveis superiores

Problemas na aquisi- Domínio pobre de


Problemas com a no- conceitos abstratos.
ção da noção de direita Estratégias de apren-
ção de tempo (desor- Problemas na planifi-
ou esquerda (possível dizagem fracas. Desor-
Outras ganização temporal- cação de tarefas.
confusão visuespacial). ganização no espaço
funções Problemas nas intera-
-sequencial). Domí-
ou no tempo. Rejeição
nio pobre de concei- Dificuldade na reali-
ções (aptidões sociais por parte dos pares. zação de exames, tes-
tos matemáticos.
pobres). tes etc.

Nota: essa lista de verificação pretende ser uma guia para pais e profissionais. Não deverá ser utilizada isoladamen-
te, mas poderá construir uma via que eles possam vir a considerar uma avaliação mais exaustiva. Todas as crianças
exibem um ou mais desses comportamentos, de tempos a tempos, ao longo da sua infância pelo que se chama a
atenção para o fato que não se devem tirar ilações com base na aplicação dessa lista por si só. Contudo a exibição
frequente de um grupo desses comportamentos pode ser considerada com um indicador para a procura de uma
consulta, ou para a efectação de observações ou avaliações posteriores.

A partir dessas listas, pode-se recolher informações que, juntas com a infor-
mação obtida pela observação direta do aluno em situações escolares e pela
sondagem histórica, possibilitam a elaboração de uma primeira intervenção
educativa com fim de minimizar ou até suprimir os problemas de aprendizagem
do aluno.

Para uma aprendizagem significativa, é necessária a estimulação de habilida-


des básicas, as quais são descritas por Antonio Morais (1997), e implicam inicial-
mente uma compreensão da imagem corporal. A criança terá como referência
seu corpo e poderá aprender conceitos como frente, atrás, alto, baixo. Quando
não desenvolve a imagem corporal, a criança pode ter problemas de orientação
espacial e temporal. A capacidade de lateralidade que permite distinguir o lado
direito e o lado esquerdo, quando indefinida, refere-se ao tipo de dificuldade
identificada como disgrafia (letra feia). A criança pode apresentar dificuldades
para discriminar letras que diferem quanto à posição espacial, por exemplo, b-d;
p-q. Com relação à capacidade visual e auditiva, a criança deve perceber e discri-
minar semelhança e diferença, percepção de figura-fundo e memória visual. No
caso da escrita, quando não tem acuidade visual e auditiva, pode ter dificuldades

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na atenção seletiva com as palavras, as letras impressas de um texto. No processo


de memória, como capacidade de retenção e armazenamento de informações,
a criança, quando não estimulada, pode ter consequências na aprendizagem da
escrita e esquecer o traçado de determinadas letras. Ou, ainda, a criança pode
não conseguir pronunciar a palavra porque esqueceu o som que a representa.

Esses são alguns pontos apresentados pelo autor para as questões educacio-
nais relativas ao manejo das dificuldades de aprendizagem que têm preocupado
os educadores. Verifica-se, então, que o tratamento dessas dificuldades é uma
tarefa complexa, desafiadora e criativa, que envolve várias ações educacionais
e, muitas vezes, a estratégia encontrada é elaborar um plano de ensino especial
para o aluno em sala de recurso ou recuperação paralela, destinadas a alunos
com dificuldades não superadas no cotidiano escolar.

A identificação das dificuldades de aprendizagem apresentadas pelos alunos


vem crescendo, embora há muitos anos se reconheça a relevância de tais proble-
mas. Nesse contexto, novas formas de ensino e aprendizagem são fundamentais,
ou seja, como se praticar uma pedagogia diferenciada em função da diversidade
dos tipos de alunos que agora devem se educar na escola.

Ações para maximizar o potencial do aluno


 Necessita de experiências que favoreçam seu desenvolvimento físico, in-
telectual, emocional e social.

 Tem interesses e necessidades que variam segundo a idade cronológica


e mental.

 Tem sua individualidade e seu ritmo pessoal de desenvolvimento.

 Tem, em cada estágio de seu desenvolvimento, um modo próprio de visua-


lizar o mundo, de explicá-lo a si mesmo.

 Aprende com mais prazer se puder vivenciar suas experiências.

 Precisa aprender a pensar e a agir por si mesmo.

 Precisa aprender a brincar e a conviver com os outros.

 Necessita ser amado e precisa aprender a dar afeto.

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Texto complementar

O papel do professor
(MORAIS, 1997, p. 187-189)

O professor desempenha um papel muito importante, tanto no processo


de diagnóstico como no processo reeducativo.

No âmbito do diagnóstico, cabe ao professor o reconhecimento da crian-


ça que apresenta distúrbios de aprendizagem. Estando em contato direto
com a criança durante o processo de ensino-aprendizagem, o professor
percebe de imediato o aluno que apresenta dificuldades para ler, trocas
ortográficas ou lentidão para realizar as atividades escolares. Após esse re-
conhecimento, é importante que os “problemas” que a criança apresenta
sejam vistos como decorrentes de dificuldades e não como fruto da “pre-
guiça” ou do “desleixo” do aluno. Essa visão não implica só uma mudança
de nomenclatura, mas uma modificação do relacionamento do professor
com a criança. Se os “problemas” de leitura escrita são classificados como
dificuldades, então a causa é independente de boa ou má vontade da
criança em realizar as tarefas escolares. Nesse caso, compreende-se que,
apesar de todo o esforço que o aluno dispensa, dificilmente conseguirá cor-
responder às expectativas escolares sem um apoio externo. Já se os “proble-
mas” são vistos como consequência de preguiça e da falta de disposição para
prestar atenção, o aluno sofrerá todo tipo de punições com o objetivo de
extinguir a “preguiça” e, assim, integrá-lo no processo de ensino. Este último
procedimento poderá acarretar na recusa da criança em voltar à escola, já
que esta se torna um ambiente aversivo.

A nível reeducativo, o professor também possui um papel de destaque.


Na verdade, dificilmente um psicopedagogo pode ter sucesso em seu traba-
lho reeducativo se não houver a colaboração desse educador.

Inicialmente, o professor deve respeitar as dificuldades da criança. Esse res-


peito envolve a não utilização de comentários depreciativos sobre as dificulda-
des apresentadas pelo aluno; respeitar o ritmo da criança e não a envolver em

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Questões sobre o manejo das dificuldades de aprendizagem

situações de competição com os demais colegas; não colocá-la em situações


geradoras de ansiedade (pedir que leia em voz alta na frente da classe, solicitar
que escreva na lousa frases ditadas oralmente); evitar comparações com os
outros colegas que não apresentam dificuldades, explicando-lhe porque ocor-
rem. Essa conversa acerca das dificuldades que a criança apresenta é de suma
importância, já que permite que se estabeleça, entre o professor e o aluno, um
clima aberto e sincero, no qual a criança se sente apoiada e tranquila sobre as
possíveis reações do professor frente às suas dificuldades.

Como foi mencionado anteriormente, a criança que apresenta distúrbios


de aprendizagem, geralmente, possui uma autoimagem negativa que é de-
corrente do constante fracasso escolar. A valorização dessa autoimagem
deve ser motivo de preocupação de todos aqueles que estão envolvidos no
processo educacional, pois a forma como a criança se vê interfere decisiva-
mente no sucesso da aprendizagem.

Com a finalidade de ajudar a criança a desenvolver a sua autoestima, deve-


-se identificar as áreas de interesse e estimulá-las. Crianças com dificuldades
para ler e/ou para escrever têm, geralmente, habilidades indiscutíveis para a
música, pintura, matemática, ciências, cabendo ao professor reforçar essas
áreas e auxiliar o aluno a utilizá-las como um meio de compreender suas
limitações. Além disso, o educador também deve reforçar todo e qualquer
desempenho escolar adequado por mínimo que ele seja. Essa valorização da
autoimagem implica o desenvolvimento da autoconfiança necessária para
que a criança se engaje, novamente, no processo de ensino e sinta prazer
em aprender.

No entanto, não se espera que o professor resolva sozinho todas as dificul-


dades pedagógicas e emocionais da criança. Na verdade, raramente o aluno
consegue superá-las sem a ajuda de um profissional. É papel desse profissional
diagnosticar as causas e as áreas que se encontram deficitárias e estimulá-las.
Assim, se a dificuldade se apresenta na área de identificação das palavras du-
rante a leitura, o reeducador deverá estimular as habilidades envolvidas no
comportamento de ler, tais como: discriminação visual, percepção rápida e
análise de palavras, conhecimento dos sons das letras, compreensão da leitura
etc. Por sua vez, espera-se que o professor contribua com o processo reeduca-
tivo não exigindo do aluno tarefas que este ainda não pode cumprir. À medida
que a criança vai progredindo no tratamento clínico, o educador poderá ir
solicitando determinadas atividades que o aluno já domina. Exemplificando,

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Questões sobre o manejo das dificuldades de aprendizagem

no caso da leitura, o professor poderá ir pedindo que a criança leia oralmente


uma frase curta. Assim que ela for adquirindo confiança e sua leitura for se tor-
nando mais nítida, vai se aumentando o tamanho da frase a ser lida, até que se
chegue à leitura de um parágrafo e de um texto.

Essa forma de trabalho conjunto, envolvendo o professor e o psicope-


dagogo, trará, ao aluno, a sensação e a certeza de que conseguirá superar
os obstáculos, já que está sendo apoiado por pessoas nas quais ele confia e
que, em contrapartida, confiam nele.

Dica de estudo
Dificuldade de Aprendizagem: psicopedagogia na relação sujeito, família e
escola, de Simaia Sampaio. São Paulo: Wak, 2008.

Atividades
1. O que devemos considerar quando verificamos dificuldades de aprendiza-
gem no aluno?

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2. Qual o significado de se identificar no aluno, em processo de aprendizagem,


sinais de dificuldades de aprendizagem?

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Questões sobre o manejo das dificuldades de aprendizagem

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Gabarito
1. O primeiro passo é perceber a complexidade das questões que envolvem
as dificuldades de aprendizagem no processo do ensino. Deve-se também
pensar que as dificuldades de aprendizagem de modo amplo e associadas a
um contexto histórico-cultural. O segundo passo consiste em identificar as
diferenças na abordagem das dificuldades de aprendizagem, o que demons-
tra que as dificuldades de aprendizagem também dependem da história in-
dividual do aluno.

2. A identificação de sinais que podem ser indicadores de DA é muito impor-


tante quando se quer melhorar o contexto educativo e promover a aprendi-
zagem significativa. Dessa maneira, abre-se a possibilidade de se intervir com
maior eficácia no processo de aprendizagem e se favorece o sucesso escolar.

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A ação preventiva e a aprendizagem

Irene Carmen Piconi Prestes


No processo de aprendizagem, a relação entre educador e educando
é essencial. O educador pode ajudar o aluno a desenvolver competências
e a enfrentar novos obstáculos. Assim, é primordial que o educador com-
preenda as características pessoais do aluno para uma aprendizagem sig-
nificativa, contribuindo para um futuro melhor para todos. Vitor Fonseca
(1995) alerta para o fato de ser fundamental reconhecer precocemente
as dificuldades do desenvolvimento e de aprendizagem para trabalhar
a favor do desenvolvimento das potencialidades dos alunos e fazer com
que fiquem mais dispostos para a aprendizagem.

As dificuldades de desenvolvimento e aprendizagem decorrem de defi-


cits no processo de aquisição da linguagem oral e escrita, falhas no desen-
volvimento psicomotor e no desenvolvimento socioafetivo. A disgrafia, a
disortografia, a dislexia, a discalculia e o transtorno por deficit de atenção
com hiperatividade (TDAH) são algumas das dificuldades de aprendiza-
gem que têm como causa possível alterações no desenvolvimento dos
processos básicos perceptivo-motores. É possível observar, ainda, que
problemas de concentração, lateralidade, coordenação visomotora, aten-
ção, memória e motivação também são comuns nos alunos que apresen-
tam dificuldades de aprendizagem.

Disgrafias

Definição
É disgráfica uma criança que apresenta dificuldade em passar para a
escrita o estímulo visual da palavra sem comprometimento intelectual e/
ou neurológico que explique essa dificuldade. Para Antonio Morais (1997),
a disgrafia pode estar associada à disortografia. Nesse caso, observa-se
que a criança que tem dificuldade para escrever corretamente a lingua-
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A ação preventiva e a aprendizagem

gem falada pode apresentar uma disgrafia associada: a criança escreve devagar,
retocando cada letra, realizando de forma incorreta as ligações entre as letras
para esconder a dificuldade ortográfica. No entanto, é possível encontrar crian-
ças disgráficas que não apresentam qualquer tipo de disortografia.

Aspectos relevantes
na identificação da disgrafia
 Rigidez do traçado: escrita muito marcada, comprimida e angulosa.

 Relaxamento gráfico: má organização das letras, linhas malfeitas, mar-


gens mal organizadas, direção e dimensão irregulares das letras.

 Irregularidade no traçado: falta de controle, escrita alongada ou compri-


da, instável e apressada.

 Excessivo esforço de precisão: excesso de precisão e lentidão.

Ações educacionais
para o desenvolvimento da escrita
 Desenvolvimento psicomotor: o ato de escrever exige a coordenação
motora fina e o controle dos movimentos de vários segmentos do corpo,
visto que a escrita necessita de precisão e rapidez.

 Desenvolvimento pessoal: a escrita é uma atividade motora em que o


desenho das letras traçadas são sinais com um significado especial para
aquele que escreve.

 Desenvolvimento da linguagem: a escrita transmite a linguagem oral,


de modo que um bom desenvolvimento da linguagem é necessário para
a aprendizagem da escrita.

