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30/03/2016 a 11/05/2016
Elaboração: 06/2015
Atualização: 03/2016
CONSIDERAÇÕES PRÉVIAS
MÓDULO IV – PRECEDENTES?
a) A teoria dos precedentes e o novo CPC
b) Incidente de resolução de demandas repetitivas (IRDR)
c) Incidente de assunção de competência
a) Aspectos gerais
Parcela das alterações trazidas pelo CPC/15 pode ser mais aparente do que
substancial; por exemplo, por acolherem entendimento jurisprudencial, por
permitirem expressamente o que já era aceito pela doutrina ou até mesmo pelos
tribunais ou por organizarem o que em linhas gerais já estava previsto no código
anterior. De todo modo, algumas novidades são em geral destacadas, entre elas
as seguintes.
Inicialmente, tem-se a valorização do contraditório e da cooperação
processual, vedando a decisão surpresa. Nesse sentido, como previsões gerais
que densificam o contraditório no processo, garante-se às partes a “paridade de
armas” (art. 7.º), e há a regra, contemplada pelo art. 9.º, de que nenhuma decisão
será proferida sem prévia oportunidade para que a parte se manifeste, exceto nas
hipóteses de tutela de urgência, da tutela de evidência prevista no art. 311, II e III,
e do procedimento monitório. Ainda, “o juiz não pode decidir, em grau algum de
jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às
partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual
deva decidir de ofício” (art. 10).
Outro ponto relevante é a preferência conferida à “autocomposição do litígio”.
Já no art. 1.º, fixa-se que o Estado deve promover, preferencialmente, a “solução
consensual dos conflitos”. No § 3.º, o dever é estendido, não valendo somente
para o juiz, mas também para os advogados, defensores públicos e membros do
Ministério Público, que devem estimular a mediação, a conciliação ou outros
métodos de solução consensual. Ademais, indo além das determinações gerais, o
código prevê, por exemplo, no procedimento comum, uma audiência inicial de
conciliação ou mediação, antes da apresentação de defesa pelo réu (art. 334),
que apenas é dispensada se as duas partes indicarem que não têm interesse na
realização do ato ou não for admitida a autocomposição (art. 334, § 4.º). Além
disso, o CPC/15 regula especificamente a mediação e a conciliação judiciais (arts.
165 a 175). Quanto ao tema, em reforço, vale lembrar também que foi editada a
Lei 13.140/2015, “sobre a mediação entre particulares como meio de solução de
controvérsias e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito do administração
pública”.
Modificou-se, ademais, a contagem dos prazos processuais, que passam a
correr somente em dias úteis (art. 219), além de haver suspensão, como regra,
entre 20 de dezembro e 20 de janeiro (art. 220, caput), impedindo inclusive a
realização de audiências e sessões de julgamento (art. 220, § 2.º). Ligado ao que
foi visto em relação às soluções consensuais, “suspendem-se os prazos durante a
execução de programa instituído pelo Poder Judiciário para promover a
autocomposição, incumbindo aos tribunais especificar, com antecedência, a
duração dos trabalhos” (art. 221, parágrafo único). Especificamente quanto ao
Ministério Público, segundo o art. 180, tem prazo em dobro para manifestar-se
nos autos. Houve, por fim, a unificação dos prazos recursais, que passam a ser
todos de 15 dias (art. 1.003, § 5.º), com exceção dos embargos declaratórios, que
permanecem com o de 5 dias.
O CPC/15, ainda, traz outras alterações do sistema processual que serão
abordadas durante o curso em módulos próprios, como: o incidente de
desconsideração da personalidade jurídica; a unificação das “tutelas de urgência”;
a possível estabilização da tutela antecipada; a viabilidade de julgamento
antecipado parcial do mérito; a cláusula geral dos negócios jurídicos processuais;
a possibilidade de dinamização do ônus da prova pelo juiz; a eliminação da ação
declaratória incidental genérica e a correlata extensão da coisa julgada para as
questões prejudiciais, desde que atendidos os requisitos legais; a “flexibilização”
da admissibilidade dos recursos, em detrimento da “jurisprudência defensiva”; a
“transformação” dos embargos infringentes em uma técnica de julgamento; o
incidente de resolução de demandas repetitivas; a valorização dos “precedentes”;
e a quebra da impenhorabilidade absoluta dos salários e outras rendas.