 Desenvolvimento socioafetivo: a aquisição da escrita resulta de um pro-


cesso de aprendizagem, com o que depende de estímulos de pais e pro-
fessores, isto é, um bom desenvolvimento emocional auxilia a criança na
aquisição da escrita.

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A ação preventiva e a aprendizagem

Condições desfavoráveis à aquisição da escrita


 Dificuldades psicomotoras: lateralidade, organização espaçotemporal,
coordenação dinâmica global, coordenação dinâmica das mãos.

 Dificuldades de linguagem e ortografia.

 Aprendizagem inicial precária: erros pedagógicos, mudança de méto-


dos ou professores são situações que dificultam a aquisição da escrita.

Disortografia

Definição
Tanto a disortografia quanto a disgrafia são alterações da linguagem escrita.
Com a disortografia, a criança escreve nos espaços certos, a caligrafia é clara,
porém cheia de erros ortográficos, e desse modo a criança revela sua incapacida-
de para usar os processos gráficos para representar na escrita a linguagem oral.

Para Morais (1997, p. 138-143), a disortografia pode ser uma das causas da
disgrafia, sendo possível que ocorra quando no processo de aprendizagem da
linguagem escrita se exige rapidez e um determinado ritmo gráfico de um aluno
que ainda não automatizou a relação entre som e letra. Nesse caso, o aluno está
impedido de realizar o traçado gráfico de forma aceitável, sua escrita é lenta e,
na maioria das vezes, incompleta – porque apresenta certas dificuldades em
recordar com rapidez que grafia representa determinado som. Essas dúvidas
podem ocasionar uma escrita irregular, com traço precipitado, falta de controle,
e excessivamente lenta.

Aspectos relevantes
na identificação da disortografia
No processo de escolarização, deve-se observar (MORAIS, 1997, p. 138-143):

 o nível de escolaridade e o rendimento escolar do aluno;

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A ação preventiva e a aprendizagem

 a frequência com que os erros gráficos aparecem no vocabulário em uso


pelo aluno;

 os tipos de erros ortográficos existentes na linguagem escrita.

Ações educacionais
para o desenvolvimento da escrita
As ações educacionais para o desenvolvimento da escrita nos aspectos psi-
comotor, mental, de linguagem e socioafetivo devem seguir as já apresentadas
anteriormente quando descrevemos a disgrafia.

Condições desfavoráveis à aquisição da escrita


 Dificuldades socioafetivas do aluno.

 Aprendizagem inicial precária. Erros pedagógicos, mudança de métodos


ou professores são situações que dificultam a aquisição da escrita. Um
exemplo disso ocorre nas atividades escolares diante da avaliação da es-
crita, o professor desconsidera a compreensão da palavra pelo aluno, ou
ainda, em um ditado, o professor avalia o aluno apenas pelo número de
palavras mal escritas.

 O aluno pode apresentar dificuldades de linguagem – por exemplo, voca-


bulário restrito.

 Dificuldades psicomotoras do aluno na discriminação auditiva e/ou visual.

Dislexias

Definição
Dislexia é a dificuldade da aprendizagem da leitura, relacionada à identificação,
compreensão e interpretação dos símbolos. Quando essa dificuldade não pode
ser explicada por condições físicas ou ambientais negativas, deficits sensoriais
ou intelectuais e comprometimento emocional, diz-se que a criança é disléxica.

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A ação preventiva e a aprendizagem

O disléxico tem dificuldades na análise e na síntese dos estímulos visuais (que


estão no espaço) e dos estímulos auditivos (que estão no tempo).

Para Martins (2006a), a leitura enquanto processo de aquisição da linguagem


compreende os processos básicos de decodificação e compreensão. Entende-se
por decodificação a capacidade linguística para identificar um signo gráfico por
um nome ou por um som da fala denominado fonema. A capacidade linguísti-
ca consiste no reconhecimento das letras ou signos gráficos e na tradução dos
signos gráficos para a linguagem oral. A compreensão se dá quando o leitor per-
cebe e dá sentido ao conteúdo da mensagem.

Aspectos relevantes na identificação da dislexia


 Dificuldades na aprendizagem da leitura.

 Discordância entre nível intelectual e nível de leitura e ortografia.

 Discordância entre leitura e outras matérias, principalmente cálculos e


aritmética.

 Nível de leitura e ortografia abaixo do nível da sala.

 Rotações, inversões, confusões, omissões, repetições de letras.

 Caráter sistemático desses erros.

Ações educacionais
para o desenvolvimento da leitura
 Desenvolvimento psicomotor: imagem corporal, noção espaçotempo-
ral, lateralidade.

 Desenvolvimento mental: a partir da interação social, a aquisição do sig-


nificado social dos objetos. Expressão oral da imagem dos objetos que se
encontra armazenada na memória da criança.

 Desenvolvimento da linguagem: ocorre no diálogo constante com a


criança, falando o nome dos objetos, descrevendo as atividades enquanto
elas ocorrem e sempre respondendo aos balbucios da criança em tom de
conversa. Por essa razão, a base da aquisição da linguagem está na expe-
riência significativa.

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A ação preventiva e a aprendizagem

 Desenvolvimento socioafetivo: exercícios cotidianos de leitura de tex-


tos e atividades que promovam a criatividade (como fantoches, teatro e
ginástica) são importantes.

Condições desfavoráveis à aquisição da leitura


 Dificuldades sensório-perceptivas: dificuldades para reconhecer e in-
terpretar estímulos auditivos, visuais e táteis.

 Dificuldade na percepção auditiva: não distingue sons parecidos, como


por exemplo p e b, d e t, m e n.

 Dificuldade para reproduzir estruturas em sequências rítmicas.

Habilidade de leitura
Para Martins (2006), desenvolve-se a habilidade de leitura do aluno,
considerando-se:

 as características do texto;

 a maturidade dos processo cognitivos do leitor;

 a visão;

 a fadiga ocular;

 a iluminação;

 a distância entre olho e texto;

 a postura do corpo;

 o tipo de letra e o tipo de papel.

Discalculia

Definição
A discalculia compreende a dificuldade para realizar atividades de cálculo
aritmético, tais como quantificação, numeração ou cálculo. Pode estar associada
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A ação preventiva e a aprendizagem

à dislexia, à disgrafia e ao deficit de atenção. Os problemas mais frequentes são


confundir números, inverter números, escrever o número espelhado, não enten-
der as relações de conservação, de quantidade e de espaço – que são aspectos
necessários para realizar as operações aritméticas.

De acordo com Garcia (1998), essa dificuldade está presente na criança, é de


caráter evolutivo e não é lesional. A discalculia não é causada por deficiência
mental, por alterações visuais ou auditivas, e nem por má escolarização.

Aspectos relevantes
na identificação da discalculia
 Dificuldades na aprendizagem das operações matemáticas.

 Discordância entre o nível intelectual e o nível de compreensão das ope-


rações matemáticas.

 Dificuldades na compreensão das noções de conservação, quantidade,


classificação e seriação.

 Nível de raciocínio lógico-matemático abaixo do nível da sala.

 Não gostar da Matemática.

Ações educacionais
para o desenvolvimento do cálculo
 Desenvolvimento psicomotor: atividade perceptiva, memória e organi-
zação espacial.

 Desenvolvimento mental: aplicação dos procedimentos matemáticos a


situações cotidianas novas: o aluno deve ser capaz de manipular os sím-
bolos matemáticos e de compreender o que está fazendo com eles, deve
ser capaz de atribuir-lhes sentido prático.

 Desenvolvimento da linguagem: capacidade de abstração e generaliza-


ção dos objetos, situações e contextos.

 Desenvolvimento socioafetivo: resolução de problemas práticos em si-


tuações concretas e em atividades cotidianas como cantar, medir, jogar,
desenhar e brincar.
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A ação preventiva e a aprendizagem

Condições desfavoráveis à aquisição do cálculo


 Desorientação e medo diante da matemática.

 Falha na aquisição do esquema corporal e da lateralidade.

 Incapacidade para tomar decisões e resolver problemas cotidianos.

 Dificuldade em classificar números.

 Alterações nos processos simbólicos e na atribuição de sentido (sinais das


operações: +, –, =, ).

 Dificuldade em compreender o princípio de conservação, de quantidade.

 Dificuldade em estabelecer correspondência um a um, termo a termo (an-


tecessor e sucessor).

Transtorno por deficit de


atenção com hiperatividade

Definição
O transtorno por deficit de atenção com hiperatividade (TDAH) é uma dificul-
dade comumente vista em crianças e se baseia nos sintomas de desatenção e hi-
peratividade. Tais aspectos são normalmente encontrados em pessoas comuns
e, assim, para haver diagnóstico de TDAH esses aspectos devem interferir signi-
ficativamente na vida e no desenvolvimento normal da criança. Geralmente, o
TDAH é notado quando a criança inicia as atividades escolares, quando o ajusta-
mento ao cotidiano escolar se mostra comprometido. No início da adolescência,
em geral o quadro se mantém o mesmo, com problemas predominantemen-
te escolares, sendo que, no final da adolescência e no início da vida adulta, na
maioria dos casos ocorre melhora dos sintomas.

Aspectos relevantes na identificação do TDAH


 Frequentes movimentos de mãos e/ou pés, denotando inquietude.

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A ação preventiva e a aprendizagem

 O aluno deixa o seu assento na sala quando se espera que permaneça


sentado.

 Falha em manter a atenção centrada em atividades.

 Distrai-se com facilidade diante de qualquer estímulo.

 Responde precipitadamente, pode falar em excesso, interrompe ativida-


des de outros, parece não escutar quando lhe falam diretamente.

 Muda de atividades com facilidade e frequência, sem acabar nenhuma, e


se esquece das atividades diárias.

 Pode realizar atividades físicas perigosas.

 Seus trabalhos escolares são descuidados e geralmente inacabados, pois


trabalha de forma impulsiva e desorganizada.

Ações educacionais para o


desenvolvimento dos processos básicos e
da aprendizagem significativa
 Desenvolvimento psicomotor: coordenação perceptivo-motora, ima-
gem corporal, linguagem, memória, equilíbrio, atenção concentrada, co-
ordenação visomotora.

 Desenvolvimento socioafetivo: trabalho em grupo e atividades extra-


classe, como dramatizações, entrevistas e pesquisas de campo. Desenvol-
vimento de autonomia e competência social.

 Desenvolvimento da linguagem: capacidade de abstração, descrição de


experiências e elaboração de conceitos, perguntas e julgamentos.

 Desenvolvimento mental: tolerância à frustração, persistência nas ações,


estabilidade do humor.

Finalmente, para melhoria do comportamento e do desenvolvimento peda-


gógico do aluno com dificuldade de aprendizagem, é necessário desenvolver
um repertório de intervenções para atuar eficientemente no contexto escolar.

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A ação preventiva e a aprendizagem

Texto complementar

Repensando os distúrbios de aprendizagem a


partir da psicologia histórico-cultural
(TULESKI; EIDT, 2007, p. 531-539)

Resumo
A psicologia histórico-cultural assume que o fator biológico determina a
base das reações inatas dos indivíduos. Sobre essa base se constitui todo o
sistema de reações adquiridas, sendo estas determinadas mais pela estrutu-
ra do meio cultural da criança do que pelas disposições biológicas. Se é por
meio do processo de apropriação da cultura que cada homem adquire as ca-
pacidades humanas, a compreensão atual acerca dos distúrbios de aprendi-
zagem pode ser reconfigurada, demonstrando que mediações adequadas e
consistentes podem ter caráter revolucionário para a aprendizagem, ao tor-
narem presente o talento cultural quando o talento biológico não se revela
como esperado.
[...]

Distúrbios de aprendizagem ou
de ensinagem: uma questão controvertida
Uma revisão da literatura procurando enfocar os diferentes termos
usados para identificar o aluno que não aprende apontou tanto a falta de
concordância sobre as definições e conceitos, quanto uma forma confusa e
contraditória na apresentação de parâmetros que permitam compreender
que fatores podem ser considerados como causais intrínsecos ou extrínse-
cos nas mais diferentes obras e autores que tratam do assunto (Rocha, 2004).
A definição mais aceita na atualidade entende que

Distúrbio de Aprendizagem é um termo genérico que se refere a um grupo heterogêneo


de desordens, manifestadas por dificuldades na aquisição e no uso da audição, fala, escrita

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A ação preventiva e a aprendizagem

e raciocínio matemático. Essas desordens são intrínsecas ao indivíduo e presume-se serem


uma disfunção de sistema nervoso central. Entretanto, o distúrbio de aprendizagem pode
ocorrer concomitantemente com outras desordens como distúrbio sensorial, retardo
mental, distúrbio emocional e social, ou sofrer influências ambientais como diferenças
culturais, instrucionais inapropriadas ou insuficientes, ou fatores psicogênicos. Porém,
não são resultado direto dessas condições ou influências (HAMMILL apud CIASCA, 1994,
p. 36, grifo nosso).

Assim, pode-se afirmar que a disfunção neurológica é a característica fun-


damental que diferencia crianças com distúrbio de aprendizagem daquelas
com dificuldades de aprendizagem (ROCHA, 2004). Tomando-se como base
esta definição, é possível considerar que as dificuldades de aprendizagem
são facilmente removíveis, por se constituírem em problemas no processo
ensino-aprendizagem, e não relacionados a fatores biológicos resultantes de
disfunções do sistema nervoso central (SNC). No que se refere à incidência,
encontramos 40% da população em idade escolar indicada como portadora
de dificuldade de aprendizagem, enquanto somente 3% a 5% apresentariam
distúrbio de aprendizagem (CAMPOS, apud ROCHA, 2004). No entanto, no
âmbito escolar e nos serviços de atendimento especializado, esse índice é
muito maior do que 3% a 5%.

Os elevados índices de dificuldades e distúrbios de aprendizagem exis-


tentes na realidade brasileira nos convidam a pensar nos desdobramentos
de diagnósticos indevidos, resultantes, em nossa opinião, de concepções
negativas sobre a criança e seu desenvolvimento e de práticas educacionais
e avaliativas que desconsideram a política educacional do país; a qualidade
da escola oferecida aos seus usuários; a relação professor-aluno; a metodo-
logia de ensino, a adequação de currículo e o sistema de avaliação adotado;
diferenças sociais e culturais que não são respeitadas no sistema de ensino;
a família – que ainda é vista como aquela que desvaloriza a educação formal
em detrimento do trabalho, etc., responsabilizando a criança pelo não apren-
der. Essas concepções, pautadas numa visão organicista e naturalizada de
homem e sociedade só pode conceber o não desabrochar das capacidades
humanas tomadas como espontâneas como doença, patologia, inabilidade
e incapacidade.

Concordamos com Souza (2000) quando afirma que se faz necessário uma
ruptura na forma de análise polarizada dos fenômenos, vindo a assumir um
referencial teórico que dê conta de articular os diversos níveis até então ge-

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ralmente entendidos como separados (no caso, a subjetividade e a realidade


social) e inclua o entendimento dos processos de escolarização e a complexi-
dade neles envolvida como sendo construídos em uma sociedade de classes
onde as crianças são tratadas de acordo com o grupo social do qual fazem
parte. Ou seja, as crianças devem ser entendidas como indivíduos que se
desenvolvem ou não, a partir do que o meio sociocultural lhes disponibili-
za não só concretamente, em termos de oferta dos instrumentos materiais
necessários para a aprendizagem, mas também dos processos de raciocínio
que o homem adquiriu ao longo de milhares de anos de evolução.

O enfoque no processo de escolarização e não nos problemas/distúrbios


de aprendizagem pretende romper com a atribuição da responsabilidade
pelo não aprender à criança ou a distúrbios de aprendizagem cuja origem
é entendida muitas vezes unicamente como psicológica, biológica ou emo-
cional. A intervenção do psicólogo deveria, ao contrário, favorecer a reflexão,
junto ao professor e à criança, sobre as relações estereotipadas existentes
na escola, pautadas em crenças que atribuem a dificuldade no processo de
escolarização à criança, tendo como resultado números elevados de repe-
tência, evasão, exclusão e rotulação.

É necessário, portanto, desenvolver mudanças na base do ensino ao invés


de mudanças fragmentadas que objetivam atingir a criança de forma indi-
vidual. Como consequência, o enfoque não seria mais ensinar a criança a
aprender, mas sim, aprender como ensinar a criança. Isso possibilitaria que
rótulos fossem evitados antes que ela tivesse oportunidade de, ao menos,
apropriar-se dos fundamentos básicos da aprendizagem escolar (CIASCA;
ROSSINI, 2000).

Dificuldades no âmbito individual como distúrbios de aprendizagem


só deveriam se tornar uma hipótese quando fossem esgotadas todas as in-
formações e análises sobre a escola onde a queixa foi produzida, e como
resultado desse trabalho de investigação e intervenção, fosse constatada a
adequação da escola (SOUZA, 2002), tarefa difícil ao tomarmos como base os
dados do INEP/MEC, que atestam os vários problemas que comprometem a
qualidade do ensino em nosso país.

Leontiev (1978) esclarece que a força desse preconceito segundo o qual


o desenvolvimento dos processos cognitivos dos indivíduos tem origem em
si mesmo é tão grande que a psicologia não marxista colocou o problema

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ao contrário, na medida em que considerava, por exemplo, que as aptidões


científicas eram condição para a apropriação do conhecimento científico, ao
invés de considerar que a apropriação dos progressos da ciência é que seria
responsável pela formação das aptidões científicas. Ou ainda, o talento ar-
tístico seria a condição para a apropriação da obra de arte. A partir de uma
perspectiva materialista-histórica e dialética, entendemos que a apropriação
da arte é justamente a condição para o desenvolvimento do talento artísti-
co. O ser humano, para ser aquilo que é, depende daquilo que aprende, do
que conhece e utiliza a cultura acumulada, e não de uma essência da qual
os homens seriam dotados desde o nascimento. Quando se compreende o
homem como um ser social, que se humaniza ou desumaniza de acordo com
as práticas desenvolvidas ou não no seio das relações sociais de produção,
esse quadro se altera radicalmente. Na síntese realizada por Leontiev (1978,
p. 283), temos que:
O verdadeiro problema não está, portanto, na aptidão ou inaptidão das pessoas para
se tornarem senhores das aquisições da cultura humana, fazer delas aquisições da sua
personalidade e dar-lhe a sua contribuição. O fundo do problema é que cada homem,
cada povo tenha a possibilidade prática de tomar o caminho de um desenvolvimento que
nada entrave.

Desse modo, as possibilidades para a humanização dos indivíduos em


uma sociedade de classes devem ser pensadas a partir do lugar que eles
ocupam nas relações sociais – que foram criadas pelos homens ao longo da
história – e não, como queria a psicologia não marxista, em decorrência de
atributos individuais, surgidos por uma dotação natural, pela qual o desen-
volvimento espiritual do homem tem origem nele mesmo. Em consonância
com esse pensamento, Vygotsky (2004, p. 3) afirma que
Do mesmo modo que a vida de uma sociedade não representa um único e uniforme todo,
e a sociedade ela mesma é subdividida em diferentes classes, assim também, não pode
ser dito que a composição das personalidades humanas representa algo homogêneo
e uniforme em um dado período histórico, e a psicologia tem que levar em conta [...] o
caráter de classe, natureza de classe e distinções de classe que são responsáveis pela
formação dos tipos humanos. As várias contradições internas que são encontradas nos
diferentes sistemas sociais encontram sua expressão tanto no tipo de personalidade
quanto na estrutura da psicologia humana naquele período histórico.

Outra limitação da perspectiva maturacionista e naturalizante do psiquis-


mo refere-se ao papel da escola no desenvolvimento do psiquismo. É bas-
tante frequente, no meio educacional, o argumento de que os alunos seriam
dotados de muita ou pouca inteligência e que já carregariam, ao nascer, um
conjunto de habilidades ou inabilidades que teriam quando se tornassem

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adultos, e nessa perspectiva, a função da educação escolar ficaria limitada a


um meio de acelerar ou retardar a maturação natural.

Contrariando essa perspectiva, Leontiev (1978) defende que o papel da


educação escolar é o de criar nas novas gerações aptidões que não são dadas
mediante a hereditariedade. Para tanto, faz-se necessário que as condições
de educação e de vida possibilitem aos homens o acesso à cultura historica-
mente produzida. Nesse sentido, de acordo com Saviani (2003), a função da
escola é a de transmissão-assimilação do conhecimento clássico acumulado
pela humanidade através dos tempos.

Dica de estudo
Natureza Selvagem, direção de Sean Penn, 2007.

Esse filme é uma experiência as sensações humanas. Faz uma reflexão acerca
da vida e da morte. Reflete sobre a felicidade que só existe na presença do outro,
a felicidade só existe compartilhada.

Atividades
1. Quais são as dificuldades de aprendizagem abordadas nesta aula? De forma
geral, do que decorrem essas dificuldades?

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2. Como se define a dislexia e quais são as ações educacionais para o desenvol-


vimento da leitura?

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Gabarito
1. As DAs decorrem de múltiplas causas, desde situações externas a internas. Estu-
damos aspectos sobre as disgrafias, disortografia, dislexias, discalculia, TDAH.

2. É a dificuldade da aprendizagem da leitura, relacionada à identificação, com-


preensão e interpretação dos símbolos. Quando essa dificuldade não pode ser
explicada por condições físicas ou ambientais negativas, deficits sensoriais ou
intelectuais e comprometimento emocional, diz-se que a criança é disléxica.
O disléxico tem dificuldades na análise e na síntese dos estímulos visuais (que
estão no espaço) e dos estímulos auditivos (que estão no tempo).

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O fracasso escolar nos dias de hoje

Irene Carmem Piconi Prestes


O sujeito sofre da desestima na qual está preso por não estar à altura
de suas aspirações, ele sofre também com a depreciação,
quando não com o desprezo que lê no olhar dos outros.
Ora, sabemos bem que lugar ocupa o sucesso social
no espírito de nossos contemporâneos!

Anny Cordiè

O propósito deste texto é pensar o tema do fracasso escolar nos dias


de hoje, tendo por referência a dimensão psicológica e sua contribuição
à educação e ao contexto escolar. Esse tema nos aflige e queremos solu-
ções. Salientamos que são inúmeros os aspectos que devem ser conside-
rados no fracasso escolar, que demonstra ser um fenômeno que não dá
mostras de esmorecer.

Assim, alguns questionamentos: o que acontece no espaço escolar, nas


salas de aula, na relação professor-aluno, que escapa a uma percepção ob-
jetiva? Para que serve a escola para o aluno? Será que o educador consegue
mostrar ao aluno para que serve a escola? O que acontece no campo rela-
cional professor-aluno que interfere no sucesso ou fracasso escolar? Pode-
ríamos dizer que há espaço para a subjetividade no contexto escolar?

Refletir sobre esses interrogantes nos remete à tarefa educativa e, em


última instância, nos remete aos aspectos interativos entre professor-alu-
no-escola e à dimensão psíquica (afetiva-emocional), os quais permeiam
as situações de aprendizagem.

Neste texto prioriza-se o olhar do campo “psi” na educação, a fim de


que se possa compreender o que significa o fracasso escolar e quais as
possibilidades de intervenção em situações de fracasso escolar. Entende-
-se que os aspectos subjetivos (expectativas pessoais, relação com a au-
toridade, valor atribuído ao aprender, afetividade) da personalidade que
perpassam os eventos relacionais estão presentes no contexto da escola,
da sala de aula, da relação professor-aluno.
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O fracasso escolar nos dias de hoje

Destaca-se que, do ponto de vista da dimensão “psi”, importa a maneira como


o aluno vive e interpreta, inconscientemente, sua experiência escolar num dado
momento de sua história escolar. Ainda, vale lembrar que definimos educação
como um sistema aberto que “se elabora no próprio movimento através do qual
eu me construo e sou construído pelos outros, esse movimento longo, comple-
xo, nunca completamente acabado” (CHARLOT, 2000, p. 52).

Já há algum tempo vemos que em cursos de capacitação e reciclagem ofer-


tados em larga escala, surgem teorias e mais teorias – algumas delas estranha-
mente transformadas em métodos – tentando dar conta das razões que levam
alguns alunos a fracassarem em seu percurso escolar. Está em situação de fracas-
so escolar o aluno que não acompanha a proposta curricular, a qual diz o que é
necessário aprender, define a sequência certa e em quanto tempo o aprendiza-
do deve ocorrer.

Tradicionalmente, a noção de fracasso escolar, segundo Charlot (2000, p. 14), “é


utilizada para exprimir tanto a reprovação em uma determinada série quanto a não
aquisição de certos conhecimentos ou competências”. O que significa dizer que o
fracasso escolar é tomado como desvio do padrão ou deficiência sociocultural.

Observamos que todos esses esforços pedagógicos fracassam e a questão


continua a assombrar os educadores:

Por que, afinal, um determinado aluno não aprende? Quais as razões para o
aluno não aprender?

Na tentativa de encontrar uma resposta, inicia-se o processo de busca de re-


solução do problema do fracasso escolar, geralmente na criança – especialmente
sobre o que, supostamente, faltaria nessa criança – com as hipóteses tradicionais,
sobre as carências intelectuais, afetivas, cognitivas, orgânicas, motivacionais ou,
ainda, os impedimentos de fundo biológico, quer sejam neurológicos, psíquicos,
mentais, físicos ou funcionais. O que pudemos concluir, com base nos estudos
realizados sobre o tema do fracasso escolar é que são múltiplas as causas, po-
dendo decorrer de questões pessoais, algumas de ordem psíquica ligadas à pró-
pria estrutura do sujeito, à história pessoal; outras dependem das contingências
às quais o aluno está submetido. Neste texto, em particular, faremos uma digres-
são, a partir dos saberes da psicologia e da psicanálise, acerca das questões que
envolvem o fracasso escolar em crianças ditas “normais”.

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O fracasso escolar nos dias de hoje

O saber medicalizante e o fracasso escolar


O viés estabelecido, a partir da leitura médica, é fortemente influenciado pelo
saber médico positivista, que condiciona de forma inexorável causa e efeito, o
que nos conduz na direção de um saber linear e absoluto sobre o corpo humano
e seu funcionamento.

Assim, tem o médico o poder de saber e de identificar os males que afetam


o corpo e curá-lo de determinada doença. O que se quer é apontar a doença,
o distúrbio, e acaba-se desconsiderando a pessoa, o doente. E, quando não se
consegue identificar a causa, como fica a cura? Isso, hoje, mostra-se também
como algo possível, quanto ao saber “inquestionável” do médico no que diz res-
peito à aids (síndrome da imunodeficiência adquirida), às alergias, às neoplasias
(câncer), muitas sem cura até o momento.

Queremos destacar que as pesquisas sobre a medicalização, sob o ponto de


vista da escola (COLLARES, 1997, p. 65-66), demonstram que, estranhamente,
esse discurso também é praticado, repetido e validado por alguns profissionais
de saúde que parecem partir do mesmo paradigma. Vejamos alguns exemplos de
falas obtidas nessas pesquisas que confirmam essa afirmação, proferidas por um
professor, um médico e um nutricionista:

“A má alimentação é a causa do fracasso escolar, porque a desnutrição afeta


o cérebro”.