Por fim, mas não menos importantes, devem ser mencionadas outras duas
novidades: a ordem cronológica dos julgamentos, ao ser proferido acórdão ou
sentença, e a especificação do dever de fundamentação da decisão judicial – ou,
mais precisamente, a especificação das hipóteses em que uma decisão judicial
não é considerada fundamentada.
A da ordem cronológica encontra-se naquele primeiro livro, sobre as “normas
processuais civis” (art. 12), sendo que a primeira lista de processos para esse
julgamento seguindo a sequência cronológica observará a antiguidade da
distribuição entre os já conclusos na data da entrada em vigor do código (art.
1.046, § 5.º). Originalmente, esta ordem cronológica era obrigatória, mas, com a
Lei 13.256/2016, passou a ser “preferencial”. Além do mais, não apenas o
julgamento, em sentença ou acórdão, deve dar-se preferencialmente dentro de
ordem de tal natureza, mas também a publicação e o cumprimento das decisões
pelo cartório ou secretaria (art. 153).
As exceções à ordem cronológica dos julgamentos são: as sentenças
proferidas em audiência, homologatórias de acordo ou de improcedência liminar
do pedido; o julgamento de processos em bloco para aplicação de tese jurídica
firmada em julgamento de casos repetitivos; o julgamento de recursos repetitivos
ou de incidente de resolução de demandas repetitivas; as decisões proferidas
com base nos arts. 485 e 932; o julgamento de embargos de declaração; o
julgamento de agravo interno; as preferências legais e as metas estabelecidas
pelo Conselho Nacional de Justiça; os processos criminais, nos órgãos
jurisdicionais que tenham competência penal; a causa que exija urgência no
julgamento, assim reconhecida por decisão fundamentada (art. 12, § 2.º). Em
relação à secretaria ou ao cartório, são elas: os atos urgentes, dessa forma
reconhecidos pelo juiz na respectiva decisão, e as preferências legais (art. 153, §
2.º).
A especificação do dever de fundamentação da decisão judicial, por sua vez,
está na parte especial, no capítulo que regula os elementos e efeitos da sentença
(art. 489, § 1.º), elencando as hipóteses em que a decisão judicial – seja ela
sentença, decisão interlocutória ou acórdão – não será considerada
fundamentada. Inobservadas as exigências, a decisão é tida como nula (art. 11),
sujeita a embargos de declaração por omissão (art. 1.022, parágrafo único, II),
além de outros recursos eventualmente cabíveis.
Analisando essas novidades:
1
Desde logo, ressalte-se que o texto foi escrito antes da aprovação do projeto pelo Senado e,
portanto, também antes de o código ser publicado. Assim, menções de projeto de código devem
ser compreendidas como efetivamente do novo CPC. Ademais, quanto a artigos que contam com
outra numeração na versão final, foi indicada a atual, entre colchetes, para facilitar a
compreensão. Por fim, o texto obviamente também é anterior à Lei 13.256/2016, que atribuiu o
caráter “preferencial” à ordem de julgamento do art. 12, assim como à de publicação e
cumprimento do art. 153.
sentença ou acórdão.
“O dispositivo, em primeira análise, se mostra louvável e é plasmado de
ótimas intenções, já que, de fato: (a) o julgamento em ordem cronológica dos
processos é imperativo de igualdade (art. 5.º, caput, da CF/1988); (b) a regra
impedirá que o julgamento siga ordem distinta considerando as partes envolvidas
(e sua eventual capacidade econômica ou política), ou mesmo a influência ou o
prestígio do advogado atuante; (c) a previsão, igualmente, obstará que os órgãos
jurisdicionais venham a preterir os processos mais complexos em favor dos
processos mais simples, de fácil resolução; e (d) por conseguinte, a disposição
contribuirá para debelar a morosidade do processo, já que as causas mais
complexas receberão tratamento em tempo semelhante ao das mais simples.
“O que, entretanto, aparenta ser um avanço (e é prometido e aplaudido como
tal), causará infindáveis problemas práticos, principalmente em 1.º grau de
jurisdição, havendo real risco de a novidade prejudicar a prestação do serviço
público jurisdicional.
“Conforme dados do TJSP – que serve de base diante da magnitude do seu
acervo no universo Judiciário brasileiro –, mais de 50% das unidades de 1.º grau
no Estado de São Paulo têm competência cível cumulativa (cível em geral,
empresarial, falência, consumidor, além dos processos relativos à Corregedoria
dos cartórios extrajudiciais), grande parte delas, inclusive, também com
competência para os feitos de Família, Criminal, Infância e Juventude, Execução
Fiscal, Juizados Especiais Cíveis e da Fazenda Pública etc. Em outros termos,
sendo notório que São Paulo é o Estado brasileiro com a maior interiorização da
Justiça, possível afirmar que no Brasil bem mais do que metade das unidades
jurisdicionais em 1.º grau de Jurisdição são cumulativas, competentes para julgar
desde os conflitos mais simples aos mais complexos.