“As consequências da desnutrição, como é de se esperar, são desastrosas para


o futuro escolar, já que este tem sua capacidade mental lesada”.

“Uma criança desnutrida já nasce com sequelas, com pouco potencial,


não recuperando as condições necessárias a um melhor desenvolvimento da
aprendizagem”.

Essas afirmações demonstram as convicções que têm seus proferidores acerca


da causa do fracasso escolar, e, em momento algum, questionam outros pontos
ou levantam qualquer dúvida sobre a participação da escola nesse evento, a re-
lação professor-aluno, as ideias e as expectativas escolares.

Atualmente, temos questionado o discurso médico como marca de saber ab-


soluto, de detentor da verdade e da certeza do conhecimento científico.

Agora, o olhar do médico deve se voltar ao doente, à sua pessoa. A pergunta


inicial deixa de ser: quais são os seus sintomas? O que dói em você? E vai na

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O fracasso escolar nos dias de hoje

direção de se buscar saber: quem é você que relata essas queixas? Como você
se vê com esses sintomas? Parece-nos evidente que as manifestações psicosso-
máticas, ao se tornarem cada vez mais frequentes, impuseram uma mudança na
prática discursiva médica. Essa nova prática deverá direcionar o olhar do aten-
dimento médico para a clínica interdisciplinar, com uma equipe de especialistas
na investigação diagnóstica da doença de determinado paciente e a definição
de um plano de intervenção de tratamento também interdisciplinar. Isso com
seus desdobramentos para outros discursos, por exemplo, o educativo.

Fracasso escolar e o contexto social


É possível estabelecer uma analogia entre o saber medicalizante e o fracas-
so escolar, quer dizer, entre a prática médica e a educativa, acerca da particular
visão que têm do exercício profissional médico e educativo. É curioso notar que
o discurso medicalizante impregnou o cotidiano relacional escolar. Ainda, vale
a pena destacar que a doença e o fracasso escolar podem ter sido produzidos
num dado momento sócio-histórico-cultural e que, ainda hoje, imprimem uma
determinada postura, um estilo de clínica para alguns médicos e professores,
mas afirmar que a origem do fracasso escolar é social é um engano.

O campo da Psicologia e da Psicanálise entendem que, para compreender o


fracasso para além desse círculo vicioso de causa-efeito, tem-se que operar com
um sistema de relações sócio-histórico-culturais presentes durante a história
pessoal do aluno em situação de fracasso. Entendendo que são vários os aspec-
tos a serem interrogados para a compreensão e diagnóstico do fracasso escolar.

Salienta-se, neste momento, outro aspecto, que é a relação do fracasso com


o contexto social. Tem-se que na sociedade atual, capitalista, a pobreza é vista
como fracasso social, fracasso de vida. Destarte, tem-se que considerar o caráter
pessoal, também presente no fracasso, já que cada pessoa expressa psiquica-
mente (afetiva e emocional) seu mal-estar numa época em que o capital é tão
importante, em que os bens materiais e o sucesso social são valores tidos como
fundamentais para o homem. É pertinente aqui situarmos o leitor na compreen-
são da subjetividade. Assim citamos Charlot (2000, p. 22), que diz:
[...] somos levados [...] a distinguir a posição subjetiva. A noção de posição remete à de lugar
(no sentido em que um exército toma suas posições), mas também à de postura (no sentido
de: uma má posição provoca fadiga). A posição dos pais, ou da própria criança, é a que
ocupam mas, também, a que assumem, o lugar em um espaço social mas, também, a postura
que nele adotam. O lugar objetivo, o que pode ser descrito de fora, pode ser reivindicado,
aceito, recusado, sentido como insuportável. Pode-se também ocupar outro lugar na mente e

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O fracasso escolar nos dias de hoje

comportar-se em referência a essa posição imaginária. Ou seja, não basta saber a posição social
dos pais e dos filhos; deve-se também interrogar-se sobre o significado que eles conferem a
essa posição.

Assim, temos que o campo subjetivo refere-se a uma certa maneira do sujeito
de recortar, de interpretar inconscientemente sua vivência, sua experiência na
sociedade.

Num outro dito de Charlot (2000, p. 17) sobre a questão do lugar e da posição
subjetiva do sujeito no discurso social tem-se que
[...] não se deve esquecer, no entanto, que a existência escolar do aluno em situação de
fracasso traz a marca da diferença e da falta: ele constrói uma imagem desvalorizada de si ou,
ao contrário, consegue acalmar esse sofrimento narcísico que é o fracasso etc. O fracasso é
estudado “de dentro”, como experiência do fracasso escolar.

Outro aspecto que fornece dados à compreensão do fracasso escolar é locali-


zar o momento na história em que as crianças foram levadas à escola.

Sabemos que, no período entre 1880 a 1918, houve um estrondoso desen-


volvimento industrial e econômico e ocorreram os movimentos imigratórios nos
Estados Unidos e na Europa; frente às novas organizações da sociedade buscou-
-se a escolarização das crianças, filhos dos trabalhadores, em escolas públicas.
Acrescenta-se, aqui, que a instrução laica e obrigatória foi estabelecida por Jules
Ferry em 1880.

Lembramos, nesse período, a utilização dos testes psicométricos de inteligên-


cia, os quais determinam uma medida numérica válida ao coeficiente de inteli-
gência de cada indivíduo, que indicavam a idade escolar, a condição da criança
para frequentar a escola regular pública.

Cabia ao professor a tarefa de transmitir os conteúdos programáticos prees-


tabelecidos ao aluno, atendendo às propostas da escola. Os objetivos educa-
cionais deveriam ser selecionados e organizados em disciplinas, bem como a
quantidade de conhecimento definido. Destaca-se aqui a valorização dos aspec-
tos cognitivos com ênfase na memorização e na produtividade do aluno sob a
forma de um comportamento de entrada e de saída, atendendo a um modelo de
aluno que deve ser processado como um produto fabril, de acordo com a visão
do projeto curricular industrial e econômico (BOBBIT, 1971).

Destarte, com o exposto acima, verificamos ações discriminatórias para o in-


gresso, permanência e sucesso escolar aplicadas às classes ricas e às pobres de
uma sociedade hierarquizada.

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Fracasso e contexto escolar


Façamos um resumo dos apontamentos apresentados até aqui. Vemos que
o discurso medicalizante e o contexto social são aspectos a serem pensados na
investigação diagnóstica do fracasso escolar. É curioso como esse discurso social
e médico de cunho positivista impregna o cotidiano relacional escolar, tomando
espaço nos discursos da escola, nas relações professor-aluno, determinando per-
cepções e alienando aqueles que aderem aos seus pressupostos da causa-efeito,
de desconsideração da pessoa, da afetividade e da subjetividade. Assim, credi-
tam à criança a responsabilidade pelo fracasso na caminhada da aprendizagem,
mas não tocam em um ponto específico: o contexto escolar.

 Ora, qual é o papel da escola?

 Qual a relação do fracasso escolar e o contexto escolar?

 Para que serve a escola para o aluno?

 Qual é a responsabilidade da escola nesse processo?

Por que estranha razão a escola se cala diante de questões intrínsecas ao fun-
cionamento, que afetam, sobremaneira, o desempenho escolar dos alunos e até
mesmo dos professores?

Segundo Charlot (2000, p. 16),


[...] o fracasso escolar não existe; o que existe são alunos fracassados, situações de fracasso,
histórias escolares que terminam mal. Esses alunos, essas situações, essas histórias é que devem
ser analisadas, e não algum objeto misterioso [...], resistente, chamado de fracasso escolar.

Desse modo questionamos alguns mecanismos institucionais que atraves-


sam as práticas educacionais e os discursos dentro dos muros escolares, por
exemplo, o das propostas pedagógicas, o da formação das salas de aula, da dis-
tribuição dos professores, das séries e das turmas.

Na verdade, passa a ser um direito informal do professor mais experiente re-


ceber a “melhor” sala, com os alunos que se destacaram no ano letivo anterior,
enquanto a sala “fraca” fica, usualmente, com o professor recém-formado ou
recém-chegado na escola.

O resultado é previsível, ou melhor, as dificuldades relacionais, de aprendiza-


gem, em breve aparecem e aí o professor terá que contar com a colaboração dos
colegas (professores, pedagogos, diretor) para adequar sua prática educativa.
Quando a situação não é resolvida entra em cena o especialista, médico, psicólo-

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go, fonoaudiólogo ou o terapeuta ocupacional. A autora Collares (1996, p. 15-16)


relata um caso que ilustra a relação do fracasso com o contexto escolar e seus
complicados desdobramentos, é o caso Reginaldo:
Uma professora de primeira série encaminhou para consulta médica o Reginaldo, criança
de oito anos e oito meses, repetente. A professora disse à mãe de Reginaldo que “ele deve
ter problemas na cabeça, pois não aprende, então precisa levar ao médico”. Na anamnese,
constatou-se que Reginaldo sempre foi uma criança absolutamente normal, em termos de
saúde física e mental, apresentando padrões de desenvolvimento neuropsicomotor e cognição
compatíveis com a normalidade. A mãe não sabe se a criança tem problemas e não consegue
entender, pois ninguém nunca percebeu nada até que ele entrasse na escola, não existindo
diferenças entre ele e seus oito irmãos. Relata que “é um pouco nervoso, mas nada que chame
a atenção; e, em casa, é muito sabido, aprende tudo até demais, até o que não deve; não
sabe fazer conta, mas me ajuda fazendo as compras e conhece direitinho dinheiro, sabendo
fazer o troco; eu não entendo, porque acho que quando uma pessoa é ruim da cabeça, não
tem raciocínio para nada”. O pai acha que o filho é normal. No ano passado, Reginaldo foi
reprovado porque, segundo a professora, era “muito novinho, ainda imaturo”. Anteriormente,
a professora já havia encaminhado a um outro serviço médico, solicitando que fosse feito um
eletroencefalograma, pois tinha problemas na cabeça.

O médico que o atendeu disse à mãe que não havia necessidade do exame, pois a criança era
normal. Não satisfeita, a professora o reencaminhou, com as mesmas observações. Reginaldo
não sabe por que não aprende e já tem dúvidas sobre sua normalidade. Ao menor conflito,
os irmãos o provocam: “bem que a professora fala que tem problema”. Quando não consegue
fazer a lição, se desespera, gritando: “eu sei que sou doente, vou passar no médico e precisar
ficar internado uns dez anos”. Durante a consulta, toda vez que se tenta abordar essas questões,
ele chora e se recusa a fazer qualquer coisa.

Terminada a avaliação, tentou-se restituir a normalidade à criança, por meio de um trabalho


com ela e a mãe. Além disso, foi enviado à escola um relatório, dando um diagnóstico final
sobre sua normalidade e plena condição de aprender, ressaltando a ausência de qualquer
patologia que pudesse explicar seu mau rendimento escolar. Foram, ainda, enfatizadas, tanto
para a família como para a professora, as consequências emocionais extremamente negativas
de Reginaldo já estar introjetando uma doença inexistente. Para grande espanto de nossa
equipe, a reação da escola foi violenta e incompreensível. Disseram à mãe que não aceitavam
esse laudo, que a médica era incompetente e que, uma vez que não havia dúvida sobre a
doença de Reginaldo, ele só poderia continuar na escola se fizesse o eletro e fosse medicado.

A dimensão “psi” e as situações


de fracasso escolar
Para compreender o significado do fracasso, é necessário comprender que de
um lado da balança está o fracasso e do outro, o sucesso. Sob esse paradigma,
o que se verifica é uma relação de valores sociais, culturalmente estabelecidos e
determinantes de quem é o aluno.

Ora, esse valor é função de um ideal, determinado imaginariamente no


campo das relações humanas. O ideal preestabelecido aparece descrito no perfil
do aluno esperado pela escola, no perfil do aluno desejado pelo professor, no
ideal de cidadão adaptado ao contexto social e à sociedade.

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Desse modo, identifica-se que o olhar dirigido ao aluno busca uma expecta-
tiva, um ideal, um comportamento padrão e tem relação direta com o aprovei-
tamento e o desempenho escolar do aluno, desconsiderando as suas potenciali-
dades e expectativas com o aprender.

Assim como nos expõe Charlot (2000, p. 27)


[...] quando um aluno está em situação de fracasso, constatam-se efetivamente faltas, isto é,
diferenças entre esse aluno e os outros, ou também entre o que se esperava e o resultado
efetivo. O aluno não sabe, não sabe fazer, não é isso ou aquilo. [...] Ao constatar-se uma “falta”
no fim da atividade, essa falta é projetada, reprojetada, para o início dessa atividade: faltam ao
aluno em situação de fracasso recursos iniciais, intelectuais e culturais, que teriam permitido
que o aprendizado (e o professor) fosse eficaz. Ele é deficiente.

Considerando o até aqui exposto, temos que supor que é coerente pensar
que cada aluno, em particular, terá um rendimento qualitativamente diferencia-
do dos seus colegas.

Destacam-se esses aspectos como relevantes e que compõem essa outra


visão, essa nova postura educacional, da atividade docente frente às questões do
campo educacional relativas ao fracasso escolar, pois um aluno que não aprende
toca fundo no professor, aponta para um suposto fracasso do professor.

O autor Lima (2002, p. 179) quando escreve sobre a relação da psicanálise


com a educação no tratamento de crianças com impasses na constituição da
subjetividade diz-nos que
[...] nas práticas que se tramam no interior da escola, notamos que há o império das regras e
da moral, pois os adultos não se endereçam às crianças em nome próprio, [...] se endereçam a
partir de uma compreensão da suposta realidade psicológica da criança [...].

Outro aspecto que também deve ser evidenciado, a despeito da complexida-


de do tema “fracasso escolar”, refere-se à formação profissional do professor que,
como em outras profissões, é muitas vezes tecnicista, lacunar e reducionista.

Olhar o aluno de outra maneira, relativizar atos, palavras e atitudes que não
correspondem ao que o professor imagina ser normal, parece-nos ser um cami-
nho para esse giro no estilo, na prática, no paradigma educacional para reconsi-
derar o aluno e, assim, mudarmos algo do cotidiano relacional escolar.

Charlot (2000, p. 33) tem uma importante contribuição que descrevemos a


seguir:

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O aluno em situação de fracasso é um aluno, o que nos induz imediatamente a pensá-lo


como tal, em referência à sua posição no espaço escolar, aos conhecimentos, às atividades e
às regras específicas da escola. Mas o aluno é também e, principalmente, uma criança ou um
adolescente, isto é, um sujeito confrontado com a necessidade de aprender e com a presença,
em seu mundo, do ­conhecimento de diversos tipos.

Um sujeito é:

 um ser humano, aberto a um mundo que não se reduz ao aqui e agora,


portador de desejos, movido por esses desejos, em relação com outros
seres humanos, também sujeitos;

 um ser social, que nasce e cresce em uma família (ou em um substituto da


família), que ocupa uma posição em um espaço social, que está inscrito
em relações sociais;

 um ser singular, exemplar único da espécie humana, que tem uma história,
interpreta o mundo, dá um sentido a esse mundo, à posição que ocupa nele,
às suas relações com os outros, à sua própria história, à sua singularidade.

Esse sujeito:

 age no e sobre o mundo;

 encontra a questão do saber como necessidade de aprender e como pre-


sença no mundo de objetos, de pessoas e de lugares portadores de saber;

 se produz ele mesmo, e é produzido, através da educação (CHARLOT, 2000,


p. 33).

Após essa exposição, consideramos que não se pode deixar de lado os aspec-
tos subjetivos, no processo do aprender, para que possam surgir sujeitos singu-
lares, criativos, em sua ousadia e inventividade, que inclusive colaborem para
criar uma escola ­melhor.

Uma última palavra: parece-nos relevante apontar que talvez nosso maior
problema esteja em articular as dimensões psíquicas, cognitivas e sociais en-
volvidas no complexo processo que é o aprender. Salientamos que o aprender,
além de transformar nossa compreensão do que são as coisas, as situações, res-
significa o sentido que elas têm para nós.

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Texto complementar

O “fracasso escolar” não existe;


o que existe são alunos em situação de fracasso
(CHARLOT, 2000)

Por que estudarmos a relação dos alunos com o saber e não o fracasso
escolar, visto ser ele que nos interessa diretamente? Porque, estritamente
falando, não existe o “fracasso escolar”. É verdade que os fenômenos desig-
nados sob a denominação de fracasso escolar são mesmo reais. Mas não
existe um objeto “fracasso escolar”, analisável como tal. Para estudar o que
se chama de fracasso escolar, deve-se, portanto, definir um objeto que possa
ser analisado. Detenhamo-nos um pouco nesse ponto.

Existem, é claro, alunos que não conseguem acompanhar o ensino que


lhes é dispensado, que não adquirem os saberes que supostamente deve-
riam adquirir, que não constroem certas competências, que não são orienta-
dos para a habilitação que desejariam, alunos que naufragam e reagem com
condutas de retração, desordem, agressão. É o conjunto desses fenômenos,
observáveis, comprovados, que a opinião, a mídia, os docentes agrupam sob
o nome de “fracasso escolar”.

Mas esse não passa de um nome genérico, um modo cômodo para desig-
nar um conjunto de fenômenos que têm, ao que parece, algum parentesco. O
problema é que se tem, pouco a pouco, reificado esse nome genérico, como
se existisse uma coisa chamada “fracasso escolar”. Afirmar que o “fracasso es-
colar” não existe é recusar esse modo de pensar sob o qual insinuam-se as
ideias de doença, tara congênita, contágio, evento fatal. Ao escutarmos tais
discursos, temos amiúde o sentimento de que se é hoje “vítima” do fracasso
escolar, assim como outrora éramos da peste. O fracasso escolar não é um
monstro escondido no fundo das escolas e que se joga sobre as crianças
mais frágeis, um monstro que a pesquisa deveria desemboscar, domesticar,
abater. O “fracasso escolar” não existe; o que existe são alunos fracassados,
situações de fracasso, histórias escolares que terminam mal. Esses alunos,
essas situações, essas histórias é que devem ser analisadas, e não algum
objeto misterioso, ou algum vírus resistente, chamado “fracasso escolar”.

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Essa análise, porém, se defronta com uma dificuldade particular: a noção


de fracasso escolar remete para fenômenos designados por uma ausência,
uma recusa, uma transgressão – ausência de resultados, de saberes, de com-
petência, recusa de estudar, transgressão das regras... O fracasso escolar é não
ter, não ser. Como pensar aquilo que não é? Não se pode fazê-lo diretamente,
pois é impossível pensar o não ser. Mas se pode fazer isso indiretamente. São
duas as maneiras de “traduzir” o fracasso escolar para poder pensá-lo.

Pode-se primeiro pensá-lo como desvio, como diferença – isto é, pensar


o não ser em referência ao que, precisamente, ele não é. O fracasso escolar é
uma diferença: entre alunos, entre currículos, entre estabelecimentos.

Foi como diferença que a Sociologia analisou o fracasso escolar nos anos
1960-1970. Mais exatamente ainda, como diferença de posições entre alunos:
o aluno em situação de fracasso ocupa, no espaço escolar, uma posição dife-
rente da do aluno em situação de êxito – sendo essas posições avaliadas em
termos de notas, indicadores de sucesso, anos de atraso, lugar num sistema
escolar hierarquizado etc. Não somente o fracasso escolar é analisado, então,
como diferença de posições como, também, tais posições só fazem sentido
como posições diferentes de outras posições. Com efeito, as posições respec-
tivas, e não essas posições em si, é que permitem falar de fracasso escolar:
que um jovem esteja no terceiro ano colegial (aproximadamente, 8.a série do
Ensino Fundamental brasileiro) aos 17 anos só tem um sentido quando se
sabe que a maioria dos alunos entra no terceiro ano aos 14 ou 15 anos; que
uma criança tire um 2 de um total de 20 atribuídos a um exercício significa, é
verdade, que ela não entendeu o exercício; mas não se falará em fracasso es-
colar se os outros alunos também tiverem uma nota muito baixa. Esse tipo de
Sociologia não trata, na verdade, senão de diferenças e recorre essencialmen-
te à ferramenta que permite apreender e processar diferenças: a estatística.

Seus resultados têm sido amplamente utilizados para afirmar que a


origem social é a causa do fracasso escolar e que os alunos em situação
de fracasso padecem deficiências socioculturais: a posição torna-se, então,
origem, e a diferença é vista como falta. Deveremos interessar-nos por esse
tipo de discurso também.

Mas o fracasso escolar não é apenas diferença. É também uma experiência


que o aluno vive e interpreta e que pode constituir-se em objeto de pesquisa.
Voltar-se-á, então, aos fenômenos empíricos que a expressão “fracasso escolar”

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designa: as situações nas quais os alunos se encontram em um momento de


sua história escolar, as atividades e condutas desses alunos, seus discursos.

Não se deve esquecer, no entanto, que a existência escolar do aluno em


situação de fracasso traz a marca da diferença e da falta: ele constrói uma
imagem desvalorizada de si ou, ao contrário, consegue acalmar esse sofri-
mento narcísico que é o fracasso etc. O fracasso escolar é estudado então “de
dentro”, como experiência do fracasso escolar.

Pode-se, aliás, em um segundo tempo, proceder a uma comparação das


experiências escolares dos alunos, conforme estiverem em situação de su-
cesso ou de fracasso. Volta-se, então, a uma análise em termos de diferen-
ças, mas diferenças, dessa vez, na relação com o saber e a escola, e não mais
(apenas) diferenças entre posições no espaço escolar.

Essas duas maneiras de “traduzir” a ideia vaga de fracasso escolar em um


“objeto de pesquisa” são legítimas e ambas produzem um saber sobre o que o
senso comum chama “fracasso escolar”. Porém, não se equivalem: não produ-
zem um saber sobre os mesmos objetos, embora ambas lidem, aparentemen-
te, com o “fracasso escolar”. A primeira, a que raciocina em termos de diferen-
ças de posições, caracteriza as sociologias que são grandes consumidoras de
estatísticas, notadamente as sociologias ditas da reprodução. A segunda, cen-
trada nas situações, nas histórias, nas condutas, nos discursos [...] (p. 16-18).

Os alunos em situação de fracasso


não são deficientes socioculturais
As sociologias da reprodução raciocinam em termos de diferenças de po-
sições. Acabamos de ver que essas sociologias recebem uma interpretação
abusiva com a tradução de posição por origem ou por fracasso. Uma segun-
da interpretação abusiva ocorre quando a diferença é pensada como defici-
ência sociocultural.

Ao contrário do que é ocasionalmente entendido nos estabelecimentos


de ensino, “deficiência sociocultural” não é um “fato”, uma constatação que
se imporia à prática docente, mas sim uma construção teórica, uma certa
maneira para interpretar o que está ocorrendo (ou não está ocorrendo) nas
salas de aula. O que podemos constatar é que certos alunos fracassam nos
aprendizados e pertencem frequentemente a famílias populares. Nada mais.

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Falar em deficiência e atribuir esses fracassos à origem familiar não é dizer


sua prática: é, sim, formular uma teoria.

Existem diversas formas da teoria da deficiência. John Ogbu (1978) dis-


tingue três. Em primeiro lugar, a teoria da privação: a deficiência é o que
falta para as crianças terem sucesso na escola. Em segundo lugar, a teoria
do conflito cultural: a deficiência é a desvantagem dos alunos cuja cultura
familiar não está conforme com a que o sucesso escolar supõe. Em terceiro
lugar, a teoria da deficiência institucional: nesse caso, a deficiência é uma
desvantagem gerada pela própria instituição escolar, em sua maneira de
tratar as crianças das famílias populares (currículos, programas, expectativas
dos docentes...).

A segunda e terceira formas raciocinam em termos de relações (entre


a cultura familiar e a ­cultura escolar, entre o aluno e a instituição). Pouco
importa aqui saber se essas teorias estão corretas ou não; em todo caso,
elas fazem um uso pertinente da noção de deficiência: a deficiência é uma
­desvantagem do aluno em decorrência de uma relação. A primeira forma, ao
contrário, vê na deficiência não mais uma relação, mas uma falta imputável
ao próprio aluno: este tem deficiências, lacunas, ­carências. Tal falta é pensa-
da como uma característica do aluno: ele é um deficiente sociocultural.

Para entender esse desvio da deficiência com relação à deficiência como


falta imputada ao aluno, é interessante analisar a história da própria noção
de handicap. Segundo o Dictionnaire Historique de la Langue Française (1993),
a palavra vem do inglês hand in cap (a mão ao chapéu), nome de um jogo
de azar. A seguir, entra no vocabulário hípico (1754): para igualar as chan-
ces numa corrida, impõe-se um handicap para um cavalo sabidamente mais
rápido, isto é, uma desvantagem (sob a forma de pesos ou distância suple-
mentar). Em 1827, a palavra já era utilizada na língua francesa e, a partir de
1889, handicapée designava uma pessoa afetada por uma deficiência física
ou mental.

Vale observar que, ao longo dessa história, trata-se de chances, desigual-


dades e igualdade: a noção de handicap poderá ser incorporada sem proble-
mas às sociologias da reprodução e sua interpretação em termos de origens.
O que interessa aqui, no entanto, é, sobretudo, o modo de pensar a desvan-
tagem e sua compensação.

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O handicap é, primeiramente, o fato de impor-se uma desvantagem a um


cavalo mais rápido. Aquele que fica “desfavorecido” é o cavalo mais rápido,
do qual se retira uma vantagem e que não será mais, pois, o “favorito” da cor-
rida. Não é desfavorecido em si: é “propositadamente” desfavorecido. O que
é pensado assim na ideia de deficiência é a produção de uma compensação
(proporcional à vantagem inicial). Ou seja, é uma relação.

A seguir, no entanto, a noção se vê invertida em vários pontos correlati-


vos. O handicap torna-se a deficiência da qual padece uma pessoa que, por
isso mesmo, encontra-se em posição de inferioridade: doravante, o mais
fraco é que é desfavorecido, e não o mais forte; além disso, ninguém quis
essa deficiência, somente fica constatado. O handicap não designa mais a
compensação de uma superioridade, mas aquilo que deve ser compensado,
a deficiência do mais fraco: o handicap não é mais pensado como uma rela-
ção, mas como uma falta que caracteriza o mais fraco.

Como se opera semelhante inversão? Em um primeiro momento, deixa-se


de pensar a própria compensação para pensar a coisa compensatória, aquilo
que deve efetuar a compensação; por exemplo, o peso suplementar imposto
ao cavalo mais rápido: a relação transformou-se em “coisa”, por meio de um
processo mental de reificação. Em um segundo tempo, não se pensa mais a
coisa compensatória, mas aquilo que deve ser compensado, o que falta para
o mais fraco: a coisa compensatória transformou-se em seu inverso, uma
falta, por meio de um processo mental que eu chamarei de aniquilamento.
Com esse duplo processo de reificação e aniquilamento, criou-se esse algo
ausente que a deficiência é, uma falta imputada a um indivíduo. O que impli-
ca que o próprio indivíduo seja reificado e aniquilado: dizer de um aluno que
é deficiente sociocultural é não só pensá-lo como um objeto, mas também
pensar esse objeto pelo que lhe falta: suas “lacunas”, suas “carências”.