“Então, o primeiro problema com a ordem cronológica surgirá em se saber – à
míngua de regra clara, se ela vale apenas para os processos estritamente cíveis,
ou se ela se estenderá nessas varas cumulativas, também, para os processos de
natureza infracional, administrativa (dúvidas, pedidos de providência, retificações
de registro) e seguintes do rito dos Juizados (Cíveis, Federais e da Fazenda
Pública). Há como se definir uma ordem cronológica sem considerar esse
componente na equação, mesmo considerando as exceções já contempladas no
dispositivo?
“O segundo problema é o da regra aumentar o mal que exatamente visa
combater: a morosidade.
“Pois não há como se negar que, com a novel disposição, o aporte para
julgamento de causas mais complexas (v.g. uma ação societária, uma ação civil
pública ou de improbidade administrativa) impedirá o julgamento de questões
mais simples, cuja rápida solução é de manifesto interesse social (causas
previdenciárias, que envolvam alimentos, execuções, despejos e procedimentos
de jurisdição voluntária em geral, tais como interdições, alvarás para
levantamento de valores etc.).
“Ainda que o § 2.º do art. 12 estabeleça exceções ao julgamento por ordem
cronológica; e que no estertor dos debates na Câmara tenha sido inserida uma
louvável exceção genérica (IX – a causa que exija urgência no julgamento, assim
reconhecida por decisão fundamentada); elas podem não ser suficientes para
contornar o eventual mal provocado pela disposição. Só quem efetivamente milita
no foro sabe o que representa para o jurisdicionado a rápida solução de certos
conflitos de menor complexidade não contemplados pelas exceções legais.
“E tudo sem contar que no estabelecer o julgamento por cronologia, o
legislador projetista desconsidera – por completo –, que há causas a merecer
reflexão mais demorada do magistrado, bem como outras que a própria
postergação da intervenção judicial é necessária para que as partes reflitam
melhor sobre o conflito e, muitas vezes, alcancem a autocomposição.
“(...).
“9. O dever de fundamentação
“Academicamente um dos mais importantes dispositivos do projeto do Novo
CPC/Câmara, absolutamente consentâneo com a promessa constitucional de
fundamentação das decisões judiciais, é o art. 499 [equivalente ao art. 489 do
CPC/15], § 1.º.
“Optou o legislador projetista, na absoluta dificuldade em se disciplinar o que
se entende por decisão fundamentada, em estabelecer quando uma decisão não
é fundamentada, encontrando, assim, o primeiro conceito a contrario sensu, a
partir da negação da segunda ocorrência.
“O dispositivo aponta que não se considera fundamentada qualquer decisão
judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que: (a) se limitar à
indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua
relação com a causa ou a questão decidida; (b) empregar conceitos jurídicos
indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso; (c)
invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão; (d) não
enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese,
infirmar a conclusão adotada pelo julgador; (e) se limitar a invocar precedente ou
enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes, nem
demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos; (f) deixar
de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela
parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a
superação do entendimento.
“Estabelece, ainda, o § 2.º do art. 499 do Projeto [art. 499 equivalente ao art.
489 do CPC/15] que ‘no caso de colisão entre normas, o órgão jurisdicional deve
justificar o objeto e os critérios gerais da ponderação efetuada’, enunciando as
razões que autorizam a interferência na norma afastada e as premissas fáticas
que fundamentam a conclusão.
“A importância que se dá para a fundamentação das decisões no projeto do
Novo CPC é tamanha, que o art. 11 do Projeto – ao enunciar as normas
fundamentais de processo civil –, estabelece expressamente que a pena pela não
fundamentação das decisões é a nulidade, o que estará a propiciar não só a
anulação dos pronunciamentos pelas instâncias superiores, como até a rescisão
de sentenças proferidas com esse vício.
“A fundamentação das decisões judiciais é uma das maiores garantias do
jurisdicionado em um Estado Democrático de Direito. Além de afastar o arbítrio
judicial e permitir o manejo adequado dos recursos, ela tem o importante papel de
explicar ao jurisdicionado as razões pelas quais seu pleito foi acolhido ou
desacolhido pelo Estado-Juiz.