A deficiência é uma falta, pois, dada como constitutiva do indivíduo. Mas,


falta de quê? Mais uma vez, é interessante identificar o modo de pensar aí
implícito. Quando um aluno está em situação de fracasso, constatam-se efe-
tivamente faltas, isto é, diferenças entre esse aluno e os outros, ou também
entre o que se esperava e o resultado efetivo. O aluno não sabe, não sabe
fazer, não é isso ou aquilo. Poder-se-ia, então, interessar-se pela atividade do
aluno e a do professor e perguntar-se o que foi que aconteceu, no que, onde
a atividade não funcionou. Mas não é assim que se faz, quando se raciocina
em termos de deficiências. Ao constatar-se uma “falta” no fim da atividade,

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essa falta é projetada, retroprojetada, para o início dessa atividade: faltam


ao aluno em situação de fracasso recursos iniciais, intelectuais e culturais,
que teriam permitido que o aprendizado (e o professor...) fosse eficaz. Ele é
deficiente [...].

Dica de estudo
O filme A Excêntrica Família de Antonia, de direção de Marleen Gorris.

Essa obra cinematográfica premiada com o Oscar de melhor filme estrangei-


ro discorre sobre a saga feminina de três gerações. No cenário de uma pequena
fazenda da Holanda, Antonia relembra o dia em que ali chegou. Apresentam-se
personagens interessantes: a filha adolescente e homossexual, a neta prodígio, a
avó louca, entre outros personagens. O filme traz uma oportunidade rara de vis-
lumbrar os efeitos subjetivos das relações humanas num grupo social e narra me-
taforicamente o quão saudáveis, ou não, podem ser as relações intersubjetivas e
seus desdobramentos aos projetos individuais de cada uma das personagens.

Atividades
Após a leitura do texto, reúnam-se em grupos de três pessoas e escrevam em
poucas palavras o que vocês compreenderam sobre as seguintes questões:

1. Por que ensinar a quem não aprende?

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2. Discorra sobre a responsabilidade da escola no processo do fracasso escolar.

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Gabarito
1. O ponto essencial dessa questão é considerar a partir das contribuições do
campo “psi” à educação que não existem crianças que não aprendem, ou
fracassadas escolares; o que existem são crianças em situação de fracasso,
impedidas circunstancialmente de aprender. Assim, tem-se que focar na
aprendizagem e não no fracasso; quer dizer, deve-se identificar os modos
de aprender da criança, sua relação com o saber. Deve-se considerar que são
muitos os aspectos que estão presentes numa situação de fracasso escolar,
o que significa que localizar o fracasso na criança é trabalhar numa leitura
linear de causa-efeito. Entender que o sujeito é um ser humano, aberto para
as relações interpessoais.

2. A escola como uma instituição social atrelada ao momento histórico con-


tribuiu para o fracasso escolar do aluno. A escola, enquanto um organismo
vivo, interage com a comunidade, faz alianças com ela, responde a reali-
dades mais amplas, como o Estado e o país. É um organismo responsável
pela transmissão dos conhecimentos socialmente acumulados, dos valores
sociais vigentes. A escola estabelece um perfil de aluno, e isso determina o
olhar que é dirigido ao aluno, ao comportamento-padrão, às potencialidades
do aluno e ao aproveitamento escolar esperado. Assim, a escola pode olhar o
aluno de outra maneira, relativizar atos e atitudes que não correspondem ao
perfil idealizado de aluno; parece ser esse o caminho para transformar algo
no cotidiano relacional da escola.

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Valores humanos e o cotidiano escolar

Irene Carmen Piconi Prestes


Este capítulo parte da premissa de uma Educação enquanto condi-
ção para se desenvolver tanto o conhecimento sobre si mesmo quanto o
sentimento de confiança em suas capacidades pessoais e de participação
social, incluindo-se aqui o agir com cidadania. O trabalho educativo orien-
tado pela via ética introduz a dimensão subjetiva do ser humano, o que
significa a ética do respeito e do reconhecimento, onde cada um possa
investir da forma mais diferenciada e singular possível, podendo benefi-
ciar-se com os efeitos dessa experiência. Assim, acredita-se contribuir para
uma educação, no espaço escolar, pautada nos valores humanos.

A aprendizagem em valores humanos no cotidiano das relações esco-


lares está pautada em três eixos: valores, atitudes e normas. Os valores
constituem marcos de referência na vida da pessoa, orientam os juízos de
valores e a tomada de decisões. As atitudes são predisposições para a ação
e preparam-nos para atuar de uma determinada maneira, fazem parte das
características diferenciais da personalidade. Já as normas são prescrições
para atuar de determinada maneira em situações específicas.

A implementação de ações democráticas no cotidiano escolar promo-


ve uma atitude reflexiva sobre as práticas educacionais e o clima de so-
ciabilidade, visando à construção de um ambiente de respeito à pessoa
humana, tendo por referência a Declaração Universal dos Direitos Huma-
nos (1948), a Constituição Federal (1988), o Estatuto da Criança e do Ado-
lescente (1990) e a Política Nacional de Direitos Humanos (2003). Dessa
maneira, tal implementação supera-se às práticas discriminatórias e valo-
riza a diversidade no contexto escolar e nas ações na sala de aula.

É preciso um programa de ações educacionais que integre o Projeto


Pedagógico e o contexto escolar. Assim, modificam-se as práticas discrimi-
natórias e excludentes vigentes, promove-se a igualdade entre as pessoas,
propicia-se o diálogo, a participação, o respeito, a responsabilidade social
e integram-se escola e comunidade.

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Valores humanos e o cotidiano escolar

Getty Images.
Esse programa não elimina as regras, as normas e as leis como mecanismos
necessários para a socialização e a convivência na escola. Essas medidas têm
sempre uma dimensão repressiva, mas não podem perder o caráter educativo,
que aponta para o sujeito e para o limite de sua identidade pessoal e sua perso-
nalidade, ou seja, o limite de sua conduta, que é uma necessidade da convivên-
cia em sociedade e também do processo civilizatório da humanidade.

É preciso que a escola se veja implicada nos conflitos sociais e os reconhe-


ça como elemento constitutivo das relações interpessoais. A escola pode criar
espaços de mediação de conflitos entre categorias como o Conselho da Escola,
a Associação de Pais, Mestres e Funcionários, o Grêmio Estudantil, e assim con-
solidar uma cultura escolar de reconhecimento e de enfrentamento de conflitos
para soluções mediadas.

A Educação promove a formação da consciência moral, que significa coerên-


cia entre o que a pessoa pensa e o que ela faz. Considera-se aqui a conformação
na prática educativa, ou seja, possibilitar a colaboração e o compromisso com a
elaboração de uma norma escolar baseada na concomitância entre os direitos e
os deveres que toda vida em grupo exige. Por exemplo, sabe-se que a destruição
do patrimônio escolar muitas vezes está associada a administrações autoritárias,
indiferentes ou omissas.

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Valores humanos e o cotidiano escolar

Comunidade escolar
pautada nos direitos humanos
Uma comunidade escolar pautada nos direitos humanos acontece no dia a
dia, na busca de direitos e deveres que possam ser incorporados à identidade
pessoal, mobilizando nos alunos o desejo de autonomia e de troca recíproca
de responsabilidades. Segundo Nagel (2006, p. 7), “o sujeito sem identificação
com seus pares torna-se incapaz de dimensionar e/ou perceber alguém que não
seja ele próprio. Não conta com um sistema decodificador ou receptor, a não ser
dos próprios interesses, e por isso não estabelece laços de reciprocidade. Con-
sequentemente, não estabelece vínculos. As amizades são fugidias”. Assim, as
ações educativas em valores humanos devem ter as seguintes características:

Getty Images.

 promoção de estratégias que valorizem as ações positivas dos alunos, que


contribuam para uma melhor autoestima e melhorem o clima relacional;

 observação e percepção, por parte do aluno, de que suas experiências


são comuns às de seus colegas e, por isso, deve responsabilizar-se por sua
conduta. Isso é importante para o comprometimento com as normas es-
colares;

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Valores humanos e o cotidiano escolar

 desenvolvimento do aluno, por meio da ação reflexiva, da capacidade de


autoavaliação. Ou seja, o aluno deve refletir sobre suas condutas antes de
agir e ser consciente da dificuldade de manifestar sua personalidade, de
manter as próprias decisões perante as exigências e pressões do grupo;

 consciência e responsabilidade do aluno por suas condutas, além da refle-


xão sobre as habilidades dos outros e as habilidades individuais;

 vivência de diferentes possibilidades de comunicação entre os grupos,


povos e sociedades.

Ações da comunidade escolar


No tocante à questão inicial de compreender o que é a escola, a psicóloga
Mossato (2000) entende-a como um organismo vivo, que interage com a comu-
nidade na qual está inserida e que, em aliança com ela, responde a realidades
mais amplas, como a do estado e do país. É, no entanto, um organismo que,
se concebido como próprio para a transmissão de conhecimentos socialmente
acumulados e capacitador da mão de obra requisitada pelo mercado de traba-
lho, também responde pela transmissão dos valores humanos sociais vigentes,
dos padrões de relação próprios de tempos e espaços específicos e dos meca-
nismos que os sustentam. Enfim, reproduz, em seu cotidiano, também as disfun-
ções socioculturais.

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Valores humanos e o cotidiano escolar

Para trilhar os caminhos de uma educação pautada em valores humanos, a


escola deve incentivar a participação de toda a comunidade através de formas
estimulantes, interessantes e reflexivas de estabelecer laços sociais inovadores.
Logo, deve pautar suas ações e estratégias educativas conforme abaixo.

 Identificar e apoiar ações sociais que promovam a construção da cidadania.

 Promover intercâmbio interinstitucional para envolver todos os agentes


sociais.

 Sensibilizar e apoiar o desenvolvimento de pesquisas sobre as questões


sociais vigentes.

 Favorecer a adaptação pessoal, familiar, escolar e social do aluno.

 Ampliar as relações de aceitação entre todos os agentes sociais.

 Favorecer a presença na sala de aula e criar espaços de trocas de experiên-


cias sociais.

 Facilitar o entendimento e o diálogo entre professores, alunos e pais.

Construindo o conhecimento
Segundo Nieves (2002, p. 75-85), ter acesso ao conhecimento é uma ca-
racterística humana, os educadores são mediadores do conhecimento coti-
diano e do conhecimento científico. É evidente a necessidade de integrar co-
nhecimentos novos, que considerem as preocupações da vida cotidiana, as
necessidades e os interesses do momento. Os educadores devem começar a
descobrir um novo papel de sua tarefa docente: o que faz e como faz (método).
Sabe-se que a aprendizagem escolar é sensível à quantidade de tempo em que
os alunos participam das tarefas acadêmicas, e que também aprendem mais
quando o educador demonstra interesse sobre aquilo que ensina.

Tomando a referência do Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos


(PNEDH, 2007) o qual entende que a educação voltada aos direitos humanos
significa fortalecer o processo de educação, de modo a contribuir para o exercí-
cio da cidadania, o conhecimento dos direitos universais humanos, o respeito à
pluralidade e à diversidade sexual, étnica, racial, cultural, de gênero e de crenças
religiosas.

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Valores humanos e o cotidiano escolar

Direitos humanos
Constituem direitos humanos sob a re-

Comstock Complete.
ferência do PNEDH (2007) entende como
sendo direito de todo ser humano, sem
distinção de raça, nacionalidade, etnia,
gênero, classe social, cultura, credo, orien-
tação sexual, opção política, ou qualquer
outra forma de discriminação. O exercí-
cio pleno da cidadania, a consideração
da diferença individual e da diversidade
humana nas interações interpessoais.

Esse exercício se dá no cotidiano esco-


lar, na prática da cidadania, ou melhor, a
participação deve estabelecer laços entre
os pares para que as necessidades e os
desejos da comunidade sejam levados em
consideração nas decisões. Considere-se
também que a prática da cidadania, além de ser solidária, encontra-se baseada
em um equilíbrio entre direitos e deveres, o que faz com que, ao estar de fato
participando da vida escolar, cada pai, cada mãe e cada responsável, tenha a
obrigação de fazer o seu melhor pelo bem comum, mas também tenha garan-
tido o seu espaço de participação nas decisões referentes à escola (JACOBI,
2000, p. 11-29).

Educar é um direito humano


A Educação propicia o acesso a uma cultura dos direitos humanos que reflete
na qualidade de vida do aluno e vem representada por condições facilitadoras
que implicam o bem-estar do aluno, quanto ao alcance daquilo que ele busca
como pessoa e como ser social. Considera-se que os valores humanos são con-
dições fundamentais para a pessoa ter um mínimo de dignidade e qualidade de
vida. Dessa maneira, é necessário ter uma educação voltada para o conhecimen-
to sobre tais valores, para que possam ser, no mínimo, reivindicados.

Assim, tem-se que, no PNEDH (2007, p. 11), educar é um direito humano que
conduz:

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Valores humanos e o cotidiano escolar

ƒƒ ao fortalecimento do respeito aos direitos e liberdades fundamentais do ser humano;

ƒƒ ao pleno desenvolvimento da personalidade humana e senso de dignidade;

ƒƒ à prática da tolerância, do respeito à diversidade de gênero e cultura, da amizade entre todas


as nações, povos indígenas e grupos raciais, étnicos, religiosos e linguísticos;

ƒƒ à possibilidade de todas as pessoas participarem efetivamente de uma sociedade livre.

Lígia Nagel (2006, p. 1) nos lembra que cultura


[...] é o resultado das múltiplas ações, atividades, trabalhos, práticas dos indivíduos. No
conjunto dessas inúmeras ações interligadas, produz-se uma forma de ser de sociedade,
constrói-se a cultura de uma época, molda-se o homem desse tempo. Cultura é um conjunto
de características de uma sociedade, geradas no inter-relacionamento humano, preservadas,
aprimoradas e reproduzidas ao longo do tempo, em princípio, sem maiores críticas. Ao se
produzir cultura, portanto, produz-se educação.

Dessa maneira, considera-se a Educação como instrumento mediador que


pode transformar mentalidades e motivar, nos mais variados indivíduos e cole-
tividades, o processo de conscientização de si e para si, em defesa da humaniza-
ção do homem.

De acordo com as ideias de Vygotsky (1994), a escola, sendo um espaço de


aprendizagem, é também um espaço de desenvolvimento, já que a aprendiza-
gem é fonte de desenvolvimento. Cabe, então, à escola, organizar-se por uma
qualidade de ensino que promova a apropriação de valores humanos que con-
tribui para uma nova forma de ver e agir no mundo. Essa é a tarefa humani-
zadora da escola: educar em valores humanos, que se mostra um instrumento
essencial no processo de desenvolvimento da personalidade e na construção da
cidadania.

Texto complementar

Para um sistema básico de valores


compartilhados no projeto educativo da escola
(GONZÁLEZ ALFAYATE, 2002, p. 51-72)

Hoje, podemos garantir que a preocupação pelos valores é algo latente


em todos os sistemas educacionais internacionais. [...] O motivo é que, em
diferentes âmbitos de nossa sociedade, percebe-se uma preocupação gene-

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Valores humanos e o cotidiano escolar

ralizada por fomentar uma postura de atuação que sirva para estabelecer
as bases de convivência de nossa sociedade. Quando esta sente alguma
necessidade ou tem consciência de algum problema, reclama e exige
alguns códigos ontológicos que organizem as pautas de comportamento
ético [...].

Esse enfoque da sociedade também projeta na escola responsabilida-


de sobre o sistema educacional, esperando que dele surjam alternativas
e compromissos apresentados por nossa sociedade, seja ela mais próxima
ou mais distante. [...]

Relacionar a educação com os valores tem muito a ver com a qualidade


de ensino. Qualidade não significa apenas mais salas de aula, mais biblio-
tecas, mais recursos tecnológicos, mais laboratórios – aspectos estes quan-
tificáveis e mais caros − , mas também uma educação em valores, embora
seja a parte mais barata e às vezes mais altruísta da educação. [...]

Fazer uma síntese equilibrada entre o “aprender a aprender” e o “apren-


der a ser” seria válido para responder ao “para que” da educação. Por trás
do discurso de qualidade de ensino estaria essa tarefa humanizadora, de
educação em valores. [...]

Esses valores não podem ser outros senão aqueles que regulam nosso
sistema de convivência e que definem a finalidade principal de nossa edu-
cação: favorecer nos alunos o pleno desenvolvimento da personalidade
que configura o ser pessoa. [...]

Em síntese, educar na dimensão moral da pessoa significa educar sua


autonomia, sua racionalidade, sua capacidade de diálogo, a fim de que
construa princípios e normas que atuem sobre seu conhecimento e sobre
sua conduta, que envolvam o pensar e o agir de cada ser humano, para
que, respeitando a liberdade de todas as pessoas, sua maturidade ética
seja possível. [...]

Situados os valores que a escola pretende difundir, faltaria resolver o


como, e isso implica entrar na trama do próprio sistema educacional. [...]
Como exemplo, [...] poderíamos enumerar o que a escola almeja com a
educação em valores.

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Relação com temas


Concretização do transversais/
Apresentação do objetivo
valor Prioridade do con-
texto
Educação Infantil.
Objetivos:
ƒƒ formar uma imagem positiva de si Autoestima/ Educação sexual.
mesmo; equilíbrio pessoal.
Educação para a saúde.
ƒƒ valorizar sua identidade sexual, ad- Saúde e higiene.
quirir hábitos básicos de saúde e de
bem-estar.
Ensino Fundamental.
Objetivos: Educação para a con-
ƒƒ estabelecer relações equilibradas com Amizade. vivência.
pessoas de diferentes idades e sexo; Educação para a paz.
Respeito/tolerância.
ƒƒ utilizar normas adequadas de com- Educação para a igual-
portamento; dade.
ƒƒ repudiar discriminações.

Ensino Médio.
Educação ambiental.
Objetivos:
Educação para a saúde.
ƒƒ analisar e avaliar a influência humana Vida.
Divisão de responsabili-
no meio físico para melhorar a quali-
dades.
dade de vida.

[...] Como conclusão, se não queremos que a presença dos valores na


escola seja meramente testemunhal, estes devem supor uma abordagem
sistemática.

Isso significa defini-los no Projeto Educativo da Escola, através dos sinais


de identidade, concretizá-los nos objetivos, propiciar a estrutura mais idônea
e baseá-los em algumas normas; no Projeto Curricular da Escola, os objetivos
e os conteúdos deveriam ser programados e sequenciados nas diferentes
etapas e áreas, explicitando a metodologia mais adequada; realizá-los nas
programações de sala de aula e, por último, avaliá-los em todos os níveis.
Somente se for um processo intencional é que se propiciará sua aquisição,
evitando, assim, que fiquem apenas no plano das boas intenções.

A escola tem o desafio e o compromisso de educar seus alunos, que devem


estar bem preparados cientificamente e, como dizia o poeta, “no pleno senti-
do da palavra bem”. Embora não haja garantias de que as boas pessoas sejam
as mais felizes, ainda assim elas continuam sendo boas pessoas.

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Valores humanos e o cotidiano escolar

Dica de estudo
Escritores da Liberdade, dirigido por Richard LaGravenese, 2007.

O filme é baseado no best-seller O Diário dos Escritores da Liberdade e discute


um ponto essencial das relações interpessoais, que é a ética na civilização.

Atividades
1. De acordo ao Plano Nacional em Educação de Direitos Humanos, a que con-
duz a educação, que é um direito humano?

2. Discorra sobre o que significa valor, norma e atitude.

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Valores humanos e o cotidiano escolar

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Gabarito
1. Ao fortalecimento do respeito aos direitos e liberdades fundamentais do ser
humano; ao pleno desenvolvimento da personalidade humana e senso de
dignidade; à prática da tolerância, do respeito à diversidade de gênero e cul-
tura, da amizade entre todas as nações, povos indígenas e grupos raciais,
étnicos, religiosos e linguísticos; à possibilidade de todas as pessoas partici-
parem efetivamente de uma sociedade livre.

2. Valores constituem marcos de referência na vida da pessoa, orientam os ju-


ízos de valores e a tomada de decisões. Atitudes são predisposições para a
ação e preparam-nos para atuar de uma determinada maneira, fazem par-
te das características diferenciais da personalidade. Normas são prescrições
para atuar de determinada maneira em situações específicas.

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Relações interpessoais
e o grupo na escola

Irene Carmen Piconi Prestes


O objetivo deste capítulo é destacar o valor das relações humanas,
das relações interpessoais ou, ainda, das e nas relações entre pessoas no
espaço da escola. Entendemos que é nesse contexto que o aluno poderá
exercer e desenvolver suas potencialidades, ancorado no professor e
assim transformará a si mesmo e a comunidade. De acordo com Carvalho
e Guimarães (2002), o sujeito nasce da relação de pessoas. Nessa relação,
ele é concebido e gerado em uma troca mútua e na interação, cresce e
desenvolve-se numa rede de relações sociais que, embora se modifiquem
ao longo da vida, o acompanharão, e ele será parte delas sempre.

Vivemos em um contexto sociocultural pleno de contradições. O de-


senvolvimento das tecnologias, das ciências e da informática é muito mais
rápido do que o desenvolvimento do homem. Cresce a responsabilidade
social com a capacitação do ser humano para conviver com as mudanças
dessa sociedade tão dinâmica. E quando isso não ocorre, gera frustrações,
desmotivação, estresse, revolta, problemas psicológicos, depressão para
o indivíduo.

Os chamados distúrbios de conduta (verificados sob a forma de agres-


são, birra e outras condutas antissociais, ou interiorizadas em timidez e
inibições excessivas) constituem o contrário do desenvolvimento global
esperado e geralmente estão associados a deficits em habilidades sociais,
a dificuldades de aprendizagem, a problemas de comportamento impor-
tantes para desempenhos mais adaptativos. Guiomar Namo de Mello, em
entrevista à revista Nova Escola (jan./fev. 2005, p. 18), levanta um questio-
namento: que pessoas queremos formar?
Para ser coerente com a noção de que a Educação Básica deve preparar para a vida, não
uma vida qualquer, mas uma boa vida, é preciso reconhecer que tudo na escola existe
para desenvolver nos alunos um conjunto de características e competências igual
ou equivalente a essa pessoa que desejamos formar. A organização pedagógica, o
conteúdo do currículo, a gestão da sala de aula. Afinal, o que é a vida que todos querem
senão um contínuo exercício de aprendizagem, autonomia, cuidados, sensibilidades,
uso de recursos?

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Relações interpessoais e o grupo na escola

Assim, vemos que a Educação e, por consequência, o professor, desempe-


nham papel fundamental no desenrolar da ação recíproca indivíduo versus con-
texto social. E hoje, mais do que nunca, ser professor é saber lidar com a dúvida,
com o não saber das questões atuais e deixar escondida a sua formação enquan-
to detentor do saber, mestre das verdades imutáveis (BARBOSA, 2001).

Sociabilidade
Os seres humanos possuem uma tendência para viver em sociedade, fazendo
parte de uma comunidade organizada com leis, valores, moral, costumes, cren-
ças etc. Diríamos que cada um de nós se sente como pertencendo a vários sub-
grupos sociais que se organizam em culturas mais amplas (PRETTE, 2001).

Segundo Carvalho e Guimarães (2002), nos últimos anos tem aumentado o


interesse de pesquisadores pela forma com que as pessoas se relacionam logo
no início de seu desenvolvimento, visto que se observa que desde o nascimento
o ser humano identifica-se com um conjunto de padrões de comportamento que
lhe torna possível interagir e adaptar-se ao ambiente em que vive e, dessa forma,
mesmo antes de ter adquirido comportamentos mais complexos, nota-se que
existe uma predisposição para que a vinculação afetiva e social se concretize.

Os comportamentos sociais podem ser manifestados de forma positiva ou


negativa. Manifestações positivas são chamadas comportamentos pró-sociais
e incluem requisições, gratificações, presentes. Manifestações negativas são
denominadas comportamentos antissociais que incluem agressões, censuras,
ameaças, roubos (XAVIER, 2002).

Atualmente, a estrutura total da sociedade funciona de tal forma que um in-


divíduo é coagido por outrem a coagir a si próprio, por vias específicas. Desde
muito cedo, pedimos a uma criança para se “autocontrolar”. Todas as nossas ins-
tituições atuam nesse mesmo sentido. Nas nossas sociedades, a força física está
sempre presente, ficando, porém, normalmente, nos bastidores; e, como o indi-
víduo pode exercer o seu próprio juízo, ele mesmo deve se coagir, desta forma:
[...] afirmar que a teoria identifica o processo de civilização com a progressão do autocontrole
é uma simplificação abusiva. [...] visto que não se pode produzir ou manter a autocoação sem
que haja algum controle vindo de outrem. [...] Sem nenhuma coação externa, não pode haver
coação interna; [...] Para mim não pode existir ordem social alguma se não houver coerções
vindas de terceiros ou de si próprio. (ELIAS, p. 106, 1989)

Para Piaget (1974), o desenvolvimento se dá através da relação do aluno com


o meio em que vive, o conhecimento é construído a partir da ação do sujeito
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sobre o objeto. Conhecer algo não significa parafrasear a realidade, o sujeito


deve ser capaz de observar e modificar o objeto, fazendo parte e compreen-
dendo como se realizou todo o processo. Para estimular o desenvolvimento dos
alunos, deve-se considerar a individualidade e respeitar os níveis de desenvol-
vimento no que se refere à assimilação dos esquemas de elaboração mental. O
professor, no papel de orientador, deve apresentar atividades estimulantes para
que o próprio aluno descubra os caminhos que o levam a ser mais criativo, co-
nhecedor, participante e transformador da sua realidade.
A didática reinante ainda considera o professor como o único detentor do saber, em sala de
aula. O aluno deve manter-se horas a fio, calado e atento. O professor vai-se habituando a
trabalhar com os “limites do não pode”, ao invés de privilegiar os “limites da possibilidade”, não
levando em conta que o objetivo do trabalho pedagógico se efetua do aluno enquanto aluno,
isto é, o trabalho pedagógico se efetua para fazer com que a figura do estudante desapareça.
(BOARINI, 1998, p. 14)

Podemos considerar que, no processo de socialização, a criança adquire com-


portamentos, atitudes, significações, valores tidos como adequados pela cultu-
ra em que vive. Os papéis sociais variam, em todas as culturas, de acordo com
o sexo, a idade, o status socioeconômico e cultural do sujeito. Eles se formam
durante toda a infância e adolescência e se atualizam na vida adulta. Nesse pro-
cesso, a criança torna-se membro de um determinado grupo social, aprendendo
seus códigos, suas normas e regras básicas de relacionamento social.

Segundo Lindgren (1982, p. 64),


[...] o convívio social é estimulador e talvez suas características é que levam as crianças a
procurar interagir com os outros. É verdade, também, que as crianças sentem-se atraídas pelas
pessoas por razões funcionais, já que necessitam de ajuda e de proteção para lidar com o
ambiente.

No processo de crescimento infantil, a convivência com outras pessoas tem


efeito estimulante na aprendizagem social. Assim, o que a criança aprende de-
pende das interações com o contexto sociocultural.