“Todavia, da forma rigorosa como se estabeleceu o que é o ‘não
fundamentar’, há risco concreto de se concentrar nos Tribunais, principalmente no
STJ, um poder quase que absoluto de anulação. Sob a rubrica da falta de
fundamentação, praticamente qualquer decisão judicial pode ser anulada pelo
STJ, anos após prolatada, em sede de Recurso Especial.
“Além disso, em um ambiente de metas e de constante cobrança por
produtividade (algumas vezes maior do que a capacidade estrutural das unidades
judiciais do país), exigir-se fundamentação tão minuciosa para toda e qualquer
decisão judicial pode implicar em diminuição do rendimento da Justiça, com os já
conhecidos males para a causa da celeridade.
“É necessário buscar um equilíbrio entre o dever de fundamentação das
decisões judiciais, a segurança jurídica e a celeridade processual. Talvez o
projeto tenha exagerado dando prevalência do primeiro. Compete à doutrina e à
jurisprudência restabelecer o equilíbrio.”2
2
GAJARDONI, Fernando da Fonseca. Pontos e Contrapontos sobre o Projeto do Novo CPC.
Revista dos Tribunais, v. 950, dez. 2014. Notas de rodapé omitidas na citação.
(arts. 354) ou de julgar imediatamente o pedido ou parcela do pedido ou dos
pedidos (art. 355), tem o juiz de organizar o processo (art. 357 e ss) a fim de
viabilizar condições adequadas para a produção da prova (arts. 369 e ss) e para a
decisão da causa (arts. 485 e ss). Em sendo o caso, tem de determinar o
cumprimento da sentença, determinando a prática de atos executivos (arts. 513 e
ss). As decisões prolatadas no procedimento comum no primeiro grau de
jurisdição podem ser controladas mediante recursos para o segundo grau de
jurisdição (arts. 994 e ss). As decisões tomadas pelo segundo grau de jurisdição
podem ser objeto ainda de novos recursos para o Supremo Tribunal Federal e
para o Superior Tribunal de Justiça (arts. 102, III, e 105, III, da CF).
“Nada obstante essa sequência legalmente estruturada, haja vista a adoção
do princípio da adequação, o procedimento pode ser em grande medida adaptado
pelo juiz (art. 139, VI) e pelas partes (art. 190) para atender às necessidades
evidenciadas pelo caso concreto. Por exemplo, o procedimento pode avançar
com as comunicações dos atos processuais sendo realizadas oportunamente a
cada ato ou com a dispensa de comunicações por prévio acordo (mediante a
fixação de um calendário processual). A organização do processo pode ocorrer
por escrito ou oralmente em audiência (art. 357). O ônus da prova, normalmente
distribuído de maneira fixa pelo legislador, pode modificado pelo juiz (art. 373). A
prova, que normalmente é colhida depois de organizado o processo, pode ser
colhida de forma antecipada (arts. 381 e ss). Dependendo do caso, pode ou não
ser necessária a realização da audiência de instrução e julgamento (arts. 358 e
ss), pode ser necessária uma fase de liquidação da obrigação pecuniária em que
condenado o réu (arts. 509 e ss) ou pode ser necessária uma fase de
cumprimento da sentença (arts. 513 e ss).
“No procedimento comum, o juiz pode praticar atos de conhecimento e atos
de execução – daí a razão pela qual, aliás, é um equívoco teórico discipliná-lo
dentro do processo de conhecimento. O juiz conhece das alegações das partes e
das provas produzidas para, logo em seguida, dar razão a uma das delas,
julgando procedente ou improcedente o pedido – não sendo o caso, é claro, de
extinção do processo sem resolução de mérito. Se necessário, ainda, depois de
prolatada sentença de procedência, pratica atos executivos a fim de promover o
seu cumprimento.”3
Questionamentos:
3
MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo Curso de
Processo Civil: Teoria do Processo Civil. V. 2. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, p.
141-142. Notas de rodapé do trecho reproduzido omitidas.
CAMARGO, Luiz Henrique Volpe. Pela Ordem: A polêmica sobre o início da
vigência do Novo CPC. Jota, 2015. Disponível em: <http://jota.uol.com.br/pela-
ordem-a-polemica-sobre-o-inicio-da-vigencia-do-cpc2015>.
Lei n.º 13.140/2015 – Dispõe sobre a mediação entre particulares como meio de
solução de controvérsias e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da
administração pública e adota outras providências. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13140.htm>.