No processo de socialização, a criança também está construindo sua perso-


nalidade, ou seja, aquele aspecto do eu que nos dá a sensação de pertencermos
a grupos sociais, que faz com que nos sintamos ao mesmo tempo iguais a todos
os outros indivíduos do grupo e diferentes de todos eles. A esse sentimento Eri-
ckson deu o nome de integridade do eu ou sentimento de identidade pessoal.

A escola é também um lugar de socialização. Os alunos gostam de ir à escola,


divertem-se, fazem amigos e namoram. Relatam que não gostam é da sala de
aula, pois este é um espaço em que só o mestre tem privilégios, ele não se sente
à vontade na sala. Dessa maneira, o reverso pode acontecer quando se propi-
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Relações interpessoais e o grupo na escola

ciam momentos para o aluno pensar, quando as disciplinas são ensinadas de


forma que os alunos reflitam sobre o que estão aprendendo, apreciem estar
ali, tenham sentimento de pertencimento e sintam-se estimados. Isso significa
gestão de sala de aula atualizada às constantes e rápidas mudanças sociais.

Atitude
A atitude, enquanto comportamento social, é aprendida de acordo com as
experiências, as informações e a percepção que o indivíduo vai organizando e
relacionando com afetos (positivos ou negativos). Aprende-se, desse modo, a
comportar-se de modo favorável ou desfavorável, em relação ao(s) outro(s). As
atitudes sociais podem ser modificadas a partir de outras interações e novas ex-
periências de grupo.

Dessa forma, entende-se que os processos mentais organizam-se por meio


das predisposições e habilidades herdadas e adquiridas nas experiências sensó-
rio-perceptivas, visuais, olfativas, tátil-cinestésicas e fisiológicas em processo de
desenvolvimento e organização na criança e no adolescente. O desenvolvimen-
to mental é um processo que se diferencia do crescimento orgânico. A mente
atinge um funcionamento maduro na adolescência. Dessa maneira, as formas
superiores mentais têm uma tendência a se ampliar ao longo da vida; cada vez
mais a experiência enriquece, aperfeiçoa a reflexão e a capacidade de se relacio-
nar do homem. Por isso, ele não cessa nunca de aprender: aprender a conhecer,
aprender a ser, aprender a fazer, aprender com o outro a conviver.

Em relação à manifestação dos processos mentais do adolescente, é necessá-


rio considerar também o seu meio de expressão e de comunicação. Nos momen-
tos progressivos, apresenta um pensamento abstrato e comunicação predomi-
nantemente verbal e, nos momentos regressivos, um pensamento concreto e
uma comunicação com muitos elementos não verbais (gestos, dramatização,
corporal-cinestésico).

Esses dois momentos do comportamento adolescente se alternam, por vezes,


em certos espaços de tempo, dificultando a busca de um modelo de comunica-
ção adequado, de um diálogo realmente produtivo entre o adulto e o adolescente,
pois surgem ocasiões em que alguém fala se dirigindo a um adulto e encontra uma
criança como interlocutor, e outras em que alguém busca se dirigir a uma criança e

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encontra um adulto. Por isso o tão idealizado diálogo entre pais e filhos não é algo
fácil e atitudes algumas vezes falam mais do que palavras (OUTEIRAL, 1994).

Por essas razões, é preciso observar a realidade à nossa volta, agir e pensar sobre
para onde o mundo está indo. O conceito de aprendizagem, portanto, teve de se
tornar mais dinâmico; aprender passou a ser exigência instrumental para a com-
preensão do mundo atual. A flexibilidade é uma atitude social de grande impor-
tância nos dias de hoje: saber aprender e desaprender com certa desenvoltura.

Papel social
Os diferentes papéis sociais são referências para a nossa percepção do outro.
A nossa enorme plasticidade como seres humanos permite que nos adaptemos
às diferentes situações sociais e sejamos capazes de nos comportar diferente-
mente em cada uma delas. No transcurso do desenvolvimento social, a criança
aprende a compreender os papéis e os pontos de vista dos outros e, eventual-
mente, chega a reconhecer que as regras, normas e valores morais são essenciais
para dirigir as relações humanas.

É importante o que o indivíduo traz consigo como carga pessoal, mas o que
fará com que se constitua como tal é a condição de ele se relacionar com outro
ser humano. Assim, “o quem eu sou” está exposto ao livre-arbítrio de cada um
durante o seu desenvolvimento, dependendo, portanto, de cada indivíduo.

Mesmo que essa escolha tenha sido forçada e inconsciente, quem escolhe é o
sujeito, ainda que seja um bebê. Dessa maneira, sempre somos responsáveis por
aquilo que somos ao longo da vida.

É preciso estar atento às relações interpessoais no grupo, pois elas sempre


podem melhorar, jamais sendo perfeitas. Segundo Fritzen (2001), estão sempre
se atualizando, quando

 as oportunidades de diálogo e de conhecimento mútuo se multiplicam;

 existem hábitos de respeito e de aceitação mútua;

 tempo e interesse são empenhados, havendo preocupação com os outros;

 as pessoas são valorizadas.

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O grupo social
Desenvolver atividades para trabalhar em grupo é importante, pois muito do
aprendizado social é feito em grupo. A experiência de grupo aproxima pessoas
com necessidades semelhantes que podem apoiar-se mutuamente e sugerir so-
luções para problemas comuns, ajudando umas às outras. Os integrantes de um
grupo experimentam novos papéis e, ao verem qual é a reação do outro diante
deles, podem ser apoiados (PRETTE, 2001; BARBOSA, 2001; PICHON-RIVIÈRE,
1982).

O trabalho de grupo é importante para o indivíduo porque gera:

 criatividade e espontaneidade;

 autoconfiança e reconhecimento pessoal;

 percepção da sua potencialidade;

 aumento de autonomia e motivação;

 liberdade para tomar decisões e testar ideias;

 expressão de sentimentos, emoções;

 gerenciamento de situações conflitantes;

 reflexão crítica;

 relaxamento.

O trabalho de grupo também tem importância social porque gera:

 reconhecimento e apreciação do outro;

 ação cooperativa;

 comunicação;

 compartilhamento de experiências;

 constatação da universalidade da experiência e da singularidade do indi-


víduo;

 apoio e confiança social;

 compreensão sobre a medida em que afetamos os outros e os relaciona-


mentos.
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“Eu” e o grupo
O adolescente, para ser aceito no grupo, tem de se submeter às novas regras,
por vezes violentamente, e assim ser considerado um novo membro. Os ritos de
iniciação são variados, mas têm muitos elementos em comum: submissão, acei-
tação das regras do grupo, alguma exigência de sofrimento físico estão sempre
presentes. A primeira comunhão dos católicos é um exemplo de inclusão social.

É comum, hoje, ver adolescentes envolvidos com drogas, e esse comporta-


mento pode significar a sua forma de inserção no grupo de pares. O grupo de
iguais poderá induzir o uso da droga por vários motivos:

 para ter um sentido de pertencer a um grupo em um ritual comum, provo-


cando experiências e possibilidades a identificação com a turma;
 como um rito de iniciação e de introdução no grupo;
 como uma atitude de exibicionismo, mostrando-se ao grupo como cora-
joso e não tendo medo de nada;
 receio de ser diferente dos outros e ser tido como medroso.

O papel do educador
É preciso, na atualidade, ensinar os alunos a usarem as informações criativa-
mente. Assim, faz-se necessário o desenvolvimento das habilidades para a so-
lução de conflitos que são impostos pelo ambiente social e exigem habilidades
de discriminar e responder a estímulos sociais e, simultaneamente, aos próprios
estímulos internos (pensamentos e sentimentos).

A educação criativa proporciona autoconfiança, espontaneidade, flexibili-


dade e prepara o aluno para conviver com as ambiguidades e as contradições
sociais. É no processo de ensino-aprendizagem que o educador pode exercitar
com o aluno a convivência e a sintonia com o meio social. Para enfrentar os de-
safios e aproveitar as oportunidades que se criam, a aprendizagem deve estar
ligada à qualidade dos vínculos que o aluno estabelece com os colegas e com o
professor. O mundo está, pois, necessitando de pessoas que saibam usar as in-
formações recebidas na escola sob novos pontos de vista. Pessoas que pensem
diferente. Como nos lembra Prette (2001, p. 222):
Viver tem o significado de preservar e de modificar, paradoxo imposto pela força da bio(vida)logia
do ser em transação permanente com as imposições do ambiente, resultantes da convivência.
Conviver, viver com, é um processo natural de agregação de todos os seres vivos.

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O uso de novas tecnologias de informação no processo de ensino-aprendiza-


gem significa a criação de outras possibilidades de se transmitir conhecimentos.
Além disso, as novas tecnologias engendram o aparecimento de novas interações
na sala de aula entre professor e aluno, que irão afetar as práticas escolares tradicio-
nais e provocar mudanças educativas. No entanto, sua eficácia depende de como
são aplicados esses recursos, que devem visar a um domínio mais claro do mundo
e das muitas maneiras que irão surgir da aplicação dos conhecimentos do homem.
Observa-se que o uso eficaz dos microcomputadores na educação depende dos
processos cognitivos e motivacionais da aprendizagem (PRETTE, 2001).

Texto complementar
Criando interesses e despertando curiosidade
(WOOFOLK, 2000, p. 358-359)

Quando Walter Vispoel e James Austin pediram a mais de 200 alunos de


Ensino Médio para classificarem as razões para seus sucessos e fracassos
em diferentes matérias escolares, “falta de interesse no assunto” recebeu
a classificação mais alta como explicação para fracassos. O interesse ficou
atrás apenas do esforço como escolha para explicar sucessos. Parece lógico
que as experiências de aprendizagem deveriam estar relacionadas aos in-
teresses dos alunos. Entretanto, isso nem sempre é uma estratégia fácil ou
mesmo desejável; há ocasiões em que os alunos devem dominar habili-
dades básicas que não têm interesse intrínseco para eles. Contudo, se um
professor sabe quais são os interesses dos alunos, estes podem fazer parte
de muitas estratégias de ensino. Por exemplo, Cordova e Lepper verifica-
ram que os alunos aprendiam mais fatos matemáticos durante um exer-
cício de computador quando eram desafiados, como capitães de naves
estelares a navegar pelo espaço, resolvendo problemas matemáticos. Os
alunos tinham que dar nomes às suas naves, abastecer a galé (imaginária)
com seus lanches favoritos e dar nomes aos membros da tripulação em
homenagem aos seus amigos.

Para alunos mais jovens, a chance de manipular e explorar objetos rele-


vantes ao que está sendo estudado pode ser a forma mais efetiva de manter

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a curiosidade estimulada. Para alunos mais velhos, perguntas construídas,


quebra-cabeças lógicos e paradoxos podem ter o mesmo efeito. Exemplo:
os rancheiros em uma região mataram os lobos em suas propriedades. Na
primavera seguinte, eles ficaram sabendo que a população de cervos estava
muito menor. Como poderia ser isso, uma vez que os lobos caçam cervos e
menos lobos deveriam significar mais cervos? Em busca de uma solução, os
alunos aprendem sobre ecologia e o equilíbrio da natureza: sem lobos para
eliminar os cervos mais fracos e mais doentes, a população de cervos au-
mentou tanto que o suprimento de alimento do inverno não pôde sustentar
os seus rebanhos e muitos morreram de inanição.

George Lowenstein sugere que a curiosidade surge quando a atenção é


focalizada em uma lacuna no conhecimento. “Essas lacunas de informação
produzem o sentimento de privação chamado de curiosidade. A pessoa
curiosa é motivada a obter a informação que falta para reduzir ou eliminar
o sentimento de privação” (p. 87). Isso tem inúmeras implicações para o
ensino. Primeiro, os alunos necessitam de alguma base de conhecimen-
to antes de poderem experimentar lacunas no conhecimento, levando à
curiosidade. Segundo, os alunos devem estar conscientes das lacunas para
que exista curiosidade. Pedir aos alunos que façam suposições, então for-
necer feedback pode ser útil. Além disso, os erros, adequadamente maneja-
dos, podem estimular a curiosidade, apontando o conhecimento que falta.
Finalmente, quanto mais aprendemos sobre um tema, mais curiosos podemos
nos tornar em relação ao assunto (grifo nosso). Como previu Maslow, satis-
fazer a necessidade de saber e entender aumenta, não diminui, a necessi-
dade de saber mais.

Dica de estudo
A Fábrica como Agência Educativa, de Felipe Luiz Gomes e Silva, Cultura
Acadêmica.

O autor aborda de maneira criativa as implicações da relações pessoais na


atualidade, fazendo um elo histórico dos efeitos das relações interpessoais no
trabalho e na educação.

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Atividades
1. Defina sociabilidade com base nos argumentos sobre relações interpessoais
e o grupo na escola.

2. Segundo Fritzen, é preciso estar atento às relações interpessoais no grupo,


pois elas sempre podem melhorar e estão sempre se atualizando. Quando
isso deve ser feito?

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Gabarito
1. Os seres humanos possuem uma tendência para viver em sociedade, fazen-
do parte de uma comunidade organizada com leis, valores, moral, costumes,
crenças etc. Diríamos que cada um de nós se sente como pertencendo a vá-
rios subgrupos sociais que se organizam em culturas mais amplas.

2.

 as oportunidades de diálogo e de conhecimento mútuo se multiplicam;

 existem hábitos de respeito e de aceitação mútua;

 tempo e interesse são empenhados, havendo preocupação com os outros;

 as pessoas são valorizadas.

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Anotações

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Psicologia e Psicologia e
EDUCAÇÃO
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Irene Carmen Piconi Prestes
Catarina de Souza Moro

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